O décimo sétimo CD
Transcrição
E m abril, a SOARMEC completou 13 anos de existência, com a feliz certeza do dever cumprido e de estar construindo uma história exemplar de trabalho voluntário ininterrupto. Um trabalho que está longe de acabar, mas cujos frutos nos permitem a licença matemática de afirmar que nossos l3 (treze) aniversários são o produto da soma dos 39 (trinta e nove) números desse jornal, com os 19 (dezenove) CDs que já editamos, com mais os 86 (oitenta e seis) programas radiofônicos que produzimos, mais os 454 (quatrocentos e cinquenta e quatro) associados que nos dão substância, e mais: 1 (um) piano de concerto, 1 (um) website, 1 (um) estúdio de remasterização, 1 (uma) biblioteca especializada em rádio, 1 (um) livro sobre o rádio educativo brasileiro, 3 (três) títulos de Utilidade Pública, 1 (um) Prêmio Estácio de Sá, e mais as centenas de discos e publicações repassados à Discoteca e ao Setor de Pesquisa da Rádio, além das incontáveis benfeitorias realizadas no equipamento e no espaço físico da Emissora. Que nos desculpem, portanto, os mais supersticiosos, mas, para a SOARMEC, esse 13º ano de existência foi um ano bom. E este número do Amigo Ouvinte – que por coincidência é o triplo de 13 – noticia que, de fato, além do retorno das relações cordiais e civilizadas com a cúpula da emissora, o ano que passou foi aquele em que recebemos o nosso almejado Título de Utilidade Pública Federal, e também aquele em que conseguimos recursos para criar um centro de excelência radiofônico. Mas esses 13 anos têm um sabor ainda mais especial porque, além do que foi exposto, eles nos colocam em simetria histórica com a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – fato que nos enche de orgulho, pois, conseguimos chegar à mesma idade da estação pioneira quando foi formalmente doada ao então Ministério da Educação e Saúde, dando origem à atual Rádio MEC. Tal simetria fica ainda mais significativa se lembrarmos que, em seu 13º aniversário, foi a aniversáriante SOARMEC quem presenteou a Rádio MEC, fazendo uma importante doação – veja na página 3 – e formalizando, administrativa e juridicamente, várias benfeitorias. Estamos de parabéns. IMPRESSO Editoria l Treze Aniversários Amigo Ouvinte Ano XIII • Nº 39 • junho 2005 I N F O R M AT I V O D A S O C I E D A D E D O S A M I G O S O U V I N T E S D A R Á D I O M E C O décimo sétimo CD Integralmente dedicado à compositora e musicóloga Helza Camêu que trabalhou por muitos anos na Rádio MEC, o 17º volume da Série Repertório já está na fábrica e deverá ser lançado na primeira quinzena de julho. Tal como o anterior, dedicado a Mário Tavares, este CD também será editado graças ao apoio da Academia Brasileira de Música, que, assim, presta homenagem a outro de seus membros, posto que Helza ocupou a cadeira nº19, cujo patrono é Basílio Itiberê. Outra novidade é que, diferentemente dos anteriores, este CD vai sair pelo selo discográfico da Rádio MEC, mas a produção pemanece a cargo da SOARMEC, que continua a manter o mesmo padrão de qualidade alcançado nos discos anteriores. O repertório, gravado no Estúdio Sinfônico, há 40 anos, é praticamente desconhecido, e compreende um duo para clarinete e fagote, uma sonata para violoncello e piano, um vocalise em homenagem a Villa-Lobos e 14 canções. São ao todo 23 intérpretes, incluindo alguns dos mais importantes músicos que já passaram pelos estúdios da Emissora, como Aída Gnatalli, Violeta Kundert, Eugen Ranewsky, Noel Devôs, George Kiszely e José Botelho. Mais sobre Helza Camêu na página 14. Também neste número Alto-falante.............................................. 2 Encontro importante, sobre 1ª reunião O rádio e a vitrola artigo de Bráulio Tavares............................8 das diretorias da SOARMEC e ACERP.....3 Quadrante, 42 anos depois...................9 Título de Utilidade e sua utilidade ....4 A centenária Maria Muniz...................11 O ouvinte permanente por C.Acselrad..5 Centro de Estudos para o Rádio Educativo e Cultural.............................13 Teatro, literatura e PP Rangel............5 Radiodifusão futuros possíves...........14 Rádios públicas nos EUA......................6 Números da CAO.................................. 15 Prata da Casa, entrevista com a produtora Lilian Zaremba........................................7 Programações...................................... 16 ACADEMIA BR ASILEIR A DE MÚSICA 60 ANOS Alto-Falante SUELI ANASTÁCIO, que estava de licença nos EUA, voltou e é a nova responsável pela comunicação interna da Rádio MEC. NOVO PROGRAMA na grade da MEC AM, desde 3 de abril, o "Oficineiros da Inclusão" é uma parceria da Emissora com a ONG Escola de Gente, e trata de questões relativas à inclusão social. RÁDIO MALUCA, programa infantil produzido por Zé-Zuca, inicialmente para a Rádio MEC e em sua fase atual para a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, agora também pode ser ouvido na MEC AM, que entra em link com a Nacional, todos os sábados, às 11 da manhã. A RÁDIO MEC tinha, assim como a Tupi, a Nacional e tantas outras rádios brasileiras. A rádio de Varsóvia tem, a de Colônia tem, a da Baviera tem, a BBC tem, a RAI tem, a RTF tem, a CBC tem, e muitas outras emissoras estrangeiras, também. Com a recente extinção da Sinfonia Cultura, da Fundação Padre Anchieta (que custava apenas R$ 3 milhões por ano), nenhuma rádio brasileira tem mais a sua Orquestra Sinfônica.É dura a dureza. POR DETERMINAÇÃO do Secretário de Cultura, Arnaldo Niskier, a Rádio Roquette-Pinto está obrigada a anunciar-se com este nome, e não como FM 94. Resta saber se a programação vai voltar a fazer jus ao nome da emissora. O DECRETO 5.396, de 21 de março, autoriza as emissoras educativas, constituídas como organizações sociais, a veicular publicidade nos intervalos de programas e eventos, e no intervalos da programação. No caso de apoio cultural é facultada a indicação do apoiador. Mas o decreto veda a veiculação de anúncios que configurem comercialização de intervalos, e a publicidade de entidades de direito público que caracterize promoção pessoal de autoridade ou empregado público. A INDÚSTRIA de rádio digital via satélite e por assinatura continua em recuperação nos EUA, colocando à disposição dos clientes mais de cem canais de rádio. Para sintonizá-los, no carro ou em casa, é preciso ter um receptor com antena. A TV CULTURA quer trazer de volta os festivais de música que marcaram época na TV Record e está promovendo o "Festival Cultura – A Nova Música do Brasil", um evento que pretende mapear a música brasileira nos dias de hoje, e cujas primeiras apresentações eliminatórias estão programadas para 13 de agosto deste ano. 2 A RADIO BANDEIRANTES está investindo em uma rede de emissoras FM com programação jornalística 24 horas por dia, durante os sete dias da semana, o que deve estar preocupando bastante o monopólio da CBN. APROVADO – na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados – o projeto de lei que impõe a divulgação da relação dos proprietários, detentores de concessão ou permissão e diretores de todas as emissoras de rádio & TV, bem como as datas de recebimento e vencimento destas. Um grande passo para acabar com a inexplicável ausência de dados disponíveis sobre as concessões de radiodifusão. ACERTOS de bastidores conduziram, em março, o deputado Jader Barbalho à presidência da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados. Notório controlador de concessões, Jader foi votado por quase todos os seus pares, muitos deles também concessionários de radiodifusão, o que significa que o controle da mídia deve permanecer nas mãos dos políticos regionais e locais. DADOS DA PUBLISHERS Association (EUA) contrariam relatórios recentes e indicam que o comércio de canções individuais aumentou em 2004. A categoria de entretenimento e estilo de vida, na qual o download de canções se inclui, registrou um aumento de 90% e a aquisição de músicas individuais representou 15% do total do conteúdo online. A RÁDIO VIVA RIO (1180 AM) saiu do ar, em fevereiro. O canal pertence ao do Sistema Globo de Rádio, que alegou não poder manter a parceria. Continuando com sua programação na Internet (www.radiovivario.com.br), a ONG quer reforçar o projeto da Rede Viva Rio de Rádios Comunitárias implementando um centro de capacitação e produção de conteúdo. PROJETO DE LEI 1048/03, do deputado Fernando Ferro, proíbe as emissoras de rádio e TV de receber dinheiro para tocar música. O projeto, a ser avaliado pela Comissão de Educação e Cultura, favorece os músicos que não podem pagar pela divulgação de seus trabalhos. O proprietário, gerente ou funcionário de emissora que receber verbas ou favores para executar músicas poderá ser condenado à prisão, caso o projeto seja aprovado. A emissora também estará sujeita a multa, suspensão ou mesmo perda da concessão. O RÁDIO foi uma das principais vedetes do 2º Festival M3, realizado em Miami, em março. Os participantes do evento, além de especulações sobre distribuição de músicas pelo celular e o crescente licenciamento para videogames, elegeram o rádio digital como alternativa para o mercado musical. O IBOPE, afirma que o brasileiro passa cinco horas diante da TV, ou seja, dois meses e meio por ano hipnotizado pela telinha. Será que não está na hora de abrirmos uma filial brasileira da ONG canadense Adbuster (www. adbusters.org) cuja proposta é ajudar os viciados em TV a largarem o vício? O OFFICE OF COMMUNICATIONS publicou no relatório "Rádio – preparing for the future" os resultados de um inquérito aplicado a 1501 ouvintes do Reino Unido. Para muitos, as informações sobre trânsito e metereologia são mais importantes do que todas as outras noticias. A BBC ANUNCIOU, que vai dispensar 3780 empregados, nos próximos 3 anos – o que representa 19% da sua força de trabalho atual. Amigo Ouvinte é uma publicação da SOARMEC Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC. De Utilidade Pública Municipal (Lei nº 2464), Estadual (Lei nº 3048) e Federal (portaria 3935) Prêmio Estácio de Sá 2002 CGC 40405847/0001-70 Praça da República l4l-A Sala 201 CEP 20211-350 Tel: 2221-7447 R: 2207 e 2210 www.soarmec.com.br/amigoouvinte [email protected] [email protected] EDITOR-RESPONSÁVEL: Renato Rocha JORNALISTA-RESPONSÁVEL: Suzel Mendonça PRESIDENTE DE HONRA: Beatriz Roquette-Pinto DIRETORIA: PRESIDENTE: Hidelbrando de Araújo Góes VICE-PRESIDENTE: Regina Salles TESOUREIRO: Roberto Cartaxo Rios ATIVID. CULTURAIS: Allan Lima COMUNICAÇÃO: Egeu Laus PATRIMÔNIO: Reinaldo Ramalho SECRETÁRIO: Renato Rocha CONSELHO FISCAL: Sérgio Cabral, Norma Tapajós e Otto A. de Castro COLABORADORES: SECRETÁRIA: Renata Mello PRODUÇÃO: Adriana Ribeiro, Silvia Rebel, Lucas Camargo Dain, Alan Vilela CONSULTOR JURÍDICO: Letácio Jansen CONTADOR: Júlio Lajchter DIAGRAMAÇÃO: Adriana Ribeiro ENTRE PARA A SOARMEC Receba este jornal, esteja em nossos eventos, conheça melhor a sua Rádio, freqüente nossa Biblioteca, acesse nossa home-page, mantenha-se informado a respeito do rádio