Esplenectomia subtotal com preservação do polo inferior do

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Esplenectomia subtotal com preservação do polo inferior do
Salus J Health Sci. 2015; 1(1): 76-85
DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2447-7826.20150009
ARTIGO DE REVISÃO
Esplenectomia subtotal com preservação do polo inferior do baço (ESTPI)
Paulo DNS1,* e Paulo MSL2
1
Doutor, Professor Titular, Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória EMESCAM, Vitória-ES, Brasil
2
Doutora, Professora Adjunta, Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória EMESCAM, Vitória-ES, Brasil
Recebido em 31 de março de 2015
Aprovado em 5 de abril de 2015
PALAVRAS-CHAVES
Baço; Cirurgia Geral;
Esplenectomia
Resumo
O baço apresenta importantes funções, dentre as quais se
destaca a imunológica. A sua retirada pode implicar na falta
dessas funções e daí sobrevir infecções, principalmente em
crianças, podendo levar ao óbito. Daí a importância de se
conservar o órgão ou parte dele. Das cirurgias conservadoras
sobre o baço (esplenorrafia, ressecções parciais segmentares,
autoimplantes esplênicos autógenos, esplenectomia subtotal
com preservação do polo superior), a mais recentemente
descrita foi a esplenectomia subtotal com preservação do polo
inferior (ESTPI). Esta operação, que se constitui em linha de
pesquisa do primeiro autor, visa garantir as funções esplênicas.
* Autor para correspondência
E-mail: [email protected]
Introdução
O baço, órgão do sistema mononuclear
fagocitário,1 foi considerado durante muito
tempo não essencial à vida e, portanto, a sua
retirada devido a trauma ou outras doenças,
não provocaria dano maior ao paciente.2-5 Em
1952, King & Shumacker Jr constataram a
associação entre a remoção do baço e a
ocorrência de sepse em crianças.6 Desde
então, os riscos de infecção pósesplenectomia têm sido reconhecidos em
crianças e em adultos, principalmente nos
dois primeiros anos após a cirurgia.7,8 As
complicações
infecciosas
após
a
esplenectomia foram também observadas
em animais de experimentação.9-12 Têm sido
também
relatadas
alterações
no
13-15
metabolismo lipídico em seres humanos
e
em animais de laboratório,16-21 que podem
causar
aterosclerose.16
O
baço,
provavelmente, apresenta funções ainda
desconhecidas. Nesse caso a retirada desse
órgão comprometeria essas funções.
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Observada a importância desse órgão, sua
preservação total ou parcial passou a ser
realizada de forma mais frequente por meio
de esplenorrafias,5 oclusões vasculares,22-26
esplenectomias parciais27-29 e dos implantes
esplênicos autógenos.30-32 Destas operações,
a mais recentemente descrita foi a
esplenectomia subtotal com preservação do
polo inferior (ESTPI).33 Nesta técnica, o
suprimento sanguíneo é mantido por meio
dos vasos do ligamento gastroesplênico que
podem ser os vasos existentes neste
ligamento ou por vaso da
artéria polar inferior. Este trabalho destinase à revisão desta técnica.
Revisão de literatura
Em 1999, o primeiro autor e colaboradores
publicaram o trabalho pioneiro no assunto.
Eles realizaram em cães a ESTPI (Figura 1)
para verificar a viabilidade do polo inferior
(PI) do baço.
Figura 1: Sequência da técnica da esplenectomia subtotal em cães. A- A seta mostra a ligadura
e secção dos vasos rente à parede do baço e do estômago, inclusive dos ramos esplênicos
principais. Observar em B que o PI fica suprido por vasos existentes no ligamento
gastroesplênico podendo haver uma contribuição de uma artéria lobar inferior para esse polo.
