THE CULTURAL TURN Evelyn Grumach Evelyn Grumach eJoao de
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THE CULTURAL TURN Evelyn Grumach Evelyn Grumach eJoao de
COPYRIGHT~ Fredric Jameson, 1998 TITULO ORIGINAL THE CULTURAL TURN CAPA Evelyn Grumach PROJETOGRAFtCO Evelyn Grumach e Joao de Souza Leite CIP-BRASIL. CATALOGAl;AO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES J29g DE LlVROS, RJ. Jameson, Fredric, 1934A virada cultural: reflexoes sobre 0 p6s-modernismo I Fredric Jameson; tradu~ao de Carolina Araujo; revisao t~cnica Danilo Marcondes. - Rio de Janeiro: Civiliza~ao Brasileira, 2006. Tradu~ao de: The cultural turn: selected writings on the postmodern, 1983-1998 ISBN 8S-200-0718-X 1. P6s-modernismo (Literatura). 2. P6s-modernismo. 1. TItulo. CDD - 809.91 CDU - 82.09 Todos os direitos reservados. Proibida a reproducsao, armazenamento ou transmissao de partes deste livro, atraves de quaiquer meios, sem previa autorizacsao por escritO. Direitos desta traducsao adquiridos pela EDlTORA CMLIZA<;;:Ao BRASILEIRA Urn selo da EDlTORA RECORD LTDA. 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Parte da resistencia a ele pode advir da pouca familiaridade com as obras por ele abarcadas, que podem ser encontradas em todas as artes: a poesia de John Ashbery, por exemplo, assim como a poesia coloquial, muito mais simples, que, na decada de 1960, surgiu da rea~ao contra uma poesia modernista academica, ironica e complexa; a rea~ao contra a arquitetura moderna, em particular contra as constru~6es monumentais do International Style; as constru~6es pop e os galp6es ornados, enaltecidos por Robert Venturi em seu manifesto Aprendendo com Las Vegas; Andy Warhol, a pop art e 0 mais recente fotorrealismo; na musica, 0 momenta de John Cage, mas tambem a sfntese posterior entre os estilos cIassieos e "populares" encontrada em compositores como Philip Glass e Terry Riley, aMm do punk e do rock new wave, com grupos como The Clash, Talking Heads e The Gang of Four; no cinema, tudo que vem de Godard - filmes e vfdeos da vanguarda contemporanea -, assim como todo urn novo estilo de filmes de fie~ao e comerciais, algo que tern equivalentes, nos romances contemporaneos, nas obras, por urn lado, de William Burroughs, Thomas Pynchon e Ishmael Reed e, por outro, do novo romance frances. Tudo isso pode ser enumerado entre P6S-MODERNISMO as variedades daquilo que pode ser chamado de p6s-modernismo. Essa lista poderia esdarecer duas coisas de uma s6 vez. Em primeiro lugar, a maior parte dos p6s-modernismos acima mencionados surge como rea~6es espedficas contra as formas estabelecidas do alto modernismo, contra este ou aqueIe alto modernismo dominante que conquistou a universidade, 0 museu, a rede de galerias de arte e as funda~6es. Esses estilos, primeiramente subversivos e polemicos - 0 expressionismo abstrato, a grande poesia modernista de Pound, Eliot ou Wallace Stevens, 0 International Style (Le Corbusier, Gropius, Mies van der Rohe), Stravinski, joyce, Proust e Mann -, recebidos por nossos av6s como escandalosos e chocantes, saD tornados, pela gera~ao que desponta na decada de 1960, como 0 sistema estabelecido e 0 inimigo - mortos, asfixiados, canonicos, esses sao os monumentos reificados que devem ser destrufdos para que se fa~a qualquer coisa nova. Isso significa que haveni tantas formas de p6s-modernismo quantas havia, no lugar, de alto modernismo, uma vez que elas sao, ao menos inicialmente, rea~6es espedficas e localizadas contra esses model os. Tal caracterfstica obviamente nao facilita em nada a tarefa de descrever 0 p6s-modernismo como algo coerente, ja que a unidade desse novo impulso - se existe - e dada, nao por si mesma, mas pelo pr6prio modernismo que ele busca destronar. A segunda caracterfstica dessa lista de p6s-modernismos e a aboli~ao de algumas fronteiras ou separa~6es essenciais, notadamente a erosao da distin~ao anterior entre a alta cultura e a chamada cultura de l.Ilassaou popular. Esse talvez seja 0 desenvolvimento mais angustiante de urn ponto de vista academko, que tradicionalmente investe na preserva~ao de urn E SOCIEDADE DE CONSUMo ambito .de alta cultura ou de cultura de elite, em contraposi~ao ao amblente ao seu redor - urn ambiente de fiIisteus, quinquiIharias e de ki.tsch, de seriados de televisao e cultura de Reader's Digest -, e na transmissao, aos seus iniciados, de diffceis e complexas habilidades de ler, ouvir ever. Porem, boa parte dos recentes p6s-modernistas ficou fascinada exatamente por aquela paisagem de anuncios e moteis das avenidas de Las Vegas, pelo Late Show e pelo cinema B de Hollywood, pela chamada paraliteratura, com os seus best-sellers de aeroporto, que se alternam entre as categorias do g6tico e do romance, da biografia popular e do misterio de assassinato, da fic~ao cientffica e do romance fantastico. Eles nao mais "citam" tais "textos", como teriam feito urn joyce ou urn Mahler, eles os incorporam, a ponto de parecer cada vez mais diffcil tra~ar a linha que separa a alta arte das formas comerciais. Uma indica~ao hem diferente dessa aboli~ao das antigas categorias de generos e discursos pode ser encontrada no que, por v.ezes,.chamamos de teoria contemporanea. Na gera~ao a.ntenor amda havia urn discurso tecnico da filosofia profisslOnal- os gran des sistemas de Sartre ou dos fenomen610gos, a obra de Wittgenstein, a filosofia da linguagem comum ou ~alftica -, a margem do qual ainda se podia distinguir aquele dlscurso bem diferente das outras disciplinas academicas _ da cienc' I' . , la po Itlca, por exemplo, ou da sociologia e da crftica hteraria H . d' d . . 0Je em la, ca a vez mais, temos urn tipo de escrita slmplesm t -h d d . - -------en e c ama a e teona, que ao mesmo tempo, todas e nenh d ----..-E '. ------ _ uma essas COlsas. sse novo tlPOde discurso, geralmente -. d "F -aSSOCla0 a ran~a e a chamada teoria francesa torna-se eel '. ' ' n ao amp amente dlfundldo e marca 0 fim da filof so la Como t I A b d' . a . 0 ra e MIChel Foucault, por exemplo, deve Ser chamada d f'l f' h" . _ e 1 050 la, lst6na, teona social ou ciencia - polftica? E impossivel decidir, como dize:n h~j~ e~ dia; e eu . 