educativo-cultural Tel. 2221.7447 R-2207 e 2210 Um encontro importante Um estúdio de ponta Fotos: Adriana Ribeiro Da esquerda para a direita: o presidente da SOARMEC, Hildebrando de Araújo Góes (assinando); o senador Roberto Saturnino Braga; Orlando Guilhon, diretor da Rádio MEC; Elizabeth Carmona, presidente da ACERP; Francisco Teixeira – gerente da Rádio MEC; Egeu Laus, diretor de comunicação da SOARMEC; Albert Amorim, gerente jurídico da ACERP; e Allan Lima, diretor cultural da SOARMEC. A primeira reunião da SOARMEC com a cúpula da ACERP foi bastante concorrida. Realizada na manhã do dia 4 de março, na sede da TVE, a reunião já seria importante pelo fato de que, pela primeira vez, dois anos após haver assumido, a direção da ACERP estava recebendo oficialmente a diretoria da SOARMEC. Mas o evento, além de formalizar a aproximação das duas instituições, serviu também para desfazer um antigo nó administrativo, que dizia respeito ao estúdio de remasterização – veja box –, estúdio esse que foi, na ocasião, oficialmente doado à Rádio MEC. A presidente da ACERP, Elizabeh Carmona, uma das signatárias do documento de doação, agradeceu a colaboração da SOARMEC e destacou a importância dos trabalhos realizados em parceria; o diretor da rádio, Orlando Guillon, chamou atenção para uma parceria já em andamento, a discográfica, tornando público o fato de que a SOARMEC abriu mão de seu selo, mas continuará produzindo CDs para o selo Rádio MEC, como é o caso do 17º da série Repertorio Rádio MEC – veja matéria na página 14 – , e do CD com a íntegra de um raro programa conduzido por Rosinha de Valença, cujo entrevistado é Caetano Veloso. O presidente da SOARMEC, Hildebrando de Araújo Góes, após agradecer ao senador Roberto Saturnino – principal responsável pelos recursos empregados na compra do equipamento, e que, na verdade, foi louvado nos discursos de todos os presentes como o grande apoiador da causa da SOARMEC e da Rádio MEC –, sublinhou o fato de que os Amigos Ouvintes estavam completando 13 anos de apoio à Emissora e reafirmou a disposição de continuar no mesmo rumo, depositando esperança de que, a partir daquele encontro, a colaboração cordial e produtiva entre as duas instituições ficaria sacramentada, o que vai permitir que possamos viabilizar muitos projetos mais. Um comentário historiográfico Guardando as proporções, o encontro em pauta é simétrico àquele que aconteceu em 1936, quando a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – com os mesmos 13 anos de idade que a SOARMEC acaba de completar(veja editorial) – doou ao governo sua concessão e todo o seu equipamento. A oficializar a doação do estúdio de remasterização, a SOARMEC estava ecoando aquele fato. Na verdade, o estúdio é o primeiro dos vários ítens que devem ser administrativamente regularizados, mas há vários outros que ainda estão no limbo administrativo, como é o caso do piano de concerto doado pela SOARMEC – que ainda carece de um documento que afete o seu uso ao estúdio sinfônico. Outras regularizações igualmente importantes e urgentes dizem respeito ao espaço que a SOARMEC ocupa no prédio da Rádio e ao próprio selo SOARMEC Discos, que, esperamos, sejam, também, juridicamente amarrados, num futuro próximo. O estúdio de remasterização, cuja existência não é novidade para os leitores deste informativo, foi adquirido com verba do Senado Federal – conseguida pelo senador Roberto Saturnino e intermediada pelo MinC –, com a finalidade precípua de beneficiar e digitalizar todo o precioso acervo analógico da Rádio MEC. Tal equipamento – o sistema Sonic Solutions, que é o mais sofisticado do planeta e está avaliado em quase setenta mil reais –, embora tenha sido adquirido e instalado há cerca de 3 anos, não chegou a entrar em funcionamento. Os fatos responsáveis por tanta demora também já foram detalhados em nossas páginas – o primeiro deles foi a incompreensível mas eficiente má vontade administrativa da gestão anterior da Rádio, e o segundo e definitivo, foi o inacreditável furto do aparelho CEDAR – o coração do equipamento – ocorrido às vésperas da inauguração do estúdio, já nos primeiros dias da gestão atual, quando apenas houvera a troca da presidente, mas a rádio ainda permanecia com a antiga gerência. A isso, seguiu-se um inquérito administrativo que não conseguiu deslindar o crime, e a sala continuou fechada, com o equipamento parado até a presente data. A doação formal do referido equipamento é um grande passo para que, em termos administrativos, a ACERP assuma a responsabilidade de repor o equipamento desaparecido e colocar em funcionamento o citado estúdio, que tantos serviços pode prestar ao acervo fonográfico da Casa. Reflexão, e informação sobre a música A Revista da Academia Brasileira de Música Faça sua assinatura anual (R$25,00) Telefax (21) 22925845 • www.abmusica.org.br • [email protected] 3 O título de Utilidade e sua utilidade A A questão das doações menos que sejam criados os títulos de utilidade pública continental e mundial, nada mais falta para que a SOARMEC, neste quesito, esteja tão qualificada quanto as mais qualificadas instituições brasileiras. De fato, em matéria de titulação em utilidade pública, a SOARMEC pode se considerar totalmente demais, pois fez barba, cabelo e bigode, ao tornar-se, em dezembro de 2004, detentora de todas as certidões de utilidade pública existentes no país: a municipal, a estadual e, por fim, a federal. O percurso A tríplice titularidade da SOARMEC vem coroar 13 anos de atividades ininterruptas e aconteceu graças à soma dos serviços prestados à Rádio MEC e ao rádio educativo-cultural do país. O percurso começou em agosto de 1996, com o reconhecimento municipal; prosseguiu em setembro de 98, com o certificado estadual, e concluiu-se no último dezembro, quando obtivemos o nosso almejado título federal (veja fac-simile). Seria uma prova de ingratidão não repetirmos aqui os agradecimentos aos parlamentares que nos ajudaram a conseguir tais distinções: o vereador Wilson Leite Passos, o deputado Carlos Minc e o senador Roberto Saturnino Braga – com destaque especial para seus assessores Anival Machado e Mauro Dantas. Um pouco de história A história do Título de Utilidade Pública começa em 1935, com a lei que cria a sua emissão. Seu significado era o de uma simples benesse do poder público. Antes, não havia qualquer regulamentação a respeito, o que só veio ocorrer em 1961, com o Decreto 50.517, que regulamenta a concessão – a qual passou a poder ser emitida por solicitação do interessado ou por ato unilateral do presidente da República. É o caso da ACERP, por exemplo, que teve o título concedido pela mesma medida provisória que a criou. Na maioria das vezes, no entanto, quem concede o título é o Ministério de Justiça, que mantém um setor especifico para essa finalidade. O jurista Paulo Haus Martins, que estudou o assunto a fundo, considera que: “Tratar a emissão do título de utilidade pública com o rigor que ora se lhe dispensam, sem que esse rigor seja acom- panhado de critérios objetivos e legais, é uma contradição do poder público que ele tem que resolver.” De fato, a obtenção do título dá a maior trabalheira. Para os interessados em requerê-lo ou em conhecer a via-crucis que tivemos de percorrer, o endereço é www.mj.gov.br /snj/utilidadepublica.. Importância e utilidade do título As entidades do chamado “terceiro setor” costumam se ressentir do reconhecimento legal e oficial, tanto em relação à sua natureza quanto ao resultado de suas ações. Assim, a utilidade principal do título consiste no reconhecimento de que os detentores do diploma são, de fato, entidades de utilidade pública. Faz parte do currículo. Mas, além de reconhecimento e prestígio, que outra utilidade pode ou deveria advir? Esta é uma pergunta que nos interessa responder e aprofundar, especulando sobre até que ponto um título dessa natureza pode e deveria ajudar ao voluntariado sem fins lucrativos, e até que ponto as entidades que o possuem têm possibilidades legais de se beneficiarem dele, através de doações e incentivos Além de generoso, o gesto de Roquette-Pinto, ao doar sua emissora ao governo, é raro. Excetuando Villa-Lobos, que também doou seus direitos autorais para que fosse criada e mantida a Academia Brasileira de Música, não temos, infelizmente, muitos outros exemplos de doações despreendidas como estas, em nosso país. Na verdade, entre nós, o verbo doar é, pelo contrário, desincentivado, e as esferas oficiais não têm demonstrado interesse em que ele venha a ser conjugado com mais frequência. No Brasil, em termos legais, doar alguma coisa não traz, em geral, qualquer benefício para o doador e, com toda certeza, alguém pagará impostos sobre a doação – ou o doador ou quem a recebe. Em 1995, para melhorar o panorama, a lei 9249, em seu artigo 13, parágrafo 2o, dispôs que as doações efetuadas a entidades que possuam o título de Utilidade Pública Federal poderão ser abatidas do Imposto de Renda, até o limite de 2% sobre o lucro operacional. Além disso, essas entidades e também podem ser objeto de subvenções e auxílios da União Federal e de suas autarquias, e podem também usufruir da possibilidade de realizar sorteios – desde que autorizadas pelo Ministério da Justiça. SOS SOARMEC A Sociedade dos Amigos Ouvintes, que foi criada para apoiar e aperfeiçoar as atividades educativas e culturais da Rádio MEC, vem prestando significativos serviços à emissora e, por extensão, ao rádio educativo-cultural brasileiro. No entanto, apesar da emissora pertencer à União e ser um patrimônio cultural da cidade e do país, a SOARMEC não recebe subvenção alguma dos poderes públicos, e conta apenas com a contribuição mensal de seus sócios. Temos certeza de que, apesar de nossa volumosa folha de serviços prestados, poderíamos, com mais recursos, ter ido muito além. Esperamos que, a partir de agora, as pessoas físicas e jurídicas de nossa cidade comecem a dar mais atenção ao trabalho voluntário prestado por sociedades como a SOARMEC, e que essa mudança de foco, encorajada pelas prerrogativas possibilitadas pela lei 9249, se traduza em aporte de recursos que, como vimos, poderão ser deduzidos do IR e serão mais que bem vindos. Apoie o nosso apoio. “Não há riqueza comparável à razão, nem pobreza que se iguale à ignorância” Ali Ibn Abu talib, pensador árabe 4 Teatro, literatura e PP Rangel. O Ouvinte Permanente AO VIVO, MA NON TROPPO Carlos Acselrad Fotos: Lucas Melo N a tradição do povo hebreu, comemora-se a maioridade dos varões ao completarem eles os 13 anos. Compreende-se a pressa: tratava-se de um povo sempre ameaçado pelos percalços do nomadismo, indo até aos da extinção e, portanto, sempre necessitado de mão-de-obra apta ao trabalho pesado, à guerra e à reprodução. As mulheres recolhiam-se à sua insignificância. Talvez certas analogias históricas nos tenham remetido tão longe ao registrar – aqui nesta solitária trincheira – a passagem do 13º aniversário de fundação da SOARMEC. Talvez coubessem outras analogias: ao