Artigo - Associação Portuguesa do Cão de Castro Laboreiro
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Artigo - Associação Portuguesa do Cão de Castro Laboreiro
Breve enquadramento do motivo que levou à publicação deste artigo. Nos últimos anos um colaborador do Jornal Noticias dos Arcos, publicou quatro artigos (Janeiro 2010, Agosto 2011, Novembro 2011 e Novembro 2012) impregnados de falsidades, envolvendo o Cão de Castro Laboreiro. Desde o primeiro momento optamos pelo silêncio porque o Cão de Castro Laboreiro, é de Castro laboreiro, é um axioma, não precisa de prova e, por outro lado, poupávamos a nossa pena às truculências de lances que não dignificam ninguém. O autor desconhecedor do conceito mais básico de raça canina e da história das raças ibéricas, transforma o Cão de Castro Laboreiro no Sabujo medieval, para tal, entre outras absurdidades, coloca o cão de Castro Laboreiro, como sendo o acompanhante assíduo das mais insignes individualidades da História de Portugal (“o preferido dos reis” - pelos menos desde a primeira dinastia), “durante muitos séculos, fora a apetência dos reis de Portugal para a caça grossa”, o Sabujo do trem de caça de D. Afonso III, durante sete séculos o guarda obrigatório das dezenas de matas das coutadas reais e vigilante dos palácios dos reis, o farejador-mor de caçadas medievais, ou seja, o rei da montaria descrito no Livro de Montaria de D. João I e na pena de outros “eminentes cronistas, escritores e historiadores dos muitos séculos anteriores que imortalizaram o nome do cão, a que os soajeiros chamavam Sabujo, de que me permito destacar entre outros Fernão Lopes, Zurara, Rui de Pina, Garcia de Resende, Antero de Figueiredo, Eugénio de Andrade e Alexandre Herculano”.[Jorge Lage] Perante tamanhas atordoadas e ruído de fundo, era indispensável em qualquer altura alguém alertar os menos versados nestas temáticas para uma tese falaciosa, alavancada em argumentos inválidos e na deturpação irresponsável de alguns documentos valiosos da história portuguesa produzidos por figuras ilustres como D. João I, Fernão Lopes ou Alexandre Herculano. É de salientar que em todos os textos escritos, em tom inqualificável, nunca lemos, nem nas entrelinhas, UMA ÚNICA palavra de respeito, elogiadora, enaltecedora ou mesmo de agrado dirigida a Castro Laboreiro e ao sentir do seu povo em relação à sua raça no que toca à sua criação, preservação e evolução. Também nunca, mas NUNCA referiu UM ÚNICO registo histórico do Cão de Castro Laboreiro. Segue o Artigo, Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 1 Artigo publicado no Jornal Noticias dos Arcos nos dias, 7 e 14 de Fevereiro 2013 O Cão de Castro Laboreiro tem as suas origens ancestrais em Castro Laboreiro O Cão de Castro Laboreiro é uma das poucas raças caninas portuguesas, com o seu Solar na actual freguesia de Castro Laboreiro (que foi concelho até 1855), e só por estultice poderia ser confundido com um Sabujo. Antes de mais, desenganem-se todos aqueles que, induzidos pelo título adoptado, pensam que vou aqui desfiar os parcos dados monográficos sobre esta nobre raça canina da minha terra Natal. O simples e único propósito deste sucinto artigo é desenvencilhar as confusões disfarçadas com pretensa roupagem histórica e travar uma enfiada de incongruências sem fundamento que, a este propósito, tem sido publicadas por Jorge Lage. Ou seja, não vou escrever nada de valedouro sobre o cão de Castro laboreiro e limitar-me-ei a demonstrar que: (i) O solar do Sabujo nunca foi o Soajo; (ii) O cão de Castro Laboreiro não é e nunca foi um Sabujo. (i) A teoria de Jorge Lage peca na sua génese. Para a fundamentar aferra-se a um privilégio de D. João I, outorgado em 1401 e ao foral manuelino de 1514, segundo o qual “na dita terra e comçelho de soaJo os moradores delle nam pagarão a nos nem a coroa Real destes Regnos njnhuum foro nem tributo Real porque sam obrigados de nos darem em cada huum anno aos tempos que lhos mandamos Requerir ou elles os quyserem mandar cinquo sabuJos feitos de monte sem outra njnhuma cousa “. Estas referências documentais têm sido a sua pedra de toque para construir a tese falaciosa de que o solar do cão Sabujo medieval foi no Soajo; e para depois asseverar, raiando o absurdo, que o Sabujo é o Castro Laboreiro. Vamos por partes. Já que tanto se vangloria com pergaminhos medievais, bastar-lhe-ia folhear os volumes das Inquirições de D. Afonso III (feitas em 1258) para se aperceber que, além dos monteiros do Soajo, existem inúmeras terras, vilas e lugares com monteiros que tinham que acompanhar o rei com cães, ascunas e cornos. Por ócio e falta de espaço, permitam-me que refira apenas como exemplo, da zona de Entre-Lima-e-Minho, a freguesia de S. Lourenço da Montaria, na serra de Arga – des que el Rey pasar per Bracara e quiser correr monte, se mandar polos omees desta collatione, vam pora ele cum ascunas et cum caes et cum cornus”. Na história dos cães, tal como a dos homens só ficou o registo das raças aristocratas, aquelas que realmente eram raças apuradas e faziam parte da vida dos poderosos. As raças de cães de caça especializadas que caçavam na época medieval na península ibérica: Alão (alano), Sabujo (sabueso), Podengo (podenco) e Galgo, ainda continuam todas a caçar entre nós. Nos últimos séculos a Espanha preservou o Alão, o Sabujo e o Galgo da extinção certa. Que a Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 2 montaria às feras e o uso destes cães de caça é prática constante e reiterada, espalhada por todo o espaço territorial do reino de Portugal, está bem patente nos tratados do século XIV, da autoria de Mestre Giraldo. Perante esta paisagem medieval, seguindo o mesmo padrão de aferimento de Jorge Lage para obter o resultado esperado, o mais fácil é encontrar solares medievais para o Sabujo em Portugal. Estou convicto que, aplicando o critério de Lage, a muito poucas terreolas portuguesas se poderia recusar o título de solar medieval do Sabujo. Permitam-me que seja mais preciso e refira o caso paradigmático do mosteiro de Santo André de Gondomar que, em tributo da carta de couto outorgada por D. Afonso Henriques (1140-1185), se obrigou a dar-lhe sabujos – repare-se que este tributo é três séculos e meio mais velho que o do Soajo. Sejamos sinceros! Se queremos falar de fundamento histórico e documentado, então temos aqui uma conjuntura que supera a do Soajo em muitos séculos. A razão sobeja ao padre Domingos Barroso quando atesta que “O sabujo em Portugal, já era sabujo quando nós ainda não tínhamos a certeza de ser portugueses”. Mas não se trata de caso único, os exemplos proliferam na documentação, deixem-me só referir, entre muitos, a carta de privilégio aos moradores de Dornas e Ferreira, outorgada a 29 de Abril de 1441, que os isenta de serem besteiros de conto porque são monteiros, criam sabujos e têm ascunas; privilégio em 1394 aos moradores da aldeia de Fataunços do julgado de Lafões, por manter sabujos para acompanhar o rei; por carta de 1483, os monteiros das matas de Cabril tinham que criar sabujos, ter lanças e buzinas; em 1546 na vila de Montalegre foram instituídos 60 monteiros e cada um tinha que criar, pelo menos, um sabujo e possuir uma chuça ou besta para montaria; há um rol de documentos de aposentações de monteiros espalhados pelo reino que continuam a criar sabujos, como um tal Martim Anes, em 1508, morador na Usseira, termo da vila de Óbidos, monteiro e guarda da mata de Valbenfeito ou, João da Costa, aposentado em 1512, monteiro e guardador da mata de Alcobaça, morador em Almofala, termo de Alcobaça; em 1643 o monarca chega ao ponto de instituir pagamentos do erário público para se criarem e manterem cães da raça, por exemplo, o alvará que mandou pagar 140. 