denúncia n. 912079 - Governo de Minas Gerais

Transcrição

denúncia n. 912079 - Governo de Minas Gerais
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
DENÚNCIA N. 912079
fl. ___
Fls.
_______
Denunciante:
Jesyca Tacyane Rodrigues Silva
Denunciada:
Prefeitura Municipal de Araçuaí, 2014.
Referência:
Pregão Presencial n. 012/2014
Partes:
Armando Jardim Paixão (Prefeito Municipal) e Fabiano Tharcyus Carvalho
de Sá (Pregoeiro)
MPTC:
Marcílio Barenco Corrêa de Mello
RELATOR:
CONSELHEIRO SUBSTITUTO HAMILTON COELHO
_________
EMENTA
DENÚNCIA. PREFEITURA MUNICIPAL. REGISTRO DE PREÇOS. PREGÃO PARA
AQUISIÇÃO DE PNEUS E ACESSÓRIOS. IMPROCEDÊNCIA. EXIGÊNCIA DAS
ESPECIFICAÇÕES
TÉCNICAS.
REGULARIDADE
DO
PROCEDIMENTO.
RECOMENDAÇÃO.
1. As especificações técnicas não se confundem com os requisitos para habilitação, que são
limitados por meio da Lei n. 8.666/93. As especificações técnicas não estão arroladas em lei,
uma vez que decorrem da necessidade específica da Administração, caso a caso, não sendo
possível ao legislador prevê-las.
2. In casu, não há exigência de marca específica, o que é vedado, mas tão somente a indicação
de marca como referência para os licitantes das características dos bens a serem adquiridos,
sem qualquer restrição à aquisição de pneus importados ou de marcas distintas daquela
indicada, desde que possuam qualidade similar.
3. A exigência de pneus de primeira linha, novos de fábrica, não remoldados, não
recauchutados, não recobertos, não frisados ou recondicionados, com certificado do
INMETRO, atendendo a normas da ABNT e com garantia contra defeitos de fabricação, além
de propiciar maior segurança e continuidade aos serviços de transporte essenciais, mormente
os voltados para saúde, educação, transporte escolar e segurança pública, indispensáveis ao
desenvolvimento humano, não compromete a competitividade ou a ampla participação dos
interessados.
4. A vantajosidade envolve tanto o custo a ser arcado pela Administração quanto à prestação a
ser executada pelo particular, numa relação de custo-benefício, devendo ser examinada
segundo diversos aspectos além do econômico.
Segunda Câmara
2ª Sessão Ordinária - 11/02/2016
CONSELHEIRO SUBSTITUTO HAMILTON COELHO:
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
fl. ___
I – RELATÓRIO
Fls.
Tratam os presentes autos de denúncia formulada pela Sra. Jesyca Tacyane Rodrigues
Silva
_______
em face do Processo Licitatório n.º 022/2014, Pregão Presencial n.º 012/2014, da Prefeitura
_________
Municipal de Araçuai, cujo objeto é “o registro de preço para aquisição de pneus, câmaras,
protetores e aro de rodas para os veículos em atendimento ao Departamento de Apoio
Logístico da Prefeitura Municipal para manutenção do Transporte Escolar do Município”,
fl. 09.
Argumenta a denunciante que, no edital, reproduzido às fls. 08/37, consta irregularidade
referente à exigência pneu “com qualidade igual ou superior a 1ª linha do pneu Pirelli”, fl. 21,
que, em seu entendimento, direcionaria a aquisição para pneus da marca indicada, ou de
fabricação nacional, o que poderia restringir o certame e constituir ato contrário e atentatório
aos princípios da Administração Pública.
Recebida a denúncia, fl. 39, e distribuída à minha relatoria, fl. 40, determinei a oitiva prévia
dos responsáveis, que juntaram os documentos de fls. 46/51.
A unidade técnica manifestou-se, fls. 54/55, pela regularidade do edital quanto aos pontos
denunciados. Assim, concluiu pelo arquivamento do processo.
O Ministério Público junto ao Tribunal considerou irregular a exigência de produtos de
primeira linha, opinando pela citação dos responsáveis, fls. 57/59.
Em síntese, é o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Passo a apreciar as irregularidades denunciadas e apontadas pelo Parquet.
Exigência de que os pneus possuam qualidade igual ou superior à 1ª linha do pneu
Pirelli.
A denunciante argumenta que a referência à qualidade dos produtos da fabricante Pirelli
direciona o procedimento licitatório para a aquisição de produtos dessa marca, ou de
fabricação nacional, cerceando a participação de licitantes e fabricantes que comercializam ou
fabricam produtos distintos.
