Faculdade de Cincias da Universidade do Porto
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Faculdade de Cincias da Universidade do Porto
Hélder Almeida Santos Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas em interfaces ar-água e líquido-líquido polarizadas Relatório de Seminário Química Analítica Dissertação para Licenciatura em Química Faculdade de Ciências da Universidade do Porto Departamento de Química 2003 Agradecimentos Aos que tronaram o trabalho possível: Ao Departamento de Química da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto por todas as condições proporcionadas para a realização deste trabalho. Aos colegas e amigos com quem partilhei o laboratório, e que sempre me apoiaram e ajudaram, em especial, aos Licenciados Ricardo Silva, Ana Barbosa, Tiago Silva e Sérgio Barreira, por todo incentivo, bom ambiente de trabalho proporcionado, camaradagem e simpatia. Ao Prof. Doutor Carlos Melo Pereira, meu orientador, pelo apoio na execução experimental, pela inestimável ajuda, interesse e dedicação com que sempre soube atender às minhas solicitações e por toda a amizade revelada, que foram preponderantes para a obtenção deste excelente trabalho, os meus mais sinceros agradecimentos. À minha família e aos que de uma forma ou de outra me ajudaram. A todos o meu muito obrigado. i Resumo O presente trabalho é constituído por duas partes. Na primeira parte estudou-se o comportamento de fosfolípidos na formação de monocamadas na interface ar-água, por aplicação da técnica de Langmuir-Blodgett (LB), e na segunda, o efeito da adsorção dos fosfolípidos em interfaces líquido-líquido polarizadas, por aplicação de técnicas voltamétricas e espectroscopia de impedância electroquímica (EIE). Utilizando a técnica de LB mediram-se as curvas de tensão superficial dos fosfolípidos, diaraquidoilfosfatidilcolina (DAPC), dibenoilfosfatidilcolina (DBPC), dipalmitoilfosfatidilcolina (DPPC) e distearoilfosfatidilcolina (DSPC), bem como, a influência de diversos parâmetros na formação e estabilidade de monocamadas desses fosfolípidos, nomeadamente a temperatura, o tipo de electrólito de suporte e a sua concentração na subfase, e o efeito da presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na subfase aquosa. Efectuaramse também, estudos de transferência de filmes de LB para slides de Ouro e utilizou-se a espectroscopia de infravermelho (FT-IR) para analisar esses slides. Utilizando técnicas voltamétricas e recorrendo à EIE, estudou-se o efeito da adsorção de diferentes fosfatidilcolinas (DAPC, DBPC e DPPC), em interfaces líquido-líquido polarizadas, bem como, a interacção observada entre estes fosfolípidos presentes, e a enzima GOx, e os catiões acetilcolina (ACh+) e butirilcolina (BuCh+). Verificou-se que os diferentes fosfolípidos (DAPC, DBPC, DPPC, e DSPC), apresentam diferentes comportamentos quando comprimidos sobre uma subfase aquosa. Os resultados parecem depender, fundamentalmente, do comprimento da sua cadeia, não sendo notório, a diferença do comportamento dos fosfolípidos por variação da concentração do electrólito de suporte da subfase aquosa. A temperatura afectou drasticamente a estabilidade das monocamadas dos fosfolípidos. O estudo da transferência de filmes de LB para slides de Ouro pretendeu avaliar a estrutura do filme dos fosfolípidos adsorvidos neste material, no entanto, os resultados obtidos foram insuficientes para tirar qualquer tipo de conclusão. Da observação das isotérmicas de mistura de fosfolípidos, pareceu que, a presença de GOx na subfase aquosa afectou o seu comportamento, mas, uma vez mais, os resultados não foram totalmente esclarecedores para se tirar uma conclusão definitiva. Através das curvas de capacidade observou-se que a adsorção dos diferentes fosfolípidos foi mais fraca a potenciais positivos, enquanto que a potenciais negativos foram obtidas monocamadas estáveis, devido a uma forte adsorção dos fosfolípidos na interface. A presença de GOx dificultou a adsorção dos fosfolípidos a potenciais negativos, enquanto que, a potenciais positivos, o aumento dos valores das curvas de capacidade indicou uma desorção do fosfolípido e uma possível adsorção da GOx na interface. Estes efeitos foram variáveis com a concentração de GOx na fase aquosa e foram mais notórios na presença do solvente 1,2-dicloroetano, do que na presença do solvente éter 2-nitrofeniloctílico. Na presença de ACh+ e BuCh+ na fase aquosa, observa-se um pico nas curvas de capacidade a potenciais positivos, devido à sua transferência iónica, não tendo estes qualquer influência na adsorção dos fosfolípidos observada a potenciais mais negativos. ii Índice geral Página Agradecimentos i Resumo ii Índice geral iii Lista de símbolos e abreviações vi Capítulo 1 - Introdução 1 1.1. Filmes de Langmuir-Blodgett 2 1.1.1. Pequena história dos filmes de Langmuir-Blodgett 2 1.1.2. Tensão superficial 3 1.1.3. Técnica e filmes de Langmuir-Blodgett 4 1.1.4. Surfactantes e filmes de Langmuir 5 1.1.5. Monocamadas insolúveis e balança de Langmuir 6 1.1.6. Forças que actuam na superfície da subfase 8 1.1.7. Isotérmicas: pressão superficial vs. área 10 1.1.7. Fases dos filmes monomoleculares 1.2. Aplicações de Filmes de Langmuir 12 14 1.2.1. Materiais adequados para a técnica de LB 14 1.2.2. Subfase aquosa 14 1.2.3. Processo de deposição de filmes LB sobre um substracto (hidrofóbico ou hidrofílico) 15 1.2.4. Tipos de deposição de filmes de LB 17 1.3. Métodos Voltamétricos 19 1.3.1. Voltametria Cíclica 19 1.4. As ITIES, a dupla camada eléctrica e a microinterface. A electroquímica nas interfaces líquido-líquido 20 1.4.1. Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES) 21 1.4.2. Interfaces líquido-líquido idealmente polarizadas 22 1.4.3. Dupla camada eléctrica numa interface líquido-líquido 23 1.4.4. Janela de potencial 24 1.4.5. Transferência iónica 26 1.4.6. Transporte de massa nas ITIES: migração, convecção e difusão 27 1.5. Espectroscopia de impedância electroquímica (EIE) iii 29 1.5.1. A impedância nas interfaces líquido-líquido 29 1.5.2. Dupla camada eléctrica 32 1.6. Formação de uma monocamada na interface 33 1.6.1. Membrana celular 33 1.6.2. Os fosfolípidos 34 1.6.3. Glucose Oxidase (GOx) 38 1.6.4. Neurotransmissores 38 1.6.5. Adsorção nas ITIES 39 Capítulo 2 – Execução Experimental 42 2.1. Reagentes utilizados na preparação das soluções 43 2.2. Técnica de Langmuir-Blodgett (LB) 44 2.2.1. Material e instrumentação 44 2.2.2. Procedimentos experimentais 45 2.3. Espectroscopia de impedância electroquímica 48 2.3.1. Material e instrumentação 48 2.3.2. Reagentes 49 2.3.2.1. Solventes 49 2.3.2.2. Electrólitos 50 2.3.3. Eléctrodos 51 2.3.4. Procedimentos experimentais 51 Capítulo 3 – Resultados e Discussão 53 3.1. Filmes de Langmuir-Blodgett 54 3.1.1. Estudo das isotérmicas de diferentes fosfolípidos na interface ar-água 54 3.1.2. Estudo da isotérmica do fosfolípido DBPC (C22) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa 3.1.3. Estudo da isotérmica do fosfolípido DAPC (C20) na interface ar-água 55 56 3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa 58 3.1.5. Estudo da isotérmica do fosfolípido DPPC (C16) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito de suporte e da sua concentração na subfase aquosa, e estudo do efeito da temperatura na isotérmica de DPPC 59 3.1.6. Estudo da isotérmica de misturas de fosfatidilcolinas na presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na interface ar-água 3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos sólidos 3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au 63 65 65 3.2. Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas e da enzima GOx em interfaces líquido-líquido polarizadas 68 iv 3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE polarizada 69 3.2.2. Estudo de adsorção da GOx na interface água/1,2-DCE 71 3.2.3. Estudos de adsorção de DAPC (C20). Efeito da presença de GOx na fase aquosa 77 3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença de GOx na fase aquosa 79 3.2.5. Estudos de adsorção da DPPC (C16) 82 3.2.5.1. Adsorção de DPPC. Estudos da presença da enzima GOx na fase aquosa 90 3.2.6. Comparação do efeito de adsorção dos diferentes fosfolípidos estudados 95 3.3. Estudos de adsorção de fosfolípidos na interface água/2-NPOE polarizada na presença da enzima GOx 96 3.3.1. Efeito do solvente orgânico na adsorção da Glucose Oxidase (GOx) 3.3.1.1. Efeito do pH 96 99 3.3.2. Efeito do solvente orgânico na adsorção de DPPC 102 3.4. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na presença da acetilcolina (ACh+) 106 3.4.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na presença da acetilcolina na fase aquosa 106 3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC 108 3.5. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na presença da butirilcolina (BuCh+) 114 3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na presença da butirilcolina na fase aquosa 114 3.5.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da butirilcolina (BuCh+) na presença do fosfolípido DPPC 115 Capítulo 4 – Conclusões finais 117 Capítulo 5 – Bibliografia 121 v Lista de símbolos e abreviaturas EIE Espectroscopia de impedância Electroquímica ITIES Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis TOATPB Tetrafenilborato de tetraoctilamónio TBATPB Tetrafenilborato de tetrabutilamónio NaTPB Tetrafenilborato de sódio GOx Glucose Oxidase (Aspergillus Niger) 1,2-DCE 1,2-dicloroetano 2-NPOE Éter 2-nitrofeniloctílico LiCl Cloreto de Lítio NaCl Cloreto de Sódio KCl Cloreto de Potássio HCl Ácido Clorídrico CHCl3 . Clorofórmio CdCl2 H2O Cloreto de Cádmio monohidratado Ag/AgCl Prata/Cloreto de prata N2 Azoto líquido Au Slide de Ouro DLPC Dilauroilfosfatidilcolina (C12:0) DMPC Dimiristoilfosfatidilcolina (C14:0) DPPC DL-α-Dipalmitoilfosfatidilcolina(C16:0) DSPC DL- α-Distearoilfosfatidilcolina (C18:0) DAPC L-α-Diaraquidoilfosfatidilcolina (C20:0) DBPC L- α-Dibenoilfosfatidilcolina (C22:0) LB Filmes ou técnica de Langmuir-Blodgett Π Pressão superficial do filme de Langmuir (mN/m) Πc Pressão superficial de colapso (mN/m) γ0 Tensão superficial do solvente puro γ Tensão superficial da solução γprato Tensão superficial do prato A0 Área de pressão molecular zero (Å2) A Área molecular (Å2) T Temperatura absoluta (K) KB Constante de Boltzmann lp, wp, tp e ρp Respectivamente, o comprimento, a largura, a espessura e a densidade do prato de Wilhelmy hl Profundidade de imersão do prato de Wilhelmy ρl Densidade de um líquido usado na subfase B vi c Concentração (mol.dm-3) Γ Excesso superficial (mol.m-2) g Aceleração da gravidade (~ 9.8 m.s-2) Π-A Isotérmica pressão superficial vs. área por molécula G Estado gasoso de isotérmica L1 ou LE Estado líquido expandido de isotérmica L2 ou LC Estado líquido condensado de isotérmica LE+LC Estado intermediário líquido condensado-líquido expandido de isotérmica (também representado por L1+L2) S Estado sólido de isotérmica Ai Pressão superficial à qual a transição de fase ocorre entre o estado L1 e L2 e os Estados L2 e S τ Velocidade de transferência ou espessura de uma monocamada de fosfolípido adsorvido AL Área ocupada pela monocamada na superfície aquosa durante uma deposição AS Área coberta do substrato sólido LS Técnica de Langmuir-Schaeffer FAD Flavina Adenina Dinucleótido v Velocidade de varrimento ou Velocidade termodinâmica v.c. Voltametria cíclica PVC Cloreto de polivinilo L-L Interface imiscível Líquido-Líquido Z’’ ou ZIm Componente imaginária da impedância Z’ ou Zreal Componente real da impedância Rs Resistência da solução Cd, Cdc ou d.c. Capacidade da dupla camada eléctrica Rtc Resistência de transferência de carga Zw ou W Impedância de Warburg ZR Impedância da resistência Zf Impedância faradaica ZC Impedância da capacidade Zt Impedância total K 0 Velocidade específica da reacção εr Constante dieléctrica da região adsorvida ε0 Constante dieléctrica relativa do vácuo (8.85x10-12 F.m-1) IR Queda óhmica TI Transferência iónica TE Transferência electrónica TFI Transferência facilitada de iões α Δβ φ Diferença de potencial eléctrica Galvânica entre duas fases (α e β) TPAsTPB Tetrafenilarsénio de tetrafenilborato μi Potencial químico da molécula i μ0i,α Potencial químico padrão de i na fase α vii aiα Actividade de i na fase α ciα Concentração de i na fase α F Constante de Faraday (~96484 C.mol-1) ou Força (mN) R Constante molar dos gases zi Carga do ião i TOABr Brometo de tetraoctilamónio Ci Capacidade interfacial θ Cobertura superficial β Coeficiente de adsorção a Parâmetro de interacção p Parâmetro correspondente ao número de colunas de solvente orgânico que pode ser substituído por uma molécula de espécie adsorvida r Parâmetro correspondente ao número de agregação das moléculas de espécies adsorvidas na interface Potencial de carga zero pcz ACh+ Cloreto de acetilcolina ou AChCl + BuCh Cloreto de Butirilcolina ou BuChCl φ Parâmetro de deposição ou potencial Galvânico (ou interno) entre duas fases E Potencial da célula ΔE Diferença de potencial entre o potencial obtido a partir da fase aquosa e o da fase orgânica Ji,m Fluxo de migração Ji,c Fluxo de convecção Ji,d Fluxo de difusão Di Coeficiente de difusão TBuATPB Tetrafenilborato de tetrabutilamónio BTPPATPB Tetrafenilborato de bis-trifenilfosforanilideno Δφ(mín. cap.) Potencial correspondente ao mínimo de capacidade Clip Capacidade interfacial da camada saturada na presença do lípido (μF.cm-2) CGOx Capacidade interfacial da camada saturada na presença da enzima GOx (μF.cm-2) Caq’ Capacidade interfacial sem GOx (μF.cm-2) Caq Capacidade interfacial sem fosfolípido (μF.cm-2) ΔG0ads Energia de adsorção de Gibbs (KJ.mol-1) Ip+ Intensidade de corrente do pico positivo Ip- Intensidade de corrente do pico negativo FT-IR Espectroscopia de Infravermalho RT Razão entre as variações/reduções da área da monocamada durante a deposição e a área do substracto sólido que foi utilizada Id Intensidade de corrente de difusão viii Capítulo Introdução Neste capítulo, apresenta-se uma breve exposição dos fundamentos teóricos das técnicas utilizadas ao longo deste trabalho, bem como, alguns exemplos práticos onde estas técnicas são aplicáveis, e ainda os princípios teóricos dos sistemas em estudo. Este primeiro capítulo é constituído por seis secções, correspondendo cada uma delas a um tema em estudo. As duas primeiras secções são relativas à técnica de Langmuir-Blodgett (LB). As três secções seguintes dizem respeito às técnicas de voltametria cíclica, electroquímica em interfaces líquido-líquido e espectroscopia de impedância electroquímica (EIE). A última secção está relacionada com os vários aspectos biológicos dos estudos efectuados ao longo deste trabalho. Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.1. Filmes de Langmuir-Blodgett O estudo das interfaces moleculares tem suscitado muito interesse nas últimas décadas devido aos rápidos avanços tanto na teoria como na parte experimental. Estes estudos abrangem a área da química-física, onde se estabelecem modelos relacionados com a reactividade e estrutura, modelos moleculares para a predição das propriedades moleculares, e o uso da espectroscopia e técnicas de superfície para elucidar os passos dos mecanismos de reacções. De entre as várias técnicas que têm vindo a ser utilizadas, destaca-se o uso de técnicas de LangmuirBlodgett, utilizadas na modificação da estrutura das superfícies para reacções de transferência de carga e permitindo efectuar uma analogia com os processos das membranas celulares. Os filmes de LB têm uma variedade de aplicações em campos como, a electrónica, óptica, a biotecnologia e a electrónica molecular. Os filmes orgânicos com espessura de alguns nanómetros (uma monocamada), são a fonte de alguns dos componentes com aplicações práticas e comerciais, tais como, sensores, detectores, monitores e componentes de circuitos electrónicos [1,2]. A possibilidade de sintetizar moléculas orgânicas, quase sem limitações, com a estrutura e funcionalidade desejada em conjunto com uma tecnologia de deposição sofisticada de filmes finos, facilita a produção de componentes eléctricos, ópticos e biologicamente activos numa escala nanométrica. Um filme fino orgânico pode ser depositado num substrato sólido através de várias técnicas, tais como, evaporação térmica, electrodeposição, adsorção a partir da solução, técnica de Langmuir-Blodgett (LB), automontagem, etc. A técnica LB é uma das mais promissoras para preparar tais filmes finos, porque permite: (i) o controle preciso da espessura da monocamada, (ii) a deposição homogénea da monocamada sobre grandes áreas, (iii) a possibilidade para fazer estruturas de multicamadas com composição de camada variável, e (iv) a deposição de monocamadas em quase qualquer tipo de substrato sólido. 1.1.1. Pequena história dos filmes de Langmuir-Blodgett Quando se descreve a história dos filmes de Langmuir ou Langmuir-Blodgett, pode começar por citar-se Benjamim Franklin, que em 1774 descreveu à British Royal Society [1], a forma como uma pequena quantidade de azeite (~ uma colher de sopa) se tinha espalhado sobre a superfície de uma pequena lagoa, de cerca de meio acre (~ 2000 m2). Franklin fez alguns cálculos quantitativos simples, chegando à conclusão que se uma colher de sopa (~ 2 ml) de azeite for espalhada em cima de uma área ~ 2000 m2, a espessura do filme na superfície da água deve ser inferior a 1 nm. Cerca de cem anos depois, Rayleigh suspeitou que a extensão máxima de um filme de azeite em água representa uma camada, uma espessura molecular. Mais tarde, uma alemã chamada Agnes Pockles, estudou os equilíbrios superficiais que ocorrem na interface ar-água, usado-os para determinar a contaminação superficial (da água), para diferentes compostos orgânicos em função da área superficial. A publicação do trabalho de Pockels em 1891 na Nature, foi decisivo para o trabalho quantitativo de Langmuir em monocamadas de ácidos gordos, ésteres e álcoois [3]. 2 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Irwing Langmuir foi o primeiro a executar estudos sistemáticos em monocamadas flutuantes em água no início do ano de 1910 até finais de 1920. Estes estudos conduziram-no ao prémio Nobel da Química em 1932. Já em 1920 observara a transferência de moléculas de ácidos gordos das superfícies de água para suportes sólidos, tais como, filamentos de tungsténio e platina. Porém, a primeira descrição detalhada da sequência da transferência de monocamadas, foi dada anos mais tarde por Katherine Blodgett [4]. A preparação de monocamadas montadas, foram então designadas de filmes de Langmuir-Blodgett (LB). O termo "filme de Langmuir" é normalmente atribuído a uma monocamada flutuante. Depois do trabalho pioneiro feito por Langmuir e Blodgett, levou quase meio século antes de outros cientistas do mundo começarem a perceber as oportunidades desta técnica única. A primeira conferência internacional de filmes LB foi realizada em 1979, e desde então, o uso desta técnica tem vindo a aumentar. Desde algum tempo a esta parte, a produção de filmes orgânicos ultra-finos com a técnica LB, começou lentamente a encontrar possíveis aplicações práticas em muitos campos, tais como, a electrónica e a electrónica molecular [5], a óptica [6] e a biotecnologia [7]. Como exemplos podem referir-se: na química, com o desenvolvimento de sensores [8], e na física, com a utilização de condutores de ondas ópticas [9], utilizados, por exemplo, nas comunicações e computadores. 1.1.2. Tensão superficial Para entendermos o que estamos a medir, e como medir as propriedades de monocamadas (filmes de Langmuir), é útil fazer uma pequena introdução à química das superfícies. As moléculas num líquido têm interacções com as outras moléculas presentes nesse líquido. O grau desta atracção, também chamada coesão, é dependente das propriedades da substância. As interacções de uma molécula no líquido são equilibradas por uma força igualmente atractiva em todas as direcções. As moléculas na superfície do líquido experimentam um desequilíbrio de forças, ou seja, uma molécula na interface ar-água tem uma maior atracção para a fase líquida, do que para o ar ou para a fase gasosa. Consequentemente, haverá uma força de ligação atractiva em relação ao líquido e a interface ar-água minimizará espontaneamente a sua área e o contacto. A tensão superficial é uma medida da energia de coesão presente numa interface (figura 1.1.) [10,11]. Figura 1.1.: Ilustração esquemática da interacção de moléculas numa interface. 3 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário As unidades mais utilizadas para a tensão superficial são dynes/cm ou mN/m, sendo estas unidades equivalentes. Os líquidos polares, como água, têm fortes interacções intermoleculares, e consequentemente, elevadas tensões superficiais. Qualquer factor que diminua a força desta interacção, diminuirá a tensão superficial: são exemplo disso, o aumento na temperatura do sistema, e qualquer contaminação, especialmente através de surfactantes. Assim, é importante haver um grande cuidado em relação à questão da contaminação, sendo a limpeza a palavra-chave em química das superfícies. 1.1.3. Técnica e filmes de Langmuir-Blodgett Monocamadas monomoleculares insolúveis na superfície de um líquido, são designadas de filmes ou monocamadas de Langmuir [1]. Estas são normalmente formadas à superfície da água por moléculas contendo uma “cauda” hidrofóbica e uma “cabeça” hidrofílica (por exemplo, os lípidos). A preparação de filmes de Langmuir pode ser feita de vários modos. Normalmente, a monocamada é formada espalhando as moléculas orgânicas na subfase de água. A solução espalhada é aplicada à superfície da subfase, permitindo que gotas pequenas caiam da seringa. Uma vez evaporado o solvente, o filme monomolecular da espécie anfipática permanece à superfície da subfase, pode ser comprimido e expandido. Quando as primeiras moléculas são espalhadas na água, elas estão muito dispersas, e assim, comportam-se como um gás bidimensional. Isto significa que a área disponível na água para cada molécula é bastante grande e a pressão superficial é baixa. A pressão superficial é normalmente medida usando um prato de Wilhelmy e uma balança de precisão. A pressão superficial pode ser aumentada por meio de uma ou duas barreiras móveis (figura 1.2.). A um certo ponto a pressão superficial começa a subir, mais rapidamente, indicando uma transição para a fase líquida. Quando a barreira é movida até para além da fase sólida, pode-se notar uma subida mais íngreme na pressão superficial. Figura 1.2.: Compressão lateral de um composto com “cabeça” hidrofílica e “cauda” hidrofóbica, formando uma monocamada numa superfície de água [1]. Uma vez depositada a primeira camada, poderão ser depositadas camadas adicionais em cada passagem subsequente do substrato pela interface ar-água. As multicamadas podem ser depositadas para produzir um filme, cuja espessura é o produto do comprimento da cadeia molecular individual e o número de vezes que o substrato atravessou a interface ar-água. 4 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.1.4. Surfactantes e filmes de Langmuir Os agentes superficiais activos (surfactantes ou tensiactivos), são uma classe de moléculas com grande importância tecnológica e uma enorme importância biológica. Geralmente, estas moléculas consistem numa parte hidrofílica (solúvel em água) e uma parte hidrofóbica (insolúvel em água). Esta natureza anfipática de surfactantes é responsável pelo comportamento de associação em solução (micelas, bicamadas, vesículas, etc.) e a sua acumulação nas interfaces (ar-água ou água-solução orgânica). A parte hidrofóbica normalmente consiste numa cadeia de hidrocarbonetos ou fluorocarbonetos, enquanto que a parte hidrofílica consiste num grupo polar (-OH, -COOH, NH3+, -PO4-, -(CH2)2NH3+, etc.) – figura 1.3. Figura 1.3.: Ilustração esquemática que mostra os componentes de um composto anfipático (à esquerda), e a sua orientação adoptada numa interface (à direita) [12]. O comportamento da associação de surfactantes em solução e a sua afinidade para as interfaces é determinado pelas propriedades físico-químicas dos grupos hidrofóbicos e hidrofílicos, respectivamente. O tamanho e a forma da cadeia de hidrocarbonetos, e o tamanho, a carga e a hidratação do grupo hidrofílico, é de extrema importância nesta relação. Os grupos hidrofílicos consistem em grupos, tais como, os ácidos carboxílicos, sulfatos, aminas e álcoois. Estes são atraídos pelas partes polares, tais como, as da água, e as forças que nelas actuam são predominantemente atractivas (1/r²). Os grupos hidrofóbicos (ou oleofílicos), tais como, as cadeia de hidrocarbonetos, gorduras e lipídios são muito menos solúveis em água e as forças que nelas actuam são predominantemente do tipo de Van der Waals (1/r12 e 1/r6). As moléculas anfipáticas “ligam-se” à interface, porque elas possuem dois tipos muito diferentes de ligação dentro da sua estrutura molecular. Dependendo do equilíbrio entre estas propriedades, foram observados uma larga variedade de estruturas auto-montadas nas interfaces e em solução. A força motriz que está por detrás da associação, é a diminuição da energia livre do sistema. Por conseguinte, quando um surfactante entra em contacto com a água, acumula-se na interface ar-água, causando uma diminuição na tensão superfícial da água. Quando os surfactantes, dissolvidos num solvente volátil não-aquoso (clorofórmio ou hexano, que são normalmente os solventes mais usados), são introduzidos sobre uma superfície líquida polar, o solvente evaporará deixando os surfactantes orientados na interface gás-líquido. Os grupos de “cabeça” hidrofílica puxam a molécula para a subfase e os grupos de “cauda” hidrofóbica direccionam-se para o ar. Uma monocamada de superfície só será alcançada se o equilíbrio anfipático da molécula for correcto; ou seja, o equilíbrio entre as partes hidrofóbicas e 5 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário hidrofílicas. Se o grupo de “cauda” hidrofóbica é muito pequeno (não suficientemente hidrofóbico), a molécula será arrastada para a água e dissolver-se-á, enquanto que, se não houver nenhuma parte hidrofílica, as moléculas podem formar filmes de multicamadas mais espessas na superfície, ou até mesmo evaporar. 1.1.5. Monocamadas insolúveis e balança de Langmuir A natureza anfipática dos surfactantes dita a orientação das moléculas na interface (ar-água ou águasolução orgânica), de tal modo que, o grupo de cabeça polar é imergido na água e a longa cadeia de hidrocarbonetos aponta na direcção do ar (figura 1.4.). Ar Água Figura 1.4.: Ilustração esquemática que mostra uma deposição de monocamada na interface ar-água [1]. A cadeia carbonatada da substância usada para estudos de monocamada tem que ser suficientemente longa para ser capaz de formar uma monocamada insolúvel [13]. Como regra, deverão existir mais do que 12 hidrocarbonetos ou outros grupos na cadeia ((CH2)n, n> 12) [14]. Se a cadeia é pequena, embora ainda insolúvel em água, o composto anfipático na superfície da água, tende a formar micelas [1]. Estas micelas são solúveis em água, o que impede a formação de uma monocamada na interface. Por outro lado, se o comprimento da cadeia é muito longo, o composto anfipático tende a cristalizar na superfície da água e, por conseguinte, não forma uma monocamada. É difícil determinar o comprimento óptimo para a cadeia de hidrocarbonetos, porque a sua capacidade de formação do filme também depende da parte polar do composto anfipático. Além disso, o composto anfipático tem que ser solúvel em algum solvente orgânico, muito volátil e insolúvel em água. As monocamadas insolúveis representam meias bicamadas, e consequentemente, são normalmente investigadas como um sistema modelo para entender melhor a estrutura e funcionalidade dos lípidos das biomembranas. Elas são observadas frequentemente com ajuda de uma balança de filme, também chamada balança de Langmuir. A figura 1.5. mostra esquematicamente uma balança de filme de Langmuir. A tina que contém a subfase normalmente é feita de Teflon® para impedir qualquer transbordo da subfase sobre as extremidades. A tina é termostatizada por água circulante em canais colocados debaixo da tina. A área superficial da tina pode ser variada efectuando o varrimento com as barreiras móveis sobre a superfície da tina. A barreira é feita de Delrin®, um material hidrofílico e suficientemente pesado para impedir qualquer transbordo da monocamada para fora da tina. 6 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Balança com prato de Wilhelmy Barreira Barreira Monocamada espalhada sobre a subfase Tina com a subfase Figura 1.5.: Ilustração esquemática de uma balança de filme de Langmuir, com um prato de Wilhelmy, para medir a pressão superficial, e as barreiras para reduzir a área superficial da subfase disponível na tina. A balança de Langmuir permite manipular a área molecular por compressão ou expansão do filme, enquanto se mede a pressão do filme. Quando se comprime o filme, ou seja, diminuindo-se a área por molécula, geralmente a pressão aumenta, enquanto que a tensão superficial diminuí. Isto acontece porque a interface ar-água (com tensão superficial elevada), é convertida numa monocamada superficial hidrofóbica (baixa tensão superficial). A barreira pode mover-se sobre a superfície do líquido que tem uma tensão superficial elevada, originando uma redução da energia e da entalpia livre do sistema. A pressão do filme é definida como a diferença entre as tensões superficiais do solvente puro, γ0, e a tensão superficial da solução, γ: Π = γ0 - γ (1.1.) A pressão superficial e a área molecular são continuamente monitorizadas durante a compressão. A pressão superficial é medida pelo método do prato de Wilhelmy [15]. Este método permite medir a força que actua no menisco da água no perímetro do prato e é proporcional à tensão superficial da subfase, incluindo a monocamada. Neste método é feita a determinação da força exercida, devido à tensão superficial num prato suspenso, de forma a que este seja parcialmente imergido na subfase (figura 1.6.). Esta força é convertida então em tensão superficial com a ajuda das dimensões do prato. A) B) Figura 1.6.: Um prato de Wilhelmy parcialmente imergido numa superfície de água: A) visão frontal; B) visão lateral. [1] 7 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Os efeitos da inclinação do prato de Wilhelmy e a validação das medidas efectuadas foram discutidas por Jordan e Lane [16]. O prato é frequentemente muito fino e feito de platina, também podem ser usados pratos feitos de vidro, quartzo, mica, etc. As forças que actuam no prato são a gravidade, a tensão superficial descendente, e a flutuabilidade (devido ao movimento ascendente da água). Para um prato rectangular de dimensões lp, wp e tp (respectivamente, comprimento, largura e espessura), de densidade, ρp, imergido a uma profundidade hl, num líquido de densidade ρl, a tensão superfícial é dada por: γprato = Força / 2.(largura + espessura) (1.2.) onde, a tensão superficial vem em mN/m, a força em mN e o perímetro em metros. Geralmente por essa razão, a tensão superfícial é determinada por: γ = Força / perímetro (1.3.) A pressão superficial é então determinada medindo as alterações em F (força) por um prato estacionário entre uma superfície limpa e a mesma superfície com a monocamada presente. Se o prato está completamente humedecido pelo líquido (isto é, cos θ = 1, ver figura 1.6.–B) a pressão superficial é obtida então a partir da seguinte equação [17]: Π = -Δγ = -[ΔF / 2(tp+wp)] = - ΔF / 2wp, se wp >> tp (1.4.) A sensibilidade pode, consequentemente, ser aumentada usando um prato mais fino. A força, é deste modo, determinada por medição das alterações na massa do prato que está associado a uma electrobalança sensível. A monocamada também pode ser mantida a uma pressão superficial constante, através de um sistema de controlo de realimentação por computador entre a electrobalança e o motor responsável pelos movimentos da barreira de compressão. Isto é útil quando se produzem filmes LB, ou seja, quando a monocamada é depositada num substrato sólido. 1.1.6. Forças que actuam na superfície da subfase As forças que afectam os grupos de cabeça polar, imergidos na subfase, são electrostáticas e proporcionais 2 a 1/r (em que r é a separação intermolecular), enquanto que as forças entre as cadeias de hidrocarbonetos são devido às interacções de Van der Waals, e proporcionais a 1/r6 e 1/r12. Consequentemente, as interacções na subfase são de mais longo alcance, do que as da superfase [1]. A isotérmica pode, normalmente, ser dividida em três regiões distintas, correspondendo cada uma delas um estado físico de transição de fase (figura 1.7.): 8 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Pressão Superficial (mN/m) Sólido Líquido Gasoso Área Molecular (Å2) Figura 1.7.: Exemplo da isotérmica de um ácido esteárico em água pura e os seus respectivos estados físicos de transição de fase [5]. Depois da deposição inicial sobre a subfase, nenhuma pressão externa é aplicada à monocamada e as moléculas comportam-se como um gás bidimensional, pelo que pode ser descrito por: ΠA = KT (1.5.) onde Π, é a pressão superficial, A, a área molecular, K, a constante de Boltzmann, e T, é a temperatura termodinâmica. Na compressão da monocamada, alguns filmes são reorganizados, e comportam-se, de maneira semelhante ao esperado para um líquido bidimensional. À medida que se comprime, o aumento na pressão causa ordenação adicional, e a monocamada comportase como um estado quasi-sólido. Este estado sólido é caracterizado por uma relação, normalmente, linear entre a pressão superficial e área molecular. Eventualmente a pressão de colapso, Πc, é alcançada quando o filme perde irreparavelmente a sua forma monomolecular. O colapso ocorre quando a compressibilidade da monocamada é superior ao máximo de compressão que a monocamada pode sofrer. Neste tipo de colapso as moléculas da monocamada sobrepõem-se umas às outras, formando-se multicamadas desordenadas (figura 1.8.). 1) 2) 3) 4) Figura 1.8.: Colapso de uma monocamada à medida que é efectuada a compressão. 