Edição número 12 - Revista o Professor

Transcrição

Edição número 12 - Revista o Professor
Entrevista: “O Ensino a Distância vem com uma única preocupação: o
dinheiro”, declara Professor Aloísio Alves da Silva
SINPRO - Sindicato dos Professores do ABC
Edição nº 11
Ensino @ Distância
Avanço ou retrocesso?
Revista do Professor - SINPRO ABC
1
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Revista do Professor - SINPRO ABC
SINPRO - Sindicato dos Professores do ABC
Edição 11 - 2009
Educação
05
Além da lousa, do
lápis e da caneta..................
Entrevista
08
Professor Aloísio
Alves da Silva ..................
E mais...
Afinal, a reforma ortográfica, por Clarice Assalim.................................................... 12
Comportamento: Qual sua qualidade de vida hoje?............................................... 15
O Pré-Sal é nosso............................................................................................................. 18
Quanto custa salvar o planeta?.................................................................................... 20
A catástrofe nos cursos de Letras, por Marcos Bagno.............................................. 22
EaD no Ensino Médio. Um passo para trás?............................................................... 23
Revolução Chinesa e Revolução Cubana, por José Rodrigues Maó Jr...................27
O centenário de Carmen Miranda............................................................................... 33
Fórum Social Mundial de Belém ..........................................................................35 e 37
Revista do Professor - SINPRO ABC
3
Editorial
Revista do Professor, nova fase
O SINPRO ABC apresenta a primeira revista eletrônica: a nova Revista O Professor. A partir de agora,
a categoria contará com duas publicações impressas e duas eletrônicas, que esperamos venham efetivar a
interação que sempre buscamos com nosso leitores.
A cada revista construímos um caminho que nos remeta para a produção materiais que possam ser
adequados pelo professor às suas necessidades, quer profissionais, quer pessoais, quer político-sociais.
Assim temos nos pautado e conduzido durante a elaboração de todo o material produzido, focamos,
sempre, no professor, em seus anseios, em sua sala de aula.
A presente edição nos traz discussões relevantes e interessantes sobre saúde, economia, política,
cultura, entre outros assuntos. Transitamos pela EaD no Ensino Médio, iniciativa que muito nos preocupa;
pelo alerta sobre os cursos de Letras; pelo pré-sal; pela qualidade de vida; pela questão ambiental, que
temos discutido em todas as nossas publicações; pelo novo Acordo Ortográfico e as implicações de sua
implementação; pelo formato de nossas aulas e nossa visão de educação. Enfim, reunimos informações
que atuarão na prática diária do professor, possibilitando a reflexão, integrando-se à formação de cada
profissional da Educação.
Esperamos que você, professor, participe deste processo de construção, opine, envie sugestões,
interaja através do site do sindicato, para que cada vez mais possamos satisfazer suas expectativas,
disponibilizando materiais de seu interesse, que possam, de alguma forma facilitar seu trabalho e valorizar
sua profissão.
Revista do
Publicação do Sindicato dos Professores de Santo André, São Bernardo e São Caetano
Ano IV - Número 11 - 2009 - ISSN 1807-7994 - SINPRO ABC - Gestão 2007/2011
Diretoria Executiva: Aloisio Alves da Silva, Célia Regina Ferrari, Denise
Filomena L. Marques, José Carlos Oliveira Costa, José Jorge Maggio,
Nelson Valverde Dias e Paulo Roberto Yamaçake
Presidente: Aloisio Alves da Silva
Diretora de Imprensa: Denise Filomena L. Marques
Edição e reportagem: Mayra Monteiro - MTb 47.135
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Revista do Professor - SINPRO ABC
Projeto Gráfico e diagramação: Mayra Monteiro e Israel Barbosa
Capa: Israel Barbosa
Tiragem: 4.000 exemplares
SINPRO ABC - Rua Pirituba, 61/65 - Bairro Casa Branca - Santo André
CEP 09015-540 - São Paulo
www.sinpro-abc.org.br • [email protected]
Educação
Ensino além da lousa, do
lápis, da caneta...
Desempenho em
sala de aula pode ser
potencializado com
atividades corporais
A
receita é a mesma há anos. Alunos
sentados nas carteiras e os focos
devem ser somente a lousa e
o caderno. Aquele que resolve
levantar, caminhar pela sala ou fazer qualquer outra
coisa “fora da cadeira” certamente será repreendido
com um sonoro “não atrapalha, sossega, senta e
presta atenção na aula!”.
Parece que o modelo das escolas julga que
o aluno é composto somente pela cabeça (e mãos
para copiar e escrever). E, assim, perguntamos: onde
fica o corpo nessa história? A atriz e professora de
dança e teatro, Letícia Olivares, faz um importante
alerta para os professores e administradores de
escola: “Infelizmente, o modelo de alunos estáticos,
sentados e olhando para frente ainda é um modelo
de disciplina considerado ideal nas salas de aula.
Porém, é prejudicial tanto para a apreensão do
conhecimento, quanto para ao posicionamento
corporal dos alunos, que muitas vezes não adotam
uma postura correta (apoiar-se sobre os ísquios,
manter a coluna ereta, apoiada no encosto da
cadeira, pés apoiados no chão)”.
Por outro lado, o que podemos observar são
alunos cada vez mais sedentários, aficionados por
vídeo games e computadores, que aproveitam as
horas vagas para fazer... nada! Com esse sedentarismo,
outros problemas também surgem e podem
comprometer a saúde e o desempenho escolar
dos estudantes. “Os alunos estão mais sedentários
e com isso os problemas vão aparecendo, como,
por exemplo, a obesidade”, destaca a professora
de Educação Física, Samantha Freitas. “Mas ainda
podemos perceber que a parte motora das crianças
está cada vez mais prejudicada, pois atividades que
eram praticadas antigamente, como correr, saltar
e andar de bicicleta na rua, hoje, já não acontecem
com tanta frequência”, completa Samantha.
Revista do Professor - SINPRO ABC
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O esporte na educação
falar na concentração, fundamental para um bom
aprendizado”.
Com atividades esportivas, a postura também
será corrigida e, além do benefício escolar, trará
melhoras na saúde dos alunos. Mas cuidado: para
cada fase de desenvolvimento motor, há um tipo
de exercício recomendado. “É preciso respeitar a
faixa etária e o desenvolvimento individual de cada
criança”, ressalta Samantha, “aos pais e professores,
cabe destacar que não devem comparar as crianças,
exigindo que todas apresentem os mesmos
resultados, pois cada um tem seu tempo para
aprender, sua individualidade”.
O sentimento de liberdade é uma boa forma
de estimular os alunos ao aprendizado. Agregar
movimentações corporais aos ensinamentos traz
mais descontração às aulas e o conhecimento vem
juntamente com o prazer de uma brincadeira.
“Os professores podem otimizar o tempo
dentro da sala, propondo uma boa espreguiçada,
junto com bocejos sonoros, para ‘acordar’ o corpo
antes do início da aula. Também deve contar com
sua sensibilidade e propor pausas quando os
alunos começam a ficar inquietos nas cadeiras,
fazendo com que levantem e façam
movimentos de balanço com os
“Infelizmente, o
braços soltos em torno do corpo,
modelo de alunos
espreguicem novamente e voltem
estáticos, sentados e
a sentar”, sugere a atriz e professora
olhando para frente
Letícia Olivares.
ainda é um modelo de
Para a Samantha, os esportes
disciplina
considerado
também funcionam como uma
ótima ferramenta para auxiliar na ideal nas salas de aula.
Porém, é prejudicial
fase escolar, uma vez que aumentam
a consciência corporal de quem os tanto para a apreensão
do conhecimento,
praticam.“A concentração e a destreza,
ambos trabalhados com esportes,
quanto para ao
são habilidades que a criança levará
posicionamento
para seus aprendizados futuros”,
corporal dos alunos,
explica a profissional da Educação que muitas vezes não
Física, “por exemplo, para escrever, é adotam uma postura
necessária uma coordenação fina que
correta"
o esporte auxilia a desenvolver. Sem
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Revista do Professor - SINPRO ABC
aula
Atuando na sala de
Com criatividade, as artes
cênicas também são ferramentas
que podem ser exploradas dentro do
ambiente escolar. “A contribuição das
artes cênicas implica em um trabalho
sobre potencialidades, ou seja, o que
cada um tem como potência a ser
despertada e trabalhada”, comenta
Letícia, “isso gera apropriação de si,
maior autoconfiança e autoestima,
habilidades
de
comunicação,
percepção sensorial, agilidade física
e mental, posicionamento ético,
desenvolvimento de percepção
estética, capacidade de trabalho em
equipe, de liderança, de improvisação,
de empatia, entre outras que refletem
em um indivíduo/cidadão mais
consciente das relações possíveis
entre si e o mundo e de seu papel na
sociedade”.
Comoteatro, osalunosvivenciam
experiências que contribuirão nas
formações acadêmica e social da
cada um. Isso ocorre porque a arte
refina conceitos de interpessoalidade,
trabalho em equipe, habilidades
motoras, melhora na dicção, oratória,
entre outros.
Para os professores e outros
trabalhadores, a teatralidade também
tem muito a contribuir na desenvoltura
durante a execução das atividades
profissionais. Letícia Olivares apresenta
algumas declarações de diversas
pessoas que, de alguma forma,
atrelaram os conceitos aprendidos
em aulas de teatro com a rotina de
trabalho.
em disposição diferenciada, como no
chão;
“É preciso que o
- Representação teatral para
professor também
explicação de passagens históricas;
tenha uma percepção
- Para a socialização, em
corporal de si e dos
fila indiana, os alunos massageiam
outros, e perceba
as costas e nuca uns dos outros,
que o corpo não é
trocando de lado ao comando do
uma máquina, mas
professor. Essa atividade promove
sim um sistema que
o toque e quebra de barreiras. Com
adolescentes, esse tipo de atividade
está o tempo todo
depende muito da habilidade do
interagindo com o
professor em conduzir, pois nessa
ambiente, com as
condições climáticas, fase, as brincadeiras maliciosas
com o humor, enfim, servem de proteção para o contato
é uma presença viva físico. Como alternativa, pode-se
aplicar jogos que utilizam conceitos
e interativa e não um
cooperativos, como levantar e falar
robô condicionado
em alto e bom som, uma qualidade
a falar na frente da
de alguém, a classe tenta adivinhar
lousa ou ficar sentado, quem é, e assim sucessivamente, até
estático e ouvindo, no todos terem dito alguma qualidade
caso dos alunos”
dos colegas. Também, pode-se
pedir que a pessoa demonstre
corporalmente as qualidades que
“Aprendi a prontidão, a disciplina, o silêncio e foram listadas;
o riso na hora certa. Tive ciência do quanto vivemos
- Para ansiedade, nada melhor do que
o dia-a-dia sem estarmos em cena, realmente. respirações profundas. O professor pode sugerir
O despertar e a consciência foram os resultados que os alunos fechem os olhos, coloquem as mãos
imediatos dos exercícios que foram desenvolvidos, sobre a barriga e tentem empurrar as mãos com
e não desaprenderei mais” - Kátia Regina R. Martin, o ar levado até o baixo ventre, procurando um
administradora de empresa
preenchimento de ar de toda a caixa torácica e não
apenas do peito;
“O teatro abriu muitos caminhos na minha
- Para desenvolver uma abordagem solidária,
vida particular e profissional, como soltura corporal, pode-se vendar os olhos de grupos de cinco
criatividade, alegria, amizade, cumplicidade, alunos e outro, sem venda, ficará responsável
reconhecimento e descontração” - Cristina Saghy por guiar o grupo organizado em fila indiana, em
Kassab, professora do Ensino Fundamental
deslocamentos pelo espaço, cuidando para que
ninguém se machuque. Todos devem passar pela
Sugestões
experiência de guiar e ser guiado;
Atendendo a pedidos da Revista O Professor,
- Mais sugestões podem ser encontradas nos
a atriz e professora, Letícia Olivares, dá algumas livros de Viola Spolin, como Jogos Teatrais na Sala
sugestões de atividades que os professores possam de Aula.
aplicar durante as aulas e transforma-las em
Mas para que o bom resultado seja observado,
momentos divertidos e mais proveitosos.
Letícia alerta: “é preciso que o professor também
- Jogo rápido de sentar e levantar: Pode ser tenha uma percepção corporal de si e dos outros,
articulado com o conteúdo da matéria trabalhada, e perceba que o corpo não é uma máquina, mas
como por exemplo, em uma aula de Português, sim um sistema que está o tempo todo interagindo
verbos são o comando para levantar e substantivos com o ambiente, com as condições climáticas, com
para sentar. Sentar quando as afirmações forem o humor, enfim, é uma presença viva e interativa
corretas e levantar nas incorretas na aula de História, e não um robô condicionado a falar na frente da
Geografia ou outras disciplinas;
lousa ou ficar sentado, estático e ouvindo, no caso
- Debates em círculos, com os alunos sentados dos alunos”.
Revista do Professor - SINPRO ABC
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Entrevista
"O Ensino a Distância
vem com uma
única preocupação:
dinheiro"
Israel Barbosa
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Revista do Professor - SINPRO ABC
O professor Aloísio Alves da
Silva, presidente do Sindicato
dos Professores do ABC, é
o primeiro entrevistado da
Revista O Professor versão
online. Em pauta, movimento
sindical, educação, Ensino a
Distância e muito mais. Assista a
íntegra da entrevista em www.
revistaoprofessor.com.br
Revista O Professor – O SINPRO ABC existe
há mais de 20 anos, mas muitos professores
não conhecem a estrutura e como funciona um
sindicato. Conte para os docentes um pouco da
história do SINPRO ABC e qual papel na vida dos
professores da base.
Professor Aloísio – Tem que participar! Aliás,
essa é uma crítica que nós fazemos a boa parte de
nossa base, pois entendemos que o sindicato, na
verdade, é todo o conjunto. Hoje temos algo em
torno de quatro mil associados e diria que, nesse
universo, um terço é somente no Ensino Superior.
Já sentimos, um pouco, uma participação maior,
que tem ampliado, talvez até pelo trabalho que
estamos executando. Hoje temos uma videoteca,
que tem trazido muito o professor até o sindicato,
temos diversas atividades, congressos, a Jornada
Pedagógica para os professores da rede Sesi/Senai,
que tem contado com uma participação muito
grande. Mas ainda gostaríamos de contar com uma
participação maior, principalmente na campanha
salarial.
Professor
Aloísio
–
Primeiramente
quero agradecer por essa iniciativa e ressaltar a
importância desse trabalho novo que o Sindicato
está começando. É uma honra ser o primeiro
entrevistado.