deixar a adolescência e adentrar a maturidade deixaríamos de ser contestadores, impertinentes, insuportavelmente chatos enfim, como soem sê-lo os da nossa espécie, para nos tornarmos ponderados, tolerantes, agradavelmente meio idiotas, enfim, como se espera sejamos os da nossa espécie. Mas não! Ledo engano Acima, dois momentos de Pedro Paulo Rangel durante gravação ao vivo no Estúdio Sinfônico. o vosso, se isso é o que esperais – aqui d` El rey! m dos mais importantes propósitos dos Amigos 3 Aqui a porca torcerá realmente o rabo. Aqui o camelo acabará por passar pelo buraco da agulha. Ouvintes é o de juntar o rádio ao livro e, nos Para trás! Aqui ninguém aderirá à senhora do últimos meses, demos alguns passos significadestino nem preferirá a América: manteremos tivos nesse caminho. Para começar, renovamos nosso acesas as válvulas dos nossos capelinhas (não, contato com o Instituto Benjamin Constant, no sentido agora foi regressão demais – vá lá, manteremos de estabelecer parcerias para dar continuidade ao projeligado o som do carro), ainda que para ouvir as to Visão da Literatura, que nada mais é do que a recupetransmissões ao vivo de Sala de concerto. ração da arte da leitura – como o sabem nossos poucos Não faz tanto tempo assim – já não se amarrava leitores e os muitos ouvintes do Memorial de Ayres, lido cachorro com lingüiça – a Rádio MEC volta e por Luiz Carlos Saroldi, na íntegra, em capítulos de 10 meia realizava transmissões externas. O programinutos, transmitido e várias vezes retransmitido. ma Cenas e bastidores reportava noites de Também conseguimos o apoio da direção do Instituto estréias teatrais, dando voz a atores e diretores, para uma futura maratona de leitura – na qual uma antes e depois do espetáculo; e quase toda manhã obra em língua portuguesa (a ser escolhida pelos de domingo era reservada aos Concertos para a alunos do próprio instituto) será lida na íntegra por juventude, da OSN, também precedidos de longas leitores que se revezariam ao longo de todo o texto. entrevistas com o regente, críticos presentes e mesmo músicos da orquestra. Eram matérias viAlém disso realizamos a gravação do que será o vas, criadas de improviso por gente da área, que segundo módulo da série Visão da Literatura, com o conhecia o trabalho de que falava, o que cercava registro do Sermão da Quarta-feira de Cinza, na voz a produção de uma aura de respeito pela comde Pedro Paulo Rangel. Outro fato auspicioso foi a petência, e mantinha interesse sempre renovado. gravação de um especial do Ao vivo entre Amigos, com Não nos consta que estas externas fossem conuma adaptação do aclamado espetáculo teatral Soppa sideradas uma extraordinária façanha. Hoje, as de Letra, também com Pedro Paulo Rangel, seu parcas transmissões de música ao vivo, de dentro criador. Alem do valor intrínseco do programa – uma da emissora ou de alguma sala da cidade, são abordagem incomum da nossa MPB, na qual, em vez anunciadas previamente por chamadas espetade cantar, o ator declama as letras das canções –, há culosas, com expressões promissoras de algo jatoda uma importância simbólica, pois, ao realizar o mais visto – “não perca este grande espetáculo”– primeiro especial do Ao vivo entre amigos, a sendo enfatizado o “ao vivo” pela locução, como SOARMEC estava voltando a participar da realização quem quer dizer “proeza! imperdível! Tão deste programa, que, como se sabe, antes de ser pensando o quê?”. Reconheçamos que, dadas as absorvido pela produção da Emissora, foi limitações, a penúria, o ‘não temos verba nem originalmente criado pela própria SOARMEC, com o pessoal’, etc. ...vai ver é realmente uma proeza. intuito de retomar a tradição das apresentações ao vivo Mas, infelizmente, o resultado tem sido sempre dentro da Rádio. bisonho. O Concerto MEC (mais um titulozinho U burocrático) brindou os ouvintes com um recital de pianista brasileiro que executou cerca de 12 obras de Chopin. O único texto lido por uma voz (depois identificada como sendo do coordenador da transmissão) foi “Rádio MEC transmitindo ao vivo da sala tal, recital do pianista tal”. Isto repetido ad nauseam, a cada brecha do artista (que, aliás, colaborou com o espírito geral de pobreza – deramlhe acesso a um microfone, que usou para pedir que apagassem um refletor que iluminava o teclado, acrescentando: “Se tivessem apagado antes eu teria errado menos notas”). Vamos e venhamos, toda crítica será antipática. Por outro lado, convenhamos: a única crítica reamente destrutiva é a indiferença. Exerçamo-la, pois (exerçamo-la? que língua a nossa!) sem culpa. Argumenta-se, por exemplo – acerca da qualidade final das produções da rádio – que “nem sempre a coisa sai impecável como gostaríamos”. Fosse esta a realidade, seria tolerável. O que é inadmissível é quando, ao invés de exceção, são regra os tropeços, os equívocos e a desinformação. Esta regra se torna mais visível ainda justamente nas programações ao vivo, quando se espera de quem fala um mínimo de competência no dizer, um mínimo de agilidade no evitar equívocos e um mínimo de informação sobre a matéria e as pessoas com quem está lidando. Sexta-feira dessas, concerto. A simples leitura de data da composição resultou no seguinte: “mil oitocent... (pigarro) mil NOVEcentos e oito... (pigarro)... ééé... mil novecentos e VINTE oito”. Um conjunto instrumental “devaneia” (sic) sobre temas universais. Após devaneios (leia-se desafinações e desencontros) sobre a Dança ritual do fogo, a peça termina (mais ou menos estilo atentado-homem-bomba-Bagdá). Sugere-se aos ouvintes que telefonem (os ouvintes – haja o que houver – parabenizam tudo e todos): “Liguem para a nossa Central de Atendimente... (pigarro)... Atandimento... ao Ou...vinto”. Pelo visto, o esperanto ainda não caiu em desuso. ([email protected]) 5 Rádios públicas nos EUA Foto: Adriana Ribeiro Cada país tem uma maneira de lidar com as concessões de canais para veículos de comunicação. Uns são mais liberais, outros nem tanto; alguns constróem redes de teleducação, e outros deixam a programação por conta do mercado. Para aprender um pouco sobre o sistema de rádios públicas dos EUA, entrevistamos o radialista norte-americano Steve Spencer (foto), que trabalhou em emissoras de Nova York e em rádios públicas na Universidade de Maryland e no estado de Missouri, onde dirigiu a KOPMF (FM), e depois a WYSO. Atualmente, Steve está no Brasil para estudar a implantação de sistemas de redes de rádio. Publicamos abaixo um resumo desta entrevista, feita por Adriana Ribeiro, que pode ser lida na íntegra em nosso site (www.soarmec.com.br). Outras fontes: NPR (www.npr.org) e CPB (www.cpb.org) N os EUA, há apenas uma rádio oficial, a Voice of America, que transmite para o exterior, em ondas curtas ou pela internet. Para os ouvintes domésticos, as rádios públicas são as chamadas NCE (Non Commercial Educational), isto é, rádios sem fins lucrativos e com uma programação mais ou menos voltada para educação: universitárias (cerca de 67%), comunitárias (30%), e rádios de bibliotecas ou municipais, entre outras. O sistema de concessão dos canais é o mesmo para todas as emissoras, comerciais ou não. Para as últimas o departamento responsável pelas concessões, o FCC (The Federal Communication Comition), destina 20% das frequências de FM. Quando começaram a surgir, nos anos 40, as estações NCE destinavam-se apenas às Universidades – para professores darem conferências no ar – e à música clássica. Hoje em dia, esse perfil é um pouco diferente. O Sistema NPR Em 1967, foi criado o sistema NPR (National Public Radio), ratificado pelo Congresso Nacional. O NPR é uma corporação, também sem fins lucrativos, parcialmente financiada pelo governo. Sua principal função é produzir programas radiofônicos de qualidade que são transmitidos voluntariamente pelas emissoras públicas. No início do sistema, eram quase 80 estações, atualmente são mais de 700. Segundo estimativas recentes, há cerca de 2533 rádios educativas nos EUA, mas nem todas transmitem programas do NPR. Financiamento A maior parte vem dos ouvintes. Além das contribuições individuais, há a possibilidade de apoio comercial e também de um financiamento por uma corporação quase independente: a CPB (The Corporation for Public Broadcasting). Aproximadamente 20 a 25% do financiamento nacional para as rádios públicas vem do CPB, mas isso difere de estação para estação. Grandes estações como a WNIC, em Nova York, recebem de 2 a 4% de seu financiamento anual. Rádios menores como a WYSO precisam de 20%. Mas a idéia é que todos possam ir baixando esse percentual. Anúncios Apesar de apresentarem às vezes grandes diferenças entre si, as não comerciais têm em comum a proibição de transmitir anúncios. A única excessão é um tipo de comercial chamado underwriting. Até 1984, os anúncios eram do tipo apoio cultural, mas depois o Congresso mudou as leis. Segundo Steve, é permitido dizer: “esse programa foi possível graças à Fundação Ford...”, dizer o slogan da Fundação, o tipo de serviço que oferece e anunciar um telefone, página na internet ou e-mail de contato. Mas não se pode dar preços ou oferecer vantagens. Também não se pode fazer chamadas imperativas (call to action) do tipo ‘ligue agora’. Algumas estações vendem produtos (CDs, camisetas), ou realizam eventos para angariar fundos. E, o que é mais importante: nos EUA o sistema de impostos facilita a captação de recursos dos ouvintes – na medida em que é possível conseguir dedução do imposto quando você contribui para uma rádio pública. Programação Nos EUA, há muitos anos, todas as estações são locais. Apesar disso, Steve Spencer ressalta que muitas são retransmissoras de programas de âmbito nacional, com pouca ou nenhuma programação local. O governo não regulamenta o que é transmitido pelas rádios, com exceção apenas para a proibição de conteúdo exclusivamente religioso nas estações financiadas pelo CPB. Steve afirma que essa não interferência se dá principalmente depois do governo Reagan, que imprimiu uma política de desregulamentações. Livros do mundo desde 1952 Avenida Rio Branco, 185 Tel: (21) 2533-2237 [email protected] / www.leonardodavinci.com.br 6 Muitas décadas antes de Reagan havia a chamada The Fairness Doctrine (a doutrina justa), a qual defendia a idéia de que o ar pertence ao povo, portanto, a concessão de um espaço no dial deve ser gratuita. Assim, segundo a doutrina, quem recebe a concessão deve ter obrigações para com o público, como, por exemplo, nos informativos, divulgar sempre duas opiniões sobre o mesmo tema. Steve: “Acho que as rádios públicas, especialmente no sistema NPR, continuam a operar como se a doutrina justa ainda existisse. Porque se você tem a confiança do público, então você tem que fazer a coisa certa”. Um alerta Steve alerta ainda para um outro problema decorrente da desregulação: um ato do Congresso , em 1996, que permitiu a consolidação da propriedade das estações. O que provocou o aparecimento de grandes cadeias como Clear Channel Communications, por exemplo, que tem mais de 1200 estações no país, e a Radio 1, com cerca de 800 estações, o que, obviamente, não é bom para a democracia. 