Utilizaram 24 cães, peso variando entre 12 e
14 kg, distribuídos em dois grupos: Grupo 1ESTPI; Grupo 2- manipulação do baço. Os
baços e remanescentes foram retirados no
7º, 15º, 30º e 70º dias no grupo 1, e no 15º e
60º dias no grupo 2, para estudo da
viabilidade macro e microscópica. A análise
dos resultados mostrou que o PI do baço de
cães manteve-se viável em 86,6% dos casos,
mesmo com a ligadura dos vasos esplênicos
principais.33
Em 2001, Paulo DNS e Lázaro da Silva,34
revendo a literatura sobre baço e
metabolismo lipídico, aventaram a hipótese
de que o baço poderia interferir no
metabolismo
lipídico.
Desse
modo,
realizaram em cães um experimento para
comprovar essa hipótese. Operaram 38 cães,
em que realizaram hemograma e lipidograma
no pré-operatório, no 7º, 28º e 56º dias pósoperatório (PO). Os animais foram
distribuídos em quatro grupos: Grupo 1 (n=7)
- manipulação do baço; Grupo 2 (n=9) hemiesplenectomia cranial; Grupo 3 (n=9) ESPTI; Grupo 4 (n=13) - esplenectomia total
(ET). Os animais do grupo 4 apresentaram
aumento do colesterol total no pósoperatório, aumento da fração HDL no 7º e
28º dias (p<0.05) e aumento da LDL no 56º dia
(p<0.01). A fração VLDL e triglicérides não
apresentaram diferenças significativas do pré
para o pós-operatório. Os animais dos grupos
1 e 3 não apresentaram alterações
significativas, e os animais do grupo 2
apresentaram aumento do colesterol total no
7º dia PO. Desse modo, os autores concluíram
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que a ET induz aumento do colesterol total,
HDL e LDL, que a hemiesplenectomia e ESTPI
protegem o animal de alterações lipídicas
significativos.34
Em 2005, Paulo ICAL et al35 realizaram um
estudo com o objetivo de verificar o efeito da
esplenectomia total, da ligadura dos vasos
esplênicos principais e da ESTPI nos lípides
plasmáticos de ratos alimentados com dietacontrole ou dieta acrescida com 2,5% de
colesterol. Utilizaram 111 ratos Wistar,
machos, pesando entre 273 e 427g, com
idade aproximada de 12 semanas. Os animais
foram distribuídos em cinco grupos: Grupo 1
(n = 20) - controle, não operado; Grupo 2 (n =
20) - manipulação do baço; Grupo 3 (n = 31) ET; Grupo 4 (n = 20) - ligadura simultânea da
artéria e veia esplênicas; Grupo 5 (n = 20) ESTPI. Foram dosados os lípides plasmáticos,
e os ratos foram distribuídos em dois
subgrupos, de acordo com a dieta (subgrupo
A - dieta-controle; subgrupo B - dieta
acrescida com 2,5% de colesterol). Todos os
animais foram submetidos à nova colheita de
sangue após 90 dias do início do experimento.
Os
animais
submetidos
à
ET,
independentemente do tipo de dieta,
apresentaram aumento significativo (p<0,05)
do colesterol total, LDL, VLDL e triglicérides. O
aumento da HDL foi significativo nos ratos
alimentados com dieta-controle (p<0,05) e
não significativo nos alimentados com dieta
acrescida com 2,5% de colesterol (p>0,05). Os
animais submetidos à ligadura simultânea da
artéria e veia esplênicas e à ESTPI, e
alimentados com dieta-controle, não
apresentaram alterações nos níveis de lípides
plasmáticos, exceto pelo aumento da HDL
(p<0,05)
observado
no
grupo
da
esplenectomia subtotal. Nos animais desses
grupos, alimentados com dieta acrescida com
2,5% de colesterol, houve aumento
significativo de colesterol total, LDL, VLDL e
triglicérides. Daí os autores concluírem que a
ET produz aumento significativo do colesterol
total, das frações LDL e VLDL e dos
triglicérides, tanto nos ratos alimentados com
dieta-controle quanto nos alimentados com
dieta acrescida com 2,5% de colesterol. O
aumento é mais significativo nos animais
alimentados com dieta acrescida com 2,5% de
colesterol. A ligadura simultânea da artéria e
veia esplênicas e a ESTPI previnem contra as
alterações dos níveis de lípides plasmáticos
observadas em ratos submetidos à ET
alimentados com dieta-controle ou acrescida
com 2,5% de colesterol.35 Nessa época foi
realizada a primeira ESTPI em ratos (Figura 2).
