Ana Rosa Neves Ramos AMERICANIDADE NA MÍDIA
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Ana Rosa Neves Ramos AMERICANIDADE NA MÍDIA
Ana Rosa Neves Ramos UFBA Brasil AMERICANIDADE NA MÍDIA --------------------------------- Será que assistiremos, em escala planetária, à expansão de um movimento de desterritorialização das culturas e de complexificação das referências identitárias, que se tornarão plurais, ou caminhamos para um novo processo “plural” de homogeneização das identidades de formato e consumo, essencialmente, americanos? Na linha de análise desenvolvida, Bourdieu1 perguntaria, ainda, “como se constitui a legitimidade dos objetos culturais?”; “Qual o lugar das instâncias que conferem autenticidade e exemplaridade aos comportamentos sociais?” – questões sobre as quais tentaremos refletir, pondo em diálogo uma certa crítica da cultura, que a pensa através da mídia. Sabe-se o quanto os Estados Unidos da América têm habitado o nosso imaginário sob diferentes perspectivas. Um dos focos da Guerra cultural dos anos 80 e 90, segundo Lucia Lippi2, é a língua, já que por meio dela se expressam e se inventam cidadãos. Em uma nação de imigrantes, na qual um deles, Noah Webster, passou a ter seu nome como sinônimo de dicionário, atualmente pensa-se em reformar a sociedade por intermédio da reforma da língua. Produziu-se, então, o chamado mecanismo de hifenização: afro-american; latin-american; italo-american…O que isto significa? Como se pode compreender isto? O certo é que, nesses tempos de globalização, a cultura norte-americana, presente no mundo do cinema, da música pop, das televisões a cabo, nos quais acrescento a internet, exerce uma atração cada vez mais forte entre as pessoas, criando uma similaridade de valores para os jovens. Assim, como poderíamos pensar, também, sobre a forma como este processo de globalização pode provocar, a curto prazo, uma transformação importante daquilo que vários “americanos, do norte e do sul, pensam, chamam de ou consideram como americanidade”? Nos anos 80 e 90, assistimos a uma interação da história, mitos e mercados, que confere sentidos a questões como multiculturalismo e political correctness. No campo da história, tanto os EUA quanto o Canadá, o Brasil e outros países, experimentam o colapso das respostas de integração nacional. Fazendo referência às pesquisas realizadas por Maurício Tenório, Lippi afirma que estamos entrando no território do paradoxo: noção de universalidade da cidadania 1 Pierre Bourdieu. “Qui crée les créateurs?” In: Questions de Sociologie. Paris: Minuit, 1980, Apud Renato Ortiz. O próximo e o distante: Japão e a modernidade-mundo. São Paulo: Brasiliense, 2000. 2 Lúcia Lippi.Oliveira. Americanos: representações de identidade nacional no Brasil e nos EUA.. Belo Horizonte:UFMG, 2000, p.176. versus definição particular de identidade. Para ela, o multiculturalismo nega a existência de um passado comum no espaço da identidade nacional, mas deseja um destino comum em que seja possível a convivência democrática dos diferentes. Essa noção busca ultrapassar o processo cultural que inventou uma comunidade baseada na unidade política, limitada e soberana, chamada nação. Nesse sentido é que podemos compreender o multiculturalismo como um processo cultural que procura negar o passado, quando o nacionalismo norte-americano foi fortíssimo, eficientíssimo, e as regras de inclusão e exclusão construíram uma cultura ou civilização. Os Estados Unidos, confrontados com o Canadá e com Brasil, chamam a atenção por aquilo que lhes parece comum: dispõem de enorme espaço territorial, sua população contou com imenso contingente de escravos (o que os diferencia do Canadá) e com imensa massa de imigrantes (aqui os três se igualam). Por outro lado, as diferenças sempre foram consideradas, expressas nos níveis de desenvolvimento e de riqueza. Igualmente distintos são os índices concernentes ao padrão de vida social, incluindo-se aí a igualdade expressa na cidadania. É Lippi quem ainda coloca que um dos maiores desafios que a nação americana enfrenta hoje tem a ver com os imigrantes. Citando dados da Revista Time, que dedicou um número especial ao tema, ela ali destaca alguns dados relevantes: 32 milhões de pessoas nos EUA (13%) não falam inglês no ambiente familiar; em 1940, 70% dos imigrantes vieram da Europa. Em 1992, 15% vieram da Europa, 37% da Ásia e 44% da América Latina e do Caribe. A projeção para 2050 é de que 52% da população sejam de anglos, 16% de negros, 22% de latinos e 10% de asiáticos. Mais de 100 línguas são faladas nos sistemas escolares de Nova York, Chicago, Los Angeles. Ela3 considera, também, que o outsider, como vitima e como agente de mudança, é traço recorrente da cultura americana e permite entender a lógica do processo político-cultural em curso na América. Contrariamente a intencionalidade cultural do Canadá francês, apresentado como uma cultura de importação, artificial, separada da vida real, Yvon Thériault4 considera que a americanidade se afirma como uma cultura sem intencionalidade. Uma espécie de matéria prima, ou de instinto, acessível pela simples inserção territorial no continente americano. Na sua opinião, existe aí um estranho postulado orgânico, 3 Apud, Lúcia Lippi Oliveira. Op. cit., Joseph Yvon Thériault. Critique de l’ Américanité: mémoire et démocratie au Québec. Montréal: Québec Amérique, 2002. 