para estabelecer a prisão temporária para os crimes de tortura

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para estabelecer a prisão temporária para os crimes de tortura
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PARECER
INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS (IAB)
PRTSÃO TEMPORÁRTA. ACRÉSC.rM0 NO ROL
11E
CRIMES
AUTORlZADORES
DE
CABIMENTO
T)E
PRISÃO
TEMPORÁRIA.
Aúl.vl..t-NTO DO PRAZO PARA 10 tuEZ) DIAS
PROR..J{OGÁVEL,POR
IGUAL
PERÍODO.
LEGISLAÇÃO TÍPICA DE DIREITO PENAL DO
lNIMIGO. SENDO A PRÓPRIA LEI 7960/89
EIVADA·
DE
INCONSTlTUCIONALIDADE,
IMPERTThi'ENTE QUALQtJER PROJETO DE LEI
QUE AMPLIE SEU'CAMPO DE INCIDÉNCIA.
Ref. Indicação n", 012/2006
Autor: Dr. Sérgio Luiz Pinheiro Sant' anna
Relatora: Victoria-Amália de Barros Carvalho Gozdawa de Sulocki
Matéria: Prisão temporária - Alteração da Lei 7.960/89
- PL n°. 4.51512004, de
autoria do Deputado Bemardo Ariston (PMDB / RJ) que acrescenta dispositivo à
Lei 7.960/89, apensado ao PL 124/2003 de autoria do Deputado Antonio Carlos
Biscaia (PT / RJ) ao qual também estão apensados o PL de n.o. 1.30412007 de
autoria do Deputado Arnaldo Faria de Sá (pTB / SP) e o de n.o. 1.605/2007 de
autoria do Deputado João Campos (PSDB / GO)
Cuida-se do Projeto de Lei n". 4.515/2004, de autoria do Deputado
Berbardo Ariston, PMDB / RJ, que acrescenta dispositivo à lei 7.960 de 1989
para estabelecer a prisão temporária para os crimes de tortura, concussão e
coação no curso do processo, além de aumentar o prazo de 5 (cinco) para 10
(dez) dias, sob os argumentos de que os crimes a serem acrescentados ao rol do
inciso Hl do artigo 1.0. da Lei 7.960/89 são graves e que o prazo de 5 (cinco)
dias sena por demais exíguo, atentando ao fato da legislação dos cnmes
hediondos, Lei 8.072/90, prever um prazo de 30 (trinta) dias.
o texto
do Projeto de Lei sob exame propõe que o inciso
m do
artigo 1° da lei 7.960/89 seja acrescido das seguintes alíneas:
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abril de 1997);
a,) concussão (art, 318 do Código Penal);
r) coação no curso do processo (art. 344 do Código
Penal)."
Propõe
ainda o texto que se aumente
o prazo para prisão
temporária, alterando o caput do artigo 2° nos seguintes termos:
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o UlZ,
em face da representação da autoridade policial ou de
requerimento do Ministério Público e terá prazo de
10(dez) dias, prorrogável por igual período em caso
de extrema e comprovada necessidade."
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Embora não seja a matéria a ser diretamente tratada por este
parecer, não podemos deixar de abordar, ainda que rapidamente, a questão da
constitucionalidade
da Lei 7.960/89, antes de opinar sobre projeto de lei que a
modifica de modo a ampliar o âmbito de aplicação da prisão temporária. Assim,
preliminarmente, é de se analisar a constitucionalidade
da própria Lei 7.960 de
21 de dezembro de 1989 a qual se pretende trazer as mudanças propostas no PL
n.o. 4.515/2004.
A
referida
Inconstitucionalidade
Lei
Federal
é
objeto
da
Ação
Direta
de
n.o. 4.109 proposta pelo Partido Trabalhista Brasileiro em
julho do corrente ano perante o Supremo Tribunal Federal, distribuída à relatoria
da Ministra Cármen Lúcia, encontrando-se, desde 25 de agosto até a presente
data, com vista à Procuradoria Geral da República. A ADI n," 4.109 caminha no
sentido de pleitear o reconhecimento
da inconstitucionalidade
da totalidade da
Lei Federal 7.960/89, canhestra criação legislativa que venho na esteira da
Medida Provisória de n. o 111 de novembro de 1989, esta última inspirada em
projeto de lei do ano de 1983 (PL n.o 1.655/83), portanto anterior à Constituição
da República.