9 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário As forças aqui exercidas tornam-se muito fortes para o confinamento em duas dimensões, e as moléculas são lançadas para fora do plano da monocamada, ou para a subfase (moléculas mais hidrofílicas), ou para a superfase (moléculas mais hidrofóbicas). Porém, o colapso da monocamada não é uniforme mas é, normalmente, iniciado perto da extremidade da barreira principal ou nas discontinuidades da tina (tais como, os cantos ou o prato de Wilhelmy). Normalmente um filme “colapsado”, consistirá numa grande área de monocamada não colapsada, entrecalada com as monocamadas que foram esmagadas, para formar agregados volumosos. A pressão de colapso pode ser definida como, o valor máximo para o qual uma monocamada pode ser comprimida sem a expulsão detectável de moléculas do filme. Este valor de pressão depende dos detalhes do procedimento experimental usado, ou seja, das substâncias químicas usadas, da temperatura, da velocidade à qual o filme é comprimido e dos procedimentos para os quais o filme foi sujeito. O valor da pressão de colapso para um ácido gordo simples saturado, pode ser de 50 mN/m, que é equivalente a aproximadamente 200 atmosferas, se se fizer uma extrapolação para três dimensões [18]. Quando a monocamada está na fase bidimensional “sólida” ou “líquida condensada”, as moléculas estão relativamente bem orientadas e bastante próximas umas das outras, e a área de pressão molecular zero (A0), pode ser obtida extrapolando o declive da fase “sólida” para a pressão zero – o ponto no qual esta linha cruza o eixo das abcissas, correspondente à área hipotética ocupada por uma molécula na fase condensada a pressão zero. Para um ácido gordo completamente saturado, tal como, o ácido esteárico, a área molecular, determinada por este método, é de 22-25 Å2 [1]. Tal área, corresponde à área de cruzamento seccional de uma cadeia de hidrocarboneto, sugerindo que a compressão da monocamada consiste em cadeias acumuladas fechadas, orientadas verticalmente. Este estudo permite obter informação sobre o modo como as moléculas se acumulam na interface e a estabilidade da camada comprimida a pressões elevadas. O filme que está a ser comprimido pode ser “fortalecido” (nunca indo acima de Πc), depois de se expandir várias vezes. Tal procedimento, permite uma acumulação mais eficiente, e normalmente, é observada um desvio para áreas moleculares mais baixas. Por exemplo, os estudos efectuados com fosfolípidos por Pethica, Mingis e Taylor e os seus colaboradores [19,20,21], sugerem que os filmes de Langmuir podem existir num número diferente de fases líquidas cristalinas na superfície da água, dependendo da temperatura e da pressão do filme. 1.1.7. Isotérmicas: pressão superficial vs. área A representação gráfica da pressão superficial em função da área molecular (figura 1.9.), é normalmente efectuada a temperatura constante, e é designado por isotérmica. Normalmente uma isotérmica é registada comprimindo o filme (reduzindo a área com as barreiras) a uma velocidade constante enquanto se monitoriza continuamente a pressão superficial. A forma da isotérmica é característica das moléculas que compõem o filme. Uma vez formado o filme, podem efectuar-se deposições em substratos sólidos. Uma ou mais monocamadas podem ser transferidas para um substrato imergido na monocamada. A monocamada é mantida uniforme controlando a pressão superficial com as barreiras ao longo do processo. Dependendo do material em estudo, compressões e expansões repetidas podem ser necessárias para alcançar uma reprodutividade. 10 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Na figura 1.9.–A, está representado o esquema de uma isotérmica Π (pressão superficial)–A (área), típica de um ácido gordo (ácido esteárico) com uma única cadeia de hidrocarbonetos (à esquerda) e de um fosfolípido com duas cadeias de hidrocarbonetos (à direita). Na figura 1.9.–C, está ilustrado a orientação das moléculas nas diferentes fases em que as monocamadas se podem encontrar. Colapso Π Sólido Líquido condensado Líquido expandido ΠC A) C) (Å2) Gasoso B) Gasoso A Líquido Sólido Figura 1.9.: A) Esquema de uma isotérmica típica de um ácido gordo (ácido esteárico) e de um fosfolípido (DPPC) [22]. B) Representação de uma isotérmica pressão superficial-área (Π-A), e as diferentes fases dos filmes monomoleculares. Estados físicos em que a monocamada se pode encontrar: G, gasoso; L1, líquido-expandido; L1L2 – líquido condensado-líquido expandido; L2, líquido-condensado; e S, sólido. C) Orientação das moléculas em diferentes fases [1]. A observação da isotérmica mostra várias regiões distintas. Estas regiões são chamadas de fases. Como se pode ver na figura 1.9.–A e B, quando a monocamada está comprimida, esta pode atravessar várias fases diferentes, que são identificadas como discontinuidades na isotérmica. O comportamento da fase de monocamada é principalmente determinado pelas propriedades físico-químicas do composto anfipático, a temperatura da subfase e a composição da subfase. Por exemplo, existem vários estados de monocamadas, dependendo do comprimento da cadeia de hidrocarbonetos e da magnitude de outras forças coesivas e repulsivas que existam entre a cabeça dos grupos hidrofílicos. Um aumento no comprimento da cadeia, aumenta a atracção entre as moléculas, condensando a isotérmica Π-A. Por outro lado, se é usado um composto anfipático ionizável, a ionização das cabeças dos grupos hidrofílicos da cadeia, induzem as forças repulsivas que tendem a opor-se às transições de fase. Uma terminologia simples, usada para classificar as fases de monocamadas de diferentes ácidos gordos, foi proposto por Harkins em 1952 [18]. Na parte mais extensa, as monocamadas existem no estado gasoso (G) – estado onde a compressibilidade é mínima. Na compressão este estado pode sofrer uma transição de fase para o estado líquido-expandido (L1). À medida que compressão decorre, a fase L1 sofre uma transição para o estado líquido- 11 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário condensado (L2), e a densidades mais elevadas, a monocamada finalmente alcança o estado sólido (S). Se a monocamada é comprimida, após se ter alcançado o estado S, ela colapsará em estruturas tridimensionais. O colapso, é geralmente visto, como uma diminuição rápida na pressão superficial ou como uma quebra horizontal na isotérmica, se a monocamada está num estado líquido. Neste caso, observa-se uma rápida e brusca diminuição da pressão superficial à medida que ocorre a compressão. Existem ainda outros pontos críticos numa isotérmica Π-A, tal como, a área molecular, na qual é observado um aumento inicial acentuado na pressão superficial, Ai (pressão superficial à qual a transição de fase ocorre entre o estado L1 e L2 e os estados L2 e S). Seguindo as definições acima descritas, pode ver-se que o ácido gordo da figura 1.9.–A, tem três regiões distintas: gás (G), líquido (L1) e sólido (S), enquanto que o fosfolípido tem uma fase de transição adicional quase horizontal (L2-L1) entre as duas fases líquidas. Este é um caso muito comum para os fosfolípidos, e a posição desta transição de fase horizontal é dependente da temperatura. À medida que a temperatura aumenta, o valor da pressão superficial à qual a transição de fase horizontal ocorre, aumentará e vice-versa [19] (figura 1.10.). Desta forma, a passagem da fase de transição L1 para L2 é fortemente afectada pela temperatura. Temperatura Π A Figura 1.10.: Alterações na forma da isotérmica (Π-A) com o aumento da temperatura [1]. Para além da temperatura, o comportamento da fase da monocamada é também afectado pelo número de átomos de carbono e pelo grau de saturação das cadeias de hidrocarbonetos do grupo apolar de um composto anfipático. Cadeias mais pequenas (contendo 10-14 átomos de carbono) existem apenas no estado L1, enquanto que cadeias mais longas (contendo 18-22 átomos de carbono), existem apenas no estado L2. É ainda de salientar que, os fosfolípidos com cadeias insaturadas existem muitas vezes apenas no estado L1, devido ao aumento da fluidez provocada pela insaturação. 1.1.7.1. Fases dos filmes monomoleculares Filmes monomoleculares mostram fases ordenadas semelhantes a sistemas tridimensionais, com uma diferença específica que surge da sua estrutura molecular típica: eles podem formar uma malha bidimensional pseudo-cristalina (posição ordenada), que é geralmente de alcance limitado, e uma orientação definida das 12 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário moléculas para moléculas vizinhas (ordem orientacional), que é frequentemente de longo alcance. Estas escalas de diferentes ordens conduzem a uma variedade de fases. Estas fases são denominadas mesofases, tal como, para os cristais líquidos, porque elas mostram os mesmos princípios de ordenamento. As fases de uma monocamada nas isotérmicas, pressão-área (figura 1.9.–B), parecem ser bastante diferentes de substâncias para substâncias. Os ácidos gordos, fosfolípidos, etc., em água, mostram frequentemente, as seguintes fases [13,23]: Gasosa (G) A equação que define este estado é dada por: ΠA = kBT. Esta pressão do filme, é porém, normalmente tão B pequena que é quase imperceptível. A área média por molécula na superfície é muito maior que a da molécula. A área total pode ser expandida indefinidamente sem ter havido uma transição de fase. Há uma transição de fase de primeira ordem para o estado líquido, que ocorre quando as monocamadas existentes no estado gasoso sofrem uma compressão. Filmes líquidos (L) Nesta fase há uma interacção lateral significativa entre as moléculas. Existem pelo menos dois tipos de fases líquidas: Líquido expandido (LE ou L1): neste fase as moléculas tocam umas nas outras, mas não há nenhuma ordem lateral. Elas são altamente hidratadas, e a equação de estado é frequentemente do tipo de Van der Waals. Para hidrocarbonetos de cadeia longa com uma cabeça polar (por exemplo, ácidos gordos), esta área é aproximadamente 40-70 Å2 [1]. Líquido condensado (LC ou L2): Depois de passar um patamar em Πc, que indica uma transição de fase de primeira ordem, ocorre uma fase de condensação de um líquido. Aqui, os lípidos exibem uma orientação inclinada com um ângulo decrescente (medido perpendicularmente à subfase). O filme ainda é relativamente rígido, com moléculas de água ainda presentes entre os grupos de cabeça polar. Os gráficos das isotérmicas Π-A são tipicamente lineares. Filmes sólidos (S) Quando a área superficial é reduzida até ao ponto imediatamente antes de se atingir o colapso, a presença de moléculas de água entre os grupos de cabeça polar é mínima. A partir deste ponto (normalmente, para Π entre 50-60 mN/m) os gráficos da isotérmica pressão superficial-área são lineares. A extrapolação para a pressão zero do filme, resulta numa superfície que corresponde à área molecular resultante do cruzamento com o eixo das abcissas (por exemplo, aproximadamente 20.5 Å2 para ácidos gordos com longas cadeias [19]). Neste estado, os filmes sólidos têm uma elevada compressibilidade. 13 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.2. Aplicações de Filmes de Langmuir Uma vez definidos os fundamentos teóricos da técnica de LB, importa também salientar algumas das suas aplicações prácticas. A técnica de LB, por definição, exige que as moléculas anfipáticas sejam adsorvidas na interface de duas fases (líquido-líquido ou gás-líquido). Para as moléculas adsorverem na interface, o “equilíbrio anfipático”, ou seja, o equilíbrio entre os componentes hidrofílicos e hidrofóbicos dentro da mesma molécula, deve ser o adequado para as duas fases em estudo. Por exemplo, o equilíbrio anfipático de uma molécula, pode ser adequado para uma interface ar-água, mas não para uma interface hexano-água. Consequentemente, a correcta escolha dos materiais, é um factor a ter em conta. 1.2.1. Materiais adequados para a técnica de LB Muitos investigadores têm produzido filmes de multicamadas usando a técnica de LB com moléculas que têm apenas um pequeno componente hidrofílico e que flutuam literalmente na superfície da água. Rigorosamente falando, estes não são filmes de LB. Em geral, os materiais como os ácidos gordos e os álcoois de cadeia longa são usados na preparação de filmes. A parte do hidrocarboneto, -CH2- da molécula, é responsável pela repulsão do material em relação à água, enquanto que o grupo polar, -COOH ou –OH, tem afinidade suficiente para a água, “ancorando” a molécula na subfase aquosa. Numa interface ar-água, tais moléculas anfipáticas, orientam-se com a sua cadeia de hidrocarboneto dirigida para o ar, e os grupos de cabeça hidrofílica dirigida para a fase aquosa: Alguns dos materiais mais estudados na formação de monocamadas flutuantes são os ácidos carboxílicos e os seus sais, e os álcoois de cadeias longas. O comprimento da cadeia do hidrocarboneto é crítica e o seu efeito na tensão superficial da subfase é determinada pela regra de Traube, que diz que, para uma determinada série homóloga de compostos anfipáticos, a concentração requerida por um igual abaixamento da tensão superfícial em soluções diluídas, diminui por um factor de cerca de três por cada grupo adicional CH2. 1.2.2. Subfase aquosa A subfase mais usada para o estudo de filmes monomoleculares é água ultra-pura. Normalmente, as medições são efectuadas de forma a excluir qualquer contaminante da subfase, uma vez que, a introdução de iões em água pura pode afectar drasticamente as propriedades da monocamada. A preparação das soluções deve ser feita cuidadosamente, devendo ser usados reagentes de elevada qualidade e água ultra-pura. Além disso, na subfase aquosa existem um número de variáveis, não necessariamente independentes umas das outras. Uma mudança no equilíbrio iónico vai afectar o equilíbrio dentro da subfase. A 14 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário alteração da acidez e a adição de iões divalentes à subfase, permite um grau de controlo considerável sobre o comportamento da monocamada e o sucesso da deposição de multicamadas. 1.2.3. Processo de deposição de filmes LB sobre um substrato (hidrofóbico ou hidrofílico) Dois tipos de superfícies podem formar camadas pela técnica de LB: hidrofóbica (repulsão da água) e hidrofílica (atracção para a água). A deposição sobre uma superfície hidrofóbica assume sempre lugar na parte inferior, enquanto que, para uma superfície hidrofílica, deposita-se sempre pela parte superior. A superfície de um substrato coberta com um filme LB muda de hidrofóbica para hidrofílica com o aumento do número de camadas. Consequentemente, quando uma superfície hidrofóbica é imergida e coberta com uma monocamada, será completamente hidrofílica enquanto é imergida. Desta forma, quando é retirada da subfase e uma segunda camada é depositada, a superfície será novamente hidrofóbica (figura 1.11.). Quando o substrato sólido é hidrofílico (por exemplo, vidro), a primeira camada é depositada elevando o substrato sólido a partir da subfase através da monocamada, enquanto que, se o substrato sólido é hidrofóbico (por exemplo, slide de ouro), a primeira camada é depositada fazendo baixar o substrato na subfase através da monocamada [24]. Sentido da sequência do processo de deposição A) B) C) Figura 1.11.: Esquema da deposição de filmes de Langmuir sobre um substrato hidrofóbico. A superfície imergida do substrato torna-se hidrofílica depois da deposição da primeira camada – A), e fica novamente hidrofóbica, depois da deposição da segunda camada – B) e C). Para se determinar que tipo de superfície temos, basta imergir o substrato na subfase. Se o menisco curvar em baixo, a superfície é hidrofóbica (figura 1.12.–A); se curva em cima, então a superfície é hidrofílica (figura 1.12.–B). 15 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Sentido da sequência do processo de deposição A) B) Figura 1.12.: Esquema representativo do tipo de superfície obtida quando o substrato sólido é imergido na subfase. A) O menisco curva em baixo, a superfície é hidrofóbica. B) O menisco curva em cima, a superfície é hidrofílica. No processo de deposição, a transferência do filme de LB para o substrato resultará da aderência da “cauda” hidrofóbica do hidrocarboneto ao substrato sólido hidrofóbico. Com um substrato hidrofílico, não ocorrerá nenhuma deposição ordenada, porque as “caudas” hidrofóbicas são repelidas pelo substrato hidrofílico à media que este é imergido na água. Por essa razão, um número par de camadas (2, 4, 6...) são sempre depositadas sobre uma superfície hidrofóbica, e um número ímpar (1, 3, 5...) sobre superfícies hidrofílicas. A qualidade superficial e a composição do substrato controlam a natureza da subsequente camada depositada. A deposição da primeira camada também é importante, uma vez que, esta determina a maneira pela qual as camadas subsequentes são colocadas. Para que a qualidade do filme seja consistente, as monocamadas devem ser mantidas a uma pressão constante, mesmo quando a transferência está a ocorrer. Num substrato hidrofílico a primeira monocamada é depositada no primeiro movimento ascendente do substrato sólido (figura 1.13.). Quando se utilizam este tipo de materiais, o substrato deverá ser imergido na subfase antes de iniciar o espalhamento e compressão da monocamada, por forma a impedir a formação de filmes de agregados moleculares depositados sobre a superfície hidrofílica durante o primeiro movimento. Figura 1.13.: Humedecimento e deposição da primeira monocamada sobre um substrato hidrofílico. 16 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.2.4. Tipos de deposição de filmes de LB Existem uma grande variedade de formas que permitem a transferência de monocamadas de filmes de LB para um substrato sólido. As interacções moleculares envolvidas na deposição da primeira camada podem ser bastante diferentes daquelas que são responsáveis pela transferência das camadas subsequentes. Por exemplo, pode ocorrer uma reacção química entre a monocamada e o substrato [25], resultando numa forte ligação da primeira camada. Para alguns materiais, a deposição de filmes parece também estar associada com uma mudança de fase distinta: de uma fase líquida bidimensional cristalina na superfície da água, para uma forma sólida cristalina compactada no substrato [26]. Na figura 1.14., é representado um diagrama esquemático que ilustra o processo de deposição de filmes LB num substrato sólido. Linha de contacto de três fases Camada aquosa intrínseca Subfase aquosa Substracto sólido Monocamada na superfície líquida A) Substracto sólido cabeça - cauda cauda - cauda cauda - cabeça cabeça - cabeça B) tipo-X numa superfície hidrofóbica tipo-Y numa superfície hidrofílica tipo-Z numa superfície hidrofílica Figura 1.14.: A) Deposição de uma monocamada flutuante num substrato sólido. B) Diferentes tipos de deposição de filmes LB num substrato sólido: tipo-X, tipo-Y e tipo-Z. A deposição LB é feita tradicionalmente na fase “sólida”. A pressão superficial, é então, bastante elevada para assegurar a coesão suficiente na monocamada, por exemplo, a atracção entre as moléculas na monocamada é bastante elevada de forma a que, a monocamada não se quebre durante a transferência para o substrato sólido. O valor da pressão superficial que dá o melhor resultado, depende da natureza da monocamada, e são normalmente estabelecidas empiricamente. Porém, raramente podem ser depositados com sucesso compostos anfipáticos a pressões superficiais inferiores a 10 mN/m, e a pressões superficiais superiores a 40 mN/m, pois as estas pressões o colapso e a rigidez dos filmes causam problemas, impedindo a deposição. Há vários parâmetros que afectam a produção dos tipos de filmes LB. Os mais importantes são: (i) a natureza da dispersão do filme sobre a subfase; (ii) a composição da subfase e a temperatura; (iii) a pressão 17 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário superficial durante a deposição e a velocidade de deposição; (iv) o tipo e natureza do substrato sólido; (v) e o tempo que o substrato sólido é armazenado ao ar ou na subfase entre os ciclos da deposição. A quantidade e a qualidade da monocamada depositada num substrato sólido são medidas por uma velocidade de transferência, τ. Esta é definida como a razão entre a diminuição da área ocupada pela monocamada na superfície aquosa durante uma deposição (a uma pressão constante), AL, e a área coberta do substrato sólido, AS [27]: τ = AL/AS (1.6.) Idealmente, cada vez que o substrato cruza a interface ar-água, a superfície do substrato é completamente coberta por uma monocamada, originando uma τ de 100%. Dependendo do comportamento da molécula, os substratos sólidos podem ser imergidos através do filme, até serem alcançadas as espessuras desejadas do filme. Diferentes tipos de multicamadas LB podem ser produzidas e/ou obtidas por sucessiva deposição de monocamadas no mesmo substrato (figura 1.14.). O mais comum é a multicamada do tipo-Y, que é produzida quando a monocamada é deposita no substrato sólido em ambas direcções. Quando a monocamada só deposita numa das direcções, cima ou baixo, a estrutura da multicamada é chamada do tipo-Z ou do tipo-X, respectivamente. Por vezes são observadas estruturas intermédias para algumas multicamadas LB, e são referidas frequentemente, como sendo multicamadas do tipo-XY, designadas camadas alternadas. A produção de tais camadas, que consistem em dois tipos diferentes de compostos anfipáticos, é também possível usando instrumentos altamente sofisticados. Nestes instrumentos, existe uma tina com dois compartimentos separados, ambos possuindo uma monocamada flutuante de um composto anfipático diferente. Estas monocamadas podem depois ser alternadamente depositadas num substrato sólido. Um modo alternativo para depositar a monocamada é a técnica de Langmuir-Schaeffer (LS). Esta técnica difere da técnica vertical descrita anteriormente, apenas no que diz respeito ao facto do substrato sólido ser mergulhado horizontalmente em contacto com a monocamada. Honig et al. [28] sugeriram o uso de outro parâmetro, φ, para ajudar a quantificar os vários modos de deposição. Este pode ser calculado da seguinte forma: φ = τA/τD (1.7.) onde, τA e τD são as velocidades de deposição da passagem ascendente e descendente, respectivamente. Consequentemente, para uma deposição do tipo-Y, φ = 1; para a deposição do tipo-X, φ = 0; e para a deposição tipoZ, φ é infinito. As monocamadas dos ácidos gordos depositam normalmente como camadas do tipo-Y [1]. Contudo, a deposição do tipo-X é possível com mudanças ligeiras nas condições de deposição; a deposição do tipo-X é normalmente favorecida para valores de pH elevados [29]. No primeiro ciclo da deposição não é usual haver formação de filmes do tipo-X, mas o caracter do filme torna-se do tipo-X à medida que a deposição prossegue [28,29]. Por exemplo, para os fosfolípidos a deposição observada foi do tipo-X [30]. 18 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.3. Métodos Voltamétricos De entre os vários métodos disponíveis para estudar os processos de eléctrodo, os métodos de varrimento de potencial são provavelmente os mais usados [31]. Estes métodos consistem na aplicação de um potencial que é variado continuamente com o tempo, o que conduz à ocorrência de reacções de oxidação ou de redução de espécies electroactivas presentes na solução (reacções faradaicas), possivelmente devido à adsorção de espécies, e a uma corrente capacitiva devida à carga de dupla camada. A técnica de varrimento de potencial é normalmente usada em eléctrodos estacionários, mas também pode ser usada em eléctrodos hidrodinâmicos. A voltametria é quantitativamente importante no estudo de interfaces moleculares, no diagnostico de mecanismos de reacções electroquímicas, na identificação de espécies presentes em solução e para a análise de velocidades de reacções [32]. Uma das formas de perturbação do potencial frequentemente usada em electroquímica, é a voltametria cíclica de varrimento linear. 1.3.1. Voltametria Cíclica A voltametria cíclica é das técnicas electroquímicas mais usada no estudo de espécies electroactivas. Embora possa ser aplicada com fins quantitativos é mais utilizada como técnica de diagnóstico. A vantagem em relação às outras técnicas, consiste em se poder aplicar diferentes escalas de tempo, isto é, diferentes velocidades de varrimento, permitindo o estudo de fenómenos com velocidades lentas e rápidas. A gama de potencial é varrida numa direcção, começando no potencial inicial até ao potencial final, sendo a direcção do potencial invertida no final do primeiro varrimento. Assim, a onda tem, normalmente, a forma de um triângulo isósceles, tal como é mostrado na figura 1.15.–A, ou seja, o potencial aumenta linearmente até um valor limite e diminui até ao seu valor inicial, com a mesma velocidade. Desta forma, o produto da reacção da transferência electrónica que eventualmente ocorra no varrimento directo, pode ser analisado novamente no varrimento inverso (figura 1.15.–B). O ciclo pode ser repetido várias vezes [32]. Para se obter o voltamograma cíclico regista-se o gráfico intensidade de corrente em função do potencial aplicado. Esta técnica, é uma ferramenta importante para: (i) a determinação formal de potenciais redox; (ii) detecção de reacções químicas que precedem ou seguem a reacção electroquímica; (iii) e evolução cinética das reacções que envolvem transferências electrónicas. Atendendo à representação da figura 1.15., tem-se que, no começo da experiência, a solução contém apenas a forma reduzida do par redox (R), por isso, a potenciais mais baixos que o potencial redox, que é o potencial inicial, não há nenhuma conversão do R em O (forma oxidada) – ponto A. À medida que o potencial redox é alcançado, há uma corrente anódica líquida que aumenta exponencialmente com o potencial. Como R é convertido em O, os gradientes de concentração são fixos acima de R e O, e a difusão acorre abaixo destes gradientes de concentração. No pico anódico (ponto B), o potencial redox é suficientemente positivo, que qualquer R que alcance a superfície do eléctrodo é oxidado instantaneamente a O. Consequentemente, a corrente depende agora da velocidade de transferência de massa à superfície do eléctrodo. No varrimento inverso (ponto C), a corrente continua a decair até o potencial se aproximar do potencial redox. Neste momento, ocorre uma redução de O para R, que causa uma corrente catódica, que eventualmente produz uma resposta em forma de pico (ponto D). 19 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Potencial / mV A) B) Figura 1.15.: A) Exemplo de um varrimento de potencial, utilizando a voltametria cíclica. B) A forma da resposta da corrente para uma experiência de voltametria cíclica [33]. Em voltametria cíclica, quando ocorre transferência de um ião através da interface, observa-se um aumento de corrente no voltamograma, no potencial de transferência do ião. Este aumento de corrente resulta do maior fluxo de iões através da interface a partir do potencial característico do ião. No entanto, à medida que a transferência ocorre, a concentração do ião na vizinhança da interface diminui e os iões têm que percorrer uma distância maior, do seio da solução até à interface, resultando numa diminuição da intensidade de corrente com a diminuição do potencial e uma resposta em forma de pico. 1.4. As ITIES, a dupla camada eléctrica e a microinterface. A electroquímica nas interfaces líquido-líquido Tal como no caso do estudo de interfaces moleculares utilizando a técnica de LB, a electroquímica das interfaces moleculares também tem sido objecto de grande interesse nos últimos anos. São exemplos destes avanços a aplicação de métodos de dinâmica molecular no estudo de estruturas interfaciais, avanços na teoria da transferência electrónica e iónica através de um meio heterogéneo, entre outros. As propriedades electroquímicas das interfaces menos usuais, como emulsões e suspensões coloidais, despertaram grande interesse na última década. Recentemente de especial interesse, são os estudos de dupla camada na interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES), microinterfaces líquido-líquido e microinterfaces gel-líquido. 20 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.4.1. Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES) Quando duas fases electricamente condutoras (α e β) são colocadas em contacto, ocorre o transporte de partição de carga (isto é, electrões e/ou iões) entre as duas fases adjacentes, por causa da diferença na energia das espécies transportadoras em ambas as fases. Este comportamento espontâneo gera uma região interfacial onde é estabelecida uma diferença de potencial eléctrica Galvânica ( Δ β φ ): α Δαβ φ = φα – φβ (1.8.) onde, φ representa o potencial Galvânico (ou interno) das respectivas fases. O equilíbrio termodinâmico é alcançado quando a energia molar de Gibbs para a espécie i é igual em ambas as fases. Em termos de potenciais electroquímicos, aplica-se a seguinte equação: ~α = μ ~β μ 0 0 (1.9.) ~ , que representa o trabalho requerido para transferir o ião i do vazio para O potencial electroquímico, μ 0 uma fase α, pode ser dividido numa parte química e eléctrica: ~ α = μ α + z Fφ α μ 0 0 i (1.10.) onde, zi é a carga do ião, F é a constante de Faraday, e μ0α é o potencial químico da espécie i na fase α, e é definido da seguinte forma: μ0α = μ0org,α + RTln a0α (1.11.) com, μ0org,aq correspondendo ao potencial químico padrão (os expoentes aq e org representam a fase aquosa e orgânica, respectivamente), e a0α correspondendo à actividade do ião na fase α. R e T, são a constante para os gases ideais e a temperatura, respectivamente. As ITIES são formadas quando uma solução aquosa contendo um electrólito hidrofílico (por exemplo, cloreto de lítio, LiCl) e uma solução orgânica contendo o electrólito hidrofóbico (por exemplo, tetrafenilborato de tetraoctilamónio, TOATPB) são colocados em contacto. A região interfacial entre duas fases imiscíveis, onde espécies carregadas e dipolos orientados coexistem, é chamada a dupla camada eléctrica [34]. Koryta et al. [35] reconheceram que a interface entre uma solução aquosa e uma solução orgânica (líquido-líquido) pode ser usada como um modelo simplificado para uma membrana biológica. Estes autores começaram também a usar para a interface líquido-líquido (L-L) a designação de ITIES (interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis). O seu objectivo inicial era o de estabelecer métodos experimentais na interface de L-L de forma a melhorar o conhecimento sobre as membranas biológicas. Segundo Vanýsek [34], uma das propriedades da interface L-L é a sua vasta aplicação em electroanálise. 21 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Assim, no caso da interface metal-líquido, a resposta eléctrica observada resultante de um estímulo eléctrico aplicado, é devido principalmente à oxidação ou redução da mesma espécie na interface. No caso da interface L-L, a mudança observada na resposta (a corrente ou o potencial), à perturbação do estímulo eléctrico (potencial ou corrente), é o resultado da passagem (transporte) de iões através da interface. É importante salientar que, o transporte de carga, quer os processos de oxidação-redução na interface levam a um aumento da corrente do circuito eléctrico, e porque, geralmente, o processo limitante pode ser qualquer dos casos, a difusão observada será uma resposta idêntica qualquer que seja o tipo de interface utilizada, podendo os conhecimentos que se detêm sobre as interfaces eléctrodo-solução ser transpostos para as interfaces L-L. As ITIES, podem ainda ser utilizadas no estudo da formação de uma monocamada de fosfolípidos, resultante da sua adsorção na interface, podendo servir como um modelo simples de uma membrana biológica. As suas aplicações incluem ainda a catálise heterogénea e nanopartículas metálicas adsorvidas na interface como centros catalíticos, extracção de solvente, farmacocinética e conversão de energia solar que envolve transferência electrónica foto-excitada [34]. 1.4.2. Interfaces líquido-líquido idealmente polarizáveis Interfaces electrificadas são as que contêm espécies carregadas livres entre as fases que estão habitualmente acumuladas nas regiões superficiais dando, como tal, origem a um conjunto de cargas em cada fase [34]. Quando as espécies carregadas estão presentes nas duas fases, deve verificar-se a electroneutralidade. Contudo, estas espécies carregadas podem, ou não, atravessar a interface. Desta forma, existem dois tipos de interface conhecidos: polarizadas e não-polarizadas. As interfaces idealmente não-polarizadas são aquelas em que a troca de espécies carregadas comuns entre as fases é permitida, enquanto que nas interfaces idealmente polarizadas a troca é impedida, ou não há espécies comuns nas duas fases. Por exemplo, se uma fase orgânica contém um electrólito altamente hidrofóbico B1A1 ou B1+ e A1-, e uma B fase aquosa contém um electrólito altamente hidrofílico B2A2 ou B2+ e A2-, a interface pode ser estudada usando a seguinte célula electroquímica [36]: R1| B1+, A1- (org)| B2+, A2- (aq)| R2 (1.12.) onde, Bi+ e Ai- (i = 1,2) representam o catião e o anião, respectivamente, e Ri (i = 1,2) o eléctrodo de referência. B O campo eléctrico aplicado à interface água-solução orgânica, é efectuado através dos dois eléctrodos de trabalho com uma fonte eléctrica externa. O potencial da célula, E, é definido como o potencial terminal do eléctrodo de referência da direita, em relação ao potencial terminal da esquerda, e está relacionado com a diferença de potencial através da interface [36]: Δφ = Δwo φ = φw- φo e E = Δφ + ΔEref (1.13.) onde, φo é o potencial Galvânico da fase α, e ΔEref depende da composição dos dois eléctrodos de referência. Consequentemente, na interface idealmente polarizável (figura 1.16.), os electrólitos não se distribuem entre os dois solventes ou distribuem-se em pequena extensão, existindo principalmente na fase onde foram 22 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário inicialmente dissolvidos [37]. Figura 1.16.: Ilustração da camada mista numa interface água/o-NPOE (éter o-nitrofeniloctílico) idealmente polarizável. 1.4.3. Dupla camada eléctrica numa interface líquido-líquido A dupla camada eléctrica existe, quando entre duas fases separadas, pelo menos, uma delas é um condutor iónico ou electrónico. aq Nestas condições, Δ org φ (equação 1.13.) é controlado pela carga eléctrica na região interfacial que pode ser fornecida por uma fonte externa. Esta situação é semelhante a um eléctrodo sólido idealmente polarizado, tal como é mostrado na figura 1.17. Em ambos os casos, as duas fases são caracterizadas por um excesso de carga na interface. Porém, para eléctrodos sólidos (figura 1.17.–B), o excesso de carga no lado metálico origina um processo puramente electrónico e é distribuído à superfície do metal (ou seja, no plano). No lado do electrólito, o excesso de carga resulta da acumulação de iões de carga oposta relativamente à do metal e é distribuído dentro de uma espessura finita, chamada camada difusa. A queda de potencial é localizada nesta camada. Por outro lado, no caso de uma interface líquida, (figura 1.17.–A), a polarização é um fenómeno puramente iónico, desde que ambas as regiões de excesso de carga envolvam iões. Neste caso, a queda de potencial poderá ser descrita em termos de duas camadas difusas. 23 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA d.c. d.c. Relatório de Seminário d.c. Figura 1.17.: Representação esquemática da carga de uma interface líquido-líquido idealmente polarizável por uma fonte externa e correspondente evolução da queda de potencial como uma função da distância para a interface: A) Caso de uma interface líquido-líquido; B) Caso de uma interface metal-líquido. Nota: d.c. representa a dupla camada. [36] Girault e Schiffrin [38,39] sugeriram ainda que, a região interfacial consistiria numa região de mistura de solventes onde haveria uma gradual modificação das propriedades, particularmente da concentração de iões em ambas as fases, e que separava duas camadas difusas (figuras 1.16. e 1.17.–A). Esta modificação considerava a penetração de iões em ambas as fases adjacentes na interface. 