Aves do Brasil

Transcrição

Aves do Brasil
WILDLIFE CONSERVATION SOCIETY
Corpo Consultor
Martha Argel (WCS)
Juan Mazar Barnett
(Seriema Tours)
Dennis Driesmans Beyer
Dante Buzzetti
Braulio Carlos
(Pantanal Bird Club)
Pedro F. Develey
(SAVE Brasil / BirdLife)
Neiva Guedes (Projeto Arara-Azul)
John A. Gwynne (WCS)
Alexine Keuroghlian (WCS)
Katherine Lemcke (WCS)
Vincent Kurt Lo (Ibama)
André De Luca
(SAVE Brasil / BirdLife)
Fernanda Marques (WCS Brasil)
Fernanda Melo
(Refúgio Ecológico Caiman)
Leonardo Vianna Mohr
(ICMBio – Ministério do Meio Ambiente)
Maria Antonietta Pivatto
(OrnitoBr)
Wandir Ribeiro
Rômulo Ribon
(Universidade Federal de Ouro Preto)
Robert S. Ridgely
(World Land Trust)
Fernando C. Straube
Eduardo Martins Venticinque
(WCS Brasil)
Carlos Yamashita
(Ibama)
Diretor do Projeto na WCS: John A. Gwynne
Artistas
Michael DiGiorgio
Dale Dyer
John A. Gwynne
Thomas R. Schultz
Guy Tudor
Andrew C. Vallely
Sophie Webb
Jan Wilczur
Fotógrafos
Maria Allen
Amazon Araguaia Lodge
Jenny Bowman
Dante Buzzetti
Luciano Candisani
Braulio Carlos
Fabio Colombini
Mario Friedlander
Adriano Gambarini
Daniel de Granville
PANTANAL & CERRADO
(Hori Consultoria Ambiental)
Peter Milko
Haroldo Palo, Jr.
João Quental
Rômulo Ribon
Cassiano Zaparoli
Autor Sênior: Robert S. Ridgely
Diretor de Arte: Guy Tudor
Coordenadora do Projeto na WCS
e Tradução: Martha Argel
Mapas das Espécies: Robert S. Ridgely,
Maria Allen e Terry Clarke
Diagramação e Produção: Terry Clarke
Introdução
A Wildlife Conservation Society (WCS) é a mais antiga organização
científica de conservação internacional dos Estados Unidos, com um
longo histórico de atuação no Brasil, desde os anos 1970 no Pantanal,
e em décadas mais recentes na Amazônia, com Márcio Ayres. Neste
primeiro volume de Aves do Brasil, uma série de guias de campo regionais das aves brasileiras, publicados sob os auspícios da WCS em
duas edições (em inglês e em português), conseguimos combinar o
trabalho de um dos ornitólogos mais respeitados do mundo e de alguns dos melhores ilustradores de aves, com imagens representativas
de suas paisagens típicas, registradas por renomados fotógrafos brasileiros. Concebida como algo mais amplo do que um guia de campo,
esta série é a peça central de uma missão ainda maior: por meio
da divulgação de informações sólidas sobre a extraordinária fauna
de aves de cada região do país, despertar um interesse generalizado
entre os brasileiros e abrir caminho para novas iniciativas em conservação. Este guia é uma ferramenta de incentivo à observação de aves,
tornando mais fácil e lúdica a identificação das espécies; indo além,
são fornecidas informações básicas sobre conservação, em conexão
com os ambientes específicos da região e as questões de proteção de
suas aves. Outro objetivo da série é apresentar a avifauna do Brasil aos
birdwatchers do mundo todo, estimulando o ecoturismo internacional
no país, criando empregos e beneficiando as economias locais.
Raros países rivalizam com o Brasil em riqueza de aves. Com 1.822 espécies já conhecidas, e outras sendo descobertas continuamente, é um
dos países mais ricos em aves no mundo todo e sua avifauna é também
uma das mais interessantes do planeta. Ocorre no país quase 60% das
espécies de aves da América do Sul, que, por sua vez, é o continente que
abriga o maior número de espécies de aves. O Brasil é o país do Novo
Mundo com maior número de aves endêmicas, isto é, que não ocorrem
em nenhum outro país – são 234 espécies. Tem também o maior número
de aves ameaçadas de extinção: 116 espécies, mais de um quarto das
aves ameaçadas na América do Sul. Tais números demonstram a necessidade urgente de ações de conservação e do aumento do interesse público pelas aves, que, em outros locais do mundo, revelaram-se um eficiente
ponto focal para o desenvolvimento de uma “cultura de conservação”.
Pela extensão geográfica do país e a riqueza de sua avifauna, um guia
das aves brasileiras num volume único seria volumoso demais para ser
levado a campo. Os livros desta série abrangem áreas que coincidem,
a grosso modo, com os grandes biomas brasileiros (segundo mapas
do IBGE), o que simplifica seu uso em campo e o reconhecimento de
espécies, ambientes, comportamentos e cantos.
O presente volume engloba duas grandes regiões do Brasil Central, o
Pantanal e o Cerrado. O Pantanal já é famoso, no país e no exterior,
por abrigar um dos mais exuberantes espetáculos de aves de água
doce do mundo. Já o Cerrado, bem menos conhecido, no passado
cobria um quarto do território do Brasil e ainda é uma das savanas
mais importantes do planeta em termos de biodiversidade, mas está
seriamente ameaçado de redução progressiva de área.
Um guia regional torna possível tratar dos problemas específicos de
conservação da região abrangida, a partir da caracterização de seus
habitats. Neste volume, a seção “Protegendo a natureza brasileira”
mostra o vínculo que há entre a extraordinária biodiversidade do Brasil
e sua grande variedade de ambientes, e destaca questões de interesse atual para a conservação. Um dos desafios do século 21 é alcançar
o desenvolvimento econômico e social sem abrir mão da preservação
ambiental. O país necessita mecanismos eficientes de proteção para
salvaguardar seus cursos d’água cada vez mais ameaçados de contaminação, a vegetação tão necessária para amenizar os efeitos do
aquecimento global e sua biodiversidade espetacular. É dentro deste
contexto que essa seção de conservação foi incluída neste volume e é
nossa intenção fazer o mesmo nos demais.
