arqueologia da paisagem industrial
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arqueologia da paisagem industrial
XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 471 MODULO 1 ARQUEOLOGIA DA PAISAGEM INDUSTRIAL: “ESCAVANDO” AS ORIGENS DA INDÚSTRIA MINERADORA EM MINAS GERAIS (1) R.A. Rodrigues da Silva Departamento de Administração. Instituto de Ciências Econômicas e Gerenciais – ICEG. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Campus Coração Eucarístico, Belo Horizonte, 30535-901, Minas Gerais, Brasil (1) [email protected] RESUMO Este artigo apresenta os conceitos de patrimônio industrial e patrimônio cultural a partir das relações estabelecidas entre a vida social e econômica da sociedade mineira (Estado de Minas Gerais – Brasil). A perspectiva principal é o desenvolvimento de paisagens industriais organizacionais como paisagem cultural, concebidas a partir de uma visão integrada da sociedade segundo uma teia de interligações que convergem para os conceitos do patrimônio e cultura. As relações estabelecidas e os aspectos da memória cultural e social visam abordar estes conceitos, proporcionando-lhes uma natureza interdisciplinar. É necessário destacar uma "específica" paisagem social-industrial que determina sua própria identidade e torna possível conhecer uma região, um espaço geográfico e um tempo em que se experimenta transformações e reflexões sobre as condições de vida e trabalho dos indivíduos. Os fatores específicos ligados à arqueologia e ao patrimônio industrial definem, assim, a construção da identidade, memória e cultura e explicam algumas questões sociais, cujas expectativas e limitações determinam a própria sociedade contemporânea. O entrelaçamento dos conceitos constitui-se em uma possibilidade de compreensão das relações de trabalho e XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 472 MODULO 1 PALAVRAS CHAVE: Patrimônio Industrial; Arqueologia Industrial; Patrimônio Cultural Ao final, o que se pretende é fomentar e discutir propostas para a valorização, a preservação e o incremento das principais idéias que levam a desenvolver conceitos relacionados à importância dos métodos arqueológicos para o entendimento do desenvolvimento tecnológico e também sócio-econômico, além de possibilidades de percepção da formação social e cultural do Estado de Minas Gerais como parte de uma memória viva. 1. INTRODUÇÃO 2. PATRIMÔNIO INDUSTRIAL da sociedade, entrelaçadas às conseqüências sócioeconômicas e culturais. Expande-se, dessa maneira, o conceito de patrimônio e se constitui em desafio a sua compreensão a partir da memória e da história culturalindustrial. Tem-se como característica principal do trabalho, apresentar alguns princípios a partir da compreensão dos ciclos de desenvolvimento da indústria mineira no Estado de Minas Gerais. A proposta está baseada na importância da indústria de metalurgia, siderurgia e dos minerais em geral para a formação da memória e da história do Estado. Assim, a idéia de construir uma relação entre a memória da técnica e a arqueologia industrial adotando-se os conceitos metodológicos de prospecção arqueológica, patrimônio industrial e memória cultural. Recorre-se, assim, aos princípios do desenvolvimento da indústria mineira, desde as proto-indústrias do Ciclo do Ouro nas primeiras décadas do século XVIII até sua evolução e adaptação junto ao mercado no início do século XX. CULTURAL E PATRIMÔNIO Os conceitos desenvolvidos para descrever patrimônio vêm, a cada ano, sendo ampliados, sendo que agregado ao conceito tradicional atrelado à patrimonialidade material se tem pensado na natureza e diversidade. Estes dois fatores determinaram nos últimos anos uma ampliação conceitual que busca englobar desde as ciências humanas, já tradicionais, como as exatas (patrimônio tecnológico e material) e as da saúde e biológicas (patrimônio genético). Além destas novas formas de ‘pensar’ o patrimônio emergem também com maior intensidade o patrimônio imaterial e o patrimônio intangível (ABREU e CHAGAS, 2003)[1]. Entretanto a preocupação com o patrimônio imaterial e urbano atrelado ao patrimônio industrial tem tido pouca 473 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 atenção. Alguns casos podem ser apresentados os quais buscam desenvolver estudos por iniciativas brasileiras, públicas ou privadas, se tem uma grande concentração na preocupação com o patrimônio histórico e industrial, não se ressaltando a importância do estudo das variáveis humanas e sociais implicadas no processo de construção da história industrial. O