- Laprev - Universidade Federal de São Carlos
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OS ALUNOS VÍTIMAS E AUTORES DA VIOLÊNCIA ESCOLAR E A RESPONSABILIDADE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL 1 STUDENTS VICTIMS AND AGGRESSORS IN SCHOOL VIOLENCE AND THE RESPONSIBILITY OF SPECIAL EDUCATION Ana Carina Stelko Pereira** Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams*** Resumo A violência na escola é uma preocupação brasileira e existem características em comum entre alunos agressivos e entre alunos vítimas. Conhecê-las é necessário para planejar intervenções e avaliar a responsabilidade da Educação Especial com o assunto. Para tanto, fez-se uma revisão em duas bases científicas internacionais, entre os anos de 1997 a 2007. Algumas descrições dos estudos em relação às vítimas são: a)garotos são mais vitimados do que garotas, b)alunos mais novos estão expostos a maior vitimização, c)escolas localizadas em comunidades com baixo status sócio-econômico ou escolas com uma grande proporção de alunos com famílias de baixa renda apresentam maior chance de serem vítimas de séria violência física, d)estudantes com comportamentos de isolamento, pouco populares, inseguros ou que mudam muito de residências e, como conseqüência, de escolas, tende a ser vítimas. Algumas das descrições em relação aos agressores são: a)meninos são mais agressivos que meninas, b)crianças agressivas têm diversas funções cognitivas deficitárias, c) alunos agressores possuem uma grande chance de já terem sido ou serem rejeitados por seus pares e terem amigos que possuem o mesmo padrão de comportamento, d) meninos agressivos na escola tendem a vivenciar violência doméstica em maior freqüência e grau de severidade do que os não agressivos. Esses alunos freqüentemente possuem relações interpessoais comprometidas, rendimento acadêmico limitado em relação ao seu potencial e poucas opções futuras de ocupações. Assim, a educação especial tem responsabilidade para com esses alunos e deve auxiliar na aprendizagem de conteúdos acadêmicos e de habilidades de interação social, criando propostas pedagógicas específicas. Palavras-chave: alunos, violência escolar; Educação Especial; deficiências. Abstract School violence is a serious Brazilian concern, and there are similar characteristics among aggressive and victimized students. Knowledge of these aspects is necessary to plan interventions and to evaluate the Special Education responsibility for such students. With this purpose in mind, a literature review was conducted in two international research database for the 1997 – 2007 period. Some results involving descriptions of the victims were: a) boys are more victimized than girls, b) younger students are more exposed to victimization, c) low socioeconomic status of the school’s neighborhood or large proportion of students whose families have low socioeconomic status present a larger chance of school is serious physical victmization, d) students who are socially isolated, unpopular, insecure or who have moved many times are more likely to be victimized. Some descriptions of the aggressors are: a) boys were found to be more frequently perpetrators than girls, b) aggressive children have many cognitive function deficits, c) students who inflict aggressive behavior, in peers, usually were rejected by such peers, and often have similarly aggressive friends, d) school aggressive boys commonly are exposed to more severe and frequent domestic violence than non-aggressive boys. These students usually have compromised their interpersonal relationships and, low academic results, as well as limited future occupational options. For all these reasons, Special Education has a responsibility for these students, and must support their learning of academic contents, and of social interaction abilities. In addition, specific pedagogic proposals are necessary. 1 * * Esse trabalho foi derivado da disciplina “Educação Especial no Brasil”, ministrada pela Profª Drª Maria Cristina Piumbato Innocentini Hayashi, do Programa de Pós-Gradução em Educação Especial. * Psicóloga e Mestranda em Educação Especial pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Bolsista mestrado do CNPQ. ** Doutora em Psicologia Experimental (USP), Mestre em Psicologia (Universidade de Manitoba, Canadá), Professora Titular do Departamento de Psicologia da UFSCAR e Coordenadora do Laboratório de Análise e Prevenção da Violência (LAPREV). Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p.79-90, jan./abr. 2008. Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial 80 Key words: students, school violence; Special Education; disabilities. INTRODUÇÃO A violência nas escolas é considerada um problema em muitos países, mesmo quando esses apresentam características econômicas e culturais diferentes. Pode-se citar, por exemplo, pesquisas nos Estados Unidos (DINKES, R., CATALDI, E.F., KENA, G., e BAUM, K., 2006), no Japão (HAYES e KAMEGUCHI, 2005), na África do Sul (BILITY, 1999), no Canadá (CARTER e STEWIN, 1999), na China (WONG, 2004), em Israel (KHOURYKASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004), na Turquia (SÜMER e AYDIN, 1999), na Jamaica (SACCO e TWEMLOW, 1997) e no Brasil (ABRAMOVAY, M. e RUA, M. das G., 2002). Um estudo importante sobre a situação da violência escolar no Brasil é a pesquisa da