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Figura 2: ESTPI em ratos. Esquema mostrando as ligaduras vasculares rentes ao baço e a secção
esplênica, com retirada da porção superior e manutenção do PI (Figura cedida pela Dra. Isabel
Cristina Andreatta Lemos Paulo)
Em 2006, Paulo DNS et al36 estudaram
aspectos técnicos, morfológicos e funcionais
do PI do baço em ratos. Operaram 36 ratos
Wistar, adultos, que foram distribuídos em
três grupos: Grupo 1 (n=10) - simulação;
Grupo 2 (n=16) - ET; Grupo 3 (n=10) - ESTPI.
No pré-operatório e no 90º PO realizaram
coleta de sangue para dosagem do colesterol,
frações e triglicérides. A seguir, os animais
foram mortos e deles retirados o PI e baço
para exame macro e microscópico. No PO
ocorreram seis óbitos no grupo ET. O baço e
PI se apresentavam macroscopicamente
viáveis. O peso médio do PI foi 35,84% ± 4,31.
Os animais dos grupos 1 e 3 não
apresentaram alterações no perfil lipídico do
pré para o pós-operatório. Porém, os animais
do grupo ET apresentaram aumento
significativo do colesterol e frações. Concluiuse que a ESTPI era exequível, que a morfologia
do PI era aparentemente normal e que a
ESTPI prevenia contra alterações lipídicas.
Comentam os autores que durante a
preservação do PI supridos por vasos do
ligamento
gastroesplênico
pôde
ser
aproveitado o coto do ramo inferior da artéria
esplênica onde os vasos do ligamento
gastroesplênico fazem anastomose antes de
adentrarem o PI do baço.36
Em 2007, Paulo ICAL et al37 verificaram os
efeitos da oxigenoterapia hiperbárica (OHB)
(Figura 3) em 78 ratos Wistar submetidos ou
não à OHB. Os animais foram distribuídos em
três grupos: Grupo 1 (n=20) - manipulação do
baço; Grupo 2 (n=36) -implante esplênico
autógeno; Grupo 3 (n=22) - ESTPI. Cada grupo
foi dividido em dois subgrupos: a- não
submetidos à OHB (ntOHB); b- submetidos à
OHB (tOHB). Assim ficou: Grupo 1 subgrupo a
(n=10) - ntOHB; Grupo 1 subgrupo b (n=10) tOHB; Grupo 2 subgrupo a (n=21) - ntOHB;
Grupo 2 subgrupo b (n=15) - tOHB; Grupo 3
subgrupo a (n=13) - ntOHB; Grupo 3 subgrupo
b (n= 9) - tOHB. Coletaram o sangue para
dosagem de lípides, imunoglobulinas,
plaquetas, corpúsculos de Howell-Jolly no
pré-operatório e 11º PO. O baço e os
remanescentes foram retirados para estudo
histológico. Observaram que o número de
sobreviventes foi maior nos grupos 1 e 3 que
no 2a, que o colesterol total e a fração LDL
aumentaram (p<0.05) nos subgrupos 2a e 3a
e não alteraram nos subgrupos 2b e 3b, que a
IgM caiu mais no grupo 2 que no grupo 3
(p<0.05), que o aumento do número de
plaquetas e aparecimento dos corpúsculos de
Howell-Jolly foi menor nos subgrupos 2b que
no 2a, no grupo 3 que no grupo 2. Além disso,
o aspecto macro e microscópico foi mais
viável nos subgrupos 2b que no 2a, no grupo
3 que no grupo 2. Daí concluem que a função
e viabilidade do PI foi melhor que a dos
implantes esplênicos autógenos, que a OHB
contribuiu para aumentar a frequência de
sobrevida dos animais submetidos ao
autoimplante esplênico, melhorar a função e
viabilidade dos implantes esplênicos e função
do PI do baço, e que a OHB não interferiu no
grupo de cirurgia simulada sobre o baço.37
Em 2008, Paulo ICAL et al.,38 estudando os
efeitos da OHB, levantaram a hipótese de que
essa terapia poderia evitar a isquemia do PI
do baço e consequentemente melhorar a
viabilidade e função desse polo. Com isso,
estudaram
aspectos
morfológicos
e
funcionais do PI do baço de ratos submetidos
