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1er Simposio de Geografía del Cono Sur: Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur
/ coordinación editorial: Ana Estela Dominguez Sandoval, Carmen Rejane Flores Wizniewsky,
Tatiane Almeida Netto, Lucía Eluén. – Montevideo: Laboratorio de Desarrollo Sustentable y
Gestión Ambiental del Territorio-Geografía, IECA, Facultad de Ciencias - UdelaR, 2015.
(Simposio de Geografía del Cono Sur; ISSN: 2393-6673; vol. 1)
540 p.
ISBN: 978-9974-0-1334-6
1. GEOGRAFÍA 2. TERRITORIOS URBANOS 3. TERRITORIOS RURALES 4. ÁREAS
PROTEGIDAS 5. BIODIVERSIDAD 6. SISTEMAS DE INFORMACIÓN
GEOGRAFICO 7.
ENSEÑANZA 8. BIENES DE LA NATURALEZA 9. TRANSFORMACIONES AGRARIAS
I. Domínguez Sandoval, Ana Estela
III. Netto, Tatiane Almeida
II. Wizniewsky, Carmen Rejane Flores
IV. Eluén, Lucía
CDU 911
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem a devida citação.
Esta é uma obra coletiva baseada em artigos enviados pelos autores e apresentados no 1er
Simposio de Geografía del Cono Sur, realizado entre 20 e 22 de agosto de 2015. Os direitos
e responsabilidades sobre os artigos e suas opiniões são dos autores que os enviaram para
publicação neste e-book.
E-book
Primera Edición
Volumen 1
Versión digital aquí
Entidad Responsable
Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio-Geografía
Instituto de Ecología y Ciencias Ambientales (IECA)
Facultad de Ciencias -UdelaR
Dirección: Iguá 4225 piso 14 ala sur CP: 11400 Montevideo-Uruguay
1er SIMPOSIO DE GEOGRAFÍA DEL CONO SUR:
Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur
De 20 a 22 agosto 2015
Instituto de Perfeccionamiento y Estudios Superiores-IPES
Montevideo - Uruguay
La comisión organizadora del 1er Simposio de Geografía del Cono Sur está formada por un
Comité Científico y un Comité de Organización.
Comisión Organizadora
Comité Científico UDELAR y UFSM
Comité de Organización UDELAR, CFE y
UFSM
MsC. Aline Fernandez da Fonseca
Dra. Ana Estela Domínguez Sandoval
Dr. André Weissheimer de Borba
Dra. Ane Carine Meurer
Dr. Benhur Pinós da Costa
Dr. Bernardo Sayão pena e Souza
Dr. Cassio Arthur Wollmann
Dr. Eduardo Schiavone Cardoso
Ms.C. Feline Schön
Dr. Fernando Pesce
Ms.C. Gabriela Fernández
MsC. Ismael Díaz
Dr. José Carlos Guerrero
Dr. Marcel Achkar
Dra. Meri Lourdes Bezzi
Dr. Roberto Cassol
MsC. Victor Cantón
Dr. Waterloo Pereira Filho
Dra. Andrea Valli Nummer
Dra. Eliane Maria Foleto
Dra. Carmen Rejane Flores
Wizniewsky
Dra. Giancarla Salamoni
MsC. Beatriz Sosa
Lic. Lucía Eluén
Prof. César Cutinella
Prof. Mónica Pizarro
Fernanda Follmann
Marilze Beatriz Losekann
Janete Cancelier Webler
Alecsandra Santos da Cunha
Tatiane Almeida Netto
Kelly Perlin Cassol
Franciele da Silva
Daniel Junges Menezes
Leonice Aparecida Mourab
PRESENTACIÓN
1er SIMPOSIO DE GEOGRAFÍA DEL CONO SUR: Desafíos para la integración de
la Geografía del Cono Sur
Como una forma de consolidar la cooperación técnico-científica entre Universidades
en el marco del Convenio entre la Universidad Federal de Santa María (UFSM, Brasil)
y la Universidad de la República (UdelaR, Uruguay) es que se celebró el 1er Simposio
de Geografía del Cono Sur, en Montevideo, Uruguay, los días 20 y 21 de agosto de
2015. Este simposio convocó a docentes y estudiantes del Programa de PosGraduación en Geografía (PPGEO) de la UFSM, el Laboratorio de Desarrollo
Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio (LDSGAT) del Instituto de Ecología y
Ciencias Ambientales de la Facultad de Ciencias de la UdelaR y el Departamento de
Geografía del Consejo de Formación en Educación de la Administración Nacional de
Educación Pública (CFE-ANEP).
Los trabajos presentados estuvieron centrados en cuatro ejes de investigación:
Eje 1- Territorios urbanos y rurales
Eje 2- Biodiversidad y área protegida
Eje 3- Geografía Física y Sistemas de Información Geográfica
Eje 4- Experiencias de educación
4
SUMÁRIO
CONFERENCIA INAUGURAL: DESAFÍOS PARA LA INTEGRACIÓN DE LA
GEOGRAFÍA EN EL CONO SUR. Fernando Pesce………… ....………………………..….8
EJE 1- TERRITORIOS URBANOS Y RURALES………………………………………….18
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL..........................................................................................19
TRANSIÇÃO AGROECOLÓGICA: AS VIVÊNCIAS DOS AGRICULTORES
FAMILIARES CAMPONESES NO MUNICÍPIO DE AGUDO/RS. Valquiria Conti y
Carmen Rejane Flores Wizniewsky ........................................................................................ 20
A IMPORTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA E CULTURAL DA PRODUÇÃO DO QUEIJO
CANASTRA – MINAS GERAIS – BRASIL. João Batista Villas Boas Simoncini e Cesar de
David ....................................................................................................................................... 32
NOTAS SOBRE AGRONEGÓCIO DA SOJA NO BRASIL. Leandro Jesus Maciel de
Menezes e Kelly Perlin Cassol ................................................................................................ 44
LA RELACIÓN INTRÍNSECA ENTRE LA SOBERANÍA ALIMENTARIA Y LA
AGROECOLOGÍA EN EL CONTEXTO DE LA CRISIS ALIMENTARIA. Alecsandra
Santos da Cunha, Ana Estela Dominguez Sandoval, Clayton Hillig, Iolanda Lopes de Oliveira
e Cristiane Maria Tonetto Godoy ............................................................................................ 57
A POLÍTICA DE ASSENTAMENTOS RURAIS NO BRASIL: A REFORMA AGRÁRIA
CONSERVADORA E A LUTA “NA” TERRA. Iolanda Lopes de Oliveira, Vera Maria
Favila Miorin, Luiz Felipe Sausen de Freitas e Alecsandra Santos da Cunha ........................ 70
O TURISMO RURAL NO DISTRITO DE ARROIO GRANDE – SANTA MARIA/RS.
Lisane Regina Vidal Conceição e Janete Webler Cancelier ................................................... 81
GEOGLIFOS NO ALTO CAMAQUÃ, RS:
PERSPECTIVAS PARA O
APROVEITAMENTO TURÍSTICO. Simone Marafiga Degrandi, Magali Rambo Anschau e
Adriano Severo Figueiró ......................................................................................................... 93
TRANSFORMAÇÕES NO PAMPA ADVINDAS DA GLOBALIZAÇÃO: UM RECORTE
PARA A FRONTEIRA BRASIL –URUGUAI. Tatiane Almeida Netto .............................. 108
PAISAJES AGRARIOS EN LA CUENCA DEL RÍO TACUAREMBÓ CHICO. Selva
Kuster e Diego Silveira ......................................................................................................... 119
TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 134
A FRUTICULTURA COMO UM NOVO CENÁRIO REARTICULADOR DO
DESENVOLVIMENTO REGIONAL NA MICRORREGIÃO GEOGRÁFICA DA
CAMPANHA MERIDIONAL. Ana Luiza Pinto Alves, Thales Silveira Souto e Meri Lourdes
Bezzi ...................................................................................................................................... 135
A PECUÁRIA LEITEIRA NO MUNICÍPIO DE ITUIUTABA - MINAS GERAIS/BRASIL
E OS REFLEXOS NA REORGANIZAÇÃO PRODUTIVA AGROPECUÁRIA. Thales
Silveira Souto, Ana Luiza Pinto Alves e Meri Lourdes Bezzi .............................................. 145
VITIVINICULTURA NA REGIÃO DE BENTO GONÇALVES: MUDANÇAS
SOCIOECONÔMICAS EM DECORRÊNCIA DO ACORDO MERCOSUL. Dilson Nicoloso
Cechin, Francisco Monte Alverne de Sales Sampaio, Frank Gonçalves Pereira, Jéssica
Medianeira Xisto e Suzana Bianchin Fernandes ................................................................... 157
CIDADES DOENTES, CIDADÃOS DOENTES: MICROTERRITORIALIDADES DE
SUJEITOS COM CÂNCER NA FEIRA ECOLÓGICA DA REDENÇÃO, PORTO
ALEGRE-RS. Leonardo Pinto dos Santos, Elizandra Voigt e Jaqueline Lessa Maciel ........ 170
OS EFEITOS DAS EXPANSÕES DAS MONOCULTURAS DE CAFÉ, LARANJA E
CANA-DE-AÇÚCAR NO MUNICÍPIO DE TABAPUÃ, SP – BRASIL PARA OS
AGRICULTORES FAMILIARES. Guilherme Valagna Pelisson ........................................ 183
5
OS MOVIMENTOS SOCIAIS E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UM OLHAR PARA O
ASSENTAMENTO CONQUISTA DA FRONTEIRA. Antônio Valmor de Campos ......... 194
IDENTIDADE MISSIONEIRA: ELEMENTOS DIFUSORES. Luiz Felipe Sausen de Freitas,
Iolanda Lopes de Oliveira e Vera Maria FavilaMiorin ......................................................... 207
LAS TRANSFORMACIONES TERRITORIALES URBANAS EN EL BARRIO JACINTO
VERA. Gladys Graciela Schiavone Cánepa.......................................................................... 218
EJE 2- BIODIVERSIDAD Y ÁREA PROTEGIDA ...................................................................... 229
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 230
UNIDADE DE CONSERVAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE MANUTENÇÃO DA
SOCIOBIODIVERSIDADE NOS CAMPOS SULINOS DO BIOMA PAMPA. Marilse
Beatriz Losekann e Fernanda Maria Follmann ..................................................................... 231
AS ÁREAS PROTEGIDAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA BRASIL – URUGUAI:
OPORTUNIDADES PARA A CONSERVAÇÃO INTEGRADA. Franciele da Silva e Eliane
Maria Foleto .......................................................................................................................... 243
ÁREAS PROTEGIDAS BINACIONALES, ¿UNA NECESIDAD POSIBLE O UNA
REALIDAD INFRANQUEABLE?”. Maria del Rosario Bottino Bernardi .......................... 256
ECOPROVÍNCIAS
DO
PAMPA
URUGUAIO-SUL-RIO-GRANDENSE:
UMA
PROPOSTA DE REGIONALIZAÇÃO. Jaciele Carine Sell, André Weissheimer de Borba e
Adriano Severo Figueiró ....................................................................................................... 284
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO GÊNERO FRAILEA BRITTON & ROSE NA BACIA
HIDROGRÁFICA DO RIO SANTA MARIA, RS. Anabela Silveira de Oliveira Deble, Luis
Eduardo de Souza Robaina e Romário Trentin......................................................................297
TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 311
PLANEJAMENTO E ADEQUAÇÃO DE TRILHAS NO CORREDOR ECOLÓGICO DA
QUARTA COLÔNIA, RS. Suzane B. Marcuzzo, Elisangela Lopes e Marilim Mazui . ...... 312
PESCA ARTESANAL NO RIO VACACAÍ, RS. AS INFLUÊNCIAS DA ORIZICULTURA
IRRIGADA E OS POTENCIAIS TERRITÓRIOS DE CONFLITOS. Tiago Rossi de Moraes
e Eduardo Schiavone Cardoso................................................................................................322
A FLORA RELICTUAL COM ESPÉCIES ENDÊMICAS NO CERRO DO ITAQUATIÁ E
CERRO DO RIBEIRÃO NO OESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PEDRO DO SUL/RS.
Rodrigo Corrêa Pontes, Leonardo Moreira Aguiar, Leopoldo Witeck Neto e Mauro Werlang
Kumpfer ................................................................................................................................ 333
EJE 3- GEOGRAFIA FÍSICA Y SISTEMAS DE INFORMACIÓN GEOGRÁFICA .............. 344
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 345
COMPARAÇÃO ENTRE DADOS GEOGRÁFICOS: AS OTTOBACIAS DA AGÊNCIA
NACIONAL DE ÁGUAS (ANA) E AS CARTAS TOPOGRÁFICAS DO EXÉRCITO.
Maurício Rizzatti, Roberto Cassol, Natália Lampert Batista e Nadinne da Silva Fernandes.
............................................................................................................................................... 346
ANÁLISE DE ERROS ASSOCIADOS A MODELOS DIGITAIS DE ELEVAÇÃO
DECORRENTES DO PROCESSO DE VETORIZAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM
ORIUNDA DE CARTAS TOPOGRÁFICAS. Daniel Junges Menezes, Romário Trntin e Luís
Eduardo de Souza Robaina ................................................................................................... 356
POTENCIALIDAD DE LAS IMÁGENES SATELITALES DE ALTA RESOLUCIÓN EN
LA DETECCIÓN DE ESPECIES LEÑOSAS INVASORAS. Beatriz Sosa, Carlos Chiale,
Gabriela Fernández e Marcel Achkar.................................................................................... 369
ANÁLISE E MAPEAMENTO DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NO MUNICÍPIO DE
SORRISO, MATO GROSSO. Tiéle Lopes Cabral, Luis Eduardo de Souza Robaina e Ivaniza
de Lourdes Lazzarotto Cabral ............................................................................................... 380
TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 393
6
ANÁLISE DE UM TRECHO DE 1,9 KM DO ARROIO DO VEADO EM SILVEIRA
MARTINS, RS. Guilherme Cardoso da Silva e Indiara Bruna Costa Moura Moraes. ......... 394
SÍNTESE DA EVOLUÇÃO DOS AREAIS DA BACIA DO ARROIO PUITÃ, OESTE DO
RS, NO PERÍODO DE 1984 À 2014. Angélica Cargnin de Souza e Carlos Alberto da
Fonseca Pires......................................................................................................................... 405
OS DADOS SRTM E SUA APLICABILIDADE NA REPRESENTAÇÃO DO CENÁRIO
GEOGRÁFICO CAPINÓPOLIS/MG/BRASIL. Eduardo Marques Silveira, Meri Lourdes
Bezzi e Roberto Barboza Castanho ....................................................................................... 415
ANÁLISE DE DISTINTAS BASES CARTOGRÁFICAS NO MAPEAMENTO DE ÁREAS
DE ALTA DECLIVIDADE. Bruno Zucuni Prina e Romario Trentin .................................. 426
RELAÇÃO ENTRE VARIÁVEIS LIMNOLOGICAS, DADOS METEOROLÓGICOS E
USO DA TERRA: ABORDAGEM MÚLTIPLOS SENSORES. Fábio Marcelo Breunig,
Waterloo Pereira Filho e Flávio Wachholz............................................................................435
CARACTERIZAÇÃO E MAPEAMENTO DAS UNIDADES DE RELEVO DO
MUNICÍPIO
DE
MATA/RS.
Daniélli
Flores
Dias
e
Romario
Trentin....................................................................................................................................448
EJE 4- EXPERIENCIAS DE EDUCACIÓN .................................................................................. 458
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 459
ANÁLISE DE DISCURSO E GEOGRAFIA: POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS.
Edipo Djavan dos Reis Göergen e Taiane Flores do Nascimento ......................................... 460
EDUCAÇÃO E PERCEPÇÃO AMBIENTAL: O QUE DIZEM OS MAPAS MENTAIS DOS
ALUNOS DE 1º ANO DO ENSINO MÉDIO DO MUNICÍPIO DE QUEVEDOS/RS. Natália
Lampert Batista, Roberto Cassol e Elsbeth Léia Spode Becker.............................................470
EDUCAÇÃO DO CAMPO: EMANCIPAÇÃO SOCIAL DE SUJEITOS. Eduardo Pastorio
............................................................................................................................................... 483
TRABAJOS POSTERS ...................................................................................................... 496
O ESPAÇO AUSENTE: UM CONCEITO CHAVE PARA A GEOGRAFIA ESCOLAR NO
CONE SUL. Leonardo Pinto dos Santos, Roselane Zordan Costella e Eduardo Schiavone
Cardoso ................................................................................................................................. 497
ENSINO DE CARTOGRAFIA UTILIZANDO DIFERENTES RECURSOS DIDÁTICOS.
Tuane Telles Rodrigues e Roberto Cassol ............................................................................ 511
ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL ATALIBA RODRIGUES DAS
CHAGAS: UM NOVO TEMPO SE APROXIMA CONSTRUINDO UMA ESCOLA COMVIDA!. Karyn Horst, Mirieli da Silva Fontoura e Ane Carine Meurer ................................ 522
CONFERENCIA DE CIERRE: TENSIONES ENTRE BIENES COMUNES Y
TRANSFORMACIONES AGRARIAS A DIVERSAS ESCALAS. Dra. Ana Domínguez e
Dr. Marcel Achkar ............................................................................................................................. 532
7
CONFERENCIA INAUGURAL: DESAFÍOS PARA LA INTEGRACIÓN DE LA
GEOGRAFÍA EN EL CONO SUR
Prof. Dr. Fernando Pesce (UdelaR)
Este ensayo fue escrito para ser presentado a modo de disertación en la mesa de
apertura del 1° Simposio de Geografía del Cono Sur: Desafíos para la integración de la
Geografía del Cono Sur. El Simposio estuvo organizado de manera conjunta por el
Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio- Geografía de
la Facultad de Ciencias - UDELAR (Uruguay), el Programa de Pos-Graduación en
Geografía y Geociencias (PPGGEO) de la Universidad Federal de Santa María, Río
Grande del Sur (Brasil) y el Departamento de Geografía del Consejo de Formación en
Educación de la Administración Nacional de Educación Pública (Uruguay). El evento
tuvo lugar en Montevideo entre el 20 y el 22 de agosto del año 2015 en el Instituto de
Perfeccionamiento y Estudios Superiores Juan Pivel Devoto. Las finalidades del
Simposio fueron consolidar la cooperación técnico-científica entre las Instituciones
participantes y promover el debate académico en torno a las principales líneas de
investigación y proyectos derivados de las mismas como mecanismo de integración
académica entre estudiantes y profesores de las tres instituciones organizadoras.
A lo largo del ensayo se intentó responder a las siguientes interrogantes:
a)
¿Cuál es la Geografía abarcativa del Cono Sur? O sea, recurriendo a los
principios metodológicos de localización y extensión geográfica, se intentará precisar
fundadamente el territorio o los territorios definidos como Cono Sur.
b)
¿Qué características geográficas presentan los territorios del Cono Sur que le
confieren singularidad en la diversidad socio- ambiental de la región?
c)
¿Cuál sería el estatuto epistemológico para una Geografía del Cono Sur?
d)
¿Cómo
se
enmarcaría
la
producción
académica
desde
el
estatuto
epistemológico definido para la integración de la Geografía en el Cono Sur?
El “topos” como punto de partida
En la antesala a la firma del Tratado de Asunción que dio lugar, en el año 1991
a la creación del MERCOSUR como dispositivo geopolítico a los efectos de
profundizar el neoliberalismo en la región, el Capitán Oscar Lebel, del Centro de
Estudios Estratégicos del Uruguay definió el topos del Cono Sur. En la monografía
titulada
"Una
visión
geopolítica
de
la
integración,
desde
una
perspectiva
8
comprometida" presentada en el I Coloquio de Estudios Fronterizos, realizado en
Rivera en el año 1988, el autor sostuvo:
"En nuestras latitudes, la historia camina a lo largo y ancho de la Cuenca del
Plata, ya que ella fue desde el comienzo de la colonización, una estratégica entrada al
corazón del continente. Es esa misma historia, quien creó una geografía unitaria para
el gran eje fluvial de la cuenca, con sus ríos Paraná, Paraguay, Uruguay y de la Plata.
(...) la historia de nuestras áreas, es la historia de su integración dependiente de las
potencias navales hegemónicas. A esos efectos, pueden distinguirse tres grandes
períodos: Primero, el de la colonia típica bajo dominio de las coronas de España y
Portugal. Segundo, el de la dependencia liberal, con hegemonía británica. Tercero, la
incorporación al área de dependencia e influencia de los Estados Unidos".
El autor definió de esa forma su visión geopolítica del topos. El Cono Sur fue
considerado como una construcción dialéctica entre la geografía/la historia/y la nueva
geografía que, a modo de transcurso temporal en espiral, se fue conformando a partir
de nuevos territorios que se fueron dibujando sobre grafías preexistentes, al impulso
del motor de la geopolítica global, cuyos actores, pretendidamente hegemónicos, han
impulsado diferentes modelos de desarrollo siempre enmarcados en el modo de
producción capitalista.
Dando continuidad a la tesis de Lebel y proyectando la investigación sobre la
construcción de los territorios en el Cono Sur Latinoamericano a fines del siglo XX,
Pesce (2003) “ (…) en las últimas años del siglo XX, momento histórico en el que se
están produciendo transformaciones territoriales importantes en el contexto de la
denominada "Globalización", acordes con las condicionantes geopolíticas impuestas
por el capitalismo financiero internacional que impulsa modelos económicos basados
en el neoliberalismo, valiéndose de los adelantos técnicos en los medios de
información y comunicación, exigiendo la flexibilidad de las fronteras no sólo desde el
ámbito económico, sino también político, dibujando nuevas regionalidades en las
grafías del Cono Sur”.
Se vislumbraba la intervención de los estados en la construcción de
equipamiento e infraestructura territorial, financiada por los organismos multilaterales
de crédito, que a modo de mega obras, cumplieran con la finalidad de generar las
condiciones generales necesarias para la reproducción del capital trasnacional en el
entonces embrionario Orden Agroeconómico Internacional. En este nuevo estadio de
la historia del capitalismo en la geografía unitaria de la región, la inversión de capitales
en el modelo de desarrollo extractivo articula actores económicos y políticos globales,
con actores económicos y políticos regionales, con actores económicos, políticos y
sociales nacionales, que están grafando los territorios a partir de los agronegocios y la
9
producción de commodities acorde a los requerimientos del mercado global. La
inversión de capital en la adquisición por compra o arrendamiento de superficie, tierras
fértiles, ecosistemas productivos y agua resulta lucrativa y sitúa a los territorios del
Cono Sur como uno de los reductos de mayor relevancia a tales efectos.
Desde el punto de vista geográfico, el Cono Sur puede circunscribirse a la
región articulada por los ríos Paraguay - Paraná y Uruguay, - que desembocan en el
Río de la Plata- y que definen fluvialmente la Cuenca Hidrográfica homónima,
localizada al centro y sudeste de América del Sur, abarcando un área aproximada de
4.350.000 Km2.
En la actual coyuntura global los inversores del capital trasnacional observan a
la Cuenca del Plata a partir de tres requerimientos esenciales:
La red de drenaje tiene aptitud navegable en casi toda su extensión, dadas las
características topográficas de la cuenca, "(…) particularmente cuando es tan pequeña
la pendiente media de la superficie de las aguas de los ríos. El Paraguay - Paraná,
desde Corumbá al estuario del Plata presenta una suave pendiente y es navegable
para pequeñas embarcaciones en unos 2.400 kilómetros". (Shanahan E.W)
La conectividad territorial, facilitada por los cursos fluviales es geopolíticamente
trascendental para Bolivia y Paraguay, dada la condición de países mediterráneos que
los mismos ostentan en el continente suramericano; también la interconexión fluvio
marítima a través de la Cuenca del Plata es importante para los productores rurales de
la región centro occidental del Brasil, que con una producción agrícola - forestal
destinada principalmente a la exportación, los cursos fluviales le significan una salida
marítima más competitiva que los corredores terrestres hacia los puertos brasileños
del Atlántico.
A su vez, Argentina y Uruguay gozan de una ubicación geopolítica estratégica
como "puertas de ingreso" a los territorios de la Cuenca del Plata, con sus dos puertos
ultra marinos históricamente competitivos: Buenos Aires y Montevideo.
La localización geográfica de los territorios interconectados fluvialmente por los
ríos Paraná, Paraguay y Uruguay, determina una gran diversidad de paisajes y
ambientes naturales, dentro de los que se incluye el Bioma Pampa y cuya
especialización productiva se fue construyendo a partir de la valorización de los
recursos naturales que a lo largo de los distintos períodos históricos fueron articulando
los territorios de la cuenca al sistema capitalista internacional.
a)
Extensividad, lo que permite disponer de enormes extensiones de
espacio físico para maximizar la producción de commodities con el soporte tecnológico
que la sustenta, convirtiendo los paisajes pampeanos, mesopotámicos, chaqueños,
pantanalenses y matto grossenses en tecnosistemas monoproductivos.
10
b)
Compacticidad, o sea la conformación de territorios compactos,
promoviendo la eliminación de escotaduras fronterizas que impidan poner en práctica
la extensividad. En este sentido los territorios del Cono Sur se presentan permeables
desde el punto de vista político, institucional e ideológico al capital transnacional
inversor.
Las décadas de los años 70 al 90 del siglo pasado se caracterizaron, desde el
punto de vista político por la sucesión de gobiernos cuyas políticas económicas
consolidaron el modelo neoliberal emergente del denominado Consenso de
Washington, lo que Ramonet (1998) denominó imposición de los regímenes
“globalitarios”, identificando como tales, a aquellos gobiernos que impulsaron los
dogmas del libre mercado y que subordinaron las economías, las sociedades y las
culturas
nacionales
a
la
razón
competitiva
de
los
mercados
financieros
transnacionales.
Las Geografías resultantes en el Cono Sur se consolidaron en torno a tres
premisas económicas básicas señaladas por Vilas (2008) : a) que era necesario
promover la inversión extranjera para que los países de la región alcanzaran el
crecimiento económico sostenido, b) que para atraer las inversiones era necesario la
más amplia apertura de los mercados internos y c) que se debían efectuar las
reformas institucionales que levantaran restricciones, subsidios y regulaciones por
parte de los estados nacionales que fueran de competencia desleal al capital.
Svampa (2011) por su parte sostiene que el neoliberalismo se impuso en los
territorios a través de reformas estructurales que acentuaron las brechas políticas,
económicas, sociales y culturales, generando una redistribución del poder social,
desfavoreciendo a los sectores populares y a las clases medias al concentrarse el
poder en élites económicas internacionales.
Se podría definir que los territorios resultantes y que dibujan la Geografía del
Cono Sur se sostienen en a) la generalización de un modelo extractivo- exportador, b)
la degradación ambiental y c) la extranjerización de la tierra y sus consecuencias tanto
a nivel rural como urbano.
En el transcurso de la primera década del siglo XXI la geografía política
latinoamericana se ha ido modificando con el surgimiento y consolidación de nuevos
gobiernos electos democráticamente, que tienen como imagen objetivo alcanzar
escenarios sociales, económicos y políticos que, manteniendo las relaciones sociales
de producción y sin alterar las condiciones estructurales de distribución de la renta, en
los que se superen las consecuencias sociales, políticas e institucionales, producto de
la aplicación de las transformaciones neoliberales.
11
El actual patrón de acumulación del capital transnacional ha adicionado a la
inversión de capital en el sector financiero, el de la explotación de los tres recursos
naturales fundamentales en el mundo contemporáneo y que son los recursos hídricos,
edáficos y biogenéticos cuya extensión geográfica en la Cuenca del Plata presentan
calidad ambiental para hacer viable al modelo y una posibilidad de acumulación en los
que Harvey denominó en por desposesión. Los países del cono sur latinoamericano,
que han sido tradicionalmente exportadores de materias primas y alimentos, con una
fuerte especialización productiva de los territorios rurales, no han permanecido ajenos
al proceso de imposición de un modelo económico extractivo exportador a gran escala
territorial y con fuerte inversión de capitales transnacionales.
La división territorial del trabajo en materia agropecuaria se ha sustentado en
base a la disponibilidad y características cualitativas de los llamados recursos
naturales – tierras fértiles, accesibilidad hídrica y condiciones climáticas-, la extensión
geográfica y la posición estratégica. Los bienes ambientales y las diversas ofertas
ecosistémicas de los territorios del sur se han transformado, desde la lógica capitalista,
en las variables económicas de mayor rentabilidad. Principalmente la posibilidad de
extender la frontera agrícola a expensas de grandes extensiones ecosistémicas
nativas y la imposición de los agronegocios en los territorios rurales de los países de la
Cuenca del Plata es realizada bajo el impulso dado por mega corporaciones
trasnacionales. Las propuestas de infraestructura y equipamiento en el territorio van
jerarquizándolos en función de su potencialidad para articularse al mercado global
sucediéndose la sumatoria de propuestas de mega emprendimientos y mega obras.
La mayor limitante para alcanzar la sustentabilidad socio- ambiental territorial
sea la planteada por Petras (2002) cuando sostiene que la conquista ideológica más
relevante del neoliberalismo es la de que el modelo extractivo se impuso como un
sistema autoritario, convalidado por el proceso electoral para concretar las reformas
estructurales y aparentar ser tan solo un programa económico. A su vez sostiene que
para revertir los impactos políticos y sociales del neoliberalismo es necesario primero,
considerarlo como un proyecto político más amplio que un simple programa
económico que tuvo consecuencias sociales, pues desde ese lugar se desestima
como proyecto ideológico y como propuesta política. La adopción del modelo y sus
lógicas inherentes, tales como la permeabilidad política y cultural para adaptarse a la
innovación, la apertura a las inversiones del capital, producir para exportar,
incrementar los excedentes, especializar la producción de bienes alimentarios,
constituyen las bases promisorias para convertir las economías atrasadas de los
países del cono sur latinoamericano en “geografías ganadoras”. (Achkar et.al, 2008).
12
El develar la ideología que subyace a los discursos oficiales dominantes es
fundamental al momento de pensar el estatus epistemológico para la Geografía
ciencia en el Cono Sur de la región, pues obliga a la academia a definirse
políticamente en torno a qué geografía investigar, desde qué lugar ideológico hacerlo y
con qué finalidades producir conocimiento sobre los territorios.
El estatuto epistemológico para la Geografía en el Cono Sur
Entre la descripción, la explicación y la transformación de los fenómenos
geográficos, señalaba David Harvey (1985) "(…) la geografía histórica del capitalismo
ha de ser el objeto de nuestra teorización, y el materialismo histórico-geográfico el
método de investigación".
Por su parte Dalby (1990a, 1990b) propuso el desarrollo de una "teoría crítica
de la Geopolítica", que definió como "la investigación de cómo un conjunto particular
de prácticas llega a ser dominante y excluye otro conjunto de prácticas. En donde el
discurso convencional acepta las circunstancias actuales como dadas, 'naturalizadas',
una teoría crítica se plantea preguntas sobre cómo han llegado a ser tal cual son".
Siguiendo la tradición epistemológica socio- crítica con raíces en el Cono Sur
latinoamericano en la década de 1970, que tuvo en el 1º Congreso de Geografía en
Salto, Uruguay en 1973 y en Neuquén, Argentina el 1º Encuentro de Geografía
latinoamericana dos espacios referenciales para la definición de un estatuto científico
para la disciplina.
Ese movimiento intelectual, reunido en Neuquén, en el que participó Milton
Santos y Pierre George envió una ponencia, fue muy crítico con la investigación y la
enseñanza geográfica vigente en la región, a la que acusaba de “(…) no haber pasado
la fase de los estudios temáticos y parcializados exentos de cuantificación precisa y
por tanto con validez científica discutible…”1 Y proponían una refundación disciplinar
para “(…) que la investigación y la enseñanza geográfica y científica irrumpa como un
instrumento más en la transformación revolucionaria de la sociedad”.
En esa afirmación se encuentra el pilar ontológico del paradigma crítico, o sea
el involucramiento de quienes practican la investigación y la enseñanza geográfica en
la transformación radical de la sociedad.
Sostenía el Prof. Daniel Vidart (1967) sobre la construcción social del espacio,
“Los geógrafos lo descuidan a menudo. Consideran a las formas geoculturales –
espacios naturales, paisajes humanizados- en primer plano y a las sociedades, como
1
ANPG (1969)- Hacia Una Geografía Regional- Colección Nuestra Tierra, Nº 33. Montevideo, Uruguay.
13
un homogéneo telón de fondo. Esta visión es incorrecta, simplista y al final, falaz. El
espacio social señala que en las sociedades existen jerarquías, estratificaciones (…)
El espacio social salta las barreras geográficas, planetariza el orbe de las sociedades
globales. Aunque los separen miles de leguas comparten un mismo espacio los
dueños de los cafetales paulistas y los propietarios de la United Fruit del Caribe, y por
igual son integrantes del submundo de los explotados el pelado mexicano, el roto
chileno, el fellah de Egipto. Dicho espacio social, estructurado y dispuesto en
pirámides clasistas el geógrafo debe utilizarlo y descifrarlo, si se propone buscar en la
construcción de los paisajes humanizados los grupos sociales que sobrellevan el peso
de las penosas tareas musculares mal retribuidas, si califica debidamente la condición
clasista de los grandes balnearios de lujo, si descubre en las configuraciones de la
ecología humana, en su sentido de localización espacial, de los grupos provocadas
por la “acción competitiva” como se llama eufemísticamente por los sociólogos de USA
a la lucha de clases”.
Desde
esos
antecedentes
lejanos
en
el
tiempo
pero
aún
válidos
ontológicamente, se propusieron que el geógrafo como investigador y como docente
debe posicionarse socialmente en forma comprometida para lograr transformaciones
sociales, económicas y políticas de tipo estructural, o de lo contrario, seguirá
contribuyendo con el mantenimiento del orden instituido. “Para la geografía radical, los
geógrafos no son pues espectadores neutrales de la sociedad en la que viven. Debido
a la posición social que tienen de hecho o la que reivindican, su geografía está influida
por dimensiones personales. Estas dimensiones personales guían la elección de sus
temas de investigación y las formas de expresión que adoptan; están inspiradas por
opciones fundamentales que no vienen impuestas por la práctica de la disciplina, sino
por adhesiones más o menos explicitas o críticas a tal o cual gran sistema de
pensamiento”. (Herin, 1992)
Los geógrafos y profesores de Geografía deberían adoptar a los territorios
como categoría analítica, entendiendo a estos como configuraciones espaciales a
distintas escalas producto de la interrelación de diferentes actores políticos,
institucionales, sociales, económicos, que operan a partir de diferentes proyectos de
desarrollo a escala local, regional, global.
Las finalidades para la investigación y la docencia geográficas podrían
delimitarse a partir de los siguientes ejes estructurantes:
-
Interpretar las complejas configuraciones de los territorios y reconocer la
interrelación dinámica de diferentes actores que intervienen en su configuración.
14
-
Asociar las relaciones existentes entre las estructuras y dinámicas
territoriales locales, articuladas a dinámicas regionales, nacionales y globales, para
comprender los factores que las favorecen y las impulsan.
-
Abordar la estructura y dinámica de la Biosfera para comprender la
manifestación de los ciclos biogeoquímicos en los territorios y cómo las actividades
antrópicas se articulan e inciden en los mismos (Impactos Ambientales).
-
Estudiar los impactos que las sociedades introducen en los sistemas
ambientales y sus manifestaciones territoriales para comprender cómo los efectos
“naturales” sobre la sociedad son producto de factores y procesos complejos en los
que diferentes agentes intervienen con responsabilidades diferenciales.
-
Abordar los procesos, modelos y funciones de los asentamientos
humanos a los efectos de identificar las características ambientales que afectan
diferencialmente a los agentes sociales y cómo éstos construyen diferencialmente
ambientes y territorios.
Para finalizar, la pregunta efectuada al inicio ¿para quién producir Geografías?
se responderá apelando a dos profesores de Geografía uruguayos pioneros en la
construcción del pensamiento geográfico crítico en el Cono Sur, los profesores Eliseo
Salvador Porta y Pablo Fierro Vignoli, quienes en nombre de la Sala de Geografía de
Paysandú, exponían en el Primer Congreso de Profesores de la asignatura (1967) la
comunicación El profesor e investigador de Ciencias Geográficas ante los problemas
de Uruguay y América Latina, en la que se preguntaban ¿qué papel cabe al profesor
de Geografía?, y respondían a ella de manera categórica “(…) Ningún profesor como
el de Geografía puede tentar la urgente aventura de despertar conciencia de los
problemas latinoamericanos, crear un espíritu crítico, combatir el subdesarrollo de
mentes (…) y para ello debe documentarse en forma seria y con la mejor bibliografía,
(…) tenemos aquí en Uruguay, nosotros los docentes, una estupenda arma de
transformación; podemos educar, podemos hacer que los problemas se conozcan y se
sientan. (…) Queremos un curso comprometido como deseamos un profesor
comprometido. Comprometido primero en lealtad a los patrones internacionales del
saber y en lealtad a su pueblo, comprometido en crear dentro de su clase un espíritu
de tolerancia y de comprensión crítica de la realidad geográfica en la que está inmerso
para poder interpretarla, comprenderla para como ciudadano, transformarla.
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17
EJE 1- TERRITORIOS URBANOS Y RURALES
18
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL
19
TRANSIÇÃO AGROECOLÓGICA: AS VIVÊNCIAS DOS AGRICULTORES
FAMILIARES CAMPONESES NO MUNICÍPIO DE AGUDO/RS
Valquiria Conti – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Carmen Rejane Flores Wizniewsky – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Palavras-chave: Agroecologia, estratégias, sustentabilidade, unidade de produção
familiar, Agudo/RS.
Resumo: A presente pesquisa tem o intuito de fazer uma reflexão sobre a busca da
sustentabilidade através da agroecologia. Como objetivo geral pretende-se
compreender como os agricultores do município de Agudo optaram pela produção
agroecológica. Mais especificamente, busca-se conhecer as estratégias de produção
agroecológica nas unidades de produção familiar em questão e caracterizar o viver e o
produzir destes agricultores. Com o uso de entrevistas semiestruturadas, foi possível
perceber que tal transição parte de uma necessidade do agricultor familiar camponês,
em utilizar um modelo agrícola que não cause danos a sua saúde e a do consumidor.
A agricultura agroecológica é praticada, de modo geral, há dois anos no município e
está obtendo êxito na produção.
Introdução
A presente pesquisa busca a reflexão sobre a sustentabilidade através da
agroecologia no que tange os aspectos ecológicos, econômicos e socioculturais. Tal
estudo tem como temática central a transição da agricultura convencional para a
agricultura agroecológica, no município de Agudo, localizado na região Central do
estado do Rio Grande do Sul.
A agroecologia surge, segundo Gomes (1999), como a construção de um novo
paradigma, o qual representa uma ruptura do modelo produtivista baseado na
Revolução Verde e uma orientação na produção e na circulação do conhecimento na
agricultura. A Revolução Verde, segundo Martins (1999), surge no espaço rural
brasileiro em meados dos anos 1960 e 1970, trazendo consigo a industrialização rural
na forma de pacotes tecnológicos, os quais, incentivaram a monocultura em larga
escala e a produção de commodities para a exportação.
Além da produção em larga escala, a introdução de culturas geneticamente
modificadas e hibridas, o intenso uso de agrotóxicos e insumos, bem como o emprego
de maquinas agrícolas, resultam no empobrecimento e exclusão de um numero
importante de famílias de agricultores. Empobrecimento este não apenas no âmbito
econômico, mas também cultural, pois durante este processo, numerosos saberes,
técnicas e culturas tradicionais deram espaço ao saber e as culturas produzidas e
20
comercializadas por industrias sementeiras. Neste sentido, a soberania alimentar dos
povos se viu também ameaçada, uma vez que as unidades de produção familiar foram
se introduzindo no modelo de modernização.