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Por restringir-se às aves do Brasil Central, este volume evita que os observadores, sobretudo iniciantes, percam-se entre informações sobre espécies de outras regiões (como ocorre com guias de âmbito nacional). Há,
ainda, textos curtos sobre aves de áreas de transição entre o Cerrado e
biomas vizinhos, tratadas em mais detalhes nos volumes seguintes.
Praticamente, todas as aves residentes no Brasil Central, as espécies
ameaçadas e a maioria das migratórias de presença regular estão ilustradas e são tratadas em textos individuais. Em cada mapa de distribuição, a área verde indica a distribuição normal da ave; a cor azul indica a
distribuição de aves que migram para a região da América do Norte nos
meses mais quentes (sobretudo de outubro a março); e o bege indica
distribuição de aves do sul que vêm no outono e inverno (sobretudo de
abril a agosto). Um ponto preto ou colorido indica registros isolados, fora
da distribuição normal da ave ou, em alguns casos, a única localidade
em que é conhecida. Esse código de cores é apresentado na legenda que
está na parte interna da capa, junto com os símbolos usados. No livro
estão indicadas, ainda, as aves incluídas na Lista Oficial de Espécies da
Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, do Ministério do Meio Ambiente,
de 2003 – em ordem decrescente de ameaça: Criticamente em perigo,
Em perigo e Vulnerável.
Este volume, como os demais da série, facilita a identificação de aves
numa região em que o elevado número de espécies, aliado à semelhança entre elas, é um grande desafio para a maioria dos observadores. As
ilustrações foram elaboradas de modo a permitir a pronta comparação
entre espécies parecidas, exibindo as marcas diagnósticas citadas no
texto descritivo da espécie. A diagramação do livro facilita ainda mais a
identificação, com poucas espécies por página, e com texto e mapa de
distribuição de cada espécie lado a lado com a sua ilustração. Cada texto
traz, ainda, descrições sucintas e cuidadosamente elaboradas de habitat,
comportamento e canto, o que torna o guia ainda mais fácil de usar.
Nosso sonho é inspirar todo um país de observadores de aves em potencial, que irão se encantar com a beleza da rica fauna de aves do Brasil
e motivar-se para participar ativamente da proteção das belíssimas paisagens naturais e de nosso patrimônio biológico. É nossa esperança que
este livro seja um ponto de partida para todo esse processo.
John A. Gwynne e Martha Argel
O Brasil possui uma das maiores e melhores avifaunas do planeta. Há
muito tempo esse fato é reconhecido por ornitólogos e birdwatchers
do mundo todo, mas até agora poucos brasileiros têm conhecimento
dele. Isso está mudando, e tenho esperança que este livro e esta série
servirão para acelerar o processo. Saia de casa, vá observar aves e, enquanto o faz, contribua para proteger as fabulosas espécies do Brasil.
Robert S. Ridgely
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PANTANAL & CERRADO
ProtegendoWild
Protecting
a natureza
Brazil
brasileira
PANTANAL & CERRADO
Protegendo a natureza brasileira
Natureza, gado e lavoura
Nas últimas décadas, dois padrões bem diferentes de
uso da terra se firmaram no Brasil Central. No Pantanal,
a paisagem é dominada pelas fazendas de gado, muitas
das quais hoje ajudam na proteção de animais silvestres
que no passado eram alvo de caça ou captura. Em muitas áreas, populações da arara-azul-grande, do jacarédo-pantanal, da ariranha e até mesmo da onça estão se
recuperando, graças ao esforço conjunto de fazendeiros,
pesquisadores e organizações ambientais.
No Cerrado, porém, a maior parte da vegetação foi destruída para dar lugar à agricultura. Uma geração atrás, o vasto
Cerrado parecia interminável. Hoje em dia, mais de três quartos dele sofrem algum tipo de uso agrícola. A proteção do
que resta requer que governos e proprietários particulares
demarquem e protejam remanescentes significativos. Menos
que 5% do Cerrado está protegido legalmente, boa parte em
“ilhas” que podem já ser pequenas demais para evitar a perda de espécies mais raras. A maioria está isolada demais
para que as aves se desloquem entre elas. Quanto mais fragmentados os remanescentes, menos eficientes serão para a
preservação de algumas das aves mais especiais do Brasil.
FOTO DAS PÁGINAS ANTERIORES: D. DE GRANVILLE
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As águas do Pantanal veem do Cerrado
O Pantanal é um mosaico de ambientes, que anualmente
passa por grandes cheias e vazantes. Pouca gente se dá
conta de que as águas das enchentes anuais são trazidas pelos rios que veem do Cerrado. Sem suas cheias,
o Pantanal seria uma grande extensão de campos e savanas, não muito diferente do próprio Cerrado. A cada
temporada de chuvas, a água que se precipita no Planalto Central brasileiro escorre para dentro do Pantanal, levada pelos rios Paraguai, Cuiabá, Piquiri, Taquari e seus
afluentes. Ao transbordarem, as águas desses rios, ricas
em nutrientes, inundam os campos e criam uma área
úmida imensa e temporária.
No Cerrado, a época das chuvas em geral tem início
em novembro, mas pode levar até dois meses para que
as águas cheguem ao Pantanal Norte trazendo a cheia.
Esta move-se devagar para sul, e tarda bem uns quatro
meses para atingir o Pantanal Sul, onde, curiosamente,
o pico da inundação pode ocorrer em plena época de
seca. Em seu avanço gradual, as águas trazem consigo
nutrientes que garantem o viço da vegetação rasteira;
eles também alimentam uma abundância de peixes, que
são consumidos tanto pela população pantaneira quanto pelas aves aquáticas.
Práticas agrícolas em uso no Cerrado, como aplicação maciça de herbicidas e fertilizantes e a erosão em áreas de
plantio, estão afetando de modo negativo a qualidade da
água na planície pantaneira. A redução da contaminação
química e a preservação da vegetação nativa ao longo dos
rios têm importância crítica na proteção ao Pantanal.
FOTO: D. De Granville
O Pantanal é uma imensa planície alagável, ocupando cerca de 210.000 km2. Salvo por pequenas áreas no Paraguai
e na Bolívia, é uma paisagem tipicamente brasileira. Todo
ano, quando o rio Paraguai e seus afluentes transbordam
e inundam a região, ela se transforma em uma das superfícies úmidas mais extensas do mundo. Abrigando uma
impressionante população de aves aquáticas, a importância da planície pantaneira foi reconhecida pela convenção
Ramsar, que protege áreas úmidas no mundo inteiro, e
pela Unesco, que a declarou patrimônio mundial.