200 réis, pelo almoxarifado da vila de Setúbal, a Luís da Cunha Gomes para sustento de 16 cães sabujos; em 1209 nos foros medievais de Riba-Côa em linguagem de carácter lionês, figuram o sabujo, o alam e o podenco, etc… Afinal o solar medieval do Sabujo era em Riba- Côa, Gondomar, Arga, Dornas, Ferreira, Lafões, Cabril, Usseira, Alcobaça, Setúbal, Montalegre…? Todas estas e muitas outras terras têm uma autoridade histórica e documental igual (para não dizer superior) à esgrimida por Jorge Lage. Mas ainda alguém acredita na fábula de que existiu o famoso Sabujo (do Soajo)? Claro que não! Existiu o cão Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 3 Sabujo, sem sombra de dúvida, mas pretender que seja do Soajo, que aqui fosse o seu solar, que era aqui que o monarca, a nobreza e todos os monteiros do reino vinham buscar Sabujos, só num mundo de acéfalos. D. Fernando, nono rei de Portugal (reinou de 1367 1383), enviou de presente ao soberano mouro de Granada seis Alãos e seis Sabujos, “todos com collares brollados, e fozis de prata dourados, e as trelas delles douro fiado, e trimta azcumas, todas com comtos e amguados de prata dourados, que levavom quareemta e seis marcos de prata em guarniamento”. Foi ao Soajo que o Belo foi buscar metade da matilha? E, ultrapassando a fronteira de Portugal, que dizer dos milhares de Sabujos que existiam em todos os reinos medievais da Espanha? O seu solar também era no Soajo? Foi ao Soajo que vieram todos os reis (como Filipe II, caçador inveterado; no seu reinado foram publicados vários tratados de caça), príncipes e nobres da Europa à procura de Sabujos para caçar? O poder de ficcionar é ilimitado quando descobrimos cães de Castro (o clássico e famoso cão Sabujo do Soajo) no trem de caça de D. Afonso III - ou na pena de Fernão Lopes. Pelo andar da carruagem, não ficaria surpreendido se qualquer dia viesse a lume que Gaston Phébus, um dos maiores monteiros medievais - descreveu os sabujos na Vizcaya y en España em precioso tratado de caça do século XIV (Livre de Chasse) -, veio ao Soajo buscar as centenas de Sabujos que compunham a sua matilha. Não é verdade que na Biscaia fala Alexandre Herculano de sabujos na Dama Pé de Cabra? A leitura de Herculano e do conde de Foix, pode servir para contestar a segunda parte da tese, que, em quixotesco, nada fica a dever à primeira. (ii) Além das raças de caça perfeitamente identificadas, com estalões medievos, por todo o território nacional sempre existiram milhares de cães sem raça, de companhia, a vadiar (cidades e vilas), a caçar e a guardar animais e propriedades. Cães existiam em todos os sítios. Os cães que guardam são referidos como cães de guarda, cães de gado, cães pastores, cães de lobo, lobeiros, mastins, molossos, ou simplesmente rafeiros. Registou o professor J.R. dos Santos Júnior sobre a vezeira da cabrada do couto de Dornelas, concelho de Boticas, que tinha entre 700 a 800 animais no princípio do século XX: “A cabra tinha 7 ou 8 cães de lobo. Os cães, que tinham coleiras de pregos, vinham para o povo com os vezeireiros ao fim da tarde. Na manhã seguinte os cães acompanhavam os pastores a que calhava dar o dia à vezeira, e guardavam o gado dos lobos durante o dia. Muitas vezes os lobos, especialmente no inverno, rondavam ameaçadoramente o rebanho. Então os pastores acirravam os cães que espantavam as feras.”. Os poucos cães de Dornelas não pertenciam a nenhuma raça. Ainda hoje, o grosso dos cães que trabalha no monte ou guarda quintas, são heterogéneos no mesmo dono, lugar, vale ou montanha. O povo nunca controlou o cio dos seus cães. Em Castro Laboreiro os cães de guardar atingiram o estatuto de raça. A fórmula parece simples, mas é extremamente complexa: Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 4 isolamento geográfico, dezenas de animais do mesmo tipo e, principalmente a consanguinidade permanente e significativa, que permitiu fixar, apurar e manter características (físicas e funcionais) identificadoras da raça. Além das condições naturais indispensáveis e obrigatórias existentes, das variáveis mais importantes desta equação foram mesmo o conceito padrão de raça que nasceu e foi enraizado pela população; e a gestão da introdução de sangues novos, voluntários – que acontece sempre em todas as raças, em ambiente natural -, ao longo do tempo, até chegarmos ao estalão rácio que temos hoje e que continua em permanente evolução. O cão Sabujo e o cão de Castro Laboreiro são duas raças totalmente distintas: têm dois estalões diferentes e individualizados e possuem características genéticas, morfológicas e funcionais que não admitem qualquer controvérsia ou mínimo erro de identificação – o que faz destas linhas um texto dispensável e obsoleto (conversa de surdos), que, espero assim o entendam, só por imperiosa necessidade me resignei escrever. É de todo desajustado e desnecessário, até seria pouco apropriado, estar aqui a cotejar os estalões. A genética, por sua vez, é temática que não admite intrometimento de leigos, por isso, deixo aos especialistas ou, então, o autor que demonstre em que medida “o cão de Soajo – o sabujo - é património genético (…) da autarquia municipal arcuense, por ser de Soajo”. Quanto às funções, nem sequer é preciso ser um curioso de canicultura, basta o bom senso para de imediato se constatar que o cão de Castro Laboreiro é um cão de guarda tipo mastim, enquanto que o Sabujo é um cão de caça, de faro por excelência, entre os melhores rastreadores, usado em matilha ou à trela para farejar rastos de odor ou sangue de caça grossa. É assim hoje e desde há centenas de anos. Por ventura, algum documento, inclusive os do Soajo, reconhecem melhor funcionalidade ao Sabujo? Só a aptidão para a caça grossa permitiu ao Sabujo o papel preponderante nos pergaminhos medievais e suscitou o interesse do poder monárquico, da nobreza, do clero e dos amantes da arte de caçar. Em contrapartida, quem se atreve a dizer que o Castro Laboreiro é ou alguma vez foi apreciado pelas suas aptidões de narizes? Todos aqueles que, minimamente, conhecem esta raça têm resposta pronta, que me escuso de repetir. As características do Sabujo, acompanhado dos pormenores de morfologia, do seu carácter criação, selecção, aprendizagem e tratamento que necessita, desde o nascimento até ao momento da morte, são assíduas em tratados ibéricos sobre caça (não raro, acompanhadas de iluminuras bem elucidativas). Mas fiquemos apenas pelo mais importante produzido em Portugal, o Livro da Montaria de D. João I. Jorge Lage refere este monumento medieval apenas para lhe incutir as palavras bífidas características do seu discurso – “o Livro da Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 