que se observa a partir dos entroncamentos e interconexões entre os conceitos de patrimônio, cultura e indústria, entre a materialidade e o imaterial é um desafio à interdisciplinaridade do ‘patrimônio cultural’ amplo. Nele se tem uma ampliação e ‘globalização’ do conceito que permite desenvolver a memória e a história cultural as quais possibilitam um maior entendimento da presença contínua entre passado-presente-futuro (BURITY, 2002)[2]. Para Ferreira e Orrico (2002)[3], as várias formas de se articular cultura e memória, história e sociedade, passado e presente definem de infinitas maneiras novas fronteiras e articulações que identificam uma linguagem nacional própria, identidade e memória sociais que muitas vezes são significantes e trazem significado a algumas questões que inquietam os estudiosos e apaixonados pela memória cultural. 2.1. Arqueologia Industrial e Patrimônio Industrial As origens da arqueologia industrial podem ser descritas a partir da Idade Moderna, com a utilização de diversos meios de intensificação da produção, os quais começam a ser utilizados com uma vinculação aos processos de industrialização e uma reordenação morfológica dos edifícios produtivos durante os séculos XVIII e XIX de acordo com os modos de exploração e tecnologia aplicados. Estes fenômenos são perceptíveis com a desapropriação do conhecimento e das técnicas produtivas que são repassadas dos homens às empresas, junto a uma maior individualização do trabalho e à especialização produtiva (TORRÓ, 1994)[4]. Os movimentos de construção da arqueologia industrial estão intimamente ligados aos processos de promoção e conservação, inventário, documentação, investigação e valorização do patrimônio industrial. Além destas formas, tem-se também o fomento ao ensino destes aspectos como um objetivo a suscitar as pessoas e as organizações para a importância e revalorização do patrimônio industrial, suas implicações nos processos de vida do homem e de construção do atual estado da sociedade (BERGERON, 1995)[5]. Através de uma construção da memória industrial, a partir da importância do administrador ou gestor das empresas acompanhados de uma equipe interdisciplinar, XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 474 MODULO 1 pode-se reconstruir a história das empresas e de seus processos que determinaram ou sofreram influências em seu desenvolvimento. Com isso, a (re)construção destas atividades, as situações reais de trabalho, os contextos em que se desenvolveram e a recuperação da memória histórica permitem a contextualização das práticas espontâneas ou administrativas, os métodos de valoração e exploração do trabalho. Suas formas de desenvolvimento ou de expressão são extremamente variáveis e o equilíbrio empresa-sociedade está em conformidade com as possibilidades locais e, principalmente, os contextos sóciopolíticos, econômicos e culturais. Os conceitos de arqueologia superam aqueles percebidos pela maioria das pessoas, de uma ciência que possui uma conceituação caracterizada por uma metodologia específica, centrada nos problemas históricos ou sociedades antigas. Para Gutiérrez Lloret (1994)[6] não se pode constituir um conceito único para uma arqueologia genérica, e sim, deve-se desenvolver várias articulações que dêem conta dos temas englobados pelo termo e que têm como propósito o desenvolvimento do termo. O conceito de arqueologia industrial está imbricado ao desenvolvimento das sociedades capitalistas ou industriais em que constituem as atividades caracterizadoras de uma nova estrutura econômica das sociedades contemporâneas. Complementando, a perspectiva de conceitualização do campo de atuação da arqueologia industrial tem na análise de Santacreu Soler (1992)[7] sua centralidade na idéia de uma construção fatorial dos conhecimentos aplicada aos fatores de produção em direção a uma orientação mais social. Ela se compõe de empresários e de funcionários protagonistas dos processos de produção ou de técnicos administrativos e de gestão. Segundo López Garcia (1992)[8], as transformações provocadas pela inserção de empresas e/ou indústrias em um dado momento da vida social de um determinado espaço ou lugar, além de suas características, tendem a transformá-las ou modificá-las de alguma forma. As mudanças estruturais das organizações são elementos de transformação de uma instalação industrial, seja a respeito da história do trabalho ou das técnicas adotadas em um certo espaço de tempo. O estudo dos impactos sociais da indústria em um determinado lugar pode ser determinante para