Revista Semestre V15-2.indd - Tribunal Regional Eleitoral do

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Revista Semestre V15-2.indd - Tribunal Regional Eleitoral do
ISSN 1415-4064
Poder Judiciário
Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
SEMESTRE
ELEITORAL
Semest. Eleit.
Salvador
v. 15
n. 1/2
p. 1-528
jan/dez. 2011
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA BAHIA
Periodicidade: Anual
Edição e distribuição:
Secretaria Judiciária
Coordenadoria de Jurisprudência e Documentação
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COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Cássio Miranda - Juiz
Renato Reis Filho - Juiz
Salomão Viana - Juiz
Marta Maria Barreiros Gavazza de Brandão Lima - Secretária
COMISSÃO TÉCNICA
Alessandra Franco Pessoa - Coordenadora de Jurisprudência e Documentação
Dionísia Maria Andrade Leal - Chefe da Seção de Biblioteca e Legislação
Maria da Salete Saraiva - Analista Judiciário
Analúcia Guimarães - Analista Judiciário
Elizabete Sales Pereira - Técnico Judiciário
Osnir Mendes Madureira - Analista Judiciário
Oneíza Mabel Carneiro Guedes - Chefe da Seção de Jurisprudência
Nizaldo Pereira da Costa - Técnico Judiciário
José Alexsander Bahia - Analista Judiciário
Maurício Neves Rabello do Amaral - Chefe da Seção de Editoração e Memória
Ana Cláudia Carvalho - Técnico Judiciário
Adriano Mitsuo Muniz Shibasaki - Analista Judiciário
Camila Guerra de Araújo e França - Técnico Judiciário
Lia Mônica Borges Peres Freire de Carvalho - Técnico Judiciário
CAPA
Felisberto Bulcão
Semestre Eleitoral. Tribunal Regional
Eleitoral da Bahia. - v.1, n.1
(1997) . - Salvador: TRE , 1998-
.
Anual.
ISSN 1415-4064
1. Direito Eleitoral. 2. Jurisprudência.
I. Bahia. Tribunal Regional Eleitoral. II.
Título.
Os artigos publicados são da exclusiva responsabilidade dos autores e, desde que haja
autorização destes e seja indicada a fonte original, poderão ser republicados.
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA BAHIA
Presidente
SARA SILVA DE BRITO
Vice-Presidente
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA
Corregedor Regional Eleitoral
JOSEVANDO SOUZA ANDRADE
Juízes
CÁSSIO MIRANDA
JOÃO DE MELO CRUZ FILHO
MAURICIO KERTZMAN SZPORER
MÔNICA AGUIAR
Procurador Regional Eleitoral
SIDNEY PESSOA MADRUGA
SECRETARIA DO TRIBUNAL REGIONAL
ELEITORAL DA BAHIA
Diretor-Geral
ANDRÉ LUÍS MARTINS BESERRA
Secretária de Administração
MARIA ÂNGELA DOS SANTOS SILVA
Secretária de Controle Interno
TÂNIA REGINA DE OLIVEIRA MARQUES
Secretário de Gestão de Pessoas
FLÁVIO SOUZA MAGALHÃES
Secretária Judiciária
MARTA MARIA BARREIROS GAVAZZA DE BRANDÃO LIMA
Secretária de Orçamento, Finanças e Contabilidade
CARLA LUSTOSA DA SILVA
Secretária de Tecnologia da Informação
CÍNTHIA ALMEIDA DA SILVEIRA
SUMÁRIO
1 DOUTRINA
DEMOCRACIA DELIBERATIVA E REFORMA POLÍTICA NO BRASIL: TENDÊNCIAS E POSSIBILIDADES”.
Jaime Barreiros Neto .......................................................................... 9
2 JURISPRUDÊNCIA
2.1 Acórdãos ..................................................................................
2.2 Resoluções ..............................................................................
2.3 Decisões do Presidente ...........................................................
53
326
340
3 ATOS DA PROCURADORIA ..... ....................................................
363
4 LEIS E ATOS NORMATIVOS
4.1 Emendas Constitucionais.......................................................
4.3 Leis Ordinárias ......................................................................
425
426
6 BIBLIOGRAFIA ..............................................................................
7 ÍNDICE ALFABÉTICO ....................................................................
8 ÍNDICE NUMÉRICO ......................................................................
511
517
527
DEMOCRACIA DELIBERATIVA E REFORMA POLÍTICA NO BRASIL: TENDÊNCIAS E POSSIBILIDADES
Jaime Barreiros Neto*
SUMÁRIO. 1. Introdução. 2. O regime político da democracia:
surgimento e evolução. 3. A democracia e as suas principais
vertentes teóricas. 4. Democracia no Brasil: aspectos históricos.
5. A Constituição de 1988 e a opção do povo soberano pelo
modelo de democracia deliberativa no Brasil. 6. Democracia
deliberativa no Brasil: tendências e possibilidades diante das
propostas de reforma política em discussão no Congresso
Nacional. 7. Conclusões. 8. Referências.
1. INTRODUÇÃO.
Nos últimos anos, sempre que ocorre uma crise política no Brasil
um tema sempre polêmico é retomado, ensejando acalorados debates e
suscitando muito mais dúvidas do que efetivas respostas: a reforma política,
defendida por muitos e boicotada por quase todos, apresenta-se como a
“fórmula mágica” para todos os males que assolam o nosso ainda recente
regime democrático.
Terá, no entanto, a reforma política o condão de efetivamente
promover uma democratização mais efetiva no país, viabilizando uma maior
participação da sociedade na construção da cidadania? Que tipo de reforma
o Brasil precisa, a fim de alcançar um estágio mais elevado de desenvolvimento político? Terá a esperada reforma política o condão de estabelecer
um modelo democrático mais deliberativo na nossa sociedade?
Este artigo não tem a pretensão de oferecer resposta, mas sim
de ofertar reflexões acerca de tão instigantes questionamentos. Para isso,
inicialmente, será feita uma breve abordagem acerca do regime político
democrático, sua importância, evolução, tendências e características. Em
um segundo momento, por sua vez, será apresentado um panorama geral
da evolução da democracia no Brasil, a partir do qual será fundamentada a
opção do legislador constituinte de 1988 pelo modelo da democracia deliberativa, para, enfim, ser discutido o tema central do presente artigo, a relação
possível entre uma reforma política e a expansão dos espaços de deliberação
e participação política no nosso país.
* Professor Assistente da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, professor da Universidade Católica
do Salvador e da Faculdade Baiana de Direito e Analista Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia. Mestre em
Direito Público (UFBA).
DOUTRINA
2. O REGIME POLÍTICO DA DEMOCRACIA: SURGIMENTO E EVOLUÇÃO.
O ponto de partida para uma discussão acerca da relevância de
uma reforma política no Brasil contemporâneo, indiscutivelmente, passa por
um debate em torno do conceito, da evolução e das vertentes teóricas da
democracia. Afinal de contas, o que seria, efetivamente, um regime político
democrático, tendo em vista que nas mais diversas sociedades do século
XXI o discurso vislumbrado é o discurso da democracia, eleições e consultas
populares são realizadas, persistindo, entretanto, graves contradições, que
geram inúmeras dúvidas e imprecisões quanto ao referido conceito?
As origens históricas da democracia remontam ao período da antiga
Grécia1:, quando mais precisamente na cidade-estado de Atenas, por volta
do século VI a.C, uma crise política desenvolvida a partir da decadência do
poder dos Eupátridas, classe política dominante até então, desencadeou
uma série de reformas políticas, capitaneadas, primeiramente, por Sólon e,
posteriormente, por Péricles, fazendo com que o poder político, até então
concentrado, se diluísse através de uma assembléia popular denominada
“Eclésia”, não tão popular assim, é verdade, tendo em vista que da mesma
só participavam aqueles que eram possuidores da cidadania (excluídos, assim, os escravos, mulheres e estrangeiros). Na ágora, praça pública onde a
“Eclésia” se reunia, entretanto, todos eram iguais politicamente, sendo este
o grande espaço da deliberação política. Neste sentido, é válido destacar a
seguinte passagem do pensamento de Hannah Arendt, exposto em sua “A
Condição Humana”, referente à democracia grega2:
A pólis diferenciava-se do lar pelo fato de somente conhecer
“iguais”, ao passo que o lar era o centro da mais severa desigualdade. Ser livre significava ao mesmo tempo não estar
sujeito às necessidades da vida nem ao comando de outro e
também não comandar. Significava nem governar nem ser
governado. Assim, dentro do domínio do lar, a liberdade não
existia, pois o chefe do lar, seu governante, só era considerado
livre na medida em que tinha o poder de deixar o lar e ingressar no domínio político, no qual todos eram iguais. É verdade
que essa igualdade no domínio político tem muito pouco em
1 É de se destacar que alguns autores, como Robert Dahl, por exemplo, não concordam com a tese de que a democracia
teria surgida na antiga Grécia. Segundo Dahl (Sobre a Democracia, p. 20, Tradução: Beatriz Sidou. Brasília – DF: UNB,
2001), teria existido uma espécie de democracia primitiva, há milhares de anos, quando os homens ainda não haviam
se sedentarizado e, na divisão do trabalho dos pequenos grupos que se organizavam em busca da “caça, da coleta de
raízes, frutos e outras dádivas da natureza”, naturalmente um regime democrático, pautado na igualdade formal, teria
prevalecido. A sedentarização do ser humano, entretanto, segundo Dahl, teria tornado as formas de hierarquização das
sociedades mais naturais, gerando, como conseqüência, o desaparecimento de governos populares por milhares de anos,
substituídos que foram por monarquias, aristocracias e oligarquias. Assim, apenas por volta do ano 500 a. C. é que sistemas de governo populares voltaram a se desenvolver, especialmente na Europa (Grécia e Roma).
2 Hannah Arendt, A Condição Humana, 11.ed. p. 38-39, Rio de Janeiro: Forense Universitária: 2010.
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comum com o nosso conceito de igualdade: significava viver
entre pares e ter de lidar somente com eles, e pressupunha a
existência de “desiguais” que, de fato, eram sempre a maioria
da população na cidade-estado. A igualdade, portanto, longe
de estar ligada à justiça, como nos tempos modernos, era a
própria essência da liberdade: ser livre significava ser isento da
desigualdade presente no ato de governar e mover-se em uma
esfera na qual não existiam governar nem ser governado.
O modelo de democracia instituído em Atenas, contudo, era bastante
diverso do modelo concebido atualmente, baseado na representação política. Neste sentido, Noberto Bobbio, comparando a democracia dos antigos
com a democracia dos modernos, na qual a eleição torna-se pressuposto
essencial, professa3:
Para os antigos a imagem da democracia era completamente
diferente: falando de democracia eles pensavam em uma praça
ou então em uma assembléia na qual os cidadãos eram chamados a tomar eles mesmos as decisões que lhes diziam respeito.
“Democracia” significava o que a palavra designa literalmente:
poder do demos, e não, como hoje, poder dos representantes
do demos. Se depois o termo demos, entendido genericamente
como “a comunidade do cidadãos”, fosse definido dos mais
diferentes modos, ora como os mais, os muitos, a massa, os
pobres em oposição aos ricos, e portanto se democracia fosse
definida ora como poder dos mais ou dos muitos, ora como
poder do povo ou da massa ou dos pobres, não modifica em
nada o fato de que o poder do povo, dos mais, dos muitos, da
massa, ou dos pobres, não era aquele de eleger quem deveria
decidir por eles, mas de decidir eles mesmos.
Em Roma, tal qual na Grécia, o governo popular surgiu em meados do século V a. C., com o nome de república (expressão que pode ser
interpretada como “coisa pública” ou “os negócios do povo”). Inicialmente, o
governo da república era restrito aos patrícios, mas, com o tempo, a plebe,
através da luta, adquiriu o direito de participar das assembléias populares. O
sufrágio, entretanto, em momento algum alcançou as mulheres. A expansão
territorial de Roma, no entanto, terminou por inviabilizar a democracia direta,
por distanciar o povo das principais decisões políticas, como bem ressalta
Robert Dahl4:
Roma jamais adaptou adequadamente suas instituições de
governo popular ao descomunal aumento do número de
seus cidadãos e seu enorme distanciamento geográfico da
3 Norberto Bobbio, Teoria Geral da Política, p. 372.
4 Ibidem, p. 23-24.
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cidade. Por estranho que pareça do nosso ponto de vista, as
assembléias a que os cidadãos romanos estavam autorizados
a participar continuavam se reunindo, como antes, na cidade
de Roma – exatamente nesse mesmo Fórum, hoje em ruínas,
visitado pelos turistas. No entanto, para a maioria dos cidadãos
romanos que viviam no vastíssimo território da república, a
cidade era muito distante para que pudessem assistir às assembléias, pelo menos sem esforço extraordinário e altíssimos
custos. Conseqüentemente era negada a um número cada vez
maior (e mais tarde esmagador) de cidadãos a oportunidade
de participar das assembléias que se realizavam no centro do
sistema de governo romano. Era como se a cidadania norteamericana fosse conferida a pessoas em diversos estados,
conforme o país se expandia, embora a população desses
novos estados só pudesse exercer seu direito de voto nas
eleições nacionais se comparecesse a assembléias realizadas
em Washington, D. C.
É de se ressaltar que, ainda na Antigüidade, surgem registros acerca
da existência de assembléias populares na região Trondheim, na Noruega,
por volta do ano 900 d. C. Tais assembléias, chamadas de Ting, em norueguês, eram compostas por vikings livres, excluídos que eram os escravos.
Segundo Robert Dahl5:
A Ting caracteristicamente se reunia num campo aberto,
marcado por grandes pedras verticais. Na reunião da Ting,
os homens livres resolviam disputas; discutiam, aceitavam ou
rejeitavam leis; adotavam ou derrubavam uma proposta de
mudança de religião (por exemplo, aceitaram a religião cristã
em troca da antiga religião nórdica); e até elegiam ou davam
aprovação a um rei - que em geral devia jurar fidelidade às
leis aprovadas pela Ting.
Os vikings pouco ou nada sabiam e menos ainda se importavam com as práticas políticas democráticas e republicanas
de mil anos antes na Grécia e em Roma. Dentro da lógica da
igualdade que aplicavam aos homens livres, eles parecem
ter criado suas próprias assembléias. Entre os vikings livres
existia a idéia da igualdade, como demonstra a resposta dada
por alguns vikings dinamarqueses quando um mensageiro lhes
perguntou da margem do rio que subiam na França: “qual é o
nome de vosso senhor”?
- Nenhum. Somos todos iguais.
Em todo caso, temos de resistir à tentação de exagerar. A igualdade de que se gabavam os vikings aplicava-se apenas aos
homens livres, e mesmo estes variavam em riqueza e status.
Abaixo dos homens livres estavam os escravos.
5 p. 28-29 et seq.
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Com o fim do Império Romano do Ocidente, em 476 d. C., o período
histórico denominado de Idade Antiga é encerrado, dando-se início à Idade
Média, período no qual um novo sistema econômico de produção, o feudalismo, passa a prevalecer, com reflexo substancial sobre a organização política
dos povos. As invasões bárbaras fazem com que a própria noção de Estado,
definido por Reis Friede6 como “toda associação ou grupo de pessoas fixado
sobre determinado território, dotado de poder soberano”, ou, ainda, “um agrupamento humano, em território definido, politicamente organizado”, deixe, para
muitos doutrinadores, de ser reconhecida, uma vez que os ideais de soberania
e direito público terminam por ceder espaço ao poder quase que absoluto dos
senhores feudais, que impunham suas determinações de forma incontestável
aos seus vassalos, selando os destinos de vida e morte dos mesmos, e uma
clara preponderância do direito privado sobre o direito público. Sobre a organização política do período medieval, sintetiza Sahid Maluf7:
O Estado medieval, que se ergueu sobre os escombros das
invasões bárbaras, recebeu a influência preponderante dos
costumes germânicos. As tradições romanas pouco ou nada
influíram. Os reis bárbaros, francos, godos, lombardos e vândalos, uma vez completada a dominação dos vastos territórios que
integravam a órbita de hegemonia do extinto império cesarista,
passaram a distribuir cargos, vantagens e privilégios aos seus
chefes guerreiros, resultando daí a fragmentação do poder. E
como fossem imensos os territórios e impossível a manutenção
da sua unidade sob um comando central único, criaram uma
hierarquia imperial de condes, marqueses, barões e duques, os
quais dominavam determinadas zonas territoriais, como concessionários do poder jurisdicional do Rei. Em compensação,
tais concessionários se comprometiam a defender o território,
prestar ajuda militar, pagar tributos e manter o princípio da
fidelidade de todos ao Rei.
O senhor feudal era o proprietário exclusivo das terras, sendo
todos os habitantes seus vassalos. Exercia o senhor feudal
as atribuições de chefe de Estado, decretava e arrecadava
tributos, administrava a justiça, expedias regulamentos e promovia a guerra. Era uma espécie de rei nos seus domínios.
Seu reinado, porém, repousava sobre um conceito de direito
privado, não de direito público. Desse fato resultaram anomalias tais como a jurisdição privada, a cunhagem privada, a
guerra privada etc.
A posse das terras era vitalícia e hereditária, operando-se a
sucessão causa mortis pelo direito de primogenitura: a senhoria
feudal passava automaticamente ao mais velho herdeiro varão
do feudatário falecido.
6 Reis Friede, Curso de Teoria Geral do Estado (Teoria Constitucional e Relações Internacionais), 1. ed., p. 5, Rio de
Janeiro - RJ: Forense Universitária, 2000.
7 Sahid Maluf, Teoria Geral do Estado, 26. ed., p. 109, São Paulo - SP: Saraiva, 2003.
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Com o início do período denominado de “Baixa Idade Média”, em
meados do século XI, quando cessam as invasões bárbaras, o mundo começa
a assistir, gradativamente, à decadência do sistema feudal e ao surgimento,
ainda tímido, de um novo sistema econômico de produção, o capitalismo.
Através de uma renovação das práticas agrícolas, com a descoberta de novos
instrumentos de trabalho, do renascimento comercial, decorrente da expansão das áreas produtivas, que terminou por gerar um excedente agrícola,
propiciador de circulação de riquezas, e do renascimento urbano, decorrente
do próprio desenvolvimento comercial, ressurge a atividade econômica na
Europa, fator de enfraquecimento do sistema vigente e de fortalecimento da
nova ordem que começa a florescer. Neste contexto, a democracia ressurge,
em cidades do norte da Itália, por volta do ano 1100, inicialmente restrita
aos membros das famílias da classe superior e, posteriormente, alargada à
participação da chamada “classe média”, formada por novos ricos, pequenos
artesãos, soldados, pequenos mercadores e banqueiros.
No século XII, mais precisamente em 1188, segundo Fávila Ribeiro8, surge, na Espanha, a concepção de democracia representativa, com a
convocação das cortes de Castela e Leão. Até então, embora já se tivesse
conhecido práticas representativas em Roma e na própria Grécia, não havia
se verificado, de fato, a existência de instituições representativas independentes, uma vez que todas as formas de representação até então conhecidas
haviam se submetido, em última instância, aos agentes do poder central, que
detinham o poder de invalidar os atos dos representantes.
As cortes de Castela e Leão, entre os séculos XII e XVI, quando houve
o triunfo definitivo do despotismo, eram periodicamente convocadas, com efetivo
poder representativo para deliberar, em especial, sobre matéria tributária. Era
também da competência das cortes a autorização para a declaração da guerra
e para a celebração da paz. De acordo com Fávila Ribeiro9:
As cortes reunidas em 1257 e em 1291 autorizaram fosse celebrada a paz pelo rei Fernando IV. E em 1391 decidiram que não
poderia a guerra ser declarada sem a sua prévia deliberação,
a menos que ocorresse invasão territorial, prescrevendo ainda
que nenhum tributo poderia ser cobrado sem que houvesse a
concordância da representação do país.
No século seguinte, mais precisamente em 1215, na Inglaterra, vem
ao lume a Magna Carta, convenção firmada entre o monarca João Sem Terra
e os barões feudais na qual, de forma pioneira, é suscitada uma das noções
basilares da democracia moderna, aquela segundo a qual o rei, naturalmente,
deve vincular-se às leis que edita. Além disso, a Magna Carta reconhece a
existência de direitos ao Clero e à Nobreza independentes do consentimento
8 Fávila Ribeiro, Direito Eleitoral, 4. ed. p. 25-26, Rio de Janeiro - RJ: Forense, 1996.
9 Loc. cit.
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do monarca, bem como finca a noção da existência de um parlamento com
poderes de fiscalização sobre os atos praticados pelo rei. Pode-se afirmar
que a Magna Carta inglesa plantou as sementes da democracia moderna,
uma vez que “acaba proporcionando o desenvolvimento progressivo do ideal
democrático, segundo o qual o poder não emanava mais de um ente divino
ou de seus representantes na Terra, mas dos cidadãos livres e dos ocupantes de cargos eletivos”10, através da consagração de princípios basilares
como: 1) respeito, pelo rei, aos direitos adquiridos pelos barões; 2) a prévia
audiência do Grande Conselho11 (composto por barões e tenentes-chefes),
para imposição de tributos; 3) o direito dos barões de se insurgirem contra o
rei quando houvesse o desrespeito às leis do país; 4) o princípio do devido
processo legal; 5) o princípio da proibição de denegação da justiça, pala
cláusula 40 (“não venderemos, nem recusaremos, nem dilataremos a quem
quer que seja o direito e a justiça”); 6) eleição, pelos barões, de 25 representantes para acompanhar as ações do rei, com vistas ao cumprimento do
acordo estabelecido na Carta.
No século XIV, por sua vez, uma grande crise econômica, decorrente
das guerras e das mudanças climáticas que abateram a Europa, afetando
a produção de alimentos, aliada à peste bubônica, epidemia que devastou
a população do velho continente, e ao fortalecimento de uma nova classe
econômica, a burguesia, terminam por fazer surgir a necessidade de uma
maior organização e centralização política, propiciando o advento dos Estados
Nacionais Modernos. O feudalismo, em crise, cede espaço ao surgimento das
monarquias nacionais, com território delimitado, costumes, línguas e religiões
particularizadas, nas quais se vislumbrava a idéia de que o rei, absoluto em
seu poder, seria um catalizador das aspirações nacionais, figura sagrada,
imbuída de autoridade divina. Diante desta nova realidade social e econômica, surge, portanto, o Estado nacional, simbolizado pelo poder absoluto dos
monarcas, inaugurando uma nova era na história da humanidade: a Idade
Moderna, período considerado como o de transição definitiva entre os dois
grandes modos de produção da economia, o feudalismo e o capitalismo.
Durante a Idade Moderna, que tem início na segunda metade do
século XV e marco final na Revolução Francesa de 1789, o mundo assiste
a um gradativo processo de fortalecimento do poder político de uma classe
10 Orides Mezzaroba, Introdução ao Direito Partidário Brasileiro, 2.ed. p. 23, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
11 Criado por Guilherme I, O Conquistador, no século XI, o “Grande Conselho” era convocado periodicamente pelo rei e
formado por barões, bispos e abades, tendo como objetivo alimentar o rei de opiniões sobre temas e problemas governamentais. Não existia, entretanto, relação de representação entre os seus membros e a comunidade, uma vez que não havia
qualquer autoridade própria dos membros do Conselho, circunscritos à função de aconselhamento e interlocução do rei
no que se refere a temas relevantes. Com a subida ao trono do Conde de Leicester, Simon de Montfort, após a derrubada
do Rei Henrique III, na década de 60 do século XIII, representantes dos cavalheiros e dos cidadãos são convocados, em
1265, para compor o Grande Conselho, fazendo com que o parlamento inglês passasse a assumir um caráter legislativo,
uma vez que os representantes tinham poder para deliberar sobre normas de caráter obrigatório e vinculativo. Conforme
constatação de Orides Mezzaroba (p. 24 et seq.): “não há como negar a importância do Parlamento da época de Montfort
como um marco no caminho dos governos representativos que viriam mais tarde. O funcionamento parlamentar do reino
já se encontrava, nesse período, associado a uma forma de organização representativa das atribuições parlamentares”.
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DOUTRINA
social burguesa já detentora do poder econômico, que termina por rechaçar
a preponderância do poder real, impondo uma nova ordem, pautada nas
premissas da liberdade e da força normativa de uma Constituição escrita,
fenômeno historicamente batizado de constitucionalismo, notabilizado pela
publicação da obra Qu’est-ce que le Tiers État? (Que é o Terceiro Estado),
traduzida no Brasil com o título de “A Constituinte Burguesa”, escrita pelo
abade francês Emmanuel Joseph Sieyès. Nesta obra, o abade Sieyès estabelece o conceito de poder constituinte como poder intangível e determinante
da organização e fundamentação de um Estado, sendo tal poder titularizado
na nação, definida como “um corpo de associados que vivem sob uma lei
comum e representados pela mesma legislatura”12. Para Sieyès13:
A nação existe antes de tudo, ela é a origem de tudo. Sua
vontade é sempre legal, é a própria lei. Antes dela e acima dela
só existe o direito natural. Se quisermos ter uma idéia exata da
série das leis positivas que só podem emanar de sua vontade,
vemos, em primeira linha, as leis constitucionais que se dividem
em duas partes: umas regulam a organização e as funções
do corpo legislativo; as outras determinam a organização e as
funções dos diferentes corpos ativos. Essas leis são chamadas
de fundamentais, não no sentido de que possam tornar-se
independentes da vontade nacional, mas porque os corpos
que existem e agem por elas não podem tocá-las. Em cada
parte, a Constituição não é obra do poder constituído, mas do
poder constituinte. Nenhuma espécie de poder delegado pode
mudar nada nas condições de sua delegação. É neste sentido
que as leis constitucionais são fundamentais.
O regime político do absolutismo, estabelecido com o apoio da própria classe burguesa, desejosa de uma centralização política que propiciasse
a extinção do modelo econômico de produção feudal, começa, assim, a entrar
em colapso, uma vez que a burguesia percebe que o rei, outrora necessário
à afirmação do novo modo de produção econômico, o capitalismo, já não o é
mais, tendo se transformado, ao contrário, em um entrave ao próprio desenvolvimento das atividades burguesas, que necessitava de liberdade.
É de se ressaltar, entretanto, que o ocaso do absolutismo monárquico começa a se afirmar mesmo antes do constitucionalismo, fenômeno
observado no século XVIII, o famoso “século das luzes”. No século XVII, na
Inglaterra, com as chamadas “Cartas Inglesas” e com a Primeira Revolução
Industrial, deflagrada a partir da criação da máquina a vapor, por James
Watt, o modelo do absolutismo monárquico começa a ruir, dando-se início à
12 Emmanuel Joseph Sieyès, A Constituinte Burguesa, Qu’est-ce que lê Tiers État? Tradução: Norma Azevedo. 4. ed.
p. 04, Rio de Janeiro-RJ: Lumen Juris, 2001.
13 Ibid., p. 48-49.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
DOUTRINA
consolidação do regime político da democracia moderna14. O primeiro dos
documentos históricos posteriormente batizados de “Cartas Inglesas” que, em
seu conjunto, sepultaram o absolutismo monárquico na Inglaterra foi o Petition
of Rights, de 1629, documento dirigido ao Rei Carlos I pelo parlamento, no
qual se exigia o cumprimento de preceitos estabelecidos na Magna Carta
de 1215, e que se encontravam constantemente violados. Sobre o Petition
of Rights, leciona Orides Mezzaroba15:
No ano de 1628, pressionado pelo Parlamento, que exigia
respeito da Coroa pelas leis inglesas, Carlos I foi compelido
a sancionar o Petition of Rights, documento que buscava
reafirmar os princípios da Carta Magna e que restringia as
prerrogativas do rei. O novo pacto não impediu que Carlos I
passasse logo a governar por doze anos sem o Parlamento.
Em 1640, sob forte pressão política, Carlos I foi obrigado a
convocar novo Parlamento. Contrariando as expectativas do
rei, a maioria dos seus membros acabou demonstrando que na
prática não eram apenas reformistas, mas, acima de tudo, revolucionários. Um dos primeiros atos do Parlamento foi acusar
o rei e seu fiel servidor, o Conde de Strafford, de alta traição.
Ao mencionado Conde recaiu a maior responsabilidade pelo
fechamento do Parlamento, nos anos anteriores. Mas, como
o Conde não poderia sofrer os efeitos de um impeachment, o
Parlamento acabou aprovando e obrigando o sancionamento
real do Bill of Attainder. Por este último documento, Strafford
perdia o direito de ser julgado por uma Corte de Justiça, o que
importava legalizar a sua execução. Passados nove anos,
Carlos I teve o mesmo destino de seu auxiliar. Com isso, pela
primeira vez na história, o Parlamento Inglês coloca-se acima
do rei, passando, inclusive, a governar sem ele.
A morte de Carlos I, em 1649, supracitada por Mezzaroba, e a
conseqüente instalação da chamada “República de Cromwell” é, há de se
ressaltar, outro momento marcante da decadência do absolutismo monárquico
na Inglaterra do século XVII.
Tudo começou em 1641, quando, na Irlanda Católica, eclode uma
revolta de caráter religioso, instaurando-se uma guerra civil! Carlos I comanda o exército de repressão à citada revolta, contra a vontade do parlamento
14 Como bem ressalta Dalmo de Abreu Dallari (Elementos de Teoria Geral do Estado, 25 ed. p. 147, São Paulo - SP:
Saraiva, 2005), “É através de 3 grandes movimentos político-sociais que se transpõe do plano teórico para o prático os
princípios que iriam conduzir ao Estado Democrático: o primeiro desses movimentos foi o que muitos denominam de
Revolução Inglesa, fortemente influenciada por Locke e que teve sua expressão mais significativa no Bill of Rights, de
1689; o segundo foi a Revolução Americana, cujos princípios foram expressos na Declaração de Independência das
treze colônias americanas, em 1776; e o terceiro foi a Revolução Francesa, que teve sobre os demais a virtude de dar
universalidade aos seus princípios, os quais foram expressos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de
1789, sendo evidente nesta a influência direta de Rousseau”.
15 Orides Mezzaroba, Introdução ao Direito Partidário Brasileiro, 2 ed. p. 24-25, Rio de Janeiro – RJ: Lumen Júris, 2004.
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inglês, que é então invadido pelo rei. Os principais líderes parlamentares
são, assim, presos pelo exército real, o que desencadeia uma guerra civil
entre os cavaleiros, defensores do rei, e os cabeças redondas, defensores
do parlamento.
O exército parlamentar, liderado por Oliver Cromwell, vence as
tropas do rei na Batalha de Naseby, em 1645, obrigando Carlos I a fugir para
a Escócia, onde, ao negar-se a reconhecer a Igreja Presbiteriana, é vendido
pelo Parlamento escocês ao parlamento inglês, sendo executado em 1649.
É iniciada, então, a República de Cromwell, período no qual é suprimida a
Câmara dos Lordes, o que propicia a eliminação das estruturas feudais que
atravancavam o desenvolvimento do capitalismo na Inglaterra.
Em 1653, com o fortalecimento de Cromwell, o parlamento é dissolvido, dando-se início a uma ditadura pessoal que só acabou com a morte do
líder revolucionário, em 1658. Em 1660, finalmente, a monarquia é restaurada,
tendo assumido o trono o rei Carlos II, da dinastia Stuart, descendente de
Carlos I, restabelecendo-se o absolutismo monárquico e a supremacia da
Igreja Anglicana16, tornada oficial por Henrique VIII, no século XVI, quando
houve o fortalecimento do poder da monarquia e o rompimento da coroa
inglesa com o papa.
Em 1679, entretanto, o poder real é, mais uma vez, enfraquecido,
com a edição da Lei de Habeas Corpus17 (Habeas Corpus Act), garantia
fundamental da liberdade e instrumento de fortalecimento do parlamento,
16 Segundo lição de Alceu Luiz Pazzinato e Maria Helana Valente Senise (História Moderna e Contemporânea, 7 ed.
p. 67, São Paulo - SP: Ática, 1994), “durante o governo de Henrique VIII (1509-1547), a burguesia fazia pressão pelo
aumento do poder do Parlamento, o que lhe daria oportunidade de legislar sobre matéria financeira, inclusive sobre as
taxas cobradas pela Igreja e sobre a liberação da prática da usura. Henrique VIII, necessitando aumentar as riquezas do
Estado, aproveitou-se dessa situação para confiscar os bens da Igreja. Isso gerou desentendimentos com o papa, agravados quando o monarca solicitou a anulação do seu casamento com Catarina de Aragão. A anulação foi pedida porque, não
tendo sucessores masculinos com a princesa espanhola, Henrique VIII temia que, em caso de sua morte, o trono inglês
passasse para o controle da Espanha. Esse temor era compartilhado por toda a nação, que apoiou o rei, diante da negativa do papa em conceder-lhe o divórcio. O rei então rompeu com o papado e promoveu uma reforma na Igreja inglesa,
obrigando seus membros a reconhecê-lo como chefe supremo e a jurar-lhe fidelidade e obediência. Assim, Henrique VIII
obteve do clero inglês o divórcio de Catarina de Aragão e pôde desposar Ana Bolena, dama da Corte. O papa Clemente
VII tentou intimidar o rei, excomungando-o. Porém, Henrique VIII não cedeu à pressão papal e em 1534 decretou o Ato
da Supremacia, que consolidou a separação da Inglaterra e o papa. Com esse decreto Henrique VIII transformou-se no
chefe da Igreja de seu país, o que lhe deu condições de reprimir todos os opositores da Reforma Anglicana. A doutrina
anglicana apresentou poucas modificações em relação à doutrina católica, a não ser o desencorajamento do culto de
santos e relíquias e a popularização da leitura da Bíblia, vertida para o idioma nacional. No aspecto prático, a Reforma
Anglicana resolveu duas questões básicas para a monarquia inglesa: a concretização do divórcio do rei, que lhe deu
uma solução para a herança do trono; e a apropriação dos bens da Igreja, os quais, vendidos para a nobreza e para a
burguesia, deram o necessário suporte financeiro para a Coroa. O anglicanismo se consolidou no reinado de Elizabeth
I, que renovou o direito de soberania real sobre a Igreja, além de fixar os fundamentos da doutrina e do culto anglicano
na Lei dos 39 Artigos, de 1563”.
17 Sobre o significado do Habeas Corpus, leciona Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, 18 ed. p. 109, São
Paulo – SP: Atlas, 2005): “Habeas Corpus eram as palavras iniciais da fórmula do mandado que o tribunal concedia
e era endereçado a quantos tivessem em seu poder ou guarda o corpo do detido, da seguinte maneira: ‘Tomai o corpo
desse detido e vinde submeter ao Tribunal o homem e o caso’. Também se utiliza, genericamente, a terminologia writ,
para se referir ao Habeas Corpus. O termo writ é mais amplo e significa, em linguagem jurídica, mandado ou ordem a
ser cumprida. Portanto, o Habeas Corpus é uma garantia individual ao direito de locomoção, consubstanciada em uma
ordem dada pelo juiz ou tribunal ao coator, fazendo cessar a ameaça ou coação à liberdade de locomoção em sentido
amplo – o direito do indivíduo de ir, vir e ficar”.
18
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preponderantemente protestante, contra as arbitrariedades praticadas pelos
últimos soberanos católicos da Inglaterra, da dinastia Stuart, em especial o
Rei Jaime II, último dos monarcas absolutistas ingleses.
Foi em 1685, com a morte de Carlos II, que o católico Jaime II assumiu o trono inglês, tentando restabelecer seu credo como oficial, loteando
cargos públicos entre partidários do catolicismo. Diante da política adotada,
o Parlamento inglês, de maioria protestante, decide depor o rei, oferecendo a
Coroa inglesa a Guilherme de Orange, chefe do governo da Holanda e casado
com Maria Stuart, filha protestante do primeiro casamento do rei Jaime II.
Com a chegada de Guilherme de Orange e seus exércitos, em 1688,
o rei Jaime II foge para a França, notabilizando aquele momento que historicamente foi batizado de Revolução Gloriosa, quando, sem derramamento
de sangue, Guilherme de Orange assume o trono inglês, após assinar o Bill
of Rights, documento através do qual o poder real é limitado, pondo-se fim
ao absolutismo monárquico na Inglaterra. Através do Bill of Rights, o Parlamento impõe à monarquia limitações de poder tais como a obrigatoriedade
de submissão à aprovação das câmaras de qualquer previsão de aumento
de tributos, a garantia da liberdade de imprensa, da liberdade individual e da
propriedade privada e a confirmação do anglicanismo como religião oficial (o
que ressaltou a intolerância com o catolicismo).
Realizada, então, a transição do absolutismo monárquico para a
monarquia constitucional, na Inglaterra, chegamos, finalmente, ao século
XVIII, quando se completa a transição do feudalismo para o capitalismo, do
absolutismo para a democracia moderna. É no século XVIII que, através do
iluminismo, do constitucionalismo, do fortalecimento da Revolução Industrial
da Revolução Americana e da Revolução Francesa de 1789, é posto o ponto
final na Idade Moderna, iniciando-se o domínio do liberalismo, palco para o
retorno da democracia como regime político dominante, pautado em três
marcos fundamentais: a supremacia da vontade popular; a preservação da
liberdade e; a igualdade de direitos.
Dois importantíssimos acontecimentos, já ressaltados, contribuíram
decisivamente para o sepultamento do absolutismo monárquico e para a consagração da democracia moderna, no século XVIII: a Revolução Americana
de 1776 e a Revolução Francesa de 1789.
É em 1776, nos Estados Unidos da América (que ainda não eram
tão unidos, uma vez que a federação americana só se formalizou em 1787,
com a Constituição dos Estados Unidos da América), com a Declaração de
Direitos do Povo da Virgínia, que é fundada a concepção de direitos constitucionais fundamentais, embora ainda sem a pretensão da universalização, que
viria a ser observada na França, alguns poucos anos depois. Ingo Wolfgang
Sarlet18, acerca do tema, assim dispõe:
18 Ingo Wolfgang Sarlet, A eficácia dos direitos fundamentais, 2. ed., p. 47, Porto Alegre: Livraria do Advogado
Editora, 2001.
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19
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As declarações americanas incorporaram virtualmente os
direitos e liberdades já reconhecidos pelas suas antecessoras
inglesas do século XVII, direitos estes que também tinham sido
reconhecidos aos súditos das colônias americanas, com a nota
distintiva de que, a despeito da virtual identidade de conteúdo,
guardaram as características da universalidade e supremacia
dos direitos naturais, sendo-lhes reconhecida eficácia inclusive
em relação à representação popular, vinculando, assim, todos
os poderes públicos. Com a nota distintiva da supremacia
normativa e a posterior garantia de sua justiciabilidade por
intermédio da Suprema Corte e do controle judicial da constitucionalidade, pela primeira vez os direitos naturais do homem
foram acolhidos e positivados como direitos fundamentais
constitucionais, ainda que este status constitucional da fundamentalidade em sentido formal tenha sido definitivamente
consagrado somente a partir da incorporação de uma declaração de direitos à Constituição em 1791, mais exatamente, a
partir do momento em que foi afirmada na prática da Suprema
Corte a sua supremacia normativa.
A característica principal das declarações da Virgínia, de 1776, e
da França, de 1789, é a afirmação da liberdade humana perante o poder
soberano do Estado. O absolutismo monárquico, supressor da liberdade individual, é superado, dando vazão a um paradigma de sociedade legitimada
sob os preceitos liberais de reconhecimento da liberdade religiosa, de opinião
e, principalmente, liberdade econômica, necessária a um momento histórico
de consolidação do capitalismo de massa, promovido pela revolução industrial, como sistema econômico dominante. Posta estava, assim, a chamada
“primeira geração de direitos”19, os direitos de liberdade individual perante o
Estado, que, a partir desse momento, passa a ter a conotação de “um mal
necessário” para a garantia da liberdade individual, devendo, entretanto,
se caracterizar como Estado mínimo, mero garantidor da segurança e da
liberdade, nos moldes vislumbrados por John Locke. Celso Lafer20, acerca
do assunto, traça as seguintes considerações:
Num primeiro momento, na interação entre governantes e governados que antecede a Revolução Americana e a Revolução Francesa, os
19 É de se ressaltar que a classificação dos direitos fundamentais em gerações de direitos se refere, tão somente, a um
critério cronológico, de positivação dos mesmos nas Constituições. Não existe uma hierarquia entre os chamados “direitos humanos de primeira, segunda e terceira gerações”, e sim uma relação de interdependência entre os mesmos. Acerca
de tal classificação, Jorge Miranda (Teoria do Estado e da Constituição, p. 24, Rio de Janeiro - RJ: Forense, 2002 apud
Ricardo Cunha Chimenti e outros, Direito Constitucional, 1. ed., p. 46, São Paulo - SP: Saraiva, 2004) tece os seguintes
comentários: “... Conquanto essa maneira de ver possa ajudar a apreender os diferentes momentos históricos de aparecimento dos direitos, o termo geração, geração de direitos, afigura-se enganador, por sugerir uma sucessão de categorias
de direitos, umas substituindo-se às outras – quando, pelo contrário, o que se verifica em Estado social de direito é um
enriquecimento crescente em resposta às novas exigências das pessoas e das sociedades”.
20 Celso Lafer, A Reconstrução dos Direitos Humanos (Um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt), p. 126, São
Paulo - SP: Companhia das Letras, 1988.
20
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direitos do homem surgem e se afirmam como direitos do indivíduo face
ao poder do soberano no Estado absolutista. Representavam, na doutrina
liberal, através do reconhecimento da liberdade religiosa e da opinião dos
indivíduos, a emancipação do poder político das tradicionais peias do poder
religioso e através da liberdade de iniciativa econômica a emancipação do
poder econômico dos indivíduos do jugo e do arbítrio do poder político.
Os direitos humanos da Declaração de Virgínia e da Declaração
Francesa de 1789 são, neste sentido, direitos humanos de primeira geração,
que se baseiam numa clara demarcação entre Estado e não-Estado, fundamentada no contratualismo de inspiração individualista. São vistos como
direitos inerentes ao indivíduo e tidos como direitos naturais, uma vez que
precedem o contrato social. Por isso são direitos individuais: (I) quanto ao
modo de exercício – é individualmente que se afirma, por exemplo, a liberdade
de opinião; (II) quanto ao sujeito passivo do direito – pois o titular do direito
individual pode afirmá-lo em relação a todos os demais indivíduos, já que
estes direitos têm como limite o reconhecimento do direito do outro [...]; e (III)
quanto ao titular do direito, que é o homem na sua individualidade.
A partir das revoluções liberais do século XVIII, portanto, a democracia, definitivamente, se consolida como o regime político dominante no
mundo, produto da ideologia liberal que se impõe. O passar dos anos, as
revoluções sociais ocorridas na Europa e o advento de novas ideologias
contrárias ao liberalismo, no entanto, fazem surgir, desde então, concepções
diversas acerca do que seria, efetivamente, um regime democrático. No
próximo tópico, serão expostas, sinteticamente, as principais vertentes teóricas que embasam o discurso da democracia na contemporaneidade, para
então, posteriormente, destacarmos a abordagem central deste trabalho: a
análise crítica do modelo de democracia e das tendências e possibilidades
da reforma política que se avizinha.
3. A DEMOCRACIA E AS SUAS PRINCIPAIS VERTENTES TEÓRICAS.
Como já destacado no tópico anterior, a idéia de democracia passou por muitas transformações ao longo da história, sendo bastante distinta
a concepção que modernamente temos do regime democrático em relação
às premissas presentes na pólis ateniense.
O que muitas vezes não é observado, entretanto, é que, mesmo
nos dias de hoje, o conceito de democracia ainda é muito polêmico, suscitando diversas interpretações decorrentes, principalmente, da influência das
ideologias no cotidiano político.
Diariamente, nos mais diversos ambientes sociais em que convivemos, bem como nas notícias que lemos nas revistas, jornais e internet, e
ouvimos no rádio e na TV, nos deparamos com o tema da política. Ao mesmo
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tempo, entretanto, em que nos envolvemos constantemente com discussões
relativas à referida temática, muitas vezes observamos pessoas que afirmam
que não gostam de política, não procuram conhecer o tema e, até mesmo, se
aborrecem com tal assunto. Enfaticamente, tais indivíduos afirmam as suas
aversões a tal espécie de assunto e, orgulhosamente, sentenciam: “não me
envolvo com política! Sou apolítico”.
Uma inexorável realidade, entretanto, teima em desafiar a credibilidade do discurso daqueles que se auto-intitulam “apolíticos”, fazendo com
que, de forma implacável, a certeza de tal discurso reste abalada: o homem
é, essencialmente, um animal político; a política, e o poder, se constituem
em pressupostos inabaláveis da sociedade humana.
A afirmação de que a sociedade humana é, fatalmente, uma sociedade política, fazendo com que todos os seres humanos, desde a mais
tenra idade, se constituam em animais políticos, deriva da própria lógica da
condição humana, eminentemente paradoxal. Afinal de contas, o ser humano,
como ser condicionado, se posta, diariamente, ante o desafio de conviver
com os seus semelhantes, tendo em vista a lógica de alteridade em que
está mergulhado desde os primórdios da sua existência, ao tempo em que é
impelido, também por sua natureza, a querer dominar e destruir o outro, em
consonância com a célebre constatação atribuída a Thomas Hobbes segundo
a qual “o homem é o lobo do homem”. Neste sentido, relevante se mostra a
lição de J.J. Calmon de Passos21, segundo a qual:
Há duas assertivas que, por força e de sua constante repetição,
se tornaram lugares comuns: o homem é um animal social e
o homem é o lobo do homem. Aparentemente contraditórias,
elas na verdade se somam para expressar a condição humana.
Somos criaturas incompletas, incapazes de realização pessoal sem a aceitação de nossa semelhante, paradoxalmente
vocacionados para sermos um com os outros (interação, solidariedade etc.) permanecendo, entretanto, um em meio aos
outros, sentindo-nos inéditos e irrepetíveis. Este eu exigente
compele-nos a ser um contra os outros e impede-nos de ser
um para os outros de modo pleno e constante, disso resultando carências e conflitos, competições e confrontos. A síntese
deste processo dialético é a vida de cada qual de nós e a dos
grupamentos humanos, oscilando entre o mais e o menos
desses extremos. Em resumo, a realidade é a do necessário
viver convivendo, cooperando e conflitando.
Em “A Condição Humana”, Hannah Arendt constrói a concepção de
vida activa, a fim de designar três atividades consideradas fundamentais à
21 J.J. Calmon de Passos, Direito, Poder, Justiça e Processo: julgando os que nos julgam. p. 41, Rio de Janeiro: Forense,
2000.
22
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compreensão do ser humano como ser condicionado, às quais a pensadora
alemão denomina trabalho, obra e ação22. Assim, segundo Arendt23:
O trabalho é a atividade que corresponde ao processo biológico
do corpo humano, cujos crescimento espontâneo, metabolismo e resultante declínio estão ligados às necessidades vitais
produzidas e fornecidas ao processo vital pelo trabalho. A
Condição humana do trabalho é a própria vida.
O conceito de trabalho estabelecido por Hannah Arendt, assim,
pode ser entendido como o conjunto de imperativos biológicos do homem,
independentes da sua racionalidade, que primariamente definem o ser humano como um ser condicionado. A segunda condicionante à qual o homem
está submetido na sua existência, por sua vez, é denominada, na doutrina
de Hannah Arendt, pela nomenclatura “obra”. Assim então24:
A obra é a atividade correspondente à não-naturalidade [unnaturalness] da existência humana, que não está engastada
no sempre-recorrente [ever-recurrent] ciclo vital da espécie e
cuja mortalidade não é compensada por este último. A obra
proporciona um mundo “artificial” de coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural. Dentro de suas fronteiras
á abrigada cada vida individual, embora esse mundo se destine
a sobreviver e transcender todas elas. A condição humana da
obra é a mundanidade [worldliness].
A capacidade inerente ao homem de transformar o ambiente em
que vive, se adaptando ao mesmo e impondo sua marca criativa, assim, pode
ser relacionada à concepção de “obra”, firmada por Hannah Arendt. Foi principalmente a partir da obra que o homem se impôs como animal dominante
na Terra, na escala progressiva da seleção natural.
Não apenas, entretanto, o “trabalho” e a “obra” podem ser observados como imperativos da condição humana, na doutrina de Hannah Arendt.
Também a idéia de “ação”, vislumbrada como a lógica da alteridade, a lógica
do outro, em que está mergulhado o homem, pode ser apontada como uma
atividade humana fundamental. Assim, mais uma vez na lição de Arendt25:
22 Vale destacar que até a publicação da 11ª edição brasileira da obra “A Condição Humana”, no ano de 2010, as três
referidas atividades humanas fundamentais, o trabalho, a obra e a ação, eram traduzidos, para o português como labor,
trabalho e ação, respectivamente. Tal mudança conceitual se deu, segundo os tradutores da obra, a partir de um estudo
aprofundado feito a partir da análise das edições alemã, espanhola e francesa, o qual possibilitou uma compreensão mais
precisa dos conceitos de labor e work, estabelecidos na obra original da autora, escrita em inglês.
23 Hannah Arendt, A Condição Humana, 11. ed. revista, trad. Roberto Raposo, p. 08, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010
24 Op. Cit., mesma página.
25 Idem, p. 08-10.
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23
DOUTRINA
A ação, única atividade que ocorre diretamente entre os homens, sem a mediação das coisas ou da matéria, corresponde
à condição humana da pluralidade, ao fato de que os homens,
e não o Homem, vivem na Terra e habitam o mundo. Embora
todos os aspectos da condição humana tenham alguma relação
com a política, essa pluralidade é especificamente a condição
– não apenas a condition sine qua non, mas a condition per
quam – de toda vida política. Assim, a língua dos romanos –
talvez o povo mais político que conhecemos – empregava como
sinônimas as expressões “viver” e “estar entre os homens”
(inter homines esse), ou “morrer” e “deixar de estar entre os
homens” (inter homines esse desinere). Mas, em sua forma
mais elementar, a condição humana da ação está explícita até
em Gênesis (“macho e fêmea, Ele os criou”), se entendemos
que esse relato da criação do homem é distinto, em princípio,
do outro segundo o qual Deus originalmente criou o Homem
(adam) – “ele”, e não “eles”, de modo que a multidão dos seres
humanos vem a ser o resultado da multiplicação. A ação seria
um luxo desnecessário, uma caprichosa interferência nas leis
gerais do comportamento, se os homens fossem repetições
interminavelmente reproduzíveis do mesmo modelo, cuja natureza ou essência fosse a mesma para todos e tão previsível
quanto a natureza ou essência de qualquer outra coisa. A
pluralidade é a condição da ação humana porque somos todos
iguais, isto é, humanos, de um modo tal que ninguém jamais
é igual a qualquer outro que viveu, vive ou viverá.
A partir da análise crítica da concepção de vida activa de Hannah
Arendt, firmada nas três atividades humanas fundamentais descritas, é possível
concluir pela inexorável lógica paradoxal da condição humana, uma vez que,
como já demonstrado, em virtude da condicionante “obra” o homem é um ser
naturalmente compelido a agir de forma criativa, impondo sua marca ao mundo,
transformando e dominando o ambiente em que vive, ímpeto este que gera,
como conseqüência, o desejo humano de querer dominar os outros homens
(dando razão à concepção hobbesiana, já citada, segundo a qual o homem
seria “o lobo” do próprio homem), ao tempo em que o ser humano também
se mostra condicionado a conviver, mergulhado na lógica da “ação”, descrita
pela referida cientista política. Ao necessitar do seu semelhante e, ao mesmo
tempo, tentar dominá-lo e/ou destruí-lo, o homem demonstra, assim, toda a
contradição inerente à sua natureza animal, fato que impõe, como ponto de
equilíbrio, a irrefutável presença de uma força abstrata que pode ser considerada um pressuposto de toda e qualquer sociedade: o poder político.
É o poder político, na definição de Paulo Bonavides26, “aquela
energia básica que anima a existência de uma comunidade humana num
26 Paulo Bonavides, Ciência Política, 10. ed. p. 106, São Paulo: Malheiros, 2001.
24
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determinado território, conservando-a unida, coesa e solidária”. Conforme
lição de Fernando Loureiro Bastos27, “o fundamento para a existência e para o
exercício do poder político pode ser encontrado na necessidade de encontrar
mecanismos destinados à resolução dos conflitos de interesses resultantes
do acesso aos bens finitos”. Podemos assim concluir que o poder político
constitui-se em pressuposto fundamental das sociedades humanas, ponto de
equilíbrio entre duas necessidades inexoráveis e paradoxais: a necessidade
de convivência e a necessidade de dominação.
Materializado em normas de comportamento, o poder político é
exercido, primariamente, através da força bruta, a qual, entretanto, não é
bastante para a sua sobrevivência: o alimento do poder é a legitimidade, ou
seja, o apoio, o reconhecimento das pessoas em relação à ordem instituída,
sendo inviável, a qualquer forma de poder, sobreviver pautada simplesmente
na referida força.
A base maior da sobrevivência do poder é, assim, a força da palavra,
do convencimento, a força da ideologia. Quando alguém está submetido ao
poder da força bruta, a tendência natural deste alguém é reagir, na primeira
oportunidade, ameaçando a continuidade do poder instituído. Quando este
mesmo indivíduo, por outro lado, é dominado pelo poder da palavra, muitas
vezes não percebe a dominação, agindo conforme os interesses do dominante, sem contestação.
Atuam, assim, as ideologias, como espécies de “cimentos sociais”,
conjuntos de crenças e valores unificadores do corpo social, capazes de
garantir a ordem e a estabilidade. A ideologia é a mais pura manifestação do
poder da palavra, decisivo para o exercício da política.
É de se ressaltar que, historicamente, vários já foram os sentidos
dados à palavra ideologia: a) um sistema de crenças políticas; b) um conjunto
de idéias voltadas para a ação; c) as idéias de classe dominante; d) a visão
do mundo de uma classe ou grupo social específico; e) as idéias políticas
que reúnem ou articulam interesses de classe ou sociais; f) as idéias que
propagam falsa consciência sobre os explorados ou oprimidos; g) as idéias
que situam o indivíduo num contexto social e geram um sentimento coletivo
de inclusão; h) um conjunto de idéias sancionadas oficialmente usado para
legitimar um sistema ou regime político; i) uma ampla doutrina política que
reivindica o monopólio da verdade; j) um conjunto abstrato e extremamente
sistemático de idéias políticas. A mais conhecida definição de ideologia, entretanto, é atribuída a Karl Marx, que entendia a ideologia como um instrumento
de controle da produção mental, associado à ilusão e à mistificação, ou seja,
a falsa consciência do trabalhador.
Antonio Gramsci, italiano marxista que viveu o período do fascismo
de Mussolini, nas décadas de 20 e 30 do século XX, inspirado em Marx, costu27 Fernando Loureiro Bastos, Ciência Política: guia de estudo. p. 23, Lisboa: Associação Acadêmica da Faculdade
Direito de Lisboa, 2007.
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mava identificar a concepção de ideologia à produção de falsas necessidades
transformadoras dos seres humanos em consumidores vorazes, fato gerador
de uma “imbecilização coletiva”. Vladimir Lênin, grande líder da Revolução
Russa, por sua vez, contrariando Marx, não identificava a ideologia como
algo negativo, mas sim como o conjunto de idéias fundamentais de uma
determinada classe social.
É o conceito de ideologia, assim, bastante controverso. Andrew
Heywood, importante cientista político britânico contemporâneo, entretanto,
leciona que qualquer ideologia tem, como principais atributos, o oferecimento
de uma explicação para a ordem vigente; o desenvolvimento de uma tese
acerca do futuro desejável; e um conjunto de explicações sobre como a mudança política pode ser realizada. É a ideologia, na definição de Heywood28,
um “conjunto de idéias mais ou menos coerente que fornece a base para a
ação política organizada, a qual pode ter a intenção de preservar, modificar
ou derrubar o sistema de poder vigente”.
A partir das diversas ideologias e interesses desenvolvidos, principalmente, após a queda do Antigo Regime, várias concepções acerca da
teoria democrática foram desenvolvidas, das quais destacamos, com maior
ênfase, o Elitismo Competitivo, a Democracia Participativa e a Democracia
Deliberativa.
Primeiramente, o modelo do Elitismo Competitivo pode ser apontado
como o mais difundido nos primórdios da democracia moderna, tendo como
fundamento maior a idéia de que o processo democrático se estabelece a
partir da competição entre grupos de interesse, sendo o processo eleitoral o
instrumento a partir do qual o povo, periodicamente, elege os seus líderes.
Neste modelo, portanto, o papel do eleitor se restringe à escolha dos seus
representantes, fato que, por conseguinte, termina por gerar um distanciamento entre o exercício da soberania popular e o teórico titular do poder
político, ou seja, o povo.
Curiosamente, o advento das revoluções burguesas, apontado como
fator decisivo para o surgimento das democracias modernas, também serviu
de palco para grandes desconfianças e oposições ao regime democrático,
apontado por muitos como ameaçador da estabilidade política. A irracionalidade das massas e o risco do deferimento de uma ampla participação política
prevaleceram, como discurso, nos primórdios da Era Contemporânea, fundamentando uma perspectiva ideológica de contenção do poder popular.
O desenvolvimento da representação política, contudo, terminou por
fazer com que a democracia viesse a ser consagrada como modelo político
mais adequado, eliminando, aos poucos, as contradições entre o liberalismo e o regime democrático. O Elitismo Político, entretanto, neste contexto,
Andrew Heywood, Ideologias políticas: do liberalismo ao fascismo. 1. ed. p. 25,
São Paulo: Ática, 2010.
28
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desenvolveu-se como a principal teoria relacionada ao exercício do poder
político, fundamentado, como já observado, em uma grande desconfiança
acerca da possibilidade de alargamento do poder de sufrágio, bem como
em uma defesa da idéia de que a democracia se resumiria à disputa entre
grupos de interesse. Neste sentido, é válido citar a seguinte lição de Cristina
Buarque de Hollanda29:
As diferenças acentuadas entre as versões originais dos
modelos liberal e democrático constituíram as bases de um
encontro tenso. Até meados do século XIX, democracia e
liberalismo eram noções políticas conflitantes e até mesmo
antagônicas. Pouco a pouco, mediados pelo princípio representativo, acomodaram-se na fórmula da democracia liberal, que
hoje organiza boa parte da vida política no mundo, sobretudo
no Ocidente.
Essa nova arquitetura política foi objeto de crítica de Gaetano
Mosca (1858-1941), Vilfredo Pareto (1848-1923) e Robert Michels (1876-1936), autores que constituem o cânone do que se
convencionou denominar teoria das elites. Apesar das nuances
e até importantes distâncias nas visões políticas destes três
pensadores, todos convergem na descrição da democracia
liberal como regime utópico cuja rotina institucional não guarda
vínculos com sua motivação ideal. Nessa perspectiva, as idéias
de soberania popular, igualdade política e sufrágio universal
compõem um universo abstrato de discurso, sem sustentação
real. Na percepção elitista, todo exercício da política, alheio às
suas justificativas formais, está fadado à formação de pequenos
grupos que subordinam a maior parte da população.
(...)
Embora não constituam uma escola bem definida, com um
corpo rígido e coerente de doutrinas políticas, Mosca, Pareto
e Michels compartilhavam o diagnóstico de que toda forma
política produz distinção entre minorias dirigentes e maioria
dirigida. Nessa perspectiva, a retórica democrática, destituída
de vínculos com a realidade social, serviria apenas à legitimação do poder das minorias que mobilizavam um discurso
universalista com vistas a garantir seu próprio benefício.
Um dos grandes expoentes do modelo elitista de democracia, ao
lado de Mosca, Pareto e Michels, foi Joseph Schumpeter, economista austríaco que viveu na primeira metade do século XX (1883-1950) e, em 1942,
escreveu a obra “Capitalismo, socialismo e democracia”. Contrariando a idéia
de que a busca do consenso nos espaços de deliberação democrática seria
viável, Schumpeter defende a concepção segundo a qual a sociedade vive
de interesses antagônicos e, muitas vezes, inconciliáveis. A idéia de um bem
29 Cristina Buarque de Hollanda, Teoria das Elites, p. 09-10, Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
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comum a todos, assim, seria uma falácia, uma vez que a realidade social
seria competitiva, sendo a política, tão somente, um jogo a ser disputado por
grupos e facções em busca do poder30.
A crise do liberalismo, desencadeada a partir de meados do Século
XIX, alcançando o seu apogeu com a Crise de 1929 e a II Guerra Mundial,
contudo, marcou o início da derrocada do modelo puramente representativo de democracia, identificado com o Elitismo Competitivo. Neste sentido,
desenvolve-se um novo modelo de democracia participativa, enfatizando a
necessidade de uma participação direta do povo na vida política do Estado
como forma de ruptura com as estruturas então vigentes de poder, as quais
sacramentavam um distanciamento do povo em relação às instâncias decisórias da sociedade, com privilégios para pequenos grupos dominantes que
impunham, através de políticas de exclusão, os seus interesses em face dos
anseios da coletividade. Como destaca Frank Cunningham31:
O “problema da democracia” que os participacionistas explicitamente delimitam para tratar é que os procedimentos democráticos facilitam e propiciam encobrimento para regras opressivas
baseadas em classe, gênero, raça ou outros domínios de
exclusão contínua e subordinação. As razões que eles vêem
para isso não são que representantes eleitos podem ser comprados e que a maioria das pessoas tem pouco controle sobre
o comportamento dos partidos políticos e agendas legislativas.
Nem é exatamente que os arranjos liberais-democráticos
deixam estruturas opressivas intactas nos reinos privados.
Ainda mais delibitador é que as pessoas, cuja experiência de
autodeterminação coletiva é confinada principalmente ao voto,
não adquirem nem o conhecimento, nem as habilidades, nem
a esperança de tomar conta de suas vidas, aquiescendo assim
com sua própria opressão. A participação direta, inicialmente
em arenas pequenas e localizadas, é requerida para romper
o círculo resultante da passividade política e da continuidade
da subordinação.
Em muitos países, o modelo de democracia participativa é festejado,
nos ordenamentos jurídicos, como o adequado à valorização do exercício
30 Ainda segundo Cristina Buarque de Hollanda (op. cit. P. 40-41), “Schumpter opõe ao irrealismo da democracia clássica uma teoria que supõe mais próxima da realidade e que deriva o poder político da luta pelo voto. Nessa concepção,
não há distinção substantiva entre os ambientes e os sujeitos da política e do comércio. Um eleitor e um consumidor
dispõem de informação superficial e mediada a respeito dos seus objetos de escolha. As possibilidades de voto ou consumo tendem a definir o desejo dos eleitores ou compradores, ao invés de serem definidas por eles. Inverte-se, assim, a
relação de anterioridade do modelo democrático tradicional: as elites induzem (e não expressam) as escolhas do povo.
(...) A democracia compreendida por Schumpeter é, portanto, uma inversão do entendimento usual do conceito. No lugar
da ficção democrática que supõe representantes diretamente vinculados ao povo, o autor identifica um cenário real constituído por elites políticas, com diferentes estratégias de captura do voto, em disputa pelo poder e referidas aos interesses
dos eleitores apenas na medida do seu próprio interesse”.
31 Frank Cunningham, Teorias da Democracia: uma introdução crítica. Tradução: Delmar José Volpato Dutra. p. 160,
Porto Alegre: Artmed, 2009.
28
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da soberania popular, por permitir uma maior aproximação entre o povo e
o poder, distanciando-se do modelo elitista prevalente nos primórdios da
chamada “sociedade contemporânea”, estabelecida, principalmente, após
a Revolução Francesa. As limitações deste modelo, no entanto, vêm sendo
cada vez mais apontadas e denunciadas por importantes cientistas políticos, para os quais o mero estabelecimento de novos meios de exercício do
sufrágio, a exemplo da promoção de consultas populares como plebiscitos
e referendos, não seria suficiente para a realização de uma ruptura com o
modelo do Elitismo Competitivo outrora dominante, uma vez que, também
neste modelo, prevaleceria a disputa entre grupos e idéias pré-concebidas,
pautada no princípio da maioria.
Como alternativa, assim, ao modelo representativo e ao próprio
modelo participativo, advém o chamado “modelo deliberativo de democracia”,
o qual, aparentemente, se apresenta como o mais adequado a ser seguido
na construção de um processo de reforma política no Brasil consonante
com os princípios fundamentais da República estabelecidos na Constituição
Federal de 1988.
Neste modelo, pressupõe-se como requisito para a definição das
prioridades e decisões políticas a ampla discussão pública, fundamentada
sempre na possibilidade de convencimento mútuo entre os participantes do
processo político, sem que tal processo, portanto, se caracterize como uma
mera disputa entre visões antagônicas em um jogo de vitoriosos e derrotados. Na democracia deliberativa, muito mais do que a competição entre
grupos de interesse e opiniões ou preferências individuais, o que prevalece
é a possibilidade de uma ampla discussão, por meio da qual o consenso
é construído coletivamente, sem que haja a mera imposição da vontade
dominante. A grande preocupação dos defensores do modelo deliberativo
de democracia reside na defesa da legitimidade do processo democrático,
construída a partir da viabilização de um amplo debate público acerca das
mais diversas questões de interesse da sociedade, debate este para o qual
todos devem estar preparados para buscar convencer e também para ser
convencidos, dissociando-se, assim, de uma postura fechada a mudanças
de opiniões pré-concebidas. Como bem destacam Denise Vitale e Rúrion
Soares Melo32:
(...) na proposta deliberativa a participação deve poder ser entendida como um processo de formação, ou ainda, de transformação de preferências. Através de um processo de discussão
pública com uma pluralidade de outros diferentes cidadãos,
as pessoas podem obter novas informações, aprender a partir
32 Denise Vitale; Rúrion Soares Melo. Política Deliberativa e o Modelo Procedimental de Democracia. In: NOBRE,
Marcos; TERRA, Ricardo (org.). Direito e Democracia: um guia de leitura de Habermas. p. 227. São Paulo: Malheiros,
2008.
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de outras experiências diferentes de problemas coletivos, ou
mesmo concluir que suas opções iniciais estavam baseadas
em pré-concepções, ou mesmo ignorância.
Um dos principais expoentes do modelo deliberativo de democracia
é o filósofo alemão contemporâneo Jürgen Habermas, para quem o discurso
e a deliberação construídos a partir de uma dimensão procedimental mediada
pelo direito seria a base de construção da democracia.
Para construir a sua tese, Habermas, inicialmente, desenvolve a
concepção de ação comunicativa, tipo de ação social destinada à promoção
do entendimento entre os integrantes da sociedade dissociada de impedimentos e pautada na liberdade e na discussão racional. Como bem leciona
Marcos Nobre33:
Na ação comunicativa, o objetivo não é o êxito, não é o cálculo
dos melhores meios para alcançar fins previamente determinados; a ação comunicativa tem por objetivo o entendimento
entre os participantes da discussão. Da perspectiva da ação
comunicativa, é essencial que se faça possível ouvir o maior
número possível de vozes, de opiniões e de questionamentos,
sem restrições.
Difere a ação comunicativa da ação instrumental, espécie de ação
social presente nas sociedades modernas voltada, principalmente, à neutralização de eventuais conflitos sociais, de forma a orientar o êxito da produção,
distribuição e circulação de bens e mercadorias e para a qual não são relevantes singularidades de opiniões, crenças ou percepções de mundo34.
Na visão de Habermas acerca da democracia, é de fundamental
importância o estabelecimento de procedimentos confiáveis a partir dos quais
a ação comunicativa possa ser exercida. Neste sentido, o Direito se apresenta como instrumento crucial para a garantia dessa procedimentalização
33 Marcos Nobre, Introdução, In: NOBRE, Marcos; TERRA, Ricardo. Direito e Democracia: um guia de leitura de
Habermas. p. 21. São Paulo: Malheiros, 2008.
34 Melhor esclarecendo a diferença entre ação instrumental e ação comunicativa, Marcos Nobre (Idem, p. 20-21)
leciona que “de um lado, Habermas sustenta que a sociedade moderna se reproduz materialmente porque neutraliza os
potenciais de conflito e de dissenso sob a forma de uma ação orientadora para o êxito, para o sucesso de produzir mercadorias, de comprar e vender mercadorias segundo regras, de administrar a aplicação das leis segundo critérios impessoais, de assegurar a infra-estrutura necessária para a circulação de bens e pessoas e muitas outras coisas mais. Na lógica
da reprodução material da sociedade, o mundo e os atores sociais são tomados não como sujeitos dotados de opiniões,
visões de mundo e crenças, mas como mero objetos, como meios com vistas à consecução de um fim determinado. Essa
lógica neutraliza, portanto, os potenciais de conflito e de dissenso, já que está orientada unicamente para a consecução
de determinados fins de reprodução material previamente estabelecidos. O tipo de ação social característico desta lógica
é, para Habermas, a ação instrumental. De outro lado, entretanto, a estabilização fornecida pela lógica instrumental de
algumas ações sociais não elimina os potenciais de conflito e de dissenso próprios das sociedades modernas. Seu papel
é unicamente o de limitar o campo em que eles ocorrem, garantindo que não coloque em risco a reprodução material da
sociedade. De modo que há ainda uma outra maneira de lidar com o conflito e o dissenso próprios das sociedades modernas que não por meio da neutralização instrumental. Essa outra maneira de lidar com o conflito e o dissenso é a discussão
racional, livre de impedimentos, na qual as próprias regras de discussão têm que ser estabelecidas pelos participantes. É
o tipo de ação que Habermas chamada de comunicativa”.
30
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do processo deliberativo. É o que destaca Denise Vitale, em artigo sobre o
tema35, para quem, na visão de Habermas:
(...) discurso, e democracia são duas faces da mesma moeda,
mediados pelo direito. Uma vez institucionalizado juridicamente,
o princípio do discurso converte-se em princípio da democracia.
Ambos, porém, fundamentam-se a partir da mesma fonte, já
que todo poder político deve ser extraído do poder comunicativo
dos cidadãos. Nesse contexto, o conceito de institucionalização
refere-se a um comportamento esperado do ponto de vista normativo e à institucionalização de procedimentos que garantam
a equidade dos possíveis compromissos.
Se, pelo princípio do discurso, as normas que pretendem
validade precisam encontrar o assentimento de todos os potencialmente atingidos, o princípio da democracia assegura a
formação política racional da opinião e da vontade, através da
institucionalização de um sistema de direitos que garante a cada
um igual participação num processo de normatização jurídica.
A importância decisiva do direito reside no seu potencial de
institucionalização jurídica de procedimentos que garantam os
princípios formadores da teoria discursiva. Nesse sentido, falase em uma teoria procedimental através da qual a legitimidade
das normas jurídicas mede-se pela racionalidade do processo
democrático da legislação política.
Outro importante filósofo cujas idéias podem ser apontadas como de
suma importância para a compreensão do modelo deliberativo de democracia
é o americano John Rawls (1921-2002), considerado um dos mais importantes
estudiosos contemporâneos da questão da legitimidade das escolhas realizadas pelos grupos sociais. Em sua mais festejada obra, “Teoria da Justiça”,
Rawls desenvolve a concepção de “justiça como equidade”, a partir da qual
defende que o objeto primário da justiça se constitui na estrutura básica da
sociedade, sendo, mais exatamente, a maneira pela qual as instituições
sociais mais importantes, ou seja, a constituição política e os principais
acordos sociais e econômicos, distribuem direitos e deveres fundamentais
e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social.
Parte Rawls de uma distinção entre o conceito de justiça como um equilíbrio
adequado entre reivindicações concorrentes e uma concepção de justiça
como um conjunto de princípios correlacionados com a identificação das
causas principais que determinam esse equilíbrio, caracterizando a justiça
como sendo apenas uma parte de um ideal social, para então afirmar que o
conceito de justiça se define pela atuação de seus princípios na atribuição de
direitos e deveres e na definição da divisão apropriada de vantagens sociais,
sendo a sua concepção uma interpretação dessa atuação36.
35 Denise Vitale, Jürgen Habermas, modernidade e democracia deliberativa. In: Caderno CRH, Salvador, v. 19, n. 48,
p. 551-561, Set./Dez. 2006.
36 Idem, p. 11.
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31
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Objetiva John Rawls, partindo da idéia principal de justiça como
eqüidade, apresentar uma concepção de justiça que generalize e leve a um
plano superior de abstração a conhecida teoria do contrato social, elegendo
como base de seu pensamento a contestação à idéia de que o contrato
original seria um contrato que introduz uma sociedade particular ou que estabelece uma forma particular de governo, mas sim elevando a idéia de que
os princípios da justiça, para a estrutura básica da sociedade, são o objeto
do consenso original.
Para o filósofo americano, no estado prévio de natureza, que ele
denomina posição original, os princípios da justiça são escolhidos sob um
véu da ignorância, diante do qual não é dada a ninguém a possibilidade de
compreender a sua real posição e interesses na sociedade. Assim, “uma
vez que todos estão numa situação semelhante e ninguém pode designar
princípios para favorecer sua condição particular, os princípios da justiça são
o resultado de um consenso ou ajuste eqüitativo”37. Para Rawls38:
o objetivo da justiça como equidade como uma concepção
política é prático, e não metafísico ou epistemológico. Ou seja,
apresenta-se não como uma concepção de justiça que é verdadeira, mas como uma concepção que pode servir de base
a uma acordo político informado e voluntário entre cidadãos
vistos como pessoas livres e iguais.
Esclarecendo melhor a concepção de Rawls acerca da justiça como
equidade, Michael J. Sandel assim leciona39:
Rawls raciocina da seguinte forma: suponhamos que estamos
reunidos, como agora, para definir os princípios que governarão
nossa vida coletiva – para elaborar um contrato social. Que
princípios selecionaríamos? Provavelmente teríamos dificuldades para chegar a um consenso. Pessoas diferentes têm
princípios diferentes, que refletem seus diversos interesses,
crenças morais e religiosas e posições sociais. Algumas pessoas são ricas, outras são pobres; algumas têm poder e bons
relacionamentos; outras, nem tanto. Algumas fazem parte de
minorias raciais, étnicas ou religiosas; outras não. Temos de
chegar a um consenso. Mas até mesmo o consenso refletiria o
maior poder de barganha de alguns sobre o dos demais. Não
há motivos para acreditar que um contrato social elaborado
dessa maneira seja um acordo justo.
Analisemos agora uma experiência mental: suponhamos que,
ao nos reunir para definir os princípios, não saibamos a qual
categoria pertencemos na sociedade. Imaginemo-nos cobertos
37 Loc. cit., p. 13.
38 John Rawls, Justiça como equidade: uma concepção política, não metafísica. In: Lua Nova, nº. 25, p. 33, São Paulo: 1992.
39 Michael J. Sandel. Justiça: o que é fazer a coisa certa. 4. ed. p. 177-178. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
32
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por um “véu de ignorância” que temporariamente nos impeça
de saber quem realmente somos. Não sabemos a que classe
social ou gênero pertencemos e desconhecemos nossa raça
ou etnia, nossas opiniões políticas ou crenças religiosas.
Tampouco conhecemos nossas vantagens ou desvantagens
– se somos saudáveis ou frágeis, se temos alto grau de escolaridade ou se abandonamos a escola, se nascemos em uma
família estruturada ou em uma família desestruturada. Se não
possuíssemos essas informações, poderíamos realmente fazer
uma escolha a partir de uma posição original de equidade. Já
que ninguém estaria em uma posição superior de barganha,
os princípios escolhidos seriam justos.
Como se observa, a teoria de justiça desenvolvida por John Rawls
pode ser entendida como de grande relevância para o estabelecimento de
parâmetros para a construção do consenso em um modelo deliberativo de
democracia, sendo a idéia do “véu da ignorância” bastante adequada para
o firmamento de um procedimento seguro para o desenvolvimento da ação
comunicativa habermasiana.
No próximo tópico, será apresentada uma breve síntese histórica
da evolução da democracia no Brasil, a fim de que, no tópico seguinte, uma
abordagem geral acerca das propostas de reforma política em discussão no
Congresso Nacional seja realizada, tendo como base a análise do modelo
de democracia que, a partir da leitura do texto da Constituição Federal de
1988, apresenta-se como o mais adequado ao desenho institucional da
nossa sociedade.
4. DEMOCRACIA NO BRASIL: ASPECTOS HISTÓRICOS.
É o Brasil, conforme enunciado previsto logo no artigo 1º da Constituição Federal de 1988, um Estado Democrático de Direito, fundamentado nos
princípios fundamentais da soberania, da cidadania, da dignidade da pessoa
humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e do pluralismo
político. Muito tem se questionado, no entanto, se essa condição brasileira
de Estado Democrático de Direito tem sido plenamente realizada, ou, em
realidade, deturpada por interesses individuais ou de grupos econômicos, em
prejuízo das finalidades precípuas ao regime político da democracia. Afinal,
será que realmente existe no Brasil participação efetiva do cidadão na vida
política do Estado, entendimento esclarecido acerca das questões sociais e
institucionais, igualdade de voto e transparência relacionada às receitas e
gastos? Será que os parâmetros necessários à realização de uma democra-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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cia deliberativa, consistente, no entendimento de Joshua Cohen40, em “uma
associação cujas relações são governadas pela deliberação pública de seus
membros” vêm sendo observados de fato em nosso país?
Os constantes abalos sofridos pelas instituições democráticas
brasileiras, decorrentes da corrupção em larga escala, do abuso do poder
econômico por parte de grupos de pressão, partidos políticos e titulares de
mandatos eletivos, do desinteresse e do distanciamento do povo em relação à política, das dificuldades para o exercício da governabilidade, dentre
outros fatores, nos últimos tempos, têm suscitado, cada vez mais, propostas
de alterações, muitas vezes radicais, no nosso sistema político, sempre
nos teóricos intuitos de aproximar mais o povo das instâncias deliberativas
do poder, promover uma maior legitimidade dos governantes, combater a
imoralidade administrativa e o mau uso dos recursos públicos e efetivar
os objetivos constitucionais de construção de uma sociedade livre, justa e
solidária, que almeje efetivamente a redução das desigualdades sociais e
regionais, erradique a pobreza e a marginalização, busque o pleno emprego
e o desenvolvimento digno do homem.
Diante do descrédito crescente relacionado à legitimidade e à eficiência das instituições políticas brasileiras, o discurso em defesa de uma ampla
e higienizadora reforma política tem se tornado um grande clichê, apontado
como a tábua de salvação para todos os males que afligem a democracia
brasileira, como se fosse possível o milagre da imediata transformação de
usos e costumes muitas vezes enraizados culturalmente há décadas, ou
mesmo séculos, por meio apenas de simples alterações legislativas.
Patrocinando uma breve análise histórica da estrutura política e social
brasileira, é possível observar-se que pertence ao Brasil uma das mais ricas
histórias políticas do mundo, apesar da sua relativamente curta existência como
Estado. Desde a sua independência, em 1822, o Brasil já vivenciou quase
setenta anos de monarquia, cento e dezessete anos de república, golpes de
estado, mobilizações populares, a universalização do sufrágio, no passado
restrito a uma minoria privilegiada entre outros fatos relevantes.
Esta instabilidade política, entretanto, que acompanha o país nestes
seus pouco mais de cento e oitenta anos como Estado independente, gerou
um certo descrédito popular quanto a viabilidade de implementação de uma
verdadeira democracia, pautada nos parâmetros da liberdade, da igualdade
e da justiça social.
Desde a época da colonização, convivemos no Brasil com uma
estrutura política pautada em uma grande desigualdade social e cultural.
40 Joshua Cohen, Deliberação e legitimidade democrática, In: Ângela Cristina Salgueiro Marques (organização e tradução), A deliberação pública e suas dimensões sociais, políticas e comunicativas [textos fundamentais], p. 85, Belo Horizonte: Autentica Editora, 2009. Ainda segundo o referido autor (idem, p. 90), “a noção de uma democracia deliberativa
está enraizada no ideal intuitivo de uma associação democrática na qual a justificação dos termos e das condições procede
através do argumento público e da troca de razões entre cidadãos iguais. Cidadãos em tal ordem compartilham um compromisso com a resolução de problemas ligados à escolha coletiva por meio da troca de razões em público e entendem suas
instituições básicas como legítimas na medida em que estabelecem a estrutura para a deliberação pública livre”.
34
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Fenômenos como o patrimonialismo41, o coronelismo, o populismo, o clientelismo, o cartorialismo, o empreguismo e o nepotismo são verificados desde à
época da colonização, através da confusão entre o público e o privado, o uso
do poder da propaganda, as fraudes eleitorais e a corrupção, fortalecendo o
poder das oligarquias políticas .
O modo patriarcal pelo qual o Estado era governado durante a época
da colonização, o fato de o Estado brasileiro se confundir, durante séculos,
com as figuras dos donatários de terras, dos senhores de engenho e, posteriormente, dos fazendeiros do café, fez com que se tornasse extremamente
dificultosa a diferenciação entre a esfera pública e a esfera privada no país.
As relações familiares, assim, tradicionalmente, se sobrepuseram às relações
profissionais e públicas42.
O patrimonialismo, gerador do poder das elites políticas e ainda
tão presente nos dias atuais, transmudou-se, com o passar do tempo, em
outras práticas igualmente nocivas ao Estado democrático de Direito. Durante
a República Velha, por exemplo, época do domínio político dos chamados
“coronéis”, foram práticas constantemente verificadas o empreguismo, o nepotismo e o clientelismo43. A influência de todos estes fenômenos dirigiu, sem
41 Como bem ressalta Raymundo Faoro, em sua clássica obra “Os Donos do Poder”: “de D. João I a Getúlio Vargas,
numa viagem de seis séculos, uma estrutura político-social resistiu a todas as transformações fundamentais, aos desafios
mais profundos, à travessia do oceano largo. O capitalismo politicamente orientado – o capitalismo político, ou o précapitalismo – centro de aventura, da conquista e da colonização moldou a realidade estatal, sobrevivendo, e incorporando
na sobrevivência, o capitalismo moderno, de índole industrial, racional na técnica e funda na liberdade do indivíduo –
liberdade de negociar, de contratar, de gerir a propriedade sob a garantia das instituições. A comunidade política conduz,
comanda, supervisiona os negócios privados seus, na origem, como negócios públicos depois, em linhas que se demarcam gradualmente. O súdito, a sociedade, se compreendem no âmbito de um aparelhamento a explorar, a manipular, a
tosquiar nos casos extremos. Dessa realidade se projeta, em florescimento natural, a forma de poder, institucionalizada
num tipo de domínio: o patrimonialismo, cuja legitimidade acenta no tradicionalismo – assim é porque sempre foi”. As
origens do patrimonialismo remontam ao loteamento do território nacional, promovido pela metrópole portuguesa no
século XVI. Após o fracasso das capitanias hereditárias, nas quais os donatários não gozavam de nenhum direito sobre
a terra, sendo-lhes permitido, apenas, a cobrança de tributos, Portugal resolveu criar, na antiga capitania da Bahia de
Todos os Santos, uma cidade na qual seria instalada a sede do governo-geral do Brasil. Assim, em 1549, foi fundada a
cidade de Salvador, primeira capital do Brasil, tendo sido retomadas pela metrópole as capitanias hereditárias e distribuídas as terras em sesmarias entre os moradores que comprovassem condições financeiras de dar produtividade às terras,
aumentando os rendimentos das Coroa. A partir da livre distribuição de terras promovida por meio das sesmarias, uma
elite oligárquica passou a se constituir, reflexo fiel de uma estrutura social pautada no monopólio da riqueza, do prestígio
e do domínio por parte dos senhores rurais.
42 Neste sentido, vale destacar as clássicas lições de Sérgio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil. 26. ed. p. 145-146,
São Paulo – SP: 1995): “No Brasil, onde imperou, desde tempos remotos, o tipo primitivo da família patriarcal, o desenvolvimento da urbanização – que não resulta unicamente do crescimento das cidades, mas também do crescimento dos
meios de comunicação, atraindo vastas áreas rurais para a esfera de influência das cidades – ia acarretar um desequilíbrio
social, cujos efeitos permanecem vivos ainda hoje. Não era fácil aos detentores das posições públicas de responsabilidade, formados por tal ambiente, compreenderem a distinção fundamental entre os domínios do privado e do público. Assim, eles se caracterizam justamente pelo que separa o funcionário “patrimonial” do puro burocrata, conforme definição
de Max Weber. Para o funcionário “patrimonial”, a própria gestão política apresenta-se como assunto de seu interesse
particular; as funções, os empregos e os benefícios que deles aufere relacionam-se a direitos pessoais do funcionário
e não a interesses objetivos, como sucede no verdadeiro Estado burocrático, em que prevalecem a especialização das
funções e o esforço para se assegurarem garantias jurídicas aos cidadãos. A escolha dos homens que irão exercer funções
públicas faz-se de acordo com a confiança pessoal que mereçam os candidatos, e muito menos de acordo com as suas
capacidades próprias”.
43 Sobre prática do clientelismo, leciona José Antonio Giusti Tavares [A mediação dos partidos na democracia representativa brasileira. In: TAVARES, José Antonio Giusti (org.). O sistema partidário na consolidação da democracia
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dúvida alguma, o processo eleitoral brasileiro em toda a sua história. Fraudes,
compra de votos e clientelismo marcaram a história das nossas eleições,
caracterizadas, na maior parte da história brasileira, como grandes mentiras
protagonizadas por oligarquias que se mantiveram, e ainda se mantém, de
alguma forma, no poder.
Durante o império, por exemplo, era permitido votar por procuração.
A cédula era assinada pelo eleitor e o alistamento eleitoral era feito no dia
da eleição.
Na República Velha pouca coisa mudou. Apenas uma pequena
minoria da população participava das eleições. Tal fato decorre da proibição
de voto aos analfabetos (cerca de 50% dos habitantes brasileiros à época) e
às mulheres, bem como à facultatividade do voto. As fraudes eleitorais ainda
eram muito freqüentes, transformando as eleições em verdadeiras farsas44.
Seguindo-se à República Velha, um período histórico pouco democrático, onde houve um afastamento ainda maior do povo do centro das
decisões políticas se sucedeu. A Era Vargas, iniciada em 1930 e consagrada como o Estado Novo, em 1937, é marcada pelo autoritarismo e pelo
populismo, caracterizado essencialmente “pela ausência ou inocuidade das
mediações institucionais, entre as quais o sistema representativo e os partidos, capazes de prover transitividade e responsabilidade recíproca entre as
massas e o líder”45.
No populismo, o líder carismático exerce um papel de conciliador de
interesses entre as classes sociais, que passam a construir, de certa forma, uma
aliança. O apoio popular das massas ao líder populista, a quem são imputadas
brasileira. p. 366-367, Brasília – DF: Instituto Teotônio Vilela, 2003. (Coleção Brasil 2010, v. 03)]: “o clientelismo é
um conjunto de mecanismos adscritivos de distribuição e alocação de benefícios derivados da ocupação do Estado, em
qualquer de seus níveis ou esferas, que se faz mediante um padrão de relações individualizadas de tutelagem e dependência, através dos quais um detentor de autoridade pública ou de poder político extrai, ao mesmo tempo fragmentária
e sincreticamente, de diferentes classes, associações ou grupos de sociedades, pessoas cujos interesses promove individualizadamente e que, beneficiadas pelo favor político, constituem contingentes atomizados e disponíveis de indivíduos
dependentes, quanto à realização de seus interesses econômicos ou à preservação de seu status social, daquele que lhes
exerce o patronato, compondo assim uma mesmo clientela”.
44 Como bem observa Jairo Nicolau (História do Voto no Brasil, 1. ed. p. 34, Rio de Janeiro – RJ: Jorge Zahar, 2002),
“(...) o processo eleitoral era absolutamente viciado pelas fraudes em larga escala e, salvo poucas exceções, as eleições
não eram competitivas. As eleições, mais do que expressar as preferências dos eleitores, serviram para legitimar o
controle do governo pelas elites políticas estaduais. A fraude era generalizada, ocorrendo em todas as fases do processo
eleitoral (alistamento de eleitores, votação, apuração de votos e reconhecimento dos eleitos). Os principais instrumentos
de falsificação eleitoral foram o bico de pena e a degola. A eleição a bico de pena consistia na adulteração das atas feitas
pela Mesa Eleitoral (que também apurava os votos). Nas palavras de Vitor Nunes Leal, “inventavam-se nomes, eram
ressuscitados os mortos e os ausentes compareciam; na feitura das atas, a pena todo-poderosa dos mesários realizava
milagres portentosos”. A Câmara dos Deputados tinha uma comissão responsável por organizar a lista dos deputados
presumivelmente legítimos para a legislatura seguinte (Comissão Verificadora dos Poderes). O controle da comissão
pelos deputados governistas permitia que, frequentemente, parlamentares eleitos pela oposição não tivessem seus diplomas reconhecidos. Tal mecanismo era conhecido no meio político como degola e foi largamente utilizado na Primeira
República”.
45 José Antônio Giusti Tavares, op. cit. p. 365.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
DOUTRINA
características messiânicas, quando não divinas, é a principal característica
dessa prática que, por tantos anos, dominou a política brasileira46.
A redemocratização ocorrida com a queda de Vargas, em 1945, ao
tempo em que restituiu a Justiça Eleitoral, extinta no Estado Novo, e propiciou
a ampliação do sufrágio e a volta das eleições, não impediu, entretanto, que
a presença nociva do populismo não se fizesse e o golpismo se fortalecesse.
Assim foi que, em 1964, a nossa democracia restou abalada por mais um golpe
de Estado, através do qual o povo brasileiro, mais uma vez, foi marginalizado
do exercício dos seus direitos políticos fundamentais. As eleições para os
principais cargos passaram a ser indiretas e o pluripartidarismo foi substituído
por um bipartidarismo submisso aos interesses do grupo dominante.
Nos anos 80, entretanto, a semente da democracia, plantada novamente durante o período de repressão, passa a gerar frutos, e o período
ditatorial, de tristes lembranças, se encerra. A democracia ressurge, e as
eleições se intensificam. O povo volta a eleger o presidente da república e a
antiga urna de lona é substituída pela urna eletrônica (já nos anos 90). Um
grande avanço!
Todo este avanço dos últimos anos, entretanto, não é capaz de
fazer com que o povo brasileiro supere um descrédito, ainda muito presente,
relacionado às nossas instituições políticas. Escândalos de corrupção, surgidos no interior das mais variadas instâncias deliberativas da sociedade, a
exemplo do Senado Federal, do Poder Executivo dos municípios, estados e
União, ou mesmo dos órgãos judiciários e do Ministério Público, ao lado dos
elevados gastos públicos mantidos pelo Estado, da ineficiência administrativa
e da pouca legitimidade alcançada pelos partidos políticos, fazem com que
renasçam, a cada instante, os velhos fantasmas do clientelismo, do patrimonialismo e do populismo desmedido, sobreviventes em pleno século XXI.
A defesa de uma ampla e eficiente reforma política, assim, se faz, a
cada dia, mais recorrente. Ocorre que, na grande maioria das vezes, a defesa
de mudanças nas instituições políticas da sociedade é construída de forma
açodada, sem uma análise mais profunda acerca dos impactos, positivos e
negativos, de eventuais transformações. Em uma análise bastante racional
46 Segundo Francisco C. Weffort (O populismo na política brasileira. In: FURTADO, Celso (coord.). Brasil: tempos
modernos. 3. ed. p. 49, Rio de Janeiro – RJ: Paz e Terra, 1979), “O populismo é produto da longa etapa de transformação
por que passa a sociedade brasileira a partir de 1930. Como estilo de governo, sempre sensível às pressões populares, ou
como política de massas, que buscava conduzir, manipulando suas aspirações, o populismo só pode ser compreendido
no contexto do processo de crise política e de desenvolvimento econômico que se abre com a revolução de 1930. Foi a
expressão do período da crise da oligarquia e do liberalismo, sempre muito afins na história brasileira, e do processo de
democratização do estado que, por sua vez, teve que apoiar-se sempre em algum tipo de autoritarismo, seja o autoritarismo institucional da ditadura Vargas (1937-1945), seja o autoritarismo paternalista ou carismático dos líderes de massas
da democracia do após-guerra (1945-64)l. Foi também uma das manifestações das debilidades políticas dos grupos
dominantes urbanos quando tentaram substituir-se à oligarquia nas funções de domínio político de um país tradicionalmente agrário e dependente, numa etapa em que pareciam existir as possibilidades de um desenvolvimento capitalista
nacional. E foi sobretudo a expressão mais completa de emergência das classes populares no bojo do desenvolvimento
urbano e industrial verificado nestes decênios e da necessidade, sentida por alguns dos novos grupos dominantes, de
incorporação das massas ao jogo político”.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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DOUTRINA
e pertinente acerca do tema da reforma política, Gláucio Ary Dillon Soares
e Lucio R. Rennó formulam importantes observações, que, merecem ser
transcritas, sobre tal realidade47:
As instituições políticas são imperfeitas. O ditado popular “nada
é perfeito” também se aplica às instituições políticas, como
às demais esferas da vida. Sempre há vantagens e desvantagens nas escolhas institucionais que fazemos. Vantagens
absolutas e desvantagens absolutas são construtos ideais:
servem como referências “puras”, mas não se encontram na
realidade. Há uma tendência, talvez universal, a achar que
“nossas” instituições não funcionam bem. Há quase sempre
um viés negativo na análise das instituições políticas que não
é privilégio do Brasil. Em diferentes países, as análises sobre o
funcionamento das instituições políticas frequentemente foram
negativas. Muitos analisam as instituições de outros países e
épocas de maneira idealizada e, no confronto entre realidade
e fantasia positiva, a fantasia positiva ganha sempre. Há um
ditado americano que expressa essa tendência muito bem:
the grass is always greener on the other side of the fence (a
grama do vizinho é sempre mais verde).
Em qualquer empreitada reformadora há custos, às vezes não
evidentes, muitas vezes não antecipados, regra que se aplica
às mudanças nas instituições políticas. Em outras palavras, o
remédio também é amargo e pode ser mais amargo do que a
doença. Os reformadores responsáveis devem saber até onde
os benefícios da mudança institucional se sobrepõem aos custos.
Raramente temos o conhecimento necessário para fazer a contabilidade das perdas e ganhos numa mudança institucional.
No mesmo sentido da ausência de uma análise mais aprofundada
acerca dos efeitos das propostas de reforma política em discussão no país,
verifica-se, também, que a participação popular na discussão dos temas
da reforma política, os quais poderão acarretar mudanças profundas no
formato da democracia brasileira, muitas vezes é relegada a um segundo
plano, enfraquecendo a efetividade da Constituição Federal outrora batizada de cidadã. Tal prática não só retira parte da legitimidade do processo de
evolução da democracia brasileira, como também mutila a própria coerência
do ordenamento jurídico pátrio, fundado em 05 de outubro de 1988, com a
promulgação da atual Lei Maior.
É a Constituição de 1988 produto de um processo democrático, que
culminou na adesão do legislador constituinte a um modelo de democracia
deliberativa que precisa ser seguido e observado. É o que se demonstrará,
no tópico a seguir.
47 Gláucio Ary Dillon Soares e Lúcio R. Rennó, Projetos de Reforma Política na Câmara dos Deputados. In: SOARES,
Gláucio Ary Dillon; RENNÓ, Lúcio R. (org.). Reforma Política: lições da história recente. p 09-10. Rio de Janeiro:
Editora FGV, 2006.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
DOUTRINA
5. A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A OPÇÃO DO POVO SOBERANO PELO
MODELO DE DEMOCRACIA DELIBERATIVA NO BRASIL.
A Constituição Federal de 1988, como já observado, estabelece
como princípios fundamentais, em seu artigo 1º, a soberania, a cidadania,
a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa e o pluralismo político. O parágrafo único do mesmo artigo, por sua
vez, dispõe que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Uma leitura apressada deste primeiro artigo da Carta Magna poderia
levar á conclusão de que o Brasil adota, tão somente, o modelo de democracia
participativa, ao estabelecer que o povo é o titular da soberania, exercida, por
sua vez, através da escolha de representantes eleitos periodicamente ou de
forma direta, através, por exemplo, de plebiscitos, referendos ou iniciativas
populares de lei.
Da análise, no entanto, dos conceitos de democracia participativa e
de democracia deliberativa, estudados no tópico 03 deste artigo, é possível
se depreender que muito mais do que um modelo de democracia participativa, o legislador constituinte de 1988 firmou, na Lei Maior, os princípios de
uma democracia deliberativa, fundamentada, como já destacado, na ampla
possibilidade de discussão pública acerca das mais diversas questões de
interesse coletivo.
Tal constatação pode ser ratificada a partir da análise mesmo dos
citados princípios fundamentais, os quais, como será observado doravante,
impõem a mais ampla e igualitária participação popular na deliberação das
questões públicas.
A cidadania e o pluralismo político, previstos nos incisos II e V do
artigo 1º da Carta Constitucional, denotam que o sistema jurídico brasileiro
é constituído sob a forma de uma democracia pluralista e participativa, na
qual “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido”, conforme
redação do parágrafo único do artigo 1º da Carta Constitucional.
Ao dispor sobre a cidadania como um dos fundamentos da Constituição Brasileira, está indicada uma concepção de Estado que prima pela
participação política do povo em suas questões fundamentais. Como afirma
Dalmo de Abreu Dallari48:
A participação política é uma necessidade da natureza humana. Para todos os seres humanos é indispensável a vida em
sociedade e para que esta seja possível torna-se necessária
uma organização, ou seja, é preciso que exista uma ordem,
na qual as pessoas possam viver e conviver.
48 Dalmo de Abreu Dallari, O que é participação política. Coleção primeiros passos, 15. reimpressão, p. 89-90, São
Paulo: Brasiliense, 2001.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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DOUTRINA
É necessário ter sempre em conta que a ordem social é ordem
humana, ordem de pessoas que têm inteligência e vontade e
que se acham em constante movimento. Por esse motivo a
ordem social não pode ser confundida com uma simples arrumação de coisas. Assim, portanto, não se pode admitir que
nas sociedades humanas se estabeleça distinção entre os que
arrumam e o que são arrumados.
Em vista de tais características, todo indivíduo que viva numa
sociedade democrática tem várias tarefas importantes a executar. É preciso estabelecer as regras de organização e funcionamento da sociedade; é indispensável que essas regras sejam
flexíveis e que sofram alteração sempre que houver mudanças
significativas na realidade social, devendo-se decidir quando
e em que sentido mudar; é necessário, ainda, tomar decisões
para resolver as situações de conflito, fixando os rumos em que
a sociedade deve caminhar e resolvendo os conflitos de acordo
com esses rumos. Para que os que vivem numa sociedade
não-democrática a tarefa mais importante, como é evidente,
é lutar para que ela se torne democrática.
O fundamento da cidadania denota que o princípio da soberania
popular é abraçado em nosso país, consistindo esse princípio na realização
do ideal maior de igualdade política.
Ao se referir ao pluralismo político como base fundamental do
nosso ordenamento jurídico, a Constituição, por sua vez, conforme lição de
José Afonso da Silva49:
opta, pois, pela sociedade pluralista que respeita a pessoa
humana e sua liberdade, em lugar de uma sociedade monista
que mutila os seres e engedra as ortodoxias opressivas. O
pluralismo é uma realidade, pois a sociedade se compõe de
uma pluralidade de categorias sociais, de classes, de grupos
sociais, econômicos, culturais e ideológicos. Optar por uma
sociedade pluralista significa acolher uma sociedade conflitiva,
de interesses contraditórios e antinômicos.
O pluralismo político, desta forma, fundamenta a democratização
do poder e o respeito à diversidade, fato que só reforça a necessidade de
construção de espaços deliberativos nos quais seja assegurada a liberdade de
opinião e expressão e o debate livre, a coexistência pacífica e a possibilidade
de convencimento mútuo entre os mais diversos atores sociais.
Cidadania e pluralismo político, assim, conformam o Estado brasileiro sob o regime político da democracia deliberativa, na qual o povo participa
de forma direta e indireta das questões e decisões políticas do Estado e da
sociedade a partir da viabilização de um amplo debate público acerca das
49 José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 15. ed., p. 147, São Paulo: Malheiros, 1998.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
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mais diversas questões de interesse da sociedade. A legitimidade do Estado
brasileiro sob a ótica democrática está intrinsecamente vinculada a essa
característica deliberativa adotada pelo nosso regime político, estabelecido
pela Constituição de 1988.
Em outras passagens da Carta Constitucional também é possível
notar-se a escolha do legislador constituinte pelo estabelecimento de um
regime democrático deliberativo no país. O art. 58, § 2º, II, por exemplo, estabelece que cabe ás comissões formadas nas casas do Congresso Nacional
realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil. Já o art. 89, VII
da Constituição, por sua vez, prevê que do Conselho da República deverão
participar “seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos
de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos
pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com
mandato de três anos, vedada a recondução”.
O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério
Público, criados a partir da Emenda Constitucional nº. 45/04, também contam,
nas suas composições com cidadãos comuns de reputação ilibada, conforme
previsões, respectivamente, dos artigos 103-B, XIII e 130-A, VI. Já no artigo
204, II, é previsto que as ações governamentais na área de assistência social
serão formuladas tendo como diretriz a “participação da população, por meio
de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle
das ações em todos os níveis”.
Como se observa, não restam dúvidas acerca da opção do legislador
constitucional por um modelo de ampla participação popular nas instâncias
da democracia, conformada, portanto, sob a ótica deliberativa. Neste sentido apresenta-se como requisito de legitimidade de toda e qualquer reforma
que possa advir no nosso sistema político a convergência dos mais diversos
setores da sociedade. Da mesma forma, o próprio conteúdo das propostas
de reforma política a serem discutidas deverá contemplar o alargamento, e
não a atrofia, dos espaços de participação e deliberação pública.
6. DEMOCRACIA DELIBERATIVA NO BRASIL: TENDÊNCIAS E
POSSIBILIDADES DIANTE DAS PROPOSTAS DE REFORMA POLÍTICA
EM DISCUSSÃO NO CONGRESSO NACIONAL.
Diante da constatação afirmada no tópico anterior deste artigo,
chegamos, finalmente, ao último aspecto da nossa discussão: até que ponto as propostas de reforma política em discussão no Congresso Nacional
poderão caminhar no sentido da efetivação de um modelo deliberativo de
democracia no Brasil?
Mudanças no sistema eleitoral, com a adoção do voto proporcional
de lista fechada fato que determinaria o fim do voto nominal nos candidatos
a vereador e deputado (o eleitor teria que votar apenas nas legendas partiSemest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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dárias); financiamento público exclusivo de campanhas, fator apontado por
muitos como fundamental para a redução da corrupção e para o barateamento
das campanhas; possibilidade de candidaturas avulsas, dissociadas dos partidos políticos, nas eleições municipais, fator que poderá, na visão de muitos,
enfraquecer as agremiações partidárias e fortalecer o personalismo político;
estabelecimento de cotas para candidaturas femininas, fazendo com que as
mulheres passem a ocupar 50% das cadeiras na Câmara dos Deputados,
assembléias legislativas e câmaras de vereadores; fim da reeleição para os
cargos de presidente da república, governador e prefeito, com a extensão do
mandato para 05 anos; dentre outros temas menos polêmicos, mas também
relevantes, encontram-se na pauta da reforma política, formulada por comissões especiais constituídas por deputados federais e senadores no Congresso
Nacional. Todas essas possibilidades poderão, a depender do rumo a ser
tomado pelas discussões, viabilizar ou macular um alargamento dos espaços
de deliberação pública em nosso país, efetivando ou contrariando as bases
principiológicas da Constituição Federal expostas no tópico anterior.
No que se refere às mudanças no sistema eleitoral, por exemplo,
com a possibilidade de adoção do sistema proporcional de lista fechada ou
mesmo do voto distrital, é válida a seguinte reflexão: será que tais propostas
contribuirão ou criarão obstáculos à melhor efetivação de um modelo democrático de maior participação popular?
Atualmente, nas eleições para vereadores, deputados estaduais,
distritais e federais, adota-se o sistema eleitoral proporcional de lista aberta, a
partir do qual o eleitor tem a liberdade de escolher não apenas o seu partido
político de preferência como também o seu candidato preferido para ocupar
cargos eletivos nas câmaras municipais, assembléias legislativas, Câmara
Distrital do Distrito Federal e Câmara dos Deputados. Argumenta-se, de forma
contrária a este sistema, que o mesmo tem enfraquecido o debate de idéias,
ao valorizar mais o personalismo dos candidatos do que, efetivamente, as
propostas e ideologias dos partidos políticos.
Foi com a Revolução Francesa, em 1789, que surgiu o ideal do
sistema eleitoral proporcional. Coube a Mirabeau, um dos líderes do Terceiro
Estado, defender, na Assembléia Constituinte de Provença, a tese de que “o
Parlamento deveria expressar o mais fielmente possível, o perfil do eleitorado”
(DIRCEU, José; IANONI, Marcos, Reforma política: instituições e democracia
no Brasil atual. 1. ed. p. 22).
No século seguinte, o inglês John Stuart Mill50 publica a obra “Considerações sobre o Governo Representativo”, na qual consagra a defesa do
sistema eleitoral proporcional como o mais democrático e representativo.
Segundo Stuart Mill:
50 John Stuart Mill, Consideração sobre o governo representativo, p. 89.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
DOUTRINA
Em qualquer democracia realmente igual, toda ou qualquer
seção deve ser representada, não desproporcionalmente, mas
proporcionalmente. Maioria de eleitores terá sempre maioria de
representantes, mas a minoria dos eleitores deverá ter sempre
uma minoria de representantes. Homem por homem, deverá
ser representada tão completamente como a maioria. A menos
que se dê, não há governo igual, mas governo de desigualdade
e de privilégio: uma parte do povo manda na outra; retirar-se-á
de certa porção da sociedade a parte justa e igual de influência
na representação, contrariamente a todo governo justo, mas
acima de tudo, contrariamente ao princípio da democracia, que
reconhece a igualdade como o próprio fundamento e raiz.
Finalmente, no ano de 1885, uma conferência internacional sobre
reforma eleitoral, ocorrida na Bélgica, vem a fortalecer, definitivamente, a tese
do sistema eleitoral proporcional. Consagra-se, neste momento, o modelo de
representação proporcional formulado pelo belga Victor D’Hont, cuja concepção era a de que os sistemas eleitorais deveriam viabilizar a representação
das diversas correntes de opinião presentes na sociedade expressas pelos
partidos políticos.
São duas as técnicas adotadas mundialmente, na atualidade, para a
representação proporcional: a do número uniforme e a do quociente eleitoral
(baseada no método D’Hont). Na técnica do número uniforme, utilizada pela
primeira vez na Alemanha, nas eleições parlamentares ocorridas em 1920, o
número de votos correspondentes ao preenchimento de uma vaga, em cada
circunscrição, é previamente estabelecido por lei, fazendo com que, tantas
vezes esse montante seja atingido, tantas vagas serão obtidas. Se em uma
circunscrição, por exemplo, se estipular o número de 15000 votos por vaga,
e um partido obtiver 90876 votos, terá direito a seis vagas, ou seja, o número
inteiro inferior à divisão dos votos obtidos, noventa mil oitocentos e setenta e
seis, pelo número de votos correspondentes a uma vaga, quinze mil.
A técnica do quociente eleitoral, por sua vez, é consistente de
operações aritméticas sucessivas, para que haja a representação proporcional, sendo a adotada pelo Direito Eleitoral brasileiro, conforme o disposto
nos artigos 106 a 113 do Código Eleitoral, nas eleições para deputados e
vereadores.
O processo para a averiguação do número de vagas cabíveis a
cada partido ou coligação não é de tão grande complexidade, como se possa
aparentar. A primeira etapa a se cumprir é a de determinar o quociente eleitoral, segundo o que dispõe o artigo 106 do CE: “determina-se o quociente
eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a
preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou
inferior a meio, equivalente a um, se superior”. De se ressaltar que, neste
caso, por votos válidos se entende os votos distribuídos aos candidatos e às
legendas, não se computando os votos brancos e nulos.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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A segunda etapa, por sua vez, é a determinação do quociente partidário, que se atinge através da divisão do número de votos válidos dados
sob a mesma legenda ou coligação de legendas, pelo quociente eleitoral,
desprezada a fração, conforme disposto no artigo 107 do Código.
Quando dois ou mais partidos estiveram coligados para a disputa
de uma eleição proporcional (deputados ou vereadores), seus votos serão
computados em conjunto para a determinação do quociente partidário, como
se fossem um único partido. Somar-se-ão, assim, os votos de todos os candidatos lançados por todos os partidos coligados, além de todos os votos
de legenda obtidos pelos mesmos partidos. Estarão, então, eleitos tantos
candidatos registrados por um partido ou coligação quantos o respectivo
quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um
tenha recebido.
Este sistema, assim, permite que candidatos com menos votos
possam ser eleitos em detrimento de candidatos com mais votos. Se o partido
A, por exemplo, obteve votos suficientes para eleger quatro vereadores, os
quatro candidatos mais votados dessa partido estarão eleitos, mesmo que o
quarto colocado, por exemplo, tenha obtido menos votos do que o segundo
colocado do partido B, o qual, contudo, não foi eleito, tendo em vista que este
mesmo partido B, após os cálculos do quociente eleitoral e partidário, teve
direito a apenas uma vaga na casa legislativa respectiva.
A eleição de candidatos caricatos, como o palhaço Tiririca, nas
eleições 2010, com a conseqüente eleição de outros personagens não tão
populares, simpáticos e tão bem votados, em virtude do sistema proporcional,
tem suscitado muitas críticas da sociedade. Em 2002, por exemplo, o exdeputado federal, Enéas Carneiro, foi eleito com a votação recorde na história
do país de mais de 1.600.000 votos, elegendo, consigo, em virtude do sistema
proporcional, correligionários que não obtiveram nem mesmo quinhentos
votos, gerando uma crise de legitimidade destes novos representantes.
As opções que se apresentam como alternativas a este sistema,
contudo, também apresentam problemas de legitimidade: se o sistema
fosse de lista fechada, como vem sendo proposto em muitos projetos de lei
integrantes da chamada “reforma política”, os eleitores brasileiros votariam
apenas nas legendas, ou seja, nos números dos partidos. Neste sistema,
os partidos decidem previamente, antes das eleições, a ordem em que os
candidatos aparecerão na lista. O eleitor votaria somente na legenda, não
podendo escolher o seu candidato de preferência, não tendo, assim, a oportunidade de definir livremente os nomes daqueles que ocupariam as cadeiras
conquistadas pelo partido ou coligação.
De forma recorrente, lideranças políticas, juristas e cientistas políticos também aventam a possibilidade de substituição do sistema eleitoral
proporcional de lista aberta pelo sistema de voto distrital nas eleições para
deputados e vereadores no Brasil. O que significa, entretanto, esta propositura, na prática?
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
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Podemos afirmar que a adoção do sistema de voto distrital nas
eleições para deputados e vereadores significaria, tão somente, a substituição
do sistema proporcional pelo sistema majoritário, no qual ganha a eleição os
candidatos mais votados, sem a distribuição de cadeiras de forma proporcional à votação dos partidos políticos. Assim, por exemplo, o estado da Bahia
elege, atualmente, 39 deputados federais pelo sistema eleitoral proporcional
de lista aberta. Caso fosse adotado o voto distrital, a Bahia, provavelmente,
seria dividida em 39 distritos uninominais, a partir dos quais seriam eleitos
deputados federais o candidato mais votado de cada distrito. Uma outra opção, seria a divisão da Bahia em distritos plurinominais, onde seriam eleitos,
pelo sistema majoritário, mais de um candidato.
Indiscutivelmente, a adoção do sistema de voto distrital nas eleições
para deputados e vereadores facilitaria a compreensão do processo eleitoral pelos eleitores. Por outro lado, a tão salutar e importante representação
das minorias ficaria ameaçada, uma vez que, para eleger representantes,
determinado partido precisaria ter o seu candidato como mais votado em
determinado distrito. Um partido que tivesse vinte por cento dos votos válidos em todo o estado, por exemplo, poderia não eleger candidato algum,
caso nenhum dos seus candidatos obtivesse a primeira colocação em um
dos distritos uninominais, fato este que contrariaria as bases principiológicas
do nosso sistema político, pautadas no modelo da democracia deliberativa,
como já destacado.
Um outro tema de grande relevância, suscitador de grande polêmica
e que precisa ser melhor discutido pela sociedade, é o tema do financiamento público de campanhas. De acordo com o projeto de lei nº. 2679/03, da
Comissão de Reforma Política da Câmara dos Deputados, adotar-se-ia no
Brasil o financiamento público exclusivo de campanhas, em substituição ao
atual sistema, de natureza preponderantemente privada, embora com participação pública. Cada eleitor brasileiro contribuiria com o equivalente a sete
reais para um fundo de campanhas, que seria dividido proporcionalmente
entre os partidos políticos, de acordo com a representatividade de cada uma
na Câmara dos Deputados.
Como principais argumentos favoráveis ao financiamento público de
campanhas, doutrinadores e parlamentares afirmam o combate ao fisiologismo político e ao abuso do poder econômico. Neste sentido, é de se destacar
a opinião de David Samuels51, para quem o atual sistema “tende a perpetuar
o status quo, por apertar ainda mais os laços entre as elites políticas conservadoras e os interesses empresariais, e limitar a capacidade de interesses
novos terem voz nas instituições de representação no Brasil”.
51 David Samuels, Financiamento de campanhas no Brasil e propostas de reforma. In: Reforma Política: lições da
história recente. p. 152. Rio de Janeiro: FGV, 2006.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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Como principais argumentos favoráveis à manutenção da possibilidade de financiamento privado, afirma-se que o financiamento público
não seria capaz de eliminar a pressão do poder econômico, além de violar
a liberdade política do cidadão e gerar elevação dos gastos públicos. Neste
sentido, vale destacar observação formulada por Paulo Adib Casseb52, para
quem “o ponto central na discussão sobre a corrupção eleitoral reside em
questões diversas do financiamento público de campanhas, mais precisamente na intensificação da fiscalização e limites às doações”.
Um importante questionamento necessita ser feito, então, em relação a esta questão do financiamento de campanhas, condizente com tudo
aquilo que foi destacado neste artigo: qual o modelo de financiamento de
campanhas eleitorais que melhor consagra a escolha firmada pelo legislador
constituinte originária de adoção, no Brasil, de uma democracia deliberativa?
O atual modelo permite, de fato, uma equidade nas instâncias de discussão
dos rumos do país nos processos eleitorais?
A simples oposição dos argumentos supracitados, relacionados às
temáticas do financiamento público de campanhas e dos sistemas eleitorais,
já demonstra o quão palpitante é o tema da reforma política. Outras temáticas, a exemplo da adoção ou não do sistema de governo parlamentarista
no Brasil, objeto de controvérsias desde a Assembléia Nacional Constituinte
de 1987/88; a reforma do sistema partidário, com a adoção da cláusula de
barreira e a criação das federações partidárias em substituição às atuais coligações; ou mesmo o recorrente debate sobre a extinção do Senado Federal,
reforçam ainda mais a atualidade e a relevância dessa discussão, a qual,
como já observado, deverá ser empenhada de forma mais ampla possível
pela sociedade, a fim de que, no futuro, os próprios espaços de deliberação
pública suscitados pela Constituição de 1988 sejam não apenas preservados
como alargados.
7. CONCLUSÕES.
Definida pelo notável presidente americano Abraham Lincoln, em
famoso discurso realizado em 1863, em Gettysburg, como “o governo do
povo, pelo povo e para o povo”, a democracia consagrou-se, ao longo do
último século, como o regime político mais adequado à consolidação das
liberdades fundamentais e à promoção dos direitos humanos, sendo patente,
entretanto, as suas dificuldades e imprecisões, sacramentadas em famosa
afirmação de Sir Winston Churchill, grande líder político britânico durante a
II Guerra Mundial, como “o pior de todos os regimes políticos, à exceção de
todos os demais já testados”. Tal conclusão de Churchill denota uma impor52 Paulo Adib Casseb, Financiamento público de campanha. In: Reforma Política: uma visão prática. p. 68, São Paulo:
Iglu, 2007.
46
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011.
DOUTRINA
tante característica do regime político democrático, salientada pelo cientista
político italiano Giovanni Sartori, em sua famosa obra “Teoria Democrática”:
a democracia é um processo em constante evolução.
Tomando por base o pensamento de Sartori, citado, o tema da reforma política, apontado por muitos como solução para os problemas políticos
brasileiros, vem mais uma vez à tona, com a divulgação do relatório final dos
trabalhos da Comissão de Reforma Política do Senado Federal e também da
Câmara dos Deputados. A necessidade de aprimoramento da democracia
brasileira, assim, é novamente posta na berlinda, suscitando polêmica e
reflexões entre os mais diversos setores da sociedade.
É verdade que a democracia, como ressaltado, é um processo em
constante desenvolvimento. Para que tal evolução se incremente, entretanto, é necessário participação popular e entendimento esclarecido. Em caso
contrário, a reforma política poderá, tão somente, oferecer o efeito simbólico
de que algo de bom está sendo feito pelo país, sem que o discurso venha a
refletir a realidade. É fundamental, assim, que a sociedade civil se mobilize
em torno de tal discussão, debatendo, criticamente, as reformas propostas,
tendo em vista o grande impacto a ser causado na nossa sociedade pelas
mesmas. A necessidade de valorização dos espaços de deliberação pública
neste processo, dessa forma, apresenta-se como imperiosa, sob pena de
violação aos princípios fundamentais estabelecidos na Constituição Federal
de 1998, base de todo o ordenamento jurídico, político e social.
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 2 3 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 3.389-97.2010.6.05.0000
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Aracatu
RECORRENTE:
Coligação HUMILDADE ACIMA DE TUDO. Advs.: Béis. Alessandro Brito dos Santos e Cláudia Anunciação Coelho.
RECORRIDO:
Sérgio Silveira Maia.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 90ª Zona/Brumado.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Irregularidades não sanadas. Aprovação com ressalva.
Suposto equívoco na decisão impugnada. Inexistência. Não provimento.
Nega-se provimento a recurso, mantendo-se a decisão
que aprovou com ressalva as contas do candidato, quando inexiste o alegado equívoco na decisão impugnada.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de janeiro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral .
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto pela Coligação HUMILDADE
ACIMA DE TUDO em face de sentença de fls. 74/75, proferida pelo Juízo
Eleitoral da 90ª Zona/Brumado, que aprovou com ressalva a prestação de
contas do candidato Sérgio Silveira Maia, alusiva ao pleito de 2008.
Em sede de razões (fls. 79/82), a recorrente alega que a Juíza
zonal laborou em erro ao julgar a prestação de contas ora sob análise, sem
levar em consideração que nos autos do processo tombado sob o número
09/2009 ficou amplamente comprovado que o recorrido omitiu bens na sua
prestação de contas.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
53
JURISPRUDÊNCIA
Argúi-se, também, que em face da similitude dos objetos os suprarreferidos processos deveriam ser julgados conjuntamente.
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral se manifestou,
às fls. 106/107, pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
A matéria submetida à apreciação dessa egrégia Corte se restringe
a análise do suposto equívoco no qual teria incorrido a magistrada zonal,
na medida em que aprovou, com ressalva, as contas de candidato que não
declarou à Justiça Eleitoral todos os bens que possuía no ensejo do registro
de candidatura.
De acordo com a parte irresignada, o juízo singular ainda procedeu
de forma equivocada ao desconsiderar a Representação nº 09/2009, deixando
de ultimar a reunião do feito mencionado (ação amparada no artigo 30-A da
Lei das Eleições) com a prestação de contas ora em apreço.
A argumentação trazida nas razões recursais não enseja acolhimento.
De plano, há que se destacar que, ao contrário do que se verifica nos argumentos lançados pela coligação recorrente, não se constata a
alegada existência de erro ante o processamento apartado da prestação de
contas e da aludida representação ajuizada com fulcro no art. 30-A da Lei
das Eleições.
A título elucidativo, cumpre destacar as diferenças entre os prazos
de ajuizamento e de julgamento, o objeto e o espectro de investigação das
demandas, os ritos, os pedidos apresentados pelas partes e, sobretudo, entre
as consequências que podem advir de um pronunciamento judicial em sede
de prestação de contas, ou, em caso de ação de investigação judicial eleitoral,
para apuração de captação e gasto ilícito de recursos de campanha.
Desta forma, não há que se falar em desacerto do juízo singular
por deixar de reunir os feitos para julgamento conjunto, até mesmo porque
a aprovação, ou aprovação com ressalva das contas de campanha não
constitui, num primeiro momento, fato impeditivo ao posterior julgamento e
condenação de candidato que tenha violado as disposições contidas no art.
30-A da Lei n° 9.504/97.
Doutra banda, em que pese o judicioso parecer do Ministério Púbico
Eleitoral, após me debruçar sobre os autos, tenho que a matéria devolvida
ao Poder Judiciário através da irresignação em apreço diz respeito única e
exclusivamente à conduta omissiva do recorrido no que tange à declaração
de bens que foi apresentada à Justiça Eleitoral, no ensejo do registro de candidatura. Por tal motivo, entendo que não se pode levar em conta a contração
de obrigações após as eleições ou a abertura de conta de campanha após o
54
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
prazo normativo, até mesmo porque, procedendo doutra forma, estaríamos
violando o direito de defesa da parte recorrida que se ateve a contrarrazoar
a tese encampada pela coligação recorrente.
A fim de espancar eventuais dúvidas acerca das constatações lançadas acima, colaciono trecho da peça recursal que sintetiza os argumentos
e interesses da coligação recorrente:
“No mérito, nota-se facilmente que a Douta Magistrada foi
induzida a erro ao aprovar com ressalvas as contas de campanha do Recorrido, uma vez que, na representação acima
indicada (autos n° 09/2009) está fartamente demonstrada a
omissão de bens de propriedade do Recorrido na declaração
junto a Justiça Eleitoral, na oportunidade do pedido de registro de candidatura, caracterizando, sem sombra de dúvidas
o ‘caixa-dois’, veementemente vedado pelo disposto no art.
30-A, da Lei n° 9.504/97.
...
Malgrado o respeito que temos para com a MM. Juíza prolatora
da sentença de fls. 74/75, ora combatida, a qual merece ser
reformada integralmente, temos certo que a I. Magistrada ‘a
quo’ laborou em evidente equívoco, porquanto, não observou
a omissão na declaração de bens do Recorrido, conforme
demonstrado nos autos 09/2009, certidão inclusa.”
Retornando ao ponto nodal do recurso, urge asseverar que a alegada conduta de omissão de bens carece de qualquer comprovação nos autos.
A simples transcrição da exordial de uma representação, não se presta ao
fim colimado pela Coligação HUMILDADE ACIMA DE TUDO.