Dentre os biomas brasileiros, o Cerrado só perde em tamanho para a Floresta Amazônica – no país, ele ocupa
quase 2 milhões de km2, um quarto do território nacional.
Assim como o Pantanal, é quase exclusivo do Brasil, com
pequenas extensões no Paraguai e Bolívia. No Planalto
Central brasileiro, em pleno domínio do Cerrado, nascem
rios importantes, formadores das três maiores bacias do
país: a bacia amazônica, a norte; do Paraná, a sul e oeste;
e do São Francisco, a leste. Tido no passado como “terra
inútil”, o Cerrado é, pelo contrário, uma das savanas biologicamente mais ricas do mundo, cuja importância e diversidade só agora estão sendo reconhecidas. Sua flora é
composta por 10 mil espécies, 40% das quais endêmicas
ao Brasil, só ocorrendo aqui. Até o momento, ao menos
694 espécies de aves foram registradas no Cerrado, das
quais 51 endêmicas e 33 quase endêmicas.
A alta diversidade da avifauna brasileira resulta da grande variedade de ambientes existente, cada um com suas
aves. As espécies não ocorrem ao acaso; ao longo do tempo, elas evoluíram em ambientes específicos, aos quais
adaptaram-se. Em ambos, Pantanal e Cerrado, existem
muitos ambientes distintos, cada qual com sua paisagem e
sua composição de aves. É por isso que essas regiões são
tão ricas, tanto para as aves como para os birdwatchers.
O Cerrado abastece de água
o Pantanal
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Quando as águas baixam, multidões de aves fartam-se de peixes nas poças isoladas
Um espetáculo natural
Com cerca de 450 espécies de aves, o Pantanal é um
dos locais mais afamados do mundo para a prática do
bird­watching (observação de aves). É fácil observar, entre
outras, espécies como o tucanuçu, a arara-azul-grande,
a maracanã-de-colar e o mutum-de-penacho. Além disso,
todos os anos, por alguns meses, a região abriga uma
das maiores concentrações de aves pernaltas no mundo
inteiro. Durante a cheia, as aves pernaltas espalham-se
por toda a região em pequenos grupos. Quando as águas
baixam, as lagoas encolhem e se convertem em poças
isoladas, nas quais imensos cardumes de peixes ficam
aprisionados. A abundância de presas fáceis atrai uma
multidão de aves aquáticas, às vezes em números impressionantes, em que a estrela é o jaburu, cuja elevada
estatura faz com que se destaque entre a inquieta multidão de garças, biguás e colhereiros. Cinco espécies de
martins-pescadores juntam-se à festa e até o céu fica
cheio de aves.
O ecoturismo tem importância econômica cada vez maior
para o Pantanal e para as fazendas pantaneiras. Um roteiro muito popular entre os observadores de aves é percorrer a Rodovia Transpantaneira, de Poconé para sul,
parando a cada tanto em diferentes ambientes. Num bom
dia, com um bom guia, é possível ver mais de 100 espécies diferentes de aves, ativas mesmo nas horas de
maior calor.
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O espetáculo de vida no Pantanal não se limita às aves.
As paisagens abertas permitem o avistamento de alguns
dos maiores animais terrestres da América do Sul, como
o jacaré-do-pantanal, a capivara, a sucuri-amarela e o
cervo-do-pantanal. Ocasionalmente, também podem ser
vistos a anta, o cateto, a queixada, a ariranha (aumentando em número e fácil de ver, em alguns locais) e até
mesmo a onça-pintada.
A exuberância da fauna do Pantanal impressiona, mas a
proteção a seus grandes espetáculos naturais exige bastante esforço, à medida que novos desafios emergem no
milênio que se inicia. O sistema pantaneiro de criação de
gado tem sido um bom exemplo de uso sustentável da
terra, aliando tradição cultural e proteção ao ambiente,
mas a pecuária passa a ser predatória quando os tamanhos dos rebanhos aumentam demais. A conservação das
paisagens naturais pantaneiras depende da presença de
campos naturais, cerrados e matas intactos, da boa qualidade das águas provenientes do Cerrado e da manutenção
tanto do fluxo lento do rio Paraguai quanto de seu ritmo
anual de cheias e vazantes. É do mosaico de ambientes –
capões de mata junto a banhados, campos junto a baías
– que se origina a rica biodiversidade do Pantanal.
PHOTO: J. QUENTAL
PANTANAL
FOTO: JENNY BOWMAN
“O Pantanal tem a maior
concentração de fauna das Américas.
As pessoas de fora do Brasil conhecem
só a Amazônia.”
Dra. Maria Tereza Jorge Pádua, ex-diretora de Parques Nacionais
e ex-presidente do Ibama
Os jacarés descansam em grupos
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PANTANAL
FOTO: C. ZAPAROLI
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FOTO: H. PALO JR.
Brejos
Campos naturais
Os campos naturais pantaneiros são amplas áreas revestidas por capim e ervas, que durante alguns meses por
ano ficam inundadas pelas águas das cheias, formando
extensos alagados. As cheias não são uniformes na região. Muitas vezes, os campos do Pantanal Norte estão
sob água, enquanto no Pantanal Sul ainda estão secos.
Algumas aves, como o raro frango-d’água-pequeno, fazem
deslocamentos para se aproveitar das inundações e, durante a seca, podem sumir por completo do Pantanal.
Quando as águas baixam, o solo fica exposto e as sementes dormentes de capim começam a germinar. Os alagados dão lugar aos campos, que são ocupados pelo gado, e
as aves campestres substituem as aquáticas. Emas, seriemas, marias-faceiras e curicacas percorrem o capinzal em
busca de alimento, da mesma forma que os caminheiroszumbidores e outros passarinhos. Do alto de cupinzeiros,
corujas-buraqueiras e noivinhas-brancas vigiam os arredores. Perto das sedes de fazendas, bandos de príncipesnegros e caturritas alimentam-se de frutos e sementes.
No fim da seca, o amadurecimento em massa das sementes
de capim atrai papa-capins migratórios, de nove espécies
diferentes, algumas delas em extinção. Ao redor das poças
que dia a dia encolhem mais, juntam-se jaburus, colhereiros, cabeças-secas e maguaris, entre outros, para capturar
os peixes aprisionados. Então, após algumas semanas de
seca, a água das chuvas no Cerrado voltam a encher os
rios, que transbordam de novo e recomeçam o ciclo.
