Situações urgentes em Gastrenterologia

Transcrição

Situações urgentes em Gastrenterologia
APOIO:
SITUAÇÕES URGENTES EM
GASTRENTEROLOGIA
JOSÉ PEDROSA
Editor convidado
FICHA TÉCNICA
Produção Gráfica
Rabiscos de Luz
Com o patrocínio exclusivo de:
AstraZeneca - Produtos Farmacêuticos Lda.
Tiragem:
5000 exemplares
Depósito Legal:
250185/06
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SITUAÇÕES URGENTES EM
GASTRENTEROLOGIA
EDITOR CONVIDADO
José Pedrosa, Assistente Graduado de Gastrenterologia
Hospital Padre Américo Vale do Sousa, Serviço de Gastrenterologia
COLABORADORES
Adélia Rodrigues, Assistente Graduada de Gastrenterologia
Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, Serviço de Gastrenterologia
Américo Silva, Assistente Graduado de Gastrenterologia
Hospital S. Teotónio – Viseu, Serviço de Gastrenterologia
Ana Paula Oliveira, Chefe de Serviço de Gastrenterologia
Hospital de S. Bernardo – Setúbal, Serviço de Gastrenterologia
António Castanheira, Assistente Hospitalar de Gastrenterologia
Hospital S. Teotónio – Viseu, Serviço de Gastrenterologia
Carla Andrade, Interna do Internato Complementar de Gastrenterologia
Centro Hospitalar do Funchal, Serviço de Gastrenterologia
Cristina Fonseca, Assistente Graduada de Gastrenterologia
Hospital Garcia da Orta – Almada, Serviço de Gastrenterologia
Filipe Silva, Assistente Hospitalar de Gastrenterologia
Hospital de Santo André – Leiria, Serviço de Gastrenterologia
Helena Vasconcelos, Assistente Hospitalar de Gastrenterologia
Hospital de Sto. André – Leiria, Serviço de Gastrenterologia
Henrique Morna, Assistente Graduado de Gastrenterologia
Centro Hospitalar do Funchal, Serviço de Gastrenterologia
Horácio Guerreiro, Chefe de Serviço de Gastrenterologia
Hospital Distrital de Faro, Serviço de Gastrenterologia
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COLABORADORES (Cont.)
João Mangualde, Interno do Internato Complementar de Gastrenterologia
Hospital de S. Bernardo – Setúbal, Serviço de Gastrenterologia
José Ramada, Director do Serviço de Gastrenterologia
Centro Hospitalar do Alto Minho – Serviço de Gastrenterologia
Luís Lopes, Coordenador da Unidade de Endoscopia de Intervenção do Serviço de Gastrenterologia
Centro Hospitalar do Alto Minho – Serviço de Gastrenterologia
Nuno Nunes, Assistente Hospitalar de Gastrenterologia
Hospital Divino Espírito Santo - Ponta Delgada, Serviço de Gastrenterologia
Margarida Sampaio, Assistente Hospitalar de Gastrenterologia
Hospital do Barlavento – Portimão, Serviço de Gastrenterologia
Rita Ornelas, Interna do Internato Complementar de Gastrenterologia
Hospital Distrital de Faro, Serviço de Gastrenterologia
Rui Loureiro, Interno do Internato Complementar de Gastrenterologia
Hospital Garcia da Orta – Almada, Serviço de Gastrenterologia
Rui Sousa, Assistente Graduado de Gastrenterologia
Hospital Amato Lusitano - Castelo Branco, Serviço de Gastrenterologia
Sónia Fernandes, Interna do Internato Complementar de Gastrenterologia
Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, Serviço de Gastrenterologia
Vítor Viriato, Chefe de Serviço de Gastrenterologia
Hospital Pedro Hispano – Matosinhos, Serviço de Gastrenterologia
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ÍNDICE
Prefácio .............................................................................................. 13
Isabelle Cremers
Introdução .......................................................................................... 15
José Pedrosa
Disfagia total. Etiologia e terapêutica .............................................. 17
Vítor Viriato
Ingestão de cáusticos e corpos estranhos .......................................... 27
Américo Silva e António Castanheira
Hemorragia digestiva alta no Serviço de Urgência .......................... 53
Margarida Sampaio
Tratamento endoscópico da hemorragia digestiva alta de
causa não varicosa ............................................................................ 65
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
Hemorragia digestiva associada à hipertensão portal ...................... 85
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Hemorragia digestiva baixa .............................................................. 119
Luís Lopes e José Ramada
Urgência na Doença Intestinal Inflamatória – Diagnóstico e
Tratamento ........................................................................................ 131
Carla Andrade e Henrique Morna
Urgência em Proctologia .................................................................. 145
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
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Insuficiência hepática aguda.............................................................. 157
Rui Sousa
Ascite refratária e Síndrome hepatorrenal ........................................ 177
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
Colangite aguda ................................................................................ 199
Nuno Nunes
Pancreatite aguda .............................................................................. 207
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
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PREFÁCIO
A edição de livros pelo Núcleo de Gastrenterologia dos Hospitais Distritais serviu vários
objectivos: estreitar a ligação aos médicos de Medicina Geral e Familiar; colaborar na formação
pré-graduada dos estudantes de medicina da Escola de Ciências da Saúde da Universidade do
Minho e da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior; contribuir para
a formação pós-graduada de médicos gastrenterologistas, hepatologistas e de outras especialidades; enriquecer a Biblioteca Gastrenterológica em língua portuguesa; realçar o importante
papel desempenhado pelos gastrenterologistas dos Hospitais do Núcleo de Gastrenterologia dos
Hospitais Distritais na actividade assistencial, cuja experiência representa uma mais-valia destes
livros, adicionando o conhecimento da sua prática clínica aos ensinamentos das publicações já
existentes; o de comprovar que os Gastrenterologistas do Núcleo de Gastrenterologia dos
Hospitais Distritais cumprem a tripla faceta que caracteriza o Assistente Hospitalar: a actividade
assistencial, o ensino e a investigação clínica.
A edição deste livro coincide com o final do mandato de uma Direcção do Núcleo de
Gastrenterologia dos Hospitais Distritais, à qual tive a honra de presidir, procurando nestes anos
continuar o trabalho dos meus antecessores e manter as características da nossa Associação,
realçando as suas potencialidades no campo da investigação, proporcionadas pela implantação
dos seus Associados por todo o país, prestando assistência médica a cerca de 75 % da população.
Ao Dr. José Pedrosa, editor deste livro, agradeço a disponibilidade, o apoio e a amizade. Aos
colegas que empenhadamente colaboraram nos vários capítulos, agradeço o contributo. A todos
os que participaram neste projecto, felicito pela qualidade da obra realizada, que prestigia o
Núcleo de Gastrenterologia dos Hospitais Distritais.
Setúbal, Setembro de 2006
M. ISABELLE CREMERS
(Presidente do Núcleo de
Gastrenterologia dos Hospitais Distritais)
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INTRODUÇÃO
O convite que me foi formulado pela Direcção do N.G.H.D. para coordenar como editor esta
5ª publicação, integrada numa série de edições sob os auspícios do N.G.H.D. e subordinada ao
título “Situações Urgentes em Gastrenterologia”, constituiu um desafio inolvidável e de responsabilidade acrescida pela relevância e actualidade do tema.
Simultaneamente consideramos honrosa e prestigiante a possibilidade que nos foi oferecida
de poder concretizar um projecto tão abrangente e multicêntrico, tendo sido nossa preocupação
aliar a experiência adquirida no terreno por alguns colegas com a energia e vontade dos mais
novos que connosco trabalharam com pundonor e profissionalismo.
A rápida e vertiginosa evolução tecnológica permitiram nos últimos anos que a Endoscopia
Digestiva ultrapassasse o cariz meramente diagnóstico para assumir um papel cada vez mais
interventivo e definitivo no tratamento de situações clínicas de difícil resolução evitando
frequentemente o recurso a alternativas terapêuticas mais penalizantes.
Não quisemos contudo monopolizar os aspectos meramente endoscópicos porque entendemos que a Gastrenterologia não deve ser restringida apenas aos aspectos técnicos, outro sim
deve continuar a privilegiar a vertente clínica.
Tivemos a preocupação de tentar uniformizar e homogeneizar os vários capítulos que
integram esta publicação, mas não queremos cometer a estultícia e a presunção de o termos
conseguido na sua plenitude. Caberá ao leitor e colega que nos lê julgar até que ponto é que esse
desiderato foi ou não atingido.
Fica uma última palavra de agradecimento perene e inelidível para todos os que colaboraram
neste projecto e que com brio profissional e sacrifício pessoal, ajudaram a torná-lo uma realidade.
Penafiel, Setembro de 2006
JOSÉ LUÍS PEDROSA
(Editor Convidado)
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DISFAGIA TOTAL
ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
VITOR VIRIATO
caracterizada pela ausência de peristalse, tanto
primária como secundária no corpo esofágico,
bem como pressão aumentada com relaxamento
incompleto do esfíncter esofágico inferior na
maior parte dos casos. A disfagia obstrutiva é
causada pelo estreitamento mecanico ou
estenose na faringe, esófago ou transição esófago-gástrica. É o tratamento endoscópico das
causas de disfagia obstrutiva e da acalásia o
objectivo fundamental desta revisão. (Quadro 1)
I -INTRODUÇÃO
A disfagia define-se como a sensação de
demora na passagem do bolo alimentar nos 10
segundos imediatos ao início de uma deglutição. A disfagia nunca é psicogénica. É um
dos sintomas mais específicos e fácilmente
identificáveis que se encontram na prática
clínica. A história clínica, a observação da
deglutição, o “timing” do início da disfagia são
muito importantes no diagnóstico da disfagia e
identificam em 80-90% das situações o
mecanismo envolvido, a localização e a causa
benigna ou maligna da situação. Portanto, se
ouvirmos o doente com atenção e fizermos as
perguntas apropriadas o diagnóstico é habitualmente fácil.
A disfagia total, situação clínica que implica
a completa inabilidade para deglutir, inclusivé
a própria saliva e secreções, é mais frequentemente um episódio agudo, desencadeado a
maior parte das vezes pela obstrução do lúmen
do esófago ( já habitualmente comprometido
por patologia prévia) pelo bolo alimentar ou
corpo estranho e o seu tratamento endoscópico será abordado neste capítulo em conjunto
com o tratamento endoscópico das causas mais
comuns de disfagia.
Os três principais tipos de disfagia podem
ser classificados como de transferência, de
trânsito e obstrutiva. A disfagia de transferência corresponde a uma alteração patológica
do mecanismo neuromotor da fase orofaríngea
da deglutição. A disfagia de trânsito é clássicamente representada pela acalásia, alteração
QUADRO I - CAUSAS DE DISFAGIA ESOFÁGICA
Corpos estranhos intra-luminais
(causa habitual de disfagia aguda)
Doenças da mucosa
• DRGE (estenose péptica)
• Anéis e membranas ( disfagia sideropénica
ou Síndrome de Plummer-Vinson )
• Neoplasias do esófago
• Lesões cáusticas (e.g. ingestão de lixívia,
“pill esophagitis”, pós escleroterapia)
• Pós-radioterapia
• Esofagite infecciosa
Doenças do Mediastino
• Tumores (e.g. cancro pulmão, linfoma)
• Infecções (e.g. tuberculose, histoplasmose)
• Cardiovasculares (aurícula dilatada,
compressão vascular)
Doenças do músculo liso ou da inervação
• Acalásia
• Esclerodermia
• Outras alterações da motilidade
• Pós-cirurgia (i.e. pós-fundoplicatura,
dispositivos anti-refluxo)
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DISFAGIA TOTAL. ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
é que a disfagia poderá começar a ser sentida
quando há no máximo perda de 20-30% do
lúmen. No entanto nesta fase precoce os
doentes frequentemente ignoram o sintoma
que apenas é percebido como uma sensação de
demora transitória na passagem do bolo
alimentar. A disfagia ou não é suficientemente
incomodativa para trazer o paciente ao
médico ou é simplesmente negada.
As estenoses benignas progridem lentamente, estão raramente associadas com
emagrecimento significativo, são a maioria das
vezes consequência da esofagite de refluxo e
são praticamente sempre tratadas adequadamente através de dilatação esofágica. Por
outro lado as estenoses malignas são tipicamente progressivas a partir do aparecimento
da disfagia e praticamente sempre associadas a
história de emagrecimento significativo antes
do doente procurar o médico. Infelizmente a
maioria dos doentes com obstrução esofágica
de causa maligna têm disfagia significativa 3 a
6 meses antes do diagnóstico.
Doenças obstrutivas
O doente com obstrução do lúmen
aprende frequentemente a lidar com esta
situação de forma a manter um razoável
estado de nutrição e evitar atenção médica.
Habituam-se muitas vezes a alimentação
exclusivamente líquida ou mole, prolongam o
tempo demorado na refeição por vezes até
chegar aos 90 minutos, mastigando exaustivamente antes de deglutir e “empurrando” a
comida bem mastigada com grandes quantidades de líquidos. Com frequência a obstrução
completa ocorre de forma aguda devido a
impactação por bolo alimentar. A maioria
desses episódios de obstrução aguda é devida a
estenoses benignas do esófago.
Os pacientes com estenose esofágica
quase sempre têm dificuldade em deglutir pelo
menos um dos seguintes alimentos: carne,
especialmente bife, maçãs, ou pão fresco.
O doente prefere habitualmente frango ou
peixe, evita o bife há algum tempo, aprendeu
a torrar o pão e descasca as maçãs de forma a
reduzir a disfagia.
O doente com obstrução mecânica desenvolve tipicamente a disfagia de início para
sólidos de maior volume, progredindo subsequentemente por vezes até ao ponto de ter
dificuldade na deglutição de líquidos e da
própria saliva. Algumas pessoas têm graus
estáveis de estenose e nunca desenvolvem
disfagia progressiva e apenas em determinadas
circunstâncias, como a embriaguês é que têm
episódios transitórios de disfagia, não procurando por isso cuidados médicos. No entanto,
quando a estenose é provocada por reacção
inflamatória progressiva ou crescimento
tumoral, o doente desenvolve disfagia progressiva em semanas ou meses
Quando a disfagia ocorre regularmente
com alimentos sólidos, o médico pode prever
com segurança que o lúmen do esófago está
reduzido em pelo menos 50% do diâmetro
habitual. Devemos recordar que o lúmen
crítico para disfagia persistente para sólidos é
de 13mm ou menos. O trágico desta situação
Acalásia
A disfagia nos doentes com acalásia é o
sintoma dominante e surge tanto para sólidos
como para líquidos. A sua gravidade flutua ao
longo do tempo, mas o mais comum é atingir
um “plateau” que não piora com o passar do
tempo. Há no entanto alguns doentes com
disfagia muito pronunciada e importante
emagrecimento. Os doentes referem com
frequência o uso de manobras posturais para
melhorar a deglutição, como levantar os
braços acima da cabeça ou extensão forçada
do dorso. Associados à disfagia surgem a
regurgitação, por vezes dor torácica (em 1/3
dos doentes) e sintomas de aspiração pulmonar.
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Vitor Viriato
cortantes localizados a nível do cricofaríngeo.
No entanto a esofagoscopia flexível é preferida
na grande maioria das outras circunstâncias já
que é também eficaz, não necessita de anestesia geral como a rígida e permite a observação
completa do esófago, estômago e duodeno.
II - ABORDAGEM DAS CAUSAS
MAIS COMUNS DE DISFAGIA
1 - Corpos estranhos
A abordagem aos corpos estranhos no tubo
digestivo alto será especificamente alvo de um
capítulo nesta publicação. Não poderíamos no
entanto passar sem pelo menos, num capítulo
com o título de disfagia total abordar os princípios gerais que devem nortear a actuação do
clínico quando confrontado com estes doentes
e a actuação perante um caso de impactamento alimentar, causa mais comum de
disfagia total.
Equipamento
O equipamento que deve estar prontamente disponível inclui pinças “dente de rato”,
“alligator jaws”, ansas de polipectomia, recuperadoras de pólipos, cesto de Dormia, rede de
recuperação e “overtubes” de várias dimensões.
É muitas vezes útil a realização de um teste de
recuperação de um objecto similar com o
mesmo equipamento antes do início do
exame. A utilização de 1 “overtube” protege as
vias aéreas, permite múltiplas introduções do
endoscópio e protege a mucosa do esófago de
erosões e lacerações durante a retirada de
objectos cortantes
Princípios gerais
Logo que a ingestão do corpo estranho
esteja diagnosticada o médico tem de decidir
se é ou não necessária qualquer tipo de intervenção, qual o grau de urgência e por que
meios. A abordagem é influenciada pela idade
do doente, estado clínico, tamanho, forma e
tipo de corpo estranho. Têm também
importância a localização do corpo estranho e
as capacidades técnicas do endoscopista.
O “timing” da endoscopia na ingestão de
corpos estranhos á ditado pelos riscos apreciados em relação á aspiração e/ou perfuração.
É necessária intervenção urgente quando há
um corpo estranho cortante ou uma “pilha” no
esófago. De igual forma é também necessário
actuar com urgência para prevenir a aspiração,
quando um corpo estranho ou um impactamento alimentar criam uma obstrução quase
total de forma que o doente tem até dificuldade em deglutir as próprias secreções.
Aqueles doentes sem evidência de obstrução
de alto grau e que não estão em “distress”
agudo podem ser tratados de forma menos
urgente, até porque pode haver resolução
espontânea da situação. Em nenhumas
circunstâncias deve um corpo estranho ou
impactamento alimentar ser deixado no esófago mais de 24 horas.
A esofagoscopia rígida ou laringoscopia
directa podem ser tentadas em objectos
Impactamento alimentar
O tipo mais comum de corpo estranho em
adultos é o impactamento de carne ou outro
tipo de bolo alimentar. Os doentes em “distress” agudos ou incapazes de deglutir as
secreções requerem intervenção imediata.
Se o doente não se sente desconfortável, não
está em risco de aspiração e engole bem a
saliva, a intervenção não necessita ser urgente
e pode ser deferida para um período mais
conveniente porque muitos impactamentos
alimentares resolvem-se espontaneamente. No
entanto a endoscopia não deverá ser retardada
para além das 24 horas após apresentação,
porque o risco de complicações aumenta de
forma significativa.
A observação endoscópica inicial deverá
reconhecer e localizar o local exacto do
impactamento. O bolo alimentar pode geralmente ser removido na totalidade ou em
fragmentos com os instrumentos acima citados.
Poder-se-á, como também já descrito, utilizar
um “overtube”. Depois de o bolo alimentar
estar reduzido em tamanho poderá ser ultrapassado pelo endoscópio. Quando conseguimos
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DISFAGIA TOTAL. ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
progredir até ao estômago podemos recuar o
endoscópio até ao nível da obstrução e
empurrar suavemente o bolo alimentar até ao
estômago. Não é aconselhável efectuar esta
manobra de forma “cega” já que é muito
comum nos impactos alimentares a existência
de patologia esofágica subjacente.
A enzima proteolítica papaína não deve
ser utilizada já que tem sido associada a casos
de hipernatremia, erosões e perfuração do
esófago. A administração de Glucagon 1 mg
EV, numa tentativa de relaxar o esófago é em
geral segura e pode ajudar á resolução espontânea da situação enquanto se programa a
endoscopia. No entanto o seu uso não deverá
contribuir para atrasar a intervenção
endoscópica.
estenoses. Os sintomas são habitualmente
progressivos iniciando-se com disfagia para
sólidos que pode progredir até á disfagia para
líquidos. Estes sintomas estão directamente
relacionados com o calibre da estenose: inicia-se disfagia para sólidos quando o lume atinge
13 mm ou menos.
A base do tratamento é a dilatação esofágica, que no entanto deve ser sempre seguida
por terapêutica com IBP em dose plena já que
esta reduz significativamente a taxa de recidiva
da estenose.
As estenoses pépticas devem ser dilatadas
progressivamente com dilatadores de Savary
ou com balões. A escolha entre os tipos de
dilatador deve ser baseada na experiência e na
correcta adaptação do endoscopista ao seu
uso. A experiência publicada até á data não
demonstrou convincentemente a superioridade de um tipo de dilatador em relação a
outro.
Se a dilatação for efectuada com dilatadores de Savary o diâmetro do primeiro dilatador
deve ser semelhante ao diâmetro calculado
para a estenose. Introduzem-se depois dilatadores de diâmetro progressivamente crescente
até se encontrar resistência, após o que não se
devem passar mais que dois dilatadores numa
mesma sessão. Se forem utilizados dilatadores
de balão o diâmetro inicial não deverá ser
superior a 45 French. Não parece que exista
relação entre o nível de dilatação inicial e a
recidiva posterior da estenose pelo que não há
suporte para a crença de que as estenoses
devem ser dilatadas de forma agressiva para
evitar recidivas. A extensão da dilatação num
paciente individual deve ser baseada na
resposta sintomática à terapêutica e nas
dificuldades encontradas durante a dilatação.
A maioria dos doentes tem um bom alívio da
disfagia com a dilatação para diâmetros entre
os 12 mm e os 16 mm. As estenoses não devem
em geral ser dilatadas acima dos 18 mm. Para
doentes cuja disfagia persiste ou recorre após
uma dilatação inicial e terapêutica anti-refluxo,
devemos confirmar endoscopicamente a cicatrização da esofagite antes de repetir a dilatação.
2 – Estenoses esofágicas benignas
As duas causas mais frequentes de
estenoses benignas do esófago são o refluxo
gastro-esofágico e as anastomoses cirúrgicas.
Constituem também causas relativamente
comuns de estenose esofágica benigna alguns
anéis e membranas, as estenoses cáusticas e
pós-radioterapia.
Estenoses pépticas
A estenose péptica é uma complicação da
doença de refluxo gastro-esofágico (DRGE)
que surge em cerca de 10% dos doentes com
esta patologia e que procuram apoio médico.
Têm sido associadas com idade mais avançada
dos doentes, com o sexo masculino e com
duração prolongada dos sintomas de refluxo.
Localizam-se habitualmente a nível do esfíncter esofágico inferior e quando são mais
proximais estão associadas com esófago de
Barrett. A endoscopia é essencial na sua
avaliação, mas por vezes estenoses ligeiras
podem passar despercebidas, mesmo quando
sintomáticas, pelo que a sua avaliação clínica
deve ser complementada por um trânsito
esofágico. Existe esofagite proximalmente á
estenose em cerca de 50% dos casos mas
devem ser efectuadas biópsias em todas as
20
Vitor Viriato
Depois da cicatrização da esofagite a necessidade de dilatações é determinada empiricamente. Em estenoses refractárias pode-se fazer
uma tentativa com injecção de corticóides na
estenose. Muito raramente estenoses verdadeiramente refractárias requerem ressecção
esofágica e reconstrução. Excepcionalmente
pode haver indicação para colocação de uma
prótese em estenoses benignas.
fície lisa, pouco espessas (menos de 4 mm),
localizadas a nível da transição gastro-esofágica e recobertas por epitélio escamoso em
cima e colunar na parte distal. A sua patogenia não é clara, mas pelo menos em alguns
doentes o refluxo gastro-esofágico tem sido
incriminado. Os doentes têm habitualmente
disfagia intermitente para sólidos, principalmente quando o lume tem 13 mm ou menos.
Esta disfagia é de curta duração, acompanha-se de desconforto torácico e é aliviada por
manobras posturais, pela regurgitação ou pela
ingestão de água. São muitas vezes
responsáveis por quadros de disfagia total após
o doente deglutir um grande bocado de carne
(steak-house syndrome) que exigem imediata
intervenção endoscópica para a sua resolução.
Os anéis e as membranas são tratados por
dilatação esofágica, com balão ou dilatadores
de Savary, a qual deve ser levada até aos 20
mm, com o objectivo de evitar recidivas e
numa única sessão.
Estenoses de anastomoses cirúrgicas
As estenoses das anastomoses podem ser
muito estreitas e tortuosas, especialmente
quando surgem após uma deiscência pós-operatória. Encontram-se em até 40% das anastomoses gastro-esofágicas, especialmente se for
usado “stapler” ou houver deiscência da anastomose. A dilatação com balão (método ao qual
damos preferência nesta indicação) ou vela é
eficaz em 75-90% dos casos, mas há necessidade em média de 3 a 5 sessões de dilatação
por doente. A realização de endoscopia no
pós-operatório precoce (3 a 5 dias após
cirurgia) e dilatação conduzem a uma necessidade de menor número de dilatações em fases
mais tardias. Para minimizar o risco de recidiva
a dilatação deve ser efectuada até 18-20 mm.
Algumas estenoses muito estreitas necessitam
dilatação com velas já que não é nesses casos
sequer possível a insuflação do balão.
Estenoses cáusticas
As lesões cáusticas do esófago, abordadas
especificamente noutro capítulo desta publicação, têm frequentemente como sequelas
estenoses esofágicas. Estas estenoses, mesmo
sem serem especialmente longas, são habitualmente muito difíceis de dilatar, têm uma taxa
de recidiva mais elevada que as estenoses de
qualquer outra etiologia e estão associadas
com um maior risco de perfuração o qual se
estima entre 1-2% por procedimento. Se nos
lembrarmos que alguns doentes, até terem
uma resposta aceitável às dilatações, necessitam de numerosas sessões, temos este risco
aumentado muitas vezes. É necessário todo o
cuidado, mesmo quando a dilatação é efectuada
com balões ou velas de pequeno calibre.
Anéis e membranas
Os anéis e membranas são estruturas de
fino calibre, frágeis e que comprometem
parcial ou totalmente o lúmen esofágico.
O termo membrana designa uma prega
mucosa que faz protusão no lúmen e é
recoberta por epitélio escamoso. São mais
comuns no esófago cervical e causam
frequentemente disfagia intermitente ou são
assintomáticas sendo descobertas aquando de
investigação endoscópica ou radiológica por
outros motivos. Estão frequentemente associados com anemia ferropénica ( Síndrome de
Plummer-Vinson ou de Patterson –Kelly).
Os anéis esofágicos foram descritos por
Schatzki como estruturas mucosas de super-
Estenoses rádicas
Alguns doentes submetidos a radioterapia
a tumores da cabeça, pescoço ou tórax acabam
por desenvolver estenoses rádicas do esófago.
O tempo que medeia entre a radioterapia e o
seu aparecimento é em média de 14 semanas.
21
DISFAGIA TOTAL. ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
Tal como em outros tipos de estenose
esofágica a dilatação com balão ou dilatadores
de Savary é o tratamento de eleição, recomendando-se também nas estenoses desta
etiologia dilatações progressivas, não forçadas
em função do risco também aumentado de
perfuração nesta condição.
minimizar as complicações. Estas são muito
menos frequentes com uma única dilatação
com balão de 30 mm o qual proporciona desaparecimento ou redução significativa da disfagia a curto prazo em 70-85% dos doentes e a
longo prazo em 50-65% dos doentes. É prática
da maioria das instituições propor como tratamento inicial a dilatação e considerar a
esofagomiotomia por via laparoscópica em
caso de falha ou recidiva após a 1ª dilatação
(ou 2ª em muitas instituições), desde que o
paciente tenha condições para tal.
A injecção de toxina botulínica no esfincter esofágico inferior pode também ser
utilizada, habitualmente em doentes que
representam maior risco cirúrgico. Trata-se de
um procedimento seguro e que induz remissão
clínica durante pelo menos 6 meses em
aproximadamente 2/3 dos doentes com
acalásia. No entanto a maioria dos doentes
necessita injecções repetidas para manter a
remissão e apenas aproximadamente 2/3 dos
doentes em remissão aos 6 meses permanecerão
em remissão ao fim de 1 ano, mesmo com
injecções repetidas.
3- Acalásia
O termo acalásia provém do Grego e
significa “que não relaxa”. De facto, a ausência
de relaxamento do esfíncter esofágico inferior
com a deglutição é a causa dos sintomas nesta
doença. Não se conhece a sua causa, atinge
igualmente homens e mulheres, raramente
antes da adolescência e é relativamente pouco
frequente (incidência de 1/100.000). A disfagia
para sólidos e líquidos é o seu principal sintoma,
podendo também aparecer regurgitação, dor
torácica, tosse, soluços e emagrecimento.
Antes de se proceder ao seu tratamento
por meios invasivos (dilatação ou cirurgia)
devemos excluir um quadro de pseudoacalásia provocado por lesões malignas para o
que pode muitas vezes ser necessário efectuar
TCA e/ou ecoendoscopia a fim de excluir
lesões infiltrativas dessa área.
A dilatação é efectuada nesta situação
com balões pneumáticos, os quais são passados
sob controlo radioscópico e sobre um fio-guia
até à transição gastro-esofágica e insuflados a
grande pressão. Parece não haver risco aumentado de perfuração com períodos de insuflação
maiores ( até 1 ou 2 minutos) embora a preferência generalizada dos endoscopistas vá para
períodos menores ( 15-30 segundos). É objectivo desta dilatação a rotura das fibras do
esfíncter esofágico inferior e desta forma
aliviar a obstrução funcional. Existe um risco
apreciável de perfuração esofágica (2-8%) neste
tipo de dilatação, o qual constitui a sua principal limitação, embora muitas vezes a perfuração
possa ser tratada de forma conservadora se for
reconhecida precocemente. Existem balões
com diâmetros de 30, 35 e 40 mm, devendo
sempre começar-se pelos de 30 mm de forma a
4- Neoplasias do esófago
O cancro do esófago é habitualmente
diagnosticado numa fase avançada e incurável. Os doentes com doença localmente
irressecável ou não candidatos a cirurgia
podem ser submetidos a variados tipos de
medidas paliativas de tipo endoscópico em que
o gastrenterologista tem importante papel. Os
objectivos desta paliação são o alívio da
disfagia, a melhoria do estado nutricional e da
qualidade de vida.
Têm sido utilizadas múltiplas técnicas
endoscópicas mas não há consenso quanto á
melhor abordagem. A escolha é primariamente ditada pelas características do tumor, a
preferência do doente e a experiência do
endoscopista. O tratamento deve ser individualizado e em diferentes fases da doença
podem ser aconselháveis diferentes métodos
de paliação. (Quadro II)
22
Vitor Viriato
QUADRO II - TERAPÊUTICA PALIATIVA NO
CANCRO DO ESÓFAGO
MÉTODOS
MÉDODOS
ENDOSCÓPICOS
NÃO ENDOSCÓPICOS
permite o alívio rápido da disfagia em apenas
um procedimento. As próteses metálicas autoexpansíveis (PMAE) substituíram rapidamente as próteses plásticas, já que necessitam
de pouca ou nenhuma dilatação prévia e são
de introdução mais fácil. Além disso expandem o lúmen obstruído para um diâmetro
maior (18-23 mm) do que o proporcionado
pelas próteses plásticas. A eficácia no alívio da
disfagia é semelhante para os 2 tipos de
prótese (> 90%), mas a experiência proporcionada por múltiplos ensaios prospectivos e
randomizados mostra que as PMAE estão
associadas a menor número de complicações
relacionadas com a introdução (10%-43% vs
0%-16%), menor número de dias de hospitalização e melhor qualidade de vida e sobrevida
em alguns ensaios. Embora bastante mais
caras que as próteses plásticas a diferença no
custo é amplamente compensada por estas
vantagens.
Dilatação
Cirurgia
Colocação de prótese
Radioterapia
Ablação com LASER
Quimioterapia
Terapêutica fotodinâmica
Injecção de álcool
Colocação de sonda para alimentação
As estenoses esofágicas malignas podem
ser dilatadas utilizando balões TTS ou velas
tipo Savary, com ou sem controlo radiológico.
A dilatação pode ser complicada por
perfuração em até 10% dos casos. A maioria
dos doentes pode ser dilatada até um diâmetro
que permita a passagem de alimentação líquida e mole (9-12 mm), mas as melhoras são
breves (desde alguns dias até 4 semanas).
A dilatação é portanto utilizada principalmente em conjugação com outros métodos,
nomeadamente facilitando a colocação de 1
prótese ou em doentes “aguardando” melhoras
na deglutição após Radioterapia.
Entre todas as técnicas endoscópicas a
colocação de próteses assume presentemente
o papel principal nas técnicas paliativas já que
Existem presentemente comercializados
vários tipos de PMAE (Quadro III), diferindo
no design e sistemas de libertação. A sua colocação pode ser efectuada com ou sem controlo
por radioscopia e a maioria das presentemente
utilizadas são parcialmente recobertas por uma
membrana de silicone ou poliuretano a fim de
QUADRO III - PMAE APROVADAS PELA FDA
Material
Design
Coberta
Força radial
Sistema de libertação (F)
Comprimento (cm)
Diâmetro extremidade (mm)
Diâmetro corpo (mm)
Grau de encurtamento (%)
Fecho de fistulas
Ultraflexa
Wallstent IIa
Z-Stentb
Nickel titanium (nitinol)
Rede
Sim
+
16
10, 12, 15
23, 28
18, 23
30-40
Sim
Elgiloy
Rede
Sim
+++
18
10, 15
28
20
30
Sim
Aço inoxidável
Zigzag
Sim
++
31
8, 10, 12, 14
25
18
0-10
Sim
aMicrovasive/Boston Scientific Inc (Natick, MA).
bWilson-Cook Medical (Winston-Salem, NC).
23
DISFAGIA TOTAL. ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
impedir o crescimento tumoral para o interior
da prótese. Num estudo prospectivo randomizado com 62 doentes as próteses recobertas
obtiveram melhor paliação do que as não
recobertas devido ao menor crescimento
tumoral para o interior da prótese (3% vs 30%)
e necessidade de menor número de
reintervenções (0% vs 27%). As próteses
recobertas tendem no entanto a migrar mais
frequentemente que as não recobertas (26% vs
0%), principalmente quando se colocam no
esófago distal. Algumas modificações no “design”
das próteses como a prótese Flamingo Wallstent
e a prótese Ultraflex com “flaps” proximais têm
vindo a melhorar este aspecto das próteses
recobertas. Estes dois últimos tipos de prótese
têm sido utilizados com sucesso na paliação de
tumores distais com taxas de migração de 6%.
Não existem presentemente dados
inequívocos que demonstrem superioridade de
um tipo de prótese sobre as outras pelo que a
escolha do tipo de prótese depende principalmente da sua disponibilidade, da familiaridade
do endoscopista e da sua preferência pessoal.
O tipo e frequência das complicações
relacionadas com as PMAE variam segundo os
estudos. Os resultados de um inquérito nacional
nos USA mostraram taxa de complicações técnicas no imediato de 5% – 17%, incluindo má
colocação (0,3% – 5%), expansão falhada (4% –
7%), colocação falhada (1% – 3%), e migração
(0,3% – 2%). As complicações imediatas
ocorreram em 7% – 15% dos casos, incluindo
dor torácica (6% – 12%), hemorragia (0,2% –
0,6%), perfuração (0,6% – 1%), e morte (0,5%
– 1,4%). Complicações técnicas tardias ocorreram em 9% – 18% dos casos, incluindo crescimento tumoral para dentro da prótese ou nos
seus extremos (6%–11%) e migração da prótese
(3%–7%). As complicações tardias ocorreram
em até 27% dos doentes, incluindo sintomas
de refluxo (4% – 5%), disfagia recorrente (8%
– 9%), fistulas traqueo-esofágicas (1% – 3%),
hemorragia (0,5% – 4%), perfuração (0,5% –
0,8%), e morte em resultado da doença
maligna subjacente nos 30 dias imediatos em
7% dos doentes.
O crescimento tumoral para o interior ou
nos extremos da prótese pode ser tratado
através da colocação de nova prótese ou
através da ablação do tecido tumoral utilizando Laser, Árgon-plasma ou terapêutica
fotodinâmica. Deve ter-se sempre muito
cuidado durante a utilização de métodos
térmicos de ablação para não danificar a
prótese subjacente.
A utilização de Radioterapia após
colocação de PMAE não é consensual. Há
estudos que apontam para uma melhor sobrevida destes doentes enquanto outros apontam
para uma maior taxa de complicações,
nomeadamente fistulas traqueo-esofágicas e
hematemeses massivas devido a erosão da
aorta pela prótese. Portanto a colocação de
PMAE antes da radioterapia deve ser efectuada com muita ponderação. A comparação
entre os diferentes tipos de estudos torna-se
difícil devido aos diferentes tipos de próteses e
“design” dos estudos.
As próteses são ideais para as neoplasias
estenosantes do esófago médio. A seguir á
colocação da prótese os doentes devem ser
aconselhados a modificar a dieta e evitar
alimentos sólidos (por exemplo pão e carne)
que possam ocluir a prótese. As próteses que
atravessem a junção gastro-esofágica podem
levar a sintomas graves de refluxo pelo que
devem ser instituídas medidas gerais antirefluxo e terapêutica com inibidores da bomba
de protões. A colocação de próteses na vizinhança do esfíncter esofágico superior é difícil
tecnicamente, embora haja séries publicadas
de colocação com sucesso. As complicações
incluem sensação de corpo estranho, aspiração
para as vias aéreas e compressão traqueal com
compromisso respiratório. A colocação de
próteses nesta localização só deve ser tentada
por endoscopistas experimentados ou então
serem utilizadas modalidades alternativas na
paliação destes doentes.
As próteses podem ser eficazes na paliação
da disfagia resultante de compressões extrínsecas do esófago. As próteses recobertas
utilizam-se também no tratamento de fístulas
24
Vitor Viriato
malignas traqueo-esofágicas, situação em que
constituem uma indicação formal e levam ao
fecho da fistula em 90-100% dos casos. Os
doentes com fístulas traqueo-esofágicas
persistentes mesmo após colocação de prótese
esofágica poderão beneficiar da colocação de
uma segunda prótese nas vias aéreas para
fechar a fístula.
A injecção intra-tumoral de álcool absoluto leva a necrose e redução da massa
tumoral. A técnica é barata, disponível e de
execução técnica simples. O esclerosante é
tipicamente injectado em bólus de 0,5-1ml
com uma agulha de escleroterapia nas partes
exofíticas do tumor. A experiência mostra uma
eficácia de 80-100% no alívio da disfagia. No
entanto este efeito paliativo é de curta
duração ( menos de 1 mês) pelo que são
necessárias injecções repetidas. É comum o
aparecimento de dor torácica após a terapêutica e podem surgir complicações sérias como
mediastinite e fistulas traqueo-esofágicas. Esta
técnica deverá ser apenas aplicada em tumores
curtos, exofíticos e não fibróticos para os quais
não existam outras alternativas disponíveis.
Há relatos preliminares de injecção intratumoral de cisplatina e gel de epinefrina com
alguma eficácia deste tipo de quimioterapia
local, o qual permanece experimental até á
data.
A paliação da disfagia pode também ser
conseguida através da coagulação tumoral
com Árgon-plasma. A demora média nas
reintervenções é de cerca de 1 mês sendo
necessárias 5 sessões em média por paciente.
Apesar da pouca profundidade de coagulação
atingida pelo Árgon plsma (2 mm) têm sido
descritos casos de perfuração em 1-2% dos
tratamentos. Parece não haver grande benefício na utilização do Argon plasma em
tumores muito exofíticos, mas no entanto esta
técnica parece ser de maior utilidade no
controle de tumores sangrantes e no
tratamento dos crescimentos tumorais para
dentro e nos extremos das próteses esofágicas.
O laser ND:YAG provoca lesão mais
profunda que o Árgon plasma porque vaporiza
o tecido e recanaliza o lúmen obstruído.
Lesões exofíticas pouco extensas em comprimento são a indicação ideal para o laser.
O procedimento é habitualmente repetido
48h após. É habitualmente efectuado de forma
retrógrada exigindo por isso muitas vezes a
realização de dilatação prévia. Os tumores
muito próximos do esfíncter esofágico superior
são melhores indicações para laser que para
colocação de prótese. No entanto a terapêutica com laser é menos eficaz que a colocação
de próteses em tumores da junção gastroesofágica e do cárdia. A terapêutica com laser
é eficaz no alívio da disfagia em 70%–95% dos
caso e a duração da resposta vai de 1-2 meses,
o que leva frequentemente á necessidade de
múltiplas sessões devido ao crescimento
tumoral. A resposta pode ser potenciada por
radioterapia ou braquiterapia. As complicações “minor” do laser incluem a dor torácica, agravamento transitório da disfagia devido
ao edema pós-tratamento e leucocitose. As
complicações “major” incluem a hemorragia,
perfuração e fístula traqueo-esofágica. Ao
contrário da colocação de próteses a terapêutica com laser está contraindicada na presença
de fístulas e não está indicada em tumores
longos, tortuosos e muito estenosantes.
Também não é eficaz na disfagia provocada
por compressão extrínseca.
A terapêutica fotodinâmica tem sido
também empregue como técnica paliativa no
tratamento da disfagia de causa maligna. Não
está apenas indicada em tumores exofíticos,
podendo também ser utilizada em lesões de
tipo infiltrativo ou plano e em lesões longas.
A sua utilização é também mais fácil que a
colocação de próteses ou laser nos tumores do
esófago cervical. A disfagia melhora em 6090% dos casos e as complicações agudas são do
mesmo tipo que as observadas nas outras
técnicas endoscópicas oscilando entre 5 a 20%.
Um dos principais obstáculos á sua utilização
nos cancros avançados do esófago é o tempo de
foto-sensibilização (4-6 semanas) associado à
terapêutica que se torna excessivo no contexto
da sua utilização como método paliativo.
25
DISFAGIA TOTAL. ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
BIBLIOGRAFIA
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Medicine
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26
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E
CORPOS ESTRANHOS
AMÉRICO SILVA
ANTÓNIO CASTANHEIRA
carcinoma esofágico são as complicações mais
importantes a médio e longo prazo. Não há
terapêutica provada que impeça a evolução
estenótica das lesões mais graves.
A maioria dos corpos estranhos ingeridos
atravessa o tubo digestivo espontaneamente,
não requerendo qualquer tipo de abordagem
terapêutica(11,16). Em 10 a 20% dos casos a
terapêutica é não cirúrgica, estando esta
indicada, actualmente, em menos de 1% das
situações(16,17).
Ao longo deste capítulo vamos rever os
aspectos epidemiológicos, clínicos, de abordagem diagnóstica e terapêutica e as
complicações inerentes à ingestão de cáusticos
e de corpos estranhos.
INTRODUÇÃO
A ingestão de produtos cáusticos e corpos
estranhos é uma emergência gastrenterológica
relativamente frequente, sendo responsável
por 4 a 12 % das endoscopias urgentes.
Os cáusticos são substâncias com elevada
capacidade destrutiva do tracto digestivo,
podendo ser letais. A morbilidade associada à
ingestão de corpos estranhos é significativa,
com complicações minor em 15 a 42% e major
em 0,5 a 7,5%. São raros os casos de morte
publicados(1,2) e a mortalidade após admissão
hospitalar é baixa como atestam as séries
publicadas(3-9), com nenhuma fatalidade em
852 admissões de adultos e uma em 2206
admissões de crianças. Apesar dos dados da
literatura, a mortalidade global pode atingir os
3,5%, estimando-se a ocorrência anual de
1500 mortes por ingestão e 3000 por aspiração
de corpos estranhos(10-11), nos USA.
O tipo e a extensão das lesões decorrentes
da ingestão de cáusticos, dependem de factores
relacionados com a natureza do agente corrosivo, a sua forma de apresentação, a quantidade
e o modo de ingestão, acidental ou intencional.
A endoscopia é o melhor meio de triagem das
lesões, permitindo avaliação diagnóstica e
prognóstica. Cinquenta a 80% dos doentes
com suspeita de ingestão de cáustico não apresentam lesões significativas no exame
endoscópico(12,13). Na fase aguda, pode ocorrer
necrose e perfuração, com mortalidade entre 1
e 4%, nos países ocidentais(14,15). As estenoses
esofágicas e gástricas e o desenvolvimento de
INGESTÃO DE CÁUSTICOS
Epidemiologia
Apesar de medidas de saúde pública
restritivas quanto à apresentação e venda de
produtos corrosivos, constata-se um aumento
progressivo da incidência de lesões cáusticas
graves desde a introdução no mercado, em
1960, dos produtos de limpeza alcalinos. Em
2000 ocorreram 206 636 casos de ingestão de
produtos de limpeza nos USA, 58% em
crianças menores de 6 anos(12). Em Espanha, a
incidência da intoxicação por cáusticos entre
1994 e 2001, foi de 38,7 / 100 000 habitantes,
sendo a etiologia maioritariamente acidental
(84,6%). No mesmo estudo o suicídio motivou
6,8% dos casos com observação hospitalar(18).
27
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
Em Portugal não há estatísticas conhecidas,
não existindo, provavelmente, protocolos de
conduta devidamente uniformizados no diagnóstico e terapêutica destes doentes. Haverá
até atitudes inadequadas ou mesmo nocivas
que poderão concorrer para uma maior gravidade das lesões cáusticas, quer na abordagem
extra-hospitalar, quer já no serviço de urgência.
Por outro lado, é consabido a potencial
gravidade da ingestão de cáusticos, produzindo lesões extensas no tracto digestivo, que
podem resultar na perfuração e morte na fase
aguda (1 a 4% nos países ocidentais)(14,15), ou
no desenvolvimento de estenoses e carcinoma
esofágico a médio e longo prazo, respectivamente.
Alcalinos
São os agentes corrosivos mais frequentes
nos países ocidentais, encontrando-se na
maioria dos produtos de limpeza doméstica e
industrial(19). Os produtos de limpeza doméstica mais comuns contêm peróxido de
hidrogénio (3%), hipoclorito de sódio ou
hidróxido de sódio em baixas concentrações
(1%), com pH entre 10,8 e 11,4, sendo
irritantes ligeiro a moderados(19,20). A sua
ingestão acidental produz habitualmente
lesões mínimas, podendo ocorrer dano mais
sério por ingestão de grandes quantidades.
É raro o desenvolvimento de estenoses.
Outros produtos, como os usados no desentupimento de canalizações, são mais agressivos.
Contêm hidróxido de sódio (soda cáustica)
entre 4% e 45%, sendo a apresentação cristalina mais perigosa que a forma líquida.
Produzem lesões severas, incluindo perfuração
e desenvolvimento frequente de estenoses.
Natureza dos agentes cáusticos
Cáustico corresponde a toda a substância
química com capacidade de destruição dos
tecidos orgânicos expostos, lesando as
membranas celulares e provocando necrose.
Pode tratar-se de produto alcalino ou ácido
(tabela 1).
Ácidos
A ingestão de ácidos corrosivos é rara nos
países ocidentais (<5%). É relativamente
TABELA 1 – PRODUTOS CÁUSTICOS MAIS FREQUENTES (*)
Tipo de agente
Alcalino
Ácido
Hidróxido de sódio e de potássio
++++
Hidróxido de sódio e de potássio em
concentrações elevadas
Hidróxido de amónio
Hipoclorito de sódio e cálcio
Carbonato de sódio
Perborato de sódio
Fosfato de sódio
Hipoclorito de sódio
++++
Utilidade
Detergentes
Agentes de limpeza de fornos e canalizações
Cosméticos/Sabões
Pilhas
++
++
++
++
++
++
Ácido clorídrico
++++
Ácido sulfúrico
++++
Ácido nítrico
Peróxido de hidrogénio
++++
+++
Ácido fosfórico
++
Desinfectante
Branqueador
Branqueador
Branqueador
Pasta dentífrica
Detergente
Desinfectante
Limpeza de sanitários
Antioxidantes
Limpeza de piscinas
Limpeza de sanitários
Líquido de baterias
Fabrico de tintas
Desinfectante
Branqueador
Detergentes
Ácido acético
Ácido férrico
+
+
Solventes para pinturas
Tinta de escrita
28
Américo Silva e António Castanheira
vulgar em países como a Índia, onde os ácidos
clorídrico e sulfúrico são de fácil acessibilidade
(21-23. No Ocidente, os ácidos encontram-se
em produtos de limpeza e desinfecção de
sanitários (sulfúrico e clorídrico), produtos
anti-ferrugem (clorídrico, oxálico, fluorídrico),
fluido de baterias (sulfúrico) ou agentes de
limpeza de piscinas (clorídrico).
insípidos, inodoros e incolores. Além disso,
são muitas vezes colectados em embalagens de
reciclagem doméstica, originando confusões
trágicas. Sendo de fácil ingestão, provocam
frequentemente lesões importantes (figuras 1
e 2) no esófago e estômago(13,18,19,24).
Fisiopatologia
Alcalinos
Os agentes corrosivos alcalinos têm
habitualmente pH entre 11,5 e 14. Produzem
necrose coliquativa ou de liquefação(13).
A sua acção envolve destruição do colagénio,
saponificação das gorduras, dissolução de
proteínas, emulsão das membranas lipídicas e
desidratação tissular. A trombose vascular e
produção de calor concorrem para a lesão em
profundidade. A destruição tissular é rápida,
logo nos primeiros segundos ou minutos,
podendo progredir durante várias horas.
A concentração do cáustico e o tempo de
contacto são importantes. Por exemplo, uma
solução de hidróxido de sódio (NAOH) a
22,5%, em contacto com o esófago durante 10
segundos, e outra a 30% durante 1 segundo,
podem provocar igualmente lesão transmural
(13,19).
Há, no entanto, outros factores que
influenciam a intensidade e extensão da lesão
cáustica, nomeadamente: o volume ingerido
(pode relacionar-se com a etiologia da
ingestão), a forma de apresentação (líquida ou
sólida) e grau de viscosidade; a existência de
condições patológicas prévias que reduzam a
clearance esofágica, a presença de refluxo
gastro-esofágico e a presença ou ausência de
alimentos(13,18,19,24).
Os alcalinos em forma sólida ou cristalina
(p. ex. soda cáustica) são de difícil deglutição,
tendem a aderir à mucosa oral e faríngea,
provocando lesões mais ou menos graves a
esse nível, poupando o esófago. Os líquidos
alcalinos possuem características que potenciam a sua agressividade: são habitualmente
FIGURA 1 - ESOFAGITE CÁUSTICA - GRAU 2B
FIGURA 2 - QUEIMADURA GÁSTRICA POR CÁUSTICO
- GRAU 3
Após a agressão cáustica, sobrevem o
descolamento da mucosa entre o 4º e 7º dia,
iniciando-se a invasão bacteriana, resposta
inflamatória e formação de tecido de
granulação. A deposição de colagénio tem
início após a 2ª semana. As primeiras 2
semanas são, por isso, o período de maior
fragilidade e risco de perfuração(22).
29
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
A fase de cicatrização começa na 3ª
semana, podendo continuar-se por vários
meses. Ocorre, frequentemente, retracção
com encurtamento do órgão e dismotilidade,
além de estenoses fibróticas, nas queimaduras
mais graves(14).
A lesão típica por corrosivo alcalino
envolve o esófago em 100% dos casos e provoca lesões focais no estômago, dada a
neutralização parcial do cáustico pelo ácido
gástrico(21).
alcalinos líquidos lesam predominantemente o
esófago, podendo até não induzir lesões orofaríngeas. Os ácidos são habitualmente mais
corrosivos a nível gástrico.
O envolvimento da laringe ou epiglote
associam-se a rouquidão e estridor. A lesão do
tracto respiratório pode ocorrer no acto de
ingestão do cáustico ou por aspiração de
vómito(12). Sede intensa, náuseas e vómitos
são habituais. Os sintomas de queimadura
esofágica incluem odinofagia e disfagia,
enquanto o envolvimento do estômago pode
determinar epigastralgias e hematemeses.
Podem surgir melenas ou hematoquézia e
sinais de irritação peritoneal, mesmo sem
perfuração. A ocorrência de hematemese
massiva associa-se a fistulização com vaso de
grosso calibre e é frequentemente letal (p. ex.
fístula aorto-entérica)(13).
O quadro clínico pode incluir também
acidose metabólica, necrose tubular aguda,
insuficiência renal, pancreatite, hiponatrémia, síndrome de dificuldade respiratória,
coagulação intravascular, anemia secundária
a hemorragia e hemólise. Em casos graves,
com lesão de toda a parede visceral e tecido
perivisceral, com mediastinite e/ou peritonite
química, advém colapso cardiovascular e
choque hipovolémico(18).
A perfuração gástrica ou esofágica pode
acontecer em qualquer momento durante as
primeiras 2 semanas (fase de ulceração e
granulação). A alteração do estado clínico do
doente com agravamento súbito de dor
abdominal preexistente, ou aparecimento de
dor torácica, impõem avaliação radiológica
adequada(19).
Diversos investigadores tentaram estabelecer a previsibilidade de lesão esofágica
através de um determinado quadro semiológico. Num estudo, por exemplo, a presença
de estridor associou-se a lesão significativa do
esófago em 100% dos casos(26). Porém, outro
estudo mostrou que nenhum sintoma isolado
ou grupo de sintomas podia predizer
adequadamente a presença de lesão esofágica
(27). Todavia, é consensual que crianças
Ácidos
Os cáusticos ácidos têm, geralmente, pH
inferior a 2 e induzem uma necrose de
coagulação pelo efeito proteolítico e de termo-coagulação proteica que determinam(25).
Dada a pouca viscosidade, o trânsito dos
ácidos é rápido e, com a neutralização parcial
pelo pH alcalino do esófago, as lesões a este
nível são usualmente pouco severas, localizando-se nos 2/3 distais do órgão.
No estômago, é rápido o atingimento da
pequena curvatura e região pré-pilórica, com
produção de queimadura mais ou menos
profunda e formação de escara que pode ser
transmural. É habitual o espasmo antral e
pilórico, aumentando a intensidade da lesão
gástrica. A presença de alimentos não impede
lesões extensas, dada a natureza hidrófila do
ácido. Por outro lado, o estômago vazio,
contraído e verticalizado, associa-se a
queimadura do antro e corpo médio(13,18,23).
O duodeno também pode ser atingido
pelo excesso de ácido após o relaxamento
pilórico.
Apresentação clínica
Fase precoce (aguda e sub-aguda)
Como atrás se disse, a apresentação clínica
depende sobretudo do tipo de substância, da
quantidade e da sua forma de apresentação.
Os alcalinos sólidos, de mais difícil ingestão,
provocam maior lesão a nível da mucosa oral e
faríngea e poupam relativamente o esófago; os
30
Américo Silva e António Castanheira
assintomáticas com suspeita de ingestão
involuntária de cáustico, não apresentam,
geralmente, lesões significativas na endoscopia(28).
Dez a 30% dos doentes com queimadura
esofágica não apresentam lesões orofaríngeas.
Até 70% dos pacientes com queimaduras
orofaríngeas não apresentam lesões esofágicas
significativas. Na verdade, a presença de
lesões na orofaringe não é um indicador
adequado de lesão esofágica. Nenhum sinal ou
grupo de sinais prediz adequadamente os
achados endoscópicos(29).
Abordagem diagnóstica e terapêutica do
doente causticado
Medidas pré-hospitalares
A ingestão real ou potencial de um
produto cáustico constitui sempre uma
situação de grande alarme e premência na
tomada de atitude salvadora mas, frequentemente, inadequada ou até gravosa para a
vítima. A lavagem gástrica e a indução do
vómito estão contra-indicados, pois a
reexposição do esófago ao agente corrosivo
tende a provocar lesões adicionais. Por outro
lado, não está provada a eficácia da água ou
leite como antídotos, podendo mesmo determinar agravamento das lesões pela reacção
química exotérmica que originam. Além disso,
a administração de leite vai prejudicar a
observação endoscópica. O carvão activado é
ineficaz, favorece o vómito, facilitando a
aspiração e obscurece o campo de visão para a
endoscopia. Está, por isso, contra-indicado
também. Estará indicada apenas a irrigação da
boca e faringe com água ou leite sem deglutir,
para remoção de partículas de cáustico
aderentes à mucosa(18,33).
Exceptuam-se à conduta referida as situações seguintes: 1) na ingestão de partículas
sólidas com probabilidade de aderência à
mucosa esofágica e possível lesão transmural, é
lícito a ingestão de 150 ml de água, leite ou
bebida não carbonatada (50 ml nas crianças);
2) no caso de ingestão de corrosivo ácido,
poderá ter lugar a sondagem gástrica com
drenagem e lavagem nos primeiros 60 minutos
pós ingestão (se possível por via endoscópica,
já em meio hospitalar)(18,34).
Fase tardia
As sequelas a médio-longo prazo da
ingestão de corrosivo relacionam-se, fundamentalmente, com o desenvolvimento de
estenoses esofágicas e/ou gástricas e, menos
frequentemente, duodeno-jejunais(13,19). As
estenoses esofágicas desenvolvem-se com o
início da cicatrização depois da 2ª semana e
podem tornar-se sintomáticas dentro de 3
meses ou manifestar-se até 1 ano após a
agressão cáustica. A estenose gástrica,
nomeadamente com obstrução de drenagem
(estenose antro-pilórica), pode evidenciar-se
dentro de 4 a 6 semanas ou só se tornar
patente vários anos depois(21-23).
Acloridria, gastroenteropatia perdedora
de proteínas, mucocelo esofágico (1 a 5 anos
após interposição de cólon com exclusão
esofágica), carcinoma gástrico de células
escamosas (raro, 3%) e o carcinoma esofágico
(incidência 1000 a 3000 vezes superior à da
população geral), são outras complicações
possíveis das queimaduras por cáusticos.
O carcinoma esofágico tem habitualmente
um longo período de latência, que pode ir até
58 anos. A maioria das lesões ocorre a nível
da carina e tem geralmente melhor prognóstico, dado surgir em doentes mais jovens,
com sintomatologia mais precoce(30-33).
No hospital
O diagnóstico da ingestão e lesão por cáusticos faz-se pela anamnese, exame objectivo e
exploração instrumental.
É importante a recolha de dados sobre o
quê, quando, como, porquê e em que
quantidade ocorreu a ingestão do cáustico.
31
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
Importa conhecer também as atitudes
tomadas até à assistência hospitalar.
A abordagem inicial deve focar-se na
manutenção das vias aéreas e ressuscitação de
volume(12,18). As primeiras medidas que se
impõem são uma observação rigorosa da boca,
faringe e laringe (laringoscopia directa),
assegurar a permeabilidade das vias aéreas;
efectuar intubação endotraqueal se necessário,
ou traqueostomia na sua impossibilidade. É
corrente a administração de corticóide para
resolução do edema laríngeo (embora de
resposta lenta). Importantes são, também,
gestos simples como a elevação da cabeceira
(evitar o refluxo, lesão adicional e bronco-aspiração). A administração de um antiemético
potente de acção central e analgesia adequada
podem ser igualmente indispensáveis(35).
Simultaneamente, importa estabilizar o
doente. Dependendo da gravidade da apresentação clínica, é conveniente obter um acesso
venoso periférico eficaz, pelo menos duas vias;
controlar o equilíbrio ácido-básico e efectuar
balanço analítico; monitorizar os parâmetros
vitais; repor líquidos (glucose 5% e lactato de
Ringer). Se shock, administrar expansores do
plasma e albumina; eventuais fármacos
vasoactivos (dopamina, dobutamina, norepinefrina). Se hemorragia, transfundir
concentrado de eritrócitos. Prevenir IRA
(secundária a hemólise e shock), administrando furosemida(18).
contraste hidrossolúvel não é inócuo, devendo
atender-se à possibilidade de aspiração
brônquica, com risco de edema pulmonar
associado à hipertonicidade do produto(36).
No seguimento destes doentes, o exame
radiológico com contraste baritado é mais
adequado, pois permite a avaliação das
complicações com maior detalhe morfológico.
Possibilita a apreciação da gravidade e
extensão das queimaduras, nomeadamente no
que concerne à sua evolução estenótica(37).
Endoscopia
A EDA é o exame primordial na
abordagem do doente com história de ingestão
de cáustico. Deve efectuar-se tão cedo quanto
possível, logo que o doente esteja estabilizado
e não haja evidência de perfuração(18,22).
Indicação
Não existem guidelines definitivas, mas a
presença de queimaduras orais e/ou sintomatologia é indicação segura para EDA.
A suspeita de ingestão de lixívia doméstica
em crianças assintomáticas, sem lesões orais,
não obriga a endoscopia. A quantidade
ingerida (uma colher ou uma chávena, p. ex.),
a eventual intenção suicida e a persistência de
sintomas são circunstâncias relevantes na
indicação para a realização do exame(13).
Contra-indicação
A presença de queimaduras do 3º grau na
hipofaringe ou obstrução respiratória, sinais ou
sintomas de perfuração, instabilidade hemodinâmica ou shock, são contraindicação para EDA.
A fase sub-aguda entre os 5 e 15 dias pós ingestão, associada a risco elevado de perfuração por
amolecimento dos tecidos, contra-indica
também a realização do exame (18,22).
Exames radiológicos
A avaliação inicial do doente causticado
grave inclui, obrigatoriamente, a radiografia
simples do tórax e abdómen, tendo em mente
a possibilidade de aspiração ou perfuração.
Esta pode ser sugerida pela presença de ar no
mediastino ou sub-diafragmática, indiciando
perfuração esofágica ou gástrica, respectivamente. O exame radiológico com contraste
hidrossolúvel realiza-se na suspeita de
perfuração, nas queimaduras hipofaríngeas
graves, na endoscopia incompleta ou na
impossibilidade da sua realização. O uso de
Timing, risco de perfuração e extensão da
EDA
A endoscopia deve efectuar-se tão precocemente quanto possível, geralmente antes
das 24 horas, embora alguns autores apontem
32
Américo Silva e António Castanheira
as 96 horas pós-ingestão como limite para o
exame sem risco de complicações(13,19). A
realização precoce do exame permite a triagem
de doentes quanto à gravidade das lesões,
possibilitando uma adequada racionalização
dos meios terapêuticos.
O exame deve ser efectuado sob sedação
apropriada, sendo a entubação endotraqueal
necessária apenas em doentes com dificuldade
respiratória. O risco de perfuração associado à
exploração endoscópica relacionava-se com a
utilização de aparelhos rígidos e doentes não
colaborantes, sendo obviado pelo uso de
endoscópios flexíveis e pela sedação conveniente(22).
A extensão do exame é a esófago-gastroduodenoscopia, sempre que exequível sem
risco que a contra-indique. A ausência de
lesões esofágicas ou a sua presença, não exclui
ou permite graduar a intensidade de lesões
gastro-duodenais. É, todavia, geralmente
aceite a recomendação de não progredir além
de uma queimadura circunferencial do 2º
grau ou uma lesão de 3º grau, dado o risco
acrescido de perfuração. A avaliação do tracto
digestivo não explorado, nesta circunstância,
será efectuada por exame radiológico
contrastado, incluindo o TAC com duplo
contraste, oral e intravenoso(18,19).
Recentemente, surgiram estudos avaliando
o potencial aumento da eficácia diagnóstica e
prognóstica da endoscopia com o complemento da ultrassonografia. Enquanto uns
autores consideram uma mais valia em termos
prognósticos (38), outros concluem que a técnica
não aumenta a capacidade preditiva de
complicações precoces ou tardias fornecida
pela endoscopia convencional(39). Há, igualmente, estudos que dão ênfase à associação de
parâmetros clínico-laboratoriais (hematemeses, LDH elevada) à severidade dos achados
endoscópicos, na previsão do risco de desenvolvimento de estenose fibrótica(40).
Graduação dos achados endoscópicos
A classificação ou estadiamento das lesões
por cáusticos (tabela 2) é similar às
queimaduras cutâneas: grau 1, 2, e 3.
A classificação endoscópica das queimaduras por cáusticos é, como vimos, de grande
relevância clínica, pois permite uma avaliação
prognóstica e orientação terapêutica adequadas.
Cinquenta a 80% dos doentes com
suspeita de ingestão de cáustico não apresentam lesões na endoscopia(12,13).
As lesões de grau 1 e 2a determinam pouca
morbilidade aguda e, em regra, não evoluem
para estenose. Permitem dieta oral e alta
hospitalar a curto prazo, com inibidor da
secreção ácida.
Nos casos de lesão mais grave (2b e 3) é,
geralmente, necessário o internamento em
TABELA 2 – GRADUAÇÃO ENDOSCÓPICA E CORRESPONDENTE PATOLOGIA (12,22).
Achados endoscópicos
Patologia
Grau 0
Normal
Grau 1
Edema e eritema
Lesão das camadas superficiais da mucosa
Grau 2a
Friabilidade, lesões bolhosas, hemorragia,
exsudato esbranquiçado, erosões
ou ulceração superficial
Extensão até à muscular própria
Grau 2b
Lesões de grau 2a mais profundas mas
descontínuas ou ulcerações circunferenciais
““
Grau 3a
Múltiplas ulcerações profundas,
coloração acinzentada ou castanho-escuro
Lesão transmural com extensão possível
a estruturas mediastínicas ou peritoneais
Grau 3b
Necrose extensa
““
33
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
unidade de cuidados intensivos com suporte
nutricional adequado. Nestes casos (2b e 3a),
a evolução para estenose cifra-se entre 70% e
100%. As queimaduras 3b associam-se a
elevada a mortalidade (65%), podendo ser
necessária esofagectomia como medida
salvadora(15,22).
na ausência de corticoterapia. Porém, está
indicado o seu uso precoce, no caso de aspiração brônquica e perfuração gástrica ou
esofágica(14,46-48).
Sucralfato
Melhora a mucosite, mas não acelera a
cicatrização nem previne complicações(49).
Terapêutica da lesão cáustica e
prevenção de estenoses
Inibidores da secrecção cloridro-péptica
Os inibidores da bomba de protões (IBP)
são mais eficazes que os antagonistas H2,
favorecem a regeneração da mucosa gástrica e
previnem a agressão esofágica por refluxo, que
é complicação habitual e contribui para desenvolvimento rápido de estenoses(50).
Não há terapêutica específica e a evolução
para estenose depende quase exclusivamente
da intensidade e extensão das lesões(12,15).