UNESCO (2005), a qual realizou uma investigação quantitativa (aplicação de questionários a alunos e professores) e qualitativa (realização de grupos focais com alunos, entrevistas individuais com professores, policiais, inspetores e pais) em Salvador, Porto Alegre, São Paulo, Belém, e Rio de Janeiro, ainda que nessa última capital o estudo tenha sido apenas qualitativo. Dessa investigação participaram 9744 alunos e 1768 adultos (professores, diretores, inspetores, policiais). Nessa pesquisa (UNESCO, 2005) os alunos afirmaram que existem situações de ameaças entre os pares, seja ameaça de violência física, de destruição de bens alheios, de morte; 30% mencionaram ter conhecimento de ameaças existentes na escola e 14% dos estudantes disseram já ter sido vítima de ameaça. Os alunos que disseram terem apanhado na escola foram 4,8% e que afirmaram terem batido em alguém foram 19,8%. A diferença entre os que bateram e os que apanharam é devido, provavelmente, segundo UNESCO (2005), ao fato de que socialmente se configura que “é honroso bater, enquanto apanhar seria assumir o papel do mais fraco”. Segundo o depoimento dos alunos, caracteriza-se como agressão física de aluno contra aluno: “bater na cabeça, puxar cabelo, dar coque, machucar gravemente, ferir, chutar, dar paulada, furar aluno com faca, dar socos e pontapés, etc”. Sobre o desrespeito à propriedade de outros, 69,4% dos alunos afirmou existir furtos na escola (UNESCO, 2005). Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. Ainda na pesquisa da UNESCO (2005), 1,9% dos professores afirmaram ter sido xingados todos os dias do ano, 7,9% relataram que foram insultados frequentemente, e 37,3% ocasionalmente. Quanto aos professores, muitos confirmaram que já receberam ameaças “duras” (de morte, de apanharem, de terem seus carros danificados), sendo que essas geralmente ocorriam nas seguintes situações, na opinião dos educadores: quando os alunos tiravam notas baixas, quando reprovavam, quando os alunos perdiam o prazo de entrega de um trabalho e quando se exigia o uso do uniforme. Além disso, 9% dos professores afirmaram já ter sido ameaçados e/ou xingados e/ou agredidos por pais de alunos (UNESCO, 2005). Apesar dessa situação alarmante, é animador constatar que nem todos os alunos apresentam comportamentos agressivos e nem todos se declaram vítimas. Ter um maior conhecimento das características em comum entre os agressores e entre as vítimas é fundamental para se intervir de modo adequado. Muitas pesquisas internacionais caracterizam os alunos que comumente são agressores e vítimas na escola, porém no Brasil são poucas as investigações a esse respeito. Revisar pesquisas de outros países pode servir como um subsídio para futuras pesquisas brasileiras e, também, pode estimular discussão a respeito da necessidade de inclusão desses indivíduos (alunos agressores e vítimas) no contexto da Educação Especial, a fim de que tenham as suas necessidades garantidas. Portanto, o objetivo do presente trabalho consiste em revisar o que a literatura científica internacional da última década aponta como as características mais freqüentes de vítimas e agressores na violência que ocorre em contexto escolar e discutir a importância de que esses alunos sejam considerados no contexto da Educação Especial. Para tanto, foi realizada uma busca de textos publicados entre 1997 a julho de 2007 na base de dados Sage e Springer Link. Na primeira, a procura de textos foi por meio das palavras “school and violence” restritas as palavras-chave (keywords) dos artigos, já na segunda base de dados, também, foram utilizadas as palavras “school and violence”, porém restringiu-se a busca ao título dos artigos. Tal diferença na forma de busca foi necessária, porque na base de dados Springer Link PEREIRA; WILLIAMS não é possível fazer busca com base nas palavraschave. Em seguida, foram lidos os títulos e resumos dos artigos apresentados selecionados aqueles que buscassem descrever a relação entre ser estudante vítima ou agressor da violência escolar com outras variáveis. Assim, por exemplo, foram excluídos estudos que apenas aludissem à violência doméstica vivenciada por alunos sem investigar a relação com a violência escolar, artigos que discutissem como avaliar violência escolar sem apresentar resultados de caracterização dos alunos vítimas e agressores, que explicitassem intervenções preventivas sem investigar as características de alunos agressores e vítimas e que se restringissem apenas à violência sexual que ocorre nas escolas. Portanto, de 68 artigos encontrados, foram mantidos no estudo 23 artigos. Além desses textos, utilizaram-se outros pertinentes ao assunto, de conhecimento dos autores, sendo que muitos desses foram derivados de estudos do Laboratório de Prevenção a Violência (LAPREV). OS ALUNOS VÍTIMAS DA VIOLÊNCIA ESCOLAR Características demográficas como gênero, etnia, idade e status-sócio econômico se relacionam à vitimação do aluno. O gênero do estudante influencia na possibilidade de ele ser vitimado, sendo que homens são mais vitimados do que mulheres (WARNER, WEIST e KRULAK, 1999; KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004) e escolas com maior proporção de garotos por garotas tem mais possibilidade de serem violentas (KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004). Contudo, em relação a ser vítima