A unidade técnica ressaltou a possibilidade, já reconhecida por este Tribunal de Contas, de
indicação de marca em processo licitatório, desde que seguida da expressão “ou similar”, o
que equivaleria ao conteúdo do edital em comento, “com qualidade igual ou superior”, fl. 21.
Importante não olvidar que as especificações técnicas não se confundem com os requisitos
para habilitação, que são limitados por meio da Lei n.º 8.666/93. As especificações técnicas
não estão arroladas em lei, uma vez que decorrem da necessidade específica da
Administração, caso a caso, não sendo possível ao legislador prevê-las.
Com efeito, compulsando o edital, verifiquei não constar a exigência de marca específica, o
que é vedado, mas tão somente a indicação de marca como referência para os licitantes das
características dos bens a serem adquiridos. No caso em comento, não há qualquer restrição à
aquisição de pneus importados ou de marcas distintas da Pirelli, desde que possuam qualidade
similar. Por isso, acorde com a unidade técnica, considero regular a exigência de pneus com
qualidade igual ou superior ao Pirelli.
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
fl. ___
Quanto ao apontamento ministerial acerca da obrigatoriedade de que os pneus sejam de
primeira linha, vale destacar que a divisão entre pneus de primeira e segunda linha Fls.
é uma
peculiaridade do mercado, dicotomia que, para fins de especificação editalícia, não _______
configura
indicação de característica subjetiva, pelo contrário: todo fabricante e revendedor de
pneus
_________
tem ciência do significado das expressões “pneus de primeira linha” e “de segunda linha”.
Não há, portanto, risco de classificação ou desclassificação arbitrária de licitantes, por parte
da Administração, em razão da utilização de tais termos.
Entendo que a exigência de pneus de primeira linha, novos de fábrica, não remoldados, não
recauchutados, não recobertos, não frisados ou recondicionados, com certificado do
INMETRO, atendendo a normas da ABNT e com garantia contra defeitos de fabricação, além
de propiciar maior segurança e continuidade aos serviços de transporte essenciais, mormente
os voltados para saúde, educação e segurança pública, in casu, transporte escolar,
indispensáveis ao desenvolvimento humano, não compromete a competitividade ou a ampla
participação dos interessados.
Frise-se, também, que não há indício de que referidas especificações estariam direcionando o
certame para a aquisição de pneus fabricados no país, tal como alegado pela denunciante.
A propósito, muito embora os pneus de segunda linha sejam, em geral, mais baratos e
atendam aos requisitos mínimos de segurança para comercialização no país, sua durabilidade
é sabidamente menor, o que ocasiona maior produção de material descartável, e,
consequentemente, maiores impactos ambientais negativos.
Especialistas advertem ainda que a segurança propiciada por pneus de segunda linha é
consideravelmente inferior aos de primeira linha, pois, em razão da utilização de carcaças
mais simples, desenhos de banda de rodagem antigos, com profundidade menor de sulcos,
compostos de borracha alternativos (mais moles), processos de produção e balanceamento
menos apurados, sua aderência, desempenho dinâmico e conforto acústico são
comprometidos.
Portanto, não merece guarida a ilação de que, a fim de assegurar oportunidades idênticas a
todos os eventuais interessados, deve o órgão ou entidade abster-se de especificar critérios
adequados de qualidade e segurança para os produtos ou mercadorias almejados, razão pela
qual já propus, perante o Tribunal Pleno, nos autos do Recurso Ordinário n.º 896.534, que a
Cartilha deste Tribunal sobre o assunto, nesse particular, seja revista.
Nesse mesmo sentido as recentes decisões desta Corte de Contas nos Processos n.os 812.261,
952.076 e 944.666, nas quais se firmou a intelecção de que é lícita a exigência de pneus de
altos padrões de qualidade e segurança. Assim, afasto os apontamentos.
Não obstante, recomendo aos responsáveis que, nos próximos editais licitatórios, para a
escolha da melhor forma de contratação, dentro dos limites legais, resguardem a isonomia
entre os licitantes, a vantajosidade para a Administração e a sustentabilidade, a fim de cumprir
seu dever constitucional de preservação do meio ambiente, nos termos do art. 225 da
Constituição da República e do art. 3º da Lei n.º 8.666/93.
Destaque-se que a vantajosidade envolve tanto o custo a ser arcado pela Administração
quanto a prestação a ser executada pelo particular, numa relação de custo-benefício. Assim,
ela deve ser examinada segundo diversos aspectos além do econômico. Nesse sentido, leciona
Marçal Justen Filho:
“A vantagem caracteriza-se como a adequação e satisfação do interesse coletivo por via
da execução do contrato. [...]. A maior vantagem apresenta-se quando a Administração
assumir o dever de realizar a prestação menos onerosa e o particular se obrigar a realizar
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
fl. ___
a melhor e mais completa prestação” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de
Licitações e Contratos Administrativos, 15ª edição, São Paulo: Dialética, 2012. Pág. 61).