Tendo em vista a dicotomia entre a modernização da agricultura no contexto da
agroecologia, a presente pesquisa, faz uma caracterização das vivências dos
agricultores em transição agroecológica no município de Agudo, Rio Grande do Sul.
A problemática atenta-se a compreender os principais aspectos que levaram os
sujeitos da pesquisa a optarem pela agroecologia. Como objetivo geral, pretende-se
compreender como os agricultores em questão optaram pela produção agroecológica.
Mais especificamente busca-se conhecer as estratégias de produção agroecológica
nas unidades de produção familiar em questão; e caracterizar o viver e o produzir
destes agricultores.
Quanto aos aspectos metodológicos, a pesquisa utiliza uma abordagem
qualitativa, buscando compreender o fator motivador de se de esta opção pela
agroecologia. Tal abordagem deve ser ressaltada, diante as dificuldades e essencial
contribuição para a verificação, análise e diagnóstico referente à temática abordada.
Foram elaboradas entrevistas semiestruturadas, as quais, conduziram a
conversa com informantes chave, previamente identificados pelo extensionista do
escritório da EMATER/RS de Agudo. Durante o trabalho de campo, realizado nas
unidades de produção familiar em transição agroecológica do município de Agudo,
além das entrevistas, foram utilizadas técnicas como a observação sistemática e o
caderno de campo. Para citar a fala dos agricultores no texto, fora utilizada a
abreviação AFC (Agricultor Familiar Camponês) e o respectivo número da ordem de
sua entrevista.
Reflexões conceituais
Agricultura familiar camponesa
Há uma diversidade de entendimentos acerca do espaço rural, que se explica
em parte, pelas diferentes formas de ocupação do território, ligadas ao tempo, espaço
e culturas. Dessa forma, a delimitação do espaço rural se caracteriza, em alguns
casos, por um núcleo que agrupa moradias, instituições públicas e privadas ligadas ao
lugar. Em outros casos há maior complexidade em delimitar o espaço rural, devido a
dispersão das residências. Independente das delimitações, ambos possuem algo em
comum: o agricultor. Tal sujeito se insere como personagem principal no espaço rural
(WANDERLEY, 2000).
21
De modo mais recente, as transformações que tangem o rural, estão ligadas a
fatores externos, como as relações políticas e econômicas, em um mundo no qual a
globalização da economia avança, trazendo consigo empresas transnacionais que
remoldam o campo; e internos, no qual o processo de mudança no espaço rural
abarca em uma complementariedade deste para o urbano (WANDERLEY, 2000).
Do ponto de vista teórico, segundo Wanderley (2003), há uma dificuldade em
atribuir valor conceitual à categoria agricultura familiar no Brasil. Com a implantação
do PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), a
conceituação de agricultura familiar acabou se confundindo com a definição usada por
este programa de créditos. Outros autores defendem que a agricultura familiar
corresponde a uma categoria de agricultores que se moldaram em relação a
modernização da agricultura, adequando-se as exigências do mercado.
Inegavelmente, há um processo de mudança profunda no meio rural brasileiro,
a qual afeta precisamente as vivências dos agricultores e, em por vezes, a lógica
familiar. Porém, para muitos agricultores, a lógica imposta pela modernização da
agricultura não se introduz de forma completa na unidade de produção familiar, visto
que não reproduz o modelo de empresa capitalista, e sim, o modelo familiar. Mesmo
integrada ao mercado, o fato de permanecer familiar evidencia a origem camponesa
de sua evolução (WANDERLEY, 2003)
Wanderley (1996) em sua obra nos traz o termo agricultor familiar camponês,
ou agricultura camponesa que pode ser entendida como
Uma das formas sociais de agricultura familiar, uma vez que ela se
funda sobre a relação entre propriedade, trabalho e família. No
entanto, ela tem particularidades que a especificam no interior do
conjunto maior da agricultura familiar e que dizem respeito aos
objetivos da atividade econômica, às experiências de sociabilidade e
à forma de sua inserção na sociedade global. (WANDERLEY, 1996,
p.3)
É dentro desta perspectiva que se centra esta pesquisa, visto a identificação do
conceito com os agricultores de Agudo, mais especificamente, os que estão passando
por uma transição agroecológica. Contudo, a concepção de agricultura familiar
camponesa, vai além da relação propriedade, trabalho e família, ligada aos saberes
sociais e a identificação com o lugar e com a agricultura.
Na caracterização dos estabelecimentos rurais, Wanderley (1996), trata a
agricultura familiar camponesa como uma atividade que se caracteriza pelo cultivo da
terra nas unidades de produção familiar, utilizando-se de mão de obra familiar. Outra
característica importante é o uso de saberes sociais a diversificação da produção, o
22
que auxilia na diminuição de gastos com alimentos, os quais podem ser cultivados
pela família, e se aproveita do ambiente que o circunda para suprir suas
necessidades.
A modernização do campo
Desde os primeiros tempos da civilização, a agricultura é a principal forma de
interação do homem com a natureza, tal interação resultou em impactos, os quais se
intensificaram nos últimos anos com o advento do desenvolvimento rural. Para Lima
(2003), a necessidade do aumento na produção de alimentos, fibra e riqueza, resultou
na criação, aperfeiçoamento e adaptação de maquinas e implementos que auxiliassem
a transformar o campo em prol do benefício econômico.
No século XX, houve um avanço considerável das tecnologias ligadas a
agricultura, bem como um avanço nos impactos ambientais dela resultantes. O ideário
vigente se referia a limitação que os agricultores possuíam em produzir alimentos,
necessitando assim, de insumos químicos e maquinários para desenvolver a sua
produção.
A evolução e a estrutura rural na década de 1970 no Brasil, reflete um setor
industrial, produtor de bens voltado a agricultura. Marafon et al (2012, p.4) explica que
“paralelamente à implantação desse setor ocorreu a modernização de um mercado
para os produtos industriais do sistema agroindustrial fruto de modificações
significativas na forma de se produzir”. Graziano da Silva (1999) se refere a esta fase
denominando que estava assentada no tripé indústria - agricultura – agroindústria,
sendo constituído nesta época os complexos agroindustriais, ligado a modernização
da agricultura.
Assim, a agricultura está cada vez mais subordinada à indústria, que dita as
regras de produção, tornando o agricultor cada vez mais dependendo do capital.
Sobre essa questão, Gonçalves Neto (1997, p. 78), ressalta que “a década de 1970 foi
impulsionada por uma política de créditos facilitados, e que a agricultura brasileira, não
apenas respondeu às demandas da economia, mas foi profundamente alterada em
sua base produtiva”. Nesse sentido, o maciço crescimento do uso da tecnologia
mecânica, de agrotóxicos e adubos, a assistência técnica, êxodo rural, nos permite
afirmar que o campo brasileiro mudou.
Segundo
Hespanhol
(2008),
a
modernização
da
agricultura
e
o
estabelecimento da Política Agrícola Comum (PAC), contribuem em uma gama de
países que necessitavam importar alimentos. Para Hespanhol (2008, p. 372) “tais
países, não apenas se tornaram autossuficientes, como se converteram a
23
exportadores líquidos de produtos agrícolas a partir dos anos de 1980”. Em
contraponto a estas vantagens, o autor afirma que os problemas ambientais
decorrentes desta modernização são preocupantes. A qualidade ambiental de vastas
áreas, foram comprometidas com a expansão de monoculturas e o uso indiscriminado
de máquinas, implementos, fertilizantes químicos e de biocidas, (HESPANHOL, 2008).
Além dos problemas ambientais, os problemas sociais promulgados pelo
modelo produtivista da agricultura moderna, não proporcionou a superação da pobreza
nas zonais rurais, nem proporcionou a melhoria da qualidade de vida. Tal forma de
agricultura também não levou a erradicação da problemática da fome no mundo,
apesar de ter ampliado a oferta de alimentos, os problemas de distribuição se
perduraram e até se agravaram, (HESPANHOL, 2008)
Para Hespanhol (2008), tal modernização, associada ao modelo de
desenvolvimento produtivista, passou a ser contestada nos anos de 1970 e 1980,
surgindo assim, “novas abordagens, nas quais tem se valorizado as potencialidades
locais, a diversidade, o meio ambiente bem como envolver os atores sociais nos
projetos de desenvolvimento. ” Hespanhol (2008, p. 371).
Todavia, voltar ao modelo agrícola anterior a agricultura moderna seria,
segundo Gaiovicz e Saquect (2006) “um retrocesso na revolução tecnológica”. No
entanto, é necessário buscar alternativas que amenizem os impactos causados por tal
modernização. Assim, a agroecologia surge como a solução para a pratica de um
desenvolvimento rural sustentável que beneficie igualmente a todos, não apenas no
aspecto econômico.
Agricultura Agroecológica
Frente aos problemas ambientais, sociais e econômicos, provocados pela
agricultura modernizadora, a agroecologia eclode com o intuito de socializar com os
agricultores alternativas ecológicas. Assim, Gliessman (2000, p. 54) define a
agroecologia em um primeiro momento como um “importante representante do
processo de princípios ecológicos no desenho e manejo de agroecossistemas
sustentáveis”.
Em uma visão voltada para os aspectos socioculturais é aprofundada por
Sevilla Guzmán (2002). Este autor, traz a ideia que há a necessidade de a
organização agroecológica partir de dentro da comunidade ou unidade de produção.
Assim, percebe-se a necessidade da valoração da cultura local, da identidade da
comunidade, indo de encontro com o modelo desenvolvimentista da agricultura
moderna.
24
Todavia, Sevilla Guzmán (2002) e Caporal e Costabeber (2004) reconhece
algumas limitações pelas quais a prática agroecológica tem enfrentado, tais como a
supervalorização dos aspectos técnicos, a pouca inclusão de questões socioculturais,
e uma visão voltada a questões estritamente agronômicas, tem gerado o que Sevilla
Guzmán chamou de agroecologia restrita.
Assim, a produção de produtos orgânicos, que seguem esta lógica, se destina
à exportação ou a uma pequena parcela da população que possa pagar por este alto
custo. Neste viés, os produtos orgânicos não contribuem para a segurança alimentar
dos povos, principalmente das massas marginalizadas pelo sistema capitalista, uma
vez que estas são as mais vulneráveis frente a questão alimentar, e os orgânicos
ainda são ofertados no mercado a preços muito distantes da maior parte da
população.
É possível perceber que a produção orgânica é diferente da agricultura
agroecológica. Podemos classifica-la de duas formas, uma, que se aproxima dos
nichos de mercado, das parcelas corporativas da produção em larga escala; a outra, é
de caráter político e cultural, focada na preservação da saúde, do ambiente, buscando
a autonomia e a soberania alimentar.
Os sujeitos da presente pesquisa se adequam a esta última denominação, uma
vez que, mesmo estando no estágio inicial de transição agroecológica, pretendem,
segundo o relato do representante do escritório da EMATER/ASCAR, de forma
progressiva, melhorar e adaptar o modo de produzir, a ponto de serem considerados
agroecológicos.
A transição agroecológica é uma construção social que surge da compreensão
das limitações e os riscos existentes no atual modelo hegemônico. Tal transição cria
alternativas que apoiam o processo de transformação da agricultura, com enfoque
sustentável. Altieri (1998) e Gliessman (2000), abordam o processo de transição
agroecológica, o qual se dá de forma gradual, contínua e multilinear. Os autores
dissertam sobre a complexidade desta transição, visto que cada agricultor possui uma
realidade específica e vivencia graus diferentes de transição. Assim, foram delimitados
três níveis fundamentais do processo de transição agroecológica, do mais simples ao
mais complexo, sendo eles: o menor uso de insumos, a substituição de insumos até
chegar ao redesenho do agroecossistema. O agroecossistema é redesenhado com o
intuito de buscar níveis de maior sustentabilidade.
Esta transição, para Costabeber (2006) é um processo gradual de
modificações nas formas de manejo dos agroecossistemas utilizados pelos
agricultores. É importante que o processo seja construído com o uso dos saberes dos
agricultores, bem como, com o auxílio de extensionistas ou educadores da área. As
25
consequências do processo de transição são a preservação do meio ambiente, a
redução do custo de produção, o uso de produtos com maior qualidade nutricional e
com redução ou ausência de químicos.
Esta nova forma de agricultura não requer apenas uma substituição de
insumos e técnicas, requer também uma mudança de valores, práticas e ideias de
quem se compromete a praticá-la, em relação ao manejo dos recursos disponíveis
(COSTABEBER, 2006). O processo de transição não deve ser compreendido como
retrocesso, e sim como um caminho rumo ao desenvolvimento rural sustentável.
Resultados parciais
O município de Agudo está localizado na região central do estado do Rio
Grande do Sul. Sua população é de 17.161 habitantes segundo o senso do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2010), sendo que destes, 7.723 residem
no meio urbano e 9.438 residem no campo. Seus limites municipais são ao norte com
Ibarama e Lagoa Bonita do Sul, a leste com Paraíso do Sul e Cerro Branco, a sul com
Restinga Seca, a oeste com Dona Francisca e Nova Palma, como pode ser observado
na Figura 1.
A base econômica do município está centrada na agropecuáia, suplementada
com atividades industriais as quais, subsidiam as relações comerciais. É a agricultura
que movimenta a economia local, tendo na fumicultura e na orizicultura a principal
fonte de renda para o município. Nos últimos anos, alguns agricultores do município,
vêm produzindo outra forma de agricultura, a qual não agride o ambiente e possui
características sustentáveis: a agricultura agroecológica.
Estes agricultores, possuem características heterogêneas quanto a sua
produção. Cultivam em suas unidades de produção familiar, cultivos como banana,
laranja, morangos, arroz, soja, cana de açúcar, e verduras. Vale ressaltar que todas
essas culturas se enquadram no primeiro e segundo níveis de transição
agroecológica,
defendidos
por
Altieri
(1998)
e Gliessman (2000),
referidos
anteriormente.
26
Figura 1: Mapa de localização do município de Agudo. Fonte: IBGE, 2010
Se heterogêneas são suas culturas, semelhantes foram suas motivações a
parar de produzir de forma convencional. Segundo relatos dos sujeitos da pesquisa, a
questão norteadora para esta mudança está pautada na saúde humana. De modo
geral, todos os agricultores foram diagnosticados com patologias possivelmente
relacionadas ao uso de agroquímicos. Sintomas como estado depressivo, dores de
cabeça constantes, náuseas, alergias, foram citados pelos sujeitos da pesquisa como
constantes, antes da transição agroecológica. Além da preocupação com a saúde da
família, sempre houve a inquietação com a saúde do consumidor de seus produtos,
como pode ser percebido na fala do agricultor (AFC 2).
27
Se nós passamos mal e ficamos doentes só mexendo nos venenos,
imagina quem come isso todos os dias? Se faz mal só de encostar na
pele, imagina dentro do estômago? Foi pensando nisso que conversei
com meu marido e decidimos parar de usar veneno, todos estávamos
doentes e ajudávamos outras pessoas a adoecer com o que
produzíamos (AFC 2 – Trabalho de campo, junho de 2015).
Outro fator motivacional está nos cuidados com o ambiente, todos os
agricultores possuem conhecimento das consequências danosas do modelo agrícola
vigente para com o ambiente. Sendo assim, além de utilizar pouco ou nenhum químico
em sua produção, esses agricultores, preservam a maioria das plantas e animais
existentes em suas unidades de produção familiar, utilizando as características
benéficas que esses podem oferecer, e repelindo, de forma natural, os organismos
que ainda não forma adequados no agroecossistema.
A produção é desenvolvida com a mão de obra familiar. Em média os
agricultores utilizam um hectare para a prática agroecológica. Dentre as unidades de
produção, algumas são utilizadas apenas para o plantio de forma agroecológica, já em
outras, o plantio livre de agrotóxicos ocupa parcelas de terra próximas às do plantio
convencional. Segundo entrevistas, a área destinada a produção agroecológica varia
de 300 metros a quatro hectares.
No que se refere as técnicas utilizadas pelos agricultores, estes recebem o
auxílio de extensionistas do escritório da EMATER/RS, os quais esclarecem os
questionamentos acerca da produção agroecológica. Vale ressaltar que o auxílio
destes extensionistas é fator determinante para esta transição, uma vez que eles dão
o suporte para que os sujeitos da pesquisa consigam progredir na transição.
Além
do
uso
do
conhecimento
transmitido
pelos
extensionistas
da
EMATER/RS, o uso de saberes geracionais também se faz presente na vida destes
agricultores. A reprodução destes saberes é percebida nas práticas cotidianas, como
na lavoura, nos serviços domésticos, bem como no uso de ervas medicinais.
Nas unidades de produção familiar o uso de maquinário se faz restrito, são
utilizados apenas tratores para o preparo do solo. No que se refere ao uso de
agroquímicos, alguns agricultores ainda fazem o uso de adubos químicos e/ou
pesticidas quando não conseguem repelir insetos como a lagarta do cartucho,
Spodoptera frugiperda, e o pulgão do milho Rhopalosiphum maidis, ou o pulgão da
couve, Brevicóryne brássicae. Em geral, os agricultores usam adubos orgânicos,
produzidos na unidade de produção familiar e outros adquiridos no comércio.
O manejo do solo é realizado com adubação verde, uso de plantas
recuperadoras de solo, consórcio de plantas e pó de rocha, os quais auxiliam na
fertilidade do solo. Os insetos são repelidos das culturas com o uso de plantas
28
praguicidas, estas com forte odor, que afasta os insetos; e compostos orgânicos que
podem ser produzidos na unidade de produção familiar.
Os agricultores apontam algumas dificuldades na produção agroecológica,
relacionados ao acesso a determinadas mudas para o cultivo de algumas variedades,
como é o caso do morango (fragaria vesca), cuja muda é importada do Chile. O
acesso a adubos de origem orgânica e o alto preço de alguns produtos orgânicos
também estão dentro das desvantagens destacadas pelos sujeitos da pesquisa.
A colheita é feita conforme a cultura. Além do autoconsumo, a comercialização
ocorre diretamente ao consumidor, sendo comercializada em feiras, na rua, nas casas
dos consumidores, na casa dos agricultores, abastecem também restaurantes, bares e
supermercados. De modo geral, a produção é comercializada dentro do município.
Conclusões
Frente aos resultados já obtidos, é possível fazer uma reflexão no que tange os
aspectos ecológicos, econômicos e socioculturais da pesquisa. A transição
agroecológica, para os familiares camponeses no município de Agudo têm auxiliado
estes sujeitos a mudar seus hábitos e construir novas vivências. Práticas de cuidado e
conservação dos recursos naturais, se tornaram corriqueiros ao passo que os sujeitos
da pesquisa se ascendem na transição. Cuidados com a saúde, uso de ervas
medicinais e saberes geracionais em seus hábitos diários são aspectos retomados por
estes agricultores familiares camponeses.
No que se refere a questão econômica, há a valorização dos produtos
comercializados pelos agricultores, os quais são vendidos a preços acessíveis. Tal
iniciativa garante que mais pessoas tenham acesso a alimentos de qualidade, bem
como favorece e incentiva os agricultores a seguir na produção de alimentos livres de
agrotóxicos e insumos químicos.
Dado o exposto, é possível afirmar que a transição agroecológica é um sistema
vantajoso para os agricultores familiares camponeses de Agudo. É perceptível a
mudança benéfica que existe no viver destes agricultores, uma vez que isso é
constatado em suas falas. Para estes agricultores, a continuação da produção é
almejada, visto que eles se identificam e se completam com o que estão fazendo.
Quando questionados sobre as perspectivas futuras, a resposta unanime foi a
continuação progressiva deste processo de agricultura agroecológica, com o intuito de
aumentar seus conhecimentos acerca da agroecologia, diversificar sua produção,
possuir maior autonomia frente a produção, e atingir a segurança alimentar na
propriedade.
29
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16 de março].
31
A IMPORTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA E CULTURAL DA PRODUÇÃO DO
QUEIJO CANASTRA – MINAS GERAIS – BRASIL
João Batista Villas Boas Simoncini – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Cesar De David – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
Este artigo tem como proposta demonstrar a importância socioeconômica e cultural da
produção do queijo Canastra2, considerado patrimônio cultural imaterial pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e pelo Instituo Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG). Sua produção pode ser
considerada um dos fatores de organização social, resistência cultural e de
manutenção e permanência dos produtores familiares no espaço rural da microrregião
da Canastra no Estado de Minas Gerais.
Palavras-chave: Queijo Canastra; patrimônio imaterial; produção familiar.
Objetivo
Demonstrar a importância social, econômica e cultural da produção do queijo
Canastra.
Metodologia
Para estruturação do trabalho foram utilizados os dados dos censos
demográficos e dos censos agropecuários do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), de publicações de outros órgãos, instituições e associações, tais
como: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMPRAPA Gado de Leite),
Instituto de Laticínios Cândido Tostes (ILCT), Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER/MG), Instituto Mineiro de
Agropecuária (IMA), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN),
Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG),
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de Minas
Gerais (SEBRAE/MG), Associação dos Produtores de Queijo Canastra de Medeiros
(APROCAME) e Associação dos Produtores de Queijo Canastra (APROCAN).
2
O nome Canastra advém do grego kanastron, e do latim cannastrum, que significa recipiente, deve-se à
semelhança existente entre o imenso chapadão e um grande baú (mobiliário antigo e ainda utilizado), que
os antigos chamavam de canastra (NETTO, 2014).
32
INTRODUÇÃO
“[...] quando o mineiro parte, leva a
família, os animais, as sementes, a
saudade e um pedaço de queijo”.
Rocha, 1995, p. 2.
A produção e o consumo do queijo Canastra se confundem com a própria
história do povoamento local, iniciado no período colonial, onde se buscava minerais e
pedras preciosas.
Os relatos dos naturalistas que percorrem Minas Gerais entre o final do século
XVII e meados do século XIX descrevem detalhadamente os hábitos e costumes
alimentares dos habitantes das Minas Gerais. Saint-Hilaire (1975; 2004); Pohl (1976)
destacam que era comum a fabricação do queijo artesanal no século XIX e
mencionam o queijo como produto de expressão na alimentação e na economia.
Outros registros históricos descrevem que da formação dos primeiros rebanhos
utilizando a pastagem nativa de campo e as pastagens naturais existentes nas áreas
desmatadas, surgiu a necessidade da produção do queijo. O produto era consumido
pelas famílias e/ou comercializado junto aos tropeiros que passavam pela região e
distribuíam estes produtos para diversas comarcas. O processamento era rudimentar,
sendo o coalho natural, obtido da raspagem do estômago seco do tatu, porco ou do
bezerro macho. Como fermento láctico, usava-se o “pingo”, ou seja, o soro que
escorre do queijo no prazo de 12 a 24 horas, sendo que usualmente este “pingo” era
trocado entre os produtores de queijo. A produção era guardada em malas de couro
(bruacas ou buracas) e transportada em lombo de muares ou em carros de boi.
Naquela época, devido às dificuldades de transporte, o queijo chegava a ser
comercializado com 30 a 60 dias de maturação. (ALMEIDA; FERNANDES 2004).
Explica Meneses (2006) que a elaboração do queijo Canastra é estabelecida a
partir de leite cru, de uma tradição familiar e de uma economia local que o associa à
atividade fundamental da fazenda mineira típica. Complementa Almeida; Fernandes
(2004) que na região da Canastra a produção do queijo artesanal é um fator cultural
de significativa importância sócio-econômica para grande parte das famílias rurais. Em
toda a região é significativa a presença da agricultura familiar, com sua diversificação
de produtos e seu consequente envolvimento na atividade leiteira. É principalmente
dessa região que sai cerca de 4.470 toneladas/ano de queijo Canastra para abastecer
os mercados locais, regionais e estados vizinhos.
33
A produção de queijo Canastra nunca cessou, pois se trata de uma atividade
que se consolidou historicamente, pertence ao “modus vivendi” das famílias locais que
desde o início da ocupação dos campos da região viam na fabricação do queijo uma
alternativa segura de renda e de sobrevivência. (ALMEIDA; FERNANDES 2004).
As condições socioambientais da região onde é produzido o queijo Canastra,
segundo os autores supracitados, são favoráveis à sua produção. Isso se deve ao fato
do ambiente ser propício ao desenvolvimento de bactérias específicas do lugar, que
contribuem para o sabor característico do queijo Canastra.
Cabe destacar que o estabelecimento dos produtores familiares de queijo
Canastra e a da sua produção configuram a paisagem local, estabelecem na
população um sentimento de pertencimento ao lugar e uma identificação territorial3.
1 ASPECTOS GERAIS DA REGIÃO E DA PRODUÇÃO DO QUEIJO CANASTRA
A região onde é produzido o queijo Canastra pode ser visualizada no Mapa de
Localização da Microrregião da Canastra. Essa região localiza-se no sudoeste do
Estado de Minas Gerais, limitando-se ao norte/noroeste com a região do Triângulo
Mineiro, ao sul com a região do Lago de Furnas e a oeste com a região Centro-Oeste
de Minas.
3
Haesbaert (2007) salienta que não existe atualmente uma forma geral de identificação territorial, e que é
fundamental a contextualização histórico-geográfica de cada movimento de construção identitárioterritorial.
“A identidade territorial só se efetiva quando um referente espacial se torna elemento central para a ação
política do grupo, um espaço em que a apropriação é vista em primeiro lugar a partir da filiação territorial,
e onde tal filiação inclui o potencial de ser ativada, em diferentes momentos, como instrumento de
reivindicação política [...]”. (HAESBAERT, 2007, p. 45). “A identidade territorial sem dúvida toma por base
um contexto muito mais complexo do que a simples “paisagem”, imbricando fatores como a diferenciação
sócio-econômica e cultural dos espaços [...]”. (HAESBAERT, 2007, p. 46).
34
A região compõe junto com as demais o denominado Território do Queijo Minas
Artesanal (ver Mapa Território do Queijo Minas Artesanal). Para diferenciá-la foi
denominada e delimitada geograficamente de Microrregião da Canastra pelo Instituto
Mineiro de Agropecuária - IMA (2004) através da Portaria nº 694, de 17 de novembro
de 2004, que em seu Art. 1º determinar: “Fica identificada a microrregião da Canastra
como produtora do Queijo Minas Artesanal, composta pelos municípios de Bambuí,
Delfinópolis, Medeiros, Piumhi, São Roque de Minas, Tapiraí e Vargem Bonita” (IMA,
2004), (ver Mapa do Queijo Minas Artesanal Canastra).
Segundo Almeida; Fernandes (2004) as características agroclimáticas da
microrregião podem ser assim estabelecida: o clima caracterizado na área delimitada
é classificado como tropical de altitude, típico do cerrado, com temperatura média
anual em torno de 22,2 °C, com a média mínima de 16,7 ºC e a média máxima de 27,6
ºC, com chuvas distribuídas entre os meses de outubro a março, com índice
pluviométrico médio em torno de 1.390 mm anuais; a altitude varia de 637 a 1.485 m,
tendo um relevo com aproximadamente 25% de área plana, 40% de área ondulada e
35% de área montanhosa; a umidade do ar típica de cerrado, com inverno seco e
verão úmido, podendo ir de valores inferiores a 40% no inverno e superiores a 85% no
verão.
35
TERRITÓRIO DO QUEIJO MINAS ARTESANAL
Fonte: EMATER/MG.
Fonte: EMATER/MG.
Os autores destacam uma variação acentuada dos tipos de solos, dependendo
dos limites geográficos analisados. Ainda acrescentam que a região da Serra da
Canastra apresenta um grande potencial hidrológico em virtude da sua geomorfologia,
principalmente pelo fato da presença de escarpas rochosas. As águas emergentes de
formação de rochas quartzíticas apresentam-se, além de cristalinas, com oxigenação
36
propiciada por quedas d’água de diferentes dimensões. As condições favoráveis
relativa à qualidade da água, à vegetação tanto nativa (próprias de campos e
cerrados) quanto às espécies forrageiras exógenas cultivadas contribuem para as
características e a qualidade do queijo Canastra.
Complementando a descrição da região, faz-se necessário reconhecer
particularidades geoeconômicas e demográficas. Ao analisar os estratos da estrutura
fundiária4 dos municípios que compõem a microrregião da Canastra (Quadro I),
verifica-se um número expressivo de estabelecimentos em uma área inferior a 100 ha,
sendo acompanhado por estabelecimentos com área entre 100 ha e menos de 500 ha,
configurando uma estrutura que tem como base a pequena e média propriedade.
QUADRO I - ESTRUTURA FUNDIÁRIA DOS MUNICÍPIOS QUE COMPÕEM A
MICRORREGIÃO DA CANASTRA - 2010
Município
Extratos
Nº de Estab.
Área (ha)
0 a menos de 100 ha
1.079
34.347
100 a menos de 500 ha
182
34.760
Bambuí
Mais de 500 ha
23
17.785
Total
1.284
86.892
0 a menos de 100 ha
318
10.455
100 a menos de 500 ha
143
31.456
Delfinópolis
Mais de 500 ha
23
20.460
Total
484
62.371
0 a menos de 100 ha
402
15.220
100 a menos de 500 ha
163
31.956
Medeiros
Mais de 500 ha
14
6.688
Total
579
53.864
0 a menos de 100 ha
839
24.406
100 a menos de 500 ha
149
26.972
Piumhi
Mais de 500 ha
23
17.842
Total
1.011
69.220
0 a menos de 100 ha
557
23.885
São Roque de
100 a menos de 500 ha
207
40.896
Minas
Mais de 500 ha
11
6.777
Total
775
71.558
0 a menos de 100 ha
246
8.170
100 a menos de 500 ha
51
11.240
Tapiraí
Mais de 500 ha
7
3.604
Total
304
23.014
0 a menos de 100 ha
154
5.300
100 a menos de 500 ha
53
10.825
Vargem Bonita
Mais de 500 ha
7
3.878
Total
214
20.003
Fonte: IBGE, 2013 - Atlas do Censo Demográfico 2010. Elaboração: SIMONCINI, 2015.
4
A estrutura fundiária de qualquer município é estabelecida pelo Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária - INCRA através do módulo fiscal, delineando, assim, as dimensões do minifúndio, da
pequena, da média e da grande propriedade. A Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, dispõe, no
artigo 16, que a reforma agrária tem como objetivo estabelecer um sistema de relações entre o homem, a
propriedade rural e o uso da terra, possibilitando a promoção da justiça social, o progresso e o bem-estar
do trabalhador rural, bem como o desenvolvimento econômico do país, com a gradual extinção do
minifúndio e do latifúndio. (SIMONCINI, 2011).
37
Pode-se afirmar com base nos dados do Quadro II, que mais de 2/3 do total de
estabelecimentos rurais estão voltados para pecuária bovina e configuram-se como
pequenos e médios, seguindo a tendência do Quadro I.
QUADRO II - A PECUÁRIA NA MICRORREGIÃO DA CANASTRA
NÚMERO E ÁREA DOS ESTABELECIMENTOS
CONDIÇÃO DO PRODUTOR: PROPRIETÁRIO
Município
Extratos
Área (ha)
Nº de Estab. Nº de Estab. Área (ha)
(Percentua
(Unidades) (Percentual) (Unidades)
l)
Mais 0 a menos de 100 ha
780
58,31
24.789
24,18
De 100 a menos de 500 ha
149
11,13
28.085
27,39
De 500 a mais
TOTAL
13
942
0,97
70,41
11.165
64.039
10,89
62,46
Mais 0 a menos de 100 ha
262
54,13
8.710
13,96
De 100 a menos de 500 ha
120
24,8
26.677
43
De 500 a mais
TOTAL
18
400
3,72
82,65
15.665
51.052
25,11
82,07
Mais 0 a menos de 100 ha
297
51,22
11.176
18,18
De 100 a menos de 500 ha
120
20,69
21.319
34,67
De 500 a mais
TOTAL
5
422
0,86
72,77
1.840
34.335
2,99
55,84
Mais 0 a menos de 100 ha
381
37,53
11.383
15,66
De 100 a menos de 500 ha
71
7
11.154
15,36
TOTAL
4
456
0,40
44,93
X
22.537
X
31,02
Mais 0 a menos de 100 ha
417
53,75
17.594
24,59
São Roque de De 100 a menos de 500 ha
Minas
De 500 a mais
148
19,08
28.066
39,21
TOTAL
7
572
0,90
73,73
4.107
49.767
5,74
69,54
Mais 0 a menos de 100 ha
173
56,17
5.925
22,46
De 100 a menos de 500 ha
28
9,1
6.055
22,95
TOTAL
5
206
1,64
66,91
3.059
15.039
11,60
57,01
Mais 0 a menos de 100 ha
103
47,25
3.914
17,05
De 100 a menos de 500 ha
38
17,43
7.578
33,01
3
144
1,38
66,06
2.268
13.760
9,88
59,94
Bambuí
Delfinópolis
Medeiros
Piumhi
Tapiraí
Vargem
Bonita
De 500 a mais
De 500 a mais
De 500 a mais
TOTAL
Nota:
1 - Os dados das Unidades Territoriais com menos de 3 (três) informantes estão
desidentificados com o caracter X.
2 - A categoria Total inclui os estabelecimentos que declararam ter mais de
uma Condição legal das terras.
Fonte: IBGE - Censo Agropecuário 2006 - Elaboração: SIMONCINI, 2015.
38
De acordo com o “CADASTRO GEORREFERENCIADO DOS PRODUTORES
DE QUEIJO MINAS ARTESANAL DA REGIÃO DA SERRA DA CANASTRA5”, 73% da
área das propriedades rurais produtoras de queijo Canastra têm como extensão até
100 hectares, estando os outros 27% restante assim dividido: 101 a 200 (ha) 14%, 201
a 300 (ha) 4%, 301 a 500 (ha) 5% e 4% acima de 500 ha, reforçando assim, a
constatação efetuada sobre o Quadro II.
A partir desta constatação e tendo como base a Lei nº 11.326, de 24 de julho
de 20066 e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF
- pode-se dizer que a maioria dos produtores do queijo Canastra é classificada como
produtores familiares7.
Ao analisar e inter-relacionar os dados do IBGE (2002) organizados e expostos
nos Quadro III e IV, percebe-se que a população rural é mais significativa onde há
maior produção e número de produtores familiares de queijo Canastra. O que permite
inferir que a produção do queijo é responsável pela permanência de parte da
população destes municípios no campo. Como se pode observar no Quadro III, do
total de 75.613 habitantes, 14.481 vivem no meio rural, ou seja são quase 19,2% do
total, porém, desses 19,2% há municípios com maior expressividade de população
rural, é o caso de Vargem Bonita com 47%, Medeiros 43%, Tapiraí 42% e São Roque
de Minas 37%.
5
Pesquisa elaborada de julho de 2013 a abril de 2014 pelos pesquisadores Prof. Dr. Ronaldo Perez,
Alessandro Regino (agrônomo - UFV), e Cássio Geraldo Pinto (administrador de empresas - UFV) a
pedido do SICOOB - Saromcredi; SEBRAE/MG; APROCAN.
6
Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e
Empreendimentos Familiares Rurais.
7
Agricultores e produtores rurais familiares que compõem as unidades familiares de produção rural e que
comprovem seu enquadramento mediante apresentação da Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP)
válida, e:
a - explorem parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário, comodatário, parceiro ou
concessionário do Programa Nacional de Reforma Agrária, ou permissionário de áreas públicas; b residam na propriedade ou em local próximo; c - não disponham, a qualquer título, de área superior a
quatro módulos fiscais, contíguos ou não, quantificados segundo a legislação em vigor (este item não se
aplica quando se tratar de condomínio rural ou outras formas coletivas de propriedade, desde que a
fração ideal por proprietário não ultrapasse os quatro módulos fiscais); d - obtenham, no mínimo, 50% da
renda familiar da exploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento; e - tenham o trabalho
familiar como predominante na exploração do estabelecimento, utilizando apenas eventualmente o
trabalho assalariado, de acordo com as exigências sazonais da atividade agropecuária, podendo manter
empregados permanentes em número menor que o número de pessoas da família ocupadas com o
empreendimento familiar - exceto na Linha PRONAF Microcrédito (Grupo “B”), em que não se admite a
manutenção de qualquer empregado assalariado, em caráter permanente; f - tenham obtido renda bruta
anual familiar de até R$ 360 mil nos últimos 12 meses que antecedem a solicitação da DAP,
considerando neste limite a soma de todo o Valor Bruto de Produção (VBP), 100% do valor da receita
recebida de entidade integradora e das demais rendas provenientes de atividades desenvolvidas no
estabelecimento e fora dele, recebidas por qualquer componente familiar, exceto os benefícios sociais e
os proventos previdenciários decorrentes de atividades rurais. (BNDES, 2015).
39
QUADRO III - POPULAÇÃO URBANA E RURAL DOS MUNICÍPIOS PRODUTORES DO
QUEIJO CANASTRA - 2010
2
Município
Área (Km )
Pop. Urbana
%
Pop. Rural
%
Bambuí
1.457
19.325
85
3.409
15
Delfinópolis
1.171
4.846 70,95
1.984
29,05
Medeiros
969
1.948
57
1.496
43
Piumhi
905
28.564
90
3.319
10
São Roque de
2.107
4.222
63
2.464
37
Minas
Tapiraí
434
1.085
58
788
42
Vargem Bonita
409
1.142
53
1.021
47
Total
7.452
61.132
14.481
Fonte: IBGE, 2013 - Atlas do Censo Demográfico 2010. Elaboração: SIMONCINI, 2015.
QUADRO IV - MUNICÍPIOS, PROPRIEDADES RURAIS, PRODUTORES E PRODUÇÃO
ANUAL DO QUEIJO CANASTRA
Municípios
Prop. Rurais (Nº) Produtor de Queijo (Nº)
Queijo Prod. Ano (Ton.)
Bambuí
1.438
149
576
Delfinópolis
484
25
70
Medeiros
537
430
1.600
Piumhi
956
50
165
São Roque de
933
852
1.537
Minas
Tapiraí
258
89
162
Vargem Bonita
207
200
360
Total
4.813
1.795
4.470
Fonte: IBGE - Pesquisa da Pecuária Municipal - 2002. Elaboração: SIMONCINI, 2015.
Ao analisar os dados do Quadro IV percebe-se que nos município de Vargem
Bonita, São Roque de Minas e Medeiros o número de produtores familiares de queijo
Canastra é próximo do número de propriedades rurais. É justo nestes três municípios
que se verifica maior porcentagem da população rural, o maior número de produtores
e a maior quantidade de queijo produzido na microrregião.
O Quadro V a seguir indica o número de estabelecimentos agropecuários e
quantidade de leite produzida no de 2006.
QUADRO V - NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS AGROPECUÁRIOS E
QUANTIDADE DE LEITE PRODUZIDA - 2006
Número de estabelecimentos
agropecuários (Unidades)
Município
Total
Agric.
Agric. não
familiar - lei
familiar
11.326
Quantidade produzida (Litros)
Total
Bambuí
822
686
136
35.672.535
Delfinópolis
296
175
121
Medeiros
372
275
97
Piumhi
400
280
São Roque de
Minas
615
464
Agric. familiar Agric. não
- lei 11.326
familiar
20.665.225
15.007.310
15.360.692
6.193.761
9.166.931
20.608.165
12.753.990
7.854.175
120
22.048.809
8.873.155
13.175.654
151
30.747.511
18.089.502
12.658.009
40
Tapiraí
157
127
30
4.049.670
2.629.255
1.420.415
Vargem
Bonita
118
80
38
2.378.520
1.114.120
1.264.400
2.780
2.087
693 130.865.902
70.319.008
60.546.894
TOTAL
Fonte: IBGE - Censo Agropecuário - 2006. Elaboração: SIMONCINI, 2015.
Com base na análise de dados do Quadro V, pode-se confirmar que a pecuária
leiteira nos sete municípios que compõe a microrregião da Canastra é de base
familiar, sendo parte dessa produção direcionada aos laticínios, como é o caso dos
municípios de Bambuí, Delfinópolis e Piumhi.
