- No mestrado em Ciências Sociais da UFMA

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- No mestrado em Ciências Sociais da UFMA
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
DAYANA DOS SANTOS DELMIRO COSTA
MULHERES E ESPECIALIZAÇÃO POLÍTICA: trajetórias e recursos eleitorais entre
as deputadas federais/estaduais no Maranhão.
São Luís-MA
2009
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DAYANA DOS SANTOS DELMIRO COSTA
MULHERES E ESPECIALIZAÇÃO POLÍTICA: trajetórias e recursos eleitorais entre
as deputadas federais/estaduais no Maranhão.
Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais apresentada
ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Universidade Federal do Maranhão para defesa pública.
Orientador: Prof. Dr. Igor Gastal Grill
São Luís- MA
2009
3
Costa, Dayana dos Santos Delmiro.
Mulheres e especialização política: trajetórias e recursos eleitorais entre as
deputadas federais/estaduais do Maranhão/ Dayana dos Santos Delmiro
Costa- São Luís, 2009.
182f.
Impresso por computador (fotocópia)
Orientador: Igor Gastal Grill
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Maranhão,
Mestrado em Ciências Sociais, 2009.
1. Mulheres – Política – Maranhão 2. Mulheres – Profissionalização
política 3. Gênero – Recursos eleitorais I. Título
CDU 396.9 (812.1)
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DAYANA DOS SANTOS DELMIRO COSTA
Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais apresentada
ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Universidade Federal do Maranhão para defesa pública.
Aprovada em _____/_____/_____
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Prof. Dr. Igor Gastal Grill (Orientador)
Doutor em Ciência Política
Universidade Federal do Maranhão
____________________________________________
Profª. Drª. Karina Kuschnir
Doutora em Antropologia Social
Universidade Federal do Rio de Janeiro
____________________________________________
Prfª. Drª Arleth dos Santos Borges
Doutora em Ciência Política
Universidade Federal do Maranhão
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AGRADECIMENTOS
“Como o não sabes ainda
Agradecer é mistério”
Fernando Pessoa, Quadras ao Gosto Popular
Ao finalizar este trabalho, gostaria de tecer alguns agradecimentos, não como apregoam
os ditames formais da academia, mas de pincelar sentidos, relações, momentos, que
possibilitaram a construção desta dissertação. Antes, devo contar que, durante as atividades no
mestrado, houve objetivos que vislumbrei, mas que não foi possível alcançá-los. Esses
percalços, longe de obscurecerem o trajeto, aumentaram-lhe o brilho. E, ao invés de me
deterem, impulsionaram-me com mais força. Por isso afirmo com convicção, essa caminhada
valeu a pena!
Agradeço a Deus, por sempre me iluminar e me guiar. Sem Ele nada disso seria
possível.
Gostaria de destacar o papel desempenhado neste trajeto pelo meu orientador, o prof.
Dr. Igor Gastal Grill. Agradeço pela exigência crescente, pelos desafios cada vez mais
complexos que me eram apresentados e pelo tempo disponibilizado nas discussões e
correções desse trabalho. Sem falar na paciência em entender uma orientanda
demasiadamente ansiosa, obrigada mesmo!
Aos professores do Programa de Pós- Graduação em Ciências Sociais da UFMA, em
especial prof. Horácio Antunes que, como coordenador do Programa, sempre se colocou à
disposição nas resoluções de questões burocráticas durante minhas atividades de pesquisa.
Prof. Biné pelos comentários e sugestões nas aulas de métodos e na banca de qualificação. E o
prof. Carlão, meu pai acadêmico, pelo estímulo de sempre.
À profª. Arleth Borges, que tem acompanhado meu desempenho desde a graduação,
agradeço pelas valiosas considerações na banca de qualificação e por ter aceitado compor a
banca de defesa dessa dissertação.
À profª. Ilse Gomes, do Departamento de Sociologia e Antropologia da UFMA, minha
mãe na academia, pelo incentivo e pelas muitas razões que ela bem sabe.
À profª. Karina Kuschnir, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, pela
atenção dedicada nas respostas dos e-mails que enviava desde o início de minha pesquisa.
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Pela oportunidade que me concedeu em participar das atividades do Laboratório de
Antropologia Urbana e discutir parte desse trabalho com suas orientandas, para mim foi um
momento de trocas enriquecedoras, um verdadeiro aprendizado. Agradeço também por ter
aceitado o convite em participar da banca.
Aos meus colegas de mestrado, nunca me esqueci do bolo partilhado em meu aniversário
no primeiro dia de aula, pelo convívio diário nos estudos, pelos desabafos nas preparações dos
artigos e dissertação. Muito especialmente a Lenir e Antônio Marcos, presentes em minha
vida desde a graduação, na verdade, qualquer palavra mencionada aqui em relação a essa
amizade ficaria muito aquém do justo. E Elthon Aragão, pelos empréstimos de livros, pelos
muitos diálogos sobre a pesquisa. À Maria Tereza, por facilitar o acesso e participar de
entrevista com uma deputada.
Aos funcionários da Assembléia Legislativa com que pude contar no acesso às
informações durante meu trabalho de campo, agradeço Srª. Iracema, chefe do setor de
cadastro parlamentar, Srª. Rosália, bibliotecária e o Sr. Braulio Martins, secretário-geral da
Mesa Diretora. Agradeço também todas as deputadas que concederam entrevista.
Agradeço a Srª. Sara Aguiar do Departamento de Estatísticas do TRE-MA
Ao Sr. Cesário e Srª. Léa Dias, por abrirem as portas de sua casa e me hospedarem,
durante os dias em que estive pesquisando no município de Lago da Pedra.
À turma dos alunos de graduação do Curso de Ciências Sociais em que tive a
oportunidade de realizar meu estágio docência, pelas discussões e trocas em sala de aula sobre
métodos e etapas dessa pesquisa. Em especial João Gilberto, Vinícius, Franklin, Romário,
Anderson, Adriana, Clícia, Rafael Dantas e Reinaldo.
À Natália e Thiago Lima, pela força e incentivo.
À Capes\Cnpq , pela bolsa concedida.
Aos meus familiares que torceram e me apoiaram. Meus pais, Miro e Adelina, pelas
palavras de esperança sempre mencionadas.
E ao Flávio, que por vezes deve ter detestado este trabalho, pois ele sacrificou muitos
momentos que poderíamos ter desfrutado juntos. Obrigada pela seleção e padronização das
imagens e pela editoração gráfica da capa desta dissertação. Suas cobranças acabaram
servindo de estímulo para que eu concluísse, sem demora, mais esta etapa da vida que vamos
construindo juntos. Nêgo te amo!
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Há muito mais a quem agradecer... a todos que, embora não nomeados, contribuíram
de alguma forma na construção desse texto, o meu reconhecido e carinhoso muito obrigada!
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RESUMO
Esta dissertação analisa a dinâmica de constituição das diferentes estruturas e volumes de
capitais das mulheres maranhenses na política, pelo levantamento de informações sobre as
origens sociais e carreiras políticas das deputadas federais/estaduais eleitas no Maranhão entre
1982 a 2006. Busquei identificar variáveis sociais que me permitissem perceber quais os
recursos acumulados por essas mulheres ao longo do processo de especialização política,
como foi desenvolvido o ‗trabalho político‘ na busca pelo reconhecimento dos profanos.
Procurei ainda destacar por meio dos relatos das deputadas quais são suas representações
sobre fazer ‗política‘ e suas concepções sobre a questão de ‗gênero‘ na política. Por último,
numa perspectiva mais antropológica, faço uma análise do ‗gênero‘ como afirmação de uma
identidade estratégica, assim como o acionamento de outros recursos nas lutas eleitorais por
uma mulher maranhense em campanha. Considerei o significado das adesões eleitorais de
alguns agentes entrevistados na campanha municipal de 2008 no município de Lago da PedraMA.
Palavras-chave: Profissionalização política. Trajetórias. Gênero. Recursos eleitorais.
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RÉSUMÉ
Cette dissertation analyse la dynamique de constitution des différentes structures et les
volumes de capitaux des femmes maranhenses dans la politique, à travers l'enquête
d'informations sur les origines sociales, parcours et carrières politiques des députés
fédéraux/de l'état élus dans le Maranhão entre 1982 à 2006. J'ai cherché identifier des
variables sociales qui me permettaient de percevoir lequel les ressources accumulées par ces
femmes au long du processus de spécialisation politique, comme celles-ci ont développé la
‗travail político‘dans la recherche par la reconnaissance des profanes. J'ai cherché encore à
détacher à travers les histoires des députés lequel sont leurs représentations sur faire
‗política‘et leurs conceptions sur la question de ‗genre‘ dans la politique. Finalement, dans
une perspective plus anthropologique, je fais une analyse de genre mange affirmation d'une
identité stratégique, ainsi que la commande d'autres ressources dans les luttes électorales pour
une femme maranhense en campagne. J'ai considere la signification des adhésions électorales
de quelques agents interviewées en la campagne municipale de 2008 dans la ville de Lago da
Pedra-MA
Mots-clés: Professionnalisation politique. Trajectoires. Genre. Ressources électoraux.
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LISTA DE SIGLAS
AL- Assembléia Legislativa
ARENA- Aliança Renovadora Nacional
BEM- Banco do Estado do Maranhão
CEMAR- Companhia Energética do Maranhão
CFEMEA- Centro Feminista de Estudos e Assessoria
DEM- Democratas
IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPU- Inter-Parliamentary Union
ONU- Organização das Nações Unidas
PDC- Partido Democrata Cristão
PDS- Partido Democrático Social
PFL- Partido da Frente Liberal
PT- Partido dos Trabalhadores
PTN- Partido Trabalhista Nacional
PSDB- Partido da Social Democracia Brasileira
PC do B- Partido Comunista do Brasil
PMDB- Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PL- Partido Liberal
PDT- Partido Democrático Trabalhista
PSOL- Partido Socialismo e Liberdade
PP- Partido Progressista
PR- Partido da República
TRE- Tribunal Regional Eleitoral
TSE- Tribunal Superior Eleitoral
UDN- União Democrática Nacional
UFMA- Universidade Federal do Maranhão
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LISTA DE QUADROS
Quadro1- Representação parlamentar de mulheres no Brasil e no cenário internacional
................................................................................................................................................. 34
Quadro2- Representação feminina no parlamento conforme as regiões do mundo- 2006
................................................................................................................................................ 34
Quadro 3- Os 20 países onde as mulheres representam pelo menos 30% na Câmara Única ou
Baixa do Parlamento- ano 2005 ............................................................................................ 38
Quadro 4- Países que têm uma mulher como Chefe de Estado ou de Governo-2006
.................................................................................................................................................. 39
Quadro 5- Mulheres eleitas deputadas federais no Maranhão (1982-2006)......................... 56
Quadro 6- Quadro sinótico dos percursos das deputadas federais no Maranhão (1982-2006)
............................................................................................................................................... 58
Quadro 7- Cargo eletivo anterior das deputadas federais no Brasil ...................................... 60
Quadro 8- Participação das deputadas federais maranhenses nas comissões......................... 66
Quadro 9- Participação das deputadas federais nas comissões (2003 a 2006)....................... 69
Quadro 10- Mulheres eleitas deputadas estaduais no Maranhão (1982-2006)....................... 88
Quadro 11- Quadro sinótico dos percursos das deputadas estaduais no Maranhão (19822006) ...................................................................................................................................... 90
Quadro 12- Idade de ingresso no primeiro cargo eletivo entre as deputadas estaduais no
Maranhão ..............................................................................................................................102
Quadro 13- Deputadas estaduais eleitas no Maranhão com mais de um mandato (1982-2006)
...............................................................................................................................................104
Quadro 14- Participação das deputadas estaduais nas comissões........................................ 106
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1- Fotos da atuação profissional de Cleide Coutinho no município de Caxias... 97
Ilustração 2- Edson Vidigal e Alexandre Costa visitando o Hospital administrado pelos
Coutinho ................................................................................................................................. 99
Ilustração 3- Material de campanha de Cleide Coutinho pra deputada estadual em 2006.
................................................................................................................................................ 100
Ilustração 4- Capa do cd do relatório de atividades de Helena Heluy- 2007....................... 101
Ilustração 5- Escritório da Família Jorge de Atendimento aos moradores de Lago da Pedra
............................................................................................................................................... 115
Ilustração 6- Entrada do Sistema de Comunicação Waldir Jorge....................................... 116
Ilustração 7- Atendimento aos eleitores na residência da família Jorge em Lago da Pedra
................................................................................................................................................ 116
Ilustração 8- Foto do Waldir Filho no restaurante da apoiadora de campanha................... 145
Ilustração 9- Maura Jorge no centro de sua equipe de campanha recebendo algumas
orientações............................................................................................................................. 148
Ilustração 10- Candidato a vereador Marcão e Maura Jorge visitando uma moradora do
Cajueiro ................................................................................................................................ 149
Ilustração 11- Mudança de cartaz na fachada de uma residência do Cajueiro .................... 149
Ilustração 12- Maura Jorge e pequeno comerciante no Cajueiro ........................................ 151
Ilustração 13- Porta- retrato na casa de uma eleitora (de saia azul) com mãe da Maura
Jorge...................................................................................................................................... 151
Ilustração 14- Manifestantes chegando no ―
Alto do Waldir‖.............................................. 153
Ilustração 15- Eleitores subindo no trio elétrico .............................................................. 153
Ilustração 16- Inicio do trajeto pelas ruas de Lago da Pedra ............................................ 154
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Ilustração 17- Candidata Maura Jorge no jantar discursando para os agentes de saúde
............................................................................................................................................... 161
Ilustração 18- organização do palanque para o culto em comemoração a vitória de Maura
Jorge ...................................................................................................................................... 165
Ilustração 19- O símbolo da pomba no culto em ações de graça de Maura Jorge............ 165
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SUMÁRIO
1-INTRODUÇÃO - RETOQUES SUCESSIVOS: caminhos na construção de um
objeto..................................................................................................................................... 16
1.1 A Política como Atividade Profissional: aprendizagem de um saber específico e
demarcação em relação aos profanos................................................................................... 22
1.2 Trabalho de campo.......................................................................................................... 26
Capítulo 2- A CONQUISTA DOS DIREITOS DE CIDADANIA E MULHERES NA
POLÍTICA: um breve retrospecto e algumas comparações.............................................. 29
2.1 Cidadania.......................................................................................................................... 29
2.2Mulheres
no
Parlamento:
direito
de
votar
e
serem
votadas
.................................................................................................................................................. 31
2.3 Mulheres na Arena Política Brasileira.......................................................................... 39
2.4 Política de Cotas para Mulheres..................................................................................... 42
Capítulo 3- TRAJETÓRIAS DAS DEPUTADAS FEDERAIS E ESTADUAIS NO
MARANHÃO: recursos sociais e mecanismos de legitimidade política..........................47
3.1 O Maranhão pós- década de 80: alguns marcos políticos........................................... 47
3.2 Gênero e Profissionalização política no Maranhão.................................................... 53
3.3 Deputadas Federais Maranhenses: percursos e comparações................................... 55
3.4 O espaço de concorrência política a partir das representações dos agentes
............................................................................................................................................. 69
3.5 De ―
companheira de militância‖ a deputada federal.................................................. 77
3.6 Deputadas Estaduais no Maranhão............................................................................. ..87
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Capítulo 4 – MULHER MARANHENSE EM CAMPANHA ELEITORAL: de deputada
a prefeita de Lago da Pedra................................................................................................ 110
4.1 Tornando-se herdeira política...................................................................................... 112
4.2 A campanha de 2006.................................................................................................... 122
4.3 Rumo à prefeitura de Lago da Pedra: a campanha de 2008 ................................... 130
4.3.1 Os cabos eleitorais: significados de adesões em Lago da Pedra............................... 133
4.3.2 A comerciante-vereadora.......................................................................................... 134
4.3.3 O presidente do SINPROESEMA............................................................................ 136
4.3.4 O bancário................................................................................................................ 138
4.3.5 O líder religioso católico........................................................................................... 147
4.3.6 A líder evangélica e dona de restaurante ................................................................. 141
4.4 Os atos de campanha em 2008 .................................................................................. 145
4.4.1 visitas, ‗poeirão‘ e o comício .................................................................................... 146
4.4.2 O jantar com agentes de saúde ................................................................................ 158
4.4.3 Comemorando o resultado: culto e forró na praça.................................................... 164
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 169
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 172
ANEXO.............................................................................................................................. 177
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INTRODUÇÃO
1- RETOQUES SUCESSIVOS: caminhos na construção de um objeto.
(...)diante do mistério do real, a alma não pode, por decreto, tornar-se ingênua. É
impossível anular, de um só golpe, todos os conhecimentos habituais. Diante
do real, aquilo que cremos saber com clareza ofusca o que deveríamos saber.
(BACHELARD, 1996:.18, grifos meus).
Escolhi iniciar esse texto com Bachelard (1996) porque considero imprescindível fazer
referência à noção de obstáculo epistemológico, para refletir sobre meus percursos e
deslocamentos nessa tarefa singularmente complexa de se fazer pesquisa em Ciências Sociais.
Enquanto nas ciências físicas e naturais os objetos não falam e pode-se identificar de forma
clara uma fronteira entre pesquisador e objeto, nas ciências sociais estes se confundem, por
serem ambos partes da sociedade. Como ressalta Louis Pinto (1998:13) “O sociólogo deve
levar em consideração o fato de que faz parte do mundo social que pretende descrever e
compreender”. É imperioso, para mim, considerar que, no escopo de uma investigação em
Ciências Sociais, existem desafios que impõem ao pesquisador a necessidade de ultrapassar os
pré-construídos. É aqui que retomo a noção de obstáculo epistemológico de Bachelard (1996),
cuja opinião aparece como obstáculo a ser superado pelo pesquisador. Segundo Bachelard
(1996), o pesquisador, ao olhar seu objeto de estudo, pode incorrer no perigo de se deixar
levar pelas primeiras impressões. Nas palavras do autor:
A opinião pensa mal; não pensa, traduz necessidades em conhecimentos. Ao
designar os objetos pela utilidade, ela se impede de conhecê-los. Não se pode
basear nada na opinião: antes de tudo é preciso destruí-la. Ela é o primeiro
obstáculo a ser superado. (BACHELARD, 1996:18)
Bourdieu (1999) também adverte sobre as pré-noções como obstáculo epistemológico
na atividade de pesquisa em Ciências Sociais. Bourdieu (1999) propõe a vigilância
epistemológica.
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A vigilância epistemológica impõe-se, particularmente, no caso das ciências do
homem nas quais a separação entre a opinião comum e o discurso científico é
mais imprecisa do que alhures [...] a familiaridade do universo social constitui,
para o sociólogo, o obstáculo epistemológico por excelência [...] O sociólogo
nunca conseguirá acabar com a sociologia espontânea e deve se impor uma
polêmica incessante contra as evidências ofuscantes que proporcionam, sem
grandes esforços, a ilusão do saber imediato e de sua riqueza insuperável.
(BOURDIEU, 1999:23).
Remi Lenoir (1996) aponta com precisão a dificuldade da tarefa de afastamento das
pré-noções, por estas se tornarem banais e evidentes. Destaca Lenoir (1996):
A primeira dificuldade encontrada pelo sociólogo deve-se ao fato de estar diante
das representações preestabelecidas de seu objeto de estudo que induzem a
maneira de apreendê-lo e, por isso mesmo, defini-lo e concebê-lo (...). Entre
essas representações, a que aparece sob a forma de um ―
problema social‖
constitui, talvez, um dos obstáculos mais difíceis de ser superado. (LENOIR,
1996:61-62)
Foi seguindo as diretrizes apontadas por esses autores, que tentei fazer, antes de tudo,
um exercício de elaborar perguntas, construir dúvidas sobre a participação das mulheres na
política maranhense. Busquei me afastar da tendência de incorporar esquemas de
pensamentos habituais. Não queria fazer uma pesquisa apologética sobre a necessidade de
uma maior participação das mulheres no parlamento, tornada óbvia por argumentos de ordem
numérica. Apesar da preocupação em trazer reflexões sobre a baixa participação feminina na
elite política, tive o cuidado de não assumir o papel de pesquisador porta-voz. Objetivei
aprofundar a compreensão sobre as relações entre gênero e política no Maranhão, iniciada
desde a graduação1, tentando não ficar presa, de maneira doutrinária, a axiomas
preestabelecidos ou a uma ideologia ―
feminista‖.
Além da experiência de pesquisa na graduação e do anseio por um estudo não engajado
nas questões ―
feministas‖, a exposição de um terceiro fator que me levou a iniciar essa
investigação talvez possa esclarecer ao leitor os caminhos que ela veio a tomar. Um mês após
minha defesa de monografia, tive a oportunidade de participar do minicurso Análise das Elites
Políticas2, e dentre os referenciais de análise que tive acesso me chamou atenção os estudos
Desenvolvi, como bolsista de iniciação científica, uma pesquisa que buscava identificar em que medida a
condição feminina foi acionada enquanto estratégia discursiva para o fortalecimento da legitimidade de Roseana
Sarney no Maranhão. Resultando em meu trabalho monográfico: Delmiro (2006).
1
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sobre especialização política, trajetórias, lideranças e redes, me motivando a participar das
reuniões do grupo de estudo sobre elites políticas. Foi por meio dessas reuniões que tive a
oportunidade de aprofundar as leituras dos novos autores3 que me foram apresentados no
referido minicurso, estas me auxiliaram na construção do eixo estruturante dessa pesquisa,
escolhi fazer um estudo sobre profissionalização política no Maranhão sob um recorte de
gênero.
Assim, saltando-se de uma evidência sobre a importância da participação das mulheres
na política, devido a estas terem uma presença ainda pouco expressiva nesse espaço,
pergunto: diante das dificuldades que as mulheres enfrentam para adentrar no parlamento as
que conseguiram ser eleitas na política maranhense utilizaram quais trunfos para obter êxito?
Eis, portanto, o que me interessava identificar, as estratégias de reconversão4 de bases sociais
(parentesco, títulos, exercício profissional, liderança prévia, cargos públicos) em bases
eleitorais. Então mais do que refletir sobre os motivos da supremacia masculina no âmbito
parlamentar, o eixo de minha análise centra-se principalmente na tentativa de contribuir para
o entendimento da dinâmica da profissionalização política no Maranhão.
As limitações inerentes a uma pesquisa de mestrado impunham um recorte. Delimitei o
estudo sobre as diferentes trajetórias das mulheres na política maranhense apenas ao cargo de
deputada federal e estadual. Todavia, havia, ainda, uma necessidade de um recorte temporal,
decidi, então, delimitar o estudo a partir da década de 1980 - período em que o Brasil começa
a passar pelo processo de redemocratização – até as deputadas que foram eleitas em 2006.
Analiso as variações na composição da ―
elite política‖ ao longo do tempo, buscando comparar
a mobilização de recursos sociais entre mulheres eleitas em diferentes momentos no
Maranhão.
Fez parte da programação dos 20 anos do curso de Ciências Sociais na UFMA. O professor Igor Grill
apresentou as diferentes concepções de autores ―
clássicos‖ da teoria das elites (Mosca (1939); Pareto (1935);
Michels (1958); Mills (1981); Dahl (1964); Schumpeter (1961) e propostas metodológicas de se trabalhar com o
tema, na perspectiva de autores mais contemporâneos (Grynspan (1990); Bourdieu (1989), dentre outros).
2
Na graduação ainda não havia tido contato com autores que deram ênfase em seus estudos tanto à
especialização política, tais como Offerlé (1996, 1999), Phelippeau (2001) e Lagroye (1994), como os autores
que privilegiaram uma abordagem mais antropológica da política, tais como Mayer (1987), Landé (1977),
Kuschnir (2000), Bezerra (1999), dentre outros.
3
4
Bourdieu (1979:146) refere-se às reconversões como: ―
deslocamentos transversais, que supõe a passagem a um
outro campo, através da reconversão de uma espécie de capital numa outra ou numa subespécie de capital
econômico ou capital cultural em uma outra (...), portanto uma transformação da estrutura patrimonial que é a
condição de salvaguardar o volume global do capital e da manutenção da posição na dimensão vertical do espaço
social‖. (Apud: Grill: 1999:10)
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Para por em marcha tal empreendimento, tive que buscar ultrapassar as amarras das
auto-evidenciais, sendo necessário o uso de algumas noções, esquemas analíticos, que me
ajudassem a pensar os problemas colocados, categorias que me auxiliassem na construção de
meu objeto. Era importante um estudo de trajetória5 (Bourdieu 1996, Grynspan 1990, Miceli
2001, Offerlé 1996) até para se evitar trabalhar com o conceito de mulher como um grupo
homogêneo. O exame de trajetórias individuais permite avaliar estratégias e ações de atores
em diferentes situações e posições sociais, seus movimentos, seus recursos, as formas como
os utilizam ou procuram maximizá-los, suas redes de relações, como se estruturam, como as
acionam, nelas se locomovem ou as abandonam. Ao mesmo tempo, centrando o foco em
atores, pode-se refletir sobre padrões e mecanismos sociais mais amplos. (Grynzpan,
1990:74).
Utilizei ainda a noção de trajetória de Bourdieu (1996) que considera que esta ―
é uma
série de posições sucessivamente ocupadas por um mesmo agente – ou mesmo grupo -em um
espaço ele próprio em devir e submetido a transformações incessantes‖, sendo assim possível
deslocar-se do sujeito e situar acontecimentos biográficos em alocações e deslocamentos no
espaço social. Associada à noção de trajetória de Bourdieu (1996) busquei, construir uma
prosopografia com o grupo dessas 26 deputadas (22 estaduais, 4 federais). Esse método reúne
dados biográficos de um grupo de atores históricos que têm algo em comum, seja uma função,
uma atividade, ou ainda uma posição social. Considerando as diretrizes de Miceli (2001), ‗tais
inferências devem ser lastreadas em evidências empíricas que abranjam uma quantidade
representativa de casos cujas características sociais, escolares, profissionais, etc. possibilitam
a reconstrução de uma trajetória para os fins de análise sociológica ou política‘.
Sobre o método prosopográfico, Charle (2006) aponta que este é, e vem sendo adotado
principalmente por historiadores, como uma espécie de biografia coletiva. Seu princípio é
―
definir uma população a partir de um ou vários critérios e estabelecer, a partir dela, um
questionário biográfico, cujos diferentes critérios e variáveis servirão à descrição de sua
dinâmica social (...) segundo a população e o questionário em análise‖ (Charle, 2006:41). A
prosopografia comparada permite relativizar as correlações que parecem óbvias, o autor
exemplifica tal questão, com seu estudo sobre o espaço universitário, por meio de biografias
coletivas dos professores da Universidade de Berlim e de seus pares da Sorbonne na
passagem do século XIX para o século XX. Por meio de aplicação do método prosopográfico,
5
No decorrer do trabalho o itálico será usado como marcador de categorias teóricas, assim como na reprodução
dos trechos das entrevistas. E o emprego das aspas duplas para categorias nativas.
20
Charle (2006) contradiz a ideia preconcebida de que a expansão do ensino superior se traduz
em certa abertura social do recrutamento dos professores universitários. Na França, há uma
continuidade entre ensino secundário e superior que permite o ingresso de novos agentes ao
topo da hierarquia universitária ou um sistema de bolsas no ensino superior durante o período
de acumulação de títulos universitários. Na Alemanha, diferentemente, observa-se uma
ausência dessas duas ajudas, explicando por que o recrutamento social dos professores
alemães permanece elitista.
O uso de diferentes fontes (tais como pesquisas em arquivos, entrevistas, dicionários
cpdoc6) associado a determinadas variáveis (primeiro cargo eletivo, idade de ocupação do
primeiro cargo eletivo, número de mandatos, ocupação de cargos públicos e laços de
parentesco com ascendente político), organizei quadros sinóticos que me permitiram uma
melhor comparação entre os diferentes casos estudados, seus percursos e posições ocupadas
nas dinâmicas sociais no Maranhão. Tais dados viabilizaram uma compreensão do processo
de profissionalização política das deputadas, aproximando a experiência individual e
diversidades das trajetórias sociais. Tal método ajuda a enfocar nos condicionantes sociais e
políticos de constituição do grupo em questão.
Qual o itinerário, as posições ocupadas por essas mulheres que conseguiram ‗entrar na
política‘? Offerlé (1996), quando fala em ‗entradas na política 7‘ destaca a importância do
estudo de trajetórias para entender a maneira como os novos ingressantes adaptam suas
propriedades aos condicionantes estruturais da profissão política. As deputadas maranhenses
possuem experiências variadas de constituição de capitais8, construídos com base em distintas
6
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil.
7
Entrées en politique au pluriel, puisqu‘il será question ici tout autar d‘étudier des trajectoires individuelles que
des trajectoires collective (nouveaux entrants) et de percevoir de quelle manière les nouveaux entrant doivent
adapter leurs propriétés aux contraintes structurelles du métier et de la profession politiques tendanciellement
delimites sans être fermés ou codifiés; de quelle façon les entrants créent et recréent par leur concurrence (entre
eux et avec leurs prédécesseurs) les conditions de possibilite de leur réussite politique. (Offerlé, 1996:3)
8
Além do econômico, que compreende a riqueza material, o dinheiro, as ações etc. (bens, patrimônios, trabalho),
Bourdieu considera: o capital cultural, que compreende o conhecimento, as habilidades, as informações etc.,
correspondente ao conjunto de qualificações intelectuais produzidas e transmitidas pela família, e pelas
instituições escolares, sob três formas: o estado incorporado, como disposição durável do corpo (por exemplo, a
forma de se apresentar em público); o estado objetivo, como a posse de bens culturais (por exemplo, a posse de
obras de arte); estado institucionalizado, sancionado pelas instituições, como os títulos acadêmicos; o capital
social, correspondente ao conjunto de acessos sociais, que compreende o relacionamento e a rede de contatos; o
capital simbólico, correspondente ao conjunto de rituais de reconhecimento social, e que compreende o prestígio,
a honra etc.
21
trajetórias. Questionei, de início, quem são essas mulheres? Quais suas origens sociais? Tais
deputadas tiveram atuação em movimentos estudantis, sindicatos ou partidos políticos antes
de se elegerem? Quais são suas concepções e definições a respeito da política? O fato de ser
mulher foi privilegiado como elemento fortalecedor da legitimidade política durante as
campanhas? As relações de parentesco dessas mulheres influenciaram nas decisões nas urnas?
O que pensam sobre o feminismo e os direitos das mulheres? Que ‗qualidades pessoais‘ ou de
‗liderança‘, buscaram utilizar para legitimar a condição de candidata? Tentei compreender as
estratégias de reconversão de diferentes recursos sociais em bases eleitorais.
Cabe aqui ressaltar que, quando falo em estratégias, não estou afirmando que essas
mulheres fizeram ao longo de suas vidas, foi todo um trabalho conscientemente planejado
voltado para a arena eleitoral, como um processo mecânico. Adoto a noção de estratégia
associada ao conceito de habitus9 de Bourdieu (1990, 1994) que considera estratégia como
conhecimento incorporado pelos agentes ao longo de suas vidas. Estas estratégias seriam o
produto do senso prático como o sentido do jogo 10, de um jogo social particular,
historicamente definido, que se adquire desde a infância, à medida que se participa das
atividades sociais. Os indivíduos não constroem estratégias livremente como desejam, mas,
sobretudo como podem frente às condições cotidianas de sobrevivência, sejam estas da
dimensão sociocultural, econômica ou política.
Coradini (2001) também ajuda ultrapassar a visão automática do uso de recursos quando
fala sobre a legitimação de características sociais tidas como eleitoralmente pertinentes:
(...) na relação entre qualquer característica ou recurso social de origem e
ascensão, seja na esfera política ou em outra qualquer, a reconversão nunca é
direta. Isso porque essa reconversão sempre depende de diferentes lógicas
sociais, vinculadas a esferas diferentes, o que faz com que, inclusive, os
‗interesses‘ e o valor associado a determinadas características possam adquirir
significados contrários‖. (CORADINI, 2001:9. Grifos meus).
Apresentarei agora outras categorias que estão relacionadas a esta análise, como as noções
de especialização política, métier político, redes, facções.
O habitus, vem a ser um sistema de disposições que as pessoas obtêm via socialização, e que se traduzem em
valores, comportamentos – interiorizados e exteriorizados de diferentes formas. A educação elementar tende a
inculcar maneiras de postar todo o corpo, como a nadar, olhar, falar, sorrir.
9
10
O bom jogador [...] faz a todo instante o que deve ser feito, o que o jogo demanda e exige. Isso supõe uma
invenção permanente, indispensável para se adaptar às situações indefinidamente variadas, nunca perfeitamente
idênticas‖. (Bourdieu, 1990, p.81).
22
1.1 - A Política como Atividade Profissional: aprendizagem de um saber específico e
demarcação em relação aos profanos.
Quanto à discussão da política como atividade profissional, utilizo as idéias da
sociologia weberiana, que a partir da distinção entre o ―
viver para a política‖ e o ―
viver da
política‖ reflete sobre meios que dispõem os indivíduos para atuarem politicamente. Weber
(2002) apoiando-se sobre critérios econômicos diferencia o modelo dos notáveis
parlamentares e aquele que passa a predominar com as empresas políticas modernas. Nas
palavras do autor:
Há duas formas de exercer política. Pode-se viver ―
para‖ a política ou pode-se
viver ―
da‖ política. (...) Quem vive ―
para‖ a política a transforma no sentido mais
profundo do termo em ―
objetivo de sua vida‖, seja porque encontra forma de
gozo na simples posse do poder, seja porque o exercício dessa atividade lhe
permite achar equilíbrio interno e exprimir valor pessoal, colocando-se a serviço
de uma ―
causa‖ que dá significação à sua vida. (...) assenta-se nossa distinção
num aspecto extremamente importante da condição do homem político que é o
aspecto econômico. Do que vê na política uma permanente fonte de rendas,
diremos que ―
vive da política‖ e diremos no caso contrario que ―
vive para a
política‖ (WEBER, 2002:68, grifos meus).
A abordagem seguida nessa pesquisa inspira-se ainda no estudo da ―
gênese da profissão
política‖ na França, realizado por Phélippeau (2001). O autor ultrapassando o enfoque
econômico weberiano sobre a atividade política ressalta em suas análises aspectos ligados às
origens sociais, aos códigos de conduta, às representações, às habilidades adquiridas pelos
indivíduos nas lutas eletivas.
Phélippeau (2001) mostra como a formação da profissão política, na França, se
apresenta inicialmente no regime censitário, momento em que ocorriam as rivalidades nos
meios aristocráticos, cujos membros lutavam pela afirmação de seu prestígio social. Com o
passar dos anos, ocorre o abandono do regime censitário, o que favorecerá gradualmente um
recrutamento social mais diversificado. Esses indivíduos que não eram dotados de trunfos
econômicos comparáveis aos dos notáveis vão se apoiar em recursos de outro tipo em busca
de sucesso na conquista por cargos eletivos. Alguns dos quais conseguem um mandato de
deputado depois de terem trabalhado muitos anos numa Assembléia Municipal, terreno onde
adquiriram capacidades administrativas e aprenderam truques e as receitas que serviram para
ganhar votos. Destacou Phélippeau (2001) ao falar sobre a oposição entre os notáveis e os
23
empresários políticos profissionalizados, como dois estilos de atuação política na França do
século XIX:
(...) as transformações técnicas e morfológicas que afetam o processo de
designação eletiva tornam possível a ingerência, nessas lutas, de adversários
menos ricos, que entram verdadeiramente em campanha em nome de programas
e de projetos e que se tornam gradualmente políticos de profissão. Pensar a
emergência de uma profissão política implica, por conseguinte, indagar-se sobre
o grau de incompatibilidade entre esses modos de se apresentar para se fazer
eleger, que resultam do enfretamento dos oriundos de cada um desses grupos,
que tudo opõem em sociedade (PHÉLIPPEAU, 2001:192).
Somando-se a essas análises, adoto a perspectiva de Michel Offerlé (1996 1999). Este
focaliza nos estudos das condições sociais dos agentes e o acesso à profissionalização política.
Offerlé (1996) associa a ideia de predisposições sociais e historicamente constituídas e a
concepção da política como atividade especializada, exemplificando com três recursos que
podem ser usados no acesso a profissão política. Destaca Offerlé (1996):
En combinant l‘idée de prédispositions socialemente et historiqument constituées
à la réussite politique et l‘idée de la constitution d‘une activité sociale spécialisée
et professionnalisée, on a pu ainsi réfléchir sur le long terme aux activités qui
préparaient le mieux à la politique, dresser a la sociographie des elites politiques,
signifier une rupture historique entre le notable dilettante et l‘homme politique
profissionel, styliser trois filières d‘accès à la profession politique (carrière
notabilière locale, trajectoire militante, accès direct au centre) ( 1996:3).
Ainda sobre os estudos das características sociais do profissional político, Offerlé
(1999), numa perspectiva processual, apontou em suas análises os usos políticos que podem
ser feitos de determinadas competências profissionais. Ele questiona por que certas profissões
em determinados períodos constituem ‗viveiros‘ de vocação política, por que algumas
profissões predispõem mais ou preparam melhor para atividade política.
Offerlé (1999) destaca a necessidade de se considerar no estudo da profissionalização
política o background social dos agentes, demonstra que na relação existente entre os
eleitores e os profissionais da política, eles são mediatizados por suas experiências sociais
anteriores. No espaço de concorrência política, existe uma transação que envolve disposições
de um lado e, de outro, propriedades sociais que vão aproximando os indivíduos.
Grill (2003) em seu estudo sobre as bases da herança política no Rio Grande do Sul faz
uso de noções que ajudam a pensar sobre as exigências para o exercício da profissão política,
sobre a política como atividade profissional destaca Grill (2003):
24
(...) a profissionalização política incide em esforços para a permanência dos
agentes no meio político, na aquisição de uma competência técnica particular
viabilizada pelos anos consagrados à vida pública e na dedicação plena aos
papéis políticos. Conseqüentemente, gera o afastamento do meio profissional de
origem e a perda progressiva dos conhecimentos específicos relativos às antigas
ocupações. (...) os longos anos consagrados à vida pública lhe fornecem uma
espécie de direito moral à renovação dos mandatos (GRILL, 2003:160).
Além de chamar atenção para a competência técnica como direito à renovação dos
mandatos, com base nos autores acima referidos, Grill (2003) com base nos trabalhos de
Offerlé (1996, 1999) estabelece alguns pontos em comum e algumas distinções entre a
profissão política e as demais profissões, dentre as características comuns ele ressalta:
demarcação em relação aos profanos, aprendizagem e aquisição de um saber específico,
controle de entrada, monopólio de gestão da atividade, controle entre os pares. Em relação às
particularidades da profissão política, o autor destaca: 1) não pode ser delimitada por critérios
objetivos, pois seus limites são mais fluidos, intermitentes e passageiros (portanto objeto de
lutas); 2) a lógica da profissionalização política se alimenta de uma denegação identitária por
parte dos seus praticantes que, apesar de consagrarem todo tempo a esse métier, como um
profissional, reivindicam o exercício sobre o modo da vocação, do serviço e da arte.
Para além da discussão dos ―
profissionais da política‖, sigo também a idéia da
constituição da política como uma espécie de métier (Lagroye 1994) que compreende
aprendizado e desempenho de um conjunto de habilidades, de gramáticas, de competências
técnicas e repertórios próprios da política. Tais qualificações podem ser assimiladas nas mais
diferentes redes de sociabilidade do político, a exemplo da família, partido, sindicato ou
movimento estudantil. Tal noção me auxiliou na compreensão de que a lógica própria da
competição política exige dos agentes o desempenho de papéis, que podem até ser
contraditórios, sendo que estes não se resumem ao período eleitoral, o trabalho político é algo
permanente.
Vale ressaltar, ainda, que os estudos sobre a dinâmica da especialização política exigem
tanto uma abordagem mais societal, privilegiando dados das origens sociais e do capital de
notoriedade (Bourdieu 1998) nas carreiras políticas dos agentes como abordagens de
enfoques mais institucionalistas, verificando o capital de investidura (Bourdieu 1998), o
25
longo período dedicado aos anos de mandatos e ocupação de cargos públicos pelos líderes
políticos.
No estudo sobre as dinâmicas no espaço político especializado, busquei enfocar ainda os
aspectos menos formais da política, evidenciando as interações sociais pautadas por trocas e
reciprocidade, em que a lógica de mobilização política não se dá predominantemente via
grupos dotados de uniformidade. Considero que a força de mobilização dos empreendedores
políticos, em geral, está relacionada ao controle de recursos e a habilidade de cultivar relações
a partir de tais recursos. Para tal, utilizei alguns trabalhos sobre lideranças políticas focados na
perspectiva da Antropologia da Política 11, tentei identificar as ―
qualidades de liderança‖
atribuídas à deputada Maura Jorge, suas concepções sobre a atividade política e sua
capacidade de administrar redes de relações na campanha em Lago da Pedra e como ela joga
com vários papéis ao mesmo tempo.
Para pensar as alianças políticas que têm como lógica de sustentação o princípio de
reciprocidade, utilizo ainda a noção de rede. Para Landé (1977) é necessário que as redes
sejam limitadas para efeito de estudos, embora estas já tenham sido caracterizadas como
infinitas. Isso se torna possível por meio do detalhamento das alianças diádicas12 que podem
ser entre pessoas de status iguais ou diferentes, assim pode-se limitar a rede a um tamanho
manejável no tempo e espaço. A noção de rede política me auxiliou na busca por apreender as
teias de relações maximizadas pelo ego focal- Maura Jorge- para um fim político específico:
campanha municipal 2008 em Lago da Pedra.
Mayer (1987) desenvolveu a noção de quase-grupos, para pensar a rede como uma
estrutura limitada, este se caracteriza como um conjunto finito de interconexões que se origina
de um ego. O ego em função de mobilizações políticas específicas, estrutura conjuntos de
ação baseado em várias formas de elos, a interconexão pode está baseada em relações de
patronagem, parentesco, partido, amizade, religiões, etc.). Mayer (1987), ao estudar as
relações entre líderes e seguidores, se baseia ainda na noção de facções como unidades de
conflito acionadas em ocasiões específicas. Para Mayer (1987:149) as facções são vagamente
ordenadas, suas bases de arregimentação são estruturalmente diversas e tornam-se manifestas
11
Para um histórico desse campo de estudos ver Kuschnir (2007)
Landé (1977) nas discussões que desenvolve sobre relações diádicas, as concebe como um acordo voluntário
entre pessoas que se dispõem a trocar serviços e ajudas em tempo de necessidade. Estas podem ser de caráter
vertical ou horizontal, isto é, entre pessoas de status diferentes ou iguais.
12
26
por meio de uma interconexão de autoridade pessoal entre líder e seguidor e se baseiam muito
mais em transações do que em questões de princípios.
A concepção de política, baseada no princípio de reciprocidade, está presente em
muitas situações do cenário brasileiro, como mostram importantes estudos desenvolvidos em
diferentes dimensões da hierarquia política, que destacaram reflexões sobre a política e as
relações pessoais (lealdade, reciprocidade, favor, mediação) como Kuschnir (2000a, 2000b),
Bezerra (1999), Palmeira e Heredia (1995), Palmeira (1992, 1996), Grill (1999, 2003), dentre
outros.
Foi a partir das noções e problemáticas apresentadas que comecei a construir meu
objeto, não na pretensão de busca da verdade 13, nem na ilusão de que seja um trabalho linear,
e sim num movimento de construção e reconstrução, lembrando o que Bourdieu (1998) coloca
sobre a composição do objeto científico:
(...) a construção do objeto- pelo menos na minha experiência de investigadornão é uma coisa que se produza de uma assentada, por uma espécie de acto
teórico inaugural, e o programa de observações ou de análises por meio do qual a
operação se efectua não é um plano que se desenhe antecipadamente, à maneira
de um engenheiro: é um trabalho de grande fôlego, que se realiza pouco a pouco,
por retoques sucessivos, por toda uma série de correcções, de emendas.
(BOURDIEU; 1998:26-27)
1.2 - Trabalho de campo
Como indica Bourdieu sobre o sociólogo em relação ao espaço de lutas pelas classificações: ―
o sociólogo não
é mais o árbitro imparcial ou espectador divino, o único a dizer onde está a verdade (...) é aquele que se esforça
por dizer a verdade das lutas que têm como objeto- entre outras coisas a verdade‖ (Bourdieu, 1988:14)
13
27
Cabe ressaltar que o presente estudo esta relacionado a dois projetos de pesquisa14 mais
amplos, estes contribuíram para nortear alguns momentos em que se dividiu essa pesquisa. Na
primeira fase, realizei a maior parte do trabalho na Assembléia Legislativa do Maranhão, tive
contato com assessores, assisti a algumas sessões no plenário, conquistei, aos poucos,
funcionários; realizei entrevistas com deputadas; tive acesso aos arquivos da biblioteca e do
setor de cadastro parlamentar. Cabe destacar, ainda, a ajuda que obtive de um amigo de minha
turma de mestrado, ao me apresentar ao secretário geral da Mesa Diretora da Assembléia
Legislativa, facilitou meu acesso às informações e trânsito nos diferentes espaços da AL. A
investigação foi desenvolvida também por meio de um mapeamento a partir de repertórios
biográficos da Câmara dos Deputados e biografias publicadas sobre as deputadas
federais/estaduais que exerceram mandatos no Maranhão no período 1982-2006. Utilizei,
também, alguns dados de fontes secundárias, dados do site do TSE, TRE, dentre outros.
Busquei, portanto, nesse primeiro momento da pesquisa, sistematizar quadros mais
amplos que me permitissem analisar dados sobre a origem social e os percursos das
deputadas.