1.4.4. Janela de potencial Numa interface idealmente polarizável não ocorre nenhum processo faradaico, desde que todos os componentes do sistema sejam considerados como tendo uma energia de transferência padrão de Gibbs infinita [36]. Desde que, as espécies iónicas tenham solubilidade finita em qualquer fase do electrólito, a interface líquido-líquido idealmente polarizável pode ser definida numa gama de potencial limitado. A esta gama dá-se o nome de “intervalo de polarização” (figura 1.18.), e a diferença de potencial Galvânica pode ser controlada potenciostaticamente. 24 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1 2 1 2 Δ aqorg φ 1 2 1 2 1 2 Figura 1.18.: Representação esquemática do processo interfacial dentro da janela de potencial: interface entre a fase aquosa (1) e a fase orgânica (2). [36] Como os electrólitos não existem apenas na fase onde foram dissolvidos, existe um intervalo de polarizabilidade, sendo esse intervalo dependente da composição de ambas as fases. Assim, se na fase aquosa existir um sal do tipo A1- B1+ (hidrofílico) e na fase orgânica um sal do tipo A2B2+ (hidrofóbico), a transferência do ião B1+ da fase aquosa para a fase orgânica ocorrerá a potenciais positivos, tal B como a transferência do ião A2- da fase orgânica para a fase aquosa, dependendo do valor da energia de Gibbs de cada espécie. De igual modo, a transferência do ião A1- da fase aquosa para a fase orgânica ocorrerá a potenciais mais negativos, tal como a transferência do ião B2+ da fase orgânica para a fase aquosa. A diferença de potenciais de transferência destes iões constitui um intervalo, no qual, a interface se comporta como idealmente polarizável. Consequentemente, torna-se possível a determinação voltamétrica, fazendo uso das ITIES, das espécies cujos potenciais de transferência estejam compreendidos entre os potenciais de transferência dos iões que constituem os electrólitos de suporte, isto é, cujos potenciais de transferência se situem no intervalo de polarização ou "janela de potencial" (figura 1.18.). Esta janela pode ser expandida usando electrólitos de suporte mais hidrofóbicos e hidrofílicos na fase orgânica e na fase aquosa, respectivamente, desde que este tipo de sais necessite de uma elevada energia para transferir para a fase adjacente [36]. Neste trabalho foi utilizado o TOATPB como electrólito de suporte na fase orgânica e NaCl na fase aquosa. A voltametria cíclica pode ser utilizada como técnica de diagnóstico quando se pretende verificar se a interface se comporta como idealmente polarizada ou se ocorre transferência iónica. Um voltamograma cíclico típico de uma situação em que os únicos iões presentes são os do electrólito de suporte encontram-se representado na figura 1.19. 25 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 60 40 I / μA 20 0 -20 -40 I II III -60 -700 -600 -500 -400 -300 -200 -100 E / mV Figura 1.19.: Voltamograma cíclico demonstrando as três zonas distintas que o constituem usando a seguinte célula electroquímica: AglAgCl | LiCl 100 mM(aq) || TOATPB 10 mM(1,2-DCE) | NaTPB, NaCl 10 mM(aq) | AgCl|Ag. Neste caso, a diferença de potencial medida corresponde à diferença entre o potencial da fase aquosa e o potencial da fase orgânica. Assim, a variação de intensidade de corrente nos potenciais mais positivos deve-se à transferência do catião lítio da fase aquosa para a fase orgânica, ou do anião tetrafenilborato da fase orgânica para a fase aquosa. Nos potenciais mais negativos a variação da intensidade de corrente deve-se à transferência do anião cloreto da fase aquosa para a fase orgânica, ou do catião tetraoctilamónio da fase orgânica para a fase aquosa. Os estudos voltamétricos nas ITIES estão limitadas à zona II, isto porque, se pode considerar como tendo um comportamento idealmente polarizável. As zonas I e III comportam-se como interfaces não-polarizáveis. O aumento brusco da intensidade de corrente nas zonas I e III, deve-se à transferência de um ião ou iões do electrólito de suporte. Enquanto que a intensidade de corrente na zona II deve-se a uma corrente residual. 1.4.5. Transferência Iónica A forma do sinal que se obtém no voltamograma cíclico devido à transferência de um ião depende do tipo de difusão que as espécies sofrem até à interface [40]. Podem ser observados dois tipos de difusão: a difusão planar, ou seja, a difusão que é unidireccional e perpendicular a um dado plano, designada de difusão linear; e a difusão que se distribui em todas as direcções, designa-se por difusão esférica [41]. A difusão linear verifica-se, geralmente, nas macro-ITIES, enquanto que, a difusão esférica pode ocorrer quando a interface apresenta uma área reduzida, como é o caso das micro-ITIES [42,43]. A voltametria cíclica tem uma aplicação importante, que consiste na determinação dos coeficientes de difusão e dos potenciais de meia onda das espécies iónicas, e consequente, a determinação da energia de Gibbs para 26 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário essas espécies [44]. Nas interfaces líquido-líquido, são ainda possíveis três tipos de transferência de carga: transferência iónica (TI), transferência iónica facilitada (TIF) e transferência electrónica (TE). Se existir um ião semi-hidrofóbico em qualquer uma das fases, transferirá dentro da janela de potencial e ocorrerá um fluxo da corrente faradaica. Contudo, estes processos de transferência não serão aqui discutidos. A redistribuição iónica gerará uma resposta de corrente. Efectivamente, para restabelecer a electroneutralidade de cada fase, ocorrerão reacções redox nos contra-eléctrodos (eléctrodos associados ao eléctrodo de trabalho, que conduzem a corrente eléctrica através da solução) presentes nas soluções aquosa e orgânica. Por convenção, a corrente é positiva para a passagem de uma carga positiva da fase aquosa para a fase orgânica. A onda voltamétrica obtida para uma transferência catiónica reversível é esquematicamente mostrada na figura 1.20. Δaqorg φ eq 1 2 1 Δaqorg φ 2 Figura 1.20.: Representação do estado estacionário da evolução da corrente para a transferência catiónica ou aniónica entre a fase aquosa (1) e a fase orgânica (2). Existem várias formas de definir a escala de potencial. Entre elas pode referir-se a definição de escala de potencial proposta por Girault e Schiffrin [45] usando o potencial de carga zero (pcz) como o ponto zero. O pcz é uma quantidade prontamente acessível que pode ser medida usando um eléctrodo de electrólito de corrente [46,47] ou por representação gráfica das curvas de electrocapilaridade. 1.4.6. Transporte de massa nas ITIES: migração, convecção e difusão Nas ITIES, tal como para as interfaces metal-líquido, podem ocorrer três tipos de transporte de massa: (i) migração, (ii) convecção e (iii) difusão. Desta forma, o transporte de massa de uma espécie (i) é totalmente descrito pela equação de Nernst-Planck [33]: Ji = Ji,m + Ji,c + Ji,d (1.14) onde, o fluxo de i é igual à soma do fluxo de migração (Ji,m), do fluxo de convecção (Ji,c) e do fluxo de difusão (Ji,d). A migração corresponde ao deslocamento das partículas carregadas por aplicação de um potencial eléctrico φ. O fluxo resultante das espécies é dado por: 27 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Ji,m = – (ziF/RT)Dici (grad φ) Relatório de Seminário (1.15.) onde, zi, Di e ci são a carga, o coeficiente de difusão e a concentração do ião, respectivamente. A migração é o principal mecanismo que permite a passagem de carga através da solução quando uma corrente é aplicada. Porém, desde que a carga possa ser transportada por qualquer espécie iónica, uma concentração elevada do electrólito de suporte, originará um aumenta significativo na condutividade da solução, de tal modo que apenas uma quantidade desprezável de espécies electroactivas são transportadas por migração. Consequentemente, o termo Ji,m pode ser desprezado da equação 1.14., quando as espécies i estão na presença de sais concentrados do electrólito de suporte. A convecção é o movimento das espécie induzidas pelo movimento do meio no qual a espécie está presente. Este movimento pode ser resultado de flutuações da temperatura ou da agitação mecânica. O fluxo de convecção é escrito da seguinte forma: Ji,c = civ (1.16.) onde, v é a velocidade hidrodinâmica da solução e c, é a concentração da solução. Na maioria das experiências de soluções líquido-líquido, as soluções não são agitadas e os eléctrodos são estáticos (sem rotação, nem vibração), por isso, o sistema não sofre nenhuma convecção forçada. A temperatura também é constante na escala do tempo das experiências. Desde que, a convecção forçada e natural sejam eliminadas, o termo de convecção na equação 1.14. pode ser desprezado. Finalmente, a difusão é o movimento da espécie devido a um gradiente de potencial químico onde as espécies provocaram o abaixamento desse gradiente para alcançar a homogeneidade ao longo da solução. O fluxo de difusão para uma espécie dissolvida i é determinado por: Ji,d = –Di(grad φ) (1.17.) Sendo o transporte de migração e convecção desprezáveis na maioria das experiências nas ITIES, o movimento das espécies electroactivas é limitado pela difusão, de modo que, a equação de fluxo, (equação 1.14.) reduz-se somente à primeira lei de Fick expressa pela equação 1.17. A corrente, que está directamente relacionada com fluxo Ji, é consequentemente, originada pela chegada e remoção de espécies electroactivas difundidas até à interface. Nas ITIES a relação entre a intensidade de corrente de transferência e a concentração iónica apresenta uma forma idêntica à das reacções redox [48]. A expressão da equação 1.18. permite quantificar a intensidade de corrente para uma transferência iónica, quando a transferência ocorre por difusão num microeléctrodo [49], e é dada por: Id = 4.zi.F.Di.a.Ci (1.18.) onde, Id, zi, F, Di, a e Ci, são a intensidade de corrente de difusão, a carga do ião, a constante de Faraday (~96484 C.mol-1), o coeficiente de difusão do ião, a área da interface e a concentração da espécie i em solução, respectivamente. Uma outra expressão que pode ser utilizada para quantificar a intensidade de corrente para uma 28 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário transferência iónica reversível, quando a transferência ocorre por difusão é dada pela equação de Randles-Sevcik [33]: Id = 0,4463.zi.F.a.Ci.(zi.F/RT)1/2.(Di)1/2.ν1/2 (1.19.) onde, os símbolos têm o mesmo significado que anteriormente, e ν é a velocidade de varrimento. No entanto esta relação só é válida para processos reversíveis, isto é, a transferência que satisfaçam as seguintes condições: 1. os potenciais de transferência são independentes da velocidade de varrimento; 2. a diferença entre os potenciais de pico de transferência é igual a 59/z mV a 25 ºC; 3. a relação da intensidade de corrente de pico com a raiz quadrada da velocidade de varrimento tem que passar pela origem. 1.5. Espectroscopia de impedância electroquímica (EIE) A impedância electroquímica ou espectroscopia de impedância, é uma técnica utilizada no estudo e caracterização de sistemas electroquímicos, principalmente por ser uma técnica não destrutiva [50]. Esta técnica é muito utilizada em estudos da dupla camada eléctrica e no estudo de membranas biológicas [36], entre muitas outras aplicações. 1.5.1. A impedância nas interfaces líquido-líquido Esta técnica consiste na aplicação, ao sistema em estudo, de uma perturbação sinusoidal de pequena amplitude e na medição da resposta do sistema à perturbação, quando este se encontra em estado estacionário. No estudo de estímulos sinusoidais, a propriedade do sistema que resulta da relação entre a intensidade de corrente e o potencial aplicado é denominada a impedância, podendo ser definida como: Z = dE / dI (1.20.) A impedância pode ser representada de duas formas: a) uma escalar, usando os números complexos, onde a impedância é definida como: Z = Z’−iZ’’ (1.21.) onde, Z’ e Z’’, são respectivamente as componentes real e imaginária da impedância. 29 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A grandeza da impedância pode ser calculada pela seguinte equação: |Z| = [(Z’)2 + (-iZ’’)2]1/2 (1.22.) b) também pode ser representada de forma vectorial, utilizando um sistema de eixos cartesianos. Na figura 1.21. pode observar-se uma representação esquemática do vector impedância. Figura 1.21.: Representação vectorial da impedância. É possível decompor a impedância nos seus componentes, projectando o vector sobre cada um dos eixos. A projecção sobre o eixo das ordenadas, corresponde à componente imaginária da impedância, Z’’, e a projecção efectuada sobre as abcissas corresponde à parte real da impedância, Z’: Z’ = |Z| cosφ e Z’’ = |Z| senφ (1.23.) O valor de φ pode ser calculado aplicando a seguinte expressão: φ = arctg(Z’’/Z’) (1.24.) Utilizando um circuito eléctrico equivalente, pode efectuar-se o ajuste dos resultados experimentais e a sua respectiva interpretação. Na figura 1.22., encontra-se representado o circuito de Randles [51], que representa o equivalente eléctrico de um processo de transferência de carga reversível. Figura 1.22.: Circuito equivalente de Randles: Rs representa a resistência da solução, Cdc, a capacidade da dupla camada, Rtc a resistência de transferência de carga (associado à cinética do processo de transferência electrónica ou iónica) e W a impedância de Warburg. [50] 30 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A impedância de um sistema é o resultado da adição (vectorial) da impedância de cada um dos componentes que fazem parte do sistema. Na figura 1.22. encontram-se os componentes que normalmente são utilizados para a simulação de resultados de impedância dos processos que ocorrem em sistemas líquido-líquido. A impedância associada a uma resistência, ZR, é definida por: ZR = R (1.25.) Ainda no circuito da figura 1.22., W representa a impedância de Warburg que está relacionada com os processos de transporte de carga controlados por difusão. A sua expressão analítica é complexa, mas normalmente utiliza-se na sua forma simplificada [52]: ZW = (1 – i)(σ/ω1/2) (1.26.) onde ω, representa a frequência angular, e σ, o coeficiente de difusão de Warburg. O valor de σ, para a transferência iónica através das ITIES, é o resultado da soma dos coeficientes de Warburg, da espécie que se transfere, na fase aquosa, σaq, e na fase orgânica, σo. A resistência de transferência de carga, Rtc, e a impedância de Warburg, ZW, estão associadas em série porque os processos ocorrem em sequência, o primeiro referente à transferência de carga através da interface e o segundo ao transporte de massa das espécies electroactivas do seio da solução até à interface. A capacidade da interface, Cd, que se encontra em paralelo com os dois componentes anteriores, representa a distribuição de carga na dupla camada eléctrica. A sua impedância é definida do seguinte modo: ZC = (−i/Cω) (1.27.) A impedância total é calculada de acordo com as leis dos circuitos eléctricos. Quando as impedâncias Z1 e Z2 se encontram em série, a impedância total, Zt, é igual a: Zt = Z1 + Z2 (1.28.) Se os componentes se encontram em paralelo, Zt é calculada por: Zt = (Z1Z2) / (Z1 +Z2) (1.29.) Na figura 1.23. está representado um espectro de impedâncias, ou representação de Nyquist (também designado por diagrama de Argand). Os resultados foram obtidos a partir de uma simulação efectuada utilizando o circuito equivalente de Randles da figura 1.22. 31 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Z'' / Ω 2000 1000 0.1 Hz 10 KHz 0 0 1000 2000 3000 4000 5000 Z' / Ω Figura 1.23.: Espectro de impedâncias calculado a partir do circuito de Randles, usando os seguintes valores para os diferentes componentes: Rs = 1000 Ω; Rtc = 1500 Ω; σ = 1000 ΩS-1/2; Cd = 1 μF. A simulação foi efectuada utilizando o programa “ZSimpWin” para o Windows. Pereira [38], salienta que utilizando estes modelos, é possível efectuar a determinação dos diferentes parâmetros sem erros exagerados. Contudo, quando se pretendem ajustar resultados experimentais, a existência de erros associados à medição, mesmo que aleatórios ou devido ao simples ruído eléctrico, torna a tarefa de ajuste, em alguns casos, praticamente impossível. Alguns trabalhos [53,54,55] demostraram a importância da utilização de métodos de ajuste não-linear para minimizar os erros introduzidos na determinação dos parâmetros dos circuitos equivalentes, e ainda a introdução de procedimentos para a validação dos resultados experimentais [56]. Para encontrar-mos o melhor circuito equivalente a utilizar, devemos ter em conta algumas regras: (1) o circuito deve ser análogo às propriedades físico/geométricas do sistema (ou seja, deve ser possível explicar o significado de cada componente do circuito em termos de um modelo físico da interface); (2) Os elementos individuais do circuito devem depender de variáveis experimentais, de formas razoáveis e relacionáveis; (3) o mesmo circuito equivalente deve permitir, tanto quanto possível, relacionar as mudanças dos valores do elemento com as mudanças da resposta electroquímica. 1.5.2. Dupla camada eléctrica A capacidade de dupla camada consiste na combinação da capacidade da camada compacta em série com a camada de difusão. A camada de difusão é dependente da quantidade de soluto, e altera drasticamente a sua espessura com a concentração. Pelo contrário, a camada compacta é talvez menos espessa e independente da concentração. Em suma, além deste efeito na capacidade, a variação na espessura afecta também a queda de 32 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário potencial através da camada de difusão. A relação entre a capacidade e a impedância de dupla camada é dada pela expressão: Z = 1/(2πƒCdc) (1.30.) onde ƒ, é a frequência em Hz e Cdc, a capacidade de dupla camada. A capacidade de dupla camada é definida diferencialmente, representando o aumento na carga, dQ, que resulta quando o potencial é aumentado por dE: Cdc = dQ/dE (1.31.) 1.6. Formação de uma monocamada na interface A compreensão das estruturas das membranas biológicas tem sido muito importante para o desenvolvimento de diversas áreas de investigação nas últimas décadas. Para se ter uma visão do funcionamento das membranas, é necessário o conhecimento da composição, estrutura e dinâmica da membrana. 1.6.1. Membrana celular Todos os seres vivos do planeta são constituídos por uma membrana. Estas membranas são estruturas finas, possuindo uma espessura de alguns nanómetros e servem para separar o interior da célula da parte exterior, permitindo assim, a interacção e selectivamente com ambiente. As membranas são estruturas organizadas e assimétricas, possuindo duas faces com topologias e funções diferentes. Dada a sua capacidade de adaptação a novas condições ambientais, as membranas são, também, dinâmicas. As membranas são compostas fundamentalmente por lípidos e proteínas (figura 1.24.). As biomoléculas insolúveis em água mas altamente solúveis em solventes orgânicos, como o clorofórmio, são designadas de lípidos. Os lípidos existentes na membrana são: os fosfolípidos, os glicolípidos e o colesterol. A razão entre quantidade de proteínas e lípidos existente na membrana varia enormemente. Uma membrana consiste numa bicamada constituída por uma variedade de moléculas anfipáticas (principalmente fosfolípidos). Existem também proteínas ligadas à superfície da bicamada, de onde elas podem ser removidas, simplesmente por uma alteração do pH ou da concentração iónica [57]. Todas as membranas contêm uma quantidade apreciável de fosfolípidos, tais como, a fosfatidilcolina, fosfatidilserina, fosfatidiletanoamida, esfingomielina e fosfatidilinositol. As membranas contêm ainda colesterol. O difosfatidilglicerol encontra-se apenas na membrana mitocondrial interna. 33 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Figura 1.24.: Esquema de uma bicamada de fosfolípidos (membrana celular). As pequenas moléculas existentes entre os fosfolípidos (representadas na figura a preto), são de colesterol e servem para fornecer rigidez e estabilidade à membrana. Por simplificação, não se representaram as proteínas. Todas as membranas biológicas são constituídas por um padrão comum, qualquer que seja a sua composição, ou seja, todas contêm uma bicamada fosfolipídica como unidade estrutural básica. Desta forma, as bicamadas e as monocamadas de fosfolípidos têm sido intensamente estudadas, dado que representam modelos simplificados das membranas biológicas. Os estudos electroquímicos têm sido mais vastamente aplicados às monocamadas do que às bicamadas, porque a queda de potencial através da camada pode ser melhor monitorizada no primeiro caso, tornando-as assim mais fiáveis. 1.6.2. Os fosfolípidos Os fosfolípidos apresentam uma variedade de classificações de acordo com a sua composição química. No entanto, em seguida destacar-se-ão alguns daqueles que foram objecto de estudo. Os glicerofosfolípidos (fosfolípidos baseados no glicerol) que contêm o amino álcool colina [HOCH2CH2N(CH3)3] são designados de fosfatidilcolinas ou lecitinas [alguns destes tipos de fosfolípidos foram objecto de estudo neste trabalho, tais como, a DPPC (dipalmitoilfosfatidilcolina), DAPC (diaraquidoilfosfatidilcolina), DSPC (distearoilfosfatidilcolina) e a DBPC (dibenoilfosfatidilcolina)]. Os fosfolípidos que contêm o grupo amino álcool etanolamina (HOCH2CH2NH2), são designados de fosfatidiletanolaminas ou cefalinas. Os fosfolípidos contêm um grupo carregado ou polar ligado a cadeias longas de ácidos gordos, como se pode observar na figura 1.25. 34 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Fosfolípido Ácido gordo (1,2-Dipalmitoilglicero (ácido hexadecanóico ≡ fosfatidilcolina ≡ DPPC) ácido palmítico) “Cauda” Hidrofóbica Grupo Fosfato A) “Cabeça” Hidrofílica B) C) Figura 1.25.: A) Estrutura de um fosfolípido (DPPC). B) Estrutura de um ácido gordo (ácido palmítico). C) Representação esquemática da estrutura de um fosfolípido. Na tabela 1.1. estão representadas as principais fórmulas estruturais dos fosfolípidos derivados do glicerol. Tabela 1.1.: Estruturas dos principais tipos de fosfolípidos derivados do glicerol [58]. Fórmula de estrutura Designação Fosfatidilcolina ou lecitina (PC) Fosfatidiletanoamina (PE) Fosfatidilserina (PS) 35 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Fosfatidilinositol (PI) Fosfatidilglicerol (PG) Difosfatidilglicerol (DPG) Os diferentes fosfolípidos são designados de acordo com o tamanho das cadeias R apresentadas nas estruturas da tabela 1.1. Algumas das fosfatidilcolinas simétricas e saturadas têm a seguinte designação: • 12 átomos de carbono (dilauroil-PC ou DLPC) • 14 átomos de carbono (dimiristoil-PC ou DMPC) • 16 átomos de carbono (dipalmitoil-PC ou DPPC) • 18 átomos de carbono (distearoil-PC ou DSPC) • 20 átomos de carbono (diaraquidoil-PC ou DAPC) • 22 átomos de carbono (dibenoil-PC ou DBPC) • etc. Os fosfolípidos são constituídos por um grupo carregado ou polar (habitualmente fosfato), que efectua a ligação com as longas cadeias de ácidos gordos, como está representado na tabela 1.1. A parte da molécula que contém o grupo fosfato é hidrofílica e é atraída para a água. As cadeias carbonadas de ácidos gordos são hidrofóbicas e são afastadas da água. Deste modo, o fosfolípido quando colocado num meio aquoso, tem tendência a formar bicamadas de fosfolípidos ou micelas. Por vezes, nas bicamadas de lípidos ocorre uma rápida junção espontânea das partes hidrofílicas ou hidrofóbicas, formando uma camada, vesícula/micela, possuindo uma única camada circular de fosfolípidos com as caudas a apontar para o interior, porque se encontra num meio aquoso. Esta vesículas/micelas são camadas muito estáveis, sendo usadas para estudar certas propriedades da membrana (figura 1.26.–A). O carácter anfipático dos fosfolípidos também lhes permite formar monocamadas biológicas (figura 1.26.–B), pois quando se encontram 36 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário numa mistura de dois solventes imiscíveis podem colocar-se na interface dos dois solventes formando uma monocamada. A) B) Figura 1.26.: A) Esquema de uma micela de fosfolípidos. B) Esquema de uma monocamada de fosfolípidos. O ponto isoeléctrico (pI) de um fosfolípido, corresponde ao pH ao qual o fosfolípido está presente exclusivamente na sua forma de zwiterião. A pH igual ao ponto isoeléctrico do fosfolípido, estes encontram-se sob a forma de zwiterião ou ião dipolar, ou seja, a molécula possui uma carga positiva e uma carga negativa em simultâneo. São estas características estruturais dos fosfolípidos que permitem efectuar os estudos de bicamadas de fosfolípidos, utilizando apenas monocamadas de fosfolípidos (meia bicamada). Tal como foi dito anteriormente, muitos destes estudos são efectuados utilizando a técnica de LB ou técnicas electroquímicas. As bicamadas de fosfolípidos podem existir em dois estados diferentes: um altamente ordenado, designado de estado gel, e um mais fluído, designado de estado líquido cristalino. A transição entre estas duas fases ocorre à medida que a bicamada é aquecida. Aquecimento Gel Líquido cristal Figura 1.27.: Transição de fase do estado Gel para o estado líquido cristal. Como se pode ver na figura 1.27., as moléculas de fosfolípidos estão mais expandidas na fase líquido cristalino do que na fase gel. Esta expansão resulta no aumento da energia térmica, a qual produz mudanças conformacionais trans-gauche nas ligações C-C, ao longo da cadeia de hidrocarbonetos. Uma transição semelhante ocorre em monocamadas de fosfolípidos, entre a fase líquido expandido (LE) e líquido condensado (LC), que pode ser estudada utilizando, por exemplo a técnica de LB, tal como foi objecto de estudo na primeira parte experimental deste trabalho. 37 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 1.6.3. Glucose Oxidase (GOx) Neste trabalho, para além do estudo efectuado com os fosfolípidos, também se estudou o efeito que a presença da GOx provoca no processo de adsorção das monocamadas de fosfolípidos em interfaces líquido-líquido e na interface ar-água. A glucose oxidase (GOx) é uma enzima que tem atraído muito interesse, devido à sua aplicabilidade em biosensores para a determinação de glucose em fluidos, bem como, para remoção da glucose e do oxigénio de bebidas e de produtos alimentares, e ainda, nos estudos da adsorção em monocamadas na interface líquido-líquido polarizadas [59]. A GOx é uma glicoproteína globular dimérica de dimensões de 60x52x77 Å [59] (figura 1.28.), construída a partir de duas subunidades idênticas, cada uma com massa molecular de 77000 Da que são ligadas com pontes de dissufito, ligações de sais e de hidrogénio [60]. A GOx é uma coenzima redox, contendo uma unidade FAD (Flavina Adenina Dinucleótido) por monómero. A enzima tem um coeficiente de difusão de 4.94 x10-7 cm2.s-1 numa solução de NaCl 0.1 M e uma parte da cadeia hidrofóbica encontra-se localizada perto da superfície [59]. O diâmetro médio da enzima nativa em solução, de acordo com os dados da correlação espectroscópica de fotões, é de 76 Å a pH 7.4 [61]. Tem um raio de Stokes de 43 Å com velocidade fraccionária de 1.21, a partir do qual a enzima em solução é uma proteína alongada com uma estrutura rígida. Hecht et al. [60], argumentam que cada monómero tem uma forma esférica compacta de dimensões de 60x52x37 Å. A proteína nativa é acídica com um ponto isoeléctrico de 4.44. A pH 7 está carregada negativamente com 11 cargas [59]. A) B) Figura 1.28.: A) Topologia global da haloenzima GOx. B) Estrutura da subunidade da GOx contendo FAD (representada a vermelho). 1.6.4. Neurotransmissores Neste trabalho também foram objecto de estudo dois neurotransmissores, o cloreto de acetilcolina (AChCl) e o cloreto de butirilcolina (BuChCl). Os sais de cloreto de acetilcolina e butirilcolina pode ser considerados uma versão sintética do neurotransmissor central e periférico, sendo também usados como vasodilatores e agentes cardiovasculares. 38 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário De uma forma geral, nos sistemas biológicos o transporte de informações é efectuado por impulsos nervosos, que passam através de diferentes etapas com a transformação de impulsos eléctricos em químicos e impulsos químicos em eléctricos. Segundo Jehring et al. [62], este comportamento dos interruptores dos neurónios pode ser simulada em modelos simplificados por camadas de electrodesorção de compostos orgânicos em eléctrodos de mercúrio. Estes autores utilizaram a polarografia ac e dc para caracterizar o fenómeno eléctrico. Jehring et al. estudaram também as propriedades de camadas de electrodesorção na mistura da lecitina de ovo e acetilcolina, verificando que a composição da camada de electrodesorção é fortemente dependente da concentração e do potencial eléctrico aplicado. O cloreto de acetilcolina (AChCl - C7H15NO2Cl, figura 1.29.–A), e o cloreto de butirilcolina (BuChCl C9H20NO2Cl, 1.29.–B), apresentam as seguintes fórmulas de estrutura: A) B) Figura 1.29.: A) Estrutura química da molécula de cloreto de acetilcolina (AChCl). B) Estrutura química da molécula de cloreto de butirilcolina (BuChCl). Acetilcolina e a butirilcolina são também neuro-hormonas que medeiam a transmissão de impulsos do nervo em todos os locais colinérgicos (onde a colina está presente) que envolvem os nervos autonômicos. Desta forma, o estudo destas duas espécies electroactivas é de extrema importância para compreender alguns dos fenómenos que ocorrem ao nível cerebral. 1.6.5. Adsorção nas ITIES A adsorção de fosfolípidos na interface líquido-líquido também pode ser usada para estudar e modelar as características de uma membrana biológica ou artificial. Assim, o sistema interfacial líquido-líquido está mais directamente relacionado com os problemas dos sistemas biológicos e emulsões do que a interface ar-água. Este sistema ainda tem outra vantagem relativamente ao estudo das monocamadas lipídicas numa interface ar-água, que é a possibilidade de se controlar rigorosamente a queda de potencial através da monocamada. Com este controlo podem aplicar-se várias técnicas electroquímicas para caracterizar os processos interfaciais, como a variação do estado da monocamada em resposta ao potencial através desta, a transferência iónica ou electrónica através da monocamada ou reacções enzimáticas dependentes do estado eléctrico numa interface lípido-solução. Desta forma, quando a concentração na interface de alguma espécie é maior relativamente ao esperado 39 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário pelas interacções electrostáticas (interacções presentes em moléculas polares e espécies iónicas, resultantes da atribuição de um conjunto de cargas estacionárias a cada um dos átomos da interacção [63]), pode falar-se em adsorção. O grau de cobertura, θ, dá-nos uma indicação da quantidade de espécies adsorvidas, e representa a fracção de superfície de eléctrodo que está coberta com a espécie adsorvida. Se a espécie adsorvida pode formar uma monocamada, θ corresponderá à razão entre a quantidade de espécie adsorvida presente e a quantidade máxima de espécie que pode ser adsorvida [64]. O valor de θ será unitário quando se forma a monocamada. A adsorção de um material dissolvido à superfície do líquido pode ser tão forte que é formada uma camada monomolecular compacta [65]. Como há materiais anfipáticos que praticamente não dissolvem no líquido, isto conduz à formação de monocamadas insolúveis. Neste caso, o excesso superficial, Γ, corresponde à quantidade de material adicionado, dividido pela área superficial. Os fosfolípidos, em geral, são solúveis em nitrobenzeno (NB), 1,2-dicloroetano (1,2-DCE) e o-NPOE, que são os solventes mais utilizados para estudos de ITIES. A monocamada é, por conseguinte, formada por adsorção dos fosfolípidos a partir da fase orgânica da interface. Quando a monocamada está no estado líquido expandido (LE), a formação da monocamada é limitada por difusão das moléculas de fosfolípido. Contudo, as monocamadas na fase líquida condensada (LC) ou sólida (S), necessitam de algumas horas ou dias para estabilizar. [66] No entanto, o estudo em monocamadas começou a ser feito na interface ar-água devido à simplicidade da técnica e ao facto de nem todos os compostos poderem ser estudados nas interfaces líquido-líquido, pois muitos destes compostos são solúveis na fase orgânica. Recorreu-se então, aos grupos carregados electricamente, pois os compostos com estes grupos podem “prender-se” à interface e evitar a sua dissolução na solução. Diversos estudos têm sido efectuados com fosfolípidos em filmes monomoleculares numa interface ar-água ou líquido-líquido, no sentido de determinar as suas propriedades, comportamento, e transições de fase [19,25,67,68,69,70,71,72]. Alguns autores [19,20,21], obtiveram relações de pressão superficial-área, para uma série homóloga de 1,2diacilfosfatidilcolinas e 1,2-diacilfosfatidiletanoamidas saturadas na interface ar-água, verificando que as fosfatidilcolinas formavam filmes mais expandidos que as fosfatidiletanoaminas, devido ao tamanho e orientação dos grupos polares das diferentes moléculas. Anos mais tarde, foram feitos estudos para outras lecitinas [25] com diferentes tamanhos de cadeias e em comparação com outro tipo de fosfolípidos (cefalinas). Os resultados mostram que, as curvas de isotérmicas, para a zona pouco compacta, variavam com o tamanho do grupo polar do fosfolípido, mas eram independentes dos tamanho das cadeias (C14 a C22). Verificaram ainda que, as lecitinas mais pequenas tinham pouca tendência a formar agregados ou micelas. Noutro trabalho [21], os mesmo autores estudaram o efeito do tamanho das cadeias nas fases de transição com as lecitinas de C14 a C22 para zonas de maior empacotamento, verificando que nesta zona, ao contrário do que acontece para a zona menos compacta, não há influência do tamanho da cadeia da lecitina. Estudo realizados por Kakiuchi e colaboradores, mostraram que em interfaces água-nitrobenzeno o comportamento de monocamadas da fosfotidilcolina (PC) [67], da fosfotidiletanolamina (PE) [68] com medição de capacidades superficiais e da fosfotidilcolina com medição de tensão superficial [67,68], se pode efectuar utilizando a técnica de medição da capacidade de dupla camada eléctrica em ITIES, Cdl. Esta técnica mostrou-se bastante 40 Capítulo 1 — Introdução QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário simples e muito sensível em fosfolípidos adsorvidos, e a medição da tensão superficial foi útil para determinar o excesso de superfície termodinâmico. De acordo com o trabalho de Kakiuchi e colaboradores [67], o processo de adsorção é lento sendo necessário cerca de pelo menos 1 hora para se atingir um estado de equilíbrio. Estes autores verificaram a formação de uma monocamada saturada estável de fosfotidilcolina (DLPC) quando a concentração de DLPC na solução aquosa era maior que 10 μM. A cobertura de superfície determinada através das curvas de capacidade foi descrita pela isotérmica de Frumkin, indicando que a monocamada estava num estado líquido-expandido com as caudas de hidrocarbonetos orientadas para a fase orgânica e penetrando nas moléculas do solvente e iões em solução. Wandlowski et al. [71,72], efectuaram estudos de adsorção também com DLPC, DMPC e DPPC, na interface água-nitrobenzeno e observaram um deslocamento positivo do potencial de carga zero (pcz) com o aumento da adsorção de DLPC obtido pelo máximo das curvas electrocapilares calculadas através da segunda integração das curvas de capacidade em função do potencial. Murtomaki et al. [73,74], estabeleceram um sistema electroquímico para estudar as monocamadas depositadas numa interface líquido-líquido sob pressão superficial controlada e obter as isotérmicas de Langmuir de fosfolípidos. Desta forma, obtiveram isotérmicas de fosfolípidos DPPC e DSPC, nas interfaces ar-água e água/1,2dicloroetano. Observaram ainda que, as interfaces ar-água mostravam uma transição de fase mais bem definida do que a interface água/1,2-dicloroetano, devido talvez ao pequeno tamanho das moléculas de 1,2-dicloroetano que as tornam muito móveis na interface. Também verificaram que para o caso da adsorção de DSPC, a potenciais mais positivos a adsorção deste lípido parecia fraca, enquanto que a potenciais mais negativos obtiveram-se monocamadas estáveis. Estes autores mostraram ainda que, através da compressão lateral de fosfolípidos, conseguem-se atingir monocamadas mais comprimidas do que pelo método de área constante com sucessiva adição de lípidos; no entanto, o colapso das monocamadas dos fosfolípidos pode ocorrer para diferentes orientações da molécula [75]. Observaram ainda que, a velocidade de compressão pode provocar diferentes formas dominantes nas monocamadas de fosfolípidos [76], e no método dinâmico de compressão, ocorre uma perda significativa de fosfolípidos para a solução orgânica por dissolução ou formação de micelas [73]. Estudos mais recentes têm sido efectuados não só com fosfatidilcolinas, mas também com compostos de grande interesse biológico, tais como, fármacos, enzimas produzidas no corpo humano, entre outros. Como exemplo de alguns trabalhos efectuados recentemente com compostos de grande interesse biológico, podem citar-se ainda, Annika, Liljeroth et al. [77,78,79], da Universidade de Tecnologia de Helsínquia (Finlândia). 