Queremos dar condições para o Brasil ser competitivo

Transcrição

Queremos dar condições para o Brasil ser competitivo
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“Queremos dar
condições para o Brasil
ser competitivo”
Guido Mantega, ministro
da Fazenda, reage à crise
internacional e fala sobre a
situação econômica do Brasil
e quais medidas o governo
tem tomado para que o País
não seja atropelado pelo
cenário mundial
foto: fredy uehara
O
Ministro da Fazenda Guido Mantega: economia estabilizada
2 - LIDE
LIDE – Grupo de Líderes
Empresariais organizou seminário na Federação das
Indústrias do Estado de São
Paulo (Fiesp), em 24 de maio, para
debater com Guido Mantega, ministro da Fazenda, sobre a Agenda
Brasil para o Avanço Acelerado do
País. O documento foi desenvolvido pelo LIDE e pelo economista
Paulo Rabello de Castro, Presidente do LIDE Economia com base no
projeto apresentado pelo próprio
ministro, em 2008, que prevê o realinhamento de cinco pontos: aumento
da eficiência no setor público; transformação de juros em infraestrutura
local; eficiência fiscal e competitiva;
socialização da riqueza nacional; e
do tripé “educação, inovação e sustentabilidade”.
Em entrevista à revista LIDE, o
ministro comenta sobre o programa
e a participação do setor privado
na sustentação da economia do
País, além de realçar os cuidados
com a crise europeia, os controles fiscais e monetários adotados
pelo governo, a desoneração da
folha de pagamento e a simplificação tributária.
LIDE – Como o governo tem
enxergado a crise mundial?
Guido Mantega – Existe
uma deterioração da economia internacional há tempos. Há um ano
tivemos esse agravamento. Acreditávamos que os europeus seriam
mais eficazes na resolução. Porém,
eles estão bem lentos em entender
e definir soluções para o problema,
utilizando apenas estímulos monetários. Isso é errado. É preciso usar
estímulos fiscais e incentivar a demanda interna de consumo de cada
nação. Os grandes problemas ainda
não foram resolvidos. Vamos continuar com um quadro de recessão
na União Europeia e de baixa evolução nos Estados Unidos. Nenhum
deles está transmitindo otimismo
ao mundo.
LIDE – A crise influencia no desenvolvimento do Brasil?
G.M. – Isso já afetou os emergentes. O Brasil também está sendo
atingindo. Não podemos menosprezar a instabilidade. Estamos falando
desde o ano passado que a situação
é grave, problemática. Mas temos
condições de superá-la por aqui.
LIDE – Por que o Brasil foi menos afetado?
G.M. – O Brasil e a América Latina estão sendo os menos afetados,
com impacto entre 0% e 1% do
Produto Interno Bruto. Hoje temos
mais experiência na condução de
problemas econômicos mundiais.
Desde a crise de 2009 estamos implantando mudanças significativas
na economia brasileira. Além disso,
hoje temos mais reservas, o mercado consumidor está aquecido,
as empresas estão mais sólidas e
não houve interrupção do crédito.
Mas precisamos ter ousadia, tanto
o governo como o setor privado,
acreditando que vamos reverter esse
quadro, acreditando que podemos
crescer 4% a 5% ao ano.
LIDE – Quais são essas mudanças?
G.M. – Começamos a tomar medidas para estimular a
economia. A redução do custo financeiro, da taxa de juros e
da taxa Selic, por exemplo. Isto
tem um impacto positivo para o
setor produtivo e promove a competitividade. Outra medida é a
mudança da relação entre política fiscal e cambial. Os países
têm manipulado suas taxas cambiais para ganhar competitividade
quando desvalorizam as moedas.
O Brasil nunca participou desse
movimento, e conseguiu criar um
fundo de reserva de 374 bilhões
de dólares. Agora, vamos manter
o real desvalorizado para incentivar a exportação.
LIDE – Qual sua expectativa
para o PIB deste ano?
G.M. – Acredito que o crescimento fique de 3,5% a 4%.
LIDE – Como o setor privado pode auxiliar na evolução da
economia?
G.M. – A aprovação pelo Congresso da Resolução 72 contou
com apoio dos empresários. A
medida simplificou a alíquota do
ICMS (Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços) para produtos importados entre operações
interestaduais. Precisamos agora
fazer isso para todas as mercadorias, não apenas as importadas.
Além disso, o setor público precisa
estimular o setor privado mais receoso. Temos que fazer aquisições,
como a de equipamentos (ônibus e
caminhões). Em contrapartida, os
empreendedores precisam acreditar e apostar no Brasil, com mais
investimentos.
LIDE – Essa medida do ICMS
entra em vigor no começo de janeiro. Como o governo vai fazer
para que os estados que mais arrecadam com o imposto não sejam prejudicados, como Santa
Catarina e Espírito Santo?
G.M. – Vamos compensar com
volume de crédito e com taxas reduzidas, melhorando a produção
do estado. “Os empreendedores precisam acreditar e
apostar no Brasil com mais investimentos”
LIDE - 3
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de 2012 cresceram 22%, se tomarmos como base o mesmo período
de 2011. Fizemos uma prorrogação
para a linha branca. Para o setor automobilístico, iremos estudar se será
necessário.
LIDE – O governo vai incentivar as instituições financeiras a
reduzirem o spread?
