ronco dos motores e das guitarras

Transcrição

ronco dos motores e das guitarras
CIRCUITO DAS AMERICAS
Mir6-Rivera e Associ ados. Austin, Estados Unidos . 2012
INTERNACIONAL
RONCO DOS MOTORES
E DAS GUITARRAS
POR FERNANDO LUIS LARA
Arquitetos projetam urn espa~o de encontro que
pode receber shows e eventos durante to do o ana
no novo aut6dromo de Formula 1 em Austin
afortuna
Confesso que me arrepio toda ve z
Ecclestone, aqui associado
que vejo adjetivos como "mundial"
de joe "Red" McCombs (bilionario
ou "das americas" descrevendo
texan a dono de concess ionarias
algo que so diz respeito aos Estados
de automoveis) e a Bobby Epstein,
Unidos, como na World Series do
resolveu que A us lin seria sua casa
beisebol. lncrivel como os ianques
nos Estados Unidos pelos pr6x imos
tem a facilidade de vender tudo
nove anos. Assim surgiu um aut6·
o que fazem como alga para o
dromo novinho em folha , corn capa·
planeta intei ro. P.or isso, come~o
cida de para 120 m il espectadores,
este texto criticando a pretensao
em uma cidade que ainda nao bateu
da pista de For mula 1 de Aus tin
a marca de 1 milhao de habitantes.
de se autoint itu lar Circuito das
Mais ou menos a propon;:ao que
Amer icas, principalmente em um
tinha o Maracana quando inaugu·
pals que ate m uito pouco tempo
rado no Rio de janeiro de 1950.
nao dava a menor bola para a F1.
Mas ao arranhar um pouco este
0 circui to em si foi projetado
pelo escritorio alemao Tilke GmbH,
verniz pretensioso percebe-se ou tra
au tor de outra s duas dezenas de
narrativa. Cien te de que o passado
pistas. E para tod a a arquitetura ao
os une ao Mexico eo futu ro passa
redor do circui to foi cont ratado o
pel a integra<;ao com os vizinhos ao
escri t6rio mais premia do de Austin:
sui, Austi n
e hoje uma cidade que
Mir6-Rivera and Associa tes.
to ma consciencia da sua latin idade,
Juan Miro nasceu em Barcelona,
celebrada ainda que de forma des as·
cresceu em Madri e veio para os Es-
trada. E, como bem sabem os que
tados Unidos cursar o mestrado em
acompanham a Formula 1, elegancia
Yale. Miguel Rivera nasceu em Porto
e discri~ao nao sao qualidades fa·
Rico e estudou tambem na Colum-
cei s de encontrar. 0 circa de Bernie
bia University. No inicio dos anos de
1 arqu1'bane ada principal
2 tickets
.
.. -- --..
. ·-
'
Grande Plaza
passarela de pedestres
7 gra,,de area verde
II
8 concessoes
9 assemos na gram a
'O-ARQUIBANCADA
IM PLANTA~A
. PRINCIPAL
4 est~ndes
. ~o
S a nlitea troAustm 3o
6 ass en tos na grama
(parte alta)
1o lago
t·ada
11 por tOes de en
12 tickets
- ANFITEATRO
IM PLANTA<"'AO
•· -r
au
torre do observat6no
, 360
anfitea tro AuStin
(
1 pista
..
2 torre do observatono
3 passarela de
pede sues
58
3
4
S
6
OEZEMBRO 2013 INTERNACIONAL
1 tickets
2 portliesdeentrada
3 plataformasdecarga
4 concessl5es
s
p1sta
6 saida dos boxes
7 boxes
0
CIRCUITO COM PORTA NAO APENAS
A $ PISTA$ PARA CORR IDAS DE FORMULA
1,
MAS ~ TAMBEM UM COMPLEXO
DE ENTRETEN IMENTO, COM UM
A NFITEATRO PARA SHOWS DE MUSICAIN CLUINDO ESPA<;O PARA ORQUESTRA
- E ASSENTOS TANTO FIXOS QUANTO N A
GRAMA AO REDOR DO PALCO
---- -
0
10
VISTA LATERAL- ARQU IBANCADA PRINCI PAl
1990 os dois se conheceram no escrit6r io de Ch arl es Gwathmey, o menos con hecido dos N ew Yor k Five.
