Artigos do Vol. 1, No 1 (2009)

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Artigos do Vol. 1, No 1 (2009)
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Vol. 1, No 1 (2009)
Edição Especial de Lançamento
Seção Principal
Em Defesa da Áudio-descrição:contribuições da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com
Deficiência
Francisco José de Lima
O Traço de União da Áudio-descrição
Francisco José de Lima
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Conteúdo
A professora Ms. Silvana Aguiar repercute o lançamento da RBTV.
http://www.rbtv.associadosdainclusao.com.br/index.php/principal/article/view/8/9
Silvana Aguiar dos Santos
A professora Dra. Marianne Rossi Stumpf comenta sobre o potencial de artigos científicos em
LIBRAS.
http://www.rbtv.associadosdainclusao.com.br/index.php/principal/article/view/9/10
Marianne Rossi Stumpf
Relato de Experiência
Mãe relata como sua filha começou a aprender a desenhar e reconhecer desenhos táteis
Rosângela Gera
Foto-descrição
Descrição da Foto para capa
Roberto Rômulo
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Vol. 2, No 2 (2010)
Editorial
Revista Brasileira de Tradução Visual: Acesso à Informação e à Comunicação no Mundo Virtual
para Todas as Pessoas
Romeu Kazumi Sassaki
Seção Principal
A TEORIA NA PRÁTICA: ÁUDIO-DESCRIÇÃO, UMA INOVAÇÃO NO MATERIAL DIDÁTICO
Paulo André de Melo Vieira
ÁUDIO-DESCRIÇÃO: ORIENTAÇÕES PARA UMA PRÁTICA SEM BARREIRAS ATITUDINAIS
Francisco José de Lima
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Uma Eleição “Deficiente
Fábio Adiron
ARTES VISUAIS PARA DEFICIENTES VISUAIS: O PAPEL DO PROFESSOR NO ENSINO DE DESENHO
PARA CEGOS
Diele Fernanda Pedrozo de Morais
INCLUSÃO E CULTURA SURDA: OBSERVANDO QUESTÕES ACERCA DA SURDEZ
Liane Carvalho Oleques
Para inglês ouvir: Política de adoção da audiodescrição na TV digital do Reino Unido
Flávia Oliveira Machado
Relato de Experiência
RELATO DE EXPERIÊNCIA: ENSINANDO LAURA A FAZER DESENHOS EM RELEVO
claudia croce
Foto-descrição
O Violeiro (1899)
Ernani Nunes Ribeiro
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Artigos do Vol. 1, No 1 (2009)
Em Defesa da Áudio-descrição:
contribuições da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com
Deficiência
Francisco J. Lima
Rosângela A. F. Lima
Lívia C. Guedes
Resumo:
O presente artigo alerta sobre a necessidade e urgência da
divulgação/conscientização dos usuários sobre o serviço da áudio-descrição.
Denuncia que milhares de pessoas ficam diariamente alijadas do direito
constitucional ao lazer e à educação, total ou parcialmente, pois a programação
televisiva, tanto quanto as de cinema, teatro e das casas de cultura, mostra de
artes, feira de artes e de museus, não são acessíveis ao público com
deficiência, invariavelmente por falta de acessibilidade física e, certamente,
devido às barreiras atitudinais e comunicacionais, advindas da falta da oferta
de áudio-descrição das imagens e outras configurações visuais, que se tornam
inacessíveis às pessoas com deficiência visual, por conta da não oferta desse
serviço assistivo. Sustenta o direito de as pessoas com deficiência terem áudiodescrição
na Lei nº 10.098, no Decreto Federal
5.296/2004 e no Decreto
Legislativo 186/2008. Os autores fazem a assertiva de que o reconhecimento
legal, nacional e internacional dos direitos não basta para garantir às pessoas
com deficiência o desfrute de todos os seus direitos. Concluem que é urgente
que os operadores do direito tanto quanto os indivíduos com deficiência,
detentores do direito à áudio-descrição, saibam interpretar as leis garantidoras
desse serviço assistivo, entendê-lo, respeitá-lo e garanti-lo em todas as suas
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formas e instâncias
Abstract
The current article warns about the need and urgency of making audio
description service more widely available , as well as about the need of making
users aware of the benefits of such assistive tecnology. It denounces the fact
that thousands of people remain lacking their constitutional right to education
and entertainment, whether total or partially blind, since programs on television,
as well as cinema films, theaters and houses of culture, art exhibts, fairs of arts
and museums remain inaccessible to disabled citizens, as a rule, due to lack of
physical accessibility and, certainly, also due to attitudinal and communication
barriers, wherever there is no offer of audiodescription of images, this way, they
become inaccessible to people with disabilities. This article stresses the right to
audiodescription based on the following brazilian laws:
"Decreto Federal
"Lei nº 10.098";
5.296/2004" and on "Decreto Legislativo 186/2008". The
authors state that legal, national and international, acknowledgement of these
rights is not bottom-line in warranting that people with disabilities will actually
enjoy them. They conclude that it is urgent that law operators as well as people
with disabilities, owners of the right to audiodescription, know how to: interpret
the laws which guarantee this assistive service; understand such right; and
guarantee it in all its forms and instances.
1- Introdução
Segundo a ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e
Televisão), já em 2004 existiam 186 geradoras de programação no Brasil,
dentre as quais 34 estavam no estado de São Paulo.
De acordo com a Wikipedia, existem no Brasil 10 estações de TV
comerciais (Band; RBTV; CNT; Rede Diário; Rede Gazeta; Rede Globo; NGT;
Rede Record; SBT; Rede TV); 03 estatais (TV Brasil; NBR; Tv Cultura); 2
legislativas (TV Câmara; TV Senado); 1 judiciária (TV Justiça); 36 segmentadas
(Agronegócio: Canal do Boi; Terra Viva; Agro Canal; Novo Canal; Canal Rural;
Educativas: TV Cultura; Sesc TV; Canal Futura; TV Escola; Paraná Educativa;
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Esporte: TV Esporte Interativo; Jovem: MixTV; M1 Station TV; MTV Brasil;
Rede União; TV Mundial; Rede 21; PlayTV; Notícias: Record News; RIT
Notícias; Religiosas: Rede Gênesis; Rede Gospel; Rede Boas Novas; TV
Aparecida; TV Canção Nova; TV Século 21; Rede Vida; RIT TV; Rede Super;
TV Mundo Maior; TV Novo Tempo; Rede Familia; Vendas: Rede TV+; Polishop
TV; Shoptime.com; Shop Tour).
Isso significa que milhares de horas semanais de transmissão televisiva,
englobando lazer, cultura, educação, etc., chegam às casas dos milhões de
brasileiros espalhados entre os grandes centros e os locais mais longínquos do
nosso país. E destes milhões de brasileiros, 24,6 milhões têm alguma
deficiência. Segundo o IBGE (Censo 2000), 14,5% da população total do Brasil
apresentam algum tipo de deficiência, são pessoas com ao menos alguma
dificuldade de enxergar, ouvir, locomover-se, ou com alguma deficiência física
ou mental.
Ainda segundo o IBGE, entre 16,6 milhões de pessoas com algum grau
de deficiência visual, quase 150 mil se declararam cegos.
É importante destacar também que a proporção de pessoas com
deficiência aumenta com a idade, passando de 4,3% nas crianças até 14 anos,
para 54% do total das pessoas com idade superior a 65 anos. À medida que a
estrutura da população está mais envelhecida, a proporção de pessoas com
deficiência aumenta, surgindo um novo elenco de demandas para atender às
necessidades específicas deste grupo.
Dentre as pessoas com deficiência estão também aquelas com
deficiência física, que não podem manter-se em posição para assistir televisão
(dependendo das informações auditivas mais do que das visuais advindas da
televisão).
Todas essas pessoas, porém não só elas, ficam diariamente alijadas do
direito constitucional ao lazer e à educação, total ou parcialmente, devido ao
fato de que a programação televisiva, tanto quanto a de cinema, teatro e, por
vezes, das casas de cultura, mostra de artes, feira de artes, museus, etc., não
são acessíveis a esse público, invariavelmente por falta de acessibilidade física
e, certamente, devido às barreiras atitudinais e comunicacionais, mormente
aquelas advindas das imagens e outras configurações visuais não descritas,
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portanto, inacessíveis à pessoa com deficiência visual.
Compondo o grupo de pessoas excluídas do acesso aos conteúdos
televisivos, de cinema, teatro, museus e outros, estão também as pessoas
dislexas ou que são analfabetas, pessoas que têm dificuldade e, às vezes,
estão totalmente impedidas de entender o conteúdo escrito, por exemplo,
aqueles encontrados em filmes legendados ou em informações por escrito,
disponíveis aos visitantes de museus e similares.
De acordo com dados da Associação Brasileira de Dislexia, as pessoas
com esse transtorno ou distúrbio de aprendizagem têm a leitura, a escrita e a
soletração comprometidas, sendo este considerado “o distúrbio de maior
incidência nas salas de aula”. A ABD aponta, ainda, que “Pesquisas realizadas
em vários países mostram que entre 05% e 17% da população mundial é
disléxica”.
Em relação aos analfabetos, estima-se que, no ano de 2002, o número
de brasileiros analfabetos chegou a 14,6 milhões, sendo “11,8% da população
de 15 anos ou mais de idade, contra 17,2% em 1992. O País tinha 32,1
milhões de analfabetos funcionais, e 65,7% dos estudantes com 14 anos de
idade estavam defasados”. Todo esse contingente de pessoas analfabetas ou
alfabetizadas funcionais estão alijadas do direito de acesso à cultura, advindo
de filmes legendados, simplesmente pelo fato de esses filmes não terem
legendas áudio-descritas. Entretanto, são as pessoas com deficiência visual
que, em grande número, mais se beneficiarão da áudio-descrição e que, sem
ela, têm o seu direito de acesso à comunicação, à educação e à cultura
denegados, parcial ou totalmente.
Como fica patente, não podemos continuar a ignorar todas essas
pessoas e suas necessidades especiais de acesso aos bens e serviços, dentre
os quais a cultura e a educação, enquanto bens, e a áudio-descrição, enquanto
serviço para aquisição desses bens.
2- Marco Legal
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Vindo transformar essa realidade excludente e de negação de direitos
constitucionais às pessoas com deficiência visual (cegas ou com baixa visão),
com dislexia, com algumas deficiências físicas e intelectuais, bem como de
modo a ampliar o acesso à cultura e à educação aos milhares de cidadãos
brasileiros analfabetos, em 19 de dezembro de 2000, promulgou-se a Lei
Federal nº 10.098, importante lei sobre a acessibilidade comunicacional que,
quatro anos mais tarde, seria regulamentada pelo Decreto Federal 5.296, de
dezembro de 2004.
Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na
comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que
tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às
pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de
comunicação, para garantir-lhes o direito de acesso à informação, à
comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao
esporte e ao lazer. (Lei Nº. 10.098/2000).
De acordo com o decreto que regulamenta a Lei supracitada:
Art. 5
2. Caberá ao Poder Público incentivar a oferta de aparelhos de
televisão equipados com recursos tecnológicos que permitam sua
utilização de modo a garantir o direito de acesso à informação às
pessoas portadoras de deficiência auditiva ou visual.
Parágrafo único. Incluem-se entre os recursos referidos no caput:
I - circuito de decodificação de legenda oculta;
II - recurso para Programa Secundário de Áudio (SAP); e
III - entradas para fones de ouvido com ou sem fio.
Art. 53. A ANATEL regulamentará, no prazo de doze meses a
contar da data de publicação deste Decreto, os procedimentos a
serem observados para implementação do plano de medidas
técnicas previsto no art. 19 da Lei no 10.098, de 2000.
§ 1o O processo de regulamentação de que trata o caput deverá
atender ao disposto no art. 31 da Lei no 9.784, de 29 de janeiro de
1999.
§ 2o A regulamentação de que trata o caput deverá prever a
utilização, entre outros, dos seguintes sistemas de reprodução das
mensagens veiculadas para as pessoas portadoras de deficiência
auditiva e visual:
I - a sub-titulação por meio de legenda oculta;
II - a janela com intérprete de LIBRAS; e
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III - a descrição e narração em voz de cenas e imagens. (grifo
nosso, Decreto Nº. 5.296/2004)
Tais instrumentos legais ampliaram significativamente o conceito de
acessibilidade à comunicação, tanto trazendo às pessoas surdas a legenda,
em close caption, e janela com língua de sinais, quanto trazendo às pessoas
cegas a áudio-descrição, em canal secundário de áudio (canal sap). Não se
omitindo
quanto
determinaram
às
que
barreiras
esse
comunicacionais
acesso
deve
se
dar
em
outras
também
instâncias,
em
eventos
educacionais/acadêmicos, em conferências, congressos, seminários etc., onde
quer que imagens sejam exibidas e pessoas com deficiência visual delas
necessitem conhecer, para o lazer, educação ou outra razão.
Art. 59. O Poder Público apoiará preferencialmente os congressos,
seminários, oficinas e demais eventos científico-culturais que
ofereçam, mediante solicitação, apoios humanos às pessoas com
deficiência auditiva e visual, tais como tradutores e intérpretes de
LIBRAS, ledores, guias-intérpretes, ou tecnologias de informação e
comunicação, tais como a transcrição eletrônica simultânea.
(Decreto Nº. 5.296/2004).
Em uníssono com nossa Carta Maior, em junho de 2006, o Ministério
das
Comunicações
publicou
a
Portaria
310,
tornando
obrigatória
a
acessibilidade na programação das televisões abertas, em todo o território
nacional. Assim, ficou determinada a obrigatoriedade de veiculação diária de
programas com acessibilidade (no caso das pessoas com deficiência visual,
pela oferta da áudio-descrição), a princípio com duas horas, devendo
progressivamente ir aumentando até chegar a programação total.
O Ministério das Comunicações, ainda, concedeu carência de dois anos
para que as emissoras se preparassem para iniciar suas transmissões com
áudio-descrição e a legenda oculta em seus programas, respondendo ao
previsto pelo referido Decreto e à lei de acessibilidade comunicacional a que
ele regulamentava.
9.1.1 No prazo de 2 (dois) anos, contado a partir da publicação desta
Norma, para as estações transmissoras ou retransmissoras
localizadas em cidades com população superior a 1.000.000 (um
milhão) de habitantes. (Portaria 310, de 27 de junho de 2006).
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Em julho de 2008 o Ministério das Comunicações publicou a portaria
466, agora dando prazo de 90 dias para que as emissoras passassem a incluir
a áudio-descrição em seus programas, nos termos da mencionada Portaria 310
de 2006.
Em 14 de outubro de 2008, porém, o Ministro de Estado das
Comunicações, Ministro Hélio Costa, assinou a Portaria nº 661, suspendendo a
portaria anterior, não revogando, contudo, o previsto pelo Decreto 5.296 de
2006
e
demais
dispositivos
legais
que
sustentam
a
acessibilidade
comunicacional, já apresentados neste texto.
Rezava, então, a Portaria de 30 de julho de 2008, na qual o Ministério
das Comunicações definia o prazo de noventa dias para que se começasse a
oferta de áudio-descrição em canais televisivos:
Portaria nº 466, de 30 de julho de 2008
O MINISTRO DE ESTADO DAS COMUNICAÇÕES, no uso das
atribuições que lhe confere o art. 87, parágrafo único, incisos II e IV, da
Constituição,
Considerando que a Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000, incumbe
ao Poder Público promover a eliminação de barreiras na comunicação e
estabelecer mecanismos e alternativas técnicas que tornem acessíveis os
sistemas de comunicação às pessoas com deficiência sensorial e com
dificuldade de comunicação para garantir-lhes o direito, entre outros, de
acesso à informação, à comunicação, à cultura, e ao lazer,
Considerando que o Decreto no 5.296, de 02 de dezembro de 2004, que
regulamenta a mencionada Lei, alterado pelo Decreto no 5.645, de 28 de
dezembro de 2005, estabeleceu a competência do Ministério das
Comunicações para dispor, em Norma Complementar, acerca dos
procedimentos para a implementação dos mecanismos e alternativas
técnicas acima referenciados, determinando que esses procedimentos
deveriam prever a utilização de subtitulação por meio de legenda oculta,
janela com intérprete de LIBRAS e a descrição e narração em voz de
cenas e imagens,
Considerando que, além de investimentos, a implementação desses
recursos de acessibilidade pelas exploradoras de serviços de radiodifusão
de sons e imagens, nos termos do cronograma constante da Norma no
001/2006, aprovada pela Portaria no 310, de 27 de junho de 2006, requer
mão-de-obra especializada em quantidade suficiente para atender a
demanda do setor,
Considerando o requerimento apresentado pela Associação Brasileira de
Emissoras de Rádio e Televisão - ABERT em que noticia ser a quantidade
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de profissionais especializados na produção do recurso de áudiodescrição, existente atualmente no mercado nacional, insuficiente para
atender, nos termos do cronograma supracitado, a demanda do setor de
radiodifusão de sons e imagens, e
Considerando ainda que, na busca de solução para a questão
apresentada, o Ministério das Comunicações, em 23 de julho daquele ano,
promoveu reunião com representantes do setor de radiodifusão, do setor
de produção de áudio-descrição, do Comitê Brasileiro de Acessibilidade e
da União Brasileira de Cegos na qual obteve a garantia, dos
representantes do setor de produção de áudio-descrição e do
representante do Comitê Brasileiro de Acessibilidade e da União Brasileira
de Cegos, de que a demanda requerida pelo setor de radiodifusão poderia
ser atendida dentro do prazo de três meses com a formação de,
aproximadamente, cento e sessenta profissionais com a qualificação
exigida para a produção de áudio-descrição, resolve:
Art. 1o Conceder o prazo de noventa dias, contado da data de publicação
desta Portaria, para que as exploradoras de serviço de radiodifusão de
sons e imagens e de serviço de retransmissão de televisão (RTV) passem
a veicular, na programação por elas exibidas, o recurso de acessibilidade
de que trata o subitem 3.3 da Norma Complementar no 01/2006, aprovada
pela Portaria no 310, de 27 de junho de 2006, ficando mantidas as demais
condições estabelecidas no subitem 7.1 da mesma Norma.
Art. 2o Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
HÉLIO COSTA
3- O direito à Áudio-descrição no contexto do Decreto Legislativo 186 de
9 de julho de 2008
Seria redundância legal advogar pelo direito da pessoa com deficiência
aos bens e serviços culturais, bem como à equiparação de condições se esse
direito fosse de pronto respeitado. Acontece que não o é! Como confirma a
Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, “(...) as pessoas com
deficiência continuam a enfrentar barreiras contra sua participação como
membros iguais da sociedade e violações de seus direitos humanos em todas
as partes do mundo”. Portanto, também no Brasil.
Fosse nossa Carta Maior respeitada na íntegra, nenhuma outra lei seria
necessária se a pessoa com deficiência fosse, realmente, reconhecida como
pessoa, e enquanto tal fosse percebida como tendo direitos, não iguais às
demais, mas consoante as suas próprias necessidades e/ou características
específicas, visto que é assim que a Constituição Brasileira proclama.
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A todos deve ser garantido o direito de ir e vir, às pessoas com
deficiência devem adicionalmente ser garantidos os meios/recursos para que
exerçam aquele direito.
A todas as crianças é devido o direito à educação, às crianças com
deficiência este direito deve ser acompanhado pelo direito de acesso à escola,
de acesso aos ambientes educacionais, de acesso aos meios e recursos que
viabilizem a educação, etc.
Corrobora nosso entendimento, o fato de
a
referida Convenção reconhecer “a importância da acessibilidade aos meios
físico, social, econômico e cultural, à saúde, à educação e à informação e
comunicação, para possibilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo de
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais” (Decreto Legislativo
186/08).
Assim é que, sustentados na Convenção, defendemos que o direito à
cultura, ao lazer e tudo o mais que advém da aprendizagem pela cultura e da
saúde pelo lazer, devem estar garantidos a todas as pessoas, e isso significa
garanti-los a todas as pessoas, sem qualquer adjetivação. No entanto, a
adjetivação de um indivíduo em pessoa com deficiência requer tratamento
desigual, sem o que, é sabido, não se promoverá a igualdade dessas pessoas
com aquelas sem tal adjetivação.
garantidor
Portanto, a “re-edição” de dispositivo
do direito da pessoa com deficiência não se trata de mera
redundância. De fato, não fosse legislar pelo direito das crianças com
deficiência, pelo direito das mulheres com deficiência, pelo direito dos
trabalhadores com deficiência, enfim, pelo direito das pessoas com deficiência,
estas não seriam tidas como pessoas, trabalhadores, mulheres ou crianças.
Sumariando e, por assim dizer, re-editando a Carta Universal dos
Direitos da Pessoa Humana, agora com a adjetivação de pessoa humana com
deficiência, países de todo o mundo se unem para dizer que as pessoas com
deficiência são pessoas, e são pessoas com deficiência
que requerem
respeito e cuidado, consoante suas necessidades, porém sem paternalismos e
sem privilégios. De fato, reconhecer-lhes os direitos, garantir-lhes o acesso a
esses direitos é efetivamente dever de cada um dos indivíduos da sociedade
universal, e certamente não é privilégio e nem paternalismo.
Em uníssono com este entendimento, o Brasil reconhece e ratifica os
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ditames da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, na
forma de decreto legislativo com força de emenda constitucional (Decreto
Legislativo 186/2008).
Por si só este feito é um dos mais significativos passos no
reconhecimento de que o cidadão brasileiro com deficiência é pessoa humana,
como foi definido, pela primeira vez em nosso país, em nossa Constituição de
1988.
Não obstante, o reconhecimento legal, nacional e internacional dos
direitos da pessoa com deficiência não é suficiente para garantir a essas
pessoas o desfrute de todos os seus direitos. É mister que os operadores do
direito tanto quanto os cidadãos com deficiência, detentores desse
direito,
saibam interpretá-lo, entendê-lo, respeitá-lo e garanti-lo, em todas as suas
formas e instâncias.
Assim é que
se reconhece na Convenção que: “a deficiência é um
conceito em evolução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas
com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem
a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas”. Em outras palavras, reconhece-se
que a sociedade e suas barreiras atitudinais impõem incapacidades a essas
pessoas, que quando muito teriam limites inerentes às suas deficiências.
Máxime para as pessoas cegas, a advocacia de seus direitos passa pela
própria educação dos indivíduos com deficiência visual, quanto aos serviços a
que têm direito e dos meios ou vias para alcançá-los. Como afirmamos acima,
não se trata de requerer privilégios, mas de saber interpretar os instrumentos
jurídicos como ferramentas garantidoras da igualdade de acesso e desfrute do
que está socialmente disponível às pessoas não cegas.
Neste artigo fazemos um recorte do direito de acesso à comunicação, à
informação, à cultura, à educação e aos demais bens culturais, por meio da
áudio-descrição de eventos visuais, os quais sem este recurso limitam e/ou
impedem o pleno exercício do direito à educação, ao lazer e à cultura em geral.
A Convenção sobre o direito das pessoas com deficiência, por mais de
uma vez, nos permite sustentar a tese do direito à áudio-descrição,
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considerando a intencionalidade da Convenção e dos pressupostos que a
sustentam.
Já no primeiro artigo, a Convenção nos alerta para o fato de que as
pessoas com deficiência encontram barreiras físicas e sociais que “podem
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de
condições com as demais pessoas” (Decreto 186/2008).
Não é difícil perceber que a barreira comunicacional, advinda da
ausência de áudio-descrição, por exemplo nas peças publicitárias, quanto ao
uso de preservativos em que se pretende a educação das pessoas a respeito
de DST/Aids, exclui da população alvo dessas peças as pessoas cegas ou com
baixa visão a quem tais informações visuais não chegam.
Ora, o direito à saúde é direito de todas as pessoas, sejam elas sem
deficiência ou com essa adjetivação. Não propiciar, portanto, igualdade de
acesso à informação para as pessoas com deficiência visual é discriminá-las
por razão de deficiência, uma vez que não é a cegueira que as impede de
receber a informação, mas o obstáculo
ocasionado pela falta da áudio-
descrição, a qual é, em última instância, uma alternativa comunicacional para
os eventos visuais.
"Discriminação por motivo de deficiência" significa qualquer diferenciação,
exclusão ou restrição baseada em deficiência, com o propósito ou efeito de
impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o desfrute ou o exercício, em
igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais nos âmbitos político, econômico,
social, cultural, civil ou qualquer outro. Abrange todas as formas de
discriminação, inclusive a recusa de adaptação razoável;” (Decreto
Legislativo 186/2008)
O acesso à comunicação, no sentido mais amplo, está previsto na
referida Convenção, conforme se pode ler:
Artigo 2
Definições Para os propósitos da presente Convenção:
"Comunicação" abrange as línguas, a visualização de textos, o braille, a
comunicação tátil, os caracteres ampliados, os dispositivos de multimídia
acessível, assim como a linguagem simples, escrita e oral, os sistemas
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auditivos e os meios de voz digitalizada e os modos, meios e formatos
aumentativos e alternativos de comunicação, inclusive a tecnologia da
informação e comunicação acessíveis; (Decreto Legislativo 186/2008)
Consideremos, agora, o artigo terceiro, mormente quando diz:
Princípios gerais. Os princípios da presente Convenção são:
a) O respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual,
inclusive a liberdade de fazer as próprias escolhas, e a
independência das pessoas.
c) A plena e efetiva participação e inclusão na sociedade;
e) A igualdade de oportunidades;
f) A acessibilidade; (Decreto Legislativo 186/2008)
Seria flagrante afronta a tais princípios negar a uma pessoa com
deficiência visual o direito de, por si só, decidir o que e quando assistir na
televisão, cinema ou mesmo num DVD, condicionando-a tomar tal decisão se e
quando uma pessoa vidente lhe estivesse disponível para ler a legenda do
DVD, descrever a cena de um filme, ou o número de telefone exibido na tela
da televisão.
É mister, então, frisar que cada vez mais as pessoas precisam de
conhecimentos culturais gerais, muitos dos quais veiculados na televisão,
noticiários, documentários, etc, para a obtenção de emprego, por exemplo.
Assim, a áudio-descrição vem constituir-se numa ferramenta de acesso
laboral tanto quanto para o lazer e para a educação. Se às pessoas videntes
está garantido o acesso às informações visuais, estas devem, igualmente,
serem disponibilizadas às pessoas com deficiência visual. De outra forma,
essas pessoas estarão novamente sendo discriminadas por razão de
deficiência, já que nem mesmo o conceito de “adaptação razoável” pode servir
de justificativa para a não oferta da áudio-descrição.
Considerando as grandes cifras destinadas à produção das obras
televisivas e de cinema, o investimento de um percentual mínimo para a áudiodescrição não pode ser justificativa razoável para denegar direito fundamental
da pessoa com deficiência visual.
Ademais, uma vez áudio-descrito um filme, por exemplo, a áudio-
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descrição pode ser agregada como mais um produto derivado de uma dada
obra. Por exemplo, poder-se-á em um CD divulgar o áudio original do filme,
acrescido da áudio-descrição, o que permitirá que um motorista ouça seu filme
no carro, enquanto dirige. A áudio-descrição permitirá com que ele veja em sua
mente, aquilo que temporariamente seus olhos não podem alcançar.
Com a adoção
da Convenção como emenda constitucional à nossa
Carta Maior, o Brasil se compromete a pesquisar e desenvolver recursos de
acessibilidade, eliminando em todas as instâncias, pública ou privadas,
barreiras comunicacionais, atitudinais e outras, de modo a respeitar os direitos
fundamentais da pessoa com deficiência.
f) Realizar ou promover a pesquisa e o desenvolvimento de produtos,
serviços, equipamentos e instalações com desenho universal, conforme
definidos no Artigo 2 da presente Convenção, que exijam o mínimo
possível de adaptação e cujo custo seja o mínimo possível, destinados a
atender às necessidades específicas de pessoas com deficiência, a
promover sua disponibilidade e seu uso e a promover o desenho universal
quando da elaboração de normas e diretrizes;
g) Realizar ou promover a pesquisa e o desenvolvimento, bem como a
disponibilidade e o emprego de novas tecnologias, inclusive as tecnologias
da informação e comunicação, ajudas técnicas para locomoção,
dispositivos e tecnologias assistivas, adequados a pessoas com
deficiência, dando prioridade a tecnologias de custo acessível; (Decreto
Legislativo 186/2008)
Ora, a áudio-descrição se encaixa no previsto uma vez que advém de
pesquisa, inclusive acadêmica, registrada em dissertações e teses, bem como
em
artigos
científicos,
encontrados
em
universidades
de
renome
e
reconhecimento internacional.
Além disso,
a áudio-descrição permite o acesso a constructos
educacionais, por exemplo, na áudio-descrição de uma teleaula, ou de slides
apresentados, por exemplo na cadeira de neurofisiologia a alunos de
psicologia.
Desconsiderar o custo benefício desse recurso e a viabilidade de sua
implantação é tripudiar sobre nossa Constituição, sobre a emenda que agora
dela faz parte e principalmente sobre milhões de pessoas com deficiência
visual, com dislexia, com deficiência física e outras.
Especial atenção devemos dar para o papel da áudio-descrição na
garantia do direito de igualdade e oportunidade devido às crianças com
19
deficiência. Não podemos dizer que as crianças com deficiência visual terão
igualdade de oportunidades, menos ainda, igualdade de condições de
decidirem pelo que lhes é de direito, se essas crianças forem impedidas do
acesso às informações visuais como aquelas contidas nos materiais didáticos
(nos livros que trazem figuras, gráficos, mapas, etc.), nos materiais
paradidáticos e destinados ao lazer, os quais trazem fotos, figuras para pintar,
entre outros.
Uma criança cega que recebe a áudio-descrição das imagens contidas
em seu livro, melhor pode acessar as informações e conceitos dele advindos.
Uma criança com baixa visão que recebe a áudio-descrição de uma
figura pode melhor “visualizar” aquilo que está vendo e cujos detalhes não
distingue.
A aquisição dos conceitos de novos vocabulários, bem como a
oportunidade de discutir os eventos visuais com seus coleguinhas que
enxergam,
podem ser facilitados, mediados ou viabilizados pela áudio-
descrição.
Sem ela,
se desconsiderará mais um item
da Convenção, e por
conseqüência, aviltar-se-á mais uma vez nossa Carta Maior, ao se descumprir
o Decreto 186/08 em seu artigo 7.
Artigo 7
Crianças com deficiência
1. Os Estados Partes tomarão todas as medidas necessárias para
assegurar às crianças com deficiência o pleno exercício de todos os
direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de
oportunidades com as demais crianças.
2. Em todas as ações relativas às crianças com deficiência, o superior
interesse da criança receberá consideração primordial. (Decreto Legislativo
186/2008)
O reconhecimento de que não é a deficiência que incapacita a pessoa,
mas as barreiras que a ela são impostas, bem como a busca pela
independência moral, ética, física, profissional e de toda sorte, vem se somar
na tentativa de tornar as pessoas com deficiência livres das peias sociais que
as colocam como dependentes daqueles que não lhes devem mais do que o
respeito.
É sabido, que o ser humano, enquanto ser social depende de sua
20
espécie, no entanto, tal dependência não pode dar vez a uma relação de
privação das liberdades mais fundamentais a que toda pessoa humana tem
direito: a liberdade de ir e vir, a liberdade de acesso ao trabalho e lazer, a
liberdade de acesso às informações e a liberdade de expressar sobre elas.
Como tais liberdades têm sido denegadas, a Convenção traz, com
clareza solar, dispositivo que rejeita tal situação. E, ao fazê-lo, fundamenta
mais uma vez o pleito por uma áudio-descrição que esteja disponível em todas
as instâncias e a todas as pessoas que dela necessitem, para que o acesso à
informação e tudo que dele decorre, possa ser desfrutado pelas pessoas
cegas, tanto quanto as informações visuais são para as pessoas videntes. Sem
meias palavras, a Convenção diz:
Art 9 – Acessibilidade
1. A fim de possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma
independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida, os
Estados Partes tomarão as medidas apropriadas para assegurar às
pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de oportunidades com as
demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e
comunicação, inclusive aos sistemas e tecnologias da informação e
comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao
público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural. Essas
medidas, que incluirão a identificação e a eliminação de obstáculos e
barreiras à acessibilidade, serão aplicadas, entre outros, a:
b) Informações, comunicações e outros serviços, inclusive serviços
eletrônicos e serviços de emergência;
Artigo 21
Liberdade de expressão e de opinião e acesso à informação Os Estados
Partes tomarão todas as medidas apropriadas para assegurar que as
pessoas com deficiência possam exercer seu direito à liberdade de
expressão e opinião, inclusive à liberdade de buscar, receber e
compartilhar informações e idéias, em igualdade de oportunidades com as
demais pessoas e por intermédio de todas as formas de comunicação de
sua escolha, conforme o disposto no Artigo 2 da presente Convenção,
entre as quais:
a) Fornecer, prontamente e sem custo adicional, às pessoas com
deficiência, todas as informações destinadas ao público em geral, em
formatos acessíveis e tecnologias apropriadas aos diferentes tipos de
deficiência;
b) Aceitar e facilitar, em trâmites oficiais, o uso de línguas de sinais, braille,
comunicação aumentativa e alternativa, e de todos os demais meios,
modos e formatos acessíveis de comunicação, à escolha das pessoas
com deficiência; (grifo nosso)
d) Incentivar a mídia, inclusive os provedores de informação pela Internet,
a tornar seus serviços acessíveis a pessoas com deficiência; (Decreto
Legislativo 186/2008)
21
Como se vê, sobejamente, o Decreto, e a Convenção que ele aprova,
hora em comento, sintetiza a defesa pela dignidade humana da pessoa com
deficiência, pela igualdade de condições, pela igualdade de oportunidades,
pela igualdade de acesso, pela quebra de barreiras atitudinais, e, fortemente,
pela promoção da acessibilidade (física, cultural, comunicacional, entre outras).
A constante defesa desses direitos, ao longo da Convenção, de um lado
denuncia o quanto eles vêm sendo negados, de outro, diz da premência de
torná-los realidade, num momento histórico, em que milhões de pessoas por
todo o mundo são excluídas, desrespeitadas, discriminadas, por razão de
deficiência.
Certamente, a áudio-descrição não dará cabo de toda essa mazela
social, no entanto, enquanto um serviço mediador
de acesso à cultura,
enquanto um serviço assistivo de baixo custo e enquanto uma ferramenta de
acessibilidade comunicacional, contempla os princípios fundamentais desta
Convenção
e vem contribuir para a independência das pessoas com
deficiência, seu acesso à informação, à educação, ao trabalho e ao lazer.
Em suma, a áudio-descrição é um exemplo claro de que se pode fazer
muito, investindo economicamente pouco, para beneficiar a tantos.
A A-d, neste diapasão, é Acesso à Dignidade, é Acesso ao Direito, é
áudio-descrição.
4- Da necessidade da áudio-descrição
Pelo cenário até aqui exposto, do desconhecimento de que significa a
áudio-descrição
para
as
pessoas
que
dela
se
beneficiarão
e
do
desconhecimento que se tem das leis que sustentam a reivindicação pela
oferta
da
áudio-descrição,
urge
a
necessidade
de,
de
um
lado
divulgar/conscientizar os usuários do serviço da áudio-descrição a respeito da
existência deste, de seu direito de o exigir, e de os informar, acima de tudo, a
respeito dos benefícios que tal serviço trará às pessoas, mormente àquelas
com deficiência visual; de outro lado, é mister que profissionais sejam
treinados/capacitados na oferta do serviço de áudio-descrição, para trabalhar
nos diversos segmentos, teatro, cinema, televisão, museu e no sistema
educacional em geral.
22
Mais
do
que
isso,
contudo,
estamos
falando
de
que
essa
conscientização sobre a oferta da áudio-descrição resultará em propiciar a
centenas de milhares de pessoas o acesso ao lazer, à cultura e à própria
educação com qualidade, quesitos constitucionais, ainda hoje denegados às
pessoas com deficiência, quando as imagens estão no foco da questão.
Assim, crianças cegas não recebem livros com desenhos e outras
configurações gráficas bidimensionais; jovens não desfrutam da programação
televisiva, adultos são privados de áreas da ciência a qual poderiam estar
inseridos; idosos não aproveitam na totalidade os passeios que fazem, todos
pela ausência das informações advindas do contato com as imagens ou com o
contato precário com elas, quando são pessoas com baixa visão. E estas são
muitas, quando se considera que cerca de 95% dos idosos, com mais de 75
anos, terão alguma perda visual.
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a
garantia de:
(...) III - atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um;
(...) § 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público
subjetivo.
§ 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua
oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.
(Constituição Federativa do Brasil, 1988).
Na educação, a áudio-descrição permitirá a pessoas cegas pleitear
profissões nas áreas da arquitetura, da química, da geografia, das artes, da
computação, dentre outras que hoje são vistas como inatingíveis para as
pessoas cegas, uma vez que essas profissões fazem uso de grandes porções
de conteúdo visual. Não obstante, várias pessoas cegas ou com baixa visão já
estão nessas áreas, embora não tenham acesso às imagens por meio de
áudio-descrição. E isso exige delas grandes esforços e desprendimento de
energia que poderia estar sendo usada para outra atividade, caso a áudiodescrição lhes estivesse disponível.
Para as crianças pequenas, a áudio-descrição faculta o acesso a
conceitos novos e à elaboração de conceitos ainda não bem formados; permite
23
a aquisição de novos vocabulários e o acesso ao lazer, o qual será partilhado
com as demais crianças que enxergam, levando à inclusão de todas
(www.rnib.org.uk).
Exemplo disso é sua aplicação nos jogos (tipo vídeo-games). Crianças
cegas poderão jogar e discutir sobre o que jogaram, a que fase chegaram etc.,
falando com seu coleguinha que enxerga. E ambas as crianças poderão, então,
partilhar seu conhecimento sobre o jogo. Nos dias de hoje, essas situações são
raras e as crianças cegas ficam com poucas chances de discutir/brincar com
seus coleguinhas quando os jogos são o mediador ou assunto da conversa.
Os benefícios da narração descritiva, isto é, da áudio-descrição, pode
ser aquilatado a partir de uma áudio-descrição feita durante uma visita ao
museu. Nestes casos, a áudio-descrição feita por um áudio-descritor
conhecedor da capacidade das pessoas com deficiência visual em apreciar as
configurações bidimensionais, permitirá maior e adequada acessibilidade
dessas pessoas aos museus e seus conteúdos. Isso se alcançará, por
exemplo, pela utilização de recurso de áudio gravado, acessado a partir de um
aparelho de CD, em cuja mídia está um roteiro com a descrição das obras
apresentadas num dado trajeto.
Na apresentação de slides, tem-se orientado a inclusão de informação
sonora, podendo o apresentador gravar previamente o texto ou legenda
disponíveis no slide, bem como a descrição das imagens nele contidas.
(www.rnib.org.uk).
A áudio-descrição pode, ainda, servir como eliminador de preconceitos e
de discriminação como a que recentemente se viu ocorrer quando o TJ do
Maranhão negou a participação de candidato cego em concurso para
magistratura.
O presidente do TJ-MA, Raimundo Cutrin, disse, por meio de assessoria
de imprensa, que a atividade de juiz é incompatível com a falta de visão.
Segundo ele, juízes têm de fazer inspeções, correções e interrogatórios,
atividades que exigem “visão apurada”.
No último dia 7, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determinou reserva
de 5% a 20% das vagas para pessoas com deficiência em todos os
concursos para magistratura do país. A decisão não faz ressalva a cegos.
24
A determinação, contudo, dá autonomia aos tribunais para definir os
editais, observando a “compatibilidade entre as funções a serem
desempenhadas
e
a
deficiência
do
candidato".
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u459168. shtml
Para além do fato de que um juiz não deve prejulgar, nem mesmo
baseado naquilo que vê, sabendo que a visão pode ser facilmente iludida e
sabendo que, se de um lado é a visão que captura as imagens, de outro, é o
cérebro que as analisa e delas tira suas conclusões, apenas por preconceito se
pode aduzir que uma pessoa cega não seria capaz de exercer a função de
magistrado. Um juiz não deve julgar meramente pelo que lhe é apresentado às
vistas, mas julgar pelos fatos que lhes chegam à mente, à razão. Com efeito,
alhures, muitos são os exemplos de juízes cegos atuando nas mais diversas
áreas: Sir John Fielding (1721-1780), Bill Kempton; Diane Cram; John Lafferty,
Thomas “TJ” Loftus; Joseph Donahey; Richard Conway Casey; Richard B.
Teitelman, e uma dezena de outros magistrados.
A “lacuna” de acesso às informações visuais, largamente usada como
argumento para discriminar pessoas cegas no ofício do magistrado no Brasil,
pode ser tranquilamente suplantada por um áudio-descritor que atue como
perito em tradução visual, em auxílio ao juiz. E, como é sabido, ter o apoio de
peritos não é incomum na atuação dos magistrados que, por exemplo,
se
valem de perito que interprete fotos de um crime, identificando, por exemplo, se
a arma e o corpo estão em posições condizentes com esta ou aquela tese da
defesa ou da acusação.
Logo, o áudio-descritor judiciário pode colaborar com o magistrado com
deficiência visual ou com dislexia, mas também com eventuais cidadãos com
deficiência visual, e.g. pessoas idosas com baixa visão que, contra si, estão
sendo usadas imagens numa dada ação, da qual precisem de maiores
detalhes da imagem para melhor defender-se. A igualdade de condições no ato
de defender-se deve ser perseguida com a maior retidão, sob pena de, não
tendo esse direito respeitado, o cidadão com deficiência visual ser discriminado
por razão de deficiência (Lei 3.956/2001).
Com efeito, o excelso desembargador Antonio Fernando Bayma Araújo
reconheceu que se obrara preconceituosamente contra a pessoa com
25
deficiência, donde sentenciou que se suspendesse o concurso que negara a
participação de pessoas com deficiência visual.