de furtos não há diferenças significativas entre alunos e alunas (SCHRECK, MILLER e GILBSON, 2003). Outro fator importante é a etnia do aluno. Segundo a revisão de estudos de Warner, Weist e Krulak (1999) a minoria étnica na escola tendem a ser vitimada pela maioria étnica. Schreck, Miller e Gilbson (2003) citam Kaufman, Chen, Choy, Ruddy, Miller e Chandler et al. (1999) os quais ressaltam que alunos negros tendem a ser vítimas. Porém, vale notar que a violência também ocorre entre estudantes de mesma etnia e gênero. Alunos mais jovens estão expostos à maior vitimização do que estudantes mais velhos (KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, 81 ASTOR e ZEIRA, 2004). Smith, Madsen e Moody (1999) citados por Khoury-Kassabri, Benbenishty, Astor e Zeira (2004) apresentam como hipóteses explicativas para esse fato: a) crianças mais novas têm maior número de alunos mais velhos do que elas, os quais estão em posição favorável para vitimá-las, b) crianças mais novas ainda não foram socializadas em relação ao entendimento de que não se deve violentar outros e c) crianças mais novas não adquiriram habilidades sociais e de assertividade para lidarem efetivamente com incidentes de bully (intimidação física ou/e psicológica ou/e sexual que ocorre de modo freqüente e repetitiva entre colegas ou pares na escola) e para desencorajarem outras situações de bully. Pode-se também considerar a hipótese de que alunos mais velhos são mais fortes fisicamente, tendo mais condições para agredir de modo físico a outros alunos. Segundo Khoury-Kassabri, Benbenishty, Astor e Zeira (2004), há indicativo de que alunos de escolas localizadas em comunidades com baixo status sócio-econômico ou de escolas com uma grande proporção de alunos com famílias com poucas condições sócio-econômicas apresentam maior chance de serem vítimas de séria violência física do que aqueles que estudam em escolas sem essas condições. Contudo, esses autores também apontam que essa constatação não pode ser generalizada para qualquer tipo de vitimação, já que há níveis mais altos de vitimação do tipo verbal e por exclusão social descritos por alunos em escolas localizadas em comunidades de maior nível sócioeconômico e em comunidades mais abastadas sócioeconomicamente. Possíveis explicações, de acordo com os mesmos autores, são: estudantes de escolas em regiões mais ricas e com alunos de famílias mais ricas podem ser mais sensíveis ao abuso verbal ou alunos de escolas em regiões carentes e com alunos de famílias em maior desvantagem podem ser mais tolerantes em relação a comportamento de abuso verbal, devido a um controle mais informal e menores sanções em relação a tais comportamentos pela família e vizinhança desses alunos. Características comportamentais também se relacionam a possibilidade de vitimação. Estudantes com comportamentos de isolamento, pouco populares, inseguros ou que mudam muito de residências e, como conseqüência, de escolas, tendem a ser vítimas (WARNER, WEIST e KRULAK, 1999). Schreck, Miller e Gilbson (2003) afirmam que os alunos reduzem o risco de ser vítimas quando aumentam a quantidade de pessoas Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial protetoras (por exemplo, amigos e professores de confiança) ao redor deles e de seus pertences. Os autores (SCHRECK, MILLER e GILBSON, 2003) também, afirmam que os alunos comprometidos com a escola e cientes que os funcionários dessa têm senso de justiça e eficiência em relação à disciplina tende a vivenciar menos violência. O fato de não acreditar nos funcionários enquanto protetores e justos sugere que esses alunos tendem a não buscar ajuda, pois esses funcionários seriam incapazes de garantir-lhes segurança. Os alunos que participam mais de atividades extracurriculares tendem a ser menos vitimizados e a usar menos drogas do que os alunos que participam menos dessas atividades (REID, PETERSON, HUGHEY e GARCIA-REID, 2006). As relações com o grupo de pares estão associadas com a possibilidade de vitimização. Alunos com amigos infratores são vulneráveis à violência. Isso ocorre porque um grupo de alunos com comportamentos anti-sociais tende a brigar com outros grupos de infratores e um aluno no grupo, quando não concorda com as atitudes de outros do seu grupo, pode sofrer retaliações. Assim, a violência comumente ocorre entre grupos e no grupo de pares (REESE, VERA, SIMON e IKEDA, 2000). Adicionalmente há características da escola em que esse aluno vítima estuda. Khoury-Kassabri, Benbenishty, Astor e Zeira (2004) perceberam que alunos que estudam em salas de aula super lotadas descrevem maior grau de vitimação, contudo não encontraram relação significativa entre violência e número de alunos na escola. Tal contradição, possivelmente, se refere, de acordo com os autores, ao fato de que existem outras variáveis que se relacionam com o número total de estudantes, como por exemplo, a proporção de professores por alunos. Em uma mesma perspectiva, Schreck, Miller e Gibson (2003) citam estudos (GOTTFREDSON e GOTTFREDSON, 1985; WELSH, STROKES e GREENE, 2000) que afirmam que apesar de o grande número de alunos em uma escola associar-se a conseqüências negativas, tais como maior desordem, medo de crimes e vitimação de professores, o nível de violência contra estudantes não parece ser afetado. Outro fator de importância percebido pelos autores (KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004) é que o “clima” escolar se correlaciona com o nível de vitimação na escola. Entende-se por clima escolar a cultura da escola, na qual crenças, valores, atitudes, ainda que não Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. 