Vale salientar, outrossim, que o setor técnico desta Corte não identificou nos autos a falha mencionada nas razões da irresignação, tratando, pois,
de irregularidades outras (atraso na abertura da conta bancária e realização
de despesas após o prazo legal), que, a meu ver, além de estar fora do mérito
recursal, não se mostram capazes – pela pouca monta das movimentações
financeiras - de conspurcar a transparência das contas apresentadas.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de janeiro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
55
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 3 8 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 8.703-61.2007.6.05.0151
CLASSE 31
MUNICÍPIO:
Gandu
RECORRENTES: Adailton Santos Silva e Agnaldo de Santana Luz.
Advs.: Béis. Leonardo Mineiro Falcão, Joyce Meira Tavares Porto
e Juraci Souza Falcão Junior.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 151ª Zona.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
REVISOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso criminal. Ação Penal. Condenação. Art. 350
do Código Eleitoral. Declaração falsa. Art. 354. Obtenção para terceiro. Fim eleitoral. Prova de domicílio.
Não provimento.
Nega-se provimento a recurso quando o acervo probatório obtido com a instrução do feito demonstra
que o segundo Recorrente, a pedido do primeiro,
subscreveu declaração falsa para alistamento de
eleitor sem o necessário domicílio eleitoral.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto
do Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 26 de janeiro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - MAURICIO
KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso interposto por Adaiton Santos Silva e Agnaldo
de Santana Luz em face da decisão que os condenou à pena de 1 (um) ano
e 06 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, substituída por prestação
pecuniária no importe de três salários míninos, bem como ao pagamento de
56
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
5 (cinco) dias-multa, por violação aos artigos 350 e 354 do Código Eleitoral,
respectivamente, o primeira pela emissão de declaração falsa e o segundo
por sua utilização com o intuito de realizar transferência do domicílio eleitoral
de Edvaldo de Jesus Ribeiro.
Tendo sido preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos, o benefício da suspensão condicional do processo foi concedido àquele eleitor,
não tendo sido estendido aos ora Recorrentes em virtude de estarem sendo
processados por outro crime de mesma natureza (fls. 101/102).
Sustentam os Recorrentes que para configuração do delito tipificado
no artigo 350 do Código Eleitoral seria imprescindível a presença de dolo
específico, elemento que não teria sido efetivamente comprovado no decurso
da instrução processual.
Alegam, ainda, que as declarações acoimadas de falsas não se
constituiriam em meio eficaz para a obtenção do resultado pretendido, qual
seja, a transferência do domicílio eleitoral.
Defendem, igualmente, que o conceito do crime de falsidade ideológica, descrito no Código Penal, afastaria a ilicitude quando o documento
objeto de fraude fosse sujeito à verificação de autoridade pública.
Ademais, aduzem a inocorrência de condutas ilícitas uma vez que
embora o eleitor Edvaldo de Jesus Ribeiro, terceiro Acionado, tenha indicado
endereço diverso do que o seu efetivo domicílio na declaração impugnada,
com o intuito de transferir seu título para o Município de Gandu, há mais de
seis anos ele seria residente na zona rural da aludida Municipalidade.
Pugnam, ao fim, pelo provimento do Recurso.
Em contrarrazões de fls. 143 a 146, o Parquet zonal sustenta que
a instrução probatória demonstrou a efetiva existência de dolo nas condutas
dos Recorrentes, uma vez que o segundo Apelante tinha ciência de que o
eleitor Edvaldo não residia em seu domicílio e que o primeiro Recorrente se
valia das declarações prestadas para se beneficiar com os votos dos eleitores
transferidos.
Argumenta, ainda, ser descabida de fundamentação jurídica a tese
defensiva formulada no sentido de afastar a incidência do delito previsto no
artigo 350 do Código Eleitoral quando se trata de documento que somente apresente endereço distinto do verdadeiro, mas no mesmo domicílio eleitoral.
Requer o conhecimento e desprovimento da inconformidade.
Com vistas dos autos, o Procurador Regional Eleitoral Auxiliar se
manifestou pelo não acolhimento das razões recursais.
É o relatório que submeto à apreciação do Juiz Revisor.
Salvador, em 10 de dezembro de 2010.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
57
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 5 4 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 4.515-85.2010.6.05.0000
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Anagé
RECORRENTE:
Elbson Dias Soares. Advs.: Béis. Luiz Viana Queiroz, Ivan Brandi,
Silvio Avelino Pires Britto Júnior e outros.
RECORRIDOS:
Andréa Oliveira Silva e Ismênio Nolasco Amorim (Advs.: Béis.
Delcio Medeiros Ribeiro e Erick Menezes de Oliveira Júnior) e
Rubens Oliveira Dias (Advs.: Béis. Ruy Hermann Araújo Medeiros, Osvaldo Camargo Junior e João Nascimento S. Bonfim).
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 161ª Zona.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso. AIJE. Abuso de poder econômico e político.
Captação de sufrágio. Utilização da máquina pública.
Transporte de eleitores. Construção de barragem em
período eleitoral. Suporte probatório frágil e inconsistente. Desprovimento.
Preliminar de intempestividade.
Levando-se em conta a data em que foi juntado aos autos
o mandado de intimação, considera-se que o recurso
foi veiculado dentro do prazo legal, motivo por que se
afasta a prefacial concernente à intempestividade da
irresignação.
Mérito.
Nega-se provimento a recurso, ante a constatação da
falta de suporte probatório apto a corroborar as acusações contidas na exordial, razão pela qual a sentença que
julgou improcedente AIJE não merece reproche.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado,
que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de fevereiro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; CARLOS
ALBERTO DULTRA CINTRA - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA Procurador Regional Eleitoral.
58
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por Elbson Dias Soares em
face de sentença (fls. 540/546), que julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral n° 306/2008.
As razões recursais (fls. 563/585) repousam no argumento de que
o juízo singular incidiu em erro ao deixar de reconhecer que Rubens Oliveira
Dias (Prefeito do Município de Anagé à época), em comunhão com Andrea
Oliveira Silva e Ismênio Nolasco Amorim (respectivamente candidatos aos
cargos de prefeito e vice-prefeito de Anagé), fizeram uso da máquina pública durante a campanha eleitoral incidindo em prática de captação ilícita
de sufrágio e abuso de poder – nas modalidades econômica, política e de
autoridade.
Os fatos que lastreiam as acusações renovadas através da via
recursal residem basicamente no uso de veículos destinados ao transporte
escolar para o translado de eleitores em mais de uma ocasião; na suspensão
das aulas em um dos estabelecimentos de ensino da cidade para que todos
os cidadãos locais pudessem assistir a um evento político; na distribuição de
combustível aos simpatizantes da campanha dos recorridos; no transporte
ilegal de eleitores no dia da eleição e na construção de uma barragem durante
o período eleitoral.
Em suas contrarrazões (fls. 614/620), os recorridos se concentram
especialmente na alegação de intempestividade do recurso, ao argumento
de que em que pese a existência de intimação pessoal do recorrente, a intimação da sentença já havia sido publicada no DJE, em momento anterior,
contando-se o prazo a partir desta primeira ocasião.
Por fim, no mérito, revelam a sua satisfação para com o decisum
vergastado, pugnando pela sua mantença.
Instado a se manifestar, o Procurador Regional Eleitoral com assento nesta Corte invocou o princípio da unidade institucional para reiterar as manifestações da Promotoria Eleitoral, requerendo o provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE.
De acordo com os recorridos, a irresignação em testilha é intempestiva, pois a sentença guerreada foi publicada no Diário Oficial em 13 de
julho de 2010, sendo que o recurso somente foi aviado em 16 de agosto do
mesmo ano.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
59
JURISPRUDÊNCIA
A questão prévia posta para acertamento nesta Corte, ao contrário
do que pode parecer num primeiro momento, não é simplória.
Para asseverar com certeza se o recurso é ou não intempestivo,
fez-se necessário esmiuçar o caderno processual antes de apontar as diretrizes do nosso ordenamento que melhor se aplicam ao caso.
Após a prolação da sentença, verifica-se que foi adotada uma série
de medidas que passo a descrever.
Num primeiro momento, foram expedidos os mandados de intimação de n°s 96, 97, 98, 99, 111, 112 e 113 do ano de 2010, endereçados às
partes – Elbson Dias Soares, Andréa Oliveira Silva, Ismênio Nolasco Amorim
e Rubens Oliveira Dias – e aos advogados Ruy Hermann Araújo Medeiros
(patrono do senhor Rubens Oliveira), Délcio Medeiros Ribeiro (patrono da
senhora Andrea Oliveira e do senhor Ismênio Nolasco) e Edivaldo Santos
Ferreira Júnior (patrono do recorrente, senhor Elbson Dias Soares).
Pois bem.
Às fls. 555/557 dos autos, no dia 09 de junho de 2010, foram juntados os mandados de intimação destinados ao Dr. Ruy Hermann, ao Dr.
Delcio Medeiros e à senhora Andréa Oliveira.
À fl. 558, consta o mandado do senhor Ismênio Nolasco Amorim,
acostado aos autos somente em 16 de junho de 2010.
Na folha seguinte (559), verifica-se que o oficial de justiça cumpriu
a determinação do juízo singular, ultimando a comunicação da sentença ao
Dr. Edivaldo Santos Ferreira Júnior, uma vez que o respectivo mandado foi
juntado em 06 de julho de 2010.
A esta altura, os recorridos, então acionados, seja pessoalmente,
seja através dos seus advogados já tinham ciência da decisão da lavra do
Juiz da 161a Zona Eleitoral, no entanto, o senhor Elbson Dias Soares, bem
como os causídicos habilitados a lhe prestar assessoria jurídica deixaram de
receber o mesmo tratamento, pois ainda não haviam sido intimados.
Ocorre que, mesmo após a intimação pessoal dos recorridos e
advogados retromencionados, com a consequente abertura de prazo recursal após a juntada aos fólios dos mandados cumpridos, eis que a Chefe de
Cartório certifica à fl. 560 que o decisum em pauta foi publicado no Diário de
Justiça Eletrônico no dia 13 de julho de 2010.
Esta era, portanto, a segunda abertura de prazo recursal para todas as partes que se encontravam no pólo passivo da relação processual,
enquanto que Elbson Dias Soares tomava conhecimento da decisão do
magistrado zonal apenas neste momento.
Os fatos que envolvem a comunicação do ato processual em tela
não se esgotam por aí. No dia 13 de agosto de 2010, exatamente um mês após
a publicação da sentença no diário eletrônico, juntou-se aos autos o mandado
de intimação pessoal remetido ao senhor Elbson Dias Soares, que, por seu
turno, protocolizou a irresignação em apreço no dia 16 do mesmo mês.
60
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Após este breve relato das circunstâncias que envolvem a preliminar
de intempestividade, passo a tecer as considerações que reputo necessárias
ao enfrentamento do tema.
Ao tratar dos atos de comunicação processual, no Capítulo XLVIII
do segundo volume das suas Instituições de Direito Civil, Cândido Rangel
Dinamarco emite a seguinte opinião1 :
“Comunicação processual é a transmissão de informações
sobre os atos do processo às pessoas sobre cujas esferas de
direito atuarão os efeitos deste, eventualmente acompanhadas
do comando a ter uma conduta positiva ou uma abstenção.
Ela é essencial ao princípio do contraditório, figurando
como instrumentação técnico-processual da ciência dos atos
do processo, que é inerente a este; contraditório é participação e, sem o conhecimento dos atos do adversário ou
dos pronunciamentos do juiz, a parte não saberia quando
reagir a eles.” Grifos nossos.
Na mesma obra, só que no volume I, capítulo VII, Dinamarco lança
as seguintes ponderações2 :
“O princípio isonômico, ditado pela Constituição em termos de
ampla generalidade (art. 5°, caput, c/c art. 3°, inc IV), quando
penetra no mundo do processo assume a conotação de princípio da igualdade entre as partes. Da efetividade deste
são encarregados o legislador e o juiz, aos quais cabe a
dúplice responsabilidade de não criar desigualdades e de
neutralizar as que porventura existam.
...
O tema da prática do princípio isonômico pelo juiz é muito próximo ao da imparcialidade e com ele bastante relacionado. O
juiz imparcial atua de modo equilibrado, o parcial é propenso a
buscar favorecimento de uma das partes. Nem teria significado
a preocupação pela imparcialidade do juiz, não fora com o
fito de garantir aos sujeitos litigantes o tratamento isonômico
indispensável para que, ao fim, o processo possa oferecer
tutela jurisdicional para quem efetivamente tenha razão. Na
outra ponta, o tema da isonomia confina com as garantias
da liberdade, do contraditório e da ampla defesa, porque a
igualdade das partes inclui igualdade em oportunidades de
participar com liberdade, defendendo-se adequadamente.
Contraditório é participação e participar do processo significa, para as partes, empregar as armas lícitas disponíveis
com o objetivo de convencer o juiz a dar julgamento favo1 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, vol. II. Malheiros Editores.
2 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, vol. I. Malheiros Editores.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
61
JURISPRUDÊNCIA
rável. Dão o destaque dado a paritá nelli armi em estudos
sobre o princípio isonômico, mas que bem poderia ser
feito no trato do contraditório”. Grifos aditados.
Valho-me das palavras do renomado processualista porque, ao
meu sentir, da forma como se sucedeu a marcha processual, o recorrente foi
colocado em situação de desvantagem ante as partes contra quem litigava.
A oportunidade de fazer uso da via recursal foi oferecida a Andrea
Silva, Ismênio Oliveira e Rubens Dias antes da publicação da decisão no
diário eletrônico. Os três acionados tiveram ciência da sentença, puderam
aguardar a juntada aos autos do mandado de intimação cumprido pelo oficial
de justiça e, ainda assim, foram agraciados com o novo prazo que começou
a correr após a publicação no DJE.
Enquanto isso, Elbson Soares não havia gozado do mesmo privilégio. Nem ele, nem os seus advogados contaram com a intimação da sentença
antes da publicação no DJE.
Tem-se, outrossim, que o oficial de justiça deu vencimento às suas
obrigações, mesmo que um mês após a aludida publicação, e procedeu à
intimação pessoal do ora recorrente, que, neste segundo momento cumpriu
regularmente o prazo.
É bem verdade que o TSE já decidiu (Agravo Regimental em
Recurso Especial Eleitoral nº 36332) que em casos de intimação pessoal
e pelo Diário, considera-se data da publicação o primeiro dia útil seguinte
ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça Eletrônico, mas,
ante as peculiaridades com as quais nos deparamos neste caso, considerar
que o recurso é intempestivo, sob o meu ponto de vista, resultaria em grave
afronta ao multirreferido princípio isonômico, bem como ao contraditório, já
que restou evidente a situação vantajosa - e fora de parâmetros normativos
ou axiológicos válidos - em que se viram as partes que figuraram no pólo
passivo da AIJE n° 306/2008.
Por tais razões, voto no sentido do não acolhimento da preliminar.
MÉRITO.
Do exame acurado dos autos, verifico que não merecem guarida
as alegações do recorrente.
Às fls. 155/156 consta o Contrato n° 10109/2008, firmado entre a
Prefeitura Municipal de Anagé e a Transcops Cooperativa de Transportes
Alternativos do Sul e Sudoeste da Bahia.
O objeto da avença supracitada, de acordo com a primeira cláusula,
foi o transporte de alunos e professores do ensino médio e fundamental, tanto
na zona rural, quanto na sede do Município de Anagé.
Destaque-se, que no pacto em apreço a prefeitura local não firmou
vínculo de exclusividade com a Transcops.
62
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Ora, para se chegar à conclusão no sentido de que os veículos
que deveriam estar a serviço da municipalidade foram utilizados em prol da
campanha política dos recorridos seria necessário vincular as acusações da
peça vestibular a elementos de prova, aptos a pulverizar eventuais dúvidas
acerca do ocorrido e este não é o caso dos autos.
De plano, entendo que a relação de pagamentos realizados pela
prefeitura no mês de novembro de 2007 é inservível para o mister a que se
propôs o ora recorrente, já que os fatos apurados são referentes ao prélio
eleitoral de 2008.
Ainda nesta linha de raciocínio, não é demais asseverar que, como
não havia um contrato de exclusividade entre a Prefeitura Municipal de Anagé
e a Transcops Cooperativa, não haveria impedimentos iniciais para que os
ônibus utilizados para transporte escolar em determinados dias e horários
fossem locados para o desempenho de outras tarefas, mesmo que de caráter
político.
Não se vislumbra no caso em tela a existência de prova inequívoca
do aludido favorecimento aos então candidatos Andréa Oliveira e Ismênio
Nolasco através do intermédio do então Prefeito de Anagé, Rubens Oliveira
Dias.
As alegações no sentido de que os recorridos foram responsáveis
pela realização de transporte irregular de eleitores no dia da eleição caem
por terra à vista da cópia do Inquérito Policial n° 007/2009 (fls. 355/405).
Para não deixar lacunas acerca do ocorrido, farei uso das palavras
do delegado de polícia responsável pela investigação, que assim se expressou às fls. 402/405:
“A suspeita que pairava sobre os investigados era se havia
sido cometido o crime eleitoral de arregimentar votos através
do transporte gratuito. O artigo 302 da Lei 4737/1965 (Código Eleitoral) prevê: Promover, no dia da eleição, com o fim
de impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto a
concentração de eleitores, sob qualquer forma, inclusive o
fornecimento gratuito de alimento e transporte coletivo ...
As testemunhas ouvidas foram unânimes em dizer que não
houve qualquer tipo de propaganda política nos dois ônibus
e afirmaram, categoricamente, que todos sem distinção de
preferência política, eram transportados de forma igual. Não
houve, portanto, segundo o que foi apurado, o fim de
impedir, embaraçar ou fraudar o exercício de voto, pelo
contrário, pois segundo os moradores da localidade, com
a apreensão dos ônibus em questão, eles tiveram que
andar por vários quilômetros debaixo do sol quente para
voltarem para as suas residências, não havendo outro
transporte para eles”. Grifos nossos.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
De igual sorte, a simples alegação de que os gastos da municipalidade com combustível aumentaram consideravelmente durante o período
eleitoral se revela de todo inconsistente. Não só porque a relação de gastos adunada aos autos pelo acionante (fl. 42) é incompatível com a tabela
comparativa apresentada pela defesa às fls. 324/325, mas também porque
o manancial probatório é carecedor de elementos que vinculem o suposto
aumento de gastos com a campanha política.
Na mesma linha, firmo convencimento no sentido de que a gravação
acostada à fl. 26 dos autos nada prova. É impossível aferir, com as ferramentas de que se dispõe no caderno processual, se os ônibus utilizados no
evento político em apreço desfalcaram a linha de transporte de estudantes
e mestres, pois, como já se destacou, a cooperativa Transcop não firmou
contrato de exclusividade com a prefeitura local e estava autorizada, sem
incidir em afronta à legislação eleitoral, a disponibilizar os seus veículos para
atividades variadas.
É necessário destacar, outrossim, que os argumentos levantados
no sentido de que em diversas ocasiões havia adesivos referentes à candidatura dos recorridos nos automóveis utilizados para transporte de eleitor
não denotam, neste caso, a existência de abuso de poder em quaisquer de
suas modalidades, seja porque é impossível aferir as circunstâncias e quais
as pessoas que fizeram uso dos autocolantes (até mesmo porque em grande
parte dos casos a colagem foi realizada na parte externa dos carros), seja
porque, reiterando o que já foi dito, inexiste demonstração de que o serviço
de transporte escolar foi interrompido para finalidades escusas.
Ainda sob o viés da falta de robustez do cabedal probatório, é
dever lembrar que, muito embora dois depoentes (Marcelo Cruz Brito à fl.
480 e Telma de Oliveira à fl. 483) tenham declarado que eram estudantes
do Colégio Estadual Renato Viana e que no dia 25 de setembro do ano de
2008 o translado de alunos patrocinado pela prefeitura teria sido suspenso
para que todos os moradores e estudantes locais pudessem acompanhar um
comício que se realizaria naquela data, à fl. 451 dos autos está acostado o
Ofício n° 61/2009, documento em que o Secretário de Educação do Município
de Anagé assegura que não houve aula durante o turno noturno no Colégio
Renato Viana durante o ano de 2008.
Há de se registrar ainda que nenhum outro estudante do Colégio
Estadual Renato Viana veio a juízo declarar que as aulas foram suspensas
no turno noturno do dia 25 de setembro em função da realização de um
comício.
No que tange à construção de barragem em ocasião de pleno
vapor da disputa eleitoral, entendo que a gravação de fls. 575, consistente
na entrevista realizada com o senhor Elieser Cordeiro Almeida, não é de
grande utilidade para os propósitos do recorrente, primeiramente porque
não foi submetida ao crivo do contraditório, depois porque a construção da
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
barragem não denota intuito eleitoreiro, mormente se tivermos em vista: a)
o Decreto n° 29/2008 (fl. 172) que trata da situação anormal caracterizada
como emergencial em face da estiagem que se abateu sobre a região de
Anagé; b) o Decreto n° 50/2008, que prorroga a situação anormal retromencionada; c) o Decreto n° 11.122/2008, em que o Governador do Estado da
Bahia homologa o Decreto n° 29/2008 e d) a declaração de fl. 182, em que
Aurelino Joaquim dos Santos autorizou o Município de Anagé a construir uma
aguada em sua propriedade.
Desta forma, não vislumbrando motivos para consentir com o pedido
de reforma da decisão de primeiro grau, voto no sentido de negar provimento
ao recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de fevereiro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 7 7 / 2 0 11
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO Nº 3.486-97.2010.6.05.0000
CLASSE 42
(EXPEDIENTES NºS 5.951/2011 E 6.003/2011 – RECURSOS)
MUNICÍPIO: Salvador
RECORRENTES:
Jutahy Magalhães Júnior (Advs.: Béis. Jutahy Magalhães Neto,
Fabiany da Silva Ribeiro, Diego Freitas Ribeiro e outros) e João
Almeida dos Santos (Adv.: Bel. Luiz Viana Queiroz).
INTERESSADOS: PSDB – Seção da Bahia (Advª.: Belª. Ana Virgínia Coni da Silva)
e Antônio José Imbassahy da Silva.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Recursos. Representação. Procedência. Propaganda
partidária. Utilização indevida. Propaganda extemporânea. Configuração. Desprovimento.
Identificando-se a realização de propaganda eleitoral
ante tempore durante a veiculação da propaganda
partidária deferida à agremiação representada, negase provimento ao recurso, mantendo-se as sanções
imputadas aos recorrentes.
Vistos, relatados e discutidos os expedientes acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS, nos termos do voto
do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 21 de fevereiro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício
da Presidência - MAURÍCIO KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY
PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recursos interpostos por Jutahy Magalhães Júnior e
por João Almeida dos Santos contra decisão deste Relator que, julgando
procedente Representação ofertada pelo Ministério Público Eleitoral, os condenou, bem como ao PSDB e a Antonio Imbassahy da Silva, ao pagamento
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
de multa no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) pela prática de propaganda
eleitoral antecipada.
Aduz o primeiro recorrente que a decisão fustigada merece reforma,
pois a propaganda partidária não fora desvirtuada, tanto que o artigo 45 da
Lei nº 9.096/95 destacava dentre os objetivos da propaganda partidária, a
transmissão de mensagens de seus filiados sobre a execução dos programas
partidários, o que fato teria ocorrido.
Defende ter apenas mencionado a criação de importante lei à época
em que fora ministro do Bem Estar Social, sem divulgar sua candidatura ou
pedir votos, sem exteriorizar críticas às administrações anteriores com fins de
comparação nem ultrapassar os limites da discussão de temas de interesse
político-comunitário.
O segundo recorrente também aponta error in judicando na decisão,
sustentando-se na permissão para divulgar a posição do partido em relação
a temas político-comunitários atribuída à propaganda partidária pelo § 1º do
artigo 45 da Lei nº 9.096/95, no qual se enquadraria suas considerações sobre
a segurança pública, sem que tivesse havido qualquer desvio de finalidade
que propiciasse pedido implícito de votos.
Requer o provimento do recurso para julgar improcedente o pedido
contido na Representação.
Instado a se manifestar, o Procurador Regional Eleitoral pugnou pelo
desprovimento dos recursos, que teriam se limitado a negar a ocorrência de
propaganda extemporânea.
É o relatório.
VOTO
Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.
A decisão atacada não comporta qualquer reforma, pois, ao assistir
as inserções destinadas à propaganda partidária do PSDB, não há como
se afastar seu caráter eleitoral extemporâneo, com a divulgação de filiados
da agremiação que almejavam conquistar os cargos eletivos em disputa no
pleito que se aproximava, valendo-se da exposição garantida pelo horário
de televisão concedido à sua Agremiação.
Não tendo havido recurso do PSDB nem de Antonio Imbassahy da
Silva, peço vênia para transcrever os fundamentos da minha decisão, que integralmente mantenho, em especial nos trechos que tocam aos recorrentes:
A questão de fundo reside na utilização, pelo PSDB, de tempo
destinado à propaganda partidária para divulgar publicidade
eleitoral em momento vedado pela lei, beneficiando os demais
Representados.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
Para o deslinde da demanda sub judice, é imprescindível a análise do teor das propagandas inseridas na mídia de fls. 21.
Quanto às inserções veiculadas no dia 16/06/2010, observo que o
conteúdo difundido extrapolou os ditames legais para a realização de propaganda partidária, revelando-se, em verdade, publicidade eleitoral subliminar,
porquanto além de divulgar a imagem do candidato Jutahy, bem como a
mensagem “Deputado Federal”, atribuem realizações à pessoa do próprio
candidato, como claramente se evidencia no excerto em destaque:
“Jutahy: 305.000 pessoas na Bahia, idosas e portadoras de
necessidade especiais recebem, todo mês, um salário mínimo. São pessoas muito pobres, que assim podem viver com
dignidade. Isso acontece graças à LOAS (Lei Orgânica de
Assistência Social, criada por mim, quando fui Ministro do
Bem-Estar-Social, com a decisiva participação do José Serra,
então líder do PSDB na Câmara Federal. Tenho orgulho dessa
lei e dessa parceira que veio beneficiar tanta gente.”
...
No tocante à inserção veiculada com a participação de João
Almeida, tenho que o objetivo eleitoral se encontra ainda mais
realçado pois o referido candidato, após realizar críticas contra
o Governador, expressamente, menciona o prélio vindouro, pedindo que a população “escale correto o seu time”. Transcrevo
a seguir o teor da publicidade alvejada:
JOÃO ALMEIDA: “Eu estou assustado com a violência. O
governador comprou carro blindado e helicóptero para se
deslocar em segurança. Tá certo? E para proteger você e sua
família quando saem para escola e para o trabalho, o que faz
o governo? Só propaganda mentirosa. Depois da Copa, vêm
as Eleições. Escale correto o seu time. A Bahia quer menos
conversa e mais trabalho.”
...
Ademais, é inquestionável o prévio conhecimento dos candidatos, que participaram efetivamente da propaganda, emitindo
os pronunciamentos ora impugnados, bem como a ciência da
agremiação, que é a responsável pela utilização do seu espaço
de propaganda partidária.
Com essas razões, julgo procedente a Representação para
condenar os Representados ao pagamento de multa no valor
de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) cada um, nos termos do artigo
36, § 3º da Lei nº 9.504/97, a ser recolhida ao Fundo Partidário
após o trânsito em julgado do feito.
As peças recursais não ofertaram razões aptas a modificar o convencimento antes firmado no decisum desafiado, que reconheceu a prática
de propaganda eleitoral ante tempore.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
O então deputado Jutahy Magalhães de fato valeu-se de sua
participação para referenciar a LOAS - Lei Orgânica de Assistência Social.
Entretanto, o fez destacando ter sido lei por ele criada e, ainda, ressaltando
a participação de José Serra, que viria a ser o candidato à Presidência da
República pelo PSDB, transformando a inserção televisiva em verdadeira
propaganda eleitoral em período vedado.
De igual modo agiu o recorrente João Almeida, cuja manifestação,
buscando associar a escalação dos times da copa que se desenrolava com
a escolha de candidatos na eleição que estaria por vir, não pode ser vista de
outra forma que não um pedido subliminar de votos.
Pelo exposto, na esteira do parecer ministerial, voto pelo desprovimento dos recursos.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 21 de fevereiro de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 8 6 / 2 0 11
AÇÃO CAUTELAR
PROCESSO Nº 4.903-85.2010.6.05.0000
CLASSE 1
(APENSO: AÇÃO CAUTELAR Nº 5.101-25.2010.6.05.0000 – CLASSE 1)
MUNICÍPIO:
Aporá
REQUERENTES:
1. Ivonei Raimundo dos Santos (Advs.: Béis. Rafael de Medeiros Chaves Mattos, Pedro da Costa Vargens e outros); 2. José
Mendes de Souza Filho (Advs.: Béis. Rafael de Medeiros Chaves
Mattos, Marcelo Antônio Álvares Silva e outros).
REQUERIDA:
Coligação UM NOVO TEMPO. Adv.: Bel. Vagner Bispo da
Cunha.
RELATOR ORIGINÁRIO:Juiz Cássio Miranda.
RELATOR DESIGNADO:Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Ações cautelares. AIJE contra prefeito e vereador
eleitos. Sentença condenatória. Cassação dos
mandatos. Pedido de efeito suspensivo a recursos.
Excepcionalidade da medida. Art. 257 do Código
Eleitoral. Requisitos autorizadores. Configuração.
Procedência das ações.
Devem ser julgadas procedentes ações cautelares
que objetivam conferir efeito suspensivo a recursos
interpostos contra sentença de primeiro grau, quando
presentes os requisitos autorizadores da medida.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, por
maioria, vencidos o Relator e o Juiz Salomão Viana, JULGAR PROCEDENTES AS AÇÕES CAUTELARES, designado para lavrar o Acórdão o Juiz
Carlos Alberto Dultra Cintra, nos termos de seu voto, adiante lavrado, que
passa a integrar o presente decisum.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de fevereiro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; CARLOS
ALBERTO DULTRA CINTRA - Juiz Relator designado; SIDNEY PESSOA
MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de Ações Cautelares ajuizadas por Ivonei Raimundo dos
Santos e José Mendes de Souza Filho com a finalidade de emprestar efeito
suspensivo a recursos interpostos contra a sentença prolatada nos autos
da AIJE nº 371/2008, pelo Juízo Eleitoral da 44ª Zona, que determinou a
cassação dos mandatos dos requerentes, prefeito e vereador do Município
de Aporá, respectivamente.
Sustentam, em síntese, que o entendimento sufragado no decisum
mostra-se equivocado, porquanto o fato de o magistrado a quo ter negado
credibilidade aos depoimentos prestados pelas testemunhas de defesa, bem
como a fragilidade das provas adunadas aos autos da referida ação, são
elementos suficientes para evidenciar a plausibilidade de êxito dos recursos
interpostos.
Na demanda cautelar nº 4903-85 o pleito liminar restou deferido
pelo Juiz Plantonista, ao passo que na ação cautelar 5101-25 este Relator
indeferiu o pedido.
Foram interpostos agravos regimentais que, por deliberação desta
Corte, através de voto de desempate, resultaram na concessão do efeito
suspensivo requestado.
Apesar de devidamente notificada para se manifestar, a coligação
requerida quedou-se inerte.
O Procurador Regional Eleitoral lançou opinativo pugnando pelo
julgamento simultâneo de ambas as ações e indeferimento dos pleitos nelas
formulados.
Foi determinada a reunião dos feitos para serem julgados conjuntamente.
É o relatório.
VOTO
A procedência da ação cautelar requisita a presença conjugada
da plausibilidade do direito invocado - fumus boni juris - e do periculum in
mora, o qual se traduz na ineficácia da decisão, se concedida somente no
julgamento definitivo da ação.
No caso, entendo presentes tanto o fumus boni juris como o periculum in mora.
Imperioso assinalar que se deve dar mais consistência ao voto
popular, a fim de que seja resguardada e assegurada a legitimidade da
vontade do eleitor demonstrada nas urnas. A cassação do mandato de um
eleito pela vontade popular é um fato muito sério e que requer um estudo
mais aprofundado a ser feito no recurso que será apreciado por esta Corte
em momento oportuno.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
71
JURISPRUDÊNCIA
De igual forma em relação ao periculum in mora, eis que o eleito
seria subtraído do mandato que lhe fora outorgado pelos eleitores do Município
de Aporá, período de tempo que não lhe poderia ser devolvido, configurandose, pois, prejuízo irreparável.
Cabe ressaltar também, por oportuno, que, conforme pacífica jurisprudência da Corte Superior Eleitoral, não restam dúvidas sobre a possibilidade de concessão de efeito suspensivo para os recursos que ordinariamente
não possuem tal efeito, como é o presente caso.
Ante o exposto, divirjo do eminente juiz Relator, Dr. Cássio Miranda,
e julgo procedentes as presentes ações cautelares.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de fevereiro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator designado
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 8 8 / 2 0 11
INQUÉRITO
PROCESSO Nº 144(13.602-02.2009.6.05.0000)
CLASSE 18
MUNICÍPIO:
Salvador
PROCEDÊNCIA:
Departamento de Polícia Federal.
INVESTIGADO:
João Luiz Argolo dos Santos. Adv.: Bel. Jorge Salomão Oliveira
dos Santos.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Inquérito. Artigo 350 do Código Eleitoral. Apuração.
Deputado Federal. Declinção de competência. Remessa dos autos ao STF.
Diante da eleição do investigado ao cargo de Deputado Federal, falece a este Regional competência para
apuração do feito, devendo os autos serem remetidos
ao Supremo Tribunal Federal, a teor do artigo 102, I,
alínea “b” da Constituição Federal.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DECLINAR DA COMPETÊNCIA PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, nos termos do voto do Juiz Relator de fl. 195, que integra
o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 24 de fevereiro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - MAURICIO
KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de Inquérito Policial instaurado para apurar a suposta
prática do crime tipificado no artigo 350 do Código Eleitoral, consubstanciado
na apresentação de documentos falsos com o fim de realizar alistamento
eleitoral, atribuída à João Luiz Correia Argolo.
Apresentado o relatório de fls. 183/186, elaborado pelo Delegado
de Polícia Federal que presidiu o Apuratório, os autos foram remetidos a esta
Corte, tendo este Relator determinado seu encaminhamento ao Ministério
Público Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
Em pronunciamento de fls. 190, o Procurador Regional Eleitoral
Auxiliar, diante da eleição do Investigado para o cargo de deputado federal,
opinou pelo envio dos autos ao Supremo Tribunal Federal.
É o relatório.
VOTO
Com efeito, o Investigado João Luiz Correia Argolo dos Santos
elegeu-se Deputado Federal nas eleições realizadas em outubro de 2010,
com mandato que somente se encerrará no ano de 2014.
Portanto, como bem observou o Parquet Eleitoral, esta Corte não
mais detém competência para a apuração do feito, que deve ser encaminhado
ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do artigo 102, inciso I, alínea “b”
da Carta Magna.
Voto, pois, pela remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 21 de fevereiro de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
74
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 0 7 / 2 0 11
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO Nº 4.824-09.2010.6.05.0000
CLASSE 42
(EXPEDIENTE Nº 64.078/2010 – RECURSO)
MUNICÍPIO:
Salvador
RECORRENTES:
José Ronaldo de Carvalho, Paulo Ganem Souto e Antônio Carlos
Peixoto de Magalhães Neto. Advs.: Béis. Ademir Ismerim, Lílian
Maria Santiago Reis e Déborah Cardoso Guirra.
INTERESSADA:
Look Comunicação Visual Ltda. Adv.: Bel. Marcus Welber Carvalhal Pinheiro.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
RELATOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso. Representação. Colagem de cartazes com
propaganda eleitoral em bem público. Notificação
prévia dos beneficiários para restauração do bem no
prazo de 48 horas. Inércia. Incidência da norma contida no art. 40-B, parágrafo único, da Lei nº 9.504/97.
Aplicação de multa no valor mínimo legal (art. 37,
§ 1º da Lei nº 9.504/97). Negativa de provimento ao
recurso.
1. Uma vez constatada a existência de propaganda
irregular em bem público, bem como a inércia dos
beneficiários em adotar providências para retorno
ao status quo ante, impõe-se a incidência das normas contidas nos arts. 40-B e 37, caput e § 1º da Lei
nº 9.504/97, justificando-se, assim, a aplicação de
multa em decorrência da prática do ato ilícito.
2. Recurso a que se nega provimento.
Visto, relatado e discutido o expediente acima indicado,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de fevereiro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício da Presidência - SALOMÃO VIANA, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
75
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto por José Ronaldo de Carvalho, Paulo
Ganem Souto e Antonio Carlos Peixoto de Magalhães Neto contra decisão
proferida pelo relator que me antecedeu no feito (fls. 51/53), que julgou procedente representação ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral contra os
recorrentes e a pessoa jurídica Look Comunicação Visual Ltda.
Segundo o Ministério Público, teria havido prática de propaganda
eleitoral irregular, consubstanciada na colagem de cartazes nos muros da
residência oficial do representante local do Poder Judiciário do Estado da
Bahia, na sede do Município de Pojuca.
Por meio da decisão recorrida, a cada um dos recorrentes foi imposta a obrigação de pagar multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais),
com fulcro nas normas contidas nos arts. 11, § 1º e 12 da Resolução/TSE
nº 23.191/2009.
Em suas razões (fls. 75/81), os recorrentes alegam, em síntese, que,
tão logo foram intimados a respeito da concessão de medida de urgência,
providenciaram a retirada da propaganda e a restauração do bem ao estado
anterior, em razão do que não é cabível a penalidade que lhes foi imposta.
O Ministério Público Eleitoral, de sua vez, pugnou pela manutenção
integral da decisão vergastada.
É o relatório.
VOTO
Não há controvérsia nos autos acerca da existência da propaganda
que gerou o oferecimento da representação. A controvérsia reside é na questão em torno de ter havido ou não a retirada da propaganda, pelos recorrentes,
no prazo concedido na decisão liminar proferida (fls. 19/20).
E aí o que se vê é que, malgrado notificados (fls. 22/24), os recorrentes não adotaram as providências indispensáveis para que fosse procedida a
retirada da propaganda no prazo estabelecido pelo Poder Judiciário Eleitoral,
conforme se depreende do conteúdo da certidão de fl. 48.
Efetivamente, a aludida certidão dá conta de que a Belª Maria de
Lourdes Melo, Juíza de Direito da Comarca de Pojuca, em contato telefônico
com servidor desta Casa, “assegurou que a propaganda irregular foi retirada
a seu mando, por servidores daquele Juízo, em período anterior ao primeiro
turno das eleições, uma vez que não havia sido retirada pelos responsáveis,
em cumprimento às notificações emitidas”.
E neste passo é relevante consignar que a norma contida no parágrafo único do art. 40-B da Lei nº 9.504/97 é clara ao estatuir que a respon-
76
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
sabilidade do candidato estará demonstrada se este, intimado da existência
da propaganda irregular, não providenciar, no prazo de 48 horas, sua retirada,
bem como a regularização da situação, e, ainda, se as circunstâncias e as
peculiaridades do caso específico revelarem a impossibilidade de o beneficiário não ter tido ciência da propaganda.
E como os representados foram regularmente notificados, permanecendo inertes, resta evidenciada a sua responsabilidade pela prática da
ilicitude, fato que justifica a aplicação da reprimenda imposta na decisão
vergastada.
À vista de tais considerações, voto no sentido de que seja negado
provimento ao recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de fevereiro de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
77
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 11 6 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 14.725-58.2008.6.05.0036
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Amargosa
RECORRENTE:
Coligação AMARGOSA DO POVO. Advs.: Béis. Fernando Vaz
e José Juarez Vinhas Júnior.
RECORRIDOS:
Valmir de Almeida Sampaio e Karina Borges Silva. Advas.: Belas.
Carla Maria Nicolini e Sara Mercês dos Santos.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 36ª Zona.
RELATOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso. Procedimento de investigação judicial
eleitoral. Réus ocupantes dos cargos de prefeito e
de vice-prefeito, reeleitos. Alegação de prática de
atos configuradores de abusos de poder econômico
e de poder político, de uso indevido dos meios de
comunicação, de captação ilícita de sufrágio, bem
como de condutas vedadas aos agentes públicos.
Multiplicidade de fatos imputados. Insuficiência do
acervo probatório para a comprovação dos ilícitos.
Negativa de provimento ao recurso.
1. Não merece reparo a sentença que julga improcedente o pedido formulado em procedimento de
investigação judicial eleitoral, quando as provas
colacionadas aos autos, apesar de demonstrarem
indícios da ocorrência dos fatos, não é suficiente para
ensejar a formação de um juízo de valor baseado em
provas robustas.
2. Recurso a que se nega provimento.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 15 de março de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - SALOMÃO
VIANA, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral
78
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela Coligação AMARGOSA DO
POVO contra a sentença de fls. 916/939, por meio da qual a MM. Juíza
Eleitoral da 36ª Zona julgou improcedentes os pedidos formulados no procedimento de investigação judicial eleitoral n. 241/2008.
A demanda foi proposta pela recorrente contra Valmir de Almeida
Sampaio e Karina Borges Silva e o pedido está fundado na alegação da
prática de atos configuradores de abuso de poder político, abuso de poder
econômico, captação ilícita de sufrágio, condutas vedadas aos agentes públicos e uso indevido de meios de comunicação.
Em suas razões (fls. 943/976), a recorrente pugna pela reforma da
sentença sob o argumento de que teriam restado robustamente comprovados
os seguintes ilícitos, atribuídos aos recorridos: (a) implementação do programa
social “Família na Escola” sem lei específica e sem dotação orçamentária;
(b) uso indevido de meios de comunicação, consubstanciado na difusão, por
intermédio da propaganda política dos recorridos, da informação de que a
coligação recorrente seria contrária ao programa “Bolsa Família”; (c) uso de
uma máquina tipo “Patrol” pertencente ao Município de Amargosa, em propriedade rural privada; (d) uso de ônibus e veículos vinculados à prefeitura
em eventos eleitorais; (e) utilização de servidores municipais a serviço da
campanha eleitoral dos recorridos; (f) uso de retroescavadeira pertencente
ao município para fins eleitorais; e (g) distribuição de vales-gasolina a motociclistas em troca de votos.
Em suas contrarrazões (fls. 1005/1026), os recorridos refutaram
as alegações do recorrente e protestaram pela manutenção integral da
sentença.
Instado, o Procurador Regional Eleitoral, invocando o princípio
da unidade institucional, adotou as razões lançadas pela promotoria às fls.
904/913, propugnando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
São múltiplos os motivos apresentados pela recorrente para embasar o pleito de reforma da sentença.
Nenhum deles, todavia, com força para frutificar.
Assim é que, no tocante à alegação de que o programa “Família
na Escola” teria sido implementado com objetivos nitidamente eleitorais –
por meio da participação dos recorridos em eventos e palestras, bem como
mediante a distribuição de bens e serviços –, a acusação não restou suficientemente comprovada.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
79
JURISPRUDÊNCIA
Primeiro, porque o acervo documental coligido aos autos (fls.
295/352 e 587/654) revela que o programa teve início no ano de 2006, fato
que foi confirmado pela própria recorrente na peça recursal (fl. 948).
Segundo, porque, ao contrário do quanto afirmado pela recorrente,
as fotografias acostadas aos autos – as quais retratam um evento ocorrido na
Escola Municipal Professor Eraldo Tinoco (fls. 106/109) –, após periciadas,
contrariam as alegações de que “(...) as instituições foram enfeitadas com as
cores do partido, bandeiras vermelhas, sendo evidenciado pedido de voto”.
Com efeito, a resposta contida no laudo pericial ao questionamento
formulado pela própria coligação recorrente, acerca deste fato, é a de que
nas imagens aparecem bandeirolas vermelhas, além de bandeirolas de
outras cores, como o amarelo, o azul, o verde e o branco. Demais disso, na
mesma resposta consta que não foram identificados adesivos nem bolas na
cor vermelha utilizados na preparação do ambiente (fl. 720).
Terceiro, porque – também ao contrário do alegado pela recorrente
– as fotografias acostadas aos autos não demonstram a utilização, no evento,
de carro de som e de maciça propaganda eleitoral em prol dos recorridos.
Neste ponto, é oportuno transcrever a seguinte conclusão do laudo
pericial de fls. 720/721:
“Dois carros aparecem na foto no canto superior esquerdo à
folha 106. Um é uma Kombi branca, placa JLK-1437, sem adesivos aparentes. O outro é um Gol aparentando ser da cor bege,
placa JKU-7532, com vários adesivos fixados na chaparia,
vidros e pára-choque (ao todo 22 puderam ser visualizados).
Os adesivos que puderam ser identificados são dois adesivos
retangulares com fundo em vermelho e números “65.789” na
cor branca fixados na chaparia e pára-choque, e um adesivo
no formato de estrela com fundo em vermelho, bordas brancas
e o número “13” na cor branca ao centro, fixado no pára-brisa
traseiro (Figura 4). O veículo Gol possui algo no formato de
uma caixa preta acima do capô, porém, pelas imagens, não é
possível identificar algum equipamento emissor de som.”
Como se vê, o laudo pericial não foi conclusivo quanto à utilização
de aparelho de som no veículo Gol e, quanto aos adesivos, eles estavam
nitidamente presentes em somente um dos veículos.
Logo, não restou comprovada a acusação, neste particular.
Quanto aos demais eventos ocorridos em escolas, a prova que
emerge dos autos também não permite concluir que o programa “Família na
Escola” teria sido utilizado para servir a interesses eleitorais.
Já no que toca à controvérsia lançada nos autos acerca de o programa ser oriundo do governo federal ou do governo municipal, bem como
quanto a existir ou não lei autorizadora e dotação orçamentária específica
para a sua implementação, tais questões somente teriam natureza eleitoral – e
80
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
aí, sim, se incluiriam no âmbito da competência constitucional desta Justiça
especializada – se houvesse sido demonstrada a distribuição ilícita de bens
pelos recorridos em período vedado, já que, em tal caso, incidiria a norma
contida no art. 73, § 10 da Lei n. 9.504/97.
Neste ponto, bem salientou a Promotoria Eleitoral (fl. 911):
“Logo, não havendo qualquer imputação de distribuição ilícita
aos participantes, torna-se inadequada a transmudação do
objeto para apuração da existência de dotação orçamentária
ou de lei estabelecendo o programa social, na forma pretendida
pela Autora (fls. 387/388).”
A conclusão, pois, no particular, é a de que, se aconteceram gastos
referentes ao programa “Família na Escola” sem que existisse lei autorizadora
e sem dotação orçamentária específica, o assunto tem natureza administrativa, e não eleitoral.
No que se refere à alegação de que teria havido uso indevido de
meios de comunicação, consubstanciado na difusão, por meio da propaganda
política dos recorridos, da informação de que a coligação recorrente seria
contrária ao programa “Bolsa Família”, o acervo probatório contido nos autos
também não se revela apto para comprovar a ocorrência do ilícito.
Com efeito, o trecho da fala do primeiro recorrido, que foi apontado
como caracterizador da ilicitude, não ultrapassa os limites da crítica política
regular, inerente aos debates eleitorais. Isto porque na propaganda aludida
apenas são lançadas críticas ao fato de os adversários dos recorridos serem
contrários ao governo Lula e, por conseguinte, ao programa Bolsa Família.
Demais disso, a veiculação de propaganda com teor inverídico no
horário eleitoral gratuito deveria ter sido questionada por meio de pedido de
direito de resposta, providência que, ao que tudo indica, não foi adotada pela
coligação recorrente.
Quanto à afirmação de que teria havido uso de uma máquina tipo
“Patrol”, pertencente ao Município de Amargosa, em propriedade rural privada, também não restou ela comprovada, pois as testemunhas arroladas
pela coligação recorrente nada esclareceram (fls. 417/431). Ao contrário, se
limitaram a afirmar que desconheciam o fato.
Ademais, as fotografias de fls. 45/46 dos autos não permitem concluir se o local onde estava a máquina no momento em que foi fotografada
era uma propriedade particular, como alega a recorrente, ou se tratava de
uma estrada pública, como justificaram os recorridos.
No tocante à alegação de que teria havido uso de ônibus e veículos
vinculados à prefeitura em eventos eleitorais, também ela não restou provada,
uma vez que a prova oral produzida não contribuiu para elucidar os fatos.
De sua vez, quanto às fotografias apresentadas, malgrado elas
exibam a imagem de um ônibus com logomarca da prefeitura e com banSemest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
81
JURISPRUDÊNCIA
deiras de propaganda dos recorridos, nada há nos autos que comprove que
os veículos aludidos estavam a serviço da prefeitura no momento em que
foram fotografados.
O mesmo ocorre quanto ao ônibus da Escola Agrotécnica de
Amargosa. Quanto a isto, embora tudo leve a crer que as pessoas que eram
transportadas e desciam do ônibus também iriam para evento político protagonizado pelos recorridos – dada a proximidade entre o local em que o ônibus
estava e o local do evento –, as fotografias, isoladamente consideradas, não
permitem que se chegue a tal conclusão de forma inequívoca, haja vista que
não há, na imagem do ônibus e na imagem das pessoas transportadas, nenhum elemento caracterizador de participação em campanha eleitoral.
No que se refere à afirmativa de que teriam sido utilizados servidores municipais a serviço da campanha eleitoral dos recorridos, também
não foi produzida qualquer prova para demonstrar que a servidora Joseneze
Brito, conhecida como “Neze da Moto” – a única cujo nome foi declinado
pela recorrente – teria servido aos interesses da campanha dos recorridos
em horário de expediente.
Quanto à utilização dos serviços de outros servidores, a parte autora
sequer se dignou de declinar os nomes dos mesmos, limitando-se a afirmar
na exordial que “assim como ela, existem diversos servidores municipais
‘ajudando’ o Prefeito”.
Demais disso, as fotografias acostadas aos autos (fls. 57/64) não
comprovam que os servidores fotografados estavam em dia e horário de
expediente naquele momento.
E como não existe vedação legal para que servidores públicos
participem de campanhas eleitorais, desde que seja preservado o horário
do expediente, a conclusão não pode ser outra: as alegações, também aqui,
não restaram provadas.
No tocante à afirmação de que teria havido uso de uma retroescavadeira pertencente ao município para fins eleitorais, mais uma vez o acervo
probatório é indigente, o que afasta a possibilidade de acolhimento do pedido
com base em tal alegação. É que a prova deste fato limita-se às fotografias de
fl. 52, que contém imagens inconclusivas. De sua vez, a prova oral produzida
também não trouxe maiores esclarecimentos.
Por fim, no que toca à alegação de que teria havido distribuição
de vales-gasolina a motociclistas em troca de votos, verifica-se dos autos
que o Comitê Financeiro do Partido dos Trabalhadores celebrou contratos
de locação tendo por objeto motocicletas “para propaganda eleitoral com
bandeiras em carreatas e caminhadas, e também para fiscalização noturna
durante o período de campanha eleitoral” (fls. 179/182).
Nos aludidos contratos consta que as despesas com combustível
durante a execução dos serviços seriam de responsabilidade do locatário
82
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
na proporção de 3 (três) a 5 (cinco) litros para cada moto, de acordo com o
tipo de evento.
De sua vez, o relato de algumas das testemunhas arroladas pela
própria coligação recorrente corroborou tais evidências, como se depreende
dos seguintes excertos:
“(...) que os vales gasolina era entregue para os motoqueiros
irem para as caminhadas e passeatas; que os vales gasolina
correspondiam ao valor de R$ 10,00 (dez reais); (depoimento
da testemunha Carlos Henrique Almeida Rodrigues, arrolada
pela recorrente);
“(...) que a distribuição era para o pessoal que participava das
caminhadas dos eventos do PT; (depoimento da testemunha
Joselito Santos da Silva, arrolada pela recorrente).
Como cediço, a configuração dos ilícitos imputados aos recorridos,
ante as graves reprimendas que acarreta, exige prova de uma robustez tal
que não deixe margem a dúvidas razoáveis, o que não ocorreu na situação
sob exame.
Não é difícil imaginar, ante os criminosos descalabros que cotidianamente acontecem na política dos municípios baianos, que uma sequência
fática como a narrada na petição inicial pode ser verdadeira.
Infelizmente, todavia, do modo como a prova veio aos autos não é
possível chegar à conclusão de que os ilícitos efetivamente aconteceram.
Este é, pois, mais um daqueles casos em que, apesar de haver
indícios da ocorrência dos fatos, o conjunto probatório não é suficiente, não
restando outro caminho para o órgão julgador senão o de se conformar com
a frustração da impossibilidade de formar um juízo de valor baseado em
provas robustas.
Pelo exposto, em harmonia com o parecer ministerial, voto no
sentido de que seja negado provimento ao recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 15 de março de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
83
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 2 5 / 2 0 11
AÇÃO CAUTELAR
PROCESSO Nº 5.111-69.2010.6.05.000
CLASSE 1
MUNICÍPIO:
Uruçuca
REQUERENTE:
José Pedro de Oliveira Castro. Advs.: Béis. Janjório Vasconcelos
Simões Pinho e Itamar da Silva Rios.
REQUERIDO:
Ministério Público Eleitoral.
INTERESSADO:
Reginaldo Barbosa da Silva. Advs.: Béis. Bruno Gustavo Freitas
Adry, André Luiz de Andrade Carneiro, Sanzo Biondi e outros.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Ação Cautelar. Pedido Liminar. Concessão. Efeito
suspensivo. Recurso em AIJE e AIME. Procedência.
Vislumbrando a possibilidade de êxito no recurso
interposto, julga-se procedente a ação cautelar,
mantendo-se a decisão liminar que atribuiu efeito
suspensivo ao recurso interposto nos autos da AIJE
e AIME reunidas por conexão, nas quais o demandante teve seu diploma cassado e sua inelegibilidade
decretada.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, por
maioria, vencidos os Juízes Salomão Viana e Cássio Miranda, JULGAR
PROCEDENTE A AÇÃO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado,
que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 17 de março de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício
da Presidência - MAURICIO KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY
PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral
RELATÓRIO
Cuida-se de ação cautelar, com pedido liminar, promovida por José
Pedro de Oliveira Castro, na qual se requer a atribuição de efeito suspensivo
ao recurso interposto contra a decisão que lhe cassou o mandato de vereador
e decretou sua inelegibilidade por oito anos, proferida nos autos da AIME
84
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
nº 281/2008 e da AIJE nº 279/2008, apensadas por determinação do Juiz
Eleitoral da 198ª Zona.
Sustenta o requerente que o Ministério Público teria instaurado
procedimento administrativo preparatório para apurar denúncia de crime
eleitoral, ouvindo testemunhas, requisitando documentos e requerendo diligências, tudo sem passar pelo crivo do contraditório, juntando aos autos o
material unilateralmente colhido, que teria desconsiderado os depoimentos
das testemunhas que relataram os fatos tal como teriam acontecido.
Alega, ainda, que, quando da realização da primeira audiência,
indagada pelo Juiz se confirmava o que teria antes dito ao Ministério Público, a primeira testemunha de acusação, assim não procedendo, teria
recebido voz de prisão, amedrontando as demais que aguardavam para
serem ouvidas.
Defende que a fragilidade das provas colhidas no procedimento
administrativo utilizado como alicerce da sentença zonal fora reconhecida
pela Procuradoria Eleitoral em habeas corpus impetrado pelas testemunhas
arroladas nas ações.
Assevera ser evidente a plausibilidade do recurso, já que as provas que embasaram a condenação não teriam sido colhidas sob o crivo
do contraditório.
Requer seja suspensa a execução da decisão vergastada, permitindo-se que o requerente fique no cargo até o julgamento final do feito.
Instado, o Parquet zonal, em manifestação de fl s. 188/202,
sustenta que as alegações do demandante teriam mero intuito procrastinatório, pois a decisão do Magistrado da 198ª Zona encontraria alicerce
em provas robustas, inexistindo ilegalidade ou fragilidade dos elementos
probantes.
Defende, ainda,000 que a alegada parcialidade do Magistrado
Zonal já teria sido afastada por esta Corte quando do julgamento da exceção nº 287.
Alega, outrossim, que as provas produzidas pela investigação
ministerial não seriam ilegais, tendo sido submetidas ao contraditório de
forma diferida.
Pugna, ao fim, pela eficácia imediata da decisão proferida pelo
Magistrado da 198ª Zona.
Em decisão de fls. 88/90, deferi o pleito liminar, concedendo o efeito
suspensivo requestado, para determinar que o requerente fosse mantido no
cargo de vereador do Município de Uruçuca, decisão esta que foi ratificada
por este Colegiado quando da apreciação de agravo regimental interposto
por Reginaldo Barbosa da Silva na qualidade de terceiro interessado.
Com vistas dos autos, o Procurador Regional Eleitoral reiterou a
manifestação do Promotor de fls. 188/202, opinando pela improcedência do
pedido.
Pelo expediente nº 9.623/2011, o requerente apresentou manifestação acerca do referido opinativo.
É o relatório.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
85
JURISPRUDÊNCIA
VOTO
Busca a presente ação cautelar a atribuição de efeito suspensivo
ao recurso interposto contra decisão que cassou o mandato do requerente,
matéria que já foi discutida por esta Corte quando do julgamento do agravo
regimental interposto contra a decisão liminar proferida, que o manteve no
cargo de vereador do Município de Uruçuca.
Da análise das alegações do requerente e dos demais elementos encartados aos autos, tenho que existe substrato fático e jurídico para
manutenção do efeito suspensivo atribuído liminarmente, uma vez que se
vislumbram indícios que, in abstractu, revelam chance de êxito do recurso
manejado pelo demandante.
Impende destacar, primordialmente, a alegada fragilidade da prova
testemunhal produzida, tendo em vista que o primeiro depoente, ao negar
o que antes havia afirmado em procedimento administrativo conduzido pelo
Ministério Público, teria saído da audiência preso e algemado, em virtude
de reconhecido crime de falso testemunho, o que poderia ter intimidado as
demais testemunhas arroladas para depor, motivando inclusive a impetração
de habeas corpus preventivo, com o escopo de impedir que o Juiz decretasse a prisão de quem não confirmasse o quanto dito antes, tendo esta Corte
decidido pela expedição de salvo-conduto (Habeas corpus nº 156, julgado
em 18/12/2009).
Destaca-se, ainda, que a inconformidade do requerente nestes
autos acerca da situação retro mencionada não se refere à possível parcialidade do juiz, mas sim à imprestabilidade das provas testemunhais colhidas,
não se confundindo, portanto, com o teor da matéria ventilada na exceção de
suspeição ajuizada anteriormente, que abarca questões atreladas à pessoa
do juiz e à suposta fragilidade da prova testemunhal.
Ademais, é inegável que o afastamento do requerente do cargo de
vereador para o qual foi eleito lhe causa prejuízo que não poderá ser reparado
caso venha a ser provido o recurso por ele interposto.
Salienta-se que o Tribunal Superior Eleitoral vem se mostrando favorável à manutenção do mandato até o julgamento final do recurso interposto,
conforme posicionamento extraído do acórdão de 12/11/2009, exarado nos
autos da ação cautelar nº 3346 - Sena Madureira/AC:
“AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CAUTELAR. RECURSO
ESPECIAL ELEITORAL. EFEITO SUSPENSIVO. CONCESSÃO. POSSIBILIDADE. FUMUS BONI JURIS. PERICULUM
IN MORA. SÚMULAS Nos 7/STJ E 279/STF. NÃO CONTRARIEDADE. NÃO PROVIMENTO.
1. A análise da plausibilidade das alegações do recurso especial, a partir da moldura fática do acórdão recorrido, para fins de
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
concessão de efeito suspensivo, não contraria os enunciados
das Súmulas nº 7/STJ e 279/STF. No caso, ficou assentado na
decisão agravada que, a partir da leitura do v. acórdão regional,
poder-se-ia verificar, em princípio, a possibilidade de êxito do
recurso, pelo fato de, da moldura fática do v. acórdão recorrido, extrair-se que a participação do candidato beneficiário ou
sua anuência na suposta prática violadora do art. 41-A da Lei
9.504/97 não foi bem delineada, demandando análise de sua
compatibilidade com a jurisprudência desta c. Corte. Por outro
lado, em análise preliminar, não pode ser desconsiderado o
fato de que a controvérsia foi decidida com voto de desempate
do e. Desembargador Presidente.
2. Em regra, os recursos eleitorais são recebidos tão
somente no efeito devolutivo. Admite-se o recebimento
do recurso no duplo efeito apenas excepcionalmente,
desde que pleiteado mediante ação cautelar na qual fique
evidenciada a presença de fumus boni juris e periculum in
mora. Precedentes: AgR-AI nº 10.157/SC, DJE de 20.2.2009;
AgR-AC nº 3.000/MT, DJE de 15.12.2008, ambos de minha
relatoria. Na hipótese dos autos, a plausibilidade das alegações
consubstancia-se nas dúvidas existentes sobre a robustez da
prova dos autos delineada na moldura fática do v. acórdão
regional. Já o perigo da demora consistiria na possibilidade de
realização de novas eleições em curto espaço de tempo.
3. Agravo regimental não provido.”
(Acórdão de 12/11/2009. Agravo Regimental em Ação Cautelar
nº 3346 - Sena Madureira/AC. Relator: Min. Felix Fischer. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 01/02/2010, Página
427) Grifos aditados.
Saliente-se que o recurso ao qual a cautelar concedeu efeito
suspensivo foi recebido na Procuradoria Regional Eleitoral em 17/01/2011,
devendo, em breve, ser apreciado pelo Colegiado.
Por essas razões, voto pela procedência do pedido, ratificando a
liminar que atribuiu efeito suspensivo ao recurso interposto pelo requerente
em face da decisão proferida nos autos da AIJE nº 279/2008 e da AIME nº
281/2008, reunidas por conexão.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 17 de março de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 3 6 / 2 0 11
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO: Nº 7.898-71.2010.6.05.0000
CLASSE 42
MUNICÍPIO:
Manoel Vitorino
REPRESENTANTE: Ministério Público Eleitoral.
REPRESENTADOS: Euclides Nunes Fernandes (Adv.: Bel. Ademir Ismerim) e Lenilton
Pereira Lopes (Adv.: Bel. Sérgio Castro Sampaio).
RELATOR:
Juiz Renato Reis Filho.
Representação. Conduta vedada. Art. 73, incisos
I e IV da Lei nº 9.504/97. Utilização de veículos da
prefeitura, em carreata, em favor do primeiro representado. Ilicitudes demonstradas. Responsabilidade
do candidato não apurada. Prévio conhecimento não
demonstrado. Procedência parcial.
Preliminar de falta de interesse de agir.
À luz dos §§1º e 4º do artigo 73 da Lei nº 9.504/97,
todo aquele que concorre para a prática da ilicitude
poderá ser responsabilizado, mediante o arbitramento de sanção pecuniária, pelo que não se acolhe a
preliminar.
Preliminar de ilicitude da prova.
Acolhe-se, parcialmente, a preliminar, somente para
considerar imprestável, como meio de prova, o vídeo
trazido pelo autor, porquanto desacompanhado da
respectiva degravação.
Preliminar de incompetência do Juízo.
Em se tratando a presente demanda do descumprimento da Lei nº 9.504/97, em eleições estaduais, não
há dúvida acerca da competência deste Regional
para processar e julgar a causa, consoante previsão
expressa constante do artigo 96 do aludido diploma
legal.
Preliminar de ilegitimidade passiva e ausência de
prévio conhecimento.
Verificando-se tratar-se de questões atinentes ao
próprio mérito da ação, julgam-se prejudicadas as
preliminares, devendo as mesmas serem analisadas
em momento oportuno.
88
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Mérito.
Julga-se parcialmente procedente a ação quando, após
verificado o conjunto probatório, tem-se por evidenciada
a responsabilidade do prefeito na utilização de bens móveis da prefeitura, bem como na utilização promocional
de uma ambulância municipal, em favor de candidato ao
cargo de deputado estadual, cujo prévio conhecimento,
todavia, não foi demonstrado.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER AS PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA
DO JUÍZO e DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR, JULGAR PREJUDICADAS AS DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM e DE AUSÊNCIA DE
PRÉVIO CONHECIMENTO e ACOLHER PARCIALMENTE A PREFACIAL
DE ILICITUDE DA PROVA e, no mérito, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO PARA CONDENAR LENILTON PEREIRA
LOPES AO PAGAMENTO DE MULTA NO VALOR DE VINTE MIL REAIS,
nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o
presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de março de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício da Presidência - RENATO REIS FILHO, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de representação manejada pelo Ministério Público Eleitoral em face do Deputado Estadual Euclides Nunes Fernandes e de Lenilton
Pereira Lopes, prefeito do Município de Manoel Vitorino/BA, por suposta
afronta ao artigo 73, I e IV da Lei nº 9.504/97, consubstanciada na utilização de
veículos da Prefeitura, em favor da candidatura do primeiro representado.
A exordial noticia que o agente da Polícia Federal, Tárcio Sousa
Prado, em cumprimento à Ordem de Missão nº 144/2010, diligenciou visita
à sede do Município de Manoel Vitorino, onde teria presenciado a ocorrência
de carreata, que contava com a presença de carro de som, ambulâncias,
viaturas da prefeitura e veículos particulares.
Em informação acostada aos autos, o referido agente policial assevera que alguns dos veículos particulares portavam ostensiva propaganda em
favor do então candidato a deputado estadual, Euclides Nunes Fernandes.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
89
JURISPRUDÊNCIA
Aduz ter fotografado o episódio e buscado informações adicionais, gravando
“entrevista” com o prefeito representado, tendo este informado tratar-se de
mera recepção, organizada pela população local, em decorrência do recebimento da ambulância do SAMU. Entretanto, afirma que o “entrevistado”
se contradisse quando indagado sobre a procedência do carro de som que
capitaneava o evento.
Encaminhada a informação policial ao Ministério Público Eleitoral,
o eminente Procurador Regional Eleitoral Substituto ajuizou a presente ação,
com o escopo de obter a condenação dos representados ao pagamento da
multa prevista no artigo 73, § 4º da Lei nº 9.504/97 e a cassação do diploma
do prefeito representado.
Em sua defesa, Lenilton Pereira Lopes suscitou preliminares de
falta de interesse de agir e de ilicitude da prova. No mérito, pugna pela improcedência da demanda, alegando inexistir nos autos qualquer prova das
acusações que lhes foram feitas.
Euclides Nunes Fernandes também juntou contestação, aventando,
preliminarmente, a incompetência absoluta do Juízo para o julgamento do
feito, a ilegitimidade passiva ad causam e a ausência de prévio conhecimento.
Na questão de fundo, denega a veracidade dos argumentos levantados na
proemial, afiançando não ter qualquer conhecimento do evento sob exame,
atrelando aos autos declarações que confirmariam a sua presença em localidades distantes de Manoel Vitorino na data do aludido episódio. Insta, assim,
pelo não acolhimento dos pedidos formulados.
Em réplica, o Ministério Público Eleitoral pugnou pelo não acolhimento das preliminares e pela procedência da representação.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUIZO.
A competência para processar e julgar as representações decorrentes do descumprimento da Lei n.º 9.504/97 encontra-se, expressamente,
prevista no artigo 96 daquele diploma legal, in verbis:
“Art. 96. Salvo disposições específicas em contrário desta Lei,
as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação
ou candidato, e devem dirigir-se:
[...]
II - aos tribunais regionais eleitorais, nas eleições federais,
estaduais e distritais;
90
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
[...]
§ 3º Os tribunais eleitorais designarão três juízes auxiliares
para a apreciação das reclamações ou representações que
lhes forem dirigidas.”
Findo o processo eleitoral, teve termo, também, a competência dos
juízes auxiliares, razão pela qual foram os respectivos processos redistribuídos
aos membros do Tribunal, em absoluta observância ao dispositivo legal.
Em se tratando a presente demanda de representação por prática
de conduta vedada a agentes públicos, em eleições estaduais, não há dúvida
de que a competência originária é deste Regional. Nesta direção, inacolhese a preliminar.
PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR.
O segundo representado, Lenilton Pereira Lopes, argumenta que
ao autor faltaria o interesse de agir, asseverando que, em consonância com
o disposto no artigo 20 da Resolução TSE nº 23.193/09, a ação sob exame
só poderia ter sido ajuizada até a data da sua diplomação, que ocorreu em
18/12/2008.
A tese não merece prosperar. É que o segundo representado ostenta
o cargo de prefeito da cidade de Manoel Vitorino e foi acionado na condição
de agente público pela prática de condutas, supostamente, vedadas, perpetradas em benefício da candidatura do primeiro representado, que concorrera
ao cargo de deputado estadual.
Com efeito, à luz dos §§1º e 4º do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, todo
aquele que concorre para a prática da ilicitude poderá ser responsabilizado,
mediante o arbitramento de sanção pecuniária.
Nesta senda, há que ser observada a data da diplomação do
primeiro representado, cujo cargo estava em disputa nas últimas eleições,
donde se verifica que a ação foi ajuizada em tempo hábil e perante o Tribunal
competente, considerando-se que se tratava de eleições estaduais.
Assim, não afasta-se a preliminar.
PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM e DE AUSÊNCIA DE PRÉVIO CONHECIMENTO.
Euclides Nunes Fernandes argumenta que não poderia figurar no
polo passivo da presente demanda, uma vez que não teria qualquer responsabilidade, ou sequer conhecimento do evento ora discutido.
O exame da fundamentação das aludidas preambulares revela
questões atinentes ao próprio mérito da ação, devendo ser apreciadas em momento adequado, à vista do que se julgam prejudicadas as preliminares.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
91
JURISPRUDÊNCIA
PRELIMINAR DE ILICITUDE DA PROVA.
Aventou-se a ilicitude das provas colacionadas aos autos, em razão
da ausência de degravação das declarações do Prefeito Lenilton Pereira
Lopes, constantes do vídeo de fl. 22, e da inexistência dos negativos das
fotografias juntadas à inicial.
No que concerne à inexistência dos negativos, a jurisprudência
pátria é uníssona no sentido de que, em se tratando de fotografias realizadas
com câmera digital, é prescindível a apresentação dos requeridos negativos,
desde que as imagens encartadas se façam acompanhar da respectiva mídia,
o que, de fato, ocorreu na hipótese vertente.
Entretanto, no tocante à ausência da degravação do vídeo, entendo
assistir razão ao acionado.
Com efeito, os artigos 6º, § 4º e 22, § 1º da Resolução TSE nº
23.193/09 evidenciam a imprescindibilidade do encimado documento, senão
vejamos:
“Art. 6º. As petições ou recursos relativos às representações
serão admitidos, quando possível, por petição eletrônica ou
via fac-símile, dispensado o encaminhamento do texto original,
salvo aqueles endereçados ao Supremo Tribunal Federal.
[...]
§ 4º. A mídia de áudio e/ou vídeo que instruir a petição
deverá vir obrigatoriamente acompanhada da respectiva
degravação em 2 vias, observado o formato mp3 para as
mídias de áudio; wmv, mpg, mpeg ou avi para as de vídeo
digital e VHS para fitas de vídeo.
Art. 22. [...].
§ 1º No caso de representação instruída com imagem e/ou áudio, a respectiva degravação será encaminhada juntamente
com a notificação, devendo uma cópia da mídia permanecer
no processo e a outra mantida em secretaria, sendo facultado
às partes e ao Ministério Público, a qualquer tempo, requerer
cópia, independentemente de autorização específica do relator.” Grifos aditados.
Demais disso, o áudio do multicitado vídeo não se apresenta em
condições satisfatórias, restando impossibilitada a perfeita compreensão do
seu conteúdo.
Pelo exposto, acolho, parcialmente, a preliminar, para considerar
imprestável, como meio de prova, o vídeo constante da fl. 22 dos autos.
MÉRITO.
De início, tem-se por pertinente a análise dos dispositivos legais
apontados pelo representante, quais sejam os incisos I e IV do artigo 73 da
Lei nº 9.504/97, in verbis:
92
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
“Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou
não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de
oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou
coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos estados, do Distrito Federal,
dos territórios e dos municípios, ressalvada a realização de
convenção partidária;
[...]
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato,
partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens
e serviços de caráter social custeados ou subvencionados
pelo Poder Público;”
O exame das evidências coligidas aos autos autoriza a conclusão
de que a pretensão ministerial merece parcial provimento.
As fotografias registradas pela Polícia Federal revelam a ocorrência
de uma carreata em favor do então candidato ao cargo de deputado estadual,
Euclides Fernandes, da qual participaram veículos da prefeitura municipal,
incluindo uma ambulância da SAMU – Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência.
A referida prova ganha robustez com a informação prestada pelo
agente da Polícia Federal, às fls. 09/12, cujos principais trechos peço vênia
para transcrever, à vista de sua relevância:
Em 29 de setembro de 2010, durante o cumprimento da referida
Ordem de Missão que teve como finalidade de diligenciar no
município de Jequié-BA e adjacências a fim de cumprir dever
constitucional do DPF nas Eleições 2010, dentre outros municípios, estivemos no Município de Manoel Vitorino, localizado
às margens da BR 116, a 395 km de Salvador.
Logo na nossa chegada à cidade, identificamos uma carreata
com razoável número de veículos, onde lá estavam veículos
de uso da prefeitura local, tais como ambulâncias, carros de
som alugados dentre outros. O que nos chamou a atenção
foi que no meio desses veículos estavam alguns com propagandas políticas de candidatos às eleições 2010, mais
ostensivamente o candidato a Deputado Estadual pelo
PDT, ‘EUCLIDES’, nº 12363, inclusive parecendo estar à
frente da carreata, logo após o carro de som. Procedemos
então um acompanhamento com nossa viatura, tirando algumas fotos. Logo após conseguimos uma pequena entrevista
com o prefeito municipal local, o Sr. LENILTON PEREIRA
LOPES. Ao solicitarmos informações sobre o que estaria
acontecendo, este nos informou que estava em Jequié/BA
onde recebera uma ambulância SAMU e estava chegando
naquele momento com uma viatura do SAMU e que estaria
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
93
JURISPRUDÊNCIA
apresentando à sociedade local, e que assim que chegaram,
ele e sua comitiva, teriam sido recebidos pela população com
muita empolgação.
(Informações da Polícia Federal – fls. 09/12).
Entretanto, é de se reconhecer que nada há nos autos que evidencie que o primeiro representado tenha sido, pessoalmente, responsável pela
realização do evento, ou de que tenha a ele comparecido. Neste sentido,
não se afigura razoável responsabilizar o candidato, porquanto não restou
demonstrado o seu prévio conhecimento.
O que se extrai dos autos é a participação inequívoca do prefeito,
na aludida carreata, na qual se promoveu a utilização de bens móveis da
Prefeitura, bem como o uso promocional da ambulância, em benefício da
candidatura do primeiro representado, numa tentativa de se vincular a imagem do candidato ao aludido serviço móvel, de inegável caráter social, o que,
indubitavelmente, denota afronta à legislação eleitoral.
Considerando a magnitude da lesão decorrente das condutas ora
apuradas, tenho que a sanção pecuniária revela-se suficiente para repreender
o ilícito perpetrado, à luz do princípio da proporcionalidade. Neste sentido,
eis o que se colhe do magistério de José Jairo Gomes:
“Ora, o fato de uma conduta ser vedada a agente estatal não
significa que sempre e necessariamente leve à cassação de
diploma, pois nesta seara incide o princípio da proporcionalidade, pelo qual a sanção deve ser sempre ponderada em
função da lesão perpetrada ao bem jurídico. Em tese, uma
conduta vedada pode ser sancionada com multa, com a só
determinação de cessação ou mesmo com a invalidação do
ato inquinado.
[...] A proporcionalidade opera na fixação da sanção, seja no
aspecto qualitativo, seja no quantitativo. Consequentemente,
em certos casos, em vez de se cassar o registro ou o diploma,
pode-se optar pela multa. E mesmo na dosagem desta deve
haver moderação.”
(GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 4ª ed. Belo Horizonte:
Del Rey, 2009, p. 515).
Pelo exposto, julgo, parcialmente, procedente a ação, para condenar
apenas o segundo representado, o Sr. Lenilton Pereira Lopes, ao pagamento
de multa, no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais), com fulcro no § 4º, do
artigo 73 da Lei n.º 9.504/97.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de março de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 6 8 / 2 0 11
RECUERSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA
PROCESSO Nº 719 (3-88.2008.6.05.0110)
CLASSE 29
MUNICÍPIO:
Ribeira do Pombal
RECORRENTE:
Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB de Ribeira do
Pombal. Advs.: Béis. Brenno de Melo Gomes Calasans e Paulo
Miranda Fontes.
RECORRIDOS:
José Lourenço Morais da Silva Júnior e Jairo Monteiro do Nascimento. Advs.: Béis. Rafael de Medeiros Chaves Mattos, Tâmara
Costa Medina da Silva e Pedro da Costa Vargens.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 110ª Zona.
RELATOR:
Juiz Salomão Viana.
REVISOR:
Juiz Cássio Miranda.
Recurso contra expedição de diploma. Alegação de
corrupção, fraude, abuso de poder político e econômico e captação ilícita de sufrágio. Exigência de
prova pré-constituída. Necessidade, apenas, de que
as provas a serem produzidas sejam especificamente
requeridas na petição inicial. Desconhecimento da
gravação por parte de um dos interlocutores. Alegação de ilicitude da prova. Inacolhimento. Pedido
ancorado em provas frágeis. Improcedência.
1. Não se pode exigir que a petição inicial do procedimento que a lei rotula de “recurso contra a expedição
de diploma” se faça acompanhar de toda a prova
necessária ao julgamento do feito. A necessidade,
apenas, é a de que as provas a serem produzidas
sejam especificamente requeridas na petição inicial,
tal como o foram no caso destes autos.
2. O desconhecimento da gravação por parte de um
dos interlocutores não tem o condão de macular
a prova, uma vez que, em juízo de ponderação, o
interesse público na lisura do processo eleitoral
deve prevalecer sobre os direitos à intimidade e
privacidade.
3. Deve ser julgado improcedente o pedido fundamentado em fraude, abuso de poder político e econômico
se o acervo probatório se revela frágil.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
95
JURISPRUDÊNCIA
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE PROVA
PRÉ-CONSTITUÍDA, por maioria, vencidos os Juízes Renato Reis Filho e
Mauricio Kertzman Szporer, INACOLHER A PRELIMINAR DE ILICITUDE DA
PROVA e, no mérito, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO,
nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o
presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício da Presidência - SALOMÃO VIANA, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de procedimento que a lei rotula de “recurso contra expedição de diploma”, deflagrado a partir de demanda proposta pelo PARTIDO
DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA contra JOSÉ LOURENÇO MORAIS DA SILVA, conhecido como “Zé Grilo” (prefeito), e JAIRO MONTEIRO
(vice-prefeito), com fundamento no inciso IV do art. 262 do Código Eleitoral.
O demandante sustenta que os demandados teriam praticado atos configuradores de captação ilícita de sufrágio, abuso de poder político e econômico,
corrupção e fraude.
Os atos teriam sido materializados nas seguintes condutas:
i) oferecimento, em 15/08/08, pelo prefeito demandado, em troca
de voto, de bem e de vantagem pecuniária a José Arivaldo, durante visita à
Associação Baixa do Umbuzeiro, além da promessa de entrega de um uniforme de futebol, de uma bola e de bebida a pessoa não identificada;
ii) oferecimento, pelo prefeito acionado, de vantagens a pessoas
integrantes da nação cigana, após acordo que teria sido firmado em 02/08/08
com cerca de 20 famílias residentes do Município, para calçamento de um
trecho da Rua Salustiano Barreto Mendonça, onde estariam concentradas as
residências das aludidas pessoas. Além disso, as principais destinatárias das
vantagens seriam uma pessoa de nome Josafá (que seria beneficiada pela
construção de um calçamento em uma fazenda de sua propriedade, situada na
região do Tabuleiro, à margem direita da BA-110, no sentido Pombal-Tucano,
logo após o Motel Xodó) e outra de nome Ataíde (que seria beneficiada com
a lavratura de uma escritura relativa à compra e venda de um imóvel rural
que o prefeito réu teria lhe vendido cerca de um ano antes);
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
iii) doação, pelos demandados, de filtros de água em troca de votos;
iv) promessa feita, em troca de votos, por uma pessoa de prenome
Manoel (ex-secretário municipal de saúde) e outra de prenome Sérgio (prestador de serviços para a prefeitura), por ordem dos demandados, ao eleitor
Rosival Barbosa, de entrega de dinheiro, outorga de vantagens pessoais,
concessão de uma linha de ônibus para transportar alunos e transferência
da esposa para a sede do Município;
v) contratação de 522 novos servidores municipais no ano de 2008,
no período de janeiro a junho, abrangendo cargos comissionados e temporários, sem prévio concurso público e sem a demonstração de urgência e de
excepcional interesse público;
vi) utilização de servidores municipais, no horário de expediente,
para servir aos interesses da campanha dos acionados; e
vii) transporte ilegal de eleitores no dia do pleito.
Na defesa que apresentaram (fls. 342/412), os réus alegaram,
inicialmente, ausência de justa causa para a propositura da demanda, ante
a inexistência de prova pré-constituída das alegações, e a ilicitude da prova carreada aos autos, consistente em gravação de conversa por um dos
interlocutores sem a autorização do outro. No mais, rechaçaram todas as
imputações que lhes foram dirigidas.
Encerrada a instrução, na qual vieram aos autos documentos e
foram ouvidas testemunhas, ambas as partes apresentaram alegações finais
(fls. 566/657 e 672/681).
Em seu pronunciamento de fls. 683/687, o Procurador Regional
Eleitoral opinou pela rejeição das alegações de ausência de prova préconstituída e de ilicitude da prova e, na sequência, se pronunciou no sentido
de que seja rejeitado o pedido.
É o relatório, que submeto à apreciação do Juiz revisor.
VOTO
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA.
A alegação de ausência de prova pré-constituída não merece acolhimento, visto que não se pode exigir que a petição inicial do procedimento que
a lei rotula de “recurso contra a expedição de diploma” se faça acompanhar
de toda a prova necessária ao julgamento do feito. A necessidade, apenas,
é a de que as provas a serem produzidas sejam especificamente requeridas
na petição inicial, tal como o foram no caso destes autos.
Esta, aliás, é a posição que vem sendo pacificamente adotada pelo
Tribunal Superior Eleitoral.
Assim, voto pela rejeição da alegação.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
97
JURISPRUDÊNCIA
ALEGAÇÃO DE ILICITUDE DA PROVA CONSISTENTE EM OBTENÇÃO
DE GRAVAÇÃO CLANDESTINA.
Alegam os demandados que as mídias alusivas às gravações de diálogos travados entre o primeiro réu, juntamente com as pessoas conhecidas
como Ataíde Cigano e Tavinho Cigano, e o eleitor José Arivaldo Evangelista
dos Santos, bem como a dos diálogos travados entre Manoel, Sérgio e Rosival, consistiriam em prova ilícita e imoral, porquanto as gravações teriam
ocorrido sem a autorização de um dos interlocutores.
Ocorre que, conforme tenho me manifestado em diversos julgamentos nesta Corte, em posicionamento amparado pela jurisprudência das
Cortes Superiores, o desconhecimento da gravação por parte de um dos
interlocutores não tem o condão de macular a prova, uma vez que, em juízo
de ponderação, o interesse público na lisura do processo eleitoral deve prevalecer sobre os direitos à intimidade e privacidade.
Quanto a isto, vale trazer à colação o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. GRAVAÇÃO.
CONVERSA TELEFÔNICA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES, SEM CONHECIMENTO DO OUTRO. INEXISTÊNCIA DE CAUSA LEGAL DE SIGILO OU DE RESERVA DE
CONVERSAÇÃO. LICITUDE DA PROVA. ART. 5º, XII e LVI,
DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. A gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, quando ausente causa
legal de sigilo ou de reserva da conversação não é considerada
prova ilícita. Precedentes.
2. Agravo regimental improvido.
(STF. Ag.Reg. no Agravo de Instrumento n. 578858, do Rio
Grande do Sul, relatora a Min. Ellen Gracie. Julgamento em
04/08/2009 Órgão Julgador: Segunda Turma. DJE: 28-082009).
Na mesma linha, os seguintes julgados do Tribunal Superior Eleitoral:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL.
DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS
FUNDAMENTOS.
I - A decisão regional encontra respaldo na jurisprudência
desta Corte, uma vez que persiste o interesse de agir do
Ministério Público Eleitoral na causa, mesmo diante da ine-
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
xistência do mandato eletivo, em virtude da possibilidade de
aplicação da sanção de multa por infração ao art. 41-A da Lei
das Eleições.
II - A gravação clandestina feita por um dos interlocutores,
sem conhecimento do outro, não constitui interceptação
vedada pela Constituição da República. (Precedentes do
TSE).
III - Divergência jurisprudencial não demonstrada (Súmula
284 do STF).
IV - Os fatos delineados no acórdão regional não seriam
suficientes para que este Tribunal afastasse a conclusão da
prática da captação ilícita de votos sem o reexame da matéria
fático-probatória, vedado nesta instância, a teor da Súmula 279
do Supremo Tribunal Federal.
V - Decisão agravada mantida por seus próprios fundamentos.
VI - Agravo regimental desprovido. (grifo nosso)
(AgR-REspe n. 4198880, de Porto Velho/RO. Relator o Min.
Enrique Ricardo Lewandowski. DJE - 10/05/2010, p. 21).
RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA. ILICITUDE. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA. ART. 5º, XII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
ORDEM JUDICIAL. AUSÊNCIA. CONTAMINAÇÃO DAS DEMAIS PROVAS. INCIDÊNCIA DOS VERBETES SUMULARES
Nº 7/STJ e 279/STF.
1. A gravação clandestina feita por um dos interlocutores,
sem conhecimento do outro, não constitui interceptação
vedada pela Constituição da República, sobretudo quando
se destine a fazer prova, em juízo ou inquérito, a favor de
quem a gravou.
2. No caso dos autos, não é possível saber se quem forneceu a mídia seria a própria pessoa constante da gravação,
ou seja, não há como aferir se houve anuência de um dos
interlocutores.
3. Para alterar a conclusão do decisum, de que as demais
provas estariam contaminadas por derivação, seria necessário
amplo reexame do material probatório, providência inviável nas
instâncias extraordinárias (Súmulas nos 7/STJ e 279/STF).
4. Recurso especial desprovido. (grifos acrescidos).
(REspe n. 35622, de Manaus/AM. Relator o Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira. DJE - 05/10/2009, p. 60/61).
Recurso Especial. Representação. Captação ilícita de sufrágio.
Rito do art. 22 da LC nº 64/90. Apresentação do rol de testemunhas. Momento oportuno. Inicial. Precedentes. Reabertura
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JURISPRUDÊNCIA
de prazo. Preclusão. Pelo rito do art. 22 da Lei Complementar
nº 22/90, o momento oportuno de apresentação do rol de
testemunhas, pelo autor, é o do ajuizamento da inicial, sob
pena de preclusão.
Provas testemunhais. Requerimento do Ministério Público
Eleitoral. Custos legis. Possibilidade. Art. 83, II, do Código de
Processo Civil. O Ministério Público Eleitoral, conforme preceitua o art. 83, II, do Código de Processo Civil, pode requerer
oitivas de testemunhas que entender imprescindíveis.
Prova. Gravação de vídeo por um dos interlocutores, ainda que
sem conhecimento dos demais. Possibilidade. Precedentes
do Supremo Tribunal Federal. É lícita a gravação de fita de
vídeo por um dos interlocutores, mesmo sem o conhecimento
dos demais.
Recurso a que se dá parcial provimento. (grifos acrescidos).
(ARESPE n. 27845, de Sítio Novo/RN. Relator o Min. Joaquim
Benedito Barbosa Gomes. DJE de 31/8/2009, tomo 165,
p. 37).
A prova questionada é, portanto, lícita.
É como voto.
VOTO
ALEGAÇÕES FÁTICAS.
O caso é de rejeição do pedido, por absoluta ausência de um conjunto probatório mínimo que conduza ao fim colimado pelo demandante.
Com efeito, no que toca à alegação de que teria havido oferecimento, em 15/08/08, pelo prefeito demandado, em troca de voto, de bem e
de vantagem pecuniária a José Arivaldo, durante visita à Associação Baixa
do Umbuzeiro, além da promessa de entrega de um uniforme de futebol, de
uma bola e de bebida a pessoa não identificada, o que se vê da transcrição
acostada à petição inicial é que três interlocutores dialogam e, em determinado momento, o “interlocutor masculino 1” solicita uma espécie de “ajuda”,
consistente na doação de pisos ao “interlocutor masculino 2”, e que este
questiona acerca da quantidade de metros e do local onde seriam os mesmos
utilizados (fls. 55/70).
Todavia, no referido diálogo, além de não ser possível extrair os
nomes dos participantes, observa-se que o pedido atinente à doação do piso
partiu do próprio beneficiário, restando ausente, conforme pontuado pelo
Ministério Público, “a conduta pró-ativa por parte de eventual candidato em
prometer o que quer que seja, em troca de votos”.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Demais disso, é de se pontuar a descontinuidade dos trechos do
conteúdo degravado e a falta de audibilidade da mídia acostada aos autos
pelo partido autor. Tais circunstâncias muito contribuem para revelar a fragilidade, no particular, da acusação.
Em acréscimo, as testemunhas arroladas pelo demandante para
provar tais fatos – José Elto Evangelista dos Santos (fls. 1204/1208, anexo
7) e José Augusto Ferreira Bitencourt (fls. 975/978, anexo 6) –, foram ouvidas em termos de declarações, sem compromisso, ante o acolhimento da
contradita contra elas formulada.
Ainda assim, da leitura das declarações por elas prestadas verificase que nenhuma delas presenciou o fato, de maneira que seus depoimentos
foram baseados naquilo que consta da mídia acostada aos autos e naquilo
que elas “ouviram dizer”, por intermédio de terceiros.
Por outro lado, a testemunha Edson Oliveira dos Santos, arrolada
pela parte ré e ouvida sob compromisso, fez as seguintes afirmações:
“que o assentamento da Fazenda Conceição é conhecido como
assentamento dos moradores da Baixa do Umbuzeiro; que o
depoente mora neste assentamento; que esse assentamento
possui 27 (vinte e sete) casas e uma escola; que conhece o
senhor José Erivaldo e este mora no aludido assentamento;
que mora próximo do senhor José Erivaldo a uma distância de
apenas duas casas; que viu o prefeito José Lourenço, Ataíde
Cigano e outras pessoas que não conhece se dirigindo para
a casa de José Erivaldo, aproximadamente no mês de junho,
não recordando a data; que no mesmo dia as aludidas pessoas
estiveram na casa do depoente antes de se dirigirem à casa
de José Erivaldo; que ficou na sua casa recebendo outras
pessoas, mas viu que a comitiva se dirigiu para a casa de
José Erivaldo, não tendo acompanhado; que José Erivaldo
esteve na casa do depoente, tendo entrado; que José
Erivaldo chamou o prefeito para sua casa; que Erivaldo
chamou o prefeito do lado de fora da casa do depoente;
que o prefeito foi chamado por Erivaldo depois que este
último saiu da casa do depoente; que várias pessoas entraram na casa do depoente; que Erivaldo ficou conversando
com algumas pessoas na casa do depoente mas não recorda
o nome de nenhuma; (...) que José Lourenço esteve em sua
casa para convidá-lo para a convenção, não recordando o
dia em que esta iria ocorrer; que a convenção iria ocorrer no
Centro de Abastecimento, não recordando o horário; (...) que
o convite para a convenção foi dirigido a todas as pessoas que
se encontravam presentes aos arredores da casa do depoente;
que não recorda a data exata da convenção mas seria no final
do mês de junho de 2008; (...)” (fls. 1225/1229, anexo 7).
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101
JURISPRUDÊNCIA
Na mesma linha foram as declarações prestadas por Odilon Santos de
Souza, testemunha arrolada pelos demandados e ouvida sem compromisso:
“que o assentamento Fazenda Diamante é próximo ao assentamento Baixa do Umbuzeiro; (...) que o prefeito José Lourenço
esteve na casa do declarante no ano da eleição de 2008 no
mês de junho, mês de São João, não lembrando a data exata, juntamente com seu motorista, que não lembra o nome,
convidando-o para a convenção; (...) que depois deste dia o
prefeito não esteve no assentamento no período eleitoral pois
se estivesse teriam lhe contado; que quando saiu José Lourenço disse que iria para o assentamento Baixa do Umbuzeiro
na casa de Edson; (...)” (fls. 1230/1233, anexo 7)
Neste passo,vale salientar que a testemunha Edson Oliveira dos
Santos, no depoimento que prestou – corroborado pelas declarações de
Odilon Santos de Souza –, deixou claro que os fatos ocorreram no mês de
junho, o que se contrapõe à afirmação, contida na exordial e confirmada
pelas declarações das testemunhas arroladas pelo partido autor, de que o
fato teria ocorrido em 15/08/08.
Este conjunto de inconsistências muito colabora para tornar frágil
a acusação.
Por fim, para encerrar a discussão a respeito da primeira alegação
feita na petição inicial, é de ser realçada a firme assertiva da testemunha
Edson Oliveira dos Santos no sentido de que o prefeito teria comparecido à
residência de José Erivaldo a convite deste. Tal assertiva, quando cotejada
com o conteúdo da própria gravação acostada pelo autor – na qual restou
evidenciado que o pedido partiu do próprio beneficiário – configura forte
indício de que realmente o suposto ilícito teria sido forjado pelo beneficiário
José Erivaldo.
No que toca à alegação de que José Erivaldo teria presenciado,
ainda, uma promessa de entrega de um uniforme de futebol, de uma bola
e de bebida a pessoa não identificada, nem mesmo o próprio José Erivaldo
compareceu em juízo para depor e confirmar o fato.
Ao lado disso, inexistem outras provas nos autos, exceto a gravação
de fls. 55/70, a qual, à vista da sua descontinuidade e da não identificação
dos nomes dos interlocutores, impossibilita qualquer conclusão sobre os
diálogos.
A segunda acusação é a de que teria havido oferecimento, pelo
prefeito acionado, de vantagens a pessoas integrantes da nação cigana,
após acordo que teria sido firmado em 02/08/08 com cerca de 20 famílias
residentes do município, para calçamento de um trecho da Rua Salustiano
Barreto Mendonça, onde estariam concentradas as residências das aludidas
pessoas. Além disso, as principais destinatárias das vantagens seriam uma
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JURISPRUDÊNCIA
pessoa de nome Josafá (que seria beneficiada pela construção de um calçamento em uma fazenda de sua propriedade, situada na região do Tabuleiro,
à margem direita da BA-110, no sentido Pombal-Tucano, logo após o Motel
Xodó) e outra de nome Ataíde (que seria beneficiada com a lavratura de uma
escritura relativa à compra e venda de um imóvel rural que o prefeito réu teria
lhe vendido cerca de um ano antes).
Quanto a isto, a prova é praticamente nenhuma.
Com efeito, a prova dos autos não demonstra o nexo causal existente entre o calçamento da Rua Salustiano Barreto Mendonça e o apoio político
dos integrantes da nação cigana aos demandados. Aliás, seria profundamente
questionável que a promessa de calçamento de uma rua caracterizasse abuso
de poder e/ou captação ilícita de sufrágio.
Também não há nada nos autos que comprove a interrupção de
obras de calçamento de outras ruas da cidade para priorizar o da rua referida, de maneira que a única conclusão a que se pode chegar é à de tudo
permaneceu no campo das alegações
Além disso, a alegação de que a pessoa de nome Josafá teria sido
agraciado com a construção de calçamento em fazenda de sua propriedade e
que “o início do acordo firmado entre o Prefeito e o cigano Josafá se constata
no vídeo onde o Trator de Josafá está sendo carregado com os paralelos
do ‘calçamento da rua dos ciganos’ e transportando para sua fazenda”, não
passa de mera ilação, pois a mídia de fl. 89 apenas mostra um trator – que,
segundo ambas as partes, pertencia ao cigano Josafá – transportando pedras, o que não autoriza concluir, sem outras provas complementares, em
que circunstâncias elas eram transportadas: se foram doadas, a quem foram
doadas e se realmente pertenciam ao município.
Quanto à lavratura da escritura de compra e venda de um bem imóvel que teria sido vendido pelo prefeito a uma pessoa de nome Ataíde há mais
de um ano, a verdade é que se trata de um ato naturalmente decorrente do
negócio jurídico celebrado e que, por isto mesmo, está longe de materializar
a concessão de uma vantagem pessoal.
Ademais, nenhuma prova há nos autos de que o prefeito réu estaria
condicionando a entrega do documento à comprovação de que Ataíde votaria
em seu favor, como alegado pelo partido autor. A matéria, portanto, mais uma
vez, resume-se a meras alegações.
No que se refere à acusação de que os demandados teriam doado
filtros de água em troca de votos, inexistem nos autos elementos aptos a
comprovar que tais atos teriam sido praticados com fins eleitoreiros, pois a
única prova que corrobora a acusação é a declaração da testemunha José
Augusto Ferreira Bitencourt, ouvida sem compromisso, que afirmou: “(...) que
foram distribuídos filtros nas casas populares do bairro Pombalzinho com a
finalidade de angariar votos; que sabe que a distribuição ocorreu a mando
do prefeito José Lourenço mas não recorda a data nem pessoa que teria
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
distribuído; (...) que a aquisição não obedecia a um programa específico da
Administração; (...)” (fls. 975/978, anexo 6).
Em outro momento, na mesma assentada, a mesma testemunha
deixou claro que teve conhecimento do convênio realizado entre a Caixa
Econômica Federal e o Município de Ribeira do Pombal e que somente as
pessoas beneficiadas com casas populares teriam recebido os filtros: “(...) que
os filtros foram entregues aos proprietários de todas as casas populares do
bairro Pombalzinho entregues em 2008; que tomou conhecimento de convênio
realizado entre a Caixa Econômica e o Município de Ribeira do Pombal para
construção de casas populares no bairro de Pombalzinho; (...) que somente
receberam filtros da Prefeitura Municipal as pessoas também beneficiadas
com casas populares; (...)”. (fls. 975/978, anexo 6).
Ao lado disso, constam dos autos documentos que sinalizam no
sentido de que as doações consistiram em concretização do “Projeto de Trabalho Técnico Social”, desenvolvido pela Prefeitura Municipal de Ribeira do
Pombal, que previa, de há muito, a construção de casas populares e doação
de filtros de água aos beneficiados respectivos conforme se verifica das fls.
210/228 do anexo 2.
Quanto à alegação de que uma promessa teria sido feita, em troca
de votos, por uma pessoa de prenome Manoel (ex-secretário municipal de
saúde) e outra de prenome Sérgio (prestador de serviços para a prefeitura),
por ordem dos demandados, ao eleitor Rosival Barbosa, de entrega de dinheiro, outorga de vantagens pessoais, concessão de uma linha de ônibus
para transportar alunos e transferência da esposa para a sede do município,
a prova se resume à gravação de uma conversa entre os três personagens
(fls. 91/104) e ao depoimento, sem compromisso, do próprio Rosival Barbosa
Santos (fls. 1257/1262, anexo 7).
Todavia, na gravação aludida há diversos cortes que impossibilitam
a compreensão, com clareza, dos diálogos. Demais disso, não há comprovação de que o diálogo teria sido travado a mando dos réus.
Já no que se refere ao depoimento, não possui ele credibilidade,
ante o acolhimento da contradita formulada contra a testemunha.
Alega também a agremiação autora que o fato estaria comprovado
por meio de uma entrevista concedida por uma pessoa conhecida por Dile do
Poço (que seria cabo eleitoral do prefeito demandado) à Rádio Pombal FM.
Entretanto, no conteúdo da entrevista não há qualquer informação
que demonstre o cometimento do alegado ilícito. Ao revés, o entrevistado
noticia a ocorrência de supostas irregularidades praticadas pelo vereador
Marcelo Brito (fls. 108/114).
No que concerne à acusação de que teria havido contratação de
522 novos servidores municipais no ano de 2008, no período de janeiro a
junho, abrangendo cargos comissionados e temporários, sem prévio concurso
104
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
público e sem a demonstração de urgência e de excepcional interesse público,
também não restou demonstrada sua correlação com o período eleitoral.
Com efeito, de uma simples verificação nos documentos de fls.
116/138, percebe-se que o quadro de servidores temporários do Município de
Ribeira do Pombal totalizava 176 pessoas em janeiro de 2008, ao passo que
este número foi elevado para 654 em junho de 2008. Por sua vez, o número
de cargos em comissão somava 320 no mês de janeiro de 2008, elevando-se
para 364 no mês de junho do mesmo ano.
Tais constatações corroborariam as assertivas do partido autor.
Em sua defesa, os demandados alegam que o Município de Ribeira
do Pombal tem uma séria deficiência em seu quadro funcional, principalmente
no campo de educação, tanto assim que em novembro de 2007 foi realizado
concurso público para contratação de pessoal para as mais diversas áreas,
inclusive e principalmente para a atividade discente.
Dizem, mais, que enquanto não haviam sido contratados, mediante
concurso público, os profissionais para compor o quadro funcional do município, a administração era obrigada a contratar direta e excepcionalmente
outros profissionais para suprir as mencionadas deficiências e atender ao
interesse público, o que teria sido feito com o início do novo período escolar
(em fevereiro de 2008), principalmente no mês de março de 2008.
Malgrado pareçam frágeis as alegações dos réus, o fato é que os
documentos de fls. 1234/1250 do anexo 7 revelam um quadro comparativo
de servidores temporários referentemente aos meses de novembro de 2007
e novembro de 2008.
E aí o que se vê é que naquele período o número de servidores
temporários totalizava 584 e neste último 627, fato que, quando confrontado
com os dados afirmados pelo autor, retiram a densidade da alegação de que as
contratações ao longo do ano de 2008 decorreram de interesses eleitorais.
De fato, se em novembro de 2007 o número de servidores temporários totalizava 584, e em janeiro de 2008 – período mais próximo da
eleição - totalizava 176, não se pode chegar à automática conclusão de
que as contratações estivessem relacionadas à eleição, embora, repita-se,
tudo esteja a indicar que havia, de fato, irregularidades, tanto assim que o
Ministério Público promoveu medidas para a assinatura de um Termo de
Ajustamento de Conduta com o Município em 26/09/07, por meio do qual este
se comprometeu a obedecer às normas contidas no art. 37 da Constituição
Federal, sobretudo a norma relativa à obrigatoriedade de concurso público
(fls. 187/190 do anexo 1).
Quanto ao aumento do número de cargos em comissão, tenho como
plausível a justificativa dos acionados de que decorreu ele do preenchimento de vagas já existentes e decorrentes da Lei Municipal n. 352/2003, que
alterou e atualizou a tabela prevista na Lei n. 322/01. Constam dos autos
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
cópias de ambas as leis e, de fato, verifica-se que houve a criação, pela
Lei n. 352/2003, de diversos novos cargos (fls. 1264/1282 do anexo 7).
Noticia, ainda, o partido autor, a ocorrência de irregularidades no
concurso público realizado pelo município, bem como na contratação de
“auxiliar de creche”, cargo que, segundo eles, não integra a estrutura administrativa do município. Tais fatos, todavia, embora possam configurar ilícitos
no campo administrativo, por não possuírem relação direta com o processo
eleitoral são insusceptíveis de apreciação por esta Justiça especializada.
No tocante à alegação de que teria havido utilização de servidores
municipais, no horário de expediente, para servir aos interesses da campanha dos acionados, diz o autor que o prefeito e o vice-prefeito teriam cedido
e utilizado servidores em horário de expediente para acompanhá-los a uma
visita à feira livre de Ribeira do Pombal, no dia 15/08/08, às 11 horas (em
pleno horário de expediente), no intuito de angariar votos.
Contudo, as fotografias de fls. 141/148 não comprovam que a visita
à feira teria ocorrido no horário de expediente e nem mesmo a finalidade da
tal visita.
Ademais, dois dos servidores elencados pelo acionante como participantes do fato – Josefa Góis de Melo e Marcos Vinícius Valadares Barreto
– já haviam sido exonerados do cargo público em comissão que ocupavam
no dia em que ocorreu o fato.
Por sua vez, a testemunha José Augusto Ferreira Bitencourt, arrolada pelo autor, ouvida sem compromisso, afirma “que presenciou uma visita
realizada na feira livre, Central de Abastecimento, em uma sexta-feira durante
período de campanha eleitoral, não recordando a data exata; que a visita
ocorreu entre dez e doze horas da manhã em dia de expediente normal; que o
prefeito José Lourenço lá esteve com toda sua comitiva, a exemplo de Vinícius
que ocupa cargo comissionado na prefeitura; (...)”. O depoimento, todavia,
não possui credibilidade, ante a ausência de compromisso da testemunha.
A alegação, pois, carece de substrato probatório.
Por fim, no que toca à acusação de que teria havido transporte
ilegal de eleitores no dia do pleito, do mesmo modo, a acusação não se fez
acompanhar de prova suficiente.
O que há nos autos são fotografias de veículos de passeio transportando pessoas, sem maiores evidências.
Ao lado disso, o próprio partido acionante deixa claro que a conduta
não teria sido praticada pelos réus. Ao revés, na narrativa constante da exordial ele imputa a autoria do fato aos candidatos a vereador “Miranda do Sem
Terra” e “Marcelo Brito”, e a “Edmilson, irmão do candidato a vereador Dian”.
Desse modo, ainda que os candidatos aludidos apoiassem os demandados,
tal fato, por si só, não seria suficiente para que a responsabilidade recaísse
sobre estes últimos, haja vista que aqueles, também na qualidade de candidatos a vereadores, tinham interesse direto no transporte de eleitores.
106
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Por sua vez, a testemunha compromissada Hugo Raniere Oliveira
Moreira, ao ser inquirida (depoimento trasladado da AIME n. 372/2008), fez
as seguintes afirmações (fls. 1201/1203):
“(...) que no dia da eleição se encontrava no povoado da Boca
da Mata, que o veículo de fl. 21 pertencia a Miranda do Sem
Terra que foi candidato a vereador, não eleito; que o de fl. 23
pertencia a Marcelo Brito, atual presidente da câmara; que o
de fl. 25 pertencia a Dian, candidato vereador, não eleito; que
os três veículos estavam transportando eleitores no dia da
eleição sem autorização da Justiça Eleitoral; (...) que no dia
da eleição presenciou o senhor José Lourenço, atual prefeito,
em local próximo ao Posto de Saúde do Povoado Boca da
Mata depois da entrada do povoado, relativamente distante
do colégio eleitoral; que não viu o vice-prefeito sr. Jairo; que
o sr. José Lourenço estava conversando com eleitores, mas
não o viu conversando com os donos dos veículos; que não
presenciou sr. José Lourenço transportando eleitores e veículos
não autorizados pela Justiça Eleitoral; (...)”.
Do cotejo do depoimento supra com as fotografias acostadas aos
autos, não se pode concluir que o transporte de eleitores possuía qualquer
relação com os acionados, restando também esta acusação sem o necessário
suporte probatório.
Este é, pois, mais um daqueles casos em que, apesar de haver
indícios da ocorrência dos fatos, o conjunto probatório não é suficiente, não
restando outro caminho para o órgão julgador senão o de se conformar com
a frustração da impossibilidade de formar um juízo de valor baseado em
provas robustas.
Pelo exposto, em harmonia com o parecer do Ministério Público
Eleitoral, voto no sentido da rejeição dos pedidos.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
107
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 7 0 / 2 0 11
RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA
PROCESSO Nº 726 (17.993-18.2008.6.05.0167)
CLASSE 29
(APENSO: PETIÇÃO Nº 1.094-87.2010.6.05.0000
MUNICÍPIO:
Ourolândia
RECORRENTES: Coligação A VONTADE DO POVO, Adinael Freire da Silva e Eustáquio Freire Neto. Advs.: Béis. João Daniel Jacobina Brandão
de Carvalho e Carlos Augusto Santos Medrado.
RECORRIDOS:
Antônio Araújo de Souza e José Neitom de Oliveira. Advs.: Béis.
Ademir Ismerim e outros.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 167ª Zona/Jacobina.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
REVISOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Recurso contra expedição de diploma. Preliminares
de legitimidade ativa ad causam e de ausência de
interesse de agir. Inacolhimento. Regularidade na
intimação dos recorridos acerca da designação da
audiência de instrução. Transcrição videofonográfica
apresentada conjuntamente com a inicial. Prova documental. Não violação ao princípio do contraditório.
Alegação de prática de captação ilícita de sufrágio,
abuso de poder econômico e abuso de poder político.
Comprovação apenas do primeiro ilícito. Cassação
dos diplomas. Determinação de nova eleição. Provimento parcial.
Preliminar de ilegitimidade ativa ad causam.
Embora não exista norma expressa acerca dos legitimados para a propositura do recurso contra expedição do diploma, a jurisprudência pátria consolidou-se
no sentido de que as coligações podem interpô-lo,
tendo em vista que os atos praticados durante o
processo eleitoral podem repercutir, juridicamente,
não só após as eleições, mas até mesmo após a
diplomação.
Mantém a sua legitimidade ativa ad causam candidato
que, à época do ajuizamento do RCED, concorria ao
pleito com o respectivo pedido de registro de candidatura sub judice.
Preliminar de ausência de interesse de agir.
Candidato ao cargo de vereador possui legitimidade
para impugnar diploma concedido a prefeito, por-
108
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
quanto o interesse de agir, neste tipo de demanda,
reside na necessidade de ver afastado do cenário
político ocupante de cargo eletivo eleito mediante
a prática de condutas tendentes a afetar a lisura e a
regularidade do pleito eleitoral.
Alegação de nulidade dos atos processuais realizados durante a audiência de instrução.
Não há que se falar em nulidade dos atos processuais
praticados durante a audiência de instrução quando
as partes são devidamente intimadas para comparecerem à assentada.
Alegação relativa à ausência de contraditório na
realização da perícia.
Não se configura perícia, mas prova documental,
transcrição videofonográfica que instrui a exordial,
razão pela qual se revela manifestamente improcedente pedido de desentranhamento com base na ausência de contraditório quando da sua confecção.
Do incidente de falsidade.
Julga-se improcedente incidente de falsidade por
ausência de provas, pois os recorridos, apesar de
devidamente intimados da decisão de deferimento da
realização da perícia, deixou transcorrer, in albis, o
prazo para recolhimento dos honorários periciais.
Mérito.
Cabalmente demonstrada a prática de captação
ilícita de sufrágio, mediante doação de materiais de
construção, dá-se parcial provimento ao recurso,
cassando o diploma dos recorridos e determinando
a realização de novas eleições, nos termos do art.
224 do Código Eleitoral.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER AS PRELIMINARES, JULGAR IMPROCEDENTE O INCIDENTE DE FALSIDADE e DAR PARCIAL PROVIMENTO AO
RECURSO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa
a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência;JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY
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JURISPRUDÊNCIA
PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso contra expedição de diploma interposto por
Eustáquio Freire Neto e Adinael Freire da Silva, bem como pela Coligação A
VONTADE DO POVO, com fundamento no inciso IV do art. 262 do Código
Eleitoral, em face de Antônio Araújo de Souza e José Neilton de Oliveira,
diplomados, respectivamente, prefeito e vice-prefeito do Município de Ourolândia no dia 18 de dezembro de 2008.
Sustentam os recorrentes que os recorridos viciaram as eleições
municipais de 2008 ao praticarem captação ilícita de sufrágio, abuso de
poder econômico e abuso de poder político, mediante: (i) fornecimento de
água potável a eleitores habitantes de localidades onde o serviço de abastecimento era deficiente; (ii) utilização de recursos públicos para construção
de calçada de imóvel particular; (iii) doação de terreno da prefeitura para a
Associação Comercial de Ourolândia durante o período eleitoral; (iv) celebração de contrato de prestação de serviço com a Caixa Econômica Federal
com o objetivo escuso de angariar recursos para a campanha política; (v)
contratação de policiais militares para o exercício do cargo de professor,
sem a correspondente contraprestação do serviço; (vi) veiculação, em mídia
impressa, de notícia inverídica atribuída a um dos recorrentes; (vii) transporte
de eleitores para Jacobina, por meio de ônibus locado pela Prefeitura, a fim
de que realizassem alistamento e transferência das respectivas inscrições
eleitorais para o Município de Ourolândia; e, finalmente, (viii) doação de areia
e sacos de cimento em troca de voto.
Pugnam, assim, pelo provimento do recurso, a fim de que sejam
desconstituídos os diplomas dos recorridos.
Instruíram a inicial com os documentos de fls. 28/178.
Nas contrarrazões de fls. 186/208, os recorridos, após suscitar as
preliminares de perda superveniente da legitimidade ativa ad causam de
Adinael Freire da Silva e da Coligação A VONTADE DO POVO e de ausência
de interesse de agir de Eustáquio Freire Neto, impugnaram o rol de testemunhas apresentado pelos recorrentes, bem como a perícia, as fotos e a
mídia que instruíram a exordial, requerendo, assim, instauração de incidente
de falsidade.
No mérito, rechaçaram todas as alegações constantes na peça
vestibular, requerendo o não provimento do recurso.
110
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Às fls. 212/218, o membro do Ministério Publico de 1º grau apontou
a necessidade de instrução da demanda.
Remetidos os autos a este Regional, a eminente Juíza que me
antecedeu no presente feito determinou a expedição de carta de ordem para
a oitiva das testemunhas arroladas pelas partes.
Realizada a audiência de instrução, retornaram os autos a este
Tribunal, ocasião em que foram os contendores intimados para apresentação
de alegações finais, as quais foram colacionadas às fls. 319/336 e 338/344,
tendo os recorridos suscitado a nulidade dos atos praticados na assentada
instrutória, de cuja realização, alegam, não foram devidamente intimados.
Em atendimento ao requerimento do Procurador Regional Eleitoral,
foram encaminhadas pela 167ª Zona Eleitoral cópias dos termos de audiência,
do parecer ministerial e das sentenças proferidas nas AIJEs tombadas sob
os nos 336/2008 e 337/2008 (fls. 353/406).
Concedida oportunidade de manifestação acerca dos documentos
juntados, somente os recorridos se pronunciaram (fls. 413/419).
À fl. 423, determinei a instauração do incidente de falsidade, que
não restou instruído em razão da ausência de recolhimento dos honorários
periciais.
Com vista dos autos, o Procurador Regional Eleitoral pronunciouse pelo provimento do recurso tão-somente no que concerne à prática da
captação ilícita de sufrágio.
É o relatório que submeto a apreciação do eminente Juiz Revisor.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 457/459 dos autos.
De início, impõe-se afirmar a tempestividade do ajuizamento da
presente ação, protocolizada no prazo legalmente previsto (art. 258 da Lei
nº 4.737/65), razão pela qual dela conheço.
PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM.
Afirmam os recorrentes, preliminarmente, que ocorreu a perda
superveniente da legitimidade ativa ad causam de Adinael Freire da Silva
e da Coligação A VONTADE DO POVO, na medida em que o registro de
candidatura daquele restou indeferido pela Justiça Eleitoral.
Não merece acolhida a preliminar.
Embora não exista norma expressa acerca dos legitimados para a
propositura do recurso contra a expedição do diploma, a jurisprudência pátria
consolidou-se no sentido de que podem ajuizá-lo: os partidos políticos, as
coligações, os candidatos registrados especificamente para a eleição e o
Ministério Público Eleitoral. (RCED nº 674, Rel. Min. José Augusto Delgado,
DJ de 24/04/2007; RCEd nº 643, Rel. Min. Fernando Neves, DJ de 6.8.2004;
AgRg no REspe nº 25.269, Rel. Min. Caputo Bastos, DJ de 20.11.2006).
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111
JURISPRUDÊNCIA
Saliente-se que a legitimidade ativa das coligações foi consagrada,
mesmo após as eleições, tendo em vista o resguardo do interesse público.
Sobre esta questão, é relevante transcrever, pela clareza da manifestação, trecho extraído do AgR-RESP 36.398-MA, relatado pelo Min.
Arnaldo Versiani Leite Soares:
“Com efeito, é assente na jurisprudência pátria que a legitimidade ad causam das Coligações partidárias persiste mesmo
após o pleito eleitoral, haja vista que as prerrogativas e obrigações atribuídas às Coligações, no que se refere ao processo
eleitoral, não se encerram na data do pleito, sendo essa a
melhor interpretação do art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.504/97. Isso
assim se passa porque os atos praticados durante o processo eleitoral podem repercutir, juridicamente, não só após as
eleições, mas até mesmo após a diplomação. Em razão disso
podem elas intentar Investigações Judiciais Eleitorais e, em
razão da previsão na legislação eleitoral vigente, de dois outros
instrumentos para se impugnar o resultado advindo das urnas,
quais sejam, o recurso contra expedição de diploma e a ação de
impugnação de mandato eletivo, podem estas ações também
ser ajuizadas pelas Coligações.
(...)
Assim, pode-se dizer que a atuação legítima da coligação
partidária se preserva com relação a todos os feitos em que se
discute fatos acontecidos durante o pleito eleitoral para o qual
a coligação fora constituída.” (Agravo Regimental em Recurso
Especial Eleitoral nº 36398, Publicação: DJE - Diário da Justiça
Eletrônico, Data 24/06/2010, Página 46/47 ).
Tendo em vista que o processo eleitoral funda-se em questões de
interesse público, precipuamente na defesa do regime democrático, qualquer
interpretação acerca da legitimidade para a propositura das ações eleitorais
deve ser realizada da forma mais ampla possível, evitando-se, assim, indevidas restrições ao direito de acionar o Poder Judiciário com o intuito de
resguardar a lisura da manifestação popular.
Nessa linha de entendimento, não deve prevalecer a alegação no
sentido de que, em razão do indeferimento do registro de candidatura de
Adinael Freire da Silva, não teria a Coligação recorrente legitimidade para o
manejo do presente feito.
Isso porque, conforme já decidido por esta Corte na ocasião
do julgamento dos recursos eleitorais nos 101-44.2010.6.05.0167 e 10229.2010.6.05.0167, que envolveram as mesmas partes, o indeferimento
do registro do candidato ao pleito majoritário não afetou a legitimidade da
Coligação, que preservou a sua autonomia, até mesmo porque não se restringiu a indicar concorrentes ao cargo de prefeito, tendo, também, requerido
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
o registro de candidatos a vereador, conforme comprova o Demonstrativo de
Regularidade de Atos Partidários constante às fls. 28 e 29.
A questão da legitimidade ativa ad causam de Adinael Freire da
Silva também foi discutida no Recurso Eleitoral nº 102-29.2010, no qual
restou assentado que o momento para análise dessa condição da ação
seria a ocasião do ajuizamento da demanda, quando então o registro da
candidatura do aludido recorrente ainda não tinha sido indeferido por esta
Justiça Especializada.
Pelo exposto, inacolho a preliminar.
PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR DO RECORRENTE
EUSTÁQUIO FREIRE NETO.
Também não merece acolhida a preliminar de ausência de interesse
de agir do recorrente Eustáquio Freire Neto.
Não obstante o mencionado autor ter disputado, nas eleições de
2008, vaga para o cargo de vereador, possui legitimidade para a propositura
da presente ação eleitoral, uma vez que a jurisprudência especializada não
qualifica os candidatos que poderiam impugnar a expedição de diplomas,
de modo a estabelecer restrição no sentido de que somente os concorrentes ao mesmo cargo poderiam requerer a cassação dos diplomas dos seus
adversários eleitos.
Por outro lado, ao ocupar o polo ativo do feito, assume o candidato
Eustáquio Freire Neto a função de agente propulsor da busca do interesse
público, consubstanciado na fiscalização da regularidade das eleições.
Assim, o interesse jurídico a ser analisado não é aquele comumente presente em demandas privadas, mas o da sociedade em ver afastado
do cenário político ocupante de cargo eletivo eleito mediante a prática dos
indesejáveis ilícitos eleitorais.
Outro não é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, citado
na manifestação do Ministério Público de 1º grau:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRA-RAZÕES. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CONTRADITÓRIO. GARANTIA.
REPRESENTAÇÃO. INTERESSE DE AGIR. OMISSÃO AFASTADA. NÃO DISTINÇÃO. CANDIDATOS. REPRESENTAÇÃO.
ART. 96, CAPUT, LEI Nº 9.504/97. REJEIÇÃO.
1. Os ora embargantes apresentaram contraminuta ao agravo
interposto contra a inadmissão do recurso especial da parte
contrária. Naquela peça são combatidos todos os fundamentos
do recurso especial posteriormente provido. As manifestações
da parte quanto ao tema central da controvérsia foram realizadas, motivo pelo qual se afasta a alegação de ofensa ao
contraditório. Ausente a comprovação de prejuízo concreto.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
113
JURISPRUDÊNCIA
2. Motivado pelo interesse público, o candidato ao cargo
de Vereador representou contra o candidato ao cargo de
Prefeito no Município de Capinzal/SC. O interesse de agir
reside na necessidade de se coibir a prática de condutas
tendentes a afetar a lisura do pleito eleitoral e a igualdade
de oportunidades entre os candidatos, não importando
se haverá repercussão da decisão na esfera política do
representante.
3. O permissivo do artigo 96, caput, da Lei nº 9.504/97 não
faz distinção entre os candidatos habilitados a propositura de
representação eleitoral, desde que o façam em mesmo pleito
e circunscrição. De todo evidente o interesse do Ministério
Público Eleitoral em recorrer, pois aquela instituição detém o
múnus público para tanto.
4. Os embargos declaratórios prestam-se para integração e
servem apenas para ajustar e corrigir deficiências do acórdão.
Rejeitam-se os embargos declaratórios que não preenchem
os requisitos do art. 275 do Código Eleitoral.
5. Embargos de declaração rejeitados.”
(EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 6506, Acórdão de
24/10/2006, Relator(a) Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 08/11/2006, Página 112).
Para atestar a tese aqui defendida, é suficiente relembrar a hipótese,
tranquilamente aceita pelos tribunais, de assunção, pelo Ministério Público,
da titularidade das ações eleitorais em caso de desistência do autor.
“AGRAVOS REGIMENTAIS COM O MESMO OBJETO. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. ELEIÇÕES
2006. PEDIDO DE DESISTÊNCIA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM
RESOLUÇÃO DO MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA
DE ORDEM PÚBLICA. PROCURADOR-GERAL ELEITORAL.
LEGITIMIDADE ATIVA SUPERVENIENTE. COMPETÊNCIA.
PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA. NÃO PROVIMENTO.
1. Em recurso contra expedição de diploma, a desistência
manifestada pelo recorrente não implica extinção do feito sem
resolução do mérito, tendo em vista a natureza eminentemente
pública da matéria. Precedentes: REspe nº 26.146/TO, Rel.
Min. José Delgado, DJ de 22.3.2007; AgRgREspe nº 18.825/
MG, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 27.4.2001.
2. Embora não haja previsão expressa para que o Ministério
Público assuma o polo ativo da demanda, tal medida é justificada pela relevância do interesse público ínsito na demanda e
por analogia, nos art. 9º da Lei 4.717/65 (GOMES, José Jairo.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Direito Eleitoral. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 341),
e nos arts. 82, III e 499, §2º, CPC. (REsp 8.536, Rel. Min. Paulo
Brossard, DJ 24.3.1993; REspe nº 15.085/MG, Rel. Min. José
Eduardo Alckmin, DJ de 15.5.1998).
