A RELAÇÃO ENTRE CONSUMO DE LEITE DE VACA E A ACNE1

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A RELAÇÃO ENTRE CONSUMO DE LEITE DE VACA E A ACNE1
A RELAÇÃO ENTRE CONSUMO DE LEITE DE VACA E A ACNE1
THE RELATION OF COW MILK CONSUMPTION AND ACNE
Gabriella Pedrotti Leite2
Juliana Lopez de Oliveira3
RESUMO
A acne é uma doença genética, multifatorial que se caracteriza por hiperproliferação
de queratinócitos, hiperprodução sebácea e colonização bacteriana. A patologia que
geralmente tem início na puberdade e pode persistir até a idade adulta, é
considerada andrógeno dependente uma vez que são os hormônios andrógenos que
influenciam o desenvolvimento e produção da glândula sebácea. A influência da
dieta na acne é um assunto controverso que dividiu a opinião de especialistas ao
longo dos anos, porém recentemente algumas pesquisas identificaram uma possível
relação entre dietas de alto índice glicêmico e consumo de leite e derivados com o
agravamento da acne. O leite de vaca possui em sua química componentes
bioidênticos, entre eles precursores andrógenos que poderiam estimular diretamente
a produção sebácea, porém, a maior probabilidade é que o IGF-1 presente no leite
possa desencadear o processo acneico devido a seus efeitos no organismo como
hiperinsulinemia, hiperqueratinização, produção hormonal e produção sebácea.
Palavras-chave: Leite. Acne. Dieta.
1 Artigo apresentado como exigência parcial para obtenção do título de especialista em
Nutrição Aplicada à Estética da AVM Faculdade Integrada.2 Pós graduanda no curso de
Especialização Lato Sensu em Nutrição Aplicada à Estética da AVM Faculdade Integrada,
2014
3
Professora do curso de Especialização Lato Sensu em Nutrição Aplicada à Estética da
AVM Faculdade Integrada.
2
ABSTRACT
Acne is a genetic, multifactorial disease that is marked by keratinocyte
hyperproliferation, sebaceous overproduction and bacterial colonization. The
pathology that generally begins in puberty and may persist until adult age is
considered androgen-dependent once the androgen hormones are the ones who
influence development and production of sebaceous gland. The influence of diet on
acne is a controversial subject that has divided the opinion of specialists over the
years, however, recent researches have identified a possible relation between acne
aggravation and high glycemic level and milk/dairy products consumption. Cow milk
has bioidentical components in its chemistry, including androgen precursors that
could directly stimulate sebaceous production, yet, most likely is that IGF-1 present in
milk may initiate acne process due to its effects on the organism such as
hyperinsulinemia, hyperkeratinization, hormone and sebaceous production.
Key-words: Milk. Acne. Diet.
INTRODUÇÃO
A associação de elementos da dieta à patologias diversas vem sendo alvo de
pesquisas e discussões no meio profissional, acadêmico e científico. Patologias ou
desordens estéticas são reclamações comuns em consultórios médicos, estéticos ou
nutricionais pois comumente afetam a estética do corpo e consequentemente a autoestima. A acne é uma patologia da pele que tem seu início na adolescência com
fatores etiológicos relacionados ao início da fase pubertal, porém, pode ser marcada
por manifestações exageradas além da possibilidade de persistir ou surgir na idade
adulta, o que acaba gerando insatisfações estéticas. Por ser uma patologia
multifatorial, a acne pode estar relacionada à diversos fatores etiopatológicos entre
eles o aumento na produção de hormônios andrógenos, entretanto, estudos
recentes apontam também a dieta como possível fator agravante.
3
A associação da acne à dieta vem sendo alvo de discussões e controvérsias
no meio científico. Antes dos anos 60 já era comum no tratamento de acne restringir
certos alimentos na dieta como carboidratos de alto índice glicêmico e gorduras. Em
1949 um estudo encontrou uma possível relação entre o consumo de leite e o
agravamento da acne, porém foi considerado fraco e inconclusivo. Por volta dos
anos 70, outros estudos foram publicados indicando que não havia relação entre a
acne e a dieta ou o consumo de leite, porém estes estudos possuiam problemas na
metodologia e também foram considerados inconclusivos.1
Devido a esta dúvida na relação entre a acne e a dieta, fatores como
desequilíbio hormonal e genética eram apontados como os principais causadores
sem que fosse dada muita importância à interferência da alimentação. Nas últimas
décadas, este tema ganhou maior atenção dos pesquisadores, novas pesquisas
foram realizadas e novas evidências começaram a ser encontradas. Dietas de alto
índice glicêmico, leite e derivados do leite são atualmente apontadas como possíveis
agravantes da acne devido a mecanismos que podem alterar a produção de sebo,
queratinização da pele, produção hormonal entre outros fatores que agravariam a
acne.