A este quadro físico-natural e geoeconômico que configura a região da
Canastra somam-se os aspectos sócio-culturais que contribuíram e estabeleceram um
modo de fazer próprio na manipulação do leite, dos coalhos, das massas, das formas
de prensagem, da cura, e da tradição comercial. A esse modo de fazer acrescentamse formas de viver e significados atribuídos. (MENESES, 2006).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se afirmar que a produção do queijo Canastra contribui e fortalece o
modo de fazer, a tradição e os vínculos dos produtores familiares com o território. É a
sua produção/comercialização que garante renda e emprego, que possibilita a
permanência dos produtores no meio rural e contribui para o estabelecimento e
valorização dos saberes tradicionais. (SIMONCINI; DAVID, MACHADO, 2014).
Como patrimônio cultural imaterial, traz consigo todo um conhecimento incutido
na “arte de fazer”, passado de geração em geração, materializando-se no “saber
fazer”8 (elemento principal da caracterização de um terroir9). Ressalta-se que a sua
produção, ao constituir-se como um dos elementos que configuram a organização
social local, contribui com a geração de renda e emprego, funcionando como fator
econômico positivo não só em escala local, mas também regional e nacional.
Acrescenta-se a estes aspectos, o fato de que a produção do queijo Canastra contribui
para o estabelecimento e manutenção de questões simbólicas, responsáveis pela
8
Conhecimentos, aptidões e técnicas adquiridos individualmente ou por um grupo, através da
experiência.
9
O termo Terroir veio a ganhar conotação positiva nos últimos 60 anos, quando a valorização da
delimitação dos vinhedos nas denominações de origem de vinhos na França veio a balizar critérios
associados à qualidade de um vinho, incluindo o solo e a variedade, dentre outros. A palavra Terroir
passa a exprimir a interação entre o meio natural e os fatores humanos. E esse é um dos aspectos
essenciais do Terroir, de não abranger somente aspectos do meio natural (clima, solo, relevo), mas
também, de forma simultânea, os fatores humanos da produção - incluindo a escolha das variedades,
aspectos agronômicos e aspectos de elaboração dos produtos. Na verdade o Terroir é revelado pelo
homem através do saber-fazer local. O Terroir se opõe a tudo o que é uniformização, padronização,
estandardização e é convergente ao natural, ao que tem origem, ao que é original, ao típico, ao que tem
caráter distintivo e ao que é característico. (TONIETTO, 2007).
41
(re)produção cultural e, o mais importante, configura-se como possibilidade de
permanência dos produtores no meio rural.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Elmer Ferreira Luiz de; FERNANDES, Maurício Roberto. Caracterização
da microrregião da canastra como produtora do queijo minas artesanal. São
Roque de Minas, MG: EMATER/MG, 2004.
BNDES. Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - Pronaf
Investimento. Disponível: < http://www.bndes.gov.br/apoio/pronaf.html> - Acesso: 04
mai. 2015.
EMATER/MG. Queijo minas artesanal. Guia técnico para implantação de boas
práticas de fabricação em unidades de produção do queijo minas artesanal.
Disponível:
<http://www.emater.mg.gov.br/doc/intranet/upload/queijo_site/cartilha_queijo%202.pdf
> - Acesso: 27 jun. 2014.
HAESBAERT, Rogério. Identidades territoriais: entre a multiterritorialidade e a reclusão
territorial (ou: do hibridismo cultural à essencialização das identidades). In. ARAUJO,
Frederico Guilherme Bandeira de; HAESBAERT, Rogério. (Orgs.). Identidades e
territórios: questões e olhares contemporâneos. Autores: Amélia Cristina Alves
Bezerra... [et al.]. - Rio de Janeiro: Access, 2007. p.33-56.
INSTITUTO MINEIRO DE AGROPECUÁRIA - IMA. Portaria nº 694, de 17 de
novembro de 2004. Microrregião da Canastra. Belo Horizonte, 2004.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Atlas do censo
demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2013.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Censo
agropecuário 2006 - Agricultura Familiar - Primeiros Resultados - Brasil, Grandes
Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística; Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão, 2009.
MENESES, José Newton Coelho. Queijo Artesanal de Minas: patrimônio cultural do
Brasil. Brasília, DF: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN;
Ministério da Cultura, 2006.
NETTO, Marcos Mergarejo. A geografia do Queijo Minas Artesanal. Belo Horizonte,
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POHL, Johann Emanuel. Viagem no Interior do Brasil. Tradução de Milton Amado e
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Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1976. (Reconquista do Brasil, v.14).
ROCHA, Tião. (Org.). Afinal, o que é ser mineiro? Belo Horizonte: SESC/MG, 1995.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem às nascentes do Rio São Francisco.
Tradução: Regina Regis Junqueira. Prefácio: Mário Guimarães Ferri. 2. ed. Belo
Horizonte: Ed. Itatiaia, 2004. (Reconquista do Brasil, v.235).
42
______. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Tradução:
Vivaldi Wenceslau Moreira. Belo Horizonte: Editora Itatiaia; São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 1975.
SEBRAE. CADASTRO GEORREFERENCIADO DOS PRODUTORES DE QUEIJO
MINAS ARTESANAL DA REGIÃO DA SERRA DA CANASTRA. Coordenadores:
Ronaldo Perez, Alessandro Regino e Cássio Geraldo Pinto. Viçosa, MG: SEBRAE;
SICOOB Saromcredi; APROCAN, 2014.
SIMONCINI, João Batista Villas Boas; DAVID, Cesar De; MACHADO, Luciano
Carvalho. Queijo Canastra: bom, limpo e justo. In: ANAIS do Congresso Internacional
de Gastronomia - Mesa Tendências 2014. Conexão essencial: o produtor familiar e a
cozinha. Santo Amaro, SP: Centro Universitário Senac, 04 e 05 de Novembro de 2014.
p. 9-10.
SIMONCINI, João Batista Villas Boas. Produção alimentar no município de
Visconde do Rio Branco - MG. Rio Grande, RS: FURG, 2011. Dissertação de
Mestrado.
TONIETTO, Jorge. Afinal, o que é Terroir? Flores da Cunha, RS: Bon Vivant. v. 8, n.
98, p. 08, abr. 2007.
43
NOTAS SOBRE AGRONEGÓCIO DA SOJA NO BRASIL10
Leandro Jesus Maciel de Menezes – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Kelly Perlin Cassol - Universidade Federal de Santa Maria.
[email protected]
RESUMO
Ao longo das últimas cinco décadas é possível observar o expressivo aumento na
produção do cultivo de soja no Brasil, principalmente em termos econômicos e
comerciais. Diante deste fato, propõe-se, neste artigo, realizar uma breve discussão
teórica sobre o desenvolvimento desta atividade, mais especificamente pretende-se
tratar do sistema agroindustrial ligado a este cultivo e de que modo os grupos
empresariais atuam no financiamento da produção. Assim, inicialmente faz-se uma
discussão sobre o poder concentrador da atividade sojicultora, e, em seguida, buscase abordar as relações entre os produtores e os complexos agroindustriais que dão
suporte ao financiamento desta atividade.
Palavras-chave: Agronegócio. Soja. Agroindustrial. Concentração.
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento da sojicultora no Brasil tem sido observado ao longo das
últimas décadas e claramente pode-se notar uma expressiva expansão para todas as
regiões do país a partir da segunda metade da década de 1960. A produção de soja
tornou-se, em pouco tempo a principal atividade agrícola, tanto no que se refere à área
plantada como tambémno que se refere aos valores econômicos e sociais. Além disso,
destaca-se a forte integração da agricultura à indústria, que passa a ditar as regras de
produção, distribuição e comercialização.
A expansão desta atividade no Brasil se deve inicialmente ao incentivo do
11
Estado
através de políticas de crédito rural e também devido a investimentos do
setor privado, onde se destaca o financiamento da produção rural. Enquanto o setor
público incentiva a produção de uma das principais comodities exportadas pelo país, o
setor privado tem visível interesse na continuidade desta atividade devido a forte
utilização de insumos modernos que se articulam a produção e também devido ao
fornecimento desta matéria prima. Neste sentido, verifica-se que o cultivo da soja
encontra-se com os interesses do capital, transformando a cultura agrícola em
10
Este artigo foi apresentado na disciplina de Geografia do Cone Sul, ofertada no 1º semestre
de 2015 pelo Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa
Maria. Santa Maria – RS.
11
Destaca-se aqui que o período de 1964 a 1985 no Brasil, foi marcado por governos militares
que buscaram enquadrar a economia do país em um projeto globalizado.
44
agronegócio. Entende-se como agronegócio, o complexo espaço econômico onde
convergem investimentos econômicos transnacionais em todo conjunto das atividades
e setores ligados a produção, distribuição e comercialização dos produtos agrícolas
em escala global (ACHKAR, DOMÍNGUEZ e PESCE, 2008).
A soja em grãos representa grande parcela da exportação de commodities do
Brasil. De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
de 1990 até 2011, a quantidade produzida de soja em grão apresentou crescimento de
7,2%, da área colhida e de aumento de produtividade12. Dentre os grandes produtores
mundiais de soja (Estados Unidos, Brasil e Argentina), o Brasil é o que tem o maior
potencial de expansão da área cultivada (DALL'AGNOL et al., 2004). A soja em grão e
seus derivados, de acordo com Siqueira et al (2013) representam importante parcela
do mercado brasileiro de oleaginosas em produção, uso e comércio.
Neste contexto, é objetivo deste trabalho descrever e refletir teoricamente
sobre osistema agroindustrial da soja e aforma como tem se dado a aproximação
entre produtores e os grupos empresariais que atuam nofinanciamento da produção.
Inicialmente faz-se uma discussão sobre opoder concentrador que se encontra em
meio a atividade sojicultora, e, em seguida, trata-se das relações entre os produtores e
os complexos agroindustriais que dão suporte em termos de financiamento a esta
atividade.
A Concentração De Poder Em Meio À Atividade Sojicultora No Brasil
No decorrer da década de 1970, momento em que no Brasil ocorria uma forte
regulação estatal e que de forma intensa desencadeava a modernização agrícola, o
setor agroindustrial diretamente vinculado ao processamento da soja destacou-se num
cenário variado em termos de transformações produtivas pela dinamização que
apresentava. Nesse momento, ocorreram mudanças profundas na sua capacidade
instalada. Tratava-se, sobretudo, do aumento expressivo da capacidade das
agroindústrias esmagadoras13, por meio dos mecanismos de intervenção do Estado,
como os subsídios fiscais e creditícios. Com o financiamento e/ou patrocínio por parte
do Estado, os empreendimentos nos grandes parques industriais chegaram a gerar
12
Porcentagem se refere a Taxa Geométrica de Crescimento (TGC) - Calculada pelo antilog do
parâmetro β1 da regressão ln(Y1) = β0 + β1T + ui, em que Yi é o valor da quantidade
produzida de soja em grãos, ou a área ou a produtividade e T ( SIQUEIRA, 2013).
13
A indústria de esmagamento da soja extrai, refina e processa derivados do óleo e seus
principais produtos são o óleo bruto, o óleo refinado e o farelo de soja, além de outros em
produção ou potencialmente passíveis de produção. Este segmento proporciona as maiores
potencialidades de competitividade da cadeia produtiva, pelas possibilidades de diferenciação
e da consequente agregação de valor (BUAINAIM et al., 2000).
45
uma considerável capacidade ociosa, fruto da perspectiva de beneficiar-se ao máximo
do apoio governamental dado ao setor.
O final dessa década é considerado um marco no perfil das agroindústrias
esmagadoras de soja, uma vez que esses empreendimentos ficaram sujeitos a uma
nova dinâmica advinda das transformações tecnológicas e da conversão dos
mercados regionais em nacionais (WESZ JUNIOR, 2011). Essa ampliação da escala
geográfica de atuação de algumas agroindústrias do setor implicou na redução do
número de estabelecimentos processadores e o aumento do tamanho médio das
plantas dos estabelecimentos (KAGEYAMA et al., 1990).
A eminente expansão da capacidade de esmagamento ocorrida no decorrer da
década
supracitada
não
teve
sequencia
na
década
posterior,
quando
as
transformações no setor praticamente se estagnaram. Conforme Castro (1996) e
Mazzali (2000), essa estagnação esteve relacionada a uma conjuntura diversificada
que engloba: 1) o término da venda de óleos e gorduras para alguns mercados
europeus, pois estes optaram pela proteção da sua indústria doméstica, importando
somente a matéria-prima; 2) aumento da participação da Argentina na exportação de
produtos processados devido aos seus custos mais reduzidos pela sua logística
eficiente, pela queda dos tributos que pesavam contra a exportação e pela fertilidade
natural da região agrícola; 3) maior lucratividade na comercialização do grão brasileiro
frente ao óleo e ao farelo de soja; 4) emergência de matérias-primas substitutas
diretas (girassol, palma, colza, etc.;); 5) instabilidade dos preços.
O quadro de estagnação evidenciado, no decorrer da década de 1980, sofreu
uma alteração abrupta no início da década de 1990. A partir desta última década,
consolidaram-se neste setor algumas empresas lideres (Sadia, Perdigão e Ceval) e,
ao mesmo tempo, ocorreu de forma mais contundente o “entrelaçamento” dos setores
da soja e de carnes que, passaram a se organizar em redes14.
Neste momento, o cenário da estrutura industrial do complexo da soja poderia
ser caracterizado pela existência de: a) grandes grupos nacionais que atuavam nas
cadeias de oleaginosas e de carnes (como, por exemplo, as empresas Sadia,
Perdigão e Ceval); b) grandes grupos internacionais (Cargill, Santista e Gessy Lever)
que buscaram
adotar um
comportamento mais conservador, sem grandes
investimentos na ampliação da capacidade de processamento industrial da soja; c)
empresas regionais de menor porte (Caramuru, Bianchini e Granóleo) e cooperativas
que investiram no processamento industrial da soja ou na produção de farelo
(CASTRO, 2002).
14
Sobre o tema ver: MAZZALI, L. O processo recente de reorganização agroindustrial: do
complexo à organização “em rede”. São Paulo: Editora da Unesp, 2000.
46
Esta caracterização, no entanto, denota tal cenário até o inicio do Plano Real.
Trata-se de um cenário diverso englobando empresas internacionais e nacionais de
grande e pequeno porte sendo estas últimas as que majoritariamente o dominavam.
Um domínio que estava ligado ao protecionismo em vigor na economia nacional que
induzia as filiais das multinacionais instaladas no país a controlarem seu próprio
processo de incorporação do progresso técnico, o que permitia que vicejassem as
empresas nacionais de médio e pequeno porte mesmo atuando em mercados
regionais.
Contudo, este cenário passou por importantes alterações, na medida em que
os planos do governo federal passaram a não ter como compromisso central a busca
pelo desenvolvimento como ocorria no período dos governos ditatoriais. Objetivavasea estabilização econômica direcionada fundamentalmente ao combate inflacionário.
Com o surgimento do Plano Real, a inflação é estabilizada, ao mesmo tempo
em que se rompe em grande medida com a proteção tarifária e com a presença
estatal, implantando um modelo pautado na competitividade e na abertura comercial.
Logo, há um retorno abundante de capital internacional que passa a ser utilizado pelo
governo federal para adotar uma política neoliberal com atração de capital externo.
Este novo ambiente fez com que os grupos internacionais decidissem explorar
as potencialidades do mercado brasileiro. E sua entrada no mercado brasileiro, na
visão de Benetti (2004), teve como reflexo o aumento da competição rompendo o
equilíbrio com que se repartia o mercado interno entre a tríade das empresas então
operantes,
obrigando-as
a
revisarem
suas
estratégias
e
a
mudarem
seu
comportamento de atuação. De acordo com esta autora:
As filiais das empresas estrangeiras aqui já instaladas se
reestruturaram e promoveram novos investimentos; as nacionais de
grande porte, visando garantir suas posições no mercado, aceitaram
as novas regras do jogo, transitando bruscamente para o padrão de
crescimento baseado na diferenciação acelerada da produção. (...) As
pequenas e as médias empresas, por seu lado, viveram um período
de dificuldades dramáticas, ao sofrerem a concorrência direta e
intensificada dos grandes grupos nacionais e internacionais, sem que
tivessem, como os grandes brasileiros, as mínimas condições de
acompanhar o novo jogo vigorando no mercado (BENETTI, 2004, p.
23).
Nesse cenário, os grupos internacionais por meio do capital estrangeiro fizeram
novos investimentos, adotando como principais mecanismos de transações a fusão e
aquisição de empresas situadas à jusante da agricultura. A partir disso, tais grupos
tornaram-se os protagonistas de um processo intenso de concentração e centralização
de capital, desnacionalização das empresas, internacionalização dos mercados. Este
47
fenômeno aparentemente novo, no entanto, representa a aceleração de situações que
já estavam presentes no período da constituição dos complexos agroindustriais e que,
com a liberalização comercial, a estabilização monetária e a atração de capitais
estrangeiros deixam de ser tímidas e minoritárias (FLEXOR, 2006).
Também, é apenas aparente, uma provável mudança na complementação e
diversificação da estrutura produtiva. O que ocorreu como aponta Benetti (2004) é um
simples avanço sobre as plantas já existentes, trocando os empresários nacionais por
estrangeiros.
Sobretudo, esse movimento revela a necessidade das empresas estrangeiras
em: 1) eliminar concorrentes, aumentando a presença da empresa compradora no
mercado; 2) saltar etapas no processo de crescimento horizontal das empresas; 3)
construir escalas de produção compatíveis com o novo padrão de desenvolvimento,
altamente exigente quanto à incorporação continuada de tecnologia; 4) assegurar o
suprimento de matérias-primas e de canais de distribuição dos bens finais, já
estruturados pela empresa adquirida; e 5) entrar rapidamente no mercado doméstico,
aproveitando a fase promissora de negócios que se desenhava, alargada pela
integração do Brasil ao Mercosul (BENETTI, 2004).
Esse movimento expressa um dos principais objetivos das empresas,
sobretudo, das empresas internacionais, o de adquirir as estruturas industriais de seus
concorrentes. Ao alcançar tal objetivo, a partir de fusões e aquisições, tem-se como
consequência a concentração empresarial.
A profundidade da concentração empresarial a jusante da cadeia da soja, já
pode ser observada no período entre 1995 e 2005, ao analisar-se a participação das
cinco maiores empresas sobre o percentual da capacidade de esmagamento no Brasil.
Isso porque, como conforme demonstra a tabela 1, os cinco líderes passaram de uma
participação percentual de 36% em 1995 para 53% em 2005.
Tabela 1: Participação das cinco maiores empresas no esmagamento da soja no
Brasil entre 1995 e 2005.
1995
2005
Colocação Empresa Participação Origem do
no esmaga- capital
mento da
soja (%)
Colocação Empresa Participação Origem do
no esmaga- capital
mento da
soja (%)
1ª
2ª
3ª
4ª
5ª
Ceval
Santista
Cargill
Sadia
Incobrasa
14%
6%
6%
5%
5%
1ª
Nacional
2ª
Internacional
3ª
Internacional
4ª
Nacional
5ª
Nacional
Bunge
ADM
Cargill
Coinbra
Imcopa
22%
10%
9%
7%
5%
Internacional
Internacional
Internacional
Internacional
Nacional
48
Total
36%
Total
53%
Fonte:Wesz Junior (2011).
Como se pode observar, também, nesse período as quatro posições iniciais
ampliam significativamente seu percentual de participação, passando de 31% para
48%. Essa ampliação deu-se por parte de grupos estrangeiros que, em 1995,
concentravam apenas 12%.Em contrapartida, os grupos nacionais retrocederam em
termos de controle de 24 para 23%.
A participação de novas tradings é reflexo do elevado número de fusões e
aquisições responsável pela maior alteração na estrutura patrimonial e nominal do que
pela construção de novas plantas industriais. E parece expressar muito claramente
que determinados grupos ampliaram seu poder político-econômico no setor jusante da
agricultura ao transformar um cenário e, a partir disso, dominar o setor de
processamento
da
soja
com
processo
de
desnacionalização,
concentração
empresarial e centralização do capital.
Todavia, o poder político-econômico de determinados grupos que atuam no
setor a jusante não se restringe e nem pode ser vislumbrado na sua totalidade a partir
de observações sobre as transformações nesse único setor. Isso ocorre porque na
consolidação no fortalecimento das empresas líderes, as mesmas atrelaram um
conjunto de estratégias produtivas, econômicas e comerciais que permitiram, a partir
dos contextos encontrados, promover a integração entre os elos a montante
(fertilizantes) e a jusante (esmagamento) da produção agropecuária. Ou seja, uma
estratégia onde os mesmos grupos responsáveis pela etapa de agroindustrialização
da oleaginosa, simultaneamente, também passaram a atuar concomitantemente na
produção e distribuição de insumos.
Por conseguinte, há, não apenas uma atuação paralela, mas uma reprodução
no segmento a montante, por parte desses mesmos grupos que passaram a dominar
as etapas da agroindustrialização da oleaginosa, do processo de desnacionalização,
concentração empresarial e centralização de capital. Porém, ao que tudo indica, de
forma ainda mais intensa.
Neste contexto, a maior expressão desta realidade é encontrada na expansão
do Grupo ABCD (ADM, Bunge, Cargill, Dreyfus (Coinbra)) que através de fusões e
aquisições passou a dominar tanto o setor à jusante quanto alguns segmentos à
montante. Em 2002, somente a Cargill e a Bunge dominavam respectivamente 11,1%
e 29,3% deste último setor. Bastaram-se dois anos para a primeira chegar a 14% e a
segunda a 30%. O crescimento percentual dessas duas empresas de 2002 a 2004
49
demonstra que a atuação da Cargill se fez de forma mais agressiva do que a da
Bunge. O que não ocorreu de 2004 a 2007 quando a Cargill teve seus percentuais de
crescimento praticamente estagnados chegam a 14,1%, enquanto que os percentuais
de crescimento da Bunge chegam a 13,4%. Ou seja, essa última empresa, em
aproximadamente três anos (2004 a 2007), tem o domínio sobre o setor a montante
ampliado de 30% para 43,4% (SOUZA, 2007).
Somente essas duas empresas que compõem o grupo ABCD já, em 2007,
dominavam 57,5% de segmentos específicos do setor a montante da agricultura. E
mais, seus avanços em direção a concentração empresarial se dão sobre os demais
grupos que reduziram seu percentual do período de 2002 a 2007 de 59,6% para
42,5%. Ou seja, em 2007, os números percentuais da Bunge já são maiores do que o
percentual de todos os demais grupos desde que se exclua deste universo o grupo
Cargill.
Em linhas gerais, a conjuntura de concentração do setor a montante na sua
totalidade, na visão de Benetti (2004), demonstra que existe uma forte tendência à
geração de um monopólio pelo elevado grau de concentração do setor. Nesta
concentração, por meio das estratégias de fusões e aquisições, não se dá apenas, ou
não se visa unicamente, o domínio sobre mercado, mas sim o domínio sobre as fontes
de recursos naturais e da produção de matérias-primas básicas.
Benetti (2004) é um entre tantos autores que demonstra muito claramente a
expansão dos grandes grupos estrangeiros sobre a economia do agronegócio através
de aquisições de ativos existentes e de novos investimentos. Para essa autora:
[...] esse processo permitiu-lhes controlar setores estratégicos das
cadeias de produção agropecuária relacionados a suprimentos à
agricultura — pesquisa agrobiotecnológica e indústria sementeira,
fertilizantes, defensivos, produtos de saúde animal e equipamentos
agrícolas. Como tais grupos usualmente integram, formal ou
informalmente, produtores agrícolas, financiando-os, transmitindolhes inovações tecnológicas e adquirindo sua produção; como são
processadores de matéria-prima; e, finalmente, dado que constituem
poderosas tradings internacionais, principalmente responsáveis pelo
comércio exterior das commodities em seus vários ramos, então, é
razoável concluir que desempenharam um papel estratégico na
internacionalização da produção brasileira agropecuária. (BENETTI,
2004, p. 170).
Isso nos permite concluir, também, que esse fenômeno fez emergir, na cadeia
da soja como um todo, um processo, ainda em curso, de concentração de poder e um
poder de concentrar sem precedentes. Essa concentração de poder e esse poder de
concentrar praticamente estão presentes nos quatro mercados que compõem uma
cadeia agroindustrial típica. Ou seja, no mercado entre produtores de insumo e
50
produtores rurais, mercado entre produtores rurais e a agroindústria, mercado entre
agroindústria e distribuidores e, finalmente, mercado entre distribuidores e
consumidores finais (BATALHA, 1997).
Essa concentração de poder por parte de poucos grupos internacionais nos
dois primeiros mercados, onde os agentes buscam agregar valor a seus produtos e
obter maiores lucros, manifesta-se em cada momento em que se estabelecem
relações com os produtores de distintas partes do campo brasileiro. Essas relações,
que tem se disseminado nos últimos anos, contribuem significativamente para que a
produção de soja desenvolva-se e se territorializeno campo brasileiro de forma cada
vez mais dinâmica.
A seguir dar-se-á ênfase para a atuação de determinadas em empresas de
setores distintos do complexo agroindustrial no financiamento da produção rural no
Brasil. Também, serão feitas considerações sobre a disseminação de relações entre
empresas do complexo agroindustrial e os produtores de soja.
O Financiamento Da Produção Rural: As Relações Entre Produtores E Empresas
Dos Complexos Agroindustriais (Cais)
No decorrer da década de 1980, o Estado,que até então era o principal
protagonista do financiamento da produção agrícola no Brasil, passou a dar cada vez
mais espaço para quenesse âmbito empresas do complexo agroindustrial assumissem
um importante papel.A partir disso, há uma reconfiguração das relações estabelecidas
com os produtores rurais, sobretudo com os produtores de soja.
O Estado, diante do agravamento do processo inflacionário e principalmente de
uma crise fiscal enfrentada na década de 1980, impôs drásticos cortes a politica de
crédito rural considerada como o principal instrumento de financiamento direcionado a
produção rural. Tais cortes decretaram o decréscimo dos recursos direcionados a
agricultores de diferentes segmentos via crédito rural. Enfraquecia-se com isso uma
politica de créditorural concebida como a principal propulsora da modernização da
agricultura brasileira, base da articulação entre agricultura e indústria.
E em um contexto de incerteza quanto ao financiamento da produção rural, as
empresas do setor a montante e a jusante da agricultura passaram a ocupar um papel
importante no financiamento da produção rural. Para Mazzali (2000), tais empresas
tornaram-se os novos protagonistas do financiamento da produção rural, constituindosenos principais agentes financeiros no campo.
Com a participação de forma mais efetiva dos agentes privados no
financiamento da produção rural emergem formas de financiamento e de
51
comercialização da safra. A partir de novas formas de financiamento as empresas
buscavam essencialmente garantir que não ocorresse uma redução da área plantada
e consequentemente da produção da soja. Com esta perspectiva foram criados e
utilizados novos mecanismos e criadas fontes alternativas ou informais de
financiamento da produção rural.
Dentre as formas de financiamento podemos citar o sistema troca-troca, os
contratos de soja verde, osistema de equivalência de trocas, a Cédula de Produtor
Rural (CPR). Há, entre essas formas de financiamento distinções, que não serão aqui
ressaltadas, e em praticamente todas elas um ponto em comum: essas formas dão as
empresas o direito de apropriar-se da produção dos sojicultores que a elas recorrem
ao buscar financiamento para a produção rural.
Cada forma de financiamento formaliza uma relação estabelecida entre
produtores e empresas. Nos últimos anos, essas relações têm se disseminado de
forma bastante significativa. Tanto que, a oferta de financiamento pelas tradingse
agroindústrias, em 2005, já cobriam 67% da produção nacional de soja (RODRIGUES
et al., 2009).
Uma vez que, há empresas que como se enfatizou anteriormente dominam
setores diretamente relacionados à produção de soja, a concentração de poder por
parte de alguns grupos lhes permite o poder de concentrar a apropriação da produção
e, consequentemente, da riqueza produzida pela via do financiamento. Exatamente
por isso, as empresas de maior representatividade em termos de concentração
empresarial são justamente as que mais têm investido no financiamento da atividade
sojicultora. Para ter-se uma noção da representatividade de certas empresas faz-se
uso das palavras de Wesz Junior (2009, p. 87):
Em 2008, a Bunge disponibilizou cerca de US$ 700 milhões para o
financiamento da soja no Brasil, o que representa mais de 40% do
montante de recursos ofertados pelas tradings no país. A Cargill, por
sua vez, investiu US$ 400 milhões (23,5%) em crédito aos produtores
e a Amaggi, US$ 200 milhões (11,8%) (Valor Econômico, 28/05/2009
e 22/06/2009). Apesar de não ter conseguido dados da ADM e
Dreyfus, já é possível perceber o peso e a importância das três
empresas citadas anteriormente na oferta de financiamento, pois
representavam 76,3% do volume liberado pelas tradings ao cultivo da
soja, em 2008.
Esse cenário aponta para a expressividade da modalidade de investimento
privado nas lavouras de grãos. No entanto, ela não alcança da mesma forma todos os
produtores da monocultura. Sobretudo, pois, como destacam Rodrigues et al. (2009),
antes de ser formalizada as relações entre produtores e empresas por intermédio de
contrato, as estratégias utilizadas pelas empresas no financiamento alteram-se
52
conforme o perfil do produtor, dependendo do volume produzido de soja, do patrimônio
disponível e da trajetória de inadimplência. Nesse sentido, pondera o último autor
citado:
Os contratos com preços fixos estabelecidos, em real ou dólar, em
geral são direcionados a produtores com baixo poder de negociação,
que conforme avaliação de cadastro tem registros de inadimplências,
pouca ou nenhuma garantia, ou seja, estão descapitalizados. Bem
como quanto maior o poder de barganha do produtor maior será sua
oportunidade de negociar o preço de venda, podendo ter pouca ou
nenhuma quantidade de grãos pré-fixados, lhe sendo permitido
acompanhar o mercado a fim de definir a época e a quantidade a ser
comercializada (RODRIGUES et al., 2009, p. 12).
Essa é uma maneira das empresas financiadoras da produção evitar perdas e
potencializar ganhos. Nesse sentido, muitas vezes, de acordo com Fernández (2009),
as empresas realizam o monitoramento individual da situação econômica do agricultor
e buscam informações se os produtores não fazem parte da chamada “lista negra”,
relação que é controlada e compartilhadas pelas e entre as empresas, daqueles
produtores que não cumpriram os contratos com as tradingspelo desvio da produção,
por questionamentos de contratos, ou por outros motivos.
Embora haja esse monitoramento por parte das empresas, muitas vezes, ser
um produtor inadimplente, com pouca garantia e descapitalizado – o que os eliminam
da possibilidade de acessar o Sistema Nacional de Crédito Rural brasileiro – é um
fator importante, mas não é impeditivo ao financiamento junto às tradingsporque elas
estão interessadas, principalmente, na garantia da oferta de grãos (WESZ JUNIOR,
2011).
O que fazem muitas vezes essas empresas é construir mecanismos que ao
diminuir as possiblidades de perda ou prejuízos, tornam os contratos menos
vantajosos aos produtores rurais. Nesse sentido, como alerta Wesz Junior (2011, p.
90), “as tradingsse relacionam entre si para alcançar suas metas particulares, manter
o preço da soja mais baixo e obter informações a respeito dos agricultores”.
Em
meio
a
tudo
isso
os
produtores
de
soja
inadimplentes
e/ou
descapitalizados tem na viabilidade de financiamento com baixa exigência de garantia,
menor burocracia, elevada agilidade e grande disponibilidade de recursos, algumas
vantagens em estabelecer relações com as empresas em comparação com o sistema
público.
Outros aspectos importantes são a proximidade dos armazéns com a empresa
que negociarão as safras, o tempo de relacionamento com a firma, o melhor preço
pago pela soja, a diversidade de serviços (REZENDE e ZYLBERSZTAJN, 2007).
Dentre esses aspectos econômicos a assistência técnica é considerada como um
53
diferencial. De certa forma, ela é um aspecto interessante para as empresas, uma vez
que, por meio dela podem monitorar o momento da colheita e direcionar ao seu
armazém a parte da produção correspondente ao contrato. O que no entendimento de
Fernández (2009) explica, em certa medida, a menor taxa de inadimplência e de
dívidas dos financiamentos contraídos das tradingsquando comparado com as dívidas
bancárias.
Para além dos aspectos econômicos supracitados, não menos importante, é a
existência, em meio às relações e que as fazem disseminar-se, da construção de
parâmetros sociais “como a confiança, a tradição, o respeito, a compreensão que a
empresa teve com o agricultor em momentos de dificuldades, negociando as dívidas,
enfim, um conjunto de elementos que qualifica e dá sentido a relação” (Fernández,
2009, p. 73).
Essa possibilidade de conseguir financiamento com as empresas do complexo
agroindustrial faz com os produtores da monocultura soja expandam a sua produção
cada vez mais. E, no momento atual, é uma alternativa importante para os produtores
que não acessam e também para os que acessam o crédito rural que provem do setor
publico.
A partir do final da década de 1990, há uma recuperação do credito rural em
termos de volume de recursos destinados a produção rural. E isso tem permitido que
os produtores de soja acessem tantos recursos do setor publico quanto do setor
privado. O primeiro, assim como o segundo, tem interesse direto na produção de
umadas principais commodities agrícola e a terceira mais importante commoditie no
quadro geral de exportações.
Por fim, é importante destacar que, longo das últimas décadas, a produção de
soja vem concentrando-se em grandes estabelecimentos rurais. E, a expansão da
produção vincula-se diretamente com a concentração da terra, o domínio cada vez
maior da indústria sobre a agricultura e a pouca geração de ofertas de emprego em
determinadas atividades agrícolas. Logo, em meio aos ganhos econômicos das
empresas que monopolizam o processo produtivo surgem múltiplas implicações
sociais, tais como a perda de autonomia, principalmente dos pequenos produtores e o
seu endividamento, bem como também os insere em uma atividade que, muitas vezes,
degrada os recursos naturais tão importantes para o desenvolvimento de qualquer
atividade agrícola.
54
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando-se a expansão da atividade sojicultora nas últimas décadas, no
Brasil, é possível inferir que a mesma está fortemente pautada no entrelaçamento
entre a agricultura e a indústria. Neste sentido, observa-se que com as alterações
ocorridas durante a década de 1980, no cenário nacional, que oportunizou a entrada
de agentes privados, fortaleceu-se e expandiu –seestaarticulação.O que se percebe a
partir disso é a importância do desenvolvimento da sojicultura no contexto de
acumulação de capital via complexos agroindustriais. De um lado, por ser uma das
atividades agrícolas em que mais se tem utilizado inovações tecnológicas e
biotecnológicas de origem industrial e, por outro lado, por fornecer uma matéria –
prima que movimenta o mercado mundial de alimentos e seus derivados.
Neste contexto, é possível observarque a monopolização exercida por algumas
empresas, em diferentes setores do complexo agroindustrial, permite a tais empresas
lucrar com a comercialização de produtos de origem industrial, como por exemplo, os
fertilizantes e as sementes geneticamente modificadas. E, a partir de formas de
financiamento privados, que são diferentes das oferecidas pelo setor público,
apropriam-se de uma produção que tem se intensificado e se expandido em partes
distintas do território brasileiro. Logo, apropriam-se da mais valia produzida por uma
diversidade de atores rurais envolvidos com o desenvolvimento da sojicultora.
Por fim, deve-se ressaltar que, dependendo do contexto em que se encontram
os agricultores atrelados a atividade sojicultora, o financiamento viabilizado pelo setor
privado contribui, seja para dar continuidade a esta atividade, que demanda de altos
investimentos, ou para ampliá-la. No entanto, isso não significa que não haja um
comprometimento da autonomia dos agricultores ao se estabelecer relações
comerciais com determinadas empresas, que como foi enfatizado ao longo do texto,
tem buscado tanto monopolizar, quanto aumentar seus ganhos e assim ampliar o
campo dessas relações, que torna, principalmente os pequenos produtores reféns da
lógica capitalista.
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56
LA RELACIÓN INTRÍNSECA ENTRE LA SOBERANÍA ALIMENTARIA Y LA
AGROECOLOGÍA EN EL CONTEXTO DE LA CRISIS ALIMENTARIA
Alecsandra Santos da Cunha –Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Ana Estela Dominguez Sandoval – Universidad de La Republica
[email protected]
Clayton Hillig – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Iolanda Lopes de Oliveira – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Cristiane Maria Tonetto Godoy – Universidade do Estado do Rio Grande do Sul
[email protected]
Resumen:
Este trabajo tiene como objectivo hacer una discusión sobre el tema de la Soberanía
Alimentaria y Agroecología en el contexto actual de la crisis alimentariamundial globalizada. En
este sentido, el texto pone de relieve la importancia de la Soberanía Alimentaria para erradicar
el hambre y la pobreza en el mundo, teniendo en cuenta que está dotado con una connotación
política tal que promueve el empoderamiento de las poblaciones en riesgo en todo el mundo. Y
una estrategia clave en el camino hacia la Soberanía Alimentaria es la Agroecología, que
implica una serie de acciones que proporcionan situaciones que impulsan la Soberanía
Alimentaria. A partir de una revisión de la literatura fue posible identificar el contexto sociopolítico en el momento en que surgió la perspectiva de la Soberanía Alimentaria, su relación
con la Agroecología y el contexto actual.
Palabrasclave: La globalización; Comida Sana, Autonomía Familiar; Movimientos Sociales.
Introducción
La matriz productiva hegemónico de Brazil es la agricultura intensiva
capitalizada, el monocultivo, el consumo de una gran cantidad de insumos químicos,
incluyendo varios tipos de pesticidas. Esta matriz productiva no garantiza la Soberanía
Alimentaria, ya que está directamente vinculado a lo capital, que a su vez, transforma
la producción de alimentos en medio de la acumulación de riqueza. Actualmente, bajo
el punto de vista capitalista, la comida no és más comida hacia la supervivencia
humana, hacia convertirse en mercancía.
A partir de esta matriz productiva, presente en varios países además de Brazil,
una crisis alimentaria se ha instalado en todo el mundo. Sin embargo, esta crisis no
está vinculado a la cantidad de alimentos que se producen, sino más bien en la forma
en que se produce y se distribuye.
Desde el contexto global, los movimientos sociales empezeron un proceso de
oposición a los grandes conglomerados que dominan la producción de alimentos en
todo el mundo, rechazando paquetes tecnológicos y se pegan a una “nueva” matriz
productiva basada en la producción orgánica y los principios de Agroecología, uno
57
campo del conocimiento científico, asesor de la agricultura sostenible. Por lo tanto,
representada por Vía Campesina, los diversos movimientos sociales proponen el
concepto de Soberanía Alimentaria, en el que las personas pueda recuperar el control
sobre su producción y distribución de la comida.
En este sentido, el presente trabajo pretende conocer los antecedentes
históricos para la emergencia del concepto de Soberanía Alimentaria, así como
contextualizarlo en la actualidad, sobre el choque de las dos formas de producción - la
agroindustria y la agricultura familiar de base ecológica - en el corazón la discusión de
las instituciones conectada al problema de la crisis alimentaria y el hambre en el
mundo.
La investigación se desarrolló impiezo de la recopilación de datos secundarios.
Los análisis presentados en este documento se tomaron de documentos tales como
libros, tesis, disertaciones y otras publicaciones que se ocupan de cuestiones
relacionadas con el objeto del mismo. Eran parte de la colección de datos secundários
de la búsqueda, la realización de selección y lectura de publicaciones sobre la
soberanía alimentaria, los movimientos sociales, la agroecología, la producción
orgánica y la agricultura familiar. Una revisión de la literatura de los temas tratados fue
hecho y consideró también la experiencia en el campo desarrollado en el curso de
post-grado y el trabajo diario de los autores. Este texto está tomado de otro original
construido para la evaluación en el assunto "Principios de Agroecología" en el
Especialización en la Agricultura Familiar Campesina y Educación del Campo II de la
Universidad Federal de SantaMaria.