PANTANAL
Pato-do-mato, maçarico-real
e jaburu
Os brejos, baías e rios pantaneiros retêm a água o ano
todo, ao contrário dos campos, inundados periodicamente.
Algumas espécies de aves só vivem em ambientes perenemente úmidos. O socoí-vermelho, o raro socó-boi-baio,
o cardeal-do-banhado, o carretão-do-brejo, o pia-cobra e o
japacanim têm marcada predileção por brejos, em cujas
margens o cavalaria é abundante. As sanãs, parentes menores das saracuras, especializam-se nos vários ambientes: a sanã-do-capim vive em capinzais altos e úmidos,
junto a lagoas; a sanã-carijó, na beira de brejos, longe da
água aberta; a sanã-parda, em brejos com vegetação densa; e a sanã-castanha, em borda de mata.
O tricolino, um passarinho pouco conhecido, prefere capinzais úmidos extensos, nos quais, às vezes, passa despercebido. A freirinha, o gavião-velho e o gavião-caramujeiro
pousam à beira d’água, sobre moitas e outros poleiros
baixos. O frango-d’água-azul e o socó-boi percorrem as bordas de vegetação emergente densa. A marreca-de-coleira,
o tachã e bandos ruidosos de marrecas-caboclas e irerês
frequentam as lagoas em que a jaçanã e a lavadeira-de-cara-branca caminham sobre a vegetação flutuante. Algumas
aves de brejo, como o tachã, as garças e outros pernaltas,
aproveitam as cheias sazonais para se espalharem pelos
campos inundados. Capivaras, cervos-do-pantanal e sucuris-amarelas podem fazer o mesmo. Mas são os brejos
permanentes que garantem a abundância de aves aquáticas no Pantanal ao longo do ano todo.
Japacanim,
cardeal-do-banhado e jaçanã
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SERIEMAS (Cariamídeos) São aves grandes e elegantes, de pernas e cauda longas, que vivem em
ambientes abertos, tanto naturais como antrópicos.
SERIEMA Cariama cristata
89-94 cm
Muito comum, de ocorrência ampla em cerrados, campos naturais, pastos e
áreas de cultivo, às vezes perto de casas; segue queimadas. Grande, de pernas
longas e hábito sobretudo terrícola; estabelece-se em ambientes alterados e
colonizou regiões desmatadas. Ocorrência localizada no Pantanal, ausente de
áreas inundáveis. O bico forte terminado em gancho e as pernas são avermelhados; vistosa crista “despenteada” na base do bico. Olho castanho-claro; uma
das poucas aves com “cílios”. Pardo-cinzenta por cima, com tênues vermiculações escuras; branco-suja por baixo com fino rajado escuro; penas externas
da cauda com pontas brancas. Em voo, primárias com colorido preto e branco
chamativo. Inconfundível, é uma das aves-símbolo do Cerrado. Sozinha ou em
pares, percorre terrenos abertos, à caça de presas (insetos grandes, roedores e
lagartos). Tem fama de predadora de serpentes; não come carniça. Faz o ninho,
uma massa volumosa de ramos e gravetos, na copa de árvores baixas. Às vezes
dá voos curtos e pousa em postes de cercas e arvoretas, saltando para o chão se
perturbada. Quando assustada, afasta-se caminhando ou correndo; em estradas
de terra, pode correr adiante de um carro. O canto potente é um dos primeiros
sons de aves ouvidos ao amanhecer; emitido pelos dois sexos, às vezes em
dueto, é uma série longa de notas estridentes e desafinadas, de intensidade
decrescente: “kié-kié-kié-kié-kié-kié-kié-ke-ke-ke-ke”.
EMAS (Reídeos) Pertencem ao grupo das Ratitas, formado por aves incapazes de voar, que inclui ainda o
avestruz, o emu e o kiwi, todas do Velho Mundo. As duas espécies de emas, cujos ancestrais fósseis viveram
há mais de 40 milhões de anos, são as maiores aves da América do Sul.
EMA Rhea americana
145-160 cm
Comum, de forma localizada, em campos naturais, cerrado e áreas de uso
agropecuário (em especial pastos e plantios extensos de soja), mas apenas
naqueles em que não é alvo de perseguição. Desaparece em locais em que
a população humana é mais densa. Enorme, é a maior e mais pesada ave da
região. Não voa. Pernas muito longas, cinzentas; olho claro. Pardo-cinzenta,
da cor do capim seco, mais clara por baixo, com penas do dorso macias
e moles; pescoço muito longo, de base enegrecida no M e colorido mais
uniforme na F, que é bem menor. Não tem cauda. Inconfundível. Geralmente
em pequenos grupos, às vezes em grupos maiores, formados quase que só
por jovens. Caminha devagar, enquanto se alimenta de grande variedade
de folhas, frutos, insetos e pequenos vertebrados. Arisca, costuma manter
distância de observadores, afastando-se discretamente quando se aproximam. Quando algo muito próximo a assusta, abaixa o pescoço e afasta-se de
repente num zigue-zague ligeiro, erguendo as asas e inflando a plumagem.
Várias FF põem ovos num mesmo ninho, em geral bem escondido no meio
do capinzal alto. Um só M encarrega-se da incubação e do cuidado com os
filhotes, que deixam o ninho logo após a eclosão. A ema só vocaliza na época
do acasalamento, quando o M produz um som profundo e potente, ouvido de
longe, quase como o mugido de um grande mamífero. Uma das aves icônicas
do Cerrado brasileiro, sofreu na região expressiva redução tanto em área de
ocorrência quanto em número de indivíduos. Uma população significativa habita o Parque Nacional das Emas, fazendo-lhe jus ao nome.
SERIEMA
RED-LEGGED SERIEMA
EMA
GREATER RHEA
115
PAPAGAIOS, ARARAS E PERIQUITOS (Psitacídeos) Aves coloridas, de bico curto muito curvo e
pés hábeis. Porte variável, cauda longa ou curta. Ruidosos e sociáveis, a maioria aninha em ocos de árvores. Silenciam quando pousam e podem ser detectados pela “chuva” de restos que cai ao comerem frutos ou sementes.