41 Capítulo Execução Experimental Neste capítulo, descrevem-se os reagentes, os solventes, o material de vidro, a instrumentação, as condições e os procedimentos experimentais que foram utilizados neste trabalho. Desta forma, como o estudo realizado consistiu na utilização de duas técnicas diferentes –técnica de LB e espectroscopia de impedância ou impedância electroquímica–, apresentam-se em seguida os diferentes materiais e instrumentação, para cada uma das técnicas em questão. Relativamente à primeira técnica, como se trata de uma técnica nova no Departamento de Química da Faculdade de Ciências, a parte experimental será descrita de forma exaustiva. Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 2.1. Reagentes utilizados na preparação das soluções Tabela 2.1.: Especificações dos reagentes utilizados neste trabalho. Nome – Fórmula química Marca Nome – Fórmula química Marca DPPC (C16:0) - C40H80NO8P Sigma Brometo de tetraoctilamónio, ≥ 98 % - C32H68BrN Fluka (TOABr) DSPC (C18:0) - C44H88NO8P Sigma Diidrogenofosfato de Sódio - NaH2PO4.2H2O M&B DAPC (C20:0) - C48H96NO8P Sigma 1,2 – DCE, 99 % vol. - ClCH2CH2Cl Aldrich DBPC (C22:0) - C52H104NO8P Sigma Cloreto de cádmio monohidratado - CdCl2.H2O Merck Cloreto de Lítio (p.a.) - LiCl Merck (GR) Ácido acético glacial, 100% p.a. - CH3COOH Pronalab Cloreto de Sódio (p.a.) - NaCl Merck (GR) Éter 2 – Nitrofeniloctílico - C14H21NO3 Fluka Cloreto de Potássio (p.a.) - KCl Merck (GR) Tetrafenilborato de Sódio 99.5 % (a.r.) - Aldrich (C6H5)4BNa (NaTPB) Ácido Clorídrico 37 % (p.a.) - Merck Cloreto de Acetilcolina, 98 % C7H15NO2Cl (AChCl) HCl Ácido Sulfúrico 95-97 % (p.a.) Aldrich Pronalab Cloreto de Butirilcolina, 98 % -C9H20NO2Cl - H2SO4 Sigma (BuChCl) Clorofórmio (p.a.) - CHCl3 Pronalab Hidrogenofosfato de Sódio (p.a.) - Na2HPO4 Merck Acetona (a.r.) - C3H6O Riedel-de- Álcool etílico 99.8 % vol. - C2H6O Aga Haën GOx (EC 1.1.3.4 – 23 U/mg) Fluka 43 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 2.2. Técnica de Langmuir-Blodgett (LB) 2.2.1. Material e instrumentação Tabela 2.2.: Lista de materiais e instrumentos mais relevantes utilizados na técnica de LB. Material / Instrumentação Especificações / Marcas 1. Balança de Langmuir KSV Minitrough (figura 2.1.) 2. Bomba de aspiração/sucção Mini laboratory pumps – LABOPORT® 3. Prato Wilhelmy Perímetro = 39.240 mm 5. Tina Mini: comprimento = 75.0 mm; Área = 24225.0 mm2; Teflon; Volume: 260 cm3 6. Barreiras hidrofílicas e hidrofóbicas Simétricas - Derlin® e Teflon® 7. Termostatizador / Regulador de temperatura Julabo Labortechanik Gmh F12 8. Luvas de nitrilo sem pó SAFE SKIN® 9. Microseringas Hamilton (50 e 100 μL) e SGE para gases (50 μL) 10. Sistema de filtração de soluções Vacuum Filtration System - Alltech 11. Membrana para a filtração Nylon membrane filters: 47 mm, 0.2 μm 12. Slides de Ouro (Au) Forma: rectangular; largura: 18 mm; altura: 18 mm; espessura: 3 mm 13. Pincéis e pipetas de Pasteur — 14. Ultra-sons Grant – XB6 15. Perkin Elmer System 2000 FT-IR 44 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Legenda: 1 – Interface Vertical 2 – Controlo manual 3 – Braço mergulhador 12 4 – Tina de Langmuir 3 5 – Poço 6 – Barreiras 1 hidrofílicas/hidrofóbicas 7 – Suporte para a Tina 10 4 6 9 8 6 7 11 8 – Substracto sólido 9 – Prato Wilhemly 10 – Ligação do Regulador/ 5 termostatizador da temperatura do banho 2 11 – Local para a colocação do sensor da temperatura 12 – Electrobalança Figura 2.1.: Balança de Langmuir – “KSV Minitrough”, utilizada nos estudos das isotérmicas dos diversos fosfolípidos. [80] 2.2.2. Procedimentos experimentais Para se ter sucesso utilizando a técnica de LB, foi necessário ter-se muita atenção a todos os passos da execução experimental, pois embora se trate de uma técnica de fácil execução, é muito sensível e fortemente afectada por diversos factores, especialmente a limpeza, tornando-a assim numa das técnicas mais difíceis para a obtenção de resultados reproduzíveis a curto prazo. É de salientar que nas experiências de LB a balança de Langmuir se encontrava dentro de uma caixa de acrílico transparente, com abertura para um dos lados, não estando, portanto, completamente isenta de contaminações devido a poeiras e/ou pó, dificultando assim a execução experimental para a obtenção de resultados razoáveis. Na técnica de LB a formação de monocamadas foi feita recorrendo a um sistema de compressão para a obtenção das isotérmicas dos diversos fosfolípidos ou a um sistema de deposição quando se pretendeu transferir o filme para um substrato sólido, tal como foi descrito no capítulo 1 (secções 1.1. e 1.2.). Todo o material de vidro utilizado foi inicialmente mergulhado em ácido sulfúrico durante uma noite e, posteriormente lavado, abundantemente, com água da torneira e em seguida com água Millipore. Em seguida descrevem-se os procedimentos experimentais, utilizando a técnica de LB: 45 Capítulo 2 — Execução Experimental • QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Compressão 1. Em cada experiência começou-se por lavar a tina (ver figura 2.1. nº 4) e as barreiras (ver figura 2.1. nº 6) abundantemente com etanol e água Millipore, utilizando um pequeno pincel devidamente lavado e limpo, para ajudar a remover poeiras e/ou outras partículas que podiam encontrar-se à superfície da tina/barreiras. É fundamental que a tina de teflon e as barreiras sejam muito bem lavadas. No entanto, mais tarde verificou-se que a utilização do pincel para efectuar a limpeza era uma má opção, pois tendia a deixar contaminantes na tina, optando-se apenas pela limpeza utilizando água e etanol. 2. Em seguida, colocou-se a tina no local apropriado na balança de Langmuir (ver figura 2.1. nº 7) para se iniciar a experiência e colocou-se sobre esta as barreiras na posição zero (posição que corresponde à abertura máxima das barreiras na tina, quando estas se encontram o mais afastado possível uma da outra). Efectuou-se a ligação do termostatizador/regulador da temperatura (ver figura 2.1. nº 10). Com o software desenvolvido por KSV Instruments Ltd., efectuou-se o controlo da temperatura do banho da tina, da posição das barreiras e do prato Wilhelmy. 3. Sobre a tina colocou-se a subfase pretendida (cerca de 260 cm3). Habitualmente a concentração de electrólito de suporte foi cerca de 100 mM, para efectuar os estudos. Em seguida lavou-se abundantemente o prato Wilhelmy (ver figura 2.1. nº 9) e o sensor da temperatura (ver figura 2.1. nº 11) com etanol e água Millipore, colocando-os depois no local indicado para efectuar as medições. 4. Fechou-se o compartimento relativo à balança de Langmuir e deixou-se estabilizar a temperatura. Uma vez estabilizada a temperatura, removeu-se algumas poeiras e/ou partículas que se encontravam à superfície da subfase com a ajuda de uma pipeta de Pasteur (muito bem lavada com etanol e água Millipore), e de uma bomba de sucção. Sempre que se efectuaram diferentes experiências, a pipeta de Pasteur foi substituída. 5. Em seguida, efectuou-se uma primeira compressão das barreiras. O valor de pressão superficial nesta fase, para a subfase foi inferior a 0.1 mN/m (pois a tensão superficial da água é 0 mN/m). Moveram-se novamente as barreiras para a posição zero, colocou-se a pressão superficial a zero, utilizando o software e voltou-se a comprimir. Sempre que se obteve valores de pressão superficial acima de 0.1 mN/m, efectuou-se uma nova limpeza da superfície da subfase tantas vezes quantas as necessárias para fazer baixar o valor da tensão superficial. Para repor o volume da subfase adicionou-se mais solução, mas sempre pela parte de fora das barreiras (ou seja, a adição da subfase nunca é efectuada entre a área de subfase que fica entre as barreiras, correspondente à área central). 6. Após a pressão superficial apresentar um valor inferior a 0.1 mN/m, efectuou-se a deposição do volume de fosfolípido pretendido (previamente retirado do frigorífico à temperatura ambiente) sobre a superfície da subfase utilizando uma microseringa, tal como mostra a figura 2.2.–1. Foram utilizadas concentrações de fosfolípidos cerca de 1 mg/mL e os volumes adicionados entre 30–50 μL. 7. Antes do início de qualquer experiência, a microseringa foi lavada com duas soluções de clorofórmio para lavagem. Inicialmente começou-se por utilizar uma seringa Hamilton, mas devido aos problemas de evaporação do clorofórmio das soluções de fosfolípidos, optou-se por utilizar uma seringa para gases SGE para minimizar as perdas e os erros. A deposição foi feita ao longo da superfície da subfase, tendo-se o cuidado de não depositar, nem muito perto das extremidades, nem muito perto do prato de Wilhelmy. Teve-se também o cuidado de, ao depositar as gotas de fosfolípidos sobre a superfície não as deixar cair de uma altura elevada, mas sim deixando formar uma gota na ponta da microseringa, depositando-a o mais junto possível à superfície da subfase, pois a 46 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário queda de uma gota muito acima da superfície, leva a que estas não sejam adsorvidas na superfície, e “mergulhem” para o interior da subfase. 8. Deixou-se evaporar o solvente durante cerca de 30 minutos. Após este tempo, utilizando o software da KSV Instruments Ltd., efectuou-se a compressão das barreiras, com uma velocidade de compressão de 5 mm/min, tal como se pode visualizar na figura 2.2.–2. 9. Após terminada a compressão, procedeu-se da seguinte forma: - Efectuou-se a expansão das barreiras até à posição zero; - Retirou-se o sensor da temperatura e o prato Wilhelmy que se encontravam no local próprio sobre a tina, e foram lavados com água Millipore; - Guardou-se o prato de Wilhemly num frasco fechado contendo etanol. Antes de voltar a ser colocado em contacto com a subfase, lavou-se abundantemente com água Millipore para remover todo o etanol; - Aspirou-se a subfase com a ajuda de uma bomba de sucção e efectua-se a limpeza descrita inicialmente, para se efectuar nova experiência. Notas: Todos os procedimentos anteriormente descritos foram efectuados utilizando luvas de nitrilo sem pó. As subfases dos sais das soluções aquosas foram previamente filtradas utilizando o sistema de filtração de vácuo (Vacuum Filtration System – Alltech) e uma membrana de Nylon para a filtração. As características dos materiais e instrumentação podem ser visualizadas na tabela 2.2. • Deposição (“Dipping”) Na deposição foram utilizados como substratos sólidos slides de ouro, com as características indicadas na tabela 2.2., previamente lavados com etanol e água Millipore e secos com azoto (N2). A deposição de uma monocamada de lípido sobre o substrato hidrofóbico deve ser feito mergulhando o slide de cima para baixo, ou seja, de uma posição acima da superfície da subfase para o seu interior. Depois de lavado e seco, coloca-se o substrato sólido (slide de ouro) no mergulhador (ver figura 2.1. nº 3), na posição correcta na balança de Langmuir (ver figura 2.1. nº 8). Para se efectuar a deposição de um substrato sólido sobre uma monocamada de fosfolípidos seguiu-se os procedimentos anteriormente descritos na “compressão” até ao sétimo ponto inclusivé, e depois procedeu-se da forma a seguir descrita. Deixou-se evaporar o solvente durante cerca de 30 minutos. Após este tempo, utilizando o software da KSV Instruments Ltd., seleccionou-se o “target” (valor da pressão superficial a atingir pela compressão para se efectuar a deposição), na maioria das vezes antes de se atingir o colapso, o que normalmente corresponde a um valor entre 4550 mN/m. Este valor é mantido constante ao longo da deposição. Uma vez atingido o “target”, esperou-se cerca de 30 minutos para o sistema estabilizar e em seguida, procedeu-se à deposição do slide de ouro (figura 2.2.–3) utilizando o software, com uma velocidade de deposição de 2 mm/min. Após a deposição o slide de ouro foi removido, seco em N2 e armazenado no frigorífico. A sua análise foi deita por espectroscopia de infravermelho utilizando um FT-IR Perkin Elmer 2000. 47 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Figura 2.2.: Representação esquemática dos vários procedimentos da técnica de LB: 1) Deposição do fosfolípido sobre a superfície de uma subfase na balança de Langmuir, utilizando uma microseringa. 2) Compressão das barreiras sobre a superfície da subfase contendo o fosfolípido em estudo. 3) Deposição de uma monocamada de fosfolípidos sobre um substrato sólido (slide de ouro). Nos ensaios com DPPC, DBPC, DSPC e DAPC foram usadas soluções dos compostos dissolvidos em clorofórmio (CHCl3). Depois de preparadas, as soluções de fosfolípidos foram armazenadas no frigorífico. Na preparação das soluções de DBPC, devido à maior dificuldade de dissolução deste fosfolípido em clorofórmio, recorreu-se ao ultra-sons para se obter uma solução homogénea. As soluções aquosas da subfase foram preparadas por pesagem do sal correspondente (LiCl, KCl, HCl, NaCl e CdCl2.H2O) e sua dissolução em água Millipore (Milli-Q, 18 MΩ.cm-1 a 25 ºC). As pesagens de todos os componentes sólidos foram efectuadas numa balança analítica Mettler AE100. 2.3. Espectroscopia de impedância electroquímica 2.3.1. Material e instrumentação O pH das soluções aquosas (HCl, CH3COOH + CH3COONa e Na2HPO4 + NaH2PO4.H2O) utilizadas no estudo do efeito do pH, foram medidos utilizando um medidor de pH, 654 pH Meter - Ω Metrohm. 48 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário O controlo das variáveis experimentais e aquisição de dados na voltametria cíclica e na impedância electroquímica, no estudo de adsorção dos fosfolípidos na interface líquido-líquido, foi feito utilizando um potenciostato de quatro eléctrodos SI 1287, Solartron Instruments, para fazer o controlo do potencial aplicado aos eléctrodos, e também um "Frequency Responce Analyser" 1250, Solartron Instruments. Os dados obtidos nessas medições foram adquiridos e tratados num sistema computadorizado de aquisição de dados, com software desenvolvido por Pereira et al. [81]. Os espectros de impedância foram ajustados ao circuito equivalente R[C(RW)], representado na figura 1.22., utilizando o programa EQUIVCRT, elaborado por Baukamp [56]. A montagem experimental, de todas as experiências, foi efectuada numa gaiola de Faraday com o intuito de minimizar o ruído eléctrico. Neste trabalho experimental utilizou-se células com uma interface macroscópica de 0.28 cm2 e 0.22 cm2. A interface está posicionada entre dois capilares de Luggin por forma a minimizar a queda óhmica. Na figura 2.3. está representado um esquema da célula electroquímica utilizada nos estudos de adsorção na interface líquido-líquido. Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente. Figura 2.3.: Representação esquemática da célula electroquímica de quatro eléctrodos [82] para solventes orgânicos menos densos que a água (1,2-DCE e 2-NPOE), usada neste trabalho: 1– Eléctrodo de referência na fase aquosa (Ag/AgCl); 2– Contra-eléctrodo na fase aquosa (platina); 3– Contra-eléctrodo na fase orgânica (platina); 4– Eléctrodo de referência na fase orgânica (Ag/AgCl). 2.3.2. Reagentes 2.3.2.1. Solventes Para os estudos de adsorção na interface líquido-líquido utilizando a impedância electroquímica foram utilizados os seguintes solventes orgânicos: 1,2- Dicloroetano (1,2-DCE); Éter 2-Nitrofeniloctílico (2-NPOE). 49 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A água ultrapura Milli-Q (Millipore) foi usada como solvente na preparação de soluções aquosas e na preparação da fase aquosa, a qual, é obtida a partir do sistema de purificação Millipore (18 MΩ.cm-1). Para preparar as soluções dos diversos fosfolípidos a várias concentrações, adicionou-se a quantidade apropriada de fosfolípido (dissolvido em CHCl3) à solução orgânica. As espécies electroactivas (AChCl e BuChCl) a diferentes concentrações, foram adicionadas à fase aquosa, com o objectivo de estudar a interacção e/ou o efeito entre estas e os fosfolípidos na fase orgânica. Depois da adição das soluções de fosfolípido na célula, aguardou-se cerca de 60 minutos antes de se iniciarem as medições de impedâncias, tempo que, segundo Kakiuchi [67] era suficiente para estabelecer e equilibrar a posição dos fosfolípidos na interface. Nos estudos em que foi utilizada a GOx, na ausência do fosfolípido na fase orgânica, o tempo de espera antes do inicio das medições de impedâncias foi de cerca de 30 minutos [59]. 2.3.2.2. Electrólitos • Fase aquosa: Na fase aquosa utilizou-se uma solução contendo os seguintes sais: LiCl, NaH2PO4.2H2O e Na2HPO4. Na sua preparação pesaram-se os sais e dissolveram-se em água Millipore. Como referência da fase orgânica foi utilizada uma solução de tetrafenilborato de sódio (NaTPB) e o cloreto de sódio (NaCl). Na sua preparação pesaram-se os sais e dissolveram-se em água Millipore. O uso desta mistura como referência deve-se à baixa solubilidade do cloreto de tetraoctilamónio (TOACl) em água, garantindo deste modo, o comportamento de eléctrodo selectivo em relação ao ião comum com a fase orgânica. As soluções de Glucose Oxidase (GOx), cloreto de acetilcolina (AChCl) e cloreto de butirilcolina (BuChCl) adicionadas à fase aquosa para efectuar os correspondentes estudos, foram preparadas por pesagem dos respectivos compostos e sua dissolução em água Millipore. Depois de usadas, as soluções de GOx foram armazenadas no frigorífico, por um período não superior a 5 dias. • Fase orgânica: O composto orgânico utilizado nesta fase foi o tetrafenilborato de tetraoctilamónio (TOATPB). Este composto foi sintetizado através da mistura de duas soluções aquosas equimolares de tetrafenilborato de sódio (NaTPB) e brometo de tetraoctilamónio (TOABr). Ambas as soluções foram preparadas por pesagem do sal e dissolução numa mistura água/etanol 1:1. Após a mistura obteve-se um precipitado branco (TOATPB) que foi filtrado usando o vácuo e purificado por cristalização com acetona. Em seguida os cristais foram secos à temperatura ambiente. As soluções orgânicas de TOATPB, em cada um dos solventes considerados, foram preparadas por pesagem do sal e posterior dissolução no solvente orgânico (1,2-DCE ou 2-NPOE). O solvente orgânico foi utilizado sem qualquer purificação adicional. As preparações das soluções utilizando o solvente orgânico 2-NPOE foram realizadas no saco de luvas 50 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário numa atmosfera inerte (N2). Dada a grande dificuldade da dissolução do TOATPB em 2-NPOE, recorreu-se ao ultrasons para obter uma solução homogénea. No final de cada ensaio esta solução foi armazenada no frigorífico. 2.3.3. Eléctrodos A preparação dos eléctrodos de Ag/AgCl foi efectuada a partir de um fio de prata por electrodeposição de AgCl, no seio de uma solução concentrada de NaCl, geralmente durante cerca de 12 horas (aproximadamente). 2.3.4. Procedimentos experimentais Medição de impedâncias A lavagem da célula (figura 2.3.) é um aspecto importante devido à grande sensibilidade da interface líquido-líquido. Para a sua lavagem procedeu-se da seguinte forma: — inicialmente lavou-se com álcool etílico comercial com a finalidade de remover a fase orgânica, depois com água removendo os iões hidrofílicos, e por fim, com acetona, removendo possíveis restos de fase orgânica permitindo uma secagem mais rápida. A montagem da célula foi efectuada na hotte, com as soluções não equilibradas, e em seguida a célula foi ligada ao potenciostato, tal como foi referido no ponto 2.3.3. A diferença de potencial medida, entre os dois eléctrodos de referência, corresponde à diferença de potencial na célula, ΔE, sendo definida como a diferença de potencial entre o eléctrodo da fase aquosa e o eléctrodo da fase orgânica: ΔE = ERE (aq) – ERE (org) = Δowφ + ΔEref (2.1.) Determinou-se o valor de ΔEref por adição de TMA+ à fase aquosa da célula, medindo o potencial de meia onda de transferência deste catião. De acordo com os valores obtidos anteriormente, e por comparação com os resultados obtidos para os diferentes sistemas em estudo, efectuou-se o ajuste dos valores de potencial a Δowφ, quer para os voltamogramas cíclicos, quer para as curvas de capacidade, da seguinte forma: Δowφ = ΔE – ΔEref (2.2.) Para a interface água/1,2-dicloroetano o valor obtido para ΔEref foi igual a –350 mV, enquanto que para a interface água/2-NPOE obteve-se um valor de ΔEref igual a –226 mV. 51 Capítulo 2 — Execução Experimental QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Em cada sistema estudado começou-se por realizar experiências de voltametria cíclica, sem compensação de queda óhmica, com o objectivo de determinar a janela de potencial. Os voltamogramas cíclicos foram registados, após se verificar a sua forma estável, à velocidade de varrimento de 50 mV/s. Para as experiências utilizando o solvente orgânico 1,2-dicloroetano, as medições de impedância foram realizadas a um potencial ac com uma amplitude de 20 mV, sobreposto a um potencial dc constante, e a sua leitura foi efectuada num intervalo de frequências de 200 Hz a 0.5 Hz, medindo-se 15 pontos por década. Nos estudos em que se utilizou o solvente orgânico 2-NPOE, foram realizadas leituras de impedância num intervalo de frequências de 50 Hz a 0.5 Hz, medindo-se 20 pontos por década. Cada leitura, a um dado potencial, só foi efectuada após 30 segundos do início da aplicação do respectivo potencial, com o objectivo de permitir a estabilização do sistema. O varrimento do espectro de impedância foi efectuado no sentido das frequências mais altas para as mais baixas. As medições tinham início a um valor de potencial localizado aproximadamente no meio da janela de potencial. Em seguida eram efectuadas medições para valores de potencial mais negativos, depois para valores de potencial mais positivos, e por fim, a medição era terminada no mesmo valor inicial. Assim, a impedância foi medida num intervalo de potencial definido pela janela de potencial, em intervalos de 50 mV. 52 Capítulo Resultados e Discussão Neste capítulo apresentam-se os resultados dos estudos das isotérmicas de fosfatidilcolinas na interface ar-água, por aplicação da técnica de Langmuir-Blodgett (LB). Apresentam-se também os estudos de adsorção de fosfatidilcolinas em interfaces líquidolíquido polarizadas, assim como, a sua interacção com a enzima Glucose Oxidase (GOx) e espécies com características neurotransmissoras, tais como, a acetilcolina e a butirilcolina, por aplicação de técnicas voltamétricas e utilizando a espectroscopia de impedância electroquímica. Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.1. Filmes de Langmuir-Blodgett Antes de mais, convém referir que nesta primeira fase, o objectivo do estudo foi apenas caracterizar e desenvolver a técnica de LB para a obtenção das diferentes isotérmicas das fosfatidilcolinas, não tido sido feito um estudo aprofundado neste campo, uma vez que o período em que se trabalhou com esta técnica foi relativamente curto, não sendo suficiente para efectuar um estudo mais exaustivo. A técnica de LB tem sido usada extensivamente para produzir filmes de mono e multicamadas, assim como, a sua transferência para substratos sólidos. O método envolve primeiro a “construção” de uma monocamada na interface ar-água e depois a transferência para o substracto. As mono ou multicamadas resultantes podem ser caracterizadas por várias técnicas espectroscópicas e electroquímicas. Nesta primeira etapa do trabalho determinou-se e caracterizou-se as isotérmicas de diferentes fosfatilcolinas, bem como, a influência de diversos parâmetros na formação e estabilidade das monocamadas dessas fosfatidilcolinas, nomeadamente a temperatura, a concentração e tipo de electrólito de suporte utilizado na subfase aquosa, assim como, o efeito da presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na subfase aquosa. Efectuaram-se também, estudos de transferência de filmes de LB para slides de Ouro e utilizou-se a espectroscopia de infravermelho (FT-IR) para analisar esses slides. Em seguida são apresentados os resultados obtidos para cada um dos fosfolípidos estudados. Os gráficos que a seguir se apresentam dizem respeito a estudos de compressão para a obtenção das isotérmicas de fosfatidilcolinas na interface ar-água. Nestes gráficos está representada a pressão superficial (PS ou Π) em mN/m, em função da área média aparente disponível por molécula (Mma ou A) em Å2, isto é, a razão entre a quantidade de fosfatidilcolina adicionada e área geométrica do filme. 3.1.1. Estudo das isotérmicas de diferentes fosfolípidos na interface ar-água Os estudos que a seguir se apresentam foram realizados com uma balança de Langmuir, com controlo da pressão superficial. Efectuaram-se compressões laterais na interface ar-água, pois segundo Pallas e Pethica [83] parece improvável que o estado líquido condensado da camada lipídica possa ser alcançada por adsorção, porque as monocamadas a pressões acima da pressão de espalhamento, são termodinamicamente estáveis. Dada a enorme sensibilidade da técnica e, uma vez que, as condições experimentais em que se encontrava a balança de Langmuir não eram as mais adequadas (por exemplo, a balança não estava envolvida por câmara de fluxo laminar para manter a atmosfera isenta de qualquer pó e/ou poeiras, e não estava assente sobre um suporte “anti-vibratório”, fundamentais para a limpeza e estabilidade do sistema), a obtenção de resultados reprodutíveis e concordantes com a literatura, foi muito difícil e em alguns casos, não se conseguiu obter reprodutividade nas isotérmicas dos fosfolípidos, durante o período de ensaios utilizando esta técnica (cerca de dois meses e meio). Dado que área molecular média das isotérmicas é característica de cada espécie, se não houver alterações a nível das condições experimentais, os resultados deverão ser reprodutíveis e aquele valor será o mesmo para cada experiência utilizando a mesma espécie. Os gráficos obtidos mostram que nem sempre isso aconteceu, o que demonstra a grande dificuldade em controlar um conjunto variado de variáveis, não permitindo a obtenção de 54 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário resultados reprodutíveis. Consequentemente, a interpretação dos resultados será feita de acordo com os dados obtidos. 3.1.2. Estudo da isotérmica do fosfolípido DBPC (C22) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa A figura 3.1. mostra a isotérmica, pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o fosfolípido DBPC à temperatura de ~20 ºC. 70 IV III II VDBPC adicionada à subfase = 80 μL I 60 Experiência 1subfase: água; [DBPC] = 1.00 mg/mL; Π / mN.m -1 50 Experiência 2subfase: água+100 mM NaCl; [DBPC] = 1.04 mg/mL; 40 30 Experiência 3subfase: água+100 mM NaCl; [DBPC] = 1.00 mg/mL; 20 10 0 20 30 40 43 50 60 A/Å 70 80 90 100 2 Figura 3.1.: Isotérmicas do fosfolípido DBPC na interface ar-água e ar-solução aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Na isotérmica da DBPC podem ser encontradas quatro regiões correspondentes aos seguintes estados físicos: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido (LE); III – líquido condensado (LC); e IV – colapso. À medida que a área superficial é reduzida do seu valor inicial, ocorre uma variação gradual da pressão superficial até se atingir uma região aproximadamente horizontal (IV). Na primeira região horizontal – I (desde ~70 Å2 até ~50 Å2), as cadeias hidrofóbicas do fosfolípido inicialmente distribuído sobre a superfície, encontram-se bastante dispersas. A pressão superficial a que isto ocorre é muito pequena (< 1mN/m), devido às fracas interacções entre a água e a parte hidrofóbica do fosfolípido; consequentemente, esta porção da isotérmica não exibe nenhum patamar (esta primeira região corresponde a um “estado gasoso”, semelhante a um gás bidimensional). À medida que a compressão decorre, observa-se um ligeiro aumento na curva da isotérmica, correspondente a uma transição de fase (região II). Para compressões mais elevadas, a área superficial vai sendo 55 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário sucessivamente reduzida e a pressão superficial tende a aumentar, devido ao aumento das interacções entre a água e a cadeia hidrofóbica do fosfolípido, surgindo uma segunda transição abrupta, caracterizada por uma região linear vertical muito inclinada (III). Este estado é devido à mudança de fase e representa uma transição para um estado ordenado análogo ao sólido, de moléculas bidimensionais. Aqui a compressibilidade é aproximadamente constante, sendo definida por [1]: c = – 1/A (∂A/∂Π)T,P,ni (3.1.) onde, c é a concentração da espécie (neste caso, DBPC), A é a área comprimida, e (∂A/∂Π) é o declive da recta do gráfico da isotérmica. Efectuando a extrapolação para a pressão superficial zero, a intercepção dá-nos a área por molécula de DBPC que seria esperada obter para um estado hipotético de uma camada empacotada-fechada, não comprimida, correspondendo a um valor de ~43 Å2 para este fosfolípido. A áreas superficiais mais baixas (~35 Å2) e a pressões elevadas (~60 mN/m), ocorre o colapso (região IV) da isotérmica e a compressibilidade aproxima-se do infinito, pois as forças aqui exercidas são demasiado fortes para o confinamento em duas dimensões. Assim, as moléculas são “lançadas” para fora do plano da monocamada, ou para a subfase (moléculas mais hidrofílicas), ou para a superfase (moléculas mais hidrofóbicas), caracterizada por uma descida brusca da pressão superficial. Todas as isotérmicas apresentadas mostram apenas o ponto inicial em que se atinge o colapso. Para que o colapso seja atingido e registado nas isotérmicas é necessário, entre outros factores, que o nível da subfase não esteja muito elevado, pois se tal acontecer a subfase começará a transbordar para fora da tina perto das extremidades das barreiras ou nas descontinuidades (cantos), não sendo possível registar toda a isotérmica do fosfolípido. O colapso das isotérmicas de DBPC, foi atingido a pressões superficiais ligeiramente inferiores a 60 mN/m, quer na interface ar-água, quer na interface água-solução aquosa (NaCl ou LiCl), e a área molecular média do colapso para as isotérmicas de DBPC foi de ~35 Å2, o que está de acordo o obtido por Rosilio et al. [75]. Tal como Rosilio et al., também aqui se observou que a isotérmica não exibe uma fase fluída e a pressão superficial na transição da fase expandida para a fase condensada é muito baixa (< 1 mN/m). A isotérmica de DBPC apresenta o mesmo comportamento nas interfaces ar-água e ar-solução aquosa (LiCl ou NaCl), não sendo aparentemente afectadas com a introdução destes sais na solução aquosa, pois para ambas obteve-se as mesmas curvas da isotérmica e os mesmos estados de transição de fase. Ou seja, as isotérmicas mostram não ser dependentes do electrólito da subfase aquosa. 3.1.3. Estudo da isotérmica do fosfolípido DAPC (C20) na interface ar-água Na figura 3.2. está representada a pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o fosfolípido DAPC à temperatura de ~20 ºC, correspondente à isotérmica deste fosfolípido obtida por compressão lateral. 