Soberanía Alimentaria y el advenimiento conceptual
El concepto de Soberanía Alimentaria surgió de la necesidad de hacer frente a
la matriz productiva hegemónica de los principales países en los que está en la base
económica, la agricultura. El primer término que surgió en este sentido fue el de
Seguridad Alimentaria y Nutricional: de acuerdo a la Ley Orgánica de Seguridad
Alimentaria y Nutrición - LOSAN (Ley N ° 11.346, 2006), Seguridad Alimentaria y
Nutricional (SAN) es la realización de el derecho de todos al acceso regular y
permanente a alimentos de calidad en cantidad suficiente, sin comprometer el acceso
a otras necesidades esenciales, basado em las prácticas de alimentos que promueven
la salud, que respeten la diversidad cultural y que son el medio ambiente, cultural,
económica y socialmente sostenible (Ministerio de Desarrollo Social - Sitio Oficial).
A partir de este concepto incorporado por el Ministerio de Desarrollo Social
(MDS), es la Secretaría Nacional de Seguridad Alimentaria y Nutricional (SESAN),
58
plan, ejecutar, coordenary supervisar los programas, proyectos y acciones de SAN, de
acuerdo con las directrices de la Política Nacional de Seguridad Alimentaria y
Nutrición, creado por el Decreto Nº 7.272 / 2010.
Sin embargo, el contexto global muestra que lo capital se ha apropiado de la
producción de alimentos, convertió esta actividad em más una forma de acumulación,
de rentabilidad y de explotación laboral. La comida ya no es una necesidad para la
supervivencia humana y se convierte en una simple mercancía. En este sentido, la
necesidad de ampliar el concepto de Seguridad Alimentaria y Nutricional se hizo
urgente y necesario.
Por lo tanto, los movimientos sociales impezaron a manifestarse sobre el tema,
representados por Vía Campesina. La Vía Campesina es un movimiento internacional
que converge a millones de campesinos, productores de alimentos pequeños y
medianos, los sin tierra, los pueblos indígenas, los migrantes, los trabajadores y las
trabajadoras agrícolas de todo el mundo. Ella aboga por una agricultura sostenible y
en pequeña escala como una forma de promover la justicia social. Se opone y enfrenta
la agroindustria y las multinacionales que están extinguiendo la gente del campo y de
los recursos naturales.
La Vía Campesina comprende en torno a 164 organizaciones locales
y nacionales en 73 países de África, Asia, Europa y América. En total,
representa a alrededor de 200 millones de campesinos y campesinas.
Es un movimiento autónomo, pluralista y multicultural, sin ninguna
afiliación política, económica o de cualquier otro tipo (La Via
Campesina – Site Oficial).
La Vía Campesina fue fundada en Bélgica en 1993 por grupos de campesinos
y campesinas de todo el mundo. La hora tenía una nueva era para la sociedad
mundial, la globalización, y en este contexto los grupos campesinos reclamavan que
fueron reconocidos y que su voz estaba presente en la toma de decisiones que
influyen de manera efectiva sus vidas.
(...) a grande perversidade na produção da globalização atual não
reside apenas napolarização da riqueza e da pobreza, na
segmentação dos mercados e das populações submetidas, nem
mesmo na destruição da Natureza. A novidade aterradora reside na
tentativa empírica e simbólica de construção de um único espaço
unipolar de dominação. A tirania do Dinheiro e da Informação,
produzida pela concentração do capital e do poder, tem hoje uma
unidade técnica e uma convergência de normas sem precedentes na
história do capitalismo (Santos, 2003, p. 03).
Por lo tanto, para lograr la Soberanía Alimentaria y detener los efectos
destructivos del neoliberalismo, que pueden ser considerados una de los mayores
59
recursos en la naturaleza del nombramiento a favor del capital, se encuentran entre los
objetivos de la Vía Campesina. Que sostiene que los pueblos de la cantidad de campo
a unos 200 millones de habitantes, con esto en mente, capaces de producir alimentos
de calidad para ellos y el resto del mundo de una manera sana y sostenible.
Además, según la FAO, las mujeres producen aproximadamente el 70% de los
alimentos en todo el mundo, tenendo papel clave en este proceso. Este papel es
reconocido
por
Vía
Campesina,
que
se
refiere
al
proceso
histórico
de
dominación/opresión de la mujer por el neoliberalismo y el patriarcado, defensa "los
Derechos de las Mujeres y la Igualdad de género a todos los Niveles y lucha contra
todas las formas de violencia Hacia Las Mujeres "(La Vía Campesina - Sitio Oficial,
2015).
En este contexto y de acuerdo con la Vía Campesina por la Soberanía
Alimentaria se entiende que:
É o direito dos povos a definir suas próprias políticas e estratégias
sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que
garantam o direito à alimentação a toda a população, com base na
pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a
diversidade
dos
modos
camponeses
de
produção,
de
comercialização e de gestão, nos quais, a mulher desempenha um
papel fundamental (La Vía Campesina).
Por lo tanto, la Soberanía Alimentaria está directamente relacionada con la
producción de alimentos. Pero no sólo producir, es necesario producir alimentos de
calidad, diversa, libre de venenos con el fin de proteger la salud de los agricultores, la
salud de los consumidores y no destruir los recursos naturales.
La crisis alimentaria en el mundo globalizado
La economía globalizada intenta homogeneizar todos los sujetos, actores
sociales, colocándolos en una posición dependiente del mercado. La Soberanía
Alimentaria, por otro lado, prioriza la producción y el consumo de alimentos saludables
locales, el desarrollo de una matriz productiva diversa al modelo hegemónico, la
producción campesina sostenible que promueve la salud del medio ambiente y la
sociedad. Una producción campesina en la que el modo de vida, las expectativas y las
necesidades de las personas que viven em el/de el campo se encuentran entre las
prioridades.
Además de controlar la producción y proteger a los productores locales de las
importaciones y el dominio del mercado de negocios, la ideología de la Soberanía
Alimentaria busca asegurar que “los derechos de uso y gestión de tierras, territorios,
60
agua, semillas, ganado y biodiversidad estén en manos de quien produce alimentos y
no del sector empresarial.”(La Vía Campesina - sitio Oficial, 2015). La Soberanía
Alimentaria puede ser un canal de búsqueda de la solución de la crisis alimentaria y la
pobreza global.
La crisis mundial de alimentos se sabe que no tienen nada que ver con la
cantidad de alimentos producidos en el mundo exterior. La FAO (Informe de 2014),
estima que actualmente se producen tres veces la cantidad de alimentos necesarios
para alimentar a toda la población del planeta. Así que el problema no está en la
producción, sino en la forma de esta producción y su distribución. Pero si la comida no
es la comida más y convertirse en mercancía, si la comida no es la comida más y es
una parte del proceso de acumulación de capital, se puede inferir que estas son las
razones de la crisis alimentaria.
Y hacia la comida se convirtir en mercancía y medio de acumulación,
estrategias se implementaron en los campos y em las relaciones que involucran esta
producción. Por lo tanto, los paquetes tecnológicos basados en una serie de insumos
químicos agrícolas, altamente dependientes de las inversiones se realizaron en la
agricultura en todo el mundo.
A partir de 1950, a mal designada Revolução Verde, que preconizava
a moto-mecanização, o uso de insumos químicos e a adoção de
material genético modificado, mudou o panorama do campo, sem,
contudo, contribuir para superar o quadro de fome e desigualdades
sociais. A industrialização da agricultura trouxe consequências como
a mudança da matriz energética da energia solar para o petróleo, a
concentração fundiária, a expansão das monoculturas, a
contaminação da água, dos solos, a redução da diversidade biológica
e cultural e a elevação dos custos de produção (Meirelles, 2008, p.
03).
El patrón de producción basado en la agricultura para la exportación admite
monocultivos en grandes áreas, alto grado de mecanización y el consumo de agua, así
como los insumos químicos como pesticidas y fertilizantes y semillas modificadas
genéticamente. El modelo hegemónico, toda la cadena de producción es altamente
dependiente del petróleo, porque además de la composición química de la mayoría de
estos produtos, aún existe el consumo de combustible utilizado tanto en la adquisición
de paquetes tecnológicos como el flujo de la producción para todos el mundo. E
todavia esa dependencia del petróleo, un recurso natural no renovable, la
agroindustria se expande con el fin de dominar el territorio que podría ser la
producción de alimentos saludables para el mercado interno.
61
O avanço do agronegócio pode ser constatado a partir de vários
enfoques, entre os quais o aumento da produção/produtividade e da
área plantada com produtos de exportação, o crescimento da
participação do agronegócio no PIB brasileiro que já ultrapassa os
30%, pela crescente mecanização e tecnificação dos processos
produtivos no campo, pelo aumento da integração entre os capitais
agropecuários-industriais-financeiros, bem como pela ampliação das
cadeias produtivas agroalimentares e de insumos sob controle de
conglomerados econômicos, via de regra multinacionais, que
dominam parcelas cada vez mais significativas dos mercados em que
atuam (Campos, 2011, p. 101).
El Brasil está entre los países que consumen más pesticidas en sus cultivos,
por lo tanto, tiene su suelo empobrecido y dañado, los suministros de agua
contaminados, alimentos enfermos, la salud de los campesinos atacados por carga de
veneno que los que están expuestos, y por último, la población consume alrededor de
3,5 L de estos venenos enun año (Oliveira, 2010). Los riesgos para la salud humana tanto por el consumo a través de los alimentos, como por contacto a través de la
aplicación - son altos y han comenzado a ser informado de casos de contaminación en
la leche materna, además, enfermidades pulmonar y neurológicas se han relacionado
con casos específicos de los agricultores que utilizan pesticidas en sus cultivos
(Palma, 2011).
En este sentido, se puede inferir que el modelo de producción agrícola que se
encuentra en Brazil desde la aplicación de la Revolución Verde sobre todo, puede
estar a punto de colapsar. Que si tenemos en cuenta la contaminación y la
sobreexplotación de los recursos naturales, el ataque a los ecosistemas, los diversos
efectos causados a la salud humana, la concentración de la tierra y la riqueza, entre
otros. Según Campos (2011), la agroindustria es responsable de la creación y
consolidación de la pobreza en el campo y, teniendo en cuenta el éxodo rural que
hace que esta pobreza generada por ésta se extiende a la ciudad.
Quanto à dimensão espacial, o agronegócio busca continuamente
ampliar seus territórios e, nos espaços apropriados, tem o poder de
condicionar a produção e distribuição da maior parte da riqueza,
contribuindo também para o seu reverso, a produção da pobreza
(Campos, 2011, p.109).
Por otra parte, la agroindustria corrobora la hegemonía del campo, eliminando
la diversidad de este entorno social, que no puede ser considerado sólo como un lugar
de producción, pero sobre todo es un lugar de experiencia y la reproducción social
campesina.
Destacado
entonces,
sin
embargo,
sin
análisis
más
profundas,
las
características del mal que la agroindustria impone a la sociedad en las dimensiones
62
político, cultural, económico, ambiental y social, se considera necesaria e inminente
nueva forma de producción de alimentos que tiene condiciones para revertir todo este
proceso de explotación, la contaminación y el agotamiento de la naturaleza,
considerando el ser humano como una parte integrante de la naturaleza y la búsqueda
de una reconexión.
La Agroecología como una matriz productiva alternativa
En este contexto de autonomía precaria de la sociedad a costa del capital, los
movimientos sociales contribuyen como parte fundamental en la lucha contra el
modelo hegemónico de la producción agrícola, y por lo tanto en contra del sistema
capitalista.
Y una de las maneras de hacer frente al modelo hegemónico es la
Agroecología, por el cual está destinado a ser un campo científico del conocimiento
que guía el uso sostenible de los recursos naturales renovables. En esta forma de
producir, bajo esa orientación, la producción de alimentos está en armonía con la
naturaleza, utilizando los recursos naturales em forma adecuados y controlados.
Existe la preocupación por el uso del agua, el suelo, la ausencia total de plaguicidas e
insumos químicos. Con la orientación de Agroecología se aprovecha del sistema todo
lo que tiene que ofrecer, teniendo en cuenta su potencial:
A agroecologia valoriza os conhecimentos locais e colabora
efetivamente para a sustentabilidade plena na agricultura. Surge
diante da necessidade de transformação do modelo agrícola
dominante, na qual propostas alternativas englobam nesse contexto a
agricultura orgânica, ecológica, regenerativa, biodinâmica, entre
outras (Cunha, Fagundes, Rodrigues, 2011, p. 02).
Y aún:
O saber agroecológico é essencial para a construção de um novo
paradigma produtivo ao mostrar que é possível produzir "com a
natureza". Este saber pela sustentabilidade põe em questão um
complexo processo de recuperação, hibridação e inovação dos
saberes, em uma política de reapropriação cultural da natureza (Leff,
2002, p. 44).
Por lo tanto, la Agroecología está intrínsecamente ligada a la trayectoria de la
Soberanía Alimentaria. Lo que nos lleva a pensar en una característica notable y
esencial de la producción de alimentos de manera sostenible, la diversificación. La
vulnerabilidad económica, productiva y alimentar de la familia campesina es
63
erradicada mediante la diversificación de la producción que garantiza la biodiversidad
del ecosistema local, contribuyendo a la conservación y el equilibrio de los recursos
naturales, la promoción de una dieta rica en nutrientes y complejos vitamínicos
diversas.
Existe uma enorme variedade de consórcios, o que reflete a ampla
variedade de culturas e práticas de manejo que os agricultores de
todo o mundo utilizam para atender às suas necessidades de
alimentos, fibras, medicamentos, combustível, materiais de
construção, forragem e renda (Altieri, 2012, p. 221).
Varias técnicas pueden ser utilizadas, el cultivo mixto se mencionó
anteriormente, por ejemplo, permite un mejor uso de la instalación de producción, la
productividad aumenta sin necesidad de grandes inversiones. La pérdida de los
cultivos causados por el mal tiempo, el ataque de plagas y las fluctuaciones del
mercado también se puede controlar a través de la diversificación de la producción.
Otra dimensión de policultivo y la producción en la agricultura basada en la
agroecología con una base sostenible, y también tan importante como la generación
de ingresos (ingresos generados por la venta de los excedentes) y el auto de la
familia, es la calidad de los alimentos que se consumen de esta matriz productiva.
Como se mencionó anteriormente, los productos alimenticios producidos en la
agroindustria están cargados de insumos químicos como fertilizantes y pesticidas, así
como los transgénicos, que causan una serie de problemas para la salud humana.
Específicamente en relación con una categoría de plaguicidas, organoclorados, Palma
(2011, p. 42-43) establece que:
O alvo de ação dos organoclorados é o sistema nervoso motor e
sensorial e o córtex motor (GRISOLIA, 2005). Sua toxicidade
compromete a transmissão do impulso nervoso central e autônomo,
provocando alterações comportamentais, sensoriais, do equilíbrio, da
atividade da musculatura voluntária e de centros vitais,
particularmente da respiração (OPAS, 1996). Podem penetrar no
organismo humanopor via dérmica, pulmonar, gástrica e respiratória
(RODRIGUES, 2006).Em casos de intoxicação aguda, após duas
horas
aparecem
sintomas
neurológicos
de
inibição,
hiperexcitabilidade, parestesia na língua, nos lábios e nos membros
inferiores, desassossego, desorientação, fotofobia, escotomas,
cefaleia persistente, fraqueza, vertigem, alterações do equilíbrio,
tremores, ataxia, convulsões tônico-crônicas, depressão central
severa, coma e morte. Já as manifestações crônicas salientam-se
neuropatias periféricas, inclusive com paralisias, discrasias
sanguíneasdiversas, inclusive aplasia medular, lesões hepáticas com
alterações das transaminases e da fosfatase alcalina, lesões renais,
arritmias cardíacas a dermatoses,como cloroacne (OPAS, 1996).
64
La autora también menciona en su investigación de la toxicidad, síntomas y
consecuencias para la salud humana, animal y ambientales otras categorías de
pesticidas tales como las piretrinas y piretroides, además de dinitroanilinas. Es
necesario, por lo tanto, de forma inminente, erradicar el uso de pesticidas en los
cultivos. Comida de alta calidad, producido de una manera saludable es una parte
integral y fundamental para el logro de la Soberanía Alimentaria a través de la
Agroecología, no hay autonomía y soberanía si la población está enferma por el
consumo de alimentos contaminados.
Por lo tanto, la agricultura sostenible, además de ser libre de venenos, tiene
una producción diversificada de alimentos, haciendo que la tabla del productor y el
consumidorcontiene muchas variedades de alimentos diferentes, contribuyendo así a
la plena salud. La biodiversidad que se encuentra en la naturaleza es la base de una
comida rica y saludable, además de satisfacer otras necesidades básicas para el
desarrollo de la humanidad. Y esta biodiversidad se corta cuando los pesticidas,
fertilizantes químicos y transgénicos se convierten en la principal forma de actividad en
la producción de la agricultura capitalista.
En esta misma línea de pensamiento se puede ver que las consecuencias de
las acciones de los seres humanos en la naturaleza son evidentes en todas las partes
del mundo. Una de las actividades quemás cambia, explora y degrada el medio
ambiente es la agricultura modernizada, es decir, que a gran escala, se centró en la
producción de comida con valor en el mercado, especialmente internacional (Veiga,
Silva, Veiga, 2005). Además de los estragos de los pesticidas, como el exterminio de
varias especies de flora y fauna fundamentales para el complejo funcionamiento de los
ecosistemas locales, el uso intensivo de los recursos hídricos y del suelo provoca
diversos tipos de degradación. Los seres humanos degradan su calidad de vida
mediante la degradación de la naturaleza y los recursos naturales.
O usointensivo do solo, aliado a um manejo inadequado, potencializa
um processo naturalde erosão e assoreamento dos cursos de água.
Associado ao problema da erosão estáo uso indiscriminado dos
agrotóxicos. O uso desses produtos químicos é um dosmais graves
fatores de deterioração da qualidade dos recursos hídricos. Estudos
em várias regiões do país demonstram que acontaminação dos
recursos hídricos por agrotóxicos representa um problema real
quepode trazer sérias consequências para o meio ambiente e para a
saúde humana(VEIGA et al., 2005, p. 4260).
Además de las dimensiones de la salud humana, la preservación de la flora, la
fauna y los recursos naturales, otra dimensión de gran importancia en la producción de
base sostenible y diversificada es el mercado. El establecimiento de pequeñas ferias y
65
mercados, cerca del sitio de la producción, la adhesión a una nueva condición
socioeconómico de consumo es fundamental. De este modo se eliminan los
intermediarios, el alto consumo de petróleo para el transporte a largas distancias, y
establece otras relaciones, si no la única, económica.
Esta proposta de soberania alimentar enfatiza os circuitos locais de
produção-consumo […] a ideia de uma aliança entre agricultores e
consumidores é considerada estratégica. Os consumidores devem
tomar consciência de que sua qualidade de vida está intimamente
associada aos modelos agrícolas e seus múltiplos serviços
ambientais. Esta multifuncionalidade só emerge quando as paisagens
estão dominadas por unidades produtivas pequenas
e
biodiversificadas, sendo, no fim dascontas, mais produtivas que as
grandes monoculturas (Marques, 2010, p. 83).
En este sentido, las políticas sociales, culturales, económicos y ambientales
deben ser articuladas con el fin de establecer un proceso de rediseño de las relaciones
de producción, suministro, elaboración y consumo de alimentos (Perez-Cassarino,
2012). Las medidas públicas y las políticas de formación inicial y continua son
necesarios para asegurar que los agricultores son capaces de organizarse para
construir mercados locales que puedan garantizar el flujo de exceso de producción, sin
intermediarios, fortalecimiento del productor y beneficiando al consumidor.
Considerações Finais
Las Formas y estrategias para buscar la Soberanía Alimentaria pasa por varias
dimensiones, desde la producción de alimentos a través de los sistemas de producción
sostenibles guiadas por Agroecología, a la educación política para las personas que
viven en el/de el campo pueden ser reconocidos como sujetos de la historia, los
sujetos socioculturales que mantienen una relación directa con los aspectos políticos,
económicos y ambientales de la producción de alimentos y el afrontamiento del capital.
La necesidad de establecer, ampliar y consolidar formas alternativas de
producción de alimentos, pasando por toda la cadena de producción, es inminente. La
propuesta de la Vía Campesina, con el lanzamiento del concepto de Soberanía
Alimentaria, serpentea cadena de producción en su totalidad. Es una propuesta
innovadora para enfrentar el capital y el modelo hegemónico de producción de
alimentos.
Pensando en las dimensiones involucradas en el camino hacia el logro de la
Soberanía Alimentaria, proponiendo la autonomía de lãs personas involucrados en
toda la cadena de producción es de suma importancia para profundizar el debate
66
sobre semillas modificadas genéticamente, insumos químicos y el mercado global.
Semillas transgénicas excluen la capacidad de la agricultura familiar a controlar su
producción, dejando como rehenes de las multinacionales a través de paquete
tecnológico involucrado en esta lógica de producción.
Creemos que las políticas públicas son necesarias que promuevan la transición
del modelo de producción hegemónico hacia la Agroecología. Sin embargo, se
necesita este tipo de políticas públicas que realmente son eficaces e involucran a
todos los agricultores familiares. El derecho a controlar sus semillas, el manejo de sus
cultivos y de la forma de distribución es fundamental en la producción de alimentos
sanos y la preservación de los recursos naturales. Además, hay que luchar contra la
concentración de la tierra y la concentración de la riqueza, que genera las
desigualdades sociales en Brasil.
Es necesario garantizar la dimensión de la salud de los alimentos, así como el
uso de bio-fertilizantes y control de plagas a través de prácticas y manejos de los
recursos naturales de manera sostenible. Ellos pueden y deben ser producidos en la
unidad de producción, reduciendo los costes de producción y la reducción de la
contaminación a cero. Además, la gestión sostenible y adecuada protege los recursos
naturales y reduce los efectos dañinos de las actividades humanas sobre ellos.
La construcción de los mercados locales - ejemplificado por ferias - elimina los
intermediarios, los costos de transporte a larga distancia y el uso de sustancias que
mantienen los alimentos con "aspecto saludable" el tiempo suficiente para que puedan
ser vendidos en grandes cadenas de supermercados. Tenga en cuenta que,
actualmente, la mayoría de los consumidores de alimentos procedentes de la
agricultura sostenible (base ecológica) está en las clases media y alta, que debido a
que estos productos fueron elitizados por grandes cadenas de supermercados, que
impiden a la población de bajos ingresos comprarlos, por lo que también la importancia
de los mercados locales, mercados alternativos.
En todo este contexto, la dimensión cultural está intrínsecamente relacionada
con el derecho de los campesinos a existir como sujetos sociales, dotados de muchos
conocimientos tradicionales que trascienden las zonas rurales como medio de
producción, para construirlo como un espacio vivido. Y, sin embargo, el concepto de la
Soberanía Alimentaria lleva consigo la importancia de las mujeres en el contexto del
mundo del trabajo en el campo, la construcción de una visibilidad que rompe con la
presentación que el patriarcado les impone.
La Soberanía Alimentaria, por lo que depende de una compleja reorganización
de los sistemas de producción y distribución, depende principalmente de una nueva
visión de la sociedad con respecto al consumo. Mediante pequeñas redes de
67
solidaridad que proporcionan las transformaciones locales, puede revolucionar el
conjunto en la búsqueda de un mundo con mayor equidad.
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69
A POLÍTICA DE ASSENTAMENTOS RURAIS NO BRASIL: A REFORMA
AGRÁRIA CONSERVADORA E A LUTA “NA” TERRA
Iolanda Lopes de Oliveira- Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Vera Maria FavilaMiorin- Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Luiz Felipe Sausen de Freitas- Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Alecsandra Santos da Cunha- Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
Este trabalho tem como objetivo analisar a luta pela terra e a sua conquista no Brasil.
Desde as ocupações de terra, principal forma de luta camponesa a criação dos
assentamentos rurais pelo Estado, questionando o quão eficaz é o processo da
reforma agrária no País. Além de ponderar a luta na terra, fator relevante para a
manutenção e desenvolvimento futuro desses assentamentos. Lançando mão dos
dados fornecidos pelo Dataluta, faz-se uma retomada histórica de 1988 a 2012, das
ocupações e implantação de assentamentos e por fim uma breve análise das
condições para o desenvolvimento deste.
Palavras-chave: luta pela terra, reforma agrária, assentamentos rurais, luta na terra.
Introdução
O Brasil, desde o início de sua colonização, tem sua história marcada por políticas que
beneficiamo crescimento da desigualdade social. São séculos de favorecimento a
latifúndios e grandes propriedades rurais em detrimento dos minifúndios e das
pequenas propriedades, muitas vezes incapazes de permitir a reprodução de
seus proprietários, agricultores familiares.
A partir de 1960 o debate a cerca da questão agrária Brasileira ganha força
principalmente entre os intelectuais da época e passa a ser defendido por alguns
partidos políticos como o Partido Comunista Brasileiro (PCB); setores reformistas da
Igreja Católica; a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal);
ealguns economistas conservadores. O assunto ganha força no cenário nacional e
impulsiona a criação do Estatuto da Terra em 1964, considerado um marco na luta
pela reforma agraria no país.
Porém apesar dos esforços e avanços neste setor, ainda pode-se considerar
que a tão sonhada reforma agrária, reivindicada por muitos, principalmente pelos
70
movimentos socioterritorias, não ocorrera de fato, ou pelo menos não como planejada.
Embora tenham ocorrido inúmeras ocupações de terra por todo o país desde então, a
resposta do Estado é tímida, foram cerca de nove mil assentamentos criados no país,
e em numero desproporcional a cada região geográfica brasileira. A região Centro sul
que concentra a maior parte da população brasileira e da riqueza nacional, além de
milhões de expropriados e camponeses em vias de desintegração devido à
modernização da agricultura e industrialização do país, foi a menos favorecida na
implantação dos assentamentos, enquanto a região Norte, com menor contingente
populacional, e menor número de ocupações, além de pouca estrutura para a criação
dos assentamentos, recebeu um numero considerável de novos assentamentos, haja
visto que para se implantar um assentamento rural, inúmeras variáveis devem ser
levadas em consideração para garantir seu desenvolvimento futuro.
Portanto, a reforma agrária apresenta um aspecto não reformista de fato, pois
preserva as regiões de capital consolidado como o Sudeste, Sul e parte do Centro
Oeste e aposta na fronteira agrícola da Amazônia para a implantação desses
assentamentos rurais. Assim temos no Brasil uma reforma agrária conservadora, que
apesar de criar novos assentamentos, conserva a estrutura agrária já consolidada no
capital e maquia os reais problemas do rural brasileiro.
A política de assentamentos rurais no Brasil e a Reforma Agrária conservadora
O Brasil se caracteriza como um país que apresenta imensas desigualdades
sociais e regionais resultantes da concentração da riqueza.
Fato que pode ser
comprovado ao se analisar o processo de formação da estrutura agraria do país, que
desde o inicio favoreceu o desenvolvimento da grande propriedade em detrimento a
pequena. De acordo com Giraldi e Fernandes (2008, p. 73) os problemas da questão
agrária, relativos à vida e produção no campo, compõem o conjunto de questões que
barram outro modelo de desenvolvimento para o país, mantendo suas características
contraditórias em favor de um pequeno número privilegiados que detém os meios
de produção e controlam a política e as finanças.
Segundo Stedile (2006, p.35) principalmente após 1964, com o país
enfrentando uma profunda crise econômica, três questões se apresentavam como
principais exigências para acelerar o processo de desenvolvimento capitalista do
Brasil, são elas: o combate à inflação, a alteração da politica externa e a
“modernização” da agricultura. Em relação ao combate a inflação, o governo militar
implantou a chamada politica de “recessão calculada”, que tinha como principal
pressuposto a superexploração seletiva da força de trabalho e o arrocho salarial
71
seletivo. Quanto à politica externa, ficou mais evidente a aproximação já esperada
com os Estados Unidos, e por fim quanto à “modernização”, colocava-se como
inevitável a reforma agrária.
Um dos primeiros atos do governo militar foi então a criação do Estatuto da
Terra, que foi apresentado no dia 26 de outubro de 1964 e aprovado no dia 30 de
novembro de 1964.
O estatuto então apresentado como umas das prioridades
governamentais levanta a questão da reforma agraria como chave para a resolução
dos problemas agrários da época, dando a terra uma nova regulamentação,
modificando-se a estrutura agrária do País. De acordo com o então presidente Castelo
Branco, honrando também os compromissos internacionais assumidos na Carta de
Puntadel Este, a qual em seu Título Primeiro, art. 6°, dispõe:
[...] que as Repúblicas Americanas procurarão, entre outros objetivos
a serem atingidos nesta década Impulsionar, respeitando as
particularidades de cada País, programas de reforma agrária integral,
encaminhada à efetiva transformação onde for necessária a
modificação das estruturas dos injustos sistemas de posse e uso da
terra, a fim de substituir o regime de latifúndios e minifúndios por um
sistema justo de propriedade, de maneira que, complementada por
crédito oportuno e adequado, assistência técnica, comercialização e
distribuição dos seus produtos, a terra se constitua, para o homem
que a trabalha, em base da sua estabilidade econômica, fundamento
do seu crescente bem-estar e garantia de sua liberdade e dignidade”.
No entanto de acordo com Ianni (1981), a reforma agraria proposta por Castelo
Branco, tida como “democrática e cristã”, voltava-se para o aumento da produção e da
produtividade, bem como para a consolidação da propriedade privada no campo.
Ainda, segundo Graziano da Silva (1982), o Estatuto da Terra teve como
especificidade o fato de conter em seu bojo duas estratégias distintas: uma
“distributivista”, voltada a democratização da propriedade da terra; e a outra
“produtivista”, concentradora, sinalizando a opção que prevaleceria nos anos 1970, a
chamada “modernização conservadora”.
A criação e a implantação de assentamentos rurais no território nacional deixa
evidente que a prometida reforma agraria, não se consolidou como deveria se
apresentando de maneira tímida, ou como afirma Girardi (2008) uma “reforma agraria
conservadora”.
A implementação desses assentamentos rurais se consolidaram principalmente
após as duras reivindicações dos movimentos socioterritorias espalhados por todo o
País, porem essa etapa constitui apenas uma parte da luta, a conquista da terra,
posteriormente o então assentado ainda precisa conquistar condições de vida e
produção na terra; resistir na terrae lutar por um outro tipo de desenvolvimento
que permita o seu estabelecimento estável, o processo de “luta na terra”.
72
No Brasil, a ocupação é a principal estratégia de luta pela terra realizada pelos
movimentos socioterritoriais. Os dados do Banco de Dados da Luta Pela Terra
(DATALUTA) de 2012, mostram que no país entre os anos de 2000 e 2012 foram
cerca de 5.344 ocupações, mobilizando um total de 708.706 famílias. Geralmente, as
propriedades ocupadas são aquelas que apresentam indicativos de descumprimento
da função socialda terra, definida no artigo 186 da Constituição Federal, que diz:
[...] A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,
simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta Lei,
aos seguintes requisitos: aproveitamento racional e adequado;
utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação
do meio ambiente; observância das disposições que regulam as
relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos
proprietários
e
dos
trabalhadores(MINISTERIO
DO
DESENVOLVIMENTO AGRARIO, 2007. p.391).
Pinto Jr. e Farias (2005 p. 48) afirmam que não basta que a propriedade rural
seja produtiva (art. 185) no sentido economicista para que não seja passível de
desapropriação; ela deve serprodutiva respeitando simultaneamente os princípios do
art. 186. A produtividade não pode ser alcançada sob consequência de desrespeito
aos aspectos da função social, de forma que essas duas características são
indissociáveis e “a função social écontinente e conteúdo da produtividade”.
A reforma agrária historicamente é defendida como a solução dos problemas
agrários Brasileiros. No entanto a realidade esta longe de atender a essas
expectativas. Em uma analise do período de 1988 até 2006, quando ela foi
intensificada, é possível perceber o quão tímido foram os avanços. As então ações de
reforma agrária no Brasil têm sido baseadas principalmente nas políticas de criação de
assentamentos rurais e de concessão de crédito aos camponeses. Nota-se que essas
ações ocorrem principalmente em regiões que já apresentam uma estrutura agraria
consolidada, como afirma Girardi (2008, p. 79) “pois a forma como é conduzida a
política de assentamentos conserva a estrutura das regiões de ocupação consolidada,
isto é, Centrosul e Nordeste, de forma que o cumprimento dos princípios
constitucionais é muito restrito”.
A partir de 1988, foram contabilizadas no país mais de oito mil e setecentas
ocupações de terra,(gráfico 01) levando mais de um milhão de famílias a viverem por
um longo tempo nos acampamentos, em condições precárias de vida. Em resposta,
os governos criaram desde então nove mil e setenta assentamentos rurais.
Assentando novecentos e trinta e três mil famílias em uma área superior a oitenta e
um milhões de hectares.
73
Mesmo parecendo um numero elevado, ele ainda se configura como uma
característica da reforma agraria conservadora, pois ao analisarmos os dados da
geografia dos assentamentos rurais neste período agrupando os números da luta pela
terra e de sua conquista por macrorregião. Entre 1988 e 2012, de todas as famílias
que participaram de ocupações de terra no Brasil, (figura 01) apenas 9,30% o
aconteceu na região Norte.
Figura 01: Número de Ocupações e de famílias nas ocupações.
Dados: DATALUTA 2012.
Porém, ao contabilizar o numero de famílias “assentadas” pelos governos no
mesmo período (figura 02), 22,9% receberam lotes na região Norte.
As regiões Centro Oeste e Nordeste apresentam equilíbrio entre a proporção
numérica de famílias em ocupações e famílias assentadas em relação ao total
brasileiro. Já no caso do Sul e do Sudeste, ao contrário do que ocorre no Norte, a
74
participação nas ocupações é superior ao assentamento de famílias. Na região Sul o
numero de ocupações é de 12,54%, assentando apenas 9% das famílias, enquanto no
Sudeste o numero de ocupações é superior a 26%, porém assentando 9% do total das
famílias (Tabela 01).
Figura 02: Número de assentamentos e de famílias assentadas de 1988 a 2012.
Dados: DATALUTA 2012
Região
Ocupações
Famílias em
Assentamen-
Famílias
Área dos assen-
de terra
ocupação
tos criados
assentadas
tamentos
Hectares
Norte
817
109.900
2.079
404.242
61.232.525
Nordeste
3.352
448.314
4.123
310.332
10.194.484
Centro-
1.184
194.722
1.237
137.636
8.053.941
Sudeste
2.334
295.242
815
45.412
1.486.148
Sul
1.102
173.480
816
36.214
814.730
BRASIL
8.789
1.221.658
9.070
933.836
81.781.828
Oeste
Tabela 01: Número de ocupações e assentamentos criados discriminados por regiões.
Dados: DATALUTA
ORG: Iolanda Lopes de Oliveira
De acordo com Girardi e Fernandes (2008, p. 80) As regiões Centro-Sul e
Nordeste são as áreas onde a reforma tem sentido e é necessária, pois desconcentra
75
as terras e aperfeiçoa a sua utilização; pois são as regiões em que se concentra a
maior parte da população brasileira, se concentram os milhões de expropriados e
camponeses em vias de desintegração devido à modernização da agricultura e
industrialização do país, não planejadas de forma adequada para garantir a
distribuição da riqueza e absorção desta população por outros setores. Além da
concentração populacional, as regiões de ocupação consolidada, onde se concentram
as ocupações de terra, são caracterizadas pela melhor infraestrutura para produção,
maior mercado consumidor e acesso a serviços básicos como educação, saúde,
eletricidade e saneamento básico. Tendo isso em mente, as ocupações na metade
meridional do país são as que mais contribuem para a realização da reforma agrária,
pois é nessas regiões que a estrutura concentrada já estabelecida deve ser reformada.
O processo da luta “na” terra
Apesar, do considerável número de assentamentos rurais implantados ao longo
deste período, é de fundamental relevância levar em consideração variáveis que
possam
influenciar
futuramente
no
desenvolvimento
e
manutenção
desses
assentamentos.
O Ministério Extraordinário de Política Fundiária afirma que assentamentos
estão apoiados por uma política de crédito própria, através do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA), que financia a implantação dos lotes, com
recursos para a construção da moradia, manutenção da família no primeiro ano, além
de financiar o custeio da produção e disponibilizar crédito para investimento, com
prazos e carências. Além disso, foi implementado o Projeto Lumiar, que deixou de
funcionar ao final do ano de 1999. Esse projeto objetivou fornecer assistência técnica
aos assentados, pois esta era uma das suas reivindicações históricas. Tinha por
finalidade maior: o desenvolvimento das famílias assentadas; a consolidação dos
projetos de assentamento e sua inserção no Município ou região como unidade de
produção competitiva, geradora de renda e emprego; suprir a necessidade de
assistência técnica e a capacitação das famílias assentadas, no que diz respeito à
implantação e desenvolvimento de culturas e pastagens, armazenamento e
comercialização, criação de animais e introduzir novas tecnologias e ações de
estímulo à organização dos assentados (Ministério Extraordinário de Política
Fundiária, 2001).
Em estudo realizado por Bittencourt, Castilho, Bianchini e Silva (1999), sobre
os principais fatores que afetam o desenvolvimento dos assentamentos de reforma
76
agrária no Brasil, os autores concluíram que a qualidade físico-química dos solos, a
disponibilidade de água, a frequência das chuvas e o relevo têm sido aspectos
importantes para determinar o nível de desenvolvimento dos assentamentos.
Consequentemente tais aspectos podem ser considerados como pré-condições para o
êxito dos projetos de assentamento.
Portanto, o aspecto natural é um fator central que pode não só determinar a
diferença entre os assentamentos com maior ou menor nível de desenvolvimento, mas
também, impossibilitar o próprio desenvolvimento produtivo. Um item da analise faz
referencia ao distanciamento dos projetos de assentamento dos centros comerciais, as
vias de acesso, quando existem, são de extrema precariedade. Tal aspecto foi
sublinhado por Bittencourt e colaboradores (1999 p.22), que evidenciaram que os
projetos de assentamentos “localizados em entorno com produção agropecuária mais
dinâmica – que contam com a presença de mercados específicos interligados com
agroindústrias - tendem a se beneficiar desse entorno”, conseguindo inserir a
produção dos assentados nessas cadeias produtivas. Ou seja, a proximidade do
mercado consumidor e o seu acesso são fatores relevantes para o êxito do
assentamento.
Compreende-se que após passarem por um longo processo de luta “pela” terra,
vivendo em condições precárias em acampamentos por longos períodos, os
assentados se veem obrigados a enfrentar outro processo, o de luta “na” terra, pois
apenas conceder o direito a terra não significa que esse assentado consiga se
reproduzir socialmente.
Ao serem inseridos na realidade dos assentamentos, os
assentados geralmente detentores de nenhum ou pequeno capital, logo se
empobrecem, ao se depararem com as precárias condições, já apresentadas
anteriormente.
Entretanto, esta preocupação é recente. O Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA), a partir dos anos 1990 e do Governo Fernando Henrique
Cardoso, menciona em um relatório apresentado no ano 2000, que o processo de
assentamento somente estaria completo quando os beneficiários estivessem inseridos
no mercado de forma competitiva, reconhecendo a fundamental importância à
viabilização de serviços e infraestrutura básicos. Isso comprova que apenas o acesso
a terra não é suficiente, é preciso apoio governamental para que os assentados
possam permanecer nela, assim a luta “pela” terra passa a ser a luta “na” terra.
