Inovação em desIgn na hIstóRIa do underwear masCulIno

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Resumo
O presente artigo tem como objetivo estudar a evolução do
underwear masculino com ênfase no período do século XX aos
dias atuais, identificando aspectos inovadores de design e sua
relação com o contexto sócio-cultural.
Palavras-Chave: underwear masculino; design; inovação
Design, Arte, Moda e Tecnologia.
São Paulo: Rosari, Universidade Anhembi Morumbi, PUC-Rio e Unesp-Bauru, 2010
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Inovação em design na história do underwear masculino
Introdução
A palavra underwear é entendida hoje, dentro do contexto atual da moda, como
conceito que extrapola o sinônimo de cueca ou roupa de baixo. Dentro do sistema de moda
o underwear está ligado a elementos e significados que remetem a um estilo de vida. Porém,
este conceito foi instituído na década de 1980, até então encontrávamos produtos com foco
na função de uso.
Com exceção às camisolas ou túnicas usadas por homens e mulheres como roupa
interior, a diferença na anatomia ditou variações básicas das peças íntimas masculinas e
femininas. O underwear feminino tem um maior apelo voltado para a estética e a sexualidade
ao invés de praticidade. Já com as peças masculinas a primeira preocupação foi por muito
tempo apenas funcional, confeccionadas de acordo com a forma do corpo, em materiais
resistentes e na cor branca.
O que chamamos de roupa íntima ou roupa de baixo, enquanto produto de design,
passou por inúmeras inovações incrementais, tecnológicas e até sustentáveis para chegar aos
produtos que encontramos no mercado atualmente.
Inovações no Design do Underwear Masculino
As cuecas, como conhecemos hoje, foram criadas no século XX, até então havia
peças que compunham a roupa interior. No entanto, as tangas já eram usadas na pré-história.
Segundo Benson & Esten (1996), em 1991 montanhistas encontraram nos Alpes Tiroleses, os
restos congelados de um homem que viveu cerca de 3300 a.C. Ele usava uma tanga de couro
sob a capa, fornecendo a documentação mais antiga de underwear masculino.
Depois da invenção da energia hidráulica, das máquinas de fiação e do descaroçador de
algodão durante a Revolução Industrial, o underwear poderia, pela primeira vez, ser produzido
em massa, o que causou uma reestruturação dos processos e do consumo. As pessoas
começaram a comprar suas roupas íntimas nas lojas em vez de fazê-los em casa, o que podia
levar até três dias.
A roupa de baixo padrão deste período para homens, mulheres e crianças foi os “union
suits”. Uma espécie de macacão, geralmente feito em malha, que cobria desde os tornozelos
até os punhos, possuía uma abertura na parte superior na frente fechada por botões, e uma
abertura na parte de trás inferior de vestir e facilitando os atos de vestir e ir ao banheiro. Em
1895 o catálogo Montgomery Ward (figura 1) oferecia peças em “lã de cor natural, cinza e
vermelho, que se tornou muito popular.
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Figura 1: Catalogo Montgomery Ward de 1895
Destacamos o uso da cor vermelha como um indício de outras inovações tecnológicas
no desenvolvimento da roupa de baixo. Pois, indicava o domínio da técnica de tingimento da
lã em vermelho, uma cor forte e que precisava de uma boa fixação para não descolorir. Thales
de Andrade (2004), entende por inovação tecnológica alterações e/ou criações tecnológicas
significativas em produtos e processos. A inovação tecnológica pode ser considerada como a
transformação de uma idéia em um produto ou processo novo para utilização na indústria, no
comércio, na ciência ou em uma nova leitura de um serviço social.
No século XX, a historia do underwear masculino, parece ser uma história americana,
as maiores empresas e os grandes investimentos estavam nos Estados Unidos. Havia também
empresas francesas que se destacavam na produção de roupas íntimas mas, os lançamentos
e inovações geralmente ocorriam primeiro na América.
Joe Boxer (1995) observa que como muitos produtos importantes, roupa interior foi
melhorada significativamente pela guerra. Durante a Primeira Guerra Mundial, foi confeccionado
o primeiro bermudão com botões (figuras 2 e 3), como underwear de verão para os soldados
da infantaria. As peças tiveram tão boa aceitação, que os homens insistiram em usá-las quando
eles voltaram para casa.