A importância do SINPRO ABC nos três
segmentos que representamos, Ensino Básico,
Sistema S (Sesi/Senai) e também o Ensino Superior,
dá-se no sentido de garantias de
direitos trabalhistas e de condições
"A importância do
de trabalho ao professor. Destacamos,
OP – Resumidamente, qual
SINPRO ABC nos
principalmente, que antes da
é a principal vantagem em ser um
três segmentos que
existência do SINPRO ABC, o professor
professor sindicalizado?
representamos, Ensino
tinha seu contrato regido única e
Básico, Sistema S
exclusivamente pela CLT e não havia
Professor Aloísio – A primeira
recebimento de hora-atividade, que (Sesi/Senai) e também questão é no sentido de fortalecer
o Ensino Superior,
é um valor pago para a preparação
a luta do Sindicato, no que se refere
dá-se no sentido de
de aulas. Entendemos que ainda é
à própria manutenção e ampliação
garantias
de
direitos
um percentual muito baixo, mas,
dos direitos. A categoria tem que
trabalhistas e de
antes, nem esse percentual existia.
entender que, quanto maior o
Buscamos, a cada ano, a ampliação condições de trabalho número de associados, mais forte o
desse índice, como já aconteceu
Sindicato fica em suas campanhas
ao professor"
na rede Sesi/Senai, que não tinha
de negociações pela garantia dos
nada e hoje recebe 15% de horadireitos. Segundo lugar, tem a questão
atividade. Antes, também, não havia o pagamento daquilo que o Sindicato oferece aos associados,
do descanso semanal, garantia semestral de salário como o Departamento Jurídico, as várias atividades
etc. Hoje, graças ao Sindicato e a Convenção promovidas pelo Sindicato, estamos em fase de
Coletiva, nós asseguramos valores consideráveis conclusão da nossa primeira turma do Curso de
aos professores.
Libras (desenvolvida na sede do SINPRO ABC), temos
Como é que o Sindicato chega ao professor? diversos convênios de grande importância. Aquilo
O Sindicato chega ao professor principalmente que ainda não conseguimos avançar na Convenção
através das visitas. Acredito que somos um dos Coletiva, oferecemos através dos convênios.
poucos sindicatos que têm um trabalho de estar Destaco a parte de lazer, que é fundamental na vida
constantemente no local de trabalho daquele do trabalhador/professor. Estamos em processo de
que ele representa. Boa parte dos sindicatos implantação, até o final de março deve estar tudo
só se aproxima dos professores ou de outros certo, de convênios na parte médica e odontológica
trabalhadores de outras categorias em momento a todos os associados.
de campanha salarial. Pelo contrário, nós estamos
Os não-associados às vezes falam assim: “o
constantemente em contato com os professores Sindicato não faz nada por mim”. Faz sim, faz muito,
nos locais de trabalho.
através da Convenção Coletiva. O professor que
não é associado ao Sindicato tem que entender que
OP – Por outro lado, os professores também a Convenção Coletiva lhe garante direitos e essa
devem participar das atividades do sindicato...
luta, quando assinamos a Convenção, não é para
o associado, é para toda a categoria. Nossa base
Revista do Professor - SINPRO ABC
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está em torno de 7 mil professores, incluindo os
três segmentos que representamos – Ensino Básico,
Sistema S e Ensino Superior -, e nas Convenções
Coletivas estão garantidos os nossos direitos.
Inclusive assinamos Convenções Coletivas válidas
por dois anos, que garantem nossos direitos.
OP – Como a atual diretoria foi escolhida?
Qual foi a participação dos professores da base na
escolha dos professores que os representariam
no SINPRO ABC?
o Sindicato tem feito aos mantenedores das
escolas?
Professor Aloísio – Nossa principal
reivindicação está associada, principalmente,
à questão da valorização através do salário e,
também, das condições de trabalho. Hoje notamos
a precarização nas relações de trabalho - diga-se de
passagem se dá em todos os setores e não somente
na educação, como nos bancários, na saúde etc. O
trabalho do Sindicato vem no sentido de fiscalizar,
durante as visitas que falei anteriormente, quando
falamos com os professores se está havendo ou não
o respeito à Convenção Coletiva. Pela Convenção,
nós entendemos que é um mecanismo de tentar
limitar ou inibir essa ação de desrespeito e de
valorizar o professor.
Esse é um momento que enfrentamos
uma série de dificuldades, no Ensino Superior
particularmente, devido à política agressiva de
algumas instituições para ganhar mercado. Essa
luta para ganhar mercado acaba precarizando as
relações e condições de trabalho.
Professor Aloísio – É um Sindicato
democrático. A composição da diretoria se dá,
primeiro, através de uma convenção em que os
professores são chamados para participar. Depois é
aberto o processo para a formação de chapas. Vale
destacar que não houve a formação de uma chapa
de oposição, o que culminou em uma chapa única.
Essa chapa única foi legitimada pelos professores,
que participaram do processo eletivo da atual
diretoria. Tivemos mais de 94% dos professores
votando na diretoria que compõe, hoje, o SINPRO
ABC e dirigirá de 2008 até 2011,
em um mandato de quatro anos. "A categoria tem que
Vale ressaltar a participação dos entender que, quanto
maior o número de
professores dos três segmentos,
associados, mais
inclusive dos aposentados.
OP – O Sindicato defende
a valorização do trabalho do
professor. Atualmente, quais são
as principais reivindicações que
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Revista do Professor - SINPRO ABC
forte o Sindicato fica
em suas campanhas
de negociações pela
garantia dos direitos"
OP – Esse é o lema da campanha
“Educação não é mercadoria”...
Professor Aloísio – Educação
não é mercadoria, porque infelizmente
os mantenedores têm encarado a
educação como uma mercadoria
como outra qualquer, haja vista um
seminário que foi realizado por eles
na segunda-feira (09/03/09), no qual participei
como ouvinte, e destacaram justamente que não há
preocupação focada na qualidade, mas, sim, para
manter os rendimentos. O que mostra, portanto,
que mantenedor de instituição do ensino particular
tem a preocupação central em termos de valores e
não exatamente na qualidade de ensino, que nós
do Sindicato defendemos.
OP – Por falar em qualidade de ensino,
qual sua opinião sobre Ensino a Distância, tanto
no nível Médio como no Ensino Superior?
que, primeiro, o aluno do Ensino a Distância requer
maior disciplina, maior responsabilidade, e no
Ensino Médio, acredito, que ainda não tenha essa
maturidade para tal. Está ligado à própria formação
do cidadão. É preciso entender que a escola está
ligada à formação da cidadania e quando se coloca
esse ponto no Ensino a Distância, avaliamos que
fica complicado. A obrigatoriedade do ensino das
disciplinas Sociologia e Filosofia gerou um grande
problema, não só na rede privada, como também na
rede pública, já que houve uma confusão a respeito
da implantação e adequação da grade curricular
dessas disciplinas, e, então, uma das soluções foi
“jogar” essas disciplinas para o Ensino a Distância.
Nós entendemos que é prejudicial, sim, para a
qualidade de ensino.
Professor Aloísio – O Ensino a Distância,
em sua proposta inicial, é preciso ponderar de
duas formas. O Brasil é um país com dimensão
continental. Para a população do Norte, CentroOeste ou interior do Nordeste do país, em que
OP – Professor, para finalizar, deixamos
muitos alunos, de fato, não têm acesso à educação, aberto o espaço para fazer suas considerações
principalmente no Ensino Superior, essa proposta finais aos professores.
é interessante por permitir que esse cidadão, que
acaba sendo excluído, passe pelo processo de
Professor Aloísio – O professor da base,
inclusão. Porém, nos grandes centros, onde nós como um todo, tem que entender que o Sindicato
estamos – região metropolitana de São Paulo e não é um espaço físico, o Sindicato não é apenas
do Rio, por exemplo – com a polarização, você diretoria. O Sindicato, na verdade, somos todos nós.
acaba encontrando faculdades em
É como uma grande construção, em
cada esquina, veja em Santo André "O professor da base, que cada tijolo tem sua importância.
e São Bernardo. Nesse caso, por
O Sindicato é isso: cada professor tem
como um todo, tem
que vem o Ensino a Distância? O
sua importância, seja quando vem
que entender que
Ensino a Distância vem no Ensino
ao Sindicato pegar uma informação,
o Sindicato não é
Superior com a única preocupação
quando traz uma denúncia, pois
um espaço físico, o
de dinheiro. Então, volto à questão do
através das denúncias que o Sindicato
seminário do dia 09/03/09: a solução Sindicato não é apenas pode agir. O professor, ao se filiar,
apontada para a crise, inclusive pelo diretoria. O Sindicato, fortalece nossa luta. Sei que, na
na verdade, somos
próprio palestrante contratado pelo
questão financeira, ninguém gosta
todos
nós. É como uma de pagar impostos, ninguém gosta de
Semesp, está em reduzir custos. Onde
podemos ter essa possibilidade? grande construção, em contribuir, até considerando o estado
que cada tijolo tem
Pela EaD e cursos modulares. Não se
que o país vive hoje, mas para manter
discutiu a qualidade de ensino nesse
sua importância"
uma estrutura, inclusive essa revista,
seminário. O que chama atenção é
requer recursos financeiros. Vou
isso: você ter alguém que acha que
insistir: às vezes o pessoal pensa “o que
faz um grande trabalho pelo Brasil, que é esse o eu ganho ao me filiar?”: Você ganha fortalecimento
discurso do sindicato patronal desse segmento, mas da instituição, exatamente para garantir seus
que a única preocupação é exatamente o dinheiro.
direitos através de nossas Convenções Coletivas.
Então, o Ensino a Distância, nesse viés, tem
Então, o que a gente deixa de mensagem é
sua importância para algumas regiões no Ensino ‘você que é professor, é SINPRO ABC’. Diga sempre
Superior, mas, nas grandes metrópoles, eu vejo que ‘sim’ para o SINPRO ABC, junte-se a nós e vamos
a única preocupação daqueles que estão usando é fortalecer nossa luta.
na questão de ser mais lucrativo. Basta ver o número
de alunos que apenas um professor pode atingir.
No Ensino Médio, a avaliação que nós temos
Para assistir a entrevista com o professor
no Sindicato é totalmente contrária. Entendemos Aloísio, acesse www.revistaoprofessor.com.br.
Revista do Professor - SINPRO ABC
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Educação
“Afinal, estamos de
Acordo!”
O (novo) Acordo
Ortográfico”
Por Clarice Assalim*
A
s mais estranhas compreensões
sobre o Acordo Ortográfico podem
ser encontradas na imprensa falada
e escrita: que agora a língua está
unificada, que agora cada um pode escrever como
quiser, que Portugal abriu mão da sua identidade
e soberania por causa do Acordo, e por aí vai. Estas
compreensões mostram, por um lado, o quão
pouco as questões conceituais da(s) língua(s) são
compreendidas por amplos setores da sociedade
(por exemplo, a diferença entre ortografia e língua),
mas ao mesmo tempo mostra como se expressam
as posições políticas, no atual momento histórico,
no julgamento das ações sobre a(s) língua(s).
O livro “Afinal, estamos de Acordo!”, publicado
pela editora Porto de Ideias, trata do Acordo
Ortográfico inserindo-o em um contexto histórico
e político, fato que permite entender melhor as
mudanças em curso e avaliar a importância da unidade
ortográfica para o letramento dos cidadãos dos
vários países da CPLP, para a circulação de materiais
escritos e para a nova e crescente presença da língua
portuguesa no mundo. Traz a público a discussão
de que várias outras modificações já ocorreram
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Revista do Professor - SINPRO ABC
anteriormente na forma de escrever a língua
portuguesa, constituindo-se a reforma ortográfica,
portanto, um índice das mudanças históricas nas
sociedades humanas em que uma determinada
língua é falada. Trata-se, consequentemente, de um
ato desprovido de dramaticidade, e que não traz
sobressaltos nem provoca catástrofes. Não é, de
certo modo, algo novo, embora possa parecer, num
país em que mesmo fatos ocorridos há apenas 37
anos (a reforma ortográfica de 1971, por exemplo)
desaparecem rapidamente da memória de muitos.
As mudanças ortográficas ocorrem por causa
das grandes ideologias que dominam os Estados
dos quais estas línguas são oficiais ou nacionais. É
o caso da etimologização da ortografia a partir do
século XVI, para dar um exemplo, na sequência
da ascensão da nova classe burguesa mercantil
– o chamado ‘Renascimento’ – que valorizava a
antiguidade clássica exatamente para que ela se
constituísse num contraponto ao domínio medieval
do catolicismo.
O Acordo Ortográfico, cujo principal propósito
é a unificação da grafia da língua, é completamente
coerente com a ideologia da criação dos blocos
de países e dos processos de integração regionais,
e não é por acaso que se realiza em 2009, depois
de caminhadas como a da criação da Comunidade
de Países da Língua Portuguesa (CPLP, fundada em
1997).
A implantação desse Acordo põe em evidência
um dos aspectos mais importantes da constituição
ou estrutura política da língua: a disputa entre duas
normas diferentes, e que até agora se representavam
em duas diferentes ortografias, a norma lusitana e a
norma brasileira. É esta disputa entre os dois países
que o Acordo Ortográfico atualiza, encarna e, em
um dado lugar, resolve. Como dizia um importante
autor: a relação entre Portugal e Brasil é o conflito
mais bem ancorado em acordos de todos os tempos
... mas se trata de uma relação de aproximação e
afastamento, uma relação das mais complexas,
portanto.
A ortografia portuguesa e suas
reformas
É consenso dividir-se a história da escrita
portuguesa em três grandes períodos: 1) o
fonético, do século XIII até o século XVI; 2) o
pseudoetimológico, do século XVI até 1904; e 3) o
simplificado, a partir de 1904.
O período fonético caracteriza-se, em linhas
gerais, por uma flutuação na grafia das palavras.
Embora chamado de fonético, não se trata de um
período de simples transcrição da fala, mas de um
momento em que várias alternativas de construção
de escrita são testadas. É durante este período
que nossa ortografia começa a configurar-se de
acordo com suas particularidades e que começa
a haver o progressivo estabelecimento da escrita
portuguesa, a partir dos modelos de escrita que
eram conhecidos.
O período pseudoetimológico caracterizase pela tentativa - nem sempre acertada - de
se escrever de acordo com a retomada da forma
greco-romana da palavra. Inicia-se no século XVI,
com o Renascimento, movimento intelectual
caracterizado pela assim chamada ressurreição dos
estudos clássicos, que levou os escritores do XVI à
tradução, à imitação e à assimilação dos Antigos.
Como consequência, a penetração na língua
portuguesa de formas eruditas e semieruditas,
calcadas no latim, se intensificou.
Não é difícil imaginar as extravagâncias a que
esse influxo levou. Uma profusão de consoantes
dobradas e de grupos consonantais, como <ph>,
<th>, <rh> foram sendo introduzidos à língua
portuguesa - muitos justificados pela etimologia,
mas outros muitos resultantes da pretensão
daqueles que se julgavam conhecedores de latim e
de grego. Assim, não só vocábulos novos entraram
para o nosso léxico com aspecto gráfico alatinado,
mas também os que já tinham formas vulgares
sofrem o travestimento etimológico. O resultado
são formas gráficas absolutamente injustificáveis,
como lythographia.
Porque o abuso (ab-uso) ultrapassou o uso,
esta é a razão pela qual este período da língua, que
se estende do século XVI ao XX, seja chamado de
pseudoetimológico. O que caracteriza esse período
é o emprego de consoantes mudas ou geminadas,
de grupos consonantais (nem sempre gregos) e das
letras k, w r y.
O abismo que a etimologização gráfica
provocou em relação à modalidade falada do
português fez nascer uma espécie de bilingüismo,
que refletia e agravava a separação entre duas
camadas sociais: a dos portugueses cultos e eruditos
e a dos demais falantes. Ou seja, de um lado, uma
minoria escolarizada que começa paulatinamente a
praticar uma modalidade de língua bem de acordo
com o pensamento renascentista (e posteriormente
racionalista); de outro, a maioria analfabeta, que
continua praticando uma modalidade de língua
calcada nos padrões medievais.
A ditadura ortográfica imposta pela escrita
etimológica e a consequente elitização da língua
provocaram reações em nome de uma simplificação
ortográfica que culminaram, em 1904, com a
publicação da Ortografia Nacional, de Gonçalves
Viana.