Terapêutica médica e instrumental
Corticosteróides
Os estudos são controversos. São fármacos
com potente acção anti-inflamatória e inibidora
da fibrogénese, que actuam atrasando ou
diferindo a estenose cicatricial em queimaduras
esofágicas severas por alcalinos. A sua eficácia
baseia-se em estudos não controlados em
animais que mostram uma redução até 50% da
evolução estenótica(41). Existem estudos
prospectivos e meta-análises que favorecem a
utilização de corticóides em doentes com lesões
de grau 2b e 3(42,43). Todavia, outros estudos
não mostram qualquer benefício e sublinham
até os seus efeitos perniciosos. Com efeito, os
corticóides mascaram o aparecimento de sinais
mediastinite ou peritonite e alteram a barreira
de protecção gástrica; favorecem a sobreinfecção bacteriana e fúngica, e alterarem o
metabolismo ósseo(44-46).
São, contudo, de uso corrente, administrando-se a metilprednisolona em doses
endovenosas de 40 a 60 mg em lesões severas
e circunferenciais (2b e 3a) durante pelo
menos 3 semanas, com redução progressiva
subsequente.
Outros agentes farmacológicos
Além dos conhecidos inibidores da síntese
do colagénio (b-aminoproprionitrilo, penicilamina, N-acetilcisteina e colchicina)(51,52),
mais recentemente, têm sido investigadas
outras substâncias, como a heparina, o factor
de crescimento epidérmico (EGF)e o ester
fenetil do ácido cafeico (CAPE)(53,54). São
substâncias que mostraram uma diminuição
de estenose cicatricial nos estudos em animais,
aguardando-se ensaios em humanos.
Intubação nasogástrica
A colocação de sonda nasogástrica com
intuito de manutenção da patência do lúmen
esofágico pode associar-se ao desenvolvimento de estenoses longas, pelo que o seu uso
deve ser parcimonioso(13,19). A alimentação
por sonda nasoentérica é, no entanto, quando
possível, um meio de aporte nutricional
adequado, sem as potenciais complicações
sépticas, metabólicas e tromboembólicas associadas à nutrição parentérica. A maioria dos
autores recomenda início de alimentação
nasoentérica às 24 horas e introdução de
líquidos per os depois de 48 horas, se o
doente consegue deglutir a saliva sem dificuldade(15).
Antibióticos
O uso de antibioterapia de largo espectro é
consensual, na administração de corticóides,
não se advogando a sua utilização profilática,
34
Américo Silva e António Castanheira
Cirurgia
A cirurgia tem indicação precoce ou emergente, na fase aguda e também diferida ou
reconstrutiva, no tratamento das complicações a médio e longo prazo.
As indicações para cirurgia emergente são
a evidência de perfuração, complicações
graves do tracto respiratório (fistula traqueoesofágica, p. ex.), hemorragia gastrointestinal
maciça, necrose extensa esofágica e/ou gástrica (lesões grau 3b). A presença de shock,
acidose metabólica, alterações da coagulação
e ingestão de grande quantidade de cáustico
associa-se a achado de lesões mais graves na
laparotomia, sendo estes doentes que mais
poderão beneficiar com cirurgia precoce(22,61-64).
A cirurgia diferida tem indicação na
reconstrução da continuidade do tubo digestivo em doentes esofagectomizados; a plastia
ideal é a interposição de cólon, geralmente
mais de 6 meses após a queimadura(18,63,64). A
cirurgia tem lugar, igualmente, no tratamento
das complicações a médio prazo, como seja a
resolução de estenoses gástricas ou o fracasso
da dilatação nas estenoses esofágicas. A longo
prazo tem indicação no tratamento do carcinoma espinhocelular, sequela tardia, mas com
incidência elevada nas vítimas da ingestão de
cáusticos.
Apresenta-se um algoritmo de abordagem
diagnóstica e terapêutica, necessariamente
genérico, consubstanciado na tabela 3.
Nutrição parentérica total
A nutrição parentérica total (NPT) é indispensável nos casos mais graves, quando a opção
não é a alimentação por sonda nasoentérica ou
por jejunostomia. Por outro lado, alguns autores
atribuem-lhe a vantagem suplementar de poder
evitar a formação de estenoses(13), embora essa
possibilidade não seja inequívoca. O efeito
deletério do traumatismo alimentar a nível da
queimadura esofágica ou gástrica associado à
potencial colonização bacteriana, poderão
agravar e perpetuar a reacção inflamatória
exacerbando a fibrose(55).
Colocação de stent
Outros investigadores ensaiaram a introdução de próteses de silicone no esófago com
lesão cáustica grave, no intuito de prevenir a
evolução estenótica, com eficácia não universalmente aceite(56,57).
Dilatação precoce
Como atrás se disse, a fase sub-aguda,
entre os 5 e 15 dias pós ingestão de cáustico, é
o período de maior fragilidade da parede
esofágica dada a avulsão do material necrótico
substituído gradualmente por tecido de granulação. Alguns autores preconizam o início de
dilatação precoce para profilaxia de estenose
cicatricial(58), mas este procedimento não é
recomendado, dado o risco acrescido de
perfuração.
Tratamento de estenoses
A resolução por dilatação endoscópica
periódica de estenoses curtas no esófago é
exequível e razoavelmente bem sucedida.
Estenoses antro-pilóricas que requeriam,
habitualmente, terapêutica cirúrgica, também
podem ser tratadas com sucesso por dilatação
endoscópica. A aplicação intra-lesional de
corticóide de acção prolongada pode melhorar
os resultados, reduzindo a frequência de
dilatação(59,60). As sessões de dilatação
iniciam-se geralmente à 3ª ou 4ª semana de
ingestão de cáustico, após diagnóstico radiológico da estenose.
INGESTÃO DE CORPOS
ESTRANHOS
Aspectos Epidemiológicos e História
Natural
Os corpos estranhos podem classificar-se
em dois tipos: impactos alimentares e verdadeiros corpos estranhos. Estes últimos podem
subdividir-se, consoante as suas caracteristicas
morfológicas e toxicológicas, em rombos,
cortantes ou pontiagudos, e tóxicos ou não
tóxicos.
35
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
TABELA 3 – ALGORITMO DE ABORDAGEM DIAGNÓSTICA E TERAPÊUTICA (*)
Investigar:
-Tipo de
substância
-Volume
-Concentração
-Ingestão acidental
Evitar vómito provocado
ou auto-induzido
Ingestão de cáustico
Dificuldade respiratória?
Estabilização hemodinâmica
Assegurar vias aéreas
Nada per os
Laringoscopia directa
Intubação orotraqueal ou
traqueostomia
Radiografia simples do tórax
e abdómen
Perfuração
Não
Sim
Endoscopia
Cirurgia
urgente
0-2a
2b-3a
Tratamento sintomático
Avaliação psiquiátrica
se intenção suicída
3b
Nutrição nasoentérica
Prevenção
estenoses
de
Opção A (?)
Opção B (?)
-Corticóides
-Antibióticos
-Antisecretores
Stent
Rx com contraste baritado aos 14 dias e
cada 2 semanas durante 8 semanas
Opções A e B
– eficácia não
provada
Estenose
Cirurgia
electiva
Tratamento endoscópico dilatações anterógradas /
Stent (?)
Fracasso
(*) Adaptado de Montoro Huguet M. y García Cabezudo J. Lesiones por ingestión de cáusticos. © AEG - Asociación Española de Gastroenterología (www.aegastro.es)
36
Américo Silva e António Castanheira
rias (2-10%), das pilhas (1-3%) e moedas (12%). Por vezes ocorrem situações bizarras
como a ingestão de insectos (figura 3), de
casca de amêijoa (figura 4) e mesmo ratos
vivos com fins supostamente terapêuticos(68).
A ingestão do corpo estranho pode ser
voluntária ou involuntária e, neste caso,
perceptível ou não. Independentemente da
forma como se dá a ingestão, podemos deparar
com três situações, a saber:
1. Uma fatalidade, habitualmente como
consequência da obstrução da árvore
respiratória. Esta ocorrência é cada vez
menos frequente, com o conhecimento
mais ou menos generalizado da manobra
de Heimlich.
2. A resolução espontânea, entendendo-se
como tal a transposição do cardia, que
sucede na maioria dos casos (80-90%).
Não significa, contudo, a solução do
problema, pois as complicações podem
acontecer durante o seu trânsito no
tubo digestivo, e motivar a ida a um
serviço de urgência no prazo de horas,
dias ou mesmo meses.
FIGURA 3 - INSECTO NO ESÓFAGO
3. Por último, a impactação esofágica do
corpo estranho que ocorre em 10 a 20%
dos casos, motivando a procura imediata
ou a curto prazo de cuidados médicos.
A análise de onze séries publicadas(3e a experiência nacional apresentada
(HUC, H.S.Teotónio - Congresso Nacional
Gastrenterologia – Vilamoura 2005; e H. S.
Marcos - Reunião Anual do NGHD) permitenos afirmar relativamente a aspectos epidemiológicos que, apesar da ingestão de corpos
estranhos ocorrer em qualquer idade, é particularmente frequente nas crianças com idades
compreendidas entre os seis meses e os três
anos, nos adultos com deficiência mental,
psico-motora ou doença psiquiátrica, nos
alcoólicos, e quando se pretende ganho
secundário com o acto (ex.: presidiários para
obtenção de melhores condições ou tentativa
de fuga; como chamada de atenção familiar).
Os corpos estranhos mais frequentes são os
impactos alimentares (34-59%), seguidos dos
ossos e espinhas (16-18%), das próteses dentá-
9,17,65-67)
FIGURA 4 - CASCA DE AMÊIJOA NO ESÓFAGO
O esófago é o local de impactação mais
frequente do tubo digestivo, ocorrendo nos 2/3
inferiores em 38 a 52% e no 1/3 superior em 23
a 36% dos casos, logo seguido do estômago (716%) e da faringe/cricofaríngeo (6 a 16%).
Outras áreas importantes de impactação são o
arco duodenal e a válvula ileo-cecal (< 2%).
O conhecimento da normal anatomia
esofágica e dos seus locais de estreitamento
fisiológico é importante, pois permite-nos
37
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
identificar as áreas de maior risco de
impactação, que são: o músculo cricofaríngeo
/ esfíncter esofágico superior (E.E.S.) a 15-17
cm dos incisivos (figura 5); o arco aórtico
(A.A) a 23 cm dos incisivos (figura 6); o ramo
principal do brônquio esquerdo (R.P.B.E) a 27
cm dos incisivos (figura 7); o esfíncter esofágico inferior (E.E.I.) a 36-38 cm dos incisivos
(figura 8).
FIGURA 7 - IMPACTAÇÃO NO R.P.B.E.
FIGURA 5 - IMPACTAÇÃO NO E.E.S.
FIGURA 8 - IMPACTAÇÃO NO E.E.I.
Comparando os diferentes aspectos epidemiológicos entre o impacto alimentar e os
verdadeiros corpos estranhos, verificamos que:
1. O impacto alimentar esofágico é mais
frequente nos idosos, ao contrário dos
verdadeiros corpos estranhos, que são
mais frequentes nas crianças.
FIGURA 6 - IMPACTAÇÃO NO A.A.
2. A ingestão de verdadeiros corpos
estranhos nos adultos é maioritariamente voluntária, ao contrário das
38
Américo Silva e António Castanheira
crianças em que é acidental e, muitas
vezes, consequência da sua curiosidade
explorativa do meio que a rodeia.
ABORDAGEM DIAGNÓSTICA E
TERAPÊUTICA
A abordagem inicial, no Serviço de
Urgência, não é efectuada por um gastrenterologista na grande maioria dos nossos
Hospitais. O internista ou cirurgião poderão,
em alguns casos, ter de implementar medidas
emergentes no sentido de restabelecer a
permeabilidade das vias respiratórias. Quando
tal não é necessário, a colheita de elementos
como o tipo de corpo estranho ingerido, o
timing de ingestão, a sintomatologia associada,
a existência ou não de patologia digestiva
prévia, são importantes para a posterior
decisão terapêutica. O exame objectivo deve
centrar-se na detecção de complicações. A
laringoscopia directa deverá ser o prolongamento do exame objectivo podendo,
ocasionalmente, permitir a observação e
remoção do corpo estranho e assim a
resolução imediata do problema.
3. O impacto alimentar esofágico está
habitualmente associado a patologia
esofágica adquirida no adulto, a malformações anatómicas nas crianças, e a
problemas de dentição ou ao uso de
próteses dentárias nos idosos.
ASPECTOS CLÍNICOS
A maioria dos pacientes é capaz de relatar
a história da ingestão do corpo estranho.
Outros, no entanto, pela idade, por alterações
mentais ou psiquiátricas, não fornecerão
qualquer informação. Os sintomas são variados e muitas vezes inespecíficos, dependendo
fundamentalmente do local de impactação, do
grau de obstrução e da existência de complicações associadas. Incluem graus variados de
disfagia, odinofagia e dor torácica. Com a
obstrução esofágica completa surge a sialorreia
e a regurgitação. Até 5% dos pacientes manifestam sintomas sugestivos de obstrução
respiratória (69), com dispneia, estridor e tosse,
consequência da impactação do corpo estranho no crico-faríngeo e esfíncter esofágico
superior, por compressão da traqueia ou
mesmo por aspiração do corpo estranho ou
secreções.
Crianças mais jovens e indivíduos com
alterações mentais ou psiquiátricas podem
apresentar-se no Serviço de Urgência em
choque, com dificuldade respiratória, recusa
alimentar, vómitos, impossibilidade de deglutição da saliva, pneumonias de repetição,
devendo os corpos estranhos ser incluídos no
diagnóstico diferencial destas situações.
Sinais como tumefacção, eritema, tensão,
crepitação na região cervical, indiciam
perfuração orofaríngea ou do esófago proximal. O abdómen deve ser observado para
exclusão de sinais de peritonite ou obstrução
intestinal.
Papel dos meios de diagnóstico não
endoscópicos – A Imagiologia
A imagiologia tem um papel importante na
abordagem diagnóstica do doente que ingeriu
um corpo estranho, a radiografia simples torácica e abdominal, em dois planos, permite a
identificação, a caracterização, a localização e,
quando for caso disso, a monitorização da
progressão ao longo do tudo digestivo de um
corpo estranho radiopaco. Doentes assintomáticos no momento da observação no
Serviço de Urgência, têm estudos radiológicos
positivos em 15% dos casos(69) enquanto nos
sintomáticos detectar-se-á algum tipo de
alteração na maioria dos exames. Estima-se,
no entanto, a ocorrência de 0,5% falsos
negativos e 20% falsos positivos(70,71). A radiografia simples toraco-abdominal permite
estabelecer o diagnóstico de complicações
como a perfuração, pela presença de ar livre a
nível sub-cutâneo na região cervical ou torácica, no mediastino ou no peritoneu. Mais
raramente pode revelar uma migração extra-digestiva de um corpo estranho.
39
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
A utilização de contraste deve evitar-se
pois pode inviabilizar ou dificultar, de certa
forma, a realização de endoscopia digestiva
alta (EDA), e está contra-indicado em
doentes com sintomas de manifesta obstrução.
Na suspeita de perfuração deverá utilizarse gastrografina como meio de contraste, que
poderá estabelecer o local de rotura (figura 9).
A intervenção será sempre necessária quando
a impactação de um corpo estranho ocorre no
esófago, devendo esta acontecer no prazo
máximo de 12 a 24 hrs, dependendo do tipo de
objecto em causa. Pelo risco acrescido de
complicações, especial atenção deverá ser
dada aos corpos estranhos pontiagudos ou
cortantes, cuja remoção deve ser feita antes da
sua passagem para lá do estômago.
Relativamente ao grau de urgência da
intervenção, esta deverá ser emergente
quando o corpo estranho ou bólus alimentar
impactado causam alto grau de obstrução,
condicionando risco de aspiração ou asfixia;
quando se trata de um objecto pontiagudo ou
cortante, pilhas ou disco de bateria alojados
no esófago ou estômago; ou quando o tempo
de impactação é desconhecido. Ciriza et al,
num trabalho prospectivo envolvendo 122
doentes(73) admitidos por suspeita de corpo
estranho ou impactação alimentar esofágica,
concluiram que o início imediato de sintomas
após ingestão do corpo estranho e a presença
de disfagia no momento de observação no
Serviço de Urgência indicam, com uma sensibilidade de 86% e especificidade de 63%, que
o corpo estranho irá ser encontrado no esófago,
tornando assim necessária e urgente a intervenção.
A abordagem terapêutica vai depender
de vários factores, como a idade e condição
clínica do doente, o local de impactação e
característica do corpo estranho, a experiência
pessoal e da própria instituição. São várias as
opções terapêuticas disponíveis, passando pela
endoscopia flexível e rígida, pela eventual
utilização de tipos variados de cânula balão
(exemplo: Foley), dilatadores ou fármacos,
ficando a cirurgia reservada à falência do
método endoscópico ou perante o diagnóstico
de algumas complicações. Não existem
estudos controlados prospectivos comparando
os diferentes métodos, fundamentalmente
pela variabilidade de factores envolvidos,
como: diferentes localizações, tamanhos e
formas dos corpos estranhos; diferentes
tempos de impactação; presença ou ausência
FIGURA 9 - PERFURAÇÃO ESÓFAGICA - TRÂNSITO
COM GASTROGRAFINA
O TAC e a RMN raramente são
necessários, podendo, no entanto, ser úteis
nos seguintes casos: corpos estranhos de
pequenas dimensões, como espinhas ou
esquírolas ósseas na hipofaringe e no esófago
cervical; na avaliação das complicações pré e
pós-remoção; na caracterização da extensão
da lesão na parede digestiva; no diagnóstico de
abcessos intra e extra-murais; na avaliação da
extensão de massas cervico-torácicas e a sua
relação com as estruturas neuro-vasculares(72);
na ocorrência de mediastinite; e, por último,
em casos duvidosos com RX/EDA “normais”
mas com persistência de sintomas
Papel do Gastrenterologista e da
Endoscopia Digestiva
Ao gastrenterologista cabe decidir da
necessidade ou não de intervenção, do grau de
urgência da mesma e dos meios a utilizar.
40
Américo Silva e António Castanheira
de patologia esofágica associada; nível variado
de experiência do endoscopista.
Os métodos endoscópicos, como técnica
de remoção de corpos estranhos foram pela
primeira vez descritos em 1936 por Chevalier
Jackson, e a primeira utilização da endoscopia
flexível ocorreu em 1972. Desde essa data, a
endoscopia digestiva alta tem adquirido
vantagem, pela facilidade técnica, com excelente visualização e possibilidade de remoção
de corpos estranhos até ao duodeno, pela
baixa morbilidade, por evitar a anestesia geral
na maioria dos adultos e em algumas crianças,
reduzindo assim os custos do procedimento e,
também, pela possibilidade de diagnóstico
incidental de outras patologias.
A endoscopia flexível é, na actualidade, o
melhor método de diagnóstico e terapêutica.
No entanto, para a sua total eficácia, o
gastrenterologista deverá ter disponível uma
variedade de equipamentos acessórios(74),
nomeadamente: pinça de corpos estranhos,
ansas de polipectomia, cesto de Dormia e
overtubes com diferentes comprimentos, que
possam permitir a remoção de corpos estranhos no esófago ou no estômago. O apoio da
anestesia é, em algumas circunstâncias, crucial
para o sucesso final do procedimento. Como é
natural a avaliação dos meios a utilizar deve
ser feita caso a caso e depende muito da experiência do endoscopista.
Apoiando-nos nas guidelines da ASGE e da
SPED(74,75) e em múltiplos trabalhos publicados,
vamos rever, seguidamente, as recomendações
terapêuticas relativas à impactação alimentar
esofágica e à ingestão dos diferentes tipos de
verdadeiros corpos estranhos e, por último,
descrever as complicações a eles associadas.
mento luminal ou alterações da motilidade;
2º da natureza e volume dos alimentos deglutidos. Na realidade constatamos que, na
presença de patologia esofágica (observada em
25% dos doentes(77) submetidos a endoscopia
por corpo estranho) e quando os alimentos,
particularmente a carne, são mal mastigados e
rapidamente deglutidos, pode ocorrer a
impactação alimentar esofágica.
FIGURA 10 - IMPACTAÇÃO ESOFÁGICA - BÓLUS
ALIMENTAR
A remoção endoscópica deverá ser imediata quando o doente se apresenta com
dificuldade respiratória, está incapaz de
deglutir as secreções orais, ou quando o tempo
de impactação é desconhecido. Se está confortável, sem risco de aspiração e capaz de
deglutir as secreções salivares, a intervenção
não necessita de ser emergente, devendo
contudo ocorrer nas 12 horas imediatas à
admissão. Consegue-se, dessa forma, diminuir
o risco de complicações. Por vezes, durante o
período de espera, dá-se a resolução espontânea da impactação.
A observação endoscópica permite identificar o tipo de bolus alimentar, o local de
impactação e a existência de patologia esofágica associada. As opções terapêuticas mais
frequentemente utilizadas são: 1 - remoção em
bloco ou por fracções; 2 - empurramento para
o estômago em bloco ou por fracções; 3 sucção sob visão directa, utilizando o cilindro
Impactação Alimentar Esofágica
A impactação esofágica de um bólus
alimentar (figura 10) constitui a causa mais
comum de “corpo estranho” esofágico nos
adultos, sendo raramente observado nas
crianças(76). Resulta, habitualmente, da combinação de dois factores: 1º da presença de
patologia esofágica que condicione estreita41
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
de Stiegman da laqueação de varizes; 4 - a
conjugação das técnicas anteriores; 5 - a utilização de fármacos isolados ou em associação
às técnicas anteriores.
A remoção em bloco ou por fracções com
auxílio de pinça de corpos estranhos, ansa de
polipectomia ou cesto Dormia, deve ser feita
quando o bólus é volumoso, contém espinhas
ou ossos ou quando existe estenose esofágica.
Quando a opção é o empurramento em
bloco ou por fracções, deverá ser excluída a
existência de estenose esofágica e, o procedimento efectuar-se-á sob visão directa,
exercendo uma suave pressão, preferencialmente sobre o lado direito do bólus.
Historicamente, os fármacos mais utilizados são o glucagon, o diazepam e os enzimas
proteolíticos. O glucagon é de utilização segura
não devendo, no entanto, atrasar a realização
da endoscopia(77,78). Ao actuar sobre fibra
muscular lisa, relaxando os 2/3 inferiores do
esófago e diminuindo a pressão do EEI, pode
promover a passagem espontânea do bólus
alimentar. A dose óptima parece ser 0,5 mg,
todavia, na práctica clínica utiliza-se 1 e 2 mg
podendo repetir-se(79). Está contraindicada a
sua utilização na suspeita de feocromocitoma
ou insulinoma. Alguns autores associam o
diazepam ao glucagon para promover o relaxamento das fibras musculares estriadas. Os
poucos trabalhos publicados não mostram
diferença estatisticamente significativa(80)
entre a utilização de glucagon+placebo vs
glucagon+diazepam (32% vs 38%).
Os efeitos secundários da terapêutica com
glucagon incluem nauseas, vómitos e hiperglicémia(12,81).
Os enzimas proteolíticos e os comprimidos
libertadores de gás que em tempos foram
utilizados estão, actualmente, contraindicados
em absoluto. Foram responsabilizados por
erosões, perfurações, hipernatrémias e edema
pulmonar hemorrágico, no caso da papaína(81)
e, perfuração ou rotura esofágica, no caso dos
comprimidos libertadores de gás(12).
Após resolução do impacto alimentar,
mesmo quando espontânea, é obrigatória a
avaliação endoscópica cuidada de todo o
esófago, não só para despiste de patologia
subjacente, mas também de eventuais complicações resultantes do procedimento ou da
impactação.
Corpos Estranhos Pontiagudos e/ou
Cortantes
Uma grande diversidade de corpos estranhos pontiagudos ou cortantes ingeridos,
voluntária ou involuntariamente, aparecem
descritos na literatura. Os mais frequentes são,
indiscutivelmente, as espinhas de peixe (figura
11) e os ossos de galinha, mas as agulhas,
alfinetes, clips, palitos metálicos ou de
madeira, e as próteses dentárias (figura 12)
também ocorrem comummente e, como os
primeiros, são responsáveis e estão associados
às complicações mais graves. A suspeita de
ingestão de um corpo estranho pontiagudo ou
cortante implica a realização de endoscopia
digestiva alta, mesmo na presença de um
exame radiológico negativo, dado que a maioria das esquírolas ósseas ou espinhas não são
demonstráveis radiologicamente.
FIGURA 11 - REMOÇÃO DE ESPINHA COM PINÇA DE
CORPOS ESTRANHOS
Um objecto pontiagudo ou cortante alojado
no esófago constitui uma emergência médica,
pois quanto maior for o tempo de impactação,
maior é o risco de complicações. A localização
gástrica ou no duodeno proximal, por descida
42
Américo Silva e António Castanheira
Os acessórios a utilizar durante a remoção
endoscópica, nomeadamente overtubes,
campânula de Ballard, e mesmo adaptações
como, neste caso, um cilindro de sistema de
laqueação de varizes esofágicas (figura 13),
dependerão sempre da experiência do operador e do seu julgamento caso a caso.
espontânea ou após manipulação, obriga a atitude terapêutica endoscópica imediata(69,82)
com remoção, dado o risco acrescido de complicações como a perfuração, 15-35%(83-85),
associadas ao seu trânsito pelo tubo digestivo.
FIGURA 12 - PRÓTESE DENTÁRIA IMPACTADA NO
ESÓFAGO
FIGURA 13 - PRÓTESE
DENTÁRIA COM PONTE METÁ-
LICA REMOVIDA COM UTILIZAÇÃO DE
Não existem normas rígidas para a remoção
de corpos estranhos pontiagudos, devendo, no
entanto, algumas regras ser respeitadas. Assim,
o procedimento deverá ser efectuado sempre
sob visão directa e, especial atenção será
prestada à extremidade pontiaguda (figura 11),
que deverá ser orientada distalmente.
Na impactação esofágica, a libertação do
corpo estranho pontiagudo da parede do
esófago com segurança é um aspecto terapêutico da máxima importância. Y.T. Jeen et al(86)
propuseram a utilização de um balão insuflável
adaptado à extremidade distal do endoscópio
que, ao ser insuflado, afasta as paredes do
esófago promovendo a libertação do corpo
estranho e a sua posterior remoção, diminuido
assim o risco de complicações.
Os corpos estranhos pontiagudos alojados
na região da hipofaringe, no cricofaríngeo e no
esófago proximal junto ao esfíncter esofágico
superior, representam um desafio adicional e,
por vezes, serão removidos de forma mais
segura por laringoscopia directa no primeiro
caso, ou por endoscopia rígida com anestesia
geral no segundo.
CILINDRO DE LAQUEAÇÃO DE VARIZES
ESOFÁGICAS
Quando o corpo estranho pontiagudo ou
cortante está fora do alcance do endoscópio, o
seu trânsito ao longo do tubo digestivo deverá
ser monitorizado, com realização de radiografias diárias, para documentar a sua passagem
ou detectar eventualmente e de forma
precoce, uma complicação. Os doentes deverão iniciar uma dieta rica em fibras e os
laxantes ou procinéticos estão contra-indicados;
por outro lado, devem ser instruídos no sentido
do recurso imediato ao Serviço de Urgência
em caso de dor abdominal, vómitos, febre e
hematemeses ou melenas.
A abordagem cirúrgica será considerada
quando o objecto pontiagudo não progredir
por três dias consecutivos.
Corpos Estranhos Rombos vs Longos
A ingestão de objectos rombos é mais
frequente nas crianças, ocupando as moedas
um lugar de destaque. Os objectos rombos são,
43
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
grafia semanal é suficiente para seguir a
progressão ou confirmar a expulsão. Um objecto que permaneça uma semana na mesma
localização ou na ocorrência de sintomas indiciadores de complicação obstrutiva, ou outra,
está indicada cirurgia imediata(3,16).
Os objectos com comprimento superior a 6
cm (figura 14) não ultrapassam habitualmente
o arco duodenal, devendo, por isso, ser
removidos endoscopicamente(88,93). A utilização de overtube é aconselhável, de preferência
um overtube longo (45 cm) que ultrapasse a
junção gastroesofágica. A remoção “overtube+endoscópio+corpo estranho” deverá
ser feita em bloco(94).
habitualmente, fáceis de remover e estão
associados a menor número de complicações.
Quando a sua passagem para o estômago está
confirmada, é permitida, na maioria dos casos,
uma atitude conservadora(5,8,9,87). No entanto,
se esta passagem se verifica durante a endoscopia, muitos autores preconizam a sua
remoção(4,88).
As complicações da ingestão de moedas
são raras e incluem: falência na progressão no
tubo digestivo, aspiração e obstrução respiratória, erosões ou ulcerações da mucosa e
formação de fístulas(9,89). Quando alojadas no
esófago (figura 5-8), são facilmente removidas
com pinça de corpos estranhos tipo dente de
rato ou “alligator”(3,85,89,90). Outra alternativa
para remoção de moedas alojadas no esófago,
por vezes utilizada por pediatras em centros
onde a endoscopia não está facilmente
disponível, é a utilização de sonda balão tipo
Foley, com apoio radiológico. Este método é
eficaz e as complicações são raras. No entanto,
convém referir que não há controlo sobre o
corpo estranho durante a remoção, sendo real
o risco de aspiração, e não se exclui a existência de patologia esofágica associada
(16,91,92).
Quando a remoção do corpo estranho
rombo alojado no esófago é impossível por
endoscopia flexível ou rígida, a alternativa
será o empurramento para o estômago. A
decisão posterior estará dependente da dimensão do corpo estranho, podendo a atitude ser
conservadora se for inferior a 25 mm. Se a
dimensão for superior a 25 mm, a transposição
do piloro geralmente não ocorre, devendo ser
tentada de novo a remoção endoscópica, com
apoio eventual de outros acessórios. A cirurgia
será a última alternativa.
Se o corpo estranho já não está acessível
ao endoscópio, será expelido nas fezes ao fim
de 4 a 6 dias, na maioria das situações. Pode,
contudo, demorar mais tempo, havendo casos
descritos de 4 semanas. Os pacientes devem
ser aconselhados a uma dieta rica em fibra e a
vigiar as fezes. Caso se trate de um objecto
rombo radiopaco a realização de uma radio-
FIGURA 14 - PARAGEM DE PROGRESSÃO DE CORPO
ESTRANHO LONGO, METÁLICO.
Pilhas ou Discos de Bateria
A ingestão de pilhas ou discos de bateria
ocorre mais frequentemente nas crianças, que
as deglutem de forma involuntária, ao
contrário dos adultos que, na maioria das
vezes, o fazem voluntariamente para ganho
secundário. A maioria das séries aponta para
uma incidência de 65 a 70% nas crianças vs 30
a 35% nos adultos(95). A impactação no esófago deste tipo de corpos estranhos é uma
emergência endoscópica dado que a necrose
de liquefação e a perfuração podem ocorrer
44
Américo Silva e António Castanheira
rapidamente(95,96). Maves et al demonstraram
(97) que as alterações da mucosa ocorrem no
prazo de 1 hr, progredindo para a perfuração
em 8-12 hrs.
Os mecanismos envolvidos na agressão da
mucosa são: 1) Acção corrosiva directa; 2)
Queimadura de baixa voltagem; 3) Necrose de
pressão (19). O mecanismo mais importante no
desencadear da maioria das lesões parece ser a
acção corrosiva directa dos químicos alcalinos
(12).
A regra de ouro relativamente à
impactação de pilha ou disco de bateria no
esófago é a sua remoção imediata utilizando os
meios julgados mais eficazes, eventualmente
com entubação endotraqueal ou ajuda de
overtube, para adequada protecção da árvore
respiratória.
Quando a pilha ou o disco de bateria está
alojada no esófago e a remoção endoscópica é
impossível, deverá ser empurrada para o
estômago. Na localização gástrica, a remoção
com um cesto Dormia é habitualmente fácil.
Por sua vez, a decisão da remoção ou não,
depende da dimensão da pilha ou do disco de
bateria ou seja: se inferior a 25 mm a atitude
poderá ser conservadora, pois o trânsito
processa-se na maioria das vezes sem complicações, sendo o objecto expulso até às 96 hrs
(85% são expulsos em 72 horas após transposição duodenal(98). Se for esta a opção,
deverá efectuar-se radiografia às 48 horas(95).
No caso de a pilha ou o disco permanecer no
estômago, deverá ser removido endoscopicamente. Por este motivo, em nossa opinião,
deverá sempre ser tentada a remoção
endoscópica inicial e assim resolver, em definitivo, o problema. Se a pilha ou disco de bateria tiverem dimensão superior a 25 mm, as
possibilidades de transposição do piloro são
diminutas e, mesmo que esta se verifique, o
risco de impactação jejunal é elevado. Nesta
circunstância, está sempre indicada a remoção
endoscópica imediata. Todavia, se todas as
possibilidades de remoção endoscópica estão
excluídas e a expulsão natural não ocorre, ou
se durante o trânsito intestinal surgem compli-
cações a alternativa é cirúrgica.
Se a pilha ingerida for de óxido de
mercúrio, existe o risco adicional de intoxicação por este composto(69).
A administração de eméticos, catárticos,
inibidores da bomba de protões não tem
qualquer valor comprovado. Registe-se inclusivamente um caso de re-impactação esofágica
após uso de eméticos, descrito na literatura
(95). A lavagem gástrica pode, caso se trate de
discos de bateria, facilitar e promover a passagem do piloro(99), não sendo também aconselhada.
Narcóticos - “body packing”
A deglutição de cocaína ou outros narcóticos envolvidos em invólucros plásticos, de
látex ou de outra natureza, ocorre muitas
vezes na tentativa de tráfico de drogas através
de fronteiras ou , em desespero, numa rusga ou
fuga policial(100).
A remoção endoscópica não está aconselhada e, perante um quadro de “body
packing”, os invólucros podem ser demonstráveis radiologicamente ou por TAC em 70 a
90% dos casos. Porém, os falsos negativos
acontecem com frequência(101,102).
Aconselha-se internamento em Hospital
com Unidade de Cuidados Intensivos Gerais,
preconizando-se uma atitude de “vigilância
armada” devido à possibilidade de rotura do
invólucro, designadamentede quando é frágil
ou há paragem de progressão, com ou sem
oclusão intestinal. A suspeita clínica de rotura
tem lugar quando o quadro semiológico inclui
taquicardia, arritmias, hipotensão ou
hipertensão, diaforese, tremores, hipertermia,
agitação psicomotora ou de forma mais
dramática depressão respiratória e coma.
Perante esta evolução clínica impôem-se
medidas celeres de reanimação e cirurgia.
Complicações da ingestão de corpos
estranhos
As complicações decorrem habitualmente
das características morfológicas do corpo
estranho (dimensão, forma, composição), da
45
INGESTÃO DE CÁUSTICOS E CORPOS ESTRANHOS
sua impactação, ou como consequência da sua
manipulação durante a tentativa de remoção.
A.T.Y.Lai et al em estudo retrospectivo (103)
que englobou 1338 casos de ingestão de corpo
estranho concluíram que os factores de risco
preditivo de desenvolvimento de complicações, após ingestão de corpo estranho são:
1 - Recurso tardio ao Serviço de Urgência (>
48hr); 2 - Corpo estranho visível no Rx cervical; 3 - Corpo estranho impactado no cricofaríngeo ou 1/3 superior do esófago.
Complicações ligeiras traduzidas por
edema, erosões, lacerações superficiais,
hematomas ou alterações respiratórias
discretas, ocorrem em 15 a 42% dos casos de
ingestão de corpo estranho(85,104-106). A abordagem terapêutica destas complicações é
médica.
Menos frequentemente, ocorrem complicações mais graves (0,5 a 7,5%), como a
perfuração (figuras 9 e 15), a formação de
fístulas (traqueo-esofágica ou aorto-esofágica)
e abcesso extra ou intra-mural(85,104-106).
A abordagem terapêutica destas complicações
é mais complexa, sendo na maioria delas
necessária a intervenção cirúrgica.
A perfuração é a complicação severa mais
frequente, e a fístula aorto-esofágica é a mais
fatal(107-109). O período de latência entre a
ingestão de um corpo estranho e a formação
de uma fístula varia entre 1 e 3 semanas,
podendo ocorrer anos mais tarde(104). Mais
raramente, pode dar-se a migração do corpo
estranho para o mediastino, pulmões,
brônquios, peritoneu, originando, por vezes,
quadros sintomáticos inexplicáveis.
Conclusões
A ingestão de cáusticos e de corpos estranhos constitui uma situação clínica relativamente frequente e potencialmente mortal,
podendo necessitar de uma abordagem
multidisciplinar de urgência ou diferida, por
intensivistas, ORL, pneumologistas, gastrenterologistas, especialistas em nutrição e
cirurgiões.
Em relação à ingestão de cáusticos é importante a monitorização intensiva dos casos mais
graves. Salientamos o risco de perfuração na
fase aguda e a evolução estenótica frequente
das lesões do 2º e 3º graus. É discutível a eficácia dos corticóides e antibioterapia na prevenção da formação de estenoses. O risco
aumentado de carcinoma espinho-celular obriga a uma vigilância a longo prazo.
Não existem regras “standard” para a
remoção de corpos estranhos do tubo digestivo, uma vez que cada caso é único e o sucesso depende de uma variedade de
factores. O bom senso, a experiência e a
existência de equipamento adequado,
permitem ao gastrenterologista uma actuação
endoscópica segura e eficaz, na maioria das
situações. A endoscopia rígida poderá ser útil
em corpos estranhos localizados na proximidade do esfíncter esofágico superior e em
algumas impactações esofágicas que não se
conseguem resolver com endoscopia flexível.
O papel do cirurgião está, na actualidade,
limitado a algumas complicações e a sua intervenção inicial, na remoção do corpo estranho,
só é necessária numa percentagem residual (<
1%) de casos.
FIGURA 15 - COMPLICAÇÕES: PERFURAÇÃO DE
DIVERTÍCULO DE MECKEL POR ESPINHA
(CEDIDA PELO SERVIÇO DE CIRURGIA I
H.S. TEOTÓNIO - VISEU - DIRECTOR:
DR. JOÃO LEITÃO
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HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA
NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
MARGARIDA SAMPAIO
Serviço de Urgência com hemorragia digestiva
alta, focando aspectos da avaliação inicial, da
ressuscitação e estabilização hemodinâmica,
do papel da endoscopia alta e da avaliação
prognóstica. Nos próximos dois capítulos serão
abordados de uma forma mais específica as
hemorragias de causa varicosa e não varicosa.
INTRODUÇÃO
A hemorragia digestiva alta (HDA) é um
dos motivos mais frequentes de admissão nas
urgências hospitalares. É duas vezes mais
frequente nos homens do que nas mulheres e
aumenta com a idade, variando a incidência
anual entre 36 e 102 por 100 000 habitantes(1-4).
Associa-se a morbilidade, mortalidade e
custos financeiros significativos e, apesar de
todos os avanços em endoscopia digestiva e
farmacoterapia das últimas décadas, a taxa de
mortalidade permanece elevada, entre os 6 e
10% (1, 5-7). Este facto poderá ser atribuído ao
envelhecimento da população e ao aumento
da prevalência da comorbilidade, verificando-se que a maioria dos doentes com hemorragia
morrem não por causa do episódio de
hemorragia, mas em consequência de descompensação de outras doenças(1,3).
A endoscopia digestiva alta tem um papel
fulcral na abordagem do doente com HDA.
Deve ser efectuada precocemente após a
admissão(8,9) permitindo identificar a causa de
hemorragia em 80 a 90% dos casos(10,11).
O espectro de lesões que podem causar HDA
é diverso. A úlcera péptica continua a ser a
causa mais frequente seguindo-se as varizes
gastroesofágicas(6,12-14). A terapêutica hemostática endoscópica nas úlceras de alto risco e
nas varizes, reduz a necessidade de transfusão
sanguínea, a necessidade de cirurgia e a
duração do internamento hospitalar(9).
Neste capitulo irei debruçar-me sobre a
abordagem do doente que se apresenta no
Avaliação inicial
A abordagem inicial do doente com
suspeita de HDA inclui uma breve história
clínica e exame físico sumário, focados na
identificação da etiologia da hemorragia e na
avaliação da gravidade da hemorragia.
Os principais sintomas da hemorragia alta
são as hematemeses (vómitos de sangue vivo
ou digerido) e as melenas (fezes negras,
viscosas e com cheiro característico) que
surgem respectivamente em 60 a 80% e 40 a
70% dos doentes.
Embora no geral, seja clinicamente óbvio
se a origem da hemorragia digestiva é o trato
gastrointestinal alto ou baixo, em alguns
doentes surgem duvidas. As melenas indicam
usualmente uma origem no trato gastrointestinal alto (acima do ligamento de Treitz) e
podem ser produzidas experimentalmente pela
ingestão de 100 a 200ml de sangue. No
entanto, quando o volume da hemorragia
baixa é demasiado pequeno para causar
hematoquézia ou a motilidade cólica é muito
lenta, a hemorragia com origem no intestino
delgado ou no cólon proximal pode originar
melenas.(15) Em oposição, a hematoquézia
53
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
alertar para a possibilidade de hemorragia
varicosa. Outros problemas médicos, como a
cirurgia prévia com colocação de prótese
aórtica, a neoplasia gastrointestinal já
conhecida, podem apontar para diagnósticos
específicos(15).
Na avaliação inicial é importante estimar a
gravidade da hemorragia. A agitação, a palidez
da pele, a taquicardia e a hipotensão podem
indicar choque com necessidade de reposição
de volume imediata. O choque traduz uma
perda de cerca de 25% do volume total do
sangue. A diminuição ortostática de 20 mmHg
na pressão sistólica ou o aumento no ritmo do
pulso de 20 pulsações por minuto, indicam
uma depleção de pelo menos 20% do volume
intravascular(21). (tabela 1)
(evacuação de sangue vermelho, fezes cor de
tijolo e ou coágulos) é geralmente um sinal de
origem baixa da hemorragia, mas pode ocorrer
nos casos de HDA maciça ou de trânsito
gastrointestinal acelerado (10-15%). A descrição feita pelos pacientes pode ser indutora
de erro, sendo mais fiável a observação directa
do aspecto das dejecções ou a realização do
toque rectal.(16-18)
Em algumas circunstâncias, particularmente quando o doente apresenta perdas
hemáticas rectais difíceis de caracterizar como
hematoquézias ou melenas, na ausência de
hematemeses, a colocação de uma sonda
naso-gástrica pode ser útil na identificação da
origem alta ou baixa da hemorragia(19).
A demonstração de sangue no aspirado nasogástrico indicia o tracto gastrointestinal alto
como a origem da hemorragia. Já a ausência de
sangue no aspirado, não exclui esta origem,
visto que um piloro competente pode impedir
o refluxo duodenogastrico do sangue na úlcera
duodenal com hemorragia(20).
Embora alguns dados clínicos possam
indiciar a causa provável de hemorragia,
mesmo os gastrenterologistas mais experientes
não conseguem prever a etiologia da hemorragia numa fracção significativa de doentes.
A história passada de úlcera péptica ou de
dispepsia sugerem hemorragia por úlcera.
O uso de AINE e antiagregantes plaquetários
associam-se ao desenvolvimento de úlceras e
ao aumento de risco de hemorragia.
O diagnóstico prévio de cirrose, a presença de
ascite, a identificação de estigmas de doença
hepática ou de hepato-esplenomegalia, devem
A repercussão hemodinâmica da hemorragia é determinante, tanto das medidas
necessárias para a abordagem posterior do
doente, como do prognóstico. Por exemplo, um
doente com instabilidade dos sinais vitais tem
com elevada probabilidade uma fonte vascular
importante como a úlcera péptica com vaso
visível ou as varizes gastroesofágicas.
O prognóstico destes doentes é pior do que o
dos doentes com sinais vitais normais, e exigem
uma intervenção imediata e mais agressiva(22).
A avaliação analítica na admissão deve
incluir hemoglobina, hematócrito, estudo da
coagulação, contagem de plaquetas, tipo
sanguíneo, ureia, creatinina, ionograma e
“provas hepáticas”. Os valores de hemoglobina e hematócrito iniciais são maus
indicadores de quantidade de sangue perdida,
TABELA 1 - STATUS HEMODINÂMICO, SINAIS VITAIS E GRAVIDADE DE HEMORRAGIA
Status hemodinâmico/
% de perda
Gravidade da
Sinais vitais
de volume intravascular
hemorragia
Choque (hipotensão em repouso)
Taquicardia ou hipotensão ortostática
Normal
20-25
10-20
<10
Maciça
Moderada
Minor
Adaptado de Rockey DC, 2005 (21)
54
Margarida Sampaio
mas servem como indicadores de gravidade e
decisão da necessidade de transfusão. Na
hemorragia aguda, quando determinados
pouco após o início da hemorragia, podem não
reflectir com acuidade a quantidade de sangue
perdido. Pode existir instabilidade hemodinâmica com um valor de hematócrito razoável,
se a perda de sangue tiver sido rápida e a
análise realizada precocemente, já que na
sequência do episódio hemorrágico a restauração do volume intravascular por chamada
de liquido extra vascular, pode levar 24 a 72 h
sendo a descida do valor do hematócrito
progressiva. Inversamente o doente com
ferropenia por perdas crónicas pode apresentar-se com hematócrito muito baixo mantendo
a estabilidade hemodinâmica. O volume globular médio baixo e a ferritina baixa são pistas
importantes neste caso. A relação ureia/creatinina elevada resulta de elevação da
azotemia, por aumento da carga de proteínas
no trato gastrointestinal alto, resultante do
sangue digerido, e aponta para hemorragia
digestiva alta. Este achado não é específico e
pode representar depleção de volume
intravascular e azotemia prerenal(6,15).
A realização de um electrocardiograma
está indicada sobretudo no idoso, na presença
de factores de risco coronário e na hemorragia
grave.
provas de compatibilidade de sangue. Não são
necessários cristalóides a não ser que exista
hipoalbuminémia severa.
O pulso e tensão arterial devem ser monitorizados (são indicadores mais rápidos e
fiáveis de persistência/recidiva de hemorragia
que os valores laboratoriais). Quando a
hemorragia é grave ou activa, é importante a
inserção de um cateter urinário para avaliar o
débito urinário e em casos seleccionados
(doença cardiopulmonar concomitante) pode
ser necessário a colocação de um cateter
venoso central e a monitorização da pressão
venosa central. Os doentes com instabilidade
hemodinâmica persistente devem ser transferidos para uma unidade de cuidados
intensivos. A ressuscitação agressiva e a
monitorização em UCI parecem reduzir a
mortalidade(21,22).
Os critérios para avaliação da necessidade
de transfusão de sangue variam em função da
idade do doente, da presença de doença
cardiovascular concomitante e da persistência
da hemorragia. Em geral o hematócrito deve
ser mantido acima de 30% nos idosos e acima
dos 20% a 25% nos jovens saudáveis. Nos
doentes com hipertensão portal não se deve
ultrapassar os 27-28% (21). Quando o volume
transfundido é elevado (> 3000 ml), o sangue
deve ser aquecido(23).
Os concentrados de glóbulos vermelhos
são preferidos ao sangue total, sendo este
reservado para circunstâncias raras, como a
hemorragia maciça com necessidade de
reposição rápida de grande volume, em que é
necessária a reposição de factores de coagulação. Como orientação, na ausência de
hemorragia activa, uma unidade de concentrado de glóbulos vermelhos eleva, em média,
a hemoglobina em 1g/dl.
Quando existem alterações marcadas da
coagulação, por exemplo no caso de cirrose
hepática, de anticoagulação oral, ou quando
houve necessidade de várias transfusões (> 10
unidades de concentrado de glóbulos vermelhos), está indicada a transfusão de plasma
fresco congelado, para corrigir o deficit de
Estabilização
Hemodinâmica/Ressuscitação
A rapidez com que são instituídas as medidas de ressuscitação é curcial, já que muita da
morbilidade e mortalidade associada a HDA
surge em consequência do choque(22). Quanto
mais grave for a hemorragia, mais vigorosas e
prontas devem ser as medidas de ressuscitação.
No doente com instabilidade hemodinâmica devem ser canalizadas de imediato duas
veias com cateteres de grande calibre (18
gauche ou superiores), iniciando-se rapidamente a reposição do volume intravascular
com coloides (soro fisiológico ou lactato de
Ringer), enquanto se aguarda a realização das
55
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
factores de coagulação. A transfusão de
plaquetas deve ser ponderada nos casos de
hemorragia activa com contagem de plaquetas
inferiores a 50000 por mm3(13,24).
excluir outras causas, como a úlcera péptica, o
sindroma de Mallory-Weiss, a gastropatia da
hipertensão portal e a ectasia vascular antral
(13). Reconhecidamente a origem da hemorragia é um dos mais importantes factores
prognósticos na HDA. A hemorragia varicosa
tem uma taxa de recidiva e uma mortalidade
superior ás outras causas, atingindo os 30% de
mortalidade no episódio inicial e variando a
recidiva entre 50 e 70%(15).
Relativamente á úlcera péptica, a identificação de estigmas de hemorragia como a
hemorragia activa, o vaso visível e o coagulo
recente, é determinante na definição do risco
de recidiva de hemorragia e do prognóstico.
(Tabela 3).
Endoscopia – diagnóstico e hemostase
Diagnóstico
A endoscopia digestiva alta é fundamental
na abordagem do doente com HDA. Permite
localizar com acuidade a origem e avaliar a persistência e/ou o risco de recidiva da hemorragia.
Na maioria das séries endoscópicas a causa
de hemorragia é identificada em 90 a 95% dos
episódios hemorrágicos e em 20 a 30 % existe
mais do que uma causa potencial de hemorragia. As três etiologias mais frequentes são a
úlcera péptica, as lesões agudas gastroduodenais e as varizes esofágicas (5,12-14). (Tabela 2).
A dimensão e localização da úlcera e do
vaso sangrante têm também importância.
A recidiva hemorrágica é mais frequente nas
úlceras maiores que 2 cm e vasos com mais de
1mm. A parte alta da pequena curvatura do
estômago e parede posterior do bulbo são
localizações desfavoráveis pela proximidade,
No doente com cirrose hepática as varizes
são a causa da hemorragia digestiva em 50 a
90% dos casos. A endoscopia urgente permite
TABELA 2 - CAUSAS DE HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA IDENTIFICADAS EM SÉRIES ENDOSCÓPICAS
Causa de hemorragia
Frequência (%)
Laine 2001 (ref 15)
Sofia e col 1992 (ref 12)
Ulcera péptica
Varizes gastroesofágicas
Mallory-Weiss
Gastroduodenite erosiva
Esofagite erosiva
Neoplasias
35-62%
4-31%
4-13%
3-11%
2-8%
1-4%
45,6%
27,5%
4,0%
11,5%
4,3%
2,1%
Causa não identificada
7-25%
8,1%
TABELA 3 - ESTIGMAS ENDOSCÓPICOS E RISCO DE RECIDIVA NA HEMORRAGIA POR ÚLCERA
Estigmas
Hemorragia activa
Vaso visível
Coagulo aderente
Outros
Base limpa
Incidência (%)
8%
15-50%
18-20%
12-18%
10-36%
Adaptado de ref 15
56
Risco de persistência/recorrência (%)
85-100%
18-55%
24-41%
5-9%
0%
Margarida Sampaio
respectivamente, das artérias gástrica esquerda
e gastroduodenal(15).
Reconhece-se que a endoscopia precoce,
geralmente definida como a realizada nas
primeiras 24 horas(25), reduz a necessidade de
recursos, os custos hospitalares, a necessidade
de transfusão e a duração do internamento
hospitalar(26). No entanto, não existe consenso
na determinação do momento óptimo para a
realização da endoscopia alta no doente com
hemorragia digestiva alta(25). Admite-se que
se a urgência dispuser de um endoscopista
treinado, será vantajoso que o exame seja
realizado o mais próximo possível da apresentação, já que fornece informação muito
importante sobre a etiologia – a EDA mais
precoce parece ter maior rendimento diagnóstico (12) – sobre a actividade da hemorragia e o
risco de recidiva e, permite uma abordagem do
paciente mais adequada às necessidades e ao
risco. Os doentes com persistência de hemorragia e os com cirrose hepática beneficiam da
realização da EDA o mais precoce possível.
Quando a endoscopia não é conclusiva, a
angiografia é útil na abordagem diagnostica do
doente com HDA. Para que neste exame se
detecte o local, a hemorragia deve ser arterial
e ter um débito de pelo menos 0,5 a 0,6
ml/min. Pode ajudar nos doentes com hemorragia recorrente de causa obscura e representa
uma alternativa terapêutica, por exemplo, na
embolização de úlceras sangrantes e neoplasias
em doentes inoperáveis. Tem uma taxa de
complicações graves significativa, especialmente quando se efectua embolização, devido
a necrose isquémica e perfuração(27).
Nos doentes com risco elevado de complicações decorrentes do exame endoscópico,
como os com enfarte agudo de miocárdio no
último mês, deve ser cuidadosamente ponderada a relação risco beneficio na realização da
endoscopia(28).
A ressuscitação adequada, definida como a
estabilização hemodinâmica, antes da EDA,
dos doentes com hemorragia digestiva alta,
reduz significativamente a mortalidade(22).
A lavagem gástrica previa á endoscopia,
ajuda a remoção de sangue residual, coágulos e
outros conteúdos gástricos, melhorando as
condições de observação e de execução de
eventual terapêutica, mas pode ser insuficiente.
A administração de eritromicina endovenosa,
em dose única de 3mg/Kg peso, a correr em 20
a 30 minutos, cerca de 30 a 90 minutos antes
do exame endoscópico, acelera o esvaziamento
gástrico e melhora as condições da endoscopia,
reduzindo o tempo de execução e a necessidade
de repetir o procedimento(29,30).
A intubação endotraqueal, para protecção
da via aérea, deve ser considerada nos doentes
com risco de aspiração pelo débito de hemorragia ou falta de colaboração, nomeadamente
quando existe alteração do estado de
consciência.
Os doentes com HDA submetidos a
terapêutica endoscópica estão sujeitos a uma
bacteriémia transitória pós-procedimento, que
no entanto, não tem consequências na maioria dos casos. Nos doentes com risco de
endocardite bacteriana devem ser cumpridas a
as recomendações para profilaxia antibiótica
(31). Particularmente nos doentes com cirrose
hepática, os estudos recentes demonstram que
a profilaxia antibiótica reduz a recorrência de
hemorragia e melhora a sobrevida(24).
Preparação para endoscopia
A endoscopia não é um exame isento de
complicações (1,0% de morbilidade e 0,1% de
mortalidade na endoscopia diagnóstica),
muitas das quais dependem de factores
relacionados com o doente, como a idade, a
co-morbilidade e a instabilidade hemodinâmica. Os doentes devem ser adequadamente
monitorizados não esquecendo a oximetria.
Hemostase endoscópica
A endoscopia no doente com hemorragia
digestiva alta deve ser sempre realizada com
intenção de actuar terapêuticamente caso
os achados endoscópicos o justifiquem(25).
As diferentes técnicas de hemostase
57
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
endoscópica e seus aspectos práticos serão
assunto dos próximos capítulos, motivo pelo
qual serão aqui referenciadas sumariamente.
Na úlcera péptica, que continua a ser a
causa mais frequente de hemorragia digestiva
alta, quando estão presentes de estigmas de
hemorragia, a terapêutica hemostática
endoscópica (injecção de adrenalina e/ou
esclerosantes, métodos térmicos ou abordagem
combinada) reduz a taxa de mortalidade, a
persistência/recidiva de hemorragia e a necessidade de cirurgia urgente. Recomenda-se o
tratamento da hemorragia activa e do vaso
visível. O coágulo aderente deve, se possível,
ser removido para permitir a identificação de
estigmas subjacente e definir melhor a
necessidade de terapêutica endoscópica(15,25).
A recidiva de hemorragia após hemostase
endoscópica, varia entre os 15 e 20% e ocorre
geralmente nas primeiras 48-72horas(25).
Na primeira recidiva deve ser tentado novo
tratamento endoscópico, verificando-se em
estudos que é eficaz em cerca de 50% dos casos
e reduz a necessidade de cirurgia(32). Na falência
das medidas médicas e endoscópicas em controlar a hemorragia deve ponderada precocemente
a cirurgia ou a angiografia de intervenção,
quando existe contra-indicação cirúrgica.(15)
A hemorragia varicosa para espontaneamente em cerca de 50% dos casos. A mortalidade no episódio inicial é mais elevada do que
a verificada na hemorragia digestiva não
varicosa, cifrando-se em 30% e podendo
atingir os 70-80% quando o sangramento
persiste. A terapêutica endoscópica no episódio agudo (escleroterapia ou ligadura elástica)
associa-se a melhoria do prognóstico, com
eficácia quer no controlo da hemorragia activa (80 a 90% dos casos) quer na prevenção da
recidiva hemorrágica no internamento índex.
A combinação de agentes vasoactivos com a
terapêutica endoscópica parece ser mais eficaz
que o seu uso isolado.(24)
A colocação do balão de SengstakenBlakemore deve ser reservada para os casos de
doentes com hemorragia maciça não controlada por medidas médicas e ou terapêutica
endoscópica. Embora em 90% dos casos se
consiga a hemostase, uma vez desinsuflado o
balão, a taxa de recidiva é elevada, pelo que
nestes casos devem ser consideradas medidas
terapêuticas mais definitivas como shunt
transjugular intrahepatico portosistemico
(TIPS) ou a abordagem cirúrgica.(24)
Tratamento não endoscópico
A lavagem gástrica com soro fisiológico
gelado não tem qualquer efeito benéfico na
hemostase e pode mesmo, acompanhar-se de
efeitos negativos, como a redução do débito
cardíaco. Caso se opte por realizar lavagem
gástrica na preparação para a endoscopia,
recomenda-se a utilização de água á temperatura normal.
Em relação á hemorragia por úlcera péptica, os únicos agentes farmacológicos com
eficácia comprovada em vários estudos, são os
inibidores da bomba de protões em doses
elevadas. Existem estudos que demonstram a
superioridade do omeprazole oral, em doses
elevadas, quando comparado com placebo, na
redução da recorrência da hemorragia, da
necessidade de cirurgia urgente, do número de
transfusões e da duração do internamento nos
doentes não submetidos a terapêutica hemostática. O omeprazole em doses elevadas,
endovenoso ou oral, é comprovadamente
vantajoso após hemostase endoscópica.(33-35)
O pantoprazole endovenoso continuo reduz a
taxa de recidiva hemorrágica nos doentes com
ulcera péptica com estigmas major, submetidos
a hemostase endoscópica, quando comparado
com ranitidina endovenosa ou placebo(36,37).
Em resumo, admite-se o efeito benéfico do uso
dos inibidores da bomba de protões (omeprazole ou pantoprazole) nos doentes com úlceras
pépticas de alto risco, submetidos ou não a
tratamento endoscópico, recomendando-se
um bolus endovenoso de 80 mg, seguido de
infusão endovenosa (8mg/h) nas primeiras 72
horas, período em que a recidiva hemorrágica
é mais frequente(38). Não existe evidência
científica suficiente para recomendar o uso
58
Margarida Sampaio
sistemático empírico de inibidores da bomba
de protões antes da endoscopia nos doentes
com HDA alta, mas esta utilização poderá
ser admissível face ao excelente perfil de
segurança destes fármacos(38).
Em relação a outros fármacos, como os
inibidores H2, a somatostina (ou o seu análogo
sintético octreotido), a vasopressina, as
prostaglandinas, os resultados dos estudos
disponíveis são demonstram claramente a
eficácia e a sua utilização rotineira não é
recomendada(38). O uso de acido tranexâmico
(inibidor do plasminogenio) foi abandonado
devido a indução de efeitos secundários graves.
Em relação á hemorragia por varizes existe
um grande número de estudos sobre a utilização de agentes vasoactivos. A vasopressina
associava-se a efeitos secundários significativos o que levou ao desenvolvimento de
agentes mais seguros como a somatostatina, o
octreotido e a telipressina. A eficácia no
controlo da hemorragia, na redução da
necessidade transfusional e na recorrência da
hemorragia foi amplamente comprovada para
todos estes agentes, mas a redução na mortalidade em relação ao placebo, só foi
demonstrada para a telipressina. Outro
aspecto vantajoso da telipressina é a sua semivida mais longa e a possibilidade de poder ser
facilmente administrada ainda antes do
internamento hospitalar ou logo na admissão
hospitalar com redução da falência do controlo da hemorragia. A combinação de agentes
vasoactivos com terapêutica endoscópica das
varizes apresenta-se vantajosa(24).
Após endoscopia os doentes com baixo
risco de recidiva de hemorragia podem iniciar
precocemente dieta oral(38).
A abordagem da hemorragia digestiva no
Serviço de Urgência deve ser multidisciplinar.
O cirurgião deve ser consultado precocemente
e a sua intervenção deve ser ponderada atempadamente(38). A cirurgia urgente é a opção
nas seguintes situações: na hemorragia grave
com choque não abordável endoscopicamente
em que a cirurgia emergente é a única forma
de evitar a exsanguinação; na falência em
controlar medica e endoscopicamente a
hemorragia; na recidiva grave após duas
tentativas de hemostase endoscópica; na
complicação grave da terapêutica endoscópica
nomeadamente a perfuração(39).
Factores prognósticos e estratificação de
risco
Os doentes com HDA aguda apresentam-se
com um largo espectro de gravidade clínica
que vai desde a hemorragia insignificante á
hemorragia catastrófica(40). Embora cerca de
80 % dos episódios de hemorragia digestiva
alta parem espontaneamente, nos restantes
20% a hemorragia persiste ou recidiva, o que
se associa a aumento da mortalidade, a maior
necessidade de cirurgia e de transfusões de
sangue, a maior duração do internamento
hospitalar e aumento dos custos económicos(11,38). É fundamental a identificação
pronta deste subgrupo de doentes, que claramente beneficiam com a vigilância apertada e
a intervenção terapêutica agressiva.
Na literatura identificam-se vários indicadores de prognóstico e ou risco aumentado
de recidiva na HDA. (tabela 4).
TABELA 4 - RISCO AUMENTADO DE RECIDIVA NA
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA
Idade avançada (> 60 anos)
Choque/instabilidade hemodinamica/ortostatismo na
apresentação
Co-morbilidades (cardiopatia isquemica,
insuficiência cardíaca congestiva, doença hepática
ou renal, neoplasia)
Diagnostico endoscópico específico (varizes, ulcera
péptica, neoplasia digestiva…)
Uso de anticoagulantes/coagulopatia
Lesão de alto risco na endoscopia (hemorragia
arterial, vaso visível, coagulo)
Relativamente aos aspectos clínicos são
valorizados como indicadores de pior prognóstico a gravidade da hemorragia inicial, a idade
avançada do paciente, a presença e a gravi59
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
dade de doenças concomitantes (insuficiência
renal crónica; doença cardiopulmonar severa;
insuficiência hepática; cardiopatias; cancro).
O início da hemorragia, durante internamento
hospitalar por outro motivo, tem maior
gravidade (os doentes que sangram enquanto
internados têm uma taxa de mortalidade de
25%). Reconhece-se como importante a
origem da hemorragia, sendo que a hemorragia varicosa tem taxas de recidiva e mortalidade particularmente elevadas. Em relação a
úlcera péptica a presença e o tipo de estigmas
de hemorragia tem importância major.
No outro extremo do espectro, é possível
identificar um número significativo se doentes
com hemorragia de gravidade mínima, com
baixo risco de recidiva e mortalidade. Nos
doentes com idade inferior a 60 anos e sem
comorbilidade importante, a taxa de mortalidade, por HDA não varicosa, chega a ser
inferior a 1%. A conjugação da avaliação de
risco associado a presença de estigmas
endoscópicos, permite identificar um sub
grupo de doentes de baixo risco em que poderá
ser adequada a alta precoce ou mesmo o tratamento em regime de ambulatório, sem que
seja afectada a qualidade dos cuidados, com
uma significativa economia de recursos(40,41).
evidência de doença hepática ou cardíaca.
Sugerem que a aplicação dos seus critérios
pode identificar cerca de 20% de doentes que
podem não ser internados ou ter alta precoce
sem necessidade de EDA urgente(42).
Cameron e colaboradores desenvolvem
um sistema de estratificação de risco que
identifica os doentes com elevado e baixo risco
de recidiva da hemorragia, de mortalidade e
de necessidade de intervenção terapêutica
urgente(43).
O mais divulgado sistema de estratificação
com critérios endoscópicos é o de Rockall e
colaboradores. Utilizam factores clínicos e
endoscópicos para identificar doentes em risco
de recidiva de hemorragia ou morte (tabela 5).
Estabelecem que a endoscopia precoce pode
identificar doentes candidatos a alta precoce.
Um score igual ou superior a 8 pontos indica
uma mortalidade de 41-46%, um score igual
ou inferior a 2 implica um prognóstico excelente, podendo ter alta precoce ou ser tratado
em ambulatório(39,40).
Foram propostos vários sistemas de estratificação de risco na hemorragia digestiva alta
aguda a que me referirei sumariamente.
Alguns são baseados em critérios clínicos e têm
como objectivo a estratificação de doentes
antes da endoscopia, direccionando-se para a
previsão da necessidade de tratamento
(transfusão, terapêutica endoscópica ou cirurgia), internamento e monitorização. Outros
incluem critérios endoscópicos, fazendo uma
boa previsão do prognóstico (incluindo o risco
de morte) e identificando a necessidade de
monitorização mais intensiva e de internamento mais longos.