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Figura 2: Bermuda usada na I Guerra Mundial
Figura 3: Detalhe dos botões
Os esportes e as guerras tiveram forte influência no uso da roupa interior, e com o
surgimento do bermudão com botões, vemos uma importante inovação incremental na roupa
de baixo. De acordo com Fontanini & Carvalho (2005) dentro de um processo de inovação, as
inovações incrementais estão inseridas em um contexto peculiar de investimentos (tempo e
necessidades) em que gradualmente a empresa promove melhorias e aperfeiçoamentos em
seus produtos, equipamentos e métodos de fabricação. A inovação incremental é aquela em
que o novo produto ou processo incorpora alguns novos elementos em relação ao anterior,
sem que, no entanto, sejam alteradas as funções básicas. Neste caso, ocorre a separação do
union suit em camisa e bermuda, mas estas peças continuaram a desempenhar papel de roupa
interior. Estas modificações no produto acarretaram também modificações os processos, de
forma incremental.
Segundo Blackman (2009) a tecnologia e modernização das cidades trazem novos estilos
de vida, assim, quando o homem tornou-se mais ativo e sua roupa interior começou a ser mais
leve, mais fina e confortável. Os esportes tornaram-se parte do lazer vigente, trazendo com
ele a necessidade de liberdade de movimentos. Na década de 1920 as empresas americanas
investiram em diversas tecnologias e usavam os anúncios publicitários para divulgar a patente
de seus novos projetos. Os avanços tecnológicos nos materiais ganharam destaque, entre
eles estavam os tecidos pré-encolhidos e com propriedades de isolamento térmico, como o
Duofoldi (figura 4); e Keepkool (figura 5), que tratava-se de underwear feito em ribana elástica
e porosa que oferecia conforto e frescor.
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Figura 4: Anúncio de undewear com Duofold
Figura 5: Anúncio de undewear Keepkool
As inovações em modelagem também causaram grande impacto e melhorias na
usabilidade da roupa interior. A empresa Swiss American lançou o Navycltohh (figura 6), um
modelo de union suit curto e com peces nas costas para dar melhor ajuste ao corpo. Já a
marca Hatchway criou um modelo em malha com transpasse frontal, que dispensava o uso
de botões (figura 7).
Figura 6: Anúncio de undewear Navicloth
Figura 7: Anúncio de undewear Hatchway
Os “shorts íntimos” foram a novidade que chegou com o século XX. De acordo com John
de Greef (1989), duas invenções na década de 1930 modificaram o conceito de underwear,
aproximando-o das peças que conhecemos hoje. A primeira foi quando Jacob Golomb, o
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fundador da marca Everlast, aplicou um cós elástico nos calções íntimos, deixando-o com
a aparência do short de pugilista, esta peça ficou conhecida como boxerii e a segunda foi a
criação do Jockey Breif ®iii ou slip Jockey (figura 8).
A cueca slip Jockey foi criada em 1934 por Arthur Kneibler, um executivo e designer da
Cooper Inc. A inspiração para o modelo veio de cartão-postal da Riviera Francesa, mostrando
um homem em um maiô estilo biquíni. Depois de algumas experiências, Kneibler introduziu
um novo tipo de roupa interior, confortável sem pernas, com uma sobreposição em Y invertido
parte da frente. Tal formato trazia benefícios funcionais, oferecendo aos seus usuários mais
conforto e suporte do que as outras roupas íntimas masculinas disponíveis no momento.
Figura 8: Modelo Slip Jockey (1935)
Com certeza este dois produtos revolucionaram o mercado de roupa íntima na década
de 1930, mas discordamos de John de Greef quando ele afirma que a concepção da cueca
boxer é uma invenção, trata-se sim de mais uma inovação incremental nesta linha de produtos.
Já o modelo de cueca slip, pode ser considerado uma invenção, que conforme Gomes (2001)
apresenta-se como um produto novo, desenvolvido a partir da manifestação da criatividade
utilizada com foco no incremento funcional do mesmo. Um invento dotado de novidade,
atividade inventiva e utilidade industrial, torna-se suscetível de concessão de patentes. O que
aconteceu com a Jockey Breif ®, patenteada no mesmo ano de sua invenção.