11 de setrembro Muitas estações comerciais deixaram de ter jornalistas em seus quadros funcionais, e, por conta disso, no dia da tragédia do World Trade Center, as estações mais ouvidas não dispunham de profissionais que transmitissem informações. Impossibilitadas de prosseguir com a programação regular, a saída foi botar no ar o áudio das TVs. Porém, como os profissionais das rádios públicas estavam fazendo a cobertura do fato, Steve estima que, neste dia, o sistema de rádios públicas ganhou milhões de ouvintes. “Rádios públicas existem há 30 anos, mas em 11 de setembro milhões de pessoas descobriram estas estações, que eram as únicas a transmitir notícias sobre o ocorrido”. Teoria . MÚ ICA . CURSOS BÁSICOS Ritmo e som Harmonia Percepção musical . Carlos: 2521 3311 Arranjo Prata da Casa Entrevista com Lilian Zaremba Foto: Acervo Pessoal radicais: sisuda e amplamente receptiva. Sua risada era poderosa, vibrava. Dirce sabia tudo o que existia naquela discoteca, o estado das gravações, autores – era um arquivo ambulante. Foi ali que treinei minha capacidade para voar. Isso porque trabalhava-se em meio a outras conversas, telefones tocando, entradas e saídas de produtores procurando material, batendo nas teclas das máquinas de escrever. Me lembro especialmente da voz de Paulo Santos; do Lauro Gomes, outro grande conhecedor do acervo fonográfico; e do casaquinho nos ombros, faça chuva ou sol, da Dona Rosalina. Até hoje o Lauro não pode me ver de casaco, evoca a profecia: vai ficar igual! Respondendo por escrito às perguntas do AMIGO OUVINTE, Lilian Zaremba (na foto com o técnico Ribamar) conta histórias de sua trajetória e aborda temas como rádio-arte e internet. Fala também do resultado de suas pesquisas no mestrado e doutorado da UFRJ para sua produção radiofônica. Veja em nosso sítio na internet a íntegra da entrevista. Quando e como você veio para Rádio MEC? Foi em 1974. Eu estudava flauta doce e teoria musical na Pro-Arte. Acho bom destacar essa parte da minha formação por estar relacionada à música. Nessa época ingressei para a graduação em Arquitetura na UFF. Cursei dois anos e tranquei a matrícula, depois que fiz estágio num escritório de arquitetura. Vi que não poderia passar o resto da vida ali. Foi quando Gustavo José Meyer, na época produtor da Rádio MEC – excelente produtor, digase – me sugeriu que apresentasse uma proposta de série sobre música antiga, assunto que, naquele momento, não estava sendo explorado na programação. Foi o que fiz. Conversei com o diretor, que era o Reginaldo Magalhães, e fiz um piloto que foi aceito. Gustavo Meyer foi meu orientador: ensinoume o básico inicial da produção radiofônica. Jacob Herzog, hoje pianista e professor-doutor da UFRJ, trabalhava na Rádio, também, e foi outra ajuda indireta – seus comentários sobre trabalho me são preciosos até hoje. Como era o ambiente quando você começou? A sala dos produtores ficava aonde hoje é a segunda sala da discoteca, arquivo dos LPs. Era ali que a Dirce reinava. Uma figura imponente, morena bonita, capaz de conjugar expressões faciais Como foi fazer seu primeiro programa? O Música Antiga reunia o repertório da música medieval e renascentista da Europa Ocidental. Basicamente os LPs que eu encontrava na Modern Sound – porque a Rádio possuía pouquíssimo material dessa fase da música. Alguma coisa gravada em fitas-rolo vinha de países como a Bélgica e a Holanda, mas nem sempre era adequado – alguns concertos gravados ao vivo, com palmas, outros com a locução muito diferente do padrão da MEC... aliás, essa é uma questão que ainda existe. Mas eu pesquisava também nos livros, basicamente na Livraria Leonardo da Vinci. Não estou fazendo anúncio dessas lojas porque, a rigor, elas prestaram um serviço muito além do comercial, pois eram um reduto de informações numa época sem Internet. As suas influências em rádio: você ouvia rádio antes? O que você ouvia? Minha primeira experiência foi aos três anos de idade. Minha mãe, professora, trabalhava e precisava me deixar na casa de minha avó, que também trabalhava. Então, ela ligava o rádio na sala – ficava dentro de um móvel enorme, de madeira – me colocava sentada no sofá e ia fazer o que tinha de fazer. Eu ouvia aquelas vozes – me lembro muito bem da voz do Paulo Gracindo – e achava que estavam todos ali, dentro da casa, escondidos em algum lugar. Ficava imóvel, ouvindo, assustada e ao mesmo tempo me divertindo, imaginando sei lá o quê. Quando eu completei doze anos, ganhei um rádio de presente. Era um daqueles rádios com capa de couro, vermelha, e um botão para ondas curtas. Passei a dormir com o rádio grudado no travesseiro. Gostava de ouvir as falas em outras línguas, mesmo sem entender nada. Viagens no sono através de vozes e alguma música, mas basicamente vozes – Sidarta Ribeiro, destacado biólogo brasiliense, afirma que o sono é como um eco. Concordo: essa época de rádio escuta infantil-adolescente ressoa permanentemente em mim. As emissoras estrangeiras, especialmente as européias, ainda hoje apresentam uma cultura que privilegia textos longos e muita informação. Dormia e acordava com o rádio ligado. Minha irmã, assim que pôde, trocou de quarto. No início você fazia o texto, que era lido por dois locutores, hoje você fala seus textos ... Trabalhei com profissionais maravilhosos. Pessoas que nunca me desconsideraram por ser jovem e inexperiente, e me ajudaram a entender o trabalho e sempre se colocando disponíveis. Allan Lima, Yeda de Oliveira, Maravilha Rodrigues, William Mendonça, Lindolfo Moreira, Ronaldo Rosas e Anita Taranto. No início era sempre uma dupla: voz feminina e masculina. Uma dinâmica sonora na leitura do texto, que enriquecia o conteúdo das informações, porque um homem, para além das especificidades de timbre e altura de voz, sempre fala diferente de uma mulher. William, figura elegante, trabalhava na embaixada americana. Sua pronúncia era impecável, sua disposição para gravar, também. Yeda, cantora lírica, possuía voz mais suave, delicada. Sempre bem vestida, penteada e perfumada. Maravilha, voz contralto, fornecia imagens diferentes com sua leitura, podia ser mais direta, padrão muito pessoal e moderno. Uma mulher de figura forte, apesar da compleição física pequena. Impressionava o fato de fumar – isso acaba com a voz ! Com o tempo, com as aposentadorias, doenças, e mudanças de emprego, a Rádio foi se esvaziando de locutores. Naquela época, existia a distinção entre os locutores "de cabine", que ficavam no ar lendo notas e notícias variadas, e os locutores apresentadores de programas. Existia uma certa diferença profissional, como se os primeiros não fossem adequados à leitura de textos narrativos. Talvez fosse também uma forma de hierarquia, começando-se como locutor de cabine até, com experiência, passar a locutor de programas gravados. Aliás, existia também o locutorapresentador-produtor, caso do Paulo Santos. (continua na página 10) "O que me sidera é que não haja um governo que tenha coragem de investir milhões na educação para transformar este país” José Gil, pensador português, sobre a situação educacional portuguesa 7 O rádio e a vitrola Biblioteca Tude de Souza Silvia Rebel O acervo de nossa biblioteca, a única especializada em assuntos radiofônicos, já ultrapassou os 300 títulos, compreendendo desde livros sobre a história do rádio no Brasil e no mundo, até scripts e gravações de programas, passando por manuais de produção radiofônica e de técnica vocal, bem como livros sobre música popular brasileira e erudita, além de coleções de revistas e muito mais. Vários títulos são raridades, como os números da revista da Rádio Mayrink Veiga e da precursora revista Rádio, a primeira a tratar do assunto, no país. Esta revista, que era editada quinzenalmente, foi idealizada pela Rádio Sociedade do Rio de Janeiro e depois veio a contar com a participação da Rádio Club de Pernambuco (dispomos dos números 13 e 24, publicados no ano de 1924). Mas há novidades também, como a doação que acabamos de receber da Introdução ao estudo da música indígena brasileira, livro raro e definitivo da compositora e musicóloga Helza Camêu (ver página 14). Atualmente, estamos atualizando o nosso acervo (incluindo sinopses de todos os volumes) que pode ser consultado no site da SOARMEC (www.soarmec.com.br). Além disso, acabamos de receber, em março, o espaço que há muito tempo estávamos pleiteando, visando à ampliação de nossa biblioteca. Trata-se da sala 206, na qual estão todos os documentos e scripts do arquivo (foto) organizado pelo dedicado funcionário Mário Dias, na década de 80, e que nunca mais foi consultado. O trabalho de organização e catalogação daquele material já está sendo feito pelo mais novo colaborador da SOARMEC, o estudante do curso de Arquivologia da UFF, Alan Vilela de Novaes. Fotos: Renato Rocha Vista parcial da sala, com Alan Vilela, paramentado, em pleno trabalho, e, no destaque, sem máscara. O rádio e a vitrola (ou CD-Player, para os mais contemporâneos) nos dão experiências diferentes da vida. Quando ligamos o rádio, nunca sabemos exatamente o que vamos escutar. No máximo temos idéia do horário dos programas: programa de notícias, de música, de futebol, etc. Mas quando ligamos um programa musical, não escolhemos as canções, ficamos à mercê do programador. Claro que sempre é possível escolher uma rádio “que só toca MPB”, ou “só toca rock”, etc., mas não temos direito a escolhas mais específicas. Na vitrola, o programador somos nós. Ela só toca se a gente disser o quê, e botar pra tocar. Por definição, então, a vitrola só toca o que a gente possui em casa. Temos controle sobre a programação – com a ressalva de que, se quisermos ouvir um disco que não temos, nada feito. Ouvir rádio ou ouvir vitrola, portanto, são experiências de vida distintas. Na infância, toda vez que eu ligava o rádio tinha medo de que tocasse muita porcaria, mas o que esperava era que de repente aparecesse uma música que eu gostava e não tinha em casa, ou então alguma novidade que me fizesse largar qualquer brinquedo com que estivesse me entretendo (ou, de preferência, largar o dever de casa) e correr para junto, para ouvir até o fim e ficar sabendo qual era a música, quem era o artista. Ouvir rádio era um contato com O Mundo. As grandes epifanias musicais da minha vida foram através do rádio. A primeira vez que ouvi Saudosa Maloca, a primeira vez que ouvi Eleanor Rigby, ou The Brothers Four cantando The Green Leaves of Summer, Nelson Gonçalves cantando Vermelho 27, Leny Eversong cantando Granada. Já a vitrola nos transporta para um mundo perfeito porém fechado. Nesse mundo, só ouvimos o que já conhecemos e já gostamos; e é um mundo onde não existe a novidade, a surpresa. Mesmo a possível surpresa tem que passar primeiro pelas nossas mãos, tem que ser comprada ou ganha e colocada por nós para tocar. Assim é a cabeça das pessoas. A pessoa