Como já tinha feito uma abordagem mais quantitativa, sentia necessidade de observar,
mais no cotidiano, as dinâmicas na vida de uma deputada. A princípio pensei em escolher
uma deputada, dentre as da atual legislatura e observar sua atuação nas campanhas municipais
em termos de apoio a um determinado candidato a prefeito. Havia situações de deputadas
esposas apoiando candidatos a prefeito tanto em São Luís como no interior do estado do
Maranhão, mas ocorreu que entre as sete deputadas que ocupam atualmente as cadeiras na
AL-MA, uma lançou candidatura à prefeitura do município de Lago da Pedra-MA. Decidi
então acompanhar não um trabalho de apoio, mas de candidata. Era a oportunidade de
observar diretamente a mobilização de cadeias de líderes-seguidores, de estratégias de
apresentação nas campanhas eleitorais, foi assim que o foco recaiu sobre a trajetória de Maura
Jorge, resultando no último capítulo dessa dissertação.
14
Ambos coordenados pelo professor do PPGCS-UFMA Igor Grill, em momentos diferentes, o primeiro, As
Bases da Especialização Política no Maranhão: origens sociais, carreiras e profissionalização entre deputados
federais (1945-2006), foi desenvolvido de 2006 a 2007 e o segundo em 2008: Dinâmicas da “Política Local”: a
constituição de espaços municipais de concorrência eleitoral no Maranhão.
28
Minha ida ao município e a inserção na rede de apoiadores da deputada foi facilitada
por uma indicação de uma amiga, cuja mãe era vereadora no município de Lago da Pedra,
prima da deputada Maura Jorge e uma das coordenadoras da campanha. Esta me apresentou a
sua mãe que recebeu em sua casa, onde fiquei hospedada de 19 a 25 de julho de 2008. Período
em que tive a oportunidade de conhecer a deputada Maura Jorge, entrevistá-la, participar das
reuniões, organização e execução de 4 atos de campanha nas eleições municipais de Lago da
Pedra- um jantar com a candidata e os agentes de saúde do município, visitas da candidata de
casa em casa no bairro do Cajueiro, poeirão15 e um comício de abertura oficial da
campanha16. Nessa parte do trabalho de campo, pude observar a dinâmica simbólica da
política (Geertz, 1980), considerando elementos da cultura local e as redes de significado dos
eleitores se atualizando publicamente. Nesse mesmo período, tive a oportunidade de ouvir
relatos de alguns vereadores, eleitores e lideranças locais que apoiam a atual candidatura da
Maura Jorge. Por meio de conversas informais, pude perceber as bases das alianças diádicas
(Landé, 1977), como os diferentes apoiadores recorriam aos valores de lealdade e
reciprocidade para justificar sua adesão à campanha. Dentre os diferentes motivos e
justificativas de apoio, pude identificar alguns mencionando a gratidão devido a favores
concedidos pela parlamentar em outras ocasiões; outros tinham expectativas de obter maiores
benefícios e outros ainda destacavam qualidades pessoais da candidata como ―
preparada‖,
―
experiente‖, ―
simples‖, ―
candidata do povo‖, atributos que segundo os informantes não
estavam presentes na candidata de oposição.
Quanto aos métodos utilizados no decorrer da investigação, considero o que indica
Bachelard (1996), que os métodos devem evoluir e se multiplicar conforme o objeto o exija,
levando-se em conta a necessária vigilância e rigor, que devem ser atitudes constantes na
atividade científica. O que este autor propõe é não confundir rigor científico com rigidez
metodológica, que pode estancar a criatividade e imobilizar o pensamento. Por isso não elegi
um método isolado na coleta de informações, e sim uma combinação de algumas técnicas,
pesquisa em arquivos, entrevistas, prosopografia, observação direta, diário de campo.
Para efeito de exposição, a dissertação ficou dividida em três partes. Na primeira parte,
traço um breve retrospecto sobre a participação da mulher na política, trazendo algumas
15
Categoria nativa para designar uma espécie de carreata misturada com passeatas puxadas por um trio elétrico
passando principalmente pelos bairros ―
adversários‖ anunciando que o candidato está bem nas campanhas.
Também chamado de arrastão.
16
A explicação dada pelos organizadores da campanha para data escolhida para abertura oficial, foi devido
sexta- feira cair no calendário como dia 25, por se tratar do mesmo número da candidata filiada ao DEM.
29
comparações associadas aos cenários internacional, brasileiro e maranhense. Apresento ainda
uma discussão sobre a Lei de Cotas para mulheres 9.100/95 e 9.504/97 e sua influência no
incentivo às candidaturas femininas na America Latina e no Brasil.
Na segunda parte, faço a sistematização e análise de alguns dados sobre a trajetória das
deputadas federais e estaduais eleitas no Maranhão no período entre 1982 e 2006, destacando
as variáveis sobre a origem social e carreira política, dedicando uma especial atenção ao caso
da ex- deputada federal Terezinha Fernandes. E, finalmente, no último capítulo analisei a
trajetória da deputada Maura Jorge e sua atuação no espaço de concorrência política,
enfocando principalmente nas eleições municipais em Lago da Pedra.
Capítulo 2 - A CONQUISTA DOS DIREITOS DE CIDADANIA E MULHERES NA
POLÍTICA: um breve retrospecto e algumas comparações.
2.1- Cidadania
As análises sobre mulheres na política devem levar em conta o lento processo de
mudanças políticas no país, particularmente no campo dos direitos de cidadania, pressupondo
que só há democracia de direito e de fato quando os direitos de cidadania são extensivos a
todos os segmentos, sem discriminação territorial, socioeconômica, de raça e de gênero.
Apontarei agora, algumas reflexões sobre o exercício da cidadania no Brasil com base em
30
Carvalho (2004), para depois apresentar alguns quadros comparativos sobre a representação
parlamentar feminina.
As concepções sobre cidadania são várias, mas há um relativo consenso em torno da
proposta de Marshal (1967), que identificou três tipos básicos de direitos de cidadania:
direitos civis, direitos políticos e direitos sociais. Os direitos civis referem-se à conquista da
liberdade pessoal, a liberdade de palavra, de pensamento e de fé, o direito à propriedade e a
contrair contratos válidos, além do direito à justiça; os direitos políticos referem-se ao direito
de voto e ao direito de acesso a cargos públicos; os direitos sociais vão do direito ao bem-estar
econômico (trabalho, salário justo, aposentadoria), educação, saúde e a segurança. O cidadão
completo seria aquele que fosse titular dos três direitos, sendo que o exercício de certos
direitos não gera automaticamente o gozo de outros.
Foi fundamentado nos estudos de Marshall (1967) sobre as conquistas dos direitos na
Inglaterra, que Carvalho (2004) tratou sobre o avanço da cidadania no Brasil enquanto
fenômeno histórico. Mostrando que no Brasil há algumas diferenças do modelo inglês. A
primeira refere-se à maior ênfase em um dos direitos, o social, em relação aos outros. A
segunda refere-se à alteração da lógica da sequência em que os direitos foram adquiridos, no
Brasil, o social precedeu os outros, diferentemente da Inglaterra, onde Marshall (1967) mostra
que os ingleses introduziram, primeiramente, os direitos civis no século XVIII. A pirâmide
dos direitos foi invertida. Aqui, primeiro vieram os direitos sociais, nos anos 30, implantados
em período de supressão dos direitos políticos e de redução dos direitos civis por Getúlio
Vargas – o que explicaria, em parte, a origem do Estado clientelista no país. O autor verifica
que a falta de liberdade política sempre foi compensada, pelo autoritarismo do Brasil pós-30,
com o paternalismo social. Enquanto que na sequência inglesa destaca Carvalho:
Na sequência inglesa havia uma lógica que reforçava a convicção democrática.
As liberdades civis vieram, primeiro, garantidas por um Judiciário cada vez mais
independente do Executivo. Com base no exercício das liberdades, expandiramse os direitos políticos consolidados pelos partidos e pelo Legislativo.
Finalmente, pela ação dos partidos e do Congresso, votaram-se os direitos
sociais, postos em prática pelo Executivo. A base de tudo eram as liberdades
civis. (2004:220)
Com tal observação, Carvalho (2004) não pretende mostrar que só há um caminho para
a cidadania. Ele considera que houve diferentes percursos como o caso da França e da
Alemanha. Mas o que o autor chama atenção é para o fato de que caminhos diferentes afetam
o produto final, afetam o tipo de democracia que geram. Ressalta, como consequência do
31
caminho percorrido na aquisição dos direitos no Brasil, a excessiva valorização do Poder
Executivo, já que Estado é visto, por muitos, como distribuidor paternalista de empregos e
favores. E ligada a essa fascinação pelo Executivo estar em busca de lideranças carismáticas,
de um messias político. O autor chama essa cultura orientada mais para o Estado do que para
representação de ―
estadania‖ em contraste com cidadania. Para exemplificar, a busca por
soluções rápidas, por meio dos líderes carismáticos, cita três dos cinco presidentes eleitos pelo
voto popular após 1945, Getúlio Vargas, Jânio Quadros e Fernando Collor, destacando que
nenhum deles terminou o mandato, em boa parte por não se conformarem com as regras do
governo representativo, sobretudo com o papel do Congresso.
Após 1985, quando da queda do regime militar, os direitos civis estabelecidos antes
dele, tais como a liberdade de expressão, de imprensa e de organização, foram recuperados.
Ainda assim, muitos direitos responsáveis pela aquisição da cidadania no Brasil continuam
inacessíveis à maioria da população. E na história da luta por esses direitos quero, agora,
chamar atenção para o processo de participação política das mulheres. Por participação
política das mulheres, entendo a participação das mulheres no parlamento, nas eleições, nos
governos executivos e no poder judiciário, nos conselhos e conferências de políticas públicas
e também todas as ações das mulheres realizadas em função da sua auto-organização como
movimento social em suas diversas vertentes – partidário, urbano, sindical, popular, rural,
urbano, acadêmico. Entretanto, nessa pesquisa, dou especial atenção à participação das
mulheres no parlamento e nas eleições.
2.2 Mulheres no Parlamento: direito de votar e serem votadas
Os Estados Unidos da América, em 1788, foi o primeiro país a assegurar à mulher o
direito de ser eleita, mas o direito de voto só vai ser conquistado pelas mulheres americanas,
em 1920. Passaram-se mais 105 anos para um segundo país, agora, a Nova Zelândia, em
1893, assegurar às mulheres o direito de votar. Mas, o direito de serem eleitas as mulheres da
Nova Zelândia tiveram assegurado somente em 1918. A Austrália foi o país seguinte, em
32
1902, mas ainda com a imposição de restrições, que só vão ser retiradas em 1962 (MIGUEL,
2000).
Após a Segunda Guerra Mundial, intensificam-se as conquistas das mulheres neste
campo, com 95 países assegurando às mulheres os direitos de votar e serem votadas. Daí em
diante, quase que ano a ano, novos países asseguram às mulheres esses direitos. Mas, somente
em 1971 as mulheres suíças tiveram seus direitos de votar e serem votadas assegurados. E de
forma mais tardia, no ano de 1976, Portugal eliminou toda e qualquer restrição ao direito das
mulheres portuguesas de votar e serem votadas.
Na América Latina, Chile – em 1931, Brasil – em 1932, e Bolívia – em 1938, foram os
primeiros a assegurar, ainda que muitas vezes acompanhado de condições ou restrições, o
direito às mulheres de votar e serem votadas. Na Argentina, este direito é conquistado em
1947. As mulheres paraguaias foram as que mais tardiamente conseguiram seu direito de voto
na América Latina – somente em 1961.
Como marcos históricos desse contexto que contribuíram para o crescimento da
representação parlamentar podemos citar a criação da Organização das Nações Unidas
(ONU), em 1945, e a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, a
exemplo do artigo 21.1: “todos têm o direito de participar no governo do seu país,
diretamente ou através da livre escolha de seus representantes”. Apesar de as regras do
Direito estarem longe de representar as regras de fato, pode-se observar esse aumento por
intermédio de alguns dados.
Segundo a União Interparlamentar (IPU), o número de países que contam com
atividades parlamentares aumentou muito desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Em 1945,
havia 26 parlamentos, este número cresceu até atingir 187 parlamentos no ano de 2005.
Paralelamente cresceu a participação feminina. As mulheres representavam apenas 3% dos
deputados em 1945 nos diversos parlamentos em funcionamento no mundo, subindo para
7,5% em 1955 e para 10,9% em 1975. Entre 1995 e 2005 a representação parlamentar
feminina no mundo cresceu de 11,6% para 16,2% (ver quadro1). Nesse período de 60 anos
(1945-2005) pode-se destacar alguns acontecimentos com princípios que visavam à promoção
da igualdade entre homens e mulheres: a Convenção dos Direitos Políticos da Mulher de 1952
e 1960, a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra Mulher
em 1979, as Conferências Mundiais sobre a Mulher: México, 1975, Copenhague, 1980 e
Nairóbi, 1985 e Beijing (Pequim) 1995.
33
A Convenção de 1952 teve como principal objetivo firmar o reconhecimento do direito
das mulheres a fazerem parte de governos e serem livremente escolhidas para representação
política. A Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a
Mulher, de 1979, propugnou a adoção de medidas legais de proteção dos direitos da mulher,
refreando as práticas de discriminação que impedem a participação feminina nas instituições
políticas e em todos os campos da autoridade pública. Em 1985, em Nairóbi, dentre as
proposições havia uma seção intitulada “Igualdade na participação política e nos processos
de decisão‖, no seu parágrafo 86 e seguintes, afirmaram a necessidade de intensificar esforços
para assegurar a igualdade da participação da mulher nos corpos legislativos nacionais e
locais.
Um outro marco que mobilizou mulheres de todo mundo foi a IV Conferência
Mundial sobre a Mulher ocorrida em Beijing em 1995, apesar de muitas diferenças entre as
representações dos vários países- sob regimes econômicos, políticos, práticas religiosas,
costumes os mais diversos, houve um significativo avanço rumo à conquista da igualdade das
populações femininas. Conforme pode ser observado no quadro 1, a partir dos anos 90,
ocorreu um aumento significativo na percentagem de mulheres no parlamento do Brasil,
alcançando metade dos índices mundiais, isso pode ser atribuído, em parte, às discussões e
aprovação posterior da Lei de Cotas.17
Quadro1- Representação parlamentar de mulheres no Brasil e no cenário internacional.
17
ANO
NÚMERO DE
PARLAMENTOS
% DE MULHERES
NOS
PARLAMENTOS DO
MUNDO
% DE MULHERES
NO PARLAMENTO
DO BRASIL*
1945
26
3
0,0
1955
61
7,5
0,9
1965
94
8,1
0,5
1975
115
10,9
0,3
1985
136
12
1,7
Em maio de 1995, parlamentares do sexo feminino da América Latina reuniram- se em São Paulo para discutir
a experiência argentina com cotas e as políticas de cotas no restante do mundo. Além disso, a plataforma de
ações adotadas pelos governos, a partir da Conferência de Beijing, endossou o compromisso de assegurar acesso
igualitário à participação das mulheres, tanto nas estruturas de poder quanto nos cargos de tomada de decisões.
Os encontros regionais produziram idéias sobre cotas, e levaram as participantes a propor leis sobre o assunto
nos seus próprios Parlamentos; por sua vez, a Plataforma de Beijing legitimou o uso da política de cotas em
âmbito mundial.
34
1995
176
11,6
6,3
2005
187
16,2
8,3
Fonte: Women in Politics: 60 years in retrospect, 1945-2005.www.ipu.org
*www.tse.gov.br
A percentagem de representação feminina no parlamento varia muito conforme as
regiões consideradas (quadro2). De acordo com dados da União Interparlamentar destacam-se
os países Nórdicos que possuem uma representação média de gênero no parlamento de 40%.
Em seguida, os conjuntos dos países das Américas e da Europa possuem uma representação
próxima a 20%, ou seja, metade da representação dos Países Nórdicos. Em quarto e quinto
lugar, os países da África Sub-Saara e da Ásia apresentam uma taxa de participação das
mulheres no parlamento de 17,5% e 16,3%, respectivamente. Bem abaixo da média mundial,
de 16,8%, aparecem os países árabes, que apesar das mulheres continuarem subrepresentadas,
com 8,2%, a sua participação, duplicou nos últimos oitos anos, principalmente em países
como Djibuti, Jordânia, Iraque, Marrocos e Tunísia. Também abaixo da média mundial
aparece o Brasil com 8,6%. Os aumentos mais importantes registaram-se em África e na
América Latina, onde o aumento médio nos últimos dez anos foi de cinco pontos percentuais.
Quadro 2- Representação feminina no parlamento conforme as regiões do mundo- 2006
REGIÃO
Países Nórdicos
%
40
Américas
20,2
Europa
19,6
África Sub-Saara
17,5
Ásia
16,3
Países Árabes
8,2
Média Mundial
16,8
Brasil
8,6
Fonte: www.ipu.org
Seria inviável nessa pesquisa tentar explicar os diversos motivos da pequena presença de
mulheres na elite política e quais as causas dessas variações de representação feminina nas
35
regiões do mundo. Mas existem estudos sobre essa temática com perspectiva comparativa
entre países. Cito o exemplo da pesquisa desenvolvida na França por Achin (2005) sobre os
diferentes processos que contribuíram para entrada das mulheres no parlamento, a autora
analisa os pontos comuns e divergentes na França e Alemanha entre 1945 a 2000, articulando
numa perspectiva macro e micro as mudanças (políticas, institucionais, sociais, culturais, etc.)
ocorridas nesses países e as diferentes trajetórias das deputadas na França e na Alemanha.
Achin (2005) considera diferentes variáveis como a origem social, profissional e política,
número de mandatos, regime matrimonial, idade de ocupação de cargos eletivos das
deputadas, por meio destas faz uma comparação das características das diferentes trajetórias
das deputadas francesas e alemãs.
Primeiramente Achin (2005) considera a variável da nacionalidade para distinguir as
características das deputadas, observando as peculiaridades de cada país no recorte temporal
proposto. O eixo temporal é divido na França, primeiramente, entre os anos de 1945 a 1956.
As mulheres eleitas deputadas nesse período são, em sua maioria, jovens (entram no
parlamento antes dos 40 anos), exercem profissões ―
menos qualificadas‖ (comerciantes,
artesãs, agricultoras, operárias), grau de escolarização inferior ao bacharelado, tiveram
carreiras militantes em partidos e sindicatos, a autora as chama de les résistantes.
O outro recorte temporal se refere às deputadas francesas eleitas depois dos anos 80. A
autora as distingue de acordo com sua filiação partidário e origens sociais. São as deputadas
―
socialistas‖, que em sua maioria vivem em concubinato ou são divorciadas, participaram de
militância em associações, dispõem de diplomas superiores na área de Licenciatura, a autora
as chama de les énarques. E as deputadas dos partidos considerados de direita (gaullistes,
libérales et d‟extrême droite). Estas, em sua maioria são casadas, exercem profissões ―
mais
qualificadas‖ (chefes de empresas e professions intellectuelles supérieures), entram no
Parlamento com mais de 50 anos e exerceram anteriormente carreiras de assistência
parlamentar, Achin (2005) as chama de députées de terrain.
Na Alemanha, o eixo temporal é divido em as deputadas eleitas entre 1949 e final dos
anos 60. As características sociais que predominam entre as deputadas nesse período são:
mulheres viúvas, profissionalmente inativas, não possuem grau de escolarização superior,
exerceram profissões mais modestas, são as deputadas do ‗pós-guerra‘, Achin (2005) as
chama de anciennes démocrates. As deputadas eleitas na Alemanha depois dos anos 80, são
mais jovens (entram no Parlamento com menos de 40 anos), são divorciadas ou vivem em
concubinato, exercem profissões ‗mais qualificadas‘, o grupo não apresenta carreiras de
36
acesso singular, a autora as chama de députées alternatives. Entre deputadas eleitas entre o
fim dos anos 60 na Alemanha e o fim dos anos 80, prevalecem mulheres com diplomas de
curso superior em licenciatura, exercem profissões consideradas superiores, participaram de
militância partidária ou de associação, são casadas ou solteiras e praticantes de crenças
religiosas (católicas ou protestantes). Achin (2005) as chama de femmes de parti, em razão da
estrutura de seu capital, sua carreira depende, em boa parte, da sua participação na
organização partidária. Por meio das construções desses tipos o trabalho de Achin (2005)
evidencia como a profissão política não se apóia sobre um equivalente universal e não pode
ser delimitada mediante uma competência sem levar em conta, variações conjunturais e
históricas.
No Brasil, há o trabalho de Avelar (2001), que fez uma comparação mais apurada sobre
os diferentes níveis de participação feminina entre alguns países latino-americanos e o
conjunto de países nórdicos. Avelar (2001) destaca que uma das causas das diferenças da
participação feminina entre esses dois blocos de países é a diferença entre os países que têm
forte tradição participativa e aqueles que têm um Estado forte aliado ao poder local, como é o
caso dos países latino-americanos. A autora propõe uma discussão se existe ou não uma
correlação positiva entre níveis de qualidade de vida e a representação política feminina. Os
nórdicos são os que têm mais alto IDH e entre os países latino-americanos, a Argentina se
destaca no IDH e na representação feminina. Há uma infinidade de fatores que atuam na
ascensão política das mulheres, mas ao que tudo indica, é necessário um mínimo de
redistribuição social de renda para que seja incrementada a representação dos segmentos.
Quando discute sobre a participação das mulheres na política nos países latinoamericanos, Avelar (2001) chama atenção para o fato de estes terem passado por regime
político autoritário, porém com suas peculiaridades. Na Argentina, ainda sob repressão, as
mulheres das famílias de mortos e desaparecidos no regime militar, aglutinaram-se em
movimentos de protesto: Las Madres de La Plaza de Mayo, organização de protesto contra os
militares, ocupando a praça quase diariamente, criaram uma rede de solidariedade. Mães,
filhas, esposas, irmãs foram unidas por verem seus entes queridos desaparecidos, estas
construíram e continuam construindo a base da representação política feminina naquele país.
“Não é sem motivo que, no ranking da representação sul-americana, a Argentina é o país
com mais alta taxa de presença de mulheres na política formal, uma extensão de sua
organização na sociedade civil” (AVELAR, 2001:54).
37
O Chile, devido o regime autoritário, dividiu as famílias e as mulheres entre próPinochet e anti-Pinochet. As mulheres das famílias vítimas das mortes do regime também se
uniram criando foco de solidariedade. O caso do México é distinto, um país de partido único
por quase um século, nas últimas quatro décadas viu a emergência da organização das
mulheres nos movimentos sociais, toleradas pelo regime autoritário do
Partido
Revolucionário Institucional- PRI. A grande dificuldade residia na construção de movimentos
autônomos sem a interferência do Estado, porque a marca da intermediação clientelística nos
programas sociais do governo neutralizava a construção de identidades políticas, fossem elas
femininas ou não. Ou seja, um Estado forte e desmobilizador.
Em relação às razões da baixa presença feminina na política, existem alguns estudos,
tais como Avelar (2001), Araújo (1998), Miguel (2001) que apresentam algumas explicações.
No geral são argumentos ligados às estruturas familiares, à vida pessoal, aos sistemas
econômicos, às estruturas do Estado, aos tipos de regimes políticos e ao grau de
tradicionalismo e religiosidade dos respectivos países. Outras dizem respeito às relações entre
movimentos sociais e partidos políticos, cujo argumento central é o de que a participação e o
ativismo local não resolvem o problema da exclusão política da mulher. Outras, ainda, sob
enfoques institucionalistas, afirmam sobre a dificuldade de se conseguir dos partidos a adoção
de desenhos institucionais que mudem os princípios de representação democrática.
Entretanto apesar da representatividade feminina na política ainda ser baixa, alguns
avanços já podem ser observados, como os países que conseguiram atingir e até mesmo
ultrapassar o percentual mínimo fixado pela ONU (ver quadro3). O objetivo de 30% fixado
pela ONU para a representação de mulheres nos parlamentos, definido para 1995, é
considerado como a ―
massa crítica‖ de mulheres necessária para que tenham uma influência
considerável nos trabalhos do parlamento. Exemplos de países que já ultrapassaram esse
percentual é Ruanda18 (48,8%) e Suécia (45,3%).
Um marco, em relação ao aumento da participação de mulheres na vida política, foi a
eleição para presidente no Chile de Michelle Bachelet, primeira mulher eleita na América do
Sul. Michelle Bachelet criou o primeiro gabinete paritário, composto igualmente por homens
18
Ruanda pertence ao grupo de nações que atravessaram um período traumático, a exemplo do genocídio
cometido em 1994 contra cerca de 800 mil pessoas, em sua maioria membros da etnia tutsi, por parte da minoria
hutu. Nessa época, as mulheres de Ruanda tiveram de assumir responsabilidades que tradicionalmente não
assumiam e que, terminado o conflito, não quiseram ceder. Mulheres de todo o mundo ajudaram as ruandesas a
estabelecer um regime eleitoral que introduziu o sistema de cotas e uma sensibilidade de gênero a todo o
processo. A política de Cotas para mulheres no Ruanda incide diretamente sobre o Parlamento, desde 2003, as
mulheres ocupam 39 dos 80 assentos da Assembléia Nacional e 6 dos 20 lugares do Senado. (Dados fornecidos
pelo secretário-geral da União Interpalamentar -UIP, Anders B. Johnsson, em www.ipu.org, acesso em 05/09/08)
38
e mulheres (10 ministros para cada um). No quadro 3 apresento a lista dos países que têm uma
mulher como Chefe de Estado ou de Governo.
Quadro 3- Os 20 países onde as mulheres representam pelo menos 30% na Câmara Única ou
baixa do Parlamento 19- ano 2005.
Ruanda
48,8%
Moçambique
34,8%
Suécia
45,3%
Bélgica
34,7%
Noruega
37,9%
Áustria
33,9%
Finlândia
37,5%
Islândia
33,3%
Dinamarca
36,9%
África do Sul
32,8%
Países Baixos
36,7%
Nova Zelândia
32,2%
Argentina
36,2%
Alemanha
31,8%
Cuba
36%
Guiana
30,8%
Espanha
36%
Burundi
30,5%
Costa Rica
35,1%
Rep.
Unida
Tanzânia
da 30,4%
Fonte: site União Interparlamentar, www.ipu.org
Quadro 4- Países que têm uma mulher como Chefe de Estado ou de Governo-2006
19
País
Cargo
Chile
Presidente
Finlândia
Presidente
Irlanda
Presidente
Letônia
Presidente
Libéria
Presidente
Nos países com parlamentos unicamerais a legislatura desenvolve sua prática política por apenas uma câmara
(ou casa). No Bicameralismo a legislatura de um país é dividida em duas câmaras (ou casas), na maioria dos
casos, os parlamentos bicamarais são divididos em "Câmara Baixa" (geralmente a Câmara dos Deputados ) e
"Câmara Alta" (Senado).
39
Filipinas
Presidente
Bangladeche
Primeira- Ministra
Alemanha
Chanceler
Nova Zelândia
Primeira- Ministra
Moçambique
Primeira- Ministra
São Tomé e Príncipe
Primeira- Ministra
Fonte: www.ipu.org
2.3- Mulheres na Arena Política Brasileira
O chamado movimento sufragista ganhou força no Brasil no início do século XX,
culminando com a conquista do direito ao voto pelas mulheres, que se deu em 1932,
constituindo um marco inicial na história da participação da mulher no parlamento, a despeito
da obtenção desse direito de cidadania, poucas mulheres venceram as resistências e ousaram
se candidatar aos cargos legislativos, sendo que uma percentagem ainda menor conseguiu
fazer parte do time dos eleitos. Mas bem antes de 1932, já podem ser observados no Brasil
alguns marcos importantes na luta pelo direito das mulheres.
Muitas foram as mulheres que, anonimamente, desbravaram os primeiros caminhos para
a emancipação feminina no Brasil. Uma trajetória, porém, ficou registrada: a da pioneira
Dionísia Gonçalves Pinto, nascida em 1809, no sítio da família, em Papari, Rio Grande do
Norte, cidade que hoje leva o pseudônimo de sua filha mais ilustre, Nísia Floresta. Segundo o
Cfemea- Centro Feminista de Estudos e Assessoria- em 1831, já então ativista pelos direitos
das mulheres, Dionísia Gonçalves Pinto publica uma série de artigos sobre a condição
feminina em jornais de Recife, em Pernambuco, onde passara a residir. E em 1832, aos 22
anos, seu primeiro livro: Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens, obra que defende o
direito das mulheres à educação e ao trabalho.
No âmbito da política, as primeiras manifestações, no Brasil, pelo direito de voto das
mulheres, ocorreram em 1852, quando a jornalista Violante Bivas e Velascos fundou o
primeiro jornal totalmente feito por mulheres, o Jornal da Senhora. Duas décadas depois, em
1873, a professora Francisca Senhorinha de Motta Diniz criou, na cidade de Campanha da
Princesa, em Minas Gerais, o jornal feminista intitulado O Sexo Feminino, também
inteiramente editado por mulheres. Esse periódico faria, em 1875, uma ampla defesa do voto
40
feminino. Em 1878, estreou em São Paulo a peça O voto feminista, de Josefina Álvares de
Azevedo, que mais tarde provocaria grandes debates sobre o tema. No Brasil Império, apenas
uma mulher exerceu o direito de votar: a Dra. Isabel de Matto Dellom, que apelou para a Lei
Saraiva que dava aos detentores de títulos científicos o direito de voto. Ela chegou a se
apresentar como candidata à Constituinte, embora soubesse que não tinha nenhuma
possibilidade de vencer. Cesário Alvim, então Ministro do Interior, ao saber do caso da Dra.
Isabel, ficou inconformado e baixou um decreto proibindo o voto feminino em qualquer
circunstância.
Na Constituinte Republicana de 1890, foi apresentada emenda concedendo direito de
voto à mulher; a qual, contudo, foi rejeitada, sob o argumento de não existir um movimento
feminino para acompanhar os debates. No primeiro dia do ano de 1891, mais de trinta
constituintes assinaram uma emenda ao projeto de Constituição, de autoria de Saldanha
Marinho, conferindo o direito de voto à mulher brasileira. A pressão dos que se opunham ao
voto feminino foi mais forte e, na sessão de 27 de janeiro de 1891, o deputado Pedro Américo
assim se manifestou: “A maioria do Congresso Constituinte, apesar da brilhante e vigorosa
dialética exibida em prol da mulher-votante, não quis a responsabilidade de arrastar para o
turbilhão das paixões políticas a parte serena e angélica do gênero humano”.
Em 1894, foi promulgada a Constituição Política da cidade de Santos, estabelecendo,
em seu art. 42, a ―
capacidade política aos maiores de 21 anos e às mulheres, que exercessem
profissão honesta, sabendo ler e escrever e residindo no município há mais de um ano, o
direito de voto‖. Tal disposição, contudo, foi revogada pelo Congresso Legislativo de São
Paulo. Dessa forma, as aspirações femininas ao direito ao voto nesse período foram
fracassadas.
Somente em 1917 a luta ganha novo impulso, quando Deolinda Dalto, uma professora
que fundara o Partido Republicano Feminino 20, organiza e lidera uma passeata de mulheres no
Rio de Janeiro, as chamadas ―
sufraguetes‖, na qual reivindicavam o direito de votar. Um ano
após, em 1918, Bertha Lutz propõe a criação de uma associação de mulheres, com o objetivo
de intensificar a luta pelo direito ao voto. Em 1922, ela cria a Federação Brasileira pelo
Progresso Feminino e mais tarde ocupa uma cadeira na Câmara Federal.
A trajetória política das mulheres não foi uma luta completamente solitária. Contou
também – é verdade que em pequena parcela – com a colaboração de alguns homens de visão
20
Foi fundado em 1910
41
considerada avançada para a época. Foi assim que, em 1928, o então Governador do Estado
do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine, buscou introduzir na Constituição de seu Estado
o direito de voto às mulheres e no ano seguinte, em 1929, elegeram a primeira prefeita da
América do Sul: Alzira Soriano de Souza21, do município de Lages, no Rio Grande do Norte.
O Presidente Getúlio Vargas, em 1932, ante a pressão feminina promulgou o Código
Eleitoral22, no qual estava garantido às mulheres o direito de sufrágio. Conquistado este
direito, as mulheres não perderam tempo, tanto assim que já no ano seguinte, em 1933, nas
eleições convocadas pela Assembléia Constituinte, elegeram a primeira deputada federal, a
paulista Carlota Pereira de Queiroz; Bertha Lutz foi eleita suplente.
Segundo José Eustáquio Diniz Alves, professor da Escola Nacional de Ciências
Estatísticas do IBGE, durante 60 anos, de 1932 até 1992, as mulheres brasileiras conseguiram
obter no máximo 7% das cadeiras do legislativo municipal. Em 1994 as mulheres
representavam 8% das Assembléia Legislativas do país e 6% da Câmara Federal, para reverter
essa situação de desvantagem foram promulgadas as Leis 9.100/95 e 9.504/97 inaugurando a
política de cotas, implantadas como medida para incentivar as candidaturas femininas e
reduzir as desigualdades de gênero na esfera política. Desde então tem crescido o número de
mulheres candidatas e eleitas. Farei uma discussão mais detalhada mais adiante sobre a
questão das cotas, mas já adianto que no Brasil o crescimento tem ficado abaixo do esperado e
do que aconteceu em outros países que adotaram algum tipo de política de cotas. Nas eleições
municipais de 2004 a média nacional de candidaturas femininas para as Câmaras Municipais
foi de 22% e a percentagem de vereadoras eleitas ficou em 12% (fonte: TSE).
Quanto à Câmara Federal atualmente no Brasil, a presença de mulheres só é maior do
que a do Haiti, da Guatemala e da Colômbia. Apesar do número de deputadas no Brasil ter
crescido entre a legislatura passada e a atual, passando de 32 para 45, elas ainda ocupam
menos de 10% das 513 cadeiras da Câmara. Outro item que evidencia a baixa participação de
No entanto, esta não exerceu o mandato. A Comissão de Poderes do Senado impediu que a prefeita eleita
tomasse posse e anulou os votos de todas as mulheres da cidade. O Rio Grande do Norte foi o único Estado
brasileiro a permitir que as mulheres fossem às urnas naquele ano. Apesar do voto feminino ter sido adotado pela
primeira vez em 1928 no Rio Grande do Norte, o sufrágio feminino só foi oficializado quatro anos depois, por
meio de um decreto-lei assinado pelo presidente Getúlio Vargas. Em 1945, Alzira Soriano finalmente elegeu-se
vereadora e até 1958 liderava a bancada da UDN.
21
Por meio do Decreto nº. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, é instituído o Código Eleitoral Brasileiro, e o
artigo 2 disciplinava que era eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma do
código. É de ressaltar que as disposições transitórias, no artigo 121, dispunham que os homens com mais de 60
anos e as mulheres em qualquer idade podiam isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza
eleitoral. Logo, não havia obrigatoriedade do voto feminino.
22
42
mulheres no cenário político brasileiro é a pequena presença delas à frente das lideranças
partidárias e na Mesa Diretora da Câmara. Dentre os partidos políticos registrados no TSE
apenas dois (PCB e PSOL) apresentam uma mulher na sua presidência nacional e no
Maranhão, no TRE apenas dois partidos foram identificados com mulheres em sua
presidência (PTN e PR) 23.
2.4 - Política de Cotas para Mulheres
A―
política de cotas‖ começou a ser adotada a partir da década de 70 nos países do norte
da Europa e hoje muitas nações vêm implementando as cotas como estratégia para elevação
dos percentuais da presença feminina nos parlamentos. Na esfera da representação
parlamentar, é possível identificar dois tipos de cotas: aquelas adotadas por iniciativa própria
dos partidos políticos, sem que haja legislação formal — caso dos países escandinavos e de
muitos outros países europeus com partidos que assumem essas políticas — e aquelas
aplicadas por meio de legislação nacional, compulsórias. Com relação às cotas adotadas via
legislação, existem aquelas que incidem diretamente sobre o parlamento, pela reserva de
assentos a serem ocupados pelas mulheres — modalidade que vem sendo adotada em alguns
países da Ásia e do norte da África; e existem ainda as que se aplicam às eleições, isto é,
incidem sobre as listas eleitorais que os partidos irão apresentar por meio de um percentual
mínimo de reserva das vagas para as mulheres ou para cada sexo (ARAÚJO, 2001).
Na América Latina, nos anos 90, treze países 24 aprovaram leis que estabelecem cotas.
Com exceção da Argentina, todos os demais países adotaram leis de cotas nos anos
posteriores à 4ª Conferência Mundial sobre as Mulheres, realizada em Beijing, em 1995, e
depois de uma série de importantes encontros regionais entre as mulheres políticas da
América Latina.
23
No Partido Comunista Brasileiro- PCB a presidência nacional é de Zuleide Faria de Melo e no Partido
Socialismo e Liberdade-PSOL é Heloísa Helena, em todos os demais são homens que ocupam o lugar de
presidente nacional do partido. E no Maranhão: o Partido Trabalhista Nacional-PTN e o Partido da RepúblicaPR, com Surama Oliveira e Lindinalva Vilela, respectivamente.
Argentina, Brasil, Bélgica, Bolívia, Costa Rica, Colômbia, Equador, Panamá, Paraguai, Peru, República
Dominicana e Venezuela, todos com legislação nacional estipulando a cota para a candidatura de todos os
partidos.
24
43
Quanto ao histórico da aprovação da Lei de Cotas no Brasil, é referência o estudo de
Miguel (2000), em que a autora realiza uma pesquisa sobre os pronunciamentos dos
parlamentares federais no Brasil acerca do debate sobre a política de cotas, identificando que,
apesar dos diferentes posicionamentos quanto a percentagem a ser reservada e modo de
aplicação, a maioria dos parlamentares considerava tal política um objetivo justo. O projeto de
Lei foi apresentado pela deputada Marta Suplicy (PT) em agosto de 199525, após ter
participado em maio do Encontro das Mulheres do Parlamento Latino americano. Marta
Suplicy (PT) afirmou que dentre as trocas de experiências com personalidades de outros
países, o que mais tinha chamado a atenção das parlamentares brasileiras tinha sido a questão
das cotas eleitorais. Ela anuncia a apresentação do projeto de lei:
Tenho em mãos um projeto pronto. Gostaria de convidar todas as Deputadas
desta Casa para que assinem também. Na segunda e terça-feira estarei
coletando as assinaturas. Não se trata de uma proposição de autoria de uma
mulher, de uma pessoa; deve ser uma proposta das mulheres da Câmara
Federal, que vão defendê-la em seus Estados. (Deputada Marta Suplicy - PT/SP,
apud: Miguel 2000)
E, se reportando a dúvidas que tinha em relação a adoção de uma política de cotas,
quando se discutiu e aprovou cotas de 30% nos cargos de direção do PT, afirma:
Lembro-me de que, quando isso foi votado, minha posição era de muita dúvida,
uma dúvida que ia ao encontro de muitas mulheres, no sentido de se sentirem
inferiorizadas. Por que temos que ter uma situação de privilégio? Por que ter
uma cota? Será que não conseguimos chegar pela nossa competência, com as
nossas próprias pernas? Isso, enfim, foi aprovado pelo PT, mas com muita
dificuldade, porque muitas vezes as mulheres não querem, porque não têm
condições de infra-estrutura para, por exemplo, morar em Belém do Pará e vir
para uma reunião da executiva em São Paulo. Com quem ficam os filhos? O
próprio partido teve que ir criando condições para que essas mulheres pudessem
chegar a uma reunião. Isto é interessante, porque o partido foi obrigado a criar
essa condição. Se não existem quadros, o partido é obrigado a capacitar
mulheres para ocupar esses quadros. Então fui vendo isso no meu próprio
partido. Nunca havia pensado nisso em âmbito nacional, apenas no âmbito do
partido. (...) A ação afirmativa é realmente um instrumento adotado em muitos
países. Demorei em ser convencida disso, mas agora não tenho a menor dúvida.
É o caminho para que consigamos transformar efetivamente a situação da
mulher nesse País. (Deputada Marta Suplicy - PT/SP, apud: Miguel, 2000)
25
O projeto de lei sobre cotas (que recebeu o número 783/95), foi assinado também por 26 outras Deputadas:
Esther Grossi (PT/RS), Marinha Raupp (PSDB/RO), Alzira Ewerton (PSDB/AM), Ceci Cunha (PSDB/AL),
Maria Elvira (PMDB/MG), Nair Xavier Lobo (PMDB/GO), Cidinha Campos (PDT/RJ), Elcione Barbalho
(PMDB/ PA), Fátima Pelaes (PFL/AP), Jandira Feghali (PC do B/RJ), Maria Valadão (PFL/ GO), Ana Júlia
(PT/PA), Marisa Serrano (PMDB/MS), Socorro Gomes (PC do B/ PA), Tete Bezerra (PMDB/MT), Yeda
Crusius (PSDB/RS), Simara Ellery (PMDB/ BA), Zila Bezerra (PFL/AC), Zulaiê Cobra Ribeiro (PSDB/SP),
Marilú Guimarães (PFL/MS), Alcione Athayde (PPB/RJ), Sandra Starling (PT/MG), Laura Carneiro (PFL/RJ),
Telma de Souza (PT/SP), Conceição Tavares (PT/RJ) e Lídia Quinan (PMDB/GO).
44
Com a apresentação do referido projeto de lei, o tema da participação política das
mulheres passa a ser motivo de um debate mais permanente na Câmara dos Deputados e no
Senado Federal, culminando na aprovação da Lei 9.100/95 que previa 20% das vagas de
candidatura, ampliada para 30% pela Lei 9.504/97. 26
No entanto, na visão de Araújo (2001), Miguel (2001), Avelar (2001) os resultados
quantitativos iniciais da política de cotas no Brasil, continuam pouco animadores quando
comparados aos de outras experiências semelhantes.
A análise desse processo requer um olhar mais abrangente, que considere, mas, ao
mesmo tempo, ultrapasse a abordagem centrada — em geral de maneira genérica — na
denominada ―
resistência‖ e/ou ―
discriminação‖ masculinas. Este enfoque, embora considere
um aspecto presente na realidade, não é capaz de dar conta da diversidade de fatores
envolvidos no processo. Além de desconsiderar, ou considerar de forma residual, toda a
lógica político-pragmática envolvida nas empreitadas em torno do poder, também não ajuda a
explicar como muitos países latino-americanos com trajetórias e culturas políticas
semelhantes às do Brasil, e talvez mais conservadores quanto ao chamado ―
machismo latino‖,
vêm apresentando quadros bem mais favoráveis às mulheres na esfera política, inclusive em
relação às suas iniciativas de cotas. (ARAÚJO, 2001:232)
Para Htun (2001) a natureza do sistema eleitoral de cada país afeta significativamente o
sucesso da política de cotas. Todos os países com leis de cotas na América Latina elegem os
seus Parlamentares a partir de listas partidárias usando representação proporcional 27, embora
em alguns países um percentual fixo de Parlamentares é escolhido por representação distrital.
Todas as leis de cotas latino-americanas estipulam um percentual mínimo para o número de
candidatos do sexo feminino.
Além desta similaridade quanto à diretriz geral, as leis e o contexto da aplicação de
cotas variam significativamente. Htun (2001) e Araújo (2001) discutem sobre quatro aspectos
que podem determinar o sucesso da aplicação de cotas: a natureza da lista partidária, norma
O Partido Popular Socialista-PPS foi o único a encaminhar voto contrário às cotas de candidaturas. Ver o
discurso do deputado Sérgio Arouca, em MIGUEL( 2000: 45).
26
27
Nesse tipo de sistema eleitoral os partidos formulam uma lista de candidatos para a circunscrição eleitoral, e o
eleitor vota em apenas um nome. Apurada a votação, os votos válidos e os votos em branco são somados e o
total é dividido pelo número de cadeiras a serem preenchidas, obtendo-se então o quociente eleitoral. Só entram
na disputa os partidos que têm votos acima do quociente eleitoral. Seus votos são divididos pelo quociente
eleitoral para que se obtenha o quociente partidário. As sobras dessa divisão servem para redistribuir as cadeiras
restantes através da fórmula D‘Hondt, que é a divisão dos votos de cada partido ou coligação pelas cadeiras
obtidas no primeiro cálculo, mais uma. Recebem as cadeiras ainda não ocupadas aqueles que obtiverem as
maiores médias (Nicolau, 1991)
45
competitiva na lista partidária, o tamanho da circunscrição eleitoral e o compromisso
partidário.
Quanto à primeira questão é ressaltado se a lista partidária é aberta ou fechada. Num
sistema de lista fechada, cada partido controla o posicionamento dos seus candidatos na sua
lista. Neste sistema, os eleitores votam nos partidos e não nos candidatos. A quantidade de
votos recebida por partido determina quantos candidatos da lista serão eleitos. Entretanto,
durante a campanha eleitoral, os candidatos de um mesmo partido lutam juntos pela
maximização dos votos da legenda 28·. Por outro lado, num sistema de lista aberta, como o do
Brasil, os eleitores escolhem os seus candidatos votando nestes e não nos partidos. Desta
forma, o fator que determina quem serão os eleitos é a quantidade de votos recebidos por cada
candidato individualmente. Assim, fundamentalmente, as eleições produzem uma competição
interna em cada partido, fazendo com que os candidatos de um mesmo partido disputem a
preferência do eleitorado entre si e entre os candidatos dos demais partidos. (HTUN,
2001:227)
O segundo aspecto é a norma competitiva na lista partidária, que Mala Htun, (2001)
chama de obrigatoriedade de posição, que significa colocar mulheres em posições que lhes
possibilitem ser selecionadas. Ou seja, não basta estar na lista do partido, é imprescindível
estar nas primeiras posições da lista. A autora explica:
Num sistema de lista fechada, o partido apresenta aos eleitores uma lista
partidária com candidatos ordenados numericamente. O voto recebido pelo
partido determina quantas pessoas da lista serão eleitas. Por exemplo,
imaginemos que um Município vai eleger dez Vereadores. Cada partido
apresenta uma lista com dez candidatos. Se um partido recebe 25% dos votos,
duas ou três pessoas das primeiras posições da lista serão eleitas. Fica claro com
este sistema que não basta apenas estar presente na lista do partido, há que se
estar no início da lista. Obrigatoriedade de posição competitiva na lista é,
portanto isto: uma norma que diz que as mulheres têm de ser colocadas no início
da lista e não nas posições inferiores. (HTUN, 2001:228)
A lei argentina tem uma norma de obrigatoriedade de posição competitiva da lista que
diz que cada terceira posição deve ser ocupada por uma mulher 29. Em países com sistema de
lista fechada, mas sem esta norma de obrigatoriedade de posição competitiva para mulheres,
como a Costa Rica, a República Dominicana e a Venezuela, a eficácia de cotas tem sido
menor30. Portanto, para os estudiosos do assunto de cotas para mulheres, num sistema de lista
28
29
Argentina, Bolívia, Costa Rica, República Dominicana, Paraguai e Venezuela têm sistema de lista fechada.