Atendendo pleito da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB/MA), em Mandado de Segurança impetrado na última
segunda-feira, o desembargador Antonio Fernando Bayma Araújo
concedeu liminar suspendendo o concurso para preenchimento de vagas
para o cargo de juiz do Tribunal de Justiça do Maranhão até que seja feita
a readaptação do edital do certame, garantindo a participação de
portadores de deficiência visual total ou parcial, bem como a realização
das provas em “braile”, “ampliada”, “leitura de prova”, utilização de “ledor”
ou outros mecanismos de auxílio aos deficientes.
O desembargador afirmou que tentar proibir a participação de deficientes
visuais no concurso é uma atitude preconceituosa, discriminatória e
segregacionista, na medida em que, sem qualquer amparo legal, gera
prejuízos não só na órbita material do direito, mas, sobretudo, de ordem
moral e pessoal.
“A manutenção da regra, sem uma resposta imediata do Poder Judiciário,
causa transtorno não só a quem pretende se inscrever no concurso na
qualidade de deficiente, mas a toda a sociedade”, assinalou o
desembargador Bayma Araújo.
O desembargador considera que o TJ não pode incorrer na violação a
direito líquido e certo consistente no impedimento da participação dos
portadores de deficiência visual no concurso para provimento do cargo de
juiz de direito substituto de entrância inicial.
“Direito não se pede, exige-se. A igualdade é para todos, e não para uma
parte”, sentenciou o magistrado.
“A decisão do desembargador Bayma Araújo foi justa e coerente, tendo em
vista que o edital do mencionado concurso traz em seu bojo previsão
claramente inconstitucional, evidenciando um preconceito injustificáve e
promovendo uma acintosa violação aos direitos fundamentais da pessoa
humana”, ressaltou o presidente da OAB/MA, José Caldas Gois, ao ser
informado da decisão.
Para a OAB, na parte que proíbe a participação de cegos no concurso, o
edital é absolutamente contrário à lei e chega-se mesmo ao ponto em que
a regra estabelecida no mesmo implicaria na obrigação de que membros
do Poder Judiciário, com base em disposição ilegal, viesse a praticar ato
definido em lei como crime, ao indeferir, de plano, por exemplo, o pedido
de inscrição de pessoa cega ou portadora de deficiência visual.
“Se os empregadores privados não podem discriminar os trabalhadores,
para critérios de admissão em razão de serem portadores de deficiência,
com muito maior razão não pode o Estado, a Administração Pública e,
principalmente, o Poder Judiciário, a quem incumbe, a defesa da Ordem
Jurídico Constitucional.
A norma contida na Constituição visa promover, e não impedir, o ingresso
de todos, inclusive dos deficientes, em igualdade de condições, no serviço
público”, salientou a OAB no Mandado de Segurança. (
http://imirante.globo.com/jus-ma/plantao/plantao.asp?codigo1=811)
5- Considerações Finais
26
Como pudemos observar, são várias as áreas em que a áudio-descrição
respeita
o
direito
de
acesso
às
mais
diversas
formas
de
comunicação/informação a que as pessoas com deficiência têm direito.
Não é desconhecido, por exemplo, a linda, poética e significativa áudiodescrição feita pelo cosmonauta Iuri Alieksieievitch Gagarin, em que, ao ver a
terra de onde ninguém jamais vira antes, descreveu nosso planeta como: “A
Terra é azul!”, trazendo aos que a terra não podiam ver a informação de que
cor ela era. E quantos mundos azuis deixam de ser acessíveis às pessoas com
deficiência visual pela ausência da áudio-descrição, em particular, e pelas
demais barreiras comunicacionais em geral?
Enumerá-las é quase impossível, tantas são as formas que tomam, mas
uma coisa é possível fazer e é disso que estamos tratando aqui: romper com
barreiras, para a participação de todos numa sociedade para todos e que não
pára todos os que têm alguma deficiência.
Portanto, que atuemos em busca e defesa do recurso da áudiodescrição para que seja mais um serviço de tecnologia assistiva disponível às
pessoas com deficiência. E mais:
que esse serviço seja prestado com a
qualidade e freqüência que merecem seus usuários: a melhor!
BIBLIOGRAFIA:
AUDETEL, The European AUDETEL Newsletter: bringing television to life for
visually impaired audiences. Audetel Newsletter 1, November 1992, pp. 1-5.
AUDETEL CONSORTIUM. Audetel developments 1992-1995. VHS
videocassette (disponible en la ITC), 1995.
BARDISA, Lola. Cómo enseñar a los niños ciegos a dibujar. Madrid: ONCE,
1992.
BRASIL, Lei Nº. 10.098/2000. Disponível em http://agenda.saci.org.br
BRASIL, Decreto Nº. 5.296/2004. Disponível em http://agenda.saci.org.br
BRASIL, Portaria 310/2006. Disponível em
http://www.mc.gov.br/o-ministerio/legislacao/portarias
BRASIL, Portaria 466/2008. Disponível em
http://www.mc.gov.br/o-ministerio/legislacao/portarias
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao
BRASIL, Decreto Legislativo 186, de julho de 2008. Disponível em
http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/99423
LIMA, F. J. Ensinando reconhecer desenhos pelo tato: o efeito do treino no
27
desempenho de pessoas cegas na nomeação de figuras examinadas
hapticamente. Submetido à Pontifícia Universidade Católica do Paraná
(PUCPR), 2004.
ROYAL NATIONAL INSTITUTE FOR THE BLIND. Blind and partially sighted
adults in Britain: the RNIB survey. Londres: HMSO Publications, 1991.
WEISEN, Marcus. The AUDETEL Project: deliverable 2. Review of current
expertise on audiodescription. Londres: Royal National Institute for the Blind,
1992.
28
O Traço de União da Áudio-descrição
Versos e Controvérsias1
Francisco J. Lima2
Rosângela A. F. Lima3
Paulo A. M. Vieira4
Resumo
O presente artigo versa sobre a áudio-descrição, defendendo esse recurso
assistivo como meio de acessibilidade à informação, à comunicação, à
educação e à cultura para as pessoas com deficiência, mormente para as com
deficiência visual. Ilustra o uso da áudio-descrição em vários países e diz como
este direito tem sido requerido pelas pessoas com deficiência. Apresenta
razões para que se escreva áudio-descrição com o hífen, colocando em debate
a controvérsia sobre a grafia desse vocábulo, quando grafado sem o hífen.
Conclui fazendo a assertiva de que a áudio-descrição é recurso para a
acessibilidade e que “Acessibilidade” no cinema, no teatro e na televisão
implica na oferta de áudio-descrição às pessoas com deficiência visual. Ao
apresentar tal argumento, o presente artigo defende que com a
áudio-
descrição “Se você não vê, poderá ouvir; Se você não ouve, poderá ler; e Se
você não lê, poderá compreender”. Acrescenta que, se o leitor ainda não se
convenceu de que a áudio-descrição é acessibilidade à informação, à
comunicação, à educação e à cultura, ele deve convencer-se desse direito e
praticar essa acessibilidade, promovendo a cidadania, dignidade e respeito aos
direitos da pessoa humana, também nos museus, no cinema, nos teatros e na
televisão.
1
controvérsia(con.tro.vér.si:a) sf.1. Diferença de opiniões ou discussão quanto a uma ação,
afirmação, teoria, proposta ou questão; POLÊMICA2. P.ext. Ação de negar, contradizer ou de se
opor a algo; CONTESTAÇÃO; IMPUGNAÇÃO3. P.ext. Debate de idéias; POLÊMICA[F.: Do lat.
controversia, ae.] www.aulete.com.br
2
Professor adjunto do Centro de Educação, Universidade Federal de Pernambuco,
tradutor e intérprete, psicólogo, coordenador do Centro de Estudos Inclusivos. Email: [email protected]
3
Professora adjunto do Centro de Artes e Comunicação- UFPE, coordenadora do
Letras/Libras- Pólo UFPE.
4
Bacharel em Administração, colaborador do CEI (Centro de Estudos Inclusivos)
29
Abstract
The current article deals with audio description, upholding this assistive
resource as a medium of accessibility to: information; communication; education
and culture for people with disability, especially visually impaired people. It
presents the employment of audio description in many countries, and shows
how this assistive tool has been demanded by people with disability. It also
points out grammatical reasons for writing the Portuguese word “audiodescrição” with hyphen, putting in debate the controversy around the spelling of
this word, when written without hyphen. This article closes with the statement
that audio description is a resource for accessibility which in cinemas, theaters,
and television implies the offering of audio description for people with visual
impairment, and doing so, the current article emphasizes: “If you don‟t see you
will be able to hear. If you can‟t hear you will be able to read. If you can‟t read
you will be able to understand”. It adds: in case the reader isn‟t yet convinced
that audio description is accessibility to: information; communication; education
and culture, he should get convinced of this right, and putting it into practice
promotes: citizenship, dignity and respect for the rights of the human person, in
museums, cinemas, theater rooms and television.
1- Introdução
A narração (oral ou escrita) dos eventos tem sido uma opção há muito
utilizada para dar a conhecer a quem deles não participou, viu ou observou.
Como sabemos das “Histórias” e lendas antigas, seriam através dos
olhos e da fala de terceiros que se conheceriam as novas terras, a respeito das
quais os viajantes que delas voltavam, contavam suas experiências e
impressões. Contudo, tais narrativas eram entrecortadas por interpretações,
muitas vezes imprecisas, isso
quando não eram fantasiosas. Mesmo os
registros, em forma de imagens pintadas, esculpidas ou tecidas, podiam
representar o que se acreditava ter acontecido ou visto e não o que
verdadeiramente ocorrera.
Com o advento das tecnologias de registro audiovisuais, o gravador, a
filmadora e as câmeras fotográficas, o acesso aos elementos sonoros e visuais
30
dos eventos passaram a ser freqüentes e amplos, com mais precisão e
fidedignidade da imagem vista.
No entanto, na medida em que se ia deixando a narração e se
assumindo mais a apreciação da imagem, as pessoas com deficiência visual
passavam a ficar mais e mais de fora do mundo das informações, da
educação, da comunicação em geral, e do lazer, quando as imagens eram o
foco das apresentações.
Nas
últimas
décadas,
contudo,
um
movimento
internacional,
desencadeado nos Estados Unidos vem mudando essa situação.
Esteado na técnica da tradução visual e com o princípio de que todos
devem ter pleno acesso à informação, à comunicação, à cultura, à educação e
ao lazer, bem como com o entendimento de que cabe ao indivíduo decidir
sobre o que quer, como quer, quando quer ter a acesso a tudo isso, começouse a desenvolver o que veio a ser chamado de áudio-descrição.
Assim como a ortografia desse vocábulo apresenta um traço de união
que nos remete a uma nova construção, a partir da composição de elementos
distintos e com significados diversos bem conhecidos, o real sentido da áudiodescrição também nos remete a uma nova compreensão do direito à
informação e à comunicação. Por conseguinte, o significado dos vocábulos
áudio e descrição é bem mais que a união dos dois elementos que o compõem,
não sendo, portanto, a mera narração de imagens visualmente inacessíveis
aos que não enxergam. A áudio-descrição implica em oferecer aos usuários
desse serviço as condições de igualdade e oportunidade de acesso ao mundo
das imagens, garantindo-lhes o direito de concluírem por si mesmos o que tais
imagens significam, a partir de suas experiências, de seu conhecimento de
mundo e de sua cognição.
Destarte, se de um lado as imagens como estão, são inacessíveis às
pessoas com deficiência visual, de outro, expectadores com essa deficiência
estão desejosos de acesso aos construtos visuais das obras e dos eventos que
fazem parte de seu dia-a-dia.
“Pessoas com deficiência reivindicam no Congresso legendas e áudiodescrição na televisão.
MADRI, 23 de Setembro (EUROPA PRESS) -
31
O presidente do Comitê Espanhol de Representantes de Pessoas com
Deficiência (Cermi), Luis Cayo, solicitou nesta terça na Câmara dos
Deputados a propositura de uma “legislação que obrigue as televisões, os
meios áudio-visuais a fazer suas transmissões com legendas, em língua
de sinais e com áudio-descrição.
Durante sua intervenção na Comissão para as políticas de inclusão da
pessoa com deficiência, Cayo destacou que as televisões acessíveis às
pessoas com deficiência funcionam há vários anos em países como os
Estados Unidos, Grã Bretanha ou França, todavia “na Espanha é um tema
pendente”.
“Esperamos que nesta legislatura seja saudada esta dívida”, asseverou. 5
Sim, elas estão desejosas e conscientes do direito que têm à esse
acesso.
RESOLUÇÃO 96-13 -TELEVISÃO DIGITAL
CONSIDERANDO que a televisão desempenha um importante papel para
a educação e inclusão social e cultural e é o passatempo mais popular das
pessoas com deficiência visual;
CONSIDERANDO que as pessoas com deficiência visual perdem
informações cruciais devido ao grande conteúdo visual de programas de
televisão;
CONSIDERANDO que a áudio-descrição (sic) (uma narração descrevendo
ações, linguagem corporal, expressões faciais e cenários) já possibilita que
milhares de pessoas com deficiência usufruam dos programas de televisão
em alguns países;
CONSIDERANDO que pesquisas de opinião mostram que a vasta maioria
das pessoas com deficiência visual querem e precisam de áudio-descrição
de programas de televisão;
CONSIDERANDO que o artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos
Humanos reconhece o direito de todos de fazerem parte da vida cultural da
comunidade e beneficiarem-se de avanços científicos;
CONSIDERANDO que em alguns países a legislação sobre transmissão
televisiva reconhece o direito das pessoas com deficiência visual de
usufruírem da televisão com áudio-descrição;
CONSIDERANDO que o advento da televisão digital (que fará mais canais
disponíveis) fornece uma solução técnica para a transmissão e recepção
da áudio-descrição; e
CONSIDERANDO que os receptores digitais devem ser facilmente
utilizáveis por pessoas com deficiência visual a fim de que a televisão
digital lhes seja acessível;
Esta Quarta Assembléia Geral da União Mundial de Cegos, em convenção
na cidade de Toronto, Canadá, decide:
A.
Exigir dos legisladores que reconheçam o direito das pessoas com
deficiência visual de usufruírem da televisão e que dediquem uma parte da
capacidade de transmissão digital ao som da áudio-descrição à medida
que e quando a televisão digital estiver sendo introduzida;
5
http://www.europapress.es/epsocial/noticia-discapacitados-reivindican-congreso-subtitulos-
audiodescripcion-television-20080923172228.html
32
B.
Exigir dos canais de televisão que assumam um compromisso para
com seus espectadores com deficiência no sentido de introduzirem
serviços tão logo um método de transmissão do som da áudio-descrição
torne-se disponível; e
C. Exigir a cooperação dos fabricantes de receptores para que incorporem
as necessidades das pessoas com deficiência visual ou com baixa visão
no projeto dos receptores digitais.
Quarta Assembléia da União Mundial de Cegos (WORLD BLIND UNION)6
TORONTO, CANADÁ
26-30 AGOSTO 1996
Por toda a parte, à busca por uma Sociedade Inclusiva, as pessoas
com deficiência têm ocupado espaços e falado para serem escutadas. Suas
falas, ainda que um tanto abafadas pelos modelos tradicionais de exclusão e
de segregação, estão, contudo, sendo ouvidas cada vez mais. De fato, no que
concerne ao acesso à imagens visuais, as pessoas com deficiência visual vêm
logrando êxito, seja no estrangeiro, seja no Brasil. E isso pode ser visto nas
programações de teatros e cinemas ao redor do mundo.
No Caribe:
Em Cuba, filmes com sistema de áudio-descrição para pessoas com
deficiência visual.
ELIZABETH LÓPEZ CORZO
A Amostra de Cinema Cubano, com cinco filmes para cegos e pessoas
com baixa visão foi apresentada hoje, na cidade de La Habana, mediante o
sistema de áudio-descrição, método inovador na América Latina devido ao
enfoque mais integral que lhe outorga a ilha.
José Luis Lobato, cineasta e promotor do projeto, mencionou que na
Argentina houve um precedente dessa iniciativa mas, agora, Cuba é o
único país que trabalha em profundidade com uma amostra
cinematográfica desse tipo.
Este é um evento de importância mundial, uma vez que a nação caribenha
o desenvolve tendo em vista o usufruto conjunto de videntes e nãovidentes, completamente diferente do que ocorre em outras partes do
mundo, que só se destina aqueles com deficiência visual e também aqui se
promove a visita ao cinema como um centro cultural fora do âmbito
doméstico, disse ele.
Carlos Abel Ramirez, chefe do Departamento de Cultura, Educação e
Relações Públicas da Associação Nacional dos Cegos, classificou como
muito positivo o projeto devido ao seu cunho social e humano, pois o
objetivo desta entidade é a reabilitação integral de seus afiliados e de seu
ambiente social.
6
http://www.worldblindunion.org/en/documents/generalassembly/resolutions/Resolutions%201996.doc
33
Acrescentou que se amplia o conhecimento das pessoas com deficiência,
enquanto o povo também se instrui sobre as necessidades dessas
pessoas e em como podem ser satisfeitas.
O sistema supre, com a voz de um locutor, a falta de percepção das
imagens, através de descrições sonoras complementares que detalham os
gestos dos personagens, sua aparência, paisagens, e outros, e só foi
desenvolvida nos Estados Unidos, Espanha e Itália.
Robert Smith, Vice Presidente do Instituto Cubano de Arte e Indústria
Cinematográficas, afirmou que este é um método, que merece uma
atenção para alcançar seu objetivo comunicativo, mantendo a sua
integridade artística. Ele disse que em breve começarão a distribuir fitas
em todos os conselhos de Cuba, através dos Centros Provinciales del
Cine.
A continuidade do projeto é de extrema vontade de cultura do país, junto
com versões de outros programas na telinha disse Jorge Gonzalez, chefe
do Departamento de dublagem do Instituto Cubano de Rádio e TV, e
comentou que a apresentação está prevista durante o verão, a partir da
coleta em um canal nacional.
Até a data terão sido finalizadas as áudio-descrições de Viva Cuba, La
bella del Alhambra, Clandestinos, Páginas del diario de Mauricio e
Bailando Cha Cha Chá, enquanto se continua trabalhando nos títulos Se
permuta, El brigadista e Fresa y Chocolate.7
No Havaí:
Teatro Diamond Head para a Pessoa com Deficiência Visual
O Teatro Diamond Head está oferecendo áudio-descrição para as pessoas
com deficiência visual no segundo domingo de cada apresentação ao vivo
do teatro.
A seguinte lista de datas refere-se às suas apresentações durante esta
estação.
Título do Filme e Data da Apresentação
Meet Me in St. Louis - December 9 2007
Barefoot in the Park - February 10 2008
Flower Drum Song - March 30 2008
The Producers The Wizard of Oz - May 25 2008
The Wizard of Oz - July 20, 2008
Todas as apresentações são as 16:00 e oferecemos um disconto de $5
para as poltronas de $22 e $32, para as pessoas com deficiência visual.
Contato:
Melanie Garcia
Box Office Manager/Volunteer Coordinator
Diamond Head Theatre
520 Makapuu Ave.
Honolulu, HI 96816
(808) 733-0277, x.3108
Na Catalunha:
7
http://www.granma.cubaweb.cu/2008/06/05/cultura/artic08.html
8
http://www.acb.org/hawaii/#diamond
34
TV3 oferece 'La gran pellícula' com áudio-descrição para pessoas com
deficiência visual através da TDT.
Desde 16 de fevereiro a TV3 transmite através da TDT, 'La Gran Pel.lícula'
com a áudio-descrição para pessoas com deficiência visual. A televisão da
Catalunha habilitou um canal de áudio específico para a áudio-descrição,
como parte de um projeto que prevê um aumento progressivo da
programação acessível a pessoas com deficiência visual.
Toda semana, 'A Gran Pel.lícula‟, que é apresentado sexta-feira à noite, irá
incorporar comentários descritivos para que as pessoas com deficiência
visual possam acompanhar tudo o que acontece e que só é apresentado
através da imagem. Com este serviço de áudio, pessoas com deficiência
visual podem obter informação sobre todos os elementos necessários para
não perder o fio da meada do filme e também informações sobre as
atitudes e expressões dos personagens, movimentos, paisagens, o
figurino, e assim por diante.
TV3 fez os primeiros lançamentos de filmes com áudio-descrição no final
da década de 80, e mais tarde ofereceram-se séries como 'plats
bruts','Majoria absoluta‟ e „L‟un per l‟autre‟. Mas o projeto que agora se
coloca em prática planeja oferecer uma programação regular e estável
dirigida às pessoas com deficiência visual e ir ampliando-a. Para tornar
possível esta expansão, a Televisão da Catalunha, criou um sistema
tecnológico específico e apropriado. As áudio-descrições até agora vinham
sendo transmitidas através do sistema dual, e isso implicava na eliminação
da versão original ou o som estéreo do programa.
Agora, graças às TDT, TVC, se pode destinar um canal de áudio
exclusivamente para a áudio-descrição. Para ter acesso a este serviço
apenas necessita-se de escolher o canal correspondente dentro do menu
de áudios do receptor de TDT.
Há muitos anos, a acessibilidade é um objetivo prioritário da TVC.
Diariamente, são oferecidos espaços informativos traduzidos para a língua
de sinais catalã, e desde os primórdios do teletexto tem-se incentivado de
modo muito importante a legendagem destinada às pessoas com
deficiência auditiva.
A Legendagem foi inaugurada no ano de 1990, e desde então a oferta tem
aumentado ano após ano. No ano de 2006, foram emitidas um total de
mais de 10.000 horas legendadas no conjunto dos diferentes canais
(analógicos e digitais). No que concerne à programação, nestes momentos
é possível continuar com as legendas em qualquer tipo de programas:
informativos, documentários, desenhos animados, séries, filmes,
programas culturais e de entretenimento, etc.
No ano de 2003, também foi desenvolvido um sistema tecnológico próprio
que permite legendar em tempo real programas ao vivo. O programa
“Àgora” é oferecido com legendas, desde há quase dois anos, graças a
este sistema, e em 2007, começou-se também a legendar o programa “El
temps”.9
Em Portugal:
9
http://todosobremitele.blogcindario.com/2007/02/04639-tv3-ofrece-la-gran-pel-licula-conaudiodescripcion-para-personas-ciegas-a-traves-de-la-tdt.html
35
TV Cabo e Canal Lusomundo Gallery adaptam filmes Portugueses para
pessoas cegas
No próximo dia 24 de Fevereiro, o canal Lusomundo Gallery apresenta o
15º filme português com áudio-descrição(sic)
A TV Cabo/Canal Lusomundo Gallery exibiu o primeiro filme com áudiodescrição em 3 Dezembro de 2004. O filme "O Pátio das Cantigas" tornouse assim o primeiro filme português a incorporar a áudio-descrição.
No próximo dia 24 de Fevereiro, o filme “O Grande Elias”, de Arthur
Duarte, torna-se o 15º filme com áudio-descrição sincronizada à disposição
no canal Lusomundo Gallery da TV Cabo.
A um ritmo de um filme por mês, o leque dos filmes portugueses vão desde
os clássicos, sendo o mais velho de 1935 ("As Pupilas do Senhor Reitor"),
até aos filmes contemporâneos, com realizações datadas de 2003, como é
o caso de "A Selva" de Leonel Vieira.
Lista dos filmes com áudio-descrição
"O Pátio das Cantigas" de Francisco Ribeiro (Ribeirinho), 1941
Duração: 125 min. Estreou a 3 Dezembro 2004 (Dia Internacional
das Pessoas com Deficiência)
"O Costa do Castelo" de Arthur Duarte, 1943 Duração: 125 min.
Estreou a 28 Janeiro 2005
"O Leão da Estrela" de Arthur Duarte, 1947 Duração: 110 min. Estreou
a 20 Fevereiro 2005
"O Querido Lilás" de Artur Semedo, 1987 Duração: 104 min. Estreou a
30 Março 2005
"A Vida é Bela" de Luís Galvão Teles, 1982 Duração: 109 min. Estreou
a 29 de Abril 2005
"Um Crime de Luxo" de Artur Semedo, 1991, Duração: 87 min. Estreou
a 20 Maio 2005
"A Selva" de Leonel Vieira, 2003 Duração: 120 min. Estreou a 19 Junho
2005
“Fado, História d‟uma Cantadeira” de Perdigão Queiroga, 1947
Duração: 108 min. Estreou a 21 Julho 2005
“As Pupilas do Senhor Reitor” de Leitão de Barros, 1935 Duração: 102
min. Estreou a 26 Agosto 2005
“A Vizinha do Lado” de António Lopes Ribeiro, 1945 Duração: 115 min.
Estreou a 29 Setembro 2005
“Sonhar é Fácil” de Perdigão Queiroga, 1951 Duração: 94 min. Estreou
a 30 Outubro 2005
“O Pai Tirano” de António Lopes Ribeiro, 1941 Duração: 118 min.
Estreou a 30 Novembro 2005
“Maria Papoila” de Leitão de Barros, 1937 Duração: 98 min. 21
Dezembro 2005
“Os Três da Vida Airada” de Perdigão Queiroga, 1952 Duração: 98 min.
Estreou a 25 Janeiro 2006
Próxima estreia
“O Grande Elias” de Arthur Duarte, 1950, Duração: 124 min. Estreia a
24 de Fevereiro 2006.10
No Brasil:
10
http://www.acesso.umic.pt/tv/lusomundo.htm
36
Imagine o que não se pode ver
A experiência pernambucana
Espetáculo O menino que contava estrelas foi o primeiro a disponibilizar a
áudio-descrição no Recife.
Mariana, oito anos, é esperta. Morena, cabelos cacheados, inquieta.
Nasceu com deficiência visual, o que não está impedindo que ela comece como toda criança - a compreender o mundo que a cerca. Faz balé.
"Danço muito bem. Vou me apresentar no teatro da UFPE. Você
conhece?", pergunta a pequena. Mariana já está acostumada à aúdiodescrição. Viu Irmãos de Fé, do padre Marcelo Rossi, primeiro filme que
ofereceu o recurso no país. Na televisão, assiste a programas educativos
que permitem que ela construa as imagens que é impossibilitada de ver.
No último mês de outubro, a garotinha era uma das mais curiosas na
platéia da peça O menino que contava estrelas, que esteve em cartaz no
Teatro Joaquim Cardozo, no Recife.
Mariana nasceu com deficiência visual, faz balé, assiste TV e gostou da
peça Completando a "lista dos pioneiros", o espetáculo foi o primeiro no
Recife que disponibilizou a áudio-descrição. "A parte que eu mais gostei foi
a do dragão.
O menino encontrava um dragão de verdade. Ficou se tremendo".
A áudio-descrição da peça foi realizada pelos alunos do curso Imagens
que falam, detradução visual com ênfase em áudio-descrição, que está
sendo ministrado pelo professor Francisco Lima. Cego desde que nasceu,
há 44 anos, o professor - doutor em psicofísica sensorial - lida
profissionalmente com imagens desde 1996. "Trabalhei com a produção de
desenhos que podem ser reconhecidos pelo tato, um recurso que é
desconsiderado muitas vezes pelos próprios educadores".
Atualmente, o professor tem se dedicado a difundir a áudio-descrição que,
no caso do teatro, é feita ao vivo. "Repetimos a experiência na peça Os
cegos, que também estava no Joaquim Cardozo, e pretendemos continuar
fazendo isso. Inicialmente, com as peças deste teatro", explica.
No campo da arte, além dos palcos e do cinema, a áudio-descrição pode
ser utilizada também nos museus. "Seria uma descrição das obras que as
outras pessoas conseguem enxergar", complementa Francisco. Para
tornar as artes plásticas completamente acessíveis para pessoas cegas,
no entanto, os recursos sensoriais devem ser estimulados. Por que não,
por exemplo,disponibilizar reproduções das obras para que os deficientes
possam tocá-las?
"É preciso pensar em quais barreiras os deficientes enfrentam. Cada tipo
de deficiência é uma barreira diferente. Temos uma lei no Recife, por
exemplo, obrigando a fazer maquetes dos prédios públicos importantes,
que possam ser tocadas, para os deficientes conhecerem a arquitetura do
lugar. Mas isso não sai do papel", denuncia Anderson Tavares, idealizador
da consultoria Visibilidade, que trabalha com acessibilidade.
Diário de Pernambuco,
Imagine o que não se pode ver
Pollyanna Diniz - [email protected]
11
http://www.diariodepernambuco.com.br/2008/11/16/viver6_0.asp
37
Muito embora venham sendo várias as ações não governamentais
voltadas a respeitar o direito de as pessoas com deficiência assistir a um filme,
a uma peça teatral ou de visitar um museu
com acessibilidade; não obstante
os esforços das pessoas com deficiência visual em fazer o Ministério das
Comunicações entender que acessibilidade não é opção, mas sim necessidade
e direito;
a despeito da clareza solar de nosso ordenamento jurídico na
garantia do direito à informação, à educação e à cultura, as emissoras de TV
brasileiras, representadas pela ABERT, vêm fazendo lobby (e sendo acolhidas
pelo Mini-Com) contra a implantação da lei que assegura esse direito aos
milhares de cidadãos com deficiência, aqui incluídas pessoas com dislexia,
com deficiência intelectual e física.
E não só elas, mas também as pessoas idosas (com dificuldade de
leitura) e as pessoas analfabetas, uma vez que, no cinema e nos DVDs os
filmes são, em grande parte, legendados e não dublados, o que impede a
todas essas pessoas o acesso ao constitucional direito ao lazer que dessas
obras poderia advir, caso tivessem áudio-descrição, esse recurso que é
definido pela PORTARIA Nº 310, DE 27 DE JUNHO DE 2006 do Ministério das
Comunicações como sendo:
3.3. Áudio-descrição (sic): corresponde a uma locução, em língua
portuguesa, sobreposta ao som original do programa, destinada a
descrever imagens, sons, textos e demais informações que não poderiam
ser percebidos ou compreendidos por pessoas com deficiência visual. 12
A oferta da áudio-descrição eliminaria e/ou minimizaria a atitude
excludente de nossa sociedade que ainda não percebeu que não é a
deficiência que incapacita a pessoa, mesmo quando e onde lhe impõe limites.
Quem incapacita uma pessoa com deficiência é a própria sociedade que não
lhe respeita o direito de acesso aos bens e serviços disponíveis às pessoas
sem deficiência e que um contribuinte com deficiência, também ajuda pagar
com seus impostos.
Logo não se está falando de filantropia ou privilégio quando se reclama
pela a oferta da áudio-descrição, nem de um remendo desta. Estamos falando
12
http://acessibilidade.sigaessaideia.org.br/media/1/20060703-PORTARIA%20MC%20310%2006%20%20ACESSIBILIDADE%20NA%20RADIODIFUSAO.doc
38
da provisão de um serviço com qualidade para todos a toda hora, pois a toda
hora uma pessoa vidente pode ligar a televisão e assistir a um programa.
Assim, para que tenha mesma igualdade de acesso a essa programação é que
as pessoas com deficiência pleiteiam a áudio-descrição e a acessibilidade a ela
associada.
São 10:00 h e Joe, que é cego, quer ver televisão. A mulher e o filho de
Joe, que usufruem de capacidade de visão, não estão disponíveis para ler
o guia dos programas.
Mesmo que estivessem disponíveis, Joe tentará ser independente e não
quer aceder a essa informação através da sua família. É claro que pode ir
de canal em canal e esperar cada intervalo para perceber através do áudio
que programa é que está a ver. Isso é exatamente o que ele e outros
cegos têm feito ao longo dos anos, porque o guia da programação
tradicional é puramente visual. E num universo de mais de 200 canais, Joe
dispenderia todo o seu tempo navegando, em vez de se divertir com um
programa específico. Mas agora, Joe já não é obrigado a navegar
inutilmente, graças aos serviços desenvolvidos associados à sua STB.
Barreiras dos Media Convergentes para os Indivíduos Que São Cegos ou
Têm Baixa Visão13
De modo a responder ao direito de acesso à comunicação e à
informação, portanto, surge uma técnica, e um profissional que a emprega: a
áudio-descrição e o áudio-descritor, bem como são desenvolvidas tecnologias
para a aplicação dessa técnica.
Todavia,
a
áudio-descrição
não
é
uma
descrição
qualquer,
despretensiosa, sem regras, aleatória. Trata-se de uma descrição regrada,
adequada a construir entendimento, onde antes não existia, ou era impreciso;
uma descrição plena de sentidos e que mantém os atributos de ambos os
elementos, do áudio e da descrição, com qualidade e independência. É assim
que a áudio-descrição deve ser: a ponte entre a imagem não vista e a imagem
construída na mente de quem ouve a descrição.
Logo, a união dos sentidos se dá por uma ponte em cujas extremidades
estão a imagem e a descrição. Essa ponte, o áudio-descritor, vem conduzir a
imagem que sem a descrição será inacessível às pessoas com deficiência
visual, mas que, com a áudio-descrição, tomará sentido.
Com efeito, para Lívia Mota (2008), a áudio-descrição
13
http://acesso.umic.pt/tv/media.htm
39
“...é um recurso de acessibilidade que permite que as pessoas com
deficiência visual possam assistir e entender melhor filmes, peças de
teatro, programas de TV, exposições, mostras, musicais, óperas e outros,
ouvindo o que pode ser visto. É a arte de transformar aquilo que é
visto no que é ouvido,o que abre muitas janelas para o mundo para as
pessoas com deficiência visual. Com este recurso, é possível
conhecer cenários, figurinos, expressões faciais, linguagem corporal,
entrada e saída de personagens de cena, bem como outros tipos de
ação, utilizados em televisão, cinema, teatro, museus e exposições”.
(grifos nossos)
http://www.saci.org.br/index.php?modulo=akemi&parametro=22027
Estando disponível nos Estados Unidos e Europa, há umas 3 décadas,
no Brasil, a áudio-descrição ainda é motivo de
espanto para quem, pela
primeira vez ouve falar ou lê a respeito dessa tecnologia assistiva de acesso à
comunicação/informação.
Mercado inclusivo
10/Dez/2009
Nunca ouvi falar em audiodescrição. Até o dia em que uma amiga
publicitária, Neide Cavalcanti, disse que estava se formando na segunda
turma do curso de extensão de formação de audiodescritores ou imagens
que falam do Centro Estudos Inclusivos, que fica no Centro de Educação
Inclusiva (CEI) da UFPE. A técnica é usada para pessoas com deficiência
visual, com baixa visão e para os print deisability, os que têm dificuldade
de leitura, como analfabetos, crianças e disléxicos, por exemplo.
O coordenador do CEI, Francisco Lima, define a disciplina como uma
técnica de descrição voltada aos eventos visuais, imagens, fotos, filmes,
tornando-os compreensíveis a pessoas cegas, por intermédio da fala ou
escrita de quem descreve tais eventos.”
Moema Luna é jornalista e responsável pela coluna JC Marketing e
Comunicação
http://jc3.uol.com.br/comercial/coluna.php?canal=5&dth=2009-12-10
O próprio Ministério das Comunicações e outros têm dado provas de não
entender/saber o alcance dessa tecnologia e do que ela significa em termos de
direitos humanos. Exemplo disso é a deplorável e controversa Portaria 661/08
que protelou a obrigatoriedade de as televisões oferecerem áudio-descrição em
suas programações, conforme manda nosso ordenamento jurídico lei 10098/00
e decreto 5296/04.
Segundo Quico (2005),
Num estudo realizado em 1998, a American Foundation for the Blind
verificou que a maioria das pessoas com deficiências visuais que tinham
utilizado o serviço de Áudio-Descrição consideraram este como muito útil,
40
bem como davam preferência aos conteúdos com Áudio-Descrição (sic).
Os principais benefícios do serviço citados por pessoas invisuais ou com
deficiências visuais graves foram os seguintes:
- ficar a conhecer os ambientes visuais do programa,
- compreender melhor os materiais televisivos,
- sentir-se independente,
- sentir-se igual a uma pessoa sem deficiências visuais,
- sentir satisfação,
- alivio dos espectadores sem deficiência visual com quem assistiam aos
programas.14
E o desconhecimento sobre os benefícios da áudio-descrição perpassa
outras áreas sociais, como a da educação que, por seu ministério não obriga
que os livros didáticos estejam disponíveis aos alunos com deficiência visual
com a descrição dos
elementos visuais, muitas vezes necessários para o
completo entendimento e conseqüente aprendizagem do conteúdo desses
livros.
Em defesa da áudio-descrição
Pelo caráter incipiente da áudio-descrição no Brasil, até mesmo entre
alguns dos áudio-descritores brasileiros, verifica-se controvérsia, por exemplo,
quanto à grafia do termo áudio-descrição, o qual tem aparecido escrito como
“áudiodescrição”, “áudio descrição” e, mais freqüentemente, na forma de
“audiodescrição”. E como se grafa a palavra áudio-descrição, então?
Como se pode ver pela grafia adotada neste artigo, o autor optou por a
grafar com hífen, mantendo o acento agudo no a do primeiro elemento do
léxico.
Ao dizermos áudio-descrição, estamos dizendo de áudio e estamos
dizendo de descrição. Os termos mantêm individualmente seu sentido original,
porém, constituindo novo sentido, numa nova unidade semântica. Quanto à
prosódia e à grafia das palavras em separado, elas são mantidas, logo não
havendo razão que justificasse as unir na grafia ou as escrever em separado,
sem hífen. Isto é, a junção dos termos áudio e descrição pelo hífen leva ao
entendimento de uma nova construção semântica, com sentido próprio, sem
que cada termo se destitua por completo de seu sentido original.
14
http://www.acesso.umic.pt/tv/quico_audiodescricao_2005.doc.
41
Fundir áudio e descrição, sem a correta grafia, portanto, pode levar a
uma idéia imprecisa do que, de fato, ela é, um novo termo, com elementos
constitutivos conhecidos, mas que mantém a acentuação e demais atributos
gráficos dos elementos em separado e, por conseguinte, com sentido próprio e
distinto do significado que têm os termos áudio e descrição individualmente.
Quando se une diferentes elementos com hífen e não se perde o sentido
original de cada elemento constitutivo, constrói-se na relação uma nova
unidade semântica com sentido próprio e concernente ao novo vocábulo. Não
se dar conta disso é um equívoco que pode levar a conclusões errôneas.
No extrato abaixo vê-se exemplo do erro que o autor pode cometer,
quando a despreocupação com o uso da grafia correta ou o aligeiramento na
decisão de que escrita adotar dão lugar à pesquisa, ao estudo e, enfim, à
investigação científica minuciosa.
Você está com uma pressa danada e quer saber se "salário mínimo" se
grafa com hífen ou sem ele. Numa consulta ao dicionário, você
rapidamente vê "salário-mínimo" com hífen e se dá por satisfeito: vai usar
a expressão com o hífen.
Nada disso! Numa consulta mais atenta, você verá que "salário-mínimo"
com hífen tem um significado diferente do que está imaginando. A
expressão não significa o valor mínimo que o trabalhador brasileiro deve
receber como salário. Nesse caso, devemos grafar sem o hífen: "salário
mínimo". "Salário-mínimo" é uma expressão popular que possui outro
sentido: "Esse time é salário-mínimo" = "Esse time é muito fraco, não vale
nada".
Quando queremos nos referir à remuneração mínima dos assalariados,
utilizamos as palavras "salário" e "mínimo" no sentido básico delas, o que
não acontece na expressão com hífen, que é usada para adjetivar alguma
coisa.15
O
excelso, polêmico e não menos criticado gramático e filólogo da
língua portuguesa Napoleão Mendes de Almeida, confirma o uso de hífen,
quando os elementos constitutivos de um vocábulo mantém prosódia e grafia
originais, formando nova palavra com sentido próprio. E Napoleão concorda
com essa regra, sem deixar de seu purismo no que tange às normas
gramaticais e ortográficas, bem como sem deixar de ser crítico ferrenho do uso
de hífen, dizendo que esse traço-de-união “é desnecessário e mero „enfeite‟
que deve ser eliminado”.
15
http://campus.fortunecity.com/drew/273/orto.doc
42
Justifica-se o hífen em algumas das palavras compostas por justaposição,
a saber, naquelas formadas por dois termos que têm significação própria
quando isolados e, no se unirem para formar o composto, conservam
ambos, além da significação, a grafia e a prosódia que lhes são peculiares:
guarda-chuva, couve-flor, papel-moeda, amor-perfeito. “Justifica-se” ficou
dito, mas não nos esqueçamos de que esse enfeite existe quase que
exclusivamente no nosso idioma. (Almeida, 1996:244-245)
Alinhados com o Gramático, sustentamos que o uso do hífen não é
exclusivo de nossa Língua, como se pode verificar em outros idiomas como
no inglês e francês.
Com efeito, também nesses idiomas há os que adotam o traço-de-união
ao grafarem áudio-descrição. Seria mesmo por “enfeite”?
Audio-Description
Bernd Benecke
Bayerischer Rundfunk, Munich, Germany
RÉSUMÉ
L‟audio-description est présentée principalement selon deux axes: son
développement récent et les principales étapes de réalisation de ce mode
de transfert linguistique.
(A áudio-descrição é apresentada principalmente segundo dois eixos: seu
desenvolvimento recente e as principais etapas de realização deste modo
de transferência lingüística).
ABSTRACT
This paper deals mainly with two aspects of audio-description: the
development of this mode of language transfer and the main steps in the
preparation of an audio-description.
(Este artigo trata principalmente de dois aspectos da áudio-descrição: o
desenvolvimento deste modo de tradução lingüístico E os passos
principais no preparo da áudio-descrição).
MOTS-CLÉS/KEYWORDS
audio-description, blind and visually-impaired people, German TV
channels, recording
(Palavras chave áudio-descrição, pessoas cegas e com deficiência visual,
canais de televisão alemã, gravação)16
Centre Dramatique Régional de Tours
DE GAULLE EN MAI
Textes organisés par Jean-Louis Benoit
Extraits du Journal de l‟Elysée de Jacques Foccart
Avec Jean-Marie Frin, Arnaud Décarsin, Luc Tremblais, Laurent Montel,
Dominique Compagnon
Ce sont des extraits du journal de Jacques Foccart consacré à cette
période qui nous ont permis de construire ce spectacle (...)
