Sem título-1

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Sem título-1
Enquanto isso, no Brasil e no Mundo...
O Brasil das oligarquias
De 1889 a 1930, o período denomina-se Primeira República, República
Velha ou República dos Coronéis. Esse
período iniciou-se com a presidência dos
militares Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, tentando solidificar o poder
do Exército. Porém, em 1894, foi eleito
Prudente de Morais, da oligarquia paulista. Durante seu governo, ocorreu no
sertão baiano o Movimento de Canudos.
na Bahia
A Guerra de Canudos – 1896-97
Após a abolição, muitos negros e
mulatos ficaram desempregados e marginalizados. O Nordeste, desde a decadência da cana-de-açúcar, passava por
problemas econômicos. Estes motivos
geraram uma exclusão social acentuada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BORGES, Sebastião Wenceslau. Memoriando,
3ed, Editora São Paulo, 2003.
FAUSTO, Boris. História do Brasil, Edusp,
2ed,1995.
GRILO, Antonio Theodoro. Sindicato Rural de
Passos, Editora São Paulo, 2002.
GRILO, Antonio Theodoro. Câmara Municipal
150 anos, Editora São Paulo, 1998.
NORONHA, Washington. História da cidade de
Passos, do Senhor Bom Jesus dos Passos, vol. 1 e 2.
O PAPIRO, ano 1 nº 1, publicação da Faculdade de Filosofia de Passos, 1973.
VASCONCELOS, Elpídio Lemos de. Álbum de
Passos, 1920.
Acervo Darci Morais de fotos e documentos.
http://www.geocities.com/Athens/7452
EXPEDIENTE
Especial editado pelo Jornal Folha da Manhã e Fundação de
Ensino Superior de Passos - FESP
JORNAL FOLHA DA MANHÃ
Carlos Antônio Alonso Parreira - Diretor Jornalístico
Maria das Graças Lemos - Diretora Comercial
FESP/UEMG
Prof. Fábio Pimenta Esper Kallas - Presidente do Conselho
Curador
Moeda de ouro
de 1889. Ela foi
cunhada em
comemoração à
Proclamação da
República e valia
20 mil réis.
EDIÇÃO
EDIÇÃO:: Carlos Antônio Alonso Parreira/ Profª. Selma Tomé
PESQUISA E REDAÇÃO: Profª. Leila Maria Suhadolnik Oliveira Pádua Andrade
REVISÃO: Prof. José dos Reis Santos
IMA
GENS E FO
TOGRAFIA
IMAGENS
FOT
OGRAFIA:: Prof. Diego Vasconcelos
PROJET
O GRÁFICO/MONT
AGEM: Profª. Heliza Faria
PROJETO
GRÁFICO/MONTA
Fascículo 05/10 - Julho de 2008
Antonio Conselheiro era um
crente que tinha
um comércio à
beira da estrada.
Além de vender
secos e molhados, aconselhava
as pessoas usando a Bíblia.
Foi ficando
famoso como
crente, deixou a
vendinha, mulher
e filhos e iniciou
pregações pelo sertão, impregnadas do
mito do sebastianismo: prometia uma
nova vida, “o sertão vai virar mar”, a vida
vai melhorar. Muitas pessoas passaram a
seguí-lo. Pouco depois, invadiram umas
terras abandonadas e começaram a erguer uma vila com casas e igreja. Foi uma
experiência comunitária. Plantavam, colhiam, faziam as casas, teciam e dividiam
tudo entre si.
Antonio Conselheiro, seus seguidores e sua comunidade não agradaram aos
latifundiários, que viram a mão-de-obra barata evaporar-se. Conselheiro não era padre e era criticado pela Igreja e pelo Estado, pois não aceitava o casamento civil.
Prudente de Morais, primeiro presidente da elite agrária, queria afastar o
Exército do jogo político, mandando-o
para uma missão nos confins da Bahia.
Cinco expedições do Exército exterminaram com o arraial de Canudos. A
igreja foi destruída, Conselheiro e a maior parte da comunidade morreram durante a guerra. Muitos fugiram, sobraram os velhos, mulheres e crianças.