4 essencialista, positivista, em relação à cultura, sobre os quais é necessário nos debruçar com mais calma. A americanidade é uma cultura e não teria porque se discutir sobre. Ela é uma cultura de proximidade, de imediatismo, uma maneira menos civilizada, mais natural, uma forma primária de pertencer ao mundo. Não foi, como veremos, o menor dos paradoxos da americanidade, querendo romper com a cultura canadense francesa, qualificada de étnica por causa da sua pretensa filiação com a cultura francesa de origem, que se tenha reduzido um fenômeno de cultura a uma relação mecânica, objetiva, a um território, a um continente. Discorrendo sobre “quando a americanidade não significa americanização”, Thériault questiona qual seria então essa cultura, que se vincularia como relação necessária, originária, ao pertencimento continental do Québec? No dizer dos seus partidários, a americanidade não significa americanização. Yvan Lamonde5 explica que a americanização do Québec, conceito de resistência ou de recusa, é esse processo de aculturação através do qual a cultura estadunidense influencia e domina a cultura, tanto canadense quanto quebequense – e mundial –, enquanto que a americanidade, que engloba tanto a América Latina quanto a América saxônica, é um conceito de abertura e de mouvance, que traduz a sua filiação ao continente Americano. No que tange a americanidade, parece realmente difícil manter uma distinção, ultimamente ancorada na completa autonomia de uma representação identitária – a americanidade – do principal sujeito histórico que a incorpora – a América estadunidense –, porquanto que a americanidade pretende ser uma leitura “objetiva” do real histórico, distanciado dos enganos da representação. De início, segundo Thériault, não é verdade que os trabalhos centrados sobre a americanidade busquem definir uma realidade política, econômica e cultural que englobaria o conjunto da América e que se distinguiria da americanização – a influência americana sobre o resto do continente. É a América estadunidense que fascina os personagens dos romances designados “da americanidade”. É porque a ação se desenrola indistintamente entre Montréal, Nova York, Califórnia ou a Flórida, ou ainda porque os personagens desses romances são, como o homem da fronteira Americana, personagens da errância, que esses romances são tidos como “da americanidade”. Jean Morrisset6 considera que há alguma coisa de “patético” nessa identidade quebequense, amplamente centrada sobre a rejeição da América e da mestiçagem. A recusa da americanidade no pensamento canadense-francês baseia-se, segundo Gérard 5 6 Apud Yvon Thériault. Op cit.,. Jean Morisset; Eric Wadel. Amériques. Montréal: Hexagone, 2000. Bouchard7, sobre um passado “basicamente imaginário” e de “falsas representações de si e dos outros”. Isto porque é ainda sobre a grande tradição do republicanismo americano, e não naquela mais autoritária e corporativista da América Latina, que os quebequenses fazem referência, para inserir a sua história política na grande tradição democrática. Efetivamente, são praticamente inexistentes abordagens que tratem da americanidade quebequense da América do Sul cujo percurso parece, em muitos aspectos, completamente oposto aquele dos seus vizinhos do Norte, com os quais divide o continente. As grandes exceções dizem respeito aos trabalhos através da História, realizados por Gérard Bouchard, e de através da literatura, realizados por Jean Morency, os quais buscam compreender a americanidade como percurso histórico das “novas sociedades”. Para Thérialult, uma tal distinção não vai na mesma direção teórica que ele pretende dar ao Québec, para o termo americanidade. Na sua opinião a americanidade quebequense não significa o projeto de inventariar as múltiplas maneiras nacionais de estar na América e sim, aquele de conceber, para alem das diferencas, um pertencimento “continental”. Como bem lembrou Morisset8, no seu comentário sobre a serie “l’Americanité”, o termo americanidade é oriundo da América Latina (americanidad) e foi ali empregado para dissociar o percurso Americano dos países do Sul, daquele da América estadunidense. De acordo com essa hipótese teríamos, então, uma americanidade brasileira, argentina, mexicana, etc., diferente da americanidade estadunidense. E é justamente esta referência a uma americanidade diferenciada – como pretendeu a referência da América francesa na antiga representação canadense francesa, ou a “québecitude” dos sociólogos da Revolução tranqüila – que a americanidade quebequense contestará. Paremos de apresentar o percurso histórico do Québec francês na América como um percurso singular, diferenciado do resto da América (anglo-saxônica). Ao invés disso, observemos as semelhanças, aceitemos a hipótese da normalidade histórica, ou seja, de um percurso correspondente a sua verdade empírica e que deve se transformar em consentimento do seu pertencimento continental. Essa vontade de fazer do conceito de americanidade uma busca de similitudes, bem mais do que uma compreensão dos percursos diferenciados conduz a análise a não distinguir americanidade e 7 Apud, Yvon Thériault. Critique de l’Américanité…Op. cit. Jean Morisset; Eric, Wadell. Américanité. Op.cit. Cf. também Yvon Thérialult, Critique de l’ Américanité. Op.cit.,. 