A dieta ocidental é geralmente associada ao consumo predominante (em
média 50%) de alimentos de alto índice glicêmico, incluindo grãos e açúcar
refinados, batatas, leite e derivados do leite. Em países com estilo de vida occidental
a acne afeta entre 79 a 95% dos jovens, o que sugere a influência de fatores
ambientais.2,3
Com o objetivo de identificar a relação do consumo de leite de vaca e o
aparecimento ou agravamento da acne, foi realizada uma pesquisa bibliográfica de
abordagem qualitativa em artigos científicos publicados nos últimos 10 anos sobre a
influência ou relação da acne e o consumo de leite. Outros objetivos deste trabalho
foram revisar as causas da acne, identificar os componentes químicos do leite e
verificar a existência de algum componente ou mecanismo que poderia estimular o
aparecimento ou agravamento da acne.
METODOLOGIA
4
Esta pesquisa foi elaborada a partir de uma pesquisa bibliográfica de
abordagem qualitativa. Incialmente foi realizada uma pesquisa bibliográfica nas
principais referências dermatológicas sobre o tema acne com intuito de definir a
patologia e suas causas de acordo com os principais autores. Em seguida foi
realizada uma pesquisa em bancos de dados online tais como Scielo, Lilacs e Wiley
utilizando os seguintes parâmetros: acne e leite; acne e dieta. Após o levantamento
de dados, foram selecionados apenas artigos científicos publicados nos últimos 10
anos contendo os parâmetros indicados acima. Os estudos encontrados foram então
analisados e comparados entre si para identificar as relações entre o consumo de
leite e derivados na dieta com a fisiopatologia da acne.
A ACNE
A acne é uma afecção dos folículos pilossebáceos localizados na região da
face e torax que apresentam uma glândula sebácea hipertrofiada. A acne possui
características hereditárias, trasmitida por genes autossômicos dominantes que
podem determinar o tamanho da glândula sebácea e sua atividade bem como a
queratinização folicular anômala.4,5 Os fatores fundamentais para o desenvolvimento
da acne são hipersecreção sebácea, hiperqueratose da unidade pilossebácea,
colonização por Propionibacterium acnes e consequente processo inflamatório.6
O desenvolvimento da glândula sebácea e sua consequente produção de
sebo é influenciada pela ação dos hormonios andrógenos, especialmente
testosterona e dehidroepiandrosterona (DHEA).6 Os hormônios andrógenos
estimulam o aumento da glândula sebácea e da produção de sebo, a proliferação de
queratinócitos no ducto da glândula sebácea e no acro-infundíbulo folicular.7 O
folículo piloso e a pele apresentam receptores para hormônios andrógenos e
estrógenos. A glândula sebácea possui receptores apenas para os andrógenos. Os
andrógenos podem ser provenientes de fontes endógenas, produzidos pelos
ovários, supra-renal e tecidos periféricos, especialmente a pele, e fontes exógenas
como androgênios ou anabolizantes.4 A ação dos andrógenos no desenvolvimento
da acne pode ocorrer por aumento dos andrógenos circulantes ou pela ação
periférica dos andrógenos que são transformados em dihidrotestosterona (DHT) na
5
pele pela ação da enzima 5α−redutase presente na unidade pilosebácea, podendo
causar uma resposta exagerada da glândula sebácea.5,8,9 Em peles com tendência à
acne o número de receptores andrógenos é maior, assim como a atividade da 5αredutase também é maior. Indivíduos com menor número de receptores andrógenos
funcionais produzem menos sebo e não desenvolvem acne.7
Na unidade pilossebácea, a testosterona atua: no crescimento e na
pigmentação dos pelos terminais; produção de ácidos graxos; aumento do colágeno
e facilitação na formação de culturas de microorganismos cutâneos.4
Apesar de a acne ser uma patologia considerada andrógeno-dependente, sua
ocorrência pode não estar correlacionada apenas aos níveis séricos de andrógenos.