Conforme Bernhard Roetzel (2000), o modelo slip tornou-se “uma cueca verdadeiramente
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revolucionaria”. Sua modelagem apresentava a vantagem de proporcionar mais su¬porte e
de não marcar ou fazer volume sob as calças leves. Seu corte particular¬mente confortável,
oferecia suporte e um perfeito encaixe, e sobretudo era confeccionada em material de
excelente qualidade. A fita elástica intro¬duzida na parte abaixo da virilha, apenas ajustava a
parte exterior da coxa de forma a não prejudicar a circulação do sangue. Para o autor, o êxito
das cuecas justas da marca Jockey também teve conseqüências no restan¬te roupa, pois
permitiu que as calças fossem confeccionadas com cortes mais ajustados. “Em combinação
com as cuecas Jockey, adaptadas à anatomia do ho¬mem, as calças modernas ajustavam-se
pro-gressivamente mais.” (ROETZEL, 2000 p. 46).
Mais tarde, em 1944, outra marca americana, a Munsingwear, modificou a contronstrução
da parte frontal da cueca slip, tranzendo um bolso horizontal amplo e aberto. E chamou o
produto de Slip Kanguru, devido a relação com a bolsa do marsupial (figuras 9 e 10).
Figura 9: Anúncio da marca Munsingwear 1945
Figura 10: Ilustração do modelo slip Kanguru
O sucesso da slip Jockey não eliminou o modelo boxer. Seu uso passou a ser uma
questão de escolha, pois por mais conforto que a slip pudesse oferecer, para os adeptos da
boxer, ela era sempre apertada. As boxers tinham a vantagem de poder ser feitas sob medida
por um alfaiate, o que simbolizava uma questão de status.
De acordo com John de Greef (1989), nos anos de 1930, o raiom foi introduzido na
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produção de cuecas, uma novidade vendida sob a denominação de seda artificial. Outro
marco importante, foi a introdução dos Fasteners Gripper, um pequeno fixador de pressão.
A publicidade da Scovill Manufacturing Companyiv divulgada na Publication Unknown em
1937 (figura 11), anunciava as vantagem destes fixadores sobre os botões. Para isto usava
o depoimento de Ralph Guldohl e Sam Snead, dois jogadores premiados de golf, sobre a
facilidade dos fixadores na prática de esporte, pois estes ficavam embutidos, não faziam volume
e não machucavam. E de donas de casa, que destacavam que os grippers não quebravam, o
que acontecia constantemente com os botões comuns durante o uso ou a lavagem da peça.
A anúncio destacava ainda, marcas de underwear que usam seus Fasteners Gripper.
Figura 11: Anúncio da Scovill Manufacturing Company 1937.
A revista Life abriu uma nova era de foto jornalismo em 23 de novembro de 1936. Logo
Jockey, Scovill, Quickees entre outras empresas estavam utilizando fotografias em vez de linha
de desenhos em anúncios de suas roupas íntimas, como observado na figura acima.
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Na primeira metade da década de 1940 a inovação no underwear masculino permaneceu
estática. Benson & Esten (1996), destacam que isto ocorreu porque toda a energia americana
estava voltada para o esforço de guerra. A escassez causada pela guerra estava declarada
em um anuncio da marca Jockey que dizia: “Tio Sam precisa de borracha por isso o cós da
Jockey não é mais de elástico”. Neste momento viu-se o retorno do cós de tecido com dois
botões laterais. Mas a guerra também trouxe uma novidade à roupa íntima, a introdução do
conceito de cor. Para uma melhor camuflagem os soldados usavam cuecas verde-oliva, pois
observaram que as peças brancas chamavam a atenção do inimigo quando estavam para
secar. Em 1944 marca Zorba, entrou no mercado nacional e virou sinônimo de cuecas no
Brasil.
Após a guerra, a Cluett, Peabody & Co. Inc, desenvolveu e patenteou o “Sanforized”,
um novo processo de pré-lavagem que impede os tecidos de encolherem. Passam a
ser comercializadas cuecas com o tecido cortado em viés, que se adaptavam a todos os
movimentos. As inovações foram imediatamente adotadas pelos produtores mais importantes,
cada empresa buscava o seu reconhecimento de marca própria.
Segundo Joe Boxer (1995) o conceito de modernidade estava cada vez mais presente.
A revolução das cuecas começou em 1950, quando os fabricantes começaram a confeccionar
underwear estampados e coloridos. Depois de anos de roupas íntimas, simples e brancas, os
homens foram finalmente apresentados a opções variadas quando como mostra o anúncio da
marca Jockey na Look Magazine, como mostra a figura 12.