Assim, as propostas de politicas para a criação dos assentamentos rurais, são
de fundamental importância para que após a implantação e consolidação destes, os
então moradores ali assentados, consigam alcançar o desenvolvimento, como afirmam
as propostas do II Plano Nacional de Reforma Agraria (PNRA), onde busca-se
77
combinar viabilidade econômica com sustentabilidade ambiental, integração produtiva
com desenvolvimento territorial, qualidade e eficiência com massividade. Criando as
condições para que o modelo agrícola possa ser alterado, introduzindo-se maior
preocupação com a distribuição de renda, a ocupação e o emprego rural, a segurança
alimentar e nutricional, o acesso a direitos fundamentais e o meio ambiente.
Desta forma o II PNRA propõe que a criação e o desenvolvimento dos novos
assentamentos passarão a se orientar por um projeto regional produtivo associado a
um plano de desenvolvimento territorial, definido conjuntamente com os beneficiários e
acompanhado pela assistência técnica. Significando uma oportunidade para ampliar a
oferta de alimentos na região e para promover a diversificação produtiva, como em
função da destinação dos seus produtos e subprodutos – alimentos e geração de
energia. Ao integrar-se aos arranjos produtivos locais, os assentamentos contribuirão
para a expansão das cadeias produtivas existentes ou para a formação de novas
cadeias, dinamizando o desenvolvimento dos municípios e das regiões.
Considerações finais
Ao analisar o cenário rural brasileiro, remete-se a questão agrária no Brasil, a
qual é fruto de um processo histórico que envolve o debate sobre as formas de
ocupação, expansão das fronteiras territoriais e agrícolas e de acúmulo de riquezas
por parte das forças hegemônicas.Um espaço construído socialmente para tender à
expansão mundial do modo capitalista de produção, uma expansão calcada na
exploração, na apropriação do tempo de trabalho e na partilha desigual de riqueza
produzida. Para tanto, há a necessidade de se contrapor a esses elementos que
resultam no êxodo rural, pois o campo, além de espaço produtivo, é lugar de vida, de
interação social, condição muitas vezes colocada em segundo plano.
Apesar do grande esforço dos movimentos socioterritorias pela conquista da
terra, a resposta do Estado ainda pode ser considerada tímida. De 1988 a 2012 foram
criados e implantados mais de 9000 assentos rurais, assentando um pouco mais de
um milhão de famílias, porém esses números apesar de parecerem otimistas, ao ser
analisados do ponto de vista geográfico, não se caracteriza como animadores para a
tão sonhada reforma agraria, ao contrario revela um cenário maquiado, caracterizando
um processo de reforma agraria conservadora.
Pois para não modificar a estrutura agraria atual e consolidada do país de
favorecimento ao grande capital que se concentra principalmente na região Centro sul
e Nordeste, a região de fronteira agropecuária na Amazônia passa a ser a válvula de
escape para a criação dos assentamentos rurais. A maioria das ocupações de terra
78
ocorre nas regiões Sul e Sudeste, porém são as regiões com menor número de
implantação de assentamentos, caso contrário da região Norte que apresenta o menor
numero de ocupações, mas ganha no número de assentamentos e famílias
assentadas. Esta frente pioneira na Amazônia não apresenta boas condições para a
implantação dos assentamentos, pois tembaixa densidade de infraestrutura,
precariedade de serviços básicos e pouco mercado consumidor. Assim os
assentamentos são precariamente instalados, o que faz com que a estratégia de
gastar menos com a reforma agrária na fronteira agropecuária funcione, já que o
interesse é o número de famílias assentadas e não a qualidade de vida dessas
famílias.
Em relação à criação dos assentamentos e a qualidade de vida dessas
famílias, Inúmeras variáveis devem ser observadas antes desta implantação,
respeitando especificidades locais, a fim de atender as demandas futuras destes
assentados, como por exemplo, boas condições de topografia e solo, favorecendo a
produção e o melhor desenvolvimento das atividades agropecuárias. A presença de
um mercado consumidor próximo, onde esta produção possa ser comercializada, e
boas condições das vias de acesso essas localidades, assim como o transporte. A
presença da assistência técnica e da extensão rural, para facilitar e sanar duvidas dos
assentados referentes a problemas encontrados durante o processo produtivo, haja
visto que uma realidade dos assentamentos rurais brasileiros atualmente é a grande
diversidade de pessoas, originarias de varias regiões do pais, que não conhecem as
especificidades locais, dificultando a adaptação dos mesmos aos cultivares locais,
atrapalhando o desenvolvimento da produção e consequentemente a obtenção de
renda através das atividades agropecuárias. Entre outras tantas variáveis a serem
observadas.
Assim, após passarem por um longo processo de luta “pela” terra, vivendo em
condições precárias em acampamentos por longos períodos, os assentados se veem
obrigados a enfrentar outro processo, o de luta “na” terra, pois apenas conceder o
direito a terra não significa que esse assentado consiga se reproduzir socialmente e
permanecer no assentamento.
Referências
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assentamentos brasileiros: espaços de pesquisa. Rio de Janeiro: DL Brasil.
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79
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80
O TURISMO RURAL NO DISTRITO DE ARROIO GRANDE – SANTA
MARIA/RS
Lisane Regina Vidal Conceição – Universidade Fedaral de Santa Maria
[email protected]
Jante Webler Cancelier – Universidade Fedaral de Santa Maria
[email protected]
Resumo
A inserção da pluriatividade na agricultura familiar assinala a presença de novas
territorialidades, baseadas nas atividades do turismo rural que contribuem para a
reprodução e permanência do homem no campo. Neste contexto, o turismo rural é
visto como o conjunto de atividades desenvolvidas no meio rural, comprometido com a
produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, bem como
promovendo o resgate do patrimônio cultural e natural da comunidade envolvida.
Neste sentido, o trabalho tem por objetivo analisar os processos e as dinâmicas
colocadas no espaço rural do Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria –
RS desenvolvidas pela agricultura familiar.
Palavras-chave: Pluriatividade; Agricultura Familiar; Território.
Resumen
La inserción de la pluriactividad en la agricultura familiar señala la presencia de nuevas
territorialidades, basadas en las actividades del turismo rural que contribuyen para la
reproducción y permanencia del hombre en el campo. En este contexto, el turismo
rural es visto como el conjunto de actividades desarrolladas en el medio rural,
comprometido con la producción agropecuaria, agregando valor a los productos y
servicios, bien como promoviendo el rescate del patrimonio cultural y natural de la
comunidad. En este sentido, el trabajo tiene como objetivo analizar los procesos y las
dinámicas colocadas en el espacio rural do Distrito de Arroio Grande, condado de
Santa María-RS desarrolladas por la agricultura familiar.
Palabras clave: pluriactividad, agricultura familiar, territorio.
Introdução
Diversos autores ao longo dos anos têm se interessado pelos estudos do
espaço rural ocupado pela agricultura familiar, entre outras questões, estes buscam
demonstrar a importância deste segmento para o Brasil. Na contemporaneidade a
característica essencial das unidades familiares é constituída pela necessidade
constante de adaptação a novos cenários. “As explorações familiares que se
mantiveram são as que souberam, ou puderam adaptar-se às exigências impostas por
situações novas e diversas” (LAMARCHE,1993, p.21).
Neste contexto, a pluriatividade para a agricultura familiar caracteriza a
presença de novas territorialidades, baseadas em atividades como o turismo rural que
contribuem para a reprodução e permanência do homem no campo. O turismo rural é
visto como o conjunto de atividades desenvolvidas no meio rural, comprometido com a
produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e
promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade. (MINTUR, 2003, p.07).
81
O turismo rural esta sendo adotado pelo agricultor familiar como recurso para
encontrar, na diversificação de suas atividades econômicas, o meio de viabilizar sua
permanência e continuidade as suas atividades no meio rural. Neste sentido, este
artigo se propõe a compreender os processos e as dinâmicas colocadas no espaço
rural do Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria/RS, especificamente para
a agricultura familiar. Inicialmente trazem-se algumas colocações acerca do conceito e
definição de território, na seqüência procura-se discutir as novas tendências colocadas
para os territórios rurais de Santa Maria/RS, principalmente com atividades
relacionadas ao turismo rural.
Metodologia
A pesquisa caracteriza-se pela abordagem qualitativa. Apresenta uma
abordagem interpretativa que se propõe traduzir e expressar o fenômeno estudado,
também se constitui em um trabalho laborioso, visto que registra as informações,
coleta dados, organiza e realiza as análises (MATOS; PESSÔA, 2009, p. 282). A
pesquisa qualitativa está veiculada à Geografia Crítica, busca, acima de tudo, a
compreensão da essência dos fenômenos estudados.
Para seu desenvolvimento, utilizou-se a pesquisa bibliográfica, a pesquisa
documental, a pesquisa de campo e as análises.
Realizou-se um levantamento bibliográfico para caracterizar a área de pesquisa
com a leitura de artigos científicos e livros relacionados às questões de natureza
teórica que abordem a temática, assim como leituras que possibilitaram a
contextualização e discussão do termo território. A estruturação teórica possibilita a
interpretação da realidade percebida; identificar e representar os fenômenos
socioeconômicos e culturais responsáveis pela manifestação de determinados eventos
(MENDES; PESSÔA, 2009).
Num segundo momento, de fase exploratória, a pesquisa documental, o
levantamento de dados empíricos em fontes secundárias e primárias, junto a órgãos
públicos e associações entre as quais se destacam o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), Censos Agropecuários e Demográficos na Fundação de
Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE), a Secretaria de Desenvolvimento
Rural de Santa Maria – RS.
Esta fase do estudo permitiu acesso a informações históricas, econômicas,
sociais e estruturais sobre a região. Os dados levantados forneceram subsídios para
compreensão das relações que se estabelecem na área de estudo, possibilitando um
esforço de apreensão do espaço geográfico.
82
Os dados qualitativos foram obtidos por meio de entrevistas semiestruturadas
dirigidas ao Secretário de Desenvolvimento Rural e ao Secretário de Turismo de Santa
Maria – RS. O objetivo foi conhecer os projetos e as ações direcionadas para o Distrito
de Arroio Grande. As entrevistas ocorreram de forma direta e seguiram um roteiro
determinado de questões. Optou-se pela entrevista semiestruturada procurando
oferecer ao informante a possibilidade de discorrer sobre o tema de forma espontânea
e abrangente. No momento posterior a coleta de dados qualitativos, através de um
processo investigativo, foi possível eleger o espaço que seria foco de nossas análises.
Elegeu-se a Rota turística e gastronômica de Santa Maria – Silveira Martins como o
foco central da análise no que se refere às atividades atreladas ao turismo rural.
Posterior a esse momento, realizaram-se trabalhos de campo percorrendo o
trajeto entre Santa Maria, especificamente o distrito de Arroio Grande, até Silveira
Martins. A técnica utilizada para a coleta de dados, nesta fase, foi a observação
simples. A observação simples coloca-se num plano cientifico, pois vai além da
simples constatação dos fatos, a coleta de dados é seguida de um processo de
análise e interpretação, o que lhe confere a sistematização e o controle requeridos dos
procedimentos científicos (GIL, 2010, p. 101).
Discussão
Conceituando e definindo território
Do ponto de vista geopolítico, o território é compreendido como Estado-Nação,
a partir do momento em que há uma organização em sua defesa. O termo território
abrange o sentido de um campo de forças ou uma rede de relações sociais,
econômicas, culturais e políticas, que se projetam no espaço. É moldado a partir das
combinações de condições e forças internas e externas, que devem ser
compreendidas e entendidas em sua totalidade espacial. No território se inclui a
interação entre duas categorias - base da Geografia: sociedade – natureza e onde se
projetou trabalho, seja por meio de energia, informação, conhecimento ou técnica, e
que, devido a isso, revela relações de poder.
O território não é simplesmente um elemento que contém recursos naturais e
pessoas. Para Gonçalves (2002, p.230) “o território é uma categoria espessa que
pressupõe um espaço geográfico que é apropriado e esse processo de apropriação territorialização – enseja identidades – territorialidades”. Na seqüência ainda destaca
que a sociedade se territorializa sendo o território sua condição de existência natural.
Desta forma, vão se materializando em diferentes temporalidades determinadas
83
configurações territoriais.
Já Clavijo (2011, p.139) coloca que El territorio es, por tanto, el espacio que
acoge y encuyo seno se desarrollala vida social, la actividad económica, la
organización política, el presente y el futuro de una comunidad social. El territorio se
presenta, por tanto, como un sistema activo em continua evolución. Na formação do
território assumem importância as relações culturais entre um grupo ou lugares
particulares, ou seja, apropriação de uma porção do espaço por um grupo, definindose como elemento constitutivo de sua identidade. Portanto, as diferenças e/ou
desigualdades dos territórios são resultantes das características físicas, humanas e
culturais, moldadas a partir da combinação e das forças internas e externas (relações
de poder) de uma espacialidade.
A influência cultural e histórica do grupo social molda no espaço uma feição
distinta, como que o personalizando, tornando-o sua propriedade, na qual o espaço se
revela como a identidade deste tipo humano (o grupo sociocultural) que sobre ele se
movimenta, atua e se perpetua, reproduzindo o próprio espaço, agora transformado
em sua morada de vida, o seu território.
Na concepção de território e de seu entendimento, VALE, SAQUET e SANTOS
(2005, p.13), mencionam-no como um processo de conjugação de forças, relações e
produções interconectadas, com articulações de aspectos econômicos, políticos e
culturais, no tempo e no espaço. Neste aspecto, cabe ressaltar que as três noções
relacionam-se reciprocamente, ou seja, existe um mutualismo entre idéia e matéria,
em que uma ora outra, em cada lugar ou em cada momento histórico, pode
predominar frente às demais.
A importância da dimensão econômica no território está centrada na dinâmica
econômica em processo de expansão, enquanto que a dimensão cultural do território
deve levar em consideração as origens de cada grupo social, bem como a sua história
ao longo dos tempos, a fim estabelecer seus valores e costumes, os quais marcam o
espaço onde vivem. Neste contexto, Clavijo (2011):
La identidad de un lugar significa el reconocimiento de una trama
colectiva de significados o representaciones ambientales y culturales,
históricamente legada y socialmente adquirida, de la cual derivan
formas particulares de pensar y valorar el entorno y modos de
diferenciarse frente a los otros. De ahí que la identidad territorial
conjugue un tejido de representaciones propias del territorio que la
sociedad adquiereen razón de habitarlo y modelarlo en el transcurso
del tiempo. Múltiples territorios que interactúan de múltiples formas,
se entremezclan en la representación cultural del espacio geográfico.
Por tanto, es importante considerar diferentes enfoques que se
ajustan a las variaciones y especificidades ecológicas, geohistóricas,
antropológicas y económicas de los territórios (CLAVIJO, 2011,
p.140).
84
Contemporaneamente, neste território estão presentes os “mais” e os “menos”
desenvolvidos, os “avançados” ou “dinâmicos” e os “atrasados” ou “tardios”, permitindo
que no seu entendimento esteja presente a ótica tridimensional sociedade- espaçotempo. (RAFFESTIN, 1993, p.160).
Desta maneira, cabe ressaltar que os territórios podem se organizar ou se
dissolver de modo relativamente rápido. Ser antes instáveis do que estáveis, ou ter
existência em alguns momentos. Além disso, possuem capacidade diferenciada de
oferecer competitividade aos investimentos, ocasionando distintas vantagens de
localização produtiva, que podem variar de lugar para lugar ou no decorrer do tempo.
Desta forma, se insere a capacidade de cada território em gerar ou absorver
inovações, maior ou menor capacidade disponível de infra-estrutura e de mão-de-obra
adequadas à localização dos segmentos econômicos intensivos em conhecimento.
A última década do Século XX foi palco de profundas mudanças na política
econômica mundial implicando em transformações nas relações de produção em nível
externo e interno dos países que compõem o grande eixo econômico. Sauer (1998)
entende que o espaço rural teria conhecido transformações como decorrentes deste
novo patamar de internacionalização e de rearranjo na forma de acumulação do
capital que se materializava no processo de globalização, o qual tem por objetivo a
mudança na natureza e intensidade da revolução científica e tecnológica, como
igualmente a liberalização e integração dos mercados.
Esta estrutura globalizante não só interferiu alterando significativamente os
padrões de concorrência e as condições de acumulação do capital e dos mercados
também vêm provocando a valorização das vantagens comparativas referentes à
qualidade, preço e origem da oferta. Este novo processo em sua marcha desloca o
foco da abundância de matéria-prima barata e da disponibilidade de mão-de-obra para
o domínio das tecnologias e dos recursos humanos. Isto não só tem desarticulado
regiões tradicionalmente fornecedoras de matérias-primas e de mão-de-obra como
também aquelas que não estavam preparadas, tecnicamente, para novos desafios,
como foi o caso de inúmeras regiões brasileiras. Desequilibraram-se as relações no
meio rural, afetando profundamente o setor da produção dirigido ao atendimento do
consumo interno que de uma hora para outra se viu concorrendo, no abastecimento
interno, com produtos similares importados em pleno território nacional.
Entretanto, ao mesmo tempo em que a globalização abriu os mercados e gerou
crises no meio rural e na produção agrícola, também determinou a busca por um novo
paradigma para o desenvolvimento local, através da valorização do lugar em
contraposição ao cenário internacional, pois o processo que globalizou a economia
mundial,
contraditoriamente,
valorizou
as
diferenças
regionais,
ao
priorizar
85
mercadorias exóticas e de procedências fora do circuito das transformações
padronizadas pela tecnologia em curso. Neste contexto, a pluriatividade tem sido uma
estratégia de sobrevivência do homem do campo nos últimos anos.
Nesta linha de pesquisa é válido salientar que o espaço rural não é somente o
espaço destinado produção da agropecuária é um
espaço em
constante
transformação onde novos usos e funções vão surgindo constantemente. O trabalho
de Domingues (2011) especifica que;
... la agricultura no es solamentela que cambia, sino también la
sociedad. La sociedad es la que expresa nuevas exigencias, reclama
alimentos sanos y de calidad, medios rurales bellos y acogedores,
corrientes de agua limpias, um patrimonio rural mantenido y un
ambiente natural preservado. Los territórios rurales se han
convertido para la población urbana en lugares de reposo y
recreación, por lo tanto, esta situación representa para el autor una
buena oportunidad para conocer mejor el trabajo de los productores
y todas sus facetas. Por otra parte, se están generando cambio sem
los lugares de residencia de algunos sectores de la población urbana
que pasan a residir en el campo, buscando mejores condiciones de
calidad ambiental, lo que también incidiría en estas nuevas
oportunidades para los productores. (LAMBERT apud DOMINGUES,
2011, p. 210)
Assim, novos modos de vida passaram a ser valorizados por serem pautados
em sistemas de produção particulares e de especificidade local, principalmente os do
meio rural, passaram a ganhar espaço nos mercados e identificar um lugar, uma
região e até mesmo um modo de único.
Observa-se, ainda que o setor agrícola, especificamente o determinado pela
presença da agricultura familiar, vem sendo entendido como uma estratégia de
manutenção do emprego e da recuperação e de distribuição de renda. Isso é
entendido na medida em que a agricultura familiar emprega mais de 80% da mão-deobra rural, possui melhor potencialidade de preservação dos recursos naturais,
abastece o mercado interno e gera divisas que permanecem no país. A valorização do
local, de alimentos mais saudáveis e de produtos naturais, também é visto como
positivo.
Assim, verifica-se nos anos 90 uma intensificação de “novas” atividades
agrícolas e não-agrícolas no campo brasileiro, impulsionadas por demandas
específicas das classes média e alta urbana. Essas atividades atuam em nichos
específicos de mercado, diferenciando-se das tradicionais “commodities” direcionado
ao mercado nacional e internacional, respondendo, assim, por uma produção “pósfordista”. Entre essas atividades pode-se citar: piscicultura; criação de animais de alto
valor agregado, como rã, scargort; produção orgânica de ervas medicinal e de
temperos e condimentos; produção orgânica de verduras e legumes; turismo rural;
86
fazenda-hotel e revitalização crescente de atividades tradicionais como o artesanato e
agroindústria artesanal rural (SILVA et al, 1997, p. 62).
O turismo rural no Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria/RS e a
construção de novas territorialidades
O município de Santa Maria - RS está localizado na região central do Estado
do Rio Grande do Sul, conforme Figura 1. Possuiu uma população de 262.368 mil
habitantes, sendo que mais de 95% desta população vive na área urbana (IBGE,
2011). Sua configuração territorial está associada ao processo de ocupação e
formação socioeconômica da região central do Rio Grande do Sul. Neste município,
assim como na região, ocorre o predomínio dos estabelecimentos agrícolas familiares.
A forma como foram ocupadas e distribuídas as terras refletem a atual estrutura
fundiária do município e da região.
Figura 1 – Localização do município de Santa Maria no estado do Rio Grande do Sul.
As
características
naturais
e
o
tamanho
dos
estabelecimentos
são
determinantes no uso e ocupação do solo, pois determinam o tipo de atividade
agrícola que poderá se desenvolver. Neste sentido, cada distrito apresenta
características especificas o que possibilita o desenvolvimento de diferentes
atividades.
87
O espaço rural de Santa Maria - RS é um espaço heterogêneo, pois, comporta
uma diversidade de atores sociais. Materializam-se no espaço a pequena
propriedade15, a média propriedade e a grande propriedade. Cada tipo de propriedade
possui especificidades que as diferenciam entre si. A complexidade de realidades
existentes dentro do espaço geográfico está evidenciada nas características distintas
presentes no território.
Em toda a região do Rio Grande do Sul, assim como em Santa Maria/RS, a
impossibilidade que os agricultores familiares encontram para adquirir novas terras
ocasiona à exploração desenfreada dos recursos naturais. Ao longo dos anos, esse
processo tem ocasionado à perda da fertilidade natural dos solos e a contaminação
dos recursos hídricos, ocasionando queda na rentabilidade da agricultura. Dentro
dessa perspectiva, os espaços rurais estão em constante transformação, modificados
diariamente pelas atividades realizadas em seu espaço.
Na contemporaneidade o foco das discussões para o desenvolvimento dos
espaços rurais embasa-se na análise do território e ambiente. A valorização dos
recursos naturais e das potencialidades locais tem possibilitado novas dinâmicas
econômicas para os territórios. Os agentes territoriais interessados neste novo
mercado evidenciam-no como um espaço onde se tem qualidade da vida e bem-estar,
criando novos usos, principalmente através dos condomínios rurais fechados, das
chácaras de lazer e do turismo rural. Reiterando estas afirmativas Graziano Silva et al.
(1997, p.14) salienta que;
... o processo de geração de “novas” atividades no meio rural
brasileiro mostra pelo menos duas características comuns. A
primeira refere-se ao fato de que elas se originaram de importações
de outros Países, e a segunda se refere às atividades que antes não
eram comerciais, isto é tinham apenas valores de uso e não valores
de troca. Em ambos os casos o importante é que se criam novos
espaços de reprodução do capital no meio rural brasileiro, muitas
vezes revigorando regiões e/ou atividades tradicionais que se
mostravam decadentes ....
Constata-se que no Distrito de Arroio Grande em Santa Maria/RS está mais
inserida na segunda opção. Muitas atividades que outrora tinham somente valor de
uso passaram a ter valor de troca, exemplos são as atividades relacionadas ao turismo
rural.
O turismo é um fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e
temporário de indivíduos ou grupos de pessoas que, fundamentalmente por motivos
15
Pequena propriedade é aquela que possui área entre um quatro módulos fiscais. Média
propriedade aquela que possui área superior quatro e até 15 módulos fiscais. Grande
propriedade aquela que possuir mais que 15 módulos fiscais (Lei 8629/93).
88
de recreação, descanso, cultura ou saúde, saem de seu local de residência habitual
para outro, no qual não exercem nenhuma atividade lucrativa nem remunerada,
gerando múltiplas inter-relações de importância social, econômica e cultural (DE LA
TORRE, 1992, p.15).
Desta forma, novos usos e funções surgem e ressurgem cotidianamente para a
agricultura familiar, no Distrito de Arroio Grande estas tendências também se
manifestam nos territórios, através de diversas atividades entre elas o turismo rural.
O Ministério do turismo compreende que o turismo rural representa o “conjunto
das atividades turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometidas com a produção
agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o
patrimônio cultural e natural da comunidade”. Ainda evidencia que o meio rural pode
ser “aproveitado para o turismo, mas não só as propriedades, como também os
atrativos e produtos existentes no campo podem ser uma opção para os turistas e uma
oportunidade para os que nele vivem”. Neste contexto, são passíveis de serem
explorados economicamente nos territórios atividades como:
Bebidas e alimentos in natura – cereais, peixes, frutas, legumes,
verduras orgânicas – ou processadas – vinho, doces, mel, pão,
Artesanato e outros produtos associados ao turismo, criação de
animais, atividades eqüestres e de pesca, atividades de ecoturismo,
esportes de aventura, caminhadas, atividades folclóricas, música,
dança, tradições religiosas, gastronomia, saberes e fazeres locais,
atividades recreativas no meio rural, visitação a fazendas, casas de
cultura e ao patrimônio (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2014).
De forma geral, pode-se dizer que estas atividades estão presentes nos
espaços rurais e urbanos de Santa Maria. As distintas características encontradas em
seu território tornam o município atrativo ao desenvolvimento de diversas atividades
entre elas o turismo rural. Santa Maria possui segundo o Plano Municipal de Turismo
(2009, p. 10) “uma atratividade peculiar em virtude de sua privilegiada localização
geográfica, permitindo contemplar cenários formados por montanhas, morros e vales
em uma única imagem”. Nos distritos, especialmente em Arroio Grande, há uma
natureza exuberante e herança histórico-cultural, que garante um lazer recheado de
tipicidades.
Atualmente, tramitam na Prefeitura de Santa Maria vários projetos que
procuram dar visibilidade aos distritos rurais, esses buscam acima de tudo tornar os
espaços mais dinamizados e atrativos ao público urbano. Contudo, de forma
consolidada para o turismo rural se tem somente a Rota Gastronômica de Santa Maria
– Silveira Martins. Esta rota possui 43 pontos de visitação, que vão segundo o Plano
Municipal de Turismo (2009, p. 59) do Distrito de Arroio Grande a Silveira Martins, o
berço da colonização italiana. “No roteiro, há fábricas de facas, restaurantes,
89
agroindústrias, balneários, belvederes, monumentos, igrejas, capelas, um museu e
espaços dedicados ao Turismo ecológico, de aventura e rural”.
Esta rota de turismo rural é estruturada e dinamizada, sua potencialidade de
crescimento está relacionada à infraestrutura de acesso. A maior parte do trajeto é
asfaltada e bem sinalizada, no caminho estão dispostas várias placas direcionando os
turistas aos pontos onde os serviços são ofertados. A disponibilidade dos serviços de
telefonia, rede elétrica, assim como a produção primária diversificada e a produção
artesanal de produtos de origem local são elementos que contribuem de forma
significativa para o desenvolvimento da Rota Gastronômica. A procura ocorre
principalmente pelos restaurantes que oferecem comida típica italiana, assim como, a
beleza das paisagens naturais existentes na região.
A valorização da cultura por meio da gastronomia está agregando valor na
renda dos agricultores e produzindo oportunidades de emprego no espaço rural,
tornando o espaço atrativo principalmente para os jovens residentes. Além de
contribuir para o aumento da auto-estima dos agricultores, pela melhoria do visual e do
ambiente rural. É também uma estratégia para preservar a cultura e a tradição
colonial.
O que se percebe é que no Distrito de Arroio Grande novas territorialidades vão
surgindo e o capital ao longo dos anos vem articulando alguns territórios e
fragmentando/marginalizando outros. Neste contexto, os espaços dinamizados são
aqueles que apresentam infraestrutura e serviços adequados para o turismo rural.
Conclusões
De forma geral no Brasil, percebe-se que nos mais diferenciados territórios
ocorre o desenvolvimento desigual e contraditório. E o agricultor familiar inserido
nesse processo historicamente é confrontado com problemas de ordem estrutural e
funcional. Os projetos que incentivam a produção familiar, assim como, as atividades
implementadas, têm gerado maior dinamismo econômico aos estabelecimentos
agrícolas.
Atualmente, não existem alternativas prontas, construídas para a agricultura
familiar, o que existe são estratégias que em curto prazo mantém os produtores no
espaço rural. As alternativas colocadas para a diversificação no meio rural devem
acima de tudo qualificar a atividades desenvolvidas pelos agricultores familiares.
Para viabilizar o estabelecimento os agricultores investem em várias atividades
e posteriormente mantem o foco em atividades que oferecem maior retorno. Este fato
comprova a multifuncionalidade e a pluriatividade do espaço rural de Santa Maria,
90
cujos agricultores realizam uma busca constante de alternativas para garantir a
reprodução social das famílias. Dentro destas alternativas, está o turismo rural.
O turismo rural é uma atividade que surge nos distritos do município, e está se
tornando uma alternativa de renda complementar, contribuindo para o aumento da
auto-estima dos agricultores, pela melhoria do visual e do ambiente rural. No entanto,
não se pode deixar de evidenciar que esta atividade também se consolida pelo
interesse que o capitalismo tem em se apropriar do espaço através dos mais
diferentes tipos de atividades. Atualmente esta é uma atividade pouco promissora em
termos de desenvolvimento socioeconômico, pois a procura pelas rotas do turismo
rural ainda é pequena. A precariedade na infra-estrutura é um agravante ao
desenvolvimento da atividade.
As diferenças econômicas e sociais encontradas dentro dos diferentes espaços
rurais de Santa Maria são expressivas, o que leva a constatação de que os programas
implementados pelo Governo Municipal não estão atingindo de fato todos os espaços.
Muitos espaços rurais vêm perdendo sua vitalidade econômica, tornando-se vazios e
pouco atrativos aos agentes que mobilizam o território. E a agricultura familiar, para
sobreviver neste modelo econômico excludente precisa se reinventar constantemente,
se adaptar aos novos rearranjos espaciais.
Neste sentido, pode-se destacar que o espaço geográfico não é inerente às
ações humanas, ele próprio é parte dessas ações, é reflexo e condição das
materializações do processo de reprodução da sociedade.
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92
GEOGLIFOS NO ALTO CAMAQUÃ, RS: PERSPECTIVAS PARA O
APROVEITAMENTO TURÍSTICO
Simone Marafiga Degrandi – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Magali Rambo Anschau – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Adriano Severo Figueiró – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O conceito de geoglifo tem sido correntemente adotado para designar grandes
estruturas geométricas de terra, em alto ou baixo relevo, encontradas na Amazônia
ocidental, ligadas a práticas culturais de populações tradicionais (SCHAAN et al,
2007). No Rio Grande do Sul, no domínio da bioregião do Pampa, tais estruturas
geométricas também podem ser identificadas, muito provavelmente ligadas às práticas
pecuárias primitivas desenvolvidas por criadores e povos indígenas desde a
introdução do gado no século XVII. Muitas destas estruturas serviram de base para a
reconstrução de currais e cercas geométricas construídas a partir de diferentes
materiais e formatos, servindo como testemunhos pretéritos da atividade pecuária
neste território. Tais estruturas, vistas do alto, podem ser enquadradas como geoglifos,
instigando a curiosidade e despertando interesse em relação a historia de sua
construção e funcionalidade no RS. Nesse sentido, o presente trabalho apresenta o
mapeamento destas estruturas e discute seu potencial de aproveitamento turístico no
território do Alto Camaquã, onde a existência de um vasto geopatrimônio e a
possibilidade de criação de um futuro geoparque, pode agregar valor a partir da
incorporação de alguns destes sítios culturais tipicamente pampeanos. Na área
estudada foram identificados 211 geoglifos, distribuídos em um alinhamento
preferencial de sentido NW – SE, coincidindo com a direção geral de muitas estruturas
tectônicas do Escudo Sul-Rio-Grandense, o que pode indicar um certo favorecimento
geomorfológico para uma das possíveis rotas utilizadas durante o ciclo tropeiro no Sul
do Brasil no século XIX. Ressalta-se a necessidade de estudos mais aprofundados
sobre esta temática, salientando seu valor patrimonial e o respectivo potencial de
qualificação turística para este território.
Palavras-chave: geoglifos; valor turístico; Alto Camaquã; Pampa.
Introdução
O processo histórico de ocupação moderna do Rio Grande do Sul teve início
com a introdução do gado pelos jesuítas no século XVII. Este processo, marcado pela
evangelização das populações indígenas, incluíam as atividades de preia do gado no
campo e a sua guarda em estruturas conhecidas como currais (encerras) e cercas
utilizadas para o manejo destes animais. Vistos do alto, os vestígios de tais estruturas
(muitas das quais reconstruídas nos séculos seguintes e materializadas até hoje na
paisagem) podem ser enquadradas como geoglifos, semelhantes às estruturas
descobertas na Amazônia ocidental na última década (SCHAAN et al, 2007, 2010),
porém, supostamente com outras finalidades. Assim, os geoglifos podem ser
entendidos como estruturas geométricas marcadas no solo, em alto ou baixo relevo,
93
que despertam a curiosidade sobre suas verdadeiras origens e funções e que
representam um patrimônio cultural do território.
A partir do conhecimento do grande número de geoglifos encontrados no
sudoeste do RS, especificamente no território do Alto Camaquã, o presente trabalho
tem a finalidade de apresentar o mapeamento destas estruturas e discutir o
aproveitamento turístico das mesmas, como atrativos adicionais, associados ao já
conhecido potencial geoturístico deste território (BORBA et al, 2013; GARCIA et al,
2013; BORBA, 2014).
A metodologia de trabalho partiu de fontes bibliográficas e documentais, que
permitiram a revisão dos temas em estudo. Para o mapeamento das estruturas foram
revisados e filtrados os dados sobre os geoglifos da região Sudoeste do RS16
produzidos por Farias (2010).
A partir destas informações, os dados foram salvos em formato KML e através
da utilização do software GPSTrackMaker® PRO, foram extraídas as informações de
coordenadas geográficas de cada geoglifo existente dentro da área do Alto Camaquã.
Através do software ArcGIS® 10 com o aplicativo ArcMap™ esses dados foram
organizados em shapefile (extensão e formato de dados no software citado) com a
ferramenta “Editor”, para posterior espacialização.
Para conferência das informações, os geoglifos marcados foram verificados um
a um através do software Google Earth®, com imagens de satélite datadas de junho
de 2014, tendo havido modificações em relação a demarcação inicial dos geoglifos
realizada por Farias (2010). A constatação nas imagens demonstrou que algumas
demarcações não estavam relacionadas com a presença de geoglifos, tendo sido
estes pontos em desacordo editados pela ferramenta “Editor” do ArcGIS®.
Os Geoglifos do Rio Grande do Sul
No Rio Grande do Sul (RS), uma grade quantidade de cercas ou mangueiras
(currais) construídos com pedras, madeiras e árvores plantadas em alinhamento
circular ou apenas em formato de valas na terra, representam, na sua maior parte,
testemunhos atuais de estruturas pretéritas da atividade pecuária, desenvolvida no
estado a partir da introdução do gado no século XVII. Estas estruturas teriam sido
construídas, conforme fontes históricas e documentais, entre os séculos XVII e XIX,
antes da chegada do arame de aço ao RS, que ocorreu por volta de 1870.
16
4https://www.google.com/maps/d/u/0/viewer?mid=zQgcM1ziUZ-Y.k-YRgScb1gD8&hl=en_US,
acessado em julho de 2015.
94
Farias (2010, p.1-2) esclarece a funcionalidade e como eram construídas estas
estruturas, antes da chegada do arame de aço:
(...) Antes disso, as cercas eram feitas com muros de pedra ou com
outros materiais como valas cavadas no chão, madeira beneficiada,
ananás, bananeiras, pessegueiros e outras árvores frutíferas,
bromélias, espinheiros, cana, cactos e até de pau-a-pique. Diferentes
fontes falam das rotas usadas para transporte de vacas, cavalos e
mulas passando por essa região já a partir do século XVIII, e foi
encontrada em um antigo inventário menção a uma Estrada Real
passando pelo local no século XIX. (...) Existem também inúmeras
citações dos currais sendo usados pelos colonizadores da região
durante o século XVIII, na época da preia do gado cimarrón, antes
pertencente aos jesuítas. Segundo mapas antigos e outras
referências, os tropeiros que transportavam esses animais realmente
passavam por ali, além de fotos e textos situarem alguns desses
currais de pau-a-pique e de pedra nos atuais municípios gaúchos de
Pelotas, Capão do Leão, Aceguá, Bagé e em outras cidades
próximas.
Os currais ou mangueiras, como são comumente denominados pela cultura
gaúcha, tinham sua funcionalidade associada ao gado, construídos em locais
estratégicos (rotas) que eram utilizadas por tropeiros17 que viajavam levando o gado,
ou como encerras para o simples manejo dos animais (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006).
Maestri (2010, p.78) aborda o início desta atividade no Sul do Brasil:
O ciclo tropeiro do Sul do Brasil desenvolveu-se, sobretudo, a partir
do transporte e comercialização de mulas. (...) Nos séculos 16, 17 e
18, as mulas foram utilizadas intensamente em múltiplas atividades
de transporte de homens e mercadorias, sobretudo nas zonas de
mineração da América hispânica e lusitana. (...) No século 18, os
muares foram utilizados intensamente nas regiões auríferas e
diamantíferas do Brasil.
A partir século XVIII, o tropeiro partia da região Sudeste até os
campos do Pampa, em busca do gado. Após a preia, seguiam em
grandes comitivas, interrompendo suas viagens durante a noite para
descansar e se alimentar, surgindo assim, postos de descanso e
pernoite, com currais e casas de moradia, que mais tarde comumente
se orientaram à criação animal (MAESTRI, 2010).
A região Sudoeste do RS concentra a maior parte dos currais e cercas
construídas para a encerra do gado vacum, de muares e equinos, mas também podem
ser encontradas no Uruguai e Argentina (de onde grande parte dos animais eram
contrabandeados das possessões espanholas) e nos Estados de Santa Catarina e
Paraná. O tropeirismo, durante o ciclo minerador, articulou as regiões Centro-Sul do
Brasil, através os atuais territórios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná,
17
O termo tropeiro, conforme destaca Maestri (2010, p.78) descreve “o financiador e os
trabalhadores, especializados ou não, que se dedicavam ao transporte de quantidades de
animais, sobretudo muares, cavalares e vacuns, de uma região para outra, através de longas
distâncias”.
95
justificando a construção destas estruturas utilizadas para encerra do gado, em rotas
que seguiam até Sorocaba (SP), onde os animais eram comercializados em grandes
feiras, e depois levados a outros estados brasileiros.
A construção destas estruturas pode ser classificada em quatro tipos distintos:
currais circulares construídos a partir do empilhamento de pedras; currais circulares
formados a partir de valas e muretas de terra; currais circulares configurados a partir
de árvores plantadas em alinhamento circular e, ainda, cercas retilíneas, formadas
pelo empilhamento de pedras. Além das estruturas em formato circular e das cercas
retilíneas, podem ser encontrados currais em formatos retangulares.
Na figura 1, algumas destas estruturas originais estão representadas nas
pinturas do jesuíta Florian Paucke (1719-1780), missionário no Pampa hispânico do
século XVIII. Algumas destas antigas estruturas, utilizadas no manejo do gado em
diferentes períodos, tanto pelos indígenas quanto pelos espanhóis, foram aproveitadas
e reconstruídas pelos tropeiros do século XIX, preservadas até hoje na paisagem do
Pampa.
Figura 1 – Pinturas de Florian Paucke, em Iconografía Colonial Rioplatense (1749-1767), que
ilustram a atividade de manejo com o gado em diferentes tipos de currais.
Fonte – FARIAS, B. M. (2014).
96
Vistas do alto, estas estruturas apresentam geralmente grandes dimensões,
podendo ser enquadradas como geoglifos. Os geoglifos compreendem estruturas ou
grandes figuras construídas na superfície do solo, “criando uma espécie de relevo”,
facilmente visíveis a partir de locais altos, observações aéreas ou imagens de satélite,
possuindo formas variadas, que vão desde configurações geométricas, até formas
humanas (antropomorfas) ou de animais (zoomorfas).