com Cabeça Rádio vive antenada para tudo que acontece em volta, é sempre uma das primeiras a perceber o brotar de novas tendências. Vive plugada nos terminais da Contemporaneidade, sensível ao mínimo estremecimento sísmico da cultura planetária, venha ele da Turquia ou da Provença. O lado negativo disto é que a pessoa tende a se distrair com irrelevâncias, a valorizar besteiras, e a consumir quantidades industriais de lixo cultural. A pessoa com Cabeça Radiola vive em seu mundo perfeito, onde as mudanças só ocorrem com uma lentidão geológica. Torna-se um gurmê de si mesmo, porque de tanto escutar e re-escutar seu próprio repertório passa a conhecê-lo num grau espantoso de sutileza e detalhe. As novidades lhe chegam em conta-gotas. E seu gosto, à medida que se torna exigente e perfeccionista, torna-se também conservador. Só ouve o que gosta, e só gosta do que já conhece. Na vida cultural brasileira temos numerosos e ilustre exemplos de ambos os grupos. Braulio Tavares (extraído do Jornal da Paraíba) Duas perdas Raul Penna Firme Exímio contrabaixista, Raul foi, com os lendários Patané, Luciano Perrone e Célio Nogueira, um dos músicos fundadores da Orquestra Sinfônica Nacional da Rádio MEC, que integrou durante todo o tempo em que ela permaneceu na emissora e mesmo depois de 82, quando a OSN foi transferida para a UFF. Era sócio-fundador da SOARMEC e um amante incondicional da música, tendo participado intensamente dos eventos musicais da cidade. Foi um dos maiores defensores da OSN. 8 José Antônio Cândido de Almeida, “Jaca” Fotos: Arquivo Família Começou bem jovem na rádio, no setor de tráfego do Projeto Minerva, passando depois a trabalhar como datilógrafo e a assinar as laudas com suas iniciais, razão do apelido. Trabalhou depois como assistente de produção e passou a ostentar o bigode farto, que se tornou sua marca fisionômica. Nos anos 80, assumiu a chefia dos operadores de áudio. Aderiu ao plano de demissão voluntária, e retornou à emissora, já no final dos anos 90, passando a trabalhar no almoxarifado. Tinha 49 anos. Quadrante 42 anos depois Fotos: Acervo Radio MEC A partir da esquerda: Manoel Bandeira, Rubem Braga, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Cecília Meirelles e Carlos Drummond de Andrade, na noite de lançamento do Quadrante 1; Dinah Silveira de Queiróz, que remetia suas crônicas da Itália e não esteve presente no lançamento e Paulo Autran. O programa ‘Quadrante’ foi um dos mais famosos do rádio brasileiro. Idealizado pelo próprio diretor da Rádio MEC, Murilo Miranda, o programa consistia em crônicas lidas por Paulo Autran, e escritas pelo maior time de cronistas da época. E o sucesso do ‘Quadrante’ motivou a publicação de dois livros (fotos) com uma seleção das crônicas veiculadas pelo programa, que estreou em 1961 e foi transmitido até 1964, quando saiu do ar por obra e graça do sr. Eremildo Vianna – veja entrevista com Paulo Autran, nesta página. Por um desses absurdos inexplicáveis, o acervo da emissora só possui uma única gravação das centenas de programas que foram feitos. Para suprir esta lacuna, a SOARMEC está fazendo uma parceira com a Editora Casa da Palavra, objetivando publicar um livro-disco, com nova seleção daquelas crônicas e um CD com 14 delas, gravadas 40 anos depois pelo próprio Paulo Autran. Arte de ser feliz crônica de Cecília Meirelles para o programa Quadrante H Houve um tempo em que a minha janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma regra: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros, e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim. "Murilo Miranda era um homem que tinha trânsito por todos os meios intelectuais do país. Era amigo pessoal de Mário de Andrade. Existem cartas de Mário para ele e dele para Mário, maravilhosas. Era um homem com uma visão extraordinária sobre cultura. E ele teve a idéia de fazer o programa Quadrante, que eram cinco minutos em que eu lia crônicas. E os cronistas eram a nata da inteligência do Rio de Janeiro. Então, era um programa privilegiadíssimo. Durava no máximo cinco minutos, que era o tempo de leitura da crônica. Ia ao ar às oito horas da noite e era reprisado no dia seguinte, ao meiodia. Era um dos programas de maior audiência. O sucesso do Quadrante foi uma coisa extraordinária, na época, porque a Rádio MEC nunca teve a pretensão de rivalizar com nenhuma rádio comercial. Foi a primeira vez na história da Rádio em que um programa teve mais audiência que os programas das rádio comerciais. Às vezes eu falava com alguém pelo telefone e a pessoa perguntava: "Não é o Paulo Autran? Estou reconhecendo sua voz da Rádio MEC". Isso aconteceu inúmeras vezes. Quando foi editado o livro Quadrante, na noite de autógrafos, o Carlos Drummond de Andrade escreveu uma das coisas que mais me envaidecem em minha carreira. Ele escreveu: "Para o Paulo Autran, que transformou em arte todos esses meus modestos trabalhos". Pode até ter sido ironia dele, mas não era. Ele era muito sincero, uma pessoa extraordinária. Quando veio o golpe militar, a Rádio MEC caiu nas mãos de um senhor chamado Eremildo Viana que, se tinha cultura, se tinha conhecimento, não demonstrava. Ele queria mesmo era acabar com todo e qualquer programa que tivesse liberdade artística de escoha ou qualquer coisa assim. E então ele acabou com o Quadrante." (trecho de entrevista ao Amigo Ouvinte, em abril de 1999) Foto: Clara Zuñiga ouve um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa, e sentia-me completamente feliz. Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém minha alma ficava completamente feliz. Houve um tempo em que a minha janela se abria para uma terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não a podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, e às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz. Paulo Autran recorda 9 Entrevista com Lilian Zaremba (continuação da página 7) Foi aí que você se tornou locutora de seus textos? Foi. Com a redução drástica de locutores, a Rádio, num determinado momento, sem poder contratar ninguém, decidiu que os próprios produtores gravariam seus programas. Para mim, esse momento foi um divisor de águas. Lembro bem do primeiro dia em que fui gravar. O técnico era o Mario Jorge, com quem eu trabalharia muito tempo. Depois que li o texto, o Mário disse: “Sinceramente, sem querer ofender, sua voz é muito ruim” . De fato, escrever é uma coisa, e ler em voz alta é outra. O escritor Raduan Nassar, diz que "as palavras são sementes". Concordo, totalmente. Depois que saem da sua boca, não pertencem mais a você: criam vida própria. O que você diz, a maneira como diz, a sua voz, o ambiente em que é ouvida sua fala, a disposição de quem capta esta fala – são tantas as variantes a serem consideradas... E nunca essas questões todas tinham me assombrado, antes de me colocarem o desafio de ler meu próprio texto. Foi então que comecei a aprender a escrever. Até ali, me parece, apenas reproduzi textos colando idéias alheias, formas extraídas da literatura onde garimpava informações dos livros de história da música e contra-capa de discos, basicamente. Passei a entender que um texto radiofônico precisa observar a dinâmica da própria fala, e que este texto terá sua própria forma musical. Um belo texto pode ser destruído por uma leitura equivocada. Existe ritmo, existe respiração, entonação, articulação, textos e sub-textos, informação direta e indireta – um mundo se abriu ali para mim. E eu percebi que a minha voz era tudo, menos profissional nos moldes requeridos. Mas, ao mesmo tempo, esta voz passou a ser adequada para meus textos, porque, basicamente, era eu quem estava ali emitindo opinião. Aprendi então que podia escrever para mim ou para outros. Foi o momento em que comecei a prestar mais atenção na maneira de falar e na voz de cada um. Hoje, quando alguém fala, muitos detalhes me chamam atenção. Adoro trabalhar com profissionais como Eduardo Fajardo, Daniela Lapidus, Luciano Gama, Luiz Nascimento, vozes lindas, cabeças pensantes e profissionais dispostos a ousar e transformar a fala em muitas possibilidades de comunicação. É uma tremenda inspiração para mim. O rádio impõe um padrão de locução, que, quase sempre, está longe do falar do homem comum. Como você vê isso? A discussão em torno da "voz no rádio" é bastante interessante e atual. A experiência radical e vitoriosa da Fluminense FM pode ser um exemplo brasileiro emblemático desta mudança nos padrões de locução radiofônica. Recentemente, fiz um 10 programa sobre isso – porque hoje minha voz está envelhecida e como toda voz envelhecida, acrescida de asperezas ou rugas, se quiser uma metáfora. Mas sempre lembro do Tom Jobim e sua música "Luiza". A gravação que ele fez é, sem dúvida alguma, a melhor. Inclusive foi utilizada na abertura de uma novela da Globo, subvertendo sutilmente o "padrão globo de qualidade" no horário de maior audiência. E porque aquela voz, cheia de imperfeições supostamente inadmissíveis é a melhor? Porque transmite algo além do texto: um sub-texto pessoal. Podem chamar de emoção, sentimentos, o que seja. Eu chamaria de identidade, e, de fato, a voz é uma impressão única, pessoal. A idéia deste original sem cópia nos aproxima de nossa humanidade: somos todos e só um. E você está mais satisfeita com sua voz hoje? Atualmente, quando possível, prefiro trabalhar com locutores e deixar minha voz para textos específicos, de opinião crítica. Me parece o mais adequado dentro de uma grade e um padrão sonoro como o da MEC-FM. Gosto do fato da MEC-FM possuir várias falas, não impondo um padrão rígido, fechado, cansativo, como as outras emissoras em geral. Mas acredito que tudo deva ser balanceado, alternando informações e textos lidos por locutores profissionais. A diferença entre as falas, misturando produtores e locutores – afinal o Jorge Ayer, Nelson Tolipan, Servio Tulio, Lauro Gomes, e outros também gravam seus próprios programas – criam um design sonoro e a ilusão de intimidade aproximando o público ouvinte... é incrível ser reconhecida pela voz, e isso já me aconteceu várias vezes. Qual programa que você produziu depois? Nesta mesma época em que passei a gravar meus textos, produzi uma nova série, voltada para o repertório dos séculos 17 e 18. Depois de dez anos produzindo o Música Barroca, resolvi pedir para os ouvintes enviarem suas opiniões. Não havia internet na época e recebi só duas cartas, ambas solicitando informações, digamos, equivocadas. Uma delas me pedia o endereço do lugar aonde se vendia facsímiles – isso porque eu fiz um programa falando das partituras de música barroca, muitas vezes impressas em cópias fac-símiles. Mas nada disso tinha ficado claro: eu tinha sido extremamente incompetente e soube nesse exato momento o tamanho do prejuízo. Até ali, muito pouco do que fiz se comunicou. Basicamente, era a música quem comunicava algo – o texto, não. Ao invés de informar, confundia. Acho que posso resumir assim: a partir do final dos anos 80, comecei a tentar