0 que esse "discurso te6rico" tambem seJa enumerado SUgir _ _ --;-----"---entre as manifesta~6es do p6~lI!..0~~rmsmo. - A essa altura e preciso abordar a uesta2-@ usa ade u~do <ksse conceito: afinal, nao se_trata apeEas de mais~ palavra para descrever um estiloJ?articular. Tr~ta-se tam~e~, f ao menos no usa que fa~o dele, ~ um concelto de pen041za~ao, cuja fun~ao e correlacionar 0 surgimento de novos ?spectos ormais na cultura com 0 surgimento de um novo lliJo de vida social e de uma nova ordem economica - 0 que e I freqiientemente chamado, em tom de eufemismo, de ~oderniza~ao, sociedade de consumo p6s-industrial,. de .socledade da midia e do espetaculo, ou, ainda, de capltahsmo multinacional. Esse novo momento do capitalismo pode ser datado nos Estados Unidos, a partir do subito desenvolvimento p6s-~uerra, ou seja, ao final da decada de 1.940 e inicio d.a decada de 1950, ou ainda, na Fran~a, a partIr do estabeleclmento da Quinta Republica, em 1958. A decada de 1960 e, em varios aspectos, 0 principal pedodo de transi~ao;.u~ pedodo no qual a nova ordem internacional (0 neocolomahsmo, a Revolu~ao Verde, a dissemina~ao dos computadores e das informa~6es eletronicas) e, ao mesmo tempo, instaurada e abalada, tanto por suas pr6prias contradi~6es internas quanto pela resistencia externa. Quero a'l!!i d~linear alguns dos modos pelos quais os novos p6_s-modernismos expres~am. a ;erdade interna da recem-surgida ordem social do capltahsmo tardio, muito embora tenha que limitar a descri~ao a apenas dois de seus aspectos mais significativos, que eu chamo . ma de pastiche e esquizofrenia. Eles nos proporclOnarao u chance de perceber a especificidade da experiencia p6s-modernista do espa~o e do tempo, respectivamente. I f Um dos aspectos ou praticas mais significativos do p6s-modernismo hoje e 0 pastiche. Antes de tudo e precise explicar esse termo (originario da linguagem das artes visuais), ate porque muitos em geral tendem a confundi-Io ou assimiIa-Io a um fenomeno verbal, a ele relacionado, chamado de par6dia. Tanto 0 pastiche quanto a par6dia envolvem a imita~ao, ou melhor, a mfmica de outros estilos, particularmente dos seus maneirismos e cacoetes estiHsticos. E 6bvio que a literatura modern a em geral oferece urn campo riqufssimo para a par6dia, ja que os maiores autores modernos tern sido, todos eles, definidos pela inven~ao ou produ~ao de estilos bem particulares: pensemos na frase longa de Faulkner ou na imagetica natural caractedstica de D. H. Lawrence; pensemos em Wallace Stevens e no seu modo peculiar de usar abstra~6es; pensemos tambem nos maneirismos dos fil6sofos, de Heidegger, por exemplo, ou de Sartre; pensemos nos estilos musicais de Mahler ou Prokofiev. Todos esses estilos, por mais diferentes que sejam uns dos outros, sac comparaveis nisto: cada urn deles e perfeitamente inconfundfvel; uma vez aprendido urn deles, provavelmente nao se ira confundi-Io com mais nada. A par6dia tira proveito da singularidade desses estilos e se a~odera de suas idiossincrasias e excentricidades para produZl~uma imita~ao que ridiculariza 0 original. Eu nao diria que o lmpulso satfrico e consciente em todas as formas de par6dia·.' em t0d 0 caso, urn born parodista deve ter alguma compalxao pelo original, tal como urn grande mfmico deve ter a C~pacidade de por-se no lugar da pessoa imitada. Ainda as81m, 0 efeito geral da par6dia e - seja pela compaixao ou pela maHcia - revelar 0 ridfculo na natureza particular desses maneirismos estilfsticos, particularmente pelos seus excessos e excentricidades em rela~ao ao modo pelo qual as pessoas normalmente falam ou escrevem. Desse modo, por tnis de toda par6dia permanece, em algum lugar, 0 sentimento de que ha uma norma lingiilstica em contraste com a qual os estilos dos gran des modernistas podem ser ridicularizados. Mas 0 que aconteceria se nao mais se acreditasse na existencia da linguagem normal, do discurso cotidiano, da norma lingiHstica (digamos, do tipo de poder comunicativo e de clareza que Orwell enaltecia em seu famoso ensaio "Politics and the English language")? Poder-se-ia pensar nisso do seguinte modo: talvez a imensa fragmenta~ao e particulariza~o da literatura moderna - a sua explosao em uma infinidade de estilos e maneirismos distintos e particulares - prenuncie tendencias mais profundas e gerais na vida social como urn todo. Suponhamos que a arte moderna e 0 modernismo longe de serem urn tipo de curiosidade estetica especializada - tenham de fato prenunciado desenvolvimentos sociais nessa dire~ao; suponhamos que, nas decadas que sucederam 0 surgimento dos grandes estilos modernos, a sociedade tenha come~ado a fragmentar-se, de modo que cada grupo tenha passado a falar uma curiosa linguagem particular s6 sua, cada profissao tenha desenvolvido 0 seu c6digo particular ou idioleto e, finalmente, cada indivfduo tenha se tornado um tipo de ilha lingiHstica, separado de todos os demais. Nesse caso, entao, a pr6pria possibilidade de qualquer norma lingiilstica, em cujos termos poder-se-ia ridicularizar linguagens particulares e estilos idiossincraticos, desapareceria, e nao tedamos nada alem da diversidade e da heterogeneidade lingiilsticas. Esse e 0 momenta em que 0 pastiche surge e a par6dia se torna impossfvel. 0 pastiche, assim como a par6dia, e a imita~ao de urn estilo peculiar e unico, 0 usa de uma mascara estilfstica, 0 discurso em uma lfngua morta; no en tanto, ele e uma pratica neutra de tal mfmica, desprovida do motivo oculto da par6dia, sem 0 impulso satfrico, sem 0 riso, sem aquele sentimento ainda latente de que existe algo normal, em compara~ao com 0 qual aquilo que e imitado e comico. 0 pastiche e a par6dia palida, a par6dia que perdeu 0 seu senso de humor; 0 pastiche esta para a par6dia assim como aquela coisa curiosa, a pratica moderna de urn tipo de ironia palida, esta para aquilo que Wayne Booth chamou de ironias estaveis e comicas do seculo XVIII. 1 I Ii Esse e 0 momenta de introduzir uma nova pe~a nesse quebra-cabe~a, ~g_ocapaz de ajudar a explicar por que 0 modernismo cIassico e algo do passado e por que 0 p6s-modernismo deve ter tornado 0 seu lugar. 