5 Montaria, da autoria do insigne D. João I que, também aborda os sabujos, pelos vistos, devia ter incorporado os “cães de castro”, para satisfação dos defensores do nome errado!” – que pretendem persuadir à força de ameaça, mas acaba por ser vítimas do seu próprio veneno, uma vez que ele é o único que defende um nome errado (cão Sabujo do Soajo). Nem sequer se deu ao cuidado de reproduzir o que de mais relevante consta sobre o Sabujo, que o pudesse aproximar do Castro Laboreiro, está-se mesmo a ver porquê. O Livro da Montaria é bem claro quando diz,”os rostros deles seiam curtos, os laivos grandes, os olhos pequenos, e as sobrancelhas derribadas, e o toutuço da cabeça que seia levantado, e as orelhas longas, e grossas, e anchas, e os couros do papo descolgado, e a laã doce no sentido da maão”. No Castro Laboreiro, o rosto não pode ser curto; não têm as sobrancelhas derribadas; o occipital não pode ser saliente; os lábios não podem ser grandes; as orelhas do Castro são finas, não pode ser orelhudo, muito menos ter orelhas longas e anchas; a barbela (o estalão não a admite) a existir (resquícios) nunca pode ser descolgada. O rei da Boa Memória (1385-1433) acaba por escrever, de forma bastante técnica e muito pormenorizada, o mais incipiente estalão (conjunto de características raciais e funcionais) português do Sabujo medieval. Tem alguma coisa a ver com o Castro Laboreiro? Aliás, se o Castro Laboreiro se aproximasse, sequer, da funcionalidade do Sabujo descrito neste documento e fosse apto para caça grossa, em matilha ou à trela, as dezenas de matilhas (319 em 2009) de caça grossa registadas na Autoridade Florestal Nacional (AFN), que caçaram nas mais de 600 montarias realizadas em 2012 no país, teriam de ser formadas na quase totalidade com o cão de Castro e, obrigatoriamente teria que ser incluído no Grupo 6 da Fédération Cynologique International (FCI), quando é sabido que ele está, e bem, incluído no Grupo 2. Substituímos os cães das matilhas de caça grossa? Alteramos as regras de classificação seguidas pela FCI? Já ultrapassei os limites de espaço que gentilmente me concedeu a direcção deste periódico e da paciência dos leitores, de forma que seria fastidioso e demasiado prolixo continuar aqui a debater documento a documento e analisar autor a autor. No entanto, não posso deixar de chamar à colação mais uma forma dolosa e sem escrúpulos como Jorge Lage manipulou uma importante fonte documental, só para lograr os seus propósitos – são os argumentos que fundamentam as teses e não estas que fundamentam os argumentos, muito menos quando gravosamente adulterados. No último artigo de 2011 deixou expressamente consignado que “na primeira Exposição canina Internacional de Lisboa, realizada em 1908, até houve a participação de um sabujo com o nome «Soajo»”. Na verdade, nessa Exposição Canina de 1908 não participou nenhum animal de raça Sabujo, nem nenhum cão com o nome “Soajo”. Tentando apurar eventual equívoco, contactei o autor que persistiu na inverdade e me Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 6 afirmou categoricamente que a raça, “participou, em 1908, na primeira exposição internacional de Lisboa, com exposição de vários exemplares, um de entre os quais com o nome de «Soajo»”. Teria sido fácil creditar se o Catálogo original da referida Exposição não fizesse parte do meu espólio pessoal há muitos anos – além de poder ser consultado na Biblioteca Pública de Santarém. Posso afiançar com toda a segurança que em nenhum dos exemplares consultados consta a palavra “Sabujo” ou “Soajo”. Entre outros testemunhos, a Revista Ilustração Portuguesa do Jornal O Século, nº116 de 11 de Maio de 1908 também publica reportagem extensa, repito, sem constar qualquer menção à raça Sabujo ou a qualquer cão “Soajo”. Por outro lado, é certo que o cão de guarda de Castro Laboreiro foi uma das raças admitidas à Exposição na secção destinada a cães de guarda e defesa, na subsecção destinada a cães peninsulares. Infelizmente, não foi inscrito nenhum exemplar. Mas fica provado que em 1908 o Cão de Castro Laboreiro já é reconhecido oficialmente como raça autóctone, ao lado do Serra da Estrela, Rafeiro e Fila. Em 1908, tal como hoje, Sabujo em Portugal era uma figura de retórica. O evento, com mais de 350 cães (onde também estavam os melhores cães de caça de Portugal), foi organizado por Caçadores ilustres e fundadores de jornais e revistas de caça, muitos deles amigos pessoais da família real e companheiros de caçadas do Rei D. Carlos, assassinado em Fevereiro desse ano. O Presidente da Comissão Organizadora foi o Conde de Penha Garcia, Ministro do Estado e a mesma era constituída por 21 elementos, entre Condes e Viscondes e famosos caçadores de montaria, como o Dr. Henrique Anachoreta, no papel de Secretário-geral da Exposição. Um dos objectivos principais da Exposição era a fundação do Livro Genealógico dos Cães Peninsulares. Saliente-se que o Sabujo pago pelos soajeiros durante séculos a fio, obrigatoriamente desde 1514 até 1832 – na opinião fantasiosa de Lage, que desafiamos a que apresente pelo menos uma prova documental da entrega desses cães ao rei – não é referenciado em nenhuma fonte escrita desta Exposição, apesar de ter sido liderada pelos melhores conhecedores das raças caninas em Portugal, mas o Castro Laboreiro foi expressamente referenciado. Pois na alucinação de Jorge Lage consta apenas o Sabujo e um cão chamado Soajo. Como é possível? Nas diversas arrozadas, Jorge Lage não teve em conta os tratados de caça, não ousou desempoeirar um único documento do Arquivo da Montaria Mor do Reino e ignorou todos os inúmeros registos históricos do Castro Laboreiro, principalmente aqueles que são anteriores a Manuel Marques ou a Camilo Castelo Branco. Mesmo sem estalão oficial produzido em 1935 - o cão de Castro Laboreiro é reconhecido como raça de guarda pela Direcção Geral da Agricultura, Instituições do Ensino Superior (Ciências Agrárias e Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 7 Veterinária - Zootecnia), Exército Português, assim como pela população em geral. Existem registos oficiais pormenorizados de cães de Castro Laboreiro e fotografias com a legenda cão de guarda da raça Castro Laboreiro. São nomeados juízes oficiais da raça e foram realizadas Exposições Nacionais, Internacionais e Concursos da raça. São conhecidos escritos valiosos de Castrejos, jornalistas, turistas, escritores, intelectuais e historiadores. No primeiro Concurso conhecido no Solar da raça, julgado por um júri constituído conjuntamente por Castrejos de cerne e “por Leonel Carmona, subchefe de serviço na Direcção dos Serviços Pecuários do Norte, como presidente Domingos Correia de D´Assis, delegado de pecuária do distrito de Braga, no impedimento do delegado de pecuária no distrito de Viana do Castelo, ambos nomeados pela referida direcção”, ficou registado documento detalhado, precioso, para memória futura, “Acta do concurso de cães de guarda de Castro Laboreiro que teve lugar na referida freguesia em 18 de Outubro de 1914”. Termino com a ideia clara de que os cães de caça não tem um solar específico e plenamente convicto que só a experimentação genética, que consegue recuar a milhares de