8 americanização – se é que tal seja possível – e a confundir, muitas vezes, os dois processo com a modernização. Para Maximilien Laroche9, fala-se muito em americanidade, mas não se fala em americanização. Entretanto é nela que se desenrola o essencial. Houve quem confiscasse a americanidade, sabe-se muito bem por qual manobra de troca-troca, por qual metonimização hiperbólica dos Estados Unidos, passamos a substituir, na América, o termo estadunidense por Americano, e que a operação não se deteve a esse golpe de prestidigitação lingüística, mas transbordou em outros campos, para impor, sobretudo, uma mitologia particular do universo. Serge Proulx10, em artigo intitulado “L’Americanité serait-elle ancrée dans les dispositives techniques?”, questiona-se se as tecnologias de comunicação podem influenciar nossas representações culturais de outra forma que pelos conteúdos que estas veiculam? Para tanto parte das três tecnologias de invenção Americana que marcaram o nosso entorno, a partir da Segunda Guerra (a televisão, a informática e as redes de comunicação interativa). Ancorado numa abordagem metodológica que supõe que se trate a questão entre tecnologia e cultura pelo viés de uma análise temática dos conteúdos culturais, Proulx deseja tratar a questão postulando que um dispositivo técnico pode agir sobre a cultura na qual se insere, por sua própria materialidade, independente dos conteúdos culturais que ele possa veicular. A sua problemática aproxima-se daquela desenvolvida por McLuhan para quem “a mídia era a mensagem”. Proulx questiona-se se uma certa americanidade – quer dizer um certo estilo, maneira de fazer, escolha definida de algumas formas de concepação-recepção, impondo implicitamente alguns ritmos e certos valores às criações culturais –, já não estaria contida nesses dispositivos técnicos antes mesmo que eles penetrem no nosso espaço simbólico. Para definir o que entende por americanidade ele recorre a uma analogia, através da qual Roland Barthes designara a italianidade, na sua celebre analise sobre a campanha publicitaria das massas Panzani. Sobre o plano icônico Barthes observara a presença de um sistema de conotação cujo significante seria “a reunião do tomate, do pimentão e do matiz tricolor (amarelo, verde e vermelho) do cartaz, e cujo significado seria “a Itália”, melhor dito “a italianidade”. Na leitura de Barthes o saber mobilizado por este signo é propriamente francês, à medida que ele se baseia sobre o conhecimento 9 Maximilien Laroche. Dialéctique de l’américanisation. Québec: ULAVAL/GRELCA, 1993. de alguns estereótipos turísticos a respeito da Itália. Da mesma maneira, na opinião de Proulx, a expressão da “americanidade” mobiliza um sistema de conotação cobrindo um estilo, maneiras de fazer, uma escolha de ritmos nas produções, etc., que se atribui, certa ou erradamente, aos Estados Unidos. Em suma o que Proulx pretende é demonstrar que não é porque esta nova cultura técnica é Americana nas suas origens, que ela poderá abalar as bases identitárias do sujeito comunicante e sim, porque esta técnica conduz a uma nova relação no e com o mundo. A americanidade dos seus criadores e secundária, enquanto fonte de influência, em comparação com a força cognitiva estruturante, das redes de comunicação interativa enquanto tecnologia intelectual. Para Jocelyn Létourneau11 esta expansão das redes planetárias de comunicação interativa seria um lugar privilegiado para “impenser” a problemática da identidade quebequense, dito de outra forma, para definir uma outra opção radical à história da sua memória coletiva. Os tráficos simbólicos dos internautas constituiriam, assim, para o observador, um revelador da “mouvance” de suas referências identitárias – como indivíduos e como grupos – na pluralidade de suas ambivalências, num contexto de reconsideração radical, onde os modos de fazer e os valores da americanidade seriam apenas uma fonte, no meio de tantas outras, no processo de construção social da identidade quebequense contemporânea. E o que entendemos por americanização da televisão, pergunta-se Dave Atinkson12? Eu abriria um pouco mais a questao, para melhor contemplar a discussão, presente neste Colóquio e nesta mesa, o que entendemos por americanização da mídia? Não pretendo, com tal, afirmar que se trate de algo novo.Qualquer pessoa que tenha lido um pouco sobre a história da televisão e, antes dela, a história do cinema, associa americanização a dominação americana particularmente ao cinema. Este “imperialismo americano” suscitou, nos anos 70, a necessidade de se reivindicar, através da Unesco (1980), uma nova ordem mundial para a informação e para a comunicação. Os defensores dessa ordem esperavam por um termo à circulação, em mão única, dos 10 Serge Proulx. “L’ Américanité serait-elle ancrée dans les dispositives techniques?” In: Florian Sauvageau (org.) Variations sur l’influence culturelle américaine: culture francaise d’Amérique. SainteFoy: ULAVAL, 1999, p.209-230. 