Aversão à perda no golfe e nos negócios

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Aversão à perda no golfe e nos negócios
José Manuel Macedo
Golf &
Negócios
Aversão à perda no
golfe e nos negócios
golfe aproximadamente uma pancada num torneio de 72 buracos. No
caso dos 20 maiores profissionais isto significa um prejuízo total de
cerca de US$ 1,2M em pryze moneys.
De acordo com a pesquisa, os jogadores calculam as suas tacadas
com base no risco de não terem um bom desempenho no par. Pope e
Schweitzer demonstram que os jogadores evitam a possibilidade de
perda jogando de forma conservadora quando têm a possibilidade
de ficar acima do par, porém correm mais riscos se perceberem que
podem ficar abaixo dele.
Pope diz que o estudo explora a “aversão à perda”, uma predisposição
nas tomadas de decisões que é um elemento de extrema importância
no campo da economia comportamental. Esse ramo da economia
explora a maneira pela qual a psicologia humana influencia os
mercados e as empresas. “A pesquisa mostra que as pessoas
trabalham com mais afinco para evitar perdas”, diz Pope.
As descobertas do estudo desafiam as teorias segundo as quais as
predisposições nas tomadas de decisões não têm vida longa nos
mercados e que, quando existem, tendem a desaparecer com a
concorrência, com grandes riscos e com a experiência. Que lugar melhor
para analisar essa teoria do que o mundo competitivo e dos altos pryze
moneys da PGA Tour, pensaram.
O estudo revela predisposições de julgamento num cenário de alto
risco por onde circulam especialistas”, diz Schweitzer. “A conclusão é a
seguinte: se Tiger Woods se deixa dominar por uma certa predisposição
quando joga, que esperança temos nós?”, graceja Pope.
O quadrado terrível
Num trabalho intitulado “Será que Tiger Woods é avesso a perdas?”,
Devin Pope e Maurice Schweitzer, professores de gestão de operações
e de informações da Universidade de Wharton, Pennsylvania, USA,
analisaram as tacadas dadas em torneios profissionais de golfe.
Os autores concluíram que os melhores jogadores de golfe perdem,
sistematicamente, a oportunidade de alcançar um birdie por medo de
um bogey. De acordo com os pesquisadores, para muitos jogadores
sejam eles profissionais ou não, a agonia de um bogey parece
superar a emoção de um birdie.
Ao que tudo indica, Tiger Woods e outros super astros do golfe
mundial que disputam partidas milionárias em tacadas de alguns
metros apenas, estão sujeitos ao mesmo temor e aversão ao risco
que costuma afligir investidores e gerentes.
Trilhar um caminho seguro, porém, tem seu custo. Os autores acreditam
que essa predisposição custe ao jogador profissional mediano de
Muita gente acredita que os profissionais não demonstram qualquer
tipo de predisposição nas suas áreas de especialização, o que já
não aconteceria com uma pessoa sem experiência nenhuma numa
área de especialização específica, diz Pope. “As pessoas acham que
os CEOs têm menos predisposições do que os seus colaboradores,
o que talvez seja verdade, mas isso não significa que eles também
não tenham as suas inclinações próprias.”
Todos os anos, o circuito da PGA Tour é dividido entre 40 a 50 torneios
individuais em que cerca de 150 jogadores competem. Os torneios
de quatro dias pagam, em média, um total de aproximadamente
US$ 6M em 2010, sendo que dois terços dos jogadores com
melhor desempenho dividem parte do prémio, enquanto o vencedor
normalmente embolsa 18%.
Os dados foram compilados por cerca de 250 trabalhadores
contratados pela PGA Tour para colher informações detalhadas sobre
os vários torneios. Para obter os dados, as partidas são monitorizadas
por lasers instalados à volta de cada buraco dos percursos. Eles
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Excesso de confiança e nervosismo
Os autores procuraram evitar obstáculos ao seu estudo controlando
inúmeras variáveis. Nas suas análises, controlaram, por exemplo, a
posição da bola no green próximo do buraco, verificaram se o jogador
é melhor com o Driver do que com o Putter, se o facto de o jogador
estar repetidamente numa área próxima a um buraco específico
altera seu comportamento, quais as suas reacções emocionais a essa
experiência, etc.
Eles também incluíram as explicações psicológicas, inclusive o excesso
de confiança e o nervosismo. Para testar o excesso de confiança,
questionaram se depois de uma tacada bem dada os jogadores se
deixam levar por um “excesso de confiança e se eles se tornaram
arrogantes de um modo tal que lhes tenha prejudicado a sua tacada
seguinte”. Contudo, e este é um dado extremamente interessante, os
dados mostram que quando os jogadores finalizam um buraco com
uma tacada a menos em relação à média, é provável que precisem
de menos tacadas do que a média no próximo buraco. “Exceptuandose, assim, a aversão ao risco”, observam os autores.
medem e registam, as coordenadas de cada bola depois de
cada tacada. Pope e Schweitzer utilizaram dados de 239 torneios
realizados entre 2004 e 2009, concentrando-se em 2,5 milhões de
tacadas dadas por 421 profissionais tendo cada um deles dado
pelo menos 1.000 tacadas.
Para analisar especificamente a aversão à perda, os pesquisadores
examinaram as tacadas no contexto do par atribuído a cada buraco.
