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Dissertação QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE EM ADOLESCENTES PORTADORES DE CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Juliana Bertoletti INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA DE CARDIOLOGIA Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde Área de Concentração: Cardiologia QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE EM ADOLESCENTES PORTADORES DE CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Autora: Juliana Bertoletti Orientadora: Profa. Dra. Lúcia Pellanda Dissertação submetida como requisito para obtenção do grau de Mestre ao Programa Ciências de da Pós-Graduação em Saúde, de Área Concentração: Cardiologia, da Fundação Universitária de Cardiologia / Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul. Porto Alegre 2013 i Dados Internacionais de Catalogação na Publicação B546q Bertoletti, Juliana Qualidade de vida relacionada à saúde em adolescentes portadores de cardiopatias congênitas / Juliana Bertoletti ; orientadora Lucia Campos Pellanda. – Porto Alegre : 2013. 111 f.; il. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul / Fundação Universitária de Cardiologia – Programa de PósGraduação em Ciências da Saúde: Cardiologia, 2013. 1. Cardiopatias Congênitas. 2. Adolescentes. 3. Qualidade de vida. I. Pellanda, Lucia Campos. II.Título. CDU: 616.12-007-053.6 Bibliotecária responsável: Marina Miranda Fagundes CRB 10/2173 ii AGRADECIMENTOS Agradeço a minha mãe Joice Bertoletti pela inspiração, pelos ensinamentos da vida toda e pela colaboração e contribuição efetiva na realização deste trabalho. Ao meu marido Leonardo Rosa, pela parceria e por sua capacidade de me surpreender diariamente. A minha orientadora Lúcia Pellanda, por ter me acolhido em seu grupo com tanta generosidade, por seu conhecimento e competência, e pela habilidade em tratar o complexo com tal simplicidade. Aos estagiários Giovana Marx e Sérgio Pedro Hattge Junior, que participaram da coleta de dados e contribuíram com textos e leituras da área médica. Ao funcionário da unidade de pesquisa do IC/FUC, Sérgio Kakuta Kato, por sua orientação na análise estatística do trabalho e pelas discussões que possibilitaram um olhar mais apurado sobre os resultados. Aos professores, colegas de classe (são muitos para citar) e funcionários do IC/FUC que, cada um a sua maneira, contribuíram para que eu chegasse ao fim desta etapa. iii SUMÁRIO QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE EM ADOLESCENTES PORTADORES DE CARDIOPATIAS CONGÊNITAS – BASE TEÓRICA ................. 5 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 6 2 QUALIDADE DE VIDA ............................................................................................ 4 2.1 QUALIDADE DE VIDA – ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS................ 4 2.2 QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE ......................................... 10 2.2.1 Qualidade de Vida Relacionada à Saúde em Crianças eAdolescentes ........ 11 2.2.2 Instrumentos de avaliação da QVRS na população pediátrica ..................... 15 2.2.3 KIDSCREEN - Instrumento de Avaliação da QVRS .................................... 18 3 CARDIOPATIAS CONGÊNITAS ........................................................................... 23 3.1 CARDIOPATIAS CONGÊNITAS NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA .................. 23 3.2 Cardiopatias Congênitas e Qualidade de Vida ............................................ 27 4 JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 34 5 OBJETIVOS .......................................................................................................... 35 5.1 OBJETIVO GERAL ..................................................................................... 35 5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ....................................................................... 35 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DA BASE TEÓRICA ....................................... 36 ARTIGO ORIGINAL – HEALTH-RELATED QUALITY OF LIFE IN ADOLESCENTS WITH CONGENITAL HEART DISEASE................................................................... 49 RESUMO .................................................................................................................. 52 ABSTRACT............................................................................................................... 54 INTRODUCTION ...................................................................................................... 56 METHODS ................................................................................................................ 58 RESULTS ................................................................................................................. 61 DISCUSSION ........................................................................................................... 63 LIST OF TABLES...................................................................................................... 67 References ............................................................................................................... 72 ARTIGO DE REVISÃO –QUALIDADE DE VIDA E CARDIOPATIA CONGÊNITA NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA ................................................................................ 76 RESUMO .................................................................................................................. 78 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 79 Qualidade de vida relacionada à saúde em crianças e adolescentes ........................ 80 Cardiopatias congênitas na infância e adolescência ................................................. 83 Cardiopatias Congênitas e Qualidade de Vida .......................................................... 86 Conclusão ................................................................................................................. 90 Referências............................................................................................................... 91 APÊNDICE ............................................................................................................... 99 iv BASE TEÓRICA QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE EM ADOLESCENTES PORTADORES DE CARDIOPATIAS CONGÊNITAS INTRODUÇÃO Os avanços nos tratamentos e as possibilidades efetivas de controle de doenças crônico-degenerativas e congênitas têm acarretado um maior tempo de vida a pessoas acometidas por esses agravos1. É notório o aumento da sobrevida de recém-nascidos com Cardiopatias Congênitas (CC) viabilizado por tratamentos médicos especializados, levando ao crescimento do número de crianças e adolescentes cardiopatas. A necessidade de acompanhamento clínico e tratamento médico contínuo são imprescindíveis aos pacientes cardiopatas, não importando o grau de complexidade da cardiopatia. Nas lesões mais graves, muitas vezes há necessidade de repetidas intervenções cirúrgicas, e não raro os pacientes permanecem com sequelas e lesões cardíacas residuais. Diante desse contexto, é importante considerar as repercussões de ordem física, psicológica e social que acompanham as CCs nas diferentes fases de desenvolvimento do ciclo vital. A Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS), inicialmente mais investigada na população adulta, tem ganhado especial atenção na infância e adolescência devido ao impacto que o seu prejuízo pode causar em longo prazo, além do benefício que as intervenções precoces com foco na sua melhoria podem trazer, principalmente em pacientes com doenças crônicas. A avaliação da QVRS em crianças e adolescentes tem sido utilizada como um importante desfecho de saúde, para identificar grupos e subgrupos que estejam em risco, rastrear hábitos de saúde e para auxiliar na definição do peso associado a cada doença2. 3 O monitoramento da Qualidade de Vida (QV) de crianças e adolescentes cardiopatas pode trazer informações relevantes sobre a efetividade dos tratamentos e intervenções que complementam os dados clínicos, oferecendo aos profissionais de saúde um panorama mais completo sobre a saúde física, psicológica e social de seus pacientes. 4 2 QUALIDADE DE VIDA 2.1 QUALIDADE DE VIDA – ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS As definições associadas à QV são inúmeras, especialmente por ser este um conceito complexo, subjetivo, e de natureza multidimensional, que inclui no mínimo as dimensões física, psicológica e social 3. Apesar de o termo ter sido difundido recentemente, a ideia de QV é tão remota que pode ser identificada nas obras dos primeiros pensadores e filósofos da Antiguidade Clássica, que se debruçaram sobre o estudo da natureza humana e das práticas de saúde que podem levar o homem a um perfeito estado de harmonia e realização. A obra de Hipócrates de Cós (460-377 a.C.), por exemplo, se caracteriza pela observação empírica não só dos pacientes em si, mas dos fatores ambientais ligados à doença, revelando desde então um conceito ecológico do processo saúde-enfermidade 4. Hipócrates entendia o homem como uma unidade organizada e a doença como a desorganização desse estado4, levando sempre em consideração a ação do ambiente e da alimentação sobre o organismo, o que se relaciona à noção atual sobre QV como a busca do equilíbrio biopsicossocial. Para Aristóteles (384-322 a.C.), a natureza dota todos os animais de instrumentos próprios para viver melhor, mas a conquista de uma vida plena e feliz dependeria do cultivo de hábitos virtuosos, da prática do equilíbrio e da moderação nas ações. Assim, é possível afirmar que há uma relação quase direta entre a atividade médicofilosófica e a busca por uma vida melhor 5. 5 A Organização Mundial de Saúde – OMS - em 1948 definiu a saúde como “um estado de bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou incapacidade”, instaurando a partir daí uma mudança de paradigma em relação ao conceito até então conhecido e praticado na Medicina. Apesar da introdução desta nova definição, a preocupação com a saúde da população se intensificou somente a partir da década de 70 6. Os estudos sobre QV iniciaram nesse período, e a inclusão do termo como palavra-chave nas bases de dados médicos ocorreu em 1975 7. Contribuiu para este fato o surgimento da Medicina Biopsicossocial na década de 70, uma abordagem integral e holística que teve o propósito de ultrapassar o reducionismo da perspectiva biomédica na promoção da saúde, considerando não somente a cura dos sintomas, mas o impacto dos tratamentos sobre os diversos aspectos da vida dos pacientes 8. Durante a década de 80, as pesquisas sobre avaliação médica começaram a contar com a participação dos cientistas sociais, que empregaram seus próprios conceitos e metodologias para investigar QV, um conceito tradicionalmente entendido como a „satisfação com a vida como um todo‟ ou „satisfação geral‟ 9. O estudo sistemático da QV na Medicina começou no campo da Oncologia, onde os médicos se depararam pela primeira vez com o dilema entre o ganho na sobrevida e os efeitos adversos dos tratamentos 7,10,11 . A abordagem interdisciplinar tornou-se essencial para atender a necessidade de compreender o processo de saúde e adoecimento integralmente, visando à realização de intervenções que trouxessem benefícios para a vida dos pacientes, aumentando seu bem-estar e reduzindo os efeitos adversos dos tratamentos. No campo de estudos da Psicologia, 6 destacou-se nesse mesmo período o surgimento da Psicologia da Saúde, em decorrência das mudanças do novo paradigma biopsicossocial 12 . Mais recentemente, o movimento da Psicologia Positiva, fundado por Martin Seligman em 1998 13, vem consolidando a importância de investigar os fatores de proteção da saúde no desenvolvimento humano, considerando aspectos como otimismo, espiritualidade, felicidade, coragem e resiliência, todos esses fatores associados ao bem-estar e a QV de pessoas doentes e sadias. O crescente interesse pelo estudo da QV no campo científico pode ser identificado por meio de uma rápida pesquisa no banco de dados Pubmed, onde foi encontrado um número de 40.549 artigos publicados sobre o tema entre 1900 e 1999, e 150.300 artigos publicados em um período de tempo dez vezes menor, entre os anos 2000 e 2012. O aumento no número de pesquisas sobre QV reflete a iniciativa de diversas áreas de estabelecer um corpo teórico e metodológico mais coeso sobre o construto, embora ainda permaneçam várias lacunas em relação à definição, mensuração e interpretação de qualidade de vida. A revisão da literatura evidencia que o termo QV é utilizado de maneira ampla e algumas vezes errônea, como um termo genérico que abarca uma série de variáveis físicas e psicológicas, tais como funcionamento, estado de saúde, percepções, condições de vida, comportamento, felicidade, estilo de vida e sintomas. Pode, portanto, tornar-se uma vaga noção para um estado de bem-estar subjetivo com validade científica duvidosa 7. Moons P, Budts W, De Geest 14 identificaram algumas armadilhas conceituais e fizeram esclarecimentos em relação à utilização do termo QV, a saber: 1) a QV não deve ser empregada como sinônimo de estado de saúde 7 ou habilidades funcionais, já que ela envolve outras dimensões de ordem psicológica e social; 2) a QV refere-se mais à percepção subjetiva do que a parâmetros objetivos; 3) não existe uma distinção clara entre indicadores e determinantes de QV, possivelmente devido à variedade de conceitos e definições; 4) a QV pode mudar ao longo do tempo, mas não apresenta grandes variações; 5) a QV pode ser influenciada de maneira positiva ou negativa, a depender do contexto, suporte social e características de personalidade de cada indivíduo. Para Lipp e Rocha 15 , QV se refere ao viver que é bom e compensador nas áreas