Ao nosso sentir. a Lei Federal 7.960/89 efetivamente
não se
coaduna os Direitos e Garantias Fundamentais do Estado Democrático de Direito
instituídos pela Constituição da República de 1988 e, conseqüentemente, muito
menos o Projeto de Lei que amplia as possibilidades de decretação de prisão
temporária e o prazo de tal prisão.
A Lei Federal que dispõe sobre a prisão temporária veio dar a
roupagem de legalidade à prática das prisões para averiguação, plantando no seio
do Estado Democrático de Direito a semente do Estado Policial autoritário que,
ao invés de dar maior efetividade aos direitos e às garantias individuais, vem em
sentido contrário reforçando a lógica punitiva.
A prisão temporária é hipótese de prisão a ser decretada com vista
às investigações no inquérito policial, não podendo sequer ser considerada típica
medida cautelar processual,
pois lhe falta características
típicas da prisão
cautelar, estando mais próxima das medidas de contenção ditas administrativas,
até porque a natureza jurídica do inquérito policial seria o de procedimento
administrativo pré-processual (LOPES JUNIOR. Aury. Direito Processual Penal
e sua Conformidade Constitucional; p. 242, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2008).
Tendo em vista que no procedimento investigatório, o cidadão se
enquadra ainda na categoria de suspeito, não havendo ainda, nesta fase préprocessual
uma probabilidade
maior de culpa, o primeiro
dos princípios
constitucionais a ser vulnerado é o da Presunção de Inocência, artigo 5.°, inciso
LVII da CF 88. Por outro lado, o inciso LXVI deste mesmo artigo 5.° da
Constituição Federal dispõe acerca da liberdade provisória, significando que em
nosso ordenamento jurídico
a liberdade é a regra, sendo a prisão cautelar
exceção, não se admitindo assim a banalização de tal instrumento de força que é
a prisão.
Neste diapasão, as modificações que se pretende introduzir na Lei
7.960/89~ esta já de constitucionalidade
duvidosa,
vai na contramão
do
estabelecido na Constituição da República e se insere no que se convencionou
chamar de "cultura da emergência", em que os três Poderes da República, Legislativo, Executivo e Judiciário -, estão sendo chamados a dar uma resposta,
e com urgência, a uma suposta crise na esfera da Segurança Pública.
Assim, novas leis penais e processuais penais mais duras são
aprovadas, a exemplo do presente Projeto de Lei, assistimos à repressão policial
cada vez mais violenta e, por sua vez, temos decisões judiciais permeadas pela
ideologia do eficientismo penal e de defesa social, tudo em detrimento dos
valores de um Estado Democrático de Direito. Tal movimento, fomentado por
campanhas na mídia, traz em seu bojo o discurso da necessidade de combate ao
caos, identificado como um perigo à ordem pública, contaminando a Justiça
Criminal com a ideologia do "combate ao crime", o que se traduziria no
endurecimento da legislação penal e a larga utilização da prisão provisória, nesta
nomenclatura se englobando a temporária para resolução dos conflitos penais.
o
significativo aumento de decretação de prisões temporárias,
fundadas em abstrações como "gravidade do delito" ou "periculosidade
do
agente", e ainda "manutenção da ordem pública", essas duas últimas guardando
muito mais suas naturezas
administrativas
do que propriamente
penal ou
processual penal, configuram-se em controle social penal prévio que se vale de
uma culpabilidade presumida e traduz-se, ao final, em verdadeira antecipação da
pena, tudo em nome da lei - e de forma ilegal.
Isto posto, pelas razões acima expostas, este parecer é no sentido
de sugerir ao Plenário do IAB que se posicione contrariamente ao Projeto de Lei
n" 4.515/2004, por ser incompatível com os Direitos e Garantias Fundamentais
insculpidos
na Constituição
da República
Federativa
do Brasil,
qualquer
ampliação das hipóteses de cabimento da prisão temporária, além de incabível,
também por afronta aos direitos e garantias individuais, o aumento de prazo para
prisão neste caso.
Victoria-Amália de Barros Carvalho Gozdawa de Sulocki

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