Camarim 35 - Cooperativa Paulista de Teatro
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Camarim 35 - Cooperativa Paulista de Teatro
uma publicação da cooperativa paulista de teatro • ano 8 • nº 35 • jul/ago/set 2005 1 4 5 6 SERVIÇOS PALAVRA DA COOPERATIVA A Hora da Cultura – Manifesto POLÍTICA CULTURAL Políticas de Estado Para a Cultura em Compasso de Espera Ney Piacentini Mobilização Permanente Renata de Albuquerque Sobre o Fundo 12 TADEUZ KANTOR O Trabalho de Kantor Michal Kobialka Manifesto O Teatro da Morte Tadeusz Kantor 26 31 32 2 ENTREVISTA SESC Aposta no Valor da Cultura Com Danilo Santos Miranda REPORTAGEM Arte no Quintal Renata de Albuquerque COOPERATIVA EM NOTÍCIAS Apresentação de Camarim EXPEDIENTE O teatro, como é de sua natureza, resiste ao arquivo e ao museu. Assim, as páginas de Camarim pautam-se pelo movimento, sofrem seus avanços e refluxos e, como a cena, denunciam o nível de consciência que temos de nosso trabalho em seu momento atual, flagrando os vínculos que lhe conferem relevância. Se o momento é de organização e luta, radicalização de um processo cujos contornos se definem pelo confronto direto com a pasmaceira institucional e a norma da acomodação, as páginas de nossa revista reclamam também seu momento de reflexão e elaboração dessa experiência, abrindo-se para além da perplexidade e da paralisia, esposando o que há de mais radical nas tentativas de superação de nossas condições atuais de produção e criação – condições não apenas da arte, mas de nossa sociedade cada vez mais dependente e sua sociabilidade rarefeita. Camarim, portanto, quer abarcar toda a cena, e além da cena. A autonomia de suas páginas reflete a autonomia de nosso teatro, e essa é a condição de sua existência. Camarim é uma publicação da Cooperativa Paulista de Teatro – Ano 8 – Número 35 – Julho/ Agosto/Setembro 2005 • Editor: José Fernando Peixoto de Azevedo • Jornalista Responsável: Renata de Albuquerque (Mtb 30.228/SP) • Conselho Editorial: Ney Piacentini (Diretoria) • Diagramação: Pedro Penafiel • Impressão: Hanabi • Foto de Capa: A Classe Morta, (Manequins de Crianças), de Tadeusz Kantor, 1975 • Tiragem: 3000 exemplares • Distribuição Gratuita Praça Roosevelt, 82 • Consolação • CEP 01303-020 • São Paulo • SP Telefone: (11) 3258-7457 • Fax: (11) 3151-5655 • [email protected] 3 serviços Carlos Biaggiolli, Alexandre Terreri, Roberto Rosa, Cenne Gotts (da nova diretoria) e Luiz Amorim, ex-presidente da Cooperativa (ao centro), durante posse da nova diretoria no prédio da nova sede Nova sede ◗ A SEDE PRÓPRIA DA COOPERATIVA já é uma realidade. Depois de meses de procura, o novo endereço da CPT já está confirmado: Praça Dom José Gaspar, 30 – 4º andar. As reformas no local já estão sendo feitas e, em breve, a mudança será anunciada. Fique atento! Atualização cadastral ◗ A COOPERATIVA está promovendo uma atualização no cadastro dos cooperados, para facilitar o atendimento. Por isso, não deixe de entrar em contato com a Thaís, no telefone 3258-7457, ramal 204 para informar dados como seu e-mail, endereço e telefone. Biblioteca da CPT ◗ A NOVA SEDE DA CPT vai contar com uma biblioteca, para que os cooperados possam realizar consultas a livros e outras publicações relacionadas a teatro. Por isso, se você quiser doar algum material para fazer parte do novo acervo, entre em contato com a Mayra. São aceitos livros sobre artes cênicas, revistas, textos teatrais e publicações em geral. 4 MANIFESTO ◗ HÁ DOIS ANOS o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito portador e representante da esperança e dos sonhos dos milhões de cidadãs e cidadãos brasileiros que acreditavam ter chegado a hora de verem concretizadas as lutas empreendidas pela sociedade civil, desde os anos da ditadura militar, por uma sociedade justa e democrática. Papel importante e singular teve a área cultural e, em particular, o Teatro nas lutas sócio-políticas pela democratização. Hoje assistimos, estarrecidos, à incompreensão por parte dos responsáveis e gestores executivos da Política e do Orçamento Público, que tratam a área cultural como se nenhuma importância tivesse para a Sociedade. A exemplo das políticas gestadas em governos anteriores, os trabalhadores e trabalhadoras da cultura ainda são vistos como criadores de Mercadorias. Continuamos entregues às regras injustas e discricionárias do Mercado. Continuam a imperar os guichês que, em sua tradição secular, favorecem apenas aqueles que têm acesso ao poder e aos que administram a “coisa” pública. A censura política, outrora responsável pela tutela e pela definição do que era ou não cultura, tornou-se obsoleta diante da censura econômica existente e exercida através das Leis de Incentivos, que proliferam pelo país. A conseqüência mais visível é a permanência do recorte de classe, que define o verdadeiro apartheid cultural em que vivemos, e que divide a sociedade entre os brasileiros e brasileiras que podem usufruir da produção artística e aqueles – ampla maioria – que não o podem. Quando são agitadas as bandeiras das reivindicações populares do DIREITO À CULTURA, nos acenam com as promessas de um porvir. No entanto, exercendo o ofício da arte, sabemos não haver futuro se não trabalharmos com a matéria presente. Por isso, tendo exercido a paciência e a compreensão que nos exigiu o tempo histórico, é chegada a hora de virmos a público expor à sociedade o descaso com a área cultural e, em particular, com as Artes Cênicas. Para reverter este quadro exigimos: ✔ Lançamento e execução imediata dos editais para os programas “Myriam Muniz” e “Klaus Viana” de fomento às Artes Cênicas, já articulados pela Funarte. ✔ Implementação e manutenção de ações públicas que possam reverter a crise pela qual atravessam as Artes Cênicas, com programas de fomento à criação, fruição e circulação, para além da perspectiva mercadológica, e que se destinem ao usufruto da maioria da população brasileira. ✔ Abertura do Fundo Nacional de Cultura, de forma transparente e democrática, propiciando o acesso da sociedade civil ao FNC. ✔ Estímulo às Políticas Públicas para a área cultural que permitam de fato o acesso universal de todos aqueles que criam o “bem simbólico” nacional, e não apenas da elite que vem se beneficiando das ações pontuais e discriminatórias do Estado. ✔ Neste sentido: reformulação das Leis de Incentivo para que cumpram o fim determinado para o qual foram criadas. ✔ Democratização do acesso aos mecanismos de apoio e patrocínio das ESTATAIS e estímulo à criação de editais com comissões públicas e compartilhadas de julgamento, por mérito, dos projetos. ✔ Concretização das ações em discussão no Ministério da Cultura, com o envolvimento do Congresso Nacional, transformando-as em Leis que regulamentem a ação governamental no âmbito da União, do Estado e dos Municípios, tendo em consideração a diversidade e pluralidade da realidaCONVOCAÇÃO de brasileira. O texto desse manifesto circula em todo país, seguido de um abaixo✔ Ampliação e aplicação assinado reivindicando o imediato descongelamento e o aumento para real do orçamento do Minis2% do orçamento da União para Cultura. Grupos e artistas devem tério da Cultura, que possa retirar cópia na sede da Cooperativa. Maiores informações 3258-7457. atender às demandas do país. 5 palavra da cooperativa A hora da cultura política cultural Políticas de Estado para a cultura em compasso de espera A nova diretoria da Cooperativa Paulista de Teatro tomou posse em maio. Leia a seguir o discurso de posse do novo presidente, em que faz uma análise do atual panorama da política cultural “Não apenas a rotinização da cultura, mas a tentativa consciente de arrancá-la dos grupos privilegiados para transformála em fator de humanização da maioria, através de instituições planejadas”. Antonio Candido, no prefácio de Mário de Andrade por ele mesmo, de Paulo Duarte ◗ A ANOTAÇÃO DE ANTONIO CANDIDO a respeito do projeto de Mário de Andrade à frente do Departamento de Cultura na São Paulo dos anos 30 permanece como indicativo de uma tarefa insuperada. Nesta síntese exemplar, Candido aponta as idéias mestras de um plano de gestão que alinhava a um só tempo a clara posição política e a visada estratégica que ainda hoje o Estado insiste em ignorar. Setenta anos depois, Governo federal, Estados e Municípios assumem francamente o lavar as mãos diante da tarefa constitucional de tratar os bens culturais, sua criação, fruição e difusão como direito da sociedade inteira. A arte, a formação artística e a participação na discussão do pensamento permanecem como latifúndios simbólicos exclusivos das elites. A exemplo do processo social brasileiro visto integralmente, o momento atual só confirma, no campo da produção artística, os enormes contrastes criados com a mercantilização que se Chico Cabreira estende por todas transfere o cargo a as áreas do fazer. Ney Piacentini, na No caso específico cerimônia de posse das políticas de inda nova diretoria 6 cremento à criação, sofisticou-se e legitimouse a desigualdade, através de um instrumento jurídico que legaliza a transferência dos deveres do Estado para a iniciativa privada. As Leis de Incentivo, cujo modelo é a Lei Sarney, criada em meados dos anos 80, multiplicam nas diversas legislações regionais Brasil adentro um paradigma que não só perpetua a injustiça no uso do dinheiro público como normaliza certa visão elitista e privilegiada do que seja a cultura. O que se pode ver com a maior clareza é o desvio, devidamente legitimado, do recurso público, para atividades quase sempre de apelo midiático e de promoção das marcas empresariais. Essa dinâmica só tem reforçado o verdadeiro apartheid entre os que podem vivenciar – como criadores ou fruidores – os bens artísticos e culturais e os que permanecem, como sempre estiveram, à margem do processo da invenção e do investimento nas potencialidades criativas. O governo Lula, rendido ao modelo descrito acima, anuncia que a captação de recursos via Lei Rouanet cresceu em 2004 cer- ca de dez por cento em comparação com o ano anterior. Não interessa discutir o modelo, apenas apontar os resultados. Por outro lado o governo federal, na mais acertada intenção de criar canais mistos de discussão, convoca fóruns e seminários, cria as câmaras setoriais para organizar e debater demandas. Mas a macro-política cuida de inutilizar estas ações. É que na paralela o Minc trabalha com a perspectiva de acomodar-se ao contingenciamento de recursos do já minguadíssimo orçamento. Na esfera estadual o problema se acentua. Até o momento, a Secretaria de Estado da Cultura