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Sumário INTRODUÇÃO 3 O protecionismo e a crise de 2008 5 1. Visão geral do protecionismo antes da crise de 2008 5 2. Aumentou o protecionismo como resposta à crise? 6 3. O Brasil no contexto da crise global 11 POLÍTICA INDUSTRIAL E PROTECIONISMO 15 1. Por que política industrial? 15 2. Respondendo a falhas 16 2.1. Externalidades no Aprendizado 16 2.2. Externalidades entre Setores e Problemas de Coordenação 16 2.3. Externalidades Informacionais e Diversificação 17 2.4. Barreiras à Entrada e Externalidades Associadas à Exportação 18 2.5. Externalidades do Investimento Direto Estrangeiro 18 3.Conclusões 19 ESTUDO DE CASO: BENS E SERVIÇOS DO SETOR DE PETRÓLEO E GÁS (P&G) 20 1.Introdução 20 2. Política industrial no setor de P&G 20 20 2.1. Levantamento das Ações (A) Política de Conteúdo Local em E&P (B) PROMEF e Congêneres (C) Outras Medidas 2.2. Avaliando as Ações (A) Quais são os Objetivos? Qual a Melhor Maneira de Alcançá-los? (B) Quais Setores? (C) Regras de Saída (D) Competição e Inovação (E) A Regra de Conteúdo Local Ótima (F) Investimento Direto Estrangeiro 3.Conclusões 22 26 ESTUDO DE CASO: EQUIPAMENTOS MÉDICOS, HOSPITALARES E ODONTOLÓGICOS (EMHO) 1. 28 Introdução28 2. Política industrial para Emho 28 28 2.1. Levantamento das Ações (A) Margem de Preferência nas Compras Públicas (B) Outras Medidas 2.2. Avaliando as Ações 28 (A) Quais são os Objetivos? Qual a Melhor Maneira de Alcançá-los? (B) Quais Setores? (C) Regras de Saída (D) Competição e Inovação (E) A Regra de Margem de Preferência em Compras Públicas (F) Investimento Direto Estrangeiro 3.Conclusões 33 Anexos 34 Política industrial na Coreia do Sul 34 Política industrial na Noruega 35 CONCLUSões FINAIS 37 NOTAS 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 42 TABELAS, FIGURAS E GRÁFICOS (por ordem de aparição) Gráfico 1: Percentual (%) das medidas de proteção do G-20 por grandes grupos 9 Gráfico 2: Indicador de cobertura das medidas de comércio do G-20 9 Gráfico 3: Participação (%) dos principais grupos de produtos no total das exportações brasileiras 11 Gráfico 4: A valorização do real e os preços das commodities 12 Figura 1: Classificação das Políticas Públicas 15 Figura 2: O PROMEF – Resumo Esquemático 21 Figura 3: E&P – Cadeia de Fornecimento 24 Tabela 1: Margens de Preferência em EMHO 30 Figura 4: Determinantes do Aprimoramento Tecnológico para Países em Desenvolvimento 32 Introdução N o Brasil, o debate sobre as diretrizes da política industrial voltou a ganhar importância com o lançamento da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), em 2003. No entanto, foi com a valorização da moeda brasileira, a partir de 2008 (breve interrupção entre setembro de 2008 a abril de 2009), junto com a crise econômica mundial, que o debate ganhou destaque na agenda de políticas públicas. A valorização cambial poderia levar a uma possível desindustrialização (doença holandesa) da economia, mas esta não seria a única causa. O acirramento da concorrência chinesa no mercado doméstico, e em terceiros mercados, apontava para questões já enfatizadas nas políticas governamentais. O tema da inovação tecnológica trazido pela PITCE, e reforçado com a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) de maio de 2008, já era identificado como um dos principais desafios a serem enfrentados pelas políticas públicas e o setor empresarial, se o objetivo era conferir competitividade à indústria brasileira. O aumento da participação do Brasil nas exportações mundiais estaria diretamente dependente da elevação da produtividade, onde a inovação tecnológica teria um papel crucial. Em setembro de 2008, a crise mundial passou a ser o centro das atenções. O Brasil, como membro do G-20, foi um participante ativo na defesa do monitoramento e do alerta para que a recessão não fosse motivo de medidas protecionistas, postura que é mantida até hoje nas reuniões do grupo. Em abril de 2011, o governo lançou um novo plano, que foi depois ampliado, em 2012, o ”Plano Brasil Maior”. O núcleo central do plano seguiu as diretrizes dos planos anteriores — inovação como elemento chave para o aumento da produtividade — e consolidou como objetivo o adensamento produtivo e tecnológico das cadeias produtivas. Entre os instrumentos que foram eleitos para assegurar esse adensamento constam as políticas de conteúdo local. Entretanto, políticas de conteúdo local podem configurar exigências de desempenho para o investidor estrangeiro e, logo, estariam em desacordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). A justificativa para essa interpretação é que medidas de conteúdo local distorcem os fluxos de comércio ao reduzirem o potencial de importações e, logo, seria uma medida protecionista. Contudo, este estudo parte da seguinte premissa: antes de rejeitar qualquer consideração sobre o tema de conteúdo local, à luz das regras da OMC (sempre passíveis de interpretações), a questão principal é analisar se o instrumento cumpre as funções que os governos desejam. Guimarães (2012) distingue duas motivações para as políticas de conteúdo local. Uma de natureza macroeconômica e de curto prazo com o objetivo de garantir a demanda doméstica. A segunda com objetivos específicos e de longo prazo associados ao desenvolvimento industrial. 3 No Brasil, a restrição cambial, de natureza macroeconômica, foi concomitante ao modelo de industrialização via substituição de importações (uma perspectiva de longo prazo, desde os anos 50 até o final da década de 80). As exigências de conteúdo local procuravam minimizar o gasto com divisas ao mesmo tempo em que promoviam a produção doméstica. Como argumenta Tavares Jr.(2012), essa política teve efeitos positivos em termos da criação e consolidação de um parque industrial diversificado, mas sua permanência foi uma das causas do baixo investimento em inovação tecnológica no país. No momento atual da economia brasileira, a volta de exigências de conteúdo local não se justificaria por razões de restrições cambiais. No entanto, ao eleger o tema do adensamento das cadeias produtivas locais nas diretrizes da política industrial, o conteúdo local parece ser entendido como um dos instrumentos que podem contribuir para esse objetivo, num contexto em que a questão da inovação tecnológica continuaria a ser o foco principal da política industrial. Nesse caso, a questão é avaliar em que medida a política de conteúdo local atende aos objetivos propostos. Ademais, qualquer análise deve ser realizada por setores, uma vez que o potencial de resposta da oferta doméstica às restrições de importações varia. Outra perspectiva sobre as exigências de conteúdo local é a de que seu uso foi fortalecido pela crise mundial. Embora a questão do conteúdo local já estivesse presente em alguns setores no Brasil (petróleo e gás), a crise mundial teria propiciado um cenário em que o tema do protecionismo ganhou força. Nesse caso, o debate seria centrado no tema da crise e o protecionismo. O objetivo geral do estudo é, portanto, apresentar uma reflexão sobre o tema da política industrial em termos de objetivos e seus instrumentos que contribua para o debate da política brasileira, levando em consideração o que foi dito anteriormente. Assim, na primeira seção é apresentada uma breve análise do contexto geral mundial pós 2008. Haveria indícios de uma nova onda protecionista? Como o Brasil tem respondido a esse novo contexto? A razão para essa seção é avaliar em que medida os efeitos da crise contribuíram para as diretrizes da política industrial pós-crise. Ressalta-se que a seção não pretende analisar de forma detalhada o tema. A ideia é a de apresentar algumas observações gerais que permeiam a reflexão sobre políticas industriais e protecionismo no Brasil. A segunda seção apresenta uma análise teórica sobre as diretrizes da política industrial, onde o tema das falhas de mercado e as externalidades são destacados como guia para intervenções do governo. A terceira e quarta seções partem da premissa de que a heterogeneidade das características que definem cada cadeia produtiva obriga a uma análise de estudos de casos. Além disso, de que o efeito de cada instrumento deve ser analisado separadamente. Logo, foi selecionada a avaliação da exigência de conteúdo local no setor de petróleo e gás e no de equipamentos médicos, hospitalares e odontológicos1. A escolha se justifica pelos seguintes motivos: são setores intensivos em tecnologia; são prioritários na agenda governamental (a exploração das reservas de petróleo e a melhora nos serviços de saúde); e, para ambos, a participação do investimento direto estrangeiro é um fator que influencia a questão de acesso às novas tecnologias e fornecimento de insumos. A quinta seção conclui o trabalho. 4 O pr o te ci o n i s m o e a cr i s e de 2 0 0 8 Na reunião do G-20 de abril de 2009, foi solicitado aos orga- barreiras protecionistas de caráter não multilateral carac- nismos internacionais pertinentes o acompanhamento das terizaram esse período (Pereira, 1998). medidas de comércio e investimento dos países membros Nos anos 90, imperou um relativo consenso quanto do grupo. O temor que a crise econômica repetisse a onda aos benefícios da liberalização comercial/financeira. Na protecionista dos anos 30 era um tema constante no deba- América Latina, o debate sobre o esgotamento do modelo te sobre os efeitos da recessão mundial. de substituição de importações marcou o final da década A seção apresenta uma visão geral do tema do pro- de 80 (Pereira, 2003). A criação da Organização Mundial do tecionismo. Em seguida, analisa o tema das diretrizes da Comércio (OMC), que selou o término das negociações da política industrial brasileira no contexto pós-2008. Rodada Uruguai, consolidou o compromisso com a disciplina multilateral em direção a uma ordem liberal no comércio de mercadorias e serviços. Mesmo o aumento dos 1. acordos preferenciais de comércio foi considerado um passo positivo para a liberalização. Um exemplo foi o Merco- Visão geral do protecionismo antes da crise de 2008 sul, associado ao ”regionalismo aberto”. A tarifa externa comum adotada para a criação da união aduaneira entre O tema do protecionismo pode ser analisado a partir de Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai promoveu uma re- duas perspectivas. Na primeira, o protecionismo é enten- dução tarifária nas pautas nacionais dos países membros. dido como uma resposta a crises internacionais e/ou do- O consenso sobre os benefícios da liberalização co- mésticas. Nesse caso, a proteção é justificada como forma mercial/financeira começou a diluir no final dos anos 90. de atenuar a queda no emprego/renda decorrente da crise. As crises nos países asiáticos, o baixo crescimento em Aqui se insere a crise de 1930 com a adoção generalizada grande parte dos países latinos, a crise da Argentina, en- de instrumentos de proteção comercial. Na segunda, o pro- tre outros problemas, foram apontados como exemplos tecionismo é visto como parte integrante das políticas de de que apenas a liberalização não assegurava o cresci- desenvolvimento industrial. O modelo de substituição de mento econômico esperado. Nota-se que não é possível importações adotado na América Latina até meados da dé- atribuir somente à liberalização comercial/financeira dos cada de 80 seria um exemplo. anos 90 as crises que ocorreram em países latinos e asiá- As perspectivas não são excludentes. Uma das premis- ticos nesse período. No Brasil, a valorização cambial (uma sas que orientou o modelo de substituições de importa- das principais âncoras do programa anti-inflacionário de ções foi a restrição cambial (uma questão macroeconômi- 1994) junto com a liberalização comercial conviveu com ca), entendida como um dos entraves ao desenvolvimento um cenário de baixas taxas de crescimento econômico e dos países latinos na década de 50. Na primeira metade redução dos postos de trabalho em vários setores. Como da década de 80, a proliferação de barreiras não tarifárias, Cordoba e Laird (2006) ressaltam, a liberalização comer- como o aumento das investigações sobre práticas desle- cial é um instrumento que requer um entorno institu- ais, e acordos voluntários de restrição às exportações le- cional e econômico para que seus benefícios sejam as- varam ao conceito de ”novo protecionismo” aplicado, em segurados. Na ausência dessas condições, os custos da especial, à política de comércio exterior dos Estados Uni- liberalização levam a pressões protecionistas.2 dos. A forte valorização do dólar aprofundou e deixou mais A Rodada de Doha, iniciada em 2001 como a ”Roda- claro as mudanças no padrão de vantagens comparativas da do Desenvolvimento”, refletia a demanda de países que estavam ocorrendo no comércio mundial. A prolifera- em desenvolvimento que consideravam que os ganhos ção de investigações sobre práticas desleais e os acordos prometidos com os compromissos da Rodada Uruguai voluntários de restrição às exportações, que constituíam não haviam se materializado de forma satisfatória. Não 5 sim por um maior grau de autonomia das políticas locais. 2. Nesse sentido, revisão do acordo de investimentos, direi- Aumentou o tos compensatórios, propriedade intelectual passaram a protecionismo como fazer parte da agenda de países como a Índia e o Brasil resposta à crise? havia uma demanda por ”mais proteção comercial”, mas (um exemplo é o tema da propriedade intelectual). O impasse agrícola, a partir de 2003, levou à relativa Os relatórios elaborados pela OMC para a publicação estagnação da Rodada de Doha. Por outro lado, porém, conjunta com a OECD e a UNCTAD sobre as medidas o crescimento da economia mundial até 2008 foi um fa- de comércio introduzidas pelos países do G-20 após tor que contribuiu para afastar demandas protecionistas, a crise não sugerem o surgimento de uma nova onda mas não o debate sobre as diretrizes das políticas de de- protecionista, conforme o Box sobre ”Medidas de co- senvolvimento industrial. mércio do G-20” sugere. No entanto, alguns pontos No caso brasileiro, como antes mencionado, a valo- são destacados. rização cambial levou a crescentes déficits no saldo de transações correntes do balanço de pagamentos. O efei- i)em todos os relatórios é expressa a preocupação to contágio das crises asiáticas, moratória russa, além com a baixa taxa de retirada das medidas protecio- de questões macroeconômicas levaram ao abandono da nistas adotadas; política cambial como âncora do programa de estabiliza- ii)é ressaltada a elevada frequência de medidas de ção da inflação em janeiro de 1999. No entanto, o deba- caráter setorial voltadas para setores que já eram te sobre a ”vulnerabilidade externa” do país reacendeu considerados sensíveis em alguns países mesmo a questão do papel da política industrial e de comércio antes da crise. Dessa forma, a crise, ao se eleger exterior (Pinheiro, 2002). medidas de proteção como alívio temporário/per- No ano de 2003, o tema da política industrial ganhou manente, estaria postergando os ajustes estrutu- força com o lançamento da ”Política Industrial, Tecnológica e de Comércio exterior” (PITCE). As políticas passadas rais necessários face a mudanças nos padrões de privilegiavam a criação da capacidade produtiva (modelo vantagens comparativas; de substituição de importações) ou eficiência de proces- iii)u ma clara indicação de preocupação com o au- sos produtivos (anos 90), mas não o tema da competi- mento do protecionismo não se dá imediatamen- tividade no comércio mundial (Salerno e Daher, 2006). A te após a eclosão da crise, mas a partir de meados novidade da PITCE seria a ênfase conferida ao tema da de 2011, onde as incertezas quanto aos rumos da inovação tecnológica. Em 2008 foi lançado a ”Política de recuperação econômica passam a dominar o ce- Desenvolvimento Produtivo” (PDP), com maior grau de nário internacional; abrangência e de propostas de articulação entre as cadeias produtivas.3 Nenhum desses programas pode ser iv)a lém do tema dos setores sensíveis, passam para identificado com a questão do protecionismo. Ressaltam, o rol das motivações protecionistas os desalinha- porém, o papel do Estado na promoção do desenvolvi- mentos cambiais; e, mento industrial, em especial, nos setores associados às v)os três últimos relatórios destacam o aumento de novas tecnologias. medidas não tarifárias associadas às diretrizes de políticas industriais. 