Figura 12: Anúncio de underwear estampado na década de 1950
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As inovações não se restringiram às cores, novos materiais como raiom, dracon, nylon,
lycra e o spandex entraram no mercado, mas o algodão ainda era o material mais usado. Já nos
anos de 1960 a busca por novos e melhores estilos de roupas íntimas causou uma propulsão
nas empresas de produtos químicos para aprimorar as fibras sintéticas, tornando popular
as cuecas em malha de nylon, ou poliamida. John de Greef (1989), afirma que a Du pont e
designers italianos criam novos produtos e as cuecas se tornam mais elásticas e menores.
Quanto às formas, a tangav e o fio dentalvi foram introduzidos como uma opção entre uma
nova geração de jovens determinados a desafiar o sistema. Também foram foi introduzidas
estampas de leopardo, tigre e estampas de zebra. Havia no mercado uma grande variedade
de produtos, oferecidos em materiais, modelagens, cores e estampas diferenciadas (figura
13), possibilitando que a escolha do underwear figurasse como uma expressão da identidade
de cada homem. Conforme Dario Caldas (1997) no final dos anos 1960, a maior parte dos
homens que seguiam um pouco as tendências de moda começaram a efetuar mudanças em
seu modo de se comunicar através da roupa e do corpo. Ainda na década de 1960 a marca
Zorba introduz o modelo slip no Brasil.
Figura 13: Anúncio Jockey Underwear da década de 1960.
Na década de 1960 ocorrem importantes modificações não apenas peças, mas
também na sua aprensentação ao consuminor. Expondo o corpo masculino de forma mais
explícita, sem que isto maculasse sua masculinidade, isto graças as mudanças sócio culturais
em curso. De acordo com Fernando de Barros (1997) o sentido de juvenilização e a cultura
jovem foram o fio condutor para as primeiras mudanças do masculino na década de 1960,
assimiladas principalmente pela moda, que quebra a visão conservadora de homem, que
começa a passar por transformações.
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Faz-se importante lembrar que qualquer relação estabelecida entre um grupo social
e os padrões estéticos que o identificam ocorra, é preciso que tais padrões sejam aceitos e
compartilhados pelos integrantes do grupo, mesmo se considerarmos que essa estética foi
forjada pela indústria da moda e imposta através da mídia. Assim, vemos que estas primeiras
mudanças no padrão de masculinidade foram possíveis por que estavam em sintonia com os
acontecimentos sócio-culturais vigentes, com destaque para cultura jovem.
Para Marco Sabino (2007) a clássica cueca samba-canção, com altura no meio das
coxas, nunca deixou de ser consumida, mas, nos anos 1970, passou a ser sinônimo de
“caretice” e uma peça adotada por pessoas mais tradicionais. Nesta época ganharam espaço
propagandas enfatizando a sexualidade do underwear, relacionando-o com a revolução sexual
em curso, o corpo masculino passou a ser mostrado de forma mais descontraída e jovial.
“Como nunca antes, os homens eram adorados como símbolos sexuais e, muitas vezes
expressava sua sexualidade recém-descoberta em boates popular conhecido como “discos”.”
(BOXER, 1995, p. 27). Quebraram-se tabus na representação masculina (figura 14), o homem
conservador, provedor da família e com foco no sucesso, pode ser substituído por um jovem,
alegre e sem muitas preocupações, que se permite tomar café em uma caneca tão colorida
quanto sua cuecavii. Parte do corpo da mulher vestindo uma camisola de seda e renda, que
aparece de costas, sugere que a felicidade no jovem também pode estar relacionada a suas
atividades sexuais, porém de forma muito sutil. Como o próprio titulo, “a great understatement
by Jockey” (um grande eufemismo por Jockey) indica. A figura feminina, mesmo que colocada
de forma secundária na imagem, auxilia no equilíbrio da publicidade, para que este homem
não seja percebido como gay.
Figura 14: Anúncio Jockey Underwear da década de 1970.