Presentes em diversos países e construídos com diferentes materiais, formas e
tamanhos, o desconhecimento sobre seus significados torna o assunto intrigante e
envolto em mistérios, existindo diversas teorias que vão desde explicações místicas,
cerimoniais, calendários astronômicos, uso agrícola, ou como no caso do RS,
construções destinadas a encerra para o gado.
Uma grande quantidade de geoglifos podem ser encontrados especialmente na
região Andina, em países como Peru, Chile e Bolívia. No sul do Peru, geoglifos
localizados no Deserto de Nasca18, descobertos em 1927, são os mais conhecidos e
impressionantes exemplos destas estruturas, pois apresentam linhas que tomam
formas bastante complexas.
Conforme destacam Schaan, Bueno e Ranzi (2010), no início dos anos 1970
foram descobertas, através de vôos comerciais, algumas estruturas geométricas na
Amazônia brasileira, no Estado do Acre. Estas estruturas, compostas por
monumentais trincheiras e muretas de terra, foram identificadas por ocasião de um
levantamento inicial de sítios arqueológicos realizado na região. Na época, pouca
atenção lhes foi dada, uma vez que os pesquisadores estavam mais interessados em
estudar restos de artefatos cerâmicos, com a finalidade de montar sequências
seriadas que produzissem cronologias de ocupação (SCHAAN; BUENO; RANZI,
2010).
Entretanto, com o intenso processo de desmatamento e construção de
estradas, para o assentamento de fazendas e desenvolvimento da agricultura,
revelaram-se sítios arqueológicos que estavam até então protegidos dentro da floresta
(SCHAAN; BUENO; RANZI, 2010). A partir dos anos 1990, foi possível a identificação
de centenas de geoglifos, concentrados na Amazônia Ocidental, localizados na porção
leste do estado do Acre, atingindo o sul do estado do Amazonas, oeste de Rondônia e
norte da Bolívia.
No RS, as diversas estruturas, tem despertado a atenção de pesquisadores
sobre sua origem e datação. A grande maioria parece ter sido originalmente
18
Os geoglifos do Peru, também são conhecidos como as “linhas de Nasca”.
97
construída entre os séculos XVIII e XIX, mas a delimitação de um período, bem como
a origem das obras, comumente associada à mão de obra escrava, ainda é um ponto
em discussão (ROSTAN, 2015). Algumas destas estruturas, visíveis através de
softwares como o Google Earth, embora muito parecidas com os antigos currais, em
razão do formato circular, possuem origem mais recente, resultado da atividade de
doma de cavalos.
Até pouco tempo, os currais construídos em formato circular eram interpretados
apenas como locais recentes construídos para a encerra do gado. Essa função e
origem, amplamente aceita por pesquisadores e pela cultura gaúcha, vem sendo
questionada devido a semelhança com os geoglifos do Acre. A ideia lançada por
pesquisadores que trabalham no estudo dos geoglifos do Acre de que nem todos os
currais gaúchos tenham surgido a partir do ciclo tropeiro no Sul do Brasil ou as
atividades de preia do gado do século XIX, mas que tenham origem anterior a isso,
apimentou as discussões, levantando a hipótese de que os currais circulares de terra
(em forma de vala) do RS, também pudessem estar associadas a povos précolombianos, como vem sendo apontado por estudos na Amazônia.
Existem muitas controvérsias acerca da origem dos currais circulares de terra,
já que nenhuma das estruturas do RS foi estudada através de escavações ou outros
métodos de investigação arqueológica. Porém, o que se pode afirmar é que estudos
aprofundados precisam ser realizados, bem como garantir a proteção e conservação
dos “geoglifos gaúchos”, já que, estando associados ao início da atividade pecuária no
RS ou à ocupação do território antes disso, por povos pré-colombianos, são símbolos
culturais e evidências arqueológicas de extrema importância histórica e cultural, que
incrementa valor turístico ao território do Alto Camaquã.
Geoglifos no Alto Camaquã
Uma grande quantidade de currais enquadrados como geoglifos neste estudo,
pode ser encontrada nos municípios que compõem o território conhecido como Alto
Camaquã, localizado na Metade Sul do RS. O Alto Camaquã compreende o terço
superior da Bacia Hidrográfica do Rio Camaquã, inserido no contexto geológico do
Escudo Cristalino Sul-rio-grandense e da Bacia Sedimentar do Camaquã, abrangendo
os municípios de Bagé, Caçapava do Sul, Lavras do Sul, Santana da Boa Vista,
Piratini, Pinheiro Machado, Dom Pedrito e Hulha Negra.
Em virtude dessa complexidade do embasamento geológico e da diversidade
de paleodinâmicas associadas, o conjunto de municípios que compõem este território
apresenta feições geomorfológicas que lhe conferem um caráter singular na
98
configuração da paisagem regional, formada pela diversidade de vales e serras,
afloramentos rochosos e vegetação típica do Pampa (SEPLAG, 2008).
A economia destes municípios é bastante diversificada, se destacando a
pecuária extensiva com a criação de bovinos e ovinos, desenvolvida sobre campo
nativo. Conforme salienta Neske (2009), na interface da evolução agrária do território
do Alto Camaquã entre o período de colonização no século XVII até os dias atuais, a
pecuária de corte permanece sendo a principal atividade produtiva, e foi a partir dessa
atividade e das formas sociais coletivas a ela associadas, que se constituiu a
identidade cultural deste território.
Além das características naturais da paisagem, marcada pela grande
quantidade de afloramentos rochosos que limitaram o desenvolvimento de uma
agricultura moderna e mecanizada em grande parte do território, a própria história de
ocupação explica a importância da atividade pecuária e da existência das cercas e
currais nessa porção do Pampa.
Antes do interesse das Coroas Ibéricas pelo atual território do RS, o território
do Pampa era habitado por povos indígenas caçadores, coletores, pescadores e
horticultores incipientes, caracterizados pelas boleadeiras e pelas grandes lanças. O
nome genérico desses povos, os charruas, era também o de um dos seus dois
grandes braços – charruas e minuanos (MAESTRI, 2010).
Após a introdução do gado por jesuítas espanhóis, no início do século XVII nas
Missões Jesuíticas, uma grande área compreendida entre a Laguna dos Patos e os
rios Jacuí no RS e Negro, no Uruguai, onde o gado chimarrão (selvagem) havia
procriado em grande medida, passou a fazer parte da denominada Vaquerías del Mar
(Vacaria do Mar) (MAESTRI, 2010), onde se situa o Alto Camaquã. Este gado solto
nos campos era regularmente capturado por espanhóis e portugueses que buscavam,
incialmente, o couro e o sebo para exportar para a Europa, e também por índios que
habitavam o território.
A partir desta origem geográfica e histórica, associada ao início da atividade
tropeira no Sul do Brasil, se explica a grande quantidade de currais e cercas
(geoglifos) para o trabalho com o gado, encontrados nos municípios que compõem o
território do Alto Camaquã, conforme podemos observar na figura 2 (Mapa dos
Geoglifos no Alto Camaquã-RS).
Como pode ser observado na figura 2, há uma grande concentração de
geoglifos em um alinhamento de direção NW – SE, coincidindo com a direção geral de
muitas estruturas tectônicas do Escudo Sul-Rio-Grandense (VIERO e SILVA, 2010), o
que pode indicar um certo favorecimento geomorfológico para uma das possíveis rotas
utilizadas durante o ciclo tropeiro no Sul do Brasil no século XIX, tal como já apontado
99
por Pereira e Cassol-Pinto (2014) para as rotas tropeiras do primeiro e segundo
planaltos paranaenses. Ao todo foram identificados 211 geoglifos no Alto Camaquã,
sendo que nos municípios de Caçapava do Sul e Santana da Boa Vista não foram
encontrados geoglifos. Os municípios que mais contabilizaram geoglifos foram Piratini,
com 91 geoglifos e Pinheiro Machado, com 45 geoglifos mapeados. Os demais
municípios, como Bagé, totalizaram 34 geoglifos, Lavras do Sul, 19 geoglifos, Dom
Pedrito 15 geoglifos e em Hulha Negra 7 geoglifos.
A grande maioria dos geoglifos encontrados no Alto Camaquã está situado em
propriedades rurais, sendo que alguns estão localizados em meio às áreas agrícolas.
Quanto ao formato, predominam os circulares, sendo que também foram encontrados
5 geoglifos em formato retangular. Também foram encontrados alguns geoglifos
situados na área urbana do município de Bagé. A figura 3 apresenta alguns exemplos
de geoglifos do Alto Camaquã, com diferentes formatos e materiais de construção.
Através das imagens é possível observar que alguns apresentam árvores em sua
circunferência, outros, constituem-se por valas circulares ou ainda muros de pedras.
Em algumas propriedades rurais, onde se encontram geoglifos, estas
estruturas vêm sendo danificadas e até mesmo destruídas devido ao
desinteresse ou mesmo à falta de conhecimento dos proprietários. Em Santa
Vitoria do Palmar, onde currais de palmas19 (Butia capitata) são encontrados, o
plantio de lavouras de arroz vem ameaçando este patrimônio e os condenando ao
desaparecimento. Os agrotóxicos, bem como a grande quantidade de água, utilizados
para o plantio do arroz nas lavouras, prejudicam e matam as antigas palmeiras
(OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006).
19
Os currais de palmas, encontrados em Santa Vitória do Palmar, possuem características
bastante particulares em relação ao restante dos currais ou geoglifos encontrados no restante
do RS. O material utilizado para a elaboração destas encerras para o gado, a palma, era
transplantada, e depois as plantas eram balizadas com tiras de couro, formando uma barreira
que impedia que o gado fugisse (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006). Na cidade de Castillo,
Departamento de Rocha (Uruguai), existem currais de palmas semelhantes aos de Santa
Vitória do Palmar.
100
Figura 2 – Mapa dos Geoglifos dentro dos municípios que compõe o território do Alto
Camaquã-RS.
Org. – ANSCHAU, M. R. (2015).
101
Figura 3 – Exemplos de geoglifos encontrados em municípios do Alto Camaquã, RS.
Fonte – Google Earth, datadas em junho de 2014.
Estes monumentos sobrevivem ao tempo sem que haja estudos mais
detalhados ou mesmo iniciativas de preservação viabilizada por órgãos como o
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) ou Estadual (IPHAE),
responsável pela proteção deste tipo de patrimônio no Brasil ou no estado. Até o
momento, nenhum destes geoglifos integram o livro de tombo do IPHAN.
Perspectivas para o aproveitamento turístico dos Geoglifos no Alto Camaquã
A configuração natural da paisagem do Alto Camaquã, caracterizada pela
marcante presença de aspectos macroestruturais do patrimônio natural, apresenta um
grande potencial para o desenvolvimento territorial baseado no aproveitamento
turístico. A importância e diversidade do geopatrimônio presente nestes municípios,
pode ser exemplificada através de formações geológico-geomorfológicas singulares
como as Guaritas e a Pedra do Segredo, em Caçapava do Sul ou a Casa de Pedra e o
Rincão do Inferno, em Bagé, entre outras, que se destacam pela beleza cênica e pelo
potencial de desenvolvimento do Geoturismo.
102
O Geoturismo pode ser definido como uma tipologia do turismo de natureza,
onde o principal interesse do turista centra-se no conhecimento e na interpretação de
aspectos geológicos e geomorfológicos de um determinado local. Para Hose (2000, p.
136) o Geoturismo caracteriza-se pela:
(...) provisão de facilidades interpretativas e serviços para promover o
valor e os benefícios sociais de lugares e materiais geológicos e
geomorfológicos e assegurar sua conservação, para o uso de
estudantes e turistas e outras pessoas com interesse recreativo ou de
lazer.
Nesse sentido, o Geoturismo centra seu interesse no conjunto de elementos
geológico-geomorfológicos de um território, identificados como de especial importância
cultural, científica, educacional e/ou turística, denominados de geopatrimônio, devendo
ser conservados pelo seu valor patrimonial.
Além das características naturais citadas, o conjunto de referências culturais,
associadas aos recursos paisagísticos disponíveis e ao saber fazer local das
comunidades, conferem ao Alto Camaquã um potencial turístico especial. No RS
alguns roteiros turísticos temáticos integram os municípios que compõem o Alto
Camaquã, entre os quais se destaca o roteiro “Caminho Farroupilha Cultura e
Tradição Gaúcha”, incluído na Região Turística do Pampa. Neste roteiro são
ressaltadas as características da cultura gaúcha ligadas ao Pampa e à figura do
gaúcho. Além dessa peculiaridade é enaltecido o resgate da história da formação das
estâncias, das charqueadas, das lidas campeiras e da produção pecuária, da
Revolução Farroupilha e Federalista, das características ambientais do Pampa, da
hospitalidade do povo gaúcho e sua cultura.
Este conjunto de referências, em termos de patrimônio natural e históricocultural, englobaria, também, os diversos geoglifos (currais e cercas) encontrados
nestes municípios, enriquecendo as oportunidades de geração de renda através do
desenvolvimento do turismo, de forma sustentável e diferenciada de outros roteiros do
Estado do RS.
Ao encontro desta perspectiva, contemplando a conservação e valorização de
paisagens e principalmente como uma estratégia de desenvolvimento territorial
sustentável, tem se destacado a criação de geoparques. Geoparques são territórios
com área bem delimitada, que integram uma estratégia de desenvolvimento territorial
baseada
no
Geoturismo,
através
da
atração
turística
desempenhada
pelo
geopatrimônio, visando a sua conservação e a melhoria da qualidade de vida das
comunidades locais (FARSANI et al., 2012).
103
A incorporação de um geoparque na Rede Global de Geoparques (Global
Geoparks Network/GGN), criada em 2004, conta com o reconhecimento da
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO),
através de uma marca atribuída às áreas com significativo geopatrimônio e que
efetivamente o utilizem para a geração de desenvolvimento local.
Em estudos recentes, alguns pesquisadores com o apoio da Companhia de
Pesquisa de Recursos Minerais ou Serviço Geológico do Brasil (CPRM) vêm propondo
o reconhecimento de geossítios inventariados no Alto Camaquã, a exemplo das
Guaritas, de caráter sedimentar e especial relevância geomorfológica e das Minas do
Camaquã, vinculado à história da mineração em Caçapava do Sul, com potencial para
a criação de um geoparque20.
Dentro de um geoparque, além de locais que se destacam em termos de
patrimônio natural, é valorizado também o patrimônio cultural das comunidades locais,
sendo incentivada a promoção e comercialização de produtos tradicionais, como no
caso do artesanato, gêneros alimentícios ligados à gastronomia típica, condução
turística, entre outros, que contam com certificação atrelada ao geoparque21.
Conforme salienta Schobbenhaus (2010), o impacto local é imediato, reforçando a
identificação da população com
sua região e promovendo a
criação de
empreendimentos locais inovadores, como pequenos negócios de hospedagem e
alimentação, gerando novos empregos e fontes de renda.
Neste sentido, acreditamos que a criação de um Geoparque no Alto Camaquã
pode oferecer ao território uma alternativa de aproveitamento sustentável de seu
patrimônio natural e histórico-cultural pelas comunidades locais. Atrelado a este
geoparque deveria ser pensada a valorização e visitação a alguns destes geoglifos
aqui identificados, como sítios de interesse cultural, associados à memória da preia do
gado, à introdução da pecuária no RS e às rotas criadas pelos tropeiros no Sudoeste
do RS.
Assim, roteiros integrados, considerando de um lado o patrimônio natural, e de
outro, o patrimônio cultural, incluindo a visitação aos geoglifos existentes no Alto
Camaquã, constitui uma opção bastante inovadora dentro do contexto turístico do RS,
principalmente se configurada dentro do território de um geoparque.
20
Além dos estudos realizados pela SIGEP e CPRM em Caçapava do Sul, outros
pesquisadores que trabalham com o geopatrimônio no Alto Camaquã, integrantes do grupo
PANGEA da UFSM, vem apontando o potencial geoturístico do território e a possibilidade de
criação de um geoparque integrando os municípios.
21
Os produtos promovidos e comercializados dentro de um geoparque, recebem a
denominação de “geoprodutos”.
104
Conclusões
A análise e mapeamento dos currais no Alto Camaquã pode confirmar sua
característica de geoglifos, assumida por suas evidências em alto e baixo relevo,
deixadas como marca na superfície do solo. Através da pesquisa do referencial teórico
sobre a temática deste estudo foi possível constatar que há uma carência em estudos
relativos aos geoglifos do RS, principalmente no que se refere a vinculação dessas
estruturas a sua funcionalidade, associada, muito provavelmente, ao início da
atividade pecuária no Sul do Brasil. Apesar da carência de estudos para a
identificação da origem dos geoglifos, as hipóteses levantadas sobre sua origem,
instigam por si só a curiosidade e o interesse de visitantes, desempenhando um forte
papel de atratividade turística.
Através do mapeamento dos currais e da sua verificação através de imagens
pelo software Google Earth®, pode-se constatar a localização da maioria destas
estruturas próxima a estradas, assinalando também a observação de condições
apropriadas de relevo às atividades tropeiras, sendo, portanto, características que
podem confirmar a utilização de antigas rotas no alinhamento estrutural NW – SE no
território do Alto Camaquã.
Além disso, salienta-se que os currais apresentados neste estudo, acabam por
integrar o patrimônio cultural do RS, associado ao manejo do gado pelos antigos
povos que habitavam o estado. Para tanto, são necessários estudos específicos sobre
os currais, com pesquisas arqueológicas que fortaleçam essa hipótese, ou como no
caso de pesquisas mais avançadas sobre o tropeirismo, desenvolvidas por Pereira e
Cassol-Pinto (2014) no Paraná, onde estas estruturas associados às rotas dos
tropeiros, foram condicionadas pela geomorfologia da região.
As características singulares da paisagem do Alto Camaquã apresentam um
conjunto de referências naturais e culturais de grande potencial para o aproveitamento
geoturístico, evidenciando a proposição e criação do “Geoparque Alto Camaquã”.
A partir do conhecimento e divulgação deste tipo de patrimônio, especialmente
devido à conotação intrigante associada ao tema “geoglifos”, entende-se que medidas
de conservação e proteção destas estruturas devam ser seguidas de planos de
interpretação direcionados aos turistas, fornecendo informações que levem ao seu
entendimento e devida valorização.
105
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107
TRANSFORMAÇÕES NO PAMPA ADVINDAS DA GLOBALIZAÇÃO: UM
RECORTE PARA A FRONTEIRA BRASIL –URUGUAI
Tatiane Almeida Netto – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
Ao longo do século XIX o território do Pampa apresenta alteração em seu cenário com
a introdução de uma política de desenvolvimento economicista que compreende
tensões territoriais e apresenta a multiterritorialidade como característica. O objetivo
do trabalho é promover a reflexão sobre as tensões territoriais advindas da
globalização e da influência do capital que acarretam as transformações na dinâmica
produtiva do território do Pampa e apresenta como recorte empírico a fronteira BrasilUruguai, especificamente as cidades gêmeas Santana do Livramento e o
Departamento de Rivera. Metodologicamente utilizam-se de instrumentos como a
pesquisa documental, bibliográfica, observação direta e entrevista semiestruturada
com informantes qualificados. Os resultados apontam o espaço rural compreendido
como território de incorporação do capital derivados da transformação agrária e das
inter-relações sociais do mesmo com o ambiente. Conclui-se que os territórios são
formados por uma relação híbrida entre global e local e a dinâmica agrícola presente
neste espaço fronteira Brasil-Uruguai influencia diretamente as relações sociais,
portanto os sujeitos presentes e resultantes desta dinâmica. A transformação na
dinâmica territorial é observada na diversidade de sujeitos, na modernização das
atividades, inserção de tecnologias e introdução de novos cultivos.
Palavras chave: Território; Pampa; Rural; Relações sociais; Sujeitos.
RESUMÉM
En el territorio del siglo XIX Pampa presenta cambios en su situación con la
introducción de una política de desarrollo economicista que comprende las tensiones
territoriales y presenta la multiterritorialidade tan característico. El objetivo es promover
la reflexión sobre las tensiones territoriales derivados de la globalización y la influencia
de la capital que causan los cambios en la dinámica productiva del territorio de la
Pampa y tiene el corte empírico de la frontera entre Brasil y Uruguay, específicamente
las ciudades gemelas de Santana do Livramento y Departamento de Rivera.
Metodológicamente se utilizan instrumentos como investigación documental, la
literatura, la observación directa y entrevistas semi-estructuradas con informantes
calificados. Los resultados indican el campo entendido como el territorio de
incorporación de la capital derivados de la transformación agraria y las interrelaciones
sociales de la misma con el medio ambiente. Llega a la conclusión de que los
territorios son formados por una relación híbrido entre presentes agrícola y dinámica
global y local en este espacio de frontera entre Brasil y Uruguay influye directamente
en las relaciones sociales, por lo que el presente y el resultado de este tema dinámico.
La transformación de las dinámicas territoriales se observa en la diversidad de los
sujetos, en la modernización de las actividades, la integración de las tecnologías y la
introducción de nuevos cultivos.
Palabras-clave: Territorio; Pampa; Rural; Relacionessociales; Sujetos.
108
INTRODUÇÃO
O Bioma Pampa hoje adentra as discussões na academia devido a sua
biodiversidade e riqueza sociocultural, na qual está diversidade, paisagens e saberes
estão ameaçados pela introdução de novas alternativas que descaracterizam a
evolução social e biológica do Bioma Pampa (SUERTEGARAY e SILVA, 2009).
O Bioma Pampa está localizado entre 34º e 30º latitude sul e 57° e 63° latitude
oeste, abrange regiões pastoris de planícies em três países da América do Sul, sendo
estes: cerca de dois terços do estado brasileiro Rio Grande do Sul, as províncias
argentinas de: Buenos Aires, La Pampa, Santa Fé, Entrerríos e Corrientes e a
República Oriental do Uruguai. (SUERTEGARAY e SILVA, 2009, p. 45) (Figura1).
Figura1- Localização do Bioma Pampa na América Latina.
Elaboração do autor, 2013.
Observa-se no Pampa a formação de múltiplos territórios formados a partir das
classes sociais presentes e suas relações em conflito e disputa pelo poder e controle.
Nesse sentido, podemos identificar multiterritórios, não somente aqueles identificados
pelo uso como o trinômio que representa a produtividade: bovino, rizicultura e
silvicultura e sim a presença de um território formado também pela identidade do
gaúcho. Território formado a partir da integração entre o homem e a natureza,
109
interação esta que pode ser constatada nas letras das canções nativas, no artesanato
com lãs, na gastronomia e festas típicas que ultrapassam as fronteiras de Estados
interligando três nações distintas, o Sul do Brasil, o Uruguai e a Argentina.
Os temas da globalização, da presença de capital estrangeiro, da
industrialização, da agricultura flexível interferem diretamente na estrutura social
agrária provocando tensões territoriais.O trabalho presente tem como objetivo a
reflexão sobre as tensões territoriais advindas da globalização e da influência do
capital que acarretam as transformações na dinâmica produtiva do território do Pampa.
O presente estudo apresenta como recorte empírico a fronteira Brasil-Uruguai,
especificamente as cidades gêmeas Santana do Livramento e o Departamento de
Rivera.
Metodologia
A pesquisa considera-se um estudo exploratório e descritivo e se utiliza de
ferramentas como a pesquisa bibliográfica, observação direta e pesquisa documental
através da coleta de dados dos Censos do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), do Censo 2011 Uruguay Instituto Nacional de Estadística (INE), do
Censo Agropecuário 2011 Estadísticas Agropecuárias (DIEA) vinculados ao Ministerio
de Ganadería, Agricultura y Pesca (MGAP).
A área de estudo desta pesquisa se concentra no espaço denominado território
do Pampa e apresenta recorte intencional para análise a fronteira Brasil-Uruguai. O
recorte se faz necessário para apresentação da transformação da dinâmica agrária na
fronteira nas últimas duas décadas, para tanto, foram realizadas 10 entrevistas
semiestruturadas através da Mobilidade acadêmica da AUGM em setembro de 2014,
com informantes chaves, entre eles: técnicos privados e/ou públicos, órgãos diretivos
de fomento, instituições públicas e de ensino. Os entrevistados foram indicados pela
UDELAR através da Unidade de Extensión e pela Sociedade de Fomento Rural de
Rivera pela efetiva participação dos informantes na fronteira Brasil-Uruguai,
especificamente nas cidades gêmeas22de Santana do Livramento e Departamento de
Rivera.
A Influência Do Capitalismo Na Dinâmica Agrícola
22
Segundo o Ministério da Integração Nacional do Brasil são considerados cidades-gêmeas os
municípios cortados pela linha de fronteira, seja seca ou fluvial, integrada ou não por obra de
infraestrutura, que apresentem grande potencial de integração econômica e cultural, podendo
ou não apresentar a unificação de malha urbana com a cidade do país vizinho (DOU, 2014).
110
O processo de globalização, desde final do século XIX acarreta uma nova
lógica industrial orientando o setor agrícola através de empresas agroindustriais
transnacionais, que modificam as funções da agricultura em um setor com propósitos
diversos.
O Bioma Pampa ao longo do século está sendo alterado com a introdução e
homogeneização de culturas agrícolas, quer seja silvicultura ou grãos. Monoculturas
impostas pelo sistema capitalista na busca de produtividade, onde a paisagem
pampeana está vivenciando uma crise na tradicional economia de criação de gado
extensiva. (SUERTEGARAY e SILVA, 2009, p. 59).
A modernização e a presença do capitalismo resultam em uma agricultura com
um modelo de crescimento vinculado a uma estrutura produtiva, fordista e tecnológica,
com pacotes tecnológicos difundidos/exigidos pelas empresas processadoras de
alimentos. Incorpora-se na agricultura moderna o trabalho industrial exigindo dos
produtores um comportamento empresarial e não mais familiar, condicionando a
presença de trabalhadores assalariados (FLORES, 1998).
A referida autora aponta que a dinâmica agrícola se transforma a partir da
abordagem do capitalismo agrário, através da flexibilização da agricultura e das
complexas relações da natureza com a sociedade que moldam as formas de produção
e mercado presentes neste espaço. A agricultura flexível acarreta na diversificação
produtiva, na incorporação de novas tecnologias e descentralização das empresas
transnacionais com formação de redes e novas formas de organização do trabalho
que se adaptam e se reorganizam e até refuncionalizam formas de produção
tradicionais.
Flores (1998) ao realizar uma análise social, desta produção agrícola observa
distintas classes presentes, destacando-se o campesinato apoiado na lógica produtiva
familiar. Para a referida autora a pobreza rural e a falta de alternativas para a
manutenção de uma produção tradicional e de subsistência levam esses produtores a
inserirem-se como trabalhadores eventuais, assalariados rurais, buscando uma
complementação de renda, fenômeno este conhecido como a pluriatividade.
Ao identificarmos a introdução de novos cultivos no território fronteira Brasil/
Uruguai, ligados às cadeias globais de valor23, tais como a soja e a silvicultura,
observamos a reorganização deste espaço com a introdução de novas relações
sociais. A partir de 2000 intensificam-se os estudos das cadeias globais de valor
23
Define-se cadeia de valor a representatividade das empresas e pessoas envolvidas na
produção de um bem ou serviço, desde a sua concepção até o consumo final. Cadeias globais
de valor podem ser compreendidas como a fragmentação, pelas empresas, de suas etapas
de produção, distribuídas pelo mundo conforme vantagens de custos, insumos e logística
(REIS e ALMEIDA, 2014).
111
(CGV), nas quais através da fragmentação da produção em âmbito mundial,
possibilitariam aos países em desenvolvimento uma via rápida de industrialização
através da captura de etapas ou tarefas dos elos das cadeias de valor. Para tanto,
organizações econômicas internacionais como OCDE, Banco Mundial, OMC e
UNCTAD estimulam a intensificação das políticas de liberalização comercial (VEIGA e
RIOS, 2014).
Embora as cadeias globais de valor, como o nome mesmo descreve, estejam
inseridas mundialmente, autores como Baldwin, destacam uma regionalização destas
cadeias em relação aos custos de deslocamento e às políticas comerciais (VEIGA e
RIOS, 2014). A política de desenvolvimento economicista acarreta em acordos
comerciais entre países vizinhos favorecendo o surgimento de cadeias regionais que
alteram a dinâmica espacial frente à diversificação de sujeitos e compreendem
tensões territoriais, uma vez que o território é fruto das relações de poder da
diversidade destes sujeitos presentes neste espaço.
As relações impostas no território não são derivadas somente dos seres
humanos e seu espaço, e sim de diversos atores, entre eles e o espaço, na qual as
relações de inclusão e exclusão resultantes desta dinâmica definem o território e a
territorialidade. A organização em redes observada como exemplo na cadeia de soja
insere-se no Bioma Pampa desterritorializando-o, modificando a relação entre os
produtores e orientando novas espacializações (GUIBERT et al, 2011).
A agricultura hoje enfrenta cada vez mais mudanças tecnológicas em virtude
do produtivismo do paradigma do capitalismo agrário. Flores (1998) aponta que as
mudanças tecnológicas, e a intensificação de pacotes tecnológicos emergem sempre
no intuito de criar uma natureza com imagem e semelhança do capital, como exemplo
a inserção de transgênicos, nanotecnologia e agricultura de precisão.
Atualmente se tem presente a influência da globalização, da informação, da
tecnologia que dão origem ao capital virtual, resulta no território na inserção de redes,
onde os gigantes coorporativos se apropriam da biodiversidade desterritorializam
comunidades e destroem culturas (BARTRA, 2006).
As Transformações Do Pampa: Fronteira Brasil-Uruguai
Brasil e Uruguai através das políticas de incentivos realizadas pelo
MERCOSUL24 aumentaram na última década os números de produção de
24
OMercado Comum do Sul é um bloco econômico criado pelo Tratado de Assunção, em 1991,
e conta atualmente com Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e, mais recentemente, com a
112
commodities. Entre 2000 e 2011, as reservas internacionais do Brasil e Uruguai
cresceram 958% (de US$ 33,4 bilhões para US$ 353,8 bilhões) e 270,2% (de US$ 2,8
bilhões para US$ 10,4 bilhões), respectivamente (PINTO, 2013).
Tanto no Brasil como no Uruguai a priorização de exportação segue em
produtos do setor primário com níveis relativamente baixos de processamento. O
avanço do agronegócio pode ser percebido no espaço rural da fronteira BrassilUruguai. Através das entrevistas percebe-se uma maior intensificação da cadeia de
soja no lado brasileiro e da silvicultura no lado Uruguaio, embora ambas estejam
presentes na fronteira.
O território a partir da globalização apresenta múltiplas significações e uma
crescente complexidade em referência às relações sociais presentes, onde novas
categorias e novas vivências são reproduzidas constantemente formam-se então
territórios-rede marcados pela descontinuidade e fragmentação. Haesbaert (2004)
contextualiza multiterritorialidade como consequência do capitalismo e acumulação
flexível dos sujeitos sociais que formam as relações presentes nestes territórios-rede.
Na Fronteira Brasil/Uruguai observamos a inserção de uma agricultura
capitalista que se territorializa com as cadeias globais de valor, promovendo conflito e
desenvolvimento e ao mesmo temo expropriando o campesinato. Inicialmente no
Brasil essa alteração ocorre na década de 60 com a introdução da soja, e no Uruguai
com a introdução da silvicultura a partir da “LeyForestal” de 1987 (Ley 15.939/1987)
favorecendo a homogeneização de cultivos agrícolas.
Na fronteira Brasil/Uruguai, assim como na Bacia do Prata, a globalização
proporciona a intensificação de terras agrícolas em detrimento de áreas de pastagens
e uma transformação empresarial do setor agropecuário reduzindo a incidência de
produtores familiares (GAUTREAU,2014). Os temas da globalização, da presença de
capital estrangeiro, da industrialização, da agricultura flexível, nos últimos 10 anos,
interferiram diretamente na estrutura social agrária. A partir da abordagem do
capitalismo agrário se moldam as formas de produção e mercado presentes neste
espaço. Na figura 02 representa a diversidade da produção agrícola presente na
fronteira Brasil-Uruguai. Configura-se como representativo deste espaço o trinômio:
bovino, rizicultura e silvicultura.
Venezuela como países-membros. A política imposta pelo Mercosul objetiva a reorganização
espacial e a especialização do agronegócio, na produção de commodities, especialmente da
cadeia de proteína animal avançando na inserção global (WILKINSON, 2009).
113
Figura 2- Mapa temático Dinâmica Agrária na Fronteira Brasil- Uruguai
Fonte: Elaboração do autor, 2015
A estrutura social apresentada na região da fronteira está diretamente ligada a
estrutura agrária e conforme Piñeiro (2012) não houve significativa modificações nos
últimos 20 anos em toda a América Latina, ou seja, continuam a representar a
distribuição desigual em termos de posse da terra. Podemos identificar os sujeitos
sociais presentes como: assalariados rurais, empresários rurais, campesinos e/ou
produtores familiares.
A transformação na dinâmica territorial é observada na diversidade de
propriedades e na modernização das atividades. Ainda se observa propriedades
tradicionais, com baixo investimento e consequentemente baixa rentabilidade, em
contraste com outras empresariais, com maior grau de investimento, como exemplo
deste tipo de racionalidade empresarial se identifica as cabanhas que investem em
aprimoramento zootécnico. Podemos apontar as cabanhas como uma fase inicial na
mudança do comportamento do pecuarista adotando um perfil mais empresarial, onde
se iniciou a adoção do consórcio com a agricultura e o arrendamento da terra para a
rizicultura (COSTA, 1987).
O empresário rural é o que tem a posse da terra e emprega mão de obra
assalariada (assalariados rurais), apresenta como dois subtipos distintos: o tradicional
114
estancieiro que resiste a inversão tecnológica, domina e se mantém pelas grandes
quantias de posse de terra. E o mais recente ator, o empresário “agrícola-ganadeiro”,
presente nas últimas quatro décadas do século XX (PIÑEIRO, 2012).
As entrevistas realizadas com as informantes chaves destacaram uma
transformação na dinâmica produtiva na fronteira, o tradicional sistema produtivo, a
pecuária de corte, que está dando espaço a agricultura, seja a silvicultura ou a soja. A
soja aparece consorciada com a cultura de arroz, perdendo espaço para esta em
razão da rentabilidade.
O empresário agropecuarista, ou seja, aquele que consorcia atividades
agrícolas com pecuária realiza constantes inversões tecnológicas sobre a terra para
garantir a produtividade, complementa sua produção pecuária com diversos cultivos
agrícolas (arroz, cereais, oleaginosas, silvicultura).
Nesse sentido apontamos a inserção das cadeias globais de valor. No Uruguai
destacam a inserção de tecnologias, de novos modelos de gestão, junto a cadeia de
agronegócio de cereais e oleaginosas, na produção de celulose e cadeia leiteira
impulsionadas por políticas públicas e agropecuárias ampliando o mercado de compra
e venda, assim como o arrendamento de terras e o trabalho assalariado rural
(PAOLINO, 2014). A expansão agrícola no Uruguai aponta que até o ano de 2006 isto
se dava em áreas de pecuária tradicional e recentemente, após 2006 já se integram a
áreas novas e com aptidão agrícola (ACHKAR et al, 2011)
As áreas de pecuária de corte se consolidam com a introdução de técnicas e
manejos, onde o produtor cada vez mais se atualiza em busca da produtividade e
sustentabilidade de seu sistema. Tal informação é comprovada com os dados do
Censo Agropecuário do Uruguai que apresenta um aumento em pastagens artificiais,
campos melhorados fertilizados, e com a introdução de cultivos forrageiros anuais, no
ano de 2004 em Rivera apresentava uma área de 55.414 ha e em 2012 apresenta
uma área superior com 96.071 ha (DIEA, 2006).
A estrutura agrária presente na fronteira não é modificada, mas através desta
nova dinâmica agrária surgem novas relações sociais, favorecendo o surgimento da
pluriatividade e da multifuncionalidade do espaço rural. Os produtores familiares
presentes podem ser tipificados em dois tipos: os capitalizados e os pluriativos.
Portanto, se inserem na lógica produtivista para se manter na atualidade,
diversificando a produção e utilizando de tecnologias, e quando não possuem capital
de giro oferecem sua força de trabalho como mão de obra (pluriatividade).
Através das entrevistas e dos dados do censo identifica-se que os produtores
familiares presentes na fronteira Brasil-Uruguai em sua maioria são os pecuaristas, e
os mesmos além de diversificação na produção com fumo e fruticulturapara se
115
manterem produzem também novas relações sociais, como o arrendamento de áreas
de empresas florestais para o pastoreio do gado e a venda da força de trabalho na
cadeia florestal, seja no momento do plantio ou da colheita.
Considerações Finais
O território do Pampa está sendo modificado em sua paisagem em decorrência
das diversas relações de poder estabelecidas pela dinâmica produtiva e mercantilistas
atreladas a política de desenvolvimento. Apresenta-se múltiplos territórios: o território
da soja, da silvicultura, da pecuária.
Muitos são os indícios e indicadores de uma transformação na dinâmica
produtiva agrícola no espaço de fronteira Brasil/Uruguai, impulsionados pelas políticas
e acordos comerciais advindos da abertura ao capital internacional. As perspectivas e
alternativas de desenvolvimento do território estão cada vez mais dependentes das
características dominantes, da economia mundial, e dos modelos produtivos vigentes.
A demanda por alimentos e matéria prima favorecem países como Uruguai e
Brasil a investirem na produção de matérias primas aliadas as cadeias globais de
valor, na qual os países apostam em acordos de liberalização comercial, inovações
nas tecnologias da informação e de comunicações e na logística, principalmente de
transporte. Essa lógica não fica fora do território fronteira Brasil/Uruguai, prova disso é
o aumento crescente da cadeia de soja e o fortalecimento da cadeia de silvicultura no
Departamento de Rivera.
A partir das observações de uma transformação na dinâmica produtiva agrícola
na fronteira Brasil-Uruguai partimos para o entendimento de que um rural dinâmico
está ressurgindo das organizações sociais advindas da atividade agrícola, um
movimento de reorientação da capacidade produtiva da população rural com a
absorção de novos componentes econômicos, culturais e sociais.
Haja vista, que os territórios são formados por uma relação híbrida entre global
e local a dinâmica agrícola presente neste espaço fronteira Brasil/Uruguai influencia
diretamente as relações sociais, portanto os sujeitos presentes e resultantes desta
dinâmica.
Os entrevistados relataram a persistência de produtores na pecuária de corte
pela tradição em manter a atividade e estarem voltados a vida campeira. Mas a
atividade de pecuária está cada vez mais ameaçada seja pela diminuição de área de
pastagem o que afeta diretamente os produtores familiares para a permanência na
atividade e acabam por ter de relacionar-se com a cadeia florestal através de
116
arrendamentos. Estes arrendamentos não são superiores a onze meses e não
garantem o reconhecimento da sua classe.
As transformações territoriais podem resultar em perda da identidade local, na
qual gera espaços produtivos, mas espaços sem representação política, social e
totalmente dependente da economia global. Para o desenvolvimento sustentável
emerge hoje que os territórios possuam as bases e poderes dissipados pela
cooperação e reconhecimento da diversidade, da realidade e do contexto histórico
presente neste espaço.
Emerge então a reformulação de um novo paradigma, que possibilite um
desenvolvimento sustentável, com participação dos atores e sujeitos sociais, um
modelo endógeno baseado no diálogo, na participação para a promoção de abertura
política e não econômica que faça a releitura da diversidade cultural e social do
Território do Bioma Pampa para que não se perca a identidade e a valorização dos
sujeitos representantes deste espaço, além da proteção da biodiversidade.