anos atrás com elevada segurança científica, poderá um dia contrariar esta ideia e consignar o Sabujo a um espaço geográfico restrito que possa ser identificado com o seu solar. Nada obsta a que isso venha a acontecer num futuro próximo, mas duvido que os marcadores apontem para o Soajo. Do que não tenho dúvida é de que nem um “milagre” genético consegue transformar um cão Sabujo num cão de Castro Laboreiro. Por isso e até lá as teses de Jorge Lage – que pretendem transformar o cão de Castro Laboreiro num famoso Sabujo, farejador-mor de caçadas medievais, o rei da montaria, guarda obrigatório das coutadas reais, vigilante dos palácios dos reis e acompanhante assíduo das mais insignes individualidades da História de Portugal, com o seu solar fixo entre as penedias do Soajo – não passam de conjecturas estéreis e gratuitas, destituídas de qualquer suporte científico ou base documental, que ninguém levará a sério. O que nada o impede de continuar a defender a sua “tese”, porque a liberdade de expressão (inclusive a do disparate) é um direito fundamental reconhecido pela Constituição da República Portuguesa. Eu fico por aqui, bem ciente de que não mudarei de opinião nem voltarei ao assunto com argumentação coligida em Corografias, enciclopédias, cartas de viscondes ou falácias da internet. Janeiro de 2013, Castro Laboreiro, Américo Rodrigues Considerando a resposta que o meu artigo suscitou, segue novo artigo, Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 8 Artigo publicitado no Jornal Noticias dos Arcos no dia 28 de Março de 2013. O «SABUJO PORTUGUÊS DO SOAJO» – Uma Nova Raça Canina Inventada por Jorge Lage Volto à liça, para que Jorge Lage se não possa engrandecer ou indevidamente valer do «qui tacet consentire videtur», ou seja, do velho aforismo jurídico de que «quem cala consente». E se, por um lado, aproveito o ensejo para deixar bem claro – de uma vez por todas – quem é o verdadeiro «mentiroso» nesta controvérsia Castro Laboreiro/Sabujo, por outro lado, sintome no dever de aclarar os sérios «equívocos, parcialidades, subjetividades, distorções e ocultações», o «rol de asneiras», as «enganadoras orientações» e a «confusão» (tudo acusações que Jorge Lage me dirige) que o meu artigo acabou por suscitar unicamente na cabeça de Jorge Lage. Propositadamente sublinho e repito, unicamente, porque ninguém de bom senso duvidará (nem os textos de Jorge Lage sequer as enfraqueceram, antes pelo contrário) das afirmações que fiz e aqui reitero com toda a convicção: (i) O solar do Sabujo nunca foi o Soajo; (ii) O cão de Castro Laboreiro não é e nunca foi um Sabujo. Se conhecia a documentação provatória da criação de Sabujos em muitas terras do reino, quase todos com datas anteriores às soajeiras, com que objectivo difundiu de forma enganadora, durante anos, que o Soajo era o solar do Sabujo? É o Castro Laboreiro o Sabujo de D. Afonso III, João I, Fernão Lopes ou Alexandre Herculano? Apresentou alguma prova que ateste que os Castros são os Sabujos conduzidos à trela por monteiros nos desenhos e pinturas dos Palácios de Vila Viçosa, Ajuda, Mafra, etc, conforme mail cominador que me fez chegar no início de 2013? Os derradeiros textos que apresentou como tentativa inútil de contraditório a essas afirmações destilam um tal desnorte do autor que chega ao ponto de criar uma nova raça canina portuguesa, só para poder manter a farsa que criou nos últimos anos. Por isso, com a mesma segurança e certeza assevero aqui que: (iii) O cão «Sabujo Português», «Sabujo do Soajo» ou «Sabujo Português do Soajo» é uma invenção idiota de Jorge Lage. Jorge Lage entendeu perfeitamente que «o cão Sabujo e o cão de Castro Laboreiro são duas raças totalmente distintas: têm dois estalões diferentes e individualizados e possuem características genéticas, morfológicas e funcionais que não admitem qualquer controvérsia ou mínimo erro de identificação». Para fazer face a esta realidade bem patente, que refuta todas as suas teses falaciosas, a imaginação pouco fértil de Jorge Lage engendrou uma nova raça canina a que resolveu apelidar de «cão do Soajo ou Sabujo Português» ou, melhor ainda, «Sabujo Português do Soajo», em Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 9 contraposição ao «Sabueso» – nem dá para acreditar!! Todos sabem que Sabueso ou Sabujo é a mesma palavra em duas línguas diferentes, mas raça Sabujo existe só e apenas uma – ao contrário do que pretende Lage, as fronteiras políticas e a língua oficial de cada Estado não criavam raças caninas à toa. É importante que fique bem claro que Lage sobre esta temática já publicou vários textos, dizendo sempre o mesmo, e NUNCA, até agora, diferenciou o cão do Soajo do Sabujo, antes pelo contrário, aproveitava cobiçosamente TODAS as referências documentais, históricas e literárias ao Sabujo numa tentativa vã de fundamentar a sua tese estéril e pacóvia de serem «cães vigilantes dos palácios dos reis e parques do reino durante sete séculos» – legenda que teve o desplante de colocar numa pretensa estátua ao Castro Laboreiro. A verdade é que (a não ser nos escritos de Jorge Lage) NUNCA e em lado NENHUM, até agora, apareceu escrito o nome de Sabujo Português do Soajo; e NUNCA nem NINGUÉM, até agora, ouviu falar do Sabujo Português do Soajo – está, assim, criada uma nova raça canina por inspiração profética. É claro que reconsiderarei tudo o que disse e penitenciar-me-ei perante todos se alguém conseguir apresentar um ÚNICO documento oficial válido em que, sem margem para falsas suspeita, esteja identificado o Sabujo Português do Soajo. E não posso deixar de salientar que todos os documentos que até à data se conhecem se referem apenas e exclusivamente ao Sabujo de caça, inclusive, os documentos do Soajo, Carta de D. João I e o foral de D. Manuel I. Em abono da verdade, é legítimo questionar porque é que D. João I, que «mandou defender», o Sabujo Português do Soajo, não lhe dedicou uma única palavra no Livro da Montaria e se limitou a descrever o Sabujo como cão de caça. Mais relevante ainda é que D. Manuel I, no famigerado foral do Soajo (1514), tenha imposto a entrega de «cinquo sabuJos feitos de monte», i. e., preparados para caçar – este é o único sentido da frase foralenga. Jorge Lage continua a escrever o que lhe apetece, «No Livro da Montaria diz-se que os mais corpulentos eram selecionados para correr e foram designados por «sabujos de correr». Estes eram os que corriam atrás dos javalis, ursos, etc., e com eles tinham de travar lutas violentas ao apanhá-los». Isto não está escrito no Livro da Montaria. O sabujo era tão corpulento que D. João I escreve vários parágrafos a esclarecer os monteiros como ensinar o Alão a evitar que não confunda o Sabujo com o porco, porque se o fizer não filha (agarra, morde) o porco e filha os Sabujos, principalmente quando «vem os sabujos muy juntos com ele» (o porco). Mais à frente, «O ensinamento dos sabujos todo esta em três cousas, em correr, em atrelar e em achar: e assi quando os monteiros quiserem a qualquer ensinar destas cousas algum sabujo, devem a fazer segundo o que cada um quiser ensinar: ca se quiserem ensinar o sabujo a correr, que é a mais pequena cousa destas três», mais à frente, «e se alguns monteiros