0 novo componente e 0 que g~alm~~e ~e ch~ma de "a morte do sujeito" ou, para dize10~m hnguagem mais convencional, 0 fim do individualis~oJ-nquanto tal. Os gran des modernistas foram, como ~Issemos, definidos pela inven~ao de urn estilo pessoal, particular . - d'Iglta, . I _ . ' tao I'ncon fun d'IveI quanto a nossa Impressao tao . lllCompa' '. rave I quanto 0 nosso pr6prIo" corpo. Mas ISSO slgnlf!ca qu ' . d' . e a estetlca mo ermsta e, de certo modo, organ1cament I· d 'd . e Iga a a concep~ao de urn eu unico e de uma 1 entldad . I u . ---: partlcu ar, de uma personalidade singular e de ma llldivid ua I'd d 1 a ~ da gual se espera que gere sua visao P6S'MODERNISMO propria e singular do mundo e que construa 0 seu proprio estilo, singular e inconfundlvel. Contudo, hoje, a partir de imlmeras perspectivas distintas, os teoricos sociais, os psicanalistas e mesmo os lingiiistas - para nao falar daqueles que trabalham na area da cultura e da transforma~ao cultural e formal - estao explorando a no~ao de que esse tipo de individualismo e essa identidade pessoal sao coisas do passado, que ~~elho sujeito ind~l e individualista esta "morto", e que se pode chegar ate a des~rever 0 conceito de indivlduo singular e a base teorica do individualismo como ideologicos. Ha, na verdade, duas p-2!i~6es em tudo isso, uma das quaise mais radical do que a outra. A primeira delas esta contente em dizer: sim, ha muito tempo, na era cIassica do capitalismo competitivo, no auge da famllia nuclear e no surgimento da burguesia como a classe social hegemonica, houve algo como 0 individualismo, como os sujeitos individuais. Mas hoje - na era do capitalismo corporativo, do chamado homem organizacional, das burocracias, tanto nos negocios quanto no Estado, da explosao demografica -, hoje, esse antigo sujeito individual bur- . gues nao existe mais. Ha, por outro lado, uma segunda posi~ao, a mais radical delas, que podemos chamar de posi~ao pos-estruturalista. Ela acrescenta: nao apenas 0 sujeito individual burgues e algo do passado, como ele e tambem urn mito, algo que nunca chegou de fato a existir, nunca houve sujeitos autonomos desse tipo. Esse construto e meramente uma mistifica~ao filosofica e cultural, que buscou persuadir as pessoas de que elas "tinham" subjetividades individuais e possulam certa identidade pessoal singular. Para os nossos propositos aqui, nao e particularmente E SOCIEDADE DE CONSUMO importante decidir qual dessas posi~6es esta certa (ou meIhor, qual deIas e mais interessante e produtiva). 0 que devemos guard~~ d~ tudo i,ssoe, antes, urn dilema estetico: porque, se a expenencla e a IdeoIogia do eu singular - uma experiencia e ideoIogia que nutriram as praticas estiHsticas do modernismo cIassico - sao passado acabado, entao nao ha mais clareza sobre 0 que se espera que os artistas e escritores do pedodo presente fa~am. 0 que esta claro e apenas que os modeIos anteriores - Picasso, Proust, 1: S. Eliot - nao funcionam mais (ou sao positivamente prejudiciais), ja que ninguem tern mais aqueIe tipo de mundo e estilo singular e unico para expressar. E provaveImente essa nao e apenas uma questao "psicoIogica"; temos tambem que Ievar em conta 0 imenso peso de setenta ou oitenta an os de modernismo cIassico propriamente dito. Esse e urn outro senti do, a partir do qual ~s autores e artistas do presente nao serao mais capazes de mventar novos estilos e mundos - eIes ja foram inventados; somente urn numero Iimitado de combina~6es e posslveI, apenas aqueIas que ja foram pensadas. Dessa forma, 0 peso de ~oda a tradi~ao estetica modernista - hoje morta _ tambem ~esa como urn pesadeIo no cerebro dos que vivem", como dlsse Marx em outro contexto. Isso nos leva mais uma vez ao pastiche: em urn mundo no qual a ino 'I" va~ao estl Istlca nao e mais posslvel tudo 0 que resta e imita t'I £I ' r es I os mortos, a ar atraves de mascaras e com as vozes dos estilo " , , , s no museu Imagmano. Mas ISSOsignifica que a arte p' d 6' os-mo erna ou contemponlnea se pautara peIa pr pna arte de u d '" " de m mo 0 novo; mals amda, slgmflca que uma suas mensage ' , d ns essenclals envoIvera a faIencia necessaria a arte e da est't' £ I" , passado. e Ica, a a encla do novo, 0 aprisionamento no P6S.MODERNISMO Como tudo isso pode parecer muito abstrato, eu gostaria de dar alguns exemplos, urn dos quais e tao onipresente que raramente 0 relacionamos aos tipos de desenvolvimento da aha arte aqui discutidos. Essa pnitica espedfica do pastiche nao se liga tanto a alta cultura, mas muito mais a cultura de massa, e e geralmente conhecida como "cinema nostalgico" (0 que os franceses, com elegancia, chamam de /a mode ret~o o estilo retrospectivo). Devemos conceber essa categona no seu sentido mais amplo. Estritamente falando, nao ha duvidas de que ela consiste apenas em filmes sobre 0 passado, ou ainda, em momentos de gera~6es espedficas desse pass ado. Assim, urn dos filmes que inauguram esse novo "genero" (se e que se trata disso) e 0 filme de Lucas, Loucuras de verao, que, em 1973, se propos a recapturar toda a atmosfera e as peculiaridades estilfsticas dos Estados Unidos da decada de 1950, os Estados Unidos da era Eisenhower. 0 grande filme de Polanski, Chinatown (1974), faz algo parecido com a de: cada de 1930, assim como 0 conformista, de Bertolucci (1969), em rela~ao ao contexto italiano e europeu do mesmo perfodo, a era fascista da Italia. Podedamos continuar listando esses filmes por urn tango tempo. No entanto, por que chamalos de pastiche? Nao seriam eles, ao contrario, obras de urn genero mais tradicional, conhecido como cinema hist6rico - obras que podem ser mais simplesmente teorizadas por uma extrapola~ao daquela outra forma bem conhecida, a do romance hist6rico? Tenho minhas raz6es para pensar que precisamos de novas categorias para tais filmes. Porem, permitam-me, antes disso, acrescentar algumas anomalias: suponhamos que eu E SOCIEDADE DE CONSUMO sugira que Guerra nas estre/as (George Lucas, 1977) tambe seja um filme nostalgico. 