não lançou nenhum programa público para a área teatral, contentando-se em manter apenas dois projetos dirigidos ao teatro não profissional. Para emoldurar o quadro já lastimável a Secretaria vem criando contratos com Organizações Sociais para a gerência dos teatros do Estado. Como nos melhores exemplos da administração privada, a escolha dos parceiros não passou por editais ou concorrência – o que até pode ser permitido por Lei, mas denuncia uma política centralizadora e anti-democrática na condução da coisa pública. Enquanto a sociedade civil luta pela implantação do Fundo Estadual de Cultura, elaborado e discutido por dezenas de entidades de classe de todo o Estado, a Secretaria continua apoiando-se em um ou outro evento, sem a organicidade de um projeto, necessário e até aqui inexistente, que defina uma verdadeira política cultural. A esta altura ações ainda muito isoladas, estruturadas em programas como a Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, criam paradigmas alternativos de incremento à produção. Devolvem ao poder público a responsabilidade por mediar as relações, assimilam o fenômeno dos coletivos de trabalho e da pesquisa como foco de investimento, democratizam as instâncias de decisão e oportunizam o acesso da população à matéria artística. Aos olhos da nova gestão municipal o programa soou como um escândalo, a ponto de ser colocado, ilegalmente, em suspensão, para agora ser inseguramente retomado, sob a pressão dos artistas. O fato é que se em geral qualquer plano de ação precisa eleger prioridades, em um país com demandas sócio-culturais tão extraordinárias como o Brasil a prioridade é uma exigência. No teatro ou em outras áreas da expressão artística e cultural o Estado tem que assumir com firmeza aquela tarefa civilizatória de rotinizar a cultura na perspectiva da justiça social. Planejar ações para desconcentrar privilégios e disseminar as oportunidades que vão definir, por fim, a democratização verdadeira da arte. Por enquanto avançamos devagar e permanecemos quase em compasso de espera. Ney Piacentini é ator da Companhia do Latão, presidente da Cooperativa Paulista de Teatro, vice-presidente do Conselho Municipal de Cultura de São Paulo e representante paulista na Câmara Setorial de Teatro do Ministério da Cultura 7 política cultural Mobilização Permanente A luta continua face à indefinição do governo Por Renata de Albuquerque ◗ MAIS UMA VEZ, no último dia 21 de junho, artistas de diversas áreas estiveram reunidos na Assembléia na expectativa de votação do Projeto de Lei para o Fundo Estadual de Arte e Cultura. A votação não ocorreu. Por conta de um indicativo do Secretário de Cultura do Estado, João Batista de Andrade, adiou-se a votação, no esforço de mais um acordo. Em resposta à mobilização, os artistas saíram com a promessa de que na semana seguinte, dia 28, o Secretário, em audiência na Assembléia, apresentaria proposta de lei do governo – um misto de lei de incentivo e fundo público, ainda indefinido. Até o início de junho, parecia possível ver um horizonte mais claro para o pro- Ocupação artística do Plenário da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, em 11 de abril 8 jeto do Fundo Estadual de Arte e Cultura. Em 11 de abril, o plenário da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo ficou lotado por causa da “Ocupação Cultural” feita pela “classe” artística, que homenageou Danilo Miranda, José Renato e Raul Cortês. Na ocasião, estavam presentes representantes de 42 municípios paulistas, demonstrando que a aprovação do Fundo não é uma demanda apenas da capital, mas que é apoiada por diversas esferas do Poder Público. Afinal, o projeto do Fundo é suprapartidário, foi assinado por 67 deputados, incluindo lideranças da Assembléia, e contempla todas as áreas artísticas. Uma amostra de que a preocupação vai além dos limites da capital paulista são as Audiências Públicas que começaram a ser feitas em maio, em diversas cidades do interior do Estado. As prefeituras das cidades convidam e membros da Comissão PróFundo vão até os locais, discutir o projeto e falar sobre ele com o poder público e com outras pessoas que têm interesse no assunto. Bauru, Campinas e São Carlos são exemplos de cidades que abriram suas portas para essa discussão. “A idéia é conscientizar a respeito do Fundo, que vai servir a todos”, afirma Alexandre Terreri, membro da Comissão Pró-Fundo, presidente do Cepetij e segundo tesoureiro da Cooperativa Paulista de Teatro. “O Fundo vai promover uma descentralização de recursos, que serão destinados ao interior”, completa Luiz Carlos Moreira, também membro da Comissão Pró-Fundo. Outro indício de que a situação era favorável era que o Presidente da Assembléia, deputado Rodrigo Garcia (PFL-SP), recebeu representantes da Comissão e comprometeu-se a colocar o projeto em votação. “Basta o governador não vetar”, ressaltou Terreri na ocasião. Um novo Secretário de Cultura do Estado de São Paulo, o cineasta João Batista de Andrade, assumiu o cargo, e acreditava-se que ele fosse favorável ao Fundo e que pudesse auxiliar para que o projeto fosse aprovado. “Não sou porta-voz de ninguém, mas pelo que conheço do novo secretário, acredito que temos um interlocutor honesto e lúcido, que vai defender o mesmo que nós”, afirmou Moreira na ocasião. Apesar dos indícios de boas notícias, já o primeiro prazo para que a votação acontecesse, no mês de maio, foi adiado. A data foi prorrogada para junho. E, em Junho, diante das manobras internas à Assembléia e sua bancada ligada ao executivo, mais uma vez viu-se o adiamento da votação e a evidência de que é cada vez mais urgente a discussão so bre o que seja um programa público re almente distinto de um projeto desse ou daquele governo. 9 política cultural Leia a seguir um texto, contendo as linhas gerais do projeto de lei apresentado pelas diversas entidades. SOBRE O FUNDO A exemplo da lei de Fomento ao Teatro, votada na Câmara Municipal de São Paulo, tratase de um projeto de lei apresentado à Assembléia Legislativa, para todo o Estado, por intermédio de 67 deputados de todos os partidos. O Fundo se articula com uma proposta de organizar a política pública de arte e cultura sobre três colunas: 1) Projetos de governo. 2) Programas públicos estabelecidos em lei, como as leis de incentivo ou o Programa Municipal de Fomento ao Teatro. 3) Fundos municipais, estaduais e federal. Em complemento aos programas, o Fundo surge como uma base de sustentação mais abrangente, mais aberta e flexível, voltado para todas as áreas e sempre com recursos para aqueles que criam e produzem, sem intermediários. I. SOBRE OS RECURSOS O FUNDO deverá ter um pouco mais de 100 milhões de reais consignados no orçamento da Secretaria de Estado da Cultura, corrigidos anualmente (o artigo 2 fala em 8.700.000 UFESPs). Há outras fontes de recursos no artigo 3. II. PARA ONDE VAI O DINHEIRO DO FUNDO O FUNDO destina recursos para a pesquisa, criação e circulação de obras e atividades artísticas e/ou culturais através de: a) Projetos de artistas e produtores culturais, pessoas físicas ou jurídicas, com ou sem fins lucrativos, que ficam com 81% dos recursos. b) Incentivo às Prefeituras para investir em cultura através de programas públicos municipais, estabelecidos através de leis que também se destinam a artistas e produtores locais, que podem ficar com até 10% dos recursos do FUNDO. c) Ações estratégicas, que podem ser projetos da sociedade, programas públicos, ações 10 10 ou projetos de governos municipais, estadual ou federal, da administração direta ou indireta, que ficam com 07% dos recursos. d) Os 2% restantes vão para a própria administração e manutenção do FUNDO. SOBRE OS PROJETOS Os interessados devem se inscrever através de editais públicos, em janeiro e julho de cada ano (cada interessado concorre com os outros interessados da sua Região Administrativa, área e edital). Assim, os editais serão criados (ou repetidos) duas vezes por ano. Quem cria os editais é o CONSELHO DE ARTE E CULTURA DO FUNDO (ver mais à frente). Quem julga são COMISSÕES JULGADORAS (ver mais à frente). Haverá editais para as áreas abaixo, com a seguinte distribuição dos 81% dos recursos do FUNDO: 1. Artes Visuais: 8%; 2. Áudio-visual: 20%; 3. Circo: 6%; 4. Cultura Popular: 8%; 5. Dança: 6%; 6. Literatura: 8%; 7. Música: 11%; 8. Hip-Hop: 3%; 9. Teatro: 11%. Esse dinheiro será distribuído para todas as Regiões Administrativas do Estado de forma proporcional à quantidade da população em cada uma. Se o dinheiro de uma área não for usado por uma região, será alocado para a mesma área de outra região. O FUNDO prevê alternativas para projetos que não se encaixam, especificamente, em uma área e para projetos que envolvam mais de uma área. SOBRE O INCENTIVO ÀS PREFEITURAS O FUNDO pode aplicar, anualmente, até 10% de seus recursos em parcerias entre o Estado e as Prefeituras. Para receber apoio financeiro, o Município também tem que investir em artistas e produtores locais através de editais ou semelhantes, estabelecidos em programas públicos criados por lei, além de criar um Conselho Municipal de Cultura. Quem decide sobre esses recursos é o CONSELHO DE ARTE E CULTURA DO FUNDO (a cada semestre). Não havendo interesse das Prefeituras, ou por decisão do CONSELHO, essa verba vai, no todo ou parcialmente, para os editais de projetos ou para as ações estratégicas. SOBRE AS AÇÕES ESTRATÉGICAS Anualmente, 07% dos recursos do FUNDO vão para ações estratégicas, que também serão definidas e decididas pelo CONSELHO em função do início e do meio do ano. É um dinheiro que pode ser aplicado em projetos do governo (municipal, estadual, federal, administração direta ou indireta), em projetos da sociedade, editais ou ações que o próprio CONSELHO criar. Trata-se de alocar recursos em uma ou mais áreas, regiões ou propostas consideradas fundamentais ou emergenciais em cada momento. III. AS DECISÕES FUNDAMENTAIS Todas as decisões são tomadas pelo CONSELHO DE ARTE E CULTURA DO FUNDO, onde o Governo tem maioria. O CONSELHO é formado por: 1) Secretário de Estado da Cultura ou seu representante, que é o Presidente e tem o voto de desempate. 2) 9 membros indicados pelo Secretário. 