quiserem saber porque é o cão grande e forte melhor para achar que os pequenos e fracos»; ou seja, é Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 10 exactamente o contrário do que afirma Lage; da raça, o mais forte era melhor para achar; correr no rasto da caça era o mais fácil de ensinar ao Sabujo. Escreve O de Boa Memória, os alãos são «como os fidalgos(…)os alaãos som a mais linda casta de caães, que todallas outras que Deus fez, e nos conhecemos»; Contradiz Lage em 2011, o Sabujo, «foi durante séculos a fio, o cão preferido pelos reis de Portugal!». Folheou alguma vez a obra do rei de Aljubarrota? Jorge Lage acaba por dar o dito por não dito ao admitir que todos os documentos e autores que ele exibiu como o passado glorioso do cão Sabujo Português do Soajo a guardar os palácios reais e as montarias e coutadas de Portugal (uma fantasia ridícula) afinal se referem ao Sabujo Ibérico. Caso contrário, que prove como é que se apura quais são os documentos escritos – não vale a pena estar a referir datas e localidades – bem como os (passo a citar) «eminentes cronistas, escritores e historiadores dos muitos séculos anteriores que imortalizaram o nome do cão, a que os soajeiros chamavam Sabujo, de que me permito destacar entre outros Fernão Lopes, Zurara, Rui de Pina, Garcia de Resende, Antero de Figueiredo, Eugénio de Andrade e Alexandre Herculano» que se referem ao Sabujo Ibérico e quais são os que se referem ao pretenso Sabujo Português do Soajo. Garanto-vos que todos esses documentos (inclusive os dois do Soajo) e autores referem o SABUJO e apenas o SABUJO (sem qualquer outro adjectivo ou determinativo – o adjectivo «Português» e o determinativo «do Soajo» é uma alucinação de Jorge Lage, exclusivamente plasmada nos seus textos) em contexto de caça – caros leitores, tirem conclusões sinceras e facilmente chegarão ao mentiroso. Se dúvida houvesse, a identificação mais patente do verdadeiro mentiroso surge com a notícia da Exposição Internacional de Lisboa em 1908. Apesar de já em texto anterior eu ter chamado a atenção para esta intrujice de Jorge Lage, não contente, vem agora dizer (passo a citar) que «Um sabujo chamado “Soajo” participou de facto na Exposição de Lisboa, mas Rodrigues nega porque não foi à Biblioteca Nacional como lhe recomendei, para se certificar dessa verdade!». Admiro-lhe a coragem – porque até para manter a posição de mentiroso é preciso ter coragem – e o papel de tutor – como se eu precisasse das suas orientações néscias na pesquisa das fontes primárias e verdadeiras!! Só há uma forma de resolver a questão e de todos apartarem, de uma vez por todas, quem é o MENTIROSO. Ditosamente, as novas tecnologias permitem-me resolver o problema da forma mais eficaz: disponibilizar a todo o público interessados o catálogo original com todos os cães que foram inscritos nessa Exposição (que, repito, faz parte do meu espólio pessoal). Os eventuais interessados podem, a partir de agora, consultar esse documento, de fio a pavio desde a capa até à contracapa, basta dirigir-me um mail. Caso seja solicitado poderei também disponibiliza-lo online. Do «Sabujo» e do «Soajo» absolutamente nada. Por isso, Jorge Lage falta pela terceira vez à verdade e vai continuar a Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 11 mentir porque não tem a humildade de confessar que urdiu o registo, sabendo de antemão a força que tal dado teria junto do público para credibilizar a sua tese falaciosa. Além das inverdades e das afirmações gratuitas nunca suportadas por qualquer acervo histórico idóneo, Lage, nunca é de fiar. Dou um exemplo dos mais inocentes. Em Novembro de 2001 escreveu sem qualquer pudor: «Não é em Castro Laboreiro que, actualmente, se encontram bons cães». Vejamos o texto completo do profº Manuel Marques (1935): «Não é em Castro Laboreiro que, actualmente, se encontram bons cães. Os lugares de Portos, Ameijoeira, Padrosoiro e Corbeira além de outros, tem-nos dos melhores, sobretudo o primeiro». Na frase transcrita ao amputar – propositadamente - a segunda parte do parágrafo do texto original, retirou todo o sentido ao conteúdo publicado pelo profº Manuel Marques. Para quem não sabe, os outros lugares mencionados são todos da freguesia de Castro Laboreiro. Nisto, adulterar, Lage é imbatível! Pegando de novo no aforismo dos «cães vigilantes dos palácios dos reis e parques do reino durante sete séculos», para além da estultice que a afirmação encerra no seu todo, Jorge Lage comete a maior asneira ao se referir aos palácios dos reis há mais de sete séculos. Ao arvorar-se em paladino da Verdade e da Justiça (é o próprio que várias vezes se autointitula) nem sequer sabe que o poder monárquico e a Corte são itinerantes durante todo o período medieval. Por outras palavras, Jorge Lage não sabe que na Idade Média os reis portugueses não tinham palácios, andavam de terra em terra, onde obrigatoriamente lhes era garantida a pousadia e alimentação. Envio ou coloco também na Web (para quem o solicitar) o Regimento da Montaria Mor de 1605 de Filipe II (distinto do Regimento dos Monteiros Mores dos lobos e mais bichos de 09-08-1549, em vigor até 1834), acervo que permitiu a Lage imaginar os cães do Soajo - rafeiros bastardos paridos entre as penedias do Soajo - como cães de caça grossa e vigilantes obrigatórios, durante séculos, em dezenas e dezenas de matas das Coutadas Reais de caça e mata na região centro do reino, em Lisboa, Colares, Queluz, Sintra, Arrábida, Palma, Pinheiro, Pêra, Comporta, Óbidos, Samora Correia, Pancas, Benavente, Salvaterra, Chamusca, Almeirim, Muja, Coruche, Pinheiro, Coimbra, Santarém, Alcobaça, Mafra, etc. Como é possível inventar e acreditar nisto? Nas cortes do Porto, de 1372, o clero de Entre Douro e Minho e Beira agravou-se ao rei, dizendo que os fidalgos levavam para os mosteiros «sabujos e allãos e outros cães e fazem lhes dar pam sem comto». Em 1402, o arcebispo de Braga determinou que as casas beneditinas e agostinhas da diocese não mais mantivessem «allãos, nem sabujos nem podengos nem outros cães». Em 1512, Mestre António, natural e morador da Vila de Guimarães na sua obra Provincia Dantre Douro he Minho, dá-nos conta das andanças de ócio (na caça) dos fidalgos da Comarca, «montados de todas veações e aues caçadeyras sciliset Açorees, fallcõaes, gaujãees, Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 12 ojas, he que há quãees de caçar coelho[s] librees, galgos, podemguos, aloães, sabuujos com que fidallgos he homens homrados da dita Comarqua pas[s]am tempo». Obviamente para Lage os Sabujos dos três registos não eram do Soajo, «Mas deve notar-se que para estes («senhores da nobreza»), os cães de Soajo não eram enviados. Apenas o foram, séculos a fio, enviados aos reis para serviços próprios e da Coroa Real!». Nos fraguedos do Soajo e na zona centro do reino havia uma praga de cães desta raça – na ficção de Lage, mas os nobres, do Sabujo Português do Soajo, nicles. Só mesmo num mundo acefálico! Comparar as Coutadas de caça (todas próximas de Lisboa) com Parques Naturais de países civilizados é no mínimo ardiloso; nestes locais salvaguardava-se a caça unicamente para usufruto do rei (ou quem ele licenciasse), ou seja, para a família real