82 formais e escritas, caracterizam o estilo da interação entre alunos, professores e administradores (WALKER e GRESHAM, 1997). Assim, escolas com regras claras, consistentes e justas, nas quais as relações entre professores e alunos são percebidas como positivas, vivenciam menos violência. Até mesmo, o “clima” escolar explica bastante as diferenças na vitimação entre escolas em um mesmo bairro (KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004). Em uma mesma perspectiva, Reid, Peterson, Hughey e Garcia-Reid (2006) perceberam que os alunos que afirmam pouco garantia de que a escola faz cumprir as suas normas tendem a vivenciar violência com mais freqüência, avaliar as normas sociais contra o uso de drogas como de pouca significância e usar mais drogas dos que os alunos que percebem que a escola faz cumprir as suas normas. Warner, Weist e Krulak (1999) apontam que o currículo escolar deve ser consistente com os interesses e necessidades do aluno, sendo que o nível de violência é maior em escolas em que as atividades não se relacionam aos valores e vontade dos alunos e que não permitem que os alunos opinem sobre as situações escolares. Existir locais da escola ou ao redor dessa em que os alunos estejam desprotegidos, sem supervisão de professores ou funcionários, afeta diretamente o uso de drogas e o bullying verbal (xingamentos, ofensas, etc). Assim, alunos que assinalam existir mais locais inseguros na escola e perto dela tendem a vivenciar mais violência verbal e a utilizar drogas mais vezes (REID, PETERSON, HUGHEY e GARCIA-REID, 2006). A existência de gangues na escola, também, é um indicativo de violência (DEVOE, PETER, KAUFMAN, RUDDY, MILLER, PLANTY, 2003, citados por CULLEY, CONKLING, EMSHOFF, BLAKELY E GORMAN, 2006). A vitimização por violência pode ser de modo direto ou indireto e ambas as formas se relacionam com diversos fatores de risco à saúde. O modo direto é o qual alguém usa de violência física, psicológica ou sexual para com uma pessoa e o modo indireto é aquele em que um indivíduo, sem ser propriamente o alvo da violência, sofre conseqüências negativas ao assistir, escutar ou saber de outros sendo agredidos e/ou conhecer os efeitos que a violência teve em uma outra pessoa - ver no caso de exposição à violência conjugal Brancalhone e Williams (2003). Comportamentos tais como abuso de substâncias, atividade sexual de risco, dirigir alcoolizado, deixar-se guiar por motorista PEREIRA; WILLIAMS alcoolizado e envolvimento em brigas estão comumente inter-relacionados e Jessor (1992) citado por Albus, Weist e Perez-Smith (2004), inclusive denomina tais atitudes como Síndrome de Comportamento de Risco na adolescência. Porém, Albus, Weist e Perez-Smith (2004) afirmam existir diferenças nessas inter-relações de acordo com o tipo de violência a que o sujeito foi exposto. O uso de álcool e drogas se associa a conhecer muitas pessoas que já foram vítimas de violência e observar pessoas vitimizadas por violência, contudo não se relaciona significativamente em ser vítima de violência. Assim, os resultados do estudo de Albus, Weist e Perez-Smith (2004), apontam que o uso de drogas se associa mais com a exposição à violência indireta, enquanto observador e por conhecimento de histórias de pessoas vítimas. Os comportamentos sexuais de risco estão mais associados ao conhecimento de situações de violência e em ter sido vítima, mas não se associa em ter observado violência. Os comportamentos de agressividade se associam em ter testemunhado violência e ter sofrido de violência. Os autores também ressaltam que os alunos que presenciam situações de violência, ainda que não tenham sido os agressores, nem propriamente as vítimas, também sofrem efeitos nocivos relacionados à violência e intervenções de enfrentamento da violência devem incluí-los enquanto público-alvo. Por fim, as vítimas freqüentes de violência podem esconder os seus sentimentos de professores e colegas de turma, porém a situação pode ser grave de modo que se desenvolvam problemas acadêmicos, depressão, isolamento social, aversão à escola e outros problemas psicológicos (CRICK e GROTPETER, 1996, KOCHENDERFER e LADD, 1996, SLEE, 1995 citados por COLVIN, TOBIN, BEARD, HAGAN e SPRAGUE, 1998; WARNER, WEIST e KRULAK, 1999). Os alunos autores da violência escolar Existem fatores do indivíduo (gênero, história pré-natal, distúrbios psiquiátricos, funções cognitivas deficitárias, valores morais, crenças ou “julgamentos”, fatores da família, do grupo de pares, da comunidade na qual o aluno reside e da escola que podem predizer comportamentos de agressividade. É importante notar que esses se combinam em múltiplas graduações, não sendo um único fator exclusivo para o desenvolvimento de comportamentos violentos. 