[...]
6. Agravos regimentais não providos.”
(AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA nº 661, Acórdão de 03/11/2009, Relator(a)
Min. FELIX FISCHER, Publicação: DJE - Diário da Justiça
Eletrônico, Data 10/12/2009, Página 9 ).
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO ART. 41-A DA LEI 9.504/97. DESISTÊNCIA
TÁCITA. AUTOR. TITULARIDADE. AÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. POSSIBILIDADE. INTERESSE PÚBLICO.
PRECLUSÃO. AUSÊNCIA.
[...]
2.O Ministério Público Eleitoral, por incumbir-lhe a defesa
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis (art. 127 da Constituição
Federal), possui legitimidade para assumir a titularidade da
representação fundada no art. 41-A da Lei nº 9.504/97 no caso
de abandono da causa pelo autor.
3.O Parquet assume a titularidade da representação para
garantir que o interesse público na apuração de irregularidades
no processo eleitoral não fique submetido a eventual colusão
ou ajuste entre os litigantes. Assim, a manifestação da parte
representada torna-se irrelevante diante da prevalência do
interesse público sobre o interesse particular.
[ ...]
7. Agravo regimental desprovido.”
(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 35740,
Acórdão de 16/06/2010, Relator(a) Min. ALDIR GUIMARÃES
PASSARINHO JUNIOR, Publicação: DJE - Diário da Justiça
Eletrônico, Data 06/08/2010, Página 53-54 ).
Pelos motivos exposto, afasto essa preliminar.
ALEGAÇÃO DE NULIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS REALIZADOS
DURANTE A AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO.
Em suas alegações finais, mencionam os recorridos que não foram
devidamente intimados da realização da audiência de instrução ocorrida no
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115
JURISPRUDÊNCIA
dia 1º de dezembro de 2009, razão pela qual, juntamente com seu patrono,
não compareceram àquela assentada e não produziram, por consequência,
a prova testemunhal indicada nas contrarrazões.
Alegam que a intimação da designação da referida audiência ocorreu na pessoa de advogada que não mais detinha poderes para representálos no feito.
Do exame atento da sequência dos atos praticados pelo juízo zonal
e pelos recorridos, verifico, entretanto, que não merece prosperar a alegação
em foco.
Na audiência realizada no dia 27 de novembro de 2009, com vistas
à oitiva das testemunhas arroladas pelas partes, o magistrado de 1º grau,
diante da ausência, devidamente justificada, da Belª. Lílian Maria Santiago
Reis, então patrona dos recorridos, redesignou o ato processual para o dia
1º de dezembro de 2008, ordenando fossem providenciadas as intimações
necessárias (fl. 292).
Naquela mesma data, o Cartório Eleitoral, via fac-símile, intimou a
supracitada advogada acerca da remarcação da audiência (fl. 295).
Em 30 de novembro, um dia antes da data da assentada instrutória, portanto, a causídica referida, às 10:00h, protocolizou, junto ao Cartório
Eleitoral, petição requerendo a juntada de substabelecimento, por meio do
qual transferiu ao Bel. Ademir Ismerim, sem reservas, os poderes que lhe
foram outorgados pelos recorridos.
Horas depois, mais precisamente às 13:10h, a Belª. Lílian Maria
Santiago Reis, já destituída de poder de representação, novamente peticiona,
pleiteando, desta vez, a redesignação da audiência, tendo em vista a impossibilidade de comparecimento do advogado substabelecido (fl. 299).
Na assentada do dia 1º de dezembro, o magistrado zonal, amparado
pelo opinativo da Promotoria, indeferiu o pedido de adiamento, passando à
oitiva das testemunhas arroladas pelos recorrentes.
É evidente, da análise do encadeamento dos atos, que a intimação
dos recorridos ocorreu segundo os ditames estabelecidos pela legislação processual, não havendo que se falar, deste modo, em quaisquer nulidades.
O que restou vislumbrado, saliente-se, foi mais uma tentativa dos
recorridos de retardar o andamento do processo, cuja instrução foi adiada
por duas vezes a pedido destes.
ALEGAÇÃO RELATIVA AO EXCESSO DO NÚMERO DE TESTEMUNHAS
ARROLADAS PELOS RECORRENTES.
A impugnação sub examine perdeu o objeto, pois, malgrado os
recorrentes tenham arrolado, na petição inicial, testemunhas em quantidade
superior à permitida pela legislação eleitoral, na ocasião da audiência de
instrução apenas apresentaram 4 delas.
116
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
ALEGAÇÃO RELATIVA À AUSÊNCIA DE CONTRADITÓRIO NA
REALIZAÇÃO DA PERÍCIA.
Requerem os recorrentes seja desentranhada dos autos a transcrição videofonográfica que instruiu a exordial, ao argumento de que foi
confeccionada sem a obediência ao princípio do contraditório.
O documento impugnado, ao contrário do que pretendem fazer crer
os recorridos, em verdade, não é uma prova pericial, mas, sim, uma espécie
de prova documental, trazida aos autos pelos recorrentes, que contrataram
um profissional especializado a fim de que realizasse a transcrição dos depoimentos constante na mídia de fl. 165.
É cediço que o contraditório em relação à prova documental é realizado mediante a produção, pela parte adversa, durante o curso do feito, de
outras provas aptas a repulsar as evidências decorrentes daquela.
Os recorridos, além de não haverem juntado aos autos qualquer
tipo de documentação na oportunidade da apresentação das suas contrarrazões, não compareceram à audiência de instrução e nem providenciaram
o recolhimento dos honorários pericias relativos à perícia deferida no curso
do incidente de falsidade.
Assim, não há que se falar em desentranhamento do aludido documento, que poderá, sim, ser valorado, mas como prova produzida unilateralmente pelos recorrentes.
DO INCIDENTE DE FALSIDADE.
O suscitado incidente de falsidade deve ser julgado improcedente
por ausência de provas, pois os recorridos, apesar de devidamente intimados
da decisão de deferimento da realização da perícia, deixou transcorrer, in
albis, o prazo para recolhimento dos honorários periciais.
MÉRITO.
Conforme relatado, alegam os recorrentes que os recorridos, mediante inúmeras condutas, viciaram o pleito de 2008 ao praticarem captação
ilícita de sufrágio, abuso de poder econômico e abuso de poder político.
De todos os imputados ilícitos eleitorais, porém, somente restou
comprovada a captação ilícita de sufrágio, consistente em doação de areia
e sacos de cimento ao eleitor Bento Antônio dos Santos.
Não há provas suficientes acerca do alegado fornecimento de água
potável em troca de votos.
Sobre a imputação, os recorrentes lograram êxito em levar a juízo as
testemunhas José Francisco Xavier e Paulo Rosalvo da Silva, as quais, apesar
de confirmarem as alegações iniciais, não se envolveram diretamente nos fatos
e não souberam apontar os beneficiários da conduta (fls. 304 e 305).
Também apresentaram, à fl. 31, cópia autenticada de um cheque
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JURISPRUDÊNCIA
subscrito por Antônio Moreira de Souza Neto, sobrinho do recorrido Antônio
Araújo de Souza e, à época, chefe do setor de licitações do Município de
Ourolândia, no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), nominal à Maria
Cristina A. Ribeiro, suposta amiga da proprietária do veículo por meio do qual
se realizou a distribuição da água.
O documento aludido, contudo, somente faz prova da sua existência,
dele não podendo ser extraída a informação apresentada pelos recorrentes,
ainda que analisado em conjunto com a prova testemunhal.
O mesmo sucedeu com a imputação relativa à utilização de recursos
públicos para construção da calçada da residência do eleitor Vinícius Lima
de Medeiros, pois os recorrentes, para comprová-la, somente colacionaram
ao feito as fotografias de fls. 38 e 39, que, desacompanhadas de outros
meios probatórios, não autorizam qualquer conclusão acerca da ocorrência
do ilícito eleitoral imputado.
De igual modo, não vislumbro abuso de poder político e econômico
ocasionados pela doação de terreno municipal para a Associação Comercial de Ourolândia e pela celebração de contrato de prestação de serviços,
firmado entre a Prefeitura e a Caixa Econômica Federal, com a anuência da
Caixa de Previdência dos Servidores Municipais, pois os recorrentes não
se desincumbiram de comprovar, respectivamente, a intenção eleitoreira
e a finalidade de desviar os recursos financeiros oriundos do ajuste para a
campanha eleitoral.
Ressalto que não possui idoneidade para atestar o noticiado desvio
de verba pública o flagrante operado pela polícia local, que encontrou, no
dia 05/10/2008, em poder do Diretor da supracitada Caixa de Previdência, a
importância em dinheiro de R$ 710,00 (setecentos e dez reais) e 55 folhetos
de propaganda eleitoral do candidato a vereador Janival Rodrigues e do
prefeito Antônio Araújo de Souza (fl. 43).
Sobre os fatos, a Promotoria Zonal, nos autos da AIJE nº 337/2008,
assim se manifestou:
“Cumpre, de logo, observar que não vislumbra o Ministério
Público qualquer irregularidade eleitoral no contrato de fls.
21/28, onde o Município de Ourolândia (e não o candidato
ANTÔNIO ARAÚJO) recebeu, antecipadamente, contrapartida
de valores da CEF, em face da exclusividade nas movimentações financeiras do Município e da Caixa de previdência dos
seus servidores.
Não existe, nos autos, qualquer comprovação de desvio desses
recursos, que pertencem ao Município de Ourolândia e não
aos candidatos. Não há, ao menos, notícia de saques desses
valores ou da utilização dos mesmos em algum programa ou
obra municipal.
De outro lado, em relação a conduta do Diretor da Caixa de
118
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Previdência de Ourolândia, consta nos autos a Certidão de fl.
19, que descreve que, efetivamente, no dia 05/10/2008 (dia
das eleições) MARCOS ANDRÉ VASCONCELOS PEREIRA e
APRÍGIO MARTINS DA SILVA foram abordados por Policiais
Militares enquanto conduziam o veículo VW Gol, de cor prata,
placa policial JRQ-3988, sendo apresentados na Delegacia
de Ourolândia e que foi encontrada, em poder de MARCOS
ANDRÉ, a quantia de ‘R$ 710,00 e 55 folhetos de propaganda
política do candidato a vereador Janival Rodrigues, n. 121123,
do prefeito Antônio Araújo e vice Neilton.
As circunstâncias que compõem a situação acima descrita,
levam qualquer observador (por mais ingênuo que possa ser)
a chegar a uma conclusão óbvia: MARCOS ANDRÉ tinha a
intenção de efetuar compra de votos em favor dos candidatos
ANTÔNIO ARAÚJO, JOSÉ NEILTOM DE OLIVEIRA e JANIVAL
RODRIGUES.
Ocorre, todavia, que não foi indicada nos autos sequer uma
única pessoa que tenha recebido vantagem pecuniária oferecida por MARCOS ANDRÉ em troca de voto.”
No que tange à suscitada contratação de policiais militares para o
exercício do cargo de professor, sem a correspondente contraprestação do
serviço, visando-se apenas à abstenção destes em relação à repreensão
dos atos ilícitos praticados durante a campanha eleitoral, também não há
provas.
Extrai-se dos documentos de fls. 59/75 que Jair Rodrigues de
Oliveira, Josafá Alves de Souza e Paulo Ricardo V. Amorim, efetivamente,
são policiais militares e professores celetistas contratados pela Prefeitura
Municipal de Ourolândia.
Os recorrentes não comprovaram, porém, que as contratações
foram motivadas por razões políticas.
O relatório extraído do Sistema de Acompanhamento de Pagamento de Pessoal, extraído do sítio do Tribunal de Contas do Município, revela
que os aludidos policiais ingressaram no quadro da Prefeitura por meio de
contratações ocorridas nos anos de 2005 e 2007, muito antes do início do
período eleitoral.
A par disso, as testemunhas não fizeram declarações contundentes
acerca do ilícito apontado.
Inácio Ribeiro de Brito, em seu depoimento de fl. 306, apenas afirmou “que soube que alguns policiais militares davam aula em Ourolândia,
mas não sabe dizer o nome de nenhum; que também soube, por ouvir dizer,
que policiais militares também recebiam como professores de Ourolândia”.
Não há, assim, elementos que demonstrem a omissão dos policiais
no exercício de suas funções, razão por que, também por esta alegação, não
merece procedência a demanda.
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JURISPRUDÊNCIA
Quanto ao mencionado abuso de poder econômico decorrente
de veiculação de matéria jornalística supostamente inverídica, além de não
ter sido demonstrada a responsabilidade pela divulgação da notícia, a qual,
ressalte-se, não se afastou da verdade, não se comprovou a ampla distribuição do material impresso no município.
Igual sorte acompanha a alegação relativa ao transporte de eleitores
ocorrido no mês de abril de 2008.
O testemunho colhido à fl. 360, prestado por Cícero Pereira da Silva, foi corroborado pelas fotografias juntadas às fls. 90/92, mas só permite a
extração de uma única conclusão: a de que houve o transporte de eleitores
para realização de alistamento e transferências das inscrições eleitorais. Não
há evidências mínimas a respeito do patrocínio do ato.
O supracitado depoente apenas asseverou que:
“... que acha que foi contratado um ônibus para trazer esses
eleitores para Jacobina, mas desconhece quem contratou e
quem era proprietário desse ônibus; que não sabe informar
se o ônibus que transportou os eleitores era particular ou se
prestava algum serviço para a Prefeitura de Ourolândia.”
A captação ilícita de sufrágio, consistente na doação de areia e
sacos de cimento, consoante já anunciado, é a única alegação em relação
à qual foram produzidas provas sólidas e contundentes.
O depoimento de fls. 307 e 308, juntamente com as fotografias
de fls. 103, 159/163 e 167/169, não deixa dúvidas que Antônio Araújo de
Souza, candidato a reeleição, contando com o auxílio de Filomeno Bezerra
dos Santos, realizou a doação de materiais de construção ao eleitor Bento
Antônio dos Santos, com o fim de obter-lhe o voto.
O cooptado acima citado, ouvido em juízo, foi enfático em afirmar
que:
“Que ANTÔNIO ARAÚJO DE SOUSA e FILOMENO passaram
pela casa do depoente, quando faziam algumas visitas “de
casa”; que, ao perceber que a casa do depoente estava em
reforma, ANTÔNIO ARAÚJO DE SOUSA perguntou se aquelas
obras eram em benefício dele; que o depoente respondeu que
não, pois o dinheiro que usava havia ganhado em um bingo
em Várzea Nova (quatro mil reais); que ANTÔNIO ARAÚJO
DE SOUSA perguntou ao depoente quantos sacos de cimento
seriam necessários para acabar a reforma; que respondeu 20
sacos, no que ANTÔNIO ARAÚJO perguntou se quinze dava;
que o depoente respondeu que sim; que ANTÔNIO ARAÚJO
mandou que filomeno ‘ajeitasse’ os sacos de cimento para o
depoente; que FILOMENO pediu uma xerox do documento
de identidade do depoente, no que foi atendido; que no dia
seguinte, um menino chegou na casa do depoente e disse
que FILOMENO o aguardava; que ao chegar na casa de FI-
120
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
LOMENO, este entregou uma nota ao depoente, no qual havia
ordem de pagamento de quinze sacos de cimento na loja de
TURECO; que, então, foi até aquela loja, mas não pegou os
sacos de cimento porque estavam em falta; que deixou a ordem
na loja de TURECO; que no dia posterior , TURECO mandou
levar os quinze sacos de cimento na casa do depoente; [...]
que ANTÔNIO ARAÚJO pediu para que o depoente votasse
nele; [...] que dois dias depois da entrega do cimento, chegou
na casa do depoente uma carrada de areia, numa caçamba da
Prefeitura; [...] que a foto constante da petição inicial retrata o
depoente e a caçamba descarregando areia para dentro de sua
casa; que do lado da caçamba tinha a foto com um bode, que
é a marca da Prefeitura [...]” (Depoimento de fls. 307 e 308).
O Professor Marcos Ramayana, em sua obra Direito Eleitoral (Editora Ímpetus, 4ª edição, p. 253), prevê a existência de três elementos para
a caracterização da captação ilícita de sufrágio, quais sejam: (i) a prática
de uma ação (doar, prometer, anuir); (ii) a existência de uma pessoa física
(eleitor) e (iii) o resultado a que se propõe o agente.
A análise da potencialidade da conduta para influir no resultado das
eleições é, portanto, desnecessária, tendo em vista que o art. 41-A da Lei
nº 9.504/97 possui a finalidade precípua de resguardar a vontade do eleitor.
Imperiosa, dessa maneira, é a procedência do pedido de cassação
dos diplomas com base na captação ilícita de sufrágio.
Saliento que a utilização de veículo da prefeitura para favorecimento
da candidatura dos recorridos poderia configurar, em tese, abuso de poder
político. Sucede que a imposição de penalidade com base neste ilícito eleitoral, ao contrário da compra de voto, exige prova da potencialidade lesiva,
o que não ocorreu no caso sub examine.
Realmente, não há indícios de que este ato, isoladamente, possua
o condão de interferir no resultado do pleito.
Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial,
voto no sentido de que, inacolhidas as preliminares, seja julgado improcedente o incidente de falsidade e parcialmente provido o presente recurso,
determinando-se a cassação dos diplomas dos recorridos tão somente em
razão da captação ilícita de sufrágio.
Voto, ainda, com fundamento no art. 224 da Lei nº 4.737/65, pela realização de novas eleições no Município de Ourolândia, uma vez que, anulados
os votos atribuídos ao recorrido e ao segundo colocado no pleito – em razão do
indeferimento do pedido de registro da candidatura deste –, a nulidade atingiu
mais de 50% dos votos válidos colhidos nas eleições de 2008.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
121
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 8 0 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 1-04.2011.6.05.0017
CLASSE 31
MUNICÍPIO:
Salvador
RECORRENTE:
Ministério Público Eleitoral.
RECORRIDO:
Alfredo Boa Sorte Júnior.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 17ª Zona.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
REVISOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso Criminal. Denúncia. Artigo 39, § 5º, II da Lei
nº 9.504/97. Transação penal. Ausência de intimação.
Rejeição da denúncia. Procedimento sumaríssimo.
Observância. Necessidade. Provimento.
Aplica-se aos crimes eleitorais, quando cabível, o
procedimento contido na Lei nº 9.099/95, devendo ser
provido o recurso para anular a decisão e facultar ao
réu a aceitação da proposta de transação penal.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício
da Presidência - MAURICIO KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY
PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pelo Ministério Público em face
de decisão do Juiz Eleitoral da 17ª Zona que, nos autos da Ação Penal em
exame, teria deixado de proceder conforme estabelecido no artigo 76 da Lei
nº 9.099/95 e, entendendo ausente um dos requisitos previstos no artigo 41
do Código de Processo Penal, teria rejeitado denúncia por ele formulada
contra Alfredo Boa Sorte Júnior.
Aduz o Recorrente que o Magistrado zonal, apesar da regularidade
formal da denúncia, em vez de proceder conforme estabelecido no artigo 76 da
122
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Lei nº 9.099/95, antecipando o juízo de prelibação, teria obstacularizado o autor
da infração de se manifestar sobre a proposta inicial de transação penal.
Sustenta que a rejeição da denúncia de igual modo teria inviabilizado
a busca da verdade real, somente possível com a instrução do feito.
Destaca, ainda, que se rejeitada pelo Investigado a proposta do
Ministério Público, deveria ser formalmente oportunizado o oferecimento
da denúncia, com a proposta de suspensão condicional do processo e que,
antecedendo a denúncia oral, ainda poderia requerer diligências para garantir mais elementos de provas, nos termos autorizados pelo artigo 77 da Lei
nº 9.099/95.
Ressalta que procedimento idêntico fora adotado pelo Procurador
Regional Eleitoral, tendo como Relator o Juiz Cássio Miranda, que proferiu
decisão designando audiência preliminar na forma prevista no artigo 76 do
mesmo Diploma legal.
Quanto ao exame do mérito da denúncia, embora entenda não ser
o momento adequado para sua discussão, afirma que o Código Eleitoral é
restritivo nas hipóteses de rejeição de denúncia, nelas não se enquadrando
a decisão recorrida.
Para fins de manejo de recursos às instâncias superiores, prequestiona os artigos 76 e 77 da Lei nº 9.099/95, bem como os artigos 358, I do
Código Eleitoral e 5º, LIV da Constituição Federal.
Apesar de devidamente intimado (fls. 33), Alfredo Boa Sorte Júnior
deixou de apresentar contrarrazões ao recurso.
Ouvido, o Procurador Regional Eleitoral posicionou-se pela admissibilidade do apelo e, no mérito, por seu provimento.
É o relatório que submeto à apreciação do Juiz Revisor.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 42/43.
Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso,
registrando, de logo, que a pretensão recursal enseja acolhimento.
Com efeito, os crimes previstos no artigo 39, § 5º da Lei nº 9.504/97
são puníveis com detenção de seis meses a um ano, com alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período e multa, enquadrandose como infração de menor potencial ofensivo, à qual deve ser aplicado o
procedimento descrito na Lei nº 9.099/95.
No caso em apreço, embora tenha oferecido a denúncia de fls.
01 e 02, o Promotor Eleitoral, expressamente, requereu fosse procedida à
intimação de Alfredo Boa Sorte Júnior para:
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
123
JURISPRUDÊNCIA
“[...] querendo, aceitar a proposta de transação penal, consistente em pena restritiva de direito, in casu, adstrita tão somente
à aplicação de multa no valor de R$15.000,00 (quinze mil
reais), a ser revertida para a Defesa Civil deste Estado, uma
vez que eventual prestação de serviço à comunidade poderia
redundar, impropriamente, em benefício político ao denunciado, nos termos do art. 76 da Lei nº 9.099/95 c/c o art.39, § 5º,
inciso II da Lei nº 9.504/97”.
Assentado o cabimento da transação penal nos processos de
competência da Justiça Eleitoral, impõe-se a observância da regra contida
no artigo 76 da Lei nº 9.099/95.
Nesse sentido decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande
do Sul no julgamento de recurso criminal no qual, por maioria, determinouse o retorno dos autos à origem para que fosse examinado o benefício legal
postulado.
“Processo penal eleitoral. Transação. Cabe, também nos
crimes eleitorais de menor potencial ofensivo, a aplicação
do sistema processual penal da Lei nº 9.099/95. Recurso
recebido como apelação e assim provido.”
(Acórdão de 14/11/2001 - Recurso Criminal nº 61999 - Porto
Alegre/RS. Relator: Dr. Manoel Lauro Volkmer de Castilho.
Publicado no DJE - Diário de Justiça Estadual, Tomo 225, Data
27/11/2001, Página 77.) Grifos aditados.
Por essas razões, em consonância com o parecer ministerial, voto
pelo provimento do recurso para anular a decisão de fls. 11/15 e determinar a
adoção do procedimento sumaríssimo, devolvendo-se os autos à origem para
que seja formulada a proposta de transação penal requerida pelo Parquet.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de abril de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
124
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 2 0 5 / 2 0 11
HABEAS CORPUS
PROCESSO Nº 356-65.2011.6.05.0000
CLASSE 16
MUNICÍPIO:
Mata de São João
IMPETRANTE:
Belª. Miucha Bordoni.
PACIENTE:
Eujácio Simões Viana Filho.
IMPETRADO:
Juiz Eleitoral da 185ª Zona.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
Habeas corpus. Trancamento de ação penal. Alegação de extinção da punibilidade e ausência de justa
causa. Não configuração. Denegação.
Denega-se a ordem de habeas corpus que visa trancamento de ação penal, uma vez que o recebimento
da denúncia interrompeu a prescrição arguida pelo
impetrante.
Ademais, as questões suscitadas pelo impetrante, relativas à suposta ausência de justa causa, demandam
esclarecimentos acerca dos fatos e exame aprofundado
do conjunto probatório, o que não se afigura possível em
sede de habeas corpus.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DENEGAR A ORDEM, nos termos do voto do Juiz Relator,
adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de abril de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; JOSEVANDO
SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de concessão de liminar,
impetrado por Miucha Bordoni em favor de Eujácio Simões Viana Filho, visando ao trancamento de ação penal nº 120/04, em trâmite no Juízo Eleitoral da
185ª Zona, instaurada para apuração de suposta prática dos crimes previstos
nos arts. 324, 325, 326, c/c 327, II e III do Código Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
125
JURISPRUDÊNCIA
Afirma a impetrante que, em 19 de março de 2010, o magistrado a
quo declarou extinta a punibilidade em relação aos crimes capitulados nos
arts. 325 e 326, por incidência da prescrição, tendo a denúncia sido recebida apenas em relação ao crime tipificado no art. 324, c/c 327 do referido
Diploma Legal.
Para embasar o pedido de trancamento da ação penal, sustenta a
extinção da punibilidade também em relação ao crime previsto no art. 324,
pois em setembro de 2010 teria se operado a prescrição em face do transcurso de mais oito anos da data do suposto ilícito, ocorrido em setembro de
2002, durante a campanha eleitoral daquele ano, tendo como vítima a então
Prefeita de Mata de São João, Márcia Carneiro Dias.
Defende, ainda, a ausência de justa causa, em face da ausência
de tipificação penal da conduta do agente, que não teria praticado o crime
de calúnia, mas sim proferido críticas de cunho político, configurando retórica típica dos comícios eleitorais, estando ausente o elemento subjetivo do
tipo – o dolo específico.
Entendendo ausentes os requisitos autorizadores, o Juiz Mauricio
Kertzman Szporer, substituindo este Relator, ante a sua ausência da Comarca,
indeferiu o pleito liminar formulado (fls. 26/27).
O ilustre Juiz Eleitoral prestou as devidas informações às fls. 32/33.
Instada a se manifestar, a Procuradoria Regional Eleitoral pronunciou-se pela denegação da ordem requerida (fls. 36/41).
É o relatório.
VOTO
Pretendendo a concessão do writ, para o fim de trancamento da
ação penal, sustenta o impetrante a extinção da punibilidade e a ausência
de justa causa em razão da atipicidade do suposto fato criminoso descrito,
considerando que o conjunto probatório acostado aos autos não autoriza
o enquadramento jurídico-penal nos artigos 324 e 327, II e III do Código
Eleitoral.
Defende o Impetrante o advento da prescrição de que trata o art.
109, IV do Código Penal, uma vez que, tendo o fato delitivo ocorrido em setembro de 2002, o prazo prescricional do crime do art. 324, c/c 327 do Código
Eleitoral – de 8 anos – teria se operado em setembro de 2010.
Ocorre que a denúncia foi recebida em 19 de março de 2010,
interrompendo a contagem do prazo prescricional, nos termos do art. 117, I
do Código Penal.
Também não há que se falar na inutilidade da condenação ensejando falta de interesse de agir, sugerida pelo paciente, pois, como bem
126
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
observou o Ministério Público Eleitoral, “o STJ já sumulou a matéria no sentido de que não cabe a prescrição teórica ou antecipada no processo penal”
(Súmula 438).
Quanto à suposta ausência de justa causa, trazida sob a alegação
de ausência de tipificação penal da conduta do agente, que não teria praticado
o crime de calúnia, mas sim proferido apenas críticas de cunho político, tenho
que razão não assiste ao impetrante, também, nesse ponto.
É de se observar que o trancamento de ação penal em habeas
corpus é medida excepcional, somente se justificando em face de manifesta
inépcia da denúncia ou irrefutável atipicidade do fato.
No caso dos autos, a denúncia foi recebida, pois atendeu aos requisitos legais, apontando indícios de materialidade e autoria.
As questões suscitadas pelo impetrante demandam esclarecimentos
acerca dos fatos efetivamente ocorridos e, em consequência, exame aprofundado do conjunto probatório, o que não se afigura cabível na via estreita
da ação de habeas corpus.
Esta ação não comporta, ademais, ampla discussão sobre a presença, ou não, dos elementos subjetivos configuradores da tipicidade penal, que
deverão ser devidamente perquiridos, via cognição exauriente, no decorrer
da ação penal em trâmite no juízo de primeiro grau.
Assim, o trancamento prematuro da ação penal é cabível tãosomente quando emerge dos autos, de forma incontroversa, a divergência
entre a imputação e os elementos de convicção em que se baseia, ficando
patente o abuso do poder de investigar.
Na presente hipótese, como destacou o eminente Procurador
Regional Eleitoral em sua manifestação, “o que o paciente pretende com a
impetração é antecipar na via excepcional e unilateral do habeas corpus a
discussão de mérito, com o sacrifício do direito de prova dos fatos alegados
pelo Estado. Tal não é possível, porquanto o direito ao devido processo legal também se estende ao presentante da sociedade e do Estado no Juízo
criminal, que em regra é o Ministério Público”.
A respeito do tema, vejamos o entendimento firmado pela jurisprudência do TSE:
Recurso em Habeas Corpus. Trancamento de ação penal.
Apuração fatos definidos como crime. Calúnia.
Art. 324 do Código Eleitoral. Propaganda eleitoral. Divulgação
co-réu. Alegações de cerceamento de defesa e ilegalidade.
Inexistência. Configuração. Conduta típica. Manutenção da
decisão regional.
O habeas corpus é meio próprio para trancar a ação penal, por
ausência de justa causa, quando desponta prontamente a
atipicidade da conduta.
Recurso Ordinário conhecido, mas desprovido. (grifos nosso)
(AC. TSE nº 82, de 12/05/2005, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira).
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
127
JURISPRUDÊNCIA
Diante do exposto, denego a ordem de habeas corpus pleiteada.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de abril de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
128
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 2 6 4 / 2 0 11
PROPAGANDA PARTIDÁRIA
PROCESSO Nº 903-42.2010.6.05.0000
CLASSE 27
(EXPEDIENTE Nº 73.042/2010 – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO)
EMBARGANTE:
Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB - Seção
da Bahia. Adv.: Bel. Manoel Guimarães Nunes.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Embargos de Declaração. Propaganda Partidária.
Inserções. Cassação de tempo. Art. 45, § 5º da Lei
nº 9.096/95. Efeito suspensivo das decisões. Omissão. Acolhimento parcial.
Dá-se parcial provimento a embargos declaratórios, para
considerar a incidência da norma disposta no art. 45,
§ 5º da Lei nº 9.096/95, mantendo-se, todavia, inalterada
a parte dispositiva do acórdão embargado, que autorizou a veiculação de propaganda partidária somente no
segundo semestre de 2011.
Visto, relatado e discutido o expediente acima indicado,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, por
maioria, vencidos os Juízes Salomão Viana e Cássio Miranda, ACOLHER
PARCIALMENTE OS EMBARGOS, nos termos do voto do Juiz Relator,
adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 3 de maio de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de embargos declaratórios, com pedido de efeito modificativo, opostos pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB,
em face da decisão que, por maioria, deferiu o pedido de veiculação de propaganda partidária, na modalidade de inserções, somente para o segundo
semestre do ano de 2011, tendo em vista ter sido cassado todo o tempo a
que teria direito o partido no primeiro semestre.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
129
JURISPRUDÊNCIA
Na hipótese dos autos, a aludida agremiação solicitou a utilização
do tempo de 20 minutos por semestre, em inserções de 1 minuto ou 30
segundos.
Tendo em vista as decisões proferidas nos processos tombados sob
os nos 3.822/CRE, 3.826/CRE, 3.831/CRE, 3.855/CRE, 3.867/CRE, 3.879/
CRE, 3.882/CRE, 3.896/CRE, 3.897/CRE. 3.902/CRE, 3.905/CRE, 3.907/CRE
e 3.928/CRE, cassando o total de 157 (cento e cinquenta e sete) minutos e 30
(trinta) segundos do tempo de propaganda partidária que caberia ao partido,
esta Corte determinou a cassação do tempo que caberia à agremiação no
primeiro semestre.
Aduz a embargante que, ao assim proceder, o Tribunal não considerou o § 5º do art. 45 da Lei nº 9.066/95, incluído pela Lei nº 12.034/2009,
que atribui efeito suspensivo aos recursos dirigidos ao TSE nos processos
de representação por propaganda partidária irregular, e que, por esse motivo,
não poderia ter havido a diminuição do tempo.
É o relatório.
VOTO
Assiste razão parcial ao embargante.
De fato, em quase todas as representações acima indicadas, houve
a interposição de recurso dirigido ao TSE.
Conforme demonstrado pelo irresignado, apenas nos autos da representação nº 3867/CRE não houvera o manejo de apelo à Corte Eleitoral
Superior, restando definitivamente determinada a cassação de 05 minutos
do tempo de propaganda partidária a que teria direito o partido no primeiro
semestre do ano corrente.
Em que pese a interposição de recursos para o TSE, verifica-se,
no entanto, que nas representações nos 3822/CRE, 3826/CRE, 3831/CRE,
3855/CRE, 3879/CRE, 3896/CRE, 3897/CRE, 3907/CRE e 3928/CRE já
existe manifestação da Instância Superior desprovendo os agravos de
instrumento interpostos contra as decisões que negaram seguimento aos
recursos especiais.
Dispõe o § 5º do art. 45 da Lei nº 9.096/95, incluído pela Lei
nº 12.034/09, que:
“Art. 45.
§ 6º Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais que
julgarem procedente representação, cassando o direito de
transmissão de propaganda partidária, caberá recurso para
o Tribunal Superior Eleitoral, que será recebido com efeito
suspensivo.”
130
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Sabendo-se que para os recursos aptos a desafiar as decisões do
TSE, no âmbito da matéria em exame, não há regra análoga à disposta no
parágrafo acima transcrito, conclui-se que, além dos cinco minutos
fixados na representação nº 3867/CRE, devem ser subtraídos da Agremiação
127 minutos e 30 segundos, referentes ao total do tempo cassado nas representações nos 3822/CRE, 3826/CRE, 3831/CRE, 3855/CRE, 3879/CRE,
3896/CRE, 3897/CRE, 3907/CRE e 3928/CRE.
Tendo em vista que esta Corte, por maioria, assentou o entendimento de que a subtração somente pode ocorrer no primeiro semestre, o
partido deverá ter cassado todo o tempo referente a este período, porquanto
a sanção ultrapassa em muito os 20 minutos a que teria direito.
Isto posto, acolho os embargos aclaratórios, dando-lhes parcial provimento, para, tão somente, reconhecer a incidência do artigo 45, § 5º da Lei
nº 9.096/95, mantendo inalterada a parte dispositiva do acórdão embargado,
que autorizou a veiculação da propaganda partidária somente no segundo
semestre de 2011, pelo tempo de 20 minutos.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 3 de maio de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
131
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 3 0 4 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 3.545-77.2010.6.05.0035
CLASSE 31
MUNICÍPIO: Mucuri
RECORRENTE:Alessandro Mattias Loures. Advs.: Béis. Sérgio dos Santos, Roberto
Albert de Almeida e Moisés Ronacher Dantas.
RECORRIDO:Ministério Público Eleitoral.
PROCEDÊNCIA:Juízo Eleitoral da 35ª Zona.
RELATOR:Juiz Renato Reis Filho.
REVISOR:Juiz Salomão Viana.
Recurso criminal. Transporte ilegal de eleitores.
Condenação pelo Juízo a quo. Autoria e materialidade
evidenciados. Manutenção da decisão. Presença dos
requisitos do art. 44 do CP. Substituição da pena.
Possibilidade. Desprovimento.
1. Nega-se provimento a recurso, para manter a decisão de origem que condenou os réus pela prática
do delito de transporte ilegal de eleitores, quando a
prova dos autos revela-se consistente, evidenciando
a autoria e a materialidade dos fatos assacados.
2. Estando presentes os requisitos estatuídos pelo
artigo 44 do Código Penal, deve a pena privativa de
liberdade ser substituída pela restritiva de direitos.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 10 de maio de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - RENATO REIS
FILHO, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral.
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso interposto por ALESSANDRO MATIAS LOURES, contra sentença de piso (fls. 96/101) que julgou procedente a denúncia
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JURISPRUDÊNCIA
ofertada em desfavor do recorrente, de ODAIR JOSÉ MATIAS LOURES, e
de FABIO CARDOSO DA SILVA NETO, como incursos nas penas do artigo
302 do Código Eleitoral c/c artigos 5º e 11º da Lei n.º 6.091/74, condenandolhes à pena de 04 (quatro) anos de reclusão e de 200 (duzentos) dias-multa,
por terem os réus, no pleito de 2006, prometido e ofertado transporte e café
da manhã a eleitores da localidade denominada Cimental, no município de
Mucuri/BA.
Segundo a exordial acusatória, o denunciado Fábio, que é filiado
ao PTB e, à época dos fatos, fazia campanha para o deputado Benito Gama,
teria ido à Fazenda Cimental, onde teria se comprometido a realizar o transporte de alguns eleitores, para que estes fossem votar em Mucuri. Por ordem
de Fábio, Alessandro teria entregue a Odair uma requisição de 20 litros de
combustível, para abastecimento no Posto Mucuri.
Odair, então, teria se dirigido àquela fazenda, com o pretexto de
comprar carvão e, na volta, teria realizado o transporte de vários eleitores
até a residência do denunciado Fábio. Naquele local, teria sido oferecido
café da manhã aos eleitores, oportunidade em que a polícia foi acionada e
prendeu Odair e Alessandro.
Em suas razões, o recorrente nega a ocorrência dos ilícitos, asseverando ter havido uma valoração equivocada dos elementos de prova
coligidos aos autos, em virtude do que pugna pelo provimento do recurso,
para que seja o recorrente absolvido.
Em contrarrazões (fls. 124/128), o Ministério Público reitera os
argumentos expendidos na proemial.
O ilustre Procurador Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fl. 133), adotando integralmente as contrarrazões
lançadas pela Promotoria zonal.
É o relatório que ora submeto à judiciosa apreciação do eminente
Juiz Revisor.
Salvador, 16 de fevereiro de 2011.
Dr. Renato Reis Filho
Juiz Relator
VOTO
Adoto como relatório o constante às fls. 135/136 dos autos.
Conheço da inconformidade, uma vez que atendidos os requisitos
de admissibilidade.
Bem analisados os autos, tenho por acertada a sentença de origem,
que condenou os réus como incursos nas penas do artigo 302 do Código
Eleitoral c/c artigos 5º e 11º da Lei nº 6.091/74.
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JURISPRUDÊNCIA
De início, vejamos o que dispõe o artigo 302 do Código Eleitoral:
Art. 302. Promover, no dia da eleição, com o fim de impedir,
embaraçar ou fraudar o exercício do voto a concentração de
eleitores, sob qualquer forma, inclusive o fornecimento gratuito
de alimento e transporte coletivo:
Pena - reclusão de quatro (4) a seis (6) anos e pagamento de
200 a 300 dias-multa.
O exame da Lei nº 6.091/74, por sua vez, revela que o legislador,
ao regulamentar a matéria, estabeleceu que o fornecimento gratuito de alimentos e de transporte coletivo a eleitores é prerrogativa exclusiva da Justiça
Eleitoral, senão vejamos:
Art. 5º Nenhum veículo ou embarcação poderá fazer transporte de eleitores desde o dia anterior até o posterior à eleição,
salvo:
I - a serviço da Justiça Eleitoral;
II - coletivos de linhas regulares e não fretados;
III - de uso individual do proprietário, para o exercício do próprio
voto e dos membros da sua família;
IV - o serviço normal, sem finalidade eleitoral, de veículos de
aluguel não atingidos pela requisição de que trata o art. 2º.
Art. 11. Constitui crime eleitoral:
[...]
III - descumprir a proibição dos artigos 5º, 8º e 10:
Pena - reclusão de quatro a seis anos e pagamento de 200 a
300 dias-multa (art. 302 do Código Eleitoral).
A materialidade do delito restou provada por meio do auto de prisão
em flagrante (fls. 05/54) e dos depoimentos colhidos no processo.
A autoria dos réus está demonstrada diante dos depoimentos
testemunhais prestados, tanto na fase inquisitorial como judicial. Importante
transcrever o que declarou, em juízo, Orlando Pereira Silva, policial militar,
que conduziu à prisão os réus Odair e Alessandro:
“Que o depoente estava de serviço no dia da eleição quando
foi chamado pelo telefone pela Promotora de Justiça, Graziela
Junqueira, solicitando apoio para realizar uma prisão. Que se
dirigiu até a esquina das ruas Nova Viçosa e Paquetá, onde
encontrou a Promotora junto com os réus ODAIR E ALESSANDRO, sendo que estes haviam sido flagrados em uma Kombi
transportando eleitores. Que encontrou a Kombi estacionada
com 3 eleitores no interior dela e aproximadamente 8 pessoas em volta. [...] Que a Kombi estava estacionada quase em
frente à residência do réu FÁBIO. Que havia um entra e sai
de pessoas na casa do réu [...]”
(ORLANDO PEREIRA SILVA, policial militar, à fl. 77)
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JURISPRUDÊNCIA
Consta dos autos, ainda, o depoimento de Paulo Rocha Guimarães,
à fl. 84, que não deixa dúvida acerca dos fatos:
“Que estavam na estrada esperando condução para virem
votar quando um dos acusados passou e deu carona para o
depoente e seu colegas mas não foi nada programado. [...]
Que o depoente e seus companheiros é que pediram carona
ao veículo. Quando o motorista parou, o depoente e seus
companheiros avisaram ao motorista que estavam vindo para
Mucuri votar. [...] Que o depoente mais umas cinco pessoas
se dirigiram a pé para a casa do Dr. Fábio. Que pediram ao
motorista do veículo que lhes desse um cafezinho na casa do
Dr. Fábio. Indagado qual o motivo de terem pedido ao motorista
o café na casa de Dr. Fábio e qual a ligação entre o Dr. Fábio
e o acusado que dirigia o veículo o depoente respondeu: ele
era o motorista de Dr. Fábio. Que os eleitores que pediram
carona, pediram um café ao motorista e o motorista os levou
até a casa do Dr. Fábio.”
(PAULO ROCHA GUIMARÃES, à fl. 84)
Em que pese o réu Alessandro José Matias Loures tenha negado os
fatos em juízo, o mesmo afirmou, perante a autoridade policial, ter recebido
uma requisição de 20 litros de gasolina, assinada pelo Dr. Fábio. Demais disso,
o seu irmão, Odair José Matias Loures, confessou ter conduzido algumas
pessoas à casa do Dr. Fábio, onde foi servido café, senão vejamos:
“que no dia dos fatos foi à Fazenda Cimental fazer um pagamento de carvão e na volta, deu carona a algumas pessoas
conhecidas Às quais pediram para ficar na porta da casa do
Dr. Fábio. O declarante estacionou o veículo na porta da casa
do Dr. Fábio e as pessoas disseram que queriam tomar café
na casa do Dr. Fábio. As pessoas entraram e lhes foi servido
o café. Que enquanto estava na porta da casa do Dr. Fábio,
o irmão do depoente chegou, oportunidade em que o declarante informou que havia feito o pagamento do carvão e que
as pessoas às quais o declarante havia dado carona queriam
tomar o café e que eram um número considerável de pessoas
às quais tiveram que fazer fila para serem atendidas.”
(Depoimento pessoal do réu ODAIR JOSÉ MATIAS LOURES,
à fl. 58)
Bastante elucidativo é, também, o depoimento pessoal do réu Fábio
Cardoso da Silva Neto, cujos principais trechos seguem transcritos:
“Quanto aos fatos narrados na denúncia, tem a esclarecer que
é presidente do PTB no Município e atuou na campanha
do deputado Benito Gama. No domingo anterior às eleições,
o declarante esteve na Fazenda Cimental para pedir votos
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JURISPRUDÊNCIA
para seu candidato e naquela oportunidade se comprometeu a proporcionar transporte aos eleitores. O compromisso foi assumido juntamente com o Sr. Alessandro, o qual
tem vínculos comerciais naquela região. Na 5ª feira, em audiência pública realizada no Fórum, o depoente ouviu da Juíza
Eleitoral a advertência feita a todos os presentes quanto à
proibição legal e consequências penais do transporte de
eleitor no dia da eleição. No sábado, conversou com o Sr.
Alessandro, dizendo-lhe para abortar a busca dos eleitores
porque aquilo iria dar problema. O Alessandro argumentou
que haviam dado a palavra e que deveriam cumpri-la. O
declarante então disse ao Sr. Alessandro que a responsabilidade seria toda dele, Alessandro. No domingo pela manhã,
tocaram a campainha da casa do declarante e ao atender a
porta, deparou-se com o Sr. Alessandro com uma Kombi
cheia de eleitores. O declarante permitiu que as pessoas
entrassem em sua casa e providenciou um cafezinho com
pão para aquelas pessoas e disse ao Alessandro para
despachar o pessoal. Em seguida, se dirigiu a Itabatã [...].”
(grifos aditados)
(Depoimento pessoal do réu FÁBIO CARDOSO DA SILVA
NETO, à fl. 60)
Para que a conduta se amolde ao tipo penal, é imprescindível que
se tenha a justa correspondência entre os elementos do tipo e o ato acoimado
ilícito. In casu, o tipo insculpido nos dispositivos retro encerra, além dos elementos objetivos, o elemento subjetivo, qual seja o fim específico do agente
de obter vantagem eleitoral, o que resta explicitado nos autos, conforme se
depreende da leitura da prova oral produzida.
Nesta senda, tenho por acertada a decisão a quo, que julgou procedente a denúncia. Impende, todavia, observar que, na hipótese versada,
encontram-se presentes os requisitos autorizadores da substituição da pena
privativa de liberdade pela restritiva de direitos, nos termos do artigo 44 do
Código Penal, in verbis:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se
o crime for culposo;
II - o réu não for reincidente em crime doloso;
III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a
personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
A sentença de origem condenou os réus a 04 (quatro) anos de reclusão, além do pagamento de 200 dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo)
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JURISPRUDÊNCIA
do salário mínimo vigente à época dos fatos. O magistrado zonal determinou
que a pena de reclusão deveria iniciar-se no regime semi-aberto.
O primeiro requisito previsto no inciso I do artigo 44 do CP encontrase atendido, porquanto a pena aplicada não superou os quatro anos e o delito
não foi praticado mediante violência ou grave ameaça à pessoa.
De igual modo, o segundo pressuposto, inserto no inciso II do referido artigo, está presente, já que os réus não são reincidentes na prática
de crime doloso.
O terceiro requisito, de natureza subjetiva, demanda a análise da
pena aplicada, à luz do binômio necessidade e suficiência.
Do exame dos autos, verifica-se que os réus são tecnicamente
primários, nada havendo que lhes desabone a vida pregressa. Como assentado na decisão objurgada, inexistem elementos suficientes acerca da
conduta social e da personalidade dos réus, que pudessem influir na fixação
da pena, de modo que as circunstâncias judiciais revelam-se favoráveis aos
mesmos.
Nesta direção, com vistas a se evitar o desnecessário encarceramento dos condenados, a substituição da pena privativa de liberdade pela
restritiva de direitos ressai como medida razoável e suficiente à reprovação
das práticas delitivas em comento, restando atendido, ainda, o caráter preventivo da medida punitiva.
O § 2º do artigo 44 do CP assim estabelece:
Art. 44. [...].
§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição
pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos;
se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode
ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa
ou por duas restritivas de direitos.
Na hipótese, a condenação se deu à pena restritiva de liberdade e
multa. Como consectário, a substituição da pena de prisão deverá se dar por
uma restritiva de direito, mantendo-se a condenação à reprimenda pecuniária,
nos termos da sentença de piso.
Forte em tais razões, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo-se a condenação dos réus e a pena aplicada, que deve ser substituída
por uma restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade, em entidade a ser definida pelo juízo da execução, em observância
ao estatuído pelo art. 44 do Código Penal.
É como voto.
Sala de Sessões do TRE da Bahia, em 10 de maio de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 3 6 4 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 13.653-50.2008.6.05.0193
CLASSE 30
(APENSOS: RECURSOS ELEITORAIS Nos 13.645-73.2008.6.05.0193 e 13.656-05
.2008.6.05.0193 – CLASSE 30)
MUNICÍPIO:
Marcionílio Souza
RECORRENTES: Coligação RENOVAR É PRECISO, O POVO NO PODER,
Rauildo Santos de Souza e PRTB de Marcionílio Souza. Advs.:
Béis. Vagner Bispo da Cunha, Lindolfo Rebouças, Paulo de
Tarso Santos, Anderson Batista, José Antônio Sampaio Gomes
e Pablo Picasso Silva Dias
RECORRIDOS:
Edson Ferreira de Brito e Edson Pires de Souza. Advs.: Béis.
Fabrício Maltez Lopes e Rafael de Medeiros Chaves Mattos.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 193ª Zona/Iaçu.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
REVISOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Recursos eleitorais. AIME, AIJE e Representação.
Fundamento no art. 30-A da Lei nº 9.504/97. Pedido
de inelegibilidade, cassação de diploma e multa. Alegação de captação ilícita de sufrágio, abuso do poder
econômico e corrupção. Arguição de arrecadação e
gastos ilícitos de recursos. Ilicitude na obtenção da
prova documental. Inocorrência. Comprovação da
ocorrência dos ilícitos eleitorais. Cassação dos diplomas e mandatos políticos. Inelegibilidade do primeiro
recorrido. Assunção dos segundos colocados.
Preliminar de inadequação da via eleita.
Afasta-se a prefacial, porquanto o art. 30-A da Lei
nº 9.504/97 autoriza a impugnação de condutas
relativas à arrecadação e gastos de recursos para
fins eleitorais por meio de representação, a qual,
de acordo com o § 1º do mesmo artigo, deve seguir
o procedimento do art. 22 da Lei Complementar nº
64/90, previsto para o processamento das AIJES.
Alegação de coisa julgada.
A aprovação das contas de campanha não impede
o ajuizamento de representação com base no art.
30-A da Lei nº 9.504/97, uma vez que constituem
ações independentes, razão por que não se acolhe
a preliminar.
Mérito
Dá-se provimento a recursos manejados contra
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JURISPRUDÊNCIA
decisão de 1º grau que julgou improcedentes AIME,
AIJE e Representação Eleitoral, quando se comprova
a prática de abuso de poder econômico, captação
ilícita de sufrágio e violação ao art. 30-A da Lei das
Eleições, cassando-se, por conseguinte, os diplomas e mandatos políticos e declarando-se a inelegibilidade do primeiro recorrido; determinando-se,
outrossim, a imediata diplomação dos candidatos
da chapa majoritária que obteve a segunda maior
quantidade de votos na eleição de 2008 ocorrida
naquela municipalidade.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER AS PRELIMINARES DE INADEQUAÇÃO DA
VIA ELEITA e DE COISA JULGADA e, no mérito, DAR PROVIMENTO AOS
RECURSOS, nos termos do voto do Juiz Relator de fls. 1.329/1.355, que
integra o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 24 de maio de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY
PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recursos aviados pela COLIGAÇÃO RENOVAR É
PRECISO, O POVO NO PODER, RAUILDO SANTOS DE SOUZA e pelo
DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO RENOVADOR TRABALHISTA
BRASILEIRO contra decisões lançadas pelo Juiz da 193ª Zona Eleitoral/
Iaçu, que julgou improcedentes a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo
nº 659/2008, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 656/2008 e a Representação Eleitoral nº 654/2008, ajuizadas em desfavor de EDSON FERREIRA
DE BRITO e EDSON PIRES DE SOUZA, atuais Prefeito e Vice-Prefeito do
Município de Marcionílio Souza, eleitos no pleito de 2008.
Nas peças vestibulares das supra epigrafadas AIME e AIJE, os
seus autores, ora Recorrentes, requereram a decretação da inelegibilidade e
cassação dos diplomas dos investigados, ora Recorridos, e, ainda, a aplicação de multa, sob a alegação da ocorrência de abuso de poder econômico,
corrupção e captação ilícita de sufrágio, cujo delineamento decorre da doação
de combustível, cestas básicas, dinheiro e peças de motocicleta, além de
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JURISPRUDÊNCIA
fornecimento de transporte gratuito a eleitores visando ao comparecimento
de comício.
Nas decisões vergastadas in foco, o douto Magistrado Zonal, empós
declarar a nulidade da prova documental referente à distribuição de combustível e da prova pericial dela decorrente, reconheceu a fragilidade do acervo
probatório, julgando improcedentes os pedidos iniciais.
Pertinente a Representação nº 654/2008, os Recorrentes alegam
que a prestação parcial das contas dos Recorridos fora apresentada de forma
fraudulenta, contendo omissão das receitas e despesas realizadas até o dia
06.08.2010, período em que a campanha eleitoral daqueles se encontrava
deflagrada.
Demais disso, aduzem que na contabilização das contas de campanha foram omitidos os gastos com serviços advocatícios, comitê financeiro, propaganda eleitoral, locação de veículos para transporte de eleitores,
financiamento de campanha dos candidatos ao cargo de vereador, locação
de carros de som, doações de cestas básicas e de peças de motocicleta.
Ao final, pedem pela procedência da Representação para que sejam
cassados os diplomas outorgados aos Recorridos.
Em todos os recursos ora postos a acertamento, os Recorrentes
sustentam, inicialmente, que a decisão hostilizada se revela extra petita, ao
argumento de que a declaração judicial de nulidade da prova documental,
impulsionada pela tese da obtenção ilícita das notas de abastecimento, não
foi invocada pelos demandados, que somente suscitaram a questão relativa
à falsidade dos documentos, a qual, alega, restou afastada pela perícia.
Afirmam, outrossim, que as aludidas notas foram entregues pelo
gerente do posto de gasolina, Sr. Erasmo Cristovão de Almeida Ribeiro, o
qual detinha a sua posse legítima, razão pela qual não há que se falar em
presunção de furto, com a conseqüente ilegalidade na obtenção.
Argumentam que, ainda que admitida a ilicitude da prova, deve
esta ser valorada, à vista da proteção do Estado Democrático e do princípio
da proporcionalidade.
No que tange à prova testemunhal, dizem que não é correto desconsiderá-la, sob o argumento de que as testemunhas dos recorrentes afirmaram
a existência das condutas ilícitas, enquanto aquelas dos investigados, ora
recorridos, negaram-nas, pois os depoimentos das primeiras se encontram
em consonância com o conjunto probatório constante nos autos.
Quanto à prestação parcial das contas, alegam que os documentos juntados aos fólios evidenciam a existência de doações e gastos não
contabilizados. Mencionam, também, que nunca houve doação de serviços
advocatícios, cujos contratos, confeccionados para sustentar a tese de defesa,
encontram-se imbuídos de falsidade ideológica, assim como aquele relativo
à doação do carro de som.
Referem que a tese relativa à ocorrência do abuso do poder econômico e da captação ilícita de sufrágio resta comprovada pelas notas de
abastecimentos carreadas aos autos, documentos que culminam por eviden-
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JURISPRUDÊNCIA
ciar a distribuição aos eleitores de grande quantidade de combustível, cujos
gastos também não foram declarados na prestação de contas.
Sobre as gravações de áudio e vídeo referentes à campanha
eleitoral, asseguram que são imaculadas, encontrando-se em conformidade
com as demais provas do processo.
Por derradeiro, argumentam que as testemunhas de defesa faltaram
com a verdade, a exemplo do arrendatário do posto de combustível, Sr. Carlos
Alberto Roque da Cunha, que afirmou não haver negociado mercadorias no
referido estabelecimento comercial durante o período anterior às eleições.
Pugnam, dessa maneira, pelo provimento dos recursos para que,
reconhecendo-se a licitude da prova documental e a perícia dela decorrente,
sejam as sentenças invectivadas reformadas, de modo a se julgar procedentes as ações sub examine, com a conseqüente decretação de inelegibilidade
e cassação dos diplomas dos Recorridos, dando-se posse imediata à chapa
a qual coube o segundo lugar no certame de 2008.
Em contrarrazões, os Recorridos, inicialmente, requerem que esta
Corte analise a demanda nos exatos limites propostos na inicial, deixando
de apreciar qualquer outro fato ou pleito apresentado posteriormente, uma
vez que consumada a preclusão.
Ainda, preliminarmente, argúem que a Representação enfocada é
via processual inapropriada para investigar a existência da suposta captação
e gastos ilícitos de recursos e que a matéria relativa à prestação de contas
já fora julgada pelo órgão competente, que a aprovou, com ressalvas, devendo por tais razões, portanto, o processo, neste aspecto, ser extinto sem
resolução de mérito.
No tocante à questão de fundo, os Recorridos afirmam que restou
peremptoriamente provada na instrução probatória a não ocorrência das ilicitudes imputadas. Evidenciam, também, que se procedeu a devida correção
em relação aos equívocos detectados na prestação de contas.
Aduzem que, mesmo que se admita a existência das ilicitudes,
sua ocorrência jamais poderia causar desequilíbrio no certame, vez que as
campanhas eleitorais dos candidatos contendores foram materializadas de
igual forma.
Instado nos autos da AIME e da AIJE, o ilustre representante do
Ministério Público Eleitoral com assento nesta Corte, em prestígio à unidade
institucional, adotou as razões lançadas pelo Parquet de 1º grau, manifestando-se pelo desprovimento do recurso.
Em relação à Representação formulada com base no art. 30-A da
Lei 9.504/97, o MPE manifestou-se pelo provimento parcial do recurso, a fim
de que sejam cassados os diplomas dos candidatos eleitos.
Em momento posterior, vislumbrando a conexão entre as partes e os
fatos constantes dos feitos sub judice (AIJE, AIME e Representação), ordenei
o apensamento dos processos para julgamento conjunto (fls. 1.294), dando
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JURISPRUDÊNCIA
azo ao pedido de reconsideração por parte dos Recorrentes, sem êxito, uma
vez que mantive o meu posicionamento (fls. 1300/1301), valendo sublinhar
que, desta decisão, não houve irresignação.
É o relatório.
VOTO
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos.
Preliminares deduzidas nos autos:
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
Inicialmente, cumpre examinar a preliminar de inadequação da via
eleita levantada nos autos da Representação de nº 654/2008 pelos Recorridos, sob o argumento de que as alegações referentes à suposta captação e
gastos ilícitos de recursos devem ser levadas ao crivo do judiciário por meio
da Ação de Investigação Judicial Eleitoral.
É cediço, todavia, que o art. 30-A da Lei 9.504/97 autoriza a impugnação de condutas relativas à arrecadação e gastos de recursos para
fins eleitorais por meio da Representação, a qual, de acordo com o § 1º do
mesmo artigo, deve seguir o procedimento do art. 22 da Lei Complementar
nº 64/90, previsto para o processamento das AIJEs.
Em judicioso parecer, o preclaro Procurador Eleitoral pontuou “...
da análise do referido dispositivo legal, verifica-se que a apuração de condutas em desacordo com o artigo 30-A segue apenas o procedimento da
AIJE, não existindo óbice, portanto, para a sua proposição sob a forma de
representação eleitoral...”
Demais, observa-se que a aludida preliminar já foi afastada por decisão interlocutória lançada na Representação n. 654/2008 (fls. 658/661), valendo
a transcrição do seguinte excerto da lavra do Juízo de primeiro grau:
“(...) Inicialmente, passo a apreciar a alegação da falta de
interesse de agir, na modalidade adequação, sustentando a
inaplicabilidade da via processual eleita por entender que se
trata de verdadeira ação de investigação judicial eleitoral e que
não houve pedido na inicial de conversão da representação
em referida ação.
Não assiste razão aos representados, uma vez que há de se
reconhecer à representação eleitoral prevista no art. 30-A, da
Lei 9.504/97 a natureza de autêntica ação judicial (...)
(...)Dessa forma, rejeito, a alegação de falta de interesse de
agir (...)”
A Representação com fulcro no supracitado art. 30-A, desse modo,
não deve ser confundida com a AIJE, pois, a despeito de utilizar-se do rito
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JURISPRUDÊNCIA
processual desta, constitui-se ação própria, com requisitos bem definidos
pela Lei Eleitoral.
Mercê dessas ponderações, mormente considerando no caso que
inexistiu qualquer prejuízo para a parte recorrida, ensejando a máxima pas
de nullité sans grief (art. 129 do CE), inacolho a preliminar.
ALEGAÇÃO DE COISA JULGADA.
Defendem os Recorridos, ainda em sede de preliminar, que a contenda relativa à captação e gastos ilícitos de recursos deve ser extinta sem
julgamento de mérito, tendo em vista anterior aprovação, pelo órgão eleitoral
competente, das suas contas de campanha.
Não há que se falar, porém, em coisa julgada material entre a prestação de contas prevista no art. 28 da Lei das Eleições e a Representação
eleitoral da estipe em análise, quando a própria legislação autoriza a instauração desta para averiguar irregularidades havidas naquelas.
Efetivamente, deve-se reconhecer que o objeto da reclamação
com base no art. 30-A da Lei nº 9.504/97 é muito mais amplo do que o da
prestação das contas de campanha, cujo procedimento, instrumentalizado
mediante formulários previamente definidos pela Justiça Eleitoral, não permite
a averiguação da ocorrência dos ilícitos apontados na exordial.
Em verdade, ao julgar as contas de campanha, realiza o magistrado apenas uma análise formal acerca dos documentos que lhes foram
apresentados, observando se foram obedecidas minimamente as exigências
estabelecidas pela legislação de regência.
Demais disso, não há que se falar em coisa julgada quando não
houve pronunciamento da Justiça Eleitoral acerca dos fatos imputados aos
recorridos.
A decisão que julgou as contas possui natureza administrativa,
analisando principalmente aspectos meramente formais dos dados apresentados pelo candidato, haja vista o exíguo prazo para a apreciação destas,
inexistindo, assim, a alegada relação de prejudicialidade com a ação prevista
pelo art. 30-A da Lei n. 9.504/97.
Ademais, a minireforma instituída pela Lei n. 11.300/06, que acrescentou o predito art. 30-A à Lei da Eleições, teve como finalidade principal,
entre outras, permitir a análise mais aprofundada das contas de campanha
de forma a se evitar a malversação de recursos.
Sobre a matéria, o Min. Ricardo Lewandowsky, proferindo decisão
no Recurso Ordinário n. 2366-GO, em 20.10.2009, destacou:
“(...)Tampouco prospera a alegação de ser inviável a análise da
infração ao art. 30-A da Lei 9.504/97 em virtude dos mesmos fatos, objeto
da representação, terem sido analisados quando do julgamento da prestação
de contas do recorrido. O processo de prestação de contas tem natureza
administrativa e sua análise é feita sobre um prisma bastante restrito.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
143
JURISPRUDÊNCIA
(...)
Na espécie, não pode haver preclusão entre a matéria discutida
no processo de prestação das contas que o candidato estava obrigado a
encaminhar à Justiça Eleitoral – até o trigésimo dia posterior à realização
das eleições, por força do disposto nos artigos 28, § 2º, 29, inciso III, da Lei
9.504/97 -, e aquela da representação prevista no artigo 30-A, do mesmo
Diploma legal, em que se examinou a alegação de captação e gasto ilícitos
de recursos para fins eleitorais.
No primeiro caso, tem-se que um processo sem contraditório, onde
até mesmo de ofício pode haver a determinação de diligência para suprir as
falhas. E como o prazo para julgamento do processo é muito pequeno, a Justiça Eleitoral se limita a apreciar, não raro, os aspectos formais e contábeis,
aprovando ou rejeitando as contas.
Na representação fundada no 30-A, de modo diverso, é possível
examinar com profundidade todos os aspectos da arrecadação e gastos dos
recursos, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, seguindo o rito do
artigo 22 da Lei Complementar nº 64/90. O preceito legal em que se funda a
ação, como bem assinalou o acórdão recorrido (fl. 1907), tem como principal
finalidade impedir o uso de recursos vedados e o emprego do “caixa dois”
na campanha eleitoral. Somente aqui se permite a imposição da sanção de
perda do diploma ou do mandato eletivo.”
Na esteira desse entendimento, julgados do TRE-SP:
RECURSO ELEITORAL. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. CAPTAÇÃO E GASTO ILÍCITOS DE RECURSOS DE CAMPANHA.
PREFEITO E VICE-PREFEITO. EXTINÇÃO DO PROCESSO
SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO. PRESTAÇÃO
DE CONTAS APROVADAS. INDEPENDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO COM FUNDAMENTO NO ART. 30-A EM RELAÇÃO A PRESTAÇÃO DE CONTAS APROVADAS. FATO
QUE NÃO IMPEDE O INGRESSO DE REPRESENTAÇÃO.
RECURSO PROVIDO. (RE - RECURSO nº 34203 - Taboão
da Serra/SP; Acórdão de 23/03/2010, Relator(a) PAULO HAMILTON SIQUEIRA JÚNIOR, Publicação: DJESP - Diário da
Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 13/04/2010, Página 31).
Por esses fundamentos, rejeito, também, esta preliminar.
MÉRITO
Conforme relatado, por meio dos presentes recursos, interpostos
nos autos da AIME nº 659/2008, da AIJE nº 656/2008 e da Representação
Eleitoral nº 654/2008, visam os Recorrentes a reformar as decisões de 1º
grau para que sejam decretadas a inelegibilidade e cassação dos diplomas
dos Recorridos, ao fundamento de arrecadação e gastos ilícitos de recursos
144
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
durante a campanha eleitoral e, ainda, da prática de abuso de poder econômico, captação ilícita de sufrágio e corrupção eleitoral.
Da análise atenta dos autos, verifico que a pretensão exordial das
três ações supra epigrafadas se lastreiam praticamente nos mesmos fatos,
tanto é assim que o Magistrado a quo instruiu conjuntamente a AIJE e a AIME,
juntando, inclusive, aos fólios destas ações, na qualidade de prova emprestada, cópias de termos de depoimentos e dos laudos periciais produzidos na
Representação de nº 654/2008.
Vale destacar que as decisões atacadas apresentam diversos
pontos em comum, o mesmo ocorrendo com os recursos interpostos pelos
Recorrentes. A par disso e pelas razões acima expendidas, as irresignações
postas a acertamento merecem julgamento simultâneo, ressaltando, contudo,
que, empós análise e constatação dos ilícitos alegados nas preludiais, suas
conseqüências jurídicas, com a aplicação do correspondente ato punitivo,
serão examinadas de per si.
O primeiro fato que ora me debruço, constitutivo da causa de pedir
de todas as demandas em julgamento, diz respeito à distribuição de combustíveis, cujas provas documentais e pericial foram declaradas, de ofício,
nulas pelo douto Magistrado a quo, ao argumento de que sua obtenção se
deu de forma ilícita.
Cumpre, desse modo, aferir a licitude ou não da prova documental, delineada pela obtenção e apresentação em Juízo das notas de abastecimento.
Com o intuito de provar a grande quantidade de distribuição de
combustíveis a eleitores e correligionários políticos, os Recorrentes instruíram
as iniciais com cópias de “notas de fornecimento” oriundas do Posto Dallas,
antigo Tamburi, de propriedade do primeiro Recorrido, Edson Ferreira de Brito
(fls. 326/329), referentes ao mês de agosto do ano de 2008.
Posteriormente, na oportunidade da realização da audiência de instrução da Representação nº 654/2008, apresentaram novas cópias das referidas
“notas de fornecimento de combustível”, só que, desta vez, autenticadas.
O Juízo a quo, ao valorar essa prova, declarou-a nula, por entender
que foi obtida de forma ilícita, baseado unicamente no fato de que a autenticação dos documentos tinha sido realizada na mesma data da audiência
instrutória e que o cartório abriu o expediente às 8 horas, sendo que aquela
sessão se iniciou às 8 horas e 30 minutos.
Em face desta circunstância, o a quo entendeu que não houve
tempo hábil para autenticar a documentação sob enfoque e, por conseguinte,
aplicou a conhecida “teoria dos frutos da árvore envenenada” para também
anular a perícia dela decorrente.
No decisum vergastado, restou consignado que:
“...as cópias fotostáticas das denominadas “notas de abastecimentos” do “Posto Tamburi”, atualmente conhecido como
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
145
JURISPRUDÊNCIA
“Posto Dalas”, foram obtidas por meio ilícito.
É que os documentos em referência, se autênticos, foram
retirados de maneira ilegal do interior da empresa em questão, e isso por duas vezes: inicialmente, antes da propositura
da ação, e, também, por ocasião da audiência de instrução,
quando foram juntadas novas cópias dos mesmos, desta feita
autenticadas.
...
Em sabendo do local onde os documentos poderiam ser encontrados, os Representantes deveriam ter promovido a necessária busca e apreensão dos mesmos, conduto processual
adequado à espécie. Não é possível aceitar que, furtivamente,
tenham-nos retirado do local onde estavam para extração de
cópias, e, repita-se, valendo-se do indigitado expediente legal
por duas vezes.”
Asseguram os Recorrentes, nas razões recursais, que a decisão
fustigada encontra-se equivocada, pois as aludidas notas foram entregues pelo
gerente do posto de combustível, Sr. Erasmo Cristovão de Almeida. Todavia,
verifico dos elementos dos autos, que o referido gerente, de fato, detinha a
posse legítima dos documentos, conforme se depreende do seu depoimento
como testemunha referida nos autos da AIJE n.656/08 e AIME n. 659/8.
Eis o depoimento:
“Sou gerente do posto Dallas (...) (...) As notas fiscais são preenchidas tanto por mim como pelo frentista que estiver trabalhando (...) (...) As
notas de abastecimento ao final do expediente são entregues a mim para
conferência do caixa (...) (...) O posto Dallas antigamente chamava posto
Tamburi, e continua sendo conhecido pelo nome antigo (...)”
Impende dizer, porque relevante, que inobstante a audiência tenha
se iniciado às 08 horas e 30 minutos, a prova in foco fora juntada após a oitiva
das testemunhas, sendo que levada por uma das partes que chegou à sede
do Juízo Zonal após o início daquela sessão e, por isso mesmo, entendo que
não houve incompatibilidade de horário.
De fato, colhe-se do termo de audiência de fls. 778 dos autos da
Representação n. 654/2008 a informação de que o pedido de juntada de
documentos foi formulado após a oitiva das testemunhas, quando a parte
pediu a palavra para juntar os documentos autenticados.
Do mesmo termo de audiência, aufere-se que o Juízo Zonal concedeu prazo de cinco dias para que os Recorrentes indicassem em poder de
quem os documentos originais se encontravam, inclusive, deferiu, de logo,
busca e apreensão (Representação n. 654/2008 – fls. 779).
Por petitório de fls. 831/851 da supra epigrafada Representação,
os Recorrentes indicaram que receberam os documentos, tanto as cópias
iniciais como as fotocópias, das mãos do Sr. Erasmo Cristovão de Almeida,
146
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
gerente do aludido Posto de Combustíveis. No mesmo requerimento, solicitaram perícia nos referidos documentos e, ainda, o endereço em que os
originais poderiam ser encontrados.
A par disso, o Juiz sentenciante, após o fornecimento do endereço e indicação de como se obteve o documento focalizado, culminou por
revogar o seu despacho que ordenara a sua busca e apreensão (fls. 853/
Representação n. 654/2008).
Digno de nota o fato da parte recorrida não ter manifestado qualquer
irresignação ante a juntada dos documentos em audiência, bem como após
a informação de como os mesmos foram obtidos. Observa-se, ainda, que a
audiência na qual se juntou os documentos, foi realizada em 25/05/2009 e o
Sr. Erasmo Cristovão de Almeida foi ouvido como testemunha referida nos
autos da AIME e AIJE em 29/09/2009, quando todas as partes do processo já
tinham conhecimento de que o mesmo foi quem fornecera os documentos.
Diante do exposto, não há, pois, em se falar em prova obtida ilicitamente, visto que obtida por meio moralmente legítimo (art.332, do CPC).
Deve-se salientar, porque também importante, que não há que se
falar em julgamento extra petita em razão da consideração da tese da ilicitude da prova, de ofício, pelo juízo a quo. Isso porque o direito à produção de
provas lícitas nos processos judiciais e administrativos vem expressamente
previsto no art. 5º, inc. LVI da Constituição Federal, consistindo, portanto,
uma questão de ordem pública, que, por sua natureza, deve ser considerada
pelo judiciário, independentemente de alegação das partes.
Inobstante isso, mesmo que a prova tivesse sido obtida por meio
pouco recomendável, de qualquer sorte deve ser imperiosamente valorada
por conta da natureza dos interesses defendidos, com a aplicação do princípio
da proporcionalidade, invocado para salvaguardar valores maiores, in casu,
a supremacia do interesse público.
Trilhando nesse entendimento, gizo o fato de que nos sistemas
jurídicos em geral, os valores por eles protegidos encontram-se escalonados
conforme o grau de importância atribuído pela sociedade. Assim, a materialização dos valores e direitos que se mostram mais importantes, em casos
específicos, pode-se dar através da aceitabilidade processual de provas
colhidas, mesmo que logradas mediante meios não previstos em lei.
Nessa esteira de intelecção, a incidência da Teoria da Proporcionalidade amaina a vedação ao uso da prova obtida por meio impróprio para
admiti-la excepcionalmente e em casos de extrema gravidade, dando abrigo,
destarte, a outros valores fundamentais, considerados mais urgentes na
concreta avaliação do caso.
Nesse passo, a proibição da prova adquirida por meio distinto
daquele corriqueiramente admitido, não se afigura absoluta, podendo ceder
quando em colisão com outro direito fundamental, de maior peso, isso em
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
147
JURISPRUDÊNCIA
decorrência de isenção ao respeito que se deve a outras garantias de igual
ou superior relevância, como ocorre na vertente, pois aqui os bens jurídicos
tutelados, quais sejam, o Estado Democrático de Direito, a soberania popular,
a lisura e transparência das eleições suplantam – e muito – o bem jurídico hipoteticamente violado: a privacidade da empresa pertencente ao acionado.
Daí é que, imperiosa é a aceitabilidade da valoração das cópias
das notas de abastecimento juntadas aos autos e da perícia dela decorrente,
porque fora obtida por meio moralmente legítimo, sendo, pois, lícita, seja porque, ainda que considerada ilícita, deve ser analisada em virtude do princípio
da ponderação de interesse (proporcionalidade).
Admitida por este Julgador a necessidade de valoração da mencionada prova documental, vislumbro que a sentença guerreada não procedeu
ao seu devido e regular cotejo com o acervo probatório existente nos fólios,
ao contrário, preferiu ignorá-la para examinar as demais provas isoladamente, deixando, assim, uma percepção falsa de pouco importância àqueles
documentos.
Note-se que tais documentos foram periciados pela Polícia Federal, conforme laudos de fls. 934/950 e fls. 1088/1091 da Representação
n. 654/2008, sendo que, ao responder quesitação, informou ser possível realizar perícia em documentos xerocopiados (fls. 948) e que não foi detectados
sinais de falsificação nas referidas notas (fls. 945). Já nas fls. 946, a perícia
descreveu o conteúdo das notas de abastecimentos. Concluiu, também, que
há notas que foram preenchidas pelo primeiro recorrido, o Sr. Edson Ferreira
Brito, então prefeito eleito.
Da análise acurada dos autos, verifico que tais notas, nas quais
consta a assinatura de um dos Recorridos, corroboram os depoimentos das
testemunhas, no sentido de que aquele, durante sua campanha, realizou
doação de combustível, por meio do Posto Dallas, antigo Tamburi, com vistas
à presença dos beneficiados em seus comícios e carreatas, bem como em
troca de voto, vejamos:
“(...) Durante a campanha passada houve distribuição de
combustível no posto em que eu trabalhava, as vezes chegavam veículos para serem abastecidos e em outras eram
enchidos tambores de combustíveis. Quando era pequenos
abastecimentos, ele ligava ou eu mesmo ligava para ele com
a finalidade de confirmar a autorização para abastecimento,
mas quando era grande quantidade de combustível, quem autorizava era Erasmo, gerente do posto. O seu Edson comprava
a prazo havendo controle através de notas de fornecimento.
(...) Pessoalmente ele já esteve no Posto onde assinou nota
de fornecimento.”
(Declarações prestadas por Elizeu Braga Júnior às fls. 729/731
– Representação nº 654/2008)
148
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Já no depoimento prestado na AIJE n. 656/2008 e AIME 659/2008,
na qual se apurava a captação de sufrágio, transladado posteriormente para
a Representação n. 654/2008, a testemunha afirmou: “(...) Calenta comentou
comigo que utilizou combustível para levar para fora de Marcionílio, inclusive
doentes, em troca de votos (...)”
Às fls 725/728, da Representação n. 654/2008, Raimundo Ubiratan
Medrado Júnior diz:
“(...) Às vezes aos sábados eu levava os cabos eleitorais na
roça para pedir votos. Eu também só recebia o combustível
nessas viagens. Os carros de Bené e de Renato Calenta
também faziam esses serviços. Quem distribuía o combustível na Beira Rio era Dinho e Alaíde esposa de Besouro. Só
me lembro que fiz duas viagens para o Beira Rio levando em
média 80 litros de diesel e 220 de gasolina. O combustível era
distribuído para pessoas que quisessem participar da carreata
do Sr. Edson.”
A testemunha Maria Aparecida Bastos Novais, por sua vez, em
depoimento colhido nos autos da Representação nº 654/2008, mas utilizado
como prova emprestada nos outros dois feitos, afirma que:
“(...) os participantes das carreatas ganhavam combustíveis
do S. Edson para colocar em seus veículos. (...) Não sei dizer
quem distribuía combustível no posto de gasolina, pois não
moro na cidade de Marcionílio e sim no Caxá, onde a distribuição de combustível era feita por Didi. (...) Embora eu tenha visto
a chegada do combustível apenas uma vez e nessa oportunidade eu não tenha visto a distribuição de combustível, em todos
os comícios do Sr. Edson Deusdete distribuía combustível (...)”
(Depoimento prestado por Maria Aparecida Bastos Novais às
fls. 722/724 – Representação nº 654/2008).
Em sede de contestação, o representado Edson Ferreira de Brito
negou que teria assinado as citadas notas, contrariando a conclusão da
perícia grafotécnica realizada sob estas e utilizadas nos três feitos, de que
a grafia nelas constante proveio do seu próprio punho (fls. 1.088/1.091 dos
autos da Representação).
À vista do exposto, não resta dúvida acerca da ocorrência da doação
de combustível para realização de carreatas, pelo que entendo que tal fato
configurou abuso de poder econômico, captação ilícita de sufrágio e violação
ao art. 30-A da Lei das Eleições.
Vejamos.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
149
JURISPRUDÊNCIA
Para a configuração do ilícito tipificado no art. 41-A da Lei nº
9.504/97, no entanto, exige-se a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer, entregar) dirigida a um eleitor determinado ou ao menos determinável
e que tenha a finalidade de obter voto.
Antes do advento da Lei 12.034/2009, que acrescentou o § 1º ao art.
41-A da Lei das Eleições, o TSE já decidia “...o entendimento desta Corte é
que o pedido de voto não precisa ser explícito e direto para que se configura
a conduta do art. 41-A da Lei 9.504/97.” (Agravo Regimental em RCED n.
697, Acórdão de 13/10/2009, Rel. Min. Ricardo Levandowsky).
Aufere-se do processo que realmente houve captação ilícita de
sufrágio mediante distribuição de combustível e promessa de contratação
com o município para os proprietários de ônibus aderirem à campanha
transportando eleitores.
O Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, julgando caso similar ao presente, nos autos do RE n. 5.715, Acórdão n. 5.635/2009, Rel. Juiz
Sílvio Abreu, em 21/01/2009, cuja nota taquigráfica foi juntada à estes autos
pelos Recorrentes, pontuou:
“Narra a exordial, em síntese, que os representados, “foram flagrados distribuindo, doando, fornecendo, anuindo-se aqueles distribuição de
combustível (gasolina e óleo diesel), para diversos eleitores para participarem
de uma carreata, no afã de angariarem votos e a simpatia do eleitorado.”
(...)
Extrai-se dos autos ser o volume de combustível expressivo (1.616
litros), notadamente considerando que o Município de Ouro Verde de Minas
possui pouco mais de cinco mil habitantes. A potencialidade lesiva para
comprometer o resultado do pleito revela-se clara, como bem demonstrou o
Magistrado a quo:
In casu, portanto, restou configurada captação ilícita de sufrágio
decorrente da doação de combustível, sendo inequívoco o abuso de poder
econômico em razão do volume expressivo de combustível e do vultoso valor
pago ao proprietário do Posto Laia” (…).
Na vertente, os documentos de fls. 786/826 dos autos da Representação n. 654/2008 noticiam a distribuição de mais de 600 (seiscentos)
litros de combustível, bem como dão conta, ainda, da retirada de dinheiro
em espécie do referido posto, destinada a aquisição de combustível (fls. 79;
806; 817 e 821 daqueles mesmos autos).
Esses documentos convergem e harmonizam com a prova colhida
no curso da dilação probatória, conforme depoimento da testemunha arrolada
pela parte autora e ouvida na condição de declarante nos autos da Representação n. 654/2008 e testemunha compromissada nos autos da AIME
n. 659/2008 e AIJE 656/2008, de acordo com o termo de audiência de fls.
415 deste último feito.
150
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
“(...) No posto chegavam por semana de 4000 a 5000 litros de
combustível (...) Acredito que a média de venda do posto seja
de 4000 a 5000 litros por semana (...) Quando o veículo a ser
abastecido era a álcool eu preenchia no valor do abastecimento
inserindo que era para a compra de álcool para o carro de som,
entregando o valor correspondente em dinheiro para o condutor, que providenciava o abastecimento no outro posto (....)
Acredito que metade das vendas eram em razão da campanha
de Edson. (...) – Depoimento prestado por Elizeu Braga Júnior,
fls. 414/418 dos autos da AIJE n. 656/2008, juntado como prova
emprestada nos autos da Representação 654/2008.”
Acerca desta circunstância, o Ministro Caputo Bastos, proferindo
decisão monocrática nos autos do processo AG-8994, DJ de 29/5/2008, entendeu como configurado o abuso no ato de distribuição de 350 (trezentos
e cinqüenta) litros de combustível, além de valores em espécie distribuídos
a pessoas para que utilizassem os seus veículos na carreata que acompanharia o Governador do Estado do Pará do aeroporto até o centro da cidade
de Braves.
“(...) 2. Ação de investigação judicial eleitoral. Abuso de poder
econômico e captação de sufrágio 41-A da Lei n. 9.504/97. (...)
2.3. Forte probabilidade de que a conduta investigada tenha
influído no resulta do pleito que se mostra flagrante. Caracterizado o abuso de poder econômico. (..)” NE: Distribuição, em
praça pública, de combustível a 331 veículos que participariam
de carreata em benefício dos candidatos representados, em
município com pouco mais de nove mil domicílios. (AC. De
4.3.2004 no Respe n. 21327, Rel. Min. Ellen Gracie).
No tocante à configuração de abuso de poder econômico, tem-se
que recentemente esta Corte decidiu em processo semelhante: “É consabido
que para aferição da potencialidade lesiva das condutas em sede de Direito
Eleitoral não se requer aplicação de raciocínio cartesiano, como se fosse
necessário influenciar quantidade de eleitores maior ou igual que a diferença de votos entre os candidatos beneficiados e os derrotados” (Trechos do
voto da relatoria do Des. Eserval Rocha, nos autos do Recurso n. 1456468.2008.6.05.0191, julgado em 02/12/2010).
De há tempos a jurisprudência do TSE encontra-se firme no sentido de que o requisito da potencialidade deve ser apreciado em função da
seriedade e da gravidade da conduta imputada, à vista das particularidades
do caso, não devendo tal análise basear-se em eventual número de votos
decorrentes do abuso, ou mesmo em diferença de votação (RCED n. 755,
Acórdão de 24/08/2010, Rel. Min. Arnaldo Versiani Leite Soares, publicação
no DJE, data 28/09/2010, pág. 11/15).
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151
JURISPRUDÊNCIA
Nessa esteira de intelecção, o inciso XVI do artigo 22 da LC 64/90,
com nova redação, preconiza que para configuração do ato abusivo, não será
considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas
apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam. Observa-se que
nessa parte, trata-se de matéria processual, e, assim, não incide a celeuma de
que se aplica ou não ao processo em curso como o advento a novel Lei.
A conduta imputada aos Recorridos, ao nosso entendimento, é
grave, por configurar nítido “caixa 2”, quer por revelar os autos que a maior
parte do combustível utilizado na campanha não foi declarada a essa Justiça
Especializada; quer por ter havido despesas com ônibus para transportar
eleitores e até mesmo a retirada de dinheiro em espécie do posto de combustível, para que se abastecesse o veículo de som da campanha com álcool
em outro posto da cidade, visto que o primeiro não tinha bomba de álcool,
tudo sem a necessária e devida inserção na prestação de contas.
Nesse passo, às fls. 749/751, nos autos da Representação
n. 654/2008, a testemunha Leonardo Rodrigues Oliveira, diz:
(...) Sou proprietário do estabelecimento Barracão que tem um Gol
branco a álcool, de propriedade de Lucineide prestando serviços como carro
de som. O locutor do carro de som antes da política era Milton Bala (...)
Às fls. 741/742, a testemunha arrolada pela defesa na Representação 654/2008, Joel Marques Costa, afirma:
(...) Eu vi um Gol branco, cujo proprietário não sei informar, fazendo
propaganda para o candidato Edson e Milton Bala (...).
Aliado a esses depoimentos, o documento de fls. 417, dos autos
da Representação n. 654/2008, comprova que realmente o referido veículo
fora cedido à campanha dos Recorridos. Todavia, a prestação de contas dos
Recorridos noticiou apenas a utilização de 42,5 litros de álcool, o que fora
feito no Posto Marcos e Mariana, cuja nota fiscal encontra-se às fls. 448.
Vale destacar, ainda, os depoimentos prestados por Elizeu Braga Júnior, às fls. 729/731, e por Raimundo Ubiratan Medrado Júnior, às
fls. 725/728, nos autos da sobredita Representação, respectivamente:
(...) O posto Tamburi não vende álcool. Um carro de som modelo
VW Gol era movido a álcool e como não havia álcool no posto, ele pegava o
dinheiro correspondente e abastecia no outro posto (...).
(...) O carro de Milton Bala era a álcool. O Posto Tamburi não vende
álcool. Só lembro desse carro a álcool trabalhando na campanha de Edson.
Só o posto de Carlinhos vende álcool em Marcionílio (...).
Já nos autos da AIME n. 659/2008, Elizeu Braga Júnior diz que:
(...)Em média acredito eu saia cerca de 2.000 a 3.000 litros por semana em favor da campanha de Edson (...) No posto chegavam por semana
de 4.000 a 5.000 mil litros de combustível (...).
Não bastassem esses depoimentos contundentes, as notas de
fornecimento de nºs 00277, 00271, 0168 e 186, às fls. 235, 271 e 224, respectivamente, declaram a retirada de valores em espécie.
152
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JURISPRUDÊNCIA
Demais disso, a quantidade de combustível utilizada na campanha
não foi sequer computada. Evidentemente, essas condutas são sérias e graves, configurando, como dito antes, o repudiado e intolerável “caixa 2”.
Destarte, resta comprovada, por meio de provas robustas e idôneas,
a potencialidade lesiva caracterizadora do abuso do poder econômico a patentear a gravidade das condutas sub examine, circunstância que impõe, sem
sombra de dúvida, reprovação por parte deste Tribunal, com a consequente
aplicação da legislação pertinente.
A violação do artigo 30-A da Lei das Eleições, também, restou
fartamente comprovada.
Nas contas de campanha apresentadas pelos acionados, verifica-se
que há declaração de gastos com combustível no montante de R$ 4.669,00
(quatro mil, seiscentos e sessenta e nove reais). Tais gastos, no entanto,
foram comprovados mediante as notas fiscais de fls. 186 e 187, tendo sido
a primeira emitida em 12.09.2008, no valor de R$ 3.254,50, pelo fornecedor
Marcos e Mariana Comércio de Combustíveis Ltda. e a segunda emitida em
15.9.2008, pelo Posto Dalas Comércio Derivado de Petróleo Ltda, no valor
de R$ 1.415,00
As notas de abastecimento que instruíram a exordial, todavia,
comprovam, juntamente com as outras provas produzidas nos autos, que
no mês de agosto do ano de 2008 foi realizado considerável gasto com
combustível, o qual, além de não ter transitado pela conta corrente aberta
para fins eleitorais, não foi declarado na prestação de contas de campanha,
fato que, inelutavelmente, compromete a regularidade da contabilidade dos
gastos de campanha dos recorridos e impõe a cassação de seus diplomas,
conforme norma contida no § 2º do art. 30-A da Lei nº 9.504/97, alterada pela
Lei nº 11.300/2006.
Somam-se a isso a notícia de saques direto em boca de caixa;
arrecadações e gastos antes da abertura de conta bancária e não computação de gastos com a utilização de ônibus a serviço da campanha eleitoral.
Estas condutas, isoladamente, não acarretaria gravidade, entretanto, no caso
específico, diante do cabedal probatório que comprova as demais irregularidades, culminam por levar incidência da conseqüência máxima prevista no
art. 30-A da Lei da Eleições.
Destaca-se o fato de que se apurou a prática de simulação de pagamento de serviços com dinheiro de campanha, contudo, o valor teria sido
devolvido e pago posteriormente com cheque da própria Prefeitura.
Nessa senda, diz a testemunha referida, Reginaldo Ribeiro Braga,
nos autos da AIME n. 659, às fls. 784:
(...) O cheque em questão foi para prestação de contas que depois
foi sacado no banco em Iaçu e entregue a Elias. Eu prestei serviços para a
campanha de Edson como letrista desenhista, tendo meu acerto ficado no
valor de RS 6.000,00 para ser recebido em 2009. Eu só recebi R$ 1.500,24
através de um cheque da Prefeitura de Marcionílio, o restante até hoje não
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
153
JURISPRUDÊNCIA
recebi. O cheque em questão ficou registrado para pagamento como se eu
tivesse prestado serviço de viagem com o meu carro para a prefeitura de
Marcionílio (...).
Tem-se, assim, que este depoimento se encontra convergente com
as demais provas dos autos, notadamente, com o documento de fls. 507 e
543 da Representação n. 654/2008, comprovando que a testemunha recebeu
o cheque nº 850004, no valor de R$ 400,00 sacado em 30/10/2008.
Esses fatos evocam lição de José Jairo Gomes, em sua obra “Direito
Eleitoral”, asseverando que leciona1:
“O termo captação ilícita remete tanto à fonte quanto à forma
de obtenção de recursos. Assim, abrange não só o recebimento
de recursos de fontes ilícitas e vedadas (vide artigo 24 da LE),
como também sua obtenção de ‘modo ilícito’, embora aqui a
fonte seja legal. Exemplo deste último são os recursos obtidos
à margem do sistema legal de controle, que compõem o que
se tem denominado ‘caixa dois’ de campanha.
(...)
O bem jurídico protegido é a lisura da campanha eleitoral arbor
ex fructu cognoscitur, pelo fruto se conhece a árvore. Se a
campanha é alimentada com recursos de fontes proibidas ou
obtidos de modo ilícito ou, ainda, realiza gastos não tolerados,
ela mesma acaba por contaminar-se, tornando-se ilícita. De
campanha ilícita jamais poderá nascer mandato legítimo, pois
árvore malsã não produz senão frutos doentios.
Também é tutelada a igualdade que deve imperar no certame.
A afronta a esse princípio fica evidente, por exemplo, quando se compara uma campanha em que houve emprego de
dinheiro oriundo de‘ caixa dois’ ou de fonte proibida, e outra
que se pautou pela observância da legislação. Em virtude do
ilícito aporte pecuniário, a primeira contou com mais recursos,
oportunidade e instrumentos não cogitados na outra.”
Apesar de configurada a potencialidade da conduta, como demonstrado anteriormente, a mesma não é exigida para a configuração da ilicitude
acima apontada, sendo pois imperiosa a conclusão pela cassação do diploma
dos Recorridos, cuja contabilização de campanha não foi conduzida de forma
ética e sob o manto da legalidade.
No que tange à imputação relativa à doação de cestas básicas,
dinheiro e peças de motocicletas a diversos eleitores, fatos mencionados
nas três ações, verifico que não foram comprovados.
Em relação à doação de cestas básicas, distribuídas pelo estabelecimento comercial denominado “Barracão”, afirmaram as testemunhas que:
1 Gomes, José Jairo. Direito Eleitoral. 2. Ed./José Jairo Gomes. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 389/390.
154
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
“... Eu não cheguei a ver, porém muitos comentavam que o
Supermercado Barracão andou distribuindo cestas básicas
em troco de voto em Edson...” (Testemunha dos Acionantes,
José Márcio Florentino Costa dos Santos – Fls. 731/733 da
AIME).
“... Não sei se houve distribuição de cestas básicas no supermercado Barracão durante a campanha passada...” (Testemunha dos Acionantes, Édio de Jesus Conceição – Fls. 734
e 735 da AIME)
“Que eu saiba o Barracão não foram vendidas cestas básicas
a pedido de pessoas ligadas a Edson para a distribuição durante a campanha. Venda fiado em meu estabelecimento só
com a minha autorização. Não houve venda fiado para Edson
durante a campanha” (Testemunha dos Acionados, Leonardo
Rodrigues Oliveira – proprietário do estabelecimento comercial
“Barracão” – Fls. 769/770 da AIME).
A prova relativa à doação de R$50,00 (cinqüenta reais) e R$60,00
(sessenta reais), respectivamente, a José Márcio Florentino Costa dos Santos e Jailton Machado dos Santos evidenciou-se de extrema fragilidade, de
modo a não permitir a extração de quaisquer dos efeitos pretendidos pelos
recorrentes, pois foi resumida a um único depoimento, o do primeiro indivíduo,
cujas declarações não foram corroboradas por outras provas constantes nos
autos.
A autorização para entrega de peças de motocicleta ao suposto
cooptado, Sr. Édio de Jesus Conceição, também não restou comprovada,
não havendo, inclusive, qualquer menção a este fato no próprio depoimento
prestado por este.
De igual maneira, houve prova de utilização de ônibus para realização de transporte de eleitores para eventos políticos, como se depreende
dos depoimentos abaixo transcritos, prestados por Maria Aparecida Bastos
Novais, às fls. 722/724, e por Antonio César Souza Silva, às fls. 735/738,
nos autos da Representação n. 654/2008, respectivamente:
(...) As seguintes pessoas levavam eleitores em ônibus para os
comícios: Gabriel, Didi, Valteone e João do Sítio, as quais desde antes da
campanha faziam transporte de alunos, atividade que continuam exercendo
(...);
(...) Durante a campanha havia ônibus para transporte de eleitores
do lado de Sr. Edson os quais era de propriedade da Roni, Didi Bie Divão e
João do Sítio, os quais na administração passada e também na atual trabalha para a municipalidade (...) O transporte que me referi era para comícios
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
155
JURISPRUDÊNCIA
inclusive na zona rural (...)Não sei a quantidade precisa, mas em cada evento
havia cerca de sete ônibus (...).
Vale dizer que da prestação de contas dos Recorridos não constou
despesas com locação de ônibus, o que, inelutavelmente, caracteriza omissão
e o já citado “caixa 2”.
A mídia colacionada aos autos, que comprovaria o fato acima
noticiado, de acordo com a Informação Técnica nº 91/2009 de fls. 935/939,
“possui evidentes sinais de edição”, não podendo, por isso, ser considerada
prova hábil.
Ultimada a análise dos fatos apontados nas três ações eleitorais,
passo, neste momento, a examinar especificamente as noticiadas omissões
na prestação das contas dos demandados, ora recorridos.
De início, ressalto, em consonância com o opinativo do Ministério
Público, que a não contabilização de despesas de campanha na prestação
de contas parcial, apesar de consistir falha, não compromete, em definitivo,
a regularidade da contabilidade dos gastos e receitas dos recorridos durante
a campanha eleitoral, pois estas poderão ser declaradas quando da apresentação das contas finais.
No que se refere à não contabilização dos serviços advocatícios,
comungo do entendimento perfilhado pelo Juízo Zonal e pelo Ministério Público Eleitoral, no sentido de que a despesa com estes não constitui gasto
de campanha sujeito ao registro e aos limites legais, bem como à emissão
de recibos eleitorais, nos moldes instituídos pela Lei nº 9.504/97.
As despesas com material de propaganda eleitoral, apesar de
inicialmente omitidas, foram declaradas na prestação de contas retificadora,
onde constou a respectiva nota fiscal (fl. 335), razão pela qual considerado
sanado o vício.
Por fim, a contabilização dos gastos relativos à suposta doação de
cestas básicas, bem como de peças de motocicleta, não pode ser exigida,
tendo em vista a não comprovação dos fatos alegados.
À vista dessas considerações, comprovada a violação do art. 30-A
da Lei nº 9.504/97, bem como o abuso de poder econômico e a captação
ilícita de sufrágio, dou provimento aos recursos para, como base no § 2º do
artigo 30-A e art. 41-A, ambos da Lei 9.504/97, cassar os diplomas e mandatos políticos outorgados aos Recorridos Edson Ferreira de Brito e Edson
Pires de Souza, respectivamente Prefeito e Vice-Prefeito do Município de
Marcionílio Souza, declarando, ainda, a inelegibilidade do primeiro Recorrido,
cuja aferição do prazo deverá ocorrer no momento de pedido de registro de
candidatura.
E porque eleitos com 42,94% dos votos, determino a assunção
imediata dos candidatos da chapa majoritária que obteve a segunda maior
quantidade de votos na eleição de 2008 ocorrida naquela municipalidade.
156
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 17 de maio de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
157
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 4 2 1 / 2 0 11
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
PROCESSO: Nº 8-93.2011.6.05.0017
CLASSE 9
MUNICÍPIO:
Salvador
SUSCITANTE:
Juízo Eleitoral da 17ª Zona.
SUSCITADO:
Juízo Eleitoral da 15ª Zona.
INTERESSADO:
Jean Márcio Alves Oliveira.
RELATOR:
Juiz Renato Reis Filho.
Conflito negativo de competência. Crime eleitoral.
Lugar da infração. Domicílio do acusado. Impossibilidade de determinação. Critério da distribuição.
Diante da impossibilidade de se adotar como critério
de regulação da competência o lugar da infração ou
o domicílio do réu, fixa-se a competência através de
mecanismo subsidiário previsto no artigo 6º, § 1º do
Regimento Interno dos Juízos e Cartórios Eleitorais,
qual seja, a realização de distribuição pelo juízo designado por este Tribunal, especificamente o Juízo
da 15ª Zona Eleitoral.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia,
à unanimidade, DETERMINAR O ENCAMINHAMENTO DOS AUTOS AO
JUÍZO DISTRIBUIDOR, nos termos do voto do Juiz Relator de fls.39/41, que
integra o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 14 de junho de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício da Presidência - RENATO REIS FILHO, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Juiz da
17ª Zona Eleitoral desta Capital (fls. 17/22), que entendeu não deter competência para processar e julgar a denúncia ofertada pelo Promotor em atuação
perante a 15ª Zona Eleitoral, em desfavor de Jean Márcio Alves Oliveira, pela
prática do delito de veiculação de propaganda eleitoral irregular, nesta cidade,
na data de 03 de outubro de 2010.
158
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A aludida denúncia fora remetida ao Juízo suscitante, após a declinação do Magistrado da 15ª Zona Eleitoral, ao fundamento de que, à vista
da impossibilidade de se definir o lugar da infração, a competência passaria
a ser fixada pelo domicílio do réu. Informando que o mesmo possui endereço
na Rua Primeiro de Março, bairro da Mata Escura, nesta Capital, localidade
pertencente à jurisdição da 17ª Zona Eleitoral, determinou a remessa dos
autos àquele Juízo.
O Juízo suscitante, por sua vez, pondera que a denúncia limitou-se
a afirmar que o crime ocorrera na cidade de Salvador, sem delimitar o local
específico. Informa que, paralelamente à informação de que o réu residiria no
bairro da Mata Escura, existe informação constante do espelho do Registro
de Candidatura (fl. 9) dando conta de que o mesmo receberia notificações e
intimações da Justiça Eleitoral no bairro do Caminho das Árvores, também
neste município.
Assevera, assim, que, em sendo incertos o lugar da infração e o
domicílio ou residência do infrator, a competência para processar e julgar o
crime objeto da peça incoativa deverá ser fixada pelo critério da distribuição,
à luz do § 1º do art. 6º do Regimento Interno deste Regional.
Em pronunciamento de fl. 31, o Procurador Regional Eleitoral emitiu parecer acolhendo a tese do Juízo suscitante, no sentido de que seja a
competência determinada pelo critério de distribuição.
É o relatório.
VOTO
Com razão o Juízo suscitante.
De logo, impõe-se a análise do teor do artigo 69 do Código de Processo Penal, de aplicação subsidiária a esta Especializada, in verbis:
Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:
I - o lugar da infração:
II - o domicílio ou residência do réu;
III - a natureza da infração;
IV - a distribuição;
V - a conexão ou continência;
VI - a prevenção;
VII - a prerrogativa de função.
Depreende-se, assim, que o primeiro critério adotado pelo legislador
pátrio, para a fixação da competência, consiste no lugar da infração.
Da leitura da peça acusatória, todavia, não é possível extrair-se qual o
local em que se deu o delito narrado, qual seja o de veiculação de propaganda
eleitoral irregular, previsto no artigo 39, § 5º da Lei nº 9.504/97. À fl. 06, tem-se
uma certidão lavrada por um servidor da Procuradoria Regional Eleitoral, dando
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
159
JURISPRUDÊNCIA
conta de que a conduta ilícita fora perpetrada em diversos bairros de Salvador,
tais quais Itaigara, Pituba, Matatu de Brotas e Paralela.
É consabido que a competência territorial para processar e julgar
as demandas atinentes à matéria eleitoral, nesta Capital, restou delimitada
observando-se os diversos bairros existentes, cabendo a cada uma das vinte
zonas eleitorais a jurisdição de acordo com os logradouros. Neste sentido,
cada um dos bairros suso-mencionados pertence a zonas eleitorais distintas,
à vista do que subsiste a necessidade de se avançar para o segundo critério
legal, a fim de se determinar qual o juízo competente, na hipótese.
O inciso II, do mencionado art. 69 do CPP, estabelece, assim, que
deve ser observado o domicílio ou residência do réu. O mecanismo, em análise, também não se revela suficiente para dirimir a controvérsia, porquanto,
conforme relatado, há nos autos notícia de dados diversos. Enquanto a certidão de fl. 04 indica que, segundo o Cadastro Eleitoral, o acusado residiria
no bairro da Mata Escura, o espelho do seu registro de candidatura (fl. 09)
aponta o bairro do Caminho das Árvores, subsistindo, pois, a incerteza.
Resta, portanto, a adoção de um terceiro critério, previsto no inciso
IV, do mesmo art. 69, consistente na distribuição. A matéria encontra-se regulamentada no artigo 6º, § 1º do Regimento Interno dos Cartórios Eleitorais
(Resolução TRE nº 007/2001), que assim dispõe:
Art. 6º Nos feitos criminais, de regra, determinar-se-á a competência pelo lugar da infração, aplicando-se, supletivamente,
os artigos 70 e seguintes do Código de Processo Penal.
§ 1º Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência
regular-se-á pelo domicílio ou residência do infrator, e, não
sendo estes conhecidos, a distribuição ocorrerá, de forma
eqüitativa e alternadamente, a cada um dos juízes eleitorais
do município.
Para os fins de fixação da competência para o processamento e
julgamento da denúncia, dessarte, há de se proceder à sua regular distribuição, nos moldes previstos no citado dispositivo.
Com estas ponderações, conheço do presente conflito, dirimindo-o,
com fulcro no artigo 6º, §1º da Resolução Administrativa nº 07/2001, pelo
que determino a remessa dos autos ao juízo distribuidor, designado por
este Regional, qual seja o Juízo da 15ª Zona Eleitoral, para as providências
cabíveis.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 14 de junho de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
160
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 5 5 0 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 14.022-49.2008.6.05.0159
CLASSE 31
MUNICÍPIO:
Uibaí
RECORRENTE:
Raul Bastos Machado Neto. Advs.: Béis. Érica Nunes Novaes
Machado, Marcos Gean Alecrim Machado, Eric Nunes Novaes
Machado e Alex Vinícius Nunes Novaes Machado.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 159ª Zona/Central.
RELATOR:
Juiz Renato Reis Filho.
REVISOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso criminal. Difamação e injúria na propaganda
eleitoral. Procedência. Apresentação das Alegações
finais. Ordem. Inversão. Nulidade. Reconhecimento.
Preliminar de nulidade do processo referente à proposta de transação penal.
Inacolhe-se a prefacial, uma vez que, designada a
audiência preliminar, com a regular intimação do
acusado, impõe-se reconhecer que a ausência deste
revela a sua intenção de rejeitar a proposta de transação penal, o que foi ratificado pelo seu advogado.
Preliminar de nulidade por inversão da ordem processual e cerceamento de defesa.
A inversão da ordem de apresentação das alegações
finais afronta a ampla defesa e o devido processo
legal, restando evidenciado o manifesto prejuízo à
defesa, em virtude do que se acolhe a preliminar, para
decretar a nulidade da sentença, determinando-se
seja oportunizado ao recorrente a nova apresentação
das razões finais.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO
REFERENTE À PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL e ACOLHER A PRELIMINAR DE NULIDADE POR INVERSÃO DA ORDEM PROCESSUAL,nos
termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
161
JURISPRUDÊNCIA
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de junho de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - RENATO REIS
FILHO, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso manejado por RAUL BASTOS MACHADO
NETO, contra sentença exarada pelo Juiz Eleitoral da 159ª Zona/Central
(fls. 179/184), que julgou procedente a denúncia oferecida pelo Ministério
Público zonal, pela prática dos crimes previstos nos artigos 325 e 326 do
Código Eleitoral (difamação e injúria na propaganda eleitoral), condenando
o réu à pena de 211 (duzentos e onze) dias-multa.
A decisão de origem fixou a pena em 169 (cento e sessenta e nove)
dias-multa, para o crime de injúria na propaganda eleitoral. Para o delito de
difamação, a pena restou fixada em 08(oito) meses de detenção, além de
20 (vinte) dias-multa. Observando o disposto no art. 44, § 2º, primeira parte,
do Código Penal, procedeu-se, todavia, à substituição da pena privativa de
liberdade aplicada, pela sanção pecuniária, restando, assim, o réu condenado
aos aludidos 211 (duzentos e onze) dias-multa.
Inconformado, Raul Bastos Machado Neto interpôs o recurso de
fls. 189/216, no qual suscita a preliminar de nulidade do processo, desde
a audiência de conciliação, em razão de a proposta de transação penal ter
sido ofertada ao patrono do réu, e não à pessoa deste último. Arguiu, também,
a nulidade do processo, por inversão da ordem de apresentação das
alegações finais, o que teria ensejado o cerceamento da defesa.
O recorrente segue em seu arrazoado, aduzindo a nulidade da sentença, por não terem sido enfrentadas as preliminares trazidas nas defesas
apresentadas, às representações acostadas aos autos, além de argüir erro
na dosimetria da pena. No mérito, o insurgente afirma que os crimes descritos
na denúncia não ocorreram, considerando-se a especialidade do tipo eleitoral.
Pugna, assim, pelo provimento do recurso, para que seja a denúncia julgada
improcedente, culminando com a absolvição do réu.
Em pronunciamento, o eminente Procurador Regional Eleitoral
acolheu a tese da defesa, atinente à violação dos princípios do contraditório
e da ampla defesa, decorrente da inversão da ordem de apresentação das
alegações finais, opinando, destarte, pelo provimento parcial do recurso,
com a decretação da nulidade da sentença, para que seja oportunizada à
defesa novo prazo para oferecimento de alegações finais ou ratificação da
peça anteriormente apresentada.
À criteriosa apreciação do eminente Juiz Revisor.
162
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 251/252 dos autos.
PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO REFERENTE À PROPOSTA
DE TRANSAÇÃO PENAL.
Da acurada análise dos autos, verifica-se que, efetivamente, a
aludida proposta não foi ofertada à pessoa do acusado, que se encontrava
ausente, mas, apenas, ao seu advogado.
Designada a audiência de instrução e tendo havido a regular intimação do acusado, forçoso reconhecer, todavia, que a ausência deste revela
o seu intuito de rejeitar a proposta de transação penal, o que, por sua vez,
veio a ser confirmado pelo seu patrono, à fl. 48, restando ausente, destarte
a alegada mácula processual.
Rejeita-se, assim, a preliminar.
PRELIMINAR DE NULIDADE POR INVERSÃO DA ORDEM PROCESSUAL
E CERCEAMENTO DE DEFESA.
O recorrente aponta a existência de nulidade, em razão da inversão
da ordem de apresentação das alegações finais. Neste particular, tenho que
razão lhe assiste.
In casu, impõe-se reconhecer o manifesto prejuízo que afligiu o
recorrente. É que, ao apresentar as suas alegações finais em momento anterior àquelas ofertadas pelo Ministério Público, o recorrente não teve a justa
oportunidade de ter ciência das proposições expostas pelo órgão acusatório
ou mesmo de rechaçá-las.
Em que pese tenha sido expedida a intimação ao causídico do réu,
conforme se vê à fl. 174, a peça de defesa não foi reapresentada ou ratificada, tendo o aludido advogado se recusado a receber a intimação, alegando
não ter sido constituído nos autos, e que teria atuado no feito, apenas, em
substituição a um colega.
Do quanto apurado, não há dúvida de que o referido advogado seja
procurador do réu. Consta dos autos petição por ele assinada, acompanhada
de cópia de procuração do réu, em que se requer o adiamento da audiência preliminar, marcada para o dia 12/03/2009 (fls. 41/42). Posteriormente,
o mesmo patrono compareceu à audiência do dia 15/04/2009, na qual se
apresentou como representante do réu, oportunidade em que requereu a
realização de perícia nas mídias coligidas aos autos.
A despeito da valoração acerca da argumentação expendida pelo
advogado, o fato é que o réu restou indefeso, tendo o Magistrado de origem
entendido que as razões finais haviam sido ratificadas tacitamente.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
163
JURISPRUDÊNCIA
Entrementes, em se tratando de uma ação em que se busca apurar
a ocorrência de um ilícito penal, há que se assegurar ao réu todas as garantias
legais, preservando-se incólumes a ampla defesa e o devido processo legal.
Nesta direção, tem-se a súmula 523 do Supremo Tribunal Federal, cujo teor
segue consignado:
Súmula 523 do STF. No processo penal, a falta da defesa
constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará
se houver prova de prejuízo para o réu.
Na hipótese vertente, o prejuízo decorrente da ausência das alegações finais é manifesto, restando evidenciada a nulidade apontada.
Sobre o tema, eis o que se colhe do julgado adiante transcrito:
APELAÇAO CRIMINAL. INVERSAO NA ORDEM DE MANIFESTAÇAO DAS PARTES ALEGAÇÕES DO ASSISTENTE
APRESENTADAS APÓS A DA DEFESA SEM OPORTUNIZAR
MANIFESTAÇAO POSTERIOR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE ABSOLUTA. OCORRÊNCIA.
A inversão na apresentação das alegações finais é causa de
nulidade absoluta, porque fere os princípios constitucionais da
ampla defesa e do contraditório. A ordem é cogente e obriga
a relação processual, que está regida pela ação acusatória e
reação defensiva. - apresentando o assistente de acusação
suas alegações finais após a da defesa, sem oportunizar a esta
vista dos autos, ocorre cerceamento de defesa, devendo ser
anulado o processo. Recurso conhecido e provido.
(TJBA - APELAÇÃO: APL 2782002007 BA 27820-0/2007.
Segunda Câmara Criminal. Relatora Aidil Silva Conceição.
Julgamento: 16/04/2009)
Pelo exposto, em homenagem ao princípio da proteção judicial
efetiva, na linha do opinativo ministerial, acolho a prefacial em exame, para
decretar a nulidade da sentença, determinando seja oportunizado ao réu a
apresentação de novas alegações finais, devendo-se proceder à nomeação
de defensor dativo, se necessário.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de junho de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
164
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 7 5 5 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 1-67.2008.6.05.0030
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Aratuípe
RECORRENTES:
Antônio Bonfim Pereira Lago e Taurino Silva de Jesus. Advs.:
Béis. Aloísio Figueiredo Andrade Júnior, José Batista de Santana
Júnior e Edilton de Oliveira Teles.
RECORRIDOS:
Antônio Miranda Silva Júnior e Adeval Moreira Silva. Advs.
Béis.: Igor Coutinho Souza, Andréia Prazeres Bastos de Souza
e Caroline Matos Bispo.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 30ª Zona / Nazaré.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Captação
ilícita de sufrágio. Abuso de poder político e econômico. Provas insuficientes. Improcedência. Recurso.
Acervo probatório frágil. Não provimento.
Nega-se provimento a recurso para manter a decisão que julgou improcedente ação de investigação
judicial por abuso de poder político e econômico e
captação ilícita de sufrágio, quando o acionante não
se desincumbiu do ônus de comprovar os ilícitos
alegados.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 12 de julho de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; CARLOS
ALBERTO DULTRA CINTRA - Juiz Relator;SIDNEY PESSOA MADRUGA Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por Taurino Silva de Jesus,
em face de sentença (fls. 487/491) do Juízo Eleitoral da 30ª Zona/Nazaré,
que julgou improcedente a ação de investigação judicial eleitoral aviada por
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
165
JURISPRUDÊNCIA
capacitação ilícita de sufrágio e abuso de poder político/econômico contra
Antônio Miranda Silva Júnior e Adeval Moreira Silva, candidatos à reeleição,
respectivamente, para aos cargos de prefeito e vice-prefeito.
Em sede de razões (fls. 509/529) sustenta-se, em suma, que diante das provas constantes nos autos restou comprovada a ocorrência das
práticas ilegais imputadas, motivo pelo qual, merece reforma a decisão do
juízo zonal.
Alega-se que os ilícitos ocorreram por meio de aluguel de casa
com recursos da prefeitura; doação de material elétrico e peças de reparo
para veículos que não pertencem ao município; distribuição de dezenas de
caçambas de areia, bem como, pela promoção da reforma de casas, durante
o período eleitoral de 2008, tudo em troca de votos.
Os recorridos em sede de contra-razões (fls. 552/566) refutaram
os fatos que lhe foram imputados e alegaram que a recorrente não se desincumbiu do ônus probatório. Sendo assim, pugnaram pela manutenção da
sentença recorrida.
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral manifestou-se (fl.
579), adotando integralmente as alegações lançadas pela Promotoria Zonal,
pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Após compulsar os autos, entendo que não merece acolhimento a
pretensão recursal.
Primeiramente, é necessário que se descrevam os fatos aduzidos
na inicial, que foram os seguintes:
a) Aluguel de casa com recursos da prefeitura municipal, durante o período eleitoral, em benefício de eleitora;
b) doação de material elétrico aos moradores do Sapé de
Baixo;
c) doação de peças de reparo para veículos que não pertencem
ao município;
d) distribuição de dezenas de caçambas de areia;
e) reforma de casas;
Consta nas razões recursais que os recorridos praticaram estas
condutas visando obter, de forma ilegal, o voto dos beneficiários.
Antônio Miranda Silva Júnior e Adeval Moreira Silva, em defesa,
negam a captação ilícita de sufrágio e o abuso de poder político e econômico,
juntando os documentos de fls. 54/254.
Com efeito, as graves acusações contidas na peça exordial não se
166
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
confirmaram através da produção de provas robustas e consistentes. Aliás,
ainda sob o prisma da falta de consistência das provas adunadas aos autos,
fazendo uso das palavras do Promotor Eleitoral, cumpre advertir que “todas
as testemunhas arroladas pelos impugnantes e ouvidas em juízo, foram
ouvidas apenas como declarantes”.
Quanto ao fato apontado no primeiro item (aluguel de casa durante
o período eleitoral) verifica-se a existência do contrato de locação e de cheques da prefeitura local. Afora isso, foi ouvida a testemunha arrolada pelos
investigantes, Rosenilda dos Santos, dona do imóvel locado, sem o devido
compromisso do art. 415 do CPC.
De acordo com a prova dos autos, constata-se que o imóvel foi
alugado pela prefeitura de Aratuípe, com base na legislação municipal vigente
(Lei Municipal nº 500/2007), com a finalidade de conceder benefício assistencial à moradora Araly Santos Rocha que, à época, se encontrava em situação
de vulnerabilidade social. Trata-se, portanto, de um benefício concedido em
virtude da inscrição da beneficiária em programa social do município, antes
do período eleitoral, conforme documentos de fls. 109/112, fato que por si só
não revela afronta à Lei das Eleições.
Por oportuno, insta transcrever o que alegou a testemunha compromissada na forma da lei, Maridil Glória dos Santos, a respeito do fato:
Maridil Glória dos Santos – fl. 347:
“(...) que conhece D. Rosenilda e D. Araly, que era a depoente quem dava os cheques para Araly pagar o aluguel da
casa alugada a Rosenilda; que o valor do cheque era de cem
reais, que a Prefeitura pagava o aluguel de Araly porque
era pessoa carente, e que a lei 500 de 2007 dá amparo as
pessoas carentes, que quando dava o cheque a Araly dava
o recibo anexado ao cheque e ela trazia assinado, mas nunca
disse a depoente que era ela quem assinava o recibo. (...) que
soube que não era Rosenilda quem assinava o recibo depois
da audiência aqui na justiça”.
No tocante à doação de material elétrico e de peças de carro em
troca de votos, não assiste melhor sorte aos recorrentes.
De início, vale destacar que as testemunhas do ocorrido (Josué
Domingos do Rosário e Antônio de Jesus Raimundo) foram ouvidas sem
prestar compromisso legal (fls. 273/274 e 289/291), uma vez que se considerou em primeiro grau de jurisdição que ambos tinham interesse no resultado
da demanda.
Afora os mencionados depoimentos não se constata a presença de
quaisquer indícios da prática de ilícito eleitoral. Neste diapasão, importante
asseverar ainda o quanto foi dito pela a única testemunha compromissada a
respeito da suposta doação de material elétrico:
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
167
JURISPRUDÊNCIA
Marcos Carlos Souza Santos – fls. 293/294:
“que tem um sítio na estrada do Sapé e a fazenda fica na região
de Duas Barras, que o sítio fica no Sapé de Baixo, que seu sítio
não tem energia elétrica, que perto de seu sítio existe casas e
outros sítios, que nas propriedades próximas casas e sítios tem
energia, que quem levou a energia para estas propriedade
foi o pessoal de lá mesmo em mutirão se reuniram e levou
energia para lá que inclusive o depoente doou madeira para
eles, que uma dessas pessoas é o Senhor Donato e Soriano,
que foi convidado a participar do mutirão e não quis, que não
quis porque era muita gente, era uma fiação só, que a energia
fica fraca, que o sítio as vezes tem gente as vezes também
não tem, que o pessoal comprou cabos, fios e postes, que
parece que foi em novembro a dezembro do ano passado de
2008 que o pessoal botou essa energia, que o Prefeito não
deu nenhuma ajuda para aquisição desse material”.
Mas não é só isso.
Naquilo que está relacionado com as acusações de compra de peças automotivas em troca de favorecimento nas urnas, o eleitor supostamente
beneficiado – Josué Domingos do Rosário – foi claro ao dizer que “não está
no seu conhecimento que o prefeito tenha pago peças no seu carro” e que “o
seu filho não lhe comentou que o prefeito tivesse pago R$ 400,00 em peça
(sic) para o seu carro.”
Além do mais, a Santana Diesel, em resposta ao ofício n° 15 de
2010, esclareceu que não consta em seus registros nenhuma operação de
venda, emissão de notas fiscais, nem pagamento de peças de um veículo
F-4000 (modelo do automóvel da testemunha que teria sido aliciada) para a
Prefeitura Municipal de Aratuípe no ano de 2008.
Por fim, não ficou comprovada a compra de votos mediante a
reforma gratuita de imóveis e doação de areia para construção, porquanto,
baseada em prova testemunha frágil e controversa.
Saliente-se que, a própria testemunha arrolada pelos investigantes,
Aniceto Xavier Lopes (eleitor supostamente beneficiado pela reforma das
casas), disse que o Alcaide não fez proposta de reforma da casa em troca
de votos.
É importante, outrossim, no que pertine a estas últimas acusações,
destacar que os documentos de fls. 218/221 atestam a inclusão de Antonio
Bonfim Barreto Lopes, filho da retromencionada testemunha e morador do
imóvel reformado, em Programa Social do Município de Aratuípe. Desta forma, restou justificada a realização de eventuais benfeitorias na propriedade
da família Lopes.
No que diz respeito à entrega de areia para construção em troca
de favores eleitorais, tem-se, apenas das altercações contidas na peça exordial, que, isoladamente, não se mostram capazes de ensejar a condenação
requerida pelos recorrentes.
168
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
É proveitoso, neste átimo, trazer à lume as lúcidas observações
lançadas pela representante do Parquet zonal no parecer de fls. 473/485:
“É fato que o Município de Aratuípe está entre os mais pobres
do país, com baixíssimos índices de alfabetização, com raríssimas oportunidades de emprego para a população. Não
há empresas no município, fábricas ou outros meios que
possam ser traduzidos em oportunidades de trabalho para os
munícipes. É natural que a administração municipal figure
como o maior empregador e, ainda, que o Poder Público
desenvolva programas sociais de habitação, de doação de
cestas básicas, assistência médica, entre outros...
Desta forma, ante o exposto, com esteio nos suportes fáticos e
jurídicos expostos e de todas as provas dos autos, opina o Ministério Público
pela improcedência do pedido indeferindo assim o pleito dos impugnantes”.
Isso posto, ante a ausência de lastro probatório apto a demonstrar
as condutas imputadas aos recorridos, na esteira do parecer ministerial, voto
no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo na sua integralidade
a bem fundamentada decisão zonal.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 12 de julho de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
169
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 8 8 6 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 16.250-03.2009.6.05.0081
CLASSE 30
MUNICÍPIO: Cristópolis
RECORRENTES: Coligação UNIDOS PARA O PROGRESSO, Agamenon Dantas
de Souza e Romeu Joaquim de Santana. Advs.: Béis. Gustavo
Ribeiro Gomes Brito e Leonardo Oliveira Cerqueira Lima.
RECORRIDOS:
José Santana da Silva e Nivaldo Menezes Filgueiras. Advs.: Béis.
Clodoaldo Narciso dos Reis Coelho e Danilo Matos Cavalcante
de Souza.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 81ª Zona/Olindina.
RELATOR:
Juiz Renato Reis Filho.
REVISOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso Eleitoral. AIME. Prefeito e vice-prefeito.
Fraude. Abuso de poder político. Inadequação da via
processual. Extinção.
Preliminar de inadequação da via eleita.