O aumento de níveis séricos do fator de crescimento insulina símile 1 (IGF-1) foram
observados em homens e mulheres adultos com acne dando crédito à possibilidade
da influência do hormônio do crescimento (GH), hiperinsulinemia e IGF-1 na acne.
Uma correlação positiva entre a taxa de excreção de sebo facial e níveis séricos de
IGF-1 foram demonstrados em pacientes com acne pós adolescência.7 Também
foram encontradas evidências de que os níveis elevados de IGF-1 em indivíduos
pré-puberais, puberais, adolescentes e jovens adultos está relacionado à
prevalência de acne nesta população.10
A acne é frequentemente associada à desordens onde ocorre aumento na
sinalização de fatores de crescimento e resistencia à insulina como na Síndrome dos
Ovários Policísticos, Acromegalia e Síndrome de Apert. O hormônio do crescimento
GH, hiperinsulinemia e IGF-1 influenciam no metabolismo de andrógenos nas
gônadas e adrenal e devido à isso podem estar associados à patologia da acne. 3,7
Dietas de alto índice glicêmico possuem impacto no metabolismo de
testosterona e no aumento dos níveis de IGF-1. Smith et al7 demosntrou que uma
dieta de baixo IG por 12 semanas diminuiram níveis séricos de IGF-1 e melhoraram
significativamente a acne. A ocorrência de acne em síndromes associadas à
resistência insulínica evidencia a relação entre o IGF-1 e a acne.7
A ACNE E O CONSUMO DE LEITE
6
Estudos demonstraram que o consumo de leite pode exacerbar a acne pois
estimula o aumento de insulina e IGF-1. Devido à semelhança de alguns de seus
componentes com a biologia humana, o leite e outras substâncias químicas
relacionadas à dieta podem atuar como perturbador endócrino e causar acne.
Perturbadores endócrinos são substancias naturais ou sintéticas que podem alterar
o sistema hormonal e a homeostase. Devido à propriedades químicas semelhantes,
possuem afinidades com os receptores e enzimas envolvidas na síntese, liberação e
degradação dos hormônios tornando qualquer sistema endócrino suscetível a eles,
incluindo a glândula sebácea.7
O leite é uma secreção complexa cuja função é estimular o crescimento e
desenvolvimento de mamíferos recém-nascidos. O leite de vaca contém diversos
componentes bioativos: precursores andrógenos como 5α-androstenediona e 5αpregnanediol, hormônios esteróides, fatores de crescimento insulina símile IGF-1 e
IGF-2, prolactina, somatostatina, hormônio liberador do hormônio do crescimento
(GHRF), hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), hormônio luteinizante (LH),
hormônio estimulador da tireóide (TSH) e liberador da tireotrofina, insulina, fator de
crescimento epidermal (EGF), fator de crescimento neuronal (NGF), fatores de
crescimento transformador (TGFs), vitamina D, transferrina, lactoferrina, diversas
prostaglandinas,
eritropoetina,
bombesina,
neurotensina,
peptídeo
vasoativo
intestinal, diversos nucleotídeos, adenosina de monofosfato cíclico (cAMP),
monofosfato
de
guanosina
cíclico
(GMPc),
B-casomorfina
e
relaxina. As
concentrações dessas substâncias podem variar de acordo com o periodo de
gestação e lactação.2,10
Em termos proteicos, o leite é composto por 80% de caseína e os demais
20% são proteínas do soro do leite. As proteínas do soro possuem efeito
insulinotrópico enquanto a caseína possui maior efeito estimulante do IGF-1. O leite
é uma fonte rica em IGF-1 (4–50 ng/ml) e IGF-2 (40–50 ng/ml) ativos mesmo após
os processos de pasteurização e homogeinização que não atuam significativamente