ARARA-AZUL-GRANDE Anodorhynchus hyacinthinus
96-101 cm
No passado, teve ampla ocorrência em mata de galeria; hoje só é numerosa
VU no Pantanal. Espetacular, o maior psitacídeo do mundo. Enorme bico preto,
mandíbula margeada de amarelo-vivo. Plumagem azul-intensa, preta sob
a asa e a cauda. Inconfundível, mas outras araras podem parecer bem
escuras em iluminação ruim; a silhueta “cabeçuda” é característica. Ao
contrário das outras araras, raramente voa muito alto. Vive em casal ou grupinhos; alimenta-se dos frutos das palmeiras acuri (Scheelea) e bocaiúva
(Acrocomia), e desce ao solo para comer os coquinhos caídos, caminhando
com passo bamboleante. Bandos com até 30-40 aves congregam-se onde
a comida é farta. Na região, aninha em ocos de árvores, em geral imensos
maduvis (Sterculia). Voz muito potente, mais grave e rouca que a de outras
araras, um “raaanh!” que pode ser repetido, às vezes mais arrastado, às
vezes como um tagarelar rápido. A ocupação agropecuária fez sua população diminuir ou sumir em boa parte da distribuição original. No Pantanal,
a população declinou há algumas décadas, pela captura para o tráfico de
animais, mas agora parece estar estável ou mesmo aumentado, graças à
proteção por muitos proprietários rurais.
O GÊNERO ARA inclui araras grandes e coloridas, de caudas afiladas muito longas e pele nua na face.
Vozes potentes, que ressoam a grande distância.
ARARA-CANINDÉ Ara ararauna
81-86 cm
Razoavelmente comum, de forma localizada, em mata de galeria e cerradão; está em declínio populacional ou desapareceu em muitos lugares.
Face nua branca, com fileiras de peninhas pretas e um pequeno “babador”
preto. Por cima, colorido azul-intenso, com penas de voo mais escuras. Por
baixo, amarelo-viva; amarelo sob as asas e a cauda. Inconfundível, mas
sob iluminação ruim pode ser difícil dis­tinguir suas cores. Vive em casal
ou bandinhos; em alguns lugares reúnem-se grupos grandes, com 30-50
aves (como no P. N. das Emas). Pode voar longas distâncias entre os locais
de pernoite e alimentação, passando veloz a grande altura – com luz adequada, esse é um espetáculo belíssimo. Como outros psitacídeos, pode
ser difícil de localizar quando pousada, pois permanece em silêncio. Na
região alimenta-se dos frutos de palmeiras, no chão ou a baixa altura. Voz
menos áspera que outras araras, mas ainda assim barulhenta; o grito mais
característico é um “rraaah!” rouco e potente, dado em voo ou pouco antes
de voar; também dá um “kurioréc” típico.
ARARA-VERMELHA-GRANDE Ara chloropterus
89-96 cm
Escassa, hoje com ocorrência localizada em cerradão e mata semi-úmida,
podendo aparecer em cerrado; declinou em muitas áreas, por causa da
captura e ocupação agropecuária. Bico bicolor; face nua branca com fileiras
de peninhas vermelhas. Colorido geral vermelho-vivo; baixo dorso, rabadilha
e crisso azul-claros. Coberteiras da asa verdes, penas de voo azuis. Vermelho
sob as asas e a cauda. Inconfundível em boa iluminação. Comportamento
parecido ao da canindé. Parece ocorrer sobretudo longe da água e nunca em
bandos grandes. Aninha em ocos de árvores ou em buracos em paredões
rochosos. Voz mais potente que a das outras araras, em geral mais grave e
menos variada que a da canindé.
MARACANÃ-DE-CARA-AMARELA Orthopsittaca manilata
46-48 cm
Razoavelmente comum em matas de galeria, sobretudo no N da região.
Associada à palmeira buriti (Mauritia). Antes no gênero Ara. Face nua amarelada.
Colorido geral verde, azulado na coroa, com garganta e peito esbranquiçados,
como se enfarinhados; mancha vermelha na barriga. Penas de voo azuladas.
Amarelo-esverdeado claro sob as asas e a cauda. Compare com a maracanãdo-buriti (página 117), de face branca, verde mais intenso, vermelho na testa
e dorso, sem amarelo sob as asas; também com a maracanã-pequena, menor.
Em geral em grupinhos, às vezes em bando com 25 ou mais aves. Vista voando
entre locais de pernoite e de alimentação, tipicamente em buritizais; às vezes
pernoita nas palmeiras. Em voo, esguia, com asas finas e pontudas e cauda
estreita, às vezes meio erguida; batidas curtas de asa. Ao voar, voz mais aguda e
mais suave que a das outras araras, um “cree-e-e” repetido, ouvido de longe.
arara-azul-grande
HYACINTH MACAW
arara-canindé
BLUE-AND-YELLOW
MACAW
arara-vermelhagrande
RED-AND-GREEN
MACAW
maracanã-de-cara-amarela
RED-BELLIED MACAW
CORUJINHA-DO-MATO Megascops choliba CORUJA-BURAQUEIRA Athene cunicularia
133
23,5 cm
Razoavelmente comum, de ocorrência ampla em mata, capoeira e arvoredos junto a casas. Antes no gênero Otus. “Orelhinhas” bem visíveis. Cinza
ou canela por cima, com leve estriado escuro e salpicada de pardo; sobrancelha e área facial esbranquiçadas, linha escura delineando a face, olho
amarelo; pintas brancas nas escapulares. Por baixo, parda vermiculada de
preto. Forma ferrugínea rara. Na região, única coruja pequena com orelhas.
Hábito noturno; passa o dia na folhagem, às vezes encostada num tronco
para escapar à detecção. Come insetos. O canto, muito ouvido, é um trinado curto, terminando num “uk!” ou “uk!-uk!” abrupto, às vezes seguido por
um ulular suave, “tu-tu-tú-tú-tú-tu-tu”, do parceiro.
A corujinha-orelhuda (M. watsonii) vive em sub-bosque de mata no N da região (essa população às
vezes é separada em outra espécie, M. usta). Pequena, de olho escuro, mais marrom e uniforme que a
anterior. Sem área facial clara; padrão menos evidente por baixo. Dá uma sequência regular de notas
graves e aflautadas, bem definidas.