16
http://www.erudit.org/revue/meta/2004/v49/n1/009022ar.pdf
43
Représentation avec audio-description
Jeudi 11 décembre 2008
(Estes são extratos do jornal de Jaques Foccart dedicados a este período
que nos permitiram construir este espetáculo: (...)
Representação com áudio-descrição.
Quinta, 11 de dezembro de 200817
Bringing ballet to the blind - News - audio-description at the Kentucky
Center for the Arts - Brief Article
Dance Magazine,
June, 2002
by Janet Weeks
Dancers aren't the only ones warming up before The Nutcracker
performances at the Kentucky Center for the Arts in Louisville. Out front, a
trained audio-description volunteer also prepares for a live performance. As
the flowers waltz, the volunteer, settled into the light booth or some other
suitable space, broadcasts an auditory scene for blind patrons who listen
from their seats using a receiver and earphone. The center's audiodescription program celebrates its tenth anniversary this season and for the
first time it's offering the service for modern dance as well as ballet
devotees.
(Trazendo Ballet aos cegos – Notícia – Áudio-descrição no Centro de
Artes de Kentucky- Breve artigo. Os dançarinos não são os únicos a se
aquecerem antes da apresentação do “The Nutcracker”, no Kentucky
Center for the Arts de Louisville. Lá na frente, um voluntário treinado em
áudio-descrição também se prepara para uma performance ao vivo)18
Ficando demonstrado o uso desse sinal gráfico em outros idiomas, em
mesma expressão de que fazemos uso, a saber, áudio-descrição e ficando
demonstrado que, até mesmo o grande Gramático brasileiro Napoleão Mendes
de Almeida reconhece a justificativa para o uso de hífen em vocábulo
composto, conforme citado, passemos a analisar, pois, o léxico áudiodescrição, quanto ao significado em separado de seus elementos e a relação
destes quando juntos.
Segundo o popular Dicionário do Aurélio:
Áudio: [De audi(o)- (q.v.).] S.m. 2. Cin. A parte sonora de um filme.
Descrição: [Do lat. Descriptione.] S.f. 1. Ato ou efeito de descrever. 2.
Exposição circunstanciada feita pela palavra falada ou escrita.
(FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda,2004)
Aqui, há de se notar que a descrição se presta “pela palavra falada ou
escrita”, portanto não sendo de se admirar que desse termo derivem áudio17
http://www.accesculture.org/?cat=77
18
http://findarticles.com/p/articles/mi_m1083/is_/ai_87022579
44
descrição, a descrição escrita de imagens estáticas (de fotografias, pinturas,
esculturas etc.), ou das expressões, figurinos em filmes e peças teatrais, tanto
quanto a parte sonora de um filme, em processo de legendagem para o
sistema close caption, voltado aos indivíduos surdos, cujo acesso aos áudios
do filme se dá, por exemplo, pela descrição dos sons necessários à
compreensão da obra e que não são deduzidos da informação visual ou escrita
da cena.
Consoante o excelso lexicógrafo Caldas Aulete:
Descrição: s.f. discurso por meio do qual se descreve ou representa
alguma coisa ou pessoa; narração circunstanciada; enumeração dos
caracteres que distinguem uma pessoa ou coisa.(Aulete, 1968)
Observemos que a narração a que o termo descrição nos remete,
quando da áudio-descrição é uma narração dos atributos visuais não
compreendidos dos diálogos e efeitos sonoros do filme, o que deixa patente a
manutenção desse significado ao se constituir a palavra áudio-descrição
(descrição com palavras, narração, dos eventos imagéticos, das características
da cena ou dos elementos dela).
Portanto, o termo descrição é
adequadamente aplicado nessa
construção do vocábulo para melhor determinar que a descrição não seja
confundida com interpretação. Com efeito, na áudio-descrição, descreve-se o
que se vê e não o que se pensa ou que se acha ter visto.
A áudio-descrição vem completar, ampliar o conhecimento que se pode
alcançar de uma dada cena ou filme, mas será a cognição que fará a diferença,
de fato. Assim, o papel do áudio-descritor é levar à mente do usuário do
serviço, por meio da descrição, oral ou escrita, aquilo que ele vê, da forma que
vê, com a maior completude e exatidão que o tempo lhe permitir, dentro de
regras e premissas profissionais, sólidas e éticas.
Para sustentarmos com maior profundidade este entendimento,
tomemos mais uma vez o que vem significar áudio e descrição, agora na
definição do renomado dicionário Michaelis:
áudio
áu.dio2
sm (lat audio) Telev 1 Faixa do espectro reservada ao som, em
45
contraposição ao vídeo. 2 Coluna do script destinada às falas e anotação
de sons.19
descrição
des.cri.ção
sf (lat descriptione) 1 Ação ou efeito de descrever. 2 Lit Tipo de
composição que consiste em enumerar as partes essenciais de um ser,
geralmente adjetivas, de modo que o leitor ou ouvinte tenha, desse
ser, a imagem mais exata possível. (grifos nossos)20
Como fica patente, a relação de script, de descrição circunstanciada, de
narração pela fala em registro oral ou pelo próprio registro escrito, bem como a
relação de tradução da imagem em som, tornando-o “oposição à imagem”, mas
correspondente ao filme, torna o vocábulo áudio-descrição um termo com
sentido específico e inovador, cujos elementos assumem o significado da
tradução visual mediado pelo audiodescritor.
Por assim dizer, então, o áudio-descritor é o (hífen) que une a obra ao
expectador, dando novo sentido a ambos, o sentido da acessibilidade, da
cidadania, do respeito que cada espectador deve ter ao se deparar com uma
obra, seja ela cultural, educacional ou outra.
Entretanto, mais que uma questão gramatical o hífen da áudio-descrição
é o traço de união entre a audição das pessoas com deficiência visual e a
imagem visual pretendida pelo autor; entre a inacessibilidade e a compreensão;
entre o desrespeito e o reconhecimento de direitos.
Ainda assim, lancemos olhos ao novo acordo ortográfico da língua
portuguesa, previsto para entrar em vigor no ano que nos soma à porta, e
vejamos o que ele nos diz:
Segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, apresentado por
Ernani Terra, o emprego do hífen (-)
continua a ser usado nas palavras compostas, na ligação dos
pronomes oblíquos enclíticos (colocados depois da forma verbal) e
mesoclíticos (colocados no meio da forma verbal) ao verbo e na ligação
dos sufixos de origem tupi: couve-flor, segunda-feira, entregá-lo, entregálo-íamos, sabiá- guaçu.21
19
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=%E1udio> Acessado em: quinta-feira, 27 de novembro de 2008.
20
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=%E1udio> Acessado em: quinta-feira, 27 de novembro de 2008.
21
http://abrale.com.br/biblioteca/Acordo_Ortografico_da_Lingua_Portuguesa.doc
46
O autor observa que “no entanto, as palavras em que se perdeu a noção
de composição deverão ser escritas sem o hífen”, o que não é o caso do
vocábulo áudio-descrição, em que se mantém o sentido dos elementos em
separado.
O autor observa ainda que não se usa hífen quando:
a) quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por r ou s:
antirreligioso, antissemita, contrarregra, cosseno
b) quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por vogal
diferente dela: antiaéreo, autoestrada, coeducação.
Em todos esses casos, certificamos que não é acolhida a justificativa da
grafia de áudio-descrição sem o (hífen).
Ao
consultarmos
o
site
http://www.colegiocastroalves.g12.br,
verificaremos que:
Nova Regra
Regra Antiga
Como Será
Não usamos mais
hífen em compostos manda-chuva, pára-quedas, pára- mandachuva, paraquedas,
que, pelo uso,
quedista, pára-lama, pára-brisa,
perdeu-se a noção pára-choque, pára-vento
paraquedista, paralama, parabrisa,
parachoque, paravento
de composição
Obs: o uso do hífen permanece em palavras compostas que não contêm elemento de
ligação e constitui unidade sintagmática e semântica, mantendo o acento próprio, bem
como naquelas que designam espécies botânicas e zoológicas: ano-luz, azul-escuro,
médico-cirurgião, conta-gotas, guarda-chuva, segunda-feira, tenente-coronel, beija-flor,
couve-flor, erva-doce, mal-me-quer, bem-te-vi etc.22
Também aqui, nada se vê que obsta o uso do hífen em áudio-descrição.
Pelo contrário, se confirma que nos casos em que os elementos mantêm
sentido e grafia originais, porém constituindo nova unidade semântica com
sentido próprio, a indicação é de se fazer uso desse traço-de-união.
22
http://www.colegiocastroalves.g12.br/L%C3%8DNGUA_PORTUGUESA.doc
47
E é pela união que devemos optar no caso da áudio-descrição, uma vez
que mais que a controvérsia sobre a grafia deste vocábulo, o debate a ser feito
é o da defesa de as pessoas com deficiência terem acesso à áudio-descrição,
como meio de resposta social à barreira comunicacional que os filmes e outros
recursos televisivos, de cinema, de teatros e outros impõem às pessoas cegas
ou com baixa visão, quando o recurso da A-d não é oferecido.
Logo, não nos debatamos pelo que há de controvérsia na A-d, mas nos
detenhamos no que nela nos une. Em outras palavras, não nos descuidemos
do traço que nos une na áudio-descrição: o direito humano de se ter acesso
com igualdade de condições e oportunidade aos bens e serviços devidos a
todos, sejamos pessoas com deficiência ou não.
Ademais, áudio-descrição é nada menos que acessibilidade, e
acessibilidade é áudio-descrição, significando que, como dizem os poetas,
Se você não vê, poderá ouvir;
Se você não ouve, poderá ler;
Se você não lê, poderá compreender.”
Entretanto, se você ainda não se convenceu de que áudio-descrição é
direito à informação, à comunicação, à cultura, lazer e educação, convença-se
de que ela é tudo isso e pratique a acessibilidade, promovendo a cidadania,
dignidade e respeito à pessoa humana, também nos museus, no cinema, nos
teatros e na televisão.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. 3. Ed.
São Paulo: Editora Ática, 1996. p. 244-245.
AULETE, Caldas. Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa. 5ª ed.
Rio de Janeiro, Delta S.A., 1968.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. 3ª ed. Revista e atualizada. Curitiba, ed. Positivo, 2004.
MOTTA,
Maria Villela de Mello.
Audiodescrição – recurso de
acessibilidade para a inclusão cultural das pessoas com deficiência
48
visual,
2008.
In:
http://www.saci.org.br/index.php?modulo=akemi&parametro=22027
QUICO, Célia. Acessibilidade e Televisão Digital e Interactiva: o caso particular
do serviço de Áudio-Descrição destinado a pessoas invisuais ou com
deficiências visuais graves". In: Estratégias de Produção em Novos Media,
Edição COFAC/ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. ISBN:
972-8881-08-8, 2005.
49
Mãe relata como sua filha começou a aprender a desenhar e
reconhecer desenhos táteis
Prezado Editor,
Meu nome é Rosângela Gera. Sou médica e mãe de uma garotinha de sete
anos que é cega.
Gostaria de compartilhar com os demais leitores desta revista, minha
experiência como mãe, vivenciando a escolarização da Laura
e sua
aprendizagem com desenhos,
numa escola comum, aqui em
Colatina, Espírito Santo.
Como disse, a Laura é uma
garotinha de 7 anos, que
cursou no ano de 2009 o
primeiro
ano
do
ensino
fundamental de 9 anos , já
tendo concluído, portanto, a
etapa da
Foto 1
educação infantil . Foto 1:
Laura com as
colegas na escola
brincando com uma caixa surpresa , elas pegam um objeto dentro da caixa e
tentam adivinhar o que é antes de retirá-lo .
Ela aprendeu a ler e escrever em braile, estudando na escola comum, junto
com seus colegas , confirmando a assertiva de que a expectativa sobre uma
criança cega quanto ao seu aprendizado pode ser a mesma de uma criança
vidente, desde que para a primeira, sejam aplicadas as estratégias
diferenciadas, necessárias para aquisição de habilidades .
Desde que Laura entrou na escola, aos 2,5 anos , rasgar , cortar, colar, picotar,
50
usar massinhas , palitinhos etc., fizeram parte do rico repertório de estímulos
que recebe uma criança para desenvolver sua coordenação
motora, a
concentração, atenção e tantas outras funções cognitivas . Porém, confesso
que
entre
essas
tantas
atividades
ofertadas
a
Laura
para
o
seu
desenvolvimento, uma lhe foi negligenciada, a do ato de desenhar, de levar a
sério o seu potencial para reconhecer desenhos .
Eu não tinha (nunca recebi)
informação
suficiente para
acreditar que deveria investir
nesse recurso com a minha
filha .
Por outro lado, na escola, as
professoras de minha filha,
até
então
nem
sequer
pensavam na possibilidade
Foto 2
de que seria possível que ela
tivesse êxito nessa habilidade. Foto 2: Laura na escola em atividade de
equilibrismo no projeto circo, andando em cima de uma corda e segurando um
bastão.
Na última semana de aula do ensino infantil, minha garotinha chegou em casa
chorando, contando que os colegas lhe disseram que “cego só faz rabiscos “.
E foi assim, com ela empunhando o lápis como uma criança pequena que
acabou de descobrir essa funcionalidade
e com esse sentimento de
impotência diante do ato
de
desenhar
que
começamos o ano letivo
de 2009, primeiro ano dela
no ensino fundamental.
51
Mas a Laura desejava desenhar, queria usar o lápis de cor como seus colegas;
a nova professora , com uma postura completamente diferente das professoras
dos anos anteriores, acreditava que minha filha, mesmo tendo uma deficiência
visual, poderia sim executar a atividade de desenhar e se propôs a estudar o
tema para descobrir estratégias que permitissem ensinar essa habilidade à
Laura . Foto 3: Papel com linhas feitas em relevo , e um espaço entre elas de cerca
de 3,0 cm e colocado em uma prancheta forrada que produz relevo no que é escrito
sobre ela . Uma letra R em EVA foi colada no papel. E a Laura vai escrevendo a letra
R observando o modelo e percebendo o traçado do que escreve.
Foto 3
Começamos por aquilo que lhe motivava,
o que desejava desenhar e uma atividade comum era que as crianças
desenhassem na própria agenda referências sobre o tempo naquele dia, se
estava ensolarado fazíamos um sol, se nublado, desenhávamos nuvens, e
assim por diante.
A professora, então, usou uma prancheta forrada com um material que
proporcionava relevo aos riscos que executava, de maneira que Laura podia
seguir com os dedos o desenho que ela havia feito. “Então o sol é redondo, e
dele saem os raios.“
Concluia
Laura
ao
examinar os desenhos
da professora.
De posse de um círculo
,
examinava
seus
contornos, contornavao e em seguida repetia
no
papel
começamos
formas
.
E
com
as
geométricas,
descobrimos que delas
Foto 4
ser derivadas .
várias figuras poderiam
52
Utilizamos
material
imantado com as formas
geométricas de
que
ela
maneira
montava
suas
figuras numa tela antes de
desenhá-las . Um dia fez
um palhaço, seu chapéu
que era um triângulo , seu
corpo
,
como
um
quadrado, as pernas no
formato
compridos
Foto 5
de
retângulos
,
retângulos
menores para os pés
e
assim por diante . Foto 5: Desenho de uma pessoa , feito cabeça, abdome ,
tórax e extremidades.
Também desenhou uma figura de mulher no dia das mães para ser colocado
no mural e foi muito emocionante
ver lá o seu desenho.
Foto 6: Desenho feito pela Laura
para ser colocado no mural para
o dia das mães. Descrição: O
desenho foi feito numa folha de
papel cor de rosa recortada na
forma
de
coração.
É
a
representação de uma mulher,
Foto 6
cabeça, pescoço, tórax, abdome e extremidades com lápis de cera preto. A
professora perguntou se iria deixar o seu desenho sem roupa então ela pintou
53
o torax e abdome de amarelo e decidiu vestir calça então pintou de vermelho
as pernas, depois pintou na região dos pés para fazer o calçado, também
vermelho. Fez quatro traços marrons saindo da cabeça em direção vertical
para baixo representando os cabelos. No canto superior esquerdo do papel
está escrito meu nome Rosangela feito em braile.
Em pouco tempo, com tantos estímulos para desenvolver esta habilidade, ela
já segurava no lápis apropriadamente e a professora sempre recomendava : “
“Rosângela não permita que Laura use o lápis de maneira incorreta em casa,
porque ela já sabe como usá-lo , aqui na escola”.
Dessa maneira ela rapidamente aprendeu a reconhecer as letras em bastão
em madeira e EVA daí para escrevê-las também não demorou :ela as escreve
com uma altura de cerca de 2,0cm e estamos em processo para reduzir suas
dimensões .
Também a utilização das formas geométricas para explicar o formato das letras
foi essencial: “O A que é um triângulo cortado na metade e o V que é um
triângulo de cabeça para baixo, sem o teto”. “O B que é uma reta com dois
semicírculos”, e por aí foi”.
Os seus livros passaram obrigatoriamente a ter que ter desenhos. Laura adora
descobrir e saber como é o corpo do bichinho de quem falamos , o
comprimento do rabo, o tamanho do chapéu , e quando não há desenhos, tal
qual as outras crianças da sua idade , ela pergunta: “ Esse livro não tem
figura?“
E para que nenhum “ desavisado “ sobre o tema pergunte : “ E pra que criança
cega quer desenho “?
Aqui, eu mesma tenho a resposta, pois é semelhante pergunta que faço
quando vejo um livro adaptado para o braile (destinado a crianças cegas), sem
as figuras e desenhos do livro original. São folhas e mais folhas impressas,
transcritas, sem nenhum desenho, sem nada que possa despertar o interesse
nesse sentido, e se fizéssemos o contrário ?,Se tirássemos os desenhos dos
livros infantis que vão para as demais crianças? Alguma ia se interessar por
54
ele?
Crianças cegas não são diferentes . Gostam de encontrar desenhos e outras
figuras em seus livros e mais do que isso, precisam deles .
Talvez a resposta seja a de que quem produz os livros não saiba de nada disso
e já passou da hora de saber.
A possibilidade de divulgar essas informações, de estudar mais sobre o tema,
de descrever nossas experiências, e de poder demonstrá-las é fundamental
para que esse assunto passe a fazer parte do cotidiano das escolas, das salas
de aula, onde alunos cegos são excluídos de uma atividade tão prazerosa e
significativa, como a do desenho.
Não podemos continuar negando essa oportunidade a nossas crianças; elas
não podem pagar o ônus da nossa ignorância sobre o tema . E precisamos
desmistificar a idéia do professor que diz ao pequeno aluno que quer tocar em
desenhos que acabaram de ser expostos no mural da sala:
“Tira a mão daí, menino. A gente vê com os olhos .!?!?!?”
Atenciosamente,
Rosângela Gera.
55
Descrição da Foto para capa
Fotografia em preto e branco nas dimensões 15 cm x 21 cm e formato
retrato, onde se vêem, em primeiro plano, duas figuras humanas - um homem e
uma mulher - em um flagrante de carnaval.
No segundo plano, mais ao longe, há pessoas desfocadas, em frente a
uma construção de tijolos aparentes, com duas janelas.
Vê-se, em parte, o lado esquerdo de uma mulher jovem, de rosto
arredondado, de olhos escuros, a qual fita um ponto à esquerda além da foto.
Ela usa chapéu de tonalidade clara e aba circular com laço de fita sobre a
56
copa. A mulher tem a pele morena e traja uma fantasia carnavalesca com
mangas volumosas, formadas em parte por tecido e em parte por lantejoulas
circulares e brilhantes. Seus lábios, em um suave sorriso, deixam-lhe à mostra
os dentes. Ela abraça um rapaz por trás, recostando-lhe a face direita no braço
esquerdo, pouco abaixo do ombro.
O homem é jovem, tem rosto alongado, cabelos curtos e crespos e a
pele morena. Está com a face voltada para o rosto da mulher que o abraça. Os
lábios do homem são grossos e estão levemente abertos. Ele traja uma camisa
clara com desenhos de coqueiros no lado inferior esquerdo e usa um cordão
escuro com pingente. Na mão direita, segura um pano à altura do abdômen.
Descrição de Ernani e Lívia Guedes
* * *
57
Artigos do Vol. 2, No 2 (2010)
Revista Brasileira de Tradução Visual:
Acesso à Informação e à Comunicação no Mundo Virtual
para Todas as Pessoas23
Romeu Kazumi Sassaki 24
Incontestável o valor da Revista Brasileira de Tradução Visual (RBTV),
recentemente tornada uma realidade em nosso país, graças ao longo e
persistente empenho envidado pelo professor Francisco José de Lima,
coordenador do Centro de Estudos Inclusivos (CEI), da Universidade Federal
de Pernambuco.
O valor da RBTV se deve a, pelo menos, três fatores: a demanda dos
potenciais usuários, o imperativo da legislação nacional e a pressão das
normas internacionais. Antes de descrever estes fatores, proponho que
relembremos, no próximo parágrafo, do que se trata a RBTV segundo a
proposta do próprio prof. Lima.
23
Citação bibliográfica:
SASSAKI, Romeu Kazumi. Revista brasileira de tradução visual: Acesso à informação e
à comunicação no mundo virtual para todas as pessoas. Recife/PE, ano I, n. 2, Mar/Jun
2010.
24
Consultor de inclusão social e autor dos livros “Inclusão: Construindo uma Sociedade para
Todos (7.ed., Rio de Janeiro: WVA, 2006)” e “Inclusão no Lazer e Turismo: em busca da
qualidade de vida (São Paulo, Áurea 2003).” E-mail: [email protected]
58
A RBTV é uma publicação eletrônica, dotada de acessibilidade
comunicacional, gratuita, aberta a todas as pessoas (com ou sem deficiência)
interessadas em conhecer, divulgar ou relatar experiência sobre estudos
imagéticos em diversos campos, tais como: cinema, televisão, teatro, museus e
outras mídias em que imagem e som sejam possíveis. A RBTV terá
fotodescrição, audiodescrição, legendagem, closed captioning, desenhos em
relevo, fotografia, pintura, escultura etc. A RBTV faz parte de um projeto maior
(Associados da Inclusão), que trabalhará pelo empoderamento da pessoa com
deficiência e que está descrito no site www.associadosdainclusao.com.br.
Demanda dos potenciais usuários
Durante séculos, a existência de pessoas com deficiência foi ignorada,
desconhecida ou desconsiderada sempre que fontes como as autoridades
constituídas e/ou os setores da sociedade civil: (1) aprovavam leis aplicáveis
supostamente a toda a população, (2) construíam ambientes destinados
supostamente a toda a população, (3) formulavam políticas públicas que
beneficiariam supostamente toda a população, (4) instalavam programas e
serviços utilizáveis supostamente por toda a população.
Nesses vários cenários, destaco, em função da RBTV, apenas um eixo
transversal: a comunicação bilateral entre fonte e usuário. Portanto, para as
fontes acima, as pessoas com deficiência não eram consideradas usuárias,
nem mesmo potencialmente. A comunicação entre fonte e usuário estava
bloqueada inadvertidamente ou até deliberadamente.
Entretanto, as pessoas com deficiência demandaram a acessibilidade
comunicacional a partir de 1980, em termos mundiais e de início timidamente.
No decorrer dos últimos 30 anos, essa demanda cresceu e se organizou,
tornando-se um poder de pressão junto às autoridades constituídas e à
sociedade civil com o objetivo de exigir plena acessibilidade comunicacional em
todos os ambientes abertos supostamente a toda a população.
59
As pessoas com deficiência passaram não só a exigir essa
acessibilidade, como também a oferecer conhecimentos e informações sobre
os modos pelos quais o acesso comunicacional deveria e deve acontecer.
Nesse período de três décadas, surgiu e se desenvolveu o lema “Nada sobre
nós, sem nós”. Ele significa que nada (lei, política pública, benefício, programa,
serviço, ambiente físico, transporte, tecnologia etc.) a respeito de pessoas com
deficiência deverá ser feito sem a participação das próprias pessoas com
deficiência em todo o processo de feitura: formulação, discussão, definição,
aprovação, implementação, monitoramento, avaliação e reformulação.
A RBTV é o resultado natural da demanda destes potenciais usuários.
Em processo simbiótico, a revista beneficiará diretamente as pessoas com
deficiência e, indiretamente, as pessoas sem deficiência.
Imperativo da legislação nacional
A legislação brasileira constitui outro fator desencadeante para a criação
da RBTV. Devemos cumpri-la. No que se refere à acessibilidade
comunicacional, nossas leis garantem as seguintes medidas, em resumo:
Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), instituído
pela Lei n. 9.998, de 17/8/2000, e regulamentado pelo Decreto n. 3.624,
de 5/10/2000. Cabe ao Ministério das Comunicações aplicar os recursos
do Fust, por exemplo, (a) Na implantação de acessos individuais para
prestação do serviço telefônico, em condições favorecidas, a
estabelecimentos de ensino, bibliotecas e instituições de saúde; (b) Na
implantação de acessos para utilização de serviços de redes digitais de
informação, destinadas ao acesso público, inclusive da internet, em
condições favorecidas, a estabelecimentos de ensino e bibliotecas,
incluindo os equipamentos terminais para operação pelos usuários; (c) Na
instalação de redes de alta velocidade, destinadas ao intercâmbio de
sinais e à implantação de serviços de teleconferência entre
60
estabelecimentos de ensino e bibliotecas; (d) No fornecimento de acessos
individuais e equipamentos de interface a instituições de assistência a
deficientes; (e) No fornecimento de acessos individuais e equipamentos
de interface a deficientes carentes.
Critérios e normas de acessibilidade, instituídos pela Lei n. 10.098, de
19/12/2000. A acessibilidade é aqui entendida como “a supressão de
barreiras e obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano,
na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de
comunicação”. O poder público: (a) Promoverá a eliminação de barreiras
na comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que
tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas
com deficiência visual, auditiva e com dificuldade de comunicação, para
garantir-lhes o direito de acesso à informação, à comunicação, ao
trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer; (b)
Implementará a formação de profissionais intérpretes de escrita em braile,
língua de sinais e de guias-intérpretes, para facilitar qualquer tipo de
comunicação direta à pessoa com deficiência visual, auditiva e com
dificuldade de comunicação. Os serviços de radiodifusão sonora e de
sons e imagens adotarão plano de medidas técnicas com o objetivo de
permitir o uso da língua de sinais ou outra subtitulação, para garantir o
direito de acesso à informação às pessoas com deficiência auditiva.
Política Nacional do Livro, instituída pela Lei n. 10.753, de 30/10/2003. São
diretrizes pela política, entre outras: assegurar ao cidadão o pleno
exercício do direito de acesso e uso do livro; assegurar às pessoas com
deficiência visual o acesso à leitura. São considerados livros, entre outros:
livros em meio digital, magnético e ótico, para uso exclusivo de pessoas
com deficiência visual e livros impressos no sistema braile. Cabe ao
Poder Executivo implementar programas anuais para manutenção e
atualização do acervo de bibliotecas públicas, universitárias e escolares,
incluídas obras em sistema braile.
61
Acesso da criança com deficiência à informação, assegurado no Artigo 23, da
Convenção sobre os Direitos da Criança, que foi promulgada pelo Decreto
n. 99.710, de 21/11/1990. Assim, o Brasil assumiu o dever de promover,
com espírito de cooperação internacional, um intercâmbio adequado de
informações nos campos da assistência médica preventiva e do
tratamento médico, psicológico e funcional das crianças com deficiência,
inclusive a divulgação de informações a respeito dos métodos de
reabilitação e dos serviços de ensino e formação profissional, bem como
o acesso a essa informação, a fim de que o nosso país possa aprimorar
sua capacidade e seus conhecimentos e ampliar sua experiência nesses
campos.
Política Nacional para a Integração da Pessoa com Deficiência, disposta pela
Lei n. 7.853, de 24/10/1989, tendo esta lei sido regulamentada pelo
Decreto n. 3.298, de 20/12/1999. Cabe aos órgãos e às entidades do
poder público (1) Assegurar à pessoa com deficiência o pleno exercício
de seus direitos básicos (por ex., educação, cultura); (2) Garantir o efetivo
atendimento das necessidades (por ex., comunicacionais) de pessoa com
deficiência, sem o cunho assistencialista; e (3) Viabilizar as seguintes
medidas: (a) Promover o acesso da pessoa com deficiência aos meios de
comunicação social; (b) Apoiar e promover a publicação e o uso de guias
de turismo com informação adequada à pessoa com deficiência; (c)
Incentivar a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico em todas as áreas
do conhecimento relacionadas com a pessoa com deficiência. São
objetivos desta Política Nacional, entre outros, o acesso, o ingresso e a
permanência da pessoa com deficiência em todos os serviços oferecidos
à comunidade.
Combate à discriminação, compromisso adotado pelos signatários da
Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de
62
Discriminação contra as Pessoas com Deficiência, promulgada pelo
Decreto n. 3.956, de 8/1/2001. Assim, o Brasil se comprometeu a tomar
medidas de caráter legislativo, social, educacional, trabalhista ou de
qualquer outra natureza, para, entre outras ações, (a) Eliminar
progressivamente a discriminação e os obstáculos de comunicação; (b)
Colaborar para o desenvolvimento de meios e recursos destinados a
facilitar ou promover a vida independente, a auto-suficiência e a
integração total, em condições de igualdade, à sociedade das pessoas
com deficiência; (c) Criar canais de comunicação eficazes que permitam
difundir entre as organizações públicas e privadas que trabalham com
pessoa com deficiência os avanços normativos e jurídicos ocorridos para
a eliminação da discriminação contra as pessoas com deficiência.
Sistemas e meios de informação e comunicação, utilizados, com segurança e
autonomia, total ou assistida, por pessoas com deficiência ou mobilidade
reduzida, assegurados pelo Decreto n. 5.296, de 2/12/2004. Tornou-se
obrigatória, 12 meses após a publicação deste Decreto, a acessibilidade
nos portais e sítios eletrônicos da administração pública na rede mundial
de computadores (internet), para o uso das pessoas com deficiência
visual, garantindo-lhes o pleno acesso às informações disponíveis. Os
telecentros comunitários instalados ou custeados pelos Governos federal,
estadual, municipal ou do Distrito Federal devem possuir instalações
plenamente acessíveis e, pelo menos, um computador com sistema de
som instalado, para uso preferencial por pessoas com deficiência visual.
Caberá ao poder público incentivar a oferta de aparelhos de telefonia
celular que indiquem, de forma sonora, todas as operações e funções
neles disponíveis no visor, bem como de aparelhos de televisão
equipados com recursos tecnológicos que permitam sua utilização de
modo a garantir o direito de acesso à informação às pessoas com
deficiência auditiva ou visual. Nesses recursos, incluem-se: (a) o circuito
de decodificação de legenda oculta; (b) o recurso para Programa
Secundário de Áudio (SAP); (c) as entradas para fones de ouvido com ou
sem fio. Estes recursos deverão ser obrigatoriamente contemplados pelo
63
projeto de desenvolvimento e implementação da televisão digital. Cabe
ainda ao poder público: (1) Adotar mecanismos de incentivo para tornar
disponíveis em meio magnético, em formato de texto, as obras publicadas
no Brasil [a indústria de medicamentos deve disponibilizar exemplares de
bulas dos medicamentos em meio magnético, braile ou em fonte ampliada
e os fabricantes de equipamentos eletroeletrônicos e mecânicos de uso
doméstico devem disponibilizar exemplares dos manuais de instrução em
meio magnético, braile ou em fonte ampliada]; (2) Apoiar
preferencialmente os congressos, seminários, oficinas e demais eventos
científico-culturais que ofereçam apoios humanos às pessoas com
deficiência auditiva e visual, tais como tradutores e intérpretes da Língua
de sinais brasileira (Libras), ledores, guias-intérpretes, ou tecnologias de
informação e comunicação, tais como a transcrição eletrônica simultânea.
A Anatel, através do Decreto n. 5.645, de 28/12/05, regulamentou a
utilização, entre outros, dos seguintes sistemas de reprodução das
mensagens veiculadas para as pessoas com deficiência auditiva ou
visual: (a) subtitulação por meio de legenda oculta; (b) janela com
intérprete da Libras; e (c) descrição e narração em voz de cenas e
imagens.
Requisitos de acessibilidade no ensino superior, dispostos pela Portaria n.
3.284, de 7/11/2003. Para fins de autorização e reconhecimento e de
credenciamento de instituições de ensino superior, bem como para
renovação, o Ministério da Educação determina os seguintes requisitos de
acessibilidade, entre outros: (1) Em relação a alunos com deficiência
visual, a instituição interessada deve manter sala de apoio equipada com
máquina de datilografia braile, impressora braile acoplada ao computador,
sistema de síntese de voz, gravador e fotocopiadora que amplie textos,
software de ampliação de tela, equipamento para ampliação de textos
para atendimento a alunos com baixa visão, lupas, réguas de leitura,
scanner acoplado a computador. (2) Em relação a alunos com deficiência
auditiva, a instituição deve propiciar intérprete de língua de sinais/língua
portuguesa, especialmente quando da realização e revisão de provas,
64
complementando a avaliação expressa em texto escrito ou quando este
não tenha expressado o real conhecimento do aluno.
Pressão das normas internacionais
Antes do advento da internet, a pressão internacional - para que cada
país implementasse os tratados de direitos referentes a pessoas com
deficiência - tinha pouca força de influência, embora conhecida e apoiada no
interior dos meios especializados. Já com a globalização nas comunicações
virtuais, essa pressão se tornou ágil, instantânea, abrangente, enfim poderosa.
Uma das inúmeras bandeiras defendidas pelo segmento das pessoas
com deficiência é a da acessibilidade comunicacional, seja ela digital, em
pessoa, por escrito, por telefonia ou qualquer outro meio. A RBTV é também
uma resposta à pressão internacional por uma comunicação totalmente
acessível de, para e sobre pessoas com deficiência em toda a sua diversidade.
Mas a mobilização mundial pela acessibilidade comunicacional remonta
aos primórdios da luta pelos direitos protagonizada por pessoas com
deficiência, pois o direito à informação e à comunicação acessíveis fazia parte
do conjunto de direitos. A mobilização, portanto, teve a seguinte trajetória
histórica:
Ao longo dos 12 meses de 1981, foi realizada uma enorme quantidade
de ações em comemoração ao Ano Internacional das Pessoas Deficientes
(AIPD), instituído em 16/12/1976 (Resolução 31/123) pela Organização das
Nações Unidas (ONU). O lema do AIPD já dizia tudo: “Participação Plena e
Igualdade”, ou seja, participação das pessoas com deficiência em todas as
áreas da sociedade com igualdade em dignidade e em direitos (conforme
estabelecidos na Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, de
9/12/1975).
Em 3/12/1982, através da Resolução 37/52, a ONU adotou o Programa
Mundial de Ação relativo às Pessoas com Deficiência (PMAPD), que contém
65
detalhes operacionais sobre como implementar todos os direitos das pessoas
com deficiência, formulados durante o AIPD.
O período de 1983 a 1992 foi oficializado como a Década das Pessoas
Deficientes das Nações Unidas (Resolução 37/53, de 3/12/1982) e utilizado
para avançar mais ainda na implementação dos direitos defendidos no acima
referido PMAPD.
Em 14/10/1992, a ONU instituiu o Dia Internacional das Pessoas com
Deficiência para ser comemorado anualmente no dia 3 de dezembro, também
para difundir, defender e implementar os direitos destas pessoas (Resolução
47/3).
Em 20/12/1993, a ONU lançou as 22 Normas sobre a Equiparação de
Oportunidades para Pessoas com Deficiência, documento no qual o direito de
acesso ao ambiente físico e à informação e comunicação constitui a Norma 5
(Resolução 48/96).
Finalmente, em 13/12/2006, a ONU adotou a Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi ratificada pelo Brasil com valor
de emenda constitucional através do Decreto Legislativo n. 186, de 9/7/2008, e
promulgada pelo Decreto n. 6.949, de 25/8/2009.
Este documento reconhece a importância da acessibilidade aos meios
físico, social, econômico e cultural, à saúde, à educação, à informação e
comunicação, para possibilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo de
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. O conceito de
comunicação abrange as línguas, a visualização de textos, o braile, a
comunicação tátil, os caracteres ampliados, os dispositivos de multimídia
acessível, assim como a linguagem simples, escrita e oral, os sistemas
auditivos e os meios de voz digitalizada e os modos, meios e formatos
aumentativos e alternativos de comunicação, inclusive a tecnologia da
informação e comunicação acessíveis. O conceito de língua abrange as línguas
faladas e de sinais e outras formas de comunicação não-falada.
De acordo com este tratado internacional de direitos humanos, são
obrigações dos Estados Partes, entre outras, (a) Realizar ou promover a
pesquisa e o desenvolvimento de produtos, serviços, equipamentos e
66
instalações com desenho universal; (b) Realizar ou promover a pesquisa, o
desenvolvimento, disponibilidade e o emprego de novas tecnologias, inclusive
as tecnologias da informação e comunicação, ajudas técnicas para locomoção,
dispositivos e tecnologias assistivas, adequados a pessoas com deficiência; (c)
Tomar medidas a serem aplicadas, entre outros, a informações, comunicações
e outros serviços, inclusive serviços eletrônicos; (d) Promover o acesso de
pessoas com deficiência a novos sistemas e tecnologias da informação e
comunicação, inclusive à internet; (e) Promover, desde a fase inicial, a
concepção, o desenvolvimento, a produção e a disseminação de sistemas e
tecnologias de informação e comunicação, a fim de que esses sistemas e
tecnologias se tornem acessíveis a custo mínimo; (f) Assegurar que as pessoas
com deficiência possam exercer seu direito à liberdade de expressão e opinião,
inclusive à liberdade de buscar, receber e compartilhar informações e ideias,
em igualdade de oportunidades com as demais pessoas e por intermédio de
todas as formas de comunicação de sua escolha (por ex., incentivando a mídia,
inclusive os provedores de informação pela internet, a tornar seus serviços
acessíveis a pessoas com deficiência); (g) Tomar medidas para que as
pessoas com deficiência possam ter acesso a bens culturais em formatos
acessíveis, ter acesso a programas de televisão, cinema, teatro e outras
atividades culturais, em formatos acessíveis e ter acesso a locais que ofereçam
serviços ou eventos culturais, tais como teatros, museus, cinemas, bibliotecas
e pontos turísticos, bem como, tanto quanto possível, ter o acesso a
monumentos e locais de importância cultural nacional.
Conclusão
Pelo exposto, a Revista Brasileira de Tradução Visual é, no contexto do
segmento das pessoas com deficiência, um produto natural da demanda dos
potenciais usuários, do imperativo da legislação nacional e da pressão das
normas internacionais. A RBTV é, também, uma solução ao problema central
67
apontado nestes três fatores. A RBTV tem um enorme desafio a enfrentar,
contribuindo com a sua parte em benefício dos quase 26 milhões de pessoas
com deficiência existentes em nosso país.
68
A TEORIA NA PRÁTICA: ÁUDIO-DESCRIÇÃO, UMA INOVAÇÃO NO MATERIAL
DIDÁTICO
Paulo André de Melo Vieira
Francisco José de Lima
RESUMO
O presente artigo aplica em duas atividades de ciências a técnica da áudio-descrição,
a qual consiste na transmissão por meio oral/textual dos elementos essenciais
oriundos de uma determinada imagem que esteja presente em uma dada forma de
expressão cultural, desde um filme do cinema às páginas dos livros didáticos,
permitindo, especialmente em relação a estes últimos, que suas mensagens e
conteúdos sejam compreendidos pelo aluno com deficiência visual ou com baixa
visão. Isto será comprovado através de dois exemplos práticos de como a áudiodescrição favorece a compreensão de atividades presentes no livro didático. Os
benefícios da técnica serão apresentados segundo a literatura da área. O texto será
concluído com a assertiva de que a áudio-descrição traz benefícios tanto para os
alunos como para os professores no contexto educacional inclusivo.
Palavras-chave: áudio-descrição, livro de ciências, educação inclusiva, deficiência
visual, imagem.
ABSTRACT
This article applies audio description techniques on describing images found in a
textbook of science. Audio description can be defined as the translation, through oral
words or texts, of key elements seen on a certain image, such as those present on
various cultural expression, from a movie in the cinema to the pages of text books. It
allows people with visual disability to access visual content by reading or listening to
the description made for that image. It is asserted that audio description aids blind
students to comprehend an assortment of school visual activities and that it benefits
both apprentice and teachers as they learn how to better make use of visual images in
inclusive classroom settings.
69
Keywords: audio description, people with disability, textbook, science book, visually
impaired people
INTRODUÇÃO
O Primado das Imagens no Contexto Escolar
Nós estamos rodeados por imagens visuais através da televisão, filmes, vídeos,
computadores e textos repletos de figuras. O uso destas fontes de imagens é óbvio
quando se anda pela escola. As salas de aula, muitas vezes, contêm computadores,
televisões, e aparelhos de DVD. As salas de aula das escolas, centros de mídia, e
laboratórios de informática estão cheios de imagens visuais. (HIBBING; RANKINERIKSON, 2003).
Como se pode entender do texto acima, a intensificação da utilização de imagens nos
ambientes educacionais remete-nos à necessidade de uma reflexão em termos do
acesso pelo aluno com deficiência visual à informação imagética presente nos
materiais didáticos, assegurando àquele aluno uma menor desigualdade no tocante à
permanência em sala de aula regular.
Relação Imagem e Texto Segundo a Teoria da Codificação Dual
Vários autores têm apontado para a relação que as imagens estabelecem com o texto
verbal e como se processam tais relações na mente dos alunos, de modo a
beneficiarem-se do jogo entre os elementos imagéticos e verbais no contexto escolar.