A Guerra de Canudos deu origem a um dos clássicos da literatura brasileira, o livro “Os Sertões”, de Euclides
da Cunha, e inspirou o longa-metragem
Canudos, de Sergio Rezende, que teve
José Wilker no papel de Conselheiro.
fotos Canudos - Conselheiro
Os coronéis apropriaram-se do poder. Durante esse período, as oligarquias paulista e mineira, economicamente
mais fortes, monopolizaram o poder estabelecendo o que se convencionou chamar de “República do Café com Leite”.
São Paulo e Minas eram os maiores produtores de café do Brasil, porém Minas
Gerais também produzia leite e seus derivados.
A economia brasileira, na época, dependia de um único produto: o café. Por
isso, era muito fragilizada. Qualquer abalo
no preço do produto
provocava uma crise
imediata na economia. Os fazendeiros
dominavam os mecanismos do governo e
sempre usavam o Estado para atender
suas necessidades
privadas.
Além de Canudos, vários movimentos sociais aconteceram naquela época:
R evolta do Contestado em
Santa Catarina e Paraná (19121916) - Sertanejos foram expulsos
pelo governo, após invadirem uma terra contestada pelos dois Estados. Muita gente morreu pretendendo um pedaço de terra.
Revolta da V
acina (1904) - MoVacina
radores dos cortiços do Rio de Janeiro,
na maioria imigrantes, tiveram suas casas derrubadas para o alargamento das
ruas da capital brasileira. Ficaram revoltados e negaram-se a tomar a vacina obrigatória do governo.
Movimento Anarco-sindicalista – Foi liderado pelos imigrantes alemães e italianos que, ao chegarem ao
Brasil, ficavam espantados com a ausência de leis trabalhistas, regulamentando
a relação patrão e empregado.
Na Europa do início do século XX
O início do século XX apresenta-se
com grandes disputas industriais entre
os países europeus.
A Inglaterra e a França detinham a
liderança do mercado e da economia
mundiais, disputavam colônias no mundo inteiro.
A Alemanha e a Itália não eram
nações antes de 1870. Por meio de
guerras e unindo povos da mesma nacionalidade, Otto Von Bismarck (alemão) e Camilo de Cavour (italiano) lideraram os processos de unificação de
seus países.
Em 1870, após a Guerra FrancoPrussiana, estavam formados dois novos
países na Europa: a Itália e a Alemanha.
Esses novos países e sua burguesia estavam ávidos por colônias. A Alemanha logo
se destacou e, em 1900, já produzia mais
aço que a Inglaterra. Os conflitos nascidos dessas disputas vão envolver o mundo em duas guerras mundiais.
O auge das divergências
políticas: a “Matança do
Fórum” em 1909 e suas
conseqüências para a cidade.
A especialização na pecuária de
gado zebu e a reestruturação
da elite agrária levando à
formação de novos partidos e
embates entre Patos e Perus.
O avanço na organização e do
progresso da cidade, abertura
de ruas e praças, a construção
da ponte do Rio Surubi que
facilitou a exportação do gado e
a implantação da rede
ferroviária.
O coronelismo à moda passense
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urante o Império, as disputas
políticas dividiam conservadores e liberais.
Embora divergissem quanto ao
poder, tinham a mesma postura a respeito das classes baixas: precisavam ser controladas
quanto ao acesso à terra e ao
poder.
O maior exemplo desse
elitismo foi a criação da Guarda
Nacional, um instrumento constituído legalmente que permitiu aos latifundiários a formação
de suas próprias milícias. Receberam títulos militares como
1- Juca
tenente, capitão e coronel –
expedidos pelo governo – e,
assim, firmaram o poder e o seu
domínio oficial sobre as propriedades e a
política.
Esses títulos foram oferecidos principalmente durante a República Velha,
gerando o fenômeno conhecido como
Coronelismo. Podiam ser comprados ou
obtidos gratuitamente junto ao governo, como forma de troca de favores.