Há uma mudança significativa na tônica dos discursos que venda, os produtos além
de conforto passam a vender estilo, diversão, juventude, sensualidade e uma diversidade de
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modelos (formas, cores e materiais) criando diferentes opções e possibilidades de construções
visuais masculinas. Segundo Fernando de Barros (1997), na década de 1970 a palavra moda
passou a ser natural para os homens, que passam a escolher novas formas de identificação
a partir do vestuário. O autor afirma ainda que das mudanças introduzidas pela moda nesta
época, a variedade de cores e materiais foi a mais bem aceita na construção dos discursos
sobre o corpo masculino. “A “política do corpo” destacava-se como um dos símbolos de um
novo comportamento. “Permitir, liberar, experimentar” valia também para a moda.” (BAROS,
1997. p. 152)
Conforme Benson & Esten (1996), na década de 1980 a roupa íntima tornou-se
um produto de moda, com peças lançadas em coleções. Quase todas as marcas usavam
publicidade de atração “sexy”, com corpos masculinos e pouca roupa como seu principal
chamariz. Marco Sabino (2007), complementa que a Calvin Klein acabou entrando para a
História da Moda quando exibiu, em um outdoor em plena Times Square, Nova York, o atleta
olímpico Tom Hintnaus de torso nu e ana¬tomia perfeita vestindo apenas uma cueca (figuras
15 e 16).
Figura 15: Outdoor Calvin Klein na Times Square - NY 1982.
Figura 16: Imagem aproximada
Observamos que a cultura de massa impulsionou novas representações do corpo, novas
concepções de masculinidade, além de novas lógicas sociais de compartilhamento coletivo,
de aparência, de prazer e de estética, como algo que se faz experimentar e compartilhar com
os outros. Conforme Semprini (2010), a “redescoberta” do corpo se dá a partir da década
de 1960, mas é de 1980 em diante que o corpo se tornou o protagonista da cena social e do
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consumo. A sua liberação progressiva de exigência e de censuras lhe permitiu se fazer notar
e reivindicar uma atenção cada vez maior. A dimensão do corpo também está associada às
lógicas das marcas, tornado-o suporte de múltiplas questões simbólicas. E essa dimensão
simbólica é ainda mais dominante nos territórios do adorno, da beleza e do erotismo, que
fazem do corpo um verdadeiro instrumento de socialização.
Toda esta ênfase no underwear masculino, fez com que o valor destas peças aumentasse
no mercado. Desde então, a Calvin Klein tem dominado o mercado da publicidade cuecas
com modelos como o Mark Wahlberg, ex-jogador de futebol Freddie Ljungberg, o ator africano
Djimon Hounsou, entre outros. Nos anos 1980, uma época em que o espírito lúdico tornou-se
tendência, a cueca samba-canção reapareceu como produto de moda, trazendo estampas
de bichinhos, personagens de Walt Disney e dos desenhos de Hanna Barbera. Este retorno
de formas amplas no underwear, influenciou também na roupa exterior, com o volume das
cuecas, as calças com pregas voltaram a moda. Em 1980 a marca Mash é lançada no Brasil.
Joe Boxer (1995), diz que nos 1990 o fenômeno “cueca de grife” tornou-se ainda mais
forte, e mais uma vez a marca Calvin Klein sai na frente, estampando seu nome no cós de
elástico das peças. Este ato transformou a relação do homem com seu underwear novamente,
a cueca passou de uma peça do vestuário que se escondia sob as calças para um produto
de moda, uma escolha de estilo de vida. Astros pop passaram a exibir o cós grifado de suas
cuecas e adolescentes passaram a optar por calças largas no quadril, estilo conhecido como
grungeviii (figura 17).
Figura 17: Anúncio da Calvin Klein Jeans mostrando o cós da cueca com a marca.
Também nesta época, a lojas de varejo começaram a vender cuecas tipo short mais
ajustados, conhecida nos Estados Unidos como boxer briefs ou midle boxers. Aqui no
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Brasil estas peças são o que chamamos de cueca boxer. Em 1991 a marca Lupo lança
uma linha íntima masculina no mercado nacional. Nos anos 1990 a lingerie masculina evoluiu,
principalmente no que diz respeito aos materiais e técnicas de produção. As inovações das
malhas, naturais e químicas, possibilitaram o desenvolvimento de produtos voltados para usos
específicos, inclusive para diferentes práticas de esporte. O maior destaque ficou com as
peças em microfibra e com costuras invisíveis.
No século XXI, as inovações continuaram com foco nos materiais e acabamentos,
buscando cada vez mais, unir beleza e conforto. As peças sem costura ganharam uma boa fatia
do mercado. A partir dos anos 2000 vemos um número crescente de inovações no mercado
nacional, as empresas brasileiras investem em tecnologia para produzir novos produtos e se
tornam lançadoras de tendências para o mercado mundial. Segundo Márcia Mariano (2006),
a marca gaúcha Upmanix foi a primeira marca a lançar uma cueca em fibra de bambu, com
propriedades bactericidas e anti-odor, além de modelos dupla face e peças perfumadas no
Salão da Lingerie em São Paulo, em agosto de 2006.