a construção de uma história social que envolva desde a busca da harmonia até a da contradição em relação aos espaços pré-existentes. Com isso, pode-se observar que o contexto em que se encontra a arqueologia industrial apresenta-se amplo e tem como princípio a abordagem da história industrial e 475 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 econômica do modelo de sociedade moderna. Tal fato ocorre a partir dos registros escritos ou do conjunto de estruturas desenvolvidos através dos últimos dois séculos. Inclui, também, o estudo das características sócioambientais que permitam um olhar crítico ao desenvolvimento e às influências das empresas segundo o entorno que elas abarcam. 3. UMA BREVE HISTÓRIA DA INDÚSTRIA DAS MINAS GERAIS A história do Estado de Minas Gerais se desenvolve e está entrelaçada ao desenvolvimento da indústria minera. O próprio nome do Estado – “Minas Gerais” – leva à intuição de grandes reservas dos vários minerais por sua extensão. O descobrimento de grandes quantidades de ouro no século XVIII foi o ponto de partida para o desenvolvimento da indústria mineira que até os primeiros anos do século XX seguiu sendo um de seus pontos de referência. Entretanto, depois de quase três séculos de influência mineira, a importância dos minerais transferiu-se do ouro para a extração de ferro. Nos últimos anos do século XX, a importância da indústria mineira foi relacionada ao turismo com a recriação da Estrada Real e a busca de um turismo cultural em torno da mesma. Assim, as possibilidades de tornar mais visível a importância de a indústria mineira ao Estado e também ao País tornar-se fundamental quando se pretende desenvolver a arqueologia, a história e a memória deste caminho. Especificamente em Minas Gerais, a memória ou história da indústria mineira se faz a partir da última década do século XVII e no século XVIII. A formação das primeiras proto-indústrias ou centros de exploração dos minerais se faz presente nas políticas econômicas do domínio português e continua até os primeiros anos do século XIX. A partir deste momento, se tem um novo ciclo que permanece inalterável no período do Império brasileiro até os primeiros anos do século XX quando começa a preocupação de se constituir um parque tecnológico que pudesse desenvolver o país e propiciar a implantação de empresas industriais brasileiras. Com isso, se tem a trajetória histórica da indústria mineira em que no há explicitamente uma preocupação com sua importância histórica e social, não menos com a preocupação patrimonial e cultural disseminada na sociedade das Minas Gerais. Ao final do século XX e os primeiros anos do século XXI se tem uma preocupação turística em desenvolver a principal via de transporte e comércio desde o século XVIII até os primeiros anos do século XX, a Estrada Real. Mas, não se tem uma XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 476 MODULO 1 preocupação centrada na manutenção da cultura e história da indústria mineira, e sim em fazer dele um novo caminho para o turismo ecológico e rural. As discussões propostas pretendem desenvolver um convite às possibilidades e apresentar algumas possibilidades de (re)criar este patrimônio ao longo da Estrada Real que outrora foi importante para o desenvolvimento da indústria mineira e de toda a região das Minas Gerais. 3.1. Das Pequenas Fundições às Primeiras Indústrias O período em que começa a busca pelas minas no estado de Minas Gerais compreende as primeiras décadas do século XVIII, também denominado “Ciclo do Ouro” ou “Surto de Mineração”. Com isso, a partir das descobertas das jazidas de ouro, também foram encontrados outras de vários minerais, principalmente pedras preciosas ou semipreciosas. Os processos migratórios e o desenvolvimento dos grandes jazidas determinaram os movimentos sociais e de trabalho durante o século XVIII. Ainda sob a dominação do Império Português, o estado foi considerado o mais importante na colônia brasileira e o período do ouro foram condicionantes e determinantes para mudar os processos sócio-econômicos a partir de seu crescimento, auge e decadência (1693 a 1770) e a considerável proto-indústria do ouro. (BARBOSA, 1979[9]; COSTA, 1978[10]). A característica da população e da economia brasileira, até o período anterior, se havia centrado na região costeira e na agricultura. Com isso, se percebe um fluxo populacional e a nova dimensão do território, em que se tem a formação das principais cidades, de centros comerciais e de toda uma economia anteriormente inexistente (ANTONIL, 1982)[11]. Os