na redução de sua atividade. Permanecendo intacto, o IGF-1 passa pelo trato
gastrointestinal chegando ao plasma na sua forma bioativa. O IGF-1 humano e
bovino possuem moléculas idênticas e possuem o mesmo nível de afinidade com os
receptores de IGF-1 (IGF1R) humanos. O consumo elevado de leite poderá
aumentar os níveis de IGF-1 circulantes em 10-20% em adultos e 20-30% em
crianças. 2,7,11
7
Além da associação aos hormônios andrôgenos, a acne foi recentemente
associada ao IGF-1 encontrado nas proteínas do leite.11 O IGF-1 é produzido em
maior escala pelo fígado, após sinalização do hormônio do crescimento (GH)
produzido e secretado na corrente sanguínea pela gândula ptuitária anterior. O IGF1 estimula o crescimento sistêmico do corpo e tem efeito de promover o crescimento
em quase todas as células.7
O sistema de fator de crescimento semelhante à insulina IGF inclui: IGF-1,
IGF-2 e pró-insulina, três receptores de IGF: receptor de IGF-1 (IGF1-R), receptor de
IGF-2 (IGF2-R), e receptor de insulina (IR) e seis proteínas de ligação de IGF
(IGFBP-1 a IGFBP6). Estes desempenham diferentes papéis na proliferação celular,
síntese de proteínas, homeostase de carboidratos e metabolismo ósseo.7
Além do IGF-1, precursores andrógenos e hormônios esteróides que
influenciam a comedogênese e a acne, o leite ainda é enriquecido com outras
moléculas bioativas que atuam na unidade pilosebácea como glicocorticóides, fator
de transformação do crescimento-β (TGF-β), peptídeos hormoniais semelhantes à
tireotropina e compostos semelhantes à opiáceos.12
O aumento dos níveis séricos de glicose, insulina e IGF-1 estão relacionados
à ingestão de alimentos de alto índice glicêmico e estes níveis podem aumentar a
testosterona e diminuir a globulina ligadora de hormônios sexuais (SHBG) o que
aumenta a oferta de testosterona na unidade pilosebácea.8 O leite e derivados do
leite, possuem baixo índice glicêmico, o que contraria a evidência a respeito da dieta
de alto índice glicêmico. Entretanto o consumo de leite e derivados da proteína do
soro do leite induzem ao aumento dos níveis séricos de IGF-1 e insulina pós
prandial.3,12
Do ponto de vista endócrino, o índice glicêmico (IG) e a carga glicêmica (CG)
estão relacionados a um aumento da resposta insulínica. Apesar de baixo índice e
carga glicêmica, o que não deveria aumentar significativamente os níveis de
insulina, o leite e derivados elevam a taxa de insulina a níveis semelhantes ao
consumo de pão branco.13 Uma situação de hiperglicemia ocorre após o consumo de
alimentos de alto IG. Em resposta, o pâncreas libera grandes quantidades de
insulina para diminuir os níveis de glicose no sangue rapidamente. Porém, está
rápida redução nos níveis de glicose faz com que estes fiquem muito baixos
desencadeando outra resposta nas glândulas adrenais que liberam andrógenos com
8
objetivo de sinalizar ao fígado para liberar glicogênio de suas reservas para
normalizar os níveis séricos de glicose.7
A hiperinsulinemia estimula a síntese de andrógenos, devido à sua influência
no aumento dos níveis de IGF-1 que regulam proliferação de queratinócitos, síntese
de andrógenos, e produção de sebo e diminiu as concentrações da proteína ligadora
dos fatores de crescimento insulina-símiles-3 (IGF-BP3) que controla a apoptose;
gerando um desequilíbrio que leva a uma hiperproliferação de queratinócitos.12,14
Níveis elevados de IGF-1 também estão relacionados à superprodução de
sebo e acne. A insulina e o IGF-1 estimulam a lipogênese nas glândulas sebáceas.