0 que isso significaria? Presum: que podemos concordar que ele nao e urn filme hist6rico sobre 0 nosso passado intergaIactico. No entanto, deixe-me colocar a questao de urn outro modo: uma das experiencias culturais mais importantes das gera~6es que cresceram entre as decadas de 1930 e 1950 foram os seriados das tardes de sabado, do tipo Buck Rogers - vH6es alienfgenas, her6is tipicamente american os, heroin as em perigo, 0 raio da morte ou a caixa do apocalipse e, por fim, 0 her6i pendurado no penhasco, cuja soIu~ao mHagrosa s6 seria vista na pr6xima tarde de sabado. Guerra nas estre/as reinventou essa experiencia na forma do pastiche; nao ha sentido em se pensar uma par6dia desses seriados, uma vez que eles foram extintos ha muito tempo. Longe de ser uma satira sem sentido dessas formas mortas, Guerra nas estre/as satisfaz urn anseio pro fun do (sera que eu poderia dizer reprimido?) de experimenta-Ios novamente; e um objeto complexo no qual, em urn primeiro niveI, crian~as e adolescentes podem apreender apenas as aventuras, ao passo que 0 publico adulto po de realizar urn deseJ' . . o mUlto mals profundo, e mais propriamente nostaIgico, de voltar a esse perfodo anterior e revive-Io atraves dos seus estranhos e antigos artefatos esteticos. Esse fHme e, por:nto, ~or metonfmia, urn fHme hist6rico ou nostalgico. Ao ntrano de Loucuras de verao, ele nao reinventa uma imam ge. do passado na sua totalidade vivida' ao contrario ao relllVentar _ " tic d a sensa~ao e a forma de objetos de arte caracterfsos e um p {d ' rea er 0 0 anterIOr (os seriados), ele procura cender urn 'd d Nes f ,Senti 0 e passado associado aqueles objetos. se ntenm 0 do aqui ,s cafa res da area perdida (1981) ocupa uma posira . d" 3' 0 mterme leina: em urn determinado n{vel, 0 rf Q.,..... "- \'" SOCIEDADE filme trata das decadas de 1930 e 1940, mas ele tambem ~~s transporta a esse pedodo por metonlmia, atraves de suas tlplcas est6rias de aventura (que nao sao mais as nossas). Agora me permitam discutir uma outra anomalia que pode levar-nos adiante na compreensao do dnema nostalgico~ em particular, e do pastiche de modo geral. Ela envolve urn £tIme recente chamado Corpos ardentes (Lawrence Kasdan, 1981), que, como £oi abundantemente apontado pelos cdticos, e urn tipo distante de refilmagem de Pacto de sangue (1944). (0 plagio alusivo ou evasivo de motes antigos e, naturalmen:e, tambem urn aspecto do pastiche.) Bern, Corpos ardentes nao e tecnicamente urn filme nostalgico, ja que se passa em urn cenario contemporaneo, em uma pequena vila da Fl6rida, perto de Miami. Por outro lado, essa contemporaneidade tecnica e de £ato muito amblgua; os creditos - sempre a nossa primeira sugestao - usam £ontes em estilo art deco da decada de 1930, que nao £azem outra coisa a nao ser provocar rea~6es nostalgicas (em primeiro lugar, sem duvidas, em rela~ao a Chinatown, mas depois para alem de~eate,algum out~o referendal hist6rico). Junto a isso, 0 pr6pno estllo do her61 e amblguo; William Hurt e urn astro novo, mas nao tern nad~ do estilo caracterfstico da gera~ao anterior de astros mascuhnos como Steve McQueen ou Jack Nicholson, ao contririo, a sua persona aqui e urn tipo de mistura das caracterfsticas desses atores com urn papel mais antigo, do tipo geralmente associado a Clark Gable. Tambem aqui hi, portanto, uma sensa~ao levemente arcaica com rela~ao a tudo isso. Esse espectador come~a a se perguntar por que essa hist6ria, que poderia ter sido situada em qualquer lugar, e ambientada e~ uma pequena cidade da Fl6rida, a despeito de sua referenCla contemporanea. Come~a·se a perceber, em pouco tempo, que ~ DE J CONSUMO '~ o o ambiente da pequena cidade tern uma fun~ao estrategica crucial: permite que 0 filme dispense grande parte dos signos e referencias que poderiam ser associados ao mundo contempodineo, a sociedade de consumo - os utensllios e artefatos , os arranha-ceus, 0 mundo de objetos do capitalismo tardio. Tecnicamente, enfim, seus objetos (seus carros, por exemplo) sao produtos dos anos 1980, mas tudo no filme conspira para emba~ar essa referencia imediatamente contemporanea e tornar posslvel a sua recep~ao como mais uma obra nostalgica _ como uma narrativa situada em algum passado nostalgico indefinlvel, digamos, uma eterna decada de 1930 para alem da hist6ria. Parece-me muito sintomatico encontrar precisamente 0 estilo do cinema nostalgico invadindo e colonizando ate mesmo aqueles filmes atuais que se passam em cenarios contemporaneos" como se, por algum motivo, nao pudesse~ais, hoje, focar 0 nosso pr6prio presente, como; nos ~i,v~ssemostornado incapazes de alcan~ar repr~senta~6es estetlcas de I!£ssa pr6pria experiencia atual. Mas, se assim e, entao estamos diante de uma imposi~a; do pr6prio capitalis: mo de consumo - ou, ao men os, de urn sintoma alarmante e patol6gico de uma sociedade que se tornou incapaz de lidar com 0 tempo e a hist6ria. Assim, voltamos agora a questao sobre por que 0 cinema nost'la glCOou ' , 0 pastIche devem ser considerados diferentes dos antigos rom £'1 '1' Ulr nessa , ances e I mes h'" lstoncos. D evo mc dlSCussao 0 m alOr ' exemp 10 I'lterano, " • ao meu ver, dessa questao: os ro mances d e E. L. Doctorow - Ragtime, com a sua atmosfera d a Vlra ' da d 0 seculo, e Lago da solidao, em sua maior parte ". sobr e a nos sa d eca d a de 1930. Mas esses, na minha °Plnlao • romances hist6ricos apenas aparentemente. D ' sao Octorowe urn artlsta ' , e urn dos poucos romancistas seno radicais que ainda produzem hoje. Nio e prestar urn desservi~o a ele, entretanto, sugerir que as suas narrativas nao representam 0 nosso passado hist6rico, ao menos nao tanto quanto representam as nossas ideias e estereotipos c~lturai~ sob~e esse passado. A produ!rao cultural foi recondu~da_ ao mt~nor da. ( mente, dentro do sujeito monaoico; ela_~o po~e malS olhar diretamente com seus pr6prios olhos para 0 mundo_:e~ busc; de urn referente, ao contrario, ela deve,-~~mo n~aveEna de Platao, tra!rar suas imagens mentais do mundo nas p_a: redes que a confinam. Se ainda sobrou aqui qualquer realism~, e urn "realismo" que brota do choque de se compreender ~sse confinamento -e de ~e perceber que, sejam quais forem os_ ~motivos, arece os c '~d nad sa buscar 0 passado hist6ri~ ~traves de nossas pr6prias imagens pop e estere6tipos sobre 0 ~sado, que perman~ce para semp~e fora de alcance. '- que acontecem dentro ~esse novo e~pa~o, nao acompanhamos essa evo u~ao~~u~e uma _muta!rao no objeto, - qual ain a nao se seguiu uma muta~ao equivalente no sujeito' ,nao pDSsufmos 0 instrumental perceptivo para nos emparelharmos a esse novo hiperespa~o, como eu 0 chamo, em parte porque nossos habitos