CABURÉ Glaucidium brasilianum 16,5 cm
Comum, de ocorrência ampla em capoeira e borda de mata. Miúdo, de olho
amarelo, sem “orelhas” e com dois “olhos falsos” pretos na nuca, bem evidentes.
Cor variável (marrom, ferrugíneo e formas intermediárias). Por cima, marromferrugíneo ou acinzentado, coroa rajada, asa com pintas brancas. Branco por
baixo, coleira na garganta, peito e barriga estriados. Cauda marrom, com barras
claras. Única coruja tão pequena na maior parte da região. Pousa em locais
expostos; é assediado por pássaros, que constituem suas principais presas. Tem
voo rápido e direto. Canta de dia e de noite, uma longa série regular e rápida de
notas aflautadas “pu”, durando um minuto ou mais, às vezes iniciada com alguns “uit” mais agudos. Responde de imediato a imitações e playbacks, voando
até o “intruso” e encarando-o. Também dá vários chamados meio trinados.
O caburé-da-amazônia (G. hardyii) vive em dossel e borda de mata no N da região (como na serra das
Araras). Lembra o anterior, mas com cabeça e nuca salpicadas de branco. O canto é uma série rápida
e aguda de assobios, durando uns dois segundos.
CABURÉ-CANELA Aegolius harrisii 19-20 cm
Raro, de ocorrência localizada em sub-bosque de mata rala e em cerrado;
na região, registrado só na área de Brasília, mas deve ter distribuição maior.
Inconfundível. Por cima, marrom-escuro, pintas brancas nas asas, linha de
manchas pardas nas escapulares. Face e partes inferiores alaranjadas,
a área facial delineada com preto, olho castanho; mento preto. Biologia
pouco conhecida. Dá um trinado rápido, trêmulo e algo agudo, contínuo e
“ondulado”. Pode responder a playback.
CORUJINHA-DO-MATO
TROPICAL SCREECH OWL
caburé
FERRUGINOUS PYGMY OWL
caburé-canela
BUFF-FRONTED OWL
23 cm
Comum, de ocorrência ampla em campos, cerrado, pastos e até parques
urbanos; é a coruja mais fácil de ver. Pernas longas e emplumadas, brancas. Olho amarelo. Marrom por cima, coroa estriada de branco, costas e
asas com pintas brancas. Por baixo, branco-suja barrada e salpicada de
branco. Única coruja terrícola, inconfundível. Ativa dia e noite. Vive em casais ou grupos familiares. Aninha em buracos escavados na terra, às vezes
na base de cupinzeiros. Costuma ficar pousada perto do ninho, no chão, em
mourões ou postes de luz, e à aproximação de pessoas ou cães costuma
mover a cabeça para cima e para baixo, encarando fixamente o intruso. Dá
um grito de alarme agudo, “quiiii, qui qui qui qui qui”.
SUINDARA Tyto alba 35,5-40,5 cm
Localmente comum, de ocorrência ampla em áreas abertas. Pertence à família dos Titonídeos. Disco facial em forma de coração, branco orlado com
mais escuro, olho escuro. Forma clara (ilustrada), cinza e pardo-dourada
por cima, branca por baixo, em geral pintalgada. Forma escura, menos numerosa, mais cinza por cima, parda por baixo, em geral pintalgada. Branca
sob as asas; aspecto fantasmagórico ao voar de noite. M mais claro que a
F. Pousada, é bem clara, esguia, de cabeça grande. Compare, em voo, com
o mocho-do-banhado e a coruja-orelhuda (página 131). Noturna, às vezes
ativa no lusco-fusco; caça voando baixo, intercalando um voo batido lento e
planeios. Come roedores, aves e insetos. Mais numerosa no entorno humano, passa o dia em forros, galpões, torres e ocos de árvores. Grito agudo e
áspero, “ch-h-h-h-h-t!”, como um tecido rasgando (daí outro nome popular,
rasga-mortalha). Se perturbada, agacha-se e infla as asas.
coruja-buraqueira
BURROWING OWL
suindara
BARN OWL
CHIFRE-DE-OURO Heliactin bilopha
BEIJA-FLOR-ESTRELINHA Calliphlox amethystina
F
M
beija-flor-estrelinha
AMETHYST WOODSTAR
M
F
topetinho-magnífico
FRILLED COQUETTE
F
M
7 cm
Raro, de ocorrência talvez localizada e ligada à estação do ano, em dossel
e borda de mata e capoeira, no NO da região. Parece menos numeroso
que o topetinho-magnífico (podem estar juntos, como na Chapada dos
Guimarães). Parecido a ele, inclusive no comportamento. M com crista canela, mais longa e mais pontuda; penas dos lados do pescoço mais longas,
brancas com pintas redondas verdes nas pontas. F com garganta canela e
coroa mais acanelada, ambas sem manchas.
MOSQUITINHO Chrysolampis mosquitus
chifre-de-ouro
HORNED SUNGEM
6,5 cm
Escasso, de ocorrência localizada (talvez relacionada à estação do ano)
em dossel e borda de mata e capoeira, às vezes em áreas abertas vizinhas.
Bico reto. M verde-bronzeado por cima, ponto branco atrás do olho, manchinha branca no lado do dorso estendendo-se à parte baixa dos flancos.
Garganta vermelha, cintilante, orlada por um colar branco que sobe pelos
lados do pescoço; barriga verde-suja, leve acanelado nos flancos e crisso.
Cauda longa, bifurcada, preto-violácea. F, por cima, como o M; garganta
branco-suja, salpicada de violeta e verde, orlada por um colar branco meio
indistinto; canela por baixo, mesclado com branco no meio da barriga;
mancha no flanco como no M; cauda mais curta, verde-fosca com faixa
subterminal preta. Compare com as FF dos topetinhos. Em geral solitário,
visita flores e bebedouros; costuma pousar em ramos bem altos. Voo lento
e flutuante, como o de uma mamangava, com cauda meio erguida. O M
exibe-se diante da F, indo e vindo num voo pendular.
Os TOPETINHOS são beija-flores minúsculos, de cauda curta e faixa clara na rabadilha. MM coloridos e
adornados. Voo lento, às vezes parecem flutuar. Em geral mantêm a cauda meio erguida.