Blachford e colaboradores, propõem um
score baseado na hemoglobina da admissão,
uremia, pulso, pressão arterial sistólica,
apresentação com síncope ou melenas e na
60
Margarida Sampaio
TABELA 5 - SCORE DE ROCKALL
Factor
Idade (anos)
Choque
Pulso(ppm)
PAS(mmHg)
Comorbilidade
Diagnóstico
Estigmas de
hemorragia
recente
pontuação
0
<60
Ausente
<100
≥100
ausente
1
60-79
Taquicardia
≥100
≥100
2
≥80
Hipotensão
<100
CI;IC; outra
comorbilidade
major
Lesão maligna
TDA
Malorry-Weiss;
Todos outros
ausência de lesão
diagnosticos
ou ausencia de EHR
Ausência de estigmas
de hemorragia recente
ou mancha negra
na base da ulcera
3
IR;IH;doença
maligna
disseminada
Sangue no TDA,
coagulo aderente,
vaso visível ou
hemorragia em jacto
Legenda: PAS- pressão arterial sistólica ; CI- cardiopatia isquémica ; IC- insuficiência cardíaca; IR - insuficiência renal; IH - insuficiência hepática;
EHR - estigmas de hemorragia recente; TDA - tracto digestivo alto.
Adaptado de Rockall et al 1996 (ref 40)
A hemostase endoscópica quando aplicada
adequadamente é muito eficaz no controlo da
hemorragia activa e na prevenção da recidiva.
Estão publicadas várias recomendações sobre
a abordagem específica do doente com úlcera
péptica sangrante e hemorragia varicosa, quer
em relação ao papel da endoscopia quer em
relação à terapêutica médica. Embora o
internamento hospitalar seja necessário na
maioria dos casos, é possível identificar um
sub-grupo de doentes com muito baixo risco
de recidiva de hemorragia e mortalidade que
poderão ter alta precoce ou ser enviados
directamente para o domicílio após realização
da endoscopia.
Considerações Finais
A HDA é uma situação comum no Serviço
de Urgência e a urgência gastrenterológica
mais frequente. Na figura 1 apresentam-se
esquematicamente os passos principais da
abordagem na urgência desta situação.
O espectro de gravidade da HDA é variável,
salientando-se a importância da identificação
precoce de factores de risco para recidiva e
mortalidade. As medidas de estabilização
hemodinâmica devem ser iniciadas precocemente, já que são determinantes na
prevenção/reversão do choque e redução da
mortalidade. A endoscopia digestiva alta deve
ser realizada idealmente nas 12 a 24 horas
após a apresentação já que é fundamental na
identificação da etiologia da HDA, na
definição do risco de persistência/recidiva da
hemorragia e, secundariamente, do risco de
mortalidade. As etiologias mais frequentes da
HDA são a úlcera péptica, as lesões agudas da
mucosa gastroduodenal e as varizes.
61
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA NO SERVIÇO DE URGÊNCIA
FIGURA 1 - ALOGARITMO DE ABORDAGEM DO DOENTE COM HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA
hemorragia
digestiva
alta
doente co m cirrose
In i c i a r an t i b i ó t i c o e ag e n t e s v a s o a c t i v o s
avaliação
clinica inicial
ressuscitação inicial
estabilização
avaliação de risco
inicial
pré-endoscopia
risco elevado de recidiva
risco baixo de recidiva
internamento em
enfermaria ou SO
EDA urgente (12-24h)
internamento em UCI
EDA emergente
EDA
polipo, MAV,
Mallory-Weiss,
Dieulafoy,
neoplasia
úlcera peptica
varizes esofagicas
ou gastricas
causa não
identificada
estigmas de
hemorragia
activa/recente?
terapêutica
endoscópica
sim
abordagem
terapêutica de
acordo com os
achados
endoscópicos e
situação de base
não
terapêutica
endoscópica
vigilância em
internamento
investigação
adicional
alta
clínica
precoce
Legenda-UCI - unidade de cuidados intensivos; SO-serviço de observação; EDA-endoscopia digestiva alta ; MAV-malformação arteriovenosa
62
Margarida Sampaio
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64
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO
DE HEMORRAGIA DIGESTIVA
ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
FILIPE GOMES SILVA
HELENA VASCONCELOS
INTRODUÇÃO
Na abordagem dum doente com HDA
duas atitudes são fundamentais: a estabilização hemodinâmica do doente e a realização
precoce de uma endoscopia digestiva.
Nas últimas décadas a endoscopia
tornou-se num instrumento essencial, quer
no diagnóstico, quer na estratificação do risco
e ainda no tratamento de patologia hemorrágica. Assim é consensual a realização de uma
endoscopia, o mais precocemente possível.
A terapêutica endoscópica é desnecessária
na maioria dos doentes com HDA dado que em
cerca de 80% a hemorragia pára espontaneamente. Existe no entanto um subgrupo de
doentes com risco de persistência ou recidiva
hemorrágica, que se associa a uma mortalidade
de 20-40%, e que beneficiam de terapêutica
endoscópica precoce(3).
As potencialidades da endoscopia digestiva
terapêutica estão relacionadas com a possibilidade de tratar a causa da hemorragia e
diminuir a taxa de recidiva, sendo esta
reconhecida como o factor que mais afecta
negativamente o prognóstico.
A hemostase endoscópica na HDA de
causa não varicosa foi introduzida em 1976
por Soehendra, utilizando a injecção de um
agente esclerosante (polidocanol a 1%) na UP
com hemorragia activa.(4)
Dois estudos de meta-análise dos anos 90,
demonstraram que no subgrupo de elevado
risco a terapêutica endoscópica é benéfica
dado que reduz a incidência da recidiva
hemorrágica, bem como a necessidade de
intervenção cirúrgica e a mortalidade(5,6).
A hemorragia digestiva alta (HDA) é umas
das emergências médicas mais comuns. Apesar
de todas as inovações terapêuticas introduzidas
nas últimas décadas a mortalidade por HDA
mantém-se entre os 10-14%. Este facto está
relacionado com o envelhecimento da população. A maioria dos doentes com HDA é
idoso e tem múltiplas patologias associadas e
encontrando-se polimedicado. Existe uma
relação directa entre o número e gravidade da
patologia médica e a mortalidade(1).
A causa mais frequente de HDA é a úlcera
péptica (UP) com cerca de 50%, seguida por
outras causas tão diversas como: esofagite,
erosões gastro-duodenais, varizes, lesão de
Mallory-Weiss, angiodisplasias, lesão de
Dieulafoy, ectasia vascular antral, neoplasias
entre outras (Tabela 1).
TABELA 1 - CAUSAS DE HEMORRAGIA DIGESTIVA
ALTA (2)
Causa
Úlcera péptica
Erosões gastro-duodenais
Esofagite
Varizes
Mallory Weiss
Malformações vasculares
Neoplasias
Percentagem (%)
35-50
8-15
5-15
5-10
15
5
1
Outras
5
65
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
TABELA 2 - TÉCNICAS DE HEMOSTASE
A realização de terapêutica endoscópica
está indicada nas situações de risco hemorrágico elevado. O tipo e modalidade da técnica
terapêutica a ser utilizada está sujeita a maior
controvérsia. São múltiplos os estudos que
demonstram que na globalidade todos os
métodos são igualmente úteis. Difícil é definir,
em cada caso específico, o método mais eficaz.
Isto deve-se ao facto dos estudos existentes
possuírem diferentes metodologias, serem
frequentemente de um só centro e com relativamente reduzido número de doentes, o que
interfere com o valor estatístico dos mesmos.
Outra crítica resulta da heterogeneidade dos
estudos, nomeadamente no que diz respeito
aos “end-points”, factores de risco associados
à recidiva, níveis de experiência do endoscopista no tratamento e reconhecimento das
lesões hemorrágicas, o que torna difícil uma
comparação directa das diferentes técnicas.
Existem diferentes modalidades de
terapêutica endoscópica com eficácia demonstrada na hemostase, no entanto a sua
aplicabilidade está também dependente da
disponibilidade em cada unidade de
endoscopia, sendo que cada unidade tende a
utilizar mais frequentemente o tipo de
terapêutica com que está mais familiarizado,
isto é, aquele em que tem mais experiência.
ENDOSCÓPICA
Injecção
Adrenalina
Esclerosantes (álcool, polidocanol, etanolamina)
Cianoacrilato
Fibrina
Trombina
Térmicos
Sonda térmica
Sonda multipolar (BICAP) / monopolar
Laser
Árgon plasma
Mecânicos
Hemoclips
Laqueação elástica
Endoloop
Sutura
1.1. Métodos de Injecção
Esta técnica é muito utilizada pela sua simplicidade/facilidade de execução, baixo custo e
fácil disponibilidade. A solução é injectada
com auxílio de agulha de esclerose em redor
(nos 4 quadrantes) e no ponto hemorrágico.
Podem ser utilizadas várias substâncias,
como por exemplo: adrenalina diluída, agentes
esclerosantes (álcool absoluto, polidocanol,
etanolamina, etc.), cola de fibrina, trombina e
cianoacrilato.
A solução injectável ideal tem sido motivo
de controvérsia considerável. A utilização de
adrenalina diluída é provavelmente a substância mais utilizada. Não está demonstrado que
uma solução injectável seja superior a outra,
nomeadamente a adrenalina diluída quando
comparada com as outras soluções. A associação de outro agente injectável é também
motivo de discussão, sendo que a maioria dos
estudos randomizados não demonstram
benefício. No entanto é uma prática comum,
atendendo à complementaridade no seu
mecanismo de acção.
1. TÉCNICAS DE HEMOSTASE
ENDOSCÓPICA
As diferentes técnicas de hemostase
endoscópica têm como objectivo final parar a
hemorragia e reduzir o risco de recidiva. Isto é
alcançado com a obliteração da lesão
hemorrágica sangrante.
Podemos dividir as técnicas de hemostase
em 3 grandes grupos (Tabela 2): métodos de
injecção, térmicos (com ou sem contacto) e
mecânicos(3,7-9).
66
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
1.2. Métodos térmicos
A acção da adrenalina (concentração
1:10000 ou 1:20000) resulta do efeito de tamponamento local, vasoconstrição e indução da
agregação plaquetária. Ao contrário dos
agentes esclerosantes a adrenalina não causa
lesão tecidual.
Os agentes esclerosantes actuam por efeito
de tamponamento, indução de resposta inflamatória e efeito trombosante, que pode provocar lesão tecidual significativa e logo maior
risco de complicações. É de ter presente que
no caso destas soluções, quanto maior for
efeito trombosante/esclerosante, maior é o
risco de perfuração. Por isso deve-se atender
às doses de agente a injectar: álcool absoluto,
administrar doses parciais de 0,1 a 0,2 ml não
devendo exceder a dose total de 1,5-2 ml; no
polidocanol a 1%, doses parciais de 1-2 ml,
não devendo exceder um total de 10-15 ml.
A cola de fibrina, resulta da mistura de
fibrinogénio e trombina e é aplicada de forma
semelhante aos esclerosantes. Permite a obliteração do vaso sangrante, mas ao contrário
dos agentes esclerosantes, não se associa a
lesão tecidual significativa. Os melhores resultados de hemostase endoscópica têm sido obtidos com a aplicação repetida até ao desaparecimento dos estigmas hemorrágicos de risco.
Potenciais desvantagens, são desde logo, o
custo (quando comparado com as outras
soluções), a possibilidade de ocorrer obstrução
na agulha de injecção, de danificar o endoscópio e ainda os riscos inerente a um tratamento
que utiliza derivados do sangue. Existem estudos também que utilizam a injecção de trombina que, tal como a cola de fibrina, não induz
lesão tecidual.
O cianoacrilato (histoacryl) tem sido
utilizado na hemostase endoscópica sobretudo
no tratamento de lesões varicosas, em particular nas varizes fúndicas. No âmbito de lesões
não varicosas a experiência é mais reduzida.
Esta substância polimeriza e endurece de imediato em contacto com o sangue, levando à
obliteração da lesão sangrante(3,7-9).
Os métodos térmicos podem ser divididos
de acordo com existência de contacto ou não
da sonda/cateter com a lesão vascular.
Relativamente ao primeiro grupo, temos a
sonda térmica e a electrocoagulação monopolar e multipolar, sendo o laser e o árgon plasma
os representantes do segundo grupo.
A hemostase obtida por estes métodos é
feita à custa do calor produzido nos tecidos.
O calor produz edema tecidual, coagulação
das proteínas e contracção arterial. Outro
mecanismo de hemostase é por tamponamento local, por firme aplicação da sonda
sobre a lesão sangrante.
A sonda térmica (heater probe) consiste
num cilindro de alumínio com uma resistência
de aquecimento que pode atingir 250ºC,
envolvido numa bainha de teflon para
diminuir o risco de adesão tecidual. Possui
orifícios de irrigação, proximal à extremidade
da sonda, que possibilita a lavagem de sangue
ou coágulos. Pode-se aplicar perpendicular e
tangencialmente, o que permite o tratamento
de lesões com mau acesso. No tratamento de
úlcera péptica é preconizado aplicação firme
na sonda (tamponamento) e coagulação com
3 a 4 pulsos de 30 Joules cada. Tem como
inconveniente a necessidade de maior tempo
de contacto com a lesão vascular para poder
induzir a sua trombose/obliteração.
A electrocoagulação consiste na passagem
de corrente eléctrica de elevada frequência
pela lesão sangrante, provocando libertação
de calor e coagulação do vaso. Na electrocoagulação monopolar a corrente eléctrica de
elevada frequência estabelece-se entre a
extremidade da sonda e uma placa terra
colocada no doente. Produz uma destruição
tecidual menos controlável e maior, que se
associa a um maior risco de perfuração, sendo
por isso pouco utilizada. Na electrocoagulação
multipolar (ex: BICAP) a corrente eléctrica
estabelece-se entre dois ou mais eléctrodos
existentes na extremidade da sonda. Isto origina um efeito coagulante e de queimadura
67
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
que produz uma lesão em profundidade mais
limitada e logo com menor risco de perfuração. Possui um canal central de irrigação,
existindo em diferentes calibres (7 ou 10
French), em função do tamanho do canal de
trabalho do endoscópio, sendo que a utilização
de maiores diâmetros parece ser mais eficaz.
A sonda Gold (injection-Gold probe) combina as duas terapêuticas – térmicas e esclerose.
O laser (Nd:YAG) tem uma penetração
maior que o árgon plasma, o que consequentemente se associa a um maior risco de
perfuração. Associado a este inconveniente,
temos que referir os elevados custos de
aquisição do material e a sua mobilidade limitada, o que faz com o laser não seja actualmente uma terapêutica muito utilizada, a não
ser para tratamento de hemorragias
secundárias a tumores. No árgon plasma a
corrente eléctrica é transmitida por árgon
ionizado e produz um efeito de coagulação
máximo de 3-4 mm de profundidade, tendo
por isso risco de perfuração menor que o laser.
Pode-se aplicar perpendicular e tangencialmente, é facilmente mobilizável e relativamente barato. A intensidade da corrente
eléctrica e o débito gasoso são pré-determinados conforme a lesão e local de tratamento.
O árgon plasma espalha-se como um spray e
logo é muito útil aquando do tratamento de
lesões difusas na mucosa(3,7-9).
dos tangencialmente. Outro aspecto é a dificuldade da sua aplicação em lesões ulcerosas
com fundo muito fibrótico e eventual deslocamento prematuro.
A laqueação elástica foi inicialmente
aplicada no tratamento de patologia hemorroidária e posteriormente no tratamento de
varizes esofágicas. Tem sido também descrita a
sua aplicação no tratamento de lesões não
varicosas, nomeadamente em lesões de
Dieulafoy, Mallory Weiss, angiodisplasias e no
tratamento de hemorragia pós polipectomia.
Tem como handicap significativo a limitação
do campo visual que pode prejudicar a sua
adequada aplicação(3,7-9).
2. HEMOSTASE ENDOSCÓPICA DE
ACORDO COM O TIPO DE
LESÃO
2.1. Úlcera Péptica
A úlcera péptica (UP) é a causa mais
frequente de hemorragia digestiva alta de
origem não varicosa, com mais de 50% dos
casos de hemorragia digestiva alta. A mortalidade associada à HDA por UP não tem
melhorado nos últimos anos. Este facto está
intimamente associado ao envelhecimento da
nossa população (com aumento de patologias)
e ao aumento do consumo de fármacos que
predispõem a hemorragia digestiva.
Tornou-se necessário estratificar o risco
individual de cada doente, para poder definir
qual o grupo de doentes com maior risco de
recidiva hemorrágica/mortalidade e assim
definir o grupo com maior necessidade de
cuidados e de terapêutica hemostática.
Existem vários scores (ex. score Rockall) que
combinam factores clínicos e factores
endoscópicos no sentido de estratificar o risco
de cada doente (Tabela 3). Os achados
endoscópicos são extremamente importantes
na orientação do doente. A terapêutica
endoscópica tem como objectivos, por um
lado, parar a hemorragia, por outro, reduzir o
1.3. Métodos mecânicos
No âmbito dos métodos mecânicos, os
mais difundidos são a aplicação de hemoclips e
elásticos. Pretende-se com estes métodos, e
como o nome indica, obliterar mecanicamente
o vaso sangrante, sem causar lesão tecidual
circundante.
Os hemoclips são conceptualmente um
método ideal para alcançar hemostase de um
vaso sangrante, assemelhando-se praticamente à laqueação cirúrgica dum vaso. Porém
eles são por vezes difíceis de libertar, nomeadamente com o endoscópio em inversão ou em
locais de mau acesso e não podem ser aplica68
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
TABELA
3
SCORE DE ROCKALL (Inicial)
1. Idade
<60 anos
60 – 79 anos
>80 anos
SCORE DE ROCKALL (Após Endoscopia)
Pontuação
0
1
2
2. Choque
S/ sinais
4. Diagnóstico
MW, S/lesão ou estigmas
Outros diagnósticos
Lesão maligna GI alta
5. Estigmas de hemorragia
S/ estigmas ou mancha negra
0
Pulso >100 e TA sist. >100
TA sist. <100
3. Comorbilidade
Ausente ou discreta
Insuf. Cardíaca, d. coronária …
Insuf. Renal ou hepática, neoplasia
1
2
Sangue no tracto GI alto, vaso
visível, coágulo, hemorragia
Pontuação
0
1
2
0
2
0
2
3
Cotação: - Score ≥ 8 pontos = mortalidade 41 – 46 %
- Score ≤ 2 pontos = mortalidade não valorizável
risco de recidiva hemorrágica, sabendo-se que
este último é um dos factores que mais afecta
negativamente o prognóstico do doente.
No sentido de estratificar o risco de recidiva
da UP é comum utilizar a classificação de
Forrest, que descreve os achados endoscópicos
e associa a cada um deles, uma taxa de recidiva
(Tabela 4)(10).
A terapêutica hemostática está indicada
nos casos de estigmas major de hemorragia.
A hemostase endoscópica é preconizada na
presença de hemorragia activa e vaso visível
não sangrante, dado que a taxa de recidiva
hemorrágica é reduzida para 13-30%, quando
comparada com os 90% na hemorragia activa
e 50% na presença de vaso visível(13). A presença de coágulo aderente suscita polémica
quanto à necessidade de hemostase. Dois estudos randomizados recentes, abordando esta
temática, compararam tratamento médico vs
tratamento hemostático (adrenalina num caso
e noutro adrenalina seguido de electrocoagulação bipolar). Em ambos os estudos foi detectado uma diminuição da taxa de recidiva no
grupo submetido a tratamento endoscópico.
No entanto não foram identificadas diferenças
nos restantes “end-points” (taxa de cirurgia
urgente e de mortalidade) (14,15). A actuação
ideal perante a presença de coágulo aderente
continua a ser um problema por resolver. No
entanto, se após lavagem agressiva do coágulo
se conseguir expor adequadamente o fundo da
úlcera, e se se identificar hemorragia activa ou
vaso visível, a terapêutica hemostática está
indicada. Por vezes a remoção do coágulo não
TABELA 4 - CLASSIFICAÇÃO DE FORREST
– TAXA DE RECIDIVA
Forrest Ia
Forrest Ib
Forrest IIa
Forrest IIb
Forrest IIc
Forrest III
Hemorragia em jacto
Hemorragia em babamento
Vaso visível não sangrante
Coágulo aderente
Manchas pigmentadas
Fundo limpo
90%
20%
50%
20%
<5%
<5%
Várias meta-análises têm demonstrado as
vantagens da hemostase endoscópica,
nomeadamente no que diz respeito à
diminuição das taxas de recidiva e mortalidade, quando comparados com placebo ou
terapêutica médica, no contexto de UP com
estigmas de hemorragia recente major(9,11,12).
69
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
e exequível, sendo aí mais questionável qual a
atitude a tomar. Se pensarmos no risco de
recidiva existente neste tipo de situação e na
possibilidade de existirem achados significativos por debaixo do coágulo, não é de todo
reprovável instituir terapêutica hemostática.
As opções terapêuticas de hemostase são
múltiplas, desde métodos de injecção, térmicos bem como, mais recentemente, métodos
mecânicos.
esclerosantes foram motivo de estudo no
sentido avaliar da eficácia ou a potencial
vantagem da associação de um agente esclerosante à adrenalina. Existem vários estudos
randomizados realizados, apenas dois
mostraram superioridade da associação, mas
unicamente no que diz respeito à taxa de
recidiva, não existindo diferenças nos
restantes end-points(18-26). Rutgeerts et al
mostraram que a associação de adrenalina
mais polidocanol a 1% era significativamente
mais eficaz, mas apenas em termos de recidiva
hemorrágica(18). Lin et al mostraram que a
associação de adrenalina mais álcool a 98%
era mais eficaz em caso de hemorragia em
jacto (90 vs 46%, P <0,05) e era associado a
uma diminuição da demora média de internamento(21). Tendo em conta o maior risco de
complicações associadas à utilização de
agentes esclerosantes e aos resultados dos
estudos randomizados actualmente existentes,
não existe vantagens demonstráveis na associação de esclerosantes à adrenalina.
A cola de fibrina tem sido utilizada no
âmbito da hemostase de UP. Existem alguns
trabalhos, que comparam a injecção de
adrenalina com cola de fibrina, que mostram
uma menor taxa de recidiva no grupo tratado
com cola de fibrina, mas não detectaram
alterações de resultados finais tais como a
taxa de cirurgia e de mortalidade. Isto devese, em parte, ao número reduzido de doentes
envolvidos nos estudos(27,28). Em dois estudos
prospectivos randomizados há uma tendência, não estatisticamente significativa, que
revela melhor resultados com a cola de fibrina em relação à injecção de polidocanol ou
adrenalina com soro salino hipertónico(29,30).
Outro estudo randomizado comparou polidocanol, injecção única de cola de fibrina e
injecção repetida de cola de fibrina, mostrando diferenças significativas em favor da
injecção repetida de cola de fibrina em
relação ao polidocanol. Este estudo levanta, a
dúvida se o real benefício resulta da utilização da cola de fibrina ou se da repetida
injecção de fibrina(31).
Métodos de injecção
A injecção de diferentes soluções, como
objectivo hemostático, é uma técnica simples
de executar, de fácil aprendizagem e pouco
dispendiosa. A utilização desta terapêutica
hemostática no contexto de HDA por UP está
validada por vários estudos, como por exemplo
o de Gralnek et al, que realizou um estudo
randomizado em que comparou injecção
versus tratamento médico, em doentes com
hemorragia activa. A terapêutica hemostática
com injecção resultou numa maior taxa de
hemostase, menor taxa de cirurgia urgente,
menor necessidade de aporte transfusional e,
logo, menos custos(16).
A adrenalina é o agente injectável mais
popular. Produz efeito de tamponamento local,
vasoconstrição e agregação plaquetária. Ao
contrário dos agentes esclerosantes não induz
lesão tecidual. Normalmente é utilizada na
diluição de 1:10000 ou 1.20000. Até recentemente, o volume ideal de adrenalina a ser
administrado não estava bem definido. Lin et
al compararam grandes volumes (13-20 ml)
com pequenos volumes. A hemostase inicial
foi conseguida em todos os doentes. Já a taxa
de recidiva foi superior no grupo de pequeno
volume 30,8% vs 15,4%. O número de cirurgias, o aporte transfusional e a mortalidade
foram semelhantes. Pode-se deduzir que a
utilização de grandes volumes de adrenalina
(> 13 ml) pode reduzir a taxa de recidiva(17).
A associação de um agente esclerosante
tem como objectivo melhorar os resultados
obtidos com a adrenalina. Múltiplas soluções
70
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
Métodos térmicos
A injecção de trombina foi também alvo
de investigação. Kubba et al realizaram o estudo randomizado mais significativo envolvendo
140 doentes. Compararam adrenalina isolada
versus injecção de adrenalina e trombina
humana em doses entre as 600 e as 1000
unidades. A associação foi significativamente
superior, não apenas em termos de recidiva
hemorrágica, mas também, em termos de
necessidades transfusionais e mortalidade (0
vs 10%, P < 0,041)(32).
Os estudos existentes sobre a cola fibrina e
trombina mostram uma tendência para uma
melhor eficácia, no entanto não demonstram
cabalmente a sua supremacia em relação à
injecção de adrenalina ou de soluções esclerosantes. A utilização de colas de fibrina não é
por norma, uma primeira opção terapêutica,
sendo, mais frequentemente, uma arma de
recurso, atendendo a que os agentes injectáveis se associam a uma alta taxa de sucesso.
O uso de colas apresenta-se menos disponível
e tem custos mais significativos, embora seja
uma opção eficaz.
A aplicação de cianoacrilato (histoacryl)
no tratamento da UP foi recentemente avaliada
num estudo randomizado prospectivo, comparando-a com injecção de adrenalina e solução
salina hipertónica. Na generalidade, não
foram detectadas diferenças significativas
entre as duas modalidades de terapêutica
hemostática. No subgrupo de hemorragia activa,
a taxa de recidiva foi significativamente inferior,
no grupo tratado com histoacryl (14% vs 42%,
p=0,039), embora sem mais alterações significativas nos restantes end-points. A terapêutica
com histoacryl associou-se a complicações por
embolização arterial sistémica(33).
Uma meta-análise recente realizada por
Bardou et al, que inclui 38 estudos relevantes,
não demonstrou benefício estatisticamente significativo de uma solução injectável em relação a
outra(12), o que, combinado com os vários estudos referidos anteriormente, faz da adrenalina
isolada a opção mais indicada. A associação de
outra solução esclerosante não é consubstanciada pelos estudos existentes na actualidade.
Os métodos térmicos foram validados no
tratamento hemostático da UP em vários estudos randomizados, quer com a utilização de
sonda térmica(34), electrocoagulação monopolar(35-37), electrocoagulação multipolar(34,38, 39)
e laser(40), tendo sido demonstrado que são
superiores ao tratamento conservador.
Os estudos comparativos existentes entre
os diferentes métodos térmicos no entanto
não permitiram pôr em evidência uma técnica
em particular(41, 42). Uma meta-análise realizada por Bardou et al, que incluiu 20 estudos
relevantes sobre os métodos térmicos na
hemostase de UP, não permitiu demonstrar
superioridade de um método sobre outro(12).
Tem sido avaliada a utilidade do árgon plasma no contexto de HDA por UP. A terapêutica com laser não é, actualmente, muito utilizada, devido aos seus elevados custos e pouca
mobilidade. O árgon plasma surge como uma
alternativa, existindo alguma relutância na sua
utilização, devido ao seu reduzido poder de
penetração, o que, para alguns autores, motiva
uma menor capacidade hemostática, em particular nos casos de hemorragia activa em
jacto. Os escassos estudos existentes mostram
no entanto, que é uma terapêutica promissora,
segura, eficaz e de fácil manuseamento. Um
estudo randomizado comparou o árgon plasma
vs a sonda térmica em 41 doentes com hemorragia digestiva alta com sede em UP com estigmas major de hemorragia recente que incluía
hemorragia activa ou vaso visível não-sangrante. Ambas as modalidades terapêuticas
obtiveram resultados semelhantes no que diz
respeito a aspectos como: hemostase inicial,
recidiva hemorrágica, mortalidade e necessidade de terapêutica cirúrgica. No entanto, o
estudo teve pouco poder estatístico para poder
permitir uma adequada avaliação e logo detectar diferenças entre estas técnicas(43). Outro
estudo randomizado comparando o árgon plasma com injecção vs a sonda térmica envolvendo 185 doentes não mostrou diferenças significativas entre as duas opções terapêuticas(44).
71
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
Métodos térmicos vs injecção
versus injecção (5/35; 15%) e combinação
(8/32; 25%). No entanto a falência global foi
significativamente (p=0,01) diferente nos três
grupos, com a maior taxa associada ao tratamento com hemoclips isolado (12/35; 34%),
versus injecção (2/34; 6%) e combinação
(8/32; 25%). Os autores concluíram que a
terapêutica com hemoclips era significativamente menos eficaz que a terapêutica com
injecção, sendo a dificuldade técnica na sua
aplicação a maior causa da sua falência(51).
Chou et al compararam hemoclips (n=39)
com a injecção de água destilada (n=40),
tendo-se detectado uma menor taxa de recidiva no grupo tratado com hemoclips. Não
foram detectadas diferenças com significado
estatístico nos restantes end-points(52).
A maior taxa de recidiva no grupo tratado
com injecção de água destilada era de esperar,
o que logo interfere com a interpretação dos
resultados.
Cipolletta et al comparam a aplicação de
hemoclips com sonda térmica, tendo-se verificado que a aplicação de hemoclips estava
associada a uma menor taxa de recidiva comparada com terapêutica com sonda térmica
(1,8% versus 21%, respectivamente). A duração do internamento e necessidades transfusionais foram também significativamente
menores(53). Neste último estudo a taxa de
recidiva do grupo tratado com sonda térmica é
inexplicavelmente alta. Este facto teve interferência na apreciação global dos resultados,
favorecendo o grupo tratado com hemoclips.
Por outro lado Lin et al realizaram um estudo
randomizado que também comparava a utilização de hemoclips versus sonda térmica e
onde foram encontradas taxas de hemostase
inicial e definitiva significativamente maiores
no grupo tratado com sonda térmica (85% vs
100%, P < 0,05). A taxa de recidiva não foi
diferente nos dois grupos(54).
Em 2004 Park et al apresentaram um estudo
randomizado com 90 doentes, comparando
métodos mecânicos de hemostase com
injecção de adrenalina ou injecção de adrenalina isolada. No grupo tratado com métodos
A maioria dos estudos randomizados não
demonstraram diferenças nas taxas de recidiva,
cirurgia e mortalidade com o tratamento
hemostático com sonda térmica, electrocoagulação multipolar ou laser quando comparados
com a terapêutica com injecção(3).
Métodos mecânicos
Os métodos mecânicos têm vindo a ser
cada vez mais explorados no âmbito da hemostase de UP. O hemoclips tem sido alvo de
vários estudos, quer representando a experiência individual de um grupo(45), quer sob a forma
de estudos tipo caso-controlo, comparando-o
com a injecção de álcool(46, 47), a injecção de
adrenalina(48), ou ainda, com a injecção de
adrenalina e sonda térmica(49), que demonstram
eficácia semelhante.
Trabalhos de investigação têm apresentado
resultados conflituosos acerca da eficácia
desta modalidade de terapêutica e eventual
vantagem sobre métodos já instituídos
(injecção e térmicos). Existem 5 estudos
randomizados que comparam a aplicação de
hemoclips com o tratamento com injecção
(adrenalina diluída com soro salino hipertónico, adrenalina com polidocanol e água
destilada) em 3 estudos e sonda térmica nos
outros 2(50-54). Chung et al randomizaram os
doentes para receberem hemoclips, solução de
adrenalina com soro salino hipertónico ou
ambas. Em ambos os grupos a taxa de hemostase inicial foi superior a 95%. A taxa de
recidiva foi ligeiramente superior no grupo
tratado só com solução injectável, mas esta
diferença não foi estatisticamente significativa
(50). Gevers et al realizaram um estudo randomizado com 105 doentes para receberem
tratamento hemostático com hemoclips,
injecção de adrenalina e polidocanol ou a
combinação dos dois métodos. A falência inicial na hemostase e a taxa de recidiva foram
superiores (mas sem significado estatístico) no
grupo tratado com hemoclips (13/35; 37%),
72
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
mecânicos foram utilizados hemoclips (n=23)
e elásticos (n=22). A taxa de hemostase inicial foi semelhante em ambos os grupos.
A taxa de recidiva, no grupo de terapêutica
combinada (4,5%), foi significativamente
menor quando comparado com o grupo tratado
só com adrenalina (20,5%). O número de
sessões de terapêutica endoscópica foi significativamente menor no grupo de tratamento
combinado(55).
Depreende-se dos estudos anteriores que é
difícil afirmar sobre a superioridade ou mais
valia da aplicação de hemoclips no contexto
da UP. O sucesso na aplicação de hemoclips
está condicionado por algumas algumas
dificuldades, dado que depende de um
adequado posicionamento do hemoclips para
coaptar o vaso, o que em situações de hemorragia torrencial, ou localizações proximais no
estômago, ou face posterior do bulbo, é factor
limitativo desta técnica. Outro aspecto que
pode limitar a aplicabilidade de hemoclips são
as úlceras de fundo muito fibrótico, que
impede boa compressão do vaso. Existem
poucos dados sobre aplicação de elásticos no
âmbito de UP para poder avaliar a sua eficácia,
ou o seu potencial, no tratamento de UP sangrante.
adrenalina mais tratamento térmico em cinco
deles, injecção de adrenalina mais laser em
dois e adrenalina com aplicação de hemoclip
em um. A terapêutica combinada foi associada
a uma diminuição, estatisticamente significativa, da taxa de recidiva, comparada com a
injecção isolada, tratamento térmico isolado
ou tratamento médico. Não se constatou
semelhante redução da taxa de recidiva quando se comparou a terapêutica combinada com
a aplicação isolada de hemoclip, embora
tivesse ocorrido uma diminuição estatisticamente significativa, da taxa de cirurgia(12).
A validade da combinação de terapêuticas
na hemostase endoscópica foi avaliada recentemente através de uma meta-análise realizada
por Calvet et al, em que foram combinados 16
estudos. Em todos os estudos comparou-se a
injecção de adrenalina isolada vs injecção de
adrenalina com: outro agente injectável
(esclerosante), métodos mecânicos ou térmicos. A adição de um segundo método de
hemostase endoscópica reduziu a taxa de
recidiva de 18,4% para 10,6% e a taxa de
cirurgia urgente de 11,3% para 7,6%.
A mortalidade desceu de 5,1% para 2,6%.
A análise de subgrupos mostrou que o risco de
recidiva descia, qualquer que fosse o segundo
método aplicado(56).
Comparação monoterapia vs combinação
Conclusões
Os mecanismos de acção dos diversos
métodos de hemostase são diferentes. É por
isso lógica a sua associação, com o objectivo
final de melhorar os resultados de hemostase.
Todas as técnicas de hemostase têm demonstrado alguma eficácia quando utilizadas
isoladamente no tratamento de UP com
estigmas de elevado risco. No entanto, os
estudos que comparam a monoterapia com a
terapêutica combinada e algumas meta-análises recentes abordando este tema, têm
demonstrado que a terapêutica combinada é
superior a cada uma delas isoladamente.
A hemostase endoscópica está indicada nas
situações em que se identificam estigmas de
hemorragia de elevado risco de recidiva
(Forrest Ia, IIa, IIb). Os estudos existentes
indicam que não existe superioridade de um
método de hemostase sobre qualquer outro, o
que faz com que a modalidade de hemostase
usada irá depender das disponibilidades de cada
unidade de endoscopia e, sobretudo, da experiência de cada executante. A hemostase
endoscópica será eficaz quando realizada por
um endoscopista com experiência e destreza
técnica com o método que vai utilizar. Existe
uma tendência, que é consubstanciada por
vários estudos, para a combinação de técnicas,
Bardou et al avaliaram a eficácia da terapêutica combinada em 8 estudos: injecção de
73
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
No âmbito de estudos randomizados é de
referir o trabalho realizado por Laine et al,
englobando um total de 17 doentes. Comparou
a electrocoagulação multipolar vs tratamento
médico. Concluiu que a terapêutica com
electrocoagulação multipolar era mais eficaz
em termos de hemostase definitiva e necessidade de cirurgia que o tratamento médico(58).
Llach et al realizaram um estudo randomizado,
comparando o tratamento por injecção vs
tratamento médico, em doentes com vaso
visível não sangrante ou hemorragia activa.
A hemostase inicial foi alcançada em todos os
doentes tratados endoscopicamente e houve
diminuição significativa da taxa de recidiva
(28% vs 6%, P <0,05)(59). Park et al realizaram
um estudo prospectivo randomizado, envolvendo 34 doentes com hemorragia activa.
Dividiram os doentes em dois grupos: um deles
foi submetido a hemostase com adrenalina (na
diluição de 1:10000) e o outro a laqueação
elástica. O número de elásticos aplicados foi de
um a dois e o volume médio de adrenalina
injectada foi de 18ml. Foi alcançada hemostase
inicial em todos os doentes do grupo submetido a laqueação elástica e em 16 dos 17
doentes submetidos a injecção com adrenalina.
Atendendo ao reduzido número de doentes
não foi possível detectar diferenças significativas, quer na eficácia, quer na segurança das
duas técnicas(60). Mais recentemente, Huang
et al trataram 35 doentes com hemorragia activa (jacto e babamento) com sede em MW.
Os doentes foram aleatoriamente distribuídos
por terapêutica com hemoclips (n=18) ou
injecção com adrenalina (n=17). Os dois grupos
eram sobreponíveis em termos clínicos e características endoscópicas. Não houve recidiva
hemorrágica, necessidade de cirurgia, complicações ou mortalidade em ambos os grupos.
Embora o estudo seja reduzido, os resultados
parecem favorecer a utilização de hemoclips na
terapêutica deste tipo de patologia(61). Chung
et al estudaram 76 doentes em que existia
hemorragia activa, vaso visível ou coágulo
fresco aderente. Os primeiros 30 doentes foram
distribuídos aleatoriamente por: injecção de
isto é, associar a injecção de adrenalina com
outro método, mecânico, térmico ou mesmo de
injecção. Esta última opção encontra-se muito
vulgarizada em Portugal, com bons resultados,
ao contrário do que alguns estudos nos
indicam. Porém, a meta-análise de Calvet et al,
com todas as limitações inerentes a este tipo de
estudo, mostrou a existência de benefício na
associação de um agente esclerosante à adrenalina, o que vem apoiar esta atitude(56).
A hemorragia em babamento sem outro
estigma (Forrest Ib) é por norma auto-limitada. No entanto, se apesar de lavagem local e
observação, o babamento hemorrágico persistir,
a monoterapia com recurso a métodos
térmicos ou de injecção, é recomendável para
obter hemostase definitiva(4).
2.2. Lesão de Mallory Weiss
A lesão de Mallory-Weiss (MW) consiste
numa laceração ao nível da transição esófagogástrica que resulta de um aumento rápido da
pressão intra-gástrica. É uma causa comum de
HDA, correspondendo a cerca 3-15%,
consoante as séries. Por norma a hemorragia
induzida por este tipo de lesão é auto-limitada.
No entanto, em algumas situações (que
podem chegar aos 23%) pode associar-se a
perdas hemáticas significativas(57).
Como referido anteriormente, na maioria
dos casos a hemorragia é auto-limitada, não
existindo necessidade de terapêutica endoscópica. Esta está indicada em situações de
hemorragia activa ou estigmas de hemorragia
recente – vaso visível ou coágulo aderente, à
semelhança das lesões ulcerosas pépticas.
Têm sido publicados vários estudos sobre
hemostase no contexto de hemorragia por
MW, em que são utilizadas diferentes modalidades terapêuticas. Estes trabalhos sofrem da
mesma limitação: o pequeno número de
doentes envolvidos. Pode apenas concluir-se
pela aparente eficácia das diferentes modalidades terapêuticas, não sendo, no entanto,
possível determinar a maior eficácia de uma
técnica sobre outra.
74
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
2.3. Lesão de Dieulafoy
soro fisiológico e adrenalina (n=14), hemoclips ou laqueação elástica (n=16). Nos
restantes 46 doentes procedeu-se à irrigação da
lesão com solução de adrenalina a 1:10000 até
ocorrer hemostase (grupo com tratamento
médico). Houve recidiva em 4 dos 14 doentes
que foram tratados com injecção de adrenalina
e num dos 46 doentes tratados medicamente.
Não houve recidiva nos doentes tratados com
hemoclips ou laqueação elástica. As recidivas
ocorreram nos doentes com hemorragia activa.
Os autores concluiram que a terapêutica
endoscópica não é necessária em doentes sem
hemorragia activa e que os métodos mecânicos são mais eficazes que a injecção de
adrenalina(62).
Existem ainda numerosos trabalhos sobre
as diferentes modalidades terapêuticas hemostáticas. Em termos de hemostase com métodos
de injecção, têm sido utilizados diferentes
tipos de soluções: adrenalina isolada(63) ou
associada a agente esclerosante (polidocanol
ou álcool)(64, 65) ou esclerosante isolado
(polidocanol ou álcool)(66, 67). Sobre a utilização de métodos térmicos existem trabalhos em
que foram testadas quer a electrocoagulação
multipolar (BICAP), quer a sonda térmica,
com grande eficácia terapêutica para ambas(63,
65). No âmbito dos métodos mecânicos, a
laqueação elástica e a aplicação de hemoclips,
têm demonstrado serem opções eficazes e
seguras a ter em conta(68-70).
Em conclusão e considerando os diferentes
estudos existentes bem como os métodos de
hemostase utilizados, pode-se concluir que: a
terapêutica endoscópica está associada a uma
paragem da hemorragia activa em mais de
90% dos casos; todos os métodos parecem ser
eficazes em obter hemostase e, aparentemente
têm eficácia semelhante; na recidiva hemorrágica, um segundo tratamento endoscópico
pode permitir obter hemostase definitiva; por
fim, o risco de complicações secundárias ao
tratamento endoscópico é reduzido.
A lesão de Dieulafoy (LD) é responsável
por 0,6% a 5,8% das hemorragias digestivas
altas. A LD consiste num vaso arterial tortuoso e de calibre anormalmente aumentado, ao
nível da submucosa, que acaba por erosionar a
mucosa e dar origem a hemorragia. Essa
hemorragia é na maioria das vezes significativa.
O mecanismo pelo qual ela ocorre é ainda
motivo de discussão, mas provavelmente
resultará de erosão da mucosa pela actividade
pulsátil do vaso arterial. Cerca de 75% dos
casos de LD localizam-se no estômago, em
particular no fundo (65%) e menos frequentemente ocorrem no corpo ou antro gástrico
(respectivamente 23 % e 4%), As localizações
duodenais, esofágicas e cólicas são menos
frequentes(71,72).
O diagnóstico endoscópico é, por vezes,
difícil atendendo ao pequeno tamanho da LD
e à sua localização proximal, onde, por norma,
se acumula conteúdo hemático. Os achados
endoscópicos consistem na presença de
solução de continuidade da mucosa, de reduzidas dimensões, com hemorragia activa em
jacto. Por vezes existe um vaso visível ou
coágulo aderente, em qualquer das situações
sem ulceração significativa da mucosa. Devido
às dificuldades diagnósticas, não é raro a
necessidade de várias endoscopias para se
descobrir a lesão.
Atendendo à raridade deste tipo de lesão
sangrante e à multiplicidade de terapêuticas
hemostáticas utilizadas nos diversos trabalhos
existentes, é difícil a apreciação dos resultados, não existindo, por isso, consenso sobre
qual a melhor opção de hemostase endoscópica. No tratamento das LD tem sido
descrito praticamente todo o tipo de opções de
terapêutica hemostática, desde injecção de
adrenalina(73,74), álcool(75,76), polidocanol(77),
histoacryl(78,79), cola de fibrina(80) e glucose
hipertónica(81); sonda térmica(82-85); electrocoagulação multipolar(84,86); laser(87); laqueação elástica(88-94) e hemoclips(95-100). Por vezes,
o mesmo trabalho apresenta resultados que
75
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
advêm da utilização de diferentes técnicas ou
mesmo combinações de técnicas, o que não
permite concluir efectivamente qual a técnica
mais eficaz. Não se pode consequentemente
afirmar categoricamente a superioridade de
um método sobre outro. Apenas se pode
afirmar a sua eficácia no tratamento deste tipo
de lesão.
Em relação a trabalhos randomizado existentes, é de referir o realizado por Chung et al.
Comparam a injecção de adrenalina vs métodos mecânicos. Concluíram que os métodos
mecânicos (hemoclips, n=9; laqueação elástica, n=3) eram mais eficazes que a injecção de
adrenalina (n=12) em termos de hemostase
inicial (92% vs 75%, p=0,1), recidiva hemorrágica (8,3% vs 33,3%, p=0,03), e necessidade de cirurgia urgente (0% vs 16,7%,
p=0,1)(98). Outro estudo, realizado por Park
et al, englobou 32 doentes com LD. Foram
distribuídos em dois grupos: um foi submetido
a terapêutica com injecção de adrenalina
(n=16) e no outro foram aplicados de hemoclips (n=16). Não houve mortalidade associada à hemorragia em ambos os grupos. Não
houve diferenças significativas na hemostase
inicial entre os dois grupos (93,8% vs 87,5%,
P=1,00). Detectou-se uma menor necessidade de endoscopia para atingir hemostase
definitiva no grupo tratado com hemoclips vs
grupo tratado com injecção de adrenalina
(86,3% vs 31,3%, P=0,086). A aplicação de
hemoclips foi significativamente mais eficaz na
prevenção de recidiva comparando com a
injecção de adrenalina (0% vs 35,7%,
P<0,05). Os autores concluem que a hemorragia por LD foi eficazmente tratada pelos
métodos endoscópicos. A aplicação de hemoclips revelou-se mais eficaz que a injecção com
adrenalina, com menor necessidade de subsequentes endoscopias(99). Estes trabalhos e
outros existentes têm vindo a demonstrar a
eficácia dos métodos mecânicos no tratamento
deste tipo de lesão, bem como a sua superioridade sobre os métodos de injecção(18-27,30).
Outra eventual vantagem dos métodos
mecânicos sobre os outros métodos é a ausên-
cia de lesão tecidual e logo de complicações.
Podemos, em conclusão, afirmar que:
obtém-se uma hemostase inicial em cerca de
85% dos doentes; existe um risco de recidiva
precoce de 10% e que parte destas recidivas
podem ser tratadas com métodos endoscópicos. O risco de recidiva a longo prazo é
reduzido ou nulo. Quanto à melhor opção
terapêutica, os métodos mecânicos (laqueação
elástica, hemoclips) têm vindo a mostrar-se
particularmente indicados para este tipo de
lesão, com grande sucesso/eficácia na jugulação da hemorragia por LD e existindo dados
que mostram superioridade quando comparados com os métodos de injecção. Como
outra opção temos os métodos térmicos
(sonda térmica, BICAP) com ou sem injecção
de solução hemostática prévia (ex: adrenalina)
que têm demonstrado ser também eficazes. No
entanto, ressalva-se a falta de estudos
randomizados que permitam definir, efectivamente, qual a melhor opção terapêutica,
nomeadamente comparando os métodos
mecânicos com os métodos térmicos. No caso
de apenas possuir soluções injectáveis, parece
lógico associar adrenalina diluída inicialmente
para exercer o seu efeito compressivo e associar um agente esclerosante para puder obter
uma hemostase efectiva. Deve-se referir,
todavia, que tanto os métodos térmicos como
os de injecção não estão desprovidos de potenciais complicações, pois podem originar lesão
tecidual(101).
2.4. Angiodisplasias
Designam-se por angiodisplasias as lesões
vasculares que se apresentam com vasos ectasiados na mucosa e que não estão associadas a
lesões cutâneas, síndromes vasculares sistémicos e ou síndromes familiares. Estas lesões
são muito semelhantes às telangectasias que
aparecem nessas doenças e o tratamento
endoscópico recomendado é igual.
As angiodisplasias chegam a estar incriminadas em cerca de 4% das hemorragias
digestivas altas(102).
76
Filipe Silva e Helena Vasconcelos
Estas lesões são na maioria das vezes multifocais o que por vezes dificulta o tratamento
adequado. Também a forma de apresentação
da hemorragia condiciona a escolha do método
endoscópico mais eficaz.
A selecção da melhor técnica de hemostase não se baseia em conhecimentos científicos
correctamente validados devido à falta de
estudos suficientemente amplos e randomizados.
Encontra-se na literatura apenas referência a
pequenas séries de doentes tratados, sem obedecer às regras e preceitos científicos dos ensaios
clínicos que nos permitam validar as técnicas ou
afirmar a superioridade de uma sobre a outra.
A terapêutica endoscópica com recurso a
agentes esclerosantes e sonda térmica são
usados, embora possa haver recorrência da
hemorragia em cerca de metade dos doentes.
Isto deve-se mais ao sangramento de outras
angiodisplasias do que a ineficácia do método
(102).
A utilização de Nd-Yag laser ou árgon plasma são as técnicas que apresentam os melhores resultados diminuindo a hemorragia e as
necessidades transfusionais. Pelas características já previamente mencionadas a coagulação
com recurso ao árgon plasma é actualmente a
técnica mais popular. É a que se apresenta com
maior acessibilidade e mais simples de executar(103-105). A potência recomendada é de 40 a
60 W com um fluxo de 2L/min.(103).
Tal com em outras lesões sangrantes de
alguma raridade não existem trabalhos
randomizados que possam aconselhar o uso de
qualquer opção terapêutica, contudo devido à
lesão ocupar todo o antro, os métodos térmicos sem contacto são mais utilizados por se
poderem aplicar numa grande extensão de
mucosa(106).
O sucesso parece ser muito superior com o
recurso à utilização do laser ou do árgon
plasma. O Nd-Yag laser apresenta taxas de
resposta que podem chegar aos 90 %. Porém as
complicações associadas não são desprezíveis(107).
O árgon plasma é uma técnica de electrocoagulação que tem como vantagem a limitada
penetração na parede gástrica o que reduz o
risco de complicações. Este é hoje em dia o
método mais amplamente usado nesta patologia(105,108,109). A potência recomendada é de
40 a 60W com um fluxo de 2L/min(103).
Múltiplas sessões são muitas vezes necessárias
até se obter o controlo das necessidades transfusionais nesses doentes.
2.6. Esofagite Péptica
A esofagite péptica é responsável por cerca
de 5-15% das HDA. No entanto, a hemorragia
clinicamente significativa é um acontecimento raro(7).
Normalmente, neste contexto, o tratamento conservador, combinado com inibidores
da secreção ácida, é suficiente. Muito
raramente, é necessário terapêutica hemostática endoscópica, no contexto de HDA por
esofagite. Uma eventual situação em que a
hemostase endoscópica pode ter lugar é perante a presença de ulceração com erosão de
vaso arterial subjacente. A melhor opção de
terapêutica hemostática é controversa, dado
que não existem estudos nesse sentido. No
entanto, por comparação com a doença péptica gastro-duodenal, poderão ser aplicadas as
mesmas técnicas consideradas eficazes neste
tipo de lesão sangrante(7).
2.5. Ectasia Vascular Antral
A ectasia vascular antral, ou estômago em
melância, constitui uma causa rara de hemorragia digestiva.
O aspecto endoscópico característico
complementado com a análise histológica faz
o diagnóstico. Esta lesão associa-se a várias
doenças auto-imunes.
Antes do advento da terapêutica endoscópica o tratamento era frequentemente cirúrgico (antrectomia). Nem sempre é necessário
recorrer à terapêutica endoscópica dado que
muitas vezes o tratamento conservador com
suplementos de ferro se revela suficiente.
77
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA DE CAUSA NÃO VARICOSA
2.7. Gastrite e Duodenite Erosivas
referir uma taxa de recidiva de 33% ao fim de
um mês e uma mortalidade ao ano de 89%,
como seria de esperar neste género de patologia. Por norma são necessárias, várias sessões
de terapêutica endoscópica para obter os
resultados pretendidos(113).
As erosões gástricas e duodenais são a
causa de 5 a 15% das HDA(7).
Raramente induzem perdas hemáticas
significativas, resolvendo-se apenas com tratamento médico. A terapêutica endoscópica é,
por norma, pouco útil, atendendo à
distribuição difusa deste tipo de lesões e pelo
facto destas serem geralmente superficiais.
Excepcionalmente poder-se-á recorrer aos
métodos térmicos (BICAP, árgon plasma) se a
hemorragia for significativa e se apresentar de
forma localizada(110).
2.9. Hemorragias Iatrogénicas
As hemorragias secundárias a procedimentos terapêuticos endoscópicos são representadas principalmente por hemorragias após
mucosectomia, esfinterotomia endoscópica,
esclerose ou ligadura elástica de varizes esofágicas, dilatação, gastrostomia por via
endoscópica e polipectomia(114, 115).
Por norma, estas hemorragias são
acessíveis a tratamento endoscópico, embora
excepcionalmente possa existir necessidade
de resolução cirúrgica. De um modo geral
todas as opções de hemostase, quer por métodos de injecção, térmicos ou mecânicos têm
demonstrado eficácia na paragem da hemorragia(114,116-118).
2.8. Tumores
A patologia tumoral é responsável por
cerca de 1 a 5% das HDA. Normalmente
correspondem a tumores primitivos do estômago (adenocarcinoma, tumores do estroma,
linfomas, tumores neuro-endócrinos ou pólipos) e de metástases gástricas ou duodenais de
tumores primitivos sobretudo do pulmão,
mama, rim ou melanoma maligno(111-113).
No contexto de patologia tumoral, o papel
desempenhado pela endoscopia é essencialmente diagnóstico, pois a maioria dos doentes
serão orientados para ressecção cirúrgica, se
possível. A hemostase endoscópica poderá
estar indicada para controlo da hemorragia,
antes de uma cirurgia electiva ou no caso do
doente não ter condições para ser submetido a
cirurgia, no sentido de diminuir as perdas
hemáticas e assim a necessidade de aporte
transfusional(111-113).
Quanto ao tipo de terapêutica, tanto o
laser como árgon plasma parecem ser os mais
úteis, permitindo uma destruição tumoral e
também hemostase sobre extensas áreas.
A injecção de álcool também é uma opção,
embora o grau de destruição tumoral seja mais
difícil de controlar. Savides et al utilizaram
num estudo retrospectivo como métodos
hemostáticos a sonda térmica ou a injecção de
adrenalina ou ambas. Conseguiram alcançar
hemostase em todos os tumores, sendo de
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HEMORRAGIA DIGESTIVA
ASSOCIADA À HIPERTENSÃO
PORTAL
RITA ORNELAS
HORÁCIO GUERREIRO
I - INTRODUÇÃO
varizes, o uso de drogas vasoactivas, o tratamento em ambiente de cuidados intensivos e o
combate precoce à infecção.
Nos capítulos que se seguem, abordaremos
o tratamento e prevenção da hemorragia
digestiva associada às varizes esofágicas e
gástricas e à gastropatia da hipertensão portal.
A hipertensão portal é a consequência
major da cirrose, sendo responsável por eventos como hemorragia gastrointestinal massiva
(varizes esofágicas e gástricas), ascite,
síndrome hepato-renal e encefalopatia. Dado
o impacto combinado das suas complicações, a
hipertensão portal representa a principal causa
de morte e de transplantação hepática em
doentes com cirrose.
A hemorragia gastrointestinal massiva é
um dos problemas clínicos mais frequentes e
graves da cirrose hapática. Embora os doentes
cirróticos possam apresentar hemorragia de
várias origens, a rotura de varizes gastroesofágicas é, de longe, a causa mais importante
de hemorragia gastrointestinal neste grupo de
pacientes, contribuindo para cerca de 80% dos
episódios hemorrágicos.
A avaliação e o tratamento da hipertensão
portal evoluíram muito nos últimos anos,
pelo que o prognóstico da cirrose hepática
melhorou bastante. Embora a mortalidade no
internamento, em cada episódio hemorrágico,
permaneça elevada, na ordem dos 8%, a
mortalidade por hemorragia, englobando o
período de internamento e as semanas subsequentes, decaiu para metade, cifrando-se
actualmente entre 15 e 30 %.
Para o decréscimo da mortalidade muito
contribuíram a melhor compreensão da
fisiopatologia da hipertensão portal, novos
exames complementares, novas técnicas
terapêuticas, a possibilidade de erradicar as
II - VARIZES ESOFÁGICAS
1. História natural
A hemorragia por varizes esofágicas é uma
das complicações mais graves da hipertensão
portal, constituindo o último passo na cadeia
de eventos que começa com um aumento da
pressão portal, condicionante da formação e
dilatação progressiva de vasos colaterais, dentro dos quais as varizes gastro-esofágicas são os
mais relevantes do ponto de vista clínico(1).
A ausência de marcadores não invasivos
aplicáveis na clínica para a identificação de
varizes esofágicas, faz da endoscopia digestiva
alta o método de eleição para esse efeito(1,2).
Dada a grande variabilidade de prevalência de varizes esofágicas em doentes cirróticos,
é actualmente consensual que todos os
doentes devem efectuar endoscopia para
avaliar a presença de varizes esofágicas, aquando do diagnóstico da cirrose hepática(3,4).
A prevalência de varizes esofágicas em
doentes cirróticos é aproximadamente 50%(5),
variando entre 30 e 80 %, e parece estar rela85
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
cionada com o grau de insuficiência hepática(6,4), sendo que mais de 90% dos cirróticos
desenvolvem varizes esofágicas no decurso da
sua vida(7,8) e, destes, 30% vão sangrar(9).
O risco de desenvolvimento de varizes esofágicas de novo é de cerca de 5% por ano. Uma
vez presentes, o risco de varizes pequenas se
tornarem maiores é de 4% a 10% por
ano(5,10,11). A regressão espontânea de varizes
esofágicas pequenas pode por vezes ser observada(5,11). A abstinência alcoólica é um factor
determinante a considerar nesta ocorrência.
de grande calibre, em doentes cirróticos
estáveis, ronda os 35%(16).
De acordo com a actual teoria da explosão,
o aumento da pressão hidrostática interior é o
principal factor implicado, contribuindo para
o aumento do calibre da variz e consequente
diminuição da espessura da sua parede.
A hemorragia ocorre quando a tensão na
parede (força interna exercida pela parede do
vaso contra a distensão desencadeada pelo
aumento de pressão intra-varicosa) excede o
limite de elasticidade, produzindo a rotura da
variz(17).
O conceito fisiopatológico encontra
suporte nas observações clínicas de que o risco
de hemorragia é directamente proporcional ao
tamanho das varizes e à diminuição da espessura da sua parede, traduzida pela presença de
ponteado, manchas ou riscos vermelhos, que
se pensa reflectirem áreas onde a parede é
especialmente delgada(6).
A hemorragia por varizes representa,
aproximadamente, 70%-80% dos episódios de
hemorragia gastrointestinal alta em doentes
com hipertensão portal(12,13).
Mesmo sem qualquer intervenção, a
hemorragia cessa em mais de metade dos
doentes. Naqueles que sobrevivem ao evento
hemorrágico agudo, existe um elevado risco de
recidiva tardia (depois das 6 semanas) e mais
de 70% volta a sangrar se não for tratado(14).
A incidência de recidiva hemorrágica nas
primeiras 6 semanas (recidiva precoce) é de
30% a 40%. Este risco tem um pico nos
primeiros cinco dias, durante os quais ocorrem
40% dos episódios de recidiva(1).
De acordo com um consenso internacional, a mortalidade da hemorragia por
varizes esofágicas é actualmente avaliada às 6
semanas(3).
Acresce que, doentes com rotura de
varizes esofágicas e com valores de gradiente
de pressão na veia hepática (GPVH - a diferença entre a pressão portal e a pressão na veia
cava inferior)> 20 mmHg na admissão,
apresentam taxas de recidiva hemorrágica e
mortalidade mais elevadas, o que reflecte a
importância da pressão portal no prognóstico
destes doentes(18). Embora a pressão portal
não seja equivalente à pressão intra-varicosa,
a sua variação reflecte variações simultâneas
desta(19), o que também está de acordo com a
explicação fisiopatológica.
2. Patogénese
A tensão e a espessura da parede da variz
constituem os factores determinantes da sua
rotura. De acordo com a modificação de Frank
da lei de Laplace, a tensão da parede da variz
é directamente proporcional à pressão varicosa transmural (gradiente entre as pressões
intra-esofágica e varicosa) e ao raio (calibre)
da variz, e inversamente proporcional à espessura da parede da variz(15). Varizes de grande
calibre apresentam tensão elevada e menor
espessura da sua parede, que se associam a
maior risco de rotura. A prevalência de varizes
3. Factores de risco
Os factores que predispõem ou que precipitam a hemorragia não estão totalmente
definidos. No entanto, a sua identificação é
importante na selecção de doentes que mais
beneficiariam de terapêutica profiláctica.
O índice de prognóstico mais frequentemente utilizado foi proposto pelo North
86
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Italian Endoscopic Club, que estratifica os
doentes com cirrose de acordo com a probabilidade de hemorragia ao 1º ano(7), tendo sido
validado prospectivamente em séries independentes que incluíram mais de 1000 doentes(6).
Três factores de risco para a primeira hemorragia de varizes foram estabelecidos: tamanho
das varizes, espessura da parede do vaso com
manchas e riscos vermelhos (fig. 1) e gravidade
da doença hepática (baseada na concentração
sérica de albumina, tempo de protrombina,
valor de bilirrubina, presença de ascite e encefalopatia)(7).
mais elevada de hemorragia não-controlada,
recidiva precoce e mortalidade ao 1º ano)(23,20).
Estes factos sugerem que um fármaco
vasoactivo que baixe a pressão portal deve ser
administrado sempre, independentemente da
realização de terapêutica endoscópica eficaz.
QUADRO I. FACTORES DE RISCO DE HEMORRAGIA
POR VARIZES ESOFÁGICAS
Tamanho das varizes
Espessura da parede do vaso (manchas e riscos vermelhos)
Gravidade da doença hepática (albumina, tempo de protrombina, bilirrubina, ascite, encefalopatia)
GPVH > 12 mmHg
4. Factores de prognóstico de recidiva
precoce e mortalidade
Apesar dos avanços recentes na terapêutica farmacológica e endoscópica da hemorragia
de varizes, a taxa de recidiva ainda é elevada,
cerca de 25-60%, sendo a taxa de recidiva
ainda maior em doentes com carcinoma hepato-celular ou varizes gástricas(24).
FIGURA 1 - VARIZES ESOFÁGICAS DE GRANDE CALIBRE
COM MANCHAS E RISCOS VERMELHOS.
A recidiva precoce está significativamente
associada ao risco de morte nas primeiras 6
semanas. Os indicadores de prognóstico de
recidiva precoce descritos na literatura são um
GPVH > 16 mmHg25, GPVH > 20 mmHg na
admissão(18), infecção(26,27), ureia elevada e
hipoalbuminemia(6). O valor de hematócrito,
valor de aminotransferases, classe Child-Pugh
e trombose da veia porta constituem indicadores significativos de falência terapêutica
ao 5º dia(28).
Um factor determinante no sangramento
das varizes esofágicas é o GPVH. A hemorragia apenas se verifica quando o GPVH for
superior ao valor limite de 12 mmHg e os
doentes com hemorragia, ou com varizes de
maior calibre, apresentam geralmente gradientes mais elevados(11,20).
Embora não exista uma relação linear entre
a gravidade da hipertensão portal e o risco de
hemorragia para valores acima dos 12
mmHg(21,22), vários estudos mostraram que o
GPVH é um factor de prognóstico independente para hemorragia de varizes e morte
(Quadro I). Valores de GVPH na admissão
superiores a 20mmHg associam-se a pior
prognóstico (frequência significativamente
A presença de hemorragia activa na endoscopia associou-se a recidiva precoce em alguns
estudos(29,30) e a falência terapêutica ao 5 º dia
(28), mas não noutros estudos (Quadro II)(31).
Os factores associados a mortalidade (às 6
semanas) por rotura de varizes esofágicas
incluem a classe de Child-Pugh(32,33), função
87
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
QUADRO II
FACTORES DE RISCO DE RECIDIVA PRECOCE
GPVH > 16 mmHg
GPVH > 20 mmHg na admissão
Ureia elevada
Infecção
Hipoalbuminémia
Carcinoma Hepato-Celular
Varizes Gástricas
Hemorragia activa na endoscopia ?
FACTORES DE RISCO DE FALÊNCIA TERAPÊUTICA AO 5º DIA
Hematócrito
Aminotransferases
Classe de Child-Pugh
Trombose da Veia Porta
Infecção
Hemorragia activa na endoscopia ?
renal(31,13), idade, consumo activo de álcool(6),
encefalopatia, valor de bilirrubina, albumina,
etiologia alcoólica e carcinoma hepato-celular(28,31).
Embora alguns autores(34) tenham observado que a presença de hemorragia activa na
endoscopia constitui um factor de prognóstico
de mortalidade, outros não o confirmaram(35,36,6).
5. Outros Factores de Prognóstico
a) Alterações da Coagulação
O efeito das alterações da coagulação na
gravidade da hemorragia por varizes não está
clarificado.
Embora um tempo de protrombina prolongado se associe a uma maior probabilidade de
hemorragia por rotura de varizes esofágicas, ao
primeiro ano(7), e os doentes cirróticos, com
hemorragia gastrointestinal, requeiram transfusões de grande volume, que podem
exacerbar a coagulopatia(38), os dados actualmente disponíveis não permitem estabelecer
recomendações referentes ao tratamento da
coagulopatia, nem à correcção da trombocitopénia(39). Recentemente Tripodi A et al
vieram pôr em causa a existência de uma verdadeira coagulopatia na cirrose, argumentando
que a diminuição dos factores de coagulação é
compensada por uma diminuição de factores
anticoagulantes(40).
A recidiva precoce é provavelmente o factor
de prognóstico mais importante para o risco de
morte, às 6 semanas(6), e os estudos demonstram
que a insuficiência hepática e a gravidade da
hemorragia constituem indicadores de prognóstico precoce e de falência terapêutica ao 5º dia.