56 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 70 Subfase: água; VDAPC adicionado à subfase = 50 μL Experiência 1-: [DAPC] = 1.04 mg/mL Experiência 2-: [DAPC] = 1.04 mg/mL Experiência 3-: [DAPC] = 1.05 mg/mL Experiência 4-: [DAPC] = 1.05 mg/mL 60 -1 50 Π / mN.m Relatório de Seminário 40 30 20 10 0 20 30 40 50 60 70 80 90 100 2 A/Å Figura 3.2.: Isotérmicas do fosfolípido DAPC na interface ar-água. Velocidade de compressão: 5 mm/min. As isotérmicas do fosfolípido DAPC apresentam uma variação no comportamento para as mesmas condições experimentais, na interface ar-água. Tal diferença pode ser explicada pelo facto da concentração ou da quantidade adicionadas à subfase aquosa não serem exactas. Dada a instabilidade da solução fosfolípidoclorofórmio, devido à rápida evaporação do solvente à temperatura ambiente, a concentração do fosfolípido é alterada, o que faz com que os dados introduzidos no programa de software não correspondam à realidade, obtendose isotérmicas deslocadas ora para a esquerda, ora para a direita. Verificou-se que durante a abertura das soluções contendo o fosfolípido, o solvente clorofórmio evaporava rapidamente, ocorrendo mudanças súbitas de concentração, o que fez com que os resultados não fossem reprodutíveis de experiência para experiência. Este facto não foi tão marcante no caso dos outros fosfolípidos. Um outro factor que poderá ter contribuído para os resultados obtidos, terá sido a má limpeza da subfase ou do material experimental, ou ainda, o facto do fosfolípido não se encontrar nas melhores condições, pois verificouse que ao longo do tempo este fosfolípido sofre uma rápida degradação, originando uma grande diferença entre as isotérmicas com soluções novas, acabadas de preparar (experiência 1, 2 e 3), e com soluções mais antigas, ou seja, abertas e usadas durante um maior número de vezes (experiência 4). As experiências 1 e 2 foram efectuadas com a mesma solução de DAPC e a experiência 3 foi realizada com uma nova solução de DAPC. Também neste caso, as diferenças observadas estão relacionadas com o que foi dito anteriormente, ou seja, o facto de para o mesmo volume adicionado à subfase aquosa a concentração não ser a mesma, o número de moléculas por área será também diferente. Estes erros no cálculo da concentração da solução, originam resultados diferentes, daí o deslocamento das isotérmicas ao longo do eixo das abcissas. Como tal, o valor da área molecular média para o qual a isotérmica começa a variar bruscamente e que é característica deste fosfolípido, não é reprodutível nas experiências efectuadas. A isotérmica da experiência 4 apresenta ainda um comportamento 57 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário completamente diferente de todas as outras. Este facto poderá estar relacionado com a explicação dada anteriormente, ou ainda ser resultado do fosfolípido não se encontrar nas melhores condições. Desta forma, perante os resultados obtidos, nada se pode concluir quanto à forma e comportamento da isotérmica deste fosfolípido. Contudo, os resultados obtidos na experiência 3, mostram a existência de três regiões distintas (não representadas no gráfico por simplificação), tal como no caso do fosfolípido DBPC, correspondentes a três estados físicos de transição de fases. Este resultado parece ser concordante com as isotérmicas obtidas por elipsometria por Ducharine et al. [84], que tal como a DBPC, o fosfolípido DAPC apresenta uma pressão superficial na transição da fase expandida para a fase condensada também muito baixa (< 1mN/m), mostrando apenas um comportamento de fase sólida em compressão. Desta forma, analisando a experiência 3, observou-se que o colapso foi atingido ~55 mN/m, e a área molecular média correspondente ao colapso foi de ~50 Å2. Verificou-se uma variação brusca na isotérmica, correspondente à transição de fase (líquido expandido para líquido condensado) a uma área molecular média de ~57 Å2. Ducharine et al. obtiveram um valor de pressão superficial para o colapso ligeiramente inferior a 50 mN/m, correspondente a uma área molecular média de ~44 Å2. A mudança brusca na isotérmica correspondente à transição de fase, líquido expandido para líquido condensado, foi obtida para uma área molecular média de ~59 Å2. Desta forma, a experiência 3 parece estar mais concordante com o que é observável para este fosfolípido comparativamente ao obtido por aqueles autores. Contudo, os resultados obtidos até à data não foram suficientemente esclarecedores para se puder dizer que esta é a isotérmica representativa do fosfolípido DAPC, pelo que em futuras investigações, poderá ser objecto de estudo. 3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa Tal como nos dois casos anteriores determinou-se a isotérmica de DSPC. As isotérmicas de DSPC, tal como nas isotérmicas de DBPC, parecem não serem influenciadas pelo electrólito na subfase aquosa, uma vez que, as isotérmicas obtidas nas interfaces ar-água e ar-solução aquosa (NaCl), apresentam as mesmas curvas e os mesmos estados de transição de fase, observando-se ligeiras diferenças apenas na região III. Tal diferença pode ser explicada pelo facto do volume da subfase contida na tina variar ligeiramente de experiência para experiência. Na figura 3.3. está representada a pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o fosfolípido DSPC à temperatura de ~20 ºC. A isotérmica de DSPC apresenta também quatro regiões distintas correspondentes a quatro estados físicos de transição de fases: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido; III – líquido condensado; e IV – colapso. A explicação para a formação destes estados ou fases é a mesma que para a isotérmica de DBPC. 58 Capítulo 3 — Resultados e Discussão 70 QUÍMICA ANALÍTICA II III IV I Experiência 1subfase: água+10 mM NaCl; [DSPC] = 0.53 mg/mL; V DSPC adicionado à subfase = 60 μ L 60 -1 50 Π / mN.m Relatório de Seminário Experiência 2subfase: água; [DSPC] = 0.93 mg/mL; V DSPC adicionado à subfase = 40 μ L 40 30 20 10 0 20 30 40 52 50 60 A/Å 70 80 90 100 2 Figura 3.3.: Isotérmicas do fosfolípido DSPC na interface ar-água e ar-solução aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Na isotérmica da figura 3.3. a pressão superficial na transição da fase expandida para a fase condensada é também muito baixa, tal como nos casos anteriores. Para as isotérmicas de DSPC o colapso foi atingido a pressões superficiais ~60 mN/m. Estes valores encontram-se muito próximos dos obtidos por Mälkiä et al. [79]. A área média por molécula correspondente ao colapso foi de ~37 Å2, um pouco inferior à obtida por Liljeroth et al. [77], e Grandell e Murtomäki [74], respectivamente, 43 Å2 e 40 Å2 (a diferença pode ser devido ao nível da subfase estar um pouco elevado). Esta área molecular é cerca de duas vezes a área superficial do ácido esteárico (~22 Å2) [74]. Também de acordo com o que foi observado por Mälkiä et al. [79] e Liljeroth et al. [77], a pressão superficial para a isotérmica de DSPC começou rapidamente a aumentar para valores situados entre 52–54 Å2, correspondentes ao estado de mudança de transição de fase, líquido expandido para líquido condensado. Por extrapolação para a pressão superficial zero, determinou-se a área média por molécula obtida para esta mudança de fase, que foi de ~52 Å2, estando concordante com o obtido por aqueles autores. 3.1.5. Estudo da isotérmica do fosfolípido DPPC (C16) na interface ar-água. Estudo do efeito do electrólito de suporte e da sua concentração na subfase aquosa, e estudo do efeito da temperatura na isotérmica de DPPC No seguimento do estudo da determinação das isotérmicas para diferentes fosfatidilcolinas, estudou-se a isotérmica de DPPC na interface ar-água. Os resultados obtidos para a DPPC suscitaram um interesse especial, porque este fosfolípido apresentou um comportamento bastante diferente do observado para as outras fosfatidilcolinas. 59 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A figura 3.4. mostra a isotérmica típica do fosfolípido DPPC, representada pela pressão superficial (Π) em função da área molecular média (A), obtidas por compressão lateral à temperatura de ~20 ºC. 70 V IV II III I 60 Π / mN.m -1 50 40 30 20 10 0 20 30 40 50 60 A/Å 70 80 90 100 110 2 Figura 3.4.: Isotérmica típica do fosfolípido DPPC na interface ar-água. Condições experimentais: subfase – água; [DPPC] = 1.00 mg/mL; VDPPC adicionado à subfase = 30 μL. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Ducharme et al. [84] observaram por elipsometrica, que as isotérmicas do fosfolípido DPPC a 17 ºC, na interface ar-solução aquosa (tampão de fosfato, 10-3 M e pH = 7.2), apresentava-se dividida em vários segmentos. Cada segmento corresponderia à área molecular para a qual o filme exibe diferentes estados físicos. Os resultados obtidos para este fosfolípido mostram um comportamento semelhante. Desta forma, nas isotérmicas de DPPC é possível observar cinco regiões distintas correspondendo a cinco estados físicos diferentes, resultantes da transição de fases: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido (LE); III – líquido expandido + líquido condensado (LE+LC); IV – líquido condensado (LC); e V – colapso. Na figura 3.4, é possível observar as diferentes regiões da isotérmica de DPPC. Em seguida far-se-á uma análise pormenorizada para cada uma dessas regiões. Inicialmente, as moléculas de DPPC espalhadas à superfície da subfase interagem muito fracamente com as moléculas de água, encontrando-se completamente desordenadas à superfície, pois a área superficial disponível por molécula é muito grande e a pressão superficial é muito baixa (~ 0 mN/m). Esta primeira região vai até ~100 Å2, e corresponde a um “estado gasoso” – I, semelhante a um gás bidimensional. Entre ~100 Å2 e até ~85 Å2, a diminuição da área por molécula origina um ligeiro aumento da pressão superficial (desde ~0 mN/m até ~5 mN/m), ocorrendo uma mudança de fase da monocamada do fosfolípido, que corresponde ao estado líquido expandido (LE ou L1) – II. Segundo Kaganer et al. [85], nesta fase, tal como na fase gasosa, não são detectados sinais de difracção de raios-X, uma vez que, provavelmente, as “cabeças” das moléculas estão translacionalmente desordenadas e as cadeias estão conformacionalmente desordenadas. À medida que a compressão da monocamada continua, observou-se um patamar horizontal até ~55 Å2 e à pressão superficial constante de ~5 mN/m, correspondente a uma região de estado físico coexistente, sendo um estado de transição intermediário, designado por LE+LC – III. A existência do patamar horizontal indica que a 60 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário transição é de primeira ordem. O patamar não é perfeitamente horizontal em muitos sistemas, devido à possível formação de pequenos agregados moleculares ou de micelas [85]. A partir de ~55 Å2 observou-se uma mudança brusca no estado físico, resultante da menor área disponível por molécula, que é detectado pelo aumento súbito da pressão superficial (observou-se uma linha quase vertical) e que corresponde à transição de fase para o estado LC – IV. Neste estado a monocamada é menos compressível do que no estado líquido expandido. Aqui as moléculas devem encontrar-se alinhadas paralelamente umas às outras, podendo encontrar-se inclinadas em relação à água ou perpendicularmente a ela [85]. O colapso do filme – V, foi observado para pressões ligeiramente inferiores a 60 mN/m, correspondendo a uma área de ~35 Å2. A isotérmica deste fosfolípido mostra a existência de um estado físico intermediário (LC+LE), que não foi observado nas isotérmicas das outras fosfatidilcolinas. Esta região quase horizontal corresponde à coexistência de um fluído isotrópico e uma fase mais condensada. É sabido que as moléculas dos lípidos formam “ilhas” altamente organizadas, todavia, existe uma menor organização entre as “ilhas” formadas [85]. A monocamada não é tão homogénea como a dos ácidos gordos. Esta organização heterogénea parece ter um papel importante na biomembrana, na medida em que a permibilidade iónica ocorrerá através das zonas “menos” organizadas. A isotérmica de um fosfolípido pode ainda ser afectada por vários factores, tais como, a composição da subfase aquosa, a concentração do electrólito de suporte ou ainda a temperatura da subfase. Seguidamente apresentam-se os estudos respeitantes à variação destes factores no caso do fosfolípido DPPC. Na figura 3.5., estão representados as várias isotérmicas da DPPC para as diferentes situações em estudo: o efeito da composição da subfase aquosa e o efeito da concentração do electrólito de suporte da subfase (figura 3.5.– A e B); e o efeito da temperatura da subfase (figura 3.5.–C). 70 70 [DPPC] = 1.00 mg/mL; VDPPC adicionado à subfase = 30 μL 60 40 30 Experiência4subfase: água Experiência5subfase: água +10 mM CdCl2.H2O Experiência6subfase: água +10 mM NaCl 50 Π (mN/m) Π (mN/m) 60 Experiência 1subfase: água +100 mM HCl Experiência 2subfase: água +100 mM KCl Experiência 3subfase: água +100 mM LiCl Experiência 4subfase: água 50 [DPPC] = 1.00 mg/mL; VDPPC adicionado à subfase = 30 μL 40 30 20 20 10 10 0 0 20 30 40 50 60 70 80 90 100 20 2 A) 30 40 50 60 70 2 A/ Å B) 61 A/ Å 80 90 100 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 70 [DPPC] = 1.00 mg/mL; VDPPC adicionado à subfase = 30 μL Subfase: água Experiência 7Temperatura ~10ºC Experiência 4Temperatura ~20ºC Experiência 8Temperatura ~30ºC Experiência 9Temperatura ~40ºC 60 Π (mN/m) 50 40 30 20 10 0 20 30 40 50 60 70 80 90 100 2 C) A/ Å Figura 3.5.: Isotérmicas do fosfolípido DPPC para diferentes estudos: A) e B) O efeito da composição e da concentração da subfase aquosa na isotérmica de DPPC. C) O efeito da temperatura na isotérmica de DPPC. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Os resultados obtidos mostram que todas as isotérmicas apresentam as mesmas curvas e os mesmos estados físicos de transição de fases anteriormente descritos, com a excepção dos obtidos para diferentes valores de temperatura. No entanto, observou-se alguns desvios das isotérmicas, ora para a esquerda ora para a direita, quando comparadas com a isotérmica contendo apenas água Millipore (figura 3.4.). Este comportamento não seria de todo esperado, pois os estados físicos ocorrem para áreas por molécula que são características deste fosfolípido. As diferenças estão relacionadas, muito provavelmente, com o facto da concentração ou a quantidade de fosfolípido adicionada à subfase não ser exacta, ou ainda, devido à presença de contaminantes na subfase aquosa, provocando deslocamentos das isotérmicas ao longo do eixo das abcissas. Desta forma, para os sistemas estudados a concentração e o tipo de electrólito de suporte da subfase, parecem não influenciar significativamente as curvas da isotérmica e os estados de transição de fase da DPPC, como mostra a figura 3.35.–A e B, tal como tinha sido observado por Mingis et al. [21]. A excepção parece estar relacionada com o ponto de colapso, onde a presença de catiões divalentes originou um colapso mais rápido. O resultado não está de acordo com o previsto, pois sabe-se que, a estabilidade de uma monocamada pode ser aumentada pela adição de catiões divalentes (aqui Cd2+) [1] à fase aquosa. A origem da sua capacidade de ligação ainda não é muito clara –uma “afinidade” não especificada dos lípidos para catiões [74] –, mas está provavelmente relacionado com a forte hidratação dos catiões divalentes e a partilha da sua esfera de hidratação com os grupos da “cabeça” dos lípidos [74]. Os catiões divalentes também têm um campo eléctrico relativamente forte à sua volta e algumas forças atractivas de longo alcance (ião-dipolo, etc.), podem também contribuir para a ligação. Desta forma, seria de esperar que a experiência 5 apresenta-se um valor de colapso ligeiramente superior ao observado. Tal facto não se verificou devido possivelmente ao nível da subfase estar 62 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário ligeiramente elevado, relativamente às outras experiências, provocando o transbordo da subfase para fora dos limites da tina, antes de toda a isotérmica ser registada. A figura 3.5.–C, mostra que a isotérmica do fosfolípido DPPC é fortemente dependente da temperatura. Assim, para temperaturas mais baixas (10 ºC) ou mais elevadas (30 e 40 ºC), relativamente à temperatura de 20 ºC, não é observado um patamar correspondente ao estado intermédio LE+LC, observando-se apenas a fase de transição de primeira ordem de uma fase líquido expandida para uma fase líquido condensada. Este efeito é mais pronunciado a baixas temperaturas (experiência 7), sendo quase imperceptível a temperaturas mais elevadas (experiência 8 e 9). Estes resultados mostram ainda que a temperatura à qual é possível distinguir com clareza todos os estados físicos, correspondentes à transição de fases, é ~20 ºC. 3.1.6. Estudo da isotérmica de misturas de fosfatidilcolinas na presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na interface ar-água Uma vez caracterizada as isotérmicas de cada uma das fosfatidilcolinas estudadas, foi também objectivo deste trabalho observar o comportamento de misturas de fosfolípidos, bem como, a influência da GOx no comportamento das isotérmicas dessa mistura. Na figura 3.6. e na tabela 3.1., encontram-se os resultados obtidos para os estudos de misturas de fosfatidilcolinas, e o efeito na presença da enzima GOx. 70 Experiência9 Experiência10 60 50 60 50 40 30 40 20 30 Experiência5 Experiência6 Experiência7 Experiência8 50 Π (mN/m) Π (mN/m) 60 Π (mN/m) 70 70 10 40 30 0 20 20 30 40 50 Experiência1 Experiência2 Experiência3 Experiência4 10 60 70 80 90 100 20 2 A/ Å 10 0 0 20 30 40 50 60 70 80 90 100 20 2 A) 30 40 50 60 70 80 90 100 2 A/ Å B) A/ Å Figura 3.6.: A) Isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na interface ar-água. B) Isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na presença de GOx na interface ar-água. Velocidade de compressão: 5 mm/min. As condições experimentais referentes a cada experiência encontram-se descritas na tabela 3.1. 63 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Tabela 3.1.: Condições experimentais utilizadas para a obtenção das isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na presença da GOx, na interface ar-água, representadas na figura 3.6. Exp.* Subfase: água + Substâncias: Volume das substâncias Volume de GOx 100 mM NaCl [DPPC+DSPC] / adicionadas à subfase/ μL adicionado à subfase / μL -1 mg.mL 1 (0.54 + 0.45) = 0.99 30 − 2 (0.20 + 0.80) = 1.00 30 − 3 (0.80 + 0.20) = 1.00 30 − 4 (0.20 + 0.80) = 1.00 40 − 1 (0.54 + 0.45) = 0.99 30 1000 (9.6 nM GOx) 5 6 + 98 nM GOx (0.54 + 0.45) = 0.99 30 − 7 + 10 μM GOx (0.20 + 0.80) = 1.00 30 − 8 + 10 μM GOx (0.80 + 0.20) = 1.00 30 − 9 Só [DSPC] = 0.53 60 10 Só [DPPC] = 1.00 30 − *Temperatura experimental: ~20 ºC. 1 Nesta experiência a GOx foi injecta na subfase. Em todas as outras experiências foram preparadas soluções de GOx em solução aquosa de NaCl. A figura 3.6.–A, mostra o comportamento das isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas (DPPC+DSPC). Observou-se que para fracções aproximadamente equivalentes de DSPC e DPPC (0.45 e 0.54 mg/mL, respectivamente – experiência 1) a isotérmica apresenta um comportamento intermédio entre as duas monocamadas puras de fosfolípidos (experiência 9 e 10). Este facto sugere que a mistura de fosfolípidos forma monocamadas contendo alternativamente moléculas de DPPC e DSPC à superfície da interface, ou seja, do tipo ABABAB... Aumentando a concentração de DSPC relativamente à DPPC (experiência 2 e 4), observou-se que a maior fracção deste fosfolípido (DSPC) à superfície da subfase aquosa por área da tina, originou uma isotérmica similar à obtida quando estamos na presença apenas de DSPC, devido possivelmente ao seu melhor rearranjo molecular à superfície da subfase (note-se a reprodutividade das duas experiências). De igual modo, quando a quantidade de DPPC (experiência 3) foi muito superior à de DSPC, a isotérmica adquiriu um comportamento semelhante ao observado para a isotérmica de DPPC, pelas razões já citadas. Contudo, a definição das regiões correspondentes à transição de fases são agora menos perceptíveis que anteriormente, pois não se observa praticamente nenhuma diferença na passagem da fase líquido expandido para a fase intermediária LC+LE. Na figura 3.6.–B, verificou-se que a presença de GOx parece afectar ligeiramente o comportamento da mistura de fosfatidilcolinas (DSPC+DPPC). O comportamento observado mostra algumas semelhantes com o obtido por Sun et al. [86], que obtiveram a isotérmica da glucose oxidase nativa (GO) em 20% de metanol espalhada sobre uma subfase contendo 2.5 mM BaCl2 e pH = 5.6. Nesta isotérmica observa-se apenas um estado sólido (tais como, as que se obtiveram aqui). No entanto, a passagem ao estado líquido condensado é mais lento nas isotérmicas aqui 64 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário obtidas. Tal facto, dever-se-á à presença da mistura de fosfatidilcolinas que levam mais tempo a organizarem-se na superfície da subfase aquosa. Comparando com a mistura inicial na ausência de GOx, verifica-se que a isotérmica deixou de ter as regiões correspondentes à transição de fase, observando-se apenas uma fase líquido expandido e outra líquido condensada. Verificou-se que o facto da GOx se encontrar já em solução na subfase aquosa (experiência 6) ou a sua posterior injecção na subfase aquosa (experiência 5), não teve qualquer influencia nas curvas da isotérmica (para concentrações de GOx muito baixas). Para misturas de fosfatidilcolinas contendo maior quantidade de DSPC e na presença de GOx, observou-se que a passagem até ao estado líquido condensado ocorre em condições idênticas, à observada na ausência de GOx. Contudo, o estado condensado ocorre a uma área molecular média mais baixa na presença de GOx, devido à grande quantidade de moléculas que se encontram em contacto na subfase aquosa, tal como pode ser observado pelo declive menos acentuado da experiência 7, comparativamente com o das experiências 2 e 4. Os desvios que são observados nas isotérmicas apresentadas em cada uma das experiências, estão relacionados, com o facto da concentração ou da quantidade de fosfolípidos adicionados à subfase aquosa não serem exactas, ou devido à presença de contaminantes na subfase, ou ainda, devido à presença da própria enzima (GOx). Para determinar este último efeito seriam necessários efectuar estudos mais aprofundados para concentrações de GOx mais elevadas. 3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos sólidos Os filmes de Langmuir podem ser transferidos para diferentes substratos sólidos, tais como, Si, Pt, Au e vidro usando a técnica de Langmuir-Blodgett (LB). No entanto, há que ter em conta que alguns filmes nunca se tornam estáveis, devido ao facto das moléculas serem parcialmente solúveis na água ou tenderem a formar micelas na superfície que depois penetram na subfase aquosa. Após um único ciclo de deposição efectuou-se a compressão e a deposição a uma pressão constante de 45 e/ou 50 mN/m, nas condições descritas no capítulo 2, secção 2.2.2. O objectivo deste estudo foi verificar e detectar a transferência de monocamadas de fosfolípidos da superfície da subfase aquosa na presença ou na ausência de GOx para slides de Au, utilizando o método de deposição. Para facilitar a análise dos filmes utilizou-se substratos sólidos de Au e a sua análise foi efectuada a partir dos espectros de transmitâncias e absorvâncias de infravermelho. 3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au Como o filme do fosfolípido formado à superfície da subfase é hidrofóbico, o slide de Au foi depositado de cima para baixo (capítulo 1, secção 1.2.3.). Depois de se espalhar o fosfolípido à superfície da subfase esperou-se cerca de 30 minutos para deixar o solvente evaporar. Em seguida seleccionou-se um “target” (pressão superficial constante a que se efectuou a deposição), e iniciou-se a compressão. Para se obter uma correcta razão de transferência (RT) teve que se esperar até que a monocamada estivesse suficientemente estável. (RT = razão entre as variações/reduções da área da monocamada durante a deposição e a área do substrato que foi utilizada). 65 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Desta forma, se atingir o “target” seleccionado (Π = 45 e/ou Π = 50 mN/m) injectou-se o volume de enzima correspondente na subfase aquosa e esperou-se por um período de 20-30 minutos para obter a estabilidade requerida para a deposição. Após este tempo efectuou-se a deposição do slide. Os resultados obtidos para a deposição podem ser visualizados na figura 3.7. A figura 3.7., mostra a isotérmica de DBPC na presença de GOx na subfase aquosa à temperatura de ~20 ºC. Verificou-se que à medida que o slide de Au penetra na subfase aquosa ocorre um aumento da transferência da monocamada, diminuindo, consequentemente, a área da monocamada presente na subfase aquosa. 70 [DBPC] = 1.00 mg/mL subfase: água VDBPC adicionado à subfase = 40 μL 60 Π / mN.m -1 50 Experiência 1Injecção de 100 μL de GOx 2.5 μM na subfase aquosa Experiência 2Injecção de 100 μL de GOx 5.0 μM na subfase aquosa 40 30 20 10 0 20 30 40 50 60 70 80 90 100 2 A / Å Figura 3.7.: Isotérmicas de DBPC obtidas por compressão na interface ar-água na presença da enzima GOx na fase aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Velocidade de deposição: 2 mm/min. Através da análise do espectro de reflectância (figura 3.8.) do slide de Au, resultante da deposição da monocamada de DBPC, na presença da enzima GOx na fase aquosa, verificou-se que ocorreu transferência da monocamada de DBPC presente na superfície da subfase aquosa para o slide de Au, pois as bandas assinaladas a azul, correspondem aos diferentes grupos funcionais que se podem encontrar na constituição da molécula de DBPC. 66 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 0,010 2 0,008 1 5 0,006 3 4 Experiência 1Injecção de 100 μL de GOx 2.5 μM na subfase aquosa Experiência 2Injecção de 100 μL de GOx 5.0 μM na subfase aquosa 0,004 Reflectância [DBPC] = 1.00 mg/mL subfase: água VDBPC adicionado à subfase = 40 μL 0,002 0,000 -0,002 -0,004 -0,006 5000 4000 3000 2000 1000 -1 Número de onda / cm Figura 3.8.: Espectros de reflectância de slides de Au depositado na monocamada do fosfolípido DBPC, na presença de GOx na subfase aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min; velocidade de deposição: 2 mm/min. Desta forma, recorrendo à tabela de espectros de infravermelho da referência [87], pode fazer-se uma análise das bandas obtidas na figura 3.8. Assim, a banda assinalada com o n.º 1, com valores de absorvância entre ~3960-2830 cm-1 indica a presença de ligações O-H, devido à água contida no slide; a banda nº 2, com valores de absorvância entre ~3010-2830 cm-1, indica a presença dos grupos da cadeia alifática, CH2, CH3 (ligações C-H) e de grupos N-CH3; a banda n.º 3, com valores de absorvância entre ~1830-1610 cm-1 indica a presença de grupos ésteres (COOR); a banda n.º 4, com valores de absorvância entre ~1480-1350 indica a presença de ligações C-H2 no plano; a banda n.º 5, com absorvância entre ~1270-940 cm-1 indica a presença de grupos éter (R–O–R), ligações: alquilaminas C-N strech e P-O alquil. Não se evidencia a presença de grupos funcionais pertencentes à enzima GOx, pelo que esta não terá sido transferida da subfase aquosa para o slide de Au durante a deposição, possivelmente devido ao seu grande tamanho e volume, ou devido ao facto desta se dissolver na subfase aquosa não penetrando na monocamada do fosfolípido, ou ainda, devido ao facto da concentração de GOx presente em solução ser muito pequena para que a sua transferência ocorresse para o slide. Assim, para as gamas de concentrações de GOx estudadas, não se observa qualquer influência desta, quer na isotérmica do fosfolípido, quer na transferência para substractos sólidos, como se pode comprovar pelos espectros de absorvância obtidos. A deposição da monocamada foi efectuada de acordo com o que está representado na figura 1.14. do capítulo 1, secção 1.2.4. Trata-se de um processo de deposição do tipo-X para filmes hidrofóbicos do fosfolípido, onde as “caudas” do fosfolípido estariam orientadas para o interior do substrato sólido, enquanto que as “cabeças” ficaram dirigidas para fora do substrato. 67 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.2. Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas e da enzima GOx em interfaces líquido-líquido polarizadas Nesta segunda fase, o presente trabalho teve como objectivo caracterizar e estudar electricamente a adsorção de diferentes fosfatidilcolinas e da enzima GOx na interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES). Para caracterizar essa interacção obtiveram-se as curvas de capacidade de dupla camada na interface polarizada, utilizando-se a espectroscopia de impedância electroquímica (EIE) e a voltametria cíclica (v.c.). Foram também efectuados estudos de adsorção de fosfolípidos, na presença da GOx na fase aquosa, com o objectivo de determinar o seu efeito e influência na formação de monocamadas de fosfatidilcolinas em interfaces líquido-líquido polarizadas. Embora as alterações na estrutura da dupla camada da interface, induzida pela adsorção de uma monocamada de fosfolípido, possam ser consideradas como um modelo simplista para as membranas biológicas [69], estas não produzem, um ambiente fisicamente realista para a configuração de proteínas transmembranares. A principal diferença é a presença do solvente orgânico no interior da monocamada. As moléculas do solvente orgânico “filtram” as interacções atractivas entre as caudas dos hidrocarbonetos dos fosfolípidos, e consequentemente tornam a camada mais expandida. Na maior parte dos estudos de monocamadas de fosfolípidos nas ITIES, a camada tem sido formada por adsorção do lípido a partir da fase orgânica [74]. Contudo, existe uma incerteza quanto ao estado exacto da camada devido à incapacidade de controlar a pressão superficial. Os estudos electroquímicos de tais monocamadas pode, por sua vez, fornecer informação fundamental na transferência de massa através das bicamadas lipídicas, à medida que a velocidade de transferência de carga é medida como uma corrente eléctrica. Todas as experiências de medição de impedâncias electroquímica para a obtenção das curvas da capacidade em função do potencial aplicado, que a seguir se apresentam, foram realizadas à temperatura ambiente e a pH ~7 (excepto aquelas em que o objectivo era estudar o efeito do pH), pois as fosfatidilcolinas utilizadas possuem um grupo zwiterião cujo domínio de estabilidade corresponde ao pH de uma solução neutra [58]. As medições de impedâncias foram efectuadas após se terem definido as janelas de potencial a partir dos voltamogramas cíclicos dos sistemas em estudo. Estas medições foram efectuadas na zona de potencial entre -250 mV e 250 mV para os diferentes sistemas em estudo, com o objectivo de se obterem as respectivas curvas de capacidade. Todas os dados de impedâncias obtidos a cada potencial para todos os sistemas em estudo formam bem ajustados pelo circuito equivalente representado na figura 1.22. (erros de ajuste entre 2-5%), utilizando o programa EQUIVCRT desenvolvido por Boukamp [56]. 68 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE polarizada Começou-se por estudar o efeito do pH da solução aquosa no processo de adsorção da GOx na interface água/1,2-DCE. Para pH 7, a célula electroquímica utilizada pode ser esquematizada da seguinte forma: 10 mM NaTPB Célula 1: Ag AgCl (RE2) + 100 mM LiCl + 10 mM TOATPB 10 mM Na2HPO4 + AgCl Ag . 10 mM NaCl (1,2–DCE) 10 mM NaH2PO4 2H2O (H2O) (org) (H2O) (RE1) pH ~ 7 A esta célula foi adicionado 0.1 μM de GOx à fase aquosa. Para os restantes valores de pH foram preparadas as respectivas soluções aquosas, substituindo-se a solução aquosa de pH 7 da célula anterior pelas soluções a seguir indicadas: 100 mM LiCl +: 100 mM HCl (pH 1), ou 10 mM HCl (pH 2), ou 0.158 M Na2HPO4 + 10 mM NaH2PO4.2H2O (pH 8.4), ou 2.51x10-3 M Na2HPO4 + 10 mM NaH2PO4.2H2O (pH 6.6). Da observação dos voltamogramas cíclicos (figura 3.9.–B) para os diferentes sistemas em estudo, não se observaram diferenças significativas, nos valores de intensidade de corrente para as soluções a diferentes valores de pH contendo 0.1 μM de GOx. Na figura 3.9.–A, estão representadas as curvas de capacidade em função do potencial aplicado para uma mesma concentração de GOx (0.1 μM) a diferentes valores de pH. Este valor de concentração de GOx foi escolhido, no sentido de avaliar o efeito do pH para concentrações de GOx muito baixas, pois se o efeito aqui é notório, para concentrações mais elevadas esse efeito será proporcional à concentração. A enzima possuí um ponto isoeléctrico (pI) igual a 4.44, e quando em solução aquosa a pH neutro, encontra-se carregada negativamente com 11 cargas [59]. Por esta razão, com o objectivo de avaliar o efeito do pH, foram escolhidas soluções aquosas com valores de pH inferiores e superiores ao seu pI. 69 Capítulo 3 — Resultados e Discussão 25 C / μF.cm-2 20 10 0 10 -10 5 -20 0 50 0.1 μMGOx - pH=7.0 0.1 μMGOx - pH=1.1 0.1 μMGOx - pH=2.0 0.1 μMGOx - pH=6.6 0.1 μMGOx - pH=7.0 0.1 μMGOx - pH=8.4 20 15 0 -250 -200 -150 -100 -50 Relatório de Seminário 30 0 μM GOx - pH = 7.0 0.1 μM GOx - pH = 1.1 0.1 μM GOx - pH = 2.0 0.1 μM GOx - pH = 6.6 0.1 μM GOx - pH = 7.0 0.1 μM GOx - pH = 8.4 I / μA 30 QUÍMICA ANALÍTICA -30 -300 100 150 200 250 -200 Δφ/ mV -100 0 100 200 300 400 Δφ / mV A) B) Figura 3.9.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface entre a solução de 1,2-DCE e a solução aquosa contendo 0.1 μM de GOx a diferentes valores de pH. B) Voltamogramas cíclicos correspondentes ao sistema água/1,2-DCE contendo 0.1 μM de GOx a diferentes valores de pH. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). As curvas de capacidade apresentam comportamentos um pouco distintas para os diferentes valores de pH estudados. Os valores da capacidade encontram-se abaixo da do electrólito base, o que indica que a GOx adsorveu ao longo de toda a gama de potenciais. A excepção aconteceu para valores de pH inferiores ao pI da enzima (pH 1 e 2), onde se observou um aumento da capacidade acima do valor da do electrólito base para Δφ > ~ -50 mV. A estes potenciais ocorrerá a protonação da enzima GOx na fase aquosa, dificultando a sua adsorção na interface e aumentando a sua tendência para permanecer em solução aquosa (pois a enzima passará a estar carrega positivamente), originando o aumento da capacidade interfacial, e consequente, a desorção de GOx da interface. Para valores de pH superiores ao ponto pI da enzima (pH 6.6 e 8.4), observou-se um maior efeito na adsorção da enzima, do que a pH próximo do pI da enzima, na interface água/1,2-DCE. Este facto resultará de que a pH > 4.4, a enzima encontrar-se-á carregada negativamente, resultante da desprotonação dos grupos carregados positivamente, ocorrendo adsorção ao nível da interface. Desta forma, as diferenças observadas nas curvas de capacidade indicam que a adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE é afectada pelo pH da fase aquosa. Este estudo possibilitou a análise da adsorção da enzima GOx (0.1 μM) quando em solução aquosa para diferentes valores de pH. Uma vez que, se pensa, segundo diversos autores [59,88,89], que a pH ~7 a enzima GOx terá uma actividade mais elevada, os estudos que a seguir se apresentam com GOx, são todos efectuados com este valor de pH da solução aquosa. 70 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.2.2. Estudo de adsorção da GOx na interface água/1,2-DCE A adsorção da enzima GOx na interface água/1,2-DCE foi estudada com base nas curvas de capacidade interfacial, utilizando uma célula electroquímica idêntica à célula 1, representada na secção anterior, adicionandolhe x μM de GOx à fase aquosa. Na figura 3.10. estão representados alguns exemplos dos voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a referida célula, para diferentes concentrações de GOx na fase aquosa. 80 0 μM GOx 1 μM GOx 2 μM GOx 15 μM GOx 60 40 I / μA 20 0 -20 -40 -60 -80 -300 -200 -100 0 100 200 300 400 Δφ / mV Figura 3.10.: Voltamogramas cíclicos para a interface água/1,2-DCE na presença de GOx na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização de compensação da queda óhmica (IR). Os voltamogramas cíclicos mostram que a adição de GOx à fase aquosa não causa qualquer desvio marcante nas margens da janela de potencial, não se observando diferenças significativas para os diferentes sistemas em estudo. Não há sinais evidentes de precipitação na interface, resultantes de uma possível desnaturação da enzima. Pressupõe-se que a enzima não precipita ou induz qualquer transferência iónica dos electrólitos de suporte. Um exemplo dos espectros de impedância obtidos a –25 mV pode ser observado na figura 3.11., representado num diagrama de Nysquist ou de Argand. 71 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 0 μM GOx 0.5 μM GOx 12 μM GOx 4 6x10 4 5x10 4 -Z'' / Ω 4x10 4 3x10 0.5 Hz 4 2x10 4 1x10 200 Hz 0 3 5,0x10 4 1,0x10 4 1,5x10 4 2,0x10 Z' / Ω 4 2,5x10 4 3,0x10 4 3,5x10 4 4,0x10 Figura 3.11.: Exemplo de espectros de impedância para a interface água/1,2-DCE na presença de GOx na fase aquosa. Δφ = -25 mV. Após se efectuar o ajuste das impedâncias, obtiveram-se as curvas de capacidade (capacidade da dupla camada, em função da variação de potencial), representadas na figura 3.12., para as diferentes concentrações de GOx na fase aquosa. 