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2 de dezembro
O POPULAR – Pág. 2 – Giro – Pressa + Definição (OSs)
O POPULAR – Pág. 2 – Aids – Antirretrovirais como prevenção
O POPULAR – Pág. 6 – Cartas dos leitores – Hugo
O POPULAR – Pág. 7 – SUS desfalcado (artigo)
O HOJE – Pág. 2 – Oposição de fachada
O HOJE – Pág. 2 – Ação de Natal
O HOJE – Pág. 3 – Saúde – Gastos em internet vão somar 80 milhões
DIÁRIO DA MANHÃ – Capa – Estresse – O perito explica
DIÁRIO DA MANHÃ – Capa – Guerra nos bastidores da Saúde
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 2 – Guerra nos bastidores da saúde
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 3 – O estresse sob o olhar do perito
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 6 – Goiás vai ganhar seu Hospital do Servidor
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 6 – Menos sal, mais saúde
Opção - Págs. A-20 a A-23 - Entrevista Zacarias Calil
O POPULAR – Pág. 2 – Giro – Pressa + Definição (OSs)
O POPULAR – Pág. 2 – Aids – Antirretrovirais como prevenção
O POPULAR – Pág. 6 – Cartas dos leitores – Hugo
O POPULAR – Pág. 7 – SUS desfalcado (artigo)
O HOJE – Pág. 2 – Oposição de fachada
O HOJE – Pág. 2 – Ação de Natal
O HOJE – Pág. 3 – Saúde – Gastos em internet vão somar 80 milhões
DIÁRIO DA MANHÃ – Capa – Estresse – O perito explica
DIÁRIO DA MANHÃ – Capa – Guerra nos bastidores da Saúde
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 2 – Guerra nos bastidores da saúde
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 3 – O estresse sob o olhar do perito
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 6 – Goiás vai ganhar seu Hospital do Servidor
DIÁRIO DA MANHÃ – Pág. 6 – Menos sal, mais saúde
Opção - Págs. A-20 a A-23 - Entrevista Zacarias Calil
“Já passou da hora de Goiás ter seu hospital pediátrico”
Cirurgião famoso pelos casos de separação de gêmeos siameses, o médico diz que SUS deve atender
seu paciente sem apoio de conveniados e admite que pode ser candidato no próximo ano
Fernando Leite/Jornal Opção
O cirugião pediátrico Zacarias Calil é um dos profissionais goianos da medicina mais conhecidos em outros
Estados. Ele ganhou notoriedade por realizar as difíceis cirurgias de separação dos chamados gêmeos siameses —
a última foi há menos de duas semanas, com Arthur e Heitor, de 4 anos. Nessa área, pode-se dizer seguramente
que ele é uma das maiores autoridades do mundo atualmente. Nessa entrevista, Zacarais Calil fala de sua
“especialidade”, a que foi levado pelo desafio. Conta que até 1989 não se falava em gêmeos siameses em Goiás.
Até que veio o caso emblemático das meninas Larissa e Lorraine. Daí ele se interessou e ofereceu ajuda. “É um
desafio particular, porque são patologias raras, não tem como se especializar nisso”, diz.
O cirurgião fala também da situação da assistência pública à saúde no Brasil, um quadro que ele diagnostica como
“muito complicado”. Observa, porém, que em Goiás as Organizações Sociais, gestão terceirizada que o governo
estadual instituiu, melhoraram o quadro. Ele não poupa crítica ao programa Mais Médicos do governo federal:
“É demagógico”. Zacarias Calil discorre também sobre meio ambiente, tema que lhe é caro, e elogia o trabalho do
secretário Leonardo Vilela, titular da Semarh. Informa que está filiado ao PP e admite sair candidato a deputado
estadual no ano que vem, como forma de ajudar a sociedade com sua experiência.
Murilo Nascente Santana — Qual foi o caso mais complexo pelo qual o sr. já passou?