Testes in vitro demonstraram que o IGF-1 aumenta a lipogênese em sebócitos de
forma dose-dependente. O IGF-1 aumenta a expressão da proteína de ligação ao
elemento regulatório de esterol (SREBP-1) que regula a biosíntese de lipídeos e
níveis de colesterol celular nos sebócitos da glândula sebácea.2,15,16
Na pele, o IGF-1 é sintetizado principalmente nos fibroblastos e melanócitos e
possivelmente pelos queratinócitos do estrato granuloso. O receptor de IGF1R pode
ser encontrado em toda a extensão das glândulas sebáceas sugerindo que o IGF-1
atue como mitógeno e morfógeno sebáceo. A insulina também atua como mitógeno
quando se liga ao IGF1-R ou ao receptor de insulina-A (IR-A), para sua ação
metábolica e no metabolismo da glicose ela se liga ao receptor de insulina-B (IR-B).7
Pesquisas encontraram correlações entre níveis séricos de IGF-1 e a
presença de acne em adultos. Em mulheres foi encontrada uma relação positiva
entre níveis séricos de IGF-1 aumentados e número total de lesões acneicas
(pápulas,
pústulas
e
comedões);
níveis
séricos
de
DHT
e
sulfato
de
dehidroepiandrosterona (DHEA-S). Os níveis séricos de IGF-1 também estão
relacionados à taxa de secreção sebácea na pele de adultos.2 Crianças que
consumiram leite por 1 mês tiveram aumento nos níveis séricos IGF-1 / IGFBP-3 e
GH.7
Em estudos com humanos, constatou-se que os níveis de IGF-1 aumentam
os níveis de andrógenos, assim como os níveis de andrógenos também aumentam
os níveis de IGF-1 circulantes. Um estudo demonstrou que a atividade da 5αredutase aumentou proporcionalmente após a administração de IGF-1 em
fibroblastos da pele mostrando que o IGF-1 pode influenciar a regulação de
andrógenos na pele além de também ativar o receptor de andrógenos.2
9
No corpo humano, a DHT é obtida pela redução da testosterona pela enzima
5α-redutase presente na unidade pilosebácea, porém a DHT pode chegar ao
receptor andrógeno sem a influência da enzima quando seus precursores já
encontram-se reduzidos como ocorre com as moléculas presentes no leite: 5αandrostenediona e 5α-pregnanediol que já sofreram a ação da enzima na glândula
mamária bovina. 8,10
Adebamowo et al realizou um estudo utilizando 47.355 mulheres com o
objetivo de verificar possível associação entre a presença de acne na adolescência
e o consumo de leite e alguns derivados. A pesquisa verificou que para as mulheres
que desenvolveram acne no período, o consumo de leite e derivados era maior do
que aquelas que não desenvolveram ou tiveram um quadro menos agressivo.
Outros
dois
estudos
similares
foram
realizados
pelo
mesmo
grupo
de
pesquisadores: um utilizando uma amostra de 6000 adolescentes do sexo feminino
e outro com 4273 adolescentes do sexo masculino ambos com idade entre 9 a 15
anos. Apesar das críticas às suas pesquisas com relação à idade inicial dos
adolescentes que seria muito baixa para o desenvolvimento de acne e ao método de
obtenção de informações relativos à dieta que seriam baseados em relatos pessoais
passados, as três pesquisas estabeleceram uma relação positiva entre a presença
de acne e o consumo de leite.17,18,19
Um estudo sul coreano verificou uma relação positiva entre a ingestão de leite
e sorvete com a ocorrência de acne. Os pesquisadores reportaram que os indivíduos
que possuiam acne consumiam maior quantidade de leite e derivados comparado
aos que não possuiam acne. Nos Estados Unidos, outro estudo envolvendo
mulheres demonstrou que aquelas que consumiam dois ou mais copos de leite
desnatado por dia tinham 22% mais chance de desenvolver acne severa e 44% mais
chance de desenvolver acne nódulo-cística em relação àquelas que consumiam
apenas um copo de leite desnatado por dia.20
O leite desnatado, parece ainda ter um efeito mais agravante do que o leite
integral como sugerem alguns estudos. Um estudo com 24 pré adolescentes de 8
anos de idade que ingeriram doses diárias de 53g de carne magra ou o equivalente
em leite desnatado (1,5 litros) demosntrou que o grupo que ingeriu o leite desnatado
teve um aumento significativo nos níveis de insulina e IGF-1 enquanto o grupo que
ingeriu carne magra não teve aumentos similares. Tal fato sugere que o surgimento
10
ou agravamento da acne não está relacionado a quantidade de gordura no leite, o
que contribui para a associação aos níveis de IGF-1.7,12
No processamento do leite desnatado, pode ocorrer uma alteração na
biodisponibilidade das moléculas bioativas ou uma interação das mesmas com
proteínas de ligação sugerindo que o balanço dos constituintes hormonais do leite
seja alterado. Ainda, para compensar o baixo teor de gordura e simular a
consistência do leite integral são adicionadas proteínas do soro do leite,
especialmente a α-lactoalbumina.12
O IGF-1 é também um estimulante da lactogênese que é secretado no leite.