Em Passos, os coronéis deram o tom
do jogo político, divididos em dois partidos: o Comercial e o Lavourista. O primeiro defendia os coronéis ligados ao
comércio, e o segundo reunia a força do
campo. Nos dois casos, faziam uso da
força militar paralela ao Exército oficial.
Os delegados exerciam função pública, mas também tinham milícias pagas, recrutadas no seio da população para
defender a lei.
Os nomes das ruas de nossa cidade comprovam a história:
Tenente V
asconcelos fundou a
Vasconcelos
primeira botica da cidade;
Coronel João de Barros foi prefeito de Passos por duas vezes;
Coronel Neca Medeiros construiu o Grupo Escolar
Wenceslau Braz – hoje, Escola Municipal Francina de
Andrade;
Capitão Limírio foi professor e político e empreendeu a abertura da Avenida Progresso, hoje Otto
Krakauer.
6
5
4
3
2
1
7
Miranda, 2 - Neca Medeiros, 3 - Totonho Medeiros, 4 - Bernardino Vieira,
5- Antônio Celestino, 6 - Belarmino, 7 - Bernardino Borges
Lavouristas contra Governistas:
o avanço da violência
Nos primeiros anos do século XX,
houve um aumento sensível da violência
na região, compondo um cenário novo e
perigoso, cujo desfecho foi violento e
traumático para Passos.
Joaquim Gomes, agente executivo
(cargo equivalente ao de prefeito, hoje),
era do Partido Republicano Mineiro PRM -, mas defendia os interesses do
Comércio. Os Lavouristas, que representavam o campo, estavam fora do poder e irritados. Havia, portanto, uma rivalidade na elite política.
Devido à pecuária de engorda, percebia-se uma grande ociosidade durante os intervalos em que o gado estava
nas invernadas. Os trabalhadores envolvidos nas caravanas ficavam na vadiagem
pela cidade, bebendo, jogando, freqüentando as casas de prostituição e arrumando confusão. Esse modelo de vida
durava de três a seis meses. Depois,
eles partiam em caravanas com gado gordo para ser vendido em Três Corações.
Esses trabalhadores eram ex-escravos ou pessoas que migraram para a região, possivelmente acompanhando o Rio
São Francisco e fugindo da Guerra de
Canudos. Na época, o arraial de Canu-
dos, na Bahia, estava em guerra
contra o Exército Nacional. Em
1897,
n u m a
campanha impulsionada pelo
presidente
Prudente de
Morais, o Exército
promoveu uma verdadeira carnificina na região, matando milhares de seguidores do beato Antonio
Conselheiro.
Esses homens chegavam revoltados
com a violência promovida no enfrentamento das forças de Antonio Conselheiro contra o Exército. Muitos deles, exescravos ou mulatos, estavam revoltados
também com as condições sub-humanas
a que foram submetidos após a abolição e
com a falta de proteção do governo à sua
nova situação. Nada tinham a perder e,
por isso, envolviam-se com uma série de
crimes no Nordeste e em nossa região.
A chegada da luz elétrica
A
Lei nº. 337
de 28 de
janeiro de
1911, no
governo do
coronel
João de
Barros, regulamentou a instalação da
energia
elétrica em Passos por meio de uma concessão de privilégios, primeiramente ao
coronel Jorge Luiz Davis e depois ao coronel João Cândido de Mello e Souza. Os dois
fundaram a Empresa de Força e Luz Mineira de Mello e Davis e exploraram a queda do
Rio São João, distante 15 km de Passos. A empresa fornecia energia elétrica para as
pequenas indústrias durante o dia e, à noite, para casas particulares e iluminação
pública. Os dois não eram passenses.
As comitivas de gado
Caravanas de
donos de terras,
capatazes, cozinheiros, ponteiros, matreiros, culatreiros e peões
dirigiam-se para os
postos de venda
de gado ou para o
sertão de Mato
Grosso e Goiás,
levando gado gordo e/ou para buscar gado magro e
trazer para as fazendas de engorda. Eram experientes,
conheciam as estradas e seus perigos. Conheciam os postos de venda do gado e,
principalmente, os animais: burros, cavalos, bois e vacas.