A ausência de repercussão econômica nos fatos que
ensejaram o ajuizamento da ação em exame desautoriza o seu manejo, porquanto caracterizado, em tese,
apenas, o abuso de poder stricto sensu, em virtude
do que se acolhe a preliminar, para extinguir a ação,
sem julgamento do mérito.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia,
à unanimidade, ACOLHER A PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA
ELEITA, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a
integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 19 de julho de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício da Presidência - RENATO REIS FILHO, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
170
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto por Agamenon Dantas de Souza e
Romeu Joaquim de Santana, respectivamente, candidatos a Prefeito e Vice
nas Eleições 2008 no Município de Crisópolis/BA, e pela Coligação UNIDOS
PARA O PROGRESSO contra sentença zonal que julgou improcedente a ação
de impugnação de mandato eletivo, manejada em desfavor de José Santana da Silva e Nivaldo Menezes Filgueiras, Prefeito reeleito e Vice-Prefeito
da referida municipalidade, ao argumento de suposta ocorrência de fraude
eleitoral e abuso do poder de autoridade.
Insatisfeitos com a decisão de origem, os recorrentes alegam que,
no dia do Pleito, teria havido manipulação fraudulenta, por parte dos recorridos, do serviço de transporte público municipal que, à época, estaria à disposição da Justiça Eleitoral, o que se teria perpetrado, em síntese, mediante
as providências adiante elencadas:
1. Paralisação dos transportes no período compreendido entre as
11h até as 15h30min, quando os ônibus teriam permanecido estacionados
na Praça Antonio Conselheiro;
2. Alteração das rotas originalmente estabelecidas pelo juízo zonal,
de modo a obstar que os eleitores dos candidatos adversários lograssem
chegar aos seus locais de votação.
As acusações dão conta de que tais práticas teriam prejudicado
diversos eleitores, resultando num índice de abstenção significativa em
algumas localidades pontuais, é dizer, em algumas seções eleitorais específicas, justamente aquelas nas quais, segundo os recorrentes, teriam eles
mais adeptos.
Alegam que os três coordenadores do serviço de transporte de
eleitores, designados pelo Juízo zonal, por ocasião das eleições, os Srs. Edvan Ferreira Costa, Hélio José de Mendonça e Rozenildo Barreto, possuíam
efetiva relação de subordinação ou interesse econômico com os recorridos,
em virtude do que invocam a aplicação do artigo 267, parágrafo único, do
Código Eleitoral, requerendo seja ordenado à Prefeitura Municipal de Crisópolis o fornecimento de cópias do processo de contratação e de pagamento
da empresa DIDA TRANSPORTES M.E. e dos aludidos funcionários.
A derradeiro, pugnam pelo provimento do recurso, para que seja
totalmente reformada a sentença invectivada.
Em contrarrazões de fls. 500/514, os recorridos suscitam a preliminar de inadequação da via eleita, ao fundamento de que as acusações
consistem em abuso de poder político, de autoridade e conduta vedada,
práticas que não poderiam ser apuradas por meio de ação de impugnação
de mandato eletivo.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
171
JURISPRUDÊNCIA
Pontuam que o pedido de produção de prova estaria precluso. No
mérito, em síntese, refutam a ocorrência dos fatos que lhes foram assacados,
ressaltando que esta Corte já apreciou as acusações objeto da presente
demanda, quando do julgamento do RCED n.º 706 e do RE n.º 16460-88.
Instam, assim, pelo desprovimento da inconformidade.
Em opinativo de fls. 618/619, o Procurador Regional Eleitoral posicionou-se no sentido do não provimento do recurso, esposando integralmente
o pronunciamento lançado pelo Ministério Público zonal (fls. 441/445).
É o relatório, que ora submeto à apreciação revisional.
Salvador, 29 de junho de 2011.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 521/522.
PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
Os recorridos asseveram que as acusações elencadas na presente
demanda conformam hipóteses caracterizadoras do abuso de poder político,
de autoridade e conduta vedada, práticas que não poderiam ser apuradas
em sede de ação de impugnação de mandato eletivo.
Aos impugnados, imputou-se a manipulação do serviço de transporte coletivo público municipal, que estaria a serviço da Justiça Eleitoral, em
benefício de suas candidaturas, para impedir que os eleitores dos candidatos
adversários lograssem chegar às suas seções eleitorais.
Trata-se, destarte, de prática que não guarda qualquer vinculação
financeira, e que consiste, em verdade, em hipótese conformadora do abuso
de poder stricto sensu, não sendo possível extrair-se, da narração dos fatos,
qualquer viés econômico.
Sobre o tema, tem-se o magistério de Adriano Soares da Costa, ao
definir o abuso de poder stricto sensu:
“É aquele em que a atuação do agente público é ilícita por
desequilibrar o processo eleitoral, com o uso impróprio do
seu cargo ou função pública, em favor de uma determinada
candidatura”
(COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral.
8ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2009, p. 414)
Com efeito, a ausência de repercussão econômica nos fatos que ensejaram o ajuizamento da ação em exame desautoriza o seu manejo, sendo este
o entendimento sufragado pelo Tribunal Superior Eleitoral, senão vejamos:
“RECURSO ESPECIAL. DESCABIMENTO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. ABUSO DO PODER
POLÍTICO. ABUSO DE AUTORIDADE.
172
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
- Nos termos do art. 14, § 10, da CF, na ação de impugnação
de mandato eletivo serão apreciadas apenas alegações
de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude, não
sendo possível estender o seu cabimento para a apuração de abuso de poder político ou de autoridade strictu
sensu, ou seja, que não possa ser entendido como abuso
do poder econômico.
- Na hipótese sob exame, o Tribunal Regional Eleitoral justificou
a procedência da AIME apenas em razão da prática de abuso
de autoridade de delegado de polícia, que fazia abordagens
e prisões contra possíveis opositores.
- Recurso a que se dá provimento para afastar a cassação do
mandato do primeiro recorrente.
- Prejudicialidade dos apelos interpostos pelo vice-prefeito e
pelo segundo colocado.”
(RESPE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 28208 - Ibaretama/CE. Acórdão de 25/03/2008. Relator(a) Min. MARCELO
HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA. Publicação: DJ - Diário
da Justiça, Data 13/06/2008, Página 16. RJTSE - Revista de
jurisprudência do TSE, Volume 19, Tomo 2, Página 109)
Nessa direção, acolho a preliminar, para extinguir a ação, sem
resolução do mérito, com fulcro no artigo 267, IV do CPC.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 19 de julho de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
173
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 9 5 0 / 2 0 11
PRESTAÇÃO DE CONTAS
PROCESSO Nº 6.281-76.2010.6.05.0000
CLASSE 25
MUNICÍPIO: Salvador
PROMOVENTE:
Josivaldo de Jesus Gonçalves, candidato a Deputado Estadual.
Adv.: Bel. Wenceslau Augusto dos Santos Junior.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Prestação de contas. Eleição 2010. Candidato a Deputado
Estadual. Entrega intempestiva da 1ª parcial. Abertura tardia
da conta. Divergência da data do recebimento dos recibos. Erros formais. Despesa não relacionada. Cheque. Valor irrisório.
Princípios da insignificância, razoabilidade e proporcionalidade.
Aplicação. Aprovação com ressalvas.
Diante da subsistência de falhas que não afetam a
confiabilidade e a transparência das contas, e à luz
dos princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade, devem ser aprovadas com ressalvas
as contas apresentadas pelo promovente.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à unanimidade, APROVAR AS CONTAS COM RESSALVAS, nos termos do voto
do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 20 de julho de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - MAURICIO
KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de prestação de contas relativa à arrecadação e aplicação
de recursos de campanha para o certame de 2010, apresentada por Josivaldo
de Jesus Gonçalves, candidato ao cargo de deputado estadual pelo Partido
Cristão – PC.
Protocolizadas as contas em 02/11/2010, após distribuição, os
presentes autos foram encaminhados à Secretaria de Controle Interno para
análise técnica, tendo sido emitido relatório preliminar para expedição de
diligências.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Instado, o promovente apresentou prestação de contas retificadora,
acompanhada de documentos (fls. 59/94), com vistas a sanar as irregularidades detectadas.
Retornando os autos ao setor técnico, foi emitido relatório conclusivo
pela aprovação com ressalvas (fls. 96/98).
Notificado, o promovente não se manifestou acerca do parecer
conclusivo.
Com vistas dos autos, o Procurador Regional Eleitoral opinou pela
aprovação das contas com ressalvas.
É o relatório.
VOTO
A prestação de contas ora em exame, elaborada por meio do sistema
de prestação de contas eleitorais, protocolizada com atendimento do prazo
legal, observou as disposições da Lei nº 9.504/97, contendo mídia e peças
exigidas pela Resolução TSE nº 23.217/2010.
O exame técnico procedido identificou a subsistência de falhas,
quais sejam: a) entrega intempestiva da prestação de contas referente à 1ª
parcial; b) erro na data do recebimento dos recibos eleitorais; c) abertura da
conta bancária após o prazo legal; d) e não comprovação da despesa no
valor de R$8,47, referente a sobra de campanha.
Da apreciação cautelosa dos autos, evidencio que a entrega intempestiva da 1ª parcial e a incongruência da data do recebimento dos recibos
eleitorais são irregularidades formais, que não afetam a lisura das contas.
De igual modo, a abertura tardia da conta bancária específica,
ainda mais em pequeno período (seis dias de atraso), quando demonstrada
a inexistência de movimentação financeira prévia a data da sua abertura,
não é mácula de natureza grave, porquanto não inviabiliza o controle desta
Especializada.
Quanto a não comprovação de despesa no importe de R$8,47, verifico que o promovente alega que o referido dispêndio não foi consignado na
prestação de contas, por se tratar de sobra financeira de campanha, que teria
sido repassada à Direção Partidária. Neste contexto, observo que embora o
promovente não tenha apresentado a guia de depósito, o referido valor saiu
da conta bancária específica em 15.10.2010, ou seja, posteriormente às
eleições, através de compensação de cheque, consoante extrato de fl. 86,
circunstância que sinaliza, a meu ver, a ausência de má-fé do candidato.
Ademais, ao se considerar que a quantia de R$8,47 se revela insignificante perante os valores totais da movimentação financeira de campanha,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
175
JURISPRUDÊNCIA
e ainda diante da inexistência de outras máculas graves, entendo ser aplicável
ao caso os princípios da insignificância, razoabilidade e proporcionalidade,
para afastar a reprovação das contas.
Ex positis, em conformidade com o relatório conclusivo elaborado pela Secretaria de Controle Interno deste Tribunal e com o opinativo
ministerial, voto por aprovar, com ressalvas, as contas ora submetidas a
julgamento.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 20 de julho de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
176
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 9 8 6 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 13.225-64.2008.6.05.0162
CLASSE 30
MUNICÍPIO: Madre de Deus
RECORRENTES: Coligação É TRABALHO DE VERDADE, Carmen Gandarela
Guedes e Paulo Sérgio de Souza. Advs.: Béis. Anhamona de
Brito, Tadeu Muniz Nogueira, José Souza Pires, Thiancle da
Silva Araújo e outros.
RECORRIDOS:
Coligação A FORÇA DO POVO DE MADRE, Eranita de Brito
Oliveira e Edmundo Antunes Pitangueira. Advs.: Béis. Ademir
Ismerim, Deborah Cardoso Guirra, Rafael de Medeiros Chaves
Mattos e outros.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 162ª Zona/São Francisco de Conde.
RELATOR:
Juiz Salomão Viana.
REVISOR:
Juiz Cássio Miranda.
Recurso. Procedimento de impugnação de mandato
eletivo. Improcedência. Alegação de captação ilícita
de sufrágio. Fragilidade das provas. Alegação de abuso de poder político e econômico. Cabimento de apuração de abuso de poder político com repercussão
econômica em sede de AIME. Conjunto probatório
que evidencia a caracterização do abuso. Incidência
das normas insculpidas nos art. 1º, inc. I, d, e 15 da
Lei Complementar n. 64/90. Aplicação do princípio
da proporcionalidade. Preponderância da proteção
à probidade administrativa e à moralidade para o
exercício do mandato sobre a proteção a direitos
individuais (CF, art. 14, § 9º). Ausência de previsão
legal de cabimento de sanção pecuniária em sede de
procedimento de impugnação de mandato eletivo.
Recurso a que se dá parcial provimento. Cassação
dos diplomas. Inelegibilidade. Lei Complementar n.
135/10. Irretroatividade. Decretação pelo prazo de três
anos. Aplicação da norma contida no art. 224 do CE.
Determinação de que sejam realizadas novas eleições
sob a forma indireta (art. 81, § 1º da CF).
1. Deve ser parcialmente reformada sentença que
julga improcedente pedido contido em demanda
de impugnação de mandato eletivo, quando as provas colacionadas aos autos, apesar de não serem
contundentes no que tange à imputação da prática
de captação ilícita de sufrágio, revelam-se aptas a
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
177
JURISPRUDÊNCIA
comprovar a efetiva ocorrência de abuso de poder
político entrelaçado com abuso de poder econômico,
consistente na utilização da máquina administrativa
do município em favor da reeleição do chefe do
executivo;
2. A proteção à probidade administrativa e à moralidade para o exercício do mandato é um valor
constitucionalmente protegido, assim como o é a
proteção aos direitos individuais, mas se tais valores
estão em testilha, o conflito deve ser resolvido, à luz
da aplicação do princípio da proporcionalidade, em
favor proteção da coletividade, por meio da defesa
da probidade e da moralidade (CF, art. 14, § 9º);
3. Tendo em vista a ausência de previsão legal de
cabimento de sanção pecuniária em sede de procedimento de impugnação de mandato eletivo, neste
aspecto o recurso não merece provimento;
4. Recurso parcialmente provido para o fim de que
sejam cassados os diplomas dos dois primeiros recorridos, com a decretação da sua inelegibilidade por
três (03) anos, contados a partir da eleição ocorrida
no ano de 2008;
5. Considerando que os recorridos obtiveram 52,88%
dos votos válidos, devem ser realizadas novas eleições (art. 224 do CE), porém sob a forma indireta, em
obediência à norma contida no art. 81, § 1º, da CF.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, por
maioria, vencido o Juiz Mauricio Kertzman Szporer, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, nos termos do voto do Juiz Relator de fls. 2.451/2.464
e, pelo voto de desempate, vencidos o Relator e o Revisor, DECLARAR A
INELEGIBILIDADE DOS RECORRIDOS POR TRÊS ANOS, nos termos do
voto do Juiz Renato Reis Filho de fls. 2.476/2.480, que integra o presente
Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 9 de agosto de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente, SALOMÃO
VIANA, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral.
178
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JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto por CARMEN GANDARELA GUEDES, COLIGAÇÃO É TRABALHO DE VERDADE e PAULO SÉRGIO DE
SOUZA contra a sentença de fls. 2.358/2.370, que julgou improcedente o
pedido contido na demanda de impugnação de mandato eletivo, cuja propositura fez nascer, junto ao Juízo Eleitoral da 162ª Zona, sediada em Madre
de Deus, o procedimento n. 899/2008.
A demanda foi proposta pelos recorrentes em face de ERANITA
DE BRITO OLIVEIRA (atual prefeita do Município de Madre de Deus), EDMUNDO ANTUNES PITANGUEIRA (atual vice-prefeito) e da COLIGAÇÃO
A FORÇA DO POVO DE MADRE e se funda nas alegações de que os
demandados, nas eleições municipais ocorridas em 2008, teriam praticado
atos configuradores de captação ilícita de sufrágio, abuso de poder político
e abuso de poder econômico.
Em suas razões de fls. 2.394/2.408, pugnam os recorrentes pela
reforma da sentença, ao argumento de que restaram robustamente comprovados os seguintes ilícitos praticados pelos recorridos: (a) aprovação, no
final do ano de 2007, da Lei Municipal n. 454/2007, por meio da qual foram
criados inúmeros cargos em comissão, cujo provimento teria sido norteado
por interesses eleitoreiros da recorrida e de seus correligionários políticos; (b)
uso dos servidores municipais e de funcionários de ONG´s conveniadas com
o Município para realização de campanha em prol da reeleição da recorrida;
(c) condicionamento da permanência de munícipes como beneficiários de
programa social em troca de voto; e, finalmente, (d) exoneração de servidores
de funções gratificadas por motivos meramente políticos.
Nas contrarrazões de fls. 2.412/2.432 os recorridos pugnam pela
manutenção, na íntegra, da sentença hostilizada, rechaçando a ocorrência
dos atos cuja autoria lhes foi imputada.
Instado a se manifestar, o Procurador Regional Eleitoral, invocando
o princípio da unidade institucional, adotou as razões lançadas pela promotoria
que atua junto ao juízo de primeiro grau às fls. 2.349/2.353, propugnando
pela negativa de provimento ao recurso (fl. 2.43732).
É o relatório, que submeto à apreciação do eminente Juiz revisor.
Salvador, BA, 21 de fevereiro de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
VOTO
O ato contra o qual o recurso foi interposto é recorrível. De sua
vez, o recurso está previsto em lei, é o adequado para o caso, foi interposto
tempestivamente e atende às exigências formais. Além disso, inexistem fatos
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179
JURISPRUDÊNCIA
impeditivos ou extintivos do direito de recorrer e o recorrente possui legitimidade recursal e interesse. Encontram-se, pois, satisfeitas todas as exigências
intrínsecas e extrínsecas para que o recurso interposto seja conhecido, motivo
pelo qual dele conheço.
Os recorrentes atribuem aos recorridos a autoria de inúmeros ilícitos eleitorais, supostamente configuradores de abuso de poder econômico
e político.
No que concerne à imputação da prática de atos configuradores de
captação ilícita de sufrágio, consistentes no condicionamento da permanência de munícipes como beneficiários de programa social em troca de voto,
a verdade é que o acervo probatório existente nos autos não autoriza que
se chegue à conclusão de que, efetivamente, tal prática teria sido levada a
cabo por qualquer dos recorridos.
Com feito, conforme consignado pelo juízo de primeiro grau, embora
a testemunha Maria Helena Soares tenha mencionado que sofreu ameaça
de suspensão do recebimento do benefício caso não votasse na recorrida,
ela não chegou a afirmar que deixou de perceber o auxílio governamental
por não haver votado na aludida candidata.
Já no que tange aos demais ilícitos eleitorais noticiados, o que se
vê é que a prova coligida aos autos revela que os recorrentes estão prenhes
de razão ao pugnar pela reforma da sentença com fundamento na efetiva
ocorrência de abuso de poder econômico, decorrente da utilização da Administração Pública Municipal de Madre de Deus em prol da reeleição dos
recorridos.
Com efeito, às vésperas do ano eleitoral, mais precisamente, em 04
de dezembro de 2007, a recorrida Eranita de Brito Oliveira, na qualidade de
Prefeita do Município de Madre de Deus, enviou à Câmara de Vereadores o
Projeto de Lei n. 28/2007, que, aprovado pelo Legislativo, resultou na edição
da Lei n. 454, de 28 de dezembro de 2008, que aumentou expressivamente a
quantidade de cargos em comissão do Executivo Municipal, cujos provimentos
ocorreram ao longo do ano eleitoral.
O documento de fls. 387/393, extraído do Sistema de Acompanhamento de Pagamento de Pessoal do Tribunal de Contas dos Municípios,
comprova a ocorrência de, pelo menos, 160 nomeações em cargos comissionados no ano de 2008.
Malgrado não seja vedada pela legislação eleitoral a nomeação
de servidores para a ocupação de cargos em comissão em ano de eleições,
mesmo durante os três meses que antecedem o pleito, a verdade é que a
conduta levada a cabo pelos recorridos, aliada aos outros ilícitos comprovados
nos autos e reforçada pela experiência comum, resultante da observação
do que ordinariamente acontece nos rincões do interior da Bahia no período
eleitoral (CPC, art. 335), revela que a criação e o respectivo preenchimento
dos cargos foram motivados por razões meramente eleitoreiras.
180
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Demais disso, emerge dos autos que servidores municipais e
funcionários da ONG Capacitar, conveniada com a Prefeitura de Madre de
Deus, eram compelidos a fazer campanha eleitoral em prol dos recorridos e
que funções gratificadas foram canceladas por motivações exclusivamente
políticas.
Neste passo, a testemunha Luciano Jorge de Azevedo Nascimento,
ex-servidor comissionado do Município de Madre de Deus, em depoimento
colhido nos autos da AIJE n. 664/2008, cuja cópia instruiu o presente feito
na qualidade de prova emprestada (fl. 862), afirmou o seguinte, quanto aos
ilícitos aludidos:
“(...) que exercia cargo de confiança da Representada; que
foi exonerado no dia 04/07/2008; que duas semanas antes
da eleição, a candidata representada, juntamente com o vice,
estavam fazendo visitas a residências, quando ingressaram na
residência do depoente; que ao solicitarem o voto, a esposa do
declarante respondeu que não votaria na representada porque
a mesma havia exonerado o depoente; que ouviu quando a
representada disse à esposa do depoente que este havia feito
“sua escolha política”; (...) que houve uma reunião na Secretaria
de Desenvolvimento Econômico em virtude da saída de um
secretário em face de candidatura a vereador; que a reunião foi
realizada para apresentar a secretária nova e teve a presença
da prefeita, da secretária que iria assumir e do secretário que
estava deixando o cargo; que a candidata a prefeita representada disse que estava em fase de campanha e que “os servidores
tinham que arregaçar as mangas porque muitos que estavam
fora, brigando pela outra candidata, queriam o espaço que era
deles”; que foi colocado que muitos servidores não estavam
comparecendo às inaugurações de obras da prefeitura; que a
prefeita disse que “eles não ficassem em cima do muro’, pois
tinham que trabalhar pela campanha da representada; que
por duas vezes a representada perguntou ao depoente “não
é Luciano”?; que a reunião referida aconteceu no final de abril
ou início de maio; que no final do expediente era mandado que
o depoente fosse para a rua pedir votos para a representada;
(...) que muitos servidores eram cobrados para fazer campanha
para a representada; (...) que essa atuação dos servidores para
favorecer a campanha da representada iniciou-se em abril de
2008; (...) que encontrava com os servidores na rua fazendo
trabalho de campanha; que pode citar os nomes dos servidores
Jorge, Orlando e Ari, que também trabalhavam na secretária
de desenvolvimento (...)” (fls. 1.562/1.565).
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
181
JURISPRUDÊNCIA
De sua vez, as testemunhas referidas Orlando Roque Batista Santos e Ariosvaldo da Cruz Correia Filho corroboraram o depoimento acima
transcrito:
“(...) que trabalhava na prefeitura desde o primeiro dia do mandato da prefeita atual; que exercia cargo de confiança nominado
Assessor II; (...) que a Secretaria de Gabinete, Sra. Isabel,
passou a ligar para o setor de trabalho do depoente dizendo
que o mesmo tinha que comparecer aos eventos políticos e da
prefeitura, para estar acompanhando; (...) que pediu exoneração em agosto de 2008; que pediu exoneração por causa dos
telefonemas que vinha recebendo , já que tem pressão alta e se
sentia mal; que se sentia pressionado; (...) que o secretário de
desenvolvimento econômico Amilton Pereira disse diretamente
ao depoente que era para pedir voto a prefeita Eranita; (...) que
isso foi dito várias vezes, sendo algumas vezes no local de
trabalho; (...) que a prefeita compareceu à posse da secretaria
Lílian na Secretaria de Desenvolvimento, oportunidade em que
disse aos servidores que todos precisam trabalhar mais para
reelegê-la e que estavam fazendo corpo mole (..)” (Depoimento
prestado por Orlando – fls. 1.851/1.855)
“(...) que exercia cargo de confiança; (...) que no discurso de
posse da secretária Lílian, a prefeita disse que os funcionários
deveriam ir a rua e garantir a reeleição da prefeita e dos nossos
empregos; (...) que Luciano foi demitido porque se declarou
eleitor da outra candidata a prefeita Carmen; (..) que a funcionária Carla teve a FG retirada por motivo político, já que se
declarou eleitora de outra candidata.” (Depoimento prestado
por Ariosvaldo - fls. 1.856 e 1.857)
Por seu turno, a servidora efetiva Carla Virgínia Santos Sobral,
ouvida em termos de declarações, no depoimento de fls. 1.551/1.555, disse
que em agosto de 2008 teve suspenso, sem justificativa, o recebimento da
gratificação que vinha recebendo:
“(...) que no mês de agosto de 2008, foi suspensa a gratificação, sem justificativa, sendo que continuou desempenhando
as mesmas atividades; que em julho de 2008 foi a primeira vez
que participou da carreata da candidata Carmem Gandarela;
(...) que um dia após o referido evento, recebeu uma ligação
do Sr. Antônio Carlos Soro, agradecendo, de forma irônica,
a participação da declarante no referido evento político; que
sua tia Valnísia lhe telefonou no mesmo dia que o Sr. Antonio
disse que iria pedir ‘a cabeça” da depoente à prefeita Eranita;
que ‘isso me fez crer’ que a retirada da gratificação se deveu
a esse fato”.
182
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Demais disso, a utilização de empregados da ONG Capacitar como
instrumento de campanha para a reeleição da recorrida restou comprovada
mediante o depoimento colhido durante a tramitação do procedimento de impugnação de mandato eletivo (AIME) autuado sob o n. 13.445-62 (898/2008),
cujas provas também foram utilizadas como prova emprestada neste feito:
“Trabalhou de 2007 a 2008 na ONG Capacitar (...); teve uma
reunião (...) para tratar de assuntos políticos e teve uma reunião
em cima da casa da Prefeita (...) só participou quem a Prefeita
tinha certeza que ia votar nela (...) a reunião era desse tipo
assim: a Prefeita falou (...) vocês estão trabalhando, vocês
precisam do emprego de vocês; tem que manter esse emprego, então para que isso aconteça eu tenho que me reeleger e
vocês tem por obrigação de votar para mim (...); elaboraram
uma ficha com nome, endereço, título, zona e agente ia em
determinada rua (...); cada equipe ia para uma rua dessa para
fazer o preenchimento da ficha para que eles pudessem fazer
um catado para ver até que ponto eles tinham votos(...); a gente
tinha de oito da manhã até às dezesseis horas para andar em
toda Madre de Deus fazendo esse cadastro (...)” (Depoimento
prestado por Sandra Regina dos Reis Santos, constante na
mídia colacionada à fl. 2250)
Neste passo, é de se observar que o juízo a quo, na sentença recorrida, reconheceu a prática dos aludidos ilícitos eleitorais, julgando, todavia,
improcedente o pedido, por entender que os fatos – fatos comprovados,
realce-se – não poderiam ser apurados por meio deste procedimento:
“Há prova de que os servidores Carla Virgínia Santos e Francis
Luiz Costa Junior tiveram a função gratificada cancelada em
agosto de 2008, segundo fls. 601, havendo ainda indicação
de que os mesmos servidores, conforme produção de prova
testemunhal e o próprio depoimento da testemunha Carla Vírginia que o ato teve cunho político pelas razões de divergência
dos referidos servidores.
(...)
(...) há prova segura de que se fez uso dos servidores para
angariar votos em favor da Prefeita atual. Além dos testemunhos, há documentação juntada na inicial no referido sentido,
exibindo essa conduta praticada pela Prefeita.
Conforme julgado esclarecedor acima, a prática de recrutar
servidores, com possíveis ameaças de desemprego, para que
fossem usados na campanha eleitoral, além de realizações de
reuniões e comícios com a exortação da plena campanha da
Prefeita que necessitava reeleger-se compromete a lisura do
processo político (...).
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
183
JURISPRUDÊNCIA
Assim, conforme atestado pelo Ministério Público, o que se
revela nesses autos é grave ocorrência de abuso de poder
político, que, por determinação constitucional, não pode ser
motivo para condenação nesta demanda de AIME.”
A parte final das conclusões a que chegou o juízo a quo – a de
que a “... grave ocorrência de abuso de poder político, (...) por determinação
constitucional, não pode ser motivo para condenação nesta demanda de
AIME” – não se sustenta.
É que, distintamente do quanto afirmado na sentença, as inúmeras
nomeações decorrentes do aumento expressivo da quantidade de cargos
em comissão da Prefeitura de Madre de Deus, mediante a edição da Lei
Municipal n. 454, de 28 de dezembro de 2007, aliadas aos comprovados
ilícitos eleitorais consistentes no uso de servidores municipais para realização
de campanha em prol da reeleição da recorrida e na dispensa de funções
gratificadas por motivos meramente políticos, conduz à inexorável conclusão
de que os recorridos incorrerem, sim, em abuso de poder econômico, com o
objetivo de assegurar a vitória nas eleições de 2008.
Aliás, é assente a jurisprudência do TSE quanto à configuração de
abuso de poder econômico em casos em que a máquina pública é utilizada
a favor de campanhas eleitorais:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO ENTRELAÇADO COM ABUSO
DE PODER POLÍTICO. AIME. POSSIBILIDADE. CORRUPÇÃO. POTENCIALIDADE. COMPROVAÇÃO. SÚMULAS Nos
7/STJ E 279/STF. NÃO PROVIMENTO.
(...)
3. O abuso de poder econômico entrelaçado com o abuso
de poder político pode ser objeto de Ação de Impugnação
de Mandato Eletivo (AIME), porquanto abusa do poder
econômico o candidato que despende recursos patrimoniais, públicos ou privados, dos quais detém o controle
ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou
excesso no emprego desses recursos em seu favorecimento eleitoral. Precedentes: REspe nº 28.581/MG, de minha
relatoria, DJe de 23.9.2008; REspe nº 28.040/BA, Rel. Min.
Ayres Britto, DJ de 1º.7.2008.
4. No caso, os agravantes utilizaram-se do trabalho de
servidores públicos municipais e de cabos eleitorais, que
visitaram residências de famílias carentes, cadastrando-as
e prometendo-lhes a doação de quarenta reais mensais,
caso os agravantes sagrassem-se vencedores no pleito
de 2008.
5. A reiteração do compromisso de doação de dinheiro,
feita individualmente a diversos eleitores, não significa
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
que a promessa seja genérica. Pelo contrário, torna a
conduta ainda mais grave, na medida em que não implica
apenas desrespeito à vontade do eleitor (captação ilícita
de sufrágio), mas também tende a afetar a normalidade e a
legitimidade das eleições (abuso de poder econômico).
6. A jurisprudência desta c. Corte é no sentido de que o exame
da potencialidade não se vincula ao resultado quantitativo
das eleições (RCED nº 698/TO, de minha relatoria, DJe de
12.8.2009). De todo modo, o e. Tribunal a quo reconheceu
existir elementos suficientes para a caracterização não só da
captação ilícita de sufrágio, mas também do abuso de poder
econômico, que influenciou a vontade popular, avaliando, implicitamente, a diferença de votos entre os candidatos.
7. Para chegar à conclusão diversa do v. acórdão regional,
haveria a necessidade de revolver o conteúdo fático-probatório
dos autos, procedimento inviável neste recurso especial eleitoral em virtude das Súmulas ns. 7/STJ e 279/STF.
8. Agravo regimental não provido.
(Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 11708. Acórdão de 18/03/2010, relator o Min. FELIX FISCHER, Publicação:
DJE - Diário da Justiça Eletrônico, tomo 70, de 15/04/2010,
pp. 18/19).
ELEIÇÕES 2004. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRECLUSÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE
MANDATO ELETIVO. CAUSA DE PEDIR. CAPTAÇÃO ILÍCITA
DE SUFRÁGIO. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO-OCORRÊNCIA.
CONDUTA. SUBSÍDIO DE CONTAS DE ÁGUA. PREFEITO.
ABUSO DE PODER ECONÔMICO MEDIANTE UTILIZAÇÃO
DE RECURSOS PÚBLICOS. CABIMENTO DA AIME. POTENCIALIDADE DEMONSTRADA.
(...)
4. O c. Tribunal Superior Eleitoral, na sessão de 22.4.2008,
passou a entender pela possibilidade de abuso de poder
econômico entrelaçado ao abuso de poder político: “Se o
abuso de poder político consistir em conduta configuradora de abuso de poder econômico ou corrupção (entendida
essa no sentido coloquial e não tecnicamente penal), é
possível o manejo da ação de impugnação de mandato
eletivo” (REspe nº 28.040-BA, Rel. Min. Carlos Britto, DJ
de 1º.7.2008). No ponto, o voto de desempate do e. Min.
Marco Aurélio também é elucidativo:
“(...)
Então, assento premissa necessária a passar ao exame
da controvérsia sob o ângulo da impugnação ao mandato:
a circunstância de se tratar de conduta vedada pela Lei
nº 9.504/97 não implica restrição, não afasta a formalização
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
da ação de impugnação ao mandato e possibilidade de vir
a ser acolhido o pedido. (...)
Está-se diante de quadro a revelar, além de conduta vedada, o acionamento do poder econômico da Prefeitura em
prol, justamente, daqueles que se mostraram candidatos
à reeleição” .
5. Na espécie, abusa do poder econômico o candidato que
despende recursos patrimoniais, públicos ou privados,
dos quais detém o controle ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou excesso no emprego desses
recursos em seu favorecimento eleitoral. Nesse contexto,
o subsídio de contas de água pelo prefeito-candidato,
consignado no v. acórdão regional, o qual se consumou
com o favorecimento de 472 famílias do município nos
2 (dois) meses anteriores às eleições, e a suspensão do
benefício logo após o pleito configura-se abuso de poder
econômico com recursos públicos.
6. Uma vez constatado o abuso do poder econômico mediante o entrelaçamento com o abuso de poder político
(v.g., conduta vedada), descabe alegar preclusão das
alegações aduzidas na AIME. Decorrência da tese inaugurada no REspe nº 28.040-BA, Rel. Min. Carlos Britto, DJ
de 1º.7.2008.
(...)
10. Recurso especial conhecido em parte e, nessa, desprovido.
(Recurso Especial Eleitoral n. 28581. Acórdão de 21/08/2008,
relator o Min. FELIX FISCHER. Publicação: DJE - Diário da
Justiça Eletrônico, de 23/09/2008, p. 15. RJTSE - Revista de
jurisprudência do TSE, vol. 19, tomo 3, p. 263)
Diante de tal conjunto probatório, dúvida alguma pode pairar de que
as condutas perpetradas macularam irremediavelmente as eleições municipais de 2008 do pequeno Município de Madre de Deus, na medida em que
a recorrida, valendo-se do seu poder político, utilizou o poder econômico do
município para financiar a sua campanha à reeleição.
E não foi outra a conclusão da Promotoria atuante junto ao primeiro, ao se manifestar sobre os mesmos fatos nos autos do procedimento de
investigação eleitoral (AIJE) n. 664/2008, cuja cópia instruiu estes autos:
“No caso sob exame, restou configurada, pela análise do
conjunto probatório coligido no âmbito da presente Ação de
Investigação Judicial Eleitoral, a efetiva ocorrência de conduta
caracterizadora de abuso de poder econômico, político e de
função, consistente na utilização da Administração Pública
Municipal de Madre de Deus, em prol da candidatura da
representada, ainda que sem o conhecimento, conivência ou
participação, em detrimento dos demais candidatos, maculando
a normalidade e igualdade no pleito. (fls. 2.026/2.039)
186
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Importa ressaltar, ainda, que foi de apenas 634 a diferença de votos entre o primeiro e os segundo candidatos mais votados para o cargo de
prefeito, em um universo de 11.014 votos válidos.
O caso, pois, é, sim, de reconhecimento de que os recorridos incorreram na prática de abuso de poder político e econômico, em razão do
que a sua conduta se subsume às normas contidas nos art. 1º, inc. I, d, e 15
da Lei Complementar n. 64/90, com a redação dada pela Lei Complementar
n. 135/10, que prevêem a cassação dos seus registros e/ou diplomas, bem
como a inelegibilidade pelos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que
os fatos ocorreram.
Ultrapassada a etapa relativa ao exame dos fatos, registro que,
independentemente da posição externada, por mínima maioria, pelo Supremo
Tribunal Federal, mantenho o meu entendimento sobre a possibilidade da
aplicação das normas contidas na Lei Complementar n. 135/2010 relativamente a fatos ocorridos anteriormente à sua entrada em vigor.
Aliás, vale salientar que, no julgamento do Mandado de Segurança
n. 22087-2/DF, ocorrido em 28 de março de 1996, relator o eminente Ministro
Carlos Mário Velloso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal assentou o
entendimento de que “... inelegibilidade não constitui pena...” e que, portanto,
“... é possível a aplicação da lei de inelegibilidade, Lei Complementar n. 64,
de 1990, a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência”.
E não é difícil entender o motivo pelo qual não pode ser dado às
causas de inelegibilidade, quaisquer que sejam elas, o mesmo tratamento
que é dispensado às penas.
É que ao elencar as situações que geram inelegibilidade, o que o
legislador complementar faz, diferentemente de impor penas, foi estabelecer os parâmetros para que se reconheça aqueles que podem exercer um
mandato eletivo.
A respeito, numa visita à série de dispositivos constitucionais
que versam sobre inelegibilidade, vale lembrar a letra do § 9º do art. 14 da
Constituição Federal: “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade
administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada
a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições
contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função,
cargo ou emprego na administração direta ou indireta” (os grifos não são do
original).
Tanto é suficiente para se concluir que as normas que contém
causas de inelegibilidade não são punitivas, mas de proteção da probidade
administrativa e da moralidade para o exercício do mandato.
Não se pode, entretanto, deixar de reconhecer que tais normas,
se aplicadas imediatamente, têm potencial para lesar o patrimônio jurídico
de determinadas pessoas: aquelas que, antes, poderiam se candidatar e
exercer um mandato eletivo, e que, agora, em razão das novas normas, não
podem mais.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
187
JURISPRUDÊNCIA
Todavia, as lesões provocadas em tais casos não são diretas,
mas reflexas, já que – repita-se – o conjunto normativo atinente às causas
de inelegibilidade não tem a finalidade de impor penas, mas de proteger a
probidade e a moralidade.
Portanto, aqueles que, antes das novas normas, podiam se candidatar e exercer mandatos eletivos e que, agora, não podem mais, não
sofreram qualquer apenação. Sofreram, sim, no seu patrimônio jurídico, os
efeitos concretos de um conjunto normativo.
E se tais efeitos lhes são adversos, não se pode negar a tais pessoas o direito de resistir às adversidades.
Surge, então, um quadro de conflito entre dois bens jurídicos constitucionalmente protegidos: de um lado, o direito individual de certas pessoas
de disputar e exercer mandato eletivo e, do outro, a proteção à probidade
administrativa e à moralidade para o exercício do mandato.
A solução de um conflito desta natureza, que exige a aplicação dos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não pode ser outra que
não aquela que agasalha a proteção da coletividade, por meio da defesa da
probidade e da moralidade, mesmo que isto implique o sacrifício de direitos
individuais.
É por tais motivos que mantenho o entendimento de que as causas
de inelegibilidade não constituem pena e que, por isto, a elas não se aplica
o princípio da anterioridade da lei penal.
Demais disso, reconhecendo que as novas situações de inelegibilidade criadas pela Lei Complementar n. 135, de 4 de junho de 2010, podem
ser violadoras de direitos individuais, posiciono-me em favor da preponderância da proteção aos interesses da coletividade, por meio da defesa da
probidade e da moralidade, mesmo que isto implique o sacrifício dos aludidos
direitos individuais.
Por fim, impende registrar que a procedência de um pleito de impugnação de mandato eletivo somente pode acarretar a cassação do mandato
eletivo e, por via reflexa, a inelegibilidade dos acionados, sendo incabível a
aplicação de sanção pecuniária ante a ausência de previsão legal.
Neste sentido, inclusive, tem se manifestado o TSE:
Ação de impugnação de mandato eletivo. Abuso do poder
econômico.
1. Para afastar a conclusão do Tribunal Regional Eleitoral
no sentido de que a grande quantidade de obras e serviços
realizados em município às vésperas das eleições - que, na
sua maioria, não eram essenciais ou atos de mera gestão tiveram conotação eleitoral e configuraram abuso do poder
econômico com potencialidade suficiente para desequilibrar a
disputa, seria necessário o reexame de fatos e provas, vedado
em sede de recurso especial, nos termos da Súmula nº 279
do Supremo Tribunal Federal.
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JURISPRUDÊNCIA
2. A procedência da AIME enseja a cassação do mandato
eletivo, não se podendo impor multa ou inelegibilidade, à
falta de previsão normativa.
Agravos regimentais não providos.
(AgR – Respe n. 5158657 – São Pedro do Piauí/PI, Acórdão
de 01/03/11, publicado no DJE de 10/05/11, Relator Ministro
Arnaldo Versiani Leite Soares)
Recurso especial. Ação de impugnação de mandato eletivo.
Corrupção. Multa.
1. Para afastar a conclusão da Corte Regional Eleitoral que
entendeu configurada a corrupção, em sede de ação de impugnação de mandato eletivo, seria necessário o reexame
de fatos e provas, o que é vedado nesta instância especial,
conforme Súmula nº 279-STF.
2. A procedência da AIME enseja a cassação do mandato
eletivo, não sendo cabível a imposição de multa a que se
refere o art. 41-A da Lei nº 9.504/97, por falta de previsão
no art. 14, § 10, da Constituição Federal e na própria Lei
nº 9.504/97.
Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido, para
tornar insubsistente a multa aplicada.
(RESPE n. 28186 – Pedro Avelino/RN, Acórdão de 06/12/07,
publicado no DJ de 14/03/08, Relator Ministro Arnaldo Versiani
Leite Soares).
Diante das razões acima elencadas, voto no sentido de que seja
dado provimento parcial ao recurso para, com base nas normas insculpidas
nos art. 1º, inc. I, d, e 15 da Lei Complementar n. 64/90, com as alterações
procedidas pela Lei Complementar n. 135/10, cassar o mandato eletivo dos
recorridos Eranita de Brito Oliveira e Edmundo Antunes Pitangueira, decretando, ainda, a inelegibilidade de ambos por 8 (oito) anos a partir da eleição
em que foram praticados os ilícitos.
Tendo em vista que os recorridos obtiveram 52,88% dos votos
válidos no pleito de 2008, conforme informações extraídas do Sistema de
Gerenciamento de Eleições desta Justiça Especializada, o caso é de aplicação
do art. 224 do Código Eleitoral, devendo ser realizadas, portanto, de imediato,
novas eleições, as quais, todavia, em harmonia com a norma do art. 81, §1º
da Constituição Federal, deverão ser ocorrer sob a forma indireta, devendo,
até a posse do novo prefeito, o Presidente da Câmara Municipal permanecer
interinamente na chefia do Poder Executivo Local.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 14 de junho de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
189
JURISPRUDÊNCIA
ACÓRDÃO
PROCESSO Nº 988/2011
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 430-22.2011.6.05.0000
CLASSE 22
MUNICÍPIO:
Bom Jesus da Lapa
IMPETRANTE:
Ednaldo Meira Silva. Advs.: Béis: Rafael de Medeiros Chaves
Mattos, Tâmara Costa Medina da Silva, Pedro da Costa Vargens
e outros.
IMPETRADO:
Juiz Eleitoral da 59ª Zona/Poções.
LITISCONSORTE: Coligação BOM JESUS DA SERRA DE VOLTA AO CAMINHO
CERTO.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Mandado de Segurança. Pedido liminar. Deferimento.
Direito líquido e certo. Verificação. Concessão.
Concede-se a segurança, ante a comprovada violação
de direito líquido e certo não amparado por habeas
data ou habeas corpus.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, CONCEDER A SEGURANÇA, nos termos do voto do Juiz
Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 9 de agosto de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Ednaldo Meira
Silva em face de ato do Juízo Eleitoral da 59ª Zona/Poções, que não deu
seguimento a dois recursos eleitorais interpostos sequencialmente pelo impetrante para desfazimento de sentença que julgou procedente a AIME n°
2.199 contra ele proposta.
Em suas razões (fls. 01/14) o impetrante aduz que o magistrado
zonal incorreu em equívoco ao realizar juízo de admissibilidade, avocando
competência que, no caso sub examine, era deste egrégio Tribunal. Ademais,
alega que mesmo que cumprisse ao Juízo Eleitoral da 59ª Zona ultimar
190
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
tais providências, ainda assim se revelaria o desacerto da decisão que não
conheceu do recurso interposto, razão pela qual requereu o deferimento de
medida liminar para sustar a decisão impetrada.
Presentes os seus requisitos autorizadores, deferi a ordem requestada em decisão proferida às fls. 17/20 dos presentes fólios.
Regularmente notifi cados, os litisconsortes passivos não se
manifestaram.
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral Auxiliar manifestou-se (fls. 30/31) pela concessão da segurança.
É o relatório.
VOTO
Da análise minudente dos autos, entendo que assiste razão ao
impetrante.
A Coligação BOM JESUS DA SERRA DE VOLTA AO CAMINHO
CERTO ajuizou ação de impugnação de mandato eletivo em face de Edinaldo
Meira Silva e Sidney Teixeira Coelho. Esta demanda foi julgada procedente
pelo Juíz Eleitoral da 59ª Zona/Poções. Da sentença foi interposto recurso
eleitoral, o qual não foi admitido pelo magistrado a quo.
Para fundamentar sua decisão, o juiz zonal aduz que o primeiro
recurso interposto é inexistente por falta de representação processual. Por
outro lado, defendeu que a segunda peça recursal não poderia ser conhecida,
porquanto não se pode recorrer duas vezes da mesma decisão.
Como é possível observar, trata-se de dois recursos interpostos em
sequência. Em verdade, a Belª. Tâmara Costa Medina da Silva, com regular
instrumento de mandato, apresentou a irresignação dos seus clientes por
meio de fac-símile recebido pelo cartório eleitoral através do protocolo de
nº 17.686/2011, às 13h46 do dia 30 de março do corrente ano.
Por oportuno, cumpre asseverar que a decisão foi publicada no
Diário da Justiça em 25 de março, uma sexta-feira, de modo que, não há
que se falar em intempestividade do recurso. Ademais, os originais do fax
enviado pela patrona da parte foram juntados aos autos no dia seguinte, ou
seja, 31 de março de 2011.
Por sua vez, em momento posterior (todavia, também no dia 30
de março de 2011), o doutor Samuel Teles Filho aforou peça jurídica de
igual teor destinada a combater a sentença zonal. Saliento que foi juntado
substabelecimento para este mandatário atuar no feito no dia 25 de março,
através de fac-símile, juntando-se aos fólios, no dia 31 de março, o documento original.
A meu ver, não restam dúvidas acerca dos equívocos perpetrados
pelo juízo singular. O inicial foi considerar como primeiro recurso aquele interposto pelo Bel. Samuel Teles Filho, quando na verdade a peça aviada pela
Belª. Tâmara Costa Medina da Silva foi protocolizada anteriormente. Depois,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
191
JURISPRUDÊNCIA
tem-se que o substabelecimento original conferido ao patrono da parte foi
juntado em tempo hábil, de tal maneira que inexistem irregularidades que,
sob este viés, impeçam o regular andamento do recurso.
Como se não bastasse, cumpre salientar que o juiz de primeira
instância não possui competência para exercer juízo de admissibilidade sobre
recursos interpostos contra sentença proferida em AIME. Assim, vejamos o
que dispõe o art. 267, § 6° do Código Eleitoral:
Art. 267. Recebida a petição, mandará o juiz intimar o recorrido
para ciência do recurso, abrindo-se-lhe vista dos autos a fim de,
em prazo igual ao estabelecido para a sua interposição, oferecer razões, acompanhadas ou não de novos documentos.
[...] § 6º Findos os prazos a que se referem os parágrafos
anteriores, o juiz eleitoral fará, dentro de 48 (quarenta e oito)
horas, subir os autos ao Tribunal Regional com a sua resposta
e os documentos em que se fundar, sujeito à multa de dez por
cento do salário-mínimo regional por dia de retardamento, salvo
se entender de reformar a sua decisão.
De igual sorte, procede o art. 8°, § 2° da Lei Complementar n° 64/90,
cujo rito é adotado em sede de AIME:
Art. 8°. Nos pedidos de registro de candidatos a eleições municipais, o Juiz Eleitoral apresentará a sentença em cartório
três dias após a conclusão dos autos, passando a correr deste
momento o prazo de três dias para a interposição de recurso
para o Tribunal Regional Eleitoral.
§ 2° Apresentadas as contra-razões, serão os autos imediatamente remetidos ao Tribunal Regional Eleitoral, inclusive
por portador, se houver necessidade, decorrente da exigüidade
de prazo, correndo as despesas do transporte por conta do
recorrente, se tiver condições de pagá-las. (grifos nossos).
Portanto, qualquer que seja o caminho adotado, não sobejam dúvidas no sentido de que o magistrado laborou em erro, seja pela ausência de
competência para exercer juízo de admissibilidade, seja pela fundamentação
equivocada que resultou no não recebimento dos recursos.
Ex positis, com base nos argumentos apresentados, na esteira do
parecer ministerial, concedo a segurança requerida, determinando ao juízo
zonal que abra vista para contrarrazões e, empós, remeta os autos da AIME
nº 2.199 para exame por esta Corte.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 9 de agosto de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
192
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 9 9 1 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 16.467-66.2008.6.05.0118
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Cachoeira
RECORRENTE:
Pedro Roberto Elpídio Ferreira. Adv.: Bel. Chrisvaldo Monteiro
de Almeida.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 118ª Zona.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Candidato. Vereador. Irregularidades. Parecer conclusivo.
Ausência de intimação. Cerceamento de defesa.
Configuração. Acolhimento da preliminar. Retorno
dos autos à origem.
Preliminar de cerceamento de defesa.
A norma de regência confere diversas oportunidades aos promoventes para que sejam sanadas as
irregularidades eventualmente identificadas nas
contas. Deste modo, olvidando-se a necessidade
de intimação para manifestação acerca do parecer
conclusivo, impõe-se acolher a preliminar, de modo
que sejam remetidos os autos à zona de origem,
a fim de que o candidato tenha a oportunidade de
apresentar os documentos que reputar necessários
diante do caso concreto.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, ACOLHER A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA,
DETERMINANDO-SE O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM, nos termos
do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente
Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 9 de agosto de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
193
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por Pedro Roberto Elpídio
Ferreira em face de sentença de fl. 33, do Juízo Eleitoral da 118ª Zona/
Cachoeira, que julgou desaprovadas as contas de campanha do recorrente,
candidato à vereador.
Em suas razões de fls. 58/62, o recorrente alega, em sede de
preliminar, cerceamento de defesa por não ter sido oportunizada a sua manifestação acerca do Relatório Conclusivo do cartório eleitoral. No mérito,
aduz que as supostas irregularidades não comprometeram a regularidade
das contas. Por fim, pugna pelo provimento do presente recurso.
De posse dos autos, a Secretaria de Controle Interno desse egrégio
Tribunal exarou Relatório Técnico de exames pela manutenção da decisão
que desaprovou as contas (fl. 75/76).
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral manifestou-se
pelo não acolhimento da preliminar aventada e, no mérito, pelo desprovimento
do recurso (fls. 79/80).
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA.
Entendo que merece acolhimento a preliminar aventada.
Compulsando os autos, verifico que após a apresentação da prestação de contas foi emitido relatório preliminar para a expedição de diligências
(fls. 23/24). Intimado, o candidato não se manifestou a respeito das falhas
apuradas. Sendo assim, o Cartório Eleitoral da 118ª Zona exarou Relatório
Conclusivo pela desaprovação das contas. Posteriormente, os fólios foram
encaminhados ao Parquet que opinou pela desaprovação, e foram conclusos
ao magistrado zonal que julgou desaprovadas as contas.
A meu ver, a norma de regência da matéria, sistematicamente,
confere aos candidatos oportunidades variadas de se manifestar nos autos
das prestações de contas a fim de sanar as irregularidades eventualmente
encontradas e/ou esclarecer possíveis dúvidas.
A fim de afastar eventuais dúvidas acerca do tema, vejamos o que
dispunha o art. 37 da Res. TSE nº 22.715/2008:
Art. 37. Emitido parecer técnico pela desaprovação das
contas ou pela aprovação com ressalvas, o juiz eleitoral
abrirá vista dos autos ao candidato ou ao comitê financeiro,
para manifestação em 72 horas, a contar da intimação.
194
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Parágrafo único. Na hipótese do caput, havendo a emissão de novo parecer técnico que conclua pela existência
de irregularidades sobre as quais não se tenha dado
oportunidade de manifestação ao candidato ou ao comitê
financeiro, o juiz eleitoral abrirá nova vista dos autos para
manifestação em igual prazo.
Vê-se, pois, que mesmo depois do parecer conclusivo, ainda existe
a possibilidade de que o candidato tenha nova vista dos autos, a fim de sanar
vícios remanescentes.
Desta forma, vejo que a não intimação do promovente para se
manifestar acerca do parecer conclusivo, mesmo que tenha se tratado de
uma reprodução do parecer prévio, resultou em prejuízo, de tal modo que as
contas foram desaprovadas.
Neste passo, vislumbro como necessária a remessa dos autos ao
juízo de origem a fim de que seja conferida a oportunidade de manifestação – assegurada pelo regramento específico, diga-se de passagem – para
que então o magistrado local dê o andamento que julgar adequado ao feito,
ordenando as diligências e demais medidas que reputar necessárias.
Pelo exposto, acolho a preliminar.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 9 de agosto de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
195
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 0 8 5 / 2 0 11
PETIÇÃO
PROCESSO Nº 282-11.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
Salvador
REQUERENTE:
João Henrique de Barradas Carneiro. Advs.: Béis. Tiago Cedraz
Leite Oliveira, Flávio Aurélio Nogueira Júnior, Sérgio Tourinho
Dantas e outros.
REQUERIDO:
Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB. Advs.:
Béis. Jayme Vieira Lima filho e Manoel Guimarães Nunes.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
Ação de declaração de existência de justa causa.
Desfiliação Partidária. Resolução TSE nº 22.610/2007.
Grave discriminação pessoal. Configuração. Reconhecimento da justa causa. Procedência.
Preliminar de incompetência da Justiça Eleitoral.
Inacolhe-se a preliminar, eis que a constitucionalidade do art. 2º da Resolução TSE nº 22.610/2007, que
fixa a competência da Justiça Eleitoral para processar, apreciar e julgar ação de decretação da perda
de cargo eletivo é matéria consolidada, consoante
decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos da
ADI nº 3999/DF, que declarou a constitucionalidade
do referido diploma.
Preliminar de ilegitimidade passiva.
Tendo em vista que o partido político é um instituto
único, dividido em diretórios municipais, estaduais
e nacional por questões meramente administrativas,
afasta-se a preliminar de ilegitimidade passiva do
diretório regional.
Preliminar de falta de interesse de agir.
O art. 1º, parágrafo terceiro da Res. TSE nº 22.610
prevê a possibilidade de requerimento de declaração
de existência de justa causa para o mandatário que
já se desfiliou, razão por que se impõe a rejeição da
preliminar.
Preliminar de cerceamento de defesa.
Rejeita-se a preliminar de cerceamento de defesa suscitada em face da dispensa do depoimento pessoal
do autor e da oitiva de testemunhas, porquanto ao
julgador é facultado deferir ou indeferir determinadas
provas, conforme entender necessárias.
Mérito.
196
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Julga-se procedente ação de declaração de existência de justa causa, quando o requerente comprova
a grave discriminação pessoal de que se diz ter sido
vítima por parte da agremiação pela qual se elegeu,
configurando a hipótese constante do art. 1º, § 1º,
inciso IV da Res. TSE nº 22.610/2007.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACÓRDÃO os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER AS PRELIMINARES e, no mérito, JULGAR
PROCEDENTE O PEDIDO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante
lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; JOSEVANDO
SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de pedido de declaração de existência de justa causa
para desfiliação partidária requerido pelo Prefeito João Henrique de Barradas Carneiro, em desfavor do Partido do Movimento Democrático Brasileiro
– PMDB, com fundamento no art. 1º, §1º, IV, c/c § 3º da Resolução do TSE
nº 22.610/2007.
De acordo com a inicial, o requerente foi reeleito para o cargo de
Prefeito pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, ora
requerido, nas eleições de 2008, sendo que, em razão de perseguição de
caráter pessoal por parte de dirigentes da Agremiação, a boa relação então
existente entre o autor e o partido sofreu danos irreversíveis, transbordando
“os limites da discussão política para um claro desrespeito pessoal”, perpetrados mediante a prática de diversos atos de discriminação contra sua pessoa,
impossibilitando sua permanência nos quadros do partido.
Para prova do alegado, arrolou testemunhas e apresentou os documentos de fls. 31/223.
Citado, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB
apresentou defesa (fl. 227/255), suscitando, preliminarmente, a incompetência
absoluta deste Tribunal Regional Eleitoral e carência de ação por ilegitimidade
passiva ad causam e por falta de interesse de agir originário ou, alternativamente, por perda superveniente do objeto. No mérito, rechaçou os fatos
alegados na inicial, defendendo a ausência de justa causa, a impropriedade
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
197
JURISPRUDÊNCIA
da juntada de faxes em fotocópias e a violação do sigilo da comunicação, a
inexistência de coação ou qualquer ofensa do partido para com o autor e,
ainda, que o partido foi excluído da Administração Municipal e não o contrário.
Sustenta, por fim, a “impossibilidade jurídica da grave discriminação pessoal
do Autor por supostas ofensas do Acionado à sua cônjuge”.
Arrolou testemunhas e anexou vasta documentação (fls.256/400).
Remetidos os autos ao Procurador Regional Eleitoral (fls. 405/411),
este opinou pela rejeição das preliminares e, no mérito, pelo deferimento
do pedido.
Em 23 de fevereiro de 2011, determinei o sobrestamento do feito
até que a Petição nº 390-40, que versa sobre os mesmos fatos e as mesmas
partes, estivessem conclusos.
Indicadas pelas partes as provas que pretendiam produzir (fls.
423/425), foi designada audiência para oitiva de testemunhas, ocasião em que
este Magistrado encerrou a dilação probatória por entender desnecessários
o depoimento pessoal e a produção de prova testemunhal.
Em alegações finais, o requerente reafirma os termos da exordial;
o partido requerido, por seu turno, reitera as razões lançadas na contestação, arguindo, demais disso, o cerceamento de defesa por inobservância do
devido processo legal em face da dispensa do depoimento pessoal do autor
e da oitiva das testemunhas arroladas (fls. 481/511).
Instado, o Ministério Público Eleitoral manteve seu entendimento
pelo deferimento do pedido (fls. 524).
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO (INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º DA RESOLUÇÃO TSE Nº 22.610/2007).
A preliminar não merece prosperar, pois a constitucionalidade da
referida Resolução é matéria que jaz consolidada, consoante a decisão do
Supremo Tribunal Federal nos autos ADI nº 3999/DF, declarando a constitucionalidade do referido diploma.
A jurisprudência trazida pela defesa encontra-se há muito ultrapassada e destoa do entendimento firmado pela Corte Superior Eleitoral:
“CONSULTA. DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA SEM JUSTA CAUSA. PERDA DE CARGO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ELEITORAL. Não obstante a autonomia assegurada no art. 17, § 1º,
da Constituição Federal, os partidos políticos estão sujeitos
à jurisdição da Justiça Eleitoral quanto aos atos que tenham
198
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
potencialidade para interferir no processo eleitoral. Assim, no
que tange à perda do cargo por desfiliação partidária sem
justa causa, a competência para julgar a matéria pertence à
Justiça Eleitoral, devido aos reflexos que a perda de cargo
eletivo acarreta no âmbito eleitoral.” (AC. TSE nº 22893/2008,
de 14/08/2008, re. Min. Félix Fischer).
A propósito, especialmente no que se refere à reserva legal de
lei complementar, vale a transcrição de jurisprudência do Tribunal Regional
Eleitoral de Santa Catarina, cuja ementa segue transcrita:
AÇÃO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DE MANDATO ELETIVO
POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA - PEDIDO FORMULADO
POR PROMOTOR ELEITORAL PERANTE JUIZ ELEITORAL
DE PRIMEIRO GRAU - RESOLUÇÃO N. 22.610 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL - COMPETÊNCIA PARA
AS AÇÕES DE PERDA DE MANDATO POR INFIDELIDADE
PARTIDÁRIA - INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE
SUSCITADO EX OFFICIO PELO RELATOR - EXAME DA MATÉRIA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RESPEITO À
INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA - PRESERVAÇÃO DA FORÇA
NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO - RESSALVA DO PONTO
DE VISTA PESSOAL.
A competência para as ações de perda de mandato eletivo
por infidelidade partidária restou estabelecida pelo artigo 2º
da Resolução n. 22.610/2007 do Tribunal Superior Eleitoral,
cabendo aos Tribunais Regionais Eleitorais o julgamento relativo aos mandatos “não federais”.
Apesar da reserva constitucional à lei complementar para
estabelecer a competência dos órgãos da Justiça Eleitoral,
não há espaço para interpretações constitucionais fora da
exegese previamente realizada pelo Supremo Tribunal Federal.
Decorrência dos princípios da autenticidade da interpretação
constitucional pela Suprema Corte, em qualquer dos modelos,
concentrado ou difuso, e da preservação da força normativa
da Constituição bem como de sua integridade.
Acórdão 22016; ADM – Matéria Administrativa; TRE-SC – Itaiópolis-SC; Rel. MÁRCIO LUIZ FOGAÇA VICARI; DJE – Diário
de JE, Data 20/02/2008.
A título ilustrativo, transcrevo excerto do voto proferido pelo Ministro
Celso de Mello, nos autos do Mandado de Segurança nº 26.603 do Distrito
Federal, no qual se verifica a constitucionalidade da Resolução no âmbito
formal, inclusive quanto ao seu art. 2º:
“Na realidade, Senhora Presidente, e em face, precisamente,
de tais premissas, torna-se necessário assegurar, ao Deputado,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
199
JURISPRUDÊNCIA
naqueles casos em que se justificar o ato de sua voluntária
desvinculação do partido político pelo qual se elegeu, o direito
de resguardar a titularidade do mandato legislativo, exercendo
– quando a iniciativa não for da própria agremiação partidária
– a prerrogativa de fazer instaurar, perante órgão competente
da Justiça Eleitoral (o TSE, tratando-se de Deputado Federal),
procedimento em cujo âmbito se lhe viabilize a possibilidade
de demonstrar a ocorrência das exceções justificadoras da
desfiliação partidária”.
Em seu voto, o Ministro declarou que considera o TSE competente
para apreciar a Ação de Decretação de Perda de Cargo Eletivo no caso de
Deputado Federal, não se vislumbrando qualquer inconstitucionalidade no
sobredito art. 2º da Resolução sob comento.
Em sendo assim, consolidado tal posicionamento pelo STF – órgão
máximo do Poder Judiciário a quem incumbe, precipuamente, a proteção e
interpretação da Carta Magna –, não resta dúvida de que o dispositivo contido
na Resolução, que disciplina a competência dos Tribunais para apreciação
das ações em discussão, não confronta a Constituição Federal.
Mercê destes fundamentos, rejeito a preliminar sob epígrafe.
PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA
AD CAUSAM DO DIRETÓRIO PARTIDÁRIO REGIONAL.
Sustenta, em síntese, o requerido, que, “tratando-se de mandato
de prefeito, notadamente da esfera municipal, é óbvio que tal legitimidade se
vincula estritamente ao órgão de direção partidária do município respectivo,
aqui, o de Salvador/BA”.
Razão não lhe assiste.
Como bem salientou o Ministério Público Eleitoral, citando precedente
do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (Acórdão nº 33.017/2008 – Requerimento nº 664, Classe 18), a questão da legitimidade “está intimamente ligada
à idéia de interesse processual e, levando-se em consideração que a idéia de
Partido Político é um instituto único, apenas dividido em diretórios municipais,
estaduais e nacional por questões administrativas e com o intuito de facilitar
o engajamento deste com a população local”, resta indubitável que o diretório
regional está legitimado a integrar o pólo passivo da presente lide.
Peço vênia para transcrever trecho do brilhante voto do Relator do
referido processo, Dr. Munir Abagge, reportando-se a entendimento jurídico
do Ministro Carlos Ayres Britto:
“Com efeito, se incumbe ao Diretório Municipal velar pela normalidade do processo eleitoral municipal, evitando qualquer
forma de abuso (podendo, inclusive, no pleito municipal, ajuizar representação por propaganda irregular e outras funções
200
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
eleitorais, além de impugnar registro de candidatura), não
vejo como se lhe recusar a legitimidade para vindicar mandato
eletivo por desfiliação partidária de vereadores”.
Naquela ocasião, firmou-se o entendimento, que adoto integralmente, de que a legitimidade, ativa ou passiva, é concorrente, isto é, pode
ser exercida por qualquer das esferas partidárias.
Sendo assim, pode ser exercida pelo diretório nacional se o mandato for federal, estadual ou municipal; pelo diretório estadual, se o mandato
for estadual ou municipal; e pelo diretório municipal, quando se tratar de
mandato municipal.
Com base nesses fundamentos, tenho que a legitimidade, no caso,
por se tratar de mandato de prefeito – municipal, portanto –, pode ser exercido
tanto pelo diretório municipal quanto pelo diretório regional do partido, razão
pela qual rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam.
PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE
AGIR OU PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO.
Defende o requerido a preliminar em epígrafe sob o argumento de
que, uma vez que o bem jurídico pleiteado pelo autor é a desfiliação partidária e esta, de fato, já se efetivou, com o pedido de desfiliação formulado
pelo requerente em 03 de fevereiro de 2010, restaria evidenciada a falta de
interesse de agir ou, alternativamente, a perda superveniente do objeto.
Tal preliminar também há que ser rejeitada.
O pedido for formulado em consonância com a Resolução TSE
nº 22.610/2007, cujo art. 1º, § 3º dispõe, in verbis:
“O mandatário que se desfiliou ou pretenda desfiliar-se pode
pedir a declaração da existência de justa causa, fazendo citar
o partido, na forma desta Resolução”. (grifos aditados)
Desta forma, resta evidenciado o interesse de agir do requerente.
PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR INOBSERVÂNCIA
DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.
A última preliminar, suscitada em sede de alegações finais pela parte
requerida, foi arguida em face da dispensa, por este julgador, do depoimento
pessoal do autor e da oitiva das testemunhas arroladas
De saída, há que se dizer, porque relevante, que o Magistrado, frente
à moderna sistemática processual, é o destinatário e soberano na análise
da prova, e como tal, é quem deve considerar a sua necessária produção
ao deslinde da controvérsia.
Sabe-se que o poder instrutório faculta-lhe deferir ou indeferir determinada prova e que a questão depende de sua avaliação e da necessidade
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201
JURISPRUDÊNCIA
daquela, constituindo-se aqui, no âmbito formal, a ampla defesa, reflexo
do devido processo legal. No caso específico, a norma que rege a matéria
prevê, expressamente, a faculdade do magistrado de avaliar a necessidade
de produção de provas, deferindo-as ou não, conforme se extrai do art. 7º,
caput, da Resolução TSE nº 22.610/2007.
Sobre a matéria trago à baila lição do Prof. Alexandre de Moraes,
in Constituição do Brasil Comentada:
“Por ampla defesa entende-se o asseguramento que é dado ao
réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo
de calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é
a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução
dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido
caberá igual direito da outra parte de opor-se-lhe ou de darlhe a versão que lhe convenha, ou, ainda, de fornecer uma
interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor.”
Mercê dessas considerações, no plano jurídico-conceitual, entendo
que este Relator, imbuído da apreciação do requerimento que lhe fora posto
a acertamento, tem o condão e a faculdade legal de indicar, na órbita do
direito e das consequências que dele resultam, quais provas são necessárias ao deslinde do feito, dispensando aquelas que entender prescindíveis,
considerando os fatos e circunstâncias constantes dos autos, de maneira a
se evitar eventual e futura alegação que conduza à hipótese de cerceio de
defesa e, ainda, na busca da verdade.
Na hipótese dos autos, verifico que a causa já está madura para
julgamento, não havendo necessidade de dilação probatória uma vez que a
prova documental acostada aos autos mostra-se bastante e suficiente ao deslinde da questão, nos termos do art. 6º da Resolução TSE nº 22.610/2007.
À vista dessas considerações, rejeito a preliminar de cerceamento
de defesa.
MÉRITO.
A Resolução TSE nº 22.610/2007, que disciplina o processo de
justificação de desfiliação partidária, prevê, em seu art. 1º, § 1º, as seguintes
hipóteses para configuração de justa causa: a) incorporação ou fusão do partido; b) criação de novo partido; c) mudança substancial ou desvio reiterado
do programa partidário; d) grave discriminação pessoal.
No caso dos autos, o requerente pretende legitimar judicialmente
sua desfiliação dos quadros da agremiação requerida, ao argumento de que
foi vítima de grave discriminação e perseguição pessoal levada a efeito através da “(i) descoberta de papéis de faxes enviados do PMDB/BA divulgando
notícias prejudiciais ao Requerente e a sua cônjuge; (ii) a veiculação pública
202
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
por dirigentes Regionais da intenção de expurgar o Autor dos quadros do
Partido sem qualquer justa causa, que culminou na [...] suspensão imotivada
do registro do Requerente e (iii) [...] a divulgação em jornais e redes sociais
pelos Dirigentes Locais do partido Réu de jargões e apelidos que depreciam
o Prefeito Suplicante”.
Impõe-se ressaltar, antes de mais nada, que, não raro, a disputa
intrapartidária provoca a exaltação de ânimos, que se traduzem em discussões acaloradas, o que é perfeitamente aceitável, porquanto a confrontação
de ideias faz parte do próprio processo político democrático.
É natural e salutar que no seio de uma associação de pessoas
haja divergências internas, motivadas pelo conflito de objetivos, aspirações
e ideais, contexto no qual se incluem as agremiações político-partidárias.
Reflexo da própria sociedade, o partido político é a união de pessoas que,
em princípio, comungam dos mesmos interesses, mas que poderão, indubitavelmente, possuir aspirações políticas distintas, traduzidas por embates
internos, podendo até resvalar em críticas mútuas, desde que respeitados
certos limites de razoabilidade e respeitabilidade.
Isto posto, evidentemente não se pode entender como aceitável a
perseguição política, prática condenável que cerceia a liberdade de consciência do indivíduo.
O art. 1º, IV da Resolução/TSE nº 22.610/07 tem por escopo
justamente proteger o filiado de situações em que ele é injustificadamente
preterido no seio da agremiação partidária à qual está vinculado. Esse é o
espírito da lei.
No caso dos autos, observa-se que a relação entre o requerente
e o PMDB começou a se tornar conflituosa em razão da divergência política
entre aquele e o filiado Geddel Vieira Lima, um dos principais representantes
políticos da agremiação.
A partir daí, restou demonstrado nos autos que o Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB e filiados seus, notadamente Geddel
Vieira Lima, transbordando os limites razoáveis da divergência política, passaram a assumir uma postura inaceitável e injustificadamente desrespeitosa
em relação ao requerente, que culminaram na suspensão deste último do
Partido sem que houvesse a devida apuração em processo administrativo
que avalizasse a aplicação de tal medida disciplinar, conforme estatuem os
art. 10 e 11, II do Estatuto do PMDB.
É de se notar que, muito embora o Código de Ética do PMDB preveja a hipótese de suspensão de filiado a título de providência acautelatória
em processos de cancelamento de filiação, a aplicação de tal medida, por si
só, já é suficiente para a delineação do clima de animosidade que imperava
entre a agremiação e o filiado.
A par disso, o filiado Geddel Vieira Lima, por meio do twitter, passou
a se manifestar, reiteradamente, em relação ao Prefeito, utilizando-se de
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JURISPRUDÊNCIA
termos chulos como “Menino Maluquinho” (fl. 58) e “doido” (fl. 216), chegando a se referir à Prefeitura Municipal como “manicômio” (fl. 58) e “biruta de
aeroporto” (fl. 49), fatos que rapidamente se tornaram notícia nos principais
veículos de comunicação escrita locais, como é de conhecimento público e
notório na sociedade soteropolitana.
Não se pode olvidar que tais expressões emanaram de um integrante partidário com a representatividade do ex-Ministro e Deputado Federal
Geddel Vieira Lima, que expressou sua mágoa em diversos veículos de comunicação, destacando a insustentabildiade da situação de João Henrique
no Partido (fls. 40 e 62,v).
Merece ainda destaque a matéria jornalística veiculada na Tribuna
da Bahia no dia 12/01/2011, cujo trecho trasncreve-se a seguir:
“Geddel usou seu perfil no microblog Twiter para atacar o alcaide. ‘De longe, quando leio sobre a Prefeitura de Salvador,
começo a ficar incomodado em ver o nome do PMDB associado a esse manicômio e ao menino maluquinho’, disse, em
postagem na rede social.
Essa não é a primeira vez que Geddel dispara contra João.
Além dele, diversos quadros do PMDB vêm dando declarações contra o prefeito” (grifos aditados).
Como bem pontuou o Procurador Regional Eleitoral (fls. 405/411),
“em face dos elementos de prova carreados, não é possível afirmar com a
necessária segurança que a movimentação partidária pretendida pelo requerente seria voluntária e injustificada. Pelo contrário, antes eclodem razões
para que se conclua pela ocorrência de grave discriminação.”
E prossegue:
“Aduza-se, por fim, que o próprio teor da peça contestatória
revela o sentimento negativo que a agremiação e seus principais dirigentes nutrem pelo requerido; circunstância que, isoladamente considerada, não consubstancia elemento decisivo,
porém associada à prova dos autos ganha relevo no desenho
da justa causa para a desfiliação pretendida”.
Percebe-se, pois, que restou evidenciada injustificável discriminação
pessoal de que o requerente diz ter sido vítima, caracterizando a justa causa
constante do art. 10, § 1°, IV da Resolução TSE nº 22.610/2007, o que torna
inviável sua permanência no partido pelo qual se elegeu tendo em vista a
sucessão de fatos que revelam a total falta de amparo para com o filiado.
Nesse sentido, colhem-se os seguintes julgados do Tribunal Superior Eleitoral:
“Pedido de perda de cargo eletivo. Justa Causa. Grave discriminação pessoal.
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JURISPRUDÊNCIA
Os fatos vivenciados pelo parlamentar comprovam ter sido
ele discriminado pela agremiação a qual se elegeu, vindo
a sofrer as respectivas consequências, tais como a falta
de espaço e representatividade a ele imposta na legenda,
o que enseja a justa causa para a desfiliação.
Pedido improcedente.” (PET-2759, Rel. Arnaldo Versiani Soares. DJE de 24/04/2009, Página 28).
“Pedido. Perda de cargo eletivo. Desfiliação partidária. Justa
causa. Grave discriminação pessoal.
(...)
2. Embora a grave discriminação pessoal, a que se refere
o inciso IV, do § 1º, da Res.-TSE nº 22.610/2007, possa,
em regra, estar relacionada a aspectos partidários, não se
pode excluir outros aspectos do conceito de justa causa
para a desfiliação, inclusive os essencialmente pessoais,
o que envolve, até mesmo, questões de nítida natureza
subjetiva.
3. Hipótese em que a permanência do deputado no partido pelo
qual se elegeu se tornou impraticável, ante a sucessão de fatos
que revelaram o abandono e a falta de apoio ao parlamentar,
configurando, portanto, grave discriminação pessoal, apta
a ensejar justa causa para a migração partidária.
Pedido Improcedente.” (grifos acrescidos) (PET - 2766, Rel.
Arnaldo Versiani Soares. DJE, Tomo 80, Data 29/04/2009,
Página 57/58).
Em contexto semelhante, qual seja, o de que as represálias empreendidas pelo Partido pelo qual o Prefeito logrou se eleger configura discriminação pessoal apta a justificar desfiliação partidária, este e. Regional,
adotou a mesma solução no julgamento do Processo 1.178, Classe “PET”,
em decisão assim ementada:
Petição. Ação de declaração de existência de justa causa.
Resolução TSE nº 22.610/2007. Correspondência enviada
pelo partido. Represália. Comprovação da justa causa. Procedência.
Julga-se procedente ação de declaração de justa causa,
quando o ex-filiado logra comprovar a ocorrência de fatos que demonstram a represália do partido contra a sua
pessoa, ensejando, assim, o pedido de desfiliação partidária formulado pelo acionante, nos termos do art. 1º, § 1º,
inciso IV da Res. TSE nº 22.610/2008. (grifei) (Ac. nº 5078 de
17.12.2008, Rel. Marcelo Silva Britto.)
Em julgado ainda mais recente, esta Corte, apreciando a Petição
nº 1.193, reconheceu a prática de grave discriminação pessoal contra parlamentar, deferindo-lhe o pedido de declaração de existência de justa causa
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205
JURISPRUDÊNCIA
para se desfiliar do partido ao qual pertencia (AC. TRE/BA nº 997/2009, de
28.7.2009, Relatora Juíza Cynthia Resende).
Por tudo quanto exposto, na esteira do parecer do Procurador Regional Eleitoral, voto pela procedência do pedido para declarar que existe justa
causa a autorizar a desfiliação do Prefeito João Henrique de Barradas Carneiro
dos quadros do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB.
É como voto.
Sala de Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
206
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 0 8 8 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 3.556-17.2010.6.05.0000
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Barreiras
RECORRENTE:
Jusmari Terezinha de Souza Oliveira. Advs.: Béis. Rafael de Medeiros Chaves Mattos, Tâmara Costa Medina da Silva, Elivânia
Barbosa Soares e outros.
RECORRIDOS:
1. Coligação BARREIRAS É TUDO PRA MIM e Deijaci Guedes
Juvenal (Advs.: Béis. Sanzo Biondi, André Luiz de Andrade
Carneiro, Ruyberg Valença da Silva, Lílian Dias de Castro e
outros); 2. Coligação UNIDOS SOMOS FORTES e Jenni Dias
de Castro (Adv.: Bel. Thiancle Araújo).
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 70ª Zona Eleitoral.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
REVISOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Recursos eleitorais em Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - AIME. Preliminar de inadequação da via
eleita. Inacolhimento. Quebra de sigilo fiscal por força
de determinação judicial fundamentada. Persecução
da verdade real e do interesse público. Mitigação
do direito ao sigilo. Necessidade de valoração das
declarações de rendimentos. Doações eleitorais
ilícitas. Não demonstração da potencialidade lesiva.
Provimento.
Preliminar de inadequação da via eleita.
Não merece guarida pedido de extinção dos processos, sem resolução do mérito, sob o fundamento da
inadequação da via eleita, uma vez que a irregularidade
relativa à arrecadação de recursos de campanha pode
configurar modalidade de abuso de poder econômico,
corrupção ou fraude, passíveis de apuração mediante
o ajuizamento de ação de impugnação de mandato
eletivo.
Mérito.
Por não ser direito absoluto, pode o sigilo fiscal ser
quebrado por ordem judicial expressa, desde que seja
necessário ao deslinde do feito, instaurado com vista
a proteger interesse público relevante: a legitimidade
das eleições;
Dá-se provimento ao recurso eleitoral quando se
verifica que os elementos de prova coligidos aos au-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
207
JURISPRUDÊNCIA
tos revelam-se inaptos a demonstrar que o excesso
nas doações teve potencialidade para influenciar no
resultado do certame.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR e DAR PROVIMENTO AOS
RECURSOS, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que integra
passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CONTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY
PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recursos interpostos por Jusmari Terezinha de Souza
Oliveira, Prefeita do Município de Barreiras, contra as sentenças proferidas
pelo juízo da 70ª Zona Eleitoral, que julgou procedente os pedidos constantes
dos autos das Ações de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) no 1.192/2009
e nº 1.191/2009, reunidas originariamente, em razão da conexão, determinando a cassação do mandato eletivo da Recorrente e, conseqüentemente,
da sua Vice-Prefeita, Srª Regina Rocha Figueiredo Nogueira.
Em suas razões recursais, pugna, inicialmente, pela extinção dos
feitos sem resolução de mérito, por entender que a AIME não é via adequada
para apurar os supostos ilícitos descritos nas peças vestibulares, relativos à
arrecadação e gastos de recursos de campanha.
Subsidiariamente, requer sejam reformadas as sentenças atacadas
ao argumento de que as provas de que se valeu o Magistrado de 1º grau para
fundamentar a procedência dos pedidos possuem natureza ilícita, devendo,
por isso, ser desconsideradas.
Alega, ademais, que o decreto de cassação não deve prevalecer,
uma vez que baseado em mera presunção de fraude, supostamente existentes
nas informações insertas nas retificações da declaração de imposto de renda
realizadas pelos doadores da campanha eleitoral da Recorrente.
Sobre o limite das doações individualizadas das pessoas físicas e
jurídicas a campanhas eleitorais, menciona que não deve ser estimado mediante a verificação da simples declaração de renda apresentada ao Fisco,
mas a partir de outros meios de prova que possibilitem a aferição do montante
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JURISPRUDÊNCIA
resultante dos rendimentos brutos efetivamente obtidos pelos doadores, ainda
que não declarados.
Assevera, outrossim, que a responsabilidade decorrente da inobservância do limite de doação estabelecido pela legislação eleitoral é exclusiva do doador, assim como ocorre com as informações aludidas nas suas
declarações de renda.
Por fim, assegura que, ainda que se considere a configuração do
ilícito eleitoral referido nos autos, sua ocorrência não possui potencialidade
lesiva para desequilibrar o pleito.
Instados, os Recorridos apresentaram contra-razões nas quais rechaçam in totum as alegações recursais, pleiteando, ao final, a manutenção
das decisões hostilizadas.
Ouvido, o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral
pronunciou-se pelo desprovimento dos recursos.
É o relatório, que ora submeto à apreciação do eminente Juiz
Revisor.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 484/485 dos autos nº 3.557-02–RE.
DA CARÊNCIA DE AÇÃO POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
Não merece guarida o pedido de extinção dos processos, sem resolução do mérito, sob o fundamento da inadequação da via eleita, uma vez
que a irregularidade relativa à arrecadação de recursos de campanha pode
configurar modalidade de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude,
passíveis de apuração mediante o ajuizamento da ação de impugnação de
mandato eletivo.
Na esteira desse entendimento, a título ilustrativo, transcrevo
recente decisão do Ministro Arnaldo Versiani, citada no pronunciamento
ministerial:
“Ao contrário do pretendido pelos embargantes, questões
referentes à arrecadação e gastos de recursos de campanha (art. 30-A da Lei nº 9.504/97) e à prática de condutas
vedadas (art. 73 e seguintes da Lei nº 9.504/97) podem
perfeitamente ser conhecidas em sede de ação de impugnação de mandato eletivo, desde que revelem a prática de
atos de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude,
tal como reconhecido pelo art. 14, § 10, da Constituição da
República. (Ação Cautelar nº 371413, Decisão Monocrática
de 26/10/2010, Relator(a) Min. ARNALDO VERSIANI LEITE
SOARES, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data
29/10/2010, Página 38-40).” Grifos aditados.
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209
JURISPRUDÊNCIA
Diante do exposto, inacolho a preliminar suscitada.
MÉRITO.
Inicialmente, importa mencionar que esta Corte restringir-se-á a
analisar a imputação relativa à fraude na captação e aplicação dos recursos
de campanha, uma vez que as outras duas acusações contidas, exclusivamente, na peça vestibular da AIME n. 3.557-02, quais sejam, a distribuição
gratuita de combustível e a doação de ambulância e outras benesses em
troca de votos não foram apreciadas pelo juízo zonal, ao argumento de que
foram objeto de apreciação em outros feitos, e, contra esse entendimento, não
houve insurgência de quaisquer das partes, tornando-se matéria preclusa.
Desta forma, este órgão de segundo grau encontra-se vinculado ao
princípio da devolutividade, segundo o qual somente poderá ser apreciado o
objeto da insatisfação demonstrada nos recursos.
Antes, porém, de examinar a questão recursal de fundo, que demanda a realização de um juízo de valor sobre as provas produzidas, fazse mister analisar a licitude do manancial probatório que fundamentou as
sentenças vergastadas, consistente nas declarações de imposto de renda
dos doadores da campanha da recorrente, fornecidas pela Receita Federal
e colacionadas aos autos por força de determinação judicial.
É cediço que o direito ao sigilo fiscal consiste em um dos desdobramentos do direito à proteção da intimidade, assegurado expressamente
no inciso X do art. 5º da Constituição Federal de 1988, na medida em que
as informações prestadas ao Fisco pelo contribuinte referem-se a detalhes
do seu patrimônio, sendo, pois, de inegável foro íntimo, devendo, por isso,
serem preservadas sob segredo.
Sucede que, ainda que decorra da proteção à intimidade, o sigilo
fiscal, assim como o próprio direito do qual deriva, não pode ser assegurado
de forma absoluta. Diante de determinados casos concretos, impõe-se a sua
relativização, a fim de que sejam garantidos direitos ou interesses de maior
relevância, in casu, o interesse público.
Impende ressaltar que o abrandamento desse direito somente pode
ocorrer de forma lícita, sem abusos ou arbítrios. Assim, não se pode, sob o
manto do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, violar
quaisquer garantias constitucionais sem que sejam observados os requisitos
estabelecidos pela legislação ordinária ou pela própria Lei Maior, bem como
sem que seja justificada em razão da proteção de um bem jurídico de maior
relevância.
As informações fornecidas ao Fisco pelos contribuintes, desta feita,
somente poderão ser levadas a conhecimento de terceiros nas hipóteses
expressamente autorizadas pela lei de regência.
O art. 198, § 1º do Código Tributário Nacional, ao regulamentar o
sigilo fiscal, condiciona a divulgação de informações pela Fazenda Pública
210
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JURISPRUDÊNCIA
a duas situações. A primeira refere-se à realização de convênios entre os
entes federativos, com o fim de obterem dados para o melhor exercício da
fiscalização dos tributos. A segunda, aplicável ao caso sub oculi, faz alusão
à requisição regular da autoridade judiciária no interesse da justiça.
A propósito do tema, o Professor Alexandre de Moraes leciona que:
“Os sigilos bancário e fiscal, consagrados como direitos individuais constitucionalmente protegidos, somente poderão
ser excepcionados por ordem judicial fundamentada ou de
Comissões Parlamentares de Inquérito, desde que presentes
requisitos razoáveis que demonstrem, em caráter restrito e
nos estritos limites legais, a necessidade de conhecimento
dos dados sigilosos.” (In Direito Constitucional, 20ª edição,
Editora Atlas, pág. 62).
No caso em vitrina, com o intuito específico de investigar os fatos
noticiados na proemial, relativos à prática de abuso de poder econômico,
mediante arrecadação ilícita de recursos, - o que poderia, em tese, interferir
na legitimidade do pleito ocorrido em 2008 -, o Magistrado a quo deferiu
pedido da parte autora no sentido de que fosse expedido ofício à Receita
Federal, a fim de que os autos fossem instruídos com a declaração de renda
dos doadores da campanha da recorrente.
A execução da medida evidenciou-se, portanto, necessária ao
deslinde da causa e à apuração da verdade real, não merecendo acolhida
qualquer alegação no sentido de que a decisão judicial foi arbitrária, imotivada
e, por isso, inválida.
Nesse sentido:
“RECURSO ESPECIAL. CASSAÇÃO DE DIPLOMA. ART. 41-A
DA LEI Nº 9.504/97. ELEIÇÕES MUNICIPAIS. PREFEITO E
VICE-PREFEITO. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DO STF. ANULAÇÃO DOS VOTOS
VÁLIDOS. NÃO-INCLUSÃO DOS VOTOS NULOS. REEXAME
DE PROVAS. NEGADO PROVIMENTO.
1. Justificada a quebra de sigilo bancário, ordenada pelo
juiz monocrático, tem-se que o disposto no art. 22, VI,
VII e VIII, da LC nº 64/90 permite ao julgador proceder às
diligências que julgar necessárias ao deslinde da causa,
buscando salvaguardar a licitude das eleições. Tese que
encontra respaldo na jurisprudência do STF, consolidada
"no sentido de não possuir caráter absoluto a garantia dos
sigilos bancário e fiscal, sendo facultado ao juiz decidir
acerca da conveniência da sua quebra em caso de interesse público relevante e suspeita razoável de infração penal"
(STF - AgRg no AI nº 541.265/SC, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ
de 4.11.2005). Grifos aditados.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
211
JURISPRUDÊNCIA
Ressalte-se que o interesse público perseguido na ação, qual seja,
a proteção da legitimidade da eleição, é reconhecidamente preponderante
sobre o direito individual de terceiros que, eventualmente, estejam relacionados com suposto esquema de abuso de poder em favor da recorrente.
Por outro lado, não há de prosperar o argumento da recorrente
de que a quebra do sigilo fiscal somente poderia ocorrer se os destinatários
da violação fossem partes no feito. Isso porque, os apontados doadores de
campanha não podem ocupar o pólo passivo deste tipo de demanda como
litisconsortes, porquanto não possuem interesse jurídico na causa, cuja
sanção, prevista para o caso de procedência do pedido - desconstituição do
mandato, jamais poderia atingi-los.
Assim, exigir a observância do contraditório e da ampla defesa em
relação a terceiros que não fazem parte do processo e que não poderão ser
alcançados por eventual acolhimento do pedido inicial perfaz-se descabida,
não merecendo, deste modo, o acolhimento da tese da ilicitude da prova com
base nesses argumentos.
Mencione-se, neste ponto, que os referidos doadores somente
poderão ser responsabilizados por eventuais ilícitos eleitorais mediante a
instauração do competente processo judicial, onde, então, deverão ocupar o
polo passivo da demanda, sendo-lhes assegurada a observância do princípio
do devido processo legal e seus consectários.
A admissão da tese da recorrente, conforme mencionado pelos
recorridos em sede de contrarrazões, limitaria as possibilidades de instrução
probatória da AIME.
Sob a vertente defendida pela parte recorrente, outras medidas
consideradas invasivas à privacidade de terceiros e comumente utilizadas
em processos desta estirpe, como a busca e apreensão e a exibição de
documentos, haveriam também de ser consideradas ilícitas.
Na linha do entendimento aqui perfilhado:
“MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO
JUDICIAL ELEITORAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA.
APONTADA TERATOLOGIA E PREJUÍZO IMINENTE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. QUEBRA DOS SIGILOS BANCÁRIO
E FISCAL. TERCEIROS. INDEFERIMENTO. PRODUÇÃO
DE PROVA. DIREITO SUBJETIVO DA PARTE. INTERESSE
PÚBLICO. CONVENIÊNCIA E UTILIDADE COMPROVADAS.
MITIGAÇÃO DO DIREITO AO SIGILO. PRECEDENTES.
CONCESSÃO DA SEGURANÇA.
- O art. 22, VI e VIII, da Lei Complementar nº 64/90, permite
ao julgador determinar todas as diligências que julgar
necessárias ao deslinde da causa, inclusive a quebra dos
sigilos fiscal e bancário 'que não possuem caráter absolu-
212
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
to, sendo facultado ao juiz decidir acerca da conveniência
em caso de interesse público'.
- Segurança concedida.”
(MANDADO DE SEGURANCA nº 614, Acórdão nº 6999 de
01/06/2009, Relator(a) CARLOS ANTÔNIO SARMENTO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 03/07/2009)
Grifos aditados.
No mencionado feito, a discussão cinge-se à possibilidade de fornecimento de informações confidenciais, de caráter fiscal, provenientes de
doadores de campanha, obtidas junto à Receita Federal, sem que, para tanto,
tenha havido prévia autorização judicial, o que não ocorre no caso.
Imperiosa, portanto, é a valoração pelo órgão julgador das declarações de rendimentos colacionadas aos autos, uma vez que produzidas de
forma lícita.
Examinadas as provas, verifico, em consonância com a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, que a suposta ilicitude não restou
comprovada, sendo impertinente, dessa forma, invocá-la a título de tese
argumentativa.
Feitas essas considerações prévias, passo a analisar a questão
meritória propriamente dita.
O estudo da documentação coligida aos presentes, revela-me que o
desrespeito aos limites impostos pelo legislador à doação financeira efetuada
em campanhas eleitorais não possuiu o potencial de influir no resultado do
certame de Barreiras, no ano de 2008.
A utilização de recursos financeiros na campanha eleitoral em
desconformidade com o que determina a Lei das Eleições não é suficiente,
por si só, à caracterização de abuso; faz-se necessária a comprovação da
potencialidade lesiva da conduta a ensejar o claro desequilíbrio entre os
candidatos ao pleito.
Tal requisito – potencialidade - para fins de caracterização do abuso
de poder econômico, deve ser aferido diante da possível influência do ilícito
no resultado apurado nas urnas, suficiente para tornar a disputa entre os
concorrentes desigual, sobretudo por sua gravidade.
“Eleições de 2006. Recurso Ordinário (Código Eleitoral, art.
267, II, a). Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. Confecção e distribuição de camisetas. Abuso do poder econômico.
Potencialidade lesiva. Influência. Pleito. Conjunto probatório.
Insuficiência. Inelegibilidade (Lei Complementar nº 64/90, art.
1º, I, g). Rejeição de contas. Decisão. TCU. Inexistência. Vida
pregressa. Incompatibilidade. Exercício. Cargo público. Inaplicabilidade. Desprovimento. 1. Acaso existisse decisão do Tribunal de Contas da União rejeitando as contas de agente público;
o que não se verifica na hipótese - a matéria, por configurar
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
213
JURISPRUDÊNCIA
causa de inelegibilidade infraconstitucional, deveria ter sido
argüida em sede de impugnação de registro de candidatura,
sob pena de preclusão, e não em via de ação de impugnação
de mandato eletivo. 2. O mesmo sucede em relação à vida
pregressa do candidato, cuja hipótese de inelegibilidade não
foi ainda definida por lei complementar, de que depende a aplicação do art. 14, § 9°, da Constituição. 3. O abuso do poder
econômico exige, para a procedência da ação, demonstração inequívoca da existência de potencialidade lesiva
da conduta, apta a influir no resultado do pleito. 4. In casu,
não foi especificado na inicial quantas camisetas supostamente
seriam destinadas à campanha do recorrido. Além da inexistência de provas quanto à destinação eleitoral do material, há
nos autos apenas a notícia da apreensão de um determinado
quantitativo, mas, evidentemente, sem qualquer potencialidade de influir negativamente na lisura do pleito eleitoral, pois
sequer chegou a ser distribuído. 5. Recurso desprovido.” (RO
- Recurso Ordinário nº 503304 - João Pessoa/PB, Acórdão de
27/04/2010, Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO
DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico,
Data 02/06/2010, Página 71/72) Grifos aditados.
No caso em exame, as declarações de imposto de renda apresentadas pelos doadores das recorrentes levam-me a concluir que, efetivamente,
os limites impostos pela legislação de regência foram extrapolados, conforme
se extrai do quadro sinótico avante:
DOADORES
R e n d i m e n t o Limite Permitido:
2007 (DIRPF 10% rendimento
Original) R$
(PF), em 2007
Valor Total doado em R$
Valor excedente
em R$
1 - Everaldo França G. Júnior
1.014.954,81
101.495,48
85.464,90
-
2 - Izolda Leite
P. Maia
33.547,76
3.354,77
26.000,00
22.645,23
3 - João Francisco de Souza
207.569,54
20.756,95
20.000,00
-
4-Cristiano dos
S. Nascimento
26.499,53
2.649,95
7.000,00
4.350,05
5 – Everaldo Galvão
32.842,12
3.284,21
6.000,00
2.715,79
6 – Pedrita Galvão
78.907,63
7.890,76
15.000,00
7.109,24
7 – Bartira Pignata
69.377,20
6.937,72
7.000,00
62,28
TOTAL
214
36.882,59
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Sucede que, inobstante superiores aos percentuais fixados em lei,
o somatório de tais excessos não foi suficiente para causar qualquer espécie
de influência no resultado do pleito, como bem assentou, em seu parecer, o
representante do Parquet zonal, no seguinte trecho:
“...
Da análise do caso sub judice, sob o prisma da temperança,
com tranquilidade, conclui-se, que os excedentes ao limite
legal das doações à campanha das Impugnadas, de per se,
não tiveram o condão de influir no resultado das eleições ou
desviar a retidão do processo eleitoral.
...” Grifos aditados.
Tanto assim é, que a diferença de votos da recorrente para o candidato segundo colocado foi da ordem de 10.889, quantitativo por demais
expressivo, capaz de demonstrar que a recorrente elegeu-se sem a interferência das doações irregulares recebidas.
Cumpre-me registrar, outrossim, que a mera utilização de uma
faculdade prevista em lei – apresentação de declaração retificadora de imposto de renda – não implica, necessariamente, na realização de fraude ou
“caixa 2”, como bem faz crer a sentença do magistrado de instância inferior
na seguinte passagem:
“(...) Com efeito, não se está no presente feito discutindo
apenas a legalidade do quantum ofertado pelos contribuintes
financeiros da campanha das requeridas. O caso, ao menos
como foi colocado, é muitíssimo mais grave. A principal jaça de
que se acusam as impugnadas é de se terem valido, à larga,
do “caixa 2”. Tal procedimento teria caracterizado possíveis
abusos do poder econômico, corrupção e fraude. (...)”
Considerar a apresentação das retificadoras indício suficiente de
fraude é extrapolar os limites da lógica, é presumir o que não se extrai das
provas constantes destes fólios.
Aliás, insta ressaltar, neste ponto, que a observância dos limites
das contribuições financeiras incumbe aos doadores, não cabendo falar em
penalização do candidato pela suposta doação ilícita, mas, se for o caso,
em responsabilização daqueles por parte do órgão de persecução penal: o
Ministério Público. Desta linha de raciocínio tem compartilhado os tribunais
pátrios. Observemos:
“PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2008. CANDIDATO
AO CARGO DE PREFEITO. DOAÇÕES RECEBIDAS DE
PESSOAS FÍSICAS ACIMA DO LIMITE LEGAL. MOTIVO
INSUFICENTE PARA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS DO
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
215
JURISPRUDÊNCIA
CANDIDATO. DECISÃO DO JUÍZO MONOCRÁTICO MANTIDA. CONTAS APROVADAS. IMPROVIMENTO DO RECURSO.
1. Doação a candidato efetuada em valor que ultrapasse o
limite legalmente permitido, promovidas por pessoas físicas
ou jurídicas, de per se, consubstancia causa insuficiente à
desaprovação das contas de campanha do candidato beneficiário. Precedente. 2. A pretensão dirigida à penalização
do candidato pela suposta doação ilícita empreendida
por terceiros - pessoas físicas e jurídicas - consubstancia
hipótese não prevista em nosso ordenamento jurídico de
responsabilização por ato de terceiro. 3. A eventual prática,
pelo candidato, de abuso de poder econômico é passível de
apuração, porém, devendo ser observada a legislação de regência da matéria (art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990).
4. Constatadas na prestação de contas do candidato a
realização de doações supostamente feitas em desrespeito ao limite máximo legal estipulado (art. 23 da Lei
nº 9.504/1997), cabe ao Ministério Público Eleitoral apurar
a responsabilidade pelo eventual ilícito eleitoral mediante
a propositura de representação, com isso, garantindo-se
ao doador-acusado o pleno exercício das constitucionais
garantias à ampla defesa e ao contraditório (art. 5.º, LV, da
Constituição Federal de 1988). 5. Improvimento do recurso.”
(RE - RECURSO ELEITORAL nº 3183 - Maruim/SE, Acórdão
nº 236/2009 de 28/07/2009, Relator(a) ARTHUR NAPOLEÃO
TEIXEIRA FILHO, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Data
10/8/2009, Página 10).
Recurso Eleitoral. Candidato. Prestação de contas. Doação
recebida. Pessoa jurídica. Limite ultrapassado. Responsabilidade. Doação recebida acima do limite legal não pode ensejar a rejeição da prestação de contas de candidato pois
é responsabilidade da empresa-doadora a observância
do percentual fixado em lei. (RE - RECURSO ELEITORAL
nº 1299 - colorado do oeste/RO Acórdão nº 201/2009 de
28/07/2009 Relator(a) PAULO ROGÉRIO JOSÉ. Publicação:
DJ - Diário de justiça, Tomo 147/2009, Data 10/8/2009, Página
83). Grifos aditados.
Dessa forma, cobrar do candidato que, além de cumprir todas as
exigências legais inerentes ao processo eleitoral, também tenha conhecimento
prévio da capacidade financeira de todos os seus doadores, apresenta-se
um tanto quanto desarrazoado.
Por tudo quanto previamente exposto, evidenciado restou que o
excesso nas doações financeiras não teve potencialidade para influenciar
no resultado das eleições de 2008 no Município de Barreiras.
216
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Isto posto, trilhando a esteira de raciocínio do MPE zonal, voto por
dar provimento aos recursos, de sorte a reformar as sentenças combatidas,
mantendo a recorrente no cargo de Prefeita da indigitada municipalidade,
assim como a sua Vice, Regina Rocha Figueiredo Nogueira.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
217
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 0 9 7 / 2 0 11
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO Nº 3.984/CRE
MUNICÍPIO:
Salvador
REPRESENTANTE: PP – Seção da Bahia. Advs.: Béis. Milton de Cerqueira Pedreira
e Ednaldo Oliveira Moura.
REPRESENTADOS: PC do B – Seção da Bahia e Alice Mazucco Portugal. Advs.:
Béis. Aline Ferraz Fernandes e Vandilson Pereira Costa.
CORREGEDOR REGIONAL ELEITORAL: Juiz Josevando Souza Andrade.
Representação. Propaganda partidária. Preliminar
de inadequação da via eleita. Rejeição. Crítica ao
governo municipal. Improcedência.
Preliminar de inadequação da via eleita.
Acolhe-se a preliminar de inadequação da via eleita
apenas em relação a matéria relativa a propaganda
eleitoral e a aplicação da sanção prevista no art. 36,
§ 3º da Lei nº 9.504/97, haja vista a existência de rito
próprio.
Mérito
É lícita a utilização do espaço de propaganda partidária para divulgação de críticas à administração
municipal, com o propósito de expor a posição do
partido em relação a temas de interesse políticocomunitário.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, ACOLHER PARCIALMENTE A PRELIMINAR e JULGAR IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO, nos termos do voto do Corregedor Regional Eleitoral, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Corregedor Regional
Eleitoral; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
218
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Cuida-se de representação, com pedido liminar, formulada pelo
Partido Progressista - PP, por seu Diretório Regional, contra conduta do
Partido Comunista do Brasil – PC do B, consistente na veiculação de propaganda gratuita político-partidária com alegado desvio das finalidades legais,
transmitida pelas emissoras de televisão deste Estado, nos dias 23, 24 e 25
de maio do corrente ano, mediante inserções de 30 segundos.
Alega o representante, em síntese, que as referidas inserções fazem
propaganda eleitoral negativa contra a atual gestão municipal, como relata
a pretensão da segunda representada em mudar Salvador, “delineando as
promessas do Partido e suas quanto à sua pretensa eleição nas eleições
vindouras”, razão pela qual pleiteia a aplicação da penalidade constante no
art. 45, § 2º, inc. II da Lei nº 9.096/95 e a penalidade ínsita no art. 36, § 3º
da Lei nº 9.504/97.
Verificando a ausência dos requisitos autorizadores, neguei a medida liminar requerida (fls. 12/14).
Devidamente notificados, os representados apresentaram a defesa
de fls. 23/36, arguindo, em sede de preliminar, a inadequação da via eleita. No
mérito, assevera que não houve violação à legislação de regência, e requer
a improcedência da representação.
Devidamente instada, a Procuradoria Regional Eleitoral, às
fls. 40/45, manifestou-se pela rejeição da preliminar e procedência da representação.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
Da análise dos autos, observo que merece parcial guarida a questão
prévia ora sob apreciação.
O rito designado no art. 33, inc. X do Regimento Interno deste
Tribunal é adequado somente para a apuração de propaganda partidária
irregular. Portanto, não se pode aplicar a sanção prevista no art. 36, § 3º da
Lei nº 9.504, dispositivo atinente a propaganda eleitoral e de rito próprio (arts.
2º e 3º da Resolução TSE nº 23.193,)
Diante do exposto, acolho parcialmente a preliminar aventada,
apenas em relação a matéria relativa a propaganda eleitoral e a aplicação
da sanção prevista no art. 36, § 3º da Lei nº 9.504/97.
MÉRITO.
De acordo com o art. 45 da Lei nº 9.096/95, a propaganda partidária
gratuita, transmitida por rádio e televisão, deverá ser veiculada com o intuito
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
219
JURISPRUDÊNCIA
de difundir os programas, as idéias e a doutrina dos partidos políticos, bem
como as suas atividades congressuais, tornando-os conhecidos perante a
coletividade. Objetivará, outrossim, conforme inovação introduzida pela Lei
nº 12.034/2009, a promoção da participação política feminina, dedicando às
mulheres o tempo que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária,
observado o mínimo de 10% (dez por cento).
O § 1° do artigo supracitado, por sua vez, estabelece algumas
vedações ao conteúdo das comentadas propagandas, proibindo expressamente, dentre outras ações, a divulgação de propaganda de candidatos a
cargos eletivos.
Extrai-se ainda, da jurisprudência nacional, que as finalidades da
propaganda partidária não são desvirtuadas no caso de críticas desferidas ao
governo quanto à gestão administrativa. Estas críticas estão umbilicalmente
ligadas ao posicionamento de partido de oposição relativo a tema de interesse
político-comunitário. Como se pode observar a seguir:
“PROPAGANDA PARTIDÁRIA. ALEGAÇÃO DE PROMOÇÃO
PESSOAL DE FILIADO. PROPAGANDA DE PRÉ-CANDIDATO.
PERDA DO OBJETO. INÉPCIA DA INICIAL. ILEGITIMIDADE
PASSIVA. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES. IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO.
[...]
É lícita a participação de filiado em programa de propaganda
política quando se destina à divulgação de ações concretas da
agremiação partidária, inspiradas no ideário do partido.
Não configura desvirtuamento de finalidade a utilização do
espaço destinado à propaganda partidária para o lançamento
de críticas sobre a forma de condução da gestão administrativa estadual e municipal, uma vez que guarda vínculo com o
posicionamento de partido de oposição relativamente a tema
de interesse político-comunitário.
Improcedente a representação quando atendidas as prescrições legais a respeito do acesso gratuito ao rádio e à televisão
para propaganda partidária.” (Acórdão nº 75/TO, rel. Min.
Humberto Gomes de Barros, DJ de 17.02.2006, p.125)
“PROPAGANDA PARTIDÁRIA. CADEIA ESTADUAL. ALEGAÇÃO DE DESVIRTUAMENTO. OFENSA NÃO CONFIGURADA. IMPROCEDÊNCIA.
Assertivas que, desferindo crítica ao governo estadual quanto
à forma de conduzir a gestão administrativa, guardam vínculo
com a divulgação do posicionamento de partido de oposição
relativamente a tema de interesse político-comunitário.
Improcedente a representação quando não caracterizada
transgressão da previsão legal a respeito da utilização do
220
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
espaço destinado à veiculação de propaganda partidária.”
(Acórdão nº 661/SC, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ
de 25.2.2005)
“PROPAGANDA PARTIDÁRIA. ALEGAÇÃO DE OFENSAS.
NÃO-CARACTERIZAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA NEGADO. IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO.
Não configura desvirtuamento de finalidade a utilização do
espaço destinado a propaganda partidária para o lançamento
de críticas ao desempenho de agentes públicos quando não
excedam o limite da discussão de temas de interesse políticocomunitário.
Não caracterizando ofensa à honra ou à imagem do representante, tais críticas não autorizam a concessão de direito
de resposta.” (Acórdão nº 702/PE, rel. Min. Peçanha Martins
DJ de 27.5.2005)
É o caso dos autos.
Com efeito, da análise do conteúdo da mídia acostada aos fólios e
de sua respectiva degravação, verifica-se que a propaganda impugnada não
desrespeitou as regras e princípios norteadores da legislação de regência.
O trecho abaixo transcrito, extraído da propaganda em análise,
evidencia o acerto da conclusão acima:
Alice Portugal (Deputado Federal do PC do B): “Quem ama
Salvador, não pode aceitar que a cidade mãe do Brasil seja
tratada com tanto descaso. A cidade precisa de um novo
caminho. O PCdoB se orgulha de fazer parte do projeto que
está mudando a Bahia e o Brasil. Queremos mudar também
a nossa querida capital, com transporte público de qualidade,
educação, moradia e saúde, melhorando a vida das pessoas.
Participe dessa mudança. Venha para o PCdoB.”
Do cotejo do excerto supra com a legislação eleitoral relativa à
propaganda partidária, constata-se, pois, a descaracterização de propaganda
irregular, eis que não houve afronta à proibição contida no inc. II do §1º do
art. 45 da Lei dos Partidos Políticos.
À vista dessas considerações, julgo improcedente a representação.
É como voto.
Sala de Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
Josevando Souza Andrade
Corregedor Regional Eleitoral
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
221
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 0 9 8 / 2 0 11
AÇÃO PENAL
PROCESSO: Nº 1-42.2010.6.05.0145
CLASSE 4
MUNICÍPIO:
Santa Luz
AUTOR:
Ministério Público Eleitoral.
RÉUS:
Joselito Carneiro de Araújo Júnior (Advs.: Béis. Sebástian Borges
de Albuquerque Mello, Marcelo Marambaia Campos e outros);
Jeová Lourenço da Silva e Natanael Dantas da Silva (Advª.: Belª
Maria Ivete de Oliveira); Pedro dos Reis Almeida (Advs.: Béis.
Raul Silva Carneiro e Maria Ivete de Oliveira).
RELATOR:
Juiz Wanderley Gomes.
Ação penal originária. Crime previsto no artigo 299
do Código Eleitoral. Prefeito e corréus. Conexão.
Art. 76 do CPP. Recebimento da denúncia. Decisão
zonal. Nulidade. Competência do Tribunal. Atos de
instrução. Validade. Preservação. Inexistência de
prejuízo. Artigo 567 do CPP. Indícios de autoria e de
materialidade do delito. Recebimento da denúncia
pelo Colegiado. Art. 6º da Lei nº 8.038/90.
1. Oferecida a denúncia por crime previsto no artigo
299 do Código Eleitoral contra diversos acusados,
em sendo um deles chefe do executivo municipal,
e havendo conexão entre as práticas noticiadas, é
de se fixar a competência originária deste Regional,
para o processamento conjunto das mesmas, pela
inteligência do artigo 76 do CPP;
2. É nula a decisão de recebimento da denúncia, exarada pelo Magistrado zonal, porquanto incompetente,
preservando-se válidos, todavia, os atos de instrução
praticados, quando inexistente prejuízo para a defesa, à luz do artigo 567 do CPP;
3. Recebe-se a denúncia, quando os fatos descritos
na exordial configuram, em tese, crime capitulado em
lei, para que se possa, por meio de processo, apurar
a autoria, a materialidade do delito e o grau de culpa
dos réus ou a demonstração de suas inocências.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
222
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, ANULAR A DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU E RECEBER A
DENÚNCIA, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa
a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício
da Presidência - WANDERLEY GOMES, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA
MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de denúncia ofertada pelo Ministério Público Eleitoral em
desfavor de Joselito Carneiro de Araújo Júnior, Prefeito do Município de Santa
Luz/BA, de Jeová Lourenço da Silva, Vereador daquela cidade, e de Pedro
dos Reis Almeida e Natanael Dantas da Silva, sob a acusação de terem os
mesmos praticado o crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral.
De acordo com a denúncia, os acusados, em lugares e dias diversos, em momentos próximos à data das eleições municipais do ano de
2008, em unidade de desígnios, visando a satisfazer interesses pessoais,
em benefício próprio ou de terceiro, teriam oferecido vantagens indevidas a
eleitores, em troca de votos, durante o período eleitoral, que caracterizaria o
crime comumente chamado como “compra de votos”.
A exordial noticia que momentos antes das eleições Pedro dos Reis
Almeida teria oferecido 750 tijolos e o valor de R$30,00 à eleitora Rosinei
Varjão Cardoso, em troca do voto para si e para o, então, candidato à reeleição, Joselito Júnior. Teria, ainda, oferecido uma caixa de cerveja ao eleitor
Santílio da Silva Araújo em troca de seu voto.
Consoante se depreende da leitura da peça incoativa, Jeová Lourenço da Silva teria ido à casa da mesma eleitora Rosinei, onde teria ofertado à sua mãe valores em dinheiro para que votasse em Júnior. O acusado
teria, igualmente, no dia 03/10/2008, por volta das 21 horas, no Povoado de
Miranda, oferecido R$70,00 ao eleitor Herogilson da Silva Santos.
Em relação a Joselito Carneiro de Araújo Júnior, imputa-se o oferecimento, alguns dias antes da eleição, da quantia de R$20,00 à eleitora
Jessica Daiane Varjão dos Santos, num local conhecido como “Val do Pão”;
R$50,00 ao eleitor Cleiton, e R$20,00 ao eleitor Santílio da Silva Araújo.
Por fim, a Natanael Dantas da Silva imputa-se o oferecimento de
R$70,00 ao eleitor conhecido como Dermival, em troca do seu voto para o
número 25.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
223
JURISPRUDÊNCIA
Segundo a denúncia, haveria, nos autos, indícios significativos da
autoria e da materialidade do crime, em visto que pugna o representante do
Parquet pelo seu recebimento, para que, citados e interrogados os denunciados, sejam os mesmos, ao final, condenados.
Inicialmente ofertada pelo ilustre Promotor de Justiça em atuação
perante a 145ª Zona Eleitoral, a peça inaugural foi ratificada pelo Procurador
Regional Eleitoral Substituto (fl. 159-v), em razão de ter o magistrado zonal,
após o recebimento da denúncia, reconhecido a incompetência daquele Juízo
para processar e julgar o presente feito, em face da prerrogativa de foro de
um dos denunciados, conforme se depreende da exceção de incompetência
em apenso.
Remetidos os autos a esta Corte, renovou-se a citação dos investigados que ratificaram as defesas apresentadas perante a inferior instância.
Nelas, pugnaram pela rejeição da denúncia, em razão de sua inépcia, aduzindo inexistirem elementos mínimos necessários para viabilizar a defesa, a
exemplo da descrição da participação de cada um dos acusados em cada
uma das condutas elencadas. Asseveram, outrossim, que não haveria qualquer referência, na exordial, acerca da ocorrência de co-autoria, a justificar
o processamento conjunto das acusações.
No mérito, alegam a absoluta ausência de provas, e instam pela
absolvição dos acusados.
Em réplica, o Procurador Regional Eleitoral pondera que a alegação
de inépcia da inicial deve ser afastada, ao fundamento de que as condutas
ilícitas estariam suficientemente descritas, de modo a se permitir a sua perfeita
compreensão, não havendo qualquer óbice ao exercício da ampla defesa.
Aponta a existência de conexão e continência entre as práticas que teriam
sido perpetradas em concurso.
É o relatório.
VOTO
De início, é de se pontuar que a competência para o processamento
do feito, ora trazido à apreciação, é deste Regional, em razão da prerrogativa
de função de que é titular um dos investigados, in casu, o Sr. Joselito Carneiro
de Araújo Júnior, Prefeito da Cidade de Santa Luz/BA.
Considerando a existência de conexão entre as condutas narradas
na proemial, a autorizar o seu processamento e julgamento conjunto, pela
inteligência do artigo 76 do Código de Processo Penal, é de se invocar a
Súmula 704 da Suprema Corte, in verbis:
Súmula 704. Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa
e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo
do co-réu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.
224
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Incide, assim, o rito insculpido na Lei nº 8.038/90, mediante a
aplicação da regra da simetria, segundo a qual o Tribunal Regional Eleitoral
é o órgão, ficticiamente, correspondente ao Tribunal de Justiça do Estado,
para a hipótese.
Nessa linha, impende reconhecer a nulidade da decisão do Magistrado zonal, que recebeu a denúncia (fl. 99), com fulcro no artigo 567 do CPP,
reputando válidos, todavia, os atos de instrução já praticados, evitando-se,
destarte, a repetição de esforços, quando inexistente qualquer prejuízo para
a defesa.
Com essas ponderações, calcado no artigo 6º da Lei nº 8.038/90, passa-se ao exame da peça inaugural, à qual a defesa atribui a pecha da inépcia.
Com esteio no magistério de Pacelli, “inepta é a acusação que diminui o exercício da ampla defesa, seja pela insuficiência na descrição dos
fatos, seja pela ausência de identificação precisa de seus autores”.
Nessa direção, a teor do artigo 41, inciso I do Código de Processo
Penal, verifica-se que os fatos atribuídos aos denunciados, e suas circunstâncias, foram, suficientemente, descritos conforme relatado, de modo que não se
vislumbra qualquer óbice ao exercício da ampla defesa e do contraditório.
Noutro ponto, tenho por atendidos os demais requisitos formais
previstos no já mencionado artigo 41 do CPP, revelando-se medida de rigor
o não acolhimento da alegação de inépcia da inicial.
Superada a questão, é de se assinalar que aos denunciados, imputouse a prática de oferecimento de dinheiro e bens materiais a eleitores, com finalidade eleitoreira, de modo que se verifica que os fatos noticiados subsumem-se,
em tese, ao quanto descrito no artigo 299 do Código Eleitoral.
Lado outro, a exordial incoativa fez-se acompanhar do Procedimento Investigatório nº 16/08, instaurado pelo Ministério Público Eleitoral,
de notícia crime e de fotografias, restando, assim, demonstrado que existem
indícios suficientes de autoria e da materialidade do delito, a autorizar o seu
recebimento.
Nestes termos, com fulcro no artigo 6º da Lei nº 8.038/90, recebe-se
a denúncia, determinando-se o prosseguimento da ação penal contra Joselito
Carneiro de Araújo Junior, Jeová Lourenço da Silva, Pedro dos Reis Almeida e
Natanael Dantas da Silva para que se proceda, por meio do devido processo
legal, à apuração da autoria e da materialidade do delito, bem como do grau
de culpa de cada um dos réus, ou a demonstração de suas inocências.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 16 de agosto de 2011.
Wanderley Gomes
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
225
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 2 8 0 / 2 0 11
HABEAS CORPUS
PROCESSO: Nº 76-94.2011.6.05.0000
CLASSE 16
MUNICÍPIO:
Ilhéus
IMPETRANTE:
Jabes Sousa Ribeiro. Adv.: Bel. Fabiano Almeida Resende.
IMPETRADA:
Juíza Eleitoral da 26ª Zona/Ilhéus.
RELATOR:
Juiz Salomão Viana.
Habeas Corpus. Pedido de trancamento de procedimento criminal. Excepcionalidade da medida. Necessidade de demonstração de atipicidade da conduta,
da incidência de causa de extinção da punibilidade
ou da ausência de indícios de autoria e de prova da
materialidade do delito. Caso em que estão presentes
elementos mínimos que legitimam a instauração da
persecução criminal. Denegação da ordem.
1. O trancamento da ação penal mediante o uso do
habeas corpus é medida excepcional, somente autorizada quando houver demonstração – de plano – da
atipicidade da conduta, da incidência de causa de
extinção da punibilidade ou da ausência de indícios
de autoria e de prova da materialidade do delito.
2. Uma vez constatada a existência de elementos que
representem um mínimo de viabilidade de satisfação
futura da pretensão condenatória, a instauração da
persecução criminal se legitima.
3. Ordem denegada.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DENEGAR A ORDEM, nos termos do voto do Juiz Relator,
adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de setembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - SALOMÃO
VIANA, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral.
226
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de procedimento de habeas corpus, com pedido de concessão de medida de urgência, impetrado por Djalma Eutímio de Carvalho,
em favor de Jabes Ribeiro, visando ao trancamento de procedimento criminal em curso junto ao Juízo Eleitoral da 26ª Zona, sediada no Município
de Ilhéus, neste Estado, no qual o paciente figura como réu, em razão de
suposta prática de corrupção eleitoral ativa, delito capitulado no art. 299 do
Código Eleitoral.
O impetrante, em seu arrazoado, alega que a exordial acusatória
é inepta, porquanto descreve fato atípico e não aponta o beneficiário da
conduta ilícita descrita.
Sustenta, ainda, que a peça acusatória não encontra amparo nas
provas produzidas nos autos do inquérito policial, o que evidenciaria a ausência de justa causa para que o procedimento criminal tenha curso.
Por entender que estavam atendidas as exigências legais para
tanto, requereu que fosse concedida, liminarmente, ordem para expedição
de salvo-conduto, com o sobrestamento da prática dos atos do procedimento
criminal tombado sob o n. 2-93.2010, até o julgamento do writ.
Ao final, pugnou pelo acolhimento definitivo da pretensão deduzida,
para que seja ordenado o trancamento do aludido procedimento criminal.
Indeferida a medida de urgência postulada (fls. 172/174), foi aberta a
oportunidade para a autoridade apontada como coatora prestar informações.
Certificado o decurso do prazo decendial sem manifestação da
autoridade notificada, foram os autos remetidos à Procuradoria Regional
Eleitoral, que se pronunciou pela denegação da ordem.
Às fls. 184/185, foram juntadas as informações prestadas extemporaneamente pela Juíza Eleitoral da 26ª Zona, acompanhadas dos documentos
de fls. 186/221.
À vista do falecimento do impetrante, admiti o ingresso do paciente
Jabes Sousa Ribeiro no pólo ativo da relação jurídica processual, na qualidade
de impetrante do habeas corpus em seu próprio favor.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, devo registrar que no curso do processo sob exame
sobreveio o falecimento do impetrante, motivo que levou o paciente a requerer
o seu ingresso na relação jurídica processual na qualidade de “...litisconsorte
do impetrante falecido...” (sic).
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
227
JURISPRUDÊNCIA
Por óbvio, tendo em vista o falecimento do impetrante num caso
desta natureza, não se há que pensar na aplicação das normas que regem
a sucessão processual. E como o falecimento gera um quadro de perda de
capacidade de ser parte, também não se há que falar na possibilidade de um
litisconsórcio em que um dos litisconsortes não pode ser parte.
De outro lado, todavia, é inegável a existência de interesse jurídico
do paciente para ingressar no procedimento de habeas corpus, evitando, com
isto, que o processo respectivo seja extinto sem a resolução do mérito.
Em vista disso, admiti o ingresso do paciente Jabes Sousa Ribeiro
no polo ativo da relação jurídica processual, na qualidade de impetrante do
habeas corpus em seu próprio favor (fls. 223/224).
Feitas estas considerações, passo ao exame da questão de fundo.
E aí o que se vê é que o caso não é para a concessão da ordem.
Com efeito, o trancamento de um procedimento criminal mediante
o uso do habeas corpus é medida excepcional, somente autorizada quando
houver demonstração – de plano –, da atipicidade da conduta, da ocorrência
de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria e
de prova da materialidade do delito. É como tem decidido o Supremo Tribunal
Federal (HC 101012/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
DJU de 10/12/2010; HC 94835/SP, Segunda Turma, Relª. Minª. Ellen Gracie,
DJU de 24/10/2008; HC 89398/SP, Tribunal Pleno, Relª. Minª. Cármen Lúcia,
DJU de 26/10/2007).
A interrupção de um procedimento criminal por meio do habeas
corpus, destarte, deve se restringir aos casos em que não houver qualquer
dúvida de que o procedimento a nada conduzirá, já que a via estreita do writ
não se presta à análise aprofundada de acervo probatório.
E como, no caso sob exame, diferentemente do quanto é defendido
pelo impetrante, há elementos que indicam um mínimo de chances de que,
ao fim do procedimento, seja satisfeita a pretensão condenatória, torna-se
legítima a instauração da persecução criminal, em atendimento ao princípio
da obrigatoriedade.