6 Medidas de comércio do G-20 1º Relatório: setembro de 2009 Ressalta a questão das políticas setoriais voltadas para setores considerados sensíveis pelos governos (automotivo, Abrangeu o período de abril a agosto de 2009. As projeções siderurgia, têxteis e vestuário). Seriam setores que já apre- para a queda no volume de comércio e do investimento para sentavam problemas antes da crise, em alguns países, mas 2009 configuravam o aprofundamento da recessão mundial. que estariam sendo alvo de medidas de apoio com potencial No entanto, não havia indicação de uma escalada de medi- de efeitos restritivos sobre os fluxos de comércio. das protecionistas de comércio. Haviam sido observados: aumento de tarifas; medidas não tarifárias (em especial, 4º Relatório: novembro de 2010 nos setores siderúrgico e automotivo); e, novos subsídios Abrangeu o período de maio a outubro de 2010. O relató- às exportações agrícolas. Os pacotes fiscais e financeiros rio coincidiu com um período que a economia e o comércio foram considerados positivos para a recuperação da eco- mundial começavam a se recuperar. As medidas restritivas nomia mundial. No entanto, alguns pontos que integram de comércio continuavam a ser introduzidas, mas a um rit- esses pacotes constituem restrições ao comércio como, por mo mais lento. O mesmo ocorria, porém, com o ritmo de exemplo, cláusulas de desempenho que favorecem a indús- retirada das medidas implementadas após 2008. Logo, o tria local em detrimento das importações. Logo, a incidência monitoramento ao protecionismo deveria continuar. Duas das medidas protecionistas seria condizente com episódios questões estariam contribuindo para a demanda por prote- anteriores de recessão.4 Os riscos apontados seriam de que ção, mesmo com um cenário internacional mais favorável: o novas medidas continuassem a ser introduzidas e que alí- elevado desemprego em alguns dos países do G-20; e, va- vios temporários passassem a ser permanentes. lorizações cambiais percebidas como fruto de políticas deliberadas por parceiros que desejavam ganhar ”vantagens 2º Relatório: março de 2010 competitivas” – beggar-my-neighbor policies. Abrangeu o período de setembro de 2009 a fevereiro de 2010. Não foi observado aumento no número de medidas 5º Relatório: maio de 2011 restritivas ao comércio em relação ao primeiro relatório. No Abrangeu o período de meados de outubro de 2010 a abril entanto, as novas medidas de comércio introduzidas foram de 2011. O número de restrições ao comércio aumentou. O concentradas em setores intensivos em trabalho. Continu- relatório destaca as restrições às exportações de alimentos ava a preocupação com as cláusulas de desempenho asso- e minerais, aumento de tarifas de importações e licenças ciado aos pacotes de financiamento. Em adição, o pacote de não automáticas. É a primeira vez que o relatório expressa estímulos à recuperação econômica via compras do gover- claramente uma preocupação com o possível aumento do no acentuou a preferência por empresas/produtos locais. protecionismo. O relatório chamou a atenção para a lenta recuperação da economia mundial e o desemprego gerado que sugeriam a 6º Relatório: outubro de 2011 continuidade de demandas por medidas de proteção. Abrangeu o período de maio a outubro de 2011. O relatório destaca os indícios de um aumento do protecionis- 3º Relatório: junho de 2010 mo como resposta às questões cambiais e desequilíbrios Abrangeu o período de novembro de 2009 a meados de macroeconômicos em alguns países, já percebidos no maio de 2010. Não há diferenças substanciais em relação relatório de novembro de 2010. Ademais, políticas indus- ao relatório anterior, pois cobrem quase o mesmo período. triais que envolvem medidas de substituição de importa- Destaca, porém, que as principais medidas de comércio se ções voltaram a ser utilizadas. O compromisso com a re- referem às investigações de dumping, subsídios e salva- tirada das medidas protecionistas como resposta à crise guardas, que são instrumentos legais de defesa comercial. continuava em ritmo lento. 7 Medidas de comércio do G-20 Logo, embora os relatórios do G-20 não apontem para um acirramento do protecionismo que possa lem- 7º Relatório: maio de 2012 brar os anos 30, chama a atenção para uso de medidas Abrangeu o período de meados de outubro de 2011 a meados que teriam o potencial de distorcer os fluxos de comér- de maio de 2012. O relatório inicia com a seguinte afirma- cio. A questão seguinte é, portanto, como medir esse ção ”Os últimos sete meses não testemunharam nenhuma protecionismo? desaceleração na imposição de novas medidas restritivas Segundo Cadot e Malouche (2012), as tarifas de im- de comércio das economias do G-20”. Concomitantemente, portação caíram ao longo das duas últimas décadas nos ressalta a questão do viés protecionista nas diretrizes das países desenvolvidos e em desenvolvimento, além de políticas industriais de alguns países do G-20. Compras go- ter aumentado o número de países que consolidaram vernamentais como instrumento de estímulo às indústrias as suas tarifas de cláusula de nação mais favorecida na domésticas, políticas setoriais voltadas para aumento do OMC.5 No entanto, cresceu o número de medidas não ta- conteúdo local, são exemplos citados como formas de prote- rifárias (MNT) tanto nos países desenvolvidos como nas cionismo, embora difíceis de monitorar (avaliar). No cômputo grandes economias emergentes. Aqui entramos num geral das medidas protecionistas, as mais utilizadas ao lon- terreno nebuloso. Algumas MNT, como as barreiras fitos- go dos períodos são as investigações sobre dumping. sanitárias e normas técnicas, visam assegurar normas e padrões de segurança e qualidade que são considera- 8º Relatório: outubro de 2012 dos importantes para o bem estar das sociedades. Me- Abrangeu o período de meados de maio de 2012 a mea- didas de defesa comercial, como as investigações sobre dos de outubro de 2012. Não destaca nenhuma mudança dumping e subsídios, embora restrinjam o comércio, são nas políticas comerciais dos países do G-20. Alerta para instrumentos legais reconhecidos pela OMC e podem ser a insistente continuação de medidas que deveriam ser alvo de painéis de solução de controvérsias, se o seu uso temporárias. Somente 21% das medidas relativas ao co- for considerado improcedente. mércio que foram introduzidas desde outubro de 2008 O gráfico 1 mostra o percentual das medidas restri- foram removidas. tivas, por principais grupos coletadas pela OMC, referen- Fonte: WTO/OECD/UNCTAD (2012) Report on G20 Trade and Investment Measures, vários relatórios. te aos países do G-20. Desde o início da publicação, em 2009, dos relatórios foram identificadas 710 medidas relativas ao comércio. Fica evidente, porém, a concentração de medidas de defesa comercial, o que seria esperado em tempos de crise associada com desalinhamentos cambiais. Em segundo lugar, estão computadas as medidas na fronteira, com mudanças tarifárias, licenças de importações, barreiras técnicas e fitossanitárias. Em terceiro lugar, estão as medidas de exportação, as quais se referem às limitações impostas às exportações de produtos agropecuários e minerais e/ou subsídios às exportações agrícolas. Embora seja desejável a estimativa de algum indicador quantitativo do protecionismo, aqui se esbarra no tema de como mensurar o efeito restritivo de MNTs de 8 forma agregada. Seria preciso estimar os equivalentes cionistas após 2009 e o seu uso mais frequente a partir tarifários de todas as MNTS, uma tarefa nem sempre de meados de 2011. possível. Assim, numa primeira abordagem, pode-se Utilizando-se o mesmo método, relatório publicado utilizar indicadores de incidência para dar uma visão ge- pela WTO (2012), o qual agrega as medidas de todos os ral do uso de medidas de comércio. O relatório do G-20, seus membros, aponta que a diferença entre medidas de por exemplo, mostra o indicador de cobertura , ilustrado defesa comercial e de fronteira diminuem, pois muitos no gráfico 2. países em desenvolvimento não possuem recursos hu- 6 7 A cobertura do índice não chega a 1,5% em nenhum manos qualificados e arcabouço institucional que per- período. Em termos cumulativos, 3,5% das importações mita a utilização de investigações sobre práticas desle- mundiais e 4,4% das importações do G-20 foram alvo de ais.9 Os dados permitem comparar o período de meados medidas de comércio.8 Observa-se que os resultados de outubro de 2010 a meados de maio de 2012. No total confirmam a desaceleração do uso das medidas prote- acumulado das medidas, o percentual atribuído às me- Gráfico 1: Percentual (%) das medidas de proteção do G-20 por grandes grupos* 70 Defesa comercial 60 Transfronteiriça 50 Exportações 40 Outras 30 20 10 0 05 10 /2 /2 01 01 2- 1- 10 05 /2 /2 01 01 2 2 1 01 /2 10 101 /2 05 10 05 /2 /2 01 01 0- 0- 04 10 /2 /2 01 01 1 0 0 01 /2 05 001 /2 03 09 04 /2 /2 00 00 9- 9- 02 08 /2 /2 01 00 0 9 Fonte: WTO/OECD/UNCTAD (2012) * O número de medidas em cada um dos períodos, seguindo a ordem descrita no gráfico foi de: 80; 95; 56; 54; 122; 108; 124; e; 71. Gráfico 2: I ndicador de cobertura das medidas de comércio do G-20 1,2 Part% nas import. mundiais 1 Part% nas import.do G-20 0,8 0,6 0,4 0,2 2 2 01 2- 05 11 /2 /2 01 01 1- 10 05 /2 /2 /2 10 101 /2 05 001 /2 10 01 01 1 /2 04 /2 05 /2 01 0- 10 /2 905 00 /2 11 01 0 01 0 01 9 00 /2 810 00 /2 10 1 0 9 Fonte: WTO/OECDE/UNCTAD (2012) didas do grupo dos países do G-20 foi de 47%. E, mesmo Em outro artigo, de 2010, Kee, Neagu e Nicita procu- excluindo as medidas de defesa comercial, o percentual é de raram responder à seguinte pergunta ”Has protectio- 40%. Logo, os países do G-20 têm uma participação elevada nism been rising since fall 2008?”11. Para tanto, os auto- na introdução das medidas protecionistas. Não surpreende, res compararam o Overall Trade Restrictiveness Indices portanto, que as conclusões sejam similares aos relatórios (OTRI) de diversos países entre 2008 e 2009.12 Os resulta- sobre o G-20. No último relatório global do G-20 (meados de dos dos cálculos, que levou em conta apenas as políticas outubro de 2011 a meados de 2012) é destacado que alguns comerciais tarifárias e os direitos antidumping dos paí- países estão se voltando para políticas de substituição de ses, mostram que não houve um aumento generalizado importações. Ademais, teria crescido o número de restri- do protecionismo decorrente da crise financeira global. O ções associadas a políticas de compras governamentais. aumento de tarifas e de direitos antidumping nos países analisados explica, em conjunto, menos de 2 por cento do Outra fonte de monitoramento das medidas protecionistas é o Global Trade Alert (GTA) elaborado sob a coor- colapso do comércio mundial. denação de Evenett (2012). No último relatório publicado Apesar de muitas nações terem aumentado suas ta- em junho de 2012, foi ressaltada a participação do G-20 no rifas em produtos selecionados, apenas alguns poucos aumento do protecionismo. Segundo o relatório, no ano de países, como Malawi, Rússia, Argentina, Turquia e China 2009, o grupo era responsável por 60% de todas as medi- apresentaram impactos decrescentes significativos sobre das de proteção. Esse percentual aumentou para 75% em os seus fluxos comerciais. Os Estados Unidos e a União 2011 e no primeiro semestre de 2012 para 79%. Da mesma Europeia, por sua vez, utilizaram como um dos principais forma que os relatórios da OMC, o GTA é sujeito a críticas, instrumentos de política comercial a aplicação de direi- pois são incluídas como proteção medidas que precisam ser tos antidumping para proteger a sua indústria nacional. analisadas para que se avalie o efeito restritivo no comércio, No entanto, mesmo depois de levar em conta os direitos além da verificação das medidas não seguir o rigor da OMC antidumping, as evidências fornecidas no artigo sugerem que precisa responder aos seus membros. No entanto, as- que o impacto comercial, devido a alterações na política sim como nos relatórios da OMC, a principal mensagem é comercial durante o período analisado, foi mínimo. 10 de um aumento no protecionismo em relação ao momento Datt e outros (2011) analisam os relatórios da OMC e imediato pós-crise com a volta de um cenário de incertezas do GTA. Chamam atenção para o fato de que a resposta à sobre a recuperação mundial a partir de 2011. crise de 2008 englobou medidas de liberalização comercial, Segundo Henn e Mc Donald (2011), a análise dos da- promoção ao comércio e restrições ao comércio na forma dos de medidas de política comercial discriminatórias, de MNT, todas privilegiando o recorte setorial. Encontra- implementadas desde julho de 2008 até abril de 2010, ram no crescimento das cadeias de ofertas globais (a es- mostra que, em termos agregados, houve uma queda de pecialização vertical ao longo das cadeias produtivas), uma apenas 0,2% no comércio mundial decorrente do aumento das razões para a não proliferação do protecionismo como do uso de medidas discriminatórias. Por outro lado, a nível resposta à crise. Concordam com as observações da OMC de produto, concluiu-se que a queda variou entre 5% (bor- e do GTA, que o prolongamento da crise e os desequilíbrios der measures) e 7% (behind the border measures). Nesse macroeconômicos expressos na questão cambial poderiam artigo, os autores inferem ainda que medidas como apli- estar levando a uma mudança no contexto mundial — o cação de direitos antidumping, e outras medidas prote- risco do aumento do protecionismo não estaria descartado. cionistas menos convencionais como MNTs, políticas de Em suma, os estudos citados não sinalizam um efeito compras discriminatórias, subsídios domésticos e me- significativo no comércio mundial em função das medidas didas de socorro, contribuíram mais fortemente para a de proteção. Esse resultado, porém, pode estar associado queda recente dos fluxos de comércio mundial. ao caráter seletivo setorial no uso de vários instrumentos.13 10 O primeiro se refere à forte recuperação nos preços 3. das commodities, a partir de meados de 2010. De um lado, O Brasil no contexto da crise global contribuiu para minimizar o efeito da crise via elevação 14 nos termos de troca e aumento das reservas internacio- O país acompanhou a crise. Em 2009, o produto interno nais. Por outro lado, intensificou a valorização da moeda bruto caiu (-0,3%), depois recuperou (7,5%, em 2010) e vol- nacional, o que trouxe à tona o debate sobre a desindus- tou a desacelerar (2,7% em 2011) com a piora das condi- trialização e a primarização da pauta de exportações bra- ções internacionais em meados de 2011. sileira (Pereira, 2011, Pereira e Souza, 2011). O gráfico 3 Segundo Irwin (2012), a crise de 2008 não repetiu a ilustra a questão da primarização da pauta de exportações onda protecionista de 1930 devido aos diferentes regimes e o gráfico 4 mostra a forte valorização da taxa efetiva de cambiais. Na crise de 30, muitos países adotavam o pa- câmbio associada à elevação dos preços da commodities.16 drão-ouro e na crise atual o regime preponderante é o do O segundo remete ao tema da competitividade dos câmbio flexível. O câmbio flexível dá maior autonomia para produtos industriais brasileiros. No comércio mundial, a os governos no manejo das políticas monetárias, além de participação do Brasil nas exportações mundiais aumen- funcionar como atenuador de um choque externo.15 Em tou de 0,9% para 1,4% entre 2000 e 2011. Esse aumento é suma, os governos dispõem de um maior número de ins- explicado pelo desempenho das exportações de produtos trumentos para lidarem com choques externos. No caso agrícolas, pois as manufaturas brasileiras mantiveram do Brasil, entretanto, outros fatores devem ser considera- sua participação abaixo de 1% nesse período. 17 dos na análise do efeito cambial. Gráfico 3: Participação (%) dos principais grupos de produtos no total das exportações brasileiras 70 Básicos Semimanuf. 60 Manuf. 50 40 30 20 10 Ja n- O ut 20 12 11 20 10 20 09 20 08 20 07 20 06 20 05 20 04 20 03 20 02 20 01 20 20 00 0 Fonte: SECEX/MDIC 11 Gráfico 4: A valorização do real e os preços das commodities* 180 160 140 120 100 80 09_12 07_12 05_12 03_12 01_12 11_11 09_11 07_11 05_11 03_11 01_11 11_10 09_10 07_10 05_10 03_10 01_10 11_09 09_09 07_09 05_09 03_09 01_09 11_08 09_08 07_08 05_08 03_08 01_08 60 * Os índices estão na base janeiro de 2008. O índice de preço é composto pelas 23 principais commodities destacadas pela SECEX. O ín- Índice de preços commodities Índice da taxa de câmbio efetiva real dice da taxa de câmbio real efetiva é composto pelo: euro; dólar; peso argentino; moeda japonesa; moeda chinesa; e, a libra esterlina. Elaboração: IBRE/FGV (2012) O terceiro ressalta o aumento nos coeficientes de O que essas observações querem indicar? importação na indústria como sinal da baixa competi- A valorização cambial e a ”primarização da pauta expor- tividade dos produtos brasileiros, acentuada pela ques- tadora” pós-crise trouxeram à tona, de forma mais con- tão cambial. Pelo cálculo da FIESP (2012) o coeficiente tundente, questões que permeiam o debate da agenda importado da indústria geral aumentou de 16,2% para de política industrial e de comércio exterior do Brasil. Não 23,1%, entre 2006 e 2011 e da indústria de transforma- se trata de uma questão de caráter conjuntural ou que se ção de 14,4% para 21,9%. Os resultados variam entre os exaure no tema cambial. Como melhorar a competitivida- setores, mas a acentuada elevação dos coeficientes de dos produtos brasileiros é um tema presente no debate passou a ser parte integrante da agenda entre o gover- brasileiro, desde a década de 90. A agenda de competitivi- no e segmentos dos setores empresariais. dade inclui questões como infra-estrutura, sistema tribu- 18 O quarto fator a ser ressaltado se refere aos resulta- tário, educação, entre outros (Bonelli, 2011). No entanto, dos da balança comercial, que continuaram superavitá- embora haja consenso sobre a agenda de políticas hori- rios, mesmo com a valorização cambial. No ano de 2008, zontais que favoreçam a competitividade dos produtos o saldo comercial foi de US$ 24 bilhões, seguido de um brasileiros, não há consenso sobre as diretrizes da po- saldo de US$ 25 bilhões (2009), US$20 bilhões (2010) e lítica industrial e do comércio exterior quando se trata US$29 bilhões (2011). de medidas de caráter seletivo. Como será analisada na 12 seção seguinte, a correção das falhas de mercado como Bloco 4: Sistemas produtivos do agronegócio argumento para o uso de instrumentos da política in- Bloco 5: Comércio, logística e serviços dustrial requer cuidado. Ademais, quando são utilizadas Como já mencionado, a participação nas cadeias produ- medidas de proteção há sempre o risco de serem criadas tivas globais foi uma das forças que atenuou as demandas novas distorções. por proteção. No caso do Brasil, entretanto, esta mesma O lançamento do Plano Brasil Maior de 2011 foi motivação teria aumentado a demanda por proteção. Foi realizado num contexto internacional de incertezas conferida maior ênfase ao tema do aumento do valor adi- quanto à recuperação da economia mundial, e de acir- cionado localmente, o que tem sido alvo de debate e susci- ramento do debate no Brasil sobre o risco da desin- ta controvérsias. Não se trata, entretanto, de debater se o dustrialização associada à valorização cambial. 