TOPETINHO-MAGNÍFICO Lophornis magnificus 7 cm
Escasso, de ocorrência localizada (talvez relacionada à época do ano) em dossel e borda de mata e capoeira, às vezes em jardins e áreas aber­tas vizinhas;
no Pantanal, raro ou ausente. M com bico vermelho de ponta preta. Coroa e
crista cor de canela, testa e garganta verde-vivas; por cima, verde com faixa
branca na rabadilha; nos lados do pescoço, leques de penas alongadas, brancas com pontas verdes; penas da cauda ferrugem orladas de verde, exceto
par central, verde-bronzeado. Verde-cinzento por baixo. F sem crista ou leque;
testa canela salpicada de verde; faixa clara na rabadilha e cauda como no M.
Garganta branca salpicada de verde; por baixo, branco lavado de verde nos
lados. Compare com o topetinho-pontilhado, M de crista mais longa e pintas
verdes redondas nas pontas dos tufos, F com testa e garganta ferrugíneas,
sem manchas. Alimenta-se em flores a qualquer altura, também em árvores.
TOPETINHO-PONTILHADO Lophornis gouldii
149
9,5-11 cm
Escasso, em cerrado e campo rupestre. Minúsculo. Bico curto, reto. M bonito, tem coroa azul-escura com tufinhos laterais de brilho vermelho, azul e
dourado; por cima, verde-bronzeado. Face, garganta e peito pretos; branco
nos lados do pescoço e peito e na barriga. Cauda longa e fina, bran­ca,
exceto pelas penas centrais. F mais apagada, sem tufinhos nem azul na cabeça. Garganta cinza, lados do pescoço e demais partes inferiores brancos,
flancos esverdeados. Cauda como a do M, mais curta. Fácil de reconhecer,
pois há poucos beija-flores em seu ambiente restrito. Em geral solitário,
visita flores de preferência próximas ao chão; é raro que visite arbustos ou
árvores floridos; pode capturar insetos em voo.
topetinho-pontilhado
DOT-EARED COQUETTE
F
M
8-9 cm
Escasso, em cerradão, mata, capoeira, bordas e sedes. Parece ter ocorrência localizada, talvez ligada à estação do ano. M com coroa e nuca
vermelhas, separadas da garganta e peito dourados por uma faixa escura; costas e demais partes inferiores pretas; cauda canela-viva com ponta
preta. F verde por cima, pode ter manchinha atrás do olho; cauda canela
com faixa subterminal preta e ponta branca, penas centrais verdes. Por
baixo, cinza-clara. M imaturo como a F; pode ter brilho laranja na garganta.
Com luz ruim, o M parece enegrecido, mas a forma da cabeça, com coroa
achatada, arrepiada atrás, é típica; também ajuda a identificar a F, junto
com o canela da cauda, mais visível em voo. Visita árvores floridas com
outros beija-flores.
mosquitinho
RUBY TOPAZ
M
F
155
SURUCUÁS (Trogonídeos) São aves coloridas de plumagem macia, pernas curtas, bico grosso e curto
terminado num ganchinho, cauda longa, graduada e de ponta quadrada. Vivem em ambientes florestais;
pousam bem eretos e, a despeito do colorido vistoso, são discretos e detectados quase sempre por suas
vocalizações, ouvidas com frequência. Em muitas espécies, vários indivíduos de ambos os sexos reúnemse para cantar. Pegam em voo seus alimentos (frutos e grandes invertebrados). Aninham em cavidades,
muitas vezes escavadas em cupinzeiros arbóreos.
SURUCUÁ-DE-RABO-PRETO Trogon melanurus 30,5 cm
Escasso, em matas e bordas no extremo NO da região, como na Serra das
Araras. Um surucuá grande, de barriga vermelha. M com bico amarelo-vivo e
anel ocular vermelho; verde-azulado vivo por cima, mais azul na rabadilha e
por cima da cauda, coberteiras da asa vermiculadas de preto e branco. Face
e garganta pretas, papo verde-vivo com linha peitoral branca; peito e barriga
vermelho-brilhantes. Cauda preta por baixo. F com mandíbula amarela; cinza por cima, na garganta e no peito, barriga vermelha; às vezes linha branca
separando as duas cores. Cinza-escura sob a cauda, penas externas muitas
vezes com pontas brancas e algum barrado. Compare com o surucuá-debarriga-vermelha (página 157), menor, cauda com barrado preto e branco
evidente, e com o surucuá-variado, presente no SE da região. Geralmente em
casal, costuma pousar em galho grossos a alguma altura, dentro da mata.
Discreto, é mais ouvido que visto. Permanece imóvel por longos períodos;
a cada tanto, lança-se para pegar um fruto ou grande inseto, e prolonga
o voo até pousar em outro poleiro. Às vezes junta-se em grupinhos e as
aves perseguem-se umas às outras, os MM cantando e as FF chamando
baixinho. O canto é uma série de 20-30 notas ressonantes e graves, que se
inicia suavemente: “ca-ca-ca-ca-cau-cau-cáu-cáu-cáu...”; também costuma
dar um cacarejo suave enquanto ergue e abaixa a cauda.
SURUCUÁ-GRANDE-DE-BARRIGA-AMARELA Trogon viridis
surucuá-de-rabo-preto
BLACK-TAILED TROGON
M
F
28 cm
Comum, a meia-altura e logo abaixo do dossel, em mata e borda, no NO da
região. Anel ocular azul-claro em ambos os sexos, único entre os surucuás
da região. M verde-azulado vivo por cima, mais intenso na nuca; testa, face
e garganta pretas. Peito azul-intenso; barriga amarela. Cauda parece quase
toda branca por baixo (na verdade, por causa das amplas pontas brancas das
penas pretas). F cinza por cima, na garganta e no peito, com leve vermiculado
branco nas coberteiras da asa e barrado nas penas de voo. Barriga amarela.
Cauda cinza-escura por baixo, penas externas barradas e com larga ponta
branca. Compare a F com a do surucuá-pequeno, menor e também barrada
sob a cauda, mas com branco ao redor do olho e linha peitoral branca. Muitas
vezes em casais; pousa alto dentro da mata e mais baixo na borda, onde pode
ser bem manso, observando os arredores quase preguiçoso. Pode juntar-se
em grupinhos durante a corte. O canto é uma série rápida e constante de
15-20 notas “cau” ou “caup”, de timbre mais agudo que o do surucuá-derabo-preto. Ambos os sexos dão um chamado suave, “tchuc”, e um “cua cua
cuo-cuo-cuo-cuo-cuo” anasalado, em geral ao erguer e abaixar a cauda.