O status de artigo fashion e moderno do underwear masculino de hoje, levou a uma
série de modismos. Seguindo as tendências de moda a Zorbax, lançou em 2009 quatro novos
modelos de cuecas, voltados para diferentes públicos. A Boxer Silver dirigida aos jovens, com
elástico mais largo, de 40 mm de largura para ser exibido por fora da calça. ZBoxer Extreme
Action, confeccionada em microfibra, tecido que facilita a transpiração e tem secagem rápida,
além de proporcionar ajuste perfeito ao corpo; Boxer Extreme Nitro com predominância do
algodão, resultando em um produto com ênfase no conforto; e Slip Seamless Algodão, que
utiliza a tecnologia sem costura, proporcionando muito mais liberdade de movimento no diaa-dia. Outra novidade foi o lançamento da Zorba Orgânica, desenvolvida especialmente para
os consumidores preocupados com a preservação do meio ambiente.
As tendências mundiais alertam para necessidade de preservação do ambiente. Além
dos teóricos da área, vemos esta informação começa a ser disseminada também para o
público em geral. E o design é apontado como um dos grandes possíveis mediadores da
sustentabilidade. Mas para que isto aconteça é necessário que haja mudanças também nas
formas de compreender, ensinar e fazer design. Para Silva & Santos (2009) a sustentabilidade
mediada pelo design, depende de uma abordagem ampla e integrada das competências
do designer, passando pela modificação projetos voltados para os produtos para projetos
sistêmicos, que valorizem requisitos ambientais, sociais, culturais e, sobretudo éticos. Atentas
às novas tendências, as empresas estão buscando desenvolver produtos a partir de processos
e materiais mais limpos.
Dentre as inovações sustentáveis podemos destacar ainda, a cueca de malha PET da
marca D’Uomoxi, que utiliza onze garrafas PET de dois litros para produzir um quilo de malha
PET, suficiente para criar dezesseis cuecas, figura 18.
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Figura18:Anúncios da cueca de malha PET da marca D’Uomo.
E a cueca feita de fibra de bananeira lançada pela marca australiana Aussiebumxii
(figuras 19 e 20). Os produtos são confeccionados com uma malha composta de 27% fibra
de banana, 64% algodão e 9% elastano, para garantir ao consumidor conforto e flexibilidade.
Preocupada com os consumidores cada vez mais exigentes e que também levam em conta a
sustentabilidade ecológica e econômica, a empresa garante que as peças da linha “Banana”
são extremamente macias, maleáveis, leves e têm grande poder de absorção de água. Além
da utilização de tecido tecnológico que evita o uso de outros materiais que são normalmente
empregados na confecção de roupa íntima e que agridem o meio-ambiente. Pois, a fibra de
banana tem um bom brilho, é leve, resistente, tem ótima absorção de umidade e é considerada
uma das mais ecologicamente corretas. E as cuecas de fibra de bananeira, não requerem
cuidados diferentes da maioria das roupas íntimas, devem ser lavadas em água fria, sem
alvejantes, seco à sombra e passadas com ferro frio.
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Figura 19: Foto do desfile
Figura 20: destaque da cueca da linha “Banana” – Aussiebum
Mas o investimento em tecnologia para underwear mais inovador é o aplique de GPS
às roupas íntimas. A marca Lindelucyxiii desenvolveu uma cueca em algodão, no modelo boxer,
com recortes e bolsos e o GPS é um acessório que acompanha a cueca, figuras 21 e 22.
Figura 21: Foto do desfile
Figura 22: destaque da cueca com GPS - Lindelucy
O aparelho tem a função de rastreamento, através de satélite, isso se o usuário desejar
ser encontrado, caso contrário ele também poderá ser desligado. O GPS traz também o botão
de pânico, que pode ser acionado em caso de qualquer emergência ou eventualidade.
Conclusão
Acreditamos que o homem burguês voltou seu primeiro pensamento para roupas
íntimas quando viu em seu acumulo um valor simbólico, uma forma de diferenciação e de
status. Mas, os aspectos funcionais foram pela maior parte do tempo, no decorrer da história
da roupa íntima, o fator principal da modificação das formas e dos materiais destes produtos,
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visando a usabilidade e o conforto, porém estas não são mais as únicas preocupações do
mercado.