Hibbing e Rankin-Erikson, 2003 citando Pressley & McCormick (1997) dizem que “As
representações verbais do conhecimento são compostas de palavras (o código verbal)
para objetos, eventos e idéias. As imagens ou sistema não-verbal representam o
conhecimento em “representações não-verbais que retêm alguma semelhança com as
percepções que as fazem surgir.” Expandindo essa assertiva, Swanson (1989) explica
que:
70
O conceito de codificação dual, ou codificação do
conhecimento em representações tanto verbais quanto nãoverbais, sugere que os elementos de ambos os sistemas são
intricadamente conectados. Esta conexão entre sistemas de
codificação verbais e não-verbais nos permite criar imagens
quando ouvimos palavras e gerarmos nomes ou descrições de
coisas que vemos em figuras. (SWANSON, 1989, apud
HIBBING; RANKIN-ERIKSON, 2003, tradução nossa).
A cognição, de acordo com a TCD, envolve a atividade de dois
subsistemas distintos (...) um sistema verbal especializado em
lidar diretamente com a linguagem e um sistema não-verbal
(imagens) especializado em lidar com objetos e eventos nãolinguísticos. Supõe-se que os sistemas sejam compostos de
unidades representacionais internas, chamadas de logogens e
imagens, que são ativados quando a pessoa reconhece,
manipula, ou simplesmente pensa sobre palavras ou coisas. As
representações são específicas para cada modalidade, de
modo que temos diferentes logogens e imagens
correspondentes às propriedades auditivas, hápticas e motoras
de linguagem e objetos. Paivio (2006 )
Segundo Swanson, bons leitores são capazes de, na mente, criar conexões verbais e
não-verbais automaticamente, e “a incapacidade de fazer conexões verbais e nãoverbais rápida e eficientemente está relacionada a deficiências de aprendizagem.”
Diante desta interdependência imagem e texto, o aluno com deficiência visual enfrenta
uma situação de desigualdade e de exclusão por lhe ter sido historicamente denegado
o acesso ao pólo imagético desta dualidade. A áudio-descrição poderia lhe permitir
compreender e exercitar mentalmente estas inter-relações. A oferta da áudiodescrição das imagens presentes no material didático vem a ser, portanto, crucial no
estabelecimento dessas conexões mentais entre imagem e texto para o aluno com
deficiência visual.
ÁUDIO-DESCRIÇÃO – DEFINIÇÃO
71
A áudio-descrição é uma técnica de representação dos elementos-chave presentes
numa dada imagem que, ao dialogar com os elementos de um texto verbal, pode ser
descrita também de forma verbal para formar uma unidade completa de significação. A
áudio-descrição pode ser de uma imagem estática como uma pintura no museu, de
uma escultura em três dimensões, da gravura bidimensional presente nos livros
didáticos; ou de imagens dinâmicas que nada mais são do que um conjunto de
imagens estáticas que juntas criam a ilusão de movimento como o que se processa
nos filmes de cinema, televisão, peças de teatro, ou vídeos de computador.
Conforme se lê em http://www.audiodescricao.com/home.htm:
A audiodescrição é um recurso de tecnologia assistiva que
permite a inclusão de pessoas com deficiência visual junto ao
público de produtos audiovisuais. O recurso consiste na
tradução de imagens em palavras. É, portanto, também
definido como um modo de tradução audiovisual intersemiótico,
onde o signo visual é transposto para o signo verbal. Essa
transposição caracteriza-se pela descrição objetiva de imagens
que, paralelamente e em conjunto com as falas originais,
permite a compreensão integral da narrativa audiovisual. Como
o próprio nome diz, um conteúdo audiovisual é formado pelo
som e pela imagem, que se completam. A audiodescrição vem
então preencher uma lacuna para o público com deficiência
visual.
Iniciando-se em meados da década de 1980, os museus começaram a oferecer tours
com áudio-descrição (Snyder, 2002a) e as práticas difundiram-se largamente (ASTC,
2001). Piety (2003, p. 13) nota uma semelhança entre a áudio-descrição de peças de
museu e a de conteúdos dos livros. Pois como as áudio-descrições em museus são de
imagens estáticas, são as que mais se assemelham às áudio-descrições dos
conteúdos encontrados em livros.
Ao trabalhar a passagem da linguagem imagética para a linguagem verbal, a áudiodescrição pode ser classificada como uma modalidade de tradução onde o que se
pretende fazer é processar as informações permitindo a sua passagem de uma
linguagem para a outra, procurando manter o maior nível de fidelidade entre o que
está numa linguagem e o que é veiculado utilizando-se de outra, sendo mais
importante preservar a integridade da mensagem do que fazer uma correspondência
literalizante palavra por palavra, elemento por elemento.
72
Todo trabalho de tradução exige disciplina mental, paciência, raciocínio e sensibilidade
para se compreender como o outro compreende. Isto não é diferente no caso da
áudio-descrição, pois ela requer uma exegese da audiência, no sentido da
compreensão de como as audiências receptoras reagirão às diferentes possibilidades
de construção dos discursos descritivos. Assim, a áudio-descrição não pode ser
empreendida sem um cauteloso planejamento do que é necessário ser veiculado, do
que vai, não vai e como vai ser dito, num trabalho de alta seletividade, principalmente
sabendo que será necessário lidar com frequentes restrições de tempo, no caso das
exibições de imagens dinâmicas ou restrições de espaço, no caso das imagens
estáticas, e.g., descrições presentes nos livros didáticos e outras, uma vez que, em
todos os casos, se poderá estar diante de abundantes informações visuais. Sob essa
égide, nenhuma outra pessoa será melhor em preencher tais requisitos técnicos e
científicos que não o profissional para tal treinado e habilitado: o áudio-descritor.
Piety (2003, p. 32) citando Basil Hatim faz uma triangulação entre interpretação,
tradução e áudio-descrição para então denominar esta última de „transrepresentação‟:
Como um processo de linguagem, a descrição visual pode ser
vista como um membro da família das atividades de tradução e
interpretação. De acordo com Metzger (1999), „Tanto a
tradução e a interpretação lidam com a comunicação de um
dado texto para uma outra linguagem‟. Uma questão-chave
aqui é que o texto que está sendo comunicado é composto de
elementos visuais (cenas, sinais, sorrisos, etc.) em vez de
linguagem formalizada. Se tradução é o que acontece quando
o escrito é convertido para o escrito e interpretação quando o
conversacional é convertido em conversacional (HATIM, 1997),
então a descrição visual pode ser vista como
transrepresentação porque toma as informações visuais cruas
e as converte em linguagem.
O exercício de transrepresentação do visual para a linguagem escrita ou falada
provocará um enriquecimento na capacidade de expressão de quem empreende a
áudio-descrição, pois a riqueza de informações advindas do mundo visual tenderá a
enriquecer no outro pólo a capacidade de expressão no mundo lingüístico através do
esforço de fazer equivaler os elementos essenciais do não-verbal a formas verbais.
73
A ÁUDIO-DESCRIÇÃO E SEUS BENEFÍCIOS PARA A PESSOA COM
DEFICIÊNCIA
De acordo com Fels, Udo, Ting, & Diamond, 2006; Packer, 2005; Schmeidler &
Kirchner, 2001 apud AFB, a áudio-descrição, segundo indivíduos que dela vêm
se utilizando, traz possibilidades de independência e igualdade com indivíduos
videntes, ao mesmo tempo, maior socialização, pois permite o diálogo sobre os
conteúdos presentes nas diversas formas de expressão cultural.
“...Vídeo descrição pode também beneficiar audiências secundárias de até um
milhão e meio de crianças entre 6 e 14 anos, com deficiências de
aprendizagem por capturar a sua atenção e aumentar as suas habilidades de
processar informações.” (Federal Communication Comission, 21 de Julho de
2000)
“A áudio-descrição é também usada em salas de aula comuns, já que as descrições
propiciam oportunidades de aprendizagem adicionais para construir o vocabulário e
desenvolver habilidades de descrição.” http://main.wgbh.org
A ÁUDIO-DESCRIÇÃO DAS IMAGENS NO MATERIAL DIDÁTICO
Dado o caráter estratégico do material didático no desenvolvimento intelectual dos
alunos, é mister ampliar o estudo de técnicas que venham, de forma padronizada e
segura, adequá-lo a uma ampla gama de necessidades estudantis, mormente de
acordo com os princípios do desenho universal.
Nas palavras de Marentette (2004), o Desenho Universal inclui os seguintes
componentes:
Múltiplos meios de representação;
Múltiplos meios de expressão;
Múltiplos meios de envolvimento;
Uso equitativo;
Flexibilidade no uso;
Informações perceptíveis
Tolerância ao erro;
Baixo esforço físico;
Tamanho e espaço apropriados para o uso;
Comunidade de aprendizes;
74
Ambiente inclusivo, acolhedor com alto nível de expectativas.
Assim, como se tem visto nos muitos exemplos de sucesso alcançados pela aplicação
da técnica de tradução visual em outras mídias, a áudio-descrição trará, ao espaço
escolar, significativa contribuição para a aprendizagem dos alunos com e sem
deficiência.
A título de ilustração da assertiva acima, tomemos os seguintes exemplos: 1. Em um
exercício (acerca da força da gravidade, extraído de um livro de Ciências da 2ª. Série
do Ensino Fundamental, Descobrindo o Ambiente (1991), página 31, encontramos as
figuras abaixo (Fig.1; Fig.2) sem nenhuma áudio-descrição:
“Qual das ilustrações representa o cesto que exige mais esforço para ser carregado?”
Fig. 1 Menina carregando cesto de flores.
Fig. 2 Menino carregando cesto de frutas.
A pergunta óbvia a se fazer é: como poderá o aluno com deficiência visual responder a
esta questão sem que lhe seja oferecida a áudio-descrição das imagens, visto que ela
é crucial para a compreensão do que é pedido no exercício?
Sequer foi ofertada legenda como pista para as imagens.
Consideremos, agora, essa atividade com a oferta de áudio-descrição
“Qual das ilustrações representa o cesto que exige mais esforço para ser carregado?”
75
Figura da esquerda em que uma menina carrega sorridente um cesto de flores.
Figura da direita em que um menino com boca contorcida carrega um cesto de frutas.
Como segundo exemplo, igualmente sem áudio-descrição, nem legenda, também do mesmo
livro de Ciências, analisemos o seguinte exercício encontrado nas páginas 92-93:
“Observe a ilustração da página ao lado, pense e responda no caderno:”
Fig. 3 Desenho, sem descrição, da parte hidráulica de uma casa.
1 Onde fica o hidrômetro? Para que ele serve?
2 Em que lugar fica armazenada a água que chega da rua?
3 Siga os canos coloridos de azul e descubra: para onde vai a água da
caixa?
4 Siga os canos coloridos de marrom e descubra: para onde vai a água
usada?
76
5 Que acontecerá com a água da caixa se alguém esquecer a torneira
aberta?
6 Chico demorou 10 minutos no banho. Quantos litros de água ele
gastou, se de seu chuveiro saem 20 litros de água por minuto?
7 Compare suas descobertas com as de seus colegas. Pequenas
atitudes podem contribuir muito para evitar o desperdício da água
potável. Pensem conversem e descubram como usar o melhor da
água no seu dia-a-dia.
O texto apresentado no exercício acima está em quase total dependência da imagem que
com ele se relaciona. Aqui cabe bem a indagação: como poderia a criança com deficiência
visual responder às perguntas propostas sem ter acesso aos elementos visuais presentes
na imagem que lhe permitiriam a compreensão dos conteúdos propostos?
Agora, notemos a imagem do referido texto acompanhada de sua áudio-descrição:
“Observe a ilustração da página ao lado, pense e responda no caderno:”
Um cano azul leva água, que passa por um hidrômetro e sobe para a laje de cima do
primeiro andar enchendo quase toda a caixa d‟água a qual também possui uma bóia. Da
caixa, também por canos azuis, a água desce, no primeiro andar, para uma pia, para o vaso
sanitário e para o chuveiro, onde uma menininha está tomando banho, e para a pia do andar
térreo, onde uma mulher lava os pratos. Canos marrons saem da parte de baixo da pia, do
vaso, do chuveiro, da pia da cozinha e se juntam na caixa de esgoto, do lado de fora da
casa, e à qual está ligado um grande cano marrom que vai dar na rua.
Vemos, a partir do exemplo, que a áudio-descrição da imagem permitiria ao aluno com
deficiência visual ou com baixa visão compreender de onde a água veio (do hidrômetro, por
canos azuis); onde ficou armazenada (na caixa d‟água) e qual o seu destino após utilizada
(cano de esgoto, por canos marrons). Ao proceder à feitura da áudio-descrição, o autor, o
editor, ou o professor poderiam ser levados a refletir sobre a conveniência de substituir o
nome “Chico” por um nome feminino ou colocar uma figura de gênero masculino em lugar da
figura da menina, uma vez que uma criança com baixa visão pode ter dificuldade de
identificar, na imagem, o gênero da figura.
77
Considerações finais
Do que aqui foi apresentado, pois, só podemos concluir pela importância/necessidade da
oferta da áudio-descrição nos livros didáticos, não só para ganho dos alunos com
deficiência, mas para todos que desses livros vão fazer uso, aí incluídos os próprios
professores.
Então, por que denegar à criança com deficiência a oferta de um recurso simples e de baixo
custo que traz benefícios a todos? A saber: ao áudio-descritores, aqueles trabalhadores que
serão contratados para elaborar as melhores descrições possíveis das imagens presentes
no material didático que exercitam suas habilidades verbais esforçando-se por oferecer uma
descrição que apresente de forma lógica e inteligível os elementos essenciais presentes nas
imagens; aos professores que terão o seu tempo de aula otimizado por ter a áudio-descrição
já ofertada no material didático; ao aluno com deficiência visual que poderá fazer o exercício
junto com os seus colegas; e ao aluno sem deficiência visual que terá seu poder de
percepção dos elementos presentes na imagem consideravelmente elevado.
Certamente não é pelo investimento econômico que se fará na melhoria da educação
também não é pela impossibilidade de encontrar profissionais capacitados para fazer áudiodescrições das imagens contidas nos livros didáticos, logo é possível que a resposta esteja
no entendimento de que as pessoas com deficiência não fazem uso desses materiais ou que
se o fazem não são capazes de aprender as informações imagéticas neles contidas, em
ambos os casos a resposta esteia-se em barreiras atitudinais que levam ao aluno com
deficiência prejuízos de ordem educacional e mesmo social.
Os autores do presente artigo têm, portanto, diversas razões para acreditar que a áudiodescrição traz benefícios a todos, no seio de uma sociedade para todos. E dentre essas
razões, certamente, a de que a técnica da áudio-descrição apresenta possibilidades reais de
aplicação na construção de um material didático mais acessível ao aluno com deficiência
visual, pois acrescenta informações ao texto que, de outra forma, ficariam em silêncio em
seu diálogo com a informação textual.
BIBLIOGRAFIA
78
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http://www.afb.org/Section.asp?SectionID=44&TopicID=338&DocumentID=4032
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http://main.wgbh.org
http://cs.felk.cvut.cz/~xmikovec/bis/UI_Analysis.html
rbtv
79
ÁUDIO-DESCRIÇÃO: ORIENTAÇÕES PARA UMA
PRÁTICA SEM BARREIRAS ATITUDINAIS
Francisco J. Lima25
Lívia C. Guedes26
Marcelo C. Guedes27
Resumo
O presente artigo lista algumas das barreiras atitudinais contra a pessoa com
deficiência, mais comumente encontradas na sociedade e oferece sugestões para evitá-las,
quando da oferta do serviço de áudio-descrição, técnica que descreve as imagens ou cenas
de cunho visual, promovendo acessibilidade à comunicação e à informação, também para
as pessoas cegas ou com baixa visão. Nesse contexto aqui também se trata de questões
que envolvem a prática
do áudio-descritor, se oferece orientações de como esse
profissional da tradução deve atuar para evitar barreiras atitudinais em seu ofício, bem como
alerta para o perigo de ações que venham limitar o exercício, a aplicabilidade e os recursos
instrumentais que o áudio-descritor pode valer-se na oferta dessa tecnologia assistiva. Dá
dicas de como se fazer a áudio-descrição, tanto quanto ressalta que esse gênero de
tradução visual é direito constitucional brasileiro, concluindo que, portanto, a áudio-descrição
deve ser garantida/oferecida sem custos aos clientes com deficiência que do serviço
necessitem.
Palavras-chave: áudio-descrição, barreiras atitudinais, pessoas com deficiência, tradução
visual, acessibilidade comunicacional.
Abstract
This article discusses the attitudinal barriers commonly practiced against people with
disability. A series of hints are given to avoid attitudinal barriers by the audio describer and
some of the bases for audio description are summarized to offer visual translators important
25 Professor Adjunto da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Coordenador do Centro de Estudos
Inclusivos (CEI/UFPE); Idealizador e Formador do Curso de Tradução Visual com ênfase em Áudio-descrição
“Imagens que Falam” (CEI/UFPE).
26
27
Áudio-descritora, Pedagoga e Mestra em Educação pela UFPE.
Áudio-descritor, Graduando em Comunicação Social: Cinema Digital.
80
tools for their work. It stresses the importance of recognizing audio description as an
assistive technology, making the assertion that this service is due to people with visual
disability without no cost. It concludes that audio describers should be free to make their
choices as translators and that ruling their work without robust scientific research can be both
harful to audio describers and their clients, as well as to those who higher their work.
Keywords: audio description, attitudinal barriers, people with disability, visual translation,
communicational accessibility.
Introdução
Durante muito tempo, as pessoas com deficiência foram vistas como incapazes de
aprender e de manifestar conhecimento, sendo a elas denegado o acesso à cultura, tanto
quanto ao lazer e à educação.
Na presunção de que essas pessoas nasciam por desígnio divino, que existiam para
espiar pecados ou faltas cometidas por seus antecessores, nem se pensava em lhes
oferecer meios de acesso à educação mais básica, menos ainda ao conhecimento científico.
Assim, as pessoas com deficiência ficaram à margem da sociedade, isto é, asiladas e
exiladas socialmente em instituições ou longe dos ambientes sociais.
De acordo com Chicon e Soares (2003, apud LIMA et. ali. 2004, p.09-10), ao longo
do tempo, a sociedade demonstrou basicamente três atitudes distintas diante das pessoas
com deficiência:
[ ] inicialmente, seguindo a seleção biológica dos espartanos, ela
demonstrou menosprezar, eliminar/destruir todas as crianças mal
formadas ou deficientes; os bebês que nasciam com alguma
deficiência ou “deformação” eram jogados de uma montanha,
eliminando-se, assim, o que não era “perfeito”. Posteriormente,
numa atitude reativa, provinda da proteção e assistencialismo do
Cristianismo, evidenciou-se um conformismo piedoso; e, em
seguida, já na Idade Média, o comportamento da sociedade
caracterizou-se pela segregação e marginalização da pessoa com
deficiência, operadas pelos “exorcistas” e “exconjugadores” da
época, os quais acreditavam que as pessoas com deficiência faziam
parte de crenças demoníacas, supersticiosas e sobrenaturais. (grifos
nossos).
81
Afastadas do convívio social e sem a possibilidade de estabelecerem eficientemente
uma comunicação que as permitisse compartilhar saberes e atuar contributivamente na
construção da sociedade em que viviam, às pessoas com deficiência foi negligenciado o
acesso e, conseqüentemente, o usufruto dos bens culturais, sociais, artísticos e
educacionais que as poderiam ter tornado, de fato, cidadãs.
Foi a partir desse entendimento preconceituoso sobre as pessoas com deficiência
que, historicamente, muitas barreiras atitudinais foram construídas e consolidadas, podendo
ser encontradas até hoje, nos mais diversos ambientes sociais e sob variadas formas,
dentre elas na própria comunicação.
De acordo com Gotti (2006), “As barreiras atitudinais são aquelas estabelecidas na
esfera social, em que as relações humanas centram-se nas restrições dos indivíduos e não
em suas habilidades”. (http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/txt/revistainclusao2.txt).
As barreiras atitudinais, portanto, partem de uma predisposição negativa, de um
julgamento depreciativo em relação às pessoas com deficiência, sendo sua manifestação a
grande responsável pela falta de acesso e à conseqüente exclusão e marginalização social
vivenciada por todos os grupos vulneráveis, mais particularmente, por aquelas pessoas
vulneráveis em função da deficiência.
No entendimento de Guedes (2007, p.31):
[ ] a perpetuação das barreiras que reforçam a situação de
dependência e exclusão a que as pessoas com deficiência vêm
sendo freqüentemente submetidas é causada pela sociedade
quando esta não busca promover soluções alternativas de
acessibilidade a fim de remover as barreiras que limitam ou
impedem a plena atuação dessas pessoas.
Uma vez presentes na comunicação, as barreiras atitudinais podem levar à total
exclusão de uma pessoa com deficiência, por exemplo, ao deixar de oferecer o contato
acessível com acervos bibliográficos, programas artísticos e arquivos culturais socialmente
construídos. Dependências como essas incorrem em outros tipos de exclusão, de
82
semelhante e maior gravidade, como a exclusão do sistema de ensino, do direito ao trabalho
etc.
Conforme Sassaki (2004, p.41), a eliminação de barreiras comunicacionais é uma
conseqüência da criação de acessibilidades comunicacionais, definidas como sendo a
ausência de barreiras:
[ ] na comunicação interpessoal (face-a-face, língua de sinais,
linguagem corporal, linguagem gestual etc.), na comunicação escrita
(jornal, revista, livro, carta, apostila etc., incluindo textos em braile,
textos com letras ampliadas para quem tem baixa visão, notebook e
outras tecnologias assistivas para comunicar) e na comunicação
virtual (acessibilidade digital).
Guedes (2007, p.29) ressalta ainda que o acesso à informação também se vê
prejudicado diante de barreiras atitudinais, uma vez que elas estão:
[ ] localizadas na profundidade das demais barreiras, enraizadas a
ponto de competir com os obstáculos concretos que comumente
excluem ou marginalizam as pessoas com deficiência dos processos
naturais que promovem o acesso [ ] aos demais sistemas sociais
gerais.
Portanto, o fato de a sociedade ainda conceber a existência de barreiras na
comunicação pode ser explicado, em parte, pelas dificuldades que encontra em enxergar as
pessoas com deficiência como sujeitos produtivos e por creditar a elas o pejo da
inferioridade, ambos comportamentos que exemplificam barreiras atitudinais.
Segundo Werneck (2006, p.164), “Ainda não somos permeáveis a uma efetiva
comunicação de mão-dupla com pessoas em relação às quais nos sentimos superiores”.
Uma vez sentindo-se superior a essas pessoas, a sociedade deixa de estabelecer uma
comunicação eficiente, deixa de criar espaços de diálogo para ouvir as demandas das
pessoas com deficiência, colocando-se numa atitude que não permite a aprendizagem
mútua. Essa atitude de superioridade social, portanto, também é manifestação da barreira
atitudinal, a barreira que diminui as pessoas com deficiência, inferiorizando-as, a fim de
parecer superior a elas.
Na tomada de consciência de que as barreiras atitudinais são mais freqüentes do
que podemos pensar, o presente artigo lista algumas das barreiras mais comumente
encontradas na comunicação e oferece sugestões para evitá-las, quando da oferta de áudio-
83
descrição, técnica que descreve as imagens ou cenas de cunho visual, promovendo
acessibilidade à comunicação, também para aquelas pessoas cegas ou com baixa visão.
Áudio-descrição: Comunicação legal
Nos dias de hoje, o direito à informação é tema universalmente debatido, tanto que
se tornou lugar comum nos depararmos com a máxima que anuncia a chegada da Era da
Informação.
Apesar de o direito à informação não figurar explicitamente entre os artigos de nossa
Carta Magna que definem o direito social ou fundamental da pessoa humana, a exemplo do
direito à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, ao respeito e à liberdade,
entendemos que para que se possa usufruir de todos esses direitos, faz-se necessário
garantir e preservar o acesso a um canal sem barreiras à informação, isto é, sem barreiras
atitudinais e comunicacionais.
Acordes com esse entendimento, no ano de 2004, publicou-se nos anais do Fórum
de Barcelona a seguinte afirmação:
Se o direito à comunicação e à informação também é um direito
universal, a mídia pública e privada também deveria cumprir com a
obrigação de fortalecer valores democráticos, elevar a diversidade e
qualidade de seu conteúdo (especialmente no que se refere às
crianças), ajudar as pessoas com deficiências físicas a ganhar
acesso ao conteúdo, e garantir a normalidade nas suas descrições
de minorias sociais. (www.barcelona 2004.org apud Franco,
http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=
S000967252006000100008&script=sci_arttext).
Logo, o acesso à informação não pode ser tratado como um tema isolado, uma vez
que ele está associado a outros direitos que, igualmente, conferem cidadania às pessoas. A
negação do direito à informação, portanto, pode marginalizar pessoas em situação de
vulnerabilidade social, tais como as pessoas com deficiência.
A fim de concretizar o direito à comunicação e o pleno acesso à informação, tramita
no Senado Federal uma proposta de Emenda Constitucional 28 representada pelo Deputado
Federal Nazareno Fonteles, do PT do Piauí, defendendo nova redação para o Artigo 6º da
Constituição Federativa, na qual se lê a intenção de incluir a comunicação como direito
social:
28
http://www.camara.gov.br/sileg/integras/460005.pdf
84
No que diz respeito à comunicação, há mais de 50 anos o direito à
comunicação é reconhecido no ordenamento jurídico de diversos
países. A ONU, em dezembro de 1946 reconheceu “a importância
transversal da comunicação para o desenvolvimento da
humanidade, enquanto um direito humano fundamental - no sentido
de básico - por ser pedra de toque de todas as liberdades às quais
estão consagradas as Nações Unidas, fator essencial de qualquer
esforço sério para fomentar a paz e o progresso no mundo...”. Vale
lembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu
Artigo 19º afirma que “todo o indivíduo tem direito à liberdade de
opinião e de expressão”, o que implica o direito de não ser
inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir,
sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer
meio de expressão. (grifo nosso).
Ciente da necessidade de se promover e implementar o acesso das pessoas com
deficiência aos meios de comunicação, bem como ao compartilhamento dos bens culturais
socialmente produzidos, é que o Ministério das Comunicações aprovou, em 27 de junho de
2006, a Portaria Nº. 310, a qual define, entre outros, a áudio-descrição como um recurso de
acessibilidade que:
[ ] corresponde a uma locução, em língua portuguesa, sobreposta
ao som original do programa, destinada a descrever imagens, sons,
textos e demais informações que não poderiam ser percebidos ou
compreendidos por pessoas com deficiência visual.
As bases jurídicas da Portaria Nº. 310/2006 estão vinculadas à existência de outros
documentos normativos que formam o elenco das medidas constitucionais para a áudiodescrição, quais sejam:
Lei Nº. 10.098, de 19 de dezembro de 2000:
Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na
comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas
que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às
pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de
comunicação, para garantir-lhes o direito de acesso à informação, à
comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao
esporte
e
ao
lazer.
(http://agenda.saci.org.br/index2.php?modulo=akemi&s=documentos
&parametro=1742);
Decreto Lei Nº. 5.296, de 02 de dezembro de 2004:
Art. 59. O Poder Público apoiará preferencialmente os congressos,
seminários, oficinas e demais eventos científico-culturais que
ofereçam, mediante solicitação, apoios humanos às pessoas com
deficiência auditiva e visual, tais como tradutores e intérpretes de
LIBRAS, ledores, guias-intérpretes, ou tecnologias de informação e
comunicação, tais como a transcrição eletrônica simultânea.
85
(http://agenda.saci.org.br/index2.php
?modulo=akemi&s=documentos&parametro=13983);
Portaria Nº. 466, de 30 de julho de 2008, em cuja redação determinou:
Art. 1º. Conceder o prazo29 de noventa dias, contado da data de
publicação desta Portaria, para que as exploradoras de serviço de
radiodifusão de sons e imagens e de serviço de retransmissão de
televisão (RTV) passem a veicular, na programação por elas
exibidas, o recurso de acessibilidade de que trata o subitem 3.3 da
Norma Complementar no 01/2006, aprovada pela Portaria no 310,
de 27 de junho de 2006, ficando mantidas as demais condições
estabelecidas no subitem 7.1 da mesma Norma.
No âmbito geral30, os seguintes instrumentos legais somam-se aos documentos
supramencionados e podem ser interpretados como respaldo para a proposta da áudiodescrição, enquanto medida de acessibilidade básica e indispensável para a Inclusão Social
das pessoas com deficiência:
Constituição Federativa do Brasil (1988), que defende em seu Artigo 220 que:
A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão
qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição;
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Nº. 8.069/90):
Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores
culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da
criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da
criação e o acesso às fontes de cultura.
29
Com a publicação da Portaria Nº. 661/2008, o prazo de 90 dias e a obrigatoriedade a ele vinculado foram
revogados.
30 Sugerimos a leitura da Lei nº. 4.117, de 27 de agosto de 1962, que institui o Código Brasileiro de
Telecomunicações; do Decreto-Lei nº. 236, de 28 de fevereiro de 1967, que modifica e complementa a Lei nº.
4.117, de 1962; da Lei nº. 7.853, de 24 de outubro de 1989, que dispõe sobre a Política Nacional para a
Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e consolida as Normas de proteção; da Lei nº 10.048, de 8 de
novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica; da Lei nº. 10.436, de 24 de
abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS; do Decreto nº. 52.795, de 31 de outubro
de 1963, que aprova o Regulamento dos Serviços de Radiodifusão; do Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de
1999, que regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989; do Decreto nº. 5.371, de 17 de fevereiro de
2005, que aprova o Regulamento do Serviço de Retransmissão de Televisão e do Serviço de Repetição de
Televisão, ancilares ao Serviço de Radiodifusão de Sons e Imagens; do Decreto nº. 5.645, de 28 de dezembro de
2005, que altera o art. 53 do Decreto no 5.296, de 2004; da Instrução Normativa nº. 1, de 02 de dezembro de
2005, da Secretaria de Comunicação Institucional da Secretaria Geral da Presidência da República, que
regulamenta o art. 57 do Decreto no 5.296, de 2004; da Norma Brasileira ABNT NBR 15290:2005, que dispõe
sobre Acessibilidade em Comunicação na Televisão.
86
Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da União,
estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para
programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a
infância e a juventude. [ ]
Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às diversões e
espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa
etária.
Em face do exposto, entendemos que em nosso país já se dispõe de uma gama
considerável de ordenamentos legais que justificam juridicamente a prática da áudiodescrição como recurso legítimo de acessibilidade.
Assim, quando as barreiras atitudinais forem eliminadas nas emissoras e demais
entidades que promovem a cultura, o entretenimento e as artes, e passarem a emitir
o “sinal da acessibilidade”, a áudio-descrição será, enfim, uma prática ostensiva.
O alcance social da áudio-descrição
A
técnica
de
áudio-descrição,
conforme
definido
no
www.adinternational.org/ADIad.html:
[ ] envolve a acessibilidade aos elementos visuais do teatro,
televisão, cinema e outras formas de arte para pessoas cegas, com
baixa visão, ou qualquer outra deficiência visual. É um serviço de
narração que tenta descrever aquilo que está disponível ao vidente,
e é oferecido sem custo adicional ao espectador com deficiência
visual – aquelas imagens que uma pessoa que é cega, ou com
deficiência visual, antes só podia ter acesso por meio dos sussurros
de um colega vidente.
Em teatros, em museus, e assistindo à televisão, a filmes, e a
apresentações em vídeo, a áudio-descrição é comentário e narração
que guia o ouvinte através da apresentação com descrições
concisas, objetivas de novas cenas, cenários, trajes, linguagem
corporal, e “piadas visuais”, todos colocados entre trechos de
diálogos ou músicas. (http://www.adinternational.org/ADIad.html).
Segundo Graciela Pozzobon, em www.audiodescricao.com.br, a narração de cenas
por meio de sussurros ao espectador cego:
[ ] além de ser incompleta, causa incômodo aos espectadores que
enxergam, de forma que as pessoas cegas freqüentemente deixam
de tentar entender o filme, ou programa. Por outro lado, se
imaginarmos uma sala de cinema ou um canal de televisão que
ofereça um meio pelo qual a pessoa com deficiência visual ouça o
conteúdo do programa com independência, audiodescrito,
desenvolvido especialmente para ela, com certeza veremos uma
grande parcela deste público, normalmente excluído, assistindo a
87
programas e desfrutando do conteúdo audiovisual com autonomia e
conforto da mesma maneira que uma pessoa que enxerga.31
Assim, com a oferta da áudio-descrição, ao ir ao cinema, teatro, palestras etc.,
pessoas cegas ou com baixa visão terão a oportunidade de ampliar o conhecimento advindo
do conteúdo das imagens ali apresentadas (em filmes, peças, slides, cartazes,
transparências, folders e conhecer os gestos que o expositor estaria fazendo para ilustrar a
sua fala), ao mesmo tempo que as demais pessoas da platéia.
Os principais benefícios do oferecimento da áudio-descrição para as pessoas
cegas, por exemplo, incluem:
[ ] conhecer os ambientes visuais do programa;
compreender melhor os materiais televisivos;
sentir-se independente;
(...) sentir satisfação;
alívio dos espectadores sem deficiência visual com quem
assistiam aos programas32.
Numericamente falando, através da áudio-descrição se estaria permitindo o acesso à
informação e comunicação a, pelo menos, 48,1%, dos quase 24,5 milhões de brasileiros
com deficiência, percentual relativo às pessoas que declararam ter comprometimentos
visuais33. Porém, os benefícios provenientes da áudio-descrição não se restringem ao
público com deficiência visual.
Igualmente, a áudio-descrição permite que pessoas disléxicas, cuja presença de um
distúrbio de aprendizagem compromete a capacidade de leitura, escrita e soletração de mais
de 5% da população em todo o mundo (http://www.dislexia.org.br/abd/dislexia.html),
restituam sua autonomia, pelo simples fato de lançarem mão do recurso sonoro para ouvir
aquelas informações cuja leitura lhes poderia causar transtornos e atrasos significativos,
prejudicando o entendimento.
Também as principais dificuldades encontradas por uma criança em idade escolar
ou, por exemplo, por um profissional disléxico que necessite memorizar textos, tais como,
dividir palavras, relacionar letras a seus respectivos sons, reconhecer fonemas e/ou
compreender o que lêem34, passam a ser amplamente minimizadas pelo uso da áudiodescrição, quando, através desse recurso de acessibilidade comunicacional, se substitui ou
se complementa a informação visual com a informação sonora.
31
32
http://www.audiodescricao.com.br/www/index.html
ASTC – “Accessible Practices/ Best Practices/ Audio-Description”, Association of Science – Technology
Centres. Disponível online: http://www.astc.org/resource/access/medad.htm
33
Censo Demográfico (IBGE, 2000).
34
http://www.crfaster.com.br/dislexicosfamosos.pdf.
88
Já as pessoas analfabetas têm a chance de utilizar o recurso da áudio-descrição
para terem acesso ao mundo de conhecimentos e informações que só lhes seria possível
adentrar através da leitura e escrita. Sendo a essas pessoas facultado o direito de acessar
informações auditivas e, através delas, realizar aprendizagens significativas, já se poderia
estimar que, pelo menos 14,6 milhões35 de brasileiros analfabetos, estariam mais próximos
do conhecimento e, assim, mais distantes da marginalização social.
Além de beneficiar diretamente as pessoas com deficiência durante eventos,
programas ou espetáculos artísticos e culturais, a áudio-descrição tem um alcance ainda
maior quando utilizada como ferramenta pedagógica. Para tanto, imaginemos a seguinte
cena: um aluno cego vai à escola e, em sua primeira aula do dia, o professor pede aos
alunos que abram o livro na página 15 e concentrem-se na análise de gráficos matemáticos.
Apesar de o aluno cego estar inserido numa sala de aula regular, junto com outras
crianças com e sem deficiência, são momentos como este que definirão se a metodologia
adotada pelo professor e, conseqüentemente, a proposta pedagógica da escola, assumirão
ou não uma conduta inclusiva.
O professor inclusivo, ciente de que seu papel como mediador da aprendizagem
requer a contemplação das necessidades de todos os alunos, cuidará de áudio-descrever
para o aluno cego as informações contidas nos gráficos, tendo para com ele a atenção
necessária ao alcance total das informações pretendidas36.
Sem uma adequada áudio-descrição por parte do professor, ao aluno, incorrer-se-á
no que Lima (1998, p.15-16) já antecipava:
[ ] mesmo que o professor tenha habilitação para educação
especial, ele poderá estar presumindo que a representação que
formula para explicação de dada informação ao aluno sem limitação
visual seja a mesma que deveria dar ao aluno cego. É possível que
seu pressuposto seja de que uma vez verbalizando o exemplo dado
à sala, isso bastará à compreensão do aluno cego.
35
Estimativa apresentada pelo IBGE (http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.
php?id_noticia=132&id_pagina=1), referente ao ano de 2002.
36
Salientamos que, no caso específico de gráficos e outras configurações bidimensionais, constitui-se como
recurso de acessibilidade bastante eficiente para a apropriação de informações visuais por pessoas cegas e com
baixa visão, a disponibilização concomitante da áudio-descrição e de materiais em relevo que favoreçam a
captura háptica (através da ponta dos dedos). O leitor interessado deve recorrer Para maiores informações,
sugerimos a leitura dos seguintes artigos: - LIMA, F. J. e DA SILVA, J. A. Algumas considerações a respeito da
necessidade de se pesquisar o sistema tátil e de se ensinar desenhos e mapas táteis às crianças cegas ou com
limitação parcial da visão. Revista Benjamim Constant, n° 17. Rio de Janeiro: IBCENTRO, 2000; - LIMA, F. J. O
efeito do treino com desenhos em relevo no reconhecimento háptico de figuras bidimensionais tangíveis. Livro
de Resumos - III Seminário de Pesquisa, página 57. Ribeirão Preto, SP, 2000; - LIMA, F. J. e GUEDES, L. C. A
produção do desenho em relevo: a caneta M/H 1.0 como alternativa tecnológica de acesso à educação, por
meio da arte. Submetido à Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), 2004.
89
O professor inclusivo poderá lançar mão dos recursos de acessibilidade disponíveis,
promovendo oportunidades para a eliminação de barreiras atitudinais entre os alunos,
através do estímulo de atividades coletivas de áudio-descrição que envolvam a todos,
sensibilizando-os e dando-lhes autonomia para também desenvolverem e se beneficiarem
do recurso em conjunto.
Mais significativamente, o professor inclusivo poderá oportunizar a todos os
alunos o entendimento de que a áudio-descrição, antes de ser um recurso que beneficia a
um ou outro aluno da turma, com essa ou aquela deficiência, constitui-se como um recurso
pedagógico que agrega a característica de ser acessível.
Assim, a áudio-descrição pode ser considerada como ferramenta pedagógica de
acessibilidade quando a sua aplicação tiver por objetivo:
- minimizar ou eliminar as barreiras presentes nos meios de comunicação que se
interponham ao acesso à educação, tais como aquelas presentes no acesso a materiais
bibliográficos;
- proporcionar que alunos com deficiência visual, com dislexia e outros tenham acesso aos
conteúdos escolares, ao mesmo tempo que o restante da turma;
- permitir que todas as ilustrações, imagens, figuras, mapas, desenhos e demais
configurações bidimensionais, presentes nos livros didáticos, fichas de exercícios, provas,
comunicados aos pais, cartazes, circulares internas etc., também sejam disponibilizadas
através da áudio-descrição;
- zelar pela autonomia, empoderamento e independência dos alunos com deficiência visual
e outros usuários do recurso;
- atentar para a descrição de objetos que fazem parte do cotidiano escolar, como a
disposição do mobiliário da sala de aula, da planta baixa da escola, da distribuição do
acervo na biblioteca, dos espaços de recreação e outros ambientes e produtos de uso
comum etc.;
- perceber a transversalidade do recurso, por exemplo, ao estimular que através de uma
atividade coletiva de áudio-descrição, durante uma aula de matemática ou de ciências, os
alunos possam desenvolver descrições por escrito de tal sorte que as informações ali
contidas possam ser aproveitadas nas aulas de língua portuguesa;
90
- considerar a importância de democratizar as informações e conhecimentos construídos em
sala de aula para toda a comunidade escolar, oferecendo este recurso em exposições,
mostras, feiras de ciências, apresentações, reuniões de pais e mestres, encontros
pedagógicos, aulas de reforço escolar, excursões temáticas, jogos e olimpíadas esportivas,
exibição de filmes e nos demais encontros e atividades cuja educação seja o foco;
- reforçar o respeito pela diversidade humana, praticando e divulgando ações de cunho
acessível entre os alunos com e sem deficiência;
- atrair parceiros que possam financiar projetos de acessibilidade na escola e a partir dela;
- criar programas e projetos de voluntariado e monitoria que envolvam o público interno da
instituição e a comunidade escolar, a fim de capacitar os interessados na temática da áudiodescrição e levar a diante outras iniciativas de acessibilidade;
- promover encontros de formação, reflexão e sensibilização sobre a inclusão social das
pessoas com deficiência para professores, funcionários, gestores, alunos e comunidade,
fortalecendo a máxima de que a inclusão só poderá ser construída através da perpetuação
de práticas acessíveis, ou seja, a partir da eliminação de barreiras tais como as atitudinais e
aquelas presentes nos meios de comunicação.
Barreiras atitudinais na áudio-descrição
A fim de auxiliar aos áudio-descritores a construir e desenvolver seus roteiros de
maneira inclusiva, isto é, respeitando e contemplando a diversidade humana que deles
poderão se servir, apresentamos, a seguir, algumas das barreiras atitudinais que devem ser
evitadas desde a concepção dos roteiros até a realização/gravação da áudio-descrição.
Salientamos, contudo, que essas orientações tanto podem servir para as áudiodescrições simultâneas (desenvolvidas em eventos ao vivo, como em peças de teatro,
acompanhamento pedagógico, palestras etc.), como para as áudio-descrições pré-gravadas
(aquelas mais aplicadas ao cinema e televisão).