ou não à OHB. Utilizaram 79 ratos distribuídos
em dois grupos: Grupo A (n=40) - simulação;
Grupo B (n=39) - PI. Cada grupo foi dividido
em dois subgrupos: 11 e 70 dias. Cada
subgrupo foi dividido de acordo com o
tratamento com oxigênio hiperbárico: não
tratado (nt) - A11nt=10, B11 nt=13, A70nt
=10, B70 nt=9 e tratado (t) - A11t=10, B11t=9,
A70t=10, B70t=8. Foram dosados os lípides,
imunoglobulinas, contadas as plaquetas,
corpúsculos de Howell-Jolly no pré e pósoperatório. Após o término do experimento,
o baço e o PI foram retirados para histologia.
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Figura 3: Câmara hiperbárica (CHV- Vitória Montadora e distribuidora Ltda- Vitória-ES) com
formato cilindro capsular construída com aço carbono.
1- Entrada e saída da câmara; 2- Válvula para escape do oxigênio; 3- Termômetro; 4Manômetro; 5- Tubo para entrada de oxigênio no interior da câmara; 6- Visor para observação
dos animais no interior da câmara; 7- Tampa oclusora da câmara. A Câmara tem 27 cm de
largura, 51cm de comprimento e 1,5cm de espessura.
Houve aumento do colesterol total (p=0.002),
VLDL-colesterol e triglicérides (p=0.003) e
LDL-colesterol (p=0.013) no subgrupo B11nt e
não houve nos demais subgrupos. A IgM
diminuiu significativamente nos subgrupos
B11t, B11nt, B70nt e B70t e não sofreu
alterações no grupo simulação. A viabilidade
do PI do baço foi melhor nos subgrupos B11t
que no B11nt e não diferiu entre os subgrupos
B70t e B70nt. Os autores concluem que a
função e a viabilidade do PI melhoraram
tardiamente. Os animais submetidos à OHB
apresentaram melhor viabilidade e função do
PI do baço precocemente, mas não
tardiamente.38
Em 2008, Paulo DNS et al39 realizaram um
estudo para verificar se o PI do baço cresce
após esplenectomia subtotal, mesmo com a
ligadura dos vasos esplênicos principais. Eles
realizaram ESTPI em 39 ratos, peso
328,8±27,79g, distribuídos em dois grupos:
Grupo 1 (n=20) - controle, retirada imediata
do PI; Grupo 2 (n=19) - retirada do PI no 80º
dia PO. Foram medidos comprimento, largura
e espessura do PI do baço. O peso do PI no
grupo 1 foi avaliado de forma direta: pesado
em uma balança e o peso obtido foi dividido
pelo peso do baço. Daí calculou-se o
percentual de peso do PI. O peso do PI de
forma indireta foi calculado com base no peso
ideal do baço de acordo com a fórmula: 1,80
x peso corporal + 230,49 (obtido por análise
de regressão linear). Foram comparados os
dois métodos de pesagem e observou-se não
haver diferença entre a forma direta e a
indireta no que diz respeito ao percentual
médio. O grupo 2 apresentou um percentual
médio de peso do PI, por cálculo indireto,
maior que no grupo 1 (p<0.001). O
comprimento, largura e espessura do PI do
baço no grupo 2 aumentou do 1º para o 80º
dia (p<0.05). A análise histológica mostrou
sinais de hiperplasia celular. Daí os autores
concluírem que o PI mesmo com a ligadura
dos vasos esplênicos apresentou média de
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crescimento significativo no 80º dia PO e
sinais de hiperplasia celular.39
Em 2011, Silva JJ et al40 realizaram um estudo
com o objetivo de verificar a exequibilidade e
segurança da ESTPI por via laparoscópica e
para
determinar
a
viabilidade
do
remanescente esplênico. Utilizaram 20 ratos
machos, peso entre 365 e 474g, distribuídos
em dois grupos: Grupo 1 (n=10) - ratos mortos
no 10º dia PO; Grupo 2 (n=10) - ratos mortos
no 80º dia PO. O PI foi retirado para exame