Fls.
_______
_________
Não se faz a licitação que se quer, mas aquela que a lei indica como mais favorável
ao
interesse da sociedade, e que, a teor do ordenamento vigente, só pode ser a que propicie
sustentabilidade também no serviço público, cabendo à autoridade gestora estimar os custos
direto e indireto do bem ou atividade objeto do contrato; levar em consideração, por exemplo,
a poluição ambiental por ele gerada; o consumo de energia por ele demandado; a despesa com
a manutenção; a matéria prima por ele incorporada na linha de produção, que não deve ser
perigosa ou nociva à saúde; os resíduos poluentes por ele gerados no decorrer de sua vida útil
e no seu descarte; que não se utilize de mão de obra informal, escrava, infantil ou condições
de trabalho legalmente indesejáveis; se incorpora tecnologia que reduz impacto ambiental etc.
Tão importante quanto atender à específica necessidade da Administração que venha a
motivar a abertura de procedimento licitatório é, com o advento da Lei n.º 12.349/10, buscar
sustentabilidade nas contratações de governo, esta voltada para a geração de emprego,
aumento da renda, e, sobretudo, redução de impactos negativos com o fim de preservar o
meio ambiente.
É dever legal do gestor público dar efetividade ambiental (art. 3º da Lei n.º 8.666/93) às
contratações públicas, em respeito ao princípio da proteção ao meio ambiente, inserto no art.
225 da Constituição do Brasil. Portanto, privilegiar bens fabricados e serviços prestados com
base em parâmetros que minimizem danos ambientais, exigindo, por exemplo, a logística
reversa prevista no inciso III do art. 33 da Lei n.º 12.305/10, é respeitar a Constituição, as
normas internacionais ratificadas e demais leis de proteção ambiental, contemplando, dessa
forma, interesse público primário.
III – CONCLUSÃO
Diante do exposto, considerando que não foram confirmadas as irregularidades apontadas
pela denunciante, manifesto-me, acorde com o órgão técnico, pela improcedência da
denúncia.
Não obstante, recomendo aos responsáveis que, nos próximos certames licitatórios, para a
escolha da melhor forma de contratação, dentro dos limites legais, resguardem a isonomia
entre os licitantes, a vantajosidade para a Administração e a sustentabilidade, a fim de cumprir
seu dever constitucional de preservação do meio ambiente, nos termos do art. 225 da
Constituição da República e do art. 3º da Lei n.º 8.666/93.
Intimem-se a denunciante e os denunciados desta decisão.
Findos os procedimentos pertinentes à espécie, arquive-se o processo, a teor do previsto no
inciso I do art. 176, regimental.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Exmos. Srs. Conselheiros da
Segunda Câmara, por unanimidade, na conformidade da Ata de Julgamento e diante das
razões expendidas na proposta de voto do Relator, em julgar improcedente a denúncia,
considerando que não foram confirmadas as irregularidades apontadas pela denunciante. Não
obstante, recomendam aos responsáveis que, nos próximos certames licitatórios, para a
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
fl. ___
escolha da melhor forma de contratação, dentro dos limites legais, resguardem a isonomia
entre os licitantes, a vantajosidade para a Administração e a sustentabilidade, a fim de cumprir
Fls.
seu dever constitucional de preservação do meio ambiente, nos termos do art.
225
da
_______
Constituição da República e do art. 3º da Lei n. 8.666/93. Intimem-se a denunciante
e os
_________
denunciados desta decisão. Findos os procedimentos pertinentes à espécie, arquive-se o
processo.
Votaram, nos termos acima, o Conselheiro José Alves Viana, o Conselheiro Gilberto Diniz e
o Conselheiro Presidente Wanderley Ávila.
Presente à Sessão a Subprocuradora-Geral Elke Andrade Soares de Moura.
Plenário Governador Milton Campos, 11 de fevereiro de 2016.
WANDERLEY ÁVILA
Presidente
HAMILTON COELHO
Relator
(assinado eletronicamente)
ahw/rrma/RB
CERTIDÃO
Certifico que a Súmula desse Acórdão foi
disponibilizada no Diário Oficial de Contas
de ___/___/______, para ciência das partes.
Tribunal de Contas, ___/___/_____.
_________________________________
Coordenadoria de Taquigrafia e Acórdão