social, afetiva, profissional e de saúde, sendo possível conquistá-la por meio do equilíbrio pessoal, da busca por relações interpessoais satisfatórias e da harmonia com o meio ambiente. Segundo Minayo, Hartz e Buss 16 existe um patamar material mínimo e universal para que a QV seja possível, relacionado à satisfação das necessidades humanas básicas, como alimentação, acesso à água potável, habitação, trabalho, educação, saúde e lazer. Entretanto, reforçam os autores que todas as pesquisas feitas sobre QV incluem valores não materiais, como amor, liberdade, solidariedade e inserção social, realização pessoal e felicidade, fatores esses indispensáveis à sua concepção subjetiva16. De acordo com Musschenga 9, a QV está fortemente relacionada a aspectos sociais, como ter uma rede de apoio, e a aspectos psicológicos, especialmente traços de personalidade que favoreçam um sentimento de competência, força de ego, sentimento de ter controle sobre a própria vida, maturidade e otimismo. Assim, as condições objetivas de vida, sejam elas boas ou ruins, teriam pouca influência sobre a avaliação da QV, 8 especialmente em estados duradouros de adversidade e riqueza, ou de saúde e doença. A definição mais recente de QV proposta pelo Grupo de Qualidade de Vida da OMS 17 , é amplamente aceita e deixa claro o caráter subjetivo e multidimensional do termo, colocando o próprio indivíduo como referência em se tratando de sua avaliação. A definição da OMS é possivelmente a primeira que incorporou diretamente a influência dos componentes culturais em sua base teórica, em vez de considerá-los como uma variável externa 18 , como fica claro a seguir: “Qualidade de vida é a percepção que o indivíduo tem da sua posição na vida, no contexto da cultura em que vive e do sistema de valores inerente, e em relação com os seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações. É um conceito amplo influenciado de forma complexa pela saúde física da pessoa, seu estado psicológico, nível de independência, relacionamentos sociais e sua relação com características importantes do seu ambiente” 17 . O reconhecimento da multidimensionalidade do construto refletiu-se na estrutura do instrumento de medida WHOQOL-100, desenvolvido em um projeto colaborativo e multicêntrico que incluiu estágios de clarificação do conceito, revisão por experts, grupos focais e um estudo piloto abrangente 17 . Ressalta-se a inclusão da dimensão espiritual como um dos domínios avaliados, o que vem adquirindo maior importância a partir da modificação no conceito de saúde como um estado dinâmico de completo bem-estar físico, 9 mental, espiritual e social, proposto na 101º sessão da Assembleia Mundial de Saúde 6. Observa-se que a partir da década de 90, começou a delinear-se um consenso entre os estudiosos em relação a dois aspectos relevantes do conceito de QV: a importância de considerar a sua subjetividade e multidimensionalidade 1. A subjetividade se refere à capacidade do próprio indivíduo em avaliar seu estado de saúde, suas condições de vida e expectativas, utilizando os processos cognitivos subjacentes para a percepção de sua QV 5. A importância de considerar a subjetividade representou uma mudança em relação à tendência inicial do uso do conceito, pois comumente a QV era avaliada por um observador, geralmente um profissional de saúde. Já a multidimensionalidade refere-se à importância de reconhecer as diferentes dimensões presentes no construto, que têm sido investigadas continuamente por meio de pesquisas científicas e estudos empíricos, e que de acordo com Kuczynski 5 podem ser divididas em quatro áreas correlatas: física, funcional, emocional e social. A QV, portanto, diz respeito a uma percepção individual que pode variar de acordo com a cultura vigente, onde interagem conjuntamente os indicadores subjetivos e objetivos na avaliação do bem-estar, da felicidade e satisfação com a vida, levando-se em conta os níveis universais dos direitos humanos 19 . Para a investigação da QV é necessário conhecer a descrição do próprio indivíduo sobre o que ele sente pela sua vida, pois a relação entre as condições de vida e o estado psicossocial é imperfeita, estabelecendo-se a partir da apreciação individual, baseada em valores e expectativas pessoais 20 . 10 2.2 QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE No contexto médico, a QV adquire diferentes significados, e seus conceitos podem se relacionar ao grau de funcionamento biológico normal, ao grau de satisfação com a vida ou ao nível de desenvolvimento humano 9. Na literatura, o termo Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS) tem sido usado com mais frequência e com objetivos semelhantes à conceituação mais geral. No entanto, diferente do conceito genérico de QV que não faz referência direta a disfunções ou agravos, a QVRS engloba os aspectos diretamente associados às enfermidades e às intervenções em saúde. Sua avaliação, portanto, permite identificar o impacto que as doenças causam na QV das pessoas 1. 21 A revisão da literatura conduzida por Pedroso e Pillatti elucida que a introdução da QV na área da saúde se deve a três fatores: o avanço tecnológico, que resultou em melhores condições de saúde e aumento da expectativa de vida; a mudança no contexto epidemiológico das doenças, com aumento na prevalência de doenças crônicas; e finalmente a mudança de paradigma sobre o ser humano, que passou a ser entendido como um organismo biopsicossocial a ser tratado em toda a sua complexidade. Medidas de QVRS têm sido cada vez mais necessárias como complementos às medidas biológicas ou clínicas de doenças, refletindo o crescente reconhecimento da importância de como os pacientes se sentem de modo geral e o quanto estão satisfeitos com o tratamento 22 . A remissão de sintomas ou taxas de sobrevida já não é suficiente para indicar o sucesso de um tratamento, especialmente no caso de doenças crônicas, onde é fundamental se pensar na QV do paciente em termos sociais e psicológicos 5. 11 Inúmeros estudos têm destacado a utilidade de aferir a QVRS como importante desfecho na prática clínica, na avaliação de serviços de saúde, em pesquisas clínicas e na tomada de decisão sobre tratamentos e intervenções de saúde 10,23-25 . Baseados nas conclusões de internacionais, os autores Varni, Burwinkle e Lane diversos 23 estudos estimam que na população adulta até 52% dos médicos tomam decisões clínicas a partir de resultados da avaliação de pacientes sobre sua QVRS. O interesse ativo do médico e/ou profissional de saúde na opinião do paciente, possibilitado pela coleta de informações a respeito dos aspectos psicossociais relacionados à sua saúde, melhora a comunicação e aumenta a satisfação do paciente com os cuidados médicos. Além disso, os dados sobre QVRS auxiliam os médicos a detectar limitações funcionais e problemas psicológicos em seus pacientes, possibilitando a realização de intervenções mais focadas nas suas necessidades e o encaminhamento adequado a outros serviços de referência em saúde 23. 2.2.1 Qualidade de Vida Relacionada à Saúde em crianças e adolescentes Enquanto a QV na população adulta tem sido bastante investigada nos últimos dez anos, entre crianças e adolescentes é uma área recente. A dificuldade de definir e conceituar QV torna-se um constante desafio para os pesquisadores desta área, principalmente na construção de instrumentos válidos e fidedignos, que abarquem todas as suas dimensões e considerem a percepção do indivíduo em desenvolvimento. 12 A elaboração do conceito para crianças e adolescentes tem sido marcada por debates de natureza teórica e de operacionalização, dada a necessidade de se levar em consideração uma perspectiva de pessoa em desenvolvimento. Isto requer uma metodologia de avaliação que possa ser utilizada em suas diferentes fases, da infância até a adolescência 19 . Os estudos sobre QV em crianças e adolescentes começaram a ser desenvolvidos no final da década de 80, ocorrendo em três etapas: a primeira, no final dos anos 80, teve como principal objetivo desenvolver um conceito teórico destinado a este grupo etário; a segunda etapa, iniciada nos anos 90, consistiu na construção de instrumentos de avaliação; e a terceira etapa, de 1995 até os dias de hoje, envolve a aplicação de instrumentos de medida em estudos clínicos e epidemiológicos 2. O principal desafio em conceituar QV na infância e adolescência reside no fato de se tratar de indivíduo em desenvolvimento, com graus peculiares de percepção de si mesmo e do mundo que dificilmente podem ser uniformizados em uma só concepção de satisfação pessoal. Nesse sentido, é prioridade instaurar definições que traduzam os interesses próprios desta faixa etária 5, o que gera dificuldades em elaborar métodos de avaliação que captem a percepção das próprias crianças e adolescentes, e não as expectativas e percepções de pais e profissionais de saúde que os avaliam. De forma geral, os instrumentos de avaliação de QV na infância apresentam pouca congruência entre as concepções de papel e função normal da criança em cada idade e em diferentes contextos sociais, bem como em relação à importância que dão à função familiar e às relações sociais como fatores para o seu bem-estar. O amplo espectro de conteúdos e 13 a variedade de dimensões e itens contemplados nos instrumentos de QV na infância refletem as diferenças no seu processo de elaboração, na linha teórica utilizada, na população-alvo e nos objetivos de aplicação do instrumento 5,26. Algumas vertentes de discussão sobre um modelo ideal de QV na infância e adolescência, conforme destacou Kuczinski 5 , sugerem que é importante avaliar a esfera global (relacionada à sociedade e macro ambiente) e externa (relacionada às condições socioeconômicas) acima de aspectos pessoais e interpessoais, pois crianças necessitam, sobretudo, se desenvolver em condições adequadas e promotoras de saúde. Reforçando essa ideia, Matza et AL 27 considera que em geral as crianças não tem a escolha de mudar significativamente um problema ambiental, ao contrário dos adultos, que possuem recursos financeiros e suporte social adequados para, por exemplo, deixar um emprego ou um casamento insatisfatório. Fatores contextuais, portanto, podem exercer uma influência em longo prazo sobre o desenvolvimento social e psicológico das crianças, sendo importante considerar variáveis como a família, os colegas, a escola e a comunidade ao avaliar sua QV. No caso de crianças com doença crônica, existem poucas tentativas de elaboração de métodos e instrumentos de avaliação da QVRS, e ainda é pouco frequente a preocupação em apreender a percepção e repercussão da doença do ponto de vista do paciente, o que resulta em grandes discrepâncias quanto à resposta e à evolução clínica 5. Ao explorar desfechos subjetivos como QV em condições de doença, é importante que o pesquisador entenda exatamente o que está sendo medido, para evitar que variáveis quantitativas 14 como medidas fisiológicas ou habilidades funcionais sejam equiparadas a medidas de QV 28 . Conforme Gill and Feinstein 29 , são os valores e preferências do indivíduo que distinguem QV de outras medidas de saúde, o que torna possível a sua percepção positiva apesar de possíveis limitações ocasionadas pela doença. Para Lawford e Eiser 30 , a habilidade da criança em se adaptar às suas experiências e a forma como interpreta experiências de vida adversas terão impacto sobre a sua QV. As reações de cada criança frente à experiência adversas, tais como lidar com a doença, mostram que há um nível de ajustamento individual e estilos de enfrentamento (Coping) que estão relacionados à sua percepção sobre QV. O conceito de resiliência tem sido utilizado para explicar as diferenças individuais encontradas em crianças que mostram altos níveis de funcionamento em certos domínios da QV, apesar de enfrentarem condições de vida adversas. A resiliência pode ser entendida como um processo dinâmico que abrange a adaptação positiva do indivíduo em contextos de extrema adversidade. A maioria das pesquisas nessa área tem sido realizada com crianças, e mostram que existem fatores de proteção como suporte social, estilos de enfrentamento e caraterísticas de personalidade da criança que explicam as diferenças individuais encontradas 30. O impacto da doença e do tratamento para as crianças pode ser substancialmente diferente da população adulta, o que torna indispensável que a QV seja investigada diretamente entre elas. Alguns estudos indicam que crianças entre quatro e seis anos de idade já são capazes de responder sobre os domínios mais concretos, referentes à dor e uso de medicação, por 15 exemplo. Já os domínios mais abstratos ou subjetivos, como o impacto emocional da doença sobre sua vida, são mais apropriados para crianças com mais idade 27 . Na seleção de um instrumento de QV deve-se analisar, portanto, se o questionário serve ao propósito da investigação, se as dimensões abordadas são relevantes ao contexto, e se há adequação ao grupo etário de interesse 26,27. 