histopatológico e a porção superior retirada
durante a primeira operação foi utilizada para
controle de viabilidade do baço. A técnica foi
exequível em todos os casos. Houve dois
óbitos no PO imediato de causa indefinida. O
peso médio percentual do PI avaliado
indiretamente no 10º dia foi de
53.67%±11.59% e no 80º dia foi de 62,69%
±6.89%. O PI apresentava necrose com
abscesso em um caso (5.9%) e aspecto
macroscópico normal nos outros casos. Os
achados microscópicos mostravam aspectos
compatíveis com a normalidade. Daí os
autores concluírem que a ESTPI por
laparoscopia é factível e segura, e que o
referido polo manteve-se viável em 94.1%
dos casos.40
Em 2011, Paulo MSL et al41 realizaram um
estudo com o objetivo de avaliar o efeito da
OHB na sobrevida e peso de ratos submetidos
à ESTPI e na viabilidade e crescimento do polo
inferior do baço. Quarenta ratos Wistar foram
submetidos à ESTPI e distribuídos em dois
grupos: Grupo A (n=20) - não tratados com
OHB; Grupo B (n=20) - tratados com OHB.
Esses grupos foram divididos em dois
subgrupos de 10 animais cada, de acordo com
a época de eutanásia: 15º e 45º dias. A
sobrevida e o peso dos animais foram
anotados. O PI foi medido, pesado e analisado
morfologicamente. Todos os animais
sobreviveram. O peso aumentou em todos os
subgrupos, porém diminuiu no 10º dia nos
subgrupos tratados com oxigênio hiperbárico
(p<0,001). A viabilidade do PI foi mais
evidente nos animais tratados no 15º dia,
porém não diferiu no 45º dia. O crescimento
do PI não ocorreu no 15º e sim no 45º dia PO,
nos animais não tratados (p<0,01) e tratados
(p<0,05). O aumento celular e vascular nos
animais tratados foi mais significativo do que
nos animais não tratados. Daí os autores
concluírem que a OHB não interferiu na
sobrevida dos animais, porém diminuiu o
peso. Melhorou a viabilidade do PI, mas não
interferiu no seu crescimento.41
Em 2013, Paulo MSL et al42 realizaram um
estudo para analisar a imunoexpressão do
PCNA do PI do baço de ratos. Para isso,
analisaram os fragmentos do PI de 20 ratos
Wistar submetidos à ESTPI. Os ratos foram
distribuídos em dois grupos: Grupo A (n=10) não submetidos à OHB; Grupo B (n=10) submetidos à OHB a 2,5 atmosfera por 120
minutos, duas vezes ao dia por três dias e uma
vez ao dia por sete dias. Os grupos foram
então subdivididos em quatro subgrupos: A15
(n=5) - mortos no 15º dia; A45 (n=5) - mortos
no 45º dia; B15 (n=5) - mortos no 15º dia; B45
(n=5) - mortos no 45º dia. Nesses dias foram
coletados fragmentos do polo inferior para
análise imuno-histoquímica no sentido de
avaliar a expressão de PCNA. Houve aumento
da expressão do PCNA no grupo B. No 45º dia
PO houve maior aumento da positividade do
PCNA que no 15º dia PO (p<0.01). Daí os
autores concluírem que a análise quantitativa
do PCNA sugere que a OHB aumenta a
proliferação celular contribuindo para a
regeneração esplênica.42
Em 2014, Borjailli AS et al43 realizaram um
estudo para investigar se havia diferenças
entre a função fagocitária do PI
remanescente da esplenectomia subtotal e a
função fagocitária de autoimplante esplênico
autógeno. Utilizaram 36 ratos Wistar,
pesando 364 ± 60g. Os animais foram
submetidos à ESTPI e ao autoimplante
esplênico autógeno no omento maior. A
viabilidade foi avaliada microscopicamente e
a função fagocitária foi avaliada pela captação
de radioisótopo coloidal e pela contagem de
macrófagos. A viabilidade dos implantes
esplênicos autógenos e do PI do baço foi