Apaixonados pel a cidade que tem
na latinidade uma de suas marcas
registradas. j uan Mir6 e Miguel
Rivera m on taram aqui o escrit6ri o
M ir6-Rive ra e construiram uma
parceria premiada - como a ponte
de pedestres (2005) e os banheiros
publicos do Zilker Park (20 07)- A
ponte de pedestres
e 0 projeto mais
premia do da dupla. Dois grandes
tubos de a<;o curvados servem de supor te principal. Ate ai, nada de m ais.
A genialidade esta no rendilhado
fe ito de vergalhoes dobrados que sao
o piso eo guarda-corpo da ponte_
Tudo pulsando em laranja-fe rrugem,
o ritrno dos ve rgalhoes alternando
para ci rna (gu arda -co rpo) ou para
baixo te nde ao etereo Com o raizes
suspensas ou trepadeiras penduradas, a pon te e de uma delicadeza 1mpar. Nos banheiros publicos. a enfase
na materialidade e na simplicidade
retorna sob a forma de placas de a~o
retangulares de dimensoes das mais
variadas cravada s no chao, como
um pequeno labirin to que esconde
a maior par te do co rpo do usuario
en quan to a abertura visual superio r
gara nte a segu ran~a . Os arquitetos
demonstrararn ainda es tarern
afinados co m o dim a de Aust in: uma
cidade que nao se preocupa com a
chuva em 350 dias por ano. mas para
completamen te devido a aguaceiros
nos 15 restan tes_ De toda fo rma,
os banhe i ros ao ar Iivre sao usados
tranquilam ente na maior parte do
ano e lavados pel as tempestades.
Mas
e o Circu ito das Americas a
59
maior obra da dupla Mir6 e Rivera
ate agora. Muito mais que uma
simples pista de corrida, o Circuito
e um complexo de entretenimento.
A palavra circuito vem do latim
circus, substantive masculine que
significa recinto para espetaculos
publicos. Aqui, a pista de corr ida
vem agregada a ediffcios de arqui·
bancadas que podem.comportar
ate 120 mil pessoas (o tamanho
ARQUIBANCAOA PRINCIPAL - Jll PAVIMENTO
do novo Maracana). E, como bern
demonstram nossos reformados
estadios, o entretenimento vern
associado a todo tipo de salas VIP,
lojas, restaurantes e estacionamento, muito estacionamento.
Por Austin ser uma cidade
ainda de tamanho medio (750 mil
habitantes) o impacto de 6o mil
autom6veis em uma mesma dire~ao
pode ser brutal. Na inaugura~ao
do circuito em novembro de 2012
ARQUIBANCADA PRINCIPAl - 22 PAVIMENTO
havia dois corredores implementados. Um terrestre, com onibus
indo e voltando do centro a cada
cinco minutos, e outro aereo, com
helic6pteros fazendo o mesmo
percurso ate o topo dos hoteis.
0 Circuito consegue receber este
fluxo sem maiores problemas. As
varias entradas sao bem sinalizadas
e quem estaciona nas areas VIP entra
rapidamente para suas respectivas
arquibancadas ou salas especiais.
CORTE - ARQUIBANCAOA PRINCIPAL
60
au
OEZEMBRO 2013
INTERNACIONAL
ARQUIBANCAOA PRINCIPAL - 111 PAVIMENTO
10
............,..
0
0
CIRCUITO FOI PROJETADO PELO
ESCRIT6RIO ALEMAO TllKE GMBH,
ENQUANTO A ARQUITETU RA AO
REDOR DO CIRCU ITO FICOU A CARCO
DO MrR6-RIVERA, ESCRIT6RIO DE
AU STIN FORMADO PELO ESPANHOL
jUAN M1R6 E PELO PORTO· RIQUENHO
MICUEL RIVERA
a
9
---
CORTE - TORRE DO OBSERVAT6RIO
pista
2 observat6rio
3 elevador
4 entrada
0
s cobertura
a
6 palco
7 assentos ou espa~o
9 plateia (assentos na
assentos fixos
10
grama)
para orquestra
19
I I
DETALHE - TORRE DO OBSERVATORIO
1 sinalizador
2 escada de metal com posto de segura~a
estendivel
3 autofalante
4 mecanismos do elevador
5 membrana de cobertura de TPO
(poliolefinas termoplasticas)
6 isolamento
7 steeldecl<
a
cabos do elevador
9
tubo dea~o
10 cober-turatubulardea~
0
I I
...............1
11 coluna e suporte de a~o
12 cintaebarradea~
13 chapa de a~o
14 vigadea~o
15 guarda-corpo de vidro lamina do
16 parede de concreto
17 corrim~o de aco
1a escada metcllica
19 funda~3o de concreto
20 coluna metalica
21 drenagem Hnear
22 asfalto
VISTA DO DECK- TORRE DO OBSERVATORIO
61
0 publico em geral estaciona mais
Ionge esc desloca de micm -6nibus
ou a pe para uma grande pra t;:a que
serve como rece p~ao. Al i funciona
urn aniiteatro ao ar livre com ca paci dade para 6,6 mil pessoas sentadas
e possibilidade de receber ate 14 Mil.