3) 9 membros eleitos por entidades. Cada membro indicado pelo Secretário tem que ser pessoa de notório saber em uma das áreas e o mesmo vale para os membros eleitos pelas entidades. Cada entidade representativa, de caráter regional, estadual ou nacional, com sede ou seccional no Estado de São Paulo há mais de três anos na data da indicação, pode indicar um nome para cada área que representar. Todas as entidades, de todas as áreas, podem votar em até dois nomes indicados para cada área. O nome mais votado por área e que tenha, pelo menos, os votos de metade mais uma de todas as entidades que votaram, vai para o CONSELHO junto com os representantes do Secretário. IV. AS COMISSÕES JULGADORAS DOS EDITAIS Cada edital terá uma COMISSÃO JULGADORA composta de cinco membros de notório saber na área: 1) 03 membros nomeados pelo Secretário de Estado da Cultura, que indicará, dentre eles, o Presidente, que só terá direito ao voto de desempate. 2) 02 membros eleitos a partir de indicação de entidades. As entidades representativas na área, de caráter regional, estadual ou nacional, com sede ou seccional no Estado de São Paulo há mais de três anos na data da indicação, poderão indicar até quatro nomes para a COMISSÃO. Os interessados inscritos no edital votam em até dois nomes das listas indicadas pelas entidades. O nome mais votado vai para a COMISSÃO junto com os representantes do Secretário. TANTO PARA O CONSELHO COMO PARA AS COMISSÕES: Em caso de vacância, não havendo indicação de entidade, em caso de empate ou na falta de nome que obtenha o apoio das entidades, cabe ao Secretário decidir e escolher o nome que ocupará a vaga. 11 11 tadeusz kantor O trabalho de Kantor Tadeusz Kantor (1915-1990) Kantor em cena no espetáculo Wielopole-Wielopole, 1980 12 Por Michal Kobialka Tradução de Jorge Will ◗ TADEUSZ KANTOR, artista plástico polonês, teórico e diretor teatral, fundador (com Maria Jarema) da companhia teatral CRICOT 2 (1955), nasceu em Wielopole, Polônia. Foi educado em Tarnóvia e Cracóvia. Quando estudou pintura e cenografia na Academia de Belas Artes de Cracóvia (1933 -1939), Kantor conheceu o simbolismo, o construtivismo e Bauhaus. Em 1938, ele fundou o Teatro Ephemeric (Mecânico), onde apresentou A Morte de Tintagiles de Maurice Materlinck. Em 1942, com um grupo de pintores jovens, Kantor organizou o Teatro Independente, clandestino e experimental, durante a ocupação nazista, onde ele dirigiu Balladyna de Juliusz Slowacki (1942) e O Retorno de Ulisses de Stanislow Wyspianski. Como citado por Kantor em sua “Lição 1” de As Lições Milanesas, esta produção foi fundamental para a elaboração dos seus conceitos sobre espaço autônomo de performance, objeto pobre, ator-objeto, e “realidade da vida” (“realidade do mais baixo calão”): 1944. CRACÓVIA. TEATRO CLANDESTINO. O RETORNO DE ULISSES DO SÍTIO DE ESTALINGRADO. O abstracionismo, que existiu na Polônia até o inicio da II Guerra Mundial, de sapareceu no período do genocídio em massa. [...] A arte perdeu seu poder. A re-produção estética perdeu seu poder. O ódio de um ser humano apoiado por outras bestas humanas amaldiçoou a A R T E. Só tínhamos força para agarrar o que estava mais próximo, O OBJETO REAL e chamá-lo de obra de arte! No entanto, era um objeto P O B R E, incapaz de realizar qualquer função na vida real, um objeto a ser descartado. Um objeto que foi desprovido de uma função vital que o salvaria. Um objeto despojado, sem função, a r t í s t i c o! [...] Uma cadeira de cozinha … Um objeto, que foi esvaziado de qualquer função vital, veio à tona pela primeira vez na história. Este objeto era vazio. Tinha que justificar sua existência a si mesmo e não às coisas que o cercavam e lhe eram estranhas. [E o fazendo, o objeto] revelava sua própria existência. E quando sua função era imposta a ele, essa ação era vista como se isso tivesse acontecido pela primeira vez desde o momento da criação. Em O Retorno de Ulisses, Penélope, sentada em uma cadeira de cozinha, representou o ato de estar “sentada” como um ato humano acontecendo pela primeira vez. O objeto [físico] adquiriu sua função histórica, filosófica e a r t í s t i c a ! 1 Os experimentos de 1944 e 1963 fecham o período no qual Kantor questiona as convenções de criação ou exibição artística vigentes, e, devido à experiência da II Guerra Mundial, modifica a função de uma vanguarda artística numa sociedade. Estes experimentos colocam em xeque as narrativas históricas oficiais que encontram um modo efetivo de desprezar o questionamento de Adorno sobre o que significa representar depois de Auschwitz. Assim, por exemplo, em O Retorno de Ulisses, em 1944, “Ulisses se recusa categoricamente a ser apenas uma imagem, uma representação. [...] em tempos de loucura gerada pelos homens, em tempos de guerra, a morte e suas trupes tenebrosas, que se recusaram a ser impedidas pelos sentidos humanos e racionais, iniciando e confundindo-se com a esfera da vida”2. A emoção do drama e seu caráter mitológico foram atirados e fundidos com a vida contemporânea. A peça foi representada não em um teatro, mas sim em uma sala que “estava destruída. Havia guerra e havia milhares de salas assim. Todas se pareciam: tijolos sem reboco por trás de uma camada de tinta, gesso caindo do teto, piso faltando tacos, pacotes abandonados cobertos de poeira, entulho espalhado por todos os lados, pranchas remanescentes de um convés de navio foram dispensadas ao horizonte dessa decoração, um tambor de revólver apoiado num monte de pedaços de ferro, um megafone militar pendurado por um cabo de aço enferrujado. A figura inclinada de um soldado com capacete usando um sobretudo surrado [de um soldado alemão] em pé con13 tadeusz kantor tra a parede. Nesse dia, seis de junho de 1944, ele se tornou parte dessa sala”3. Em 1963, os objetos exibidos tornaram irrelevante qualquer tentativa classificatória de localizá-los no espaço ou seqüência temporal sistematizando-os em uma unificadora totalidade. Ao contrário, os objetos rearticularam suas funções nas relações, que aconteceram acidentalmente, e que não poderiam ser previstas por nenhuma norma – “a ditadura da utilidade” é vencida; o objeto que estava despido da segurança da sua estrutura original a que pertence, “começa uma discreta relação possível com seus semelhantes”4. Para conseguir isso, Kantor explora o processo de incorporação na atividade artística de objetos encontrados, ou seja, os objetos, os eventos e o ambiente. Esta realidade não subjugada à modelagem artística ou necessidades formais. Não funciona como modelo, que existe anterior à obra de arte, e, conseqüentemente, não corresponde a nenhuma convenção de representação. Conforme Kantor observou: Realidade pode apenas ser “u s a d a” “Usada” é o único termo apropriado fazer uso da realidade na a r t e significa uma apropriação da realidade. [...] Durante esse processo a realidade transgride sua própria b a r r e i r a e caminha na direção do “i m p o s s í v e l” A realidade apropriada contem em si mesma objetos reais situações e um ambiente descrito pelo tempo e lugar. Suas r e a ç õ e s entre si, as i n t e r c o n e x õ e s entres eles a apropriação g e s t u a l do (como se, encantando a realidade) ritual são substituídos pelo processo de modelagem que está fora de questão aqui 5. A estratégia da apropriação da realidade significa o processo de arrancar os objetos da realidade para explorar sua qualidade de ob14 jeto no meio onde eles adquiriram suas funções na relação com outros elementos colocados nesse espaço6. Portanto, os objetos são descaracterizados e não conceituais no entender de Adorno sobre os princípios que regem as obras de arte autônomas7. O foco está em suas estruturas inerentes, ao invés de na totalidade dos efeitos; num processo manual de significação, ao invés da soberania visual do olhar produzindo a imagem representacional num espaço clássico, tridimensional; nos processos não-representativo, não-ilustrativo, e não-figurativo, nos quais o olhar não desempenha uma função visual de ordenação, mas segue as relações que organizam seus campos de percepção; no irrepresentável na representação em si mesma; naquilo que “recusa o consolo das formas corretas, recusa o consenso do gosto permitindo uma experiência comum de nostalgia pelo impossível, e questiona novas apresentações.”8. Levando em consideração a importância e a direção das transformações na arte em geral no século XX e no Dadaísmo, Surrealismo, Abstracionismo, Arte Informal em particular, Kantor enfatizou sua partida pelas formas geométricas ou abstratas, que tinham que eliminar ou transcender os dois eventos históricos, como a I e II Guerras Mundiais, co-modificação das artes, em direção à realidade degradada ou à realidade do mais baixo calão, destituída de seus aspectos marcantes pelos eventos da guerra. A realidade degradada ou a “realidade do mais baixo calão” não funciona como uma estratégia artística, mas sim como uma indução tática, que permitirá ao artista ser “surpreendido, acidentalmente ou de forma inesperada, pela esfera desconhecida e ignorada da realidade que intervem na arte.”9. Na produção de Kantor de O Polvo (1956) de Stanislaw Ignacy Witkiewicz (Wtkacy’s), ambiente, objeto e atores fo ram engajados num processo complexo de constituição de formações espaciais diversas criando choques, escândalos e tensões com o objetivo de desbloquear a imaginação e esmagar a casca empregnável do drama. Isto quer dizer, ambientes, objetos e atores, e mais seus atributos, não ilustra- vam, interpretavam ou teciam comentários sobre o drama, mais que isso, eles criaram um sistema de relações para depreciar o valor da realidade por explorar seu aspecto cotidiano desconhecido, escondido. Esta exploração foi diferente em momentos distintos nos anos 60. No “Teatro Informal”(1961), Kantor explorou a matéria [um aspecto desconhecido da REALIDADE ou do seu estado elementar], que não precisa obedecer as leis da realidade, está sempre mudando e fluindo; escapa da escravidão das definições racionais, faz todas as tentativas para comprimi-lo em uma forma sólida ridícula, desnecessária e vã; é destruidora perene de todas as formas, e nada mais que uma manifestação, é acessível apenas pelas forças de destruição, por vontade e risco da COINCIDÊNCIA, e por uma ação rápida e violenta 10. No “Teatro Zero” (1963) Kantor lidou com objetos marginalizados e emoções para desmembrar o desenvolvimento da trama lógica, construindo cenas por referência textual para revelar a individualidade de um ator descartando a ilusão: A técnica tradicional de desenvolver trama fez uso da vida humana como um trampolim para se impulsionar em direção ao reino das paixões crescentes e intensas do heroísmo, do conflito e das reações violentas. Quando surgiu pela primeira vez, essa idéia de “crescer” significou a expansão trágica do homem, ou uma batalha heróica para transcender as dimensões humanas e seus destinos. Com o passar do