De acordo com eles, o número do par cria um ponto de referência
que distingue claramente a perda do ganho. Nos seus cartões
de marcação, os jogadores circulam os buracos que embocaram
abaixo do par. Se marcaram acima do par, a pontuação é feita num
quadrado. “Embora os jogadores se devessem preocupar apenas
com a pontuação geral no torneio, eles podem ser influenciados
pelo ponto de referência do par na hora em que dão as suas
tacadas. O par chama a atenção, mas pelas regras é irrelevante”,
observam os autores.
A maior parte das tacadas foi de par (47%) ou de birdie (39,8%).
A estratégia adoptada para cada buraco pelos jogadores, em
relação ao par, fornece um meio para medir a aversão à perda.
Pope e Schweitzer usaram dados para determinar se um jogador
estava a jogar com cautela ao dar uma tacada que levaria a bola
exactamente para perto do buraco, de modo que sua próxima
tacada fosse certeira. Usando dados para medir a força de uma
tacada e a posição da bola antes da tacada, concluíram que, em
média, os jogadores dão as suas tacadas em busca de birdies
numa frequência aproximada de dois pontos percentuais a menos
em relação às tacadas de par. “Essa descoberta é coerente com
a aversão à perda, pois os jogadores concentram-se mais quando
jogam para o par para evitar perdas”, observam.
Esse comportamento reflecte a predisposição para evitar perdas,
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que nesse caso ocorre quando o jogador perde um par e marca um
bogey, em detrimento da possibilidade do melhor score de todo o
torneio, o que, em última análise, é o que importa. “A aversão à
perda consiste no erro sistemático de segregar ganhos e perdas,
avaliando-se as decisões isoladamente, em vez de agregá-las, e de
sobrevalorizar as perdas em relação aos ganhos.”
No contexto dos negócios, o par pode ser comparado aos
ganhos trimestrais ou à estratégia de venda dos investidores, ou
à manutenção das acções, dependendo de quanto se pagou por
elas inicialmente. “No golfe, os jogadores avaliam seu desempenho
com base em cada buraco, e não com base no seu desempenho
geral”, dizem os autores. “Nos negócios, as pessoas avaliam seu
desempenho com base em um trimestre específico, ou em como uma
acção específica se comportou, ou de que maneira uma conta em
especial se comportou. As pessoas erram quando analisam decisões
correlatas de forma independente.”
Mais observam que os resultados de sua pesquisa estão de acordo
com a Teoria da Perspectiva, um conceito económico importante
desenvolvido pelos psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky,
em 1979. De acordo com essa teoria, as pessoas sentem maior
aversão ao risco quando têm ganhos do que quando correm o risco
de sofrer uma perda. Em sintonia com essa teoria, “se o jogador
profissional de golfe recorre ao par como referência, deverá ser
mais cauteloso nas tacadas na procura de um birdie do que nas
tacadas na procura do par. Especificamente, em relação à perda
de uma tacada, constatamos que os jogadores acertam com menos
dificuldade as tacadas de birdie do que as de par [...] Mostramos
que os jogadores sacrificam o sucesso quando jogam por um birdie
para evitar outras tacadas que sejam difíceis”. Além disso, esse
padrão de comportamento “diminui os lucros esperados” para os
jogadores, conclui o estudo.
Em relação ao nervosismo, o estudo propõe a ideia de que os
jogadores valorizam uma tacada na procura de um birdie mais do
que o par, e que podem ficar nervosos e “sufocados” na ânsia desse
birdie. A pesquisa constatou que, embora os jogadores amadores de
golfe raramente procurem o birdie, os profissionais tentam conseguir
tantos birdies quanto shots para par. Mesmo quando um birdie
bem-sucedido ou um par, podem colocar os jogadores em posição
semelhante, ainda assim, os amadores optam pela procura do par no
buraco seguinte.
“Em primeiro lugar”, diz o estudo ainda relativamente à questão do
nervosismo, “os jogadores dão tacadas mais curtas na procura de um
birdie em comparação com outras com o objectivo de par. Em segundo
lugar, mostramos que mesmo os melhores jogadores, inclusive Tiger
Woods, apresentam essa tendência nas primeiras rondas do torneio.
Em terceiro lugar, a diferença entre as tacadas de par e de birdie
diminuem conforme o torneio vai evoluindo.”
Por fim, além da análise quantitativa, os autores citam exemplos
práticos do próprio Tiger Woods. Depois de uma rodada em 2007,
o profissional com maior número de vitórias da PGA disse: “Acho
que bons shots de par são mais importantes do que os de birdie.
Ninguém quer perder uma pancada. Há uma diferença, no plano
psicológico, entre perder uma pancada e fazer um birdie. Para mim,
o par é mais importante.”
Os autores salientam que o golfe já foi objecto de outras pesquisas
económicas recentes, e que consideram não terem sido pioneiros nesta
abordagem, mas que estavam interessados em explorar o assunto
novamente, devido à riqueza e variedade de dados existentes na
PGA Tour.
Posicione
o seu Negócio
Embora Pope não jogue golfe e Schweitzer o faça apenas
esporadicamente, dizem que o assunto era o mais adequado aos seus
objectivos de pesquisa. “Trata-se de um domínio rico para estudos
de tomadas individuais de decisão. Temos dados que medem os
resultados de centenas de milhares de decisões similares feitas por
indivíduos talentosos, experientes e extremamente motivados, pelo
golfe”.
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