Curso Online A Escola no Combate ao Trabalho Infantil Professora
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Curso Online A Escola no Combate ao Trabalho Infantil Professora Carolina Vanderlei Castro de Almeida1 O Trabalho em Rede e a Fiscalização do Trabalho Infantil Vamos ‘conversar’ um pouquinho mais sobre o trabalho em rede no Sistema de Garantia e sobre a vivência da fiscalização do trabalho no combate ao trabalho infantil. O grande desafio do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente é trabalhar em rede, é fazer com que as partes, que a priori trabalhariam separadamente, se integrem, conversem entre si, porque uma ação complementa a outra. O Estado tem, digamos, vários braços, várias ramificações, e cada uma tem a sua prerrogativa e também a sua limitação. Por isso é preciso que esses braços conversem, para que se chegue a um todo que funcione muito bem em prol da criança e do adolescente. A fiscalização no combate ao trabalho infantil começou com mais força na década de 1990, quando o Brasil reconheceu que, de fato, nós tínhamos esse problema, mas a fiscalização em relação ao trabalho infantil remonta a muito antes, em 1891, com um decreto que regulamentou o trabalho da criança, no ‘chão de fábrica’ na capital, à época o Rio de Janeiro. Foi a primeira vez que se falou, dentro da legislação brasileira, em inspetor, em fiscal e em auditor do trabalho. A nomenclatura foi mudando ao longo dos anos e a fiscalização do trabalho está sempre muito integrada, ela tem sempre um olhar muito carinhoso voltado para a questão da infância e da adolescência. Hoje a fiscalização do trabalho é dividida em projetos. Cada estado tem os seus projetos. Alguns são obrigatórios para todos os estados, no caso, por exemplo, o trabalho infantil. Todo estado da federação brasileira, mais o distrito federal, tem hoje, um projeto com auditores voltados 1 www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] Página Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo 1 Carolina Vanderlei Castro de Almeida é Auditora Fiscal do Trabalho e coordena o Projeto de Combate ao Trabalho Infantil da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo. exclusivamente ou prioritariamente para a questão do combate ao trabalho infantil. Nos últimos cinco anos (de 2008 a 2011), a fiscalização no trabalho afastou cerca de 10 mil crianças do trabalho proibido. Durante uma ação fiscal, o auditor vai a uma empresa, vai ao estabelecimento que contrata, que explora a mão de obra infantil, com uma ação voltada prioritariamente para o empregador, em que se concentra nas obrigações funcionais, atuando, notificando e determinando que ele afaste aquela criança do trabalho, mas a nossa ação não para só ai, ela também se volta para a criança. A primeira coisa a ser feita é o cálculo de verba rescisória, em que nos preocupamos que a criança saia do emprego com algum tipo de direito assegurado. Além disso, durante a fiscalização, durante o processo que chamamos de verificação física, que é o período em que ficamos no estabelecimento, é feita uma ficha de verificação em que constam dados socioeconômicos da criança, não só dados relativos às condições de trabalho, como jornada, salário, forma de pagamento, mas também dados que possibilitem que, posteriormente, a rede de proteção consiga localizar aquela criança, aquele adolescente que foi afastado do trabalho infantil. É perguntado o nome da criança, nome da mãe e do pai, data de nascimento, escola em que estuda, turno em que estuda, se recebe bolsa família, se não recebe, enfim, informações que, posteriormente, tornam mais fácil fazer com que essa criança seja cuidada. Porque quando a criança chega a uma situação de trabalho infantil, quando ela chega na situação em que sua mão de obra é explorada, outros direitos, com certeza, já foram desrespeitados, e para nós é uma pergunta que fica, quando a gente afasta a criança do trabalho infantil: para onde essa criança vai? Por isso essa preocupação de encaminhar para a rede de proteção. São feitos termos de encaminhamentos para o Conselho Tutelar, para a assistência social, tanto municipal quanto estadual, também para o PETI2, às vezes, para o Ministério Público do Trabalho, enfim, nós lançamos mão da rede de proteção, para que o nosso trabalho não fique inócuo, porque a nossa preocupação não é só fazer com que aquele empregador não contrate mais a mão de obra infantil, é fazer também com que aquela criança não seja mais uma Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] 2 Programa de Erradicação do Trabalho Infantil Página 2 trabalhadora, que ela possa viver sua infância e adolescência em plenitude, tendo seus direitos assegurados de forma geral. Em 2012, tivemos uma situação bastante interessante lá em Pernambuco, onde foram afastados diversos adolescentes na faixa etária mais complicada do trabalho proibido, entre 16 e 17 anos, que estavam em trabalhos insalubres, perigosos e no trabalho noturno. Estes adolescentes já eram pais de família, e a partir de uma iniciativa do ministério do trabalho, da superintendência regional do trabalho e emprego em Pernambuco, conseguiu-se uma articulação com a instituição de ensino e de aprendizagem para receber aqueles adolescentes vindos da situação de trabalho infantil. Eles saíram de uma situação de vulnerabilidade, em que estavam tendo seus direitos desrespeitados, e passaram a uma situação de cidadania. A aprendizagem é um contrato muito específico dentro da legislação trabalhista, em que o objetivo principal não é assegurar o direito ao trabalho, mas o direito à profissionalização, que consta no artigo 227 da Constituição Federal. O adolescente, quando está em um contrato de aprendizagem, recebe um salário não só pelo tempo que está na empresa, mas também pelo tempo que está na instituição de ensino aprendendo uma profissão. Acho que este é só um exemplo da nossa preocupação com as crianças e os adolescentes resgatados do trabalho infantil. A ação sistêmica se dá, inclusive, pelo próprio direito, pois quando um direito é desrespeitado, normalmente ele gera um desrespeito há vários outros. A Constituição