tempo, se transformou em um mero show, exigindo potentes elementos de espetáculo e a aceitação da ilusão violenta e irresponsável – figuras convincentes e uma procriação impensada de formas 11. No “Teatro do Happening” (1967), Kantor deu atenção à verdade cotidiana e sua potencialidade para ser objeto não-conceitual médio ou “objeto-encontrado”, objeto “que fora encontrado: um objeto cuja estrutura [era] densa e sua identidade [era] delineada por sua própria ficção, ilusão, e dimensão físico-psicológica”12. Fazendo uso de objetos pobres, matéria, objetos marginalizados, objetos deteriorados, que são colocados dentro de uma estrutura aberta de realidade fluida, dinâmica, Kantor modificou um modelo de cultura ou atividade artística baseado na restrição, negação, transformação da imagem/objeto. Os experimentos teatrais de Kantor, que, no período de 1965 até 1969, tomaram forma de Happenings, mais adiante desenvolveram estes conceitos13. O manifesto “O Teatro da Morte”(1975) significou uma mudança nas pesquisas de Kantor. As produções, que seguiram, exploraram as noções de memória, história, mito, criação artística, e a função do artista como cronista do século XX: A Classe Morta (1975: a exploração de memórias acontecia num espaço ante uma barreira intransponível); Wielopole, Wielopole (1980: introdução da idéia de espaço da memória); Que Morram os Artistas (1985: introdução à teoria de negativos que modificaram a noção de espaço da memória–agora, era denominado depósito de memória, ou seja, um lugar onde lembranças são sobrepostas umas às outras); Aqui Não Volto Mais (1988: introdução da idéia de pousada da memória, que existia além dos confins do tempo e espaço, onde Kantor encontrou suas próprias criações passadas); e Hoje é Meu Aniversário (1990: exploração do ultrapassar o limiar entre o mundo da Ilusão e o mundo da Desenho de Kantor para “A gaiola e a mulher”; “Sofia na gaiola”, foto acima. 15 tadeusz kantor Desenho e foto da “Máquina Fotográfica-metralhadora”, do espetáculo Wielopole-Wielopole, 1980 Realidade, que provocou a desintegração da própria ilusão)14. As experiências teatrais de Kantor e sua versão oficial e não-oficial da história do século XX são testemunhas de sua crença de que o teatro é uma resposta para a realidade, ao invés de representação da realidade. Mais importante, como ele observou, Teatro “é uma atividade que acontece se a vida é levada ás últimas conseqüências, onde todas as categorias e concepções perdem seus significados e direitos de existir; onde loucura, febre, histeria e alucinações são o último estágio da vida diante da chegada da TRUPE DA MORTE e do ESPLÊNDIDO ESPETÁCULO da morte”15. Michal Kobialka é tradutor e ensaísta, é professor do Departamento de Teatro e Dança da Universidade de Minnesota/EUA. 16 Fontes Adicionais A Journey Through Other Spaces: Essays and Manifestos: 1944-1990, editado, traduzido e com análise crítica do teatro de Tadeusz Kantor por Michal Kobialka (Berkeley, 1993) Ein Reisender, ed. Piotr Nawrocki and Peter Kamphel (Nürnberg, 1988) Hommage á Tadeusz Kantor, ed. Krzysztof Pleœ- niarowicz (Cracóvia, 1999) Kantor, l’artiste á la fin du XXé siécle, ed. Georges Banu (Paris, 1990) Dennis Bablet, Tadeusz Kantor (Paris, 1983) Wiesaw Borowski, Tadeusz Kantor, (Warszawa, 1982) Krzysztof Pleœniarowicz, The Dead Memory Machine: Tadeusz Kantor’s Theatre of Death (Londres, 2000) 7 Notas 1 2 3 4 5 6 Tadeusz Kantor, “Milano Lessons: Lesson 1,” A Journey Through Other Spaces: Essays and Manifestos, 1944-1990, translated and with the critical commentary by Michal Kobialka (Berkeley: University of California Press, 1993), 211-12. A Journey, 274. A Journey, 272. Walter Benjamin cited in Douglas Crimp, “This is not a Museum of Art,” Marcel Broodthaers (Minneapolis: Walker Art Center, 1989), 72. A Journey, 96-7. In 1963, Kantor presents the Popular Exhibition, also known as the Anti-Exhibition, at Galeria Krzysztofory in Kraków. It comprised of the objects, which were usually removed to the margins of the creative activity, glossed over by the traditional conventions, and discarded as irrelevant. “It was an inventory [of facts, theatrical objects, drawings, sketches, prescrip- 8 9 10 11 12 13 14 15 tions, letters, stamps, tram and bus tickets, etc.] without any chronology, hierarchy, and locality. I found myself in the middle of all that, without a role of my own” (Kantor, “Zero,” Ambala¿e (Warszawa: Galeria Foksal, 1976), 21). The objects, like laundry pieces, were hanging clipped to the ropes running through the vaulted space of the Gallery (A Journey, 23-5). Theodor Adorno, “Commitment,” The Essential Frankfurt School Reader, eds. Andrew Arato and Eike Gebhardt (Oxford: Basil Blackwell, 1978), 317. Jean-François Lyotard, The Postmodern Explained, trans. Don Barry, Bernadette Maher, Julian Pefanis, Virginia Spate, and Morgan Thomas (Minneapolis: University of Minnesota Press, 1993), 15. Wiesaw Borowski, Tadeusz Kantor (Warszawa: Wydawnictwa Artystyczne i Filmowe, 1982), 76. A Journey, 51. A Journey, 59. A Journey, 85. In: “Tadeusz Kantor’s Happenings: Reality, Mediality, and History,” Theatre Survey 43, 1 (May 2002): 59-79. In: A Journey, Part 2, “The Quest for the Self/ Other: A Critical Study of Tadeusz Kantor’s Theatre” for a detailed discussion of the concept of memory in Kantor’s production from the period between 1975 and 1990. A Journey, 149. Espetáculo Hoje é meu aniversário (1990) 17 tadeusz kantor MANIFESTO O MORTE ◗ 1. Craig afirma: a marionete deve retornar; o ator vivo deve desaparecer. O homem, criado pela natureza, é uma ingerência estranha na estrutura abstrata de uma obra de arte. De acordo com Gordon Craig, em algum lugar às margens do Ganges, duas mulheres invadiram o templo da Divina Marionete, que conservava com vigilância o segredo do verdadeiro TEATRO. Essas duas mulheres tinham inveja desse SER perfeito e almejavam seu PAPEL, que era iluminar o espírito dos homens pelo sentimento sagrado da existência de Deus; elas almejavam sua GLÓRIA. Apropriaramse de seus movimentos e de seus gestos, de suas vestimentas maravilhosas, e, pelo recurso de uma medíocre paródia, admiraram-se satisfazendo os gostos vulgares da plebe. Quando enfim elas fizeram construir um templo à imagem do outro, o teatro moderno – o que conhecemos muito bem e que ainda permanece – havia nascido: a ruidosa Instituição de utilidade pública. Ao mesmo tempo que ela, surgiu o ATOR. Em apoio à sua tese Craig invoca a opinião de Eleonora Duse: “Para salvar o teatro, é preciso destruí-lo; é preciso que todos os comediantes e todas as comediantes morram de peste... são eles que levantam obstáculos à arte...” derão novamente venerar a felicidade da existência e render uma divina e alegre homenagem à MORTE.” De acordo com a estética SIMBOLISTA, Craig considerava o homem submetido a paixões diversas, a emoções incontroláveis e, por conseguinte, casuais como um elemento absolutamente estranho à natureza homogênea e à estrutura de uma obra de arte, como um elemento destruidor do seu caráter fundamental: a coesão. Craig – assim como os simbolistas cujo programa, em seu tempo, teve um desenvolvimento notável – tinha atrás de si os fenômenos isolados mais extraordinários que, no século XIX, anunciavam uma época nova assim como uma arte nova: Heinrich von Kleist, Ernst Theodor Hoffmann, Edgar Allan Poe... Cem anos antes, e por razões idênticas às de Craig, Kleist tinha exigido que o ator fosse substituído por uma marionete, pensando que o organismo humano, submetido às leis da NATUREZA, constituía uma ingerência estranha na ficção artística nascida de uma construção do intelecto. As outras censuras de Kleist faziam-se sobre os limites das possibilidades físicas do homem e ele denunciava além disso o papel nefasto do controle permanente da consciência, incompatível com os conceitos de encantamento e de beleza. ◗ 2. Teoria de Craig: o homem-ator suplanta a marionete e toma seu lugar, causando assim o declínio do teatro. Há algo de imponente na atitude desse grande utopista quando ele afirma: “Exijo com toda a seriedade o retorno do conceito da supermarionete ao teatro... e desde que ela reapareça, as pessoas po- ◗ 3. Da mística romântica dos manequins e das criações artificiais do homem do século XIV ao racionalismo abstrato do século XX. Ao longo do caminho que se pensava seguro e que foi tomado ao homem do Século das luzes e do racionalismo, eis que avan- De Tadeusz Kantor Tradução de Roberto Mallet 18 TEATRO DA Paradoxalmente, é dessas tentativas românticas e diabólicas ao ponto de negar à natureza seu direito à criação que nasce e se desenvolve o movimento RACIONALISTA ou mesmo MATERIALISTA – sempre mais independente e sempre mais perigosamente distanciado da NATUREZA – a corrida para um “MUNDO SEM OBJETO”, para o CONSTRUTIVISMO, o FUNCIONALISMO, o MAQUINISMO, a ABSTRAÇÃO e, finalmente, o VISUALISMO PURISTA que reconhece simplesmente a “presença física” de uma obra de arte. Esta hipótese arriscada que tende a estabelecer a gênese pouco gloriosa do século do cientismo e da técnica engaja apenas minha própria consciência e serve unicamente à minha satisfação pessoal. Espetáculo A Classe Morta (1975) com a mulher/ homem na janela çam, saindo repentinamente das trevas, sempre mais numerosos, os SÓSIAS, os MANEQUINS, os AUTÔMATOS, os HOMÚNCULOS – criações artificiais que são várias injúrias às criações próprias da NATUREZA e que carregam em si todo o menosprezo, todos os sonhos da humanidade, a morte, o horror e o terror. Assiste-se ao aparecimento da fé nas forças misteriosas do MOVIMENTO MECÂNICO, ao nascimento de uma paixão maníaca de inventar um MECANISMO que sobrepujasse em perfeição, em implacabilidade, o tão vulnerável organismo humano. A tudo isto em um clima de satanismo, no limite do charlatanismo, das práticas ilegais, da magia, do crime, do pesadelo. É a CIÊNCIA-FICÇÃO da época, na qual um cérebro humano demoníaco criava o HOMEM ARTIFICIAL. Isto significava simultaneamente uma crise de confiança súbita em relação à NATUREZA e a esses domínios da atividade dos homens que lhe estão intimamente associados. ◗ 4. O dadaísmo, introduzindo a “realidade já pronta” (os elementos da vida), destruiu os conceitos de homogeneidade e de coerência da uma obra de arte postulados pelo simbolismo, a Arte nova e por Craig Mas retornemos à marionete de Craig. Sua idéia de substituir um ator vivo por um manequim, por uma criação artificial e mecânica, em nome da conservação perfeita da homogeneidade e da coerência da obra de arte, não tem mais sentido hoje. Experiências ulteriores que destruíram a homogeneidade da estrutura de uma obra de arte introduziram nela elementos ESTRANHOS, através de colagens e de montagens; a aceitação da realidade “já pronta”; o pleno reconhecimento do acaso; a localização da obra de arte na estreita fronteira entre REALIDADE DA VIDA e FICÇÃO ARTÍSTICA – tudo isto tornou negligenciáveis os escrúpulos do início de nosso século, do período do simbolismo e do “Art nouveau”. A alternativa “arte autônoma de estrutura cerebral ou perigo de naturalismo” deixou de ser a única possibilidade. 