Efetivamente, o conjunto probatório que acompanha a petição inicial
é conducente à conclusão de que existem, sim, indícios mínimos autorizadores da continuidade do procedimento criminal, já que foi descrito um fato
típico e é profundamente questionável a tese segundo a qual a identificação
do beneficiário da conduta seja elemento do tipo, de sorte que, sem ela, não
haveria como prosseguir na persecução criminal.
Demais disso, a denúncia é clara e respeitou as exigências contidas no art. 357, § 2º, do Código Eleitoral, possibilitando, assim, o exercício
da ampla defesa, o que leva à conclusão de que não é plausível a linha de
raciocínio de que haveria inépcia.
No ponto, bem salientou o Procurador Regional Eleitoral, quando
consignou em seu parecer que “O que o paciente pretende com a impetração
228
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
é antecipar na via excepcional e unilateral do habeas corpus a discussão de
mérito, com o sacrifício do direito de prova dos fatos alegados pelo Estado.
Tal não é possível, porquanto o direito ao devido processo legal também se
estende ao presentante da sociedade e do Estado no juízo criminal, que em
regra é o Ministério Público” (fl. 181).
Diante do exposto, na mesma linha adotada pelo Ministério Público Eleitoral, voto no sentido de que seja denegada a ordem de habeas
corpus.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de setembro de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 2 8 8 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 13.315-09.2008.6.05.0183
CLASSE 31
MUNICÍPIO:
Teixeira de Freitas
RECORRENTE:
Tyago Ramos de Oliveira. Advs.: Béis. Athos Batista Coelho e
Neusa Rodrigues Coelho.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 183ª Zona.
RELATOR:Juiz Salomão Viana.
REVISOR:Juiz Cássio Miranda.
Recurso criminal. Pedido de realização de perícia
grafotécnica em boletim de ocorrência policial. Desnecessidade. Indeferimento. Tipo previsto no art. 11,
III da Lei n. 6.091/74. Promoção de concentração de
eleitores por meio de transporte coletivo com o fim
de fraudar o exercício do voto. Conjunto probatório
robusto. Comprovação da prática do ilícito. Negativa
de provimento ao recurso.
01. É desnecessária a realização de perícia grafotécnica em boletim de ocorrência policial sob o fundamento de que teria havido adulteração no documento
original quando é juntada aos autos cópia autenticada do próprio documento original, cujo conteúdo é
idêntico ao do documento questionado;
02. A matéria eleitoral impõe que o Poder Judiciário
leve em conta a experiência comum, resultante da
observação do que ordinariamente acontece (CPC,
art. 335) e tal experiência é reveladora de que, infelizmente, é prática dominante nos rincões do interior
da Bahia o transporte irregular de eleitores no dia da
realização do pleito;
03. O fornecimento de transporte, de uma só vez,
no dia das eleições, a diversas pessoas que iriam
exercer o direito de votar, materializa concentração
de eleitores, com o fim de fraudar o exercício do
direito de votar, mormente quando considerado que
em municípios de pequeno porte é frequente a troca
de votos por favores ou doações;
04. Recurso a que se nega provimento.
230
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de setembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - SALOMÃO
VIANA, Juiz Relator, SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional
Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso criminal interposto por Tyago Ramos de Oliveira contra a sentença que o condenou pela prática do crime previsto no art.
11, III, da Lei n. 6.091/74, impondo-lhe a pena de 4 anos de reclusão, além
do pagamento de 200 dias-multa, com a substituição da primeira delas por
pena restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária a ser paga
à entidade privada com destinação social conhecida como “Pestalozzi”, , no
valor de 20 (vinte) salários mínimos.
Segundo a denúncia, no dia 5 de outubro de 2008, dia do primeiro
turno das eleições, por volta das 9h20, na BR-101, na altura do trevo da
Avenida Paulo Souto, o denunciado foi abordado por policiais rodoviários
federais, transportando eleitores diversos para suas seções eleitorais, num
veículo VW/Kombi, ano de fabricação e modelo 1990, de cor branca, placa
policial GSI 7101/MG. Na abordagem, também se verificou que o denunciado
não possuía habilitação para conduzir veículos automotores.
Em vista disso, o recorrente foi denunciado como incurso nas penas
a que se refere o art. 11, III, c/c o art. 5º, da Lei n. 6.091/74 e com o art. 309
do Código de Trânsito Brasileiro.
O juízo singular, porém, somente condenou o réu pelo delito de
transporte ilegal de eleitores, absolvendo-o do delito de trânsito, sob o fundamento de que não restou demonstrado o perigo de dano, previsto no tipo
legal mencionado (fls. 106/116)
Em suas razões (fls. 123/129), o recorrente pugna pelo provimento
do recurso para o fim de que seja totalmente modificada a sentença e de que
seja deferido o pedido de perícia grafotécnica no documento denominado
“Boletim de Ocorrências Policiais – Folha B3”, juntado à fl. 16 dos autos,
confirmando, assim, que o mesmo foi adulterado com a inclusão de um novo
texto, com tinta de caneta esferográfica, e não carbonada, e com caligrafia
diferente. Postula, ainda, que, após a perícia, seja ele absolvido das imputações que lhe foram feitas.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
231
JURISPRUDÊNCIA
Em contrarrazões (fls. 136/137), o Ministério Público Eleitoral
pugnou pela negativa de provimento ao recurso, posição que também foi
perfilhada pela Procuradoria Regional Eleitoral.
É o relatório, que submeto à apreciação do eminente Juiz revisor.
Salvador, BA, 06 de setembro de 2011.
VOTO
Adoto como relatóro o constante às fls.149/150 dos autos.
DO PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA NO BOLETIM
DE OCORRÊNCIA POLICIAL.
Em sua peça de recurso, o recorrente reitera o pedido de realização
de perícia grafotécnica no boletim de ocorrência policial (Folha B3), sob o
argumento de que tal documento teria sido adulterado, com a inclusão de
um novo texto, escrito com tinta e caligrafia distintas do restante do conteúdo
do documento.
A alegação, todavia, é totalmente impertinente.
Com efeito, o pleito em referência já foi objeto de decisão – aliás,
acertada decisão – pelo juízo singular, quando, na sentença, assim consignou:
“Em relação ao pedido de perícia no boletim de ocorrência
a mesma é desnecessária e protelatória, vez que há nos
autos cópia autenticada do boletim de Ocorrência Policial n.
392/2008, fornecida pela Polícia Rodoviária Federal, dando
conta que o mesmo confere com os originais. Bem como, o
fato de que os fatos na ocorrência narrados foram corroborados
com os depoimentos de Thales Ramos de Oliveira, Rosilda
Maria de Jesus, Floripes da Conceição de Jesus, Sheila Neres
de Jesus e Outros” (fl. 107).
De fato, consta nos autos cópia autenticada do boletim de ocorrência
n. 392/2008 (fls. 96/101), donde se conclui que é completamente desnecessária a realização de perícia para averiguar a autenticidade do boletim juntado
às fls. 11/16 dos autos, bastando, para tanto, que se confira este com aquele
cuja cópia autêntica encontra-se às fls. 96/101. E desta conferência resulta
a inquestionável conclusão de que os documentos são idênticos.
Por tal razão, voto no sentido de que seja indeferido o pedido de
produção de prova pericial ora formulado.
232
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
DA ANÁLISE DOS FATOS.
O recurso não merece provimento.
É que o exame dos autos revela que os fatos imputados ao ora
recorrente foram robustamente comprovados por meio da prova testemunhal
colhida no curso da instrução.
Neste passo, vale o registro de que o recorrente, quando ouvido,
tanto na fase policial quanto em juízo, confessou que realizou o transporte
irregular de eleitores, nestes termos:
“Adquiriu o referido veículo há dois anos e que o mesmo
encontrava-se em reforma, saindo da oficina de lanternagem
na sexta-feira, dia 03/10/2008, e que para ganhar um dinheirinho resolveu fazer transporte clandestino de pessoas; QUE no dia de hoje, embora não esteja vinculado
a nenhum partido ou candidato, desde as 06:00 horas da
manhã está transportando pessoas para votar, cobrando
o valor de R$ 1,00 (Um real) por pessoa; QUE por último,
estava transportando 08 (oito) pessoas, as quais conhece pelos
nomes de Maria Bernarda, Sheila Neres e Eliene de Jesus,
e que fizeram lotação no bairro São Lourenço e imediações
com destinos variados, uma na Rodoviária Nova e as outras no
Jerusalém e Castelinho; QUE o interrogado não sabe informar
se as mesmas estavam indo votar ou não, uma vez que o interrogado estava somente preocupado em ‘faturar’ um trocado
a mais, pois está desempregado; (...)” (termo de interrogatório
do acusado prestado na fase policial, fl. 9).
“lida a denúncia para o interrogado, o mesmo afirmou serem verdadeiros os fatos nela narrados; que nunca existiu
nenhum vínculo entre o denunciado e o vereador Netinho; que
estava transportando pessoas no dia da eleição e cobrava
pelo transporte das pessoas; que o transporte das pessoas
não se destinava a seções eleitorais específicas, o transporte
era feito de um lugar para o outro de forma aleatória; que no
momento da abordagem dos policiais o denunciado estava se
deslocando para o bairro Jerusalém; que o denunciado não
conhecia nenhuma das pessoas que estava transportando;
que o veículo em que o denunciado transportava as pessoas
era de sua propriedade; que à época do fato em apuração
o denunciado não tinha habilitação para dirigir veículos e
ainda não a possui; que o veículo apreendido ainda continua
apreendido; (...)” (termo de interrogatório do acusado prestado
em juízo, fls. 36/37)
Da leitura dos excertos acima reproduzidos, verifica-se que o transporte irregular de eleitores efetivamente ocorreu e que este fato se tornou
incontroverso nos autos, ante a confissão do denunciado.
O cerne da controvérsia cinge-se, pois, à comprovação do especial
fim de agir, necessário para a configuração do delito de transporte ilegal de
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
233
JURISPRUDÊNCIA
eleitores, qual seja, a finalidade específica de impedir, embaraçar ou fraudar
o exercício do voto (art. 11, III da Lei n. 6.091/74, c/c o art. 302 do CE). É
que o denunciado, em ambas as oportunidades em que foi ouvido, negou
que estivesse com esta intenção ao praticar o ato.
E quanto a isso, a prova testemunhal colhida comprovou que o
transporte irregular se deu com a finalidade de que os eleitores transportados
votassem no então candidato a vereador conhecido por “Netinho”.
Com efeito, as declarações prestadas por Thales Ramos de Oliveira, irmão do réu, são bastante esclarecedoras e demonstram, de forma
cristalina, que o transporte clandestino se deu em favor do vereador Netinho
(fls. 70/71). Este cenário foi confirmado, ainda, pelas testemunhas Rosilda
Maria de Jesus (fl. 71), Floripes da Conceição de Jesus (fl. 71) e Sheila Neres
de Jesus (fl. 71).
Por oportuno, vale transcrever trechos dos depoimentos respectivos,
nas partes que mais interessam:
“(...) que na eleição de 2008 o declarante não fez campanha
para nenhum candidato a prefeito e nem vereador; que o declarante estava na Kombi com o seu irmão Tyago, no dia
da eleição; que a Kombi era dirigida pelo denunciado e à
época não tinha habilitação, e por esta razão o denunciado chamou o declarante para juntos fazer transporte de
eleitores; que no dia da eleição o declarante encontrava-se
em sua casa, assistindo o programa Esporte Espetacular,
quando o denunciado o convidou para ir ‘ali comigo’, ou seja,
com o denunciado; tendo o declarante aceitado o convite, entrado na Kombi e daí partindo para o Bairro Tancredo Neves
e chegaram em uma casa a onde tinha cerca de 200 pessoas;
que o declarante saltou da Kombi entrou na referida casa e
ainda pediu um copo d’água; que o declarante viu quando
as pessoas que estava naquela casa exibiam o título de
eleitor e logo em seguida entraram na Kombi, cerca de 08
ou 12 pessoas, que seriam levadas para votarem na seção
do Bairro Jerusalém, e todos os eleitores já com o candidato a vereador indicado para votar, que era o candidato
‘Netinho’; que no porta luvas da Kombi, tinha santinhos
do vereador Netinho; (...) que o denunciado estava iniciando
o primeiro transporte de eleitores, quando foi abordado pela
Policia Rodoviária Federal; (...) que logo, no início do convite
do denunciado, o declarante não percebeu que era para
transporte de eleitores, na modalidade compra de votos, mas
quando chegou naquela casa no Bairro Tancredo Neves e viu
mais de 200 pessoas e todas as 200 pessoas direcionadas
para votar no candidato a vereador Netinho, o declarante desconfiou que o transporte era realmente direcionado somente
para transportar eleitores para votar no candidato a vereador
234
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Netinho; que o candidato a vereador Netinho encontrava-se
na referida casa, onde tinha mais de 200 pessoas, quando
o declarante e o denunciado chegaram; que o denunciado
propôs pagar para o declarante, de R$ 50,00 a R$ 100,00
caso ficasse transportando juntamente com o denunciado,
os eleitores; que foi o candidato a vereador Netinho quem
contratou o denunciado para transportar os eleitores;
que cada eleitor estava recebendo R$ 30,00 para votar
no candidato a vereador Netinho; (...) que a Kombi não
pertencia ao denunciado e sim, salvo engano, à Rádio a
onde o vereado Netinho trabalhava, Rádio Caraípe; (...)
afirma o declarante que as testemunhas Rosilda, Floripes
e mais duas vieram para este Fórum, para esta audiência,
trazidas pelo vereador Netinho, no seu próprio veículo, um
Celta branco; (...)” (termo de declarações prestado por Thales
Ramos de Oliveira, fls. 70/71).
“(...) que votou no candidato a vereador Netinho, mediante o
pagamento de R$ 20,00 pelo voto; que realmente estava na
casa a onde se reuniu mais de 200 eleitores para votar no
candidato a vereador Netinho; que a casa fica situada na Rua
Santa Tereza, Bairro Tancredo Neves; informa a depoente que
veio para esta audiência pelo vereador Netinho, que não teve
nenhuma orientação hoje do vereador Netinho; confirma a
depoente que todo o depoimento prestado por Thales é
a expressão da verdade; que ao receber a intimação para
esta audiência, a depoente foi até a Rádio Caraípe, a onde
o vereador Netinho trabalha, tendo o vereador Netinho
orientado à depoente a prestar o depoimento como prestara antes deste, porém, este é o depoimento verdadeiro.”
(depoimento da testemunha compromissada Rosilda Maria de
Jesus, fl. 71).
“(...) que estava na casa da Rua Santa Tereza, onde se encontrava mais de 200 eleitores para votarem no candidato a
vereador Netinho; que recebeu para votar no candidato a vereador Netinho R$ 30,00; que na quarta-feira desta semana
o vereador Netinho esteve na residência da depoente,
orientando a mesma para que prestasse o depoimento,
conforme ela falou no seu primeiro depoimento, o qual
retifica em todos os seus termos, porque ‘a mentira tem
pernas curtas’; que todas as pessoas que estavam na Kombi no dia em que houve a abordagem da Polícia Rodoviária
Federal, trabalharam na campanha do vereador Netinho e
iam votar no candidato para vereador Netinho; confirma a
depoente que no porta luvas da Kombi tinha santinho do
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
235
JURISPRUDÊNCIA
candidato a vereador Netinho; confirma a depoente que
todo o depoimento prestado por Thales é a expressão da
verdade.” (depoimento da testemunha compromissada Floripes da Conceição de Jesus, fl. 71).
“(...) que estava na Kombi dirigida pelo o denunciado quando
houve a abordagem pela Polícia Rodoviária Federal; que as
testemunhas Rosilda e Floripes estavam na Kombi; que Thales
também estava na Kombi; (...) que retifica o seu depoimento e
confirma de que recebeu cerca de R$ 20,00 ou R$ 30,00 para
trabalhar no dia da eleição para o candidato para revereador
Netinho; que veio para este Fórum em um veículo de cor
branca não sabendo a quem pertence o carro, mas o referido
veículo foi buscar a depoente na sua casa; (...) que antes
desta audiência a depoente ligou para o vereador Netinho e
obteve do vereador sobre o que falar nesta assentada; (...).”
(depoimento da testemunha compromissada Sheila Neres de
Jesus, fl. 71).
É bastante um exame do conjunto dos depoimentos prestados
para se concluir que as testemunhas foram convergentes em confirmar que
houve a prática do ilícito, tendo ficado demonstrada, além da realização do
transporte coletivo de eleitores, a finalidade específica de fraudar o exercício
do direito de voto.
Ao lado disso, há uma peculiaridade nos depoimentos prestados pelas três últimas testemunhas. É que elas apresentaram duas versões distintas
quando ouvidas em juízo. A verdade, porém, é que há fortes indícios de que
as primeiras versões apresentadas decorreram de orientação do candidato
beneficiado para que elas depusessem em favor do denunciado. Tanto que
elas próprias confirmaram este fato ao serem reinquiridas.
Concluo, destarte, que o recorrente praticou, sim, o ato ilícito cuja
autoria lhe é imputada, já que, ao fornecer o transporte, de uma só vez, a
diversas pessoas que iriam exercer o direito de votar, resultou promovendo,
no dia da eleição, sob a forma de transporte coletivo, uma concentração de
eleitores, com o fim de fraudar o exercício do direito de votar, pois o seu objetivo, inequivocamente, era o de que aqueles eleitores direcionassem seus
votos para o candidato a vereador “Netinho”.
De mais a mais, as circunstâncias que brotaram nos autos impõem
que o Poder Judiciário leve em conta que o fato se deu no dia das eleições.
E aí a experiência comum, resultante da observação do que ordinariamente
acontece (CPC, art. 335), revela que, infelizmente, a prática dominante nos
rincões do interior da Bahia é o transporte irregular de eleitores no dia da
realização do pleito.
236
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Aliás, não deve ter sido outro o motivo pelo qual o veículo fretado
pelo recorrente foi flagrado: os órgãos de fiscalização adotaram medidas com
o objetivo de coibir a prática dominante.
Os atos praticados se subsumem, pois, à norma antigamente contida no 302 do Código Eleitoral e que, hoje, se encontra insculpida no art. 11,
III da Lei n. 6.091, de 15 de agosto de 1974.
À vista do exposto, voto no sentido de que seja negado provimento
ao recurso, com a manutenção, na íntegra, da sentença vergastada.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 22 de setembro de 2011.
Salomão Viana
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
237
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 2 9 7 / 2 0 11
RECURSO CRIMINAL
PROCESSO Nº 1.087-61.2011.6.05.0000
CLASSE 31
MUNICÍPIO:
Paulo Afonso
RECORRENTE:
Alberto Gomes da Cruz. Advs.: Béis. Manuel Natividade, Gláucio
de Assis Natividade e Elizabeth Guedes de Carvalho Pimentel.
RECORRIDO:
Ministério Público Eleitoral.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 84ª Zona.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
REVISOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso Criminal. Ação Penal. Código Eleitoral, art.
302. Lei nº 6.091/74. Transporte ilegal de eleitores.
Não caracterização da conduta. Ausência de dolo
específico. Provimento.
Preliminar de nulidade da sentença.
Rejeita-se a prefacial tendo em vista que o prazo
concedido ao Ministério Público para oferecimento
da denúncia é impróprio, sem consequências processuais. Ademais, não se deve pronunciar nulidade
quando do mérito o juiz puder decidir a favor da parte
a quem esta aproveite.
Mérito.
Dá-se provimento ao recurso para reformar a decisão
que julgou procedente a ação penal por transporte
ilegal de eleitores, quando não ficou comprovado o
dolo específico do recorrente em cooptar ilicitamente
intenções de voto.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR e, no mérito, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que
passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 26 de setembro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
238
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso Criminal aviado por Alberto Gomes da Cruz,
em face de sentença, de fls. 81/86, do Juízo Eleitoral da 84ª Zona/Paulo
Afonso, que julgou procedente a Ação Penal proposta com embasamento
na acusação de transporte ilegal de eleitores.
Em sede de razões (fls. 99/100) o recorrente alega, previamente,
nulidade do processo porquanto não observado o prazo legal de 10 dias,
contado da prática da infração, para o oferecimento da denúncia. No mérito,
aduz que não existiu o dolo específico, consistente em impedir, embaraçar ou
mesmo fraudar a livre manifestação do voto, indispensável à caracterização
do delito que lhe foi imputado. Por fim, requer a reforma da decisão que o
condenou.
O recorrido em sede de contra-razões (fls. 104/105) alega que a
configuração do crime ficou comprovada diante da instrução criminal. Sendo
assim, pugnou pela manutenção da sentença recorrida.
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral se manifestou
(fl. 109/110) pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 112 dos autos.
ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO FEITO.
Entendo que não merece acolhimento a aludida nulidade.
Argúi o recorrente a nulidade do processo ao argumento de que
não teria sido observado o prazo de 10 (dez) dias entre a pretensa infração
penal e o oferecimento da denúncia.
Primeiro, insta destacar que não houve ocorrência de prescrição da
pretensão punitiva estatal; depois, o prazo para oferecimento da denúncia por
parte do Ministério Público não é peremptório, de tal modo que não restou
prejudicada a ação penal.
Neste sentido, vejamos o posicionamento do STJ em feito da Relatoria do Ministro Félix Fisher:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS (EC
Nº 22/99). TRÁFICO DE DROGAS. DEMORA NO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO
PENAL.
I - Não acarreta, por si, extinção da punibilidade e nem preclusão, a inobservância de prazo para o oferecimento da denúncia
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
239
JURISPRUDÊNCIA
em crime de ação penal pública. (HC 9599 RJ 1999/0046176-2.
Relator(a): Ministro FELIX FISCHER. Julgamento: 14/06/1999.
Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA. Publicação: DJ
16.08.1999 p. 87.)
Neste mesmo sentido se posiciona o Tribunal Regional Federal da
4a Região:
INQUÉRITO POLICIAL Nº 2005.04.01.023856-4/SC. RELATOR. DES. FEDERAL TADAAQUI HIROSE. DJU de
16.11.2006.
EMENTA: PROCESSO PENAL. NOTÍCIA-CRIME. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. PRAZO. ART. 46, CPP. CRIMES
CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. GESTÃO TEMERÁRIA.
LEI Nº 7.492/86, ART. 4º, PARÁGRAFO ÚNICO. DEPUTADO
ESTADUAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO EM ABSTRATO.
1. O art. 46 do CPP estabelece o prazo de 15 dias, contados
do recebimento do inquérito ou das peças de informação,
para que o Ministério Público ofereça a denúncia. Inexiste
preclusão quanto a esse prazo, que é denominado processual
impróprio. Gera mera irregularidade, que pode ser alegada
em um eventual pleito de liberdade provisória, por exemplo,
mas não macula a ação penal; Por fim, dispõe o art. 249,
§ 2°, do Código de Processo Civil, que o juiz não pronunciará
a nulidade quando puder decidir do mérito a favor da parte a
quem esta aproveite.
Assim, diante da jurisprudência que importa a regra contida no art.
249, § 2° do CPC para a seara criminal e tendo em conta que os argumentos acerca do vício em apreço não se sustentam pelo fato de que a o prazo
em questão é impróprio e gera mera irregularidade, rejeito a alegação de
nulidade do feito.
MÉRITO.
Após me debruçar sobre os autos, chego à conclusão de que merece
acolhimento a pretensão recursal.
Primeiramente, é necessário que se descreva o fato sobre o qual
recai a presente demanda, qual seja: transporte ilegal de eleitores, configurando violação ao disposto no art. 11, III, c/c art. 5° da Lei nº 6.091/74.
O Ministério Público Zonal alega na denúncia que o réu, ora recorrente, praticou o delito acima mencionado, por ter transportado os Srs.
Valdemar José de Farias e José Manoel de Sá do Povoado Agrovila III para
votar no Povoado Quixaba, ambos na cidade de Glória/BA, no dia 06 de
outubro de 2002.
240
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Com efeito, insta salientar alguns aspectos relevantes das provas
colhidas durante a instrução criminal.
Inicialmente, tem-se que o réu, em depoimento pessoal (fl. 53), não
nega o fato de ter transportado duas pessoas em seu automóvel no dia da
eleição, de tal modo que este acontecimento é incontroverso.
Por outro lado, não é possível ignorar as informações prestadas
pelo depoente José Manoel de Sá, devidamente compromissado na forma
da lei, no sentido de que:
José Manoel de Sá – fl. 64:
“Que o depoente é primo carnal do acusado; Que a genitora do
acusado é irmã do pai do depoente; Que confirma o teor do seu
depoimento prestado ao delegado de polícia constante às fls.
16; Que o depoente reside na Fazenda Gato e que na época
dos fatos da denúncia votava no Povoado Quixaba; Que o depoente acha que dá mais de 10KM entre as duas localidades;
Que após o fato da denúncia, o depoente transferiu o seu título
para votar na Agrovila 5, que é perto da casa do doente; Que
o acusado apenas transportou o depoente e o Sr. Valdemar
José de Farias o qual também votava na Quixaba.”
Na mesma linha trilha o Sr. Valdemar José de Farias, ao dizer que:
Valdemar José de Farias – fl. 65:
“Que o acusado é casado com a prima longe do depoente;
Que o depoente confirma que no dia dos fatos prescritos na
denúncia o depoente e o Sr. José Manoel de Sá iam votar na
Quixaba e por isso estavam na beira da estrada aguardando
condução, quando por ali passou o acusado, dirigindo um
veículo tipo pampa, tendo o depoente dado com a mão e o
acusado parou o carro; Que Alberto Gomes da Cruz conduziu o depoente até o Povoado Quixaba, onde votava; Que o
acusado transportou tão somente o depoente e José Manoel
de Sá; Que do local onde o depoente reside até o Povoado
Quixaba dista cerca de quatro léguas [...] [...] Que o depoente
não sabe dizer se havia veículos da Justiça Eleitoral para
transportar os eleitores”.
À luz dos elementos coligidos ao caderno processual, vejamos as
disposições contidas nos arts. 11, III e 5º da Lei nº 6.091/74:
“Art. 5º Nenhum veículo ou embarcação poderá fazer transporte de eleitores desde o dia anterior até o posterior à eleição,
salvo:
I - a serviço da Justiça Eleitoral;
II - coletivos de linhas regulares e não fretados;
III - de uso individual do proprietário, para o exercício do próprio
voto e dos membros da sua família;
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
241
JURISPRUDÊNCIA
IV - o serviço normal, sem finalidade eleitoral, de veículos de
aluguel não atingidos pela requisição de que trata o Art. 2.”
...
“Art. 11 - Constitui crime eleitoral:
(...)
III - descumprir a proibição dos artigos 5, 8 e 10:
Pena - reclusão de quatro a seis anos e pagamento de 200 a
300 dias multa (Art. 302 do Código Eleitoral);”
Por oportuno, cumpre asseverar que o art. 11 do dispositivo supra
mencionado nos remete expressamente ao art. 302 do Código Eleitoral, que
determina:
“Art. 302. Promover, no dia da eleição, com o fim de impedir,
embaraçar ou fraudar o exercício do voto a concentração de
eleitores, sob qualquer forma, inclusive o fornecimento gratuito
de alimento e transporte coletivo:
Pena - reclusão de quatro (4) a seis (6) anos e pagamento de
200 a 300 dias-multa.”
Sendo assim, em uma interpretação sistemática e teleológica, forçoso reconhecer que a configuração do ilícito está diretamente relacionada
ao dolo específico de impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto, o
que não ficou provado nos autos da presente demanda.
Considero pertinente trazer à baila o entendimento esposado pelo
douto Procurador Regional Eleitoral Auxiliar, que trilha por esta mesma linha
(fls. 109/110):
“A prova colhida demonstrou a autoria e materialidade de fato
capitulável no art. 11, inciso III, da Lei 6.091/74. Contudo, não
ficou demonstrado o dolo. Ao dar carona a dois eleitores, o
réu/recorrente apenas cumpriu um costume muito comum em
áreas rurais. Não ficando provada cabalmente a sua intenção
de cooptar eleitores para este ou aquele candidato, não é
possível condená-los por este crime”.
Ademais, em que pesem as alegações de José Manoel no sentido de que é “primo carnal” do acusado e de Valdemar José de Farias, no
sentido de que o acusado é casado com uma prima sua, o que em tese e,
por si só, já afastaria os comandos contidos no supramencionado art. 5º, o
magistrado zonal passou ao largo desta questão, decidindo ainda assim pela
condenação do réu.
Em verdade, está-se diante de uma situação que não merece atrair
sanção de natureza criminal, visto que, em verdade, está evidente o simples
oferecimento de carona a um membro da família e a um conhecido, sem
quaisquer repercussões eleitorais.
242
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Neste passo, destaco jurisprudência desta Corte que se adequa
perfeitamente aos fatos aqui discutidos:
“Recurso criminal. Transporte ilegal de eleitores. Dolo específico. Ausência. Desprovimento.
Deve ser mantida decisão que absolveu os Recorridos considerando-se não ter restado demonstrada a prática de transporte
de eleitores com a finalidade específica de aliciar votos.”
(TRE-BA, RECR nº 07, Feira de Santana – BA, Relator. José
Maurício Vasconcelos Coqueiro, publicado em 16 de março
de 2009).
Diante de tudo que foi exposto, reiterando a ausência do dolo específico para a configuração do tipo penal, na esteira do parecer ministerial,
voto no sentido de dar provimento ao recurso, reformando a decisão zonal.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 26 de setembro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
243
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 3 0 4 / 2 0 11
RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA
PROCESSO Nº 647 (1.69.2008.6.05.0191)
CLASSE 29
MUNICÍPIO:
Capim Grosso
RECORRENTE:
Coligação CAPIM GROSSO PAZ E PROGRESSO. Adv.: Bel.
José Souza Pires.
RECORRIDOS:
Itamar da Silva Rios (Advs.: Béis. Luiz Viana Queiroz, Marcio
Moreira Ferreira e Maurício Oliveira Campos) e João Dias de
Souza (Adv.: Bel. Epifânio Dias Filho).
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 191ª Zona.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
REVISOR:
Juiz Salomão Viana.
Recurso contra expedição de diploma. Abuso de
poder econômico e político. Captação ilícita de
sufrágio. Captação e gastos ilícitos de recursos.
Rejeição de contas municipais. Existência de provas
que demonstram o cometimento de abuso de poder
político e econômico. Provimento.
Preliminar de ausência de prova pré-constituída.
Rejeita-se a preliminar, porquanto, não bastasse
a juntada aos autos de provas aptas a subsidiar a
interposição do RCED, o entendimento do TSE é no
sentido de que o requisito da prova pré-constituída
não é mais obrigatório, sendo facultado às partes
requerer a produção de provas durante o andamento
do feito, desde que indicados na petição inicial.
Mérito.
Dá-se provimento a recurso contra expedição de diploma, diante da existência de lastro probatório apto
a demonstrar que os recorridos violaram as regras
legalmente estabelecidas, afetando a lisura do pleito
e a paridade de armas entre os concorrentes.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR, no mérito, DAR PROVIMENTO
AO RECURSO e, por maioria, vencidos o Revisor e o Juiz Cássio Miranda,
244
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
APLICAR A INELEGIBILIDADE POR TRÊS ANOS, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 27 de setembro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral .
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso Contra Expedição de Diploma, interposto pela
Coligação “Capim Grosso Paz e Progresso” em face de Itamar da Silva Rios
e João Dias de Souza, sob alegação de captação ilícita de sufrágio, abuso
de poder econômico, abuso de poder político, captação e gastos ilícitos de
recursos e condutas vedadas aos agentes públicos.
Em suas razões de fls. 21/35, a Coligação “Capim Grosso Paz e
Progresso” imputa aos recorridos as seguintes condutas: abuso de poder
político em festa junina; gasto e arrecadação irregular de recursos eleitorais;
utilização de servidores públicos em campanha; concessão de vantagem
indevida a cidadãos com recursos públicos; extrapolamento do valor máximo
de gastos de recursos informados à Justiça Eleitoral; abuso de poder por
contratação irregular de servidores e captação ilícita de sufrágio. Alegam,
ainda, que os diplomas expedidos devem ser desconstituídos em razão da
rejeição das contas municipais dos exercícios de 2006 e 2007.
Em suas contrarrazões de fls. 2.680/2.703 e 2.844/2.865, os recorridos pugnam, inicialmente, pelo não conhecimento do recurso, ao argumento
de que não há nos autos prova pré-constituída. No mérito, requerem seja
negado provimento à presente demanda.
Instado a opinar, o Procurador Regional Eleitoral com assento nesta
Corte exarou manifestação pela rejeição da preliminar aventada e, no mérito,
pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Adoto como relatório o constante à fl. 3377 dos autos.
PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA.
Afirmam os recorridos que o presente RCED não deve ser conhecido, em razão de falta de prova pré-constituída apta a comprovar os fatos
alegados pela recorrente.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
245
JURISPRUDÊNCIA
Não merece acolhimento a preliminar, pois a acionante colacionou
aos autos, como meio de prova, cópia das Ações de Investigação Judicial
Eleitoral de nos 1.459, 1.443, 1.802 e 1789, documentos relativos à prestação
de contas dos recorridos, bem como CD’s que compunham os retromencionados feitos, dentre outras provas.
Não obstante a documentação acostada, o atual entendimento
do TSE é no sentido de que é prescindível a prova pré-constituída, já que é
possível a produção, durante a tramitação do recurso contra a expedição de
diploma, de todos os meios lícitos de prova, desde que indicados na petição
inicial. É o que podemos aferir deste precedente abaixo transcrito:
ELEIÇÕES 2006. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE
DIPLOMA. ART. 262, IV, DO CÓDIGO ELEITORAL. DEPUTADO ESTADUAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E DE
AUTORIDADE. DESPROVIMENTO.
1. Para que a petição inicial seja apta, é suficiente que descreva
os fatos que, em tese, configuram ilícitos eleitorais.
Precedentes.
2. Esta Corte já assentou a possibilidade de produção, no
Recurso Contra Expedição de Diploma, de todos os meios
lícitos de prova, desde que indicados na petição inicial,
não havendo o requisito da prova pré-constituída.
3. É assente neste Tribunal o entendimento de que a ação de
impugnação de mandato eletivo, a ação de investigação judicial
eleitoral e o recurso contra expedição de diploma são instrumentos processuais autônomos com causa de pedir própria.
4. A utilização de recursos financeiros na campanha eleitoral
em desconformidade com o que determina a Lei das Eleições
não é suficiente, por si só, à caracterização de abuso, sendo
necessária a comprovação do potencial lesivo da conduta.
5. O conjunto probatório dos autos não permite concluir que
tenha havido abuso de poder político e de autoridade.
6. Recurso Desprovido.
(RCED n. 767, julgado em 04.02.2010. Relator: Ministro Marcelo Ribeiro).
Pelo exposto, não acolho a preliminar.
MÉRITO.
Conforme relatado, trata-se de recurso contra expedição de diploma
ajuizado em face de Itamar da Silva Rios e João Dias de Souza, sob alegação
de captação ilícita de sufrágio, arrecadação e gastos ilícitos de recursos, conduta vedada aos agentes públicos e abuso de poder econômico e político.
Primeiramente, cumpre esclarecer que os fatos em apreço neste
recurso, em sua maioria, foram discutidos em sede das AIJE’s nos 1.459,
1.443, 1.802 e 1.789, já apreciadas por este Regional.
246
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
O litígio em análise funda-se nos seguintes fatos alegados pelo
recorrente: a) suposta afronta às normas eleitorais no ensejo da realização
da festa junina de 2008 no Município de Capim Grosso; b) compra de votos
mediante promessa de material esportivo para um time de futebol local; c)
utilização de servidores públicos em campanha; d) concessão de vantagem
indevida a cidadãos com utilização de recursos públicos; e) contratação irregular de servidores; f) gastos e arrecadação irregulares de recursos, abuso
de poder econômico e captação ilícita de sufrágio; g) extrapolação dos limites
de gastos de campanha informados à Justiça Eleitoral pelos ora recorridos;
e h) rejeição de contas municipais dos exercícios de 2006 e 2007.
Passo, então, à análise de cada um deles.
A) DO ABUSO DE PODER POLÍTICO EM FESTA JUNINA.
No que toca aos festejos juninos, verifico que o conjunto probatório
carreado aos autos demonstra que o prefeito local efetivamente participou da
festa típica, adotando, porém, comportamento plenamente lícito.
Não há como concluir que o gestor municipal se valeu da festa junina
do município para promover sua reeleição, como pretende a recorrente, pois
sequer era candidato ao tempo do evento. Demais disso, quando indagado
acerca da realização da festa de São João no ano seguinte, Itamar da Silva
Rios teve o bom senso de destacar que estaria ocupando oficialmente o cargo
de prefeito municipal até o dia 31 de dezembro de 2008.
Do mesmo modo, o arremesso de CDs promocionais que, ao que
tudo indica, foram fornecidos pela própria banda, não serve como prova do
cometimento do aludido ilícito eleitoral.
B) COMPRA DE VOTOS MEDIANTE PROMESSA DE MATERIAL
ESPORTIVO PARA TIME DE FUTEBOL LOCAL.
Também não restou provada a promessa de doação de material
esportivo em troca de votos.
Do exame da cópia da degravação de uma reunião promovida pela
primeira dama do município e pelo candidato a vereador Sandoval Vilas Boas
com jovens do Bairro Sacramento, trazida aos autos às fls. 2500/2505, oriunda
da AIJE nº 1.789, não podemos aferir nenhuma concessão ou promessa de
vantagem em troca de voto.
No referido documento, inclusive, afirma a primeira dama que repudia a compra de votos, aconselhando os jovens a nunca venderem o seu
direito político supremo.
Ademais, ainda que restasse demonstrado o pedido de voto, a exigida anuência do candidato beneficiário não foi comprovada. Não é possível a
presunção acerca do consentimento do recorrido somente porque o suposto
ilícito tivesse sido praticado pela sua esposa.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
247
JURISPRUDÊNCIA
C) UTILIZAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS EM CAMPANHA
ELEITORAL.
No que concerne à alegação de utilização de servidores públicos
em campanha eleitoral, não há configuração de qualquer ilícito, porquanto
inexiste norma que proíba o servidor de participar de campanha do seu candidato predileto, contanto que não o faça em horário normal de expediente,
conforme dispõe o art. 73, III da Lei nº 9.504/97.
Aos fólios foi juntada documentação comprovando que existiam
servidores públicos participando de campanha eleitoral, todavia, não ficou
demonstrado que isto ocorria durante o horário de trabalho.
Não obstante o afastamento das acusações até então mencionadas,
restou evidente nos autos a prática de ilicitudes outras, que conspurcaram
absolutamente o resultado do prélio eleitoral de 2008 no Município de Capim
Grosso.
É sobre estas questões que passo a me debruçar neste átimo.
D) DA CONCESSÃO DE VANTAGEM INDEVIDA A CIDADÃOS E
DAS CONTRATAÇÕES IRREGULARES DE SERVIDORES.
Conforme consignado nos outros feitos, Itamar da Silva Rios, na
qualidade de prefeito, em 28 de março de 2008, fez publicar o edital de
n° 31/2008 (fls. 1881/1886), por meio do qual promoveu a abertura de concurso público para o preenchimento de 146 cargos municipais.
A realização do certame, todavia, foi obstada por um provimento
liminar exarado em sede de ação cautelar preparatória, ajuizada por Josefa
Iodália de Oliveira Souza e Hildete Silva Rios de Carvalho, membros da
Câmara Municipal de Capim Grosso.
Dias após a concessão da medida liminar, foi publicado o Decreto
Municipal n°434/2008 (fls. 1915/1917), autorizando a contratação temporária
de pessoal para atender a interesse público, constando do referido ato normativo que as contratações não poderiam ultrapassar o total de 296 vagas
e teriam o prazo de 6 meses, com a possibilidade de prorrogação por mais
3 meses.
Como se não bastasse, conforme se depreende dos documentos
de fls. 1918 e 1920, foram instituídos os Decretos Municipais de n°s 437 e
446/08, que, respectivamente, permitia a contratação de 100 professores e
declarava estado de emergência no município, autorizando a contratação de
servidores sem especificação de vagas.
Diante desses fatos, entre maio a junho do ano em que se realizou
o pleito eleitoral foram contratadas 272 pessoas para prestação de serviços,
sem o devido processo seletivo.
248
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
As justificativas sobre a epidemia de dengue somada à decretação
do estado de emergência não justificam a contratação da maior parte dos
profissionais, como é o caso dos cem professores, por exemplo.
Para ratificar o que apresenta o acervo documental, válida é a
transcrição de alguns depoimentos:
Que tem ciência da existência de contratações irregulares no
município de Capim Grosso; que entende como contratação
irregular aquela feita sem nenhum critério e sem que tenha
sido dada oportunidade a outras pessoas; que tem visto essas contratações na área de agentes de saúde e também em
postos de saúde; que as pessoas que chegavam no ponto
de apoio dos agentes de endemias dizendo que foram
indicadas por vereadores ou pelo Prefeito; que essas
pessoas falavam diretamente com o coordenador, o qual
entrava em contato com o prefeito e, após, começavam a
trabalhar; que a maioria das pessoas que chegam no ponto
de apoio, chegam dessa maneira; que essas pessoas são
contratadas como agente de saúde. [...] que as pessoas
contratadas apresentavam no posto uma ordem escrita onde
se consignava a indicação para que a pessoa exercesse o
cargo; que já viu uma dessas ordens, mas a mesma não estava
assinada, tendo o portador dito ao coordenador que foi indicada
pelo vereador EDNON. [...] que não eram pedidos currículos
dos contratados. [...]. (grifou-se).
(Depoimento prestado por Amilton José Santos Brito, nos autos
da AIJE 1459/2008 - fls. 1948/1950).
[...] que trabalha como agente de saúde há 9 anos, dos quais
8 anos como concursada; que no setor de esquistossomose
existem 13 pessoas contratadas e quatro concursadas; que
as pessoas foram contratadas nos meses de maio, junho e
julho, época em que também foram chamadas pessoas do
concurso. [...] que as pessoas contratadas se apresentam
com ordens de vereadores ou após determinação do
Prefeito ao chefe; que já viu diversas ordens assinadas
por vereadores se recordando com precisão de ordens
assinadas pelos vereadores ELUIZIO, ELGA; que também
já viu pessoas que trabalham no setor assinarem ordens para
contratação, tais como Josemir, que era chefe de transportes
e Ednon, que é vereador; que o chefe se chama Moraes e
quando este recebe a ordem, diz ao portador que conversará
com quem assinou e com o próprio Prefeito, para averiguar a
ordem; que tais ordens são escritas em papéis sem qualquer
formalidade, inclusive já viu ordens assinadas em guardanapos.
[...] que, como havia muita demanda para exame, em razão do
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
249
JURISPRUDÊNCIA
número alto de pessoas contratadas, o microscópio quebrou,
sendo que os agentes estão apenas cumprindo horário, sem
trabalhar efetivamente. [...] que o aumento do número de
agentes piorou a qualidade dos serviços, já que o aumento
do número de laminas quebrou o microscópio e mofaram as
amostras, bem assim aumentou o tempo de visitação em cada
casa, já que ao invés de passar para outra residência o agente
tem que passar treinamento para os outros. (grifou-se).
(Depoimento prestado por Alexandra Rios Oliveira nos autos
da AIJE 1459/2008 - fls. 1951/1953).
[...] que exerceu o cargo de secretário de transportes na
gestão do atual prefeito, até o início do presente ano, tendo
sido exonerado em virtude de ser irmão do vereador Ednon,
por imputação de prática de nepotismo; [...] que os contratos
foram levados a termo pelo prefeito; [...] que não houve processo seletivo para a contratação de motoristas, tendo
o depoente alegado ao prefeito estado emergencial; [...].
(grifou-se).
(Depoimento prestado por Josemir Rios de Queiroz nos autos
da AIJE 1459/2008 - fls. 1979/1980).
Diante disto, entendo que restou configurada a prática de conduta
vedada aos agentes públicos, bem como o abuso de poder político, consoante
conclusão desta Corte manifestada no julgamento simultâneo dos Recursos
Eleitorais nos. 13.176-33, 14.563-83, 14.564-68, 14.606-20 e 15.175-84.
E) GASTOS E ARRECADAÇÕES IRREGULARES DE RECURSOS,
ABUSO DE PODER ECONOMICO E CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO.
Avançando sobre as demais alegações, chama a atenção o fato
de que o valor de R$30.000,00, referente ao extrapolamento dos gastos de
campanha declarados inicialmente, é muito próximo dos R$26.760,00 utilizados para o pagamento de 669 pessoas na antevéspera da eleição de 2008
(conforme expediente de fls. 7196/7262 do Processo nº 1.812/09).
O recorrido, no ensejo da prestação de contas de campanha, apresentou relação fictícia de apenas 10 credores de campanha que fariam jus
ao recebimento do valor acima mencionado.
Todavia, da análise do Processo n° 1.802/08, cuja cópia integra
os presentes autos, verifica-se que o montante de R$26.760,00 foi utilizado
para o pagamento de mais de seiscentas pessoas, identificadas pelo candidato como funcionários de campanha, mediante petição assinada de próprio
punho, dirigida ao Juízo Zonal.
Para uma melhor elucidação dos fatos, destaco que o magistrado
250
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
zonal, no ano de 2008, cientificando-se acerca da ocorrência de saques de
valores elevados na semana anterior ao pleito, com o escopo de evitar a
prática de determinados ilícitos eleitorais, exarou a Portaria n° 15, determinando que as agências bancárias locais não autorizassem saques acima de
R$2.000,00.
Diante do empecilho da Justiça, Itamar da Silva Rios apresentou
petição requerendo saque no valor de R$ 27.250,00 para pagamento de
supostos funcionários de campanha.
Neste diapasão, cumpre asseverar que a relação nominal apresentada pelo candidato contava com 757 pessoas (fls. 515/540).
Após o indeferimento do pedido, o juiz reconsiderou a sua decisão,
autorizando a utilização da quantia, desde que o adimplemento das obrigações
do então candidato para com os seus funcionários somente pudesse ocorrer
mediante ordem de pagamento bancária.
Às fls. 548/573 do presente RCED, foi acostada cópia do Processo
n° 1.802/08, onde consta documentação fornecida pelo Banco Bradesco da
qual se extrai que, em 02 de outubro de 2008, seiscentas e sessenta e nove
pessoas foram beneficiadas com o recebimento da quantia de quarenta reais
cada uma, totalizando o montante de R$26.760,00.
Não nos parece razoável a tese da defesa, quando alega que o candidato agiu de boa-fé ao fazer com que os recursos financeiros transitassem
pela conta de campanha, em atenção à autorização judicial.
A fim de refutar, de imediato, tal alegação, deve-se salientar que
esse foi o único meio encontrado pelos recorridos para realizar os supostos
pagamentos, uma vez que, consoante já mencionado, havia uma portaria
da lavra do magistrado zonal que proibia a realização de saques em valor
superior a R$2.000,00.
Assim, a justificativa de boa-fé por parte dos recorridos, desacompanhada de outros fatores, é de pouca valia.
Ademais, as alegações no sentido de que os limites de gastos com
a campanha foram excedidos por conta de um erro de digitação do contador
não merecem prestígio, pois, somente após a rejeição das contas eleitorais
é que a recorrente passou a defender a referida tese.
Por entender que o número de 669 funcionários de campanha é
demais elevado para o porte do Município de Capim Grosso, verifico que o
intuito dos recorridos foi mesmo de cooptar votos de forma ilícita, beneficiando
inúmeros eleitores, 48 horas antes das votações, em manifesto abuso de
poder econômico, também reconhecido nos feitos anteriormente julgados
por esta Corte.
Outrossim, a respeito da realização de despesas antes da abertura
da conta bancária, quais sejam: R$200,07 a João Soares Lima, R$836,00
a Rubem Araújo, R$5.003,82 a Rogeres Magno Vilas Boas e R$357,20 a
Antonio Silva, entendo que as irregularidades não merecem maiores reperSemest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
251
JURISPRUDÊNCIA
cussões, pois representam pequenos valores no que se refere ao contexto
da campanha e pelo fato de terem sido pagas através de cheques da conta
eleitoral, com a devida consignação.
No que se refere à alegação de simulação de aluguel de veículos
para captação ilícita de votos e ausência de descrição de despesa referente
a aluguel de dois ônibus e outros gastos ordinários, não existem provas nos
autos capazes de corroborá-la.
F) EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES DE GASTOS DE CAMPANHA
INFORMADOS À JUSTIÇA ELEITORAL
A ultrapassagem dos limites de gastos de campanha informados
à Justiça Eleitoral também restou comprovada, existindo fortes indícios de
que esta irregularidade está intimamente relacionada ao abuso de poder
econômico perpetrado mediante o beneficiamento de mais de seiscentos
eleitores.
Conforme consta nos autos, o candidato, na sua prestação de
contas de campanha, informa que arrecadou recursos em dinheiro no valor
de R$200.569,68. Todavia, da análise de suas contas bancárias, verificase um excedente de R$30.000,00 (fl. 1.416), - quantia muita próxima dos
R$26.760,00 utilizados para o pagamento de 669 pessoas -, referente a uma
receita de origem não identificada, creditada no dia 10/09/08, sob a rubrica
de transferência de valores entre contas.
G) REJEIÇÃO DE CONTAS MUNICIPAIS DOS EXERCÍCIOS DE
2006 E 2007.
Por fim, aduz a recorrente que as contas dos exercícios de 2006
e 2007 do Município de Capim Grosso, geridas pelo candidato à reeleição,
ora recorrido, foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios do
Estado da Bahia, conforme Pareceres Prévios de nos 280/08 e 519/08, por
irregularidades insanáveis que culminaram, inclusive, com a imputação de
multa ao gestor.
Alega, outrossim, que as contas de 2006 foram rejeitadas também
pela Câmara de Vereadores, por decurso de prazo, através do Decreto Legislativo n° 008/2008.
De fato, o recorrido teve suas contas desaprovadas pelo Tribunal
de Contas dos Municípios, mas este fato, por si só, não acarreta as consequências almejadas pela recorrente.
CONCLUSÃO.
Diante de tudo o que foi exposto, entendo que restou explícita a
quebra da isonomia entre os candidatos que disputaram a eleição municipal
passada, maculada por manifesto abuso de poder econômico perpetrado
pelos ora recorridos.
252
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
É cediço que a potencialidade lesiva das condutas nos feitos eleitorais não deve ser aferida por meio de raciocínio cartesiano, em que se
verifique se o ato ilícito influenciou eleitores em quantidade maior ou igual à
diferença de votos entre o primeiro e segundo colocados.
Mesmo assim, não se pode olvidar que a diferença de 441 votos foi
facilmente suplantada pelas 272 contratações temporárias, sem realização
de processo seletivo, e pela distribuição de quarenta reais a 669 pessoas.
Importante ressaltar que os critérios de contratação suscitados pela
recorrente em suas razões não são suficientes para afastar a extensão e o
impacto político gerado pelo oferecimento de garantia de emprego, ainda que
provisório, a parcela considerável do eleitorado local.
Evidente, desta feita, o uso desvirtuado dos recursos arrecadados
e da máquina pública em favor da campanha dos candidatos eleitos.
É por essas razões que voto no sentido de dar provimento ao
presente recurso contra expedição de diploma, a fim de que sejam cassados os diplomas dos recorridos, anulando-se os votos por eles recebidos e
determinando-se, por conseguinte, a realização de eleições indiretas, em
atenção aos comandos do art. 224 do Código Eleitoral conjugados com o
art. 81 da Constituição Federal.
Ademais, ressaltando meu posicionamento quanto a não concessão de eficácia retroativa à Lei Complementar nº 135/2010 para atingir fatos
concernentes à eleições pretéritas, é que voto pela inelegibilidade de Itamar
da Silva Rios e João Dias de Souza, por três anos, a partir da data da eleição em que foram cometidas as ilicitudes, com fulcro na Lei Complementar
nº 64/90.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 27 de setembro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
253
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 3 3 9 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 15.240-22.2009.6.05.0113
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Riacho de Santana
RECORRENTES: Coligação RIACHO EM BOAS MÃOS, Partido dos Trabalhadores
– PT de Riacho de Santana e Fábio Ricardo Guimarães Castro.
Advs.: Béis. Custódio Lacerda Brito, Éder Adriano Neves David
e João Carlos Silva Aguiar Soriano.
RECORRIDOS:
Tito Eugênio Cardoso de Castro, João Daniel Machado de
Castro e Alexandre Hermenegildo Cardoso de Castro. Advs.:
Béis. Danilo Matos Cavalcante de Souza, Gercino Hermenegildo
Cardoso de Castro Filho e Amando Magno Barreto Ribeiro.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 113ª Zona.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
REVISOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Recurso. Ação de impugnação de mandato eletivo.
Improcedência. Captação ilícita de sufrágio. Consultas médicas em troca de voto. Comprovação. Prática
pelas esposas dos candidatos. Ciência dos beneficiados. Provimento parcial. Inelegibilidade e multa.
Não aplicação. Cassação de mandato.
Comprovada a oferta de atendimento médico a eleitor,
formulada por esposas de candidatos, em troca de
votos para seus cônjuges, dá-se parcial provimento
ao recurso para cassar os mandatos dos recorridos,
não se cominando a inelegibilidade nem a multa
pretendida pelos recorrentes.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, por
maioria, vencidos parcialmente os Juízes Salomão Viana e Cássio Miranda
e totalmente o Juiz Wanderley Gomes, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO
RECURSO, nos termos do voto do Juiz Relator de fls. 639/643, que integra
o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 3 de outubro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA, Vice-Presidente no exercício
da Presidência - MAURICIO KERTZMAN SZPORER, Juiz Relator - SIDNEY
PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
254
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso interposto pela Coligação Riacho em Boas
Mãos, pelo Partido dos Trabalhadores – PT e por Fábio Ricardo Guimarães
de Castro contra decisão do Juiz da 113ª Zona que, julgando improcedente
a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, extinguiu o processo com resolução do mérito.
Os Recorrentes ajuizaram a AIME com o fim de desconstituir os
mandatos do prefeito, do vice-prefeito e de um vereador eleito, que alegam
terem sido conquistados com a prática de corrupção eleitoral, com abuso do
direito de captar votos por parte das esposas dos Recorridos.
Argúem a flagrante captação ilícita de sufrágio vedada pelo artigo
41-A da Lei n° 9.504/97, requerendo, ao final, o provimento do recurso para
reformar a decisão de primeiro grau e, por conseguinte, desconstituir os
mandatos dos Recorridos, imputando-lhes a inelegibilidade por três anos e
multa, além de proceder à diplomação do segundo colocado no pleito.
Em contrarrazões de fls. 576 a 589 e 594 a 610, os Recorridos
alegam que a parte Recorrente não se desincumbiu do ônus de comprovar a ocorrência dos fatos imputados. Alegam que alguns depoimentos de
testemunhas se deram de maneira falsa, levantando dúvida acerca da sua
credibilidade.
Defendem ser indispensável a comprovação de que o candidato
teria participado diretamente do ato, dele tenha tido prévio conhecimento ou
ao menos consentido.
Requerem, por fim, que seja negado provimento ao recurso,
mantendo-se a sentença na íntegra.
Em pronunciamento de fl. 632, o Procurador Regional Eleitoral, em
prestígio à unidade institucional, opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório que submeto à apreciação do Juiz Revisor.
Salvador, 28 de abril de 2011.
VOTO
O cerne da irresignação sub judice reside na alegação de que os
elementos probatórios acostados teriam demonstrado a prática de captação
ilícita de sufrágio, perpetrada através da oferta de consulta e de exame médico
pelas esposas dos Recorridos para a Sra. Ivani de Souza e para seu filho
Janilson Barrem de Souza, em troca de votos para os candidatos impugnados,
que concorreram aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador.
Do compulsar dos autos, entendo que assiste razão aos Recorrentes, senão vejamos.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
255
JURISPRUDÊNCIA
As provas testemunhais apresentadas sustentam de sobremaneira
as alegações aventadas pelos Impugnantes, conforme se depreende dos
excertos a seguir transcritos:
“Que a depoente se recorda que foram pedidos votos pelas
Sras. Nádia, Carla e Margarete; Que tem conhecimento
que as Sras. Nádia é esposa de Tito, Margarete de Daniel
e Carla de Alexandre; Que as três senhoras pediram votos
na casa da depoente; (...) Que foi prometido a depoente,
em troca do voto nos candidatos Tito e Alexandre, um
exame com um médico dermatologista em Guanambi; (...)
Que a Sra. Nádia pegou o nome completo da depoente em
uma quinta-feira e pediu para que ela fosse até a sua casa no
sábado; Que no sábado a depoente foi com seu irmão Janilson
atpe(sic) a casa da Sra. Nádia; Que a Sra. Nádia os atendeu e escreveu em um papel o nome do médico que iria
atendê-la em um endereço em Guanambi; Que confirma
que o papel com o nome do médico e endereço recebido
da Sra.Nádia é o de folha 11 dos Autos; ...” (depoimento da
Sra. Ivani de Souza – fls.115).
“Que tem conhecimento que sua irmã recebeu uma proposta
de tratamento médico em troca de voto; (...) Que o depoente
esteve presente quando foi pegar a ordem para o exame;
Que o depoente esteve com sua irmã na casa da Sra. Nádia,
esposa do candidato Tito; Que o depoente viu a ordem; Que
o papel juntado na folha 11 é a ordem que foi assinada pela
Sra. Nádia; Que a Sra. Nádia preencheu todo o papel e o
entregou à testemunha Ivani; (...) Que depois ela começou
a preencher o papel e ao mesmo tempo recomendava o
voto para Tito e Alexandre; Que a Sra. Nádia perguntou ao
depoente como ele estava; Que o depoente disse que se não
fosse o problema de gastrite, estaria bem; Que a Sra. Nádia
perguntou a ele se não queria um exame de endoscopia;
Que a Sra. Nádia disse inicialmente que daria metade do
exame, mas depois resolveu dar R$60,00; Que o depoente
deveria receber o restante do valor, mas não conseguiu e não
fez o exame; Que a Sra. Nádia pediu ao depoente para votar
em Tito e Alexandre; Que o depoente foi com a testemunha Ivani até o Comitê às 07 horas para pegar a condução
para fazer o exame; (...)” (depoimento do Sr. Janilson Barrem
Souza, fls. 134).
Ademais, o documento referido pela Depoente, encartado às fls.
11, registra os seguintes dizeres:“Dermatologista/ Dr. Ariovaldo / End. Pça.
da Igreja Matriz – Guanambi-BA/ Valor R$50,00 c/ desconto por ordem de
256
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
chegada”, conteúdo que se coaduna com as afirmações da testemunha, ainda
mais quando se considera que no verso do documento consta a observação:
“Comitê, 7hrs, segunda-feira”, indicando o local e horário descrito pelo irmão
da testemunha, Sr. Janilson.
Outrossim, os depoimentos do médico, Dr. Ariovaldo, e da Sra.
Noélia, secretária responsável pelos agendamentos, reforçam as acusações,
uma vez que embora afirmem a ausência de consulta marcada para a Sra.
Ivani, apontam a existência de consulta para a Sra. Nádia, como se depreende
dos excertos a seguir transcritos:
“que apenas a senhora Nádia marcou consulta para o dia
15 de setembro, mas a ela não compareceu; que todas as
marcações de consultas são realizadas por mim na agenda
aqui apresentada; (...)”.
Destaca-se, ainda, que as afirmações retro foram corroboradas pela
certidão de fls. 403, que atestou constar na agenda uma consulta marcada
em nome da Sra. Nádia no dia 15 de setembro de 2008.
Ademais, verifico que a defesa não impugnou a veracidade do
referido documento, tão somente alegou que este poderia ter sido emitido
pela Sra. Nádia quando ela ocupava o cargo de Assistente Social no Município. Entretanto, não apresentou prova desta afirmação, inexistindo sequer
o depoimento desta senhora.
Vale ressaltar que o magistrado que prolatou a sentença atacada
reconheceu ter havido atuação ilícita por parte das esposas dos Recorridos,
concluindo, contudo, não ter sido demonstrado que a promessa do exame
médico consistiria em “um padrão de conduta persistente na campanha que
não pudesse ser ignorado pelos impugnados,....”
Assim, no tocante à anuência dos Recorridos, entendo que se faz
presente, uma vez que não há como se admitir que desconhecessem os atos
praticados por suas próprias esposas em benefício de suas campanhas.
Destaca-se do parecer ministerial exarado em primeiro grau:
“...
Portanto, os fatos foram devidamente provados na instrução
processual. Outrossim, data venia, não parece crível que tal
estrutura de captação ilícita de sufrágio fosse ignorada pelos
beneficiários/impugnados, haja vista ter sido executada direta e pessoalmente pelas respectivas esposas; ao revés, as
regras de experiência que envolvem o jogo político sugerem
exatamente a conclusão oposta: primeiro, por se tratar, as
envolvidas, de esposas dos impugnados; segundo, por se de
todo “recomendável” que práticas tais sejam levadas a efeito
por interpostas pessoas, justamente para viabilizar a tese defensiva da ausência de participação/conhecimento do ilícito,
na hipótese de sua eventual descoberta.”
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
257
JURISPRUDÊNCIA
No caso em apreço, ainda mais evidente esse conhecimento já que
o ato foi perpetrado em visita conjunta feita pelas esposas dos três candidatos
aliados, a Sra. Nádia, mulher do prefeito; a Sra. Margareth, do vice-prefeito
e a Sra. Carla, que teria se identificado como esposa do vereador.
Se meros correligionários partilham suas ações políticas, que dirá
três esposas agindo juntas em benefício da campanha de seus maridos
concorrentes pela mesma chapa.
Observo, ainda, que a conduta perpetrada deteve potencialidade
para alvejar a legitimidade do pleito, ainda mais quando a diferença de votos
entre os concorrentes somente atingiu 3,5% (595 votos).
Assim, considerando-se que o acervo probatório constante dos
autos confirmou a prática de captação ilícita de sufrágio, devem ser aplicadas
aos Recorridos as reprimendas previstas no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97.
Quanto à inelegibilidade, incabível sua imputação por meio da ação
de impugnação de mandato eletivo e, no que diz respeito à multa, embora
exista previsão no artigo 41-A no qual se funda a presente condenação,
também não pode ser aplicada em sede de AIME.
Portanto, meu voto é pela cassação dos mandatos conferidos aos
Recorridos, convocando-se o suplente do vereador eleito e, no que se refere
à disputa majoritária, considerando-se que o primeiro colocado obteve 51,75%
dos votos válidos do certame, é o caso de aplicação do artigo 224 do Código
Eleitoral que prevê a renovação do pleito, na forma prevista no artigo 81,
§ 1º da Constituição Federal.
Voto, pois, pelo provimento parcial do recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 30 de agosto de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
258
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 3 4 1 / 2 0 11
PETIÇÃO Nº 370-49.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
Entre Rios
REQUERENTE:
Reginaldo Nunes de Rezende. Adv.: Bel. Guttemberg Oliveira
Boaventura.
REQUERIDO:
Partido Renovador Trabalhista Brasileiro - PRTB – Seção da
Bahia. Adv.: Bel. Wallace Sertório.
RELATOR:
Juiz Carlos Alberto Dultra Cintra.
Petição. Pedido de declaração de existência de justa
causa. Grave discriminação pessoal. Não ocorrência.
Indeferimento.
Preliminar de carência da ação.
Afasta-se a prefacial, porquanto comprovado nos
autos que o requerente encontra-se regularmente
filiado à agremiação partidária.
Mérito.
Ante a inexistência de grave discriminação pessoal,
tendo em vista a ausência de elementos probatórios,
indefere-se o pedido de declaração de ocorrência de
justa causa, para fins de desfiliação partidária.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR e, no mérito, INDEFERIR O
PEDIDO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a
integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 3 de outubro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência e Relator ; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de petição, interposta por Reginaldo Nunes de Rezende,
na qual este requer a declaração judicial da existência de justa causa para
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
259
JURISPRUDÊNCIA
sua desfiliação partidária, ao argumento de que sofreu e vem sofrendo grave
discriminação pessoal por parte de integrantes da direção do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB de Entre Rios.
O requerente alega que recebeu simulacro de processo disciplinar
que, dentre outras cominações, opina pela desfiliação do ora autor, sob o
único argumento de inadimplência com as contribuições mensais, sem que
oportunizasse ao mesmo qualquer possibilidade de parcelamento do débito
junto à tesouraria do partido. Por fim, afirma que requereu o seu registro
individualmente, tendo o Partido da República o impugnado, além de ter se
negado a fornecer os recibos eleitorais.
Em sede de defesa (fls. 64/70), o Partido Renovador Trabalhista
Brasileiro suscita, em caráter preliminar, a carência da ação, porquanto o
requerente teria sido expulso do partido, não sendo mais filiado, logo, não
poderia ajuizar ação de desfiliação partidária.
Ademais disso, no mérito, alega que o filiado, ora autor, infringiu as
regras de fidelidade partidária descumprindo mandamento estabelecido no
estatuto do partido, qual seja, o pagamento da contribuição mensal devida
pelos filiados.
Instado, o eminente Procurador Regional Eleitoral manifestou-se
às fls. 112/116, pelo não acolhimento da preliminar aventada, e, no mérito,
pelo indeferimento do pedido.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO.
Primeiramente, no que toca à preliminar aventada pelo requerido,
entendo que não merece guarida. Da análise da certidão de fl. 105, é possível
constatar que o requerente está regularmente filiado ao partido, sendo assim,
não há que se falar em carência da ação.
MÉRITO.
Do cotejo dos autos, entendo que deve ser julgado improcedente
o pedido contido na petição interposta por Reginaldo Nunes de Rezende,
protocolizada sob o n. 10.443/2011.
Com efeito, da análise do caderno processual, não vislumbro a
suscitada discriminação pessoal, de modo a justificar o reconhecimento
da justa causa e a consequente desfiliação do vereador do partido ao qual
pertence.
Para melhor entendimento do caso em apreço, é preciso individualizar pontualmente o fato que se discute nesta demanda, qual seja, o descum-
260
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
primento de mandamento contido no estatuto do partido, consubstanciado no
não pagamento de contribuição mensal devida pelos filiados.
Segundo o requerente, a discriminação pessoal encampada pela
Grei decorre, em síntese, da não concessão de oportunidades para ultimar
o parcelamento do débito junto à tesouraria do partido e, especialmente, do
cerceamento de defesa durante a marcha do procedimento que culminou
com a sua expulsão do partido.
Não obstante o alegado pelo edil, é impossível vislumbrar o cerceamento de defesa aduzido, tendo em vista que, nestes autos, inexiste
cópia integral do processo disciplinar instaurado e nenhum documento hábil
para comprovar o quanto alegado. Muito pelo contrário, o acervo probatório
apresenta elementos que demonstram que o autor fora notificado regularmente para se defender, conforme faz prova os documentos de fls. 75/80
(notificação e AR).
Sob outra perspectiva, o partido possui respaldo para expulsar o
filiado que não cumpra as regras estabelecidas no estatuto. Vejamos o que
dispõem as normas deste texto normativo no que toca às medidas disciplinares a que estão sujeitos os filiados:
“Art. 66 Aplicam-se as seguintes medidas disciplinares aos
Dirigentes do Partido, aos Parlamentares detentores de mandato eletivo, aos ocupantes de cargo ou função pública, por
indicação do Partido e aos filiados em geral:
I – advertência reservada ou pública.
II – Suspensão por 3 (três) a 12 (doze) meses.
III – Impedimento ou cancelamento de registro de candidatura,
caso seja candidato a cargo eletivo.
IV – Destituição de função em Órgão Partidário.
V – Expulsão do Partido.
Parágrafo 2° - Poderão estar sujeitos às penas de suspensão,
por períodos que vão de (três) a 12 (doze) meses, aqueles
membros ou filiados supracitados no “Caput” desse artigo, que
incorrerem ou infringirem o Programa ou o Estatuto Partidário
nos seguintes procedimentos:
[...] IV – O parlamentar que, no exercício do mandato, deixar
de efetuar o pagamento de suas contribuições sobre os seus
respectivos salários de remuneração e subsídios ao Órgão
Partidário designado e comprovado, bancariamente, por
auditoria.
[...] X – A expulsão do Partido, tanto para membros dirigentes,
parlamentares e filiados em geral é medida extrema, e ocorrerá,
quando em qualquer dos casos citados, entre os incisos I e
IX, parágrafo 2° do art. 66 desse Estatuto, a causa ou o fato
gerador, o motivo ou o ato provocador, ou o dano caracterizado,
forem graves e provocarem ou resultarem em prejuízo irreversível a integrantes do Partido ou ao próprio Partido”.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
261
JURISPRUDÊNCIA
Destarte, da dicção da norma transcrita, é possível constatar que,
a priori, o inadimplente que não cumpriu com sua obrigação pecuniária está
sujeito à suspensão de três a doze meses. Entretanto, o próprio art. 66, §2°,
inciso X, permite a expulsão do filiado ao Partido caso a conduta ou o dano
forem graves e provocarem prejuízo irreparável.
Dito isto, impende ressaltar que a decisão de fls. 87/90, emanada
da Comissão de Ética Disciplinar Regional do PRTB, concluiu que a inadimplência representou grande prejuízo ao partido, por se tratar de agremiação
que depende exclusivamente das contribuições de seus filiados. Desta forma,
restou evidenciada a gravidade da conduta perpetrada.
Portanto, a aferição da gravidade da infração é uma atribuição da
agremiação e está pautada na legalidade, tendo em vista que a norma instituída no estatuto do grêmio político confere certo grau de discricionariedade
à legenda.
Outrossim, cumpre salientar que outras providências foram adotadas antes de se chegar à adoção da medida extrema, pois o requerente foi
inscrito no SPC (fl. 28), empós, notificado (fls. 75/80) e, por fim, foi instaurado
processo disciplinar.
Aliás, cumpre destacar que o processo interno não foi amparado
apenas no inadimplemento com a obrigação pecuniária. Conforme se extrai
do documento de fls. 75/78, houve violação a outras normas, como: aquela
que trata da defesa da identidade ideológica do partido e do respeito às suas
diretrizes hierárquicas emanadas do estatuto; e aquela outra que cuida da
determinação de que um terço dos respectivos cargos em comissão de seus
gabinetes serão de indicação do grêmio partidário.
Tem-se ainda que, a alegação de perseguição e discriminação pessoal do requerente não merece prestígio, pois, pelo que consta, a agremiação
tem utilizado a mesma conduta em casos semelhantes, como ocorreu nos
autos tombados sob o n° 369-64.2011.
Por todo o exposto, ante a ausência de elementos capazes
de configurar a justa causa, acompanhando o pronunciamento do Procurador
Regional Eleitoral com assento nesta Corte, voto no sentido de julgar improcedente o pedido postulado na presente petição.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 3 de outubro de 2011.
Carlos Alberto Dultra Cintra
Juiz Relator
262
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 3 7 1 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº: 14.394-16.2008.6.05.0056
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Santo Antônio de Jesus
RECORRENTE:
Partido Verde – PV de Santo Antônio de Jesus. Advs.: Béis.
Antônio Ferreira Leal e outros.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 56ª Zona.
RELATORA:
Juíza Mônica Aguiar.
Recurso. Prestação de contas. Exercício de 2007.
Desaprovação. Ausência de abertura de conta bancária. Irregularidade insanável. Comprometimento
do efetivo controle da Justiça Eleitoral. Negativa de
provimento.
1. A exigência atinente à abertura de conta bancária
pelos partidos políticos, prevista no art. 14, “l” da
Resolução TSE nº 21.841/04, é imprescindível para
viabilizar o exame da movimentação financeira de
valores. O descumprimento deste dever resulta na
impossibilidade de ser aferida a veracidade das informações prestadas e, por conseguinte, conduz à
desaprovação das contas;
2. Recurso a que se nega provimento.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto da
Juíza Relatora, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 18 de outubro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - MÔNICA
AGUIAR, Juíza Relatora - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pelo Partido Verde contra decisão
proferida pelo Juízo Eleitoral da 56ª Zona, que desaprovou as contas do
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
263
JURISPRUDÊNCIA
seu Diretório Municipal em Santo Antônio de Jesus, alusivas ao exercício de
2007, por entender que não restou comprovada nos autos a movimentação
financeira da agremiação.
Em suas razões (fls. 127/129), o recorrente alegou, em síntese, que
no ano de 2007 não recebeu repasse de cotas do fundo partidário, e sim,
tão-somente, uma doação no valor de R$ 147,14 (cento e quarenta e sete
reais e quatorze centavos), a qual teria sido devidamente escriturada e seria
a única movimentação financeira ocorrida nesse exercício.
Asseverou, ainda, que seu atual presidente tomou posse em janeiro de 2008, não podendo, pois, ser responsabilizado pela Administração
anterior.
A Secretaria de Controle Interno do Tribunal, de sua vez, pronunciou-se no sentido de que seja mantida a desaprovação das contas (fls.
139/140).
Instado a se manifestar, o eminente Procurador Regional Eleitoral
se posicionou no sentido do desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Da análise dos autos, verifica-se que as irregularidades que motivaram a desaprovação das contas do recorrente foram as seguintes:
1.Ausência de abertura de conta bancária em nome do partido para
a movimentação dos seus recursos financeiros;
2.Registro contábil que não reflete a real movimentação financeira
no que concerne ao destino de uma doação no valor de R$ 147,14 (cento
e quarenta e sete reais e quatorze centavos), informado como “pagamento
ao Fundo Partidário – Executiva Estadual do Partido”, uma vez que se trata
de institutos diversos.
No que toca à doação da quantia de R$ 147,14, observa-se que,
não obstante tenha havido falhas na escrituração, restou comprovado que o
valor foi transferido para o órgão estadual da agremiação (fl. 81), em razão
do que este vício não possui o condão de macular as contas.
O mesmo não se pode dizer quanto à ausência de abertura de
conta bancária, uma vez que este vício, por si só, reveste-se de gravidade
suficiente para ensejar a desaprovação das contas.
Neste passo, é oportuno salientar que o Tribunal Superior Eleitoral,
usando das atribuições que lhe confere a norma contida no art. 61 da Lei
nº 9.096/95, regulamentou, por meio da Resolução TSE nº 21.841/04, a
forma como as contas devem ser prestadas pelos partidos políticos. Assim
é que a norma insculpida no art. 14, II, “l” da mencionada resolução instituiu,
dentre outras exigências, a da apresentação da relação de contas bancárias
264
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
abertas, com a indicação do número respectivo, da instituição bancária e da
agência, com o respectivo endereço, bem como a indicação específica da
conta destinada exclusivamente à movimentação dos recursos oriundos do
fundo partidário e da destinada à movimentação dos demais recursos.
Não é preciso muito esforço para se concluir que a abertura das
contas é imprescindível para viabilizar a aplicação de várias das normas contidas na citada resolução, especialmente no que diz respeito à movimentação
financeira ou à sua ausência. Obviamente, sem que existam contas abertas,
não há como serem exibidos extratos bancários, o que retira qualquer possibilidade de que seja procedido a um exame mínimo a respeito da regularidade
dos atos praticados na gestão dos recursos.
Registre-se, ainda, que a alegação apresentada pelo partido – de
que não houve movimentação financeira no ano de 2007 – para justificar a
omissão quanto à abertura da conta bancária não procede, haja vista que é
evidente a probabilidade de existirem diversas operações não registradas,
cujos custos são perfeitamente estimáveis em dinheiro. É o que se dá, por
exemplo, com as despesas atinentes ao próprio funcionamento da agremiação, como o eventual aluguel de um imóvel ou o pagamento do consumo de
energia elétrica, as quais, ainda que custeadas com doações, deveriam ter
sido contabilizadas.
No particular, não há nos autos dados mínimos que permitam seja
aferida a forma de custeio do funcionamento da agremiação no exercício de
2007.
Conclui-se, pois, que o recorrente descumpriu normas cogentes
do sistema jurídico eleitoral e, com isso, inviabilizou a atividade fiscalizatória
do Poder Judiciário Eleitoral, impossibilitando a aferição da veracidade das
informações prestadas.
Por outro lado, a circunstância de o atual presidente do partido
haver tomado posse em janeiro de 2008 não socorre o recorrente, haja vista
que as contas ora julgadas são do partido e não da pessoa que o representa, em razão do que este fato é irrelevante para interferir na conclusão do
julgamento.
Ante o exposto, em consonância com a posição externada pela
Procuradoria Regional Eleitoral, voto no sentido de que seja negado provimento ao recurso.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 18 de outubro de 2011.
Mônica Aguiar
Juíza Relatora
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
265
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 3 9 8 / 2 0 11
PETIÇÃO
PROCESSO Nº 5-92.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
Salvador
REQUERENTE:
José Carlos de Jesus Rodrigues. Advs.: Béis. Milton de Cerqueira
Pedreira e Gabriel Portella Fagundes Neto.
REQUERIDOS:
Sérgio Barradas Carneiro (Advs.: Béis. Sérgio Barradas Carneiro
e Ricardo Luiz Serra Silva); PRB – Seção da Bahia (Adv.: Bel.
Anderson George de Lima Casé); Joseph Wallace Faria Bandeira (Advs.: Béis. Antônio José Guerra, Maurício Damasceno
Pereira e Adgasito Guerra Filho); Acelino Freitas (Advs.: Béis.
Átila Brandão de Oliveira, Rodrigo Andrade de Almeida e outros)
e PT – Seção da Bahia (Advs.: Béis. Sara Mercês dos Santos e
Luís Vinícius de Aragão Costa).
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
Requerimento. Deputado Federal nomeado Ministro.
Vacância. Preenchimento da vaga. Direito assegurado ao 1º Suplente da Coligação e não do Partido.
Indeferimento.
Preliminares de ilegitimidade ativa ad causam e de
ausência de interesse jurídico.
Candidato que ficou em segundo lugar em número
de votos para determinado cargo em seu partido e,
em tese, encontra-se na iminência de assumir cargo
eletivo, tem legitimidade e interesse para propor ação
que, supostamente, poderá lhe beneficiar, razão pela
qual rejeitam-se as preliminares.
Mérito.
Indefere-se pedido formulado por primeiro suplente
do partido ao qual Deputado Federal nomeado Ministro pertence, devendo ser convocado o primeiro
Suplente da coligação formada à época da eleição.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER AS PRELIMINARES e INDEFERIR O PEDIDO,
nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o
presente Acórdão.
266
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 7 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; JOSEVANDO
SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral .
RELATÓRIO
Cuida-se de requerimento formulado por José Carlos de Jesus
Rodrigues, candidato ao cargo de Deputado Federal pelo PP nas eleições de
2010, ocupante da primeira suplência do partido e quinta colocação na linha
de suplência da coligação, no qual pleiteia sua diplomação no aludido cargo,
a fim de suprir a vaga deixada pelo Deputado Federal Mário Negromonte,
seu co-partidário, em decorrência de sua investidura no cargo de Ministro das
Cidades. Requereu, ainda, o peticionante, a agilização no julgamento das
suas contas de campanha, tendo em vista ser esta condição indispensável
para sua diplomação.
Fundamentou seu pedido em julgamento do Supremo Tribunal Federal na Medida Cautelar em Mandado de Segurança nº 29.988, realizado
em 09/12/2010, no qual o Ministro Relator Gilmar Mendes entendeu que “o
mandato parlamentar pertence também ao partido político” e que, “ocorrida
a vacância, o direito de preenchimento da vaga é do partido político detentor do mandato, e não da coligação partidária já não mais existente como
pessoa jurídica”.
Instado, o Ministério Público Eleitoral pugnou pela indeferimento
do pedido (fls. 12/14).
Às fls. 15/16, o requerente atravessou petição, reiterando os pedidos formulados.
À fl. 24, este relator determinou que o requerente providenciasse a
citação dos partidos políticos integrantes da Coligação pela qual concorreu,
assim como dos suplentes que obtiveram melhor classificação que a sua
dentro da referida aliança partidária, inclusive daquele que foi convocado
para substituir o Deputado Federal Mário Negromonte.
Sérgio Barradas Carneiro manifestou-se às fls. 49/53, afirmando
não merecer agasalho a pretensão do autor, porque lastreada em decisão
provisória e desprovida de amparo legal, asseverando que, nos termos do
art. 112, I do Código Eleitoral, “os candidatos suplentes são aqueles mais
votados pela coligação e não aqueles pertencentes às listas dos partidos”.
O Partido Republicano Brasileiro – PRB, por seu turno, requereu,
preliminarmente, o sobrestamento do feito até o julgamento do Mandado de
Segurança nº 30.321, em trâmite no Supremo Tribunal Federal, contendo
partes, pedido e causa de pedir idênticos aos dos presentes autos. No mérito,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
267
JURISPRUDÊNCIA
sustenta que tanto o TRE da Bahia quanto a Câmara dos Deputados agiram
de acordo com a lei e a jurisprudência pátria ao diplomar Acelino de Freitas,
filiado ao PRB, no aludido cargo, uma vez que este foi o suplente mais bem
votado da coligação.
Joseph Wallace Faria Bandeira, em sua defesa, argui as preliminares
de ilegitimidade ativa e de extinção do processo pela perda do objeto. Quanto
à matéria de fundo, sustenta que, segundo as normas eleitorais vigentes,
“havendo vacância da titularidade, o suplente a ser convocado é o primeiro da
coligação extinta”, destacando a inaplicabilidade dos precedentes apontados
na petição inicial por tratarem de situação distinta da dos autos.
Acelino Freitas, em sua peça contestatória, levanta as preliminares
de ilegitimidade ativa ad causam e de inexistência de interesse de agir. Quanto
à questão meritória, pugna pelo indeferimento do pedido, sob o argumento de
que, “a despeito da cessação do caráter de representação partidária substitutiva,
(...) afiguram-se válidos em todos os termos e para todos os efeitos, até o final
da legislatura os demais efeitos, em especial o direito de exercício à suplência,
segundo a ordem nominal de votos objeto da lista encaminhada por este tribunal
à Câmara dos Deputados, na hipótese de licenciamento do titular”.
Finalmente, o Partido dos Trabalhadores – PT, invocando o princípio da segurança jurídica, manifestou-se no sentido da improcedência do
pedido.
À fl. 199, o Procurador Regional Eleitoral reiterou integralmente o
pronunciamento anterior.
É o relatório.
VOTO
DO PEDIDO DE SOBRESTAMENTO DO FEITO.
Inicialmente, impõe-se esclarecer que, embora tramite no Supremo
Tribunal Federal o Mandado de Segurança nº 30.321, versando sobre os mesmos fatos e no qual figuram as mesmas partes dos presentes autos, não há
que se falar em sobrestamento do feito até o julgamento daquele mandamus,
tendo em vista o princípio da celeridade, vetor desta Justiça Especializada.
À vista disso, impõe-se o indeferimento do pedido.
PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM E DE AUSÊNCIA
DE INTERESSE DE AGIR.
As preliminares em epígrafe, suscitadas sob o argumento de que
o partido político é o único legitimado e interessado em integrar o pólo ativo
da presente demanda, não merece prosperar.
Com efeito, o candidato que ficou em segundo lugar em número
de votos para determinado cargo em seu partido e, em tese, se encontra na
268
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
iminência de assumir cargo eletivo, tem legitimidade e interesse para propor
ação que, supostamente, poderá lhe beneficiar.
Rejeitam-se, portanto, as preliminares.
MÉRITO.
José Carlos de Jesus Rodrigues, candidato ao cargo de Deputado
Federal pelo PP nas eleições de 2010, ocupante da primeira suplência do
partido e quinta colocação na linha de suplência da coligação, pretende ser
diplomado no aludido cargo, suprindo, assim, a vaga deixada pelo Deputado
Federal Mário Negromonte, seu co-partidário, em decorrência de sua investidura no cargo de Ministro das Cidades.
Em que pesem os argumentos lançados na inicial, razão não assiste
ao requerente.
Inicialmente, impõe-se pontuar que o caso dos autos não se refere a
qualquer das situações ensejadoras de perda de mandato – tais como abandono do cargo, infidelidade partidária, renúncia ou morte do parlamentar.
Trata-se, em verdade, de hipótese de vacância de cargo, prevista
no art. 56, inciso I da Constituição Federal, que dispõe, in verbis:
Art. 56 – Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:
I – Investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de
Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplomática
temporária;
O parágrafo primeiro do aludido dispositivo constitucional, por seu
turno, estatui:
§ 1º - O suplente será convocado nos casos de vaga, de
investidura em funções previstas neste artigo ou de licença
superior a cento e vinte dias.
Em sendo assim, o afastamento em questão – para investidura
em cargo de Ministro de Estado – é hipótese de licenciamento, de caráter
reversível e não definitivo, configurando opção política levada a efeito, via de
regra, com a anuência do partido ao qual o parlamentar é filiado. Como bem
observou o Ministério Público Eleitoral, cuida-se de situação que “em lugar
de ‘desfalcar’ a Agremiação (...), projeta-a com mais força e visibilidade ao
cenário político-governamental”.
Não há que se falar, portanto, em perda do cargo, visto que o vínculo
entre o titular e o parlamento são mantidos, razão por que se revela inaplicável
a regra segundo a qual, verificada a vacância, o direito de preenchimento
da vaga é do partido político detentor do mandato, e não da coligação constituída para aquele pleito. Não é a assunção definitiva do mandato que está
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
269
JURISPRUDÊNCIA
em pauta, e sim a quem cabe o direito ao exercício da suplência enquanto o
seu titular se encontrar licenciado.
Dito isso, afigura-se cristalina a inadequação do precedente invocado pelo requerente na petição inicial, pois ali, diversamente do caso dos
autos, tratava-se de renúncia de parlamentar.
Fixadas essas premissas, mostra-se oportuno destacar que, malgrado o caráter temporário da coligação, o agrupamento partidário decorre de
ato de vontade das agremiações que a integram, que o fazem visando uma
melhor condição de disputa eleitoral que aquela que teriam caso concorressem isoladamente, já que, coligados, os partidos agregados têm possibilidade
de registrar maior número de candidaturas – majorando, consequentemente,
o quociente eleitoral; têm maior tempo de propaganda eleitoral gratuita no
rádio e televisão; apenas para citar algumas das vantagens da formação da
coligação.
Isto posto, não resta dúvida de que na presente hipótese a titularidade do direito em questão é do primeiro na linha de suplência no âmbito da
coligação, à qual, nos estritos termos do art. 6º, § 1º da Lei nº 9.504/97, são
atribuídas “as prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere
ao processo eleitoral”, funcionando “como um só partido no relacionamento
com a Justiça eleitoral e no trato dos interesses interpartidários”.
Por essas razões, julgo improcedente o pedido.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 7 de novembro de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
270
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 4 0 4 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº: 12.338 (15-10.2009.6.05.0148)
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Itanhém
RECORRENTE:
Zulma Pinheiro dos Santos Vaz. Advs.: Béis. Julimar da Silva
Fernandes e Jucimar da Silva Fernandes.
RECORRIDOS:
Milton Ferreira Guimarães e Alfim Alves do Nascimento. Advs.:
Béis. José Carlos Teixeira Pinto e Jônathas Bahia Teixeira.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 148ª Zona.
RELATOR:
Juiz Wanderley Gomes.
REVISOR:
Juiz Josevando Souza Andrade
Recurso eleitoral. AIME. Agravo retido. Decisão que
reconheceu litispendência e coisa julgada. Inocorrência. Provimento. Retorno dos autos à origem.
Dá-se provimento a agravo retido para reformar
a decisão que reconheceu, equivocadamente, a
ocorrência de litispendência e coisa julgada, para
determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem
para regular processamento.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO, nos termos do voto
do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 7 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS, Juiz-Presidente - WANDERLEY
GOMES, Juiz Relator - SIDNEY PESSOA MADRUGA, Procurador Regional
Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por ZULMA PINHEIRO DOS
SANTOS, em face de MILTON FERREIRA GUIMARÃES e de ALFIM ALVES
DO NASCIMENTO, contra sentença proferida pelo Juiz Eleitoral da 148ª
Zona/Itanhém, que julgou improcedente a ação de impugnação de mandato
eletivo, ajuizada sob alegação de fraude e abuso dos poderes econômico
e político.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
271
JURISPRUDÊNCIA
Inicialmente, insta assinalar que o Magistrado zonal, inaudita altera
parte, julgou extinta a ação, com resolução do mérito, em razão da ocorrência
da decadência (fls. 307/312). Inconformada, a impugnante interpôs recurso, ao
qual esta Corte deu provimento, determinando o retorno dos autos à origem,
para o regular processamento, por entender que a demanda fora manejada
dentro do prazo decadencial, para a propositura da AIME, considerando o
teor do artigo 184 do Código de Processo Civil1.
Após a apresentação da contestação e da réplica, foi designada
audiência de instrução e julgamento, ocasião em que o Juiz zonal reconheceu a ocorrência de coisa julgada e litispendência, em relação
aos seguintes fatos: 1) utilização de bens públicos móveis e imóveis sem
contraprestação; 2) omissão de doações em dinheiro por meio de órgão da
Administração Pública Municipal, concessionário de serviços públicos, com
convite para a população de Itanhém comparecer ao ginásio de esportes no
dia 30 de julho de 2008, às 19:00 horas, para debate público que, por sua
vez, não ocorreu, configurando artifício para induzir o eleitor; 3) utilização
do galpão multiuso no Distrito de Ibirajá, para a realização de debates entre
os candidatos no dia 30 de julho de 2008; 4) utilização da ASSOCIARTE –
Associação dos Artesão de Itanhém, que funciona no prédio da Secretaria
da Agricultura e Meio ambiente de Itanhém; 5) Utilização de pá mecânica
do Município, para auxiliar nos preparativos do comício dos impugnados; 6)
utilização dos veículos que fazem transporte escolar da rede municipal para
transportar partidários, correligionários e simpatizantes, após a realização
do referido comício; 7) utilização de música Bem-te-vi, de composição de
Paulinho Pedra Azul, em alusão ao apelido do primeiro impugnado, em festa
de comemoração dos 50 anos da cidade de Itanhém.
Segundo o Magistrado a quo, tais fatos teriam sido apreciados na
Representação n.º 182/2008, e estariam sendo analisados nos autos da
prestação de contas n.º 329/2008. Assim, entendeu que restariam, apenas, a
serem analisados os seguintes fatos: 8) utilização de 15 ônibus de empresa de
concessionária de serviço público, qual seja a empresa Viação Santa Clara;
9) utilização de 100 pessoas vestidas com as cores amarela e vermelho na
rodoviária, visando a captação de votos; 10) mudança de trajetos e horários
no transporte de eleitores às vésperas das eleições, sem os fiscais da coligação da impugnante, em relação ao assentamento São Geraldo (Distrito
de Batinga) e Itanhém.
Contra aquela decisão, a impugnante interpôs o agravo retido
de fl. 455.
Concluída a instrução, a sentença de piso foi proferida no sentido
de julgar improcedente o pedido formulado na inicial, por ausência de provas
das acusações.
1
272
Acórdão n.º 903/2009. Relator Juiz Renato Reis Filho, fls. 335/349.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Em suas razões recursais, a recorrente pugna, preliminarmente,
pelo conhecimento e provimento do agravo retido, para que seja determinado
o retorno dos autos ao Juízo de origem, a fim de seja dado prosseguimento à
instrução dos pontos controversos retirados da presente lide, pelo reconhecimento da coisa julgada e da litispendência. No mérito, insta pelo provimento
do recurso, defendendo que o conjunto probatório dos autos é robusto e hábil
a comprovar as condutas imputadas aos impugnados.
Em contrarrazões de fls. 511/514, os recorridos salientaram que
o agravo retido deve ser desprovido, uma vez que os fatos deduzidos na
presente ação foram objeto da representação eleitoral, tombada sob o n.º
182/2008. Quanto à questão de fundo, protestaram pela manutenção integral
da sentença, aduzindo a inexistência de prova acerca das acusações contra
si lançadas na peça vestibular.
Com vista dos autos, o Procurador Regional Eleitoral opinou pelo
provimento do agravo retido, para que seja o processo anulado a partir da
audiência de instrução, com a determinação do retorno dos autos ao Juízo
de origem, a fim de que seja retomado o prosseguimento regular do feito.
É o relatório, que ora submeto à apreciação revisional.
VOTO
Adoto como relatórioo o de fls. 526/528.
AGRAVO RETIDO.
Depreende-se da análise dos autos, que assiste razão ao agravante
ao pugnar pela reforma da decisão que reconheceu a ocorrência de coisa
julgada e litispendência em relação aos fatos elencados nos itens 1 a 7 do
relatório.
Com efeito, ao contrário do quanto salientado no decisum impugnado, conquanto se reconheça a parcial identidade fática entre a presente
ação e a Representação nº 182/2008, as demandas diferenciam-se quanto
às partes e aos pedidos.
Na ação em exame, a impugnante formulou em relação a Milton
Ferreira Guimarães e Alfim Alves do Nascimento pedido de desconstituição
de seus mandatos e a declaração de nulidade dos diplomas que lhes foram
outorgados, bem como a convocação imediata dos segundos colocados nas
eleições municipais ocorridas em 2008, para assumirem a chefia do Poder
Executivo Municipal.
Em consulta ao Sistema de Acompanhamento de Documentos e
Processos – SADP, verifica-se que a Representação nº 182/2008, por sua
vez, foi ajuizada pela Coligação AVANÇA ITANHÉM, que sequer integra
a presente AIME, restando já aí evidenciada a diversidade de partes. Em
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
273
JURISPRUDÊNCIA
se tratando de ação de investigação judicial eleitoral, tem-se, ainda, outro
elemento diferenciador, qual seja, a inelegibilidade como consequência da
eventual procedência da demanda.
Observa-se, assim, que não existe a tríplice identidade entre as ações,
de modo que resta afastada a hipótese de ocorrência de coisa julgada.
O mesmo se diga em relação à suposta litispendência entre esta
AIME e a Prestação de Contas nº 329/2008. Aqui é manifesta a inexistência
de correspondência entre os elementos das demandas, não se afigurando
sequer razoável comparar uma ação de impugnação de mandato eletivo com
o procedimento de jurisdição voluntária de prestação de contas, porquanto
absolutamente distintos os pedidos e as causas de pedir.
Pela sua relevância, é de todo pertinente trazer à baila as lições de
Humberto Theodoro Júnior, sobre o tema:
“Referindo-se à litispendência e à coisa julgada, nosso Código
de Processo Civil dispõe que ‘uma ação (rectius: causa) é idêntica á outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa
de pedir e o mesmo pedido’ (art. 301, §2°). (...).
Para que as partes sejam as mesmas, impõe-se que seja idêntica a qualidade de agir jurídica nos dois processos. (...).
O pedido, como objeto da ação, equivale à lide, isto é, à matéria
sobre a qual a sentença de mérito tem de atuar.(...);
A causa de pedir, que identifica uma causa, situa-se no elemento fático e em sua qualificação jurídica. Ao fato em si mesmo
dá-se a denominação de ‘causa remota’ do pedido; e à sua
repercussão jurídica, a de causa próxima do pedido.
Para que sejam duas causas tratadas como idênticas é preciso
que sejam iguais tanto a causa próxima como a remota (...)”.
(Júnior, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil,
RJ: Editora Forense, 2005, págs. 72/73).
Com mais forte razão, o Tribunal Superior Eleitoral já assentou o
entendimento de que as ações eleitorais são autônomas, porquanto fundadas
em causa de pedir próprias e consequências distintas, senão vejamos:
RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. ELEIÇÕES
2006. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PRELIMINAR DE
LITISPENDÊNCIA. AFASTAMENTO. OFERECIMENTO DE
SERVIÇOS DE FRETES GRATUITOS A ELEITORES EM
COMITÊ ELEITORAL DE CANDIDATO.
I - Não há litispendência entre as ações eleitorais, ainda que
fundadas nos mesmos fatos, por serem ações autônomas,
com causa de pedir própria e consequências distintas, o
que impede que o julgamento favorável ou desfavorável
de alguma delas tenha influência sobre as outras. Precedentes do TSE.
[...]
IV - Recurso provido.
274
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou a preliminar de litispendência e proveu o Recurso, nos termos do voto do Relator.
(RCED - Recurso Contra Expedição de Diploma nº 696 Goiânia/GO. Acórdão de 04/02/2010. Relator Min. Ricardo
Lewandowski. Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico,
Volume -, Tomo 62, Data 05/04/2010, Página 207).
ELEIÇÕES 2006. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE
DIPLOMA. ART. 262, IV, DO CÓDIGO ELEITORAL. DEPUTADO FEDERAL. DEPUTADO ESTADUAL. ALBERGUES.
HOSPEDAGEM GRATUITA. FINALIDADE ELEITORAL. AUSÊNCIA. CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO. ABUSO DO PODER
ECONÔMICO. DESCARACTERIZAÇÃO. PRELIMINARES
REJEITADAS. SUSPENSÃO DO PROCESSO. LITISPENDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.
1. [...].
2. A representação prevista na Lei nº 9.504/97, a ação de
impugnação de mandato eletivo, a ação de investigação
judicial eleitoral e o recurso contra expedição de diploma,
são autônomos, possuem requisitos legais próprios e
consequências distintas, não havendo falar em litispendência.
3. [...].
4. [...].
5. Recurso desprovido.
O Tribunal, por unanimidade, desproveu o Recurso, nos termos
do voto do Relator.
(RCED - Recurso Contra Expedição de Diploma nº 729 - Porto Alegre/RS. Acórdão de 18/08/2009. Relator Min. Marcelo
Henriques Ribeiro de Oliveira. Publicação: DJE - Diário da
Justiça Eletrônico, Tomo 178, Data 18/09/2009, Página 16).
Grifos nossos.
Nessa direção, no encalço do opinativo ministerial, voto no sentido de dar provimento ao agravo retido, determinando o retorno dos autos
à instância a quo, a fim de que seja dado regular processamento ao feito,
apreciando-se as condutas retiradas da presente lide, pelo equivocado reconhecimento da coisa julgada e da litispendência.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 7 de novembro de 2011.
Wanderley Gomes
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
275
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 4 1 2 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSONº 10-21.2008.6.05.0162
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Madre de Deus
RECORRENTE:
Coligação É TRABALHO DE VERDADE. Advs.: Béis. José Souza
Pires e Luiz Augusto da Costa Montal.
RECORRIDOS:
Eranita de Brito Oliveira (Advs.: Béis. Ademir Ismerim e Lílian
Maria Santiago Reis) e Edmundo Antunes Pitangueira.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 162ª Zona/São Francisco do Conde.
RELATORA:
Juíza Mônica Aguiar.
Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral.
Extinção do processo sem resolução do mérito.
Ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo. Intimação para correção da falha. Defeito no ato intimatório realizado.
Provimento. Invalidação da sentença. Retorno dos
autos com a determinação de que seja renovado o
ato de comunicação.
Deve ser invalidada a sentença que extingue o processo sem resolução do mérito quando constatado
que a intimação para o saneamento de pressuposto
processual de desenvolvimento válido do processo
foi direcionada a advogados que não mais representavam a parte, donde sobressai o defeito do ato
intimatório realizado.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto da
Juíza Relatora, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; MÔNICA
AGUIAR-Juíza Relatora;SIDNEY PESSOA MADRUGA-Procurador Regional
Eleitoral.
276
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela Coligação É TRABALHO DE
VERDADE contra sentença (fl. 1.016) que, nos autos da ação de investigação judicial eleitoral autuada sob o nº 10-21.2008.6.05.0162, ajuizada pela
recorrente em desfavor da Eranita de Brito Oliveira e Edmundo Antunes
Pitangueira, extinguiu o processo sem resolução do mérito, com fulcro nos
arts. 47, parágrafo único e 267, IV do CPC, ante a ausência de pressuposto
de constituição e desenvolvimento válido do processo.
A demanda foi proposta inicialmente pela recorrente contra a primeira recorrida, sob a alegação de que esta teria praticado abuso de poder
político e econômico, além de condutas vedadas aos agentes públicos durante
a campanha eleitoral de 2008.
Após a instrução do feito, o magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedente a demanda para condená-la ao pagamento de multa no
valor de cinco mil UFIR, além de custas, despesas processuais e honorários
advocatícios, no valor de um mil reais, e determinar o restabelecimento de
funções gratificadas dos servidores Carla Virgínia Santos e Francis Luiz
Costa Junior (fls. 752/759).
Contra esta decisão, ambos os pólos da relação jurídica processual
interpuseram recurso (fls. 801/816 e 819/845).
O Tribunal, por sua vez, reconhecendo o litisconsórcio passivo
necessário entre a prefeita, Eranita de Brito Oliveira, e o seu vice, Edmundo
Antunes Pitangueira, invalidou os atos processuais praticados pelo juízo de
primeiro grau dos quais deveria ter participado o vice-prefeito e determinou
o retorno dos autos à instância a quo para que fosse ordenada a intimação
da parte autora a fim de que esta promovesse a inclusão do vice-prefeito no
pólo passivo da relação processual (fls. 955/969).
Em despacho proferido à fl. 1.003, o juiz zonal determinou a intimação das partes para a regularização da representação processual e, em
seguida, a citação da parte ré, ordenando à autora a inclusão do vice-prefeito
no pólo passivo.
Ato contínuo, o cartório eleitoral emitiu certidão atestando que deixou de citar o vice-prefeito, Edmundo Antunes Pitangueira, em virtude de a
parte autora não ter apresentado cópia da petição inicial (fl. 1.010).
Intimada para apresentar o documento aludido, a autora quedou-se
inerte (fls. 1.013 e 1.015), com o que ensejou a extinção do processo sem
resolução do mérito (fl. 1.016).
Em suas razões (fls. 1.021/1.026), alega a recorrente, em síntese,
que as intimações – tanto a da decisão que extinguiu o processo quanto a
do despacho que determinou a apresentação de cópia da petição inicial para
citar o vice-prefeito – são nulas, porquanto foram efetuadas em nome de ad-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
277
JURISPRUDÊNCIA
vogados que não mais detinham poderes nos autos, haja vista que, após a
publicação do acórdão deste Tribunal, que determinou a retorno do processo
à instância a quo para citação do vice-prefeito, a parte autora protocolizou
petição por meio da qual constituiu novo advogado, revogando, assim, os
poderes anteriormente outorgados aos demais causídicos.
Por sua vez, em contrarrazões (fls. 1.063/1.065), a recorrida pugna
pela manutenção da decisão, ao argumento de que as intimações ocorreram
em nome do Bel. Luiz Augusto da Costa Montal, o qual colacionou aos autos
procuração outorgando-lhe poderes às fls. 1.003 e 1.008.
Instada, a Procuradoria Regional Eleitoral se pronunciou no sentido
do provimento do recurso para nulificar a decisão recorrida, determinandose, por conseguinte, o retorno dos autos ao Juízo de origem, a fim de que
se renove o ato intimatório, considerada, no momento de sua deflagração, a
representação processual presente nos autos.
É o relatório.
VOTO
Da análise dos autos, verifica-se que, em 29/03/2011, a parte autora – ora recorrente -, em obediência ao despacho de fl. 1.003, requereu a
citação do vice-prefeito, Edmundo Antunes Pitangueira, em petição subscrita pelo Bel. José Souza Pires, acompanhada de procuração na qual ele é
constituído novo patrono da parte e onde também consta o seguinte: “com
poderes extensivos ao Bel. Luiz Augusto da Costa Montal”.
Destarte, tendo em vista o entendimento firmado no âmbito do STJ
no sentido de que “há revogação tácita de mandato com a constituição de
novo procurador sem ressalva do instrumento procuratório anterior” (STJ.RMS
nº 23672, DJE de 21/06/2011), é forçoso convir que houve total alteração da
representação processual da recorrente, em razão do que o Bel. José Souza
Pires passou a ser o seu novo patrono, com poderes estendidos a um dos
advogados que já integrava a representação anterior, qual seja, Luiz Augusto
da Costa Montal.
A questão fulcral do presente recurso reside, pois, em aferir se as
publicações promovidas no Diário da Justiça Eletrônico retratam o novo cenário de representação processual da recorrente, de sorte que os atos de comunicação referidos estejam em compasso com o devido processo legal.
Sucede que a intimação da parte autora da demanda - não obstante
a nova procuração acostada aos autos (fl. 1.008) - ocorreu em nome dos
quatro advogados anteriormente constituídos, conforme se depreende das
publicações realizadas em 01/04/11 e 28/04/11, respectivamente (fls. 1.009
e 1.014).
A peculiaridade do caso, todavia, decorre da circunstância de que
Luiz Augusto Costa Montal integrava a representação anterior e continuou a
integrá-la com a nova procuração acostada aos autos, que estendeu a ele os
poderes que foram concedidos ao Bel. José Souza Pires. Foi justamente nesta
questão que se embasou o decisum vergastado, para entender que a intimação
teria alcançado sua finalidade.
278
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Entretanto, não se pode desconsiderar o fato de que o cartório eleitoral
deixou de observar a alteração promovida na representação processual da parte
autora e, por conseguinte, a intimação foi dirigida a três advogados que não
mais possuíam poderes de representação nos autos. Em contrapartida, omitiuse o nome do principal causídico da parte, qual seja, o Bel José Souza Pires, o
qual, inclusive, foi o único subscritor das últimas manifestações da recorrente
no processo.
Neste ponto, vale transcrever as lúcidas palavras do Parquet,
quando, em seu opinativo, asseriu:
Não se pode, portanto, ter como válido o ato intimatório publicado em nome dos representantes pretéritos, ainda mais
quando um dos patronos anteriores permaneceu à frente da
representação processual da parte ao ‘acaso’, de forma quase
que subsidiária, advirta-se.
O entendimento perfilhado pelo Ministério Público Eleitoral, do qual
comungo integralmente, está em consonância com os princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal.
Demais disso, há que se levar em conta o princípio da confiança,
o qual conferiu ao principal patrono - com a apresentação da nova procuração - a certeza de que, a partir daquele momento, seria intimado de todos
os atos do processo.
Por fim, não menos importante é a violação ao princípio da proporcionalidade que, no caso, inegavelmente ocorreu, haja vista que a extinção de
uma ação de investigação judicial eleitoral sem resolução do mérito é medida
significativamente grave, sobretudo, se levado em conta o visível defeito no
ato processual intimatório praticado.
No particular, mais uma vez, peço vênia para transcrever as ponderações bem lançadas no opinativo ministerial, in verbis:
Nessa perspectiva, por fim, insta destacar que as regras
processuais se prestam a viabilizar a solução dos litígios de
maneira a proteger direitos ameaçados ou aviltados por atos
de ilicitude, pelo que não podem descambar para o ‘fetichismo’,
a ‘forma pela forma’.
Pelo exposto, em consonância com a posição externada pela Procuradoria Regional Eleitoral, voto no sentido de que seja dado provimento ao recurso
para invalidar a decisão recorrida e determinar o retorno dos autos à instância
originária para que se renove o ato intimatório, considerando, no momento de
sua efetivação, a representação processual das partes nos autos.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de novembro de 2011.
Mônica Aguiar
Juíza Relatora
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
279
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 4 1 4 / 2 0 11
PETIÇÃO
PROCESSO Nº 490-92.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
Ipiaú
REQUERENTE:
Jaldo Coutinho Brandão. Adv.: Bel. Genivaldo Santana Lins.
REQUERIDO:
Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, Seção
da Bahia.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
Ação de declaração de existência de justa causa.
Desfiliação partidária. Resolução TSE nº 22.610/2007.
Grave discriminação pessoal. Não configuração.
Improcedência.
Julga-se improcedente ação de declaração de justa
causa, quando o requerente não comprova a grave
discriminação pessoal de que diz ter sido vítima por
parte da agremiação pela qual se elegeu, afastando,
assim, a hipótese prevista no art. 1º, § 1º, inciso IV
da Res. TSE nº 22.610/2007.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; JOSEVANDO
SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador
Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de pedido de declaração de existência de justa causa para
desfiliação partidária requerido por Jaldo Coutinho Brandão, em desfavor do
Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, com fundamento no
art. 1º, §1º, incisos III e IV da Resolução TSE nº 22.610/2007.
De acordo com a inicial, o requerente, vereador eleito no pleito de
2008 no Município de Ipiaú pelo partido requerido, estaria sofrendo diversos
280
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
atos de discriminação por parte de co-partidários seus, em especial do Sr.
Deraldino Alves Araújo, Prefeito daquela localidade que, em razão da fiscalização exercida pelo requerente na condição de vereador ao chefe do Poder
Executivo, teria “perseguido sistematicamente” o autor, que passou a ser
“excluído de reuniões”, “alvo de piadas, calúnias, difamações e até ameaça
de expulsão do partido.”
Afirma ter se tornado insustentável sua permanência no quadro de
filiados do PMDB, caracterizada a hipótese de “perseguição injustificável, a
denominada grave discriminação pessoal autorizadora da desfiliação partidária”, asseverando, ainda, ter comunicado, através de cartas, a situação
relatada ao diretório local da agremiação.
Às fls. 101/102, verificando a ausência dos requisitos específicos
para a concessão da tutela antecipada requestada, indeferi tal pleito, determinando a citação do requerido que, embora regularmente notificado,
quedou-se silente (fl. 106).
Remetidos os autos ao Procurador Regional Eleitoral, este se manifestou pelo indeferimento do pedido (fl. 108).
É o relatório.
VOTO
A Resolução TSE nº 22.610/2007, que disciplina o processo de
justificação de desfiliação partidária prevê, em seu art. 1º, § 1º, as seguintes
hipóteses para configuração de justa causa: a) incorporação ou fusão do partido; b) criação de novo partido; c) mudança substancial ou desvio reiterado
do programa partidário; d) grave discriminação pessoal.
No caso dos autos, o requerente pretende legitimar judicialmente
sua desfiliação dos quadros da agremiação requerida, ao argumento de
que foi vítima de grave discriminação e perseguição pessoal levada a efeito
através de atos de exclusão, inicialmente perpetrados pelo prefeito, e em
momento subsequente, por outros co-partidários ligados ao Chefe do Executivo, de quem teria sido “alvo de piadas, calúnias, difamações e até ameaça
de expulsão do partido”.
Impõe-se ressaltar, antes de mais nada que, não raro, a disputa
intrapartidária provoca a exaltação de ânimos, que se traduzem em discussões acaloradas, o que é perfeitamente aceitável, porquanto a confrontação
de idéias faz parte do próprio processo político democrático.
É natural e salutar que no seio de uma associação de pessoas
haja divergências internas, motivadas pelo conflito de objetivos, aspirações
e ideais, contexto no qual se incluem as agremiações político-partidárias.
Reflexo da própria sociedade, o partido político é a união de pessoas que,
em princípio, comungam dos mesmos interesses, mas que poderão, induSemest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
281
JURISPRUDÊNCIA
bitavelmente, possuir aspirações políticas distintas, traduzidas por embates
internos, podendo até resvalar em críticas mútuas, desde que respeitados
certos limites de razoabilidade e respeitabilidade.
Isto posto, evidentemente não se pode entender como aceitável a
perseguição política, prática condenável que cerceia a liberdade de consciência do indivíduo.
O art. 1º, IV da Resolução/TSE nº 22.610/07 tem por escopo
justamente proteger o filiado de situações em que ele é injustificadamente
preterido no seio da agremiação partidária a qual está vinculado. Esse é o
espírito da lei.
Na presente hipótese, o requerente alegou que sua relação com
o PMDB começou a se tornar conflituosa em razão da divergência política
entre aquele e o Chefe do Executivo a partir do momento em que o primeiro,
na condição de vereador, passou a exercer sistemática fiscalização sobre
os atos praticados pelo prefeito, notadamente a prestação de contas, os processos de pagamento, os contratos e licitações, motivando o comportamento
discriminatório e persecutório deste último em relação à sua pessoa.
Entretanto, compulsando os autos, observa-se que o requerido
apenas limitou-se a aduzir genericamente que teria sofrido discriminação por
parte do prefeito e alguns outros correligionários do seu partido, sem, entretanto, trazer qualquer prova capaz de levar à conclusão de que realmente
tal fato teria ocorrido.
É de se observar, que, embora o requerido tenha deixado transcorrer in albis o prazo para apresentação de defesa, a revelia não importa
o reconhecimento automático da procedência do pedido, uma vez que a
presunção de veracidade prevista como efeito material de sua ocorrência é
relativa e não absoluta.
Dessa forma, ao apreciar o requerimento formulado, cabe ao magistrado analisar as provas e alegações trazidas pela parte autora,valorando-as
conforme seu próprio entendimento e convicção.
Adune-se, por oportuno, que não há nos autos documento algum
capaz de revelar a perseguição enunciada pelo requerente. A vasta documentação que acompanhou a inicial comprova, tão-somente, que: 1) o autor
mantinha uma rigorosa atitude fiscalizadora em relação à gestão do Chefe
do Executivo, pedindo, inclusive, em reiteradas ocasiões, providências ao
Ministério Público local acerca dos atos reputados irregulares; e 2) que o
peticionante comunicou ao Presidente do Diretório Municipal do PMDB seu
estado de insatisfação com a administração exercida pelo requerido, oportunidade em que relatou, de maneira genérica, estar sendo “perseguido” e
“ameaçado de expulsão do Partido”.
Saliente-se que o fato de ter comunicado a suposta perseguição –
repise-se, de maneira absolutamente genérica - ao dirigente partidário não
282
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
comprova que a conduta discriminatória efetivamente ocorreu.
Não é demais repetir que singelas divergências e conjecturas, sem
nenhum dado concreto que conduza à conclusão pela ocorrência de perseguição e/ou grave discriminação pessoal, não podem amparar uma alegação
de justa causa capaz de justificar uma desfiliação partidária.
Diante disso, mostra-se inadmissível que, de forma injustificada e sem qualquer prova convincente de evento de qualquer das causas
autorizadoras de desfiliação elencadas no art. 1º, § 1º da Resolução TSE
nº 22.610/2007, venha a ser alterada a representação partidária escolhida
através das urnas.
Nesse sentido, colhem-se os seguintes entendimentos jurisprudenciais dos tribunais pátrios:
1. Fidelidade Partidária. Desfiliação sem justa causa. Procedência do Pedido.
2. Divergência entre filiados partidários no sentido de ser
alcançada projeção política não constitui justa causa para
desfiliação.
3. As causas determinantes da justa causa para a desfiliação estão previstas no art. 1º, § 1º, da Resolução
nº 22.610/2007.
4. O requerido não demonstrou grave discriminação pessoal a motivar o ato de desfiliação.
5. Pedido procedente”.
(PET nº 2.756 – Relator Min. José Augusto Delgado – DJE Diário da Justiça Eletrônico, Data 02/05/2008, Página 04).
Feitos Diversos. Pedido de justificação de desfiliação partidária. Vereador. Eleições 2004. Resolução n. 22.610/2007/
TSE. Alegação de mudança substancial ou desvio reiterado
no programa partidário. Não-comprovação. A mera oscilação
de um órgão partidário municipal entre a situação e a oposição
não configura justa causa para desfiliação. Alegação de grave
discriminação pessoal. Não comprovada pelos depoimentos testemunhais. Verificação de meros desentendimentos
e divergências políticas, comuns no âmbito interno dos
partidos políticos. Improcedência do pedido.
(TRE/MG - FD 10572007 Acórdão nº 2.900 – Relator Juiz Gutemberg da Mota e Silva - DJMG - Diário do Judiciário-Minas
Gerais, Data 12/09/2008). (grifos aditados).
Porque oportuno e perfeitamente aplicável à presente hipótese,
peço vênia para transcrever excerto do judicioso voto da Desembargadora
Cynthia Resende, Relatora do Acórdão TRE/BA nº 1.271, de 15.09.2009,
que, apreciando situação semelhante, assim dispôs:
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
283
JURISPRUDÊNCIA
“...não se trata aqui de impor àquele que, descontente com
outros filiados da sua grei partidária, permaneça contra sua
vontade vinculado a determinado partido político, mas de
conferir plena eficácia a interpretação constitucional manifestada pela Máxima Corte de Justiça deste País quando do
julgamento dos Mandados de Segurança nos 26.602, 26.603
e 26.604, oportunidade em que se decidiu que os mandatos
parlamentares obtidos por via do sistema eleitoral proporcional
pertencem aos partidos políticos, visando assim a assegurar
que a representação parlamentar partidária permaneça - durante toda a legislatura - proporcionalmente fiel à representação
partidária decidida pelo eleitor. Conforme o voto condutor da
decisão, da lavra do ministro Celso de Mello, ‘a mudança de
partido sem uma razão legítima viola o sistema proporcional
das eleições, determinado no artigo 45 da Constituição, desfalcando a representação dos partidos e fraudando a vontade
do eleitor. Isso porque as vagas obtidas por meio de quociente
eleitoral pertencem ao partido, e não ao parlamentar’ (in Notícias STF, 05/10/2007).”
À vista dessas considerações, inexistindo justa causa a fundamentar
a desfiliação da agremiação partidária pelo qual foi eleito o requerente, voto
pela improcedência do pedido formulado por Jaldo Coutinho Brandão.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 8 de novembro de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
284
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 5 1 3 / 2 0 11
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
PROCESSO Nº 1.282-46.2011.6.05.0000
CLASSE 9
MUNICÍPIO:
Salvador
SUSCITANTE:
Josevando Souza Andrade, Corregedor Regional Eleitoral.
SUSCITADO:
Juiz Carlos D’Ávila Teixeira.
INTERESSADOS: Paulo Ganem Souto, Nilo Augusto de Moraes Coelho, Coligação
A BAHIA MERECE MAIS (Advs.: Béis. Ademir Ismerim e outros);
Jaques Wagner e Otto Roberto Mendonça de Alencar.
RELATOR:
Juiz Cássio Miranda.
Conflito negativo de competência. Juiz Corregedor e
Juiz Auxiliar. Ação de investigação judicial eleitoral
por violação à Lei nº 9.504/97 e suposta prática de
abuso de poder político. Conexão. Competência mais
ampla atribuída à corregedoria. Hipótese de desmembramento afastada. Reconhecimento da competência
do juiz corregedor suscitante.
Preliminar de falta de interesse de agir.
Inacolhe-se a preliminar arguida pelo Ministério Público Eleitoral, quando a mesma se confunde com
o próprio mérito da demanda, não sendo possível,
dessa forma, se falar em extinção do feito sem resolução de mérito.
Mérito.
A representação que se fundamenta em fatos que
se amoldam, em tese, na prática da conduta vedada
proscrita pela Lei nº 9.504/97 e no abuso de poder
político, deve ser processada e julgada pelo Corregedor Eleitoral, por deter competência mais ampla
do que aquela conferida ao juiz auxiliar, durante o
período eleitoral, não sendo razoável o desmembramento previsto pela Res. TSE nº 23.193/10, haja
vista a possibilidade de serem proferidas decisões
contraditórias acerca da mesma situação fática.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, INACOLHER A PRELIMINAR, e no mérito, RESOLVER O
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
285
JURISPRUDÊNCIA
CONFLITO E FIXAR A COMPETÊNCIA DO JUIZ CORREGEDOR REGIONAL ELEITORAL, nos termos do voto do Juiz Relator de fls. 60/65, que
integra o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 24 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz Presidente; CÁSSIO MIRANDA - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional
Eleitoral
RELATÓRIO
Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Juiz
Josevando Souza Andrade, Corregedor Regional Eleitoral desta Corte, que
entendeu não deter competência para processar e julgar a investigação judicial
eleitoral ajuizada por Paulo Ganem Souto, Nilo Augusto Moraes Coelho e
a Coligação “A Bahia merece mais”, em desfavor de Jaques Wagner e Otto
Roberto Mendonça Alencar, pela prática de conduta vedada prevista pelo art.
73 da Lei n. 9.504/97, nas eleições de 2010.
A referida Representação de nº 5122-98.2010.6.05.0000 fora remetida à Corregedoria, após a declinação do então Juiz Auxiliar Carlos D’Ávila
Teixeira, sob o argumento de que, com o advento da Lei Complementar
nº 135/10, que modificou a Lei Complementar nº 64/90, a inelegibilidade passou a ser aplicada também a todos os agentes praticantes de atos vedados e,
portanto, seria desnecessário o desmembramento a que se refere o art. 21 da
Res. TSE n. 23.193/10, dispositivo que ressalva a competência do Corregedor
para apuração das transgressões à Lei das Inelegibilidades. Demais disso,
ponderou que o campo de cabimento da AIJE é mais amplo, abrangendo,
no caso concreto, a possibilidade de apurar a ocorrência ou não de atos
configuradores de abuso de poder, razão pela qual concluiu que a relatoria
do processo deveria ser transferida ao Corregedor Regional Eleitoral.
De outro lado, o Juiz suscitante sustentou que, conforme entendimento sufragado pela maioria dos membros deste Tribunal, a citada Lei
nº 135 não se aplica ao certame eleitoral passado. Assim, ressalvando os
fatos atinentes à alegação de abuso de poder, cuja competência, de fato,
seria atribuída ao Corregedor, requer seja declarada a competência do Juiz
suscitado para processar e julgar a ação em comento.
A Procuradoria Regional Eleitoral, em opinativo lançado às fls. 53/54,
pronunciou-se pela extinção do feito sem resolução do mérito.
É o relatório.
286
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
VOTO
De início, verifica-se que o ponto fulcral da divergência instaurada
entre os Juízes que figuram no presente conflito negativo de competência
refere-se à aplicabilidade ou não da Lei Complementar nº 135/2010 para as
eleições de 2010.
Deveras, nota-se dos autos que o então Juiz Auxiliar Carlos D’Ávila
Teixeira declinou da competência de processar e julgar ação de investigação
judicial eleitoral, interposta com vistas à apuração de fatos que caracterizam,
em tese, a prática de conduta vedada e abuso de poder político e de autoridade, com os fundamentos que ora peço vênia para trazer à colação:
“(...) nos casos em que a propositura da demanda importar na
alegação simultânea de fatos configuradores da prática de ato
vedado e da prática de ato de abuso de poder, a norma contida
no art. 21 da Resolução aludida impõe que seja procedido ao
desmembramento do feito, de modo que cada um dos fatos seja
apurado por meio de processos que tramitarão em separado:
um, o da representação, sob os cuidados de um juiz auxiliar
e o outro, o da investigação judicial eleitoral, sob a direção do
Corregedor Regional Eleitoral.
Assim, à primeira vista, o caso destes autos seria de desmembramento.
Sucede que a norma que se refere ao desmembramento
surgiu numa situação em que o pano de fundo era a distinção
das consequências jurídicas decorrentes do acolhimento de
um pedido formulado numa representação, quando comparadas com as consequências derivadas do acolhimento de um
pedido formulado num procedimento de investigação judicial
eleitoral.
É que, antes da entrada em vigor da Lei Complementar
n. 135/10, o entendimento dominante era o de que a procedência do pedido formulado num procedimento de investigação judicial eleitoral acarretaria a cassação do registro
de candidatura e a inelegibilidade, como decorrência da
aplicação da norma contida no art. 22, XIV, da LC n. 64/90.