Federal, no artigo 7o, inciso 33, quando cita que é proibido o trabalho noturno perigoso e insalubre aos menores de 18 anos, e de qualquer trabalho aos menores de 16, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, ela não só emana uma ordem que proíbe que se contrate e se explore a mão de obra infantil, como ela também transforma a criança e o adolescente num sujeito detentor do direito ao ‘não-trabalho’. A criança e o adolescente www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] Página Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo 3 naquela faixa etária que acabei de comentar, são detentores desse direito, eles tem o direito ao ‘não-trabalho’ e isso tem um motivo: o desrespeito desse direito ao ‘não-trabalho’ gera um desrespeito aos outros direitos elencados no artigo 227 da Constituição. É impossível, por exemplo, termos uma criança que trabalha em um ambiente insalubre e que ela tenha seu direito à saúde resguardado, ou o direito à vida resguardado. Uma criança que trabalha não tem seu direito à educação resguardado, pois ela chega à escola cansada, de noite, ela não consegue fazer o dever de casa, ela não dorme bem, por isso, é preciso que a gente enxergue o direito ao ‘não-trabalho’ nessa complexidade de direitos. Ele ajuda a garantir esses outros direitos, por isso é tão importante combater o trabalho infantil das crianças e dos adolescentes. Gostaria agora, de falar do papel da escola no combate ao trabalho infantil. Ela tem um papel de destaque, sobretudo no eixo da promoção dos direitos, à medida que ela pode trazer essa discussão para dentro da sala de aula. Eu não consigo enxergar a promoção de direitos, se os detentores desses direitos não sabem que os tem, ou não sabem como fazer valer esses direitos. Assim, o papel da escola na disseminação da informação, na discussão, é fundamental. E, em minha opinião, mais do que um papel, é um poder maravilhoso quando o professor traz essa discussão para a sala de aula. Se o educador trouxer essa discussão para a sala de aula e encontrar um aluno trabalhador, ele pode acionar esse Sistema de Garantia, indo até o Conselho Tutelar, ou à Secretaria de Direitos Humanos que, hoje, tem um número, que é o disque 100, em que qualquer desrespeito aos direitos humanos pode ser denunciado, inclusive o trabalho infantil. A denúncia que chega via telefone, para a Secretaria de Direitos Humanos, depois é repassada para outros órgãos do Estado, para as instituições, o Ministério do Trabalho e Emprego, para o Ministério Público do Trabalho, repassado inclusive para o Conselho Tutelar. Essa é uma das formas de se fazer denúncias contra o trabalho infantil. Outra possibilidade é comparecer a uma sede regional do Ministério do Trabalho. Todas as capitais possuem uma superintendência, algumas cidades possuem gerências, outras agências. Em todas elas é possível fazer denúncia, e tão logo essa denúncia é colhida, é enviado um fiscal do trabalho para averiguar a situação, para ver qual é o procedimento e, encontrada a criança, fazer www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] Página Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo 4 exatamente aquilo que falei há pouco: encaminhá-la para a rede de proteção. Eu gostaria de compartilhar com os leitores uma história que aconteceu comigo, em 2012, em uma das ações de combate ao trabalho escravo urbano, promovida pela Superintendência Regional de Trabalho e Emprego em São Paulo. Via de regra, durante essas ações, são lavrados termos de apreensão de documentos e de objetos. Estes objetos do local de trabalho são levados para análise, para depois servirem de elementos de convicção, para de fato configurar uma situação de trabalho degradante. Essa ação, especificamente, ocorreu numa oficina de costura na Zona Norte de São Paulo e, durante a análise documental do material, eu encontrei um caderno que trazia anotações. É importante deixar claro que, normalmente, nessas oficinas, não há uma separação entre o ambiente de trabalho e da residência, tudo é muito misturado, você sai do quarto e, de repente, já está no salão das máquinas, são várias famílias morando junto e há realmente essa confusão mesmo do que é estabelecimento e do que é casa. Em um desses cadernos eu encontrei uma tarefa, um dever de casa de uma das meninas, filha de um casal de trabalhadores resgatados nessa ação que resultou na constatação de trabalho degradante, e a atividade consistia exatamente em fazer uma redação sobre o que era e porque era proibido o trabalho infantil. Aquilo me emocionou muito, porque, aquela letrinha, daquela menina em alfabetização, que fez um texto, respondeu a questão... Ela fez um texto claríssimo sobre porque era proibido o trabalho infantil e encontrar aquele caderno foi um alento à fiscalização. Encontrar aquele texto, naquelas condições, durante uma ação de trabalho degradante, foi um alento, foi muito significativo para nós. Imaginar aquela criança, aquela menina que tinha por volta dos seus 7, 8 anos, crescida numa situação de perversa exploração, num ambiente de trabalho e no ambiente de residência onde diversos direitos humanos eram desrespeitadíssimos, as condições do local, do ambiente, eram condições de grave e eminente risco, a ponto do local ser interditado, e as pessoas serem retiradas de lá. E imaginar que essa menina, crescida nessas condições, era sabedora dos seus www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] Página Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo 5 direitos, do que era trabalho infantil... Ela sabia por que era proibido o trabalho infantil e isso tudo, graças à escola, graças ao papel transformador que a educação tem em nossas vidas. Cabe à escola tomar esse papel transformador e levar essa discussão para a sala de aula e eu desejo à vocês que aproveitem o curso, que consigam levar essa discussão para www.fundacaotelefonica.org.br/escolasrurais - [email protected] Página Projeto Escolas Rurais Conectadas Fundação Telefônica Vivo 6 sala de aula, que discutam com seus alunos e sejam agentes de transformação também.
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