19 tadeusz kantor Espetáculo WielopoleWielopole (1980) com a maquina fotográfica/ metralhadora Se o teatro, em seus momentos de fraqueza, sucumbiu ao organismo humano vivo e a suas leis, é porque aceitou, automática e logicamente, esta forma de imitação da vida que constituem sua representação e sua re-criação. Ao contrário, nos momentos em que o teatro era suficientemente forte e independente para permitir-se libertar-se dos constrangimentos da vida e do homem, produzia os equivalentes artificiais da vida que, sujeitando-se à abstração do espaço e do tempo, eram ainda mais vivos e mais aptos a atingir a absoluta coesão. Em nossos dias essa alternativa na escolha perdeu tanto seu significado quanto seu caráter exclusivo. Pois criou-se uma nova situação no domínio da arte e existem novos quadros de expressão. O surgimento do conceito de REALIDADE “JÁ PRONTA” retirada do contexto da existência tornou possíveis sua ANEXAÇÃO, sua INTEGRAÇÃO na obra de arte através da DECISÃO, do GESTO e do RITUAL. E isto é presentemente muito mais fascinante e mais poderosamente inserido no real que qualquer entidade abstrata ou artificialmente elaborada, ou que esse mundo surrealista do “MARAVILHOSO” de André Breton. Happenings, “eventos” e “instalações” reabilitaram impetuosamente regiões inteiras da 20 REALIDADE até então desprezadas, desembaraçando-as do peso de suas destinações terra a terra. Esse DESLOCAMENTO da realidade pragmática – essa “suspensão” para fora das fronteiras da prática cotidiana – puseram em movimento a imaginação dos homens muito mais profundamente que a realidade surrealista do sonho onírico. Foi isto que finalmente fez desaparecer toda importância aos temores de ver o homem e sua vida interferir no plano da arte. ◗ 5. Da “ realidade imediata” do happening à desmaterialização dos elementos da obra de arte. Portanto, como toda fascinação, também esta tornou-se, depois de certo tempo, CONVENÇÃO pura – universalmente, tolamente, vulgarmente utilizada. Essas manipulações quase rituais da realidade, ligadas à contestação do ESTADO ARTÍSTICO e do LIGAR reservado à arte, começaram, pouco a pouco, a tomar um sentido e um significado diferentes. A PRESENÇA material, física do objeto e o TEMPO PRESENTE no qual podem figurar unicamente a atividade e a ação aparentemente atingiram seus limites e tornaram-se um entrave. ULTRAPASSÁ-las significava privar essas relações de sua IMPORTÂNCIA material e funcional, ou seja, de sua possível APREENSÃO. (Dado que se trata aqui de um período muito recente, ainda não terminado, fluido, as considerações seguintes referem-se e ligam-se a minhas próprias atividades criativas.) O objeto (A Cadeira, Oslo, 1970) tornavase vazio, desprovido de expressão, de encadeamentos, de pontos de referência, de sinais de uma intercomunicação voluntária, de sua mensagem; ele estava orientado para nenhum lugar e tornava-se um engodo. Situações e ações permaneciam encerradas em seu próprio CIRCUITO, ENIGMÁTICAS (O Teatro impossível, 1973). Em minha manifestação intitulada Cambriolage (Furto) deu-se uma INVASÃO ilegítima sobre o terreno em que a realidade tangível encontrava seus prolongamentos INVISÍVEIS. Cada vez mais distintamente se precisa o papel do PENSAMENTO, da MEMÓRIA e do TEMPO. ◗ 6. Recusa da ortodoxia do conceptualismo e da “vanguarda oficial das massas”. Impõe-se a mim cada vez com mais força a convicção de que o conceito de VIDA não pode ser reintroduzido em arte senão pela AUSÊNCIA DE VIDA no sentido convencional (ainda Craig e os simbolistas). Esse processo de DESMATERIALIZAÇÃO instalou-se em minha atividade criativa, evitando-se entretanto toda a panóplia ortodoxa da lingüística e do conceptualismo. É certo que essa escolha foi em parte influenciada pelo gigantesco engarrafamento que emporcalhou esse caminho agora oficial e que constitui, infelizmente, o último trecho da grande estrada DADAÍSTA coberta de cartazes com seus slogans ARTE TOTAL, TUDO É ARTE, TODO MUNDO É ARTISTA, A ARTE ESTÁ NA VOSSA CABEÇA etc. Eu não gosto dos engarrafamentos. Em 1973 escrevi o esboço de um novo manifesto, que leva em conta essa falsa situação. Eis o seu começo: “Depois de Verdun, do Cabaret Voltaire e da Privada de Marcel Duchamp, quando o “fato artístico” foi encoberto pelo estrondo da Gorda Bertha, a DECISÃO tornou-se a única oportunidade que resta ao homem de ousar qualquer coisa recentemente ou ainda hoje inconcebível. Ela tem sido há muito tempo o estimulante primeiro da criação, uma condição e uma definição da arte. Nestes últimos tempos milhares de indivíduos medíocres tomam, sem escrúpulos nem reticências de nenhuma espécie, decisões. A decisão tornou-se um fato banal e convencional. O que era um caminho perigoso tornou-se agora uma auto-estrada cômoda – segurança e sinalização hipermelhoradas. Guias, manuais, placas de sinalização, cartazes, centros, corporações artísticas – eis o que garante a perfeita criação artística. Somos testemunhas de um LEVANTE EM MASSA de comandos de artistas, de combatentes de rua, de artistas de choque, de artistas operários, de escrevinhadores, de caixeiros viajantes, de saltimbancos, de chefes de escritórios e de agências. Nesta auto-estrada já oficial, o tráfico, que ameaça afogar-nos sob uma onda de garatujas insignificantes e de pretensos coups de théâtre, vai crescendo a cada dia. É preciso abandoná-la o quanto antes. Mas isto não é tão fácil! Ainda mais que está no seu apogeu – cega e avalizada pelo altíssimo prestígio do INTELECTO, recobrindo tanto os sábios quanto os tolos – a ONIPRESENTE VANGUARDA...” ◗ 7. Sobre os caminhos secundários da vanguarda oficial. Os MANEQUINS fazem sua aparição. Minha recusa obstinada em não aceitar as soluções do conceptualismo, embora elas me parecessem a única saída para o caminho encetado, conduziu-me a colocar, tentando circunscrevê-los, os acontecimentos relatados acima e que marcaram a última fase de minha atividade criativa sobre caminhos secundários suscetíveis de me oferecer maiores oportunidades de desembocar no DESCONHECIDO! Uma tal situação, mais que qualquer outra, deu-me confiança. Todo período novo, sempre, começa por tentativas sem grande significação, pouco notáveis, como que em surdina, não tendo grande coisas em comum com o caminho já traçado; tentativas privadas, 21 tadeusz kantor íntimas, eu diria mesmo pouco confessáveis. Obscuras em todo caso. E difíceis! Tais são os momentos mais fascinantes e mais carregados de sentido da criação artística. E subitamente me senti interessado pela natureza dos MANEQUINS. O manequim em minha encenação de La Poule d’eau, de Witkacy (1967) e os manequins em Les Cordonniers (Os Sapateiros), de Witkacy (1970) tinham um papel bem específico; constituíam uma espécie de prolongamento imaterial, alguma coisa como um ÓRGÃO COMPLEMENTAR do ator que era seu “proprietário”. Quanto aos que utilizei em grande número na encenação da Balladyna, de Slowacki, eles constituíam os DUPLOS das personagens vivas, como se fossem Espetáculo Hoje é meu aniversário (1990) dotados de uma CONSCIÊNCIA superior, atingida “depois da con- tiram, mas como que mantidos à distância sumação de sua própria vida”. Esses mane- à margem da cultura aceita, nas bancas dos quins já estavam visivelmente marcados mercados, nas barracas duvidosas dos ancom o selo da MORTE. darilhos, longe dos esplêndidos templos da arte, vistos como curiosidades desprezíveis, ◗ 8. O manequim como manifestação da boas apenas para abastecer o gosto da ralé. “realidade” mais trivial. Como um proce- Mas por esta razão são eles – muito mais dimento de transcendência, um objeto va- que as acadêmicas peças de museu – que zio, um engodo, uma mensagem de morte, podem, no tempo de um breve olhar, leum modelo para o ator. vantar uma ponta do véu. O manequim que utilizei em 1967 no teaOs manequins têm também um odor de tro Cricot 2 (La Poule d’eau) foi, depois d’O pecado – de transgressão delituosa. A exisPeregrino Eterno e das Embalagens Huma- tência dessas criaturas configuradas à imanas, o próximo dos meus personagens a en- gem do homem de uma forma quase sacríletrar de maneira absolutamente natural em mi- ga e quase clandestina, fruto de procedimennha Coleção como outro fenômeno a apoiar tos heréticos, traz a marca desse lado obscuesta convicção ancorada em mim há muito ro, noturno, sedicioso da trajetória humatempo de que somente a realidade mais trivi- na, o cunho do crime e dos estigmas da moral, os objetos mais modestos e os mais despre- te enquanto fonte de conhecimento. A imzados são capazes de revelar em uma obra de pressão confusa, inexplicada, de que é pelo arte seu caráter específico de objeto. artifício de uma criatura com falaciosos asManequins e figuras de cera sempre exis- pectos da vida, mas privada de consciência 22 creção material do mundo, nessa trapaça das aparências, que representam o mais baixo nível da existência. Não acho que um MANEQUIM (ou uma FIGURA DE CERA) possa substituir, como queriam Kleist e Craig, o ATOR VIVO. Isto seria fácil e excessivamente ingênuo. Esforço-me por determinar os motivos e a destinação dessa entidade insólita surgida inopinadamente em meus pensamentos e em minhas idéias. Sua aparição concorda com esta convicção cada vez mais forte em mim de que a vida não pode ser exprimida em arte senão pela falta de vida e pelo recurso à morte, através das aparências, da vacuidade, da ausência de qualquer mensagem. Em meu teatro um manequim deve tornar-se um MODELO que encarna e transmite um profundo sentimento da morte e da condição dos mortos – um modelo para o ATOR VIVO. e de destino, que a morte e o nada transmitem sua inquietante mensagem – é isto que causa em nós esse sentimento de transgressão, ao mesmo tempo recusa e atração. Inclusão no index e fascinação. O ato de acusação esgotou todos os argumentos. O primeiro a prestar as costas aos ataques foi o próprio mecanismo dessa ação, considerada levianamente como um fim em si mesma e depois relegada entre as formas medíocres da