19 A Brasil está ou não mais protecionista, mas se as medidas, questão do adensamento das cadeias produtivas ga- como as exigências de conteúdo local, auxiliam no objetivo nhou força, ainda mais que o governo identificou no de criar um parque industrial tecnologicamente eficiente e crescimento da demanda associado aos novos inves- inserido nas cadeias globais. Algumas observações são re- timentos (petróleo, construção naval, energia, saúde) levantes para esclarecer tal consideração. uma oportunidade de estimular a oferta doméstica ao No último relatório da OMC sobre o G-20, consta a ele- longo das cadeias produtivas. vação temporária das tarifas de importações para 100 pro- Assim, as orientações estratégicas do Plano Brasil Maior dutos (classificação a 8 dígitos) anunciadas pelo governo (2011)20 foram: brasileiro, em setembro de 2012. A média das tarifas des- Promover a inovação e o desenvolvimento tecnológico; ses produtos passou de 13,6% para 23,4% e, nesse conjunto, Criar e fortalecer competências críticas da econo- predominam bens intermediários, o que encarece o custo mia nacional; dos produtos finais. A representatividade dos produtos na pauta de importações é pequena (3,1%), mas acumularam Aumentar o adensamento produtivo e tecnológico um déficit de US$ 1,5 bilhões no período de janeiro a julho das cadeias de valor; de 2012. No mesmo relatório, porém, consta a redução tem- Ampliar os mercados interno e externo das empresas porária de cerca de 800 produtos dos setores de bens de brasileiras; capital, informática e telecomunicações.22 Uma vez que consideramos que avaliar o uso de Garantir crescimento socialmente inclusivo e ambien- instrumentos e os objetivos da política industrial é um talmente sustentável; caminho que pode contribuir para o debate no lugar de Ampliar os níveis de produtividade e competitividade questionar se há ou não um viés protecionista na política da indústria brasileira. inaugurada no ano de 2011, caberia questionar se o au- O cerne continuava como nos planos anunciados ao mento observado nas tarifas não teria seguido alguma longo dos anos 2000. Na questão da inovação tecnológi- lógica ditada pelas diretrizes da política industrial. Ade- ca, porém, foi conferida uma maior ênfase ao tema das mais, se a redução das tarifas não sinalizaria a preocu- cadeias produtivas locais. Desta forma, foram definidos pação com a competitividade dos produtos. cinco Blocos de Sistemas Produtivos: Um segundo esclarecimento se refere ao tema das cadeias produtivas. No passado, exigências de conteúdo local Bloco 1: Sistemas da Mecânica, Eletroeletrônica e Saúde21 associadas às compras governamentais desempenharam Bloco 2: Sistemas produtivos intensivos em escala um papel importante na construção da oferta doméstica ao longo das cadeias. No cenário atual, onde o ritmo da Bloco 3: Sistemas produtivos intensivos em trabalho 13 inovação tecnológica acelerou, as exigências de conteúdo local poderiam consolidar ofertas domésticas em contínua defasagem com o quadro internacional. O efeito China também precisaria ser considerado. Se antes havia sempre a possibilidade de garantir vantagens comparativas em bens intensivos em trabalho e atender às demandas de países com menor grau de desenvolvimento, agora isso se tornou mais difícil com a concorrência chinesa. Por fim, cabe considerar que a estratégia de política industrial que priorize questões de conteúdo local pode criar entraves para a realização de acordos de livre comércio, os quais têm sido, justamente, um dos canais para a construção das cadeias produtivas globais e regionais, como observado na região asiática (Baumann, 2010). 14 Política Industrial e Protecionismo 1. estrutura, garantir direitos de propriedade e reduzir a POR QUE POLÍTICA INDUSTRIAL? 23 burocracia nos negócios são exemplos de políticas ho- Idealmente, medidas de política industrial devem ter rizontais na provisão de bens públicos. Criar universi- Prover educação de qualidade, investir em infra- dades de engenharia, por exemplo, implica na provisão como objetivo a diversificação da economia para novos de bens públicos, mas de natureza vertical, pois atende setores, de modo a garantir o incremento da produ- a determinados setores (eletrônicos, por exemplo), mas tividade da economia. Sendo assim, é importante que não a outros. Nesse ponto, cabe a distinção entre setores os setores contemplados pela política industrial se desenvolvam em bases competitivas. Embora eventu- e atividades. Atividades são ações que potencialmente almente implique algum tipo de proteção temporária, perpassam diversos setores e que normalmente não são o sucesso da política industrial passa pela exposição atividades-fim das empresas (inovação, por exemplo).25 dos setores beneficiados à competição internacional. Por sua vez, no quadrante inferior direito (Figura 1) são Nesse sentido, boa parte das políticas adotadas pelos classificadas políticas que distorcem os preços relativos países em resposta à crise, inclusive no Brasil (ver ca- de setores específicos (subsídios e proteção comercial pítulo anterior), dificilmente se encaixa nessa concep- para determinados setores, por exemplo). Finalmente, ção de política industrial. há intervenções de mercado que buscam atingir deter- Para efeito de organização das ideias, as políticas minadas atividades (subsídios para pesquisa e desenvol- públicas serão classificadas de acordo com duas di- vimento, subsídios para treinamento de mão-de-obra, mensões: quanto ao seu tipo – provisão de bens pú- subsídios para investimento em capital, por exemplo), e, blicos ou intervenções no mercado – e quanto à sua não, determinados setores (quadrante inferior esquerdo). transversalidade – vertical (limitada a alguns poucos Dito isso, define-se política industrial como sendo setores) ou horizontal (de alcance setorial mais amplo) ações voltadas para alterar a estrutura produtiva da eco- (ver Figura 1). nomia de modo a incrementar a produção e a capacitação 24 tecnológica em determinados setores. Em outras palaFigura 1: Classificação das Políticas Públicas vras, a política industrial é definida como seletiva, ou seja, está associada às políticas verticais, mas também podem TRANSVERSALIDADE Horizontal incluir medidas horizontais de intervenção no mercado Vertical (área colorida da Figura 1). Com base nesta definição de Provisão de Bens Públicos política industrial leve (quadrante superior direito, asso- Política Industrial Leve ciado a bens públicos; e quadrante inferior esquerdo, que alteram preços relativos de atividades, em particular de pesquisa e desenvolvimento) e política industrial pesada (quadrante inferior direito, associado a intervenções que Intervenções no Mercado TIPO DE POLÍTICA política industrial, alguns autores fazem a distinção entre Política Industrial Leve distorcem preços relativos de setores).26 Política Industrial Pesada Sendo assim, cabe a pergunta: em que circunstâncias ações de política industrial são justificadas? A resposta se refere à correção de falhas de mercado e provisão de bens públicos, com balanço a ser feito com relação às falhas de governo. Se não há falhas de mercado significati- Fonte: Adaptado de Stein (2011). vas (ou se essas são inferiores às falhas de governo), não 15 há espaço para política industrial. A seção seguinte iden- atrasadas. Nesse caso, a proteção excessiva de um de- tificará as principais falhas de mercado que teoricamente terminado setor pode levá-lo a se desenvolver usando justificariam o uso de política industrial, avaliando empi- tecnologias ou modos de produção defasados, com pouco ricamente se há evidências de que essas distorções são potencial de geração de externalidades. Sendo assim, fica grandes o suficiente para merecer a atenção do governo claro que políticas que distorcem os preços – promoção e, se for o caso, qual tipo de política seria mais adequado. de exportações ou proteção comercial, por exemplo – não A resposta a essas questões depende do tipo de falha de necessariamente levam ao aumento do bem-estar.32 mercado em jogo. Aqui são avaliados três tipos: exter- Nessas circunstâncias, embora possam se desenvolver, nalidades no aprendizado, externalidades entre setores e os setores contemplados pela política industrial acabam externalidades informacionais. não proporcionando ganhos de produtividade expressivos para a economia. 2. 2.2 E xternalidades entre Setores e Problemas de Coordenação RESPONDENDO A FALHAS 27 A motivação para política industrial associada à ”indús- 2.1 Externalidades no Aprendizado 28 tria nascente” é construída a partir de externalidades Um dos argumentos mais antigos para justificar a neces- que se manifestam dentro da indústria (ou setor). No sidade de política industrial é o de ”indústria nascente”. entanto, podem existir externalidades entre setores Um dos pré-requisitos para a validade deste argumen- que, em última instância, também justificariam o uso de to é a presença de externalidades no aprendizado dinâ- política industrial. mico, ou seja, diminuição do custo de cada firma com o No caso da ”indústria nascente”, a política industrial volume produzido por todas as firmas ao longo do tem- pode ser pensada como uma ferramenta para resolver po (learning by doing).29 Como as firmas pioneiras não problemas de coordenação entre os agentes privados. O internalizam a redução de custos que sua produção irá mesmo pode ser dito das externalidades intersetoriais. proporcionar para as demais firmas no futuro, existe a Mas, enquanto as externalidades associadas ao argu- possibilidade de que, se o custo inicial de produção for mento de ”indústria nascente” são eliminadas conforme suficientemente alto, a economia não produza esse bem o setor atinge determinado tamanho, usualmente isso sem intervenção do governo. não ocorre com as externalidades entre setores. Em ou- Nesse caso, prover proteção para o setor que apre- tras palavras, embora ambas sejam problemas de coor- senta aprendizado dinâmico faz sentido econômico se o denação, a solução, em termos de política industrial, ten- aprendizado for rápido o suficiente (o que reduziria o cus- de a ser diferente nos dois casos. to da política). Cabe lembrar que, mesmo quando a pro- O argumento de big push se encaixa perfeitamente teção é a escolha ótima, esta deve ser diminuída ao longo na descrição de externalidade introduzida no parágrafo do tempo, na medida em que os custos das firmas forem anterior. 33 De forma resumida, determinados investi- sendo reduzidos, e deve ser eliminada quando esgotadas mentos somente se tornariam economicamente viáveis as possibilidades de aprendizado. se realizados simultaneamente e, nesse caso, haveria 30 As externalidades associadas ao aprendizado dinâmi- espaço para atuação do governo na coordenação das co têm sido recorrentemente relacionadas aos spillovers decisões individuais. de conhecimento.31 Além disso, muitas vezes as indús- Entretanto, o argumento somente faz sentido se a trias com potencial de learning by doing podem se de- economia é fechada, ou seja, se não é possível a compra senvolver com tecnologias modernas ou com tecnologias de insumos intermediários no mercado internacional. 16 Sendo assim, a sua relevância repousa somente nos in- No entanto, essas prescrições devem ser ponderadas sumos intermediários não-comercializáveis, tais como pela presença de outros países (em particular de países infraestrutura, educação e serviços. Nesse caso, ou o grandes, como a China) na mesma região do espaço de argumento recai na importância de políticas horizontais produção. Em outras palavras, eventualmente pode ser (no caso da infraestrutura e educação) ou perde o apelo melhor permanecer em áreas menos densas ou sofisti- se o insumo intermediário pode ser ofertado por firmas cadas do espaço de produção, mas cuja competição de multinacionais via investimento direto estrangeiro. outros países seja menos intensa.37 34 Sendo assim, deve-se dar preferência ao que foi antes Note-se que essa abordagem mais recente tem al- definido como política industrial leve. Como se trata de guma semelhança com a abordagem mais tradicional de um problema de ação coletiva, basta que o governo adote encadeamento.38 Basicamente, alguns setores – espe- políticas que garantam a coordenação adequada entre os cialmente da indústria manufatureira – possuiriam for- agentes econômicos. Ademais, se a externalidade estiver tes encadeamentos com o restante da economia, pois associada à inovação, faz mais sentido econômico fomen- demandariam muitos insumos de outros setores em seu tar essa atividade, e, não, o setor que dela se beneficia. processo produtivo. Analogamente, também existiriam Recentemente, as externalidades entre setores têm setores que são muito demandados pelos demais. Nes- sido exploradas de forma um pouco diferente. De forma se caso, por conta dessas externalidades, faria sentido bem resumida, determinados produtos estariam relacio- deslocar a economia para os setores que promovem mais nados entre si, de modo que a produtividade em um de- fortemente esses encadeamentos. terminado produto seria maior se o país já tivesse alcançado alta produtividade em um produto próximo. Vários fatores poderiam explicar a proximidade entre produtos 2.3 E xternalidades Informacionais e Diversificação – intensidade semelhante de fatores de produção, nível Outro tipo de falha de mercado está relacionado ao fato similar de sofisticação tecnológica e compartilhamento de que a utilização local de tecnologias que já são empre- da cadeia de suprimentos – e determinados produtos endidas em outros países não é imediata e necessita de pertenceriam a áreas mais densas do espaço de produ- adaptações. Dito de outro modo, a função de produção de ção (ou seja, teriam muitos produtos próximos de si).35 um determinado bem não é a mesma em todos os paí- Nesse sentido, tudo mais constante, países que al- ses, pois boa parte da tecnologia é tácita ou depende do teram sua estrutura produtiva na direção de áreas mais ambiente econômico e institucional em que está inserida. densas do espaço de produção e, portanto, mais sujei- Desse modo, existe incerteza se determinada atividade é tas ao aproveitamento das externalidades, tenderiam a passível de ser produzida localmente, ou seja, se as firmas crescer mais. Usualmente, as áreas mais densas esta- envolvidas na nova atividade serão suficientemente pro- riam associadas a produtos mais sofisticados ou cuja dutivas. Então, se a revelação dessa informação sobre a produtividade é mais alta. Desse modo, países que res- produtividade só ocorre após o investimento e o retorno tringem sua estrutura produtiva a regiões do espaço de desse investimento não é inteiramente capturado, há es- produção mais afastadas desses produtos mais sofisti- paço para intervenção do governo.39 cados e de maior produtividade, usualmente produzidos Sendo assim, o equilíbrio de mercado gera investi- pelos países ricos, teriam mais dificuldade de convergir mento muito pequeno em novas atividades e um nível para os níveis de renda das nações mais avançadas. de diversificação muito baixo. Trata-se de um problema Sendo assim, a política industrial deveria tentar posi- semelhante ao enfrentado pelas firmas que investem cionar os países tão perto quanto possível da cesta de em inovação mas, nesse caso, o retorno do investimento exportação dos países ricos. pode ser protegido por leis de patente e de proprieda- 36 17 de intelectual. Assim, sugere-se uma política industrial Nesse sentido, a presença de multinacionais parece gerar que, em linhas gerais, deve incentivar o investimento em externalidades associadas à criação de novas conexões novos setores ex ante e eliminar setores pouco produti- exportadoras (maior diversidade de produtos e destinos), vos ex post. O incentivo deve ser dado somente à firma pelo menos para empresas chinesas.41 pioneira, e, não, às imitadoras. Proteção comercial e sub- Ademais, se os consumidores incorrem em custo para sídios à exportação seriam pouco adequados, pois não experimentar novos produtos e conhecem a qualidade do é possível a discriminação entre pioneiros e imitadores. produto local, mas não a do produto importado, esse custo Empréstimos e garantias por parte do governo, embora se transforma em barreira à entrada para as exportações consigam atingir as firmas de forma discriminada, sofrem de outros países.42 Nesse caso, algum tipo de subsídio à de sérios problemas associados à influência política no exportação poderia ser justificado, mas apenas quando a direcionamento dos recursos, corrupção e moral hazard. diferença entre o produto de alta qualidade e o de baixa qualidade é significativa, quando a diferença no custo de produção entre esses produtos é baixa, quando o grau de 2.4 B arreiras à Entrada e Externalidades Associadas à Exportação diferenciação entre o produto exportado e o produzido no exterior é alto, e quando o mercado de destino da expor- Alguns autores argumentam que existem externalida- tação é muito protegido. De qualquer modo, o subsídio des associadas à atividade exportadora. Nesse caso, se- deve ser diminuído ao longo do tempo, conforme o proble- ria reforçada a necessidade de algum tipo de política pú- ma de assimetria for sendo reduzido. No entanto, em vez blica. A esse respeito, Aitken, Hanson e Harrison (1997) de subsídios, parecem ser mais adequadas medidas que utilizam microdados de firmas mexicanas e encontram reduzam diretamente a assimetria informacional, como, evidências de que a probabilidade de uma firma expor- por exemplo, promoção do país como produtor de bens de tar é maior se esta se localiza nas proximidades de uma qualidade e investimentos na certificação de produtos. empresa multinacional, mas não é alterada com a proximidade de uma firma exportadora doméstica. 