matar animais quando lhe apetecesse, espécies que rareavam no resto do território nacional (javali, veado, gamo, perdiz, lebre); todos os predadores nocivos à caça eram abatidos: lobo, raposa, etc. Nas Coutadas de caça só caçava a família real ou pessoas portadoras de licenças que eram atribuídas por origens sociais e profissão, onde estava descriminado a espécie a caçar, a técnica e os meios utilizados, se podia usar ou não arma de fogo e, se podia usar cão, com que tipo de raça. As licenças de caça maior eram um privilégio normalmente da nobreza. O Sabujo é uma das raças licenciadas no rol de documentos. No Arquivo da Montaria-Mor do Reino (1583-1833) onde Lage nunca buliu é possível encontrar correspondência quase diária do Monteiro Mor com as diversas Coutadas Reais (todas a Sul de Coimbra). Das maiores rábulas de Lage é a simples montaria de lobos do Soajo (igual a centenas em todo o país; no Alentejo de grande dimensão ainda no século XIX) e a mata de pinheiros de Aquiajos (ou de Soajo) que consta em 1605 nas matas da Montaria de Coimbra. Lage garante «que as grandes matas de pinhais de Soajo» fizeram parte das Coutadas Reais até à sua extinção no século XIX (1834). Escreve em 2010: «No regimento de 1605 claramente se constata que as grandes matas de pinhais de Soajo ficaram submetidas à supervisão do monteiro-mor da “Montaria da cidade de Coimbra” (que incluía também as matas do Botão, Lagarces, S. Lourenço e Salgueira, todas estas nas imediações da sede coimbrã), havendo nela vinte “monteiros pequenos”, sem se indicar quantos em Soajo, embora se diga que “todos os moradores de Soajo eram monteyros como sempre foram”. Porque houve protestos ou por qualquer outra razão com a restauração de Portugal a – “Montaria da Vila de Soajo” - voltou a ter autonomia, deixando de depender totalmente da de Coimbra, como o comprovam vários documentos, pois foram posteriormente nomeados sucessivos monteiros-mores para Soajo. Estes tomavam posse na câmara sedeada na Vila de Soajo, “cabeça da sua Montaria e Concelho”. ». Esperamos ad eternum uma publicação idónea de Lage sobre a Coutada Real do Soajo (?). No referido arquivo podemos obter informação pormenorizada. Por exemplo, a Vila de Melgaço tinha Monteiro Mor em 1800, nomeado pelo Monteiro Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 13 Mor do Reino com posse na Câmara Municipal de Melgaço. Outro, em 1647-03-01, António Rodrigues de Lima, recebe Cartas de Monteiro Mor, dos lobos e mais bichos da comarca de Ponte de Lima e, da Vila de Soajo. Adiante, porque não me sobeja o tempo, nem chegaria todo o espaço que este periódico arcuense me pudesse disponibilizar, para revelar os lapsus calami e banalidades de Lage, mas permitam-me plasmar mais um excerto da sua autoria, quando colocou o Castro Laboreiro no trem de caça de Afonso III, apesar de agora recusar os louros de rei da montaria e farejador mor para o inventado Sabujo do Soajo: «o “Regimento de D. Afonso III sobre caça”, documentado em 1261, mas nele não podem constar, ao lado dos podengos, os sabujos… porque, segundo descobridores do século XX, devem corrigi-lo, escrevendo: “os castro-laboreiro”! Quando D. Afonso III, vinha ao Soajo para caçar, ainda na primeira metade do século de 1201, trazendo os seus sabujos, os monteiros de Soajo apoiavam-no com mais sabujos, e ainda chifres de vacas (a servir de buzinas) e lanças (ascumas), às vezes desde o rio Douro». O sublinhado é meu, porque (1.º) D. Afonso III não escreveu nenhum regimento sobre caça e (2.º) nunca esteve no Soajo a caçar ou fazer o que quer que fosse; (3.º) o resto, é um disparate pegado que não merece comentário. Que fariam 10 cães de Castro juntamente com 4 Alões e 12 podengos no referido trem? Mas a sua iliteracia estende-se a outras áreas do conhecimento, como a cinologia, quando tenta justificar os genes de duas raças portuguesas (Rafeiro do Alentejo e Serra da Estrela de pêlo curto) e do Labrador: todas três descendentes do Sabujo do Soajo. Como é possível partir de premissas tão falsas? Não sabemos que leitura fez, mas temos a certeza que não entendeu o que leu – já avisamos que a Genética não admite entremetimento de leigos. Na verdade, os seus escritos não merecem resposta de ninguém minimamente conhecedor e rigoroso. Lage refere 3 ilustres, Aníbal, Caldas e Marques. Tudo o que lhe apetecer dizer sobre o meu conterrâneo padre Aníbal Rodrigues é digno de piedade. Em 1994, Eugénio de Castro Caldas na sua monografia Terras de Valdevez e Montaria do Soajo – obra sem obrigações históricas, referindo-se ao Soajo e ao tratado de montaria de D. João I, que não deve ter folheado (cita Gama Barros), arrisca: «Quantos aos sabujos afigura-se que a raça foi conservada apenas em Castro Laboreiro, onde mantém o que se afigura ser o seu «solar», assegurado por alguns criadores. O «solar» do Soajo perdeu-se sem pena nem glória, dando lugar a vulgares rafeiros». O ilustre Arcoense, afigurouse-lhe que o cão de Castro Laboreiro é o Sabujo medieval descrito por D. João I usado nas montarias do reino e registado no Foral do Soajo. Lage tem agora opinião contrária. Um dado indesmentível conhecido de todos e impossível de contornar registou Castro Caldas na sua “Memória” do século XX, no Soajo, nunca pariram cadelas de ventre - cadelos puros - de raça Castro Laboreiro. O desaparecimento dos dinossauros do Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 14 planeta terra é empresa mais fácil de tratar do que o sumiço de tais matriarcas da Vila do Soajo. O que levou o Arcoense a intuir que o Castro era o Sabujo de D. João I? Principalmente um erro iniciado há mais de três séculos, na obra de Carvalho da Costa. Não pretendo retirar quaisquer méritos a esta obra, sobretudo atendendo às condições e à época em que foi escrita (o alvará de autorização é de 1701, a compilação é anterior), mas é uma Corografia de todo o reino de Portugal e é como tal que tem que ser lida e aproveitada e, por outro lado, errare humanum est. O informador de Carvalho da Costa no Soajo ao fazer a súmula histórica dos documentos do concelho confundiu os rafeiros que guardam gado com os Sabujos que vinham referidos no Foral, «tem bons rafeiros, a que chamam sabujos, com que guardam os gados e pagam ao rei cinco cada ano». Nunca foi tarefa fácil encontrar um bom Alão, Sabujo, Galgo ou Podengo entre o povo. Os informantes de Carvalho da Costa normalmente vertiam toda a informação histórica que existia e por certo alguma fabulada. As cartas de confirmação de privilégios, referidas por Jorge Lage – também solicitadas a Filipe III, nada provam da entrega de cães de caça. Sempre que um rei subia ao trono por vezes os povos solicitavam a confirmação de alguns dos seus privilégios - que eram sempre confirmados. Publique Lage as provas idóneas da entrega de Sabujos. O informador de Castro Laboreiro bastante erudito, pelo conhecimento eclesiástico apresentado - entre erros e imprecisões, escreveu que, existiam «ovelhas galegas, grandes, e que davam o melhor burel de todo o Portugal». Isto não é minimamente sério. Este tipo de obras grandiosas – Corografias apresentam demasiados erros e não podem ser tábua para fazer história. É indispensável esgaravatar, comparar e discernir. Em 1873 surge uma nova obra que vai ter 12 volumes (o último publicado em 1890), ainda mais grandiosa e mais completa, Portugal Antigo e Moderno, de Pinho Leal. Jorge Lage com o seu construído teórico baseado nuclearmente na Corografia de Carvalho da Costa, fundeada nos dois documentos medievos já muito referidos, estranhamente, não escreve uma única linha sobre Pinho Leal em todos estes anos. Fê-lo agora porque percebeu que os ventos iam nessa direcção, mesmo assim preferiu o texto da Peneda como vamos ver. É fácil perceber porquê. Na verdade, o informador de Pinho Leal do Soajo apesar de trabalhar com a Corografia de Carvalho da Costa na cabeceira e ser conhecedor da documentação, não conhece os Sabujos nem o tributo de séculos aos reis, refere unicamente os cães de guardar gados. Diz mais, «Esta freguesia esta situada em paiz summamente aspero e desabrido na serra da Gabiarra, ou Gavieira, também denominada serra do Soajo, perto de Castro Laboreiro, e um dos ramos da serra do Marão.