É justamente a partir desse trabalho que,
em 1910, Portugal nomeia uma comissão para
estabelecer uma ortografia simplificada e uniforme
para ser usada nas publicações oficiais e no ensino.
De fato, no ano seguinte, entra em vigor a primeira
reforma ortográfica, instaurando-se o chamado
período simplificado da ortografia portuguesa.
Embora essa reforma não tenha sido
extensiva ao Brasil, que ainda praticava uma escrita
etimológica, a Academia Brasileira de Letras decide
em 1915, harmonizar nossa grafia com a portuguesa,
revogando a sua resolução quatro anos depois.
Em 1931, a Academia das Ciências de Lisboa e
a Academia Brasileira de Letras firmaram um acordo
preliminar que objetivava a unificação da ortografia
dos dois países, a partir da reforma implantada
em Portugal, em 1911. No entanto, o Vocabulário
Ortográfico publicado em Portugal, em 1940, e o
Revista do Professor - SINPRO ABC
13
publicado no Brasil, em 1943, ainda apresentavam
divergências.
Somente em 1971 são promulgadas alterações
ortográficas no Brasil (basicamente relativas à
acentuação gráfica), reduzindo as divergências com
Portugal.
Novo acordo foi proposto pelas duas
academias em 1975. No entanto, Portugal, vivendo
um momento de convulsão política, com a
Revolução dos Cravos e a independência de suas
colônias africanas (Guiné Bissau, em 1973, seguida
de Angola, Cabo Verde, Moçambique e São Tomé e
Príncipe, todas em 1975), não o transforma em lei.
O atual acordo ortográfico
Em 1986, o então presidente do Brasil, José
Sarney, promoveu um encontro dos sete países
de língua portuguesa, no Rio de Janeiro, onde
foi apresentado o Memorando Sobre o Acordo
Ortográfico da Língua Portuguesa. As críticas feitas
a esse acordo foram imensas tanto em Portugal
quanto no Brasil, sobretudo pela proposta de se
suprimir o acento das palavras proparoxítonas (o
que fez surgirem várias piadinhas tanto no Brasil
quanto em Portugal, como aquela em que dois
lusófonos conversam sobre “tartarugas”: 1. Você
tem cagado no jardim? 2. Não, eu tenho cagado em
casa. 1. Onde você tem cagado? 2. Eu tenho cagado
na banheira.).
Quatro anos mais tarde, a Academia das
Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de
Letras elaboraram a base do “Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa”, tido como mais moderado
e atendendo às críticas feitas à proposta de 1986.
Tal acordo deveria entrar em vigor em “1 de janeiro
de 1994, após depositados todos os instrumentos
de ratificação de todos os Estados junto do Governo
português”. (artigo 3°). Como apenas o Brasil, Cabo
Verde e Portugal ratificaram o documento, a sua
entrada em vigor ficou pendente.
Em 1998, em Cabo Verde, foi redigido
o primeiro “Protocolo Modificativo ao Acordo
Ortográfico da Língua Portuguesa”, em que se
suprimiu do texto original a data para sua entrada
em vigor. Mais uma vez, somente Brasil, Cabo Verde
e Portugal aprovaram esse protocolo.
Com a independência de Timor-Leste, em
2002, oito países passaram a ter o português
como língua oficial. Com isso, em julho de 2004,
os chefes de Estado da Comunidade dos Países
de Língua Portuguesa (CPLP), reuniram-se em São
14
Revista do Professor - SINPRO ABC
Tomé e Príncipe, onde foi aprovado um “Segundo
Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico”, que,
além de permitir a adesão de Timor-Leste, reduzia
para somente três a quantidade de signatários para
que o acordo finalmente entrasse em vigor.
Mais uma vez, Brasil e Cabo Verde assinaram
esse protocolo e, ao contrário do que era de se
esperar, Portugal se negou a fazê-lo, alegando a
falta de um Vocabulário Ortográfico Comum.
No final de 2006, São Tomé e Príncipe assinou
o acordo, completando o número mínimo de
signatários para que fosse implantado. No entanto,
a ausência de Portugal constituía um entrave, tendo
sido sentida como possível enfraquecedora da sua
implementação.
Pressionado pelo governo brasileiro para
aderir à reforma, vista como uma forma de aumentar
o prestígio da língua e qualificar o intercâmbio
cultural entre os países, finalmente, em 06/3/2008,
Portugal aprovou a polêmica proposta do acordo
ortográfico da língua portuguesa, unificando a
escrita entre os oito países lusófonos.
Em 29 de setembro de 2008, em sessão
na Academia Brasileira de Letras, o Presidente
Lula, em presença do embaixador de Portugal no
Brasil, Francisco Manuel Seixas da Costa, assinou o
decreto que normaliza a adesão do Brasil ao Acordo
Ortográfico da Língua Portuguesa, que entrará em
vigor em janeiro de 2009. Apesar disso, as antigas
normas ortográficas poderão ser usadas até o
final de 2012. Ou seja, durante esse período, serão
aceitas as duas formas de escrita nos concursos
públicos, vestibulares, provas escolares etc. Os
livros didáticos, por sua vez, têm prazo até 2010
para enquadramento ao acordo.
As novas regras
Poucas são as mudanças decorrentes desta
reforma ortográfica. O projeto do Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa visa mais à padronização do
que à simplificação do sistema ortográfico, já que o
português é, até então, uma língua com duas grafias
oficiais: a do Brasil e a dos demais países lusófonos.
Com o novo Acordo, padronizam-se alguns
poucos pontos discordantes, como o emprego do
hífen, algumas regas de acentuação e a queda de
consoantes mudas (afetando a grafia lusitana de
algumas palavras, como projecto, actual, objectivo
etc.).
* Clarice Assalim é professora de Língua
Portuguesa e sócia do SINPRO ABC
Comportamento
Qual é a qualidade
de sua vida hoje?
Pare um instante e dê a você
mesmo uma atenção especial
neste momento
Por Roberta Alves*
“
Antes de me casar, eu costumava sair
para comer em restaurantes da cidade,
tanto no almoço como no jantar. Quintafeira à noite era a folga das empregadas,
em Bronxville, de modo que muitas famílias saíam
para comer fora. Uma bela noite, eu estava em meu
restaurante favorito e na mesa ao lado havia um pai,
uma mãe e um menino magrinho de uns doze anos
de idade. O pai disse ao menino: ‘Tome o seu suco
de tomate’. E o menino respondeu: ‘Não quero’. O
pai insistiu, com voz mais alta: ‘Tome o seu suco de
tomate’. A mãe interveio: ‘Não o obrigue a fazer o
que ele não quer’. O pai olhou para a mulher e disse:
‘Ele não pode levar a vida fazendo o que quer...
eu nunca fiz nada do que quis, em toda a minha
vida’. Esse é o homem que nunca perseguiu a sua
bem-aventurança [estado de profundo bem-estar;
felicidade completa]. (...) Eu sempre recomendo
aos meus alunos: Vão aonde o seu corpo e a sua
alma desejam ir. Quando você sentir que é por
aí, mantenha-se firme no caminho, e não deixe
ninguém desviá-lo dele.” (Trecho tirado do livro O
Poder do Mito, de Joseph Campbell)
E você? Está aonde o seu corpo e sua alma
desejam?
É o caminho que escolheu?
Faz o que quer?
Como está sua vida pessoal?
Profissional?
Financeira?
Afetiva?
O seu lazer?
Qual é a qualidade da vida que você leva hoje?
O que lhe agrada?
O que você quer que seja diferente?
Revista do Professor - SINPRO ABC
15
Já parou para fazer uma reflexão a respeito?
Ou prefere nem pensar nisso e levar as coisas do
jeito que é possível, porque a vida é assim mesmo?
Ei! Pare um instante e encare-se frente a
frente com num espelho, olhe-se de corpo inteiro,
observe-se, sem julgamentos, dê esse tempo a você
mesmo, como se fosse um encontro com quem
você se tornou. Pode ser? Preparado?
Quando criança, quais eram os seus sonhos? O
que queria ser quando crescer? Você se lembra? De
quais brincadeiras mais gostava? Quais eram seus
melhores amigos? Como era sentir-se encantado
pela vida? Tomar chuva; chupar sorvete até lamber
os dedos; jogar queimada; brincar de pega-pega;
esconde-esconde; conversar na rua até o anoitecer
e admirar o brilho das estrelas...
E hoje, quanto daquela criança ainda vive aí
dentro de você?
Tem uma bela história na qual uma criança
vê uma senhora de bastante idade, com o cabelo
todo branco e com muitas rugas no rosto e fica
intrigada. Então, pergunta à senhora se um dia ela já
foi criança. A senhora sorri docemente e responde:
“Não. Eu ainda sou criança, só que há mais tempo
que você”.
Cuidado para que o seu adulto, cheio de
responsabilidades e problemas a resolver, não
acabe sufocando a sua criança, a ponto da vida se
transformar num mar de obrigações.
Aulas, preparação de materiais, leitura,
correção de trabalhos e provas, programa para
ser cumprido, alunos desobedientes, pais que
não compreendem a real função dos docentes na
vida de seus filhos, trânsito, ônibus e trem lotados,
contas para pagar, família para cuidar, filhos para
educar, cuidados com a casa, crise mundial, pressão
de vários lados, correria, correria, correria... ei...
socorro... quero descer desse trem!
Conhece essa história? Ou alguém que passa
por isso? Já se sentiu assim?
E como lidar com essa realidade? Como ter
qualidade de vida?
Sugiro que comece por fazer uma análise do
seu momento atual. Antes de desejar ir a qualquer
lugar, é necessário primeiro saber onde você está.
Fique sozinho por uns minutos em um
local tranqüilo. Pegue um papel em branco e uma
caneta. Faça um círculo e divida-o em oito partes
iguais, como se fosse um disco de pizza. Em cada
parte escreva os seguintes nomes: ambiente
físico, saúde, carreira, desenvolvimento pessoal,
relacionamentos, romance, dinheiro e lazer. Caso
16
Revista do Professor - SINPRO ABC
queira, pode nomear de outra forma, aumentar
ou diminuir o número de itens, fique à vontade. O
importante é fazer um balanço de sua vida neste
momento e visualizar o resultado.
Em cada área, coloque o seu grau de
satisfação atual: de 0 a 100%. Sendo o zero na
parte central do círculo e o número 100 na outra
extremidade. Defina o número conforme você vê
que este item está hoje, e não como gostaria que
estivesse. Tendo escolhido o número, marque com
uma bolinha o local referente a ele. Por exemplo, na
parte de relacionamentos você definiu que está 60%
satisfatório. Então vá até a linha correspondente a
essa área e marque-a mais ou menos no local que
acredite representar 60%. Faça isso em relação a
todos os oito itens. Ao final, ligue os pontos. Essa
é a roda da sua vida no presente momento. Quais
áreas estão bem e quais podem melhorar? E o que
você pode e quer fazer para melhorá-las? Qual
é a qualidade de sua vida profissional, de seus
relacionamentos, de sua saúde?
E por falar em saúde, como você está? Tem
se cuidado? Ah, está acima do peso, então quer
emagrecer?
Neste assunto especificamente, há vários
pontos a destacar. Antes, mais algumas perguntas,
bastante úteis para sua autoavaliação:
Você tem horários para comer?
Como, quanto, quando e o que você come?
Você costuma comer além do necessário? Em
quais ocasiões? Por quais motivos?
Quanto o seu modo de se alimentar interfere
em sua vida como um todo e em particular na sua
atuação profissional e na sua disposição diária?
Em primeiro lugar, saiba que há três tipos
de fome: a biológica (do corpo propriamente dita),
a social e a psicológica (que também denomino
emocional).
A biológica é a fome autêntica, única razão
pela qual se deveria comer, necessária para que
o ser humano saiba que precisa se alimentar e,
quando obedecida adequadamente, permite que
a saciedade ocorra – sinal de que o corpo já está
satisfeito e a pessoa também.
A fome social é colocada pela sociedade,
mas que precisa encontrar terreno fértil no aparato
psíquico do indivíduo. Em grande parte dos
encontros sociais a comida está presente antes,
durante e/ou depois. As pessoas vão ao cinema,
por exemplo, e depois saem para comer; assistem
a uma peça de teatro depois vão jantar; recebem
amigos em casa ou são recebidos e lá está a comida
novamente. E ainda muitas vezes fica a impressão
de que quando não é servido nada ou não é aceito
o que servem, a educação passou longe.
O terceiro motivo pelo qual se come é
a fome psicológica, um impulso que aparece
independentemente do corpo físico estar satisfeito,
já que sua origem é outra, no aspecto psicológico.
É quando a pessoa come porque está ansiosa,
entediada, cansada, insegura, como também ao
sentir-se feliz e eufórica, por exemplo.
Ao ter fome, pergunte a si mesmo e sinta
qual dos três tipos é. Caso seja a fome biológica,
alimente-se devagar, mastigue bem os alimentos,
prazerosamente e durante 20 minutos (tempo que
precisa para o cérebro receber a mensagem de que
a saciedade chegou). Ter horários certos para comer
é importante e ajuda para que a fome biológica seja
reconhecida mais facilmente.
Caso perceba que é a fome social ou
psicológica, dê a elas outra resposta, mais adequada,
sem ser comida. Converse com alguém, ouça uma
música, leia o seu livro preferido, faça um passeio,
dance, assista a um belo filme, enfim, se possível,
faça algo que lhe seja agradável e que você se sinta
bem, tirando o foco da comida e colocando-o em
si mesmo. Dessa forma, verá como emagrecer fica
mais simples.
Quanto aos demais itens de sua roda da vida,
determine exatamente o que quer em cada um
deles, escreva em um papel com o maior número de
detalhes possível e trace uma estratégia para atingir
o que se propôs. Coloque um prazo (data específica)
possível para que os seus objetivos sejam realizados
e mãos à obra.
Seja o autor de sua própria história.
Arquivo pessoal
* Roberta Alves, coach profissional/pessoal/
emagrecimento, jornalista, pós-graduada em SócioPsicologia, possui extensão em Psicologia Hospitalar
com ênfase em Transtornos Alimentares e Obesidade,
pela Faculdade de Medicina do ABC, e também é autora
do blog “Faça as Pazes com a Balança” (www.sejamagro.
blogspot.com).
Obs.: Quando recebi o convite para escrever este
artigo fiquei muito feliz e lisonjeada porque a profissão de
professor é uma das que mais admiro, pela importância
que esses profissionais têm em nossa vida. Particularmente
guardo na lembrança vários que passaram pelo meu
caminho durante anos e anos de estudo e deixaram
ensinamentos valiosos. Agradeço pela oportunidade de
poder retribuir um pouco à classe da qual tanto recebi.
Revista do Professor - SINPRO ABC
17
Nacional
O Pré-sal é nosso,
é do povo
O
Brasil descobre riquezas naturais
e a população assiste uma série
de especulações que levantam,
novamente, a questão: Será que
o Brasil vai perder o direito de administrar nossos
bens naturais e permitir que empresas privadas se
beneficiem daquilo que é nosso?
No que depender dos movimentos sociais e
do SINPRO ABC, com o Pré-Sal a cena não se repetirá
da forma como ocorreu com a Vale do Rio Doce,
privatizada a preço de banana no governo FHC, em
1997.
Recentemente foi descoberta reserva de
petróleo em área brasileira, abaixo da camada de sal.