2.2.2 Instrumentos de avaliação da QVRS na população pediátrica As medidas de avaliação da QV se dividem em instrumentos genéricos e específicos. As medidas genéricas podem ser aplicadas tanto a indivíduos saudáveis como aqueles afetados por uma condição específica, em vários tipos de doenças e em culturas e lugares diferentes. São instrumentos multidimensionais que procuram avaliar diversos critérios como capacidade funcional, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, emocionais e saúde mental, sendo que seu foco reside nas reações subjetivas do indivíduo diante das experiências da vida 31 . São exemplos de instrumentos genéricos para a população pediátrica o PedsQL - Pediatric Quality of Life Inventory AUQUEI - Autoquestionnaire de Qualité de Vie Enfant Imagé 32 ,o 33 , o CHQ - Child Health Questionnaire 34 e o KIDSCREEN 35. Já as medidas específicas são instrumentos capazes de detectar a melhora ou piora de sintomas e funcionamento da condição de saúde em estudo, com maior sensibilidade para medir alterações a efeitos dos tratamentos de determinadas doenças 16,22,27 . Na população pediátrica, as condições de saúde que apresentam maior número de instrumentos de medida específica são asma, câncer e epilepsia, e os países que mais 16 desenvolvem este tipo de instrumento são os Estados Unidos, Reino Unido e Canadá 26. Dois instrumentos específicos para a avaliação das cardiopatias na infância e adolescência foram desenvolvidos no Reino Unido e Estados Unidos, e ainda estão em processo de serem testados e validados em diferentes contextos culturais: são o ConQol Índex – CQI 36 e o Pediatric Cardiac Quality of Life Inventory – PCQLI 37, respectivamente. Em uma revisão sistemática sobre instrumentos de avaliação da QV para crianças e adolescentes, Solans et AL 26 identificou a existência de 30 instrumentos genéricos e 64 doença-específicos, publicados entre os anos de 2001 e 2005. Embora a maioria dos instrumentos apresente padrões aceitáveis em relação às propriedades psicométricas, poucos apresentaram análises de validade de critério (n=5), validade de estrutura (n=15) ou sensibilidade à mudança (n=14). O desafio em acessar a percepção infantil também se revela no estudo, visto que 26% dos instrumentos doençaespecíficos se destinam exclusivamente aos pais como respondentes (Proxy). Existe uma controvérsia entre os pesquisadores em relação ao uso de medidas específicas de QV. Enquanto alguns autores defendem a capacidade desses instrumentos em detectar alterações de saúde e identificar as características de um determinado agravo, outros acreditam que algumas medidas específicas tem enfoque restrito a sintomas e disfunções, contribuindo pouco para uma visão mais abrangente de outros aspectos não médicos associados à QV 38. Além disso, o uso dessas medidas não permite a comparação de diferentes condições clínicas, tornando-se restrito a sujeitos com doenças e condições específicas. Assim, é aconselhável que medidas genéricas sejam utilizadas para avaliar a QV como desfecho principal de 17 tratamentos e intervenções, enquanto que medidas específicas podem ser utilizadas como fonte de informações complementares 7. No Brasil, o estudo de Soares et al 39 analisou a produção científica nacional sobre QV de crianças e adolescentes, encontrando 30 artigos publicados entre os anos de 1990 e 2008. Os resultados mostraram uma predominância de pesquisas de abordagem quantitativa (70%), e um índice maior de pesquisas com instrumentos de avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde (66,7%) do que instrumentos genéricos (28,6%). Observou-se ainda um maior número de artigos publicados na área da Medicina (40%), seguida pela Enfermagem (30%) e Psicologia (26,6%). Em relação à avaliação da QV nas doenças crônicas, destacaram-se no Brasil os estudos pioneiros realizados pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas –UNICAMP - sobre QV e epilepsia, que serviram como ponto de partida para o avanço das discussões sobre o tema, e culminaram na construção de um questionário multidimensional para avaliar epilepsia na população pediátrica. Embora 50% das publicações nacionais encontradas no estudo de Soares et al 39 avaliassem a QV de crianças e adolescentes a partir da perspectiva de seus cuidadores, os autores concluíram que a comunidade científica está procurando valorizar a percepção da criança e do adolescente como relatores de sua experiência, considerando as particularidades desse período da vida na aplicação de metodologias de pesquisa adequadas. Apesar de todas as dificuldades encontradas na elaboração de instrumentos para a população pediátrica, é importante lembrar, como salienta Kuczynski 40 , 18 que “o indivíduo em desenvolvimento é capaz de se expressar; nós é que não conseguimos (ou não nos propomos a) entendê-lo”. 2.2.3 KIDSCREEN - Instrumento de Avaliação da Qualidade de Vida Relacionada à Saúde Para os fins do presente estudo será utilizado o KIDSCREEN, um instrumento de avaliação genérica da QV para crianças e adolescentes. O Projeto KIDSCREEN foi patrocinado pela Comissão Europeia para produzir o primeiro instrumento genérico e transcultural que avalia a QVRS em crianças e adolescentes. A etapa inicial do projeto consistiu na realização de uma análise de conteúdo dos questionários pediátricos de avaliação de QVRS já existentes, para identificar temas comuns, agrupá-los em categorias e investigar o constructo que embasa esse diferentes instrumentos 41 . O projeto decorreu durante três anos (2001-2004), e os países que inicialmente participaram foram a Áustria, República Checa, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Polônia, Espanha, Suécia, Suíça, Holanda, Irlanda e Reino Unido. Atualmente, diversos países latino-americanos já validaram ou estão em processo de tradução e validação deste instrumento em amostras nacionais 2,35,42 . O estudo de tradução, adaptação transcultural e propriedades psicométricas do KIDSCREEN para a língua portuguesa no Brasil foi conduzido por Guedes e Guedes 43 , e o estudo de validação para a população brasileira foi concluído por Ritter et al 44. O instrumento KIDSCREEN tem como objetivo medir as experiências pessoais de crianças e adolescentes sobre sua saúde e bem-estar através de 19 uma série de dimensões, incluindo aspectos sociais, emocionais, cognitivos, físicos e funcionais 2. Pode ser utilizado para a avaliação genérica da QV em crianças e adolescentes entre oito e 18 anos de idade, no contexto da saúde e da doença crônica. Trata-se de um questionário de autopreenchimento que pode ser aplicado em hospitais, estabelecimentos médicos e em escolas, por profissionais do campo da Saúde Pública, Epidemiologia, Medicina, Psicologia, Enfermagem e investigação clínica. O questionário também possui uma versão para os pais (proxy) , com objetivo de avaliar como a QVRS das crianças é percebida por eles, identificando possíveis discrepâncias entre essas percepções 2. Ravens-Sieberer e o grupo Europeu KIDSCREEN 35 defendem que a conceitualização de QVRS implica um modelo compreensivo de saúde subjetivo e multidimensional, definido como um construto psicológico que descreve aspectos físicos, psicológicos, mentais, sociais e funcionais do bemestar. A elaboração do questionário procurou descrever a relação entre QVRS e outros determinantes relevantes referidos na literatura, além das variáveis sociodemográficas. As hipóteses para a construção da relação entre a QVRS e os determinantes foram baseadas no seguinte modelo, como mostra a Figura 1: 20 Relacionamento pais-filhos Estado de saúde dos pais Saúde mental Nível socioeconômico Idade QVRS Estado de saúde física Gênero Comportamento de risco Utilização de serviços de saúde Fonte: THE KIDSCREEN Group Europe, 2006, pp.33 45 Figura 1: Modelo KIDSCREEN Por meio de revisão da literatura e grupos focais centrados no tema da QV com crianças e adolescentes, foram estabelecidas dez dimensões do instrumento KIDSCREEN: (1) Saúde e atividade física; (2) Sentimentos; (3) Estado de humor geral; (4) Auto percepção; (5) Tempo livre; (6) Família e ambiente familiar; (7) Questões econômicas; (8) Amigos; (9) Ambiente escolar e aprendizagem; e (10) Bullying, termo utilizado na literatura para caracterizar as situações de provocação em que a criança se sente rejeitada pelos pares 2,46 . São três versões distintas: o KIDSCREEN-52 é a versão mais longa contendo 10 domínios, o KIDSCREEN-27 avalia cinco domínios, e o KIDSCREEN-10 Index apresenta um escore global de QV. Para o presente estudo será utilizada a versão KIDSCREEN-27, composta por 27 questões que avaliam os seguintes domínios: (1) Bem-estar físico; (2) Bem-estar 21 psicológico; (3) Autonomia e relação com os pais; (4) Suporte social e grupo de pares; e (5) Ambiente escolar possibilidades de resposta de 47 . Cada questão apresenta cinco acordo (nada/pouco/moderadamente/muito/totalmente) com e a a intensidade frequência (nunca/raramente/algumas vezes/frequentemente/sempre) da situação ou comportamento apresentado. Após o período inicial de desenvolvimento, adaptação transcultural e validação do instrumento KIDSCREEN, a fase atual está voltada para a aplicação do questionário em pesquisas clínicas e epidemiológicas. Percebese que as atuais pesquisas procuram levar em conta a relação entre variáveis demográficas (ex. idade, gênero e condições socioeconômicas), características intrapessoais (ex. autoconceito, extroversão, locus de controle interno) e características sociais (família, escola, grupo de pares e comunidade) para melhor compreender e avaliar o nível de QVRS nas crianças e adolescentes 46. Em estudo realizado com 3710 crianças e adolescentes entre nove e 17 anos em sete países europeus, o instrumento KIDSCREEN foi aplicado para avaliar se diferenças de gênero e idade são encontradas nos aspectos relacionados à QVRS. Os resultados mostram que as crianças relatam em geral uma boa QVRS, independentemente do gênero, entretanto, esta percepção diminui depois dos 12 anos de idade. Nas dimensões física e psicológica, foi encontrado maior declínio da QVRS em meninas em relação aos meninos. Conclui-se que algumas tarefas do desenvolvimento infantil podem causar diferenças na QVRS de acordo com a idade, especialmente na 22 adolescência, quando essas tarefas começam a se tornar específicas de acordo com o gênero 48. O mesmo tipo de estudo conduzido em 12 países europeus com 21.590 crianças e adolescentes apresentou resultados similares, mostrando uma diminuição mais acentuada da QVRS entre as meninas com o avançar da idade, além de uma variação significativa entre os países 49 . De acordo com relatório sobre a saúde dos adolescentes, conduzido pela Comissão Européia em 2000 48 , os meninos têm mais problemas de saúde do que as meninas na infância, enquanto que na adolescência as jovens moças apresentam distúrbios psicossomáticos e emocionais com maior frequência do que os jovens rapazes. A revisão da literatura identificou alguns estudos realizados utilizando a versão KIDSCREEN-27 para avaliar a QVRS de crianças e adolescentes em contextos de saúde e doença, tais como: doenças crônicas (câncer, diabetes e artrite juvenil) 50 , doenças psiquiátricas 51,52 , e obesidade e sobrepeso 53 . Localizou-se um estudo em que o KIDSCREEN-27 foi utilizado para avaliar a QVRS de crianças com prolapso de válvula mitral, em comparação com um grupo de crianças saudáveis. Os resultados deste estudo mostraram diferença estatisticamente significativa somente em uma das dimensões investigadas (Bem-estar físico), em comparação com o grupo de crianças saudáveis. Entretanto, dentro do grupo de crianças com prolapso mitral, a frequência de sintomas clínicos teve impacto sobre as diferentes dimensões da qualidade de vida 54. 23 3 CARDIOPATIAS CONGÊNITAS 3.1 CARDIOPATIAS CONGÊNITAS NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA As malformações cardíacas são consideradas uma das formas mais frequentes de anomalia congênita ao nascimento. Estima-se que a cada 1000 recém-nascidos vivos, cerca de 10 sejam afetados por algum tipo de malformação cardíaca, sendo 1/3 dessas com diagnósticos críticos que 55,56 requerem intervenção cirúrgica . Estudos realizados na população brasileira avaliaram a prevalência de CC em nascidos vivos, identificando a proporção de 5,5:1000 nascidos vivos entre os anos de 1889 a 1998 no estado do Paraná 57 , e 9,58:1000 nascidos vivos entre os anos de 1990 e 2003 no estado de Minas Gerais 55 . Para Huber et al 63 , o diagnóstico precoce e a detecção de malformações cardíacas no período pré-natal têm contribuído para o aumento da incidência nos achados, tanto nos estudos nacionais quanto internacionais. As CCs podem ser classificadas em cardiopatias cianóticas e acianóticas, a depender da presença de cianose como manifestação clínica. As lesões obstrutivas acianóticas, como a Estenose Pulmonar, Estenose Aórtica e Coarctação da Aorta geralmente são assintomáticas nas crianças em suas manifestações mais leves 58 . As lesões cianóticas mais comuns são a Tetralogia de Fallot, a Transposição das Grandes Artérias e a Atresia Tricúspide, que apresentam como sintomas o sopro assintomático descoberto na ausculta de rotina, cor azulada, crises hipercianóticas e baixa tolerância ao exercício 59. 