83 Há diferenças de acordo com o gênero e história pré-natal. Meninos são mais agressivos do que meninas (MALDONADO e WILLIAMS, 2005; PINHEIRO, 2006; WELSH, 2003), também percebem mais a violência como solução para problemas e condenam menos o seu uso (ARTZ e RIECKEN, 1997). Há evidências de que a Síndrome Alcoólica Fetal e os efeitos do álcool durante o desenvolvimento do feto - mesmo quando não preenchem critérios para a síndrome - podem gerar impulsividade, baixa tolerância à frustração, déficit de atenção e dificuldades de aprendizagem (RIGONI e SWENSON, 2000). Indica-se para o aprofundamento do tema, Gallo (2006). Carter e Stewin (1999) frisam ser necessário realizar uma “avaliação psicopatológica” dos alunos que apresentam comportamentos violentos, pois esses podem apresentar comportamentos semelhantes por motivos diversos. Os autores citam o estudo de Carter (1998) que revela que há estudantes com comportamentos violentos e depressão, alunos com comportamentos violentos e Transtorno de Déficit de Atenção e estudantes com comportamentos violentos e dificuldades de aprendizagem. Segundo Carter e Stewin (1999) é importante que se faça intervenções respeitando as diferenças percebidas na avaliação psicopatológica. Destacam, também, que nem todos os alunos que cometem atos violentos preenchem critérios psiquiátricos, pois a ocorrência desses também depende de questões culturais, situacionais e das características da vítima. Na perspectiva social-cognitiva, afirma-se que crianças agressivas têm diversas funções cognitivas deficitárias. Tais crianças têm dificuldades em interpretar de forma acurada o comportamento dos outros, geralmente os interpretam como hostis, possuindo dificuldades em empregar estratégias não agressivas de resolução de problemas e em acreditar que a agressão seja inapropriada e ineficaz (BOXER, GOLDSTEIN, MUSHER-EIZENMAN, DUBOW E HERETICK, 2005). De modo semelhante, Guerra (2003) expõe fatores para o não desenvolvimento de condutas agressivas: habilidade de monitorar e regular emoções, sentimentos e impulsos, capacidade empática, possibilidade de lidar com problemas interpessoais, desenvolvimento saudável da identidade, perspectiva de futuro e habilidade de se engajar em relações positivas com pares. Um estudo (ZHANG, LOEBER e STHOUTHAMER-LOUBER, 1997) verificou qual a relação entre ter comportamentos violentos e o Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial juízo quanto às quais atitudes são certas e erradas. Os participantes da pesquisa eram meninos os quais foram acompanhados durante 4 anos, sendo inicialmente selecionados de três séries diferentes (séries 1, 4 e 7 do sistema público escolar de Pittsburg, EUA), assim o período do ciclo de vida pesquisado foi dos 7 aos 16 anos. O juízo acerca do que era certo e errado tem menor capacidade de predizer o comportamento violento do que o comportamento violento predizer o juízo quando se está entre 7 a 10 anos de idade. Porém, dos 10 aos 12 anos de idade ocorre uma inversão, sendo que o juízo prediz duas vezes mais o comportamento violento do que o comportamento violento prediz o juízo de certo e errado. Subsequentemente, dos 13 aos 16 anos, o comportamento violento tem a mesma magnitude de predizer o juízo que o juízo predizer o comportamento. Lier, Vitaro e Eisner (2007) fazem uma revisão sobre qual é a importância dos pares para o desenvolvimento de comportamentos agressivos em escolares. Colegas podem influenciar o desenvolvimento de condutas agressivas de duas maneiras: rejeitando e/ou vitimizando seus pares e estimulando e dando suporte a comportamentos agressivos por parte do colega. Os alunos rejeitados ou vitimizados, muitas vezes, podem apresentar comportamentos agressivos e, por isso, são excluídos por colegas. Tal exclusão pode retirar do aluno a possibilidade de aprender habilidades sociais, o que dificultará, também, relacionamentos sociais com outros colegas no futuro. Além disso, a relação entre a criança rejeitada e seus pares gera trocas coercitivas mútuas, o que pode manter ou aumentar a agressividade da criança. Porém, a criança rejeitada não tende a permanecer sem amigos, afiliando-se com outros estudantes rejeitados, os quais possivelmente, também, se comportam de modo violento e acabam por estimular comportamentos agressivos. Portanto, os alunos agressores possuem uma grande chance de já terem sido ou serem rejeitados por seus pares e terem amigos que possuem o mesmo padrão de comportamento. Uma outra importante influência por parte dos amigos é que esses podem facilitar o acesso a armas de fogo, o envolvimento em uso de drogas e tráfico de drogas e o ingresso em gangues. Padovani e Williams (2005) fizeram um estudo com adolescentes infratores e perceberam que os amigos podem punir comportamentos de evitação de brigas, resolver brigas por meio de agressões físicas em conjunto e colaborar no planejamento e na realização de assaltos. Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. 84 Stueve, Dash, O’Donell, Tehranifar, WilsonSimmons, Slaby e Link (2006) estudaram a relação entre papel dos alunos enquanto observadores de agressões e/ou com conhecimento de situações futuras de agressividade e o desenvolvimento de comportamentos violentos. Os autores afirmam que pesquisas sobre bullying e agressões físicas apontam que alunos simpatizantes de estudantes agressores podem estimular a violência quando previnem que outras pessoas separem alunos que brigam, quando encorajam a continuação da agressão (por exemplo, gritando: “Isso aí! Bata mais!”), ou quando servem como cúmplices e coagressores. No entanto, também há os alunos que devido à passividade influenciam no aumento do comportamento agressivo de outro aluno. Isso ocorre porque a presença desses alunos pode ser uma mensagem para o agressor de que ele tem que se mostrar superior, forte e defender sua honra e também porque pode permitir a concepção de que o comportamento agressivo é aceitável. Deve-se perceber que, também, pode existir uma influencia positiva dos pares como quando eles tentam separar colegas que se agridem, quando defendem a vítima, quando dizem para colegas ignorarem provocações e ao confidenciar a adultos situações de agressões. Além dos pares, a família também possui um importante papel no desenvolvimento de comportamentos agressivos e não agressivos. Batsche e Knoff (1994) mencionados por Williams (2004) apontam que alunos agressivos são geralmente oriundos de famílias em que: a) os pais preferem o uso de violência física como forma de disciplina, b) são por vezes hostis e rejeitam a criança, c) são também permissivos, sendo inconsistentes e oferecendo pouca supervisão, d) têm pouca habilidade para solucionar problemas e e) ensinam seus filhos a revidar ante a mínima provocação. Em uma mesma direção, Maldonado e Williams (2005) perceberam que meninos agressivos na escola tendem a vivenciar violência doméstica em maior freqüência e grau de severidade do que os não agressivos. Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000) incluem circunstâncias que podem produzir efeitos negativos na educação realizada pelos pais, tais como conflitos entre eles, ser usuário de drogas, estar desempregado, estar com dívidas, ter carência de suporte social. Rigoni e Swenson (2000) adicionam luto mal resolvido, conflito familiar intenso, divórcio, pais que tem deficiência mental ou desordens emocionais e que assim estão frequentemente preocupados com os próprios problemas sendo negligentes ou PEREIRA; WILLIAMS maltratando o filho. Portanto, essas situações estressantes geralmente tornam os pais pouco disponíveis positivamente aos filhos. Artz e Riecken (1997) perceberam que os comportamentos do pai e da mãe têm efeitos diferentes nos filhos. O suporte do pai a comportamentos pró-sociais se correlaciona positivamente com o filho (a) ter valores pró-sociais, sendo que não há relação significativa quando há o suporte pela mãe. Porém, percebeu-se que o fato da mãe ter sido vítima de bullying quando criança se relaciona com a importância que o filho (a) concede a valores prósociais. Para uma discussão mais aprofundada sobre influências paternas no desenvolvimento infantil, sugere-se Cia, Williams e Aielo (2005). Thompson e Massat (2005) apontam que a exposição a eventos violentos acarreta problemas de comportamento, rendimento acadêmico reduzido e distúrbio de estresse pós-traumático. Esse distúrbio se caracteriza por: a) experiência contínua do evento traumático, como pesadelos, angústia emocional intensa diante da exposição a elementos evocativos do trauma, b) esquiva persistente de estímulos associados ao trauma e entorpecimento da reatividade geral (por exemplo, evitação de lembranças do trauma, redução acentuada do interesse ou participação em atividades significativas, afastamento em relação a outras pessoas, e c) excitação aumentada (distúrbio do sono, irritabilidade, surtos de raiva, problemas de concentração, hipervigilância, reação de susto exagerada). Na revisão de literatura de Brancalhone e Williams (2003), aponta-se ser comum que crianças expostas à violência conjugal desenvolvam problemas de saúde física, ansiedade, percepções negativas de si mesmas, agressividade, dificuldades de aprendizagem. Infelizmente, os alunos agressivos, muitos dos quais vivenciam situações de violência familiar e em sua comunidade, tendem a reproduzir a violência quando adultos. Segundo Colvin, Tobin, Beard, Hagan e Sprague (1998) várias pesquisas demonstraram que crianças que apresentam comportamentos de bullying para com os outros, comumente, quando adultos apresentam comportamentos de violência doméstica, de violência contra criança, de abuso sexual e outros crimes com o uso de violência. Esses autores (COLVIN, TOBIN, BEARD, HAGAN E SPRAGUE, 1998) citam Olweus (1991) o qual afirma que alunos com oito anos identificados por colegas como autor de bullying têm seis vezes mais chance de ter registros de sérios crimes em ficha 85 policial aos trinta anos do que os estudantes que não foram identificados enquanto autor de bullying. Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000), também, afirmam que estudos longitudinais apontam que comportamentos agressivos e/ou anti-sociais na infância estão fortemente associados ao envolvimento futuro em comportamentos violentos. Peacock, McClure e Agars (2003) fizeram uma pesquisa sobre os fatores que predizem atos violentos, pensamentos violentos, abuso de substâncias e atitudes contrárias à norma, como cabular aulas. Os autores apontam que a exposição à violência na comunidade deve ser mais estudada. No caso, os autores investigaram tal aspecto com perguntas sobre se os alunos já haviam presenciado ou tido conhecimento de pessoas assassinadas, esfaqueadas, atingidas com tiros e se a pessoa que sofreu a agressão era um familiar, amigos ou estranhos. Percebeu-se que ter sido exposto à violência na comunidade é um importante fator de risco, até mesmo quando há uma relação de apego entre o adolescente e seus pais e um relacionamento saudável entre o adolescente e seus pares. Os autores supõem que isso ocorre porque a comunidade violenta promove modelos e/ou a aprendizagem de estratégias de resolução de conflitos por meio de comportamentos infratores e de violência. Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000) citam estudos (BREWER, HAWKINS, CATALANO, E NECKERMAN, 1995; SMITH E JANJOURA, 1988) que afirmam que jovens que estão mais em risco para o desenvolvimento de condutas agressivas são os que moram em comunidades em desvantagens sócio-econômicas, com poucos recursos de atendimento em saúde mental e/ou de promoção de habilidades prósociais, comunidades pouco organizadas e com altos índices de violência. Valois, Paxton, Zullig e Huebner (2006) analisaram se a satisfação com a própria vida, por parte de adolescentes, se relacionaria com o comportar-se violentamente. A satisfação com a vida foi medida por meio de uma escala (Middle SchoolYouth Risk Behavior Survey) a qual investiga 6 fatores: família, amigos, escola, si mesmo, ambiente em que mora e um item que mede satisfação com a vida de modo global. Percebeu-se que há uma forte relação positiva entre “satisfação com a vida” e comportamentos violentos. Assim, os que se envolvem em brigas sejam as que resultam em necessidade de atendimento médico ou as que não resultam e os que carregam uma arma de fogo ou arma branca, na maioria das vezes, estão Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial insatisfeitos com a própria vida. Os estudiosos, também, notaram diferenças importantes entre gênero e etnia, mesmo tendo-se controlado o status sócio-econômico e a série em que se estudava. As adolescentes de etnia branca que estavam insatisfeitas com a vida tenderam a ter portado revólver e armas brancas, ter se envolvido em brigas e em brigas que necessitasse atendimento médico, enquanto que as de etnia negra insatisfeitas apenas tendiam a portar armas brancas e ter se envolvido em brigas que necessitou atendimento médico. Já os jovens brancos e os negros insatisfeitos diferiram, pois os primeiros tenderam a já ter portado armas brancas, a ter se envolvido em brigas e em brigas que necessitaram de cuidados médicos, enquanto que os negros insatisfeitos tenderam a carregar revólveres e armas brancas e a se envolver em brigas que necessitaram de cuidados. Segundo os autores, não se sabe exatamente a razão para essas diferenças. Em relação à influência da escola, Walker e Gresham (1997) citados por Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000) afirmam que baixa expectativa da escola quanto à aquisição acadêmica do aluno, pouca supervisão aos alunos e estrutura física não segura, por parte da escola, são fatores de risco a comportamentos agressivos. Welsh (20003) estudou qual a influência de fatores do indivíduo e do clima escolar para a existência de violência e condutas desordeiras na escola. Os fatores do indivíduo investigados foram: o compromisso com as regras convencionais, o relacionamento com pessoas com comportamentos pró-sociais, o envolvimento em atividades não infracionais, crença nas regras convencionais ou morais. O autor (Welsh, 2003) percebeu que em relação a condutas desordeiras, tais como desrespeito aos professores, violação das regras escolares e vandalismo, o clima escolar é o fator que está mais relacionado. Em oposição, os fatores individuais estão mais relacionados com os comportamentos de violência mais graves como bater em alunos e professores, ameaçar, roubar e usar drogas na escola. O compromisso da Educação Especial Nota-se que não existe uma variável causal exclusiva para o ser vítima ou autor de violência escolar, mas um conjunto de variáveis relacionadas às quais se combinam de diferentes formas. Assim, por exemplo, um aluno agressor pode ter uma família em que haja violência doméstica, estudar numa escola sem regras delimitadas e ter um Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. 86 temperamento impulsivo com hiperatividade. Já outro aluno violento pode ter pais negligentes e residir numa comunidade muito violenta que valorize comportamentos infratores. Há, também, casos de alunos que são vítimas e agressores e, ainda que sejam em menor quantidade do que os alunos apenas vítimas e do que os alunos apenas agressores, são os mais rejeitados pelo grupo de pares e apresentam sintomas de estresse, ansiedade, depressão e comportamentos de agressividade e impulsividade (SCHWARTZ, TOBLIN, ABOUEZZEDDINE, TOM, STEVENS, 2005, PINHEIRO, 2006). Conforme Rigoni e Swenson (2000, p.288.) “... as ‘causas’ da violência escolar não são simples e nem redutíveis a uma relação estrita de causa e efeito. Ao contrário, a violência eclode como resultado de múltiplos fatores que amplificam e reforçam um ao outro.” Independentemente de explicações causais, percebe-se que os alunos agressores possuem características comuns entre si, o que também ocorre com as vítimas. Identificar essas particularidades pode e deve ser uma atitude de todos aqueles comprometidos em ensinar esses alunos e facilitar seu desenvolvimento saudável. Na maioria das vezes, quando se pensa acerca de quais sejam as pessoas portadoras de necessidades educacionais especiais, as crianças e adolescentes vítimas/ou agentes da violência escolar são esquecidas. Privilegiam-se os portadores de deficiências visuais, auditivas, intelectuais. Talvez, o motivo para isso é que se acredite erroneamente que deficiência é uma incapacidade permanente, incorrigível e biológica, o que não se aplica a ser ou, melhor, “estar” um aluno vítima ou agressor. Contudo, sabe-se que esses alunos freqüentemente possuem relações interpessoais comprometidas, rendimento acadêmico limitado em relação ao seu potencial e poucas possibilidades de ocupações profissionais futuras. Além disso, no caso dos agressores, as deficiências em múltiplas demandas são agravadas por esses alunos serem comumente julgados por professores, familiares e colegas como culpados por sua condição. É comum se dizer que agem de modo violento por terem um “péssimo caráter” e que necessitam de “limites”, o que muitas vezes apenas se configura como broncas, xingamentos, exclusão social e punição física. Infelizmente, é muito comum que esses alunos sejam transferidos muitas vezes de escolas e/ou de turmas, sem nunca serem percebidos como indivíduos com necessidades educativas especiais. Já os alunos vítimas, quando PEREIRA; WILLIAMS não são também agressores, acabam não tendo suas dificuldades reconhecidas, pois não costumam atrapalhar as explicações do professor, apesar de sentirem medo, ansiedade, depressão e baixa autoestima. Conforme Padovani (2003) não há no Brasil uma política e/ou proposta pedagógica específica para garantir a educação escolar e a promoção de habilidades dos estudantes que apresentam problemas comportamentais, tais como a agressividade. No entanto, de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Educação e da Câmera de Educação Básica, de 11 de fevereiro de 2001, dentre os educandos considerados com necessidades educacionais especiais incluem-se os que, durante o processo educacional, apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, sejam essas vinculadas a uma causa orgânica específica ou relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências. Considerando, então, as dificuldades que agressores e vítimas da violência escolar possuem, esses devem ser incluídos como educandos com necessidades educativas especiais. Porém, deve ser feito maior investimento dos pesquisadores, políticos, profissionais da educação, familiares, enfim, da comunidade, para que exista tal entendimento. Até mesmo porque, na mesma resolução (RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 2, de 11 de Fevereiro de 2001), institui-se que: Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e aprendizagem, contando, para tal, com: I - a experiência de seu corpo docente, seus diretores, coordenadores, orientadores e supervisores educacionais;. 87 III - a colaboração da família e a cooperação dos serviços de Saúde, Assistência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público, quando necessário. Como ainda não existe a compreensão de que tais alunos possuem características particulares e, por isso, necessitam de um ensino especial, pode-se dizer que a educação desses alunos não respeita o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), o qual impõe: “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurandose-lhes: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; direito de ser respeitado por seus educadores (...)” Muito pode ser feito a fim de diminuir as conseqüências de ser vítima ou agressor na escola e até mesmo alterar essa condição do aluno. Tais objetivos, estariam de acordo com o artigo de nº 3, da Resolução do Conselho Nacional de Educação e da Câmera de Educação Básica, de 2001, o qual afirma que: Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. II - o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema; Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008. Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial Algumas das medidas apontadas por Williams e Padovani (2006) para praticar uma verdadeira inclusão escolar de crianças e jovens com problemas de agressividade no ambiente escolar são: oferecer atividades pedagógicas especializadas, diminuir o número de alunos na turma na qual esses alunos estudam, existir uma sala específica a onde o aluno possa se acalmar e aprender a ter autocontrole em situações de raiva, auxiliar na defasagem acadêmica que o aluno com problemas de comportamento geralmente possui. Outras ações importantes são: realizar atividades com pais a fim de verificar situações de violência doméstica e intervir nessas situações, aplicar programas que auxiliem no desenvolvimento de habilidades parentais, executar atividades de prevenção de violência escolar, que privilegiem uma formação adequada dos professores para identificar comportamentos de violência e realizar encaminhamentos a fim de diminuí-los e que incluam no currículo atividades de desenvolvimento de habilidades sociais. Existir suporte emocional para as crianças vítimas de violência na escola, na comunidade ou em suas famílias. Para um detalhe maior a respeito desse assunto, ver Williams (2004). Conclui-se, então, que são muitas as ações possíveis, porém primeiramente é necessário que se conceda uma atenção especial a esses alunos (vítimas e agressores) de modo que haja medidas para diminuir essa condição e que existam ações de prevenção. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, Miriam; RUA, Maria das Graças. 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