perceptivos foram formados naquele antigo tipo de espa!r0, que eu chamei de espa~o do alto modernismo. A recente arquitetura - assim como muitos outros produtos culturais que mencionei nas observa~oes anteriores - representa, portanto, algo como urn imperativo ao crescimento de novos 6rgaos, que expandam os nossos sentidos e os nossos corp os ate novas dimensoes, ainda inimaginaveis, talvez ate, em ultima instancia, impossfveis. a --- o ediffcio cujas caracterfsticas * Antes que eu tente oferecer uma conclusao urn pouco mais positiva, gostaria de esbo!rar a analise de urn ediffcio absolutamente p6s-moderno - uma obra que e, em varios aspectos, distinta daquela arquitetura p6s-moderna cujos principais nomes sac Robert Venturi, Charles Moore, Michael Graves e, mais recentemente, Frank Gehry, mas que, aos meus olhos, oferece algumas li!roes surpreendentes sobre a originalidade do espa~o p6s-modernista. Permitam-me ampliar a figura que perpassou as observa~oes feitas ate aqui para torna-la ainda mais explfcita; estou mjJondQ a_~o!raod~ue estamos dian~ te de algo como uma muta~ao no proprio espa~o construfdo. '"Mi;ha sUp'osi~ao-<5 de que nos mesmos, os sujeitos humanos passarei a enumerar e 0 hotel Westin Bonaventure, construfdo no novo centro de Los Angeles pelo arquiteto John Portman, cujas obras incluem varios hoteis da rede Hyatt Regency, 0 Peachtree Center, em Atlanta, e 0 Renaissance Center, em Detroit. Devo mencionar 0 aspecto populista da defesa ret6rica do p6s-modernismo Contra as austeridades elitistas (e ut6picas)' dos grandes l'i1OCternismos arquitetonicos; em geral afirma-se que, por urn lado ess --. _ , as constru!roes malS recentes sac obras populares e, ~~: o.?tr.o,!que elas r,es~e~tam,a liI2guag<:.mda malha da ci~amencana. Isso slgmflca dlzer que elas nao mais tentam comof -_ _, lzeram as obras-primas e monumentos do alto modernlSmo ins I' .-. ' enr uma nova mguagem, dlferente, distinta, elevad a e Ut6 ,. 'd Pica, no sistema simb6lico cafona e comercial _ da Q ade que as cerca, mas, ao contrario, buscam falar essa mesma linguagem, usando 0 seu lexico e a sua sintaxe, que_ ~lematicameI1te, "aprendida com Las y~as". Levando-se em conta 0 primeiro aspecto, 0 Bonaventure de Portman confirma totalmente essa defini~ao; trata-se de uma constru~ao popular, visitada com entusiasmo tanto pelos moradores locais quanto pelos turistas (mesmo que outras constru~6es de Portman tenham tido maior sucesso nesse quesito). A inser~ao populista na malha urbana e, contudo, urn outro problema e e por ele que n6s come~aremos. Hi tres entradas para 0 Bonaventure: uma pela rua Figueroa e outras duas atraves de jardins suspensos do outro lado do hotel, construfdo na ladeira que restou do que antes, foi a colina Beacon. Nada disso se parece com os antigos toldos de hotel ou 0 monumental porte-cochere com que as suntuosas constru~6es, hi nao muito tempo, costumavam representar a passagem da rua para 0 antigo interior. As vias de acesso ao Bonaventure saD 0 que antes se considerava como entradas laterais ou dos £Undos; os jardins ao fundo levam ao sexto andar das torres e, mesmo af, e preciso descer urn lance de escadas para encontrar 0 elevador pelo qual se tern acesso ao lobby. Por outro lado, aquela que ainda estamos tentados a considerar como a entrada principal, na rua Figueroa, recebe o visitante, com suas bagagens e tudo mais, no mezanino do segundo piso, de onde e preciso descer pela escada rolante ate 0 balcao de atendimento principal. Tratarei daqui a pouco desses elevadores e escadas rolantes. 0 que eu gostaria de sugerir em primeiro lugar a respeito desses acessos curiosamente nao demarcados e que eles parecem ter sido impostoS por alguma nova categoria de fechamento que rege 0 espa~o interno do pr6prio hotel (e isso apesar das restri~6es materiais sob as quais Portman teve que trabalhar). Creio que, junto com um certo mlmero de outros ediffcios caracteristicamenI""'te p2,s-moaernos, tais como 0 Beaubourg, em Paris, ou 0 Eaton Center, em Toronto, 0 Bonaventure aspira a ser urn espa~o total, urn mundo completo, urn tipo de cidade miniatura (e eu gostaria de acrescentar que a esse novo espa~o total corresponde uma nova pratica coletiva, urn novo modo no qual os indivfduos se movem e se reunem, algo como a pratica de um novo tipo, historicamente original, de hipermassa). Nesse senti do, entao, a minicidade do Bonaventure de furtman id£almente nao deveria ter nenhuma entrada (uma vez que a via de acesso e sempre a costura que liga 0 ediffcio ao resto da cidade que 0 cerca), pois .ele nao q_uers..:!... uma parte da cida~e, mas, sim, 0 seu equivalente e 0 seu substitu:, Isso, entretanto, nao e obviamente possfvel ou factfvel, 0 que nos leva a minimiza~ao e a redu~ao deliberadas da fu~- I -~ao da entrada. Todavia, essa disjun~ao emrela~ao a ddade ao redor e muito diferente da dos grandes monumentos do International Style; af 0 ato de disjun~ao era violento, visfvel e tinha urn significado simb6lico muito real- como nos grandes pi/otis de Le Corbusier, cujo gesto separa radicalmente 0 novo espa~o ut6pico do moderno da malha urbana degradada e decafda, a qual ele, desse modo, repudia de modo explicito (embora a aposta do moderno era de que esse novo espa~o ut6pico, na virulencia do seu Novum, se espalhasse por toda a cidade e, por fim, a transformasse atraves do poder de sua nova linguagem espacial). 