Resenha: Enigmas da Alma

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Resenha: Enigmas da Alma
Resenha: Enigmas da Alma
Janice Inchauspe Pereira¹
médica e psicanalista Sabina Spielrein que, em 1905,
aos dezenove anos, é internada pelos pais no Hospital
Psiquiátrico de Burghozli-Zurique. Um ano após a perda
da irmã, apresentava sintomas de histeria. Carl Gustav
Jung, um jovem médico residente do hospital assume o
caso e, inspirado por seu mestre Sigmund Freud, utiliza
os conhecimentos da psicanálise. No decorrer do tratamento, se estabelece forte ligação afetiva entre médico
e paciente.
contexto em que surge e se desenvolve a psicanálise,
sobre métodos, sobre a condição humana dos terapeutas e, especialmente, sobre a alma feminina e a situação
da mulher no mundo da ciência e do trabalho nos anos
1900. Nessa época, Jung, comprometido com o processo de humanização dos tratamentos, introduz a “conversa” como método e a relação terapêutica é concebida
como um espaço de troca onde ocorrem interações entre
inconscientes. O relacionamento de Sabina e Jung ilustra os efeitos dessas interações tanto na vida da paciente como na do terapeuta. O envolvimento entre eles
ultrapassa limites e aciona em ambos elementos que,
com o passar do tempo, criam consciência. Coexistem
as criticas aos aspectos nocivos do envolvimento entre
pacientes e terapeutas assim como as recomendações
sobre um mínimo de envolvimento necessário para que a
relação seja terapêutica.
usando esse termo, primeira a elaborar uma tese
sobre psicanálise em uma universidade – praticamente
relações, especialmente as que se estabelecem entre
terapeutas e pacientes, tem o mérito de tirar Sabina do
anonimato. Mostra como a ignorância estigmatizava e
continua a estigmatizar. Mostra a jornada heroica que
cada um precisa empreender para tornar-se quem é.
Mostra que encontros autênticos e sensíveis são raros,
mas determinantes no crescimento. Mostra que a saída
do caos é possível quando se estabelecem relações de
valorizar o que há de saudável em cada um. Mostra que o
maior delito que se pode cometer com alguém é impedir
o desenvolvimento de suas potencialidades. Mostra que
o sofrimento faz parte da jornada. Mostra que existe uma
força interna que nos impele a realização. Mostra que temos modos únicos de existir e que precisam ser acolhidos. Mostra a importância de valorizar a contribuição de
cada um nessa empreitada fadada ao fracasso: decifrar
os enigmas da alma humana... E por falar em enigmas,
destaque para Tumbalalaika (recordações), música especial da trilha sonora.
Sabina, uma das primeiras psicanalistas do mundo, é rusque durou um ano, deu continuidade ao tratamento com
Jung com quem manteve um relacionamento afetivo
durante os sete anos seguintes. Sua história de vida e
dicina. Orientada por ele, conclui os estudos com uma
dissertação sobre esquizofrenia. Anos após a ruptura
desse relacionamento, retorna para a Rússia casada com
“Berçário Branco”, pré-escola cujos princípios contêm
determinantes de seu adoecimento e internação: a sexualidade, a liberdade e o desenvolvimento da capacidade
critica. Após três anos, a escola é fechada pelo governo soviético sob a acusação de ensinar práticas sexuais
perversas. Ironicamente, uma das cenas mais bonitas do
superar seus medos por meio do contato com um chimpanzé.
Durante as próximas seis décadas, nunca mais se ouve
falar em Sabina. Inovadora, pioneira – primeira analista
mulher de crianças, primeira a escrever sobre esquizofrenia
1 Psicóloga, Mestre em Educação, Doutora em Psicologia, Coordenadora do Curso de Psicologia da Faculdade IBGEN.
2 Direção: Roberto Faenza; País: FRA/ITA/ENG; Gênero: Drama. Duração: 89 minutos. Ano: 2003.