Barreira Atitudinal de Generalização: generalizar a forma de realizar a áudiodescrição, baseando suas escolhas e atitudes nas predileções de uma pessoa
especificamente ou de um grupo de pessoas com deficiência.
91
Pelo fato de uma pessoa cega, por exemplo, achar que lhe basta receber umas
poucas informações, essenciais para o entendimento da obra, o áudio-descritor não deve
generalizar que todas as pessoas cegas prefiram receber as informações dessa mesma
maneira, ou seja, muitos outros podem desejar conhecer as minúcias de uma apresentação
visual, como os detalhes do figurino dos artistas ou as cores das casas apresentadas em
uma cena.
Lembre-se de que a áudio-descrição deve primeiro eleger os elementos essenciais
da cena ou imagem; depois, as informações secundárias, sem prejuízo da mensagem
central. Contudo, não deve deixar de oferecer os demais elementos sempre que o tempo
permitir ou, quando necessário, antes ou intervalo da apresentação.
Barreira Atitudinal de Padronização: presumir que porque os usuários têm uma dada
característica, são cegos, por exemplo, suas respostas ao entendimento da áudio-descrição
serão as mesmas entre todos.
Lembre-se de que os usuários da áudio-descrição não formam grupos homogêneos
e ainda que tenham características semelhantes, não perderão sua individualidade, pois
todos têm seus próprios recursos cognitivos para compreender aquilo que está sendo
transmitido. Considere que em uma mesma platéia você poderá áudio-descrever para
grupos de pessoas cegas, disléxicas, analfabetas, com baixa visão etc., e que mesmo esses
grupos tendo características semelhantes entre si, cada espectador é único.
Barreira Atitudinal de Ignorância: desconhecer as características dos usuários da áudiodescrição.
Lembre-se de que para realizar um bom trabalho de áudio-descrição é preciso
conhecer o público a que ela se destina. Poderão fazer uso desse recurso pessoas cegas ou
com baixa visão, pessoas com dislexia ou, ainda, pessoas analfabetas que vão ao cinema
para assistir a filmes estrangeiros legendados.
Além dos espectadores convencionais, há que se considerar a presença de qualquer
outra pessoa que queira fazer uso do serviço. Afinal, assistir a filmes, peças teatrais e a todo
tipo de apresentações visuais, aproveitando o serviço de áudio-descrição, pode ser uma
opção enriquecedora para qualquer pessoa e as pessoas com deficiência intelectual,
certamente, se beneficiarão desta técnica também, visto que ela esclarece com palavras
aquilo que se está vendo.
92
O áudio-descritor que conhece o público para o qual está trabalhando terá maiores
chances de acertar em suas escolhas, de evitar expressões preconceituosas e outras
atitudes discriminatórias durante a realização do serviço.
Barreira Atitudinal de Medo: temer realizar áudio-descrições de algum gênero ou conteúdo
específico que o áudio-descritor julgue ofensivo ao público-alvo do serviço; temer utilizar
palavras cujo sentido ilustraria a condição de deficiência de uma pessoa, tais como
“cegueira” ou “surdez”, por receio de magoar os espectadores cegos ou surdos que estejam
na platéia, ou de ser injusto com eles.
Lembre-se de que as pessoas com deficiência estão atentas a sua realidade e o uso
de palavras que reforcem ou admitam a verdade sobre elas só será compreendido como
negativo se trouxerem o peso da depreciação, caso contrário, serão apenas palavras
descritivas.
Barreira Atitudinal de Rejeição: recusar-se a interagir com os usuários do serviço de
áudio-descrição e seus acompanhantes, adotando comportamentos hesitantes diante da
possibilidade de ter o seu trabalho avaliado ou de ter um contato mais aproximado com esse
público.
Lembre-se de que para alcançar bons resultados como áudio-descritor é necessário
adquirir conhecimentos sobre as necessidades do público a que o serviço se destina, sobre
a forma como costuma absorver e compreender as informações recebidas e sobre as
possíveis falhas na comunicação geradas a partir desse desconhecimento.
Barreira Atitudinal de Propagação da deficiência: julgar (em virtude de um usuário do
serviço de áudio-descrição apresentar uma dada deficiência), que ele tem uma outra
deficiência, e que esta o incapacita de compreender a áudio-descrição e o conteúdo
descrito.
Lembre-se de que a existência de uma deficiência não implica em outra e de que não
existe relação entre deficiência e a capacidade intelectual de uma pessoa. Além do mais,
mesmo as pessoas com deficiência intelectual podem entender aos filmes e outros
conteúdos, mormente quando auxiliadas pela áudio-descrição.
Aquele que tem uma deficiência terá condições de avaliar, compreender, apreciar ou
não um espetáculo áudio-descrito se este vier relacionado a outras características
93
particulares, tais como, o seu grau de escolaridade, sua idade ou as suas preferências
pessoais.
Barreira Atitudinal de Inferioridade: acreditar que o espectador com deficiência,
mesmo utilizando o recurso da áudio-descrição, tem chances inferiores de alcançar a
compreensão das cenas e intenções do filme ou peça exibida, comparativamente aos
espectadores videntes.
Lembre-se de que a crença na potencialidade das pessoas, independentemente de
suas deficiências ou características particulares, deve permear toda e qualquer atitude do
áudio-descritor, cujo serviço prestado deverá objetivar a transmissão fidedigna das
informações visuais, tais quais as pessoas videntes têm acesso. Portanto, o áudio-descritor
deve concentrar-se, primeiramente, em prestar um bom serviço, deixando que os resultados
sejam sentidos pela platéia.
Barreira Atitudinal de Comparação: comparar os espectadores com deficiência com
aqueles que não têm deficiência, julgando que os primeiros têm como única motivação para
ir ao cinema, teatro etc., a oferta de áudio-descrição.
Lembre-se de que toda pessoa, independente de ter ou não uma deficiência, vai ao
cinema, teatro, palestra, museu, casa de espetáculo em geral, interessada em seu conteúdo
relacionado. Atrelar as motivações pessoais do espectador à oferta da áudio-descrição é
superestimar o papel do áudio-descritor.
Barreira Atitudinal de Piedade: ter atitudes protetoras para com os usuários da áudiodescrição por sentir dó ou pena deles, em virtude de sua deficiência.
Lembre-se de que a existência da barreira atitudinal de piedade pode levar o áudiodescritor a cometer erros graves como interpretar conteúdos visuais, apresentar conclusões
pessoais e antecipar informações para os espectadores com deficiência, podendo lhes dar a
impressão de que não bastaria áudio-descrever, mas seria necessário também lhes explicar
as descrições ou, ainda, desrespeitar a sequência e o ritmo das cenas, para que as pessoas
com deficiência não tenham um “trabalho a mais” na hora de compreendê-las.
Lembre-se, ainda, de que as pessoas com deficiência não devem ser tratadas como
coitadinhas; elas são pessoas humanas que merecem respeito por sua dignidade, e atitudes
apiedadas não condizem com uma postura inclusiva, devidamente respeitosa.
94
Barreira Atitudinal de Adoração do Herói: considerar que uma pessoa com deficiência
visual, por exemplo, consumidora do serviço de áudio-descrição, seja “especial”,
“excepcional” ou “extraordinária” pelo simples fato de assistir a espetáculos, de frequentar
lugares públicos onde comumente se vê pessoas videntes ou sem nenhum tipo de
deficiência. Ou, ainda, pelo fato de serem capazes de compreender aquilo que está sendo
apresentado e áudio-descrito.
Lembre-se de que todas as pessoas têm seus pontos de força e de fraqueza e isso
não necessariamente está ligado à condição de deficiência. Considerar que uma pessoa tem
atitudes heróicas simplesmente porque está vivendo a sua vida e superando os obstáculos
naturais de sua personalidade e características íntimas, não é uma atitude que acrescenta
valor aquela pessoa. Assim como as demais pessoas, as pessoas com deficiência
desejariam ser reconhecidas como heroínas quando seus próprios feitos ou atitudes
justificassem tal deferência.
Barreira Atitudinal de Baixa Expectativa: acreditar que os usuários da áudio-descrição
não poderão compreender aquilo que está sendo apresentado pelo fato de terem uma
deficiência. Acreditar que, pelo fato de as pessoas com deficiência visual não serem
frequentemente vistas em cinemas ou teatros, por exemplo, elas não se interessam por
atividades culturais, sociais, educacionais ou artísticas.
Julgar os limites impostos pela deficiência visual como sendo sinônimos de
incapacidade constitui barreira atitudinal que impede o áudio-descritor de sentir a apreciação
de seu trabalho.
Lembre-se de que o fato de as pessoas com deficiência não serem vistas nos
espetáculos pode ser decorrente da costumeira falta de acessibilidade física e
comunicacional que graçam os ambientes em que eles se dão. Além do mais, as barreiras
atitudinais abundantemente encontradas pelas pessoas com deficiência acabam, muitas
vezes, por lhes desencorajar a frequentar esses lugares.
Barreira Atitudinal de Compensação: oferecer um serviço de áudio-descrição que procure
minimizar a eventual falta de acesso à informação visual de uma dada cena, antecipando às
pessoas com deficiência visual informações (descrições antecipadas e interpretativas) que
as privilegiem.
95
Lembre-se de que nem tudo que é visto será possível descrever, portanto, não se deve
procurar compensar o espectador com deficiência com informações que ainda não estão
disponíveis aos demais. A áudio-descrição visa à igualdade de acesso ao conteúdo do filme,
portanto, o antecipar ou interpretar, além de desigualar os espectadores, subestima a
capacidade de entendimento do espectador com deficiência.
Barreira Atitudinal de Exaltação do modelo: usar a imagem do espectador com
deficiência, usuário do serviço de áudio-descrição, como modelo de persistência, coragem e
superação diante dos demais espectadores.
Lembre-se de que, quando o assunto é a inclusão de pessoas com deficiência, o único
modelo que deve ser ressaltado é o modelo da acessibilidade, do desenho universal, enfim
da inclusão de todas as pessoas humanas na sociedade. Em nada auxiliará fazer exaltações
sobre o potencial, inteligência ou habilidade de uma dada pessoa com deficiência que não
sejam absolutamente verdadeiras.
Barreira Atitudinal de Estereótipos: pensar no espectador com deficiência, construindo
em torno da deficiência generalizações positivas ou negativas sobre todas as pessoas que
têm aquela mesma deficiência.
Lembre-se de que não é a deficiência que definirá a capacidade de compreender o que está
sendo áudio-descrito, mas sim a clareza, a objetividade e o uso de um vocabulário coerente
com a natureza da obra descrita e de seu público.
Barreira Atitudinal de Negação: considerar os espectadores com deficiência da mesma
forma que os demais espectadores, não levando em consideração as necessidades reais e
específicas advindas de sua deficiência. Na barreira atitudinal de negação, nega-se a
existência da deficiência do espectador, neste caso, a áudio-descrição não é oferecida e se
o for, apenas se o fará em algumas situações que terceiros acreditem ser necessárias.
Lembre-se de que negar a deficiência de uma pessoa, em qualquer momento, não é
o mesmo que lhe tratar com respeito ou dedicar-lhe o rótulo de “pessoa normal”. Para que a
áudio-descrição cumpra, de fato, o seu papel como meio de comunicação inclusivo ou
recurso de comunicação acessível, é mister que ela considere não só a existência e a
justificativa de usuários com deficiência na platéia, como também conheça as características
dessas deficiências. Assim, o áudio-descritor poderá prestar um melhor serviço, alcançando
a todos.
96
Barreira Atitudinal de Substantivação da deficiência: identificar o espectador usuário do
serviço a partir do nome do sentido ou órgão relacionado à sua deficiência, como se essa
“parte” representasse o “todo” da pessoa.
Lembre-se de que se referir ao espectador com deficiência visual como “o cego” ou
“o visual” ou, no caso de pessoas disléxicas, chamá-las de “as disléxicas”, passa a ser
pejorativo, não correspondendo a uma atitude inclusiva.
Lembre-se de que, ao interagir com o espectador o áudio-descritor deve buscar
conhecer-lhe o nome e a ele identificar-se para que ambos saibam com quem estão falando.
Barreira Atitudinal de Segregação: obrigar as pessoas com deficiência, usuárias do
serviço de áudio-descrição, a ocupar determinados assentos no auditório, agindo de modo a
segregá-las, não lhes permitindo a tomada de decisão sobre onde desejam sentar-se.
Lembre-se de que quando por razões técnicas, aos espectadores com deficiência for
necessário destinar locais específicos, o áudio-descritor deve informar-lhes as razões e
perguntar-lhes se desejam ficar ali.
Lembre-se de que obrigar as pessoas com deficiência a estarem “num lugar a elas
destinado”, sem que assim desejem, constitui-se crime e, portanto, é atitude contrária aos
preceitos mais básicos de socialização, democracia e cidadania.
Barreira Atitudinal de Adjetivação: adotar adjetivos para designar as pessoas com
deficiência,
atribuindo-lhes
classificações
pejorativas
como
“lentas”,
“distraídas”,
“desmemoriadas” etc.
Lembre-se de que o uso de tal adjetivação, tanto deteriora individualmente a identidade das
pessoas, como o faz coletivamente, a partir da presunção de que o indivíduo com deficiência
visual ou o grupo de pessoas com deficiência visual, por exemplo, seriam formados por
pessoas “deficientes”(ineficientes), ao passo que o que são designa-se , com melhor
conceito, de pessoa com deficiência. Nos dois casos, a barreira atitudinal e o desrespeito
residem em adjetivar as pessoas de forma depreciativa.
97
Algumas dicas para quando for áudio-descrever
* Evite sobrepor a áudio-descrição às falas dos personagens ou efeitos sonoros importantes
para a compreensão do produto.
Lembre-se de que assim como os espectadores sem deficiência, os espectadores
com deficiência, usuários do serviço de áudio-descrição, devem ter acesso a todas as
informações provenientes do material originalmente apresentado, como a trilha sonora e os
diálogos, e que a áudio-descrição deverá ser adicionada a esses elementos fundamentais.
Assim, as pessoas que buscarem o serviço de áudio-descrição terão acesso a todas as
informações do filme, peça ou exibição, podendo compartilhar de suas impressões com os
demais espectadores com e sem deficiência.
* Evite classificar desordenamente um conteúdo visual (filme, curta-metragem, peça teatral,
desenho animado etc.) como pertencente a um determinado gênero específico. Basear-se
numa classificação errônea, poderá levar-lhe a fazer a áudio-descrição de um determinado
conteúdo visual, adotando uma impostação de voz ou entonação caricata e equivocada.
Lembre-se de que o fato de um conteúdo visual adotar linguagens como a animação,
a computação gráfica ou elementos cênicos que aparentem ser destinados, por exemplo, a
um público infantil, não significa que ele seja realmente destinado a esse público.
O trabalho do áudio-descritor deve refletir a atenção de que as ferramentas e
linguagens visuais utilizadas nos produtos culturais e artísticos nem sempre são destinadas
a um mesmo público, a exemplo do cinema de animação, que produz filmes para todos os
gêneros e para todos os públicos, por exemplo, das mais diversas faixas etárias.
* Evite a utilização desnecessária de termos técnicos, de palavreado rebuscado e/ou de
expressões tendenciosas e ambíguas que dificultem a compreensão do público assistente.
Lembre-se de que a áudio-descrição deve ser construída a partir de uma linguagem clara,
simples, objetiva e acessível para que a compreensão do conteúdo assistido não seja
prejudicada e que, ao invés de promover comunicação, se construa novas barreiras
comunicacionais através da escolha da linguagem.
98
* Evite aproveitar todas as pausas entre os diálogos ou cada momento de silêncio para fazer
áudio-descrição.
Lembre-se de que haverá momentos em que o silêncio será utilizado de forma intencional,
como um elemento importante para o entendimento da trama, e que os usuários do serviço
de áudio-descrição também devem ter a oportunidade de conhecer e compreender as
intenções geradas a partir da escolha de recursos como esse.
* Evite basear a áudio-descrição em juízos de valor pessoais ou moralismos.
Lembre-se de que, ao prestar um serviço de áudio-descrição, o profissional deve abster-se
de qualquer condicionamento íntimo a respeito do conteúdo assistido. Ao aceitar um
trabalho de áudio-descrição, é mais aconselhável que o profissional considere previamente
a natureza do conteúdo a ser áudio-descrito, evitando aqueles que possivelmente lhes
gerariam desconforto.
Considerações finais
Considerando a classificação das barreiras atitudinais aqui apresentadas, bem como
as orientações sugeridas a fim de evitá-las na prática de áudio-descrição, concluímos que
para que se realize um trabalho de tradução visual de forma acessível, cada profissional
deve, cotidianamente, revisar a sua prática, buscando examinar as próprias atitudes a fim de
não cometer barreiras sociais que venham a desvirtuar o sentido de seu trabalho.
Salientamos, porém, que as barreiras atitudinais aqui elencadas não esgotam o
universo de possibilidades de outras barreiras que podem atingir os diversos perfis humanos
e advir da combinação dessas barreiras atitudinais com outras.
Acreditamos que será apenas a partir da eliminação das barreiras atitudinais,
presentes nos meios de comunicação, que as pessoas com deficiência visual e os demais
beneficiários
da
democratização
da
áudio-descrição,
como
recurso
legítimo
de
acessibilidade, poderão ter garantias de acesso aos demais direitos sociais e fundamentais
da pessoa humana, sendo-lhes, daí favorecido o usufruto da educação, do trabalho, do
lazer, da cultura e da garantia efetiva de sua liberdade de expressão e manifestação num
mundo cada vez mais inclusivo.
99
Em última instância, é importante que entendamos que a áudio-descrição é recursos
assistivo, advindo da área da tradução visual, isso significa que os usuários deste serviço
têm direito constitucional a essa forma de acessibilidade.
Em outras palavras, isso implica em obrigação de oferta do serviço aos que estão a
frente da organização de eventos culturais, aos que estão a frente da produção de eventos e
produtos educacionais e isso significa que é obrigação de que o serviço prestado seja feito
com qualidade e sem custo adicional aos clientes que desse serviço necessitam.
Por outro lado, não se pode impor regras, normas ou obrigações ao ofício dos
tradutores visuais que trabalham com a áudio-descrição, pois eles são, primeiramente,
profissionais da tradução. Enquanto tais têm o livre direito de exercer a escolha intelectual
da tradução que vão fazer, da qualidade do serviço que vão prestar e da maneira que o
farão.
Certamente, diretrizes, dicas, orientações como as que aqui foram apresentadas e
muitas outras, deverão fazer parte da formação do áudio-descritor, de seu código de ética,
da conduta que deverá ter para com seus clientes, sejam eles os usuários ou os
contratantes do serviço de áudio-descrição. No entanto, o áudio-descritor não pode ser
tolhido da sua liberdade de expressão por regras que ultrapassem o conhecimento daqueles
que eventualmente as venham produzir ou que, de alguma forma, limitem, no presente ou
no futuro, a atuação daquele profissional.
No Brasil, assim como na maioria dos demais países, a áudio-descrição ainda é um
serviço pouco oferecido e, principalmente, pouco conhecido pelos potenciais clientes.
Com efeito, apesar de a áudio-descrição surgir na academia, a partir de uma
dissertação de mestrado, ela ainda é muito pouco
significa que não temos
cientificamente investigada, o que
conhecimento basilar suficiente para a construção de regras
normativas que não levem em consideração pesquisas, técnicas e opiniões dos próprios
áudio-descritores, dos formadores destes e de seus clientes.
Em suma, as orientações aqui apresentadas não se prestam a regrar o papel do
áudio-descritor, sua atuação profissional ou as ferramentas e aplicações com as quais vai
trabalhar ou ainda em que situações as vai utilizar.
Logo, estas orientações devem ser vistas , quando muito, como diretrizes para o
profissional da áudio-descrição, que pretende, com ética e inclusividade, investir no campo
da tradução visual para propiciar acessibilidade comunicacional à pessoas historicamente
excluídas por razão de deficiência.
10
0
Referências bibliográficas
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questão de educação e empregabilidade. Recife. 2007. 270f. Dissertação (Mestrado
em Educação), Universidade Federal de Pernambuco - UFPE.
LIMA, F. J.; ARAÚJO, C. M. de; AZEVEDO, G. E. M.; GUEDES, L. C.; BRASILEIRO, A. K.
Inclusão da Pessoa com deficiência no Ambiente Social de Trabalho: Sugestões para
Seleção e Contratação. Pernambuco: UFPE, 2004.
LIMA, F. J.; TAVARES, Fabiana. Barreiras Atitudinais: Obstáculos à Pessoa com
deficiência na Escola. 2007. Disponível em: http://www.saci.org.br/
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SASSAKI, R. K. Inclusão no Lazer e Turismo: Em Busca da Qualidade de Vida. São Paulo:
Áurea, 2003.
WERNECK, C. Sociedade Inclusiva. Quem Cabe no seu TODOS? Rio de Janeiro: WVA,
2002.
http://www.barcelona 2004.org
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http://www.camara.gov.br/sileg/integras/460005.pdf
Lei Nº. 10.098/2000
http://agenda.saci.org.br/index2.php?modulo=akemi&s=documentos &parametro=1742
Decreto Nº. 5.296/2004
http://agenda.saci.org.br/index2.php?modulo=akemi&s=documentos& parametro=13983
Portaria 310/2006:
http://www.mc.gov.br/o-ministerio/legislacao/portarias/portaria-310.pdf
10
1
Portaria 466/2008:
http://www.mc.gov.br/o-ministerio/legislacao/portarias/portaria-466.pdf
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm
Lei Nº. 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente):
http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L8069.htm
www.audiodescricao.com.br
http://www.audiodescricao.com.br/www/index.html
http://www.astc.org/resource/access/medad.htm
Censo Demográfico (IBGE, 2000):
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=132&id_p
agina=1
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/txt/revistainclusao2.txt
http://www.crfaster.com.br/dislexicosfamosos.pdf
Uma Eleição “Deficiente”
A chamada do noticiário para o jornal da noite cita uma matéria onde o chefe político
de plantão da localidade inaugurou um novo complexo esportivo dedicado às
pessoas com deficiência. A reportagem, para ilustrar a matéria mostra a quadra
10
2
poliesportiva novinha e cenas de um jogo de basquetebol entre cadeirantes, seguido
de um jogo de futebol de salão para pessoas com deficiência visual.
Todos elogiam o lugar e exaltam a figura do doutor fulano que tornou aquele sonho
possível. Em sua entrevista, o doutor fulano ressalta a importância da inclusão social
(mesmo que isso signifique isolar pessoas com deficiência em um local só para elas)
e faz promessas de mais benefícios para os “coitadinhos deficientes”. Candidato a
deputado na eleição que se aproxima, o doutor Fulano espera ser votado
maciçamente por esse público.
Em casa, Marcos, que é pessoa com deficiência visual, ouve a matéria e chama a
esposa para descrever o que a TV está mostrando, pois, em nenhum momento a
emissora pensou que do outro lado da telinha existem milhões de cegos assistindo
ao jornal e não têm acesso às imagens, pois a tal emissora não disponibiliza áudiodescrição dos seus programas.
Em casa, Ana Maria, que é surda e vive sozinha, não tem ninguém para chamar
para lhe ajudar a saber a que exatamente as imagens da TV se referem, pois a
emissora também não legendou a programação, nem providenciou a oferta da janela
de LIBRAS para traduzir o que estava sendo dito na matéria.
Em casa, Dagoberto, que é cadeirante, achou tudo muito bonito, mas lamentou que
não vai poder usar o complexo esportivo pois esse, apesar de acessível,está
localizado num bairro da cidade que não é servido por transporte público adaptado.
Em casa, Mariana, pessoa com deficiência intelectual, pediu que a mãe a levasse
para jogar basquete naquela quadra e teve de ouvir como resposta que a TV
informara que aquele local tinha sido cedido para uma entidade de reabilitação, a
qual não atende pessoas com a deficiência de Mariana.
Nesse momento, o doutor fulano acabava de perder ou, pelo menos, deixava de
ganhar, no mínimo, 4 votos.
O último censo demográfico brasileiro aponta a existência de mais de 24 milhões de
pessoas com deficiência no Brasil. Se mantida a proporção (14,5%), o censo que
será realizado este ano de 2010 deverá encontrar quase 30 milhões de pessoas com
deficiência. O maior grupo é o das pessoas com deficiência visual, parcial ou total,
seguido pelo grupo das pessoas com deficiência física ou motora.
10
3
Desse total, mais de 70% têm mais de 16 anos e, portanto, são eleitores. Cerca de
20 milhões de votos (na verdade, muito mais, se considerarmos os familiares dessas
pessoas) espalhados por todo Brasil. Sonho de consumo de qualquer candidato.
Deveria ser o sonho de consumo de todo marketeiro que vai cuidar da propaganda
eleitoral desses candidatos.
Os políticos ainda se preocupam em fazer jogo de cena e em entregar pacotes de
caridade em forma de benefícios fiscais, gratuidades ou verbas para entidades
assistencialistas. Os marketeiros não têm esse poder. Mas teriam o poder de fazer a
mensagem publicitária chegar a esses eleitores e isso seria muito mais simples do
que parece.
Numa eleição onde os meios de comunicação eletrônicos serão cada vez mais a
ferramenta para se chegar aos eleitores, a falta de preocupação com a
acessibilidade comunicacional é gritante. Se você entrar no site de qualquer um dos
grandes partidos políticos vai encontrar, em todos eles, programas de TV da
legenda. Nenhum deles tem qualquer recurso de acessibilidade.
Nem vou entrar no mérito da falta de acessibilidade nas TV´s abertas, essas estão
protegidas da obrigatoriedade da oferta de acessibilidade por manobras protelatórias
do Ministério das Comunicações.
Verdade se diga, isso não é exclusividade de políticos e de marketeiros. Esta
semana mesmo recebi um material de divulgação de um curso sobre inclusão.
Nem o material, nem o site da faculdade que o promovia eram acessíveis. Ao
procederem assim, os promotores de tal curso pareciam dizer: “Afinal de contas,
para que as pessoas com deficiência precisam de acesso a conteúdos que falem a
respeito delas?”
Pior ainda é visitar algumas páginas de políticos que são, eles mesmos, pessoas
com deficiência, e descobrir que em seus sites existem conteúdos sem
acessibilidade.
Convém lembrar que essa preocupação dos criadores e produtores dos programas
de TV, rádio e de páginas da Internet não pode se resumir às questões tecnológicas
(se bem que só isso já seria um salto de qualidade enorme), mas também à
linguagem e às atitudes devem ser ponto de preocupação desses profissionais.
10
4
Muitas pessoas com deficiência, historicamente, tiveram pouco ou nenhum acesso à
educação formal e, em decorrência disso, nem sempre vão entender mensagens
que usam expressões mais complexas. O que os marketeiros não podem esquecer
é que, mesmo sem a mesma bagagem cultural, essas pessoas têm consciência
política.
Claro, existe uma grande massa de manobra que se satisfaz com o fato de ganhar
um passe livre para o transporte público e barganhar seu voto em troca disso, para
depois descobrir que o ônibus é gratuito. E também essas pessoas, junto às demais
pessoas com deficiência não conseguirão chegar ao ponto ou embarcar no
transporte, pela falta de acessibilidade física.
Claro, existe uma grande massa manobrada por instituições assistencialistas que as
tutelam e fazem qualquer negócio para não perder esse poder. Não poucas dessas
instituições têm representantes (geralmente, não são as próprias pessoas com
deficiência) nas câmaras e no senado, eleitos às custas dessa troca de
favores. Tanto uns como outros continuarão presentes na próxima eleição, mas isso
também está mudando.
As pessoas estão ficando mais críticas e mais preocupadas em conquistar sua
autonomia. Não adianta a propaganda do governante Beltrano falar que está
colocando professores auxiliares nas séries iniciais do ensino fundamental se,
quando o aluno chega à escola ele descobre que isso só acontece numa escola
modelo ou projeto piloto do outro lado da cidade.
Não adianta nada políticos e marketeiros tomarem todas as medidas para que suas
campanhas sejam acessíveis se os locais de votação estão repletos de escadas
inacessíveis, armadilhas diversas para pessoas com deficiência física, com
dificuldade de locomoção, com baixa visão e cegas.
Agora, se você é profissional de marketing, ou produtor de mídia eletrônica e vai
trabalhar para algum candidato nas próximas eleições, não deixe de se informar a
respeito dos recursos de acessibilidade disponíveis e não se esqueça de incluí-los
na sua campanha.
Descubra o que é áudio-descrição, legendagem, interpretação de Libras, existe
muita informação a respeito disso na Internet. Convide pessoas com deficiência para
10
5
participarem dos focus groups sobre a campanha. Entenda a terminologia e a
linguagem usadas com essas pessoas.
Isso tudo não garante que todas as pessoas com deficiência votarão no seu
candidato mas, pelo menos, evitará que votos sejam perdidos pelo fato de todos
esses eleitores em potencial sequer haverem tido conhecimento da sua proposta,
pois ela lhes estava inacessível.
Fábio Adiron é consultor e professor de marketing direto, pai de pessoa com
deficiência e militante dos movimentos em defesa dos direitos das pessoas com
deficiência.
ARTES VISUAIS PARA DEFICIENTES VISUAIS:
O PAPEL DO PROFESSOR NO ENSINO DE DESENHO PARA CEGOS
10
6
Diele Fernanda Pedrozo de Morais37
[email protected]
RESUMO
Este artigo apresenta parte do referencial teórico e prático da pesquisa desenvolvida junto aos alunos
da Escola de Educação Especial Professor Osny Macedo Saldanha, na qual atuo como docente
desde 2006. Neste percurso, tive como principal objetivo encontrar alternativas do ensino do
desenho, com o intuito de realizar uma pesquisa na qual as pessoas implicadas tivessem “algo a
dizer e fazer”. No decorrer deste texto busca-se discutir além das questões específicas do ensino do
desenho, a valorização da criança não-visual, apontando que o modo pelo qual esta se apropria dos
conhecimentos não está destituído de significados – culturais, sociais ou afetivos – pelo fato desta
“não enxergar”. É inegável a importância da visão para o desenvolvimento da criança, sendo assim,
justifica-se o impacto que sua ausência pode causar no desenvolvimento do indivíduo, no entanto, se
indaga sob quais parâmetros essas concepções estão sendo calcadas. As reflexões neste ponto se
pautaram na experiência como docente, no contato com a realidade da criança não-visual, e
principalmente, na busca incansável de conscientizar as pessoas ditas “normais” de que a criança
pode, e deve, se desenvolver como um ser integral, não considerando somente suas limitações, mas
sim, suas potencialidades.
Palavras-chave: Deficiente Visual; Ensino do Desenho; Inclusão; Pesquisa-ação.
ABSTRACT
This article shows part of theoretical and practical referencial of developed research together with the
students from Escola de Educação Especial Professor Osny Macedo Saldanha, which I am teacher
since 2006. On this course, I had as main target to find out alternatives from drawing’s education, with
the intention to realize a research which the involved people had “something to say or to do”. During
this text seeks to discuss besides of specific questions from drawing’s education, the recognition of
blind child appointing that the mode which one appropriates of skills is not related of cultural, social
and affective meaning because of this one does not see. It is undeniable the importance of sight for
the children’s development, thus, it justifies the impact that their absence can cause on the
development of individual, however if inquires under what parameters these conceptions are being
based. The reflections on this issue were discussed on the experience like teacher, in contact with the
reality of blind child, and mainly, on the tireless pursuit to let the “normal” people aware that the
children can and must develop as a integral human, not considering only their limitations, but your
potentials.
Keywords: Blind; Drawing’s Education; Inclusion; Action research.
1. UM POUCO DE HISTÓRIA
Antes de entrar nas questões específicas que se pretendem tratar neste
artigo, cabe apontar alguns pressupostos que deram início a pesquisa iniciada em
2006, para que assim, seja possível compreender onde surgiu o interesse em
ensinar Artes Visuais para deficientes visuais.
Na última década incluir alunos com necessidades educacionais especiais no
sistema regular de ensino tem sido sem dúvida, uma das questões mais discutidas
no país, principalmente por estar amparada e fomentada pela legislação vigente.
37
Mestranda regularmente matriculada na turma 2009/II, do PPGAV – CEART/UDESC, na linha de Pesquisa
Ensino das Artes.
10
7
Segundo Mazzota (1996) a preocupação com educação de pessoas com
necessidades especiais no Brasil é recente. Bisaccione e Mendes (2008 p.70)
apontam alguns marcos importantes na difusão da filosofia de Educação Inclusiva: a
Conferência Mundial sobre Educação para Todos na cidade de Jomtien, na
Tailândia, em 1990, a partir da qual se estabeleceu os primeiros ensaios da política
de educação inclusiva; e a Conferência Mundial sobre necessidades especiais, que
ocorreu na Espanha em 1994, resultando na elaboração da Declaração de
Salamanca, onde a concepção de educação inclusiva substituiu definitivamente o
conceito de educação especial.
No Brasil, o caráter de Educação Inclusiva foi implementado pela Lei de Diretrizes e
Bases n° 9.394/9638, na qual se afirma que: “[...] todas as crianças devem ser acolhidas pela
escola, independente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais.”
Bueno (2001) esclarece que o termo necessidades educativas especiais não se
restringe apenas a pessoas com deficiência, mas também a toda parcela da população que
vem sendo historicamente excluída da escola e da sociedade.
Mas afinal, o que seria incluir uma criança com necessidades especiais no sistema
regular de ensino? Entende-se aqui a inclusão como algo que vai além das barreiras
arquitetônicas e acessibilidade, incluir é transpor barreiras atitudinais, o que implica em uma
mudança de pensamento frente ao diferente.
Para Sassaki (1997) o processo de inclusão exige uma mudança na sociedade:
“Incluir é trocar, entender, respeitar, valorizar, lutar contra exclusão,
transpor barreiras que a sociedade criou para as pessoas. É oferecer
o desenvolvimento da autonomia, por meio da colaboração de
pensamentos e formulação de juízo de valor, de modo a poder
decidir, por si mesmo, como agir nas diferentes circunstâncias da
via.” (SASSAKI, 1997, p.41)
Partindo desse pressuposto de inclusão, as escolas deveriam ser espaços
democráticos, atendendo todos os alunos, independentemente de suas diferenças. Porém
sabemos que, para que esta realidade seja possível, seria necessário uma nova postura da
escola, que precisaria refletir o projeto pedagógico, o currículo, a metodologia de ensino, as
formas de avaliação e atitude dos educadores.
A inclusão efetiva dos alunos com necessidades especiais no ensino regular
depende de ações que favoreçam a integração social, no qual escola e a comunidade
escolar devem ser adaptar para oferecer serviços educativos de qualidade para todos.
No entanto, dentro da nossa realidade de ensino, é preciso destacar o despreparo
dos professores do ensino regular para receber em suas salas de aula alunos com
necessidades especiais.
Bisaccione e Mendes (2008, p.71) apontam que “parece
necessário produzir conhecimento sobre como deve ser formado o professor especializado e
como deve ser capacitado o professor do ensino regular para fazer frente à inclusão”. As
autoras salientam ainda, que é preciso conhecer um pouco mais da realidade das nossas
escolas e os desafios que representam para o professor do ensino regular ter um aluno com
necessidades especiais em sua turma.
38
E mais recentemente, com as Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica (Resolução
CNE/CEB Nº 2), e Plano Nacional de Educação - Educação Especial são exemplos de documentos que
defendem e asseguram o direito de todos ao ensino regular.
10
8
Dados como estes deram origem à problemática desta pesquisa, tendo em vista
que, o curso de licenciatura em Educação Artística da Universidade Federal do Paraná - no
qual me graduei no ano de 2007 - não contemplava em sua grade curricular disciplinas
referentes ao atendimento de alunos com necessidades especiais. Entretanto, estando
licenciada em Artes Visuais, de acordo com a LDB 9.394/96, em minha atuação poderia
receber em sala alunos com necessidades especiais, incluindo neste caso deficientes
visuais39.
Seria possível ensinar artes visuais para uma criança não-visual40? Como
transformar cores, formas e linhas em representações acessíveis à uma pessoa cega?
Partindo destes questionamentos, as reflexões construídas a seguir se pautaram na
experiência como docente, no contato com a realidade da criança não-visual, e
principalmente, na busca incansável de conscientizar as pessoas ditas “normais”, que a
criança cega pode, e deve, se desenvolver como um ser integral, não considerando somente
suas limitações, mas sim, suas potencialidades.
2. O PAPEL DO PROFESSOR NO ENSINO DE CRIANÇAS CEGAS
O primeiro contato com a realidade em questão aconteceu no ano de 2005, quando
ainda acadêmica do curso de Educação Artística, propus uma exposição de desenhos
sensoriais para os alunos da Escola de Educação Especial Professor Osny Macedo
Saldanha41, mantida pelo Instituto Paranaense de Cegos. A vivência tinha como objetivo
realizar um percurso didático onde eram apresentados os conceitos de ponto, linha e forma,
em desenhos táteis e estruturas concretas. Como primeiro resultado, foi possível notar o
entendimento dos alunos cegos dos conceitos apresentados, bem como a possibilidade de
ensinar desenho utilizando linhas táteis.
A experiência foi estimulante e encantadora, e no ano seguinte, decidida a
pesquisar sobre o tema no trabalho de conclusão do curso de graduação, surgiu a
oportunidade de atuar como docente na escola supracitada. A partir desta nova situação que
se apresentou, a concepção da pesquisa teve de ser modificada, e, portanto, a metodologia
redesenhada: não estaria apenas interferindo na realidade observada, neste caso estaria
também, fazendo parte desta realidade.
Atuando como professora-pesquisadora, tive a oportunidade de desempenhar um
papel ativo na própria realidade dos fatos observados. Esta figura do professor-pesquisador
foi defendida por Lawrence Stenhouse que julgava necessário que “o docente tivesse pleno
domínio da prática pedagógica”, e acreditava na investigação como único caminho para isso
(ELLIOTT, 1998 p. 137). Portanto, neste estudo, a investigação em sala de aula é voltada
para a prática, aliada ao saber teórico, e a reflexão contínua deste processo.
Estes pressupostos caracterizam metodologicamente este estudo como uma
pesquisa-ação, que na definição de Michel Thiollent designa:
“[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um
problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes
39
Entende-se como deficiente visual pessoas cegas (percepção de luz, a falta total da visão), ou com baixa visão
(mesmo com auxílio óptico não possuim visão suficiente).
40
O termo não-visual é utilizado no decorrer do texto como sinônimo de criança cega.
41
A Escola de Educação Especial Professor Osny Macedo Saldanha, mantida pelo Instituto Paranaense de
Cegos – IPC, é a única escola do Estado que ainda oferece Ensino Fundamental para crianças deficientes
visuais (cegos ou com baixa visão) com idades entre 6 e 14 anos. No período da tarde funciona como Centro de
Apoio Especializado, prestando atendimento aos alunos deficientes visuias que estudam no ensino regular.
10
9
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo
cooperativo e participativo”. (THIOLLENT , 2003, p.14)
Ferreira (2006, p.231) aponta que estudos na área da educação inclusiva que
adotaram a pesquisa-ação como metodologia mostram que quanto mais o professor
conhece seus alunos (interesses, habilidades, necessidades, história de vida) e incorpora
esse conhecimentos no planejamento das estratégias de ensino a serem adotadas “maiores
serão as chances de promover a participação de cada aluno(a) na atividade de sala de aula,
a inclusão e o sucesso escolar de todos”.
Mesmo com conhecimento mínimo, e até então teórico, a respeito da deficiência
visual, e nenhuma experiência na área da educação especial, decidi transformar a sala de
aula em um “laboratório de pesquisa”, no qual os sujeitos tinham “algo a dizer e a fazer”.
Estava disposta a esclarecer minhas dúvidas e curiosidades a respeito das pessoas cegas,
ouvindo seus relatos e observando sua realidade.
Nesse sentido, podemos apontar a obra de Pierre Bourdieu como fundamental no
entendimento das relações entre a pesquisa e o pesquisador, principalmente pelo fato do
autor considerar que a pesquisa sociológica só tem sentido quando alia pensamento e ação.
Valle (2008, p. 95-96) afirma que Bourdieu “desejava pensar a teoria e a prática de forma
articulada”, e acredita que seu legado nos leva à compreensão de nossas próprias práticas e
de nossas opções teórico-metodológicas, inspirando as pesquisas sobre a educação
brasileira”.
Ao aliar o saber teórico e o saber prático no decorrer das investigações que
permearam, e ainda permeiam esta pesquisa, foi possível compreender os resultados e as
respostas dos alunos frente às dificuldades apresentadas, bem como apontar novos
questionamentos levando-se em conta estes resultados e respostas. Cada atividade
alimentava as posteriores, revelando uma “conversa” de uma ação com a ação seguinte,
entremeadas de justificativas e explicitações dos objetivos, não se resumindo a uma
seqüência linear de tópicos soltos.
Valle (2008, p.102) afirma que a pesquisa sociológica não é linear, “durante o
desenvolvimento dos trabalhos de investigação, a problemática pode mudar de direção, as
hipóteses podem ser redefinidas, as opções metodológicas podem ser diversificadas”. Estas
elaborações envolvem um “pensar” com antecedência, um “projetar” sobre o que pode ser o
processo de ensino-aprendizagem dos alunos, bem como, um “rever” o acontecido e as
reações dos mesmos.
Dentro desta perspectiva, do decorrer deste estudo, busca-se compreender o
desenvolvimento de cada aluno e conhecê-los em vários aspectos – sociais, cognitivos,
afetivos e emocionais – o que implica uma constante investigação por meio de observações,
diálogos com as crianças, com suas famílias e com os outros docentes da escola.