Os indicadores de prognóstico da mortalidade,
às 6 semanas, relacionam-se mais com a
doença hepática do que com a gravidade da
hemorragia (Quadro III)(28,37).
QUADRO III. FACTORES DE PROGNÓSTICO DE
MORTALIDADE ÀS 6 SEMANAS
Apesar de tudo, é prática comum efectuar
transfusão de plaquetas em doentes com
hemorragia activa e trombocitopénia acentuada e administrar plasma fresco congelado
para correcção da coagulopatia grave(14).
Os doentes com hemorragia aguda por
varizes esofágicas, com recidiva precoce, apresentam um estado de hipocoagulação
relacionado com hipofibrinogenemia ou deficiência de factores de coagulação(41). A
administração intravenosa de factor VIIa
recombinante (rFVIIa) permite corrigir o
Recidiva precoce
Infecção
Classe de Child-Pugh
Função Renal
Idade
Consumo activo de álcool
Encefalopatia
Etiologia alcoólica
Hipoalbuminémia
Bilirrubina elevada
Carcinoma Hepato-Celular
Hemorragia activa na endoscopia?
88
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
tempo de protrombina nos cirróticos, tanto no
contexto de hemorragia aguda(42), como na
ausência de hemorragia(43), e a sua administração poderá melhorar os resultados da
terapêutica convencional nos doentes com
insuficiência hepática moderada a grave
(Classe B e C de Child-Pugh), sem aumentar a
incidência de eventos adversos (complicações
tromboembólicas)(38).
c) Factores de prognóstico de recidiva
tardia (depois das 6 semanas)
A pressão portal poderá ser o principal
factor determinante de recidiva hemorrágica
tardia.
Num estudo, a redução do GPVH foi o
único factor de prognóstico independente
para recidiva, em doentes sob profilaxia
secundária com propranolol(50). Estão
descritos outros factores de risco de recidiva
tardia, tais como o calibre das varizes,
consumo activo de álcool, insuficiência renal
e grau de insuficiência hepática(51). No
entanto, o calibre das varizes e a classe de
Child-Pugh parecem sofrer alterações que
acompanham as variações do GPVH(11).
Também a abstinência alcoólica, que diminui
o risco de recidiva, se associa a uma redução
no GPVH(11).
Consequentemente, tem sido sugerido por
alguns autores que doentes sob terapêutica
médica para prevenir a recidiva hemorrágica,
deveriam idealmente ser monitorizados com
medições da GPVH, para avaliar o efeito do
tratamento na pressão portal(52).
b) Infecções
A infecção é outro factor de risco nos
doentes cirróticos com hemorragia aguda por
rotura de varizes, documentando-se a sua
existência em 35-66% dos episódios hemorrágicos(44). A infecção bacteriana associa-se a
risco aumentado de falência de controlo
da hemorragia, de recidiva precoce e de
mortalidade, sendo porventura o factor de
risco mais importante na recidiva hemorrágica(26,32).
Tem sido colocada a hipótese de que a
infecção bacteriana e a endotoxinemia resultariam na activação de uma cascata de
citoquinas, com libertação de substâncias
vasoactivas, nomeadamente a endotelina,
levando a um aumento da pressão varicosa e
disfunção da hemostase primária, conduzindo
por sua vez à rotura de varizes(44).
Vários estudos controlados, aleatórios,
mostraram um benefício significativo da profilaxia antibiótica na hemorragia por varizes,
com uma redução absoluta do risco de mortalidade de 7%, comparativamente com o placebo
ou com aqueles que não fizeram profilaxia(12).
Os aérobios gram negativos entéricos são os
microorganismos mais frequentemente
isolados nos doentes cirróticos com hemorragia gastrointestinal(24,45,46,47,48,49), sendo que
as quinolonas se têm provado eficazes na
prevenção das infecções, neste contexto(24,46,47,49).
É actualmente recomendação consensual
que a profilaxia antibiótica com cefalosporina
endovenosa ou com quinolona oral seja instituída, desde a admissão, em todos os doentes
cirróticos com rotura de varizes(3).
6. Tratamento da Hemorragia Aguda
Considera-se que uma hemorragia digestiva alta foi provocada por rotura de varizes,
quando se demonstra, na endoscopia de
urgência, hemorragia em jacto (fig. 2) ou em
“babamento” (oozing) de uma variz, um coágulo de fibrina (“white nipple sign”) aderente
a uma variz, ou a presença de varizes esofágicas e ausência de outra condição patológica
para explicar a hemorragia digestiva(3).
A primeira e mais importante medida
terapêutica é a estabilização hemodinâmica do
doente e a prevenção da aspiração do vómito
hemático(53).
A rotura de varizes esofágicas constitui
uma emergência médica. Estes doentes devem
ser internados num hospital que tenha pelo
menos unidade de cuidados intensivos e
endoscopia. Idealmente devem ser tratados
numa unidade de cuidados intensivos.
89
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
reflexa que reduz o fluxo sanguíneo portocolateral e pressão portal, que tende a parar a
hemorragia espontaneamente. Este fenómeno
é contrariado, e mesmo agravado, pela
transfusão sanguínea. Em doentes com
hipertensão portal, a expansão do volume
plasmático aumenta a pressão portal(12).
Por outro lado, é importante corrigir a
anemia nos dias subsequentes, uma vez que a
anemia persistente se associa a agravamento
da síndrome de circulação hiperdinâmica e
hipertensão portal, podendo constituir um
factor de risco para a recidiva(12,57).
As recomendações actuais são manter a
volémia parcimoniosamente, usando expansores do plasma para assegurar a estabilidade
hemodinâmica (pressão arterial sistólica
superior a 80 mmHg e frequência cardíaca
inferior a 100 pulsações por minuto) e
transfundir apenas as unidades de concentrado de eritrócitos suficientes para manter a
hemoglobina em 8g/dL e o hematócrito entre
25% e 29%, dependendo estes valores de
outros factores do doente, como co-morbilidades, idade, ou presença de hemorragia
activa(39,3). Todos os doentes que recebem
transfusões sanguíneas em grande volume
devem ser monitorizados em relação à
hipocalcemia(15).
FIGURA 2 - HEMORRAGIA EM JACTO DE VARIZ
ESOFÁGICA
A determinação da gravidade da hemorragia baseia-se em sinais clínicos, a maioria de
natureza hemodinâmica, que devem ser interpretados no contexto da cirrose (não esquecer
os efeitos da terapêutica com B-bloqueantes).
Os valores iniciais da hemoglobina ou do
hematócrito não são indicadores fidedignos da
perda de sangue(54).
a) Medidas Gerais
Estabilização hemodinâmica
A hemorragia por varizes esofágicas é
frequentemente massiva, de grande débito,
sendo essencial evitar complicações do
choque hipovolémico e da diminuição da
perfusão de órgão vitais. A reposição da
volémia deve ser iniciada o mais precocemente possível. Evitar o choque hipovolémico
prolongado é particularmente importante para
prevenir complicações, como infecções e
insuficiência renal, que estão associadas ao
risco de recidiva hemorrágica e morte(1).
As transfusões em excesso, contudo,
devem ser evitadas, não apenas pelos riscos
inerentes à transfusão em si, mas também por
poder desencadear um (novo) aumento da
pressão portal, associado ao risco de persistência ou recidiva da hemorragia(55,56).
A hipovolémia causada pela hemorragia
desencadeia uma vasoconstrição esplâncnica
Antibioterapia
A profilaxia antibiótica deve ser instituída
desde a admissão, dado que a administração
precoce melhora a sobrevida. A presença de
infecção, que tem um efeito deletério no
controlo da hemorragia e na mortalidade, deve
ser investigada(27). As infecções mais frequentes
são peritonite bacteriana expontânea (40%),
infecção urinária (25%) e pneumonia (25%).
Pelo seu baixo custo, a norfloxacina, 400
mg de 12h/12h por via oral(58), ou outra
quinolona, poderá ser uma primeira escolha.
Contudo, em doentes de elevado risco
(choque hipovolémico, ascite, insuficiência
hepática) será aconselhável a administração
endovenosa de uma cefalosporina de terceira
geração(59).
90
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Uma vez que a aspiração brônquica de
conteúdo gástrico e/ou sangue constitui um
problema particular, podendo ser exacerbado
pelos procedimentos endoscópicos, é aconselhável proceder a entubação orotraqueal
para proteger as vias aéreas, particularmente
nos doentes com alto débito hemorrágico ou
não cooperantes, designadamente com encefalopatia(1).
face às suas reacções adversas e ao surgimento
de outros fármacos com melhor perfil de
segurança e de eficácia. Hoje em dia, a terlipressina, a somatostatina e o octreótido, são os
medicamentos com uso mais generalizado.
Dada a heterogeneidade dos estudos, não é
possível confirmar a superioridade de um
fármaco vasoactivo em relação a outro. Na
última reunião de Baveno (Baveno IV), não
foi possível chegar a consenso sobre qual a
substância a utilizar. Frequentemente a selecção do fármaco vasoactivo (terlipressina,
somatostatina, vapreótido, octreótido) depende da disponibilidade local.
Faz sentido que a terlipressina seja a
primeira escolha, uma vez que é o único
fármaco que num estudo mostrou melhorar a
sobrevida, em relação a placebo(62). Contudo,
o seu perfil de segurança não é o melhor e
existem contra-indicações para a sua utilização(63), pelo que o octreótido e a somatostatina
são alternativas igualmente válidas(59).
Não existe evidência directa de que a
somatostatina ou o octreótido, usados isoladamente, tenham benefício em relação ao placebo ou ausência de tratamento na hemorragia
aguda por varizes. Contudo, existem estudos
controlados, randomizados que apontam para
a equivalência destes fármacos em relação à
terlipressina e à escleroterapia no controlo da
hemorragia(64).
Tratamento da encefalopatia
Doentes que desenvolvem ou apresentam
encefalopatia devem ser tratados com
lactulose, lactitol ou outros fármacos.
Embora seja usual lactulose ou lactitol para
a prevenção da encefalopatia, não existem
estudos que comprovem a sua eficácia neste
âmbito(39).
b) Terapêutica Específica
Terapêutica Farmacológica
Os fármacos vasoactivos oferecem uma
oportunidade para manipular o desequilíbrio
entre a resistência vascular intra-hepática e
esplâncnica, que conduz e perpetua a
hipertensão portal. Os seus efeitos hemodinâmicos incluem a diminuição da pressão e
fluxo sanguíneo portal, fluxo sanguíneo
colateral e pressão varicosa, conduzindo à
hemostase, quando usados na hemorragia
activa por varizes esofágicas(60).
A terapêutica farmacológica vasoactiva
tem a vantagem de ser de uso fácil, dispensando equipamentos e pessoal especializado,
podendo ser administrada antes da endoscopia
diagnóstica e mesmo durante a transferência
do doente para um hospital, ou quando não
existe um endoscopista disponível 24 horas
por dia(61).
Na suspeita de hemorragia por varizes
esofágicas, a terapêutica farmacológica deve
ser instituída o mais cedo possível (antes da
endoscopia diagnóstica) e mantida por 2-5
dias(39).
O primeiro fármaco usado na prática clínica foi a vasopressina, entretanto abandonado,
c) Terapêutica Endoscópica
Esclerose de Varizes
A primeira descrição de injecção de esclerosante em varizes esofágicas para controlo de
hemorragia data de 1939(65).
Em 1979 foi publicado o primeiro ensaio
controlado, randomizado que demonstrou a
eficácia da escleroterapia no controlo da
hemorragia por varizes esofágicas(65). Outros
trabalhos, que se seguiram, comprovaram a
melhoria da sobrevida em doentes tratados
com esta técnica(66,67).
Existe grande variabilidade da técnica de
esclerose utilizada nos vários ensaios,
91
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
nomeadamente em relação ao agente esclerosante utilizado, volume injectado, número
de sessões, intervalo entre as sessões e local de
injecção.
A esclerose pode ser efectuada com
injecção do esclerosante directamente na
variz (intra-varicosa) para produzir trombose,
ou adjacente à variz (para-varicosa) de forma
a induzir fibrose submucosa e obliteração dos
vasos perfurantes mais profundos. Na prática,
as duas técnicas podem ser usadas em combinação (68). Aliás, foi demonstrado que
punções efectuadas com a intenção de serem
intra-varicosas são de facto para-varicosas
em cerca de 35-45% dos casos. Admite-se
que a injecção intra-varicosa é superior à
para-varicosa no controlo da hemorragia
activa e na obliteração total das varizes,
requerendo menos tempo e um menor
número de sessões para atingir o objectivo.
No entanto, a injecção para-varicosa poderá
associar-se a uma menor taxa de recorrência(69).
febre, derrame pleural, dor torácica e disfagia
aguda, são frequentes e geralmente auto-limitadas. Pode provocar igualmente úlceras
superficiais que se podem associar a hemorragia ou levar a estenoses, que surgem em até
40% dos doentes(73,74).
Esclerose vs Terapêutica Farmacológica
Vários ensaios compararam a esclerose
com a terapêutica farmacológica: um com a
vasopressina(75), outro com a terlipressina(76),
pelo menos cinco com octreótido(77,78, 79,80,81)
e quatro com a somatostatina (61,82,83,84).
A esclerose foi superior à vasopressina, associada à nitroglicerina, no controlo da hemorragia activa(75). Não se verificaram diferenças
estatisticamente significativas na falência do
controlo da hemorragia, recidiva e mortalidade em relação à terlipressina(76). A esclerose
foi equivalente ao octreótido e à somatostatina no controlo da hemorragia. Estes resultados foram confirmados em meta-análise(85,64).
No entanto, recentemente os resultados e a
metodologia desta meta-análise foram postos
em causa por outro autor, que chegou à
conclusão que a esclerose é superior à
terapêutica farmacológica(86,87), conclusão
que nos parece ser a mais sustentada.
Vários esclerosantes têm sido utilizados,
nomeadamente o polidocanol a 1%-3%, o
oleato de etanolamina a 5%, o morruato de
sódio a 5%, e o tetradecil sulfato de sódio a
1-3%. Todos os esclerosantes foram usados
com sucesso em ensaios controlados,
aleatórios, isoladamente ou associados(70,71).
Adicionalmente, dois tipos de colas ou
adesivos tecidulares, o histoacril e o bucrilato,
têm sido utilizados no tratamento da hemorragia por varizes(65).
A injecção de esclerosante é iniciada
durante a endoscopia diagnóstica, que deverá
ser o mais precocemente possível(67). Depois, é
geralmente repetida até à completa obliteração
das varizes, devendo as primeiras sessões ser
efectuadas a intervalos curtos, semanalmente(72), para impedir a recidiva hemorrágica
precoce.
Laqueação Elástica de Varizes Esofágicas
A laqueação elástica de varizes esofágicas,
como técnica terapêutica da hemorragia,
através do bloqueio mecânico do fluxo sanguíneo, foi introduzida por Stiegmann em
1986(88).
Na laqueação elástica, bandas elásticas são
usadas para estrangular a variz e o tecido
adjacente, após sucção da mesma para o interior de um dispositivo cilíndrico adaptado à
extremidade do endoscópio (fig. 3)(65). Três a
sete dias após a laqueação elástica, aproximadamente, a variz e a mucosa circundante
estrangulada necrosam e caem, deixando uma
úlcera superficial que cicatriza em 14 dias
(fig.4)(89).
Foram descritas várias complicações locais
e sistémicas associadas à injecção de
esclerosante. As complicações agudas como a
92
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
mento de elástico. Com o aperfeiçoamento da
técnica, foi criado um mecanismo que permite
aplicar vários elásticos com uma única introdução e a peça cilíndrica opaca foi substituída
por uma peça transparente. Esta simplificação
da técnica permite não só uma melhor
visualização, como reduz as potenciais complicações associadas ao carregamento dos elásticos e a múltiplas introduções do endoscópio
em cada sessão terapêutica(90).
A incidência global de complicações é
substancialmente menor do que as associadas
à esclerose de varizes(91,92,93,94,95,96,97), nomeadamente a incidência de úlceras e de estenoses
esofágicas(98).
Num estudo recente, o tratamento com
pantoprazole, 40mg por dia, após laqueação
elástica de varizes, conduziu a uma redução de
50% da dimensão das úlceras(99).
São necessários mais estudos para
averiguar se a adição destes fármacos diminui
os episódios de hemorragia e a morbilidade
associada à laqueação elástica.
FIGURA 3 - LAQUEAÇÃO ELÁSTICA DE VARIZ
ESOFÁGICA
Esclerose vs Laqueação Elástica
Os resultados de 7 ensaios prospectivos,
controlados, aleatórios, que compararam a
laqueação elástica com a esclerose de
varizes(91,92,93,94,95,96,97), demonstram que a
laqueação é tão eficaz como a esclerose no
controlo da hemorragia activa por varizes, mas
com menor taxa de complicações. A obliteração das varizes foi mais rápida(92,93,94,95,96,97),
com uma menor taxa de recidiva hemorrágica
(91,93,94,96,97) e com menos complicações
(92,93,94,95,96,97) no grupo da laqueação elástica.
Um dos estudos concluiu que a laqueação é
tão eficaz como a esclerose na hemostase de
varizes com hemorragia de baixo débito, em
babamento, mas mais eficaz do que a esclerose
na hemostase de varizes com hemorragia em
jacto.(100) Em dois ensaios, houve, inclusivamente, uma melhoria da sobrevida nos
doentes tratados com laqueação(94,97).
Numa meta-análise efectuada por Laine,
demonstra-se que a laqueação elástica é melhor
FIGURA 4 - ESCARA APÓS LAQUEAÇÃO ELÁSTICA
COM ÚLCERA SUPERFICIAL, À DIREITA. À
ESQUERDA, ANEL DE LIGADURA ELÁSTICA
AINDA “IN SITU”, APÓS NECROSE DE VARIZ
Recomenda-se que o procedimento se
inicie nas varizes mais distais, imediatamente
acima da junção gastro-esofágica, ou na variz
sangrante (distalmente ao ponto de rotura), se
existir. Deverá haver a preocupação de deixar
suficiente mucosa íntegra entre cada laqueação, pelo que as laqueações subsequentes
poderão ser aplicadas em espiral a níveis
progressivamente mais altos(66).
A técnica inicialmente descrita apresentava como principal limitação o facto de ser
necessário remover o endoscópio, após cada
laqueação, para efectuar um novo carrega93
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
que a esclerose, quer em termos de rapidez para
atingir a erradicação das varizes esofágicas, quer
em relação à taxa de recidiva, à incidência de
complicações e à mortalidade(98).
No entanto, comparativamente com a
esclerose, a recorrência de varizes após erradicação pode ocorrer mais frequentemente nos
doentes tratados com laqueação elástica(91,92),
pelo que é de extrema importância manter a
vigilância endoscópica regular nestes doentes.
Duas das principais desvantagens apontadas em relação à laqueação elástica de
varizes são a fraca visibilidade aquando da
hemorragia activa(101,53), problema minorado
com os cilindros transparentes e, sobretudo, o
facto de ser necessário retirar o endoscópio
para carregar o dispositivo de laqueação,
obrigando a uma segunda introdução, com o
consequente risco de vómito e de aspiração do
conteúdo gastro-esofágico(102).
período em que decorreu o estudo. No grupo
da esclerose, a taxa de recidiva hemorrágica
foi mais elevada do que no grupo da laqueação
elástica. O autores deduzem que nos doentes
com hemorragia por rotura de varizes se
justifica a administração precoce de fármacos
vasoactivos, que deverão ser mantidos pelo
menos durante 48 horas após laqueação elástica e 120 horas após esclerose(107).
Combinação de Laqueação Elástica e
Esclerose vs Laqueação elástica
A adição da esclerose à laqueação elástica
no tratamento das varizes esofágicas assenta
no conhecimento de que esta oblitera varizes
para-esofágicas profundas, que são colaterais
aos vasos da submucosa, enquanto que o efeito
da laqueação se localiza à submucosa(92).
Por outro lado, pequenas varizes previamente tratadas e localizadas numa secção de
mucosa fixada e de difícil aspiração são
preferencialmente tratadas com esclerose em
vez de laqueação elástica(108).
Terapêutica endoscópica combinada
com terapêutica farmacológica
O tratamento hemostático actualmente
recomendado para as varizes esofágicas
sangrantes é iniciar um fármaco vasoactivo,
(terlipressina, somatostatina, octreótido, ou
vapreótido) desde a admissão, e associar
terapêutica endoscópica na endoscopia
diagnóstica(39).
A evidência para a utilização da terapêutica combinada provém de uma série de
ensaios controlados, aleatórios e de uma metaanálise que demonstraram que a administração precoce de fármacos vasoactivos facilita
a endoscopia, melhora o controlo da hemorragia e a taxa de recidiva ao 5º dia(103,104,105,106).
Um trabalho de investigação recentemente publicado suporta as recomendações
actuais, confirmando que o GPVH médio
aumenta significativamente, em relação aos
valores prévios ao tratamento, após esclerose
ou laqueação elástica, das varizes esofágicas.
No grupo da laqueação elástica a elevação do
GPVH voltou aos valores pré-tratamento em
48 horas, enquanto que no grupo da esclerose
permaneceu elevado ao longo de 120 horas,
A terapêutica combinando laqueação
elástica e esclerose simultânea não apresentou
benefícios em relação à laqueação isolada no
tratamento da hemorragia por varizes no que
se refere a recidiva, complicações e taxa de
mortalidade, tendo mesmo requerido um
número de sessões significativamente maior
para atingir a erradicação de varizes(109). Estes
resultados foram confirmados em meta-análise(110), tendo os autores concluído que a
hemostase na hemorragia aguda por varizes
esofágicas foi semelhante na laqueação elástica
e na terapêutica combinada de laqueação e
esclerose, não podendo por isso ser recomendada no tratamento da hemorragia aguda.
d) Outros métodos endoscópicos
Endoloop vs Laqueação elástica
Naga et al(111) avaliaram a eficácia da
laqueação com “endoloop” comparativamente
com a laqueação elástica no controlo da
hemorragia aguda por varizes esofágicas. Não
94
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
houve diferenças significativas em relação à
hemostase primária, recidiva precoce e tardia,
e recorrência de varizes após obliteração
completa. Contudo, este estudo envolveu um
número reduzido de doentes e não foi
aleatório, sendo necessários mais estudos para
validar estes resultados. Shim CS et al apresentaram resultados concordantes(112).
hemodinâmica, requerendo transfusão de mais
de 2 unidades de eritrócitos. Se ocorrer dentro
das primeiras 6 semana após o evento inicial
representa uma recidiva precoce, enquanto
que um episódio hemorrágico que ocorra
depois deste período é definido como recidiva
tardia.
A maioria dos autores admite a falência
terapêutica quando não é possível controlar a
hemorragia após duas sessões de terapêutica
endoscópica de emergência.
O risco de falência de controlo de hemorragia é de aproximadamente 10-20%, com o
tratamento actual de primeira linha, sendo que
o risco é mais elevado nos primeiros dias após
admissão.(114) Estes doentes apresentam um
risco aumentado de complicações associadas a
hemorragia activa e morte, devendo ser identificados e estabilizados enquanto se implementa
uma terapêutica de salvamento(14).
Clips
Yol S et al comparou(113) a colocação de
clips por via endoscópica com a laqueação
elástica no tratamento da hemorragia por
varizes esofágicas. Concluíram que o uso de
clips é tão eficaz como a laqueação elástica na
hemostase primária. Entre as vantagens apontadas em relação à laqueação, os autores
apontam o melhor campo visual e a lesão local
mínima, comparada com a úlcera após
laqueação elástica.
7. Falência da terapêutica médica e
endoscópica de primeira linha
Os factores de risco para falência terapêutica estão enunciados na parte inicial deste
artigo, pelo que não serão aqui repetidos.
É importante definir quando o tratamento
médico ou endoscópico de primeira linha
falhou e avançar para terapêuticas de salvamento de segunda linha.
8. Tratamento de Salvamento
a) Transplantação hepática
Considera-se falência de controlo da
hemorragia: nas primeiras 6 horas, quando há
sinais de persistência de hemorragia associados a instabilidade hemodinâmica, ou necessidade de transfundir mais de 4 unidades de
eritrócitos. Depois das primeiras 6 horas,
quando ocorrem novas hematemes, ou surge
sangue vivo no aspirado gástrico; quando há
necessidade de transfundir 2 ou mais unidades
de eritrócitos para manter o hematócrito em
24% ou a hemoglobina em 8 g/dl, ou quando
após 24 horas persistem sinais de hemorragia.
A transplantação hepática é o único tratamento que corrige não só a hipertensão portal
mas também a insuficiência hepática. Oferece
tratamento a longo prazo para a prevenção da
recidiva hemorrágica, descompensação
hepática e morte. Apresenta uma sobrevida ao
primeiro ano de 80% a 90% e de 60% aos 5
anos, constituindo o melhor tratamento para
doentes com insuficiência hepática avançada.
Todos os doentes que sobrevivem a um episódio de hemorragia digestiva por rotura de
varizes esofágicas devem ser avaliados como
candidatos potenciais de transplantação
hepática(14,115).
Considera-se recidiva hemorrágica: qualquer sangramento, hematemeses ou melenas
recentes, que surjam após 24 horas de paragem da hemorragia. Considera-se que é uma
hemorragia significatica se tem repercussão
95
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
Três meta-análises(126,127,128) compararam
a eficácia da terapêutica endoscópica com o
TIPS na prevenção da recidiva hemorrágica.
Os resultados demonstraram que o TIPS é
mais eficaz na prevenção da recidiva do que a
terapêutica endoscópica, contudo associou-se
a uma maior taxa de encefalopatia e não
houve melhoria da mortalidade. Os autores
concluíram que o TIPS não pode ser recomendado como tratamento de rotina na
prevenção da recidiva, devendo ser reservado
para o grupo de doentes que continuam a
sangrar ou desenvolvem recidiva hemorrágica
após terapêutica endoscópica.
Por outro lado, a colocação do TIPS de
acordo com as indicações actuais, baseadas
apenas em critérios clínicos (ex.: falência da
hemostase após duas sessões de endoscopia
terapêutica), associa-se a uma elevada
mortalidade (30% a 40%) apesar do controlo da hemorragia, devido a complicações já
existentes antes da colocação do
TIPS(122,124,129). Factores associados a mau
prognóstico incluem encefalopatia prévia,
ascite, insuficiência renal, bilirrubina>
3mg/dL, ALT> 100 U/L e TIPS de emergência(130,131).
Um estudo recente(132) sugere que critérios
hemodinâmicos poderão identificar um grupo
de doentes que poderia beneficiar da colocação mais precoce do TIPS.
Em cerca de 3% a 10 % dos casos pode
ocorrer, nas primeiras semanas após colocação
do TIPS, trombose do stent com recorrência
da hipertensão portal e hemorragia(14).
Simultaneamente, a eficácia do TIPS a
longo prazo encontra-se comprometida pelo
desenvolvimento de hiperplasia pseudointimal, constituída por células endoteliais
sinusoidas hepáticas e células mesenquimatosas, suportadas por um estroma de tecido
conjuntivo, produzindo estenose do shunt e
hipertensão portal recorrente(133).
Aproximadamente 20% e 30% dos doentes
apresentam recidiva hemorrágica por varizes
esofágicas após 1 e 2 anos de seguimento,
respectivamente(14).
b) Tamponamento com Balão
O tamponamento com balão consegue
atingir a hemostase na maioria dos
doentes(116,117). Contudo, está frequentemente associado a compromisso da via aérea e
uma elevada incidência de recidiva quando o
balão é desinsuflado(118), além de que a insuflação prolongada (> 24 horas) pode causar
necrose de pressão da mucosa esofágica. Uma
das complicações mais graves é a migração do
balão gástrico para o esófago, podendo provocar
a rotura deste orgão, ou asfixia por obstrução
da via aérea.
Devido às suas potenciais complicações,
recomenda-se que o balão seja usado apenas
em doentes com hemorragia activa, como
medida temporária até que uma terapêutica
definitiva possa ser instituída, e por um período
máximo de 24 horas(119,36,39).
c) TIPS
O shunt transjugular porto-sistémico
intra-hepático é um procedimento que
envolve a descompressão da veia porta através
da criação de um canal de baixa resistência
entre as veias porta e hepática, que se mantém
patente pela colocação de um stent metálico
fenestrado. O TIPS é colocado por via transjugular através de métodos angiográficos,
evitando a laparotomia e a necessidade de
anestesia geral(14).
Pelo menos seis estudos não controlados
avaliaram especificamente o papel do TIPS no
tratamento da hemorragia por varizes esofágicas não controlada(120,121,122,123,124,125).
Mostraram que o TIPS pode ser efectuado
com sucesso nesta situação em mais de 90%
dos casos, estando associado a um rápido
controlo da hemorragia em 90% a 100% dos
casos. Estes dados constituem a base para a
utilização do TIPS como tratamento de salvamento em doentes que continuam a sangrar
ou que apresentam recidiva precoce após
tratamento médico e endoscópico de primeira
linha.
96
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Recentemente foram introduzidos stents
revestidos e os estudos indicam que a patência
dos shunts a longo prazo é substancialmente
superior à dos stents não revestidos(134).
Pelo menos três estudos compararam o
shunt espleno-renal distal com a esclerose de
varizes(137-139). A cirurgia associou-se a uma
taxa de recidiva significativamente menor. A
taxa de encefalopatia foi significativamente
superior em dois(138,139) e semelhante num dos
estudos(140). Não se verificaram diferenças em
relação à mortalidade.
d) Cirurgia
Inclui técnicas cirúrgicas descompressivas
(shunt cirúrgico), não descompressivas (sem
shunt) e a transplantação hepática.
Transsecção esofágica e desvascularização
da junção gastroesofágica
A transsecção esofágica é tão eficaz no controlo da hemorragia como a esclerose de
varizes esofágicas(140). No entanto como não
corrige a hipertensão portal, as varizes
recorrem com o tempo e a taxa de recidiva
hemorrágica pode atingir os 50% dos doentes.
A desvascularização consiste na transsecção
esofágica, esplenectomia, e laqueação das
varizes peri-gástricas e peri-esofágicas. Apesar
de ser eficaz no controlo da hemorragia, o seu
uso é limitado dada a elevada taxa de recidiva
Descompressão portal
O shunt cirúrgico classifica-se em: (1) não
selectivo total (ex.: shunt portocava), (2) não
selectivo parcial (ex.: enxerto H portocava), e
(3) selectivo (ex.: shunt espleno-renal distal).
Os shunts totais são eficientes na hemostase durante a hemorrgia activa e na
prevenção da recidiva(135). No entanto, o
shunt cirúrgico não melhorou a mortalidade
em comparação com a terapêutica endoscópica(136).
As recomendações de Baveno IV são: 39
1) A endoscopia deve ser efectuada o mais precocemente possível desde a admissão (dentro de 12 horas),
especialmente em doentes com hemorragia significativa ou com estigmas de doença hepática crónica.
2) O tamponamento com balão só deverá ser utilizado como “ponte” até que seja possível instituir tratamento
definitivo (no máximo durante 24 horas)
3) Na suspeição de hemorragia por rotura de varizes, um fármaco vasoactivo (terlipressina, somatostatina,
octreótido, vapreótido) deve ser iniciado o mais precocemente possível (antes da endoscopia diagnóstica) e
mantido durante 2 a 5 dias nos doentes em que se confirma a hemorragia por varizes.
4) A laqueação elástica é a terapêutica endoscópica recomendada, embora a esclerose possa ser usada no
episódio agudo se a laqueação for tecnicamente difícil.
5) A injecção de adesivos tecidulares (ex.: N-butil-cianoacrilato) é a terapêutica endoscópica recomendada na
hemorragia por rotura de varizes gástricas.
6) A melhor forma de manejar uma falência da terapêutica combinada (farmacológica e endoscópica) é
considerar uma segunda terapêutica endoscópica ou o TIPS.
97
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
hemorrágica em 30% a 40% dos casos.
Geralmente só é efectuada quando não é possível efectuar um shunt cirúrgico (ex.: trombose
extensa das veias porta e mesentérica)(15).
farmacológica, terapêutica endoscópica, TIPS,
cirurgia e transplantação hepática.
a) Terapêutica Farmacológica
Duas meta-análises concluíram que o tratamento com beta-bloqueantes não-selectivos
(propranolol,
nadolol)
reduz
significativamente o risco de recidiva hemorrágica e
a mortalidade em relação ao placebo. No
entanto o tratamento com propranolol associase ainda a taxas de recidiva de 50% e os efeitos
secundários surgem em 40% dos casos(114,142).
A eficácia dos beta-bloqueantes é semelhante
à esclerose de varizes na prevenção da recidiva
e na melhoria da sobrevida, apresentando
menos efeitos secundários(114).
A associação de beta-bloqueante e esclerose de varizes diminuiu a taxa de recidiva
hemorrágica em relação à esclerose isolada,
sem se registarem no entanto diferenças de
mortalidade(114).
Meta-análises verificaram de forma consistente um marcado benefício no tratamento
com beta-bloqueante não-selectivo, tanto em
termos de recidiva hemorrágica, como em
relação a mortalidade(143).
9. Conclusão
A administração de fármacos vasoactivos
em associação com a terapêutica endoscópica é
melhor do que a terapêutica endoscópica isolada, e deverá ser o tratamento padrão nos
doentes com hemorragia por varizes esofágicas.
Embora a esclerose e a laqueação elástica
sejam semelhantes em termos de eficácia no
controlo da hemorragia activa por varizes
esofágicas, a taxa de recidiva e a morbilidade
pós-tratamento são inferiores com a laqueação
elástica, pelo que esta é a técnica actualmente
recomendada. Contudo, em situações difíceis,
nomeadamente em presença de hemorragia de
alto débito, ou quando há um risco elevado de
aspiração de vómito, poderá ser preferível
avançar com a esclerose, posto que esta será
mais fácil de executar e dispensa uma segunda
intubação.
A terapêutica combinada simultânea,
laqueação elástica e esclerose, não apresenta
benefícios no contexto da hemorragia aguda.
As restantes modalidades terapêuticas
apenas deverão ser usadas em segunda linha,
como tratamento de salvamento na hemorragia não controlada.
Os nitratos não devem ser usados em
monoterapia e a sua administração em combinação com beta-bloqueantes é controversa.
Apesar de existir evidência do benefício
clínico da associação dos beta-bloqueantes e
nitratos na profilaxia primária da hemorragia
por varizes esofágicas cxliv, os resultados dos
ensaios clínicos que avaliam a sua eficácia na
profilaxia secundária são contraditórios(143,145).
Vários estudos demonstraram que quando
a terapêutica farmacológica reduz o GPVH
abaixo de 12 mmHg ou pelo menos 20% em
relação ao valor prévio ao tratamento(146,147,50),
risco de hemorragia é prevenido de forma
muito eficaz. De acordo com estes dados, a
conferência de Consensus de Reston
recomendou que se procedesse a avaliação da
resposta hemodinâmica à terapêutica médica
na hipertensão portal.(4)
10. Profilaxia secundária
Os doentes que sobrevivem a um primeiro
episódio de hemorragia por varizes esofágicas
apresentam um risco muito elevado de recidiva hemorrágica (70% ou mais ao primeiro
ano) e de morte (30-50%)(141).
Por esta razão, ficou decidido, em duas
reuniões de consenso, que todos os doentes
que sobrevivessem a um episódio de hemorragia por varizes esofágicas deveriam iniciar
tratamento para prevenção de recidiva(39,4).
As modalidades terapêuticas utilizadas na
prevenção da recidiva incluem terapêutica
98
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Apenas um terço dos doentes tratados com
beta-bloqueantes(50,148) e entre 45% a 60% dos
tratados com a associação de beta-bloqueante e
nitratos atingem os valores de GPVH
desejáveis(20,149,150). Os doentes que não
respondem poderão beneficiar de ajustes na
terapêutica farmacológica, nomeadamente
associação de nitrato ao propranol cli ou
terapêutica alternativa, como laqueação
elástica, ou TIPS, sendo no entanto necessários
mais estudos para esclarecer estas questões(152).
recidiva hemorrágica e a taxa de complicações
major foi menor(149). Lo GH et al verificaram
que a taxa de recidiva hemorrágica por varizes
esofágicas foi significativamente inferior com a
laqueação elástica, mas não houve diferenças
em relação à taxa de recidiva hemorrágica
global (incluindo outras lesões de hipertensão
portal), nem em relação à mortalidade(157)
b) Terapêutica Endoscópica
Apesar da esclerose reduzir significativamente a taxa de recidiva hemorrágica e de
mortalidade em relação ao placebo(36), a
laqueação elástica é actualmente considerada
como a terapêutica endoscópica de escolha,
uma vez que se mostrou superior à esclerose(93,95,96,97,100,157) face à sua menor taxa de
complicações, menor taxa de recidiva
hemorrágica e menor número de sessões para
se conseguir a obliteração das varizes.
Numa meta-análise que incluiu 7 ensaios
controlados, aleatórios, registou-se uma
melhoria da sobrevida a curto prazo (tempo de
seguimento médio 10-12 meses) a favor da
laqueação elástica(98).
Uma meta-análise dos quatro ensaios
disponíveis que compararam o método
terapêutico endoscópico de primeira linha
(laqueação elástica) com a associação farmacológica de beta-bloqueante e mononitrato de
isosorbido mostrou resultados semelhantes
entre as duas terapêuticas, existindo no entanto
uma significativa heterogeneidade no risco de
recidiva entre os estudos(158).
Lo GH et al(159) comparou a laqueação
elástica isolada com a tripla associação de
laqueação elástica, nadolol e sucralfate. A
terapêutica tripla foi superior à laqueção
isolada na prevenção de recidiva hemorrágica
gastrointestinal e por varizes esofágicas.
Paralelamente, verificou-se diminuição da
recorrência de varizes e gastropatia na
terapêutica combinada. Embora se tenha verificado uma tendência para a melhoria da
sobrevida no grupo da terapêutica tripla, esta
não apresentou significado estatístico.
Bureau C et al(151) concluíram que a
adição de MNI ao beta-bloqueante aumenta o
número de doentes que atinge os valores
desejados de GPVH (GPVH < 12 mmHg ou
descida de 20% do valor basal), o que se
associa a uma menor taxa de hemorragia (10%
de hemorragia nos que respoderam e 64% nos
que não atingiram os valores de GPVH alvo).
Estes autores sugerem que o MNI seja adicionado ao propranolol ou nadolol nos doentes
que não respondem à terapêutica isolada com
o beta-bloqueante, o que implicaria a monitorização da resposta hemodinâmica em cada
doente.
Contudo, outros autores recomendam a
associação do MNI a todos os doentes, dispensando a necessidade de avaliar a resposta do
GPVH(20,149,153).
No entanto, alguns autores questionam a
aplicabilidade e a validade clínica da monitorização do GPVH, considerando a actual
evidência insuficiente para sustentar a
recomendação de monitorização da redução
do GPVH na prática clínica(154).
A associação de beta-bloqueante e
mononitrato de isosorbido é superior à esclerose 21 e equivalente ou superior à laqueação
elástica(149,155,156).
Patch D et al(155) verificaram que a combinação terapêutica do beta-bloqueante e MNI
foi tão eficaz como a laqueação elástica na
prevenção da recidiva. No estudo de
Villanueva C, a terapêutica combinada
diminui significativamente a incidência de
99
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
Recentemente de la Pena et al(160) constataram que a associação de nadolol à laqueação
elástica diminuiu significativamente a taxa de
recidiva hemorrágica comparativamente com
a laqueação isoladamente, embora não se
tenha verificado diferença em relação à
mortalidade.
Possivelmente a associação entre laqueação elástica e beta-bloqueante constitui a
melhor opção no contexto da prevenção
secundária, mas são necessários mais estudos.
A laqueação elástica deverá ser usado
isoladamente quando existem contra-indicações ou intolerância aos beta-bloqueantes.
Deverá ser associado aos beta-bloqueantes em
doentes que sangram, apesar de já fazerem
profilaxia com beta-bloqueante(39).
sobrevida(161), no entanto a esclerose efectuada em varizes pequenas residuais após
obliteração por laqueação elástica demonstrou superioridade na recorrência de varizes a
longo prazo(162).
c) TIPS
O TIPS é mais eficaz do que a terapêutica
endoscópica na prevenção da recidiva(163-165)
e do que a terapêutica farmacológica com propranolol e mononitrato de isosorbido(154).
Contudo, associa-se a uma elevada taxa de
encefalopatia, a elevadas taxas de disfunção
do shunt, não melhorando a sobrevida(128).
Não pode ser considerado como medida
terapêutica de primeira linha na profilaxia
secundária de hemorragia por varizes esofágicas, sendo usado apenas como terapêutica
de salvamento(14,128) em doentes com episódios recorrentes de recidiva hemorrágica
A associação de laqueação elástica e esclerose de varizes não oferece vantagem quer na
prevenção de recidiva quer na melhoria de
As recomendações de Baveno IV são: 39
1) A profilaxia secundária deve ser iniciada o mais precocemente possível, a partir do 6º dia após hemorragia.
2) Um beta-bloqueante não-selectivo deve ser iniciado em doentes não tratados previamente. Aqueles que
apresentam contra-indicações ou que não toleram a medicação devem ser tratados com laqueção elástica.
3) Possivelmente a associação de beta-bloqueante e laqueação é o melhor tratamento, mas são necessários mais
estudos.
4) Sempre que possível, o efeito hemodinâmico do beta-bloqueante deve ser monitorizado, e alguns autores
sugerem que sempre que não são atingidos os valores alvo do GPVH deve ser associado um nitrato.
5) Doentes previamente medicados com beta-bloqueante e que sangram, deve ser adicionada laqueação
elástica.
6) Doentes que recidivam apesar de terapêutica farmacológica associada a terapêutica endoscópica devem ser
tratados com TIPS ou shunt cirúrgico.
7) O transplante hepático deve ser considerado em doentes Child B/C, oferecendo bom prognóstico.
8) O TIPS pode ser usado como ponte para o transplante hepático.
100
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
significativa sob terapêutica com beta-bloqueante associado ou não a mononitrato de
isosorbido ou laqueação elástica. Deve ser
considerado particularmente nos doentes
cirróticos Child B ou C candidatos a transplantação hepática. A redução da disfunção do
shunt pode ser conseguida com o uso de stents
revestidos com politetrafluoroetileno(134) e a
taxa de encefalopatia diminuída com a associação de TIPS a laqueação elástica(166). Outra
estratégia possível poderá ser a associação de
beta-bloqueante ao TIPS, pois esta diminui o
gradiente de pressão portal em doentes com
disfunção do shunt(167).
ragia por varizes gástricas é menor do que por
varizes esofágicas, mas a primeira tende a ser
mais severa, sobretudo nas varizes fúndicas,
requerendo mais transfusões sanguíneas e
apresentam uma taxa de mortalidade mais
elevada.(169)
d) Cirurgia
A cirurgia associa-se a uma menor taxa de
recidiva hemorrágica a longo prazo em comparação com a terapêutica endoscópica, mas não
apresenta impacto na sobrevida(136,168). De
acordo com a evidência clínica, o papel da
cirurgia é limitado, estando reservado para
doentes com hemorragia recorrente refractária
à terapêutica endoscópica e farmacológica,
como medida de salvamento(138).
FIGURA 5 - VARIZ DO FUNDO GRÁSTRICO
Após o primeiro episódio de hemorragia de
varizes gástricas, a recidiva é comum, estando
descritas taxas entre 27% a 89% dos doentes,
com as maiores percentagens descritas em
doentes com varizes do fundo. A mortalidade
associada a hemorragia varia entre 8% a 12%,
nas varizes do cárdia, e 31% a 55%, nas varizes
fúndicas(170,171).
III. VARIZES GÁSTRICAS
As varizes gástricas constituem colaterais
portosistémicos dilatados, localizados a nível
gástrico, que se desenvolvem como consequência de hipertensão portal generalizada ou
segmentar (fig. 5). Podem ocorrer isoladamente, ou mais frequentemente em associação
com varizes esofágicas. As varizes gástricas
isoladas são relativamente raras, com uma
prevalência entre 5% a 12%. Contudo, na
presença de varizes esofágicas, as varizes
gástricas coexistem entre 10% a mais de 50%.
Globalmente as varizes gástricas ocorrem em
aproximadamente 20% dos doentes com
hipertensão portal(169).
Constituem a origem em 5% a 10 % de
todos os episódios de hemorragia digestiva
alta em doentes cirróticos. O risco de hemor-
1. Classificação
A classificação mais utilizada de varizes
gástricas é a classificação de Sarin et al(172), e
foi recomendado o seu uso no consenso de
Baveno III(3). Esta classificação baseia-se na
classificação anatómica; associação a varizes
esofágicas; primárias (diagnosticadas na observação inicial) ou secundárias (observadas após
obliteração da varizes esofágicas). A classificação de Sarin divide as varizes gástricas em
dois tipos: varizes gastroesofágicas (GOV) ou
varizes gástricas isoladas (IGV). As varizes
gastroesofágicas são varizes gástricas que se
associam a varizes esofágicas estendendo-se
para além da junção gastro-esofágica. Estas
101
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
podem ser tipo 1 ou tipo 2 dependendo da sua
extensão para a pequena curvatura gástrica ou
fundo, respectivamente. As varizes gástricas
que ocorrem na ausência de varizes esofágicas
são designadas por varizes gástricas isoladas.
Estas subdividem-se de acordo com a sua
localização em IGV 1 e IGV 2. As do tipo 1
localizam-se no fundo gástrico e as do tipo 2
podem estar presentes em qualquer localização desde o antro, piloro, ou corpo gástricos.
Existem vários estudos não controlados,
mostrando uma elevada eficácia de adesivos
tecidulares (N-butil-2-cianoacrilato- Histoacryl)
na hemostase em doentes com hemorragia por
varizes gástricas, com taxas superiores a
90%(176-178,190,191). Contrariamente à injecção
de esclerosante, as taxas de recidiva hemorrágica com o cianoacrilato são entre 0% e
28%.(176-178,191,192).
Recentemente dois ensaios controlados,
aleatórios, confirmaram a superioridade do
cianoacrilato na hemostase de varizes gástricas
em relação à laqueção elástica(175) e à injecção
com álcool(174).
A trombina e cola de fibrina também têm
sido utilizadas no controlo da hemorragia por
varizes gástricas com uma taxa de sucesso
superior a 75% e uma taxa de recidiva de 0%
a 30%(179,180,181). No entanto, as séries são
pequenas e não existem estudos controlados e
aleatórios.
Os efeitos secundários são semelhantes aos
da esclerose e incluem pirexia e desconforto
abdominal, que são geralmente ligeiros e transitórios(174). Outros efeitos secundários mais
raros associados ao uso de acrilatos incluem
embolia da veia porta, embolia cerebral,
pulmonar, abcesso retroperitoneal, enfarte
esplénico, trombose da veia esplénica e da veia
porta(192).
Dada a elevada taxa de hemostase
primária e taxa de recidiva inferior comparada
com a esclerose, a injecção de acrilatos é
actualmente considerada como o tratamento
de primeira linha da hemorragia de varizes do
fundo gástrico, bem como na erradicação
profiláctica secundária de varizes gástricas(39).
2. Tratamento
O tratamento óptimo das varizes gástricas
não está ainda bem estabelecido.
O tratamento inicial da hemorragia activa
é semelhante ao das varizes esofágicas,
incluindo a administração de fármacos vasoactivos (terlipressina, somatostatina, ou análogo
da somatostatina), estabilização hemodinâmica, prevenção de complicações (antibioterapia, prevenção de encefalopatia).
As terapêuticas actuais incluem injecção
de esclerosantes convencionais(173), injecção
de cianoacrilato(174,175,176,177,178) cola de fibrina(179,180) trombina(181), laqueação(182,183),
obliteração transvenosa retrógrada com balão
encravado (balloon-occluded retrograde
transvenous obliteration)(184,185), tamponamento com balão(186), TIPS(124,187,188) e cirurgia.(189)
3. Injecção de esclerosantes e colas
A injecção de esclerosantes tradicionais no
tratamento das varizes gástricas tem apresentado uma eficácia inferior em relação às varizes
esofágicas(170, 173). Este facto deve-se provavelmente ao maior fluxo sanguíneo nas varizes
gástricas comparativamente com as esofágicas,
resultando numa rápida diluição e extravasão
do esclerosante na corrente sanguínea.
A injecção de esclerosante controla a
hemorragia activa de varizes gástricas em 40%
a 100% dos casos(170,173), mas associa-se a uma
elevada taxa de recidiva.
4. TIPS
O TIPS controla a hemorragia aguda
refractária de varizes gástricas em mais de 90%
dos casos. A recidiva ocorre em 10% a 30 %
dos doentes ao fim de 1 ano e a encefalopatia
de novo ocorre em 3% a 16%(124,187,188).
Recentemente, um estudo comparou
restrospectivamente a relação custo benefício
102
Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
entre a injecção de cianoacrilato e colocação
de TIPS no tratamento da hemorragia por
varizes gástricas(193). A taxa de recidiva inicial
(até aos 30 dias) foi significativamente inferior
no grupo de doentes tratados com TIPS, mas
não houve diferenças em relação à mortalidade global. Os autores concluíram que o
cianoacrilato constitui um tratamento seguro
e eficaz para a hemorragia de varizes gástricas
e envolvendo menos custos do que o TIPS.
São necessários, contudo, estudos prospectivos, controlados, aleatórios, para esclarecer
qual a melhor abordagem terapêutica nestes
doentes. De acordo com as recomendações
actuais(39), os autores concluíram igualmente
que o cianoacrilato deve ser usado como
terapêutica de primeira linha no tratamento da
hemorragia aguda por varizes gástricas,
estando o TIPS reservado para a falência desta
terapêutica(193).
erradicação de varizes gástricas, apresentando
uma baixa taxa de recidiva hemorrágica.
Matsumoto A et al(194) desenvolveram a
esclerose endoscópica com balão encravado
(ballon-occluded endoscopic injection
sclerotherapy) que pode ser utilizado em
doentes com ou sem shunt gastro-renal.
6. Tamponamento com balão
O balão de Sengstaken-Blakemore ou de
Minnesota geralmente não são eficazes no
controlo da hemorragia de varizes fúndicas,
dado o reduzido volume do balão gástrico (200
mL). O balão de Linton-Nachlas tem um
único balão gástrico com um volume de 600
mL e parece ser mais eficaz no controlo da
hemorragia de varizes do fundo gástrico em
mais de 50% dos doentes, embora 20%
apresentem recidiva hemorrágica(192).
O balão deverá ser utilizado apenas
como medida temporária até ser efectuado
tratamento definitivo.
5. Técnicas Radiológicas de Intervenção
A obliteração transvenosa retrógrada com
balão encravado (OTR-B) constitui uma
técnica radiológica de intervenção desenvolvida no Japão, para tratar varizes do fundo
associadas a shunt gastro-renal, o que corresponde a cerca de 85% a 90% dos doentes com
varizes gástricas(192). Este procedimento
envolve a obliteração das varizes do fundo, das
veias tributárias, e do shunt gastro-renal
associado(184). A OTR-B é muito eficaz na
Um estudo prospectivo, aleatório, que
comparou a eficácia do Histoacril com os beta-bloqueantes na prevenção secundária de
varizes esofagogástricas, após hemostase
primária com injecção de cola, sugere que a
taxa de recidiva precoce e tardia e a mortalidade não são significativamente diferentes
nas duas modalidades terapêuticas(195).
Embora não houvesse diferenças significativas
As recomendações de Baveno IV são: 39
1) O tratamento endoscópico da hemorragia aguda de varizes gástricas deve ser efectuado com colas/ adesivos
tecidulares (ex.: N-butil-cianoacrilato).
2) No que se refere à prevenção secundária, em doentes que tenham sangrado de varizes gástricas isoladas tipo
1 ou varizes gastroeosfágicas do tipo 2, esta poderá ser feita com N-butil-cianoacrilato, TIPS ou
B-bloqueantes.
3) Doentes que tenham sangrado de varizes gastroesofágicas tipo 1 poderão ser tratados com N-butil-cianoacrilato, laqueação das varizes esofágicas ou B-bloqueantes.
103
HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
entre as duas modalidades terapêuticas, todos
os episódios de recidiva hemorrágica de varizes
gástricas ocorreram no grupo tratado com
Histoacril e as complicações foram mais
frequentes neste grupo. Estas observações
levantam a questão da utilidade dos beta-bloqueantes na prevenção da recidiva hemorrágica de varizes gástricas, pelo que se aguardam
mais estudos neste campo.
2. Tratamento
A GHP é frequentemente assintomática,
sendo a incidência de hemorragia aguda baixa
(menos de 3% aos 3 anos)(199).
A hemorragia é geralmente crónica e
insidiosa, com uma incidência de 11% a 22%
dos casos, manifestando-se como anemia
crónica(196).
O suplemento com ferro pode ser o
suficiente para manter a hemoglobina dentro
de valores normais. Caso contrário, os beta-bloqueantes são a única forma eficaz de
tratamento provada nestes doentes(200) e
devem ser usados na prevenção secundária(39).
Na hemorragia aguda de GHP, os beta-bloqueantes, a somatostatina, o octreótido, a
terlipressina, foram propostos dada a sua capacidade de diminuir a perfusão gástrica(200-202).
O propranolol controla a hemorragia da gastropatia hipertensiva portal e a hemorragia
recorrente na GHP severa(199). Mais recentemente, outro estudo demonstrou que o propranolol pode ser utilizado na prevenção da
gastropatia hipertensiva portal em doentes
com predisposição para o seu desenvolvimento.
De facto, o propranolol reduziu significativamente a frequência de gastropatia hipertensiva
portal, após laqueação elástica e obliteração de
varizes esofágicas(102).
IV. GASTROPATIA HIPERTENSIVA
PORTAL
1. Definição
A gastropatia hipertensiva portal (GHP) é
uma condição frequentemente diagnosticada
em doentes com hipertensão portal e caracteriza-se pela presença de um reticulado da
mucosa ou padrão em mosaico (GHP ligeira).
A GHP grave define-se pela presença de
hemorragia da submucosa (ponteado vermelho, manchas vermelho cereja, ou manchas
castanhas) associada ao padrão em
mosaico(196). A GHP observa-se tipicamente
no fundo e corpo gástricos e a sua prevalência
varia grandemente, havendo registos de
frequências desde 4% a 98% em estudos de
doentes com hipertensão portal(197,198), sendo
a prevalência global em doentes cirróticos de
80% (fig. 6)(196).
O TIPS e os Shunts cirúrgicos devem ser
considerados apenas como terapêutica de
salvamento, naqueles doentes que apresentam
hemorragia recorrente de GHP, apesar do
tratamento com propranolol, ou na presença
de contra-indicações à sua utilização(39).
V. CONCLUSÃO
A hemorragia por rotura de varizes é a
complicação mais temível da hipertensão
portal, sendo que as varizes são altamente
prevalentes nos doentes cirróticos.
Sempre que exista suspeita clínica de
cirrose hepática, ou sempre que seja diagnos-
FIGURA 6 - GASTROPATIA HIPERTENSIVA PORTAL
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Rita Ornelas e Horácio Guerreiro
Suspeita de rotura de varizes
Terapêutica farmacológica vasoactiva
Estabilização hemodinâmica, antibiótico, prevenção de encefalopatia e aspiração
Endoscopia
Rotura de Varizes Esofágicas/ Gástricas
Terapêutica Endoscópica
Controlo da hemorragia
Falência/ Recidiva Hemorrágica
Ligeira
Repetir Terapêutica endoscópica
Controlo da hemorragia
Manter terapêutica farmacológica durante 2 a 5 dias
Severa
Tamponamento com balão
transitóriose necessário
Falência Terapêutica
TIPS/ Cirurgia
FIGURA 7.(158) TRATAMENTO DA HEMORRAGIA POR ROTURA DE VARIZES. (ADAPTADO DE ABRALDES JG, ANGERMAYR B,
BOSCH J. THE MANAGEMENT OF PORTAL HYPERTENSION. CLIN LIVER DIS. 2005 NOV;9(4):685-713)
colocados dois acessos venosos de bom calibre
e fazer a infusão de fluidos, cristalóides ou
colóides, de forma a manter a TA sistólica
acima de 100 mmHg e o pulso abaixo de 100
ppm. A expansão exagerada da volémia deve
ser evitada e as transfusões devem ser parcimoniosas, procurando manter a Hb em 8 g/dl
e o hematócrito entre 24% e 29%.
A endoscopia alta deve ser tão precoce
quanto possível e adicionada da terapêutica
endoscópica, de preferência a laqueação elástica no caso das varizes do esófago. As varizes
ticada cirrose hepática, dever-se-á proceder a
endoscopia alta para exclusão de varizes.
A vigilância endoscópica posterior das varizes
deverá ser feita periodicamente de acordo com
os achados iniciais.
Perante uma hemorragia activa em doente
com cirrose hepática, ou suspeita de cirrose,
dever-se-á iniciar de imediato e sempre que
possível, a perfusão de um fármaco vasoactivo.
Nesta fase inicial, é de suma importância
prevenir a aspiração do vómito e combater a
instabilidade hemodinâmica. Deverão ser
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HEMORRAGIA DIGESTIVA ASSOCIADA À HIPERTENSÃO PORTAL
gástricas sangrantes são melhor controladas
com injecção de colas.
A profilaxia antibiótica, com uma
quinolona (oral ou endovenosa), ou com uma
cefalosporina de terceira geração endovenosa,
deve ser instituída logo que se estabeleça o
diagnóstico.
Os fármacos vaso-activos devem ser
mantidos pelo período mínimo de 48 horas e
até às 120 horas.
No caso de falência de controlo da hemorragia, deve-se equacionar um dos métodos de
salvamento, inclusivamente a transplantação
hepática.
Sempre que se consiga o controlo da
hemorragia e a partir do 6º dia, todos os
doentes deverão ser submetidos a tratamento
profilático secundário, com B-bloqueantes
não selectivos, isoladamente ou associados a
nitratos, ou prosseguir com laqueação elástica
até à erradicação das varizes, complementada
ou não com esclerose sequencial, ou mesmo
associando laqueação elástica e terapêutica
farmacológica.
Embora existam ainda alguns casos de
hemorragias absolutamente incontroláveis, os
novos recursos técnicos e o melhor conhecimento etiopatogénico trouxeram-nos grandes
avanços no manejo de uma situação grave e
permitiram melhorar o prognóstico dos
doentes cirróticos.
Persistem, no entanto, áreas de controvérsia para o esclarecimento das quais serão
necessários mais estudos. Em relação ao episódio agudo é necessário esclerecer qual a
duração ideal da terapêutica farmacológica, o
potencial do rFVIIa e avaliar a eficácia da colocação precoce do TIPS e de stents revestidos.
A combinação de beta-bloqueantes com
nitratos e a monitorização do GPVH
constituem entre outras, áreas por esclarecer
no âmbito da profilaxia secundária da hemorragia por hipertensão portal.
Seguramente que os próximos anos proporcionarão novos conhecimentos nos fenómenos
hemodinâmicos, na fibrogénese hépatica e na
farmacologia que permitirão aperfeicoar o
controlo de uma entidade com potencial letal
ainda muito reservado.
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118
HEMORRAGIA DIGESTIVA
BAIXA
LUÍS LOPES
JOSÉ RAMADA
Apresentação clínica
Tradicionalmente define-se hemorragia
digestiva baixa como a hemorragia que se origina abaixo do ligamento de Treitz.
No entanto, o conceito de hemorragia
digestiva baixa é algo problemático, pois a
saída de sangue pelo recto pode ter ponto de
partida em qualquer ponto do tracto gastrointestinal.
A experiência clínica mostra que em cerca
de 80% dos pacientes com hemorragia digestiva há passagem de sangue pelo recto, e um
estudo clínico mostrou que 11% dos doentes
com hematoquésia tinham a causa de hemorragia digestiva no tracto digestivo alto, isto é,
até ao ligamento de Treitz (conceito clássico).
A gravidade da apresentação clínica da
hemorragia digestiva baixa aguda cobre um
espectro vasto que vai desde a rectorragia
ligeira sem compromisso hemodinâmico até à
hemorragia maciça com necessidade de cirurgia emergente e outras medidas “life-saving”.
Infelizmente, os termos e definições usados
para descrever estas situações variam amplamente entre os vários investigadores.
Cerca de 50% dos doentes apresenta-se com
anemia e distúrbio hemodinâmico ligeiro a
moderado. No entanto, 9% dos doentes apresentam-se com colapso cardiovascular, 10%
com síncope e 30% com alterações ortostáticas.
Parecem existir algumas diferenças na
gravidade de apresentação da hemorragia
digestiva baixa em relação à hemorragia digestiva alta. Uma revisão recente do American
College of Gastroenterology mostrou que os
doentes com hemorragia digestiva baixa
apresentam-se menos frequentemente em
choque ou ortostase do que os doentes com
hemorragia digestiva alta (19% versus 35%) e
necessitam menos frequentemente de transfusões (36% versus 64%; p < 0,00001).
Tal como na hemorragia digestiva alta, a
maioria dos doentes com hemorragia digestiva
baixa pára de sangrar espontâneamente sem
qualquer tipo de intervenção (80-85% dos
casos). No entanto, a mortalidade varia entre
0 e 25%.
Vários estudos têm tentado validar
critérios de mau prognóstico na hemorragia
Incidência
A hemorragia digestiva baixa é uma das
causas mais frequentes de admissão no serviço
de urgência.
Estima-se que a incidência anual de
hemorragia digestiva baixa é de 20-27 casos
por 100.000 adultos, sendo o cólon o ponto de
partida na maioria dos casos.
Verifica-se ser mais frequente no sexo
masculino e a incidência aumenta com a
idade, sobretudo após os 65 anos de idade.
Com efeito, verifica-se um aumento de cerca
de 200 vezes na incidência entre a 6ª e a 9ª
décadas de vida, provávelmente em relação
com a ocorrência mais frequente de diverticulose cólica e de angiodisplasia no doente idoso.
119
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
digestiva baixa aguda. Actualmente os mais
usados são os critérios do sistema de classificação BLEED (hemorragia activa, pressão
arterial sistólica inferior a 100mm Hg, tempo
de protrombina >1,2 vezes o controle, estado
mental alterado, comorbilidade associada), e
os critérios de Strate (hipotensão, taquicardia,
síncope, abdomen indolor à palpação, uso de
aspirina, hemorragia nas primeiras 4horas após
o 1º episódio, 2 ou mais comorbilidades associadas). A presença de 3 ou mais factores de
risco indicia um risco de mortalidade elevado
(84%). Com 1 ou 2 factores de risco a mortalidade desce para 43% e a ausência de factores
de risco corresponde a um risco de 9%
Por tais motivos, hoje em dia muitos hospitais usam um cartão de cores para definir
objectivamente a cor do sangue e, com isso,
suspeitar do tipo de hemorragia (alta ou
baixa).
O toque rectal cuidadoso pode evidenciar
patologia anorectal não clinicamente
aparente. Um estudo permitiu concluir que
40% dos carcinomas rectais diagnosticados
por rectoscopia são palpáveis.
A aspiração nasogástrica num doente com
apresentação clínica típica de hemorragia
digestiva baixa não está indicada por rotina.
Alguns estudos clínicos efectuados permitiram
concluir que em 93% dos doentes com aspirado nasogástrico hemático, o ponto de partida
da hemorragia era no tracto digestivo alto. Em
nehum dos casos havia ponto de partida no
tracto digestivo baixo (p < 0,00001).
DIAGNÓSTICO CLÍNICO
A história clínica e o exame físico inicial do
doente com hemorragia pelo recto pode fornecer
informação importante quanto ao ponto de
origem e quanto à etiologia (ingestão de AINEs,
rádioterapia prévia, cirurgia vascular prévia,
obstipação crónica, polipectomia recente).
Será oportuno lembrar que nos casos de
colite/proctite rádica, a hemorragia pode ocorrer ao fim de meses ou anos. O mesmo se pode
passar com os doentes com prótese aórtica, em
que o estabelecimento de uma fístula aortocólica pode ocorrer tardiamente (cerca de 14
anos após a cirurgia).
A abordagem inicial para o diagnóstico de
hemorragia digestiva baixa consiste no registo
da descrição da hemorragia notada pelo doente
ou pela observação directa das fezes. Apesar
disso, nem sempre é fácil afirmar com rigor a
origem da hemorragia, e existem discrepâncias
entre doentes e médicos quanto à definição da
cor das fezes. Num estudo, 120 doentes deram
23 descrições diferentes da côr do sangue saído
pelo recto, e em 22% notou-se discrepância
entre a descrição verbal da cor e a cor para que
apontaram num cartão teste. Quanto aos médicos, verificou-se também que 33% ao examinarem o mesmo paciente deram 2 ou mais
descrições diferentes quanto à cor do sangue.
PROCEDIMENTOS DIAGNÓSTICOS
Sigmoidoscopia
Hoje em dia é um procedimento já não
muito usado no doente com hemorragia digestiva baixa. Além da possibilidade de diagnosticar uma lesão sangrante, pode também
encontrar estigmas de sangramento recente e
respectiva extensão, podendo com isso levantar suspeita de sangramento num local mais
proximal do tracto digestivo baixo.
Colonoscopia
Inicialmente foi considerada como não
tendo valor no doente com hemorragia digestiva baixa activa, pois não se acreditava na sua
capacidade diagnóstica dadas as potenciais
dificuldades de visualização impostas pelo
sangue e fezes e pelas potenciais complicações
na sua execução (perfuração, agravamento da
hemorragia).
A primeira colonoscopia de emergência no
contexto de hemorragia digestiva baixa foi
descrita em 1970 e não foi recomendada como
investigação viável no doente com este tipo de
hemorragia. Nos anos que se seguiram, a
120
Luís Lopes e José Ramada
colonoscopia apenas era realizada nos doentes
em que a hemorragia tinha parado e o clister
opaco e/ou a angiografia eram negativos.