Segundo a Federação Única dos Petroleiros, a FUP,
“essas reservas deveriam ser integralmente do povo
brasileiro, não fosse a ação entreguista dos neoliberais,
que acabaram com o monopólio estatal e abriram
a exploração das nossas jazidas para as empresas
privadas”. Levantamento da FUP revela que o Brasil se
tornará uma das três maiores nações petrolíferas do
mundo com a descoberta das mega reservas.
O petróleo é nosso
A legislação criada no governo Fernando
Henrique Cardoso, Lei 9.478/97, permite um modelo
de concessões questionado por especialistas. Em
dezembro de 2008, o seminário Regulação do Setor
Petrolífero Brasileiro, promovido pela FUP, teve como
principal tema de debate a urgência pela criação de
novas leis.
Henrique Jäger, técnico do Dieese, destacou
no evento que a Petrobrás tem se fortalecido
durante a gestão Lula e graças aos investimentos do
governo o Pré-Sal foi descoberto. Para ele, “alterar
a regulamentação do setor será agora um passo
fundamental na consolidação de todas as mudanças.
Trata-se de decidir quem irá controlar uma das maiores
reservas de petróleo do mundo: a nação brasileira ou
as empresas multinacionais?”.
A movimentação recebe o apoio de sindicatos,
entre eles o SINPRO ABC, que está recolhendo
18
Revista do Professor - SINPRO ABC
assinaturas de professores e populares, para atingir
a meta de 1 milhão e 300 mil apoiadores da luta
para garantir que as riquezas do Pré-Sal sejam do
povo. Após o recolhimento das assinaturas, a FUP
encaminhará ao Congresso Nacional o projeto de
lei de iniciativa popular que consolide o monopólio
estatal do setor petróleo, o fim das concessões para
exploração das reservas brasileiras, a destinação social
destas riquezas e o fortalecimento da Petrobrás como
empresa eminentemente pública.
“Precisamos assegurar que as riquezas geradas
por estes recursos energéticos sejam utilizadas em
projetos estratégicos de desenvolvimento nacional
que criem empregos, distribuam renda e melhorem
a qualidade de vida das populações pobres do nosso
país. Por isso, precisamos urgentemente de uma nova
legislação para garantir que as jazidas de petróleo e
gás natural sejam controladas pelo Estado e utilizadas
em benefício do povo brasileiro”, destaca documento
assinado pela FUP.
Nosso petróleo privatizado
Dados publicados pela Federação Única dos
Petroleiros revelam que, em mais de dez anos, mais
de 711 blocos petrolíferos do Brasil já foram leiloados,
no total de 3.383 áreas colocadas em licitação. Nesse
período, o valor do barril de petróleo subiu de US$ 12
para mais de US$ 100, e mais de 70 grupos atuam no
país explorando nosso petróleo e gás.
No início de 2009, diversas empresas
multinacionais estiveram no Brasil e manifestaram
preocupação para a ministra da Casa Civil, Dilma
Roussef, sobre uma possível mudança no marco
regulatório. “A história de luta dos trabalhadores já
mostrou muitas vezes que se grandes capitalistas são
contra alguma coisa, muito provavelmente essa coisa é
boa para os trabalhadores. E dessa vez não é diferente.
Esses tubarões têm razão para se preocuparem. O
pré-sal é do povo brasileiro e a população, cada
vez mais, compreende a importância de lutar por
esse patrimônio –independentemente da vontade
entreguista de setores do governo”, completa a FUP.
Os neoliberais e a intervenção do Estado
Por Luiz Pinguelli Rosa , Diretor da COPPE/UFRJ
A demora na aprovação pela Câmara de
Representantes americana do socorro a grandes
bancos fez os economistas clamarem pela intervenção
do Estado na economia, o que sempre foi combatido
pelos neoliberais lá e cá. O curioso é que os partidos
de esquerda não estão se pronunciando à altura da
gravidade da situação. Por outro lado, o discurso de
Lula na abertura da Assembléia da ONU condenou o
capitalismo financeiro mundial. Seus pronunciamentos
voltaram a ter um tom mais à esquerda, lembrando seus
discursos de campanha no segundo turno de sua eleição,
quando deixou constrangidos vários aliados, embora
tenha ganhado parcela da esquerda que não votara
toda nele no primeiro turno, e ampliado sua vantagem
garantida pelos votos dos mais pobres.
Entretanto, para ter maioria no Congresso, o
governo Lula acabou incluindo muitos neoliberais. Na
campanha para prefeituras, candidatos conservadores
aparecem travestidos de lulistas de primeira hora,
atraídos magicamente, como no conto do flautista de
Harmelin, cuja melodia atraía ratos. Estes são muito
usados para caricaturar o comportamento humano,
não necessariamente o lado negativo. O Remy, por
exemplo, do filme Ratatouille, é talentoso e cativante.
O mais célebre é o Mickey Mouse, símbolo do mocinho
americano, vencedor em todas as situações. Na esquerda
houve o Sigmund, ratinho cult de Ipanema que Jaguar
espalhava pelas páginas do Pasquim, símbolo dos eternos
perdedores, como são os críticos tanto da ditadura
militar quanto do pensamento único neoliberal. Mas
uma característica dos ratos reais é abandonar o barco
quando este se encontra em perigo. Se o navio estiver
atracado, fogem para terra firme pelas amarras. Mas a
nave do neoliberalismo está longe do porto, à deriva,
como uma nau sem rumo. Não afundou, embora esteja
com o casco furado, e tentam salvá-la. Lembra E la nave
va, filme de Fellini, levando as cinzas do ilustre falecido
para uma ilha distante.
Logo que estourou a crise anunciada foi curioso ler
os artigos de dois economistas no Financial Times de
17 de setembro de 2008. Um deles, M. Wolf, reconhece
a inevitabilidade da intervenção do Estado e culpa o
mercado financeiro globalizado e totalmente livre de
amarras. O outro, J. Key, argumenta que é impossível regular
o mercado, entre outras razões porque os executivos dos
grandes grupos financeiros ganham fortunas, logo são
mais competentes do que os reguladores do Estado que
ganham menos. Isso mostra a falta de sentido de reduzir
tudo à pura competição econômica. A métrica monetária
não se aplica à avaliação de valores humanos. Carlos
Drummond de Andrade, por exemplo, tinha uma vida
modesta. Ganhava menos com sua obra literária do que
podem render hoje alguns grandes sucessos editoriais,
sempre encontrados nas prateleiras de livrarias de
aeroportos. Nem por isso são melhores que Drummond,
embora sejam mais vendáveis.
Um dos problemas levantados pelos congressistas
americanos no debate da proposta da administração
Bush é exatamente a remuneração desses executivos,
que pode alcançar alguns milhões de dólares anuais. Se o
Estado vai dar US$ 850 bilhões, que vêm do contribuinte,
para salvar os grupos financeiros em situação falimentar,
não seria justo manter essas remunerações.
Voltando ao Brasil, a popularidade do Lula está em
alta. Medidas de governo como o Plano de Aceleração
do Crescimento e a ampliação do Programa Bolsa-Família
e do crédito popular levaram cerca de 20 milhões de
brasileiros, segundo o IBGE, a sair da pobreza e ingressar
na classe C de renda, chamada por eufemismo de classe
média. Tudo isto e o crescimento das exportações
levaram a economia no Brasil a crescer 5% em 2007 e
manter o crescimento alto em 2008, até a crise financeira
americana afetar o crédito e as exportações.
No governo Fernando Henrique houve o Proer para
salvar os bancos. Seus lucros bateram recordes em 2007.
Os juros e o superávit primário continuaram nas alturas,
ainda que o Mantega na Fazenda e o Paulo Bernardo no
Planejamento destoem do Meirelles no Banco Central.
A política monetária destina parte significativa dos
impostos para pagar juros altos aos grupos financeiros
brasileiros e estrangeiros que possuem títulos do governo.
Cerca de 10 vezes mais do que o total para as bolsasfamília em 2007 teve este destino. Somando o superávit
primário ano a ano, o total, ao longo de cinco anos, por
exemplo, dá algumas centenas de bilhões de reais. Isto é
um tipo de intervenção do Estado na economia, omitida
pelos economistas neoliberais quando pedem corte de
gastos públicos que vão para saúde, educação e infraestrutura.
A descoberta de grande quantidade de petróleo no
Pré-Sal pela Petrobras recolocou no Brasil a questão da
intervenção do Estado. O governo pensa em assumir
maior controle, mudando o regime de concessões para
explorar o petróleo, criando eventualmente uma estatal
para gestão do Pré-Sal e capitalizando a Petrobras. Os
adeptos do puro mercado que se opõem a isso parecem
desatualizados com o que ocorre nos EUA.
Publicado no site oficial em defesa do Pré-Sal (www.
presal.org.br), em outubro de 2008
Revista do Professor - SINPRO ABC
19
Meio Ambiente
Quanto custa salvar a
natureza
Apenas na semana de 12 a 18 de outubro, no auge da
crise econômica, os governos dos principais países do
mundo despejaram cerca de US$ 4 trilhões no mercado. O
que aconteceria se essa quantia fosse destinada ao meio
ambiente?
Por Eduardo Araia, da Revista Planeta*
Q
uando cientistas listam os efeitos
danosos criados pelas mudanças
climáticas e se aventuram a
especular sobre o que seria
necessário para limitá-las a níveis aceitáveis, os
governos em geral desconversam sobre o assunto.
Afinal, consideram, gastos que chegam facilmente
a dezenas, centenas de bilhões de dólares não
poderiam ser feitos assim de repente. Além disso,
os malefícios do aquecimento global ainda não
parecem tão evidentes e, por enquanto, é melhor
deixar como está para ver como fica. Mas veio a
crise econômica global e, como se observou, os
dirigentes mundiais não tiveram (muito) medo de
abrir seus cofres para injetar liquidez ao redor do
planeta - só numa semana de outubro, uma quantia
entre US$ 2 trilhões e US$ 4 trilhões foi destinada
para essa finalidade.
O mundo ganhou, assim, um inesperado
modelo de comparação: se, para salvar a economia,
pode-se gastar tudo isso, por que pouco ou nada
se investe para salvar a Terra? Como revelam alguns
20
Revista do Professor - SINPRO ABC
relatórios recentes, divulgados por órgãos da ONU,
entidades beneficentes e empresas privadas, a
conta para proteger a natureza, frear as mudanças
climáticas e oferecer alimentação, água limpa e
saneamento para 1 bilhão de pessoas é bem menor
do que todo o dinheiro despejado no mercado. Por
outro lado, se a quantia anunciada naquela semana
de outubro fosse aplicada na redução das emissões
de gases-estufa e na proteção da natureza, calculase que o investimento teria um retorno de até
cem vezes o seu valor inicial e, além disso, seriam
economizados trilhões de dólares a serem gastos
mais tarde.
Investir na redução de emissões de gasesestufa traria ótimo retorno e evitaria gastos futuros
Conheça a seguir alguns desses estudos e tire
suas conclusões.
Ecossistemas e biodiversidade - De acordo
com um estudo preliminar dos custos e benefícios
de investir na diversidade da natureza - "The
Economics of Ecosystems and Biodiversity" (Teeb)
-, encomendado pela Comissão Européia e pelo
governo da Alemanha, a maior parte dos rios,
mares, florestas e montanhas poderia ser protegida
com um investimento anual de aproximadamente
US$ 45 bilhões. "Os argumentos econômicos para
a proteção da natureza estão começando a entrar
no pensamento dominante", diz Pavan Sukhdev,
diretor do Deutsche Bank e líder da equipe de
pesquisadores (que devem aprontar uma versão
completa do relatório em 2009). Em setembro, o
grupo estimou que a perda dos serviços prestados
pelas florestas, tais como oferecer água limpa
e absorver o dióxido de carbono (CO2), já está
custando à economia do planeta algo entre US$ 2
trilhões e US$ 5 trilhões por ano.
Outro grande estudo, o "Building Biodiversity
Business", divulgado em março deste ano por
economistas da Shell e membros da International
Union for Conservation of Nature (IUCN), mostra
que preservar os mais importantes ecossistemas
mundiais ao longo de 30 anos custaria cerca de
US$ 1,3 trilhão. Por essa quantia, perto de 15% das
terras e 30% dos oceanos seriam protegidos da
exploração ilegal de madeira, pesca predatória e
poluição, assim como a maior parte das espécies
animais ameaçadas.
Mudança climática - Segundo lorde Nicholas
Stern, que liderou o estudo do governo britânico
sobre os custos e benefícios das mudanças
climáticas, custaria 1% do Produto Interno Bruto
(PIB) mundial num ano - ou seja, US$ 540 bilhões manter as emissões de gases-estufa num nível que
evitasse os piores efeitos do aquecimento global.
Mas em sua revisão para a Secretaria do Tesouro,
em 2006, ele afirmou que, se os países não agissem,
os custos e riscos totais das mudanças climáticas
subiriam para trilhões de dólares por ano.
Energia renovável - Mudar dos combustíveis
fósseis para fontes de energia limpa só nos Estados
Unidos reduziria as emissões mundiais de dióxido
de carbono em cerca de 20%, afirma Jeffery
Greenblatt, gerente de clima e energia do Google
e responsável pelo lançamento, em outubro, do
Clean Energy 2030, uma proposta da empresa
para reduzir a dependência norte-americana de
combustíveis fósseis. Mas não ficaria só nisso,
assegura ele: a transformação ajudaria a gerar
centenas de milhares de empregos.
O Clean Energy 2030 propõe o gasto de US$
4,4 trilhões, ao longo de 22 anos, para substituir
todo o carvão e o petróleo usados na geração de
eletricidade por gás natural e fontes de energia
renovável. O plano envolve a geração de 380
gigawatts (GW) de energia eólica, 250 GW de solar
e 80 GW de geotérmica. Além disso, propõe uma
redução de 33% no consumo de energia, com a
adoção de medidas de ecoeficiência, e uma queda
de 40% do petróleo consumido pelos carros, o
que seria obtido por um acréscimo de vendas de
90% no segmento de veículos híbridos somado a
carros convencionais com motores cerca de 50%
mais econômicos.
Água e saneamento - A organização
beneficente internacional WaterAid estimou em
outubro que oferecer água potável e saneamento
para os 2,5 bilhões de pessoas no mundo que não
contam com esses serviços custaria cerca de US$
55,7 bilhões (ou 37,5 bilhões de libras esterlinas).
A quantia, de acordo com uma porta-voz da
instituição, é praticamente igual aos recursos (37
bilhões de libras) que o governo britânico repassou
aos bancos Royal Bank of Scotland, HBOS e Lloyds
no dia 13 daquele mês.
Fome - No início de 2008, Jacques Diouf,
diretor-geral da Organização das Nações Unidas
para a Alimentação e a Agricultura (FAO), afirmou
que evitar todas as futuras ameaças de conflitos
envolvendo alimentos custaria cerca de US$ 30
bilhões anuais. E perguntou em seguida: "Como
podemos explicar às pessoas de bom senso e boafé que não é possível encontrar US$ 30 bilhões
por ano para permitir que 862 milhões de pessoas
famintas desfrutem do mais fundamental dos
direitos humanos: o direito à alimentação e, assim,
o direito à vida?"
Para Mario Mantovani, diretor de
Mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica, a
crise tem um lado purificador e desnuda muitos
discursos artificialmente engajados. "O que vimos
recentemente foi, como se diz, o 'salve-se quem
puder, porque o bicho está pegando'", analisa.