As boiadas tinham mais de mil cabeças. Não era fácil conduzir tanto gado. A
viagem durava meses, percorrendo cinco
a seis léguas por dia. Com o berrante à
frente, as caravanas, enfrentando calor e
chuva, conduziam os bois e cuidavam para
que não se desgarrasse nenhum animal.
Quando paravam para descansar, acendiam uma fogueira, deitavam-se em redes
e cobriam-se com capas gaúchas.
Sebastião Wenceslau descreve o
Tio Pedro, um boiadeiro, em seu livro “Memoriando”: “...seu chapéu de aba larga
Primeira empresa de telefonia
A partir de 27 de julho de 1910,
no governo do coronel João de Barros,
foi legalizada a Empresa Telephônica. De
início, a empresa teve algumas dificuldades, porém a partir de 1915 ampliou as
linhas e os aparelhos, que eram de madeira nobre (aroeira ou peroba) e os isoladores de porcelana. A empresa foi dirigida por vários empresários, entre eles:
Veridiano de Mello Pádua, Abelardo de
Mello Pádua e Jerônymo de Mello.
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de barbela de couro, seu lenço vermelho
no pescoço, as camisas xadrez ou as riscadas, calças largas de brim, amarelas ou
cinzas e as calças rancheiras. A guaiaca
de carregar o dinheiro estava sempre na
cintura. Usava um par de botinas, esporas de rosetas e tinha sua polaina para
proteger as pernas. Trazia na cintura sua
famosa garrucha calibre 32” e tinha um
facão e cabo de relho especiais.
Inaugurada em 1906 e medindo
489 metros, a ponte do Surubi, no Rio
Grande, abriu um corredor que ligava
Passos a Cássia e Delfinópolis. O movimento intenso de gado levou para a região de Toledos um novo surto de desenvolvimento, uma nova escola, uma
nova capela e muita riqueza.
Comitiva do Capitão Manoel
Ferreira de Andrade, em Passos
Em 1882, por
meio da Câmara
Municipal de Passos,
importaram-se mudas de cana. Desde
o início da formação
das fazendas, há referências aos engenhos domésticos
para a fabricação
da rapadura, do
açúcar mascavo e da
garapa.
A partir da importação das mudas, a
produção passou a
ser mais efetiva e vai
se desenvolver cada
vez mais, chegando à
formação das Usinas
Açucareiras.
O 26 de setembro e a
Família Lemos Marcondes
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Hermógenes Marcondes era descendente de italianos e trabalhava na Companhia de Seguros Sul América, em São Paulo. Chegou a Passos dia 04 de novembro de 1909, para pagar o seguro de vida à viúva de
Juca Miranda, Sra. Valéria Lemos Miranda. Ficou hospedado na Fazenda das Águas, de propriedade de Joaquim Júlio Lemos e Maria do Carmo Pádua Lemos.
Joaquim Júlio era irmão de Valéria. Sr. Marcondes apaixonou-se pela filha do casal chamada Cornélia de Pádua Lemos, ganhou uma fazenda do sogro e casou-se
com a moça em junho do ano seguinte, formando a
Família Lemos Marcondes.
A Sra. Delva Marcondes de Melo Lemos afirmou:
“Se não tivesse acontecido o fato de 26 de setembro,
minha família não existiria e nem eu!”
MEMÓRIA
“Meu pai morreu
queimado na Guerra
de Canudos. Foi. Eu
era criança ainda
quando vi os sordados da República
botá fogo cum kerozene na minha gente
toda, por ordem do
general. Pois foi. Cum
gente grande do governo que eu aprendi a num tê piedade
dos inimigo. Quando
mato algum, e tenho
tempo, tamém gosto
de queimá o corpo...” Claudimiro.
Fascículo 1 dos Contratadores da Morte)
Propaganda extraída do Álbum de Passos, de 1920, página 155.
João Sarno fundou a Alfaiataria Sarno em
1909 e, por muitos anos, vestiu os homens elegantes de Passos.