A partir dos anos 80, a colonoscopia começou
a ser realizada mais precocemente após se ter
verificado que a preparação cólica por via oral
era segura nestes doentes. A partir daí 13
protocolos usaram a colonoscopia como
modalidade diagnóstica primária; 68% dos
exames documentaram a causa da hemorragia.
O “timing” da realização da colonoscopia
tem variado de protocolo para protocolo, mas
o consenso geral é de que a mesma seja realizada nas primeiras 12-24 horas por forma a
permitir a estabilização hemodinâmica do
doente e a conveniente preparação cólica.
Mesmo nos casos mais urgentes, a ressuscitação do doente deve sempre preceder a
realização da colonoscopia.
O diagnóstico de hemorragia digestiva
baixa com ponto de partida no intestino delgado pode ser presumido quando se encontra
sangue fresco no íleon ou a sair pela válvula
ìleocecal e a endsocopia digestiva alta é negativa. A presença de sangue fresco no cólon e a
sua ausência no íleon sugere o cólon como o
local da hemorragia. Embora estes cenários só
reflictam evidência circunstancial, parecem
constituir protocolos válidos para determinação do local de sangramento.
A taxa de complicações da colonoscopia na
hemorragia digestiva baixa aguda é extremamente baixa (1,3%), sendo que as mais frequentemente observadas são, por ordem
decrescente: insuficiência cardíaca, perfuração
do cólon, agravamento da hemorragia e sépsis.
À luz dos conceitos actuais, a colonoscopia
tem um papel primordial na maioria dos
doentes com hemorragia digestiva baixa pois
oferece um elevado potencial diagnóstico,
terapêutico e prognóstico.
necem na circulação sanguínea durante
48horas e não são captados pelo fígado nem
pelo baço. Consegue teoricamente detectar
débitos sanguíneos extremamente baixos
(0,1ml/min). Na prática o que se tem verificado dos vários estudos de medicina nuclear, é
que apenas 45% dos cintilogramas são positivos. Por tal motivo têm sido feitas tentativas
para seleccionar grupos de doentes com maior
probabilidade de terem cintilogramas positivos,
e, de facto, parece haver alguma evidência de
que os doentes que sangram activamente, têm
maior probabilidade de terem cintilogramas
positivos.
O “timing” da positividade do cintilograma
pode predizer a acuidade do local de sangramento. Com efeito, verifica-se que nos
doentes em que o cintilograma é positivo nas
primeiras 2 horas, o mesmo determina com
uma acuidade de 78% o local de sangramento,
ao passo que se essa positividade surge depois
das 2 horas, a acuidade quanto ao local de
sangramento desce para 57%, pois pode
apenas representar sangue que se moveu
distalmente no tracto digestivo. Por tal motivo,
a decisão de intervir cirurgicamente num
doente com hemorragia digestiva baixa aguda
com base apenas na positividade do cintilograma não está recomendada.
Angiografia
A angiografia é uma técnica radiológica
que tem sido usada com sucesso no diagnóstico e tratamento da hemorragia digestiva
baixa aguda.
Para ser positiva é necessária uma hemorragia arterial com débito igual ou superior a
0,5ml/minuto. É por este motivo que muitos
centros advogam o uso do cintilograma como
teste antes da angiografia, pois os doentes com
cintilogramas negativos têm muito poucas
probabilidades de terem uma angiografia positiva.
A sensibilidade e especificidade da arteriografia mesentérica varia entre 47 e 100%
consoante as séries. A positividade da
angiografia nem sempre indicia o local de
sangramento. Num dos melhores estudos efec-
Cintilograma com Tc99
A cintilografia com eritrócitos marcados
com Tc99 é outro método usado na investigação da hemorragia digestiva baixa aguda.
Os eritrócitos marcados com tecnécio perma121
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
ETIOLOGIA E TERAPÊUTICA
tuados até ao momento, 78% das angiografias
foram positivas, e nessas, 32% concluiram pelo
local provável de sangramento. Só 46%
concluiram pelo local exacto de sangramento.
Um dado importante a reter é que a angiografia raramente detecta sangramento venoso.
A infusão de vasodilatadores, anticoagulantes e trombolíticos pode ser usada para
provocar hemorragia antes da angiografia nos
doentes com hemorragia de causa desconhecida. Quando se usam estas técnicas, consegue-se detectar a hemorragia em 20-80%
dos doentes.
A angiografia é uma técnica muito dependente do executante, pelo que é necessário um
radiologista experiente bem como doentes
bem selecionados para se obterem bons resultados e poucas complicações, algumas das
quais potencialmente graves.
A taxa global de complicações nas maiores
séries é de cerca de 9,3%. As principais
ocorrências são: hematoma no local da
punção, trombose da artéria femural, reacções
ao contraste injectado, insuficiência renal e
acidente vascular cerebral isquémico.
As 2 principais causas de hemorragia
digestiva baixa aguda significativa são a
doença diverticular do cólon e as angiodisplasias do cólon. As 2 principais causas de
hemorragia digestiva baixa sem instabilidade
hemodinâmica são a doença hemorroidária e
as neoplasias.
A classificação das causas em termos de
frequência é realizada em função da hemorragia digestiva baixa aguda significativa.
Causas mais frequentes de hemorragia
digestiva baixa aguda significativa
1- Doença diverticular do cólon
(mais frequentes)
2- Angiodisplasias (mais frequentes)
3- Doença hemorroidária
4- Lesões por anti-inflamatórios (AINE)
5- Colite isquémica
6- Doença inflamatória intestinal
7- Hemorragia pós-polipectomia
1- Doença diverticular do cólon
Enteroscopia por cápsula
Apesar de ser um teste diagnóstico menos
invasivo, o seu papel na hemorragia digestiva
baixa aguda ainda não está bem definido. No
entanto, 2 estudos já publicados concluiram
que a endoscopia por cápsula identificou o
local/causa da hemorragia em 40-90% dos
doentes com hemorragia digestiva e endoscopia digestiva alta e colonoscopia negativas.
A hemorragia diverticular resulta da
ruptura assimétrica dos ramos intramurais da
artéria marginal na cúpula do divertículo ou
na margem anti-mesentérica. Embora a
maioria dos doentes com diverticulose sejam
assintomáticos, cerca de 20% desenvolvem
diverticulite e 3 a 5% desenvolvem hematoquézias agudas graves (fig.1). No doente idoso
com várias co-morbilidades, a hemorragia
diverticular condiciona uma morbilidade e
uma mortalidade entre os 10 e os 20%. Apesar
de cerca de 75% dos divertículos se localizarem
no colon esquerdo, o cólon direito é a fonte da
hemorragia em 50 a 90% dos doentes, quando
se utiliza a angiografia como método de diagnóstico. Quando a hemorragia diverticular é
diagnosticada por colonoscopia, a fonte da
hemorragia é o cólon esquerdo em 60% dos
doentes. A hemorragia diverticular cessa
espontaneamente em 75% dos doentes; 99%
Radiologia versus Colonoscopia na
Hemorragia Digestiva Baixa Aguda
Os estudos publicados comparando os
resultados das técnicas radiológicas e da
colonoscopia na hemorragia digestiva baixa
aguda são limitados. No entanto, todos eles
têm concluído pela superioridade da colonoscopia relativamente às técnicas radiológicas no
diagnóstico e terapêutica (82% versus 12%)
122
Luís Lopes e José Ramada
que permitem localizar a fonte da hemorragia,
permitindo realizar uma colectomia segmentar
em oposição a uma colectomia subtotal. Uma
resseção segmentar cega está contra-indicada
e está associada a uma taxa de recidiva hemorrágica de 42% e uma taxa de morbilidade e
mortalidade muito alta, podendo chegar aos 83
e 57% respectivamente.
dos doentes necessitam menos de 4 unidades de
glóbulos rubros. A hemorragia recorre entre os
14 a 38% dos doentes após o 1º episódio e em
cerca de 50% após o 2º episódio.
FIGURA 1 - COÁGULO ADERENTE NUM DIVERTÍCULO.
Quando tratada de uma forma conservadora a hemorragia diverticular resolve
espontaneamente na maioria dos doentes.
A instabilidade hemodinâmica persistente
apesar de uma ressuscitação vigorosa implica
uma terapêutica de intervenção. A terapêutica
não cirúrgica pode ser realizada durante a
colonoscopia e a angiografia. A angiografia
permite a infusão directa de vasopressina,
resultando na resolução da hemorragia em
91% dos casos. No entanto, em cerca de 50%
dos casos, a hemorragia recorre após a cessação
da infusão. A embolização transcatéter controla
eficazmente a hemorragia, mas está associada a
um risco de enfarte intestinal de 20%.
A terapêutica intestinal pode ser realizada
através da injecção de adrenalina, métodos
térmicos (ex, electrocoagulação multipolar)
ou através da aplicação de métodos mecânico:
clips vasculares (fig. 2) ou ligaduras elásticas.
A terapêutica cirúrgica é necessária quando
a instabilidade hemodinâmica persiste apesar
de uma ressuscitação intensiva. A intervenção
cirúrgica é necessária em 18 a 25% dos
doentes que necessitam de transfusões de
glóbulos rubros. A mortalidade operatória é de
cerca de 10% apesar da melhoria dos métodos
FIGURA 2 - CLIP NO DIVERTÍCULO COM COÁGULO
ADERENTE.
2-Angiodisplasias
As angiodisplasias ou ectasias vasculares
do colon são a anomalia vascular mais frequente do tracto digestivo. Constituídas por
vasos da submucosa dilatados e ectásicos, as
angiodisplasias do cólon são responsáveis por
20 a 30% dos casos de hemorragia digestiva
baixa aguda. Estas ocorrem com igual frequência em ambos os sexos, mais frequentes após os
60 anos e cerca de 2/3 ocorrem em pessoas
com mais de 70 anos. Na maioria dos doentes
existem mais do que uma angiodisplasia. Em
termos de localização, estas lesões são mais
frequentes no cego e cólon ascendente (54%),
cólon sigmoide (18%) e recto (14%). Estas
também se podem localizar no intestino delgado. A apresentação clínica mais frequente é a
de uma anemia ferropriva e mais raramente
hematoquézias.
Na colonoscopia as angiodisplasias são
reconhecidas pelo sua cor vermelha, aspecto
123
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
dos em hemorragia o tratamento com vasopressina ou embolização pode ser realizado.
A utilização de terapêuticas hormonais
(estrogéneos) para contolar a hemorragia
gastrointestinal de origem obscura supostamente causada por angiodisplasias é controversa
e pode ser ineficaz.
A cirurgia deve ser considerada nos
doentes em que a causa da hemorragia foi
claramente identificada e em que os outros
métodos se revelaram ineficazes.
plano consistindo em vasos ectásicos que parecem irradiar de um vaso central; podem ter
um diâmetro que oscila entre os 2 e os 10 mm
(fig. 3). Um halo de mucosa pálida pode ser
observada à volta da lesão. Quando o cólon é
examinado completamente, a sensibilidade
para detectar as angiodispasias excede os 80%.
Uma preparação insuficiente do intestino
pode acarretar uma avaliação incompleta da
mucosa. Adicionalmente, o uso de narcóticos
na sedação podem diminuir a sensibilidade da
colonoscopia devido à diminuição transitória
do fluxo sanguíneo na mucosa.
3-Doença hemorroidária
A frequência de doença hemorroidária nos
doentes com hemorragia digestiva baixa é de
cerca de 75%, mas essa causalidade é infrequentemente estabelecida. As hemorroídes
são causa de hemorragia aguda em 2 a 9% dos
casos, nos estudos que incluem as fontes de
hemorragias ano-rectais (fig. 4).
FIGURA 3 - ANGIODISPLASIA NO CEGO.
A terapêutica endoscópica convencional é
realizada através da aplicação de métodos
térmicos. Para prevenir a ocorrência de
hemorragia quando a cauterização é realizada,
as angiodisplasias de maior dimensões devem
ser tratadas das margens para o centro de
modo a obliterar os vasos de «alimentação».
O argon plasma é o método térmico mais
popular no tratamento das angiodisplasias do
colon. Quando o tratamento se faz no cego
devem ser usados intensidades menores e
menor tempo de disparo no sentido de evitar a
ocorrência de perfurações.
A angiografia permite também diagnosticar
as angiodisplasias. Após a injecção do contraste estas aparecem como vasos ectásicos, de
esvaziamento lento, tufos vasculares ou vasos
de enchimento precoce. Quando diagnostica-
FIGURA 4 - LIGADURAS ELÁSTICAS EM DOENÇA
HEMORROIDÁRIA GRAU II.
4- Anti-inflamatórios (AINE)
Os AINE foram implicados em várias
lesões do intestino delgado, cólon e nas
ulcerações gastroduodenais. O íleon terminal
e o cego são os 2 locais mais susceptíveis a
lesões induzidas por este tipo de fármacos.
Os AINE estão associados à exacerbação da
doença inflamatória intestinal (DII), indução
124
Luís Lopes e José Ramada
de colites que se assemelham a uma DII e
complicações da doença diverticular aumentando o risco de perfuração e de hematoquésias.
Os doentes mais idosos ou aqueles a
tomarem AINE cronicamente têm um risco
aumentado de complicações.
Os AINE podem ainda causar lesões
localizadas na mucosa, tal como é sugerido
pelo aparecimento de diafragamas. As úlceras
intestinais e do cólon causadas pelos AINE
geralmente demarcam-se claramente da
mucosa circundante e têm uma predilecção
pelo íleon e cólon proximal, locais onde os
comprimidos estão em contacto com a mucosa
destes segmentos mais tempo que nos outros
segmentos do intestino ou cólon. As estenoses
tipo diafragma são uma lesão patognomónica
de lesão por AINE, que resulta de uma
reacção de cicatrização a uma úlcera. Estas
habitualmente localizam-se na porção média do
intestino delgado, mas também podem ocorrer
no íleon terminal e cólon. Os diafragmas
geralmente são múltiplos e estão recobertos por
mucosa normal.
Em doentes com lesões induzidas pelos
AINE e hemorragia, a colonoscopia mostra
ulcerações não específicas no cólon, intestino
delgado, sobretudo no íleon terminal e cego.
A histopatologia é inespecífica, e causas infecciosas, rádicas, e DII devem ser excluídas.
O tratamento é a suspenção da administração
deste tipo de medicamentos. Após a cessação
destes, deve-se repetir a colonoscopia cerca de
6 a 8 semanas depois, para confirmar a resolução das lesões. Se as lesões persistem outro
diagnóstico deve ser colocado. A terapêutica
cirúrgica está reservada nos casos de perfuração ou hemorragia grave refractária.
lação sistémica ou por alterações anatómicas
ou funcionais dos vasos mesentéricos.
Geralmente na angiografia não são detectadas
lesões ou factores precipitantes. Nos doentes
que foram submetidos a cirurgia aortoilíaca a
frequência de colite isquémica clinicamente
significativa é de 1 a 7%.
A isquemia cólica não oclusiva geralmente
atinge o ângulo esplénico, o cólon direito ou
transição recto-sigmoídea, as áreas com
menor fluxo. Clinicamente manifesta-se por
uma dor abdominal súbita no quadrante
inferior esquerdo, tipo cólica, de intensidade
moderada, seguida nas 24 horas subsequentes
por hematoquésias de sangue vivo ou diarreia
sanguinolenta. Hematoquésias agudas sem dor
abdominal acompanhante devem levar a
equacionar outros diagnósticos.
A colite isquémica deve ser diferenciada
clinicamente de uma isquemia mesentérica
aguda em que os doentes geralmente têm uma
dor abdominal muito mais intensa, desproporcionada aos achados no exame físico,
aparentam estarem muito doentes e geralmente identifica-se um factor precipitante.
Na colite isquémica, a colonoscopia
mostra ulcerações da mucosa e nódulos
hemorrágicos (típicos), com o recto poupado
na maioria dos doentes (fig. 5). A histologia
revela necrose e não apresenta alterações
inflamatórias como nas DII.
5- Colite isquémica
A isquemia do cólon, é a doença vascular
mais comum no tracto gastrointestinal, resultando da redução temporária e súbita do fluxo
mesentérico. A hemodinâmica mesentérica
pode ser influenciada por alterações na circu-
FIGURA 5 - COLITE ISQUÉMICA - ÂNGULO ESPLÉNICO
125
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
7- Hemorragia pós-polipectomia
O tratamento é de suporte e a maioria dos
doentes tem uma evolução clínica favorável
ao fim de alguns dias ou semanas.
Cera de 20% dos doentes desenvolvem
uma colite crónica que é diferente da colite
ulcerosa, pois é segmentar e poupa o recto;
estenoses cólicas podem-se desenvolver.
A colite crónica causada por isquemia não
responde ao tratamento médico usado na DII
e muitos doentes podem necessitar de colectomia.
A polipectomia endoscópica é o tratamento
de 1ª linha para a grande maioria dos pólipos
do colon. Complicações ocorrem em menos de
5% das colonoscopias realizadas para polipectomia e de entre as complicações a hemorragia pós-polipectomia é a mais frequente
sendo responsável por 2 a 8 % dos casos de
hemorragia digestiva baixa aguda. A frequência
deste tipo de hemorragia tem aumentado
provavelmente devido ao uso mais frequente
de corrente mista em oposição à coagulação
pura. A hemorragia massiva que por vezes
ocorre durante a polipectomia é arterial e
pode ser tratada pela aplicação da ansa novamente no pedículo. A hemorragia tardia
ocorre após a queda da escara. Este tipo de
hemorragia é geralmente auto-limitado e cessa
espontaneamente em 70% dos casos. Nos
casos em que é necessário terapêutica existem
uma variedade de técnicas que poderão ser
utilizadas, tais como, aplicação da ansa no
pedículo remanescente, ligaduras elásticas,
clips e laços hemostáticos (fig. 7), injecção de
adrenalina seguida de um método térmico.
6- Doença inflamatória intestinal
Apesar da hemorragia digestiva baixa ser
uma manifestação frequente da DII, a hemorragia aguda é infrequente. A maioria dos
doentes com colite ulcerosa (fig. 6) referem
hematoquésias, enquanto que apenas 1/3 dos
doentes com Crohn referem perdas hemáticas
visíveis.
FIGURA 6 - COLITE ULCEROSA - RECTO PROXIMAL.
A hematoquésia aguda grave é responsável por 6% das hospitalizações por doença de
Crohn e 1,4 a 4,2% por colite ulcerosa. Um
episódio de hematoquésia grave num doente
com colite ulcerosa geralmente corresponde a
um doente com pancolite. A recidiva hemorrágica não é incomum após um episódio de
hematoquézia aguda grave, e quando acontece
necessita de cirurgia para controlar a hemorragia em 57% dos casos.
FIGURA 7 - PEDÍCULO REMANESCENTE COM CLIPS E
LAÇO.
126
Luís Lopes e José Ramada
Causas menos frequentes de hemorragia
digestiva baixa aguda significativa
Colite infecciosa
Hematoquésias agudas severas não são
causadas habitualmente por um agente infecioso. As causas bacterianas mais frequentes
são a Eschirichia coli O157:H7 e a Salmonella.
Clinicamente os doentes apresentam uma
história de dor abdominal em cólica, diarreia
aquosa seguida de uma diarreia sanguinolenta.
Salmonella, Campylobacter e Yersinia podem
causar edema da mucosa, hiperemia, erosões e
ulcerações e devem ser distinguidas através
dos resultados das culturas. Outras causas
infeciosas incluem a amebíase, infecção por
citomegalovírus, Mycobacterium avium (sobretudo nos imunocomprometidos).
FIGURA 8 - COLITE RÁDICA - MÚLTIPLAS TELANGIECTASIAS NO RECTO.
Neoplasias
A hemorragia, oculta ou visível, é a forma
de apresentação mais frequente, mas raramente é severa. A frequência de hemorragia
grave por neoplasias cólicas varia dos 2 aos
26% (fig. 9).
Colite rádica
As hematoquésias agudas massivas são
uma complicação rara da terapêutica rádica.
Hemorragia pelo recto ocorre entre 1 a 5% dos
doentes com proctite rádica. A inflamação
causada pela exposição do recto ou região
recto-sigmoíde a radiação durante o tratamento
de neoplasias prostáticas ou ginecológicas
pode resultar em hemorragias significativas
cerca de 9 meses a 4 anos após a terapêutica.
Durante o tratamento os doentes apresentam
uma lesão aguda da mucosa podendo-se
queixar de tenesmo e diarreia sanguinolenta,
bem como dor abdominal. A esta fase aguda
pode seguir-se uma proctocolite crónica que
pode ser complicada de hemorragia baixa que
pode variar de leve a severa. Endoscopicamente a mucosa mosta telangiectasias
múltiplas (fig. 8). Esta hemorragia, por vezes é
de difícil tratamento, podendo ser tratada com
enemas de sucralfato, aplicação de formaldeído, aplicação de argon plasma ou laser.
FIGURA 9 - NEOPLASIA DO SIGMOIDE.
Úlceras estercorais
Este tipo de úlceras devem ser colocados
no diagnóstico diferencial sobretudo dos
doentes idosos com história de obstipação.
Geralmente apresenta-se como um úlcera
única na região recto-sigmoidea e resulta da
pressão das fezes sobre a mucosa. Apesar das
127
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
Prognóstico
complicações mais frequentes serem a
perfuração e a hemorragia, um quadro de
hematoquézias grave é raramente atribuído a
esta patologia.
A mortalidade por hemorragia digestiva
baixa é inferior a 5%. A colonoscopia precoce
está associada a tempos de internamento
menores e menores custos por doente.
Outras causas
Outras causas raras de hemorragia digestiva baixa aguda incluem a invaginação intestinal, trauma da mucosa do cólon pelo
endoscópio ou tubo de enemas, colopatia de
hipertensão portal, varizes cólicas (fig. 10)
endometriose, lesões de Dieulafoy, endometriose, síndrome da úlcera solitária do recto
(fig. 11) e hemorrogia pelo divertículo de Meckel.
FIGURA 10 - VARIZ CÓLICA IDIOPÁTICA.
FIGURA 11 - ÚLCERA SOLITÁRIA DO RECTO.
128
Luís Lopes e José Ramada
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129
URGÊNCIAS NA DOENÇA
INTESTINAL INFLAMATÓRIA
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
CARLA SOUSA ANDRADE
HENRIQUE MORNA
INTRODUÇÃO
doença, outros factores que contribuem para a
variabilidade clínica são a intensidade da
inflamação e a presença ou ausência de
complicações locais ou extra-intestinais(25,31).
Na maioria dos casos, a DC é caracterizada por exacerbações intermitentes que
alternam com períodos de remissão completa
ou relativa, podendo ainda ser classificada
em três padrões gerais, independentes da
localização anatómica: inflamatório, fibroestenótico e perfurante (fistulizante)(9).
As situações de urgência no contexto de
DC, incluem:
A Doença Intestinal Inflamatória
Idiopática (DII) compreende aquelas condições caracterizadas por uma tendência para
a activação imunológica e para a inflamação
crónica ou recorrente ao nível do tracto
gastrointestinal (GI). A Doença de Crohn
(DC) e a Colite Ulcerosa (CU) são as duas
formas principais de DII(9,10).
Embora estas duas entidades sejam
frequentemente consideradas em conjunto, na
medida em que partilham muitas características clínicas e epidemiológicas, são na realidade
síndromes distintas, com tratamentos e
prognósticos diferentes, pelo que as situações
de urgência, em cada uma destas entidades,
serão consideradas isoladamente.
A. Exacerbações agudas da doença, com
Colite severa
B. Fístulas e abcessos
C. Estenoses
DOENÇA DE CROHN
A. Exacerbações agudas da doença –
Colite Severa
A DC é uma condição inflamatória crónica que pode envolver, potencialmente,
qualquer porção do tracto GI, desde a boca até
ao anús, com uma propensão para a porção
distal do intestino delgado (ID) e cólon proximal(9,13). A inflamação é frequentemente
descontínua ao longo do eixo longitudinal do
intestino, podendo envolver todas as camadas
da parede, desde a mucosa até à serosa; esta
natureza descontínua, por sua vez, dá lugar a
muitas variações na localização da doença, a
qual poderá, inclusivé, variar ao longo do
tempo, geralmente com envolvimento de segmentos adicionais. Para além da localização da
A apresentação clínica, nestas circunstâncias, é determinada pela localização da
inflamação intestinal (Quadro 1).
QUADRO I. PADRÕES DE ENVOLVIMENTO DA
DOENÇA DE CROHN (9,25)
- Doença Ileo-cecal
- Doença limitada ao ID
- Doença limitada ao Cólon
131
40-50%
30-40%
20%
URGÊNCIAS NA DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
Os sintomas mais característicos são a dor
abdominal, a diarreia e a perda ponderal(1,35,9,11,13).
A dor abdominal pode assumir várias
apresentações, contudo o padrão mais comum
é o de dor tipo cólica, no flanco direito, habitualmente pós-prandial, a qual ocorre nas
situações de ileo-colite. Pode ainda estar
relacionada com obstrução parcial intermitente, numa zona intestinal estenosada,
acompanhando-se neste caso por distensão
abdominal, naúseas e vómitos. A inflamação
da serosa, observada nos casos de inflamação
transmural, também pode ser responsável por
alguns casos de dor abdominal.
A gravidade da diarreia está relacionada
com a extensão da colite e com a gravidade da
inflamação. Nos casos de doença limitada ao
cólon, sobretudo com envolvimento rectal,
habitualmente é de pequeno volume e está
associada a urgência e tenesmo. Na doença
ileo-cólica, a diarreia é mais volumosa, sem
sintomas proctológicos. A base fisiopatológica
da diarreia (inflamação, má absorção de ácidos
biliares, sobrecrescimento bacteriano, fístulas
internas ou síndrome do intestino curto) tem
importantes implicações terapêuticas.
A perda ponderal e a desnutrição também
ocorrem frequentemente na DC e são responsáveis por alguns dos sintomas constitucionais,
tais como fraqueza, irritabilidade e cansaço
fácil. Os factores responsáveis são inúmeros e
incluem, em primeiro lugar, a diminuição da
ingestão por receio de que esta possa desencadear dor abdominal e diarreia. Outros
factores incluem a má absorção intestinal, a
perda entérica de proteínas por exsudação
através da mucosa inflamada e o aumento das
necessidades energéticas e proteicas associadas ao estado catabólico induzido pela
inflamação intensa(24,31,32).
Durante as exacerbações agudas podem
ainda ocorrer febrícula (a febre alta deverá
levantar a suspeita duma complicação infecciosa), hematoquézia e várias formas de
doença perianal, nomeadamente lesões
cutâneas (maceração, úlceras superficiais e
abcessos), lesões do canal anal (fissuras,
úlceras e estenoses) e fístulas perianais.
Os achados no exame físico(9,13) podem
incluir sinais de doença crónica e desnutrição,
febrícula ou febre, sinais físicos de anemia ou
de deficiências vitamínicas, taquicárdia e
desidratação. O abdómen pode ser doloroso,
mais frequentemente no flanco e fossa ilíaca
direita, podendo ser palpável uma massa a
qual poderá corresponder a abcesso intraabdominal ou que poderá ter surgido por
adesão de ansas intestinais inflamadas e
mesentério. O exame anorectal poderá revelar
as lesões cutâneas já referidas, abcessos,
fístulas ou fissuras. As fissuras anais da DC
tendem a estar localizadas mais excentricamente do que as fissuras idiopáticas, as quais
ocorrem ao longo da linha média. O exame
físico poderá ainda revelar estenose do canal
anal, a qual poderá ser assintomática durante
as fases agudas da doença, dada a menor
consistência das fezes.
Perante um quadro clínico compatível com
DC agudizada é essencial estabelecer o
diagnóstico diferencial com outro tipo de
colites, nomeadamente colite ulcerosa, colite
infecciosa, isquémica, rádica, vasculítica e
farmacológica, sendo necessário recorrer a
alguns exames complementares de diagnóstico.
Do ponto de vista analítico(1,2,9,11,13) as
alterações são geralmente inespecíficas, sendo
possível encontrar: leucocitose e trombocitose
ligeira/moderada, anemia, hipoalbuminémia e
elevação da Velocidade de Sedimentação
(VS) e Proteína C Reactiva (PCR). No sentido de avaliar a presença de má absorção de
vitaminas e minerais, será necessário determinar os níveis séricos de ferro, ferritina,
vitamina B12, ácido fólico, zinco, cálcio,
magnésio e selénio. O doseamento da gordura
fecal poderá revelar esteatorreia. Para
exclusão de patologia infecciosa, deverão ser
sempre realizadas coproculturas, exame parasitológico das fezes e pesquisa de toxina de
Clostridium dificille. Em alguns casos seleccionados poderá ser útil a serologia para
Yersínia enterocolítica.
132
Carla Andrade e Henrique Morna
A Radiografia simples do abdómen
por ser exame de simples realização e
inócuo, torna-se mandatória, no sentido de
avaliar a extensão da doença e a sua gravidade, podendo evidenciar sinais de obstrução
do ID, dilatação cólica com perda do padrão
haustral ou sinais de perfuração intestinal.
Os estudos contrastados deverão ser
adiados na fase aguda.
A rectossigmoidoscopia com biopsia(11),
realizada sem preparação, permite definir a
actividade da doença e a sua extensão; um
exame completo do cólon não é justificável,
sobretudo pelo elevado risco de perfuração.
Em casos específicos, nomeadamente
quando existe suspeita de perfuração localizada
ou de abcesso intra-abdominal, poderá ser
necessário proceder à realização de Ecotomografia ou TAC Abdominal, para diagnóstico
e eventual punção com drenagem guiada.
Uma vez estabelecido o diagnóstico, é
necessário definir o grau de gravidade clínica
da Doença de Crohn(9) (Quadro 2).
(7,9,11,13),
QUADRO 2. ÍNDICE DE ACTIVIDADE DA DOENÇA DE CROHN (CDAI)
Nº de dejecções líquidas ou de
consistência mole
Dor abdominal
Estado geral
Complicações
Tratamento com loperamida ou
opiáceos
Massa abdominal
Hematócrito
Peso corporal
Total na última semana
x2
0=ausência; 1=ligeira; 2=moderada; 3=intensa
Total na última semana
0=bom; 1=mediano; 2=mau; 3=muito mau; 4=terrível
Total na última semana
Artralgia/artrite, febre (>37,8ºC), irite/uveíte,
eritema nodoso, pioderma gangrenoso, estomatite aftosa, fissura, fístula ou abcesso anal
Nº total
Se sim
x6
0=não; 1=questionável; 2=sim
Sexo feminino: 42 - Htc
Sexo masculino: 47 - Htc
(1-Peso corporal/Peso Standard) x 100
x7
x 20
+ 30
x10
x6
Total
Se CDAI < 150: doença inactiva
Se CDAI > 150: doença activa
TERAPÊUTICA
terapia, antibioterapia, imunossupressores ou
imunomoduladores e, em casos específicos,
cirurgia.
Durante uma agudização grave da DC, os
doentes deverão ser mantidos em dieta zero,
sendo o suporte nutricional agressivo uma
importante medida adjuvante na terapêutica
da DC, o qual muitas vezes inclui o recurso a
alimentação parentérica se os doentes tiverem
Os episódios agudos e severos de DC deverão ser tratados em ambiente hospitalar, com
intervenção conjunta dum Gastrenterologista
e dum Cirurgião(1,2-4,6,8,9,11,13,37-40).
O tratamento, que deverá ser intensivo, tem
como principal objectivo induzir a remissão
clínica e inclui: repouso intestinal, cortico133
URGÊNCIAS NA DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
evidência de desnutrição por doença prolongada. Deverá ainda ser dada atenção à
reposição de fluidos e electólitos.
Os antibióticos, nomeadamente o
Metronidazol e a Ciprofloxacina, isolados ou
em combinação, têm sido amplamente utilizados no tratamento de DC agudizada, como
terapêutica adjuvante.
Os corticóides constituem a base do
tratamento da DC activa severa(1,2,3,6,9),
preferencialmente administrados por via
endovenosa. A dose ideal de corticóides ainda
não foi estabelecida, contudo são frequentemente utilizados a Hidrocortisona (100 mg,
6/6 h), a Metilprednisolona (16 mg, 6/6 h) ou
a Prednisolona (1mg/kg/dia). A duração ideal
da terapêutica também ainda não foi estabelecida, variando de acordo com os autores,
contudo os tratamentos por períodos excessivamente curtos (< 3 semanas) podem resultar
em “rebounds” da doença uma vez interrompida a terapêutica; por outro lado, tratamentos
por períodos excessivamente longos estão
associados a efeitos secundários frequentes e
graves.
É de extrema importância identificar os
doentes com menor probabilidade de resposta
aos corticóides, no sentido de permitir a introdução, em tempo útil, de terapêuticas alternativas ou no sentido de encaminhar o doente
para a cirurgia(2,11,36).
Os imunossupressores, azatioprina ou 6mercaptopurina, devem ser considerados em
indivíduos com DC activa que não respondem
às terapêuticas de primeira linha, contudo
devido ao seu início lento de acção, com
tempo de indução terapêutica de cerca de três
meses, não têm indicação na fase aguda
severa. Quanto à ciclosporina, usada nos
doentes com CU, a sua eficácia na DC é
dúbia(20,27,29,30,37).
O papel das terapêuticas biológicas, como
o Infliximab (anticorpo monoclonal quimérico, anti-TNF ·, uma importante citocina pró-inflamatória na patogénese da DC, produzida
pelos linfócitos T e macrófagos), está bem
estabelecido nas formas agudas refractárias,
sendo muitas vezes utilizado como ponte para
utilização de imunomoduladores de acção
mais lenta. Nos casos agudos e severos, é utilizado na dose de 5mg/kg de peso corporal, em
infusão durante cerca de 2 horas, dose
única(9,14,15,16,21,22).
O recurso a imunomoduladores não deve
fazer adiar uma eventual colectomia, caso esta
tenha indicação formal, em particular nos
casos de deterioração clínica progressiva ou
sintomatologia persistente apesar do
tratamento médico intensivo.
B. FÍSTULAS E ABCESSOS
Um subgrupo de doentes apresenta doença
definida como penetrante, a qual pode levar à
formação de fístulas e de abcessos, tradutores
da natureza transmural da DC(9,13).
A activação imunológica desencadeia a
libertação duma variedade de proteases e
metaloproteinases da matriz que podem
contribuir directamente para a destruição
tecidual, formação de trajectos fistulosos e,
finalmente, penetração através de planos
teciduais adjacentes.
Os abcessos ocorrem em cerca de 20% dos
doentes com DC e podem ser intra ou extraabdominais(42). O tipo intra-abdominal é mais
comum e inclui os abcessos localizados no
mesentério ou entre as ansas intestinais.
A apresentação clássica neste tipo de casos
caracteriza-se por febre alta, acompanhada de
sensibilidade abdominal focal ou sinais peritoneais generalizados. Infelizmente, muitos
doentes considerados como sendo de alto risco
para perfuração ou para formação de abcessos,
estão sob terapêutica corticosteróide, a qual
pode mascarar a apresentação clínica ao
suprimir a febre e os sinais de peritonite, pelo
que é necessário manter um elevado nível de
suspeição.
A caracterização imagiológica destas lesões
deverá ser feita, como já foi referido, por ecotomografia ou TAC abdominal.
As fístulas (comunicações anómalas entre
dois orgãos, com revestimento epitelial),
134
Carla Andrade e Henrique Morna
O orifício interno ao nível da vagina pode ser
difícil de individualizar contudo, a palpação
pode desencadear dor na parede posterior.
As fístulas entero e colovesicais podem
apresentar-se como infecções urinárias recorrentes, polimicrobianas ou com pneumatúria
ou fecalúria. As fístulas enterocutâneas, para a
parede anterior do abdómen, geralmente
ocorrem após cirurgia e o trajecto fistuloso
tende a seguir os planos de dissecção para a
parede abdominal.
traduzem um estadio crónico da doença, pelo
que não deveriam ser consideradas urgências
no contexto de DC, não fossem o desconforto
e o profundo impacto que têm na qualidade de
vida destes indivíduos(41).
As fístulas perianais são comuns, estimando-se que ocorram em 15 a 35 % dos
doentes(9). Tipicamente, a lesão inicial é um
abcesso que envolve uma glândula anorectal
localizada no espaço interesfincteriano, o qual
se pode estender ao longo de diferentes planos
teciduais originando fístulas ou abcessos
criptoglandulares, perianais, isquiorectais ou
supraelevadores. As queixas mais características são a proctalgia, a escorrência anal ou
perianal, o tumor perianal, os sinais inflamatórios locais e a febre. O exame físico nestes
casos está muitas vezes limitado pela dor
desencadeada, pelo que deverá ser realizado de
forma cuidadosa. Deverá incluir inspecção
externa, palpação perianal, toque rectal e, nas
mulheres, palpação bidigital rectovaginal. Em
muitas circunstâncias, o exame minucioso só é
possível com recurso a anestésicos locais ou a
anestesia geral, o mesmo acontecendo quando
se considera a realização de estudo imagiológico por endoscopia, ecoendoscopia, ecografia
endoanal e RMN.
As fístulas que envolvem dois segmentos
do tracto GI também são frequentes(9,13,42). As
enteroentéricas, enterocólicas e colocólicas
são frequentemente assintomáticas; as fístulas
gastro e duodenocólicas podem manifestar-se
com vómito fecalóide. Quando o trajecto
fistuloso se estende posteriormente, a partir do
iléon terminal para o retroperitoneu, o fleimão
pode envolver o ureter causando hidronefrose
à direita. A penetração mais profunda origina
o clássico abcesso do psoas, que se apresenta
com desconforto no flanco direito, com febre e
com claudicação na marcha. As fístulas para a
vagina podem ocorrer a partir do recto ou do
ID, estas últimas ocorrendo habitualmente em
mulheres histerectomizadas, as quais apresentam dispareunia, desconforto perineal,
descarga vaginal persistente e, ocasionalmente,
passagem de gases ou fezes através da vagina.
TERAPÊUTICA
Uma vez estabelecido o diagnóstico de
abcesso este deverá ser drenado, por via
percutânea ou cirúrgica(41), de acordo com a
sua localização. Na fase aguda, o doente
deverá permanecer em dieta zero e deverá ser
instituída antibioterapia de amplo espectro(3).
Sempre que possível, um catéter deve ser colocado por via percutânea, guiado por TAC, e o
abcesso drenado. Se o débito se mantiver
elevado deverá ser introduzida alimentação parentérica para suporte nutricional.
A resolução cirúrgica definitiva poderá ser
adiada por várias semanas até que o abcesso
esteja completamente drenado e a DC
subjacente esteja controlada com terapêutica
médica. A drenagem percutânea sem cirurgia
subsequente geralmente resulta numa fístula
enterocutânea permanente. Se a drenagem
percutânea não for tecnicamente exequível,
ou se existir evidência de peritonite, é mandatória a intervenção cirúrgica imediata.
A abordagem terapêutica no caso de
fístulas enteroentéricas, enterovesicais ou
enterocólicas moderadamente sintomáticas
implica consideração de terapêutica médica
versus terapêutica cirúrgica, de acordo com o
caso individual(3). No caso de fístulas francamente sintomáticas, complexas, frequentemente associadas a abcessos, a opção é
geralmente cirúrgica.
A terapêutica médica inclui períodos
prolongados com Azatioprina, 6-mercapturina
ou Infliximab(14-18).
135
URGÊNCIAS NA DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
descritas, as quais habitualmente são acompanhadas de vómitos(7).
A radiografia simples do abdómen é mandatória, enquanto os estudos contratados, os
mais indicados para demonstrar a presença de
estenoses, não devem ser realizados na fase
aguda devido ao elevado risco de perfuração.
Todas as estenoses devem ser consideradas
suspeitas e, uma vez ultrapassada a fase aguda,
devem ser realizadas biópsias endoscópicas, na
medida em que alguns destes estreitamentos
representam transformação neoplásica(33,35).
No caso de doença perirectal está estabelecido que poderá ocorrer encerramento das
fístulas com tratamentos prolongados com
Metronidazol, azatioprina ou 6-mercaptopurina.
As formas mais graves de doença deverão ser
tratadas com infusões sequenciais de
Infliximab, frequentemente associadas a
imunossupressão prolongada. Os abcsessos
perirectais requerem drenagem cirúrgica. Nas
fístulas simples, a fistulectomia simples, com
terapêutica médica, permite a resolução em
70-80% dos casos(41). O uso de “seton” é eficaz
ao permitir a drenagem adequada de fístulas e
deverá ser usado, por rotina, em indivíduos
com fístulas complexas.
As formas mais graves de doença perianal
podem requerer repouso intestinal, com
nutrição parentérica total. Nos casos francamente refractários, sobretudo quando existe
lesão esfincteriana, poderá ser necessário
realizar uma protectomia.
TERAPÊUTICA
Os doentes com sintomas obstrutivos
resultantes de DC fibroestenótica frequentemente melhoram em 2-3 dias com medidas
conservadoras, nomeadamente dieta zero e
repouso intestinal, entubação nasogástrica
para descompressão gastrointestinal e
hidratação endovenosa; a estas medidas, no
caso de doença activa, deverá ser associada
terapêutica médica agressiva, incluindo corticoterapia, uma vez que a inflmação poderá
contribuir para a obstrução parcial(1,3).
Os doentes com episódios recorrentes de
suboclusão ou aqueles que não respondem à
terapêutica conservadora, poderão necessitar
de cirurgia urgente, a qual deverá consistir
numa ressecção limitada do segmento
estenótico uma vez que a DC tende a recidivar
após a cirurgia(3,9). Após recuperação dum
episódio agudo, a instituição duma dieta pobre
em resíduos poderá reduzir a incidência de
episódios subsequentes(42).
C. ESTENOSES
A variante fibroestenótica da DC caracteriza-se pela formação de estenoses recorrentes,
as quais representam inflamação de longa
duração, e que pode ocorrer em qualquer
segmento do tracto GI onde a inflamação
tenha sido activa. As estenoses não ocorrem
em todos os doentes com DC, no entanto
tendem a recorrer, geralmente ao nível da
anastomose, em doentes submetidos a
ressecção intestinal por esta causa(9,42).
Esta variante clínica habitualmente é
silenciosa até que o calibre luminal esteja suficientemente reduzido para causar sintomas
obstructivos, os quais também podem ser
secundários a inflamação aguda com edema, a
compressão extrínseca ou efeito de massa,
podendo ainda ser causados por formação de
aderências. A apresentação clínica típica, com
obstrução parcial do intestino delgado,
caracteriza-se por dor abdominal tipo cólica,
pós-prandial, distensão abdominal e ruídos de
luta. Uma obstrução mais significativa implica
agravamento das queixas anteriormente
COLITE ULCEROSA
A CU é outra entidade inflamatória crónica e idiopática que, ao contrário da DC,
afecta o recto e estende-se proximalmente, de
forma contínua, para envolver uma extensão
variável do cólon, tipicamente sem envolvimento do ID. A reacção inflamatória não é um
processo transmural, estando confinada à
mucosa e à submucosa(10,13,42).
136
Carla Andrade e Henrique Morna
Caracteriza-se clinicamente por exacerbações e remissões intermitentes e a apresentação típica depende da extensão da doença.
Habitulamente, a gravidade dos sintomas está
correlacionada com a gravidade da doença(2).
As situações de Urgência na CU incluem:
A.
B.
C.
D.
E.
F.
sintoma tão proeminente como na DC,
embora possam estar presentes desconforto
abdominal nos quadrantes inferiores ou dor
abdominal, tipo cólica.
A doença de gravidade moderada ou severa
pode estar associada a sintomas sistémicos.(13)
Os doentes podem referir anorexia, naúseas e
nos casos mais graves, vómitos e febre. Com a
inflamação e perdas hemáticas prolongadas o
doente poderá referir sintomas de anemia, tais
como dispneia, cansaço para esforços progressivamente menores e edemas maleolares.
Os estudos analíticos que traduzem o grau
de impacto sistémico da doença, exames das
fezes, estudos imagiológicos e endoscópicos
são os mesmos realizados nas fases de agudização da DC, referidos anteriormente.
A gravidade da doença pode ser estabelecida por vários critérios, nomeadamente clínicos
(Quadro 3) e endoscópicos (Quadro 4). Uma
vez que as características histológicas modificam-se mais lentamente do que o quadro
clínico ou a aparência endoscópica, não são
habitualmente utilizados como auxiliares na
decisão terapêutica imediata(10,11).
Exacerbações agudas da doença, com
Colite Severa
Megacólon tóxico
Perfuração cólica
Hemorragia maciça
Lesões perianais
Lesões estenosantes
A. EXACERBAÇÕES AGUDAS DA
DOENÇA – COLITE SEVERA
Os sintomas típicos duma exacerbação de
CU são a diarreia, as rectorragias, a mucorreia
e a dor abdominal(10,11).
A diarreia é muitas vezes acompanhada de
urgência e tenesmo, especialmente quando
recto está severamente inflamado, o que
condiciona diminuição da compliance e da
capacidade de reservatório rectal, pelo que
quando a inflamação é suficientemente grave,
a urgência é tal que poderá ocasionar incontinência(42). Em muitos doentes a diarreia
ocorre sobretudo após as refeições, podendo
ocorrer durante a noite. Frequentemente é
acompanhada de grandes quantidades de
muco.
Os doentes com proctite hemorrágica
geralmente apresentam rectorragias, habitualmente com sangue vivo na superfície das fezes
ou separado destas. Quando a doença progride
além do recto, o sangue geralmente está
misturado com as fezes ou poderá ocorrer
diarreia francamente sanguinolenta, sendo a
presença de coágulos pouco frequente, excepto
no caso de hemorragia maciça. A CU activa
associada a diarreia está geralmente associada
a sangue macroscópico(42).
Na maioria dos doentes com CU, mesmo
quando activa, a dor abdominal não é um
QUADRO 3. CRITÉRIOS CLÍNICOS
Forma ligeira
< 4 dejecções/dia, com ou
sem sangue, sem distúrbios
sistémicos, VS normal
Forma moderada
> 4 dejecções/dia, com distúrbios sistémicos mínimos
Forma severa
> 6 dejecções/dia, com
sangue, com evidência de distúrbios sistémicos: febre,
taquicardia, anemia e VS>30
QUADRO 4. CRITÉRIOS ENDOSCÓPICOS
0
1
2
3
4
137
Normal
Perda do padrão vascular
Mucosa granular, não friável
Friabialidade de contacto
Sangramento espontâneo, ulceração
URGÊNCIAS NA DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
TERAPÊUTICA
altura na evolução da doença, embora o risco
de ocorrência seja superior nas fases inicias,
podendo ocorrer como forma de apresentação.
Não parece existir predilecção por qualquer
grupo etário ou sexo(12).
Esta complicação pode ser desencadeada
por alterações do equilíbrio hidroelectrolítico,
como a hipocaliémia, ocorrendo em muitos
doentes uma elevação do pH arterial
compatível com alcalose metabólica. Alguns
fármacos, tais como os opiáceos, os anticolinérgicos e os antidepressivos, ao alterarem a
motilidade intestinal têm sido implicados na
etiologia do MT. A descontinuação súbita de
alguns fármacos usados como terapêutica da
DII, tais como os corticóides, a Salazopirina ou
a Mesalazina, podem desencadear MT.
Tipicamente, esta complicação é precedida
por uma exacerbação aguda da CU, de duração
variável e o doente geralmente apresenta
obnubilação da consciência, febre, taquicardia
e hipotensão. O abdómen pode estar distendido (o cólon transverso dilatado pode ser visível
em alguns doentes), com aumento da sensibilidade ao longo do trajecto cólico, diminuição
dos ruídos hidroaéreos (RHA), com ou sem
sinais de peritonite. O quadro clínico pode ser
fruste nos doentes submetidos a terapêutica
com analgésicos e/ou corticóides.
Analiticamente(13) é frequente existir
anemia geralmente secundária a rectorragias,
leucocitose, alterações do equilíbrio electolítico, como hipocaliémia devida à excreção
cólica desencadeada pela inflamação e pelos
corticóides, hipoalbuminémia devida à exsudação proteica para o lúmen e à diminuição da
síntese hepática secundária à inflamação.
De um modo geral existe elevação da VS e da
PCR. A alcalose metabólica, resultante da
hipocaliémia e da deplecção de volume, é
considerada factor de mau prognóstico.(12)
A radiografia simples do abdómen é essencial para o diagnóstico, evidenciando uma
dilatação cólica geralmente do transverso, o
qual apresenta frequentemente diâmetro
superior a 6 cm. Permite ainda a avaliação de
alterações inflamatórias ao nível da parede
Os indivíduos com exacerbações de gravidade severa, tal como nos casos de DC,
deverão ser hospitalizados para tratamento
intensivo, o qual deverá incluir(1,2,3,6,8,11).
• Repouso intestinal
• Reposição de fluidos e electrólitos
• Corticoterapia endovenosa (ver DC)
• Corticóides rectais (100 mg hidrocortisona, bid)
O tratamento deverá ser continuado
durante 5-7 dias desde que seja evidente
melhoria clínica, considerando-se que existe
resposta ao fim deste período quando o
próprio doente refere melhoria clínica, sem
dor abdominal, quando a frequência das
dejecções diarreicas é inferior a 4
episódios/dia, sem sangue macroscópico e
houve resolução da febre e da taquicardia.
Quando existe deterioração clínica
durante os primeiros dias, apesar de terapêutica corticóide endovenosa, a adição de
Ciclosporina endovenosa pode induzir remissão em alguns doentes, na dose de 4 mg/Kg/dia.
Importa ter em atenção os efeitos secundários
associados a esta terapêutica, nomeadamente
nefrotoxicidade, hipertensão arterial, convulsões e infecções oportunistas, sendo fundamental a avaliação dos níveis sanguíneos de
Ciclosporina, com ajustes da dose para níveis
terapêuticos(11,20,28,29,38,39,40).
O tratamento com Ciclosporina não deve
adiar a colectomia, nos casos em que esta
tenha indicação formal.
B. MEGACÓLON TÓXICO
O Megacólon Tóxico (MT) é definido
como uma dilatação cólica aguda, total ou
segmentar, não obstrutiva, com pelo menos 6
cm, associada a toxicidade sistémica(10,12,42).
Ocorre entre 2 a 5 % dos casos de gravidade severa, geralmente em indivíduos com
pancolite, podendo ocorrer em qualquer
138
Carla Andrade e Henrique Morna
intestinal, tais como distorção ou desaparecimento das haustras, podendo ainda revelar a
presença de níveis hidroaéreos ao nível do
cólon. Mais importante que o grau de
dilatação cólica é o estado geral do doente(12).
A rectossigmoidoscopia, realizada sem
preparação, não deverá progredir além dos 20
cm da margem anal, sendo útil sobretudo
quando o MT surge como manifestação
inicial, ao contribuir para o diagnóstico diferencial entre CU e outras formas de colite.
Deve ser evitada a insuflação de ar(10,12,42).
Foram descritos critérios clínicos para o
diagnóstico de MT (Jalan e colaboradores)(12).
• Ciclosporina endovenosa, 4mg/kg/dia,
se não houver resposta imediata à corticoterapia
• Profilaxia das úlceras de stress com PPI
• Profilaxia da trombose venosa profunda
com HBPM
• Profilaxia de complicações infecciosas
com antibioterapia de amplo espectro
• Reposicionamento do doente a cada
2-3 horas, para permitir a redistribuição
do ar no cólon, com progressão para o
cólon distal e recto.
1 - Evidência radiológica de distensão
cólica
2 - Pelo menos 3 das seguintes alteraçõe:
Temperatura>38ºC
> 10 500 lecócitos
Frequência Cardíaca >120 ppm
Anemia
3 - Pelo menos 1 dos seguintes parâmetros:
Desidratação
Alteração do estado de consciência
Distúrbios electrolíticos
Hipotensão
• MT que surge no contexto de
tratamento intensivo de episódio de
gravidade severa de CU
• Perfuração livre
• Hemorragia maciça
• Agravamento da toxicidade e progressão
da dilatação apesar da terpêutica
intensiva durante 24 horas (48 a 72
horas, segundo alguns autores).
São indicações para colectomia urgente(3,12):
C. PERFURAÇÃO CÓLICA
A perfuração cólica é a complicação mais
grave da CU(3,10,12,42), felizmente rara, podendo
complicar uma dilatação aguda do cólon,
embora possa ocorrer na sua ausência, situação
em que habitualmente surge como manifestação inicial da doença. O cólon sigmóide é
o local mais frequentemente envolvido(10).
Os sinais físicos de peritonite podem não
ser evidentes, sobretudo nos casos em que o
doente está sob corticoterapia, pelo que uma
sensação subjectiva de mal-estar, taquicárdia e
diminuição dos RHA podem ser as únicas
características clínicas.
Analiticamente as alterações são semelhantes às que ocorrem no MT, com leucocitose
marcadamente elevada.
A Radiografia simples do abdómen, em pé
ou tangencial, e a Radiografia do Tórax,
evidenciarão ar livre na cavidade abdominal.
TERAPÊUTICA
O tratamento inicial, de preferência numa
Unidade de Cuidados Intensivos, é médico e
tem por objectivo restaurar a motilidade
cólica e diminuir a gravidade da colite, com
subsequente redução do risco de perfuração.
Aproximadamente 50 % das dilatações agudas
resolvem com terapêutica médica, a qual
deverá incluir(1,3,10,12,42)
• Repouso intestinal
• Sonda nasogástrica para descompressão
• Correcção da desidratação com
administração de fluidos
• Correcção de desiquilíbrios electrolíticos,
como hipocaliémia e hipomagnesiémia
• Correcção de anemia com tranfusões
• Corticoterpia endovenosa (Ver DC)
139
URGÊNCIAS NA DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
A abordagem desta complicação inclui
terapêutica médica para corrigir desequilíbrios
electrolíticos e metabólicos, antibioterapia
endovenosa de amplo espectro e corticoterapia
endovenosa. Uma vez estabilizada a condição
hemodinâmica do doente, deverá ser realizada
colectomia urgente(3).
da terapêutica instituída, deverá ser considerado para colectomia urgente(11).
E. LESÕES PERIANAIS
Os doentes com CU ocasionalmente
desenvolvem fissuras anais ou abcessos
perianais, mas a ocorrência de lesões extensas
deverá sugerir DC. Para as fissuras é essencial
o tratamento da inflamação rectal, devendo a
cirurgia ser evitada sempre que possível(10).
D. HEMORRAGIA MACIÇA
A hemorragia maciça ocorre em associação com os ataques severos da CU, sendo
contudo uma complicação rara da doença(11).
A avaliação clínico-laboratorial permite a
definição de vários conceitos, nomeadamente
de Hemorragia Severa (presença de choque,
Hb<9g/dl, Htc<30% e/ou necessidade de
mais de 4 unidades de eritrócitos nas primeiras
24 horas) e de Hemorragia Maciça (associada
a Choque hipovolémico no momento da
admissão hospitalar e que requer mais de 300
cc/hora de sangue nas primeiras 6 horas, no
sentido de manter a estabilidade hemodinâmica)(43).
De um modo geral, as medidas de ressuscitação combinadas com a terapêutica médica
da exacerbação da CU, permitem o controlo
da hemorragia.
As medidas de ressuscitação têm como
objectivo o restabelecimento do equilíbrio
hemodinâmico, idealmente com manutenção
do hematócrito > 30%, procedendo-se à
administração endovenosa de fluídos (de
preferência colóides ou expansores do plasma), seguidos pela infusão de sangue total ou
plasma e/ou concentrado e eritrócitos. O
oxigénio, administrado por rotina a todos os
doentes, ajuda a prevenir a hipóxia miocárdica
e cerebral(10,11,42,43).
Deverão ser sistematicamente avaliados os
sinais vitais, o estado de consciência, a
diurese, a temperatura, o aspecto e volume das
dejecções, bem como os parâmetros analíticos,
sobretudo hemograma e ionograma.
Se o doente necessitar de 6 a 8 unidades de
concentrado de eritrócitos nas primeiras 24 a
48 horas e se a hemorragia se mantiver apesar
F. LESÕES ESTENOSANTES
As lesões estenosantes fibróticas são raras
nos doentes com CU de longa duração e raramente causam estenose franca. O diagnóstico
requer um elevado índice de suspeição para
carcinoma, indicação formal para colectomia(10).
MANIFESTAÇÕES
EXTRA-INTESTINAIS
Para além das situações de urgência que
ocorrem nos doentes com CU e DC, directamente relacionadas com o intestino, estes
doentes podem ainda apresentar uma série de
manifestações extra-intestinais, muitas das
quais são comuns a ambas as entidades
embora, nas grandes séries, ocorram mais
frequentemente em doentes com Crohn(10,13).
Dum modo geral, estas manifestações são
caracterizadas como estando associadas a
doença do ID ou do Cólon, associadas ou não
a doença intestinal activa. Algumas destas
complicações são ainda consequência directa
da patologia intestinal (nefrolitíase)(13).
140
Carla Andrade e Henrique Morna
MANIFESTAÇÕES EXTRA-INTESTINAIS
COLITE ULCEROSA %
DOENÇA CROHN %
Artropatia aguda
Sacroileíte
Espondilite anquilosante
Complicações oculares
Eritema nodoso
Pioderma gangrenoso
Colangite esclerosante 1ª
Coledocolitíase
Nefrolitíase
Amiloidose
10-15
9-11
1-3
5-15
10-15
1-2
2-8
-
15-20
9-11
3-5
5-15
15
1-2
1
15-30
5-10
Rara
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143
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
SÓNIA SOUSA FERNANDES
ADÉLIA RODRIGUES
INTRODUÇÃO
ou relacionada com o acto defecatório.
As causas mais frequentes são a trombose
hemorroidária, externa ou interna, e a fissura
anal. No entanto, outras patologias cursam com
dor anal, como o abcesso anal, a criptopapilite
aguda, a inflamação hemorroidária aguda (“crise
hemorroidária”), a proctite aguda, as lesões
traumáticas do ânus e o carcinoma anal(2).
A doença ano-rectal aguda associa-se a
desconforto, dor e preocupação para o doente.
Uma avaliação correcta dos sintomas, acompanhada de um exame objectivo cuidadoso
permitem, na maioria dos casos, estabelecer o
diagnóstico. O tratamento da patologia anorectal aguda proporciona ao doente um alívio
sintomático a curto prazo, pelo que se torna
igualmente gratificante para o clínico, estimulando o seu aperfeiçoamento teórico e técnico.
Neste capítulo abordaremos, numa
primeira parte, os sintomas ano-rectais agudos,
referindo-nos aos seus diagnósticos diferenciais
e aos exames complementares de diagnóstico
utilizados. Seguidamente, abordaremos as
urgências proctológicas de maior incidência,
focando sobretudo os aspectos terapêuticos.
TABELA 1- CAUSAS DE DOR ANO-RECTAL AGUDA
Fissura anal
Trombose hemorroidária
Crise hemorroidária
Abcesso anal
Criptopapilite
Lesões traumáticas do ânus e recto
1. SINTOMAS ANO-RECTAIS
AGUDOS
Cancro anal
Proctalgia fugaz
Nevralgia anal
Coccigodinia
História clínica. A anamnese deve
focalizar-se no tubo digestivo e na região
ano-rectal. São relevantes os antecedentes de
doença ano-rectal e os tratamentos efectuados, nomeadamente cirurgias prévias.
A doença inflamatória intestinal, sobretudo a
doença de Crohn, associa-se a complicações
ano-rectais graves e difíceis de tratar. A proctalgia pode estar relacionada com a prática de
sexo anal, quer por causa traumática quer, nos
doentes com SIDA, devido a proctites infecciosas, víricas, bacterianas ou por protozoários
(3). A coccigodinia corresponde a dor na região
coccígea, agravada pela mobilização do cóccix,
geralmente devida a traumatismo prévio.
Dor ano-rectal
A pele perianal e a anoderme têm epitélios
com grande densidade de fibras nervosas sensitivas, enquanto a mucosa rectal é suprida por
fibras proprioceptivas estimuladas pelo estiramento da parede. Assim, a linha dentada
corresponde à fronteira entre um epitélio
distal muito sensível à dor e uma mucosa
proximal praticamente indolor(1).
A dor ano-rectal aguda pode ter várias
etiologias, enumeradas na Tabela 1.
A dor ano-rectal aguda pode ser persistente
145
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
esfincteriana torna a anuscopia numa
manobra traumatizante, pelo que deve ser
protelada para um exame posterior(7). O toque
rectal é importante no diagnóstico da
trombose hemorroidária interna e do cancro
anal, ajuda na avaliação dos abcessos perianais
e pode detectar corpos estranhos ou fecalomas
no recto. A anuscopia permite esclarecer as
alterações detectadas com o toque rectal,
sendo útil no diagnóstico da criptopapilite e de
ulcerações da mucosa do recto e do canal anal,
devidas a doença de Crohn, terapêuticas
proctológicas prévias, ou infecção como a sífilis,
vírus herpes ou vírus citomegálico(2). Na
coccigodinia, a palpação do cóccix pode desencadear a dor.
A proctalgia fugaz consiste numa dor aguda
intensa e súbita, por vezes nocturna, que pode
durar alguns minutos, em indivíduos jovens
com outras manifestações de doença funcional
gastrointestinal(4,5). Na gravidez, a doença
hemorroidária é a principal cauda de dor
anal(6).
Exame objectivo. A avaliação da dor
ano-rectal assenta na anamnese e no exame
proctológico, que compreende a inspecção
cuidadosa, o toque rectal, e a anuscopia.
A doença hemorroidária é evidente à
inspecção, seja a trombose de um pedículo
hemorroidário, ou edema e sinais inflamatórios de todo o debrum hemorroidário.
A observação de massas perianais, com sinal
de flutuação, ou de orifícios fistulosos, faz
suspeitar de doença supurativa ano-rectal.
Para observar as fissuras faz-se, com o afastamento das nádegas, uma tracção que expõe o
canal anal. O toque rectal pode ser muito
doloroso e até mesmo intolerável na fissura
anal aguda; nestes doentes, a hipertonia
Exames auxiliares de diagnóstico. A
rectossigmoidoscopia pode ser efectuada,
mesmo sem preparação cólica, na suspeita de
doença neoplásica ou inflamatória do recto ou
do cólon sigmóide, com a vantagem de permitir a colheita de biopsias transendoscópicas
para análise histológica ou microbiológica.
FIGURA 1- ESTUDO DO DOENTE COM DOR ANO-RECTAL
DOR ANO-RECTAL
AGUDA
Anamese
Exame proctológico:
inspecção, toque rectal
e anuscopia
Doença
Hemorroidária
aguda
Doença
supurativa
ano-rectal
Fissura
anal
Tratamento
sintomático
Biopsia
Cancro
Anal
Ecoendoscopia
TAC/RMN
146
Proctite
inflamatória
ou
infecciosa
Endoscopia com
biopsias:
anatomopatologia
+/- microbiologia
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
Nas proctites infecciosas e úlceras anais pode
ser efectuado um esfregaço de zaragatoa anal
ou rectal. Nas doenças supurativas ou nas
lesões neoplásicas, a ecoendoscopia permite
avaliar o atingimento da parede do recto; a
tomografia computorizada (TC) e a ressonância magnética nuclear (RMN) definem a
extensão anatómica das doenças supurativas
ano-rectais, e permitem estadiar o cancro anal.
A Figura 1 representa, em diagrama, o
estudo diagnóstico da dor ano-rectal.
partida na escara de polipectomia. Os doentes
com cirrose hepática e coagulopatia podem
ter rectorragias não só pelas doenças ano-rectais comuns como também por rotura de
varizes rectais, que funcionam como shunts
portossistémicos no contexto da hipertensão
portal. O uso de antiagregantes plaquetários
ou de hipocoagulantes orais pode exacerbar a
hemorragia com ponto de partida ano-rectal.
Exame objectivo. A avaliação dos sinais
vitais e do estado hemodinâmico é fundamental nas hemorragias de grande volume.
A inspecção do ânus, o toque rectal e a
anuscopia permitem identificar a causa da
hemorragia na maioria dos casos. Nos doentes
em que se observa prolapso rectal, a causa da
rectorragia pode ser uma úlcera solitária do
recto, geralmente localizada na parede anterior. A presença de fezes impactadas na
ampola rectal deve levantar a suspeita de
úlcera estercoral, causada por necrose
isquémica da mucosa.
Rectorragia
A emissão de sangue vermelho-vivo pelo
ânus é um sintoma proctológico frequente que
causa grande preocupação ao doente.
Geralmente associa-se a dor ano-rectal e pode
ser causada por fissura anal, trombose hemorroidária externa ou lesões traumáticas do
recto. Também a proctite pode causar
hemorragia de pequeno volume, geralmente
observada como muco sanguinolento,
acompanhando-se de tenesmo, falsas vontades e urgência defecatória.
Na Tabela 2 enumeram-se causas de
hemorragia com ponto de partida ano-rectal
Exames auxiliares de diagnóstico. A rectossigmoidoscopia deve ser realizada, mesmo
sem preparação cólica, e permite identificar
outras causas de rectorragia, como a lesão de
Dieulafoy, a úlcera solitária do recto, pólipos e
carcinomas sangrantes mais proximais.
A colonoscopia total deve ser efectuada nos
indivíduos com mais de 50 anos, com história
familiar ou pessoal de adenoma ou cancro
colo-rectal, com anemia ferripriva ou pesquisa
de sangue oculto nas fezes positiva, e com sintomas de alarme como o emagrecimento ou a
alteração recente dos hábitos intestinais(12).
Na Figura 2 resumem-se alguns passos
importantes na avaliação do doente com
rectorragia.