A sra. Adriana, mãe dos gêmeos Arthur e Heitor, hoje com 4 anos, nos procurou dizendo que estava grávida de 7
meses à época e que os meninos eram siameses. Ela estava desesperada e pedia ajuda para que pudéssemos
oferecer algum tipo de tratamento. Adriana nos localizou pela internet. Por isso eu digo que a divulgação da
imprensa é muito importante para nosso trabalho, nesta seara das anomalias raras. Se fosse apenas isoladamente,
creio que não teria conseguido nos localizar. Então, oferecemos os meios para que ela pudesse vir para o Hospital
Materno-Infantil (HMI) e ser acompanhada aqui no pré-natal até o término da gravidez, para que as crianças
pudessem nascer nas melhores condições possíveis. Em uma patologia complexa, se o pré-natal for bem-feito, a
chance de sobrevida é muito maior, porque está uma equipe inteira totalmente preparada — o hospital, o centro
cirúrgico, a equipe de pediatria e a UTI neonatal. O governo de Goiás nos ofereceu como apoio, por meio da OVG
[Organização das Voluntárias de Goiás], a Casa do Interior, que é muito importante, porque as pessoas às vezes
ficam “largadas”, sem ter onde ficar. A sra. Adriana foi, então, para este local, que fica perto do HMI, e depois deu à
luz gêmeos siameses. É um caso extremamente complexo sobre o qual apenas agora estamos conseguindo
enxergar uma luz no horizonte. Até então, todos os procedimentos que fizemos para que se criasse pele não tinham
dado resultado satisfatório. Agora conseguimos e pegamos o caminho correto. Temos dez expansores para que se
possa criar pele e fazer a cirurgia.
Cezar Santos – É possível saber quantas cirurgias serão necessárias nesse caso?
Esse procedimento talvez seja o último. Obviamente, existe risco de complicações, por exemplo nos expansores. O
problema é que, quando há infecção em um deles, este, por continuidade, passa a contaminar os outros. Já ocorreu
caso em que precisamos retirar todos os seis expansores que já havíamos colocados. Uma simples infecção de
vias aéreas superiores — como uma gripe, um resfriado, uma sinusite — pode levar à contaminação dos
expansores.
Cezar Santos — Como é lidar com um caso como este, do Arthur e do Heitor, que têm vários órgãos em
comum?
Dos casos que já tivemos, este é o mais complexo, o mais difícil deles. Eles estão unidos pelo tórax e apresentam
união também do abdome — que é único para os dois — e têm três bacias. No abdome, o fígado é único, assim
como os intestinos delgado e grosso, bexiga e genitália. Arthur tem dois rins e Heitor, apenas um. Isso é um fator
complicador no pós-operatório. Há também uma malformação na coluna, por causa da própria posição em que se
encontram. Mas têm um desenvolvimento psicomotor normal, uma cabeça fantástica, um grau de inteligência muito
bom para a idade deles, uma habilidade no manuseio do computador que às vezes surpreende. E eles pedem para
ser separados. Nunca acompanhei um caso de gêmeos siameses até 4 anos. Na literatura mundial, hoje não deve
haver mais de seis casos no mundo de irmãos que estão unidos ainda por ser impossível de serem separados.
Cezar Santos — Um caso memorável é aquele das americanas Abby e Brittany Hensel, com duas cabeças e
só um corpo.
Sim, eu acompanhei esse caso. Elas têm um tórax único, coração único, dois braços e duas pernas. Têm uma vida
praticamente normal, mas é impossível separá-las. Há também outras duas irmãs, unidas pela cabeça. Uma olha
sempre para frente e a outra, para trás. Uma é maior que a outra e a maior carrega a menor em um carrinho.
Acompanhei recentemente um documentário sobre elas. Tem também dois irmãos isquiópagos [unidos pela pélvis],
com quatro pernas. Esses dias, em outro documentário, vi também um outro caso de separação impossível, na
Índia.
Murilo Nascente — Como é a questão da separação, em relação aos órgãos em comum?
Sempre um fica prejudicado, pela própria anatomia. O que observamos é a questão do sistema arterial e venoso —
um leva o sangue e o outro traz. Se não tiver um sistema arterial compatível na divisão, o tecido entra em necrose e
acabamos perdendo um deles. Isso é um fator fundamental que às vezes não aparece nos exames, mas que é
observado no momento da cirurgia, pelo conhecimento anatômico. Mas sempre alguém, entre os dois, fica com
menos, não há como fazer igual por igual, é uma questão da própria anatomia.