"Nada como uma crise para mostrar quem é
quem em toda essa história. Como vimos, não
houve muitos problemas para arranjar mais
dinheiro a fim de manter sistemas financeiros,
incentivar o consumo, coisas assim, mas quase
ninguém falou sobre meio ambiente em toda
essa história. A crise vai mostrar realmente quem
tem compromissos reais nessas áreas e quem só
faz marketing, greenwash, como se diz em inglês.
Nessa travessia, muitos projetos já foram ou vão
ser desmascarados, enquanto outros vão ser de
fato executados - e estes últimos, imagino, não
devem ser muitos."
Revista Planeta, janeiro de 2009 – número
436, Editora Três
Revista do Professor - SINPRO ABC
21
Artigo
A catástrofe dos cursos de
Letras
Por Marcos Bagno, na Revista Caros
Amigos*
A
formação dos professores de
português, hoje, no Brasil, é uma
catástrofe. Nós, os responsáveis
pelos cursos de Letras, não
enxergamos a bomba-relógio que temos nas
mãos. As estatísticas não mentem: a retumbante
maioria dos estudantes de Letras vêm de camadas
sociais pobres ou mesmo miseráveis, filhos
de pais analfabetos ou que têm escolarização
inferior a quatro anos. Isso significa muita coisa.
Significa que esses estudantes têm um histórico
de letramento muito reduzido: no ambiente
familiar, não convivem com a cultura letrada, não
têm acesso a livros, revistas, enciclopédias etc.
Significa que não são falantes das normas urbanas
de prestígio (as mesmas que supostamente terão
de ensinar a seus futuros alunos) e têm domínio
escasso da leitura e da escrita. Só na faculdade é
que a maioria deles vai ler, pela primeira vez na
vida, um romance inteiro ou um texto teórico.
Vêm, quase todos, do ensino público, essa tragédia
ecológica brasileira muito pior que as queimadas
na Amazônia. Nós, porém, fingimos que eles
são ótimos leitores e redatores, e despejamos
sobre eles, logo no primeiro semestre, teorias
sofisticadas, que exigem alto poder de abstração
e familiaridade com a reflexão filosófica, e textos
de literatura clássica, escritos numa língua que
para eles é quase estrangeira. E assim vamos nos
iludindo e iludindo os estudantes.
O resultado é que os estudantes de Letras
saem diplomados sem saber lingüística, sem saber
teoria e crítica literária e sem saber escrever um
texto acadêmico com pé e cabeça. Todos os dias,
22
Revista do Professor - SINPRO ABC
recebo mensagens de formandos que me pedem
orientação para seus trabalhos finais. Alguns até
me enviam seus projetos. São textos repletos
de erros primários de ortografia, pontuação,
sintaxe, vocabulário, com frases truncadas e sem
sentido. Assim eles chegam ao final do curso,
e suas monografias, mal escritas, sem nenhum
rigor teórico ou metodológico, são aprovadas
alegre e irresponsavelmente por seus supostos
orientadores.
O problema, é claro, não está no fato
(que merece comemoração) de acolhermos na
universidade alunos vindos das camadas mais
desfavorecidas da população. O problema é
não oferecermos a eles condições de, primeiro,
se familiarizar com o mundo acadêmico, que
lhes é totalmente estranho, por meio de cursos
intensivos (e exclusivos) de leitura e produção
de textos, de muita leitura e muita produção
de textos, para só depois desses (no mínimo)
dois anos de preparação eles poderem começar
a adentrar o terreno das teorias, das reflexões
filosóficas, da alta literatura. Se não fizermos isso
urgentemente (anteontem!), as salas de aula do
ensino básico estarão ocupadas por professores
que, mal sabendo ler e escrever adequadamente,
não poderão desempenhar sua principal tarefa:
ensinar a ler e a escrever adequadamente! Não
sei, aliás, por que escrevi "estarão ocupadas": elas
já estão ocupadas, neste momento, por essas
pessoas, de quem se cobra tanto e a quem não se
oferece uma formação docente que também seja,
minimamente, decente.
* Marcos Bagno é professor, escritor e
linguista. Artigo publicado na Revista Caros
Amigos – Nov/ 2008
Especial
EaD no Ensino Médio:
Um passo para trás?
Para o SINPRO ABC, autorização
da Educação a Distância no
nível Médio é sinônimo de
retrocesso e precarização na
qualidade de ensino
P
rofessor, responda sinceramente:
Você vê sucesso na Educação a
Distância para jovens entre 14 e
17 anos? Olhando para uma classe
dessa faixa etária, você acredita que os alunos têm
maturidade e responsabilidade para vivenciar essa
modalidade que desobriga a presença dentro da
sala de aula? E você, como profissional, está pronto
para elaborar aulas virtuais, além de preparar todo
conteúdo “tradicional”?
Para o Sindicato dos Professores do ABC, esse
modelo, sem dúvidas, não funciona e o resultado
não será positivo para a formação dos estudantes.
Segundo o presidente do SINPRO ABC, professor
Aloísio Alves da Silva, “atualmente, já está difícil
conseguir bom desempenho dos alunos quando
estão acompanhados pelos professores, quem
dirá quando não tiver essa assistência”.
Esse tema já foi destaque no boletim O
Professor, do SINPRO ABC, em outubro do ano
passado. Na ocasião, o Sindicato divulgou moção
de repúdio contra a autorização do Conselho
Estadual de Educação de São Paulo, que permite
as escolas públicas e privadas oferecer ensino
não presencial no nível Médio, com limite de 20%
da carga horária. O SINPRO ABC acredita que a
medida tem fins essencialmente economicistas
e demonstra o descaso do Conselho e outras
instâncias educacionais com a qualidade do
ensino. Resultado: qualidade de ensino nota zero.
“Somente aqueles que não vivenciam a
realidade cotidiana da educação julgam que
as aulas a distância podem promover a melhor
aprendizagem”, destaca a moção sindical, “as
novas tecnologias devem ser usadas como meios
e não como fins”.
Em entrevista à Agência Brasil, Daniel
Cara, presidente da Campanha Nacional pelo
Direito à Educação, argumenta que a medida é
“extremamente negativa e contraria todos os
princípios educacionais”. “A eficiência da educação
a distância é discutida até mesmo no caso da
formação de professores, não tem nenhum sentido
aplicá-la na educação básica”, observa Cara. Daniel
salienta, ainda, que assim como na educação
Básica, o Ensino Médio requer o contato entre
professor e aluno para a formação do estudante
como indivíduo.
Revista do Professor - SINPRO ABC
23
O que contradiz a LDB?
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
direciona os eixos que envolvem, logicamente,
a educação. Ao ler a lei e traçar comparativos,
podemos verificar algumas contradições entre o
estabelecido pela LDB e o proposto com o Ensino
a Distância no Nível Médio. Vejamos:
- Art.1º § 2º. A educação escolar deverá
vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.
Por prática social entendemos convívio com
outras pessoas, em sociedade. A ausência de um
ambiente no qual não existe essa vivência, torna
impraticável o desenvolvimento do vínculo citado
na lei.
- Art. 3º. O ensino será ministrado com base
nos seguintes princípios:
(...)VII - valorização do profissional da
educação escolar;(...)
IX - garantia de padrão de qualidade;
Uma das lutas do SINPRO ABC é pela
valorização do trabalho do professor, independente
de seu segmento de atuação. Hoje em dia, os
docentes a distância não recebem remuneração
adequada ao tempo de trabalho, nem são
preparados para administrar as ferramentas
virtuais. Resultado disso, o ensino e as condições
de trabalho se tornam precários e os alunos saem
das escolas com o conteúdo insuficiente.
No que diz respeito a qualidade, como
assegurar que os estudantes do Nível Médio
assistam aulas a distância, sem que todos acessem à
internet em seus domicílios? Como aprenderão?
24
Revista do Professor - SINPRO ABC
- Art. 4º. O dever do Estado com a educação
escolar pública será efetivado mediante a garantia
de:
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e
gratuidade ao Ensino Médio;
Para conseguir acompanhar uma aula não
presencial, o aluno precisará de uma boa conexão
de internet. Também, não se pode partir do
pressuposto que todos tenham computadores
nos domicílios ou que todos possam pagar uma
“lan house” para ter acesso ao conteúdo online.
Analisando esses apontamentos, é possível
concluir que o estudante deverá pagar para
essa atividade “extra-sala” obrigatória, ou, caso
contrário, não poderá adquirir e participar das
aulas. Consequência disso, o termo gratuidade
não se aplica a modalidade da EaD.
Movimento sindical contra EaD
no Ensino Médio
Conforme dito no início da matéria, o
Sindicato dos Professores do ABC é contra a
autorização de 20% das aulas a distância no nível
Médio, por acreditar que as condições de trabalho
serão precarizadas e o ensino será sucateado.
A Apeoesp, Sindicato dos Professores do
Ensino Oficial do Estado de São Paulo, por meio
da presidenta Maria Izabel Noronha, divulgou
nota com o posicionamento da entidade para a
determinação. Izabel afirmou que “ao oferecer até
20% da carga horária na modalidade a distância,
poderá ocorrer uma queda ainda maior da
qualidade do ensino no Estado de São Paulo”.
caminha na direção que apontamos acima, apenas
Confira a íntegra do documento:
camufla o problema.
“A decisão do Conselho Estadual de Educação,
Se, em algumas regiões de alguns estados
homologada pela secretária estadual da Educação, com grande extensão territorial e incontornáveis
autorizando as escolas de Ensino Médio a oferecer dificuldades de acesso – como na Amazônia – podem
até 20% da carga horária na modalidade a distância ser encontradas justificativas para a implementação
poderá contribuir para uma queda ainda maior da do ensino regular a distância, no Estado de São Paulo
qualidade do ensino no nosso estado.
é completamente descabida a adoção desta forma de
Mais uma vez, evidencia-se a indisfarçável ensino.
intenção de cortar gastos, um objetivo recorrente nas
Nada justifica que qualquer disciplina do
medidas educacionais adotadas nos últimos 14 anos Ensino Médio, no estado mais rico da federação,
no Estado de São Paulo. Além disso, uma medida seja ministrada a distância, considerando que a
de tal amplitude e impacto no processo de ensino- transmissão e a construção do conhecimento são
aprendizagem deveria ter sido objeto de consultas e processos coletivos, que exigem a inter-relação
debates nas redes de ensino, em particular na rede presencial professor-aluno, aluno-professor e alunoestadual, o que não ocorreu.
aluno. Pretender substituir tal processo de ensinoÉ público e notório que a oferta de vagas aprendizagem por um processo, no qual o aluno
no Ensino Médio, na rede pública, não atende à relaciona-se de forma passiva com conteúdos prédemanda no Estado de São Paulo. Da mesma configurados, transmitidos através de um monitor de
forma, são altos os índices de evasão e repetência, vídeo significa, na verdade, uma rendição do Estado
sobretudo no noturno, tendo em vista a inadequação frente aos problemas do Ensino Médio decorrentes,
dos conteúdos e das dinâmicas deste nível de ensino em grande medida, das políticas educacionais que
à realidade e às necessidades dos
vêm sendo aplicadas por este mesmo
alunos-trabalhadores e da juventude
"Atualmente, já está Estado nos últimos anos.
de um modo geral. Antes de propor difícil conseguir bom
Não se trata, aqui de combater
“inovações”, a secretária da Educação
as
novas
tecnologias educacionais e os
desempenho dos
de São Paulo deveria preocupar-se em alunos quando estão novos meios disponíveis à produção e
construir uma identidade ao Ensino acompanhados pelos transmissão do conhecimento. TrataMédio.
se, na verdade, de manter e valorizar os
professores, quem dirá
Não se pode pretender resolver
processos educacionais que privilegiam
quando
não
tiver
essa
problemas que envolvem o próprio
a relação direta entre o professor e
assistência”
perfil deste nível de ensino com
seus alunos, pois é desta interação,
Professor Aloísio
medidas que visam, tão somente,
necessária e insubstituível, que pode
contornar o problema da baixa
emergir um ensino de qualidade, desde
oferta de vagas e obter resultados
que asseguradas as condições materiais,
quantitativos, como o aumento das matrículas e do a gestão democrática, projeto político-educacional
número de concluintes, em detrimento da qualidade adequado e outros pressupostos.
do processo educacional.
As novas tecnologias são ferramentas
A meta deve ser a construção de uma fundamentais a uma educação de qualidade. Mas
educação científico-tecnológica básica, que combine elas são ferramentas de trabalho e não substituem o
conhecimentos gerais e específicos, articulando processo educacional. Elas são úteis a professores e
pensamento e ação, teoria e prática, escola e alunos como pontes para o conhecimento, mas não
sociedade, contemplando: o universo da ciência podem ser utilizadas para substituir ou obstaculizar a
contemporânea; as novas tecnologias; as relações relação entre professores e alunos. Qualquer tentativa
sócio-históricas estabelecidas pelos homens na de fazê-lo, como esta decisão do Conselho Estadual
sociedade e no trabalho; as diferentes formas de de Educação e da Secretaria Estadual da Educação,
linguagem presentes nos espaços sociais e produtivos. significa condenar a educação do Estado de São
Para tanto, o currículo deve combinar uma parte Paulo a mais atraso e menos qualidade. Por isto,
comum (75%) e uma parte diversificada (os demais conclamamos a Secretaria Estadual da Educação a
25%) livremente definida pelas unidades escolares, de rever sua posição, cancelando esta decisão e investindo
acordo com seus projetos político-pedagógicos.
em mais escolas, mais vagas, mais professores, mais
A resolução do Conselho Estadual de Educação, condições de trabalho e, consequentemente, mais
assumida como política pelo governo estadual, não qualidade no Ensino Médio do estado de São Paulo”.
Revista do Professor - SINPRO ABC
25
Regulamentação
Para contratação de professores na
modalidade em EaD, as instituições de ensino
devem obedecer a convenção coletiva de trabalho
da categoria dos professores observando ainda os
seguintes pontos :
- A contratação dos professores será realizada
pelas próprias instituições de ensino credenciadas
para oferta do curso em EaD e não pela instituição
conveniada;
- Definição dos papéis de professor, de
professor-tutor presencial e do professor tutor a
distância;
- 25% (vinte e cinco por cento) de Horaatividade para tarefas em EaD;
- Pagamento de elaboração de material
áudio-visual;
- Vigência dos direitos autorais vinculada ao
contrato de trabalho do professor na instituição;
- Número máximo de 20 (vinte) alunos por
professor e por professor-tutor;
- Os professores que atuam na EaD, bem
como, os professores tutores em disciplinas
virtuais, na mesma instituição e nos respectivos
pólos, terão direito a férias e recesso escolar,
conforme prevê a CCT da categoria;
- Os estabelecimentos de ensino que ofertam
cursos/disciplinas na forma de EaD remunerarão
os docentes que neles atuarem, com no mínimo,
o valor da hora-aula paga aos professores dos
curso regulares presenciais, respeitando as
especificidades desta oferta, considerando a
elaboração dos materiais, a docência propriamente
dita e o atendimento aos alunos;
- Os equipamentos de multimídia utilizados
pelos docentes na execução de planos de
trabalho, devidamente sintonizados com o plano
pedagógico da instituição, deverão ser por ela
disponibilizados;
- O atendimento aos alunos deverá ser,
obrigatoriamente, no ambiente da instituição
ofertante, sendo proibido o fornecimento para
26
Revista do Professor - SINPRO ABC
os alunos do telefone e e-mail particular do
professor;
- A carga horária de trabalho do professor
deverá ser previamente definida pela instituição
de ensino, nunca ultrapassando a jornada de
40(quarenta) horas semanais;
- Não se inclui no âmbito definitório de
“Educação a Distância” a simples disponibilização
de material de apoio pedagógico no site da
escola;
- As formas de comunicação entre
‘professor-instituição’ e ‘professor-aluno’ devem
se dar, preferencialmente, por correio eletrônico,
fax ou caixa postal telefônica; a comunicação não
deve ser feita pelo telefone, seja residencial, seja
pessoal do professor;
- Horário de trabalho: flexível, agenda de
trabalho previamente definida com a instituição
de ensino onde constariam datas/horários de
presença do professor na instituição;
- A elaboração de material didático deverá
ser remunerada como tarefa específica e deve
ser previamente “negociada” com a instituição.