2.5 Externalidades do Investimento Direto Estrangeiro Esse resultado parece indicar que as externalidades não estão relacionadas à atividade exportadora em si, Muitos países lançaram mão de políticas de atração de in- mas a algum outro aspecto da atividade das empresas vestimento direto estrangeiro, com a justificativa de que multinacionais. Elas podem ser geradas, por exemplo, existem externalidades associadas a ele. Basicamente, pelo aumento de produtividade das firmas domésticas as firmas multinacionais poderiam gerar spillovers para por meio da transferência de tecnologia e modelos de organização mais modernos (mais detalhes na próxima as firmas domésticas por três canais: (i) pela geração de seção). Essa conjectura é reforçada por evidências de externalidades na atividade exportadora; (ii) pelo aumento que, para empresas de países em estágios mais de- da competição no mercado local; (iii) pela transferência de senvolvidos, normalmente mais atualizadas em ter- tecnologia e de métodos organizacionais. O primeiro canal foi objeto da seção anterior. Com rela- mos tecnológicos e organizacionais, as externalidades ção ao segundo canal, Greenaway, Sousa e Wakelin (2004) associadas à exportação não são significativas. 40 Também é possível argumentar que existem barreiras encontram indícios de que o principal canal pelo qual o in- à entrada de firmas domésticas em mercados estrangei- vestimento direto estrangeiro aumenta as exportações de ros. Além de barreiras tarifárias, quotas de importação firmas britânicas é pelo aumento da competição. De qual- e especificações sanitárias, existem também barreiras quer modo, existem outros instrumentos mais apropria- à entrada associadas ao estabelecimento de contatos dos do que a promoção de investimento direto estrangeiro comerciais e ao conhecimento do mercado estrangeiro. para garantir e reforçar a competição no mercado domés18 3. tico, em especial política de defesa da concorrência e abertura da economia à concorrência internacional. CONCLUSÕES O terceiro canal merece maior atenção. Diversos auto- Medidas de política industrial, em particular de política res ressaltam que as externalidades somente são apro- industrial pesada, somente são justificadas na presença priadas pelas firmas domésticas sob certas condições. de falhas de mercado, em particular de externalidades. Por exemplo, os spillovers das firmas multinacionais são Nesse sentido, mostra-se útil separar as iniciativas de mais bem aproveitados na presença de um mercado de política industrial de acordo com o seu objetivo. Se o objeti- crédito doméstico desenvolvido, que permita a inserção vo é preservar setores já estabelecidos ou diversificar o te- dos fornecedores locais na cadeia produtiva das empre- cido industrial para segmentos correlatos aos já existentes sas estrangeiras.43 Desse modo, caso a intenção do gover- – política industrial in the small –, a melhor opção é remover no seja incentivar o investimento direto estrangeiro, cabe obstáculos que impedem o desenvolvimento desses seto- combinar essa política com intervenções que aumentem a res, em lugar de protegê-los. Assim, devem ter prioridade intermediação financeira em âmbito doméstico. iniciativas que destravem o crescimento da produtividade, e Além disso, há evidências de que o investimento di- não as ações voltadas a compensar a falta de competitivi- reto estrangeiro aumenta a produtividade das empre- dade. Promoção da qualificação do capital humano, investi- sas domésticas somente se o estoque de capital huma- mento em infraestrutura, melhora do ambiente de negócios no for grande o suficiente.44 Nesse caso, vale combinar e redução da complexidade tributária e da incerteza regu- promoção de investimento direto estrangeiro com po- latória devem estar no topo da agenda.48 Ou seja, trata-se líticas educacionais e de treinamento de mão-de-obra, basicamente de uma agenda de política industrial leve. ou manter o foco em setores nos quais já exista um nú- Entretanto, se o objetivo é fazer grandes apostas, mero razoável de trabalhadores qualificados. pela criação de setores inteiramente novos na economia A relação entre investimento direto estrangeiro e – política industrial in the large –, é bastante provável que mercado de trabalho é uma via de mão dupla. Na verda- seja necessário o uso de medidas de política industrial de, se a mão-de-obra qualificada é condição necessária pesada. Nesse sentido, a literatura econômica e a experi- para que investimento estrangeiro gere externalidades ência histórica sugerem que é preciso ter regras simples para as empresas domésticas, as multinacionais tam- e caminhar com cuidado. bém geram externalidades positivas para os trabalha- Políticas industriais pesadas devem ter prazo de- dores domésticos em termos de melhores salários. 45 terminado para acabar: quando utilizado, o esquema Finalmente, as evidências sobre as externalidades do de promoção e proteção (como barreiras à importação e investimento direto estrangeiro e os canais pelos quais políticas de conteúdo nacional) deve ser gradualmente elas se manifestam ainda são, em grande medida, incon- removido. Mais do que escolher vencedores, a política in- clusivas.46 Desse modo, em vez de políticas de incenti- dustrial deve ser capaz de eliminar perdedores, sob pena vo ao investimento direto estrangeiro, faz mais sentido de desenvolver setores pouco competitivos e incapazes políticas para eliminar as barreiras que impedem que de se inserirem no mercado internacional. as firmas domésticas construam relacionamentos com Além disso, dada a necessidade de burocracia estatal as multinacionais, melhorando o acesso a insumos de muito bem preparada, de arranjo institucional complexo qualidade, crédito e tecnologia.47 Ademais, como no Bra- (para dar conta da coordenação entre diferentes atores sil ainda há muitos entraves ao investimento direto (es- do governo e entre eles e o setor privado) e de acompa- trangeiro ou doméstico), faz mais sentido políticas para nhamento sistemático, é preciso ter foco. Não é possível removê-los do que algum tipo de subsídio ao influxo de fazer muitas apostas estratégicas ao mesmo tempo, sob capital externo. pena de não conseguir sucesso em nenhuma delas. 19 Es tu do d e C a s o : B e ns e S e rv iç o s d o S e t o r d e Pe tr ó l e o e G á s (P& G ) 1. tamares mínimos discriminados por itens e subitens. INTRODUÇÃO aberta a possibilidade de o regulador autorizar o não- A partir da discussão teórica e das evidências empíricas -cumprimento da cláusula de conteúdo local em caso elencadas nas seções anteriores, pretende-se analisar de não disponibilidade do produto ou serviços no mer- um caso específico de política industrial adotada no cado doméstico. 50 Entretanto, ao contrário das rodadas anteriores, foi Brasil. Nesse sentido, o setor de P&G foi escolhido por já Em segundo lugar, a definição de conteúdo local ter acumulado mais de uma década de experiência com também sofreu alterações. Na Rodada 1, o critério de políticas de conteúdo local no segmento de exploração conteúdo local foi definido pela localização da empresa e produção (E&P), o que permite analisar os resultados (no caso de produtos) ou localização da prestação dos e deles tirar lições para outros setores. Assim, a aná- serviços. Na Rodada 2, o conteúdo local de produtos lise da literatura sobre o tema foi complementada com passou a ser auferido de acordo com a definição de bem a realização de um workshop com empresas do setor de produção nacional, ou seja, máquina ou equipamento (doravante Workshop-P&G) e entrevistas com interlo- cujo valor alcance pelo menos 60% de índice de naciona- cutores do Governo. lização. Na Rodada 3, esse conceito é ampliado para os 49 serviços pela definição de serviço prestado no país, ou seja, aqueles em que materiais e serviços importados 2. correspondam a menos do que 20% do preço de venda. POLÍTICA INDUSTRIAL NO SETOR DE P&G de ser dicotômico. Para cada item e subitem a parcela Por fim, na Rodada 7, o conceito de conteúdo local deixa de conteúdo local passou a ser calculada como a razão 2.1 Levantamento das Ações entre a soma dos valores dos componentes que não fo- (A) Política de Conteúdo Local em E&P ram importados e a soma dos preços dos produtos. Em A partir da liberalização do mercado, foram realizadas outras palavras, a definição de conteúdo local passou a diversas rodadas de licitação de blocos de petróleo e ser mais rigorosa. gás. Desde a primeira, em 1999, todas incluíram regras Por fim, os procedimentos requeridos para a com- de conteúdo local. No entanto, essas regras foram sen- provação da exigência de conteúdo local também foram do alteradas ao longo do tempo. alterados ao longo dos anos. Até a Rodada 2, não era Essas mudanças podem ser classificadas em pelo necessária nenhuma comprovação específica. A partir menos três planos. Em primeiro lugar, a natureza da da Rodada 3, o regulador passou a exigir relatórios de exigência de conteúdo local sofreu algumas modifica- gastos trimestrais com separação do que foi feito lo- ções ao longo das Rodadas. Até a Rodada 4, não exis- calmente e do que foi importado. Além disso, também tia compromisso mínimo de conteúdo local, embora passou a ser exigida a apresentação de declaração de esse quesito fizesse parte dos critérios de escolha origem por parte dos fornecedores. Da Rodada 7 em nas licitações (com peso de 15%). Nas Rodadas 5 e 6, diante, a comprovação passou a exigir a certificação jun- foram fixados patamares mínimos de conteúdo local, to a entidades credenciadas pelo regulador. podendo as empresas ofertar percentuais adicionais em algumas atividades, os quais eram considerados (B) PROMEF e Congêneres na definição do lance vencedor. Por fim, a partir da Criado em 2004, o Programa de Modernização e Expan- Rodada 7, foram instituídos percentuais máximos e são da Frota (PROMEF) tem como objetivo a revitaliza- mínimos de conteúdo local em termos globais e pa- ção da indústria naval brasileira, a partir da encomenda 20 de navios por parte da Transpetro. Na verdade, o pro- Marinha Mercante (AFRMM), cobrado sobre os serviços grama foi criado a partir da necessidade de a Transpetro de frete realizados em território brasileiro. No entanto, modernizar e aumentar a sua frota de navios para atin- com o aumento dos financiamentos com os recursos do gir a meta de atender a Petrobras em 100% na cabota- fundo, a União foi autorizada a conceder crédito de até gem e 50% no longo curso. R$ 15 bilhões aos agentes financeiros do FMM (Lei nº 12.249/2010). O PROMEF foi desenvolvido com base em três premissas essenciais: ( i ) construir os navios no Brasil; ( ii) Ademais, dado que os agentes econômicos têm uma alcançar um nível mínimo de nacionalização (65% na percepção alta dos riscos associados ao financiamento dos primeira fase e 70% na segunda); ( iii) oferecer condições estaleiros domésticos, o governo criou o Fundo de Garantia para os estaleiros nacionais conquistarem competitivi- para a Construção Naval (FGCN), Lei nº 11.786/2008, modi- Embora tenda sido idealizado a ficada posteriormente pela Lei nº 12.058/2009. Trata-se de partir das necessidades da Transpetro, pode ser anali- fundo com finalidade de garantir o risco de crédito – aquele sado como uma política pública de fomento à constru- associado à incerteza no recebimento tempestivo do valor ção naval (e à indústria de navipeças). Nesse sentido, a contratado, por conta do não-cumprimento pelo estaleiro análise do programa será contextualizada no conjunto brasileiro do cronograma de construção – e de desempe- de medidas recentes adotadas para apoiar o setor, que nho – aquele associado às incertezas quanto ao não-cum- são resumidas na Figura 2. primento de todas as obrigações por parte do estaleiro ou dade em nível global. 51 da qualidade da embarcação – das operações de financia- No âmbito do PROMEF , o financiamento – da Transpetro e dos estaleiros – é feito com recursos do mento à construção naval brasileira com recursos do FMM. Fundo da Marinha Mercante ( FMM ), cujo agente finan- O FGCN é um fundo de natureza privada, e a União está ceiro é o BNDES . As condições desses financiamentos autorizada a participar com até R$ 5 bilhões da formação seguem as regras gerais estabelecidas para os recur- de seu patrimônio.52 Por fim, a Petrobras mantém programas de natu- sos do FMM . Saliente-se que os recursos do FMM são usualmente reza semelhante ao PROMEF . Ressalte-se o Programa provenientes do Adicional ao Frete para Renovação da de Renovação da Frota de Apoio Marítimo (PROREFAM), Figura 2: O PROMEF – Resumo Esquemático TRANSPETRO NAVIOS Financiamento pelo FMM Garantia pelo FGCN ESTALEIROS BRASILEIROS Desonerações Tributárias Capacitação Tecnológica Treinamento de Mão-de-obra INSUMOS Requerimento de Conteúdo Local Mínimo (65%-70%) INDÚSTRIA LOCAL Fonte: IBRE (2011). 21 voltado para construção de navios de apoio no Brasil também a indústria petroquímica). Entretanto, assim com índice de nacionalização de 75%, e o Programa com em boa parte dos fundos setoriais, apenas uma Empresa Brasileira de Navegação ( EBN ), no qual arma- pequena parcela dos recursos é efetivamente liberada dores brasileiros são contratados pela Petrobras por pelo governo. Por fim, também há previsão legal de 15 anos, sob a condição de construir seus navios em que, nos campos que pagam participação especial, 1% estaleiros domésticos. das receitas seja alocada pelas empresas para investimento em pesquisa e desenvolvimento. (C) Outras Medidas Ainda na esfera da inovação e da capacitação de ca- Embora as políticas de conteúdo local sejam a face mais pital humano, ressaltem-se diversas iniciativas de trei- aparente e importante da política industrial no setor de namento de mão-de-obra colocadas em prática pelo P&G, outras medidas foram adotadas concomitantemen- Prominp. Ademais, no âmbito do PROMEF, saliente-se te. Nesse sentido, sem a pretensão de ser exaustivo ou a criação da Rede de Inovação para Competitividade da de realizar análise mais aprofundada, algumas dessas Indústria Naval e Offshore (RICINO), em 2009. Essa rede medidas serão listadas a seguir.53 contempla parceria entre uma importante instituição de Especificamente com relação ao PROMEF, foi conce- pesquisa nessa área, o Centro de Excelência em Enge- dida uma série de desonerações tributárias. Essas de- nharia Naval e Oceânica (CEENO), e órgãos ligados aos sonerações se referem tanto à venda de embarcações estaleiros e empresas de navegação. (no Brasil e para outros países) como à compra de insumos para construção naval (domesticamente ou via 2.2 Avaliando as Ações importação). No caso das atividades ligadas à E&P, algo semelhante foi feito com relação aos bens de capital, com a instauração de um regime aduaneiro especial, o (A) Q uais são os Objetivos? Qual a Melhor Maneira de Alcançá-los? Repetro. Nos dois casos, o objetivo é desonerar a produ- A primeira característica que chama atenção na política ção local para alinhar a sua tributação com as importa- industrial associada ao setor de petróleo – em particular ções (para os insumos) ou para as exportações (para os no que diz respeito à política de conteúdo local – é a difi- produtos finais). No entanto, dado que o sistema tribu- culdade de se identificar claramente os objetivos. Por um tário brasileiro é, em grande medida, cumulativo, essa lado, um dos objetivos, aparentemente, seria a geração desoneração somente alcança as empresas adjacentes de renda e emprego em âmbito doméstico. Por outro, pa- aos setores beneficiados (e não toda a cadeia). Ademais, rece também haver uma preocupação com a diversifica- há dificuldades em se receber os créditos tributários, o ção da economia brasileira na direção de novos setores que fragiliza o mecanismo de desoneração. ou cadeias produtivas ligadas ao petróleo, em particular aquelas mais intensivas em tecnologia. Além disso, foram criadas linhas especiais de financiamento, tanto voltadas para investimento em Na verdade, essa percepção também foi levantada capital ( BNDES P&G e Prominp Participações, por por diversos agentes do setor durante o Workshop-P&G exemplo) e capital de giro ( Prominp Recebíveis ), quan- e por autores que se debruçaram sobre o tema.55 No caso to para investimento em inovação ( Inova Petro ). 