Diferentemente, a procedência de um pedido formulado numa
representação baseada na prática de condutas vedadas aos
agentes públicos somente produzia como conseqüência a
cassação do registro ou do diploma (art. 73, § 5º, da Lei n.
9.504/97), sem inelegibilidade.
Ocorre, porém, que com a entrada em vigor da Lei Complementar n. 135/10, que modificou a Lei Complementar n. 64/90, a
inelegibilidade passou a ser aplicada também a todos os agentes públicos praticantes de atos vedados, conforme previsão
expressa do art. 1º, I, “j”, do mencionado diploma.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
287
JURISPRUDÊNCIA
Daí a conclusão de que, hodiernamente, o desmembramento
a que se refere o art. 21 da Resolução/TSE n. 23.193/10 não
teria qualquer conseqüência prática a não ser a indesejável
possibilidade de serem proferidas decisões logicamente incompatíveis.
Por todos estes motivos, de desmembramento não se há que
falar.
E aí não é possível menoscabar a circunstância de que há
fatos – como os que são noticiados neste processo – que, além
de caracterizarem, em tese, condutas vedadas aos agentes
públicos, que é hipótese de cabimento de representação, com
atuação de um juiz auxiliar como relator, também se enquadram
no conceito, mais amplo, de abuso de poder, que é caso de
investigação judicial eleitoral, atuando o Corregedor Regional
Eleitoral como relator.
E como não há sentido em se proceder ao desmembramento
e, além disso, o campo de cabimento da investigação judicial
eleitoral é mais amplo, abrangendo, no caso destes autos, a
possibilidade de se apurar a ocorrência ou não da prática de
atos configuradores de abuso de poder político e de poder de
autoridade, a conclusão a que se chega é à de que deve ser
transferida a relatoria do processo para o eminente Corregedor
Regional Eleitoral.”
De outro eito, o Juiz Corregedor não vislumbrou a sua competência para atuar na aludida representação (ressalvados os fatos atinentes à
alegação de abuso de poder) justamente porque possui entendimento no
sentido de que a Lei Complementar n. 135/10 não se aplica às eleições daquele ano, posicionamento este perfilhado pela maioria dos membros desta
Corte, conforme Acórdão nº 1176/2010, no qual restaram acolhidas as razões
esposadas pelo ora suscitante.
Pois bem. Primeiramente, impende destacar o dispositivo constante
da Res. TSE 23.193/10 (norma que disciplina o processamento das representações e das reclamações previstas na Lei nº 9.504/97), que dispõe sobre a
hipótese de desmembramento do feito, nos seguintes termos:
Art. 21. No caso de a inicial indicar infração à Lei 9.504/97
e também as transgressões citadas nos arts. 19 e 22 da LC
nº 64/90, com ou sem pedido expresso das partes, o relator
determinará o desmembramento feito, remetendo-se cópia integral à Corregedoria Eleitoral para apuração das
transgressões referentes à LC nº 64/90 (Resolução nº
21.166/2002). (grifo nosso)
Em suma, a previsão normativa é no sentido de que a competência para apurar fatos que afrontem a Lei das Eleições é de competência
288
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
do Juiz Auxiliar, entretanto, existindo violação da Lei das Inelegibilidades a
competência é atribuída ao Corregedor, daí o comando de que o feito seja
desmembrado.
No presente caso, a situação fática exposta na exordial (alegação de
que alegam que o atual Governador estaria realizando repasses de verbas a
Associações Comunitárias e Cooperativas de Produtores Rurais em período
eleitoral), conforme destaca o próprio representante, se enquadra na conduta
vedada proscrita pelo art. 73 da Lei n. 9.504/97, bem como configura abuso
de poder de autoridade e político.
Conforme salientado pelo juiz suscitado, após o advento da Lei
nº 135/2010, esta separação de atribuições se tornou inconveniente, uma
vez que a inelegibilidade passou a ser aplicada também a todos os agentes
públicos praticantes de atos vedados, atraindo, portanto, a competência do
Corregedor Eleitoral.
Assim também entendo.
Ressalta-se, contudo, que a aplicabilidade da chamada Lei da
Ficha Limpa às eleições de 2010, apesar de defendida por este Relator em
vários processos julgados nesta Corte, não foi reconhecida pela maioria dos
membros do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 633.703 e não tem sido acolhida pela maioria dos integrantes
deste Regional, subsistindo, portanto, a controvérsia posta pelo Juiz Corregedor ao derredor da sua competência para julgar o presente feito.
De qualquer sorte, entendo que, mesmo se superado o argumento
alusivo à aplicabilidade da Lei nº 135/10, a conclusão a que se chega é a de
que efetivamente a competência para apreciar a ação sob exame deve ser
conferida ao Corregedor.
Isso porque, conforme bem pontuado pelo Procurador Regional
Eleitoral, malgrado a matéria de fundo da aludida representação comporte
violação ao art. 73 da Lei das Eleições, o que, em tese, afastaria no particular
a competência da Corregedoria, a conexão presente na espécie, sobretudo
pela natureza imbricada dos fatos, é circunstância que elide a hipótese de
desmembramento do feito.
Sobre o tema, oportuno trazer à baila o posicionamento do Tribunal
Superior Eleitoral, estampado na ementa e trechos do voto condutor do acórdão
lavrado nos autos do Recurso Ordinário nº 1540, a seguir colacionados:
RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE) COM BASE NO ART. 22 DA LEI
COMPLEMENTAR N° 64/90 E ART. 30-A DA LEI N° 9.504/97.
IRREGULARIDADES NA ARRECADAÇÃO E GASTOS DE RECURSOS DE CAMPANHA. PRAZO PARA O AJUIZAMENTO.
PRAZO DECADENCIAL. INEXISTÊNCIA. COMPETÊNCIA.
JUIZ AUXILIAR. ABUSO DE PODER POLÍTICO. CONE-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
289
JURISPRUDÊNCIA
XÃO. CORREGEDOR. PROPOSITURA. CANDIDATO NÃO
ELEITO. POSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE ATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. POSSIBILIDADE. SANÇÃO
APLICÁVEL. NEGATIVA DE OUTORGA DO DIPLOMA OU
SUA CASSAÇÃO. ART. 30-A, § 2o. PROPORCIONALIDADE.
PROVIMENTO.
(...) 3. Durante o período eleitoral, os juízes auxiliares são
competentes para processar as ações propostas com fulcro
no art. 30-A da Lei n° 9.504/97 (AgR-Rep n° 1229/DF, Rei. Min.
César Asfor Rocha, DJ de 13.12.2006; RO n° 1596/MG, Rei.
Min. Joaquim Barbosa, DJ de 16.3.2009), o que não exclui a
competência do Corregedor, pela conexão, quando a ação
tiver por objeto a captação ilícita de recursos cumulada
com o abuso de poder econômico.
“(...) Corroborando a tese da incompetência do Corregedor para
a representação com fulcro no art. 30-A: AgR-Rep n° 1229/
DF, Rei. Min. César Asfor Rocha, DJ de 13.12.2006. Registro,
ainda, que o c. Tribunal Superior Eleitoral consignou no recente
julgamento do RO n° 1596/MG, Rei. Min. Joaquim Barbosa,
DJ de 16.3.2009, que os Juízes Auxiliares têm competência
para conduzir a ação de investigação judicial eleitoral fundada
no art. 30-A da Lei n° 9.504/97.
Todavia, no caso dos autos, houve cumulação de objetos,
a saber, captação ilícita de recursos e abuso de poder econômico. E não poderia ser de outra forma, pois, entre o ilícito
previsto no art. 30-A e eventual abuso de poder econômico que
dele possa decorrer, há identidade da causa de pedir.
A captação ilícita de recursos pode ser utilizada como meio
para o abuso de poder econômico. Desmembrar o processo, neste caso, poderia ocasionar decisões conflitantes.
Além disso, o rito a ser seguido tanto na ação que investiga a
violação ao art. 30-A quanto na destinada a apuração de abuso
de poder será aquele previsto no art. 22 da Lei Complementar
n° 64/90.”
(TSE. RO - Recurso Ordinário nº 1540 - Belém/PA. Acórdão
de 28/04/2009. Relator(a) Min. FELIX FISCHER. Publicação:
DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 01/06/2009, Página
25/26/27)
Com efeito, assim como no exemplo acima, penso que não é razoável promover o destaque de dois julgadores para analisarem os mesmos fatos,
sob pena de se correr o risco de serem proferidas decisões contraditórias.
Desse modo, considerando que o campo da ação de investigação judicial
eleitoral, sob o prisma do abuso de poder, de atribuição do Corregedor, é mais
amplo, afigura-se pertinente que lhe seja confiada a relatoria da demanda
em comento.
290
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
À vista de tais considerações, conheço do presente conflito e voto no
sentido de declarar a competência do Juiz Corregedor Regional Eleitoral para
processar e julgar a Representação nº 5122-98.2010.6.05.0000, impondo-se
a remessa dos respectivos autos à sua apreciação.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 19 de outubro de 2011.
Cássio Miranda
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
291
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 5 1 4 / 2 0 11
PETIÇÃO
PROCESSO Nº 1.266-92.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
Ibirapuã
REQUERENTE:
Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB de Ibirapuã. Adv.: Bel. Igor Andrade Costa e Jayme Vieira Lima Filho.
REQUERIDO:
Silvânio Araújo de Andrade. Advs.: Béis. Luiz Viana Queiroz,
Luciano Mineiro Falcão e Maurício Oliveira Campos.
RELATOR:
Juiz Cássio Miranda.
Petição. Ação declaratória de perda de mandato
eletivo. Expulsão pelo partido acionante. Preliminar
de carência de ação. Ausência de interesse de agir.
Impossibilidade jurídica do pedido. Inadequação
da via eleita. Res.TSE nº 22.610/2007. Extinção sem
resolução do mérito.
De acordo com o entendimento do Tribunal Superior
Eleitoral, a perda do mandato eletivo está condicionada à desfiliação partidária por ato voluntário do
político.
A hipótese de expulsão pelo partido não se encontra
albergada pela Resolução TSE nº 22.610/07, restando configurada a ausência de interesse de agir da
agremiação, bem como a impossibilidade jurídica do
pedido sob tal fundamento.
Outrossim, observa-se que a presente via processual
se mostra inadequada para apreciar os motivos que
ensejaram a punição levada a cabo pelo partido, pois,
tratando-se de matéria interna corporis, não são suscetíveis de apreciação pela Justiça Eleitoral, restando
inviabilizada a aferição da ocorrência ou não da argüida infidelidade partidária supostamente caracterizada
pelo descumprimento à norma estatutária.
Extinção do processo sem resolução do mérito.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, ACOLHER A PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO E EXTINGUIR O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do voto
do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
292
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 24 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; CÁSSIO MIRANDA - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional
Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de petição interposta pelo Diretório Municipal do Partido
do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB de Ibirapuã, visando a declaração da perda do cargo eletivo do Sr. Silvânio Araújo de Andrade, vereador
daquele município, sob o fundamento da incidência de suposta infidelidade
partidária perpetrada pelo requerido.
Acosta os documentos de fls. 08/26.
Argumenta o requerente que o parlamentar há muito “não vem
cumprindo os seus deveres como filiado perante a agremiação pela qual foi
eleito, notadamente, quanto à abstenção de apoio a candidatura própria do
Partido do Governo do Estado da Bahia nas Eleições de 2010, tendo o réu,
em contraponto, declarado apoio ao candidato adversário reeleito, além de
votar constantemente contra os interesses e deliberações da bancada do
PMDB na respectiva Câmara de Vereadores”.
Afirma que foi instaurado procedimento ético disciplinar contra o
vereador, que resultou na aplicação da pena de expulsão do réu dos quadros
de filiados do PMDB e consequente desfiliação em 13 de junho de 2011.
Diante de tais fatos, considerando que o requerido não está mais
filiado à agremiação peticionante, cuja desfiliação teria decorrido da sua própria conduta contrária aos preceitos estatutários, requer que seja declarada
a perda do cargo e determinada a posse do primeiro suplente peemedebista,
nos termos da Resolução TSE nº 22.610/07.
Citado, o requerido oferece resposta acompanhada de documentação, fls. 32/49, na qual suscita a preliminar de carência de ação por ausência
de interesse de agir, uma vez que a via processual escolhida é incompatível com a pretensão buscada pelo acionante. Invoca, ainda, a prefacial de
inépcia da inicial e, no mérito, sustenta a improcedência do pedido, em face
das seguintes razões: o requerido ainda está filiado ao PMDB; se o Tribunal
considerar que o acionado não está filiado, é incontroverso que a desfiliação
foi causada por vontade da própria agremiação; a suposta desfiliação foi
precedida de processo ético-disciplinar desprovido de garantias de defesa e
provas da prática de conduta que revelasse o descumprimento dos deveres
do filiado.
Termo de audiência e oitiva das testemunhas arroladas por ambos
os pólos às fls. 02/48 da Carta de Ordem em apenso.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
293
JURISPRUDÊNCIA
Apresentadas alegações finais às fls. 65/71 e 72/75.
Em parecer de fls. 77/80, a Procuradoria Regional Eleitoral manifesta-se no sentido de acolher a preliminar de carência de ação, a fim de que
seja extinto o feito sem apreciação do mérito.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO.
Alega o requerido a ausência de interesse de agir do partido
acionante, uma vez que a medida judicial pretendida não está prevista na
Resolução TSE nº 22.610/2007, bem como a via processual escolhida é
inadequada à pretensão de conseguir uma decisão constitutiva negativa
mediante a propositura de uma ação meramente declaratória.
Assevera que, in casu, a agremiação, como única causadora da
desfiliação (pois expulsou o acionado dos seus quadros), pretende que este
Tribunal declare a perda do mandato, reconhecendo a ausência de justa
causa, desconstituindo-o do requerido. Contudo, pondera que a ação de
decretação de perda de cargo eletivo indispõe de natureza declaratória e, por
outro lado, o partido político é parte ilegítima para propor ação declaratória
de existência de justa causa à desfiliação partidária.
A questão ora suscitada advém da peculiar causa de pedir aventada
na peça exordial para supedanear a pretensão de perda de cargo eletivo:
expulsão do vereador requerido por infidelidade partidária consistente no
descumprimento aos preceitos éticos e disciplinares dispostos na regulamentação estatutária da agremiação acionante.
Sucede que a Resolução TSE nº 22.610/07, que disciplina o processo de perda de cargo eletivo, não elenca a expulsão como fundamento para
que o partido reivindique o mandato daquele que foi afastado pelo próprio
requerente. Assim dispõe a Resolução:
Art. 1º - O partido político interessado pode pedir, perante a
Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em
decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.
§ 1º - Considera-se justa causa:
I) incorporação ou fusão do partido;
II) criação de novo partido;
III) mudança substancial ou desvio reiterado do programa
partidário;
IV) grave discriminação pessoal.
§ 2º - Quando o partido político não formular o pedido dentro de
30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio,
294
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
nos 30 (trinta) subseqüentes, quem tenha interesse jurídico ou
o Ministério Público eleitoral.
§ 3º - O mandatário que se desfiliou ou pretenda desfiliar-se
pode pedir a declaração da existência de justa causa, fazendo
citar o partido, na forma desta Resolução.
Conforme se depreende da norma, há o pressuposto de que a
desfiliação partidária tenha sido um ato voluntário do filiado, hipótese distinta do caso em tela, pois houve a sua expulsão pela agremiação, fato este
estampado na peça pórtica.
Decerto, nota-se que Tribunal Superior Eleitoral, em resposta à
Consulta nº 1.398/DF, que deu origem à citada Resolução, deixou bem claro
que a perda do mandato eletivo estaria condicionada à desfiliação partidária
por ato voluntário do político, nos seguintes termos:
(…) os partidos políticos e as coligações conservam o direito à
vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver
pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do
candidato eleito por um partido para outra legenda (…).
(TSE, trecho do voto do Relator Min. Cesar Asfor Rocha,
08.05.2007).
No particular, importa ainda trazer a lume trechos do voto proferido
naqueles autos, pelo Min. Cezar Peluso, que bem elucida o contexto no qual
se inseriu a consulta:
A resposta à consulta não se adstringe, porém, e, a rigor,
nem de longe concerne à questão da fidelidade partidária,
entendida em termos como princípio destinado a governar as
relações internas entre o partido, e seus afiliados, as quais
constituem o objeto específico da previsão do art. 17, 1º, da
Constituição da República. O de que se trata aqui, é do fato
extremo da mudança de partido, coisa que só no plano teórico
pode relacionar-se com esse tema constitucional de fidelidade
e disciplina partidária (...).
Ora, a questão que a consulta suscita sobre a legitimidade do
mandato representativo proporcional tem outro fundamento,
voltado ao fato externo do cancelamento de filiação ou da
transferência de partido, à luz da relação entre o representante
e o eleitor, intermediada pelo partido. Afere-se, aqui, não a
fidelidade partidária, mas a fidelidade ao eleitor!
(grifo nosso)
Verifica-se, portanto, que a intenção da norma é de punir o parlamentar que age contrariamente à vontade popular, ao se desvincular espontaneamente do partido pelo qual foi eleito e seguir outra ideologia política.
Não há dúvidas, portanto, que a hipótese de expulsão pelo partido
não se encontra albergada pela Resolução e, considerando que tal norma restringe um direito, deve ser rechaçada sua eventual interpretação extensiva.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
295
JURISPRUDÊNCIA
Nesse diapasão, cumpre destacar as ponderações do doutrinador
José Jairo Gomes no sentido de que, se os motivos da expulsão, embora
constantes do estatuto partidário, não coincidirem com aqueles estampados
na Resolução como justa causa, “cuidando-se de privação de direito, os fundamentos para a perda do cargo não poderão ser alargados pelo intérprete”.
Ademais, observa-se que a presente via processual se mostra inadequada para apreciar os motivos que ensejaram a punição levada a cabo
pelo partido, pois, tratando-se de matéria interna corporis, não são suscetíveis de apreciação pela Justiça Eleitoral, restando inviabilizada a aferição
da ocorrência ou não da arguida infidelidade partidária, caracterizada pelo
descumprimento à norma estatutária.
Diante de tais razões que, inclusive, encontram ressonância em
precedente emanado pelo Tribunal Superior Eleitoral e em julgados oriundos
de diversas Cortes Regionais Eleitorais, penso que a pretensão autoral não
encontra amparo jurídico. Confira-se a jurisprudência:
AGRAVO REGIMENTAL. PETIÇÃO. PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DE MANDATO ELETIVO. DESFILIAÇÃO
PELO PARTIDO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. ART.
1º, § 3º DA RES.-TSE 22.610/2007. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. ART. 267, IV, DO CPC.
1. O pedido de perda de mandato por desfiliação partidária
encontra respaldo no art. 1º da Res.-TSE 22.610/2007. Contudo, referida norma impõe, como condição da ação, que o
postulante se encontre no papel de mandatário que se desfiliou
ou pretenda desfiliar-se do partido pelo qual se elegeu. No
caso, como o próprio Democratas (DEM) editou a Resolução
070/2009, impondo ao agravado o desligamento do Partido,
impossível que se concretize quaisquer das condições impostas pela norma, quais sejam, que o mandatário se encontre na
situação de quem se desfiliou ou pretenda desfiliar-se. Nesse
passo, não encontra respaldo jurídico a pretensão do suplente
de reinvindicação da vaga.
2.O ajuizamento de ação declaratória de justa causa para
desfiliação partidária não pode ser considerado, pelo partido,
pedido implícito de desfiliação. Tal pretensão encontra respaldo no direito de livre acesso ao Poder Judiciário, assegurado
constitucionalmente (art. 5º, XXXV, da CR/88) bem como no
art. 1º, § 3º, da Res.-TSE nº 22.610/2007.
3.Correta a decisão agravada ao vislumbrar a perda de objeto
da ação que postula a perda do mandato do agravado, tendo
em vista que seu desligamento foi realizado pelo partido.
Agravo a que se nega provimento.
(TSE. AgR-Pet - Agravo Regimental em Petição nº 2.983 Brasília/DF. Acórdão de 18/06/2009. Relator(a) Min. Felix
Fischer. Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data
18/09/2009, Página 11)
296
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
EXPEDIENTE SEM CLASSIFICAÇÃO. INFIDELIDADE
PARTIDÁRIA. PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DO
CARGO DE VEREADOR. ELEIÇÕES DE OUTUBRO DE
2004. EXPULSÃO DO VEREADOR. CONTRARIEDADE AO
ESTATUTO DO PRP. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME DA
EXPULSÃO EM AÇÕES DE PERDA DE MANDATO ELETIVO.
IMPROCEDÊNCIA.
(TRE-CE. EXPEDIENTE SEM CLASSIFICACAO nº 11.414
- Quixeramobim/CE. Acórdão nº 11.414 de 08/04/2008.
Relator(a) Danilo Fontenele Sampaio Cunha. Publicação: DJ
- Diário de justiça, Volume 74, Data 22/04/2008, Página 228)
PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO.
PRETENSÃO DE REAVER CARGO DE CORRELIGIONÁRIO
EXPULSO DA AGREMIAÇÃO POR MANIFESTAÇÃO PÚBLICA DE APOIO A ADVERSÁRIOS POLÍTICOS. SITUAÇÃO
QUE NÃO SE ENQUADRA NAS HIPÓTESES DA RESOLUÇÃO TSE N. 22.610/2007. NECESSIDADE DE O ATO DE
INFIDELIDADE DECORRER DE DECISÃO VOLUNTÁRIA DO
FILIADO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
(TRE-RS. RPET - RECURSO - PETIÇÃO nº 59 - Nova Bréscia/
RS. Acórdão de 18/08/2009. Relator(a) Ícaro Carvalho de Bem
Osório. Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do
TRE-RS, Tomo 138, Data 21/08/2009, Página 2 e 3)
AÇÃO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO.
PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
ACOLHIMENTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
1. Filiado que foi expulso de partido político não pode sofrer
penalidade prevista na Resolução TSE nº 22.610/2007, já que,
nesta hipótese, está-se diante de cancelamento de filiação, e
não de desfiliação a ensejar perda do mandato eletivo. Pedido
que se mostra juridicamente impossível.
2. Extinção do processo sem resolução do mérito (CPC, art.
267, VI).
(TRE-AP. PET - PETICAO nº 200 - Macapá/AP. Acórdão
nº 2.959 de 19/04/2010. Relator(a) Petrus Soares Azevedo.
Publicação: DOE - Diário Oficial do Estado, Tomo 4724, Data
03/05/2010, Página 25/26)
AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE PERDA DE CARGO
ELETIVO. DESFILIAÇÃO. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. RESOLUÇÃO TSE Nº 22.610/2007. DEMANDA AJUIZADA APÓS
EXPULSÃO DO MANDATÁRIO DOS QUADROS DO PARTIDO
POLÍTICO. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO MANIFESTAMENTE
INADMISSÍVEL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
297
JURISPRUDÊNCIA
(TRE-SP. PROC - PROCESSO nº 58.977 - São Paulo/SP. Acórdão de 04/08/2011. Relator(a) Jeferson Moreira de Carvalho.
Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP,
Data 15/08/2011)
Pelo exposto, em harmonia com o parecer ministerial, voto no
sentido de ser acolhida a preliminar de carência de ação, seja pela ausência
de interesse de agir, seja pela manifesta impossibilidade jurídica do pedido,
impondo-se a extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos do art.
267, inc.VI do Código de Processo Civil.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 24 de novembro de 2011.
Cássio Miranda
Juiz Relator
298
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 5 7 6 / 2 0 11
AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO
PROCESSO Nº 288-18.2011.6.05.0000
CLASSE. 2
MUNICÍPIO:
Salvador
IMPUGNANTE:
Nonato Carvalho Leite. Advs.: Bel. Antônio Vasconcelos Sampaio.
IMPUGNADOS:
Jutahy Magalhães Júnior. Advs.: Béis. Jutahy Magalhães Neto,
Diego Freitas Ribeiro e outros; Cláudia Silva Santos Oliveira.
Advs.: Béis. Luiz Viana Queiroz, Marcio Moreira Ferreira e outros.
RELATOR:
Juiz Wanderley Gomes.
REVISOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
AIME. Decadência. Reconhecimento. Extinção do
processo com julgamento do mérito.
Preliminar de decadência.
Acolhe-se a prefacial, para extinguir o processo, com
julgamento do mérito, em razão da decadência, quando
a ação de impugnação de mandato eletivo foi ajuizada
após o decurso dos quinze dias, contados da diplomação
dos eleitos.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, ACOLHER A PRELIMINAR DE DECADÊNCIA, nos termos
do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente
Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; WANDERLEY GOMES - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA
MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de ação de impugnação de mandato eletivo interposta
por NONATO CARVALHO LEITE, em desfavor de JUTAHY MAGALHÃES
JÚNIOR, deputado federal, e de CLÁUDIA SILVA SANTOS OLIVEIRA, deputada estadual, sob a alegação de abuso dos poderes econômico e político,
captação ilícita de sufrágio, corrupção e fraude eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
299
JURISPRUDÊNCIA
Defendendo a tempestividade da inicial, o impugnante aduz ter
havido utilização da máquina administrativa municipal de Buerarema, para
aliciar eleitores e angariar votos para os impugnados.
Aduz que a compra de votos estaria demonstrada na cópia, acostada
aos autos, do Inquérito Policial, instaurado pela Polícia Federal de Ilhéus,
para apurar a denominada “Operação Paga”.
Pugna pela procedência da ação, para desconstituir os diplomas
dos impugnados, cassando-lhes os seus respectivos mandatos.
Em contestação, o primeiro impugnado suscitou preliminares de
decadência, do não cumprimento das exigências dispostas na Lei 9.800/99
e da inépcia da peça de ingresso. No mérito, refuta as acusações lançadas e
assevera inexistir qualquer substrato probatório hábil a demonstrar a veracidade das mesmas, em virtude do que insta pela improcedência da demanda
e pela condenação do impugnante por litigância de má-fé, nos termos do
artigo 17 do CPC e artigo 14, §11 da Constituição Federal.
Regularmente citada, a segunda impugnada, por sua vez, arguiu
preliminares de litispendência e de decadência. No mérito, negou a prática
de ilicitudes, reputou inválida a prova juntada, decorrente do Inquérito Policial
n.º 0329/2010-4-DPF/ILS/BA, seja porque produzida unilateralmente, seja
porque não se presta a demonstrar o fato declarado. Alega, ainda, que o
aludido inquérito seria nulo, por incompetência absoluta do Juízo Zonal para
processar e julgar ilícitos praticados por deputados federais.
Aduz ter havido manipulação dos fatos apurados no já mencionado
Inquérito, a revelar uma trama urdida com a finalidade espúria de tentar reverter a vontade popular manifestada nas urnas. Noticia que a diferença de
votos entre o representante e a representada foi de 26.389 votos, pelo que
não teria restado demonstrada a potencialidade lesiva da ilicitude.
Por fim, acoimando falsas e impertinentes as acusações contra si
lançadas, insta pela improcedência da ação.
Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral lançou
opinativo às fls. 136/137, manifestando-se pela extinção do processo com
resolução de mérito, em relação ao primeiro impugnado, em razão da decadência. Em relação à segunda impugnada, alegando que a mesma não teria
sido citada, opina pela extinção do processo, sem resolução do mérito, nos
termos do art. 267, I c/c art. 295, IV, do CPC.
É o que me cumpre relatar.
300
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
VOTO
PRELIMINAR DE DECADÊNCIA.
Impende ressaltar que resta incontroversa a natureza decadencial
do prazo para a propositura da ação de impugnação de mandato eletivo, do
que se depreende que o mesmo não se interrompe, tampouco se suspende
em razão de férias ou recesso forense. Quanto aos termos inicial e final, é
igualmente certo que devem os mesmos ser prorrogados para o primeiro dia
útil subsequente, em obediência ao § 1º, do art. 184 do CPC, de aplicação
subsidiária a essa Justiça Especializada.
A diplomação dos eleitos, no município de Salvador, deu-se no dia
16/12/2010, uma quinta-feira, e o recesso natalino teve início na segundafeira, dia 20/12/2010, conforme a Portaria nº 612/2010, da Presidência deste
Regional, publicada no Diário de Justiça Eletrônico de 13/12/2010.
Assim, decorrido o interstício de quinze dias, contados da diplomação, tem-se que a ação poderia ser ajuizada até o dia 31/12/2010. Ocorre que,
em sendo feriado natalino, opera-se a regra acima mencionada, do dispositivo
contido no § 1º, do art. 184 do CPC, estendendo-se para o primeiro dia útil
subsequente ao término do recesso.
Na hipótese em julgamento, porém, a ação somente foi ajuizada
em 19/01/2011, de modo que o reconhecimento da decadência é medida
que se impõe.
Pelo exposto, julgo extinta a presente ação, com julgamento do
mérito, com esteio no artigo 269, IV do CPC.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011.
Wanderley Gomes
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
301
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 5 9 4 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
Nº 93-05.2011.6.05.0171
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Camaçari
RECORRENTE:
Partido Trabalhista Cristão – PTC de Camaçari. Adv.: Bel. Roberto
Moacir Nascimento.
RECORRIDO:
Ademar Lopes Fernandes. Advs.: Béis. Paulo Sérgio Dias Nunes
e Alan de Almeida Coutinho.
PROCEDÊNCIA:
Juízo Eleitoral da 171ª Zona.
RELATOR:
Juiz Wanderley Gomes.
Recurso. Representação. Outdoor. Mensagens de
felicitação. Propaganda eleitoral antecipada. Provimento.
Dá-se provimento a recurso, para condenar o recorrido à sanção prevista no art. 36, § 3º da Lei nº
9.504/97, quando a publicidade impugnada afronta
o princípio da paridade de armas entre os candidatos, configurando a prática de propaganda eleitoral
extemporânea.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de dezembro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Presidente em exercício;
WANDERLEY GOMES - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pelo Partido Trabalhista Cristão
- PTC, contra decisão zonal que julgou improcedente a representação intentada em desfavor de Ademar Lopes Fernandes, Secretário de Relações
Institucionais do Município de Camaçari, com fulcro no artigo 36 da Lei
nº 9.504/97, pela prática de propaganda eleitoral antecipada, consubstanciada
em outdoors fixados em diversos pontos da cidade, com os seguintes dizeres:
LOPES. 23/10. FELIZ ANIVERSÁRIO: SUA VIDA É UMA LUTA REPLETA
DE VITÓRIAS!
302
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
O recorrente aduz que, por meio da noticiada veiculação publicitária, o recorrido estaria promovendo e difundindo a sua pré-candidatura às
eleições municipais de 2012. Assevera que a prova dos autos revelaria a
indisfarçável intenção do recorrido em promover-se, vinculando o seu nome
e imagem aos enormes artefatos propagandísticos, cujas mensagens enalteceriam a sua pessoa.
Pugna, assim, pelo provimento da irresignação, a fim de que seja
a presente ação julgada procedente.
Em contrarrazões, o recorrido, reiterando a argumentação lançada
em sua contestação, afirma não ter praticado qualquer ato contrário à legislação de regência, mesmo porque ele não teria sequer manifestado a intenção
de concorrer a qualquer cargo eletivo. Defende a manutenção do decisum de
origem, que restou amparado no parecer do Ministério Público zonal.
Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral lançou opinativo às fls. 58/62, manifestando-se pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Com razão o recorrente.
Do exame dos autos, entendo que a decisão fustigada merece reforma, ante o notório caráter eleitoral do marketing impugnado, sendo este,
destarte, hábil a provocar o desequilíbrio de oportunidades no prélio vindouro,
circunstância que, efetivamente, viola os preceitos eleitorais.
Ressalte-se, outrossim, que o meio utilizado para a veiculação
da mensagem, objeto da presente demanda é, por si só, ostensivo. É que
não se pode negar o poder de reverberação e de alcance do outdoor, cuja
característica precípua é a continuidade, já que, durante o prazo contratado,
a mensagem veiculada fica, ininterruptamente, disponível aos incontáveis
olhares dos transeuntes da região.
Malgrado não se tenha o pedido explícito de votos, é de se reconhecer que, ao projetar o nome e a imagem do primeiro recorrido, a aludida
publicidade promove a pessoa do mesmo, lançando, no subconsciente
popular, a sua notoriedade, em ocasião anterior à permitida por lei. Resta
evidente, portanto, a afronta ao princípio da igualdade entre os candidatos,
por meio do que se conhece por propaganda subliminar.
Nesta direção, eis o que se colhe do magistério de José Jairo
Gomes :
Enquanto a [propaganda] expressa se patenteia de maneira
clara e inequívoca, a subliminar procura influenciar o receptor
sem deixar entrever que há uma mensagem sendo transmiti-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
303
JURISPRUDÊNCIA
da, ou seja, atua abaixo do limiar. A mensagem subliminar é
comunicada sutilmente, de sorte que sua percepção não se
dá de modo plenamente consciente; tem em vista persuadir o
eleitor mediata e silenciosamente.
Pelas razões retro delineadas, voto pelo provimento do recurso
para, reformando a decisão singular, condenar o recorrido ao pagamento da
multa descrita no art. 36, § 3º da Lei nº 9.504/97, fixando-a no mínimo legal,
qual seja o valor de R$5.000,00 (cinco mil reais).
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 5 de dezembro de 2011.
Wanderley Gomes
Juiz Relator
304
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 5 9 8 / 2 0 11
INQUÉRITO
PROCESSO Nº 3-37.2011.6.05.0190
CLASSE 18
MUNICÍPIO:
Serra Dourada
PROCEDÊNCIA:
Departamento de Polícia Federal.
INVESTIGADOS:
Edirlei Rosa Mesquita (Adv.: Bel. Antonio Wanderlaan Batista),
Enilson Fagundes Camelo, Cláudia dos Anjos de Souza, Eneide
de Jesus Lima, Elenice Maria de Almeida e Jovito Teixeira de
Oliveira.
RELATORA:
Juíza Mônica Aguiar.
Inquérito policial. Apuração de crime eleitoral tipificado no art. 11, c/c o art. 5º da Lei nº 6.091/74. Pluralidade de indiciados. Prerrogativa de função de um
deles. Ausência de indícios de autoria em relação ao
detentor de foro especial. Aplicação da regra geral
do art. 69 do CPP. Lugar da infração. Competência do
juízo eleitoral singular. Remessa dos autos.
1. Compete originariamente ao juízo do local da infração processar e julgar causas criminais eleitorais,
quando ausentes indícios de autoria em relação ao
único indiciado que detinha foro especial por prerrogativa de função;
2. Competência declinada para o juízo eleitoral do
lugar da infração.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DECLINAR DA COMPETÊNCIA PARA O JUÍZO DA 11ª ZONA
ELEITORAL DE FORMOSA/GO, nos termos do voto da Juíza Relatora,
adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 6 de dezembro de 2011.
DAISY LAGO RIBEIRO COELHO - Vice-Presidente no exercício
da Presidência; MÔNICA AGUIAR - Juíza Relatora; SIDNEY PESSOA MADRUGA
- Procurador Regional Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
305
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Trata-se de inquérito policial instaurado para apuração da prática
do crime de eleitoral tipificado no art. 11 c/c o art. 5º da Lei nº 6.091/74, de
que são suspeitos Edirlei Rosa Mesquita, Cláudia dos Anjos de Souza, Edneide de Jesus Lima, Elenice Maria de Almeida, Jovito Teixeira de Oliveira e
Enilson Fagundes Camelo.
Consta dos autos que no dia 03/10/04, Edirlei Rosa Mesquita foi
preso em flagrante por conduzir ônibus da empresa Apolo Turismo, na rodovia BR-020, nas proximidades do Município de Formosa/GO, transportando
eleitores da cidade de Goiânia para o Município de Serra Dourada/BA, momento em que o veículo foi abordado por uma barreira da Polícia Rodoviária
Federal, montada para impedir o transporte ilegal de eleitores.
Durante as investigações realizadas, a Polícia Federal constatou
a existência de mais 5 (cinco) envolvidos na prática do crime, dentre eles,
Enilson Fagundes Camelo, atual prefeito do Município de Serra Dourada
(fls. 125/132).
Em vista disso, o Juiz da 11ª Zona Eleitoral de Formosa/GO determinou a remessa dos autos ao TRE de Goiás, para posterior encaminhamento
a esta Corte, por entender que o foro por prerrogativa de função do prefeito
prevaleceria sobre a regra geral da competência territorial (fl. 140).
O Presidente do TRE de Goiás, por sua vez, acolhendo a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 145/146), remeteu os autos a
esta Corte (fls. 148 e 158).
Submetidos os autos do inquérito a este Tribunal, deu-se seguimento às investigações.
Concluídas as diligências investigatórias, os autos foram encaminhados ao Ministério Público Eleitoral, que, por não verificar indícios de
autoria em relação ao prefeito Enilson Fagundes Melo, promoveu declinatoria
fori, e requereu que os autos fossem restituídos à Promotoria Eleitoral da
11ª Zona, em Formosa/GO, para que proceda, se for o caso, à ação penal
contra as pessoas implicadas no crime e que não gozam de foro especial
(fls. 310/311).
É o relatório.
VOTO
O procedimento investigatório sob exame foi instaurado para apuração de delito supostamente praticado por Edirlei Rosa Mesquita, preso em
flagrante no dia do pleito de 2004, no Município de Formosa/GO, ao transportar
eleitores de Goiânia/GO para Serra Dourada/BA.
306
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Durante as investigações, surgiu a hipótese do envolvimento de
Enilson Fagundes Camelo, atual prefeito do Município de Serra Dourada,
além de outros indiciados.
Sucede que, conforme se extrai do relatório policial de fls. 125/132,
imputou-se ao prefeito Enilson Fagundes Camelo a prática do delito, pelo só
fato de ser ele um possível beneficiário da conduta ilícita (transporte clandestino de eleitores) e por ser primo do prefeito, à época, Jovito Teixeira de Oliveira
(também indiciado), que teria pagado o contrato de locação do ônibus.
Entretanto, tais elementos são sobejamente frágeis para suportar
uma acusação criminal e, por conseguinte, uma futura condenação. Por conta
disso, esposo integralmente a conclusão a que chegou o Ministério Público
Eleitoral de que, por não vislumbrar elementos suficientes de autoria em relação ao atual prefeito do Município de Serra Dourada, faltar-lhe-ia atribuição
para prosseguir nesta apuração.
Com efeito, uma vez ausentes elementos suficientes de autoria
em relação ao único detentor de foro por prerrogativa de função, há de ser
aplicada a regra geral sobre a competência territorial em matéria criminal,
qual seja, a do lugar da infração (art. 69 do CPP).
E como o fato ocorreu no Município de Formosa/GO – tanto que
o inquérito foi instaurado perante a Promotoria Eleitoral da 11ª Zona, neste
município – é este o Juízo competente para a persecução criminal em relação
às pessoas que não gozam de foro especial.
Do exposto, em harmonia com a posição externada pela Procuradoria Regional Eleitoral, voto no sentido de que seja determinada a remessa
dos autos para o Juízo Eleitoral da 11ª Zona Eleitoral, em Formosa/GO.
Em acréscimo, acolho a manifestação ministerial no sentido de
determinar que seja dada ciência ao prefeito municipal de Serra Dourada e
à Polícia Federal em Barreiras, para fins de documentação policial.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 6 de dezembro de 2011.
Mônica Aguiar
Juíza Relatora
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
307
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 6 0 0 / 2 0 11
MANDADO DE SEGURANÇA
PROCESSO Nº 1.295-45.2011.6.05.0000
CLASSE 22
MUNICÍPIO:
Candeias
IMPETRANTE:
Maria Angélica Juvenal Maia. Adv.: Bel. Fernando G. Campinho.
IMPETRADA:
Juíza Eleitoral da 127ª Zona.
INTERESSADA:
Coligação A FORÇA DO TRABALHO. Adv.: Bel. Tadeu Muniz
Nogueira.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
Mandado de Segurança. AIME. Falta de pronunciamento acerca de requerimento. Quartos embargos de
declaração. Protelatórios. Não interrupção do prazo
recursal. Multa. Aplicação. Segurança denegada.
Denega-se a medida de segurança, pois não há que
se falar em direito líquido e certo quando o writ ora
manejado, visa na verdade retardar o andamento
de recurso eleitoral já apresentado pela outra parte,
restando caracterizada a litigância de má-fé, o que
impõe a aplicação de multa.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à unanimidade, DENEGAR A SEGURANÇA e, por maioria, vencido o Juiz Mauricio
Kertzman Szporer, RECONHECER A LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, APLICANDOSE A PENALIDADE DE MULTA FIXADA EM R$2.000,00 nos termos do voto
do Juiz Relator de fls. 219/224, que integra o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 7 de dezembro de 2011.
DAISY LAGO RIBEIRO COELHO - Vice-Presidente no exercício
da Presidência; JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY
PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Buscando ordem liminar, MARIA ANGÉLICA JUVENAL MAIA,
Prefeita do Município de Candeias, impetra o presente writ contra decisão promanada da Belª JACIARA BORGES RAMOS, Juíza da 127ª Zona Eleitoral,
308
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
cuja determinação ali contida se direcionou ao encaminhamento da AIJE nº
299/2008 a este Tribunal Regional, com as razões recursais, sem que houvesse se pronunciado acerca do requerimento expressamente formulado pela
Impetrante e seu Vice-Prefeito, “no sentido de que fossem desentranhados
dos autos os documentos novos juntados após a apresentação da defesa”,
que, segundo alega, imbricam-se com os fatos deduzidos no recurso eleitoral
por si interposto.
Alega que a sentença lançada na sobredita ação investigativa sem
apreciação daquele pleito, motivou a oposição de embargos declaratórios,
sem êxito, porquanto o a quo deles não conheceu ao fundamento de extemporaneidade, dando ensejo a novos aclaratórios que, conquanto conhecidos,
não supriram, a seu ver, a omissão outrora apontada na primeira insurgência,
originando terceiros embargos de declaração que posteriormente julgados
protelatórios pela Impetrada.
Valendo de dispositivo do Código de Processo Civil, sustenta que
a objeção à sentença por meio de embargos de declaração interrompeu o
prazo para a interposição de outros recursos para qualquer das partes, sendo a decisão neles proferida foi publicada no DPJ de 09/09/2011, quando
o processo já se encontrava no Tribunal Regional Eleitoral, para onde fora
encaminhado em 25/08/2011, remetido à Procuradoria Regional Eleitoral no
dia 29/08/2011.
Distribuído o mandamus ao Juiz Plantonista, Dr. Maurício Kertzman
Szporer, a liminar requestada foi parcialmente deferida para determinar a
requisição dos autos do supracitado recurso eleitoral à Procuradoria Regional
Eleitoral (fls. 17/18) e sua permanência na Secretaria deste Tribunal.
Às fls. 25/29, a Coligação “A Força do Trabalho” formulou pedido
de reconsideração, evidenciando a sua legitimidade para intervir no feito,
escoltando o requerimento com os documentos de fls. 30/52.
Recebendo os autos, entendi por bem aguardar as informações da
autoridade coatora solicitadas pelo Juiz Plantonista (fls.54). Em momento
subseqüente, os esclarecimentos vieram às fls. 57/60, juntamente com os
documentos de fls. 61/210.
Instado, o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral pugnou pela denegação da segurança (fls. 212/213).
É o relatório.
VOTO
Examinando a questão posta a acertamento, firmo convicção, de
imediato, que razão não assiste ao Impetrante.
Com efeito, detido na petição exibida pela Coligação A Força do
Trabalho às fls. 25/29 e nas informações prestadas pela Magistrada Zonal às
fls. 61/210, verifico que os embargos de declaração aludidos pelo Impetrante,
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309
JURISPRUDÊNCIA
cuidam-se, em verdade, da quarta insurgência oposta pelos Investigados contra
a sentença exarada na AIJE sob enfoque.
Observo, igualmente, que o a quo, julgando os terceiros embargos
de declaração apresentados em 03 de agosto do corrente ano, entendeu
pelo seu caráter manifestamente procrastinatórios, ex vi da regra insculpida
no art. 275, § 4º do Código Eleitoral, razão pela qual declarou o trânsito em
julgado da sentença (fls. 198) e concedeu prazo para que a parte investigada
exibisse as suas contrarrazões, que, todavia, ainda que devidamente intimada,
quedou-se inerte.
A par disso, em face do quanto estatui o sobredito dispositivo legal,
que estabelece: ‘os embargos de declaração suspendem o prazo para a interposição de outros recursos, salvo se manifestamente protelatórios e assim
declarados na decisão que os rejeitar”, outrossim, configurada a qualidade
procrastinatória daquela terceira irresignação, com intimação válida e regular
da Impetrante do teor desta decisão, impõe-se, inelutavelmente, o afastamento
do alegado e presumível direito líquido e certo à devolução do prazo para a
interposição de eventuais recursos, cônsono requestado pela Impetrante na
peça inicial.
De mais a mais, como bem salientou às fls. 212/213, o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral com assento nesta Corte, em relação à
quarta insurgência aclaratória, “a Impetrante opôs embargos em 19 de agosto de
2011 contra decisão publicada em 27 de maior de 2011”, fato que, sem sombra
de dúvida, caracteriza a extemporaneidade daquele instrumento processual.
Ademais de toda essa fundamentação, é preciso se pontuar de que
a sentença a quo julgou improcedente o pleito constante da supra epigrafada
AIJE formulado contra a Impetrante, que, ao lado do seu Vice-Prefeito, buscou
com os quatro aclaratórios opostos tão somente o reconhecimento do pedido
de desentranhamento de “novos documentos”.
É cediço que os embargos de declaração objetivam, na melhor técnica
jurídica, o aprimoramento da decisão que, via de regra, é proferida em desfavor
do embargante, igualmente, visam a esgotar a jurisdição do Juízo a quo, com
devolução da matéria às instâncias superiores para seu exame.
Verifico na vertente, que, in casu, o Juízo singular julgou improcedente
a AIJE e, assim, culminou por fulminar o pedido da Coligação Investigante no
sentido de reconhecer as imputações exordianas ali insertas e assacadas aos
Investigados, circunstância que, sem vestígio de dúvida, repele a existência
de prejudicialidade à Impetrante.
Vale dizer que, se prejuízo adveio relativamente à decisão monocrática que considerou os terceiros embargos protelatórios e declarou o
trânsito em julgado da sentença (fls. 39), a mim, não me parece, que teve o
condão de provocar a Impetrante, porquanto, intimada, manteve-se inerte a
apresentação de contrarrazões ao recurso eleitoral interposto pela Coligação
“A Força do Trabalho”, preferindo, por sua conta e risco, opor embargos declaratórios, que, seqüencialmente, revelou-se, ao lado das outras três oferecidas
310
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
pelo seu Vice-Prefeito, a quarta objeção, ainda, que na inicial deste writ tenha
omitido esta informação.
Frente às máximas de experiência subministradas pelo exercício
da judicatura, concluo que, aos meus olhos, é inescondível o desiderato da
Impetrante: cuida-se de manobra processual curial com o intuito de retardar o
andamento e a apreciação do recurso eleitoral já apresentado pela Coligação
investigante, conduta que caracteriza induvidosa litigência de má-fé, cujo enquadramento repousa no art. 17, incisos II e VII, do Código de Processo Civil,
aqui aplicado subsidiariamente.
Acerca do tema, valho-me da brilhante lição de Victor Martins Ramos
Rodrigues, em sua obra “A Litigância de Má-Fé e os Recursos Protelatórios no
Processo de Conhecimento”:
“A litigância temerária decorre da violação do princípio da lealdade e boa-fé processual. As noções de lealdade e probidade,
não são jurídicas, mas decorrem da experiência social. A lealdade é o hábito de quem é sincero e, naturalmente, abomina a
má-fé e a traição; enquanto que a probidade é própria de quem
atua com retidão, segundo os ditames da consciência.
A litigância de má-fé é a qualificação jurídica da conduta, legalmente sancionada, daquele que atua em juízo convencido de
não ter razão, com ânimo de prejudicar o adversário ou terceiro,
ou criar obstáculos ao exercício do seu direito, desvirtuando a
finalidade do processo.
Verifica-se, portanto, que o delito processual em análise apenas
estará configurado se houver dolo, ou seja, o animus deliberado de lesar a outra parte ou procrastinar deliberadamente a
marcha processual.
(...)
Outro exemplo de litigância temerária reside na oposição injustificada ao fluxo do procedimento, no qual a malícia é elemento
essencial, que não se confunde com as hipóteses que tutelam
objetivos idôneos ou juridicamente relevantes, cuja análise
deve ficar reservada ao prudente arbítrio do juiz.
(...)
Esse inciso é genérico, por abranger todos os tipos de ações,
sendo certo que, qualquer ato ou omissão que caracterize
uma vontade da parte em atrasar o desfecho processual a fim
de “ganhar tempo” e com isso desrespeitar a parte contrária,
opondo resistência injustificada ao normal andamento do processo, é considerada litigância de má-fé, na abrangência do
art. 17 e seu inciso pertinente.”
Conclusão: “O direito de recorrer é constitucionalmente garantido (CF
5.º LV). No entanto, o abuso desse direito não pode ser tolerado pelo sistema.”
Mercê dessas ilações no plano doutrinário, conclui-se que o retardamento proposital de um feito, por intermédio de meios legais existentes nos
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311
JURISPRUDÊNCIA
nosso ordenamento jurídico, ocasiona julgamentos desnecessários e inócuos,
como na espécie, acarretando, por conseguinte, desprestígio, não só deste
valoroso e excepcional remédio heróico, mas, também, sobrecarga dos trabalhos para este Tribunal, merecendo, portanto, repúdio, quanto o mais que o
presente writ foi impetrado no plantão judiciário e do seu aparato a Impetrante
se utilizou para tratar de matéria própria de exclusiva de recurso eleitoral: pedido
de desentranhamento de documentos novos.
Ante o quadro que se descortina, é imprescindível pulso forte, de
maneira a se barrar essa conduta que propicia a eternização dos feitos com
grave lesão ao Princípio da Celeridade, maior vetor desta Justiça Especializada,
e mácula a tão já desgastada imagem do Poder Judiciário junto à sociedade,
ansiosa por Justiça.
Esse mesmo posicionamento, ainda que de início tenha encontrado
resistência, inclusive desta Corte, deu ensanchas a aplicação de multa nos
embargos declaratórios considerados protelatórios, posteriormente chancelado
pela Corte Superior no Recurso Especial Eleitoral nº 21.549 – Classe 22ª, da
lavra do Min. Humberto Gomes de Barros, datada de 19.04.2005, verbis:
“O interesse de agir existe quando há necessidade e utilidade de
acionar o aparato judiciário. Sem que dessa atividade se possa
extrair algum resultado útil, não tem razão de ser o recurso,
sendo desnecessária a prestação jurisdicional.
Verifica-se, por oportuno, a necessidade de aplicação da multa
prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC, uma vez que
os Declaratórios foram utilizados indevidamente, provocando
injustificada procrastinação da marcha processual, retardando,
em detrimento do interesse público, a finalização do litígio”.
Trilhando nessa senda, é que estou convencido de que aqui devem
ser invocado, subsidiária e cumulativamente, os artigos 17 e 18 do CPC, que,
respectivamente, definem a hipótese da litigância de má-fé e fixa multa à sua
ocorrência, desvelando-se necessários na presente, de forma a se coibir e
inibir a utilização de recursos indevidos.
Ex positis, na esteira do opinativo ministerial, denego a segurança
requerida, e, por conseguinte, faço cessar os efeitos da decisão liminar parcialmente concedida às fls. 17/18 e, autorizado pelos artigos 17 e 18 do CPC,
condeno a Impetrante ao pagamento de multa, que ora arbitro no valor de
R$ 2.000,00 (dois mil reais), a ser recolhida em favor da parte ex adversa.
É como voto.
Salvador, em 7 de dezembro de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
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JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 6 5 0 / 2 0 11
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO Nº 498-69.2011.6.05.0000
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
Central
RECORRENTES:
Leonandes Santana da Silva (Advs.: Béis. Ademir Passos, Chrisvaldo Monteiro de Almeida, Fernando Couto, Adriano Gonçalves
de Queiroz e Carlos Laranjeira Medeiros); José Maciel Júnior
e Hermenito Ferreira do Amaral (Advs.: Béis. Ademir Ismerim e
José Juarez Vinhas Júnior).
RECORRIDOS:
José Maciel Júnior e Hermenito Ferreira do Amaral; Leonandes
Santana da Silva e Uilson Monteiro da Silva (Advs.: Béis. Ademir Passos, Chrisvaldo Monteiro de Almeida, Fernando Couto,
Adriano Gonçalves de Queiroz e Carlos Laranjeira Medeiros).
PROCEDÊNCIA:
Juízo da 159ª Zona Eleitoral.
RELATOR:
Juiz Josevando Souza Andrade.
REVISOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Recursos. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo.
Litigância de má-fé. Aplicação de multa. Recurso
não provido. Alegação de captação ilícita de sufrágio
pela compra de votos e abuso do poder econômico.
Fragilidade das provas coligidas aos autos. Não
provimento.
1. Nega-se provimento a recurso que visa afastar multa
aplicada em decorrência de litigância de má-fé, quando
os recorrentes não trazem aos autos elementos hábeis
a demonstrar que tal situação não ocorreu;
2. Não deve ser provido o recurso eleitoral quando os
elementos de prova coligidos aos autos não se revelam
aptos a demonstrar a prática das condutas ilícitas assacadas pelos recorrentes;
3. Recursos aos quais se nega provimento.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS, nos termos do voto
do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 14 de dezembro de 2011.
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JURISPRUDÊNCIA
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Presidente em
exercício;JOSEVANDO SOUZA ANDRADE - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA
MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Os fólios sub examine tratam de recursos interpostos contra sentença proferida pelo juízo da 159ª Zona Eleitoral que, julgando improcedentes os
pedidos constantes da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, manejada
por José Maciel Júnior e Hermenito Ferreira em face de Uilson Monteiro da
Silva, da Coligação “O Progresso deve continuar” e de Leonandes Santana
da Silva, condenou este último ao pagamento de multa no valor de R$ 30.000
(trinta mil reais) por litigância de má-fé.
Em suas razões recursais, o Recorrente Leonandes Santana da
Silva defende que a decisão merece reforma uma vez que, ao condená-lo
na indigitada multa após julgar extinto o processo, o magistrado teria ultrapassado sua função jurisdicional. Alega, outrossim, que tal penalidade não
encontra respaldo legal, não cabendo ainda sua aplicação ex officio. Por
fim, aduz que o valor da referida multa, além de exorbitante, não poderia ser
revertido para a Fazenda Pública.
A segunda peça recursal, interposta por José Maciel Júnior e Hermenito Ferreira do Amaral, reproduziu, ipsis litteris, as razões expostas em
sede de alegações finais, ratificando, em suma, as comprovadas práticas de
captação ilícita de sufrágio - mediante a compra de votos - e de abuso de
poder econômico, motivo por que o decisum necessitaria alteração.
Os Recorridos Leonandes Santana da Silva e Uilson Monteiro
da Silva encaminharam contra-razões por meio de fax (fls. 325/332). A via
original, por seu turno, não foi apresentada, conforme se extrai da certidão
de fls. 335.
Às fls. 339/347, o Ministério Público Eleitoral pronunciou-se, preliminarmente, pelo não conhecimento das contra-razões e, no mérito, pelo
desprovimento de ambos os recursos.
É o relatório, que ora submeto à apreciação do eminente Juiz
Revisor.
VOTO
Adoto como relatório o de fls. 354/355.
Antes de se adentrar no exame das questões de fundo em postulação nos recursos interpostos, cumpre-me tecer alguns comentários sobre
a apresentação dos recursos e contrarrazões por meio de fax.
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JURISPRUDÊNCIA
Visando dar efetividade ao princípio da celeridade que deve orientar
o processo eleitoral, o Colendo Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Resolução nº 21.711/2004 (art. 12), mitigou o quanto disposto na Lei nº 9.800/99,
tornando dispensado, nessa Justiça Especializada, o envio dos originais
das petições encaminhadas através de fac-simile. A propósito, observe-se o
aresto abaixo transcrito:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSOS ORDINÁRIOS.
PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE. AFASTAMENTO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO. NÃO-PROVIMENTO.
1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral firmou-se
pela mitigação da exigência do art. 2º da Lei nº 9.800/99.
Dessa forma, tornou-se prescindível, na praxe eleitoral,
a posterior apresentação dos originais dos recursos interpostos via fac-símile. 2. Todas as questões necessárias
à adoção do entendimento esposado no acórdão embargado
foram analisadas. O magistrado não está adstrito aos argumentos das partes, nem obrigado a responder todos os seus
questionamentos. 3. A negativa de provimento aos recursos
ordinários deu-se em razão da inexistência de direito líquido e
certo à nomeação dos candidatos, ante a ausência de disponibilidade financeira para que o TRE/SE o fizesse. 4. As questões
relativas à suposta mora da autoridade coatora em realizar o
levantamento das áreas a serem atendidas pelas vagas, bem
como às prioridades no uso do orçamento da Corte Regional
não podem ser analisadas pelo TSE sem a cabal demonstração
de máculas no ato administrativo. 5. Inexistência de vícios no
aresto embargado. 6. Embargos de declaração não-providos.
ERMS - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EM
MANDADO DE SEGURANÇA nº 514 - Aracaju/SE. Acórdão
de 14/08/2007, Relator(a) Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO.
Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 14/09/2007, Página
223. (grifou-se)
Este Regional, adotando o procedimento previsto na suso referida
resolução, também tem considerado válidas as petições apresentadas sem
a correspondente via original, como é de se observar logo avante:
Recurso. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Improcedência. Captação ilícita de sufrágio. Ausência de suporte
probatório. Não provimento. Preliminar de ilegitimidade ativa
ad causam. Existindo documento comprobatório, arquivado
em Cartório, autorizando a pessoa que outorgou procuração
ao advogado a representar a Coligação autora, rejeita-se a
preliminar. Preliminar de não conhecimento do recurso por
descumprimento do artigo 2º da Lei nº 9.800/99. A falta de
apresentação dos originais, no prazo de cinco dias, não
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
enseja o não conhecimento do recurso interposto via facsímile no tríduo legal. Preliminar de inépcia da inicial. Rejeitase a prefacial, pois, ainda que houvesse tipificação equivocada
na exordial, o magistrado está subordinado unicamente aos
fatos nela narrados. Preliminar de ilicitude da prova. Deve ser
tida por ilícita a gravação ambiental feita por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro, desconsiderando-a como
prova nos presentes autos.
Mérito.
Nega-se provimento a recurso, tendo em vista não ter sido
comprovada a ocorrência da alegada captação ilícita de votos,
mantendo-se incólume a decisão que julgou improcedente a
ação. (Grifou-se)
RE - RECURSO ELEITORAL nº 12694 - Chorrochó/BA.
Acórdão nº 1523 de 03/11/2009. Relator(a) JOSÉ MAURÍCIO
VASCONCELOS COQUEIRO Publicação: DJE - Diário da
Justiça Eletrônico, Data 10/11/2009.
Nessa senda, portanto, conheço do recurso interposto, através de
fax, por José Maciel Júnior e Hermenito Ferreira do Amaral, ainda que seus
originais tenham sido encaminhados fora do quinquídio legal estipulado por
lei, bem como das contrarrazões propostas por Leonandes Santana da Silva
e outro, cuja via original não foi protocolizada.
DO RECURSO INTERPOSTO POR LEONANDES SANTANA DA SILVA.
A argumentação ventilada pelo Sr. Leonandes Santana da Silva
na insurgência que propôs apresenta-se por demais inconsistente. Antes de
se discutir os pontos levantados, entretanto, faz-se mister a transcrição do
art. 18, caput da legislação processual civil.
Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a 1%
(um por cento) sobre o valor da causa e a indenizar a parte
contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários
advocatícios e todas as despesas que efetuou. (grifou-se)
A mera leitura desse dispositivo é suficiente para, de per si, revelar
a improcedência de alguns dos argumentos levantados pelo recorrente.
O primeiro, o de que incorreu em erro o magistrado ao aplicar a multa
de ofício, manifesta-se infundado por permitir, expressamente, a norma em
epígrafe, que a condenação seja efetuada ex officio pela autoridade judicial
ou mediante requerimento a ele formulado.
O segundo argumento, por seu turno, o de que a mencionada multa
é despossuída de embasamento legal, é causador de verdadeiro espanto,
ex vi da regulamentação legal realizada pelo CPC pátrio.
316
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
As demais razões trazidas à baila, da mesma forma, não merecem
guarida, por apresentarem-se inconsistentes. Examinemos.
O princípio da inalterabilidade da sentença, consubstanciado no
art. 463 do CPC, limita o ofício do magistrado à publicação da sentença de
mérito. Após isso, sua alteração só tem cabimento em situações de correção de erro material ou de cálculo ou quando da oposição de embargos de
declaração.
Pois bem. Ao afirmar o Sr. Leonandes que a função jurisdicional
foi ultrapassada pelo juiz ao condená-lo em multa por litigância de má-fé,
mostrou-se desconhecedor do direito vigente, em específico, o que pertine
aos limites da prestação jurisdicional e aos componentes de uma sentença
de mérito (relatório, fundamentação e dispositivo).
Impende registrar que a decisão de instância inferior mostrou-se
irreprochável neste quesito, uma vez que o juiz, até a prolação da sentença,
ainda se encontrava em seu ofício jurisdicional. Demais disso, fundamentou
seu decisum, antes de anunciar a decisão pela condenação.
Já no que se refere ao montante arbitrado, R$30.000,00 (trinta mil
reais), em nada se apresentou desarrazoado. Os motivos invocados pelo juiz
de primeiro grau – natureza e importância da causa, a gravidade da conduta,
o dano causado ao Poder Judiciário e ao sistema jurisdicional como um todo,
bem como à própria equididade – são bastantes em si para servir de arrimo
à quantia fixada.
Por fim, a multa pela litigância de má-fé será revertida à Fazenda
Pública, não procedendo a alegação exposta.
Ante o exposto, nego provimento à pretensão contida no recurso
em comento.
DO RECURSO INTERPOSTO POR JOSÉ MACIEL JÚNIOR E HERMENITO
FERREIRA DO AMARAL.
Registro, ab initio, que o recurso em vitrina reproduziu textualmente
o conteúdo das alegações finais (fls. 210/221), devidamente apreciadas pelo
juiz de primeiro grau quando da sentença.
Perlustrando os autos, verifico, assim como ficou consignado na
decisão rechaçada e nas interpostas contrarrazões, que o acervo probatório
residente nos autos demonstra-se por demais frágil, incapaz de confirmar
terem os recorridos praticado quaisquer das condutas ilícitas que lhes foram
assacadas, razão que me leva a decidir pela manutenção da sentença, na
sua integralidade.
A fragilidade aqui referida deve-se aos depoimentos prestados no
bojo desses fólios que não se prestam à comprovação das alegações da parte
recorrente, já que consistem num verdadeiro emaranhado de declarações
díspares, em algumas situações desmentidas por seus próprios autores. É o
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
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JURISPRUDÊNCIA
que se sucede, por exemplo, com as declarações colhidas do Sr. Walterney
Félix Tarrão, em juízo e perante a autoridade policial, de quem supostamente
os recorridos teriam comprado voto.
Transcrevo, a priori, seu depoimento concedido em sede investigativa, às fls. 37/40:
(...) que o declarante reside nesta cidade de Irecê e aqui
possuía pequeno estabelecimento comercial (...) denominado
“Rango”; (...) que ainda possuía o “Rango” quando Cleber, morador de Central, contraiu débito junto ao seu estabelecimento
no montante de cento e cinqüenta reais; que no dia 10 de
setembro do ano em curso Cleber procurou o declarante para
quitar o débito; que, efetivamente, Cleber pagou o débito com
um cheque no valor mencionado: cento e cinqüenta reais, de
emissão de João Ribeiro Maciel Brito, cheque este de número
33581-9, do Banco do Brasil de Irecê; que o próprio declarante
descontou o cheque na agência do Banco do Brasil desta
cidade; (...) que não é verdade que tivesse vendido seu voto;
que, como disse anteriormente, recebeu o cheque de Cleber,
que quitou um débito que havia contraído no “Rango” que o
declarante possuía; (...) que, efetivamente, jamais vendeu
seu voto a João Ribeiro, ao Prefeito Leonandes ou a qualquer
outro político; (...)
Corroborando o quanto aduziu no depoimento retro, a testemunha
em foco, à fl. 41, emitiu declaração na qual aduz:
(...) Declaro ainda que, sabendo do fato de que pessoas obtiveram cópias do cheque para tentar prejudicar politicamente
o Senhor João Riveiro, sendo este eleito vereador na cidade
de Central-Bahia, proprietário da conta deste cheque em foco,
não o recebi em troca de nada, nem sequer recebi das mãos
deste, e sim do Senhor Cleberlito Matos Cruz.(...)
Já em juízo (fls. 103/104), contradizendo o que até então havia
advogado, o Sr. Walterney firmou as seguintes palavras:
(...) que estava em Irecê, em um bar de nome “Rango”, tipo
trailer, quando chegou o vereador João Ribeiro, perguntando
se o depoente ainda votava no Povoado de Queimadas, neste
município; que nesse momento ele disse para o depoente que
ia lhe dar uma ajuda de R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais)
para o depoente e sua família votar nele e no candidato a
prefeito Leonandes; que recebeu um cheque naquele mesmo
dia no referido valor; que ele disse que não ia dar o dinheiro
naquele momento porque não tinha; que podia dar o dinheiro
no dia 20; que resolveu então dar um cheque ao depoente datado do mesmo dia, que foi 10/09/2008; (...) que recebeu outra
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
ameaça de Cleberlito dizendo que se o depoente não assinasse
a declaração do dia 13 de outubro, que o depoente iria se dar
mal; que foi ameaçado de morte para fazer a declaração de fl.
41 dos autos, por Jairo do Carrapato, Enilson Pereira Bastos
e Cleberlito; (...) que nega as declarações feitas na delegacia
de fls. 31/40; que disse aquilo porque foi ameaçado de morte
por Cleberlito Matos e Jairo do Carrapato;(...)
Ante tais declarações contraditórias, de se ver que credibilidade
alguma merece o testemunho trazido pelo referido testigo. Some-se a isso, o
fato de que o depoimento prestado por Aidee dos Santos Souza (fls. 184/185),
abaixo reproduzido, considerando sua proximidade com o Sr. Walterney e
sua esposa, revela-se consistente e rico em detalhes, infirmando o declarado
por este. Verbis:
(...) a esposa de Walterney, de nome Aparecida, trabalhou para
a depoente durante oito meses como empregada doméstica;
que ela trabalhou para a depoente até o início deste ano; que
neste período Walterney e a esposa moravam em Irecê próximos a residência da depoente; que Walterney tinha um bar em
uma praça onde ficam os trillers (sic), conhecidos por “Rango”;
que Walterney vendia comida, lanches e bebidas; que o triller
de Walterney ficava próximo ao Ginásio de Esporte; que ele
trabalhou aproximadamente sete meses; que não viu Genário
procurar Walterney no seu triller; que certi dia a depoente estava dando aulas de corte e costura em sua residência, onde
funciona a ONG incubadora de novos talentos, onde trabalha
na parte financeira, quando Walterney entrou correndo muito
nervoso, dizendo que Junior de Gilci e Malafaia queriam levar
ele para a fazenda de Osmar Torres para impedir que ele
desse outro depoimento; que nessa oportunidade Walterney
disse para a depoente que Júnior de Gilci e Malafaia, em um
carro preto, levou ele até Lapão para fazer uma declaração
sobre os cheques; que o expediente já tinha sido encerrado,
mas Júnior tinha conhecimento com o pessoal com o cartório
de lá; que tinha uma arma dentro do carro quando eles foram
para Lapão; que Júnior ficou no cartório resolvendo a questão
da declaração e Malafaia e Walterney ficaram lá fora; que Walterney ouviu Malafaia conversando com mais duas pessoas,
que segundo eles eram pistoleiros, dizendo que ele ia para
fazenda de Osmar Torres e não tinha retorno; que ele achava
que ia morrer; que ele pedia para ele ir em casa avisar a família
e pegar umas roupas mas foi proibido por Malafaia, que disse
era p/ ele não dizer a ninguém para onde ele ia nem mesmo
a sua família; que passou cinco dias sem sair de casa, sendo
que Júnior e Malafaia ficavam rodando a casa dele para ver
se ele estava lá; que Malafaia e Júnior tinham receio de que
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
319
JURISPRUDÊNCIA
a coligação do prefeito Leonandes, ao descobrir que ele tinha
vendido as cópias dos cheques para Dr. Genário e Osmar
Torres; que ele se arrependeu de ter feito uma covardia para
com Cleberlito (declaração dada em Lapão), pois na verdade
Cleberlito deu um cheque de R$ 150,00 reais e ele ainda
passou um troco para Cleberlito; que Cleberlito era cliente de
Walterney e ele tinha uma conta lá em seu nome; que ele tirou
quatro cópias do cheque, que dias ele entregou a Osmar Torres
e as outras duas ficou com ele; que um senhor conhecido por
“professor” fez a negociação com Malafaia, Júnior de Gilci e
um vereador do qual não se recorda o nome; que se Walterney conseguisse a cópia do cheque para entregar a eles, ele
receberia R$ 30.000,00 se o prefeito Leonandes saísse da
prefeitura; que Walterney dormiu em sua casa durante dois
dias; que ele contou para o depoente que Júnior, Malafaia e o
professor andavam procurando um meio de completar o que
eles já tinham contra o prefeito Leonandes; que ele comentou
sobre um processo movido contra Leonandes a respeito de um
carro de som, mas que não tinha dado em nada; que com as
cópias do cheque eles sabiam que poderiam tirar o prefeito;
que eles achavam isso porque caracterizaria que CLeberlito era
funcionário do prefeito; que a depoente propôs a Walterney que
desse uma declaração na delegacia de Irecê, contando o que
tinha realmente acontecido; que a esposa dele disse que ou
ele dava essa declaração ou largava ele; que compareceram
a delegacia a depoente, Walterney, a esposa dele, Cleberlito
e um senhor de que recorda o nome; que nesse dia foi o próprio Dr. Fábio quem tomou o depoimento de Walterney; que
Walterney não foi ameaçado nem por João Ribeiro e nem por
Cleberlito para ir dar esse depoimento; que Walterney saiu da
casa da depoente direto para a delegacia e por isso não sofreu
qualquer tipo de ameaça, indo lá de livre e espontânea vontade;
que ele ficou com medo de vir para Central, porque Malafaia
e Júnior poderia fazer alguma coisa contra ele; que ele ficava
trancado dentro de casa e a esposa pegava comida na casa
da depoente e levava para ele; que os dois filhos de Walterney
eram alunos da ONG; que depois disse não teve mais contato
com Walterney; que a depoente ajudou Walterney no seu
comércio doando um fogão usado; que além disso sempre
ajudou os filhos dele com a doação de roupas e outras coisas;
que o mais velho conseguiu um emprego na Malharia o Kilão
graças ao trabalho da ONG; que o vereador James também
acompanhou o grupo até Lapão; que Walterney comentou
que tinha recebido R$ 400,00 (quatrocentos reais) de Júnior e
Malafaia para fazer a declaração em Lapão; (...) que Walterney
vendeu duas cópias do cheque para Osmar Torres e Genário,
que já se encontravam em Salvador, em processo para tirar o
320
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
prefeito; que na residência da depoente residem seu marido
e um filho; que não tem nenhum filho em Central; que tem
três filhos, sendo que apenas um mora com a depoente e os
demais moram em Irecê; que abrigou Walterney na sua casa
depois das eleições; que na época a sua filha Milena trabalhava
com voluntária em uma cooperativa sediada neste município,
trabalhando com moda; que além de Central ela trabalha em
São Gabriel, Gentio do Ouro e Barra do Mendes; que a ONG
onde ela trabalha não recebe nenhuma verba da prefeitura
de Central; que a esposa de Walterney não é funcionária da
ONG; que ela prestou serviço domésticos diretamente para
a depoente; que ela deixou de trabalhar com a depoente há
dois meses; (...).
Mais ainda. A falta de crédito atribuída ao testemunho do Sr. Walterney deve-se, também, ao fato de o mesmo enfrentar processo ajuizado
pelo Ministério Público da comarca de Irecê pelo crime de denunciação
caluniosa (autos nº 0002064-80.2010.805.0110). Quem, em sã consciência,
creditaria confiança às palavras de alguém que responde em juízo por falsa
imputação de crime?
Já no que tange ao segundo quesito invocado pelos recorrentes
como motivo idôneo ao provimento do recurso – suposta compra de votos
do Sr. José Raimundo dos Santos, identicamente, tenho por irretocável a
sentença a quo.
Extrai-se que o Sr. José Raimundo foi contratado para trabalhar na
campanha do então recorrente, à época candidato a prefeito, Sr. Leonandes,
com a finalidade de prestar serviço de locação de carro de som. Dos autos,
porém, não se consegue aferir, sem dúvidas, que a contratação de tal serviço
realmente esteve condicionado ao voto no recorrente.
Por fim, o terceiro fundamento trazido à baila pelos recorrentes,
a alegada compra de votos do Sr. Valdísio Malafaia de Carvalho e de seus
familiares, não encontra eco no aprofundado exame das provas coligidas,
máxime ao se levar em consideração sua conduta social, salientada pela
sentença (fl. 268).
Compete destacar que na sistemática do processo civil, prova diz
respeito à atividade desenvolvida pelos litigantes no processo, destinada a
trazer para os autos informações que demonstrem a veracidade das suas
alegações. Nesse toar, a sistemática adotada pela processualística pátria foi
a do livre convencimento motivado do magistrado, mediante o qual, cabe-lhe,
decidir a lide conforme sua convicção, devendo-se vincular somente à lei e
as provas colacionadas aos autos durante a instrução processual.
Nesse diapasão, não há hierarquia de provas no direito vigente, por
meio de sua tarifação. A prova testemunhal, desta feita, possui mesmo valor
que uma documental. Na situação em apreço, não se encontra robustez nas
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
321
JURISPRUDÊNCIA
provas a ponto de se reconhecer a procedência dos argumentos utilizados
nos recursos e, portanto, aplicar a penalidade prevista quando da captação
ilícita de sufrágio e do abuso de poder econômico: cassação do mandato
dos eleitos, ora recorridos.
Essa linha de intelecção, por sinal, tem sido adotada por esta Corte
em seus diversos julgados em casos análogos. Observe:
Ementa: Recurso em AIME. Eleições 2004. Candidata ao
cargo de vereador. Arts. 41-A da Lei nº 9.504/97 e 222 do
CE. Prova insuficiente. Não verificação. Não provimento. Inexistindo nos autos prova robusta e inconteste da
prática de captação ilícita de sufrágio ou abuso de poder
econômico atribuída à candidata eleita, deve ser mantida
a sentença recorrida, negando-se provimento ao apelo
interposto, com a recomendação de que seja apurado no
Juízo de origem os indícios de corrupção eleitoral apontados pelo MP.
RAIM - RECURSO EM ACAO DE IMPUGNACAO DE MANDATO nº 106 – Bom Jesus da Serra/BA, Acórdão nº 247
de 18/04/2006, Relator(a) ELIEZÉ BISPO DOS SANTOS,
Revisor(a) ANTONIO CUNHA CAVALCANTI, Publicação:
DPJBA - Diário do Poder Judiciário da Bahia, Data 26/04/2006,
Página 83.
Por tudo quanto anteriormente delineado, por mostrar-se extremamente frágil e inconsistente o acervo probatório apresentado, insuficiente,
assim, a demonstrar as graves condutas narradas na exordial, mantenho
in totum a decisão recorrida, negando provimento ao apelo que a desafiou,
ratificando a condenação pela litigância de má-fé do Sr. Leonandes Santana
da Silva no valor constante da sentença e mantendo nos cargos de prefeito
e vice-prefeito seus atuais ocupantes.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 14 de dezembro de 2011.
Josevando Souza Andrade
Juiz Relator
322
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
A C Ó R D Ã O N º 1 . 6 6 1 / 2 0 11
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO: Nº 4.917-69.2010.6.05.0000
CLASSE: 42
(EXPEDIENTE Nº 45.989/2010 – RECURSO)
MUNICÍPIO:
Salvador
RECORRENTE:
Ministério Público Eleitoral.
RECORRIDO:
Sandoval Souza Guimarães. Advª.: Belª. Paloma Contreiras
Guimarães.
RELATOR:
Juiz Wanderley Gomes.
Recurso. Representação. Placas em Comitê de Candidato. Dimensões superiores a 4m². Retorno dos
autos do TSE. Materialidade reconhecida. Propaganda eleitoral irregular. Autoria e prévio conhecimento.
Demonstração. Multa. Art. 37, §§1º e 2º da Lei nº
9.504/97. Provimento.
Tendo os autos retornado do TSE, após o reconhecimento da materialidade da propaganda irregular,
mediante placas, colocadas em comitê de candidato,
com dimensões superiores a 4m2, dá-se provimento
a recurso, quando verificada a autoria e o prévio
conhecimento do candidato, acerca da aludida publicidade, aplicando-lhe multa, prevista no artigo 37,
§§1º e 2º da Lei nº 9.504/97.
Visto, relatado e discutido o expediente acima indicado,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do
Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente Acórdão.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 15 de dezembro de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Presidente em exercício;
WANDERLEY GOMES - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Os presentes autos retornam do egrégio Tribunal Superior Eleitoral,
com a decisão de fls. 109/115, por meio da qual a eminente relatora, a Minis-
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
323
JURISPRUDÊNCIA
tra Carmen Lúcia, deu provimento ao recurso especial aviado pelo Ministério
Público Eleitoral, para determinar que, ultrapassada a questão alusiva à
materialidade da infração, fosse então, procedido ao exame da autoria e do
prévio conhecimento do ilícito, para fins de eventual aplicação de multa.
É que, ao apreciar o recurso manejado pelo parquet, em face da
decisão que julgou improcedente a representação ajuizada contra Sandoval
Souza Guimarães, candidato ao cargo de Deputado Federal, este Regional
entendeu, por maioria, que a prática alvejada (colocação de placas, com dimensões superiores a 4m2, na sede do seu comitê político) não conformava
qualquer irregularidade, conforme acórdão de fls. 55/58, assim ementado:
Recurso. Representação. Improcedência. Placas em Comitê de Candidato. Dimensões superiores a 4m². Propaganda
eleitoral irregular. Não configuração. Desprovimento.
Nega-se provimento ao recurso quando ausente, na realidade
fática, qualquer irregularidade na propaganda veiculada em
fachada de comitê central de coligações ou de partidos, nos
termos do art. 10, I da Resolulção TSE nº 23.191/2010.
(TRE-BA. Acórdão n.º 1938/2010. Relator Juiz Ruy Eduardo
Almeida Britto, de 27.10.2010)
Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso especial, que foi
provido, tendo o TSE entendido que a decisão recorrida está em desacordo
com o entendimento daquela Corte Superior, que aplica a proibição de propaganda eleitoral veiculada por meio de placas superiores a 4m2, afixadas
em comitês de candidatos.
Tendo sido, originalmente, relatados pelo ilustre Juiz Auxiliar, o Dr.
Ruy Britto, vieram-me os autos conclusos, trazendo-os, nessa oportunidade,
para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A materialidade da prática, ora impugnada, já restou apreciada pelo
Tribunal Superior Eleitoral, ao dar provimento ao recurso especial, restando,
portanto, a este Regional o exame da autoria e do prévio conhecimento do
representado, para fins de eventual aplicação de multa.
Nessa direção, impende registrar que, conquanto tenha sido regularmente notificado para apresentar defesa, o recorrido quedou-se inerte, tendo,
entretanto, apresentado manifestação, quando os autos já se encontravam
na Superior Instância, conforme se verifica às fls. 91/94.
A teor do art. 322, parágrafo único do CPC, poderá o revel intervir
no processo em qualquer fase procedimental, recebendo o processo no
324
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
estado em que se encontrar.
Da leitura da aludida peça defensiva, tem-se que a autoria da
propaganda e o prévio conhecimento do candidato restaram largamente
evidenciados, à medida que foram os fatos confessados, senão vejamos:
Visando dar conhecimento de forma ampla, mandou plotar o
local com 03 (três) painéis autocolantes nas fachadas do
referido imóvel, conforme demonstrada nas fotos objetos
desta notificação.
[...] Na inicial, verifica-se a intenção da Procuradoria Eleitoral
em classificar os painéis na condição de outdoor. [...] Ora,
como pode ser irregular, desde que o imóvel locado (doc em
anexo), funciona o Comitê Político, como bem arrazoa a Procuradora, [....]. E de que forma pode ser aferido como grande
os painéis uma vez que, na verdade os mesmos não estão a
desrespeitar a lei, [...].
(fl. 93)
E, ao final, conclui:
“Dessa feita, diante dos robustos argumentos aqui apresentados, requer seja declarada a atipicidade dos fatos narrados
no termo de Notificação, ordenando-se seu imediato ARQUIVAMENTO, haja vista a placa utilizada pelo candidato
encontrar-se em perfeita harmonia com o quanto previsto
pela legislação vigente.”
(fl. 94)
Verifica-se, destarte, que não houve qualquer contestação acerca
da veracidade dos fatos, tampouco negou a autoria. Ao revés, o candidato,
confessando a prática, limitou-se a defender a sua atipicidade, de sorte que,
tendo sido a materialidade objeto de apreciação pelo TSE, resta a questão
superada.
Nessa senda, a responsabilidade do candidato encontra-se suficientemente demonstrada, a teor do quanto previsto no § 1º do artigo 74 da
Resolução TSE nº 23.191/2010, em virtude do que, dou provimento ao recurso
para condenar o candidato recorrido à multa prevista no artigo 37, §§ 1º e
2º da Lei nº 9.504/97, que fixo, considerando a ostensividade da publicidade
em questão, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 15 de dezembro de 2011.
Wanderley Gomes
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
325
JURISPRUDÊNCIA
R E S O L U Ç Ã O N º 2 2 2 / 2 0 11
PROPAGANDA PARTIDÁRIA
PROCESSO: Nº 6.984-07.2010.6.05.0000
CLASSE 27
MUNICÍPIO:
Salvador
REQUERENTE:
Partido Verde – PV, Seção da Bahia, por seu Presidente, Ivanilson
Gomes.
RELATOR:
Juiz Renato Reis Filho.
Requerimento. Propaganda partidária. Veiculação de
inserções. Emissoras. Resolução TSE n° 20.034/97.
Lei nº 9.096/95. Requisitos mínimos preenchidos.
Observância das normas de regência. Procedência.
Deferimento.
Considerando que para caracterizar o direito de inserções no Estado não é necessário que se atenda
aos requisitos previstos no art. 57, I, b, parte final –
representação parlamentar na Assembléia Legislativa
e votação mínima de um por cento na circunscrição
regional -, sendo exigido apenas dos Partidos Políticos o cumprimento do art. 57, I, a, defere-se o pedido
de veiculação de propaganda partidária, na forma
de inserções, pelo tempo de vinte minutos, em cada
semestre do ano de 2011.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
RESOLVEM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia,
à unanimidade, DEFERIR O PEDIDO, nos termos do voto do Juiz Relator,
adiante lavrado, que passa a integrar a presente Resolução.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de abril de 2011.
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; RENATO REIS FILHO - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA
MADRUGA- Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Trata-se de requerimento formulado pelo Partido Verde – PV, Seção da Bahia, em 22/11/2010, através de seu Presidente, solicitando a este
Tribunal a veiculação de inserções de propaganda partidária, em emissoras
de televisão sediadas neste Estado, no primeiro e segundo semestres do ano
de 2011, conforme plano de mídia acostado às fls.44/54 dos autos.
326
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Em 07/02/11, a SERPAC informou que a aludida agremiação
partidária preenche os requisitos previstos no art. 57, I, alínea a da Lei nº
9.096/95, não cumprindo, entretanto, o quanto determinado no art. 57, I,
alínea b (fl. 67).
Instado a se manifestar, o eminente Procurador Regional Eleitoral
opinou pelo deferimento do pleito (fls. 70/71).
É o relatório.
VOTO
Em princípio, o dispositivo que regulamentava o direito às inserções
estaduais era o art. 49 da Lei nº 9.096/95, que assim dispunha:
Art. 49. O partido que atenda ao disposto no art. 13 tem
assegurado:
I - a realização de um programa, em cadeia nacional e de
um programa, em cadeia estadual em cada semestre, com a
duração de vinte minutos cada;
II - a utilização do tempo total de quarenta minutos, por semestre, para inserções de trinta segundos ou um minuto,
nas redes nacionais, e de igual tempo nas emissoras estaduais.
Entretanto, nas ADIns nºs 1.351-3/DF e 1.354-8/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou inconstitucional o art. 13 da Lei nº 9.096/95, popularmente conhecido como “cláusula de barreira”, o que, por consequência,
impossibilitou a aplicação do art. 49, acima transcrito. Assim, com vistas a
se evitar inconveniente vácuo legislativo, quanto ao direito de inserções nos
Estados, restou assentado nas aludidas decisões, a projeção no tempo da
vigência de preceito transitório - art. 57 da Lei nº 9.096/95 – visando aguardar
nova atuação das Casas do Congresso Nacional. Eis o teor do mencionado
art. 57:
Art. 57. No período entre o início da próxima Legislatura e a
proclamação dos resultados da segunda eleição geral subseqüente para a Câmara dos Deputados, será observado o
seguinte:
I - direito a funcionamento parlamentar ao partido com registro
definitivo de seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral até
a data da publicação desta Lei que, a partir de sua fundação
tenha concorrido ou venha a concorrer às eleições gerais para
a Câmara dos Deputados, elegendo representante em duas
eleições consecutivas:
a) na Câmara dos Deputados, toda vez que eleger representante em, no mínimo, cinco Estados e obtiver um por cento
dos votos apurados no País, não computados os brancos e
os nulos;
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
327
JURISPRUDÊNCIA
b) nas Assembléias Legislativas e nas Câmaras de Vereadores,
toda vez que, atendida a exigência do inciso anterior, eleger
representante para a respectiva Casa e obtiver um total de um
por cento dos votos apurados na Circunscrição, não computados os brancos e os nulos;
(...)
III - é assegurada, aos Partidos a que se refere o inciso I, observadas, no que couber, as disposições do Título IV:
a) a realização de um programa, em cadeia nacional, com
duração de dez minutos por semestre;
b) a utilização do tempo total de vinte minutos por semestre
em inserções de trinta segundos ou um minuto, nas redes
nacionais e de igual tempo nas emissoras dos Estados onde
hajam atendido ao disposto no inciso I, b.
Ocorre que, no julgamento do Respe 21.334/SC, O Tribunal Superior Eleitoral manifestou-se pela inconstitucionalidade do art. 57, III, b, parte
final, quanto à expressão “onde hajam atendido ao disposto no inciso I, b”,
nos seguintes termos:
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PROGRAMA PARTIDÁRIO. INSERÇÕES. 1º E 2º SEMESTRES DE 2003. ARGÜIÇÃO
DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 57, III, b, C.C. I, b,
DA LEI Nº 9.096/95. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA
PARTIDÁRIA. DIREITO DA AGREMIAÇÃO À PROPAGANDA
GRATUITA INDEPENDENTEMENTE DE REPRESENTAÇÃO
LEGISLATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 13 DA
LEI DOS PARTIDOS POLÍTICOS E DE SUAS REFERÊNCIAS
NO CORPO DO DIPLOMA CONFORME ADIn nº 1.351-3/
STF. CAPUT DO ART. 57 DA LEI Nº 9.096/95. REGRA DE
TRANSIÇÃO. EXAURIMENTO DA EFICÁCIA DA NORMA.
DECLARAÇÃO PELO TSE DA INCONSTITUCIONALIDADE
DA PARTE FINAL DA ALÍNEA b DO INCISO III DO ART. 57
DA LEI Nº 9.096/95.
1. A agremiação partidária, independentemente de representação legislativa, tem direito à propaganda gratuita em
razão da declaração de inconstitucionalidade do art. 13 da Lei
nº 9.096/95 e suas referências no corpo do diploma (ADIn
nº 1.351-3 DJ de 30.3.2007, republicado em 29.6.2007).
(...)
4. O Tribunal Superior Eleitoral assenta a inconstitucionalidade da parte final da alínea b do inciso III do art. 57 da Lei
nº 9.096/95 quanto à expressão “onde hajam atendido ao
disposto no inciso I, b” .
5. Recurso julgado prejudicado.
(TSE, REspe 21334, Publicado em 23.04.2008, Relator Ministro
Francisco Peçanha Martins). (grifou-se).
328
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Assim, para caracterizar o direito de inserções no Estado não é
necessário que se atenda aos requisitos previstos no art. 57, I, b, parte final
– representação parlamentar na Assembléia Legislativa e votação mínima de
um por cento na circunscrição regional -, sendo exigido apenas dos Partidos
Políticos o cumprimento do art. 57, I, a – representação em, no mínimo, cinco
Estados e votação de, pelo menos, um por cento no país.
Por sua vez, a Seção de Registro de Partidos e Candidatos –
SERPAC atesta na manifestação de fls. 61, que “o PARTIDO VERDE - PV
preenche os requisitos estabelecidos pelo art. 57, I, a, da Lei nº 9.096/95,
tendo superado o percentual de 1% dos votos apurados no país e elegendo
Deputados Federais em mais de cinco estados nas Eleições 2006 e 2010”.
Ante o exposto, em harmonia com o opinativo ministerial, voto pelo
deferimento do pedido, para conceder ao Partido Verde a veiculação de 20
(vinte) minutos de inserções, em cada semestre do ano de 2011.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 25 de abril de 2011.
Renato Reis Filho
Juiz Relator
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
329
JURISPRUDÊNCIA
R E S O L U Ç Ã O N º 1 . 5 7 7 / 2 0 11
CONSULTA
PROCESSO Nº 1.404-59.2011.6.05.0000
CLASSE 10
MUNICÍPIO:
Salvador
CONSULENTE:
Partido Democratas – Seção Bahia. Adv.: Bel. Ademir Ismerim.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Consulta. Campanha eleitoral. Utilização de trio elétrico. Caminhadas e carreatas. Artigo 39, § 10 da Lei
nº 9.504/97. Resposta negativa.
Considerando-se que a legislação eleitoral veda expressamente a utilização de trios elétricos durante
as campanhas, abrindo uma única exceção para a
“sonorização de comícios”, não cabe interpretação
extensiva da norma, de modo a permitir que também
sejam utilizados em carreatas e passeatas.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
RESOLVEM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, RESPONDER NEGATIVAMENTE À CONSULTA, nos termos
do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar a presente
Resolução.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011
CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA - Vice-Presidente no exercício da Presidência; MAURICIO KERTZMAN SZPORER - Juiz Relator;
SIDNEPESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
Cuida-se de consulta formulada pelo Partido Democratas – Seção
da Bahia, nos seguintes termos:
O artigo 39, § 10 da Lei 9.504/97 permite a utilização de trio
elétrico na realização de comícios. Podem os partidos políticos
e coligações utilizarem trio elétrico em carreatas e caminhadas,
nos mesmos moldes em que este é utilizado nos comícios?
330
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
O representante do Ministério Público Eleitoral emitiu o pronunciamento de fls. 07/09, opinando no sentido de que a pergunta fosse respondida
negativamente.
É o relatório.
VOTO
De início, cumpre registrar o que dispõe o artigo 162 do Regimento
Interno desta Corte, in verbis:
Art. 162. O Tribunal responderá às consultas sobre matéria
eleitoral formuladas em tese, por autoridade pública ou partido
político, sendo vedada a sua apreciação durante o processo
eleitoral, que compreende o período da realização das convenções partidárias até a diplomação dos eleitos.
Assim, atendidos os requisitos de admissibilidade que lhes são
próprios, a consulta deve ser conhecida, já que o questionamento versa sobre
matéria eleitoral em tese, além de ter sido formulado em período permitido
e por quem detém legitimidade para tanto.
O tema abordado diz respeito à utilização de trios elétricos durante
a campanha eleitoral. Sobre a questão, o artigo 39, § 10 da Lei nº 9.504/97
estatui:
Art. 39
(…)
§ 10. Fica vedada a utilização de trios elétricos em campanhas
eleitorais, exceto para a sonorização de comícios.
Diante disso, a pergunta deve ser respondida negativamente.
A legislação eleitoral veda expressamente a utilização de trios
elétricos durante as campanhas, abrindo uma única exceção para a “sonorização de comícios”, não cabendo a interpretação extensiva que o consulente
visualiza possa ser aplicada.
Nesse sentido, trago à colação decisão do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, nos autos da Representação nº 7.653-38:
RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL
IRREGULAR. ELEIÇÕES 2010. UTILIZAÇÃO DE MEIO DE
TRANSPORTE CONHECIDO COMO TRIO ELÉTRICO, EM
HIPÓTESE OUTRA QUE A ADMITIDA EM LEI. IRREGULARIDADE CONFIGURADA.
A presença de pessoas sobre o veículo, portanto bandeiras e,
inclusive, microfone, transmite a idéia de interação com o público e incitação dos eleitores, o que configura ato em comício
ou até mesmo showmício, sendo apto a causar desequilíbrio
ao pleito. A norma contida no § 10, do artigo 39, da Lei n.
9.504/97 coíbe toda e qualquer forma utilização de trios
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
331
JURISPRUDÊNCIA
elétricos, apenas excetuando quando da utilização para
sonorização de comícios. Por se tratar de requisito objetivo da lei, não cabe a este Julgador interpretar a norma
de forma extensiva. Recursos não providos.
(Representação nº 7.653-38 - Belo Horizonte/MG. Relator: Juiz
Octavio Augusto de Nigris Boccalini. Publicado em Sessão de
28/09/2010) (grifos nossos).
Ocorre que comícios são atos distintos de passeatas ou carreatas,
a serem realizados sem mobilidade, em locais previamente escolhidos, com
comunicação prévia às autoridades policiais, justificando-se a exceção à
regra pela facilidade que oferece aos candidatos, evitando-se a montagem
de estruturas fixas para uso em curto espaço de tempo.
Neste ponto, bem observou o parquet em seu pronunciamento:
Cediço, a seu turno, que o local de realização de comício deve
ser escolhido em consonância com o necessário respeito à paz
pública, de modo a que o som emitido pelos engenhos não
exceda o limite, em decibéis, estabelecido para determinada
localidade, controle quase inviável de se realizar em se tratando
de evento móvel.
Além disso, ao se utilizar um trio elétrico para sonorizar uma passeata ou carreata, não se estará permitindo que o candidato divulgue suas
ideias como faria em se tratando de um comício. Ao contrário, a sonorização nesse caso acabaria servindo para veicular jingles e motivar o público
a acompanhá-los, já que as pessoas sempre se empolgam com esse tipo
de equipamento que, por sua destinação mais conhecida, remete à ideia de
festividades e comemorações.
Por tudo quanto exposto, voto por responder à consulta negativamente.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
332
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
R E S O L U Ç Ã O N º 1 . 5 7 8 / 2 0 11
CONSULTA
PROCESSO Nº 1.413-21.2011.6.05.0000
CLASSE 10
MUNICÍPIO:
Salvador
CONSULENTE:
Partido Democratas – Seção da Bahia. Adv.: Bel. Ademir
Ismerim.
RELATOR:
Juiz Mauricio Kertzman Szporer.
Consulta. Doação de recursos entre candidatos. Limites. Matéria disciplinada no pleito de 2010. Artigo
17, § 1º da Resolução TSE nº 23.217/2010. Resposta
afirmativa.
As doações de recursos próprios de candidatos
para sua campanha não se sujeitam aos limites do
artigo 23 da Lei nº 9.504/97, devendo ser observado
o valor máximo de gastos fixado pela agremiação e
informado à Justiça Eleitoral.
As doações de um candidato para outro candidato
também encontrarão limite naquele teto, desde que o
doador não esteja se valendo de seus próprios recursos doados à sua campanha. Nesse caso, ainda que
a doação esteja sendo feita pela figura do candidato,
ele deverá respeitar o limite de 10% dos rendimentos
por ele auferidos no ano anterior enquanto pessoa
física, nos termos firmados pelo TSE no § 1º do
artigo 17 da Resolução nº 23.217, que disciplinou a
arrecadação de recursos no pleito de 2010.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
RESOLVEM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, RESPONDER AFIRMATIVAMENTE À CONSULTA, nos termos
do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar a presente
Resolução.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011.
MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS - Juiz-Presidente; MAURICIO
KERTZMAN SZPORER - Juiz Relator; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
333
JURISPRUDÊNCIA
RELATÓRIO
Cuida-se de consulta do Diretório Estadual do Partido Democratas
– DEM – formulada nos seguintes termos:
“Considerando que a Lei nº 9.504/97 faz distinção entre a
pessoa física dos candidatos e a figura dos candidatos, uma
vez que estes possuem CNPJ e conta bancária específicos,
e considerando que a figura do candidato não existia no ano
anterior à eleição, as doações realizadas de candidato para
candidato possuem algum limite? Em caso afirmativo, quais
os limites e os critérios a serem utilizados?”
O representante do Ministério Público Eleitoral emitiu o pronunciamento de fls. 07/13, opinando no sentido de que a pergunta fosse respondida
afirmativamente.
É o relatório.
VOTO
De início, cumpre registrar o que dispõe o artigo 162 do Regimento
Interno desta Corte, in verbis:
Art. 162. O Tribunal responderá às consultas sobre matéria
eleitoral formuladas em tese, por autoridade pública ou partido
político, sendo vedada a sua apreciação durante o processo
eleitoral, que compreende o período da realização das convenções partidárias até a diplomação dos eleitos.
Assim, atendidos os requisitos de admissibilidade que lhes são
próprios, a consulta deve ser conhecida, já que o questionamento versa sobre
matéria eleitoral em tese, além de ter sido formulado em período permitido
e por quem detém legitimidade para tanto.
O tema abordado diz respeito aos limites a serem observados nas
doações, mais especificamente se essas doações ocorrerem de um candidato para outro.
O artigo 23 da Lei nº 9.504/97, em seu § 1º, estatui:
Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou
estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido
o disposto nesta Lei.
§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo
ficam limitadas:
I - no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição;
334
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
II - no caso em que o candidato utilize recursos próprios,
ao valor máximo de gastos estabelecido pelo seu partido,
na forma desta Lei.
Grifos aditados.
Para o pleito de 2010, foi editada a Resolução TSE nº 23.210, de 2
de março de 2010, que disciplinou e detalhou a matéria, trazendo a resposta
ao questionamento formulado.
Eis a previsão contida nos artigos 16 e 17 daquela norma:
Art. 16. Observados os requisitos estabelecidos no art. 1º desta
resolução, candidatos, partidos políticos e comitês financeiros poderão receber doações de pessoas físicas e jurídicas
mediante depósitos em espécie, devidamente identificados,
cheques cruzados e nominais ou transferências bancárias,
ou ainda em bens e serviços estimáveis em dinheiro, para
campanhas eleitorais.
§ 1º As doações referidas no caput ficam limitadas (Lei n°
9.504/97, arts. 23, § 1º , I e II, § 7º e 81, § 1º):
I - a 10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição, no caso de pessoa física, excetuando-se as
doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens
móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o
valor da doação não ultrapasse R$50.000,00 (cinqüenta mil
reais), apurados conforme o valor de mercado;
II - a 2% do faturamento bruto do ano anterior à eleição, declarado à Receita Federal do Brasil, no caso de pessoa jurídica;
Inst. n° 23-88.2010.6.00.0000/DF. 13;
III - ao valor máximo do limite de gastos estabelecido na
forma do art. 2º desta resolução, caso o candidato utilize
recursos próprios.
§ 2º São vedadas doações de pessoas jurídicas que tenham começado a existir, com o respectivo registro, no ano de 2010.
...
Art. 17. As doações realizadas entre candidatos, comitês
financeiros e partidos políticos deverão fazer-se mediante
recibo eleitoral e não estão sujeitas aos limites fixados nos
incisos I, II e III do § 1º do artigo anterior.
§ 1º As doações previstas no caput deste artigo, caso oriundas de recursos próprios do candidato, deverão respeitar
o limite legal estabelecido para pessoas físicas. Grifos
nossos.
Diante disso, a pergunta deve ser respondida afirmativamente.
Conclui-se, assim, que um candidato poderá doar recursos a outro
concorrente sem estar limitado pelo § 1º do artigo 23 da Lei nº 9.504/97,
observando, contudo, o valor máximo de gastos fixado pela agremiação e
informado à Justiça Eleitoral.
Entretanto, se o doador se valer de seus recursos próprios que
tenham sido doados à sua campanha, ainda que a doação esteja sendo feita
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
335
JURISPRUDÊNCIA
pela figura do candidato, ele deverá respeitar o limite de 10% dos rendimentos
por ele auferidos no ano anterior enquanto pessoa física, nos termos firmados
no supracitado dispositivo.
Voto, pois, por responder a consulta afirmativamente, nos termos
antes expostos.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 28 de novembro de 2011.
Mauricio Kertzman Szporer
Juiz Relator
336
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
R E S O L U Ç Ã O N º 1 . 5 9 7 / 2 0 11
CONSULTA
PROCESSO Nº 1.406-29.2011.6.05.0000
CLASSE 10
MUNICÍPIO:
Salvador
CONSULENTE:
Partido Democratas – DEM – Seção da Bahia. Adv.: Bel. Ademir
Ismerim.
RELATORA:
Juíza Mônica Aguiar.
Consulta. Prefeito que ocupou cargo de vice-prefeito
no mandato anterior. Substituição ao então prefeito.
Período fora dos seis meses que antecederam ao
pleito. Elegibilidade e reeleição. Possibilidade. Resposta afirmativa.
Responde-se afirmativamente à indagação formulada,
pois é possível ao prefeito que tenha ocupado o cardo de
vice-prefeito no mandato anterior concorrer à reeleição,
quando a substituição ao então titular do cargo não tenha
ocorrido nos seis meses que antecederam ao pleito.
Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados,
RESOLVEM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à
unanimidade, RESPONDER AFIRMATIVAMENTE À CONSULTA, nos termos
do voto da Juíza Relatora, adiante lavrado, que passa a integrar a presente
Resolução.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 6 de dezembro de 2011.
DAISY LAGO RIBEIRO COELHO - Vice-Presidente no exercício
da Presidência; MÔNICA AGUIAR - Juíza Relatora; SIDNEY PESSOA MADRUGA - Procurador Regional Eleitoral.
RELATÓRIO
O Diretório Estadual do Partido Democratas – DEM formula consulta
sobre elegibilidade e reeleição, apresentando o seguinte questionamento:
Vice-prefeito que substituiu o titular do mandato sem caráter de definitividade
fora dos 6 (seis) meses que antecedem o pleito e se elegeu prefeito por uma
vez pode concorrer à reeleição?
O representante do Ministério Público Eleitoral emitiu parecer de
fls. 07/09, opinando pela concessão de resposta positiva ao questionamento
formulado.
É o relatório.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
337
JURISPRUDÊNCIA
VOTO
Conheço da consulta sub examine, porquanto presentes os requisitos de sua admissibilidade (artigo 23, XII do CE c/c o artigo 162 do
Regimento Interno desta Corte), haja vista ter sido formulada, em tese, por
partido político e fora do processo eleitoral, razão porque passo a responder
o questionamento do Partido Democratas – DEM.
A questão colocada em foco diz respeito à reeleição para cargo
do Poder Executivo, permitida a partir da Emenda Constitucional nº 16 de
4 de julho de 1997, que atribuiu nova redação ao § 5º do artigo 14 da CF,
possibilitando ao Presidente da República, aos Governadores de Estado e do
Distrito Federal, aos Prefeitos e a quem os houvesse substituído ou sucedido
no curso do mandato ser reeleito para um único período subsequente.
Diante desses mandamentos constitucionais e do quanto já decidido pela Corte Eleitoral Superior, passo a responder as questões suscitadas
pelo consulente.
A situação em exame questiona a possibilidade de um vice-prefeito
que substituiu o prefeito temporariamente, sem caráter de definitividade,
fora dos seis meses antecedentes ao pleito, tendo no pleito seguinte sido
eleito prefeito, concorrer nas eleições vindouras para se reeleger ao cargo
de prefeito.
A resposta à consulta formulada subordina-se ao período em que
o suposto candidato assumiu a titularidade da chefia do Executivo: se a
substituição ocorreu durante os últimos 6 meses anteriores ao pleito em que
se elegeu, ainda que por poucos dias, a resposta será negativa; se ocorreu
anteriormente a esse período, será afirmativa.
Esse entendimento já foi sufragado pela Corte Superior, conforme
se infere dos Acórdãos TSE nºs 23.344 e 23.570/2004, assim ementados:
REGISTRO DE CANDIDATO. INDEFERIMENTO. INEXISTÊNCIA. CARÁTER PROTELATÓRIO. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. TEMPESTIVIDADE. RECURSO ESPECIAL.
VICE-PREFEITO. SUBSTITUIÇÃO EVENTUAL. PREFEITO.
CONFIGURAÇÃO. TERCEIRO MANDATO.
[...]
2 – O vice-prefeito que substituiu o titular seis meses antes
do pleito e é eleito prefeito em eleição subseqüente não pode
candidatar-se à reeleição, sob pena de se configurar um terceiro mandato.
[...] (Ac. TSE 23.570 de 21/10/2004, Rel. Min. Carlos Velloso).
Agravo Regimental. Recurso Especial.
Registro. Indeferimento. Vice-prefeito que substituiu o titular
nos seis meses anteriores ao pleito. Eleito prefeito no pleito
subseqüente. Candidatura à reeleição. Impossibilidade.
(Ac. TSE 23.344 de 06/10/2004, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira).
338
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Assim, se o vice-prefeito substituiu o titular no semestre que antecede a eleição, só pode se candidatar a prefeito por um único período subsequente. Do contrário, a sua participação no pleito seguinte poderia configurar
a reeleição para o terceiro mandato, caso obtivesse êxito.
Se, entretanto, a substituição se deu antes dos seis meses precedentes ao pleito, a vedação não deve subsistir, pois o art. 14, § 5º da CF,
deve ser compreendido à luz do § 7º do mesmo dispositivo legal, que equipara
os titulares dos cargos do Executivo a quem os haja substituído no semestre
que antecede o pleito, interpretação da qual se pode inferir, também, que a
substituição antes desse período não caracterizaria o exercício de um primeiro
mandato, para efeito de reeleição.
Esta matéria já se encontra pacificada no Tribunal Superior Eleitoral,
na seguinte forma:
Consulta. Governador que ocupou o cargo de vice-governador
no mandato anterior. Possibilidade de reeleição. Art. 14, §5º,
da Constituição Federal.
É possível ao governador que tenha ocupado o cargo de
vice-governador no mandato anterior concorrer à reeleição,
exceto nos casos em que substituiu o titular nos seis meses
antes daquela eleição.
Fixadas essas premissas e, em consonância com o parecer ministerial, conclui-se que, diante da não afronta, na hipótese, da vedação
constitucional que tem por objetivo precípuo evitar a perpetuação do poder
político, deve-se responder afirmativamente à indagação formulada, se a
substituição ocorreu fora do semestre que antecedeu a eleição.
É como voto.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, em 6 de dezembro de 2011.
Mônica Aguiar
Juíza Relatora
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
339
JURISPRUDÊNCIA
MANDADO DE SEGURANÇA
PROCESSO N.º 426-82.2011.6.05.0000
CLASSE 22
MUNICÍPIO:
PAU BRASIL
RECURSO ORDINÁRIO
RECORRENTE :
JEOVAN PEREIRA SANTOS
RECORRIDO :
JUIZ ELEITORAL DA 133º ZONA ELEITORAL
D E C I S Ã O
O Recorrente acima nominado, por advogado devidamente habilitado, irresignado com o Acórdão nº. 210/2011, prolatado por este Tribunal
nos autos do Mandado de Segurança nº. 426-82.2011.6.05.0000, Classe 22,
oriundo do Município de Pau Brasil, interpõe, com fulcro no artigo 276, II,
alínea “b”, do Código Eleitoral e no artigo 105, II, alínea “b”, da Constituição
da República, Recurso Ordinário.
Sustenta o cabimento do presente recurso sob a alegação de que
o Acórdão impugnado “houve por bem indeferir o mandado de segurança
impetrado”.
Colaciona julgados de Tribunais Eleitorais de modo a alegar que
a “divergência jurisprudencial foi devidamente apontada e configurada nos
termos dos paradigmas” já apreciados pelo Tribunal Superior Eleitoral,
“porquanto o cotejo analítico dos casos já julgados foram imperiosamente
demonstrados”.
Brevemente relatados, passo a decidir.
O artigo 276 do Código Eleitoral dispõe que as decisões dos
Tribunais Regionais são terminativas, com a ressalva de cabimento de
Recurso Especial (inciso I), nos casos de malferimento de dispositivos legais
ou divergência na interpretação de lei entre dois ou mais Tribunais Eleitorais,
e Recurso Ordinário, que apresenta um rol de circunstâncias que autorizam a
sua interposição, entretanto, nos termos do inciso II do artigo 276 do Código
Eleitoral, e artigo 121, §4º, III, IV e V, da Constituição Federal, as hipóteses
de cabimento estão restritas aos mandatos federais e estaduais e às decisões que denegarem habeas corpus, habeas data, mandado de injunção e
mandado de segurança.1
1 Código Eleitoral:
“Art. 276. As decisões dos tribunais regionais são terminativas, salvo os casos seguintes em que cabe
recurso para o Tribunal Superior:
I - especial:
a) quando forem proferidas contra expressa disposição de lei;
b) quando ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais;
II - ordinário:
340
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Por sua vez, o artigo 105, II, “b”, da Constituição da República,
alegado pelo Recorrente, faz previsão do cabimento do Recurso Ordinário no
Superior Tribunal de Justiça em face dos “mandados de segurança decididos
em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos
Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão”.
Nesse sentido, equivoca-se o Recorrente ao fundamentar seu
Recurso em tal dispositivo constitucional, pois, a despeito da semelhança,
o mesmo não se aplica a esta Justiça Especializada, uma vez que a Constituição Federal elenca norma específica, artigo 121, que estabelece em que
situações as decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais são recorríveis.
Ademais, in casu, não se trata de Acórdão que indeferiu o Mandado
de Segurança, como afirma o Recorrente, mas sim de Recurso Ordinário
contra Acórdão Regional que em sede de Agravo Regimental manteve decisão do Relator que indefere a liminar requerida, isto é, decisão que não é
definitiva e nem é terminativa, hipótese, portanto, em que descaberia o manejo
de tal Recurso, diante da ausência de pressuposto recursal específico, qual
seja, decisão denegatória final – que determina o esgotamento da instância
ordinária – de mandado de segurança.
Corroboram com tal posição as lições dos processualistas Fredie
Didier Júnior e Leonardo José Carneiro da Cunha ao se manifestarem acerca
do alcance do Recurso Ordinário, nos seguintes termos:
“O mais importante no estudo deste recurso é entender o que
significa “decisão denegatória”. Essa hipótese tem acepção
ampla: compreende não só as “decisões que julgam improcedente o pedido”, mas também as “que extinguem o processo
sem apreciação do mérito”. Denegar, aqui, significa não acolher
o pedido.
Além disso, é preciso que se trate de decisão final. Somente
os acórdãos (o recurso ordinário só cabe contra acórdão) que
ponham termo a mandado de segurança, (...) denegandoos, é que dão azo a recurso ordinário; acórdãos que simplesmente neguem a liminar, confirmando, em julgamento de
agravo regimental (a despeito do enunciado n. 622 da súmula
a) quando versarem sobre expedição de diplomas nas eleições federais e estaduais;
b) quando denegarem habeas corpus ou mandado de segurança.”
Constituição Federal:
“Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de
direito e das juntas eleitorais.
§ 4º - Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando:
I - forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei;
II - ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais;
III - versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais;
IV - anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais;
V - denegarem “habeas-corpus”, mandado de segurança, “habeas-data” ou mandado de injunção.”
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
341
JURISPRUDÊNCIA
do STF), a decisão monocrática denegatória do relator, somente podem ser impugnados por recurso especial, extraordinário
e, claro, por embargos de declaração.2 [grifo nosso]
No mesmo sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça,
conforme os seguintes julgados, in verbis:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
INDEFERIMENTO DE LIMINAR. DESCABIMENTO.
1. O cabimento do recurso ordinário em mandado de segurança (art.105, II, “b”, da Constituição Federal) pressupõe
a existência de decisão denegatória final, seja de mérito
ou terminativa.
2. Não se amolda ao permissivo constitucional a interposição
do recurso ordinário em face de decisão, confirmada em sede
de agravo regimental, que indefere liminar em mandado de
segurança.
3. Recurso ordinário não conhecido3. [grifo nosso]
MANDADO DE SEGURANÇA. TRANSPORTE INTERESTADUAL DE PASSAGEIROS. EXPLORAÇÃO DE LINHA.
LIMINAR. INDEFERIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL. IMPROVIMENTO.
- Recurso cabível. Pronunciando-se o Acórdão recorrido apenas sobre a liminar, nada aduzindo sobre o mérito do pedido,
o Recurso cabível era o Especial.
- Interposto o Ordinário, relevado o erro grosseiro, mesmo
assim aquele Recurso não atenderia os pressupostos de
admissibilidade.
- Recurso não conhecido, prejudicada a cautelar.4
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO REGIMENTAL QUE MANTEM CASSAÇÃO
DE LIMINAR CONCEDIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA
INEXISTENCIA, NA ESPECIE, DE DECISÃO DENEGATORIA
A JUSTIFICAR A ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ORDINARIO CONSTITUCIONAL.
I - Não cabe Recurso Ordinário contra decisão, proferida
em Agravo Regimental, que lhe negou provimento e man2 DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: Vol. 3, 7.ed.,
Salvador: Editora JusPodivm, 2009. p. 248.
3 RMS 28.632/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 15/09/2009, DJE
05/10/2009
4 MC 199/DF, Rel. Ministro AMÉRICO LUZ, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/1995, DJ 16/10/1995, p.
34632
342
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
teve a cassação de liminar concedida em mandado de segurança, porquanto as questões de mérito do “mandamus”
só comportam apreciação em julgamento final.
II - Ainda que se leve em ordem de consideração os temperamentos que a jurisprudência desta colenda Corte tem
emprestado a interpretação do artigo 105, II, “b”, da Lei Maior,
dando sentido mais amplo a locução constitucional - “quando
denegatória a decisão” - não ha como divisar, na espécie,
decisão denegatória em mandado de segurança a justificar a
admissão do Recurso Ordinário Constitucional.
III - Recurso de que não se conhece. Decisão indiscrepante5. [grifo nosso]
Nestes termos, verifica-se ser manifestamente inadmissível o presente Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, por inadequação da
via eleita, consubstanciada na ausência de pressuposto recursal específico,
qual seja, decisão denegatória final de mandado de segurança
Todavia, nosso sistema processual admite a aplicação do princípio
da instrumentalidade das formas (artigo 250 do Código de Processo Civil) que,
somado ao princípio da indisponibilidade dos interesses democráticos (lisura
e legitimidade das eleições, nos termos do artigo 14, §9º, da Constituição
Federal), permite, com fulcro no princípio da fungibilidade, a recebimento do
Recurso Ordinário como se fosse o Especial.
Nesse contexto, considerando que o Recorrente nomeou o Recurso
como “Recurso Ordinário”, não sendo, no entanto, hipótese de cabimento
deste, e sim de Recurso Especial, já que não se trata de decisão final denegatória de mérito, mas sim de Acórdão com natureza de decisão interlocutória,
aplico o princípio da fungibilidade recursal, determinando a conversão do
presente Recurso Ordinário em Recurso Especial, sob pena de afronta ao
princípio da singularidade recursal ou unirrecorribilidade.
Passo à análise do juízo de admissibilidade do Recurso Especial.
In casu, a Corte Superior Eleitoral pronuncia-se nos seguintes
termos:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO
QUE DECIDIU QUESTÃO INCIDENTE. 1.O recurso especial
interposto contra decisão interlocutória, salvo situação excepcional, há de ficar retido nos autos, conforme dispõe o §
3º do artigo 542 do CPC. 2.A recorrente não demonstra, quer
no agravo de instrumento, quer no recurso especial, o perigo
da demora, imprescindível ao imediato pronunciamento deste
Tribunal Superior. 3.Desprovimento do recurso. 6
5 RMS 2408/DF, Rel. Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/04/1994, DJ
16/05/1994, p. 11705.
6 Ag. 8876, Rel. Min. Carlos Ayres de Britto, D.J. de 04.12.07, p. 15.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
343
JURISPRUDÊNCIA
Deste modo, consoante assentado por iterativa jurisprudência do
egrégio Tribunal Superior Eleitoral e de outros Tribunais da federação, incide
na espécie o §3º do artigo 542 do Código de Processo Civil, na redação que
lhe deu a Lei nº. 9.756/98, que “dispõe sobre o processamento de recursos
no âmbito dos tribunais”.
Estatui o referido preceptivo que “o recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra decisão interlocutória em processo
de conhecimento, cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e
somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição
do recurso contra a decisão final, ou para as contra-razões”.
Nesse contexto, a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz
Arenhart7:
“Os recursos extraordinário e especial devem ficar retidos,
como expressa o art. 542, §3º, do CPC, (...). Tais recursos
devem ser interpostos contra acórdãos que configuram decisão
interlocutória, e não contra qualquer acórdão que julga agravo
de instrumento interposto contra decisão interlocutória. (...) Se
o acórdão, dando provimento a agravo de instrumento, extingue
o processo, o caso não será de recurso retido, mas de recurso
de subida imediata. Aliás, no caso inverso, se a sentença de
extinção for reformada em razão de recurso de apelação,
o acórdão conterá decisão interlocutória, que decidiu que
o processo deve prosseguir, e assim o recurso contra ele
interposto deverá ficar retido.”
Na mesma linha de raciocínio leciona Ernane Fidélis dos Santos8:
“A decisão interlocutória não é a de caracterização de primeiro grau, mas a proferida em única ou última instância
(...) que não extinga o processo. Assim, se o tribunal prover
o recurso (...), mandado prosseguir o processo, o extraordinário ou o especial interpostos deverão ficar retidos.”
Verifica-se que a hipótese dos autos amolda-se ao supracitado
dispositivo, bem como ao entendimento jurisprudencial e doutrinário, senão
vejamos: o apelo nobre foi interposto contra acórdão desta Corte Regional
que negou provimento ao Agravo Regimental, o qual visava à reforma de
decisão do Relator que indeferiu pedido liminar por não vislumbrar “situação
processual irregular a ensejar a devolução de prazo pleiteada”, uma vez
não caracterizado prejuízo à defesa em face de constar em despacho que
7 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento, 4ª ed. rev., atual.
e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, pág. 559.
8 SANTOS, Ernane Fídelis dos. Manual de Direito Processual Civil: volume 1: processo de conhecimento. 11ª ed. rev.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, pág. 680.
344
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
lhe foi concedida o direito de retirar os autos em carga, assim, não restando
configurada a fumaça do bom direito.
Ex positis, determino, com fulcro no §3º do artigo 542 do Código
de Processo Civil, de aplicação supletiva, a retenção do Recurso Especial
interposto pelo Recorrente, a fim de que se aguarde a decisão definitiva da
causa e eventual reiteração na forma prevista pela norma de regência.
Encaminhem-se os autos, de imediato, ao Juiz Relator.
Intime-se.
Salvador, em 05 de maio de 2011.
Des. MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS
Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
345
JURISPRUDÊNCIA
MANDADO DE SEGURANÇA
PROCESSO N.º 426-82.2011.6.05.0000
CLASSE 22
MUNICÍPIO:
PAU BRASIL
RECURSO ESPECIALRECORRENTE: JEOVAN PEREIRA SANTOS
RECORRIDO:
JUIZ ELEITORAL DA 133º ZONA ELEITORAL
D E C I S Ã O
O Recorrente acima nominado, por advogado devidamente habilitado, com fulcro no artigo 542, §3º, CPC, c/c 276, I, alínea “b”, do Código
Eleitoral e no artigo 105, II, alínea “b”, da Constituição da República, ratifica
o Recurso Eleitoral interposto às fls. 131/154, contra o Acórdão nº. 210/2011,
prolatado por este Tribunal nos autos do Mandado de Segurança nº. 42682.2011.6.05.0000, Classe 22, oriundo do Município de Pau Brasil,
Alega que o acórdão vergastado malferiu os artigos 22, da Lei
Complementar nº 64/90.
Colaciona julgados de Tribunais Eleitorais de modo a alegar que
a “divergência jurisprudencial foi devidamente apontada e configurada nos
termos dos paradigmas” já apreciados pelo Tribunal Superior Eleitoral,
“porquanto o cotejo analítico dos casos já julgados foram imperiosamente
demonstrados”.
Brevemente relatados, passo a decidir.
Inicialmente, impende o registro de que o Recorrente apenas ratificou o Recurso Especial que fora retido nos autos por ter sido interposto
contra Acórdão de natureza interlocutória que negou pedido liminar, não tendo
oferecido Recurso contra a decisão final que denegou a segurança.
Nesse sentido, entendo que caso o presente Recurso Especial
obtivesse êxito seria no sentido do deferimento da medida liminar pleiteada e
negada no Acórdão nº 210/2011, e, considerando não ter havido impugnação
da decisão final que denegou a segurança ao julgar inexistir direito líquido
e certo, referida medida liminar (antecipação da tutela) jamais poderia ser
confirmada, razão pela qual o presente Recurso resta prejudicado.
Por sua vez, ainda que ultrapasse a barreira supracitada, prima
facie, não se entremostra, no acórdão ferreteado, vulneração a preceptivos
legais, eis que “nega-se provimento a agravo regimental interposto em face
de decisão que indefere pedido de devolução de prazo para apresentação
de defesa, bem como a extinção imediata de AIME com base em suposta
decadência, tendo em vista a ausência da fumaça do bom direito para concessão da medida requestada, além da inviabilidade jurídica no que tange
ao segundo pleito”, consoante se extrai do mérito de sua súmula.
346
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Ademais, a Corte Superior Eleitoral, no que respeita a alínea “b”
do inciso I do artigo 276 do Código Eleitoral, sufragou entendimento de que
para a comprovação e apreciação do dissídio jurisprudencial, devem ser
mencionadas e expostas as circunstâncias que identificam ou assemelham
os casos confrontados.
In casu, a Recorrente não logrou êxito em demonstrar a similitude
fática entre o aresto hostilizado e o acórdão alçado a paradigma, bem como
deixou de proceder ao indispensável cotejo analítico entre os mesmos.