20 0 μM GOx 0.1 μM GOx 0.5 μM GOx 1 μM GOx 2 μM GOx 5 μM GOx 10 μM GOx 12 μM GOx C / μF.cm -2 15 10 5 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 250 Δφ / mV Figura 3.12.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM GOx na fase aquosa. 72 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Da análise da figura 3.12., são observáveis diferentes comportamentos nas curvas de capacidade à medida que a GOx vai sendo adicionada à fase aquosa. Os valores da capacidade para as diferentes concentrações de GOx encontram-se abaixo da do electrólito base, o que indica que ocorreu adsorção da enzima ao longo de toda a gama de potenciais estudados. A potenciais mais negativos a capacidade interfacial diminuiu à medida que se adicionou GOx à fase aquosa até se atingir uma concentração de GOx de cerca de 5 μM (concentração para a qual os valores de capacidade atingem um valor mais baixo, correspondente a uma possível saturação interfacial). A concentrações de GOx superiores a 5 μM, observou-se um aumento nos valores da capacidade. Uma possível explicação é que, à medida que a concentração de GOx aumenta na fase aquosa, a adsorção da enzima na interface origina uma diminuição da capacidade até um valor mínimo para a qual se atinge a saturação (para a gama de concentrações estudadas corresponde a CGOx = 5 μM). Para concentrações superiores a 5 μM, a enzima poder-se-á comportar como uma camada dieléctrica [59], bloqueando a interface (pois a saturação foi atingida), originando um aumento da capacidade interfacial. Este comportamento foi também observado por Georganopoulou et al. [59] na interface água/TBuATPB (DCE) e água/BTPPATPB (DCE). No entanto, ao contrário do que foi observado por aqueles autores, para o sistema em estudo foi possível definir o valor de potencial de carga zero (pcz– potencial mínimo, resultante da intersecção das curvas de capacidade [68]), ou seja, um ponto de intersecção das curvas Cd vs. E, para as diferentes concentrações de GOx. No presente caso em estudo, é notório que a partir de Δφ = 0 mV, ocorre uma mudança no comportamento dos sistemas. A potenciais positivos a variação da capacidade interfacial com a concentração da enzima GOx na fase aquosa é inferior à observada a potenciais negativos, o que indica que a estes potenciais a sua adsorção à interface é menor. Este efeito pode ter sido originado por variação do potencial de cobertura ou da conformação da enzima [75,88,89], ou por alteração na co-adsorção do catião orgânico [59], causando uma alteração na quantidade de carga armazenada na interface. Também segundo Georganopoulou et al. [59], a capacidade interfacial varia com o tempo e com a concentração da enzima GOx, alterando o estado de adsorção da enzima, sendo este também afectado pela natureza e concentração do electrólito de suporte orgânico, daí os resultados não serem concordantes com os obtidos por aqueles autores. Assim, a incorporação do catião orgânico na camada adsorvida da enzima carregada negativamente, pode reduzir a reorientação conformacional da enzima, semelhante aos resultados publicados por Rosilio et al. [75] para o fosfolípido DBPC, onde a adsorção da GOx na interface ar-água foi promovida por co-adsorção de lípido. Desta forma, a adsorção a potenciais negativos, aumenta até um valor limite de concentração de GOx (CGOx = 5 μM), podendo este estado de adsorção da enzima ser devido à co-adsorção do catião orgânico. Após a desorção do catião, à medida que a fase aquosa se torna mais positiva, ocorre um aumento da capacidade, resultante da desorção da enzima na interface. Consequentemente, o comportamento observado nas curvas de capacidade para o sistema em estudo parece depender, quer do potencial aplicado ao sistema, quer da concentração de GOx adicionada à fase aquosa da célula 73 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário electroquímica. O comportamento observado a potenciais negativos é típico da adsorção de compostos orgânicos em interfaces electrificadas. Através da representação do valor do potencial correspondente ao mínimo da capacidade, Δφ(mín. cap.), em função da CGOx (figura 3.13.), pode observar-se que este valor de potencial se desloca para valores negativos com o aumento da concentração de GOx, atingindo-se um valor constante de Δφ(mín. cap.) a cerca de –25 mV. Δφmín. cap. / mV 0 -10 -20 -30 0 2 4 6 8 10 12 [GOx] / μM Figura 3.13.: Deslocamento do potencial ao mínimo de capacidade com o aumento da concentração de GOx. A partir dos valores da capacidade para as diferentes concentrações de GOx ensaiadas a Δφ = -25 mV (potencial correspondente ao mínimo de capacidade nas curvas de capacidade para as diferentes concentrações de GOx na fase aquosa) – figura 3.14., pode entender-se melhor o comportamento observado. A figura 3.14. mostra claramente que a composição da interface é variável com a concentração de GOx para potenciais negativos. 74 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Δφ = -25 m V 5.5 C / μF.cm -2 5.0 4.5 4.0 3.5 3.0 0 2 4 6 8 10 12 [G O x] / μ M Figura 3.14.: Variação da capacidade da dupla camada com a concentração de GOx para Δφ = -25 mV. Para se estudar o efeito da adsorção, é necessário determinar a isotérmica correspondente. A isotérmica de adsorção pode ser definida como a relação entre as concentrações interfaciais de um dado surfactante e o grau de cobertura a temperatura constante. Para interfaces sólido-líquido a equação de adsorção mais utilizada é a de Langmuir. Uma outra, derivada da equação de Langmuir e mais elaborada, é a equação de isotérmica de Frumkin, que contém um parâmetro relativo às interacções partícula-partícula, e foi utilizada por Kakiuchi et al. [68] no estudo de adsorção da DLPC na interface água-nitrobenzeno. Desta forma, os modelos anteriores podem ser aplicados para efectuar o estudo de adsorção da enzima GOx. A adsorção da enzima GOx pode ser descrita pelo modelo de Frumkin, numa primeira aproximação, na zona de potencial –25 mV. Avaliou-se o valor de θ utilizando a equação de Frumkin, dada a impossibilidade de determinar o excesso superficial: Ct = (1–θ).Caq’ + θ.CGOx (3.2.) onde, Ct é a capacidade interfacial, θ é a cobertura superficial, Caq’ é a capacidade interfacial sem GOx, e CGOx é a capacidade interfacial considerando que se forma uma monocamada de GOx completa e compacta na interface. Esta equação, é apenas válida quando a variação de θ com o potencial é insignificante, facto que se admite neste caso. Esta hipótese torna-se inadequada nas zonas de potencial positivo, onde dθ/dE é relativamente grande. Assim, dois modelos de isotérmicas foram aplicados a este sistema: 1. Um modelo mais simples, formulado para uma interface sólido-líquido, modelo da isotérmica de Frumkin: 75 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA βc = θ/(1–θ) e-2aθ Relatório de Seminário (3.3.) onde, β é o coeficiente de adsorção, c a concentração de fosfolípido, e a o parâmetro de interacção. Rescrevendo a equação 3.3., temos: ln β = ln [(θ/c.(1-θ)]-2aθ (3.4.) 2. Modelo de Volkov, formulado para uma interface líquido-líquido: βcr = [θ(p–(p–1) θ)p–1] / [pp(1–θ)p] e-2aθ (3.5.) onde, p é o parâmetro correspondente ao número de colunas de solvente orgânico que pode ser substituído por uma molécula de espécie adsorvida, e o parâmetro r corresponde ao número de agregação das moléculas de espécies adsorvidas na interface. Recorrendo à figura 3.14., e considerando que se forma uma primeira camada da enzima adsorvida para concentrações da enzima de ~5 μM, retirou-se o valor da capacidade interfacial da camada saturada, CGOx = 3.3 μF.cm-2, e o valor da capacidade interfacial sem GOx obtido através da relação da capacidade com a concentração, Caq’ = 5.4 μF.cm-2. Na figura 3.15. o ln [(θ/CGOx.(1-θ)] é representado em função do grau de cobertura, θ. 18 Δφ = -25 mV ln [θ/(CGOx.(1-θ)] 16 14 12 10 8 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 θ Figura 3.15.: Teste da isotérmica de Frumkin para a enzima GOx a Δφ = –25 mV. Na tabela 3.2. estão indicados os parâmetros termodinâmicos obtidos neste ajuste. 76 1,0 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Tabela 3.2.: Parâmetros termodinâmicos para a GOx na interface água/1,2-DCE, obtidos a partir dos resultados da figura 3.12. e 3.15. Isotérmica Frumkin Δφmín. cap. / mV -25 a 4.0 ln β 8.4 ΔGºads* / KJ.mol-1 -21 Caq’ / μF.cm-2 5.4 CGOx / μF.cm-2 3.3 * ln β = -ΔGºads/RT Os resultados obtidos mostram que as interacções entre as espécies interfaciais são atractivas, pois o valor do parâmetro a é positivo. O valor de ln β 8.4, permite o cálculo da energia padrão de adsorção de -21 KJ.mol-1. Os estudos anteriores possibilitaram a análise de adsorção da enzima GOx quando em solução aquosa, em função de vários parâmetros químicos experimentais, nomeadamente o potencial, concentração da enzima e pH. Contudo, foi também objectivo deste trabalho estudar o efeito da presença da GOx na fase aquosa, quando na presença de fosfatidilcolinas na fase orgânica, no sentido de determinar em que medida a presença de GOx condiciona ou não as características de adsorção das fosfatidilcolinas. Esses estudos são seguidamente apresentados. 3.2.3. Estudos de adsorção de DAPC (C20). Efeito da presença de GOx na fase aquosa O fosfolípido DAPC, é uma fosfatilcolina com duas cadeias de 20 átomos de carbono cada uma (C20). O esquema da célula electroquímica é igual ao apresentado na secção 3.2.1. (célula 1), tendo-se, neste caso, acrescentado 1 μM DAPC à fase orgânica e x μM de GOx à fase aquosa, para se obterem as respectivas curvas de capacidade. Foi escolhida esta concentração de fosfolípido, apenas como ponto de partida para se iniciar o estudo. Os voltamogramas cíclicos mostram que a presença do fosfolípido na fase orgânica e a adição de GOx na fase aquosa não causam qualquer desvios marcantes nas margens da janela de potencial. A figura 3.16., mostra as curvas de capacidade (capacidade da dupla camada em função da variação do potencial), para o sistema em estudo e para as várias concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa, na presença do fosfolípido na fase orgânica. 77 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 30 0 μM DAPC + 0 μM GOx 1 μM DAPC + 0 μM GOx 1 μM DAPC + 0.2 μM GOx 1 μM DAPC + 1 μM GOx 1 μM DAPC + 10 μM GOx 25 C / μF.cm- 2 20 15 10 5 0 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 Δφ / mV Figura 3.16.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2–DCE na presença de 1 μM de DAPC na fase orgânica, e para diferentes concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa. Da análise das curvas de capacidade observou-se que a potenciais negativos, a presença do fosfolípido (e na ausência de GOx na fase aquosa) origina uma diminuição da capacidade interfacial, resultante da adsorção do fosfolípido na interface. À medida que a enzima vai sendo adicionada à fase aquosa, ocorreu um aumento da capacidade interfacial, e consequente, à desorção do fosfolípido, sendo este efeito tanto maior quanto maior a concentração da GOx na fase aquosa. A explicação para este facto é que a enzima pode bloquear a interface, impedindo a adsorção do fosfolípido, aumentando o valor da capacidade. O efeito observado a potenciais negativos poder-se-á dever ainda, a uma possível substituição das moléculas de fosfolípido (desorção) da interface por moléculas de GOx (adsorção), ou pela partilha mútua da interface por ambas as espécies (adsorção mútua). A potenciais positivos, a capacidade interfacial para os diferentes sistemas segue praticamente a do electrólito base, indicando que as espécies em estudo terão uma maior tendência para permanecer na solução em que foram colocadas inicialmente. Contudo, como demonstraram os estudos efectuados com a balança de Langmuir (apresentados na secção 3.1.3.), este fosfolípido possuí um comportamento que varia bruscamente com o factor tempo, sendo difícil de avaliar até que ponto as suas soluções são estáveis, pois parece que este fosfolípido sofre uma rápida degradação ao longo do tempo. Perante estas dúvidas não se realizaram mais ensaios com DAPC e os estudos foram orientados para outras fosfatidilcolinas. 78 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença da GOx na fase aquosa No seguimento do estudo anterior foram efectuados ensaios com o fosfolípido DBPC (C22). As condições experimentais anteriormente descritas foram mantidas na realização destes ensaios, adicionando x μM de DBPC à fase orgânica e x μM de GOx à fase aquosa, na célula electroquímica representada na secção 3.2.1. Não se observaram diferenças significativas nos voltamogramas cíclicos pela adição de DBPC à fase orgânica para os sistemas em estudo, nem mesmo com a adição de GOx na fase aquosa. A figura 3.17.–A, B, C e D, mostra as curvas de capacidade, para o sistema com diferentes concentrações de DBPC na fase orgânica, na ausência e na presença da enzima GOx na fase aquosa. 30 30 0 μM DBPC 1 μM DBPC 5 μM DBPC 50 μM DBPC 25 25 20 C / μF.cm-2 C / μF.cm-2 20 15 10 5 0 -200 0 μM DBPC + 0 μM GOx 1 μM DBPC + 0 μM GOx 1 μM DBPC + 0.1 μM GOx 1 μM DBPC + 0.5 μM GOx 1 μM DBPC + 1 μM GOx 1 μM DBPC + 2 μM GOx 1 μM DBPC + 3 μM GOx 15 10 5 -150 -100 -50 0 50 100 150 0 -200 200 Δφ/ mV -150 -100 -50 0 Δφ / mV A) B) 79 50 100 150 200 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 30 30 0 μM DBPC + 0 μM GOx 5 μM DBPC + 0 μM GOx 5 μM DBPC + 0.125 μM GOx 5 μM DBPC + 3 μM GOx 25 20 C / μF.cm-2 C / μF.cm-2 0 μM DBPC + 0 μM GOx 50 μM DBPC + 0 μM GOx 50 μM DBPC + 1 μM GOx 25 20 15 10 5 0 -200 Relatório de Seminário 15 10 5 -150 -100 -50 0 50 100 150 0 -200 200 Δφ/ mV -150 -100 -50 0 50 100 150 200 Δφ / mV C) D) Figura 3.17.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE para diferentes concentrações de DBPC na fase orgânica, na ausência da enzima GOx na fase aquosa–A), e na presença da enzima GOx na fase aquosa–B), C) e D). Os valores das curvas de capacidade obtidos para a DBPC encontram-se bem abaixo da solução do electrólito base, o que indica uma adsorção deste fosfolípido para toda a gama de potenciais estudados. Da análise da figura 3.17.–A, observou-se que a potenciais negativos os valores da capacidade diminuem com o aumento da concentração da DBPC na fase orgânica, enquanto que, a potenciais positivos, verificou-se um ligeiro aumento da capacidade para concentrações mais baixas de DBPC, resultante da ligeira desorção do fosfolípido da interface. Para a gama de concentrações estudadas, observou-se que a partir de CDBPC ≥ 5 μM, ocorreu a formação de uma monocamada estável ao longo de toda a gama de potenciais estudados, sendo visível a existência de um patamar quase horizontal constante na capacidade interfacial, contrariamente ao que foi observado para o fosfolípido DAPC. Assim, a adsorção do fosfolípido na interface é tanto maior, quanto maior é a sua concentração, na ausência da GOx na fase aquosa. Para CDBPC = 1 μM (figura 3.17–B), e na presença de GOx na fase aquosa, a potenciais positivos, ocorreu uma forte adsorção do fosfolípido na interface na presença de baixas concentrações de GOx na fase aquosa (0.1 μM), observável pelos baixos valores de capacidade obtidos, ao longo de toda a gama de potenciais. A baixa concentração da enzima GOx e a presença do fosfolípido na interface, parece ser favorável para a ocorrência de uma forte adsorção. À medida que se aumentou a concentração da enzima na solução aquosa, observou-se um aumento nos valores da capacidade interfacial, resultante da desorção do fosfolípido na interface, devido ao facto da enzima poder bloquear a interface, impedindo a adsorção do fosfolípido. Este efeito foi tanto maior, quanto maior a concentração da enzima adicionada à fase aquosa (no entanto, para baixas concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa o efeito não foi muito pronunciado). 80 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A potenciais positivos, observou-se, de uma forma geral, uma tendência para o aumento da capacidade interfacial na presença da enzima GOx (tal como foi observado para o fosfolípido DAPC), indicando uma desorção do fosfolípido na interface e um aumento da adsorção da enzima da GOx, à medida que a fase orgânica se torna mais positiva relativamente à fase aquosa. Também aqui, os efeitos observados a potenciais positivos podem ser explicados pelas hipóteses apresentadas para o caso do fosfolípido DAPC: uma possível substituição das moléculas de fosfolípido (desorção) da interface por moléculas de GOx (adsorção), ou ainda pela partilha mútua da interface por ambas as espécies (adsorção mútua). Para CDBPC = 5 e 50 μM (figura 3.17.–C e D, respectivamente), observou-se uma forte adsorção do fosfolípido ao longo de toda a gama de potenciais estudados na presença da GOx. Para concentrações elevadas de fosfolípido (50 μM) a adição da enzima à fase aquosa praticamente não provocou qualquer alteração nas curvas de capacidade, pois a monocamada está saturada para esta concentração de DBPC. Para concentrações de DBPC de 5 μM, a presença da enzima na fase aquosa originou um aumento da capacidade, resultante da desorção do fosfolípido na interface. Este efeito voltou a ser mais elevado para maiores concentrações da enzima GOx adicionada à fase aquosa. A adsorção do fosfolípido DBPC pode, tal como no caso da GOx, ser descrito pelo o modelo de Frumkin anteriormente referido. Este estudo só é possível para o caso da presença de 1 μM de DBPC na fase orgânica e de x μM de GOx na fase aquosa, uma vez que, para os outros casos em estudo o número de dados experimentais não é suficiente para efectuar esta análise. Na tabela 3.3. apresentam-se os valores dos parâmetros termodinâmicos para o caso referido anteriormente. Nesta tabela, estão também representados os estudos efectuados por D.T. Reza [90], para x μM de DBPC adicionada à fase orgânica. Tabela 3.3.: Parâmetros termodinâmicos na presença de 1 μM de DBPC na fase orgânica, e na presença de x μM de GOx na fase aquosa, para uma interface água/1,2-DCE, obtidos a partir dos resultados da figura 3.17.–B, e comparação com os resultados obtidos por D.T. Reza [90]. 1 μM de DBPC + x μM de DBPC x μM de GOx [90]# Isotérmica Frumkin Frumkin Δφmín. cap. / mV -50 -75 a 1.4 1.9 ln β 12.5 11.4 81 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário ΔGºads* / KJ.mol-1 -31 -28 Caq / μF.cm-2 4.8 4.4 Clip / μF.cm-2 2.7 0.80 * ln β = -ΔGºads/RT # Resultados obtidos a partir do trabalho desenvolvido por D.T. Reza (não publicados). Onde, Caq é a capacidade interfacial sem fosfolípido, e Clip é a capacidade interfacial considerando que se forma uma monocamada de fosfolípido completa e compacta na interface. Por comparação dos resultados da tabela 3.3., verifica-se um ligeiro deslocamento do potencial mínimo da capacidade quando se adiciona a GOx à fase aquosa. O valor de a nos dois casos em estudo é positivo, o que indica que as interacções entre as moléculas adsorvidas são atractivas. No entanto, estas interacções parecem ser mais fortes na ausência da enzima GOx na fase aquosa, pois aqui o valor de a é ligeiramente superior. Por outro lado, a adsorção da DBPC é mais forte na ausência de GOx na fase aquosa, pois o valor de Clip, é muito mais baixo neste caso (0.80 μF.cm-2), do que no caso da presença de GOx (2.7 μF.cm-2). O valor de ΔGºads obtido quando temos apenas DBPC na fase orgânica é ligeiramente inferior ao obtido na presença de GOx na fase aquosa, indicando que a adsorção de DBPC é mais favorável no primeiro caso. 3.2.5. Estudos de adsorção de DPPC (C16) Grande parte do estudo deste trabalho foi efectuado com fosfolípido DPPC (C16). Escolheu-se este fosfolípido, por não existirem ainda muitos estudos sobre a sua adsorção em interfaces líquido-líquido na literatura, ao contrário do que acontece com os fosfolípidos DBPC, DSPC e DLPC. Os objectivos deste estudo e as condições experimentais utilizadas são semelhantes às anteriormente mencionadas. A adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE foi estudada, utilizando uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1., adicionando x μM de DPPC à fase orgânica. Na figura 3.18. estão representados alguns exemplos de voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula referida para o sistema em estudo. 82 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 100 0 μM DPPC 5 μM DPPC 15 μM DPPC 30 μM DPPC 50 μM DPPC 50 I / μA Relatório de Seminário 0 -50 -100 -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.18.: Voltamogramas cíclicos para a interface entre a solução de TOATPB 10 mM em 1,2-DCE e a solução aquosa de LiCl 100 mM, 10 mM Na2HPO4 e 10 mM NaH2PO4.2H2O, na presença de x μM de DPPC na fase orgânica. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). Os voltamogramas cíclicos não mostram diferenças significativas para concentrações de DPPC inferiores a 15 μM. Para concentrações iguais a 15 μM, observou-se o aparecimento de um pequeno pico de intensidade de corrente nos voltamogramas no varrimento negativo a cerca de -100 mV, semelhante ao que foi observado por Martins [58] para os fosfolípidos DSPC e DLPC a -110 mV. Para concentrações superiores a 15 μM, para além do pico observado no varrimento inverso (negativo), observou-se também um pico de intensidade de corrente no varrimento directo (positivo) a cerca de 200 mV. Verificou-se que estes picos sofrem uma diminuição ao longo do tempo, à medida que se aplica um programa cíclico de varrimento linear à célula electroquímica (no entanto, este efeito é mais notório no pico do varrimento directo). Esta diminuição ocorreu para concentrações mais elevadas de fosfolípido e a potenciais positivos, porque neste caso a transferência por difusão dos iões na interface origina a sua saturação, resultante do equilíbrio químico estabelecido entre as soluções. Observou-se ainda que, desligando o controlo de potencial e voltando novamente a ligá-lo, o pico no varrimento directo deixou de ser observado. Contudo, após um período de repouso entre 20 a 30 minutos, observou-se de novo o pico a potenciais mais positivos (varrimento directo), uma vez que, os iões regressaram à solução original, e em seguida voltarão a comportar-se da forma já descrita. O pico de intensidade de corrente que aparece nos voltamogramas a potenciais mais negativos (varrimento inverso), poderá ser resultante do fenómeno de adsorção do fosfolípido na interface, enquanto que o pico do varrimento directo, resultará de um possível fenómeno de desorção do fosfolípido da interface – processo de transferência de carga. Estes fenómenos, segundo Martins [58], parecem indicar que o aumento da quantidade de fosfolípido 83 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário provoca o transporte de estruturas auto-montadas, tais como, micelas do seio das soluções para a interface. Assim, a camada de fosfolípidos na interface poderá ser formada por micelas. Inicialmente ocorrerá difusão do fosfolípido até à interface, seguido da desintegração destas estruturas para formar um filme interfacial. As micelas formadas na fase orgânica em contacto com as moléculas de água podem formar microemulsões [74]. Para concentrações elevadas de fosfolípido na fase orgânica (acima de 15 μM), existirão também grandes quantidades de emulsões, podendo estas transferir-se juntamente com alguns iões através da interface, originando picos de corrente, tais como, os observados nos voltamogramas cíclicos da figura 3.18. Este fenómeno foi também observado por Martins para o fosfolípido DSPC e DLPC a concentrações superiores a 20 μM. Para as diferentes concentrações de DPPC e até 100 μM, adicionadas à interface água/1,2-DCE, obtiveramse as curvas de capacidade representadas na figura 3.19. 20 0 μM DPPC 0.2 μM DPPC 0.3 μM DPPC 0.5 μM DPPC 1 μM DPPC 1.4 μM DPPC 5 μM DPPC 30 μM DPPC 100 μM DPPC C / μF.cm -2 15 10 5 0 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 Δφ / mV Figura 3.19.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de DPPC na fase orgânica. Da análise da figura 3.19, observou-se um ponto de intersecção comum (pcz) nas curvas de capacidade para Δφ = 0 mV, correspondentes a um ponto de inflexão na dependência da quantidade de fosfolípido adsorvido, para o sistema em equilíbrio, tal como foi observado por Kakiuchi [68] e Martins [58], para os fosfolípidos DLPC e DSPC. Nas curvas de capacidade para as diferentes concentrações de DPPC são observáveis duas regiões distintas dependentes do potencial eléctrico aplicado: 1. a potenciais negativos, onde a capacidade interfacial diminuiu com a presença da DPPC na fase orgânica, sendo sempre menor que a capacidade correspondente à dos electrólitos base; 2. a potenciais positivos, onde a capacidade aumentou com a presença da DPPC, sendo sempre maior que a correspondente à da solução base. O comportamento observado mostra que a potenciais positivos a DPPC é desorvida da interface, tendo uma maior tendência para permanecer na fase orgânica. 84 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Para o caso dos potenciais negativos, temos que, para concentrações de fosfolípido na fase orgânica até cerca de 1 μM, a capacidade diminuí com o aumento da concentração. A 1.4 μM de DPPC, observou-se um aumento na curva de capacidade, que voltou novamente a diminuir para concentrações até cerca de 5 μM. Para 8 μM de DPPC a curva de capacidade voltou a aumentar, decaindo em seguida para concentrações de DPPC 15 μM. A concentrações mais elevadas que 15 μM, as curvas de capacidade mantiveram-se praticamente constantes até cerca de 100 μM, resultante da formação de uma camada saturada na interface. Este efeito sugere que a adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE é fortemente dependente da concentração de fosfolípido presente na solução orgânica. Este comportamento poderá estar relacionado com o que foi observado nas isotérmicas obtidas a partir da técnica de Langmuir-Blodgett (secção 3.1.5.), onde a partir da compressão do fosfolípido espalhado na interface ar-água, foi possível observar os diferentes estados de transição de fase da DPPC. Uma analogia semelhante poderá ser efectuada neste caso. Assim, as variações observadas para a gama de concentrações de 1 μM a 8 μM de DPPC, corresponderam a estados de transição de fase na interface água/1,2-DCE. Os estudos efectuados não permitem, no entanto, saber a que estados físicos corresponderam essas transições de fase. Desta forma, pode afirmar-se que o comportamento observado para as curvas de capacidade na presença de x μM de DPPC na fase orgânica é dependente, quer do potencial aplicado, quer da concentração de DPPC adicionada à fase orgânica. Convém ainda salientar que, apesar de se ter observado um pico de intensidade de corrente reversível e irreversível nos voltamogramas cíclicos para concentrações superiores a 15 μM, não se observou qualquer pico nas curvas de capacidade. Desta forma, formou-se uma camada saturada de DPPC na interface para 20 μM. O valor mínimo de capacidade obtido para esta monocamada saturada foi de cerca 1.0 μF.cm-2 a Δφ = -125 mV. Este valor é igual ao valor encontrado nas bicamadas das membranas lipídicas (cerca de 1 μF.cm-2 [91]), o que poderá indicar que o fosfolípido não está adsorvido numa monocamada, mas sim numa bicamada, sendo esta responsável pelo comportamento anteriormente descrito. Outra explicação para o efeito observado nas curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença de DPPC na fase orgânica, pode estar relacionado com o que foi observado por Girault e Schiffrin [92]. Estes autores sugeriram que a potenciais negativos os fosfolípidos adsorvem como zwiteriões numa interface água/1,2DCE, enquanto que a potenciais positivos ocorreria a reorganização dos fosfolípidos à superfície acompanhada da neutralização do grupo fosfato começando a espécie a comportar-se como surfactante catiónico. Kakiuchi et al. [67,70] obtiveram também o mesmo tipo de curvas de capacidade na interface águanitrobenzeno. Estes autores obtiveram curvas de capacidade e de tensão superficial experimentalmente, e observaram um deslocamento do potencial de carga zero, Δ0wφpcz, com o aumento da concentração de fosfolípido, para valores de potencial mais negativos, reafirmando a justificação de Girault e Schiffrin, que poderia estar relacionado com a acumulação de moléculas de fosfolípido dipolares orientadas na interface. Desta forma, Kakiuchi et al. [85] atribuíram os deslocamentos observados nos potenciais negativos à adsorção específica de iões Li+ provenientes do electrólito de suporte da fase aquosa do grupo polar hidrofílico dos fosfolípidos. Para estes autores, a explicação provável para o aumento da capacidade na região de potenciais positivos será devido à desorção das moléculas de fosfolípidos da interface acompanhada da transferência facilitada 85 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário de iões Li+. Desta forma, isto explicaria o aumento da capacidade acima dos valores de capacidade da linha de base, na zona positiva de potencial. A neutralização do grupo fosfato não parece muito provável, dado que, o ponto isoeléctrico do grupo de zwiterião da fosfatidilcolina tem um pH muito próximo do pH das soluções aquosas estudadas (pH ~7). Kakiuchi et al. afirmam ainda que, na zonas de potencial positivo poderão ocorrer processos de nãoequilíbrio na interface relacionados com a parcial desorção e variação da diferença de potencial eléctrica através da interface, o que permite justificar o facto de, nas zonas de potencial mais positivo, o aumento da capacidade com o aumento da concentração de fosfolípido não ser linear. Nas zonas de potencial negativo ocorre a adsorção de DPPC sob a forma de zwiterião, facto que provoca a diminuição dos valores de capacidade que estão directamente relacionados com a concentração de DPPC. Assim, a potenciais negativos, o comportamento observado para a DPPC é típico de componentes orgânicos em interfaces electrificadas. O gráfico do potencial correspondente ao mínimo de capacidade, Δφmín. cap., em função da concentração de DPPC (figura 3.20.), mostra que o valor do potencial se desloca para potenciais mais negativos com o aumento da concentração de DPPC na fase orgânica, atingindo um valor constante de Δφmín. cap. a cerca de –125 mV. 20 0 -20 Δφmín. cap. / mV -40 -60 -80 -100 -120 -125 -140 -160 -180 0 20 40 60 80 100 [DPPC] / μM Figura 3.20.: Deslocamento do potencial relativo ao mínimo de capacidade com o aumento da concentração de DPPC na fase orgânica. Este estudo foi efectuado a –125 mV, por ser o potencial correspondente ao mínimo de capacidade nas curvas de capacidade para as diferentes concentrações de DPPC na fase orgânica (a excepção é para CDPPC = 50 e 100 μM). As figuras 3.19., 3.20. e 3.21., mostram que a composição da interface se mantém inalterável com a concentração de DPPC a concentrações mais elevadas deste fosfolípido na zona de potencial mais negativo. Como primeira interpretação da figura 3.21., pode observa-se um patamar (representado a tracejado para concentrações entre 1 μM até 15 μM), correspondente à possível mudança no estado(s) de transição de fase(s) do fosfolípido, como foi atrás referido. 86 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Δφ = -125 mV 10 9.4 6 C / μF.cm -2 8 4 2 1 0 0 20 40 60 80 100 [DPPC] / μM Figura 3.21.: Variação da capacidade da dupla camada com a concentração de DPPC para Δφ = -125 mV. A cobertura superficial, θ, pode ser estimada pela equação 3.2., mas agora aplicada ao fosfolípido. A isotérmica de adsorção obtida a Δφ = -125 mV está representada na figura 3.22. Para o cálculo de θ, retirou-se da figura 3.21. o valor da capacidade interfacial da camada saturada, Clip ~1.0 μF.cm-2, e o valor da capacidade interfacial sem fosfolípido, Caq ~9.4 μF.cm-2. Estes resultados mostram que a partir de uma concentração de DPPC de ~20 μM, ocorre a formação de uma camada saturada. 1,0 0,8 Δφ = -125 mV θ 0,6 0,4 0,2 0,0 0 20 40 60 80 100 [DPPC] / μM Figura 3.22.: Isotérmica de adsorção para a DPPC a Δφ = -125 mV. 87 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A figura 3.23, mostra o logaritmo da concentração de DPPC na solução orgânica em função do grau de cobertura, bem como o ajuste para os dois modelos de isotérmicas anteriormente estabelecidos. Nestes ajustes fixouse r = 1 para diminuir o número de parâmetros obtidos pelos ajustes. Esta consideração é válida na medida em que se considera que os fosfolípidos formam uma camada e não se encontram agregados em vesículas ou micelas na interface. Δφ = -125 mV -9 Ajuste da isotérmica de Frumkin Ajuste da isotérmica de Volkov -10 ln [DPPC] -11 -12 -13 -14 -15 -16 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 θ Figura 3.23.: Teste para as isotérmicas de Frumkin e Volkov obtidos para as diferentes concentrações de DPPC estudadas para Δφ = –125 mV. Os parâmetros termodinâmicos obtidos a partir destes ajustes encontram-se na tabela 3.4. Comparando os dois ajustes efectuados, pode afirmar-se que os valores dos parâmetros termodinâmicos dos dois ajustes são iguais, o que sugere que os dois modelos podem ser utilizados para efectuar este tipo de estudo. Em ambos os ajustes o valor de a é positivo, sendo, desta forma, atractivas as interacções entre as espécies interfaciais. Na interface água/1,2-DCE obteve-se um valor mais baixo (1.1 e 1.0 μF.cm-2) para a capacidade na camada saturada de DPPC, que tem a mesma magnitude que a estimada a partir da tensão superficial para fosfatidilcolinas da gema de ovo adsorvidas na interface água/1,2-DCE na zona de potencial de adsorção [92]. Apesar destas diferenças indicarem a penetração do solvente orgânico em menor extensão, será necessário efectuar-se o estudo do efeito do solvente para se concluir com clareza se de facto é assim que acontece. 