Tal atividade não será considerada dentro da
hora-atividade e serão assegurados os direitos
estabelecidos na lei dos direitos autorais;
- Direitos autorais: devem ser previamente
estabelecidos pelas partes, no que dizem
respeito à utilização dos materiais elaborados
e da imagem do professor. Tais materiais não
podem ser reutilizados pela instituição sem prévia
autorização do professor;
- A gravação de vídeos será remuneração
como tarefa específica, devendo levar em conta o
direito de imagem, conforme legislação vigente;
- O tempo de acompanhamento aos
alunos, tanto na solução das dúvidas/explicações
complementares ou nos momentos de avaliação,
é necessário que seja estabelecido e remunerado
pelo número de horas-aula necessárias. Essa
carga-horária deve estar integrada à carga horária
semanal do professor.
Internacional
60 anos da Revolução Chinesa
e 50 da Revolução Cubana:
Revolução e Libertação Nacional
A Revolução Russa: matriz ideológica dos movimentos de Libertação
Nacional do Século XX
Israel Barbosa
Por José Rodrigues Máo Júnior*
E
m 2009 completam-se cinco décadas
do triunfo da Revolução Cubana
e seis da Revolução Chinesa. Para
o historiador, este distanciamento
temporal de cerca de meio século do triunfo desses
movimentos nos permite realizar reflexões mais
completas.
Embora
essas
duas revoluções tenham
ocorrido em sociedades
completamente distintas e
em diferentes continentes,
indiscutivelmente esses dois
processos
revolucionários
inscreveram-se dentro de um
movimento revolucionário
mais
amplo,
marcado
pela resistência dos povos
oprimidos da Ásia, África e
América Latina diante do
Imperialismo, e tiveram como
guia e inspiração, a grande
Revolução Russa de Outubro
de 1917.
O gigantesco Império
Russo do tempo dos Czares
não era apenas um Estado
multinacional situado em dois continentes (Europa
e Ásia): era também uma sociedade dual, onde
“ilhas” de rápida modernização industrial conviviam
com um vasto, atrasado e subdesenvolvido interior
agrário. Surpreendentemente ainda no início século
XX, a frágil estabilidade política do Império era
garantida por um regime com claras características
absolutistas.
Vítima de suas contradições internas,
Revista do Professor - SINPRO ABC
27
agravadas pela crise decorrente de sua desastrosa
participação na I Guerra Mundial, o regime czarista
ruiu estrepitosamente. Mas o que se consolidou
não foi um regime democrático-burguês que se
tentou estabelecer a partir a Revolução de Fevereiro
de 1917. O caráter autocrático do czarismo havia
impedido a formação de uma classe burguesa
poderosa e politicamente independente, capaz de
cumprir o seu papel histórico e levar adiante uma
revolução burguesa. Diante da clara debilidade
política da burguesia russa, o poder escapou-lhe
às mãos em outubro daquele mesmo ano. Em
meio ao mais completo caos político-institucional,
o apoio da massa de camponeses, operários,
soldados e marinheiros deslocou-se para a única
força política capaz de empalmar o poder: o Partido
Bolchevique.
Após assumir o poder, os bolcheviques
tiveram que enfrentar uma terrível Guerra Civil
que se estendeu até 1920, contra as tropas contrarevolucionárias do “Exército Branco”, apoiado
por tropas britânicas, francesas, estadunidenses,
japonesas, polonesas, sérvias, gregas e romenas.
No momento mais desesperador dessa guerra, os
bolcheviques chegaram a controlar apenas uma
estreita franja de terra – sem saída para o mar –
no centro e norte da Rússia. A vitória do “Exército
Vermelho” somente foi possível em decorrência do
apaixonado apoio das massas de camponeses e
operários à causa bolchevique.
Consolidados no poder após a vitória na
Guerra Civil, os comunistas russos assumem
uma tarefa ainda mais assombrosa: reconstruir e
modernizar um país economicamente atrasado,
predominantemente agrário e destruído pela
guerra. A burguesia russa havia sido incapaz
de cumprir o seu papel histórico e desenvolver
plenamente as forças produtivas de seu país.
Agora, paradoxalmente, uma outra classe social
teve de incumbir-se das tarefas não realizadas pela
burguesia.
O rubro eco da Revolução Bolchevique e da
consequente formação do primeiro Estado Operário
– a URSS – alcançou os trabalhadores de todo o
mundo. O caráter dual da antiga sociedade russa,
ao mesmo tempo europeia e asiática, desenvolvida
e atrasada, colonialista e colonial, contribuiu para
que o exemplo da revolução ocorrida naquele país
influenciasse tanto a classe trabalhadora dos países
capitalistas avançados, quanto à dos povos coloniais.
1
No que tange a esses últimos, a ampla divulgação dos
escritos teóricos dos bolcheviques, particularmente
a apaixonada defesa de Lênin quanto ao direito à
autodeterminação das nacionalidades oprimidas,
além da obra “O Imperialismo: fase superior do
capitalismo”, forneceu parte do instrumental teórico
básico para os nascentes movimentos de libertação
nacional da Ásia, África e América Latina.
Entretanto, o mais impressionante aos olhos
do resto do mundo foi o estrondoso sucesso dos
comunistas soviéticos na área econômica. Entre 1929
e 1940, o volume da produção industrial soviética
praticamente triplicou. Em 1913, a Rússia produzia
em torno de 3,6% da produção industrial do mundo.
Em 1929, a URSS produzia aproximadamente 5%, e
em 1938, 18%. É importante destacar, ainda, que
essa acelerada expansão da economia soviética
ocorreu justamente quando o mundo capitalista
vivia o grave período de depressão econômica após
1929. Para grande parte dos observadores da época,
o modelo soviético de Economia Planificada parecia
ser uma forma superior de gestão econômica e,
sobretudo, particularmente indicado para o rápido
desenvolvimento industrial de economias de países
atrasados.
Após da fundação da III Internacional
Comunista (Komintern), em 1919, o modelo de
organização dos bolcheviques passou a ser a
inspiração da maior parte dos revolucionários de
todo o mundo. Foram fundados Partidos Comunistas
na maior parte dos países. Surgiu um novo tipo de
militância revolucionária. Em uma guerra de vida e
morte entre o socialismo e o capitalismo só haveria
lugar para “soldados”, ou em outras palavras, para
militantes profundamente disciplinados, leais e
devotados à causa revolucionária, aquilo que Lênin
muito bem definiu como os “mortos sob licença”.
Dessa forma, a Revolução Bolchevique
forneceu não apenas a ideologia, mas também uma
nova forma de organização revolucionária e um
novo modelo de sociedade a ser construída.
A Revolução Chinesa e
restabelecimento do Tiang Ming
A maior e mais bem estruturada sociedade da
antiguidade teve a sua estabilidade social abalada
diante da penetração comercial da Europa no
século XIX. Nos dizeres de Marx e Engels: os “preços
baixíssimos das suas mercadoria são a artilharia
pesada com que deita por terra todas as muralhas
MARX, Karl; ENGELS, Friederich. Manifesto do Partido Comunista. Lisboa: Avante, 1984, 2 ed., p. 64.
28
Revista do Professor - SINPRO ABC
o
chinesas”1.
Para romper a obstinada resistência do
Imperador em fazer concessões comerciais aos
britânicos, esses recorreram ao contrabando de
uma mercadoria que tinha grande aceitação no
mercado chinês: o ópio. O tráfico de ópio funcionou
como ponta de lança, atrás da qual seguiam as
demais mercadorias industrializadas do ocidente.
Observado os malefícios que tal mercadoria produzia
em sua população, tropas imperiais atacaram navios
britânicos e jogaram o carregamento de ópio no
mar.
O governo britânico, indignado com esse
atentado à liberdade de comércio (o direito de
traficar drogas livremente), entrou em conflito com
a China. Ocorreu então a Primeira Guerra do Ópio
(1839-42). Essa primeira derrota militar do Império
chinês foi secundada por inúmeras outras, entre
elas a Segunda Guerra do Ópio (1856-60), a RussoChinesa de 1858, a Franco-Chinesa (1884-85), a
Sino-Japonesa de 1894-95 e a Sino-Alemã de 1898.
O Império Chinês foi obrigado a aceitar uma série de
concessões financeiras e territoriais, praticamente
cedendo aos estrangeiros a soberania das regiões
mais ricas da China. Rapidamente a china foi
transformada em um satélite do mundo industrial.
Deve-se perguntar, entretanto, como foi
possível um relativamente modesto efetivo de
canhoneiras e de tropas estrangeiras conseguir
submeter o grande Império Chinês, que contava
com cerca de um quinto da população da Terra. A
resposta deve ser procurada nas vastas e populosas
áreas rurais da China.
A ética do confucionismo garantia a
legitimidade do poder imperial. Segundo essa
ética, o Imperador era detentor do Mandato
Celestial (Tiang Ming). Entretanto, se o Imperador
se mostrasse inepto, os Céus lhe retirariam o poder,
ocorrendo então a Ruptura do Mandato Celestial
(Ge Ming). Segundo a lógica confuciana, o Ge Ming
era prenunciado por “sinais”, tais como prodígios no
céu, catástrofes climáticas, corrupção na burocracia
e agitação agrária. Destes “sinais” devemos nos ater
ao que nos parece mais importante: a agitação
agrária.
A história da China foi profundamente
marcada por constantes rebeliões camponesas.
Em alguns casos excepcionais estas rebeliões
conseguiram derrubar o poder imperial. Não
obstante, a queda de uma dinastia jamais significou
o fim do sistema imperial. Uma vez deposto o
Imperador, constituía-se uma nova dinastia, não
raro fundada a partir do principal líder da rebelião.
Desta forma, as rebeliões camponesas, longe de
ameaçar a tradicional sociedade chinesa, estavam
perfeitamente integradas a ela. Serviam para depor
um Imperador inepto e alçar ao poder um novo, que
restabelecesse os benefícios do Mandato Celestial.
A penetração comercial europeia rompeu
a frágil estabilidade social no campo. A produção
artesanal entrou em declínio diante da concorrência
dos produtos industrializados, e as indenizações
de guerra pagas pelo Império aos estrangeiros
significaram um contínuo aumento de impostos.
Além disto, as novas necessidades de consumo
por parte da elite chinesa somente poderiam ser
satisfeitas mediante o aumento da exploração do
campesinato. Consequentemente, a penetração
comercial estrangeira na China coincidiu com uma
série de rebeliões camponesas. A maior delas foi a
Rebelião Taiping (1850-66), que chegou a controlar
cerca de metade do território chinês, estabelecendo
um “Reino Celestial de Paz Universal” com a capital
em Nanquim.
Visto por esse prisma, podemos perceber
que o Imperador estava diante de dois inimigos: de
um lado os “diabos estrangeiros” e de outro o seu
próprio povo. Não é difícil perceber que o perigo
mais iminente eram as rebeliões camponesas que
se alastravam pelo Império. Em face deste quadro, o
Imperador adotou uma política de capitulação em
relação às potências estrangeiras para ter as mãos
livres para reprimir a agitação interna. Deve se
destacar ainda que a Rebelião Taiping foi sufocada
a custa de cerca de 20 milhões de mortos.
A crise do Império chinês do século XIX teve
o seu epílogo em 1911. Neste ano ocorreu uma Ge
Ming singular, que não inaugurou uma nova dinastia,
mas sim uma República. Este movimento expressava
os anseios de uma nascente intelectualidade
urbana que propugnava a modernização da China
em termos ocidentais. Era liderado pelo Partido
Nacionalista da China (Kuomintang), e tinha como
principal liderança política o médico Sun Yat-Sen.
Entretanto, a República Chinesa teve curta
duração. Em 1913 o general Yuan Shikai perpetrou
um golpe de Estado que pôs fim a esta experiência
Republicana. A partir de então, o poder se
fragmentou na China, que passou a ser governada
pelos Senhores da Guerra, chefes militares com
poderes políticos locais.
Em 1919, Sun Yat-Sen retornou do exílio,
reorganizou o Kuomintang e fundou a República do
Sul da China em 1921, com capital em Cantão.Tinha
como estrela polar de sua política, a aliança com
a URSS, o modelo de modernização a ser seguido.
Revista do Professor - SINPRO ABC
29
Por este motivo aliou-se ao recém-fundado Partido
Comunista da China (Kung Chan Tang). Liderou a
primeira fase da Guerra Civil Revolucionária (192427), contra os Senhores da Guerra, com o intuito de
reunificar a China.
Sun Yat-Sen morreu em 1925, sendo sucedido
pelo general Chiang Kai-Shek, que tinha estreitas
relações não só com a alta burguesia chinesa, mas
também com o Governo dos EUA. Ambos, por
óbvios motivos, não viam com bons olhos a aliança
do Kuomintang com os comunistas. Em 1927, uma
vez vencidos os Senhores da Guerra, Chiang KaiShek rompeu a aliança com o Partido Comunista,
assassinando mais de 5 mil militantes em Xangai
(alguns foram atirados vivos em caldeiras de
locomotivas). A ruptura entre o Kuomintang e os
comunistas marcou o início de uma Segunda Guerra
Civil Revolucionária (1927-37).
Nesta época, Mao Tse-Tung dirigia uma
escola de quadros para o movimento camponês
no sul da China. Ainda no final de 1927, organizou
um levante em Hunan, duramente reprimido pelas
tropas do Kuomintang. Refugiou-se nas montanhas
de Jinggang, próximas a província de Jiangxi, onde
conseguiu agrupar as tropas fiéis aos comunistas,
organizando os Soviets de Jiangxi.
Expulsos das cidades, os comunistas
estabelecem profundos laços políticos com o
campesinato. Os Soviets de Jiangxi passaram a ser o
centro da resistência comunista, e conferiram a Mao
Tse-Tung uma posição de destaque. Entretanto as
bases comunistas em Jiangxi estavam sob constante
fogo inimigo. Suportaram quatro campanhas de
cerco e aniquilamento movidas pelas tropas do
Kuomintang. Em 1934, foi organizada uma quinta
campanha, com mais de um milhão de soldados
apoiados por artilharia e aeronaves. Diante dessa
ofensiva, não restou outra alternativa à liderança
comunista senão a de efetuar uma retirada
estratégica. Esse episódio ficou conhecido como
A Longa Marcha, uma retirada de cerca de 10 mil
quilômetros até o noroeste da China, efetuada sob a
perseguição e fogo inimigo. Dos aproximadamente
100 mil soldados vermelhos que iniciaram a marcha,
somente cerca de 9 mil conseguiram atingir Yan´nam
um ano depois.