Se, por exemplo, um partido estiver concorrendo a somente duas vagas num Distrito, pelo menos um dos
candidatos terá de ser mulher.
46
fechada, torna-se imperativa a existência da obrigatoriedade de posição competitiva na lista
para as mulheres.
O terceiro fator, abordado, é o tamanho da circunscrição eleitoral. Este tamanho refere-se
ao número de vagas disponíveis num Distrito eleitoral. Um pequeno Distrito, principalmente
quando houver grande quantidade de partidos concorrendo às eleições, restringe a eficácia de
cotas, porque normalmente os partidos só ganham uma ou duas vagas no Distrito. Nos
sistemas de lista fechada, as primeiras posições da lista partidária, que são as únicas com
chances de vitória eleitoral, são geralmente ocupadas por homens. Portanto, quanto maior o
Distrito, maiores as chances de eleger mulheres. Segundo a cientista política norte-americana
Htun (2001) na maioria dos países, a combinação do sistema de lista aberta, a inexistência de
obrigatoriedade de posicionamento competitivo e o pequeno tamanho da circunscrição
eleitoral reduz significativamente a eficácia de uma política de cotas.
O quarto aspecto apontado sobre a discussão quanto a eficácia das cotas é o compromisso
partidário. Na Argentina, as ativistas femininas forçaram compromisso com os partidos. As
condições favoráveis para eficácia do sistema de cotas na Argentina foi uma combinação de
listas partidárias fechadas, obrigatoriedade de posicionamento competitivo e uma moderada
magnitude da circunscrição eleitoral. Enquanto que no Brasil, a Lei reserva 30% das vagas
para cada sexo, mas não obriga que cada partido preencha as vagas destinadas para o sexo que
tem representação minoritária. Em consequência, nenhum partido cumpriu a cota de 30% na
média nacional nos últimos pleitos.
O alcance da Lei 9.100/95 no Maranhão foi analisado por Ferreira (2003) considerando
que há uma resposta positiva no que diz respeito ao aumento do número de deputadas. A
autora leva ainda em consideração a administração do governo Roseana Sarney, afirmando
que este, quanto ao incentivo de candidaturas femininas, repercute de forma satisfatória nos
quadros do PFL e dos partidos aliados. A autora destaca:
O discurso político de tom emocional e pessoal, defendido pela governadora,
unido a cobertura midiática intensa, transformou-a num modelo para seus aliados
(...). Nas eleições de 2002, por exemplo, estão inscritas 10 mulheres no PFL,
quase todas com grande densidade eleitoral, no PMDB são 5 candidatas, três
pelo PSD, uma pelo PSDC, duas pelo PV, duas pelo PGT, uma pelo PHS, uma
pelo PRTB, uma pelo PT do B e cinco pelo PTN (...) assim, podemos afirmar
que a discussão sobre cotas no Maranhão está de alguma forma relacionada à
avaliação feita pelo governo de Roseana Sarney (FERREIRA, 2003:85).
30
Na Costa Rica, por exemplo, os partidos tendem a colocar mulheres nos últimos lugares da lista partidária.
Assim, elas ficam praticamente sem chance de eleição.
47
Quanto ao número de candidatas e eleitas no Maranhão na década de 90, pode-se afirmar
que houve um avanço considerável no número de deputadas dentro da AL. Na eleição de
1994 candidataram-se 30 mulheres, elegendo-se 3; já nas eleições de 1998, o número de
candidatas aumentou para 68, elegendo-se 10, sendo 7 pertencentes aos partidos aliados à
base política do governo Roseana Sarney, ficando as demais, ligadas aos chamados partidos
de oposição.
Apesar do foco do presente estudo recair sobre os recursos sociais acionados nas
disputas eleitorais, considero que nas pesquisas sobre a inserção das mulheres na política
parlamentar deve-se trabalhar para além de um único enfoque. Fiz esse breve retrospecto da
aprovação da Lei de Cotas, suas diferentes modalidades e posicionamentos das deputadas, no
intuito de envolver diferentes dimensões de análise, sempre lembrando que o problema da
representatividade das mulheres envolve uma multiplicidade de causas, passando desde
aspectos relacionados às condições socioeconômicas, a exclusão histórica, suas trajetórias
sociais até aspectos do sistema político como a cultura política e os sistemas partidários e
eleitorais.
Capítulo 3- TRAJETÓRIAS DAS DEPUTADAS FEDERAIS E ESTADUAIS NO
MARANHÃO: recursos sociais e mecanismos de legitimidade política.
3.1 - O Maranhão pós- década de 1980: marcos políticos.
Nos estudos sobre a dinâmica política maranhense em diferentes contextos históricos,
autores como Buzar (2001), Borges (2002), Costa (1997), Silva (2001), Gonçalves (2000,
2006) e Reis (2007) destacam o caráter oligárquico e patrimonialista presente nas práticas
políticas desenvolvidas no estado. O uso da máquina pública em benefício particular (a
exemplo da divisão de cargos entre aliados), as relações próximas com o governo federal, a
mediação entre os interesses econômicos do empresariado e o Estado, o discurso
48
‗modernizante‘, são alguns dos elementos apontados por tais autores, como aspectos
fundamentais para ascensão e manutenção da chamada oligarquia Sarney ao longo dos anos
no Maranhão.
Apresentarei nesse tópico, alguns marcos políticos das dinâmicas sociais no Maranhão,
dentro do recorte temporal da pesquisa (1982-2006). Por meio dos fatos mencionados pode-se
fazer uma relação dos resultados eleitorais com as práticas oligárquicas presentes na política
maranhense.
A monopolização de cargos e recursos públicos por parte de alguns grupos marcam o
cenário eleitoral por longos anos no Maranhão. Destaca Borges (2002):
No âmbito estrito do poder político, o grupo Sarney tem sido melhor sucedido do
que na administração de políticas públicas, sendo vitorioso nas urnas por tempo
quase duas vezes maior ao do oligarca anterior, Vitorino Freire. As razões para
tanto residem: no acesso quase monopolizado aos cargos e recursos públicos,
especialmente aqueles oriundos do governo federal; acesso privilegiado aos altos
escalões do poder judiciário e aos integrantes do poder legislativo; controle e uso
sistemático de meios de comunicação de massas; e no êxito performático
relacionado à estratégia de criação de uma identidade simbiótica da família
Sarney com as tradições e marcas identitárias do Maranhão e de seu povo.
(BORGES, 2002:95)
Não consiste, no objetivo dessa pesquisa, fazer uma análise detalhada da política
maranhense no que concerne às práticas dos diferentes governos que compreendem o recorte
temporal escolhido. Centrei-me nas trajetórias das deputadas estaduais 31 e federais entre 1982
a 2006, mas farei aqui um breve retrospecto tentando contextualizar o lócus da pesquisa.
Destaco, em diferentes dimensões da hierarquia política, alguns marcos políticos e
econômicos.
O processo de abertura política no Brasil já havia começado lentamente com o general
Ernesto Geisel (1974-1979), mas foi no governo do presidente Figueiredo (1979-1985) que a
volta à democracia foi acelerada. Ocorreu a anistia política e restabeleceu-se a liberdade
político-partidária, extinguindo a ARENA e o MDB, artificialmente criados como partidos
que seriam do governo e da oposição, respectivamente, autorizando eleições livres e diretas
O número de mulheres eleitas deputada estadual no Maranhão, no período compreendido da pesquisa foi
aumentando gradativamente. Segundo dados do TRE em 1982, o número de candidatas foi de seis mulheres,
sendo eleita apenas: Maria da Conceição Mesquita. O número de candidatas começa a crescer significativamente
em 1990: trinta e sete mulheres, no entanto apenas duas foram eleitas. Em 1994 candidataram-se trinta mulheres,
elegendo-se três; já nas eleições de 1998, o número de candidatas saltou para sessenta e oito, sendo eleitas dez.
Atualmente a Assembléia Legislativa dentre as suas 42 cadeiras, 7 são ocupadas por mulheres.
31
49
para os estados e municípios (1980), promovidas logo em 1982; nesse mesmo período
promove-se, também, a campanha das eleições diretas para a presidência e vice-presidência
da República, que, todavia, são realizadas por via indireta em 1985, por meio de um colégio
eleitoral específico, enquanto se elege e instala (1987) a Assembléia Nacional Constituinte,
que, por sua vez, votaria a nova Carta (5.10.1988), apelidada por Ulisses Guimarães,
presidente daquela Assembléia, de Constituição Cidadã.
No Maranhão, do ponto de vista político-eleitoral, o início dos anos 1980 foi marcado
pela reforma partidária e pelas eleições diretas para governador em 1982. A reorganização do
quadro partidário estadual implicou a formação dos seguintes partidos:
a) PDS - reunindo os políticos da ex-ARENA, agrupados em torno da liderança do senador
José Sarney e do governador João Castelo.
b) PMDB - que permaneceu com o caráter de ―
frente‖ do ex-MDB, reunindo o grupo ligado a
Renato Archer e Cid Carvalho (cassados pelo regime militar), os antigos setores dos
―
moderados‖ e ―
autênticos‖, liderados por Epitácio Cafeteira e Haroldo Sabóia do Movimento
―
Oposição
pra valer‖,
respectivamente.
Além dos grupos comunistas ainda na
clandestinidade.
c) PDT - agrupado em torno das lideranças do deputado Jackson Lago (eleito pelo MDB) e de
Neiva Moreira (ex-PSP, cassado e exilado durante regime militar), reunia também lideranças
do movimento estudantil e de outros movimentos democráticos do período, como o Comitê
Brasileiro pela Anistia.
d) PT - congregando a facção do deputado Freitas Diniz (ex-MDB), o chamado grupo dos
―
estudantes‖ (com base no movimento estudantil universitário), além de alguns setores da
Igreja progressista (especialmente a Pastoral da Juventude).
e) PTB - organizado por Cesário Coimbra.
As eleições de 1982 foram marcadas pelos efeitos do ―
pacote de novembro‖ (1981), que
estabelecia a proibição de coligações eleitorais e a obrigação dos partidos lançarem chapas
completas, ao mesmo tempo em que criava o ―
voto vinculado‖, pelo qual o eleitor teria que
votar em candidatos de um único partido (no caso, em 1982: vereador, prefeito, deputado
federal e estadual, senador e governador), sob pena de anular o seu voto.
Assim, com o
auxílio adicional do ―
voto vinculado‖, a chamada ‗oligarquia Sarney‘, por meio de seu
partido, o PDS, elegeu 124 dos 130 prefeitos, o que alavancou sua vitória nos demais cargos
em disputa: Luís Rocha (governador), João Castelo (senador), 14 deputados federais e 33
50
estaduais. Dos partidos de oposição, o PMDB conseguiu garantir 3 deputados federais e 8
estaduais, assim como 5 prefeitos, enquanto o PT elegeu 1 prefeito. Os demais partidos nada
obtiveram em termos eleitorais.
Quanto à conjuntura econômica dos anos 80 no Maranhão, houve certo crescimento,
estes são marcados pelos chamados ―
grandes projetos‖ que trouxeram para o Maranhão o
programa Grande Carajás e a fábrica de alumínio ALCOA, mas segundo Borges:
(...) o foco desses projetos não é gerar riquezas para o local onde se encontram e
sim exportá-las, de modo que os poucos empregos que geraram (pois operam
com tecnologia de ponta) e o verniz de modernidade que emprestam ao estado
foram pagos a preço elevado, com transferência de recursos públicos (infraestrutura, matérias primas e incentivos fiscais e creditícios) para empresas
privadas de atuação internacional. Nesse contexto, o Maranhão figura apenas
como um corredor de exportações geográficas e politicamente atraente para o
capital. (2002:88)
Em 1986, solidamente amparado por sua condição de presidente da República e pela
ampla popularidade conquistada pelo Plano Cruzado, José Sarney patrocinou a edição local da
―
Aliança Democrática‖ (PFL/ PMDB/ PTB), por meio da qual foi lançada a candidatura ao
governo de Epitácio Cafeteira, tradicional ―
adversário‖ da facção Sarney.
Do ponto de vista da denominada oligarquia Sarney, esta aliança com um ―
inimigo
histórico‖ foi possível porque a presença de José Sarney na Presidência da República
possibilitava-lhe mecanismos variados de controle sobre o governo do Estado, neutralizando
assim as possibilidades de uma reviravolta no quadro político estadual, no caso nada
improvável de uma ruptura do governador Cafeteira com a facção. Sendo assim, de 1987 a
1990 o Maranhão teve como governador Cafeteira, este embora não sendo maranhense nato,
se radicou em São Luís e, no começo da década de 60, se interessou pela política local,
conseguindo, nas eleições de 1962, fazer-se suplente e, logo, deputado federal.
A vitória de Cafeteira foi bastante expressiva, jamais alcançada por um candidato ao
governo estadual, obtendo mais de 1 milhão de votos (cerca de 80% do total). No rastro de
sua candidatura, a designada ‗oligarquia Sarney‘ elegeu os dois senadores (Alexandre Costa e
Edison Lobão, ambos do PFL) e ampliou sua cota de deputados. A edição maranhense da
―
Aliança Democrática‖ contou ainda com o apoio da maior parte da chamada esquerda32
32
Apesar de no último capítulo desse trabalho tentar refletir sobre o comportamento eleitoral por outros meios
que não orientação ideológica, adoto as denominações esquerda e direita, lembrando Singer (2000). Embora
Singer (2000) considere o já mencionado por Sartori (1982), que os termos esquerda e direita possuem a
qualidade de serem caixas vazias, cujo conteúdo pode ser descarregado ou carregado através do tempo. O autor
51
estadual, com exceção do PT que lançou a candidatura de Delta Martins ao governo do
Estado. A esquerda do PMDB, o grupo ―
Nossa Luta na Constituinte‖ (origem do PSB), o
PDT, os partidos comunistas, todos esses agrupamentos de esquerda por razões variadas
apoiaram a candidatura de Epitácio Cafeteira a governador. (COSTA: 1997:16)
Em 1990, o sistema eleitoral foi caracterizado por algumas mudanças ditadas pela
Constituição de 1988: a introdução do 2º turno nas eleições para governador e a maior
permissividade legal para a formação de partidos. A principal característica das eleições de
1990 foi o aumento da competitividade eleitoral dos diferentes grupos de oposição,
implicando uma verdadeira mudança qualitativa do processo eleitoral estadual. O novo
dinamismo eleitoral, entretanto, não foi suficiente para evitar a vitória da facção dominante no
cômputo geral. Já no 1º turno, a facção elegeu o senador (Epitácio Cafeteira), 8 deputados
federais e 17 estaduais; enquanto no 2º turno, depois de uma campanha bastante disputada, foi
possível assegurar a vitória de Edson Lobão (―
Maranhão do Povo‖).
Em 1994, Roseana Sarney foi candidata ao governo do Maranhão com a coligação
política- Frente Popular, sendo eleita a primeira governadora de Estado do Brasil, no segundo
turno, com 50.61% dos votos válidos. Foi uma disputa eleitoral acirrada com o candidato
Epitácio Cafeteira33, que segundo dados do TRE-MA, ela obteve 753.901 votos e Cafeteira
735.841 votos. Em 1998, para o segundo mandato, Roseana Sarney conseguiu se eleger no
primeiro turno com 1.005.339, 66,01% dos votos válidos, disputado também com o mesmo
candidato da oposição. Na gestão do ―
Novo Tempo‖, Roseana Sarney reconstrói as bases da
dominação política, se apresentando como pioneira das reformas ―
modernizantes‘ e
projetando, novamente para o Maranhão a inserção na economia transnacional e nacional.
Através da propaganda das reformas, encobre a manutenção das práticas clientelistas e
legitima-se diante da população. (GONÇALVES, 2006)
Dentre alguns programas estaduais de seu governo, podemos destacar alguns
programas: Viva Cidadão, Primeiro Emprego, Viva minha Cidade, Plano Maior de Turismo e
Viva Educação. Mas o recorte que fiz para falar um pouco de sua gestão, foi discorrer sobre
uma medida feita já no segundo mandato, que certamente serviu como estratégia de
legitimação: a Reforma Administrativa do Estado.
afirma que no Brasil um dos pontos que se aproxima da noção de esquerda é a busca de reformas sociais de
baixo para cima, com participação popular e em desafio à autoridade, enquanto que a direita estaria interessada
mais ou menos pelas mesmas reformas, mas através da autoridade do Estado.
33
Gonçalves (2006) fez uma análise das eleições de 1994 no Maranhão, mostrando as estratégias de
desqualificação do adversário mais próximo (Cafeteira) de Rosena Sarney nos por meio de análise dos discursos
e charges publicadas nos jornais O Estado do Maranhão naquele período.
52
Por meio da mensagem nº53, de 16 de dezembro de 1998, a governadora reeleita,
encaminhou à Assembléia Legislativa o projeto de lei sobre a Reforma Administrativa do
Estado do Maranhão, que uma vez aprovada transformou-se em Lei nº 7.356 de 29 de
dezembro de 1998. Esta significou um aprofundamento das medidas implementadas no
período de 1995/98.
Com essa reforma, a governadora se propõe a estabelecer estratégias com o objetivo de
realizar o saneamento das finanças públicas e a ―
modernização dos sistemas administrativos‖.
Acabou-se com a figura do secretário de estado, substituindo as vinte e duas secretarias
existentes por oito Gerências de Estado, responsáveis pelas áreas de Infra-Estrutura,
Qualidade de Vida, Desenvolvimento Humano, Desenvolvimento Social, Justiça, Segurança
Pública e Cidadania, Planejamento e Desenvolvimento Econômico, Administração e
Modernização, e Receita Estadual.
Instituíram-se, também, dezoito Gerências Regionais nos municípios-sede das chamadas
―
regiões administrativas‖, dentre elas a Gerência Metropolitana de São Luís, administrada, no
seu governo, pelo engenheiro-perito, Max Barros, deputado federal (PFL/MA) na legislatura
de 2002-2006. Cada Gerencia Regional ficou responsável em promover a integração de todas
as ações do poder estadual na região, supervisionar as unidades operacionais ali instaladashospitais, escolas, postos de saúde, centros sociais, equipamentos culturais, etc.- e executar
diretamente as atividades de competência estadual.
Silva (2001), na sua análise da Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro, nos anos
1990, observa que a Reforma Administrativa realizada no governo Roseana Sarney tem os
mesmos eixos estruturantes da reforma realizada pelo governo federal. A autora afirma:
A flexibilização pretende ser alcançada por meio da autonomia de gestão da
máquina, via a criação das Agências Executivas e das Organizações Sociais que,
por sua vez, substituirão as autarquias e as fundações públicas. Como se observa,
os eixos estruturantes da reforma do aparelho do Estado no Maranhão são os
mesmos que orientam o Plano Diretor da Reforma do aparelho do Estado
encaminhado pelo governo federal, posto que consistem em adotar os critérios da
eficiência e da racionalidade administrativa na gestão pública e transferir para o
setor público não-estatal a prestação dos serviços públicos. (SILVA; 2001:173)
Segundo a visão de Silva (2001), Roseana Sarney rearticulou por essa ―
reforma
administrativa‖, as correlações de forças do campo político pelo princípio do ―
dividir para
governar‖. As Gerências de Desenvolvimento Regional não possuíam autonomia
53
orçamentária e administrativa. Seu papel no projeto da reforma é estender o poder da
governadora a cada região do estado, por meio da qual se assegura o controle das bases
eleitorais e se institucionaliza a prática clientelista. Verifica-se, então, que diluiu pela criação
das Gerências Regionais, a concentração de poder dos políticos circunscritos em pequenas
regiões ou municípios. Ao mesmo tempo, adensou o poder em torno das decisões centradas
em suas mãos, já que as Gerências de Estado pareciam ter alcance de manobra mais limitado,
por meio da sua presença direta nas ações de governo.
No segundo mandato Roseana Sarney (PFL) exerceu suas atividades somente até 2001,
pois a governadora renunciou para candidatar-se à Presidência da República. O ano de 2001
foi assumido pelo então vice-governador José Reinaldo Tavares, reeleito em 2002 com o
apoio ‗dos Sarney‘. Entretanto, posteriormente José Reinaldo rompe com a ‗família Sarney‘ e
declara nas eleições de 2006 apoio ao candidato Jackson Lago (PDT), atual governador do
Maranhão.
Jackson Lago (PDT) venceu as eleições de 2006, em uma disputa apertada, conseguindo
51,82% dos votos válidos. Já Roseana Sarney (PFL), atual governadora do Estado, ficou com
48,18%. Não tive a intenção de me aprofundar na análise da política maranhense no decorrer
dos 24 anos que compreendem o recorte temporal da pesquisa. Correndo o risco de ser
superficial, mostrei uma visão bem sintética do cenário político maranhense nesse período,
visando fornecer ao leitor algumas informações sobre o contexto em que se insere a pesquisa.
Para não ficar apenas nos registros históricos, apresentarei adiante algumas concepções das
deputadas sobre ―
fazer política‖ no Maranhão, antes analiso alguns dados sobre os percursos
das deputadas federais e estaduais no Maranhão.
3.2 Gênero e Profissionalização política no Maranhão
(...) pode a variável de gênero isolada, determinar a sua influência sobre as práticas, representações e discursos
políticos? Outras variáveis parecem igualmente determinantes, como a percepção política, o perfil sociológico,
características pessoais, as experiências militantes precedentes, socialização política, a região eleitoral, etc.
(GUIONNET, 2002:115)
Pelo levantamento de informações sobre as características sociais das deputadas eleitas
no Maranhão, busquei identificar as variações das estruturas e volumes de capitais dessas
mulheres e o uso de tais recursos nas diferentes modalidades de construção de suas carreiras
políticas. Como desenvolveram o ―
trabalho político‖ na busca pelo reconhecimento dos
54
profanos? Que características sociais foram reconvertidas para política? Considero que o
processo eleitoral está relacionado às mais diferentes esferas, as lógicas do estabelecimento
dos vínculos que podem passar a compor as bases eleitorais dessas mulheres não são
redutíveis à lógica eleitoral. Conforme ressalta Coradini (1998):
(...) a eficácia do ―
trabalho político‖ decorre dos recursos e possibilidades de
manipulação das relações e sentidos contidos nessas diferentes esferas, a partir
de uma perspectiva de acumulação de capital político. Essas esferas incluem, por
exemplo, relações de parentesco, de ―
liderança‖ corporativa (sindicato de
professores, de trabalhadores rurais, de ―
empresários‖, de ação ético-religiosa, de
vizinhança (a ―
comunidade‖) e afinidades sociais e de estilo de vida (os clubes,
as ―
festas‖, os ―
desportes‖), por fim, sem pretensão de exaustão, relações
estabelecidas por meio da ocupação de cargos públicos‖ (CORADINI, 1998:112113).
Inspirei-me, também, em alguns estudos desenvolvidos na França, que relacionaram o
processo de especialização política e a questão de gênero34 (Guionnet 2002, Achin 2005,
Dulong e Lévêque 2002). Todos têm em comum a influência da abordagem sócio-histórica da
política de Offerlé (1996, 1999) no estudo das formas de acesso à política, perspectiva que
adoto no presente estudo.
Guionnet (2002) buscou identificar em que medida a variável de ‗gênero‘ foi utilizada
como identidade estratégica para legitimar a inserção das mulheres na política, nas eleições
municipais francesas de 2001. A autora observou como que num contexto de ‗crise política‘
uma variável que era historicamente rejeitada- o gênero - pode ser utilizada associada à idéia
de necessidade de renovação das práticas políticas 35, como uma espécie de savoir faire
feminino específico. Identificou ainda que as mulheres apesar de outsiders- devido a posição
de novatas que ocupavam no campo político- havia casos em que a condição de neófita tinha
que ser relativizada, pois algumas mulheres tinham adquirido uma experiência prévia que
contribuía na socialização política, como militância em sindicatos, participação em
34
Adoto a perspectiva de Scott (1990) cuja contribuição serviu para se pensar a diferença sexual e a sexualidade
como construções sociais que sofrem variações históricas e culturais. A autora ressalta ainda que ―
o gênero‖ é
um elemento constitutivo das relações sociais, sendo estas relações significantes de poder.
35
(...) Là où les femmes expliquent qu‘elles sont plus proches des citoyens, plus humaines et plus pragmatiques
parce qu‘elles s‘occupent des enfantes, entretiennet les relations familiales et doivent mener une double vie de
labeur (domestique et remunere), les ouvriers vantaient leurs qualités de travailleurs énergiques, honnêtes,
simples, désintéressés, généreux et dévoués. (GUIONNET, 2002:125)
55
associações ou envolvimento nas campanhas do marido, mostrando como na análise do uso
do recurso de ‗gênero‘ nas disputas eleitorais é preciso considerar também a posição social
dessas mulheres.
Nessa mesma linha Dulong e Lévêque (2002) realizaram uma pesquisa sobre o uso do
‗gênero‘ como prática de mobilização eleitoral. Por meio de uma enquete com homens e
mulheres, com perguntas como “Quais as qualidades necessárias para se fazer uma boa
campanha?” buscaram identificar se o gênero influencia nas representações sobre o métier
político. Nas respostas pode ser observado que as qualidades requisitadas para fazer
campanha ou exercer um mandato municipal varia sensivelmente de acordo com o gênero,
idade e experiência política dos agentes entrevistados. Os homens evocavam mais saberes
técnicos enquanto que as mulheres se reportavam mais às qualidades morais e de
relacionamento, como saber ouvir, compreender, conhecer a população, ser honesta.
Outro estudo que contribuiu para orientar as diretrizes dessa pesquisa no que concerne à
articulação entre gênero e política nas campanhas foi o trabalho de Barreira (1998). A autora
traça um perfil de candidatas à Prefeitura das cidades de Fortaleza, Natal e Maceió durante as
eleições de 1996. Focaliza na trajetória das candidatas, na discussão dos símbolos de
campanha e dinâmica dos conflitos eleitorais, explorando a dimensão simbólica de processos
eleitorais, caracterizados pela presença de ritos e discursos de campanha alusivos à condição
de gênero, que incorporam a construção de espaços de identificação entre candidatas e
público e diferenciação entre candidatas.
Apresento agora alguns dados sobre os percursos das deputadas federais no Maranhão e
posteriormente alguns depoimentos, retirados das entrevistas que realizei com as deputadas,
sobre suas concepções acerca do uso da variável de gênero como trunfo nas campanhas e
quais suas concepções sobre as habilidades e competências necessárias para entrar nas
disputas políticas.
3.3 Deputadas Federais Maranhenses: percursos e comparações
O Legislativo Federal continua sendo um espaço de difícil acesso às mulheres. Nas
eleições de 1982 e 1986, não houve mulheres eleitas para o cargo de deputada federal no
Maranhão. Os dados revelam que num período de 24 anos, elegeram-se no Maranhão apenas
4 deputadas federais, como mostra o quadro abaixo.
56
Quadro 5- Mulheres eleitas deputadas federais no Maranhão (1982-2006)
ANO
N. DE MULHERES
ELEITAS
NOME DAS
DEPUTADAS
PARTIDO
1982
1986
1990
1994
1998
2002
0
0
1
1
1
2
----ROSEANA SARNEY
MÁRCIA MARINHO
NICE LOBÃO
TEREZINHA
FERNANDES
----PFL
PSC
PFL
PT
NICE LOBÃO
2006
1
NICE LOBÃO
PFL
PFL (atual
DEM)
Os dados mostram, ainda, que no Maranhão prevalecem deputadas federais vinculadas
às agremiações partidárias tidas como de ―
direita‖. Entre as quatro deputadas, duas delas se
elegeram pelo PFL (uma hoje é filiado ao PMDB), uma pelo PSC e apenas uma pelo PT. Ao
se comparar os dados no que tange ao número de deputadas federais eleitas no Rio Grande do
Sul36 de 1982 a 2006 e às filiações partidárias destas, observa-se que, assim como no
Maranhão, a presença das mulheres permaneceu pouco significativa em termos numéricos,
foram eleitas nesse período apenas sete deputadas federais. As mulheres passam a marcar
presença na bancada de parlamentares do RS apenas em 1994, com a eleição de Ester Grossi
pelo PT e Yeda Crusius pelo PSDB. Em relação aos partidos das deputadas federais eleitas no
RS, diferentemente do Maranhão, cinco são de partidos situados à ―
esquerda‖, sendo três
ligadas ao PT, uma inicialmente ao PT e depois ao PSOL e uma ao PCdoB, contra duas que
pertencem a siglas localizadas mais ao centro (PSDB e PTB)
A partir do conjunto de casos, sistematizei os dados sobre os percursos das deputadas
federais no Maranhão com base nas seguintes variáveis: primeiro cargo eletivo, idade que
ocupou o primeiro cargo, número de mandatos, ocupação de cargos públicos e laços de
36
Para uma comparação mais detalhada sobre a especialização política nesses dois estados, ver Grill (2007):
Processos, Condicionantes e Bases Sociais da Especialização Política no Rio Grande do Sul e no Maranhão.
57
parentesco com ascendente político, como pode ser observado no quadro 6. Faço
comparações entre os casos e relaciono com os dados de Barreira (2006) e Grill (2007).
58
Quadro 6- Quadro sinótico dos percursos das deputadas federais no Maranhão (1982-2006)
DEPUTADA
PRIMEIRO
CARGO
ELETIVO
IDADE QUE
OCUPOU O
PRIMEIRO
CARGO
ELETIVO
ROSEANA
SARNEY
Deputada Federal
37 anos
NÚMERO DE
MANDATOS e
CARGOS
ACUMULADOS
NA CARREIRA
ELETIVA
1 mandato de
deputada federal
(1991 a 1994);
2 mandatos no
governo do
Estado do
Maranhão (1995 a
2001)
Senadora (desde
01/02/2003)
FORMAÇÃO/PROFISSÃO
Ciências Sociais- UNB
OCUPAÇÃO DE
CARGOS
PÚBLICOS
ANTERIORES AO
MANDATO DE
DEPUTADA
- Assessora no Quadro
Técnico
da
Companhia
Urbanizadora da Nova
Capital do Brasil
(NOVACAP) de 1974
a 1976;
-Assessora do
Secretário de Viação
de Obras de 1977 a
1978;
-Técnica em
planejamento do
Instituto de
Planejamento
Econômico e Social
em 1979;
- Gerente Operacional
do Programa Nacional
de Centros Sociais
Urbanos (PNCSU) do
Instituto de
Planejamento
Econômico e Social
(IPEA) em 1980;
LAÇOS DE
PARENTESCO COM
POLÍTICO
Avós, tios-avó, Pai (foi
deputado, senador pelo
Maranhão entre 1971 e
1985, governador do
Maranhão entre 1966 e
1971 e Presidente da
República de 1985 a
1990), tios, irmãos.
59
Assessora do Gabinete
Civil do Governador
do Estado do
Maranhão em 1981;
- Secretária de Estado
para Assuntos
Extraordinários;
Assessora do Senado
Federal;
Assessora do Gabinete
Civil da Presidência
da República de 1985
a 1989;
MÁRCIA
MARINHO
Deputada Federal
31 anos
NICE LOBÃO
Deputada Federal
62 anos
TEREZINHA
FERNANDES
Deputada Federal
47 anos
1 mandato de
deputada federal
(1995 a 1998)
1 mandato de
prefeita em
Caxias (2001 a
2004)
3 mandatos de
deputada federal
(1998- atual)
1 mandato de
deputada federal
Medicina- UFMA
Secretária Municipal
da Criança e Ação
Social, em Caxias,
Maranhão, de 1993 a
1994.
Cônjuge (esposo foi
eleito prefeito de Caxias
em 1992 e deputado
federal de 2002 a 2005)
Ensino Médio
Secretária da Ação
Social do Estado do
Maranhão de 1991 a
1994.
Letras- UFMA
Secretária Municipal
do Desenvolvimento
Social, em ImperatrizMaranhão de 2001 a
2002.
Cônjuge (esposo foi
deputado federal de 1979
a 1987, senador de 1987
a 1991, governador do
Maranhão de 1991 a
1994 e senador 1995atual)
Cônjuge (esposo foi
deputado estadual de
1999 a 2000 e prefeito de
Imperatriz de 2001 a
2004)
60
Quando Barreira (2006) apresenta os dados sobre cargo eletivo anterior das
deputadas federais no Brasil, afirma que apenas 21% elegeram-se deputada federal sem
terem cargos eletivos anteriores. Uma parte significativa já tinha ocupado algum cargo
eletivo anteriormente: “As representantes, antes de serem eleitas deputadas federais,
eram deputadas estaduais, vereadoras e prefeita” (BARREIRA, 2006:9). A autora
chama atenção, também, para a ideia de continuidade ou reprodução das funções
legislativas, sendo que um número expressivo das deputadas tinha mandatos anteriores
de deputada federal.
Quadro 7- Cargo eletivo anterior das deputadas federais no Brasil
Cargo eletivo anterior das deputadas
%
Deputada Federal
44%
Deputada estadual/distrital
21%
Vereadora
12%
Prefeita
2%
Não teve
21%
Construído com base nos dados de Barreira (2006)
Essa constatação se difere do que acontece no Maranhão. Como pode ser
observado no quadro sinótico, o acesso dessas mulheres de forma direta ao Legislativo
Federal, sem passar pelo cargo de vereadora, deputada estadual ou prefeita é de 100%.
Dado que não difere muito dos homens no Maranhão, conforme aponta a pesquisa de
Grill (2007), quando compara os deputados do Rio Grande do Sul com os do Maranhão
no que concerne ao primeiro cargo eletivo ocupado:
Os dados mostram que no RS 47% dos deputados federais começaram a
carreira eletiva por posições locais, como vereadores (39%), viceprefeitos e prefeitos (8% somados); contra apenas 18% no Maranhão que
iniciaram por posições do mesmo tipo, isto é, como vereadores (12%) e
como prefeitos e vice-prefeitos (6%). Contrariamente, no Maranhão 80%
dos agentes investigados debutaram na ocupação de cargos eletivos como
deputados federais (44%) ou estaduais (36%). (GRILL, 2007:10-11, grifo
meu)
No Rio Grande do Sul, quatro deputadas começaram suas carreiras de cargos
políticos por postos nos primeiros escalões (três como secretárias municipais e uma
como ministra) e três por mandatos eletivos (duas como vereadoras e uma como
deputada estadual).
61
No Maranhão há um espaço político pouco competitivo e mais fechado, pois não
se observa a passagem dessas deputadas por diferentes cargos na hierarquia política,
nem mesmo pelo de deputada estadual. Contrastando com a percentagem de cargo
eletivo anterior das deputadas brasileiras apontadas por Barreira (2006), onde 12% já
tinham sido vereadoras, 21% deputada estadual e 44% ocuparam o mesmo cargo de
deputada federal na legislação anterior. No Maranhão as 4 mulheres que conseguiram
ser eleitas deputadas federais não iniciaram suas carreiras por posições periféricas e
quando prevalece o ingresso ―
por cima‖ na carreira política eletiva, quer dizer,
diretamente pela ocupação de cargos mais altos na hierarquia política, o controle e a
seleção prévia por parte dos agentes já estabelecidos ou das máquinas políticas se
mostram decisivos, característica de contextos políticos marcadamente oligárquicos,
como é o caso do Maranhão.
O estudo de Costa (1998) sobre a Bahia e outros estados do nordeste brasileiro
conclui que é maior o número de mulheres eleitas pelos grandes partidos e os ‗mais
conservadores‘ nos estados que permanecem sob o controle das ‗oligarquias‘,
perpetuando os compromissos familiares. Nesses estados, a ideologia feminista é
precariamente adotada por parte das eleitas e o exemplo de mulheres que ascendem à
elite política pela via dos movimentos sociais são reduzidos. Segundo o estudo de Costa
(1998) no Nordeste, entrada das mulheres em altos cargos eletivos da hierarquia
política, quando ocorre, na maioria das vezes, se dá em virtude das próprias relações
familiares, perpetuando valores da elite tradicional. As oligarquias se utilizam das
relações de parentesco para preencher os cargos do poder. Segundo Avelar (2001:50)
“se as mulheres ascendem por esses canais, sua atuação nada tem a ver com as
mudanças propostas pelas gerações de mulheres que lutaram pela estruturação de sua
própria identidade política”.
Quanto às informações sobre idades de ocupação do primeiro cargo eletivo, estas
traduzem diferenças quando se compara deputados e deputadas no Maranhão. A
pesquisa de Grill (2007) revela um ingresso mais cedo entre os homens, mais de 70%
dos casos estrearam com idade inferior a 35 anos, sendo que no Maranhão 25% antes
dos 25 anos. As deputadas maranhenses estrearam na carreira política de forma mais
―
tardia‖ quando comparadas aos deputados. Entre as mulheres eleitas deputadas federais
no Maranhão, apenas Márcia Marinho ocupa o cargo antes dos 35 anos. As
62
parlamentares eleitas pelo Rio Grande do Sul dividem-se entre aquelas que entraram na
arena de cargos eletivos precocemente (antes dos 30 anos) - Luciana Genro, Maria do
Rosário e Manuela D‘Ávila - e as demais – Kelly Moraes, Ester Grossi, Yeda Crusius e
Ana Corso (com 40, 59,50 41 anos) - que entraram tardiamente (depois dos 40 anos).
As deputadas federais do Maranhão ingressaram na carreira eletiva após os 30 anos (31,
37, 47 e 62 anos).
Avelar (2001) chama atenção para os ciclos de vida da mulher que, em geral, são
segmentados conforme a situação conjugal e a maternidade como um dos fatores que
contribuem para uma entrada ―
tardia‖ das mulheres. Mais adiante apresento alguns
relatos das deputadas entrevistadas quanto à difícil conciliação entre a dedicação
familiar e a política. Avelar (2001) destaca:
Com o casamento, a mulher amplia o campo de suas tarefas domésticas,
assumindo outras responsabilidades que irão demandar mais tempo e
energia. Com a maternidade, mais ainda, tempo e energia tornam-se
cruciais na vida da mulher. As tarefas extra-família tornam-se cada vez
mais seletivas. Já a paternidade não significa necessariamente alteração
no estilo de vida, razão pela qual os homens podem continuar
desempenhando tarefas envolventes, como é o caso da política.
(AVELAR, 2001:153)
Isso não significa que devemos desconsiderar o que impõe a especialização na
política no que se refere a uma dedicação da maior parte do tempo dos agentes às
atividades políticas. Na carreira eletiva elas podem ter entrado com uma idade mais
avançada do que os deputados, mas todas tiveram atuação prévia em esferas sociais
distintas, que possibilitam um aprendizado lento e progressivo, podendo reproduzir
reconhecimento nas disputas eleitorais, como, por exemplo, atuação de Terezinha
Fernandes no movimento estudantil, atuação partidária e trabalhos desempenhados nas
campanhas do esposo.
Ainda vale destacar que a que entrou mais tarde, Nice Lobão, é a que tem o maior
número de mandatos como deputada (está no terceiro mandato, somando atualmente 10
anos de mandatos eletivos).
Roseana Sarney iniciou na carreira eletiva em 1991
quando assumiu como deputada federal foi eleita por dois mandatos consecutivos
governadora do Maranhão (1994 e 1998) e atualmente é senadora, somando um total de
63
mais de 16 anos de mandatos eletivos. Márcia Marinho depois de ser deputada federal
foi eleita em 2000 prefeita do município de Caxias e atualmente tenta retornar à
prefeitura de Caxias sendo candidata pelo PMDB. Esses dados revelam a busca de
continuidade dessas mulheres no interior do espaço político maranhense, próprio da
exigência da profissionalização política.
Somando-se ao tempo de mandatos eletivos, no estudo da profissionalização
política no Maranhão, pude identificar outras variáveis que estabeleceram pistas quanto
à lógica do sucesso dessas mulheres nas urnas. Questionei se houve ou não uma
reconversão de uma notoriedade profissional, se tiveram acesso ao ensino superior; se
estas possuem ou não parentes que ocuparam ou ocupam cargos eletivos; se estas
ocuparam cargos não eletivos (tais como secretarias, presidência de partido)
previamente; participaram ou não de algum movimento social.
Quanto ao grau de escolarização das deputadas, o investimento no título superior
só não é observado em uma deputada, Nice Lobão. Entre os homens a importância dada
ao diploma de curso superior também é notória, dentre os deputados estudados por Grill
(2007) 85% possuem título superior.
Entre as deputadas maranhenses e gaúchas, em termos de escolarização destacase a predominância de casos com títulos superiores, a formação em cursos ligados às
áreas de humanas no dois estados e observa-se a maior diversificação das vias de
obtenção de títulos superiores no Rio Grande do Sul em relação ao Maranhão. Entre as
sete deputadas gaúchas, seis possuem curso superior, sendo que: uma formada em
pedagogia pela UFRGS; outra em educação artística pela UCS; outra em Letras pela
PUC de Porto Alegre; outra em matemática pela PUC (com mestrado e doutorado);
outra em Jornalismo também na PUC e Ciências Sociais incompleto na UFRGS; e; por
fim; uma em economia pela USP (com especialização e mestrado). Entre as quatro
deputadas maranhenses, três possuem curso superior, sendo que: uma é formada em
Ciências Sociais pela UNB; outra em Letras pela UFMA; e, finalmente, a terceira em
medicina pela UFMA. (Grill, 2007)
Isso se traduz em diferentes ocupações exercidas. No Rio Grande do Sul, as cinco
deputadas que exerceram uma profissão antes de assumir um cargo político são ligadas
ao magistério. No Maranhão, as três deputadas que atuaram profissionalmente estiveram
vinculadas a funções públicas (administrativas). O que corrobora as indicações sobre o
64
conjunto dos casos que apontam para o peso das carreiras como professores entre
deputados gaúchos e a relevância da passagem por cargos administrativos entre
deputados maranhenses.
Quanto ao grau de escolarização e o uso destes como trunfo político, destaco o
acionamento feito de forma diferenciada por Roseana Sarney e Terezinha Fernandes, ao
se beneficiarem do espaço acadêmico. Enquanto a primeira fez uso nos jornais do título
de socióloga na campanha de 1990, a segunda utiliza-se muito mais do espaço
acadêmico na constituição de seu capital político oportunizado pela participação no
movimento estudantil, do que do título propriamente, mais adiante retomarei de forma
mais detalhada a trajetória política de Terezinha Fernandes. Como aponta Grill (2007)
―
os trunfos oportunizados pelo acesso ao ensino superior (título, relações, socialização
no movimento estudantil, entre outros) são extremamente relevantes para o
desdobramento das carreiras políticas‖.
Gonçalves (2006), em seu estudo sobre a trajetória política de Roseana Sarney,
destaca os atributos e autodefinições de validação de seu capital simbólico referido à
Campanha Eleitoral de 1990.
Vem à tona a formação acadêmica de Roseana Sarney Murad- atributo de
sustentação do peso do capital simbólico que afirma deter,
independentemente de seu pai José Sarney. Ser ―
socióloga‖ constitui-se
em capital cultural legitimador que autoriza seu discurso. Falará na
condição de candidata, mas de uma candidata que é ―
socióloga‖.
(GONÇALVES, 2006:95)
Barreira (2006) quando fala no capital político das deputadas e senadoras
apresenta situações diferentes que podem ser complementares para se pensar em um
perfil político das representantes no Congresso Nacional. A autora destaca duas
condições relevantes para a conquista de cargos de representação política: o capital
político de base familiar e a participação em movimentos sociais. Mostra que 36% das
deputadas e senadoras iniciaram a vida política em movimentos sociais diversos
(incluindo lutas sindicais, movimento estudantil, luta pela terra e movimento feminista)
e 25% tiveram influência familiar via filiação ou matrimônio com ascendente político e
17% ocuparam cargos de confiança em secretarias do governo. Nas palavras da autora:
65
Mulheres apoiadas por sindicatos, defensoras de interesse feministas ou
atuantes em partidos políticos atestam a importância de se pensar na
elaboração de carreiras políticas mediante formas visíveis de atuação no
espaço público. A influência familiar também contribui para a ocupação
de cargos legislativos (esposas ou filhas de político) ocorrendo também
situações de parentesco não excludentes com a participação em
movimentos sociais variados (BARREIRA, 2006:12).
No Maranhão, a ocupação de cargos públicos e relações de parentesco com
políticos são variáveis sociais que podem ser identificadas em todas as deputadas
federais eleitas no período compreendido da pesquisa. Roseana Sarney foi a que ocupou
o maior número de cargos públicos antes de se eleger deputada federal, é também a que
possui vínculos de parentesco com diferentes ascendentes políticos.
Márcia Marinho foi nomeada secretária municipal da Criança e Ação e Social em
Caxias no período em que seu marido Paulo Marinho foi prefeito do referido município
de 1993 a 1996. Nice Lobão ocupou o cargo de Secretária de Ação Social do Estado do
Maranhão no período de 1991 a 1994, sendo seu esposo Edison Lobão governador do
Estado nesse mesmo período. E Terezinha Fernandes foi Secretária Municipal do
Desenvolvimento Social de Imperatriz entre 2001 e 2002, nesse período seu esposo
Jomar Fernandes era prefeito de Imperatriz.
No Rio Grande do Sul, casos de relações de parentesco com políticos das
mulheres eleitas deputadas também podem ser identificados, duas das deputadas
federais que iniciaram a carreira como secretárias municipais (Ana Corso do PT e Kelly
Moraes do PTB) chegaram ao cargo nas gestões dos maridos prefeitos. Uma das atuais
deputadas federais do Rio Grande do Sul, Luciana Genro, é filha de um ex-vereador,
deputado federal, vice-prefeito e prefeito de Porto Alegre, além de ser Ministro do
governo de Luís Inácio Lula da Silva há 6 anos. Outra parlamentar, Maria do Rosário, é
casada com um importante dirigente do Partido dos Trabalhadores que já concorreu a
deputado estadual e ocupou cargos de primeiro escalão nos governos controlados pelo
partido no município de Porto Alegre, no estado e no país.
Outra variável que destaquei na pesquisa como recurso de legitimação foi o
trabalho das representantes no Congresso Nacional. Os dados do quadro 8 mostram que
relativizando a idéia de divisão hierárquica do trabalho político das mulheres na
Câmara, Roseana Sarney, quando foi deputada federal, não ocupou as comissões cuja
presença de mulheres é mais significativa, como Seguridade Social e Família. Na
66
atuação de Márcia Marinho, Terezinha Fernandes e Nice Lobão pode ser observado a
participação em comissões cujos temas em geral são considerados típicos do espaço
feminino. Um dado merece ser mencionado, Barreira (2006) afirma que de fato, nunca
houve até hoje nenhuma deputada presidente da Mesa Diretora da Câmara. Mostro nos
quadros abaixo a participação nas comissões das deputadas federais maranhenses e em
seguida com uma finalidade comparativa, apresento o quadro sistematizado por Barreira
(2006) com a distribuição nas comissões das 42 deputadas federais eleitas no Brasil em
2002.
Quadro 8- Participação das deputadas federais maranhenses nas comissões
ROSEANA SARNEY
Atuação da deputada
Período
Suplente da Comissão de Relações Exteriores
1991-1992
Titular da Comissão de Economia, Indústria e Comércio
1991-1992
Suplente da Comissão Mista da Conferencia das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente
1992
Titular da Comissão Especial PEC n51/90 sob a Antecipação do Plebiscito
1992
Titular da Comissão Especial PEC n45/91 que altera a Legislação Eleitoral
1992
Suplente da Comissão Especial do Projeto de Lei sobre Legislação Consultoria
1992
Vice-líder do Governo Federal na Câmara dos Deputados
1992-1993
Titular da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias
1993
Suplente da Comissão de Educação, Cultura e Desportos
1993
Titular da Comissão de Educação, Cultura e Desportos
1994
Membro do parlamento Latino-Americano
---
Coordenadora-geral do processo que resultou no impeachment do presidente
Fernando Collor, na Câmara Federal.
---
Fonte: www.senado.gov.br
67
MARCIA MARINHO
Atuação da deputada
Titular da Comissão Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática
Período
1995
Suplente da Comissão Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática
1996-1998
Suplente da Comissão Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias.
1998-1999
Titular da Comissão Desenvolvimento Urbano e Interior
1997
Titular da Comissão Direitos Humanos
1997
Suplente da Comissão Educação, Cultura e Desporto
1995
Suplente da Comissão Seguridade Social e Família
1995-1996
Titular da Comissão Seguridade Social e Família
1996-1999
Trabalho, Administração e Serviço Público,
1995-1996
Titular da Comissão especial de Implementação das Decisões da IV
Conferência Mundial da Mulher: Titular, 1997
1997
Suplente da Comissão PEC nº 25/95, Modifica Caput Art. 5º da Constituição
Federal, Inviolabilidade do Direito a Vida:
1995-1996
Titular da Comissão PEC nº 33-A/95, Altera Sistema de Previdência Social
1995-1996
Suplente da Comissão PEC nº 82/95, Recursos da Seguridade Social ao SUS
1998-1999
PL nº 1.673/96, Doação de Açudes pelo DNOCS: Suplente
1997-1999
PL nº 4.425/94 do Senado Federal, Planos e Seguros de Saúde: Suplente
1996-1997
PL nº 464/95, Critérios de Proteção e de Integração Social aos Portadores de
Deficiência: Suplente
1996-1997
Procuradoria Parlamentar: Suplente
1995-1999
CPI - Adoção e Tráfico de Crianças Brasileiras: Titular, 1995-1996.
1995-1996
Fonte: www.camara.gov.br
NICE LOBÃO
Atuação da deputada
Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional: Suplente
Período
2005
68
Desenvolvimento Urbano: Suplente
2005-2006
Titular Direitos Humanos
2005-2006
Economia, Indústria, Comércio e Turismo: Suplente
2006
Educação e Cultura
2007
Finanças e Tributação: Suplente
2005
Titular da Comissão Relações Exteriores e de Defesa Nacional
2005
Titular da Comissão Seguridade Social e Família
2005
Fixação do Salário Mínimo: Titular
---
PEC nº 3/99, Mandato Eletivo: Titular
---
PEC nº 54/99, Quadro Temporário Servidor Público: Titular
---
PEC nº 137/99, Subteto: Suplente
---
PEC nº 306/00, Plano Nacional de Cultura: Titular
---
Sessão Legislativa/Posse: Titular
---
PEC nº 374/96, MPU: Suplente
---
PEC nº 601/98, Direitos Sociais: Titular
---
PL nº 1.399/03, Estatuto da Mulher: Titular
---
PL nº 1.756/03, Lei Nacional da Adoção: Suplente
---
PL nº 3.198/00, Estatuto da Igualdade Racial: Suplente
---
PL nº 3.561/97, Estatuto do Idoso: Primeira-Vice-Presidente e Titular
---
PL nº 5.234/05, Proteção Crianças Ameaçadas de Morte: Titular
2006
PLP nº 18/99, Responsabilidade Fiscal: Suplente
---
CPI: Biopirataria: Titular
---
Mortalidade Materna: Titular.
---
Fonte: www.camara.gov.br
TEREZINHA FERNANDES
Atuação da deputada
Período
Titular da Comissão Amazônia e de Desenvolvimento Regional
2005
Titular da Comissão de Desenvolvimento Urbano
2005
69
Suplente da Comissão Fiscalização Financeira e Controle
2006
Titular da Comissão Minas e Energia
2006
Titular da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional
2005
Suplente da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional
2006
PL nº 1.756/03, Lei Nacional da Adoção: Suplente
---
PL nº 3.337/04, Agências Reguladoras: Titular
---
PL nº 5.234/05, Proteção Crianças Ameaçadas de Morte: Titular
---
PLP nº 76/03, SUDENE: Suplente
---
PLP nº 91/03, SUDAM: Titular
---
PEC nº 007/03, Agentes Comunitários de Saúde: Suplente
---
Titular da Comissão Externa: Acidente na Base de Alcântara
---
Fonte: www.camara.gov.br
Quadro 9- Participação das deputadas federais nas comissões (2003 a 2006)
COMISSÃO
Nº. TOTAL DE TITULARES
Agricultura, Pecuária, Abastecimento e
Desenvolvimento rural
Amazônia, Integração Nacional e
Desenvolvimento Regional
Ciência e Tecnologia
Constituição e Justiça e de Cidadania
Defesa do Consumidor
Desenvolvimento Econômico, Indústria e
ComércioDesenvolvimento Urbano
Direitos Humanos e Minorias
Educação e Cultura
Finanças e Tributação
Fiscalização Financeira e Controle
Legislação Participativa
Comissão de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável
Minas e Energia
Relações Exteriores
Segurança Pública e Combate ao Crime
Organizado
Seguridade Social e Família
Trabalho, Administração e Serviço Público
Turismo e Desporto
Apud: Barreira (2006)
40
Nº. DE
MULHERES
TITULARES
01
17
03
40
60
20
14
02
02
02
01
17
13
32
30
17
14
16
03
02
08
01
01
04
00
26
30
17
02
02
00
33
25
18
07
04
01
70
Os dados explicitam que, quando se compara a participação nas comissões das
deputadas federais eleitas no Maranhão com os dados das deputadas eleitas em todo
Brasil, identifica-se uma frequência de mulheres em certas comissões, tais como
Comissão de Educação e Cultura e Comissão de Seguridade Social e Família. Esse fato,
não é uma peculiaridade apenas do contexto brasileiro, o estudo de Guionnet (2002)
sobre a participação de mulheres na política francesa, ressalta um maior envolvimento
delas com questões ligadas à área social, da educação e cultura, a autora destaca:
A ce propôs l‘enquête diffusée par Libération de 31 mars 2001: sur 85
grandes Villes françaises, 65% des femmes de l‘exécutif municipal sont
affectées à l‘action sociale, 62% à l‘éducation, 40% à la culture, 35% à
l‘environnement, 23% à la politique de la ville, 15% aux finances, 15% a
La sécurité, 15% aux sports, et 11% aux transports. (GUIONNET,
2002:9)
3.4 - O espaço de concorrência política a partir das representações dos agentes
O espaço da política é o espaço onde os concorrentes se opõem a partir de
concepções sobre o mundo social e visões sobre a ―
política‖. Por meio das entrevistas
realizadas com sete mulheres que conseguiram ‗entrar na política‘ maranhense (duas exdeputadas estaduais, uma ex-deputada federal e quatro deputadas estaduais da atual
legislatura) busquei identificar quais os princípios que regem a disputa eleitoral no
Maranhão, na ótica das mulheres. A apresentação dos depoimentos a seguir visa
destacar os aspectos mencionados e valorizados pelas deputadas como qualidades
necessárias para se fazer política. Segue abaixo alguns relatos.
Você tem que ter vivência, você tem que ter cultura. Hoje por exemplo
nas discussões, na busca dos projetos, se você não tiver conhecimento a
coisa passa despercebida. (...) Quando você não tem um nível muito bom
de cultura, não tem muito conhecimento fica difícil e se for mal
assessorado, fica ainda mais difícil, porque não tem que lhe abra. (...) Eu
acho que você tem ter cultura e tem que ter amigos, para você
deslanchar no seu trabalho. Se você tem um conhecimento muito
grande, mas se você não tem amizade, com os seus amigos que estão lá
71
fazendo as secretarias, que passam esse senso de responsabilidade, de
comprometimento que você tem... as pessoas não tem interesse em lhe
ajudar, é nesse aspecto. (...) Eu entrei em quase todas as áreas onde
tinha necessidade. Porque você vê a minha vida começava às sete horas e
não tinha hora para acabar... meia noite, uma hora. Eu passei doze anos
assim. Porque você ta na Assembléia e lá você esta a mil por hora e de lá
você vai para as secretarias, para levar as solicitações dos bairros.
Nossa não é fácil é muito difícil. (Marly Abdalla, entrevista em 05/03/07)
Olha do meu ponto de vista, a minha expectativa é o Dutra que já tem
experiência então o Dutra tem possibilidade de se destacar. O Flávio,
porque o Flávio tem domínio em uma área, que é essa área mais ligada
ao Direito, ao mundo do Direito. Ele tem essa possibilidade. (...) Na
tribuna o Dutra se destaca. O Dutra tem destaque como orador, que ele
vai e fala mesmo, ele é falador. (Terezinha Fernandes, entrevista em
03/04/07)
No primeiro trecho, reproduzido da entrevista, a fala é da ex-deputada estadual
Marly Abdalla, viúva do ex-presidente da Federação das Indústrias Alberto Abdalla.
Esta teve três mandatos no Maranhão pelo antigo PFL, de 1990 a 2002. Foi candidata a
vice-prefeita de São Luís em 2004, exerce a direção da Universidade Integrada da
Terceira Idade- UNITI na UFMA desde 2005 e em 2008 disputou uma vaga de
vereadora pelo DEM nas eleições municipais de São Luís, entretanto não foi eleita.
Em seu depoimento, podem-se identificar alguns elementos sendo valorizados
como aspectos indispensáveis para se obter êxito na carreira eletiva, tais como:
‗vivência‘, conhecimento e amizade. Dentre essas qualidades mencionadas, pude
perceber que a informante não atribuía peso igualitário para todas, o recurso das
relações sociais parece ter um peso maior. Isso pode ser observado no seguinte
fragmento: “se você tem um conhecimento muito grande, mas não tem amizade com os
seus amigos que estão lá fazendo as secretarias (...) as pessoas não têm interesse em
lhe ajudar”. A amizade com as pessoas que ocupavam as secretarias e com políticos
situados em diferentes níveis da hierarquia política é o que possibilitava um melhor
atendimento de suas bases eleitorais. Marly Abdalla (DEM) afirmava no decorrer da
entrevista que teve bom trânsito nas secretarias e boa relação com os colegas da
Assembléia, afirmou que todos a chamavam de tia Marly por conta da administração da
educação infantil do SESI. “Carinhosamente tia Marly pra cá, tia Marly pra lá, porque
pegaram das crianças. Um respeito muito grande por mim” (Marly Abdalla, entrevista
05/03/07)
72
A amizade é um trunfo importante na conquista de aliados eleitorais, esta pode
facilitar os acessos37, Kuschnir (2000a) destaca em sua pesquisa sobre a trajetória dos
Silveira, as alianças que envolvem o acesso, sendo este o que diferencia os
parlamentares das demais pessoas. No caso pesquisado pela autora, tanto na atuação do
deputado como da vereadora, a troca motivada pela ‗amizade‘ aparece e os vínculos
mais fortes sempre foram com pessoas específicas e não com organizações. Isso pode
ser exemplificado pelo do depoimento de Marly Abdalla (DEM) sobre Roseana Sarney
na época em que era governadora facilitando suas atividades políticas na área
habitacional. Marly Abdalla relata:
Eu tive muitos projetos, modéstia parte muito atuante. Fiz moradia ali na
Cidade Operária nós temos o Recanto dos Pássaros, foi um projeto da
Ozinete e a parte política foi minha. Depois nós fizemos o Marly Abdalla
I e Marly Abdalla II lá na Cafeteira, onde são 750 casas. Foi a
governadora Roseana Sarney que doou o terreno para que eles fizessem
a moradia e a parte política também foi feita por mim com a mesma
pessoa que é a Ozinete, que a parte do social era com ela. (Marly
Abdalla, entrevista em 05/03/07)
No segundo caso destacado, a fala reproduzida é da ex-deputada federal
Terezinha Fernandes (PT), esposa do ex- deputado estadual e ex-prefeito da cidade de
Imperatriz (MA) Jomar Fernandes (PT). Atualmente ela ocupa a Secretaria do Trabalho
e Economia Solidária no governo Jackson Lago (PDT). Terezinha Fernandes (PT)
apresenta em seu depoimento algumas qualidades de ‗liderança‘ que considera
importante no desempenho e destaque nas atividades políticas: experiência, domínio da
área do Direito e ser bom orador são alguns dos atributos mencionados pela
entrevistada. Quando questionada sobre a possibilidade de destaque dos deputados
recém- eleitos38, ela menciona Domingos Dutra (PT) e Flávio Dino (PCdoB). Em
relação ao primeiro destaca a experiência como trunfo político, Dutra (PT) já foi eleito
duas vezes deputado estadual em 1990 e em 2002. Em 1996 foi eleito vice-prefeito de
37
Para Kuschnir "[...] a conquista de acessos, ou a entrada para a política, é resultado da colaboração dos
membros de uma rede em uma série de trocas. Votos, cargos, indicações, pedidos de promoção,
interferência em processos burocráticos e legais, encaminhamento de pedidos são os principais recursos
de que os Silveira dispõem para trocar com os membros de sua rede. Em contrapartida, recebem
financiamentos, bens materiais e ajuda em forma de trabalho na campanha. Esta é a base que constitui o
sistema de dar, receber e retribuir acessos." (Kuschnir, 2000:105)
38
Nas eleições de 2006 para deputado federal, a entrevista foi realizada em abril de 2007.
73
São Luís. Enquanto que Flávio Dino (PCdoB) ocupa pela primeira vez um cargo
eletivo, mas sua atuação na área do Direito é destacada por Terezinha Fernandes (PT)
como recurso agenciado em seu favor no cenário político. Flávio Dino (PCdoB)
advogou para diversos sindicatos e de 1994 a 2006 foi Juiz Federal. 39 A eloqüência é
outro elemento enfatizado por Terezinha Fernandes (PT), que afirma que Dutra (PT) se
destaca como orador. Apesar da Terezinha Fernandes não mencionar, Dutra (PT)
também é da área do Direito, tendo prestado assistência jurídica a diferentes setores dos
movimentos sociais. Com suas devidas peculiaridades a trajetória de ambos lembra o
que afirma Bourdieu (1998:191) sobre a reconversão para a política do capital de
notoriedade “é frequentemente produto da reconversão de um capital de notoriedade
acumulado em outros domínios e, em particular, em profissões que, como as profissões
liberais, permitem tempo livre e supõem certo capital cultural ou, como no caso dos
advogados, um domínio profissional da eloqüência”.
A deputada Telma Pinheiro (PTB), ao falar de sua trajetória política, menciona
que a ocupação de cargos públicos anteriormente contribuiu, atrelado às suas atividades
profissionais. Como pode ser observado no trecho da entrevista abaixo:
Como eu era da prefeitura desde 69, ingressei no quadro como
funcionária, e a partir daí formada em engenharia fui ser engenheira do
quadro dos servidores da prefeitura. E eu fui ocupando os cargos mesmo
por trabalho, por reconhecimento de trabalho, não foi nada político, fui
indicada por prefeitos, por governadores, para ocupar cargos de
confiança por trabalho mesmo, por competência profissional. (...)
Quando em 83 eu ocupei a Secretaria de Urbanismo em São Luís,
depois fui ser Secretária de Terras e Habitação, depois Secretária de
Infra-estrutura e de Obras (...) o meu trabalho como técnica na época
houve um reconhecimento da sociedade ludovicense porque fui a
vereadora mais votada em 95 aqui em São Luís e como deputada
estadual de dois mandatos, no primeiro mandato eu tive um bom
número de votos, no segundo mandato, na segunda eleição, eu
quadrupliquei o número de votos. (...)então eu volto 10 anos depois a
ocupar uma secretaria que tem exatamente esse mesmo objetivo, de
cidades, de organização social, da questão do uso do solo, da habitação,
enriquecido agora pela minha experiência política. (Telma Pinheiro,
entrevista 14/03/2007)
39
Para saber mais sobre a reconversão dos trunfos constituídos no espaço profissional de Flávio Dino
para política ver Barros Filho (2007) que realizou um estudo sobre as diferentes lógicas que unem
recursos sociais, herança política e atividade profissional no percurso de Flávio Dino.
74
Outro fator mencionado pelas entrevistadas como mecanismos que contribuem
para o sucesso nas urnas é o vínculo com familiares políticos. As deputadas Fátima
Vieira (PP) e Graça Paz (PDT) destacam:
Hoje eu ser deputada estadual no Maranhão o grande peso foi meu pai
já ter iniciado, já ter uma política muitos anos. Então houve uma
necessidade de uma candidatura minha e o reconhecimento de todo
trabalho que foi feito tanto pelo meu pai como por mim durante a
administração no município de Bacabal e na região do Médio Mearim.
(...) A minha campanha eu devo ao reconhecimento dos trabalhos feito
por ele, ao nome dele, as iniciativas dele, o apoio, tanto apoio financeiro,
como todo apoio que foi dado pelo meu pai. (Fátima Vieira, entrevista em
07/03/07)
Hoje sou formada em Administração de empresas e entrei na vida
política através de meu marido, que foi deputado por três mandatos
consecutivos e terminou que passou essa missão para mim. Todas às
vezes eu acompanhava, eu que fazia a campanha em toda baixada
maranhense porque eu sou da baixada e ele é da região do sertão
maranhense e eu tomava conta da campanha lá na região da baixada, ia
a vários municípios. E como a minha família já era envolvida na
política, então nessa ocasião eu já não era uma criança, uma mulher,
mãe, e meus primos prefeitos e eu tinha também um irmão prefeito e daí
a gente fez essa política no interior. (Graça Paz, entrevista em 07/03/07)
Fátima Vieira é filha do ex-prefeito da cidade de Bacabal (MA) José Vieira
(PSDB), foi diretora do Pronto Socorro de Bacabal (MA) por cinco anos e está
atualmente exercendo seu primeiro mandato de deputada estadual. Segundo Fátima
Vieira (PP) o reconhecimento que obteve de seus eleitores nas urnas se deve aos
trabalhos e apoio de seu pai. O uso dos laços de parentesco com personalidades políticas
como trunfo eleitoral pelas deputadas federais e estaduais no Maranhão será melhor
discutido adiante, mas já adianto que são vários os casos de herança política, lembrando
que esses aspecto não se restringe ao universo de candidaturas no Maranhão. 40
Graça Paz (PDT) é esposa do ex-deputado estadual e candidato a prefeito de São
Luís em 2008, Clodomir Paz (PDT), está no seu segundo mandato de deputada estadual.
No relato de Graça Paz (PDT) as relações familiares também são apontadas como um
40
Como mostra o trabalho de Grill (2003:85) sobre o Rio Grande do Sul: ―
Mesmo após vinte anos de
estruturação do sistema partidário (pós-regime militar), apesar da rotinização de eleições em todos os
níveis e a despeito de que o universo empírico refere-se a um dos contextos em que a ―
fidelidade
partidária‖ e a ―
politização‖ da população são exaltadas como virtudes ímpares, não há qualquer indício
de tendência a que candidatos provenientes de ―
famílias de políticos‖ constituam uma raridade entre os
profissionais da política‖.
75
recurso para entrada na política. Seu envolvimento nas campanhas do marido e a
experiência política de sua família na região da baixada maranhense são enfatizadas
pela deputada. Outro aspecto que pode ser notado em sua fala é a questão de conceber a
atividade política como ―
missão‖. O esforço de denegação (Offerlé, 1997) da condição
de profissional político, é recorrente na visão das atividades políticas das deputadas
entrevistadas. Muitas quando questionadas sobre como entraram na política afirmavam
que no início não queriam, foram impulsionadas ―
pela pressão‖, pela ―
missão social‖.
A deputada Graciete Lisboa (PSDB), ex-esposa do médico e prefeito da cidade
de Bacabal (MA) Raimundo Lisboa (PDT), quando fala de sua atuação na Secretaria de
Saúde de Bacabal, afirma que nesse período não pensava em disputar cargo eletivo.
Não, não. Eu achava que muita coisa podia mudar, eu tinha muito
medo da questão política (...). Mas por atender esse público que era
muito carente, que me procurava, que muitas vezes nem chegava até ele,
muitas vezes eu tirava do bolso, comprava o remédio ou tirava da própria
secretaria, enfim dava meu jeito, muitas vezes ele nem ficava sabendo e
eu já tava resolvendo. E por atender esse povo... Então começou por aí.
(Graciete Lisboa, entrevista em 30/08/07)
Marly Abdalla (DEM) também menciona durante a entrevista que não queria
entrar na política representativa, só aceitou devido à pressão que recebeu nos bairros.
Ela afirma:
Então eu tive um convite da Divinéia na época para que eu fosse
candidata. E eu disse que não, não quero me meter em política. Eu
quero ser política só para fazer o social mesmo. Mas aí houve uma
pressão muito grande, até a mão eles fizeram os meus retratos. Aí eu
conversei em casa, que as pessoas queriam que eu fosse candidata. „Olha política traz muito sofrimento, você é muito sensível é melhor não
ser‟- mas a pressão foi tão grande nos bairros que eu acabei aceitando e
eu fui uma das mais votadas, na primeira, na segunda e na terceira
eleição. (Marly Abdalla, entrevista em 05/03/08)
Em relação ao uso do gênero como mecanismo para obtenção de legitimidade
política nas campanhas, das deputadas entrevistadas, a que deu mais ênfase nesse
aspecto foi a Terezinha Fernandes (PT), a deputada Graça Paz (PDT) também
mencionou que fez uso, mas segundo ela com muita cautela, para não perder os votos
masculinos.
Eu tenho a impressão, também não é dado científico, de que o fato de eu
ser mulher me ajudou muito na campanha, porque assim, tem poucas
76
mulheres participando, que chega que sobe no palanque. Então eu chego
aos palanques e só tem homens, chego a determinadas mesas de reunião,
debates, seminários, eu chego lá só tem homens, só tem eu de mulher.
Então isso ajuda muito de certa forma, porque você chega e fala e não sei
o que é, marca. Meu Deus em quantos e quantos lugares eu andei por ai
e as pessoas falando „nossa que maravilha, vou votar em você‟, de tantos
discursos no meio de homens o meu se destacava. Então isso me
beneficiou. (Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
Eu não atentei muito pra isso, mais aqui acolá nos discursos da gente, a
gente pede. Mas eu tinha muito cuidado de pedir os votos para as
mulheres, mas ao mesmo tempo eu já tava ali, peço também o voto dos
homens porque eu tinha uma liderança e a grande maioria do sexo
masculino e isso nunca me dirigia muito à mulher porque a gente fica até
preocupada de está ofendendo os homens, porque quando eu fazia isso,
acontecia de um homem ou outro dizer assim: “Ah a senhora não quer
nosso voto?!” (Graça Paz, entrevista em 07/03/07)
A relevância dos aspectos levantados pelas deputadas - competência profissional,
talento oratório, laços de parentesco, experiência política, ocupação de cargos públicos,
capital de relações sociais- sobre os recursos acionados no espaço de concorrência
eleitoral maranhense, evidenciam variações quanto a condição de acesso e consolidação
na carreira eletiva.
Outro fator que contribui para a condição de acesso dessas mulheres à política é a
Lei de Cotas. Apesar das limitações dessa lei no Brasil, já discutidas anteriormente, as
deputadas maranhenses se posicionaram positivamente sobre a questão das cotas e do
compromisso dos partidos em relação à questão da mulher no parlamento. Das sete
deputadas entrevistadas, todas afirmaram acreditar que a política de cotas incentiva de
alguma forma a participação feminina no parlamento. A ex-deputada federal Terezinha
Fernandes (PT) afirmou que no início era contra essa proposta, mas que atualmente tem
uma visão diferente, apesar de ainda considerar algumas críticas:
E em relação à política de cotas a senhora acha que incentivou as
candidaturas ou não, a senhora tem acompanhado?
Quando o PT começou a discutir essa proposta, essa proposta é da Marta
né? Eu era contra, eu achava que nos iríamos conseguir conquistar o
nosso espaço sem precisar de esmola. Então eu fui contra na época. Mas
hoje eu já tenho uma visão diferente, eu acho que cumpriu um papel (...)
eu acho que cumpriu uma etapa, porque garantiu com que efetivamente
naquele momento, o partido se preocupasse em trazer em atrair mais
mulheres para o seu espaço. (...) Hoje eu tenho a impressão que acabou
que criando uma área de conforto. (...) Então que acontece geralmente?
Eles deixaram de se esforçar pra atrair mulheres para que a mulher
possa participar efetivamente e se conformam em ter mulheres apenas
77
para ocupar aquelas vagas, elas efetivamente não estão disputando, é só
pra constar. Mas eu acho que houve um espaço de tempo em que isso foi
importante sim, e as mulheres de fato tanto que a gente encontra as
mulheres por aí participando em função disso. Eu acho que não é pra
resolver, não resolveu o problema, a idéia não era essa a gente sabia que
não resolvia. Mas eu acho que deu um impulso sim. (Terezinha
Fernandes, entrevista em 03/04/07)
A deputada estadual Graça Paz (PDT) afirmou que as cotas estimularam a participação
das mulheres nas disputas eleitorais, apesar do PDT não ter cumprido o preenchimento
mínimo de 30%. A deputada afirma que o partido tem um compromisso muito grande em
relação ao interesse das mulheres. Em entrevista ela destaca: Estimulou porque antes a cota
mínima era mínima para o sexo feminino, graças a Deus isso foi reformulado. Hoje são 30%
no mínimo e no máximo 70% para qualquer um dos sexos.
E dentro do seu partido, ele cumpriu nas últimas eleições com esse
preenchimento mínimo de 30%?
Infelizmente não, apesar de nós termos essa cota 30% de preenchimento
mínimo e máximo 70% para candidaturas de ambos os sexos, mesmo
assim essa cota não é preenchida pelas mulheres (...). O PDT tem uma
atuação muito participativa eu diria no Brasil, principalmente falando a
nível de Maranhão, principalmente falando a nível de São Luís. Nós
temos mulheres aí na luta é pelos direitos da nossa classe e dentro do
PDT, principalmente dentro da militância do PDT, existe um trabalho
muito grande, em relação ao interesse das mulheres. (Graça Paz,
entrevista em 07/03/07)
A ex-deputada estadual Marly Abdalla (PFL) não considera as cotas como fator
mais importante nas disputas eleitorais, pode até incentivar de alguma forma, mas
aponta outros fatores que considera importante para o sucesso nas urnas. Quando
questionada a respeito da eficácia da política de cotas, Marly Abdalla enfatiza:
É eu acho que ainda é muito insignificante, não abrange... A mulher tem
que ser mais audaciosa, a mulher tem que ser mais corajosa, a gente ver
que tem até algumas partindo assim, se saindo... mas eu ainda acho que
tem que crescer muito, tem que lutar mais, ta faltando mais coragem para
a mulher enfrentar e as vezes condições também infelizmente, porque
para entrar numa campanha você tem que ter carro, tem que ter
combustível, uma série de coisas e você vê que uma pessoa mais humilde
tem a tendência, mas não tem as condições. A política de cotas apenas
incentiva de alguma forma. (Marly Abdalla, entrevista em 05/03/07)
78
3.5 - De “companheira de militância” a deputada federal.
(...) o habitus do político supõe uma preparação especial
(BOURDIEU, 1998:169).
Descendente de uma família de trabalhadores rurais, atualmente secretária do
Trabalho e da Economia Solidária do Maranhão, Terezinha Fernandes passou por
esferas diversas e desempenhou diferentes papéis ao longo de sua trajetória. De aluna do
curso de Letras e moradora da casa dos estudantes universitários, militante do
movimento estudantil no final dos anos 1970, atuante na construção do Partido dos
Trabalhadores no Maranhão, funcionária pública, esposa de político, a deputada federal
transitou por múltiplos ambientes, exercendo diferentes atividades. Herdou e adquiriu
capitais específicos que lhe ofereceram possibilidades de manobras de conversão para
as disputas políticas. Tal é o que procurei evidenciar com a análise que se segue, as
diferentes práticas, trunfos e estratégias no percurso de um agente, no caso em pauta,
uma mulher maranhense que conseguiu ser eleita deputada federal.
Terezinha Fernandes nasceu em Sobradinho, comunidade rural do município de
Barreirinhas41, localizada às margens do rio Preguiça, onde viveu até os 14 anos de
idade. De uma família de onze irmãos, foi a única que conseguiu ingressar na
universidade. Seu pai foi agricultor e sua mãe conciliava as atividades domésticas com
os trabalhos de artesanato de Buriti42. Perdeu a mãe ainda na infância, quando tinha
apenas 10 anos.
Em 1969 se deslocou para São Luís com o objetivo de dar continuidade aos
estudos, pois só tinha cursado até a terceira série, passou em São Luís a estudar na
escola pública Ivar Saldanha. Na adolescência participou do grupo de jovens na igreja
católica da Vila Vicente Fialho, onde morou com o irmão até passar no vestibular para
Letras na UFMA em 1977. Depois disso passou a morar no lar universitário. Fato que
segundo Terezinha contribuiu para entrada no movimento estudantil.
Destaca
Terezinha:
41
42
Município localizado na microrregião Lençóis Maranhenses, com uma distância de 252km de São Luís.
Também chamado de miriti, o buriti é a fruta do buritizeiro (palmeira amazônica facilmente encontrada
no norte do Maranhão). Semelhante a um coquinho, ele possui uma casca dura, de coloração vinhoavermelhado e coberta por desenhos que lembram escamas. Muitos ribeirinhos têm na palmeira sua
principal fonte de renda.
79
(...) foi na universidade que eu tive minha iniciação política mesmo... aí
me mudei para ficar morando na casa do estudante universitário, ficava
lá na rua do Norte. Então lá a gente entrava em contato com muita gente,
conversava com muita gente, e a casa, o lar universitário de qualquer
forma, era um ponto de referência para quem fazia movimento, era um
espaço bom para se recrutar militantes e aí por isso que nós fomos
procurados. (Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
Na graduação, conheceu aquele que viria ser seu esposo, Jomar Fernandes, na
época estudante do curso de Engenharia e líder estudantil. “(...) nós nos conhecemos
nesse grupo... fundamos o grupo Tarefa que foi por esse que Jomar disputou a
presidência do DCE, aí ganhou a eleição em 80”. Terezinha menciona que chegou a
disputar a presidência do Diretório Acadêmico de Letras, mas não conseguiu ser eleita,
perdendo para sua colega de curso Lúcia Brandão. Além da participação no movimento
estudantil, chegou por volta desse período, a participar também de algumas campanhas
eleitorais de pessoas que viriam ajudar a organizar o PT no Maranhão, a exemplo das
candidaturas de Haroldo Sabóia e Freitas Diniz.
Terezinha Fernandes, ao relatar sua ―
história de vida‖ buscou atribuir coerência às
opções que fez devido, segundo ela, a uma consciência política adquirida ao entrar na
universidade. Segundo suas narrativas, a entrada na UFMA foi um ponto determinante
na sua trajetória. É possível identificar em sua fala elementos que denotam a partir daí
um caminhar progressivo 43.
(...) A mudança de lá (saída do interior para São Luís) houve lógico uma
mudança de vida, mas de qualquer forma a minha visão ainda era uma
visão muito restrita das coisas então me transformei numa outra pessoa,
abri os olhos a partir do momento que eu entro na universidade. Então
em quatro anos eu passo a enxergar a vida, o mundo, o meu quintal, a
minha vida com uma realidade totalmente diferente daquilo que eu vivia.
E aí, a partir daí que eu tive de fato segurança, que eu
inconscientemente, que era na verdade de forma inconsciente, que eu
tentava enfrentar só o meu passado de lutar por conquistar um espaço,
uma profissão, uma vida melhor, aí eu transfiro isso para minha vida
política, aí deixa de ser uma luta só minha e passa a ser de fato uma luta
coletiva, aí eu me junto a outras pessoas e a outros grupos que já
estavam atuando na época. (Terezinha Fernandes, entrevista em
03/04/07)
No movimento estudantil, Terezinha destaca sua participação na luta pelo
processo de derrubada da Ditadura, menciona as campanhas que fez parte para levantar
fundos e mandar para greve do ABC paulista. Cita também a greve em favor da meia
43
Para uma problematização sobre relatos biográficos como construções lineares, apontando para um
determinado sentido, ver Bourdieu (2005)
80
passagem em 197944 em São Luís, iniciada pelos universitários, ressalta em diferentes
momentos a experiência de militar num período de difícil relação dos universitários com
a polícia.
Na UFMA, Terezinha e seu namorado começam a fazer parte de uma rede de
militantes, muitos continuaram posteriormente a participar da dinâmica política
maranhense. O nome de Jomar Fernandes aparece inúmeras vezes, com centralidade nos
fatos relatados, demonstrando que ambos debutaram politicamente como militantes e
em espaços comuns. Fato que se difere das outras trajetórias das deputadas federais
eleitas no Maranhão. Duas - Márcia Marinho e Nice Lobão- apesar de apresentarem
laços de casamento com políticos, lembram os casos analisados por Grill (2003) das
chamadas ―
primeiras-damas‖ 45. Sobre suas atividades de militância destaca Terezinha:
E aí eles (os estudantes) chegaram lá pro Jomar cobrando uma postura
de não sei o que, eu sei que Jomar foi e lá eles começaram a história
dessa greve, que resultou naquela situação toda. Mas aí mais era o
Jomar e o Márcio, que mais se destacavam da Engenharia e o pessoal
todo ia atrás do grupo, eles eram muito unidos, então faziam muita
confusão. E aí juntando com Juarez não sei se vocês chegaram a
conhecer, estava Cintra, ai tava pela UEMA que na época era FESMA
estava Joãozinho Ribeiro, o Ivan Teles, deixa eu ver quem mais..., o
Júnior que hoje eu não sei que ele faz da vida, um tempo ele ainda teve aí
pelo meio da política. Então esse povo todo eram militantes das causas
do movimento e tinham lá nossas divisões, mas na hora, o Agenor, com o
pessoal que estavam no comando do movimento porque eles estavam no
Diretório nessa época né? Foi em 79 e aí foi que a greve de fato acabou
tomando corpo. (Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
A gente pra fazer uma greve vocês não imaginam o que a gente sofria. O
pessoal do primeiro escalão ficava escondido, eu, por exemplo, tinha
época, que Jomar era escondido que nem eu sabia onde é que ele estava
a mãe não sabia, ninguém sabia. O pessoal levava porque era assim
esconde o primeiro escalão, e o segundo escalão tem que segurar as
44
A greve que visava ao direito à meia-passagem dos estudantes, alcançou significativa mobilização.
Contou com a participação não só de universitários, mas secundaristas, professores e trabalhadores que
enxergaram no movimento estudantil uma maneira de expressão possível, dentre as duras amarras da
ditadura militar. Várias pessoas foram presas, feridas, ônibus quebrados para que o direito fosse
reconquistado. Ver mais em Borges (2006)-Estudantes e Política: movimento estudantil e greve pela
meia passagem no contexto da redemocratização. Ciências Humanas em Revista (UFMA)
45
Em relação às candidaturas de ―
primeiras damas‖ destaca o autor: ―
são alçadas à política em grande
parte devido às suas atuações como ―
parceiras coadjuvantes‖ das atividades dos maridos, adquirindo
notoriedade e sendo impulsionadas pela liderança e prestígio deste‖(GRILL 2003:97). Enquanto que o
caso de Terezinha Fernandes se assemelha mais ao que o autor chama de ―
companheiras de militância‖,
citando como casos ilustrativos, as candidaturas de Miriam Marroni e Maria Helena Sartori, apesar do
vínculo de parentesco ser relevante, o autor demonstra que nas campanhas é ―mediante a apresentação
das biografias militantes das próprias candidatas que o elo é fixado‖. (GRILL 2003:105) Seria
interessante fazer um estudo da Terezinha Fernandes em campanha para observar como isso se processa.
81
pontas aqui em baixo (...) enfrentar polícia, fugir da polícia, pra garantir
que as nossas assembléias acontecessem. Que ai a gente tirava o
movimento do campus, trazia pra cá, que aqui a gente fazia era
movimento popular mesmo, não era só movimento estudantil, acabava
então a gente fazia isso pra mobilizar, ai as lideranças só chegavam lá na
hora do ato, depois saiam de novo, pra não serem apanhados. Então a
gente trabalhava num nível de radicalidade, de acordo com a realidade
que a gente estava vivendo naquele momento. A polícia federal era assim,
agora não, mas até alguns tempos atrás, a gente tinha muito ranço, muita
dificuldade de conviver com a policia essa coisa toda porque foi um
período muito duro né? Muito ruim na vida da sociedade brasileira e na
nossa vida, então a gente sabia que precisava endurecer mesmo, garantir
que as coisas acontecessem, a gente tinha essa consciência e segurava.
(Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
Foi justamente desse grupo que militava no movimento estudantil no final da
década de 1970 e início dos anos 1980, que saíram algumas lideranças para a criação do
Partido dos Trabalhadores no Maranhão 46. Terezinha conta sobre sua participação na
construção do PT no Maranhão, destacando como eram organizados os núcleos do PT
nos bairros, menciona como exemplo os bairros da Divinéia, São Cristovão, Sá Viana e
Anjo da Guarda “a gente ia mesmo pros bairros (...) a gente começou a fazer o PT
crescer e tudo”.
Em 1981, Terezinha se formou. Assim como seu esposo ela também já tinha
passado em um concurso na Secretaria de Fazenda do Estado, quando decidiram morar
em Imperatriz-MA47. Lá iniciaram e desenvolveram durante muitos anos um trabalho de
consolidação do PT. Em Imperatriz, Terezinha e seu marido, como funcionários
públicos, continuaram a militância, agora juntamente com as atividades partidárias,
militam na categoria. Participaram de várias campanhas do PT em Imperatriz, no início,
sem serem candidatos. ―
E só depois de anos a gente lá dentro, trabalhando,
conscientizando, organizando o pessoal. Depois de alguns anos aí a gente cria
candidato (...) fizemos greve pra cachorro, parava caminhão nesses postos, sempre na
militância política e dentro da categoria”.
Somente em 1986, Jomar Fernandes lança candidatura a deputado estadual. Em
1988 Jomar se candidata a prefeito de Imperatriz, em 1990 a deputado estadual, em
1994, foi candidato a vice-governador na chapa com Jackson Lago, em 1996 candidata46
Para maiores detalhes sobre os diferentes segmentos que contribuíram na construção do PT no
Maranhão, ver BORGES (2008)- PT Maranhão 1982-1992: origens, organização e governos municipais.
47
Situa-se na divisa com o estado do Tocantins, é depois de São Luís, o maior núcleo populacional do
Maranhão, atualmente com 236.311 habitantes. (IBGE)
82
se a prefeito novamente, mas só conseguiu obter êxito nas eleições de 1998 como
deputado estadual e na de 2000 como prefeito de Imperatriz. A ex-deputada ressalta sua
participação intensa e constante nas campanhas do marido. Afirma que fazia de tudo nas
campanhas, atividades de coordenação, fazer discursos. Ressalta que sua experiência de
militante estudantil ajudou muito.
Eu sempre fiz tudo, de campanha o que você quiser pensar, boa parte a
gente fazia mesmo desde quando estava no movimento estudantil, o que
foi bom nesse período. Nesse período, por exemplo, a gente tinha um
mimeógrafo no DCE lá que escrevia o discurso ou escrevia o texto a
gente mesmo datilografava a gente mesmo mimeografava a tinta ou a
álcool, mas a gente fazia tudo. Então naquele tempo militante era aquele
camarada que sabia falar no carro de som pra fazer convite, ao mesmo
tempo, mas depois chegamos lá, nós levamos essa experiência pra lá,
mas assim nós éramos militantes fabulosos porque tudo que precisava
fazer precisa varrer a sede, então a gente varre a sede, ta bom, agora
precisa lavar a mão e ir fazer discurso lá na rua grande, ia pra lá e fazia
a reunião, então a gente fazia tudo. (Terezinha Fernandes, entrevista em
03/04/07)
Quando seu esposo assume a prefeitura de Imperatriz em 2001, Terezinha
Fernandes passou a ser a secretária de Ação Social do município, o que lhe possibilitou
um contato ainda maior com os que ela chama de ―
eleitores do PT‖. Ao falar de seu
trabalho desempenhado na secretaria, destaca as atividades voltadas para capacitação
profissional dos jovens, políticas direcionadas para os idosos, portadores de
necessidades especiais e crianças carentes.
Por volta desse período, segundo Terezinha, o PT de Imperatriz começa a cogitar a
possibilidade de seu nome como candidata a deputada federal em 2002. Mas Terezinha
menciona que não tinha interesse a princípio 48, pois não queria sair de Imperatriz, deixar
de acompanhar o governo de seu marido de perto. Mas acabou sendo convencida pelo
―
pessoal do PT‖ e por seu esposo.
Pela história que eu tinha no PT no Maranhão, tudo isso. Pelo nível de
relação que a gente construiu eu o Jomar ao longo da nossa vida de
militância, eles achavam que de repente eu até poderia entrar na disputa
pra ganhar (...) Eu nem queria sair de Imperatriz naquele momento,
porque eu queria ficar lá com o Jomar, acompanhando ele no governo,
então eu digo eu não posso sair daqui, mas aí convenceram o Jomar,
depois de 7ou 8 meses de que deveria ser de fato meu nome. (Terezinha
Fernandes, entrevista em 03/04/07)
48
Ao longo da pesquisa citei alguns casos em que a negação inicial a vontade de se candidatar aparece
como argumentos nos depoimentos de algumas deputadas, em outros trabalhos (Grill 2008, Kuschnir
2000, 2001) percebe-se que esse tipo de argumento é recorrente nos relatos de vários políticos.
Reforçando o que dizem os autores sobre profissionalização política e denegação identidária.
83
As atividades de campanha de Terezinha Fernandes se deram, em grande parte, por
meio de uma dobradinha política com seu amigo de militância, o candidato a deputado
estadual, Domingos Dutra. ―
Onde eu não tinha espaço e o Dutra tinha lá eu tava, onde
eu tinha eu também levava o Dutra e assim a gente fez e deu certo”, afirma Terezinha.
A relação de apoio não se limitou ao PT do Maranhão, Terezinha se lamenta que, no
Maranhão, o PT tem muitas divergências internas, então tinha que contar com o apoio
também de outros ―
grupos‖ do Partido, a exemplo do PT do Piauí. No seu comício de
lançamento da campanha, destaca que contou com o apoio do então deputado federal
Wellington Dias49 e fala da importância de dialogar com outros ―
grupos‖.
(...) quando eu desci do palanque eu disse cuidado comigo porque eu
gostei, eu gosto muito de brincar, eu digo tenham muito cuidado comigo
porque eu gostei desse papel, se vocês me derem área eu vou acabar
querendo ficar por aqui. Mas o certo foi uma campanha muito boa, uma
campanha bonita, porque a gente conseguiu envolver muita gente, que
era a diferença naquele tempo, estávamos eu, os grupos, sempre tivemos
essas divergências dentro do PT e assim, mas assim, o nosso grupo
como a gente tem mais presença pra lá, então a gente dialoga com os
outros grupos. (Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
Aqui destaco que tanto o fato do seu nome começar a ser cotado no momento em
que seu esposo ocupa a prefeitura de Imperatriz, como as referidas alianças políticas,
podem demonstrar a forte relação que há dos diferentes níveis da hierarquia política, nas
articulações de uma campanha. Lembra também o apontado por Palmeira (2006) que a
lógica política é feita ao mesmo tempo de relações institucionais e de relações pessoais.
Candidata pelo PT, Terezinha Fernandes consegue atingir um total de 57.583
votos, sendo eleita em 2002, deputada federal no Maranhão. A maior parte dos votos
foram obtidos em Imperatriz, seguido de São Luís e Barreirinhas. Três localidades que
Terezinha Fernandes constrói identidades ao longo de seu itinerário, em Barreirinhas
acredita que os votos alcançados se devem ao fato de ser sua terra natal e por ali ainda
hoje conservar amizades. Em São Luís por sua história de militância, e Imperatriz, a
maior percentagem atingida, atribui aos anos de militância partidária e sindical, às
relações desenvolvidos no funcionalismo público e principalmente a projeção política
de seu esposo no referido município.