Em outras palavras, segundo Peruzzo (2005, p. 131) “procura-se dizer que há mais
coisas a compreender e não apenas aquilo que pode ser verificado estatisticamente”. A
questão, no nosso modo de ver, é que não se podem desconsiderar as particularidades do
sujeito pesquisado, nem aceitar a idéia de que somente a informação “quantificável” possa
ter valor científico dentro do campo das Ciências Humanas.
Acredita-se, portanto, que numa pesquisa ancorada na dialética seja possível
entender a complexidade e a profundidade do sujeito pesquisado, por meio da possibilidade
de diálogo e do encontro com o outro no contexto da pesquisa. Segundo Amorim (2004,
11
0
p.15) a idéia do dialogismo foi construída por Bakhtin, e nesta perspectiva, o autor discute a
questão da alteridade, e a relação do pesquisador com o „outro‟.
Podemos entender a alteridade no contexto deste estudo, pelo pressuposto de que
todo o homem social interage e interdepende de outros indivíduos, ou seja, nossa existência
só é permitida mediante um contato com o outro, dessa forma, eu apenas existo a partir do
outro, da visão do outro, o que me permite também compreender o mundo a partir de um
olhar diferenciado, partindo tanto do diferente, quanto de mim mesmo. (AMORIN, 2004)
Os fundamentos teóricos a respeito do sujeito cego e seu desenvolvimento levaram
a questionar a postura de pesquisadores e profissionais da educação, pois em grande parte,
apontam que o referencial teórico e as práticas que nele se fundam, têm sido elaboradas
com o amparo de um referencial próprio ao vidente42. Sendo assim observa-se que os
conceitos e idéias referentes “aquele que não enxerga”, são construídos pelos pré-conceitos
e idéias “daquele que enxerga”. O diferente é desprezado, não se ouve a voz do „outro‟,
desconsiderando a questão da alteridade. Tais concepções levam a uma tendência a impor
pessoa cega as estruturas do mundo "visível", anulando até mesmo a proposta educacional
voltado para a criança cega, que passa a ser entendida primeiramente pela sua deficiência,
e não por suas possibilidades e potencialidades.
Entende-se, portanto, que a inclusão da criança cega – seja no parque em que ela
costuma freqüentar, na escola, ou em um âmbito maior, na sociedade – diz respeito às
possibilidades e oportunidades que essa criança tem para se desenvolver como ser
humano. E essa condição, mais do que se pensa, está extremamente ligada a concepções,
expectativas e representações que se tem a respeito de quem “não enxerga”. Para que
possam ser superadas estas expectativas limitadoras ou até mesmo “sobrenaturais” sobre a
criança não-visual, é necessário que haja disposição para conhecer o “outro”.
3. CONHECENDO O „OUTRO‟: O SUJEITO NÃO-VISUAL
Considerando o papel preponderante da visão nas nossas relações com o
meio, torna-se praticamente impossível imaginar a vida sem imagens visuais, o que
nos leva a conotações, que muitas vezes ultrapassam o real significado de sua
ausência. Quando pensamos em um mundo sem a possibilidade de ver, nos
remetemos imediatamente a “escuridão”, porém, sabe-se que não basta fechar os
olhos para reproduzirmos o mundo da pessoa cega.
Amiralian (1997, p.22-23) comenta em seu livro “Compreendendo o Cego” que “a
situação de ficarmos momentaneamente privados da visão é perturbadora”, pois nos
sentimos perdidos, sem ponto de referência, e acreditamos ser este o estado constante dos
sujeitos cegos. A imagem que temos da pessoa cega foi adquirida durante toda a nossa
vida, e se fundamenta em concepções populares que por um lado concebem os cegos como
seres inferiores e dignos de piedade; ou seres superiores, dotados de poderes
sobrenaturais.
Estas concepções são históricas, e segundo Vygotski (1997, p.100) tem início na
antiguidade, mais precisamente na Idade Média. O autor aponta que em vestígios desta
época são visíveis as opiniões populares sobre o cego, onde se via a cegueira, antes de
tudo como uma enorme desgraça, e o cego como um ser indefeso, inválido e abandonado.
Por outro lado, acreditavam que os cegos desenvolviam forças místicas superiores, e que
possuíam uma “visão espiritual”. Esta visão sobrenatural do cego, segundo o autor, teve
42
O termo se refere a pessoa que faz uso da vista, em oposição aos cegos.
11
1
continuidade com o advento do cristianismo, acreditava-se que por seu sofrimento, os cegos
eram seres mais próximos de Deus.
Vygotski (2007, p.101) afirma que, somente no século XVIII, surgiu uma nova
concepção sobre a cegueira: “no lugar do prejuízo, a experiência e o estudo”. No plano
teórico, esta nova concepção teve grande importância na educação dos cegos,
incorporando-os na vida social, tendo em vista que nesta época, surgiu a possibilidade de
educação para os deficientes visuais.
Quais são as idéias e concepções a cerca da cegueira hoje? Ora, parece-me
muitas vezes que cultivamos todos os conceitos existentes na antiguidade, tendo em vista
que ainda temos a visão do “cego coitado” ou do “super cego”. A visão errônea acerca da
cegueira se perdura desde a antiguidade, e é alimentada de certa forma pela literatura,
pelas concepções populares e pela maneira distorcida de criar concepções sem antes ouvir
o „outro‟. Estas colocações são postas principalmente pela vivência com pessoas cegas, por
ouvir suas experiências e observar a atitude das pessoas videntes frente a esta condição.
Acredita-se que a real compreensão dos sujeitos cegos, só poderá ser atingida pela
apreensão de todos os fatores estruturantes de sua personalidade. Segundo Vygotski (1997,
p.104) para compreender todas as particularidades do sujeito cego, temos de tomar como
base as “exigências do pensamento dialético”, ou seja, para entender qualquer fenômeno
em sua totalidade, é preciso considerá-lo em conexão com sua história e seu contexto.
Embora pensemos que a criança deficiente visual pode desenvolver as atividades
da mesma forma que uma criança vidente, é necessário lembrar que, as mesmas têm suas
limitações, e seu desenvolvimento ocorre de maneira diferente. A deficiência em si não afeta
o que a criança é capaz de aprender cognitivamente, mas sim como irá aprender. A chave
para o desenvolvimento da criança deficiente visual será a compreensão do mundo através
de instrumentos alternativos, ou seja, se ela atinge o mesmo nível de desenvolvimento de
uma criança dita normal, é porque o alcança de outro modo, caminho ou meio. (VYGOTSKI,
1997)
Para aqueles que procuram um trabalho educacional com deficientes visuais, é
necessário compreender o que implica, no desenvolvimento destes alunos, possuir algum
impedimento visual. Para tanto, é preciso considerar, entre outros fatores: se possui baixa
visão, qual é seu grau de acuidade visual; se sua cegueira é congênita ou adquirida; e no
caso da cegueira adquirida, em que idade aconteceu.
“Os sujeitos com deficiências visuais são heterogêneos, se levarmos em
conta duas características importantes: por um lado, o resíduo visual que
possuem, e por outro, o momento de aquisição de sua deficiência, pois um
sujeito cego de nascimento não é igual àquele que adquire essa condição
ao longo da vida. Em função desse momento, seus condicionantes pessoais
e suas aprendizagens serão totalmente diferentes”. (GONZÁLEZ, 2007,
p.102)
As diferenças nas tarefas de raciocínio entre cegos congênitos e adquiridos se
devem a ocorrência de diferentes modos de representação, que, por sua vez, resultam em
diferentes habilidades de processamento cognitivo. Uma das principais dificuldades que
estas crianças cegas congênitas enfrentam no que se refere ao desenvolvimento cognitivo,
diz respeito à “lacuna na apreensão dos estímulos devido à ausência da percepção visual”
(CUNHA; ENUMO, 2003, p.39).
11
2
A percepção visual é o principal canal de veiculação e acesso às informações que
serão, posteriormente, utilizadas para construção das representações da criança sobre o
mundo. A criança cega, em função de não poder alcançar as semelhanças e diferenças dos
objetos do ambiente através de imagens visuais, deverá compreender o mundo que a cerca
pela indicação verbal das suas características, ou pela percepção tátil, como por exemplo:
[...] a formação do conceito de cão dependerá da apreensão de diferentes
estímulos, sensações táteis, auditivas, olfativas e visuais, que geram
informações que, através da visão, serão integradas, estabelecendo, assim,
o conceito propriamente dito. [...] a criança dita normal toca a cabeça, o
corpo, as pernas do cão, ouve seus latidos e, ao mesmo tempo, vê a
imagem do cão todo (CUNHA; ENUMO, 2003, p.39).
Pensando na conceituação, reconhecemos um objeto por suas características mais
marcantes e relevantes, como, por exemplo: ao identificar o animal “cão”, construímos seu
conceito através de sua forma, textura e através dos sons que este emite, para então fazer a
ligação do significado à palavra. Estes dados ficam arquivados em nossa memória, assim,
sempre que nos for solicitado a imagem referente à palavra “cão”, iremos buscar em nossos
registros mentais todas as informações apreendidas referentes a este conceito.
Informações como estas, exemplificam o motivo pelo qual nós humanos
compartilhamos a experiência de sermos capazes de evocar uma imagem mental de um
evento que ocorreu muitos anos atrás e, simultaneamente, experimentar os sentimentos
ligados à situação, como se ela estivesse ocorrendo agora. Esta capacidade se refere à
memória sensorial, construída a partir dos estímulos do meio e já significada e interpretada
pelo sujeito. (MORAIS, 2006, p.10)
Sendo assim, podemos dizer que a memória humana é capaz de realizar uma
grande variedade de operações, entre estas, a identificação e classificação de sons, sinais,
cheiros, gostos e sensações. Portanto, entende-se que a formação da imagem mental, não
depende somente do sentido da visão, mas também, de todas as outras experiências
sensoriais provenientes dos estímulos que recebemos. No caso da ausência de um dos
sentidos, a imagem mental é criada por meio dos outros sentidos de percepção.
Dentro da escassez de referencial a respeito do assunto no campo pedagógico, foi
fundamental a aproximação aos conhecimentos da Neurociência, com os quais foi possível
compreender como ocorre o processo da formação da imagem mental, e compreender que
a formação da imagem não ocorre apenas pelo canal visual, e que, portanto, a criança cega
é capaz de formar imagens mentais dos objetos por meio de informações provenientes de
outras modalidades sensoriais.
Pesquisas no âmbito da neurologia têm desvendado novos caminhos para a
compreensão das funções da imagem e da visualidade, nos ajudando a compreender a
construção do conhecimento da criança cega. O neurologista e neurocientista Antônio
Damásio (2000, p.402) denomina imagem “a estrutura mental construída a partir de sinais
provenientes de cada uma das modalidades sensoriais – visuais, auditivas, olfativas,
gustatória e somatossensoriais”. Portando, podemos considerar que se a pessoa vidente
identifica o mundo que a cerca utilizando todos os seus sentidos, é possível, no caso da
ausência do sentido visual, que esse conhecimento seja construído utilizando outros
sentidos desenvolvidos de acordo com suas experiências e oportunidades. Cohen salienta
esta concepção, ao afirmar que “o ser humano não vê apenas com os olhos, ele vê através
de toda uma experiência acumulada” (2001, p.176).
11
3
Começar a compreender, mesmo que pouco, o funcionamento cerebral e sua
imensa complexidade, permite que alguns questionamentos sejam formulados: como ocorre
o processo de formação da imagem mental da criança cega? Seria possível que
informações provenientes de todos os sentidos possam ser transformadas em
representações gráficas? Como fazer com que as imagens mentais das crianças cegas
sejam representadas em seus desenhos?
4. DESENHAR SEM VER: O ENSINO DO DESENHO PARA CRIANÇAS CEGAS
O referencial teórico que trata do ensino do desenho para crianças não-visuais é
escasso, e pesquisas nesta área ainda apontam controvérsias. Muitos consideram que
ensinar desenho para uma criança cega, é impor uma aprendizagem imposta pelos
videntes, que se dá a partir de “padrões visuais”, sendo assim, a representação gráfica do
cego uma reprodução visual imposta por quem enxerga e, portanto, falsa. (AMIRALIAN,
1997, p.85)
Oliveira (2008, p.247) relata alguns casos de artistas deficientes visuais, e na análise
de entrevistas e depoimentos também indica a participação relevante de familiares e
profissionais em sua formação e em seu trabalho cotidiano. Reily (apud Oliveira, 2008, p.247
) aponta certa tendência a não se colocar em relevo a participação de outras pessoas na
formação dos artistas com deficiência, segundo ela, “a mediação de outros sujeitos fica
ofuscada, muitas vezes por uma visão de desempenho do artista como algo inato, um dom”.
Entretanto, quando falamos em crianças cegas, e principalmente cegas de
nascimento, temos de levar em conta que o conhecimento do mundo se dará pela mediação
desse conhecimento. Neste processo de construção, a informações concedidas pelas
pessoas que convivem com a criança cega, terão papel importante na formação de
conceitos sobre os objetos.
“Quando apresentamos um objeto para que aquele que não vê desenhe,
além de permitir o toque no objeto, quando isso é possível, usamos também
a fala para descrevê-lo. A descrição verbal é um recurso essencial para
auxiliar, passo a passo, ou toque a toque, o reconhecimento do objeto pelo
cego.” (DUARTE, s/ data, p.14)
Outro ponto que deve ser destacado é que muitas vezes o recurso verbal se
sobrepõe as experiências da criança cega. É importante que a criança cega utilize todos os
recursos possíveis para formar a sua própria conceituação dos objetos, seja por meio de sua
vivência, ou pela mediação dos conhecimentos por outras pessoas.
Embora estudos sobre o ensino do desenho para cegos sejam escassos, esta
preocupação não é recente. Amiralian (1997, p.87-89) aponta os estudos de Victor
Lowenfeld (1939), que utilizou desenhos de cegos para analisar o desenvolvimento da
criatividade, de conceitos de forma e espaço, e de representações mentais. Este estudo
trouxe importantes contribuições para a compreensão da arte da criança e da influência do
sentido da visual sobre o desenho. Outro pesquisador apontando pela autora foi Millar
(1975), que analisando o desenho da figura humana de crianças cegas, videntes e videntes
vendadas, concluiu que, embora a experiência visual seja uma condição facilitadora, não é
necessária para a realização de desenhos.
11
4
Entre os autores e pesquisadores que abordam o assunto desenho e cegos, os
textos da pesquisadora Maria Lúcia Batezat Duarte 43 foram as referências mais
significativas. Apesar dos sujeitos envolvidos na presente investigação estarem inseridos em
um contexto diferente – uma Escola de Educação Especial – o referencial teórico traçado
pela pesquisadora teve grande importância no entendimento do processo de formação da
imagem mental e aquisição da linguagem gráfica de crianças cegas. Partindo das
constatações e discussões da pesquisadora, foi possível delinear alguns pressupostos que
guiaram a organização metodológica do presente estudo.
Duarte acompanha desde 2002 a aquisição da linguagem gráfica de Manuella 44. Em
seus primeiros relatos, a pesquisadora conta que tinha como objetivo ensinar para menina
representações de esquemas gráficos45 mais freqüentes encontrados nos desenhos das
crianças em idade escolar, tendo em vista, que Manuella não se sentia inserida no seu
grupo por não saber desenhar. O resultado esperados seriam a inclusão efetiva da aluna no
ambiente escolar, tornando-a capaz de representar o mundo como seus colegas. Para a
Duarte, “ensinar uma criança cega a desenhar tem como meta imediata integrá-la a uma
brincadeira infantil extremamente usual desde os primórdios da história da humanidade”.
(2004-a, p. 138)
Duarte (2004-a) deu início às atividades com a proposta de mostrar o que era
desenhar, por meio dos seguintes passos metodológicos:
“O primeiro momento do processo requer o reconhecimento do objeto em
experiência tátil. [...] O segundo momento requer uma ação dirigida na qual
a criança percorre com o dedo indicador (o dedo mais sensível, aquele que
lê em Braille) as bordas da superfície e contorno dos objetos. [...] No terceiro
momento, a figura é apresentada à criança recortada sobre um material
plástico (E.V.A). [...] No quinto momento a criança faz a primeira tentativa de
desenhar o objeto traduzido em forma geométrica. [...] no sexto momento a
criança relê e identifica tatilmente a figura de seu próprio desenho. No
sétimo e último momento dentre as principais seqüências de aprendizagem,
a criança é estimulada a realizar representações de novos objetos com a
mesma figura geométrica (DUARTE, 2004-a, p. 139-140).
A autora explica que pelos mesmos procedimentos, outras formas já foram
apresentadas à menina, obtendo resultados satisfatórios, pois, no decorrer do aprendizado,
Manuella começava a desenhar suas próprias representações dos objetos (DUARTE,
2004a, p.140).
Entre os trabalhos da autora, foi encontrado no texto “O desenho como elemento de
cognição e comunicação ensinando crianças cegas” (2004b), que inspirou muito da
concepção de ensino desenvolvida aqui. No referido texto, a pesquisadora afirma que, é
possível construir uma noção totalizadora dos objetos, utilizando materiais e métodos
adequados, permitindo às crianças cegas, de modo tátil, compreender as bordas dos objetos
e suas “linhas de contorno”, utilizando uma “seqüência-temporal” e não “visual-espacial”
como a dos videntes:
Em artigo no qual conta sua experiência com desenhos de crianças e adultos cegos,
John M. Kennedy (apud DUARTE, 2004, p. 138) afirma que, “[...] os cegos, como os
videntes, compreendem a noção de linha de contorno, a linha imaginária que a borda dos
objetos permite intuir”. O autor define a linha de contorno como uma linha inexistente, mas,
43
Maria Lúcia Batezat Duarte atualmente é orientadora da pesquisa em questão.
Manuella é cega congênita, na época a menina tinha 8 anos, estuda em uma escola de ensino regular.
45
A expressão “esquema gráfico” de Duarte também pode ser entendida como os estereótipos.
44
11
5
aos olhos de quem vê ou ao tato de quem toca, determina as bordas de superfície do objeto,
ou seja, o limite que o separa dos outros.
Entender que a criança cega pode compreender a linha de contorno dos objetos foi
um ponto importante da metodologia de Duarte, que norteou o desenvolvimento de um
método de ensino do desenho para crianças não-visuais. Tendo como base os pressupostos
já apresentados pela pesquisadora, foi possível, elaborar um método de ensino de desenho
para cegos, que envolve a exploração sistemática do tato, a explicação verbal e desenhos
táteis reproduzidos com materiais que possibilitem o relevo46. (MORAIS, 2006)47.
Durante as primeiras aulas com os alunos da Escola de Educação Professor Osny
Macedo Saldanha, no ano de 2006, foi possível responder alguns questionamentos a cerca
dos sujeitos da pesquisa. No que diz respeito ao ensino do desenho em específico, foi
constatado que as crianças não realizam representações gráficas 48 de objetos; os alunos
apenas faziam movimentos contínuos do giz de cera sobre o papel, e o traçado não permitia
que sentissem as linhas tatilmente. Conheciam pouco, ou quase nada, dos elementos
básicos do desenho, e pareciam não saber a finalidade do que estavam fazendo. Quando
eram solicitados a verbalizar o que desenhavam, o traçado ganhava o ritmo das suas falas,
que pouco se relaciona com o objeto. Neste momento, percebeu-se que ensinar desenho
para uma criança cega seria mais do que adaptar uma metodologia de ensino, mas
compreender como ela se apropria das imagens visuais e as transforma em imagens
mentais.
Resultados significativos podem ser apontados durante os 3 anos de vivência com os
alunos da escola em questão. Hoje, as crianças cegas envolvidas nesta pesquisa fazem
suas próprias representações gráficas dos objetos, reconhecem formas em relevo,
conseguem compreender imagens táteis, e representam, até mesmo, imagens de objetos
que não podem ser tocados, como uma paisagem. Algumas destas crianças nunca andaram
sobre uma montanha, não conhece visualmente a imensidão do mar, não sabem o que é o
azul do céu, não pode tocar a linha do horizonte, mas com algumas linhas táteis no papel,
entendem, explicam, representam e criam conceitos de objetos que parecem tão
inacessíveis a alguém que “não pode ver”.
5. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
“Para mudar o mundo, é preciso mudar as maneiras de fazer o mundo, isto
é, a visão de mundo e as operações práticas pelas quais os grupos são
produzidos e reproduzidos.” (Bourdieu apud Valle, 2008, p.98)
O presente artigo teve como objetivo refletir sobre as possibilidades de ensino do
desenho para crianças cegas, entretanto, mais do que isso, se buscou no decorrer do texto
discutir a valorização da criança não-visual, e o modo pelo qual esta se apropria dos
conhecimentos, demonstrando que, sua constituição como sujeito não está destituída de
significados – culturais, sociais ou afetivos – pelo fato de “não enxergar”. Apropriar-se destas
46
47
48
Como ferramenta são utilizados giz de cera, folha de sulfite 90gr sobreposta a folhas de E.V.A, e alfinetes.
Trabalho de Graduação, do curso de Licenciatura em Educação Artística, 2006.
O termo representação gráfica é utilizado no decorrer do texto como sinônimo de desenho.
11
6
experiências, para a criança cega, mesmo em circunstâncias desfavoráveis, mostra que ela
não é “deficiente49”, inferior, incapaz, impotente.
Como observado na literatura a respeito do assunto, além de muitos autores
compararem o desenvolvimento da criança cega com a vidente, as diferenças por eles
encontradas geralmente revelam na criança não-visual a desvantagem e a incapacidade.
Assim, percebemos que, na maioria dos casos, apresentam um enfoque reducionista do
desenvolvimento infantil, pois ignoram o contexto e desconsideram que o indivíduo se
desenvolve na interação com meio cultural, social e afetivo em que está inserido.
É inegável a importância da visão para o desenvolvimento, principalmente para
quem a possui, sendo assim, justifica-se o impacto que sua ausência pode causar no
desenvolvimento do indivíduo, no entanto, se indaga sob quais parâmetros essas
concepções estão sendo calcadas. Desta maneira, indaga-se também, sob qual perspectiva
a educação especial deveria traçar suas metas de intervenção, que postura e que atitudes
deveriam assumir os profissionais da área, para que o ensino seja compreendido dentro de
uma perspectiva mais ampla.
Uma atitude realista sobre o desenvolvimento da criança não-visual seria buscar
conhecer o indivíduo tal como ele é, para então, intervir de maneira adequada. Estudos
sobre o desenvolvimento da identidade de crianças videntes e não-videntes, comentam a
dificuldade que a criança poderia apresentar ao desenvolver certas habilidades. No entanto,
nas observações da realidade das crianças cegas da instituição pesquisada, constatou-se a
possibilidade que as mesmas têm de realizá-las. Ou seja, a dificuldade existe, mas ela não é
impeditiva do desenvolvimento e conhecimento da criança não-visual, pois, tal dificuldade
está impregnada de expectativas sociais referentes ao processo de aprendizagem dessa
criança.
É importante ressaltar que, pelo fato da criança não-visual compreender o mundo
utilizando outros sentidos, a percepção através destes pode ser mais ou menos acurada,
levando-se em conta as circunstâncias e oportunidades que teve para aguçá-los. Neste
processo, a família, a escola, e todos os profissionais envolvidos, tem papel importante no
desenvolvimento desta criança; oferencendo condições para seu crescimento como
indivíduo, ou seja, torná-lo capaz de se desenvolver dentro da sua realidade, de suas
potencialidades e de seus limites.
No âmbito social e educacional, este estudo busca redimensionar o papel da escola
no que se refere à inclusão, já que esta, na maioria das vezes, identifica as crianças com
necessidades educacionais especiais – neste caso em específico as crianças não-visuais –
primeiramente pela sua “deficiência”, e não por suas potencialidades. Para reverter este
quadro, seria necessário que as questões sociais pertinentes às necessidades e às
capacidades individuais destes alunos, fossem superadas no contexto do sistema
educacional. O elemento biológico não deveria ser o único determinante para as
necessidades humanas. Embora a criança possa ser privada de um elemento biológico,
físico ou sensorial, suas necessidades e habilidades, como já citado anteriormente, são
produzidas de acordo com suas possibilidades e oportunidades.
As reflexões neste ponto se pautaram na experiência como docente, no contato
com a realidade da criança não-visual, e principalmente, na busca incansável de
conscientizar as pessoas ditas “normais” de que a criança cega pode, e deve, se
desenvolver como um ser integral, não considerando somente suas limitações, mas sim,
49
O termo “deficiente” se aplica neste momento em oposição ao conceito de “eficiente”.
11
7
suas potencialidades. Seria pretensioso dizer que esta postura é capaz de mudar o conceito
estabelecido em nossa sociedade, porém, a divulgação desta pesquisa e a discussão que
aqui proponho, se colocam como uma forma de democratizar o conhecimento sobre o
assunto, que até o presente momento se encontra ainda bastante desconhecido e limitado a
um grupo pequeno de pesquisadores.
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11
9
INCLUSÃO E CULTURA SURDA: OBSERVANDO QUESTÕES ACERCA DA
SURDEZ
Liane Carvalho Oleques
PPGAV/UDESC/2010
[email protected]
Resumo
Este artigo é um recorte da pesquisa de mestrado “Desenho infantil: entre a palavra e a
imagem” que faz uma análise da produção gráfica de uma criança surda em paralelo a uma
criança ouvinte. Assim, foi necessário conhecer e expor as questões que envolvem a surdez
em toda sua complexidade, dando base a pesquisa. Num primeiro momento ressaltam-se
alguns aspectos do processo de ensino e aprendizagem da educação especial introduzindo
as questões concernentes a surdez e suas especificidades. Autores como Gonzalez (2007),
Lucia Reily (2007), Vigotski (1997), Oliver Sacks (1998), Ronice de Quadros (1997) e Márcia
Goldfeld dão base ao trabalho no tocante ao ensino especial bem como a cultura surda.
Palavras-chaves: educação especial, deficiência, surdez e cultura surda
Abstract
This article is part of a research Masters' Playground Design: between word and image
"which analyzes the graphic production of a deaf child in parallel with a hearing child. It was
therefore necessary to understand and explain the issues surrounding deafness in all its
complexity, giving basic research. At first it is worth highlighting some aspects of the teaching
and learning of special education by introducing the issues concerning deafness and its
specificities. Authors such as Gonzalez (2007), Lucia Reily (2007), Vygotsky (1997), Oliver
Sacks (1998), Ronice Frame (1997) and Marcia Goldfeld are the basis of work with regard to
special education and deaf culture.
Keywords: special education, disability, deafness and deaf culture
Considerando os aspectos que envolvem a surdez no âmbito das
necessidades especiais e culturais, este trabalho apresenta algumas questões e
reflexões acerca do sujeito surdo. Num primeiro momento, será realizada uma
pequena introdução ao contexto das necessidades especiais na contemporaneidade,
permeando por alguns autores como Gonzalez (2007), Lucia Reily (2007) e Vigotski
(1997) que tratam as necessidades especiais fora do ponto de vista da deficiência,
encarando-a como uma diferença no processo de ensino e aprendizagens.
Num segundo momento do texto a surdez ganha evidência, salientando,
suas características e a educação de surdos na atualidade, pontuando o Ensino das
Artes Visuais.
Ainda é possível perceber na sociedade contemporânea um olhar
indiferente para com as pessoas com deficiências, com necessidades especiais.
Reily (2007) discorre acerca das barreiras atitudinais, caracterizadas pelos limites e
12
0
preconceitos que a sociedade impõe as pessoas com algum tipo de necessidade
específica. Desta forma, as consequências sociais da deficiência consolidam a
condição de incapacidade.
Limites
e
preconceitos,
impostos
injustamente,
sem
o
mínimo
conhecimento e entendimento acerca do assunto, por parte destas pessoas. A
autora argumenta sobre a necessidade de estudos referentes ao tema, a fim de
desmistificar e esclarecer a sociedade com relação à deficiência:
Justifica-se o estudo das concepções sociais da diferença pela necessidade de
melhor compreender como as representações da deficiência se constituem e se
desenvolvem, como são reveladas e disseminadas, para que se possa encontrar
modos de demonstrar mitos e estereótipos de deficiência que se cristalizaram ao
longo do tempo, na perspectiva de trabalhar em prol da inclusão. (REILY, 2007, p.
221)
Considerando os procedimentos pedagógicos que implementam o ensino
atualmente, é importante salientar que nem todos os alunos possuem o mesmo ritmo
de aprendizagem, portanto, é necessário compreender estas diversidades de modo
a atender este público. A Educação Especial destina-se ao atendimento de pessoas
cegas, surdas, autistas, com déficit cognitiva ou deficiência múltipla, além de
pessoas com altas habilidades, em instituições especializadas, atendendo específica
e
exclusivamente
alunos
com
determinadas
necessidades
especiais
de
aprendizagem. Para isso, faz-se necessário a adaptação de metodologias já
existentes para o processo de inclusão.
De acordo com González (2007) que, trás alguns conceitos e dados
históricos acerca da experiência em atendimentos educacionais especiais na
Espanha, alunos que necessitam de um atendimento específico não podem ser
considerados incapacitados, considerando que sua dificuldade relaciona-se mais ao
sistema social e cultural que os rodeiam do que na existência de uma disfunção
neurológica. Assim, o autor define que pessoas que necessitam de um processo
educacional específico são aquelas que:
(...) apresentam algum tipo de deficiência física, psíquica ou sensorial, ou que estão
em situação de risco social ou de desvantagem por fatores de origem social,
econômico ou cultural que os impedem de acompanhar o ritmo normal do processo
de ensino-aprendizagem. Por meio desses atendimentos especiais pretende-se
conseguir o máximo desenvolvimento das possibilidades e capacidades desses
alunos, respeitando as diferenças individuais apresentadas ao longo desse processo.
(GONZÁLEZ, 2007, p. 19)
Para tanto, é necessário que o processo de inclusão venha a quebrar as
barreiras do preconceito, especificamente, sociais e culturais que compreendem as
12
1
pessoas que necessitam de um processo de aprendizagem diferenciado ou
adaptado como pessoas incapacitadas para o convívio social, relegando-as a
marginalidade.
A colaboração de Vigotski50 (1997) neste assunto tem mostrado que suas
reflexões atendem a demanda teórica sobre Educação Especial na atualidade. Este
autor já apontava para uma visão social da deficiência em detrimento a patologia,
ressaltando que o meio social deveria agir de modo que possibilitasse situações,
provocadoras de reações que compensassem a condição de deficiente. Desta
maneira, Vigotski acreditava que o olhar perante a deficiência deveria se concentrar
nos processos compensatórios, desviando a atenção da deficiência ou patologia
associada à incapacidade.
Já na época em que produziu seus estudos acerca das necessidades
especiais acreditava que a escola especial deveria criar tarefas positivas gerando
formas de trabalhos específicos que atendessem as peculiaridades de seus
educandos, e não simplesmente aplicar um programa simplificado e facilitado da
escola regular.
Desta forma, tem-se como objetivo na Educação Especial, portanto,
possibilitar que este aluno, por meio de profissionais capacitados e recursos
especializados,
alcance
o
máximo de
desenvolvimento
pessoal
e
social,
possibilitando uma melhor qualidade de vida “(...) nos âmbitos pessoal, familiar,
social e profissional”. (GONZÁLEZ, 2007, p. 21).
É importante salientar que alunos que necessitam de um atendimento
específico, seja no ensino regular ou em escolas especializadas, não sejam privados
do conhecimento e de interações sociais que os tornam cidadãos plenos na
sociedade contemporânea, assim como coloca González:
Depois de vermos as dificuldades surgidas na tentativa de determinar o que se deve
entender por conduta normal e diferente, posso dizer que uma pessoa sã ou normal é
aquela capaz de viver satisfatoriamente em um dado meio social, realizar-se nesse
meio e conseguir sua felicidade, ao mesmo tempo em que tenta ser útil para a
sociedade. A pessoa diferente (deficiente) é a que precisa dos repertórios sociais
adequados para realizar-se em seu ambiente social e escolar. (GONZÁLEZ, 2007, p.
22).
Neste sentido, Vigotski (1997) pontua a importância dos processos
compensatórios, salientando a necessidade da escola especial evidenciar a
compensação social, a educação social como forma de inclusão em detrimento a
50
Quanto à escrita do nome do autor será usada “VIGOTSKI” por considerar-se a forma mais simples e utilizada
na maior parte da bibliografia do autor aqui citada.
12
2
deficiência. Uma escola especial, segundo este autor deveria não apenas adaptar-se
as insuficiências, mas principalmente superá-las.
Da surdez
Dentro do panorama apresentado anteriormente, ou seja, as pessoas que
necessitam de algum tipo de atendimento específico ou diferenciado para terem
acesso e o máximo de aproveitamento em seu ambiente social encontram-se as
pessoas privadas do sentido da audição. Deste modo, serão abordadas, algumas
questões características do sujeito surdo como a língua de sinais, a cultura surda e
as propostas educacionais voltada ao atendimento destas pessoas. Autores como
Oliver Sacks (1998), Ronice de Quadros (1997), Márcia Goldfeld (2002) e Karen
Strobel (2008) entre outros subsidiam questões no âmbito da surdez e suas
especificidades.
Considerando a surdez no ponto de vista de sua condição física e
patológica é possível classificar aqui os que têm sérias dificuldades para ouvir em
função de algum dano no aparelho auditivo, interferindo pouco no desenvolvimento
da linguagem quando esta é trabalhada desde os primeiros anos de vida, porém,
ainda possuem esperanças com amplificadores de som e aparelhos implantados no
ouvido interno que fornecem impulsos elétricos permitindo a percepção do som.
Neste mesmo grupo destacam-se também os profundamente ou totalmente surdos,
que nada ouvem, além, de possuírem pouca esperança no tratamento. O quadro a
seguir mostra os cinco níveis de perda auditiva relacionando-os as consequências
na linguagem e fala.
Quadro I.51
MEDIDA AUDIOMÉTRICA
EFEITOS DA PERDA AUDITIVA NA
COMPREENSÃO DA FALA
Leve (26-40 dB)
Pode
apresentar
dificuldade
em
comunicação e expressão.
Moderado (41-55 dB)
Pode apresentar vocabulário limitado e
problemas na fala.
Grave (56-70 dB)
51
Provavelmente
terá
dificuldade
na
Tabela elaborada segundo o quadro fornecido em: GODOY, Maria de Fátima Reipert de. Educação artística
para deficientes auditivos: uma leitura a partir da visão de professores. Tese de doutorado. São Paulo:
IP/USP, 1998. P. 10.
12
3
utilização
da
linguagem
e
compreensão, além de vocabulário
limitado.
Severo (71-90 dB)
Pode ser capaz de perceber sons altos
ao redor, porém apresenta acentuada
dificuldade na linguagem e fala.
Profundo (acima de 91-dB)
Auxilio da visão para a comunicação.
Grave dificuldade na linguagem e fala.
Sendo assim, considera-se com “surdez” a pessoa incapacitada de
perceber o mínimo som a ponto de não favorecer-se com qualquer tratamento ou
aparelhos auditivos. Todavia, considerando alguns aspectos como grau e início da
perda, a surdez não limita o desenvolvimento cognitivo do indivíduo, tão pouco
afetará seu desenvolvimento se diagnosticada nos primeiros anos de vida e desde
então trabalhada a linguagem de modo consistente.
Partindo de outras perspectivas que se aproximam da surdez dentro de um
grupo linguístico diferenciado, é possível considerar alguns aspectos relevantes que
permitem entender essa condição singular e essa forma própria de assimilar e
entender o mundo, como a língua de sinais e a cultura surda.
Oliver Sacks (1998), neurologista que entre inúmeros trabalhos dedica-se,
da mesma maneira, a surdez, utiliza o termo Surdez (com letra maiúscula)
compreendendo um grupo linguístico e cultural, e surdez (com letra minúscula)
compreendendo uma condição física e uma visão médica. Desta forma destaca:
(...) comecei a vê-los [os surdos] sob uma luz diferente, especialmente quando
avistava três ou quatro deles fazendo sinais, cheios de uma vivacidade, uma
animação que eu não conseguia perceber antes. Só então comecei a pensar neles
não como surdos, mas como Surdos, como membros de uma comunidade lingüística
diferente. (SACKS, 1998, p. 16)
Partindo desta perspectiva, já é possível pensar nos processos de inclusão
dos surdos. Nesta visão a condição patológica não se sobressai, visando à surdez
dentro de um grupo que compreende o mundo de forma diferente, porém, que
precisa de auxílios e estímulos educacionais específicos para que a linguagem seja
constituída e facilite a interação do sujeito surdo dentro de seu ambiente social.
Vigotski (1997) já ressaltava a importância da educação social para que a pessoa
12
4
surda tenha condições de se “inserir na vida social como participante plenamente
válido” 52 (p. 235).
Em seu livro “Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos” Sacks
(1998) se questiona acerca de como é o mundo aqueles que não ouvem? Como é
viver privado do sentido da audição, o que acontece se uma pessoa não tem acesso
e não constitui uma linguagem? “O que é necessário para nos tornarmos seres
humanos completos?” (p. 49), pergunta o autor.
Desde muito pequenos, nós ouvintes, começamos a ter entendimento da
nossa volta por meio da língua oral que possui como modalidades de interação o
meio auditivo-oral. Desta forma, aprendemos a falar por imitação, repetindo o que
nos é apresentado. Assim, aprendemos que as coisas e os objetos que nos rodeiam
possuem nomes, aprendemos como usá-los, classificá-los, generalizá-los. Nossa
compreensão do mundo torna-se facilitada e possível através da linguagem, nosso
pensamento se constitui e nossas ações são planejadas, constituímos consciência
do eu.
Mas como fica a situação daqueles impossibilitados de ouvir?
Quando se faz uma pesquisa relativa à surdez é necessário, também,
considerar em que fase da vida ela se manifestou, ou seja, antes da formação da
linguagem – surdez pré-linguística – ou depois da aquisição da linguagem – surdez
pós-linguística. Considerar estas etapas se faz necessário, pois, a linguagem possui
um papel determinante, conforme Vigotski (2005), no desenvolvimento do
pensamento e, portanto, na compreensão do mundo. Deste modo, um surdo póslinguístico ainda possui experiências e imagens auditivas para recorrer, facilitando
suas interações com o meio ambiente, o que não acontece com um sujeito surdo
pré-linguístico.
Sacks (1998) relata as vozes e sons “fantasmagóricos” que algumas
pessoas com surdez pós-linguística pensam ouvir. O autor explica que este fato
decorre em função das experiências e associações auditivas anteriores. De modo
semelhante, é possível compreender como pessoas acidentadas ainda sentem o
membro amputado. Acrescenta ainda: “Não se trata de imaginar no sentido usual,
mas de uma tradução instantânea e automática da experiência visual para uma
experiência auditiva correlata (...)” (p.20). Da mesma forma, acontece com ouvintes
e falantes quando estes imaginam alguém falando, há uma voz concebida na mente.
Porém, parece muito difícil para uma pessoa surda pré-linguística conceber este tipo
52
Tradução da autora.
12
5
de voz ou som, uma vez que ela não tem o mínimo entendimento de como seria um
som, tão pouco, o imagina. Vivem, assim, num mundo de absoluto silêncio, sem
perspectivas sonoras.
Serão essas pessoas, os surdos pré-linguísticos, o foco desta reflexão,
considerando aqui o objetivo desta investigação, para tanto, faz-se necessário
abordar e esclarecer características deste sujeito, pois, pode haver uma dificuldade
para os ouvintes e falantes em compreender a surdez em toda sua complexidade.
Sacks (1998) diz que as pessoas tendem a avaliar a surdez como um
incômodo ou uma desvantagem, “mas quase nunca como algo devastador, num
sentido radical.” (p.22). A vista disto, os ouvintes tendem a considerar a surdez
menos grave do que a cegueira, porém, conforme o autor, a surdez pode se tornar
extremamente grave, pois, os surdos pré-linguísticos podem sofrer danos
irreversíveis se sua linguagem não for suficientemente trabalhada, de modo a
atender suas capacidades e necessidades intelectuais, do contrário parecerão
“deficientes mentais” (p.22). Sendo assim, Sacks salienta:
E ser deficiente na linguagem, para um ser humano, é uma das calamidades mais
terríveis, porque é apenas por meio da língua que entramos plenamente em nosso
estado e cultura humanos, que nos comunicamos livremente com nossos
semelhantes, adquirimos e compartilhamos informações. (SACKS, 1998, p. 22)
Márcia Goldfeld (2002) que pesquisou o desenvolvimento e as relações de
uma criança surda com atraso na linguagem, também destaca a importância da
linguagem que vai além da comunicação, estabelecendo funções organizadoras e
planejadoras
do
pensamento.
A
autora
que
segue
uma
concepção
sociointeracionista adotada por Vigotski, considera a linguagem como “(...) o
instrumento do pensamento mais importante que o homem possui (...)” (2002, p. 60)
permitindo, na pessoa surda, que os processos cognitivos se desenvolvam: “(...)
toda a cognição passa a ser determinada pela linguagem (...)” (2002, p.60).
Percebe-se, assim, a necessidade premente da estimulação e aquisição da
linguagem em pessoas surdas desde os primeiros anos de vida os quais estes
processos começam a se desenvolver e se internalizar. Do contrário, segundo
Goldfeld (2002), crianças surdas que sofrem atraso na aquisição da linguagem
podem padecer de danos irreversíveis no desenvolvimento de suas funções
cognitivas. A autora, também, observa a necessidade do auxílio constante da família
no processo de propagação da linguagem: “É preciso que a família da criança surda
tenha consciência da necessidade de estimular essa criança. As informações que
12
6
naturalmente à criança ouvinte recebe devem ser dadas também à criança surda
(...)” (2002, p. 160).
Contudo,
de
que
modo
a
pessoa
surda
pode
desenvolver-se
linguisticamente?
A língua de sinais é, atualmente, a forma mais acessível à aquisição da
linguagem à pessoa surda, pois, é uma língua de modalidade visual-gestual,
permitindo um desenvolvimento completo da linguagem e por consequência acesso
as funções cognitivas.