11 Jocelyn Létourneau. “Y-a-t-il une “Nation Québecoise”? Est-il imperative qu’elle advienne? Une mise au point. Artigo no prelo, gentilmente cedido pelo autor, a sair outubro de 2002 pela Revue Argument. 12 Dave Atkinson. “ L’Américanisation de la télévision: qu’est-ce à dire? In: Variations sur l’influence culturelle américaine: culture francaise d’Amérique. Op.cit., p.58-72. produtos de informação dos países ocidentais, dentre eles os produtos audiovisuais americanos, para o mundo. A americanização é também, simplesmente, a constatação atual de que os americanos dominam ostensivamente o mercado internacional de audiovisual e que trata-se, para eles, de um dos mais importantes setores de exportação (o segundo, perdendo apenas para o setor da aeronautica). Consideramos que a análise de Atkinson, mesmo que centrada sobre o Canadá, pode servir para ampliar a nossa compreensão sobre o funcionamento/ideologia da televisão em outros países, notadamente no Brasil, como veremos um pouco mais adiante. Ele aponta duas formas de análise sobre a questão: a primeira, a mais difundida, se interessa pela nocividade dos conteúdos dos produtos televisivos americanos, como um modo de gestao particular do medium televisão e, que se difunde à medida que os países adotam concepção analoga a idéia desde sempre pensada pelos americanos. Essa abordagem, centrada sobre o conteúdo, entende por americanização a transferência de valores operados por meio dos conteúdos das televisões americanas no seio das culturas nacionais. Esta idéia vai de encontro aquela dos partidarios da “recepção ativa”, segundo a qual os indivíduos ou culturas adaptam os conteúdos televisivos a sua realidade, lhes opondo resistência e interpretando-os de acordo com suas condições e valores. Atkinson coloca a questão sob outro ângulo: imaginemos um estudo sobre a americanização dos hábitos alimentares dos Quebequenses ou da alimentação quebequense. Para realizar tal estudo seria necessário, apenas, se limitar ao menu servido pelos restaurantes “afrancesados”, cuja sede social se encontre nos Estados Unidos: Burger King; McDonald’s; Wendy’s; PFK; Pizza Hut? A abordagem seria mais completa se estudassemos, também, os produtos quebequenses “americanos” como Mike’s; Asthon; Pizza Délic; Marie-Antoinette; Normandin. A idéia é que o fast food, ou a “refeição rápida familiar”, permanecem fast food, pouco importa a etiqueta – americana ou quebequense – a ela veiculada. Se é o fast food que é americano, entao Mike’s é tão americano quanto McDonald’s. A reflexão sobre a americanização deve então levar em consideração o que se faz em nosso(s) país(es). O seu postulado é que a americanização da televisão deve ser concebida de forma mais genérica que a simples análise das conseqüências dos conteúdos das emissões americanas sobre as culturas nacionais. Para ele é a nossa própria concepção de televisão que se americaniza sem parar. Uma ligeira digressão faz-se, talvez, esclarecedora, quando duas concepções de televisão se opunham: uma de serviço público (tipo a nossa TV E) e outra comercial (todas as nossas outras). A concepção de serviço público baseava-se sobre uma certa concepção cultural do triplo papel que a televisão deveria desempenhar: informar, educar e divertir. Nesse sistema a televisão deveria ser gerenciada, exclusivamente, ou principalmente, por gestionarios públicos, assim como o seu financiamento deveria vir, exclusivamente, dos fundos públicos. Ademais, a relação com o público não é a mesma entre um sistema de serviço público, cujo cliente deveria ser o público, o conjunto dos cidadãos, e um sistema commercial, no qual o difusor vende um auditorio para um anunciante. Um outro elemento é que o sistema de serviço público é bem mais centrado na oferta do que na demanda e é marcado por uma preocupação em formar, educar e desenvolver. O oposto do sistema commercial, centrado sobre o lucro, que se atinge através da sedução de um auditorio pela alta tecnologia e inovações das emissões, para vendê-las, em seguida, para os anunciantes. Atkinson resume o seu pensamento sugerindo como deveriamos responder (pensar) a questão “é um processo que tende fazer da televisão um setor comercial comparavel aquele do comércio”, não nos esqueçamos que para os americanos