(8,9,10,11)
TABELA 2- CAUSAS DE RECTORRAGIA
Fissura anal
Doença hemorroidária
Lesões traumáticas do recto
Após polipectomia
Úlcera solitária do recto
Úlcera estercoral
Fístula anal
Carcinoma
Pólipos
Varizes anorectais
Lesão de Dieulafoy
Proctite inflamatória/ infecciosa/ rádica
História clínica. Uma história de rectorragia crónica intermitente, geralmente no
final da defecação, ou observada no papel
higiénico, sugere doença hemorroidária.
A rectorragia associada a proctalgia após
esforço defecatório relaciona-se com a fissura
anal. Nos doentes submetidos a polipectomia
prévia, a rectorragia pode indicar uma
complicação tardia da técnica, com ponto de
Emissão de pus pelo ânus
A emissão de pus pelo ânus ocorre nas
doenças supurativas ano-rectais, nomeadamente no abcesso e na fístula anal. As fissuras
anais e as úlceras rectais também podem
infectar secundariamente e produzir descarga
147
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
FIGURA 2- ACTUAÇÃO PERANTE O DOENTE COM RECTORRAGIA
RECTORRAGIA
Anamese
Exame proctológico:
inspecção, toque rectal
e anuscopia
Sem sinais de alarme
Doença ano-rectal aguda
Alterações
parâmetros
coagulação
Tratamento
sintomático
Tratamento direccionado
à doença de base
Vitamina K, PFC, PLQ
Rever indicação ACO
Sinais de alarme:
>50 anos
História familiar CCR
Emagrecimento
Alt. recente hábitos
intestinais
Colonoscopia
total
CCR- CANCRO COLO-RECTAL; PFC- PLASMA FRESCO CONGELADO; PLQ- CONCENTRADO DE PLAQUETAS; ACO- ANTICOAGULAÇÃO ORAL
purulenta. Nas proctites ocorre emissão de
muco purulento (mucopus). Nos doentes com
doença de Crohn, a emissão de pus pelo ânus
deve levantar a suspeita de uma complicação
supurativa ano-rectal.
As principais causas de descarga anal
purulenta encontram-se descitas na Tabela 3.
cios fistulosos, abcessos e fissuras anais.
O toque rectal e anuscopia complementam a
observação, permitindo caracterizar melhor os
abcessos, nomeadamente abcessos retrofissurários, mostrar orifícios fistulosos internos,
úlceras rectais infectadas e proctites agudas.
Exames auxiliares de diagnóstico. A
colonoscopia com ileoscopia é importante na
suspeita de doença inflamatória do intestino.
Nas situações de fístulas e abcessos, a ecoendoscopia e a RMN pélvica permitem avaliar o
envolvimento da parede e definir o trajecto e
dimensão das lesões. Os parâmetros laboratoriais de infecção, sobretudo a contagem de
leucócitos e o valor da proteína C reactiva,
avaliam a repercussão sistémica do processo
inflamatório ou infeccioso. A colheita de
produtos para análise microbiológica pode
fazer-se por aspiração de pus, zaragatoa, lavado, escovado ou biopsia.
TABELA 3- CAUSAS DE DESCARGA ANAL PURULENTA
Fissura anal
Abcesso e Fístula anal
Proctite inflamatória ou infecciosa
Exame objectivo. Os sintomas de toxicidade sistémica como a febre, a taquicardia e a
leucocitose alertam para a gravidade da
infecção ano-rectal, que pode inclusivamente
evoluir para uma forma necrotizante, exigindo
tratamento cirúrgico agressivo imediato, internamento hospitalar e antibioterapia de largo
espectro. A inspecção permite identificar orifí148
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
II- PATOLOGIA ANO-RECTAL
AGUDA
sido advogada como melhor no alívio sintomático e correcção da doença hemorroidária
de base (13). A gravidade do quadro, história
de episódios prévios e ausência de comorbilidades deverão ser considerados na opção de
cirurgia precoce.
Trombose hemorroidária externa
As hemorróidas externas podem causar
dor aguda e intensa devida à formação de um
trombo intravascular. Ao exame objectivo é
visível um nódulo de cor púrpura, tenso e
doloroso. Nos casos mais graves, existe edema
associado. Pode ocorrer isquemia e necrose da
pele sobre o trombo, causando rectorragia de
sangue vermelho-vivo(1,13,14,15)
Tratamento. O tratamento nas 48 horas
iniciais consiste na remoção do coágulo após
anestesia local da pele(1,13,14,15). A taxa de
recorrência é elevada. O doente com tromboses recorrentes deve ser referenciado a
consulta de proctologia de modo a programar
um tratamento adequado da doença hemorroidária de base. A trombose hemorroidária
externa ocorre com frequência na gravidez,
devido ao aumento da volémia, ao aumento
de pressão intra-abdominal e ao relaxamento
do pavimento pélvico induzido por factores
hormonais. Na fase aguda e mais sintomática,
em que se observa um coágulo tenso, é seguro
efectuar a sua remoção por incisão da pele
após anestesia local(5,16).
Doença hemorroidária aguda
A doença hemorroidária geralmente causa
rectorragia crónica intermitente, mas também
se pode manifestar como uma hemorragia
aguda. Esta situação tem maior significado
clínico em doentes idosos, com doença cardiovascular associada, medicados com antiagregantes ou anticoagulantes, ou com outras
alterações da coagulação.
Tratamento. A gravidade da hemorragia e
o contexto clínico do doente vão determinar a
opção terapêutica. Pode ser necessário corrigir
alterações da coagulação previamente ao tratamento, de modo a aumentar a sua eficácia.
O tratamento instrumental é uma boa opção
nas hemorróidas do 1º, 2º e 3º graus, e nos
doentes com comorbilidades que aumentam
os riscos associados à cirurgia. A laqueação
elástica é o tratamento instrumental actualmente considerado de primeira linha na
doença hemorroidária sintomática(17,18).
Alternativamente, pode ser efectuada uma
injecção submucosa do pedículo hemorroidário com uma substância esclerosante, que
povoca trombose vascular e fibrose do tecido
conjuntivo ao redor(19); a eficácia e o controlo
a longo prazo dos sintomas parecem ser inferiores à laqueação elástica(18,20). Os métodos
de coagulação, seja por diatermia bipolar,
electroterapia de corrente directa ou
fotocoagulação com infra-vermelhos podem
ser usados nas hemorróidas do 1º, 2º e 3º
graus, são bem tolerados e têm poucas complicações. A coagulação com infra-vermelhos foi
estudada em ensaios randomizados, com taxas
de eficácia no controlo da hemorragia hemorroidária entre 67 e 96%(7,21). Comparativamente à laqueação e à esclerose, apresenta
menor taxa de complicações(18,19). A cirurgia é
o tratamento de escolha para os sintomas
Trombose hemorroidária interna
A trombose de hemorróidas internas pode
ocorrer no interior do canal anal, sendo o
diagnóstico efectuado pelo toque rectal e por
anuscopia. A trombose de uma hemorróida
interna prolapsada, por encarceramento, é
mais frequente e manifesta-se por dor aguda
intensa que impede a defecação. À inspecção
observa-se edema peritrombótico marcado,
que pode ser localizado ou circular, e que
causa irredutibilidade e encarceramento do
cordão hemorroidário (13).
Tratamento. O tratamento pode ser
inicialmente conservador, com repouso,
aplicação local de frio, analgesia, laxantes
suaves, venotrópicos e heparinóides tópicos.
A opção de terapêutica cirúrgica precoce
(<24 horas) sob antibioterapia sistémica tem
149
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
graves, refractários ou recorrentes, sobretudo
se existirem hemorróidas de 4º grau, com
prolapso irredutível(18,19). A ponderação dos
riscos e benefícios da terapêutica antiagregante e anticoagulante oral deve ser revista,
sobretudo nos indivíduos idosos com doença
hemorroidária sintomática.
ções de cronicidade. Os compostos mais
utilizados são o gliceril trinitrato (GNT)
tópico, dinitrato de isossorbido (DNI) tópico,
a nifedipina oral e tópica, o diltiazem tópico e
a toxina botulínica injectada localmente.
A aplicação de nitratos tópicos foi estudada na fissura anal aguda. Num ensaio controlado e randomizado publicado por Bacher(24),
utilizando pomada de gliceril trinitrato a 0.2%,
as taxas de cicatrização foram de 60% e 80%,
aos 14 dias e ao fim de 1 mês, respectivamente, bastante superiores às observadas nos
doentes que usaram gel de lidocaína.
O tratamento instrumental ou cirúrgico na
fissura aguda deve ser considerado se os
sintomas são muito intensos e intoleráveis, e
nos doentes com sintomas recorrentes.
A esclerose com polidocanol a 0,5%, álcool
a 70% ou quinina/ureia a 5%, injectados na base
da fissura após anestesia local, efectua uma
esfincterotomia química, estando especialmente
indicada nas fissuras recentes, superficiais e
dolorosas(25). A anestesia do esfíncter prévia à
esclerose diminui a hipertonia do esfíncter e,
portanto, alivia de imediato a proctalgia.
A utilização pelo doente de um dilatador
anal não mostrou eficácia num estudo controlado e randomizado publicado por Mc Donald
(26). A dilatação anal com balão pneumático
foi estudada apenas em doentes com fissura
anal crónica(27).
O tratamento cirúrgico consiste numa
esfincterotomia lateral interna, que resulta
numa elevada taxa de sucesso, superior a 93%
nas séries publicadas, com baixa recorrência.
Os resultados são díspares no que diz respeito
à taxa de incontinência pos-operatória,
variando entre 0% e 37,8%(7). Este aspecto
deve ser considerado na decisão terapêutica.
A comparação possível entre estas diferentes modalidades terapêuticas foi feita para
a fissura crónica por Nelson, numa metanálise
publicada em 2004(28), mas na fissura aguda
não dispomos de dados comparativos que
possam apoiar a decisão terapêutica, que se
mantém individualizada e muito dependente
da experiência do clínico.
Fissura anal
As fissuras anais são soluções de continuidade na anoderme, dispostas longitudinalmente desde a margem anal até à linha
denteada, habitualmente localizadas na linha
média, na comissura anterior (10%) ou posterior (90%). Manifestam-se por proctalgia
intensa durante a defecação, que se pode
prolongar por várias horas, e por rectorragia de
volume variável.
As fissuras associam-se frequentemente ao
traumatismo fecal por fezes duras com esforço
defecatório ou a períodos de diarreia com
múltiplas dejecções diárias.
As fissuras localizadas fora da linha média
exigem uma investigação adicional no sentido
de excluir doença inflamatória intestinal,
infecção pelo vírus da imunodeficiência
humana (VIH), outras infecções como tuberculose,
sífilis, por herpes ou vírus citomegálico, e neoplasias como a leucemia ou o carcinoma anal(7).
Tratamento. As fissuras agudas geralmente
são superficiais e, em cerca de metade dos
casos, respondem ao tratamento conservador
(1,22) com analgesia local e sistémica, higiene
local e aplicação de pomadas cicatrizantes.
A regularização do trânsito intestinal,
corrigindo a obstipação ou diarreia, é essencial
para a resolução da fissura(1).
Num ensaio randomizado efectuado por
Jensen(23), a associação de banhos de assento
com suplemento de 10 g de farelo bidiariamente permitiu uma taxa de cicatrização de
87,5% às 3 semanas, superior à observada com
pomada de lidocaína e conseguida mais
rapidamente que a pomada de hidrocortisona.
O tratamento farmacológico da fissura
anal tem por base o relaxamento do esfíncter
anal e tem sido estudado sobretudo nas situa150
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
Abcesso e fístula anal
O abcesso e a fístula anal correspondem a
fases diferentes de uma mesma lesão supurativa
da região ano-rectal. Inicialmente ocorre uma
colecção de pus com ponto de partida mais
frequente numa glândula anal, ou numa
solução de continuidade da parede ano-rectal,
seja fissura ou úlcera. Causas mais raras de
supuração ano-rectal estão descritas na Tabela
4. A fístula corresponde a uma fase ulterior de
drenagem do conteúdo purulento para a pele
perianal, dissecando vários planos na parede
ano-rectal. Parks(29) classificou as fístulas de
acordo com a sua relação com o esfíncter anal
em interesfinctéricas, transesfinctéricas,
supraesfinctéricas e extraesfinctéricas. As fístulas são denominadas complexas quando 1existe um elevado risco de incontinência com o
tratamento, 2- são anteriores numa mulher, 3têm múltiplos trajectos, 4- são recorrentes, e
quando se associam a 5- incontinência prévia,
6- radioterapia pélvica prévia ou 7- Doença de
Crohn (30).
O tratamento da fístula anal tem como
objectivos a resolução do processo séptico
local e a eliminação de trajectos epitelizados
associados, com o mínimo de lesão da função
esfincteriana. O tratamento é determinado
pela avaliação da gravidade e cronicidade da
fístula, pela experiência individual e do centro
hospitalar, e pelas comorbilidades associadas.
A doença de Crohn e a radioterapia prévia
associam-se a taxas de cicatrização mais
baixas. As fístulas simples podem ser tratadas
por fistulotomia ou por desbridamento do
trajecto seguido de aplicação de cola de fibrina.
Apesar de estarem descritas maiores taxas de
sucesso com a fistulotomia, a aplicação de cola
de fibrina é um procedimento seguro, que
pode ser repetido, e com risco pequeno ou
mesmo nulo de incontinência(30). As fístulas
complexas podem também ser tratadas com
desbridamento dos trajectos e aplicação de
cola de fibrina. A colocação de um seton
(material filiforme maleável, geralmente fio de
sutura não absorvível), ao longo do trajecto
fistuloso permite drenar o processo infeccioso,
facilita a cicatrização do trajecto e promove
uma fibrose dos tecidos ao redor. Os setons de
corte são gradualmente apertados, até
seccionarem os tecidos externos ao trajecto,
gradualmente fibrosados durante o processo.
Os setons de drenagem permitem uma fistulotomia em segundo tempo, após melhoria do
processo infeccioso. As taxas de recorrência
com a utilização de setons são inferiores a 8%,
mas os sintomas de incontinência são frequentes ao longo do seguimento, estando
descritos em mais de 50% dos doentes(30,31,32).
TABELA 4- OUTRAS CAUSAS DE ABCESSO E FÍSTULA
ANAL
Doença Inflamatória do Intestino
Tuberculose
Actinomicose
Linfogranuloma venéreo
Pelviperitonite
Corpos estranhos
Cirurgia
Episiotomia
Hemorroidectomia
Radioterapia
Carcinoma
Linfoma/ Leucemia
Traumatismo
Tratamento. Os abcessos perianais devem
ser tratados de imediato com incisão e
drenagem. O encerramento precoce pode
levar a recidiva, pelo que a incisão deve ser
adequada ao volume do abcesso; na fase inical,
podem ser colocados drenos ou setons(30). Nas
situações graves, sobretudo em doentes
imunocomprometidos, o internamento é conveniente. A antibioterapia deve ser associada
nos indivíduos diabéticos, imunocomprometidos, com celulite associada e com próteses
valvulares.
Infecções ano-rectais necrotizantes
Em alguns casos mais graves, o processo
supurativo ano-rectal evolui para uma sépsis
perineal que constitui uma emergência médica.
Tratamento. É necessária hospitalização e
tratamento imediatos, com desbridamento
cirúrgico extenso e antibioterapia sistémica.
A sépsis perineal pode ser uma complicação
rara de procedimentos terapêuticos proctológicos, instrumentais ou cirúrgicos.
151
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
Lesão de Dieulafoy
A lesão de Dieulafoy ano-rectal pode
causar hemorragia de grande volume com
ponto de partida numa artéria submucosa que
se superficializa e rompe após solução de
continuidade da mucosa sobrejacente.
Tratamento. A endoscopia permite, em
simultâneo, diagnosticar e tratar a hemorragia,
seja por injecção de adrenalina, injecção de
substância esclerosante, aplicação de hemoclips, coagulação com árgon plasma e electrocoagulação bipolar (BiCap). Nas hemorragias
de alto débito, em que a colonoscopia não é
possível ou não é diagnóstica, poder-se-á
recorrer à angiografia que, além de localizar a
fonte hemorrágica, permite executar terapêuticas como a embolização vascular ou a
infusão de vasoconstritores(9).
da em água, duas vezes por dia) parece ser
eficaz(11,35), apesar da experiência limitada.
Os enemas de ácidos gordos de cadeia curta
tiveram eficácia semelhante ao placebo
quando testados em estudos controlados(34).
Nos sintomas graves e refractários, as técnicas
endoscópicas estão indicadas, podendo utilizar-se coagulação com árgon plasma, laser
Nd:YAG, electrocoagulação bipolar (BiCap)
ou termocoagulação. A instilação rectal com
formalina a 4% tem sido usada com bons
resultados nos doentes com proctite rádica
hemorrágica refractária; no entanto, estão
descritos efeitos laterais significativos,
nomeadamente necrose do recto, formação de
fístulas e sépsis perineal(11,36).
O tratamento com oxigénio hiperbárico
pressupõe a criação de um gradiente de
oxigénio que estimula a angiogénese, diminuindo a isquemia na mucosa afectada. Numa
meta-análise recentemente publicada(37), o
tratamento com oxigénio hiperbárico obteve
bons resultados na proctite rádica, apesar de
os estudos disponíveis envolverem pequenos
grupos de doentes e serem metodologicamente
díspares.
Nos doentes com estenoses sintomáticas
secundárias à fibrose pode ser efectuada
dilatação por via endoscópica ou ressecção
cirúrgica do segmento afectado.
No quadro 1 estão descritas algumas das
causas de proctites infecciosas de transmissão
sexual, os métodos de diagnóstico e o tratamento recomendado.
Proctite aguda
A proctite corresponde a inflamação da
mucosa rectal, que pode ter causa idiopática,
infecciosa ou rádica.
A doença inflamatória intestinal pode
afectar a região ano-rectal, apresentando-se
como proctite, abcesso, ou fístula anal.
A proctite rádica pode ocorrer logo nas
primeiras semanas após o tratamento com
radioterapia, manifestando-se por diarreia,
tenesmo, urgência defecatória e rectorragia.
A forma crónica ocorre vários meses após o
término do tratamento, devido à fibrose,
atrofia e isquemia crónica da mucosa. Nesta
fase tardia, a diarreia, proctalgia e rectorragia
são os sintomas mais frequentes(33).
As proctites infecciosas podem ser causadas por agentes sexualmente transmitidos,
sejam vírus, bactérias ou protozoários. Estas
infecções assumem maior gravidade nos
doentes imunodeprimidos pela infecção VIH.
Tratamento. O tratamento da proctite
rádica depende da gravidade dos sintomas.
Os salicilados orais são pouco úteis isoladamente, podendo a sua eficácia ser aumentada
com a adição de metronidazol(34) ou de enemas
de corticóide(35). O tratamento com enemas
de sucralfato (20 ml de suspensão a 10% diluí-
Carcinoma anal
O carcinoma anal é uma patologia pouco
frequente, totalizando 1,6% das neoplasias do
tubo digestivo na população norte-americana
(38). Os sintomas podem surgir já em estadio
avançado e ser erradamente atribuídos a
doença ano-rectal benigna. Os sintomas mais
frequentes são a rectorragia (45%) e a dor
ano-rectal (30%). Cerca de metade dos
doentes têm ou já tiveram condilomas anais. É
mais frequente em homens na 6ª década de
vida e associa-se à transmissão sexual da
152
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
QUADRO 1- PROCTITES INFECCIOSAS DE TRANSMISSÃO SEXUAL (3)
CAUSA
Herpes
simplex
Vírus
citomegalico
Sífilis
Neisseria
gonorrhoeae
Chlamydia
trachomatis
Papiloma
virus
MANIFESTAÇÕES
CLÍNICAS
Vesículas e úlceras
perianais dolorosas,
tenesmo rectal
Úlceras perianais
Úlceras anais ou
perianais
assintomáticas
Rectorragias, fissuras,
fístulas
Proctite, mucopus
abundante, tenesmo
Nódulo anal ulcerado,
Proctite inespecífica,
adenopatia inguinal
Bom
Condiloma acuminado
Prurido, rectorragias,
mau odor, proctalgia
DIAGNÓSTICO
TRATAMENTO
PROGNÓSTICO
Cultura das vesículas
e/ou biopsia da
margem das úlceras
Biopsia do centro da
ulcera
Microscopia campo
escuro do exsudado
Serologia
Zaragatoa- ânus,
vagina, uretra,
faringe. Cultura em
Thayer-Martin
Cultura de biopsias
Esfregaço rectal
Serologia
Aciclovir p.o.
Foscarnet
Vidarabina
Ganciclovir IV- 21 dias
2ª linha- Foscarnet IV
Penicilina 2,4 MU IM
Tratamento não é
curativo
Serologias DST
Ganciclovir muito
eficaz
Bom
Tratar parceiros
Serologias DST
Bom
Serologias de
outras DST
Anuscopia e
rectossigmoidoscopia
ISH/ PCR do virus
Ceftriaxone 125 mg IM
(dose única)
Doxiciclina 2id- 21 dias
Bom
Serologias DST
Ácido bicloroacético
Podofilina, Excisão
Electrocauterização
Laser
Bom
Serologias DST
DST- DOENÇA SEXUALMENTE TRANSMITIDA; IV- INTRAVENOSO; IM- INTRAMUSCULAR; ISH- HIBRIDIZAÇÃO IN SITU. PCR- POLYMERASE CHAIN REACTION
infecção pelo papilomavírus humano, sobretudo tipo 16, 18, 45 e 46(10). Outros factores de
risco são o tabaco, a imunodepressão, pela
infecção VIH ou após transplantação, o sexo
anal receptivo com múltiplos parceiros e o
carcinoma do colo uterino (Tabela 5). Pode
manifestar-se como úlcera, pólipo, ou lesão
vegetante. O diagnóstico faz-se pela biopsia da
lesão durante a anuscopia. Histologicamente,
classifica-se como carcinoma epidermóide de
células escamosas (70-80% dos casos),
basalóide, cloacogénico ou de células transicionais (20-30%), mucoepidermóide (1-5%) e
anaplásico de pequenas células (<5%)(10).
O estadiamento é essencial, localmente com
ecoendoscopia, e à distância com TC
abdomino-pélvica e radiografia torácica.
Os indicadores de mau prognóstico são o
tamanho superior a 5 cm, tipo histológico
basalóide ou anaplásico, invasão do esfíncter
anal e metastização.
TABELA 5- FACTORES DE RISCO DE CARCINOMA ANAL
Idade superior a 50 anos
Tabagismo
Fístula anal
Sexo anal, múltiplos
parceiros
Condilomas genitais
Infecção por papilomavirus
humano- HPV 16
Infecção VIH
Imunossupressão
após transplante
Tratamento. As opções terapêuticas são a
ressecção cirúrgica, para os carcinomas da
margem anal, e a associação de radioterapia e
quimioterapia, com mitomicina e 5-fluoruracilo, para os carcinomas do canal anal
propriamente dito.
153
URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
Varizes rectais
As varizes rectais são uma complicação da
hipertensão portal presente em cerca de 45%
dos doentes com cirrose. Podem causar hemorragias maciças, agravadas pela coagulopatia e
pela trombocitopenia que acompanham a insuficiência hepática grave. As varizes do recto
distal podem ser difíceis de distinguir de hemorróidas; a ecoendoscopia tem utilidade no diagnóstico diferencial entre as duas situações(39).
Tratamento. A laqueação e esclerose por
via endoscópica, a embolização da veia
mesentérica inferior e a criação de shunt
porto-sistémico intra-hepático, cirúrgico ou
transjugular, são as opções terapêuticas, a
considerar de acordo com a gravidade da
hemorragia, o estado geral do doente e os
recursos técnicos disponíveis.
directa com o anuscópio. Nos objectos acima
da junção rectosigmoideia, tenta-se a remoção
com o colonoscópio ou com o rectossigmoidoscópio rígido; se não for possível, a laparotomia é o passo seguinte. A remoção de objectos
maiores deve ser sempre muito cuidadosa,
especialmente com os objectos de vidro. Se
ocorrer formação de vácuo durante a
extracção, podem ser inseridos cateteres de
Folley e insuflado ar proximalmente ao objecto.
Após a remoção bem sucedida, está indicada a
realização de rectossigmoidoscopia para observar a mucosa e confirmar que não ficaram
corpos estranhos residuais. Com excepção das
lesões superficiais da mucosa do recto, que
cicatrizam sem intervenção específica, as
lesões mais graves exigem profilaxia anti-tetânica e antibioterapia sistémica. A cirurgia
é necessária se não for possível retirar o corpo
estranho de outro modo, se houver sinais de
irritação peritoneal ou se um objecto de vidro
se partir durante a remoção. Nos casos mais
graves, sobretudo nos traumatismos não
iatrogénicos, é necessário efectuar colostomia
de derivação. A preservação do esfíncter anal
deve ser uma preocupação constante durante
o tratamento destes doentes.
Traumatismos ano-rectais
As lesões traumáticas do recto podem ser
iatrogénicas ou secundárias a acidentes de
viação ou a lesão penetrante por armas brancas
ou de fogo. Por vezes associam-se à presença de
corpos estranhos. Manifestam-se por dor pélvica ou perineal e hemorragia de sangue vivo pelo
ânus, no contexto de trauma ou de procedimentos endoscópicos ou cirúrgicos. O doente
pode sentir-se constrangido em admitir a
inserção anal de um corpo estranho, o que dificulta o diagnóstico. A anamnese em local com
privacidade e o exame objectivo abdominal e
ano-rectal permitem uma avaliação inicial da
gravidade da lesão, que deve ser complementada por radiografia abdominopélvica anteroposterior e de perfil.
Tratamento. Nas lesões secundárias a
procedimentos endoscópicos, o diagnóstico
geralmente é imediato; se existir pneumoperitoneu, a correcção da lesão é cirúrgica; caso
contrário, a pausa alimentar com antibioterapia de largo espectro pode ser suficiente(40).
Quando existem corpos estranhos, a sua
localização é fundamental para a decisão terapêutica. Até aos 10 cm da margem anal, a
remoção do corpo estranho é transanal, após
relaxamento do esfíncter anal, e sob visão
CONCLUSÕES
A dor anal, a rectorragia e a descarga anal
purulenta são sintomas frequentes nas
doenças ano-rectais agudas. A história clínica
e o exame objectivo cuidadoso com inspecção
do períneo, toque rectal e anuscopia,
permitem efectuar um diagnóstico correcto na
maioria dos casos, e seleccionar criteriosamente os exames auxiliares de diagnóstico,
quando necessários.
As opções terapêuticas disponíveis são cada
vez mais diversas, tendo em geral uma boa
eficácia no controlo dos sintomas a curto prazo,
e na resolução da doença a longo prazo. O
aparecimento de estudos comparativos entre
várias modalidades terapêuticas, permite cada
vez mais tomar decisões baseadas na evidência.
154
Sónia Fernandes e Adélia Rodrigues
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URGÊNCIAS EM PROCTOLOGIA
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156
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA
AGUDA
RUI CABRAL DE SOUSA
INTRODUÇÃO
conforme o intervalo de tempo decorrido
entre o aparecimento da icterícia e o da encefalopatia: hiperaguda (≤7 dias), aguda (8-28
dias) e subaguda (29-84 dias). No entanto, a
terminologia empregada não reflecte a
gravidade das várias classes, sendo que a
hiperaguda é aquela que apresenta, habitualmente, melhor prognóstico. De facto, mais
importante que o tempo, é, por exemplo, a
etiologia subjacente, conferindo maior ou
menor gravidade à doença.
A insuficiência hepática aguda é uma
situação grave, mas rara, em que a súbita deterioração da função hepática, num indivíduo
previamente saudável, resulta em encefalopatia, icterícia, coagulopatia e falência
multiorgânica. Nos Estados Unidos, surgem
cerca de 2000 casos/ano(1). Antigamente,
menos de 15% dos doentes sobreviviam;
actualmente, com o transplante hepático, a
sobrevida ultrapassa os 65%(2). Cerca de 6%
dos transplantes hepáticos em adultos são
motivados por insuficiência hepática aguda(3).
A definição de insuficiência hepática
aguda, aceite pela Associação Americana para
o Estudo das Doenças do Fígado (AASLD)
nas suas recomendações publicadas em 2005 (7),
requer evidência de coagulopatia, habitualmente INR >1.5 e encefalopatia. Outros
pressupostos são doença com menos de 26
semanas de evolução e ausência de cirrose
prévia. Casos de doença de Wilson, hepatite B
adquirida verticalmente e hepatite auto-imune,
podem ser incluídos, independentemente da
presença de cirrose, se diagnosticados há
menos de 26 semanas.
A raridade e natureza heterogénea deste
sindroma, com várias etiologias condicionando abordagens e prognósticos diferentes,
têm dificultado o seu estudo.
DEFINIÇÃO
Os termos insuficência hepática aguda e
insuficiência hepática fulminante têm sido
usados como sinónimos. Trey e Davidson(4)
descreveram, em 1968, um quadro de alteração do estado mental desencadeado menos de
8 semanas após o início de doença hepática,
em indivíduo, previamente, saudável.
Bernuau et al(5) sugeriram que o termo insuficiência hepática fulminante fosse reservado
para casos em que ocorresse encefalopatia
num prazo de 2 semanas. O’Grady et al(6)
redefiniram, em 1993, o conceito de insuficiência hepática aguda e propuseram 3 classes
AVALIAÇÃO INICIAL
Havendo suspeita, é importante confirmar
o diagnóstico e estabelecer um prognóstico,
rapidamente, para definir atitudes. A ida para
uma unidade de cuidados intensivos, para uma
unidade com centro de transplante ou colocação
do doente em lista de espera para transplante,
são decisões a tomar, logo que possível.
157
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
A história clínica deve ser, especialmente,
cuidadosa na identificação da causa provável.
Se o doente não estiver em condições de
fornecer dados, estes podem ser procurados
junto de quem lhe seja próximo. O exame
objectivo inclui, necessariamente, avaliação
do estado mental e pesquisa de sinais de
doença hepática crónica, já que a presença de
cirrose implica uma abordagem diferente.
A icterícia, embora frequente, nem sempre
existe. A presença de encefalopatia é condição
necessária para o diagnóstico.
A insuficiência hepática aguda leva, frequentemente, a falência multi-orgânica. Os
primeiros sintomas costumam ser inespecíficos:
fadiga, mal estar, anorexia, náusea, dor abdominal, febre ou icterícia(8). Uma coagulopatia
severa precede, muitas vezes, a evolução da
encafalopatia hepática para coma.
A
avaliação
laboratorial
inicial
(QUADRO 1) pretende contribuir para o
esclarecimento da etiologia e determinação do
prognóstico.
De acordo com as recomendações da
AASLD(7): 1. doentes com insuficiência hepática aguda devem ser internados e monitorizados, de preferência, numa unidade de cuida-
QUADRO 1. AVALIAÇÃO LABORATORIAL INICIAL
Tempo Protrombina/INR
Bioquímica
sódio, potássio, cloro, bicarbonato, cálcio, magnésio, fósforo,
glucose
transaminases, fosfatase alcalina, ϒGT, bilirrubina total, albumina,
creatinina, ureia
Gasimetria arterial
Lactato arterial
Hemograma
Tipagem sangue
Doseamento sérico de paracetamol
Investigação tóxicos
Serologia hepatites virais
anti-HAV IgM, HBSAg, anti-HBc IgM, anti-HEV§, anti-HCV*
Ceruloplasmina#
Teste gravidez (sexo feminino)
Amónia (arterial se possível)
Marcadores autoimunidade
ANA, ASMA, imunoglobulinas
HIV‡
Amilase e lipase
*Para diagnóstico de infecção subjacente.
#Só se doença de Wilson for provável (por exemplo: em doentes com menos de 40 anos, sem outra explicação óbvia
para insuficiência hepática aguda); neste caso, pedir doseamento de ácido úrico e realizar índice biirrubina total/fosfatase alcalina.
‡Implicações para potencial transplante hepático.
§Se houver indicação clínica.
Traduzido de referência 7: Polson J, Lee WM. AASLD Position paper: the management of acute liver failure. Hepatology 2005;5:1179-1197
158
Rui Sousa
mais recentes (2), identificam o paracetamol
como a causa mais comum (cerca de 40% dos
casos). No Reino Unido, o paracetamol está
implicado em 50 a 70% das situações de insuficiência hepática aguda(12,13). A ingestão
voluntária predomina na Europa, contrariamente ao que acontece nos Estados Unidos
em que prevalece a intoxicação involuntária.
dos intensivos; 2. contactos com um centro de
transplante e planos para transferir doentes
com pior prognóstico devem ser estabelecidos o
mais cedo possível; 3. descobrir a causa precisa
da insuficiência hepática aguda é importante
para definir as atitudes subsequentes.
ETIOLOGIA E TERAPÊUTICAS
ESPECÍFICAS
Cerca de 17% dos casos de insuficiência
hepática aguda são de causa indeterminada.
Incluem-se, aqui, provavelmente, doentes
com hepatite viral não diagnosticada, hepatotóxicos não reconhecidos (auto-medicação,
drogas e medicamentos “alternativos”) e
doenças metabólicas e genéticas (mais na
população pediátrica)(2).
A etiologia da insuficiência hepática aguda
é heterogénea (QUADRO 2) e varia consoante a época e a localização geográfica
(QUADRO 3). Causas comuns, no ocidente,
são a intoxicação (voluntária ou não) com
paracetamol e com outras drogas, enquanto
que a hepatite viral tem cada vez menos peso
(9). Na Índia, a hepatite viral (B e E) é responsável por cerca de 60% dos casos (10).
Nos Estados Unidos, séries publicadas nos
anos oitenta, mostravam a hepatite viral como
etiologia mais frequente(11), mas, trabalhos
Num estudo prospectivo publicado em
2002 nos Estados Unidos, Ostapowicz et al(2)
compararam alguns dados clínicos e laboratoriais em diferentes etiologias de insuficiência
QUADRO 2. ETIOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
A.
B.
C.
D.
E.
F.
Viral
HVA, HVB, HVD, HVE, VHS, CMV, VEB, VHVZ, adenovírus, febres hemorrágicas
Fármacos e Toxinas
• Dose-dependente: paracetamol, CCl4, fósforo amarelo, Amanita phalloides, Bacilluscereus, sulfonamidas, tetraciclina, ecstasy, med. tradicional
• Idiossincrático: halotano, INH, rifampicina, ácido valproico, AINEs, disulfiram
Vascular
Insuficiência cardíaca direita, Budd-Chiari, doença veno-oclusiva, choque (hepatite isquémica),
golpe de calor
Metabólica
Fígado gordo agudo da gravidez, doença de Wilson, sindroma de Reye, galactosemia, intolerância
hereditária frutose, tirosinemia
Variada
Infiltração maligna (metastases hepáticas, linfoma), hepatite autoimune, sepsis
Indeterminada
Abreviaturas: HVA, hepatite viral A; HVB, hepatite viral B; HVD, hepatite viral D; HVE, hepatite viral E; VHS,
vírus herpes simplex; CMV, citomegalovírus; VEB, vírus Epstein-Barr; VHVZ, vírus herpes varicela zoster; CCl4, tetracloreto de carbono; INH, isoniazida; AINEs, anti-inflamatórios não esteroides.
Traduzido de referência 127: Sass DA, Shakil AO. Fulminant Hepatic Failure. Liver Transpl 2005;6:594-605
159
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
QUADRO 3. ETIOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA HEPATICA AGUDA ATRAVÉS DO MUNDO
Argentina
1996-2001
Dinamarca
1973-1990
França
1972-1990
India
1987-1993
Japão
1992-1999
R.Unido
1993-1994
Paracetamol
HVA
HVB
Tóxicos
Choque
Indeter
Outras
0
8
22
14
0
25
31
19
2
31
17
3
15
13
2
4
32
17
?
18
27
0
2
31
5
0
0
62
0
3
18
0
0
71
8
73
2
2
2
3
8
9
Abreviaturas: HVA, hepatite viral A; HVB, hepatite viral B; Indeter, indeterminada.
Traduzido de referência 9: Ostapowicz G, Lee WM. Acute hepatic failure: a western perspective. J Gastroenterol Hepatol 2000;15:480-488
Paracetamol
hepática aguda. O grupo de doentes cuja
causa era o paracetamol tinham evolução mais
rápida, transaminases mais altas, mas taxa de
transplante mais baixa com sobrevivência sem
transplante mais elevada (QUADRO 4).
A toxicidade do paracetamol é dosedependente. Os casos de insuficiência hepática aguda são provocados, habitualmente, por
doses superiores a 10g/dia; há, no entanto,
QUADRO 4. COMPARAÇÃO DE ALGUNS DADOS CLÍNICOS E LABORATORIAIS NA INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA
AGUDA CAUSADA POR PARACETAMOL E OUTRAS ETIOLOGIAS
Sexo (% feminino)
Idade (anos)
Icterícia –encefalopatia (dias)
Coma III/IV (%)
ALT
Bilirrubina total
Tx (%)
Sobrevivência espontânea (%)
Sobrevivência total (%)
Paracetamol
n=120
79
36
1
50
4310
4.3
6
68
73
Tóxicos
n=40
73
41
12
43
574
20.2
53
25
70
Indeterminada
n=53
60
38
12
47
947
24.5
51
17
64
Outros
n=95
72
43
4
47
1060
12.6
36
33
61
p
NS
0.02
<0.001
NS
<0.001
<0.001
<0.001
<0.001
NS
Abreviaturas: ALT, alanina transferase; Tx, transplante.
Traduzido de referência 2: Ostapowicz GA, Fontana RJ, Schiodt FV, Larson A, Davern TJ, Han SH, et al. Results of a prospective study of acute liver
failure at 17 tertiary care centers in the United States. Ann Intern Med 2002;137:947-954
160
Rui Sousa
situações descritas com 3-4g/dia(14). A dose
hepatotóxica, geralmente aceite, é de
150mg/kg de peso mas está sujeita a grandes
variações(15).
insuficiência hepática aguda grave com taxas
de mortalidade muito elevadas, se o doente não
for transplantado(26), embora, trabalho mais
recente, apresente melhores resultados, apenas
com tratamento médico intensivo(27).
O diagnóstico de intoxicação com amanita
passa pela história de consumo de cogumelos
selvagens, identificação (se possível) das espécies ingeridas e quadro clínico típico. Este,
apresenta um período de latência longo, de 6 a
18 horas, uma fase gastrointestinal (com
náuseas, vómitos, dor abdominal e diarreia) e
manifestações tardias decorrentes da falência
hepática e eventual insuficiência renal.
A toxicidade hepática da amanita deve-se ás
amatoxinas que são termo-estáveis e
resistentes à secagem e armazenamento; existe
um caso descrito de intoxicação fatal com
cogumelos conservados há mais de 7 meses(28).
As toxinas podem pesquisar-se nos restos
alimentares, plasma, urina e fezes.
Segundo Floersheim(29), de entre os casos
de falência hepática por amanita, têm pior
prognóstico os ocorridos em crianças com
menos de 10 anos, aqueles em que o período
de latência é menor e os que apresentam taxa
de protrombina mais baixa (<10%).
O antídoto para o paracetamol é a N-acetilcisteína (NAC). O tratamento deve ser o
mais precoce possível. Se administrada até 12
horas após a ingestão, tem uma eficácia, praticamente, total(16). Pode ser útil, no entanto,
até mais de 48 horas depois(17). Vários estudos
mostram a sua eficácia e segurança(18,19,20).
Há, todavia, registo de efeitos secundários
graves, principalmente, do tipo alérgico(21).
A administração de NAC está recomendada
na insuficiência hepática aguda em que há
suspeita de intoxicação com paracetamol ou
nas situações em que não é possível determinar a sua causa.
Segundo as recomendações da AASLD(7) a
NAC pode ser dada por via oral ou sonda nasogástrica, diluída, numa dose inicial de
140mg/kg seguida de 70mg/kg cada 4 horas (17
vezes). Se necessária a via endovenosa, iniciar
com 150mg/kg, numa solução de dextrose a
5%, durante 15 minutos e continuar com
50mg/kg em 4 horas e 100mg/kg mais 16 horas.
O tratamento deve ser agressivo se a suspeita de ingesta é grande. Nas primeiras
horas pode-se tentar a indução do vómito
e/ou lavagem gástrica, a catarse com sulfato
de magnésio e a administração de carvão
activado. Se se confirmar a intoxicação com
amanita, o doente deve ser internado em
unidade de cuidados intensivos, considerando-se, fortemente, a sua inclusão em
lista para transplante. Existem, porém,
terapêuticas específicas, com eficácia mais
ou menos discutível; destas, destacamos, por
apresentarem melhores resultados, os tratamentos com silibinina e com penicilina G;
ambos constam das recomendações da
AASLD(7).
Carvão activado, se administrado nas
primeiras 3 a 4 horas após a ingestão de paracetamol, pode ser benéfico(22).
O reconhecimento da importância do
paracetamol como principal causa de insuficiência hepática aguda, levou a que, em alguns
países como o Reino Unido e a França, se
tomassem medidas para limitar a sua disponibilidade em termos de forma de apresentação,
com bons resultados aparentes(23,24,25).
Cogumelos
Entre as mais de 5000 espécies de cogumelos existentes, 50 a 100 são venenosas e a sua
identificação é, por vezes, difícil. A ingestão de
Amanita phalloides causa, habitualmente,
161
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
Fármacos
Anel de Kayser-Fleischer está presente em
cerca de 50% dos casos(37).
A investigação etiológica de uma insuficiência hepática aguda inclui, obrigatoriamente, a listagem dos fármacos ingeridos,
potencialmente hepatotóxicos. A grande
maioria dos casos ocorre nos primeiros seis
meses após o início da toma. Não esquecer,
nunca, os preparados das hervanárias e os
suplementos nutricionais(30).
Ceruloplasmina sérica está, tipicamente,
baixa mas pode ser normal em mais de 15%
das situações. Cobre sérico, urinário ou hepático elevados podem levar ao diagnóstico.
Não está indicado o tratamento com penicilamina (37).
O doente deve ser colocado em lista para
transplante urgente(37).
Hepatite Viral
Devem-se, sempre, pedir os marcadores de
hepatite viral, mesmo que haja outra causa
provável de insuficiência hepática aguda. Não
esquecer a hepatite D e hepatite E, caso haja
história compatível. Embora objecto de
controvérsia, a hepatite aguda C não parece
provocar insuficiência hepática aguda(2,31).
Hepatite Auto-Imune
Os auto-anticorpos podem ser negativos
tornando o diagnóstico difícil; considerar
realização de biópsia hepática.
Embora, alguns doentes respondam a corticoterapia, outros necessitam de transplante
(39,40). Recomenda-se colocação em lista de
espera para transplante(7).
Considerar tratamento da hepatite aguda B
com lamivudina, mesmo não havendo estudos
conclusivos a esse respeito(32). Doentes com
AgHBs positivo e submetidos a quimioterapia
ou terapêutica com imunossupressores, devem
ser tratados com lamivudina (ou similar) até 6
meses depois, para prevenir agudização(33).
Fígado Gordo Agudo da Gravidez e
Sindroma HELLP (Hemolysis, Elevated Liver
enzymes, Low Platelets)
Se a causa de insuficiência hepática aguda
for herpes virus ou varicela zoster, recomenda-se o tratamento com aciclovir(34-36).
Na presença de insuficiência hepática
aguda por fígado gordo agudo da gravidez ou
sindroma HELLP, a grávida deve ser transferida para uma unidade de saúde com apoio
multidisciplinar e intensivo nas áreas materno-infantil, de preferência com ligação a centro
de transplante (que pode ser necessário em
alguns casos). O parto deve ser desencadeado
logo que possível(7,41,42).
Doença de Wilson
A doença de Wilson é uma causa rara de
insuficiência hepática aguda. No entanto, é
importante o seu diagnóstico porque, não
havendo transplante, o desfecho é, quase
sempre, fatal.
Sindroma de Budd-Chiari
A história típica é a de um jovem com anemia
hemolítica e bilirrubina >20mg/dL (componente
indirecta muito elevada). Fosfatase alcalina baixa
com um indíce bilirrubina total (mg/dL)/fosfatase
alcalina (UI/L) >2 é, também, indicador de
provável doença de Wilson(37,38).
O sindroma de Budd-Chiari pode associar-se a insuficiência hepática aguda. O quadro
clínico típico é de dor abdominal, hepatomegalia e ascite.
Se confirmado o diagnóstico, houver falência hepática grave e for excluida doença
162
Rui Sousa
maligna subjacente, o transplante hepático
deve ser considerado(43).
hidro-electrolítico, parâmetros hemodinâmicos, metabólicos, nutricionais e de coagulação,
bem como vigilância e tratamento imediato de
infeccção e hemorragia digestiva(7).
Etiologia Indeterminada
Se a causa de insuficiência hepática aguda
permanecer desconhecida após a avaliação
inicial, deve ser realizada biópsia hepática(7).
Considerações Específicas
Sistema Nervoso Central
AVALIAÇÃO CLÍNICA E
TRATAMENTO
O edema cerebral e a hipertensão intracraneana são, desde há muito, reconhecidos
como as principais complicações da insuficiência hepática aguda(45) e causa de morte mais,
frequentemente, identificada em autópsias(46).
Considerações Gerais
A sobrevivência global dos doentes com
insuficiência hepática aguda, particularmente,
daqueles não transplantados, tem aumentado
ao longo dos últimos 10 anos, sugerindo tratamento médico mais eficaz(2,44).
A encefalopatia pode traduzir-se, clinicamente, de várias formas, desde pequenas
alterações de comportamento até ao coma
profundo. A classificação sugerida por Trey e
Davidson (QUADRO 5)(47), tem-se provado
útil ao longo dos anos, sendo a probabilidade
de edema cerebral directamente proporcional
ao grau de encefalopatia determinado; o
prognóstico é inversamente proporcional.
Todos os doentes com falência hepática
aguda (com encefalopatia) devem ser internados numa unidade de cuidados intensivos(7).
Há que prestar atenção especial ao balanço
QUADRO 5. ESTADIAMENTO DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
Grau
I
II
III
IV
Estado Mental
Euforia; ocasionalmente
depressão; confusão ligeira;
lentidão de raciocínio;
alterações do afecto;
desleixo; fala arrastada;
alteração do ritmo do sono
Agravamento das alterações do grau I;
sonolência;
comportamento inadequado;
mantem controlo esfincteres
Dorme a maior parte do tempo
mas acorda-se facilmente;
discurso incoerente;
confusão marcada
Não se consegue acordar;
responde ou não a
estímulos dolorosos
Tremor
Ligeiro
EEG
Geralmente normal
Presente
Anormal (lento)
Presente
Sempre anormal
Ausente
Sempre anormal
Adaptado de referência 47: Trey C, Davidson CS. The management of fulminant hepatic failure. In: Popper H, Shaffner F, eds. Progress in liver diseases,
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163
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
Com base nesta classificação foi possível, também, estabelecer uma estratégia assistencial
que consta nas recomendações da AASLD(7)
já citadas (QUADRO 6).
provocar isquémia. O balanço torna-se, quase
sempre, difícil.
O uso de aparelhos para monitorizar a
pressão intracraneana (e a pressão de perfusão
cerebral, ou seja, a tensão arterial média menos
a pressão intracraneana), tem sido objecto de
discussão. A colocação de sensores intracraneanos, em doentes graves, com coagulopatia severa, apresenta riscos, nomeadamente,
de hemorragia e infecção. Vários artigos têm,
porém, defendido o seu uso(49-52). O risco de
hemorragia pode, eventualmente, ser reduzido
com a administração de factor VII recombinante activado(53-54). Uma pressão de perfusão
cerebral muito reduzida contraindica o
transplante(1,50) ou não(55) conforme os estudos.
Nos Estados Unidos, país onde a monitorização
da pressão intracraneana tem sido mais utilizada, um trabalho, prospectivo, publicado
recentemente(56), diz-nos que 28% dos doentes
(de 24 centros – ALF Study Group) com insuficiência hepática aguda e encefalopatia grave
foram submetidos a monitorização da pressão
intracraneana; a sua utilização estava, forte-
O edema cerebral e subsequente hipertensão intracraneana, podem ser reconhecidos, sob
o ponto de vista clínico, pelo aparecimento de
hipertensão arterial sistémica, bradicárdia e
respiração irregular (tríade de Cushing) ou,
ainda, rigidez em descerebração, movimentos
oculares desconjugados ou perda de reflexos
pupilares. No entanto, não é possível monitorizar,
de forma fiável e precisa, apenas com base em
sinais clínicos, a pressão intracraneana.
Na insuficiência hepática aguda, o fluxo
sanguíneo cerebral encontra-se, ao contrário
do que acontece normalmente, algo desregulado(48). Doentes que desenvolvem aumento
da pressão intracraneana tendem a ter um
fluxo sanguíneo cerebral aumentado; mas, por
outro lado, uma diminuição da pressão arterial
sistémica pode condicionar uma redução não
controlada do fluxo sanguíneo cerebral e
QUADRO 6. TRATAMENTO DA INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA - SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Edema Cerebral / Hipertensão Intracraneana
• Encefalopatia Grau I/II
Considerar transferência para unidade com centro de transplante e colocação em lista de espera
para transplante hepático.
TAC crâneo-encefálica: para excluir outras causas de deterioração mental; pouca utilidade na
identificação de edema cerebral.
Evitar estimulação; evitar sedação, se possível
Antibióticos: vigilância e tratamento de infecções; profilaxia, provavelmente, útil.
Lactulose: possivelmente, útil
• Encefalopatia Grau III/IV
Continuar estratégia acima listada
Intubação endotraqueal (pode exigir sedação)
Elevar cabeceira da cama.
Considerar colocação de sistema de monitorização da pressão intracraneana
Tratamento imediato de convulsões; profilaxia de valor duvidoso.
Manitol: usar se aumento importante da pressão intracraneana ou primeiros sinais de herniação.
Hiperventilação: efeito de curta duração ; tentar se herniação iminente.
Traduzido de referência 7: Polson J, Lee WM. AASLD Position Paper: The Management of Acute Liver Failure. Hepatology 2005;5:1179-1197
164
Rui Sousa
mente, associada a indicação para transplante;
em 10,3% de um subgrupo de doentes
monitorizados, houve hemorragia intracraneana; a sobrevivência, trinta dias após o
transplante, foi semelhante, quer tenha havido
monitorização ou não.
Infecção
Infecções, principalmente, respiratórias e
do tracto urinário, desenvolvem-se em cerca
de 80% dos casos e bacteriémia está presente
em 20-25% dos doentes com insuficiência
hepática aguda(68-69). Infecções a fungos,
especialmente a Candida Albicans, ocorrem
em até um terço dos doentes com factores de
risco, como insuficência renal e antibioterapia
prolongada(70); são um factor de mau prognóstico associado a alta mortalidade e, frequentemente, impedem o transplante.
Manitol é eficaz, a curto prazo, na redução
do edema cerebral(57) aumentando a sobrevida(58). Porém, a administração profilática
não está indicada(7).
Hiperventilação reduz a PaCO2 provocando vasoconstrição e, consequentemente,
redução do fluxo sanguíneo cerebral(59). O seu
uso, benéfico em casos seleccionados, deve ser
restrito pelo perigo de isquémia cerebral(60).
Não há indicação para hiperventilação
profilática(7).
De acordo com as recomendações da
AASLD(7), o uso profilático de antibióticos e
de antifúngicos é de admitir, embora não
existam estudos que demonstrem, claramente,
o seu benefício. Dever-se-á instituir um
esquema de vigilância apertado, incluindo
colheita de expectoração, urina e sangue para
culturas, permitindo a detecção rápida da
infecção e tratamento dirigido.
Barbitúricos podem ser utilizados na
redução da pressão intracraneana, quando as
outras medidas falham(7). Há, no entanto,
quem prefira o propofol, devido à sua semivida mais curta, permitindo, mais facilmente,
um controlo do estado mental do doente(61).
Coagulopatia
A indução e manutenção de hipernatrémia (administração de cloreto de sódio
hipertónico a 30%) parece reduzir a incidência
e severidade da hipertensão intracraneana em
doentes com insuficiência hepática aguda(62).
Na insuficiência hepática aguda existe
uma diminuição da síntese de vários factores
de coagulação e alguns inibidores da coagulação e fibrinólise(71). Existe disfunção plaquetária (qualitativa e quantitativa) e consumo de
factores ligados à coagulação.
Segundo um trabalho(63), o uso profilático
de fenitoína, em doentes com encefalopatia
grau III ou IV, reduz a actividade epiléptica e
demonstra segurança.
Transfundir plaquetas se a) hemorragia ou
técnicas invasivas e menos de 50.000 plaquetas ou b) profilacticamente se menos de
10.000 a 20.000 plaquetas(72).
Hipotermia moderada (32-34ºC) pode
prevenir ou moderar os efeitos da hipertensão
intracraneana em doentes com insuficiência
hepática aguda. Jalan e colaboradores têm
conseguido bons resultados utilizando a
hipotermia em doentes à espera de transplante
(64-66). Eventuais efeitos indesejáveis são o
aumento do risco de infecção, agravamento da
coagulopatia e arritmias cardíacas(67).
Para além do risco associado à transfusão
de hemoderivados, o uso de plasma limita o
valor dos parâmetros de coagulação na avaliação da doença e pode contribuir para uma
sobrecarga hídrica que agrave a hipertensão
intracraneana (7).
O uso de factor VII recombinante activado
pode ser útil na realização de técnicas invasivas, principalmente, em doentes com insufi165
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
hepática aguda(77). A etiologia é multifactorial
e inclui sindroma hepato-renal, toxicidade
directa de fármacos ou toxinas, hipovolémia e
sépsis. A ocorrência de sindroma hepato-renal
é um sinal de mau prognóstico e está associada
a mortalidade de 50-100%(78).
ciência renal, nos quais a preocupação com
sobrecargas hídricas é maior(53).
Hemorragia Digestiva
Doentes com insuficiência hepática aguda,
devem receber terapêutica profilática de lesões
associadas ao stress, com bloqueadores H2 ou
inibidores da bomba de protões (ou sucralfate
em segunda linha)(7).
A primeira medida que deve ser tomada é
evitar e corrigir os factores etiológicos envolvidos. Quando a diálise for indispensável, esta,
deve ser contínua e não intermitente, favorecendo, assim, a estabilidade cardio-vascular e
o controlo da pressão intracraneana(79).
Alterações Hemodinâmicas
Na insuficiência hepática aguda existe,
caracteristicamente, uma vasodilatação sistémica com hipotensão e aumento, compensatório, do débito cardíaco. Há, também,
utilização inadequada de oxigénio pelos
tecidos, resultando em hipóxia tecidular e
acidose láctica(73).
A administração prévia de N-acetilcisteína
pode proteger a função renal, se houver necessidade de efectuar exames com contraste(80-82).
Alterações Metabólicas
Hipoglicémia surge em mais de 45% dos
doentes. Deve-se a alterações na glicogenólise, neoglicogénese e metabolismo da
insulina decorrentes da falência hepática(83).
Deve ser dada a maior importância à
manutenção do equilíbrio hemodinâmico.
O tratamento de reposição hídrica deve privilegiar os colóides (como a albumina) em vez
dos cristalóides(7). Cateterização da artéria
pulmonar deve considerar-se em doentes mais
instáveis(7). Quando a administração de
fluídos não é suficiente para manter a tensão
arterial em valores aceitáveis, tem-se recorrido
a vários agentes farmacológicos como a
adrenalina ou noradrenalina (que, todavia,
parecem agravar a libertação periférica de
oxigénio(74)), dopamina, com resultados
encorajadores(75), ou, ainda, a vasopressina,
terlipressina e octreótido, com credenciais no
tratamento da doença hepática crónica, mas
resultados desapontantes na insuficiência
hepática aguda; num estudo com seis doentes,
a administração de terlipressina em dose baixa
não teve qualquer efeito sistémico mas provocou hipertensão intracraneana grave(76).
Os valores do fósforo, potássio e magnésio
estão, frequentementes, baixos e merecem,
também, atenção.
A nutrição é importante. A alimentação
entérica deve ser iniciada o mais precocemente possível. Evitar restrições proteicas
severas; 60g/dia é razoável na maior parte dos
casos. Os preparados com aminoácidos de
cadeia ramificada não revelaram ser superiores
aos convencionais(84).
“Staff”
O desfecho final parece estar dependente
dos padrões assistenciais oferecidos. Unidades
de cuidados intensivos com equipas experientes neste tipo de patologia, bem treinadas e
bem equipadas tendem a obter melhores
resultados(85).
Insuficiência Renal
Desenvolve-se insuficiência renal em
cerca de 55% dos doentes com insuficiência
166
Rui Sousa
TRANSPLANTE E PROGNÓSTICO
níveis baixos de factor V, idade, grau elevado
de encefalopatia, α feto-proteína baixa e
ausência de Ag HBs; por exemplo, há
indicação para transplante se encefalopatia
grau III ou IV e: a) factor V menor que 20% e
idade menor que 30 anos ou b) factor V menor
que 30% e idade superior a 30 anos(86).
O transplante hepático melhorou, drasticamente, a sobrevivência dos doentes com
insuficiência hepática aguda, de 15% para
mais de 60%(2). No entanto, esta melhoria não
se ficou só a dever ao transplante; a sobrevivência espontânea (sem necessidade de
transplante) é, agora, de 40%(2).
Num artigo publicado em 1989, O’Grady
et al. do King’s College Hospital, em
Londres(13), estudaram múltiplas variáveis
clínicas e bioquímicas e a sua relação com a
mortalidade em 588 doentes com insuficiência
hepática aguda, definindo, assim, critérios
para transplante. Começaram por dividir os
doentes em dois grupos segundo a etiologia:
paracetamol ou outra; depois, determinaram
outros factores: taxa protrombina, nível de
encefalopatia, idade, etiologia, níveis de
bilirrubina total, tempo desde icterícia até
encefalopatia, creatinina sérica e pH arterial
(QUADRO 7). Os critérios para transplante
do King’s College tornaram-se uma referência
e padrão com o qual outros métodos são,
habitualmente, comparados. Foram validados
por vários trabalhos(8,12,88-91), especialmente
no grupo do paracetamol (92,93), tendo-se revelado excelentes na definição dos doentes que
vão evoluir mal, mas, relativamente incapazes
de predizer os que vão evoluir bem (8,12,93).
Nos Estados Unidos, 29% dos doentes com
insuficiência hepática aguda foram submetidos
a transplante(2); 80 a 90% destes sobreviveram, confirmando, assim, dados anteriores(2,51).
O problema é que, nessa mesma série, 1/4 dos
doentes morreram à espera de um fígado(2);
noutros trabalhos, os números são, ainda
piores, atingindo-se 40% de mortes em lista de
espera para transplante(86,87).
As escassez de orgãos, os riscos da cirurgia
e da imunossupressão, obrigam a uma selecção
rigorosa dos doentes que beneficiam de
transplante.
Em 1986, um grupo francês, investigou
factores de prognóstico em 115 doentes com
insuficiência hepática aguda relacionada com
o vírus da hepatite B(5). Estes factores,
conhecidos como critérios de Clichy, incluem
QUADRO 7. CRITÉRIOS PARA TRANSPLANTE HEPÁTICO DO KING’S COLLEGE
Paracetamol
a) pH<7.3
(qualquer que seja o grau de encefalopatia)
b) OU todos os 3 seguintes:
Encefalopatia grau III/IV
Não paracetamol
a) TP>100 segundos (INR>6.5)
(qualquer que seja o grau de encefalopatia)
b) OU todos os 3 seguintes:
Idade <10 anos ou >40 anos
Etiologia (hepatite não A e não B,
halotano, tóxicos, doença de Wilson)
Icterícia – Encefalopatia >7dias
TP>50 segundos (INR>3.5)
Bilirrubina sérica>300μmol/L (17.5mg/dL)
TP>100 segundos (INR>6.5)
Creatinina sérica>300μmol/L (3.4mg/dL)
Abreviaturas: TP, tempo de protrombina; INR, international normalized ratio.
Traduzido de referência 13: O’Grady JG, Alexander GJM, Hayllar KM, Williams R. Early indicators of prognosis in fulminant hepatic failure.
Gastroenterology 1989;97:439-455.
167
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
O MELD (Model End-stage Liver Disease)
score foi criado, inicialmente, para avaliar a
sobrevida de doentes com TIPS (Transjugular
Intrahepatic Porto-systemic Shunt)(94). É utilizado, hoje, no escalonamento de doentes
com doença hepática crónica para transplante(95). Usa 3 parâmetros bioquímicos
numa fórmula logarítmica: bilirrubina total,
tempo de protrombina e creatinina sérica. Este
esquema parece ser bastante útil, principalmente, nos doentes cuja causa de insuficiência
hepática aguda não é o paracetamol(96).
Segundo um estudo recente, é melhor que os
critérios de Clichy ou do King’s College para a
insuficiência hepática aguda, particularmente,
naquela que não está associada a fármacos(97).
autores proposto a adição do lactato aos
critérios do King’s College, com o objectivo de
aumentar a sensibilidade e a rapidez na identificação dos doentes a transplantar; o fósforo:
eficácia semelhante aos critérios do King’s
College em doença causada por paracetamol(105).
Os factores chave da evolução após transplante são: a gravidade do estado clínico pré
transplante e a natureza do “graft”(106). Numa
revisão de 100 transplantes por insuficiência
hepática aguda, efectuada no King’s College
Hospital(107), o factor predictivo de sobrevivência mais importante foi a gravidade da
falência multiorgânica. As principais causas de
morte após transplante são sepsis e falência
multiorgânica(108-110). De acordo com Farmer
et al(110), factores determinantes, para mortalidade após transplante, são raça não branca do
receptor, idade superior a 50 anos do receptor e
índice de massa corporal do dador maior que
35. Um estudo recente(111) indica 4 factores de
risco que, se presentes, em simultâneo, prognosticam uma taxa de sobrevivência aos 5 anos,
após transplante, inferior a 50%: idade superior
a 50 anos, índice de massa corporal maior que
29, necessidade de utilização de suporte de vida
e creatinina sérica acima de 2mg/dL.
O sistema APACHE 2 (Acute Physiology
and Chronic Health Evaluation – 2) tem sido,
também, testado. Um estudo efectuado em
doentes com insuficiência hepática aguda
causada por paracetamol(98), mostrou boa
correlação com a mortalidade e melhor sensibilidade que os critérios do King’s College. Um
trabalho prospectivo, recente, realizado nos
Estados Unidos em 662 doentes, igualmente,
com insuficiência hepática aguda causada por
paracetamol(99), refere que o uso dos critérios
do King’s College, na admissão, foi menos
eficaz que a utilização do APACHE 2 na
predição do desfecho final.
O desenvolvimento de um fígado artificial,
capaz de o substituir nas suas funções principais (remoção de toxinas, metabólica e de
síntese), pelo menos, enquanto o doente
aguarda transplante, é uma ideia lógica mas
que ainda não foi possível concretizar eficazmente. Vários sistemas extracorporais têm
sido testados; desde filtros ou colunas de
adsorventes(112,113), “albumin dialysis”(114,115),
MARS (Molecular Adsorbent Recirculating
System)(116,117), até à utilização de hepatocitos(118), mas os resultados não têm sido
consistentes. Desde 1990, foram efectuados 9
estudos com sistemas mistos, BAL
(BioArtificial Liver), tecnologicamente diferentes (inclusive, com hepatocitos humanos
derivados de células de hepatoma(119). Um
A indicação de que a α feto-proteína
poderia ser usada como marcador de regeneração hepática tem mais de 30 anos(100). Uma
publicação recente parece demonstrar a sua
validade, em doentes com insuficiência
hepática aguda por paracetamol, na detecção
precoce daqueles com melhor prognóstico(101).
Outros indicadores de prognóstico foram
estudados dos quais se salienta a histologia
hepática: vantajosa(8) ou perigosa e pouco
fiável(102); o TAC: útil(8) ou limitada(103): o lactato: com resultados semelhantes aos critérios
do King’s College na insuficiência hepática
aguda causada por paracetamol(104), tendo os
168
Rui Sousa
A hemocromatose aguda neonatal é
responsável por uma alta mortalidade, mesmo
após transplante hepático. A administração de
imunoglobulina em altas doses, ás grávidas de
famílias com prevalência elevada da doença,
parece reduzir a gravidade da situação neonatal(125).
estudo multicêntrico, prospectivo, randomizado e controlado, publicado em 2004(120),
com coluna de carvão, oxigenador e um biorreactor contendo uma membrana e 7 mil
milhões de hepatocitos de porco, apresentou
resultados promissores, incluindo aumento da
sobrevida num grupo de doentes. A legislação
sobre xenotransplantes, nalguns países, limita
o uso clínico de células de porco, fazendo
depender a evolução dos BAL, do desenvolvimento de biocomponentes com hepatocitos
humanos. Revisões recentes(121,122) dos vários
sistemas extracorporais testados, apontam
para algum benefício na sua utilização em
situações de agudização de doença crónica,
mas não na insuficiência hepática aguda.
Os factores de prognóstico nas crianças
são, também, de alguma forma, diferentes.
Segundo estudo realizado no King’s College
Hospital(126), as variáveis mais importantes são
a idade, o INR (International Normalized
Ration), bilirrubina e contagem de leucocitos.
CONCLUSÃO
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA
AGUDA NA CRIANÇA
A abordagem do doente com insuficiência
hepática aguda, exige avaliações e decisões
rápidas e precisas. Terapêuticas específicas, a
ida para uma unidade de cuidados intensivos
especializada, uma unidade com centro de
transplante ou colocação do doente em lista
de espera para transplante, são medidas a
tomar, logo que possível. Um melhor conhecimento dos mecanismos responsáveis pela
morte celular e falência multiorgânica, e o
desenvolvimento de estratégias que promovam ou facilitem a regeneração hepática,
podem, no futuro, permitir uma terapêutica
mais dirigida e eficaz.