A língua de sinais, ao contrário da língua oral que esbarra em um
empecilho orgânico no sujeito surdo, não necessita ser ensinada a ela, esta língua
se constitui e se desenvolve naturalmente, considerando repertórios adequados para
esta situação. Assim, como uma criança ouvinte aprende a falar por imitação de
forma natural e espontânea, a língua de sinais é assimilada pela criança surda em
contato com outras pessoas adultas surdas ou em contato com adultos ouvintes que
dominam a língua de sinais, a fim, de estimulá-la, dando-lhe acesso a linguagem e
consequentemente a comunicação, a organização de pensamento e a consciência.
Dessa forma, Sacks discorre acerca da língua de sinais em detrimento a
língua oral que muitos surdos são submetidos:
As pessoas profundamente surdas não mostram em absoluto nenhuma inclinação
inata para falar. Falar é uma habilidade que tem que ser ensinada a elas, e constitui
um trabalho de anos. Por outro lado, elas demonstram uma inclinação imediata e
acentuada para a língua de sinais que, sendo uma língua visual, é para essas
pessoas totalmente acessível. (SACKS, 1998, p. 43)
O autor acrescenta ainda que o desenvolvimento da gramática da língua de
sinais ocorre na mesma idade e forma que o desenvolvimento da língua oral na
criança ouvinte, todavia, os sinais se sucedem mais cedo por ser considerado mais
fácil, pois, consistem em movimentos muito simples dos músculos, enquanto, a fala
consiste em movimentos mais complexos tornando-se possível somente no segundo
ano de vida da criança. Dessa maneira, conforme Sacks, uma criança surda pode
fazer o sinal de “leite” já aos quatro meses de idade, enquanto uma criança ouvinte
da mesma idade põe-se a chorar. Assim, não há indícios que o uso da língua de
sinais iniba a aquisição e aprendizagem da língua oral, ocorrendo, geralmente, o
contrário.
Muitas são as concepções errônias e inadequadas atribuídas à língua de
sinais. Uma delas, talvez a mais popular, seja de que esta língua é um conjunto de
gesto que interpreta a língua oral. Apresentam, também, da mesma forma que a
12
7
língua oral todas as estruturas linguísticas necessárias para expressarem idéias
concretas, abstratas ou complexas. Dessa forma, Ronice de Quadros (1997)
pesquisadora na área na surdez com ênfase na língua de sinais explica que:
(...) os sinais eram considerados apenas representações miméticas, totalmente
icônicas, sem nenhuma estrutura interna formativa. Entretanto, as pesquisas que vem
sendo realizadas nesse campo evidenciam que tais línguas são sistemas abstratos de
regras gramaticais (...). Assim como com qualquer outra língua, é possível produzir
expressões metafóricas (poesias, expressões idiomáticas) utilizando uma língua de
sinais. (QUADROS, 1997, p. 47)
Quadros (1997) explica que esta língua é estabelecida pela visão e da
utilização do espaço, assim: “A diferença na modalidade determina o uso de
mecanismos sintéticos especialmente diferentes dos utilizados nas línguas orais” (p.
46). Por este motivo as línguas de sinais são sistemas linguísticos independentes
das línguas faladas.
Conclui-se, portanto, este breve esclarecimento acerca da língua de sinais
evidenciando uma citação de Quadros que sintetiza muito bem o que foi visto até
agora. A autora caracteriza a língua de sinais como línguas naturais, provenientes
da necessidade de comunicação:
Tais línguas são naturais internamente e externamente, pois refletem a capacidade
psicológica humana para a linguagem e porque surgiram da mesma forma que as
línguas orais – da necessidade específica e natural dos seres humanos de usarem
um sistema lingüístico para expressarem idéias, sentimentos e ações. As línguas de
sinais são sistemas linguísticos que passaram de geração em geração de pessoas
surdas. São línguas que não se derivaram das línguas orais, mas fluíram de uma
necessidade natural de comunicação entre as pessoas que não utilizam o canal
auditivo-oral, mas o canal espaço-visual como modalidade lingüística. (QUADROS,
1997, p. 47)
Propostas educacionais para surdos no Brasil
Este tópico tem como objetivo relatar as principais propostas educacionais
para surdos
vigentes
no Brasil.
Serão,
portanto,
descritas
as
principais
características de cada proposta, sendo que a pesquisa não visa fazer uma análise
crítica acerca da educação de surdos, todavia, é de interesse constar quais práticas
metodológicas estão sendo desenvolvidas no Brasil. Tendo em vista, que as
pesquisas acerca da surdez têm como alicerces, especialmente, estudos na área da
linguística e psicologia considera-se a visão de duas autoras com ênfase nos
estudos sobre surdez: Ronice Müller de Quadros (1997) e Marcia Goldfeld (2002).
É possível destacar na atualidade duas principais propostas para a
educação de crianças surdas no Brasil: o Bilinguismo e o Oralismo. No Brasil estas
12
8
duas propostas continuam vigentes, pois, considera-se que não exista uma
metodologia mais adequada, dando a possibilidade de escolha à pessoa surda.
Durante muitos anos o Oralismo foi difundido como a proposta mais
adequada a formação e educação do indivíduo surdo. Esta metodologia avaliava a
surdez como uma patologia ou deficiência que deveria ser amenizada visando a
oralização. Ou seja, seu objetivo era reabilitar o indivíduo surdo de forma que sua
interação com o mundo ouvinte fosse possível apenas pelo desenvolvimento da
língua oral, encaminhando sua personalidade e identidade para tal. Goldfeld (2002)
discorre acerca do Oralismo enfatizando que seu objetivo é direcionar a criança
surda “à normalidade” ou “à não-surdez”. A autora explica com clareza como se
constitui o processo desta proposta e seu tempo de duração:
A criança surda deve, então, submeter-se a um processo de reabilitação que inicia
com a estimulação auditiva precoce, ou seja, que consiste em aproveitar os resíduos
auditivos que quase a totalidade dos surdos possuem, e possibilitá-las a discriminar
os sons que ouvem. Pela audição e, em algumas metodologias, também com bases
nas vibrações corporais e da leitura oro-facial, acriança deve chegar à compreensão
da fala dos outros e por último começar a oralizar. Este processo, se for iniciado ainda
nos primeiros meses de vida, dura em torno de 8 a 12 anos, dependendo das
características individuais da criança, tais como: tipo de perda auditiva, época em que
ocorreu a perda auditiva, participação da família no processo de reabilitação etc.
(GOLDFELD, 2002, p. 35)
Dentro desta proposta existem outras metodologias que se baseiam na
proposta oralista se concentrando no objetivo do desenvolvimento da língua oral.
Tendo em vista seu objetivo, o Oralismo desconsidera questões
relacionadas à cultura surda. Quadros (1997, p. 26) considera esta proposta,
segundo a visão de vários estudiosos acerca da surdez (Sánchez, Ferreira Brito e
Skliar), “como uma imposição social de uma maioria lingüística (os falantes das
línguas orais) sobre uma minoria lingüística sem expressão diante da comunidade
ouvinte (os surdos).”
Ao contrário do Oralismo, o Bilinguismo respeita as particularidades do
indivíduo surdo e sua cultura, trata a surdez não como uma patologia que necessita
ser curada, porém como um modo diversificado e singular de pensar e se comunicar
que deve ser respeitado.
Quanto o que é possível afirmar sobre o Bilinguismo, considera-se como a
proposta mais viável, até então, ao ensino da criança surda. Propõem o aprendizado
da língua de sinais como língua natural e este, pressuposto para o aprendizado da
língua escrita. Segundo Quadros (1997) a proposta Bilíngue busca captar o direito
da criança surda em ser ensinada na língua de sinais, tendo em vista, que esta
12
9
língua é natural da pessoa surda e adquirida de forma espontânea, ao contrário da
língua oral que é adquirida de forma sistematizada.
Esta mesma autora acrescenta que uma proposta basicamente Bilíngue
não é totalmente favorável considerando as duas culturas as quais a pessoa surda
deve conviver: a cultura ouvinte e a cultura surda. “Uma proposta educacional, além
de ser Bilíngue, deve ser bicultural para permitir o acesso rápido e natural da criança
surda à comunidade ouvinte e para fazer com que ela se reconheça como parte de
uma comunidade surda.” (1997, p. 28). Somente respeitando estas particularidades,
a criança surda reconhecida dentro de sua própria cultura, poderá integrar-se
satisfatoriamente a comunidade ouvinte.
Outro fator relevante para se criar condições favoráveis no ensino do
Bilinguismo é o comprometimento integral da família, tendo em vista, que a maior
parte das crianças surdas em processo escolar originam-se de famílias ouvintes. O
ideal é que a família também tenha o entendimento e conhecimento da língua de
sinais auxiliando e integrando a criança neste contexto.
A entrevista realizada na coleta de dados da pesquisa de mestrado
(OLEQUES, Liane C. (2008) Análise do repertório gráfico de uma criança não
ouvinte: a surdez e suas implicações no desenho infantil. Projeto de Mestrado), com
a professora do menino surdo sujeito desta pesquisa, mostrou que mesmo o
aprendizado da língua de sinais numa proposta Bilingue pode tornar-se lenta quando
não há o apoio da família.
A professora que é responsável pela classe especial de 1ª a 4ª de alunos
surdos, explica que o menino não ingressou na escola com um repertório de sinais
consistente. Sua comunicação era restrita ao contexto familiar com muitos gestos e
pantomimas. Isso dificultou seu aprendizado, tendo em vista que o que era
aprendido na escola não era vivenciado em casa, já que a família ouvinte não
prezava pela mesma forma de comunicação. A professora entrevistada lembra-se
que o menino levou cerca de um ano até aprender e internalizar o sinal em LIBRAS
de “água”, pois até então “água” era representado pelo gesto de levar um copo a
boca. Ainda comenta que, por esse motivo, o aprendizado da LIBRAS torna-se
repetitivo e lento, pois, todos os dias deve-se reforçar os mesmo sinais até o que o
aluno internalize a palavra e o conceito.
Considerações finais
13
0
Realizar observações acerca das pessoas com necessidades especiais
torna-se um tanto complicado quanto a terminologia utilizada. É preciso um pouco de
atenção para que nossas palavras, mesmo sem intenção, não tendam a estabelecer
ou separar o que é normal ou deficiente na sociedade contemporânea, pois, como
foi visto, esta condição deve ser encarada como uma forma diferenciada, uma
necessidade
específica
ou
especial
de
ensino
e
aprendizagem,
criando
possibilidades para sua reabilitação na sociedade.
É interessante ressaltar aqui as palavras de Simi Linton53, deficiente física
e participante do movimento de direito dos deficientes, introduzindo, desta forma, o
leitor ao contexto social das necessidades especiais:
Saímos, não escondendo nossas pernas atrofiadas sob mantas de lã marrom, ou com
óculos escuras tampando nossos olhos pálidos, mas aparecemos de Shorts e
sandálias, de macacão e terno, vestidos para brincar ou trabalhar, encarando de
frente, desmascarados, sem pedir desculpas. (...) E não somos somente os atletas
cadeirantes “sarados” vistos recentemente nos comerciais de tevê, mas também
criaturas desengonçadas, atarracadas, desajeitadas, e encaroçadas declarando que
vergonha não mais definirá nosso guarda-roupa nem nosso discurso. Hoje estamos
por toda parte, de cadeiras de rodas ou em marcha desenfreada pela rua, ao som do
toque de nossas bengalas, sugando ar por tubos de respiração, seguindo nossos
cães guias, soprando e aspirando nos nossos acionadores de sopro que controlam
nossas cadeiras motorizadas. Às vezes pode acontecer de haver baba, escuta de
vozes alheias, nossa fala pode soar entrecortada, podemos utilizar cateter para coleta
de urina, podemos viver com um sistema imune comprometido. Estamos todos
ligados uns aos outros, não pela lista de nossos sintomas coletivos, mas pelas
circunstâncias sociais e políticas que nos forjaram como grupo, nos encontramos
como grupo e buscamos uma voz para expressar não o desespero pela nossa
condição, mas a revolta pela nossa condição social. Nossos sintomas, mesmo que
sejam às vezes dolorosos, assustadores, desagradáveis, ou difíceis de lidar, ainda
fazem parte do cotidiano da vida. Existem e sempre existiram em todas as
comunidades de todos os tempos. O que denunciamos são as estratégias utilizadas
para nos privar de nossos direitos, de oportunidades e da busca da felicidade.
(LINTON, 1998, p. 03 -04)
Portanto compreende-se que possibilitando habilidades específicas através
de repertórios adequados, pessoas com necessidades especiais possam usufruir de
condições dignas de inclusão a sociedade, sem esquecer do meio social que, por
sua vez, deve ser trabalhado para que possa receber estas pessoas com o respeito
e dignidade com que tem direito todo cidadão.
Com relação às pessoas surdas foi possível concluir que não há limites
cognitivos intrínsecos a surdez quando se oferecem todas as possibilidades de
acesso para a consolidação da linguagem. Portanto, a surdez deve ser
diagnosticada o mais cedo possível e a língua de sinais, vivenciada pela criança
desde os primeiros anos de vida para que possibilite, plenamente, a comunicação e
53
LINTON, 1998 apud REILY, 2007, p. 220.
13
1
o intercurso do pensamento. A linguagem deve desenvolver-se, considerando a
criança ativamente envolvida no processo de comunicação de seu ambiente sócio
cultural.
Referências Bibliográficas:
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surdas, relacionando a representação gráfica da imagem corporal com o uso
da língua de sinais. Porto Alegre e Bueno Aires.Tese de mestrado, 2003.
GODOY, Maria de Fátima Reipert de. Educação artística para deficientes
auditivos: uma leitura a partir da visão de professores. Tese de
doutorado. São Paulo: IP/USP, 1998.
GOLDFELD, Márcia. A criança surda: linguagem e cognição numa
perspectiva sóciointeracionista. 2º edição. São Paulo: Plexus Editora,
2002.
GONZÁLEZ, Eugênio. Necessidades educacionais específicas. Porto
Alegre: Artmed, 2007.
OLEQUES, Liane C. (2008) Análise do repertório gráfico de uma criança não
ouvinte: a surdez e suas implicações no desenho infantil. Projeto de
Mestrado. PPGAV/CEART/UDESC, 2008.
REILY, Helena Lúcia. Retratos urbanos de deficiência. In: Inclusão, Práticas
pedagógicas e trajetórias da pesquisa. Org. Denise M. de Jesus, Claudio
Roberto Baptista, Maria Aparecida Santos C. Barreto e Sonia Lopes Victor.
Porto Alegre: Ed. Mediação, 2007. P. 220 – 232.
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Companhia das letras, São Paulo, 1998. Tradução: Laura Teixeira Motta.
SHMITT, Deonísio. Curso de pedagogia para surdos. Língua Brasileira de
Sinais. Florianópolis, UDESC: CEAD, 2002.
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Paulo: Plexus Editora, 2002.
STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a Cultura Surda.
Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2008.
VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes,
1998.
_____________. Obras escogidas V: fundamentos de defectologia. Madri:
1997.
______________. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes,
2005.
13
2
Para inglês ouvir: Política de adoção da audiodescrição na TV digital do Reino
Unido
Flávia Oliveira Machado1
O Reino Unido estreou a era da televisão digital em 1998 com o padrão DVB (Digital
Video Broadcasting). Onze anos depois, o Ofcom (Office of Communication - órgão regulador
do setor de comunicação do Reino Unido) anunciou que 89,8% dos lares ingleses recebiam o
sinal digital. Após o desenvolvimento dessa tecnologia, foi iniciado em 2008 o processo de
desligamento da transmissão analógica de televisão, que está previsto para terminar em 2012.
Além da multiprogramação e da alta qualidade de som e imagem, os ingleses foram os
primeiros a conseguirem disponibilizar a audiodescrição como opção de acessibilidade nessa
nova mídia. A audiodescrição é um áudio extra que descreve o cenário, o figurino, a
movimentação dos personagens e todos os outros elementos que não são compreendidos,
principalmente, por pessoas com deficiência visual. O objetivo é acrescentar esse áudio
durante os intervalos dos diálogos, sem, no entanto, sobrepor informações contidas na trilha
sonora original. Vale lembrar, que este recurso atende também às necessidades de pessoas
com dislexia, com deficiência intelectual e ainda idosos. Atualmente, 10% da programação já
possuem audiodescrição e há uma forte pressão para que essa cota aumente para 20%. O
presente artigo pretende apontar, através e referências bibliográficas e documentais, algumas
especificidades da televisão digital no Reino Unido e como está sendo feita a política de
promoção da audiodescrição nesse meio de comunicação. Primeiramente, será exposto o
conceito do termo audiodescrição. Depois, será traçado um breve panorama da
implementação da TV digital no país, bem como suas estratégias políticas até chegar no
switch over e na segunda geração do DVB. Após essa contextualização, pretende-se analisar
as iniciativas políticas para a inserção, promoção e aprimoramento da audiodescrição na
televisão digital inglesa. Para isso serão apresentados dois atores chaves no desenvolvimento
dessa política: o Ofcom e o RNIB (Royal National Institute of Blind People). O estudo sobre a
política de implantação desse recurso de acessibilidade no Reino Unido, onde a
audiodescrição está mais difundida, serve como ponto de partida para outros países que
pretendem avançar na questão de inclusão social de pessoas com deficiência visual através
dos meios de comunicação, principalmente, a televisão.
Palavras chave: Audiodescrição. Televisão Digital. Política de Comunicação. Reino
Unido.
DVB. OFCOM.
1.
1
Audiodescrição
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital da UNESP/Bauru, Flávia
Oliveira Machado ([email protected]) está desenvolvendo em sua dissertação um
estudo sobre as políticas públicas para a promoção da audiodescrição na TV digital brasileira.
13
3
O projeto é orientado pelo Prof. Dr. Antonio Carlos de Jesus ([email protected] ).
Primeiramente, faz-se necessário conceituar o termo audiodescrição uma vez que ele
parece ser novo mesmo no Reino Unido, como será comprovado ainda neste artigo através
dos dados referentes às últimas pesquisas relativas a esse recurso.
É sabido que pessoas com deficiência visual não usufruem uma recepção de textos
audiovisuais, teatrais e outros tipos de conteúdos culturais de forma apropriada às suas
necessidades. A audiodescrição é um recurso de acessibilidade que promove uma fruição
satisfatória de produções culturais. Esta técnica é um tipo de tradução audiovisual e, por se
tratar de tradução de imagens em palavras, ela é considerada uma tradução intersemiótica.
Esse recurso consiste em um áudio extra com descrições de cenários, figurinos,
expressões faciais e corporais dos personagens, ações, entrada e saída de personagens e todos
aqueles elementos relevantes para a compreensão do conteúdo visual por uma pessoa com
dificuldade para usufruir tal conteúdo. Preferencialmente, essa narração deve entrar entre os
diálogos e os efeitos sonoros para que não haja sobreposição de informações. Vale lembrar
que este recurso atende também às necessidades de pessoas com dislexia, com deficiência
intelectual e ainda idosos.
A satisfação de espectadores que utilizam o serviço de audiodescrição foi comprovada
em uma pesquisa do Ofcom em 2008 com espectadores que utilizam esse recurso. Entre os
principais benefícios apontados estão: o ato de assistir a televisão ficou mais agradável, a
sensação de igualdade por poder comentar com pessoas sem deficiência os programas de TV,
independência e inclusão social. Porém, segundo o mesmo estudo, ainda há muito para ser
melhorado. Os espectadores com deficiência visual responderam que se deve aumentar o
número de programas que disponibilizam o recurso, bem como a ampliar dos gêneros de
programas e ainda melhorar a forma como é informada a existência da opção do serviço no
programa (OFCOM, 2008, p. 30).
Antes de iniciar a exposição sobre a adoção da audiodescrição no Reino Unido e os
atores envolvidos nessa temática, abordaremos a implementação da televisão digital neste país
bem como as questões políticas e econômicas relacionadas a este processo.
2.
2.1.
TV Digital no Reino Unido
O Padrão DVB
No início dos anos 90 empresas do setor de comunicação começaram a discutir a
viabilidade da criação de uma plataforma pan européia de televisão digital terrestre. Foi então
13
4
que em 1993 foi criado o Digital Video Broadcasting Project, formado por representantes do
setor privado e público. Na mesma época, o Working Group in Digital Television também
estava estudando possibilidades para essa nova mídia e trouxe para a discussão novos
conceitos como recepção móvel e HDTV (High Definition Television). Entretanto, o Digital
Video Broadcasting Project tinha a vantagem de ter membros que eram da European
Broadcasting Union o que agilizou a normatização do padrão DVB (Digital Vídeo
Broadcasting) (DVB ORG, online).
O projeto DVB era dividido em dois módulos de trabalho: o comercial e o técnico. O
grande desafio inicial era desenvolver um padrão que atendesse tanto as tecnologias de
broadcasting digital via satélite, cabo e terrestre. O sistema também deveria transportar em
pacotes uma combinação de arquivos de áudio, imagem e multimídia, permitindo assim que
posteriormente qualquer tipo de nova mídia e diferentes tipos de vídeos e áudios de alta
definição pudessem ser transmitidos. O enfoque do padrão foi trazer multiprogramação,
interatividade e som e imagem de alta qualidade.
Por causa do avanço do projeto MAC (Multiplexed Analogue Components) da
Comissão Européia, que norteou os parâmetros da tecnologia digital, a indústria broadcasting
por satélite e por cabo se desenvolveram mais rapidamente do que a terrestre. Por isso, em
1993 o padrão DVB-S (Digital Video Broadcasting for Satellite) foi lançado e no ano seguinte
o DVB-C (Digital Video Broadcasting for Cable networks) chegou ao mercado (DVB ORG,
online). Entretanto, somente a partir de 1998 é que o público pode usar essa tecnologia.
Após o desenvolvimento desses tipos de padrões e das tecnologias de compressão de
dados, está em desenvolvimento a segunda geração do DVB. Uma das novidades é o uso do
MPG-4 para a compressão. Vale ressaltar que os novos padrões são compatíveis com a
primeira geração.
2.2.
Regulamentação do setor
Em 1995, a BSkyB (empresa do conglomerado do australiano naturalizado
estadunidense Rupert Murdoch) já liderava o mercado de televisão paga analógica com 75%
das assinaturas de televisão via satélite (Goodwin, 2005, p.155), que ultrapassavam os 5
milhões de assinantes. A preocupação do governo era em relação à manutenção dessa
liderança na era digital. Para combater uma possível concentração do mercado televisivo nas
mãos da empresa, o governo teve que regular a competição econômica no mercado. Por isso,
13
5
foi criado o Broadcasting Act em 1996, que determinava entre outros pontos, a licença de
transmissão para o desenvolvimento da televisão digital de outra maneira além da transmissão
via satélite (Broadcasting Act 1996, 8). A estratégia usada para viabilizar isso foi
regulamentar a concessão de multiplexadores nacionais. Ou seja, o espectro britânico foi
dividido em 6 faixas e cada uma seria controlada por um operador. A empresa fica
responsável pela transmissão de 4 a 6 canais em uma faixa do espectro na qual antes era
possível transmitir somente um canal. Dos seis multiplexadores, três foram destinados sem
custo algum para emissoras de transmissão terrestre existentes (BBC, ITV, Channels 4 e 5 e
S4C), e o restante foi destinado a ITC (Independent Television Commission), órgão público
responsável na época por regular a televisão comercial. Ela era responsável por determinar
quais empresas iriam controlar os outros três multiplexadores (SMITH, 1999). Após uma
disputa entre a DTN (Digital Television Network) e a BDB (British Digital Broadcasting),
que em 1998 passou a se chamar ONdigital, esta venceu a batalha após desfazer uma aliança
com a BSkyB por pressão política. Mas como afirma Goodwin (2005), a BSkyB passou de
benevolente sócia para voraz concorrente no campo da plataforma digital. Prova disso foi que
a BSkyB lançou seu serviço digital com seis semanas de antecedência em relação à ONdigital.
Entretanto, mesmo depois de ser reformulada para ITV Digital, em 2002 foi decretada a
falência da ONdigital (GOODWIN, 2005, p. 161-162).
A saída encontrada para o até então fracasso da televisão digital terrestre no Reino
Unido foi a criação da Freeview, um consórcio comandado pela BBC, Crown-Castle e
BSkyB. Segundo Cave, a participação da BBC é dada pelo controle de um multiplexador, a
BSkyB provê alguns canais e a Crown-Castle comanda dois multiplexadores (CAVE, 2006,
p.108). Trazendo a proposta de TV digital terrestre gratuita, a Freeview conseguiu mais
adesão do público inglês a essa nova mídia. O grande atrativo, diferente do modelo da ITV
Digital, era a recepção gratuita de canais, dessa forma, o espectador paga somente o
equipamento (set-top box ou aparelho de televisão com o conversor digital integrado). A
comprovação do sucesso é que hoje a Freeview é líder no mercado de televisão digital.
Todavia, Goodwin (2005) afirma que se o Reino Unido liderou a revolução da TV digital em
2003, muito se deve à televisão digital por satélite e não terrestre.
Apesar de o governo ter anunciado em 1999 que o switch over ocorreria no período de
2006 a 2010, o processo de desligamento do sinal analógico só iniciou em 2008 com previsão
de término em 2012 (CAVE, 2006, p. 110). Um dos motivos para o adiamento era que a
adesão à nova tecnologia era baixa. Dentre as iniciativas para essa mudança, em 2007, o
governo inglês criou um programa de ajuda ao switch over (Digital Switchover Help Scheme)
13
6
para atender pessoas com mais de 75 anos, pessoas com deficiência que recebem auxílio
financeiro do governo, pessoas que recebem cuidado domiciliar e pessoas com deficiência
visual. O programa, que pretende atingir 7 milhões de pessoas, irá prestar auxílio em relação a
equipamentos, instalação e suporte técnico após o desligamento do sinal analógico. O
departamento de Cultura, Mídia e Esporte e a BBC são os responsáveis pelo projeto, cujo
custo é estimado em 603 milhões de libras. Para as pessoas atendidas pelo serviço pode haver
um custo padrão de 40 libras, mas dependendo da situação financeira da família, essa taxa
pode não ser cobrada. Tendo em vista que um dos públicos alvo são pessoas com deficiência
visual, foi colocado no projeto que os equipamentos deverão ter configuração compatível para
receberem a audiodescrição (Digital Help Scheme Agreement, online).
A prova do deslanche da TV digital no Reino Unido é o relatório sobre progresso
dessa nova mídia relativo ao segundo semestre de 2009. Segundo o Ofcom, 89,8% das casas
desfrutavam na televisão digital, sendo que 12,9% via cabo, 34,8% via satélite e 40,2% via
terrestre – 37,6% Freeview e 2,7% por via satélite gratuito (OFCOM, 2009b).
Em decorrência da completa digitalização do setor, o governo enfrenta a questão do
dividendo digital. Desde 2004, o Ofcom está discutindo como será a gestão da parcela do
espectro radioelétrico que ficará sem uso devido à menor faixa de banda necessária para a
transmissão digital em relação à faixa usada para a transmissão analógica. O órgão busca
garantir que o espectro seja explorado com o máximo de aproveitamento e que seus usuários
possam ter a flexibilidade de adaptação e inovação no seu uso. Para Leiva (2009), o governo
está deixando importantes questões de lado como: reservar freqüências para futuras inovações
no uso do espectro; deixar espaço para uso livre de obtenção de licença; e reservar um espaço
para o desenvolvimento da televisão móvel. Mas, governo britânico vem sofrendo pressões da
Comissão Européia que deseja a harmonização técnica de utilização da subfaixa 790 – 862
MHz para ser destinada à transmissão de dados da telefonia celular, o que pode facilitar o
serviço de roaming internacional. Segundo Matthew Howett (BBC NEWS, 2009), o Ofcom
está tentando cooperar com a União Européia nesse momento que é propício para a telefonia
celular.
3.
3.1.
Audiodescrição no Reino Unido
Outro tipo de Guarda
13
7
Para substituir a Independent Television Commission (ITC), a Radio Authority (RA), o
Radiocommunications Agency , o Office of Telecommunications (Oftel) e a Broadcasting
Standards Commission (BSC) foi criado em 2003 o Office of Communication (Ofcom) através
do Communication Act. Este novo órgão é uma instituição independente responsável por
regular a telecomunicação, a radiodifusão e o uso do espectro britânico. Os objetivos do
Ofcom foram descritos no White Paper de 2000. Segundo o documento, as três áreas de
atuação do órgão seria requerer das empresas auto-regulamentação em relação: 1) à qualidade
dos conteúdos, à quantidade de publicidade, aos patrocinadores e à acessibilidade a pessoas
com deficiência; 2) às cotas na programação para conteúdos independentes e regionais e à
agilidade na transmissão de notícias; 3) à qualidade do serviço público prestado de
radiodifusão. Às empresas caberia fazerem sua auto-regulamentação e o Ofcom iria intervir
como último recurso para fazer valer os objetivos desse serviço público (SMITH, 2006).
Neste momento cabe um pequeno esclarecimento sobre o modelo britânico de
regulamentação que possui dois tipos de documentos chaves para a criação de uma lei. O
primeiro é o Green Paper é um documento resultante de uma consulta liderada pelo governo,
que contém propostas com diversas alternativas para futuras políticas governamentais. O
Green Paper irá contribuir para a produção do segundo documento que é o White Paper. Este
contém fortes recomendações que poderão resultar em uma mudança legislativa.
Diferentemente do primeiro, o White Paper é de responsabilidade do departamento relativo à
temática do documento (ACCA, 2009). Somente após a discussão do White Paper é feito o
projeto de lei que é enviado ao Parlamento e votado para receber, se aprovado, o
assentamento real tornando-se lei (LEAL FILHO, 1997, p.43).
Voltando às questões relativas à regulamentação no Reino Unido, Smith (2006) afirma
que a criação do Ofcom, através do Communication Act, foi determinada por três fatores: o
esforço dos meios de comunicação comercial na convergência digital, a qual foi usada para
justificar a desregulamentação do setor; ao comprometimento do novo partido Trabalhista aos
princípios de liberalização do mercado e políticas de inovação; a batalha travada entre dois
órgãos governamentais (ITC e Oftel); e acordos entre departamentos rivais durante o mandado
do partido Trabalhista (SMITH, 2006, p. 937). O Communication Act concedeu ao Ofcom
autoridade para fiscalizar o mercado do espectro do Reino Unido na era digital. Entretanto,
Harding e O‟Connor (apud SMITH, 2006, p. 936) comentam que a política de
desregulamentação lançada com o Communication Act preparou o terreno para o aumento da
concentração dos meios de comunicação, ao acabar com as restrições de fusão e controle de
empresas estrangeiras (principalmente estadunidense) no setor de comunicação.
13
8
Sendo o órgão que regulamenta o setor de comunicação, o Ofcom é o responsável pela
política de implementação dos recursos de acessibilidade previstos pelo White Paper de 2000.
Antes de analisar os principais pontos da estratégia para a adoção da audiodescrição na
televisão digital do Reino Unido, será apresentado rapidamente o RNIB, que é o principal
instituto que atende às pessoas com deficiência visual no Reino Unido. Essa entidade
pressiona e colabora com o Ofcom para a promoção da audiodescrição no país.
3.2.
Lobbista de Peso
O fundador da RNIB foi Thomas Rhodes Armitage, um médico que aos trinta anos
perdeu a visão e começou a lutar pela auto-estima e por novas oportunidades para as pessoas
com deficiência visual. Em 1868, ele fundou a British and Foreign Society for Improving
Embossed Literature for the Blind, que depois se transformou em British and Foreign Blind
Association. Mas foi somente em 1953 que foi dado o nome de Royal National Institute of the
Blind e mais recentemente, em 2007, foi acrescentado a palavra People ao final do nome.
As áreas de atuação do instituto são: a promoção do Braille através de publicações
como revistas, livros, panfletos, contas de banco, partituras musicais, entre outros produtos
em Braille; o auxílio a estudantes com deficiência visual, pais, professores, escolas e
faculdades que atendem a esse público; treinamento e capacitação para o mercado de trabalho;
venda de equipamentos específicos para esse público; prestação de serviço na produção de
áudio livros e manutenção da biblioteca nacional da RNIB; promoção e divulgação da
audiodescrição e locação e venda de vídeos com esse recurso; suporte para informações sobre
deficiência visual via telefone e email. Além de atuar na sociedade com campanhas de
conscientização e divulgação de informações relacionadas à deficiência visual (RNIB, 2009b,
online).
O RNIB contribui ativamente na promoção e divulgação da audiodescrição para
informar a população sobre como ela deve acessar o serviço. Foram disponibilizados no site e
em folders (digitais e impressos) informações sobre quais equipamentos são necessários,
como usar e quais as vantagens do serviço. A instituição também informa sobre como uma
pessoa pode ser beneficiada pelo programa de ajuda para o término da transmissão de sinal
analógico de televisão (Digital Swtichover Help Scheme). Como já foi comentado neste
artigo, caso o espectador seja candidato ao auxílio, o governo subsidia a compra do aparelho
para a recepção do sinal digital de TV (o set-top box) (RNIB, 2009b, online).
13
9
Além de pressionar o governo e os radiodifusores, o RNIB também atua junto às
produtoras de cinema para a inclusão da audiodescrição nos DVD e nas salas de cinemas. O
resultado desse trabalho é que em 2009, mais de 300 salas de cinemas já estavam preparadas
para prover aos espectadores cegos um fone de ouvido capaz de receber a transmissão da
audiodescrição. E mais de 400 títulos de DVDs com audiodescrição já estavam sendo
vendidos nas lojas (YOUR LOCAL CINEMA, online). O RNIB ainda arranja fôlego para ir
além das fronteiras britânicas. Em outubro deste ano, foi lançado o projeto Bollywood que
pretende expandir e promover a audiodescrição na indústria cinematográfica da Índia. O papel
da instituição é aproximar organizações britânicas e indianas que atendem a pessoas com
deficiência visual e ainda fazer recomendações para Bollywood adotar a audiodescrição em
seus filmes.
4.
Uma questão de política pública
A temática da audiodescrição está presente em pesquisas do Reino Unido desde a
década de 90. Entre 1992 e 1995, a ITC realizou o projeto Audetel (Audio Described
Television). Reguladores, associações de espectadores e empresas de radiodifusão se
integraram para desenvolver audiodescrição para a televisão. Foi demonstrado que era
possível a transmissão de audiodescrição através dos sinais analógicos da televisão. Esse
projeto foi substituído pelo Broadcasting Act de 1996 que determinou que em dez anos 10%
dos programas da televisão digital terrestre deveriam ter audiodescrição (GREENING;
ROLPH, 2007, p. 128). Outro projeto desenvolvido foi o TIWO (Television in Words),
durante 2002 e 2004, que tinha como objetivo criar um sistema computacional que permitisse
otimizar a criação de roteiros de audiodescrição e personalizar esse recurso para diferentes
audiências (jovens, idosos, pessoas com ou sem memória visual e pessoas que preferem mais
ou menos aprofundamento na interpretação do conteúdo) (SALWAY, online). Porém, este
estudo esbarra em um ponto importante do processo de produção audiovisual. Poucas são as
produções que seguem a risca o roteiro original, ou seja, durante as gravações, a edição ou a
finalização de um conteúdo, muitos elementos são alterados em relação ao roteiro de
gravação. Para além das fronteiras do Reino Unido, pesquisadores europeus e de outras partes
do mundo têm discutido desde 2005 questões relacionadas à acessibilidade e ao acesso às
mídias na conferência Media for All. Em sua terceira edição realizada na Antuérpia (Bélgica)
em outubro de 2009, foram abordados entre outras temáticas, como legendagem, dublagem,
legenda fechada para surdos, a audiodescrição. Além de dois workshops sobre o assunto,
14
0
foram apresentados 17 trabalhos sobre aprimoramento das técnicas de audiodescrição e
experiências na adoção desse recurso. Um dos trabalhos apresentador foi os primeiros
resultados do Pear Tree Project, que tem como objetivo a criação de um padrão de qualidade
para a audiodescrição européia. Os países participantes do projeto são Reino Unido, Espanha,
Grécia, Bélgica, Polônia, Itália, Irlanda e França. Considerando as especificidades de cada
língua, esse trabalho busca padrões para o aperfeiçoamento da audiodescrição nos conteúdos
europeus (MEDIA FOR ALL, 2009).
Além da pesquisa, o Reino Unido se destaca por colocar em prática a audiodescrição.
Depois da determinação em relação à porcentagem da programação com audiodescrição do
Broadcasting Act em 1996, o Communication Act em 2003 ampliou a obrigatoriedade do
serviço para a televisão digital a cabo e por satélite. Mas foi com o Code on Television Access
Services do Ofcom que determinou 2008 como data limite para a adoção da audiodescrição
em 10% da grade de programação (GREENING; ROLPH, 2007, p. 128).
A plataforma digital permitiu a adoção da audiodescrição devido ao avanço
tecnológico em relação à televisão analógica. Com o aumento da compressão de dados é
possível acrescentar um canal de áudio exclusivo para esse tipo de recurso de acessibilidade.
Desse modo, o espectador pode acessar a audiodescrição quando quiser através da ativação
desse recurso via controle remoto. A recepção da audiodescrição na plataforma Freeview é
mixada no próprio set-top box, permitindo que o espectador altere independentemente o áudio
da audiodescrição e o áudio original de acordo com o seu gosto, enquanto na BSkyB (líder na
TV por satélite) e na Virgin (líder na TV a cabo) a audiodescrição é pré-mixada junto com o
programa original, sendo necessário somente uma configuração de linguagem feita pelo
espectador para o modo “narrativo” para a audiodescrição ser ouvida (GREENING; ROLPH,
2007, p. 130).
Apesar da audiodescrição estar presente nos programas de TV, não havia um intenso
uso do serviço por falta de divulgação para a população. Por isso, foi realizada entre 1 de
fevereiro e 14 de março de 2008 uma campanha para informar a população sobre esse tipo de
recurso de acessibilidade. A campanha conduzida pela aliança entre as empresas de
radiodifusão e o RNIB com facilitação da Ofcom. A divulgação foi com materiais para a
televisão, impressos e para o rádio. Foram feitas duas análises, uma antes (A) e outra depois
(B) da campanha de divulgação. E em 2009, foi feita uma nova consulta (C), porém sem a
execução de uma campanha de divulgação prévia. Comparando os resultados das três
pesquisas, temos: a porcentagem da população em geral que sabia do serviço foi 37% (A),
60% (B) e 45% (C); e entre as pessoas com deficiência visual foi de 43% (A), 69% (B) e 50%
14
1
(C). A causa apontada para o não crescimento das porcentagens entre a pesquisa B (em abril
de 2008) e a pesquisa C (em 2009) foi a não utilização de uma campanha prévia sobre
audiodescrição o que gerou em 2008 um crescimento imediato do conhecimento em relação
ao serviço. Desse modo, com relação ao grupo de pessoas com deficiência, foi comprovado a
necessidade de se fazer campanhas regulares para a divulgação da audiodescrição para manter
um crescimento em relação à campanha B (OFCOM, 2009a).
Em 2009, os maiores canais da televisão inglesa já possuíam audiodescrição em 10%
dos programas. Por isso, de 3 de setembro a 12 de novembro do mesmo ano, o Ofcom fez
uma consulta pública sobre o futuro da audiodescrição. Foram dadas 3 opções de escolha: 1)
não alterar a porcentagem de 10% de programas com audiodescrição; 2) aumentar para 20%
de programas com audiodescrição em todos os canais; 3) aumentar para 20% de programas
com audiodescrição somente nos 10 canais públicos enquanto os outros 48 canais
continuariam a seguir a cota de 10%. O RNIB fez uma campanha para que as pessoas e
familiares que a instituição atende respondessem a consulta. A opção sugerida pela instituição
foi a de número 2. E a estratégia usada para aumentar a adesão à campanha foi a divulgação
no site de informações sobre as opções de envio da resposta e até motivando os espectadores a
pedirem para os seus membros do parlamento que participassem da consulta também.
Ademais, a entidade sugeriu que os participantes escrevessem sobre as suas experiências em
relação à audiodescrição, qual a sua importância e ainda quais aspectos deveriam ser
melhorados (RNIB, 2009a, online).
Todavia, o governo não possui um mecanismo de controle para saber se o aumento de
10% para 20% da programação está sendo de programas inéditos ou de reprises. Por exemplo,
a BSkyB poderia alcançar a nova cota colocando mais vezes durante a programação um
mesmo filme ou programa em horários e canais diferentes. Cabe então à população fiscalizar
esse tipo de estratégia e se for o caso, fazer reclamações para que isso não ocorra.
5.
Conclusão
O Reino Unido se destaca na implementação da audiodescrição por de fato criar uma
política para a adoção de recursos de acessibilidade. O Ofcom, órgão responsável pelo setor
de telecomunicação e radiodifusão, assume seu papel fazendo valer as leis criadas para a
promoção desse recurso. Através de pesquisas e consultas públicas, o governo consegue ter
parâmetros para a manutenção e o aprimoramento da audiodescrição. As empresas de
comunicação, por sua vez, conseguem ter um retorno sobre a prestação deste serviço e
14
2
recebem também sugestões de quais tipos de programas são mais adequados
para ter a
audiodescrição, cuja qualidade também é analisada para melhor atender ao público. O
RNIB,
além de pressionar o governo, auxilia o Ofcom durante as consultas públicas e
as pesquisas
mediando o contato do governo com o público com deficiência visual. E a audiência
consome
esse serviço e ao mesmo tempo luta pela ampliação da disponibilização desse recurso
tanto na
televisão digital quanto em outros conteúdos audiovisuais. Cabe aos outros países
analisarem
de maneira crítica a experiência britânica, para que possam tirar proveito de
pontos que
possam auxiliar na criação de uma política de comunicação para a adoção da
audiodescrição
em seus meios de comunicação.
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2009.