88 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Tabela 3.4.: Parâmetros termodinâmicos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE a pH ~7, obtidos a partir dos resultados para as diferentes concentrações de DPPC e do ajustes das isotérmicas de Frumkin e Volkov. Isotérmica Frumkin Δφmín. cap. / mV Volkov -125 p 1.0 0.92 a 1.1 1.0 ln β 13.4 13.4 ΔGºads* / KJ.mol-1 -33 -33 Caq / μF.cm-2 9.4 9.4 Clip / μF.cm-2 1.0 1.0 * ln β = -ΔGºads/RT Os valores de a obtidos para a DPPC são superiores aos obtidos por Kakiuchi et al. [67] na interface águanitrobenzeno para a DLPC (a = 0.3), e são inferiores aos obtidos por Martins [58] para a DLPC e a DSPC na interface água/1,2-DCE, respectivamente 1.8 e 2.3. O valor do parâmetro a obtido (1.1 e 1.0) e o valor da capacidade na camada saturada menor (1.0 μF.cm-2), sugerem que as interacções entre as moléculas do fosfolípido DPPC são menos intensas do que as observadas para a DLPC e DSPC por Martins, mas são mais intensas do que as observadas por Kakiuchi et al. para a DLPC. O facto do aumento da concentração de DPPC ter feito deslocar Δφmín. cap. para valores negativos (figura 3.20.), sugere que existe uma diferença de potencial de Galvani no Δowφpcz, de tal forma que o potencial interno da fase aquosa se vai tornando mais negativo relativamente ao potencial interno da fase orgânica até cerca de 125 mV. Esta alteração poder-se-á dever, ou à adsorção de iões perto do grupo carregado das moléculas de fosfolípido, ficando a fase aquosa com excesso de cargas negativas ou a fase orgânica com excesso de cargas positivas e/ou devido à alteração do momento dipolar com o aumento da concentração de fosfolípidos na interface [93,94]. Para além destas contribuições, a orientação da molécula na interface [94,95], também poderá estar relacionada com o deslocamento de Δφmín.cap. de cerca de -125 mV. Obteve-se um valor baixo para a capacidade interfacial na camada saturada, o que indica que a capacidade é controlada pela parte hidrofóbica da molécula do fosfolípido, sendo possível estimar a espessura da camada orgânica, utilizando um modelo simples da interface: Clip = εrε0/τ (3.6.) onde, Clip é a capacidade da interface, ε0 a constante dieléctrica relativa do vácuo (8.85x10-12 F/m), εr a constante dieléctrica da região adsorvida e τ a espessura da camada orgânica. Girault e Schiffrin [92], proposeram que uma 89 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário monocamada estável na interface será equivalente a ter um estado condensado com espessura de cerca de 3 nm, com uma constante dieléctrica para hidrocarboneto de aproximadamente 2. Desta forma, e para Clip = 1.0 μF.cm-2, a espessura da camada da DPPC seria de 1.7 nm, mais pequena do que a espessura de uma monocamada compacta em estado líquido condensado, o que indica que a camada saturada da DPPC poder-se-á encontrar no estado líquido expandido. Os estudos realizados mostraram também que para a interface água/1,2-DCE, as curvas da capacidade não são significativamente afectadas pela presença do sal de fosfato na fase aquosa do electrólito de suporte relativamente às soluções aquosas contendo apenas LiCl. Na presença do fosfolípido na fase orgânica não foram observadas diferenças marcantes quando se utilizou apenas como electrólito de suporte da fase aquosa o LiCl. Desta forma, pode concluir-se que a natureza do electrólito aquoso não tem um efeito significativo nas curvas de capacidade obtidas numa interface água/1,2-DCE. Desta forma, o aumento da capacidade observado a potenciais positivos não é atribuído à adsorção de iões do electrólito de suporte da fase aquosa no grupo polar hidrofílico dos fosfolípidos, uma vez que, de acordo com os resultados, a natureza e concentração do electrólito de suporte da fase aquosa não influencia significativamente os valores de capacidade, não sendo esta afectada pela quantidade de cargas existentes na interface. Tal como foi referido, o comportamento observado a potenciais positivos será devido à adsorção dos iões da fase orgânica ou à existência de um pico de adsorção/desorção do fosfolípido. Nesta zona de potencial o ião TPBserá adsorvido, mas em pequena extensão, uma vez que, os grupos carregados da camada lipídica encontram-se na fase aquosa. Desta forma, a existência de um pico de adsorção/desorção do fosfolípido, parece ser a mais credível. 3.2.5.1. Adsorção de DPPC. Estudos do efeito da presença da enzima GOx na fase aquosa A adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE foi também estudada na presença da enzima GOx na fase aquosa, através da análise das curvas de capacidade interfacial. Utilizou-se uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1., à excepção de se ter acrescentado x μM DPPC à fase orgânica e x μM de GOx à fase aquosa. Os voltamogramas cíclicos mostram um comportamento idêntico ao observado para os sistemas contendo apenas DPPC na fase orgânica, ou seja, para baixas concentrações de DPPC os voltamogramas cíclicos não mostram diferenças significativas, mesmo após a adição de GOx à fase aquosa. Para concentrações superiores a 15 μM de DPPC na fase orgânica (figura 3.24.), observou-se o aparecimento de um pico de intensidade de corrente no varrimento directo (positivo) e outro no varrimento inverso (negativo). Este efeito parece ser dependente da concentração da enzima GOx, pois à medida que se adicionou GOx à fase aquosa, observou-se um ligeiro aumento dos valores da intensidade de corrente nas regiões correspondentes ao aparecimento dos picos. 90 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 100 0 μM DPPC + 0 μM GOx 50 μM DPPC + 0 μM GOx 50 μM DPPC + 0.1 μM GOx 50 μM DPPC + 0.2 μM GOx 50 μM DPPC + 7 μM GOx 50 I / μA Relatório de Seminário 0 -50 -100 -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.24.: Voltamogramas cíclicos para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de DPPC na fase orgânica e de x μM de GOx na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). Na figura 3.25. estão representadas as curvas de capacidade para diferentes concentrações de DPPC na fase orgânica, na presença da enzima GOx na fase aquosa. De acordo com o estudo anterior, e dado o comportamento observado para o fosfolípido DPPC na interface água/1,2-DCE, foram escolhidas as concentrações de DPPC 1 μM, 1.4 μM e 5 μM, porque correspondem a situações onde ocorre uma mudança no comportamento das curvas de capacidade, quando apenas está presente o fosfolípido na fase orgânica. Foram também estudados os efeitos da presença da enzima para concentrações mais elevadas de DPPC (50 μM). 25 C / μF.cm-2 20 30 0 μM DPPC + 0 μM GOx 1 μM DPPC + 0 μM GOx 1 μM DPPC + 0.1 μM GOx 1 μM DPPC + 1 μM GOx 1 μM DPPC + 5 μM GOx 1 μM DPPC + 10 μM GOx 1 μM DPPC + 30 μM GOx 25 15 10 A) 15 10 5 5 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 μM DPPC + 0 μM GOx 1.4 μM DPPC + 0 μM GOx 1.4 μM DPPC + 0.1 μM GOx 1.4 μM DPPC + 0.2 μM GOx 1.4 μM DPPC + 1 μM GOx 20 C / μF.cm-2 30 0 50 0 -250 -200 -150 -100 -50 100 150 200 250 Δφ/ mV B) 91 0 Δφ/ mV 50 100 150 200 250 Capítulo 3 — Resultados e Discussão 25 C / μF.cm-2 20 30 0 μM DPPC + 0 μM GOx 5 μM DPPC + 0 μM GOx 5 μM DPPC + 0.15 μM GOx 5 μM DPPC + 1 μM GOx 5 μM DPPC + 3 μM GOx 5 μM DPPC + 7 μM GOx 5 μM DPPC + 10 μM GOx 25 20 C / μF.cm-2 30 QUÍMICA ANALÍTICA 15 10 5 0 -250 -200 -150 -100 -50 C) Relatório de Seminário 0 μM DPPC + 0 μM GOx 50 μM DPPC + 0 μM GOx 50 μM DPPC + 0.1 μM GOx 50 μM DPPC + 0.15 μM GOx 50 μM DPPC + 0.2 μM GOx 50 μM DPPC + 7 μM GOx 50 μM DPPC + 20 μM GOx 15 10 5 0 50 0 -250 -200 -150 -100 -50 100 150 200 250 Δφ/ mV D) 0 50 100 150 200 250 Δφ/ mV Figura 3.25.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de: A) 1 μM de DPPC, B) 1.4 μM de DPPC, C) 5 μM de DPPC e D) 50 μM DPPC na fase orgânica, na presença de x μM de GOx na fase aquosa. Assim, para concentrações de 1 e 1.4 μM de DPPC (figura 3.25.–A e 3.25–B, respectivamente), a adição da GOx à fase aquosa provocou um aumento nas curvas de capacidade. Este efeito parece ser maior, quanto maior a concentração da enzima na fase aquosa. Para concentrações mais elevadas de GOx, a presença da enzima induz a desorção do fosfolípido, resultando no aumento da capacidade, uma vez que, esta se comportará como uma camada dieléctrica, bloqueando a interface e impedindo a adsorção do fosfolípido. Para CDPPC = 5 μM (figura 3.25.–C), não se observou qualquer efeito na capacidade pela adição de GOx até 3 μM. Para concentrações de GOx mais elevadas, a capacidade aumentou, pelas razões já referidas. Para CDPPC = 1 e 1.4 μM (figura 3.25.–A e 3.25.–B), e a potenciais Δφ > 0 mV, observou-se, de uma forma geral, um aumento na capacidade interfacial, relativamente aos potenciais negativos. No entanto, concentrações elevadas de GOx na fase aquosa, parecem provocar uma diminuição na capacidade para valores mais baixos do que o electrólito base. O comportamento observado quando se adicionou a GOx à fase aquosa, pode ser explicado, ou pela coadsorção da GOx na interface, por substituição das moléculas de DPPC presentes na interface (desorção), ou ainda, devido ao facto da presença da enzima GOx contribuir para uma reorganização e reorientação do fosfolípido na interface, de tal forma que, ambas as espécies contribuem para a adsorção (adsorção mútua), levando à diminuição da capacidade. Para a concentração de 5 μM de DPPC (figura 3.25.–C), a presença da GOx na fase aquosa provocou o mesmo efeito já descrito. No entanto, esse comportamento só começou a ser significativo para concentrações iguais a 10 μM de GOx. Este facto parece estar relacionado com a concentração do fosfolípido presente na fase orgânica. Quanto maior a sua concentração, maior quantidade de GOx, será necessária adicionar à fase aquosa para se observar um dos possíveis efeitos descritos para o caso da figura 3.25.–A (1 μM de DPPC). 92 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Para a concentração de 50 μM de DPPC (figura 3.25.–D), observou-se um comportamento diferente do descrito para baixas concentrações de DPPC. Neste caso, observou-se que os valores de capacidade se encontram bem abaixo da capacidade do electrólito base, assim como, a existência de um patamar praticamente horizontal, ao longo de quase toda a gama de potenciais estudados, indicativo de uma adsorção estável. A potenciais negativos a presença da enzima GOx na fase aquosa, não origina a desorção do fosfolípido (ao contrário do que foi observado para concentrações de DPPC mais baixas), pois a concentração de fosfolípido é demasiado elevada, e a existência de uma camada saturada de DPPC na interface impede qualquer interacção com a enzima. A potenciais positivos, observou-se o aparecimento de um pico próximo da zona de potencial onde se observou o pico voltamétrico no varrimento directo (positivo). Este pico parece diminuir de intensidade à medida que se aumenta a concentração de GOx na fase aquosa. Desta forma, o comportamento da capacidade parece ser depende da concentração de DPPC presente na fase orgânica e da quantidade de GOx adicionada à fase aquosa. O modelo de Frumkin para o estudo das isotérmicas de adsorção pode ser adoptado numa primeira aproximação, para os estudos de adsorção dos fosfolípidos na presença da enzima GOx. Na tabela 3.5. comparam-se os parâmetros termodinâmicos obtidos na formação de uma camada, para o fosfolípido DPPC e para diferentes concentrações deste fosfolípido na presença de GOx, com os parâmetros termodinâmicos obtidos quando apenas está presente a enzima GOx na fase aquosa. Na tabela estão ainda representados o valor da espessura para as diferentes camadas formadas na interface. Todos os resultados foram obtidos através do ajuste da isotérmica do modelo de Frumkin, anteriormente descrito. Tabela 3.5.: Comparação dos parâmetros termodinâmicos obtidos para diferentes concentrações de DPPC na ausência e na presença de x μM de GOx na fase aquosa, com os parâmetros termodinâmicos obtidos apenas na presença de GOx na fase aquosa, num interface água/1,2-DCE a pH ~7. x μM GOx 1 μM DPPC 5 μM DPPC 50 μM DPPC + x μM GOx + x μM Gox + x μM GOx x μM DPPC Δφmín. cap. / mV -25 -50 -100 -75 -125 a 4.0 1.3 4.2 5.0 1.1 ln β 8.4 12.0 9.5 7.3 13.4 ΔGºads* / KJ.mol-1 -21 -30 -24 -18 -33 Caq / μF.cm-2 5.4 2.4 1.3 1.3 9.4 Clip / μF.cm-2 3.3 3.8 1.7 0.34 1.0 τ / nm – 0.46 1.0 5.2 1.7 * ln β = -ΔGºads/RT 93 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Antes de mais, convém referir que os resultados obtidos para os sistemas em estudo indicados nas colunas 3, 4 e 5 da tabela 3.5., podem estar bastante afectados, pelo facto de, o número de pontos experimentais utilizados para efectuar as determinações indicadas serem reduzidos. No entanto, de acordo com os resultados obtidos, é seguidamente apresentada uma análise para o estudo efectuado. As interacções atractivas entre as moléculas de DPPC adsorvidas e a enzima de GOx parecem, ser mais fortes à medida que aumenta a concentração de DPPC, uma vez que, os valores de a são maiores para a camada formada de fosfolípido. Estes valores são muito semelhantes aos obtidos nos estudos da enzima GOx na ausência de fosfolípidos, e afastam-se dos valores obtidos quando temos DPPC. Este facto pode ser explicado pelo aumento do empacotamento da camada formada, com o aumento do número de interacções entre as espécies, devido à grande quantidade de espécies em contacto com a interface. À medida que a concentração de DPPC na fase orgânica aumenta, a energia de Gibbs de adsorção, ΔGºads, vai diminuindo progressivamente (torna-se menos negativo), ao contrário do que seria de prever, pois para concentrações mais elevadas de DPPC seria de esperar que ΔGºads se aproxima-se mais do valor obtido para o fosfolípido, do que do valor obtido para a GOx. Estes resultados parecem indicar que à medida que a concentração de fosfolípido aumenta na fase orgânica as interacções entre as moléculas de DPPC e GOx são mais intensas (valores de a maiores), podendo as moléculas de GOx penetrar na interface contendo o fosfolípido, substituindo as moléculas de fosfolípido adsorvidas, e consequentemente, aumentando a adsorção da enzima. Estes resultados parecem ainda estar de acordo com o que foi observado por Rosilio et al. [75] numa interface ar-água para a GOx, na presença do fosfolípido DBPC. É de salientar que estes autores atribuem a adsorção da GOx na interface contendo DBPC, à dependência na orientação da cadeia de hidrocarbonetos do fosfolípido, bem como da GOx, devido à existência de interacções hidrofóbicas ao nível das cadeias carbonadas do fosfolípido, na presença de moléculas da enzima adsorvida. No caso em estudo, nada se pode concluir relativamente às mudanças na orientação das cadeias carbonadas de DPPC ou à orientação da enzima GOx adoptadas na interface água/1,2-DCE, no entanto, pode fazer-se uma interpretação especulativa, que considera que as cadeias hidrofóbicas da superfície da enzima podem penetrar na solução orgânica. Assim, poderá existir interacção entre a enzima, os iões orgânicos e a molécula de DPPC. Este tipo de interacção será mais favorável à adsorção da GOx na interface e à desorção do fosfolípido, podendo aumentar a reorientação conformacional da enzima adsorvida. Daí a razão da diminuição do valor de ΔGºads à medida que se aumenta a concentração da DPPC, na presença de GOx na fase aquosa. Existe pois, uma certa analogia com o trabalho de Rosilio et al. [75], onde a adsorção de GOx na interface ar-água foi promovida por coadsorção de lípido, e com o trabalho de Georganopoulou et al. [59] nos estudos com GOx. O valor da espessura da camada orgânica (τ), também aumenta com o aumento da concentração de DPPC, o que indica que este fosfolípido sofre transições de estados físicos por variação da sua concentração. Para baixas concentrações de DPPC (1 μM e 5 μM), a espessura da camada orgânica é menor na presença da GOx, 0.46 e 1, respectivamente (sem GOx τ = 1.7 nm), o que também é indicativo de que a camada saturada de DPPC poderá encontrar-se no estado líquido expandido (uma vez que, τ é inferior a 3 nm, correspondente a um estado líquido condensado [92]). Para concentrações elevadas de DPPC (50 μM), o valor de τ obtido parece elevado, no entanto, a elevada concentração de fosfolípido na fase orgânica, aliada a uma possível penetração das moléculas de GOx entre as moléculas de fosfolípido adsorvidas numa camada saturada, poderão contribuir para o valor elevado obtido para a espessura. 94 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.2.6. Comparação do efeito de adsorção dos diferentes fosfolípidos estudados Na figura 3.26. estão representadas as curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença de diferentes fosfolípidos na fase orgânica para uma concentração de 1 μM (figura 3.26.–A), e na presença de 1 μM de GOx na fase aquosa (figura 3.26.–B). 30 30 25 SemFosfolípido 1 μMDPPC 1 μMDAPC 1 μMDBPC 25 20 C / μF.cm-2 C / μF.cm-2 20 15 10 5 0 -250 -200 -150 -100 -50 A) Sem Fosfolípido e sem GOx 1 μM DPPC + 1 μM GOx 1 μM DAPC + 1 μM GOx 1 μM DBPC + 1 μM GOx 15 10 5 0 50 0 -250 -200 -150 -100 -50 100 150 200 250 Δφ/ mV B) 0 50 100 150 200 250 Δφ/ mV Figura 3.26.: Comparação das curvas de capacidade na interface água/1,2DCE na presença 1 μM de diferentes fosfolípidos na fase orgânica – A), e na presença de 1 μM de GOx na fase aquosa – B). Da análise da figura 3.26.–A, observou-se que para o valor de concentração estudada de fosfolípido (1 μM) e a potenciais negativos, o efeito de adsorção é maior para a DPPC, pois o valor de capacidade nesta zona de potencial foi menor relativamente aos outros fosfolípidos, o que indica que à medida que se aumenta a cadeia de hidrocarbonetos do fosfolípidos, menor será o efeito de adsorção do fosfolípido na interface. Este facto está de acordo com a literatura, uma vez que, quanto maior o tamanho da cadeia carbonada, maior o empacotamento da camada formada no mesmo estado, pois as forças de Van der Waals são mais fortes entre cadeias de hidrocarbonetos de cadeia longa, do que entre as cadeias de hidrocarbonetos de cadeia mais curta [57]. A potenciais positivos ocorreu um aumento das curvas de capacidade relativamente aos potenciais negativos, para os diferentes fosfolípidos, resultantes da desorção do fosfolípido na interface, pelas razões atrás enunciadas. Verificou-se, contudo, que a adsorção de DBPC é mais estável ao longo da gama de potenciais estudados. Por outro lado, a adição de GOx à fase aquosa (figura 3.26.–B), provocou alterações notórias. Assim, para potenciais negativos, os valores da capacidade para os diferentes fosfolípidos aumentaram ligeiramente, o que indica que a presença de GOx conduz a uma desorção do fosfolípido da interface. No entanto, mantém-se a mesma tendência para as curvas de capacidade observada na ausência de GOx. Para potenciais positivos, ocorreu uma aproximação das curvas da capacidade junto da capacidade do electrólito de suporte, sugerindo uma desorção do fosfolípido da interface, resultante da maior tendência para o fosfolípido permanecer na fase orgânica e a GOx 95 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário permanecer na fase aquosa. 3.3. Estudos de adsorção de fosfolípidos na interface água/2-NPOE polarizada na presença da enzima GOx Para estudar o efeito do solvente numa interface líquido-líquido, foram também efectuados estudos de adsorção com o solvente orgânico 2-NPOE. Inicialmente estudou-se o efeito do solvente na adsorção da enzima GOx, na ausência de qualquer fosfolípido na fase orgânica, e em seguida estudou-se o efeito do solvente na adsorção da GOx na presença do fosfolípido DPPC. A capacidade interfacial foi obtida a partir das medições de impedância. Todas os dados de impedâncias obtidos a cada potencial, para as várias concentrações de GOx formam bem ajustados pelo circuito equivalente, representado na figura 1.22. (os erros de ajuste foram inferiores a 5 %). É de salientar que o ajuste dos resultados obtidos utilizando o solvente orgânico 2-NPOE, foram muito mais difíceis que no caso do solvente orgânico 1,2DCE, possivelmente dada a maior viscosidade do solvente NPOE. Este erro foi ligeiramente superior ao obtido para a interface água/1,2-DCE (< 2 %). As medições de impedâncias foram efectuadas na zona de potencial entre –250 mV e 250 mV. Na tabela 3.6. são apresentadas algumas das propriedades mais importantes dos solventes utilizados neste estudo. Tabela 3.6.: Propriedade físico-químicas dos solventes orgânicos utilizados neste estudo [96]. Solvente orgânico Constante Solubilidade Densidade, Viscosidade, ρ / g.mL η / cP -1 dieléctrica, ε do solvente em água da água no solvente 1,2-DCE 10.4 0.84 0.16 1.25 0.84 2-NPOE 24.2 2x10-6 0.046 1.04 13.8 3.3.1. Efeito do solvente orgânico na adsorção da Glucose Oxidase (GOx) Neste estudo utilizou-se uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1. (célula 1), à excepção do solvente orgânico que se substituiu por 2-NPOE. 96 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Os voltamogramas cíclicos obtidos encontram-se representados na figura 3.27. Não foram observadas diferenças significativas nas janelas de potencial pela adição da enzima GOx, excepto para concentrações mais elevadas (10 μM), onde foi visível um aumento da intensidade de corrente a potenciais negativos. A janela de potencial obtida com o solvente orgânico 2-NPOE, foi ligeiramente superior à obtida na interface água/1,2-DCE, assim como, os valores de intensidade de corrente foram muito menores para a interface água/2-NPOE, do que para a interface água/1,2-DCE. Este facto estará relacionado com a maior viscosidade do solvente orgânico 2-NPOE. 0 μM GOx 0.2 μM GOx 1 μM GOx 5 μM GOx 10 μM GOx 6 4 I / μA 2 0 -2 -4 -6 -300 -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.27.: Voltamogramas cíclicos correspondentes ao sistema água/2-NPOE na presença de várias concentrações da enzima GOx na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR). Na figura 3.28. estão representadas as curvas de capacidade (capacidade da dupla camada em função da variação de potencial), para o sistema com diferentes concentrações de GOx na fase aquosa até 10 μM. Para este sistema em estudo o comportamento observado para a interface água/2-NPOE, parece ser semelhante ao observado na interface água/1,2-DCE. Observou-se um deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima para valores de potenciais positivos (51 mV), ao contrário do que foi observado para o sistema água/1,2-DCE (-25 mV), indicando que o deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima varia com o solvente orgânico na presença da enzima GOx. Estes valores estão representados na tabela 3.7. 97 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 30 0 μM GOx 0.2 μM GOx 1 μM GOx 5 μM GOx 10 μM GOx 25 C / μF.cm -2 20 15 10 5 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 250 Δφ / mV Figura 3.28.: Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na presença de x μM GOx na fase aquosa. Tabela 3.7.: Deslocamento do potencial de mínimo de capacidade para a adsorção de GOx nos solventes ensaiados. Solvente orgânico Δφmín. cap. sem GOx / mV Δφmín. cap. da camada Δ(Δφmín. cap.) / mV saturada / mV 1,2-DCE 0 -25 25 2-NPOE 51 51 0 A partir das curvas de capacidade da figura 3.28., obtiveram-se os valores da capacidade interfacial para as diferentes concentrações de GOx presentes na solução aquosa, para o potencial correspondente ao mínimo da curva de capacidade da camada saturada. Aplicando o modelo de isotérmica de Frumkin, podem determinar-se os parâmetros termodinâmicos para a interface água/2-NPOE na presença da GOx. Na tabela 3.8. estão representados os resultados obtidos para a interface água/1,2-DCE e para a interface água/2-NPOE. 98 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Tabela 3.8.: Parâmetros termodinâmicos obtidos para uma interface líquido-líquido polarizadas a pH ~7 com diferentes solventes orgânicos, na presença da enzima GOx. Solvente orgânico 1,2-DCE 2-NPOE Δφmín. cap. / mV -25 51 a 4.0 5.6 ln β 8.4 9.0 ΔGºads* / KJ.mol-1 -21 -22 Caq / μF.cm-2 5.4 6.6 Clip / μF.cm-2 3.3 4.2 * ln β = -ΔGºads/RT Das propriedades do solvente apresentadas na tabela 3.8., a constante dieléctrica é aquela que é directamente proporcional à capacidade atingida, o que parece indicar que a adsorção de GOx na interface se faz envolvendo moléculas de solvente. Como o parâmetro a nas interfaces estudadas é positivo, volta a indicar que as interacções entre as moléculas de GOx são atractivas, colocando-se o solvente orgânico entre as moléculas de GOx durante a sua adsorção na interface. Uma vez que, o valor de a é ligeiramente superior na interface água/2-NPOE, a camada de adsorção da GOx deverá ser mais compacta nesta interface. O valor de ΔGºads é muito semelhante para ambas as interfaces estudadas, pelo que a formação da camada de adsorção da GOx não é afectada pela natureza do solvente. 3.3.1.1. Efeito do pH Estudou-se o efeito do pH da solução aquosa no processo de adsorção da GOx na interface água/2-NPOE. A célula electroquímica utilizada a pH ~7.2 é igual à apresentada na secção 3.2.1. (célula 1), à excepção do solvente orgânico que se substituiu por 2-NPOE, e se adicionou 0.1 μM de GOx à fase aquosa. Para o estudo a outros valores de pH, foram adicionadas à fase aquosa da célula electroquímica as seguintes soluções: 100 mM LiCl +: 10 mM HCl (pH 2), ou 9 mM CH3COOH + 10 mM CH3COONa (4.9). Como foi referido, a enzima GOx possuí um ponto isoeléctrico (pI) igual a 4.44, e quando em solução aquosa a pH neutro encontra-se carregada negativamente com 11 cargas [59]. Por esta razão, foram escolhidas soluções aquosas com valores de pH inferior, próximo e superior ao seu pI. Observaram-se diferenças nos voltamogramas cíclicos para soluções mais ácidas do sistema contendo 0.1 μM de GOx e variando o pH (figura 3.29.–B), provocando um deslocamento do voltamograma para valores de 99 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário corrente mais elevados, a potenciais positivos. 30 25 7 0μMGOx 0.1μMGOx- pH=2.0 0.1μMGOx- pH=4.9 0.1μMGOx- pH=7.2 5 4 3 20 2 1 I / μA C / μF.cm-2 0 μM GOx 0.1 μM GOx - pH = 2.0 0.1 μM GOx - pH = 4.9 0.1 μM GOx - pH = 7.2 6 15 0 -1 -2 10 -3 -4 5 -5 -6 0 -250 -200 -150 -100 -50 A) -7 0 50 100 150 200 250 -300 Δφ/ mV -200 B) -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.29.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na presença de 0.1 μM GOx na fase aquosa a diferentes valores de pH. B) Voltamogramas cíclicos correspondentes ao sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR). As curvas de capacidade interfacial representadas na figura 3.29.–A, mostram comportamentos diferentes para os valores de pH estudados, tal como foi observado para a interface água/1,2-DCE. No entanto os efeitos de adsorção parecem ser mais intensos na presença do solvente orgânico 2-NPOE. A potenciais negativos, observou-se uma diminuição dos valores da capacidade para a gama de pH estudados. Contudo, a pH inferior ao pI da enzima (pH 2), observou-se um aumento da capacidade acima do valor da do electrólito base para Δφ ≈ -75 mV. A este potencial ocorrerá a protonação da enzima GOx na fase aquosa, dificultando a sua adsorção na interface e aumentando a sua tendência para permanecer em solução aquosa (pois a enzima passará a estar carrega positivamente), originando o aumento da capacidade interfacial. Para pH superior ao ponto pI da enzima GOx, observou-se um maior efeito na adsorção da enzima na interface água/2-NPOE, do que a pH próximo do pI da enzima, uma vez que para pH > 4.44, a enzima encontrar-se-á carregada negativamente, resultante da desprotonação, ocorrendo adsorção ao nível da interface. A potenciais positivos, e para pH > pI de GOx, a capacidade interfacial segue praticamente a do electrólito base, indicando uma desorção da enzima, e consequentemente, uma maior tendência para esta permanecer em solução aquosa, devido ao aumento do número de cargas negativas em solução. Para estes estudos escolheu-se um valor de 0.1 μM de GOx, para verificar se o efeito do pH se fazia sentir mesmo a concentrações de GOx baixas. Para concentrações mais elevadas da enzima, o efeito será proporcional à sua concentração. 100 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Desta forma, os resultados mostram, tal como, no caso da interface água/1,2-DCE, que o comportamento da capacidade interfacial é dependente do valor de pH de GOx adicionada à fase aquosa. Estudou-se também o efeito de adsorção da GOx na interface água/2-NPOE, utilizando diferentes concentrações de GOx e mantendo o pH fixo (4.9), para um valor próximo do pI da GOx. Embora estes estudos não sejam suficientes para tirar uma conclusão definitiva, permitem dar-nos uma ideia da tendência do que poderá acontecer. No entanto, será necessário aprofundar este tipo de estudos em futuros trabalhos. Nestes ensaios foram mantidas as mesmas condições experimentais anteriores. A figura 3.30–B, mostra os voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Aparentemente não são observadas diferenças significativas para as diferentes concentrações de GOx a pH fixo. Na figura 3.30.–A, estão representadas as curvas de capacidade interfacial na interface água/2-NPOE na presença de várias concentrações de GOx a pH próximo do pI da enzima (4.9). 30 25 7 0 μM GOx 0.1 μM GOx - pH = 4.9 1 μM GOx - pH = 4.9 5 μM GOx - pH = 4.9 0 μM GOx 0.1 μM GOx - pH = 4.9 1 μM GOx - pH = 4.9 5 μM GOx - pH = 4.9 6 5 4 3 2 1 I / μA C / μF.cm-2 20 15 0 -1 -2 10 -3 -4 5 -5 -6 0 -250 -200 -150 -100 -50 A) -7 0 50 100 150 200 250 -300 Δφ/ mV B) -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.30.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na presença de x μM GOx na fase aquosa para um valor de pH fixo (4.9). B) Voltamogramas cíclicos correspondentes aos sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR). As curvas de capacidade mostram que para concentrações mais elevadas de GOx na fase aquosa (1 μM e 5 μM) não são observadas diferenças significativas entre si, mantendo a GOx um comportamento similar ao longo de toda a gama de potenciais aplicados. Desta forma, para potenciais negativos a capacidade diminui até cerca de -100 mV. Deste valor de potencial até cerca de -25 mV, observa-se um maior efeito de adsorção de GOx. Para potenciais positivos, a capacidade segue a do electrólito base, indicando uma maior tendência para a enzima permanecer em solução aquosa. Para concentrações mais baixas de GOx (0.1 μM), observou-se um comportamento ligeiramente diferente do anteriormente descrito. Este último resultado parece um pouco estranho, uma vez que, a curva de capacidade 101 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário mostra uma maior adsorção da GOx na interface ao longo dos potenciais negativos, comparado com os resultados obtidos para os outros valores de concentração de GOx. Seria de esperar, ou um comportamento semelhante ao obtido para os outros dois valores de concentração de GOx, ou um menor efeito, dada a menor concentração de GOx. Desta forma, os resultados mostram também que, a capacidade interfacial é afecta pela concentração da enzima GOx, quando adicionada à fase aquosa, para um valor de pH fixo (4.9). 3.3.2. Efeito do solvente orgânico na adsorção de DPPC Foi também estudado o efeito de adsorção do fosfolípido DPPC na interface água/2-NPOE. Foi utilizada uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1., à excepção do solvente orgânico que se substituiu por 2-NPOE e se adicionou x μM DPPC à fase orgânica. Na figura 3.31.–B, estão representados os voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula referida. Ao contrário do que foi observado para a interface água/1,2-DCE, para concentrações superiores a 15 μM não foi observado nenhum pico de intensidade de corrente, quer no varrimento directo (positivo), quer no varrimento inverso (negativo). Contudo, os voltamogramas continuam a não mostrar diferenças marcantes à medida que se vai adicionando DPPC à fase orgânica. 30 25 0 μM DPPC 1 μM DPPC 20 μM DPPC 50 μM DPPC 100 μM DPPC 4 20 2 I / μA C / μF.cm-2 0 μM DPPC 1 μM DPPC 20 μM DPPC 50 μM DPPC 100 μM DPPC 6 15 0 -2 10 -4 5 -6 0 -250 -200 -150 -100 -50 A) 0 50 -300 100 150 200 250 Δφ/ mV B) -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.31.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na presença de x μM de DPPC na fase orgânica. B) Voltamogramas cíclicos correspondentes aos sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR). 102 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário As curvas de capacidade obtidas estão representadas na figura 3.31.–A, para a interface água/2-NPOE, na presença de diferentes concentrações de DPPC na fase orgânica. Da análise da figura 3.31.–A, é possível observar comportamentos diferentes da capacidade interfacial, dependentes do potencial eléctrico aplicado e da concentração de DPPC adicionada à fase orgânica, tal como foi observado para o sistema água/1,2-DCE. A potenciais negativos, ocorreu uma diminuição na capacidade interfacial à medida que se aumentou a concentração de DPPC na fase orgânica (a excepção foi para CDPPC = 50 μM, onde a sua presença provocou o aumento da capacidade), relativamente à dos electrólitos base. Este facto poderá estar relacionado com um possível erro experimental, ou devido à mudança do estado de transição de fase que pode ocorrer para as diferentes concentrações de DPPC, tal como foi observado para o solvente 1,2-DCE. No entanto, os resultados experimentais não são suficientes para se efectuar uma análise contundente. Comparando com os resultados obtidos para a interface água/1,2-DCE, observou-se que o efeito de adsorção de DPPC é maior na presença do solvente 1,2-DCE, pois para este sistema os valores de capacidade são mais baixos, do que os obtidos para o solvente 2-NPOE. A maior viscosidade deste último solvente dificultará a penetração das moléculas de DPPC para perto da interface, e consequentemente, o efeito de adsorção ocorrerá em menor extensão. A potenciais positivos, a capacidade aumentou com a presença de DPPC na fase orgânica, para valores superiores ou coincidentes com a do electrólito base, o que indica a ocorrência de desorção de DPPC da interface, tal como foi observado para o solvente 1,2-DCE, indicando uma maior tendência para o fosfolípido permanecer na fase orgânica. Representado o gráfico do potencial mínimo de capacidade, Δφmín. cap., em função da concentração de DPPC (figura 3.32.–A), pode observar-se que o valor do potencial se desloca para potenciais mais negativos com o aumento da concentração de DPPC na fase orgânica, atingindo um valor constante para Δφmín. cap. = -100 mV na presença do solvente orgânico 2-NPOE. Este valor encontra-se um pouco deslocado relativamente ao obtido para o solvente 1,2-DCE (-125 mV). A figura 3.32., mostra ainda, uma tendência para a composição da interface se manter inalterável com concentrações mais elevadas de DPPC na zona de potencial mais negativo, para ambos os solventes. 