criação artística, no mesmo saco que a imitação, a ilusão enganosa destinada a abusar do espectador como os truques do manipulador de feira, a utilização de ingênuos artifícios que escapam aos conceitos da estética, o uso fraudulento das aparências, as práticas de charlatão. E ainda por cima acrescentaram-se ao processo as acusações de uma filosofia que, desde Platão e com freqüência ainda hoje em dia, designa como finalidade da arte revelar o Ser e sua espiritualidade ao invés de patinhar na con- ◗ 9. Minha interpretação da situação descrita por Craig. A aparição do ator vivo, momento revolucionário. A descoberta da imagem do homem. Busco minhas considerações nas origens do teatro; mas elas aplicam-se de fato ao conjunto da arte atual. Pode-se muito bem pensar que a descrição, imaginada por Craig, das circunstâncias nas quais surgiu o ator, e que traz em si mesma uma análise terrivelmente acusadora, deveria servir a seu autor de ponto de partida para suas idéias concernentes à “SUPER-MARIONETE”. Embora eu seja um admirador do soberbo desprezo professado por Craig e de suas diatribes apaixonadas – sobretudo quando estamos confrontados com o total declínio do teatro contemporâneo – devo entretanto, ao mesmo tempo que faço minha a primeira parte de seu credo, na qual ele nega ao teatro institucional qualquer razão de existir no plano da arte, tomar outra posição frente às bem conhecidas soluções a que chegou a respeito do ator. Pois o momento em que um ATOR surgiu pela primeira vez perante uma PLATÉIA (para empregar o vocabulário atual) parece-me ser, bem ao contrário, um momento revolucionário e de vanguarda. Vou mesmo tentar compor e fazer “entrar na his23 tadeusz kantor tória” uma imagem oposta, na qual os acontecimentos terão uma significação inversa. Eis que do círculo comum dos costumes e dos ritos religiosos, das cerimônias e das atividades lúdicas sai ALGUÉM, tendo tomado a decisão temerária de destacar-se da comunidade cultural. Não era movido nem pelo orgulho (como em Craig) nem pelo desejo de atrair sobre si a atenção de todos. Solução excessivamente simples. Eu o vejo antes como um rebelde, um objetor, um herético, livre e trágico, por ter ousado permanecer só com sua sorte e seu destino. E se acrescentamos “com seu PAPEL”, teremos diante de nós o ATOR. A revolta aconteceu sobre o terreno da arte. Este acontecimento, ou antes esta manifestação, provavelmente provocou uma grande perturbação nos espíritos e suscitou opiniões contraditórias. Com toda certeza este ATO foi julgado como uma traição às antigas tradições e às práticas do culto; viu-se nele uma manifestação de orgulho profano, de ateísmo, de perigosas tendências subversivas; aos gritos falou-se em escândalo, em amoralidade, em indecência; olhou-se o homem com desprezo como a um bufão grosseiro, um cabotino, um exibicionista, um depravado. O próprio ator, relegado para fora da sociedade, terá feito tanto inimigos cruéis quanto fanáticos admiradores. Opróbrio e glória conjugados. Seria um formalismo ridículo e superficial querer explicar esse ato de RUPTURA através do egoísmo, do apetite de glória ou de uma queda inata para o exibicionismo. Deve ter sido uma questão mais considerável, uma COMUNICAÇÃO de importância capital. Tentemos imaginar esta situação fascinante: FACE àqueles que tinham permanecido deste lado, um HOMEM postou-se EXATAMENTE semelhante a cada um deles e entretanto (em virtude de alguma “operação” misteriosa e admirável) infinitamente DISTANTE, terrivelmente ESTRANGEIRO, como que habitado pela morte, separado deles por uma BARREIRA que por ser invisível não deixava de ser apavorante e inconcebível, assim como o sentido verdadeiro e a HONRA não podem nos ser revelados senão pelo SONHO. E é assim que sob a luz deslumbrante de um clarão eles percebem subitamente a IMAGEM DO HOMEM, aguda, tragicamente clownesca, como se o vissem pela PRIMEIRA VEZ, como se acabassem de ver a SI MESMOS. Este foi seguramente um conhecimento que se poderia qualificar de metafísico. Essa imagem viva do HOMEM saindo das trevas, levando sua trajetória adiante, constituía um MANIFESTO, irradiante, de sua nova CONDIÇÃO HUMANA, somente HUMANA, com sua RESPONSABILIDADE e sua CONSCIÊNCIA trágica, avaliando seu DESTINO com uma escala implacável e definitiva, a escala da MORTE. Foi dos espaços da MORTE que veio esse MANIFESTO revelador que provocou no público (utilizemos um termo atual) esse conhecimento metafísico. Os instrumentos e a arte desse homem, o ATOR (para empregar ainda nosso próprio vocabulário), ligavam-se também à MORTE, a sua trágica e horrífica beleza. Devemos dar à relação ESPECTADOR/ ATOR sua significação essencial. Devemos fazer renascer esse impacto original do instante em que um homem (ator) surgiu pela primeira vez perante outros homens (espectadores), exatamente semelhante a cada um de nós e entretanto infinitamente estrangeiro, além dessa barreira que não pode ser ultrapassada. SERVIÇO Tadeusz Kantor No Teatro Fábrica. Projeção dos cinco espetáculos do Teatro da Morte, seguidos de conferências de Michal Kobialka. Curadoria: Márcia de Barros de 27 de junho a 1º de julho de 2005, às 19h30 Rua da Consolação, 1623 • www.fabricasaopaulo.com.br 24 Embora se possa levantar suspeitas, e mesmo acusar-nos de nutrir escrúpulos fora de propósito expulsaremos nossos preconceitos e nossos medos inatos e, a fim de melhor definir a imagem no interesse de eventuais conclusões assentaremos as balizas dessa fronteira que tem um nome: A CONDIÇÃO DA MORTE porque ele constitui o ponto de referência mais avançado que jamais foi ameaçado por nenhum conformismo da CONDIÇÃO DO ARTISTA E DA ARTE ...essa relação particular desorientadora e sedutora a um só tempo entre os vivos e os mortos que, há pouco, quando eles ainda estavam vivos não dava nenhum lugar a inesperados espetáculos a inúteis divisões, à desordem Eles não eram diferentes e não tomavam grandes ares e em razão desta característica aparentemente banal mas, como veremos, muito importante eles eram simplesmente, normalmente, respeitosamente não perceptíveis E eis que agora, subitamente do outro lado, perante nós eles despertam a surpresa como se nós os víssemos pela primeira vez expostos em exibição, em uma cerimônia ambígua: honrados e rejeitados a um só tempo irremediavelmente outros e infinitamente estrangeiros, e ainda: desprovidos, de alguma forma, de toda significação não sendo mais levados em conta sem a menor esperança de ocupar um lugar inteiramente à parte das texturas de nossa vida que não são acessíveis, familiares, inteligíveis senão para nós mesmos mas para eles desprovidas de sentido Se estamos de acordo em que o traço dominante dos homens vivos é sua aptidão e sua facilidade de estabelecer entre si múltiplas relações vitais é somente perante os mortos que surge em nós a tomada de consciência súbita e surpreendente que essa característica essencial dos vivos torna-se possível por sua falta total de diferenças por sua banalidade, por sua identificação universal que destrói impiedosamente toda ilusão diferente ou contrária por sua qualidade comum, aprovada sempre em vigor de permanecer indiscerníveis Somente os mortos se tornam perceptíveis (para os vivos) obtendo assim, por este alto preço seu estatuto próprio sua singularidade sua SILHUETA radiosa quase como no circo. Kantor, 1975 In “Le Théâtre de la Mort”. Editions L’Age d’Homme, Lausanne, 1977, p. 215-224. Desenho de Kantor para o Leito-máquina da morte ◗ 10. Recapitulação 25 Em entrevista à revista Camarim, Danilo Santos de Miranda afirma que o SESC privilegia debate, discussão e difusão de cultura Divulgação entrevista SESC aposta no valor da cultura ◗ DANILO SANTOS DE MIRANDA tem formação em filosofia, ciências sociais e administração. Desde 1984 é diretor do SESC de São Paulo, período em que ampliou a atuação cultural da entidade, afirmando ali projetos como o CPT Centro de Pesquisa Teatral. Durante sua gestão foram incentivadas pesquisas de novas linguagens nas artes cênicas, artes plásticas, em música, dança e vídeo arte. Nesse período, também foram trazidos ao SESC grupos artísticos, intelectuais, diretores, músicos, coreógrafos e vídeomakers, fazendo da instituição um dos mais importantes centros difusores de cultura para a população de São Paulo. Miranda concedeu à Revista Camarim uma entrevista, na qual fala sobre a importância da cultura e de como o SESC trata essa questão. 26 Revista Camarim: Na origem do “servi- buem ao tempo livre um caráter funcionaço social” há uma discussão sobre a relação lista, ferramental. A utilização criativa do trabalho e tempo livre. Nesse campo, lazer e tempo livre, quando as pessoas estão desocultura ganham mesmo estatuto, e talvez o brigadas de suas tarefas rotineiras e obrigaSESC seja expressão disso. O senhor poderia tórias, tende a aprimorá-las em múltiplas dinos falar um pouco sobre o modo como essas mensões: na capacidade de interação, na elequestões determinam o funcionamento do vação da auto-estima, no desenvolvimento SESC e seus projetos? da criatividade e do pensamento, na melhoDanilo Santos Miranda: A cultura pode ria da qualidade de vida com a prática de transformar as pessoas, tornando-as melho- atividades físicas e esportivas. Isso as torna res, mais solidárias, mais participativas, mais melhores como pessoas e, melhores, serão críticas. Capazes de sonhar e de romper li- mais críticas e, mais criativas, mais particimites. A cultura subverte o cotidiano e nos pativas. Disso se beneficiam, de forma direlança - prazerosa e espontaneamente –, ao ta, como conseqüência natural, as relações conflito. O tempo livre é potencialmente na família, na comunidade e no trabalho. Isso rico para isso, pois estamos desimpedidos ocorre, portanto, de forma natural, e nunca de qualquer obrigação, seja junto à escola a partir de um projeto que instrumentaliza o ou ao trabalho. É o momenuso do tempo livre para obUtilizar as formas de to da experimentação e da ter este ou aquele resultado descoberta. Entretanto, não expressão cultural como mais imediato. Uma outra devemos “instrumentalizar” questão na relação entre traferramenta a serviço o tempo livre, ou tratar as balho e tempo livre, é que deste ou aquele projeto ações culturais didaticanem sempre as pessoas estão mente. Utilizar as formas de de transformação social é preparadas para usufruir o expressão cultural como feragir contra a natureza da momento de lazer. O filósoramenta a serviço deste ou fo alemão Dietmar Kamper aquele projeto de transfor- própria cultura, que em si certa vez comentou