A ideia
eque o complexo seja
utili zado durante todo o ana para
espetaculos deste porte. Sendo
Austin uma cidade que se gaba de
ser atua lmente a capital da musica
nos Estados Unidos, com dois
enorrncs fes tivais (Austi n Ci ty Limi ts
em outubro e Sou th
by Southwest
em mar~o). a decisao fa z sentido.
Percebendo o anfiteatro como
centro de gravidade do circui to,
a dupla Mir6 e Rivera gua~dou
para este espa'io o melhor da sua
cri atividade. Em um gesto que
lembra a pon te para pedestres, mas
na esc al a global da Form ula 1, uma
ser ie de tubos vermelhos sai de
t ra s do palco do anfiteat ro e so be
envo lvendo a terre de cor trole do
circuito. De novo, um material generico como tubos metalicos ganha
nobreza e destaque pela repetio;ao
que o trans forma em elemento de
defi ni ~~o espacial. A terre, fcone
do circui to, derrama -se sobre o
an htea tro cos tu ra ndo os do is usos
pnn cipai:; do co mp lexo: o ro nco
dos mo tores eo das guitarras.
Urn projeto com a cara dos dois
arquitetos: simples e direto, sem elocubra~oes forma is ou corceitos p6s-
·estruturalistas. Uma arquiteh.. ra que
simplesmente transform a materiais
normais em espa~os excepcionais.
Tudo foi cons truldo em tempo
recorde: menos de 12 meses de
obra. Quand o se trata de desafios
desta magnitude. urn pouco de
latinidade na criatividade e no
jogo de cin tura faz diferenc;:a. Se o
circuito merece o adjetivo "of t:1e
Americas•
eporque Mir6 e Rivera
desenharam os edificios com
significa tiva revere ncia ao luga:.
62
all
D EZEMBRO 2013 INTERNACIONAL
PERCEBEN DO 0 ANFITEATRO COM O 0
CENTRO DE CRAVI DAOE DO COMPLEXO,
OS ARQUITETOS PRO )ETARAM UMA
SERl E DE T UBOS M ETALICOS Q UE
SAEM DE TRAS D O PALCO ESE ELEVA
ENVOLVEN OO A TORRE DE CO NT ROLE
D O CIRCUITO, TRANS FORMAN DO-A EM
(CONE DO COMP LEXO
BETWEEN THE ROAR OF ENGINES AND OF GUITARS
Latinity. celebra ted, albeit disastrously,
see odjec!ives like "World" or "of the
here. The circuit itselfwas projected by
Americas" describing something that
the German firm Tilke GmbH a<. Co.,
<:>nljl CJddresses the United States, Nkc
au tl1or of another two Jv~M rvu:ways.
in th e Boseball "World Series·. It is
And the firm Mir6-Rivera Architects
amazing how the Yankees car. easily
was hired for all the architecture
sell everyth ing they do as somethingfor around the circuit. Much more thon
an ordinary race trock, the Circuit is on
the entire plane:. That is why I began
entertainment complex. The idea is fo r
this text criticizi'1g the prt tentiousness
the complex to be used throughout the
of the Austir. Formula 1 Racing Circuit
on being selfent;tled as the Circ1.1 it of
year fo r shows and, on perceiving the
amphitheater as the circuit's center of
the Americas, moinly in a country that
gravity. the Mira and Rivera team saved
un!il not too long ago did not gi Je the
the best oftheir creativity fo r this space.
slightest hoot for F;. Yet, on scraping
A series of red tu bing raises up out from
off a little ofthis pretentious varnish,
another r.arro1ive is perceived. On
~find the stage of the amphitheater
and in vol:~es the circuit control tower.
keeping in mind that the past unites
the city w;th Mexico and that the future The citcuit icon tower spills out above
the amphitheater hemming in the
lies along integration with its neighbors
to the south, Austin is, today, a city
complex's
two main uses: the roar of
,,
that has embraced the awareness af its
engines and guitars.