(Vide Gabiarra, Gavieira ou Peneda)». Lage nunca podia citar Leal. O informador de Castro Laboreiro, o reverendíssimo José Manuel Alves Salgado que também informa Pinho Leal sobre Correham Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 15 (neste tipo de obras um informante escreve sobre várias terras) e que várias vezes corrige a obra de Carvalho da Costa, continua a falar da fama das ovelhas, no entanto não esquece os cães e diz: «criam-se aqui mastins d´uma corpulência e vigor extraordinários, pois qualquer d´elles mata um lobo. Criados fora d´aqui degeneram inteiramente». O informador falava que os mastins degeneravam totalmente fora da freguesia e tinha razão (Lage no seu artigo amputou a palavra MASTINS e esta última parte), levar algum animal de Castro para qualquer terra – onde só havia rafeiros, pouco adiantava no apuramento da raça. Concluindo: os registos tão importantes a cães no Soajo (rafeiros de guardar rebanhos de ovelhas e cabras como havia em todas as terras) que Jorge Lage anuncia com pompa e circunstância do final do século XIX princípios do XX resumem-se aos textos e cópias de Carvalho da Costa e Pinho Leal em enciclopédias e dicionários. Todas as referências a sabujos no Soajo são vertidas da Corografia de Carvalho da Costa, reeditada em 1868. Entre muitas deturpações, em 1923, o Instituto de Coimbra, no seu volume 70, pág. 104., publicou um texto da autoria do professor Artur Magalhães Basto sobre “Usos e costumes raianos”, com o seguinte conteúdo: «Em Castro Laboreiro, segundo refere o Sr. Prof. Leite de Vasconcelos (…) Os homens usam chapéu de pano ou carapuça e varapau; trazem geralmente a capa rapada e vestem de Saragoça (jaqueta, calça e colete). Tratando desta região, não queremos deixar de fazer referência a certas curiosidades etnográficas do Soajo. Diz Pinho Leal que ainda no princípio do século XVIII, entre fraguedos e brenhas, aqui viviam tribus semi-selvagens, sem obediência às autoridades e cujo único tributo era o pagamento anual de cinco cães sabujos ao rei». Este fragmento é cópia do texto do informador fantasista da Peneda e não do Soajo. Este tipo de textos totalmente erróneos e difusos que o influente monárquico bracarense Visconde de Nespereira confessava que lera algures, são comunicados como sendo de Castro a Manuel Marques em 1935, que se deixou levar por esta falácia – o seu objectivo científico é fazer o estalão (como de facto o fez e bem) e não reconstruir o passado histórico do Castro Laboreiro. A partir daqui são vários os autores que cometem e até exageram o erro, com X ou sem X. Manuel Marques nunca escreveu a palavra Sabujo no estalão do Castro Laboreiro, desconhecia com toda a certeza Camilo e muito menos os documentos régios do Soajo. Questão muito diferente é a referência directa que Camilo Castelo Branco tributa ao Castro Laboreiro, de forma límpida e sem qualquer contágio do trabalho de Carvalho da Costa (de Sabujos) e muito menos em conspiração com arcuenses interessados em prejudicar o Soajo – esta última tese da conspiração é da autoria de Jorge Lage (só podia ser!). Lage só conhece esta referência de Camilo através de mim. Mas o que me incomoda seriamente é a forma como ele despreza e insulta uma das maiores personalidades da cultura e da Literatura portuguesas, que ao Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 16 longo da sua vida e na ampla obra que nos legou deixou sempre bem patente uma probidade à prova de qualquer suspeita – nisto Lage deveria ser chamado à pedra nos mesmos moldes e formalismos, que por tão infames e abjectos me dispenso de estar a reproduzir, que ele reclama sobretudo para Manuel Marques. Nem sei se o deveria fazer (ainda tenho presente a promessa de aqui não «desfiar os parcos dados monográficos sobre esta nobre raça canina da minha terra Natal»), mas em prol da verdade e defesa de Camilo (acusado em 1882), vou aqui revelar, em primeira mão, que outro autor do século XIX deixou inconcussa memória ao Castro Laboreiro: Arnaldo Gama, falecido em 1869, de grande preparação histórica, discípulo de Alexandre Herculano na construção de romances históricos, na sua obra O Satanás de Coura, entre outras passagens, «O cavaleiro, que capitaneava estes homens, cavalgava um magnífico e fogoso cavalo murzelo sem mancha, ao lado do qual trotava bizarramente um daqueles gigantescos e valentes cães de Castro Laboreiro, igualmente preto retinto, cuja grandeza faz apavorar os que pela primeira vez os vêem». Este romance inédito só viu a luz do dia em 2002. Mais um fantasma para a alma penada tentar denegrir porque fala expressamente no Castro Laboreiro e se esqueceu de mencionar o Sabujo (Português do Soajo). É óbvio que não vou gastar mais dados valiosos a combater uma tese estapafúrdia, no entanto dou a conhecer aos menos versados nestas prosas um dado histórico, já público, de todo irrefutável, José Leite Vasconcelos (1858-1941), que não encontrou tribus no Soajo, conhecedor insuspeito, além de cotejar Costa e Leal foi viajante a pé e de albarda em todas estas regiões, desde o século XIX (no Soajo em 1882 - pelo menos - na companhia de outra sumidade, Martins Sarmento (1833-1899)), o linguista, filólogo, arqueólogo e etnógrafo português não conheceu nenhuma raça de cães no Soajo, nem lhe deram conta dela, muito menos Sabujos, mas o Castro Laboreiro é raça inscrita na sua obra monumental. Foi também Camilo que enganou José Leite Vasconcelos? Os mapas e alguns autores colocavam e colocam a paróquia do Laboreiro - erradamente - na serra da Peneda ou na serra do Soajo, mesmo assim a raça foi sempre, mas sempre, conhecida pelo nome do seu Solar: Castro Laboreiro. Nunca li em nenhum acervo insuspeito cão da Peneda ou do Soajo. A um ou outro informador erróneo que misturava na mesma região, Castro Laboreiro e o Soajo, como o fez Artur Magalhães Basto, o compilador do estalão não comtemplou: Impropriamente. Em 1935, havia décadas, que a raça era reconhecida pelo Estado Português e pela Direcção Geral de Agricultura. Os cães de raça Castro Laboreiro já eram registados na Pecuária Nacional como tal. Que testemunhos têm Jorge Lage? Falácias e referências de lana-caprina! Voltando ao lapso dos textos difusos respigados por Manuel Marques e seguidores, eu próprio já alertei para este erro há mais de Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 17 uma década atrás, numa comunicação apresentada, no dia 29 de Junho de 2002, na Casa da Cultura de Melgaço, à II Palestra/Debate O Cão de Castro Laboreiro: O regresso às origens, diga-se, com a presença do padre Aníbal. Essa comunicação ficou resumida no periódico local Porto dos Cavaleiros (n.