14
RELATO
DE
EXPERIÊNCIA:
ENSINANDO
LAURA
A
FAZER 5
DESENHOS EM RELEVO
Caro Editor, ao ler a seção relato de experiência desta Revista, em que
apresentava o texto da Rosângela Gera, falando sobre a experiência da filha que,
sendo cega, aprendia a desenhar e se beneficiar dessa atividade rica para a
aprendizagem e para o lazer das crianças, senti-me estimulada a escrever também e
compartilhar meu relato sobre esse tópico, já que fui eu a professora de Laura, durante
todo esse processo de ensino de como ela poderia reconhecer os desenhos e de
como os poderia desenhar.
Assim, falar de desenho hoje, me emociona pela gratificante experiência
que vivenciei no ano de 2009. Foram muitas descobertas e aprendizagens, em
particular, com a atividade de ensino de desenho a uma criança cega. Ensiná-la a
desenhar foi marcante pela satisfação que isso trouxe a minha aluna, Laurinha.
Esta trajetória teve início uma semana antes de as aulas começarem,
quando ao visitá-la em sua casa, ela me mostrou toda empolgada o seu estojo, cheio
de lápis e giz de cera. Nessa hora fiquei intrigada, o que fazer com aquele estojo? A
menina era cega. Poderia ela escrever com aqueles lápis e giz de cera? E quando
fossem atividades relacionadas ao desenho, o que a Laura iria fazer? Sem ter uma
resposta pronta, comecei a pesquisar sobre o tema e, junto com a mãe de Laura,
descobrimos estratégias que contribuiriam para aquisição dessa habilidade.
Comecei por aquilo que motivava Laura naquele momento, investiguei o
que ela desejava desenhar, e uma atividade cotidiana que fazíamos era que as
crianças desenhassem, na própria agenda, referências sobre o tempo naquele dia, se
ensolarado faziam um sol, se nublado desenhavam nuvens e assim por diante. Para
isso, adaptamos
uma prancheta, forrando-a com uma tela de nylon, que
proporcionava alto relevo aos riscos que executava de maneira que ela podia seguir
com os dedos o desenho que havia feito. "...Então o sol é redondo..."; de posse então
de um círculo , examinava seus contornos, contornava-o e em seguida repetia no
papel.
No início foi difícil, pois ela empunhava o lápis com muita dificuldade, não tinha
firmeza, seus primeiros traços saíram muito fracos, não permitindo que ela sentisse
seus próprios riscos, mas isso não foi motivo de desânimo. Eu compreendi a
14
dificuldade que ela apresentava, entendendo que não tinha a ver com sua deficiência 6
visual. Isso se devia a outro fator, pois essa prática havia sido negligenciada pelos
meus colegas que no decorrer dos anos não a ensinaram a desenhar, e eu tinha que
ensinar como empunhar um lápis, como fazemos com as crianças menores que
entram na escola.
Desenho de um sol, na cor
alaranjada feito por aluna com
deficiência visual.
Não demorou muito, aos poucos os riscos de Laura ganhavam firmeza.
Lembro do dia que ela fez o seu primeiro sol, um círculo com os raios saindo dele, a
coleguinha do lado, ao ver seu desenho expressa em bom tom: “Laura como seu
desenho está lindo! o sorriso dela foi tão intenso que neste momento tive a certeza de
quanto o desenhar era importante para ela.”
Desenho da figura humana, na cor verde,
representando a amiga de Laura.
E isso se confirmou quando Laura expressou no meu ouvido o desejo de
desenhar sua melhor amiga, ela fez a cabeça, tronco, abdômen e extremidades,
14
mostrando perfeita noção sobre o esquema corporal. Para fazer os cabelos, Laura7
pediu para passar as mãos no cabelo da amiga para saber se era liso ou cacheado. É
difícil descrever o que sentimos ao ver um desenho produzido por uma criança cega,
que nunca enxergou e que o seu desenho podia ser admirado pelos colegas. Fiquei
imaginando o que a Laura devia sentir nesse momento.
Outro material adaptado para que Laura aprendesse a fazer e reconhecer
desenhos foi a prancheta de velcro com a caneta de lã. Retiramos a tinta da caneta e
colocamos um pedaço de lã, fizemos um nó na ponta para que não se soltasse da
caneta. As crianças adoraram esse material, todos queriam a prancheta, queriam
desenhar como a Laura, ela fazia traços e formas, a lã grudava no velcro e assim
permitia a exploração tátil do seu desenho, essa prancheta foi muito útil para trabalhar
a coordenação, já que a caneta era fina e Laura precisava ter firmeza ao segurá-la.
Figura representando uma
árvore (em verde) e um
balanço na cor rosa. Da
árvore vê-se a copa e o
tronco. Do balanço vem-se
riscos
representando
respectivamente: as barras
de sustentação lateral e
superior, bem como as
correntes e o assento.
Além dos desenhos Laura começou a fazer as letras do seu nome que
tinham o traçado contínuo, como exemplo L, U, G. Esse trabalho com o nome foi feito
paralelo ao reconhecimento das formas geométricas e dos desenhos que podemos
formar através de suas derivações, assim também ocorreu com as letras do alfabeto.
14
Para as letras era feita uma associação, como exemplo: o B é como se8
fosse dois semicírculos, um em cima do outro, o V é como um triângulo de cabeça
para baixo sem o teto.
Rapidamente ela conseguiu aprender as letras em bastão e em pouco
tempo já estava escrevendo na sua prancheta. Para se orientar no espaço da folha eu
fiz uma régua vazada de uns 2 centímetros e meio.
Teve um dia que ela chegou empolgada com a tarefa de casa e logo foi
tirando a atividade da pasta e falou: “Tia, você não vai acreditar que eu fiz o meu nome
sozinha, só o G que eu não sabia…” e quando ela tirou a folha da pasta a coleguinha
do lado leu rapidinho: “LAURA GERA”, ela parecia que ia explodir de alegria, mas não
é por menos, ela sempre sonhou em poder escrever de lápis também.
Figura com o nome Laura
escrito com letras de forma.
Várias outras experiências positivas aconteceram no decorrer do ano. Hoje
tenho certeza que um grande passo foi dado pela Laura, que nós também acertamos
em investir nessa habilidade, e isso não foi nada mirabolante, apenas propiciamos a
oportunidade para ela.
Desenhar faz parte da vida de todo mundo, o desenho alegra, encanta.
Dou como exemplo os livros de histórias, qual criança gostaria de ler um livro sem
nenhuma gravura? Simplesmente um livro assim não é interessante, e com esse
pensamento nós também adaptamos todos os livros de histórias, tínhamos o cuidado
de fazer desenhos com grande diversidade de texturas para que ela apreciasse,
explorasse e os reconhecesse. Isso se tornou uma prática tão constante que Laura se
14
recusava a ler livros que não os tivesse. Sem contar que todas as crianças queriam 9
levar os livros em Braille, que puderam ser compartilhados entre a turma, pois tinha as
duas escritas.
Para encerrar esse relato gostaria de exemplificar mais um fato ocorrido já
no final do ano, que comprova como a inclusão é maravilhosa. Após fazer a atividade,
três colegas pegaram a prancheta de desenho, pediram o papel, pois queriam fazer
desenhos para Laura, elas sentaram no chão, e com o giz de cera começaram a fazêlos, primeiramente foi uma casa, assim que terminaram chamaram a Laura e lhe
entregaram a prancheta, para que fizesse o reconhecimento do desenho, vendo que
ela não estava conseguindo identificar a outra colega, foi intervindo: “também você
desenhou muito embolado, deixa que eu vou fazer outro Laura” e assim o fez.
Depois pegou a mão dela e falou: “Olha, aqui é o telhado…” e foi
descrevendo o seu desenho, depois elas queriam ensiná-la a fazer outros desenhos, e
pediram para que Laura fizesse um coração, ao sinalizar que não sabia fazer, a outra
coleguinha retirou um coração de EVA que estava no mural e o entregou, para que
Laura o contornasse.
E dessa forma as meninas foram se entendendo, buscando estratégias
diferentes, assim como eu mesma fazia.
Senti-me gratificada, elas pareciam ser meu espelho, nesta hora percebi o
significado daquele velho dito popular: “as palavras comovem, os exemplos arrastam”.
Sei que há muito a aprender, a caminhada da Laura será grande, mas
espero que essa sementinha plantada possa crescer, frutificar e dar frutos a tantas
outras crianças cegas e tantos professores e assim como eu, poderão ter o privilégio
de vivenciar momentos simples, mas que eternizam a prática pedagógica.
Por fim, gostaria
de
fazer uma nota, deixando meus
sinceros
agradecimentos ao Professor Francisco Lima, que foi nosso mestre, incansável,
sempre disposto a contribuir e partilhar, suas ricas idéias e ensinamentos, os quais
propiciaram-me um caminho de descobertas e à pequena Laura, a satisfação para sua
vida escolar.
54
O Violeiro
15
0
(1899).
Reconhecido por pintar pessoas simples do cotidiano do interior de São Paulo
José Ferraz de Almeida Junior (1850-1899), ilustra a capa do volume II da
Revista Brasileira de Tradução Visual, tanto como homenagem aquele pintor,
quanto como um exemplo de áudio-descrição aplicada às imagens estáticas.
Para conhecer mais a respeito desse artista e de muitos outros, visite a
pinacoteca
do
estado
de
São
Paulo
ou
acesse
seu
site:
HTTP://www.pinacoteca.org.br
Descrição da foto de capa volume II, ano I
Sentado no batente de uma janela de uma casa de sapê um homem branco
toca viola. Do batente para cima a parede está rebocada e pintada com cor
54
Pinacoteca do Estado de São Paulo – pintura em óleo sobre tela.
15
amarela. Do batente para baixo vê-se estrutura de barro e madeira comum as 1
casas de pau-a-pique. O violeiro está com as costas apoiada no umbral
esquerdo da janela, usa um chapéu marrom cuja parte frontal da aba esta
dobrada para cima enquanto a atrás, a aba esta dobrada para baixo. Ele veste
uma camisa xadrez em tons de cinza e branco e calça clara. Do lado de fora
da casa, em pé, uma mulher está encostada no umbral direito da janela. A
mulher, com cabelo preto preso em coque, está com o rosto olhando para a
direita, em direção às mãos do violeiro. Ela esta com os lábios entreabertos. A
mulher veste uma blusa vermelha comprida que cobre parte de uma saia
marrom. A blusa tem bolinhas brancas e mangas largas e longas cobrindo a
metade do antebraço. Ao pescoço, a mulher trás um lenço branco com listras
vermelhas. Com a mão direita segura uma extremidade do lenço e com a outra,
segura a extremidade esquerda.
Tradução de Ernani Ribeiro e Paulo Vieira.
Anexo(Notícias)
15
2
Geometria: Pensamento Puro
Na notícia intitulada “O Mundo dos Matemáticos Cegos (parte 1), postada nesta
Revista vimos extrato do artigo de mesmo nome, em que lemos a respeito do grande
geômetra cego Bernard Morin e sua “Eversão da Esfera.
Agora, trazemos a fala de Emmanuel Giroux, outro matemático, cuja excelência dos
trabalhos põem por terra a crença equivocada de que pessoas cegas não podem dedicarse à áreas das ciências exatas.
Ao ler este artigo, confira o que acontece quando sua palestra não conta com áudiodescrição na apresentação com transparências, slides e outros recursos visuais e atente
para o benefício de tornar sua apresentação mais amplamente inclusiva.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-05-17
Palco Giratório conta com áudio-descrição e é destaque no Bom Dia Pernambuco.
http://www.youtube.com/watch?v=wueKMJMgDeo
Publicado: 2010-05-16
Nova edição da Revista brasileira de Tradução Visual
veja hoje o volume 2 da revista brasileira de tradução visual Publicado: 2010-03-16
Entendimento Jurídico sobre o Direito à Acessibilidade e seu Alcance à área da
Áudio-descrição e das Atitudes
A Constituição Brasileira define como direitos a liberdade de expressão e o acesso à
informação. Ambos direitos estão imbricados entre si, deles dependendo outros,
igualmente garantidos por nossa Carta Maior, tais como o direito de acesso aos níveis
mais superiores da educação, a igualdade de condições de acesso ao trabalho e o
desfrute do lazer.
Não obstante, pessoas com deficiência têm sido constantemente usurpadas desses
direitos ou negligenciadas no respeito e garantia deles, seja por órgãos privados, seja
por órgãos públicos.
Na postagem que trazemos ao leitor RBTV o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
não deixa margem à dúvida de que a acessibilidade comunicacional é direito
incontestavelmente constitucional e que a áudio-descrição e o intérprete de Libras são
indispensáveis para a garantia desse direito.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-02-13
15
3
Não aceitar “Não” como resposta é dizer sim para as Possibilidades
A dificuldade comunicacional encontrada por pessoas surdas, pessoas cegas e com
outras deficiências, por si só, não é o que mais impede essas pessoas de alcançarem
níveis mais elevados da educação, da ciência, das artes etc.
Barreiras atitudinais contra essas pessoas têm sido responsáveis pela incapacidade que
passam assumir, quando suas deficiências não são mais que limites superáveis,
científica ou tecnologicamente (Lima, 1998)
Nesta matéria, Dr. Philip Zazove nos remete à busca de uma educação com qualidade,
em que os recursos necessários aos estudantes com deficiência devam ser oferecidos,
garantidos e estimulados.
“Nascido e criado em Chicago, Philip Zazove tinha 4 anos quando seus pais
descobriram que ele tinha uma perda auditiva profunda. Apesar de especialistas da
época recomendarem que ele fosse enviado para um colégio estadual para surdos,
Devido sua grande perda auditiva, os pais de Philip insistiram que estudasse em uma
escola pública comum. E eles persuadiram a escola municipal local a dar-lhe uma
chance como primeiro aluno surdo integrado na região.
12 anos depois, ele se formava no ensino médio da Niles West High School, com nota
máxima.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-23
Compensação Sensorial da Pessoa Cega: Mito ou Realidade?
Muitos mitos sobre a pessoa com deficiência têm encontrado na ciência “respaldo”,
talvez pelo próprio fato de muitos cientistas se deixarem levar por esses mesmos mitos
ao concluírem a partir de seus dados.
Exemplo disso é a conclusão que alguns estudiosos construíram a respeito da
incapacidade de as pessoas cegas reconhecerem desenhos. Alternativamente a essa
ilação, o baixo desempenho na nomeação de desenhos hápticos pode encontrar
explicação, por exemplo, na falta de treino da pessoa com deficiência visual em
examinar configurações hápticas e não na mediação visual (Lima, 2001).
A crença em poderes extraordinários, compensação sensorial auditiva e tátil etc.,
também fazem parte dos mitos populares e que alguns especialistas, professores,
psicólogos e mesmo cientistas repetem historicamente (Lima 1997). No estudo que hora
apresentamos ao leitor RBTV, alguns desses mitos são discutidos:
“Algumas controvérsias são observadas em relação ao desempenho de indivíduos cegos
na avaliação da capacidade auditiva e tátil. Uma possível diferença nos trabalhos referese ao desempenho de indivíduos que ficaram cegos precocemente, o que indicaria
habilidade cerebral para compensar a perda da entrada visual. Em relação à percepção
sensorial de estímulos auditivos, o mais provável é que cegos não tenham a capacidade
auditiva superior aos sujeitos normais per se, mas, preferencialmente, usem
adequadamente as pistas disponíveis para um melhor processamento auditivo espacial
(Lewald, 2002)...”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-23
15
4
Sinal de Alerta
Ao longe se vê a fumaça. A nuvem espessa cresce tomando o céu, vindo em nossa
direção. Alerta! É hora de sair daqui!
Os sinos batem ruidosamente; as sirenes ecoam por toda parte; ao longe já se pode ouvir
os motores dos aviões inimigos. Alerta! É hora de se proteger!
O que aconteceu com quem não viu? E com quem não ouviu?
Sistemas de alerta visual e auditivo têm sido desenvolvidos para minimizar e, por vezes
impedir maiores danos às pessoas, às suas vidas e às suas propriedades. Um sistema de
alerta só é, de fato bom se alcançar a todos, rápida e claramente. Então, pessoas com
deficiência precisam ser alertadas na e da forma que necessitam para que possam
protegerem-se do mal iminente. Por isso, a entrega da informação precisa ser
redundante e respeitar pessoas cegas, surdas, surdocegas, com deficiência de
comunicação, deficiência intelectual etc.
Neste estudo, os autores examinam o envio de alerta de terremoto em língua de sinais,
visto que pessoas surdas, muitas vezes declaram preferir essa forma de comunicação à
da escrita. Discutem o fato de a língua de sinais não ter uma tradição de escrita e
apontam como a entrega da informação por lígua de sinais pode sofrer ruídos
lingüísticos, derivados da via de comunicação.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-22
A Áudio-descrição na TV Digital do Reino Unido
Muitos dos que em 2010 pensam a pessoa humana, sua dignidade, seu direito à
informação, à comunicação e seu direito à igualdade de condições, hoje, lutam pela
acessibilidade universal aos bens e serviços, assim incluindo as pessoas com deficiência
visual como destinatárias dos produtos culturais, científicos, de lazer e outros.
A Constituição brasileira, hora vigente, reconheceu o indivíduo com deficiência como
pessoa, pela primeira vez em nossa história jurídica, em 1988.
Nesse compasso, é imprescindível estudarmos e aprendermos com os que, há mais
tempo do que nós têm-se aprimorado no respeito aos direitos humanos, por exemplo no
campo da acessibilidade comunicacional por meio da áudio-descrição.
No artigo que hora trazemos ao leitor RBTV, Flávia Machado apresenta um dos
trabalhos mais completos em língua portuguesa a respeito da áudio-descrição na
Inglaterra, país que tem se destacado na defesa e implementação da áudio-descrição.
Com Flávia Machado aprendemos que: “A temática da audiodescrição está presente em
pesquisas do Reino Unido desde a década de 90. Entre 1992 e 1995, a ITC realizou o
projeto Audetel (Audio Described Television). Reguladores, associações de
espectadores e empresas de radiodifusão se integraram para desenvolver audiodescrição
para a televisão. Foi demonstrado que era possível a transmissão de audiodescrição
através dos sinais analógicos da televisão.
Esse projeto foi substituído pelo Broadcasting Act de 1996 que determinou que
em dez anos 10% dos programas da televisão digital terrestre deveriam ter
audiodescrição (GREENING; ROLPH, 2007, p. 128).
Outro projeto desenvolvido foi o TIWO (Television in Words), durante 2002 e 2004,
que tinha
como objetivo criar um sistema computacional que permitisse otimizar a criação
de roteiros de audiodescrição e personalizar esse recurso para diferentes
audiências (jovens, idosos, pessoas com ou sem memória visual e pessoas
que preferem mais ou menos aprofundamento na interpretação do conteúdo)...”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-21
15
5
Imagiologia Tridimensional Digital para Construção de Protótipos Industriais
Parece óbvio que se olhamos um copo, um lápis ou uma bicicleta nós reconhecemos
um copo, um lápis e uma bicicleta. Também parece óbvio que se tocamos um copo, um
lápis ou uma bicicleta, reconhecemos um copo, um lápis e uma bicicleta. Não obstante,
como o cérebro reconhece esses padrões, como processa esse reconhecimento pela visão
ou pelo tato e como chega à sua exata nomeação, à sua reprodução/representação mental
não é assim tão óbvio e filósofos, psicólogos e muitos outros cientistas têm-se dedicado
ao estudo dessa área em todos os tempos e pelo mundo todo.
Saber como nós reconhecemos as coisas, como as representamos mentalmente ou como
podemos criar equipamentos que as traduzam em perfeita reprodução física ou virtual é
de suma importânciae necessidade em todas as áreas das ciências.
Todavia, muitos educadores ignoram a importância da ergonomia dos objetos utilizados
na escrita e negligenciam a alfabetização de seus alunos, mormente dos alunos com
deficiência visual; psicólogos ignoram a importância de se estudar o efeito da fatiga no
uso dos instrumentos de escrita e creditam à dificuldade de aprendizagem ou à
deficiência eventuais “lentidões”, “desinteresses”, erros, insucessos ou dificuldades do
aluno; engenheiros, desenvolvedores, entre outros, não têm dado a devida atenção para
a área da imagem, quando se considera a potencialidade da Imagiologia para a
acessibilidade da pessoa cega ou com baixa visão.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-21
HQ com Tradução Visual
Você sabe a que se presta a áudio-descrição?
De maneira simples, esta técnica de tradução visual se presta a dar acessibilidade à
todos os eventos visuais que não podem ser compreendidos, total ou parcialmente, pela
via da audição e tato.
Logo, se percebe que ela serve à todos que estejam temporária ou permanentemente
privado da informação visual de um dado evento ou que não se o pode ver por razão de
deficiência visual.
Mas, e as histórias em quadrinhos, como elas podem ser acessíveis às pessoas com
deficiência visual?
No Blog ”HQ para DV Ler”, que aqui apresentamos, você poderá descubrir um campo
rico para aplicação da áudio-descrição, aprender como é possível fazer a diferença,
fazendo acessível às pessoas com deficiência a comunicação, e muito mais.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-12
Dificuldades da Tradução Visual: Nem tudo que se ouve se entende
15
6
“A áudio-descrição é tradução visual com todas as vicicitudes de uma tradução,
tendo, contudo, peculiaridades que apenas a ela são atribuídas.”
Esta que é uma citação de um texto nosso, ainda não publicado, e que recebe o mesmo
nome que intitula esta notícia, serve para apresentar artigo da MA Gercélia Batista de
Oliveira Mendes, cujos ensinamentos lançam importante luz ao tradutor, seja no trato da
tradução entre línguas, seja na técnica tradutória da áudio-descrição.
A autora, ao versar sobre a atividade tradutória jurídica (do Alemão para o Português)
alerta-nos para:
“Em primeiro lugar, faz-se necessário esclarecer algumas peculiaridades do discurso
jurídico - e, por conseguinte, da tradução jurídica em termos gerais - da forma como ele
se apresenta no plano supranacional. São elas:
• Hermetismo: expressões latinas (“pacta sunt servanda”), arcaísmos (“cônjuge-varão”),
termos técnicos (“dívida quesível”), abreviações (P.R.I. – Publique-se, registre-se,
intime-se), fraseologias (“E, por estarem justos e acertados, firmam o presente
instrumento, juntamente com as testemunhas, em quatro vias de igual teor, para todos os
efeitos de direito.”) .
• Complexidade e diversidade sintática (inversão dos termos da oração, p. ex.).
• Formalismo (“na esteira da preleção do ínclito e saudoso mestre...”).
• A remissão freqüente a um contexto nacional (“conforme o enunciado do art. Art. 25,
inc. II c/c art. 13 da Lei 8.666/93”, “conforme decisão do TJ”)...”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-11
Áudio-descrição como fator de inclusão e de direito à comunicação
“Uma das estratégias para a construção de uma sociedade inclusiva se encontra na
detecção, alerta e combate às situações de exclusão, situações estas muitas vezes não
percebidas como tais pelos profissionais responsáveis pelas mesmas.”
Como se percebe da assertiva acima, o artigo que hora trazemos ao leitor RBTV, tem
base nos princípios da Teoria da Inclusão. Da leitura integral do estudo, se constatará
que este se esteia no Desenho Universal e que, fundados em lúcida compreensão da
acessibilidade comunicacional, os professores-doutores Elisabeth Fátima Torres e
Alberto Angel Mazzoni,autores da pesquisa ”O direito de acesso à informação nos
meios televisivos: onde está a inclusão?” alertam para o fato de que:
“...Em todos os canais selecionados para integrar este estudo de caso, foram constatados
deslizes graves no que diz respeito à perda de qualidade da mensagem que se pretende
transmitir, tanto em anúncios publicitários, quanto em programas jornalísticos. Essa
perda de qualidade, que implica não só empobrecimento da mensagem transmitida, mas
também desrespeito a muitos telespectadores e consumidores, atinge níveis tais que
esses deslizes já podem ser considerados vícios. Precisam, portanto, ser identificados
para serem adequadamente combatidos...”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-10
INFORMAÇÃO É PODER: Como a Televisão Pode Servir de Empoderamento às
Pessoas Cegas e com Baixa Visão
Esta que é uma queixa justa alhures, no Brasil, não é diferente. Todavia, aqui,
deliberadamente se descumpre a lei que determina a oferta da áudio-descrição na
programação televisiva.
Trazer, aqui, extrato deste artigo aos nossos leitores, mais do que informar sobre esta
técnica de tradução visual, é colaborar para que o Ministério das Comunicações venha
entender o equívocdo e a ilegalidade que é negar às pessoas com deficiência visual o
seu direito à comunicação, à informação e ao lazer, quando não se lhes garante o
recebimento da áudio-descrição.
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“A informação inacessível é um dos principais obstáculos que as pessoas cegas ou com
deficiência visual (amblíopes/ baixa visão) enfrentam, restringindo maciçamente as suas
oportunidades de vida e qualidade de vida.
Aproximadamente dois milhões de pessoas no Reino Unido tem problemas de visão,
dos quais quase 400,000 são registrados como cegos ou parcialmente cegos. Este
número tende a aumentar com o envelhecimento da população, enfatizando a
necessidade de incluir pessoas com problemas de visão no planejamento e prestação de
serviços a nível nacional, regional e local.”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-06
Verbalizar um Gráfico não é o mesmo que o áudio-descrever
Em Dezembro de 2000, era publicado na Revista Benjamin Constant (número 17, ano
6) o artigo intitulado “Algumas considerações a respeito do sistema tátil de crianças
cegas ou de visão subnormal”.
Naquele artigo escreveram os autores:
“O tato, que comparativamente à visão, é altamente hábil no reconhecimento de padrões
3D (Lederman & Klatzky, 1987, Lima & Da Silva, 1997, 1998 e Lima, Heller & Da
Silva, 1998 a e b), oferece-nos, ainda, informações que a visão encontraria dificuldade
ou mesmo se veria impedida de oferecer. Ao olharmos para um objeto, podemos inferir
que ele tem esta ou aquela forma. Associando sua cor com o material observado,
podemos, mesmo, arriscar predizer sua temperatura. Todavia, quanto a esse particular, é
o tato que nos pode dar as informações mais precisas e fidedignas, da mesma forma que
o faz para textura, aspereza, fio etc.
Muito embora pesquisas na área do sistema háptico tenham trazido informações ricas à
luz de nosso conhecimento, muito desse conhecimento ainda se restringe a laboratórios
e revistas especializadas. Educadores e pesquisadores, às vezes, trabalham
paralelamente sem cruzar as informações. Os indivíduos, que desse conhecimento
poderiam estar-se beneficiando mais prontamente, são deixados de lado ou só têm
contato com tal conhecimento de modo indireto e muito mais tarde. Por outro lado,
algumas teorias ou visões enviesadas ainda perduram entre psicólogos e educadores no
que tange ao conhecimento háptico e à capacidade ou potencialidade dos indivíduos
cegos (Heller, 1991; Lima, 2000)...”
Quanto dessa realidade mudou?
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-05
Letras sem Tradução, Exemplo de Exclusão
Você já se deu conta de como é difícil decifrar aquelas letrinhas que alguns sites
solicitam para que você exerça seu direito de acesso comunicacional?
Pois bem, por causa daquelas “letrinhas”, muitas são as pessoas que não podem fazer
uso de um computador para acessar sua conta no banco, ver sua mensagem de e-mail
etc. E isso se dá por conta de elas serem um tipo de teste de Turing, teste que implica
em reconhecer se o operador do outro lado de uma máquina é uma pessoa ou outra
máquina.
Embora o computador gere aquelas “letras”, durante muito tempo, o próprio
computador não conseguia decifrá-las, necessitando da intervenção humana. Por isso,
passou-se a usar o Capccha para “garantir” a segurança dos usuários da internet.
Hoje, o Captcha é facilmente brulado e mesmo fraudado, não dando aos usuários a
segurança que eles pensam estar recebendo.
No entanto, muitas pessoas ainda são prejudicadas por conta do amplo uso desse
sistema.
Estão entre as pessoas impedidas de decifrar ou usar as letras Captcha, as pessoas com
deficiência visual, as pessoas com dislexia, as pessoas de digitam com menor rapidez,
entre outras pessoas idosas e com limitações motoras.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-05
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GUIÃO PARA PRODUÇÃO DE TEXTO DESCRITIVO
A áudio-descrição é um gênero que une, de um lado, informações traduzidas para o
som, seja na forma de narração de um dado evento em simultânea tradução, seja na
forma escrita, para posterior leitura de terceiros, locutores, professores, ou usuários da
descrição. De outro lado, sustenta-se em orientações advindas da técnica do gênero
textual descritivo, não sendo, porém, nem só descrição, nem narração pelo contrário,
distinguindo-se de ambas.
O autor interessado em saber o porque a união destas duas formas, áudio e descrição, se
fundem para unidas formarem a áudio-descrição pode consuldar o artigo “O Traço da
União da Áudio-descrição”, publicado na Seção Principal desta Revista.
Agora, porém, trazemos um texto introdutório à descrição, cujas orientações podem
colaborar para a o estudo da áudio-descrição, mas que, não sendo um texto de áudiodescrição, tem orientações próprias da área da descrição que não esteiam aquela técnica
de tradução visual.
“Descrever é um processo no qual se empregam os sentidos para captar uma realidade
e transportá-la para o texto. Descrever é, assim, pintar com palavras, mostrar aos
leitores ou ouvintes, através de palavras, como é uma pessoa, um ambiente, um objecto
ou, até mesmo, um sentimento ou emoção.”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-05
Personagens Surdos em Livros Infanto-juvenis
Dar a conhecer à comunidade científica a amplitude do que a sociedade com
deficiência deseja receber, também faz parte dos objetivos da RBTV.
Nesse sentido, o acesso a uma literatura em que pessoas com deficiência sejam
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protagonistas precisa ser viabilizado e, dentro de nossa proposta, divulgado.
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No site de Sharon Pajka-West, de onde traduzimos este trecho podemos encontrar várias
dezenas de obras em que figuram personagens surdos.
Quantas delas já se econtram traduzidas para o português e para Libras?
Será que você estaria disposto a traduzir alguma dessas obras?
E, de nossa literatura, quantos livros já foram escritos nessa linha?
Deles, quantos estão traduzidos para Libras ou outros idiomas?
Partilhe conosco sua informação, escrevendo para: [email protected]
"Treinando Sofia” por Linda Kurtz Kingsley
“Mike e Pete estão juntos novamente, trabalhando em mais um interessante projeto!
Mike, que é surdo, e sua família estão criando uma linda cachorrinha, a qual, um dia se
tornará um cão de serviço para alguém com deficiência.
De novo, Pete e Mike aprendem a se comunicar e trabalhar juntos usando Sinais e fala.
24 Sinais para aprender e um cachorrinho para se divertir!
Confiram!”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-04
O Mundo dos Matemáticos Cegos (parte 1)
A educação das pessoas com deficiência tem sido limitada por aquilo que a pessoa sem
deficiência acha que as primeiras devem ou podem estudar. E isso tem levado a
estereótipos como aqueles que as próprias pessoas com deficiência acabam por
acreditar:
pessoas surdas devem buscar áreas como a do design, nunca a da música; pessoas cegas
devem buscar as áreas sociais, nunca as ciências naturais; as pessoas com deficiência
física devem dedicarem-se à pesquisas de “escritório”, nunca à de campo; pessoas com
deficiência intelectual devem restringirem-se aos níveis mais básicos na educação,
nunca os mais elevados níveis da pesquisa científica.
Nos extratos a seguir, descubriremos um mundo, o mundo de matemáticos cegos e suas
contribuições para essa área da ciência.
A leitura atenta e integral do artigo corroborará para o entendimento da assertiva inicial
que aqui fizemos, e dará subsídios para a mudança de comportamento de educadores e
comunidade científica, a respeito da capacidade das pessoas cegas para a ciência.
“Um visitante no apartamento do geômetra cego Bernard Morin encontra muito o que
ver. Na parede do corredor, há um pôster mostrando uma figura gerada por computador
criada pelo aluno de Morin François Apéry da Superfície de Boy, uma imersão do plano
projetivo em três dimensões. A superfície desempenha um papel no trabalho mais
famoso de Morin, sua visualização de como virar uma esfera de dentro para fora.
Embora ele não possa ver o pôster, Morin fica feliz em apontar detalhes na figura que o
visitante não deve perder...”
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-04
A Inclusão Escolar Por Uma Pedagogia da Imagem
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Importantes trabalhos na área da investigação de como as pessoas cegas
produzem/reconhecem desenhos e outras configurações bidimensionais têm sido
divulgados, alcançando, cada vez mais, as pessoas interessadas, entre as quais, as
próprias pessoas com deficiência.
A popularização do conhecimento, com a possibilidade de dar às pessoas leigas acesso
ao conhecimento produzido na academia é um dos pilares desta Revista, donde não
poderíamos deixar de divulgar este trabalho.
Numa escrita agradável, com passagens emocionantes a dissertação “Itinerário
Educacional de Uma Aluna Cega e a Busca Pela Imagem Adaptada” de Rubem Varela
une relevante estudo sobre mapas táteis ao relato de como uma garotinha cega, alegre,
esperta e inteligente é transformada pelas barreiras atitudinais que encontra na família e
na sociedade que a rodeia.
Os estudiosos da tradução visual para o sistema háptico e os interessados nas questões
sociais do ensino da pessoa com deficiência visual terão nesta dissertação fonte das
mais significativas, produzidas em língua portuguesa.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-04
O Mundo Esperado dos Jogos Acessíveis
Ao falar sobre a importância da áudio-descrição para os áudio-games, no I Encontro
Brasileiro de Áudio-games, em São Paulo, Brasil, 2005, Dr. Francisco Lima assim se
expressou:
“...É de incontestável argumentação que o uso dos jogos é, cada vez mais, uma
ferramenta educacional indispensável para uma educação calcada no desenho universal,
requerendo que a sociedade passe a se preocupar com a acessibilidade nessa área de
lazer e educação, relativamente nova para o mundo acadêmico brasileiro.
A importância da acessibilidade para os áudio-games vai, no entanto, muito além de
propiciar a estes acesso comunicacional, por parte das pessoas com deficiência visual.
Trata-se de traduzir o mundo de imagens desses jogos em um mundo partilhado de sons
e cinestesia, que contemple regras do desenho universal, da dignidade e do respeito aos
consumidores com deficiência do mundo todo.
Assim, fazer os estudiosos ouvir as necessidades da população alvo, que necessitam dos
jogos acessíveis permitirá à universidade descobrir seu papel para a ampliação da
qualidade inclusiva desses jogos, bem como para incentivar a ampliação de pesquisas na
modalidade de produção de games com características de realidade virtual, em que a
interação homem/máquina não deixe de fora pessoas com deficiência.
Postado por [email protected] Publicado: 2010-01-02
A Educação Visual de Pessoas Surdas
Com o título The value of visual literacy practices in the education of deaf students:
the experience of deaf teachers , Tatiana Bolivar Lebedeff relata importante estudo para
o entendimento e reflexão a respeito da alfabetização visual, apontando a necessidade
de a literacia visual estar em todo o currículo da educação de pessoas surdas.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-31
Como tornar acessíveis apresentações em Power Point aos membros da
assistência que não as podem ver (Adaptado por Minna von Zansen and Jenny
Craven e traduzido por Paulo Vieira)
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De acordo com a OMS, há hoje 314 milhões de pessoas com deficiência visual no
mundo. Acrescente-se aí que até 4% da população tem dislexia grave. Portanto, sua
platéia pode ter pessoas de ambos os grupos.
As diretrizes seguintes foram delineadas para apresentações usando softwares como o
PowerPoint, entretanto você também deve pensar em relação a outras formas de
apresentação. Por exemplo, você pode utilizar uma apresentação de slides em HTML,
ou pôsteres para mostrar as informações que você quer apresentar. Independentemente
do método que você escolher, as instruções a seguir podem ajudar a tornar suas
apresentações mais acessíveis.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-31
Translating Audio description Scripts: The Way Forward?
Neste artigo de Juan Francisco Lopez Veras, aspectos cruciais envolvendo a produção
de áudio-descrição são discutidos, proporcionando reflexão a respeito da possibilidade
de tornar o processo de produção audiovisual e descritivo menos complexo, menos
dispendioso e mais rápido.
O autor elucida questões conceituais e compõe relevante literatura para os interessados
no campo da áudio-descrição.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
Orientação G87: Fornecer Legendas Ocultas | Técnicas para as WCAG 2.0
Aplicabilidade
Em toda tecnologia audiovisual, em que existam agentes de utilizador que suportem
legendas ocultas.
Descrição
O objetivo desta técnica é fornecer uma forma para que as pessoas Surdas, com
deficiência auditiva, ou que tenham dificuldade em ouvir o diálogo em material em
multimédia sincronizada, possam ver o material e perceber o diálogo e os sons, sem ser
necessário que as pessoas ouvintes vejam as legendas.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
Intérpretes em tempo real
Profissionais da tradução simultânea vivem saias justas diplomáticas e dizem que, para
trabalhar bem, o conhecimento de português é tão importante quanto o de idiomas
estrangeiros.
Alex Sander Alcântara
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
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Conferência: A Inclusão dos Surdos na Universidade
Em 2002, foi criado o evento “DEAF ACADEMICS” nos Estados Unidos.
Sua primeira edição foi na cidade de Austin, estado do Texas.
Seu foco principal é pelo reconhecimento dos surdos acadêmicos perante a sociedade,
promovendo a interação entre surdos na carreira acadêmica ou pesquisadores.
No histórico desse evento aconteceram muitas coisas importantes para as comunidades
surdas que correspondem a estabelecer colaborações e divulgar novas pesquisas.
O evento já foi realizado em quatro conferências internacionais: Austin, Texas, Estados
Unidos em 2002, Washington, DC Estados Unidos em 2004, Estocolmo, Suécia em
2006 e Dublin, Irlanda em 2008.
Pelo papel relevante que a partir do Curso Letras/Libras, tornaram referência o Brasil e
a UFSC, foi ela escolhida como sede da próxima conferência a realizar-se em 2010,
Florianópolis-SC no Brasil.
Venha Apresentar seu Trabalho
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
Artista? Não. Ilustrador.
No artigo de Maria Edicy Moreira conhecemos um pouco deste grande ilustrador e,
seguindo os links nesta notícia, poderemos descobrir muito mais a respeito do mundo da
Ilustração Profissional.
“É preciso acabar com a imagem, ainda enraizada no mercado,
do ilustrador como artista inconseqüente, personalista, pouco organizado, sem
planejamento
e que faz toda sua “maravilhosa” criação em momentos de inspiração, intuição e
feeling”.
Rubens Lima
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
Conferência Deparando com a Diversidade: Nivelando no campo da arte
fotográfica.
Esta é a Conferência da Sociedade de Educadores da Fotografia, a ocorrer na
Philadelphia, Estados Unidos, em março de 2010.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-30
O uso da áudio-descrição
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Áudio-descrição é um termo usado para descrever os principais elementos visuais em
um vídeo ou um produto multimédia. Este processo permite com que os indivíduos com
deficiência visuual venham acessar o conteúdo que não esteja compreensivo apenas pela
audição das informações sonoras.
Na áudio-descrição, narradores geralmente descrevem as ações, gestos, mudanças de
cena, e outras informações visuais somente percebidas pela visão.
Os áudio-descritores também descrevem títulos, nomes dos atores, e outros textos que
apareçam na tela de um filme na TV ou na tela do cinema.
A aplicação da áudio-descrição vai dos eventos de lazer aos educacionais, abarcando
museus, mostras de arte e a internet.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-29
Mapas Táteis para Download
Dentre as diversas modalidades da tradução visual, a de se transformar o que é visto no
que é sentido pelo tato é de significativa importância para a acessibilidade
comunicacional da pessoa com deficiência visual.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-29
Projeto Lambda, Traduzindo Matemática com acessibilidade.
Expressões matemáticas complexas exigem do estudante com deficiência visual que
retenha na memória grandes porções de informações, o que lhes dificulta a
aprendizagem da matemática. O Projeto Lambda traz uma ferramenta promissora para
suprir a necessidade de estudantes cegos, no ensino médio e superior, traduzindo em
som, o que antes só estava disponível para os olhos.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-29
A Perspectiva de um Fotógrafo Cego
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Traduzir para os que enxergam, aquilo que o próprio tradutor não vê pode ser
desafiador, mas, certamente não é impossível.
Neste caso, o tradutor é um fotógrafo (Nicholas John Birchak), cego congênito, no
sentido mais amplo, que, se não vê com o órgão da visão, vê com tudo mais, superando
barreiras atitudinais e seus próprios limites, conforme ele nos conta em seu site
www.ablindperspective.com.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-28
Diferenças no Processo de Legendagem e de Tradução
Neste agradável e elucidativo texto, Leonardo Teixeira mostra diferenças entre o
processo de legendagem e de tradução, apontando que: “O primeiro passo para se
entender o processo de tradução para legendagem reside na observância de que o tempo
necessário para a leitura de uma legenda é bem maior que o tempo usado para a fala que
corresponde àquele texto. Assim, por diversas vezes, é impossível traduzir na íntegra o
que é dito, devendo-se realizar adaptações ou sínteses, que, para os conhecedores do
idioma original, podem parecer verdadeiros assassinatos da mensagem."
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-27
Pintura além da Visão.
No artigo intitulado “Uma Visão para Ensinar”, a artista e professora iraniana Shahrzad
Ossouli ensina muito mais que como pintar. Ela ensina que para fazer arte é necessário
bem mais que apenas um corpo saudável.
De acordo com a Artista é indispensável que se tenha “paixão, força de vontade e
atitude também”.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-26
Vendo imagens com a "língua": Não é ficção, é científico.
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Depois de ter ficado cego na guerra do Irac, Mike Jernigan recebeu nada mais do que
uma bengala e a "recomendação": "Vá em frente".
Neste artigo você lerá que ele vai bem mais longe que isso, "vendo com a língua" o que
não pode ver com os olhos.
Postado por [email protected] Publicado: 2009-12-26

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