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pesquisa “Perspectivas do Investimento no Brasil”, em parceria com o Instituto de
Economia
da
UNICAMP,
financiada
pelo
BNDES.
Disponível
em:
http://www.projetopib.org/?p=documentos
118
PAISAJES AGRARIOS EN LA CUENCA DEL RÍO TACUAREMBÓ CHICO
Selva Kuster - Diplomado de Geografía Docente de Geografía en I.F.D. y Liceo 1 de
Tacuarembó.
Diego Silveira - Diplomado de Geografía Docente de Geografía en I.F.D. y Liceo 4 de
Tacuarembó.
Resumen:
El trabajo presenta el relevamiento y análisis de las transformaciones en los territorios
rurales de la cuenca del río Tacuarembó Chico, durante los últimos 20 años (19952015). Ese cambio en el uso del suelo, de una ganadería extensiva y una incipiente
agricultura dispersa en el territorio de dicha cuenca y destinada al mercado local,
coevolucionó a territorios que en la actualidad son ganaderos-agrícolas-forestales, que
responden a requerimientos de mercados globales, generando nuevas ruralidades en
los paisajes, aparición de empresas multinacionales y un proceso de intensificación
agrícola. Es así pues que la lógica capitalista del mundo globalizado, se instala en los
países en desarrollo, la región norte y más precisamente los territorios de la cuenca
del río Tacuarembó Chico no escapan a ésta realidad.
Palabras clave: Territorio, Paisaje Agrario, Nuevas Ruralidades, Agronegocio,
Intensificación Agraria.
Introducción
Es la mayor cuenca interior de nuestro departamento, cuyas Coordenadas
Geográficas son: Lat. S. entre 31º18´ y 32º, Long. W. entre 55º34´ y 56º21´, con una
superficie de 3600 km2, integrada por tres subcuencas que corresponden a los
Arroyos: Tres Cruces (con 1084 km2), Tranqueras (con 540 km2) y Batoví (con 671
km2).
Concentra la mayor cantidad de habitantes del departamento, por encontrarse
en la misma la ciudad capital del departamento de Tacuarembó, con 54.757 habitantes
de un total de 90.053 del departamento (según datos I.N.E. 2011). Otros centros
poblados y caseríos dispersos dentro de la cuenca son: Paso de los Novillos,
Martinote, Sauce de Batoví, Los Rosanos, Valle Edén, Rincón de la Aldea, Zapará,
Paso Ceferino, Paso de las Carretas, Paso del Medio y Bañado de Rocha. Siendo la
densidad de población en el medio rural menor a 5 hab./km2.
Las principales actividades industriales del departamento relacionadas con la
carne, la madera, el arroz y la producción de energía a partir de biomasa se ubican en
la misma.
Importante superficie de dicha cuenca está dentro del área de recarga del
Sistema Acuífero Guaraní (SAG).
119
Objetivos
El trabajo tiene por objetivos identificar y analizar las transformaciones
territoriales en la cuenca del Río Tacuarembó Chico durante los últimos 20 años
(1995-2015).
Metodología
Se aplicó una metodología cualitativa, con revisión bibliográfica, relevamiento
en campo, entrevistas a diferentes actores sociales en el medio rural involucrados a la
temática de estudio, visita a emprendimientos agroindustriales y entrevistas a los
responsables de las mismas, documentación fotográfica de los respectivos cambios en
los paisajes rurales, comparación de dichos cambios en imágenes satelitales.
Paisajes rurales en la Cuenca del río Tacuarembó Chico
Los territorios rurales de la Cuenca del río Tacuarembó Chico han sufrido
transformaciones en los últimos 20 años, producto del cambio en el uso del suelo a
partir de los años 90 del S. XX; territorios dedicados a la ganadería extensiva y a una
incipiente agricultura de consumo destinada al mercado local, son compartidos por la
actividad forestal a partir de los años 90 y en los primeros años del S. XXI. por la
intensificación agrícola que se está produciendo en el país y en el contexto regional,
con la aparición de empresas multinacionales agrícolas dedicadas a cultivos de granos
(soja, sorgo y arroz).
Según Achkar (2012) …“El Paisaje Agrario (PA) es un área heterogénea del
territorio compuesta por un mosaico de parches interconectados que se repiten
en el espacio, integrado por factores físicos, vegetación, antrópicos y de riesgo;
implica la transformación de un sistema ambiental y adaptarlo para cubrir los
requerimientos la población”…
La Intensificación Agraria (IA) es un proceso asociado al uso más intensivo y
eficiente de los factores de producción como lo son la tierra, el trabajo, el capital y la
tecnología.
La IA “es la materialización de las señales del mercado en el sistema
ambiental, mediado por el aumento de la tecnología y el capital”… (Gazzano y
Achkar , 2013)
120
Según Díaz (2010) …“los factores macroeconómicos redireccionan los
procesos de IA desafiando rubros alternativos y conlleva a que la frontera
agrícola se expanda sobre ecosistemas naturales de mayor fragilidad”…
El paisaje geográfico “es un texto (apariencia) que al ser decodificado,
revela la valoración, modalidades de apropiación, formas de gestión y de
distribución de los bienes comunes en una sociedad acotada espacial y
temporalmente (esencia). El resultado de ello es la configuración espacial de
Territorios” (Pesce, 2011).
Los agronegocios constituyen un complejo espacio económico en el que
convergen inversiones de capital transnacional en el conjunto de las actividades
y sectores vinculados a la producción, distribución y comercialización de
productos agrarios a escala global (Achkar 2011). Los agronegocios forestal y
agrícolas sojero y sorguero buscan territorios que tienen una serie de ventajas en los
aspectos físico, político y cultural con respecto a otros territorios. Es decir que ese
espacio sea “competitivo” o sea contar con determinadas aptitudes y actitudes que lo
habiliten a la competencia. La competitividad no se va a ver solamente en la eficiencia
productiva sino que tendrá en cuenta las relaciones exitosas entre las demandas y la
eficiencia de cumplir el objetivo de la empresa. No debemos olvidar que la
competitividad se relaciona con la preferencia del cliente por determinado productoservicio frente a otras alternativas. Esos “territorios eficientes” están sustentados sobre
algunos parámetros como: el mercado global, la gestión de eficiencia y eficacia del
capital, existencia de todos los eslabones del circuito productivo, la aplicación de la
tecnología a todos ellos, la homogeneización de la producción y lo insustancial de la
producción agrícola local. Las empresas que manejan los agronegocios concentran el
capital y nos conducen a un análisis acerca de la seguridad y soberanía alimentaria de
los territorios, porque ocupan el territorio de antiguas y tradicionales formas de trabajar
la tierra. Es así pues que la lógica capitalista se instala en el mundo en desarrollo, la
región norte y más precisamente los territorios de la cuenca del Río Tacuarembó
Chico no escapan a ésta realidad. De las distintas fases que están presentes en los
agronegocios (pre-agrícola, agrícola, distribución, industrial, comercial y de servicios),
no todas están presentes en el territorio de la cuenca con la misma impronta.
121
El trabajo pretende analizar qué está cambiando, dónde se están produciendo
dichos cambios en los territorios de la cuenca en estudio, qué actores sociales son los
que impulsan los mismos, para qué y por qué. El nivel de artificialización que
adquieran esos paisajes agrarios depende de las superficies prediales relativas, del
paquete tecnológico que se aplique, del encuadre político del momento, de la
dimensión físico-biológica del ambiente y de las nuevas funciones. Los paisajes
agrícolas ocupan el S.E. de la cuenca en estudio, en tanto la franja central de la misma
en dirección N.-S. está ocupada por paisajes forestales y los paisajes ganaderos
quedan relegados al W. de dicha cuenca.
Paisajes Agrícolas
Hasta iniciado el S. XXI los paisajes agrícolas en la cuenca predominaban al
S.E. de la misma y en la margen derecha del curso inferior del río Tacuarembó Chico,
con plantaciones de arroz alternada con cría de ganado bovino.
Es a partir del año 2010 que comienza el proceso de intensificación agraria
relacionada con el agronegocio sojero y actualmente el territorio coevoluciona hacia
122
paisajes de agricultura continua, aparece un mosaico de parches interconectados que
se repiten en el territorio con cultivos de soja, arroz y sorgo en la margen izquierda del
río Tacuarembó Chico, en tanto en la margen derecha cultivos de soja; que se
combinan con cultivos forrajeros invernales (raisgrás y avena).
El escenario presenta un uso intensivo del suelo sin campos en barbechos, con
cultivos de soja que posterior a la cosecha incorpora escasa cantidad de materia
orgánica al suelo, paquetes tecnológicos de siembra directa con aplicación de
agroquímicos, practican la agricultura en los suelos más fértiles, caso de Brunosoles
(praderas negras).
Aparecen dos tipos de actores sociales: los grandes empresarios ganaderos
con tierras en propiedad o bajo arrendamiento y que frente al boom agrícola, dedican
los suelos más fértiles a cultivos y el resto a la ganadería; y por otro lado los nuevos
empresarios – gerenciadores – que sin o con poco activo fijo, buscan y compiten por
las mejores tierras bajo arrendamiento, contratan los servicios de maquinaria, trabajan
con personal asalariado y zafrales, desplazando a productores locales que muchas
veces quedan hasta fuera del sector.
La calidad y fertilidad de suelos, disponibilidad de agua, precios atractivos de
tierras y baja densidad de población rural, permiten que como en el caso de Aldea San
Joaquín, apareciera la Unión Agriculture Group (UAG), gestionando dentro de la
cuenca inferior en estudio unas 30.000 hás., dedicadas a ganadería de carne, soja y
arroz.
Dentro de la cuenca en estudio, apareció hasta el año 2014 plantaciones de
soja dispersas en las planicies aluviales más o menos extensas del área
correspondiente al Frente de Retroceso de la Cuesta Basáltica, caso de las
subcuencas del Arroyo Tambores y del Arroyo Tres Cruces; frente al rendimiento de la
soja según la fertilidad del tipo de suelo y el bajo precio internacional actualmente, ¿las
empresas continuarán sembrando en ésta área?.
Los cultivos de soja, arroz, sorgo y forraje coevoluciona en territorios que hasta
hace 10 años eran dedicados a una ganadería extensiva.
Dentro de las nuevas ruralidades en los paisajes agrícolas aparecen: camiones
cisternas
acarreando
combustible
al
campo,
conteiners
con
fertilizantes
y
agroquímicos, casas rodantes, flujo variable de mano de obra que acompaña a las
zafras, servicios aéreos de fumigación.
123
Paisajes Ganaderos
En cuanto a la ganadería predomina dentro de la cuenca una ganadería mixta
en campo natural hacia el W. de la misma, con incipiente aplicación de paquetes
tecnológicos de praderas forrajeras invernales y en emprendimientos con tierras de
propiedad.
En el resto de la cuenca la ganadería comparte los territorios con la forestación
creando vínculos de mutua dependencia, ya que es importante la presencia del
ganado con menor densidad por hectárea, para el control de la vegetación en las
áreas buffer y con esto evitar posibles focos de incendios principalmente en la estación
estival y la forestación brinda abrigo al ganado.
En los cultivos agrícolas, bajo modalidades diversas en cuanto a la cartera de
tierras, ésta dependencia ganadería – agricultura no es tan necesaria. La empresa
planta soja – forraje, ensila el forraje y va para otra región del país.
Actualmente la ganadería ve relegado su territorio frente a la agricultura y la
forestación, ¿la cantidad de cabezas de ganado disminuyó junto a la superficie de
territorios ganaderos ó acompañarán la aplicación de nuevos paquetes tecnológicos
para mantener dicha productividad, caso de los feed lodts?.
Paisajes Forestales
La mayor parte del territorio forestado del departamento de Tacuarembó está
dentro del corredor forestal de la región Norte y la cuenca del río Tacuarembó Chico
está inmersa en el mismo; la cuenca con una superficie de 3600 km2, tiene un 15% de
la misma forestada en el transcurso de los últimos 20 años.
Condiciones que permitieron dicho desarrollo forestal
-- en primer lugar las relacionadas con la disponibilidad de tierras, un alto
porcentaje que corresponde al 52% de la cuenca tiene suelos concordantes con las
areniscas de la Fm. Tacuarembó, son suelos de aptitud forestal del tipo 7.32 (según
datos de la Carta de Reconocimiento de Suelos – Escala 1:1.000.000), con
características de profundos, de fácil laboreo, permeables, de baja a extremadamente
baja fertilidad, con Índices CO.N.E.A.T. entre 70 a 88; corresponde a los Suelos
Desaturados Lixiviados, Luvisoles y Acrisoles; las formas de relieve que predominan
son colinas con pendientes de 6 – 10% y lomadas con pendientes entre 3-6%. Dichos
suelos permiten el desarrollo tanto de Eucalyptus como de
124
Pinus (éstos últimos principalmente en los suelos que contienen más aluminio
intercambiable en el horizonte B, es decir los de mayor acidez - Acrisoles).
-- baja densidad de población rural, con predios de extensiones importantes
con pocos productores rurales dueños de dichas tierras, eso favoreció la negociación
de las multinacionales con los actores locales.
-- disponibilidad de agua, hay que tener presente que al centro-oeste de la
cuenca está el área de recarga del Acuífero Guaraní; hay etapas en la fase de
producción de la madera como el caso de los viveros que necesitan de abundancia de
agua y se abastecen de la misma por medio de pozos semisurgentes.
-- el territorio de la cuenca es un “territorio eficiente” para el anclaje del capital
transnacional de las madereras, ya que tenía consolidada una infraestructura terrestre
(las rutas 5, 26, 31 y 59 atraviesan en las diferentes direcciones los territorios de dicha
cuenca y la vía férrea en dirección Sur-Norte). Además a nivel departamental se
ejecutan proyectos que consisten en el mejoramiento de la caminería de penetración
para facilitar el flujo de la entrada de insumos y salida de la producción maderera.
Como consecuencia del mejoramiento de la caminería de penetración y la nueva
construcción de la caminería interna de los predios forestados, se reactivó en la
cuenca la actividad extractiva de materiales como el balasto (proveniente del basalto
de la Fm. Arapey y de la diabasa de la Fm. Cuaró).
– la ciudad de Tacuarembó como un nodo de jerarquía regional, que
proporcionó mano de obra calificada y no calificada para la cadena productiva
agroindustrial de la madera; así como la infraestructura ya existente que favoreció la
instalación de los emprendimientos industriales madereros en el área de la
microrregión de Tacuarembó, complementado con la generación de energía de
biomasa a partir de los subproductos forestales y la instalación de todos los servicios
que apoyan dicha cadena productiva que van apareciendo rápidamente a comienzos
de los años 2000 en el eje de la Ruta 5, concentradas en el área de logística y de
actividades múltiples según POT 2009.
-- territorios que están en un Estado con estabilidad política y social, con
población alfabetizada y que es posible capacitarlas a corto plazo.
Principales empresas de agronegocios en el rubro madera que han invertido en
la Cuenca del Río Tacuarembó Chico en los últimos 20 años
Hasta los años 90 del S.XX, en el uso productivo del suelo de la cuenca
predominaba la ganadería bovina al centro y este de la misma, en tanto hacia el oeste
ganadería ovina; con territorios puntuales y reducidos de agricultura (papa y maní) y
125
una escasa forestación, de aproximadamente unas 2600 hectáreas (según datos de la
Dirección Forestal) principalmente siguiendo el eje de Ruta 26 al E. de la ciudad, que
se utilizaba como fuente de energía para abastecer las calderas de la principal
industria, el Frigorífico Tacuarembó. Es en el transcurso de 20 años que el sistema
agrario
ganadero
extensivo
coevoluciona
rápidamente
hacia
sistemas
monoproductivos forestales de rápido crecimiento destinado a la transformación
mecánica (debobinado – aserrado) ó química (celulosa) de acuerdo a la demanda
mundial.
Actualmente la cuenca cuenta con unas 52.500 hás. forestadas, tanto en
predios propiedad de las empresas o bajo los proyectos de integración productiva.
Tres empresas multinacionales forestadoras que aparecen en el escenario
nacional como: Forestal Oriental – UPM; Montes del Plata y Weyerhaueser Productos
S.A., y dos Administradoras de Fondos de Inversión (GMO Renewable Resources y
GFP - Global Forest Partners LP) han considerado a los territorios de la cuenca del río
Tacuarembó Chico, como muy estratégicos y son las que dominan las fase de
producción. Weyerhaueser Productos S.A. es la empresa que entró en el año 1996 en
el escenario de las plantaciones forestales en la cuenca. En el año 2001 aparecen las
Administradoras de los Fondos de Inversión, primero GMO y luego GFP. En el año
2006 entra en el escenario Forestal Oriental con grandes plantaciones y
replantaciones; es decir compró tierras de aptitud forestal, ó a través de los Proyectos
Fomento se asoció a productores que querían diversificar su producción y asegurarse
la venta de la producción de la madera al momento de la cosecha ó compró campos
ya forestados. Por último en el año 2010 comienza las plantaciones Montes del Plata
principalmente con los Proyectos de Integración Productivo.
Aparece un escenario cada vez más competitivo para las industrias madereras,
por lo que las correspondientes empresas forestadoras optan por estos caminos: la
compra de tierras, arrendamientos de campos con diversos convenios con los
productores agropecuarios ó asociarse a los productores, de tal forma de asegurarse
la futura producción de madera. El tiempo de producción de un bosque para la
transformación mecánica (aserrado o debobinado) insume de 15 años para los
Eucalyptus a 20 años en el caso de los Pinus; mientras que el tiempo de desarrollo de
un bosque para producir celulosa insume unos 10 años; es decir los ciclos de
producción de madera para éstas industrias son diferentes y los productores
agropecuarios prefieren obtener una renta a más corto plazo. Los escenarios de las
industrias del aserrado y debobinado son diferentes con los escenarios de la industria
de la celulosa; por lo que se puede afirmar que los territorios de aptitud forestal son
territorios muy requeridos por éstas empresas, produciéndose una gran competencia
126
por los mismos, de ahí la reciente aparición de proyectos de integración productiva
que se perciben; dichos proyectos están localizados en la ecoregión del Frente de
Retroceso de la Cuesta Basáltica con suelos desarrollados sobre areniscas intertrapp
ó basaltos masivos lajosos muy meteorizados.
Éste escenario de competitividad de los suelos de aptitud forestal condujo a un
dinamismo del mercado inmobiliario rural producido por la forestación en la cuenca en
estudio; basados en datos de la Dirección de Estadística Agropecuaria (DIEA) de
Uruguay, en la última década (2000 – 2010), el precio promedio de la tierra se
multiplicó por cinco, en el año 2000 como promedio la hectárea de tierra estaba en los
448 dólares, en el año 2010 en 2633 dólares la hectárea. En el departamento campos
de suelos de aptitud forestal rondan los 3000 dólares la hectárea; pero eso se traduce
en una cadena, un productor ganadero que vende campos de aptitud forestal con esos
precios de la tierra, puede comprar a precio más elevado que su real valor de
producción, por ejemplo campos en suelos superficiales como los basálticos y esto
lleva a un elevado precio de la tierra que nada tiene que ver con la real productividad
de los mismos.
En
la
misma
se
observa
que
el
predominio
de
las
plantaciones
correspondientes a Weyerhaeuser, se encuentran localizadas principalmente al Norte
de la Cuenca en estudio; Forestal Oriental tiene predominio de sus plantaciones en
torno al eje de Ruta 26 al Oeste y Ruta 5 al Sur; en tanto las plantaciones de Montes
del Plata predominan en el eje de la Ruta 59. Las plantaciones correspondientes a
empresas forestadoras que administran Fondos de Inversión, caso de Global Forest
Partners LP (GFP) y GMO Renewable Resources, están localizadas principalmente al
Norte de la cuenca. Se resalta el carácter estratégico de éstos territorios, tanto para
las plantaciones dentro de la cuenca como la instalación de los emprendimientos
industriales, la nueva área de logística y actividades múltiples; que aprovecharon la
infraestructura terrestre ya existentes (rutas y vía férrea).
De las empresas mencionadas anteriormente, solamente Weyerhaueser es la
empresa de agronegocios que prácticamente tiene todas las fases que intervienen en
el mismo dentro de la cuenca en estudio, mientras que Forestal Oriental – UPM,
Montes del Plata y los Fondos de Inversión tienen muy bien representada la fase de
producción. El caso Weyerhaeuser se trata de un agronegocio con integración vertical
(tener el máximo control posible de las diferentes etapas de la cadena productiva que
sean de máxima rentabilidad ó de aquellos que sean estratégicos) ya consolidada y
tendencia hacia la integración horizontal (alianzas o fusiones de empresas para lograr
el dominio de un determinado mercado). En la integración vertical en el rubro madera
cubre el conjunto de actividades de la cadena productiva: vivero clonal con
127
investigación y tecnología de punta, plantaciones con todas sus etapas, cosecha,
industrialización de las trozas de madera transformándola en tableros contrachapados
también con tecnología de punta en su maquinaria y distribución en el mercado
mundial. Valorizó los subproductos industriales a través de la cogeneración y
generación de energía y busca alianzas estratégicas con otras empresas
multinacionales para el desarrollo horizontal. A partir de febrero del 2010,
Weyerhaeuser, tiene una planta de generación de energía aprovechando los residuos
industriales, con una capacidad de 10 MWh, de eso consume unos 6,5 MWh y el
restante 3,5 MWh lo vende a UTE. Con la planta de generación de energía valoriza los
residuos que salen de la producción de tableros y le asegura la energía necesaria para
esa producción, siendo más competitivo.
La independencia en la matriz energética es fundamental para el desarrollo del
emprendimiento industrial, apoyado por la política del Estado en los convenios públicoprivado que se firman, ya que el Estado apunta a buscar las condiciones de generar
escenarios energéticos autogestionados y sustentables en las industrias. La empresa
proyecta a futuro el desarrollo de bioproductos, en éste caso incluye una alianza
estratégica con otra multinacional Chevron, para el desarrollo de biocombustibles.
Nuevas Ruralidades
Dentro de las nuevas ruralidades que han ido surgiendo en los paisajes
forestales encontramos:
-- Maquinaria forestal de gran porte, principalmente en las etapa de raleo y de
cosecha de los bosques, tales como Feller, Harvester y Forwarder; asociado a esto
camiones cisternas acarreando combustibles al campo.
-- Cartelería predial y señalización de rutas secundarias y caminos vecinales,
para ordenar el tránsito.
-- Conteiners, transformados y adaptados a oficinas, talleres móviles, depósitos
de agroquímicos y de fluídos hidraúlicos para mantenimiento de maquinaria.
-- Servicios aéreos que cumplen función de supervisión y control de incendios y
de fumigación.
-- en el aspecto social, aparecen trabajadores rurales con una gran movilidad;
según informe 2013 del Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, los trabajadores
rurales a nivel del país tuvieron un incremento en el período 1996-2011 que
correspondió al 18,8%, en el departamento de Tacuarembó pasó de 5% en el 2006 a
5,4% en el 2011; la realidad visualizada en la cuenca a través de los trabajos de
campo nos indican que los trabajadores rurales del sector forestal, en su gran mayoría
128
son no residentes en el medio rural, a diario son trasladados en camionetas ó micros
al lugar de trabajo y residen en centros poblados ó en la ciudad de Tacuarembó. Éste
fenómeno genera un flujo de vehículos y personas que diariamente sólo trabajan en el
medio rural, no residiendo en él, pudiéndose observar casas abandonadas “taperas”
en las áreas forestadas. Esto coincide con los datos del informe 2013: existe un
vaciamiento de residentes en áreas rurales forestadas, pero no del número de
trabajadores.
En cuanto al salario líquido por hora del trabajador rural forestal ronda los 59
pesos en el caso de un peón práctico; un capataz especializado como el oficial
mecánico/electricista ronda los 89 pesos, según el informe 2013, pero en entrevistas
realizadas en febrero 2015 se supo que:
-- es difícil saber la remuneración de un trabajador por hora, ya que los datos
oficiales no coinciden con la realidad, porque el “incentivo” que reciben por parte de la
empresa es “el trabajo a destajo”, es decir buscan la productividad del obrero, cuanto
más produce el trabajador mayor es su salario. Los trabajadores se diferencian por
categorías; pueden ser trabajadores mensuales ó zafrales, existe variación en las
remuneraciones de los trabajadores que pueden ir con valores muy superiores ó
inferiores a la media nacional, dependiendo de la categoría y calificación del trabajo.
-- las empresas madres tienen Certificaciones Nacionales (ISO 9100) e
Internacionales FSC (Forest Stewardship Council) y PEFC (Program for the
Endorsement of Forest Certificacion), lo que exige a las empresas tercerizadas cumplir
con las mismas normas: la seguridad del trabajador que tengan los aportes
correspondientes a la Seguridad Social, cobertura médica, canasta alimenticia y
seguro de vida.
– por lo mencionado anteriormente han aparecido en campo los cargos
técnicos de supervisores de campo; además de determinadas condiciones que se le
exige a la empresa para la comodidad de sus trabajadores, por ejemplo si alquilan
casas para que el personal pernocte cercano al área de trabajo, las mismas deben de
tener ventanales que permitan una buena aireación e ilumación en las habitaciones y
baños con agua caliente. Esto condujo a una revalorización en los alquileres de casas
en los centros poblados inmersos en las áreas forestales y a un dinamismo comercial,
esta bonanza tiene vaivenes que dependen del tiempo de estadía en el lugar de los
trabajadores.
-- existe un mayor número de trabajadoras femeninas en campo, porque
realizan un trabajo muy cuidadoso, no son competitivas favoreciendo la integración de
los equipos de trabajo.
129
-- en las empresas tercerizadas, un mismo trabajador puede cumplir diferentes
funciones, es decir trabajar como fumigador, para matar hormigas ó en la poda; de
ésta manera se busca evitar trabajos zafrales y transformarlos en más ó menos
permanentes durante el año.
Cambios producidos por el Paisaje Forestal según componentes ambientales
La actividad forestal produce un primer impacto que es en lo paisajístico,
producto de la uniformización del paisaje con los mosaicos de las especies plantadas y
la edad de los bosques. Si bien en un predio forestado existe un 30% que corresponde
a áreas buffer y cortafuegos, cuya pastura es aprovechada por el ganado; es decir
actualmente se realiza el silvopastoreo, los territorios forestales compartido con la
ganadería bovina, pero en un número menor de cabezas de ganado por hectárea.
Esos cambios producidos por las propias plantaciones, dependen de las
especies plantadas y de la edad de los bosques, que van avanzando sobre
ecosistemas de pastizales en la Cuenca Sedimentaria del Noreste en el centro-este de
la cuenca en estudio o fragmentando a la vegetación serrana de bajo porte en la
Escarpa Basáltica, hacia el oeste de la misma. En el caso de la especie del Pinus
Taeda aparece como especie invasora sobre la vegetación serrana, caso de la Gruta
de los Cuervos.
En lo faunístico, la fauna típica de los pastizales va cediendo paso a una mayor
presencia de cotorras, palomas y jabalíes (principalmente en zonas forestadas
cercanas a áreas de bañados, montes fluviales ó serranos), que encuentran en los
bosques áreas de refugio y alimentación cercana a los mismos.
Frente a monocultivos de esta magnitud ¿qué impactos pueden tener los
suelos y el agua? En suelos, nos referimos a impactos en lo relacionado a
propiedades químicas de los mismos, a la extracción de nutrientes, acidificación y
salinización.
Existen estudios realizados por la UDELAR (2006) que dan por resultados con
respecto a la acidificación de los suelos una disminución del pH entre 0,5 y 1 y que
varía según sean plantaciones de Pinus o de Eucalyptus. En cuanto al agua ¿cómo
afectan el ciclo hidrológico?, ¿el agua de escorrentía superficial y el drenaje
profundo?. INIA y la empresa Weyerhaueser realizan estudios en conjunto en cuencas
forestadas y no forestadas, cuyos primeros resultados fueron puestos al conocimiento
público en el año 2008, si bien las investigaciones son a largo plazo; existe una
tendencia a la disminución del escurrimiento superficial que puede variar entre un 22 y
31%, dependiendo de las precipitaciones anuales; además se tiene presente otras
130
variables, por ejemplo evaporación en el período estival e invernal. Hay que tener
presente también que las areniscas de la Fm. Tacuarembó, coinciden con el área de
recarga del Acuífero Guaraní.
Relación territorios rurales – territorio urbano (ciudad de Tacuarembó)
La relación entre los territorios rurales ganaderos, forestales y agrícolas con la
ciudad de Tacuarembó, están en los servicios relacionados al sector financiero tanto
público como privados, en el caso del sector ganadero con la venta de ganado con
plazos flexibles tanto a los vendedores como a los compradores.
Aparecen en la ciudad de Tacuarembó comercios dispersos, tanto en el centro
como en determinados barrios, de insumos al sector agropecuario.
En el eje de Ruta 5 principalmente al S. de la ciudad y eje Ruta 26, en el área
de logística y actividades múltiples, aparecen en los años 2005 con una fuerte
expansión a partir del año 2010, son grandes áreas con infraestructuras relacionadas
a servicios de los rubros forestal, agrícola y ganadero.
Componentes Patrimoniales de los Paisajes Rurales
Dentro de los objetos culturales a conservar en los paisajes rurales de la
cuenca del Río Tacuarembó Chico encontramos: cercos y corrales de “piedras del
lugar”, en las cuencas superiores de los Arroyos Tres Cruces y Tacuarembó Chico
existen ocho corrales construídos con la roca del lugar (basalto), se justifica ya que el
área correspondió al reparto de tierras realizado entre 1807 y 1809 por Artigas, para
justificar la tenencia de la tierra debían construir un rancho y un corral; pulpería del S.
XIX justificada por el camino de tropas que unía la región N. del país con el Sur,
ubicada en la margen derecha del Río Tacuarembó Chico en la localidad de Paso de
los Novillos; cementerios y panteones que datan del S. XIX en lugares que no
contextualizan con la ubicación de la población en el actual paisaje rural, algunos de
ellos se perciben como agrupamiento de árboles nativos; casa de piedra (arenisca) en
camino a Paso de las Carretas en la subcuenca del Arroyo Tres Cruces, que fue
campamento Artiguista entre 1804 a 1806 del Tacuarembó Chico, para el reparto de
tierras entre 1807-1809 (según documentos históricos del Archivo Municipal de
Tacuarembó).
En el área correspondiente al Frente de Retroceso de la Cuesta Basáltica
encontramos microgeoformas bien representativas y características como: paleodunas
y marmitas en Valle Edén, cerros chatos aislados en Batoví, cascadas y cañones en
131
los cursos superiores de los arroyos como el caso del Arroyo de la Jabonería, pilares
como en la Gruta de los Cuervos.
Un paisaje rural histórico correspondiente a una infraestructura agroindustrial
de las décadas de los 60 y 70 fue la tabacalera, ubicada en Rincón de Tranqueras.
Conclusión
Es indudable que el paisaje rural en la cuenca del río Tacuarembó Chico, ha
tenido transformaciones importantes durante los últimos 20 años, relacionada al
cambio en el uso del suelo en los rubros forestal y agrícola; en tanto la ganadería
quedó relegada a suelos de menor productividad al W. de la cuenca; ó compartiendo
el territorio con la forestación y lo agrícola, al centro y S.E. de la misma.
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www.renare.gub.uy
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133
TRABAJOS POSTERS
134
A FRUTICULTURA COMO UM NOVO CENÁRIO REARTICULADOR DO
DESENVOLVIMENTO REGIONAL NA MICRORREGIÃO GEOGRÁFICA DA
CAMPANHA MERIDIONAL
Ana Luiza Pinto Alves - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Thales Silveira Souto - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Meri Lourdes Bezzi - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
A presente pesquisa visa analisar a cadeia produtiva da fruticultura na Microrregião
Geográfica da Campanha Meridional, a qual surge com uma perspectiva para viabilizar
o desenvolvimento local/regional. Metodologicamente, a pesquisa foi estruturada em
etapas, partindo inicialmente de um levantamento bibliográfico e de coleta de dados.
No segundo momento, realizou-se o trabalho de campo, no qual foi possível verificar a
problemática em questão. E por fim, analisaram-se e interpretaram-se os resultados.
Salienta-se que a economia da microrregião está baseada no setor agropecuário,
principalmente na pecuária bovina (corte e leite) e nas lavouras de arroz e da soja.
Ressalta-se que o recorte espacial em estudo, é considerado atrasado
economicamente se comparado a outras microrregiões do Estado Gaúcho. Desta
forma, a fruticultura tornou-se uma possibilidade para alicerçar a economia, gerando
renda e empregos, além de contribuir para a diversificação produtiva regional.
Palavras-chave:
Vitivinicultura.
Geografia
Agrária.
Desenvolvimento
regional.
Olivicultura.
INTRODUÇÃO
O espaço geográfico apresenta em cada momento histórico as características
da sociedade que o produz e/ou reproduz. Esta dinâmica é constante no processo
evolutivo das sociedades, acarretando transformações profundas, originando novas
formas e fazendo com que velhas formas assumam novas funções (SANTOS, 1978).
Neste sentido, pode-se citar as atividades agropecuárias, as quais têm
passado por diversas e importantes transformações, mediante a modernização de
suas atividades. Assim, o espaço rural se redesenha e se reorganiza na medida em
que novos atores econômicos e tecnologias são incorporados à sua produção,
rearticulando econômica e socialmente o local e o regional.
Ressalta-se a pertinência deste estudo, pois a Microrregião em análise está
localizada na Metade Sul do Estado do Rio Grande do Sul, a qual é composta por
cinco municípios (Aceguá, Bagé, Dom Pedrito, Hulha Negra e Lavras do Sul). Ela é
considerada como um dos recortes espaciais mais atrasados economicamente, se
constituindo em uma microrregião que alia sob a ótica da cultura, a política, com a
135
formação de lideranças regionais que se perpetuam no poder e na economia por meio
da coexistência da pecuária extensiva tradicional e a inserção de novos atores
econômicos, que marcam a influência do capital como um agente que “tenta” romper
as barreiras impostas por tradições seculares (Figura 1).
Desta forma, a fruticultura insere-se neste recorte espacial, o qual é marcado
historicamente pela presença da pecuária e do latifúndio, diversificando o espaço rural
e viabilizando novas alternativas aos produtores, gerando empregos e nichos de
mercado através da produção de uvas e oliveiras.
A pesquisa tem como objetivo geral analisar as transformações espaciais da
Microrregião Geográfica da Campanha Meridional (MRG 031) mediante a inserção da
fruticultura (vitivinicultura e oliveiras). Especificamente, buscou-se: (a) analisar a
reorganização espacial da Campanha Meridional e (b) identificar as potencialidades e
as fragilidades das cadeias produtivas da uva e da azeitona no recorte espacial em
estudo.
Como procedimento metodológicos, optou-se por estruturá-la em etapas. No
primeiro momento, realizou-se o levantamento bibliográfico, o qual possibilitou abordar
os principais conceitos norteadores. Paralelamente, coletaram-se dados em fontes
secundárias, tais como: Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) e
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/RS). A segunda fase
consistiu no trabalho de campo, no qual foram realizadas entrevistas com produtores e
os órgãos gestores. Para tal atividade, foram elaborados dois formulários (entrevistas
estruturadas). A partir do resgate conceitual e das informações obtidas em campo, na
última etapa, foi possível analisar e interpretar os resultados.
136
Figura 1 - Mapa de localização da MRG da Campanha Meridional (MRG 031)
Fonte: IBGE, 2015.
Org.: ALVES, A. L. P., 2015.
DESENVOLVIMENTO
Políticas Públicas para a inserção da Fruticultura na Campanha Meridional
A economia da Microrregião Geográfica da Campanha Meridional está
estruturada no setor primário, principalmente na pecuária bovina, ovina e equina, e
pela agricultura com base na lavoura de arroz, e mais recentemente, no cultivo da
soja. Ressalta-se que esses produtos estão na melhor fase econômica já ocorrida
neste setor ao longo da história.
No entanto, apesar do excelente momento econômico, alguns produtores são
excluídos deste processo. Desta forma, foram criados programas de incentivo ao
desenvolvimento da fruticultura, para que os mesmos tivessem novas possibilidades,
além de diversificar os produtos do campo na microrregião e em toda Metade Sul do
Rio Grande do Sul.
A fruticultura começou a receber incentivos a partir da década de 90, com o
objetivo de diminuir as desigualdades econômicas, sociais e regionais da Metade Sul
do Estado gaúcho. Para essa finalidade, vários setores governamentais juntamente
com iniciativas privadas vêm elaborando estratégias de desenvolvimento, via
aproveitamento da vocação regional agrícola, diversificando as atividades do setor
137
primário. Entre as medidas, pode-se citar o Programa de Desenvolvimento da
Fruticultura Irrigada na Metade Sul/RS, criado em 1997 e o Programa Estadual de
Fruticultura (PROFRUTA/RS), no ano de 2001 (RATHMANN; HOFF; PADULA, 2006).
Ressalta-se que ambos os programas têm como portfólio, o incentivo para a
adesão de agricultores a cadeias produtivas com rendimentos acima do padrão das
tradicionais culturas da região, além de ter entre suas metas reverter o processo de
importação de frutas, através de novos polos econômicos. Entre as particularidades
desses, pode-se citar de acordo com Rathmann; Hoff; Padula (2006, p. 18)
a) o crescimento da demanda mundial de frutas na ordem de 5% ao
ano, com tendência crescente; b) mais de 70% das frutas consumidas
no mundo são de clima temperado, tendo o Brasil pequena
participação neste mercado; c) existência de capacidade ociosa em
câmaras frias de frigoríficos que podem servir para o armazenamento
da produção; d) o Rio Grande do Sul tem potencialidades para tornarse um grande produtor e exportador de frutas de clima temperado,
dadas suas condições edafoclimáticas e disponibilidade de terras
para o cultivo.
Os projetos de incentivo à fruticultura na Metade Sul do Estado podem ser
considerados como alternativas para o desenvolvimento local/regional. A fruticultura é
desenvolvida geralmente em médias e grandes unidades produtivas. Na pequena
propriedade, normalmente o produtor é capitalizado com outras fontes de renda
distintas do campo. Neste sentido, é importante enfatizar que alguns pequenos
produtores não se propõem a desenvolver este tipo de atividade, já que possuem
menores espaços para produção, não podendo colocar em risco partes de sua
propriedade para uma cultura sem lucro garantido.
Então,
torna-se
fundamental,
saber
o
papel
do
poder
público
na
regulamentação, gestão e criação de políticas públicas, a qual difere entre lugares,
regiões e até mesmo dentro de um país. Neste sentido, resgata-se Farah Júnior (2012,
p. 39), quando o autor afirma
O Estado moderno tem vários papéis a desempenhar em uma
sociedade como a brasileira, que tem características multiculturais,
sociais, econômicas e produtivas. São realidades bastante diferentes
em cada região, estados federados e, dentro destes, em suas
diversas regiões. Portanto, não há uma regra e orientação única para
que o poder público, em seus três níveis de poder, atue para atender
as necessidades e demandas da sociedade.
Neste sentido, é importante a realização de diagnósticos e prognósticos para a
execução de um planejamento, pois de acordo com Campanhola; Graziano da Silva
(2000, p. 20)
138
Mediante um diagnóstico bem elaborado, pode-se identificar os
principais problemas e reivindicações e propor as principais linhas de
uma política de desenvolvimento para o município. Entre essas linhas
destacam-se: a qualidade de vida; a renda dos agricultores familiares;
o acesso a novas tecnologias e alternativas de produção que
garantam a qualidade e a conservação do meio ambiente; a
infraestrutura produtiva e social; a assistência técnica e a formação
profissional dos agricultores; a qualidade da educação rural; o acesso
à saúde gratuita; a valorização do conhecimento e da cultura da
população local, a participação dos jovens, mulheres e idosos; e a
organização dos agricultores e sua participação nas decisões que
envolvam as políticas para o município. [...] A elaboração de planos e
políticas, porém, é apenas o início do processo. Resta saber como
essas políticas serão implantadas e, mais que isso, como elas serão
monitoradas e avaliadas.