elaborar um discurso radiofônico próprio. Acho que as produções realizadas nos anos 90, especialmente depois da série Rádio Mutandis (1997-99), já mostram um roteiro com escrita pessoal. Neste programas trabalhei a questão do tempo localizado neste momento histórico da passagem de milênio. Mutatis mutandis, expressão em latim, cuja tradução seria “mudar o que precisa ser mudado” pareceu o texto exato para comunicar este sentido dos acontecimentos mun- Foto: Gustavo José Meyer Prata da Casa diais no micro-universo individual daquele tempo radiofônico. Narrativa na primeira pessoa, utilizando muita informação musical diferenciada: misturas como Steve Reich e música tradicional balinesa, até porque, todos sabem, Reich estudou música asiática. Ainda em 1999, produzi o Rádio Atlas, série sintonizada na beirada mesmo do novo milênio e nas preocupações com este futuro já presente: super-população, globalização, devastação ambiental, intolerâncias múltiplas, etc. O roteiro misturava informações objetivas com leituras diferenciadas, utilizando poesia sonora e referências de todo tipo de cultura. Depois dessas séries veio Radioesfera. Nesta série aconteceu o encontro com Eduardo Fajardo, uma das maiores felicidades que tive. Poder escrever para alguém que possui o dom da voz, e mais que isso, o dom da fala, é para mim um luxo. É visível o salto do meu texto nos roteiros que escrevo para o atual Música em cena, série dedicada à arte musical conjugada a outras linguagens (cinema, dança, artes plásticas, novas mídias), que faço, agora, com narrativa do Fajardo. Além disso, comecei, em 2004, a série Rádio Escuta, realizando roteiro, produção e apresentação. Com ela, procuro atender à crescente demanda de ouvintes interessados nas várias produções de arte sonora, oferecendo um panorama auditivo, com documentários radiofônicos, paisagens sonoras, poesia sonora, radioarte e o repertório da música de concerto. Em que momento você decidiu pensar o rádio na Academia, fazendo mestrado e doutorado? Depois da experiência em Arquitetura, ingressei na PUC do Rio de Janeiro, e, em 1981 me graduei no curso de Licenciatura em História. O treinamento para pensar e expressar idéias – porque pensar, acredito, é também uma questão de exercício – foi determinante durante as provas no concurso para mestrado. Mais ou menos dez anos marcavam este hiato entre o fim do curso de História e o início do curso de Mestrado em Comunicação e Cultura. Um tempo que não chegou a passar totalmente em branco porque o trabalho na Rádio sempre exigiu muita leitura, pesquisa, informação. Não estava desatualizada, mas sentia necessidade de receber novas opções, ferramentas, para ampliar o exercício da reflexão. (continua na página 12) A centenária Maria Muniz Foto: Renato Rocha Foto: Acervo Rádio MEC E la foi a primeira funcionária pública a ser designada pelo Ministro Capanema para trabalhar com Roquette-Pinto na Rádio Ministério da Educação. Ela conheceu René Cavé quando ainda era locutor. Ela foi quem trouxe Carlos Drummond de Andrade para a Rádio, e quem produziu o primeiro programa do poeta – uma espécie de entrevista em que ele respondia com trechos de seus poemas. Ela fez de tudo na emissora: foi produtora, redatora, apresentadora, diretora de programação e...protetora dos funcionários perseguidos pelo temido Eremildo Vianna. Ela foi uma das vozes mais conhecidas do rádio brasileiro. Ela foi, por sua importância, a escolhida para dar o primeiro depoimento da sessão A rádio do meu tempo, neste jornal. Ela está fazendo 100 anos em outubro e, em sua homenagem, será editado um livro produzido pela editora Andrea Jakobsson Estúdio e pelo Instituto Ricardo Cravo Albin, com texto de Luiz Antônio Aguiar e depoimentos de Fernanda Montenegro, Paulo Autran, Hermínio Bello de Carvalho, Telmo de Avelar, Sergio Brito e vários outros colegas do rádio e das artes. Parabéns para Maria e parabéns para Mayra Jucá, a pesquisadora e autora da teses de mestrado que deu origem ao livro. As Rádios AM da cidade do Rio de Janeiro É na parte da manhã que as 20 rádios AM em funcionamento no Rio de Janeiro apresentam maior índice de audiência, e quase todas primam pelo caráter popular, quando não popularesco. Quem "passear" pelo dial constatará que as rádios Globo, Tupi, CBN e a rádio Rio de Janeiro (protestante) são as únicas a investir na "estética" de sua programação, com produção de jingles, vinhetas e efeitos. A Rio de Janeiro chega inclusive a inserir radioteatro em sua grade. Isso tudo, entretanto, não as descaracteriza como rádios populares, pois há um claro investimento nesse sentido, o que tanto pode descambar para o popularesco, ou para um opção musical menos mercantil, como é o caso da MEC AM, que apresenta programação popular de qualidade. Na tabela você encontrará as freqüências, o estilo e os proprietários das 21 emissoras AM do Rio de Janeiro, e poderá conferir: metade é de cunho religioso. Rádios Dial Estilo Proprietários Livre Rio de Janeiro Bandeirantes Boas Novas Tupi Globo Mundial Nacional Metropolitana Capital Record Boa Vontade Tamoio CBN MEC Manchete Carioca Copacabana Roquette-Pinto Relógio Canção Nova 1440 1400 1360 1320 1280 1220 1180 1130 1090 1030 990 940 900 860 800 760 710 680 630 580 540 Eclética Espírita Eclética Evangélica Eclética Eclética Música de Sucesso Eclética Eclética Evangélica Evangélica Evangélica Evangélica Notícias Cultura e MPB Evangélica Católica Evangélica Fora do ar Evangélica Católica José Wanderley Gomes da Silva Fundação Cristã Espírita Cultural Rede Bandeirantes Ass. Promotora de Evangelismo Diários Associados Sistema Globo Sistema Globo Governo Federal Paulo e Ricardo Bernardo Masset Igreja Pentecostal Deus é Amor Igreja Universal Legião da Boa Vontade Grupo Verdes Mares Sistema Globo ACERP / Governo Federal Waldir Derino Padres Paulinos Igreja Universal Governo do Estado do RJ MIssionário R.R. Soares Fundação João Paulo II Lucas Dain e Renata Mello 11 Prata da Casa Entrevista com Lilian Zaremba (continuação da página 10) A Academia enriqueceu o seu trabalho? Fui fazer o mestrado da escola de Comunicação da UFRJ, porque queria refletir sobre meu trabalho radiofônico, e no dia a dia isso era impossível. Você pode trabalhar a vida inteira em rádio e desconhecer quase totalmente o assunto – pode estar limitado à execução de tarefas com um mínimo de reflexão e informação a respeito delas. As aulas na ECO me levaram a pesquisar outras formas radiofônicas, ampliando minha capacidade de produzir. Reuni alguns destes textos em três publicações intituladas "Rádio Nova, Constelações da Radiofonia Contemporânea" (foto) que organizei durante o mestrado e doutorado. A biblioteca da SOARMEC possui os volumes. Além dessa publicação, organizei o I Radio-Forum do Rio de Janeiro, reunindo importantes profissionais de emissoras nacionais e estrangeiras, em seminários e audições no CCBB. Tenho trabalhado junto a pesquisadores levando suas idéias para o Rádio, e tentando atingir especialmente o público universitário, interessado em ampliar suas possibilidades profissionais. Além de seguir publicando estudos, participando de congressos e bienais, e conectada a grupos de estudo e discussão, desenvolvendo projetos em radiodifusão multimídia e um BLOG na Internet. 12 Vários programas seus pensam a linguagem radiofônica. Como você começou a elaborá-los ? Minha tese de mestrado foi uma comparação entre a produção radiofônica de Orson Welles e a de Glenn Gould. São dois exemplos ricos e únicos – até porque Welles trabalhou no rádio ‘comercial’ e Gould, no rádio ‘público’. Em que pese a diferença de tempo entre as duas produções – Welles nos primeiros anos do rádio e Gould já na era da quadrophonia –, me pareceu justo destacar o que apresentam em comum: a grande aventura da escuta. Até que ponto os programas de Welles são comerciais, e até que ponto Gould é rádio? Essa discussão é interessantíssima, mas longa. Na verdade, ando até hoje discutindo isso...Vinicius de Moraes disse certa vez que ‘na boca de Orson Welles a palavra tem gosto de maçã mordida’. Acho fantástica essa idéia, ao mesmo tempo sensual e gulosa. O poder da voz na expressão da fala talvez tenha sido um dos maiores legados de Welles ao rádio. Já Glenn Gould se propôs a retirar música das palavras, construindo na edição de várias falas o seu radiodocumentário contrapontístico. Depois dos estudos, esta disposição para pensar a formulação da linguagem radiofônica se introjetou em meu trabalho de tal forma, que já não sei o que separa meu texto disso. Foto: Lucas Mello O que a Academia pode fazer pelo rádio ? Talvez a Academia possa fazer pelo rádio tanto quanto pôde fazer pelo meu trabalho no rádio. Eu procurei o curso de Comunicação da ECO/UFRJ por causa de sua multidisciplinaridade. Estudei música, história social e política, então me faltavam as linhas mais gerais do conhecimento dos modelos comunicacionais. Existindo na ECO uma área na graduação dedicada ao radialismo, imaginei estar entrando no lugar certo. O curso de mestrado reúne excelentes professores, pensadores, profissionais com os quais se aprende ouvindo, lendo e observando. Chegava com mais de quinze anos de prática em comunicação radiofônica, mas levei um certo tempo para entender o ritmo da produção acadêmica. É completamente diferente. Nos moldes em que se coloca hoje esta pergunta, Academia e Rádio (falando em Rádio MEC mais especificamente) estão bastante distantes. Existem grandes diferenças institucionais, assim como profundo hiato entre as emissoras comerciais e públicas. É assunto extenso, mas se houver vontade política, é claro que estreitar laços só dará lucro a ambas as partes. Fale a respeito desse Blog. Depois de levar um puxão de orelhas de meu amigo, o músico, produtor e webmaster Servio Túlio, resolvi mergulhar na multimídia, o que requer a coragem para abandonar velhos hábitos e adquirir novas habilidades. E assim, iniciei em 2004 um BLOG, primeiro passo para a utilização de ferramentas que deverão me conduzir à radiodifusão multimídia. Como você descobre os temas do Rádio Escuta ? Todos os caminhos levam a Roma. Posso achar um CD numa lojinha, ou é um amigo que me traz de viagem algum. Também troco informações com pesquisadores, compositores, regentes, artistas plásticos – muitos pela internet. Existe ainda o diálogo com os colegas antenados como é o caso do Sérvio Túlio. Fora isso, também costumo viajar, vasculhar sebos, frequentar eventos de poesia sonora... uma coisa acaba levando a outra. Tenho feito também muitas entrevistas e neste caso, os convidados levam seu material sonoro. Vez por outra alguém diz: essa música é a cara dos programas da Lilian. Fico pensando neste padrão, porque, a rigor, faço programa com música de tudo que é tipo. Agora na série A Música em Cena (programa semanal sobre trilhas para cinema, teatro, dança e artes plásticas) apresento músicas bem populares, até. Mas o que fica de uma informação? Será aquilo que você se lembra, identifica, ou aquilo que marcou