Cezar Santos — O que despertou o sr. para esse ramo da medicina? Como veio seu interesse?
É interessante essa sua pergunta. Até 1989 não se falava em gêmeos siameses em Goiás. Até que veio o caso
emblemático de Larissa e Lorraine, a quem a mãe levou a um canal de televisão para pedir ajuda para alimentação,
higiene e outras questões. Eu vi o caso, me interessei e ofereci ajuda. É um desafio particular, porque são
patologias raras, não tem como se especializar nisso. Os casos aparecem esporadicamente, não são todos os
irmãos siameses que conseguem chegar até 1 ano de idade para que se possa separá-los. A maioria morre nas
primeiras 24 horas de vida e muitos dos que sobrevivem morrem nos primeiros 15 dias de vida. Por isso é que se
cria toda a celeuma em cima. Mas, ao chegar a 1 ano, já há condição para separação, o que é algo fantástico.
Pedimos, na época, ajuda ao governo de Goiás — que deu sua contribuição valiosa — para que Larissa e Lorraine
ficassem em Goiânia. Até então, ou era Rio de Janeiro ou era São Paulo ou Minas Gerais. Quando finalizamos os
procedimentos com as gêmeas, pensei “agora acabou, não vão aparecer mais casos”. E, de repente, começaram a
aparecer outros. De 1989 para cá, acompanhamos 25 casos, não só de Goiás, mas de todo o Brasil. Nesta semana
eu recebi um telefonema do Espírito Santo. Uma assistente social do Hospital das Clínicas de lá me contatou para
saber se uma grávida de gêmeos siameses poderia vir para Goiânia. Ela está com 33 semanas de gestação e, lá,
souberam que somos referência nesse tipo de cirurgia. A assistente social, então, pediu para que a gestante viesse
para cá. Na mesma hora eu liguei para o diretor do hospital e ele autorizou sua vinda, para que a
acompanhássemos. Vamos, assim, nos tornando uma referência nacional e até mundial. Para nossa surpresa,
também, recebi um e-mail da Discovery Channel [canal de televisão] de Londres solicitando o acompanhamento da
cirurgia de Arthur e Heitor, porque eles querem produzir um documentário. O pessoal do canal já esteve aqui em
Goiânia, seguiram o dia inteiro das crianças no domingo, passearam com elas pela cidade e, na quarta-feira,
também acompanharam a cirurgia. Então, teremos uma visibilidade grande. Em relação a isso, lembro que as
pessoas me criticavam muito — não só a mim, é bom dizer. Quando fizemos a primeira cirurgia, muitos
questionavam nossa experiência, diziam que só queríamos aparecer. O que houve é que o trabalho aconteceu e,
com ele, o reconhecimento. E a própria imprensa fez isso. E no mundo inteiro, a população conhece o trabalho por
meio da divulgação pelos meios de comunicação. Eu ficava admirado em assistir aos programas da Discovery
Channel que falavam sobre anomalias e, de repente, fomos procurados de forma espontânea. Você pode contar
nos dedos da mão direita quantos serviços de saúde no Brasil tiveram oportunidade de participar de um
documentário desses. Ou seja, as coisas foram acontecendo, não sei se foi uma coisa divina, mas foi assim.
Frederico Vitor — Os casos de gêmeos siameses sempre existiram. Mas como está a incidência? Há alguma
novidade em relação a isso?
Sempre houve casos, mas a incidência está aumentando bastante, como já discutimos em vários congressos de
medicina. Há trabalhos publicados recentemente que provam que as malformações estão devidamente associadas
às alterações ambientais. São vários fatores que interferem no meio ambiente e que acabam também por afetar o
ser humano. Há várias substâncias que causam problemas. Um exemplo é o bisfenol, um plástico que envolve as
embalagens de alumínio e compõe as mamadeiras. Esse produto foi proibido nos Estados Unidos, porque, quando
o produto é colocado para aquecer no micro-ondas, por exemplo, ele solta substâncias que podem provocar
malformações. Eu sempre cito o exemplo do Vietnã, que foi afetado pelo agente laranja — um produto usado como
agrotóxico —, do qual fizeram um mau preparo daquilo para espalhar. A quantidade de malformações que surgiu
por lá foi assustadora. Somente de casos de gêmeos siameses foram dez em apenas um ano. Isso fora outros tipos
de malformações, sejam neurológicas, sejam de membros inferiores etc.