Como nos filmes de faroeste!
A tragédia de 26 de setembro de 1909
pelo poeta Ananias Emerenciano Campos (20/08/1987)
26 de setembro – 1909
A chacina Isidorada
ou tragédia qu’inda comove
a gente ao ser lembrada...
Loquaz Antenor dentista
foi futriqueiro afamado
por isso tomou um tiro
na testa e morreu ajoelhado
Num domingo tenebroso
o brabo Alferes Isidoro,
porém astuto e jeitoso,
fez da cadeia um foro...
Coronel Neca Medeiros,
mesmo sem ser intimado;
como chefe executivo;
foi também assassinado
Para inquirir testemunhas
sobre o crime passional...
Pós ouvir mui caramunhas;
abriu inquérito, afinal:
George Davis, um inglês
co’um tiro no medalhão
caiu vivo e por sua vez,
ficou quietinho no chão...
Primeiro a ser inquerido
fora o Cap. Juca Miranda
era valente e temido
de coragem formidanda
Mas os outros intimados
à fatídica chacina,
correram-se apavorados,
dobrando ruas e esquinas...
Em frente ao inquiridor,
firme, ele , então depunha,
sobre o crime de rancor
como mera testemunha...
Foram três mortos, portanto
do atroz acontecimento;
deixando a cidade em pranto,
e familiares em lamento...
Mas atrás havia um soldado
com machadinha e veemente
desfere golpe acertado:
na face do depoente...
E todo o mundo com medo,
e recolhidos nos lares...
como se fosse um degredo
de infinitos pesares
Sai, pois da cadeia correndo
num desespero sem fim,
com sangue ao rosto escorrendo,
foi morto pelo Furquim...
Foi em 26 de setembro
que se deu o torpe acidente
Assaz nítido me lembro,
pois já era adolescente.
O avanço do gado indiano
O gado
zebu foi introduzido em Passos
pelo coronel José
de Paula, que
passou a criar a
raça na sua fazenda Taquarussu.
Em seguida, vários coronéis
adotaram a raça:
Eliziário José Lemos, Bernardino
Vieira e Gaspar
Lourenço de Andrade. O coronel João Lourenço de Andrade, em 1908,
importou diretamente da Ásia três touros zebus. Assim o zebu tomou
conta da região e a pecuária foi se transformando na especialidade passense, inclusive com a produção de derivados: queijo, manteiga e carne.
As eleições fraudulentas
processo eleitoral do ano de 1900, em Passos, gerou várias
denúncias, principalmente de problemas com o alistamento
eleitoral. Isso não era particularidade passense, já que na
República Velha o sistema eleitoral era muito viciado e
fraudulento. Expressões historicamente famosas confirmam tal situação: “voto de cabresto”, “curral eleitoral”, “voto fantasma”, “eleição a bico de pena”,
etc. Estas expressões indicam o uso indiscriminado do favorecimento,
do compadrio, da manipulação e compra de listas eleitorais e do voto. É
bom lembrar que o voto era aberto, isto é, oral; o eleitor precisava
apenas assinar o nome para vigorar nas listas eleitorais.
Hilarino de Morais registrou que, na gestão do Coronel
Jayme Gomes de Souza Lemos, foram plantadas vinte mudas de paineiras ao redor do Largo da Matriz. Uma delas, mais frondosa, ficava em
frente à casa dos Gomes. Na sombra desta paineira, os chefes políticos
faziam seus acordos e conchavos, principalmente durante as eleições.
De 1901 a 1903: disputas acirradas
A partir de 1901, vários incidentes
foram ocorrendo e as disputas políticas
tornaram-se cada vez mais apimentadas.
Críticas severas à administração de Joaquim Gomes foram protocoladas à Câmara e o vereador Cel. Neca Medeiros,
enraivecido, pediu demissão. A Câmara
solicitou, por intermédio de ofício, que
o Presidente do Estado mandasse forças
para manter a ordem pública.