É cediço que não basta a simples transcrição das ementas dos
julgados paradigmáticos, sendo necessário o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática das decisões tidas como divergentes, conforme
prescreve, também, o artigo 541, parágrafo único, do Código de Processo
Civil, in verbis:
Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o
recorrente fará a prova da divergência mediante certidão,
cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica,
em que tiver sido publicada a decisão divergente, ou ainda
pela reprodução de julgado disponível na Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em qualquer caso,
as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos
confrontados. [grifo nosso]
Desse modo, a Recorrente não logrou êxito em comprovar a similitude fática entre o julgado deste Regional (aresto hostilizado) e o julgado
colacionado (acórdão alçado a paradigma).
Nesse sentido, a melhor jurisprudência dispõe:
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. NÃO
DEMONSTRADA. NEGADO PROVIMENTO. (...) II - A divergência requer, para sua caracterização, o devido confronto
analítico, além da similitude fática e jurídica entre o julgado
e o acórdão paradigma, para possibilitar o conhecimento do
recurso especial.” 1 [grifo nosso]
Ante os fundamentos expostos, inadmito a subida do Recurso
Especial.
Intime-se.
Salvador, em 02 de agosto de 2011.
Des. MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS
Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
1 AgRgAg nº. 5.884, Relator Min. Cesar Asfor, D.J. de 17.3.06.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
347
JURISPRUDÊNCIA
PETIÇÃO
PROCESSO N.º 481-33.2011.6.05.0000
CLASSE 24
MUNICÍPIO:
SALVADOR-BA
REQUERENTE:
DIRETÓRIO REGIONAL DO PARTIDO DEMOCRATAS (DEM)
- BAHIA
Trata-se de petição do Diretório Regional do Partido Democratas (DEM)
– BAHIA, em que se requereu deliberação da Corte acerca de matéria de
ordem administrativa concernente à designação pelos Tribunais Regionais
Eleitorais de juízes auxiliares para a apreciação das reclamações ou
representações que lhes forem dirigidas.
Por meio da Resolução nº 650/2011, de 28/06/2011, esta Corte
Regional entendeu por não conhecer do pedido de designação de juízes para
exercerem o poder de polícia e julgar as representações em municípios onde
não há setor de distribuição e exista mais de uma Zona Eleitoral, em face
do caráter administrativo da matéria, decidindo pela remessa do feito para a
Presidência deste Tribunal.
Brevemente relatados, decido.
Inicialmente, cumpre mencionar que o voto condutor da citada
Resolução consignou:
Registre-se que a figura do juiz auxiliar mencionada pelo requerente somente se aplica às eleições estaduais quando as
representações são julgadas pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Em se tratando de eleição municipal, o próprio juiz eleitoral
titular da zona deve julgar o feito.
Destarte, o artigo 96, §2º, da lei nº 9.504/97 estabelece que:
§ 2º Nas eleições municipais, quando a circunscrição abranger
mais de uma Zona Eleitoral, o Tribunal Regional designará um
Juiz para apreciar as reclamações ou representações.
Por conseguinte, o prazo para cumprir mencionada incumbência é
determinado por meio de Resolução emitida pelo Tribunal Superior Eleitoral,
que atualmente é a de número 23.341/2011.
Referida resolução estabelece o calendário eleitoral para as eleições
do ano de 2012 e fixa o dia 19 de dezembro de 2011 como o “último dia
para os Tribunais Regionais Eleitorais designarem, para os Municípios onde
houver mais de uma Zona Eleitoral, o(s) Juízo(s) Eleitoral(is) que ficará(ão)
responsável(is) pelo registro de candidatos e de pesquisas eleitorais com as
348
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
reclamações e representações a elas pertinentes, pelo exame das prestações
de contas, pela propaganda eleitoral com as reclamações e representações
a ela pertinentes, bem como pela sua fiscalização e pelas investigações
judiciais eleitorais”.
Enquanto tal medida não for adotada não há prejuízo para qualquer
legitimado no direito de denunciar ou representar, uma vez que a competência
recai sobre o juízo eleitoral com jurisdição sobre o local do fato, conforme
entendimento doutrinário de Joel J. Cândido, in verbis:
No §2º, a medida administrativa do TRE facilitará a prestação
jurisdicional. Normalmente, os tribunais – na fase preparatória
do microprocesso eleitoral municipal – designam juízes para o
registro, para a propaganda e para a prestação de contas, ou,
às vezes, até mais de um para cada assunto, dependendo do
tamanho da Zona Eleitoral. Não havendo designação pelo
TRE, o requerente deve protocolar sua Reclamação ou
Representação no juízo eleitoral com jurisdição sobre o
local onde o fato ocorreu, por ser critério mais objetivo, que
não prejudica ninguém e que proporciona mais facilidade
na produção da prova.1
No mesmo sentido, afirma Marcos Ramayana que “mesmo ainda
não havendo designação de juiz eleitoral específico, para conhecer, processar e julgar as reclamações, cabe aos legitimados dirigir a medida ao juiz
eleitoral do local do fato”2.
Nestes termos, inexiste qualquer celeuma quanto ao recebimento
das representações eleitorais de modo que inviabilize o direito de petição e a
fiscalização partidária, uma vez que, conforme exposto, tais petições devem
ser dirigidas ao juiz eleitoral do local do fato.
Registro, por fim, que ainda não foi aprovada a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral que regulamenta as representações, reclamações e
pedidos de respostas previstos na Lei nº 9.504/97, estando tal resolução em
fase de discussão, com minuta disponível no site do TSE3, cuja audiência
pública foi realizada no dia 10/08/2011.
Ante o exposto, indefiro o pedido de designação de juízes eleitorais
específicos para apreciação de representações ou reclamações, por entender prematuro, uma vez que a Resolução TSE nº 23.341/2011estabeleceu a
data de 19/12/2011 como prazo final para adoção de tal medida, bem como a
1 CÂNDIDO, Joel J. Direito eleitoral brasileiro. 14ª edição, revista, atualizada e ampliada. Bauru, SP: EDIPRO, 2010.
pág. 669.
2 RAMAYANA, Marcos. Direito eleitoral. 10ª edição, Rio de Janeiro: IMPETUS, 2010. pág. 475.
3 http://www.tse.gov.br/internet/eleicoes/2012/audiencia_publicas.html
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
349
JURISPRUDÊNCIA
inexistência de prejuízo para qualquer legitimado no seu direito de denunciar
ou representar.
Intime-se.
Salvador, 05 de setembro de 2011.
Des. CARLOS ALBERTO DULTRA CINTRA
Vice-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
no exercício da Presidência
350
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
RECURSO ELEITORAL
PROCESSO N.º 433-74.2011.6.05.0144
CLASSE 30
MUNICÍPIO:
ENTRE RIOS
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL
RECORRENTE:
BENJAMIM DE ALMEIDA MENDES
RECORRIDO:
COLIGAÇÃO “ENTRE RIOS LIVRE”
D E C I S Ã O
O Recorrente acima nominado, por advogado, irresignado com o
Acórdão nº. 1.148/2011, integrado pelo Acórdão nº. 1.311/2011, prolatado
por este Tribunal nos autos do Recurso Eleitoral nº. 433-74.2011.6.05.0144
– Classe 30 – oriundo do município de Entre Rios - BA, interpõe, com fulcro
no artigo 276, I, “a” e “b”, do Código Eleitoral, Recurso Especial.
É o breve relato.
Decido.
Compulsando os autos verifico a ausência de procuração ou certidão
de procuração em favor do advogado, Dr. Michel Soares Reis, subscritor da
petição de Recurso Especial de fls. 94/105, quer arquivada na Secretaria
Judiciária deste Tribunal ou arquivada no cartório da 144ª Zona Eleitoral.
Acerca do tema, a Resolução TSE nº 3.193/2009 dispõe:
Art. 37. (...)
§1º Nesse período, os advogados, (...), estarão dispensados da
juntada de procuração em cada processo, se arquivarem, na
Secretaria Judiciária, mandato genérico relativo às eleições de
2010; a circunstância deverá ser informada na petição em
que ele se valer dessa faculdade e certificada nos autos.
§2º O requisito de admissibilidade dos recursos pela instância
superior será verificado a partir da certidão constante dos autos,
sendo a parte interessada responsável pela verificação da
existência da referida certidão.
Nesse contexto, conforme entendimento do Tribunal Superior
Eleitoral, incube ao subscritor da peça recursal demonstrar sua capacidade
postulatória, pois tal condição não se presume:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. DELEGADO DE PARTIDO. CONDIÇÃO NÃO COMPROVADA À ÉPOCA DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO
ESPECIAL ELEITORAL. NÃO-PROVIMENTO. 1.Cabe ao
subscritor da peça recursal demonstrar sua capacidade
postulatória e/ou sua condição de delegado do partido,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
351
JURISPRUDÊNCIA
pois tal condição não se presume. 2.Os precedentes mencionados pela parte agravante asseveram ser desnecessário
um delegado credenciado possuir procuração outorgada em
seu nome. No entanto, não sustentam que a sua condição
de representante do partido não deva ser comprovada nos
autos. 3.Agravo regimental não provido1. [grifo nosso]
Ademais, é de se observar que os Tribunais Superiores, a exemplo
do Superior Tribunal de Justiça, têm entendido que a regra estabelecida no
artigo 37 do Código de Processo Civil é inaplicável na instância superior,
sendo incabível qualquer diligência para suprir a falta de procuração2.
Portanto, cumpre salientar que dentre as finalidades das regras
procedimentais referentes ao acesso à tutela jurisdicional está a de resguardar a segurança jurídica das partes envolvidas, de modo que cabe à parte
formular seu recurso obedecendo aos pressupostos ou requisitos para a sua
admissibilidade, conforme estabelecido em lei.
Nesse sentido afirma o Ministro do STJ, Luis Felipe Salomão, ao emanar seu voto no Agravo Regimental em Recurso Especial nº 1.082.559 - RS:
Não pode, portanto, o órgão judiciário, quando da análise
dos requisitos de admissibilidade recursal, verificando a inexistência de cópia de procuração outorgando poderes para a
subscritora do recurso, declarar presentes os pressupostos
de admissibilidade, pois assim agindo, desvincular-se-ia dos
parâmetros da proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar.
É firme o entendimento desta Corte Superior de Justiça que
considera-se inexistente o recurso interposto, na instância
especial, subscrito por advogado sem procuração nos autos,
atraindo, à espécie, o enunciado nº 115 da Súmula do Superior
Tribunal de Justiça: “Na instância especial é inexistente recurso
interposto por advogado sem procuração nos autos.”
Necessário ressaltar que é pacífico o entendimento jurisprudencial do STJ de que é no momento da interposição do recurso
que a representação do advogado deve ser comprovada, não
podendo ser suprida a falta do instrumento de procuração após
o protocolo do Recurso Especial. [grifo nosso]
Ainda no sentido de inadmitir Recurso Especial cuja procuração
ou substabelecimento do subscritor esteja ausente se manifesta o Tribunal
Superior Eleitoral deixando claro que tal pressuposto de recorribilidade deva
ser atendido no prazo assinalado em lei para a interposição do recurso:
1 TSE. ARESPE 28.019. Rel. Min. José Augusto Delgado. DJ - Diário de justiça, Data 14/3/2008, Página 7/8.
2 Confira-se: STJ. AgRg no AG 421.905⁄PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 29.03.2004.
352
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. SUBSTABELECIMENTO.
AUSÊNCIA DA PROCURAÇÃO ORIGINÁRIA. INCIDÊNCIA
DA SÚMULA 115 DO STJ. FUNDAMENTO NÃO AFASTADO.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 13 DO CPC. IMPOSSIBILIDADE.
DESPROVIMENTO.
I - O substabelecimento tão-somente não comprova a regularidade da representação processual. Hipótese em que é de
rigor a aplicação da Súmula 115 do STJ.
II - A aplicação do artigo 13 do Código de Processo Civil não
encontra amparo na jurisprudência deste Tribunal. No âmbito
de recurso especial, o pressuposto objetivo de recorribilidade,
consubstanciado na regular representação processual, há
de estar atendido no prazo assinado em lei para a própria
interposição.
III - Agravo regimental a que se nega provimento3.
[grifo nosso]
Nestes termos, carece o apelo do pressuposto objetivo de recorribilidade consubstanciado na regular representação processual.
Ademais, ainda que ultrapassada essa questão, o Recurso Especial Eleitoral não ultrapassa a barreira da admissibilidade, por ser
intempestivo.
O artigo 275, §4º, do Código Eleitoral consigna:
“Os embargos de declaração suspendem o prazo para interposição de outros recursos, salvo se manifestamente protelatórios e assim declarados na decisão que os rejeitar.”
[grifo nosso]
O Acórdão recorrido foi publicado, no dia 05.09.11, no Diário da
Justiça Eletrônico do TRE-BA, nos termos de certidão de publicação de fls.
57. Na seqüência, foram interpostos Embargos de Declaração, rejeitados
em razão do manifesto intuito protelatório (fls. 85/86). Seguiu-se, então, a
interposição do Recurso Especial, em 10.10.11 (fls. 94).
A jurisprudência da Corte Superior Eleitoral se firmou no sentido de
que os embargos procrastinatórios não interrompem o prazo para interposição
do recurso especial, conforme se vê dos seguintes julgados:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO JULGADOS PROTELATÓRIOS PELO TRE. RECURSO ESPECIAL INTEMPESTIVO.
INTEMPESTIVIDADE REFLEXA. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
3 TSE. AgR-RESPE 31736. Relator: FERNANDO GONÇALVES. Publicado em Sessão em 3/12/2008.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
353
JURISPRUDÊNCIA
Os embargos de declaração manifestamente protelatórios não suspendem ou interrompem o prazo para a
interposição de outros recursos (§ 4º do art. 275 do Código
Eleitoral).
Recursos subsequentes à decisão que considerou o recurso
especial eleitoral intempestivo padecem de intempestividade
reflexa”.4 [grifo nosso]
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
DEFEITO DE FORMAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. EMBARGOS PROTELATÓRIOS. - Os embargos declarados protelatórios não interrompem nem
suspendem o prazo recursal, a teor do art. 275, § 4º, do
Código Eleitoral. [...]” 5 [grifo nosso]
Assim, é de se entender por intempestivo o Recurso Especial, pois,
reconhecido o caráter protelatório dos embargos de declaração, a interrupção
do prazo recursal não se operou. Depreende-se, portanto, que, diversamente do alegado pelas Recorrentes, a interposição do Recurso Especial não
obedeceu ao prazo de 3 (três) dias previsto no §1º do artigo 276 do Código
Eleitoral.
Ressalte-se, que em momento algum o Recorrente impugnou o
Acórdão nº 1.311/2011 que reconheceu o caráter protelatório dos Embargos
de Declaração, transitando em julgado esta parte da decisão.
Ex positis, inadmito a subida do Recurso Especial,
Intime-se.
Salvador, 17 de outubro de 2011.
Des. MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS
Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
4
TSE. AgR-RESP 32118. Rel. Min. Joaquim Benedito Barbosa Gomes. DJE - 02/09/2009. Página 21.
5
TSE. AG 7.981. Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJ 14.12.2007. Página 219.
354
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
REPRESENTAÇÃO
PROCESSO N.º 5.189-63.2010.6.05.0000
CLASSE 42
MUNICÍPIO:
SÃO FRANCISCO DO CONDE
RECURSO ESPECIAL
RECORRENTE:
UBIRAJARA DA SILVA RAMOS COROA
RECORRIDO:
MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
D E C I S Ã O
O Recorrente acima nominado, por advogado devidamente habilitado, irresignado com o Acórdão nº. 2.035/2010, prolatado por este Tribunal
nos autos da Representação nº. 5.189-63.2010.6.05.0000, Classe 42, oriundo
do Município de São Francisco do Conde-BA, interpõe Recurso Especial.
Aduz, em síntese, a existência, no Acórdão profligado, de violação ao
artigo 40-B da Lei nº. 9504/97, bem como sustenta cerceamento de defesa
É o breve relato.
Decido.
O Recurso Especial não tem condições de prosperar.
Não consta dos autos instrumento de mandato dirigido ao advogado,
Bel. Jerônimo Luiz Plácido de Mesquita, subscritor da petição de Recurso
Especial de fls. 110/115.
O Código de Processo Civil estabelece, in verbis:
“Art. 37 - Sem instrumento de mandato, o advogado não será
admitido a procurar em juízo. Poderá, todavia, em nome da
parte, intentar ação, a fim de evitar decadência ou prescrição,
bem como intervir, no processo, para praticar atos reputados
urgentes. Nestes casos, o advogado se obrigará, independentemente de caução, a exibir o instrumento de mandato no
prazo de 15 (quinze) dias, prorrogável até outros 15 (quinze),
por despacho do juiz.
Parágrafo único - Os atos, não ratificados no prazo, serão havidos por inexistentes, respondendo o advogado por despesas
e perdas e danos.”
Com efeito, observa-se que a despeito do advogado, subscritores
do presente recurso, terem feito menção de que o “instrumento de mandato
já depositado perante o TRE-BA”, não requereu nem diligenciou para que tal
fato fosse certificado nos autos.
Acerca do tema, a Resolução TSE nº 23.193/09, que dispõe sobre
representações, reclamações e pedidos de resposta previstos na Lei nº
9.504/97, consigna:
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
355
JURISPRUDÊNCIA
“Art. 37. Os prazos relativos às representações serão contínuos
e peremptórios, não se suspendendo aos sábados, domingos e
feriados, entre 5 de julho de 2010 e a proclamação dos eleitos,
inclusive em segundo turno.
§ 1º Nesse período, os advogados, inclusive os que representarem as emissoras de rádio, televisão, provedores e servidores de internet e demais veículos de comunicação, estarão
dispensados da juntada de procuração em cada processo, se
arquivarem, na Secretaria Judiciária, mandato genérico relativo
às eleições de 2010; a circunstância deverá ser informada
na petição em que ele se valer dessa faculdade e certificada nos autos.
§ 2º O requisito de admissibilidade dos recursos pela instância
superior será verificado a partir da certidão constante dos autos,
sendo a parte interessada responsável pela verificação da
existência da referida certidão.” [grifo nosso]
Conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, incube ao
subscritor da peça recursal demonstrar sua capacidade postulatória e sua
condição, pois tais condições não se presumem:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. DELEGADO DE PARTIDO. CONDIÇÃO NÃO COMPROVADA À ÉPOCA DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO
ESPECIAL ELEITORAL. NÃO-PROVIMENTO. 1.Cabe ao
subscritor da peça recursal demonstrar sua capacidade
postulatória e/ou sua condição de delegado do partido,
pois tal condição não se presume. 2.Os precedentes mencionados pela parte agravante asseveram ser desnecessário
um delegado credenciado possuir procuração outorgada em
seu nome. No entanto, não sustentam que a sua condição
de representante do partido não deva ser comprovada nos
autos. 3.Agravo regimental não provido1. [grifo nosso]
Além de considerar como inexistente o recurso interposto por advogado sem procuração nos autos, também entende a Corte Superior Eleitoral
que é de responsabilidade do causídico diligenciar pela certificação do fato
de constar arquivamento de procuração em secretaria:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO.
PREFEITO. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. DEFERIMENTO. RECURSO ESPECIAL. PROCURAÇÃO. SUBSCRITOR. APELO. AUSÊNCIA. RECURSO INEXISTENTE.
1 TSE. ARESPE 28.019. Rel. Min. José Augusto Delgado. DJ - Diário de justiça, Data 14/3/2008, Página 7/8.
356
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JURISPRUDÊNCIA
PRECEDENTES. 1. Conforme firme jurisprudência do Tribunal,
é inexistente o recurso interposto por advogado sem procuração nos autos. 2. Em face de eventual arquivamento
de procuração em secretaria, deve o advogado diligenciar
no sentido de que esse fato esteja devidamente certificado
nos autos. 3. A juntada da procuração, em sede de agravo
regimental, não sana a irregularidade atinente à representação
processual da parte2. [grifo nosso]
Ademais, é de se observar que os Tribunais Superiores, a exemplo
do Superior Tribunal de Justiça, têm entendido que a regra estabelecida no
artigo 37 do Código de Processo Civil é inaplicável na instância superior,
sendo incabível qualquer diligência para suprir a falta de procuração3.
Portanto, cumpre salientar que dentre as finalidades das regras
procedimentais, referentes ao acesso à tutela jurisdicional, está a de resguardar a segurança jurídica das partes envolvidas, de modo que cabe à parte
formular seu recurso obedecendo aos pressupostos ou requisitos para a sua
admissibilidade, conforme estabelecido em lei.
Nesse sentido afirma o Ministro do STJ, Luis Felipe Salomão, ao emanar seu voto no Agravo Regimental em Recurso Especial nº 1.082.559 - RS:
Não pode, portanto, o órgão judiciário, quando da análise
dos requisitos de admissibilidade recursal, verificando a inexistência de cópia de procuração outorgando poderes para a
subscritora do recurso, declarar presentes os pressupostos
de admissibilidade, pois assim agindo, desvincular-se-ia dos
parâmetros da proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar.
É firme o entendimento desta Corte Superior de Justiça que
considera-se inexistente o recurso interposto, na instância
especial, subscrito por advogado sem procuração nos autos,
atraindo, à espécie, o enunciado nº 115 da Súmula do Superior
Tribunal de Justiça: “Na instância especial é inexistente recurso
interposto por advogado sem procuração nos autos.”
Necessário ressaltar que é pacífico o entendimento jurisprudencial do STJ de que é no momento da interposição do recurso
que a representação do advogado deve ser comprovada, não
podendo ser suprida a falta do instrumento de procuração após
o protocolo do Recurso Especial. [grifo nosso]
Ainda no sentido de inadmitir Recurso Especial cuja procuração
ou substabelecimento do subscritor esteja ausente se manifesta o Tribunal
2 TSE. AgR-Respe 29.692. Rel Min. Carlos Eduardo Caputo Bastos. Pub. em sessão, em23/09/2008.
3 Confira-se: STJ. AgRg no AG 421.905⁄PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 29.03.2004.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
357
JURISPRUDÊNCIA
Superior Eleitoral deixando claro que tal pressuposto de recorribilidade deva
ser atendido no prazo assinalado em lei para a interposição do recurso:
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. SUBSTABELECIMENTO.
AUSÊNCIA DA PROCURAÇÃO ORIGINÁRIA. INCIDÊNCIA
DA SÚMULA 115 DO STJ. FUNDAMENTO NÃO AFASTADO.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 13 DO CPC. IMPOSSIBILIDADE.
DESPROVIMENTO.
I - O substabelecimento tão-somente não comprova a regularidade da representação processual. Hipótese em que é de
rigor a aplicação da Súmula 115 do STJ.
II - A aplicação do artigo 13 do Código de Processo Civil não
encontra amparo na jurisprudência deste Tribunal. No âmbito
de recurso especial, o pressuposto objetivo de recorribilidade,
consubstanciado na regular representação processual, há
de estar atendido no prazo assinado em lei para a própria
interposição.
III - Agravo regimental a que se nega provimento4.
[grifo nosso]
Por fim, cabe mencionar que o presente entendimento está em
harmonia com o do Supremo Tribunal Federal:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SUBSTABELECIMENTO. JUNTADA APÓS ESCOADO
O PRAZO RECURSAL. CONSEQÜÊNCIA: INEXISTÊNCIA
DO ATO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. PRECEDENTE
INVOCADO NA DECISÃO AGRAVADA. AUSÊNCIA DE
PUBLICAÇÃO. PRESCINDIBILIDADE. 1. Irregularidade da representação das partes. A juntada tardia do
substabelecimento outorgado ao subscritor da peça
processual traz como conseqüência a inexistência do
ato de interposição do recurso. Descabe observância
ao disposto no artigo 13 do Código de Processo Civil,
sob pena de afastar-se pressuposto de recorribilidade
a ser atendido no prazo recursal. Precedente. 2. Publicação de acórdão que serviu de fundamento à decisão
atacada. Prescindibilidade. A circunstância de o aresto
encontrar-se pendente de publicação não impede que
o relator o mencione como precedente em decisão
denegatória de recurso extraordinário. Precedentes.
Agravo regimental não provido5.
4 TSE. AgR-RESPE 31736. Relator: FERNANDO GONÇALVES. Publicado em Sessão em 3/12/2008.
5 STF. RE 214149 AgR, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 31/08/1999, DJ 11-021999 PP-00027 EMENT VOL-01978-02 PP-00250
358
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011.
JURISPRUDÊNCIA
Nestes termos, carece o apelo do pressuposto objetivo de recorribilidade consubstanciado na regular representação processual, de modo que
NÃO CONHEÇO do presente Recurso Especial.
Ante os fundamentos expostos, inadmito a subida do Recurso
Especial.
Intime-se.
Salvador, 20 de janeiro de 2011.
Des. MÁRIO ALBERTO SIMÕES HIRS
Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
359
ATOS DA PROCURADORIA
Ação de Impugnação de Mandato Eletivo
Processo n. 29-3.2011.6.05.0000
Classe 2
Procedência:
Salvador-BA
Relator:
Juiz Maurício Kertzman Szporer
Impugnante:
Coligação “A Bahia Merece Mais” e outros.
Impugnados:
Jaques Wagner e outro
PRONUNCIAMENTO
Eminente Relator,
Egrégio Tribunal:
Trata-se de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo interposta
pela Coligação “A Bahia Merece Mais”, Paulo Ganem Souto e Nilo Augusto
Moraes Coelho em desfavor de Jaques Wagner e Otto Roberto Mendonça
de Alencar, Governador e vice-Governador eleitos no pleito de 2010, com
fundamento na suposta prática de abuso de poder econômico, em afronta
ao art. 14, § 10, da Carta Magna.
Alegam, de início (fls. 01/32), que os impugnados, com vistas
a lograr êxito na reeleição, teriam repassado verbas para beneficiar 248
Associações e Centros Comunitários, mediante convênios irregulares e
intempestivos realizados por intermédio da Companhia de Desenvolvimento
e Ação Regional (CAR), todos com assinatura, publicação e repasse após o
período vedado pela legislação eleitoral.
Aduzem, ainda, a existência de irregularidade no repasse de dinheiro público, por meio da Empresa de Turismo da Bahia S/A (Bahiatursa),
a 154 municípios do Estado, com a finalidade de realizar os festejos juninos
do ano de 2010.
Afirmam, igualmente, que os impugnados procederam á transferência de recursos, mediante a Companhia de Desenvolvimento Urbano do
Estado da Bahia (CONDER), para o Município de Medeiros Neto, no valor
de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), com fins a realizar serviço de pavimentação na localidade, em período vedado pela legislação eleitoral.
Asseveram, também, a prática de abuso de poder econômico em
face da veiculação de propaganda em excesso e de forma irregular por parte
do Governador, à época de campanha para sua reeleição.
Por fim, alegam que, em todo o período eleitoral até o dia 01/10/2010,
o Governo do Estado realizou entrega de ambulâncias do Serviço Móvel de
Atendimento de Urgência (SAMU) a todos os Municípios, com ampla divulgação na mídia.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
363
ATOS DA PROCURADORIA
Ao final requerem a procedência da demanda e a condenação dos
impugnados à cassação de seus diplomas e mandatos, declarando-os inelegíveis pelo prazo de oito anos, nos termos da Lei Complementar n. 64/90.
Em Defesa, os impugnados suscitam, preliminarmente, a inépcia da
inicial, por ausência de capacidade postulatória da coligação “A Bahia Merece
Mais”, a inadequação da via eleita e a intempestividade da demanda.
No mérito, afirmam que todas as condutas perpetradas pelo Governador estavam pautadas na lei, ao tempo em que pugnam pela improcedência dos pedidos e condenação dos autores à pena de multa por litigância
de má-fé.
Às fls. 111/112, esta Procuradoria manifestou-se pelo não acolhimento das prefaciais de intempestividade e inépcia da inicial, e pela análise
da inadequação da via eleita quando da apreciação do mérito da demanda.
Em decisão monocrática, o Juiz Relator indeferiu pedido de produção de provas complementares formulado pelos impugnados, sob o fundamento de que “a contenda a ser dirimida repousa em matéria cuja prova
documental já trazida pelos autores permite sua elucidação” (fls. 114/116).
Agravo Regimental às fls. 119/128. Decisão às fls. 154/157.
Os autores apresentaram alegações finais às fls. 129/148, em que
repisam todos os argumentos da vertidos na inicial.
É o relatório.
Passa-se à fundamentação.
I) DA PRELIMINAR
I.1) Da inadequação da via eleita
Da análise dos autos, verifica-se que a narrativa possui robustez
satisfatória para configurar, em tese, atos de abuso de poder econômico,
susceptíveis, portanto, de arguição por meio da AIME, motivo pelo qual deve
ser rechaçada a preambular em tela.
II) DO MÉRITO
No tocante à questão de fundo, a pretensão deduzida não merece
acolhimento.
Malgrado a narrativa levada a efeito na peça vestibular se oriente
a demonstrar suposta prática de abuso de poder econômico, o conjunto
probatório coligido apresenta-se frágil para que se possa concluir no sentido
da configuração dos alegados ilícitos, mormente diante das conseqüências
previstas na legislação de regência.
364
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
II.1) Do repasse de verbas às Associações Comunitárias e Cooperativas
de Produtores Rurais
Consta da inicial que os impugnados teriam celebrado convênios, de
forma irregular e intempestiva, por intermédio da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), com 248 Associações, Centros Comunitários
e pequenos Produtores Rurais, com investimento de recursos na ordem de
R$ 36.789.707,68 (trinta e seis milhões setecentos e oitenta e nove mil setecentos e sete reais e sessenta e oito centavos), em afronta ao art. 73, VI,
a, da Lei 9.504/97, que assim prevê:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou
não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de
oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
[...]
VI - nos três meses que antecedem o pleito:
a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos
Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob
pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos
destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma
prefixado, e os destinados a atender situações de emergência
e de calamidade pública;
[...] (grifou-se).
Verifica-se que a legislação de regência limita a vedação de
transferência voluntária quando realizada entre entes da Federação, mais
especificamente entre União e Estados; União e Municípios ou Estados e
Municípios.
Ressalte-se, no entanto, que os beneficiários das transferências
de recursos são entidades sem fins lucrativos, cuja natureza jurídica é de
associação privada. Por conseguinte, não integram a Federação, pelo que
não se enquadram na hipótese normativa em comento.
Eventual interpretação extensiva no sentido da aplicação do alcance
da norma, é descabida, uma vez tratar-se de regra de caráter sancionatório
e de restrição de direitos.
Outro não é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, conforme
se depreende dos seguintes arrestos, verbis:
REPRESENTACAO ELEITORAL - ART. 96 DA LEI 9.504/97.
COMPETENCIA DO TRE.
AS HIPOTESES RELACIONADAS NO ITEM VI, LETRA "A" DO
ART. 73, NAO PODEM SOFRER ALARGAMENTO POR MEIO
DE INTERPRETACAO EXTENSIVA DE SEU TEXTO.
INEXISTENCIA DE IRREGULARIDADE NA PARTICIPACAO
DE SUPLENTE.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
365
ATOS DA PROCURADORIA
TRAMITACAO DE INVESTIGACAO JUDICIAL A RESPEITO
DOS FATOS.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (RESPE - RECURSO
ESPECIAL ELEITORAL nº 16040 - Cuiabá/MT Acórdão nº
16040 DJ de 04/02/2000, Página 30).
ELEITORAL. AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. LIMINAR INDEFERIDA. CONDUTA VEDADA. TRANSFERÊNCIA
VOLUNTÁRIA DE RECURSOS DOS ESTADOS AOS MUNICÍPIOS. ART. 73, VI, a, DA LEI No 9.504/97. VIOLAÇÃO À DECISÃO NA CONSULTA-TSE No 1.062. NÃO-CONFIGURAÇÃO.
IMPROCEDÊNCIA.
1- A transferência de recursos do governo estadual a comunidades carentes de diversos municípios não caracteriza
violação ao art. 73, VI, a, da Lei nº 9.504/97, porquanto
os destinatários são associações, pessoas jurídicas de
direito privado.
2- A regra restritiva do art. 73, VI, a, da Lei no 9.504/97 não
pode sofrer alargamento por meio de interpretação extensiva
de seu texto (Ac. no 16.040, rel. Min. Costa Porto).
3- Agravo regimental não provido.
4- Reclamação julgada improcedente.
Decisão:
O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo
regimental e julgou improcedente a reclamação, nos termos
do voto do relator.
(AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO nº 266 - Fortaleza/Código Eleitoral. Acórdão nº 266 de 09/12/2004).
Ainda assim, acaso ultrapassada a hipótese supra, há de se verificar que o “Programa Produzir”, que subsidiou todos os repasses objeto dos
convênios realizados com as Associações, foi deflagrado, pela primeira vez
no Estado, a partir do ano de 1996.
Segundo informações obtidas no sítio oficial da mencionada empresa publica , propõe-se, desde então, combater a pobreza rural, e, por
conseguinte, reduzir as desigualdades regionais, criar emprego e renda e
melhorar a vida das populações mais pobres.
Em referida página eletrônica, ainda se pode constatar que o programa, subsidiado por recursos provenientes do Banco Mundial e do Governo
do Estado, em 2010, cumpriu a sua terceira etapa, em continuidade aos
trabalhos realizados em anos anteriores.
Nada há nos autos, portanto, que indique ou sugira que a realização
dos convênios fora direcionada a beneficiar as candidaturas dos impugnados
ou manipular o resultado do pleito.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
II.2) Do repasse de verbas pela Bahiatursa
Argumentam os autores que os convênios firmados entre o Estado
da Bahia, mediante a Bahiatursa, e 155 municípios da região, com o fito de
realizar as festas juninas de 2010, em que pese assinados em período permitido, foram publicados em período vedado e pagos após o dia 3 de julho
de 2010.
Contudo, a vasta documentação carreada aos autos (Anexos XIII/
XLI) permite concluir que, desde o início do ano eleitoral, os Municípios beneficiados com esses repasses manifestaram interesse em realizar os festejos
juninos, que, de acordo com o calendário oficial do Estado, ocorrem, ano a
ano, no mês de junho.
Com a finalidade de obter apoio financeiro, os Prefeitos interessados enviaram à Bahiatursa seus projetos de festas de “Santo Antônio”, “São
João” ou “São Pedro”, com a apresentação dos respectivos cronogramas. A
partir de então, os atos preparatórios, tais como autuação, análise técnica
dos pedidos, expedição de pareceres, dotações orçamentárias, solicitações
de despesas, empenho e formalização dos convênios foram diligenciados
por referenciado orgão Estadual.
Ocorre que os atos burocráticos referenciados foram concluídos
previamente ao dia 03 de julho de 2010, até porque o implemento dos festejos juninos se dá, como antes dito, durante o mês junho, antes, portanto, do
período vedado pela legislação.
É bem verdade que o mesmo não se pode dizer a respeito do repasse da verba conveniada, até porque o caso em tela atrai a ressalva contida
na parte final do art. 73, VI, a, da Lei n. 9096/95, que permite o repasse em
período vedado, desde que os convênios estejam celebrados e formalizados
antes do período eleitoral (no caso das Eleições 2010, antes do dia 03 de
julho), bem assim a efetiva execução física do objeto conveniado. Definitivamente é a hipótese dos autos.
Veja-se, a propósito, no anexo XII (Doc.19), cópia da matéria
jornalística veiculada no periódico “Tribuna da Bahia”, em 25/06/2010, que
já informava acerca da assinatura de convênios da Bahiatursa com dezenas de municípios; bem assim de matéria publicada em sítio eletrônico,em
23/06/2010, cujo conteúdo relata situação similar.
Destaque-se, ainda, que os festejos juninos, nos Municípios da
região Nordeste do país, são celebrações tradicionais, que representam
período de intenso fluxo turístico e fomento da atividade econômica local,
independentemente do ano de eleição.
A realização de festividades como essas, portanto, refoge ao viés
eleitoral, mormente em razão do sentimento cultural que permeia as cidades
do interior da Bahia.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
367
ATOS DA PROCURADORIA
II.3) Do repasse de verba para o Município de Medeiros Neto
No que pertine à transferência de recursos destinados ao Município
de Medeiros Neto, mediante a Companhia de Desenvolvimento Urbano do
Estado da Bahia (CONDER), cai por terra os argumentos vertidos na inaugural, quando analisado o escorço probatório dos autos.
Os documentos constantes do Anexo XII (doc.22) comprovam
que as fortes chuvas ocorridas no início do ano de 2010 causaram grandes
prejuízos para a população de Medeiros Neto, o que obrigou a Administração Municipal a reconhecer o estado de emergência da cidade, por meio do
Decreto n. 13/2010, prorrogado pelo Decreto n. 25/2010.
O Estado da Bahia, por sua vez, para evitar danos maiores e irreparáveis à população, homologou os atos administrativos municipais por
meio de Decreto datado de 07/07/2010, com fins a adotar providencias no
tocante à drenagem de águas pluviais e repavimentação de áreas atingidas
pelas chuvas. O ato acabou por desbordar no envio de verbas equivalentes
a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Conclui-se, pois, que o Convênio n. 308/2010 de 25/08/2010, realizado para possibilitar o repasse de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais)
para o Município de Medeiros Neto ocorreu nos moldes previstos em lei,
conforme a exceção prevista na parte final do art. 73, VI, a, da Lei 9.504/97,
no que tange à possibilidade de repasse de recursos a Município em situação
de emergência e de calamidade pública.
II.4) Do excesso de propaganda em quantidade e dimensões irregulares
No tocante à alegação de excesso de propaganda em quantidade
e dimensões irregulares, certo é que nada restou comprovado.
De início, vale salientar que a ilicitude decorrente do efeito outdoor
(que excede os 4m2), ou ainda em razão da forma como fixado o engenho
publicitário deve ser combatida em ação própria, mediante representação
fundada no art. 37, da Lei n. 9.504/97, cujas sanções recaem na sua retirada
e no pagamento de multa.
Ainda assim, a jurisprudência no âmbito do Tribunal Superior
Eleitoral reconhece a data do pleito como termo final para o ajuizamento de
representações dessa ordem, verbis:
Representação. Propaganda eleitoral extemporânea. Falta de
interesse de agir.
1. A jurisprudência firmou-se no sentido de que o prazo final
para ajuizamento de representação, por propaganda eleitoral
extemporânea ou irregular, é a data da eleição, sob pena de
reconhecimento de perda do interesse de agir.
[...]
(AgR-AI nº 10568 - Macapá/AP. Acórdão de 20/05/2010, DJE
de 23/06/2010, Página 26);
368
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
ELEIÇÕES 2006. Agravo regimental no recurso especial. Representação por propaganda eleitoral supostamente irregular.
Ajuizamento posterior às eleições. Reconhecimento da falta
de interesse de agir do representante. Ausência de debate, no
TRE, acerca da violação a normas da Constituição Federal.
Falta de prequestionamento. Precedentes. Agravo regimental
a que se nega provimento.
Questões não debatidas no acórdão do Tribunal Regional são
incognoscíveis em sede de recurso especial.
A representação fundada no art. 37 da Lei nº 9.504/97 deve ser
proposta até a data das eleições, sob pena de ser reconhecida
a perda do interesse de agir do autor.
(ARESPE nº 28101 - São José do Rio Preto/SP. Acórdão de
23/06/2009, DJE de 01/09/2009, Página 34). (grifou-se).
A Procuradoria Regional Eleitoral, inclusive, no uso de suas
atribuições, representou, com êxito, em várias oportunidades, em face
dos impugnados – e de tantos outros candidatos ao pleito de 2010 -, com
fundamento na prática irregular consistente na veiculação de engenhos
publicitários, nos termos da lei.
Forçoso reconhecer, portanto, que, no bojo da presente AIME, qualquer
alegação nesse sentido encontra-se eivada da perda do interesse de agir.
No que tange ao suposto abuso de poder econômico por meio do
aumento de verbas na órbita de R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais), destinadas à propaganda, às vésperas das eleições, não logram os autores trazer
à tona qualquer elemento de prova apto a ensejar o acolhimento do pedido.
Muito provavelmente, para subsidiar suas alegações, os impugnantes
levaram em conta apenas o pedido de alteração do limite de gastos em campanha, para o cargo de Governador do Estado, do valor de R$ 26.000.000,00
(vinte e seis milhões de reais) para R$ 33.000.000,00 (trinta e três milhões de
reais), formulado pela Coligação “Pra Bahia Seguir em Frente”, no Processo
tombado sob o n. 2349-80.2010.
Ocorre que, naqueles autos, a Coligação dos réus justificou o aumento das verbas em razão da ocorrência dos seguintes fatos:
a)Acréscimo de 30% (trinta por cento) nos valores estimados para
gastos decorrentes da contratação de matérias gráficos, engenhos publicitários
e outros produtos e serviços;
b)Aumento da demanda por matérias de campanha em todos os
municípios do Estado, “em decorrência da posição privilegiada da candidatura
da requerente nas pesquisas eleitorais”.
c)Acréscimo do valor orçado na fase pré-eleitoral para a locação de
aeronave;
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
369
ATOS DA PROCURADORIA
d)A coligação majoritária teria feito doações a candidatos dos
partidos integrantes da Coligação proporcional em valores superiores a R$
3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais), ato que será computado
como despesa cujo montante não estava inicialmente previsto;
e)O crescimento de atos de campanha teria ocasionado o aumento
de outros gastos, tais como: combustível, locação de andaimes, carro de
som, etc.
Na oportunidade, esta Procuradoria pronunciou-se favoravelmente à concessão do pedido, porquanto a alteração vindicada apresentou-se
fundamentada e proporcional, quando comparada aos valores indicados por
outros candidatos a cargos majoritários.
Percebe-se, pois, que o implemento de R$ 7.000.000,00 (sete
milhões de reais), pleiteado pelo Governador e deferido por essa Corte,
destinou-se, a complementar despêndio com propagandas eleitorais, como
também a suprir outras despesas decorrentes das eleições.
Ao considerar razoável, portanto, no contexto das eleições 2010, o
aumento do limite de gasto de campanha, não há como reconhecer, agora,
apenas levando-se em consideração o valor absoluto pleiteado, qualquer
conduta abusiva perpetrada pelos impugnados. Até porque, em momento
algum, repita-se, os autores lograram demonstrar, de forma inconteste, que
houve, por parte dos réus, a destinação total da referida verba para pagamento
exclusivo de material publicitário.
Vale, também, acrescentar que inexiste nos autos indicativo ou
tabela comparativa que demonstre o excesso na média de gastos nos três
últimos anos que antecederam o pleito (2007, 2008 e 2009) ou do último
ano imediatamente anterior à eleição (2009), como requer a lei eleitoral,
providência a cargos dos representados que, nesse aspecto, quedaram-se
inertes (art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97).
II.5) Da entrega de ambulâncias do SAMU
Por fim, há de se reconhecer que o fato atinente à entrega de
ambulâncias do SAMU, às vésperas das eleições, a diversos municípios da
Bahia, já fora examinado por esse Regional nos autos da Representação n.
5175-79.2010.
À época dos fatos, o Juiz Relator concedeu medida liminar no
sentido de suspender a entrega dos veículos pelo Gestor Estadual, até o dia
do pleito, sob o fundamento de que referida conduta poderia influenciar no
resultado das eleições.
Entretanto, submetidos os autos à análise exauriente, o eminente
Relator, na esteira do parecer exarado pelo Procurador Eleitoral Auxiliar,
convenceu-se da licitude da conduta e proferiu voto naqueles autos, seguido,
à unanimidade, pela Corte (Acórdão n. 1.957/2010), nos seguintes termos:
370
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
[...] observo que a entrega das ambulâncias, objeto da presente
representação, foi realizada em prol de municípios localizados
em diferentes Estados federativos, como doação feita pelo
Ministério da Saúde, para garantir eficácia do Serviço de
Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).
Na esteira do parecer ministerial, na ausência de legislação
eleitoral específica, é aplicável o conceito de transferência
voluntária delineado pelo artigo 25 da lei Complementar nº
101, verbis:
Art. 25. Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por
transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou
de capitala outro ente da Federação, a título de cooperação,
auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema
Único de Saúde.(grifos no original).
Por conseguinte, ainda que as aludidas ambulâncias fossem
consideradas como recursos, a norma retromencionada exclui
do referido conceito àqueles recursos destinados ao Sistema
Único de Saúde (SUS).
Ante o exposto, resta concluir pela improcedência dos pedidos,
o que requer a Procuradoria Regional Eleitoral.
Salvador, 10 de novembro de 2011.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
371
ATOS DA PROCURADORIA
Recurso Eleitoral
Processo n. 16240-56.2008.6.05.0081
Classe 30
Procedência:
CRISÓPOLIS-BA (81a Zona Eleitoral)
Recorrentes:
Coligação “UNIDOS PARA O PROGRESSO” e outros
Recorridos:
José Santana da Silva e outro
Relator:
uiz Salomão Viana
PRONUNCIAMENTO
Eminente Relator,
Egrégio Tribunal:
Trata-se de recurso interposto contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos vertidos na Ação de Impugnação de Mandato Eletivo
tombada sob o n. 005/2009, manejada com supedâneo na prática de corrupção, por meio de captação ilícita de sufrágio, bem como de abuso de poder
econômico e político.
Em suas razões (fls. 393/415), os recorrentes reiteram os fatos e
fundamentos invocados na peça vestibular, para noticiar, em síntese, que o
recorrido, valendo-se da sua condição de Chefe do Executivo municipal e
candidato à reeleição, teria perpetrado as seguintes condutas:
1.
Viabilizado atendimento médico por profissionais contratados
pela Prefeitura e distribuição de medicamentos em benefício da campanha;
2.
Utilização de advogado contratado pela Prefeitura na campanha eleitoral;
3.
Afixação de cartazes em ônibus que prestavam serviço à
Prefeitura de Crisópolis;
4.
Realização de showmício ou evento assemelhado com participação de artista/animador em trio elétrico;
5.
Distribuição de combustível a eleitores durante evento denominado “cavalgada”.
Em suas contrarrazões (fls. 436/449), os recorridos suscitam, preliminarmente, a inadequação da via eleita. No mérito, negam a ocorrência
das condutas que lhes são imputadas e pugnam pela improcedência do
recurso.
É o breve relatório.
Passa-se à fundamentação.
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
I) PRELIMINAR
A alegação de inadequação da via eleita enseja parcial acolhimento.
Destaque-se, de logo, que é assente na jurisprudência o entendimento de que o abuso de poder político sem desdobramentos econômicos
não configura causa de pedir apta ao manejo das ações de impugnação de
mandato eletivo.
In casu, observa-se que a noticia não se cinge a tal hipótese de ilicitude, uma vez que se depreende das evidências coligidas e dos argumentos
expendidos que os impugnantes também pretendem demonstrar a ocorrência
de condutas que vencem as fronteiras do desvirtuamento do poder político
e alcançam o campo do abuso de poder econômico e da corrupção; o que,
portanto, permite reconhecer a presença de fatos susceptíveis de exame
por meio de AIME.
Nessa perspectiva, dentre as condutas apontadas pelos recorrentes,
a suposta “utilização de advogado contratado pela Prefeitura na campanha
eleitoral” não se revela apta a atender aos requisitos delineados na Constituição da República, para o manejo do remédio constitucional eleitoral; sobretudo
porque, tanto a descrição fática quanto o aporte argumentativo e probatório
coligido preenchem, em tese, o tipo da conduta vedada, espécie de abuso
de poder político, que exorbita os lindes da presente demanda.
Veja-se, a propósito, a jurisprudência firmada no âmbito do Tribunal
Superior Eleitoral:
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. § 10 DO ARTIGO 14 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL: CAUSAS ENSEJADORAS.
1. O abuso de poder exclusivamente político não dá ensejo
ao ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo
(§ 10 do artigo 14 da Constituição Federal).
2. Se o abuso de poder político consistir em conduta configuradora de abuso de poder econômico ou corrupção (entendida
essa no sentido coloquial e não tecnicamente penal), é possível
o manejo da ação de impugnação de mandato eletivo.
3. Há abuso de poder econômico ou corrupção na utilização
de empresa concessionária de serviço público para o transporte
de eleitores, a título gratuito, em benefício de determinada
campanha eleitoral.
(TSE. RESPE-28040, 22/04/2008).(grifou-se)
Por sua vez, os demais fatos narrados possuem robustez satisfatória
para configurar, em tese, atos de corrupção e abuso de poder econômico,
susceptíveis, portanto, de arguição por meio da AIME.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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ATOS DA PROCURADORIA
Nessas circunstâncias, forçoso reconhecer a parcial inadequação
da via eleita, tão somente em relação à alegação de “utilização de advogado
contratado pela Prefeitura na campanha eleitoral”.
II) DO MÉRITO
No tocante à questão de fundo, a pretensão recursal merece ser
parcialmente acolhida.
Cumpre, de logo, destacar o enunciado do art. 14, § 10, da Constituição Federal: “O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral
no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas
de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude”. (grifou-se).
Verifica-se que a narrativa levada a efeito na peça vestibular se
orienta a demonstrar suposta prática de fraude por meio de captação ilícita
de sufrágio, bem como de abuso de poder econômico.
Observa-se, na espécie, que, conquanto algumas das condutas
narradas apontem para a possibilidade de exorbitância de permissivos legais,
o fato é que, no particular, o conjunto probatório coligido apresenta-se com
significativa fragilidade para que se possa concluir no sentido da configuração dos alegados ilícitos, mormente diante das conseqüências previstas na
legislação de regência.
Sucede, todavia, que no tocante ao abastecimento gratuito de combustível, há nos autos prova suficiente de que os eventos desdobraram-se de
maneira aderente à narrativa vertida na exordial; sobretudo porque, advirtase, com a especialização dos organizadores de campanha, bem assim dos
candidatos, não se pode exigir que venha aos autos prova direta e expressa
dos ilícitos cometidos – vale dizer, praticamente, uma confissão.
Por isso mesmo, a valoração a respeito da efetiva ocorrência desse ilícito deve ser construída a partir da combinação de fatos que, uma vez
removido o manto de suposta legalidade que os reveste e examinados no
conjunto, exsurgem aptos a revelar a prática de abuso de poder econômico
com saliente potencialidade para o desequilíbrio da disputa.
Vejam-se, pois, o exame individualizado dos fatos alegados:
1) Do atendimento médico por profissionais contratados pela Prefeitura
e da distribuição de medicamentos em benefício dos investigados
No tocante a essas condutas, é fato incontroverso que profissionais da Prefeitura realizaram atendimento médico, bem como forneceram
medicamentos gratuitos, a pessoas do “Povoado Fazenda Sapê”. Contudo,
as evidências coligidas não permitem que se afirme com segurança que tal
empreitada foi acompanhada de pedido de votos em favor da campanha
eleitoral dos impugnados.
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ATOS DA PROCURADORIA
Na verdade, além desse aspecto, como asseverou o Juiz a quo, o
mesmo fato foi objeto de minucioso exame no âmbito de Ação de Investigação Eleitoral n. 354/2008, manejada pela Promotoria Zonal, ao cabo da qual
restou demonstrada a inocorrência de compra de votos, pelo que o Parquet
pugnou pela improcedência da demanda.
Por sua vez, não se há como extrair das declarações gravadas
na mídia de fl. 225 (CD-01) os elementos necessários a completar eventual
cenário de ilicitude, de modo a que reste inequivocamente configurada a
prática atribuída aos recorridos.
Ademais, não auxilia a tese dos impugnantes o argumento de que:
“[...] é, no mínimo, estranho que agentes da Prefeitura Municipal de Crisópolis procedessem a atendimento em residência de eleitor, justamente dentro
de período eleitoral [...]”. (fl. 396), uma vez que extrai-se dos autos que tal
atuação ocorria no âmbito do Programa de Saúde da Família, desenvolvido
por aquela municipalidade.
Veja-se, a esse respeito, o entendimento esposado pelo Magistrado
sentenciante:
Falta a comprovação sólida das condutas que lhe foram atribuídas, isto é, a comprovação de que o atendimento médico
narrado na petição teve uma finalidade eleitoral. Sem essa
comprovação, não há que se perquirir, aqui, acerca da existência de captação ilícita de sufrágio. (fl. 357).
2) Da afixação de cartazes em ônibus que prestavam serviço à Prefeitura
de Crisópolis
No tocante aos cartazes com propaganda eleitoral dos impugnados, afixados em ônibus que prestavam serviço ao Município de Crisópolis,
em caráter não exclusivo, verifica-se, de fato, que tal conduta é passível de
enquadramento como abuso de poder econômico.
Ocorre que não há como identificar elementos que demonstrem, na
linha do que exige a jurisprudência firmada no âmbito dos Tribunais pátrios,
inclusive da Corte Superior Eleitoral, que as ações implementadas – mormente
nas circunstâncias exibidas pelas fotos de fls. 65/69, em que se observa a
intensa propaganda, realizada por meio de bandeiras e outros artefatos revestem-se de “potencialidade suficiente para desequilibrar a disputa”.
(TSE. AgrResp n. 5158657, DJE de 10/5/2011).
3) Da realização de showmício
Por sua vez, a argumentação em torno da ocorrência do shomício
se apresenta deveras frágil, porquanto a presença do artista Ivanildo Ritche
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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ATOS DA PROCURADORIA
no evento exibido às fls. 71/72 (mídias às fls. 73 e 75) não se revela apta
a configurar a suposta ilicitude; tampouco se delineia como outra violação
à legislação eleitoral, ainda que seja possível perceber o real intuito dos
impugnados.
Essa compreensão não sofre significativa alteração com o exame
do laudo técnico encartado às fls. 203/204, uma vez que as respostas oferecidas aos quesitos formulados, bem como as conclusões lançadas pelos
peritos, não se prestam a demonstrar que o referido artista tenha realizado
um show em favor da campanha dos recorridos.
Assim, inexistem registros suficientes em relação a qualquer manifestação artística em favor dos impugnados.
Com efeito, não raro se observa das campanhas propagandísticas, em especial daquelas veiculadas por meio televisivo, que pessoas com
significativo apelo popular (artistas, jogadores de futebol, dentre outros) são
chamados a contribuir com sua imagem e verve, para fins de convencimento
do eleitorado.
Como asseverou o Juiz zonal: “Ivanildo Ritche não se ‘apresentou’,
não chegou a representar, na carretada, uma atração que pudesse dar foros
de ‘showmicio’ ao tal evento”. (fl. 359).
4) Da distribuição gratuita de combustível
No caso, os impugnantes constroem sua tese com arrimo no conteúdo da mídia de fl. 75, na qual, de fato, observa-se movimento não usual
em Posto de Combustível, com o abastecimento praticamente sequencial
de motocicletas enfileiradas, sem que se perceba qualquer procedimento
direcionado ao pagamento do produto.
Acaso ausente qualquer outro elemento de prova poder-se-ia
afirmar que se estaria diante de cenário deveras suspeito, mas sem aptidão
para vincular, direta ou indiretamente, os impugnados a eventual ilícito praticado, o que projetaria qualquer tentativa de responsabilização ao campo
do malogro.
Essa não é, todavia, a moldura dos autos, uma vez que a análise
conjunta das imagens contidas na referida mídia, bem como do laudo técnico
encartado à fl. 199/201 e das declarações fornecidas em juízo pela testemunha Edmilson dos Santos, permitem a formação de juízo de certeza de
que houve distribuição gratuita de combustível em favor da campanha
eleitoral dos impugnados.
Destaquem-se, a propósito, os seguintes trechos de referido depoimento (fl. 225 – CD-02):
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ATOS DA PROCURADORIA
Juiz: O senhor conhece um posto chamado posto Brasil?
Testemunha: Sim. É de frente a minha casa.
Juiz: Sabe onde fica? O nome da rua?
Testemunha: O nome da rua? É rua três de maio
[...]
Juiz: O senhor sabe dizer se esse posto presta serviço à
Prefeitura de Crisópolis?
Testemunha: Sim.
Juiz: Presta que tipo de serviço?
Testemunha: [...] A Prefeitura abastece nesse posto daí.
Posto Brasil.
Juiz: O senhor sabe dizer se constantemente, todo dia, tem
muito movimento no posto?
Testemunha: não. Só vê um movimento mais grande mesmo
no tempo da política.
Juiz: Mas o senhor sabe por que esse movimento é maior no
tempo da política?
Testemunha: Porque atualmente tava muito os pessoal
abastecendo. Só era chegando lá a fileira de moto. Chegando e abastecendo e eu estava lá apreciando e via tudo.
Juiz: O senhor já abasteceu nesse posto? Posto Brasil?
Testemunha: Já
Juiz: Já saiu sem pagar, alguma vez?
Testemunha: Não. Só abasteço se tiver o dinheiro; se não tiver
também não abasteço.
Juiz: O senhor sabe se o posto tem prática de vender o
combustível fiado?
Testemunha: Para a Prefeitura, sim.
Juiz: E para pessoa comum. Se o senhor chegar lá, o senhor
compra fiado?
Testemunha: Rapaz, vou falar a verdade: eu nunca comprei
lá fiado.
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ATOS DA PROCURADORIA
[...]
Juiz: Como é que o senhor sabe que abastece fiado para a
prefeitura?
Testemunha: Por que eu vou abastecer a minha moto e vejo
o pessoal abastecendo e só anotando no coisa... Dizendo
aí: anota aí para a prefeitura. Só anotando.
Juiz: É comum formar fila no posto? Fila de moto?
Testemunha: Não.
[...]
Juiz: A cavalgado que o senhor falou mais cedo. Essa cavalgada passou pelo posto Brasil?
Testemunha: Passou em frente.
Juiz: Você lembra como foi o movimento no posto Brasil
no dia da cavalgada?
Testemunha: Rapaz. Era um movimento grande, viu.
Juiz: Por que tava movimentado?
Testemunha: Para abastecer as motos. De graça.
Juiz: De graça? Por que de graça?
Testemunha: Campanha política, né?
Juiz: Sim. Campanha política abastece de graça? Se eu
chegar lá abasteço o meu carro de graça?
Testemunha: Se tiver com o adesivo, você abastece.
Juiz: Adesivo de quem?
Testemunha: Se tiver o adesivo do atual Prefeito. Aí abastece.
Juiz: Por que?
Testemunha: Não sei.
Juiz: Baste estar com adesivo que abastece de graça?
Testemunha: Abastece. Se a moto tiver com o adesivo do
15, abastece.
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ATOS DA PROCURADORIA
[...]
Juiz: Conhece alguém que abasteceu lá de graça?
Testemunha: [...] um primo meu abasteceu lá, de graça.
Juiz: E ele pagou pela gasolina depois?
Testemunha: Não.
[...]
Juiz: Tinha cartazes no posto?
Testemunha: Tinha colado nas motos, senão não abastecia.
[...]
Observa-se, portanto, que as afirmações são de significativa contundência, sobretudo porque transparece a tranqüilidade e a segurança com
as quais a testemunha fornece as informações, inexistindo quaisquer contradições no seu depoimento, cujo conteúdo, gize-se, amolda-se às imagens
exibidas na mídia de fl. 75.
Nessa perspectiva é que causa espécie o fato do Magistrado sentenciante ter ignorado de maneira peremptória essa prova testemunhal, para sustentar que: “A prova produzida pelos impugnantes a respeito do fato em exame
resumiu-se aos arquivos de áudio e vídeo gravados no CD de fl. 75.”(!?).
É preciso ressaltar que a faculdade da livre apreciação dos elementos de prova não chega ao ponto de fornecer ao Juiz uma carta branca
para omitir as razões pelas quais deixa de apreciar determinado elemento,
mormente quando o substrato probante revela saliente importância para o
deslinde da causa, hipótese em que paira sobre o Magistrado o ônus de
fundamentar o afastamento da evidência produzida.
No caso da prova testemunhal, exige-se, como de resto em relação a
qualquer arcabouço probatório, acuidade do Magistrado em perceber e extrair,
caso possível, durante a oitiva, declarações que, cotejadas com eventuais
outros elementos de convicção construídos no curso do processo, possam
conduzi-lo ao devido juízo de certeza em relação à verdade possível.
Assim é que, de forma alguma, apresenta-se viável, sob pena de
se subalternizar princípios processuais, a eliminação a priori da idoneidade
da prova testemunhal para demonstrar a ocorrência de graves condutas
perpetradas o campo eleitoral, principalmente ante a usual destreza dos
perpetradores, que oferecem severas dificuldades para se angariar outros
meios de prova.
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ATOS DA PROCURADORIA
No particular, como sói ocorrer com qualquer outra modalidade
de prova, uma vez examinada, pode se chegar à conclusão acerca da sua
fragilidade, mas não por ser exclusiva ou predominantemente testemunhal,
mas porque não se revela apta a demonstrar a ocorrência dos fatos.
Ocorre, porém, que, no caso, o depoimento de Edmilson dos Santos
integra um conjunto probatório dotado de robustez para demonstrar o cometimento do abuso de poder econômico, com saliente potencialidade
para violar o equilíbrio da disputa, em especial pela ínfima diferença de
votos que viabilizou aos impugnados o sucesso nas Eleições 2010 para a
Prefeitura de Crisópolis, conforme se verifica do seguinte quadro:
Posição
CANDIDATOS
Nº
PARTIDO
VOTOS
%
1º
JOSE SANTANA DA SILVA
15
PMDB
5.089
46,98%
2º
AGAMENON DANTAS DE
SOUZA
25
DEM
5.044
46,56%
3º
JOSÉ CALDAS FILHO
19
PTN
385
3,55%
4º
JOAO BISPO DE OLIVEIRA
13
PT
315
2,91%
Foram apenas 45 votos, diferença absolutamente sensível às manobras eleitoreiras que se destinem a romper com o equilíbrio do pleito, exatamente como a massiva distribuição de combustível noticiada nos presentes
autos, sem a qual, pode-se afirmar, haveria sérias possibilidades de que os
impugnados não tivessem alcançado resultado positivo naquela disputa.
Ressalte-se, ainda, que a “afixação de cartazes em ônibus que
prestavam serviço à Prefeitura de Crisópolis”, em relação à qual – isoladamente considerada – chegou-se à conclusão da inexistência de potencial
para desequilibrar o pleito, deve ser considerada como agravante no conjunto
das práticas que permitiram aos impugnados vantagem ilícita em relação aos
demais competidores.
Por fim, insta ressaltar que, in casu, todos os fatos noticiados se
revelam absolutamente plausíveis de terem ocorrido como narrado pelos impugnantes, não fosse a ausência de higidez do acervo probatório em relação
à parte dos eventos noticiados.
Nada obstante, a pujança da prática de distribuição gratuita de combustível restou suficientemente provada, de modo a revelar severa subversão
da vontade soberana do eleitorado de Crisópolis, apta a representar subalternização da democracia e tornar ilegítimo o resultado alcançado das urnas.
Ante o exposto, manifesta-se a Procuradoria Regional Eleitoral
pelo provimento parcial do recurso, para reformar a sentença zonal e
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ATOS DA PROCURADORIA
cassar o mandato eletivo de José Santana da Silva e Nivaldo Menezes
Filgueiras, com a imediata diplomação dos candidatos que alcançaram o
segundo lugar.
Salvador, 28 de julho de 2011.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
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ATOS DA PROCURADORIA
Recurso Contra Expedição de Diploma
Processo n. 650/2009 (6-48.2009)
Procedência:
Uauá/BA
Recorrente:
Olímpio Cardoso Filho
Recorridos:
Jorge Luiz Lobo Rosa e Péricles Cardoso de Oliveira
Relator:
Juiz Salomão Viana
PRONUNCIAMENTO
Trata-se de Recurso Contra Expedição de Diploma, fundado na
prática de abuso de poder político/econômico, fraude e captação ilícita de
sufrágio, interposto em face de Jorge Luiz Lobo Rosa e Péricles Cardoso
de Oliveira, respectivamente, prefeito e vice-prefeito reeleitos em 2008, no
Município de Uauá.
A pretensão é lastreada na ocorrência dos seguintes fatos: I) desvio de inúmeros servidores municipais para atuarem na campanha eleitoral;
II) utilização de bens públicos em favor dos recorridos; III) captação ilícita
de sufrágio, mediante a retenção de títulos de terceiros; IV) distribuição de
combustíveis e outras benesses; V) divulgação de pesquisa em desatendimento às prescrições legais; VI) utilização de títulos eleitorais por outrem no
momento da votação.
Os recorridos, preliminarmente, suscitam (fls. 968/1015 e
1850/1883): I) inépcia da inicial por ausência de prova pré-constituída; II)
nulidade da instrução caracterizada tanto pela limitação de tempo imposta
pelo Juízo monocrático, em cumprimento à carta de ordem para inquirição
das testemunhas, como em razão do indeferimento de produção de prova
testemunhal para instruir as contraditas apresentadas. No mérito, pugnam
pela improcedência do pedido.
Expedida carta de ordem para a oitiva de testemunhas (Anexo I).
Após determinada a produção de prova documental (fls. 1388, 1538,
1681/1684), vieram aos autos os documentos constantes do Anexo II (cópia
do Inquérito Policial n. 148/13586-48.2009) e do Anexo III (peças extraídas
do processo de prestação de contas do Município de Uauá, referentes ao
exercício de 2008).
Manifestações finais das partes às fls. 1813/1849 e 1850/1883.
É o relatório do essencial.
Passa-se à fundamentação.
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ATOS DA PROCURADORIA
1 - DAS PRELIMINARES
1.1 - Ausência de Prova Pré-Constituída
A preliminar de ausência de prova pré-constituída deve ser afastada,
visto que o atual entendimento da Corte Superior firmou-se pela “possibilidade de produção, no Recurso Contra Expedição de Diploma, de todos os
meios lícitos de prova, desde que indicados na petição inicial, não havendo
o requisito da prova pré-constituída” (RCD n. 745/SP, DJE de 24/08/2010,
rel. Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira).
1.2 - Nulidade da Instrução Probatória
Inicialmente, vale destacar o tumulto no trâmite do processo,
marcado pela ausência de lealdade processual, o que dificultou sobremaneira a atuação jurisdicional, tanto do insigne relator, quanto do juiz zonal,
no cumprimento da carta de ordem expedida para que fossem ouvidas as
testemunhas arroladas.
Extrai-se dos autos que foram designadas mais de 20 audiências,
entre as que foram suspensas e as efetivamente realizadas, para o cumprimento da mencionada carta de ordem, o que perdurou precisamente 15
meses (20/4/2009 a 19/7/2010), numa verdadeira saga processual, em que
se presenciou toda a sorte de imprevistos e incidentes.
A situação dos autos foi bem retratada pelo Juiz Relator Salomão
Viana, às fls. 1367/1389:
01 – Trata-se de processo que vem se caracterizando por
inusitada sequência de incidentes. Em razão disto, deverá a
Secretaria Judiciária redobrar a atenção por ocasião da prática
dos atos a seu cargo [...]
Na audiência, após uma sequência de incidentes, foi constatada a falta de peças que, no ver dos recorridos, deveriam ter
instruído a carta de ordem. Como a representação judicial do
recorrente afirmou que possuía cópias de tais peças, apresentou o acervo que detinha. Os recorridos, então, por meio do
advogado que foi designado pela MM. Juíza para representálos – e que é o mesmo a quem foram substabelecidos poderes
para representar os recorridos em ato posterior (fl.1330)-,
inquinou de falsos os documentos (fl.1226), sem indicar um
único motivo existente materialmente nos documentos para
embasar a sua alegação.
Evitem – definitivamente, evitem – os recorridos a repetição
de condutas desta natureza, que não serão, em nenhuma
hipótese, toleradas pela relatoria deste processo [...]
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
383
ATOS DA PROCURADORIA
Diante desse contexto, o juiz designado para cumprir a carta
de ordem adotou, acertadamente, medidas a fim de evitar os infindáveis
subterfúgios que, naquele momento, visavam a eternizar a demanda.
Assim, como regra geral, limitou o tempo para inquirição das testemunhas
em 20 minutos para cada parte e para o Ministério Público, bem como determinou a imediata comprovação do que fosse alegado em contradita, nos
seguintes termos:
[...] pelo M.M. Juiz Eleitoral foi dito que: reaberta a audiência, retoma-se a oitiva das testemunhas arroladas pelas
partes, primeiramente dando continuidade as arroladas pelo
recorrente. Para fins de organização e otimização do tempo,
ficam as partes e o Ministério Público advertidos que serão
concedidos 20 (vinte) minutos improrrogáveis para a inquirição das testemunhas. Para fins de celeridade e também de
otimização dessa assentada ficam as partes advertidas que
havendo oferecimento de contradita deverão de pronto ser
apresentadas ou indicadas as provas respectivas. [...] (grifo
do original).
Transcreve-se, ainda, o pronunciamento exarado pelo Promotor
Eleitoral, naquela oportunidade:
[...] Com relação ao indeferimento das contraditas, entendemos
que cabe à parte apresentar, de plano, prova robusta neste
sentido, haja vista que a presunção vigente é no sentido da
credibilidade das testemunhas arroladas. (...) No que diz respeito à limitação de tempo, entendemos que o Magistrado, como
presidente da audiência, pode recomendar às partes que sejam
objetivas em suas perguntas. Nessa conformidade, a sugestão de 20 (vinte) minutos par argüições deve ser entendida,
como a abertura para que as partes indaguem livremente as
testemunhas neste período de tempo, após o que o Magistrado
exercerá estrito controle da pertinência das perguntas [...]
Num juízo de ponderação, em que se contrapõem o interesse,
desde que legítimo, em produzir provas, e por outro lado, a solução da lide
em tempo razoável e a utilidade da decisão adotada por essa Corte – fim
maior do processo, especialmente em matéria eleitoral, em vista do caráter
temporário dos mandatos políticos -, observa-se a razoabilidade da medida
adotada pelo Juiz a quo, mormente diante da conduta contumaz demonstrada nos autos no sentido de protelar o andamento do feito.
Nota-se que o magistrado, em nenhum momento, absteve-se de
adotar as medidas necessárias para instruir o processo, cabendo-lhe, por força
legal (art. 130, CPC), o indeferimento das que entender impertinentes.
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ATOS DA PROCURADORIA
Acrescente-se, ainda, não restar comprovado nas alegações das
partes (fls. 1813/1849 e 1850/1883) o efetivo prejuízo processual, imprescindível para que seja configurada a eventual nulidade, razão pela qual esta
preliminar também deve ser afastada.
2 - DO MÉRITO
A narrativa vertida na exordial pretende demonstrar uma orquestração de ações, preordenadas a gerar resultados individuais que, em seu
conjunto, terminariam por favorecer os recorridos nas Eleições municipais
de 2008.
O exame do arcabouço probatório revela que os elementos que
sustentam as alegações do recorrente encontram suporte nos depoimentos
de testemunhas/eleitores.
Tal cenário está a exigir que, como providência anterior ao exame
dos fatos, desenvolva-se reflexão em torno da idoneidade da prova testemunhal em feitos desta natureza.
2.1 - DA PROVA TESTEMUNHAL
Não raro, surgem debates nos Tribunais em torno da utilização de
testemunhas como suporte às alegações de captação ilícita de sufrágio e
abuso de poder econômico.
Em regra, argúi-se que a gravidade das sanções decorrentes do
reconhecimento dessas práticas demandaria prova com substância insusceptível de se alcançar por meio de depoimentos colhidos em Juízo.
Tal percepção mostra-se, data venia, equivocada.
É que, malgrado a natureza das relações intersubjetivas travadas
no âmbito eleitoral, campo em que, muitas vezes, os interesses e rivalidades
conduzem à construção de versões descabidas e frágeis, a prova testemunhal está longe de ser algo descartável por ser o único ou preponderante
elemento coligido.
Exige-se, como de resto em relação a qualquer arcabouço probatório, acuidade do Magistrado em perceber e extrair, caso possível, durante
a oitiva, declarações que, cotejadas com eventuais outros elementos de
convicção construídos no curso do processo, possam conduzi-lo ao devido
juízo de certeza em relação à verdade real.
Assim é que, de forma alguma, revela-se viável, sob pena de se
subalternizar princípios processuais, a eliminação a priori da idoneidade da
prova testemunhal para demonstrar a ocorrência de graves condutas perpetradas no campo eleitoral, sobretudo pela destreza dos perpetradores, que
oferecem severas dificuldades para se angariar outros meios de prova.
No particular, como sói ocorrer com qualquer outra modalidade
de prova, uma vez examinada, pode se chegar à conclusão acerca da sua
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
385
ATOS DA PROCURADORIA
fragilidade, mas não por ser exclusiva ou predominantemente testemunhal,
mas porque não se revela apta a demonstrar a ocorrência dos fatos.
Nesse sentido encontra-se firmada a jurisprudência dos Tribunais
pátrios, que, inclusive, reconhece a possibilidade de condenação criminal com
fundamento em prova exclusivamente testemunhal, desde que robusta:
Representação. Captação ilícita de sufrágio.
1. A comprovação da captação ilícita de sufrágio lastreada
exclusivamente em prova testemunhal é perfeitamente
admitida, bastando que ela demonstre, de maneira consistente, a ocorrência do ilícito eleitoral.
2. A circunstância de cada fato alusivo à compra de voto
ter sido confirmada por uma única testemunha não retira
a credibilidade, nem a validade da prova, que deve ser
aferida pelo julgador. (TSE. AgR-REspe n. 26110, DJE de
23/06/2010). (grifou-se).
PROCESSO CRIMINAL. DELITO DO ART. 299 DO CODIGO
ELEITORAL. [...]
PARA QUE A CONDENACAO CRIMINAL SEJA BASEADA EM
PROVA ESTRITAMENTE TESTEMUNHAL, E NECESSARIO
QUE OS DEPOIMENTOS SEJAM CONTUNDENTES, INQUESTIONAVEIS E IRRETORQUIVEIS.(TRE-MG. Acórdão
nº 176 de 08/03/1999).
AÇÃO CAUTELAR - CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO
A RECURSO EM AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO
ELETIVO - ALEGAÇÃO DE QUE A SENTENÇA FOI BASEADA
EM PROVA UNICAMENTE TESTEMUNHAL E MACULADA
PELA PARCIALIDADE - NÃO CARACTERIZAÇÃO DA FUMAÇA DO BOM DIREITO - MANUTENÇÃO DA DECISÃO
LIMINAR - IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
Uma vez vigorar no processo brasileiro o princípio da livre
apreciação das provas, inexiste hierarquia entre os meios
probatórios disponíveis, sendo descabida a alegação de
que a sentença deve ser suspensa porque foi baseada
em prova unicamente testemunhal.(TRE-RN. AC.n. 2, de
08/07/2008). (grifou-se).
No caso sob apreciação, como antes asseverado, a prova oral
produzida restou fortemente corroborada por outros elementos probatórios,
cujo exame em conjunto revela sua idoneidade para confirmar a tese vertida
na presente demanda.
Veja-se, pois, o exame individualizado dos fatos alegados em desfavor dos recorridos:
386
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
2.2 – DO ABUSO DE PODER POLÍTICO
2.2.1 - Utilização de servidores municipais para atuarem em campanha
eleitoral
O recorrente assevera que os servidores adiante elencados foram
desviados de suas funções para trabalharem na campanha de reeleição do
então Prefeito:
I) Adão Gomes Ribeiro da Silva (Chefe da Divisão de Convênio e
Contratos e Presidente da Comissão Permanente de Licitação - CPL):
Conforme consta da inicial, durante o período eleitoral, o servidor
Adão, ao lado das funções desempenhadas na CPL, prestou serviço no comitê
de campanha dos recorridos em horário de expediente.
Em defesa, a parte ré acostou aos autos certidão firmada por
Adson Batista da Silva Cardoso, Chefe da Divisão de Recursos Humanos
e Documentação, do Município de Uauá, em que se atesta que o servidor
Adão Gomes encontrava-se em gozo de férias no período de 29/9/2008 a
28/10/2008, nos seguintes termos (fl. 1046):
Certificamos para os devidos fins de direito, que o servidor
ADÃO GOMES RIBEIRO DA SILVA, brasileiro, maior, solteiro,
Auxiliar Administrativo, portador do RG n.º 4423549 SSP/PA
(sic) e CPF n.º 951.019.855-20, gozou férias no período de 29
de setembro de 2008 a 28 de outubro de 2008, referente ao
período aquisitivo de 01 de janeiro de 2005 a 31 de dezembro
de 2005 [...]
Ressalte-se que o teor da referida certidão, produzida unilateralmente pelo Município, há que ser considerada com a devida reserva. Isto
porque o atual Chefe do Poder Executivo é parte neste processo.
Por outro lado, verifica-se que os documentos referentes ao Processo de Licitação n. 64/2008, (Anexo III, Volume III, parte final) foram assinados por Adão Gomes, então presidente da CPL, entre os dias 22/9/2008
e 9/10/2008, o que comprova que o servidor estava no exercício do cargo
no período que antecedeu às eleições, diversamente do que afirmam os
recorridos.
Não bastasse, a testemunha Rodrigo Gonçalves de Souza Silva
(fls. 342/346, Anexo I) confirmou a presença do aludido funcionário no comitê
eleitoral na mesma época.
Conclui-se, portanto, que razão assiste ao recorrente quando afirma
que o servidor Adão Gomes Ribeiro da Silva desviou-se de suas funções para
se dedicar à campanha eleitoral dos recorridos.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
387
ATOS DA PROCURADORIA
II) Salene Moreira Rocha e Jon Clebson de Jesus Araújo (médicos que
prestam serviço ao Município de Uauá):
Consta dos autos que os médicos Salene e Jon Clebson ofereceram atendimento médico a pessoas carentes, com o fim de obter votos em
favor dos recorridos.
Essa alegação é confirmada pela testemunha Noêmia Alves de
Souza1 , que presenciou a visita dos aludidos médicos ao seu vizinho Aniceto,
ocasião em que, após o respectivo atendimento, solicitaram aos presentes
que votassem em Jorge Lobo (fls. 358/360 – Anexo I), verbis:
[...] que num determinado final de semana do mês de setembro do ano de 2008, sexta-feira, encontrava-se na residência
de um vizinho chamado senhor Aniceto quando chegaram na
residência deste senhor os médicos Salene e Joni acompanhados da diretora da escola senhora Idelma, que os médicos
chegaram neste local empreendendo consultas de forma
gratuita ao tempo em que disseram aos presentes que lá
estavam por parte do senhor Jorge Lobo disseram ainda
que deveriam as pessoas atendidas votar no 28 pois se
essas pessoas não votassem no 28 eles iriam embora de
Uauá e não atenderiam mais a comunidade; [...] que esses
médicos continuam atendendo no Município de Uauá pela
Prefeitura [...] que os médicos gozam de um bom conceito na
comunidade [...] que o Senhor Aniceto é uma pessoa de idade
e doente; que inclusive sofreu derrame; que o atendimento
do senhor Aniceto foi feito pela Dr. Salene; que enquanto Dr.
Salene fazia o atendimento o Dr. Joni tomava um cafezinho;
que este fato aconteceu durante o período da tarde em torno
de 15:30h para as 16:00h; [...] que na ocasião da visita dos
médicos na residência do senhor Aniceto tais médicos não
estavam vestidos com roupas de campanha eleitoral mas
portavam pequenos coraçoeszinhos com o n.º 28 que foram
distribuídos para as pessoas ali presentes [...] (grifou-se).
III) José Carlos da Rocha (Assessor Especial de Educação):
Em fl. 167, verifica-se cópia de documento extraído do sítio eletrônico do Tribunal de Contas dos Municípios, em que consta como ocupante
do cargo de Assessor Especial de Educação, no mês de agosto/2008, José
Carlos da Rocha – admitido em abril/2008 -, mesma pessoa que compõe o
quadro societário do Instituto de Pesquisa Parâmetro Ltda. (fls. 171 e ss.).
Referida empresa firmou contrato com os recorridos no mês de
setembro/2008, para realização de pesquisa eleitoral no Município de Uauá,
1
Oitiva deferida pelo Juiz Relator antecedente, Dr. Evandro Reimão dos Reis, sem oposição da parte recorrida – fls. 1307 e 1316.
388
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
comunicada ao Juízo Zonal por meio da petição de fl. 170, em que expressamente consta o nome do diretor da empresa, José Carlos da Rocha.
Por outro lado, verifica-se que o Decreto de exoneração relativo ao
mencionado servidor, com data de 1/9/2008 (fl. 1029), mas sequer publicado,
uma vez que fora subscrito pelo primeiro recorrido, o então Prefeito Jorge
Luiz Lobo Rosa, não detém, per se, qualquer força probante que se queira
lhe emprestar.
Dessa forma, induvidosa a promiscuidade nas relações mantidas
entre José Carlos da Rocha e Jorge Luiz Lobo, candidato à reeleição - ora
atuava como funcionário do Município, ora como prestador de serviços para
campanha eleitoral -, razão pela qual se confundem o múnus relativo ao
efetivo exercício do cargo público e a contraprestação, em caráter particular,
pela realização de pesquisa eleitoral.
IV) José Augusto Cardoso de Andrade (servidor municipal):
O recorrente alega que José Augusto Cardoso de Andrade, conhecido como Zé de Eró, atuou na campanha dos recorridos, inclusive, na
distribuição de combustível quando da realização de comício.
No caso, os impugnantes constroem sua tese com arrimo no conteúdo da mídia de fl. 199, na qual, de fato, observa-se movimento não usual
em posto de combustível, com o abastecimento praticamente sequencial
de automóveis e motocicletas enfileiradas, sem que se perceba qualquer
ato direcionado a sua contraprestação, seja em espécie ou outra forma de
pagamento.
De outro banda, destaca-se o depoimento da testemunha Manuel
Andrade Lima (fls. 217 e ss. – Anexo I), ainda que colhido nos moldes do
art. 414, § 1º, do CPC2 , no qual se confirma que José Augusto coordenou a
distribuição de combustíveis no Posto PetroSerra/Senhor do Bonfim no dia
do último comício dos recorridos.
Dessa forma, infere-se sua ativa participação em prol dos recorridos
na Campanha Eleitoral no prélio de 2008.
V) Maximiliano Miguel Ribeiro Guimarães, Pedro Araújo Cordeiro Filho
(Assessores Jurídicos do Município de Uauá), Maria de Fátima Borges
Ribeiro (Secretária de Educação), Tales de Lima Santos (médico):
Quanto a estes servidores, porém, os autos não revelam elementos
hábeis a comprovar eventual participação na campanha dos recorridos.
2
Art. 414. [...] § 1º É lícito à parte contraditar a testemunha, argüindo-lhe a incapacidade, o impedimento ou
a suspeição. Se a testemunha negar os fatos que Ihe são imputados, a parte poderá provar a contradita com documentos
ou com testemunhas, até três, apresentada no ato e inquiridas em separado. Sendo provados ou confessados os fatos, o
juiz dispensará a testemunha, ou Ihe tomará o depoimento, observando o disposto no art. 405, § 4º.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
389
ATOS DA PROCURADORIA
2.2.2 – Utilização de bens públicos na campanha eleitoral dos recorridos
I) Ônibus escolar utilizados em campanha eleitoral:
Conforme se verifica no Anexo III, a fim de atender a demanda de
transporte escolar, o Município de Uauá firmou contrato, com cláusula de
exclusividade, em face de vários proprietários de ônibus, não lhes sendo
lícito, por conseguinte, utilizarem ditos veículos para outras finalidades, ainda
que em finais de semana.
Nada obstante, constam das fls. 218 e 219 fotografias dos ônibus
que ostentavam no letreiro a expressão “TRANS. ESCOLAR”, adornados com
adesivos típicos de propaganda política. Nota-se, ainda, que, na oportunidade, referidos veículos conduziam pessoas que empunhavam bandeiras com
o n. 28 e encontravam-se enfileirados em formação destinada à realização
de carreata.
Diante desse cenário, portanto, é possível afirmar a ocorrência de
uso de bens públicos para favorecer os recorridos.
II) Do trator destinado à limpeza urbana que circulava com propaganda
política dos recorridos:
De fato, em fl. 228, verifica-se uma fotografia de um trator com
adesivo do tipo praguinha com o n. 28. Entretanto, ainda que se tratasse de
veículo destinado à limpeza urbana, a utilização deste artefato, por si só, não
tem o condão de ensejar as graves consequências pretendidas pelo recorrente, uma vez que, isoladamente, demonstra ínfima potencialidade.
III) Do contrato no valor de R$120.670,00, firmado pelo Município de
Uauá com a empresa F.L. de Araújo - Gráfica, supostamente para atender à demanda de serviços gráficos da Prefeitura e das respectivas
Secretárias:
No tocante ao contrato no valor de R$120.670,00, firmado em
20/6/2008 pelo Município de Uauá e a empresa F.L. de Araújo – Gráfica, consta
nos autos cópia de sua publicação (Diário Oficial do Município, fl. 877).
Observa-se, ademais, impressos referentes à campanha política
dos recorridos, em que, de fato, consta o CNPJ da empresa F.L. de Araújo
(CNPJ n. 06.645.243/0001-63, fl. 880), como responsável pela confecção
do material.
De fato, causa estranheza o elevado valor do contrato para prestação de serviços gráficos, especialmente pelo fato de Uauá tratar-se de um
pequeno Município, e em pleno ano eleitoral.
No entanto, malgrado estar-se diante de um cenário deveras nebuloso, não se extrai dos autos elementos mais sólidos, aptos a configurar
eventual prática ilícita.
390
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
2.3 - DA CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO
A parte autora igualmente aduz que os recorridos se utilizaram de
diversos meios vedados com o fim de obter ilicitamente os votos dos eleitores,
conforme adiante se expõe.
I) Cooptação ilícita dos seguintes eleitores, em troca de benesses:
a) No que tange a suposta captação ilícita do voto de Poliana de
Almeida Gonçalves, consta que lhe foi oferecido o valor de R$100,00 por
Everaldo Francisco da Silva para votar em Jorge Lobo. De fato, os autos
revelam, de forma nítida, a ocorrência da noticiada compra de votos, conforme se depreende dos seguintes trechos do depoimento da eleitora Poliana
tomado em juízo:
Poliana de Almeida Gonçalves (fls. 472/474 – Anexo I):
[...] que afirma que certo dia ao transitar pela rua foi
abordada pelo sr. Everaldo e que o mesmo lhe ofereceu a
quantia de R$ 100,00 (cem reais) para votar no candidato
Jorge Lobo; [...] que não tinha relação de amizade com o
sr. Everaldo; que ao ter sido oferecido dinheiro disse que
não queria, que como era o primeiro voto queria expressar o
seu voto; [...] que a abordagem aconteceu no dia anterior ao
domingo da eleição; [...] que o sr. Everaldo não era simples
partidário de Jorge Lobo ele fazia campanha para Jorge
Lobo; [...] que a proposta foi feita em tom sério, que ele ia
dar mesmo o dinheiro [...]. (grifou-se).
b) Com referência à captação ilícita do voto de Ediene da Silva
Cardoso, afirma-se que lhe teria sido entregue a quantia de R$10,00, acompanhada de pedido de voto, por pessoas identificadas como “Emerson e
Olímpio do Poço”, no comício de Jorge Lobo, realizado na Lagoa Pires. A
fim de confirmar as alegações, a única prova exibida nos autos consiste na
mídia de fl. 233, que veicula, unicamente, declarações de Ediene, as quais,
todavia, não foram corroboradas por qualquer prova produzida em juízo.
c) Por sua vez, quanto ao eleitor Fenelon Gonçalves da Silva, alegase que o vereador Nilton Almeida lhe doara 500 telhas para que votasse nos
recorridos. O recorrente almeja comprovar o referido fato por intermédio da
mídia de fl. 237, que apresenta tão somente as declarações do próprio Fenelon, não confirmadas em juízo por outros elementos de convicção.
d) No que concerne ao aliciamento da eleitora Joelma Loiola dos
Santos, argumenta-se que o candidato a vereador Jerônimo Oliveira Cardoso lhe teria ofertado o valor de R$60,00 para que votasse nos recorridos. O
referido episódio encontra-se supostamente comprovado pela mídia de fl.
253, cujo teor, entretanto, restringe-se a declarações de terceiros acerca do
fato, sem lastro nas demais provas.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
391
ATOS DA PROCURADORIA
e) Quanto à captação ilícita dos votos de Maria Carmelita Ribeiro
da Silva e de seu esposo, José Jackson, consta que o candidato a vereador
João Alves doou à primeira a quantia de R$20,00, e ao segundo prometeu
a realização de “uma cirurgia”, com o fim de que votassem em Jorge Lobo.
Entretanto, as únicas provas produzidas neste aspecto são as mídias de fls.
262 e 267, com declarações dos respectivos eleitores que, por si só, não são
aptas a configurar a prática ilícita atribuída aos recorridos.
f) Afirma-se, ainda, na exordial, que o eleitor José Dionelson Damasceno recebeu do candidato Jorge Lobo quatro sacos de cimento em troca
do seu voto. Verifica-se, porém, no termo de audiência fls. 355/357 (Anexo
I), que, após o depoimento prestado na instrução dos presentes autos, o
mencionado eleitor foi conduzido à unidade da Polícia Federal para que se
apurasse a ocorrência do delito previsto no art. 342 do CP, em virtude das
contradições detectadas em suas declarações. Nessas circunstâncias e diante
da inexistência de outras provas acerca dos fatos, não restou configurada a
aludida captação ilícita de sufrágio.
II) Consta da inicial que os recorridos obtiveram os votos dos eleitores que possuíam débito no supermercado de Adalgison Gomes de Matos, ao
efetuar o pagamento das dívidas por eles contraídas naquele estabelecimento
(fl. 21). Entretanto, nenhuma prova foi produzida a respeito.
III) Com relação à captação ilícita de votos que supostamente
ocorrera no Distrito de São Paulo com o oferecimento de vantagens, como
empregos e dinheiro, para que os eleitores votassem em Jorge Lobo, as
alegações, igualmente, não encontram suporte probatório nos autos. Como
se verifica da mídia de fl. 280, as provas referentes àquele evento se resumem a declarações prestadas por supostas testemunhas, que, contudo, não
foram ouvidas em juízo.
IV) Quanto à doação de caixão, material de construção e passagens
de ônibus para famílias de baixa renda, trata-se, em regra, de atividades
sociais ordinárias, autorizadas por lei, usuais em pequenos municípios do
interior, diante da extrema carência da população. Não se encontram nos
autos, evidências de que tais benefícios tenham extrapolado os limites legais
(fls. 294/320).
Forçoso reconhecer, pois, que a captação ilícita de sufrágio mostrouse suficientemente comprovada tão somente quanto à eleitora Poliana de
Almeida Gonçalves.
2.4 – ABUSO DE PODER ECONÔMICO
Passa-se ao enfrentamento dos fatos, atribuídos aos recorridos,
configuradores de abuso de poder econômico.
392
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
I) Distribuição de combustível para os eleitores:
Em Alegações Finais (fls. 1850/1883), a parte ré desenvolve o
seguinte raciocínio:
[...] Sobre o frágil argumento de que os gastos com combustível, pela Prefeitura de Uauá, foram desproporcionais,
comparando-se os anos de 2007 e 2008, os recorridos, da
mesma forma, nos termos do art. 397 do CPC e em nome
do princípio da busca pela verdade real, pedem a juntada
de documentos públicos da Prefeitura de Uauá, que comprovam que, entre os anos de 2005 e 2010, os gastos com
combustíveis e lubrificantes, sempre aumentaram a cada
ano, até porque existem reajustes, na maioria das vezes
para maior senão veja-se:
R$571.663,06, em 2005;
R$686.450,31, em 2006;
R$765.585,26, em 2007 (já nos autos);
R$1.096.748,27, em 2008 (já nos autos);
R$1.288.332,49, em 2009; e
R$1.462.829,82, em 2010 [...]. (grifos no original).
Na realidade, incontestável que os preços dos combustíveis sofrem
acréscimos significativos a cada ano. Entretanto, extrai-se dos valores apresentados um aumento extraordinário nos gastos entre os anos de 2007
e 2008, sem qualquer justificativa, o que não se coaduna com a elevação
gradual, alegada pelos recorridos.
Observe-se a evolução dos valores na tabela que segue adiante3
:
3
Ano
Despesa Total/
Combustível (R$)
Diferença/
Aumento (R$)
Aumento Percentual
2005
R$571.663,06
R$114.787,25
20,08%
2006
R$686.450,31
2006
R$686.450,31
R$79.134,95
11,53%
2007
R$765.585,26
2007
R$765.585,26
R$331.163,01
43,25%
2008
R$1.096.748,27
Dados extraídos das alegações finais dos recorridos (fl. 1860).
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
393
ATOS DA PROCURADORIA
2008
R$1.096.748,27
2009
R$1.288.332,49
2009
R$1.288.332,49
2010
R$1.462.829,82
R$191.584,22
17,47%
R$174.497,33
13,54
Verifica-se que os valores constantes na coluna “diferença/aumento”
- representam o acréscimo de gasto com combustível - são crescentes até
o ano de 2008 (ano eleitoral), quando atingiu a cifra de R$331.163,01, ou
seja, um aumento de 43,25% em relação a 2007.
Nos anos subsequentes, diversamente do que argúi a defesa,
evidencia-se significativo decréscimo do dispêndio com combustível, no
Município de Uauá, o que revela a plausibilidade da tese de que o fato que
ocasionou o aumento excessivo no ano de 2008 está intimamente vinculado
à disputa eleitoral, o que dá lugar ao ditado popular: “contra fatos não há
argumentos”.
Nessas circunstâncias, sobreleva-se o depoimento de Manuel Andrade Lima Sobrinho, ainda que colhido como termo de declaração, em que
afirma (fls. 217 e ss. – Anexo I):
[...] que na data do último comício da Coligação do Prefeito,
presenciou uma aglomeração no Posto de Combustíveis
conhecido como sendo o seu proprietário o recorrido
Péricles, estando a uns 50 (cinqüenta) metros do local, pois
a casa da sua avó fica próxima; que presenciou José Augusto
coordenando a distribuição de combustíveis para os veículos,
fazendo inclusive filas; [...] que viu uma pessoa da coligação
contrária de nome Jairson filmando o episódio com câmera,
inclusive gerou uma certa confusão, queriam tomar a câmera
e foi preciso a intervenção do declarante [...]. (grifou-se).
Aliás, a mídia constante da fl. 199, que veicula imagens da aglomeração de automóveis no Posto PetroSerra/Senhor do Bonfim, torna ainda
mais robusta a comprovação do desvio de combustível, como ressaltado
anteriormente (item 2.2.1,IV).
Desta forma, exsurge dos autos, à toda evidência, o uso abusivo
de dinheiro público para distribuição de combustível em campanha.
394
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
II) Reunião política com apresentação de músicos na Comunidade de
Curundundum:
Nesse ponto, o recorrente afirma a existência de um showmício na
Comunidade de Curundundum, em dia de domingo, 24/8/2008, com a finalidade
de angariar votos para os recorridos (fls. 463 e ss.).
Diante da prova oral colhida, observa-se que, de fato, ocorrera uma reunião política na referida comunidade, situada na zona rural de Uauá, com discursos
e promessas de campanha, além da apresentação de uma banda de forró.
É o que consta do depoimento de Adão Mamede da Silva, testemunha
da parte autora devidamente compromissada (fls. 463 e 248 e ss. – Anexo I):
[...] que no mês de agosto do ano de 2008, o primeiro recorrido
Jorge Luiz Lobo realizou uma reunião política na comunidade de Curundundum e que após essa reunião por volta
da 11 horas da manhã, se iniciou uma espécie de forró pé
de serra, cujo artista era Uilson Eduardo; esse show aconteceu imediatamente após a reunião realizada pelo recorrido
Jorge Lobo, tendo o mesmo se encarregado de anunciar e
apresentar o artista; [...] sabe dizer que as pessoas da localidade, inclusive o próprio depoente foram convidados em casa
para o evento e que lá compareceu; assistiu a reunião política
até terminar; viu quando o forró começou; [...] não sabe dizer
se todas as pessoas foram convidadas no mesmo dias e se
foram convidadas ao longo da semana; estavam acompanhando o seu Jorge Lobo, aproximadamente cinco candidatos a
vereadores do lado deste, Miguel Avelino, Zé Borges, Ogeno
Lobo Milton Almeida e Galego; o vice-prefeito, conhecido como
“Pepé” também se encontrava presente; nessa reunião foi
feita apologia política, pedido de votos e promessa de
realizar a encanação, [...] na reunião tinha aproximadamente
quarenta pessoas; [...] com o Sr. Uilson tocou-se triângulo,
zabumba e pandeiro e o Uilson na sanfona; na ocasião do
convite foi informado que haveria um forrozeiro, contudo não
foi informado o nome de quem seria o forrozeiro; [...] não lembra se havia microfone no local ou infra-estrutura de som,
mas afirma com certeza que o forrozeiro tocou no “gogó”, sem
equipamento de som [...]. (grifou-se).
Nota-se pela descrição dos fatos que, apesar de não se tratar
propriamente de um showmício, configurou-se num evento assemelhado,
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
395
ATOS DA PROCURADORIA
na forma proscrita pelo art. 39, § 7º, da Lei n. 9.504/974 , que bem denota o
abuso de poder econômico na espécie.
III) Doação de cem camisas à igreja Assembléia de Deus para utilização
no Congresso da Mocidade:
Apesar de caracterizado na inicial como captação ilícita de sufrágio,
o fato sob analise melhor se subsome a hipótese de abuso de poder econômico, visto que a doação das camisas direcionou-se à entidade eclesiástica,
e não propriamente aos eleitores em troca de voto.
A partir do manuseio e audibilidade da mídia de fl. 249, verificase que no decorrer de um evento religioso realizado em 27/7/2008, o líder
eclesiástico Jaide Luiz dos Santos Silva agradeceu o apoio e as 100 camisas
que a comunidade cristã recebeu de “Jerominho”, integrante da base política
dos recorridos:
[...] Nosso irmão Jerominho, ele é uma autoridade política e
também uma autoridade eclesiástica. Ele serve ao Senhor na
Igreja Batista e tem nos apoiado e nos ajudado muito, irmãos,
glória a Deus, em todas as áreas, quando preciso dele. Realizamos dois pré-congressos e tivemos uma ajuda muito grande,
glória a Deus, do nosso irmão Jerominho. É. Ele, glória a Deus,
ele nos ajudou, irmãos, de maneira tremenda. Daqui (-). É (-).
Eu quero dizer que ele nos ajudou, é, (-) pra conseguirmos
aí cem camisa, camisas pra esse congresso e houve uma
dificuldade muito grande. De Salvador esse material foi parar
em Juazeiro da Bahia e graça a Deus chegou aqui ontem esse
material, mas nós vamos fazer aqui, pastor, com a supervisão
do senhor, um encontro de jovens [...]
Como se observa do teor da referida mídia, há uma predileção quase
explícita pelos recorridos ensejada, possivelmente, pela doação das camisas
para utilização no congresso de jovens. Assim, expõe-se, uma vez mais, o
abuso do poder econômico em benefício da candidatura dos recorridos.
IV) Distribuição de camisas e bolsas na exposição de caprinos, em 23
e 24/8/2008:
No caso, o recorrente constrói sua tese com arrimo no conteúdo da
mídia de fl. 288, na qual se constata apenas seis fotografias que retratariam
o fato sob enfoque.
4
Art. 39. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado,
não depende de licença da polícia. [...] § 7º É proibida a realização de showmício e de evento assemelhado para promoção de candidatos, bem como a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e
reunião eleitoral.
396
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
Verifica-se, nas imagens, um agrupamento de, no máximo, 10
pessoas, que ostentam indumentária padronizada, com o n. 28. Pelo contexto, extrai-se que são profissionais normalmente contratados em época da
campanha, para a divulgação das candidaturas.
Ademais, não se identifica a distribuição de qualquer benesse
naquela oportunidade. Dessa forma, inexiste suporte probatório apto para
comprovar a arguida irregularidade.
V) Distribuição significativa de dinheiro e donativos, utilização da estrutura de marketing da semana cultural e divulgação de falsa pesquisa
eleitoral:
Quanto a esses fatos, o recorrente não se desonerou do onus probandi, sobretudo diante da fragilidade dos elementos de convicção trazidos
aos autos (fls. 330 e ss. e fls. 378 e ss.).
2.5 – FRAUDE
Afirma a parte autora que terceiros, de posse de títulos de outrem,
sufragaram em lugar de determinados eleitores, nos moldes que adiante se
expõe:
I) Aliomar da Silva Lobo (tio do primeiro recorrido), com título cancelado,
votou por Aurilvado Lobo Sobrinho:
Os recorridos, em alegações finais, reconhecem que Aliomar da
Silva votou no lugar de Aurivaldo Lobo Sobrinho (fl.1866). Entretanto, afirmam
que a substituição ocorreu de maneira não intencional.
Não se afigura crível que este fato tenha ocorrido de forma
involuntária, porquanto a conduta dirigida a votar com o título alheio
denota uma atitude grave, ilícita, antidemocrática e deliberada no sentido
de ladear a lisura das eleições.
Tal constatação é corroborada, ademais, pelos documentos de fls.
341/351, consistente, dentre outros, em cópia de declaração emitida pela
Secretaria de Serviços Públicos de Camaçari, em que se atesta que Aurilvado
Lobo prestou serviços naquele município em 05/10/2008, das 8 às 19h.
Resta, pois, evidente a fraude eleitoral concernente ao fato de
Aliomar da Silva Lobo votar em lugar de Aurivaldo Lobo Sobrinho.
II) O título pertencente a Jeronoaldo Gomes da Silva, já falecido à época
das Eleições 2008, teria sido utilizado por outra pessoa, não identificada
nos autos:
O recorrente trouxe com a exordial os documentos de fls. 357/359,
que consistem em notícia obtida no sítio eletrônico do TSE quanto à
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
397
ATOS DA PROCURADORIA
situação regular de Jeronoaldo nos cadastros eleitorais, bem como cópia
de sua certidão de óbito, em que se verifica que seu falecimento ocorreu
em 13/1/2008.
Ressalte-se, todavia, que a informação de que a situação do
eleitor é regular não implica, necessariamente, que este tenha votado nas
Eleições de 2008, pois apenas atesta que o eleitor está apto a votar nas
eleições vindouras.
Somente se tornará irregular e terá o título cancelado o eleitor que
se ausentar por, no mínimo, três pleitos sucessivos, sem a correspondente
justificativa, na forma do art. 71, V, do Código Eleitoral5 .
In casu, para comprovar a prática do ilícito noticiado mostra-se
imprescindível a declaração do Cartório Eleitoral em que se certificasse a
utilização do título de Jeronoaldo nas Eleições de 2008, o que, porém, não
consta dos autos, fato que afasta a irregularidade apontada.
III) Raimundo Almeida da Silva, com domicílio eleitoral em Uauá, encontrava-se em São Paulo no dia da eleição, embora nos registros eleitorais
constasse como votante:
Para comprovar esta suposta fraude, o recorrente juntou a certidão
de quitação eleitoral de Raimundo Almeida (fl. 361), firmada em 2/12/2008,
e, ainda, cópias de documentos que visam a comprovar que se encontrava
na cidade de São Paulo no dia da eleição, como, por exemplo, tickets de
passagem de ônibus, dentre outros (fls. 362/369).
O acervo probatório, contudo, mostrou-se débil, visto que a certidão
de quitação eleitoral de 2/12/2008 não é suficiente para comprovar que o título
de Raimundo Almeida foi utilizado por terceiro, na medida em que, mesmo
ausente às urnas, o eleitor poderia obter a referida certidão, desde que para
tanto, quitasse a multa correspondente.
Dessa forma, não restou caracterizada a mencionada fraude.
IV) José Marcos Gonçalves Cordeiro, com título eleitoral cancelado,
teria votado por Adailton Oliveira da Silva:
Com o fim demonstrar a veracidade das afirmações, o recorrente
trouxe aos autos a lista de inscrições eleitorais canceladas em 2007 (fl. 339)
em que consta a de Jose Marcos, além de um fragmento do comprovante
de votação em nome de Adailton Oliveira da Silva (fl. 340).
5
Art. 71. São causas de cancelamento: I - a infração dos artigos. 5º e 42; II - a suspensão ou perda dos direitos
políticos; III - a pluralidade de inscrição; IV - o falecimento do eleitor; V - deixar de votar em 3 (três) eleições consecutivas. § 1º A ocorrência de qualquer das causas enumeradas neste artigo acarretará a exclusão do eleitor, que poderá ser
promovida ex officio , a requerimento de delegado de partido ou de qualquer eleitor. (grifou-se).
398
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
A simples apresentação desses documentos, porém, não é suficiente para demonstrar que José Marcos votou em lugar de Adailton Oliveira.
Por fim, oportuno destacar que os fatos em análise neste tópico
(item 2.5) são objeto de investigação no bojo do Inquérito Policial n. 148
(13586-48.2009), cujas cópias constam do Anexo II.
2.6 – POTENCIALIDADE DAS CONDUTAS PARA INFLUIR NO RESULTADO DO PLEITO
Nesse cenário, ao se considerar que os acionados sagraram-se
vencedores nas Eleições 2008 por uma estreita margem, precisamente
3,71% dos votos válidos, imperioso reconhecer que, além de consubstanciar
severa violação à liberdade do voto – o que, per se, já demonstra a gravidade
das condutas - as ações perpetradas pelos acionados revestiram-se de saliente potencialidade para desequilibrar o pleito, com a utilização da máquina
pública em prol da reeleição dos recorridos.
Como se extrai dos autos, resta sobejamente comprovado que:
• foram utilizados ônibus a serviço do transporte escolar para
realização de carreatas;
• servidores públicos, especialmente médicos, forneceram atendimento em troca de votos;
• aumento excessivo do gasto com combustível, no ano de 2008,
o que, como visto, encontra-se atrelado à disputa eleitoral;
• doação de 100 camisas à Igreja Assembléia de Deus, para a
realização do congresso de jovens daquela entidade.
Impõe-se, pois, concluir que restam satisfatoriamente demonstrados
os ilícitos cometidos, com prova da absoluta potencialidade/gravidade das
condutas sub examine.
3 – CONCLUSÃO
Ante o exposto, manifesta-se a Procuradoria Regional Eleitoral
pelo provimento do presente Recurso contra Expedição de Diploma, no
que refere aos fatos relativos ao abuso de poder político (itens 2.2.1, I, II,
III, IV e 2.2.2, I), captação ilícita de sufrágio (item 2.3), abuso de poder
econômico (itens 2.4, I, II e III) e fraude (item 2.5, I).
Salvador, 24 de agosto de 2011.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
399
ATOS DA PROCURADORIA
RECOMENDAÇÃO N. 03, DE 19 DE OUTUBRO DE 2011
O Procurador Regional Eleitoral no Estado da Bahia signatário,
no cumprimento de suas atribuições constitucionais e legais, notadamente
as previstas nos artigos 127 e 129, da Constituição da República; artigos 6º,
XX, 72 e 77, caput, da Lei Complementar n. 75/93; artigos 24, VIII, c.c. artigo
27, § 3°, do Código Eleitoral, resolve expedir a presente RECOMENDAÇÃO
nos seguintes termos:
CONSIDERANDO o inteiro teor do Ofício 98/2011/PFDC/MPF-GPC,
encaminhado a todos os Procuradores Regionais Eleitorais pela Procuradora
Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), no sentido de que “seja observada
a necessidade de serem removidas barreiras arquitetônicas e urbanísticas
para o acesso das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida em locais
de votação e às urnas eleitorais [...]”, tendo em vista as várias dificuldades
enfrentadas por esse coletivo no acesso às urnas eletrônicas nas eleições
gerais de 2010;
CONSIDERANDO que a Convenção da ONU sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, entrou em vigor em 3 de maio de 2008, foi posteriormente aprovada pelo Senado Federal (Decreto Legislativo n. 186/2008)
e promulgada pela Presidência da República (Decreto n. 6.949/2009);
CONSIDERANDO que referida Convenção objetiva assegurar que
as pessoas com deficiência possam participar efetiva e plenamente na vida
política e pública, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas,
diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos, incluindo o
direito e a oportunidade de votarem e serem votadas, mediante a garantia de
que os procedimentos, instalações e materiais e equipamentos para votação
serão apropria¬dos, acessíveis e de fácil compreensão e uso (art. 29, a1);
CONSIDERANDO ser atribuição do Ministério Público ações destinadas à proteção de interesses difusos e/ou coletivos das pessoas com
deficiência, nos termos da Lei Complementar n. 75/93 e da Lei n. 7.853/89,
e que os fatos sob apreciação indicam a necessidade de efetiva garantia e
respeito aos direitos assegurados às pessoas com deficiência na sua participação na vida política;
A Procuradoria Regional Eleitoral resolve RECOMENDAR aos
Senhores(as) Promotores(as) Eleitorais que:
I) promovam as necessárias diligências de forma a garantir o direito
à acessibilidade das pessoas com deficiência no pleito das eleições municipais
de 2012, sobretudo no tocante à necessidade de serem removidas barreiras
arquitetônicas e urbanísticas para o acesso das pessoas com deficiência ou
mobilidade reduzida em locais de votação e às urnas eleitorais;
400
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
II) fiscalizem o inteiro cumprimento da Resolução TSE n. 21008/2002,
que dispõe sobre o direito de voto das pessoas com deficiência e dá outras
providências;
III) tomem por termo eventuais representações/reclamações/
notícias quanto ao descumprimento das normas contidas em referida Resolução, bem como no que concerne às dificuldades de acesso aos locais
de votação e urnas eletrônicas pelas pessoas com deficiência; adotando-se
as providências que entender necessárias, com cópia para a Procuradoria
Regional Eleitoral;
Comunique-se ao Ilustre Coordenador do Núcleo de Apoio às
Promotorias de Justiça Eleitorais do Estado da Bahia (NUEL) para que encaminhe cópia da presente e do despacho de instauração do Procedimento
Administrativo correlato (incluso), por meio eletrônico e por ofício circular,
aos Excelentíssimos Promotores Eleitorais do Estado da Bahia, para cumprimento.
Dê-se ampla divulgação a presente, inclusive nos meios de imprensa, procedendo-se a imediata comunicação às autoridades e órgãos
referenciados no despacho anexo, com publicação, ainda, no Diário de
Justiça Eletrônico (DJE).
Salvador, 21 de outubro de 2011.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
401
ATOS DA PROCURADORIA
Recurso Eleitoral
Processo n. 19-46.2011.6.05.0000
Classe 30
Recorrente:
Ministério Público Eleitoral
Recorrido:
Mario de Mello Kertész
Relator:
Juiz Cássio Miranda
PRONUNCIAMENTO
Eminente Relator,
Egrégio Tribunal:
Trata-se de recurso interposto em face da sentença que julgou
improcedente o pedido formulado em Representação manejada por prática
de propaganda eleitoral extemporânea.
Contrarrazões às fls. 95/103.
Passa-se à fundamentação.
I - O PRÉ-CANDIDATO MÁRIO KERTESZ
Antes de enfrentar a questão de fundo posta nos presentes autos,
importa advertir acerca da flagrante condição ostentada pelo recorrido, no
tocante à sua pré-candidatura nas próximas eleições municipais.
O estratagema insere-se na crescente especialização alcançada
pelas assessorias publicitárias, no sentido de antecipar a imagem e as
qualidades de homem público de determinado candidato, sem que tal ação
desperte a reprimenda da Justiça Eleitoral.
Uma das condutas que integram essa estratégia é a vã tentativa
de alegar-se falta de pretensão política em sustentar o lançamento de certa
candidatura, ao revés da realidade dos fatos.
Essa é justamente a postura adotada pelo recorrido, malgrado todas
as evidências sinalizem em sentido contrário, isto é, trata-se de pré-candidato
à Prefeitura de Salvador no próximo prélio!
A reportagem do Jornal A TARDE, do dia 27/9/2011, traz na coluna
POLÍTICA os seguintes dizeres em relação à filiação partidária do recorrido
aos quadros do PMDB:
Estamos apenas no tornei início desse campeonato. Não convém utilizar todos os atletas da equipe agora. Eles precisam ser
poupados para os jogos principais. [...] Posso ser o treinador, o
armador ou o atacante. Ou seja: posso ser candidato a prefeito,
a vice ou até a vereador.(grifou-se).
402
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
Em outras palavras, o próprio admite, por escrito e publicamente,
a toda população, que sairá candidato nas próximas eleições municipais em
Salvador!!!
Não bastasse, tais afirmações, por reiteradas vezes, tem sido reforçada nos meios de comunicação – alguns de propriedade do recorrido,
o que só faz aumentar a gravidade da conduta perpetrada -, inclusive,
por meio de outras personalidades, que declinam apoio à sua candidatura,
a exemplo do líder político Geddel Vieira Lima (PMDB).
Nesse sentido, cumpre destacar o seguinte trecho de matéria veiculada por meio da internet, reproduzida em diversos sites de noticia, litteris:
[...] Geddel Vieira Lima informou ao Bahia Notícias que não há
a menor possibilidade de qualquer desacordo envolvendo os
apresentadores Raimundo Varela e Mário Kertész em relação
à sucessão municipal. Geddel assegura que o candidato do
seu partido, que tem diretriz firme, é Kertész1 [...].(grifouse).
O recorrido, no dia 26/9/2011, em publicidade realizada em seu blog
- na qual fez acompanhar, com destaque, duas fotos de seu perfil -, reiterou
aludida afirmação, nos seguintes termos:
ASSINEI HOJE OS PAPÉIS PARA A FILIAÇÃO AO PMDB.
Como já disse não significa que eu seja candidato a prefeito.
A filiação quer dizer, apenas, que eu não quero ficar assistindo
as eleições da arquibancada. Eu quero ir para o campo. Lá
eu posso atuar como treinador, ficar olhando e dando alguns
palpites. Posso ser o atacante, sendo candidato a prefeito.
Posso ser o meio atacante, sendo candidato a vice-prefeito.
E posso ser candidato também a vereador e ajudar a fazer
uma bancada boa para ajudar essa cidade2. (grifou-se).
Observe-se, outrossim, que, para coroar a sua afirmativa no sentido da mais que provável candidatura nas eleições municipais em Salvador,
o recorrido lança a mensagem subliminar para destacar sua capacidade e
pretensão de “ajudar essa cidade”.
Como se vê na opinião do recorrido, o certame democrático deve
ser comparado a um torneio futebolístico, em cujo âmbito já se iniciaram os
jogos preliminares, dos quais pretende sagrar-se vencedor, especialmente
com a antecipação e fortalecimento de sua imagem no inconsciente coletivo
do eleitorado, tudo sob os olhos da Justiça Eleitoral.
1
Disponível em: <http://www.bahianoticias.com.br/principal/samuel-celestino/2377-kertesz-e-o-unico-nome-do-pmdb-a-prefeito-de-salvador.html>. Acesso em: 5 nov. 2011.
2
Disponível em: <http://www.blogmk.com.br/index.php?pagina=29>. Acesso em: 5 nov. 2011.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
403
ATOS DA PROCURADORIA
Diante do conjunto de atuações nos meios de comunicação, do qual
foram colhidos alguns exemplos de manifestações alusivas à sua candidatura
à chefia do Executivo em Salvador, não se pode compactuar com o argumento
de que o recorrido não seria pré-candidato declarado que, ao que parece,
sequer enfrentará adversários nas prévias convencionais.
Aduza-se que, ainda que o recorrido não tenha sua candidatura
confirmada para as eleições 2011 – situação que, como já se observou,
apenas seria admissível por obra do acaso -, tal circunstância não alteraria,
em absoluto, o seu dever de observar a legislação de regência; pelo que
deveria abster-se de veicular propaganda que, no conjunto, lançam ao eleitorado o seu nome, imagem, referência aos cargos que pode concorrer,
pretensões de atuação política, além do apelo subliminar pelo apoio do
eleitorado.
Veja-se, a propósito, a jurisprudência firmada no âmbito dos Tribunais Eleitorais, inclusive dessa Corte:
Agravo regimental. Agravo de instrumento. Representação. Art.
36, § 3º, da Lei nº 9.504/97. Propaganda eleitoral antecipada.
Recurso especial. Fatos e provas. Exame. Impossibilidade.
Fundamentos não ilididos.
1. A caracterização da propaganda eleitoral extemporânea
independe da escolha dos candidatos em convenção
partidária.
2. Configura-se a propaganda eleitoral antecipada quando o
candidato antes do período permitido procurar levar ao conhecimento do eleitor, mesmo de forma dissimulada, programa de
governo que pretende desenvolver. (TSE. Ag. em Ag. n. 7652,
DJ de 18/12/2006). (grifou-se);
Representação. Propaganda extemporânea. Configuração. Art.
36 e § 3º da Lei 9504/97. Preliminar de ilegitimidade passiva.
Rejeita-se esta preliminar, tendo em vista o entendimento
pacífico do TSE no sentido da desnecessidade de formalização da candidatura como condição para legitimação
passiva em propaganda extemporânea. (TRE-BA. REP. N.
1481, Acórdão n. 421, de 12/62006). (grifou-se).
REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. AFASTAMENTO DA INÉPCIA DA INICIAL. USO
DE "OUTDOOR" COM NÍTIDO CARÁTER POLÍTICO PROMOCIONAL. DESCARACTERIZAÇÃO DE ATO DE MERA
PROMOÇÃO PESSOAL.
1. Afastada a inépcia da inicial quando a mesma individualiza
os fatos reputados como propaganda política antecipada,
ensejando o exercício dos direitos de ampla defesa e do con-
404
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
traditório. Desnecessária a formalização de candidaturas
políticas para a caracterização da propaganda política
antecipada.
2. O uso de "outdoor" com nítido caráter político promocional viola o disposto na Resolução n. 23.089/2009, do
TSE, de 1º de julho de 2009, caracterizando propaganda
política antecipada.
3. Aplicação da multa prevista no art. 36, § 3º, da Lei n.
9.504/97.
4. Improvimento do Recurso. (TRE-CE. Rep. N. 137953, DJE
de 16/6/2010). (grifou-se).
II – DA PRODUÇÃO PUBLICITÁRIA NA PROPAGANDA ANTECIPADA
Antes de enfrentar a questão posta nos presentes autos, importa
advertir sobre a necessária evolução da Justiça Eleitoral em relação à compreensão acerca da crescente especialização que, atualmente, marca a
produção publicitária no cenário político-eleitoral lato sensu.
Com efeito, os itens de conexão entre as diversas espécies de
propaganda (institucional, partidária, eleitoral, pessoal, etc.), bem como a
formação de corpos técnicos cada vez mais hábeis na arte publicitária, notadamente no âmbito eleitoral, terminam por estabelecer uma linha bastante
tênue entre a propaganda autorizada e a propaganda eleitoral irregular ou
extemporânea.
Nesse cenário, sobreleva a proliferação de mensagens que, em
período proscrito, malgrado cada vez menos desprovidas de elementos
que possibilitem a caracterização de sua ilicitude, logram alcançar o inconsciente do eleitor, antecipando estado mental favorável ao candidato
beneficiado, em flagrante banalização do processo democrático!
Essa prática, a toda evidência, provoca desmedido prejuízo ao
equilíbrio do pleito, revelando-se absolutamente reprovável sob todos os
aspectos, ainda mais quando perpetrada por pretenso candidato com forte
penetração popular, alcançada por meio da utilização dos meios de comunicação, que, de mais a mais, possuem aptidão para servir dissimuladamente
para práticas ilícitas.
A seu turno, a legislação eleitoral exsurge inapta para coibir diversas
dessas condutas, porquanto não acompanha o passo da “criatividade eleitoreira” e termina por deixar de oferecer dispositivos legais que permitam a
subsunção dos fatos e a conseqüente extração de normas idôneas a ensejar
a aplicação das pertinentes sanções.
Tais circunstâncias agregam significativa complexidade ao exame
dos casos submetidos à apreciação da Justiça Eleitoral, tornando cada vez
mais árdua a tarefa de apartar a propaganda lícita daquela proscrita, de modo
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
405
ATOS DA PROCURADORIA
a conciliar a garantia da liberdade de manifestação, a proteção da vontade
soberana do eleitor e a paridade de armas no campo da disputa eleitoral.
Há que se destacar, outrossim, que a perseguida paridade de armas que a legislação eleitoral visa garantir constitui objetivo que se revela
cada vez menos alcançável, já que, em todos os pleitos, os candidatos que
possuem o domínio sobre meios de comunicação, sejam televisivos, escritos
ou radiofônicos, terminam por agitar instrumentos para, de forma ilegítima,
abalar o equilíbrio da disputa em seu benefício.
III - DO EQUIVOCO DA SENTENÇA ZONAL
Cumpre inaugurar o presente tópico com a jurisprudência firmada
no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que a utilização de
outdoors, por si só, já caracteriza propaganda ostensiva, verbis:
RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2006. PROPAGANDA
ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. INSTALAÇÃO DE OUTDOORS. NOME. FOTOGRAFIA. DEPUTADO FEDERAL - MENSAGEM SUBLIMINAR - PROCEDÊNCIA.
[...]
2. O uso de outdoor, por si só, já caracteriza propaganda
ostensiva, pois exposta em local público de intenso fluxo e
com forte e imediato apelo visual. Constitui mecanismo de
propaganda de importante aproximação do pré-candidato
ao eleitor.
3. No período pré-eleitoral, a veiculação de propaganda
guarda, no mínimo, forte propósito de o parlamentar ter
seu nome lembrado. Afasta-se, assim, a tese de mera promoção pessoal. (TSE. RESPE. n. 26262, DJ de 1/6/2007).
(grifou-se).
A decisão vergastada encontra-se em absoluta colisão com essa
compreensão do Pretório Superior Eleitoral.
Com efeito, o detido exame da ratio decidendi e até mesmo do obter
dictum da decisão vergastada revela o equívoco do Juízo zonal, no tocante
às questões ora guerreadas.
Não logrou atentar a ilustre Magistrada sentenciante, que o recorrido se utiliza de avançado escamoteio na técnica publicitária para, de
forma destemida e até mesmo inteligente – ainda que inteligência utilizada
em prejuízo da sociedade e do Estado, gize-se –, para transitar, com liberdade e desembaraço, o seu verdadeiro intuito eleitoreiro, direcionado
a capitalizar antecipadamente o apoio do povo soteropolitano, TUDO
sob as vistas do poderes instituídos.
E ao lograr manter incólume o seu intento, deve regozijar-se da
eficiência do seu engenho publicitário, sobretudo pelo sucesso na veiculação
406
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
da propaganda eleitoral antecipada, sem que a Justiça Eleitoral perceba o
seu fim ilícito, pasmem, financiada pelo Poder Público Federal.
É o que noticia a revista Veja, antepenúltima edição, na coluna
Holofote, quando revelou a todo Brasil, que é a Petrobras que vem bancando
a ilegalidade perpetrada pelo recorrido, consubstanciada na veiculação de
propaganda eleitoral antecipada:
O radialista e ex-prefeito biônico Mário Kertész, do PMDB,
há muito sonha em voltar a ocupar a prefeitura de Salvador.
Pré-candidato declarado, Kertész aproveitou-se de um
patrocínio que recebe da Petrobras para pôr sua cara na
rua. Ele inundou a cidade com outdoors (como este abaixo) para divulgar as entrevista que realiza em um auditório. A
Procuradoria Regional Eleitoral viu no ato mais que vaidade
de Kertész – que, em vez de estampar o rosto dos entrevistados, exibe-se na propaganda. A gaiatice virou alvo de uma
investigação do Ministério Público”.(grifou-se).