Ocupou o primeiro cargo eletivo em 1992 quando foi eleito vereador de Teresina e em 1994 elegeu-se
deputado estadual chegando à presidência do diretório regional do PT, onde ficou de 1995 a 1997. Em
1996 foi candidato a vice-prefeito de Teresina na chapa de Nazareno Fonteles mas não avançou para o
segundo turno. Em 1998 foi o primeiro deputado federal eleito pelo PT no Piauí, atualmente é o
governador do referido estado.
49
84
Menciona que uma das marcas de seu mandato foi combater a ―
oligarquia
Sarney50‖. De uma forma mais específica, destaca alguns pontos da atuação de seu
mandato. Ressalta que trabalhou muito para garantir a inclusão dos trabalhadores rurais
no cenário do Estado, participou também de discussões voltadas para o projeto espacial
do Brasil, o que incluía o Centro de Lançamento de Alcântara 51, atuou na área do
Direito da criança e do adolescente, na educação, lutando por melhorias e expansão do
campus da UFMA de Imperatriz, afirma que conseguiu 59 hectares para universidade
doados pelo IBAMA. Outra ênfase dada em seu mandato foi a luta contra as
privatizações, faz menção principalmente a luta pela não privatização do Banco do
Estado do Maranhão- BEM e da CEMAR.
Terezinha afirmou que as atividades políticas sempre absorveram boa parte de seu
tempo, e com a ocupação de um cargo eletivo, o ritmo de trabalho se intensificou ainda
mais. O fato dos filhos morarem em São Luís desde 1997, e do marido ser político,
facilitava o desempenho de suas atividades. Relata que em Brasília trabalhava o dia
inteiro de terça, quarta e quinta-feira, “nas reuniões, nas comissões, era no gabinete
atendendo gente, e era respondendo ligação, e era indo nos ministérios. Mas é bom que
você pare, refresque a mente e que você tenha contatos e fique sempre se realimentando
com as bases”.
Fica evidente no relato acima, a importância atribuída por Terezinha a habilidade
que o político tem que ter na busca por conciliação das atividades desempenhadas em
Brasília com os contatos mais localizados. Acredita que poderia ter feito mais pelo
Maranhão de um modo geral, mas que em relação ―
a sua região‖ trabalhou bastante. A
concepção de que o político não pode esquecer-se das ―
bases eleitorais‖ está presente na
visão de muitos deputados federais no Brasil52. Destaco uma situação em que se pode
50
No decorrer da entrevista, Terezinha Fernandes mencionou que só não disputou a reeleição de
deputada federal, para dar sua contribuição na luta pelo fim da ―
oligarquia Sarney‖. A ex- deputada foi
convidada para ser candidata a vice- governadora de Edson Vidgal (que deixou o Superior Tribunal de
Justiça- STJ), pelo então governador José Reinaldo Tavares (PSB) para compor a chapa que disputou o
governo do Maranhão contra Roseana Sarney em 2006.
51
Afirma que fez um projeto para que parte dos lucros obtidos com tal atividade fosse repassada para a
população que habita nas proximidades do CLA, baseada na experiência da PETROBRÁS em alguns
municípios do RJ, com sua saída o projeto foi arquivado.
52
No trabalho de Bezerra (1999), por exemplo, é possível perceber as concepções, práticas e relações
sociais produzidas em torno da atuação dos parlamentares orientada para suas "bases eleitorais". O autor
85
perceber Terezinha atuando como mediadora na liberação de recursos federais para sua
―
bases‖.
Então assim a Universidade, por exemplo, quando o Fernando Ramos foi
eleito, ai ele entrou em contato comigo, eu disse:olha reitor vem pra cá
porque essa bancada foi eleita... , então venha pra cá com seus pleitos,
chama pra gente tomar um café e vamos lutar pra gente conseguir
dinheiro pra universidade. No primeiro ano nós não conseguimos, mas
no segundo ano conseguimos, no terceiro ano conseguimos e todos os
anos seguintes a gente conseguia e vai continuar conseguindo.
(...) eu não lutei muito pelo Maranhão, mas pela minha região eu lutei
aquela parte de lá Tocantins e Sul do Estado, fiz um bucado de coisa que
assim se for comparar com gente que tem aí não sei quantos mandatos
com o meu de um só, se botar na balança assim eu não perco. (Terezinha
Fernandes, entrevista em 03/04/07)
Ao selecionar os fatos que determinaram ―
entrada na política‖, Terezinha busca
enfatizar que a questão ideológica sempre esteve presente, não se define como política
se identifica mais com o termo ―
militante‖. Procura deixar claro em sua fala, o
desinteresse econômico obtido pela atividade política, afirmando que, pelo contrário, ao
longo dos anos tinha gastado muito em favor de uma causa, se endividando várias vezes
com campanhas e em benefício do partido, “nós éramos altos funcionários do Estado,
mas assim, a gente gastava tudo que tinha pra construir o PT”.
Essa ênfase no investimento de tempo, dedicação, devoção a instituição pode ser
observada na situação relatada abaixo, em que Terezinha se refere a sua tristeza e
indignação no momento em que o presidente Lula se deslocou para o Maranhão com o
objetivo de declarar apoio para Roseana Sarney nas eleições para o governo do estado
em 2006.
Eu não sou política por incrível que pareça. Por que assim, a vinda do
Lula agora na campanha da Roseana, eu viro um militante comum,
nessa hora eu peguei o avião aqui o Lula tava chegando em Timom. Eu
peguei o avião fui pra Brasília duas horas da tarde, fui pra Brasília, eu
digo eu vou só para fazer o discurso. E fui. Não fui lá nem ver meus filhos
lá no apartamento que eu ocupava, fui direto pra câmara pra me
inscrever, pra fazer o discurso, pra brigar com o Lula. (...)Aí viram,
souberam né? Souberam assim, eu cheguei conversei com o Henrique
Fontana, que era meu líder, eu digo olha Henrique to vindo aqui por
isso, por isso e por isso. E ele „não pode Terezinha, muito cuidado, não
pode, o Lula ta errado, vocês tão certo o PT tá certo em apoiar o
Jackson, mas você não pode, faltam poucos dias pra eleição, você é
deputada do PT, é uma das vice-líder da gente aqui, se você sobe nessa
tribuna a imprensa do Brasil todinho só tá atrás de uma coisinha‟. Aí lá
demonstra como esta atuação inscreve-se num sistema complexo de relações de dependências mútuas,
constituído, entre outros, por representantes dos poderes locais, nacional e agentes privados.
86
vem o Arlindo Chinaglia que é o líder do governo, era né? „Terezinha
não pode, de jeito nenhum não pode, não pode‟. Eu digo não pode? (...)
O certo é que eu cometi a besteira de comentar com eles quando faltavam
uns minutos não me deixaram falar acabaram a sessão 7 horas em ponto.
Eu chorei, briguei(...)
Pra na hora o Lula num ato daquele, chegar aqui e mudar tudo que a
gente lutou durantes anos, eu luto por isso há 30 anos, há 30 que eu
luto por isso. Pra numa tarde o Lula vim aqui e mudar isso tudo. Gente
isso não é brincadeira! O cara que eu ajudei a projetar a nível nacional,
a nível do Maranhão, carreguei bandeira pro Lula a vida toda, carreguei
e continuo carregando. Pro camarada chegar e fazer isso com a gente,
Ave Maria! Pra quem não tem ideal pode até... mas eu tenho um ideal
dentro de mim. E eu ainda acredito que o PT vai se reestruturar, vai se
restabelecer como um partido que eu acreditei que eu apostei que eu
ajudei a construir esses anos todos. (Terezinha Fernandes, entrevista em
03/04/07)
Com base nos relatos acima, reporto-me ao que Bourdieu (1998) discute sobre uma
lógica particular do capital delegado, que é a investidura. Na relação de Terezinha
Fernandes com PT, há um investimento mútuo, é a lei que rege as permutas entre o
agente e a instituição mencionada por Bourdieu (1998:192): “a instituição dá tudo (...)
àqueles que tudo deram a instituição, mas porque fora da instituição e sem a instituição
eles nada seriam”.
As redes de relações formadas por militantes e dirigentes do PT, os diferentes
fatos que relembra, fazem-na sentir parte da memória política do partido. Quando fala
que sua candidatura não estava nos seus planos, enfatiza que só acabou acontecendo
porque ―
o PT indicou o seu nome e a convenceu‖. E a indicação foi em boa parte devido
sua história no partido.
A relação agente/instituição também pode ser problematizada, no que diz respeito
à posição que o agente ocupa dentro da instituição. No episódio mencionado, Terezinha
ocupa uma posição social capaz de interferir na imagem daqueles que estão no seu
campo de ação, caso lhe fosse concedida a palavra. O receio de que a situação se
concretizasse é expresso nas palavras do Henrique Fontana, ―
você é deputada do PT, é
uma das vice-líder da gente aqui, se você sobe nessa tribuna ...”.
A candidatura somente em 2002 também é explicada por questões conjunturais,
Terezinha explica que na época da fundação do partido, ela não tinha o perfil de
candidato do PT “O PT era radicalíssimo naquele tempo então a gente não tinha a cara
do PT, a cara do PT era do trabalhador, de preferência de um trabalhador com a cara
87
bem quebrada”. Terezinha e seu esposo foram candidatos somente quando o partido
começa a falar para bases mais amplas.
Com a vitória de Jackson Lago, nas eleições de 2006, Terezinha passou a ocupar
a Secretaria do Trabalho e da Economia Solidária do Maranhão. Fala que não consegue
deixar de fazer política, por mais que não esteja ocupando cargo eletivo. Ressalta que
mesmo sendo mãe de quatro filhos, isso não a impediu de militar. O principal, segundo
Terezinha, para uma mulher continuar desempenhando suas atividades políticas é a
compreensão do marido, e destaca que isso só acontece quando o marido é militante.
Porque se não for marido militante, nenhum marido compreende não
aceita e a vida política da mulher acaba não vai pra frente. Isso eu digo
com certeza. Porque a mulher aceita acompanha o marido, tudo que ele
faz a sociedade aceita, mas a mulher sendo mulher não aceita, a não ser
que ela seja solteira, que ela faça opção de não ter família, de não casar
para ter uma militância política (...). Eu viajava pra tudo quanto era
canto do Brasil ia por aí. Lá explodiu a base espacial de Alcântara, lá
chego. Pediram a comissão externa formamos a comissão externa, aí eu
viajo pra cá, vou não sei pra onde, não sei pra onde, e quando chego em
casa digo: meu bem de madrugada vou viajar não sei pra onde. Passo
final de semana todinho viajando, quando chega segunda-feira de
madrugada vou viajar pra Brasília, acha que isso é fácil? Não é fácil.
(Terezinha Fernandes, entrevista em 03/04/07)
O vínculo de parentesco com político mais encontrado entre o grupo das
deputadas que pesquisei, foi com o cônjuge. E pude identificar em outros relatos, o fato
de o marido fazer parte do meio político, sendo destacado como fator importante no
desempenho das atividades políticas, devido o tempo de dedicação que a mesma exige.
Os exemplos das situações e relatos aqui destacados servem para mostrar as
diferentes lógicas da trajetória de Terezinha Fernandes, que ora se assemelha em alguns
aspectos com outros políticos, ora se diferencia com suas peculiaridades. Com o olhar
voltado para percurso de um agente, busquei numa perspectiva mais ampla, contribuir
com os estudos sobre as lógicas e processos que regem as disputas políticas, atentar para
problemática das relações hierárquicas entre membros das mesmas redes sociais, assim
como enriquecer a discussão sobre gênero e política.
3.6 Deputadas Estaduais no Maranhão
Da eleição realizada em 1982 até a última, em 2006, foram eleitas no Maranhão
um total de 22 deputadas estaduais conforme pode ser observado no quadro 10. Em
88
comparação com as deputadas federais considerei as mesmas variáveis. Os dados foram
em grande parte adquiridos por meio da biblioteca e dos arquivos do setor de cadastro
parlamentar da Assembléia Legislativa do Maranhão. Utilizei ainda para análise seis
entrevistas em profundidade com atuais e ex-deputadas (Graça Paz, Fátima Vieira,
Graciete Lisboa, Telma Pinheiro, Marly Abdalla e Maura Jorge). Estas relataram além
de dados sobre suas origens sociais, percursos profissionais e políticos, aspectos sobre
suas representações, valores sobre ‗a política‘ e suas posições sobre questões referentes
a participação da mulher na política. (ver modelo do questionário- anexo).
Quadro 10: Mulheres eleitas deputadas estaduais no Maranhão (1982-2006)
ANO
Nº de
mulheres
eleitas
Nome das deputadas estaduais
1982
1986
1990
1
1
2
Maria da Conceição S. Mesquita(PMDB)
Conceição Andrade(PMDB)
Maura Jorge(PFL)
Marly Abdalla(PFL)
1994
3
Marly Abdalla(PFL)
Janice Braide(PSD)
Maria Aparecida Cardoso (PRP)
1998
11
Maura Jorge (PFL), Malrinete Valério(PRP), Marly Abdalla(PFL), Luzivete
Botelho(PSDB), Janice Braide (PSD), Sandra Rodrigues (PSC), Maria
Aparecida Queiroz Furtado (PL), Tereza Murad (PDT), Telma Pinheiro
(PFL), Helena Heluy (PT), Maria da Graça Nunes Melo53
2002
8
2006
7
Graça Paz (PDT), Tereza Murad(PSB), Maura Jorge (PFL), Janice
Braide(PSD), Gardênia Maria Santos Ribeiro Gonçalves, Telma Pinheiro
(PFL), Helena Heluy (PT), Cristina Archer(PSDB), Socorro
Waquim(PMDB)
Eliziane Gama (PPS), Fátima Vieira (PP), Graça Paz (PDT), Graciete Lisboa
(PSDB), Cleide Coutinho (PSDB), Helena Heluy (PT), Maura Jorge (DEM)
Percebe-se por meio do quadro acima que no decorrer dos anos houve um
aumento considerável no número de deputadas eleitas no Maranhão. Observa-se que
tanto nas eleições de 1982 como na de 1986 apenas uma mulher conseguiu ser eleita
deputada estadual, Conceição Mesquita (PMDB) e Conceição Andrade (PMDB)
respectivamente; já durante a legislatura de 1999 a 2002 as mulheres ocuparam um
Nas eleições de 1998 Telma Pinheiro (PFL), Helena Heluy (PT) e Maria da Graça Nunes Melo tinham
ficado como suplente assumindo posteriormente. O mesmo aconteceu nas eleições de 2002 com Gardênia
Maria Santos Ribeiro Gonçalves.
53
89
número maior de cadeiras na Assembléia Legislativa Maranhense, somando um total de
11 deputadas. Atualmente a Assembléia Estadual do Maranhão conta com a
participação de 7 mulheres: Maura Jorge (DEM), Helena Heluy (PT), Cleide Coutinho
(PSDB), Graciete Lisboa (PSDB), Fátima Vieira (PP), Graça Paz (PDT) e Elisiane
Gama (PPS). Apresento abaixo no quadro 11 as propriedades sociais das deputadas
estaduais.
90
Quadro 11- Quadro sinótico dos percursos das deputadas estaduais no Maranhão (1982-2006)
FORMAÇÃO/PROFISSÃO
OCUPAÇÃO DE
CARGOS PÚBLICOS
ANTERIORES AO
MANDATO DE
DEPUTADA
LAÇOS DE
PARENTESCO COM
POLÍTICO
DEPUTADA
PRIMEIRO CARGO
ELETIVO
IDADE QUE
OCUPOU O
PRIMEIRO CARGO
ELETIVO
CONCEIÇÃO
MESQUITA
Vereadora em Coroatá
40
Ens. Médio
Empresária/Administração
Hospitalar
Diretora-Presidente da
Casa de Saúde e
Maternidade Dr. João
Mota em Coroatá de
1975 a 1979
Cônjuge (foi deputado
estadual)
CONCEIÇÃO
ANDRADE
Deputada Estadual
31
Direito/Advogada
Não se aplica
Não se aplica
MARLY ABDALLA
Deputada Estadual
51
Pedagoga/Administração
escolar
Não se aplica
Filho foi vereador em
São Luís
MAURA JORGE
Deputada Estadual
29
Direito/Advogada
Não se aplica
Mãe e cônjuge (esposo
foi prefeito de Arari)
APARECIDA
CARDOSO
Deputada Estadual
37
Ens. Médio/técn.
Contabilidade
Não se aplica
Não se aplica
APARECIDA
FURTADO
Prefeita de ParaibanoMaranhão (1993 a
1996)
38
Ens. Médio/Empresária
Não se aplica
Não se aplica
JANICE BRAIDE
Deputada Estadual
52
História/Escrivã
Não se aplica
Cônjuge (esposo foi
prefeito de Santa Luzia)
91
MALRINETE
VALÉRIO
Deputada Estadual
33
Ens. Médio/Comerciante
Tesoureira Municipal
do município de Bom
Jardim-MA em 1997
Pai (filha de ex-prefeito
de Bom Jardim)
- Assessora Especial da
Prefeitura em São LuísMA de 1972 a 1983;
- Secretária Municipal
de Urbanismo em São
Luís-MA de 1980 a
1983;
TELMA PINHEIRO
Vereadora de São Luís
(1997 a 1999)
45
Engª Civil- UEMA
- Secretária Municipal
de Planejamento em
São Luís-MA de 1987 a
1988;
Não se aplica
- Secretária Municipal
Adjunta de
Administração em São
Luís-MA de 1994 a
1995;
Secretária Municipal de
Infra Estrutura em São
Luís-MA de 1995 a
1996.
SANDRA
RODRIGUES
Deputada Estadual
28
Ens. Médio/Empresária
- Secretária Municipal
de Desenvolvimento
Econômico, Assistência
Cônjuge (esposo foi
prefeito de Timom)
92
Social e do Trabalho do
município de TimonMA de 1997 a 1998
MARIA DA GRAÇA
MELO
Prefeita de PedreirasMa (1989 a 1992)
49
Ens. Médio/Empresária
Não se aplica
LUZIVETE
BOTELHO
Vereadora em
Açailandia por dois
mandatos (1989 a
1996)
29
Superior/Func. Pública
Federal
- Assessora no
Ministério do Trabalho
em Brasília-DF em
1983;
Cônjuge (esposo foi
prefeito de Pedreiras)
Cônjuge (esposo foi
prefeito de Açailandia)
- Secretária do Ministro
Almir Pazzianoto em
1984.
CRISTINA ARCHER
Deputada Estadual
48
Comunicação Social
- Secretária Municipal
de Desenvolvimento
Social no município de
Codó-MA de 1997 a
2000;
Cônjuge (ex-esposa do
prefeito de Codó)
- Secretária Municipal
de Desenvolvimento
Social no município de
Codó-MA de 2000 a
2002.
GRAÇA PAZ
Deputada Estadual
50
Administração
Não se aplica
Cônjuge (esposo foi
deputado estadual)
HELENA HELUY
Vereadora de São Luís
(1997 a 2000)
54
Direito/Jornalismo- UFMA
Não se aplica
Não se aplica
93
GARDÊNIA
GONÇALVES
Deputada Estadual
44
Arquiteta
Não se aplica
Pai (foi governador do
Maranhão ) e mãe (foi
prefeita de São Luís).
TEREZA MURAD
Prefeita de Coroatá
(1993 a 1996)
37
Ens. Médio/Empresária
Não se aplica
Pai (foi deputado),
cônjuge (esposo foi
prefeito de Coroatá)
- Secretária Municipal
de Educação no
município de TimonMA de 1993 a 1996;
SOCORRO
WAQUIM
Deputada Estadual
48
Licenciada em GeografiaUFPI/professora universitária
- Assessora de
Educação na Gerência
de Desenvolvimento
Regional em CaxiasMA de 1999 a 2000;
Cônjuge (esposo foi
vereador por 5
mandatos em Timon,
foi eleito deputado
federal)
- Gerente da Gerência
Regional de Caxias-MA
em 1999;
- Gerente Municipal de
Desenvolvimento
Humano no município
de Caxias-MA de 2001
a 2002.
GRACIETE LISBOA
Deputada Estadual
51
Ens. Médio/Func. Pública
- Secretária de Ação
Social de Bacabal de
2005 a 2006.
Cônjuge (ex-esposa do
prefeito de Bacabal)
94
FÁTIMA VIEIRA
Deputada Estadual
47
Pedagogia- Universidade da
Paraíba (privada)
- Diretora de Pronto
Socorro no município
de Bacabal de 2001 a
2005.
Pai (filha de ex-prefeito
de Bacabal)
CLEIDE
COUTINHO
Vice-prefeita do
município de CaxiasMA em 1999
52
Medicina- Universidade
Federal da Bahia
- Secretária de Saúde de
Caxias de 1999 a 2000;
Cônjuge (esposo
prefeito de Caxias)
Deputada Estadual
30
ELISIANE GAMA
- Secretária de Ação
Social de Caxias de
2005 a 2006.
Comunicação Social-UFMA
Não se aplica
Não se aplica
95
No que tange ao grau de escolarização/profissão 54 das deputadas estaduais
percebe-se a predominância das seguintes categorias: empresárias (6), advogadas (3),
funcionárias públicas (3), comunicólogas(2) e professoras/pedagogas (2). Identifica-se
ainda uma médica, uma engenheira civil, uma arquiteta uma administradora, uma
contadora e uma historiadora (ver quadro sinótico2). Das 22 deputadas apenas 7
cursaram até o Ensino Médio, demonstrando que 68,18%
conquistaram vitórias nas urnas como deputadas
das mulheres que
investiram no diploma de curso
superior.
Uma análise mais detalhada para identificação se houve a reconversão da atuação
profissional das deputadas em trunfo político, exigiria um estudo mais aprofundado da
trajetória de cada uma delas, no entanto, exemplifico rapidamente com dois casos:
Helena Heluy (advogada) e Cleide Coutinho (médica).
No primeiro caso, destaco um trecho da biografia produzida no site da Assembléia
Legislativa ressaltando a atuação profissional de Helena Heluy na advocacia sempre em
―
defesa da causa dos oprimidos‖.
Filiada ao PT desde 1988, advogada, promotora de Justiça, procuradora de Justiça, jornalista,
fundadora e membro da Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz de São Luís, Helena tem dedicado seu
mandato à causa dos excluídos, dos sem teto, dos sem terra. Trata-se de uma luta ininterrupta em defesa
dos postulados da democracia, da liberdade, dos direitos humanos, da mulher, das crianças, dos
encarcerados etc. Como advogada, dedica sua vida à defesa da causa dos oprimidos. Em sua prática de
vida,
dá
prova
permanente
de
seu
compromisso,
coerência
e
coragem.55
No trecho destacado, percebe-se a ênfase na vinculação de sua atividade
profissional com uma história militante, contribuindo para construção de uma imagem
de porta-voz de causas legítimas. Por meio de sua atuação, enquanto advogada
conseguiu representar diferentes segmentos dos movimentos sociais, contribuindo para
a construção de um poder simbólico que é produto dos atos subjetivos de
reconhecimento, é um poder que aquele que lhe está sujeito dá àquele que o exerce.
Como afirmou Bourdieu (1998:188) “o homem político retira sua força política da
confiança que um grupo põe nele. Ele retira o seu poder propriamente mágico sobre o
grupo da fé na representação que ele dá ao grupo e que é uma representação do
próprio grupo e da sua relação com os outros grupos”.
54
Foi considerada a principal profissão, com base nas fichas de cadastro parlamentar, preenchidas pelas
deputadas.
55
Trecho extraído do site http://www.al.ma.gov.br/helena/paginas/biografia.php, acesso em 05/07/08
96
Somando-se aos vínculos estabelecidos com os movimentos sociais, as relações
construídas ao longo de sua atuação profissional- fato de ter sido professora do
Departamento de Direito da Universidade Federal do Maranhão e ter integrado por 25
anos o quadro do Ministério Público Estadual- possibilitaram a Helena Heluy o uso de
estratégias de diferenciação na lógica de concorrência política. Então sua passagem pela
UFMA, pelo Ministério Público, sua relação com os movimentos sociais e Igreja
Católica56 demonstram como a disputa política compreende diferentes lógicas.
No segundo caso, destaco alguns trechos do material de campanha da deputada
Cleide Coutinho “Drª. Cleide:uma história de luta pela saúde e compromisso social” .
O material, em questão, dispõe de 15 páginas onde se observa a apresentação da
candidata desempenhando diferentes papéis ao longo de seu percurso social- estudante,
esposa, mãe, médica, política- com fotos que ressaltam o seu capital social constituído a
partir das mais diversas lógicas, sempre relacionando a imagem da candidata ao seu
cônjuge e ao município de Caxias.
Como a questão em pauta é o uso da atuação profissional como trunfo político,
destaquei apenas as imagens e trechos que põem em relevo o desempenho da medicina
em Caxias pelo casal Cleide e Humberto Coutinho. No entanto, não se pode esquecer da
multidimensionalidade dos recursos dos agentes políticos, acumulados em diferentes
esferas sociais, sendo o uso da notoriedade profissional na busca por adesão de uma
base eleitoral, apenas um desses recursos. Para uma compreensão dos diferentes papéis
desempenhados pela deputada em questão, exigiria um estudo mais aprofundado, numa
perspectiva mais etnográfica.
Na foto número 9, é destacada o início da carreira médica do casal ainda jovem
no Hospital Miron Pedreira. No trecho desta foto, percebe-se como é construída uma
imagem de ‗inconformados com o atraso‘, que atribui ao casal a insatisfação com um
determinado tipo de instalações médicas encontradas em Caxias no inicio de suas
carreiras :“as instalações da instituição frustraram os jovens médicos”. Conferindo aos
Coutinho a busca por melhorias na área da saúde no município: “Logo depois, junto
com outros profissionais alugaram instalações para montar um hospital e alguns anos
depois construíram a Casa de Saúde e Maternidade de Caxias que se tornou a grande
referência de saúde em todo Maranhão”.
56
A deputada é fundadora e membro da Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz de São Luís
97
Ilustração 1- Fotos da atuação profissional de Cleide Coutinho no município de Caxias
98
As fotos de números 10 a 14 enfatizam o sucesso profissional da dupla de médicos.
Diz o material: “(...) A Casa de Saúde foi o primeiro hospital do Maranhão a realizar
um transplante de rim (...) as pessoas faziam fila para disputar uma consulta, uma
cirurgia ou uma internação no hospital da Drª. Cleide e do Dr. Humberto”. Por meio
das fotos e dos dizeres é creditado ao casal, a realização de uma série de benefícios
públicos na área da saúde em Caxias.
O material de campanha da parlamentar mostra ainda a mobilização de vínculos
constituídos em outros domínios com apoiadores visitando o hospital “A fama dos
médicos Cleide e Humberto Coutinho crescia na cidade e na região (...) inclusive com
pessoas ilustres visitando o hospital, tal como o ministro do STJ, Edson Vidigal e o
saudoso Senador Alexandre Costa” (ver fotos 19 e 20). Abaixo das fotos 22 e 23
identifica-se no próprio material em questão a afirmativa de que “o sucesso profissional
e pessoal do jovem casal levou ao sucesso político”.
99
Ilustração 2- Edson Vidigal e Alexandre Costa visitando o Hospital administrado pelos
Coutinho
100
Tais imagens demonstram não só a reconversão da exercício da medicina para a
política, como também Cleide Coutinho acionou seu capital social e político constituído
ao longo de sua atuação profissional como médica, como esposa do Humberto Coutinho
e na rede de relações pessoais com grandes eleitores57. Aqui vale lembrar um dos tipos
de capital político identificado por Bourdieu (1998:192) o capital delegado, a presença
nas fotos de pessoas como Edson Vidigal, Alexandre Costa e do próprio cônjuge
investem, consagram Cleide Coutinho como candidata oficial a uma eleição – ―
ato
propriamente mágico de instituição‖ - marcando a transmissão de um capital político.
Até mesmo nos slogans de campanha das duas deputadas- Helena Heluy e
Cleide Coutinho - nota-se a evocação de suas atuações profissionais.
Ilustração 3- Material de campanha de Cleide Coutinho pra deputada estadual em 2006.
Com a figura de um estetoscópio no material de campanha, Cleide Coutinho
convoca seu público eleitor com slogan ―
Saúde e Compromisso Social‖. O pequeno
trecho do material destaca sua singularidade feminina entre os candidatos,
―
capacidade que os mesmos possuem em administrar adesões, fruto da mediação operada por eles entre
diversos segmentos da população e o espaço político em níveis variados‖ (Grill, 1999)
57
101
apresentando-a como ―
mulher de fibra, coragem e determinação‖ e ao mesmo tempo
ressalta sua ―
competência profissional‖.
Helena Heluy que desempenhou ao longo dos anos atividades como advogada,
promotora de Justiça, procuradora de Justiça adota um slogan que também remete a sua
atuação profissional, ―
Justiça pra toda vida‖.
Ilustração 4 - Capa do cd do relatório de atividades de Helena Heluy- 2007
Tentei demonstrar, por meio dessa rápida abordagem, como a notoriedade
profissional das duas deputadas em questão, foi utilizada como recurso político nesse
empreendimento. Outros exemplos poderiam ser explorados como o caso da deputada
Elisiane Gama (PPS) e sua atuação profissional como comunicadora na rádio evangélica
FM Esperança, a atuação como advogada da ex-deputada Conceição Andrade nas
questões de conflitos de terras no Maranhão ou ainda a administração escolar do SESI
(Serviço Social da Indústria) realizada durante muitos anos pela ex-deputada Marly
Abdalla.
102
Entretanto, nem todos profissionais da política fazem uso de sua atuação
profissional como recurso nas disputas eleitorais, pelo contrário alguns não chegam nem
a exercê-la ou se desligam posteriormente da profissão devido o tempo de dedicação
que é exigido às atividades políticas. Levando isso em consideração, busquei identificar
qual a idade que essas mulheres que se elegeram deputada estadual no Maranhão
ocuparam o primeiro cargo eletivo e quanto tempo estas já têm de mandato. (Ver quadro
12 e 13)
Quadro 12- Idade de ingresso no primeiro cargo eletivo entre as deputadas estaduais
Idade
Entre 18-35
Entre 36-45
+ de 45
Nº de casos
6
6
10
Os dados mostram que mais de 40% das mulheres iniciaram suas carreiras após os
45 anos, o que não difere muito das deputadas federais como já foi demonstrado.
Tentando identificar o que Avelar (2001) apresenta em relação à difícil conciliação
entre a esfera familiar e a política por parte das mulheres, devido à situação conjugal e a
maternidade, perguntei às deputadas que entrevistei se isso procede. Sobre tal questão
afirmaram as deputada Graça Paz, Fátima Vieira 58 e as ex- deputadas Marly Abdalla59 e
Telma Pinheiro60, respectivamente:
Não é fácil, nunca foi fácil. Não só para as mulheres que têm uma vida
ativa politicamente como para as mulheres que trabalham fora. Ela tem
que conciliar os trabalhos de dona de casa, de mãe, de avó no meu caso
que eu tenho que dar atenção para meus netos também. Isso para gente é
muito difícil, porque o fato de nós estarmos fazendo parte de uma área
que antes era masculina, isso não nos tira nossas tarefas de casa. Nós
nos preocupamos com as tarefas de casa, com a escola dos filhos, com as
reuniões, que normalmente são as mulheres, claro que existem pais que
fazem, mas na sua grande maioria quem participa ativamente da vida da
As entrevistas realizadas com as deputadas Graça Paz e Fátima Vieira ocorreram separadamente em
seus respectivos gabinetes no dia 07/03/07 , vésperas do Dia Internacional da Mulher fato que contribuiu
na concessão da entrevista.
59
A entrevista foi realizada no dia 05/03/07 na sala da coordenação da Universidade da Terceira IdadeUNITI-UFMA.
60
A entrevista foi realizada no dia 14/03/07 na SECID, atualmente Telma Pinheiro assume a Secretaria
das Cidades.
58
103
família nessas particularidades, como dona de casa, como mãe, é a
mulher (Graça Paz).
“Há muita dificuldade, principalmente quando a gente tem casa, a gente
tem filhos, tem marido então é muito complicado, dá muito trabalho, mas
a gente tenta conciliar (Fátima Vieira).
Ah meu Deus essa é uma situação muito... precisa uma compreensão
muito grande, da família, do marido. Época de campanha você chega em
casa três horas, quatro horas da manhã. Meu marido era empresário,
tinha as empresas dele, tinhas as articulações, os amigos que era outra
ala e tudo isso preenchia o tempo dele e eu tinha oportunidade de
preencher o meu. E ele sempre respeitou, e é isso que falta, esse respeito
mutuo, não pode se apossar da vida do outro. Agora lógico, você tem que
ser correta, tem que ter limites, tem satisfação pra dar, mas de ambas as
partes. Sempre houve uma compreensão e eu fui muito feliz nesse
aspecto”. (Marly Abdalla)
É um equilíbrio né? O equilíbrio que eu busco, remindo o tempo. Como
eu não tenho mais filho pequeno, mas sou avó, o meu esposo é um homem
muito compreensível, a minha família também, pelas minhas ausências.
Por exemplo, até agora eu não fui em casa almoçar e não devo ir, talvez
chegue entre 10 ou 11 horas da noite, mas eu tento conciliar
compensando a minha família com momentos especiais, para compensar
as minhas ausências que são mais do que as minhas presenças. (Telma
Pinheiro)
Pode-se perceber por meio dos quatro depoimentos que todas destacaram a
dificuldade de conciliação entre a esfera familiar e as atividades políticas. A deputada
Graça Paz chama atenção para certas atividades em que ainda se concentra entre as
mulheres como por exemplo o acompanhamento do desempenho dos filhos nas escolas.
A ex-deputada Marly Abdalla dá ênfase sobre a questão do tempo de dedicação que
uma campanha exige, o que, segundo ela, requer uma compreensão maior por parte do
marido e da família. Telma Pinheiro também ressalta sobre o fator tempo como um dos
maiores desafios.
No quadro sinótico, é possível perceber, de forma mais detalhada, a idade de
ocupação do primeiro cargo eletivo das 22 deputadas estaduais e em que tipo de cargo
eletivo estrearam na política.
Entre as deputadas eleitas no Maranhão no período de 1982 a 2006, 14 não
haviam ocupado nenhum cargo eletivo anterior, somando mais de 60% as que
ingressaram diretamente como deputada estadual. Tanto no âmbito federal como no
estadual identifica-se no Maranhão o predomínio do ingresso ―
por cima‖ na política.
Apenas 8 mulheres iniciaram suas carreiras eletivas passando por diferentes cargos na
104
hierarquia política,4 como vereadoras: Conceição Mesquita, Telma Pinheiro, Luzivete
Botelho e Helena Heluy e 4 como prefeitas/vice-prefeitas: Aparecida Furtado, Maria da
Graça Melo, Tereza Murad e Cleide Coutinho.
Outro indicador que pesquisei sobre as deputadas que contribuiu para compreensão
da dinâmica de profissionalização política foram os anos acumulados de mandatos
eletivos. Tais dados demonstram que algumas mulheres permanecem em cargos eletivos
por um longo tempo. (Ver quadro 13)
Quadro 13: Deputadas estaduais eleitas no Maranhão com mais de um mandato (19822006)
DEPUTADAS ESTADUAIS
NÚMERO DE MANDATOS
Maria da Conceição Mesquita
2 (sendo eleita em 1978 e 1992)
Maura Jorge
4 (sendo eleita em 1990,1998,2002 e 2006)
Marly Abdalla
3 ( sendo eleita em 1990, 1994, 1998)
Janice Braide
3(sendo eleita em 1994,1998, 2002)
Helena Heluy
3 (sendo eleita em 1998 61,2002, 2006)
Telma Pinheiro
2 (sendo eleita em 1998, 2002)
Graça Paz
2 (sendo eleita em 2002 e 2006)
Considerando o número de mandatos, quem se destaca é a deputada Maura Jorge
somando mais de 16 anos de mandatos eletivos, seguida de Marly Abdalla, Janice
Braide e Helena Heluy, com três mandatos consecutivos.
Além do número de mandatos eletivos, destaco também a ocupação de cargos
públicos por parte dessas mulheres antes de se elegerem deputada estadual. Os dados
explicitam que 10 mulheres ocuparam cargos públicos antes de serem eleitas deputadas,
o que equivale a 45% dos casos. Como demonstram os dados do quadro sinótico
Em termos de tempo de dedicação dessas mulheres às atividades políticas, não
considerei apenas o número de mandatos. Como pode ser identificado nos quadros
acima, de modo geral, a carreira política dessas mulheres são longas. Com destaque
para: Telma Pinheiro, Luzivete Botelho e Socorro Waquim. Telma Pinheiro, atual
Apesar de ter assumido somente em janeiro de 2001 como primeira suplente, considero os anos de
mandatos como vereadora de São Luis de 1997 a 2000.
61
105
secretária estadual das Cidades e Infra-Estrutura, apesar de ter ingressado na carreira
eletiva somente aos 45 anos, em 1996, como vereadora, já ocupava cargos públicos
desde 1972, somando mais de 30 anos de dedicação a carreira política. A ex-deputada
Luzivete Botelho que disputou sem sucesso a prefeitura do município de Itinga-MA em
2004, ocupou cargos públicos desde 1983 e Socorro Waquim, atual prefeita de Timom,
começou em 1993 como secretária de Educação do referido município. Ressalto que a
ocupação de cargos públicos pode funcionar entre os concorrentes no espaço político
como capital significativo de diferenciação, muitas vezes não propriamente pela
atividade desempenhada, mas tais cargos acabam funcionando como títulos.
Dos casos pesquisados, doze não exerceram cargos públicos antes do primeiro
cargo eletivo, mas dentre estas, há casos de ocupação de cargos públicos
posteriormente, a exemplo de Conceição Andrade que foi Secretária de Agricultura,
Pecuária e Desenvolvimento Rural no governo Zé Reinaldo Tavares (abril 2002 a 2006)
e Marly Abdalla que foi Secretária de Estado de Desportos e Lazer no governo Roseana
Sarney (abril 1994 a 1998).
Durante o desenvolvimento de meu trabalho de campo pensei numa proposta de
análise das representações e significados da política entre as atuais deputadas no
cotidiano da Assembléia Estadual Maranhense. Desde diferentes perfis dos gabinetes, o
trabalho de ‗atendimento‘ visando manter as bases, as reuniões de comissão, a
organização das agendas, as relações com os assessores de gabinete, enfim as diferentes
formas de atuação de cada uma delas. Mas as limitações impostas pelo tempo que
disponho para o desenvolvimento de uma pesquisa de mestrado fizeram com que me
detivesse ao já destacado em relação às deputadas federais. Fiz uma apresentação da
presença dessas mulheres nas comissões (ver quadro 14). Como minha fonte de
pesquisa em relação a esses dados foi basicamente as pastas do setor de cadastro
parlamentar da Assembléia Legislativa, apresenta algumas limitações, visto que das 22
pastas analisadas 11 não estavam preenchidas nesse tópico 62.
62
Onze deputadas que não informaram os dados sobre as atuações nas comissões: Marly Abdalla, Janice
Braide, Aparecida Cardoso, Malrinete Valério, Telma Pinheiro, Luzivete Botelho, Sandra Rodrigues,
Maria da Graça Melo, Tereza Murad, Cristina Archer e Socorro Waquim.
106
Quadro 14- Participação das deputadas estaduais nas comissões
Maria da Conceição Sena e Silva de Mesquita
Atuações
Período
2ª Vice-Presidente da Mesa Diretora da
Assembléia Legislativa do MA.
Biênio 1985/1987
Presidente da Comissão de Economia,
Energia, Meio Ambiente, Recursos Naturais e
Tecnologia
1984
Conceição Andrade
Atuações
Período
Vice- Presidente da Comissão de Agricultura,
Indústria, Comércio e Turismo
1987-1988
Membro da Comissão Parlamentar composta
para averiguação ―
in-loco‖ das situação dos
trabalhadores rurais envolvidos em conflito de
terras em Buriticupu.
Agosto 1987
Membro da Comissão Parlamentar para visitar
o pólo Petroquímico da Bahia visando à
implantação de uma refinaria de Petróleo no
Maranhão
1987
Membro da
Comissão Especial
de
investigação do material de guerra apreendido
no Povoado Aldeia município de Bacabal
1987
Membro da Comissão Parlamentar PréConstituinte.
1987
Maura Jorge
Atuações
Período
107
Presidente da Comissão de Obras, Serviços
Públicos e Habitação
2007-atual
Vice-Presidente de Política Agrária, Produção
e Desenvolvimento Sustentável
2007-atual
Titular da Comissão de Defesa dos Direitos
da Mulher
2007-atual
Suplente da Comissão de Saúde
2007-atual
Suplente da Comissão de Assuntos
Municipais e de Desenvolvimento Regional
2007-atual
Suplente da
Consumidor
2007-atual
Comissão
de
Defesa
do
Helena Heluy
Atuações
Período
Presidente da Comissão de Defesa dos
Direitos Humanos
2007-atual
Titular da Comissão de Política Agrária,
Produção e Desenvolvimento Sustentável
2007-atual
Titular da Comissão de Defesa dos Direitos
da Mulher
2007-atual
Suplente da Comissão de Constituição, Justiça
e Redação Final
2007-atual
Suplente da Comissão de Ética
2007-atual
Graça Paz
Atuações
Período
Presidente da Comissão de Orçamento,
Finanças e Fiscalização
2007-atual
Vice-Presidente da Comissão de
Previdência, Assistência Social e da Família
2007-atual
Vice-Presidente da Comissão da Infância,
Juventude e Idoso
2007-atual
Suplente da Comissão de Defesa do
Consumidor
2007-atual
108
Suplente da Comissão de Ética
2007-atual
Suplente da Comissão de Defesa dos
Direitos da Mulher
2007-atual
Elisiane Gama
Atuações
Período
Presidente da comissão de Defesa dos
Direitos da Mulher – Presidente
2007-atual
Titular da comissão de Educação, Ciência,
Tecnologia, Cultura e Desporto
2007-atual
Titular da comissão de Ética
2007-atual
Suplente da comissão de Defesa do
Consumidor
2007-atual
Suplente da comissão da Infância,
Juventude e Idoso
2007-atual
Fátima Vieira
Atuações
4ª Secretária da Mesa Diretora
Período
2007-atual
Graciete Lisboa
Atuações
4ª Vice-presidente da Mesa Diretora
Período
2007-atual
Cleide Coutinho
Atuações
Período
Presidente da Comissão de Previdência,
Assistência Social e da Família
2007-atual
Vice-Presidente da Comissão de Saúde
2007-atual
Vice-Presidente da Comissão de Defesa dos
Direitos da Mulher
2007-atual
109
Suplente da
Consumidor
Comissão
de
Defesa
do
2007-atual
Suplente da Comissão de Meio Ambiente,
Minas e Energia
2007-atual
Suplente da Comissão de Ética
2007-atual
Conforme foi demonstrado em relação à freqüência das deputadas federais em
determinadas comissões, entre as deputadas estaduais também se evidencia a
recorrência da participação destas em comissões como Defesa dos Direitos da Mulher e
Previdência, Assistência Social e da Família. Um aspecto que diferencia das deputadas
federais é que, entre as estaduais, há um casos de vice-presidência e secretária da Mesa
Diretora. Conceição Mesquita foi a 2ª vice-presidente da Mesa Diretora entre os anos de
1985 e 1987 e atualmente, em relação a Mesa Diretora, a deputada Graciete Lisboa
ocupa a 4ª vice-presidência e a deputada Fátima Vieira ocupa a posição de 4ª secretária.
No que se refere às relações de parentesco com políticos entre as deputadas
estaduais eleitas no Maranhão, não se difere muito do que ocorre com as deputadas
federais. Pode ser identificado entre os 22 casos analisados, 16 deputadas que
apresentaram os usos do parentesco em suas carreiras políticas, sendo que o vínculo
com o cônjuge prevalece, seguido dos laços com o pai, duas figuras masculinas. Outro
fator que merece ser destacado é o cargo eletivo ocupado, pelos cônjuges das deputadas
estaduais, impera o cargo de prefeitura.
Feita essa análise mais geral dos perfis e posições ocupadas pelas deputadas
estaduais eleitas no Maranhão no período de 1982 a 2006, partirei agora para a parte
etnográfica da pesquisa, focalizando em um estudo de caso. Como já salientado na
introdução do trabalho, escolhi uma deputada estadual que lançou sua candidatura como
prefeita no período da pesquisa. Tal fato possibilitou uma observação participante, no
município de Lago da Pedra, cujos atos de campanha são descritos e analisados a seguir.
110
Capítulo 4 – MULHER MARANHENSE EM CAMPANHA ELEITORAL: de
deputada a prefeita de Lago da Pedra
Os estudos sobre a participação das mulheres na política, permitem explorar a
discussão se há aspectos singulares ou não do estilo feminino de fazer política. Essa
participação diferencial da mulher na política tem sido abordada por diferentes ângulos.
Alguns autores privilegiam a atuação das mulheres nos mandatos, outros enfocam a
especificidade em relação às campanhas eleitorais.
Para Miguel (2001), apesar das múltiplas identidades femininas, fala-se de uma
perspectiva social, como um ponto de partida comum, que caracteriza a contribuição
diferencial da mulher na política, a exemplo da participação de forma mais recorrente
em determinadas comissões ou secretarias específicas, como já foi demonstrado no
capítulo anterior. Avelar (2001) chama atenção para o fato, de que seja qual for o seu
partido, as mulheres tendem a dar mais atenção e prioridade às políticas dos direitos da
mulher e às políticas públicas relacionadas com questões familiares, tais como
condições de vida para as crianças, saúde, reprodução.63 No entanto, nesse capítulo, o
foco recai sobre o segundo aspecto: análise de candidatura feminina.