O Japão, que já ocupava o norte da China
(Manchúria) desde 1931, iniciou a invasão da
maior parte do restante do território chinês em
1937. Iniciou-se assim uma nova fase da história
chinesa: a de Guerra de Resistência contra o Japão
(1937-45). A atitude das tropas do Kuomintang
e as dos comunistas em face desta invasão foram
30
Revista do Professor - SINPRO ABC
diametralmente opostas. Enquanto o Exército
Popular de Libertação (comunista) sustentava
uma decidida resistência ao invasor sob a forma
de guerra de guerrilhas, o exército do Kuomintang
assumia uma postura contemplativa ou até mesmo
de colaboração diante dos japoneses. Essa atitude
refletia os interesses da classe dominante chinesa,
que preferia o domínio japonês aos comunistas. A
partir de então, aos olhos do povo, os comunistas
passaram a ser vistos como os mais verazes
defensores da nação chinesa, e o termo Hanjan –
traidor da China – deixou de ter uma conotação
exclusivamente patriótica, passando a ter também
um sentido de classe.
Com a retirada japonesa após o final da II
Guerra Mundial, se estabeleceu um vácuo político
que foi rapidamente preenchido pelos exércitos do
Kuomintang (que ocuparam todas as cidades) e o
Exército Popular de Libertação (que controlava a
maior parte das áreas rurais). Tentou-se a formação
de um Governo de coalizão, que fracassou devido
às exigências feitas pelo Kuomintang de que
os comunistas entregassem as armas. A vívida
lembrança do massacre de Xangai impediu que
os comunistas cometessem tal loucura, o que
certamente equivaleria a um suicídio. Em função
desse impasse, a China mergulhou numa Terceira
Guerra Civil Revolucionária (1945-49).
Os comunistas, fortalecidos pela sua brilhante
atuação na II Guerra Mundial, rapidamente
consolidaram o controle das áreas rurais, colocando
a maioria das cidades chinesas sob cerco. Com o
tempo, esse cerco foi se apertando e nas principais
cidades chinesas começaram a ocorrer constantes
agitações operárias e estudantis. Paulatinamente
as cidades chinesas vão caindo nas mãos dos
comunistas e Chiang Kai-Shek fugiu para a Ilha de
Taiwan.
Em Primeiro de Outubro de 1949, as tropas
do Exército Popular de Libertação marcharam
vitoriosas. Nesse mesmo dia, o camarada Mao TséTung proclamou a fundação da República Popular
da China. Mais de um século transcorreu desde que
as antigas estruturas do sistema imperial entraram
em crise diante da penetração estrangeira. Muitas
décadas se passaram desde que o Império ruiu e
mergulhou a China no mais completo caos e guerra
civil. Muitos anos se passaram sem que a China
tivesse um Governo que exercesse a soberania sobre
todo o seu território. Pela primeira vez depois de
muitas décadas, o Tiang Ming estava restabelecido.
Mas, diferentemente dos governos anteriores, não
eram os mandarins imperiais ou títeres de potências
estrangeiras que governavam: agora quem estava
no poder era o povo.
O triunfo da Revolução Cubana
Cuba, 1º de janeiro de 1959. Colunas do
Ejército Rebelde comandadas por Camilo Cienfuegos
e Che Guevara avançaram rumo a Havana após
conquistar a cidade de Santa Clara, na região central
da Ilha. O ditador Fulgencio Batista fugiu do país
com as malas devidamente recheadas de dólares,
enquanto um general anti-batistiano – Eulogio
Cantillo – intentava um golpe militar. A manobra
deste último era astuciosa: pretendia ocupar o
vácuo político-institucional decorrente do colapso
do regime e impedir a tomada do poder pelos
revolucionários.
Naquele momento, Fidel Castro, o
Comandante em Chefe do Ejército Rebelde, que
recentemente havia conquistado a cidade de
Palma de Soriano, mantinha Santiago de Cuba sob
cerco. Ao inteirar-se dos acontecimentos, Fidel,
através da Rádio Rebelde, lançou uma proclamação
convocando o povo cubano a uma greve geral
revolucionária. O povo aderiu entusiasticamente
ao chamado, lançando-se às ruas, assaltando os
corpos repressivos, detendo torturadores. Naquele
dia, o povo converteu-se num gigantesco exército e
ator decisivo do triunfo revolucionário.
Historicamente, essa data se diferenciou
de um outro evento que havia ocorrido em Cuba
há exatos 60 anos. No dia 1º de janeiro de 1899,
Cuba tornou-se independente. Entretanto, sobre as
antigas fortalezas espanholas não foram hasteadas
as bandeiras cubanas, mas a temível bandeira de
listras e estrelas dos EUA.
Nenhum povo do continente americano
lutou por sua independência em condições
tão difíceis quanto o povo cubano. Foram duas
guerras de independência: a Guerra dos Diez Años
(1868-1878), e a Segunda Guerra de Independencia
(1895-98). Neste último conflito, morreram cerca
de 80 mil soldados espanhóis e cerca de 400 mil
cubanos. Tendo em vista que a população cubana
era estimada em torno de 1,5 milhão de habitantes,
poderíamos afirmar que essa guerra foi o Vietnã do
século XIX, segundo expressão de Fidel Castro.
Em 1898, quando as tropas independentistas
cubanas praticamente já controlavam a maior parte
das áreas rurais de Cuba, os EUA intervieram no
conflito – supostamente para “ajudar os cubanos”
– e de maneira oportunista se apoderaram do país.
O primeiro Governo “cubano” foi o da intervenção
militar estadunidense que perdurou até 1902.
Durante o Gobierno Militar do EUA, foi
criada a maioria dos mecanismos institucionais e
econômicos que garantiram o domínio neocolonial
sobre Cuba. Como anexo a Constituição cubana, foi
imposta a Enmienda Platt, que dava o direito aos
estadunidenses intervirem militarmente na Ilha, e
ainda o direito a uma base naval em Guantánamo.
O Gobierno Militar inaugurou também a corrupção
e a fraude eleitoral em Cuba para eleger alguém de
confiança como Presidente. Tratava-se de Tomás
Estrada Palma, que tinha dupla cidadania e foi eleito
sem sequer estar em território cubano.
A história política de Cuba na primeira
metade do século XX pode ser resumida, a grosso
modo, numa sucessão de governos oligárquicos,
permeados por ditaduras e intervenções militares
dos EUA. Entretanto, o principal mecanismo de
sujeição de Cuba ao imperialismo não era o militar,
mas o econômico.
Ainda no século XIX, os interesses da burguesia
açucareira cubana e de empresas estadunidenses
se entrelaçavam. Esta situação aprofundou-se
durante o Gobierno Militar que, através de Ordens
Militares, expropriou terras de grande parte do
campesinato. Desta forma, empresas dos EUA – e
também latifundiários cubanos - se apropriaram de
vastas extensões de Cuba. Mecanismos comerciais
e alfandegários garantiam vantagens para o açúcar
produzido em Cuba no mercado estadunidense.
Desta situação se beneficiavam principalmente as
empresas estadunidenses estabelecidas na Ilha,
mas também, na qualidade de sócios menores, a
burguesia açucareira cubana.
Dentro desse quadro, a possibilidade de
realização de lucros por parte do setor mais
poderoso da burguesia cubana estava atrelada a
manutenção dos mecanismos de sujeição política e
econômica em relação aos EUA. Em troca da garantia
para o açúcar cubano no mercado estadunidense,
o Governo cubano teve que fazer uma série de
concessões que obstaculizaram o desenvolvimento
de outras áreas da economia. Crescentemente Cuba
tornou-se um país monoprodutor de açúcar, que
exportava para um único mercado: os EUA.
Em relação às camadas médias urbanas,
essa deformação da economia reduzia as suas
possibilidades de ascensão, ou até mesmo de
manutenção de seu status quo. Por parte do
proletariado (em grande parte rural), o caráter
sazonal da economia açucareira limitava o acesso
a empregos estáveis. Quanto ao campesinato, esse
era crescentemente vítima de expulsões de suas
terras, para dar espaço ao constante avanço dos
Revista do Professor - SINPRO ABC
31
latifúndios para novas áreas de cultivo.
Diante da postura neocolonial da classe
dominante cubana, não é de se estranhar que
a bandeira de luta pela emancipação nacional
acabasse empalmada pelos setores descontentes
da sociedade cubana. Cedo o proletariado cubano
soube vincular a luta pela emancipação social à luta
pela emancipação nacional. O Partido Comunista
de Cuba soube incorporar estas duas dimensões da
luta desde a sua fundação em 1925. Rapidamente
colheu os seus frutos: antes da Revolução, tornou-se
o terceiro maior Partido Comunista do continente.
Em 1952, Cuba estava submetida a uma nova
ditadura. No ano seguinte, um grupo de jovens,
determinados a enfrentar a tirania com armas em
punho, intentou tomar o Quartel Moncada, em
Santiago de Cuba. A operação fracassou, alguns dos
jovens caíram em combate, e muitos outros foram
assassinados após a captura. Os que sobreviveram
foram presos, julgados e sentenciados. Mais tarde
foram anistiados e reagrupados no exílio em terras
mexicanas. Ainda no México, o médico argentino
Che Guevara incorporou-se ao grupo liderado por
Fidel Castro, cujo objetivo era desembarcar em
Cuba e reiniciar a luta contra a ditadura de Fulgencio
Batista.
No México, em 25 de novembro de 1956, 82
expedicionários embarcaram no iate Granma – de
apenas 12,5 metros de comprimento. Desembarcam
em Cuba no dia 2 de Dezembro. Depois de um
primeiro combate desfavorável, o grupo foi
reduzido a cerca de 15 homens dispersos, alguns
desarmados, outros feridos. Não obstante, a região
do desembarque ocorreu próximo a região da Sierra
Maestra, na região oriental da Ilha, onde existia um
mobilizado campesinato que resistia à geofagia dos
latifundiários. Os sobreviventes do Granma foram
acolhidos no seio desta população camponesa,
protegidos e alimentados. A partir deste pequeno
grupo de sobreviventes, e com a incorporação de
camponeses da região, rapidamente se desenvolveu
uma guerrilha na Sierra Maesta. Surgiu assim, o
Ejército Rebelde.
Depois de algumas vitoriosas escaramuças
iniciais, o Ejército Rebelde cresceu em número,
a ponto de criar um território livre na Sierra. No
início de 1958, a guerrilha contava com um efetivo
de aproximadamente 300 homens. O ditador
Fulgencio Batista, com intuito de esmagar o
movimento, organizou uma ofensiva de cerco e
aniquilamento em maio daquele ano. Esta ofensiva
contava com cerca de 10 mil homens, apoiados
por artilharia, blindados e aeronaves. Durante
32
Revista do Professor - SINPRO ABC
os 76 dias desta ofensiva, combateu-se com
ferocidade, e surpreendentemente, para completa
desmoralização do regime de Batista, o Ejército
Rebelde saiu-se vitorioso.
A partir de então, a guerrilha passou a atuar
fora de suas bases na Sierra, colocando sempre as
forças repressivas em xeque. Alguns meses mais
tarde, o ditador, totalmente desmoralizado, fugiu
do país em 1º de janeiro de 1959.
No dia seguinte, Fidel Castro à frente da
Coluna nº 1 marchou pelas ruas de Santiago de Cuba,
ocupando simbolicamente o Quartel Moncada,
local onde havia desfechado a sua primeira ação
em 1953. Naquela noite, em meio ao júbilo popular,
fez o seu primeiro discurso após a queda de batista.
Neste discurso, além de referências históricas sobre
as duas datas, 1º de janeiro de 1899 e de 1959, Fidel
também se referiu ao inevitável conflito com os
EUA:
“Desta vez não se frustrará a Revolução. Desta
vez, para sorte de Cuba, a Revolução chegará de
verdade até o final; não será como em 1895, quando
vieram os americanos e fizeram-se donos do país;
intervieram na última hora e depois nem sequer a
Calixto García, que havia lutado por 30 anos, deixaram
entrar em Santiago de Cuba; ... Nem Ladrões, nem
traidores, nem intervencionistas, desta vez sim, é uma
Revolução ...”
* Prof. Dr. José Rodrigues Máo Júnior
Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de São Paulo – IFSP
Campus Cubatão
Autor de: A Revolução Cubana e a Questão
Nacional (1868-1963) (Núcleo de Estudos d’O
Capital). Co-autor de: A Revolução Chinesa: até
onde vai a força do dragão? (Scipione).
Cultura
Os cem anos da portuguesinha com
coração brasileiro
Centenário de Carmen Miranda
é comemorado com lembranças
e homenagens à estrela que
levou o nome do Brasil para o
mundo
O
que é que a baiana tem? Quem
respondeu e representou, com
muito charme e singularidade a
mulher brasileira em todo mundo,
sequer nasceu na Bahia ou muito menos no Brasil.
Maria do Carmo Miranda da Cunha nasceu no
Distrito do Porto, em Portugal, no dia 9 de fevereiro
de 1909.
Como ‘Maria do Carmo’ era conhecida pelos
familiares, porém, como Carmen Miranda foi
reconhecida internacionalmente, não só como a
mulher das roupas coloridas e das frutas na cabeça,
mas, também, como uma das maiores cantoras
populares das décadas de 30 a 50. No livro "Carmen
Miranda - A Cantora do Brasil", Abel Cardoso Junior,
jornalista e historiador explica: "O nome ‘Carmen’
trata-se de abreviação de Maria del Carmen, que é o
mesmo que Maria do Carmo”.
A carreira
Carmen veio para o Brasil em 1910, com a mãe
Olinda. Segundo o livro de Abel Cardoso Jr., Olinda
também era dona de uma linda voz e Carmen teria
herdado da mãe a vocação artística.
Aos vinte anos, Carmen cantou no Instituto
Nacional de Música, Rio de Janeiro. Na platéia,
Josué de Barros, compositor baiano, assistiu a
apresentação e se interessou pela carreira da cantora.
No mesmo ano, em 1929, Carmen se apresentou na
Rádio Sociedade e, poucos meses depois, gravou o
primeiro disco no selo Brunswick com as canções
Não Vá Sim´bora e Se o Samba é Moda.
O ano de 1930 foi o ano da consagração. Em
fevereiro, a marchinha “Ta hi” foi lançada e os foliões
do carnaval cantaram “Yá Yá Yô Yô”. Em junho, o jornal
“O País” divulgou uma entrevista com a Carmen e a
intitulou como a maior cantora popular brasileira.
Em março de 1933, estreou o primeiro filme,
Revista do Professor - SINPRO ABC
33
“A Voz do Carnaval”, no Cine Odeon. Em agosto do
mesmo ano, César Ladeira assumiu a Rádio Mayrink
Veiga, com quem Carmen assinou contrato de
dois anos. César batizou a cantora como “Ditadora
Risonha do Samba” e com aquele que se tornou
um dos mais marcantes apelidos de Carmen: A
Pequena Notável. Tempos depois, Carmen passou a
ser chamada, também, por “Embaixatriz do Samba”.
Em 1939, destaca Abel Cardoso, Carmen
gravou com Dorival Caymmi “O que é que a baiana
tem” e estreou o filme “Banana da Terra”. A partir
de então, o figurino de baiana se tornou a marca
da cantora, pela qual seria lembrada eternamente,
assim como sua voz e performance nos palcos.
O mundo conhece o que é que a
baiana tem!
Em maio de 1939, Carmen chegou a Nova
Iorque.