sobre o mação social é agir contra a “ritmo desmedido do trabaencerra multiplicidade, natureza da própria cultulho”, ou seja, as pessoas, originalidade e ra, que em si encerra multimesmo fora de sua rotina diversidade plicidade, originalidade e profissional, não conseguem diversidade. A grande quespensar diferente, agir difetão é proporcionar fluidez à cultura, enfren- rente, sentir diferente. Agem em situações tando a panacéia e a mesmice do que ten- de lazer tal qual nas situações de trabalho: de a reduzir a realidade a poucos referenci- criam regras, medidas e padrões, competem ais, a parcas perspectivas. e denigrem a dimensão prazerosa e descompromissada dos relacionamentos e das ativiRC: Há certa crítica que vê no trabalho do dades de seu lazer. SESC uma faceta da vida totalmente administrada do trabalhador, em que seu tempo livre RC: Tais questões implicariam o reconheciseria totalmente regrado pela ideologia do “bem mento de um certo “caráter público” no trabaestar” para o trabalho. Como o senhor a vê? lho do SESC? Em que medida isso se daria? DSM: As relações entre o trabalho e o DSM: Não há qualquer aproximação de lazer são discutidas largamente em teóricos caráter público, quando nos referimos à forcomo o francês Joffre Dumazedier ou o itali- ma de custeio e administração do SESC, ano Domenico de Masi. Ambos destacam a que é uma instituição de caráter privado, importância do tempo livre para o desen- ainda que sem fins lucrativos. O SESC atenvolvimento das pessoas. Mas não falam em de a um público prioritário, que é o trabadesenvolvimento profissional como o prin- lhador na área de comércio e serviços e seus cipal benefício, porque essas teorias não atri- familiares. Esse público prioritário usufrui “ ” 27 entrevista uma série de atividades com exclusividade ou vantagens especiais. Assim, do ponto de vista de administração e custeio, o SESC não possui caráter público. Entretanto, podemos afirmar o caráter público do SESC na medida em que muitas de suas ações se estendem a toda a comunidade, seja no atendimento direto, seja por programas que aqui são criados e depois reproduzidos por outras empresas, instituições e organizações. Cursos, seminários e congressos promovidos pelo SESC difundem conhecimentos e técnicas pertinentes à nossa área de atuação. Essa é uma forma de promover intercâmbio permanente com a sociedade. O SESC não segrega públicos. Na área de expressão artística, os espetáculos são acessíveis a toda a população e, além disso, são inúmeros os projetos desenvolvidos para toda a comunidade. RC: A escolha por manter, no caso do teatro, um “Centro de Pesquisa” faz irradiar, como o senhor mesmo já chegou a afirmar em textos de programas (como o que abre o programa do The Wooster Group), questões “por toda atividade desenvolvida pelo SESC com o teatro”. É evidente o trabalho do SESC nessa direção. A idéia de manutenção de trabalhos de pesquisa de cunho permanente ganha novos fóruns em São Paulo com a Lei de Fomento. Cia. Théâtre du Radeau (França), em Coda (2005) 28 No caso do SESC, como funciona esse trabalho de manutenção (quanto ao CPT)? Como se determinam os critérios de sua manutenção? Existe uma verba destinada ao trabalho e à manutenção dos artistas? Existe um modelo seguido ou elaborado? Existem outros “Centros de Pesquisa” no país? DSM: No final da década de 1970, o Teatro SESC Anchieta exibiu os espetáculos Macunaíma e Nelson Rodrigues – O Eterno Retorno, dirigidos por Antunes Filho, que desenvolvia um método de trabalho inovador. Essa é a gênese do Centro de Pesquisa Teatral do SESC que foi criado em 1982, com o objetivo de aprimorar a pesquisa sobre a arte dramática com vistas à realidade brasileira. O método implementado por Antunes tem um fundamento teórico que alia física quântica, psicologia, correntes filosóficas orientais e obras primas do cinema, das artes plásticas e da literatura. Seu método se aplica especialmente ao estudo e desenvolvimento dos recursos da voz. Antunes costuma dizer que ele não forma atores, forma cidadãos. E isso coaduna perfeitamente com tudo o que o SESC faz. O CPT, quanto à manutenção, está integrado entre os vários programas desenvolvidos pelo SESC. O Antunes é um funcionário do SESC. É o primeiro a chegar diariamente e, antes disso, aproveita para praticar atividades físicas nas salas de ginástica do SESC Consolação. Quanto a outros centros de pesquisa, é importante ressaltar que alguns grupos de teatro mantém seus núcleos de estudo. RC: Como então se situa o SESC em relação ao teatro na Cidade? DSM: São Paulo conta com excelentes teatros, que adotam padrões de programação semelhantes ou diversos ao padrão que o SESC tem. Mas existe uma diferença fundamental. É preciso considerar que o SESC é um centro difusor de cultura e, assim, é também um centro de debates, de aquisição e difusão de conhecimentos, de exaltação ao saber. Para o SESC, é importante sublinhar tendências, valorizar a experimentação e romper paradigmas. Por isso, nomes como Grotowski, Peter Brook, Isabelle Huppert, Suzuki, Therzopoulos, F. Tanguy, Michel Dydim, Andreas Kriegenbuer estiveram presentes nos palcos do SESC. La Fura Del Baus, da Espanha; Thêatre de Buffes du Nord, da França e Thalia Theater, da Alemanha, também vieram ao Brasil. Entre os brasileiros, praticamente todos os diretores identificados a novas propostas e pesquisas passaram pelo SESC. RC: Trata-se de um esforço de difusão? DSM: A democratização do acesso aos bens culturais é um dos objetivos do SESC. Não tratamos a cultura como algo acessório ou mera opção de entretenimento em oposição aos infortúnios do cotidiano. O projeto que implementamos no SESC considera a capacidade transformadora da cultura, ou seja, a capacidade de desenvolver o pensamento crítico, emancipar a criatividade, promover a solidariedade e o desejo de participação social. O SESC São Paulo possui uma rede de nove teatros na capital, com cerca de 4 mil lugares, e de oito no Interior e Litoral, com cerca de 2100 lugares. Além disso, algumas apresentações são feitas em espaços alternativos. Esse número é expressivo e, certamente, o maior número de salas vinculadas a uma única instituição, mas o que importa realmente, além da quantidade, é saber que sua programação é harmônica e está orientada por um projeto de ação cultural. RC: Está implicado aí um projeto de “formação de público”? DSM: O SESC forma públicos ao promover o que poderíamos chamar de alfabetização cultural, sem adotar cartilhas, armar tutelas ou erguer protecionismos. Como centro cultural, o SESC não promove apenas o encontro de diferentes formas de expressão, contemplando a diversidade e a multiplicidade próprias ao universo cultural. O SESC também reúne públicos diversos, de variadas faixas etárias e de diferentes níveis socioeconômicos. Somente neste mês de junho, o SESC exibe mais de 40 espetáculos para adultos e crianças. O Wooster Group (EUA), em Frank Dell’s The Temptation of St. Antony (1995) Centro de Pesquisa Teatral do SESC, criado em 1982, dirigido por Antunes Filho, figura hoje na história do teatro brasileiro pelas idéias que ali fortificam e pelos atores que ali se formam. Além do CPT, são freqüentes os seminários, as palestras, os cursos e os workshops, além da publicação de livros e relatos. Em São José do Rio Preto, no interior paulista, a Prefeitura desenvolve um festival de teatro que, há cerca de cinco anos passou a contar com a parceria do SESC. O festival tornou-se assim internacional e, além da exibir espetáculos, tornou-se um importante evento de intercâmbio e aprimoramento. RC: O que é levado em conta na seleção dos trabalhos veiculados pelo SESC? DSM: O cotidiano tende à rotina, o pensamento à normatização. O medo diante do desconhecido nos leva ao conformismo, o 29 entrevista olhar simplório e vago contempla apenas o que é óbvio e imediato. A arte, se refletir isso, for conivente ou cúmplice dessa realidade, o deixa de ser. A cultura cumpre o papel de transgressão e rompimento com essa realidade deformada e deformante. Mas faz isso com um compromisso ético: o da elevação dos sentimentos, do enaltecimento dos valores que edificam as pessoas e aprimoram as relações entre elas. A transgressão sem esse componente ético nos leva ao bizarro e ao sensacionalismo – coisas que têm circulado intensamente, em especial, na cultura de massas. RC: E o público? DSM: A primeira constatação é que o público confia na programação dos teatros do SESC, identificando-a como uma programação de referência. O SESC, de uma forma geral, tem uma imagem muito positiva junto à opinião pública. É tido como o espaço da excelência, do respeito e valorização das pessoas. Depois disso, vem a crítica especializada. A maioria dos espetáculos é sempre indicada, bem referenciada e premiada, seja pela qualidade das montagens, pela importância dos textos apresentados ou pelas propostas que são desenvolvidas. RC: Então, o que faz a especificidade do SESC? DSM: O SESC não é uma casa de espetáculos. É um centro de estudos, pesquisas e discussão, mas essa não é a diferença essencial, pois outros centros culturais de São Paulo também atuam com essas características agregadas. As diferenças essenciais se explicam a partir da própria gênese do SESC. Esta é uma instituição de capital privado, mantida pelo empresariado do co 30 Ban’Yu Inryoku (Japão), em Suna Zôo do Deserto (1995) mércio e serviços e que não se relaciona, em hipótese alguma, a ações de marketing cultural ou promoção institucional. Trata-se de um projeto de desenvolvimento social e cultural que, para sua realização, se vale de diversas linguagens e formas de expressão, como o turismo, a expressão física e esportiva, a expressão artística, a relação com o meio ambiente e outras. Além da diversidade de áreas, os centros culturais e desportivos do SESC se caracterizam também pela diversidade de públicos, seja quanto à faixa etária, seja quanto ao nível sócio -econômico. Essa diversidade e comple xidade influenciam a forma como nos relacionamos com teatro. O público no SESC, por exemplo, pode apreciar uma boa apresentação e, se quiser, desenvolver habilidades próprias em oficinas ou cursos, que se destinam tanto aos mais leigos quanto àqueles que formam tendências e Attis Theatre (Grécia), em Persas (1994) criam propostas. Momento de apuração dos votos após improvisação. público torna-se cúmplice não só do êxito (da improvisação), mas do fracasso”, diz. ◗ COMO O PRÓPRIO NOME já denuncia, há O espetáculo consiste em um jogo no qual cerca de quatro anos a Companhia do dois times de