º2 de Julho 2002), donde me permito copiar apenas o seguinte: «(1.º) pagamento de 5 sabujos ao monarca era tributada aos monteiros de Soajo e não aos castrejos; (2.º) foram os mesmos monteiros de Soajo que se queixaram ao monarca dos importunos dos nobres galegos; (3.º) o cão de Castro Laboreiro não é o sabujo medieval». Se Lage tivesse o cuidado de atender ao que foi escrito há mais de uma década, já se teria apercebido que os seus textos são totalmente vazios de conteúdo e anda a combater moinhos do vento. A César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Estou plenamente convicto que ao Castro Laboreiro não devem (nem o Castro Laboreiro necessita) ser tributados os subsídios documentais do Sabujo – essa convicção já tem décadas e ainda bem que ficou um registo impresso, caso contrário, Lage viria agora dizer que me alumiou, como pretendeu fazer com o «apresentou Rodrigues um rol de documentos já conhecidos por mim». Por isso, na minha modesta opinião erraram todos os autores que, induzidos pela Corografia do P.e Carvalho da Costa, associaram os documentos do Soajo ao Castro Laboreiro. Entre tudo quanto escreveu até à data, esta é a única razão de Jorge Lage, mas, em vez de corrigir o erro, foi pior a emenda que o soneto. Se alguns autores do século XX cometeram o lapso de aproveitar os documentos do Soajo para o passado histórico do Castro Laboreiro, Lage não desfaz o equívoco, inverte a argumentação e – ABSURDO dos ABSURDOS – quer transformar o Castro Laboreiro num Sabujo – se Maomé não vai à montanha vem a montanha a Maomé. Daí a inventar o Sabujo Português do Soajo vai um pequeno passo. Só para que todos possam aferir a clara diferença que sempre separou o Rafeiro que o povo (não o rei e os nobres, saliente-se) usava para guardar a casa e o gado dos afamados cães Sabujo de caça, ficam aqui dois extractos documentais: começo por um do ano do foral do Soajo, em 1514 «aos lavradores e povo da vila de Santarém, privilégio para que na nova coutada de Almeirim não paguem coima os gados, bovino ou outro qualquer, de dia ou de noite; aos pastores são permitidas tendas, cães rafeiros, armas não sendo bestas»; o outro é próximo da tão apregoada (por Lage) confirmação dos privilégios de Soajo, o Alvará de 21 de Março de 1800, que legisla sobre as Reaes Coutadas e Montarias, no seu item XXI «Prohibo os cães sabujos nas Minhas Reaes Coutadas, e permito sómente os cães rafeiros para a guarda dos gados». Fazendo fé na tese ilusória de Lages, em 1800 o Castro Laboreiro era tão prejudicial para a caça que era necessário legislar especificamente contra a raça, pasme-se, em todas as Coutadas Reais. Os legisladores distinguem claramente, desde sempre, sem qualquer dúvida, o Sabujo daninho Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 18 para a caça dos cães rafeiros para a guarda dos gados dos pastores das Coutadas Reais. Mas a confusão criada principalmente pelo Visconde a Manuel Marques tem um motivo por trás, a proximidade geográfica entre Castro Laboreiro e Soajo. Apesar de Lage atacar ferozmente este autor e o seu trabalho, a verdade é que se serviu do mesmo argumento como pretenso cavalo de batalha para a sua tese bastante mais errada, quando afirma «seria “ouro” de mais, numa mesma região montanhosa aparecerem duas excelentes raças caninas diferentes!» ou então «Não por estultice, mas por falta de reflexão ou carência de bom senso, é que se aceitariam em montanhas pegadas duas tão especiais raças de cães!». Como? Nestas montanhas até hoje só foi reconhecida uma raça, o Castro Laboreiro, demais conviveram e continuam a conviver todo o tipo de cães. As duas terras históricas, Castro Laboreiro e o Soajo sempre foram países distantes em tudo. As cordilheiras montanhosas que separaram os homens, para o Castro Laboreiro foram o berço. Os rafeiros do Soajo, como os de muitas outras terras, nunca existiram em número nem em homogeneidade suficiente para serem reconhecidos como raça. Para termos uma raça, em condições naturais, têm de haver muitos cães do mesmo tipo, consanguinidade constante durante décadas, gestão consciente dos sangues novos introduzidos voluntariamente e, isolamento, só assim é possível fixar características. Por tal, a criação, preservação e a evolução de uma raça canina nas mãos do povo é tarefa hercúlea e improvável. No primeiro artigo publicado em 2010, Jorge Lage gaba-se de estar em 1961 com centenas de vacas a pastorear nos baldios de Castro, tal como nós fazíamos nos baldios galegos. Quantos cães havia a guardar? Os cães eram tão importantes que Lage não refere nenhum. Os pastores das vezeiras de vacas (por vezes assalariados) que podiam ficar dias no monte raramente tinham cão, quando existia, era rafeiro de pequeno ou médio porte. Centenas de vacas em Castro significavam dezenas de pegureiros e dezenas de cães. Escreve o memorialista de Parada do Monte em 1758, sobre os lobos e cães; sucede ver-se 6 e 7 juntos e ordinariamente 2 e 3, que «no tempo das neves andam de noite pelas portas dos principais plugares da freguesia e matam muitos cães e comem-nos». Se fosse por proximidade, as freguesias de montanha do concelho de Melgaço e principalmente as muitas aldeias galegas que rodeiam Castro, todas elas mais próximas e com mais fortes ligações históricas e de convívio a Castro Laboreiro do que o Soajo, têm mais legitimidade para relacionar os registos escritos dos seus cães de guardar com o Castro Laboreiro – que muitas vezes adquiriram. Os seus (des)conhecimentos do Castro Laboreiro não surpreendem ninguém! Lage só tem um Castro Laboreiro de granito – mas é um «monumento granítico, cujos minerais de rocha são de natureza geológica similar à das Montanhas de Soajo», orgulha-se ele! Por isso, estão plenamente justificados os seus (des)conhecimentos: com o seu cão Castro Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 19 Laboreiro/Sabujo Português do Soajo continuará ignorante para sempre sobre questões históricas, morfológicas e funcionais, etc…etc…assim, também se entende e fica justificado que nem sequer consiga distinguir um Sabujo de um Castro Laboreiro. Termino com a promessa de não voltar a este assunto e com a certeza de que, enquanto o Castro Laboreiro uivar à face da terra, pode Jorge Lage continuar a içar bandeiras, oferecer cães da minha Terra a Presidentes, fazer brasões de Sabujos de orelhas guitchas, escrever textos à Assembleia da República, mandar esculpir estátuas e vociferar calinadas nos periódicos locais que lho permitam, mas o solar do Castro Laboreiro foi, é e continuará a ser Castro Laboreiro. Foram os Crastejos - desde sempre - que decidiram quem era da Raça e quem era Rafeiro. FIM. 28 Março de 2013, Castro Laboreiro, Américo Rodrigues Américo Rodrigues, Fevereiro e Março de 2013 Página 20