fazer televisão significa fazer um negócio como outro qualquer. A americanização da televisão poderia ser vista, ainda, como um processo que nega gradualmente, para a televisão, a possibilidade de ela desempenhar uma função outra do que aquela que lhe dita o Mercado e as regras comerciais. Partindo da reflexão de Christian Dufour13 sobre o contexto de mundialização, que muda gradualmente as identidades de natureza nacional, a comecar pelas mais flexiveis, na qual tece considerações sobre quais seriam os pontos de referências, os enraizamentos, dos quais as coletividades e os indivíduos teriam necessidade para se abrirem uns para os outros, apontaremos algumas particularidades envolvendo a questão, tendo por referência duas análises que consideramos significativas e interessantes: uma tratando do Québec (a dele); outra envolvendo EUA/Canadá, para em seguida tentarmos estabeler alguns elos sobre a questão, com o Brasil. Em seu estudo sobre o mundo da arte, Bourdieu14 coloca uma pergunta sociologicamente importante: quem cria os criadores? Contrariamente a uma tradição que toma a existência do artista como um dado inquestionável, isto é um fato a partir do 13 Christian Dufour. “Mondialisation et quéstion identitaire: réflexions a partir du cas du Québec”. In: Variations sur l’influence culturelle américaine: culture francaise d’Amérique. Op cit, p.167-18 14 Pierre Bourdieu. “Qui crée les créateurs?” Apud Renato Ortiz. O próximo e o distante...Op. cit., qual a explicação se estrutura, ele desloca o seu interesse para compreender como sua valoração se constitui. A resposta ao problema de Bourdieu se encontra na noção de campo artístico. Espaço estruturado de relações de poder, ele congrega diferentes tipos de atores: os próprios artistas, negociantes de arte, críticos literários. Personagens que atuam em direções diversas: a confecção da obra, sua distribuição, sua comercialização, sua premiação. O artista e a obra não existem, portanto, sozinhos, eles fazem parte de uma rede que os constitui, e não apenas lhe dá suporte. A legitimação da criação artística é construída socialmente. É sabido que o Québec é uma pequena sociedade flexível, que esta na junção de duas grandes culturas. Dufour afirma que tal fato permitiu, por exemplo, a Céline Dion explorar, sobre a cena internacional, aspectos identitarios canadenses, americanos, franceses e internacional, presentes no Québec, mais particularmente em Montréal. No plano cultural, ela tira proveito do aspecto pós-moderno da identidade quebequense e torna positiva uma assimilação, que às vezes não deixa de ser dolorosa e dificil de asssumir no plano politico. O fenômeno Céline Dion torna-se “midiático” quando da emissão Bye Bye 96 (comandada por uma dos grandes talk-show da Franca, Michel Drucker), foi transmitida para os franceses diretamente de Chicoutimi. Assim, durante três horas e meia Céline Dion e o Québec foram devidamente celebrados pelos franceses. Durante a emissão a cantora interperta, juntamente com Robert Charlebois o sucesso Je reviendrais à Montréal” e, finalmente, pouco antes do pipocar dos champanhes os franceses tiveram direito a uma inesquecivel interpretação de Paroles, Paroles, (canção criada 25 anos atras por Alain Delon e Dalida), por Céline, recitada por Delon. E o que se considera, frequentemente, como um fenômeno essencialmente comercial – a la americana – transforma o duo em pequena obra-prima, cujo bom gosto e sedução torna-se mais francês do que muitos simbolos franceses. Deneuve que o diga. Os primos franceses, na ocasião, devem ter ficado gratos pela existencia de Céline: a única superstar, de estatura planetária, capaz de dizer algo mais em francês do que “Merci beaucoup”, e que persistiu em cantar na língua de Molière, enquanto que a canção internacional e anglo-saxônica se colocava a seus pés. A França, por sua vez, lhe deu um magnifico presente, porque a sua abertura excepcional aos fenômenos culturais estrangeiros lhe permitiu conceder à cantora o primeiro reconhecimento verdadeiro daquilo que ela é: Quebequense, é claro, mas também Canadense, como bem lembra Charlebois: francesa, americana, internacional. Ate os 19 anos é o Québec quem lhe da a sua identidade, a sua maneira de ser, o seu sotaque – imediatamente reconhecível, seja em Nova York, Paris ou Montréal. O seu primeiro triunfo americano surge em 1996 e a França foi suficientemente inteligente para recupera-lá, oferecendo-lhe um enorme sucesso popular. Para os americanos ela constitui um fenômeno novo e único, ao mesmo tempo americano (porque cantora americana ela o é de fato), e estrangeiro. Antes dos Grammy, 2/3 do disco Falling You (seu disco anglófono) tinha sido vendido fora dos EUA, o que atesta que mesmo antes da sua consagração em Nova York ela já ultrapassara o quadro americano. Céline Dion constitui, portanto, um novo tipo de star que não é simplesmente internacional porque é americana. À sua maneira, ela nos dá conta da mundialização dos mercados (visível por sua penetração imprevista nos novos mercados asiáticos, em expansão no ExtremoOriente), como nos dá conta da interpenetração das identidades. Voando cada vez mais alto, os quebequenses contemplam-na, agora, um pouco incrédulos, no topo do mundo: superstar de envergadura planetária, a primeira erupção de sua identidade “coletiva” sobre a cena mundial. Através da sua pessoa, Céline Dion realiza, portanto, a síntese harmoniosa, que não foi conseguida no plano político, entre o velho Canadá francês e o Québec moderno que o sucedeu. Por outro lado, enquanto os poderes políticos, de tipo tradicional, estão em declínio, os novos poderes do tipo individual (como o seu), que surgem sobretudo por intermédio dos mídia, são cada vez mais visíveis e significativos. Para muitos quebequenses Céline Dion não é apenas uma cantora popular ou uma artista de talento, ela é um dos seus, que realizou, em seu lugar, uma parte do antigo sonho de dominação e de força. Nesse particular, o seu desafio maior – presente em qualquer realização quebequense de envergadura internacional – é não se deixar levar pelo rolo compressor americano. Para os Quebequenses o fenômeno Céline Dion mostra, de forma concreta, as incontornáveis relações que existem entre mundialização e questão identitária. Para além as abordagens comparatistas tradicionais entre semelhanças dos sistemas Canadense e Estadunidense tais como democracia, religião, o inglês como língua tradicional, os direitos sociais, os direitos das mulheres etc., ou daquelas que pretendem apenas marcar suas diferenças significativas, como, por exemplo, o processo politico de independência de ambos os países (o Canadá negociou a sua, os EUA lutaram para obtê-la), e os impactos que se refletem na cultura e no comportamento de ambos: o Canadá é mais tradicional e mais pacifista; os EUA são um país mais moderno, mais agressivo. Vejamos agora, através dessa segunda abordagem, como o jornalista Rick Groen15, crítico em Artes do jornal canadense Globe and Mail, consegue mostrar essas realidades. Trabalhando a identidade nacional através das imagens de dois símbolos do talk-show dos dois países, ele elabora o seguinte argumento: pergunte a alguém quem controla o talk-show nos Estados Unidos e ninguém fará pausa para responder: Johnny Carson. Pergunte para alguém sobre o mesmo no Canadá, e a pausa poderá ser mais ou menos longa, mas o consenso sera o mesmo: Peter Gzowski. Carson e Gzowski, Gzowski e Carson, escute o quanto são dissonantes os nomes. Um é “pão branco”, de leve digestão – o americano da gema; o outro é o “pão integral”, pesado, de massa consistente, carregado de consoantes. Groen nos convida a melhor examinar a questão: se o debate do Meech é apenas um outro capítulo da nossa saga, ja que nos perguntamos sem parar “Qual Canadá?”, “Onde fica o Canadá?” e “Por que Canadá?”, talvez, então, uma comparação dos níveis de audiência dos ícones da mídia pode nos oferecer uma dica para identificação. Assim, esta não seria uma história dos dois mestres do talk-show, mas uma história dos dois países. Abordemos primeiro as similaridades, pois elas existem em maior número do que se possa imaginar. Ambos desenvolveram fortes personalidades públicas, cuidadosamente nutridas e curiosamente semelhantes. Ambos dividem a origem: cidades pequenas do interior, deixando-nas muito jovens em busca da grande cidade. Ambos trazem o mesmo charme interiorano, um mix de uma ingenuidade peculiar, temperada pelos valores tradicionais, com uma pitada de idiosincrasias nervosas: um leve tique no primeiro e uma pequena gagueira para o outro. E foi exatamente essa “personalidade cultivada”, que permitiu a ambos esse forte relacionamento de intimidade com a sua audiência. Tal grau de intimidade implica, necessariamente em responsabilidade porque, para além de celebridades, cada um deles é uma figura nacional. Eles são vistos pelos outros como “representantes da alma do seu país”, com uma responsabilidade mais pesada aqui, no Canadá, do que lá, nos EUA. E quais seriam as diferenças que eles carregam consigo? Para se ter uma idéia, a distinção não é apenas entre os homens, mas também entre os caracteres nacionais que eles representam. A lista é longa e fala por si mesma. Um delineia a sua personalidade, de forma deslumbrada, através dos holofotes da televisão comercial; o outro o faz através de um meio não visual e mais sério, que é o público de rádio. Um está situado na Costa; o outro no Centro. Um trabalha à noite (The Tonight Show) e vem até o nosso 15 Rick, Groen. “Two Talk-show kings and a tale of two countries”. In: Canadian Content, 2rd edition. Sarah Norton and Nell Waldaman. Canadá: Harcourt Bracer, 1992, p.183-186. quarto (sugerindo o “ir para cama com”), o outro trabalha pela manhã (Morningside) e vem para a sua cozinha (o coração da identidade canadense), criando um outo tipo de intimidade: a coletiva, familiar, política, social, pública. Um gasta um tempão conversando com celebridades