103 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 60 1,2-DCE 2-NPOE 40 Relatório de Seminário 1,2-DCE: Δφ = -125 mV 2-NPOE: Δφ = -100 mV 12 20 10 -20 8 -40 C / μF.cm-2 Δφ(mín. cap.) / mV 0 -60 -80 -100 6 4 -120 2 -140 -160 0 -180 0 A) 20 40 60 80 100 0 [DPPC] / μM 20 40 60 80 100 [DPPC] / μM B) Figura 3.32.: A) Efeito do aumento da concentração de DPPC no deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima nas curvas de capacidade nos solventes ensaiados. B) Capacidade interfacial em função da concentração de DPPC a potencial mínimo Δφ = -125 mV para água/1,2-DCE, e a Δφ = -100 mV para água/2-NPOE. A partir do valor da capacidade interfacial da camada saturada, Clip, e do valor da capacidade interfacial sem fosfolípido, Caq, respectivamente 3.7 e 12.0, estimou-se o valor da cobertura superficial, θ, para o estudo com o solvente orgânico 2-NPOE. Estes valores são um pouco superiores aos obtidos para o solvente 1,2-DCE (Clip = 1.0 μF.cm-2 e Caq = 9.4 μF.cm-2). Utilizando o modelo de Frumkin, determinou-se os parâmetros termodinâmicos obtidos para os diferentes solventes. Esses valores encontram-se resumidos na tabela 3.9. Tabela 3.9.: Parâmetros termodinâmicos de adsorção de DPPC numa interface água/1,2-DCE e água/2-NPOE, a pH ~7, obtidos a partir dos resultados para as diferentes concentrações de DPPC e dos ajustes das isotérmicas de Frumkin. Frumkin Isotérmica Solvente orgânico 1,2-DCE 2-NPOE Δφmín. cap. / mV -125 -100 a 1.1 -4.3 ln β 13.4 14.0 104 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário ΔGºads* / KJ.mol-1 -33 -35 Caq / μF.cm-2 9.4 12.0 Clip / μF.cm-2 1.0 3.7 τ / nm 1.7 0.48 * ln β = -ΔGºads/RT Observou-se um ligeiro deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima para os dois solventes estudados, indicando que o potencial a que a capacidade é mínima varia com o solvente orgânico na presença do fosfolípido DPPC (tabela 3.10.). Tabela 3.10.: Deslocamento do potencial de mínimo de capacidade para uma camada saturada de DPPC nos solventes ensaiados. Solvente orgânico Δφmín. cap. sem DPPC / mV Δφmín. cap. da camada saturada / Δ(Δφmín. cap.) / mV mV 1,2-DCE 0 -125 125 2-NPOE 51 -100 149 Comparando os valores dos parâmetros termodinâmicos representados na tabela 3.9. para os dois solventes na presença de DPPC na fase orgânica, obteve-se um valor negativo para o parâmetro a na interface água/2-NPOE, o que sugere que nesta interface as interacções entre as moléculas de DPPC serão muito menos atractivas, e o solvente orgânico não deverá colocar-se entre as moléculas de fosfolípido na camada saturada. As forças dominantes deixam de ser atractivas devido ao aumento das repulsões electrostáticas. A camada deverá ser muito menos compacta do que na interface água/1,2-DCE, dado o baixo valor obtido para o parâmetro a, o que poderá provocar um maior deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima com o aumento da concentração de DPPC, por haver maior influência das interacções dos solventes aquoso e orgânico. Como se apresentou na tabela 3.10., o valor de Δ(Δφmín. cap.) na interface água/2-NPOE é maior do que para a interface água/1,2-DCE. Este facto é ainda confirmado pelo baixo valor de τ obtido na presença do solvente orgânico 2-NPOE. De acordo com a relação da capacidade da camada saturada com a espessura (equação 3.6.), a camada na presença do solvente orgânico 2-NPOE estará no estado líquido expandido. O valor de ΔGºads nas interfaces líquido-líquido é similar, sugerindo que a formação da camada não é afectada pela natureza do solvente. Note-se novamente que, os resultados obtidos para este estudo constituem uma estimativa dos parâmetros, devido ao número reduzido de pontos experimentais utilizados para efectuar as determinações indicadas para o solvente 2-NPOE. 105 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 3.4. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na presença da acetilcolina (ACh+) A acetilcolina e a butirilcolina são dois iões que podem transferir através da interface líquido-líquido dentro de uma gama de potenciais. A partir dos voltamogramas obtidos por voltametria cíclica é possível retirar parâmetros importantes, tais como, a intensidade de corrente quando ocorre a transferência de iões para ambas as fases (Ip+ e Ip-) e o seu potencial de pico (Ep+ e Ep-). Assim, na voltametria cíclica, os diferentes processos de difusão observados nas ITIES originam respostas voltamétricas diferentes. No caso de uma transferência iónica em que o processo de difusão predominante é a difusão linear, observa-se o aparecimento de um pico. As experiências a seguir apresentadas foram efectuadas com o objectivo de estudar e analisar a facilidade destes iões poderem atravessar a interface água/1,2-DCE, na ausência ou na presença do fosfolípido DPPC (C16) na fase orgânica. A partir das janelas de potencial definidas pelos voltamogramas, efectuaram-se medições de impedâncias na zona de potencial entre -250 e 250 mV, em ensaios com diferentes concentrações de ACh+ na fase aquosa, para se obterem as respectivas curvas de capacidade. Os espectros de impedância foram analisados e ajustados utilizando o circuito equivalente da figura 1.22. e o programa EQUIVCRT. Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente. 3.4.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na presença da acetilcolina na fase aquosa Inicialmente realizaram-se ensaios adicionando ACh+ à fase aquosa na ausência de DPPC na fase orgânica. A célula electroquímica utilizada nestes ensaios pode ser representada do seguinte modo: 100 mM LiCl + Célula 2: Ag AgCl 10 mM NaTPB 10 mM TOATPB + (RE2) (1,2–DCE) (org) AgCl Ag . 10 mM NaH2PO4 2H2O + x μM ou x mM ACh+, 10 mM NaCl (H2O) 10 mM Na2HPO4 + (RE1) (H2O) pH ~7 Na figura 3.33. estão representados os voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula anterior. Nestes voltamogramas observou-se um aumento na intensidade de corrente, devido à presença da ACh+. Observou-se o aparecimento de um pico de intensidade de corrente a potenciais positivos devido à ocorrência de transferência do protão da acetilcolina da fase aquosa para a fase orgânica, para potenciais entre aproximadamente -25 mV (Ip-) e 106 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 150 mV (Ip+), uma vez que, a potenciais mais positivos da fase aquosa os iões de carga positiva têm tendência a passar para a fase orgânica. No entanto, o aparecimento deste pico só começa a ser perceptível para concentrações de ACh+ na ordem dos mM. Observou-se que a intensidade de corrente dos voltamogramas aumentou à medida que se aumentou a concentração de ACh+ na fase aquosa, assim como, a intensidade de corrente dos picos observados. A diferença de potencial observada entre os picos de corrente directo e inverso, indica que a transferência da ACh+ não é reversível, devido talvez à não introdução da compensação da queda óhmica (IR). Mesmo dois dias após o primeiro ensaio, e para uma concentração de 1 mM de ACh+, observou-se o mesmo comportamento nos voltamogramas cíclicos. 250 1º varrimento 2º varrimento 200 + Sem ACh 10 μM ACh 3º varrimento 150 + + 0.2 mM ACh 100 + 0.5 mM ACh 1 mM ACh I / μA 50 + 0 -50 -100 3º varrimento -150 1º varrimento 2º varrimento -200 -250 -400 -300 -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.33.: Voltamogramas cíclicos obtidos para a interface água/1,2-DCE na presença de diferentes concentrações de ACh+ na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR). Da observação dos voltamogramas, importa salientar que: 1. após a adição de uma concentração apreciável de ACh+ (digamos, CACh+ ≥ 0.2 mM), os picos de corrente são observados de imediato, ou seja, adicionando ACh+ à fase aquosa e efectuando o varrimento de seguida, observou-se o aparecimento imediato dos picos de intensidade de corrente, logo no primeiro varrimento; 2. tal como mostra a figura 3.33., observou-se que os picos têm tendência a diminuir ao longo do tempo com o decorrer dos varrimentos. No entanto, estes nunca deixam de ser visíveis, isto é, a dada altura após o estabelecimento do equilíbrio entre os iões em solução, observou-se que os voltamogramas cíclicos se mantinham estáveis, ou seja, sem qualquer tipo de alteração ao nível da intensidade de corrente dos picos. 107 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Obtiveram-se as curvas de capacidade que estão representadas na figura 3.34., para diferentes concentrações de ACh+ adicionadas à fase aquosa na interface água/1,2-DCE, após o estabelecimento do equilíbrio da célula electroquímica durante cerca de 60 minutos. 80 Sem Ach + 10 μM Ach 70 60 + 0.2 mM Ach + 0.5 mM Ach + 1 mM Ach + C / μF.cm -2 50 40 30 20 10 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 250 Δφ / mV Figura 3.34.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de ACh+ na fase aquosa. Para a gama de potenciais estudados, observou-se que para potenciais negativos, não ocorreu qualquer alteração significativa nas curvas de capacidade, o que indica que não há qualquer tipo de adsorção na interface por parte do catião, pois os valores de capacidade seguem a do electrólito base. A potenciais positivos, observou-se o aparecimento de um pico nas curvas de capacidade para Δφ ~ 125 mV, tal como, foi observado nos voltamogramas cíclicos, correspondente à transferência da ACh+. Também aqui, se observou que o valor da capacidade dos picos aumentou com o aumento da concentração da ACh+ na fase aquosa. 3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC O estudo da cinética de transferência de iões através de monocamadas de fosfolípidos em ITIES tem sido vastamente efectuados por vários autores [68,73]. O estudo da transferência de iões através de fosfolípidos adsorvidos foi efectuada utilizando o ião acetilcolina. No entanto, o estudo cinético na interface macroscópica utilizando a técnica de espectroscopia de impedância apresentou alguns problemas, uma vez que, seria necessário corrigir a queda óhmica da célula, para se obterem resultados válidos. Todos os resultados vem afectados pela não utilização da queda óhmica (IR). O esquema da célula electroquímica é igual à apresentada na secção 3.4.1. (célula 2.), à excepção de se ter adicionado 1.4 μM ou 30 μM de DPPC à fase orgânica. 108 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Os voltamogramas cíclicos representados na figura 3.35.–B, mostram, uma vez mais que, mesmo na presença do fosfolípido na fase orgânica, ocorre a transferência da acetilcolina a potenciais positivos, resultantes no aparecimento de picos de intensidade de corrente, que também aumentam de intensidade com o aumento da concentração da ACh+ (para CACh+ > 0.2 mM). A intensidade de corrente destes picos, voltou novamente a diminuir ao longo do tempo, até ser atingido o equilíbrio químico entre as soluções. Observou-se, no entanto que, os valores de intensidade de corrente para os sistemas em estudo são um pouco inferires aos observados para os sistemas contendo apenas a ACh+, possivelmente devido à presença do fosfolípido na fase aquosa. Por outro lado, verificou-se que, após a estabilização do sistema durante 60 minutos, e posterior adição de várias concentrações de ACh+ à solução aquosa, não se observou qualquer tipo de alteração nos voltamogramas cíclicos para concentrações de ACh+ superiores a 0.8 mM, mesmo após a adição de quantidades apreciáveis de ACh+ à fase aquosa. Este facto sugere que, a partir de uma concentração elevada de ACh+ (> 1 mM), o elevado número de iões em solução aquosa conduzirá à saturação do sistema. As curvas de capacidade obtidas encontram-se representadas na figura 3.35.–A. 40 35 200 + + 0 μM DPPC + 0 mM ACh 0 μM DPPC + 0 mM ACh + + 1.4 μM DPPC + 0 mM ACh 1.4 μM DPPC + 0 mM ACh 150 + 1.4 μM DPPC + 0.2 mM ACh + 1.4 μM DPPC + 0.2 mM ACh 30 + + 1.4 μM DPPC + 0.5 mM ACh 1.4 μM DPPC + 0.5 mM ACh 100 + 1.4 μM DPPC + 0.8 mM ACh + 1.4 μM DPPC + 0.8 mM ACh 50 I / μA C / μF.cm-2 25 20 0 15 -50 10 -100 5 -150 0 -250 -200 -150 -100 -50 A) 1º varrimento 2º varrimento 0 50 -200 -400 100 150 200 250 Δφ/ mV B) -300 -200 -100 0 100 200 300 Δφ/ mV Figura 3.35.: A) Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 1.4 μM de DPPC e x mM de ACh+. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). As curvas de capacidade interfacial apresentam duas zonas de potencial distintas: 1. a potenciais negativos, onde a capacidade diminuiu com a presença do fosfolípido na fase orgânica relativamente à da solução base, resultante da sua adsorção na interface. Para 1.4 μM de DPPC e para a gama de concentrações de ACh+ estudadas, não se observou qualquer alteração marcante na capacidade interfacial, pelo que se conclui que a presença da acetilcolina na fase aquosa não afectará a 109 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário adsorção do fosfolípido, contrariamente ao que foi observado quando na presença da enzima GOx na fase aquosa. 2. a potenciais positivos, onde a capacidade aumentou para valores superiores à capacidade do electrólito base, indicando uma completa desorção do fosfolípido da interface. Neste caso, observou-se o aparecimento de um pico para Δφ ≈125 mV, tal como, foi observado para o sistema contendo apenas ACh+. Também aqui, a capacidade do pico aumentou com o aumento da concentração da acetilcolina na fase aquosa. No entanto os valores obtidos são inferiores aos observados na figura 3.34. Este facto dever-se-á à presença do fosfolípido na fase orgânica, que dificulta um pouco mais o processo de transferência do ião ACh+, fazendo diminuir o valor da capacidade interfacial. Desta forma, pode dizer-se que a capacidade interfacial para o sistema contendo ACh+ na fase aquosa e 1.4 μM de DPPC na fase orgânica, é afectada pela concentração de ACh+ e pelo potencial aplicado ao sistema em estudo. Foi escolhida esta concentração de fosfolípido (1.4 μM) para efectuar este estudo, porque se pretendia avaliar o efeito da acetilcolina na adsorção de DPPC a baixas concentrações, optando-se por aquele valor. Com o mesmo objectivo anterior, realizaram ensaios com diferentes concentrações de ACh+ na fase aquosa, na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica. Foram mantidas as condições experimentais anteriores. A capacidade interfacial e os voltamogramas cíclicos obtidos a partir deste estudo, estão representados na figura 3.36.–A e 3.36.–B, respectivamente. 100 1000 + 0 μM DPPC + 0 mM ACh 800 + 30 μM DPPC + 0 mM ACh 80 + 30 μM DPPC + 0.2 mM ACh 600 + 30 μM DPPC + 0.5 mM ACh + 60 30 μM DPPC + 1 mM ACh 400 + C / μF.cm -2 30 μM DPPC + 1 mM ACh + 0.2 μM GOx 200 40 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 250 20 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 Δφ / mV A) 110 200 250 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 200 + 0 μM DPPC + 0 mM ACh 150 + 30 μM DPPC + 0 mM ACh + 30 μM DPPC + 0.2 mM ACh 100 + 30 μM DPPC + 0.5 mM ACh 50 + 30 μM DPPC + 1 mM ACh I / μA + 30 μM DPPC + 1 mM ACh + 0.2 μM GOx 0 -50 -100 -150 -200 -300 B) -200 -100 0 100 200 300 Δφ / mV Figura 3.36.: A) Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 30 μM de DPPC e x mM de ACh+ na fase aquosa. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). Os voltamogramas cíclicos da figura 3.36.–B, são semelhantes aos obtidos na figura 3.35.–B. Aparentemente o comportamento observado nos voltamogramas cíclicos é independente da quantidade de fosfolípido presente na solução orgânica, à medida que se adiciona ACh+ à fase aquosa. Também aqui, a intensidade de corrente dos picos aumentou com o aumento da concentração de ACh+. Por adição de 0.2 μM de GOx à fase aquosa, observou-se um abaixamento na intensidade da corrente do pico. O pico que surge no varrimento inverso e que é característico da adsorção do fosfolípido, deixou de ser visível após a adição da ACh+ à fase aquosa. Da análise das curvas de capacidade e para a gama de potenciais estudados, observou-se, tal como no caso anterior, duas regiões de potencial com comportamento diferente: 1. a potenciais negativos, a presença da acetilcolina em solução aquosa não tem qualquer influência no processo de adsorção do fosfolípido; 2. a potenciais positivos, observou-se de igual modo, o aparecimento de um pico a Δφ ≈ 150 mV, resultante do processo de transferência por difusão da acetilcolina através da interface. Os picos obtidos, são no entanto, muito superiores aos observados para o sistema contendo 1.4 μM DPPC (figura 3.35.–A). A elevada concentração de DPPC na fase orgânica será a responsável por este facto, pois como já foi dito, o aparecimento de um pico de corrente no varrimento directo (positivo) para concentrações de DPPC superiores a 15 μM, correspondentes à adsorção/desorção do fosfolípido, resultante da possível transferência de um protão, conduzindo ao aumento dos valores de capacidade 111 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário nesta região de potencial. A não utilização da compensação da queda óhmica, poderá afectar ainda mais os resultados. Estudos realizados mostraram ainda que, a adição de diferentes concentrações de ACh+ à fase aquosa, antes ou após um período de estabilização do sistema (cerca de 60 minutos), na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica, não provoca qualquer alteração nas curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos. Foram também observados dois limites de concentração de ACh+: concentrações de ACh+ na fase aquosa inferiores a 0.2 mM não são suficientes para provocarem 1. alterações nas curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos; concentrações de ACh+ superiores a 1 mM, deixam de ser observadas diferenças significativas nas 2. curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos, pois o sistema parece atingir a saturação. Representando a intensidade de corrente dos picos onde ocorre a transferência da ACh+ na presença de DPPC na fase orgânica, em função da concentração da ACh+ (figura 3.37.), observou-se a existência de uma relação linear, o que indica que o processo de transferência da ACh+ da fase aquosa para a fase orgânica é controlado por difusão. Esta relação foi também observada por Vanýsek e Behrendt [97] em ITIES. Este sistema mostra, portanto, a ocorrência de processos cinéticos e de difusão na interface água/1,2–DCE a potenciais positivos. 180 0 μM DPPC + x mM ACh 160 + Ip + 140 1.4 μM DPPC + x mM ACh 120 Ip + 30 μM DPPC + x mM ACh 100 Ipico / μA + + Ip + 80 60 40 20 0 -20 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 + [ACh ] / mM Figura 3.37.: Representação gráfica da intensidade de corrente do pico positivo vs. a concentração da acetilcolina, utilizada nos ensaios anteriores, na ausência de DPPC e na presença de 1.4 μM e 30 μM de DPPC na fase orgânica. Ajustando os resultados obtidos anteriormente pelo método dos mínimos quadrados, obtiveram-se os 112 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário parâmetros da recta representados na tabela 3.11. O coeficiente de difusão foi calculado utilizando a relação da equação 1.18., usando como área da interface o valor de 0.28 cm2. Tabela 3.11.: Resumo dos valores dos parâmetros obtidos através do ajuste linear da figura 3.37., e cálculo dos coeficientes de difusão utilizando a equação 1.18. x mM ACh+ Pico Ip+ Declive / μA.mM-1 Daq / cm2.s-1 171 1.58x10-6 1.4 μM de DPPC + x mM ACh+ Pico Ip+ Declive / μA.mM-1 Daq / cm2.s-1 143 1.32x10-6 30 μM de DPPC + x mM ACh+ Pico Ip+ Declive / μA.mM-1 Daq / cm2.s-1 70 6.48x10-7 O valor obtido para o coeficiente de difusão em solução aquosa da ACh+ na interface água/1,2-DCE na ausência de DPPC na fase orgânica é inferior ao obtido por Ohkouchi et al. [49] com um microeléctrodo na interface água-nitrobenzeno (DaqACh+ = 8.9x10-6 cm2.s-1). No entanto, como seria de prever o coeficiente de difusão da ACh+ em solução orgânica é menor do que em solução aquosa, pois a viscosidade do solvente orgânico 1,2-DCE é maior do que a da solução aquosa. Um outro facto importante, especialmente do ponto de vista analítico, é que a corrente do pico catódico (resultante do varrimento directo) é muito maior comparada com a corrente do pico anódico. Este facto pode ser explicado pelos seguintes processos: durante o processo de transferência do ião anódico no primeiro varrimento de potencial, a ACh+ progride na fase orgânica por difusão dos iões, a partir de um grande volume da fase aquosa para o interior de um pequeno volume de fase orgânica. Uma observação semelhante foi efectuada por Ohkouchi et al. [49]. Os resultados obtidos mostram ainda que, à medida que se aumenta a concentração de DPPC na fase orgânica maior é a dificuldade de transferência da acetilcolina da fase aquosa para a fase orgânica, pois o valor do coeficiente de difusão foi diminuindo para valores de concentração crescentes de DPPC na fase orgânica (tabela 3.11.). A presença do fosfolípido torna a solução orgânica mais viscosa, e portanto, mais difícil de ocorrerem transferências de iões entre a fase orgânica e a fase aquosa. Estudos realizados permitiram ainda determinar a resistência de transferência de carga obtida através do estudo de impedâncias para os sistemas contendo ACh+, observando-se que esta foi mais elevada para soluções mais 113 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário concentradas de DPPC na fase orgânica, o que também vem justificar o valor mais baixo obtido na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica. 3.5. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na presença da butirilcolina (BuCh+) No caso da BuCh+, estudou-se apenas o efeito da sua presença na interface água/1,2-DCE na ausência e na presença de DPPC na fase orgânica. Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente, mantendo-se todas as condições utilizadas na secção 3.4. 3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na presença de butirilcolina na fase aquosa Começou-se por adicionar a BuCh+ à fase aquosa na interface água/1,2-DCE, na ausência de fosfolípido na fase orgânica. Utilizou-se uma célula electroquímica igual à representada na secção 3.4.1., à excepção da ACh+ que foi substituída por x μM de BuCh+ na fase aquosa. Tal como, no caso da acetilcolina, também aqui a introdução da BuCh+ nos sistemas em estudo, provocou alterações nos voltamogramas cíclicos (3.38.–B). Nestes voltamogramas é possível observar um pico de intensidade de corrente a potenciais positivos, correspondentes à transferência deste ião BuCh+ da fase aquosa para a fase orgânica. Esse pico foi observado no voltamograma cíclico para a mesma zona de potencial do sistema em estudo, entre -25 mV (Ip-) e 50 mV (Ip+). Este resultado difere bastante do que foi obtido por Beattle et al. [98], possivelmente devido ao facto de não se ter utilizado compensação da queda óhmica (IR). Deve ser notado que, o pico de corrente que se desenvolve na figura 3.38.–B, corresponde ao fluxo de iões através da interface água/1,2DCE. A corrente negativa refere-se ao facto que o potencial da água, em relação à fase orgânica, se vai tornando mais negativo no varrimento inverso, sendo isto uma convenção para todas as experiências das ITIES [98]. 114 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA 150 60 + + 0 mM BuCh 0 mM BuCh + + 50 1 mM BuCh 1 mM BuCh 100 40 50 30 I / μA C / μF.cm-2 Relatório de Seminário 20 0 -50 10 -100 0 -150 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 -300 100 150 200 250 -200 -100 Δφ / mV 0 100 200 300 Δφ/ mV A) B) Figura 3.38.: A) Curva de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 1 mM de BuCh+ na fase aquosa. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para o sistema em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR). Na curva de capacidade interfacial observou-se o aparecimento de um pico entre Δφ ~ -25 mV e 50 mV, correspondente à transferência do ião através da interface. Para a mesma concentração de espécie utilizada em solução aquosa, verificou-se que o valor da capacidade interfacial do pico na presença da ACh+ é um pouco superior à obtida para a BuCh+, aproximadamente 70 μF.cm-2 e 60 μF.cm-2, respectivamente. Estes resultados, mostram que a BuCh+ transfere mais facilmente do que a ACh+, da fase aquosa para a fase orgânica, pois comparando os respectivos voltamogramas, pode observar-se que o pico de intensidade de corrente da BuCh+ surge a potenciais, primeiro do que o da ACh+. 3.5.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da butirilcolina (BuCh+) na presença do fosfolípido DPPC Estudou-se o efeito da butirilcolina na adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE, tal como no caso da acetilcolina. O esquema da célula electroquímica é igual à apresentada na secção 3.4.1. (célula 2.), à excepção de se ter adicionado 30 μM de DPPC à fase orgânica, e substituído a ACh+ por x mM de BuCh+. Foram mantidas todas as condições experimentais anteriormente descritas. Na figura 3.39. estão representadas as curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica e x mM de BuCh+ na fase aquosa. 115 Capítulo 3 — Resultados e Discussão QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário 120 0 μM DPPC + 0 mM BuCh + + 30 μM DPPC + 0 mM BuCh 100 30 μM DPPC + 0.5 mM BuCh + + 30 μM DPPC + 1 mM BuCh C / μF.cm -2 80 60 40 20 0 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 250 Δφ / mV Figura 3.39.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica e x mM de BuCh+ na fase aquosa. Tal como no caso da acetilcolina, as curvas de capacidade mostram também que a potenciais negativos a presença de butirilcolina na fase aquosa não provoca qualquer alteração no processo de adsorção do fosfolípido, e a potenciais positivos observou-se o aparecimento de um pico nas curvas de capacidade, resultante do processo de transferência por difusão da butirilcolina através da interface. Este pico aumenta com o aumento da concentração de butirilcolina adicionada à fase aquosa. Observou-se ainda um deslocamento do pico nas curvas de potencial para potenciais mais positivos, relativamente ao observado na figura 3.38., sem a presença do fosfolípido. Este facto poderá estar relacionado com a presença do fosfolípido na fase orgânica, pois a adsorção do fosfolípido na interface dificultará o processo de transferência da BuCh+, tornando-o mais lento, e consequentemente, este ocorre a potenciais mais positivos. No entanto, para comprovar o que foi dito anteriormente, seria desejável efectuar-se um estudo cinético para a transferência da butirilcolina na interface água/1,2-DCE na ausência e na presença de DPPC na fase orgânica. 116 Capítulo Conclusões finais Neste capítulo são apresentadas as conclusões gerais, obtidas a partir da análise dos resultados do capítulo 3, para os diferentes sistemas em estudo, utilizando a técnica de LB e a espectroscopia de impedância electroquímica. Capítulo 4 — Conclusões finais QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário As experiências levadas a cabo tiveram como objectivo fornecer uma profunda compreensão na formação de monocamadas de fosfolípidos formadas na interface líquido-líquido e na interface ar-água. Os estudos efectuados utilizando a técnica de LB para determinar as isotérmicas de diferentes fosfatidilcolinas na interface ar-água, permitiram tirar as seguintes conclusões: • No estudo das isotérmicas de diferentes fosfatidilcolinas, foi possível observar a existência de 4 regiões distintas, correspondentes a 4 estados físicos de transição de fases diferentes, para os fosfolípidos DBPC e DSPC: I– Gasoso (G); II– Líquido expandido (LE); III– Líquido condensado (LC); IV– Sólido (S). • Para o fosfolípido DPPC, observou-se para além dos 4 estados referidos anteriormente, a existência de um outro estado de transição de fase, correspondente a um estado físico coexistente, designado de líquido condensado-líquido expandido (LC+LE). • A natureza e concentração do electrólito de suporte da subfase aquosa parece não influenciar o comportamento das isotérmicas dos diversos fosfolípidos estudados. No entanto, o comportamento da isotérmica de DPPC mostrou-se bastante dependente da temperatura, observando-se que para valores de temperatura inferiores ou superiores a 20 ºC, o estado físico LC+LE, deixou de ser observado. • Os estudos não foram suficientemente esclarecedores quanto ao efeito da presença de GOx na isotérmica de misturas de fosfolípidos [DSPC+DPPC]. Para baixas concentrações de GOx adicionadas à subfase aquosa, o comportamento das isotérmicas parece ser ligeiramente afectado com a sua presença. No entanto, para se obter uma conclusão mais esclarecedora, seria necessário efectuar outro tipo de misturas de fosfolípidos e utilizar valores de GOx na fase aquosa mais elevados. • A transferência de monocamadas de fosfolípido DBPC para um substracto sólido de Au, mostrou-se eficaz utilizando o método de deposição vertical. No entanto, o estudo efectuado com FT-IR não foi, contudo, eficaz para a determinação da transferência de GOx juntamente com a monocamada de fosfolípido para o slide de Au, devido talvez às baixas concentrações de GOx utilizadas, ou ainda, devido à sua dissolução na subfase aquosa, não penetrando na monocamada do fosfolípido, e por conseguinte, não ocorrendo transferência para o slide de Au. Os estudos mostraram ainda que, as isotérmicas de diferentes fosfatidilcolinas na interface ar-água, variam com o tamanho da cadeia de hidrocarbonetos (de C16 a C22), observando-se uma diminuição no valor da área molecular média. Isto significa que a monocamada é muito mais compacta para o fosfolípido com a cadeia de hidrocarbonetos maior, pois as forças atractivas de Van der Waals são mais fortes entre as cadeias mais longas de hidrocarbonetos, do que entre as cadeias mais curtas. Por outro lado, as isotérmicas da mistura de dois fosfolípidos [DSPC+DPPC], mostraram que se tratam de dois fosfolípidos miscíveis entre si, sendo as suas isotérmicas aparentemente influenciadas com a presença da enzima GOx. Esta miscibilidade torna, contudo, o comportamento da isotérmica imprevisível, pois não foi possível determinar de que forma a que a mistura de moléculas de fosfatidilcolinas se rearranjam à superfície da subfase aquosa. 118 Capítulo 4 — Conclusões finais QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário Os estudos de adsorção de fosfatidilcolinas na interface líquido-líquido polarizadas, utilizando a técnica de espectroscopia de impedância electroquímica, permitiram realizar as seguintes conclusões: 1. Relativamente à GOx pode dizer-se que: • Para as interfaces líquido-líquido polarizadas estudadas, a capacidade interfacial é dependente da concentração da GOx presente na fase aquosa, bem como, do potencial aplicado, ocorrendo um efeito de adsorção maior, para potenciais negativos. • A adsorção da GOx nas interfaces estudadas parece não ser afectada pela natureza do solvente, pois o valor de ΔG0ads foi de –21 e –22 KJ/mol, respectivamente, para a interface água/1,2-DCE e água/2-NPOE. • A capacidade interfacial foi afectada pelo pH da fase aquosa na presença de GOx, sendo este efeito mais pronunciado a pH inferior ao pI da enzima (pH ácidos). 2. Relativamente à DAPC, pode referir-se que: • A adsorção deste fosfolípido na interface água/1,2-DCE é dependente, quer da concentração de GOx presente na fase aquosa, quer do potencial aplicado, sendo maior o efeito a potenciais negativos. 3. Para o fosfolípido DBPC: • Ocorreram variações na capacidade interfacial para as diferentes concentrações de DBPC utilizadas na fase orgânica, e também na presença da enzima GOx na fase aquosa. Os valores de capacidade mostraram uma adsorção praticamente constante ao longo de toda a gama de potenciais estudados, sendo este efeito maior para concentrações mais elevadas de DBPC, o que sugere uma adsorção estável de DBPC ao nível da interface. • Os resultados mostram ainda uma adsorção menos favorável do fosfolípido na presença da enzima GOx na fase aquosa. 4. Os estudos com DPPC mostraram que: • A existência de duas regiões de comportamento diferente nas curvas de capacidade: uma a potenciais negativos, onde se observou a adsorção do fosfolípido; e outra a potenciais positivos, onde deverá ocorrer uma desorção do fosfolípido da interface. • Ambas as isotérmicas de Frumkin e Volkov, obtidas para as diferentes concentrações de DPPC, permitem um bom ajuste dos resultados, obtendo-se valores muito semelhantes para as duas isotérmicas. • O valor de ΔG0ads obtido para ambos os ajustes, foi de –33 KJ/mol em 1,2-DCE e –35 KJ/mol em 2-NPOE, o que sugere que a formação da camada não é afectada pela natureza do solvente. Estes resultados mostram ainda que, a DPPC tem uma maior tendência para ser adsorvida nesta interface, do que a DBPC e a GOx. • O valor de τ obtido para o solvente 1,2-DCE e 2-NPOE, foi, respectivamente, 1.7 e 0.48, o que sugere que a camada adsorvida de DPPC à interface se encontra no estado líquido expandido em ambos os solventes, sendo a sua espessura muito menor no solvente 2-NPOE. 119 Capítulo 4 — Conclusões finais • QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário A adsorção de DPPC nas interfaces estudadas depende do potencial aplicado, da concentração de DPPC presente na fase orgânica e da concentração de GOx (quando presente na fase aquosa). Para concentrações de DPPC mais elevadas e na presença da enzima GOx, as curvas de capacidade apresentaram um pico a potenciais positivos, devido a um fenómeno de transferência de carga da GOx da fase aquosa para a fase orgânica. • Na presença de GOx, o valor de ΔG0ads obtido, foi maior para concentrações mais elevadas de DPPC na fase orgânica, o que sugere que a adsorção de GOx na interface será mais favorável para concentrações de DPPC mais elevadas na fase orgânica. Os valores de a positivos obtidos na maioria dos casos estudados, indicam que as interacções entre as espécies interfaciais são atractivas. Estes estudos mostram ainda que o efeito de adsorção é tanto maior, quanto menor é a cadeia de hidrocarbonetos da fosfatidilcolina, para uma dada concentração de fosfolípido. Assim, o efeito será maior para a DPPC > DAPC > DBPC. O mesmo efeito foi observado na presença de GOx na fase aquosa. Os estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE, efectuados na presença de ACh+ e BuCh+ na fase aquosa, mostraram não afectar o efeito de adsorção do fosfolípido a potenciais negativos, enquanto que a potenciais positivos foi observado um pico nas curvas de capacidade, resultante do processo de difusão (transferência de carga) dos iões em estudo da fase aquosa para a fase orgânica. Futuras investigações: Como projectos futuros dever-se-á aliar as técnicas de LB e de EIE para efectuar os estudos de adsorção e com controlo da tensão interfacial em simultâneo, bem como, efectuar estudos com diversas misturas de diferentes fosfolípidos e estudar também outras possíveis enzimas e fosfatidilcefalinas com grande interesse biológico. 120 Capítulo Bibliografia Capítulo 5 — Bibliografia QUÍMICA ANALÍTICA Relatório de Seminário [1] - G. Roberts (Ed.), Langmuir-Blodgett Films, Plenum Press, New York, 1990. [2] - J.D. Swalen, D.L. Allara, J.D. Andrade, E.A. Chandross, S. 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Procedimentos experimentais: onde se lê luvas de nitrilo sem pó, deve ler-se se luvas de nitrilo sem pó talco. • Pág. 58, 3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface arágua. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa: onde se lê observando-se ligeiras diferenças apenas na região III, deve ler-se observando-se ligeiras diferenças apenas na região IV. • Pág. 65, 3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos sólidos: onde se lê espectros de transmitância e absorvância, deve ler-se apenas espectros de reflectância. • Pág. 66, 3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au: onde se lê Desta forma, se atingir, deve ler-se Desta forma, após se atingir. • Pág. 67, Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au: onde se lê absorvância, deve ler-se reflectância. • Pág. 70, 3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE polarizada: onde se lê carrega, deve ler-se carregada. • Pág. 80, 3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença da GOx na fase aquosa: onde se lê Este efeito foi tanto maior, quanto maior a concentração da enzima à fase aquosa (no entanto, para baixas concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa o efeito não foi muito pronunciado), deve ler-se apenas Este efeito foi tanto maior, quanto maior a concentração da enzima adicionada à fase aquosa. • Pág. 86, 3.2.5. Estudos de adsorção de DPPC (C16): onde se lê componentes orgânicos, deve ler-se compostos orgânicos. • Pág. 109, 3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2DCE da acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC: onde se lê inferires, deve ler-se inferiores. • Pág. 114, 3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2DCE na presença de butirilcolina na fase aquosa: onde se lê substituída por x μM de BuCh+, deve ler-se substituída por x mM de BuCh+.