54 do PROMEF, esses dois objetivos aparecem de forma Especificamente com relação à inovação, também mais explícita (ver seção 2.1). existem recursos provenientes do fundo setorial CT- A princípio, os dois objetivos não são incompatíveis, -Petro, cuja fonte de receita é uma parcela dos royal- mas demandam políticas públicas distintas. Tomando- ties de petróleo. Esses recursos podem ser usados -se o arcabouço descrito no capítulo anterior (ver Fi- para financiar atividades de inovação no setor (inclui gura 1), o desenvolvimento de novos setores ou de 22 cadeias produtivas pode eventualmente necessitar de dústrias não deveriam ter como objetivo maximizar o políticas industriais pesadas, principalmente se as ex- conteúdo local, mas os ganhos para a sociedade. Avan- ternalidades associadas a esses setores forem gran- çar em demasia nos requerimentos de conteúdo local des. Em muitas circunstâncias, essas externalidades tende a gerar resultados negativos e, no limite, inviabi- não são levadas em conta pelos agentes privados. É lizar o setor objeto do investimento inicial em termos justamente o descolamento entre o valor privado e so- de competitividade internacional. cial do investimento que gera oportunidades para po- Além disso, políticas de conteúdo local tendem a tra- líticas de conteúdo local. Para os setores que já estão zer mais benefícios em situações em que a diferença de estabelecidos, faz mais sentido econômico a adoção competitividade entre os insumos locais objeto da polí- de políticas horizontais ou políticas industriais leves, tica e a sua contrapartida importada é relativamente pe- o que seria o caso do setor de P&G, para torná-los ca- quena. Nesse caso, as penalidades em termos de custo pazes de aproveitar a demanda gerada pelos investi- tendem a ser menores. mentos neste setor. (B) Quais Setores? Entretanto, aos requerimentos de conteúdo local Essa distinção entre objetivos também pode ser tradu- também estão associados custos. Se os insumos são or- zida em termos de diferenciação de setores e cadeias denados em ordem crescente de competitividade inter- de produção contempladas pela política. A Figura 3 des- nacional, a decisão privada das empresas será avançar creve sucintamente a cadeia de valor e de suprimentos até certo ponto na escala de nacionalização. A política do segmento de E&P. No centro aparece o operador, e pública usualmente implica forçar as empresas a avançar quanto mais longe dele menos específico ao setor pe- mais nessa escala. Esse avanço tem benefícios – as ex- tróleo é o produto ou serviço. Sendo assim, para os pro- ternalidades mencionadas – mas também custos, asso- dutos e serviços mais próximos do centro, as externali- ciados à aquisição de insumos relativamente mais caros. dades tendem a ser mais fortes, e algum tipo de política Ressalte-se que esses custos se materializam mesmo industrial pesada (em particular de conteúdo local) pode em casos de sucesso na política de desenvolvimento de fazer sentido. fornecedores locais. Entretanto, para produtos e serviços mais afasta- A título de ilustração, existem amplas evidências de dos do centro, mais adequadas são políticas industriais que, após o relaxamento da política de conteúdo local leves e/ou políticas horizontais. Por exemplo, embora na indústria de petróleo norueguesa, houve grandes a indústria siderúrgica possa se beneficiar da demanda ganhos de produtividade associados a maiores graus do setor petróleo, ela não deveria ser objeto de política de liberdade para compra de insumos. 56 Esses ganhos são um indicador de que há custos associados à polí- de conteúdo local, mas de medidas que a torne capaz tica de fomento, mesmo quando os requisitos de con- de aproveitar esse incremento de demanda. Essa percepção, de certo modo, também foi exter- teúdo local mínimo não são muito altos, como no caso nada por grande parte dos agentes econômicos do se- norueguês. 57 tor durante o Workshop-P&G . Uma das preocupações Desse modo, políticas de conteúdo local são dese- levantadas diz respeito ao fato de que a regra de jáveis enquanto os benefícios sociais associados a ela conteúdo local em E&P perpassa toda a cadeia pro- forem maiores que as perdas resultantes do aumen- dutiva, mas que os operadores somente têm algum to nos custos de produção. Sendo assim, do ponto de controle sobre os seus fornecedores diretos. O mes- vista da sociedade, existe um nível ótimo de conteúdo mo foi dito pelos fornecedores diretos, com relação local, a partir do qual as perdas superam os ganhos. aos seus fornecedores. Em outras palavras, políticas de fomento a novas in23 Figura 3: E&P – Cadeia de Fornecimento Petroquímicos Apoio Logístico ip a me Fu nd ido s nto s El étric os Outr os se ia d es Gran des E ip qu am I / EP HSE tores rela cionados en erg ra E qu Serviços de Poços En eg or OPERADOR s Int Instalações Submarinas Sísmica to Tu bu laç õ EPC e Estaleiros Setores Relacionados Pr od ut s / Sistemas Módulo es Fornecedores Diretos icos ím Qu os Siderur gia s do rja Fo Drivers da Cadeia Com pon en tes Equipamentos Mecânicos s tro Ou Fonte: ONIP (2011). Obviamente, nem todos os setores próximos do cen- particular, a literatura teórica (ver capítulo anterior) e as tro da Figura 3 devem ser, necessariamente, objeto de po- experiências internacionais indicam que políticas desse lítica de conteúdo local. Conforme salientado no capítulo tipo devem ser transitórias, e que a proteção ao mercado anterior, dados os custos associados às políticas indus- doméstico deve ser gradualmente reduzida. triais pesadas, elas devem ser usadas com moderação. Nesse sentido, a contraposição das experiências bra- Deveria se restringir, portanto, somente a casos em que sileiras a de países do Leste Asiático em política industrial o desenvolvimento do setor implique salto significativo ajuda a ilustrar o ponto. Tome-se o exemplo da Coreia do em termos das capacitações existentes e não puder ser Sul. As empresas e setores objeto de política industrial alcançado apenas com políticas industriais leves. Foge sempre foram expostos a mecanismos que combinavam ao escopo deste documento entrar em uma discussão incentivos e punições. Algum tipo de meta sempre era fi- mais detalhada sobre os setores que devem e os que não xado, normalmente associado à exportação, que caso não devem ser objeto da política de conteúdo local. De todo fosse atingida implicava penalidades ou retirada de be- modo, alguns levantamentos a esse respeito – inclusive nefícios. Além disso, o governo sinalizou, de forma crível, com a ponderação de custos e benefícios – já foram fei- que a proteção seria reduzida ao longo dos anos (o que tos.58 Além disso, já se tem razoável conhecimento dos efetivamente ocorreu). Os dois mecanismos levaram a gargalos de cada setor. ganhos significativos de produtividade, necessários para 59 se conseguir atingir as metas de exportação e para se de- (C) Regras de Saída fender no mercado doméstico, diante do prognóstico da Uma vez definidos os setores que serão contemplados retirada da proteção.60 Note-se que se trata, exatamente, com a política de conteúdo local, é necessário que os da prescrição de política descrita no capítulo anterior. No incentivos sejam construídos de forma adequada. Em Brasil, ao contrário, o mercado doméstico se manteve du24 rante muito tempo isolado da competição internacional e O mesmo pode ser dito para o Japão.64 Mesmo a China, nenhuma sinalização de redução da proteção foi emitida que usa políticas de requerimento de conteúdo local para as empresas. Desse modo, embora tenha consegui- mais ativamente, tem uma postura bastante pragmática do diversificar sua economia, o país não conseguiu al- quanto ao encadeamento local de suas indústrias, indu- cançar competitividade internacional em boa parte dos zindo a compra doméstica somente se esta não ameaça setores contemplados pela política industrial. a competitividade internacional do setor. Na verdade, boa Voltando para o setor de P&G, não se identificou qual- parte da exportação chinesa ainda se refere à mera mon- quer sinalização de que a política de conteúdo local asso- tagem de produtos a partir de insumos importados.65 ciada seja transitória ou de que a proteção ao mercado Novamente, a política de conteúdo local, ao fornecer doméstico será reduzida gradativamente. Sendo assim, proteção excessiva e por tempo indeterminado a deter- corre-se o risco de que os setores contemplados pela po- minados setores, tende a desestimular investimentos lítica, excessivamente protegidos, se desenvolvam usan- em inovação, cruciais para que sejam alcançados padrões do tecnologias defasadas, incapazes de garantir compe- internacionais de competitividade. Nesse caso, conforme titividade no mercado internacional. salientado na seção 2.1, corre-se o risco de se condenar os setores contemplados pela política a se desenvolver (D) Competição e Inovação com tecnologias defasadas, o que impediria o aproveita- Um tema relacionado à discussão sobre o caráter tran- mento das externalidades associadas ao aprendizado e sitório da política industrial diz respeito ao seu efeito no a inserção nas cadeias produtivas globais. Aliás, as em- incentivo ao investimento em inovação. Nesse sentido, a presas do setor de P&G localizadas no Brasil investem proteção excessiva e por tempo indeterminado reduz os menos do que a de outros países.66 incentivos para investimento em pesquisa e desenvolvimento e inovação. Novamente, do ponto de vista teórico (E) A Regra de Conteúdo Local Ótima e no que diz respeito à provisão de incentivos adequados Ainda que possa ser uma alternativa para alavancar para inovação, a política industrial tem de ser tal que a determinados setores ligados ao setor de P&G, a re- indústria doméstica seja exposta gradativamente à com- gra de conteúdo local pode ser aperfeiçoada. Durante petição internacional.61 As evidências empíricas confir- o Workshop-P&G, foram levantadas algumas questões mam esse entendimento, indicando que uma das princi- sobre esse tema, muitas delas relacionadas à dificulda- pais alavancas do investimento em inovação é a pressão de e burocracia excessivas na medição. Ressalte-se que competitiva exercida pelos concorrentes (sejam eles do- muitas das questões também foram identificadas pela mésticos ou de outros países).62 literatura que aborda o tema.67 Novamente, tome-se o exemplo da Coreia do Sul. O Em primeiro lugar, atualmente estão associados mui- foco da política industrial naquele país foi em atingir com- tos custos (monetários e de transação) a essa política. petitividade internacional em determinados setores. Se O nível de detalhamento e a burocracia são excessivos, fosse possível atingir esse objetivo com algum encade- principalmente quando a comprovação do conteúdo local amento da economia doméstica na direção dos insumos, envolve certificação (a partir da Rodada 7).68 melhor. Se não, nenhum tipo de barreira à importação Além disso, os operadores precisam se comprometer dos insumos era imposta. Pelo contrário, muitas vezes a com os requerimentos de conteúdo local quando da realiza- importação de determinados insumos recebia incentivos. ção dos leilões de blocos de petróleo e gás. No entanto, os Não por acaso, a relevância das importações, em especial investimentos somente se materializam entre sete e dez de bens de capital, para o aumento da produtividade da anos depois. Nesse sentido, os operadores argumentam indústria sul-coreana é ressaltada por diversos autores. que é muito difícil definir com tanta antecedência o conteú- 63 25 do local a ser utilizado, pois existe muita incerteza sobre as caso a política de conteúdo local torne muito onerosas a condições em que o petróleo será extraído e a tecnologia a exploração e produção de petróleo e gás ou crie obstá- ser usada, bem como sobre a existência de capacidade de culos muito grandes aos operadores, corre-se o risco de fornecimento doméstica dos insumos e equipamentos. que o investimento direto estrangeiro migre para outros Por fim, a política de conteúdo local brasileira voltada países. O mesmo pode ser dito para outros elos da cadeia para o setor de P&G, em grande medida, tem como prin- de produção do setor. cipal instrumento a exigência de percentuais de aquisição Ademais, o sucesso da política de fomento ao setor de- de insumos domesticamente. Trata-se de uma política pende, em grande medida, da capacitação das empresas de demanda. Existem outras políticas voltadas para a domésticas ao longo da cadeia de produção. Experiências oferta – inovação, financiamento de investimento e ca- de outros países indicam que a parceria com empresas es- pacitação de mão-de-obra (ver seção 2.1) –, mas elas são trangeiras é uma ferramenta poderosa para atingir esse claramente menos importantes. objetivo. A esse respeito, o caso da Noruega é emblemáti- Entretanto, outros países basearam sua estratégia de co. Foram concebidos os chamados Goodwill Agreements, adensamento da cadeia produtiva em incentivos, e, não, acordos voluntários nos quais empresas estrangeiras ti- em exigências de conteúdo local. A Noruega é um exemplo. nham suas chances aumentadas em licitações futuras, Embora a política de demanda fosse parte relevante da caso investissem em inovação – financeiramente ou com- estratégia norueguesa, as medidas voltadas para a oferta partilhando conhecimento – junto a instituições norue- foram o aspecto mais importante. Nenhuma meta ou re- guesas de pesquisa voltadas para o setor de P&G.71 querimento de conteúdo local foi imposto. As operadoras indicaram uma lista de fornecedores, na qual o governo 3. norueguês poderia incluir empresas locais. Quem, de fato, contratasse fornecedores noruegueses tinha suas chan- CONCLUSÕES ces de vitória aumentadas nas escolhas subsequentes O eixo central da política industrial brasileira voltada para para exploração de blocos de petróleo e gás. Nesse senti- o setor de P&G, no Brasil, é a definição de requerimentos do, a ênfase dada à internacionalização dos fornecedores mínimos de conteúdo local. Trata-se de política industrial noruegueses foi tão importante quanto às preocupações com o aumento do conteúdo local.69 pesada que, portanto, deveria ser exceção e não a regra. (F) Investimento Direto Estrangeiro uso indiscriminado dessa ferramenta não é aconselhável. Está claro que o desenvolvimento do setor de petróleo A política de conteúdo local para o segmento de E&P e e gás no Brasil depende criticamente de investimentos para o setor naval precisa ser mais seletiva e contemplar diretos estrangeiros. Em primeiro lugar, estimativas in- um número menor de setores, preferencialmente aque- dicam que a demanda gerada pelo segmento de E&P no les com um bom balanço entre as externalidades geradas Brasil, até 2020, é de aproximadamente US$ 400 bilhões, e os custos da política (inclusive custos do governo em sendo boa parte disso investimento.70 Trata-se de valor termos de acompanhamento e coordenação dos agentes expressivo que, dificilmente, poderá ser inteiramente envolvidos). Nesse sentido, o primeiro aspecto a ser destacado é que o arcado por operadores brasileiros (Petrobras, principal- Além disso, mesmo nos (poucos) setores esco- mente). Nesse sentido, embora o Brasil tenha se tornado lhidos é preciso que a proteção fornecida pela regra de uma grande fronteira de produção de petróleo e gás, com conteúdo local seja temporária e progressivamente re- a descoberta do pré-sal, o país ainda compete com ou- duzida ao longo do tempo. Boa parte do sucesso da expe- tros países por investimentos nesse setor. Desse modo, riência da Coreia do Sul, recorrentemente apontada como 26 exemplo de política industrial bem-sucedida, está em se- E, mesmo em caso de atração de investimentos, os cus- guir essa recomendação. Caso contrário, é bastante pro- tos provavelmente serão superiores aos benefícios. vável que, ainda que os setores consigam se desenvolver, A esse respeito, comparadas com políticas baseadas eles não alcancem competitividade internacional. A ex- em exigências de conteúdo local, os benefícios de polí- periência brasileira com política industrial está repleta de ticas que garantem condições para que as empresas exemplos a esse respeito. Não por acaso, os resultados domésticas se insiram competitivamente nas cadeias indicam que, de fato, a política de conteúdo local em E&P produtivas globais usualmente se mostram superiores.72 não tem sido capaz de garantir a inserção das empresas Trata-se do que no capítulo 2 foi definido como políti- brasileiras na cadeia internacional de fornecimento. Ali- ca industrial leve. Aliás, mesmo para os (poucos) setores ás, a prescrição de maior seletividade para a política de em que políticas de conteúdo local podem ser adequadas, conteúdo local (ver parágrafo anterior) é reforçada pelo tem-se que os resultados são melhores, ou seja, as ex- fato de que, mesmo quando são definidos prazos, muitas ternalidades são mais bem aproveitadas, quando acom- vezes é difícil que o governo consiga se comprometer de panhadas de medidas de política industrial leve. Sendo assim, no caso brasileiro, seria desejável a re- forma crível com a extinção da política na data prevista dução na ênfase aos requerimentos de conteúdo local para o seu término. A proteção demasiada e por tempo indetermi- (inclusive com a redução dos custos envolvidos pela sim- nado também tende a reduzir os incentivos para inves- plificação da regra). Mais importância deveria ser dada às timento em inovação. Embora políticas voltadas para a políticas industriais leves e a sua articulação com a polí- redução do custo dessa atividade sejam importantes, tica de conteúdo local, nos (poucos) casos em que ela for é preciso que a inovação seja um imperativo para as em- utilizada. Nesse sentido, as experiências da Noruega e da presas brasileiras. Nesse sentido, a exposição gradual Coreia do Sul são bastante ilustrativas. É verdade, contu- das empresas brasileiras à competição é uma ferramen- do, que à época já tinham feito grande esforço de inves- ta poderosa para atingir esse objetivo e evitar que os se- timento em educação básica e infraestrutura e já possu- tores objeto da política se desenvolvam com tecnologias íam um ambiente de negócios e um sistema tributário defasadas. Novamente, a experiência brasileira com polí- bastante favorável. Além disso, nos setores objeto de po- tica industrial referenda essa conclusão. lítica industrial, investiram pesadamente na qualificação Ademais, embora a política industrial no setor de P&G de mão-de-obra pela criação de universidades e centros possa ser justificada pelas externalidades verticais, ou voltados especificamente para essas áreas.73 Em vez de seja, aquelas geradas ao longo da cadeia, isso não signifi- proteção demasiada e por tempo indeterminado para os ca que o encadeamento doméstico tenha que ser perse- setores intensivos em inovação, os governos deram sub- guido a qualquer preço. Em outras palavras, o objetivo da sídios às atividades privadas de pesquisa e desenvolvi- política não deve ser a maximização do conteúdo local, mento e investiram eles próprios nessa atividade. mas dos benefícios (líquidos dos custos) gerados em termos de bem-estar para a sociedade. Se o adensamento da cadeia produtiva local é conseguido à custa de insumos significativamente mais caros, em última instância, coloca-se em perigo a competitividade do segmento objeto da política (E&P ou construção naval). Nesse caso, como nesses setores o Brasil necessita e disputa investimentos diretos estrangeiros com outros países, corre-se o risco de que esses capitais migrem para outras nações. 