“29 de maio de 1939: Estreia na revista ‘Streets
of Paris’, em Boston, com êxito estrondoso. Já popular,
é homenageada no Jockey Club da cidade com um
páreo que leva seu nome. Dizia a imprensa: ‘sua graça
pode ser comparada a dos ídolos de um antigo templo
asteca (sic)’”
(Abel Cardoso Junior - "Carmen Miranda - A
Cantora do Brasil")
No ano seguinte, a Pequena Notável
esteve na Casa Branca e se apresentou para o
presidente Roosevelt. Com a ascensão na carreira
internacional, o público brasileiro recebeu Carmen
friamente no Cassino da Urca e acusaram-na de
ter se americanizada. Essa polêmica fez com que a
cantora gravasse uma série de canções em resposta
às críticas de americanização.
Sobre a paixão pelo país e pelos costumes
brasileiros, Carmen desabafou: “Nasci em Portugal,
mas me criei no Brasil e, portanto, considero-me
brasileira. O local do nascimento não importa,
nem sequer o sangue. O que importa é o que os
americanos chamam de ‘environment’, a influência
do país e dos costumes que nos geraram. Da minha
parte, sou mais carioca, mais sambista de favela,
mais carnavalesca do que cantoras de fados. O
sangue tem uma certa importância, mas só no
temperamento, não na maneira de sentir as coisas”.
A frase foi dita à amiga e jornalista Dulce Damasceno
de Brito, que a publicou no livro “O ABC de Carmen
Miranda”, com outras polêmicas declarações.
“Adotei o Brasil (ou ele me adotou) como país de
estimação e afinidades e também gosto muito dos
States, onde fui realmente consagrada, embora
34
Revista do Professor - SINPRO ABC
estrangeira. Sinto muito em dizer, mas Portugal
nada me significa, apesar do amor por meu país”,
completou Carmen.
Carmen foi a primeira sul-americana a deixar
a marca das mãos e sapatos na calçada do Teatro
Chinês de Los Angeles, em 1941, e, dez anos mais
tarde, foi a artista de show que mais ganhou
dinheiro nos Estados Unidos.
Em 1953, a Europa também recebeu os shows
de Carmen Miranda. Em outra passagem do livro de
Dulce, Carmen relata: “Sou orgulhosa da figura que
consegui implantar no mundo do ‘show bussiness’
como a baiana do Brasil, minhas roupas, sapatos,
turbantes e balangandãs. Também tenho orgulho
danado de ter sido a pessoa que mais faturou nos
Estados Unidos em 1944, segundo levantamento
do Departamento do Imposto de Renda. Passei à
frente de outros artistas e até do presidente! Mas,
pessoalmente, não sou ‘orgulhosa’ no sentido
especial da palavra. Na verdade, acho que sou até
humilde demais, às vezes”.
A morte
“Tenho pavor de morte em hospital, com
doença incurável. Peço a Deus que, quando chegar
a hora, me fulmine com um ataque cardíaco para
que eu não enfrente ‘essa senhora’ largada em
uma cama, cheia de dores”, dizia Carmen. Foi o que
aconteceu.
Aos 46 anos de vida, a cantora fazia uso de
diversos remédios - estimulantes e calmantes - para
suportar a intensa rotina de trabalho. Muitas vezes,
o álcool e o cigarro acompanhavam a medicação.
O uso frequente desses remédios gerou uma série
de efeitos colaterais e dependência química, o que
debilitou a saúde de Carmen Miranda.
No dia 5 de agosto, em Beverly Hills, onde
morava, a Pequena Notável se divertiu com alguns
amigos e foi para o quarto, local onde faleceu, vítima
de uma parada cardíaca.
Para a despedida, mais de 60 mil pessoas
estiveram presentes no velório realizado na Câmara
de Vereadores do Rio de Janeiro, em 12 de agosto.
No dia seguinte, o sepultamento de Carmen
Miranda reuniu entre 500 mil e 1 milhão de pessoas
no Cemitério São João Bastista.
Abel Cardoso destaca em seu livro: “Foi o
mais concorrido de toda a história do Rio, debaixo
de profunda comoção popular, apesar dos 15 anos
sem nenhuma apresentação pessoal de Carmen no
Brasil e já transcorridos 8 dias de seu falecimento. O
Hospital Souza Aguiar atendeu a 182 casos de crise
emocional”.
Sindical
A educação e o
Fórum Social Mundial
2009
Diretores do SINPRO ABC participam do Fórum e colocam em
debate os temas envolvendo a categoria
SINPRO ABC
Revista do Professor - SINPRO ABC
35
B
rasileiros,
estrangeiros,
índios,
brancos,
negros,
homens,
mulheres, professores, agricultores,
sindicalistas, estudantes... seres
humanos. Povos diferentes, que se misturam e
lutam por um objetivo em comum: “um outro
mundo é possível”.
Na edição de 2009, no Pará, o Fórum Social
Mundial atraiu, segundo a organização do evento,
mais de 133 mil pessoas, de 142 países. Entre esses
participantes estavam Jorge Gonçalves e Paulo
Yamaçake, ambos professores e diretores do SINPRO
ABC. O evento foi realizado de 27 de janeiro a 1º de
fevereiro.
Entre os diversos temas discutidos,
destacaram-se a crise mundial, economia, educação,
equidade de direitos, meio ambiente e outras
questões sociais e políticas.
Para conferir todas as deliberações, clique
aqui e acesse o portal oficial do Fórum Social 2009.
Educação no Fórum
Na tenda“Mundo do Trabalho”, a Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos
de Ensino, Contee, montou um estande para
receber visitantes e esclarecer dúvidas relacionadas
à educação.
A campanha “Educação Não é Mercadoria”
foi tema de um seminário, realizado no dia
30 de janeiro, e atraiu mais de 230 pessoas na
Universidade Federal do Pará. Aos presentes foram
entregues as revistas Conteúdo e Educação Não é
Mercadoria, ambas da Contee, além de panfletos
explicativos. Segundo a Confederação, “o interesse
dos participantes do FSM pelo tema foi tão grande
que foi preciso realizar o seminário em duas edições,
para que todos pudessem acompanhar”.
“O FSM é um espaço democrático para a
troca de ideias e informações numa busca coletiva
pela construção de um ‘outro mundo possível’. Um
mundo sem injustiças, discriminações e no qual
todos tenham as mesmas oportunidades de viver,
além de sobreviver, e se desenvolver plenamente”,
avalia a Contee.
Para a secretária geral da Confederação,
Cristina Castro,“todos saíram com o compromisso de
entrar nesta luta e divulgar a Campanha ‘Educação
não é mercadoria’. Foi um saldo muito positivo”.
Todos contra a desnacionalização
Outro ponto forte do FSM foi a Assembleia
da Educação, realizada no último dia do Fórum. Na
ocasião, movimentos sociais e órgãos relacionados
à educação aprovaram ações conjuntas para
barrar a desnacionalização do ensino no Brasil.
“Diante das informações prestadas pela Contee, foi
proposto que o Fórum se torne um instrumento de
articulação das várias iniciativas das entidades no
sentido de barrar o processo de desnacionalização
da educação”, finaliza a Confederação.
Entre os participantes da assembleia
estavam representantes da Campanha Mundial
de Educação, o Fórum Mundial de Educação, a
Universidade de Movimentos Populares, a CEAAL
(Conselho de Educação de Adultos da América
Latina), a OCLAE (Organização Continental LatinoAmericana e Caribeña de Estudantes), a Campanha
Latino-Americana pelo Direito à Educação, a
Internacional da Educação da América Latina, a ICAE
(International Council for Adult Education), a REPEM
(Rede de Educação Popular entre MULHERES), FISC
(International Civil Society Forum), entre outros.
Fórum da Educação
Paralelamente ao Fórum Social Mundial,
ocorreu o Fórum Mundial da Educação. Nesse
evento foram discutidas, em plenárias, as temáticas
“Educação, desenvolvimento e economia solidária”,
“Educação cidadã e ética planetária: inclusão
e diversidade”, “Educação, direitos humanos,
cooperação e cultura de paz”, “Educação, meio
ambiente e sustentabilidade”, “Educação de jovens
e adultos na perspectiva da educação popular”
e “Educação emancipatória no contexto da
comunicação e das tecnologias”. Duas conferências
também foram realizadas, com os temas “Educação e
Transgressão na construção da Cidadania Planetária”
e “Educação, Diálogo e Utopia: Identidades Culturais
em conflito”.
Segundo os organizadores, mais de 10 mil
pessoas inscreveram-se para participar do FME, o
que demonstra a importância do tema Educação
na construção do outro mundo possível.
O interesse dos participantes do FSM pelo tema foi tão grande que foi preciso realizar o
seminário em duas edições, para que todos pudessem acompanhar
36
Revista do Professor - SINPRO ABC
Sala de aula
Fórum Social Mundial Belém - 2009
Decepção e Catarse
Por Jorge de Barros*
S
eguir na marcha de abertura do
Fórum Social Mundial, sob a chuva
abençoada – puro suor da Amazônia
– acompanhando tantas cores, tantos
rostos, tantas línguas e sotaques, tantas lutas, tantos
sonhos e utopias... foi catártico.
Perceber as contradições irreconciliáveis, a
mesquinharia de alguns partidos arautos do “farinha
pouca, meu pirão primeiro”, os oportunismos de
última hora, a arrogância infantil dos que creem sua
luta superior às demais... foi decepcionante.
Ouvir as grandes vozes das grandes mulheres,
dos grandes homens, que, seguindo a orientação
de Sartre, elegeram uma bandeira e descruzaram os
braços, desceram dos muros das teorias para juntar
mãos militantes na construção do outro mundo
possível... foi catártico.
Ouvir asneiras dos que diminuíram o Fórum
como “ninho dos desocupados”, “mero celeiro de
hippies e rebeldias anacrônicas” ou, ainda pior,
perceber que há certa classe de “militontos”, que
vomita ecologismos e socialismos, mas só pratica o
hedonismo e o proselitismo... foi decepcionante.
Conhecer a Belém dos pescadores veneráveis,
dos vendedores simpáticos do Ver-O-Peso, das
bruxas de encantamentos coloridos, da juventude
de iaras e botos, do carimbó, do tacacá, da
maniçoba... foi catártico.
Descobrir que, ao se preparar para o Fórum,
os poderes da cidade sumiram com mendigos, viralatas e urubus (sabe-se lá o que fizeram a eles), sem
falar na repressão à população pobre durante o
Fórum, impedida de participar pela taxa de 30 reais
ou pela borracha da polícia... foi decepcionante.
Presenciar tantos povos indígenas reunidos e,
mais do que isso, organizados. Vê-los passar durante
a marcha, com seu colorido, seus movimentos, seus
passos, seus semblantes. Tudo próprio e original
como toda cultura original... foi catártico.
Presenciar a vexaminosa postura dos que
se digladiavam para tirar uma foto ao lado de
um índio, como se o mesmo fosse um boneco
da Disney, evidência da tamanha distância que
separa brasileiros de brasileiros nativos, sem falar
na demora da organização do Fórum em terminar
a tenda dedicada aos índios (deveria ter sido
prioridade)... foi decepcionante.
Ver a história arquitetônica da cidade, a
Basílica de Nazaré, os casarões, o centro velho, as
vielas históricas, as mangueiras centenárias, o Forte
do Castelo, a Casa de 11 Janelas... foi catártico.
Ver a mesma história corroída e esquecida, com
rachaduras tecidas pelo tempo ou reformas (mal)
realizadas por mãos inábeis... foi decepcionante.
Mas difícil mesmo é descrever o maior misto
de catarse e decepção a que se poderia chegar
nesse importante evento:
A catarse das vozes dos povos, os matizes de
suas lutas: Indígenas, Quilombolas, Sem Terra, Sem
Universidade, Marcha das Mulheres, Povos Sem
Estado, GLBT’s, Palestinos, Periféricos, Atingidos
Por Barragens, Igrejas, Defensores dos Animais,
Trabalhadores e Sindicatos... mas, ao apurar ouvidos
e olhos, em busca de uma voz unânime, de uma cor
predominante, de uma idéia geral que unisse tantas
lutas dissonantes... a decepção de não encontrar
nada... Ou apenas a musa frágil (porém musa!) do
lema: “Um Outro Mundo É Possível”.
Nem mesmo com relação ao mote do
Fórum de Belém – a Amazônia –, há consensos
visíveis: existem os que defendem o paraíso
absolutamente intocável, contra os que preferem o
estudo sistemático para proveito da própria região
e da ciência, em outras palavras, a exploração
Revista do Professor - SINPRO ABC
37
sustentável. Também há quem fale em patrimônio
da humanidade, mas contra estes se erguem as vozes
de latino-americanos que bradam: “A Amazônia
É Nossa”, chamando, dessa forma, atenção para a
nossa responsabilidade frente ao uso/preservação
desse fantástico bioma.
Mas será que consensos são possíveis nesse
universo de idéias multicores? O fórum clama: “Um
Outro Mundo É Possível!” e a sociedade, meio cética,
meio apática, cruza os braços, olha de soslaio, e
pergunta: “Qual”? Confesso que eu mesmo fui a
este Fórum Social, o primeiro da minha vida, com o
intuito de buscar respostas. E eis que retorno cheio
de decepções... e catarses, mas resposta nenhuma.
Acontece, porém, que também encontrei
muita gente tentando, ao seu modo, fazer um outro
mundo possível... índios que vieram exigir saúde ou
mostrar e ensinar para seus “parentes” projetos de
reflorestamento, jornalistas que ainda acreditam no
poder da informação para a difusão de novas idéias
e ideais, comunidades e movimentos sociais que,
de diversas maneiras, criaram redes de economia
solidária. Micro-soluções locais, pequenos gestos
de boa vontade, solidariedade, fé... E também os
grandes movimentos sociais, organizados contra os
latifúndios, contra as grandes empresas poluidoras,
contra as guerras movidas pelo capital, contra a
poluição do meio-ambiente, contra a escravidão e
todo o tipo de opressão.
Aliás, percebi que se amplia, cada vez mais,
a noção de que as lutas sociais e as ecológicas
não podem seguir dissociadas. Defender o meio
ambiente sem pensar na erradicação da pobreza
é falácia, da mesma maneira que a luta por justiça
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social que ignore o conceito de sustentabilidade do
planeta é pura ignorância.
Enfim, percebi que as forças como as que
atuaram no Fórum Social Mundial, com todos
os seus embates e contradições, são como uma
obra em pontilhismo: se nós olharmos de perto,
veremos uma confusão irritante de pigmentos,
aparentemente sem sentido, superficialmente
caótica. Mas se nos afastarmos lentamente (e esse
afastamento só é possível com a passagem do
tempo), uma forma vai surgir, como mágica, frente
a nossos olhos. Entretanto, é impossível enxergá-la
agora: o quadro está bem à frente do nosso nariz,
estamos imersos demais dentro dele para perceber.
E os pintores desse quadro, os povos do mundo, os
movimentos sociais, usam o pincel da boa vontade
e as cores da insatisfação... Só o passar dos anos
nos permitirá olhar, com nitidez, tudo o que se está
construindo a partir de eventos como esse. Mas a
melhor coisa, creio eu, não é ficar só esperando pra
ver qual forma irá constituir o mundo futuro. O ideal
é pegarmos nossa boa vontade e nossa revolta e
nos juntarmos ao coro da humanidade ofendida.
Pois enquanto um só Ser Humano estiver
sob a bota da opressão e a Natureza sofrer com
nossa ação predatória, não haverá redenção para
a Humanidade. Entretanto Ela também estará
definitivamente perdida, no dia em que ninguém
tiver voz para gritar contra a injustiça e a violência
que atinge nossos irmãos e nossa Mãe-Terra.
ABC
Jorge de Barros, professor e diretor do SINPRO
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é
PRO
FES
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