observada em 33 animais sem diferença entre
eles. O peso dos implantes esplênicos
autógenos foi maior que o do PI nos animais
do grupo G1(mortos e analisados no 1º dia
PO), grupo G7 (mortos e analisados no 7º dia
PO), grupo G30 (mortos e analisados no 30º
dia PO), grupo G60 (mortos e analisados no
60º dia PO) e grupo G120 (mortos e
analisados no 120º dia PO). A função dos
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implantes esplênicos autógenos, avaliada
pela captação do radioisótopo, foi maior que
a do PI nos grupos G7 e G120 e não diferiu
entre os demais grupos. O número de
macrófagos foi maior nos grupos G1, G60,
G90 e G120 e não diferiu entre os outros
grupos. Os autores concluem que até a 16ª
semana a função fagocitária foi mais
pronunciada nos implantes esplênicos
autógenos que no PI, mas se tornou similares
após esse período.43
Discussão
O baço foi considerado um órgão sem
importância e a sua retirada não trazia
maiores problemas.1-5 Porém, foram
relatadas infecções pós-esplenectomias em
seres humanos, alertando os cirurgiões.6,7,8
Essas infecções ocorreram inclusive em
animais de experimentação.9-12 Desde então,
têm sido adotadas cirurgias conservadoras
sobre o baço.5,22-32 Além disso, têm sido
relatadas, após a esplenectomia total,
alterações no metabolismo lipídico em seres
humanos13-15 e em animais de laboratório.16-21
A ESTPI33 é uma alternativa cirúrgica de
preservação do baço, que poderia ser
utilizada em situações eletivas e urgentes.
Assim no trauma esplênico, quando o PI é
viável, ele pode ser preservado. Da mesma
forma na Doença de Gaucher, na metaplasia
mieloide, na hipertensão porta e em outras
doenças, onde é possível preservar
parênquima esplênico, esse remanescente
pode ser conservado a fim de manter uma
função esplênica.
Os trabalhos mostram que a retirada do baço
em cães e ratos provoca aumento do
colesterol e mostram, também, que a
preservação do PI impede este aumento.18,20
Na tentativa de explicar o mecanismo pelo
qual o baço interfere no metabolismo lipídico,
Caligiuri et al44 sugeriram a participação do
sistema imunológico mediado por linfócitos B
no controle do LDL colesterol. Os linfócitos B
seriam capazes de produzir anticorpos contra
o LDL-colesterol-oxidado, e o complexo LDLcolesterol-oxidado mais o anticorpo seriam
captados por receptores dos macrófagos do
baço. Daí ocorreria a fagocitose com
destruição do complexo tanto no nível local,
nas placas de ateroma, quanto no nível
sistêmico, no baço. A esplenectomia total
levaria a um desequilíbrio na captação do
complexo antígeno-anticorpo. Isso explicaria
o aumento da LDL encontrado em animais
esplenectomizados. O aumento dos níveis de
triglicérides e a queda dos níveis de HDL se
devem provavelmente ao tipo de dieta
utilizada. Em nosso trabalho, os animais que
se alimentaram de dieta com 2,5% de
colesterol tiveram aumento significativo dos
triglicérides, LDL e VLDL e queda da HDL no
grupo simulado. No grupo da ET houve
aumento da LDL independentemente da
dieta.20 Porém, em um estudo realizado em
camundongo Balb/c, a retirada do baço não
provocou aumento do colesterol. Os autores
atribuem este resultado ao fato de que o
metabolismo lipídico no camundongo é
diferente.45
Estes
resultados
foram
confirmados por um estudo realizado no
laboratório do Centro de Pesquisa da
Emescam, que está aguardando publicação. O
trabalho mostra que a retirada do baço de
camundongos Balb/c, de fato, não alterou os
níveis de colesterol.