Níveis aumentados de IGF-1 podem ser encontrados no leite de vacas que
receberam hormônio do crescimento recombinante (hrGH) ou somatotrofina (BST)
para aumentar a produção de leite. 2,10
CONCLUSÃO
A relação da acne com a dieta é um tema que sempre gera discussões em
meio acadêmico, científico e profissional. O fato de que determinados alimentos
poderiam desencadear ou agravar um processo acneico já era defendido por vários
profissionais porém com dados científicos fracos ou inconclusivos.
Com o passar do tempo, a crença de que alimentos muito gordurosos
poderiam estimular a produção de sebo e acne foi defendida por muitos profissionais
como a principal relação entre a acne e a alimentação. Porém algumas pesquisas e
autores sugeriam que esta relação não gerava tanta influência sendo o fator
hormonal, por exemplo, muito mais importante.21 Na prática clínica, muitos
profissionais e pacientes reportam o agravamento da patologia após o consumo de
determinados alimentos, o que sugere que a dieta poderia realmente influenciar a
acne.
O leite vem sendo alvo de relatos de agravamento das lesões de acne e
diversas pesquisas ja foram realizadas com a tentativa de identificar esta relação.
Alguns componentes do leite foram identificados como possíveis agentes
agravadores. Os precursores andrógenos como 5α-androstenediona e 5αpregnanediol são apontados como estimulantes da produção sebácea, que é
11
andrógeno dependente, agindo diretamente na unidade pilosebácea estimulando a
produção de sebo uma vez que não necessitam da redução enzimática pela 5αredutase, porém, alguns pesquisadores questionam a possibilidade destes não
resistirem ao trato gastrointestinal não chegando intactos à corrente sanguínea.13
Sendo assim, ainda não esta claro se são os hormônios presentes no leite que
poderiam estimular a acne agindo como perturbadores endócrinos em nosso
sistema ou se estes tornam-se inativos ao passarem pelas enzimas no processo
digestivo.
O consumo de leite e o agravamento da acne se assemelha ao que ocorre em
dietas de alto IG. Apesar do baixo IG, o leite aumenta a hiperinsulinemia o que é
associado a uma grande quantidade de IGF-1 em sua composição. O IGF-1 é
apontado na maior parte das pesquisas como a mais provável relação entre o
consumo de leite e a acne, uma vez que ele é capaz de desencadear uma resposta
hormonal com liberação e regulação de andrógenos e ativação de seus receptores
na pele, proliferação de queratinócitos e produção sebácea, fatores que estão
diretamente relacionados às alterações que ocorrem na acne.2,12,14,16 Outro fato que
corrobora para esta afirmação é que pesquisas apontaram aumento de IGF-1 sérico
em adultos com acne2 e que, por sua vez, o consumo de leite aumenta os níveis
séricos de IGF-1.2,7,11
Outro fato interessante na relação do consumo de leite com a acne é que o
leite desnatado demonstrou maior agravamento em algumas pesquisas do que o
leite integral. Este fato sugere que a gordura do leite teria pouca ou nenhuma
influência pois o teor de gordura no leite desnatado é menor.12 O leite desnatado
após seu processamento recebe mais proteínas do soro para ganhar consistência
parecida com a do leite integral após a retirada da gordura o que poderia aumentar
as concentrações hormonais ou por exemplo de IGF-1, uma vez que este está
presente também na porção proteica do leite.
É cada vez mais evidente que existe uma relação da acne com o consumo de
leite e que o IGF-1 é o componente que melhor esclarece esta relação. Porém ainda
não se tem certeza de que os níveis aumentados de IGF-1 ocorram devido à
quatidade de IGF-1 presente no leite ou se o consumo de leite poderia estimular a
produção endógena de IGF-1.11 Para tal, novas pesquisas precisariam ser realizadas
a fim de compreender melhor os aumentos de IGF-1 após o consumo de leite assim
12
como outros componentes que poderiam contribuir como, por exemplo, os
hormônios.
É importante mencionar que nenhuma destas pesquisas apontou a dieta,
alimentos de alto IG, o leite ou o IGF-1 como causador determinante da acne, o que
sugere que estes apenas possam agravar o quadro, e que outros fatores pré
existentes como a genética e produção andrógena ainda determinem o surgimento
da patologia. Sendo assim, indivíduos predispostos estariam mais suscetíveis à
acne após o consumo de leite do que aqueles que por motivos genéticos não
desenvolveram a patologia.
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