Cezar Santos — O sr. fez cirurgias ou acompanhou casos no exterior?
Eu acompanhei alguns casos. No México houve uma ocorrência em que acharam que não tinham condições de
fazer a cirurgia e pediram nossa ajuda. Eu estive lá e ficou definido que viriam para o Brasil neste ano, para que a
cirurgia fosse feita pelo SUS [Sistema Único de Saúde]. Ocorre que a Constituição brasileira não permite que
pacientes de outros países venham para o Brasil em casos de procedimentos cirúrgicos eletivos. A Secretaria
Municipal de Saúde de Goiânia pediu pareceres jurídicos e a cirurgia acabou sendo negada. O custo é muito alto e,
de fato, um paciente vindo de outro país sendo operado aqui com as custas do governo local é algo complexo.
Estive na Embaixada do México, conversei com o embaixador, expliquei a situação, mas ele pareceu não
demonstrar muito interesse. Dessa forma, depois de correr atrás por um tempo, acabei desistindo.
Cezar Santos — Para se ter uma ideia, em quanto fica um procedimento desses, no total?
Se for para contar tudo — honorários médicos, diárias de UTI, medicamentos e tudo o mais —, uma cirurgia dessas
não sai por menos de R$ 1 milhão. No caso desses meninos [Arthur e Heitor], eles já estão há quatro anos aqui e
ficam na Casa do Interior. O governo de Goiás banca tudo — alimentação, exames, equipamentos, uma série de
itens. É um gasto elevado. É algo muito complexo. Esses dias eu comentei isso com o ortopedista de nossa equipe
que ninguém entre nós faz isso por dinheiro. Nos Estados Unidos não se opera um caso desses se a pessoa não
bancar. Já vi várias matérias de pessoas fazendo campanhas particulares para serem operadas de malformações e
anomalias raras. Lá a medicina é totalmente diferente da nossa em termos da questão social. Aqui todos esses
pacientes são bancados pelo governo. O Brasil tem essa vantagem na questão da saúde.
“As OSs foram benéficas para a saúde em Goiás”
Cezar Santos — Como o sr. avalia o momento da saúde pública no País?
É muito complicado, principalmente para a gente que está na linha de frente, no dia a dia. A burocracia é muito
grande. As secretarias de Saúde não conseguem comprar os medicamentos no tempo certo para que os hospitais
não fiquem desabastecidos. A saúde é um saco sem fundo, uma expressão que eu sempre costumo usar. O
quadro, às vezes, acaba por deteriorar.
Em nosso Estado, eu vejo melhoras. Por exemplo, a implantação das OSs [organizações sociais] foi benéfica, no
geral. No Hospital Materno Infantil, as coisas estão melhores com a OS, as condições de trabalho estão melhores,
bem como os equipamentos do centro cirúrgico são de boa qualidade. Tudo o que eu peço é providenciado. E
também a população está aprovando, as pessoas se sentem mais tranquilas. Agora, não tem como negar que há
superlotação. Sobre a questão da saúde da criança, por exemplo, vemos que o quadro é sério. Eu me formei em
1981, pela UFG, e tinha feito internato no HMI em 1979, quando Goiânia deveria ter 650 mil habitantes. Para você
ter ideia, o Materno Infantil continua a ter o mesmo número de leitos daquela época. Goiânia é uma das únicas
cidades do Brasil e Goiás é um dos poucos Estados que não têm hospital pediátrico. Eu penso que o paciente do
SUS tem de ser tratado pelo SUS, não tem de estar em hospital conveniado. Por quê? Porque esses hospitais
ganham pouco e não investem naquilo que deveriam. O medicamento é caro e a diária do SUS não dá para manter
a unidade e muito menos os medicamentos. Então, o paciente do SUS precisa ser atendido pelo SUS, operado pelo
SUS e tudo o mais pelo SUS. Esses dias vi a quantidade de pessoas lá no Hugo [Hospital de Urgências de
Goiânia]. Todo mundo procura o que há de melhor para si. Então, o paciente, em vez de ir para o Cais, vai direto
para lá. E o que ocorre é que o Hugo acaba deixando sua principal missão de lado, que é o atendimento daquele
que mais precisa de suas condições de urgência e emergência. A saúde pública precisa de cada vez mais
investimentos, mas como investir em um país no qual tanto dinheiro destinado para o setor é desviado? Ou seja,
temos um problema sério com a corrupção e com a má gestão. Precisamos de políticas públicas de saúde. O que
temos por aqui hoje é a “ambulancioterapia”. Repare, às segundas-feiras, na porta dos hospitais de Goiânia. O que
você vai ver são peruas e vans de prefeituras de não sei quantos municípios.