24 Os avanços na cardiologia pediátrica e cirurgia cardíaca têm aumentando consideravelmente a expectativa de vida de crianças com CC, de modo que atualmente cerca de 90% dos pacientes sobrevivem até a idade adulta 60 . Entretanto, especialmente nas cardiopatias cianóticas que requerem intervenções cirúrgicas para sua correção, parte dos pacientes permanece com defeitos residuais importantes. Em estudo realizado com adolescentes e adultos sobreviventes da cirurgia de Fontan, Pike et al 61 encontraram como principais sintomas a falta de ar com deambulação (69%), tontura (61%), palpitação (61%) e cefaleias (50%), enquanto que as maiores preocupações relacionaram-se à condição de saúde (83%), profissão/emprego (69%), habilidade para trabalhar (61%) e viver com independência (54%), entre outros achados clínicos que descrevem o impacto de tais sequelas sobre a vida desses pacientes. Na infância, há evidências de que a presença de CC pode afetar o desenvolvimento físico e ponderal, o funcionamento motor, cognitivo e neurológico 62,63 , havendo ainda maior incidência de dificuldades acadêmicas, problemas comportamentais, atrasos na fala, falta de atenção e hiperatividade em pacientes com cardiopatias congênitas complexas 64,65 . Somado a tais evidências clínicas, a necessidade de acompanhamento médico contínuo, uso de medicação e hospitalizações recorrentes podem afetar a autoestima e autoimagem desse grupo de crianças e adolescentes, acarretando em atrasos nas tarefas do desenvolvimento normal 66 . A manutenção da saúde em crianças com CC requer ainda o cuidado por parte dos pais e equipe médica com aspectos nutricionais, imunização, prevenção de doenças de inverno e 25 profilaxia da endocardite bacteriana, todos esses aspectos vitais para a sua sobrevivência em longo prazo 67 . Na entrada para a adolescência, o paciente com CC terá que enfrentar o desafio da autonomia em face da superproteção dos pais, normalmente exercida durante a infância. Segundo Marcelli e Braconnier 68 a doença instaura um vínculo de proximidade privilegiado entre a criança e seus pais, amplificando as necessidades psicológicas que caracterizam normalmente a relação de cuidado dos pais para com os filhos. A criança doente que entra na adolescência terá que enfrentar as tarefas próprias desta fase – mudanças corporais atravessadas pela doença, descoberta do mundo e das relações sociais e afetivas, e em especial o desafio de distanciar-se dos pais para conseguir individualizar-se. Além disso, a adolescência é uma fase crucial de consolidação de comportamentos de saúde saudáveis, como por exemplo, a adoção de boas práticas alimentares e exercícios, mas também um período em que comportamentos de risco se manifestam pela primeira vez, como o uso de drogas e álcool e práticas sexuais de risco 69,70 . Alguns estudos destacam a importância de um programa de transição na assistência em saúde 66,71-73 , com o objetivo de educar os adolescentes com CC sobre sua condição médica e orientá-los em relação a exercícios físicos 74,75 , sexualidade 76 e entrada no mercado de trabalho. Um programa formal de transição em saúde adequado às particularidades desta fase de desenvolvimento auxilia o adolescente com CC a adquirir maior controle sobre sua vida e facilita sua integração ao ambiente psicossocial, evitando ainda o abandono ao tratamento que costuma ocorrer 26 na adolescência, especialmente quando o paciente intervenções e percebe sua cardiopatia como “corrigida” já passou por 72 . Alguns estudos qualitativos realizados com adolescentes com CC 77-79 , utilizando técnicas de entrevista semiestruturada e em profundidade, apontaram algumas dificuldades enfrentadas por esses pacientes, tais como: lidar com a doença e as limitações físicas, exclusão social, discriminação e bullying, 77 , além do desafio da normalidade, de tornar-se independente, da incerteza quanto ao futuro e de como usar estratégias de enfrentamento para desenvolver autoestima e melhor administrar a doença, entre outros dilemas 78 . Assim, o atendimento de saúde ao paciente com cardiopatia congênita deve abarcar as suas necessidades sociais e psicológicas tanto quando as fisiológicas, como meio de melhorar sua qualidade de vida. Embora muitos pacientes cardiopatas adquiram uma condição de saúde estável, parte deles apresentam defeitos residuais e sequelas importantes na vida adulta, mesmo após inúmeras correções cirúrgicas. As CC são consideradas condições crônicas, devido aos fatores que as acompanham em longo prazo e que interferem na vida diária desse pacientes, incluindo a incerteza em relação ao curso da doença, o prognóstico, os sinais e sintomas, e as restrições na atividade física 80 . A investigação da qualidade de vida nessa população, em todas as faixas etárias, tem ganhado maior atenção como um importante desfecho de saúde, não somente relacionado a sintomas e condições clínicas, mas em termos do seu nível de bem-estar e satisfação com a vida como um todo. 27 3.2 Cardiopatias Congênitas e Qualidade de Vida Os estudos realizados para avaliar a QV de crianças e adolescentes com CC apresentam resultados inconclusivos, possivelmente devido a falta de rigor metodológico e conceitual nas pesquisas, de acordo com Moons et al 81 . As diferenças metodológicas entre os estudos, tais como delineamento, critérios de inclusão, instrumentos de avaliação utilizados, seguimento e medidas de desfecho dificultam a comparação entre os resultados. Entretanto, pode-se afirmar que uma grande parte dos estudos realizados encontra um nível de QVRS inferior entre crianças e adolescentes com CC quando comparados a controles saudáveis 54,82-86 . Segundo os achados da revisão sistemática conduzida por Dahan-Oliel, Majnemer e Mazer 87 , tais resultados estão relacionados em parte às limitações físicas - reais ou percebidas - em indivíduos com CC, o que pode levar a restrições desnecessárias e comportamentos de superproteção que possivelmente interferem na sua percepção sobre QV. Janiec et al 54 referem que crianças e adolescentes com prolapso de válvula mitral apresentam uma QV inferior à população saudável somente na dimensão do bem-estar físico, embora entre o grupo com CC a frequência e gravidade de sintomas clínicos tenha impacto negativo sobre outras dimensões avaliadas. O estudo de Krol et al 82 verificou que crianças com CC apresentaram piora no funcionamento motor e autonomia em comparação ao grupo de crianças saudáveis, entretanto, a severidade do diagnóstico não teve associação com o nível de QV dos cardiopatas. Já no estudo de Uzark et al 83 , uma em cada cinco crianças com CC refere piora significativa no funcionamento psicossocial quando comparadas 28 ao grupo controle, incluindo aquelas com cardiopatias leves ou corrigidas; por outro lado, no grupo de CC, crianças com lesões mais graves apresentaram resultados mais baixos somente no funcionamento físico, não havendo relação entre severidade da doença e funcionamento psicossocial. Esses achados mostram que a associação entre severidade do diagnóstico e QV ainda não foi elucidada entre crianças e adolescentes com CC, possivelmente devido às diferenças metodológicas mencionadas anteriormente. Os estudos de Landol et al 84 e Spijkerboer et al 85 investigaram a QV de crianças e adolescentes depois de cirurgia cardíaca e/ou tratamento invasivo por cateterismo para CC, utilizando o mesmo instrumento de medida. Seus resultados foram semelhantes, indicando um pior funcionamento motor, cognitivo, social e emocional do que crianças saudáveis. A análise multivariada realizada no estudo Landolt et al 84 revelou ainda que a duração do bypass cardiopulmonar, tempo de hospitalização, necessidade de medicação e relações familiares adversas tiveram um impacto negativo na QV das crianças, somente de acordo com a avaliação de seus pais e cuidadores. Na revisão sistemática conduzida por Latal et al 88 foram incluídos estudos publicados entre 1990 e 2008 sobre o ajustamento psicológico e QV em crianças e adolescentes submetidos à cirurgia cardíaca, com o objetivo de verificar o conhecimento atual sobre esses desfechos nessa população. Embora haja grande variabilidade entre os estudos, os resultados mostram que a QV de algumas crianças é prejudicada, especialmente daquelas com CCs mais complexas. Os resultados mostram ainda que há diferença na percepção de pais e crianças quanto ao ajustamento psicológico: enquanto as crianças avaliam-se 29 positivamente nesse aspecto, os pais em geral consideram que o ajustamento psicológico de seus filhos apresenta prejuízos, relacionando-o principalmente a severidade da CC e aos atrasos de desenvolvimento conduzido por Miatton et al 89 88 . Em um estudo sobre o comportamento e autopercepção de crianças cardiopatas submetidas a correção cirúrgica, os resultados apontaram que elas apresentam mais sintomas depressivos do que crianças saudáveis (p<.01), e que seus pais referem pior desempenho escolar, problemas sociais e comportamento agressivo quando comparados aos pais do grupo controle. Outros estudos corroboram e ampliam esses achados, indicando que a QV de pais e cuidadores de crianças com CC também pode ser afetada, devido ao impacto do diagnóstico sobre o nível de estresse e ajustamento dessas famílias 90-93 . A literatura atual sobre QV de crianças com necessidades de cuidados de saúde indica como importantes fatores de adaptação positiva a motivação e as atitudes da criança, bem como os recursos e o suporte social disponível à família. Tais fatores são considerados preditores mais importantes para uma boa QV do que a complexidade da condição médica, por isso, estratégias que reforcem o bem-estar familiar e a construção de redes de apoio social devem ser valorizadas e oferecidas nos serviços de saúde 93. Contrariando os estudos que constataram o prejuízo da QV em crianças e adolescentes com CC, alguns autores encontraram resultados surpreendentes. Teixeira et al 94 avaliou adolescentes e jovens adultos com CC e seus achados indicaram um nível de QV superior à população geral, especialmente na dimensão ambiental e de relacionamentos sociais. O estudo 30 de Culbert et al 95 avaliou a QV de crianças com diagnóstico de Transposição das Grandes Artérias (TGA), e encontrou resultados significativamente superiores do que as normas da população pediátrica em todas as dimensões, com exceção da categoria autoestima. Outros estudos encontraram pequena diferença entre a QV de cardiopatas congênitos quando comparados às normas populacionais Silva et al 99 96-98 . investigaram as variáveis que teriam um impacto negativo sobre a QV em adolescentes e jovens adultos com CC aplicando o instrumento WHOQOL-BREF, e encontraram uma melhor percepção de QV neste grupo quando comparado à população geral. A presença de cianose não mostrou associação com a piora da QV, entretanto, o número de procedimentos cirúrgicos e lesões residuais moderadas a severas tiveram um impacto significativo sobre a mesma. Destacou-se ainda entre os achados a importância do suporte social como variável relacionada ao aumento da resiliência entre os cardiopatas, o que em consequência promove melhor adaptação à doença. No Brasil, foi encontrado um artigo publicado sobre QV de adolescentes submetidos à cirurgia cardíaca, de Favarato e Romano 100 encontrou resultados satisfatórios em relação à percepção de , que QV, relacionamento social e familiar e prática de atividades físicas em 91% da amostra estudada. O instrumento utilizado foi um questionário desenvolvido pelas próprias autoras. Thomaz 101, em estudo não publicado, avaliou a QV no pós-operatório tardio de pacientes com Tetralogia de Fallot entre quatro e 12 anos de idade com o instrumento AUQEI 33 , e verificou um bom escore em 31 85% da amostra, não encontrando associação entre o nível de QV e os fatores de mau prognóstico na evolução desses pacientes. Mas como explicar esses achados? Surpreendido por pesquisas que encontraram uma QV superior nas CCs, Moons et al 102 apresentou o termo “senso de coerência” como uma hipótese para entender porque pacientes que crescem com doenças crônicas podem sentir-se satisfeitos com sua vida. O termo Senso de Coerência (SOC) foi desenvolvido por Antonovsky em 1987 para explicar porque algumas pessoas ficam doentes quando estão sob estresse, enquanto outras permanecem saudáveis 102 . Contrariando o modelo patogênico com foco na doença, baseou-se na premissa de que o indivíduo deve focar positivamente em seus recursos e capacidades para a manutenção da sua saúde e bem-estar. Assim, o termo senso de coerência pode ser definido como uma expressão da visão de mundo do indivíduo, uma orientação global baseada em um sentimento dinâmico e duradouro de confiança em si e em seu ambiente, onde os recursos estão disponíveis para lidar com demandas provenientes de estímulos internos e externos. Em se tratando de crianças com CC, é possível que elas se utilizem do senso de coerência para desenvolver mecanismos de enfrentamento da doença, mecanismos esses que continuam a ser desenvolvidos e refinados até a idade adulta. O senso de coerência é formado por três componentes 102 : 1) compreensibilidade, ou seja, o quanto os estímulos internos e externos recebidos durante a infância são estruturados, previsíveis e explicáveis. A compreensibilidade pode ser conquistada e melhorada quando as preocupações e dúvidas em relação ao defeito cardíaco são discutidas 32 abertamente com a equipe de saúde, cujo papel é essencial na educação dos pacientes. 2) gerenciamento, que se refere à percepção dos recursos disponíveis para lidar com situações estressoras, como por exemplo, viver com a doença cardíaca. Quando a criança sente-se competente para lidar com os problemas associados a sua doença, ela desenvolve um bom senso de gerenciamento da doença. A relação de apoio por parte de pais e profissionais de saúde é importante para o desenvolvimento do gerenciamento e, consequentemente, amplia o senso de coerência na criança. 3) significado, ou a capacidade do indivíduo em acreditar que sua vida tem sentido, encontrando motivação e desejo para lidar com os estímulos, assumindo o controle sobre sua vida e engajando-se na tomada de decisões. Para desenvolver o senso de significado nas crianças cardiopatas é essencial que pais e profissionais de saúde mostrem que eles são amados e valorizados. Estudos recentes foram conduzidos com adolescentes com CC para avaliar o senso de coerência como preditor do nível de saúde percebida 103 ,e também como um dos determinantes de QV em adolescentes, juntamente com o suporte parental e apoio social percebido 104 . Os resultados confirmam a importância de se considerar o funcionamento biopsicossocial do adolescente cardiopata na avaliação de sua QV, e o senso de coerência desponta como um recurso valioso a ser desenvolvido. Os estudos de Luyckx et al 105-108 têm avançado na investigação da QV como variável de desfecho de outros preditores, tais como o processo de formação de identidade de adolescentes com CC 106 , estilos parentais percebidos 105 e traços de 33 personalidade 108 , para conseguir explicar o funcionamento do adolescente com CC e descrever as principais variáveis que interatuam na sua percepção de QV. É possível que crianças com doenças crônicas, onde se incluem as crianças cardiopatas, sejam desafiados a desenvolver um senso de coerência mais cedo do que crianças saudáveis, pelas experiências que decorrem da doença e que exigem uma grande capacidade de adaptação. Crescer com CC requer atenção ao tratamento médico e muitas vezes o convívio com algumas restrições em atividades que fazem parte da vida de qualquer criança. Talvez por não conhecerem uma realidade diferente essas crianças adquiram um maior sentido de apreciação pela vida e expectativas coerentes com as suas possibilidades e limitações, o que irá influenciar a sua percepção sobre QV no decorrer do seu desenvolvimento. Ainda que o senso de coerência possa ser estimulado e desenvolvido por meio de suporte parental e cuidados adequados por parte da equipe de saúde, é importante ressaltar que a capacidade de adaptar-se positivamente é fortemente influenciada pelo processo de resiliência, no qual está incluído o estilo de enfrentamento e características de personalidade de cada criança. Todas essas variáveis que interagem na percepção de QV são de difícil apreensão por meio de um único instrumento de medida. O desenrolar de pesquisas nessa área, no entanto, sugere que os estudiosos continuam determinados a medir o que certamente é o principal objetivo de qualquer tratamento de saúde: proporcionar bem-estar e uma vida com qualidade para as pessoas. 