0 Bonaventure, contudo, se contenta em "deixar a decafda malha urbana continuar a ser em seu ser" (para parodiar Heidegger); nenhum outro efeitonenhuma maior transforma~ao proU;polftica - e esperado ou d~e· ado. - to: Esse diagn6stico e, ao meu ver, confirmado pela pele de vidro espelhado do Bonav:.nture, cuja fun!Sao pode ser primeiramente interpretada como 0 desenvolvimento de uma tematica da tecnologia reprodutiva. Porem, em uma segunda leitura e possfvel querer ressaltar 0 modo pelo qual a pele de '- -vidro repele a cidade la fora, uma repulsa para a qual jeIIlQs analogias nos oculos ~~ sol espelhados, que tornam im'p'ossfvel ao seu interlocutor ver os seus olhos e que, portanto, acabarn denotando, nao so uma certa agressividade em r:!a!Sao ao outro, como urn podersobre ele. Analogamente, a pele de vidro -realiza uma peculia; dissocia!Sao do Bonaventure em rela!Sao a sua vizinhan~a, a qual nao chega sequer a ser algo exterior, visto que, quando se tenta olhar para as paredes externas do hotel, nao se pode ver 0 hotel mesmo, mas apenas as imagens distorcidas de tudo 0 que 0 cerca. Gostaria de dizer agora algumas palavras sobre as escadas rolantes e os elevadores. Dada a sua real fun!Saode prazer na arquitetura de Portman - em particular destes ultimos, que o artista definiu como "gigantescas esculturas cineticas", que por certo contribuem para boa parte do espetaculo e do deleite do interior dos hoteis, especialmente nos Hyatts, onde eles sobem e descem, sem parar, como gran des gondolas ou lanternas japonesas - e dadas a enfase e a aten!Sao deliberadamente concedidas a eles, creio que e preciso ver tais "transportadores de pessoas" (termo do proprio Portman, adaptado de Disney) como algo urn pouco mais significativo do que meros componentes funcionais de engenharia. Sabemos que, em todo caso, a recente teoria da arquitetura come~ou a se apropriar das analises narrativas de outros campos e a tentar ver as nossas trajetorias psfquicas, atraves de tais edifkios, como narrativas ou estorias virtuais, como caminhos dinamicos e paradigmas narrativos, os quais 0 visitante e con- - -- vidado a preencher e a completar com 0 seu proprio corpo e movimento. No Bonaventure, to davia, encontramos uma intensifica!Saodialetica desse processo. Parece-me que nao apenas as escadas rolantes e os elevadores af passam a substituir o movimento, mas tambem, e sobretudo, eles nomeiam a si mesmos como os novos signos e emblemas do proprio movimento (algo que se tornara evidente quando chegarmos a questao sobre 0 que restou das formas mais antigas de movimento nesse ediffcio, especificamente do proprio caminhar). Aqui 0 passeio da narrativa foi ressaltado, simbolizado, reificado e substitufdo pela maquina de transporte, que se torn a o significante alegorico daquele antigo passeio que nao nos e mais permitido fazer por nos mesmos. Essa e uma intensifica!Saodialetica da auto-referencialidade de toda cultura moderna, que tende a voltar-se para si mesma e a designar a sua propria produ!Sao cultural como 0 seu conteudo. Fico mais perdido quando se trata de comunicar a coisa ~esma, a experiencia espacial vivid a ao se sair desses dispositlVosalegoricos e entrar no lobby ou atrio, com a sua grande coluna central, cercado por urn lago em miniatura , tudo " , poslclOnado entre as quatro torres residenciais simetricas com seus elevadores, cercados par sacadas que sobem ate 0 sexto andar, culminando em uma especie de teto de estufa. Sou ", rtentado a d'Izer que ta I espa!Sonos torna Imposslvel 0 usa da I~guagem de volume ou volumes, ja que estes saD impossfVelSde se d" G lh d me Ir. a ar etes pendurados espalham-se por esse espaC' "d ' , 3'0 vazlO, e modo a, sistematica e deliberadamente, d esvla-Io d I £ nh e qua quer orma que possa se supor que ele tea, ao passo qu _ de e uma OCupa!Saoconstante causa a sensa!Sao que 0 Va " "b Urn ele ZIOaqUl e a solutamente embalado, de que ele e mento dentro do qual voce proprio esta imerso, sem nenhum resqulcio daquela distancia que antes permitia a pe~cep~ao da perspectiva ou do volume. Estamos nesse hlperespa~o, nossos olhos e corp os estao nele merg~lhados, e, se alguma vez houve a impressao de que a supressao da profundidade, observavel na pintura e na literatura pos-modernas , seria algo necessariamente difkil de se obter na , arquitetura, talvez surja aqui a vontade de se ver ess~ Imersao atordoante como 0 equivalente formal no novo melO. Nao obstante, a escada rolante e 0 elevador sao tambem, nesse contexto, opostos dialeticos. Podemos sugerir que 0 glorioso movimento das gondolas do elevado: seja un;a ~ompensa~ao dialetica para esse espa~o preenchldo do atrio ele nos da a chance de uma experiencia espacial radicalmente diferente, porem complementar: a de se elevar, passar atrayes do teto e prosseguir do lado de fora, ao longo de uma das quatro torres simetricas, em urn movimento no qual 0 referente, a propria Los Angeles, se estende a nossa fre~te de modo espantoso, ate mesmo alarmante. No entanto, ate mesmo esse movimento vertical e contido; 0 elevador leva-nos a urn daqueles saguoes de coquetel giratorios, no qual 0 visitante , sentado , e mais uma vez passivamente girado, ao, que' lhe e oferecido urn espetaculo contemplativo da propria ClLl dade, agora transformada, pela janela de vidro, nas suas pro- - urias imagens. " ' ePermitam-me condUlr rapldamente tudo lSS0com urn r torno ao espa~o central do proprio lobby (com a observa~ao, a proposito, de que os quartos do hotel sac visivelmente mar'd" ros e ginalizados: os corredores nas alas reSl enClalSsac escu o teto, rebaixado, ou seja, depressivamente funcionais, ~o ""'ncHl. passo que se percebe que os quartos - com f reque 'd do eleredecorados - sac de extremo mau gosto ) . A d eSCl a vador e bem impactante, caindo como chumbo, atravessando o telhado e mergulhando no lago; contudo, 0 que acontece ao se chegar la e outra coisa, que eu so posso tentar caracterizar como uma confusao devastadora, algo como a vingan!;a desse espa!;o sobre aqueles que ainda se esfor!;am para nele caminhar. Dada a absoluta simetria das quatro torres, e quase im os 'vel orientar-§..el1esselobby. Recentemente foram colocados avisos sinalizando dire!;oes atraves de codigos de cores, em uma tentativa simpatiea, mas antes de tudo desesperada e reveladora, de restaurar as eoordenadas de urn espa!;o antigo. Tomarei como 0 mais drastico resultado pratico dessa muta!;ao espacial 0 notorio dilema dos lojistas que oeupam os v' iosmezaninos: tern sido obvio, desde a ~ra do hotel, em 1977, que ninguem con segue jamais encontrar umad;sas lojas que, mesmo que se eonsiga loealizar a butique procurada, e muito pouco provavel que se tenha tanta sorte de uma segunda vez; em razao disso, os comerciantes estao desesperados e todas as mereadorias estao a pre!;o de liquida!;ao. Quando lembramos que Portman, alem de arquiteto, e urn empresario e urn empreendedor milionario, urn artista que e tambem urn eapitalista, nao se pode deixar de sentir que algo como urn "retorno do reprimido" tambem aqui em questao. Chego finalmente ao ponto