Frederico Vitor — Faltam hospitais regionais no Estado?
Sim, é uma boa opção. A pergunta é: por que isso não foi feito ao longo dos anos? Ninguém se preocupa com
saúde, mas será que saúde não dá voto? Muito pelo contrário, todo mundo quer ser bem tratado. Eu, por exemplo,
tenho como maior sonho trabalhar em um grande hospital público de Goiânia, no qual eu possa receber convidados
que queiram conhecer nossos serviços. Hoje, as pessoas que vêm nos visitar encontram um local caindo aos
pedaços. Esse não deveria ser o lugar em que trabalho. Imagina a imagem que isso passa para o exterior, como
uma equipe fazendo o que fazemos pode aparecer no mundo inteiro? Mas essa realidade mudou e está mudando
mais, o hospital está cada vez mais limpo, mais saneado. Claro que há problemas, mas isso não pode ser corrigido
de um dia para o outro.
Cezar Santos — Um hospital bonito daria orgulho até para o próprio morador da cidade.
É verdade. Eu estive na Costa Rica, onde operei alguns casos de hemangioma [tumores benignos causados
congenitamente, por crescimento anormal de vasos sanguíneos, e que são desagradáveis esteticamente]. O
hospital pediátrico em que estive é fantástico. Tem cinco andares, com todas as especialidades. Aqui em Goiânia
há uma área em frente ao Hospital Santa Genoveva, sobre a qual, no governo anterior [de Alcides Rodrigues], me
chamaram para fazer um projeto que transformasse o local em um centro de especialidades médicas com vários
outros especialistas e para a qual iria até a central de transplantes. Ficamos dois anos nesse projeto, mas acabou.
É uma área fantástica, bem localizada, perto do aeroporto, com mais de 5 mil metros quadrados. Cheguei a assinar
o projeto de aprovação, mas ficou nisso, apesar de o governo ter anunciado isso várias vezes. É uma área que
deveria ser aproveitada, por exemplo, com a construção de um hospital pediátrico. Goiânia precisa de um hospital
pediátrico, já passou da hora de ter uma unidade com essa especialidade. Lá no Materno Infantil a gente vê como
os pais chegam lá, ficam sem condições.
Cezar Santos – Na verdade, tínhamos que ter centros do padrão do Crer, por exemplo...
Exato. Por que quando uma criança que necessita de uma cirurgia cardíaca fica na dependência de um hospital
particular? Por que esse tipo de cirurgia e a neurocirurgia não existem no SUS? Especialistas nós temos. Goiânia é
referência em várias especialidades, se colocam médicos especialistas para trabalhar em um lugar de qualidade as
coisas fluem. Tenho uma colega de profissão que trabalhou comigo no hospital das Forças Armadas em Brasília e
está até hoje lá, e já me disse que não abre mão de nenhuma maneira de trabalhar na unidade, porque, apesar de
ganhar mal, o hospital é muito bom de trabalhar, a gente se sente bem lá. Pode-se notar também o Instituto do
Coração, também em Brasília, onde foi atendido José Genoino [deputado condenado no processo do mensalão]
recentemente. Eu conheço o local e eles têm uma enorme estrutura. O Instituto de Cardiologia funciona todo pelo
SUS, eles têm verba e é em cima disso que nós temos de trabalhar para conseguir condições melhores. Mas
alguém tem de levantar a bandeira, algum político tem de chegar e bancar essa luta. Reclamar só não adianta, você
tem de ir e cobrar, porque o governo, enquanto a coisa está andando, ele vai seguindo assim.