e atores; o outro gasta um tempão entrevistando a versão canadense de celebridades (os jornalistas e os políticos). Um tenta veementemente, sobretudo, entreter, mesmo quando às vezes sinta-se orgulhoso pelos momentos em que aconteceu informar, por exemplo a entrevista realizada com Carl Sagan; o outro tenta arduamente, sobretudo, informar mesmo quando às vezes sinta-se orgulhoso dos momentos em que conseguiu entreter, como por exemplo um bate-papo com o maior tocador de bandolim da Acádia. Um tem convidados que, quando comecam a aparecer com freqüência, tornam-se “guest-hosts” do Johnny, claro!; o outro tem visitantes que, quando vêm com freqüência, tornam-se amigos do Morningside – amigos do Programa. Um traz, rigorosamente, para o seu programa convidados de dois pólos do país, New York e Los Angeles – Broadway e Hollywood; o outro traz, rigorosamente, visitantes de todas as regiões do seu país e de todas as partes do mundo. Um, ocasionalmente, fala com pessoas simples do país, com o coração do país, e quando o faz trata-se apenas do pitoresco e/ou grotesco (como por exmplo, uma mulher gorda, de Peória, com a maior bola de tricô do mundo); o outro conversa, regularmente, com pessoas simples, de várias regiões, mas que têm o que dizer (as idéias singulares sobre perspectiva social de um pescador de Inuvik). Um é anti-intelectual, antes de tudo um comediante, e em seguida entrevistador; o outro é cerebral, antes de tudo, um escritor, e em seguida um entrevistador. Um é milionário e tem livros escritos sobre ele; o outro não é milionário e algumas vezes escreve sobre si, outras sobre o show (o último livro seu trata essencialmente de transcrições de entrevistas selecionadas, uma forma híbrida – nem totalmente literatura nem totalmente rádio). Um é insular o outro não. Um tem “macacos de auditório” que o acompanham; o outro não. Um é chamado Johnny; o outro não é chamado Petie (diminutivo de Peter). Um entra no ar através da chamada “Com vocês o melhor do Carson”; o outro entra no ar com a chamada “Com vocês o melhor do Morningside”. Um é conhecido por todo mundo no Canadá; o outro não é conhecido por quase ninguém nos EUA. Carson e Gzowski, Gzowski e Carson “vive la différence”. O outro tenta honestamente pronunciar esta frase; aquele não tem esse tipo de preocupação, não tem importância, não é inglês, melhor dito, não é americano. Uma aproximação, agora, dos níveis de audiência/popularidade de um dos ícones da televisão brasileira, “Jô Soares”16, talvez nos forneça dicas para identificação decomo se processa a nossa “americanidade” na mídia. No dia 16 de agosto de 1988, quando estreava “Jô Soares Onze e Meia”, no SBT, o comediante Jô Soares concretizava um antigo sonho: comandar um programa de entrevistas, aos moldes dos que faziam (e fazem) tanto sucesso nos EUA. Quem viu o programa pela primeira vez pode até ter estranhado. O público estava acostumado com um Jô Soares de atrações humorísticas, na pele de personagens cômicos e polêmicos. Mas o papel de entrevistador não era totalmente desconhecido para Jô. Em 1963, ele integrava a equipe do “Programa Silveira Sampaio”, na TV Rio, sendo o responsável pelas entrevistas internacionais. Esta experiência, associada ao carisma e a simpatia, transformam o programa numa verdadeira coqueluche. Modelo pioneiro no Brasil, o “Jô Onze e Meia” (horário de Carson/formato de Gzowski), entrou para a história da televisão brasileira. De segunda a sexta, durante os onze anos em que o programa entrou no ar, Jô Soares (o nome artístico completo aqui indicando tanto o que deveria ser a imagem do “entrevistador” quanto o lado mercadológico), gravou 2.309 programas, num total de 6.927 entrevistados. Entre seus convidados, aparecem, lado a lado, as mais importantes personalidades da história do país, como presidentes, ministros e governadores, e as figuras anônimas do povo brasileiro. Poderíamos ler esse formato como o lado “pão integral” do Gzowski”. O cenário artístico nacional também foi alvo das atenções de Jô Soares. Os mais importantes artistas estiveram em sua companhia (lado Carson), sendo protagonistas de inesquecíveis entrevistas e “canjas animadíssimas” (o lado Costa americana de Carson, cujo cenário privilegiado concentra-se no eixo Rio/São Paulo – a Hollywood e a Broadway brasileiras). Esportistas, médicos, inventores, cientistas e vendedores “também” passaram pelos estúdios do “Jô Onze e Meia” (a presença da conjunção também, na frase pode muito bem sugerir uma hierarquização dos convidados – lado Carson). As entrevistas internacionais eram atrações especiais do programa (lado Broadway; Hollywood). Viajando ou via telão, Jô (lado Carson) entrevistou algumas figuras mais importantes do século, como Mikhail Gorbachov e Bill Gates (lado Gzowski). 