A insuficiência hepática aguda na criança
apresenta algumas particularidades. A presença
de encefalopatia é, geralmente, de aparecimento tardio e difícil de diagnosticar nas
criaças mais novas(123).
De acordo com um trabalho multicêntrico
publicado nos Estados Unidos(124) existem
dois picos de incidência, sendo o maior em
crianças com menos de 1 ano e o outro dos 13
aos 16 anos; o grupo etiológico predominante
é o de causa indeterminada (50% dos casos,
principalmente nas crianças com menos de 1
ano) vindo a seguir a intoxicação com paracetamol (15%); a hepatite auto-imune está
implicada em 8% dos casos e as doenças
metabólicas em 7%.
Algumas situações não respondem ao
transplante hepático (por exemplo: doenças
mitocondriais com envolvimento neurológico,
doença de Niemann-Pick tipo C, hepatite de
células gigantes com anemia hemolítica
Coombs positivo, linfohistiocitose hemofagocítica, linfoma, leucemia...) pelo que o seu
diagnóstico precoce, através de exame da
medula, é importante.
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INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA
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ASCITE REFRACTÁRIA
E SÍNDROME HEPATORRENAL
JOÃO MANGUALDE
ANA PAULA OLIVEIRA
INTRODUÇÃO
hepatorrenal, nos últimos anos tem-se assistido a importantes avanços no seu tratamento,
com desenvolvimento de terapêuticas eficazes,
que vieram alterar de forma significativa a
história natural destas entidades.
Os desequilíbrios metabólicos e hemodinâmicos secundários à insuficiência hepática e
à hipertensão portal presentes nos doentes
com cirrose têm repercussão em vários órgãos.
As consequências, a nível renal, foram
descritas pela primeira vez há mais de 100
anos por Austin Flint1, mas os mecanismos
pelos quais as alterações desencadeadas pela
disfunção circulatória da cirrose levam à
formação de ascite refractária e ao desenvolvimento do síndrome hepatorrenal (SHR) só
foram conhecidos recentemente, na sequência
dos progressos ocorridos na compreensão da
sua etiopatogénese. A teoria actualmente
aceite para explicar a disfunção hepatorrenal é
a teoria da vasodilatação arterial periférica.
Segundo esta teoria a vasodilatação do sistema
esplâncnico conduz a uma redução da volémia
efectiva e à subsequente activação dos
sistemas vasoconstrictores, que actuam a nível
renal causando retenção hidrossalina e, nos
estádios terminais, vasoconstrição renal(2,3,4)
que conduz à insuficiência renal funcional que
caracteriza o SHR.
A prevalência exacta da ascite refractária e
do SHR não são conhecidas, mas estimam-se
em cerca de 5 a 10% nos doentes internados
com cirrose e ascite(2,5). Uma vez que são
patologias que surgem exclusivamente nas
fases avançadas da doença hepática, a sua
presença constitui um importante factor de
mau prognóstico. No entanto, graças à identificação das bases fisiopatológicas da disfunção
FISIOPATOLOGIA
A disfunção hepatorrenal da cirrose caracteriza-se por uma diminuição da capacidade
de excreção de sódio e de água, da perfusão
renal e da taxa de filtração glomerular
(TFG)(6). Estas alterações instalam-se de
forma progressiva e não estão presentes simultaneamente em todos os doentes.
A teoria actualmente aceite para explicar a
disfunção hepatorrenal e a circulação
hiperdinâmica da cirrose é a teoria da vasodilatação arterial periférica(2-4). Segundo esta
teoria, a disfunção hepática e a hipertensão
portal causam uma vasodilatação do sistema
esplâncnico, por produção local de substâncias
vasodilatadoras (sobretudo óxido nítrico)(7).
Devido ao aumento do compartimento
esplâncnico, há uma redução da volémia
efectiva e da pressão arterial, que conduzem à
activação dos sistemas vasoconstrictores
(sistema renina-angiotensina-aldosterona,
sistema nervoso simpático e hormona antidiurética/ arginina-vasopressina)(8,12). Existem
cada vez mais evidências de que a diminuição
da volémia efectiva não está só dependente da
vasodilatação arterial periférica, mas também
da cardiomiopatia dos cirróticos(8). Trata-se de
uma doença sub-clínica na maioria dos
177
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
doentes, caracterizada por uma disfunção
diastólica secundária a um aumento da rigidez
do miocárdio(9,10).
Os sistemas vasoconstrictores actuam a
nível vascular, cardíaco e renal para repor a
volémia e a pressão arterial. A nível vascular
provocam vasoconstrição em vários territórios.
O território esplâncnico, escapa ao controlo
destes sistemas, pela já referida produção local
de substâncias vasodilatadoras. A nível cardíaco, têm acção inotrópica e cronotrópica
positivas. A nível renal, são responsáveis pela
retenção de sódio e de água e pela vasoconstrição renal que constituem a disfunção
hepatorrenal. Numa fase inicial, a perfusão
renal está mantida, porque a vasoconstrição é
contrariada pela produção local de factores
vasodilatadores. No entanto, como já foi
referido, com a progressão da doença a
activação dos sistemas vasoconstrictores é de
tal forma intensa que ultrapassa a capacidade
de compensação dos vasodilatadores locais.
Muitas vezes, existe um factor precipitante
(peritonite bacteriana espontânea, hepatite
aguda alcoólica, paracentese de grande volume, hemorragia digestiva), que desfaz o
equilíbrio existente. Nesta fase a perfusão renal
desce, assim como a TFG e surge o SHR.
A primeira alteração na disfunção hepatorrenal é a redução da capacidade de
excreção de sódio, que precede o desenvolvimento da ascite, fase pré-ascítica(11).
Inicialmente só está presente em ortostatismo,
é sub-clínica e traduz-se numa dificuldade em
atingir um equilíbrio de sódio aquando de uma
sobrecarga salina. À medida que a disfunção
se agrava, os doentes tornam-se incapazes de
manter um balanço neutro ou negativo de
sódio e inicia-se a formação da ascite- fase
ascítica. A redução da capacidade de
excreção de sódio deve-se a um aumento da
sua reabsorção a nível tubular e só nos estádios
mais avançados à redução da TFG. A reabsorção é mais marcada a nível distal (razão
pela qual os diuréticos que actuam no túbulo
contornado distal, como a espironolactona,
são mais eficazes), mas com o avançar da
doença ocorre também a nível proximal (local
de acção dos diuréticos de ansa, como o
furosemido). Quando a reabsorção é de tal
forma intensa que os diuréticos deixam de ser
eficazes, a ascite torna-se refractária(2).
A retenção de sódio é multifactorial e resulta
da activação do sistema renina-angiotensinaaldosterona(12,13) e do sistema nervoso simpático(14). No entanto, em cerca de um terço dos
doentes não há evidência de activação destes
dois sistemas, pelo que existem outros elementos, ainda desconhecidos, que contribuem
para a retenção de sódio(15).
A redução da capacidade de excreção de
água é a segunda alteração que ocorre nestes
doentes(16,17). Contribui para a formação da
ascite e está na origem da hiponatrémia de
diluição presente nos estádios avançados da
doença. Resulta essencialmente da hipersecreção da hormona antidiurética/ argininavasopressina (AVP). Outros factores implicados na sua génese são a diminuição da síntese
renal de prostaglandinas e a redução da TFG.
O acontecimento final na disfunção renal
da cirrose é a vasoconstrição, que conduz a
uma hipoperfusão renal e redução da TFG,
devido a um desequilíbrio entre os factores
vasoconstrictores e vasodilatadores renais, por
marcada activação dos primeiros e redução da
síntese dos segundos(3,7,16,18)(Quadro 1).
A vasocontrição uma vez presente, dá
origem a um ciclo vicioso de redução da síntese
de vasodilatadores renais e maior activação
dos sistemas vasoconstrictores, que leva à perpetuação da insuficiência renal- SHR(19)(fig.1).
ASCITE REFRACTÁRIA
Definição, Classificação e Diagnóstico
A ascite é a complicação mais frequente da
cirrose. Ocorre em cerca de 60% dos doentes nos
primeiros 10 anos após o diagnóstico20. O seu
desenvolvimento constitui um factor de mau
prognóstico, sendo a taxa de mortalidade aos 2
anos nos doentes com cirrose e ascite de 50 %21.
178
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
QUADRO 1 - FACTORES VASOACTIVOS IMPLICADOS NA PATOGÉNESE DA DISFUNÇÃO HEPATORRENAL
Vasodilatadores
Adrenomedulina
Bradicinina
Encefalinas
Endocanabinóides
Endotelina-3 (ET-3)
Endotoxinas
Factor de necrose tumoral · (TNF-α)
Glucagon
Histamina
Interleucinas
Óxido nítrico (NO)
Monóxido de carbono
Péptido natriurético auricular
Péptido natriurético cerebral
Péptido natriurético de tipo C
Péptido relaccionado com o gene da calcitonina
Polipéptido intestinal vasoactivo (VIP)
Prostaciclina (PGI2 )
Substância P
Vasoconstrictores
Angiotensina II
Adrenalina e noradrenalina
Arginina-vasopressina (AVP)
Endotelina-1 (ET-1)
Neuropeptido Y
Adenosina
Tromboxano A2
Leucotrienos
F2-isoprostanos
FIGURA 1 - FISIOPATOLOGIA DA DISFUNÇÃO HEPATORRENAL
Cirrose
Disfunção hepática
+
Hipertensão portal
Vasodilatação esplâncnica
Cardiomiopatia
Redução da volémia efectiva
Activação dos sistemas vasoconstrictores
(SRAA, SNS, AVP)
Retenção de sódio
Retenção de água
Vasodilatadores locais
Vasoconstrição renal
SHR
179
Ascite
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
restrição salina. É condição sine qua non para o
diagnóstico que os doentes estejam sob
terapêutica diurética máxima e sob dieta com
restrição salina durante, pelo menos, 1 semana.
A ascite intratável pelos diuréticos é a
ascite que não é mobilizada ou cuja recorrência
precoce após paracentese não é eficazmente
prevenida, devido ao desenvolvimento de
complicações induzidas pelos diuréticos. Estas
complicações são a encefalopatia hepática, a
insuficiência renal e as alterações electrolíticas
(hiponatrémia e hipo ou hipercaliémia).
À medida que a doença hepática se agrava,
a ascite pode tornar-se refractária à terapêutica médica, uma situação presente em 5-10%
dos cirróticos internados por ascite(2).
A definição e os critérios de diagnóstico da
ascite refractária (AR) foram elaborados pelo
International Ascites Club em 1996 e revistos
em 2003 (Quadro 2)(2,22).
Define-se como ascite refractária a ascite
que não é mobilizada ou cuja recorrência
precoce, após a realização de paracentese, não
é eficazmente prevenida pela terapêutica
médica.
A ascite refractária divide-se em dois tipos:
ascite resistente aos diuréticos e ascite
intratável pelos diuréticos.
A ascite resistente aos diuréticos é a ascite
que não é mobilizada ou cuja recorrência
precoce após paracentese não é eficazmente
prevenida por ausência de resposta a terapêutica diurética intensiva associada a dieta com
Tratamento
A terapêutica de eleição na ascite refractária é o transplante hepático (TH). Assim, o
passo mais importante no tratamento destes
doentes é avaliar se é ou não candidato a TH.
Nos doentes que estão a aguardar a sua realização e naqueles em que está contraindicado,
existem duas opções terapêuticas: paracenteses de grande volume, acompanhadas de
QUADRO 2 - DEFINIÇÃO E CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO DA ASCITE REFRACTÁRIA
Definição
1 - Ascite resistente aos diuréticos
Ascite que não é mobilizada ou cuja recorrência precoce após paracentese não é eficazmente prevenida por ausência de
resposta a terapêutica diurética intensiva e a dieta com restrição salina.
2 - Ascite intratável pelos diuréticos
Ascite que não é mobilizada ou cuja recorrência precoce após paracentese não é eficazmente prevenida devido ao
desenvolvimento de complicações induzidas pelos diuréticos, que impedem a utilização de doses eficazes destes fármacos.
Critérios de diagnóstico
1 - Duração do tratamento
Os doentes têm de estar sob terapêutica diurética intensiva (espironolactona 400 mg/dia e furosemido 160 mg/dia) e sob dieta
com restrição salina (menos de 90 mmoles Na+/dia ou 5,2 gr NaCl /dia) durante, pelo menos, 1 semana
2 - Ausência de resposta
Perda de peso inferior a 0,8 Kg em 4 dias e sódio urinário inferior ao sódio ingerido
3 - Recorrência precoce da ascite
Reaparecimento de ascite moderada ou volumosa em menos de 4 semanas
4 - Complicações induzidas pelos diuréticos
- Encefalopatia hepática (na ausência de outros factores precipitantes)
- Insuficiência renal - aumento da creatinina sérica superior a 100%, para um valor superior a 2 mg/dL
- Hiponatrémia - redução do sódio sérico superior a 10 mmol/L, para um valor inferior a 125 mmol/L
- Hipocaliémia - potássio sérico inferior a 3 mmol/L
- Hipercaliémia - potássio sérico superior a 6 mmol/L
180
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
expansores do plasma, e o TIPS. Os shunts
peritoneovenosos, apesar de eficazes, foram
abandonados pela elevada incidência de
complicações(23).
a patência das novas próteses cobertas de
politetrafluoretileno parece ser superior, com
menor recidiva da ascite(35). A segunda grande
complicação é a encefalopatia hepática.
Ocorre em cerca de 30% dos doentes, mas na
maioria dos casos pode ser controlada com a
administração de lactulose. Outras complicações que podem surgir são o agravamento da
insuficiência hepática, a insuficiência cardíaca
congestiva e a anemia hemolítica(31).
Face a estas complicações e à baixa eficácia em doentes idosos, a colocação de TIPS
está contraindicada nos doentes com
encefalopatia hepática grau 3 ou 4, INR>5,
pontuação de Child >12, obstrução biliar,
insuficiência cardíaca congestiva e idade >75
anos(31).
Paracentese terapêutica
A paracentese terapêutica é um procedimento fácil, com baixo risco de complicações
e eficaz no tratamento da ascite refractária(22).
Os diuréticos devem ser mantidos, salvo se
ocorrerem complicações ou se o sódio urinário
for inferior a 30 mmoles/dia. Para evitar a
disfunção circulatória pós-paracentese, deve ser
administrado concomitantemente um expansor
do plasma(24). A controvérsia reside no
expansor que deve ser utilizado. A albumina foi
o primeiro expansor usado e a sua eficácia na
paracentese terapêutica superior a 5 litros foi
comprovada por estudos randomizados(25).
Os estudos comparativos com outros colóides
(dextranos, hidroxietilamido, derivados do
colagéneo) mostraram que, embora a
albumina seja mais eficaz na prevenção das
alterações hormonais induzidas pela paracentese, não existe qualquer diferença entre os
dois grupos quanto à incidência de complicações (hiponatrémia, insuficiência renal) ou
à mortalidade(26-30). Com base nestes dados, as
recomendações actuais são a utilização de
albumina (8 gr albumina/L de líquido ascítico), quando o volume drenado é superior a 5
litros. Para volumes menores podem ser
usados outros colóides(22).
Paracentese terapêutica vs TIPS na ascite
refractária
Existem 5 estudos randomizados nos quais
a paracentese terapêutica foi comparada com
o TIPS no tratamento da ascite refractária.
A análise destes estudos revela que o TIPS é
mais eficaz no controlo da ascite (66% vs
24%), mas apresenta uma maior frequência de
encefalopatia hepática (55% vs 38%).
A sobrevida é idêntica nos dois grupos. Outro
factor a considerar, cada vez mais importante
em medicina, é o custo, que é mais elevado no
TIPS.
Com base nos aspectos supracitados, a
paracentese terapêutica com expansores do
plasma, deve ser utilizada em detrimento do
TIPS, porque é aplicável num maior número
de doentes, é mais barata e tem menor
incidência de complicações. O TIPS está
reservado para os doentes que necessitam de
paracenteses muito frequentes (>3/mês) e
para aqueles em que a paracentese não é eficaz
(ascite loculada) ou não é tolerada, desde que
não apresentem contraindicações à sua
realização(22).
TIPS
O TIPS é um método não cirúrgico de
descompressão portal, que foi inicialmente
desenvolvido para tratamento da hemorragia
digestiva por ruptura de varizes gastroesofágicas(31). A experiência subsequente veio
demonstrar a sua eficácia no tratamento da
ascite refractária(32-34).
O grande problema do TIPS é a elevada
taxa de complicações. A mais frequente é a
oclusão da prótese- 70% ao ano(31). No entanto,
181
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
FIGURA 2 - TRATAMENTO DA ASCITE REFRACTÁRIA
A sua exacta incidência é desconhecida,
pois não existem estudos recentes sobre este
aspecto. Na maior série publicada, a prevalência em doentes internados com cirrose e
ascite foi de 10% e a probabilidade do mesmo
subgrupo de cirróticos desenvolver este
síndrome foi estimada em 18% ao ano e 39%
aos 5 anos.
O SHR divide-se em dois tipos: o SHR
tipo 1, que é a forma aguda, caracterizada por
uma rápida deterioração da função renal e por
um prognóstico muito reservado e o SHR tipo
2, que é a forma crónica, na qual a deterioração da função renal se faz de forma mais
insidiosa e a sobrevida é mais longa(2).
Uma vez que não existem testes específicos
para este síndrome, o diagnóstico do SHR
assenta em dois pontos: a demonstração da
existência de uma redução da TFG e a exclusão
de outras causas de insuficiência renal.
O método de escolha actualmente aceite
para estimar a TFG nos cirróticos é o doseamento da creatinina sérica(2). Considera-se
que há uma redução da TFG quando o valor
absoluto da creatinina é superior a 1,5 mg/dL
ou, nos doentes com insuficiência renal
prévia, quando se verifica um aumento da creatinina superior a 50% em relação ao valor
basal do doente(2). Os diuréticos podem causar
um ligeiro aumento da creatinina pelo que,
para se estabelecer o diagnóstico de SHR, têm
de estar suspensos há, pelo menos, 5 dias.
Apesar de ser o método usado para definir a
existência de insuficiência renal nos cirróticos,
a sua sensibilidade é muito baixa, devido à
reduzida massa muscular, à dieta hipoproteica,
à hiperbilirrubinémia e à diminuicão da síntese
hepática de creatinina que caracterizam estes
doentes(38-40).
A segunda premissa necessária para
estabelecer o diagnóstico do SHR é ainda mais
complexa, uma vez que são várias e frequentes
as causas de insuficiência renal nos doentes
cirróticos.
A dificuldade em estabelecer o diagnóstico
do SHR levou à realização de uma reunião de
consenso em 1996, na qual foram definidos os
Tratamento da ascite refractária
1ª linha- Transplante hepático
2ª linha- Paracentese terapêutica + expansores do
plasma
3ª linha- TIPS
Terapêutica complementar - diuréticos + restrição salina
+/- restrição hídrica
Prognóstico
O desenvolvimento de ascite refractária
num doente com cirrose está associado a um
prognóstico muito reservado, o qual é
determinado principalmente pelo estádio
avançado da doença. A mortalidade ao ano é
de cerca de 50%(21) e traduz a gravidade da
insuficiência hepática e o elevado risco de
hemorragia por ruptura de varizes que estes
doentes apresentam. A idade superior a 60
anos, a existência de carcinoma hepatocelular
ou de diabetes mellitus são factores que
agravam ainda mais o prognóstico(36).
Embora não haja estudos publicados,
pensa-se que, mesmo nos transplantados, a
existência prévia de algum grau de disfunção
renal, determina uma sobrevida pós-transplante ligeiramente inferior nos doentes com
ascite refractária.
SÍNDROME HEPATORRENAL
Definição, Classificação e Diagnóstico
O SHR é a complicação mais grave da
doença hepática crónica terminal. É uma
forma de insuficiência renal funcional, com
rins morfologicamente normais, específica da
doença hepática avançada. Embora ocorra
mais frequentemente na cirrose, não é exclusiva
desta entidade. Pode surgir noutras situações
em que existe insuficiência hepática grave e
hipertensão portal (HTP), como sejam a
hepatite aguda alcoólica e a insuficiência
hepática aguda(2,37).
182
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
QUADRO 3 - CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO DO SHR SEGUNDO O INTERNATIONAL ASCITES CLUB
Critérios Major
1 - Doença hepática crónica ou aguda com insuficiência hepática avançada e hipertensão portal
2 - TFG baixa, definida como creatinina sérica > 1,5 mg/dL ou clearance da creatinina nas 24h < 40 mL/min ou
aumento da creatinina superior a 50% em relação ao valor basal, nos doentes com insuficiência renal prévia
3 - Ausência de choque, infecção bacteriana activa, perda de fluidos ou tratamento actual ou recente com fármacos
nefrotóxicos
4 - Ausência de melhoria da função renal (definida como creatinina sérica ≤ 1,5 mg/dL ou clearance da creatinina ≥40
mL/min) após suspensão de diuréticos e expansão de volume plasmático com 1,5 L de soro salino isotónico
5- Proteinúria < 500 mg/dia
6- Ecografia renal sem evidência de uropatia obstructiva ou de doença renal parenquimatosa
Critérios Minor
1 - Débito urinário < 500 mL/dia
2 - Sódio urinário < 10 mEq/dia
3 - Osmolaridade urinária > osmolaridade plasmática
4 - Eritrócitos na urina < 50/campo
5 - Sódio sérico < 130 mEq/L
critérios de diagnóstico deste síndrome
(Quadro 3)(2).
como na população em geral, a mais frequente
nos doentes com cirrose é a IRA pré-renal, que
inclui o SHR (Quadro 4). Num estudo
recente, no qual foram avaliados 355 doentes
com cirrose e IRA, 58 % dos doentes tinham
IRA pré-renal (incluindo 20% com SHR),
41,7% IRA intrínseca por necrose tubular
aguda (NTA) e apenas 0,3% IRA pós-renal.(41)
Causas de insuficiência renal aguda na
cirrose
A insuficiência renal aguda (IRA) divide-se em pré-renal, intrínseca e pós-renal. Tal
QUADRO 4 - CAUSAS DE IRA NA CIRROSE
Pré-renal
Intrínseca
Hipovolémia
Perdas gastrointestinais (hemorragia digestiva,
vómitos, diarreia)
Perdas urinárias (terapêutica diurética excessiva)
Fármacos nefrotóxicos
IECAs
ARA II
AINEs ( incluindo inibidores da COX-2)
Radiocontraste
Choque séptico
Ascite sob tensão
SHR
Necrose tubular aguda
Isquémica
Tóxica
Glomerulonefrite
Hepatite crónica B
Hepatite crónica C
Alcoolismo crónico
Pós-renal
Rara (<1%)
183
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
IRA Pré-renal
As causas mais frequentes na cirrose são a
NTA e a glomerulonefrite aguda.
A NTA pode ser isquémica ou tóxica. A
NTA isquémica é causada pelos mesmos
factores etiológicos da IRA pré-renal, desde que
perpetuados. A NTA tóxica resulta quase
sempre da administração de aminoglicosidos,
que têm um potencial tóxico, nos doentes com
cirrose, dez vezes superior ao da população em
geral. Só nos doentes em estado crítico, como
no choque séptico, a NTA é muitas vezes mista.
A IRA secundária à glomerulonefrite
aguda pode ocorrer em todas as causas de
cirrose, mas é mais frequente nas hepatites
víricas B e C e no alcoolismo crónico.
Apesar de existirem varias lesões glomerulares descritas em doentes com hepatite crónica C, a mais frequente é a glomerulonefrite
membranoproliferativa, associada ou não a
crioglobulinémia mista. Estima-se que a
prevalência de crioglobulinémia em doentes
com hepatite C seja de 18 a 50%(51).
Na hepatite crónica B a lesão mais frequente
é a glomerulonefrite membranosa, embora
existam casos reportados de glomerulonefrite
membranoproliferativa e nefropatia a IgA(52,53).
Nos doentes alcoólicos a IRA pode ser
secundária a nefropatia a IgA e a lesões tubulares, resultantes de rabdomiólise ou da
ingestão de etilenoglicol com formação de
cálculos de oxalato de cálcio(54-57).
A causa mais frequente de IRA pré-renal
nos doentes com cirrose é a hipovolémia. Esta
pode ser secundária a perdas gastrointestinais
ou perdas renais. As perdas gastrointestinais
ocorrem por hemorragia digestiva (cerca de
5% dos doentes internados por hemorragia
digestiva têm IRA(42)), vómitos ou diarreia
(muitas vezes induzida pela utilização de
lactulose no tratamento da encefalopatia
portossistémica). As perdas renais são, na
maioria dos casos, iatrogénicas e resultam de
uma terapêutica diurética demasiado agressiva.
A hipovolémia efectiva e a disfunção renal
que os doentes cirróticos apresentam torna-os
particularmente susceptíveis à IRA induzida
por fármacos, por um mecanismo de vasoconstrição renal. Os fármacos implicados são os
inibidores da enzima de conversão da
angiotensina, os antagonistas dos receptores
da angiotensina II, os anti-inflamatórios não-esteróides (incluíndo os inibidores selectivos
da cicloxigenase tipo 2) e os agentes de radiocontraste(43,44).
A sépsis grave condiciona IRA pré-renal
por vasodilatação periférica e vasoconstrição
renal e ocorre quase sempre na fase de choque
séptico(45,46). Os doentes com cirrose são particularmente susceptíveis ao desenvolvimento
de infecções bacterianas, nomeadamente
peritonite bacteriana espontânea (PBE)(47).
Cerca de 20-40% dos doentes com PBE têm
IRA, mas apenas 10% têm choque séptico,
pelo que existem outras causas desconhecidas
para a insuficiência renal nestes doentes(48).
Outra causa potencial de IRA é a ascite
sob tensão, por compromisso da perfusão
renal(49).
Finalmente, o SHR, sendo secundário a
uma vasoconstrição renal intensa, é igualmente uma forma de IRA pré-renal.
IRA Pós-renal
As causas de IRA pós-renal têm pouco
relevo na cirrose. Tal facto é facilmente
explicável, uma vez que a causa principal de
IRA pós-renal é a patologia prostática, que
ocorre quase exclusivamente em faixas etárias
que superam a esperança média de vida dos
cirróticos.
Investigação da insuficiência renal aguda
na cirrose
IRA Intrínseca
A IRA intrínseca classifica-se de acordo
com o local de lesão renal.
Uma vez que são várias as causas de IRA
nos doentes com cirrose, para se estabelecer o
184
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
diagnóstico de SHR é necessária uma cuidada
investigação clínica, complementada por uma
avaliação analítica, imagiológica e, em casos
seleccionados, por uma biopsia renal.
restantes alterações electrolíticas e do equilíbrio ácido-base são mais raras e mais ligeiras
e incluem a hipercaliémia e a acidose
metabólica.
A avaliação da urina pode dar importantes
informações diagnósticas(2,45): a existência de
cilindros granulosos pigmentares é típica da
NTA, enquanto que os cilindros de eritrócitos
são característicos da glomerulonefrite aguda.
Os índices urinários (sódio urinário,
fracção da excreção de sódio, osmolaridade
urinária) são úteis no diagnóstico diferencial
entre a IRA pré-renal, incluíndo SHR, e a
NTA.
No SHR, o sódio urinário é muito baixo
(<10 mEq/L) e a osmolaridade urinária é
elevada (>500 mOsm/Kg) e superior à osmolaridade plasmática, porque a função tubular
está preservada e há uma ávida retenção de
sódio. Pelo contrário, na NTA, o sódio
urinário está alto e a osmolaridade urinária
baixa. No entanto, esta regra não é universal,
já que alguns doentes com SHR têm um valor
elevado de sódio urinário e doentes com
cirrose e NTA têm, numa fase inicial, sódio
urinário baixo(2,60,61). Por este motivo os
índices urinários já não são considerados
critérios major no diagnóstico do SHR(2).
Avaliação clínica
Na história clínica devem ser investigadas
a existência de hemorragia digestiva, vómitos,
diarreia e a exposição a fármacos nefrotóxicos,
incluindo agentes de radiocontraste.
Em relação ao exame objectivo, não
existem sinais específicos de SHR. Como este
surge nos estádios avançados da doença
hepática, a maioria dos doentes apresenta
estigmas de DHC, como icterícia, discrasia
hemorrágica, encefalopatia hepática e
ascite(5,58). Esta última é universal no SHR,
pelo que a sua ausência aponta para outra
causa de IRA, nomeadamente IRA pré-renal
por terapêutica diurética excessiva(59). Outro
achado quase universal nos doentes com SHR
é a hipotensão arterial, acompanhada na
maioria das vezes de aumento da frequência e
do débito cardíaco. É importante salientar dois
aspectos no que respeita à tensão arterial: nos
doentes com SHR a tensão arterial apesar de
baixa é estável, pelo que a instabilidade
hemodinâmica sugere a existência de choque
séptico; se, ao invés de uma redução, existir
aumento da tensão arterial, a hipótese
diagnóstica mais provável é a glomerulonefrite
aguda.
Avaliação imagiológia
É obrigatória a realização de uma ecografia
renal em todos os doentes com cirrose e IRA
para excluir patologia renal intrínseca e
patologia obstrutiva. Apesar de ser o exame de
eleição para avaliar a obstrução do tracto
urinário, a sua sensibilidade não é de 100%.
Numa fase inicial e em doentes com hipovolémia, pode não ser patente a dilatação da
árvore excretora.
Avaliação analítica
Tem como objectivos avaliar quer a insuficiência renal e suas complicações, quer a
função hepática e excluir a existência de uma
infecção.
Deve incluir hemograma, proteína C
reactiva, provas hepáticas, função renal,
ionograma, gasimetria, análise sumária da
urina, urina de 24h, hemoculturas e urocultura.
A alteração electrolítica mais característica do SHR é a hiponatrémia de diluição, mas
não está presente em todos os doentes. As
Biopsia renal
Na maioria dos casos não é necessário
realizar uma biopsia renal para estabelecer o
diagnóstico da IRA. Esta só está indicada
quando os dados apontam para uma IRA
185
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
intrínseca por glomerulonefrite. As alterações
da coagulação presentes nestes doentes impedem, muitas vezes, a realização desta técnica
por via percutânea. Nestes casos, a biopsia
deve ser feita por via transjugularl(62).
produção de várias citocinas e endotoxinas,
que estimulam a produção de óxido nítrico e
outros vasodilatadores que vão agravar a
disfunção circulatória pré-existente e desencadear o SHR(48,66,67).
De igual forma, a realização de paracentese
de grande volume (>5L) sem reposição com
albumina pode causar SHR em cerca de 15%
dos doentes(2).
Aproximadamente 10% dos doentes
cirróticos com hemorragia digestiva desenvolvem insuficiência renal, na maioria dos
casos por hipovolémia (insuficiência pré-renal
ou NTA isquémica)(42). Contudo, em alguns
casos, a resposta inflamatória associada à
hemorragia pode dar origem a um SHR(68).
Na base do desenvolvimento do SHR na
hepatite aguda alcoólica e no pós-operatório
de procedimentos cirúrgicos major está a
resposta inflamatória sistémica associada.
No entanto, existe um outro factor muito
importante para o desenvolvimento de SHR
nestes doentes, que é a colestase(69). Estudos
realizados demonstraram que a colestase per se
causa vasodilatação e circulação hiperdinâmica(70,71). A importância que esta assume na
hepatite aguda alcoólica é bem conhecida, já
que constitui um dos dois parâmetros que
definem o Índice de Maddrey(72). A colestase
desempenha ainda um papel no SHR que
surge no contexto da PBE. Tal facto ficou
patente num dos mais importantes estudos
conduzido em doentes com PBE, no qual o
SHR só ocorreu em doentes com um valor de
bilirrubina total superior a 4 mg/dL(66).
A hipovolémia associada a terapêutica
diurética ou a perdas extrarrenais é classicamente considerada como um factor de risco
para o desenvolvimento de SHR(73). No
entanto, até à data, não existem estudos que
suportem esta afirmação.
Classificação do SHR
Como já foi referido, o SHR divide-se em
dois tipos, de acordo com a gravidade e forma de
instalação da insuficiência renal (Quadro 5)(2).
QUADRO 5 - CLASSIFICAÇÃO DO SHR
SHR tipo 1
Duplicação do nível da creatinina sérica para valores
superiores a 2,5 mg/dL ou uma redução superior a 50 % da
clearance da creatinina nas 24 horas para valores inferiores a 20 mL/min, em menos de 2 semanas.
SHR tipo 2
Insuficiência renal que não preenche critérios para SHR
tipo 1
SHR tipo 1
O SHR tipo 1 caracteriza-se por uma deterioração rapidamente progressiva da função
renal, definida como uma duplicação do nível
da creatinina sérica para valores superiores a 2,5
mg/dL ou uma redução superior a 50 % da clearance da creatinina nas 24 horas para valores
inferiores a 20 mL/min, em menos de 2 semanas.
Apesar de poder ocorrer espontaneamente, em muitos casos é precedido por um
factor precipitante. Os factores de risco
conhecidos para o desenvolvimento do SHR
tipo 1 são a infecção bacteriana grave
(particularmente a PBE), a paracentese de
grande volume sem reposição com albumina, a
hemorragia digestiva, a hepatite aguda alcoólica, a colestase e os procedimentos cirúrgicos
major.
O SHR tipo 1 ocorre em cerca de 30% dos
doentes com PBE, apesar da instituição de uma
correcta antibioterápia(48,63-65). A resposta
inflamatória que ocorre nestes doentes leva à
SHR tipo 2
O SHR tipo 2 caracteriza-se por uma
redução mais ligeira e gradual da função renal,
com valores de creatinina sérica de 1,5 a 2,5
186
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
mg/dL2. São doentes com DHC menos grave,
cuja principal característica é a presença de
ascite refractária. Têm um risco elevado de
evoluir para SHR tipo 1, o que acontece geralmente após exposição a um dos factores
precipitantes acima referidos(48,63,64).
Hepatite aguda alcoólica
Num estudo efectuado em doentes com
hepatite aguda alcoólica grave (índice de
Maddrey superior a 32), foi administrado um
inibidor do factor de necrose tumoral, a
pentoxifilina (400 mg TID), verificando-se
que, no grupo tratado, a incidência de SHR
(4% vs 24%) e a taxa de mortalidade hospitalar
(24% vs 46%) foram mais baixas do que no
grupo placebo(74). Os resultados demonstram
que a pentoxifilina está indicada neste
subgrupo de doentes com hepatite aguda
alcoólica.
Prevenção
Dois estudos controlados e randomizados
realizados num grupo significativo de doentes
mostraram que o SHR pode ser prevenido em
duas situações clínicas específicas: a PBE e a
hepatite aguda alcoólica.
PBE
Tratamento
A vigilância e o tratamento dos SHR tipo
1 e tipo 2 são distintos.
Os doentes com SHR tipo 1 devem ser
internados, preferencialmente numa unidade
de cuidados intensivos, com vigilância
contínua da tensão arterial, frequência cardíaca, temperatura corporal, pressão venosa
central, débito urinário, balanço hídrico, peso
e avaliação analítica diária. Os doentes com
SHR tipo 2 podem ser seguidos em ambulatório.
O tratamento de eleição para ambos os
tipos de SHR é o TH, uma vez que é o único
que oferece a possibilidade de cura das
doenças hepática e renal. No entanto, a
escassez de órgãos e a gravidade do quadro,
particularmente do SHR tipo 1, limitam, de
forma significativa, a sua aplicabilidade clínica. Este facto levou ao desenvolvimento de
outras terapêuticas que, embora não sejam tão
eficazes quanto o TH, permitem, numa elevada
percentagem dos casos, reverter o SHR de
forma definitiva, funcionando como terapêutica
única ou, de forma temporária, aumentando a
sobrevida média até à realização do TH.
Os estudos realizados permitiram inferir da
eficácia na terapêutica do SHR tipo 1 de fármacos vasoconstrictores, combinados com
expansores de plasma, e do TIPS. Estas duas
terapêuticas parecem ser igualmente eficazes
no SHR tipo 2, embora os dados relativos à
Num estudo conduzido em doentes com
PBE(66), a administração de albumina (1,5
g/Kg peso na altura do diagnóstico, seguido de
1 g/kg peso às 48 h) associada à cefotaxime
reduziu significativamente a incidência de
SHR quando comparado com um grupo
controlo que recebeu apenas cefotaxime (10%
vs 33%). Também a mortalidade intra-hospitalar
(10% vs 29%) e a mortalidade aos 3 meses
(22% vs 41%) foram significativamente mais
baixas no grupo que recebeu albumina. Da
análise individual dos dados ressaltou que
apenas os doentes com insuficiência renal à
data do diagnóstico ou com bilirrubina total
superior a 4 mg/dL desenvolveram SHR.
Actualmente, está recomendada a administração daquele esquema de albumina nos
doentes com PBE com creatinina sérica superior
a 1,5 mg/dL ou bilirrubina superior a 4 mg/dL.
Contudo, duas questões permanecem em aberto: no estudo em referência, a dose de albumina
foi arbitrariamente escolhida, pelo que se
desconhece se doses mais baixas não serão igualmente eficazes; por outro lado, não foi avaliada
a eficácia de outros expansores do plasma na
prevenção do SHR, os quais têm a vantagem de
serem mais baratos e de origem não humana.
187
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
SHR desaparece no primeiro mês após o
transplante hepático(81).
Este subgrupo de doentes tem maior
morbilidade, mortalidade intra-hospitalar e
mortalidade aos 3 anos que os doentes transplantados por outras indicações (mortalidade
aos 3 anos de 40% no SHR vs 20-30% nos
doentes sem SHR)(75-80). No entanto, num
estudo recente no qual foram administrados
um análogo da vasopressina e albumina antes
do TH, a taxa de mortalidade pós-TH foi igual
nos doentes com e sem SHR(82). Este estudo
sugere que todos os doentes com SHR devem
ser tratados com um análogo da vasopressina
antes do TH(83).
sua utilização nesta situação sejam mais
escassos. Em casos seleccionados devem ser
utilizados métodos dialíticos, como terapêutica
complementar, mas nunca como terapêutica
única do SHR.
Medidas gerais
Um dos aspectos mais importantes no
tratamento destes doentes é uma correcta
restrição salina (ingestão de sódio diário
inferior a 90 mmol/dia). Se existir uma
hiponatrémia grave (inferior a 125 mmol/L),
deve ser acompanhada de restrição hídrica
(inferior a 1L/dia).
Os diuréticos devem ser suspensos no SHR
tipo 1. No SHR tipo 2 podem ser mantidos,
mas com vigilância analítica frequente, sobretudo devido ao risco de hipercaliémia induzida
pelos diuréticos poupadores de potássio.
Sempre que exista ascite sob tensão deve
ser efectuada paracentese evacuadora, com
reposição com albumina.
Terapêutica farmacológica
A única terapêutica médica comprovadamente eficaz no tratamento do SHR é a
administração de vasoconstrictores. Diversos
outros fármacos foram testados: alguns foram
abandonados, porque os estudos demonstraram a sua ineficácia; outros tiveram resultados
promissores, mas apenas em estudos com
reduzida amostragem.
TH
Como já foi referido, o TH é a terapêutica
de escolha no SHR(75-80). Assim, o primeiro
passo no tratamento dos doentes com SHR é
avaliar se o doente é candidato a TH.
Imediatamente após o TH pode ocorrer um
agravamento da função renal, pelo que muitos
doentes necessitam de hemodiálise (35% vs
5% de doentes sem SHR)(77) no período pós-operatório precoce. Uma vez que os
inibidores da calcineurina (ciclosporina e
tacrolimus) contribuem para esta queda da
TFG, a sua instituição deve ser protelada até
que se assista à recuperação da função renal
(48 a 72h). Após esta queda inicial assiste-se a
uma recuperação gradual da TFG, atingindo
um valor médio de 30 a 40 mL/min cerca de 1
a 2 meses depois do TH. Este valor é inferior
ao observado nos doentes transplantados sem
SHR e resulta duma maior sensibilidade à
nefrotoxicidade dos inibidores da calcineurina. A disfunção circulatória associada ao
Vasoconstrictores
A utilização de vasoconstrictores tem
como objectivo reduzir a intensa vasodilatação
esplâncnica existente no doentes com SHR,
quebrando assim a cadeia de acontecimentos
que está na base deste síndrome.
São três os tipos de vasoconstrictores
usados no tratamento do SHR:
- análogos da vasopressina (ornipressina e
terlipressina)
- análogos da somatostatina (octreótido)
- agonistas α-adrenérgicos ( noradrenalina
e midodrina)
Na maioria dos estudos, os vasoconstrictores foram administrados conjuntamente
com albumina, que contraria a hipovolémia
efectiva existente e aumenta a eficácia do
tratamento(58).
188
João Mangualde e Ana Paula Oliveira
Análogos da vasopressina
mina tiveram uma taxa de resposta mais
baixa(41,58). Nos doentes que respondem,
ocorre uma rápida subida do débito urinário
(12 a 24h). A subida da TFG faz-se de forma
mais lenta e, na maioria dos doentes,
permanece inferior ao valor normal. A
incidência de efeitos secundários, nomeadamente isquémicos, é substancialmente inferior
à da ornipressina (cerca de 10%), mas na
maioria dos estudos foram excluídos doentes
com patologia isquémica de base. A recidiva
após suspensão do tratamento ocorre em cerca
de metade dos doentes, mas o retratamento é
eficaz(58,87).
Estes dados referem-se a doentes com SHR
tipo 1. Embora alguns estudos revelem uma
melhoria da função renal em doentes com
SHR tipo 2 tratados com terlipressina, a sua
eficácia neste contexto ainda não está
comprovada.
Os análogos da vasopressina condicionam
vasoconstrição devido à sua acção nos
receptores V1 localizados nas células musculares dos vasos.
O primeiro análogo da vasopressina que
demonstrou ser eficaz no tratamento do SHR
foi a ornipressina. No entanto, a sua utilização
teve de ser abandonada porque ocorreram
efeitos adversos importantes, principalmente
isquémicos, numa percentagem significativa
de doentes(84-86).
O análogo da vasopressina actualmente
utilizado no SHR é a terlipressina. A dose
inicial recomendada é de 0,5 mg de 4-4h. Caso
não ocorra resposta, a dose deve ser aumentada progressivamente (cada 2-3 dias) até 2
mg de 4-4h. A duração do tratamento não
deve exceder os 15 dias (Quadro 6).
Nos diversos estudos realizados, a eficácia
do tratamento, definida como redução da
creatinina para valores inferiores a 1,5 mg/dL,
oscila entre os 42 e 92%, com uma média
de 63%(41,58,87-92). Os doentes idosos, com
pontuação de Child-Pugh superior a 13 e os
doentes aos quais não foi administrada albu-
Agonistas α-adrenérgicos e octreótido
A utilização de agonistas α-adrenérgicos
no tratamento do SHR foi testada num menor
número de doentes, mas com excelentes
resultados. Os fármacos utilizados foram a
QUADRO 6 - VASOCONSTRICTORES USADOS NO TRATAMENTO DO SHR
Vasoconstrictores
Terlipressina
Dose inicial: 0,5 mg 4-4h
Se não ocorrer resposta, a dose deve ser aumentada progressivamente até 2 mg de 4-4h
Midodrina e octreótido
Dose inicial: 2,5 mg de 8/8h de midodrina e 100μg de 8/8h de octreótido
Se não ocorrer resposta, a dose deve ser aumentada progressivamente até 12,5 mg de 8/8h de midodrina e 200μg de 8/8h
de octreótido
Noradrenalina
Dose inicial: 0,5 mg/h em infusão contínua e.v
Se não ocorrer resposta, a dose deve ser aumentada progressivamente até 3 mg/h
Albumina
Primeiro dia: 1 gr/Kg e.v
Dias seguintes: 20-50 gr/dia e.v
Duração do tratamento
15 dias
189
ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
noradrenalina e a midodrina, este último em
conjunto com um análogo da somatostatina, o
octreótido. Concomitantemente, foi administrada albumina a todos os doentes. As taxas de
resposta foram de 83% para a noradrenalina(93) e de 88% para a combinação midodrina/octreótido(94,95). Não ocorreram efeitos
secundários, com excepção de um doente que
teve um episódio de angor no decurso da
terapêutica com noradrenalina.
A dose inicial recomendada de noradrenalina é de 0,5 mg/h em infusão contínua, que
pode ser aumentada até 3 mg/h, de forma a
obter um aumento da pressão arterial média
superior a 10 mmHg.
As doses iniciais recomendadas da combinação midodrina/octreótido são, respectivamente, 2,5 mg t.i.d. p.o. e 100 μg t.i.d. s.c.
Podem ser aumentadas até 12,5 mg t.i.d. e 200
μg t.i.d., de forma a obter um aumento da
pressão arterial média superior a 15 mmHg.
(designado BQ123) em três doentes com
SHR(101). Todos responderam ao tratamento
com recuperação da TFG. Este estudo carece
de confirmação, pelo que este fármaco não
deve ser usado fora do contexto de estudos
clínicos.
N-acetilcisteína
A utilização da N-acetilcisteína baseia-se
na redução da formação de F2-isoprostanos
(vasoconstrictores renais implicados na
patogénese do SHR) graças ao seu potencial
antioxidante(102,103). Os resultados do único
estudo realizado com este fármaco foram
promissores. Ocorreu subida da clearance de
creatinina, da natriurese, do débito urinário e
da sobrevida média(104). A reduzida
amostragem impossibilita a sua recomendação
na práctica clínica.
TIPS
Outros fármacos
A colocação de um TIPS tem como finalidade reduzir a hipertensão portal e aumentar a
volémia efectiva, por diminuição do sangue
retido na circulação esplâncnica. Estas alterações hemodinâmicas levam à supressão dos
sistemas vasoconstrictores neurohormonais
implicados na génese do SHR.
Tem uma eficácia de cerca de 60%, com
aumento da sobrevida(105-110). No entanto, só
foi testado num subgrupo de doentes menos
graves. Nos doentes com EPS grave (grau IIIIV), INR>5, hiperbilirrubinémia importante,
pontuação de Child-Pugh >12, insuficiência
cardíaca congestiva ou idade >75 anos, o
risco de efeitos adversos graves impede a sua
utilização.
Apesar de ter uma eficácia semelhante à
dos fármacos vasoconstrictores, até serem
realizados estudos comparativos, o TIPS só
deve ser usado quando os primeiros falham,
pois é um procedimento mais caro, menos
disponível, com maior incidência de efeitos
adversos e aplicável num grupo mais restrito
de doentes.
Dopamina
A dopamina foi o primeiro fármaco testado
no tratamento do SHR devido ao seu efeito
vasodilatador renal. Os estudos realizados não
demonstraram qualquer benefício pelo que a
sua utilização não é recomendada(96,97).
Misoprostol
O misoprostol é um análogo sintético da
prostaglandina E1, com potencial efeito
vasodilatador a nível renal. Tal como no caso
da dopamina, os resultados obtidos com este
fármaco foram decepcionantes, pelo que a sua
utilização foi abandonada(98,99).
Antagonistas da endotelina
A endotelina é um vasocontrictor
endógeno que está aumentado no SHR(100).
Existe apenas um estudo publicado no qual foi
utilizado um antagonista da endotelina A
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João Mangualde e Ana Paula Oliveira
Prognóstico
Diálise
As técnicas dialíticas (hemodiálise intermitente e hemofiltração contínua arterio-venosa
ou veno-venosa) não têm eficácia comprovada
no tratamento do SHR, sobretudo pela elevada
incidência de efeitos secundários graves
(hipotensão arterial, coagulopatia e hemorragia digestiva)(111).
A sua utilização só está indicada em
doentes candidatos a TH, quando não existe
resposta aos fármacos vasoconstrictores ou à
colocação de TIPS ou na sobrecarga hídrica
grave, hipercaliémia ou acidose metabólica
refractárias à terapêutica médica.
Recentemente o sistema MARS (molecular
adsorbent recirculating system), um sistema
dialítico modificado que combina a remoção
de toxinas hidrossolúveis da diálise convencional com a remoção de toxinas ligadas à
albumina, foi comparado com a hemodiálise
em 13 doentes com SHR(112). No grupo tratado
com o sistema MARS houve uma redução
significativa da bilirrubina e da creatinina e
um aumento da sobrevida. Aguardam-se mais
estudos que confirmem a utilidade deste
sistema no SHR.
O SHR é a complicação da cirrose com
pior prognóstico. Na fase pré-transplante
hepático era uma situação irreversível e fatal
em quase todos os casos, com uma taxa de
recuperação espontânea de apenas 3,5%(5,113).
O grande determinante do prognóstico é o
tipo de SHR. Até final dos anos 90, a esperança média de vida era inferior a 2 semanas
para os doentes com SHR tipo 1 e de cerca de
6 meses para os doentes com SHR tipo
2(5,114,115). O segundo determinante da sobrevivência é a gravidade da cirrose, uma vez que
os doentes da classe C de Child-Pugh têm pior
prognóstico que os doentes da classe B(41,58).
O transplante hepático foi a primeira
opção terapêutica que veio alterar de forma
significativa o prognóstico destes doentes.
Apesar da morbilidade, incluindo a duração
do internamento pós-TH e a evolução para
insuficiência renal terminal com necessidade
de suporte dialítico, e a mortalidade serem
ligeiramente superiores à dos doentes
transplantados por outras indicações, a sobrevida aos 5 anos é significativamente superior à
dos doentes não-transplantados (40% vs 0%)(77).
Como já foi referido, a administração de
vasoconstrictores e de albumina revertem
cerca de 60-70% dos casos de SHR tipo 1.
Embora o seu impacto na taxa de mortalidade
como terapêutica única permaneça em
discussão(41), prolongam a sobrevida média,
aumentam a percentagem de doentes
transplantados, e melhoram a taxa de sobrevivência pós-transplante(82). No SHR tipo 2
parecem igualmente melhorar o prognóstico.
Outra medida terapêutica que contribuiu
para melhorar o prognóstico dos doentes com
SHR foi o TIPS. Nos doentes com SHR tipo 1
a colocação do TIPS permitiu aumentar a
sobrevida média para cerca de 15 semanas.
FIGURA 3 - TRATAMENTO DO SHR TIPO 1
Tratamento do SHR tipo 1
1ª linha - Transplante hepático
2ª linha - Vasoconstritores + Albumina
3ª linha - TIPS
Terapêutica complementar- restrição salina +/- restrição
hídrica +/- diálise
FIGURA 4- TRATAMENTO DO SHR TIPO 2
Tratamento do SHR tipo 2
1ª linha - Transplante hepático
2ª linha - Paracentese terapêutica+expansores do
plasma
Conclusão
3ª linha - Vasoconstritores + Albumina vs TIPS
Terapêutica complementar- diuréticos + restrição salina
+/- restrição hídrica
A ascite refractária e o SHR constituem os
últimos degraus de uma escala de alterações
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ASCITE REDRACTÁRIA E SÍNDROME HEPATORRENAL
tologia do SHR (fármacos vasoconstrictores e
TIPS) veio alterar este cenário, permitindo
aumentar a sobrevida, funcionando como
ponte para o transplante ou, em alguns casos,
como terapêutica única.
Conquanto consideráveis passos já tenham
sido dados na redução da morbilidade e
mortalidade destes doentes, existe ainda uma
vasto campo de progressão. As prioridades para
a investigação a curto prazo devem incidir na
confirmação ou negação da eficácia dos antagonistas da endotelina, da N-acetilcisteína e do
sistema MARS, que apresentaram resultados
muito promissores nos estudos já realizados.
Mais do que tratar numa fase em que a
tentativa de reversão da situação impõe
medidas drásticas como o TIPS e o TH, no
futuro será importante identificar precocemente a fase pré-ascítica da cirrose e desenvolver medidas profiláticas, capazes de impedir
a progressão natural da disfunção hepatorrenal para a insuficiência renal irreversível.
fisiopatológicas desencadeadas pela disfunção
circulatória que acompanha a insuficiência
hepática e a hipertensão portal. Esta disfunção
estabelece-se de forma insidiosa e progressiva,
o que nos leva a concluir que o SHR se inicia,
na realidade, com a redução da capacidade de
excreção de sódio na fase pré-ascítica.
Compreender a patogenia das alterações
que conduzem à ascite refractária e ao SHR é,
pois, fundamental para a prevenção e tratamento destas graves complicações da cirrose.
Nos últimos anos tem-se assistido a importantes avanços no tratamento destas duas
entidades, com melhoria significativa do seu
prognóstico. O tratamento de eleição é o TH,
uma vez que é o único que permite a cura
simultânea das patologias hepática e renal. No
passado, a escassez de órgãos e a reduzida
sobrevida média destes doentes, determinavam que a maioria vinha a falecer antes do
procedimento. O desenvolvimento de novas
terapêuticas capazes de interferir na fisiopa-
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COLANGITE AGUDA
NUNO NUNES
A Colangite Aguda é o desenvolvimento
de infecção numa via biliar obstruída. Pode
apresentar-se de uma forma ligeira, que
resolve rapidamente com tratamento conservador, ou de uma forma que não responde a
todas as medidas tomadas para a tratar, e que
se torna rapidamente fatal.
A Colangite ascendente é a mais frequente e
a mais benigna, e está relacionada com
obstrucção parcial da via biliar principal ( VBP ).
A Colangite supurativa está associada com a
obstrucção biliar total ou quase total, com
pressão intra biliar aumentada, e pús dentro
da via biliar .
A distinção entre estas duas entidades
pode não ser clara do ponto de vista clínico e
a colangite ascendente pode evoluir para
colangite supurativa.
e há evidência experimental de translocação
de bactérias do tubo digestivo e de bactériemia
da veia porta(3,4).
A translocação pelo tubo digestivo pode
estar aumentada na icterícia obstrutiva(5). A
endotoxémia portal também está aumentada
na icterícia obstrutiva e pode estar relacionada
com a ausência de ácidos biliares no lúmen do
intestino, que são normalmente responsáveis
pela ligação a endotoxinas, levando à sua
eliminação pelas fezes(6).
O exame bacteriológico da bílis em doentes
com colangite aguda mostra que a maior
parte dos agentes tem origem no tubo digestivo.
Foram isoladas muitas espécies diferentes
(7-8) sendo as mais comuns a E.coli, a Klebsiela
e o Enterococus .
Também se isolaram bactérias anaérobicas
e existe comprovação em modelos experimentais de um efeito sinergético entre as bactérias
aeróbicas e anaérobicas(9). Podem obter-se
entre 20 a 60 % de culturas positivas(7,9,10,11).
Ocasionalmente pode isolar-se Cândida na
bílis de doentes, particularmente naqueles que
sofrem de obstrucção maligna.
FISIOPATOLOGIA
A Colangite Aguda resulta do efeito
combinado das bactérias com a árvore biliar
obstruída.
A bílis de doentes com uma via biliar normal
é estéril. Esta esterilidade é mantida pelo esfíncter de Oddi, fluxo biliar, e pelas propriedades
bacteriostácticas da bílis. Em mais de 75% de
doentes com cálculos na via biliar(1,2) é possível
obter culturas positivas na bílis.
A pressão biliar aumentada resulta na
passagem de báctérias para o sistema venoso e
linfático hepático. O processo pelo qual as
bactérias ganham acesso à via biliar é incerto,
ETIOLOGIA E INCIDÊNCIA
A forma ascendente é a apresentação mais
frequente da Colangite Aguda. A maior parte
dos doentes apresenta-se com episódios
ligeiros de colangite, e somente 10 a 15 %
com colangite supurativa (7)
199
COLANGITE AGUDA
As causas possivéis de Colangite Aguda
são multíplas. (Quadro I)
hepaticojejunostomia. O problema é agravado
quando existe estenose da anastomose bilioentérica tornando a drenagem deficiente ou
impossivel.
A infestação das vias biliares por nemátodes e tremátodes tais como ascarís
lumbricóides, e fascíola hepática e clonorchis
sinensis, tambem podem estar associadas a
episódios de Colangite Aguda
A doença hidática pode precipitar uma
colangite quando existe ruptura do quisto para
a via biliar,
indo as hidátides causar
obstrucção.
A etiologia da colangiopatia associada à
SIDA é incerta, mas está provavelmente
relacionada com infecções entéricas por
organismos oportunistas.
QUADRO I - ETIOLOGIA DA COLANGITE AGUDA
Lítiase biliar
Estenose maligna da Via Bilar
Lesões iatrogénicas
- CPRE
- Colangiografia percutânea transhepática
- Lesões pós-cirúrgicas
Parasitoses e Infecções
- áscaris lumbricóides
- fasciolíase hepática
- Hidatidose hepática
- Clonorchis sinensis
- SIDA
A causa mais frequente de Colangite
Aguda nos países ocidentais(12-13) são cálculos
na via biliar que migraram da vesícula,
apresentando-se mais frequentemente em
indivíduos com idade superior a 65 anos. Nos
últimos anos, tem havido um aumento de
casos de Colangite Aguda por obstrução
maligna da via biliar(14), e pensa-se ser devido
ao maior uso de próteses biliares e instrumentação da via biliar em doentes com icterícia
obstrutiva de causa maligna.
A Colangite Aguda é uma complicação
bem documentada da Colangio Pancreato
grafia Retrógrada Endoscópica (CPRE),
principalmente se a VBP está obstruída ou se
no momento da realização da CPRE não
houve uma remoção total dos cálculos(15).
Outras manipulações da VBP , como a
colocação de tubo em T ou a colangiografia
percutânea transhépatica tambêm estão associadas com a possibilidade de precipitarem
uma Colangite. Vários factores podem contribuir para isto, incluindo a introdução de
bactérias durante o procedimento, e a pressão
intra biliar aumentadas durante a injecção de
contraste(16).
Episódios recorrentes de colangite, podem
complicar reconstruções cirúrgicas tais como
esfincteroplastia, coledocoduodenostomia e
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E
DIAGNÓSTICO
A colangite aguda pode apresentar-se com
um largo espectro de manifestações clínicas
(Quadro II) desde uma doença ligeira até uma
colangite tóxica grave com confusão, choque e
icterícia. Somente 5 % dos doentes se apresentam com características de choque séptico(14 ).
QUADRO II – MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Tríade de Charcot
- Febre
- Icterícia
- Dor
Choque séptico
Leucocitose
Hiperbilirrubinémia
Elevação enzimas hepáticos
Hiperamilasémia
A tríade de Charcot: febre, dor e icterícia
pode estar presente em cerca de 90 % dos
doentes com colangite grave supurativa.
Doentes com formas mais ligeiras de colangite
podem não apresentar estas três características. Em séries recentes, a febre estava presente
200
Nuno Nunes
em mais de 90 % dos doentes, mas só 60%,
estavam clinicamente ictéricos na apresentação, e 50 % tinham dor abdominal.
Febre, dor e ictericia podem estar
presentes noutras condições intra abdominais
tais como o sindroma de Mirizzi, ou coexistir
com pancreatite aguda.
No exame objectivo a ictericia e a dor à
palpação são observadas em muitos doentes
com os ruídos hidro aéreos estão normalmente
mantidos. Alterações mais graves intra
abdominais, tais como dor intensa, defesa e
sinais difusos de irritabilidade peritoneal não
são habituais, e alertam para outros diagnósticos possíveis.
imagem a serem utilizados . A ecografia tem
elevada sensibilidade para colelitíase (20) mas
menor sensibilidade (50%) para a coledocolitíase(21). Pode-se no entanto inferir a existência de colédocolitíase pela presença de
dilatação da VBP associada à colélitiase.
No entanto, nem sempre se observa
dilatação da via biliar numa fase inicial de
obstrução, e a capacidade da ecografia em
demonstrar a existência de coledocolitíase é
baixa.
A TAC sem injecção de contraste é mais
sensível do que a ecografia na demonstração
de coledocolitíase
A ressonância magnética das vias biliares e
pâncreas e a ecoendoscopia, são as técnicas
mais sensíveis para a correcta determinação da
causa e do nível de obstrução nos doentes com
colangite aguda(37).
A CPRE já não deve ser usada apenas
como método diagnóstico, mas sim quando a
probabilidade de intervenção terapêutica é
grande, o que acontece nos doentes com
suspeita clínica de colangite, dado haver
métodos não invasivos com elevada acuidade
diagnóstica
A investigação laboratorial dá suporte ao
diagnóstico clínico, mas não confirma definitivamente o diagnóstico.
Os leucócitos estão elevados, em cerca de
70% dos doentes observam-se valores superiores a 10.000 por mm3(15-17).
Um pequeno grupo de doentes com
Colangite supurativa pode apresentar-se com
leucopénia(14).
Apesar de poder não haver tradução clínica, a maior parte dos doentes tem valores
elevados de bilirrubina. 20% dos doentes tem
um valor de bilirrubina inferior a 35 mol / L
(8,16). As transaminases e a fosfatase alcalina
estão habitualmente elevados(16). A fosfatase
alcalina habitualmente está mais elevada em
doentes com obstrução de causa maligna,
enquanto que é frequente nas obstruções de
causa benigna serem as transaminases que
apresentam valores mais elevados(8). Estas
alterações laboratoriais, não estabelecem o
diagnóstico, mas valores normais de bilirrubina
e transaminases são altamente improváveis em
doentes com colangite.
Ligeiras alterações da amilase são observadas em mais do que 35 % dos doentes com
colangite e 11% poderão ter valores superiores a 1000(16).
TRATAMENTO
Em casos de suspeita de colangite, devem
ser iniciadas as medidas gerais de suporte,
soros e pausa alimentar podendo ser
necessário entubação naso gástrica. Devem ser
corrigidas as alterações da coagulação e
electrolíticas e após colheita de hemoculturas
iniciar antibioterapia.
Para casos ligeiros o tratamento pode ser
iniciado com recurso a um antibiótico. Em
casos mais graves deve ser efectuada antibioterapia mais intensiva, onde múltiplos
novos regimes se tem mostrado eficazes.
A escolha de antibióticos deve cobrir tanto
as bactérias Gram + como as Gram –, até
estarem disponíveis os resultados das hemoculturas. Séries mais recentes demonstraram
que bactérias aneróbicas como bacteróides
spp, tem-se tornado mais frequentes, devendo
A ecografia e a tomografia axial computorizada (TAC) são os primeiros métodos de
201
COLANGITE AGUDA
CONCLUSÃO
o regime de antibióticos escolhido cobrir este
agente.
Baseado nestas considerações, a utilização
de uma penicilina de largo espectro, (tal como
a piperacilina) associada a um inibidor da
B-lactamase, deverá ser considerado o esquema de primeira escolha para o tratamento da
colangite aguda(38).
A melhoria é esperada entre 6 a 12 horas,
e na maior parte dos casos, a infecção é
controlada em 2 a 3 dias, com diminuição da
febre, alívio do desconforto, e descida dos
glóbulos brancos. Nestes casos a terapêutica
definitiva pode ser planeada numa base electiva. Se ao fim de 6 a 12 horas, o doente não
apresentar melhoria, ou o estado clínico
piorar, com agravamento da febre, confusão
mental ou hipotensão, tem de haver uma
drenagem emergente da Via Biliar. Se houver
disponibilidade local deve ser efectuada uma
CPRE, com extração de cálculos, ou a
descompressão através de colocação de
prótese, ou sonda naso biliar. A sonda nasobiliar ou a prótese são igualmente seguras e
eficazes(39).
A CPRE tem uma percentagem de sucesso
de 90 a 98%,(15) e é superior à cirurgia, e à
drenagem percutânea(22-27).
Posteriormente, os doentes com colangite
e colelitíase devem, de uma forma electiva,
ser submetidos a colecistectomia. Para os
colecistectomizados a CPRE é o tratamento
definitivo(31-37). (Figura 1)
A colangite aguda resulta da combinação
de uma via biliar obstruída com infecção da
mesma. Tem um largo espectro de gravidade,
de um quadro ligeiro, que responde rapidamente aos antibióticos, até um quadro grave
com septicémia, que por vezes pode ser fatal.
A litíase permanece uma importante causa de
colangite; no entanto a obstrução maligna está
a aumentar de frequência. As bactérias
responsáveis pela infecção têm origem no tubo
digestivo. O tratamento inicial deverá ser
efectuado com antibióticos de largo espectro.
A maior parte dos doentes responde ao tratamento instituído, podendo o tratamento
definitivo da obstrução biliar ser efectuado
posteriormente. Doentes com formas graves
de colangite que não respondem ao tratamento inicial necessitam de efectuar uma
descompressão emergente da via biliar. Para a
maior parte dos doentes o método mais eficaz
é a CPRE com esfincterotomia, ou em alternativa fazer-se a colocação de sonda naso-biliar
ou prótese.
202
Nuno Nunes
FIGURA 1 – ALGORITMO DE DIAGNÓSTICO E TERAPÊUTICA DA COLANGITE AGUDA
DOENTE COM COLANGITE
Correcção de desiquilíbrios hidro-electrolíticos e coagulopatia,
analgesia, antibioterapia, correcção da coagulopatia, pausa alimentar
Estabilização
Agrav amento do quadro ou ausência de recuperação em 12-24h
CPRE SEMI-ELECTIVA
(dentro de 72h)
Com limpeza da via biliar
• Doente em condição estável: ETE e limpeza da via biliar
• Doente em condição instável e alto risco: prótese biliar ou sonda
CPRE URGENTE (dentro de 12h)
Sucesso
Falência
Nov a CPRE ou drenagem percutânea
Vesícula intacta
Pós-colecistectomia
Sem mais intervenções
Sem condições para cirurgia
Elegív e l para cirurgia
Manter em v igilância
Considerar: terapêutica de dissolução
ou litotrícia extra-corpórea
Cirurgia electiva
(preferencialmentel aparoscópica)
203
COLANGITE AGUDA
Blibliografia
1
2
3
4
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
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205
PANCREATITE AGUDA
CRISTINA FONSECA
RUI LOUREIRO
impõe o diagnóstico diferencial com outras
patologias abdominais em que é necessária a
intervenção cirúrgica urgente(4)(Quadro 1).