Frederico Vitor – Como o sr. vê o programa Mais Médicos, do governo federal? O sr. acha que realmente o
problema da saúde pública é a falta de médicos?
Em parte, sim, mas não é apenas isso. Particularmente eu estudei muito sobre isso e acho que se trata apenas de
um programa político, estão seguindo o exemplo da Venezuela. A maneira como ele foi implantado no Brasil
colocou os médicos brasileiros na berlinda. Eu nunca vi um ministro de Estado ir ao aeroporto para receber médicos
que ele nem conhece. Isso para mim é uma demagogia. Quer dizer que nós, médicos do Brasil, não significamos
nada? Quantas cirurgias de alta complexidade nós fizemos em Goiás e nunca recebemos nem um e-mail ou
telegrama de agradecimento, parabenizando pelo trabalho realizado aqui? E, outra coisa, como entra um médico
para trabalhar no Brasil e não faz o Revalida? Por exemplo, tenho dois filhos médicos e um deles estudou em uma
faculdade particular. Eu suei muito para pagar seus estudos e ele, para passar e conseguir a vaga. Agora, ele
prestou vestibular, estudou no país, fez residência e vai ter as mesmas condições de alguém que saiu para estudar
na Bolívia, por exemplo? Aqui em Goiânia já deu problema, de acordo com o que eu vi nos noticiários. Os médicos
do programa estão com atraso no pagamento e sem receber os auxílios que tinham direito de alimentação e
moradia, porque eles não estavam no cronograma de planejamento do município.
É um programa em curto prazo, infelizmente é assim que é tratada a saúde no Brasil. Não existe programação de
longo prazo, porque, se tivesse um planejamento de 20 ou de 30 anos, a saúde não estaria do jeito que está. Cada
um novato que entra quer mudar o que estava sendo feito, independente se estava dando certo ou não. Por isso, a
gente fica “correndo atrás do rabo”. Mas é claro que tem o outro lado. Há determinadas cidades que não tinham
médico nenhum, só que isso não isenta o Brasil de ter critérios. Temos de pensar um plano de cargos e salários.
Eu, por exemplo, se for aposentar hoje, meu salário de aposentadoria é risível, de apenas R$ 2,8 mil após 30 anos
de serviço. Aí todo mundo fala que médico ganhamos mais. E nós ganhamos mesmo, mas é apenas gratificação:
se nós ficarmos doentes ou sairmos de férias, não receberemos um centavo. Então, como é que querem manter o
médico na rede pública? O problema não é a falta do médico, é a falta da manutenção dos profissionais no local de
trabalho.
Por exemplo, um prefeito desses interiores por aí se elege, traz um médico oferecendo R$ 40 mil, R$ 50 mil de
salário. O médico atende aquela população que estava carente durante alguns meses e depois fica tranquilo, só na
manutenção, acompanhando os pacientes. Nesse ponto, o prefeito manda o médico embora, porque o atendimento
inicial já tinha sido feito. Como que se mantém um médico assim? Ninguém segura. Além da falta de estrutura, ele
não tem segurança profissional para permanecer. Porque os juízes e os promotores têm um plano de cargos e
salários? Eles lutaram pelos direitos deles e temos de fazer isso. Infelizmente, o Mais Médicos é um programa
político, não era pra ser assim. Ele deveria valorizar mais o profissional.
Cirurgião pediátrico Zacarias Calil fala ao editor Cezar Santos e aos repórteres Frederico Vitor e Murilo Nascente Santana: “Na política
tem de ser representante do povo, não dá para entrar e ser corrupto”
Murilo Nascente Santana – Há pouco o sr. falou que Goiânia tem muita visibilidade em várias áreas da
medicina. Um desses casos de sucesso é o dr. Áureo Ludovico, que realiza a cirurgia bariátrica com
maestria, e que chegou a fazer cirurgias de tratamento da diabete. Porém, esse procedimento, que visa a
cura da diabete, não foi comprovado cientificamente, e ele chegou até a sofrer algumas retaliações da
classe médica brasileira. Como o sr. vê essa questão?