O “Jornal Comércio e Lavoura”, que
existia em Passos, foi o canal usado por
Lavouristas e Governistas para trocarem
graves ofensas e insultos.
Fragmento do artigo publicado pelo
jornal “Comércio e Lavoura”, em 28/07/
1901:
“O Partido da Lavoura, porém, não
se erguerá para repelir tão vis quanto
degradantes atos; aguarda somente o
momento da violência física e então o
grupo insultador, provocador e autor dos
fatos constantes das interrogações que
aí ficam feitas terá a merecida resposta
e nós faremos valer os nossos foros de
homens, membros de um partido que
aspira a reivindicar os seus direitos(...)”
No ano de 1902, a mando dos coronéis, alguns eleitores foram presos por
jagunços. Abriu-se inquérito e vários capangas foram presos. A cidade foi invadida por um bando de jagunços armados, que assaltaram a delegacia, deram
tiros para o alto, rasgaram os autos do
processo e soltaram os presos.
Alguns dias depois, o soldado Balbino foi morto na Rua da Chapada. Teve
o corpo queimado e a orelha cortada.
O ano de 1903 também foi muito
violento. Capangas invadiram a coleto-
ria e o hospital. Houve um tiroteio no
Circo de cavalinhos, com o saldo de uma
morte e outros assaltos ao Hospital e à
casa do juiz alistador, onde os livros de
assentamentos foram destruídos.
Chegou a Passos, nesse ano, o jagunço mais famoso da nossa história, o
camarada Sancho Garcia, que ficou conhecido como “Dente de Ouro”. Sua série de crimes começou com um assassinato no Glória e se estendeu por vários
anos. foto contratadores da morte
Os governistas passenses mantinham o governo informado dessa violência acentuada. Com isso, transformaram
os incidentes que se sucediam em justificativas para uma ação mais incisiva do
Governo do Estado. Os lavouristas, por
sua vez, defendiam-se acusando os governistas de manipularem as listas eleitorais e as eleições.
O Governo do Estado interferiu rapidamente: adiou as eleições por um ano
e o Cel. Joaquim Gomes permaneceu no
poder, para descontentamento dos lavouristas.
Passos foi ganhando fama de cidade
violenta “por cujas ruas transitava uma
horda de malfeitores e indivíduos suspeitos, de facínoras de toda espécie, que
dava fortes descargas de carabinas a qualquer hora do dia e da noite, aterrorizando a pacata população que se achava completamente ameaçada...”.
O livro “Contratadores da Morte”,
de Antonio Celestino, que viveu nesse
tempo e era lavourista, retrata o período
violento em que os coronéis dispunham
da milícia composta pelos jagunços para
reforçar o jogo político e manter o poder.
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Antônio Celestino foi advogado, escritor, jornalista e comerciante
que residiu em Passos, no início do século XX, e foi testemunha do
crescimento da violência na cidade e do seu desfecho, na Matança do
Fórum.
Acuado com os acontecimentos e com o desagrado das famílias,
devido aos artigos críticos que andava escrevendo, o escritor mudou-se
da cidade. “Os Contratadores da Morte” são um conjunto de três folhetins publicados em 1915 e 1917, na cidade de Guaxupé.
Dois folhetins trazem subtítulos: Crimes e Criminosos no Sul de
Minas e Aventuras Criminosas. Todos os fascículos relatam um episódio
especial: Na caverna dos tigres, Turbilhão de Sangue e A herança Maldita.
No ano 2000, a primeira publicação da Editora FESP reeditou os
fascículos em forma de livro, organizados pelo professor Antônio Theodoro Grilo.
Cortar a orelha do morto era uma prática usual. Durante as
revoltas regenciais, especialmente a Cabanagem, o governo
incentivava os soldados a lutarem contra os revoltosos, oferecendo prêmios pelas mortes. Os soldados chegavam ao
Rio de Janeiro trazendo colares de orelhas salgadas, a fim
de receberem as premiações. Na Guerra de Canudos, esta
prática também foi relatada.