Em relação às especificidades das campanhas femininas, há o já mencionado
trabalho de Barreira (1998) que ao tomar como objeto de análise, as candidaturas de
mulheres nas campanhas de 1996 para prefeitura nas cidades de Fortaleza, Natal e
Maceió, destacou como os discursos, slogans e rituais podem ser nomeados de jogos de
identificação e diferenças. A autora demonstra como entre as candidatas há uma
associação entre definição de fronteiras pelo do fato de ser mulher e simultaneamente
colocam-se como expressão de uma totalidade reafirmando certos valores morais e
políticos. Exemplifica com o acionamento de adjetivações presentes nos materiais de
campanhas analisados, tais como: ―m
ulheres de luta‖, ―
mulheres experientes‖ e
―
mulheres virtuosas‖ na trajetória de candidatas provenientes de diferentes contextos
sociais.
63
Demonstra ainda, como em algumas entrevistas, candidatas em busca de
Dentre os exemplos de temas defendidos por diferentes deputadas na Câmara de Deputados Federais
do Brasil, relacionados com a questão feminina, destacam-se os que se relacionam com a violência
doméstica; o reconhecimento da paternidade, pela aprovação da gratuidade do exame de DNA; a
prevenção do câncer ginecológico gratuita; atenção para os projetos sobre mortalidade materna; licenças
para mães adotantes; registros de união após 5 anos de vida em comum; direitos das empregadas
domésticas, dentre outros. (Jornal C-Femea/www.cfemea.org.br)
111
reconhecimento político, ressaltaram qualidades que, segundo estas, estariam presentes
mais nas mulheres que em homens. Em entrevista, Elma Sales, 50, ex-prefeita de Paulo
Jacinto-AL, diz o seguinte:“As mulheres são mais cuidadosas, mais criativas.
Desenvolvem, desde pequenas, o senso de responsabilidade. Além disso, nós temos um
sexto sentido que nos permite ver as coisas mais profundamente”. Outra prefeita eleita
também no interior de Alagoas, Silvana Costa Pinto, de 33 anos, do PFL, partilha da
mesma opinião: “Nós agimos muito pelo coração, conseguimos juntar o raciocínio
com o sentimento e isso nos permite ter uma visão mais geral das coisas”. (entrevista
concedida à Tribuna de Alagoas, in:Barreira 1998).
Apesar das propriedades suprapartidárias acionadas, a autora mostra como
dependendo do contexto analisado, apareciam também situações em que as candidatas
buscavam uma diferenciação com base em critérios ideológicos.
Enquanto Barreira (1998) analisou no mesmo ano -1996- candidatas ao cargo de
prefeita em cidades diferentes, neste capítulo faço uma comparação da mesma mulher
candidata- a então deputada Maura Jorge- em campanhas diferentes no Maranhão.
Analiso atos de campanha em municípios do Maranhão, visitados por Maura Jorge,
durante a campanha para deputada estadual de 2006, por meio de um vídeo. Em
seguida faço um exame, de caráter mais etnográfico da campanha de Maura Jorge para
prefeitura do município de Lago da Pedra em 2008, por meio de observação
participante.
Para uma melhor compreensão, apresento antes o percurso de Maura Jorge, por
meio de entrevista64 com a candidata, demonstrando como ela constrói sua trajetória
desde ―
filha de prefeita‖ até se tornar herdeira política. Vale ressaltar que não limito a
análise na identificação do uso do recurso de ‗gênero‘ nas disputas eleitorais, acionado
por Maura Jorge. Considero também seus diferentes movimentos e estratégias
mobilizados nas campanhas e o significado das adesões eleitorais de alguns agentes
entrevistados na campanha de 2008.
64
A entrevista ocorreu em Lago da Pedra em circunstâncias eleitorais, momento em que a situação de
entrevista pode apresentar-se para o entrevistado como oportunidade de difundir suas propostas e de
enfocar em seu discurso aspectos relacionado à campanhas.
112
4.1 - Tornando-se herdeira política
Maura Jorge (DEM) nasceu em Lago da Pedra65, no início dos anos 60, filha do
fazendeiro Waldir Jorge e da ex-prefeita Raimundinha Jorge, está no seu quarto
mandato de deputada estadual. Sua família participa das disputas políticas em Lago da
Pedra há muitos anos contra a facção política liderada por Luis Osmani (PDT), em meio
a esse período sua mãe chegou a exercer quatro mandatos como prefeita da cidade 66.
Maura Jorge ao relatar sobre a origem política de sua família ressalta o fato de seu pai
combater na época o chamado Vitorinismo 67 em Lago da Pedra:
Naquela época tinha o Vitorinismo, muito forte aqui na nossa região e
meu pai como sempre um jovem destemido, foi quem levantou a bandeira
de oposição, porque tinha só uma ala preponderante, que mandava na
época, não me lembro muito bem o motivo, boicotaram a candidatura
dele, e ele achou por bem enfrentar e lançou para a candidatura minha
mãe, a origem da nossa política foi o meu pai, mas por conta disso.
(Maura Jorge-entrevista em 20/07/08)
O fato de ter uma mãe prefeita marcou a infância de Maura Jorge, que desde
criança já a acompanhava nas inaugurações das obras, nos discursos, e sempre gostava
de observar o trabalho social. Raimundinha Jorge teve seis filhos, quatro mulheres e
dois homens, dentre os quais, Maura Jorge e o caçula- Waldir Filho - desde cedo
gostavam de participar das atividades políticas da mãe. Maura Jorge afirma que antes da
Município do Maranhão, localizado na micro-região de Pindaré, a 307 km de São Luís, atualmente com
uma população de 42.666 hab. (site-IBGE)
65
66
67
A ex-prefeita Raimundinha foi eleita em Lago da Pedra em 1972, 1976, 1996 e 2000.
Para uma melhor compreensão do ―
Vitorinismo‖ no Maranhão ver os clássicos trabalhos de BUZAR
(1998, 2001) e mais recentemente o trabalho de Morais Filho (2007) sobre as relações políticas nesse
período na região do Médio Mearim: Feudos, Canudos e Bolchevismos no Maranhão: Oposicionistas e
Vitorinistas num mundo de guerras locais.
113
sua mãe ser prefeita a cidade de Lago da Pedra não tinha praticamente nenhuma
estrutura, para ela o primeiro mandato de sua mãe marca a origem de Lago da Pedra.
(...) não tinha estrada, não tinha energia, não tinha nada, a origem do
Lago da Pedra foi com ela, a primeira escola que teve aqui foi ela quem
fez, a energia também foi ela que trouxe, o mercado municipal, eu era
pequenininha mas eu me lembro foi ela quem fez, eu tenho boas
recordações dessa época sabe (...) porque foi justamente aí que eu
comecei a me integrar nessa vida política, de vivenciar a verdade é essa,
porque desde criança, eu já participava de uma forma ou de outra, da
vida política do meu município. Tem uma coisa que me marcou e eu não
sei por que também e ao mesmo tempo eu acho que sei (...) de todas essas
obras que eu falei que foram delas, do mandato dela, a que me marcou,
foi a inauguração do primeiro ginásio daqui, eu tinha uns 9 anos ou 10
anos e eu me lembro bem, aquilo pra mim era uma coisa extraordinária
eu participar da inauguração de um colégio.(Maura Jorge-entrevista em
20/07/08)
Ao explicar hoje, o fato da inauguração do ginásio ter ficado muito presente em
sua memória, Maura Jorge atribui como fator de coerência a preocupação que sempre
teve com a questão educacional, relatou que a educação esteve de forma contínua entre
as prioridades de seus mandatos. Foi dela o projeto de lei para criação do Centro de
Estudos Superiores de Lago da Pedra na estrutura da Universidade Estadual do
Maranhão. “Sempre achei penoso constatar a frustração dos jovens que concluíam o
ensino médio e se deparavam com as dificuldades para cursar uma faculdade diante da
impossibilidade de se manter em cidades distantes que têm curso de formação
superior”, justificou a deputada.
Essa relação do cotidiano familiar e do cotidiano da política aparece também do
depoimento de outras deputadas, falas que demonstram a idéia de ―
permanência‖ da
atividade política, se diferenciando do caráter temporário atribuído por grande parte dos
eleitores, o tempo da política, que será tratado mais adiante.
A minha família do lado da minha mãe, é uma família que já vem, que
foram políticos. O meu tio avô foi o primeiro prefeito do município de
Mirinzal, (...)junto com esses antecedentes, vamos dizer assim, da gente,
a gente começa ter logo a ter um reconhecimento da situação do estado,
da situação do município, daquela localização onde a gente tem aquela
atuação, os parentes têm aquela atuação política. Então aquela
convivência com os políticos, aqueles assuntos, aquelas discussões
políticas, aquelas discussões que são super interessantes, a respeito da
economia, a respeito da situação de uma forma geral, do nosso estado,
114
do nosso país. Leva com que a gente se envolva, acaba se interessando,
a gente acaba se envolvendo. (Graça Paz, entrevista em 07/03/07)
Minha mãe tinha uma grande escola de datilografia e todo final de ano,
as turmas eram formadas 50, 60, 70 alunos e ela fazia uma festa que
tinha uma natureza também profissional e política. E ela convidava
figuras para ser paraninfa destas turmas como La Roque, Alexandre
Costa, como Vitorino Freire, como Sarney até os meados de 65 (...)E ela
tinha toda uma relação com esses políticos daquela época, e de certa
forma eu gostava muito de ouvir, de acompanhar a vida dos políticos.
Eu me lembro que eu tinha assim 16 anos o Henrique de La Roque um
grande deputado federal, foi fazer uma visita a minha casa, lá no Monte
Castelo e eu fiquei assim...me preparei, me arrumei, porque eu queria
fazer parte, quando ele chegasse, da comitiva que iria recepcioná-lo.
Então eu sempre tive muita tendência para liderança, para esse embate
político. (Telma Pinheiro, entrevista em 14/03/07)
No caso da Telma Pinheiro, na construção de sua biografia, enfatizou as visitas
comuns em seu lar, por parte de políticos influentes no cenário político maranhense. Os
vínculos de sua mãe com estes lhe possibilitaram acesso a um círculo de contatos
políticos e pessoais, e estes viabilizaram a ocupação vários cargos públicos e eletivos no
Maranhão, como já foi demonstrado no capítulo anterior. Mas vale ressaltar, que Telma
Pinheiro enfatiza que se ela deu continuidade e permanece atualmente na política, ainda
que não seja em cargos eletivos, isso se deve aos seus próprios ―
méritos‖.
A deputada Graça Paz, mencionou que a convivência desde a infância com
políticos acabou levando-a a se envolver com questões e discussões relacionadas à
atividade política e situação de seu município.
Na adolescência, Maura Jorge passou a morar em São Luís, estudou no colégio
Dom Bosco até a oitava série, cursou o ensino médio no colégio Marista e se preparou
para fazer vestibular para medicina. Segunda ela, o sonho de sua mãe era ser médica,
como ela não tinha conseguido, depositou esse sonho na filha. Maura Jorge tentou
vestibular algumas vezes para medicina, mas não passou. Afirmou que sempre quis
mesmo psicologia, “talvez por gostar de entender as pessoas, de dialogar, tanto que
hoje acho que sou um pouco psicóloga, eu chego, adentro as casas e gosto de ouvir”,
ela destaca. Maura Jorge passou para psicologia em Campina Grande na Paraíba e como
o curso só começava no segundo semestre, ela veio passar as férias em Lago da Pedra,
foi quando conheceu Rui Filho, começaram a namorar e ela não voltou mais para
115
Campina Grande. Transferiu o curso de Psicologia para o curso de Direito na
Universidade Federal do Maranhão e casou aos 17 anos com Rui Filho.
Mesmo morando em São Luís, as idas à Lago da Pedra eram constantes para
Maura Jorge, que nesse período desenvolvia vários trabalhos sociais no município
juntamente com seu irmão caçula. A família Jorge atende há vários anos inúmeros
moradores de Lago da Pedra em um escritório localizado no centro da cidade, que por
ficar no alto de uma ladeira juntamente com a residência da família e o sistema de
comunicação Waldir Jorge, os moradores da região chamam de ―
Alto do Waldir‖ (ver
ilustrações 5, 6 e 7). Atendem ainda na própria casa da família, os pedidos são de
diversas ordens, consultas, cirurgias, remédios, materiais de construção, transferências,
emprego, terrenos, passagens, dentre outros. Segundo os moradores o atendimento
prestado não se limita ao período eleitoral, “o bom da família Jorge é que pra eles não
tem tempo ruim, estando ou não na prefeitura, em época de campanha ou não, eles
sempre nos atendem, diferente do atual prefeito”, afirmou um eleitor.
Ilustração 5- Escritório da Família Jorge de Atendimento aos moradores de Lago da Pedra
116
Ilustração 6- Entrada do Sistema de Comunicação Waldir Jorge
Ilustração 7- Atendimento aos eleitores na residência da família Jorge em Lago da Pedra
O desenvolvimento de trabalhos sociais fazia parte do cotidiano de Maura Jorge e
de seu irmão mais novo, o que acabou contribuindo para que ambos futuramente
disputassem cargos eletivos, ela lembra:
117
... eu comecei a me envolver com o trabalho social, com associações. Ele
era o mais novo e eu a mais velha, tínhamos assim uma identidade eu e
ele e nós começamos assim a fazer esses trabalhos sociais, com
associações, eu tinha 20 anos e foi a partir desses trabalhos, que surgiu a
idéia de candidatura dele pra prefeito, foi o prefeito mais novo do Brasil,
acho que com 22 anos e era um ídolo pra mim, apesar de eu ser mais
velha. (Maura Jorge-entrevista em 20/07/08)
Maura Jorge nutre até hoje um sentimento de ―
adoração‖ pelo irmão, disse que
ele foi um grande exemplo para ela, que tenta fazer política inspirada no jeito que ele
fazia. O irmão mais novo de Maura Jorge, Waldir Filho, foi eleito prefeito de Lago da
Pedra em 1988, período em que foi presidente da Federação dos Municípios do Estado
do Maranhão – FAMEM, por dois mandatos. Em 1994 foi eleito deputado estadual, mas
não chegou a exercer até o final do mandato devido um acidente aéreo 68 em 1995, do
qual foi vítima fatal durante viagem para participar de uma itinerância da AL. Apesar da
morte ter ocorrido há mais de dez anos, no trabalho de campo, pude perceber que esse
sentimento de grande admiração por Waldir Filho, não é mantido apenas por Maura
Jorge, mas por várias pessoas do município. Presenciei muitos relatos emocionados
sobre Waldir Filho, observei fotos dele em estabelecimentos comerciais e nas salas de
várias residências, fui informada que a data em que ocorreu o acidente- 25 de março- é
feriado municipal em Lago da Pedra em sua homenagem. Dentre os relatos, destaco o
de uma jovem e de um senhor que viajavam comigo na van em minha primeira ida ao
município
Eu era muito pequena, mas me lembro bem, muito bem dele. Ele falava
com todo mundo, sorria o tempo todo. Tem uma coisa que jamais
esquecerei, sabe, eu tinha muita vontade de ter uma boneca, dessas mais
arrumadinhas, e eu lembro que numa noite de natal, o Waldir Filho se
vestiu de papai Noel, e saiu com um saco de brinquedos enorme lá pelo
meu bairro, foi uma alegria só, muita criança em volta dele e eu só
olhando, não conseguia chegar perto, foi quando ele olhou pra mim e
veio até onde eu estava, meu Deus eu não estava nem acreditando e o que
ele tirou de dentro do saco? Uma boneca linda e me abraçou e me
entregou. Ainda hoje guardo essa boneca, tenho muito ciúmes dela,
nunca vou esquecer daquele dia.
“Ah o Waldizinho era muito simples, a Maura lembra muito ele, mas
acho que ele era ainda mais do povo, lembro de uma vez que ele passava
lá na rua, vindo da associação todo suado, parou na minha porta e
começou a conversar, ele sempre tinha histórias para contar, e minha
Não houve sobreviventes no acidente, este vitimou o piloto da aeronave e os três deputados
maranhenses - deputados Jean Carvalho, João Silva e Waldir Filho - quando viajavam para cidade de
Imperatriz. Eles estavam em um bimotor, que caiu durante o mau tempo.
68
118
mulher perguntou se ele queria água e ele não só aceitou a água, como
disse que iria tomar um banho, a senhora acredita? Ofereci roupas
limpas do meu filho e ele aceitou, deixou as dele lá por casa mesmo, ele
era simples demais, não fazia diferença, tratava todo mundo igual e era
muito desapegado das coisas materiais.
Realizar sonhos, resolver problemas, ser o prefeito mais jovem do Brasil,
conseguir ser eleito deputado estadual ainda muito jovem, a ―
simplicidade‖, estão entre
os atributos reconhecidos a Waldir Filho por muitos moradores de Lago da Pedra. As
representações sobre Waldir Filho expressam muitos dos trunfos simbolizados pelos
líderes carismáticos, alguns destacavam ainda o fato dele ter morrido fazendo política,
―
morreu desempenhando sua missão‖, demonstrando que aquilo que parece ser uma
propriedade individual é fruto de posições ocupadas por Waldir Filho, na história
política de Lago da Pedra. Os sentimentos demonstrados pelos moradores de
―
admiração‖, ―
gratidão‖, ―
lealdade‖ evidenciam que a política envolvem também outras
lógicas.
Maura Jorge se considera herdeira política do irmão. Contou que foi na época do
mandato dele de prefeito que surgiu a idéia dela ser candidata a deputada estadual.
Segundo a deputada, Waldir Filho priorizava a questão de lançar candidatos que fossem
―
da terra‖ e apontou inicialmente seu tio, Dr. Rui, pai do deputado Mauro Jorge, que
atualmente é contra o ―
grupo político‖ da Maura Jorge, mas ele não aceitou, surgindo a
possibilidade da indicação da primeira candidatura de Maura Jorge, ela relata:
Teve a indicação do meu tio que é médico, o Dr. Ruy, que é pai do
deputado Mauro Jorge que é contra a gente, mas o sonho do meu tio era
ser prefeito e não deputado e não aceitou, então meu pai e nosso grupo
político resolveram me lançar por conta dessas circunstâncias, primeiro
pelo desejo do grupo de ter alguém que fosse da terra e depois porque
meu tio, que era a pessoa indicada pelo grupo não ter aceito, porque o
homem traça seus caminhos mas é Deus quem determina. E de repente eu
me vi sendo candidata a deputada, muito nova, inexperiente ainda ... foi
pela influência do grupo e da família e pela necessidade de ter um
candidato da terra. Fui eleita deputada no ano que me formei e não
exerci nem minha profissão porque não tive como conciliar as duas
coisas. (Maura Jorge-entrevista em 20/07/08)
Pode-se perceber no relato acima, alguns aspectos relacionados à questão da
especialização política. Maura Jorge com 29 anos, foi eleita deputada estadual pela
119
primeira vez em 1990. Chamo atenção para o recrutamento precoce69 que muitas vezes
ocorre entre os profissionais políticos, e o tempo de dedicação exigido para aqueles que
querem se dedicar a carreira política (Offerlé 1999). Maura Jorge não chega se quer a
exercer a profissão de advogada, por ter escolhido se dedicar à carreira política,
afirmando que não conseguiu conciliar as duas coisas.
Outro elemento é ―
influência da família‖, mencionada por Maura Jorge, que
apesar dela se referir ao momento específico de indicação da candidatura, percebe-se
em outros momentos da construção de sua trajetória, que muito antes da candidatura
houve um trabalho de socialização e incorporação de práticas concernentes à política
devido ao ambiente em que Maura Jorge cresceu, habilidades adquiridas nos trabalhos
sociais com o irmão, relações de parentesco com políticos e vínculos da família Jorge
com outras famílias de tradição política do Maranhão.
Grill (2008) ao discutir sobre os trunfos derivados dos laços familiares acionados
por políticos no Rio Grande do Sul, destacou algumas lógicas de diferenciação nas lutas
eleitorais: o uso do ―
nome‖, a ―
imagen‖ da família em virtude da reputação familiar na
memória política local, a familiaridade com o meio político devido a precocidade dos
contatos com códigos que marcam o funcionamento dessa esfera e os acessos a
determinados cargos oportunizados por vínculos de parentes. Apesar de demonstrar por
meio dos diferentes casos analisados que estes aspectos estão associados, o autor
identificou que a ênfase no ―
nome‖ está entre as mais freqüentes.
No caso em pauta, o nome de registro da candidata é Maura Alves de Melo
Ribeiro, mas devido ao reconhecimento do nome de seu pai- Waldir Jorge- como o
fundador do ―
grupo político‖ e da associação feita por muitos moradores de Lago da
Pedra do nome ―
Jorge‖ com os principais feitos e obras realizados nesse município, ela
adotou o nome parlamentar Maura Jorge.
Em estudo comparativo sobre os condicionantes no processo de especialização política entre os
deputados no Rio Grande do Sul e no Maranhão destaca Grill (2007:10, grifos meus): ―
Com base nos
dados coletados é possível observar que mais da metade dos parlamentares dos dois estados
inauguraram na carreira eletiva (ocuparam o primeiro cargo conquistado em pleitos eleitorais) com
menos de 35 anos. Esse ingresso precoce se torna ainda mais visível quando é considerada a idade detida
nos primórdios da ocupação dos cargos (incluindo eletivos e nomeações), quer dizer, mais de 70% dos
casos estrearam com idade inferior a 35 anos, mais da metade antes dos 30 anos e entre 23% no Rio
Grande do Sul e 25% no Maranhão antes dos 25 anos.
69
120
Na campanha de 2008, quando estive no município pude ouvir algumas vinhetas e
propagandas que passavam na rádio Santa Maura, divulgando a campanha, este também
foi reproduzido como fundo de um telão que passavam imagens da candidata na
abertura de um comício. Destaco um trecho abaixo onde o pertencimento a família
Jorge é o que inicia a chamada:
“Natural de Lago da Pedra, filha de Waldir Jorge de Melo e Raimunda
Alves de Melo, Maura Jorge iniciou a vida política no município de
Lago da Pedra onde sua família tem tradição política e social na
história do município, sua mãe foi prefeita por quatro mandatos com
uma grande folha de serviços prestados ao povo de sua terra, seu irmão
Waldir Jorge de Melo Filho foi prefeito de Lago da Pedra e exercia o
mandato de deputado estadual quando faleceu vítima de acidente aéreo,
Maura Jorge está no seu quarto mandato de deputada estadual e agora
encara mais esse desafio disputar as eleições municipais aqui em Lago
da Pedra (...) e é por isso que o povo de Lago da Pedra quer Maura
Jorge como prefeita dessa cidade para dar continuidade ao seu trabalho
na construção de uma Lago da Pedra melhor” (trecho do material de
campanha divulgado na rádio Santa Maura)
O uso estratégico do pertencimento à região também pode ser identificado no
depoimento, como trunfo acionado pela candidata. Atualmente o fato de ser
lagopedrense tem sido um dos códigos acionados por Maura Jorge nas campanhas
municipais. Tratarei mais adiante especificamente das atividades de campanha de
Maura Jorge da disputa pela prefeitura no município de Lago da Pedra em 2008.
Apesar da convivência desde pequena com o dia-a-dia da mãe prefeita, dos
trabalhos em associações com o irmão, da participação nos trabalhos de atendimento
aos eleitores da família, Maura Jorge afirma que assumiu muito inexperiente, considera
os anos de 1990 a 1994, como um marco no seu aprendizado em como fazer uma
política mais institucional.
Maura Jorge afirmou que no inicio o ambiente da Assembléia Legislativa era
desconhecido para ela, não tinha ainda conhecimento de como fazer um projeto de lei,
da prática das alianças, das trocas de apoio, fazer pronunciamentos. ―
Eu não tinha ainda
a malícia da política‖, ela afirma. Ressalta também que em seu primeiro mandato teve
que enfrentar o preconceito por ser jovem e bonita, demonstrando que características
que podem ser valorizadas em determinadas situações, em outros momentos podem ser
apontadas como elementos negativos.
121
Falavam que eu tinha sido eleita só pelo fato de eu ser bonita, não por
minha competência, lembro que me chamavam de musa da Assembléia,
(...) mas tudo tem um aprendizado na vida da gente, tudo tem um início
pra que a gente possa aprender e foi um aprendizado que valeu porque
garantiu minhas outras reeleições. Maura Jorge - entrevista em 20/07/08)
As experiências vividas nesse período, ensinaram a Maura Jorge as regras do jogo
político. Ela afirmava sua experiência adquirida, ―
agora eu já conheço o caminho das
pedras, já sei como buscar apoios”. A deputada reclama que a política no Maranhão
tem um complicador, que é o fato do Legislativo se deixar atrelar muito ao Executivo.
Segundo Maura Jorge, o Legislativo não se deixa fazer valer:
O que conduz esse atrelamento, essa vinculação é a condição de vida do
nosso povo, se você vai para o interior, vê que o povo vive na miséria, os
direitos que estão assegurados na Constituição fica só na Constituição,
na prática é só balela, e isso faz com que o eleitor veja nas eleições uma
oportunidade para se dar bem, aí o vereador ou o deputado, o
Legislativo, para ele conseguir uma reeleição ele tem que está atrelado
de certa forma ao Executivo para conseguir levar as obras, o colégio, a
estrada que na verdade não é o papel do Legislativo esse é o papel do
Executivo, mas termina que se confundem esses papéis e o Legislativo
tem que ser o Executivo na sua essência para ter a força de voltar para o
mandato, se não, não se reelege, essa é a realidade do nordestino(Maura
Jorge -entrevista em 20/07/08)
Maura Jorge afirma ter aprendido muito sobre política nos quatro anos do
primeiro
mandato.
Esta
consegue
não
só
as
reeleições,
como
aumenta
consideravelmente sua margem de votação. Nas três eleições pelo PFL ela obteve
sucesso nas urnas. Segundo dados do TRE, ela se elegeu em 1990 deputada estadual
com 14.219 votos, no ano de 1998 aumentou para 27.253 votos, em 2002 sobe para
37.612 votos e nas últimas eleições, no ano de 2006 concorreu pelo PDT perdendo
alguns números de votos, mas ainda assim foi uma das deputadas mais votadas com
34.126 votos.
Como a facção política de Maura Jorge perdeu as eleições municipais em Lago
da Pedra em 2004, em reuniões a indicaram como ―
salvadora da pátria‖, como ela
122
costuma falar. A percepção do seu conjunto político é de que o nome Maura Jorge, era o
único que poderia vislumbrar essa chance de retomar o poder municipal em Lago da
Pedra. Mas antes de falar da campanha municipal, irei detalhar alguns aspectos da
última campanha para deputada estadual.
4.2 - A campanha de 2006
Em 2006, Maura Jorge disputou pela quarta vez o cargo de deputada estadual no
Maranhão. Segundo ela, essa foi uma eleição muito difícil. Afirmou que se sentia muito
só no período da campanha no sentido da falta de apoiadores tanto da família, como nas
alianças políticas. Ela já não tinha mais o irmão que sempre foi o companheiro mais
próximo nessas lutas, a liderança do pai estava debilitada. Este já teve dois AVCs e não
tem mais a mesma mobilidade para gerir e coordenar campanhas, estava sem o apoio da
prefeitura em Lago da Pedra e contra o governo do estado.
Maura Jorge nas três campanhas anteriores- 1990, 1998 e 2002- foi candidata ao
cargo de deputada estadual pelo antigo PFL, hoje DEM, sempre declarando e recebendo
apoio do ―
grupo Sarney‖ nas disputas eleitorais. Mas segundo ela, por circunstâncias
políticas70 teve que disputar as eleições de 2006, filiada ao PDT.
Os relatos que se seguem agora, partiram da observação de um vídeo de uma hora
de duração, com alguns momentos da campanha de Maura Jorge para deputada estadual
em 2006. Tal fonte traz algumas limitações para a pesquisa por ter sido produzido pelo
próprio Sistema de Comunicação Waldir Jorge. Ainda assim, o material permitiu-me
analisar alguns aspectos da campanha de 2006. O vídeo mostra passeatas, carreatas e
comícios realizados em municípios maranhenses próximos: Lago da Pedra, Lago do
70
Em 2005 alguns deputados migraram para o PDT com o objetivo de apoiar o governador José
Reinaldo Tavares. Estes fizeram um acordo formando uma frente para vencer as eleições no Maranhão. A
exemplo dos deputados Pavão Filho, Pedro Veloso, Maura Jorge, Antonio Bacelar e Camilo Figueiredo.
Mas no segundo turno das eleições para governador do Maranhão de 2006, Maura Jorge declarou apoio
a senadora Roseana Sarney (DEM), que disputava o governo contra Jakson Lago (PDT), este último
venceu
as
eleições.
123
Junco e Lago dos Rodrigues, numa dobradinha da candidata Maura Jorge e do
candidato a deputado federal Carlos Brandão 71 (PSDB).
Antes de iniciar os comícios o vídeo mostra carros e motocicletas com pessoas
segurando bandeiras dos candidatos, estes eram guiados por um trio elétrico com um
animador e pessoas dançando em cima. O animador cantava os jingles de campanha e
enaltecia a força política dos candidatos. Dentre as frases repetidas pelo animador, me
chamou atenção, quando ao som de um forró ele mencionava que tudo tinha virado um
―
M‖, ―
M‖ de Mulher, ―
M‖ de Maura, ―
M‖ de Maranhão Melhor 72. Apesar do fato de ser
mulher, ser acionado na fala do animador, algumas vezes, nas bandeiras isso não
acontecia. Em cima do Trio e em alguns carros, havia bandeiras com um único ―
M‖ de
onde saíam apenas as palavras Maura Jorge, Maranhão Melhor.
A primeiro município visitado foi Lago da Pedra, no dia 21 de agosto de 2006
pela manhã. Ocasião em que a candidata estava aniversariando. Ao lado do candidato a
deputado federal Carlos Brandão e vereadores do município que pertenciam a sua
facção política, Maura Jorge inicia seu discurso. Não havia palanque, a candidata estava
bem próxima dos eleitores, em uma área aberta, em baixo de uma mangueira.
Maura Jorge iniciou seu discurso afirmando que não havia melhor lugar para
passar o aniversário, que não fosse sua casa, sua terra natal, ao lado de seus
companheiros, por isso ela ali se fazia presente. Afirmava que estava ali para conversar
com ―
seu povo‖ ao lado de seus amigos que não eram amigos do poder e sim do
Maranhão, disse apontando para os vereadores e para o candidato a deputado federal.
Em seguida, destacou que atualmente havia um descrédito muito grande em relação aos
políticos, mas sabia que isso não acontecia com a Maura Jorge:
Louvo e agradeço a Deus porque estou no meu terceiro mandato e posso
em todos os lugares desse estado, desafiar que ninguém vai dizer pra
deputada que no município que ela foi votada ela não ajudou a construir
uma nova realidade e por isso que eu estou aqui na minha terra, com meu
povo, conclamando vocês não só para ser um eleitor da Maura Jorge e
71
De família com tradição política no município de Colinas-MA. Foi chefe de gabinete do vicegovernador José Reinaldo Tavares de 1995 a 2002, secretário-chefe da Casa Civil no governo José
Reinaldo (2003 a 2006). Eleito deputado federal em 2006 pelo PSDB com 134.643 votos.
72
slogan utilizado pela candidata na campanha de 2006
124
do Carlos Brandão, mas, que vocês possam ser mensageiros assim como
o povo do Brandão tá fazendo com ele lá em Colinas.
Continuando seu discurso, Maura Jorge começa agradecer ao candidato a
deputado federal pela ajuda naquele momento, considerado por ela, de dificuldades na
arena política, o chama de irmão, um irmão que tem demonstrado lealdade a levando
para muitos municípios, fazendo o seu nome ficar mais conhecido no Maranhão e
declara que seu voto e deu ―
seu povo‖ é para ele.
(...)Quero te agradecer aqui em público, muitas das vezes eu chego
Brandão hoje eu to ruim e ele diz „tô junto com você nessa luta‟ e é por
isso que o povo do Lago da Pedra, o grupo da Maura Jorge vai votar em
você, pela sua lealdade com a Maura Jorge e pela sua ajuda de irmão
que você ta me dando, porque a gente só conhece os amigos quando a
gente tá na dificuldade e você tem sido esse irmão da Maura Jorge na
dificuldade que ela está (...)tenha certeza que aqui vai ser casado é
Maura Jorge e Carlos Brandão.
Em nenhum momento do comício os candidatos falam de seus partidos,
enfatizavam muito a questão da amizade, como motivo do apoio mútuo. A lógica que
orientava a união era a capacidade que os mesmos possuíam em administrar adesões em
suas respectivas regiões. O vínculo durante a campanha de 2006 de Maura Jorge com
Carlos Brandão e lideranças locais demonstra também, que nesta campanha que houve
uma intercâmbio entre os níveis hierárquicos da política: municipal, estadual e nacional.
Ainda se remetendo ao sentimento de família, se refere aos eleitores, dizendo que
eles também são seus irmãos, que os ama do fundo de seu coração, afirma que ela e os
lagopedrenses têm uma aliança e que esta tinha sido consolidada por Deus. E por isso
estava ali para mais uma vez pedir os seus votos e que ajudassem com os argumentos
para os outros eleitores também votassem na Maura Jorge. Afirma que o argumento da
beleza é bem vindo, que até ficava feliz, quando ouvia alguém dizer que votava na
Maura Jorge porque é bonita, mas que não só por isso, mas principalmente pelo seu
trabalho em Lago da Pedra.
Percebi, assim, como a candidata estabelece vínculos para cima com um
candidato a deputado federal e vínculos para baixo com os eleitores, se reportando a
idéia de família, construindo uma condição de iguais, ao chamar todos de irmãos. O
primeiro por está lhe concedendo ajuda num momento de dificuldade no cenário
125
político, afirma que este se tornou mais que amigo, um irmão; e os eleitores por serem,
assim como ela, filhos de Lago da Pedra, formando segundo a candidata, uma família
política. (Landé, 1977)
Encerra sua fala ensinando aos eleitores a ordem de votação dos cargos nas urnas
e o seu número. Agradece a Deus por lhe conceder mais um ano de existência no meio
do seu povo e, finalmente menciona o nome de a uma liderança do bairro e sua esposa
que tinham ajudado a organizar o comício agradecendo-os publicamente e deixa um
forte abraço para todos que ali se faziam presente: Quero agradecer a Deus por esse
momento de alegria com meu povo, com a minha gente, com meus irmãos e que em
muitos outros aniversários nos possamos está fazendo conquistas juntos.
Percebi durante o discurso da candidata, momentos que poderia ser identificado
como uma forma de vinculação com o protestantismo, enquanto trunfo eleitoral73. O
acionamento do nome de Deus foi um aspecto constante em sua fala. É importante
mencionar que a mãe da candidata além de ter sido prefeita por quatro mandatos, exerce
há muitos anos uma posição de liderança dentro de uma organização protestante de
Lago da Pedra74 e a própria candidata na sua opção religiosa se define como evangélica.
Cito como fato ilustrativo desse acionamento do vínculo religioso com a política
eleitoral, um momento em que aparece no vídeo, em que no meio do comício, entre os
eleitores alguém pergunta se no dia da vitória ela daria um churrasco com muita cerveja.
A candidata respondeu que os vereadores poderiam dar as cervejas e que o candidato a
deputado federal já tinha prometido a contratação de uma banda, e pergunta em seguida.
Mas eu, sabem o que eu vou fazer? E responde em tom reforçado: Eu darei um grande
culto de louvor a Deus! Ouve-se nesse momento aplausos efusivos de alguns eleitores.
Mas ao mesmo tempo, percebi que no transcorrer do discurso a candidata teve o
cuidado de não mencionar nome algum de instituição, nem católica ou evangélica. E se
os chamou de irmãos, foi por outros motivos, já mencionados anteriormente.
73
Sobre análises das diferentes lógicas e modalidades de candidatos com vínculos com organizações
religiosas e o uso de tal recurso nas lutas eleitorais ver Coradini (2001) em Igrejas, filantropia e
legitimação de candidaturas.
74
A mãe da candidata é chamada por muitos moradores de Lago da Pedra de ―
mulher de oração‖, esta é
líder do chamado ―
círculo de oração‖ da Igreja Assembléia de Deus. Na campanha de 2008, que será
tratada mais adiante, pude presenciar em sua casa, um espaço reservado para oração pela campanha, onde
diariamente várias senhoras se reuniam com tal propósito.
126
Quando terminou o primeiro comício, a carreata seguiu rumo a Lago do Junco,
com todos os carros e motocicletas buzinando, as pessoas com apitos e agitando
bandeiras deram continuidade aos atos de campanha, chamando atenção daqueles que
moravam nas proximidades da estrada que liga os municípios.
Nas imagens que mostram os carros chegando ao município de Lago do Junco, é
possível perceber que apesar da candidata está filiada ao PDT na campanha em questão,
aparecem nas fachadas das casas, os cartazes de Maura Jorge sempre ao lado da
candidata ao governo Roseana Sarney.
Em Lago do Junco, o candidato a deputado federal Carlos Brandão, inicia o
pronunciamento, ao som de fogos de artifícios, afirmando que ali estava previsto apenas
uma passeata, pois ainda tinham um compromisso em Lago dos Rodrigues, mas como o
número de participantes era bem expressivo, acabou mudando os planos, afirmando em
cima do trio, ao lado de Maura Jorge e lideranças locais,
(...) esta passeata foi muito bonita e por isso em respeito a Lago do Junco
mudamos nossos planos, esse povo merece algumas palavras, uma
palavra de carinho, de abraço, para agradecer vocês que vieram nessa
caminhada para nos apoiar, apesar de ainda termos marcado o comício
com o Valdemar do Lago dos Rodrigues.
O candidato começou falando da importância de sua candidatura para deputado
federal, como estratégia para apoiar o candidato a prefeito na eleição que ocorreria em
2008 em Lago do Junco que pertencesse a facção da Maura Jorge.
Falou ainda que soube de um candidato que havia passado em Lago do Junco,
falando mal de sua pessoa, o chamando de ―
puxa-saco do governador‖. Disse que
queria esclarecer tal situação, afirmando que havia sido Chefe de Gabinete do vicegovernador José Reinaldo nos dois mandatos. Afirmou que nesse período pode ajudar
muito o Maranhão por ocupar a referida função, atendi lideranças políticas do estado
inteiro, conseguindo obras, inclusive para Lago do Junco.
Além do cargo ocupado, o candidato aciona também suas origens familiares
como trunfo eleitoral. Afirmando que veio de uma família de tradição política em
Colinas, cita o fato de seu pai já ter sido prefeito naquela localidade, deputado estadual,
secretário estadual de saúde e seu irmão estava no segundo mandato de prefeito. Fala
127
também da reputação de sua família. Ao mesmo tempo menciona o fato dele está ali ao
lado de uma pessoa que todos conhecem, a Maura Jorge.
Sou de uma família honrada, que tem a vida limpa e eu passei três anos
como chefe da Casa Civil, vasculharam minha vida e não acharam uma
mácula. O dinheiro foi para o povo, para o benefício do povo. Por isso
estou aqui para pedir voto ao lado da Maura Jorge que é uma pessoa que
vocês conhecem e porque sou uma pessoa que tem serviços prestados
nesse município. Tenham certeza que daqui a dois anos estarei aqui, nas
eleições municipais, com esse grupo para transformar Lago do Junco.
Após encerrar agradecendo a todos os presentes, o candidato passa a palavra para
Maura Jorge. Esta inicia falando dos serviços prestados em Lago do Junco, menciona o
poço, energia, escola e os empregos gerados por meio da gerência regional, que segundo
a candidata, foram feitos com ajuda de seus mandatos.
Em seguida, se remete a campanha anterior fazendo críticas a um determinado
adversário, que segundo a candidata, em outros momentos já esteve em Lado do Junco
apoiando sua campanha, mas atualmente tinha mudado de lado por dinheiro,
intencionado em comprar a consciência do Lago do Junco.
Disse que tinha um recado para dar a esse candidato. Quero dizer para ele que a
Maura Jorge é uma vencedora, a Maura Jorge é uma guerreira, a Maura Jorge não se
dobra, não tem medo de ameaças (...) a Maura Jorge tem liderança por isso sou
respeitada.
Para se fazer legítima, Maura Jorge elenca qualidades a seu respeito, que lhe
dariam direito de ser respeitada politicamente: ser vencedora, guerreira, destemida e ter
liderança, são uns dos aspectos mencionados.
Maura Jorge continua seu discurso olhando agora para os vereadores que
estavam em cima do trio, dizendo que se orgulhava por tê-los como representantes, os
chamando de homens éticos que não haviam se corrompido pelo poder público. Falou
das vezes em que ajudou e atendeuos pedidos dos vereadores do Lago do Junco,
mencionando que estes foram várias vezes em seu gabinete e ela sempre atendeu
conseguindo benefícios para Lago do Junco em diversas áreas, cita exemplos na saúde,
educação e os empregos que gerou por meio da gerência regional. 75Afirmou que agora,
75
―
Os processos de formação das candidaturas, assim como de obtenção de votos e acessos, são pautados
por práticas que negam o caráter espontâneo e gratuito das trocas (...) o êxito do político depende
128
era a vez deles a ajudarem a ganhar as eleições de 2006, que, segundo ela, estava sendo
uma luta.
Encerra o discurso agradecendo, pedindo votos, ressaltando que a voz que pede é
uma voz que representa todas as mulheres, convoca o apoio de todas as mulheres
daquela localidade e alega que estava ali cumprindo uma missão estabelecida por Deus
para lutar ―
pelo seu povo‖. Afirma que apesar do cansaço das atividades de campanha
sentia-se revigorada pela presença das pessoas que a escutavam naquele momento.
Essa luta não é da Maura Jorge mas de todas as mulheres, do Lago do
Junco, do Lago da Pedra e do Lago dos Rodrigues. Eles querem calar a
minha voz, mas a minha voz é o instrumento que Deus me deu para lutar
pelo meu povo e pela minha gente (...)e eu encerro nesta noite tendo a
certeza que não terei apenas eleitores em Lago do Junco mas defensores
da Maura Jorge, que lutam não com armas de fogo, mas com a arma da
verdade, a verdade dos argumentos dos muitos trabalhos que aqui já fiz.
Ao se despedir, Maura Jorge desce do trio, em meio a abraços, apertos de mão e
fotos. Devido a multidão, segue com dificuldades para o seu carro para dar continuidade
às atividades políticas.
No caminho para Lago dos Rodrigues, as imagens mostram um aumento do
número de carros, vans, e motocicletas, que agora seguiam para o comício principal da
noite. Ao chegar em Lago dos Rodrigues, perceberam que havia faltado energia no
município, mas ainda assim, uma multidão eufórica, já a aguardava.
Suspeitando de boicote político, o candidato a deputado federal, inicia o comício,
dizendo que iria iniciar suas palavras pedindo liberdade ao Lago dos Rodrigues,
exclamando em cima do trio liberdade ao povo de Lago dos Rodrigues! Apagaram a
luzes, mas não apagaram a consciência desse povo, apagaram as luzes mas não
apagaram a chama do coração de vocês.
Saúda a todos, destacando a presença da liderança local Valdemar e sua esposa
que haviam organizado o comício, dizendo esta impressionado com a força política
daquele e da sua companheira de chapa, deputada Maura Jorge. Muitos no Maranhão já
falavam que vocês são fortes, mas eu não sabia que era desse tanto. Após usar dos
diretamente da sua capacidade de atender a comunidade e de negociar com os órgãos públicos‖
(Kuschnir, 2000:145)
129
mesmos recursos acionados em seu discurso no município de Lago do Junco, passa a
palavra para Maura Jorge.
A candidata inicia falando que se apresentava mais uma vez como candidata a
deputada estadual, que poderia muito bem esta como candidata a deputada federal ou
governadora, mas sentia que seu trabalho ainda estava incompleto, que talvez isso
aconteceria somente no futuro. Disse que o que a movia esta ali naquele momento era
um único sentimento, sentimento de gratidão e que tal sentimento estava fazendo uma
ligação forte dela com aquele povo. Mencionou que primeiro, era uma gratidão a Deus,
por permitir que ela ali estivesse com seu povo, segundo uma gratidão aos eleitores, que
tinham se deslocado de suas casas para se fazerem presente e ouvir a Maura Jorge e
gratidão por todos os abraços calorosos recebidos, beijos e apertos de mão, que a Maura
Jorge naquele momento se resumia a gratidão.
Em seguida pede votos e repete algumas vezes o seu número. Ao falar da ordem
de votação dos cargos na urna, fala quais são os seus candidatos, nesse momento
percebe-se a continuidade do apoio da candidata em relação a Roseana Sarney, mesmo a
Maura Jorge estando no PDT.O meu candidato ao governo do estado pelo partido, que
eu sou do PDT é o Jackson, mas quem quiser votar na Roseana fique a vontade, afinal
estamos vivendo numa democracia.
Encerrou pedindo que Deus orientasse a todos na hora de escolher os
representantes, deixando um beijo no coração de todos. A habilidade de Maura Jorge no
acionamento de diferentes identificações- mulher, lagopedrense, cristã, pertencente a
―
família Jorge‖- nos comícios mostra que o uso do gênero nas campanhas, geralmente
aparece associado à trajetória social do agente. Depende também da configuração social
e política em que se realizam as eleições e de determinados atos de campanha 76.
A performance feminina acionada se difere caso a caso. O trabalho de Scotto
(1995) mostra uma mulher candidata 77, articulando o gênero a outras identidadesmulher, negra e favelada- que diferem das acionadas por Maura Jorge. Pode ocorrer
76
No caso da campanha municipal de 2008, por exemplo, Maura Jorge participou de um jantar somente
para as mulheres de Lago da Pedra, momento em que sua condição de gênero foi bem mais acionada.
77
Benedita da Silva como candidata do PT, durante a campanha para a prefeitura do Rio de Janeiro em
1992
130
também, deslocamentos e continuidades dos perfis femininos acionados por uma mesma
mulher candidata.
Roseana Sarney, por exemplo, na campanha ao governo do Maranhão de 1994 e
1998, mantém nas duas eleições uma articulação que se assemelha a de Maura Jorge,
gênero, identidade regional e religiosidade. Mas o perfil feminino acionado na primeira
eleição se caracterizou muito mais como mulher dinâmica, que visitava e conhecia de
perto vários municípios maranhenses. Já na campanha eleitoral de 1998, acometida por
sérios problemas de saúde, muito pouco participa pessoalmente da campanha, o que
ocorre é o deslocamento do atributo que compõe sua performance de mulher dinâmica
para uma mulher forte e guerreira que sabe gerenciar seu estado de saúde precário.