34 4 JUSTIFICATIVA A QVRS tem sido considerada um importante desfecho na avaliação da efetividade dos tratamentos e intervenções de saúde, especialmente nos casos de doença crônica, fornecendo informações complementares aos dados clínicos que podem auxiliar na tomada de decisão dos profissionais de saúde. O avanço nas técnicas de diagnóstico e cirurgia cardíaca tem possibilitado a maior sobrevida de crianças e adolescentes com CC, o que torna necessário a investigação de sua saúde nos aspectos físicos, psicológicos e sociais, por meio de sua percepção de QV. Embora muitos estudos tenham sido realizados para investigar a QV de crianças e adolescentes com CC, os resultados mostram-se contraditórios quanto à influência dos aspectos relacionados ao diagnóstico (gravidade, sintomas, intervenções cirúrgicas, uso de medicação, entre outros) sobre o nível de QVRS deste grupo de pacientes. Especialmente na adolescência, a avaliação da QVRS nas CCs auxilia na detecção de grupos que estejam em risco e fornece subsídios para a elaboração de estratégias de intervenção focadas nas reais necessidades dos adolescentes. Além disso, no Brasil não foram encontrados estudos recentes com o objetivo de avaliar a QVRS em adolescentes com CC, tornando relevante a realização desta investigação em nosso meio. 35 5 OBJETIVOS 5.1 OBJETIVO GERAL Avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde de adolescentes portadores de cardiopatias congênitas. 5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Descrever a qualidade de vida de acordo com o diagnóstico e severidade da cardiopatia congênita, identificada por meio de variáveis como número de intervenções cirúrgicas, uso de medicação, presença de sintomas e lesão residual, entre outros. 36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Seidl EMF, Zannon CML. Quality of life and health: conceptual and methodological issues. Cad Saúde Pública. 2004;20(2):580-8. 2. Gaspar TM, M. G. (coord.). Qualidade de vida em crianças e adolescentes – Versão portuguesa dos instrumentos KIDSCREEN-52. Portugal: Faculdade de Motricidade Humana (UTL), 2008. 3. Santos SV. 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Programa de Pós Graduação em Ciências da Saúde: Cardiologia INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA DE CARDIOLOGIA Dissertação de Mestrado 2013 51 Authors: Juliana Bertoletti*, Giovana Caroline Marx**, Sérgio Pedro Hattge Júnior***, Lúcia Campos Pellanda****. Title: Health-Related Quality of Life in Adolescents with Congenital Heart Disease Affiliation of the authors: * Masters Student in Health Sciences: Cardiology, at Fundação Universitária de Cardiologia. Psychologist. Porto Alegre, RS, Brazil. ** Academic from Medical School, at Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, UFCSPA, Porto Alegre, RS, Brazil. *** Academic from Medical School, at Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, UFCSPA, Porto Alegre, RS, Brazil. **** Prof. Dr. In Health Sciences: Cardiology, Supervisor. Specialist in Pediatrics. Master in Cardiology. Pediatric Cardiologist of Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul – IC/FUC. Coordinator of the Preventive Pediatric Cardiology Ambulatory IC/FUC. Porto Alegre, RS, Brazil. Corresponding Author: Lucia Campos Pellanda Email: [email protected] Tel. 55 (51) 3230-3600 52 RESUMO Objetivos: Este estudo tem como objetivo avaliar a Qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) de adolescentes com Cardiopatia congênita (CC), descrevendo a qualidade de vida de acordo com o diagnóstico e a severidade da CC, identificada por variáveis como número de intervenções cirúrgicas, uso de medicação, presença de sintomas e lesão residual. Método: Foi conduzido um estudo transversal com 203 adolescentes com CC atendidos no ambulatório de Cardiologia Pediátrica de um hospital de referência no Brasil. A versão brasileira do KIDSCREEN-27 foi utilizada para avaliar QVRS. Informações relacionadas ao diagnóstico de CC e variáveis clínicas foram coletadas dos prontuários dos pacientes. Resultados: Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos de cardiopatias acianóticas e cianóticas, assim como entre os diferentes diagnósticos de CC. Uma tendência para melhor QVRS na dimensão Bem-estar psicológico (p = 0,054) foi encontrada nos grupos que realizaram cirurgia e usam medicação. Adolescentes que referiram um bom estado geral apresentaram melhores resultados em todas as dimensões da QVRS, exceto por Autonomia e relação com pais, do que aqueles que apresentaram sintomas clínicos (p<0.05). Conclusões: O tipo de CC e o diagnóstico inicial não pareceram influenciar a percepção de QVRS, corroborando os achados de estudos anteriores. Intervenções cirúrgicas e o uso de medicação podem melhorar o estado clínico prévio, o que pode ser benéfico em termos do bem-estar psicológico desses pacientes. Presença de sintomas clínicos foi a variável que 53 causou maior impacto sobre a QVRS, possivelmente devido ao prejuízo que traz à vida diária desses pacientes. Palavras-chave: qualidade de vida relacionada à saúde; cardiopatia congênita; infância e adolescência; adolescentes. 54 ABSTRACT Objectives: This study aims to evaluate the health-related quality of life (HRQL) of adolescents with congenital heart disease (CHD), describing HRQL according to the diagnosis and severity of CHD, identified by variables such as presence of symptoms, surgical interventions, use of medication and residual lesion. Methods: A cross-sectional study was conducted with 203 adolescents with CHD attended at the Pediatric Cardiology ambulatory of a reference hospital in Brazil. The Brazilian version of the questionnaire KIDSCREEN-27 was used for the assessment of HRQL. Information related to the CHD diagnosis and clinical variables were collected from the medical records of the patients. Results: There was no statistically significant difference between acyanotic and cyanotic groups, as well as for the different diagnosis of CHD. A trend for better HRQL in the dimension of Psychological Well-being (p=0,054) was found in the groups with surgical intervention and use of medication. Adolescents that referred a good general health presented significantly better results in all dimensions of HRQL, except for Autonomy and Parent Relation, than those who presented clinical symptoms (p<0.05). Conclusions: Type of CHD and initial diagnosis did not seem to affect the perception of HRQL, corroborating findings of several studies. Surgical interventions and the use of medication can improve previous clinical status, so it seems to be beneficial in terms of psychological well-being. Presence of clinical symptoms was the variable that caused the largest impact on the 55 perception of HRQL, possibly due to the impairment they bring to the daily lives of these patients. Key-words: health-related quality of life; congenital heart disease; childhood and adolescence; adolescents. 56 INTRODUCTION Advances in cardiac surgery and early diagnosis have been raising considerably the life expectancy of children and adolescents with Congenital Heart Disease (CHD). In face of this new context, the evaluation of Healthrelated Quality of Life (HRQL) is gaining more attention as an important health outcome in all age groups among this population. In childhood and adolescence, there is evidence that the presence of CHD can affect physical and weight development, as well as motor, cognitive and neurological functioning [1,2]. There is also a higher incidence of academic difficulties, behavioral problems, speech delays, hyperactivity and attention deficits in patients with complex CHD [3,4]. Besides these clinical evidences, the need for continuous medical monitoring and recurrent hospitalizations can affect the self-esteem and self-image of these children and lead to delays in completing the tasks of normal development [5], which may possibly impact their quality of life. Current research on the evaluation of HRQL in children and adolescents with CHD have presented conflicting results, possibly due to the lack of methodological and conceptual rigor [6]. However, it is possible to affirm that a major part of these studies have found a lower level of HRQL among children and adolescents with CHD when compared to healthy controls [7-12], in dimensions such as physical well-being [7], autonomy, motor functioning and social and emotional functioning [10], depressive symptoms and psychological adjustment [13,14]. Other studies, on the other hand, have shown that adolescents with CHD have an equal or higher HRQL than healthy norms [15- 57 17], especially when they have a good social support network and parental support. Although many patients with CHD acquire a stable health condition, part of them remain with residual defects and sequels during adult life. Children and adolescents with complex CHD with signs of cyanosis, residual lesions and that have gone through invasive procedures present an inferior level of HRQL than those with mild CHD, according to some authors [9,18], whereas other studies have not found association between HRQL and the severity of CHD [8,11]. The present study aims to evaluate the HRQL of adolescents with CHD, describing quality of life according to the diagnosis and severity of CHD, identified by clinical variables such as presence of symptoms, surgical interventions and medication use, among others. The evaluation of HRQL in adolescents with CHD helps to detect groups at risk and provides valuable information for the elaboration of intervention strategies focused on their health needs. 58 METHODS A contemporary cross-sectional study was conducted with 203 adolescents with CHD attended at the Pediatric Cardiology ambulatory of a reference hospital in the south region of Brazil. The study obtained the approval of the Research Ethics Committee of this institution. The adolescents were invited to participate and were previously informed about ethical aspects and the objectives of the study, before agreement and signature of the consent form. The authorization and signature of the parent or adult accompanying the adolescent was necessary. Adolescents with CHD from 10 to 18 years of age, literates and accompanied by parents or guardians were included in the study. Adolescents with other organic or congenital syndromes, developmental disorders and severe difficulties in reading that could impair the comprehension of the instrument were excluded from the sample. Data collection was performed by three researchers trained for the method, from March 2011 to March 2012. The subjects were recruited according to the eligibility criteria. A number of 211 adolescents were invited to participate moments before their appointment. Six adolescents declined to participate in the study; among the 205 patients that enrolled on the study, two were excluded for presenting other congenital syndromes, totalizing a sample of 203 subjects. Instruments: A Sociodemographic Data Record was used for the characterization of the sample and for the collection of information such as gender, age, color, 59 body mass index (BMI), schooling, educational level of parents, family income and family structure. The measurement of height and weight of the subjects for the calculation of BMI was realized according to the parameters established by the World Health Organization by age group [19]. The Brazilian version of the questionnaire KIDSCREEN-27 was used for the assessment of HRQL [20]. The KIDSCREEN is a self-report questionnaire designed to address generic HRQL across different countries, aiming to measure the personal experiences of children and adolescents about their health and wellbeing. Ravens Sieberer and the KIDSCREEN Group [21] propose that the conceptualization of HRQL implies a comprehensive, subjective and multidimensional model of health, defined as a psychological construct that describes physical, psychological, mental, social and functional aspects of wellbeing. The KIDSCREEN-27 has 27 questions that evaluate the following dimensions: Physical Well-being (5 items); Psychological Well-being (7 items); Autonomy & Parent Relations (7 items); Social Support & Peers (4 items); School Environment (4 items). Each question presents five possible answers according to the intensity (not slighty/moderately/commonly/very/extremely) or by the frequency (never/seldom/sometimes/often/always) of the situation or attitude that is being presented [22]. Information related to the CHD diagnosis and clinical variables (number of surgical interventions, age at first surgery, presence of residual lesion or sequels, medication use and symptoms) were collected from the medical records of the patients. Data related to the type of CHD were divided in two groups (acyanotic and cyanotic) and four diagnostic categories according to 60 the severity of the CHD (Mild acyanotic, Acyanotic with repercussion, Tetralogy of Fallot and Complex CHD). This evaluation was performed with the collaboration of a pediatric cardiologist. Information regarding the use of medication and presence of clinical symptoms (cyanosis, dyspnea, fatigue, chest pain and others) were collected directly with the patients. Statistical Analysis Descriptive analysis included media and percentages at a confidence interval of 95%. T test was used to compare two groups of CHD (acyanotic and cyanotic), residual lesion, previous surgery, medication use and presence of symptoms. Variance analysis – ANOVA - was used for polytomic variables (diagnostic categories) and Pearson correlation to verify the correlation between the different dimensions of the instrument. Spearman correlation was used to describe the association between age of first surgery and HRQL. The sample size was estimated in 200 subjects, for a correlation of 0.5 with α of 0.05 and β of 0.20. For data analysis the statistical program SPSS version 19.0 was utilized and the recodifications of certain items of the instrument were performed according to the instructions of the Manual KIDSCREEN (21). Mean values of the scale are considered 50 with a standard deviation around 10 (higher values indicate a higher HRQL). 