SURUCUÁ-VARIADO Trogon surrucura 27 cm
Razoavelmente comum, de forma localizada, em cerradão, mata de galeria
e capoeira. M com anel ocular vermelho; cabeça, pescoço e papo azulintensos e testa, face e garganta pretas; verde-vivo por cima, com vermiculado preto e branco na asa. Peito e barriga vermelho-vivos. A cauda parece
quase toda branca por baixo. F com meias-luas brancas diante e atrás
do olho; cinza por cima, com fino barrado branco na asa. Garganta cinzaescura, clareando em direção ao peito; barriga vermelha. Sob a cauda,
penas externas com amplas bordas e pontas brancas, escondendo muito
da parte preta. Compare com o surucuá-de-barriga-vermelha (página 157),
menor: M com laranja ao redor do olho, barrado por baixo da cauda, e F
com algum barrado por baixo da cauda, ambos com faixa peitoral branca;
também com o surucuá-de-rabo-preto, do NO da região. Comportamento
similar ao do surucuá-grande-de-barriga-amarela. O canto é uma série lenta de 20-30 notas “cau”, com o timbre às vezes caindo na segunda metade,
enquanto o ritmo se acelera; é um pouco mais curto, mais acelerado no
fim, do que no surucuá-grande-de-barriga-amarela. Dá também vários chamados, como “prrrrrr” e “cluc”.
M
F
surucuá-grande-de-barriga-amarela
AMAZONIAN WHITE-TAILED TROGON
surucuá-variado
SURUCUA TROGON
M
F
169
Os TUCANOS são bem conhecidos por seus bicos extraordinários, mais longos nos MM. Têm padrões de
colorido atraentes, com predomínio do preto. Consomem sobretudo frutos, também comem insetos e podem predar pequenos vertebrados e ovos de outras aves. Aninham dentro de ocos em troncos de árvores.
TUCANO-DE-BICO-PRETO Ramphastos vitellinus 44 cm
Razoavelmente comum no dossel e borda de mata. Bico com “quilha”
(isto é, uma crista levemente saliente ao longo do cúlmen), preto com
ponta, cúlmen e base da maxila amarelos; base da mandíbula azul. Pele
azul em torno do olho. Quase todo preto, com rabadilha amarela e crisso
vermelho. Garganta e peito brancos (peito às vezes lavado de amarelo),
com estreita orla vermelha por baixo, em geral pouco visível. Plumagem e
cor do bico idênticas ao tucano-cantador (ver abaixo), de maior porte. Em
casal, às vezes em grupinhos, percorre todos os níveis da mata, sobretudo
o topo. Move-se pelo dossel e pouco abaixo dele, saltando de galho em
galho, com agilidade surpreendente, enquanto se alimenta, usando o longo
bico para alcan­çar frutos. Às vezes junta-se a bandos mistos formados por
outras aves grandes. O voo ondulante, característico, pode parecer débil,
mas permite à ave transpor distâncias consideráveis, cruzando com certa
facilidade rios e áreas abertas; con­siste em várias batidas de asa rápidas
intercaladas com um planeio e muitas vezes parece ir perdendo altura. O
chamado, ouvido com frequência, é um “ría” agudo, forte e repetido; a cada
nota, em geral a ave joga a cabeça para cima. Para gritar, pode pousar em
poleiros elevados e expostos.
O tucano-cantador (R. tucanus) ocorre em mata, no NO da região, junto com a espécie anterior, aí mais
numerosa; idênticos na plumagem, distingue-se dela só pelo tamanho ligeiramente maior e pelo bico
mais longo e sem quilha. Ambas espécies são distinguidas mais facilmente pelas vozes: o tucanocantador dá um “latido” potente, “kéo-ke-ke”, bem diferente da voz da espécie anterior.
TUCANO-DE-BICO-VERDE Ramphastos dicolorus 45 cm
Escasso, de ocorrência localizada em dossel e borda de mata e em áreas aber­
tas próximas, no SE da região. Bico verde-claro com base preta, com algum vermelho na borda da maxila e da man­díbula. Pele vermelho-alaranjada ao redor
do olho azul-claro. Preto por cima, com rabadilha vermelha. Garganta e peito
amarelos, com re­gião do papo mais alaranjada; demais partes inferiores vermelhas, com algum preto no baixo ventre. Inconfundível. Comportamento como
o do tucano-de-bico-preto. Além de frutos, pode comer insetos e até filhotes de
outras aves. O chamado é um coaxar lento e gutural, “reenh... reenh... reenh...”,
que emite pousado no topo de árvores altas, podendo ser ouvido de longe.
TUCANUÇU Ramphastos toco tucano-de-bico-preto
CHANNEL-BILLED TOUCAN
tucano-de-bico-verde
GREEN-BILLED TOUCAN
59 cm
Razoavelmente comum, de ocorrência ampla em mata de galeria, cerradão,
cerrado e capões, frequentando ainda pastagens com árvores esparsas
e até a proximidade humana. O maior dos tucanos; vistoso, é uma das
espécies-símbolo da região e uma das aves mais populares do Brasil. Bico
muito longo, amarelo e laranja com uma “gota” preta na ponta da maxila;
em alguns MM particularmente bicudos, o bico parece tão longo quanto
o corpo! Pele nua laranja e anel ocular azul ao redor do olho. Preto, com
garganta e papo brancos, coberteiras supracaudais e crisso vermelhos.
Inconfundível. Ocorre em ambiente mais aberto que os outros tucanos. Vive
em casais ou bandinhos, em geral fáceis de observar enquanto voam de
árvore em árvore, em fila indiana, ou pulam de um galho a outro. Costuma
pousar em galhos secos, quase como se quisesse chamar a atenção para
seu bico fora do comum. Alimenta-se de frutos, inclusive cultivados (laranja,
goiaba), e também de presas animais; além de insetos, preda filhotes e ovo
de outras aves. Às vezes voa a grande altura, com batidas de asa rápidas
intercaladas com longos planeios; é capaz de atravessar extensas áreas
abertas. Pode visitar comedouros, tornando-se muito manso. Costuma ser
mais silencioso que seus parentes; o chamado é um “resmungo” grave,
dado numa curta série.
tucanuçu
TOCO TOUCAN