Eu conheço o dr. Áureo há muitos anos, praticamente desde a faculdade. Ele é um excelente profissional em todos
os sentidos. Mas, nesse caso, o que eu sei foi só o que a mídia noticiou. Tive também oportunidade de conversar
com um ex-paciente dele, que tomava cargas altíssimas de insulina e que depois da cirurgia não toma nenhuma
dose mais. De acordo com ele, o resultado foi espetacular. Mas eu não posso ter uma opinião muito contundente,
porque não conheço cientificamente o trabalho dele, testemunhei apenas um resultado e conheço outros pela mídia,
como o caso do Faustão [apresentador de TV] e do Demóstenes Torres [senador cassado], que operaram com ele.
O que eu posso dizer é que, nos procedimentos em que eu o acompanhei, ele é uma pessoa de muito valor.
Introduziu a videolaparoscopia no Brasil, algo que na época quase ninguém no mundo fazia, e foi muito corajoso.
Ele realmente revolucionou a medicina. Em 1998, estive em Orlando, nos Estados Unidos, e ele apresentava um
trabalho no Colégio Médico de Cirurgiões da cidade, onde foi muito aplaudido pelas técnicas que apresentou. O dr.
Áureo é uma pessoa de grande valor profissional e, com certeza, um dos orgulhos de Goiás.
Murilo Nascente Santana – E como o sr. vê o fato de ele ter nas mãos uma descoberta que poderia
revolucionar o mundo todo e não ter um apoio aqui no Brasil para desenvolver o seu trabalho e comprovar
cientificamente a cura para a diabete?
A pesquisa científica tem de passar por uma série de fatores. Pelo que eu li a respeito, foi isso que pecou no
trabalho dele, que não conseguiu seguir todos os protocolos. Se isso não for seguido, a pesquisa não tem validade
nenhuma e se perde toda credibilidade. Para aprovar uma pesquisa, um trabalho, é necessário também passar por
uma comissão de ética do hospital onde vai ser desenvolvido o projeto. Tem de haver aprovação também do
paciente.
Mas o que não se pode esquecer é que, por detrás disso, também existem vários interesses contrariados, algumas
indústrias e tudo isso. Mas o que realmente pecou no trabalho dele foi que a metodologia empregada não se
adequou aos fatores exigidos.
Quanto à questão de ajuda, seria fundamental ele ter o respaldo de alguma universidade, mas ele teria também de
procurar alguma instituição e aprovar sua pesquisa. Isso demora, não é uma coisa que se aprova em um mês
apenas. Envolve também um grande patrocínio e isso não é fácil. É uma coisa cheia de detalhes que tem de ter
seguidos.
Frederico Vitor – O sr. dirigiu em 2006 a Agência Ambiental [hoje Semarh]. Para o sr., quais os principais
problemas de Goiás? Como está o Cerrado goiano?
Nossa! (risos) Está em extinção mesmo. Essa época foi um período em que eu aprendi demais, foi uma experiência
muito boa na minha vida. Eu gosto muito do meio ambiente, da natureza. Eu sou muito ligado a isso, e me senti
muito bem lá. Mesmo que as pessoas estejam mais conscientes com o meio ambiente, o que a gente vê é a
degradação do nosso Cerrado, ele está desertificando. Uma coisa me chamou a atenção. Tenho ido muito à cidade
de Aruanã e fiquei impressionado com o número de animais atropelados na estrada. Isso é uma coisa que tem de
ser olhada com bastante atenção, talvez construindo corredores pelas estradas. A alta velocidade nas estradas é
muito grande e os animais sofrem com isso. É de dar dó, deveria ter mais conscientização nisso.
Cezar Santos – E quanto à corrupção? Há alguns anos a polícia cercou a agência e levou funcionários
presos por causa disso.
Todo órgão fiscalizador, no Brasil inteiro, sofre com isso. Em São Paulo, aconteceu o caso de um desvio de verba
pública que acabava sendo usado em boates. É um grande cinismo. Eu não consigo entender, como entrar no
governo só para receber algo em troca.
Quando me perguntaram se eu queria entrar para a política, eu respondi que tinha vontade, porque eu acredito que
já alcancei tudo com o suor do meu trabalho, meu patrimônio é pouca coisa, mas eu conquistei com meu trabalho.