INTRODUÇÃO
Pancreatite aguda, segundo o Simpósio
Internacional de Atlanta (1992), designa um
processo inflamatório agudo do pâncreas
exócrino que pode envolver os tecidos
peripancreáticos e/ou órgãos à distância(1,2,3,4).
O pâncreas possui mecanismos de defesa
que evitam a autodigestão causada pela
secreção de enzimas digestivas proteolíticas.
Na pancreatite aguda estes mecanismos de
protecção celular falham. As proenzimas
pancreáticas são activadas dentro das células
acinares provocando lesão da glândula e
extravasamento de substâncias tóxicas
(enzimas pancreáticas activadas, péptidos
vasoactivos, e outras substâncias) para os
órgãos vizinhos e circulação sistémica(1,3,5).
QUADRO 1- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DA
PANCREATITE AGUDA
Cólica biliar
Colecistite aguda
Perfuração de víscera oca
Isquémia intestinal
Oclusão intestinal
Aneurisma dissecante da aorta
Gravidez ectópica
Enfarte da parede inferior do miocárdio
A-Apresentação clínica
O sintoma cardinal da pancreatite aguda é
a dor nos quadrantes superiores do abdómen,
principalmente a nível do epigastro, presente
em mais de 95% dos casos(1,2,3,6); face à
localização retroperitoneal do pâncreas a dor
irradia para o dorso (dor em cinturão) em
aproximadamente metade dos casos. Se os
exsudados se estenderem para as goteiras
parieto-cólicas pode irradiar para os quadrantes inferiores do abdómen, ou ser
generalizada se houver envolvimento difuso
do peritoneu(2). Raramente irradia para o
tórax ou para os ombros(1,2,3,6).
A dor tem início agudo, atinge a intensidade máxima em 10 a 30 minutos, e persiste
durante horas ou dias. Habitualmente é muito
A abordagem do doente com pancreatite
pode ser dividida em três fases :
I. Diagnóstico, determinação da etiologia,
e avaliação da gravidade da doença
II. Tratamento
III. Detecção e terapêutica das complicações
I. Diagnóstico, determinação da
etiologia, e avaliação da gravidade
1- Diagnóstico
O diagnóstico de pancreatite deve ser feito
nas primeiras 48 horas após a admissão e
207
PANCREATITE AGUDA
intensa cedendo apenas a narcóticos(2,3,6).
Pode ser desencadeada por refeição copiosa,
consumo abundante de bebidas alcoólicas, ou
traumatismo. A intensidade dolorosa aumenta
com a ingestão alimentar e com o decúbito(7),
e diminui com a postura de genuflexão ou em
“prece maometana”.
associadas a calafrios ou a picos febris são
sugestivas de infecção(6,7). Nos doentes com
pancreatite aguda litiásica este padrão sustenta a hipótese de colangite aguda(2).
É característica a desproporção entre a
intensidade dolorosa referida pelo doente e os
escassos achados no exame objectivo do
abdómen(7). Na maioria dos casos existe dor à
palpação do abdómen, mais evidente no
epigastro, sem sinais de irritação peritoneal.
Na pancreatite litiásica pode também haver
dor à palpação do hipocôndrio direito(7).
Os sinais de irritação peritoneal, quando
presentes, traduzem pancreatite aguda grave,
ou complicada por necrose do cólon transverso(2). Habitualmente há distensão abdominal
(7) e diminuição ou ausência de ruídos intestinais(2,6). A ascite é rara e pode ser causada
por exsudação de fluido pancreático ou por
ruptura do ducto pancreático principal(2).
Em aproximadamente 1% dos casos, após 48
horas, pode observar-se na parede abdominal
dois sinais de mau prognóstico (não patognomónicos de pancreatite): uma equimose
azulada na região peri-umbilical – sinal de
Cullen – que traduz hemoperitoneu, ou uma
mancha arroxeada ou acastanhada nos flancos
– sinal de Grey-Turner- que está associado a
hemorragia retroperitoneal(1,2,4,7,9,10).
A dor aguda causada pela cólica biliar,
perfuração de úlcera, isquémia da mesentérica, e oclusão intestinal, pode simular a dor
da pancreatite. Contudo na cólica biliar a dor
localiza-se preferencialmente no hipocôndrio
direito, dura só algumas horas, e a sua intensidade varia, diferenciando-se da dor da
pancreatite que é constante e persiste mais de
24 horas(2,6). Na perfuração de úlcera péptica
a dor tem um início mais abrupto e os sinais de
irritação peritoneal(8) são mais evidentes .
O choque de etiologia desconhecida é a
forma de apresentação de 2% das pancreatites
agudas(2,7) e, neste caso, pode estar ausente a
sintomatologia dolorosa. A pancreatite
também pode ser indolor nos doentes submetidos a diálise peritoneal, no pós-operatório
(especialmente após o transplante renal), na
Doença do Legionário, nos doentes com alteração do estado mental, e na cetoacidose(2,6).
Em 90% dos casos a dor está associada a
náuseas e vómitos(1). Os vómitos podem
persistir durante horas(3) e geralmente não
contêm sangue mas podem conter bílis.
Diferenciam-se dos vómitos associados à
oclusão do intestino delgado por não serem
fecalóides e não aliviarem a dor(6).
B- Exames Analíticos
A suspeita clínica, mesmo nos casos em
que a sintomatologia dolorosa é típica, necessita de ser confirmada pela elevação sérica
das enzimas pancreáticas -amilase e/ou lipasepelo menos para o triplo do valor normal(2,3,11).
O nível de amilase sérica começa a elevar-se nas primeiras 2 a 3 horas de doença, tem
um pico das 12 às 24 horas, e normaliza após 3
a 5 dias(1,7).
Uma amilase normal ou menor que três
vezes o limite superior do normal questiona o
diagnóstico de pancreatite aguda excepto nas
seguintes situações:
Na altura da admissão a febre é rara mas
em 70% dos doentes aparece nos primeiros
dias da doença(6). Na primeira semana de
doença a febre é geralmente causada pela
resposta inflamatória sistémica e não por
processo infeccioso(2,7). Habitualmente é
inferior a 39ºC, persiste uns dias, e desaparece
quando a inflamação pancreática diminui(2).
No entanto temperaturas superiores a 39 ºC e
208
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
1) Na pancreatite aguda alcoólica - porque
os níveis intracelulares de amilase são
menores no pâncreas lesado de forma
crónica pelo álcool.
2) Na hipertrigliceridémia - porque há um
factor sérico, ainda não identificado,
que inibe a amilase e impede a subida da
amilasémia.
Nos casos em que há a suspeita de
pancreatite e a amilase é normal devem ser
doseados os triglicéridos. Se os triglicéridos
estiverem elevados o soro deverá ser diluído
antes de nova determinação de amilase.
3) Se o doseamento for tardio - se o
primeiro doseamento de amilase for
efectuado 2 a 3 dias após o início da
pancreatite o seu nível não reflecte o
pico de amilasémia e a sua sensibilidade
diminui(6,7).
A amilasúria e a relação clearance de
amilase/ creatinina persistem elevadas mais
tempo que a amilasémia e são úteis no
diagnóstico tardio(6). Contudo não diferenciam a pancreatite aguda de outros processos
abdominais que cursam com elevação sérica
de amilase e por isso não se recomenda a sua
determinação por rotina(7,10).
A hiperamilasémia, geralmente inferior a três
vezes o limite superior do normal, é frequente
em doenças extra-pancreáticas(12)(Quadro 2).
A hiperamilasémia que persiste mais de 5
dias orienta o diagnóstico para complicação de
pancreatite como o pseudoquisto ou a fístula
pancreática,(1, 6) ou para patologia não pancreática associada a amilase persistentemente
elevada como a neoplasia ou a macroamilasémia(6). Na macroamilasémia a elevação
da amilase pode ser superior a três vezes o
valor normal. Quando não é possível determinar a macroamilase o diagnóstico diferencial
com a pancreatite aguda é feito pela amilasúria
(que está baixa), pela relação clearance de
amilase/ creatinina ( que é <1%) e pela lipase
no soro (que é normal)(6).
A lipase sérica aumenta 4 a 8 horas após o
início da pancreatite, tem um pico às 24 horas,
e permanece elevada durante 10 a 14 dias(1).
A lipase sérica é ligeiramente mais sensível
que a amilase sérica porque permanece elevada
durante mais tempo e também é mais específica (96%) para lesão pancreática porque
o pâncreas é a única fonte de lipase(6,7,11).
É especialmente útil nas situações em que a
QUADRO 2- CAUSAS DE HIPERAMILASÉMIA
Origem Intra-abdominal
Pancreática
Extra-pancreática
Pancreatite aguda, Pancreatite crónica, Pseudoquisto, Traumatismo pancreático, Cancro do pâncreas
Perfuração intestinal, Enfarte intestinal, Apendicite, Peritonite, Hepatite, Aneurisma da aorta
abdominal, Rotura de gravidez ectópica, Salpingite, Quisto do ovário
Origem Extra-abdominal
Doenças das grândulas salivares, Insuficiência renal, Cetoacidose, Pneumonia, Traumatismo craneano, Queimadura,
Anorexia, Bulimia, Cirurgia extra-abdominal
Macroamilasémia
Idiopática
Induzida por drogas
Comprovada
Azatioprina, L-asparginase, Sulfonamidas, Tetraciclina, Didanosina, Metildopa, Valproato,
Estrogénios, Furosemida, Pentamidina, Ácido 5-aminossalicílico, Salicilatos, Tiazidas, Cálcio,
Alcaloides de vinca
Provável
Corticóides, Nitrofurantoína, Fenformina, Tacrolimus, Metronidazol, 6-Mercaptopurina,
Procainamida, Difenoxilato, Clortalidona, Cimetidina, Arabinosido de citosina, Cisplatina,
Ciclosporina A
209
PANCREATITE AGUDA
amilase não tem sensibilidade ou especificidade suficiente para fazer o diagnóstico: nas
pancreatites associadas a amilasémia normal,
na avaliação laboratorial tardia, e no diagnóstico diferencial com patologia associada a
hiperamilasémia com lipasémia normal (caso
da macroamilase, parotidite e neoplasias)(1,7).
Apesar do diagnóstico de pancreatite
dever ser preferencialmente confirmado pela
lipasémia(10,11) é habitualmente utilizada a
amilasémia por o doseamento de lipase não ser
realizado em todos os hospitais. A elevação da
amilase e/ou da lipase confirma o diagnóstico
mas o seu valor absoluto não se correlaciona
com a gravidade local ou sistémica da
doença(1,3,5,6,10).
em cerca de um terço dos casos o excesso de
gás intestinal impede a visualização do
pâncreas(13). Em 25 a 50% dos casos detecta
edema pancreático(5,10) e fluido peritoneal(1)
mas não distingue o pâncreas edematoso do
pâncreas necrótico(6). É útil para: excluir
patologia não pancreática(7) como o aneurisma da aorta abdominal(4) e a colecistite
aguda(13), e para efectuar o diagnóstico de
pancreatite secundária a obstrução litiásica do
colédoco- pancreatite litiásica(7). Contudo o
diagnóstico de pancreatite litiásica pode ser
instituído pela clínica suportada por dados
bioquímicos na ausência de confirmação
ecográfica(14). A ecografia tem menor sensibilidade para detectar coledocolitíase do que
para detectar litíase vesicular(14). Durante o
episódio de pancreatite aguda esta sensibilidade é ainda menor(14,15). É de salientar que a
coledocolitíase nem sempre provoca dilatação
do colédoco(15); um colédoco normal não
exclui pancreatite litiásica(14), e um colédoco
dilatado não está sempre associado a obstrução
por cálculo podendo resultar da compressão
pelo edema da cabeça do pâncreas(6).
A realização de TC abdominal na urgência, com intuito exclusivamente diagnóstico,
só está indicada nas apresentação atípicas
quando a clínica e os exames analíticos são
inconclusivos(7). A TC confirma o diagnóstico
e exclui outras causas de abdómen agudo
como a úlcera perfurada, a isquémia da mesentérica, e o enfarte intestinal, evitando a
laparotomia exploradora(3,6,10).
Nos casos de peritonite em que, após
investigação com TC, persiste a incerteza
diagnóstica, a laparotomia exploradora pode
estabelecer o diagnóstico de pancreatite ou
identificar outras patologias passíveis de terapêutica cirúrgica(1,4).
C- Exames de Imagem
Na suspeita de pancreatite está indicada a
realização de Rx de tórax, Rx de abdómen,
ecografia hepatobiliopancreática(8) e, eventualmente, TC abdominal.
O Rx de tórax e Rx de abdómen não
contribuem para o diagnóstico(10) mas detectam complicações pulmonares associadas(7) e
excluem outras patologias abdominais(4,5).
Um terço dos doentes com pancreatite
tem anomalias no Rx de tórax : elevação do
diafragma, derrame pleural, atelectasias basais
e, nos casos graves, presença de infiltrados
alvéolo-intersticiais sugestivos da Síndrome
de
dificuldade
respiratória
aguda
(ARDS)(4,5,6,13).
O Rx de abdómen exclui a oclusão intestinal e o pneumoperitoneu(1,4,5). É rara a
presença de sinais indirectos de envolvimento
retroperitoneal: a) distensão duodenal com
níveis hidroaéreos, b) a “ansa sentinela” - íleo
localizado ao jejuno, c) íleo generalizado com
níveis hidroaéreos, d) “sinal do cólon amputado”- distensão isolada do cólon transverso (5).
Estes sinais são inespecíficos e não podem ser
utilizados para fazer o diagnóstico(4).
A ecografia abdominal deve ser realizada
nas primeiras 24 a 48 horas após a admissão(3).
É muito específica mas pouco sensível(7) pois
2. Avaliação etiológica
Feito o diagnóstico de pancreatite deve ser
determinada precocemente a sua etiologia
tendo em conta que há terapêutica específica
para algumas etiologias nomeadamente para a
210
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
pancreatite litiásica e para algumas formas de
pancreatite metabólica(10).
A pancreatite é uma doença de etiologia
variada (Quadro 3).
A etiologia deve ser determinada em pelo
menos 80% dos casos e não mais do que 20%
devem ser classificados como idiopáticos(11).
Segundo os dados do estudo “Epidemiology of
acute pancreatitis in mediterranean coun-
tries”, realizado pelo Clube Português do
Pancreas em 11 hospitais nacionais, e apresentado em 2005 no 4 th Meeting of
Mediterranean Societies of Pancreatology, a
principal etiologia da pancreatite no nosso
País é a coledocolitíase (49% dos casos) seguida pelo álcool (22% dos casos). Os restantes
casos são causados por fármacos, dislipidémia
e iatrogenia (pós CPRE).
QUADRO 3- ETIOLOGIA DA PANCREATITE AGUDA
Coledocolitíase
Álcool
Metabólica
Hipertrigliceridémia, Síndrome de deficiência de apolipoproteína CII, Hipercalcémia, Insuficiência renal,
Esteatose aguda da gravidez, Cetoacidose diabética
Fármacos
Azatioprina, 6-mercaptopurina, Sulfonamidas, Tiazídicos, Furosemida, Estrogénios, Valproato, Pentamidina,
Didanosina, Paracetamol, Nitrofurantoína, Metildopa, Eritromicina, Salicilatos, Tetraciclina, Metronidazol,
Anti-inflamatórios não esteróides, Inibidores da enzima conversora da angiotensina, Citarabina, L-asparaginase, Cimetidina, Ranitidina, Corticoesteróides, Procainamida
Iatrogenia
Pós - Cirurgia (abdominal e extra-abdominal)
Pós CPRE
Manometria do esfíncter de Oddi
Aortografia trans-lombar
Pós-traumatismo
Infecciosa
Parotidite epidémica, Hepatite viral (A,B,C), outras infecções virais (vírus Coxsackie B, Echovírus,
Citomegalovírus, vírus Epstein-Barr, Herpes-vírus, HIV), bacteriana (Mycoplasma, Campylobacter,
Salmonella, Micobactérias), infestação por parasitas (Ascaris, Clonorchis)
Vascular
Isquémia/hipoperfusão, Embolização, Aneurisma do eixo celíaco, Vasculite
Patologia local
Úlcera péptica penetrante, Doença de Crohn, Divertículo peri-ampular, Doenças dos ductos (pancreático ou
biliar), Neoplasia do pâncreas, Disfunção do esfíncter de Oddi, Obstrucção da papila por parasitas ou corpo
estranho
Pâncreas Divisum
Fibrose Quística
Toxinas
Veneno de escorpião, Organofosforados, Álcool metílico
Pancreatite aguda Familiar
Doença auto-imune
Lúpus eritematoso sistémico, Síndrome de Sjorgren
Idiopática
211
PANCREATITE AGUDA
QUADRO 4- PLANO PARA INVESTIGAR A ETIOLOGIA DA PANCREATITE AGUDA
História Clínica
Antecedentes de litíase, história familiar†, ingestão de drogas, consumo de álcool, exposição a vírus ou
existência de sintomas prodrómicos
Fase I
Bioquímica no soro (Amilase, Lipase, Testes de função hepática, Lipídos, Cálcio), Ecografia abdominal, TC
abdominal
Fase II
Repetição da ecografia hepática, realização de CPRE/ ColangioRM, Exame de cristais na bílis, Ecoendoscopia,
Manometria do esfíncter de Oddi
Fase III
Título de Ac virais, Actividade da α1 antitripsina, Marcadores de autoimunidade, Citologia Pancreática e
Biliar, Teste de estimulação com secretina para exclusão de Pancreatite crónica
†Se história familiar (Pancreatite aguda, dor abdominal recorrente não diagnosticada, Carcinoma pancreático, Diabetes mellitus de tipo I) realizar o estudo genético: Mutação do gene tripsinogénico catiónico, mutação CFTR, mutação SPINK 1
A investigação da etiologia da pancreatite
aguda pode ser dividida em quatro fases. Após
um episódio de pancreatite aguda são realizados os exames incluídos na fase I. Se não se
identificar causa óbvia e os episódios recorrerem (pancreatite idiopática recorrente) o
nível de investigação aumenta(2,11) (Quadro 4).
A etiologia litíasica deve ser considerada
nos casos com: aminotransferases> 3 x o normal, icterícia, colangite, amilase> 800 IU/L, e
ecografia com litíase ou colédoco dilatado(18).
As aminotransferases elevadas têm baixa
sensibilidade e alta especificidade para o
diagnóstico de pancreatite litiásica(15). Um valor
normal de aminotransferases não exclui patologia litiásica(10); um valor superior a três ou mais
vezes o limite superior do normal de aspartato
aminotransferase (AST) ou de alanina aminotransferase (ALT) á entrada no serviço de
urgência tem um valor predictivo positivo
superior a 95% para diagnosticar a etiologia
litiásica(10,14,15). O quociente ALT/AST >1
também é sugestivo desta etiologia(7). A elevação da fosfatase alcalina (FA) e da bilirrubina
não é específica mas suporta o diagnóstico(10,14).
A icterícia, habitualmente pouco marcada, pode
ser causada por litíase mas pode também ter
origem em doença hepática concomitante ou na
compressão biliar por quisto ou por edema do
pâncreas(6). A elevação da bilirrubina e/ou das
aminotransferases 24 a 48 horas após a admissão
é muito sugestiva da presença de cálculo no
colédoco(10,15).
A Ecoendoscopia e a Colangio-ressonância magnética têm maior acuidade para o
diagnóstico de coledocolitíase do que a
ecografia; no entanto não estão facilmente
Pancreatite litiásica
A pancreatite litiásica é mais frequente no
sexo feminino (relação de 3:1) e tem um pico
de incidência entre os 50 anos e os 60 anos de
idade(1,16). Geralmente é desencadeada pela
passagem da cálculos pela ampola de Vater
para o duodeno ou, mais raramente, pela sua
persistência na ampola(17). A litíase vesicular é
sugestiva mas não conclusiva de pancreatite
litiásica(14). Só numa pequena percentagem de
casos de litíase vesicular a migração de
pequenos cálculos origina pancreatite
aguda(14,16). A incidência não é influenciada
pelo número, mas o tamanho inferior a 5 mm
aumenta quatro a cinco vezes o risco de desenvolver pancreatite(16).
A maioria dos cálculos passa fácil e rápidamente pelo colédoco e causa pancreatite
ligeira(15). Os casos de pancreatite litiásica
grave complicada por colangite estão
frequentemente associados à persistência de
cálculos no colédoco(15).
212
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
acessíveis e o seu papel na selecção de doentes
para colangiopancreatografia retrógrada
endoscópica (CPRE) terapêutica não está
completamente estabelecido(14).
Pode sobrevir pancreatite no pós operatório,
quer de cirurgias em que haja manipulação
directa do pâncreas e/ou de estruturas
contíguas, quer de cirurgias a órgãos distantes.
A exploração do colédoco, a esfincteroplastia, a
gastrectomia distal, a cirurgia renal, e a cirurgia
cardiovascular, associam-se com frequência a
pancreatite(16).
Pancreatite alcoólica
Na pancreatite alcoólica há um
predomínio de doentes jovens (< 40 anos) e
do sexo masculino(1).
Uma percentagem significativa de casos de
pancreatite aguda induzida pelo álcool pode
progredir para pancreatite crónica(16).
É controverso se os episódios de pancreatite
aguda nos alcoólicos correspondem a exacerbações de pancreatite crónica alcoólica ou a
episódios recorrentes de pancreatite aguda(2).
A maioria dos episódios é causada pelo
consumo crónico (em média durante quatro a
sete anos) de 150 g/dia de álcool mas a
ingestão de 50 g/dia de álcool também pode
causar pancreatite(19).
A taxa de mortalidade é menor do que a
da pancreatite litiásica e da pancreatite
idiopática em parte devido ao facto de os
doentes serem jovens(8).
Pancreatite Metabólica
Os doentes com hiperlipidémia de tipo I,
IV ou V podem desenvolver pancreatite
principalmente se os valores de triglicéridos
forem superiores a 1000 mg/dL(9,16). Na pancreatite grave os níveis elevados de triglicéridos
podem ser diminuídos por plasmaferese(13). Na
pancreatite aguda alcoólica há hipertrigliceridémia transitória mas é desprovida de
significado etiológico(16).
A hipercalcémia também pode causar
pancreatite; no entanto a baixa incidência de
pancreatite aguda em doentes com hipercalcémia crónica sugere a existência de outros
co-factores na sua génese(20).
Pancreatite Idiopática
Em 10% a 30% dos doentes não é possível
determinar a etiologia da pancreatite aguda
pela história clínica e pela avaliação inicial(6).
A incidência de pancreatite aguda idiopática
depende da meticulosidade da investigação
etiológica realizada. Na ausência de litíase e de
outras causas conhecidas de pancreatite aguda
deve ser excluída a microlitíase (litíase
oculta)(2). A microlitíase é a causa de 50 a
70% das pancreatites consideradas idiopáticas(2). A repetição da ecografia aumenta a
probabilidade de identificar a microlitíase(4,6)
pois pode mostrar lama ou litíase de pequenas
dimensões que não foi detectada na primeira
ecografia(6). Por vezes a microlitíase só é identificada por ecoendoscopia ou pelo exame
microscópico de cristais na bílis colhida por
duodenoscopia(4,11). Estes exames devem ser
realizados se o episódio de pancreatite recorrer(11) o que se verifica em cerca de metade
dos casos(6).
Pancreatite Iatrogénica
A pancreatite iatrogénica pode ser causada
por procedimentos endoscópicos ou cirúrgicos.
A CPRE é o procedimento endoscópico que
mais frequentemente se associa a pancreatite,
especialmente na presença dos factores
expressos no Quadro 5. Após CPRE há uma
elevação transitória e assintomática de amilase
em 50% dos doentes e pancreatite aguda em 1
a 10%(2).
QUADRO 5- FACTORES DE RISCO PARA O
DESENVOLVIMENTO DE PANCREATITE
AGUDA PÓS-CPRE
Sexo feminino
Idade jovem
Pequeno diâmetro do colédoco
Hipertensão/disfunção do esfíncter de Oddi
Realização de Manometria do esfíncter de Oddi
Injecção de contraste no ducto pancreático
Esfincterotomia
213
PANCREATITE AGUDA
A disfunção do esfíncter de Oddi é a causa
de 15 a 57% das pancreatites agudas idiopáticas(11). A manometria do esfincter de Oddi é
técnicamente difícil, só é realizada nalguns
centros, e em 20% dos casos pode provocar
pancreatite aguda(6,11). Apesar dos riscos o
procedimento é útil pois permite estabelecer o
diagnóstico de disfunção do esfincter de
Oddi(11); o seu tratamento (por esfincteroplastia cirúrgica ou por esfincterotomia e
esfincteroplastia endoscópica) previne novos
episódios de pancreatite(2).
Por vezes têm que ser investigadas causas
raras como a pancreatite infecciosa, a pancreatite autoimune, a pancreatite isquémica, e o
pâncreas divisum(11).
São suspeitas de ter pancreatite hereditária
os doentes com familiares de primeiro ou
segundo grau com história de pancreatite, com
episódio de pancreatite na juventude, e com
episódios recorrentes de pancreatite aguda
sem etiologia subjacente. Nos doentes jovens
com suspeita de pancreatite hereditária está
indicada a análise genética para identificar a
mutação do gene do tripsinogénio catiónico, a
mutação do gene regulador da condutância
transmembranar da fibrose quística (CFTR), e
a mutação do inibidor da protease serina Kazal
tipo1 (SPINK 1)(4,16,21).
A repercussão sistémica é mínima e reversível com fluidoterapia(2). O processo inflamatório é auto-limitado, com resolução
espontânea em 3 a 5 dias, e a mortalidade é
inferior a 5% (4,22). O doente é internado na
enfermaria e, ao contrário da pancreatite
grave, não tem indicação para a realização de
TC abdominal, suporte nutricional ou
antibioterapia profilática(4).
Segundo a classificação de Atlanta a pancreatite aguda é grave se tiver um dos critérios
apresentados no Quadro 6.
QUADRO 6- PANCREATITE AGUDA GRAVE
(CRITÉRIOS DE ATLANTA, 1992)
Insuficiência de órgão
Choque (Pressão Sistólica < 90 mmHg)
Insuficiência Respiratória (Pa O2 ≤ 60 mmHg)
Insuficiência Renal ( Creatinina sérica > 2 mg/dL)
Hemorragia Gastrointestinal (> 500 mL/24H)
e/ou
Complicações locais
Necrose
Abcesso
Pseudoquisto
e/ou
Critérios de Prognóstico Desfavorável
≥ 3 critérios de Ranson
≥ 8 pontos na escala APACHE II
Na pancreatite grave geralmente há
necrose e hemorragia do parênquima associada
a extensa necrose da gordura peripancreática(1).
Ocasionalmente doentes com pancreatite
edematosa podem manifestar características
clínicas de episódio grave(4).
Os doentes com pancreatite grave devem
ser tratados numa unidade de cuidados intensivos com monitorização invasiva contínua(22)
e sistemas de suporte adequados(4). A sua
evolução é prolongada exigindo internamento
superior a 4 semanas e a taxa de mortalidade
oscila entre os 30 e 50%. Mais de 95% das
mortes por pancreatite aguda ocorrem em
doentes com pancreatite grave(4).
A discriminação entre pancreatite grave e
ligeira deverá ser realizada precocemente
3- Avaliação da Gravidade
O curso clínico, o prognóstico e a terapêutica da pancreatite dependem da sua gravidade. Cerca de 80% dos episódios correspondem a pancreatite ligeira e 20% a pancreatite
grave(5,22).
A gravidade da pancreatite fica estabelecida
cedo após o início da dor abdominal e é raro
haver progressão de pancreatite ligeira para
pancreatite grave(1).
Na pancreatite ligeira há edema intersticial
da glândula (pancreatite intersticial ou
edematosa) e não há alteração da microcirculação nem focos de necrose(23). Nesta forma de
pancreatite o risco de complicações locais é
práticamente inexistente(7).
214
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
tendo em conta as implicações quanto ao local
de internamento, realização de TC abdominal,
indicação para antibioterapia e eventual
suporte nutricional(1,4).
O diagnóstico de pancreatite grave é
evidente se na admissão se verificar disfunção
de órgão. Na ausência de disfunção de órgão
ou de complicações locais da pancreatite(4) são
utilizados sistemas de prognóstico ou indicadores independentes de prognóstico para
identificar os doentes com maior probabilidade de apresentar pancreatite grave(1,3).
Os doentes com pancreatite grave ou
previsivelmente grave podem ser reconhecidos
através de :
exactidão dos sistemas multifactoriais(2,24). Doentes com mais de 70 anos
ou com co-morbilidades associadas têm
maior risco de pancreatite grave(2,24).
2- Falência de órgão- O melhor indicador
de gravidade é a presença de disfunção
de órgão que prognostica mortalidade
de 5% a 20%(18). Uma publicação
recente que contesta a classificação de
Atlanta só considera que a falência de
órgão é um indicador de gravidade se
persistir mais de 48 horas ou se agravar
durante a primeira semana de doença(11).
3- Sistemas preditivos de gravidade Existem vários sistemas de prognóstico,
baseados em dados clínicos e laboratoriais, com o objectivo de predizer precocemente a gravidade da pancreatite(3,15). Os mais utilizados na prática
clínica são os critérios de Ranson, os
critérios de Glasgow, e o sistema
APACHE II(21,25).
1- Impressão clínica da gravidade- A
avaliação clínica nas primeiras 24 horas
da admissão, principalmente do compromisso cardiovascular, respiratório, e
renal, é uma forma específica mas pouco
sensível de identificar a pancreatite previsivelmente grave (11) pois não reconhece metade dos doentes graves(5,10). No
entanto há estudos que consideram que
a avaliação clínica realizada por especialista, e principalmente a constatação
da deterioração clínica precoce, pode
identificar os doentes com pancreatite
previsivelmente grave com a mesma
Nos critérios de Ranson (Quadro 7) são
avaliados 11 parâmetros: cinco na admissão
que reflectem a gravidade do processo inflamatório pancreático, e os restantes seis às 48
horas e que traduzem a repercussão sistémica(3). Estes critérios têm as seguintes
desvantagens: a sua análise só está completa
QUADRO 7- CRITÉRIOS DE RANSON
Pancreatite Litiásica
Pancreatite Alitiásica
Na admissão
Na admissão
Idade > 70 anos
Leucocitos > 18000/ mm3
Glicemia > 200 mg/dL
Desidrogenase Láctica > 400 U/L
AST > 250 UI/L
Idade > 55 anos
Leucocitos > 16000/ mm3
Glicemia > 200 mg/dL
Desidrogenase Láctica > 350 U/L
AST > 250 UI/L
Ás 48h
Ás 48h
Descida do Hematócrito > 10
Aumento da ureia > 2 mg/dL
Calcémia < 8 mg/dL
Pa O2 < 60 mm Hg
Déficit de base > 5 mmol/l
Sequestro hidrico > 4 L
Descida do Hematócrito > 10
Aumento da ureia > 5 mg/dL
Calcémia < 8 mg/dL
Pa O2 < 60 mm Hg
Déficit de base > 4 mmol/l
Sequestro hidrico > 6 L
215
PANCREATITE AGUDA
associados a pancreatite grave(21). O seu nível
tem correlação com a necrose pancreática
sendo também útil para monitorizar a
progressão da doença(1,11).
O hematócrito, ao contrário da PCR, não
é um marcador de inflamação mas reflecte a
hemoconcentração por perda significativa de
plasma para o peritoneu e espaço retroperitoneal(1,6,7). O hematócrito ≥ 47% na admissão e/ou que não diminui após 24 horas sugere
pancreatite grave(15).
A conjugação de sistemas e indicadores
independentes de prognóstico permite predizer
com maior segurança a gravidade de um episódio de pancreatite nas primeiras 48 horas após
a entrada na urgência. Nas primeiras 24 horas
da admissão valoriza-se: a impressão clínica da
gravidade; o índice de massa corporal >
30kg/m2; a presença de derrame pleural no Rx
tórax; e o score APACHE II> 8. Às 48 horas
são valorizados: a Proteína C reactiva> 150
mg/L, o score de Ranson/Glasgow ≥ 3, e a
persistência de falência de órgão(11).
Os doentes com pancreatite grave traduzida por disfunção de órgão, ou previsivelmente
grave por critérios de prognóstico desfavoráveis, bem como os que não melhoram
após 72 h de tratamento de suporte, devem
realizar TC abdominal para determinar a
gravidade da doença(4,7,11). A extensão da
necrose pancreática e peripancreática definida
por TC correlaciona-se com a gravidade clínica(11). Para definir, localizar e quantificar a
necrose é necessária a administração de
contraste endovenoso.
O desenvolvimento da necrose pancreática
pode demorar até 72h pelo que, se a TC for
realizada antes desta altura, a gravidade da
doença pode ser subestimada(11). Após este
período a sua acuidade diagnóstica aumenta
porque há melhor delimitação das zonas de
necrose(4). Por este motivo a TC deve ser realizada 3 a 10 dias após o inicio dos sintomas(4,10)
excepto se o doente estiver em estado crítico e
necessitar de cirurgia de emergência(11).
A extensão da necrose e a sua localização
têm valor prognóstico(5) pois predizem o
ás 48 horas; não permitem avaliar a evolução
da doença; e o seu valor preditivo é baixo - a
análise do valor preditivo de cada parâmetro
na pancreatite grave demonstrou que os
únicos paramêtros úteis são os que traduzem
disfunção orgânica (insuficiência renal, insuficiência respiratória e choque) e a idade
avançada(10). A sua principal utilidade é a de
permitir identificar os doentes com pancreatite ligeira.
Imrie e colaboradores em Glasgow adaptaram nove critérios de Ranson e desenvolveram os critérios de Glasgow que, ao contrário
dos de Ranson, não variam com o factor
etiológico da pancreatite(10). Contudo continuam a ser necessárias 48 horas para a sua
análise(11) e o seu valor preditivo é baixo(5).
O sistema APACHE II devido a sua complexidade é sobretudo usado nos doentes
internados em unidade de cuidados intensivos. Pode ser aplicado no dia da admissão
mas às 48 horas o seu valor preditivo aumenta
e é sobreponível ao valor preditivo dos
critérios de Ranson(3). A sua determinação
diária avalia também a evolução da doença (4).
Um score de Ranson ou Glasgow maior
que 3, ou um score APACHE II maior que 8,
tem um valor preditivo negativo de cerca de
90% e identifica a maioria dos doentes
graves(13).
4- Indicadores independentes de prognóstico- Alguns factores isolados são indicadores de prognóstico grave embora
nenhum tenha sensibilidade ou especificidade suficiente para fazer o diagnóstico
de pancreatite grave. É o caso do
derrame pleural esquerdo(2), do índice
de massa corporal > 30kg/m2(2,24), da
proteína C reactiva(6,26), e do hematócrito(1,15).
A PCR é uma proteína de fase aguda que
demora 48 a 72 horas a ser sintetizada no figado(26,27) após a sua indução principalmente
pelas citoquinas inflamatórias(2). Ás 48 horas
valores de PCR superiores a 150 mg/L estão
216
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
desenvolvimento de complicações locais como
a infecção da necrose(4). A infecção na pancreatite atinge áreas de necrose ou colecções
fluidas adjacentes ao pâncreas(13). O risco de
infecção da necrose é muito pequeno se a
necrose for inferior a 30%, mas aumenta se a
necrose for superior a 30%(13). Quanto maior
a percentagem de necrose maior é a probabilidade de se infectar após a primeira semana de
doença(11,13). A necrose da cabeça tem pior
prognóstico do que a necrose do corpo ou da
cauda do pâncreas(2,5).
O Índice de Gravidade do Estadiamento
por TC (IGET) desenvolvido por Balthazar e
Ranson tem elevada capacidade para distinguir a pancreatite ligeira da pancreatite grave
e tem valor prognóstico(6,9)(Quadro 8). Se a
TC tiver grau A, B ou C ou IGET de 0-2 não
é necessário efectuar TC de controlo. A resolução da inflamação peripancreática e
pancreática na TC é mais lenta do que a
recuperação clínica(11). Nestes casos a TC de
controlo só está indicada se houver deterioração do estado clínico que sugira o desenvolvimento de complicação abdominal(11).
Se o TC inicial tiver grau D ou E ou IGET
de 3-10 deve ser feita TC de controlo após 7 a
10 dias se persistir a disfunção de órgão ou se
não melhorar o estado clínico(6,11). Nos
doentes que recuperam sem complicações
aparentes há autores que preconizam TC de
controlo antes da alta com o intuito de detectar
complicações assintomáticas como o pseudoquisto ou o pseudoaneurisma arterial(11).
II. Tratamento
Não é utilizada na prática clínica terapêutica direccionada ao processo etiopatogénico da
pancreatite aguda(13). Foram testados, sem
evidência de benefício clínico, fármacos para
inibir a secreção pancreática (octreótido(11),
somatostatina(2,5)), para antagonizar as
enzimas pancreáticas (antiproteases como a
apoproteina e o gabexato)(13) e para antagonizar mediadores inflamatórios (lexipafant)
(3,5). Durante o episódio agudo apenas a
pancreatite aguda grave litiásica e a pancreatite metabólica associada a hipertrigliceridémia
ou hipercalcémia têm terapêutica específica.
O tratamento inicial é essencialmente de
suporte consistindo, qualquer que seja a gravidade do episódio, na manutenção do
equilíbrio hidroelectrolítico, correcção da
hipoxémia e analgesia. Adicionalmente na
pancreatite grave está indicado o suporte
nutricional e a prevenção e tratamento de
complicações locais e sistémicas(1,2,3,22).
QUADRO 8- INDÍCE DE GRAVIDADE DO ESTADIAMENTO POR TC
Grau TC (TC sem contraste)
Pontuação
A- Pâncreas normal
0
B- Pancreatite Edematosa
1
C- B + alterações peripancreáticas ligeiras
2
D- Alterações peripancreáticas marcadas + 1 colecção fluida
3
E- Múltiplas ou extensas colecções peripancreáticas
4
Presença de Necrose (TC com contraste)
Ausente
0
< 30%
2
30 – 50%
4
> 50%
6
Índice de Gravidade por TC = Grau TC + Pontuação de Necrose
Complicações
Mortalidade
0-3
8%
3%
4-6
35%
6%
7-10
92%
17%
217
PANCREATITE AGUDA
Reposição hídro-electrolítica e controlo
metabólico:
Se a Hb for < 7 g/dL e/ou o Hto< 27%
está indicada a transfusão de concentrado de
eritrócitos(7).
A hipoalbuminémia está associada a maior
taxa de mortalidade(1,7); quando os níveis
são inferiores a 2g/dL está indicada a administração de albumina(28).
Os desequilíbrios electróliticos secundários
à perda para o terceiro espaço, por vezes
agravada por vómitos e pela drenagem por
sonda nasogástrica, devem ser corrigidos(7).
Mesmo se o valor da caliémia for normal deve
ser administrado KCl no soro. A sua concentração deve ser inferior a 60 mEq/L e o ritmo
inferior a 20 mEq/hora(7).
A diminuição da calcémia nos primeiros
dias indica doença grave(6). Na maioria dos
casos a hipocalcémia é secundária à hipoalbuminémia e o valor de cálcio ionizado é normal
não sendo necessária qualquer correcção(6,13).
Quando o cálcio reage com os ácidos gordos
livres produzidos pela lipólise peripancreática
precipita na forma de sabões de cálcio(6,7) e o
cálcio ionizado diminui. Esta forma de hipocalcémia pode originar irritabilidade neuromuscular, complicações cardíacas(1,6,7,13), e
deve ser corrigida pela administração
endovenosa de gluconato de cálcio a 10%(7). A
hipomagnesiémia, que resulta da saponificação
intraperitoneal(1), agrava a hipocalcémia e deve
ser corrigida com sulfato de magnésio a 10%(13).
É importante um adequado controlo da
glicémia. A hiperglicémia resulta da menor
secreção de insulina (por disfunção do pâncreas) associada ao aumento da secreção de
glucagon, glucocorticóides, e catecolaminas(1,7). Se os níveis de glicose forem superiores a 250 mg/dL é administrada insulina(2).
Cedo no curso da doença há hipovolémia
por aumento da permeabilidade capilar e transudação de fluido intravascular rico em
proteinas para a cavidade peritoneal(1,2,15).
A consequente diminuição da pressão de
perfusão do pâncreas, se não for corrigida,
pode condicionar alteração da microcirculação e subsequente necrose da glândula(15).
Se a perda intravascular for significativa,
caracterizada pelo sequestro de > 6L de fluido
durante as primeiras 48 horas e/ou por hematócrito ≥ 47%, prognostica pancreatite grave(15).
Para equilibrar esta perda é essencial uma
adequada reposição hídrica que é aferida pela
redução do hematócrito para 30-35% nas
primeiras 24 horas(2). Não é claro que esta
reposição previna a necrose mas pode limitar a
sua progressão e pode evitar quer a insuficiência renal quer o choque hipovolémico(3).
A maioria dos doentes com doença ligeira
necessita de 3 a 4 litros de fluido isotónico nas
primeiras 24 horas(13) de forma a manter um
débito urinário > 0,5 ml/kg peso(11).
Na pancreatite grave a necessidade de
reposição hídrica endovenosa pode atingir os
10L/dia nos primeiros dias(13). No choque
hipovolémico é administrado de forma rápida
500-1000 ml de soro (cristalóide ou colóide)
até à estabilização do doente(7) e posteriormente com taxa de infusão de 35 mL/kg por
dia de modo a compensar as necessidades
basais de fluido e a perda para o terceiro
espaço(2). Deve ser infundido volume suficiente para manter a pressão arterial sistólica
acima de 90 mmHg de forma a melhorar a perfusão de órgãos alvo. Se o choque persistir
após a correcção da volémia administra-se
vasoconstrictor(24).
Nos doentes críticos a medição da pressão
venosa central orienta a reposição da volémia;
nos casos em que persiste o choque a terapêutica vasoactiva deve ser monitorizada através
das variáveis hemodinâmicas avaliadas por
cateter de Swan-Ganz(5).
Correcção da hipoxémia
Em 25% das pancreatites há hipoxémia,
sem tradução clínica ou radiológica, que pode
evoluir para ARDS, pelo que é mandatório
realizar sempre gasimetria arterial(7). Deve ser
suplementado oxigénio de forma a manter
uma saturação arterial superior a 95%(2).
218
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
A hipoxémia refractária sugere o estabelecimento de ARDS e a necessidade de ventilação
mecânica(13,22).
só está indicada nos doentes com
antecedentes de patologia péptica ou com
critérios de gravidade com o objectivo de
prevenir as úlceras de stress(2,7).
Os doentes com pancreatite ligeira não
necessitam
de
sonda
naso-gástrica.
A entubação naso-gástrica com aspiração
contínua é útil na pancreatite grave para
prevenir a aspiração do conteúdo gástrico,
principalmente no caso de vómitos persistentes e/ou íleus(7).
Analgesia
Para o controlo da dor estão contra-indicados os fármacos espasmolíticos por poderem
provocar ou agravar o íleus paralítico(7) bem
como os antiinflamatórios não esteróides
devido às suas complicações(5).
A abordagem farmacológica é realizada de
forma gradativa sendo utilizados fármacos
analgésicos progressivamente mais potentes.
Em primeira linha é feita a administração
endovenosa de 2g de metamizol cada 6 h. Se a
dor persistir utiliza-se 100 mg de tramadol
cada 6h(7).
Os opiáceos em bólus ou em infusão
contínua controlam a dor que resiste aos
analgésicos menos potentes(5). As primeiras
doses de narcóticos podem ser dadas de 15 em
15 minutos até haver alívio da dor e posteriormente cada 2 a 3 horas conforme necessário.
Não há estudos no homem que suportem a
crença que a morfina agrava a pancretite por
estimular a contracção do esfíncter de Oddi(2).
A pancreatite causa diminuição da secreção
pancreática o que reduz o impacto da alteração de pressão no esfíncter de Oddi(13). A
petidina não produz espasmo do esfíncter(10)
mas está associada a um período mais curto de
analgesia e a maior risco convulsivo que a
morfina(1). Pode ser utilizada na dose de 100
mg ev cada 6 horas(7).
A analgesia regional (via catéter epidural)
controlada pelo doente é o método ideal para
garantir o contolo da dor intensa e persistente(3,13). A inserção de cateter epidural está
contraindicada na presença de alteração da
consciência que impeça o seu controlo pelo
doente ou de coagulopatia(24).
Antibioterapia Profiláctica
Na pancreatite ligeira não está indicada a
antibioterapia profiláctica(10). Os doentes com
pancreatite grave associada a falência precoce
de órgão(24) e/ ou com mais de 30% de necrose
pancreática, devem fazer antibioterapia
profiláctica(4,10).
A antibioterapia profiláctica melhora a
evolução dos doentes com pancreatite grave:
diminui a incidência de necrose pancreática
infectada, de sépsis(10), a necessidade de
cirugia e a taxa de mortalidade(1,2,10,15,25).
O antibiótico deve ser iniciado cedo no
curso da doença (25). Os Carbapenems
(Imipenem, Meropenem) são superiores à
associação de uma quinolona (Ciprofloxacina, Ofloxacina) com Metronidazol ou
com Cefuroxime(29).
A maioria dos autores opta pelo Imipenem
500mg 8/8 H ev durante um período de 7 a 14
dias(1,2,11). A antibioterapia só é prolongada
para além deste período quando é documentada infecção e nesta situação o antibiótico
é seleccionado pelo resultado do teste de
sensibilidade(11).
Não está esclarecido se a antibioterapia
profiláctica selecciona o crescimento de cocos
Gram positivos (Staphylococcus aureus meticilina resistentes) e fungos (Candida glabrata)(2,24,29). Alguns autores preconizam a adição
de profilaxia antifúngica com 400 mg diários
de fluconazol endovenoso(1); contudo a sua
eficácia ainda não foi demonstrada em estudos
prospectivos(21, 29).
Outras medidas de suporte
Na pancreatite a administração de antagonistas H2 ou inibidores da bomba de protões
219
PANCREATITE AGUDA
A descontaminação intestinal selectiva,
com o intuito de eliminar os patogénos da
flora intestinal e reduzir a translocação bacteriana(o principal mecanismo de infecção da
necrose pancreática), foi considerada uma
estratégia alternativa à antibioterapia sistémica. No entanto não é utilizada na prática
clínica devido à sua administração
complexa(sulfato de colistina, anfotericina B e
norfloxacina, por via oral e rectal, e associados
a cefotaxime EV), elevado custo, e inexistência de eficácia adicional relativamente à
antibioterapia sistémica(10,24).
nutrição entérica (NE), independentemente
da forma de administração, agravava a
evolução da doença(2). A NE, no pâncreas normal, estimula a síntese e libertação de enzimas
proteolíticas(24), facto que não foi demonstrado
no pâncreas necrótico(10). Um estudo experimental na pancreatite mostrou que a NE,
especialmente quando administrada no jejuno,
não estimula a secreção entero-hormonal nem
a secreção de suco pancreático ou a síntese e
libertação de enzimas proteolíticas(24).
A NPT compromete a função imunológica
do intestino(25). A ausência de nutrientes no
lúmen intestinal provoca atrofia da mucosa o
que facilita a translocação bacteriana para as
áreas de necrose pancreática(25) e estimula a
resposta inflamatória sistémica(11). A NPT só
está indicada quando existe contraindicação
para a utilização da via entérica por persistência de íleus durante mais de cinco dias ou
por impossibilidade de colocar sonda nasojejunal(10,11). Em geral os doentes necessitam
8.000-10.000 kilojoules/dia: 50-60% de
glicose, 15-20% de proteínas, e 20-30% de
lípidos(2). Os lípidos devem ser excluídos da
NPT se os trigliceridémia forem superior a 500
mg/dL(3).
Nutrição
Após pausa alimentar os doentes com
pancreatite ligeira iniciam a alimentação oral
quando a dor desaparece, reaparece o
peristaltismo intestinal, e o valor de amilase
sérica é inferior a duas vezes o valor normal, o
que geralmente se verifica após o 3º dia de
doença(7). Na dieta inicial deverá haver um
predomínio de hidratos de carbono por
estimularem menos a secreção pancreática do
que a gordura e as proteínas(3).
O suporte nutricional, preferencialmente
usando o tubo digestivo, só deve ser instituído
quando for previsível a necessidade de jejum
durante mais de 5 a 7 dias(5,10).
Na pancreatite grave geralmente não é
instituída alimentação oral durante pelo
menos 7 a 10 dias(3). O stress físico originado
pela resposta inflamatória sistémica(15)
provoca um estado catabólico que leva à
deterioração nutricional e à rápida perda de
peso, de gordura, e de proteínas(2). O suporte
nutricional deve ser iniciado precocemente(5)
porque a mortalidade aumenta quando o
balanço nitrogenado é negativo(24). Os doentes
com maior necessidade de suporte nutricional
são os que têm falência de órgão(23), desnutrição, que foram submetidos a cirurgia ou que
estão infectados(5).
Durante algum tempo esteve indicada a
nutrição parentérica total (NPT) por permitir
“o repouso pancreático”(24). Pensava-se que a
Nos doentes com pancreatite grave a
melhor forma de suporte nutricional é a
nutrição entérica (NE) habitualmente por
sonda naso-jejunal(11); esta sonda é colocada
sob controlo endoscópico ou fluoroscópico no
terceiro ou quarto dia da doença. O suporte é
iniciado com dieta semi-elementar e, se tolerada, progride-se para fórmula polimérica(2).
Na maioria dos estudos realizados foi usada
a via nasojejunal por não provocar estimulação pancreática significativa no pâncreas
normal(21). Estudos recentes mostram que a
via nasogástrica parece ser segura pois não
provoca agravamento clínico ou bioquímico
da pancreatite grave(24).
A NE, mesmo em quantidade insuficiente
para assegurar o suporte nutricional, preserva
a integridade da mucosa intestinal(24,25). Os
benefícios da NE vs NPT são: a atenuação da
220
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
resposta inflamatória sistémica, a diminuição
dos marcadores de resposta inflamatória de
fase aguda, dos pontos do índice APACHE II,
da incidência de infecções e de necrose pancreática infectada, da necessidade de cirurgia,
do tempo de internamento e da mortalidade.
Também é mais segura e barata(1,10,15,24,25).
Nos casos em que se desenvolvem complicações locais (colecções líquidas, pseudoquisto, necrose infectada) a colecistectomia é
adiada. Se estas complicações forem passíveis
de resolução espontânea (caso do pseudoquisto
e das colecções líquidas) a colecistectomia é
realizada após o seu desaparecimento. No caso
de ser necessária intervenção cirúrgica (quer
precoce no caso de necrose infectada, quer
tardia no caso de pseudoquisto que não
resolve) a colecistectomia é realizada nesse
tempo cirúrgico(4).
Tratamento etiológico
Em cerca de 29 a 63% dos doentes com
pancreatite litiásica ocorrem novos episódios
de pancreatite se não for realizado o tratamento definitivo da coledocolitíase pela colecistectomia e eventual desobstrução do ducto biliar
principal(22).
Nos doentes idosos ou naqueles sem
condições cirúrgicas, a alternativa à colecistectomia é a esfincteroctomia endoscópica
(ETE) electiva (22). Nestas circunstâncias
persiste o risco de colecistite(2).
A CPRE com ETE também está indicada
na pancreatite litíasica na grávida (em que a
colecistectomia está contraindicada) e no
doente colecistectomizado(4,18).
A colecistectomia deve ser realizada após a
resolução do episódio de pancreatite e antes
da alta. A gravidade do episódio determina o
momento da intervenção(2).
III. Detecção e tratamento das
complicações
O curso clínico da pancreatite grave tem
duas fases: a fase tóxica precoce (nas primeiras
2 semanas), caracterizada por complicações
sistémicas relacionadas com a síndrome de
resposta inflamatória sistémica, e a fase tardia
(após a 2ª semana), associada a complicações
locais e suas consequências (Quadro 9).
Fase Precoce
A fase precoce é causada pela libertação na
circulação de enzimas pancreáticas activadas e
mediadores pró-inflamatórios (citoquinas,
interleuquinas e prostaglandinas)(10). A síndrome de resposta inflamatória sistémica pode
originar complicações sistémicas com
disfunção de órgão; as mais frequentes são as
do pulmão e do rim e estão associadas a
aumento da mortalidade(13). A maioria dos
doentes com disfunção de órgão tem necrose
pancreática na TC abdominal(22,24). Há falência de órgão em aproximadamente 30% dos
doentes com pancreatite grave(13).
Cerca de 2% dos doentes com pancreatite
grave têm “Pancreatite aguda Fulminante”
caracterizada pela síndrome de disfunção
multiorgânica (MODS) precoce que ocorre até
as 72 horas do início da doença. Manifesta-se
pela rápida progressão da disfunção de órgão
sob tratamento na Unidade de Cuidados
Intensivos, e é causada por extensa necrose
pancreática não infectada(24).
Pancreatite Ligeira - a colecistectomia,
associada a colangiografia per-operatória para
excluir coledocolitíase(11), é programada até
ao 14ª dia e não deve ser adiada mais do que
28 dias(1,4).
Pancreatite Grave - nos doentes com
pancreatite grave com suspeita ou
confirmação de etiologia litiásica, bem como
naqueles com colangite, icterícia, ou dilatação
do colédoco, deverá ser realizada CPRE com
ETE urgente preferenciamente nas primeiras
72h(11). A ETE está sempre indicada mesmo
nos casos em que não se encontra cálculo no
colédoco(4,11,18).
Na ausência de complicações a colecistectomia é realizada após melhoria clínica(11,22).
221
PANCREATITE AGUDA
QUADRO 9- COMPLICAÇÕES DA PANCREATITE AGUDA
Complicações Sistémicas
Pulmonares
Cardiovasculares
Metabólicas
Hematológicas
Gastrointestinais
Renais
Neurológicas
Cutâneas
Hipoxémia, Insuficiência respiratória, ARDS, Derrame pleural, Quilotórax,
Atelectasias, Abcesso mediastínico
Hipotensão, Choque, Insuficiência cardiaca, Derrame pericárdico, Alterações ST e T
simulando Enfarte do miocárdico, Arritmias
Hiperglicémia, Cetoacidose diabética, Hipocalcémia, Hipertrigliceridémia
Coagulação intravascular disseminada, Trombose vascular
Úlcera de stress, Úlcera péptica, Íleus, Rotura de varizes esofágicas
Insuficiência renal aguda, Hidronefrose
Encefalopatia pancreática, Convulsões, Psicose, Retinopatia de Purtscher
Nódulos subcutâneos
Complicações Locais
Pancreáticas
Retroperitoneais
Necrose infectada, Pseudoquisto, Abcesso, Ascite pancreática
Abcesso, Hemorragia
Na fase tóxica a necrose é habitualmente
estéril e o tratamento é conservador(23). O
tratamento cirúrgico, apesar de controverso,
pode ser equacionado quando existe necrose
pancreática extensa (≥50%) e/ou agravamento (durante 3-5 dias) ou persistência
(superior a 10-14 dias) da disfunção de
órgão(24). A necrosectomia deve ser adiada, se
o estado clínico do doente o permitir, pelo
menos 3 semanas(3,21,24); nesta altura já não há
toxicidade sistémica, o tecido necrótico está
bem demarcado minimizando a perda de
tecido vital, e o risco de complicações hemorrágicas intra-operatórias é menor(3,22,24).
As manifestações sistémicas da pancreatite
aguda grave podem atingir diversos órgãos
(Quadro 9).
Algumas, apesar de raras, merecem
destaque especial: a retinopatia de Purtscher, a
paniculite e a encefalopatia pancreática.
A retinopatia de Purtscher é causada pela
trombose da artéria posterior da retina e
traduz-se na fundoscopia por exsudados algodonosos. Manifesta-se por perda súbita de
visão que, habitualmente, regride(2,30).
As manifestações neurológicas da pancreatite têm frequentemente origem na síndrome
de privação alcoólica. A encefalopatia
pancreática designa uma entidade clínica
independente, sem relação com a ingestão
alcoólica, associada a níveis elevados de lipase
no liquor(31).
Na paniculite (necrose do tecido celular
subcutâneo) observam-se nódulos cutâneos
avermelhados, dolorosos, preferencialmente
nas pernas junto às articulações e pontos de
pressão, que se podem confundir com o
eritema nodoso(1,2,6,7).
Apesar de nesta fase haver um predomínio
de complicações sistémicas, em 30 a 50% dos
casos desenvolvem-se nas primeiras 48 horas
de doença(32) colecções fluidas agudas no
pâncreas (4). Estas colecções de suco
pancreático não têm parede(33) e estão localizadas no pâncreas ou na sua periferia,
podendo estender-se para os espaços pararenais e cavidade posterior dos epiplons(23).
A TC abdominal mostra áreas hipodensas sem
parede definida. Metade das colecções resolve
espontaneamente nas primeiras 4 semanas(2).
As restantes evoluem para pseudoquisto
pancreático(2); só têm indicação para
drenagem quando sintomáticas (com dor ou
obstrução mecânica) ou na suspeita de
estarem infectadas(4).
222
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
QUADRO 10- AGENTES ISOLADOS NA NECROSE
Fase Tardia
A fase tardia é caracterizada por complicações locais como a necrose infectada, o
pseudoquisto, o abcesso pancreático, e pela
falência multiorgânica associada a infecção
(10,22,24,33).
Nesta fase a necrose pancreática já se
encontra organizada(32) numa colecção bem
definida de tecido necrótico e fluido rodeada
por uma cápsula fibrosa (necrose pancreática
organizada)(23). Pode ser erradamente interpretada como pseudoquisto. Se for confundida
com o pseudoquisto e for drenada pelas
técnicas habituais o tecido necrótico sólido
não é removido e pode infectar(32).
A RMN abdominal diferencia esta
colecção do pseudoquisto porque distingue o
liquido do tecido necrótico(11).
A maioria das infecções pancreáticas
ocorre nesta fase(3). No tecido necrótico há
marcada alteração dos mecanismos de defesa
do hospedeiro o que o torna muito vulnerável
à infecção(24). O risco de infecção aumenta
com a duração da doença e com a extensão da
necrose pancreática(11,15,24); atinge 25% dos
doentes na 1ª semana e 70% na 3ª semana(24).
PANCREÁTICA INFECTADA
Agentes
Frequência
Bacilos Gram negativos 50 – 70%
Enterobacteriaceae (Escherichia coli, Klebsiella spp.,
Proteus spp.)
Pseudomonas aeruginosa
Cocos Gram positivos
20 – 40%
Staphylococus aureus, Staphylococus coagulase
negativos, Enterococcus spp.
Anaeróbios
Bacteroides spp.
Fungos
Candida spp.
≤ 10%
10 – 40%
A infecção da necrose pancreática é o
maior factor de risco para a insuficiência de
órgão associada à sepsis(22).
Alguns factores sugerem a existência de
necrose infectada(5,10,22,24,25) (Quadro 11).
QUADRO 11- SUSPEITA DE NECROSE PANCREÁTICA
INFECTADA
Disfunção de órgão que persiste após o 7-10º dia
Deterioração clínica entre a 2ª e 4ª semana com:
Instabilidade hemodinâmica
Reaparecimento ou aumento da dor
Agravamento do Íleus
Sinais de irritação peritoneal
Febre
Elevação dos parâmetros inflamatórios (PCR > 180
Necrose infectada
A infecção do tecido necrosado por bactérias ou fungos é a complicação local mais
grave com taxa de mortalidade de 40%(11,24).
A disseminação dos patogéneos para o
tecido necrótico faz-se através de translocação
de bactérias intestinais, pela via biliar, e pela
via hematogénea(10). A translocação de
bactérias do cólon(3) para o tecido necrótico é
o principal mecanismo de infecção o que
explica o espectro de bactérias encontradas
(Quadro 10)(10), predominando os Gram
negativos de origem entérica. É provável que
muitos dos staphylococci isolados do tecido
pancreático resultem de disseminação
hematogénea ou que tenham sido introduzidos por procedimentos invasivos(24).
mg/dL, leucocitose)
Disfunção de órgão de novo
Aumento da pontuação APACHE II
Hemoculturas positivas
Identificação de gás no interior de áreas necróticas
Especialmente se associados a necrose de > 30% do pâncreas
Os dados clínicos e analíticos não são
suficientemente sensíveis ou específicos para
estabelecer o diagnóstico de infecção(10).
A ausência de melhoria clínica após a primeira
semana e/ou a falência de órgão podem ser
provocadas pela necrose estéril grave ou pela
necrose infectada do pâncreas. Em ambas as
situações pode haver leucocitose marcada
(> 20.000/mm3) e febre(3).
223
PANCREATITE AGUDA
Na suspeita de infecção, quer da necrose
pancreática, quer de colecções fluidas peripancreáticas, deve ser realizada punção aspirativa
com agulha fina(10,11) e exame microbiológico
do material colhido (exame directo e cultural
com pesquisa de fungos)(3). A identificação de
microorganismos no exame directo e/ou
cultural confirma o diagnóstico(5). A punção é
segura e tem sensibilidade e especificidade
superior a 90% para diagnosticar a necrose
infectada(25) sendo habitualmente realizada 7
a 14 dias após o início da pancreatite(11).
Os doentes com pancreatite necrosante e
com sépsis grave necessitam de desbridamento
cirúrgico emergente e, nestas circunstâncias,
pode ser dispensada a realização prévia de
punção aspirativa(11).
O tratamento da necrose infectada é o
desbridamento cirúrgico dependendo a escolha
da técnica de necrosectomia da experiência
local(11). Habitualmente são necessárias várias
sessões para remover a totalidade de tecido
necrótico infectado. Foram consideradas
outras opções terapêuticas como o tratamento
médico com Imipenem e/ou a drenagem
radiológica ou endoscópica(23). Se o material
infectado estiver suficientemente liquefeito a
drenagem através da colocação percutânea de
vários catéteres de grande calibre (sob controlo
imagiológico) pode constituir uma alternativa
válida ao desbridamento cirúrgico. Apesar de
alguns autores terem apresentado resultados
animadores com este modo de drenagem a sua
aplicação por rotina não está recomendada(22).
A cirurgia deve ser realizada o mais cedo
possível porque a remoção do foco séptico é
fundamental para resolver a síndrome de
disfunção multiorgânica.
Por vezes há sobreposição das duas fases
evolutivas da pancreatite e a necrose pancreática torna-se infectada na fase precoce(24).
cos e/ou sangue, rodeada por uma parede bem
definida(34) de tecido de granulação ou de tecido fibroso(32). Só após a formação da parede,
que demora pelo menos 4 semanas desde o
início da doença, o quisto é considerado
maduro e passível de ser drenado(3,32). Surge
em 4 % das pancreatites(1) sendo a localização
mais frequente no corpo e cauda do pâncreas(2).
Pode ser assintomático, provocar dor abdominal ou causar sintomas compressivos(32).
O pseudoquisto pode comprimir várias
estruturas : o duodeno ou o estômago causando
naúseas e saciedade precoce, o ducto biliar
produzindo obstrução biliar, ou as veias
mesentéricas(2,13). Para além das complicações
associadas à compressão o pseudoquisto pode
infectar, pode romper para a cavidade peritoneal produzindo ascite pancreática, e pode
ser causa de hemorragia por rotura de
pseudoaneurisma da parede(13,32).
O diagnóstico é feito preferencialmente
por TC com contraste(2). Este exame identifica
o pseudoquisto, detecta o pseudoaneurisma
arterial interno, e mostra com exatidão as suas
relações com as estruturas circundantes(2).
Até 85% dos pseudoquistos agudos resolvem
espontaneamente em 4 a 6 semanas, principalmente se tiverem < 5 cm de diâmetro(32).
Pseudoquistos, independentemente do seu
tamanho, que permaneçam assintomáticos
não necessitam de tratamento(3). Reserva-se a
drenagem para quistos que estejam a aumentar
de dimensões, a causar sintomas, ou que
estejam infectados(32).
A opção pelo método de drenagem (cirúrgica, percutânea ou endoscópica) é feita
considerando a gravidade da doença, a preferência do doente, e a experiência local(32).
Abcesso Pancreático
O abcesso pancreático é uma colecção
circunscrita de pús no abdómen, geralmente
na proximidade do pâncreas, com escassa ou
nenhuma quantidade de necrose pancreática.
Alguns abcessos contêm gás(2,3). Apesar da sua
Pseudoquisto
O pseudoquisto é uma colecção de fluido
pancreático em geral puro, mas que pode
conter pequena quantidade de restos necróti224
Cristina Fonseca e Rui Loureiro
fisiopatologia não estar completamente
esclarecida o abcesso pode resultar da infecção
secundária do pseudoquisto pancreático ou da
liquefação de necrose pancreática infectada(3).
Ocorre em 5 a 9% das pancreatites
necrosantes e desenvolve-se tardiamente
geralmente após a 4ª semana de evolução(32).
Manifesta-se pelo reaparecimento de dor
abdominal, febre, elevação dos parâmetros
inflamatórios, ou sépsis(32). Pode ser detectado
por ecografia e/ou TC. A TC é o melhor
método para sugerir o diagnóstico se documentar gás no interior da colecção. Também é
o melhor método para detectar complicações
associadas nomeadamente fístulas para o tubo
digestivo, trombose venosa, e pseudoaneurisma arterial(2).
O diagnóstico é confirmado pela identificação do agente etiológico no conteúdo
obtido por aspiração percutânea com agulha
fina(32). A taxa de infecção polimicrobiana no
abcesso é maior do que na necrose infectada(10).
As opções para drenar o abcesso são as
mesmas do pseudoquisto sendo a mais
utilizada a drenagem percutânea guiada por
ecografia ou TC(2). A abordagem cirúrgica é
reservada para os casos em que a drenagem
percutânea é ineficaz .
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