61 RESULTS The adolescents participating in this study were mostly from a low socioeconomic status (51.2%), measured by family income. A percentage of 57.6 participants were male, the mean age was 13.64 years and mean BMI was 21.02; 64.5% of the participants were evaluated as eutrophic, 26.1% were overweight or obese and 9.4% were undernourished. As for family structure, 62.1% of the adolescents lived with both parents, 24.6% lived only with the mother and 13.3% had other family configurations. Educational level of the participants measured by the number of years of study showed significant difference when compared to the expected number of years of study according to age (p = .000). Table 1 presents the main sociodemographic information and clinical variables that characterize this sample. Table 2 shows the results of KIDSCREEN-27 for the acyanotic and cyanotic groups and for the different diagnostic categories according to severity of CHD. There was no statistically significant difference between acyanotic and cyanotic groups, as well as for the different diagnosis of CHD. The results for the group with previous surgical intervention, although did not present statistically significant difference from the group without surgery, showed a trend for better HRQL in the dimension of Psychological Well-being (p=0.054). In the same manner, the group that used medication also presented this trend (p=0.055). These results are described on Table 3. Pearson correlations test was used between all the dimensions of KIDSCREEN-27 and presented moderate to strong correlations for a level of significance of p < 0.01, with coefficients ranging from 0.34 to 0.56. The strong correlation between Psychological Well-being and Autonomy and Parent 62 Relations (0.56) and the moderate correlations between Physical Well-being and Autonomy and Parent Relations (0.46) and between Psychological Wellbeing and Social Support and Peers (0.42) were the most evident. Spearman test did not show correlation between age of first surgery and HRQL. Table 4 presents the results of HRQL for residual lesion and clinical status. Residual lesion did not present statistically significant difference between groups. As for clinical status, the group that referred a good general health had better results than those that mentioned the presence of symptoms, and a statistically significant different was observed in the following dimensions: Physical Well-being (p=0.000), Psychological Well-being (p=0.002), Social Support and Peers (p=0.034) and School Environment (p=0.002). The only dimension that did not present significant difference was Autonomy and Parent Relations. 63 DISCUSSION Regarding clinical variables, results showed no relation between the level of HRQL and the severity of the CHD when analyzing the acyanotic and cyanotic groups, as well as the different diagnostic categories. These findings corroborate the evidence found in various studies [8,10,11,23] that the severity of CHD is not associated, or only moderately related, with the level of HRQL perceived by the patients. The presence of residual lesion or sequels also did not present association with HRQL, as well as age of first surgery, which is in line with the outcomes of Majnemer et al [24]. As for surgical intervention and medication, a better score was found in the dimension Psychological Well-being for the groups that have gone through surgery and used medication, although the difference was not statistically significant (p = 0,055). Such results might be related to the possible clinical improvement provided by the correction of the heart defect and control of symptoms due to medication, therefore elevating the level of psychological well-being of these patients. It can also be related to a process of positive adaptation to the heart disease, also called resilience. Moons [25] presented the term “sense of coherence” as a hypothesis to understand why some patients who grow up with CHD can feel satisfied with life, despite the adversities cause by their condition. The explanation is that they develop and continue to refine over time a series of adaptive mechanisms to face the disease, making use of internal and external resources to promote their health and well-being. The results for adolescents that referred a good general health and those who had symptoms presented significant difference in all KIDSCREEN 64 dimensions, with the exception of Autonomy and Parent Relations. These findings agree with the results of Janiec et al [7] in the evaluation of HRQL in children and adolescents with mitral valve prolapse, where the frequency of clinical symptoms had greater impact on quality of life. It also supports the results found by Moons, Van Deyk, De Geest et al [26] in the study that evaluated the impact of CHD over HRQL in the adult population, where functional status (according to the Criteria Committee of the New York Heart Association that classifies physical activity limitations and symptoms) was more related to the decrease on HRQL than the initial diagnosis and disease course. However, information of the systematic review conducted by Latal et al [14] contradict these findings, as it indicates no relation between the decrease of HRQL and the physical correlates of CHD, according to children perception. The strong correlation found between the dimensions Psychological Well-being and Autonomy and Parent Relations, as well as moderate correlations between other dimensions of KIDSCREEN confirm the hypothesis developed by Sieberer et al [21], in which HRQL is a multidimensional and subjective construct, formed by the interaction of multiple determinants. It also corroborates the results of some qualitative studies with adolescents with CHD [27,28], that pointed out the process of individualization from the family and autonomy as an important factor to better cope with the disease, improving the adolescent´s self-esteem and enabling social integration, which helps to improve the overall perception of quality of life. Concerning an important aspect of the socio-demographic profile of the sample, the significant difference found between the number of school years of the adolescents and the expected number of years according to age must be 65 discussed. This information is not a surprise considering that previous studies have mentioned more cognitive and academic problems in children with CHD [9]. It is possible that school delay is related to the heart disease; however, the sociocultural and educational context of the country must be addressed. Data from the Brazilian Institute of Geography and Statistics [29] affirm that 37,8% of Brazilian children and adolescents present delays in the number of years of study according to age. Therefore, this finding should be seen carefully, as it might be reflecting the cultural context of a developing country and not be related to the CHD condition. Conclusions Type of CHD and initial diagnosis did not seem to affect the perception of HRQL, corroborating findings of previous studies. Surgical interventions and the use of medication can improve the previous clinical status, so it seems to be beneficial in terms of the psychological well-being provided to these patients. In conclusion, the results of this study revealed that the presence of clinical symptoms was the variable that causes the largest impact on the perception of HRQL, possibly due to the impairment they bring to the daily lives of these patients. According to these findings the perception of a good general health is related to a good perception of HRQL, improving the sense of general wellbeing. Questions remain if the perception of good general health found in this sample means the absence of symptoms or is more related to appropriate coping strategies in the face of CHD. Future research could address issues 66 related to personality traits and coping strategies in the evaluation of quality of life in patients with CHD. Study Limitations Some study limitations should be considered. Lack of a control group did not allow the comparison of CHD with healthy subjects. A larger sample of CHD patients would permit the inclusion of more diagnostics and the generalization of these results for this population. Lastly, the KIDSCREEN questionnaire is an adequate, transcultural and generic HRQL instrument; however it does not present a disease-specific module for CHD. 67 LIST OF TABLES TABLE 1 – Characterization of the sociodemographic profile of the sample (n=203) and clinical variables. TABLE 2 – Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to type of CHD and severity of diagnosis. TABLE 3 - Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to previous surgical intervention and use of medication. TABLE 4 - Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to residual lesion and clinical status. 68 Table 1 – Characterization of the socio-demographic profile of the sample (n=203) and clinical variables. Variables (n=203) Frequency (%) Mean (Sd) Gender Male 117 (57.6) Age 10-14 years 128 (63) 15-18 years 75 (37) 13.64 (2.51) BMI 21.02 (4.56) Years of study / Expected years of study 6.82 (2.36) / 7.78 (2.45)* Educational level mother/father Incomplete primary education 115 (56.7) / 120 (59.1) Types of CHD Acyanotic 149 (73.4) Cyanotic 54 (26.6) Severity of diagnosis Mild Acyanotic 60 (29.6) Acyanotic with repercussion 91 (44.8) Tetralogy of Fallot 27 (13.3) Complex CHD 25 (12.3) Previous surgical intervention 121 (59.6) Age of first surgery (years) - Medication use 37 (18.2) Presence of residual lesion 22 (10.8) Clinical Status Good general health 162 (79.8) Chest pain 28 (13.8) Dyspnea 24 (11.8) Fatigue 18 (8.9) Cyanosis 3 (1.5) Others 34 (16.7) * p <.001 ( Level of significance p<0.05) 3.34 (3.726) 69 Tabela 2 – Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to type of CHD and severity of diagnosis. Dimensions of KIDSCREEN-27 Type of CHD Severity of diagnosis Acyanotic (n=149) Cyanotic (n=54) p MA* (n=60) TF** (n=27) ARep*** (n=90) CC**** (n=23) p Physical Well-being 46.69 (8.47) 46.89 (8.65) .883 47.02 (9.16) 46.74 (8.96) 46.77 (8.10) 45.93 (8.14) .965 Psychological Wellbeing 52.09 (9.03) 53.73 (10.84) .283 50.57 (8.10) 52.92 (10.83) 52.97 (9.70) 55.04 (10.42) .218 Autonomy and Parent Relation 49.46 (7.86) 49.11 (12.44) .851 48.18 (6.35) 47.14 (15.81) 50.27 (8.55) 51.34 (7.96) .210 Social support and Peers 52.84 (10.42) 55.11 (11.92) .188 52.40 (10.55) 52.12 (13.57) 53.60 (10.39) 56.80 (9.86) .340 School Environment 54.64 (9.09) 53.72 (10.97) .548 54.83 (9.04) 54.91 (12.29) 54.32 (8.78) 53.12 (11.03) .887 * MA: Mild Acyanotic; **TF: Tetralogy of Fallot; ***ARep.: Acyanotic with Repercussion; ****CC: Complex CHD. 70 Table 3 – Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to previous surgical intervention and use of medication. Dimensions of KIDSCREEN-27 Previous surgical intervention Yes (n=121) No (n=82) Physical Wellbeing 46.88 (8.44) Psychological Well-being Medication use p Yes (n=37) No (n=166) p 46.54 (8.62) .782 46.73(8.45) 46.75 (8.53) .992 53.53 (10.43) 51.02 (7.88) .054 55.24(10.2) 51.91 (9.30) .055 Autonomy and Parent Relation 50.28 (10.84) 48.02 (6.14) .061 49.73(9.64) 49.28 (9.22) .790 Social support and Peers 53.47 (11.09) 53.40 (10.57) .966 54.64(11.6) 53.17 (10.70) .459 School Environment 54.61 (10.13) 54.09 (8.81) .710 54.41(9.18) 54.40 (9.71) .993 71 Table 4 - Results (mean and standard-deviation) of KIDSCREEN-27 according to residual lesion and clinical status. Dimensions of KIDSCREEN-27 Residual lesion/sequels Clinical Status Yes (n=22) No (n=181) p Good general health (n=162) Symptoms (n=41) p Physical Wellbeing 44.28 (8.92) 47.05 (8.42) .149 47.92 (8.48) 42.04 (6.81) .000* Psychological Well-being 51.25 (9.55) 52.68 (9.56) .510 53.55(9.58) 48.50 (8.37) .002* Autonomy and Parent Relation 46.08 (13.76) 49.77 (8.54) .079 49.96(9.63) 47.03 (7.38) .071 Social support and Peers 51.24 (14.63) 53.71 (10.32) .315 54.25(10.9) 50.24 (10.17) .034* School Environment 51.72 (12.21) 54.73 (9.22) .166 55.44(9.70) 50.31 (8.08) .002* * Level of significance (p<0.05) 72 References 1. Huber J, Peres VC, Santos TJd, et al. (2010) Congenital heart diseases in a reference service: clinical evolution and associated illnesses. Arq Bras Cardiol. 94(3):333-8. 2. Marino BS, Lipkin PH, Newburger JW, et al. (2012) Neurodevelopmental Outcomes in Children With Congenital Heart Disease: Evaluation and Management. Circulation. 