27 Estudo de Caso: Equipamentos Mé di co s , H o s p i t a l a re s e O do ntoló g ic o s ( E m h o ) 1. prática no setor de EHMO. Nesse sentido, sem a pretensão INTRODUÇÃO algumas dessas medidas serão listadas a seguir.74 de ser exaustivo ou de realizar análise mais aprofundada, Em primeiro lugar, no âmbito da articulação das ações Se o setor de P&G foi escolhido pela longa experiência com de governo para o setor, foi criado em 2008 o Grupo Exe- políticas de conteúdo local nas atividades de exploração e pro- cutivo do Complexo Industrial da Saúde (GECIS), coorde- dução (E&P), o setor de EMHO foi selecionado por conta do nado pelo Ministério da Saúde (MS). uso de uma ferramenta nova – pelo menos no período recente No que tange ao financiamento, o BNDES possui dois – de política industrial, as margens de preferências em com- programas que atendem ao setor de EHMO. O primeiro de- pras públicas. Como no setor de P&G, também foi realizado les é o BNDES-Profarma, voltado para o complexo industrial um workshop com empresas do setor (doravante Workshop- da saúde, mas que tem beneficiado mais fortemente o setor -EMHO) e entrevistas com interlocutores do Governo. de medicamentos. Esse programa tem linhas específicas voltadas para aumento de capacidade, exportação, inovação 2. e de apoio a fusões e aquisições que criem grandes empre- POLÍTICA INDUSTRIAL para EMHO cífico ao setor, há também um fundo voltado ao apoio de 2.1 Levantamento das Ações áreas na fronteira tecnológica (BNDES-Funtec). Novamen- (A) Margem de Preferência nas Compras Públicas uma pequena parcela dos desembolsos.75 Por fim, assim A Lei nº 12.349/2010 e o Decreto nº 7.546/2011 regula- como no setor de P&G, existe um fundo setorial de fomento mentaram o uso do poder de compra do governo para o à inovação voltado para o setor de saúde (CT-Saúde). Entre- fomento da indústria doméstica, permitindo margem de tanto, são verificados os mesmos problemas de contingen- preferência de até 25% dos produtos nacionais sobre os ciamento de recursos dos demais fundos. sas de capital nacional. Além disso, embora não seja espe- te, os equipamentos médicos têm respondido apenas por importados em licitações da administração pública fede- Finalmente, também cumpre ressaltar o papel da ral. Esta margem de preferência é de, no máximo, cinco Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) que, anos. Os critérios para definição da margem incluem: (i) ao regular o padrão de qualidade dos produtos e equi- geração de emprego e renda; (ii) efeito na arrecadação de pamentos médicos, afeta as barreiras à entrada no se- tributos federais, estaduais e municipais; (iii) desenvolvi- tor. Ademais, ela também é responsável pelo registro e mento e inovação tecnológica realizados no país; (iv) cus- autorização para comercialização dos produtos. Dada a to adicional dos produtos e serviços. complexidade do processo, são formadas filas de registro. Ao dar prioridade a certos produtos, a ANVISA afeta a Por sua vez, o Decreto nº 7.767/2012 definiu as mar- dinâmica competitiva do mercado doméstico.76 gens de preferência do setor de EMHO. A definição de produto nacional seguirá as regras do Processo Produtivo Bá- sico – PPB (quando for aprovado) ou declaração de origem 2.2 Avaliando as Ações (na inexistência de PPB), de acordo com a Portaria/MDIC (A) Quais são os Objetivos? Qual a Melhor Maneira de Alcançá-los? nº 279/2011. Foram incluídos materiais de uso em saúde e equipamentos hospitalares com margens de preferência Como no setor de P&G (ver capítulo anterior), a política in- definidas entre 8% e 25%, de acordo com a Tabela 1. dustrial voltada para o setor de EMHO, em grande medida (B) Outras Medidas consubstanciada na definição de margens de preferência Além das margens de preferência em compras públicas, ou- para produtos nacionais em compras públicas, é baseada tras medidas de política industrial têm sido colocadas em em ações voltadas para criação de demanda. Além disso, 28 assim como em P&G, ela parece ter múltiplos objetivos, o Nesse sentido, é bastante sintomático que, no âmbi- que novamente levanta a questão do uso de uma mesma to do Plano Brasil Maior (PBM), as medidas que envolvem política para atingir objetivos distintos. margens de preferência em compras públicas tenham sido No entanto, no caso da política voltada para o setor de listadas no grupo de ações voltadas para a defesa da in- EMHO, essa multiplicidade de objetivos é apresentada de dústria e do mercado interno. Em outras palavras, aparen- forma mais transparente do que no setor de P&G. A Lei nº temente não são vistas como um instrumento (transitório) 12.349/2012 define quatro critérios para estabelecimento para alavancar o desenvolvimento de novos setores, mas das margens de preferência nas compras públicas, deixan- como medidas de proteção do mercado doméstico. do clara a tensão entre objetivos macroeconômicos (criação (B) Quais Setores? de emprego e renda) e objetivos mais específicos e de longo Mais uma vez, a distinção no que diz respeito aos objetivos prazo (desenvolvimento de setores intensivos em tecnologia). pode ser traduzida em termos de diferenciação de segmen- Novamente, para setores já estabelecidos que precisem tos industriais. Novamente, o estudo prospectivo da ABDI aumentar a sua competitividade, mais adequadas são po- ajuda a ilustrar este ponto. Foram selecionados quatro seg- líticas industriais leves, que permitam a esses setores ob- mentos prioritários: (i) neonatal; (ii) imagens médicas (radio- ter ganhos de produtividade. O uso de políticas industriais logia digital e ultrassom); (iii) equipamentos de hemodiálise; pesadas, como a definição de margens de preferência em (iv) equipamentos médicos fundamentados em óptica (en- compras públicas, não somente são desnecessárias, como doscópios e similares). Esses quatro segmentos aparecem podem dificultar ganhos adicionais de competitividade, ao na lista de produtos contemplados pelas margens de prefe- isolar os produtores domésticos da competição internacio- rências (ver Tabela 1), mas acompanhados de uma série de nal. Nesse caso, dificilmente os benefícios na geração de outros equipamentos e componentes. emprego e renda justificam os custos em termos de au- Nesse sentido, há desde componentes e produtos com mento de preços. Esse balanço desfavorável tende a ser baixo grau de sofisticação tecnológica até itens mais sofis- especialmente grave no caso de produtos da área da saúde. ticados. Em alguns setores, o Brasil já possui indústria de- Tome-se um exemplo concreto para ilustrar esse senvolvida e competitiva (incubadoras, por exemplo), mas ponto. Em estudo prospectivo da Agência Brasileira de em outros, não (imagens médicas, por exemplo). Essas di- Desenvolvimento Industrial (ABDI) sobre o setor, identifi- ferenças implicam distintas necessidades em termos de cou-se o segmento neonatal, em particular de incubado- política industrial, e dificilmente as margens de preferên- ras, como uma das prioridades da política industrial.77 O cia são a solução mais adequada para todos os setores. estudo aponta que se trata de segmento em que o Brasil Além disso, conforme salientado no capítulo 2, dados domina o padrão tecnológico e possui mão-de-obra qua- os custos associados às políticas industriais pesadas, elas lificada no setor privado e na academia. Não por acaso, devem ser usadas com moderação. Somente em casos em as empresas domésticas exportam parte considerável que o desenvolvimento do setor implica salto significativo de sua produção, inclusive para países desenvolvidos. em termos das capacitações existentes e não puder ser al- Claramente, não se trata de desenvolver novo segmento cançado somente com políticas industriais leves (e, mesmo industrial e, portanto, inexistem motivos para políticas assim, com um criterioso balanço entre custos e benefícios). industriais pesadas. Certamente, existe espaço para ga- Em outras palavras, se o objetivo das margens de preferên- nhos de competitividade, o que justificaria o uso de polí- cia vai além da mera proteção do mercado doméstico, é ne- ticas industriais leves, o que é apontado pelo próprio es- cessário que essa política seja mais seletiva na escolha dos tudo da ABDI. Entretanto, incubadoras infantis e berços setores. A esse respeito, os quatro setores selecionados no aquecidos aparecem na lista de produtos contemplados estudo da ABDI são um bom ponto de partida. com margens de preferência de 15% (ver Tabela 1). 29 Tabela 1: Margens de Preferência em EMHO Margem de Preferência Materiais de uso em Saúde Produto ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Cateter balão para angioplastia, cateter guia, cateter duplo J, e aplicação médico-hospitalar Válvulas cardíacas Implante coclear Teste rápido para doenças transmissíveis Dialisador para hemodiálise Enxertos e Preenchimentos fabricados com biomateriais ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Bomba centrífuga descartável para uso em circulação extracorpórea ou circulação assistida Coils para aneurisma Grampeador linear cortante Endopróteses vasculares (enxertos e stents) 20% ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Bolsa de Sangue Bolsas para colostomia, ileostomia e urostomia Preservativo masculino e feminino Luvas cirúrgicas e de procedimento Equipos para bomba de infusão, para soro e para sangue Agulhas hipodérmicas Oxigenador de Membrana Filtro de Sangue Arterial Instrumentais Odontológicos e Cirúrgicos Seringas Implantes ortopédicos, odontológicos e mamários 15% Equipamentos de uso em Saúde ▪▪ Campos cirúrgicos descartáveis ▪▪ Paramentação Cirúrgica Descartável 25% 8% ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Monitor de Gases Sanguíneos Aparelho de Anestesia Aparelho auditivo com transmissor para implante Coclear Marcapasso cardíaco Cardiodes fibriladores automáticos Tomógrafos Computadorizados por Raios-X Angiógrafos Arco em C cirúrgico Máquinas de Hemodiálise Aceleradores Lineares Equipamentos de imagem por ultrassom Ecógrafos com análise espectral Doppler Endoscópios Prótese mioelétrica para membro superior e inferior 25% ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Glicosímetro Holter Monitores multiparamétricos Monitor de ECG Peças de Mão e micromotores odontológicos Máquina de Circulação Extracorpórea Ventiladores pulmonares e de transporte Aparelho auditivo Mamógrafos Analisador bioquímico Citometro de Fluxo Aparelhos de Raios-X para Densitometria óssea e para Uso Odontológico Aparelho de Raios-X 20% 30 Margem de Preferência Equipamentos de uso em Saúde Produto ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Eletrocardiógrafo e Eletroencefalógrafo Colonoscópios Oxímetro de pulso Bomba de infusão Bisturis elétricos Incubadoras infantis e berços aquecidos Autoclave Fototerapia Desfibriladores cardíacos e cardioversores Lavadora de instrumentais Refrigerador ou freezer laboratorial/hospitalar Microscópio para cirurgia oftalmológica Lavadora e desinfetadora de produtos médicos ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ ▪▪ Mesa cirúrgica Cadeiras de rodas para banho, sem mecanismo de propulsão e motorizadas Cadeiras odontológicas Cama hospitalar Foco cirúrgico 15% 8% Fonte: Decreto nº 7.767/2010. Por fim, há uma excessiva ênfase no uso do desequi- tura teórica (ver capítulo anterior) e as experiências in- líbrio da balança comercial como critério de escolha dos ternacionais indicam que políticas desse tipo devem ser setores contemplados pela política, mesmo na seleção transitórias e que a proteção ao mercado doméstico deve mais parcimoniosa de setores feita no estudo da ABDI. ser gradualmente reduzida. Se esta métrica fazia sentido quando a escassez de di- A Lei nº 12.349/2012 indica que as margens po- visas em moeda estrangeira era um gargalo importante, dem ter duração máxima de cinco anos, o que é seguido atualmente não existe justificativa econômica para o uso no Decreto nº 7.767/2012. No entanto, deve-se ressaltar desse critério. Não é possível ser competitivo em todos que nada impede que ao fim dos cinco anos as margens os elos e segmentos do complexo industrial da saúde. O de preferência sejam renovadas, o que já ocorreu com di- importante é que sejam criadas condições para que seto- versas iniciativas de proteção à indústria doméstica com res nos quais potencialmente o Brasil tenha vantagens data marcada para terminar.78 Nesse sentido, é impor- comparativas se desenvolvam. Aliás, em setores como o tante que o compromisso de remoção da proteção por de EHMO, a competitividade internacional pressupõe in- parte do governo seja crível. tenso fluxo de comércio na compra de insumos e venda (D) Competição e Inovação de produtos. Na verdade, vários países em estágio de de- Assim como no setor de P&G, uma agenda crítica para senvolvimento similar ao brasileiro e muitos dos países o desenvolvimento de novos segmentos industriais no desenvolvidos possuem balanças comerciais deficitárias setor de EHMO é a de inovação. Além de políticas espe- em equipamentos e produtos médicos. cíficas (ver mais detalhes em seguida), é importante que (C) Regras de Saída a inovação se torne um imperativo para as empresas do Uma vez definidos os (poucos) setores que serão con- setor. Nesse sentido, uma das ferramentas mais podero- templados com a política de margens de preferência em sas de incentivo à inovação é a pressão competitiva dos compras públicas, é necessário que os incentivos sejam rivais. Sendo assim, no caso de setores que já têm ca- construídos de forma adequada. Em particular, a litera- pacitação tecnológica (incubadoras, por exemplo), o isola31 mento das empresas domésticas da competição interna- (E)A Regra de Margem de Preferência em Compras Públicas cional por tempo indefinido tende a reduzir os incentivos Embora o uso do poder de compra do governo em certas para inovação. A literatura teórica e a própria experiência situações seja uma boa alternativa de política industrial, brasileira com outros setores indicam que, nesse caso, o a regra de margem de preferências em compras públicas setor tende a se estabelecer em bases pouco competitivas, pode ser aperfeiçoada em alguns aspectos. Nesse sen- diminuindo, significativamente, a possibilidade de inserção tido, as empresas do setor (durante o Workshop-EMHO) internacional das empresas domésticas. levantaram pelo menos dois pontos relevantes.81 79 Em primeiro lugar, a demanda de produtos e equipa- Além disso, é pouco provável que setores mais atrasa- mentos médicos no SUS é bastante descentralizada e he- dos consigam deslocar a fronteira tecnológica, a não ser terogênea, o que dificulta um processo de compra mais no longo prazo. Para esses setores, mostra-se mais im- unificado (estados e municípios têm políticas de saúde portante a absorção (e adaptação) de tecnologias já desen- diferentes, com padrões distintos de compra de mate- volvidas. Nesse sentido, o fluxo internacional de pessoas, riais e equipamentos). A esse respeito, há um esforço do mercadorias e investimentos é uma ferramenta poderosa. MS em incentivar alguma padronização dessas compras. Esse fluxo deve ser combinado com políticas industriais