principal, 0 de que essa ultima muta~ao no espa!;o - 0 hiperespa!;o pos-moderno Consegu' , ill, por f'1m,transcender as capacidades do corpo humano mdi VI'd ua Id e se I' , pela percep!;ao oeahzar, de orgamzar o seu ento ' d' '_ rno Ime lato e de mapear cognitivamente a sua POSl~aoem ' mapeavel. Ja sugeri que essa dis' _ urn mun d 0 extenor co Jun~ao alarmante entre 0 corpo e 0 seu meio ambiente nstruldo ' mod ' - que esta para 0 atordoamento inicial do antigo ernlsmo como as ve Ioel'd ades das naves espaciais estao e ara as dos autom6veis - pode por si s6 permanecer como 0 Pl" . sfmbolo do p6s-modernismo, em ana ogla aque Ie d'l1 ema amda mais grave, que e a incapacidade de nossas mentes,. ao menos por enquanto, de map ear a grande rede de comUnIca~ao global, multinacional e descentralizada, na qual nos encontramos presos como sujeitos individuais. Por recear que 0 espa~o de Portman seja entendido como algo excepcional, aparentemente marginalizado, ou ainda vol,tado para 0 lazer como uma especie de Disneylandia, go~tan: de passar a justaposi~ao entre esse espa~o de lazer, satlsfa~ao e entretenimento (embora tambem de atordoamento) e 0 seu analogo em uma area bem diferente, a saber, 0 espa~o da guerra p6s-moderna, em particular a descrita por Michael Herr em seu grande livro sobre a experiencia do Vietna, Dispatches. As extraordinarias inova~oes lingUfsticas dessa obra podem ser consideradas p6s-modernas pelo modo ecletico no qual a sua linguagem £Unde impessoalmente todo urn Ieque de dialetos coletivos contemporaneos - em particular a linguagem do rock e a linguagem negra -, no entanto, essa fusao e ditada por questoes de conteudo. Essa primeira terrfvel guerra p6s-modernista nao pode ser recontada a partir de qualquer urn dos paradigmas tradicionais do cinema ou do romance de guerra - na verdade, 0 colapso de todos os paradigmas narrativos anteriores e, juntamente com 0 colapso de qualquer linguagem compartilhada atraves da qual urn veterano pode comunicar tal experiencia, urn dos temas principais do livro e pode-se considerar que ele abra espa~o para toda uma nova reflexao. 0 relato de Benjamin sobre Baudelaire e sobre 0 surgimento do modernismo a partir de uma nova experiencia da tecnologia urbana, que transcende todos os antigos habitOSde percep~ao corporal, e, aqui, ao mesmo tempo singularmente relevante e antiquado a luz deste saIto decisivo, quase inimagimivel, na aliena~ao tecnol6gica. Ele era urn recruta, urn alvo m6ve1 sobrevivente, uma verdadeira crian~a da guerra, porque, a exce~ao de raros momentos em que voce era fixado ou abandonado, 0 sistema funcionava de modo a mante-Io em movimento, como se fosse isso 0 que voce Supostamente desejasse. Pensado como uma tecnica para manter-se vivo, isso parecia nao fazer sentido algum, dado naturalmente que, em primeiro lugar, voce estava hi e queria ver de perto; come~ava firme e exato, mas, ao passo que ia progredindo, formava-se urn redemoinho, porque, quanto mais voce se movia, mais voce via, quanto mais voce via, mais voce se arriscava ao lado da morte e da mutila~ao, e, quanto mais voce se arriscava, mais voce se supunha abrindo mao de urn dia como urn "sobrevivente". Alguns de n6s nos moviamos pela guerra tao loucamente que nao consegu(amos mais ver para que lado 0 percurso nos levava, viamos apenas a guerra por toda a superffcie, com as suas penetra~6es ocasionais e inesperadas. Enquanto podiamos ter helic6pteros nos servin do de taxi, era preciso uma verdadeira exaustao, uma depressao beirando ao choque ou uma duzia de cachimbos de 6pio para nos mantermos ao menos aparentemente tranqiiilos. Mesmo assim, ainda continuarfamos correndo de urn lado para 0 outro dentro de nossa pr6pria pele, como se algo estivesse querendo nos pegar, ah, ah, La Vida Loca. Nos meses seguintes ao meu retorno, as centenas de helic6pteros nos quais tinha voado come~aram a se reunir ate formarem urn meta-helic6ptero e, na minha mente, essa era a coisa mais sensual do mom en- to; salvador-destruidor, provedor-dissipador, canhoto-destro, agil, fluente, astuto e hurnano; ferro quente, graxa, tecendo a tela da selva saturada, 0 suor esfriando e novarnente se aquecendo, a fita cassete de rock and roll em urn ouvido e o tiro de fuzil no outro, cornbustivel, calor, vitalidade e morte, a morte em si me sma, dificilmente urn intruso. ~ Nessa nova maquina, que nao representa movimento, como na antiga maquinaria modernista da locomotiva e do aviao, mas que s6 pode ser representada em movimento, concentrase algo do misterio do novo espa~o p6s-modernista. Para conduir, devo agora tentar caracterizar a rela~ao desse tipo de produ~ao cultural com a vida social neste pafs hoje. Esse tambem sera 0 momento para me dedicar a principal obje~ao a conceitos de p6s-modernismo do tipo que esbocei aqui, a saber, que todos os aspectos que enumerei nao sao absolutamente novos, mas, sim, caracterfsticas abundantes no pr6prio modernismo ou no que eu chamo de alto modernismo. Nao foi entao Thomas Mann urn interessado na ideia do pastiche e nao foi 0 capftulo de Ulisses, "Os bois do Sol", a sua realiza~ao mais 6bvia? Nao podem Flaubert, Mallarme e Gertrude Stein ser indufdos em urn relato de temporalidade p6s-modernista? 0 que ha~ tao n~ ~m tudo isso? Sera que n6s realmente precisamos de urn conceito de p6s-modernismo? Urn tipo de resposta a essa pergunta levantaria toda a ques\ I tao da periodiza~ao e de como urn historiador (litenirio ou n5oo)propoe uma ruptura radical entre dois perfodos, a partir de ent500distintos. Devo l~-me a sugerir que rupturas radicais entre perfodos em geral nao envolvem mudan~as completas de conteudo, mas, ao contrario, a reestrutura~ao ~ertos elementos ja dados: aspectos que em urn perfodo I ou sistema anterior eram subordinados agora se tornam do- : minantes, e aspectos que tinham sido dominantes tornam-se agora ~~cundarios. ~e~e sentido, tudo 0 que descrevemos aqui ode ser e?contrado em perfodos anteriores, notadamente dentro do pr6prio modernismo. Meu argumento e de que ate hoje esses tern sido aspectos secundarios ou menores na arte modernista, muito mais marginais que centrais, e de ' que temos algo novo quando eles se tornam os aspectos cent!ais da prod;~io cultural. Isso pode ser argumentado de modo mais concreto ao nos voltarmos para a rela~ao entre a produ~ao cultural e a vida social ~ geral. 