A administração de Neca Medeiros
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VOTO DE CABRESTO
O alistamento eleitoral
era feito por meio de
um requerimento que
o eleitor deveria preencher na frente do
Juiz de Paz. Alguns
fazendeiros privilegiados podiam trazer os
requerimentos prontos e aí a comissão
indeferia alguns, alegando que eram falsos ou que a pessoa
não sabia escrever suficientemente.
Em 1904, o Partido Governista perdeu as eleições para o Partido Lavourista. Manoel
Lemos de Medeiros, lavourista,
passou a ocupar
o cargo de presidente da Câmara e Agente
Executivo.
No ano seguinte, Neca
Medeiros iniciou o seu governo lidando com vários incidentes políticos. O governo mudou,
mas as práticas políticas do
conchavo, do jaguncismo e do compadrio continuaram.
As principais realizações de Neca
Medeiros foram: a criação de uma Escola
Pública no Córrego dos Ferros (hoje, Itaú
de Minas que, naquela época, pertencia
a Passos), implantação da primeira linha telefônica ligando
Passos a Guaxupé, compra
das oficinas do “Jornal
do Comercio e Lavoura”, que havia sido
extinto e, assim, iniciou a publicação do
jornal “Cidade de
Passos”, um semanário oficial do município, ampliação
da canalização de
água da cidade e participação da construção da Casa Paroquial.
Em 1907, foi feito o lançamento da pedra fundamental do Grupo Escolar. O construtor foi João Orlandi.
Novas eleições foram realizadas e o
Partido Lavourista, novamente, foi o vencedor. O Partido Governista fez denúncias ao Governo do Estado, que era exercido por Wenceslau Brás.
A missão do delegado Isidoro
No início de 1909, o Governo do
Estado enviou um delegado militar, o alferes Isidoro Correia Lima, para que pusesse fim aos desmandos e falsificações
eleitorais, enfim que fizesse uma “higienização” nas práticas criminais e eleitorais passenses. Desde que chegou, Isidoro aproximou-se dos líderes políticos
lavouristas: almoçava e jantava com eles,
pedia-lhes dinheiro emprestado, prestava-lhes favores. Os lavouristas tinham
a impressão de que Isidoro estava apoiando a continuação da política local suja
e violenta.
Em agosto de 1909, Juca Miranda e
seu camarada Benvindo, após desentendimentos familiares, assassinaram João
Modesto, cunhado de Juca, quando este
chegava em casa. A família de João Modesto tinha certeza de que o crime não
seria apurado e tudo ficaria como se nada
tivesse acontecido.
O desentendimento
com Wenceslau
O dia da matança do Forúm
delegado Isidoro não recebeu nenhuma denúncia do crime, mas resolveu convocar as pessoas a deporem sobre
o caso João Modesto, primeiramente em dias diferentes, depois foi adiando os interrogatórios até que todos
depusessem no mesmo dia, o que aconteceu em 26 de setembro de 1909.
O primeiro a depor foi Juca Miranda, autor do crime. O plano do delegado era chamar cada coronel na sala
de interrogatórios, assassiná-los um a um, cortando-lhes as cabeças a machadadas.
Juca Miranda sentou-se à frente do delegado e o soldado Furquim, seu ajudante, ficou de pé ao lado do
delegado. Após o depoimento, quando Juca Miranda abaixou-se para assinar o livro, o soldado deu-lhe machadadas no crânio e no
pulso. Juca reagiu e saiu ferido e gritando para os coronéis que estavam na sala de espera. Armou-se uma confusão. Não se sabia quem
atirava em quem.
Antenor Magalhães, amigo de Neca Medeiros, foi um dos muitos curiosos que foram ao Fórum assistir ao fato tão inusitado:
os coronéis depondo. Foi morto na confusão. Neca Medeiros, quando viu o alferes Isidoro saindo do
Fórum, foi para o seu lado falando alto e protestando contra a violência. Este prontamente
ofereceu-lhe proteção, dizendo-lhe que entrasse no Fórum, ao que Neca Medeiros aceitou
de imediato, achando que estaria mais protegido.