16 Cf. <http://redeglobo5.globo.com/jo/desktop/index02.htm> Na sua ida para Rede Globo, ano 2000 (lado Carson é o que vai predominar), Jô afirmara pretender seguir a mesma linha que adotara desde a sua estréia nesse tipo de programa: entrevistar desde o Presidente da República (“desde o” significando o topo da pirâmide social; mix de Carson/Gzowski) até o vendedor de cachorro quente da esquina (“até o” induzindo um dos mais baixos níveis da pirâmide social, se colocado como está sugerido, em relação ao mais alto, figura do Presidente da República). Por outro lado, o fato de ser “o vendedor da esquina”, sugere também intimidade, popularidade; pitoresco e/ou excêntrico (lado grotesco Carson), corroborado por sua declaração “se for interessante vale a pena”. Para Jô, a opção por comandar um programa de entrevistas não significa que ele tenha deixado o seu lado humorístico fora de cena. Pelo contrário, “é um humor diferente, mas está sempre presente nas minhas entrevistas, nos meus comentários” (lado Carson). Muniz Sodré17 explica que a verdadeira migração, quanto ao que acontece na tevê brasileira ultimamente, não é de público, o de classe alta migrando para as tevês a cabo, e sim do grotesco, para praticamente todos os tipos de programação de tevê aberta, inclusive aqueles antes reputados como “de qualidade”. Num programa de entrevistas como o de Jô Soares, tido como de “alto nível”, predomina o riso cruel. Estudando para se tornar um diplomata, como o pai, Jô Soares, oriundo de cidade grande e de família abastada, desenvolve gradativamente uma forte personalidade pública. Torna-se, ator, comediante, artista plástico, escritor, jornalista, músico, talk-show e, finalmente, best-seller de romances. Cerebral e deslumbrado, se antes Jô se via e era visto como um “grande” comediante (lado Carson), até no tamanho, pois ele “precisa” ser gordo para compor e manter a sua imagem de sucesso, a partir de 1995 ele busca, sobretudo, ser visto como “o escritor Jô Soares”, e em seguida como o entrevistador (lado Gzowski). Para o público, em particular o seu auditório, ele é visto, como Jô o entrevistador, Jô o comediante e por último, Jô Soares o escritor. Além de excelente entrevistador, Jô Soares é sempre o “ator principal”, o “grande convidado” do seu próprio programa/show. Essas qualidades, associadas a uma personalidade forte, “cuidadosamente cultivada”, como Carson e Gzowski, permitiram esse forte relacionamento de intimidade com a sua audiência, além de grande popularidade. Ele não é milionário como Carson, mas vive muitíssimo bem como Gzowski. Amante dos 17 Muniz Sodré; Raquel Paiva. O Império do grotesco. Rio de Janeiro: MAUAD, 2002. prazeres da vida, um deles a música (grande conhecedor da história do Jazz), apreciador de bons vinhos, da gravata borboleta e de charutos havanas, Jô Soares é mais imagem do que símbolo. Imagem de cultura, de bom gosto e do bon vivant que a sua charmosa, e sempre elegante, imagem transparece, imagem de um certo Brasil, de um Brasil americano. Gostaria apenas de finalizar por uma constatação do caso brasileiro. Aqui, esse grau de intimidade não implica em tanta responsabilidade social, quanto a canadense e a americana, porque “figuras como a de Jô”, que no nosso caso se confundem com os mídia, do qual são parte integrante, são mais vistas como celebridades do que como “figuras nacionais”. Dessa forma, elas não poderiam ser vistas, pelos brasileiros, de modo geral, como “representantes da alma do país” (imagem antes veiculada/atribuída aos intelectuais, sobretudo os escritores, agora, também, veiculada/atribuída aos esportistas, aqueles que se destacam (como, nesse momento, os jogadores da Seleção, e aqueles outros cujas imagens são “midiáticas”). Todos eles vencedores e abastados quanto Jô, porém quão diferentes em suas origens. Jô seria mais americanização, como ele próprio declarara, e a sua imagem a própria imagem da americanização (look sofisticado moderno), ele e seu programa condensam, portanto, um mix de Carson e Gzowski. Hoje, na Globo, o lado Carson torna-se cada vez mais acentuado, mais divertimento e menos informação, o que acontecia bem menos ou, de maneira inversa, quando da sua atuação no SBT. Acredito, assim, que a imagem que mais falaria da “nossa americanidade” na tevê, seria a de Silvio Santos, que não é um talk show e sim um apresentador de televisão e proprietário de um “império”, no setor da comunicação. Seus programas semanais seguem as leis do mercado e são dirigidos para as classes C e D de audiência. Silvio Santos é, sem dúvida, um dos maiores comunicadores que o país já conheceu. Vindo de uma família de classe média “remediada”, carioca da Zona Norte, exerceu funções humildes, e, com esforço, talento e sorte, torna-se o símbolo do ganhador18. Tendo atingido o topo da pirâmide social e sendo uma “figura pública” de grande penetração e responsabilidade social (lembremos que como pessoa física Silvio Santos é o maior contribuinte da arrecadação fiscal do país, fato que foi matéria da Revista Veja), a sua imagem seria aquela que melhor incorpora os paradigmas de uma “americanidade brasileira”, na mídia. 18 Cf. <http://www.portaldosilviosantos.cjb.net/>