O PI do baço, conforme foi relatado, cresce
com o tempo. Cumpre destacar que esse
crescimento do PI foi observado entre o dia
da cirurgia e o 80º dia PO por meio da
avaliação
do
comprimento,
largura,
espessura e peso desse polo.39 Um estudo
que avalia esse polo no 45º dia não confirma
o crescimento nesse período mesmo sob a
influência da OHB.41 Aí podemos admitir que
o crescimento significativo desse polo ocorra
em período além de 45 dias. Este estudo41
mostrou que a OHB não interferiu na
sobrevida dos animais submetidos à ESTPI,
porém diminuiu o peso e melhorou a
viabilidade do PI do baço. Porém, outro
estudo mostrou que a OHB aumentou a
sobrevida de animais submetidos ao implante
esplênico autógeno.37 Os animais submetidos
à OHB apresentaram melhor viabilidade e
função do PI precocemente, mas não
tardiamente.38
Há um estudo desta linha de pesquisa que
mostra que a ESTPI pode ser realizada por
laparoscopia com bons resultados. Este
estudo mostrou que o PI permaneceu viável
na maioria dos casos.40
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Os estudos com análise da expressão do
PCNA do PI do baço de ratos submetidos à
OHB mostram que essa terapia contribui para
aumentar esse antígeno. Isso sugere que a
OHB contribui com a proliferação celular
responsável pelo crescimento do PI.42 Este
resultado vai ao encontro do estudo relatado
anteriormente.39
Um estudo mais recente que compara a
função fagocitária dos implantes esplênicos
autógenos com a função fagocitária do PI
mostra que mais precocemente a função dos
implantes foi mais eficaz. No entanto, após
seis semanas as funções se equivalem.
Cumpre lembrar que a massa de tecido
esplênico implantado neste trabalho foi
significativamente maior que a massa do PI.43
Este fato poderia justificar em parte os
resultados. Portanto, estudos que comparam
massas similares de implantes esplênicos
autógenos e PI poderiam dar uma luz à
questão, bem como outras técnicas de
avaliação da função fagocitária.
Um estudo, ainda não publicado, procurou
verificar se havia diferença na vitalidade do
polo inferior do baço quando se seccionava
ou não a membrana peritoneal que une esse
polo ao estômago, e quando se fixava o polo
ao estômago. O resultado deste estudo
mostrou que não havia diferença da
vitalidade do polo inferior entre os grupos.
Faltam ainda estudos clínicos para comprovar
a real eficácia e segurança da ESTPI.
Informação obtida por meio de cirurgiões que
militam na urgência dá conta que o polo
inferior foi preservado em um caso de
traumatismo esplênico, uma vez que o
referido polo recebia uma nutrição de uma
polar inferior. Há outro relato de que o PI foi
preservado em um caso de volumoso cisto
esplênico que comprometia a porção média e
superior do baço. Outra informação pessoal
da conta de que o PI teria sido preservado em
um caso de leucemia linfocítica crônica.
Os estudos sobre a linha de pesquisa do polo
inferior do baço prosseguem, havendo dois
projetos de pesquisa de tese de doutorado
para serem iniciados em 2015.
Referências
1- Babcock GF, Amoscato AA, Nishioda K.
Effect of tuftsin on the migration, chemotaxis,
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