G.M. – É preciso irrigar mais o
sistema com o aumento do crédito
e, principalmente, com a redução
do spread. Ao reduzir juros estamos
atraindo capitais para a produção.
Se o setor financeiro colocar o pé
no freio, reduz o giro.
Indústria: redução de juros para atrair capitais para produção
LIDE – Como o senhor enxerga a estrutura tributária brasileira?
G.M. – A estrutura é ruim, ultrapassada, e prejudica a produção.
Merece uma simplificação e redução de tributos imediatamente.
LIDE – Qual a sua opinião sobre a Agenda Brasil para o Avanço Acelerado do País, documento apresentado pelo LIDE?
G.M. – Todos os cinco pontos
elencados são propostas importantes e contributivas. Nesse sentido, a
simplificação dos tributos é a mais
emergencial. Estamos simplificando
ao máximo a questão relacionada
ao recolhimento de tributos. Vamos
lutar para homogeneizar o ICMS,
além de baixá-lo para 4%. Estamos
sentindo que há cada vez mais uma
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harmonia entre os estados, gerando
uma real possibilidade de ocorrer
em curto prazo. Vamos continuar lutando para reduzir tributos federais.
Fizemos a reforma tributária para
o Simples, destinada aos pequenos empresários. Isso é o desejável
para todos os tributos. Um verdadeiro sonho.
LIDE – Qual a expectativa sobre a desoneração da folha de
pagamento?
G.M. – Vamos começar a desoneração da folha de pagamento
para 15 setores, como o de confecção, calçados e bens de capital, em
agosto. Estamos abrindo para outros segmentos e queremos receber
mais sugestões, para ampliar a desoneração. Queremos fazer a maior
desoneração possível, ao longo deste ano. Essa ação do governo reduz
imediatamente o custo da mão de
obra sem diminuir salário e preservando o emprego. Além disso,
estimula a formalização. Não vamos medir esforços para estimular
a produção brasileira, a indústria,
os serviços e o comércio. Queremos dar condições para o Brasil ser
competitivo.
LIDE – E o Imposto sobre Produtos Industrializados?
G.M. – Foi uma medida
emergencial para os setores de eletrodomésticos e automóveis, que já
rendeu bons resultados. Com a linha
branca começamos em dezembro
do ano passado. Só como comparação, as vendas de janeiro a maio
LIDE – Os investimentos são
importantes para a retomada do
País. Qual a previsão do governo?
G.M. – Nossa previsão de investimentos é de 597 bilhões de
reais na indústria de 2012 a 2015,
29,5% acima do apurado no período entre 2007 e 2010. As estatais
também vão realizar investidas. A
Petrobras deverá fazer investimentos de 83 bilhões de dólares e a
Vale de 40 bilhões de dólares até
o fim deste ano. O Brasil tem que
aproveitar a crise para dar um passo qualitativo.
LIDE – Há dinheiro disponível para as empresas e os estados captarem e realizar os investimentos?
G.M. – Aprovamos uma linha
de crédito para os estados de 20
bilhões de reais. Temos que maximizar os investimentos nos estados,
com taxa de 7,5% ao ano e carência de dois anos, com 20 anos para
pagar. Para o setor privado, aumentamos os recursos do BNDES
e reduzimos os juros dos emprésti-
LIDE – Qual o significado da
reforma na política fiscal para
o Brasil?
G.M. – Com ela conseguimos
conter gastos de custeio, que hoje
crescem menos que o PIB. Essa solidez amplia espaço para reduzir
os juros. Estamos caminhando para
os menores déficits, algo em torno
de 1,4% do PIB, e dívida líquida
de 35% do PIB, uma das menores de todos os tempos, apesar da
conjuntura atual.
LIDE – Há algo que preocupa
o governo internamente?
G.M. – Nosso receio é sempre o
risco do parlamento aprovar medidas
de uma hora para outra. O Programa
Nacional de Educação, por exemplo,
tinha antes receita de 5,1% do PIB e,
agora, passamos para 7%, conforme
o cronograma. Porém, há debates sobre ampliar para 10%. Isso não pode
acontecer sem um planejamento
prévio. Acaba quebrando o estado
brasileiro. Outro caso é o aumento
para os servidores. Sou totalmente a
favor de dar aumento justo para os
trabalhadores, mas desde que seja
bem estruturado.
LIDE – Então, o governo tem
feito seu papel?
G.M. – Sim, com certeza. Estamos reduzindo os gastos. A despesa
financeira do governo em maio foi
de 18 bilhões de reais. No mesmo
período do ano passado foi de 22
bilhões. Ou seja, são 4 bilhões a
menos no mês, o que dá aproximadamente 40 bilhões de reais
que podem ser utilizados para desoneração e para investimentos.
LIDE – Qual é o grande diferencial do Brasil?
G.M. – Temos uma virtude que
os outros países não possuem: não
temos demissões e estamos criando
novos empregos. A população está
satisfeita. A massa salarial cresce
5% ao ano e 63% do PIB é relacionado ao consumo. Construímos
um mercado dinâmico no Brasil e
vamos fazer de tudo para que ele
não pare de crescer.
n
mos para pessoa jurídica, em taxa
real de 0%, como para compra de
equipamentos.
“Nossa previsão de investimentos é de 597 bilhões
de reais na indústria de 2012 a 2015, 29,5%
acima do apurado no período entre 2007 e 2010”
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