Ademais, o orçamento do MS é limitado, o que pode leves que capacitem empresas domésticas para receber e comprometer a potência desse instrumento de política lidar com essas tecnologias (ver Figura 4). Essa conclusão industrial. Nesse sentido, trata-se de mais uma justifi- ganha mais relevo à luz da evidência de que a importação cativa para ser mais seletivo no uso dessa ferramenta. de insumos é um importante canal pelo qual empresas de setores em desenvolvimento absorvem tecnologia. A im- (F) Investimento Direto Estrangeiro portância deste aspecto no desenvolvimento dos países Assim como no setor de P&G, o investimento direto es- do Leste Asiático é enfatizada por vários autores. trangeiro é parte importante da política industrial do se- 80 Figura 4: Determinantes do Aprimoramento Tecnológico para Países em Desenvolvimento Absorção de Tecnologia Capacidade de Absorção de Tecnologia Canais de Transmissão FRONTEIRA TECNOLÓGICA Comércio Internacional Investimento Direto Estrangeiro Redes Internacionais de Conhecimento Governança e Ambiente de Negócios Conhecimento Tecnológico Básico Financiamento de Empresas Inovadoras Políticas para: - criar competências - construir infraestrutura - fomentar um ambiente amigável para inovação Políticas Proativas Externalidades Retornos de Escala DOMÍNIO DOMÉSTICO DA TECNOLOGIA 32 Efeitos dinâmicos amplificam a transferência de tecnologia Fonte: World Bank (2010). tor de EHMO. Conforme já salientado, trata-se de meca- leves, que melhorem a competitividade das empresas nismo importante de difusão e absorção de tecnologia e domésticas. Na verdade, embora seja possível identificar tende a gerar externalidades em termos de qualificação algumas iniciativas nessa direção, elas claramente têm de mão-de-obra. se mostrado insuficientes para atingir o objetivo almeja- Nesse sentido, o estudo prospectivo da ABDI levanta a do. Por exemplo, mesmo nos programas voltados espe- preocupação com o fato de que boa parte da produção do- cificamente para financiamento das empresas do com- méstica de EMHO é feita por grandes empresas multinacio- plexo industrial de saúde, as empresas do setor de EHMO nais. Em particular, há o temor de que decisões da matriz têm uma participação muito pequena. O mesmo pode ser impliquem descontinuidade da produção de determinado dito sobre iniciativas mais horizontais como a Lei de Ino- equipamento em território brasileiro de forma repentina. vação e Lei do Bem. Desse modo, segundo o mesmo estudo, haveria necessi- Em suma, mais do que maximizar a produção domés- dade de manter o centro decisório de determinados seg- tica (ou minimizar o déficit na balança comercial do se- mentos no Brasil, para não ficar dependendo de escolhas de tor), o objetivo da política industrial para EHMO deveria investimento feitas por multinacionais. ser alcançar a competitividade internacional em alguns No entanto, entende-se que, mais do que determinar a segmentos. Nesse caso, o uso de políticas industriais pe- necessidade de manutenção do centro decisório das em- sadas, quando necessário, deve ser feito com moderação presas do setor no Brasil, essa realidade sinaliza, de fato, a e em alguns poucos setores. Caso contrário, os custos necessidade de se manter um ambiente propício para o in- da política industrial em termos de bem-estar provavel- vestimento e produção em bases competitivas. Os mesmos mente irão superar os benefícios. fatores de competitividade que levam uma empresa mul- Nesse sentido, essa prescrição se mostra ainda mais tinacional a fechar uma fábrica no Brasil são enfrentados importante do que no setor de P&G. Um dos custos as- pelos produtores de capital nacional, podendo igualmente sociados à definição de margens de preferência nas com- culminar com a interrupção da produção. pras públicas de EHMO é o aumento dos preços pagos por esses produtos no âmbito do MS. Em outras palavras, como o orçamento do MS é limitado, menos pessoas 3. terão acesso a esses componentes e equipamentos na rede pública de saúde. Em se tratando de um país onde o Conclusões acesso à saúde ainda é limitado, esses custos não deve- O eixo central da política industrial brasileira voltada para riam ser negligenciados. o setor de EHMO parece ser a definição de margens de preferência em compras do Governo. Embora o poder de compra do Governo possa ser usado como ferramenta poderosa de política industrial, aparentemente o objetivo da política é a proteção do mercado doméstico, e não o fomento à inovação ou ganhos de competitividade.82 Nesse sentido, a proteção excessiva e por tempo indeterminado tende a desestimular o investimento em inovação. Embora estejam previstas para durar cinco anos, nada impede que as margens sejam renovadas no final desse período. Desse modo, sugere-se que a ênfase da política industrial do setor seja desviada para políticas industriais 33 Anexos POLÍTICA INDUSTRIAL NA Coreia do Sul 83 Com a ocupação da península coreana pelo Japão em tários na importação de insumos, depreciação acelerada 1905 houve transferência das instituições econômicas em bens de capital importados e preços subsidiados para e práticas japonesas, o que gerou um considerável surto eletricidade e transporte ferroviário. de industrialização e aprendizado tecnológico. A indus- Também foi feita uma reforma do sistema financeiro, trialização começou com indústrias leves, mas na década com o progressivo aumento da taxa de juros, o que enco- de quarenta do século passado o país já apresentava um rajou a poupança doméstica (dobrou entre 1965 e 1970), razoável parque industrial pesado (em particular na in- o desenvolvimento do setor financeiro e o uso mais efi- dústria química).84 ciente do capital. Entretanto, esta reforma foi revertida Com a divisão do país após o final da Segunda Guerra em 1972, com nova redução da taxa de juros e aumento Mundial, a Coreia do Norte herdou a maior parte da in- do controle direto do governo sobre o sistema bancário, dústria, pois até então a Coreia do Sul era especializada canalizando crédito para setores e empresas prioritários. em atividades agrícolas. Com a Guerra da Coreia (1950- Em particular, o foco passou a ser em setores da indús- 1953), o estoque de capital foi quase completamente tria pesada e química, e a política industrial tomou um destruído, mas a migração de pessoas do norte para o rumo mais seletivo e discricionário. Para os setores prio- sul gerou um aumento de capital humano não despre- ritários, o acesso a crédito em condições favoráveis foi re- zível. Como o Japão, a Coreia do Sul detinha à época um forçado por incentivos fiscais e proteção da concorrência estoque de capital humano (em termos de escolaridade externa. Assim como no caso japonês, o direcionamento média da força de trabalho) superior ao padrão de países de crédito (e outras ferramentas de controle do governo) com renda similar, e que foi incrivelmente incrementado resultou em uma economia com grandes conglomerados nos anos posteriores. (chaebols). Ademais, no imediato pós-guerra, além da extrema No final da década de setenta do século passado, a dependência econômica dos Estados Unidos, a economia deposição do governo militar e o choque do petróleo re- sul-coreana era caracterizada por altas taxas de prote- sultaram no desmonte gradativo do aparato mais sele- ção, taxas de juros reais negativas e um sistema bancário tivo de política industrial. Nesse sentido, a despeito das quase que totalmente público, que direcionava o crédito idas e vindas, é possível verificar que a proteção a de- para grupos de interesse organizados. terminados setores – consubstanciada principalmente Entretanto, este panorama mudou drasticamente nas tarifas de importação, nos abatimentos de impostos após o golpe militar em meados da década de sessenta e em taxas de juros subsidiadas – foi sendo reduzida ao do século passado. O sistema de taxas múltiplas de câm- longo dos anos. Especificamente com relação à prote- bio foi abandonado e metas de exportação foram formu- ção comercial, não somente a diferença entre os setores ladas. Embora empresas que não atingissem suas metas prioritários e não-prioritários foi reduzida, mas também a não sofressem penalização, há evidências de que aquelas proteção efetiva média da economia. Além disso, o crono- que as cumprissem tinham tratamento favorável do go- grama de redução gradual da proteção foi anunciado com verno em termos de tributação e outros incentivos. antecedência e de forma crível.85 Concomitantemente, foram colocadas em prática diversas medidas de fomento à exportação. Além da desvalorização do câmbio, os exportadores passaram a receber acesso preferencial a capital, abatimentos tribu- 34 POLÍTICA INDUSTRIAL NA Noruega 86 Com as descobertas de petróleo e gás no Mar do Norte, Outra medida adotada foi a exigência de que as ope- o governo norueguês decidiu pelo fomento ao desenvol- radoras fornecessem ao Ministério de Petróleo e Energia vimento de uma indústria local competitiva associada a lista de empresas que iriam participar do processo de à extração desses recursos naturais. A esse respeito, o concorrência para fornecer bens e serviços.89 De posse da primeiro passo foi escolher o local de instalação dessa in- lista, o governo poderia inserir empresas norueguesas no dústria. A principal justificativa para a escolha de uma só conjunto de potenciais fornecedores. Adicionalmente, o localidade era a necessidade de concentrar as atividades governo deveria ser informado de quais empresas seriam econômicas de forma a obter economias de aglomeração, as efetivas fornecedoras antes mesmo que as operado- que permitissem o aumento de produtividade das em- ras informassem as escolhidas. O objetivo era dar ao mi- presas norueguesas pela proximidade com as empresas nistério o direito de mudar a decisão. No entanto, somen- estrangeiras que já dominavam a tecnologia necessária. te em uma única ocasião, o governo acabou mudando a Adicionalmente, foram colocadas em prática diversas decisão da empresa. Com maior frequência, as influên- medidas para fomentar o surgimento de uma indústria cias eram feitas em estágios anteriores na tentativa de local associada à extração de petróleo e gás. A Lei de Con- promover o conteúdo local. cessões de 1963 representa a mais relevante medida do O governo norueguês usou também outras estratégias governo norueguês nesse sentido. Essa lei foi o primeiro para a promoção de competência local, como o retarda- mecanismo visando o desenvolvimento de fornecedores mento da quarta rodada de concessões. A terceira rodada de bens e serviços locais, visto que determinava: (i) em- ocorreu na primeira metade da década de 1970 e a seguin- presas multinacionais que entrassem no país deveriam te só ocorreu em 1978, justamente para que as empresas subcontratar empresas norueguesas; (ii) agências do go- norueguesas tivessem tempo para conseguir ficar mais verno tinham autorização para dar benefícios a empresas competitivas frente às demais. Essa rodada ocorreu jus- de acordo com a defesa dos interesses da Noruega. tamente quando o preço do petróleo dobrou, gerando um 87 Nas primeiras licenças em 1965, o governo norue- ímpeto adicional para que as autoridades norueguesas guês não detinha muito poder de barganha com relação e empresas de extração de petróleo e gás chegassem a às grandes companhias de petróleo. No entanto, a situ- um consenso quanto a objetivos comuns com relação ao ação mudou após o início da década seguinte, quando desenvolvimento da indústria local. A ingerência política muitas empresas de petróleo foram excluídas de várias aumentou nesse período, mas houve também maior in- regiões do mundo. Com as descobertas do Mar do Nor- fluência de sindicatos, empresas locais e entidades gover- te mostrando-se cada vez mais promissoras e o preço namentais que, em conjunto, conseguiram interferir até internacional do petróleo subindo, o governo norueguês mesmo na escolha da tecnologia a ser adotada.90 viu seu poder de barganha incrementado. Como conse- Embora diversos tipos de medidas governamentais quência, em 1972 decretou-se uma lei dando preferência voltadas para o desenvolvimento de empresas locais às empresas norueguesas em processos de concorrên- tenham sido adotados, nunca foram especificados re- cia quando elas fossem competitivas. No entanto, não querimentos de conteúdo local a partir de percentuais havia razão para que o governo norueguês fizesse valer mínimos ou algo semelhante.91 No entanto, as autorida- essas exigências de contratação de firmas locais, dado a des norueguesas sempre deixaram claro que a escolha falta de capacidade ou interesse em fornecer bens e ser- de fornecedores locais poderia facilitar negociações de viços para a indústria de extração de petróleo e gás. licenças futuras. 88 35 Aparentemente, as medidas governamentais surti- desenvolvimento até meados da década de 1990. Desde ram o efeito desejado. A Noruega é atualmente um dos então, os fundos privados passaram a financiar mais de líderes mundiais na produção de petróleo e gás natural. 50% das despesas com a atividade.94 Adicionalmente, algumas empresas norueguesas – Aker Além disso, o governo norueguês adotou políticas Kvaerner e StatoilHydro – fazem parte de um seleto gru- para o desenvolvimento dos recursos humanos locais, po de multinacionais do setor. O país também conta com visando basicamente dois objetivos: (i) facilitar a transfe- uma estrutura industrial repleta de pequenos e médios rência de know-how entre os funcionários das empresas fornecedores, totalizando mais de 500 empresas. A re- nacionais e estrangeiras por meio de instituições especí- levância do setor na economia é crescente. Em 2002, o ficas; (ii) incentivar a capacitação de mão-de-obra espe- setor correspondia a 18,6% do PIB norueguês. No entanto, cializada por meio de instituições de ensino.95 o setor aumentou sua participação para 23,7% em 2007, Foi criada a Norwegian Petroleum Consultants – NPC, mesmo com redução de quase 30% na produção de pe- instituição voltada para facilitar a interação e troca de tróleo e gás. Tal resultado é explicado pelas exportações informações entre empregados de empresas transnacio- de bens e serviços relacionados ao setor, visto que 10% nais e domésticas para o desenvolvimento das capacita- de toda a receita mundial com serviços nessa indústria ções locais. Ela foi criada por dez empresas norueguesas estão com fornecedores da Noruega.92 e tinha como objetivo torná-las aptas para competir com Um dos pilares das políticas de fomento à indústria empresas estrangeiras em termos de abrangência e pro- local associada à extração de petróleo na Noruega foi fundidade de capacitações.96 o incentivo não somente para o desenvolvimento da Também foi fundada a Universidade de Stavanger em economia local, mas também para a transferência de 1969, com foco no atendimento às necessidades locais tecnologia. Exemplos desse esforço foram os Goodwill de mão-de-obra para indústria de petróleo e gás. A lo- Agreements, acordos que garantiam aumento das chan- calização da universidade, perto da indústria de petróleo ces em licitações futuras para empresas de outros países e gás, proporcionou melhor interação entre academia e que investissem em pesquisa e desenvolvimento junto a iniciativa privada. Inicialmente, a indústria influencia- instituições norueguesas de pesquisa voltadas para o se- va fortemente nos cursos oferecidos pela universidade, tor de petróleo e gás. Quanto maior fosse o envolvimen- pois ela fazia parte dos comitês de desenvolvimento dos to, maiores eram as chances. Se a empresa fornecesse currículos. Adicionalmente, havia um grande intercâmbio somente suporte financeiro, suas chances aumentariam de pessoas entre a universidade e as empresas, o que para a próxima rodada de concessões. Se além dos re- proporcionava uma sintonia mais fina entre os cursos cursos financeiros, houvesse também a transferência de universitários e as práticas nas empresas.97 O sucesso da 93 know-how, a empresa ganharia ainda mais pontos para a universidade pode ser evidenciado pelo fato de ser hoje concessão seguinte. Esse sistema só foi abolido quando em dia a principal formadora de mestres em áreas asso- a Noruega ingressou na União Européia. ciadas a petróleo e gás na Noruega. O governo norueguês também incentivou investimentos em pesquisa e desenvolvimento por meio de redução de tributos. As despesas com essa atividade eram dedutíveis, o que significava um investimento do governo de 78% dos custos dessas despesas, visto que isso seria o imposto caso não houvesse a dedução. Além de estímulos tributários, o governo norueguês também foi a principal fonte de recursos para investimentos em pesquisa e 36 Co nclu s õ e s f in a is A crise mundial de 2008 suscitou o temor que a onda protecionista da re- cessão de 1929 se repetisse. Essa preocupação levou a que os governos das principais economias mundiais representadas no G-20 solicitassem a organismos internacionais que monitorassem as medidas de comércio e investimento que os países por ventura adotassem. Até o final de 2010, o risco de que medidas protecionistas agravassem a crise mundial foi descartada. Isto não significava, contudo, que os países tivessem ignorado políticas de comércio e/ou investimento que pudessem estimular a demanda doméstica. Pacotes de estímulos fiscais e financiamentos foram os instrumentos preferidos pela maioria dos governos. Sendo esses pacotes direcionados para os setores considerados sensíveis, havia preocupação de um possível efeito distorcivo nos fluxos de comércio. No entanto, a sua contribuição para atenuar a queda da demanda era considerada essencial para o não agravamento da crise. As principais medidas de comércio foram as de defesa comercial, que são práticas legais e não sinalizariam uma mudança no rumo das políticas comerciais dos países. A disciplina multilateral da Organização Mundial do Comércio (OMC), os acordos de comércio regionais e bilaterais que limitam o grau de liberdade no uso de medidas protecionistas e a integração dos países através das cadeias produtivas globais foram ressaltados como um dos principais fatores para explicar o pequeno aumento do protecionismo identificável. No final de 2010, começou a ficar claro que a recuperação da economia mundial teria alguns anos pela frente. A crise do euro, os problemas na economia estadunidense, entre outros, levaram a um quadro mundial marcado pelas incertezas. Ademais, os países não conseguiam terminar a Rodada Doha que selaria o compromisso com a disciplina multilateral. Nesse cenário, os relatórios produzidos de acompanhamento das medidas de comércio e investimento do G-20 chamam atenção para o ressurgimento de políticas associadas a estratégias de ”desenvolvimento para dentro”. Aqui se incluem margens de preferências para produtores domésticos e exigências de conteúdo local nas compras governamentais, aumentos de tarifas de importações, defesa de subsídios para produtores domésticos e novas regras para investimentos diretos estrangeiros. A motivação é, em parte, debitada aos desalinhamentos cambiais que levavam em alguns países a uma forte valorização da moeda nacional. 