de alguma forma indelével a sua memória ? A agilidade e prestação de serviços são as principais qualidades do rádio. Você concorda ? Cada vez mais me convenço, em vários níveis, da dificuldade em ser simples. Porque acaba sendo muito complexo ser simples ! Agilidade e prestação de serviços são qualidades abstratas materializadas nos objetivos: é comercial ou pública ? Pretende-se gerar a venda de produto ou a produção de conhecimento? Saindo desta seara realmente complexa diria que existe outro motivo talvez até banal para o rádio ser ágil, conciso e prestador de serviços: a falta de paciência para ouvir. Isto é um fato: frases longas, cheias de informação, simplesmente são descartadas em geral. A maior parte das pessoas ouve mas não escuta. Escutar é querer ouvir, elaborar o que se ouve. Por isso coloquei o título desta minha última série radiofônica de Rádio Escuta. A radioarte tem espaço nas rádios comerciais ? Esta categoria ‘radioarte’ vem sendo sistematizada a partir de trabalhos desenvolvidos sob parâmetros da arte sonora acústica e eletroacústica. Costumam diferenciar ‘radioarte’ de ‘arte do rádio’, sendo a fronteira entre estas classificações um debate infindável. Então, segundo essa classificação meio difusa, os radiodocumentários de Glenn Gould seriam ‘radioarte’ e os programas de Orson Welles, ‘arte do rádio’. Então, para responder sua pergunta em poucas palavras, diria que existem dois aspectos possíveis: o primeiro diz respeito ao circuito de ‘arte sonora’ – os festivais, as bienais, a produção experimental, universitária, as salas de concerto, etc. Outro aspecto seria a utilização de idéias da arte sonora, ou radioarte, levadas parcialmente ou adaptadas para esquemas comerciais. Muitas vezes assistimos comerciais de propaganda que se valeram das artes plásticas. Ouvimos também músicos como Quincy Jones ou Miles Davis incluírem sonoplastia em suas músicas, e ouvimos emissoras de rádio onde a construção da locução se confunde com a música, seja rap, hip-hop, enfim, criatividade para além dos padrões de uma emissora comercial tradicional. Eis aí porque afirmo que já existe radioarte no radio comercial. Quando se busca audiência, reinvenção ou renovação são palavras indispensáveis. Costumo convidar diferentes profissionais para gravar programas comigo. Por duas razões: primeiro porque desta forma consigo trazer novas informações, material não disponível usualmente no mercado. Em segundo, porque é nesse diálogo que meu trabalho caminha. Gravei por exemplo um especial com o músico e designer sonoro Luís Eduardo Gomes. O material apresentado por este artista expõe verdadeira arte sonora, numa relação extensa com a cultura musical dita "de concerto" e ao mesmo tempo incorporando informações do entretenimento audiovisual. Para mim foi um mundo que se abriu com novas maneiras de trabalhar a mensagem radiofônica. Acredito ser esta uma maneira da emissora se aproximar dos novos ouvintes. (continua na página seguinte) Prata da Casa Entrevista com Lilian Zaremba (continuação da página anterior) Foto: Acervo Pessoal Um centro de estudos para o rádio educativo aceitando imagens, textos, links, navegação, etc. Existe uma certa cisão entre os que acreditam ser o web-canal outra mídia, não existindo web-rádio. É assunto bastante novo, ainda em evolução, mas de qualquer forma, me parece, o rádio já lucrou. São inúmeras as inforpesar da caAssim, nosso prinmações de todo tipo sobre o universo da rência educipal objetivo é criar radiofonia na WEB. O rádio, mais do cativa e culum Centro de Esque visualidade, ganhou, neste primeiro tural, o Brasil está tudos para o rádio momento da internet, visibilidade. longe de esgotar as educativo e cultural, possibilidades eduapoiado em nossa O que você diria para concluir? cativas e culturais Biblioteca Tude de Para tentar encerrar o assunto lembrarei do Rádio – um veíSouza – a única do o título de uma sessão deste jornal: ‘A culo tão barato, opepaís especializada em rádio do meu tempo’. Antes de mais na- racionalmente, que assuntos radiofônicos da, estou com o Paulinho da Viola quan- chega a ser income cujo acervo seria do afirma ‘meu tempo é hoje’. Mas não preensível o segunampliado, significatiposso deixar de reconhecer que o tempo do plano a que foi vamente, durante o para o rádio também passou, marcando relegado. Assim, videsenvolvimento do seus caminhos. Os estúdios digitaliza- sando contribuir paprojeto – , e também dos, a equipe renovada, a incorporação ra que o país possa em uma página na de novas atividades no trabalho, deman- saldar seu comprointernet construída das da audiência e inúmeras alterações misso constitucional especialmente para tecnológicas e culturais sinalizaram o com o rádio que essa finalidade. Além passar desses anos. A importância da educa e leva cultura, disso, objetivamos cultura técnica no rádio é algo a merecer os Amigos Ouvintes incrementar nossa adestaque. Costumo afirmar que 50% do querem reunir o parelhagem de pesresultado depende do operador de áudio. maior número possíquisa e consulta. Aprendi e aprendo muito com estes pro- vel de dados a resAtualmente, nossa fissionais especiais, conhecedores pro- peito do assunto, pabiblioteca atende, de fundos, ouvidos atentos e espertos aos ra poder traçar um 2ª a 6ª, estudantes e diferentes padrões musicais, vocais, diagnóstico da situapesquisadores intesonoros. Betinho Monteiro, Ribamar ção atual, de seu hisressados na história e Mendes, Sergio Muniz, André Luís tórico e, principalno fazer radiofônico. Rebelo, Edu (Eduardo Caetano), José mente, traçar persAmpliando o nosso Monteverde, Mario Jorge, Dinho (Oli- pectivas para o fugrau de ação, pretenvaldo Meireles), Haroldo, Eduardo Lei- turo. Entendemos demos recolher e torte, Cacá (Oscar Santiago), Cosme Ubi- que, para conseguir nar disponível, para racy, Ary André e Nilton Queiróz, po- situar no contexto consultas na Bibliodem se considerar co-autores de meu contemporâneo o teca, material bibliotrabalho. A Rádio MEC foi – e continua papel de uma emisgráfico, filmico e sosendo – a grande escola de rádio que já sora educativa, prenoro sobre o rádio frequentei. Aprendi trabalhando e gos- cisamos compreeneducativo / cultural; taria de poder passar adiante o que a- der em profundidaidentificando, Ilustração: Eric Fraser prendi, caso julguem de interesse e de o que foi o pioclassificando e disutilidade. É impossível imaginar alguém neiro Colégio do Ar, qual foi a in- ponibilizando informações amplas e progredir neste modelo do futuro sem fluência do MEB na educação a dis- atualizadas na Internet e em outros saber utilizar diferentes programas e e- tância, e o que nos ensinam as expe- meios; além de organizar um fórum feitos. Rádio por satélite, rádio no celu- riências internacionais. Há outras on-line que privilegie a troca de inlar, rádio digital e o podcasting (veja interrogações, não menos importan- formações e a avaliação das experimatéria página 14) dão conta de novos tes, que também devem ser respon- ências brasileiras e internacionais formatos para a transmissão de mensa- didas, como, por exemplo, a ques- neste campo; além de criar e manter gens. O nome ‘rádio’ vai absorvendo tão das novas tecnologias. De que um laboratório para o desenvolvinovos corpos, mas nada diferente de sua forma as possibilidades do Rádio se mento das possibilidades radiofôaventura inicial. Afinal, para quem não somam às da internet, no que diz nicas e educativas, através da se lembra, entre os primeiros nomes da- respeito à educação a distância? Co- internet, para uso na rede e fora dos a esta comunicação humana encon- mo o rádio deve se adequar às novas dela; bem como fornecer material tra-se o luminiferous aether, ou seja, o tecnologias, de modo a mantermos para escolas, associações e instituéter luminoso, substância improvável viva a idéia roquettiana de uma ições, que trabalhem com rádioassim como os nossos melhores sonhos, utilização plenamente civilizatória educação e capacitação voltada para que acabam, de algum modo, se dos meios de comunicação? o veículo. transformando em realidade. A Guilherme de Souza, Lilian e Paulo Neto Uma nova rádio requer um novo ouvinte, ou produz ouvintes novos? Sou mãe e acredito e não acredito na formatação dos ouvidos. Positivamente existe a necessidade de passar conhecimento por uma questão de querer auxiliar o próximo, mas sabemos que este próximo só poderá ser auxiliado se quiser e, mesmo assim, será imprescindível avaliar criticamente nossa sabedoria preponderante. A proposta de uma nova rádio deve estar sintonizada com os rumos que uma sociedade quer e precisa tomar. Havendo diálogo inteligente as partes caminham bem, evoluem. Sintonizar este diálogo é tarefa do profissional. A internet ajuda ou não o radialista ? A radiodifusão multimídia é uma realidade que veio para ficar. Assim como a imprensa, a internet pode transformar alguma parte da aventura radiofônica em objeto obsoleto. Isso aconteceu com o livro. As iluminuras medievais, os livros artesanais, ilustrados um a um, tornaram-se obras de arte, guardadas em museus ou bibliotecas. Eles não envelheceram, alcançaram novo status. Quem primeiro elucidou esta questão foi Marshall McLuhan. Para ele, o livro não iria sumir frente a onipresença das telas do computador. Pelo contrário, o livro se tornaria obsoleto, adquirindo uma forma de arte. Obsoleto não é velho nem antigo. Acredito que isso possa acontecer com certo tipo de rádio – não sei bem qual. Mas este formato, a radiodifusão multimídia, emerge como nova ferramenta, introduzindo novos conceitos. Minha tese de doutorado sobre a nova cultura radiofônica, tratava justamente de observar esta passagem: do rádio sem imagens, apoiado na produção de sentidos via audição, para este outro múltiplo, 13 Radiodifusão: futuros possíveis Galeria Rádio MEC P Helza Camêu (1903 -1995) “A produção de Helza Camêu como compositora é bastante reduzida, mas suficiente para mostrar com clareza uma grande força expressiva, uma fértil imaginação e sobretudo, uma total fidelidade aos cânones da escola nacionalista da música brasileira.” Edino Kriger Foto: Acervo Rádio MEC Foto: Acervo Biblioteca Nacional Foto: Acervo Biblioteca Nacional C ompositora, pianista, musicóloga, pesquisadora e divulgadora da música brasileira, Helza de Cordoville Camêu começou a estudar piano com a professora Paula Ballariny, aos 7 anos. Aos 16, passou a estudar com Alberto Nepomuceno, e, aos 20 anos, realizou seu primeiro recital. Continunado os estudos, Helza passou a dar mais ênfase à sua veia de compositora do que a de pianista. A partir de 1934, suas composições começaram a se tornar conhecidas, e, pouco depois, premiadas. Em 1936, seu Quarteto de Cordas Op.12 ganhou o 2º prêmio em concurso promovido pelo Departamento Municipal de Cultura de São Paulo. Em 1944, recebeu o 1º prêmio do concurso promovido pela Orquestra Sinfônica Brasileira, com o poema sinfônico Suplício de Felipe dos Santos. Em 1955, ingressou na Rádio MEC, onde trabalhou em