28:1144-72. 3. Wernovsky G. 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Key-words: quality of life; heart diseases; congenital abnormalities; childhood; adolescence. 78 RESUMO Os avanços nas técnicas de cirurgia cardíaca e o diagnóstico precoce tem possibilitado a maior sobrevida de indivíduos com cardiopatias congênitas. A investigação da qualidade de vida em crianças e adolescentes com cardiopatias congênitas fornece informações complementares aos dados clínicos que podem auxiliar na tomada de decisão dos profissionais de saúde. Embora muitos estudos tenham sido realizados para investigar a qualidade de vida de crianças e adolescentes com cardiopatias congênitas, os resultados mostram-se contraditórios; enquanto alguns estudos revelam que as cardiopatias podem impactar a qualidade de vida, outros descrevem uma melhor percepção de qualidade de vida entre crianças e adolescentes cardiopatas quando comparados com controles saudáveis. Observa-se que as pesquisas atuais sobre o tema procuram investigar aspectos relacionados à personalidade do paciente cardiopata, as estratégias de enfrentamento utilizadas e o suporte social para compreender como essas variáveis interatuam e se associam com o nível de qualidade de vida percebido. 79 INTRODUÇÃO Os avanços nos tratamentos e as possibilidades efetivas de controle de doenças crônico-degenerativas e congênitas têm acarretado um maior tempo de vida a pessoas acometidas por esses agravos 1. É notório o aumento da sobrevida de recém-nascidos com Cardiopatias Congênitas (CC) viabilizado por tratamentos médicos especializados, levando ao crescimento do número de crianças e adolescentes cardiopatas. Diante desse contexto, é importante considerar as repercussões de ordem física, psicológica e social que acompanham as CCs e que podem trazer prejuízos à qualidade de vida desses pacientes. A Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS), inicialmente mais investigada na população adulta, tem ganhado especial atenção na infância e adolescência devido ao impacto que o seu prejuízo pode causar em longo prazo, além do benefício que as intervenções precoces com foco na sua melhoria podem proporcionar, especialmente nas doenças crônicas. A avaliação da QVRS em crianças e adolescentes cardiopatas tem sido utilizada como um importante desfecho de saúde, para identificar grupos e subgrupos que estejam em risco, rastrear hábitos de saúde e para auxiliar na definição do peso associado aos diferentes diagnósticos. O objetivo deste estudo é revisar a literatura atual sobre a avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde na infância e adolescência, com ênfase sobre o paciente portador de cardiopatia congênita. 80 Qualidade de vida relacionada à saúde em crianças e adolescentes Enquanto a qualidade de vida (QV) na população adulta tem sido bastante investigada nos últimos dez anos, entre crianças e adolescentes é uma área recente. A dificuldade de definir e conceituar QV torna-se um constante desafio para os pesquisadores desta área, principalmente na construção de instrumentos válidos e fidedignos, que abarquem todas as suas dimensões e considerem a percepção do indivíduo em desenvolvimento. De forma geral, os instrumentos de avaliação de QV na infância apresentam pouca congruência entre as concepções de papel e função normal da criança em cada idade e em diferentes contextos sociais, bem como em relação à importância que dão à função familiar e às relações sociais como fatores para o seu bem-estar. O amplo espectro de conteúdos e a variedade de dimensões e itens contemplados nos instrumentos de QV na infância refletem as diferenças no seu processo de elaboração, na linha teórica utilizada, na população-alvo e nos objetivos de aplicação do instrumento 2,3. Algumas vertentes de discussão sobre um modelo ideal de QV na infância e adolescência, conforme destacou Kuczinski 2 , sugerem que é importante avaliar a esfera global (relacionada à sociedade e macro ambiente) e externa (relacionada às condições socioeconômicas) acima de aspectos pessoais e interpessoais, pois crianças necessitam, sobretudo, se desenvolver em condições adequadas e promotoras de saúde. Reforçando essa ideia, Matza et AL 4 considera que em geral as crianças não tem a escolha de mudar significativamente um problema ambiental, ao contrário dos adultos, que possuem recursos financeiros e suporte social adequados para, 81 por exemplo, deixar um emprego ou um casamento insatisfatório. Fatores contextuais, portanto, podem exercer uma influência em longo prazo sobre o desenvolvimento social e psicológico das crianças, sendo importante considerar variáveis como a família, os colegas, a escola e a comunidade ao avaliar sua QV. No caso de crianças com doença crônica, existem poucas tentativas de elaboração de métodos e instrumentos de avaliação da QVRS, e ainda é pouco frequente a preocupação em apreender a percepção e repercussão da doença do ponto de vista do paciente, o que resulta em grandes discrepâncias quanto à resposta e à evolução clínica 2. Conforme Gill and Feinstein 5, são os valores e preferências do indivíduo que distinguem QV de outras medidas de saúde, o que torna possível a sua percepção positiva apesar de possíveis limitações ocasionadas pela doença. Para Lawford e Eiser 6, a habilidade da criança em se adaptar às suas experiências e a forma como interpreta experiências de vida adversas terão impacto sobre a sua QV. As reações de cada criança frente à experiência adversas, tais como lidar com a doença, mostram que há um nível de ajustamento individual e estilos de enfrentamento (Coping) que estão relacionados à sua percepção sobre QV. O conceito de resiliência tem sido utilizado para explicar as diferenças individuais encontradas em crianças que mostram altos níveis de funcionamento em certos domínios da QV, apesar de enfrentarem condições de vida adversas. A resiliência pode ser entendida como um processo dinâmico que abrange a adaptação positiva do indivíduo em contextos de extrema adversidade. A maioria das pesquisas nessa área tem sido realizada com crianças, e mostram que existem fatores de proteção 82 como suporte social, estilos de enfrentamento e caraterísticas de personalidade da criança que explicam as diferenças individuais encontradas 6 . Em uma revisão sistemática sobre instrumentos de avaliação da QV para crianças e adolescentes, Solans et AL 3 identificou a existência de 30 instrumentos genéricos e 64 doença-específicos, publicados entre os anos de 2001 e 2005. São exemplos de instrumentos genéricos para a população pediátrica o PedsQL - Pediatric Quality of Life Inventory 7, o AUQUEI Autoquestionnaire de Qualité de Vie Enfant Imagé 8, o CHQ - Child Health Questionnaire 9 e o KIDSCREEN 10 . Já as medidas específicas são instrumentos capazes de detectar a melhora ou piora de sintomas e funcionamento da condição de saúde em estudo, com maior sensibilidade para medir alterações a efeitos dos tratamentos de determinadas doenças 11,12 . Na população pediátrica, as condições de saúde que apresentam maior número de instrumentos de medida específica são asma, câncer e epilepsia, e os países que mais desenvolvem este tipo de instrumento são os Estados Unidos, Reino Unido e Canadá 3 . Dois instrumentos específicos para a avaliação das cardiopatias na infância e adolescência foram desenvolvidos no Reino Unido e Estados Unidos, e ainda estão em processo de serem testados e validados em diferentes contextos culturais: são o ConQol Índex – CQI 13 e o Pediatric Cardiac Quality of Life Inventory – PCQLI 14, respectivamente. No Brasil, o estudo de Soares et al 15 analisou a produção científica nacional sobre QV de crianças e adolescentes, encontrando 30 artigos publicados entre os anos de 1990 e 2008. Os resultados mostraram uma 83 predominância de pesquisas de abordagem quantitativa (70%), e um índice maior de pesquisas com instrumentos de avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde (66,7%) do que instrumentos genéricos (28,6%). Observou-se ainda um maior número de artigos publicados na área da Medicina (40%), seguida pela Enfermagem (30%) e Psicologia (26,6%). Em relação à avaliação da QV nas doenças crônicas, destacaram-se no Brasil os estudos pioneiros realizados pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas –UNICAMP - sobre QV e epilepsia, que serviram como ponto de partida para o avanço das discussões sobre o tema. Embora 50% das publicações nacionais encontradas no estudo de Soares et al 15 avaliassem a QV de crianças e adolescentes a partir da perspectiva de seus cuidadores, os autores concluíram que a comunidade científica está procurando valorizar a percepção da criança e do adolescente como relatores de sua experiência, considerando as particularidades desse período da vida na aplicação de metodologias de pesquisa adequadas. Apesar de todas as dificuldades encontradas na elaboração de instrumentos para a população pediátrica, é importante lembrar, como salienta Kuczynski 16 , que “o indivíduo em desenvolvimento é capaz de se expressar; nós é que não conseguimos (ou não nos propomos a) entendê-lo”. Cardiopatias congênitas na infância e adolescência As malformações cardíacas são consideradas uma das formas mais frequentes de anomalia congênita ao nascimento. Estima-se que a cada 1000 recém-nascidos vivos, cerca de 10 sejam afetados por algum tipo de 84 malformação cardíaca, sendo 1/3 dessas com diagnósticos críticos que requerem intervenção cirúrgica 17,18 . Estudos realizados na população brasileira avaliaram a prevalência de CC em nascidos vivos, identificando a proporção de 5,5:1000 nascidos vivos entre os anos de 1889 a 1998 no estado do Paraná 19 , e 9,58:1000 nascidos vivos entre os anos de 1990 e 2003 no estado de Minas Gerais 17 . Para Huber e cols 20 , o diagnóstico precoce e a detecção de malformações cardíacas no período pré-natal têm contribuído para o aumento da incidência nos achados, tanto nos estudos nacionais quanto internacionais. Na infância, há evidências de que a presença de CC pode afetar o desenvolvimento físico e ponderal, o funcionamento motor, cognitivo e neurológico 21,22 , havendo ainda maior incidência de dificuldades acadêmicas, problemas comportamentais, atrasos na fala, falta de atenção e hiperatividade em pacientes com cardiopatias congênitas complexas 23,24 . Somado a tais evidências clínicas, a necessidade de acompanhamento médico contínuo, uso de medicação e hospitalizações recorrentes podem afetar a autoestima e autoimagem desse grupo de crianças e adolescentes, acarretando em atrasos nas tarefas do desenvolvimento normal 24 . A manutenção da saúde em crianças com CC requer ainda o cuidado por parte dos pais e equipe médica com aspectos nutricionais, imunização, prevenção de doenças de inverno e profilaxia da endocardite bacteriana, todos esses aspectos vitais para a sua sobrevivência em longo prazo 25 . Na entrada para a adolescência, o paciente com CC terá que enfrentar o desafio da autonomia em face da superproteção dos pais, normalmente exercida durante a infância. Além disso, a adolescência é uma fase crucial de 85 consolidação de comportamentos de saúde saudáveis, como por exemplo, a adoção de boas práticas alimentares e exercícios, mas também um período em que comportamentos de risco se manifestam pela primeira vez, como o uso de drogas e álcool e práticas sexuais de risco 26-27 . Alguns estudos destacam a importância de um programa de transição na assistência em saúde 24, 28-30 , com o objetivo de educar os adolescentes com CC sobre sua condição médica e orientá-los em relação a exercícios físicos 31, 32 , sexualidade 33 e entrada no mercado de trabalho. Alguns estudos qualitativos realizados com adolescentes com CC 34-36 , utilizando técnicas de entrevista semiestruturada e em profundidade, apontaram algumas dificuldades enfrentadas por esses pacientes, tais como: lidar com a doença e as limitações físicas, exclusão social, discriminação e bullying 34 , além do desafio da normalidade, de tornar-se independente, da incerteza quanto ao futuro e de como usar estratégias de enfrentamento para desenvolver autoestima e melhor administrar a doença, entre outros dilemas 35 . Assim, o atendimento de saúde ao paciente com cardiopatia congênita deve abarcar as suas necessidades sociais e psicológicas tanto quando as fisiológicas, como meio de melhorar sua qualidade de vida. Embora muitos pacientes cardiopatas adquiram uma condição de saúde estável, parte deles apresentam defeitos residuais e sequelas importantes na vida adulta, mesmo após inúmeras correções cirúrgicas. As CC são consideradas condições crônicas, devido aos fatores que as acompanham em longo prazo e que interferem na vida diária desse pacientes, incluindo a incerteza em relação ao curso da doença, o prognóstico, os sinais e sintomas, e as restrições na atividade física 36 . A investigação da qualidade 86 de vida nessa população, em todas as faixas etárias, tem ganhado maior atenção como um importante desfecho de saúde, não somente relacionado a sintomas e condições clínicas, mas em termos do seu nível de bem-estar e satisfação com a vida como um todo. Cardiopatias Congênitas e Qualidade de Vida Os estudos realizados para avaliar a QV de crianças e adolescentes com CC apresentam resultados inconclusivos, possivelmente devido a falta de rigor metodológico e conceitual nas pesquisas, de acordo com Moons et al 37 . As diferenças metodológicas entre os estudos, tais como delineamento, critérios de inclusão, instrumentos de avaliação utilizados, seguimento e medidas de desfecho dificultam a comparação entre os resultados. Entretanto, pode-se afirmar que uma grande parte dos estudos realizados encontra um nível de QVRS inferior entre crianças e adolescentes com CC quando comparados a controles saudáveis 38 - 40 . Segundo os achados da revisão sistemática conduzida por Dahan-Oliel, Majnemer e Mazer 41 , tais resultados