37 No Brasil, a forte elevação nos preços das commodities e uma acentuada valorização cambial, após 2009, levaram a que o debate sobre a primarização das exportações e a desindustrialização passasse a ocupar posição prioritária nas discussões sobre os rumos da política industrial. O lançamento do Plano Brasil Maior de 2011, ao lado de outras medidas que o governo adotou desde então, identificadas como protecionistas (elevação de alíquotas de importações), têm sido interpretadas como um possível viés em direção às práticas do passado, do modelo de ”desenvolvimento para dentro”. Neste contexto, o estudo argumentou que o debate sobre as estratégias de política industrial brasileira remonta ao início dos anos 2000. Um consenso foi formado, desde então, e se refere à importância da inovação tecnológica no aumento da produtividade e competitividade dos produtos e serviços brasileiros. Por outro lado, o tema das políticas seletivas setoriais e do uso de instrumentos que interferem diretamente nos preços relativos nunca foi abandonada, embora nunca tenha sido consensual. A conjuntura pós 2008, ao propiciar um aumento acentuado nos coeficientes de importações em setores industriais, acirrou esse debate. No entanto, o cerne da política industrial, conforme salientado no Plano Brasil Maior, continua ser a inovação tecnológica e mais o adensamento das cadeias produtivas locais. Nesse último caso, se insere o tema das políticas de conteúdo local. Foi analisado o uso da política de conteúdo local nos setores de petróleo e gás e de equipamentos médicos hospitalares, pelas razões apresentadas na introdução. Partiu-se da premissa que a ênfase da análise seria a de avaliar a relação entre o instrumento e o objetivo da política industrial — inovação tecnológica. No caso dos equipamentos médicos, devem ser incluídos os objetivos das políticas de saúde pública. Não se repete aqui, contudo, as conclusões específicas da análise de cada setor que estão nas subseções finais desses estudos de casos. Apenas ressalta-se que, nos dois casos, foi argumentado que essas políticas podem afastar ainda mais o país de alcançar melhorias no padrão tecnológico. Por último, chamou-se atenção da questão do adensamento das cadeias produtivas locais e as estratégias das políticas de comércio exterior e industrial. Não é possível repetir as décadas passadas, quando o ritmo da inovação tecnológica era mais lento e as cadeias produtivas podiam ser abastecidas com fornecedores locais com ”custos administráveis”. É preciso considerar os benefícios de se integrar às cadeias produtivas globais (o que exige menores tarifas de importações para bens intermediários, investimentos em logística) e/ou estimular as cadeias produtivas regionais. Políticas de conteúdo local, se não forem bem administradas e limitadas, podem alijar o país dessa integração produtiva. O resultado seria uma estrutura produtiva com custo elevado o que contradiz o objetivo de melhorar a competitividade brasileira no mercado mundial. 38 N ota s 1 13 O Plano Brasil Maior define cinco blocos de competitividade setorial que identificam as áreas consideradas prioritárias na agenda governamental. As indústrias do setor de petróleo e do complexo de saúde fazem parte dos blocos de competitividade setorial. N ão era a proposta deste estudo listar as medidas adotadas pelos países. 14 F oge ao escopo do relatório examinar detalhadamente os instrumentos que o governo utilizou para lidar com os efeitos da crise de 2008. 2 V er Pereira (2006) para uma avaliação dos efeitos da liberalização na economia brasileira. 15 A desvalorização cambial decorrente de uma queda na demanda externa reduz o impacto negativo sobre a renda doméstica. 16 Também influenciou a valorização do câmbio o aumento na entrada de investimento em carteira (títulos de renda fixa, em especial) o que levou o governo a aumentar o imposto sobre operações financeiras (IOF) no ano de 2011 (WTO/OECD/UNCTAD 2011) 3 Para uma análise das políticas ver Canêdo-Pinheiro (2011) e Cano e Silva (2010). 4 Nota-se que o relatório não cita os episódios anteriores de recessão para ilustrar o seu argumento. Pode-se inferir que a principal mensagem se refere a momentos de crise/ baixo crescimento como a crise da dívida externa nos países latinos e o início dos anos 80 nos Estados Unidos (valorização cambial, baixo crescimento e desemprego) onde proliferaram medidas protecionistas. 17 O s produtos brasileiros explicavam 2,8% das exportações mundiais, no ano 2000, e 5%, em 2010. 18 E m alguns setores, os coeficientes ultrapassaram 50%, em 2011, como: material eletrônico; máquinas industriais; indústrias extrativas; e, equipamentos de informática. No entanto já eram setores com coeficientes elevados em 2006 (acima de 35%). Chamou atenção, porém, a elevação de coeficientes em setores com baixos coeficientes como o de produtos de metal (7,3%, em 2006 e 14,3%, em 2011), vestuário (passou de 4,1% para 10,2%) e automóveis (10,8% para 22,4%). 5 Esse é o caso, por exemplo, do Brasil e da maior parte dos países latinos. 6 Um exemplo ilustra essa dificuldade. Na Rodada Uruguai, uma das questões principais era como transformar em equivalentes tarifários ou medidas quantitativas os subsídios concedidos na agricultura pelos países desenvolvidos. Na crise de 2008, onde foram utilizados vários pacotes de financiamentos subsidiados, como mensurarmos o efeito dessas medidas nos fluxos comerciais não é uma tarefa simples. 7 19 A descoberta das jazidas de petróleo do Pré-Sal e a alta nos preços das commodities agrícolas levou ao debate sobre o risco da doença holandesa no Brasil (Bonelli, 2011) Indicador de frequência: calcula a razão entre o número de linhas tarifárias com medidas de comércio e o número total de linhas. Indicador de cobertura: calcula a razão entre o valor das importações sujeitas às medidas e o valor das importações totais. 20 Para uma descrição do Plano Brasil Maior ver www. brasilmaior.gov.br. 21 Nesse bloco estão a indústria de petróleo e gás e o complexo de saúde que serão analisados nos próximos capítulos. 8 Não há estimativas para os anos anteriores, o que não permite realizar comparações com os períodos pré-crise. 9 No período de outubro de 2011 a meados de maio de 2012 foram identificadas 182 medidas restritivas, sendo que 43% eram de defesa comercial e 40% de medidas na fronteira. 10 22 A s reduções, em sua maioria, são explicadas pelo regime ex-tarifário. Esse permite reduções temporárias por razões de falta de similar nacional e/ou outro argumento que comprove a relevância da redução para assegurar a oferta do produto no mercado doméstico. No GTA, a definição de medidas de proteção é mais abrangente. No período de 42 meses cobertos pelos relatórios da OMC, a média mensal de medidas restritivas ao comércio foi de 17% e no período de 44 meses analisados pelo GTA, de 25%. 23 Parte dessa seção baseou-se em Canêdo-Pinheiro (2012). 24 Classificação extraída de Stein (2011). 25 O bviamente, nem sempre é clara a distinção entre setor e atividade, ou entre política horizontal e vertical. No entanto, essas distinções são úteis para organizar a discussão. 11 N ossa tradução: O protecionismo tem aumentado desde a crise de 2008? 12 A nossa tradução para a medida é Índice Global de Restrição ao Comércio. O índice procura abranger todos os países. 26 Ver Harrison e Rodríguez-Clare (2010), por exemplo. 39 27 52 Mais detalhes sobre o FGCN ver NUNES e LOBO (2008). P arte dessa seção baseou-se em Canêdo-Pinheiro et alli (2007) e Canêdo-Pinheiro (2012). 53 O bviamente, existem medidas que não são voltadas especificamente ao setor de P&G, mas que podem ter efeito sobre ele. Essas medidas, embora importantes, não serão listadas. 28 O conceito de externalidade refere-se ao impacto da decisão de um agente econômico sobre aqueles que não participaram da mesma. 29 54 O Prominp – Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural – é um programa criado pelo governo para coordenar e colocar em prática ações de política industrial no setor de petróleo e gás. Ver Melitz (2005) para referências. 30 Ver Miravete (2003) e Melitz (2005). 31 N esse contexto, o termo spillover está sendo usado como sinônimo de externalidade. 55 Ver, por exemplo, Guimarães (2012). 32 56 33 57 Ver Rodríguez-Clare (2007) e Sauré (2007). Ver Kashani (2005). Este argumento foi pioneiramente enunciado em RosensteinRodan (1943) e mais tarde formalizado em Murphy et alii (1989) e, mais recentemente, em Rodrik (1996). A experiência norueguesa será detalhada mais adiante. 58 Ver, por exemplo, ONIP (2010). 34 59 35 60 Ver Pack e Saggi (2006). Ver, por exemplo, Oliveira e Rocha (2012). Ver Hidalgo et alii (2007). V er Lee (1997). Outros aspectos da política industrial sul-coreana serão ressaltados mais adiante, inclusive no anexo. 36 Ver Hausmann et alii (2007). 37 Ver Harrison e Rodríguez-Clare (2010). 61 38 Este argumento remonta a Hirschman (1958). 62 Ver, por exemplo, Miyagiwa e Ohno (1999). Ver Aghion e Griffith (2005) para referências. 39 Ver Hoff (1997) e Hausmann e Rodrik (2003). 63 V er Rodrik (1995), por exemplo. Para um descrição da relação da política tecnológica e de comércio exterior na Coreia do Sul ver Tigre (2002). 40 Ver Barrios, Görg e Strobl (2003) e Bernard e Jensen (2004). 41 Ver Moran (2011) para referências. 64 Ver Noland e Pack (2003) para referências a este respeito. 42 Ver Raff e Kim (1999). 65 Ver Wang e Wei (2010). 43 Ver Alfaro et alli (2004, 2010). 66 Ver Oliveira e Rocha (2012) para mais detalhes. 44 Ver Borensztein, De Gregorio e Lee (1998) e Xu (2000). 67 45 Para mais detalhes ver Moran (2011). Ver ONIP (2011) e Guimarães (2012), por exemplo. 68 Ver Guimarães (2012) para mais detalhes. 46 Ver Crespo & Fontoura (2007) para discussão a esse respeito. 69 P ara mais detalhes sobre a experiência norueguesa em política industrial no setor de P&G ver Bain & Company e TozziniFreire Advogados (2009) e IBRE (2011). 47 Ver Alfaro & Rodríguez-Clare (2004). 48 Ver Hausmann, Rodrik e Sabel (2008). 70 Para mais detalhes ver ONIP (2011). 49 R essalte-se que o segmento de E&P é um subconjunto do setor de P&G. Como a política de conteúdo local em E&P é a principal iniciativa de política industrial em P&G, será dada ênfase à exploração e produção nesse capítulo. 71 A esse respeito ver Gronhaug (1989). 72 V er Moran (2011) para referências e discussão a esse respeito. 50 P ara mais detalhes, ver Guimarães (2012), em que a descrição da evolução da regra de conteúdo local nas licitações de blocos de petróleo e gás foi baseada. 73 A liás, a escassez de mão de obra qualificada e a impossibilidade de treinar uma quantidade muito grande de trabalhadores em tempo hábil, mais um motivo para que a política de conteúdo local no setor de P&G seja mais seletiva. 51 Ver Transpetro (2011). 40 74 82 E xistem medidas que não são voltadas especificamente ao setor de EMHO, mas que podem tem efeito sobre ele. Estas medidas, embora importantes, não serão objeto desta seção. V er OECD (2011) para mais detalhes sobre o uso de políticas de demanda, em particular compras do governo, no fomento à inovação. 83 E sta seção foi adaptada de Canêdo-Pinheiro (2012). Para lições da experiência sul-coreana para o caso brasileiro ver também Ferreira Jr e Canuto (1990) e Canuto (1993). 75 Para mais detalhes ver Interfarma (2012). 76 O utros países em desenvolvimento também perseguem políticas industriais voltadas para o complexo industrial da saúde, mas com ênfase muito maior em medicamentos. Mais detalhes ver ABDI (2011). 77 Ver ABDI (2008). 78 Um exemplo é o setor de informática. Em sua fase mais recente, a Lei de Informática remonta à Lei nº 8.248/1991, mas vários de seus dispositivos foram renovados ao longo dos anos e o setor continua protegido das importações. 84 Ver Noland e Pack (2003), no qual boa parte da descrição da experiência sul-coreana foi baseada. 85 Ver Lee (1997) para detalhes. 86 Seção adaptada de IBRE (2011). 79 A esse respeito, o setor de eletrônicos é um bom exemplo. Com relação aos computadores, evidências indicam que a reserva de mercado implicou defasagem de preço ou desempenho de pelo menos três anos nos computadores produzidos (e usados) no Brasil com relação ao padrão internacional e gerou perdas de bem-estar da ordem de 20% do gasto observado com esses equipamentos [Luzio e Greenstein (1995)]. 80 Ver, por exemplo, Pack (2001). 81 A lguns estudos também abordam esses pontos. Ver Interfarma (2012) para uma abordagem mais voltada para os medicamentos, mas que também se aplica ao setor de EHMO. 41 87 Ver Hanisch e Nerheim (1993). 88 Ver Hatakenaka et alli (2006) 89 Ver Nordas et alli (2003) 90 Ver Engen (2007). 91 Ver Nordas et alli (2003) 92 Ver Bain & Company e TozziniFreire Advogados (2009). 93 Ver Engen (2007). 94 Ver Bain & Company e TozziniFreire Advogados (2009). 95 Ver Bain & Company e TozziniFreire Advogados (2009). 96 Ver Hatakenaka et alli (2006) 97 Ver Bain & Company e TozziniFreire Advogados (2009) Re fe r ê nc ia s B ib l i o g rá f ic as R. Bonelli (org) A Agenda de Competitividade do Brasil. Instituto Brasileiro de Economia, Fundação Getulio Vargas, Editora FGV, p113-142, 2011 ABDI. Estudo Prospectivo. Equipamentos Médicos, Hospitalares e Odontológicos. Série Cadernos da Indústria ABDI, v. VIII, 2008. ABDI. Política industrial de países selecionados: Brasil, Rússia, Índia e China. Brasília: ABDI, 2011. Canêdo-Pinheiro, M., Ferreira, P. 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Busca também fomentar o diálogo entre diferentes atores, públicos e privados, visando a um melhor entendimento da agenda internacional, bem como do papel do Brasil no cenário global. É reconhecido pelo Ministério da Justiça como uma entidade privada sem fins lucrativos que desenvolve atividades de interesse geral da sociedade, que lhe confere a classificação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Conselho Curador Presidente de Honra Fernando Henrique Cardoso Presidente Luiz Augusto de Castro Neves Vice-Presidente Tomas Zinner Vice-Presidentes Eméritos Daniel Miguel Klabin José Botafogo Gonçalves Luiz Felipe Palmeira Lampreia Armando Mariante Arminio Fraga Neto Carlos Mariani Bittencourt Celso Lafer Claudio Frisc htak Gelson Fonseca Junior Georges Landau associe-se Henrique Rzezinski O CEBRI oferece às pessoas físicas e jurídicas a possibi- José Luiz Alquéres lidade de serem seus associados, mediante contribuição José Pio Borges de Castro Filho anual. O apoio financeiro assim obtido permite ao CEBRI Marcelo de Paiva Abreu cumprir sua missão de fomentar o conhecimento, pro- Marco Aurélio Garcia mover o debate e produzir cada vez mais informação. O Marcos Castrioto de Azambuja caráter multidisciplinar do Centro e o seu poder de pene- Marcus Vinícius Pratini de Moraes tração em veículos de imprensa e mídias sociais atraem Maria Regina Soares de Lima um público crescente e diversificado e conferem grande Pedro Sampaio Malan visibilidade a seus associados. Roberto Pinto Mameri Abdenur Por ser uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), seus apoiadores podem usufruir da dedução do Imposto de Renda prevista na Lei n.º 9.790/99. O associado do CEBRI dispõe dos seguintes benefícios: Garantia de presença em eventos públicos Acesso a eventos reservados Sugestão de temas para estudos Sugestão de temas para projetos e pesquisas José Aldo Rebelo Figueiredo Roberto Teixeira da Costa Ronaldo Veirano Sebastião do Rego Barros Netto Vitor Sarquis Hallack Winston Fritsch Conselho Consultivo Internacional Albert Fishlow Andrew Hurrell Para maiores informações sobre como se associar, Julia Sweig entre em contato no telefone +55 [21] 2206-4444 Kenneth Maxwell ou e-mail [email protected] Leslie Bethell