três palhaços cada, mediados Quintal escolheu essa área aberta como por um juiz, jogam uma bola que contém um palco. O grupo tem, atualmente, 11 inte- tema escolhido pelo público, sobre o qual grantes. Todos já trabalhavam com o uni- improvisam. Assim, a interação do público é verso dos palhaços antes de chegar à Com- grande: vai desde a escolha do tema até a torpanhia – são artistas que vieram de grupos cida por um dos times, passando pela votacomo Sarau do Charles e Doutores da Ale- ção sobre qual dos times se saiu melhor nagria, por exemplo. quela improvisação. “Cada Eles se uniram na Compaapresentação é um espetácunhia do Quintal para pesquilo novo; o jogo muda”, diz sar a linguagem de palhaços Ballas, referindo-se à grande e improvisação. O espetácuquantidade de variantes que lo que resultou dessa pesquipermeiam a atividade. sa, Jogando no Quintal – Jogo A concepção do espetácude Improvisação de Palhaços, lo é de Marcio Ballas e César surgiu há cerca de três anos, Gouvêa, mas a direção é cosempre apresentado em qui- Os “atletas” do espetáculo Jogando letiva, “resultado de uma tais que foram crescendo no Quintal pesquisa de grupo”, como saconforme aumentava o púlienta o primeiro. Um grupo blico. Hoje, a Companhia se apresenta em um que, apesar de apresentar-se apenas no priquintal de uma escola pública onde cabem meiro final de semana que cada mês, ensaia 400 pessoas, no Butantã (SP). três vezes por semana, para manter-se afiado A escolha de manter uma relação mais di- na improvisação e aprofundar a pesquisa. reta com o público, segundo Marcio Ballas, JOGANDO NO QUINTAL – JOGO DE integrante da Companhia, foi importante na IMPROVISAÇÃO DE PALHAÇOS. Primeiro final de medida em que o palhaço precisa comparti- semana de cada mês (sextas, sábados e domingos). lhar as sensações e emoções com o público. EMEF Desembargador Amorim Lima– Rua Prof Vicente “O palhaço, mais que outros personagens, Peixoto, 50 – Butantã. Preço: R$15,00. Informações: pode assumir publicamente um erro. E o (11) 3672-1553 ou www.jogandonoquintal.com.br Renato Rebizzi Por Renata de Albuquerque 31 reportagem Grupo pesquisa linguagem de palhaços e improvisação Maura Carvalho Arte no quintal Atores do grupo se apresentam na rua com o Farambulante ao fundo ◗ A FARÂNDOLA TROUPE acaba de fechar uma parceria com a Eletropaulo. A empresa vai ceder espaço e estrutura para o grupo, a partir de um projeto de comodato que, a princípio, não está ligado a nenhuma lei de incentivo. Será cedida sala de ensaio, França revê Hysteria Luiz Fernando Marques ◗ O GRUPO XIX esteve, entre abril e junho, na França, onde apresentou o espetáculo Hysteria. O grupo já havia apresentado o espetáculo em Paris no ano de 2003, mas desta vez a turnê passou por Arles, Gap, Lyon, Auxerre, Aubusson, Malakoff/Paris, Romans e Petit Quevilly/Rouen, em um total de 26 apresentações bilíngües (parte do espetáculo é apresentada em francês e parte em português). A turnê fez parte das comemorações do Ano do Brasil na França e foi organizada pelo grupo em conjunto com Gilbert Langlois, diretor do Festival de Pierrefonds, onde o grupo se apresentou pela primeira vez há dois anos. Da esquerda para a direita: Juliana Sanches, Janaína Leite, Sara Antunes, Gisela Millás e Evelyn Klein em cena de Hysteria 32 espaço no almoxarifado e um escritório para que todas as atividades do grupo sejam desenvolvidas ali, sem que isso implique interferência da empresa no trabalho da Farândola. Ou seja: a independência do trabalho será mantida e as apresentações continuarão a acontecer na rua. Outro projeto é a turnê da Farândola pelo interior de São Paulo, chamado Projeto Circular. O micro-ônibus da companhia, batizado de Farambulante, deve rodar por cerca de 15 cidades durante o mês de junho, apresentando dois espetáculos diferentes: Que Palhaçada e Julio e Aderaldo – Um dia na Vida de dois Sobreviventes. Algumas cidades já estão confirmadas, como Sertãozinho, Jaboticabal, Matão e Monte Alto; outras serão incluídas no roteiro durante a passagem do grupo. Caixa de Imagens na Europa ◗ O GRUPO CAIXA DE IMAGENS s e apresenta na França e na Rússia nos próximos meses. Fazendo parte da proEmília cultiva tulipas no gramação da espetáculo Ainda Luzia Funarte, o grupo apresenta o espetáculo O Fotógrafo no Carreau, dentro das comemorações do Ano do Brasil na França, em junho. Logo depois, entre 2 e 12 de julho, o grupo estará em Moscou (Rússia). Ali faz a abertura da Estação Brasil, dentro do Tchecov Festival, e permanece durante todo o festival, apresentando os espetáculos O Fotógrafo, Por dentro de Otelo e Ainda Luzia, que na Rússia recebe o nome de A Luz de Lorca. Berenice Farina da Rosa Divulgação cooperativa em notícias Novos projetos da Farândola Troupe Fábio Zerloti Itália recebe Kafka ◗ O GRUPO TEATRO CÁUSTICO/Núcleo Tubo de Ensaio fez a pré-estréia do espetáculo A Construção, de Franz Kafka, no Teatro Hop Altrove, em Gênova (Itália). As apresentações do espetáculo aconteceram no final de maio. Em junho, o grupo continua na Itália, realizando apresentações nas cidades de Luggo e Dozza, a convite da Associazione Teatrale Emilia Ro magna. O ator Wilson Julião em cena, no espetáculo A Construção Núcleo Bartolomeu leva espetáculo reformulado à Espanha Divulgação ◗ NO DIA 3 DE MAIO a Fraternal Cia. de Artes e Malas Artes apresentou no Teatro Acadêmico Gil Vicente, em Co imbra (Portugal), o espetáculo Auto da Paixão e da Alegria. O convite para a apresentação partiu do GEFAC – Grupo de Etnogra- Aiman Hammoud e Mirtes Nogueira fia e Folclore da no espetáculo Auto da Paixão e da Academia de Alegria Coimbra –, que promoveu o 11º Encontro da Jornada da Cultura Popular, que teve como tema a discussão do sagrado e do profano. A Fraternal também participou de debates e mesas de discussão a respeito do tema. Arnaldo Pereira O sagrado e o profano em Portugal Cena do espetáculo, em que o personagem Segismundo é libertado e assume a revolução, entoando: “Ouve o que a rua propõe, entra na celebração, a cultura como espada pra vencer a opressão” ◗ O NÚCLEO BARTOLOMEU de Depoimentos foi à Espanha entre 1 e 11 de março, onde apresentou o espetáculo Acordei que sonhava em Madri, Alcalá de Henares e Valladolid. Para essas apresentações o espetáculo sofreu algumas alterações, como a introdução de falas em diversos idiomas, como o espanhol e o francês. Além disso, na cena da revolução, uma grande mudança aconteceu: retirou-se a alusão a armas e foi incorporada à cena uma coreografia, que representa uma proposta artística e pacífica de revolução. O resultado foi tão positivo que essa modificação agora passa a fazer parte do espetáculo em definitivo. 33 ◗ O CEFAC (Centro de Formação Profissional em Artes Circenses), uma iniciativa sem fins lucrativos que surgiu há um ano e meio da parceria entre o Galpão do Circo e a Central do Circo, está com as inscrições abertas para o processo seletivo de sua terceira turma. O curso, profissionalizante, é prático, com aulas diárias de teatro, dança, preparação física, técnica aérea, técnica de manipulação, técnica de equilíbrio e técnica acrobática. São quatro níveis que podem ser concluídos em cerca de cinco anos se o Divulgação cooperativa em notícias CEFAC abre inscrições Alunos em aula no CEFAC aluno já tiver experiência prévia. Para mais informações, consulte o link que está na página www.galpaodocirco.com.br, ou por telefone: (11) 3812-1676 e 3815-6147. Cooperados no Prêmio Shell A revista Camarim cumprimenta os cooperados vencedores da 17ª edição do prêmio Shell, referente ao ano de 2004. Veja a seguir a lista do cooperados vencedores: Autor: Newton Moreno, por Agreste Direção: Cristiane Paoli-Quito, por Aldeotas Ator: Luiz Damasceno, por Mercador de Veneza Cenário: Ilo Krugli, por Bodas de Sangue Música: Wanderley Martins, Caíque Botkay e João Poletto, por Bodas de Sangue Categoria especial: Cia. Livre, pelo projeto Arena conta Arena 50 anos Homenagem: José Renato, pela contribuição constante ao teatro brasileiro Cooperados são destaque no Prêmio Coca-Cola/FEMSA ◗ A DIVULGAÇÃO do resultado do Prêmio Coca-Cola Femsa no Teatro, a única premiação cultural voltada exclusivamente para o teatro infantil, aconteceu em abril, em São Paulo. Profissionais e espetáculos ligados à Cooperativa Paulista de Teatro foram os grandes vencedores da premiação. Veja a lista dos premiados: Autor: As Meninas do Conto (As Velhas Fiandeiras) Diretor: Cris Lozano (Caixa Mágica) Cenografia: Carlos Palma (20.000 Léguas Submarinas – Ufa!) Ator: Guto Togniazollo (Caixa Mágica) Atriz: Bia Seidl (O Mistério do Fantasma Apavorado) 34 Figurino: Marco Lima (Os Direitos da Criança) Iluminação: Fernando Anhê (Pedro e o Lobo) Revelação: Andréa Dupré (atriz, por A Matéria dos Sonhos) Trilha Sonora: As Meninas do Conto com Guilherme Maximiano e Girlei Miranda (As Velhas Fiandeiras) Categoria Especial: Zôo-Ilógico, pelo teatro de animação de objetos Produção: Cia. Delas de Teatro e Mira Haar (Cabine do Destino) Melhor Espetáculo de 2004: As Velhas Fiandeiras (As meninas do Conto) DIRETORIA: Presidente Vice-presidente Secretário Segundo Secretário Tesoureiro Segundo Tesoureiro Vogal Ney Piacentini Cenne Gotts Roberto Rosa Fernanda Rapisarda Aiman Hammoud Alexandre Terreri Carlos Biaggiolli ([email protected]) CONSELHO FISCAL: Paulo Del Castro Rosy Farias Amazyles Almeida Beth Rizzo Carlos Colabone Emília Rinaldi CONSELHO CONSULTIVO: Bebê de Soares Fátima Ribeiro Patrícia Barros Pedro Pires Petrônio Nascimento Sérgio Santiago Graça Berman NO FRONT: Administração Darcio Ranção Ricca ([email protected]) Secretária da Diretoria Mayra Rizzo Vieira ([email protected]) Financeiro Joyce Maria dos Santos ([email protected]) Luana Kavanji ([email protected]) Wladimir dos Santos Baptista ([email protected]) José Davi Souza Rafael Contas a receber Vânia Longuinho de Souza ([email protected]) Faturas Rosana de Oliveira Maciel ([email protected]) Fiscal Mara Regina ([email protected]) Gestão de Cooperados Eliana Albieri da Silva ([email protected]) Banco de Dados e Cadastro Thaís Albieri ([email protected]) Atendimento Rodrigo Correa Braz ([email protected]) Fábia Fernanda Pinez Ricardo Pereira Barroso Auxiliar jurídico Thiago Fusco ([email protected]) Webmaster Demerson Silva Campos ([email protected]) Recepcionista Dayane Aparecida dos Santos Office-boy Diego Geraldo Nunes Faxineira Maria das Montanhas Contabilidade Contabs Assessoria Empresarial Andréia Paula Romano ([email protected]) DEPARTAMENTO JURÍDICO: Advogados Martha Macruz de Sá Álvaro Paez Junqueira ([email protected]) 35 36