Atualmente existem diversas marcas que comercializam roupa interior masculina de
grande qualidade, unindo aspectos de funcionalidade às tendências da moda e à qualidade
do design. São utilizados na confecção desta peças diversos tecidos, padrões e modelagens
anatômicas. Tecnologias modernas na confecção foram agregadas ao produto final, permitindo
uma sensação de maciez, toque suave e elasticidade na medida certa. Mas, acima de tudo a
partir dos anos de 1960, e com maior ênfase no anos 1980, observamos início de uma forma
de apresentação do underwear e da representação do corpo masculino, buscando introduzir
elementos simbólicos contidos no discurso da moda que passa a vender um estilo de vida e
não uma peça de roupa do vestuário.
Cada vez mais presente, em maior quantidade e variedade de modelos, no guardaroupa masculino, as cuecas evoluíram com o tempo e ganharam adeptos que antes não se
preocupavam com o que vestiam por baixo de suas roupas. Hoje, o homem está mais atento
aos produtos que o deixam mais bonito e confortável, e autoconfiante.
Constantes inovações e elementos de design foram agregados à roupa íntima no
século XX. Destacando primeiro, as questões de usabilidade e conforto, dando ênfase à
função prática do produto. E chegamos ao século XXI com peças diferenciadas, bonitas,
tecnológicas, versáteis e confortáveis. Neste processo foram atribuídas as funçõesxiv estéticas
e simbólicas, tornando o underwear um verdadeiro produto de design e de moda.
Notas
i Duofold – tecido feito com duas camadas de lã entrelaçada proporcionando isolamento contra o frio
e separando o suor do corpo.
ii O modelo boxer americano, parece-se com o que conhecemos como samba-canção. Já o que
chamamos de boxer corresponde ao midle-boxer americano.
iii A Jockey Breif ® ou slip Jockey é o modelo que conhecemos como cueca slip.
iv Empresa que criou e patenteou o Fastener Gripper.
v Tanga – modelo de cueca pequena com duas partes de malha unidas na entreprenas são presas a
uma cintura de elástico.
vi Fio dental – modelo de cueca com a parte traseira muito pequena.
vii A frase “que se permite tomar café em uma caneca tão colorida quanto sua cueca” foi escrita para
indicar mais uma quebra de convenções no padrão familiar vigente, onde a família ao acordar se reúne
à mesa para tomarem o café juntos, provavelmente em louças tradicionais. Busca-se mostrar aqui o
rompimento com a forma convencional de ver homem na sociedade patriarcal, em consonância com
os acontecimentos vigentes.
Design, Arte, Moda e Tecnologia.
São Paulo: Rosari, Universidade Anhembi Morumbi, PUC-Rio e Unesp-Bauru, 2010
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Inovação em design na história do underwear masculino
viii O estilo grunge aparece nos anos 1990 como um movimento de anti-moda, baseado no estilo
de rock do mesmo nome. Nos anos 80, a moda também se apropriou largamente da anti-modapunk. A inspiração para a moda grunge era a classe proletária de Seattle, com roupas muito largas
e desleixadas, muitas vezes doadas, um ícone desta moda é camisa xadrez semelhante a usada por
lenhadores.
ix www.upman.com.br
x www.zorba.com.br
xi www.cuecasduomo.com.br
xii www.aussiebum.com
xiii www.lindelucy.com.br
xiv Löbach (2001), fala que um produto de design apresenta três funções básicas: a função prática,
ligada a finalidade de uso do produto, bem como sua adequação às necessidades fisiológicas de uso
como segurança, conforto e facilidade de uso. A função estética se refere aos aspectos psicológicos da
percepção sensorial durante o uso, tem como principal atributo a fruição da beleza e esta subordinada
a aspectos sócio-culturais e ao repertório de conhecimento do usuário. E a função simbólica, a
mais complexa, de acordo com autor, tem como fundamento o aspecto estético-formal do produto
reforçado pela base conceitual das dimensões semióticas. Envolve fatores sociais, culturais, políticos
e econômicos e, também, associa-se a valores pessoais, sentimentais e emotivos. A função simbólica
revela-se, sobretudo, por meio dos elementos configuracionais de estilo. Para mais informações ver
LÖBACH, Bernard. Design industrial: bases para configuração dos produtos industriais. Rio de Janeiro:
Blücher, 2001.
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