diversos setores, com destaque para a produção do programa Música e músicos do Brasil, que dividiu com Edino Krieger, Adhemar Nóbrega e Alceo Bocchino. Em 1977 lança seu primeiro e único livro editado, a importantíssima Introdução ao estudo da música indígena no Brasil. Este livro é considerado o mais completo estudo da música indígena brasileira, da sua prática e processo de formação, bem como dos instrumentos nela utilizados, incluindo sua classificação e descrições do material empregado em sua fabricação. Num trabalho que abrange quase 5 séculos, Helza examina as várias peças musicais transcritas e gravadas, detendo-se em suas características melódicas, intervalares, rítmicas e cromáticas, comparando-as com as manifestações musicais de hoje. Helza faleceu aos 92 anos de idade, deixando um livro inacabado: Tempo e música – um estudo sobre a música brasileira dos séculos XVI ao XX. Os originais deste livro, bem como diversas de suas partituras, estão disponíveis para consulta na divisão de música da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Helza ao piano e na discoteca da Rádio MEC 14 revisões futurísticas podem estar batendo à nossa porta e, logo logo, poderemos usufruir das mais novas tecnologias radiofônicas, como o radio digital, o rádio por satélite ou celular, dos quais o leitor já ouviu falar; e do podcast, que quase ninguém sabe o que é. Entre as vantagens das novas tecnologias está a melhoria do sinal, a possibilidade de haver mais estações no mesmo espaço do dial, e também o advento de outro modo de utilizar o rádio, com o ouvinte podendo escolher a melhor hora para ouvir seu programa favorito. Inicialmente, como não podia deixar de ser, todas as inovações implicarão em custos para o consumidor: o rádio por satélite requer uma assinatura; o digital, por sua vez, requer um aparelho com condições de recepção digital; o rádio no celular também implica em custos extras pelo serviço, e o podcast – fusão das palavras iPod (aparelho que toca áudio em formato MP3) com casting (difundir) só é possível, também, se o usuário tem um aparelho com condições de armazenar e reproduzir os áudios baixados da internet. O custo das novidades tecnológicas não representa um problema em países como os EUA. Juntas, as duas companhias norteamericanas que trabalham com rádio por satélite (Sirius Satellite e XM Satellite), já somam 5,3 milhões de assinantes, que gastam de 65 a 170 dólares por um aparelho receptor, e cerca de US$ 10 dólares mensais pela assinatura. Outro número significativo é o de vendas de música na internet pelo sistema iTunes, da Apple: 22 milhões de usuários. No tempo das ondas curtas, qualquer rádio a pilha poderia, quando em boas condições de recepção (à noite, por exemplo) captar o áudio de emissoras de outros continentes. A BBC, que foi uma das últimas a transmitir em ondas curtas (de longo alcance) é também uma das pioneiras em transmissão de rádio digital. No sítio www.bbc.co.uk/digitalradio há a explicação de como ouvir a emissora. Sistema digital Assim como a TV, o rádio também sofrerá, em poucos anos, uma mudança do sistema de transmissão analógico para o digital. Em relação à TV, o Governo brasileiro optou por montar um sistema próprio, diferente dos utilizados em outros países. Mas para o rádio ainda não se decidiu qual modelo será adotado. Tudo o que se sabe é que as ondas médias (AM) serão as primeiras a se beneficiarem da nova tecnologia. Segundo o assessor da Casa Civil, André Barbosa, os testes com o novo sistema digital começaram em maio utilizando o modelo da Digital Radio Mondiale – consórcio internacional que reúne emissoras como a alemã DW e a BBC inglesa. Há alguns anos chegou-se a cogitar que o BNDES iria destinar verbas para auxiliar os telespectadores a trocar seus aparelhos, quando a mudança ocorrer, mas não se falou em financiamento semelhante para o rádio. Alguns países estão resolvendo o problema em questão utilizando sistemas que permitem ao ouvinte que só possui aparelho analógico, a continuar recebendo o sinal de sua emissora, sem no entanto se beneficiar da melhoria da qualidade do áudio. Nós, os sem dólares. Apesar de nossa notória defasagem no tocante ao percentual de usuários de computadores e internet (apenas 8% da população), não são poucas as estações de rádio, inclusive comunitárias, que têm na rede mundial de computadores um grande aliado – tanto para a simples divulgação de sua existência quanto para a transmissão de programação ao vivo, o que mundializa o alcance de qualquer emissora. Redes sem centro Há também uma outra maneira de utilização da internet que pode ser vista como um promissor embrião de uma rede radiofônica, na qual os programadores de rádio poderão baixar programas de produtores independentes ou entidades como a Fundação Palmares, que oferece em seu sítio diversos programas dedicados à cultura negra (www.palmares.gov.br). É possível também que essa rede sem centro garanta o status de meio democrático ao rádio. De fato, mesmo com os custos das novas tecnologias, o esperado barateamento progressivo da produção e a difusão de programas em escala mundial, podem colocar o rádio mais próximo do sonho de Bertold Brecht: dar voz a quem o ouve. por Adriana Ribeiro. A importância do rádio educativo: um depoimento P Foto: Adriana Ribeiro elos idos de 58/59 o professor de matemática Misael Cabral (foto) passou um período na cidade do Rio de Janeiro, procurando trabalho. Tinha então 27 anos. Como não era qualificado profissionalmente, encontrou enorme dificuldade e acabou voltando para a casa dos pais, em Caxias. Desempregado e desestimulado, quase não saía de casa. Isso o fez procurar no rádio um passatempo, e, felizmente, mais do que um passatempo, encontrou no rádio uma formação. Começou a ouvir a Rádio MEC, que, na época, além de excelente programação musical, segundo o professor, contava também com cursos completos em sua grade. Ele não perdia uma aula. Mas foi ouvindo as aulas de matemática do professor Jayro Bezerra que Misael despertou para sua vocação."O professor Jayro Bezerra resolvia os problemas de matemática de forma pedagógica". A partir daí ele começou a dar aulas particulares de matemática, utilizando a didática aprendida no rádio. Foi quando um colégio em Caxias ficou sem professor e ele conseguiu seu primeiro emprego oficial, graças a seu conhecimento de matemática. Depois, prestou vestibular e ratificou sua vocação diplomando-se pela UFF e tornando-se professor universitário. Misael, que já lecionou na UFRJ, também deu aulas na rede pública, onde foi colega, coincidentemente, do próprio Jayro Bezerra, a quem pôde confessar a importância das aulas irradiadas pela MEC. Para Misael Cabral, atualmente deficiente visual, o rádio é um dos melhores companheiros. "É um veículo que aproxima o comunicador de sua audiência, mais do que a televisão. O profissional do rádio se esmera, porque só tem a voz para comunicar". Casa Beethoven de Pianos NOME E TRADIÇÃO NA VENDA, COMPRA E TROCA DE PIANOS NOVOS OU USADOS, DE CAUDA, APARTAMENTO E ARMÁRIO. Rua Riachuelo, 390 - Centro - RJ Tels: (021) 2232-5209 / 2242-2365 Fax: (021) 2222-2791 / Celular: 91614600 Adágio Músicas e Instrumentos Ltda. Partituras, Métodos e Álbuns em geral Conserta-se instrumentos musicais Vendas em consignação Jandira S. Lopes - Gerente Praça Tiradentes 9 sala 308 - Centro - RJ Tel/Fax: 2220-0846 Tribuna "Hoje é primeiro de abril, o dia da mentira, e engraçado ontem parece é que foi o primeiro de abril para os ouvintes da Rádio MEC, porque por cinco vezes a programação foi interrompida e era um ruído extraordinário e depois o locutor ao voltar a programação não pedia desculpas, uma coisa horrorosa. Eu espero que isso não se repita, porque o prejuízo é só nosso, isso é, só do ouvinte." Leda Machado, Rio de Janeiro, RJ "Sou ouvinte assíduo da Radio MEC e gostaria de saber por que o sinal de transmissão da AM e da FM está precário e por que não estão dizendo os nomes dos compositores na "Planilha Musical" da madrugada?" Ricardo Garcia Souza, Campo Grande, RJ "Gostaria que os programas que são gravados ao vivo, ou as preciosidades de Artur da Távola e Ricardo Cravo Albin fossem comercializados à pedido dos ouvintes e sócios. Assim como fazer as gravações, que seja acessível à consulta." Edéia Braga, Ilha do Governador, RJ NÚMEROS DA CAO Tabulação feita por Renata Mello, com base nos relatórios semanais da Central de Atendimento ao Ouvinte, de 1 de dezembro a 31 de maio de 2005 . Total de ligações: 3203 em 182 dias, numa média de 17,59 ligações por dia MEC FM MEC AM Total de ligações • Para o Caderno 800 • Para o Cia. do Samba • Informações e Sugestões • Elogios • Críticas • Reserva Ao Vivo ent. Amigos • Debate MEC • Pedidos de Grade • Fala Geral • Manhã de Notícias • Canta Brasil • Programação (vários) • Altamiro Carrilho • A fina flor do samba • Programação (vários) • MEC Instrumental • Nossa Música • Concerto MEC • Foleviola • Mulherio • Roda de Choro • RCA • Oficineiros da Inclusão • Pedido musical • Promoção • Momento de Jazz 1989 110 93 119 163 34 657 254 3 82 203 1 130 3 4 130 2 2 5 3 1 2 1 2 3 109 3 Total de ligações • Participaram das promoções • Informações e sugestões • Reservas Sala de Concerto • Atendendo aos Ouvintes • Pedidos de grade • Elogios • Críticas • Mestres da música • Programação (vários) • Os compositores • Música de Interlúdio • Musicâmara • Opera Completa • Momento de Jazz • MEC Notícias • Radio escuta • Manhã MEC • Tempos Modernos • Vozes Eternas • Som Infinito • Concerto MEC • Compositores Brasileiros • Clássicos da Madrugada • Ciclo Nelson Freire 1214 80 261 288 181 6 78 93 1 163 3 2 2 6 1 2 2 1 1 2 3 26 1 1 10 Central de Atendimento ao Ouvinte - CAO Tel: 2252-8413 "Se você está pensando na situação daqui a um pouco, plante arroz. Se você está pensando na situação daqui a uma década, plante árvores. Mas, se você está pensando na situação daqui a um século, eduque as pessoas." Provérbio Chinês MEC AM - 800KhZ Bossa Moderna: Produzido por Tárik de Souza. Na MEC AM às 22 horas de terça- feira, e na MEC FM às 23 horas de quinta-feira. Tome Ciência: Produzido pelo jornalista André Motta Lima, vai ao ar na MEC AM, toda terça-feira às 21 horas. Oficineiros da Inclusão: Parceria da Rádio MEC com a ONG Escola de gente. Aos domingos, 14 horas, na MEC AM. PROGRAMAÇÃO DESTAQUES DA PROGRAMAÇÃO / NOVOS PROGRAMAS Atenção para o Ciclo Guiomar Novaes, que começará domingo, dia 3/7 às 11 da manhã, na MEC FM. Na internet visite: www.radiomec.com.br e os sítios dos produtores da MEC FM Sérvio Túlio (radioelektrola.com ), Lilian Zaremba (lilianzaremba.blog.uol.com.br) e Weber Duarte (korngold.blog.uol.com.br) MEC FM - 98,9MHZ Mulherio: Programa produzido em parceria com a Secretaria Especial dos Direitos da Mulher, apresentado por Mara Régia, vai ao ar aos sábados, na MEC AM, às 14 horas. Rádio Maluca: Programa apresentado na MEC AM, às 11 da manhã de sábado, em rede com a Rádio Nacional.
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