Pra que roubar? Colocar em risco o seu nome, de sua família, dos seus filhos? Às vezes a pessoa tem um monte
de coisas, faz um patrimônio imenso em dois anos, mas de onde veio o dinheiro? Ele não trabalhou igual nós
trabalhamos. Temos de mudar isso, a corrupção existe e no órgão fiscalizador, no meio ambiente, isso é bastante
pesado. Eu sofri lá em relação a isso. As pessoas que estão lá há muitos anos se sentem donas do local. Quando
alguém é indicado, eles pensam que podem derrubar a qualquer momento, mas você sabe o que está acontecendo.
O esquema é muito entrelaçado, volta e meia a polícia fechava a agência. Muitos diretores já foram presos.
Cezar Santos – E o trabalho de Leonardo Vilela, seu colega, que está à frente da Semarh [Secretaria
Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos]? O sr. percebeu uma melhoria em relação a isso?
Tenho sim, sou fã dele, porque ele conseguiu fazer muitas coisas lá dentro que eu não consegui fazer. Uma delas é
a cota zero no Rio Araguaia, para a saída de peixes da cidade. Nós fizemos uma fiscalização violenta no Araguaia,
na época, e conseguimos chegar lá. Mas ele teve a coragem de fazer, o que incomodou muito gente. Mas o
Araguaia é um patrimônio nosso, não tem por que de os peixes saírem de lá. Você vai lá, come seu peixe lá,
tranquilo, mas não tem de trazer peixe para Goiânia. O que eu notei é que a educação ambiental está se
fortalecendo. Isso é importante. Mas ainda é preciso muito, a educação ambiental tem de estar nas escolas como
matéria obrigatória. As crianças têm de saber que devem cuidar do meio ambiente e como fazer isso, porque a
saúde está interligada a essa questão.
Cezar Santos – O sr. está filiado a algum partido?
Sim, tive convites de vários partidos e me filiei, recentemente, ao Partido Progressista (PP), com José Eliton.
Cezar Santos – E vai sair candidato para deputado?
Ainda não sei, estamos discutindo isso. Temos participado de reuniões e senti que é um partido que vai crescer
muito em Goiás. São pessoas muito bem intencionadas, que estão se integrando e eu vejo um grande diferencial. O
próprio José Eliton é muito coerente, vejo-o como uma liderança. Ele é muito culto, tem uma grande expressão,
trata todo mundo bem, de igual para igual. Eu me sinto bem no partido, apesar de que minha família ainda não
aceitou muito bem uma possível candidatura. Mas vontade eu tenho, porque temos de revolucionar, partir para
cima, não ficar na mão das pessoas que financiaram sua campanha e depois ter de defender os interesses desse
determinado grupo. Eu não tenho dinheiro para entrar na política; se eu entrar talvez nem ganhe, porque não tenho
dinheiro para fazer aquele tanto de propaganda e não vou aceitar de ninguém. Se eu fosse eleito, deveria ser pelo
que eu represento. Pelo meu trabalho, pelo que eu já fiz. Claro que nem sempre foi tudo 100% de sucesso,
ninguém tem isso, somos humanos e temos falhas. Você tem de ser eleito por seu trabalho, não por pegar dinheiro
para fazer propaganda. Eu não quero dinheiro de ninguém para fazer campanha, aí vem alguém e me fala que
então não vou ser eleito. Eu respondi que se não for eleito, tudo bem, mas quem não está sendo coerente com as
posições é ele.
Frederico Vitor – Então o sr. é a favor da reforma política?
Sem dúvida. Você tem de ser representante do povo, não dá para entrar e ser corrupto. Eu vejo em jornais a polícia
indo na casa da pessoa buscá-la. Já pensou? Entrar Polícia Federal atrás de mim, na frente de meu vizinho, de
minha família? Como que meu filho, por exemplo, vai atender um paciente depois disso? Vão jogar na cara dele que
é filho de corrupto? Não, de maneira nenhuma! Nós temos de aprender isso, isso é questão de cultura. Você tem de
estar no poder à medida que representa o povo, não tem de haver dinheiro no meio disso tudo.
Escuto que se eu não comprar diretório de não sei quem eu não vou ser eleito. Então não vou, e a população tem
de ficar sabendo. Mas vamos ver o que vai ser no ano que vem, o que vier estarei preparado.

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