Já não é só o Ministério Público Eleitoral quem acusa o recorrido
de um ilícito eleitoral: os próprios meios jornalísticos assim já procedem e
denunciam:
• trata-se de “pré-candidato declarado”;
• “aproveitou-se de um patrocínio” da Petrobras para “pôr a sua
cara na rua”;
• “inundou a cidade com outdoors.
É de se indagar, portanto:
1) Por que a imagem do apresentador, sabidamente pré-candidato as próximas eleições, ocupa espaço gigantesco, ao passo que
a imagem da pessoa do entrevistado é omitida?
2) Por que - como diligentemente averiguado pela Promotoria
zonal -, tais outdoors, financiados lamentavelmente com dinheiro público, também não estão sendo veiculados no interior do Estado, isto
é, restringem-se à cidade de Salvador?
4) E por que tais outdoors permanecem sob exibição pública,
semana após semana, em vários pontos estratégicos – a exemplo das
imediações do Aeroporto -, mesmo após consumada a “entrevista”
intensamente divulgada?
Em verdade, procura-se transmitir – de forma escamoteada e supostamente inocente – notícia sobre um programa de entrevistas que, em
verdade, é utilizado como mote de veiculação de outdoors, cujo preordenado
desiderato é a projeção da imagem do entrevistador, pretenso candidato, no
inconsciente coletivo do eleitor!!!
Implacável a imagem do recorrido estampada em inúmeros
outdoors espalhados pela cidade. De tão intensa e invasiva, penetra no
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
407
ATOS DA PROCURADORIA
inconsciente e lá permanece, sem que se consiga esquecer; até porque
não será permitido, já que a prática equivocadamente chancelada pela
sentença de primeiro grau, data maxima venia, tende a se desenvolver
até o limite do pleito.
E não se olvide, a estratégia propagandística extemporânea a
cargo do recorrido já se encontra em curso: por meio dos outdoors projeta
a sua imagem; por meio das entrevistas, projeta suas idéias e por meio dos
programas apresentados dispõe-se a ouvir os reclames da população, para
lançar críticas supostamente jornalísticas, mas com fundo eleitoreiro!
Ora, a estrutura coordenada e preordenada a desequilibrar o pleito
é nítida e completa, com a utilização de instrumentos comunicativos, de forma
desviada ao nefasto propósito de veicular mensagens que objetivam alcançar o inconsciente do eleitor, convencer-lhe acerca da melhor competência
do candidato beneficiado, conquistar-lhe a simpatia e, por fim, captar-lhe
antecipadamente o voto.
De efeito, não se pode mais – à moda dos pleitos anteriores - examinar a propaganda eleitoral antecipada de forma a isolar elementos, como
se a divulgação de idéias e opiniões, com o fim último de atrair a simpatia
do eleitorado e convencer-lhe a sufragar determinado candidato ou legenda,
pudesse ser encontrada em um só lugar.
Mas, se, por um lado, a propaganda foi antecipada, a reprimenda
chega tarde demais, considerando a denegação da liminar, o que impõe
a imediata correção de rumos por parte dessa Corte, que, de mais a mais,
instada a examinar matéria alusiva à propaganda subliminar, assim se posicionou:
Nega-se provimento a recurso, reconhecendo-se a existência
de propaganda eleitoral subliminar extemporânea, quando
o conteúdo da mensagem veiculada em busdoor evidencia o intuito de promoção da candidatura do recorrente,
implicando desequilíbrio entre os prováveis concorrentes
ao pleito que se avizinha. (TRE-BA, Acórdão 501/2008).
(grifou-se).
Entende-se configurada a prática de propaganda eleitoral
intempestiva mensagem subliminar felicitando a população
pela passagem de novo ano, com o intuito de promover a
provável candidatura do representado, razão pela qual julgase procedente a representação, mantendo-se a decisão liminar
que determinou a imediata retirada da publicidade, cominandolhe multa estatuída no art. 36, § 3º da Lei nº 9.504/97 (TRE-BA,
V-1456, ACÓRDÃO 199, 03/04/2006). (grifou-se).
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
Outro não é, advirta-se, o entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral, conforme se verifica dos seguintes arestos:
Propaganda eleitoral é aquele que leva ao conhecimento geral,
embora de forma dissimulada, a candidatura, mesmo apenas
postulada, e a ação política que se pretende desenvolver
ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o
mais apto ao exercício de função pública. (TSE-RESPE26202). (grifou-se).
A utilização da propaganda partidária para exclusiva promoção pessoal de filiado, com explícita conotação eleitoral,
em semestre anterior ao pleito, impõe a aplicação da pena de
multa pela ofensa ao art. 36 da Lei das Eleições. (...) (TSE:
RESPE-26428). (Grifou-se).
Entende-se configurada a prática de propaganda eleitoral
intempestiva a mensagem subliminar, por meio de busdoor
e de cartilha informativa dirigida à população em geral, com o
intuito de promover a provável candidatura do Representado, razão pela qual julga-se procedente a Representação,
mantendo a decisão liminar que determinou a imediata retirada
da publicidade, cominando-lhe multa estatuída no art. 36, § 3º
da Lei n. 9.504/97. (TSE: AG-7705, 17/10/2006). (Grifou-se).
A fim de verificar a existência de propaganda subliminar, com
propósito eleitoral, não deve ser observado tão-somente o texto
dessa propaganda, mas também outras circunstâncias, tais
como imagens, fotografias, meios, número e alcance da
divulgação. Hipótese em que as circunstâncias registradas
no acórdão recorrido trazem clara mensagem de ação política,
em que se destaca a aptidão do beneficiário da propaganda
para exercício de função pública. (TSE. 19.905 – 22.2.03).
(Grifou-se).
IV – DOS REITERADOS ABUSOS COMETIDOS PELO PRÉ-CANDIDATO
MÁRIO KERTESZ
A ausência de imediata providência da Justiça eleitoral – especialmente no tocante à negativa de concessão da medida liminar, pleiteada com
o objetivo de suspender a veiculação dos outdoors com propaganda eleitoral
antecipada, afixados pelo recorrido -, já produz resultados nefastos e oferecem
ao recorrido a sensação de impunidade e inércia do Poder Público.
A sua segurança em torno do sucesso do estratagema propagandístico idealizado por sua assessoria publicitária, que, para agravar, conta com
o abusivo suporte financeiro e econômico, é revelada a cada entrevista.
Dessa forma, aproveita para intensificar a sua campanha eleitoral,
com a utilização dos mais diversos meios de comunicação, em cujo âmbito
faz veicular mensagens subliminares, direcionadas ao eleitorado.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
409
ATOS DA PROCURADORIA
A última propaganda antecipada veiculada pelo recorrido (em
relação a qual já se encaminhou pertinente representação) chega às raias
do absoluto menoscabo pela Justiça Eleitoral, que produzirá impactos irreversíveis ao certame, sobretudo porque, não tardará muito, teremos outros
candidatos comportando-se de igual maneira:
Cuida-se de publicação no Jornal A TARDE, de 6/11/2011 – um dia
de domingo, não por coincidência o dia de maior circulação do periódico – a
ocupar a parte central de duas páginas do periódico, que contém imensa foto
do recorrido e mensagem com suposta pretensão de divulgar a “liderança”
de seu programa, com os seguintes dizeres: MÁRIO KERTÉSZ. Líder de
audiência no segmento notícias, segundo o IBOPE”. (grifos no original).
A penúltima – também objeto de representação do Ministério Público
Eleitoral – foi divulgada, em data recente, no BLOG MK do recorrido, cujo link
se encontra hospedado no site oficial da Rádio Metrópole, em que há pedido
explícito de votos à juventude baiana, litteris:
[...] Estamos nos mobilizando para criar, em breve um projeto
do Instituto Metrópole. Vamos unir colaboradores para criarmos
um projeto para Salvador. Precisamos de idéias que contribuam
para o enfrentamento dos principais problemas que Salvador
vive hoje, com criação de pontes para o futuro. É importante
criar propostas para a cidade, mas não de oposição aos governos estadual e federal, mas sim propostas decentes para
a cidade. E pretendo contar com o apoio da juventude, ter
sangue novo e com muita energia e força de vontade3 .
O conjunto de práticas reveladas, integram um verdadeiro quebracabeças, que preenchem preclaro objetivo de estabelecer, no inconsciente
coletivo do eleitorado, conexão entre a pessoa do entrevistador, ora recorrido,
e o desejo de desvelar suas qualidades de homem público, o que coloca a
produção propagandística sub examine como absolutamente localizada no
campo do proibido, em especial porque o propósito externado por óbvio não
se cinge à divulgação de programas de entrevista, mas a de plantar no eleitor
o benefício social que, por suposto, irá se produzir em favor do recorrido, o que
impõe o reconhecimento de que a prática noticiada caracteriza propaganda
que exorbita, as escâncaras, os limites fixados pela legislação de regência.
Ante o exposto, manifesta-se a Procuradoria Regional Eleitoral pelo
provimento, in totum, do Recurso, determinando-se, inclusive, a retirada da
propaganda, acaso continue a ser veiculada, e que, também, o recorrido se
abstenha em continuar a promover a sua divulgação.
Salvador, 7 de novembro de 2011.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
3
Disponível em: <http://www.blogmk.com.br>. Acesso em: 25 out. 2011. Acessível também no site oficial
da Rádio Metrópole: <http://www.radiometropole.com.br>
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
Recurso Eleitoral
Processo n. 48-90.2008.6.05.0143
Classe 30
Procedência:
Ipecaetá-BA (143ª Zona Eleitoral - Santo Estevão)
Recorrentes:
Ailton Souza Silva e outro
Recorrido:
Elcior Piaggio de Oliveira
Relator(a):
Juiz Josevando Souza Andrade
PRONUNCIAMENTO
Eminente Relator,
Egrégio Tribunal:
Trata-se de recurso interposto contra a sentença proferida pelo Juízo zonal, que julgou parcialmente procedentes os pedidos vertidos na Ação
de Investigação Judicial Eleitoral n. 1.288/2008, manejada com supedâneo
na prática de captação ilícita de sufrágio, conduta vedada e abuso de poder
econômico e de autoridade.
Em suas razões (fls. 722/766), suscitam, preliminarmente: “ônus da
defesa – demonstração de fato negativo – prova diabólica” e cerceamento
de defesa. No mérito, pleiteia a reforma da decisão.
Contrarrazões às fls. 776/785.
É o relatório.
Passa-se à fundamentação.
I) DAS PRELIMINARES
I.1) Da “demonstração de fato negativo”
Malgrado deduzida como preliminar, a arguição vertida sob o rótulo
“ônus da defesa – demonstração de fato negativo – prova diabólica“ orienta-se
a discutir a insubsistência dos elementos de prova coligidos pelo investigante;
matéria que impõe incursão na questão de fundo, em cujo âmbito deve ser
enfrentada.
I.2) Do cerceamento de defesa
Os recorrentes pretendem lastrear essa prefacial em duplo fundamento: I) negativa de apresentação da Ata de Convenção do Partido Social
Cristão; II) indeferimento de pleito de oitiva de testemunhas.
O levante não merece prosperar.
De logo, importa destacar que o eventual reconhecimento do
cerceamento de defesa deve ensejar a nulidade de atos subseqüentes ao
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ATOS DA PROCURADORIA
vício; providência que tem por pré-requisito a identificação de circunstâncias
prejudiciais à parte, nos termos do que estabelece o artigo 249, § 1º, do
Estatuto Processual Civil, verbis: “O ato não se repetirá nem se lhe suprirá
a falta quando não prejudicar a parte”.
Advirta-se que mesmo quando em jogo bens jurídicos de maior
estatura do que aqueles discutidos no presente feito, o princípio de que não
há nulidade sem prejuízo prevalece na jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Veja-se, a propósito, o seguinte aresto:
HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. TRÁFICO ILÍCITO
DE ENTORPECENTES. PROCEDIMENTO. LEI 10.409/2002.
NULIDADE. PREJUÍZO. 1. A demonstração de prejuízo, a
teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade,
seja ela relativa ou absoluta, eis que, conforme já decidiu
a Corte, "o âmbito normativo do dogma fundamental da
disciplina das nulidades - pas de nullité sans grief - compreende as nulidades absolutas" (HC 81.510, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, unânime, DJ de 12.4.2002). 2.
Ordem indeferida. (STF. HC-85155, de 22/03/2005).
Nessa perspectiva é que não se vislumbra na espécie qualquer
prejuízo para os recorrentes.
Com efeito, em relação ao primeiro fundamento, observa-se que
às fls. 529/530 consta cópia da “ATA DA CONVENÇÃO PARA A ESCOLHA
DOS CANDIDATOS A PREFEITO, VICE-PREFEITO E VERADORES DE
IPECAETÁ (BA) PARA AS ELEIÇÕES 2008”. Colhe-se de seu conteúdo que
se refere à “Convenção Municipal do PSC”.
Dessa forma, a alegação de ausência de referido documento é
infundada.
Some-se a isso o fato dos investigados não terem se insurgido a
contra a decisão que julgou improcedente a contradita manejada em face de
João Elcior Santos, pelo que preclusa a matéria. Ademais, os argumentos
expendidos na peça recursal não logram demonstrar com segurança sob
que ângulo o teor da ata reclamada poderia infirmar o depoimento de aludida
testemunha, de modo a comprometer a sua força probante.
No tocante ao indeferimento do pleito de oitiva de Esmeraldo
Rodrigues Machado, de igual sorte, inexiste comprometimento do direito
de defesa, já que se trata, no caso, de formação do livre convencimento
motivado do julgador, sobre o qual pesa o mister de conduzir o processo e
deliberar acerca das provas a serem realizadas; tudo com vistas a produzir a
prestação jurisdicional, nos exatos termos do artigo 130, inciso I, do Código
de Processo Civil – de aplicação subsidiária na espécie -, verbis: “Caberá
ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas ne-
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ATOS DA PROCURADORIA
cessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis
ou meramente protelatórias” (grifou-se).
Não bastasse, colhe-se do conteúdo da decisão proferida na assentada do dia 26 de agosto de 2009 (fl. 208), que o Juiz zonal expressamente
autorizou “o acionado a trazer todas as provas do inquérito policial para a
formação da convicção deste Juízo”, providência que permitiu o exercício da
ampla defesa pelos recorrentes.
Pelo afastamento da preliminar.
II) DO MÉRITO
A pretensão recursal não enseja acolhimento.
Verifica-se, no caso, que conquanto a Investigação tenha sido manejada com supedâneo em diversas condutas, a condenação se cingiu às
práticas de captação ilícita de sufrágio, cuja potencialidade lesiva, advirta-se,
ensejou abuso de poder econômico.
Destaca-se, desde logo, a previsão contida no artigos 41-A, da Lei
9.504/1997, e 22, de Lei Complementar n. 64/90:
Lei n. 9.504/97 - art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e
seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta
Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao
eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem
pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função
pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição,
inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento
previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio
de 1990. (grifou-se).
LC n. 64/90 - art. 22. Qualquer partido político, coligação,
candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à
Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional,
relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias
e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder
de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de
comunicação social, em benefício de candidato ou de partido
político, obedecido o seguinte rito [...]. (grifou-se).
Observa-se, in casu, que o acervo probatório se apresenta suficientemente robusto e apto a possibilitar o enquadramento dos fatos em tais
hipóteses normativas, de modo a autorizar a aplicação das correspondentes
penalidades.
Nessa perspectiva é que o decisum hostilizado se mostra irretocável, mormente porque o Magistrado zonal empreendeu leitura precisa das
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
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ATOS DA PROCURADORIA
provas coligidas, bem como das circunstâncias em que se desenvolveram
as condutas perpetradas pelos recorrentes, o que confere suficiente higidez
à fundamentação e ao comando sentencial.
Com efeito, os autos demonstram que o primeiro recorrente desenvolveu verdadeira estratégia de captação ilícita de votos, para o que se
utilizou de diversos meios de cooptação de eleitores, tais como o oferecimento
de vantagens, o pagamento em dinheiro e cheques, bem como a entrega de
vale combustível.
A seu turno, os argumentos expendidos pela defesa apresentamse como construções preordenadas a escamotear a verdade dos fatos, em
nítida tentativa de deslocar os atos ilícitos perpetrados pelos investigados
para o campo do permitido, desiderato que, a toda evidência, encontra-se
fadado ao insucesso, conforme já reconhecido, de forma consistente, pelo
Juízo zonal.
Verifique-se a seguir o exame individualizado dos fatos.
II.1) Captação Ilícita de Sufrágio – compra de voto em troca de R$ 200,00
e um vale combustível.
Na primeira das condutas ilícitas caracterizada nos autos, observase que o primeiro representado investiu contra a liberdade de escolha do
eleitor João Elcior Costa Santos, a quem entregou um vale combustível e o
valor de R$ 200,00, com a finalidade de obter-lhe o voto nas eleições municipais que então se acercavam.
Na declaração de fl. 40, referido eleitor afirmou que:
No dia 04 de outubro do ano corrente as 11:00 do dia, eu ia em
direção a casa de Valdemar na Fazenda Quebradas IpecaetaBa próximo a venda de Arlindo Surdo, quando Ailton Souza
Silva prefeito de Ipecaetá estava passando e me parou
ma estrada, me deu R$ 200,00 (DUZENTOS REAIS) em
dinheiro e mais um vale de gasolina no valor de R$ 5,00
(CINCO REAIS) e me pediu para que eu votasse nele para
prefeito. (grifou-se).
À fl. 42 consta cópia de um vale combustível, datado, gize-se, de
04 de outubro de 2008, no valor de R$ 5,00 (cinco reais).
Ouvido em juízo (fls. 218/220), João Elcior confirmou a declaração
por ele subscrita e aduziu que:
O Acionado Ailton entregou ao depoente a importância de
duzentos reais, em espécie, e mais um vale combustível no
valor de cinco reais, para que o depoente votasse no referido
candidato;[...] que já ouviu falar que o prefeito ameaçava demitir
os funcionários que não votassem nele; [...]
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ATOS DA PROCURADORIA
Por sua vez, no curso da AIJE n. 1.457/2008, foram tomadas as
declarações de Edmilson dos Santos Bastos (cópia às fls. 488/495), que
afirmou:
[...] que João Luiz Santo vendeu ao declarante um vale combustível no valor de quatro reais; que o vale valia cinco reais
e o declarante pagou quatro reais; que não se recorda a data
exata, mas foi próximo à eleição; que não leu bem o vale; que
o vale era de R$ 5,00, e o declarante pagou R$ 4,00; que foi
no Posto, que o declarante não se recorda do nome, mas que
fica ao lado oposto do Posto Caburé, logo na entrada de Ipecaetá; que o vale tinha uma assinatura, mas o declarante não
prestou atenção de quem era; que com certeza era o vale cuja
cópia se encontra à fl. 19 dos autos. [...] que vende gasolina;
que muitas pessoas no município estavam com vales e que
iam à sua venda comprar gasolina com o vale; [...] que tem o
conhecimento que Ailton comprou o voto de pessoas no período
do pleito eleitoral; que comprou o de Dona Maria da Glória,
que mora na Faz. Canastra, por cem reais; [...];
Embora não integre o objeto da presente demanda, importa destacar outra passagem desse depoimento, com objetivo de reforçar a tese de
que os investigados empreenderam verdadeira caça aos votos dos eleitores
de Ipecaetá:
[...] que o senhor Ailton foi à casa do declarante perguntou
para quem o declarante ia votar, que respondeu que não sabia
em quem ia votar; que Ailton pediu voto para ele e o declarante
disse que ainda não tinha decidido sobre seu voto; que na
mesma hora Ailton lhe propôs o seu voto em troca de cinco mil
reais; que o declarante pensou e em seguida aceitou os cinco
mil reais que o senhor Ailton pagou em cheque [...]
Diante desses fatos, a alegação da defesa de que a testemunha
João Elcior possuiria vínculo de parentesco com o candidato a vereador
Raimundo, opositor político dos investigados, não possui qualquer aptidão
para descaracterizar a força probante das declarações, mormente porque
tomadas sob compromisso.
Nesse cenário é que revelam-se irretocáveis as conclusões do
Magistrado sentenciante no sentido de que:
O depoimento da testemunha João Elcior e as demais provas
constantes dos autos, dentam que o representado promoveu a
captação ilícita de sufrágio e a distribuição de vale combustível
em troca de voto do referido cidadão, incidindo em conduta
vedada por lei [...]
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ATOS DA PROCURADORIA
II.2) Captação Ilícita de Sufrágio – tentativa de compra de votos e prática
de demissões por perseguição política.
Na segunda investida eleitoreira demonstrada nos autos, o primeiro
representado ofereceu o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a Aureliano Dias de
Oliveira, com a finalidade de captar-lhe o voto, bem como dos seus familiares.
Como a oferta foi rejeitada, desencadeou-se a ira do primeiro
representado, que, de forma deliberada e despropositada, providenciou o
cancelamento dos contratos de prestação de serviço de Djalma Silva Passos
e Antonio Bastos de Sena, genros de Aureliano Dias de Oliveira, respectivamente firmados com a Administração Pública municipal em 01/01/1997 e
01/05/1999 (fls. 322 e 323).
As portarias n. 012/2008 e 013/2008 (fls. 141 e 143), instrumento
do desligamento, foram subscritas pelo primeiro representado, então Chefe
do Executivo Municipal, em 14 de maio de 2008, mesma data da rescisão
dos respectivos contratos, conforme se verifica dos termos de fls. 142 e 144,
com data retroativa de 14 de maio de 2007, que leva à falsa conclusão de
que houve antecedência na ação municipal.
Em verdade, o cenário descerrado no particular amoldada-se de
maneira perfeita àquelas costumeiras ações implementadas por ocupantes
de cargos eletivos, em especial do Executivo, candidatos à reeleição, que
utilizam-se do poder para “convencer” servidores, notadamente aqueles que
não gozam de estabilidade, a alinharem-se em favor de sua campanha.
O desiderato, no caso, chega a ser acintoso, mormente pelo motivo
invocado pelo primeiro representado, contido no art. 2º, das aludidas portarias,
para promover o cancelamento dos contratos, verbis: “[...] incompatibilidade
do serviço prestado com o serviço contratado”.
Ora, ambos os genros do eleitor alvo da cooptação eleitoreira
foram contratados para a função de motorista (fls. 322 e 323), mister que
exerceram por cerca de oito e dez anos, respectivamente; um deles laborava
à disposição da Delegacia de Polícia do Município e o outro atuava como
motorista de ambulância.
Indaga-se: de que maneira, sem que se tenha notícia de qualquer
prática inadequada, dois servidores que executavam, há cerca de uma
década, atividade tão simplória e delimitada como a de motorista, podem,
incontinente, atuar de forma a ensejar o seu desligamento da função pública
há menos de seis meses das Eleições?
A resposta a esse questionamento poderia até ser mais dificultosa
não fosse o conjunto das evidências coligidas nos presentes autos, a apontar,
de maneira induvidosa, para a real motivação que subjaz à rescisão contratual, qual seja: o malogro da tentativa do primeiro representado em captar
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Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
ilicitamento o voto do sogro dos servidores desligados, bem como dos próprios
servidores e de seus familiares.
Vejam-se, a propósito, os seguintes trechos dos depoimentos:
Aureliano Dias de Oliveira (fls. 216/217):
[...] que o candidato Ailton ofereceu pessoalmente a importância de dez mil reais para o depoente afim(sic) de
que este e a família votassem nele que concorreria para
a eleição de Ipecaetá; que o Ailton fez a oferta na casa do
depoente, inclusive ele esteve na caso do depoente em duas
oportunidades; que João Souza Moreira, presenciou uma das
vezes que o Ailton esteve na casa do depoente, oferecendo a
referida benesse; que o fato se deu próximo às eleições; que
o prefeito ofereceu isto para o depoente porque este estava
construindo a própria casa; que o depoente recusou na duas
oportunidades; que levou o fato ao MP desta Comarca, junto
à(sic) Promotora Joana; que havia um comentário forte na cidade que o candidato Ailton estava comprando voto na cidade;
que sabe que o Augusto também foi cooptado para votar no
Ailton para o qual o Ailton teria dado um cheque; que Augusto
mostrou o cheque para o depoente; que Augusto falou para o
depoente: “aqui o que Ailton me deu para eu e minha família
vota(sic) nele”, palavras de Augusto exibindo o cheque para
o depoente; [...] que dois genros do depoente de nomes
Antonio Bastos Sena e Djalma Silva Passos, chegaram a
ser despedidos como represálias por não terem garantido
a Ailton o voto que este exigiu deles; que os genros do
depoente tinham oito anos de emprego e foram demitidos.
(grifou-se).
Antônio Bastos de Sena (210/211):
[...] que era motorista da Prefeitura e estava lotado na delegacia
de Ipecaetá; que o Ailton chamou o depoente para que o
mesmo garantisse três votos para o referido alcaide, sob
pena de demissão; que tinha nove anos de emprego e foi
demitido porque não garantiu três votos para o candidato
Ailton; que Ailton procurou o depoente para saber como o
sogro do depoente, Aureliano, poderia fazer para votar nele;
que Aureliano, na época, estava construindo uma casa em
Ipecaetá, onde o candidato Ailton esteve, cerca de duas
vezes, oferecendo dez mil reais para que ele e família
votasse no referido prefeito; que Ailton ainda falou para Aureliano que ele estava construindo a casa e Aureliano estava
precisando de dinheiro para construir; que logo depois do fato,
Aureliano foi na casa do depoente e contou tudo; que a oferta
dos dez mil reais se deu nas duas vezes em que Aureliano foi
abordado pelo prefeito acionado; [...]que o Djalma também foi
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ATOS DA PROCURADORIA
demitido por perseguição política, por não ter garantido os
três votos para o Ailton; que o o Djalma tinha cerca de dez
anos de motorista, na condição de motorista de ambulância.
(grifou-se).
Inequívoca, portanto, também nesse ponto, a ocorrência da prática de captação ilícita de sufrágio praticada pelo primeiro investigado.
II.3) Captação Ilícita de Sufrágio – tentativa de compra de votos por
meio de cheque
Na terceira das condutas ilícitas que ensejaram a condenação dos
investigados, verifica-se a utilização de interposta pessoa - no particular, o
genro do primeiro recorrente -, para a entrega de um cheque no valor de R$
2.200,00 (dois mil e duzentos reais) a Augusto Alves dos Santos, com o fim
de que o eleitor interpelado e seus familiares sufragassem em seu favor.
Destaque-se, de logo, que findaram baldadas as tentativas da Defesa em utilizar as apurações levadas a efeito no Inquérito Policial n. 15/2008,
cuja cópia encontra-se encartada às fls. 272/298, para criar manobra tendente
a por em dúvida a origem de referida prova de pagamento (cheque) e, assim,
afastar a ilicitude da conduta praticada pelo primeiro representado.
É que as provas produzidas durante a investigação policial não
foram idôneas a possibilitar a formação da opinio delicti do Ministério Público,
no sentido da viabilidade da ação penal, conforme se colhe da promoção
de arquivamento, em que a promotoria zonal conclui pela “atipicidade da
conduta descrita”.
Assim, descortinado o desiderato sub-reptício dos investigados,
preordenado a forjar a suposta ocorrência de extorsão indireta, envolvendo
aludido cheque, restou fortalecida a tese apresentada pelos investigantes,
mormente porque corroborada por sérios elementos de prova, circunstâncias
que levaram o Juiz a quo a concluir (fls. 668/669):
O Sr. Vilmar negou perante a Autoridade Policial os fatos que
lhe foram imputados e as demais testemunhas ouvidas possuíam algum vínculo com o representado, com exceção da Sra.
Angelina Pereira Costa.
Esta, ouvida em juízo, apresentou depoimento contraditório e
inseguro. Insta destacar que a aludida senhora em dado momento da assentada informou que não compareceu à presença
do Delegado de Policia Civil de Ipecaetá para depor sobre a
suposta troca de cheque e, após ser inquirida pelo advogado
do requerido, alterou sua versão, afirmando que foi depor na
delegacia de polícia (certidão de fls. 257).
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ATOS DA PROCURADORIA
Outrossim, a referida senhora não soube informar em juizo o
valor da troca do cheque. Todavia, perante a autoridade policial
afirmou que o valor era próximo de dois mil reais. Assim, carece
de credibilidade o depoimento da referida testemunha.
Os exame médicos da testemunha apresentados pelos representados não ilidem tal fato pois, se a testemunha não possuía
condições psicológicas e físicas para depor, tal fato deveria ter
sido oportunamente argüido antes de sua oitiva.
Assim sendo, conclui-se que o inquérito policial não possui o
condão de comprovar a origem e finalidade do cheque acostado aos presentes autos, no valor de R$ 2.200,00 (dois mil e
duzentos reais), restando flagrante que trata-se de estratagema empregada pelo representado para refutar os fatos
articulados nos presentes autos. (grifou-se).
O estratagema é, de fato, notório, uma vez que restou inequívoca a
prática da compra de voto pelo primeiro investigado, corroborada, inclusive,
pelo depoimento da testemunha Jailson Cardono dos Santos, do qual se
extrai os seguintes excertos:
Que estava na casa de seu tio Augusto quando seu Darlan
esteve lá; que no dia do fato estava na casa de sua avó, Dona
Furtunata, e foi para a casa de seu tio Augusto; que foi sozinho;
que chegando lá seu tio estava sozinho em casa; que ficaram
batendo papo e logo depois chegou Ronivon, sozinho; que
conhece Ronivon;[...] que chegou uma pessoa chamando ele
na porta; que seu Augusto reconheceu a voz que era de Darlan;
que seu Augusto pediu ao depoente e Ronivon se tirasse porque ele tinha um assunto para tratar com ele; [...] que Darlan
saudou seu Augusto e disse: “Seu Augusto eu vim trazer
o cheque que seu Ailton mandou pra o combinado pra
você e sua família votar em Ailton”; que Darlan entregou
o cheque e foi embora [...]. (grifou-se).
Como se asseverou, as provas são robustas, sobretudo se considerada a natureza recôndita que marca o ambiente em que costumam se desenvolver as ações de captação ilícita de sufrágio, o que revela o destemor dos
representados, contumazes, como se observa, nas práticas eleiçoeiras.
A conduta dos investigados se alinha ao hábito reiterado de diversos
candidatos, sobretudo em locais onde se concentram pessoas à margem de
condições mínimas de existência digna, de utilizar a oferta de bens e serviços
como meio subalterno para lograr êxito na disputa eleitoral.
In casu, em especial quando examinado o conjunto das práticas
perpetradas pelos recorrentes, é forçoso reconhecer que além de sobejarem
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
419
ATOS DA PROCURADORIA
elementos caracterizadores de captação ilícita de sufrágio, a amplitude das
condutas reveladas na espécie possui absoluta potencialidade para conformar
a ocorrência de abuso de poder econômico e político.
Veja-se, a propósito, o posicionamento firmado no âmbito dos Tribunais Eleitorais, inclusive desse Regional, sobre a matéria:
Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Improcedência.
Transporte de eleitores. Prática de abuso de poder econômico.
Captação ilícita de sufrágio. Acervo probatório robusto.
Comprovação. Configuração da infração contida no art.
41-A da Lei das Eleições. Provimento da irresignação. Cassação de diploma. Declaração de inelegibilidade. Possível
falsidade ideológica. Necessidade de apuração. Remessa dos
autos à Polícia Federal.
[...]
Dá-se provimento a recurso, determinando a cassação do
diploma dos recorridos e aplicando-lhes a sanção de
inelegibilidade, quando resta devidamente configurada,
nos autos, a prática de captação ilícita de sufrágio e o
abuso de poder econômico por meio de oferecimento de
viagem em troca de voto. Determina-se, ainda, a remessa de
cópia dos autos à Polícia Federal para apuração de eventual
ocorrência de falsidade ideológica, nos termos do art. 299 do
Código Penal. (TRE-BA. RE n. 12402. DJE de 10/11/2009).
(grifou-se).
Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Cassação do
registro de prefeito e vice-prefeito. Chapa majoritária. Imputação de captação ilícita de sufrágio. Lei nº 9.504/1997, art.
41-A. Farto lastro material, reforçado pelo acervo testemunhal. Desnecessidade de exame acerca da potencialidade
lesiva no resultado do pleito. Entendimento jurisprudencial
consolidado pelo TSE. Condenação ao pagamento de multa
acima do mínimo legal. Minoração da penalidade pecuniária.
Inexistência de hipótese de inelegibilidade.
1. Consoante entendimento jurisprudencial do TSE, a gravação ambiental, realizada sem o conhecimento de um dos
interlocutores não acarreta a ilicitude da prova produzida com
a finalidade de demonstrar a captação ilícita de sufrágio.
2. O lastro material acostado aos autos, somado ao acervo
testemunhal produzido na instrução da causa, torna evidente
a prática de captação ilícita de sufrágio por parte dos recorrentes, impondo-se a cassação do registro da chapa majoritária,
independentemente da aferição acerca da potencialidade
lesiva no resultado do pleito, e a condenação ao pagamento
420
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-, 528 jan./dez. 2011.
ATOS DA PROCURADORIA
de multa, esta em valor menor do que cominado na sentença,
haja vista a não configuração de reincidência e de outras circunstâncias capazes de autorizar a majoração para o patamar
impugnado.
3. Não obstante a utilização do rito estabelecido no art. 22 da
LC nº 64/90, a decisão que aplica a sanção do art. 41-A da Lei
nº 9.504/97 não se submete ao inciso XV do referido dispositivo
por expressa disposição legal. (TRE-BA. RE n. 11871. DJP de
01/06/2009). (grifou-se).
Investigação judicial eleitoral. Captação ilícita de sufrágio.
1. Na análise do contexto fático-probatório, o Tribunal
Regional Eleitoral manteve a decisão de primeiro grau, considerado o liame existente entre os depoimentos colhidos,
corroborado pela prova documental dos autos, entendendo
comprovada a captação ilícita de sufrágio consistente na
confecção de documentos para fraudar ou facilitar a concessão
de benefícios de aposentadoria em troca de votos.
2. Para afastar a conclusão da Corte de origem, quanto à
caracterização do ilícito do art. 41-A da Lei das Eleições e
analisar se os depoimentos eram desprovidos da verdade real
e destituídos de valor probatório, seria necessário o reexame
de fatos e provas, vedado nesta instância especial, nos termos
da Súmula nº 279 do Supremo Tribunal Federal. (TSE. AgR-AI
n. 439489. DJE de 12/8/2011). (grifou-se).
Ante o exposto, manifesta-se a Procuradoria Regional Eleitoral pelo
desprovimento do recurso.
Salvador, 20 de janeiro de 2012.
SIDNEY PESSOA MADRUGA
Procurador Regional Eleitoral
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
421
LEIS E ATOS NORMATIVOS
424
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 68, DE 21 DE
D E Z E M B R O D E 2 0 11
Altera o art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos
termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte
Emenda ao texto constitucional:
Art. 1º O art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31
de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da União de
impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já
instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e
respectivos acréscimos legais.
§ 1° O disposto no caput não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, na forma do § 5º do art.
153, do inciso I do art. 157, dos incisos I e II do art. 158 e das alíneas a, b e
d do inciso I e do inciso II do art. 159 da Constituição Federal, nem a base
de cálculo das destinações a que se refere a alínea c do inciso I do art. 159
da Constituição Federal.
§ 2° Excetua-se da desvinculação de que trata o caput a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o § 5º do art.
212 da Constituição Federal.
§ 3° Para efeito do cálculo dos recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino de que trata o art. 212 da Constituição Federal, o
percentual referido no caput será nulo."(NR)
Art. 2° Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data da sua
publicação.
Brasília, 21 de dezembro de 2011.
Mesa da Câmara dos Deputados
Mesa do Senado Federal
Este texto não substitui o publicado no DOU 22.12.2011.
LEIS E ATOS NORMATIVOS
L E I N º 1 2 . 5 4 8 , D E 1 5 D E D E Z E M B R O D E 2 0 11
Altera o art. 37 da Lei nº 10.522, de 19 de julho de
2002, que dispõe sobre o Cadastro Informativo dos
créditos não quitados de órgãos e entidades federais
e dá outras providências.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O art. 37 da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 37. Os créditos do Banco Central do Brasil passíveis de
inscrição e cobrança como Dívida Ativa e não pagos nos prazos previstos
serão acrescidos de:
I – juros de mora, contados do primeiro dia do mês subsequente
ao do vencimento, equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de
Liquidação e de Custódia – SELIC para os títulos federais, acumulada mensalmente, até o último dia do mês anterior ao do pagamento, e de 1% (um
por cento) no mês do pagamento;
II – multa de mora de 2% (dois por cento), a partir do primeiro dia
após o vencimento do débito, acrescida, a cada 30 (trinta) dias, de igual
percentual, até o limite de 20% (vinte por cento), incidente sobre o valor
atualizado na forma do inciso I do caput deste artigo.
§ 1º Os juros de mora incidentes sobre os créditos provenientes
de multas impostas em processo administrativo punitivo que, em razão de
recurso, tenham sido confirmadas pela instância superior contam-se do primeiro dia do mês subsequente ao do vencimento, previsto na intimação da
decisão de primeira instância.
§ 2º Os créditos referidos no caput deste artigo poderão ser parcelados em até 30 (trinta) parcelas mensais, a exclusivo critério do Banco
Central do Brasil, na forma e condições por ele estabelecidas, incidindo sobre
cada parcela a pagar os juros de mora previstos neste artigo.” (NR)
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 15 de dezembro de 2011; 190º da Independência e 123º
da República.
DILMA ROUSSEFF
Guido Mantega
Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.12.2011
426
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
LEIS E ATOS NORMATIVOS
L E I N º 1 2 . 5 2 9 , D E 3 0 D E N O V E M B R O D E 2 0 11
Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações
contra a ordem econômica; altera a Lei nº 8.137, de 27
de dezembro de 1990, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de
outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e a Lei nº
7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei
nº 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei nº 9.781, de 19
de janeiro de 1999; e dá outras providências.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
CAPÍTULO I
DA FINALIDADE
Art. 1º Esta Lei estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC e dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra
a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade
de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos
consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.
Parágrafo único. A coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta Lei.
CAPÍTULO II
DA TERRITORIALIDADE
Art. 2º Aplica-se esta Lei, sem prejuízo de convenções e tratados
de que seja signatário o Brasil, às práticas cometidas no todo ou em parte no
território nacional ou que nele produzam ou possam produzir efeitos.
§ 1º Reputa-se domiciliada no território nacional a empresa estrangeira que opere ou tenha no Brasil filial, agência, sucursal, escritório,
estabelecimento, agente ou representante.
§ 2º A empresa estrangeira será notificada e intimada de todos os
atos processuais previstos nesta Lei, independentemente de procuração ou
de disposição contratual ou estatutária, na pessoa do agente ou representante
ou pessoa responsável por sua filial, agência, sucursal, estabelecimento ou
escritório instalado no Brasil.
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
427
LEIS E ATOS NORMATIVOS
TÍTULO II
DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA
CAPÍTULO I
DA COMPOSIÇÃO
Art. 3º O SBDC é formado pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica - CADE e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do
Ministério da Fazenda, com as atribuições previstas nesta Lei.
CAPÍTULO II
DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE
Art. 4º O Cade é entidade judicante com jurisdição em todo o território nacional, que se constitui em autarquia federal, vinculada ao Ministério
da Justiça, com sede e foro no Distrito Federal, e competências previstas
nesta Lei.
SEÇÃO I
Da Estrutura Organizacional do Cade
Art. 5º O Cade é constituído pelos seguintes órgãos:
I - Tribunal Administrativo de Defesa Econômica;
II - Superintendência-Geral; e
III - Departamento de Estudos Econômicos.
SEÇÃO II
Do Tribunal Administrativo de Defesa Econômica
Art. 6º O Tribunal Administrativo, órgão judicante, tem como membros um Presidente e seis Conselheiros escolhidos dentre cidadãos com
mais de 30 (trinta) anos de idade, de notório saber jurídico ou econômico e
reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovados pelo Senado Federal.
§ 1º O mandato do Presidente e dos Conselheiros é de 4 (quatro)
anos, não coincidentes, vedada a recondução.
§ 2º Os cargos de Presidente e de Conselheiro são de dedicação
exclusiva, não se admitindo qualquer acumulação, salvo as constitucionalmente permitidas.
§ 3º No caso de renúncia, morte, impedimento, falta ou perda de
mandato do Presidente do Tribunal, assumirá o Conselheiro mais antigo no
cargo ou o mais idoso, nessa ordem, até nova nomeação, sem prejuízo de
suas atribuições.
428
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 4º No caso de renúncia, morte ou perda de mandato de Conselheiro,
proceder-se-á a nova nomeação, para completar o mandato do substituído.
§ 5º Se, nas hipóteses previstas no § 4º deste artigo, ou no caso
de encerramento de mandato dos Conselheiros, a composição do Tribunal
ficar reduzida a número inferior ao estabelecido no § 1º do art. 9º desta Lei,
considerar-se-ão automaticamente suspensos os prazos previstos nesta Lei,
e suspensa a tramitação de processos, continuando-se a contagem imediatamente após a recomposição do quorum.
Art. 7º A perda de mandato do Presidente ou dos Conselheiros
do Cade só poderá ocorrer em virtude de decisão do Senado Federal, por
provocação do Presidente da República, ou em razão de condenação penal
irrecorrível por crime doloso, ou de processo disciplinar de conformidade com
o que prevê a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e a Lei nº 8.429, de
2 de junho de 1992, e por infringência de quaisquer das vedações previstas
no art. 8º desta Lei.
Parágrafo único. Também perderá o mandato, automaticamente,
o membro do Tribunal que faltar a 3 (três) reuniões ordinárias consecutivas,
ou 20 (vinte) intercaladas, ressalvados os afastamentos temporários autorizados pelo Plenário.
Art. 8º Ao Presidente e aos Conselheiros é vedado:
I - receber, a qualquer título, e sob qualquer pretexto, honorários,
percentagens ou custas;
II - exercer profissão liberal;
III - participar, na forma de controlador, diretor, administrador, gerente, preposto ou mandatário, de sociedade civil, comercial ou empresas
de qualquer espécie;
IV - emitir parecer sobre matéria de sua especialização, ainda que
em tese, ou funcionar como consultor de qualquer tipo de empresa;
V - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre
processo pendente de julgamento, ou juízo depreciativo sobre despachos,
votos ou sentenças de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, em
obras técnicas ou no exercício do magistério; e
VI - exercer atividade político-partidária.
§ 1º É vedado ao Presidente e aos Conselheiros, por um período de
120 (cento e vinte) dias, contado da data em que deixar o cargo, representar
qualquer pessoa, física ou jurídica, ou interesse perante o SBDC, ressalvada
a defesa de direito próprio.
§ 2º Durante o período mencionado no § 1º deste artigo, o
Presidente e os Conselheiros receberão a mesma remuneração do cargo
que ocupavam.
§ 3º Incorre na prática de advocacia administrativa, sujeitando-se à
pena prevista no art. 321 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
429
LEIS E ATOS NORMATIVOS
- Código Penal, o ex-presidente ou ex-conselheiro que violar o impedimento
previsto no § 1º deste artigo.
§ 4º É vedado, a qualquer tempo, ao Presidente e aos Conselheiros
utilizar informações privilegiadas obtidas em decorrência do cargo exercido.
SUBSEÇÃO I
Da Competência do Plenário do Tribunal
Art. 9º Compete ao Plenário do Tribunal, dentre outras atribuições
previstas nesta Lei:
I - zelar pela observância desta Lei e seu regulamento e do regimento interno;
II - decidir sobre a existência de infração à ordem econômica e
aplicar as penalidades previstas em lei;
III - decidir os processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica instaurados pela
Superintendência-Geral;
IV - ordenar providências que conduzam à cessação de infração à
ordem econômica, dentro do prazo que determinar;
V - aprovar os termos do compromisso de cessação de prática e
do acordo em controle de concentrações, bem como determinar à Superintendência-Geral que fiscalize seu cumprimento;
VI - apreciar, em grau de recurso, as medidas preventivas adotadas
pelo Conselheiro-Relator ou pela Superintendência-Geral;
VII - intimar os interessados de suas decisões;
VIII - requisitar dos órgãos e entidades da administração pública
federal e requerer às autoridades dos Estados, Municípios, do Distrito Federal
e dos Territórios as medidas necessárias ao cumprimento desta Lei;
IX - contratar a realização de exames, vistorias e estudos, aprovando, em cada caso, os respectivos honorários profissionais e demais despesas
de processo, que deverão ser pagas pela empresa, se vier a ser punida nos
termos desta Lei;
X - apreciar processos administrativos de atos de concentração
econômica, na forma desta Lei, fixando, quando entender conveniente e
oportuno, acordos em controle de atos de concentração;
XI - determinar à Superintendência-Geral que adote as medidas administrativas necessárias à execução e fiel cumprimento de suas decisões;
XII - requisitar serviços e pessoal de quaisquer órgãos e entidades
do Poder Público Federal;
XIII - requerer à Procuradoria Federal junto ao Cade a adoção de
providências administrativas e judiciais;
430
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
LEIS E ATOS NORMATIVOS
XIV - instruir o público sobre as formas de infração da ordem econômica;
XV - elaborar e aprovar regimento interno do Cade, dispondo sobre seu funcionamento, forma das deliberações, normas de procedimento e
organização de seus serviços internos;
XVI - propor a estrutura do quadro de pessoal do Cade, observado
o disposto no inciso II do caput do art. 37 da Constituição Federal;
XVII - elaborar proposta orçamentária nos termos desta Lei;
XVIII - requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades e entidades públicas ou privadas, respeitando e mantendo o sigilo
legal quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem
necessárias ao exercício das suas funções; e
XIX - decidir pelo cumprimento das decisões, compromissos e acordos.
§ 1º As decisões do Tribunal serão tomadas por maioria, com a
presença mínima de 4 (quatro) membros, sendo o quorum de deliberação
mínimo de 3 (três) membros.
§ 2º As decisões do Tribunal não comportam revisão no âmbito do
Poder Executivo, promovendo-se, de imediato, sua execução e comunicandose, em seguida, ao Ministério Público, para as demais medidas legais cabíveis
no âmbito de suas atribuições.
§ 3º As autoridades federais, os diretores de autarquia, fundação,
empresa pública e sociedade de economia mista federais e agências reguladoras são obrigados a prestar, sob pena de responsabilidade, toda a assistência e colaboração que lhes for solicitada pelo Cade, inclusive elaborando
pareceres técnicos sobre as matérias de sua competência.
§ 4º O Tribunal poderá responder consultas sobre condutas em
andamento, mediante pagamento de taxa e acompanhadas dos respectivos
documentos.
§ 5º O Cade definirá, em resolução, normas complementares sobre
o procedimento de consultas previsto no § 4º deste artigo.
SUBSEÇÃO II
Da Competência do Presidente do Tribunal
Art. 10. Compete ao Presidente do Tribunal:
I - representar legalmente o Cade no Brasil ou no exterior, em juízo
ou fora dele;
II - presidir, com direito a voto, inclusive o de qualidade, as reuniões
do Plenário;
III - distribuir, por sorteio, os processos aos Conselheiros;
IV - convocar as sessões e determinar a organização da respectiva pauta;
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
431
LEIS E ATOS NORMATIVOS
V - solicitar, a seu critério, que a Superintendência-Geral auxilie o
Tribunal na tomada de providências extrajudiciais para o cumprimento das
decisões do Tribunal;
VI - fiscalizar a Superintendência-Geral na tomada de providências
para execução das decisões e julgados do Tribunal;
VII - assinar os compromissos e acordos aprovados pelo Plenário;
VIII - submeter à aprovação do Plenário a proposta orçamentária e
a lotação ideal do pessoal que prestará serviço ao Cade;
IX - orientar, coordenar e supervisionar as atividades administrativas
do Cade;
X - ordenar as despesas atinentes ao Cade, ressalvadas as despesas da unidade gestora da Superintendência-Geral;
XI - firmar contratos e convênios com órgãos ou entidades nacionais
e submeter, previamente, ao Ministro de Estado da Justiça os que devam ser
celebrados com organismos estrangeiros ou internacionais; e
XII - determinar à Procuradoria Federal junto ao Cade as providências judiciais determinadas pelo Tribunal.
SUBSEÇÃO III
Da Competência dos Conselheiros do Tribunal
Art. 11. Compete aos Conselheiros do Tribunal:
I - emitir voto nos processos e questões submetidas ao Tribunal;
II - proferir despachos e lavrar as decisões nos processos em que
forem relatores;
III - requisitar informações e documentos de quaisquer pessoas,
órgãos, autoridades e entidades públicas ou privadas, a serem mantidos sob
sigilo legal, quando for o caso, bem como determinar as diligências que se
fizerem necessárias;
IV - adotar medidas preventivas, fixando o valor da multa diária
pelo seu descumprimento;
V - solicitar, a seu critério, que a Superintendência-Geral realize as
diligências e a produção das provas que entenderem pertinentes nos autos
do processo administrativo, na forma desta Lei;
VI - requerer à Procuradoria Federal junto ao Cade emissão de
parecer jurídico nos processos em que forem relatores, quando entenderem
necessário e em despacho fundamentado, na forma prevista no inciso VII
do art. 15 desta Lei;
VII - determinar ao Economista-Chefe, quando necessário, a elaboração de pareceres nos processos em que forem relatores, sem prejuízo da
tramitação normal do processo e sem que tal determinação implique a suspensão do prazo de análise ou prejuízo à tramitação normal do processo;
432
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1- 528, jan./dez. 2011
LEIS E ATOS NORMATIVOS
VIII - desincumbir-se das demais tarefas que lhes forem cometidas
pelo regimento;
IX - propor termo de compromisso de cessação e acordos para
aprovação do Tribunal;
X - prestar ao Poder Judiciário, sempre que solicitado, todas as
informações sobre andamento dos processos, podendo, inclusive, fornecer
cópias dos autos para instruir ações judiciais.
SEÇÃO III
Da Superintendência-Geral
Art. 12. O Cade terá em sua estrutura uma Superintendência-Geral,
com 1 (um) Superintendente-Geral e 2 (dois) Superintendentes-Adjuntos,
cujas atribuições específicas serão definidas em Resolução.
§ 1º O Superintendente-Geral será escolhido dentre cidadãos com
mais de 30 (trinta) anos de idade, notório saber jurídico ou econômico e reputação ilibada, nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovado
pelo Senado Federal.
§ 2º O Superintendente-Geral terá mandato de 2 (dois) anos, permitida a recondução para um único período subsequente.
§ 3º Aplicam-se ao Superintendente-Geral as mesmas normas de
impedimentos, perda de mandato, substituição e as vedações do art. 8º desta
Lei, incluindo o disposto no § 2º do art. 8º desta Lei, aplicáveis ao Presidente
e aos Conselheiros do Tribunal.
§ 4º Os cargos de Superintendente-Geral e de SuperintendentesAdjuntos são de dedicação exclusiva, não se admitindo qualquer acumulação,
salvo as constitucionalmente permitidas.
§ 5º Durante o período de vacância que anteceder à nomeação
de novo Superintendente-Geral, assumirá interinamente o cargo um dos
superintendentes adjuntos, indicado pelo Presidente do Tribunal, o qual permanecerá no cargo até a posse do novo Superintendente-Geral, escolhido
na forma do § 1º deste artigo.
§ 6º Se, no caso da vacância prevista no § 5º deste artigo, não
houver nenhum Superintendente Adjunto nomeado na Superintendência do
Cade, o Presidente do Tribunal indicará servidor em exercício no Cade, com
conhecimento jurídico ou econômico na área de defesa da concorrência e
reputação ilibada, para assumir interinamente o cargo, permanecendo neste até a posse do novo Superintendente-Geral, escolhido na forma do § 1º
deste artigo.
§ 7º Os Superintendentes-Adjuntos serão indicados pelo Superintendente-Geral.
Art. 13. Compete à Superintendência-Geral:
Semest. Eleit., Salvador, v. 15, n.1/2, p. 1-,528 jan./dez. 2011
433
LEIS E ATOS NORMATIVOS
I - zelar pelo cumprimento desta Lei, monitorando e acompanhando
as práticas de mercado;
II - acompanhar, permanentemente, as atividades e práticas comerciais de pessoas físicas ou jurídicas que detiverem posição dominante em
mercado relevante de bens ou serviços, para prevenir infrações da ordem
econômica, podendo, para tanto, requisitar as informações e documentos
necessários, mantendo o sigilo legal, quando for o caso;
III - promover, em face de indícios de infração da ordem econômica,
procedimento preparatório de inquérito administrativo e inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica;
IV - decidir pela insubsistência dos indícios, arquivando os autos do
inquérito administrativo ou de seu procedimento preparatório;
V - instaurar e instruir processo administrativo para imposição de
sanções administrativas por infrações à ordem econômica, procedimento para
apuração de ato de concentração, processo administrativo para análise de
ato de concentração econômica e processo administrativo para imposição
de sanções processuais incidentais instaurados para prevenção, apuração
ou repressão de infrações à ordem econômica;
VI - no interesse da instrução dos tipos processuais referidos
nesta Lei:
a) requisitar informações e documentos de quaisquer pessoas,
físicas ou jurídicas, órgãos, autoridades e entidades, públicas ou privadas,
mantendo o sigilo legal, quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício de suas funções;
b) requisitar esclarecimentos orais de quaisquer pessoas, físicas
ou jurídicas, órgãos, autoridades e entidades, públicas ou privadas, na forma
desta Lei;
c) realizar inspeção na sede social, estabelecimento, escritório,
filial ou sucursal de empresa investigada, de estoques, objetos, papéis de
qualquer natureza, assim como livros comerciais, computadores e arquivos
eletrônicos, podendo-se extrair ou requisitar cópias de quaisquer documentos
ou dados eletrônicos;
d) requerer ao Poder Judiciário, por meio da Procuradoria Federal
junto ao Cade, mandado de busca e apreensão de objetos, papéis de qualquer
natureza, assim como de livros comerciais, computadores e arquivos magnéticos de empresa ou pessoa física, no interesse de inquérito administrativo
ou de processo administrativo para imposição de sanções administrativas
por infrações à ordem econômica, aplicando-se, no que couber, o disposto
no art. 839 e seguintes da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de
Processo Civil, sendo inexigível a propositura de ação principal;
e) requisitar vista e cópia de documentos e objetos constantes de
inquéritos e processos administrativos instaurados por órgãos ou entidades
da administração pública federal;
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
f) requerer vista e cópia de inquéritos policiais, ações judiciais de quaisquer natureza, bem como de inquéritos e processos administrativos instaurados
por outros entes da federação, devendo o Conselho observar as mesmas restrições de sigilo eventualmente estabelecidas nos procedimentos de origem;
VII - recorrer de ofício ao Tribunal quando decidir pelo arquivamento
de processo administrativo para imposição de sanções administrativas por
infrações à ordem econômica;
VIII - remeter ao Tribunal, para julgamento, os processos administrativos
que instaurar, quando entender configurada infração da ordem econômica;
IX - propor termo de compromisso de cessação de prática por infração à ordem econômica, submetendo-o à aprovação do Tribunal, e fiscalizar
o seu cumprimento;
X - sugerir ao Tribunal condições para a celebração de acordo em
controle de concentrações e fiscalizar o seu cumprimento;
XI - adotar medidas preventivas que conduzam à cessação
de prática que constitua infração da ordem econômica, fixando prazo
para seu cumprimento e o valor da multa diária a ser aplicada, no caso
de descumprimento;
XII - receber, instruir e aprovar ou impugnar perante o Tribunal os
processos administrativos para análise de ato de concentração econômica;
XIII - orientar os órgãos e entidades da administração pública quanto
à adoção de medidas necessárias ao cumprimento desta Lei;
XIV - desenvolver estudos e pesquisas objetivando orientar a política
de prevenção de infrações da ordem econômica;
XV - instruir o público sobre as diversas formas de infração da ordem
econômica e os modos de sua prevenção e repressão;
XVI - exercer outras atribuições previstas em lei;
XVII - prestar ao Poder Judiciário, sempre que solicitado, todas as
informações sobre andamento das investigações, podendo, inclusive, fornecer
cópias dos autos para instruir ações judiciais; e
XVIII - adotar as medidas administrativas necessárias à execução
e ao cumprimento das decisões do Plenário.
Art. 14. São atribuições do Superintendente-Geral:
I - participar, quando entender necessário, sem direito a voto, das reuniões do Tribunal e proferir sustentação oral, na forma do regimento interno;
II - cumprir e fazer cumprir as decisões do Tribunal na forma determinada pelo seu Presidente;
III - requerer à Procuradoria Federal junto ao Cade as providências
judiciais relativas ao exercício das competências da Superintendência-Geral;
IV - determinar ao Economista-Chefe a elaboração de estudos
e pareceres;
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
V - ordenar despesas referentes à unidade gestora da Superintendência-Geral; e
VI - exercer outras atribuições previstas em lei.
SEÇÃO IV
Da Procuradoria Federal junto ao Cade
Art. 15. Funcionará junto ao Cade Procuradoria Federal Especializada, competindo-lhe:
I - prestar consultoria e assessoramento jurídico ao Cade;
II - representar o Cade judicial e extrajudicialmente;
III - promover a execução judicial das decisões e julgados do Cade;
IV - proceder à apuração da liquidez dos créditos do Cade, inscrevendo-os em dívida ativa para fins de cobrança administrativa ou judicial;
V - tomar as medidas judiciais solicitadas pelo Tribunal ou pela
Superintendência-Geral, necessárias à cessação de infrações da ordem
econômica ou à obtenção de documentos para a instrução de processos
administrativos de qualquer natureza;
VI - promover acordos judiciais nos processos relativos a infrações
contra a ordem econômica, mediante autorização do Tribunal;
VII - emitir, sempre que solicitado expressamente por Conselheiro
ou pelo Superintendente-Geral, parecer nos processos de competência do
Cade, sem que tal determinação implique a suspensão do prazo de análise
ou prejuízo à tramitação normal do processo;
VIII - zelar pelo cumprimento desta Lei; e
IX - desincumbir-se das demais tarefas que lhe sejam atribuídas
pelo regimento interno.
Parágrafo único. Compete à Procuradoria Federal junto ao Cade,
ao dar execução judicial às decisões da Superintendência-Geral e do Tribunal,
manter o Presidente do Tribunal, os Conselheiros e o Superintendente-Geral
informados sobre o andamento das ações e medidas judiciais.
Art. 16. O Procurador-Chefe será nomeado pelo Presidente da
República, depois de aprovado pelo Senado Federal, dentre cidadãos brasileiros com mais de 30 (trinta) anos de idade, de notório conhecimento jurídico
e reputação ilibada.
§ 1º O Procurador-Chefe terá mandato de 2 (dois) anos, permitida
sua recondução para um único período.
§ 2º O Procurador-Chefe poderá participar, sem direito a voto, das
reuniões do Tribunal, prestando assistência e esclarecimentos, quando requisitado pelos Conselheiros, na forma do Regimento Interno do Tribunal.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 3º Aplicam-se ao Procurador-Chefe as mesmas normas de
impedimento aplicáveis aos Conselheiros do Tribunal, exceto quanto ao
comparecimento às sessões.
§ 4º Nos casos de faltas, afastamento temporário ou impedimento do Procurador-Chefe, o Plenário indicará e o Presidente do Tribunal
designará o substituto eventual dentre os integrantes da Procuradoria
Federal Especializada.
SEÇÃO V
Do Departamento de Estudos Econômicos
Art. 17. O Cade terá um Departamento de Estudos Econômicos,
dirigido por um Economista-Chefe, a quem incumbirá elaborar estudos e pareceres econômicos, de ofício ou por solicitação do Plenário, do Presidente,
do Conselheiro-Relator ou do Superintendente-Geral, zelando pelo rigor e
atualização técnica e científica das decisões do órgão.
Art. 18. O Economista-Chefe será nomeado, conjuntamente, pelo
Superintendente-Geral e pelo Presidente do Tribunal, dentre brasileiros de
ilibada reputação e notório conhecimento econômico.
§ 1º O Economista-Chefe poderá participar das reuniões do Tribunal, sem direito a voto.
§ 2º Aplicam-se ao Economista-Chefe as mesmas normas de
impedimento aplicáveis aos Conselheiros do Tribunal, exceto quanto ao
comparecimento às sessões.
CAPÍTULO III
DA SECRETARIA DE ACOMPANHAMENTO ECONÔMICO
Art. 19. Compete à Secretaria de Acompanhamento Econômico
promover a concorrência em órgãos de governo e perante a sociedade
cabendo-lhe, especialmente, o seguinte:
I - opinar, nos aspectos referentes à promoção da concorrência,
sobre propostas de alterações de atos normativos de interesse geral dos
agentes econômicos, de consumidores ou usuários dos serviços prestados
submetidos a consulta pública pelas agências reguladoras e, quando entender
pertinente, sobre os pedidos de revisão de tarifas e as minutas;
II - opinar, quando considerar pertinente, sobre minutas de atos
normativos elaborados por qualquer entidade pública ou privada submetidos
à consulta pública, nos aspectos referentes à promoção da concorrência;
III - opinar, quando considerar pertinente, sobre proposições legislativas em tramitação no Congresso Nacional, nos aspectos referentes à
promoção da concorrência;
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
IV - elaborar estudos avaliando a situação concorrencial de setores
específicos da atividade econômica nacional, de ofício ou quando solicitada
pelo Cade, pela Câmara de Comércio Exterior ou pelo Departamento de
Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça ou órgão que
vier a sucedê-lo;
V - elaborar estudos setoriais que sirvam de insumo para a participação do Ministério da Fazenda na formulação de políticas públicas setoriais
nos fóruns em que este Ministério tem assento;
VI - propor a revisão de leis, regulamentos e outros atos normativos
da administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal
que afetem ou possam afetar a concorrência nos diversos setores econômicos do País;
VII - manifestar-se, de ofício ou quando solicitada, a respeito do
impacto concorrencial de medidas em discussão no âmbito de fóruns negociadores relativos às atividades de alteração tarifária, ao acesso a mercados
e à defesa comercial, ressalvadas as competências dos órgãos envolvidos;
VIII - encaminhar ao órgão competente representação para que
este, a seu critério, adote as medidas legais cabíveis, sempre que for
identificado ato normativo que tenha caráter anticompetitivo.
§ 1º Para o cumprimento de suas atribuições, a Secretaria de
Acompanhamento Econômico poderá:
I - requisitar informações e documentos de quaisquer pessoas,
órgãos, autoridades e entidades, públicas ou privadas, mantendo o sigilo
legal quando for o caso;
II - celebrar acordos e convênios com órgãos ou entidades públicas ou privadas, federais, estaduais, municipais, do Distrito Federal e
dos Territórios para avaliar e/ou sugerir medidas relacionadas à promoção
da concorrência.
§ 2º A Secretaria de Acompanhamento Econômico divulgará anualmente relatório de suas ações voltadas para a promoção da concorrência.
TÍTULO III
DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PERANTE O CADE
Art. 20. O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade,
emitir parecer, nos processos administrativos para imposição de sanções
administrativas por infrações à ordem econômica, de ofício ou a requerimento
do Conselheiro-Relator.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
TÍTULO IV
DO PATRIMÔNIO, DAS RECEITAS E DA GESTÃO ADMINISTRATIVA,
ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA
Art. 21. Compete ao Presidente do Tribunal orientar, coordenar e
supervisionar as atividades administrativas do Cade, respeitadas as atribuições dos dirigentes dos demais órgãos previstos no art. 5º desta Lei.
§ 1º A Superintendência-Geral constituirá unidade gestora, para
fins administrativos e financeiros, competindo ao seu Superintendente-Geral
ordenar as despesas pertinentes às respectivas ações orçamentárias.
§ 2º Para fins administrativos e financeiros, o Departamento de
Estudos Econômicos estará ligado ao Tribunal.
Art. 22. Anualmente, o Presidente do Tribunal, ouvido o Superintendente-Geral, encaminhará ao Poder Executivo a proposta de orçamento do
Cade e a lotação ideal do pessoal que prestará serviço àquela autarquia.
Art. 23. Ficam instituídas as taxas processuais sobre os processos
de competência do Cade, no valor de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil
reais), que têm como fato gerador a apresentação dos atos previstos no art.
88 desta Lei e no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para processos
que têm como fato gerador a apresentação de consultas de que trata o § 4º
do art. 9º desta Lei.
Parágrafo único. A taxa processual de que trata o caput deste
artigo poderá ser atualizada por ato do Poder Executivo, após autorização
do Congresso Nacional.
Art. 24. São contribuintes da taxa processual que tem como fato
gerador a apresentação dos atos previstos no art. 88 desta Lei qualquer
das requerentes.
Art. 25. O recolhimento da taxa processual que tem como fato
gerador a apresentação dos atos previstos no art. 88 desta Lei deverá ser
comprovado no momento da protocolização do ato.
§ 1º A taxa processual não recolhida no momento fixado no caput
deste artigo será cobrada com os seguintes acréscimos:
I - juros de mora, contados do mês seguinte ao do vencimento, à
razão de 1% (um por cento), calculados na forma da legislação aplicável aos
tributos federais;
II - multa de mora de 20% (vinte por cento).
§ 2º Os juros de mora não incidem sobre o valor da multa de mora.
Art. 26. (VETADO).
Art. 27. As taxas de que tratam os arts. 23 e 26 desta Lei serão recolhidas ao Tesouro Nacional na forma regulamentada pelo Poder Executivo.
Art. 28. Constituem receitas próprias do Cade:
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
I - o produto resultante da arrecadação das taxas previstas nos
arts. 23 e 26 desta Lei;
II - a retribuição por serviços de qualquer natureza prestados
a terceiros;
III - as dotações consignadas no Orçamento Geral da União, créditos especiais, créditos adicionais, transferências e repasses que lhe forem conferidos;
IV - os recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos
celebrados com entidades ou organismos nacionais e internacionais;
V - as doações, legados, subvenções e outros recursos que lhe
forem destinados;
VI - os valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis e
imóveis de sua propriedade;
VII - o produto da venda de publicações, material técnico, dados
e informações;
VIII - os valores apurados em aplicações no mercado financeiro das
receitas previstas neste artigo, na forma definida pelo Poder Executivo; e
IX - quaisquer outras receitas, afetas às suas atividades, não especificadas nos incisos I a VIII do caput deste artigo.
§ 1º (VETADO).
§ 2º (VETADO).
§ 3º O produto da arrecadação das multas aplicadas pelo Cade,
inscritas ou não em dívida ativa, será destinado ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos de que trata o art. 13 da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985,
e a Lei nº 9.008, de 21 de março de 1995.
§ 4º As multas arrecadadas na forma desta Lei serão recolhidas ao
Tesouro Nacional na forma regulamentada pelo Poder Executivo.
Art. 29. O Cade submeterá anualmente ao Ministério da Justiça
a sua proposta de orçamento, que será encaminhada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para inclusão na lei orçamentária anual, a
que se refere o § 5º do art. 165 da Constituição Federal.
§ 1º O Cade fará acompanhar as propostas orçamentárias de
quadro demonstrativo do planejamento plurianual das receitas e despesas,
visando ao seu equilíbrio orçamentário e financeiro nos 5 (cinco) exercícios
subsequentes.
§ 2º A lei orçamentária anual consignará as dotações para as despesas de custeio e capital do Cade, relativas ao exercício a que ela se referir.
Art. 30. Somam-se ao atual patrimônio do Cade os bens e direitos
pertencentes ao Ministério da Justiça atualmente afetados às atividades
do Departamento de Proteção e Defesa Econômica da Secretaria de
Direito Econômico.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
TÍTULO V
DAS INFRAÇÕES DA ORDEM ECONÔMICA
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 31. Esta Lei aplica-se às pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como a quaisquer associações de entidades ou
pessoas, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com
ou sem personalidade jurídica, mesmo que exerçam atividade sob regime
de monopólio legal.
Art. 32. As diversas formas de infração da ordem econômica implicam a responsabilidade da empresa e a responsabilidade individual de seus
dirigentes ou administradores, solidariamente.
Art. 33. Serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, quando pelo
menos uma delas praticar infração à ordem econômica.
Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da
ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste
abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social.
Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da
pessoa jurídica provocados por má administração.
Art. 35. A repressão das infrações da ordem econômica não exclui
a punição de outros ilícitos previstos em lei.
CAPÍTULO II
DAS INFRAÇÕES
Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que
tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que
não sejam alcançados:
I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência
ou a livre iniciativa;
II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;
III - aumentar arbitrariamente os lucros; e
IV - exercer de forma abusiva posição dominante.
§ 1º A conquista de mercado resultante de processo natural fundado
na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores
não caracteriza o ilícito previsto no inciso II do caput deste artigo.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 2º Presume-se posição dominante sempre que uma empresa ou
grupo de empresas for capaz de alterar unilateral ou coordenadamente as
condições de mercado ou quando controlar 20% (vinte por cento) ou mais
do mercado relevante, podendo este percentual ser alterado pelo Cade para
setores específicos da economia.
§ 3º As seguintes condutas, além de outras, na medida em que
configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:
I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob
qualquer forma:
a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente;
b) a produção ou a comercialização de uma quantidade restrita ou
limitada de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita
ou limitada de serviços;
c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou potencial de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição de clientes,
fornecedores, regiões ou períodos;
d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública;
II - promover, obter ou influenciar a adoção de conduta comercial
uniforme ou concertada entre concorrentes;
III - limitar ou impedir o acesso de novas empresas ao mercado;
IV - criar dificuldades à constituição, ao funcionamento ou ao
desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor, adquirente ou
financiador de bens ou serviços;
V - impedir o acesso de concorrente às fontes de insumo, matériasprimas, equipamentos ou tecnologia, bem como aos canais de distribuição;
VI - exigir ou conceder exclusividade para divulgação de publicidade
nos meios de comunicação de massa;
VII - utilizar meios enganosos para provocar a oscilação de preços
de terceiros;
VIII - regular mercados de bens ou serviços, estabelecendo acordos para limitar ou controlar a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico, a
produção de bens ou prestação de serviços, ou para dificultar investimentos
destinados à produção de bens ou serviços ou à sua distribuição;
IX - impor, no comércio de bens ou serviços, a distribuidores, varejistas e representantes preços de revenda, descontos, condições de pagamento,
quantidades mínimas ou máximas, margem de lucro ou quaisquer outras
condições de comercialização relativos a negócios destes com terceiros;
X - discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços
por meio da fixação diferenciada de preços, ou de condições operacionais
de venda ou prestação de serviços;
XI - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, dentro das
condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais;
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
XII - dificultar ou romper a continuidade ou desenvolvimento de
relações comerciais de prazo indeterminado em razão de recusa da outra
parte em submeter-se a cláusulas e condições comerciais injustificáveis
ou anticoncorrenciais;
XIII - destruir, inutilizar ou açambarcar matérias-primas, produtos intermediários ou acabados, assim como destruir, inutilizar ou dificultar a operação de equipamentos destinados a produzi-los, distribuí-los
ou transportá-los;
XIV - açambarcar ou impedir a exploração de direitos de propriedade
industrial ou intelectual ou de tecnologia;
XV - vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente
abaixo do preço de custo;
XVI - reter bens de produção ou de consumo, exceto para garantir
a cobertura dos custos de produção;
XVII - cessar parcial ou totalmente as atividades da empresa sem
justa causa comprovada;
XVIII - subordinar a venda de um bem à aquisição de outro ou à
utilização de um serviço, ou subordinar a prestação de um serviço à utilização
de outro ou à aquisição de um bem; e
XIX - exercer ou explorar abusivamente direitos de propriedade
industrial, intelectual, tecnologia ou marca.
CAPÍTULO III
DAS PENAS
Art. 37. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas:
I - no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20%
(vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual
nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação;
II - no caso das demais pessoas físicas ou jurídicas de direito
público ou privado, bem como quaisquer associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou
sem personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não
sendo possível utilizar-se o critério do valor do faturamento bruto, a multa
será entre R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 2.000.000.000,00 (dois
bilhões de reais);
III - no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável
pela infração cometida, quando comprovada a sua culpa ou dolo, multa de
1% (um por cento) a 20% (vinte por cento) daquela aplicada à empresa, no
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
caso previsto no inciso I do caput deste artigo, ou às pessoas jurídicas ou
entidades, nos casos previstos no inciso II do caput deste artigo.
§ 1º Em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas
em dobro.
§ 2º No cálculo do valor da multa de que trata o inciso I do caput
deste artigo, o Cade poderá considerar o faturamento total da empresa ou
grupo de empresas, quando não dispuser do valor do faturamento no ramo
de atividade empresarial em que ocorreu a infração, definido pelo Cade, ou
quando este for apresentado de forma incompleta e/ou não demonstrado de
forma inequívoca e idônea.
Art. 38. Sem prejuízo das penas cominadas no art. 37 desta Lei,
quando assim exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público geral, poderão ser impostas as seguintes penas, isolada ou cumulativamente:
I - a publicação, em meia página e a expensas do infrator, em jornal
indicado na decisão, de extrato da decisão condenatória, por 2 (dois) dias
seguidos, de 1 (uma) a 3 (três) semanas consecutivas;
II - a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e
participar de licitação tendo por objeto aquisições, alienações, realização de
obras e serviços, concessão de serviços públicos, na administração pública
federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, bem como em entidades
da administração indireta, por prazo não inferior a 5 (cinco) anos;
III - a inscrição do infrator no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor;
IV - a recomendação aos órgãos públicos competentes para que:
a) seja concedida licença compulsória de direito de propriedade
intelectual de titularidade do infrator, quando a infração estiver relacionada
ao uso desse direito;
b) não seja concedido ao infrator parcelamento de tributos federais
por ele devidos ou para que sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos
fiscais ou subsídios públicos;
V - a cisão de sociedade, transferência de controle societário, venda
de ativos ou cessação parcial de atividade;
VI - a proibição de exercer o comércio em nome próprio ou como
representante de pessoa jurídica, pelo prazo de até 5 (cinco) anos; e
VII - qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação
dos efeitos nocivos à ordem econômica.
Art. 39. Pela continuidade de atos ou situações que configurem
infração da ordem econômica, após decisão do Tribunal determinando sua
cessação, bem como pelo não cumprimento de obrigações de fazer ou não
fazer impostas, ou pelo descumprimento de medida preventiva ou termo de
compromisso de cessação previstos nesta Lei, o responsável fica sujeito a
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
multa diária fixada em valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), podendo ser
aumentada em até 50 (cinquenta) vezes, se assim recomendar a situação
econômica do infrator e a gravidade da infração.
Art. 40. A recusa, omissão ou retardamento injustificado de informação ou documentos solicitados pelo Cade ou pela Secretaria de Acompanhamento Econômico constitui infração punível com multa diária de R$ 5.000,00
(cinco mil reais), podendo ser aumentada em até 20 (vinte) vezes, se necessário
para garantir sua eficácia, em razão da situação econômica do infrator.
§ 1º O montante fixado para a multa diária de que trata o caput deste artigo constará do documento que contiver a requisição da autoridade competente.
§ 2º Compete à autoridade requisitante a aplicação da multa prevista no caput deste artigo.
§ 3º Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente
pelo pagamento da multa de que trata o caput sua filial, sucursal, escritório
ou estabelecimento situado no País.
Art. 41. A falta injustificada do representado ou de terceiros, quando
intimados para prestar esclarecimentos, no curso de inquérito ou processo
administrativo, sujeitará o faltante à multa de R$ 500,00 (quinhentos reais)
a R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para cada falta, aplicada conforme sua
situação econômica.
Parágrafo único. A multa a que se refere o caput deste artigo será
aplicada mediante auto de infração pela autoridade competente.
Art. 42. Impedir, obstruir ou de qualquer outra forma dificultar a
realização de inspeção autorizada pelo Plenário do Tribunal, pelo ConselheiroRelator ou pela Superintendência-Geral no curso de procedimento preparatório,
inquérito administrativo, processo administrativo ou qualquer outro procedimento sujeitará o inspecionado ao pagamento de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil
reais) a R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), conforme a situação econômica
do infrator, mediante a lavratura de auto de infração pelo órgão competente.
Art. 43. A enganosidade ou a falsidade de informações, de documentos ou de declarações prestadas por qualquer pessoa ao Cade ou à
Secretaria de Acompanhamento Econômico será punível com multa pecuniária
no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 5.000.000,00 (cinco milhões
de reais), de acordo com a gravidade dos fatos e a situação econômica do
infrator, sem prejuízo das demais cominações legais cabíveis.
Art. 44. Aquele que prestar serviços ao Cade ou a Seae, a qualquer
título, e que der causa, mesmo que por mera culpa, à disseminação indevida
de informação acerca de empresa, coberta por sigilo, será punível com multa
pecuniária de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), sem
prejuízo de abertura de outros procedimentos cabíveis.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 1º Se o autor da disseminação indevida estiver servindo o Cade
em virtude de mandato, ou na qualidade de Procurador Federal ou Economista-Chefe, a multa será em dobro.
§ 2º O Regulamento definirá o procedimento para que uma informação seja tida como sigilosa, no âmbito do Cade e da Seae.
Art. 45. Na aplicação das penas estabelecidas nesta Lei, levar-se-á
em consideração:
I - a gravidade da infração;
II - a boa-fé do infrator;
III - a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;
IV - a consumação ou não da infração;
V - o grau de lesão, ou perigo de lesão, à livre concorrência, à
economia nacional, aos consumidores, ou a terceiros;
VI - os efeitos econômicos negativos produzidos no mercado;
VII - a situação econômica do infrator; e
VIII - a reincidência.
CAPÍTULO IV
DA PRESCRIÇÃO
Art. 46. Prescrevem em 5 (cinco) anos as ações punitivas da administração pública federal, direta e indireta, objetivando apurar infrações da
ordem econômica, contados da data da prática do ilícito ou, no caso de infração
permanente ou continuada, do dia em que tiver cessada a prática do ilícito.
§ 1º Interrompe a prescrição qualquer ato administrativo ou judicial que tenha por objeto a apuração da infração contra a ordem econômica
mencionada no caput deste artigo, bem como a notificação ou a intimação
da investigada.
§ 2º Suspende-se a prescrição durante a vigência do compromisso
de cessação ou do acordo em controle de concentrações.
§ 3º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado
por mais de 3 (três) anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos
serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada,
sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.
§ 4º Quando o fato objeto da ação punitiva da administração também
constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
CAPÍTULO V
DO DIREITO DE AÇÃO
Art. 47. Os prejudicados, por si ou pelos legitimados referidos no art.
82 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, poderão ingressar em juízo
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
para, em defesa de seus interesses individuais ou individuais homogêneos,
obter a cessação de práticas que constituam infração da ordem econômica, bem como o recebimento de indenização por perdas e danos sofridos,
independentemente do inquérito ou processo administrativo, que não será
suspenso em virtude do ajuizamento de ação.
TÍTULO VI
DAS DIVERSAS ESPÉCIES DE PROCESSO ADMINISTRATIVO
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 48. Esta Lei regula os seguintes procedimentos administrativos
instaurados para prevenção, apuração e repressão de infrações à ordem
econômica:
I - procedimento preparatório de inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica;
II - inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica;
III - processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica;
IV - processo administrativo para análise de ato de concentração econômica;
V - procedimento administrativo para apuração de ato de concentração econômica; e
VI - processo administrativo para imposição de sanções
processuais incidentais.
Art. 49. O Tribunal e a Superintendência-Geral assegurarão nos
procedimentos previstos nos incisos II, III, IV e VI do caput do art. 48 desta
Lei o tratamento sigiloso de documentos, informações e atos processuais necessários à elucidação dos fatos ou exigidos pelo interesse da sociedade.
Parágrafo único. As partes poderão requerer tratamento sigiloso de
documentos ou informações, no tempo e modo definidos no regimento interno.
Art. 50. A Superintendência-Geral ou o Conselheiro-Relator poderá
admitir a intervenção no processo administrativo de:
I - terceiros titulares de direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser adotada; ou
II - legitimados à propositura de ação civil pública pelos incisos III
e IV do art. 82 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Art. 51. Na tramitação dos processos no Cade, serão observadas
as seguintes disposições, além daquelas previstas no regimento interno:
I - os atos de concentração terão prioridade sobre o julgamento de
outras matérias;
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
II - a sessão de julgamento do Tribunal é pública, salvo nos casos
em que for determinado tratamento sigiloso ao processo, ocasião em que as
sessões serão reservadas;
III - nas sessões de julgamento do Tribunal, poderão o Superintendente-Geral, o Economista-Chefe, o Procurador-Chefe e as partes do
processo requerer a palavra, que lhes será concedida, nessa ordem, nas
condições e no prazo definido pelo regimento interno, a fim de sustentarem
oralmente suas razões perante o Tribunal;
IV - a pauta das sessões de julgamento será definida pelo Presidente, que determinará sua publicação, com pelo menos 120 (cento e vinte)
horas de antecedência; e
V - os atos e termos a serem praticados nos autos dos procedimentos enumerados no art. 48 desta Lei poderão ser encaminhados de forma
eletrônica ou apresentados em meio magnético ou equivalente, nos termos
das normas do Cade.
Art. 52. O cumprimento das decisões do Tribunal e de compromissos e acordos firmados nos termos desta Lei poderá, a critério do Tribunal, ser
fiscalizado pela Superintendência-Geral, com o respectivo encaminhamento
dos autos, após a decisão final do Tribunal.
§ 1º Na fase de fiscalização da execução das decisões do Tribunal,
bem como do cumprimento de compromissos e acordos firmados nos termos
desta Lei, poderá a Superintendência-Geral valer-se de todos os poderes
instrutórios que lhe são assegurados nesta Lei.
§ 2º Cumprida integralmente a decisão do Tribunal ou os acordos
em controle de concentrações e compromissos de cessação, a Superintendência-Geral, de ofício ou por provocação do interessado, manifestar-se-á
sobre seu cumprimento.
CAPÍTULO II
DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NO CONTROLE DE ATOS DE
CONCENTRAÇÃO ECONÔMICA
SEÇÃO I
Do Processo Administrativo na Superintendência-Geral
Art. 53. O pedido de aprovação dos atos de concentração econômica a que se refere o art. 88 desta Lei deverá ser endereçado ao Cade e
instruído com as informações e documentos indispensáveis à instauração
do processo administrativo, definidos em resolução do Cade, além do comprovante de recolhimento da taxa respectiva.
§ 1º Ao verificar que a petição não preenche os requisitos exigidos
no caput deste artigo ou apresenta defeitos e irregularidades capazes de
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
dificultar o julgamento de mérito, a Superintendência-Geral determinará, uma
única vez, que os requerentes a emendem, sob pena de arquivamento.
§ 2º Após o protocolo da apresentação do ato de concentração, ou de sua emenda, a Superintendência-Geral fará publicar edital,
indicando o nome dos requerentes, a natureza da operação e os setores
econômicos envolvidos.
Art. 54. Após cumpridas as providências indicadas no art. 53, a
Superintendência-Geral:
I - conhecerá diretamente do pedido, proferindo decisão terminativa,
quando o processo dispensar novas diligências ou nos casos de menor potencial ofensivo à concorrência, assim definidos em resolução do Cade; ou
II - determinará a realização da instrução complementar, especificando as diligências a serem produzidas.
Art. 55. Concluída a instrução complementar determinada na
forma do inciso II do caput do art. 54 desta Lei, a Superintendência-Geral
deverá manifestar-se sobre seu satisfatório cumprimento, recebendo-a
como adequada ao exame de mérito ou determinando que seja refeita, por
estar incompleta.
Art. 56. A Superintendência-Geral poderá, por meio de decisão
fundamentada, declarar a operação como complexa e determinar a realização de nova instrução complementar, especificando as diligências a
serem produzidas.
Parágrafo único. Declarada a operação como complexa, poderá a
Superintendência-Geral requerer ao Tribunal a prorrogação do prazo de que
trata o § 2º do art. 88 desta Lei.
Art. 57. Concluídas as instruções complementares de que tratam
o inciso II do art. 54 e o art. 56 desta Lei, a Superintendência-Geral:
I - proferirá decisão aprovando o ato sem restrições;
II - oferecerá impugnação perante o Tribunal, caso entenda que o ato
deva ser rejeitado, aprovado com restrições ou que não existam elementos
conclusivos quanto aos seus efeitos no mercado.
Parágrafo único. Na impugnação do ato perante o Tribunal, deverão ser demonstrados, de forma circunstanciada, o potencial lesivo do ato à
concorrência e as razões pelas quais não deve ser aprovado integralmente
ou rejeitado.
SEÇÃO II
Do Processo Administrativo no Tribunal
Art. 58. O requerente poderá oferecer, no prazo de 30 (trinta)
dias da data de impugnação da Superintendência-Geral, em petição escrita, dirigida ao Presidente do Tribunal, manifestação expondo as razões de
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
fato e de direito com que se opõe à impugnação do ato de concentração da
Superintendência-Geral e juntando todas as provas, estudos e pareceres
que corroboram seu pedido.
Parágrafo único. Em até 48 (quarenta e oito) horas da decisão de
que trata a impugnação pela Superintendência-Geral, disposta no inciso II
do caput do art. 57 desta Lei e na hipótese do inciso I do art. 65 desta Lei, o
processo será distribuído, por sorteio, a um Conselheiro-Relator.
Art. 59. Após a manifestação do requerente, o Conselheiro-Relator:
I - proferirá decisão determinando a inclusão do processo em pauta
para julgamento, caso entenda que se encontre suficientemente instruído;
II - determinará a realização de instrução complementar, se necessário, podendo, a seu critério, solicitar que a Superintendência-Geral a
realize, declarando os pontos controversos e especificando as diligências a
serem produzidas.
§ 1º O Conselheiro-Relator poderá autorizar, conforme o caso,
precária e liminarmente, a realização do ato de concentração econômica,
impondo as condições que visem à preservação da reversibilidade da operação, quando assim recomendarem as condições do caso concreto.
§ 2º O Conselheiro-Relator poderá acompanhar a realização das
diligências referidas no inciso II do caput deste artigo.
Art. 60. Após a conclusão da instrução, o Conselheiro-Relator
determinará a inclusão do processo em pauta para julgamento.
Art. 61. No julgamento do pedido de aprovação do ato de concentração econômica, o Tribunal poderá aprová-lo integralmente, rejeitá-lo ou
aprová-lo parcialmente, caso em que determinará as restrições que deverão
ser observadas como condição para a validade e eficácia do ato.
§ 1º O Tribunal determinará as restrições cabíveis no sentido de
mitigar os eventuais efeitos nocivos do ato de concentração sobre os mercados relevantes afetados.
§ 2º As restrições mencionadas no § 1º deste artigo incluem:
I - a venda de ativos ou de um conjunto de ativos que constitua
uma atividade empresarial;
II - a cisão de sociedade;
III - a alienação de controle societário;
IV - a separação contábil ou jurídica de atividades;
V - o licenciamento compulsório de direitos de propriedade intelectual; e
VI - qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação
dos efeitos nocivos à ordem econômica.
§ 3º Julgado o processo no mérito, o ato não poderá ser novamente
apresentado nem revisto no âmbito do Poder Executivo.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
Art. 62. Em caso de recusa, omissão, enganosidade, falsidade ou
retardamento injustificado, por parte dos requerentes, de informações ou
documentos cuja apresentação for determinada pelo Cade, sem prejuízo
das demais sanções cabíveis, poderá o pedido de aprovação do ato de
concentração ser rejeitado por falta de provas, caso em que o requerente
somente poderá realizar o ato mediante apresentação de novo pedido, nos
termos do art. 53 desta Lei.
Art. 63. Os prazos previstos neste Capítulo não se suspendem ou
interrompem por qualquer motivo, ressalvado o disposto no § 5º do art. 6º
desta Lei, quando for o caso.
Art. 64. (VETADO).
SEÇÃO III
Do Recurso contra Decisão de Aprovação do Ato pela SuperintendênciaGeral
Art. 65. No prazo de 15 (quinze) dias contado a partir da publicação
da decisão da Superintendência-Geral que aprovar o ato de concentração, na
forma do inciso I do caput do art. 54 e do inciso I do caput do art. 57 desta Lei:
I - caberá recurso da decisão ao Tribunal, que poderá ser interposto
por terceiros interessados ou, em se tratando de mercado regulado, pela
respectiva agência reguladora;
II - o Tribunal poderá, mediante provocação de um de seus Conselheiros e em decisão fundamentada, avocar o processo para julgamento
ficando prevento o Conselheiro que encaminhou a provocação.
§ 1º Em até 5 (cinco) dias úteis a partir do recebimento do recurso,
o Conselheiro-Relator:
I - conhecerá do recurso e determinará a sua inclusão em pauta
para julgamento;
II - conhecerá do recurso e determinará a realização de instrução
complementar, podendo, a seu critério, solicitar que a Superintendência-Geral
a realize, declarando os pontos controversos e especificando as diligências
a serem produzidas; ou
III - não conhecerá do recurso, determinando o seu arquivamento.
§ 2º As requerentes poderão manifestar-se acerca do recurso interposto, em até 5 (cinco) dias úteis do conhecimento do recurso no Tribunal
ou da data do recebimento do relatório com a conclusão da instrução complementar elaborada pela Superintendência-Geral, o que ocorrer por último.
§ 3º O litigante de má-fé arcará com multa, em favor do Fundo de
Defesa de Direitos Difusos, a ser arbitrada pelo Tribunal entre R$ 5.000,00
(cinco mil reais) e R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), levando-se em
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
consideração sua condição econômica, sua atuação no processo e o retardamento injustificado causado à aprovação do ato.
§ 4º A interposição do recurso a que se refere o caput deste artigo
ou a decisão de avocar suspende a execução do ato de concentração econômica até decisão final do Tribunal.
§ 5º O Conselheiro-Relator poderá acompanhar a realização das
diligências referidas no inciso II do § 1º deste artigo.
CAPÍTULO III
DO INQUÉRITO ADMINISTRATIVO PARA APURAÇÃO DE INFRAÇÕES À
ORDEM ECONÔMICA E DO PROCEDIMENTO PREPARATÓRIO
Art. 66. O inquérito administrativo, procedimento investigatório
de natureza inquisitorial, será instaurado pela Superintendência-Geral para
apuração de infrações à ordem econômica.
§ 1º O inquérito administrativo será instaurado de ofício ou em face
de representação fundamentada de qualquer interessado, ou em decorrência
de peças de informação, quando os indícios de infração à ordem econômica
não forem suficientes para a instauração de processo administrativo.
§ 2º A Superintendência-Geral poderá instaurar procedimento
preparatório de inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica para apurar se a conduta sob análise trata de matéria de
competência do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, nos termos
desta Lei.
§ 3º As diligências tomadas no âmbito do procedimento preparatório
de inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica
deverão ser realizadas no prazo máximo de 30 (trinta) dias.
§ 4º Do despacho que ordenar o arquivamento de procedimento
preparatório, indeferir o requerimento de abertura de inquérito administrativo, ou seu arquivamento, caberá recurso de qualquer interessado ao
Superintendente-Geral, na forma determinada em regulamento, que decidirá
em última instância.
§ 5º (VETADO).
§ 6º A representação de Comissão do Congresso Nacional, ou
de qualquer de suas Casas, bem como da Secretaria de Acompanhamento
Econômico, das agências reguladoras e da Procuradoria Federal junto ao
Cade, independe de procedimento preparatório, instaurando-se desde logo
o inquérito administrativo ou processo administrativo.
§ 7º O representante e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada ou não, a juízo da Superintendência-Geral.
§ 8º A Superintendência-Geral poderá solicitar o concurso da autoridade policial ou do Ministério Público nas investigações.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 9º O inquérito administrativo deverá ser encerrado no prazo de 180
(cento e oitenta) dias, contado da data de sua instauração, prorrogáveis por
até 60 (sessenta) dias, por meio de despacho fundamentado e quando o fato
for de difícil elucidação e o justificarem as circunstâncias do caso concreto.
§ 10. Ao procedimento preparatório, assim como ao inquérito administrativo, poderá ser dado tratamento sigiloso, no interesse das investigações,
a critério da Superintendência-Geral.
Art. 67. Até 10 (dez) dias úteis a partir da data de encerramento do
inquérito administrativo, a Superintendência-Geral decidirá pela instauração
do processo administrativo ou pelo seu arquivamento.
§ 1º O Tribunal poderá, mediante provocação de um Conselheiro e
em decisão fundamentada, avocar o inquérito administrativo ou procedimento
preparatório de inquérito administrativo arquivado pela SuperintendênciaGeral, ficando prevento o Conselheiro que encaminhou a provocação.
§ 2º Avocado o inquérito administrativo, o Conselheiro-Relator terá
o prazo de 30 (trinta) dias úteis para:
I - confirmar a decisão de arquivamento da Superintendência-Geral,
podendo, se entender necessário, fundamentar sua decisão;
II - transformar o inquérito administrativo em processo administrativo, determinando a realização de instrução complementar, podendo, a seu
critério, solicitar que a Superintendência-Geral a realize, declarando os pontos
controversos e especificando as diligências a serem produzidas.
§ 3º Ao inquérito administrativo poderá ser dado tratamento sigiloso,
no interesse das investigações, a critério do Plenário do Tribunal.
Art. 68. O descumprimento dos prazos fixados neste Capítulo pela
Superintendência-Geral, assim como por seus servidores, sem justificativa
devidamente comprovada nos autos, poderá resultar na apuração da respectiva responsabilidade administrativa, civil e criminal.
CAPÍTULO IV
DO PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA IMPOSIÇÃO DE SANÇÕES
ADMINISTRATIVAS POR INFRAÇÕES À ORDEM ECONÔMICA
Art. 69. O processo administrativo, procedimento em contraditório,
visa a garantir ao acusado a ampla defesa a respeito das conclusões do
inquérito administrativo, cuja nota técnica final, aprovada nos termos das
normas do Cade, constituirá peça inaugural.
Art. 70. Na decisão que instaurar o processo administrativo, será
determinada a notificação do representado para, no prazo de 30 (trinta) dias,
apresentar defesa e especificar as provas que pretende sejam produzidas,
declinando a qualificação completa de até 3 (três) testemunhas.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 1º A notificação inicial conterá o inteiro teor da decisão de instauração do processo administrativo e da representação, se for o caso.
§ 2º A notificação inicial do representado será feita pelo correio,
com aviso de recebimento em nome próprio, ou outro meio que assegure a
certeza da ciência do interessado ou, não tendo êxito a notificação postal, por
edital publicado no Diário Oficial da União e em jornal de grande circulação
no Estado em que resida ou tenha sede, contando-se os prazos da juntada
do aviso de recebimento, ou da publicação, conforme o caso.
§ 3º A intimação dos demais atos processuais será feita mediante
publicação no Diário Oficial da União, da qual deverá constar o nome do
representado e de seu procurador, se houver.
§ 4º O representado poderá acompanhar o processo administrativo por seu titular e seus diretores ou gerentes, ou por seu procurador,
assegurando-se-lhes amplo acesso aos autos no Tribunal.
§ 5º O prazo de 30 (trinta) dias mencionado no caput deste artigo
poderá ser dilatado por até 10 (dez) dias, improrrogáveis, mediante requisição
do representado.
Art. 71. Considerar-se-á revel o representado que, notificado,
não apresentar defesa no prazo legal, incorrendo em confissão quanto à
matéria de fato, contra ele correndo os demais prazos, independentemente
de notificação.
Parágrafo único. Qualquer que seja a fase do processo, nele poderá
intervir o revel, sem direito à repetição de qualquer ato já praticado.
Art. 72. Em até 30 (trinta) dias úteis após o decurso do prazo previsto
no art. 70 desta Lei, a Superintendência-Geral, em despacho fundamentado,
determinará a produção de provas que julgar pertinentes, sendo-lhe facultado
exercer os poderes de instrução previstos nesta Lei, mantendo-se o sigilo
legal, quando for o caso.
Art. 73. Em até 5 (cinco) dias úteis da data de conclusão da instrução
processual determinada na forma do art. 72 desta Lei, a SuperintendênciaGeral notificará o representado para apresentar novas alegações, no prazo
de 5 (cinco) dias úteis.
Art. 74. Em até 15 (quinze) dias úteis contados do decurso do prazo
previsto no art. 73 desta Lei, a Superintendência-Geral remeterá os autos do
processo ao Presidente do Tribunal, opinando, em relatório circunstanciado,
pelo seu arquivamento ou pela configuração da infração.
Art. 75. Recebido o processo, o Presidente do Tribunal o distribuirá,
por sorteio, ao Conselheiro-Relator, que poderá, caso entenda necessário,
solicitar à Procuradoria Federal junto ao Cade que se manifeste no prazo de
20 (vinte) dias.
Art. 76. O Conselheiro-Relator poderá determinar diligências, em
despacho fundamentado, podendo, a seu critério, solicitar que a Superintendência-Geral as realize, no prazo assinado.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
Parágrafo único. Após a conclusão das diligências determinadas
na forma deste artigo, o Conselheiro-Relator notificará o representado para,
no prazo de 15 (quinze) dias úteis, apresentar alegações finais.
Art. 77. No prazo de 15 (quinze) dias úteis contado da data de
recebimento das alegações finais, o Conselheiro-Relator solicitará a inclusão
do processo em pauta para julgamento.
Art. 78. A convite do Presidente, por indicação do ConselheiroRelator, qualquer pessoa poderá apresentar esclarecimentos ao Tribunal, a
propósito de assuntos que estejam em pauta.
Art. 79. A decisão do Tribunal, que em qualquer hipótese será fundamentada, quando for pela existência de infração da ordem econômica, conterá:
I - especificação dos fatos que constituam a infração apurada e a
indicação das providências a serem tomadas pelos responsáveis para fazêla cessar;
II - prazo dentro do qual devam ser iniciadas e concluídas as providências referidas no inciso I do caput deste artigo;
III - multa estipulada;
IV - multa diária em caso de continuidade da infração; e
V - multa em caso de descumprimento das providências estipuladas.
Parágrafo único. A decisão do Tribunal será publicada dentro de 5
(cinco) dias úteis no Diário Oficial da União.
Art. 80. Aplicam-se às decisões do Tribunal o disposto na Lei nº
8.437, de 30 de junho de 1992.
Art. 81. Descumprida a decisão, no todo ou em parte, será o fato
comunicado ao Presidente do Tribunal, que determinará à Procuradoria Federal junto ao Cade que providencie sua execução judicial.
Art. 82. O descumprimento dos prazos fixados neste Capítulo pelos
membros do Cade, assim como por seus servidores, sem justificativa devidamente comprovada nos autos, poderá resultar na apuração da respectiva
responsabilidade administrativa, civil e criminal.
Art. 83. O Cade disporá de forma complementar sobre o inquérito
e o processo administrativo.
CAPÍTULO V
DA MEDIDA PREVENTIVA
Art. 84. Em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, poderá o Conselheiro-Relator ou
o Superintendente-Geral, por iniciativa própria ou mediante provocação do
Procurador-Chefe do Cade, adotar medida preventiva, quando houver indício
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ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou
possa causar ao mercado lesão irreparável ou de difícil reparação, ou torne
ineficaz o resultado final do processo.
§ 1º Na medida preventiva, determinar-se-á a imediata cessação
da prática e será ordenada, quando materialmente possível, a reversão à
situação anterior, fixando multa diária nos termos do art. 39 desta Lei.
§ 2º Da decisão que adotar medida preventiva caberá recurso voluntário ao Plenário do Tribunal, em 5 (cinco) dias, sem efeito suspensivo.
CAPÍTULO VI
DO COMPROMISSO DE CESSAÇÃO
Art. 85. Nos procedimentos administrativos mencionados nos
incisos I, II e III do art. 48 desta Lei, o Cade poderá tomar do representado
compromisso de cessação da prática sob investigação ou dos seus efeitos
lesivos, sempre que, em juízo de conveniência e oportunidade, devidamente
fundamentado, entender que atende aos interesses protegidos por lei.
§ 1º Do termo de compromisso deverão constar os seguintes elementos:
I - a especificação das obrigações do representado no sentido de
não praticar a conduta investigada ou seus efeitos lesivos, bem como obrigações que julgar cabíveis;
II - a fixação do valor da multa para o caso de descumprimento,
total ou parcial, das obrigações compromissadas;
III - a fixação do valor da contribuição pecuniária ao Fundo de Defesa
de Direitos Difusos quando cabível.
§ 2º Tratando-se da investigação da prática de infração relacionada ou decorrente das condutas previstas nos incisos I e II do § 3º do art. 36
desta Lei, entre as obrigações a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo
figurará, necessariamente, a obrigação de recolher ao Fundo de Defesa de
Direitos Difusos um valor pecuniário que não poderá ser inferior ao mínimo
previsto no art. 37 desta Lei.
§ 3º (VETADO).
§ 4º A proposta de termo de compromisso de cessação de prática
somente poderá ser apresentada uma única vez.
§ 5º A proposta de termo de compromisso de cessação de prática
poderá ter caráter confidencial.
§ 6º A apresentação de proposta de termo de compromisso de cessação de prática não suspende o andamento do processo administrativo.
§ 7º O termo de compromisso de cessação de prática terá caráter
público, devendo o acordo ser publicado no sítio do Cade em 5 (cinco) dias
após a sua celebração.
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§ 8º O termo de compromisso de cessação de prática constitui
título executivo extrajudicial.
§ 9º O processo administrativo ficará suspenso enquanto estiver
sendo cumprido o compromisso e será arquivado ao término do prazo fixado,
se atendidas todas as condições estabelecidas no termo.
§ 10. A suspensão do processo administrativo a que se refere o § 9o
deste artigo dar-se-á somente em relação ao representado que firmou o compromisso, seguindo o processo seu curso regular para os demais representados.
§ 11. Declarado o descumprimento do compromisso, o Cade aplicará as sanções nele previstas e determinará o prosseguimento do processo
administrativo e as demais medidas administrativas e judiciais cabíveis para
sua execução.
§ 12. As condições do termo de compromisso poderão ser alteradas
pelo Cade se se comprovar sua excessiva onerosidade para o representado, desde que a alteração não acarrete prejuízo para terceiros ou para a coletividade.
§ 13. A proposta de celebração do compromisso de cessação de
prática será indeferida quando a autoridade não chegar a um acordo com os
representados quanto aos seus termos.
§ 14. O Cade definirá, em resolução, normas complementares
sobre o termo de compromisso de cessação.
§ 15. Aplica-se o disposto no art. 50 desta Lei ao Compromisso de
Cessação da Prática.
CAPÍTULO VII
DO PROGRAMA DE LENIÊNCIA
Art. 86. O Cade, por intermédio da Superintendência-Geral,
poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da
administração pública ou a redução de 1 (um) a 2/3 (dois terços) da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e jurídicas
que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem
efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa
colaboração resulte:
I - a identificação dos demais envolvidos na infração; e
II - a obtenção de informações e documentos que comprovem a
infração noticiada ou sob investigação.
§ 1º O acordo de que trata o caput deste artigo somente poderá ser
celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - a empresa seja a primeira a se qualificar com respeito à infração
noticiada ou sob investigação;
II - a empresa cesse completamente seu envolvimento na infração
noticiada ou sob investigação a partir da data de propositura do acordo;
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III - a Superintendência-Geral não disponha de provas suficientes
para assegurar a condenação da empresa ou pessoa física por ocasião da
propositura do acordo; e
IV - a empresa confesse sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo,
comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos
processuais, até seu encerramento.
§ 2º Com relação às pessoas físicas, elas poderão celebrar acordos
de leniência desde que cumpridos os requisitos II, III e IV do § 1º deste artigo.
§ 3º O acordo de leniência firmado com o Cade, por intermédio da
Superintendência-Geral, estipulará as condições necessárias para assegurar
a efetividade da colaboração e o resultado útil do processo.
§ 4º Compete ao Tribunal, por ocasião do julgamento do processo
administrativo, verificado o cumprimento do acordo:
I - decretar a extinção da ação punitiva da administração pública
em favor do infrator, nas hipóteses em que a proposta de acordo tiver sido
apresentada à Superintendência-Geral sem que essa tivesse conhecimento
prévio da infração noticiada; ou
II - nas demais hipóteses, reduzir de 1 (um) a 2/3 (dois terços) as
penas aplicáveis, observado o disposto no art. 45 desta Lei, devendo ainda
considerar na gradação da pena a efetividade da colaboração prestada e a
boa-fé do infrator no cumprimento do acordo de leniência.
§ 5º Na hipótese do inciso II do § 4º deste artigo, a pena sobre a
qual incidirá o fator redutor não será superior à menor das penas aplicadas
aos demais coautores da infração, relativamente aos percentuais fixados para
a aplicação das multas de que trata o inciso I do art. 37 desta Lei.
§ 6º Serão estendidos às empresas do mesmo grupo, de fato ou de
direito, e aos seus dirigentes, administradores e empregados envolvidos na
infração os efeitos do acordo de leniência, desde que o firmem em conjunto,
respeitadas as condições impostas.
§ 7º A empresa ou pessoa física que não obtiver, no curso de inquérito ou processo administrativo, habilitação para a celebração do acordo
de que trata este artigo, poderá celebrar com a Superintendência-Geral, até a
remessa do processo para julgamento, acordo de leniência relacionado a uma
outra infração, da qual o Cade não tenha qualquer conhecimento prévio.
§ 8º Na hipótese do § 7º deste artigo, o infrator se beneficiará da
redução de 1/3 (um terço) da pena que lhe for aplicável naquele processo,
sem prejuízo da obtenção dos benefícios de que trata o inciso I do § 4º deste
artigo em relação à nova infração denunciada.
§ 9º Considera-se sigilosa a proposta de acordo de que trata este
artigo, salvo no interesse das investigações e do processo administrativo.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 10. Não importará em confissão quanto à matéria de fato, nem
reconhecimento de ilicitude da conduta analisada, a proposta de acordo de
leniência rejeitada, da qual não se fará qualquer divulgação.
§ 11. A aplicação do disposto neste artigo observará as normas a
serem editadas pelo Tribunal.
§ 12. Em caso de descumprimento do acordo de leniência, o beneficiário ficará impedido de celebrar novo acordo de leniência pelo prazo de
3 (três) anos, contado da data de seu julgamento.
Art. 87. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei
nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos demais crimes diretamente
relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei nº 8.666, de
21 de junho de 1993, e os tipificados no art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, a celebração de acordo de
leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo
prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente
beneficiário da leniência.
Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente,
extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o
caput deste artigo.
TÍTULO VII
DO CONTROLE DE CONCENTRAÇÕES
CAPÍTULO I
DOS ATOS DE CONCENTRAÇÃO
Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente:
I - pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no
País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00
(quatrocentos milhões de reais); e
II - pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no
País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00
(trinta milhões de reais).
§ 1º Os valores mencionados nos incisos I e II do caput deste artigo
poderão ser adequados, simultânea ou independentemente, por indicação
do Plenário do Cade, por portaria interministerial dos Ministros de Estado da
Fazenda e da Justiça.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
§ 2º O controle dos atos de concentração de que trata o caput deste
artigo será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta) dias,
a contar do protocolo de petição ou de sua emenda.
§ 3º Os atos que se subsumirem ao disposto no caput deste artigo
não podem ser consumados antes de apreciados, nos termos deste artigo
e do procedimento previsto no Capítulo II do Título VI desta Lei, sob pena
de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária, de valor não inferior a
R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais), a ser aplicada nos termos da regulamentação,
sem prejuízo da abertura de processo administrativo, nos termos do art.
69 desta Lei.
§ 4º Até a decisão final sobre a operação, deverão ser preservadas
as condições de concorrência entre as empresas envolvidas, sob pena de
aplicação das sanções previstas no § 3º deste artigo.
§ 5º Serão proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que
possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na
dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto
no § 6º deste artigo.
§ 6º Os atos a que se refere o § 5º deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites estritamente necessários
para atingir os seguintes objetivos:
I - cumulada ou alternativamente:
a) aumentar a produtividade ou a competitividade;
b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou
c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e
II - sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes.
§ 7º É facultado ao Cade, no prazo de 1 (um) ano a contar da respectiva data de consumação, requerer a submissão dos atos de concentração
que não se enquadrem no disposto neste artigo.
§ 8º As mudanças de controle acionário de companhias abertas e
os registros de fusão, sem prejuízo da obrigação das partes envolvidas, devem ser comunicados ao Cade pela Comissão de Valores Mobiliários - CVM
e pelo Departamento Nacional do Registro do Comércio do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, respectivamente, no prazo
de 5 (cinco) dias úteis para, se for o caso, ser examinados.
§ 9º O prazo mencionado no § 2º deste artigo somente poderá
ser dilatado:
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
I - por até 60 (sessenta) dias, improrrogáveis, mediante requisição
das partes envolvidas na operação; ou
II - por até 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada do
Tribunal, em que sejam especificados as razões para a extensão, o prazo
da prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização
seja necessária para o julgamento do processo.
Art. 89. Para fins de análise do ato de concentração apresentado,
serão obedecidos os procedimentos estabelecidos no Capítulo II do Título
VI desta Lei.
Parágrafo único. O Cade regulamentará, por meio de Resolução, a
análise prévia de atos de concentração realizados com o propósito específico
de participação em leilões, licitações e operações de aquisição de ações por
meio de oferta pública.
Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de
concentração quando:
I - 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem;
II - 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por
compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis
em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer
outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas;
III - 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou
IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo,
consórcio ou joint venture.
Parágrafo único. Não serão considerados atos de concentração,
para os efeitos do disposto no art. 88 desta Lei, os descritos no inciso IV do
caput, quando destinados às licitações promovidas pela administração pública
direta e indireta e aos contratos delas decorrentes.
Art. 91. A aprovação de que trata o art. 88 desta Lei poderá ser revista pelo Tribunal, de ofício ou mediante provocação da Superintendência-Geral,
se a decisão for baseada em informações falsas ou enganosas prestadas
pelo interessado, se ocorrer o descumprimento de quaisquer das obrigações
assumidas ou não forem alcançados os benefícios visados.
Parágrafo único. Na hipótese referida no caput deste artigo, a
falsidade ou enganosidade será punida com multa pecuniária, de valor não
inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 6.000.000,00
(seis milhões de reais), a ser aplicada na forma das normas do Cade, sem
prejuízo da abertura de processo administrativo, nos termos do art. 67 desta
Lei, e da adoção das demais medidas cabíveis.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
CAPÍTULO II
DO ACORDO EM CONTROLE DE CONCENTRAÇÕES
Art. 92. (VETADO).
TÍTULO VIII
DA EXECUÇÃO JUDICIAL DAS DECISÕES DO CADE
CAPÍTULO I
DO PROCESSO
Art. 93. A decisão do Plenário do Tribunal, cominando multa ou impondo obrigação de fazer ou não fazer, constitui título executivo extrajudicial.
Art. 94. A execução que tenha por objeto exclusivamente a cobrança
de multa pecuniária será feita de acordo com o disposto na Lei nº 6.830, de
22 de setembro de 1980.
Art. 95. Na execução que tenha por objeto, além da cobrança de
multa, o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o Juiz concederá a
tutela específica da obrigação, ou determinará providências que assegurem
o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1º A conversão da obrigação de fazer ou não fazer em perdas
e danos somente será admissível se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2º A indenização por perdas e danos far-se-á sem prejuízo
das multas.
Art. 96. A execução será feita por todos os meios, inclusive mediante
intervenção na empresa, quando necessária.
Art. 97. A execução das decisões do Cade será promovida na
Justiça Federal do Distrito Federal ou da sede ou domicílio do executado, à
escolha do Cade.
Art. 98. O oferecimento de embargos ou o ajuizamento de qualquer
outra ação que vise à desconstituição do título executivo não suspenderá a
execução, se não for garantido o juízo no valor das multas aplicadas, para
que se garanta o cumprimento da decisão final proferida nos autos, inclusive
no que tange a multas diárias.
§ 1º Para garantir o cumprimento das obrigações de fazer, deverá
o juiz fixar caução idônea.
§ 2º Revogada a liminar, o depósito do valor da multa converterse-á em renda do Fundo de Defesa de Direitos Difusos.
§ 3º O depósito em dinheiro não suspenderá a incidência de juros
de mora e atualização monetária, podendo o Cade, na hipótese do § 2º deste
artigo, promover a execução para cobrança da diferença entre o valor revertido
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos e o valor da multa atualizado, com
os acréscimos legais, como se sua exigibilidade do crédito jamais tivesse sido
suspensa.
§ 4º Na ação que tenha por objeto decisão do Cade, o autor deverá deduzir todas as questões de fato e de direito, sob pena de preclusão
consumativa, reputando-se deduzidas todas as alegações que poderia
deduzir em favor do acolhimento do pedido, não podendo o mesmo pedido
ser deduzido sob diferentes causas de pedir em ações distintas, salvo em
relação a fatos supervenientes.
Art. 99. Em razão da gravidade da infração da ordem econômica,
e havendo fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ainda
que tenha havido o depósito das multas e prestação de caução, poderá o
Juiz determinar a adoção imediata, no todo ou em parte, das providências
contidas no título executivo.
Art. 100. No cálculo do valor da multa diária pela continuidade da
infração, tomar-se-á como termo inicial a data final fixada pelo Cade para a
adoção voluntária das providências contidas em sua decisão, e como termo
final o dia do seu efetivo cumprimento.
Art. 101. O processo de execução em juízo das decisões do Cade
terá preferência sobre as demais espécies de ação, exceto habeas corpus
e mandado de segurança.
CAPÍTULO II
DA INTERVENÇÃO JUDICIAL
Art. 102. O Juiz decretará a intervenção na empresa quando necessária para permitir a execução específica, nomeando o interventor.
Parágrafo único. A decisão que determinar a intervenção deverá
ser fundamentada e indicará, clara e precisamente, as providências a serem
tomadas pelo interventor nomeado.
Art. 103. Se, dentro de 48 (quarenta e oito) horas, o executado
impugnar o interventor por motivo de inaptidão ou inidoneidade, feita a prova
da alegação em 3 (três) dias, o juiz decidirá em igual prazo.
Art. 104. Sendo a impugnação julgada procedente, o juiz nomeará
novo interventor no prazo de 5 (cinco) dias.
Art. 105. A intervenção poderá ser revogada antes do prazo estabelecido, desde que comprovado o cumprimento integral da obrigação que
a determinou.
Art. 106. A intervenção judicial deverá restringir-se aos atos necessários ao cumprimento da decisão judicial que a determinar e terá duração
máxima de 180 (cento e oitenta) dias, ficando o interventor responsável por
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
suas ações e omissões, especialmente em caso de abuso de poder e desvio
de finalidade.
§ 1º Aplica-se ao interventor, no que couber, o disposto nos arts.
153 a 159 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976.
§ 2º A remuneração do interventor será arbitrada pelo Juiz, que
poderá substituí-lo a qualquer tempo, sendo obrigatória a substituição
quando incorrer em insolvência civil, quando for sujeito passivo ou ativo
de qualquer forma de corrupção ou prevaricação, ou infringir quaisquer de
seus deveres.
Art. 107. O juiz poderá afastar de suas funções os responsáveis
pela administração da empresa que, comprovadamente, obstarem o cumprimento de atos de competência do interventor, devendo eventual substituição
dar-se na forma estabelecida no contrato social da empresa.
§ 1º Se, apesar das providências previstas no caput deste artigo,
um ou mais responsáveis pela administração da empresa persistirem em
obstar a ação do interventor, o juiz procederá na forma do disposto no § 2º
deste artigo.
§ 2º Se a maioria dos responsáveis pela administração da empresa
recusar colaboração ao interventor, o juiz determinará que este assuma a
administração total da empresa.
Art. 108. Compete ao interventor:
I - praticar ou ordenar que sejam praticados os atos necessários
à execução;
II - denunciar ao Juiz quaisquer irregularidades praticadas pelos
responsáveis pela empresa e das quais venha a ter conhecimento; e
III - apresentar ao Juiz relatório mensal de suas atividades.
Art. 109. As despesas resultantes da intervenção correrão por
conta do executado contra quem ela tiver sido decretada.
Art. 110. Decorrido o prazo da intervenção, o interventor apresentará ao juiz relatório circunstanciado de sua gestão, propondo a extinção e o
arquivamento do processo ou pedindo a prorrogação do prazo na hipótese
de não ter sido possível cumprir integralmente a decisão exequenda.
Art. 111. Todo aquele que se opuser ou obstaculizar a intervenção ou, cessada esta, praticar quaisquer atos que direta ou indiretamente
anulem seus efeitos, no todo ou em parte, ou desobedecer a ordens legais
do interventor será, conforme o caso, responsabilizado criminalmente por
resistência, desobediência ou coação no curso do processo, na forma dos
arts. 329, 330 e 344 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 Código Penal.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
TÍTULO IX
DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 112. (VETADO).
Art. 113. Visando a implementar a transição para o sistema de
mandatos não coincidentes, as nomeações dos Conselheiros observarão os
seguintes critérios de duração dos mandatos, nessa ordem:
I - 2 (dois) anos para os primeiros 2 (dois) mandatos vagos; e
II - 3 (três) anos para o terceiro e o quarto mandatos vagos.
§ 1º Os mandatos dos membros do Cade e do Procurador-Chefe
em vigor na data de promulgação desta Lei serão mantidos e exercidos até
o seu término original, devendo as nomeações subsequentes à extinção
desses mandatos observar o disposto neste artigo.
§ 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, o Conselheiro que estiver
exercendo o seu primeiro mandato no Cade, após o término de seu mandato original, poderá ser novamente nomeado no mesmo cargo, observado o
disposto nos incisos I e II do caput deste artigo.
§ 3º O Conselheiro que estiver exercendo o seu segundo mandato
no Cade, após o término de seu mandato original, não poderá ser novamente
nomeado para o período subsequente.
§ 4º Não haverá recondução para o Procurador-Chefe que estiver
exercendo mandato no Cade, após o término de seu mandato original, podendo
ele ser indicado para permanecer no cargo na forma do art. 16 desta Lei.
Art. 114. (VETADO).
Art. 115. Aplicam-se subsidiariamente aos processos administrativo
e judicial previstos nesta Lei as disposições das Leis nos 5.869, de 11 de janeiro
de 1973 - Código de Processo Civil, 7.347, de 24 de julho de 1985, 8.078, de
11 de setembro de 1990, e 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
Art. 116. O art. 4o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990,
passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 4º ............................................................................................
...................................................
I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste
ou acordo de empresas;
a) (revogada);
b) (revogada);
c) (revogada);
d) (revogada);
e) (revogada);
f) (revogada);
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando:
a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas;
b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo
de empresas;
c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de fornecedores.
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa.
III - (revogado);
IV - (revogado);
V - (revogado);
VI - (revogado);
VII - (revogado).” (NR)
Art. 117. O caput e o inciso V do art. 1o da Lei no 7.347, de 24 de
julho de 1985, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
.............................................................................................
V - por infração da ordem econômica;
...................................................................................” (NR)
Art. 118. Nos processos judiciais em que se discuta a aplicação
desta Lei, o Cade deverá ser intimado para, querendo, intervir no feito na
qualidade de assistente.
Art. 119. O disposto nesta Lei não se aplica aos casos de dumping
e subsídios de que tratam os Acordos Relativos à Implementação do Artigo VI
do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, promulgados pelos Decretos nos 93.941 e 93.962, de 16 e 22 de janeiro de 1987, respectivamente.
Art. 120. (VETADO).
Art. 121. Ficam criados, para exercício na Secretaria de Acompanhamento Econômico e, prioritariamente, no Cade, observadas as diretrizes
e quantitativos estabelecidos pelo Órgão Supervisor da Carreira, 200 (duzentos) cargos de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental,
integrantes da Carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, para o exercício das atribuições referidas no art. 1o da Lei no
7.834, de 6 de outubro de 1989, a serem providos gradualmente, observados
os limites e a autorização específica da lei de diretrizes orçamentárias, nos
termos do inciso II do § 1o do art. 169 da Constituição Federal.
Parágrafo único. Ficam transferidos para o Cade os cargos pertencentes ao Ministério da Justiça atualmente alocados no Departamento
de Proteção e Defesa Econômica da Secretaria de Direito Econômico, bem
como o DAS-6 do Secretário de Direito Econômico.
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
Art. 122. Os órgãos do SBDC poderão requisitar servidores da
administração pública federal direta, autárquica ou fundacional para neles
ter exercício, independentemente do exercício de cargo em comissão ou
função de confiança.
Parágrafo único. Ao servidor requisitado na forma deste artigo
são assegurados todos os direitos e vantagens a que façam jus no órgão
ou entidade de origem, considerando-se o período de requisição para todos
os efeitos da vida funcional, como efetivo exercício no cargo que ocupe no
órgão ou entidade de origem.
Art. 123. Ato do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento
e Gestão fixará o quantitativo ideal de cargos efetivos, ocupados, a serem
mantidos, mediante lotação, requisição ou exercício, no âmbito do Cade e da
Secretaria de Acompanhamento Econômico, bem como fixará cronograma
para que sejam atingidos os seus quantitativos, observadas as dotações
consignadas nos Orçamentos da União.
Art. 124. Ficam criados, no âmbito do Poder Executivo Federal,
para alocação ao Cade, os seguintes cargos em comissão do Grupo-Direção e
Assessoramento Superiores - DAS: 2 (dois) cargos de natureza especial NES
de Presidente do Cade e Superintendente-Geral do Cade, 7 (sete) DAS-6, 16
(dezesseis) DAS-4, 8 (oito) DAS-3, 11 (onze) DAS-2 e 21 (vinte e um) DAS-1.
Art. 125. O Poder Executivo disporá sobre a estrutura regimental
do Cade, sobre as competências e atribuições, denominação das unidades
e especificações dos cargos, promovendo a alocação, nas unidades internas
da autarquia, dos cargos em comissão e das funções gratificadas.
Art. 126. Ficam extintos, no âmbito do Poder Executivo Federal,
os seguintes cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS e Funções Gratificadas - FG: 3 (três) DAS-5, 2 (duas) FG-1
e 16 (dezesseis) FG-3.
Art. 127. Ficam revogados a Lei no 9.781, de 19 de janeiro de 1999,
os arts. 5º e 6º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e os arts. 1o a
85 e 88 a 93 da Lei no 8.884, de 11 de junho de 1994.
Art. 128. Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e
oitenta) dias de sua publicação oficial.
Brasília, 30 de novembro de 2011; 190º da Independência e 123º da República.
DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Guido Mantega
Eva Maria Cella Dal Chiavon
Luís Inácio Lucena Adams
Este texto não substitui o publicado no DOU de 1º.11.2011 e retificado em 2.12.2011
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LEIS E ATOS NORMATIVOS
L E I N º 1 2 . 5 2 7 , D E 1 8 D E N O V E M B R O D E 2 0 11
Regula o acesso a informações previsto no inciso
XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3o do art. 37 e no
§ 2o do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei
no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei
no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da
Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras
providências.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte