- Laprev - Universidade Federal de São Carlos

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OS ALUNOS VÍTIMAS E AUTORES DA VIOLÊNCIA ESCOLAR E A
RESPONSABILIDADE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL 1
STUDENTS VICTIMS AND AGGRESSORS IN SCHOOL VIOLENCE AND THE RESPONSIBILITY OF
SPECIAL EDUCATION
Ana Carina Stelko Pereira**
Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams***
Resumo
A violência na escola é uma preocupação brasileira e existem características em comum entre alunos agressivos e
entre alunos vítimas. Conhecê-las é necessário para planejar intervenções e avaliar a responsabilidade da
Educação Especial com o assunto. Para tanto, fez-se uma revisão em duas bases científicas internacionais, entre
os anos de 1997 a 2007. Algumas descrições dos estudos em relação às vítimas são: a)garotos são mais vitimados
do que garotas, b)alunos mais novos estão expostos a maior vitimização, c)escolas localizadas em comunidades
com baixo status sócio-econômico ou escolas com uma grande proporção de alunos com famílias de baixa renda
apresentam maior chance de serem vítimas de séria violência física, d)estudantes com comportamentos de
isolamento, pouco populares, inseguros ou que mudam muito de residências e, como conseqüência, de escolas,
tende a ser vítimas. Algumas das descrições em relação aos agressores são: a)meninos são mais agressivos que
meninas, b)crianças agressivas têm diversas funções cognitivas deficitárias, c) alunos agressores possuem uma
grande chance de já terem sido ou serem rejeitados por seus pares e terem amigos que possuem o mesmo padrão
de comportamento, d) meninos agressivos na escola tendem a vivenciar violência doméstica em maior freqüência
e grau de severidade do que os não agressivos. Esses alunos freqüentemente possuem relações interpessoais
comprometidas, rendimento acadêmico limitado em relação ao seu potencial e poucas opções futuras de
ocupações. Assim, a educação especial tem responsabilidade para com esses alunos e deve auxiliar na
aprendizagem de conteúdos acadêmicos e de habilidades de interação social, criando propostas pedagógicas
específicas.
Palavras-chave: alunos, violência escolar; Educação Especial; deficiências.
Abstract
School violence is a serious Brazilian concern, and there are similar characteristics among aggressive and
victimized students. Knowledge of these aspects is necessary to plan interventions and to evaluate the Special
Education responsibility for such students. With this purpose in mind, a literature review was conducted in two
international research database for the 1997 – 2007 period. Some results involving descriptions of the victims
were: a) boys are more victimized than girls, b) younger students are more exposed to victimization, c) low socioeconomic status of the school’s neighborhood or large proportion of students whose families have low socioeconomic status present a larger chance of school is serious physical victmization, d) students who are socially
isolated, unpopular, insecure or who have moved many times are more likely to be victimized. Some descriptions
of the aggressors are: a) boys were found to be more frequently perpetrators than girls, b) aggressive children
have many cognitive function deficits, c) students who inflict aggressive behavior, in peers, usually were rejected
by such peers, and often have similarly aggressive friends, d) school aggressive boys commonly are exposed to
more severe and frequent domestic violence than non-aggressive boys. These students usually have compromised
their interpersonal relationships and, low academic results, as well as limited future occupational options. For all
these reasons, Special Education has a responsibility for these students, and must support their learning of
academic contents, and of social interaction abilities. In addition, specific pedagogic proposals are necessary.
1
*
*
Esse trabalho foi derivado da disciplina “Educação Especial no Brasil”, ministrada pela Profª Drª Maria Cristina Piumbato
Innocentini Hayashi, do Programa de Pós-Gradução em Educação Especial.
*
Psicóloga e Mestranda em Educação Especial pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade
Federal de São Carlos (UFSCAR). Bolsista mestrado do CNPQ.
**
Doutora em Psicologia Experimental (USP), Mestre em Psicologia (Universidade de Manitoba, Canadá), Professora Titular
do Departamento de Psicologia da UFSCAR e Coordenadora do Laboratório de Análise e Prevenção da Violência (LAPREV).
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p.79-90, jan./abr. 2008.
Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial
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Key words: students, school violence; Special Education; disabilities.
INTRODUÇÃO
A violência nas escolas é considerada um
problema em muitos países, mesmo quando esses
apresentam características econômicas e culturais
diferentes. Pode-se citar, por exemplo, pesquisas
nos Estados Unidos (DINKES, R., CATALDI, E.F.,
KENA, G., e BAUM, K., 2006), no Japão (HAYES
e KAMEGUCHI, 2005), na África do Sul (BILITY,
1999), no Canadá (CARTER e STEWIN, 1999), na
China (WONG, 2004), em Israel (KHOURYKASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA,
2004), na Turquia (SÜMER e AYDIN, 1999), na
Jamaica (SACCO e TWEMLOW, 1997) e no Brasil
(ABRAMOVAY, M. e RUA, M. das G., 2002).
Um estudo importante sobre a situação da
violência escolar no Brasil é a pesquisa da
UNESCO (2005), a qual realizou uma investigação
quantitativa (aplicação de questionários a alunos e
professores) e qualitativa (realização de grupos
focais com alunos, entrevistas individuais com
professores, policiais, inspetores e pais) em
Salvador, Porto Alegre, São Paulo, Belém, e Rio de
Janeiro, ainda que nessa última capital o estudo
tenha sido apenas qualitativo. Dessa investigação
participaram 9744 alunos e 1768 adultos
(professores, diretores, inspetores, policiais).
Nessa pesquisa (UNESCO, 2005) os alunos
afirmaram que existem situações de ameaças entre
os pares, seja ameaça de violência física, de
destruição de bens alheios, de morte; 30%
mencionaram ter conhecimento de ameaças
existentes na escola e 14% dos estudantes disseram
já ter sido vítima de ameaça. Os alunos que
disseram terem apanhado na escola foram 4,8% e
que afirmaram terem batido em alguém foram
19,8%. A diferença entre os que bateram e os que
apanharam é devido, provavelmente, segundo
UNESCO (2005), ao fato de que socialmente se
configura que “é honroso bater, enquanto apanhar
seria assumir o papel do mais fraco”. Segundo o
depoimento dos alunos, caracteriza-se como
agressão física de aluno contra aluno: “bater na
cabeça, puxar cabelo, dar coque, machucar
gravemente, ferir, chutar, dar paulada, furar aluno
com faca, dar socos e pontapés, etc”. Sobre o
desrespeito à propriedade de outros, 69,4% dos
alunos afirmou existir furtos na escola (UNESCO,
2005).
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008.
Ainda na pesquisa da UNESCO (2005), 1,9%
dos professores afirmaram ter sido xingados todos
os dias do ano, 7,9% relataram que foram insultados
frequentemente, e 37,3% ocasionalmente. Quanto
aos professores, muitos confirmaram que já
receberam ameaças “duras” (de morte, de
apanharem, de terem seus carros danificados),
sendo que essas geralmente ocorriam nas seguintes
situações, na opinião dos educadores: quando os
alunos tiravam notas baixas, quando reprovavam,
quando os alunos perdiam o prazo de entrega de um
trabalho e quando se exigia o uso do uniforme.
Além disso, 9% dos professores afirmaram já ter
sido ameaçados e/ou xingados e/ou agredidos por
pais de alunos (UNESCO, 2005).
Apesar dessa situação alarmante, é animador
constatar que nem todos os alunos apresentam
comportamentos agressivos e nem todos se
declaram vítimas. Ter um maior conhecimento das
características em comum entre os agressores e
entre as vítimas é fundamental para se intervir de
modo adequado.
Muitas pesquisas internacionais caracterizam os
alunos que comumente são agressores e vítimas na
escola, porém no Brasil são poucas as investigações
a esse respeito. Revisar pesquisas de outros países
pode servir como um subsídio para futuras
pesquisas brasileiras e, também, pode estimular
discussão a respeito da necessidade de inclusão
desses indivíduos (alunos agressores e vítimas) no
contexto da Educação Especial, a fim de que
tenham as suas necessidades garantidas.
Portanto, o objetivo do presente trabalho
consiste em revisar o que a literatura científica
internacional da última década aponta como as
características mais freqüentes de vítimas e
agressores na violência que ocorre em contexto
escolar e discutir a importância de que esses alunos
sejam considerados no contexto da Educação
Especial. Para tanto, foi realizada uma busca de
textos publicados entre 1997 a julho de 2007 na
base de dados Sage e Springer Link. Na primeira, a
procura de textos foi por meio das palavras “school
and violence” restritas as palavras-chave
(keywords) dos artigos, já na segunda base de
dados, também, foram utilizadas as palavras “school
and violence”, porém restringiu-se a busca ao título
dos artigos. Tal diferença na forma de busca foi
necessária, porque na base de dados Springer Link
PEREIRA; WILLIAMS
não é possível fazer busca com base nas palavraschave.
Em seguida, foram lidos os títulos e resumos
dos artigos apresentados selecionados aqueles que
buscassem descrever a relação entre ser estudante
vítima ou agressor da violência escolar com outras
variáveis. Assim, por exemplo, foram excluídos
estudos que apenas aludissem à violência doméstica
vivenciada por alunos sem investigar a relação com
a violência escolar, artigos que discutissem como
avaliar violência escolar sem apresentar resultados
de caracterização dos alunos vítimas e agressores,
que explicitassem intervenções preventivas sem
investigar as características de alunos agressores e
vítimas e que se restringissem apenas à violência
sexual que ocorre nas escolas. Portanto, de 68
artigos encontrados, foram mantidos no estudo 23
artigos. Além desses textos, utilizaram-se outros
pertinentes ao assunto, de conhecimento dos
autores, sendo que muitos desses foram derivados
de estudos do Laboratório de Prevenção a Violência
(LAPREV).
OS ALUNOS VÍTIMAS DA VIOLÊNCIA
ESCOLAR
Características demográficas como gênero,
etnia, idade e status-sócio econômico se relacionam
à vitimação do aluno. O gênero do estudante
influencia na possibilidade de ele ser vitimado,
sendo que homens são mais vitimados do que
mulheres (WARNER, WEIST e KRULAK, 1999;
KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY, ASTOR
e ZEIRA, 2004) e escolas com maior proporção de
garotos por garotas tem mais possibilidade de serem
violentas
(KHOURY-KASSABRI,
BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004).
Contudo, em relação a ser vítima de furtos não há
diferenças significativas entre alunos e alunas
(SCHRECK, MILLER e GILBSON, 2003). Outro
fator importante é a etnia do aluno. Segundo a
revisão de estudos de Warner, Weist e Krulak
(1999) a minoria étnica na escola tendem a ser
vitimada pela maioria étnica. Schreck, Miller e
Gilbson (2003) citam Kaufman, Chen, Choy,
Ruddy, Miller e Chandler et al. (1999) os quais
ressaltam que alunos negros tendem a ser vítimas.
Porém, vale notar que a violência também ocorre
entre estudantes de mesma etnia e gênero.
Alunos mais jovens estão expostos à maior
vitimização do que estudantes mais velhos
(KHOURY-KASSABRI,
BENBENISHTY,
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ASTOR e ZEIRA, 2004). Smith, Madsen e Moody
(1999) citados por Khoury-Kassabri, Benbenishty,
Astor e Zeira (2004) apresentam como hipóteses
explicativas para esse fato: a) crianças mais novas
têm maior número de alunos mais velhos do que
elas, os quais estão em posição favorável para
vitimá-las, b) crianças mais novas ainda não foram
socializadas em relação ao entendimento de que não
se deve violentar outros e c) crianças mais novas
não adquiriram habilidades sociais e de
assertividade para lidarem efetivamente com
incidentes de bully (intimidação física ou/e
psicológica ou/e sexual que ocorre de modo
freqüente e repetitiva entre colegas ou pares na
escola) e para desencorajarem outras situações de
bully. Pode-se também considerar a hipótese de que
alunos mais velhos são mais fortes fisicamente,
tendo mais condições para agredir de modo físico a
outros alunos.
Segundo Khoury-Kassabri, Benbenishty, Astor
e Zeira (2004), há indicativo de que alunos de
escolas localizadas em comunidades com baixo
status sócio-econômico ou de escolas com uma
grande proporção de alunos com famílias com
poucas condições sócio-econômicas apresentam
maior chance de serem vítimas de séria violência
física do que aqueles que estudam em escolas sem
essas condições. Contudo, esses autores também
apontam que essa constatação não pode ser
generalizada para qualquer tipo de vitimação, já que
há níveis mais altos de vitimação do tipo verbal e
por exclusão social descritos por alunos em escolas
localizadas em comunidades de maior nível sócioeconômico e em comunidades mais abastadas sócioeconomicamente. Possíveis explicações, de acordo
com os mesmos autores, são: estudantes de escolas
em regiões mais ricas e com alunos de famílias mais
ricas podem ser mais sensíveis ao abuso verbal ou
alunos de escolas em regiões carentes e com alunos
de famílias em maior desvantagem podem ser mais
tolerantes em relação a comportamento de abuso
verbal, devido a um controle mais informal e
menores sanções em relação a tais comportamentos
pela família e vizinhança desses alunos.
Características comportamentais também se
relacionam a possibilidade de vitimação. Estudantes
com comportamentos de isolamento, pouco
populares, inseguros ou que mudam muito de
residências e, como conseqüência, de escolas,
tendem a ser vítimas (WARNER, WEIST e
KRULAK, 1999). Schreck, Miller e Gilbson (2003)
afirmam que os alunos reduzem o risco de ser
vítimas quando aumentam a quantidade de pessoas
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008.
Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial
protetoras (por exemplo, amigos e professores de
confiança) ao redor deles e de seus pertences. Os
autores (SCHRECK, MILLER e GILBSON, 2003)
também, afirmam que os alunos comprometidos
com a escola e cientes que os funcionários dessa
têm senso de justiça e eficiência em relação à
disciplina tende a vivenciar menos violência. O fato
de não acreditar nos funcionários enquanto
protetores e justos sugere que esses alunos tendem a
não buscar ajuda, pois esses funcionários seriam
incapazes de garantir-lhes segurança. Os alunos que
participam mais de atividades extracurriculares
tendem a ser menos vitimizados e a usar menos
drogas do que os alunos que participam menos
dessas atividades (REID, PETERSON, HUGHEY e
GARCIA-REID, 2006).
As relações com o grupo de pares estão
associadas com a possibilidade de vitimização.
Alunos com amigos infratores são vulneráveis à
violência. Isso ocorre porque um grupo de alunos
com comportamentos anti-sociais tende a brigar
com outros grupos de infratores e um aluno no
grupo, quando não concorda com as atitudes de
outros do seu grupo, pode sofrer retaliações. Assim,
a violência comumente ocorre entre grupos e no
grupo de pares (REESE, VERA, SIMON e IKEDA,
2000).
Adicionalmente há características da escola em
que esse aluno vítima estuda. Khoury-Kassabri,
Benbenishty, Astor e Zeira (2004) perceberam que
alunos que estudam em salas de aula super lotadas
descrevem maior grau de vitimação, contudo não
encontraram relação significativa entre violência e
número de alunos na escola. Tal contradição,
possivelmente, se refere, de acordo com os autores,
ao fato de que existem outras variáveis que se
relacionam com o número total de estudantes, como
por exemplo, a proporção de professores por alunos.
Em uma mesma perspectiva, Schreck, Miller e
Gibson (2003) citam estudos (GOTTFREDSON e
GOTTFREDSON, 1985; WELSH, STROKES e
GREENE, 2000) que afirmam que apesar de o
grande número de alunos em uma escola associar-se
a conseqüências negativas, tais como maior
desordem, medo de crimes e vitimação de
professores, o nível de violência contra estudantes
não parece ser afetado.
Outro fator de importância percebido pelos
autores (KHOURY-KASSABRI, BENBENISHTY,
ASTOR e ZEIRA, 2004) é que o “clima” escolar se
correlaciona com o nível de vitimação na escola.
Entende-se por clima escolar a cultura da escola, na
qual crenças, valores, atitudes, ainda que não
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formais e escritas, caracterizam o estilo da interação
entre alunos, professores e administradores
(WALKER e GRESHAM, 1997). Assim, escolas
com regras claras, consistentes e justas, nas quais as
relações entre professores e alunos são percebidas
como positivas, vivenciam menos violência. Até
mesmo, o “clima” escolar explica bastante as
diferenças na vitimação entre escolas em um
mesmo
bairro
(KHOURY-KASSABRI,
BENBENISHTY, ASTOR e ZEIRA, 2004). Em
uma mesma perspectiva, Reid, Peterson, Hughey e
Garcia-Reid (2006) perceberam que os alunos que
afirmam pouco garantia de que a escola faz cumprir
as suas normas tendem a vivenciar violência com
mais freqüência, avaliar as normas sociais contra o
uso de drogas como de pouca significância e usar
mais drogas dos que os alunos que percebem que a
escola faz cumprir as suas normas.
Warner, Weist e Krulak (1999) apontam que o
currículo escolar deve ser consistente com os
interesses e necessidades do aluno, sendo que o
nível de violência é maior em escolas em que as
atividades não se relacionam aos valores e vontade
dos alunos e que não permitem que os alunos
opinem sobre as situações escolares. Existir locais
da escola ou ao redor dessa em que os alunos
estejam desprotegidos, sem
supervisão de
professores ou funcionários, afeta diretamente o uso
de drogas e o bullying verbal (xingamentos,
ofensas, etc). Assim, alunos que assinalam existir
mais locais inseguros na escola e perto dela tendem
a vivenciar mais violência verbal e a utilizar drogas
mais vezes (REID, PETERSON, HUGHEY e
GARCIA-REID, 2006). A existência de gangues na
escola, também, é um indicativo de violência
(DEVOE,
PETER,
KAUFMAN,
RUDDY,
MILLER, PLANTY, 2003, citados por CULLEY,
CONKLING,
EMSHOFF,
BLAKELY
E
GORMAN, 2006).
A vitimização por violência pode ser de modo
direto ou indireto e ambas as formas se relacionam
com diversos fatores de risco à saúde. O modo
direto é o qual alguém usa de violência física,
psicológica ou sexual para com uma pessoa e o
modo indireto é aquele em que um indivíduo, sem
ser propriamente o alvo da violência, sofre
conseqüências negativas ao assistir, escutar ou saber
de outros sendo agredidos e/ou conhecer os efeitos
que a violência teve em uma outra pessoa - ver no
caso de exposição à violência conjugal Brancalhone
e Williams (2003). Comportamentos tais como
abuso de substâncias, atividade sexual de risco,
dirigir alcoolizado, deixar-se guiar por motorista
PEREIRA; WILLIAMS
alcoolizado e envolvimento em brigas estão
comumente inter-relacionados e Jessor (1992)
citado por Albus, Weist e Perez-Smith (2004),
inclusive denomina tais atitudes como Síndrome de
Comportamento de Risco na adolescência. Porém,
Albus, Weist e Perez-Smith (2004) afirmam existir
diferenças nessas inter-relações de acordo com o
tipo de violência a que o sujeito foi exposto. O uso
de álcool e drogas se associa a conhecer muitas
pessoas que já foram vítimas de violência e
observar pessoas vitimizadas por violência, contudo
não se relaciona significativamente em ser vítima de
violência. Assim, os resultados do estudo de Albus,
Weist e Perez-Smith (2004), apontam que o uso de
drogas se associa mais com a exposição à violência
indireta, enquanto observador e por conhecimento
de histórias de pessoas vítimas. Os comportamentos
sexuais de risco estão mais associados ao
conhecimento de situações de violência e em ter
sido vítima, mas não se associa em ter observado
violência. Os comportamentos de agressividade se
associam em ter testemunhado violência e ter
sofrido de violência. Os autores também ressaltam
que os alunos que presenciam situações de
violência, ainda que não tenham sido os agressores,
nem propriamente as vítimas, também sofrem
efeitos nocivos relacionados à violência e
intervenções de enfrentamento da violência devem
incluí-los enquanto público-alvo.
Por fim, as vítimas freqüentes de violência
podem esconder os seus sentimentos de professores
e colegas de turma, porém a situação pode ser grave
de modo que se desenvolvam problemas
acadêmicos, depressão, isolamento social, aversão à
escola e outros problemas psicológicos (CRICK e
GROTPETER, 1996, KOCHENDERFER e LADD,
1996, SLEE, 1995 citados por COLVIN, TOBIN,
BEARD, HAGAN e SPRAGUE, 1998; WARNER,
WEIST e KRULAK, 1999).
Os alunos autores da violência escolar
Existem fatores do indivíduo (gênero, história
pré-natal,
distúrbios
psiquiátricos,
funções
cognitivas deficitárias, valores morais, crenças ou
“julgamentos”, fatores da família, do grupo de
pares, da comunidade na qual o aluno reside e da
escola que podem predizer comportamentos de
agressividade. É importante notar que esses se
combinam em múltiplas graduações, não sendo um
único fator exclusivo para o desenvolvimento de
comportamentos violentos.
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Há diferenças de acordo com o gênero e
história pré-natal. Meninos são mais agressivos do
que meninas (MALDONADO e WILLIAMS, 2005;
PINHEIRO, 2006; WELSH, 2003), também
percebem mais a violência como solução para
problemas e condenam menos o seu uso (ARTZ e
RIECKEN, 1997). Há evidências de que a
Síndrome Alcoólica Fetal e os efeitos do álcool
durante o desenvolvimento do feto - mesmo quando
não preenchem critérios para a síndrome - podem
gerar impulsividade, baixa tolerância à frustração,
déficit de atenção e dificuldades de aprendizagem
(RIGONI e SWENSON, 2000). Indica-se para o
aprofundamento do tema, Gallo (2006).
Carter e Stewin (1999) frisam ser necessário
realizar uma “avaliação psicopatológica” dos alunos
que apresentam comportamentos violentos, pois
esses
podem
apresentar
comportamentos
semelhantes por motivos diversos. Os autores citam
o estudo de Carter (1998) que revela que há
estudantes com comportamentos violentos e
depressão, alunos com comportamentos violentos e
Transtorno de Déficit de Atenção e estudantes com
comportamentos violentos e dificuldades de
aprendizagem. Segundo Carter e Stewin (1999) é
importante que se faça intervenções respeitando as
diferenças percebidas na avaliação psicopatológica.
Destacam, também, que nem todos os alunos que
cometem atos violentos preenchem critérios
psiquiátricos, pois a ocorrência desses também
depende de questões culturais, situacionais e das
características da vítima.
Na perspectiva social-cognitiva, afirma-se que
crianças agressivas têm diversas funções cognitivas
deficitárias. Tais crianças têm dificuldades em
interpretar de forma acurada o comportamento dos
outros, geralmente os interpretam como hostis,
possuindo dificuldades em empregar estratégias não
agressivas de resolução de problemas e em acreditar
que a agressão seja inapropriada e ineficaz
(BOXER, GOLDSTEIN, MUSHER-EIZENMAN,
DUBOW E HERETICK, 2005). De modo
semelhante, Guerra (2003) expõe fatores para o não
desenvolvimento de condutas agressivas: habilidade
de monitorar e regular emoções, sentimentos e
impulsos, capacidade empática, possibilidade de
lidar com problemas interpessoais, desenvolvimento
saudável da identidade, perspectiva de futuro e
habilidade de se engajar em relações positivas com
pares.
Um
estudo
(ZHANG,
LOEBER
e
STHOUTHAMER-LOUBER, 1997) verificou qual
a relação entre ter comportamentos violentos e o
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Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial
juízo quanto às quais atitudes são certas e erradas.
Os participantes da pesquisa eram meninos os quais
foram acompanhados durante 4 anos, sendo
inicialmente selecionados de três séries diferentes
(séries 1, 4 e 7 do sistema público escolar de
Pittsburg, EUA), assim o período do ciclo de vida
pesquisado foi dos 7 aos 16 anos. O juízo acerca do
que era certo e errado tem menor capacidade de
predizer o comportamento violento do que o
comportamento violento predizer o juízo quando se
está entre 7 a 10 anos de idade. Porém, dos 10 aos
12 anos de idade ocorre uma inversão, sendo que o
juízo prediz duas vezes mais o comportamento
violento do que o comportamento violento prediz o
juízo de certo e errado. Subsequentemente, dos 13
aos 16 anos, o comportamento violento tem a
mesma magnitude de predizer o juízo que o juízo
predizer o comportamento.
Lier, Vitaro e Eisner (2007) fazem uma revisão
sobre qual é a importância dos pares para o
desenvolvimento de comportamentos agressivos em
escolares.
Colegas
podem
influenciar
o
desenvolvimento de condutas agressivas de duas
maneiras: rejeitando e/ou vitimizando seus pares e
estimulando e dando suporte a comportamentos
agressivos por parte do colega. Os alunos rejeitados
ou vitimizados, muitas vezes, podem apresentar
comportamentos agressivos e, por isso, são
excluídos por colegas. Tal exclusão pode retirar do
aluno a possibilidade de aprender habilidades
sociais, o que dificultará, também, relacionamentos
sociais com outros colegas no futuro. Além disso, a
relação entre a criança rejeitada e seus pares gera
trocas coercitivas mútuas, o que pode manter ou
aumentar a agressividade da criança. Porém, a
criança rejeitada não tende a permanecer sem
amigos, afiliando-se com outros estudantes
rejeitados, os quais possivelmente, também, se
comportam de modo violento e acabam por
estimular comportamentos agressivos. Portanto, os
alunos agressores possuem uma grande chance de já
terem sido ou serem rejeitados por seus pares e
terem amigos que possuem o mesmo padrão de
comportamento. Uma outra importante influência
por parte dos amigos é que esses podem facilitar o
acesso a armas de fogo, o envolvimento em uso de
drogas e tráfico de drogas e o ingresso em gangues.
Padovani e Williams (2005) fizeram um estudo com
adolescentes infratores e perceberam que os amigos
podem punir comportamentos de evitação de brigas,
resolver brigas por meio de agressões físicas em
conjunto e colaborar no planejamento e na
realização de assaltos.
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Stueve, Dash, O’Donell, Tehranifar, WilsonSimmons, Slaby e Link (2006) estudaram a relação
entre papel dos alunos enquanto observadores de
agressões e/ou com conhecimento de situações
futuras de agressividade e o desenvolvimento de
comportamentos violentos. Os autores afirmam que
pesquisas sobre bullying e agressões físicas
apontam que alunos simpatizantes de estudantes
agressores podem estimular a violência quando
previnem que outras pessoas separem alunos que
brigam, quando encorajam a continuação da
agressão (por exemplo, gritando: “Isso aí! Bata
mais!”), ou quando servem como cúmplices e coagressores. No entanto, também há os alunos que
devido à passividade influenciam no aumento do
comportamento agressivo de outro aluno. Isso
ocorre porque a presença desses alunos pode ser
uma mensagem para o agressor de que ele tem que
se mostrar superior, forte e defender sua honra e
também porque pode permitir a concepção de que o
comportamento agressivo é aceitável. Deve-se
perceber que, também, pode existir uma influencia
positiva dos pares como quando eles tentam separar
colegas que se agridem, quando defendem a vítima,
quando dizem para colegas ignorarem provocações
e ao confidenciar a adultos situações de agressões.
Além dos pares, a família também possui um
importante papel no desenvolvimento de
comportamentos agressivos e não agressivos.
Batsche e Knoff (1994) mencionados por Williams
(2004) apontam que alunos agressivos são
geralmente oriundos de famílias em que: a) os pais
preferem o uso de violência física como forma de
disciplina, b) são por vezes hostis e rejeitam a
criança, c) são também permissivos, sendo
inconsistentes e oferecendo pouca supervisão, d)
têm pouca habilidade para solucionar problemas e
e) ensinam seus filhos a revidar ante a mínima
provocação. Em uma mesma direção, Maldonado e
Williams (2005) perceberam que meninos
agressivos na escola tendem a vivenciar violência
doméstica em maior freqüência e grau de
severidade do que os não agressivos. Reese, Vera,
Simon e Ikeda (2000) incluem circunstâncias que
podem produzir efeitos negativos na educação
realizada pelos pais, tais como conflitos entre eles,
ser usuário de drogas, estar desempregado, estar
com dívidas, ter carência de suporte social. Rigoni e
Swenson (2000) adicionam luto mal resolvido,
conflito familiar intenso, divórcio, pais que tem
deficiência mental ou desordens emocionais e que
assim estão frequentemente preocupados com os
próprios problemas sendo negligentes ou
PEREIRA; WILLIAMS
maltratando o filho. Portanto, essas situações
estressantes geralmente tornam os pais pouco
disponíveis positivamente aos filhos. Artz e
Riecken (1997) perceberam que os comportamentos
do pai e da mãe têm efeitos diferentes nos filhos. O
suporte do pai a comportamentos pró-sociais se
correlaciona positivamente com o filho (a) ter
valores pró-sociais, sendo que não há relação
significativa quando há o suporte pela mãe. Porém,
percebeu-se que o fato da mãe ter sido vítima de
bullying quando criança se relaciona com a
importância que o filho (a) concede a valores prósociais. Para uma discussão mais aprofundada sobre
influências paternas no desenvolvimento infantil,
sugere-se Cia, Williams e Aielo (2005).
Thompson e Massat (2005) apontam que a
exposição a eventos violentos acarreta problemas de
comportamento, rendimento acadêmico reduzido e
distúrbio de estresse pós-traumático. Esse distúrbio
se caracteriza por: a) experiência contínua do
evento traumático, como pesadelos, angústia
emocional intensa diante da exposição a elementos
evocativos do trauma, b) esquiva persistente de
estímulos associados ao trauma e entorpecimento da
reatividade geral (por exemplo, evitação de
lembranças do trauma, redução acentuada do
interesse
ou
participação
em
atividades
significativas, afastamento em relação a outras
pessoas, e c) excitação aumentada (distúrbio do
sono, irritabilidade, surtos de raiva, problemas de
concentração, hipervigilância, reação de susto
exagerada). Na revisão de literatura de Brancalhone
e Williams (2003), aponta-se ser comum que
crianças expostas à violência conjugal desenvolvam
problemas de saúde física, ansiedade, percepções
negativas de si mesmas, agressividade, dificuldades
de aprendizagem.
Infelizmente, os alunos agressivos, muitos dos
quais vivenciam situações de violência familiar e
em sua comunidade, tendem a reproduzir a
violência quando adultos. Segundo Colvin, Tobin,
Beard, Hagan e Sprague (1998) várias pesquisas
demonstraram que crianças que apresentam
comportamentos de bullying para com os outros,
comumente,
quando
adultos
apresentam
comportamentos de violência doméstica, de
violência contra criança, de abuso sexual e outros
crimes com o uso de violência. Esses autores
(COLVIN, TOBIN, BEARD, HAGAN E
SPRAGUE, 1998) citam Olweus (1991) o qual
afirma que alunos com oito anos identificados por
colegas como autor de bullying têm seis vezes mais
chance de ter registros de sérios crimes em ficha
85
policial aos trinta anos do que os estudantes que não
foram identificados enquanto autor de bullying.
Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000), também,
afirmam que estudos longitudinais apontam que
comportamentos agressivos e/ou anti-sociais na
infância
estão
fortemente
associados
ao
envolvimento futuro em comportamentos violentos.
Peacock, McClure e Agars (2003) fizeram uma
pesquisa sobre os fatores que predizem atos
violentos, pensamentos violentos, abuso de
substâncias e atitudes contrárias à norma, como
cabular aulas. Os autores apontam que a exposição
à violência na comunidade deve ser mais estudada.
No caso, os autores investigaram tal aspecto com
perguntas sobre se os alunos já haviam presenciado
ou tido conhecimento de pessoas assassinadas,
esfaqueadas, atingidas com tiros e se a pessoa que
sofreu a agressão era um familiar, amigos ou
estranhos. Percebeu-se que ter sido exposto à
violência na comunidade é um importante fator de
risco, até mesmo quando há uma relação de apego
entre o adolescente e seus pais e um relacionamento
saudável entre o adolescente e seus pares. Os
autores supõem que isso ocorre porque a
comunidade violenta promove modelos e/ou a
aprendizagem de estratégias de resolução de
conflitos por meio de comportamentos infratores e
de violência. Reese, Vera, Simon e Ikeda (2000)
citam
estudos
(BREWER,
HAWKINS,
CATALANO, E NECKERMAN, 1995; SMITH E
JANJOURA, 1988) que afirmam que jovens que
estão mais em risco para o desenvolvimento de
condutas agressivas são os que moram em
comunidades em desvantagens sócio-econômicas,
com poucos recursos de atendimento em saúde
mental e/ou de promoção de habilidades prósociais, comunidades pouco organizadas e com
altos índices de violência.
Valois, Paxton, Zullig e Huebner (2006)
analisaram se a satisfação com a própria vida, por
parte de adolescentes, se relacionaria com o
comportar-se violentamente. A satisfação com a
vida foi medida por meio de uma escala (Middle
SchoolYouth Risk Behavior Survey) a qual
investiga 6 fatores: família, amigos, escola, si
mesmo, ambiente em que mora e um item que mede
satisfação com a vida de modo global. Percebeu-se
que há uma forte relação positiva entre “satisfação
com a vida” e comportamentos violentos. Assim, os
que se envolvem em brigas sejam as que resultam
em necessidade de atendimento médico ou as que
não resultam e os que carregam uma arma de fogo
ou arma branca, na maioria das vezes, estão
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008.
Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial
insatisfeitos com a própria vida. Os estudiosos,
também, notaram diferenças importantes entre
gênero e etnia, mesmo tendo-se controlado o status
sócio-econômico e a série em que se estudava. As
adolescentes de etnia branca que estavam
insatisfeitas com a vida tenderam a ter portado
revólver e armas brancas, ter se envolvido em
brigas e em brigas que necessitasse atendimento
médico, enquanto que as de etnia negra insatisfeitas
apenas tendiam a portar armas brancas e ter se
envolvido em brigas que necessitou atendimento
médico. Já os jovens brancos e os negros
insatisfeitos diferiram, pois os primeiros tenderam a
já ter portado armas brancas, a ter se envolvido em
brigas e em brigas que necessitaram de cuidados
médicos, enquanto que os negros insatisfeitos
tenderam a carregar revólveres e armas brancas e a
se envolver em brigas que necessitaram de
cuidados. Segundo os autores, não se sabe
exatamente a razão para essas diferenças.
Em relação à influência da escola, Walker e
Gresham (1997) citados por Reese, Vera, Simon e
Ikeda (2000) afirmam que baixa expectativa da
escola quanto à aquisição acadêmica do aluno,
pouca supervisão aos alunos e estrutura física não
segura, por parte da escola, são fatores de risco a
comportamentos agressivos. Welsh (20003) estudou
qual a influência de fatores do indivíduo e do clima
escolar para a existência de violência e condutas
desordeiras na escola. Os fatores do indivíduo
investigados foram: o compromisso com as regras
convencionais, o relacionamento com pessoas com
comportamentos pró-sociais, o envolvimento em
atividades não infracionais, crença nas regras
convencionais ou morais. O autor (Welsh, 2003)
percebeu que em relação a condutas desordeiras,
tais como desrespeito aos professores, violação das
regras escolares e vandalismo, o clima escolar é o
fator que está mais relacionado. Em oposição, os
fatores individuais estão mais relacionados com os
comportamentos de violência mais graves como
bater em alunos e professores, ameaçar, roubar e
usar drogas na escola.
O compromisso da Educação Especial
Nota-se que não existe uma variável causal
exclusiva para o ser vítima ou autor de violência
escolar, mas um conjunto de variáveis relacionadas
às quais se combinam de diferentes formas. Assim,
por exemplo, um aluno agressor pode ter uma
família em que haja violência doméstica, estudar
numa escola sem regras delimitadas e ter um
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008.
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temperamento impulsivo com hiperatividade. Já
outro aluno violento pode ter pais negligentes e
residir numa comunidade muito violenta que
valorize comportamentos infratores. Há, também,
casos de alunos que são vítimas e agressores e,
ainda que sejam em menor quantidade do que os
alunos apenas vítimas e do que os alunos apenas
agressores, são os mais rejeitados pelo grupo de
pares e apresentam sintomas de estresse, ansiedade,
depressão e comportamentos de agressividade e
impulsividade (SCHWARTZ, TOBLIN, ABOUEZZEDDINE,
TOM,
STEVENS,
2005,
PINHEIRO, 2006).
Conforme Rigoni e Swenson (2000, p.288.) “...
as ‘causas’ da violência escolar não são simples e
nem redutíveis a uma relação estrita de causa e
efeito. Ao contrário, a violência eclode como
resultado de múltiplos fatores que amplificam e
reforçam um ao outro.” Independentemente de
explicações causais, percebe-se que os alunos
agressores possuem características comuns entre si,
o que também ocorre com as vítimas. Identificar
essas particularidades pode e deve ser uma atitude
de todos aqueles comprometidos em ensinar esses
alunos e facilitar seu desenvolvimento saudável.
Na maioria das vezes, quando se pensa acerca
de quais sejam as pessoas portadoras de
necessidades educacionais especiais, as crianças e
adolescentes vítimas/ou agentes da violência escolar
são esquecidas. Privilegiam-se os portadores de
deficiências visuais, auditivas, intelectuais. Talvez,
o motivo para isso é que se acredite erroneamente
que deficiência é uma incapacidade permanente,
incorrigível e biológica, o que não se aplica a ser
ou, melhor, “estar” um aluno vítima ou agressor.
Contudo, sabe-se que esses alunos freqüentemente
possuem relações interpessoais comprometidas,
rendimento acadêmico limitado em relação ao seu
potencial e poucas possibilidades de ocupações
profissionais futuras.
Além disso, no caso dos agressores, as
deficiências em múltiplas demandas são agravadas
por esses alunos serem comumente julgados por
professores, familiares e colegas como culpados por
sua condição. É comum se dizer que agem de modo
violento por terem um “péssimo caráter” e que
necessitam de “limites”, o que muitas vezes apenas
se configura como broncas, xingamentos, exclusão
social e punição física. Infelizmente, é muito
comum que esses alunos sejam transferidos muitas
vezes de escolas e/ou de turmas, sem nunca serem
percebidos como indivíduos com necessidades
educativas especiais. Já os alunos vítimas, quando
PEREIRA; WILLIAMS
não são também agressores, acabam não tendo suas
dificuldades reconhecidas, pois não costumam
atrapalhar as explicações do professor, apesar de
sentirem medo, ansiedade, depressão e baixa autoestima.
Conforme Padovani (2003) não há no Brasil
uma política e/ou proposta pedagógica específica
para garantir a educação escolar e a promoção de
habilidades dos estudantes que apresentam
problemas comportamentais, tais como a
agressividade. No entanto, de acordo com a
Resolução do Conselho Nacional de Educação e da
Câmera de Educação Básica, de 11 de fevereiro de
2001, dentre os educandos considerados com
necessidades educacionais especiais incluem-se os
que, durante o processo educacional, apresentam
dificuldades acentuadas de aprendizagem ou
limitações no processo de desenvolvimento que
dificultem o acompanhamento das atividades
curriculares, sejam essas vinculadas a uma causa
orgânica específica ou relacionadas a condições,
disfunções,
limitações
ou
deficiências.
Considerando, então, as dificuldades que agressores
e vítimas da violência escolar possuem, esses
devem ser incluídos como educandos com
necessidades educativas especiais.
Porém, deve ser feito maior investimento dos
pesquisadores, políticos, profissionais da educação,
familiares, enfim, da comunidade, para que exista
tal entendimento. Até mesmo porque, na mesma
resolução (RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 2, de 11 de
Fevereiro de 2001), institui-se que:
Para a identificação das necessidades
educacionais especiais dos alunos e a
tomada de decisões quanto ao atendimento
necessário, a escola deve realizar, com
assessoramento técnico, avaliação do aluno
no processo de ensino e aprendizagem,
contando, para tal, com:
I - a experiência de seu corpo docente, seus
diretores, coordenadores, orientadores e
supervisores educacionais;.
87
III - a colaboração da família e a
cooperação dos serviços de Saúde,
Assistência Social, Trabalho, Justiça e
Esporte, bem como do Ministério Público,
quando necessário.
Como ainda não existe a compreensão de que
tais alunos possuem características particulares e,
por isso, necessitam de um ensino especial, pode-se
dizer que a educação desses alunos não respeita o
Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), o qual
impõe:
“A criança e o adolescente têm direito à
educação,
visando
ao
pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo
para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurandose-lhes: igualdade de condições para o
acesso e permanência na escola; direito de
ser respeitado por seus educadores (...)”
Muito pode ser feito a fim de diminuir as
conseqüências de ser vítima ou agressor na escola e
até mesmo alterar essa condição do aluno. Tais
objetivos, estariam de acordo com o artigo de nº 3,
da Resolução do Conselho Nacional de Educação e
da Câmera de Educação Básica, de 2001, o qual
afirma que:
Por educação especial, modalidade da
educação escolar, entende-se um processo
educacional definido por uma proposta
pedagógica que assegure recursos e
serviços
educacionais
especiais,
organizados
institucionalmente
para
apoiar, complementar, suplementar e, em
alguns casos, substituir os serviços
educacionais comuns, de modo a garantir a
educação
escolar
e
promover
o
desenvolvimento das potencialidades dos
educandos que apresentam necessidades
educacionais especiais, em todas as etapas
e modalidades da educação básica.
II - o setor responsável pela educação
especial do respectivo sistema;
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.1, p. 79-90, jan./abr. 2008.
Os alunos vítimas e autores da violência escolar e a responsabilidade da Educação Especial
Algumas das medidas apontadas por Williams e
Padovani (2006) para praticar uma verdadeira
inclusão escolar de crianças e jovens com
problemas de agressividade no ambiente escolar
são: oferecer atividades pedagógicas especializadas,
diminuir o número de alunos na turma na qual esses
alunos estudam, existir uma sala específica a onde o
aluno possa se acalmar e aprender a ter autocontrole
em situações de raiva, auxiliar na defasagem
acadêmica que o aluno com problemas de
comportamento geralmente possui.
Outras ações importantes são: realizar
atividades com pais a fim de verificar situações de
violência doméstica e intervir nessas situações,
aplicar programas que auxiliem no desenvolvimento
de habilidades parentais, executar atividades de
prevenção de violência escolar, que privilegiem
uma formação adequada dos professores para
identificar comportamentos de violência e realizar
encaminhamentos a fim de diminuí-los e que
incluam no currículo atividades de desenvolvimento
de habilidades sociais. Existir suporte emocional
para as crianças vítimas de violência na escola, na
comunidade ou em suas famílias. Para um detalhe
maior a respeito desse assunto, ver Williams (2004).
Conclui-se, então, que são muitas as ações
possíveis, porém primeiramente é necessário que se
conceda uma atenção especial a esses alunos
(vítimas e agressores) de modo que haja medidas
para diminuir essa condição e que existam ações de
prevenção.
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Rodovia Washington Luiz, km 235, Cep 13565-905, São Carlos, SP / Telefone (16) 3351-8745,
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