I cor.Jess thot I shudder every time I
FICHA TECNICA
ARQUITETURAjuan Mirci. FAIALEEOAP.Miguel
Rivera. AlA LEEDAP
COLABORADORES Ken jone s (Sen ior
associate). Matthew Sturich (associate). Sarah
Hafley. Diana SU, Spencer Cook, Michael Hsu,
Ed Richardson
ENGENHARIA CIVIL Carlson Br ig ance &
Doering
ENGENHARIA DE ESTRlfTURASWalterP. Moore
ENGENHARIA EltTRICA E HIDRAULICA Bay &
Associates
ILU M I NA.;AO Arc light Design
ACESSIBIUDADE Altura Solutions
ACI:ISTICA Acoustic Dimensions
GEREN<:IAMENTO ECONSULTORIA DE
CONSTRU~O
MBCConsultants
PROTE~O CONTRA FOCO Rolf Jen sen
&
Associates
FABRICA~JI.O DE A~O Patriot Erectors
·
au.pini.com.br
Comente este projeto
63
Olhar de arquiteto
Quatroemum
Segredo nas rafzes
Dois mineiros que se conheceram
Tr~s paineis interligados por dobra-
Juan Mir6 e Miguel Rivera D ,
em Sao Paulo, na FAUUSP, tornaram -
di<;as que representam tr~s pontos
mesmo vindo de palses di ferentes
·Se amigos e abriram um escrit6rio.
sobre a arte. Foi no significado
- Juan e da Espanha e Miguel e de
da palavra tri ptyque (triptico, em
Porto Rico- cresceram em rne io
Essa
e a hist6ria de Marcei::J Ferraz e
Francisco Fanucci D, socics do Bra sil
frances) que a agencia franco-
as cons tru ~oes. 0 pai de Juan era
Arquitet ura desde 1979 - nesses 34
·brasileira buscou inspira~ao para
arquiteto eo de Miguel, empreitei-
anos, trabalharam com projetos de
seu nome. Na Triptyque Arquitetura
ro. "Nossa educa~ao nos prepa-
recupera~ao e restauro e fundaram,
nao sao tres, mas quatro arquitetos
rou muito bem para coordenar,
inclusive, uma loja de moveis. a Mar-
que comp<5em o time: a bra sileira
como arqui tetos, um complexo
ce naria Barauna. Para Marcelo, mes-
Carolina Bueno e os franceses Gre-
processo ", lembra Mir6. Os dais
mo no desenho de m6veis, o olhar
gory Bousquet, Guillaume Sibaud e
foram continuar os estudos nos
eo mesmo dos proretos arquitetonicos. 0 segredo e pensar como ar-
Olivier Raffaelli D . Ape~ar de todos
Estados Unidos, um momenta
serem graduados pela Ecole nationa-
de "muita reflexao e discussao na
quitelo e transpor os conceitos.
Eda
dupla o Con junto I<I<I<K, em Registro,
le superieure d'architecture Paris-Va l
carreira", segundo a dupla. Foi o
de Seine, a sede escolhida para
Texas o des tine escolhido para
SP, que ganhou o Pr~mio IAB-SP de
o primeiro escrit6rio foi o Brasil,
fundar o escritorio Mir6-Rivera, em
melhor revitaliza~ao de edificios em
em 2000. Hoje, o grupo tern uma
2000. Juntos. ganharam pr~mios
2002. A Pra~a das Artes, em Sao
unidade tambem em Paris. Com tra-
internacionais, como uma mens;ao
Paulo (AU 227), tam bem esta entre
balhos que buscam combinar o co n-
honrosa na Bienal lnternacional de
seus projetos de destaque.
cret o e a natureza, os arquitetos ja
Arqui tetura, em 2009, eo primeiro
expuseram na Bienal de Arquitetura
Iugar na London International Cre-
em Veneza em 20o8, 2010 e 2012,
ative Competition, em 2008.
e assinaram projetos de sucesso,
como o Harmonia 57 (AU 174).
IMACENS 1 FelipeHelimeister 2 divulga~ao Triptyque 3 divulga~o Mir6-Rive.-a Architects
104
au
DEZEM BRO 2013 ARQUITETO S

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