(Delmiro, 2006)
Conforme já mencionado, Maura Jorge consegue obter êxito nas eleições de
2006, obtendo 34.126 votos. Por ser evangélica atribui, à Deus a vitória, “creio que foi
de Deus, ele moveu os corações das pessoas para que reconhecessem o meu
trabalho.”(entrevista em 20/07/08)
4.3 - Rumo à prefeitura de Lago da Pedra: a campanha de 2008
Eu vou se Deus quiser
Dar o voto certo na mulher
Depois eu vou fazer a festa na praça
Mas deixa eu explicar
A mulher certa
É aquela que tem alegria
Que tá com o povo todo dia
É a candidata da massa
É a Maura Jorge
Que tem aceitação
Não foi imposição
Não é carta marcada
Maura foi escolhida pela população
E tem aprovação
Porque é preparada
Quer ir mais eu? Vamos
Quer ir mais eu? Vambora
Votar no 25
O povo disse
É a Maura Jorge agora!
(jingle da campanha 2008- grifos meus)
131
Na campanha de 2004, a facção política de Maura Jorge disputou as eleições
municipais em Lago da Pedra tendo como candidata a prefeita Célia Arruda (viúva de
Waldir Filho e irmã do atual candidato a vice-prefeito Laércio Arruda). Representando a
outra facção, tinha-se os candidatos Luis Osmani, e o vice Dr. Neguinho, este último
passou por um processo de migração entre as facções, pois já tinha sido o vice de D.
Raimundinha em campanhas anteriores. Isso mostra que o tempo da política78 é o tempo
em que são possíveis os rearranjos, esses movimentos são inerentes ao processo
eleitoral (Palmeira, 1996). Na época, Lago da Pedra possuía um colégio eleitoral de
29.485 eleitores, sendo que na busca de adesões entre as duas facções- ―
do lado do
Luiz‖ e ―
do lado do Waldir‖- como falam os habitantes locais, fazem das eleições no
município, disputas acirradas, cujo resultado está longe de ser algo preestabelecido. O
desfecho das eleições de 2004 não foram favoráveis para a facção de Maura Jorge,
tendo sido eleito prefeito de Lago da Pedra, Luiz Osmani com 10.963 votos e a
candidata apoiada pela família Jorge obteve 10.684 votos.
Como já assinalei, Maura Jorge mesmo desprovida do apoio da prefeitura de
Lago da Pedra foi eleita em 2006, para o seu quarto mandato de deputada estadual.
Segundo seus articuladores de campanha, isso mostrou a força política de seu nome no
município, local em que obteve maior votação. Por isso, como forma de recuperar a
administração de Lago da Pedra para sua facção política, em 2008, Maura Jorge
candidata-se a prefeita do município.
O prefeito Luis Osmani não pôde concorrer à reeleição devido a complicações79
com o Tribunal de Contas da União, por isso lançou sua ex-esposa Fátima Salles como
candidata a prefeita. Tal decisão foi alvo de críticas de muitos moradores de Lago da
Pedra, que acusavam a candidata de despreparada, “ela não tem experiência política,
78
Períodos em que devido às atividades de campanha, a população percebe a política e os políticos como
parte da sua vida social.
79
Contra o prefeito Luís Osmani pesa a acusação de corrupção ativa apresentada pelo Ministério Público.
De acordo com a denúncia, o prefeito e os secretários municipais Osimar Fonseca dos Santos e Kleber
Ferreira teriam tentado subornar o vereador do município, Ananias Bezerra, com R$ 30 mil, para que este
votasse, em 2004, pela aprovação das contas relativas ao exercício financeiro de 1996, época em que Luis
Osmani também era prefeito de Lago da Pedra. (portal do poder judiciário do MA- www.tj.ma.gov.b)
132
não compareceu ao debate com os professores e se ganhar será apenas uma marionete
na mão do Luiz”, comentava uma eleitora com o motorista da van que nos levava para
Lago da Pedra, se referindo à candidata Fátima Salles 80. O jingle com o qual inicio essa
sessão retrata esse contexto, quando diz que Maura Jorge não é ―
carta marcada‖. Como
em 2008 eram duas mulheres na disputa pela prefeitura em Lago da Pedra, o jingle
apresenta Maura Jorge como a ―
mulher certa‖, ―
que está com o povo todo dia‖,
―
candidata da massa‖. E devido seus quatros anos de mandato como deputada, a letra
destaca que ela é ―
preparada‖. Esse foi um dos jingles que marcava o início da
campanha de Maura Jorge em Lago da Pedra.
A campanha de Maura Jorge foi realizada por meio da mobilização de um conjunto
de agentes que já tinham vínculos anteriores com a candidata. Esses cabos eleitorais
primários (Mayer, 1987) atuavam como elos entre a candidata e o eleitorado.
Afirmavam fazer isso por diferentes motivos, seja por anos de amizade, lealdade à
família Jorge, por gratidão a benefícios recebidos no passado, por acreditarem ser
Maura Jorge a pessoa que possui as qualidades necessárias para melhor administrar o
município.
Tentei examinar alguns casos desses apoiadores diretos na campanha eleitoral de
Maura Jorge, buscando a partir das entrevistas reconstituir a trajetória desses cabos
eleitorais, se atuaram em sindicatos, movimentos religiosos, comunitários e as
diferentes lógicas subjacentes no apoio à referida candidata. Faço isso considerando que
o conjunto de ação envolve uma grande variedade de bases (parentesco, partido
político, religião, etc.) para a formação das interconexões, sempre visando o apoio
político ao candidato (Mayer, 1987).
Identificar as figuras centrais da candidatura de Maura Jorge foi possível, como já
mencionado, por meio de uma vereadora de Lago da Pedra que me hospedou em sua
casa, local em que aconteciam algumas articulações da campanha. Esta era uma das
coordenadoras de campanha da deputada, e foi por meio de sua rede de relações sociais:
familiares (por ser prima de Maura Jorge), vizinhos e colegas políticos que tive acesso
aos mais diferentes espaços no empreendimento eleitoral de Maura Jorge na campanha
municipal 2008 em Lago da Pedra. Fora dessa rede, praticamente não tive contato com
80
No material de campanha da candidata apareciam os três: Luiz Osmani no centro, abraçando Fátima
Salles e o vice Dr. Neguinho, demonstrando uma tentativa de transferência de capital político.
133
o município.
A outra candidata a prefeita - Fátima Salles (PDT)- e sua rede de
apoiadores, ficou-me desconhecida, devido à radicalidade das disputas entre as facções
em ocasião da campanha eleitoral. No tempo da política as facções são mais facilmente
identificadas, isto é, o conflito aparece de forma mais declarada. Em Lago da Pedra, há
casos de eleitores que nem se quer passam por lugares tidos como politicamente da
oposição, ―
a farmácia do 12‖, ―
a padaria do 25‖, são termos utilizados por moradores
de Lago da Pedra, ao se referirem ao número do candidato em que os proprietários dos
estabelecimentos votam. Geralmente se freqüenta o comércio e os bares de quem
compartilha o mesmo candidato, isso dificultava meu livre trânsito entre os dois grandes
blocos de adversários políticos81.
4.3.1 - Os cabos eleitorais: significados de adesões em Lago da Pedra.
Tomando Maura Jorge como ego de um conjunto de ação, analisei como esta
mobilizou para sua candidatura, agentes que por sua inserção social definem não apenas
o seu próprio voto, mas são capazes de influenciar pessoas a eles vinculadas por algum
tipo de lealdade, é o que Moacir Palmeira (1996:51) chama de eleitor de voto múltiplo.
Este pode ser um pai de família, um sindicalista, um líder religioso, etc.
O conjunto de apoiadores de Maura Jorge que tive contato no período do trabalho
de campo, era composto por amigos, familiares, vereadores, lideranças de sindicatos,
de movimentos religiosos, empresários, comerciantes e fazendeiros. Como não seria
possível apreender todos os vínculos, delimitei aos que tive um contato maior durante as
reuniões e atos de campanha que acompanhei no período de 19 a 25 de julho e após o
resultados eleitorais nos dias 11 e 12 de outubro de 2008. O conjunto era composto por
dez apoiadores principais, que entrevistei e tive conversas informais. Irei caracterizá-los
de modo mais geral, para depois descrever de forma mais detalhada 5 casos.
Entre os dez integrantes da coordenação da campanha de Maura Jorge, três eram
mulheres e sete eram homens. Seis já concorreram em alguma eleição ou ocuparam
cargos eletivos, nove possuem familiares com militância política, sete já ocuparam
cargos de assessoria ou de confiança e todos declararam já terem atuados diretamente
81
Para maiores detalhes sobre as tensões e fronteiras sociais no tempo da política, ver GUEBEL(1996)
134
em campanhas anteriores, identifiquei tanto casos de campanhas para outros candidatos,
como para a família Jorge.
Os exemplos que se seguem permitem demonstrar, como Maura Jorge administra
os elos com diferentes modalidades de apoiadores, como a candidata amplia sua rede de
seguidores, propagando sua imagem em diferentes setores, sendo essa uma dimensão
importante do métier político. Nas entrevistas com os apoiadores, as trocas,
recompensas e gratificações simbólicas, podem ser identificadas como o que dá sentido
ao engajamento nas lutas políticas.
4.3.2 A comerciante-vereadora
Filha de comerciante, vereadora de segundo mandato em Lago da Pedra, essa
grande eleitora foi uma das coordenadoras da campanha de Maura Jorge na disputa
pelo cargo de prefeita em Lago da Pedra. Refere-se à sua atividade profissional no
comércio, como fonte de experiências positivas para ser conhecida no município.
Sempre tive muita vocação voltada para as vendas (...) depois me
estabeleci comercialmente, montei meu próprio armarinho, isso me fez
ter contato com o povo, conheci muita gente. Com essa minha forma de
tratar bem, conquistei amigos, clientes.(Entrevista em 23/07/08)
Somando-se à sua profissão, explica seu contato maior com a população
lagopedrense, por meio de atividades desempenhadas na Secretaria de Ação Social de
Lago da Pedra em 1997, a convite da prefeita na época (sua tia e mãe de Maura Jorge).
A tia Raimundinha como prefeita de Lago da Pedra, tava no terceiro
mandato e me convidou para trabalhar na Secretaria de Ação Social e eu
aceitei. (...) Eu era responsável mais pelo serviço externo, tipo fazia
cadastro, quando tinha os projetos, os convênios. Por exemplo, quando
tinha conjuntos habitacionais, eu ia pro campo cadastrar as famílias,
quando havia distribuição de cestas básicas, eu estava lá no campo, eu
prestei um bom serviço para a Secretaria de Ação Social na época (...)
distribuição de quites bebês para grávidas carentes. Na época nós
tivemos um projeto Teto Seguro, que no caso era distribuição de ripas e
telhas, para as pessoas que tinham casas cobertas de palha, e a assim
acho que minha entrada na secretaria contribuiu muito... (Entrevista em
23/07/08)
135
Fazer a mediação entre benefícios e a população de Lago da Pedra durante 1997 a
2000 é apontado por essa grande eleitora como um aprendizado adquirido, que viria a
contribuir para sua entrada na política, ocupando cargos eletivos. Ela afirma que
aproveitou bem a oportunidade que lhe foi concedida na Secretaria de Ação Social e
lançou sua candidatura a vereadora em 2000, apoiada por sua tia que disputava a
reeleição na prefeitura.
Registrei candidatura e fiz meu trabalho, fiz a campanha do jeito que a
gente faz aqui, no corpo a corpo, nos bairros, nas visitas, atendendo da
forma como é feita a política aqui né? Eu fiz isso e tive o privilégio de ser
uma das vereadoras de Lago da Pedra. (Entrevista em 23/07/08)
No trecho, ―
atendendo da forma como é feita a política aqui‖, refere-se aos
favores e trocas concedidas a eleitores em busca de adesão. A distribuição de bens ou
favores aparece como modo legítimo de fazer política. São essas práticas que geram
compromissos entre o candidato e o eleitor em Lago da Pedra, como lembra Palmeira
(1996:48) ―
boa parte da arte do político consistirá em conseguir adesões por meio de
compromissos criados por sua própria ação na época da política, isto é, criados na
própria campanha.‖
Ela destaca que nos dois últimos anos de seu mandato, concorreu a presidência da
Câmara Municipal, tendo sido eleita. Orgulha-se por ter sido uma das poucas mulheres
que conseguiram ocupar um lugar na Câmara Municipal de Lago da Pedra, ressaltando
o fato de ter sido presidente da Câmara.
Em 2004, candidatou-se novamente, e embora a sua facção política tenha perdido
as eleições para prefeito, ela conseguiu ser reeleita. Refere-se a tal fato como fruto do
reconhecimento de seu trabalho político.
Ela explica que dentre os fatores de adesão à candidatura de Maura Jorge está a
gratidão às oportunidades e apoio que sempre recebeu de sua tia Raimundinha, tanto
que a pedido de sua tia, ela registrou candidatura apenas para obter a licença e ter
tempo integral para se dedicar a campanha de Maura Jorge. E outro fator mencionado
pela grande eleitora é por acreditar que o objetivo da Maura Jorge ser prefeita não é
pelo poder e sim pelo povo, para ajudar o município. Ela destaca na entrevista:
136
A Maura quando ela entra na casa do eleitor para pedir o voto, para
conquistar o voto, ela diz que está aí nessa campanha é pelo povo. Ela
não tem nenhum interesse tipo „eu quero ser prefeita pelo poder‟, não.
Até porque atualmente ela é deputada, então poder por poder ela já está
em um, então o objetivo dela é ajudar, é beneficiar é colaborar.
(Entrevista em 23/07/08)
A apoiadora atribui a Maura Jorge uma qualidade de ‗desprendimento‘ , afirma
que admira o fato dela querer deixar de ocupar um cargo de deputada estadual, que
segundo ela da uma projeção política bem maior a nível de estado para o político, para
ser prefeita de Lago Pedra. Isso prova o quanto ela realmente se preocupa com o
desenvolvimento do município, afirma a grande eleitora.
Sobre o modo de fazer campanha de Maura Jorge, ela elogia o fato da Maura
Jorge querer conhecer o eleitor, pegar na mão, abraçar, até aquele que não é eleitor ela
visita, trata todo mundo da mesma forma. (Entrevista em 23/07/08)
Foi possível identificar tanto nas conversas informais como na entrevista com a
vereadora, construções de representações sobre a candidata, como aquela que tem
competência, tanto pelo fato de descender de uma família de tradição política em Lago
da Pedra, como por estar no seu quarto mandato de deputada estadual. Outro aspecto
destacado constantemente sobre a candidata era o desinteresse por benefícios
econômicos por meio da atividade política de prefeita, já que esta vinha de uma família
estabelecida economicamente.
4.3.3 O presidente do SINPROESEMA
Trata-se de um grande eleitor que é professor e agente de saúde. Nasceu em Lago
da Pedra, mas aos nove anos foi morar no povoado Santo Agostinho. Relatou-me que na
sua adolescência e juventude sempre esteve envolvido com movimentos religiosos da
igreja católica. Foi seis anos coordenador do grupo de jovens, posteriormente se tornou
membro da Conselho da igreja matriz e no povoado em que reside foi coordenador da
Pastoral da Juventude na Paróquia São José.
Seu pai era representante do povoado, era ele quem levava as questões e as
necessidades do povoado de Santo Agostinho para a serem discutidas e resolvidas na
137
sede de Lago da Pedra. Com o passar dos anos, seu pai adoece, e esse apoiador passar a
desempenhar as funções antes exercidas pelo seu pai. Ele justifica que foi assim que
começou a se interessar por questões políticas.
Quanto ao seu posicionamento enquanto eleitor, explica sua adesão à facção da
família Jorge, devido às relações de parentesco, afirmou que seu pai sempre apoiou a
família de Waldir Jorge e enquanto líder do povoado e chefe de família acabava
influenciando no voto dos demais. O grande eleitor classifica como algo ―
lógico‖,
―
automático‖ o fato de alguém se posicionar a favor da facção apoiada por um parente
seu.
Como eu já venho de uma família de tradição em fazer parte do grupo Waldir Jorge,
então lógico que automaticamente eu passei a fazer parte desse grupo e apoiar esse
grupo. Meu pai já apoiava, minha mãe, tios e tias. (Entrevista em 11/10/08)
Apesar de nem sempre ocorrer uma correspondência entre as relações de família e
o pertencimento a uma determinada facção política. Palmeira (1996), ressalta que a
vinculação familiar nesse tipo de sociedade é particularmente importante e que as
obrigações sociais que alguém tem para com membros de sua família estendem-se à
esfera política.
Em relação aos trabalhos de campanha, desempenhados por esse cabo eleitoral, o
primeiro ocorreu em 1996, quando este foi coordenador geral do Comitê, na campanha
de D. Raimundinha. Quem era o prefeito de Lago da Pedra naquele período era Luiz
Osmani, que tentava reeleição, a família Jorge consegue ganhar as eleições, e no ano
seguinte D. Raimundinha em seu terceiro mandato de prefeita convidou esse grande
eleitor para ser diretor da Escola de Lago da Pedra, que ocupou tal cargo de 1997 a
2004.
Em 2005 afirmou que permaneceu no quadro de funcionários da prefeitura porque
é concursado como agente de saúde de seu povoado, e na escola que direcionava ficou
atuando como professor. Ele relatou que sempre fez campanha para Maura Jorge para
138
deputada estadual, mas em 2006, Laércio Arruda se candidatou a deputado estadual82 e
ele resolveu apoiá-lo.
Em 2006 surgiu um novo grupo em Lago da Pedra e eu me engajei nesse grupo
apoiando Laércio Arruda, então coordenei a campanha do Laércio aqui no município e
tive essa participação contribuindo para a formação desse novo grupo. (Entrevista em
11/10/08)
Em abril de 2007, concorreu para o cargo de presidente do Sindicato dos
Trabalhadores em Educação Pública do Maranhão – SINPROESEMA, em Lago da
Pedra e obteve votação expressiva, desempenha atualmente tal função.
Quando se refere à sua participação na campanha 2008 em Lago da Pedra afirma
que a princípio foi procurado tanto pelas lideranças da facção do prefeito atual quanto
da Maura Jorge. O fato de ele ter sido um dos principais coordenadores da campanha de
Laércio Arruda é mencionado pelo grande leitor como um dos motivos da procura pelas
facções.
E a gente começou a participar de reuniões, fazer reuniões entre a gente, até que eu
cheguei ir a São Luís a pedido da deputada no dia 11 de junho e lá em nome do grupo a
gente fez esse compromisso e de lá já veio marcada uma reunião no dia 13 de junho
onde todo grupo se reuniu com ela aqui em Lago da Pedra e nesse dia decidimos
apoiar a Maura Jorge a prefeita de Lago da Pedra e na chapa compondo como vice o
Laércio Arruda. (Entrevista em 11/10/08)
A insatisfação desse grande eleitor com as ações atual prefeito em relação aos
professores e agentes de saúde de Lago da Pedra também é citada como uma das
motivações em apoiar a candidatura de Maura Jorge. Menciona que foi acertado com a
candidata antes mesmo de a campanha começar, que com seu êxito nas urnas, ele irá
desenvolver um trabalho conjunto na prefeitura voltado para as referidas categorias.
4.3.4 - O bancário
82
Não foi eleito deputado estadual pelo PSL, mas conseguiu obter votação expressiva em Lago da Pedra,
segundo dados do TRE o total obtido pelo candidato foi de 4.864 votos.
139
Piauiense de uma família com tradição política na região de Santa Cruz no Piauí
desde os anos 60, afirma que todos os prefeitos que já administraram Santa Cruz são
seus parentes. Por influência de um dos seus onze irmãos, profissionalmente exerceu a
atividade de gerência em vários bancos nos estados de Pernambuco, Brasília e
Maranhão. Depois de gerenciar o Banco do Estado em Brasília foi convidado para
gerenciar agências do Banco do Estado no Maranhão, passando por agências nos
municípios de Imperatriz, Caxias, São Luís e Lago da Pedra, neste último passou mais
tempo, chegando a se aposentar e abrir o seu próprio banco.
Afirma que quando chegou em Lago da Pedra a família Jorge contribuiu muito para
sua adaptação no município, juntamente com um grupo de bancários que se reuniam
com freqüência, do qual ele começou a fazer parte, e estes começaram a visitar sua casa.
Já tendo conhecido a família Jorge, esta também freqüentava sua residência, desses
encontros de amigos, Maura Jorge conheceu um bancário também recém chegado no
município, aquele que viria a ser seu esposo, relação esta facilitada e incentivada por
esse grande eleitor. Segundo ele “eu já conhecia a Maura desde que ela era bem
jovenzinha, lembro bem, sempre foi linda, mas o fato de eu ter apresentado o Rui pra
ela fortaleceu nossa amizade e de lá pra cá desenvolvemos uma relação de lealdade”.
(entrevista em 12/10/08)
Em relação às atividades políticas, apesar de nunca ter ocupado nenhum cargo
eletivo, o bancário afirma tenho sangue político nas veias. Destaca que não era
candidato porque o banco em que trabalhava não permitia, mas apoiou e coordenou
campanha desde as primeiras candidaturas de Maura Jorge. Em 2004 chegou a se
preparar para ser candidato a vereador apoiado pela facção dos Jorge, mas não
conseguiu nesse momento obter sua aposentadoria junto ao extinto BEM 83, atual
Bradesco, o que inviabilizou sua candidatura. Naquele ano ficou apoiando a candidatura
de Célia Arruda, candidata dos Jorge à prefeitura de Lago da Pedra, “foi um momento
nada fácil pra Maura, perdemos as eleições aqui mas eu estive sempre junto dela”. Em
2006, foi o responsável pela coordenação da campanha de Roseana Sarney em Lago da
Pedra, mas afirma que sua relação de gratidão e lealdade a Maura Jorge foi maior,
83
O Banco do Estado do Maranhão-BEM foi vendido ao Bradesco em 10 de fevereiro de 2004.
140
afirmou que não deixava de ser difícil conciliar mas isso não o impediu de apoiar e
acompanhar Maura Jorge na campanha para deputada estadual naquela ocasião. 84
A adesão a campanha de Maura Jorge de 2008 a princípio viria acompanhada de
sua candidatura a vereador, visto que agora já havia se aposentado. “Mas em uma
conversa que eu tive com a Maura, ela disse me queria como coordenador, que aqui em
casa seria o centro das reuniões, que era melhor assim, e assim realmente foi feito”.
Ele explica que sua casa sempre esteve e sempre estará disponível para Maura Jorge.
Durante o trabalho de campo tive a oportunidade de observar o cotidiano da casa
desse cabo eleitoral no período eleitoral. Todos os dias logo cedo aconteciam as
reuniões com a equipe de campanha de Maura Jorge, juntamente com a candidata, para
avaliação dos atos de campanha ocorridos no dia anterior e programação de novos atos.
No início percebi que minha presença inibia alguns de tecer comentários 85 e sugestões,
mas aos poucos com a explicação da deputada sobre minha condição de pesquisadora
sobre sua trajetória política e a influência da apoiadora que me hospedou fui adquirindo
a confiança da equipe.
Não era raro o dia que no decorrer da reunião apareciam eleitores solicitando
uma conversa particular com a candidata, esta saia da reunião para atender o eleitor, já
havia na casa um local reservado para tal situação. Ela os recebia com um forte abraço e
sorriso no rosto e se colocava a disposição para ajudar no que fosse preciso. Houve
ocasiões em que foi solicitada minha ajuda para digitar o nome, endereço e tipo de
questão a ser resolvida, identifiquei os mais diversos tipos de pedidos, tais como
carrinho de cachorro quente, emplacamento e pagamento de impostos da moto, contas
de água atrasadas, materiais de construção, cirurgias, medicamentos, terrenos, emprego,
dentre outros.
Durante a grande circulação de pessoas em sua casa, esse grande eleitor
administrava o ambiente, organizava a ordem de entrada dos eleitores, oferecia
84
Roseana Sarney e Maura Jorge têm um histórico de alianças políticas em diferentes contextos, mas em
2006 a senadora Roseana Sarney foi candidata ao governo do Maranhão pelo antigo PFL e Maura Jorge
candidata a deputada estadual pelo PDT.
85
Era comum a candidata perguntar sobre a situação do adversário, sobre a quantidade de público em
seus atos de campanha, alguns por não me conhecerem ficavam desconfiados sobre o que realmente
poderiam falar.
141
cafezinhos, biscoitos, doces, para as pessoas da equipe de campanha e para os eleitores,
deixava sua geladeira a disposição para que todos bebessem água. As reuniões na casa
desse apoiador não tinham hora para acabar, geralmente acabavam mais cedo, quando
tinha ato de campanha a tarde. Segundo ele, não havia tempo para vida particular
naquele momento, “como já tinha deixado a gerência, eu entrei de cabeça mesmo”.
Esse cabo eleitoral usava também sua influência como presidente da Associação dos
Comerciários para aumentar a rede de apoiadores da campanha, eram poucos os
horários de repouso. Ouvi várias vezes a candidata elogiando o grau de dedicação desse
apoiador, Maura Jorge afirmava que a ajuda dele era voluntária mesmo, que em muitas
ocasiões tirava do seu próprio bolso para ajudar resolver problemas de eleitores, abre
realmente as portas de sua casa para um bom trabalho de campanha. Falando sobre esse
aspecto, o cabo eleitoral explica que ao mesmo tempo em que se sente na obrigação de
tal atitude, tem prazer em contribuir, com seu tempo, sua casa, seu próprio dinheiro 86 e
colocava que isso era o mínino que poderia fazer pela grande amizade em relação aos
Jorge, principalmente pela Maura. “Aqui em casa realmente foi o centro, aqui traçamos
metas, aqui se fiscalizou, se analisou, passamos juntos os momentos de angústia, os
momentos de alegria e foi bom, foi maravilhoso”. (entrevista em 12/10/08)
4.3.5 - O líder religioso católico
Esse cabo eleitoral morou no povoado Três Lagos87 até os nove anos de idade,
depois passou a residir em Lago da Pedra, onde começou a se envolver com o grupo de
jovens da Igreja Católica, fato que contribuiu, segundo ele, para seu primeiro
envolvimento com campanhas políticas, por meio da candidatura de Conceição
Andrade88 a deputada estadual em 1986. Esta recebeu o apoio político da Igreja Católica
de Lago da Pedra “fiz campanha pra ela com meus vinte e poucos anos, mas ainda não
tinha lá muito jeito pra coisa”. Em 1988 foi que se envolveu de maneira mais direta na
86
Segundo Kuschnir a doação de bens por parte dos assessores simboliza uma adesão ao mundo e aos
valores do político. ―
Do ponto de vista sociológico, essa é uma contribuição moralmente obrigatória, em
função dos laços de fidelidade e lealdade que estruturam a relação entre as pessoas‖(2000:85).
87
88
Maior povoado do município de Lago da Pedra-MA
Segundo dados do TRE em 1986 Conceição Andrade foi eleita pelo PMDB com 10.220 votos.
142
dinâmica política de Lago da Pedra. Relata que na época foram três candidatos a
prefeito: Waldir Filho, Aroldo Barros e o José Maria. Afirma que foi candidato a
vereador apoiando o candidato José Maria que também era apoiado pela então deputada
estadual Conceição Andrade e pela Igreja Católica. Sobre sua candidatura para vereador
em 1988 o grande eleitor destaca:
fizemos uma campanha pé no chão o candidato era pobre e os
componentes que apoiavam ele também eram todos pobres, nós nos
confiávamos no apoio do sindicato dos trabalhadores rurais e sonhava-se
em vitória pelo número elevado de sindicalista mas as vezes as pessoas
que se sindicalizam é mais pensando em obter uma aposentadoria ou um
direito de saúde... de modo que quem ganhou aquela eleição foi o Waldir
Filho (entrevista em 11/10/08)
Desde 1988 que ele não deixou mais de se envolver com as atividades políticas
do município, seja como candidato a cargo eletivo ou apoiando campanhas para
prefeito, até então todas sem êxito. Resolveu apoiar o candidato da família Jorge
somente em 2004, quando Célia Arruda saiu candidata. Justifica o apoio por esta ser,
sua amiga de infância, juntamente com seu irmão Laércio Arruda, se identificava por
ela ser uma candidata jovem e resolveu aderir a campanha também porque estava
descontente com as práticas do atual prefeito Luiz Osmani. “Nessa eu fui para rua, fiz
discursos, subi no palanque, briguei com eleitor, pena que o resultado foi negativo, mas
ainda assim eu permaneci no grupo”.
Em 2006 trabalhou na campanha de Laércio Arruda para deputado estadual que
apesar de não se eleger como já mencionado despertou o interesse dos duas principais
facções que se preparavam para as eleições de 2008. Ele relata que aconteceram várias
reuniões até chegarem a decidir de que lado optar a trabalhar nas campanhas municipais
de 2008 em Lago da Pedra. Primeiro ouviram o que tinha a dizer e oferecer a facção do
Luis Osmani. Segundo esse grande eleitor durante as possíveis negociações e propostas
apresentas pelo então prefeito Luis Osmani, ele afirmou que tinha espaço para equipe do
Laércio Arruda mas deixou claro que não tinha vaga para deputado federal, pois esta era
do Sebastião Madeira e pra deputado estadual a vaga era do Mauro Jorge89 e em relação
ao cargo de vice-prefeito disse que poderia ser pensado mas não deixou claro que a vaga
de vice-prefeito seria do Laércio Arruda. Já na reunião com a Maura Jorge, ele afirma
89
O deputado Mauro Jorge (PDT) apesar de primo de Maura Jorge(DEM) é oposição política à deputada.
Este é apoiado pelo Governador Jakson Lago (PDT) e pela facção de Luiz Osmani em Lago da Pedra.
143
que ela deu mais garantia, deixando claro que o cargo de vice seria do Laércio Arruda,
além de algumas secretarias.
E na análise que nós fizemos depois das duas reuniões o nosso grupo
estava dividido, tinham aqueles que queriam ficar com o Luiz, outros
defendiam que deveríamos tocar a campanha sozinhos e alguns queriam
ficar com a Maura ... aí ficou a questão vamos pra onde? ... até que o
Laércio disse que com o Luiz não tinha menor condição, que por questões
familiares essa aliança seria inviável. E quanto a Maura ficamos alguns
dias naquela interrogação, eu fui duas vezes em São Luis conversar com
ela, até que foi marcada uma reunião na casa da Célia Arruda e foi
realizada a união... no mesmo dia a notícia já correu na cidade que o
Laércio era o vice da Maura. (entrevista em 11/10/08)
Sobre a campanha de 2008 destaca que gostou muito de um aspecto novo na
campanha da Maura Jorge, ressaltando que dessa vez ela se dispôs a conhecer o eleitor,
segundo ele isso é muito positivo para Lago da Pedra, em comparação a outras
campanhas em que ela já tinha feito como deputada estadual. O cabo eleitoral enfatiza
que eram outras pessoas, a exemplo da mãe dela é que faziam campanha no município
para Maura Jorge, ―
esse trabalho de ir na casa do eleitor, de conversar e conquistar a
Maura não fazia, ela aparecia mais em reuniões e palanques.‖
4.3.6 A líder evangélica e dona de restaurante
Natural de Caxias mora em Lago da Pedra desde o cinco anos de idade. Define
sua relação com a Maura Jorge como uma relação de família, menciona que seu avô era
muito amigo do Waldir Jorge, pai da Maura Jorge. Minha irmã, a Lauza foi morar com
eles, a Maura ainda era criança.(...) Tenho por eles um sentimento de família. É um
pessoal que sempre ajudou a gente, não só eu como Lago da Pedra inteiro.
Essa apoiadora é dona de um dos restaurantes que serviam como base de apoio
para as pessoas que trabalhavam na campanha. Pude almoçar no restaurante de dona
Nega no dia em que participei das visitas no bairro do Cajueiro, lá pude observar várias
pessoas conversando sobre vários assuntos, mas os comentários sobre política
prevaleciam. Uns falavam sobre o número de pessoas que os adversários políticos
estavam conseguindo reunir em suas atividades, outros davam sua opinião em que
144
bairro que a Maura Jorge tinha que fazer mais visitas, alguns contavam piadas e faziam
brincadeiras com os números das candidatas, enfim era um espaço de sociabilidade
onde trocavam-se idéias desde assuntos pessoais a várias informações sobre as
possibilidades dos futuros atos de campanha.
E a dona do estabelecimento passeava entre as mesas sempre sorridente, se
mostrando muito amigável com todos, perguntava se precisavam de mais alguma coisa.
Chamou minha atenção um quadro com a foto do Waldir Filho bem na área central do
restaurante, quando terminei de almoçar perguntei a apoiadora o motivo da foto está ali
e se poderíamos gravar uma conversa. Ela muito simpática pediu desculpas pelo barulho
que as pessoas faziam, mas que poderíamos sim conversar. Foi quando me disse:
Essa foto que eu tenho do Waldir é uma relíquia, tenho uma na minha
bíblia que para ela sair de lá é preciso muita coisa, outro dia até as filhas
dele estiveram aqui me pedindo essa foto e eu disse não isso é uma
relíquia (...) sabe minha filha, quando ele começou na campanha eu
estava com um ano e quatro meses de viúva aí ele veio aqui e me
chamou queria que eu fosse com ele acompanhá-lo pelos interior a
fora, a esposa dele tava grávida do segundo filho e ele tinha problema
de gastrite e tinha que fazer a comidinha dele separada, ajeitar a roupa
dele, ele foi pra mim um bebezão. Ele disse: ‗vamos trabalhar que
quando eu for eleito eu vou te ajudar‟. Aí passei uns 90 dias mais ele pelo
interior fazendo campanha. Às vezes ele cansado me falava eu não
agüento mais e eu dizia nós vamos vencer, em nome de Jesus! Quando
saiu o resultado a emoção foi tão grande (...) ai o locutor dele dizia o
Waldir tá te chamando e eu emocionada não, eu não, mas ele me
agradeceu lá de cima do palanque lembro bem das palavras dele “uma
amiga que esteve muito presente do meu lado, minha irmã” (...) eu
agradeço a Deus em primeiro lugar e depois a ele porque tudo que eu
tenho hoje foi através dele que eu consegui. (entrevista com apoiadora)
145
Ilustração 8- Foto do Waldir Filho no restaurante da apoiadora de campanha
A experiência de ter trabalhado na campanha do Waldir Filho lhe rendeu
ampliações e melhorias no seu estabelecimento, construindo na parte superior uma
pensão. Em relação ao trabalho na campanha para Maura Jorge, a cabo eleitoral fala que
além do apoio por meio do restaurante, participa também do grupo de oração em favor
campanha, coordenado pela mãe da Maura Jorge. Afirma que trabalha na campanha
afirmando para todos da igreja em que freqüenta que a Maura Jorge é o melhor nome
para administrar o município, e que faz isso não apenas por gratidão mas porque
acredita que foi Deus quem designou a Maura Jorge para ser prefeita de Lago da Pedra.
4.4 - Os atos de campanha em 2008
No dia vinte de julho de 2008, na casa de um cabo eleitoral em Lago da Pedra, fui
apresentada a deputada Maura Jorge por sua prima e coordenadora da campanha. Nessa
ocasião pude realizar a entrevista com a candidata demonstrando logo minha intenção
em acompanhá-la nos atos de campanha. Maura Jorge disse que se lembrava de meu
primeiro contato por telefone e que sua prima já tinha comentado que meu trabalho era
sobre mulheres na política. Comentou que se sentia honrada por saber que sua trajetória
faria parte dessa pesquisa, e em seguida se dispôs a colaborar no que fosse preciso.
146
Aos poucos fui percebendo que o local escolhido para entrevista era o mesmo que
aconteciam as reuniões da equipe de campanha. No decorrer da entrevista, algumas
pessoas foram chegando e ao final de nossa conversa, a sala já estava com umas doze
pessoas. Percebi pelos olhares curiosos que muitos queriam entender minha presença
naquele local, a candidata foi logo afirmando que todos poderiam ficar tranqüilos, me
apresentou como uma pesquisadora da universidade que queria analisar sua trajetória
política e avisou que eu participaria das reuniões e atos de campanha. Como mencionei
anteriormente, alguns no início ficaram um pouco desconfiados, mas depois fui
conquistando a confiança daquela equipe.
No decorrer da semana, fiquei no município para acompanhar os eventos
programados nessa reunião: um jantar com os agentes de saúde, visitas domiciliares,
‗poeirão‘ e o comício de abertura da campanha. Fiz uma etnografia desses atos de
campanha, buscando demonstrar como o agente mobilizou os mais diversos recursos
para a disputa política.
4.4.1 visitas, „poeirão 90‟ e o comício
Na campanha de 2008, Maura Jorge utilizou em vários momentos, como nos
comícios e em reuniões menores, o discurso de que estava feliz porque agora iria
conhecer mais de perto o seu eleitorado, queixava-se que nas campanhas para deputada
não tinha tempo para visitas domiciliares, mas que esse sempre foi o seu desejo, de
“entrar, sentar e conversar na casa de seus eleitores”, afirmava a deputada.
Nas reuniões de articulação com a equipe de campanha, os coordenadores sempre
enfatizavam que a candidata tinha que visitar primeiramente os bairros onde o atual
prefeito poderia estar conquistando eleitores por ter asfaltado recentemente suas ruas.
Os bairros do Cajueiro e Planalto se encontravam nessa situação. A equipe de campanha
decidiu então, que na quarta-feira a deputada passaria o dia visitando os moradores do
Cajueiro e no dia seguinte seria feito um ‗poeirão‘ no Planalto. E para acompanhar as
duas atividades, teria um carro de som, tocando o jingle numa linguagem de pandeiro
90
Ver nota 14 na introdução.
147
repentista, que criticava a qualidade das obras realizadas pelo atual prefeito, dentre elas
incluía o asfaltamento. Na construção do jingle, observa-se uma tentativa de
desqualificação não apenas das obras, mas do próprio prefeito, na substituição do
número da outra candidata- doze- pela palavra ―
doido‖. Conforme demonstra o trecho
abaixo:
Vou contar, vou contar
Só não gosto de fuxico
Do doido pro 25 grande diferença há
Vou contar, vou contar
Só não gosto de fuxico
Do doido pro 25 grande diferença há
(...)outro dia fui a feira só pra comprar o jornal
Descendo do meu fusquinha
Me lasquei e me dei mal
Meu chinelo afundou
Até o carro atolou no asfalto sorrizal
Ter asfalto é coisa boa
Mas eu não posso negar
Tem que ser asfalto bom
E pra isso o dinheiro dá
Mas o asfalto que o doido trouxe
O povo tá rezando pra chuva não carregar
(trecho do jingle da campanha de Maura Jorge em 2008)
Na reunião, antes de seguirmos para o bairro do Cajueiro, um dos cabos
eleitorais, orientava a equipe a não deixar a candidata caminhar sozinha 91, teria sempre
que ter um grupo de pessoas à sua volta, só em caso do morador solicitar uma conversa
particular com a Maura Jorge é que todos aguardariam do lado de fora da casa. Com
tênis, jeans e boné em tom rosa, a candidata se prepara para as visitas, expressando uma
imagem de feminilidade e descontração.
As visitas começaram às 8h da manhã. Maura Jorge seguia acompanhada de sua
equipe, principalmente ao lado do candidato a vereador Marcão, que tinha muitos
conhecidos no bairro e da vereadora Léa Dias. Durante as visitas a candidata entrava
nas casas para cumprimentar as pessoas, falar o motivo de sua candidatura e ouvir os
moradores. Observei que a candidata ressaltava em sua fala uma situação de
91
Ao falar dos rituais de campanha, Kuschnir (2002: 256-257) destaca o não-isolamento em locais
públicos do candidato como parte do jogo de forças nas disputas eleitorais. ―
A companhia de motoristas,
secretários, assessores e militantes marca a posição diferenciada do candidato em relação aos demais. Ele
está no centro, ao redor do qual giram as pessoas comuns. A força simbólica dessa dinâmica é grande‖.
148
desprendimento do cargo de deputada por compromisso com o município. “Estou aqui
disputando a prefeitura, não pelo poder em si, já sou deputada estadual, mas sim
porque tenho um compromisso com minha gente”, afirmava a candidata.
E após
abraçar todos os moradores da casa, pedia para o candidato a vereador Marcão, anotar o
que a família estava precisando.
Alguns moradores recebiam a candidata com alegria e faziam pedidos dos mais
variados, tais como empregos, materiais de construção, remédios e consultas. Outros
afirmavam já ter compromisso com o ―
outro lado‖, apontando para o cartaz do
adversário em sua casa. Nesses casos, a candidata geralmente demorava um pouco mais
na casa, apresentando outros argumentos, como as obras já realizadas por sua mãe, que
ela gostaria de dar continuidade e dos benefícios que ela tinha conseguido para o
município por meio de seus mandatos como deputada.
Em alguns casos o eleitor não mudava de posição, em outros solicitava uma
conversa a sós com a deputada, que geralmente resultava na mudança do cartaz na
fachada da casa. Nas imagens que se seguem pode ser observado alguns momentos das
visitas domiciliares no bairro do Cajueiro, como a deputada acompanhada de sua
equipe, entrando na casa de eleitores e a mudança do cartaz em uma das fachadas das
casas.
Ilustração 9- Maura Jorge no centro de sua equipe de campanha recebendo algumas orientações
149
Ilustração 10- Candidato a vereador Marcão e Maura Jorge visitando uma moradora do Cajueiro
Ilustração 11- Mudança de cartaz na fachada de uma residência do Cajueiro
Depois de três horas de visitas, houve uma parada em um comércio do bairro, em
que o proprietário fez questão de distribuir refrigerantes e biscoitos para a candidata e
sua equipe, dizendo que ele juntamente com sua esposa sempre votaram em sua mãe e
150
que tinham prazer em votar na Maura Jorge. Essa atitude demonstra que nos momentos
de campanha, as doações espontâneas podem ser feitas não apenas por parte dos
políticos, mas dos eleitores também. “Ao oferecer algo ao candidato, o potencial eleitor
assume a posição de doador, revertendo sua inferioridade momentânea” (Kuschnir,
2002: 255).
Em algumas casas tinham moradores que se emocionavam com a presença da
candidata e falavam do carinho e respeito que tinham por dona Raimundinha.
Mostravam fotos que haviam tirado com a mãe de Maura Jorge. Outros agradeciam
mostrando melhorias realizadas na residência, afirmando que estas tinham sido feita
com a ajuda da família Jorge. Havia também muitos casos em que alguém da família já
estivera hospitalizado em São Luís, em outras situações e que atualmente se encontrava
melhor, por intermédio da família Jorge. Nesses casos, o morador agradecia bastante a
visita e afirmava que todos naquela casa votariam na candidata.
Em nenhum momento a candidata desqualificava diretamente o trabalho da atual
administração, deixando por conta apenas do carro de som. Distribuía sorrisos e abraços
mesmo para aqueles que não a recebiam muito bem, dizendo que tinha a certeza que
eles sabiam qual a era a melhor opção para o município.
As visitas foram encerradas às 15:30h. Nesse momento, ouvi a candidata
comentando com sua prima que se encontrava cansada e com sede. Essa perguntou se
queria que comprasse água, mas a candidata vendo um vendedor de picolé que passava
pela rua, o chamou e abraçando-o disse que queria arrematar aquele carrinho. Falou
para todos que se encontravam na rua que podiam pegar picolé e cremosinho a vontade,
depois de sentar-se em uma calçada na sombra e tirar pedaços dos picolés de alguns, se
despediu entrando em seu carro, com alguns membros de sua equipe, pedindo que sua
prima acertasse com o vendedor. Aqui apesar de não ser uma festa, me reporto aos
exemplos de outros pesquisadores citados por Kuschnir (2002:249) sobre rituais de
comensalidade na política92, no que se refere a busca do político em passar uma imagem
de nivelamento como o universo de eleitores. Mais do que pagar picolé para os
92
Citando episódios em que políticos buscavam tratar os eleitores de ―
igual pra igual‖, observados por
Grill (1999)- ―
rodadas de cerveja‖ ou ―
chimarrão‖ e por Chaves (1993)- festas dos ranchões- Kuschnir
destaca: Combinam-se aqui doação/hierarquia e congregação/igualdade (...) Devemos notar que ―
pagar
uma bebida‖ não é a mesma coisa que ―
beber no mesmo copo‖ (2002: 250)
151
moradores do Cajueiro, Maura Jorge sentou e provou junto, fazendo com que essa
situação rendesse comentários simpáticos sobre a candidata.
Ilustração 12- Maura Jorge e pequeno comerciante no Cajueiro
Ilustração 13- Porta- retrato na casa de uma eleitora (de saia azul) com mãe da Maura Jorge
152
Concluída a atividade daquele dia, nos dirigimos para o restaurante de uma das
apoiadoras de campanha, que já tinha esse papel de receber os eleitores que trabalhavam
na campanha da família Jorge. Lá foram traçadas algumas coordenadas para a atividade
do dia seguinte, o ‗poeirão‘. Como já assinalei anteriormente, o restaurante de dona
Nega era um espaço onde eleitores se encontravam para atualizar informações como
tinha sido seu trabalho de campanha, como estava a situação da Maura Jorge em seus
respectivos bairros, o que os vizinhos comentavam, quantas casas tinham cartazes da
Maura Jorge, onde havia eleitores com probabilidade de mudança na opção do voto em
favor da candidata, dentre outros assuntos. Era um momento que fazia parte de um ritual
que reforçava a identidade da equipe em relação com a ligação destes com a Maura
Jorge. Ainda que houvesse conflitos internos em relação à proximidade com a líder
política.
No dia seguinte, a cidade amanheceu ao som de fogos de artifício e carro de som,
anunciando que a tarde aconteceria o maior ‗poeirão‘ que Lago da Pedra já tinha
presenciado. Nos intervalos da programação da rádio Santa Maura todos eram
convidados a participar da concentração do ‗arrastão‘ que seria no ―
alto do Waldir‖ e de
lá seguiria para o bairro do Planalto.
Cheguei ao local de concentração às 16h, o ―
arrastão‖ estava programado para
sair às 17h. Aproveitei para conhecer a estrutura do sistema de comunicação Waldir
Jorge e observar as pessoas que iam chegando, com seus mais variados meios de
transporte, mas as motos prevaleciam.
Havia um trio elétrico tocando vários jingles da candidata, com um animador em
cima convidando a todos a participar e anunciando algumas vezes, que estava chegando
o momento da saída. Muitas pessoas disputavam uma vaga em cima do trio, para
controlar tal situação, tinha um grupo que escolhia quem poderia subir orientando aos
que subiam que tinham que dançar e não deixar as bandeiras paradas. O objetivo do
―
poeirão‖ era mostrar a facção oposta quem tinha mais eleitores e ao mesmo tempo
anunciar o comício do dia seguinte, o comício ―
do 25‖, tanto pela data, que seria na
sexta-feira 25, quanto pelo número da candidata.
Ao som de foguetes, buzinas, jingles e frases de efeito pronunciadas pelo
animador, aos poucos vai formando-se um cortejo festivo que segue pelas ruas de Lago
da Pedra, conforme pode ser observado nas imagens abaixo.
153
Ilustração 14- Manifestantes chegando no “Alto do Waldir
Ilustração 15- Eleitores subindo no trio elétrico
154
Ilustração 16- Inicio do trajeto pelas ruas de Lago da Pedra
A candidata não participou dessa atividade, por ter que conciliar as atividades de
campanha com o mandato de deputada. Todas as terças e quintas-feiras Maura Jorge
tinha que ir para São Luís, para se fazer presente na Assembléia Legislativa. Mas aos
que perguntavam pela candidata, a equipe de campanha afirmava que ela estava
chegando.
Ao longo do trajeto outras pessoas iam se incorporando àquela espécie de carreata
misturada com passeata, cantando e dançando. A massa de manifestantes aos poucos se
assemelhava a uma festa de carnaval. Passando pelas ruas do bairro do Planalto,
moradores identificados com a facção oposta vaiavam a manifestação e acenavam com
o polegar pra baixo. Nesse momento o trio elétrico parou e o animador, acompanhado
por outras pessoas que já sabiam de tal estratégia, começou a cantar o jingle que
criticava as irregularidades no orçamento da administração atual prefeito, que por tal
motivo não pode se candidatar. A letra ressalta a vinculação da candidata adversária
com referido acontecimento, e ainda a acusa de despreparo, como pode ser observado,
nos trechos que se seguem.
155
Será que foi ele?
Será que foi ela?
Que fugiu da prefeitura
Pulando pela janela
Levando o dinheiro para não pagar o povo
E agora andam juntos
Querendo enganar de novo
Eles dois estavam juntos naquele acontecimento
Com a bolsa de dinheiro para fazer pagamento
Ela fugiu com a bolsa e ele desapareceu
Será que eles pensam que o povo já se esqueceu?
Será que foi ele?
Será que foi ela?
Que fugiu da prefeitura
Pulando pela janela
Mas o povo já conhece a sua caricatura
Sua fama, seu passado, seu orgulho, sua usura
Ela é despreparada
Ela não tem estrutura
E ainda quer ser eleita
Pra mandar na prefeitura (Jingle da campanha de Maura
Jorge em 2008)
Seguindo para o lugar de onde havia saído, o trio elétrico conduzia os
manifestantes para o fim da atividade, estes ao chegarem no ―
alto do Waldir‖, aos
poucos se dissiparam. O ‗arrastão‘ foi encerrado às 20h , com o animador exclamando
“amanhã, 25, será o dia da maior concentração cívica de Lago da Pedra, não
percam”, referindo-se ao comício de abertura da campanha. Embora algumas atividades
de campanha já terem sido realizadas antes do dia 25, o lançamento oficial da campanha
de Maura Jorge aconteceu com um comício. “São os comícios que sinalizam o início do
tempo da política‖. (Palmeira, 1995:35)
Na sexta-feira 25, às 5:30h da manhã os carros de som e os fogos de artifício, já
acordavam os moradores de Lago da Pedra. Entre os intervalos dos jingles da candidata,
os carros de som anunciavam: “É hoje! É hoje! Que a nossa estrela maior vai falar!
Maura Jorge a mulher certa em que você vai votar!‖.
Na casa da prima da candidata na qual estava hospedada, o telefone não parava de
tocar desde muito cedo, alguns candidatos a vereador e pessoas envolvidas com a
organização do comício chegavam entusiasmadas e apressadas, afirmando terem muito
156
trabalhos a fazer. Minha ajuda foi solicitada para organizar e digitar os dados dos
moradores e pedidos feitos nas últimas visitas.
Uma das organizadoras da agenda da candidata disse que a Maura Jorge não
participaria das reuniões com a equipe de campanha naquela manhã, porque tinha duas
―
visitas solicitadas93‖, que não poderia deixar de atender: uma conversa requerida pelo
padre da cidade e uma visita a família de um líder de associação, que havia falecido
naquela semana. Os detalhes sobre a atividade do dia começaram a ser tratados sem a
presença da candidata, desde a montagem e som do palanque, os carros que
transportariam as pessoas do povoados próximos para assistir o comício, a ordem e o
tempo dos candidatos a vereador que teriam direito a pronunciamentos no palanque,
dentre outros assuntos.
À tarde, na praça em que aconteceria o comício, vendedores ambulantes já
armavam suas barracas com os mais variados produtos, prevalecendo bebidas e
churrasquinhos. Estes aproveitavam a ocasião para conversar sobre as expectativas do
evento, e comparar a força política que cada uma das candidatas aparentava ter. À noite
o mesmo animador do ―
poeirão‖, agora com palavras mais solenes, se referia aos nomes
das pessoas que estariam presente na atividade e avisava que em poucos instantes
começaria o comício.
O comício foi iniciado com a fala de Célia Arruda, candidata a prefeita da facção
de Maura Jorge, nas eleições de 2004. Esta saudou a todos os presentes e se reportando
a última eleição municipal em Lago da Pedra, disse que apesar de não ter obtido vitória
nas urnas naquela ocasião, era muito grata a todas as pessoas que tinham votado nela.
Pediu a esses eleitores que votassem nos candidatos Maura Jorge e Laércio Arruda, pois
tinha a certeza, que nesse ano Deus já havia estabelecido a vitória. Em seguida falaram
os candidatos a vereador e o candidato a vice-prefeito, todos ressaltaram suas propostas
e pediram voto para Maura Jorge.
Em seguida, o apresentador do comício anunciou que a candidata a prefeita iria
falar e passou o microfone a ela. Maura Jorge antes de iniciar o seu discurso, convidou
sua mãe para que ficasse ao seu lado, segurando a sua mão, enquanto falava da visita
93
A equipe diferenciava visitas domiciliares realizadas pela equipe da candidata nos bairros, daquelas em
que os próprios eleitores solicitavam. Geralmente essa solicitação era feita mediada pelos principais
apoiadores da campanha, que avaliavam antes quem era o eleitor solicitante e o caso a ser tratado.
157
que tinha feito a família de um líder de associação, o Sr. Raimundo Vianna que havia
falecido na segunda-feira, pediu a todos que fizessem um minuto de silêncio 94. Sobre
demonstrações de solidariedade em situações semelhantes a essa, destacam Palmeira e
Heredia (1995):
(...) não será surpresa no enterro de figuras importantes da comunidade e
até mesmo de cidadãos comuns, a presença de candidatos ou políticos a
eles ligados, que não deixarão passar a oportunidade de, brindando os
participantes com discursos laudatórios ao morto ou simplesmente
oferecendo sua solidariedade aos familiares, estabelecerem ou reforçarem
ligações sociais que poderão se traduzir em votos. (PALMEIRA e
HEREDIA, 1995:33)
Prosseguindo, Maura Jorge faz uso do texto bíblico que fala da passagem do
profeta Neemias animando o povo a reedificar os muros de Jerusalém: ―
Estais vendo a
miséria em que estamos, Jerusalém assolada, e as suas portas, queimadas; vinde pois e
reedifiquemos os muros.‖ E compara a liderança e papel libertador que aquele
personagem bíblico teve em relação ao seu povo com seu objetivo de chegar a prefeitura
de Lago da Pedra. A candidata afirmou: Quando estava me dirigindo para cá nesta
noite, lembrei da passagem de Neemias tirando seu povo do cativeiro, assim vos falo
que chegou a hora da libertação de Lago da Pedra.
Disse que estava disposta a mudar a situação atual de Lago da Pedra, em relação a
educação, saúde e geração de empregos. Afirmou que a senadora Roseana Sarney que já
havia confirmado conseguir liberação de recursos para instalação de energia elétrica nos
povoados que ainda não tinham, caso ela fosse eleita. (Bezerra, 1999). Prosseguiu
falando várias de suas propostas, sempre prometendo mudança. Afirmou também, que
nessa campanha ela iria conhecer mais de perto seu eleitor.
Para terminar, Maura Jorge acionou a tradição política de sua família, afirmando
que tinha certeza que entre as pessoas que ali se faziam presentes, “havia aquelas que
se lembravam da Maurinha acompanhando sua mãe nas atividades políticas‖. E que
somado a esse fato, ainda tinham os quatros mandatos de deputada estadual, que lhe
davam conhecimento e experiência para melhor administrar seu município. Encerrou,
94
A candidata soube do falecimento do líder de associação pelo celular, no momento em encontrava-se na
estrada viajando para São Luís, o que a impediu de participar do enterro. Eu estava no mesmo automóvel
e pude presenciar sua ligação logo em seguida para sua mãe, relatando, de forma preocupada, o ocorrido e
solicitando que sua mãe fosse em seu lugar, ―
em momento de campanha o que não pode é ficar sem
ninguém representando a gente lá‖, afirmou a candidata.
158
dizendo que ela sim, era uma candidata que falava 95, não mandava ninguém falar por ela
e conclamou a todos a votar 25. Descendo do palanque, liderou uma passeata de
encerramento da atividade, no meio dos eleitores, da praça principal até o ―
alto do
Waldir‖, embalada ao som dos jingles. Nesse momento, Maura Jorge já não é mais a
candidata distante do palanque 96, “eleitores e políticos se esbarram, abraçam-se,
pedidos são feitos, pequenas conversas são entabuladas, candidatos dançam e cantam
como qualquer um” Palmeira e Heredia (1995:43).
Além das passeatas e visitas domiciliares, outro evento de campanha eleitoral que
pode possibilitar um contato mais próximo entre candidatos e eleitores são as reuniões
com aspecto festivo, freqüentes nesse período (tais como jantares, feijoadas ou
churrasco), promovidas não com a motivação central de conquistar votos, mas sim de
“certificar a identidade do candidato como político digno do exercício de um mandato,
justamente num momento em que esta identidade está ameaçada pela aproximação das
eleições” (Kuschnir, 2002:243). Tive a oportunidade de acompanhar a candidata Maura
Jorge, num jantar organizado por lideranças do sindicato dos agentes de saúde de Lago
da Pedra, para os trabalhadores da referida categoria.
A seguir, descrevo alguns
aspectos observados nessa atividade de campanha eleitoral.
4.4.2 O jantar com agentes de saúde
O evento foi realizado na área externa da casa de uma apoiadora de campanha.
Começou às 20 horas, com o representante dos agentes de saúde agradecendo a
presença da deputada, do candidato a vice- prefeito Laércio Arruda e dos candidatos a
vereadores. Se referiu a mesa que eu estava presente, juntamente com os advogados de
Maura Jorge e sua chefe de gabinete, e anunciou que ali, estavam presentes também
“pessoas que não são do município, mas que são companheiros nossos, pois estão em
95
Fazendo referência ao episódio do debate com os professores em que a outra candidata a prefeita não
compareceu, mandando um representante e ao último comício da outra facção cujo o atual prefeito tinha
feito o discurso no lugar da candidata.
96
Palmeira e Heredia (1995) chamam atenção para as diferentes modalidades de interação entre
candidatos e eleitores nas atividades de campanha, de acordo com os contextos, nos quais estão inseridos
(estar em cima de um palanque ou numa passeata por exemplo).
159
Lago da Pedra com o mesmo objetivo que nós lagopedresenses estamos” 97.
Em
seguida, saudou os seus companheiros de profissão e agradeceu a dona da casa, por ter
cedido o local para a realização do jantar.
Dando continuidade, o líder dos agentes de saúde afirmou que havia distribuído o
convite do jantar para os 123 agentes de saúde que atuam em Lago da Pedra, com
objetivo destes ouvirem um pronunciamento da Maura Jorge, que estava ali naquela
noite “não como candidata, e sim como deputada que muito tem nos ajudado”. Disse
que gostaria, antes da fala da candidata, de ter uma conversa rápida com seus
companheiros de trabalho, sobre as estratégias de como estes poderiam atuar na
campanha de Maura Jorge e Laércio Arruda. Propôs que os agentes comunitários, no
momento em que estivessem trabalhando, divulgassem o nome de Maura Jorge, na casa
das famílias visitadas. “São vocês que conhecem as pessoas da comunidade, como
agentes de saúde, vocês tem acesso desde a casa do professor, zelador, vigia. Vamos
fazer a nossa parte para ajudar a coligação A Força do Povo!”, afirmou o cabo
eleitoral, provocando fortes aplausos.
Em sua fala, o agente de saúde fez menção, ainda, ao episódio do dia anterior ao
jantar. Tinha acontecido um treinamento para os agentes de saúde, promovido pela
administração do atual prefeito. Disse estar ciente que neste treinamento sua imagem
tinha sido denegrida em público, pela atual secretária de saúde. “Sei que ela se
aproveitou de minha ausência no treinamento e me apunhalou pelas costas, eu já tinha
dito pra ela minha posição sobre a atual administração, lá na câmara dos vereadores‖.
Fez várias críticas a situação na área da saúde em Lago da Pedra e ao treinamento, que
segundo ele, havia sido sonegada até alimentação para alguns, durante o treinamento e
perguntou se diante disso, todos não queriam mudança. Mais uma vez o público se
manifestou com intensos aplausos.
Encerrando sua fala, o apoiador de campanha, afirmou que sabia que todos que
estavam ali presente já votavam na Maura Jorge, mas que estes tinham a
responsabilidade de propagar suas idéias e propostas nas famílias visitadas entre os
moradores de Lago da Pedra. O mesmo chamou para dar continuidade, a delegada dos
agentes do município. Esta fez uso da palavra também tecendo críticas a atual
Percebi que a chegada no mesmo carro da deputada, juntamente com seus assessores legitimava
minha presença no jantar.
97
160
administração no que concerne à área da saúde. Entre os vários assuntos abordados,
destacou a insatisfação com valores descontados em seus salários. ―
É lamentável os
descontos realizados pela prefeitura em cima de nossos vencimentos, isso tem
diminuído a quantidade de arroz e feijão na boca de nossos filhos, isso não pode
acontecer durante mais quatro anos”. Finalizou dizendo que tinha convicção que a
Maura Jorge já era a vitoriosa.
Em seguida, o vice-prefeito Laércio Arruda fez uso do microfone, afirmando
estar ali não para falar de política e sim para cantar98. Com todos acompanhando com
palmas, cantou uma das músicas de campanha e passou a palavra para o líder dos
agentes de saúde, que disse que todos agora iriam ouvir a deputada.
A candidata, fortemente aplaudida, se dirigiu para microfone e corrigiu que
apesar de ter sido anunciada como deputada, não falaria ocupando tal cargo. O contexto
no qual ela se encontrava, propiciava o acionamento da identidade regional, mais do que
do cargo de deputada99. Assim Maura Jorge inicia seu discurso:
Bom eu vou pedir permissão aqui para o Valdielson pra que eu não fale
como deputada, eu quero me despojar aqui do cargo de deputada e quero
falar como lagopredense. Tenho absoluta certeza que esse é que é o
sentimento que nos reúne e acima de tudo nos une nessa noite. Então eu
não vou falar como deputada e sim como prefeita em nome de Jesus e
pela vontade do povo.
98
Além de exercer a profissão de dentista, é cantor de música sertaneja em Lago da Pedra.
Ao refletirem sobre os diferentes papéis que os políticos podem assumir ao comunicarem-se com
universos sociais regidos por lógicas distintas, destacam Velho e Kuschnir (2000:88) ―
O potencial de
metamorfose do político, sua habilidade para transitar em mundos e províncias de significado com
alterações drásticas de papéis e da própria apresentação do self, constituem a base de uma identidade
dinâmica e complexa do mediador‖.
99
161
Ilustração 17- Candidata Maura Jorge no jantar discursando para os agentes de saúde
Maura Jorge teceu alguns agradecimentos. Primeiro a Deus pela oportunidade de
todos estarem ali presente, diz estar agradecida pelo gesto de carinho da eleitora que
disponibilizou a casa, agradece também ao Valdielson por estar conduzindo o trabalho e
sua equipe de assessores. Finalizando seus agradecimentos, percebi que a candidata
buscou legitimar e valorizar seu trabalho político, se referindo a minha presença como
uma pesquisadora da Universidade Federal do Maranhão 100. Disse que queria agradecer
a pesquisadora que a tinha escolhido, para fazer um estudo sobre sua trajetória enquanto
mulher maranhense na política.
(...) a Dayana que esta aqui nos visitando, está fazendo um trabalho pela
Universidade Federal do Maranhão. E eu agradeço porque ela está
defendo uma tese de mestrado e me escolheu como deputada, como
política do Maranhão, para falar sobre mim nessa tese. Então eu me
sinto muito honrada Dayana, quero te dizer isso diante do nosso povo.
Prosseguindo seu discurso, a candidata afirmou que tinha ficado magoada, após
saber das últimas histórias que estavam sendo propagadas ao seu respeito em Lago da
Pedra. Afirmou que isso a fez meditar na palavra de Deus, no livro de Provérbios, que
100
Tal situação tem sido comumente vivenciada por pesquisadores na área da ciência política, a exemplo
de Kuschnir (2003).
162
falava sobre a importância de andar na verdade para se chegar aos bons lugares.
Ressaltou que estavam proferindo mentiras sobre sua pessoa, denegrindo a imagem da
Maura Jorge e de seu trabalho. Mas afirmou que não tinha medo, porque acreditava na
passagem bíblica que diz que os anjos do Senhor acampam ao redor daqueles que o
temem.
A candidata disse estar preocupada com a música da outra candidata que diz
―
Vamos continuar‖ e pergunta para todos os presentes, continuar com o quê?
Afirmando que com todas as categorias que ela tinha dialogado até aquele momento,
apenas tinha ouvido reclamações sobre a atual administração. Maura Jorge destacou que
entre os profissionais da saúde se falava em humilhação. “Quando fui conversar com o
pessoal da educação, se falava em descaso com a merenda escolar, com o educador. Aí
eu vou e me reúno com os desportistas, a mesma falta de respeito. Como podemos falar
em continuar?”
Maura Jorge propõe em seu discurso, no lugar de ―
continuísmo‖, mudança.
Acionando a legitimidade divina, disse que para tal, Deus a tinha escolhido. Que a sua
candidatura era direcionada pelos propósitos de Deus para trazer mudança para Lago da
Pedra. “Eu tenho absoluta certeza de que foi Deus que aqui me colocou, se ele me fez
aceitar esse desafio, é porque ele tem um propósito. Um propósito de uma
administração digna, que respeita nosso cidadão”.
Encerrando seu pronunciamento disse que os agentes de saúde são como
verdadeiros anjos do povo de Lago da Pedra, que ao adentrarem os lares dos mais
carentes, acabavam acalentando muitas famílias. Pedia naquela noite, portanto, que
como anjos, eles se tornassem os mensageiros da verdade, e se sentissem transformados
numa Maura Jorge que quer dar um basta em tudo que se implantou com a atual
administração. Finalizou dizendo que se Lago da Pedra estava passando por uma
situação ruim atualmente, era porque na campanha da Célia Arruda ela avisou que
―
tinha lobo que se vestia em pele de cordeiro, mas muitos não acreditaram‖. Mas que
não se preocupassem porque ela e o candidato a vice- prefeito Laércio Arruda, eram os
agentes da esperança. Quando a candidata terminou sua fala, muitos aplaudiram,
gritaram e abraçaram a candidata. No momento do jantar o ambiente foi se tornando
163
mais descontraído, cada um se servia, enquanto a candidata conversava, comia e bebia
junto de seus eleitores.101
Maura Jorge se autoconsagra ―
a mulher certa‖ para administrar Lago da Pedra,
anunciada em seu jingle de campanha. Agora, não apenas pelos aspectos anunciados na
letra: ―
aquela que tem alegria‖, ―
que está com o povo todo dia‖, ―
a candidata da massa‖,
mas baseada também em símbolos do sagrado102, como a bíblia e designações
associadas a esse universo: ―
aquela que anda na verdade‖, ―
escolhida por Deus‖,
―
agente da esperança‖.
Assim, por meio da análise das diferentes situações que observei, nota-se que a
campanha de Maura Jorge em 2008, foi realizada enfatizando-se principalmente quatro
elementos: a tradição política da ―
família Jorge‖, a identidade regional, a atuação
enquanto deputada estadual e a dimensão do sagrado. Além do jantar, visitas, comícios
e passeatas, tive a oportunidade de observar também a festa da candidata, em
comemoração à vitória nas urnas. Maura Jorge foi eleita prefeita de Lago da Pedra com
12.659 votos, enquanto a candidata da outra facção- Fátima Sales- obteve 12.097 votos.
Demonstrando o clima ainda de competição entre as facções, depois de apurado o
resultado positivo, carros de som e várias casas de eleitores de Maura Jorge, tocaram
repetidas vezes uma música com lira melancólica e choro de criança ao fundo, em tom
provocativo aos eleitores da outra facção, com a seguinte letra:
A partir de agora você vai curtir o melô do chororô
O hino da vitória
Chora eleitor apaixonado
Chora nem que seja escondido
Chora eleitor apaixonado
Chora nem que seja escondido
Quantas vezes avisei amigo meu
E você não quis me acompanhar
Agora chora o amargo da derrota
E não tem jeito o remédio é chorar
101
Observei que a candidata não parou em uma única mesa para jantar, visitou todas as mesas em que
estavam dispostos os agentes de saúde. Neste momento, Maura Jorge tirou fotos, ―
beliscou‖ a comida de
outros pratos e ouviu demandas pessoais de seus eleitores. De modo que quando saí do evento com a
candidata e sua equipe de assessores, já era madrugada.
102
A análise de Barreira (1998:66) destaca: ―
Não por acaso, os rituais da política têm tradicionalmente
evocado, de modo direto ou indireto, a presença do sagrado, a partir de símbolos deslocados e
readaptados a cada situação particular‖.
164
Com seu prestígio reforçado, Maura Jorge agora se encontrava diante do desafio
de comemorar com seu eleitorado evangélico sem desagradar aos demais. A candidata
juntamente com sua equipe de campanha, decidiu comemorar o êxito obtido nas urnas,
fazendo duas noites de festa em Lago da Pedra: um culto no dia onze e um forró no dia
doze de outubro de 2008. Analiso em seguida as duas situações.
4.4.3 Comemorando o resultado: culto e forró na praça.
O local e horário escolhido para realização dos dois eventos foi o mesmo, as
19:00h na praça principal do município. Mas o cenário, as atitudes, roupas, falas e
gestos da candidata foram bem diferenciados, demonstrando a habilidade e plasticidade
de comportamentos que são exigidos dos políticos, de acordo com situações específicas
na qual se encontram.
O palanque armado para o culto foi todo emoldurado com balões azul e branco.
No alto de forma bem centralizada, tinha uma grande pomba de isopor com uma
bandeira do número 25 presa no bico. A intenção segundo a equipe de campanha, seria
remeter por meio desses adornos, a passagem bíblica em que o personagem Noé percebe
que o dilúvio acabou, após soltar uma pomba. E naquela noite esse símbolo
representava os bons tempos anunciados para o município com a vitória da nova
prefeita. (ver fotos 18 e 19)
165
Ilustração 18- organização do palanque para o culto em comemoração a vitória de Maura Jorge
Ilustração 19- O símbolo da pomba no culto em ações de graça de Maura Jorge
Devido às relações construídas nos atos de campanha que já havia observado
anteriormente, pude ter acesso e transitar à vontade em todo espaço do palanque.
Observei que na frente havia um púlpito bem centralizado que dividia cadeiras
reservadas para os familiares de Laércio Arruda à direita e os de Maura Jorge à
166
esquerda. Os vereadores eleitos, juntamente com os pastores e cantores sentaram-se nas
fileiras mais atrás, de modo que toda parte dianteira foi tomada por familiares da
prefeita e do vice-prefeito recém-eleitos. Ao fundo ficaram os músicos e algumas
pessoas da equipe coordenadora da campanha.
Um pastor local foi escolhido para conduzir o culto, este começou lendo vários
textos bíblicos que faziam referência a importância do ato de agradecer a Deus pelos
benefícios alcançados. Em seguida chamou a candidata das eleições de 2004, Célia
Arruda, para cantar. A viúva de Waldir Filho, juntamente com suas filhas,
representando a união da família Jorge com a família Arruda, após rápido
pronunciamento em agradecimento aos eleitores de Lago da Pedra, falou que a música
que iria cantar, fazia referência à vitória concedida por Deus à Maura Jorge, que tinha
como tema ―
De coração pra coração‖.
À medida que o culto prosseguia, os vereadores eleitos pela coligação A Força do
Povo se pronunciavam. Enquanto Maura Jorge, sentada ao lado de seu esposo e de seus
pais, assistia à reunião, sem muitos acenos ao público. Dois cantores conhecidos
nacionalmente no meio evangélico foram contratados especialmente para o evento,
pastores da igreja que Maura Jorge freqüenta em São Luís, também estavam presentes,
além de lideranças locais de municípios vizinhos, como Bacabal e Lago do Junco.
Após vários pronunciamentos, músicas e orações, o pastor que coordenava o culto
chamou as duas famílias, Jorge e Arruda, para se posicionarem ao lado do púlpito para
que ele e o povo de Lago da Pedra orassem pelas mesmas. A família de Maura Jorge
encontrava-se bem mais numerosa, com irmãos, primos, sobrinhos, filhos. A deputada e
prefeita recém-eleita encontrava-se maquiada, de salto e vestes de tecido brilhoso,
remetendo seriedade e solenidade ao ambiente. Esta ficou em pé juntamente com seu
esposo Rui, seus pais- D. Raimundinha e Sr. Waldir Jorge- e se posicionou para receber
a oração ao lado da família Arruda.
Por último, obedecendo à hierarquia da ordem de ―
autoridade política‖ nos
pronunciamentos em palanque (Palmeira e Heredia, 1995) foi dada a oportunidade para
que Maura Jorge falasse. Esta antes de começar o seu discurso disse que iria falar
naquela noite com pessoas que eram seus irmãos duas vezes, ―
irmãos em Cristo e
irmãos lagopedrenses‖. E, se reportando a música cantada por Célia Arruda, disse que
167
assim como Deus tinha falado ao seu coração, naquela noite iria falar ao seu povo de
coração pra coração.
Agradeceu a todos presentes e citou o versículo que diz que o homem traça os
seus caminhos, mas é Deus quem determina onde o homem vai chegar. E começou a
falar do fato dela deixar de ser deputada para se tornar prefeita de Lago da Pedra. Maura
Jorge afirmou:
O homem traça os seus caminhos, mas é Deus quem determina onde
vamos chegar. É bem verdade que eu tracei o meu caminho, para estar
hoje lá na Assembléia Legislativa como deputada, mas Deus me disse:
Maura Jorge teu percurso mudou, mudou a tua história. E hoje vocês
estão vendo aqui a irmã, a mulher, a companheira, a interiorana e
lagopedrense que sou, como prefeita da nossa cidade.
Após a manifestação de aplausos, Maura Jorge continuou perguntando, qual era o
pai ou mãe que não queria o melhor para seus filhos. E disse que o povo de Lago da
Pedra como filhos de Deus, iria receber agora o melhor. Agradeceu a todos que abriram
as portas de sua casa, durante as visitas que ela fez nos bairros, disse que sempre orava
antes de realizar tais visitas.
Quando eu levantava pelas manhãs para minhas visitas nos lares, eu
orava: Senhor toca no coração dessas pessoas e sensibiliza (...) esse foi o
melhor encontro que eu tive com meu povo, porque nessa campanha eu
pude ter intimidade com cada um de vocês.
Maura Jorge afirmou que após esse resultado nas urnas, estava se espelhando em
Salomão, e contou a história desse personagem bíblico, que quando se constituiu rei não
pediu nada a Deus além de sabedoria, e era isso que ela estava a pedir a Deus naquela
noite, ―
peço a Deus sabedoria para conduzir o meu povo‖ . Em seguida, referiu-se aos
seus pais como colunas que a sustentavam, dando ênfase às orações de sua mãe.
Continuando seu discurso, Maura Jorge falou das perseguições que havia sofrido no
final de sua campanha, e agradeceu a Deus pelo livramentos. Finalizou enfatizando que
a vitória comemorada naquela noite, não era da Maura Jorge, “essa vitória é
primeiramente de Deus e depois do povo de Lago da Pedra”.
168
No evento do dia seguinte, os elementos usados no palanque que juntos
completavam o cenário de um culto foram substituídos por um ambiente construído
agora para um show de uma banda de forró. No mesmo palco, observei a ausência de
balões, pomba, bandeira, cadeiras e púlpito dando lugar ao jogo de luz, estrutura de som
mais amplificada e a presença de um animador que se comunicava constantemente com
o público que se aproximava. Em baixo, havia muitas barracas montadas com
vendedores de diferentes petiscos e bebidas. Uma quantidade maior de jovens em
relação à atividade do dia anterior, também podia ser observada.
Maura Jorge chegou às 20h, acompanhada do marido e dos filhos, vestindo uma
blusa mais descontraída e jeans. Os vereadores eleitos e o vice-prefeito Laércio Arruda
estavam presentes, mas não fizeram discursos. O número de pessoas em cima do
palanque era bem menor que no dia anterior, todos em pé, observavam apenas Maura
Jorge fazendo pronunciamento. Esta foi bem mais sucinta em suas palavras, agradeceu
aos jovens de Lago da Pedra pela participação na campanha e prometeu a estes que iria
investir em educação, cursos profissionalizantes e geração de empregos no município
durante sua gestão.
A nova prefeita de Lago da Pedra disse que amava os jovens e que entendia um
pouco de suas concepções e visões de mundo, porque conciliava sua atividade política
com um cotidiano compartilhado com seus quatro filhos adolescentes. Nesse momento,
chamou para frente do palanque seus dois filhos que se faziam presente e enquanto estes
acenavam para o público, Maura Jorge agradeceu a ambos pela força transmitida no
decorrer da campanha e pela compreensão e maturidade em relação ao seu pouco tempo
dedicado à família ao longo dos anos, devido às exigências dos mandatos. No mesmo
sentido, agradeceu seu esposo, encerrando sua fala ao seu lado juntamente com seus
dois filhos. Em seguida o animador anunciou a banda que tocou para o público até o
amanhecer.
Ao analisar esses diferentes atos de campanha, busquei demonstrar como a
candidata mobilizou os mais diversos recursos no tempo na política em Lago da Pedra,
me limitando a esse período. Reconheço que para uma análise mais ampla dos papéis e
da atuação do político com sua diferenciada rede de relações, seria necessário
considerar outras dimensões, tais como a relação da deputada com seus eleitores fora do
169
período de campanha, sua relação com outros deputados na Assembléia Legislativa e
seu trânsito nas diferentes esferas do Poder Público, mas ciente das limitações que o
tempo impõe numa pesquisa de mestrado, optei por deter-me ao período eleitoral, sem
esquecer que pela própria natureza de seu objeto, uma etnografia é sempre incompleta.
5- Considerações Finais
Minha intenção ao longo desse trabalho foi analisar o processo de
profissionalização política no Maranhão sob um recorte de gênero. Essa iniciativa se
desdobrou em três sentidos: identificar os perfis das deputadas federais/estaduais
maranhenses no período compreendido entre 1982-2006, refletir sobre as estratégias de
reconversão de bases sociais em trunfos eleitorais e observar esse tipo de acionamento
nas práticas de uma mulher maranhense em campanha.
Ficou claro, em relação ao número de deputadas eleitas no Maranhão nas duas
últimas décadas, que houve um aumento considerável no que se refere ao cargo de
deputada estadual. Entre as deputadas federais, apenas 4 mulheres conseguiram se
eleger nesse período. A apresentação dos dados sobre a trajetória das carreiras políticas
analisadas demonstrou que o acesso ao cargo de deputada no Maranhão encontra-se
ligado tanto na esfera federal como na estadual predominantemente às relações de
parentesco com político (com destaque para os casos de relação com o cônjuge),
somado à ocupação de cargos públicos e à reconversão da notoriedade profissional em
alguns casos, como critério de legitimação política.
Busquei, ainda, identificar os princípios que regem a disputa eleitoral no
Maranhão a partir da perspectiva dos agentes. Dentre os elementos mais mencionados
como imperiosos para se obter êxito na carreira eletiva, as deputadas destacaram vários
aspectos, tais como a experiência política, no sentido de mandatos anteriores, a amizade,
eloqüência e vínculos com familiares políticos. Demonstrando as variações quanto à
condição de acesso e de consolidação da carreira eletiva entre as deputadas no
Maranhão.
170
Como parte da demonstração das possibilidades de combinação e acionamento de
trunfos políticos ao longo dos itinerários das deputadas, analisei dois casos mais
detalhadamente: o percurso de uma deputada federal e outra estadual. Embora, tenha
utilizado estratégias de pesquisa bastante distintas e desiguais no exame dos perfis, os
dados mostraram como duas mulheres de origens sociais bem diferenciadas (no
primeiro caso uma filha de trabalhadores rurais e no outro uma filha de latifundiário)
acionaram distintos trunfos na busca pelo reconhecimento nas urnas. Enquanto que no
primeiro exemplo, Terezinha Fernandes combinou principalmente militância e relações
matrimoniais, no segundo caso, Maura Jorge acionou sobretudo a tradição política
familiar e a identidade regional. Apesar das peculiaridades destacadas nas análises, os
dois exemplos demonstraram como pode ocorrer o intercâmbio dos diferentes níveis da
hierarquia política, superando a idéia dicotômica de local x nacional de atuação política.
Os dados evidenciaram também, que o mesmo recurso político pode ser utilizado de
forma diferenciada. Em relação ao uso do gênero como mecanismo para obtenção de
legitimidade política, foi observado que o acionamento ocorre, mas geralmente com
menor peso em relação a outros trunfos eleitorais.
No que se refere à estrutura do espaço político no Maranhão, os dados
demonstraram o predomínio do ingresso ―
por cima‖, por parte tanto das deputadas
federais, como das estaduais, configurando um espaço político ―
fechado‖. Em relação às
primeiras, todas não ocuparam cargo eletivo anterior ao de deputada federal, e entre o
grupo das 22 deputadas estaduais, apenas 8 iniciaram suas carreiras como vereadoras ou
prefeitas.
Corroborando as idéias de autores que discutem sobre o processo de
profissionalização política, o tempo de dedicação dessas mulheres às atividades
políticas, em geral, somam vários anos. Não apenas pelo número de mandatos
acumulados, mas também por atividades desempenhadas antes da ocupação do cargo
eletivo. Identifiquei ao longo da pesquisa casos de passagem por secretarias, militância
ou participação nas campanhas dos maridos, antes de serem eleitas deputadas. O
conhecimento e as práticas adquiridas nessas esferas acabam funcionando como capital
significativo de diferenciação entre os concorrentes na arena política.
Semelhante aos dados encontrados em outras pesquisas sobre a participação das
mulheres na política, constatei no Maranhão a recorrência das deputadas federais e
171
estaduais em comissões ligadas a área social, sugerindo discussões futuras sobre gênero,
poder e recursos desiguais não abordadas no presente trabalho.
Apresentei no último capítulo, três elementos na análise do percurso de um
agente: o gênero acionado nas campanhas, mecanismos de herança na política e as
lógicas de adesões de cabos eleitorais numa determinada configuração.
No primeiro aspecto, quanto ao uso de gênero como identidade estratégica, a
imagem de mulher construída pela candidata geralmente estava associada a outros
elementos. A candidata relacionou a imagem de mulher tanto a seus anos de mandatos
acumulados como deputada, como ao modo de fazer política de maneira mais
pessoalizada e a sua opção religiosa: ―
mulher preparada‖, ―
mulher certa que está com o
povo todo dia‖, ―
a candidata da massa‖, ―
a mulher escolhida por Deus‖, ―
a mulher que
anda na verdade‖.
No segundo aspecto, por suas origens sociais, Maura Jorge entra na política
herdando ―
redutos‖ conquistados por sua família ao longo dos anos. Isso reforça o que
já foi discutido em vários trabalhos que abordam essa temática, o peso que
desempenham os mecanismos de hereditariedade nas disputas políticas.
Finalmente, entre as lógicas de adesões entre os apoiadores de campanha, foi
possível perceber relações de reciprocidade onde as trocas e recompensas davam
significado ao engajamento nas lutas políticas. A administração desses elos se mostrou
um componente indispensável para o exercício do métier político e para a construção e
divulgação da imagem da candidata, assim como para a fixação dos atributos que
compõem o perfil de uma mulher que se especializou na atividade política.
172
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Marly Abdalla. Realizada pela mestranda na sala de coordenação da UNITI-UFMA em
05 de março de 2007
Graça Paz. Realizada pela mestranda no Gabinete da deputada em 07 de março de
2007
Fátima Vieira. Realizada pela mestranda no Gabinete da deputada em 07 de março de
2007
Telma Pinheiro. Realizada pela mestranda na SECID em 14 de março de 2007
Terezinha Fernandes. Realizada pela mestranda e orientador na SETRES em 03 de
abril de 2007.
Graciete Lisboa. Realizada pela mestranda na residência da deputada, em 30/08/07
Maura Jorge. Realizada pela mestranda no município de Lago da Pedra, em 20/07/08
Entrevistas com cabos eleitorais:
5 entrevistas. Realizadas pela mestranda entre julho e outubro de 2008, no município de
Lago da Pedra.
Vídeo:
Vídeo de atos de campanha de Maura Jorge em 2006, produzido pelo Sistema de
Comunicação Waldir Jorge.
Internet:
www.cfemea.org.br. Acesso em 03/11/07.
www.tse.gov.br. Acesso em 07/01/08
www.ipu.org. Acesso em 23/11/07
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www.senado.gov.br. Acesso em 09/01/08
www.al.ma.gov.br. Acesso em 05/07/08
177
ANEXO
Roteiro de Entrevista
1 – Qual o perfil (étnico, de origem geográfica, social, etc.) dos seus antepassados por
parte paterna e materna?
2 - Qual o grau de escolarização do seu avô paterno?
3 - Em qual instituição de ensino superior ele concluiu o curso superior?
4 - Qual o grau de escolarização do seu avô materno?
5 - Em qual instituição de ensino superior ele concluiu o curso superior?
6 - Quais foram as atividades profissionais exercidas pelo seu avô paterno?
7 - Quais foram as atividades profissionais exercidas pelo seu avô materno?
8 - Qual o grau de escolarização do seu pai?
9 - Em qual instituição de ensino superior ele concluiu o curso superior?
10 - Qual o grau de escolarização da sua mãe?
11 - Em qual a instituição de ensino superior ela concluiu o curso superior?
12 - Quais foram as atividades profissionais exercidas pelo seu pai?
13 - Quais foram as atividades profissionais exercidas pela sua mãe?
14 - O Sr.(a) poderia descrever como foi a sua infância e como acompanhava a política
neste período?
15- Em que momento e idade o Sr.(a) começou a militar politicamente?
16 - Qual o grau de escolarização que o Sr.(a) possui?
17 - Em qual escola o Sr.(a) concluiu o primeiro grau?
18 –Em qual escola o Sr.(a) concluiu o segundo grau?
19 – Em qual instituição de ensino e curso o Sr.(a) conclui o nível superior?
20 - Quais foram as atividades profissionais que o Sr.(a) exerceu antes de participar de
eleições como candidato?
21 - O Sr.(a) exerceu algum tipo de liderança política (estudantil, partidária, sindical,
associativa, comunitária, etc.) no período que precede a sua entrada nas disputas
eleitorais como candidato? Poderia descrever como se deu a sua participação nestes
178
espaços? Quais foram seus principais aliados e adversários? Quais as polarizações que
existiam nestes espaços?
22 - O Sr.(a) ocupou cargos públicos (secretarias, assessorias, chefias de gabinete, etc.)
antes de exercer mandatos eletivos?
As questões abaixo devem ser feitas somente aos deputados que ocuparam cargos
públicos antes dos mandatos eletivos?
23 - Como se deu a sua indicação para ocupar tais cargos públicos?
24 - Quais foram as suas principais realizações no exercício destes cargos?
25 - Qual a importância dos cargos públicos para o seu ingresso nas disputas
eleitorais?
26 - O Sr.(a) se dedica ou se dedicou à produção literária, histórica ou acadêmica?
As questões abaixo devem ser feitas somente aos deputados que possuem produção
escrita
27 - Quais são os principais temas tratados na sua produção?
28 - Como o Sr.(a) define a ―
tradição intelectual maranhense‖?
29 - Quais são as principais disputas entre os intelectuais maranhenses da segunda
metade do século XX e início do século XXI?
30 - Como o Sr.(a) se define como ―
escritor‖?
31 - Qual são os tipos de engajamento que pode ser encontrado nos seus textos?
32 - Como o Sr.(a) vê a relação entre trabalho intelectual e político?
33 – Entre os seus parentes há ocupantes ou ex-ocupantes de cargos políticos ou
eletivos?
As questões abaixo devem ser feitas somente aos deputados que contam com
ocupantes de cargos políticos ou eletivos na sua rede de parentesco
34 - Qual a importância de descender de uma ―
família‖ dedicada às atividades
políticas, partidárias e eleitorais no momento do ingresso nas competições
179
eleitorais?
35 - Qual a importância de descender de uma ―
família‖ dedicada às atividades
políticas no momento da sua escolha partidária?
36 - Qual a importância de descender de uma ―
família‖ dedicada às atividades
políticas, partidárias e eleitorais nas campanhas eleitorais?
37 - Quais são as principais características comuns da atuação política dos
membros da sua família?
38 - Qual a influência da sua atuação profissional prévia na sua primeira campanha
eleitoral e nas demais?
39 - Qual a relevância da liderança política prévia na sua primeira campanha eleitoral e
nas demais?
40 - O Sr.(a) poderia descrever as suas campanhas eleitorais em termos de cabos
eleitorais, apoios, bases, etc. fazendo, se for o caso, também uma comparação entre
elas?
41 - Quais as razões, na sua opinião, que levam alguns indivíduos a se dedicarem de
forma intensa e permanente à atuação política?
42 - Entre elas, quais as que pesaram mais para a sua opção de se dedicar à atuação
política?
43 - Qual o peso da sua formação escolar, sobretudo acadêmica, no exercício de funções
políticas?
44 - Quais as habilidades, competências e conhecimentos necessários para alguém
desempenhar uma função eletiva?
45 - Qual(is) dela(s) o Sr.(a) julga mais importante para a sua atuação?
46 - Quais são os fatores, na sua opinião, que contribuem para a permanência de um
político entre os ocupantes de cargos eletivos por um longo período?
47 - Quais as principais expectativas do eleitor em geral no Maranhão em relação a um
ocupante de cargo eletivo?
48 - Quais as principais expectativas do seu eleitorado em relação aos seus mandatos?
49 - Como o Sr.(a) caracteriza a atuação dos ocupantes do cargo de deputado federal no
Maranhão?
50 - Quais são as principais características da sua atuação política?
180
51 - Quais são as prioridades dos seus mandatos eletivos?
52 - Seus filhos se dedicam a algum tipo de militância política ou desempenham alguma
liderança política?
53 - O Sr.(a) identifica em algum deles inclinação para a atividade política?
54– Em caso de resposta afirmativa, por quê?
Questões relacionadas a questão de gênero
55 – A Sra conhece os ―
movimentos sociais‖ ligados à questão de gênero ou
―
feminista‖?
56 – Qual a sua opinião sobre tais ―
movimentos sociais‖?
57 – Como a Sra caracteriza a sua relação com estes ―
movimentos sociais‖?
58 – A Sra já se sentiu discriminada devido à ―
condição de mulher‖ ou ao
―
pertencimento de gênero‖ no exercício dos mandatos?
59 – Nos seus mandatos, qual a importância atribuída aos ―
direitos da mulher‖?
60 – Quais as iniciativas, projetos ou propostas que a Sra propões ou pretende
propor que estão relacionados com esta temática?
61- A Sra tem acompanhado o processo de implementação da política de cotas
para as mulheres nas disputas eleitorais no Brasil?
62- Em caso afirmativo, qual a sua opinião a respeito desse sistema de cotas e as
disparidades existentes no âmbito político, entre homens e mulheres? Este
estimulou de alguma forma sua candidatura?
63- O partido que a Sra faz parte cumpriu nas últimas eleições com o dispositivo
que dispõe sobre o preenchimento de no mínimo 30%?
64- O partido que a Sra faz parte dispõem de alguma instância nacional de
mulheres (secretaria, grupo, comissão, núcleo)?
65- Em caso afirmativo como se da a organização e articulação das mulheres
nessa instância aqui no Maranhão? A Sra faz parte? Quais atividades
desempenhadas? Há uma mediação das direções partidárias com os movimentos
feministas ou de mulheres?
66- Durante sua campanha o fato de ser mulher foi privilegiado como elemento
fortalecedor da legitimidade política? A Sra enxerga o voto feminino como um
arsenal à disposição das mulheres?
181
67- Dentre muitos fatores explicativos para pequena presença das mulheres na
elite política, existem aqueles referentes aos ciclos de vida da mulher, que são
segmentados conforme a situação conjugal e maternidade. A Sra encontra
dificuldades no exercício das tarefas familiares e sua vinculação com a política?