principais anos de exploração dos minerais, principalmente o ouro, têm a realização das lavras nas bordas dos rios, nas áreas denominadas de aluvião nos leitos dos rios. Mas, devido a sua rápida escassez e à necessidade em utilizar técnicas mais desenvolvidas de exploração, também foram mudados e desenvolvidos os processos que determinaram a busca por economias alternativas a indústria mineira no último quarto do século XVIII. Estes processos vão mudar de direção com a chegada da Real Família Portuguesa ao Brasil em 1808 e a transferência da sede de Corte para o Rio de Janeiro. Com isso, mudam os processos de extração dos minerais e também se faz importante desenvolver novos processos e agora a considerada Era do Aço. Tais fatores levam à criação de empresas e às primeiras indústrias e fundições que se tornam fatores essenciais 477 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 para entender as novas dimensões da indústria mineira para, na época, a Província de Minas e o Brasil. Pode-se considerar, dessa maneira, que a origem da siderurgia nas Minas Gerais ocorre com uma produção artesanal ao final do século XVIII que se amplia até o século XIX. (LIBBY, 1984, 1988)[12][13] Entre os períodos de crise do ouro e o crescimento da indústria mínero-siderúrgica, as micro-regiões da província se dedicaram ao desenvolvimento de áreas específicas, pois, em geral, elas tinham alguma especialidade, considerada essencial para o desenvolvimento da economia aurífera, mas tiveram que se restabelecer e se reestruturar para a produção de gêneros alimentícios. O sul se tornou importante área de produção da cultura do café e o norte da cultura do algodão. (LENHARO, 1979)[14]. Dentre os fatos que determina tais mudanças nos rumos da mineração no Brasil e principalmente em Minas Gerais tem-se a reabertura da Real Fábrica de Diamantes no ano de 1808, além da construção da estrada de ferro no Serro do Frio, em Morro do Pilar. No ano de 1811 é criada a empresa Patriótica, empreendimento sob a cotização de Sociedade por Ações que inicia a fabricação de ferro na cidade de Congonhas do Campo. Entre as empresas criadas no período expansionista da siderurgia em Minas Gerais se pode apresentar algumas das principais na tabela 01 a seguir: XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 Ano Empresa 1819 Sociedade Mineralógica (extração de ouro da Mina de Passagem 1824 Imperial Brazilian Mining Association (extração de ouro da Mina Gongo Soco) 1827 Fábrica de Ferro de Jean Monlevade (engenheiro de minas) 1828 1830 1834 1862 1862 1862 1864 1873 1876 1880 1880 1886 General Mining Association (quatro minas) St. John d’el Rey Mining Company, Limited (Mina do Morro Velho) Serra da Candonga Gold Mining Company, Limited Santa Bárbara Gold Mining Co., Ltd (Mina de Pari no Rio Piracicaba) Dom Pedro North d'El Rey Gold Mining Company (mina de ouro no Morro Santa Ana & Maquiné) Anglo-Brazilian Gold Mining Company, Ltd. (Mina de Passagem) Roça Grande Brazilian Gold Mining Company (mina de ouro) Brazilian Consols Gold Mining Company (obtém a propriedade de Taquara Queimada, na Serra de Ouro Preto) Pitanguy Gold Mines, Ltd. [extração de ouro em Jacutinga] Brazilian Gold Mines Company (extração na Mina da Descoberta) Ouro Preto Gold Mines Company, Ltd. (Mina da Passagem) São José d'El Rey Gold Mining Co., Ltd. (Caçula) Tabela 01: Empresas no Século 19 – Minas Gerais (Brasil) Sources: Adaptado de Ferrand, L’Or à Minas Gerais; Cidade Vila Rica (atual Ouro Preto) Santa Bárbara São Miguel do Piracicaba (atual João Monlevade) São José del'Rei (atual Tiradentes). Nova Lima São Miguel e Almas (atual Serro) Santa Bárbara Mariana Mariana Caeté Mariana Santa Bárbara Caeté Ouro Preto Tiradentes 478 479 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 Leonardos, Geociências no Brasil, Rodolphe Jacob, Minas Geraes no XX século, Rio de Janeiro: Gomes e Simões, 1911. IN British Enterprise in Brazil: The St. John D'el Rey Mining Company and the Morro Velho Gold Mine, 1830-1960, Marshall Craig Eakin, Duke University Press, 1989, p.17. processos de importação estabelecidos ao final do século XIX. As mudanças produzidas pela instalação do regime presidencialista no Brasil, em 1889, e pelo surto do desenvolvimento industrial ao final do século XIX levaram ao surgimento de dois setores industriais: a indústria do aço e a do cimento. Durante o período que compreende o século XIX até o final do Império, em 1889, se pode considerar uma importância particular da expansão da indústria minera na província de Minas Gerais. A criação das empresas de exploração dos diversos minerais, frente a cri da Associação Brasileira de Mineração em 1874 e vários grupos de investigação e desenvolvimento culmina com a fundação da Escola de Minas de Ouro Preto, em 12 de outubro de 1876, por Claude-Henri Gorceix, seu primeiro diretor. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A importância e consolidação da indústria mineira em Minas Gerais e no Brasil ocorre, assim, de maneira embrionária até o final do século XIX. Depois desse período tem-se, principalmente no século XX, a criação das grandes empresas de siderurgia e mineração, além da expansão capitalista do país, a formação dos grandes centros industriais e da economia industrial que permitem o fortalecimento das primeiras grandes indústrias e sua expansão a partir do incremento das ferrovias e dos Dentre os importantes processos considerados para a formação das cidades brasileiras no século XX não se pode desconsiderar a formação cultural, a industrialização e seus desdobramentos compreendem parte de uma realidade que se faz crescente e presente durante todo o período recente da economia brasileira. Entretanto, o processo industrial, geralmente, é percebido sob olhares das estruturas macro e microeconômicas, sob as características da gestão e crescimento e desenvolvimento das empresas e também o caráter estrutural e tecnológico. Uma percepção das influências sociais, das relações estabelecidas entre organização, sociedade e Governo, e a importância ou influencia da mesma nos processos sociais e culturais de uma sociedade são temas se não inexplorados, em alguns casos, pelo menos incipientes ou embrionários. XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 480 MODULO 1 Em alguns casos, os desdobramentos das vilas operárias e suas funções são percebidos não somente sob o aspecto do desenvolvimento social-urbano, mas também a partir das perspectivas de reprodução, manutenção e construção de modelos sociais que venham a garantir uma certa estabilidade e perenidade do modelo social e industrial vigente. Esta visão, estabelecida desde os séculos XVIII e XIX, nos primórdios da industrialização, através de Robert Owen e a Fábrica New Lanark, visa, em primeiro lugar, a reprodução e garantia das relações capital-trabalho e porque não as relações sociais estabelecidas. Para Micklethwait e Wooldridge (2003)[15], os estudos relativos à história empresarial e econômica, sobre a arquitetura industrial, a ocupação geográfica, a complexa estrutura empresarial, a psicologia social, a sociologia do trabalho dentre outros têm importância impar para a manutenção e o desenvolvimento da memória empresarial e industrial brasileira se realizados estudos interdisciplinares que privilegiem não somente os fatores financeiros-econômicos, mas também os sócio-culturais. Ao incorporar a este conteúdo o entorno social, com as vilas operárias e seus desdobramentos tem-se a possibilidade de tornar visível todo um contexto sócioprodutivo que outrora tornou possível o desenvolvimento econômico e a evolução da comunidade e atores envolvidos. Estabelecer estas relações e descobrir a importância delas para a sociedade brasileira torna-se um importante passo para a ampliação do conceito de memória cultural, pois se pode entender também como patrimônio cultural de um país, região ou local a história dos empreendimentos feitos e as relações por ele estabelecidas com a sociedade. A recuperação da história industrial e cultural apresenta a possibilidade de conhecimento de uma época vivida e de seu entorno. As mudanças organizacionais segundo as transformações organizativas nas empresas com reflexos nas as condições de vida e trabalho das pessoas, nas demandas de qualificação requeridas pelos processos produtivos, na orientação general e possibilidades de ação do “trabalhador coletivo”, têm sido pouco consideradas na hora de explicar as mudanças sociais e as expectativas e limitações da sociedade contemporânea. Apesar da importância e da relevância da história organizacional e de suas influencias na visa social e político-econômica, uma adequada “síntese organizacional” torna-se pluralista e complexa a partir do ponto de vista apresentado e de como são percebidas e descritas as histórias organizacionais. (TOLLIDAY, 2000)[16]. 481 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 1 Referencias [1] R. Abreu, M. Chagas (orgs.), “Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos”, Rio de Janeiro, DP&A, 2003. [2] J. A. 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