0 modernismo antigo ou dassico era uma arte de oposi~ao, surgiu no interior da era de Duro da sociedade do neg6cio como algo de escandaloso e ofensivo ao publico da dasse media - feio, dissonante, boemio, sexualmente chocante. Era algo para ser ridicularizado (isso quando a polfcia nao era chamada para confiscar os livros ou fechar as exposi~oes), uma ofensa ao born gosto e ao senso c;omum, ou, como disseram Freud e Marcuse, urn desafio prov0cativo a realidade reinante e aos prindpios de conduta da sociedade de classe media do infcio do seculo 0 modernismo em g~ral nao combinava com 0 mobiliario rebuscado da epoca "ltoriana, com os seus tabus morais ou com as conven~oes da :ociedade bem-educada. Isso significa dizer que, fosse qual Osse0 conteudo polftico explfcito dos gran des representantes . ' aspectos _ do alt 0 mo d ermsmo, eles sempre foram, em seus xx. l ~1 mais implfcitos, perigosos e explosivos, subversivos no interior da ordem estabelecida. Se subitamente nos voltamos para 0 dia de hoje, podemos medir a imensidao das mudan~as culturais que ocorreram. Nao apenas Joyce e Picasso nao sac mais estranhos e'!':'pul~i~ como se tornaram chissicos e agora nos pareceIILmuito mais realistas. Nao obstante, ha muito pouco, quer no con~ quer na forma da arte contemporanea que a sociedade contemporanea ache intolecavel e escandaloso. As mais of ensivas formas dessa arte - digamos, 0 punk, 0 rock ou 0 que e chamado de material sexualmente explfcito - sao todas tomadas com certa complacencia pela sociedade e, ao contrario das produ~6es do antigo alto modernismo, fazem sucesso em termos comerciais. 1>4asisso significa que, mesmo que a arte contemporanea tenha os mesmos aspectos formais do antigo modernismo, ela ainda assim mudou fundamental menU; de posi~ao dentro da nossa cultura. Em primeiro lugar, a produ~ao de mercadorias, em particular de vestimentas, mobilicirio, ediffcios e outros artefatos, estci agora intimamente ligada a mudan~a de estilo que deriva da experimenta~ao artIstica. Nossa propaganda, por exemplo, e alimentada pelo modernismo em todas as artes e inconcebfvel sem ele. Em segundo lugar, os dcissicosdo alto modernismo sac agora parte do chamado Cfnone e ensinados em escolas e universidades 0 que, de uma vez por todas, os esvazia de todo 0 seu antigo poder subversivo. Na verdade, urn modo de marcar a ruptura entre os perfodos e de datar 0 surgimento do p6smodernismo e precisamente encontrado nisto: no momento (pensado por volta do infcio da decad a de 1960) no qual a posi~ao do alto modernismo e sua estetica dominante se tornaram estabelecidas na academia e, a partir de entao, perce- ----- bidas como academicas por toda uma nova gera~ao de poetaS, pinto res e musicos. Porem, tambem e possIvel se chegar a ruptura pelo outro lado, urn modo que descrevo em termos dos perfodos da recente vida social. Conforme sugeri, tanto marxistas quanto nao-marxistas se depararam com urn sentimento geral de que em certo ponto, logo ap6s a Segunda Guerra Mundial, urn novO tipo de sociedade come~ou a surgir (descrita de varias maneiras como sociedade p6s-industrial, capitalismo multinacional, sociedade de con sumo, sociedade de media e assim por diante). Novos tipos de con sumo, a obsolescencia planejada, urn ritmo ainda mais rapido de mudan~as na moda e no estilo, a penetra~ao da propaganda, urn nevel de inser~ao na sociedade, ate entao sem paralelo, da televisao e da media em geral, a substitui~ao da velha tensao entre a cidade e 0 campo, 0 centro e a provfncia, pela tensao entre 0 suburbio e a padroniza~ao universal, 0 cresci men to de grandes redes de estradas de alta velocidade e a chegada da cultura do autom6vel - esses sac alguns dos aspectos que poderiam parecer marcar uma ruptura radical com aquela antiga sociedade pre-guerra, na qual 0 alto modernismo ainda era uma for~a subterranea. , Acredito que 0 surgimento do p6s-modernismo esta in:mam~nte. relacionado com 0 surgimento desse novo momento .0 capItahsmo tardio de consumo ou capitalismo multinaClonal C . , . relO tambem que os seus aspectos formais expresSam de m . d ' . s 'I UItos mo os a 16gIca maIS profunda desse sistema OCIa partic I E is u ar. ntretanto, s6 serei capaz de demonstrar so em rela , , . rn ~ao a urn UnICOtema malOr, a saber, 0 desapareciento do s 'd d sist ~ntl 0 e hist6ria, 0 modo pelo qual to do 0 nosso ema SocIal c ontemporaneo come~ou, pouco a pouco, a A I /) ) A--: A VIRADA CULTURAL erder a capacidade de reter 0 seu pr6prio passado, ~me~ou a viver em urn presente perpetuo e em uma mudan~a per e: tua, que obliteram as tradi~6es do tipo preservado, ~rn modo ou de outro, por toda a informa~ao social anterior. -------- Pensemos apenas na exaustao que a mfdia traz para a notfcia; em como Nixon ou, ainda mais, Kennedy sac figuras de urn passado distante de agora. E tentador dizer que a fun~ao pr6pria da mfdia jornalfstica e a de relegar tais experiencias hist6ri~a~ recentes ao passado 0 mais rapido possfvel. A fun~ao informativa da mfdia seria, portanto, a de nos ajudar a esque'-'-cer, a de servir como os agentes e mecanismos de nossa amnesia hist6rica. Todavia, nesse caso, os dois aspectos do p6s-modernismo sobre os quais me debrucei aqui - a transforma~ao da realidade em imagens e a fragmenta~ao do tempo em uma serie de~r~en!e~ perpetuos - sac ambos extraordinariamente conso~----antes a esse processo. A minha pr6pria conclusao aqui deve ter a forma de uma questao acerca do valor cdtieo da arte mais recente. Ha algum acordo sobre 0 fato de 0 antigo modernismo ter funcionado contra a sua sociedade por modos que sac diversamente descritos como crftieos, negativos, contestat6rios, subversivos, oposieionistas e assim por diante. Sera que alga desse genero pode ser afirmado sobre 0 p6s-modernismo e a seu momenta social? Vimos que ha urn modo pelo qual 0 p6smodernismo responde ou reprod~efur~a a 16g1cadO capitahsmo de consumo; a questao mais significativa e se hi tambem urn modo pelo qual ele resiste a essa 16gica. Mas essa --- --- --' i _- I1 I -, --- -=- e uma questao que devemos deixar em aberto. 2. Teorias do pos-moderno li '" )