estão relacionados em parte às limitações físicas - reais ou percebidas - em indivíduos com CC, o que pode levar a restrições desnecessárias e comportamentos de superproteção que possivelmente interferem na sua percepção sobre QV. Os estudos de Landol et al 42 e Spijkerboer et al 43 investigaram a QV de crianças e adolescentes depois de cirurgia cardíaca e tratamento invasivo para CC, respectivamente, utilizando o mesmo instrumento de medida. Seus resultados foram semelhantes, indicando um pior funcionamento motor, 87 cognitivo, social e emocional do que crianças saudáveis. A análise multivariada realizada no estudo Landolt et al 42 revelou ainda que a duração do bypass cardiopulmonar, tempo de hospitalização, necessidade de medicação e relações familiares adversas tiveram um impacto negativo na QV das crianças, somente de acordo com a avaliação de seus pais e cuidadores. Na revisão sistemática conduzida por Latal et al 44 foram incluídos estudos publicados entre 1990 e 2008 sobre o ajustamento psicológico e QV em crianças e adolescentes submetidos à cirurgia cardíaca, com o objetivo de verificar o conhecimento atual sobre esses desfechos nessa população. Embora haja grande variabilidade entre os estudos, os resultados mostram que a QV de algumas crianças é prejudicada, especialmente daquelas com CCs mais complexas. Os resultados mostram ainda que há diferença na percepção de pais e crianças quanto ao ajustamento psicológico: enquanto as crianças avaliam-se positivamente nesse aspecto, os pais em geral consideram que o ajustamento psicológico de seus filhos apresenta prejuízos, relacionando-o principalmente a severidade da CC e aos atrasos de desenvolvimento. Outros estudos corroboram e ampliam esses achados, indicando que a QV de pais e cuidadores de crianças com CC também pode ser afetada, devido ao impacto do diagnóstico sobre o nível de estresse e ajustamento dessas famílias 45-48 . A literatura atual sobre QV de crianças com necessidades de cuidados de saúde indica como importantes fatores de adaptação positiva a motivação e as atitudes da criança, bem como os recursos e o suporte social disponível à família. Tais fatores são considerados preditores mais importantes para uma boa QV do que a complexidade da 88 condição médica, por isso, estratégias que reforcem o bem-estar familiar e a construção de redes de apoio social devem ser valorizadas e oferecidas nos serviços de saúde 48. Contrariando os estudos que constataram o prejuízo da QV em crianças e adolescentes com CC, alguns autores encontraram resultados surpreendentes. Teixeira et al 49 avaliou adolescentes e jovens adultos com CC e seus achados indicaram um nível de QV superior à população geral, especialmente na dimensão ambiental e de relacionamentos sociais. O estudo de Culbert et al 50 avaliou a QV de crianças com diagnóstico de Transposição das Grandes Artérias (TGA), e encontrou resultados significativamente superiores do que as normas da população pediátrica em todas as dimensões, com exceção da categoria autoestima. Outros estudos encontraram pequena diferença entre a QV de cardiopatas congênitos quando comparados às normas populacionais 51-53 . Mas como explicar esses achados? Surpreendido por pesquisas que encontraram uma QV superior nas CCs, Moons et al 54 apresentou o termo “senso de coerência” como uma hipótese para entender porque pacientes que crescem com doenças crônicas podem sentir-se satisfeitos com sua vida. O termo Senso de Coerência (SOC) foi desenvolvido por Antonovsky em 1987 para explicar porque algumas pessoas ficam doentes quando estão sob estresse, enquanto outras permanecem saudáveis 54 . Contrariando o modelo patogênico com foco na doença, baseou-se na premissa de que o indivíduo deve focar positivamente em seus recursos e capacidades para a manutenção da sua saúde e bem-estar. 89 Assim, o termo senso de coerência pode ser definido como uma expressão da visão de mundo do indivíduo, uma orientação global baseada em um sentimento dinâmico e duradouro de confiança em si e em seu ambiente. É formado por três componentes: 1) compreensibilidade, ou o quanto os estímulos internos e externos recebidos durante a infância são estruturados, previsíveis e explicáveis; 2) gerenciamento, que se refere à percepção dos recursos disponíveis para lidar com situações estressoras, como por exemplo, viver com a doença cardíaca; e 3) significado, ou a capacidade do indivíduo em acreditar que sua vida tem sentido, encontrar motivação e assumir o controle sobre sua vida 54 . Estudos recentes foram conduzidos com adolescentes com CC para avaliar o senso de coerência como preditor do nível de saúde percebida 55 ,e também como um dos determinantes de QV em adolescentes, juntamente com o suporte parental e apoio social percebido 56 . Os resultados confirmam a importância de se considerar o funcionamento biopsicossocial do adolescente cardiopata na avaliação de sua QV, e o senso de coerência desponta como um recurso valioso a ser desenvolvido. Os estudos de Luyckx et al 57-60 têm avançado na investigação da QV como variável de desfecho de outros preditores, tais como o processo de formação de identidade de adolescentes com CC 58 , estilos parentais percebidos 57 e traços de personalidade 60 , para conseguir explicar o funcionamento do adolescente com CC e descrever as principais variáveis que interatuam na sua percepção de QV. É possível que crianças com doenças crônicas, onde se incluem as crianças cardiopatas, sejam desafiados a desenvolver um senso de coerência mais cedo do que crianças saudáveis, pelas experiências que decorrem da 90 doença e que exigem uma grande capacidade de adaptação. Crescer com CC requer atenção ao tratamento médico e muitas vezes o convívio com algumas restrições em atividades que fazem parte da vida de qualquer criança. Talvez por não conhecerem uma realidade diferente essas crianças adquiram um maior sentido de apreciação pela vida e expectativas coerentes com as suas possibilidades e limitações, o que irá influenciar a sua percepção sobre QV no decorrer do seu desenvolvimento. Conclusão O número de estudos sobre qualidade de vida em crianças e adolescentes com cardiopatias congênitas tem aumentado nos últimos anos devido ao aumento da sobrevida nesta população. Os estudos mostram resultados contraditórios e, atualmente, observa-se uma tendência em investigar fatores como traços de personalidade, estilos parentais, suporte social e estratégias de enfrentamento para melhor compreender a qualidade de vida nesses pacientes. Todas essas variáveis que interagem na percepção da qualidade de vida são de difícil apreensão por meio de um único instrumento de medida. 91 Referências: 1. Seidl EMF, Zannon CML. Quality of life and health: conceptual and methodological issues. Cad Saúde Pública. 2004;20(2):580-8. 2. Kuczynski E, AssumpçãoJr F. Qualidade de Vida na Infância e na Adolescência - Orientações para Pediatras e Profissionais da Saúde Mental. Porto Alegre: Artmed; 2010. 3. Solans M, Pane S, Estrada M-D, Serra-Sutton V, Berra S, Herdman M, et al. Health-Related Quality of Life Measurement in Children and Adolescents: A Systematic Review of Generic and Disease-Specific Instruments. Value Health. 2008;11(4):742-64. 4. 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[Published online] DOI 10.1080/08870446.2012.729836 99 APÊNDICE 100 APÊNDICE 1 – FICHA DE DADOS SOCIODEMOGRÁFICOS Número do prontuário:_____________ Data: ____/____/______ Nome completo do paciente: ___________________________________________________ Data de nascimento:_____________ Idade na consulta:_________ Sexo: ( ) F ( ) M Peso:__________________ Altura: ___________ Cor: __________________________ Escolaridade:_______________________________________________________________ Cidade de origem:__________________________________________ História familiar de cardiopatia: ( ) Sim ( ) Não Escolaridade da mãe: ________________________________________________________ Escolaridade do pai: _________________________________________________________ Profissão da mãe: ___________________________________________________________ Profissão do pai: ____________________________________________________________ Seu filho mora com quem? ____________________________________________________ Renda familiar: ( ) Até 2 salários mínimos ( ) De 2 a 5 salários mínimos ( ) Mais de 5 salários mínimos Dados do PRONTUÁRIO do paciente: Cardiopatia: Descrever: Cardiopatia 1:_________ Cardiopatia 2:_________ Cardiopatia 3:_________ Cardiopatia 4:_________ Cardiopatia 5:_________ Intervenções: Cateterismo ( 1 ) Diagnóstico ( 2 ) Terapêutico ( 3 ) Ambos ( 4 ) Não Data:________________ Descrever:___________________________________________________________ Cirurgia 1: CEC: ( 1 ) Sim ( 2 ) Não Cirurgia 2: CEC: ( 1 ) Sim ( 2 ) Não Cirurgia 3: CEC: ( 1 ) Sim ( 2 ) Não Data: ____________________ Data: ____________________ Data: ____________________ Descrever: Cirurgia 1:_____________ Cirurgia 2:_____________ Cirurgia 3:_____________ Cirurgia 4:_____________ Cirurgia 5:_____________ Medicações: (0) Não utiliza (1)AAS (2) Warfarin (3) Clopidogrel (4) Furosemida (5) Hidroclorotizida (6) Fenitoina (7) Fenobarbital (8) Captopril (9) Espironolactona (10) Carbamazepina (11) Digoxina (12) Propranolol (13) Outros (especificar): ___________________________________________________________________________ Estado clínico atual/sintomas: ( )BEG ( ) Cianose ( )Dispnéia ( ) Fadiga ( ) Dor torácica ( ) Outros: _______________________________________________________ 101 APÊNDICE 2 – INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA RELACIONADA À SAÚDE: KIDSCREEN-27 KIDSCREEN-27 Health Questionnaire for Children and Young People Child and Adolescent Version 8 to 18 Years 102 Dia: _____ _______ Mês Ano Oi, Como você está? Como você se sente? Gostaríamos que você nos contasse algumas coisas. Leia todas as questões com atenção. Nos conte qual a resposta que primeiro vem a sua cabeça? Escolha a resposta mais parecida e marque-a. Lembre-se: isto não é um teste, portanto não há resposta errada. É importante que você responda a todas a questões e que possamos ver as suas marcas claramente. Quando pensar na sua resposta,lembre-se da semana passada. Você não terá que mostrar suas respostas para ninguém. Além disso, ninguém que lhe conhece, verá seu questionário após você ter terminado. Você é homem ou mulher? mulher homem Quantos anos você tem? _________ Anos Você tem alguma doença crônica, necessidade especial ou enfermidade grave? Não Sim Qual? _______________________________ 103 1. Atividades Físicas e Saúde 1. De uma forma geral, como está sua saúde? excelente muito boa boa ruim muito ruim Pensando sobre a semana passada... nada pouco moderadamente muito totalmente muito totalmente 2. Você tem se sentido bem e disposto? nada pouco moderadamente Você tem praticado atividades físicas 3. (por exemplo: correr, andar de bicicleta, escalar)? nada pouco moderadamente muito totalmente 4. Você tem sido capaz de correr bem? nada pouco moderadamente muito totalmente nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre raramente algumas vezes frequentemente sempre Pensando sobre a semana passada... 5. Você tem se sentido com energia? nunca 104 2. Sensações Pensando sobre a semana passada... pouco moderadamente muito totalmente nada pouco moderadamente muito totalmente nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre frequentemente sempre nada 1. A sua vida tem sido agradável? Pensando sobre a semana passada... 2. Você tem estado de bom humor? nunca raramente algumas vezes 3. Você tem se divertido? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre frequentemente sempre 3. Humor em geral Pensando sobre a semana passada... 4. Você tem se sentido triste? nunca raramente algumas vezes Você tem se sentido tão mal que não 5. tem vontade de fazer nada? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 6. Você tem se sentido sozinho? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 4. Sobre você Pensando sobre a semana passada... 7. Você se sente feliz do jeito que você é? 105 5. Tempo livre Pensando sobre a semana passada... nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 1. Você tem tido tempo suficiente para você mesmo? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 2. Você tem feito as coisas que quer no seu tempo livre? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre Você tem tido dinheiro suficiente para 6. fazer as mesmas coisas que seus amigos? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre Você tem dinheiro suficiente para suas despesas? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 6. Família e vida em casa Pensando sobre a semana passada... 3. Seus pais têm tempo suficiente para você? 4. Seus pais te tratam com justiça? 5. Seus pais estão disponíveis para falar quando você deseja? 7. Dinheiro Pensando sobre a semana passada... 7. 106 8. Amigos Pensando sobre a semana passada... raramente algumas vezes frequentemente sempre nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 2. Você se diverte com seus amigos? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 3. Você e seus amigos se ajudam? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre 4. Você confia em seus amigos? nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre nada pouco moderadamente muito totalmente muito totalmente nunca 1. Você tem passado tempo com seus amigos? 9. Escola e Aprendizado Pensando sobre a semana passada... 1. Você se sente feliz na escola? nada pouco moderadamente 2. Você está indo bem na escola? nada pouco moderadamente muito totalmente nunca raramente algumas vezes frequentemente sempre frequentemente sempre frequentemente sempre Pensando sobre a semana passada... 3. Você tem se sentido capaz de prestar atenção na escola? nunca raramente algumas vezes 4. Você se dá bem com os seus professores? nunca raramente algumas vezes