Quando entraram, Isidoro fechou logo a porta e, na
cozinha, Medeiros foi baleado, morrendo junto ao fogão
de lenha. Os dois políticos mais influentes de
Passos estavam mortos.
George Davis, um americano
que estava em Passos devido
a acordos para instalação da
Companhia de Força e Luz,
foi atingido por uma bala, a
qual acertou o relógio que trazia no bolso, salvando-lhe da
morte. Depois de baleado, ficou imóvel no chão, fingindose de morto até que a confusão fosse desfeita.
A invasão dos jagunços
Wenceslau Brás era advogado e promotor. Neca Medeiros e Wenceslau Brás
tiveram um desentendimento pessoal e
jurídico, na cidade de Monte Santo, onde
Wenceslau era promotor. Os dois estavam, desde então, de relações cortadas.
Em 1908, Neca Medeiros, procurando uma aproximação com o Governo do
Estado, deu nome de Wenceslau Brás para
o primeiro Grupo Escolar da cidade. Em
1909, estava instalado e foi inaugurado.
Neca Medeiros tinha muitos amigos pessoais como Antonio Celestino e
José Stockler de Miranda, o Juca Miranda, que era tenente-coronel e chefe da
Coletoria Federal. Eram coronéis de destaque, possuíam uma jagunçada considerável e, por isso, praticavam vários desmandos na cidade. A população estava
insegura e inquieta.
Após os assassinatos, Isidoro e
seus ajudantes
fugiram atirando para o alto.
A cidade
de Passos foi
invadida pela
jagunçada. Ninguém saía de casa.
Monsenhor João Pedro, por
meio de visitas e reuniões familiares,
serenou os ânimos. Isidoro e seus ajudantes retornaram alguns dias depois,
sob a proteção do prefeito. Antes de
entrar, explodiram dinamites e deram
tiros para o alto, intimidando as pessoas. Nesse mesmo dia, foram presos os
envolvidos.
Em março de 1910, numa sessão
de júri público – presidida pelo juiz de
direito da Comarca, Dr. Saturnino
Amâncio da Silveira, pelo promotor de
justiça, Dr. Fernando de Magalhães Ma-
cedo e servindo de escrivão o capitão
Hilarino Joaquim de Moraes –, foi feito o julgamento dos envolvidos na
matança. Ao lado do promotor de justiça, o Dr. João Silveira, advogado residente em Casa Branca, chamado a
Passos para auxiliar o Ministério Público na acusação por parte das viúvas
do coronel Manoel Medeiros e do tenente-coronel José Stockler de Miranda, as senhoras Guilhermina Emygdia
de Lima Medeiros e Valeria de Lemos
Miranda.
Os advogados de defesa foram Dr.
Lycurgo Leite e Dr. João Leite, de Muzambinho e Guaranésia, e Dr. Antônio Celestino, de Passos. Muitas pessoas aglomeraram-se nas dependências e ao redor do
Fórum para acompanhar os debates. Foram julgados em primeiro lugar o alferes
Isidoro e o soldado Furquim e, depois, o
coronel Francisco de Lemos Medeiros.
Todos os réus foram absolvidos.
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CHAP
ADÃO DO BUGRE
CHAPADÃO
Autor: Mário Palmério
Narrado em terceira pessoa,
“Chapadão do Bugre” foi inspirado na chacina acontecida
em Passos, nos primeiros anos
do século passado, culminando com o assassinato do coronel Neca Medeiros.
Para o crítico João H. Weber,
“Chapadão do Bugre” representa o fim do império dos jagunços e coronéis: “Uma
força estranha e impiedosa, representada pelo capitão Eucaristo Rosa, se abate sobre o sertão, destruindo tanto os
coronéis e suas práticas políticas clientelísticas como o jagunço José de Arimatéia, sem que ninguém (...) possa
chegar a entender as normas do novo mundo que se estabelecia no sertão. Apenas Camurça, a mula de José de
Arimatéia, percebe, à hora da morte, a realidade. E o faz
do ponto de vista dos marginais e oprimidos do sertão.
Mas é tarde e a destruição é inexorável”.

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