Considerando o planejamento, não basta atrair grandes empresas, é
necessário o planejamento das políticas públicas por parte do poder público para que
elas sejam eficientes. É essencial que haja uma análise social, econômica e cultural
de cada região e/ou lugar que se possa planejar. Para isso é necessário a contribuição
da população, para que se construa juntamente a este grupo, propostas que venham a
minimizar e/ou resolver as dificuldades locais/regionais.
Contudo, o planejamento para a gestão das políticas públicas torna-se um fator
determinante, em que essas devem ser mais do que a geração de intenções, e sim a
geração de ações, pois se sabe que existem inúmeras políticas públicas, e que se
fossem executadas trariam diversos benefícios coletivos, porém, nem sempre são de
fácil acesso a todos que necessitam.
Pode-se afirmar que a fruticultura representa uma possibilidade e/ou alternativa
para o desenvolvimento econômico local/regional das atividades agropecuárias, pois a
fruticultura não concorre com as lavouras e a pecuária, uma vez que, são realizadas
de forma consorciada. Entre os principais frutos cultivados na Campanha Meridional,
tem-se: uva vinífera, uva de mesa, azeitona, melancia, pêssego e figo. Ainda em
pequena escala, tem-se o cultivo de melão e frutas cítricas, tais como a laranja e a
bergamota25.
Entre os diversos fatores que contribuíram para a inserção da fruticultura na
Campanha Gaúcha, o fator determinante foi o clima favorável a esta atividade
apresentando características similares ao clima da região do Mediterrâneo, criando
condições propícias principalmente para o cultivo de uvas viníferas.
O Programa Estadual de Fruticultura aponta alguns problemas quanto a cadeia
produtiva da fruticultura. Entre os principais entraves estão a alta perecibilidade das
25
Neste trabalho optou-se em abordar as cadeias produtivas da uva e da oliveira, pois essas
são representativas e com potencialidades de expansão.
139
frutas. Desta forma, projetos mais modernos deveriam ser instaurados para a
conservação dos frutos. Para que isso seja possível, é necessária a implantação de
câmaras frias, o que resulta em um maior prazo de validade dos frutos até chegar ao
mercado consumidor interno ou para a exportação (GOVERNO DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL, 2003).
Neste sentido, João et al (2002, p. 76) afirmam que
É sobremaneira importante que cada fruta tenha a sua cadeia
produtiva devidamente estruturada, fato que começa pelo seu estudo.
Os diversos segmentos, desde viveiristas, fruticultores, comerciantes
e industriais devem ter relações fortes entre si e formarem parcerias
com entidades públicas e privadas. Somente unidos em torno do seu
produto e buscando qualidade é que estarão preparados para os
desafios, ameaças e oportunidades vindas do mercado (local,
estadual, nacional e exterior).
É importante enfatizar também que esta proposta de diversificação da
produção, não substituem os cultivos tradicionais. Elas coexistem com a matriz
econômica (pecuária-arroz-soja), sendo um complemento e/ou alternativa produtiva,
uma vez que, os períodos de safras da fruticultura são distintos aos da lavoura. Assim,
é possível ao produtor, uma distribuição dos rendimentos ao longo do ano.
Análise da atual situação da fruticultura na Microrregião
Percebe-se, de acordo com as entrevistas realizadas com os produtores, que
os diversos programas e incentivos governamentais para a expansão desta cadeia
produtiva na microrregião, acabam beneficiando produtores que possuem uma
economia estável, que não dependem exclusivamente do campo, pois são médicos,
militares, aposentados, advogados, entre outros.
Ressalta-se que a fruticultura quando instaladas em pequenas propriedades,
por meio de políticas públicas e por doação de mudas, tais como o PROFRUTA e o
Olivais do Pampa. Desta forma, essas produções possuem pouco ou nenhum
acompanhamento técnico, ou então, não estão adequadas para aquele tipo de solo. É
importante salientar que tentar inserir cadeias produtivas de alto custo e ainda sem
indústrias de beneficiamento aos pequenos produtores, é colocá-los em uma situação
de risco, tanto econômico quanto social, pois no início, os produtores recebem apoio
técnico e incentivo, no entanto, pela escassez de técnicos, acabam não sendo
acompanhados nas demais etapas de produção, o que pode gerar grandes perdas da
produção e/ou o desestímulo dos mesmos (Figura 2).
140
Figura 2 - Parreirais de uva no Município de Bagé
Fonte: Trabalho de Campo, 2015.
Org.: ALVES, A. L. P., 2015.
O alto valor do custo de plantio e manutenção dos parreirais de uva fez com
que o cultivo declinasse nos últimos anos, pois todo custo de produção são de
responsabilidade dos produtores. Assim, as únicas beneficiadas, com esta produção,
são as vinícolas. É importante salientar que existem, ainda que poucos produtores de
uva, que estão produzindo vinhos artesanais e comercializando localmente. Estes
produtores não vivem exclusivamente da vinícola, pois são também pecuaristas,
agricultores de hortigranjeiros, de arroz e de soja.
É importante salientar que no Município de Hulha Negra, está ocorrendo o
desenvolvimento de um projeto de vitivinicultura orgânica, em 22 pequenas
propriedades, meio hectare por produtor, destinado à uva para suco. A ideia é que o
suco seja produzido localmente, juntamente com o Município de Candiota, com a
finalidade
de
ser
comercializado
localmente
e
para
merenda
escolar.
O
desenvolvimento deste projeto contará com a ajuda técnica da EMATER local e
regional, UFPel e Governo do Estado do Rio Grande do Sul.
É importante destacar também que os produtores repassam suas safras para
as vinícolas da Serra Gaúcha, entre elas a Salton e a Miolo e, também para a vinícola
local Peruzzo. Há ainda, a presença de indústrias de beneficiamento situadas nos
141
municípios vizinhos, o que torna a produção de uva, uma alternativa produtiva na
microrregião, mas com muitas dificuldades a serem superadas.
Em relação aos produtores de oliveiras – geralmente antigo produtor de uva –
salienta-se que estão se organizando por meio de associativismos, tendo como
objetivo a estruturação de uma pequena agroindústria para produção do Azeite de
Oliva Extra Virgem do Pampa. Entretanto, não existem dados desta iniciativa local,
uma vez que, ainda não houve colheita (Figura 3).
Figura 3 - Plantio de Oliveiras na Microrregião
Fonte: Trabalho de campo, 2015.
Org.: ALVES, A. L. P., 2015.
Entre os entraves ao desenvolvimento da fruticultura, destaca-se a questão da
mão de obra, sendo difícil manter os trabalhadores no campo. As facilidades e
confortos da cidade acabam atraindo os mesmos. Desse modo, está cada vez mais
escassa a mão de obra para trabalhar no meio rural, pois muitas vezes, eles preferem
trabalhar informalmente na cidade, morando em áreas suburbanas, com trabalho
braçal, com baixa remuneração, para ficar próximo da família.
Outro problema observado no trabalho de campo é a necessidade do produtor
da Campanha Meridional em aprender à utilizar a assistência técnica, pois muitos
reclamam da falta de ajuda, mas raramente solicitaram auxílio técnico da EMATER,
142
prefeitura e/ou outros órgãos. Em relação ao acompanhamento técnico disponível pela
EMATER, este não é suficiente, devido aos poucos profissionais disponíveis e ao
grande número de propriedades, com também pelas grandes distâncias entre as
mesmas.
Os médios e grandes produtores contratam assessorias e técnicos, ou também
recebem auxílio dos vendedores de insumos. Os pequenos produtores precisam de
auxílio constante, pois muitas vezes, acabam sendo desestimulados pela baixa
produtividade ou pela perda de suas produções.
Em relação às linhas de crédito, a maioria dos produtores de fruticultura
realizam financiamentos, geralmente os oriundos do PRONAF (Mais Alimentos). No
entanto, os entrevistados reclamam da burocracia existente nos bancos e a demora na
liberação do crédito. Quanto ao agricultor familiar, este sofre mais que o assentado
para ter acesso ao crédito, pois este último dispõe de um número maior de programas
do governo.
Ressalta-se ainda, a precariedades das estradas do interior dos municípios que
compõem esta microrregião. Este fato acaba interferindo no escoamento da produção,
na locomoção do produtor e, também, na acessibilidade dos técnicos chegarem até as
propriedades, o que se torna um dos principais problemas a ser superado.
CONCLUSÕES
A fruticultura vem sendo desenvolvida em todos os municípios da Campanha
Meridional,
devido
principalmente,
às
boas
condições
edafoclimáticas
e
a
disponibilidade de terras para o plantio.
Desta forma, busca-se desenvolver novos nichos de mercado e manter os que
já estão estruturados, o que exige dinamismo e interação entre todos os atores da
cadeia produtiva da fruticultura, ou seja, desde os produtores, os comerciantes até os
industriais, para que possam formar parcerias. O acompanhamento técnico do plantio
à colheita é de extrema importância, pois os resultados sendo satisfatórios estimularão
os produtores. Assim, se teria uma cadeia produtiva mais segura e estável.
Sabe-se que existem programas que visam dinamizar a fruticultura, no entanto,
cabe aos governantes locais, regionais e estaduais, acompanhar como esses estão
sendo executados. Ou seja, verificar se estão sendo eficazes ou se precisam ser
melhorados, identificar os principais entraves e as potencialidades a serem sanadas
e/ou aproveitadas, para que se alcance o desenvolvimento regional, tendo a cadeia
produtiva da fruticultura como um membro integrante deste processo, fornecendo mão
143
de obra e dinamizando principalmente as pequenas unidades produtivas do recorte
espacial em estudo.
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A PECUÁRIA LEITEIRA NO MUNICÍPIO DE ITUIUTABA - MINAS
GERAIS/BRASIL E OS REFLEXOS NA REORGANIZAÇÃO PRODUTIVA
AGROPECUÁRIA
Thales Silveira Souto - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Ana Luiza Pinto Alves - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Meri Lourdes Bezzi - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Palavras-chave: Transformações; Pecuária leiteira; Ituiutaba/MG.
Resumo: A produção de leite em Ituiutaba obteve um crescimento de 795,4% entre os
anos de 1974 a 2013 (IBGE, 2013). Salienta-se que tal incremento produtivo é reflexo
da instalação de uma transformadora de leite multinacional no ano de 1974 no
município, bem como, devido a demanda das demais fábricas de Ituiutaba e região.
Portanto, objetivou-se analisar as transformações socioespaciais provenientes da
expansão produtiva do leite em Ituiutaba entre os anos de 1974 a 2013.
Especificamente, buscou-se compreender a importância desta atividade para o
município; verificar o estágio de evolução e/ou estagnação deste setor; averiguar o
cenário produtivo leiteiro, frente a expansão de soja e cana de
açúcar.Metodologicamente, a investigação foi realizada em etapas. Na primeira, fez-se
o levantamento teórico, auxiliando a interpretação dos principais conceitos norteadores
da pesquisa. Posteriormente,coletou-se dados secundários nos Censos tanto Agrícola
de 1960, quanto Agropecuários de 1970, 1980, 1996 e 2006 do IBGE, dentre outros
dados existentes no site do IBGE. Na terceira etapa, fez-se o trabalho de campo,
neste realizou-se entrevistas aos sujeitos da pesquisa. Por fim, procedeu-se a análise
e interpretação dos dados e informações coletadas, buscando a compreensão dos
principais aspectos balizadores da organização/reorganização espacial, produtiva e
econômica deste município.
Introdução
A
metamorfose
socioespacial
em
Ituiutaba/MG
foi
fundamentalmente
proporcionada pela agricultura, enfatizando-se as culturas do arroz, milho, algodão,
soja e da cana de açúcar. Na pecuária destaca-se aprodução leiteira, de carne bovina,
suína e de frango. Este setor agropecuárioatende a necessidade das agroindústrias,
as quais centraram-se no beneficiamento de grãos e gramíneas, bem como, do
processamento de leite bovino, carne bovina, suína e galinácea(Mapa 1).
145
Mapa 1: Localização do município de Ituiutaba/MG na Microrregião Geográfica de Ituiutaba
(MRG 017)
No que tange a pecuária leiteira, ressalta-se o incremento deste setor nesta
unidade territorial. O reflexo da expansão desta atividade gerou a reorganização
produtiva agropecuária, resultando a redução da área plantada de importantes
culturas, como relacionado ao arroz. Este foi o principal cultivo comercial em Ituiutaba
até a década de 1980, o qual entre 1970 a 1980 diminuiu a área plantada em 55,9%.
Em contrapartida, neste mesmo período, houve o crescimento da área destinada a
pastagem plantada de 274,3%, aumentando também o número de bovinos em 98,7%
(IBGE, 1960/1980), bem como, o número de vacas ordenhadas, 249,1%, entre 1974 e
1984 (IBGE, 2013).
As transformações proporcionadas pelo crescimento da produção de leite
foram condicionadas, a partir da década de 1970, devido a instalação da unidade
industrial multinacional transformadora de leite da Nestlé. Neste sentido, houve o
redirecionamento da produção de alguns estabelecimentos agropecuários, tendo como
intuito atender a demanda desta agroindústria. Ressalta-se que, além da Nestlé,
existem a Fazendeira, que foi fundada em 1938, e a Canto de Minas, que iniciou suas
atividades em 1994. Destaca-se também, as agroindústrias leiteiras existentes nos
municípios limítrofes que captam leite dos produtores de Ituiutaba.
Salienta-se que, por meio do processo de modernização do setor agrícola,
algumas atividades obtiveram maiores destaques, tanto relacionado às políticas
públicas desenvolvidas, quanto ao interesse no mercado mundial. Destaca-se a soja, a
partir da década de 1980 e, a cana de açúcar, a partir da década de 2000.
146
A pecuária leiteira, nesta unidade territorial,mantém o crescimento produtivo e,
principalmente, de produtividade. Tal fato, refere-se a inserção de métodos,
tecnologias e amparo técnico para a manutenção deste setor, frente a expansão do
cultivo de grãos e gramíneas essencialmente importantes no cenário comercial
brasileiro.
Para compreender as metamorfoses resultantes da expansão da pecuária
leiteira
nesta
unidade
territorial,
objetivou-se
analisar
as
transformações
socioespaciais provenientes da expansão produtiva do leite em Ituiutaba, entre os
anos de 1974 a 2013. Especificamente, buscou-se (a) compreender a importância
desta atividade para o município; (b) verificar o estágio de evolução e/ou estagnação
deste setor e (c) averiguar o cenário produtivo leiteiro, frente a expansão de soja e da
cana de açúcar.
Metodologicamente, realizou-se esta investigação por meio de etapas. No que
tange a primeira, houve a pesquisa bibliográfica, auxiliando a interpretação dos
principais conceitos norteadores. Posteriormente, coletou-se dados secundários nos
Censos tanto Agrícola de 1960, quanto Agropecuário de 1970, 1980, 1996 e 2006 do
IBGE, dentre outros dados existentes nos bancos de dados do site do IBGE. Na
terceira etapa, fez-se o trabalho de campo, realizando-se as entrevistas estruturadas
em questionários aos sujeitos da pesquisa. Aplicou-se 64 entrevistas aos produtores
de leite, bem como, às processadoras de leite do município, aos órgãos e instituições
de fomento e promoção da agropecuária e, as empresas do setor agropecuário de
Ituiutaba. Por fim, analisou-se e interpretou-seos dados e informações coletadas,
resultando
a
compreensão
dos
principais
aspectos
balizadores
da
organização/reorganização espacial, produtiva e econômica desta unidade territorial.
O desenvolvimento da pecuária leiteira no Brasil e as principais limitações
A pecuária leiteira é um importante setor produtivo para o Brasil. Ressalta-se
que esta atividade ocorre desde o principio da colonização, sendo que a criação de
gado de acordo com Valverde (1967) foi a principal atividade econômica no período do
Brasil-Colônia. Inicialmente o gado era criado com mínimos aparatos técnicos, viviam
à solta, sem estabulação, silagem ou melhoria dos pastos, faziam apenas queimadas
periódicas do capim.
No que tange a expansão da pecuária bovina, Valverde (1967) destaca o sul do
estado de Minas Gerais (Ituiutaba localiza-se a oeste destaUnidade Federativa).
Dentre os fatores preponderantes para o desenvolvimentodesta atividade, alguns
aspectos devem ser considerados, como os relacionados aos físicos-naturais, pois o
147
clima tropical que é amenizado pelas altitudes, a pluviosidade que é elevada e os rios
perenes desta região, foram fundamentais.
Por meio do incremento territorial, juntamente com o processo de
independência e desdobramento político, aliado a necessidade de atividades
produtivas alicerçadas ao uso do solo rural e beneficiamento agroindustrial para a
evolução econômica, priorizou-se, a ampliação das atividades ligadas ao campo, as
quais, até então, eram desenvolvidas pelos modos tradicionais. Utilizavam-se os
aparatos técnicos pertinentes ao período.
Neste contexto, aponta-se que a agricultura brasileira não se desenvolveu de
forma sistêmica, ou seja, houve a expansão de algumas atividades, principalmente as
que tangem a necessidade do mercado externo, deixando a margem os setores de
menor interesse.
Vilela; Bressan; Cunha (2001) consideram que neste cenário, a agricultura, que
até meados da década de 1980 era desenvolvida em grande parte do território
nacional de forma tradicional, com o desenvolvimento de políticas públicas, juntamente
com o interesse do capital internacional, priorizou a inserção de técnicas e tecnologias,
juntamente com a realização de estudos para maior e melhor produtividade.
Entretanto, no que tange a pecuária leiteira, Vilela; Bressan; Cunha (2001, p. 9)
ressaltam,
Em meio a essas histórias de sucesso, o leite mal cobriu o fundo do
copo. Qualquer que seja o índice de eficiência que se olhe, o setor de
lácteos aparece à frente de uma lista de exceções no processo de
modernização das atividades agroindustriais. Desta lista fazem parte
alguns produtos típicos de consumo doméstico, como feijão,
mandioca, batata-doce, entre outros, e mesmo o conjunto das
atividades de algumas áreas menos desenvolvidas, notadamente do
Nordeste.
Alguns problemas são verificados frente a atividade leiteira. Peche Filho (2004,
p. 34)aponta a existência de restrições técnicas, como pastagens degradadas,
caracterizando em áreas que possuem “sulcos de erosão, altas infestações de plantas
invasoras, principalmente as arbustivas e lenhosas substituindo boa parte do capim
que desapareceu”. Além disso, existe a questão do baixo padrão genético dos animais
para a produção de leite. Outro problema se refere à falta de tecnologias para adequar
às diferentes realidades do país e, também, poucas pesquisas em zootecnia de
precisão (Ribeiro; Lírio, 2006).
Neste contexto, verificam-se ainda outras dificuldades enfrentadas por este
setor, os quais se alicerçam ao tipo de transporte utilizado, as estradas precárias no
148
meio rural, falta de refrigeração do leite em algumas propriedades, assim como, a
carência de fornecimento regular de energia elétrica (Ribeiro; Lírio, 2006).
Salienta-se que o setor leiteiro passou por problemas até o fim da década de
1980. Este período foi marcado pela inserção dos interesses internacionais no campo
brasileiro e, também, ações desenvolvidas pelo Estado. Aponta-se que, a iniciativa
privada, juntamente com o poder público, priorizaram o desenvolvimento da atividade
agrícola. Além disso, havia restrições ao setor leiteiro, como por exemplo, tabelamento
do preço do litro do leite produzido.
A pecuária leiteira neste cenário, obteve significativa depreciação, devido,
principalmente, a importância dada a poucos segmentos produtivos agrícolas, como os
relacionados a soja, a cana de açúcar e ao milho, os quais são reflexos das ações e
interesses do mercado externo, congruente às políticas de desenvolvimento agrícola.
Neste período ocorreu ainda a redução do programa de crédito rural subsidiado.
Houve também, elevação da taxa de juros (Gobbi, 2006). Nesta perspectiva,Souza
(1999, p. 41) salienta,
A expansão ou retração da produção leiteira está relacionada às
políticas econômicas adotadas. Ao analisar a conjuntura econômica
brasileira, observam-se reduções da produção de leite no início dos
anos 1980, em função da crise econômico-financeira ocorrida nesse
período. Esse foi um período conturbado, cujos efeitos para o setor
leiteiro foram de atraso tecnológico, baixa competitividades e perda
de mercados. Dentre os fatores que causaram esta situação
desfavorável, destacam-se: endividamento externo, déficit fiscal,
inflação e redução de investimentos.
No entanto, a partir da década de 1990 houve o crescimento do setor leiteiro no
país, o qual se vinculou a expansão da necessidade deste produto no mercado interno
e externo. Neste sentido, destaca-se que o sistema agroindustrial leiteiro passou por
mudanças importantes. Jank;Galan (1997, p. 199) enfatizam,
O sistema agroindustrial do leite brasileiro sofreu profundas
mudanças de caráter estrutural desde a virada dos anos 90. Primeiro,
veio a desregulamentação do mercado logo no início do Governo
Collor, liberando os preços do produto após mais de quatro décadas
de controle estatal. Simultaneamente, ocorreu a abertura comercial
ao exterior e a consolidação do Mercosul, que representaram um
incremento da concorrência com produtos importados.
A produção de leite nesta perspectiva passou por um significativo
incremento(Jank;Galan, 1997). Destaca-se que “A Cadeia Agroindustrial do Leite se
configura como uma das mais importantes do agronegócio brasileiro, tanto sob a ótica
econômica como social” (Campos;Piacenti,2007, p.9).Neste sentido, a cadeia
149
produtiva do leite, em abrangência nacional, vem desempenhando um relevante papel
no suprimento de alimentos, na geração de empregos e de renda para a população
(Gomes, 2001).
No cenário produtivo agropecuário, Campos ePiacenti (2007, p. 4) referem que,
“[...] a atividade leiteira participa na formação da renda de grande número de
produtores, além de ser responsável por elevada absorção de mão de obra rural
(contratada e familiar), propiciando a fixação do homem no campo”.
Nesta perspectiva, verifica-se a importância desta atividade no cenário
econômico nacional. Gobbi (2006, p. 38)aponta,
[...] pode-se observar que o setor leiteiro mostra um comportamento
representativo da economia brasileira, tanto na década de 1980,
quando as políticas econômicas estavam voltadas para o controle da
inflação, quanto na década de 1990, em que o setor passou por
sérias mudanças estruturais decorrentes de fatores tais como:
abertura econômica via globalização e Mercosul, estabilização
econômica proporcionada pelo Plano Real e fim do tabelamento de
preço.
Portanto, verifica-se a importância da pecuária leiteira no panorama produtivo
brasileiro, bem como relacionado às transformações socioespaciais. Contudo,
observa-se que ainda há necessidade de desenvolvimento de políticas eficazes para
esse setor, as quais proporcionarão melhorias no processo de produção, sobretudo
para atender a necessidade do crescente mercado interno e, também, do exigente
mercado consumidor externo. Aumentando a competitividade e, principalmente, a
qualidade do produto final.
Resultados
Na perspectiva de tradição da bacia leiteira do estado de Minas Gerais e, por
conseguinte, de Ituiutaba, o qual obteve um crescimento de 795,4% da produção de
leiteentre os anos de 1974 a 2013 (IBGE, 2013). Faz-se importante compreender o
cenário produtivo, bem como, a realidade vivenciada pelos produtores. Neste sentido,
destaca-se a quantidade de vacas em produção nos estabelecimentos produtores de
leite de Ituiutaba (Tabela 1).
150
Tabela 1: Distribuição percentual do número de estabelecimentos produtores de leite com a
quantidade de vacas em produção no município de Ituiutaba/MG
Quantidade de vacas em produção
Estabelecimentos (%)
1 a 10
3,12%
11 a 20
23,43%
21 a 30
26,56%
31 a 40
18,75%
41 a 50
10,93%
Mais de 51
17,18%
Total
100%
Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de
Ituiutaba/MG (2015).
Org.: SOUTO (2015).
Dos produtores entrevistados, verificou-se que 71,86% possuem menos de 41
vacas em produção. Neste viés, verificou-se a importância do pequeno e médio
produtor. De acordo com a entrevista realizada no trabalho de campo, averiguou-se a
percentagem da produção de litros de leite por estabelecimento em Ituiutaba (Tabela
2).
Tabela 2: Percentagem da produção/dia de leite por estabelecimento no município de
Ituiutaba/MG
Quantidade de litros produzidos
Quantidade de
Produção
por dia por produtor
Estabelec.
(%)
1 a 100
18
28,12%
101 a 200
20
31,25%
201 a 300
8
12,5%
301 a 400
3
4,68%
401 a 500
2
3,12%
501 a 600
5
7,81%
601 a 700
2
3,12%
701 a 800
2
3,12%
Mais de 801
4
6,25%
Total
64
100%
Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de
Ituiutaba/MG (2015).
Org.: SOUTO (2015).
Analisando a tabela 2, ressalta-se a quantidade de produtores que, em sua
maioria, produzem por dia entre 1 a 100 litros e 101 a 200 litros, os quais,
correspondem ao total de 59,37% de toda a produção leiteira desta unidade territorial,
isto referente a amostra estabelecida nesta pesquisa.
Verificou-se que o pequeno e médio produtor de leite são importantes para a
manutenção do setor leiteiro nesta unidade territorial. De acordo com a entrevista
realizadas às agroindústrias leiteiras, 66,66% possuem fornecedores de leite
referentes a pequeno e médio produtor e, 33,33% responderam que seus
fornecedores são pequenos, médios e grandes produtores. Nesta perspectiva,
151
observa-se a área em hectares dos estabelecimentos agropecuários produtores de
leite em Ituiutaba (Tabela 3).
Tabela 3: Área do estabelecimento produtor de leite (ha) no município de Ituiutaba/MG
Área (ha) de 10 a
Estabelecimento(
Área (ha) de 100 a
Estabelecimento
menos de 100 ha
%)
menos de 1000 ha
(%)
10 a 20
39,06%
101 a 200
3,12%
21 a 50
42,18%
201 a 500
6,25%
51 a 100
7,81%
501 a 1000
1,56%
Total
89,05%
10,93%
Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de
Ituiutaba/MG (2015).
Org.: SOUTO (2015).
No que tange a área do estabelecimento agropecuário produtor de leite em
Ituiutaba, ressalta-se que 39,06% possuem de 10 a 20 (ha) e 42,18% possuem entre
21 a 50 (ha). Neste sentido, verifica-se que, a maioria dos produtores de leite, desta
unidade territorial, encontram-se no extrato de área entre 10 e 51 (ha), ou seja,
81,24% caracterizando a relevância destes estabelecimentos, os quais, em sua
maioria, referem-se aos pequenos e médios produtores.Relacionando a tabela 3(Área
do estabelecimento produtor de leite) com a tabela2 (Quantidade de litros de leite
produzido por dia), pode-se dizer que os pequenos e médios produtores que possuem
de 10 a 20 (ha) referem-se a 39,06% e os que possuem de 21 a 50 (ha) referem-se a
42,18% dos produtores de leite. Deste modo, visualizou-se que,28,12%produzem de 1
a 100 litros/diae 31,25% produzem de 101 a 200 litros/dia, representando 59,37% do
total do leite produzido no município para atender a demanda das agroindústrias
instaladas em Ituiutaba.
De
acordo
comVilela;
Bressan&
Cunha
(2001)
em
relação
aos
estabelecimentos produtores de leite no Brasil, verificou-se que em Ituiutaba, existe
uma quantidade expressiva de pequenos e médios produtores de leite. Neste sentido,
a quantidade de fornecedores de leite do município, bem como, a capacidade
produtiva, juntamente com as atuais necessidades do setor agroindustrial leiteiro,
contribuem para uma desvinculação das normas essenciais e aplicação de técnicas
para melhor rendimento tanto produtivo, quanto econômico dos produtores, gerando
insatisfações frente à comercialização do produto in natura.
Contudo, as políticas e ações das agroindústrias nesta unidade territorial tem
como finalidade melhorar a produtividade e, ao mesmo tempo, aumentar os lucros dos
fornecedores que conseguem se adaptar, frente a realização de investimentos,
proporcionando melhorias no processo produtivo.
152
Entre as contribuições, fomento e auxílio aos produtores de leite, salienta-se
algumas, agroindústrias como a Nestlé, a qual realiza assistência técnica aos
estabelecimentos, destacando-se o projeto Pró-sólidos, que busca incentivar a
produção de leite com mais proteína e gordura, portanto de maior valor nutricional.
Este tem como objetivo fornecer subsídio na dose de sêmen de touros provados para
o crescimento de sólidos no leite. O programa Boas Práticas na Fazenda, foi
estruturado tendo como referência experiências realizadas em países como França,
Espanha, Austrália e Nova Zelândia, seu objetivo é o de garantir a segurança e a
qualidade da matéria prima, bem como, a sustentabilidade ambiental e econômica das
fazendas. Em Ituiutaba, 73% dos fornecedores da Nestlé fazem parte deste projeto,
tendo como objetivo chegar ao ano de 2016 a 86% dos fornecedores inseridos no
projeto (Trabalho de campo, 2015).
Entretanto, observa-se a falta de incentivos, principalmente públicos, para a
realização de financiamentos a baixos juros, com maior prazo voltado para este setor
da economia. Através da realização das entrevistas e, por meio de conversas
informais com os produtores e, também, nos encontros realizados, constatou-se
diversas reclamações a respeito do pouco apoio governamental em nível municipal,
estadual e federal, bem como, das instituições de pesquisa e fomento da atividade
agropecuária.
No entanto, mesmo apresentando dificuldades na produção desta matéria
prima, vale ressaltar os principais fatores que contribuíram para o aumento da
produtividade do leite, contribuindo para as metamorfoses no panorama produtivo,
espacial e econômico. Entre elas, destacam-se a melhoria na alimentação do animal
vinculado ao uso de ração, manejo do pasto, utilização de complementos alimentares
capazes de oferecer maior rendimento à produção leiteira, como o milho, a silagem,
entre outros, bem como, devido às melhorias da infraestrutura dos estabelecimentos,
como o uso de cochos adequados para melhor indução do animal à alimentação, a
instalação da ordenha mecanizada, utilização de tanques refrigeradores para
armazenamento do leite, melhorias nas técnicas do trato e até mesmo o conforto do
animal.
Verificou-se, também, a redução do pessoal ocupado nos estabelecimentos
agropecuários produtores de leite de Ituiutaba, resultado do processo de
modernização
responsável
pela
utilização
de
tecnologias
como a
ordenha
mecanizada, a qual é presente em 39,07% dos estabelecimentos onde foram
realizadas entrevistas por meio do trabalho de campo.
Salienta-se que tal incremento produtivo é reflexo da instalação da Nestlé no
ano de 1974 no município, bem como, devido a demanda das demais fábricas de
153
Ituiutaba e região, primando as transformações socioespaciais provenientes da
expansão produtiva do leite em Ituiutaba.
Considerações
A produção leiteira em Ituiutaba é fundamental para o processo de organização
e reorganização socioespacial, sendo responsável pelas transformações ocorridas na
estrutura socioeconômica deste recorte espacial, principalmente após a década de
1970, período em que houve a implantação da Nestlé no município.
Em relação ao produtor de leite, ressalta-se que este atua como o alicerce
desta cadeia produtiva. Neste sentido, faz-se fundamental a organização de políticas
públicas, ações do setor privado, bem como, aumento de subsídios e fomento para
auxiliá-los, tanto para a manutenção da atividade produtiva, quanto para o
favorecimento à modernização e expansão da produção, possibilitando o atendimento
com qualidade e, produtividade agregada, para atender as demandas das fábricas
processadoras de leite implantadas no município e nas demais existentes nas
unidades territoriais limítrofes.
Entretanto, mesmo diante o cenário de dificuldades encontradas para o
desenvolvimento da pecuária leiteira, deve-se ressaltar o crescimento da utilização de
importantes métodos para a manutenção desta atividade, como a utilização de
tanques refrigeradores para armazenamento do leite in natura, utilização da ordenha
mecanizada, manejo do pasto, suplementação alimentar, melhoramento genético do
gado, os quais são fundamentais para a continuação no atendimento da demanda das
agroindústrias na atualidade.
Mesmo diante do atual cenário agropecuário, o qual se alicerça no cultivo da
cana de açúcar e da soja, a pecuária leiteira segue mantendo a produção e, até
mesmo, aumentando-a no período analisado. Salienta-se que existem interesses na
realização de ações por meio das agroindústrias deste município, as quais estão
voltadas para melhorar a produtividade, ao mesmo tempo que gera retornos positivos
para os fornecedores, pois, aumentamos lucros dos mesmos. Entretanto, muitas vezes
observa-se a falta de incentivos, por vezes, públicos, para a realização de
financiamentos a baixos juros, com maior prazo.
Por meio da realização de entrevistas e, também, a partir de informações
obtidas com os produtores, constatou-se muitas reclamações, as quais se concentram
no apelo da falta de políticas públicas e/ou de apoio governamental em nível
municipal, estadual e federal. Reivindicaram também, maior atuação das instituições
de pesquisa e fomento da atividade agropecuária no meio rural.
154
Em Ituiutaba, a agroindústria leiteira está em processo de desenvolvimento,
principalmente na expansão da coleta de leite. Neste município, bem como nos
demais limítrofes, verificou-se também a expansão das instalações prediais destas
unidades. Consequentemente, este crescimento a partir da pecuária leiteira gera
reorganizações do espaço, tanto urbano, quanto rural, poisa medida em que cresce a
necessidade da oferta de leite in natura, os produtores devem atender a demanda,
proporcionando a valorização do produto e a metamorfose socioespacial.
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Recuperado em 20 novembro 2014.
156
VITIVINICULTURA NA REGIÃO DE BENTO GONÇALVES: MUDANÇAS
SOCIOECONÔMICAS EM DECORRÊNCIA DO ACORDO MERCOSUL.
Dilson Nicoloso Cechin – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Francisco Monte Alverne De Sales Sampaio – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Frank Gonçalves Pereira – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Jéssica Medianeira Xisto – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Suzana Bianchin Fernandes – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
Este trabalho, produto do trabalho de campo na disciplina Geografia do Cone
Sul/PPGEO-UFSM/2015, teve por objetivo observar a reação cooperativista frente às
diversidades competitivas dos pequenos produtores de uva no município de Bento
Gonçalves/ RS - Brasil.Conforme evidências, a região do vale dos vinhedos passou
por um severo processo de esvaziamento populacional, decorrente da desvalorização
da viticultura e vinicultura local, bem como da produção agrícola. Este, resultante da
evolução tecnológica do modo de fazer e da competição com grandes empresas do
setor, inclusive internacionais. Neste sentido, houve uma importante mudança nos
processos de produção, comercialização e marketing: os produtores deixaram de
vender a uva para as grandes vinícolas, somente o excedente, e passaram a produzir
e comercializar seu próprio vinho e outros produtos, muitos de forma ecológica e
sustentável. Somados a estas mudanças e com o reconhecimento da Indicação de
Procedência do Vale dos Vinhedos, em 2002 houve forte valorização imobiliária na
região, com índices entre 200% e 500%, e o reconhecimento do mercado diante dos
vinhos produzidos no Vale, onde nos últimos 11 anos o número de turistas na região
multiplicou, passando de 45 mil, em 2001, para quase 250 mil, em 2012.
Palavras-chave: Vitivinicultura;
Cooperativismo; MERCOSUL.
Vale
dos
Vinhedos;
Espaço
Produtivo;
INTRODUÇÃO
Muitas são as descobertas e inventos que têm aplicação direta ou indireta no
cultivo da uva e no fabrico do vinho. Da produção artesanal à mecanização, da
meteorologia à microbiologia, da indústria pesada ao computador, beneficia-se a
indústria do vinho. A possibilidade de intervir numa das fases mais cruciais da
produção, a fermentação, permitiu ao homem ordenar, disciplinar e manipular as
características do vinho. O vinhateiro-artesão tornou-se figura rara diante da
157
competição com grandes empresas nacionais e multinacionais e a produção
automatizada em larga escala.
Conforme Rossatto (2009), abertura do mercado mundial, com a globalização,
provocou um apuro operacional da produção, mas com restrições a normas
internacionais. Os acordos bilaterais ao longo de anos prejudicaram a comercialização
dos produtos brasileiros; um exemplo: o vinho – a diminuição e isenção da tarifa para
importação de vinhos e espumantes – já que os vinhos e espumantes importados
contam com subsídios dos governos locais. Nos meses de colheita da uva (dezembro
a março) a definição dos preços mínimos é periódica. Quase sempre, sem decisão, é
adiada para pós-safra.
Este problema é percebido na região do Vale dos Vinhedos, na serra do
nordeste do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Uma área onde predominam suaves
colinas cobertas por parreirais, plátanos e araucárias. A região brasileira mais
tradicional na produção de vinhos, cujo legado cultural e histórico se faz presente por
parte da cultura italiana, há mais de 135 anos (FALCADE; MANDELLI, 1999).
A região com destaque para a vitivinicultura foi pioneira ao buscar a
Denominação de Origem (DO) para seus rótulos. Em termos de reconhecimento
internacional, foi dado um grande passo pela vitivinicultura brasileira quando, no ano
de 1995, o país aderiu ao OIV, organismo internacional que rege direitos do vinho pelo
mundo.
A Serra Gaúcha, como principal e mais tradicional região produtora de vinhos
do Brasil, é responsável por cerca de 90% da produção nacional, com
aproximadamente doze mil pequenas propriedades rurais que cultivam trinta mil
hectares de vinhedos. A produção vinícola deve-se a cerca de 600 produtores, entre
indústrias, cooperativas e cantinas familiares que elaboram mais de 350 milhões de
litros por ano. Desde sua origem, esta vitivinicultura esteve assentada na produção de
vinhos de consumo corrente (vinhos de mesa) provenientes de cultivares não-viníferas
(burquinas e labruscas) e que, ainda hoje, representam mais de 80% do volume
produzido. Nos últimos anos, todavia, tem havido uma diversificação de produtos com
o crescimento dos segmentos de vinhos finos, espumantes e sucos de uva.
Ao
mesmo tempo, há um esforço renovado de qualificação da produção vinícola regional
com vistas a retomar competitividade frente à “invasão” dos importados, a qual tem
afetado, sobretudo, mas não exclusivamente, o segmento nacional de vinhos finos
(NIEDERLE, 2009).
A região denominada como Vale dos Vinhedos é uma Rota Enoturística que
envolve três municípios do Estado do Rio Grande do Sul: Bento Gonçalves, Garibaldi
e Monte Belo do Sul. De uma agricultura diversificada, onde se comercializava apenas
158
o excedente da produção, passou-se a uma especialização da produção, sendo
direcionada especialmente ao cultivo da uva. A partir da segunda metade do século
XX a produção passou por um revigoramento técnico, havendo assim, um aumento na
produtividade e na qualidade da uva e consequentemente de seus derivados,
especialmente o vinho e os espumantes. Em 2001, o resultado de toda essa evolução
começava a se pronunciar. Com bastante sucesso chegaram ao mercado os primeiros
vinhos com selo de Indicação de Procedência do Vale dos Vinhedos, região de Bento
Gonçalves, onde se concentram as mais destacadas vinícolas da Serra Gaúcha
(ROSSATO, et al, 2010). A Rota do Vale dos Vinhedos oferece mais de 50
empreendimentos,
sejam
eles
vinícolas,
hospedagem
diversificadas,
opções
gastronômicas e outros empreendimentos comerciais que se beneficiam diretamente e
indiretamente da atividade turística, possibilitando ao próprio visitante escolher os
atrativos que lhe chamam mais atenção e o usufruto das atividades de seu maior
interesse” (LAVANDOSKI, 2008).
O estado do Rio Grande do Sul é responsável por mais de 90% da produção
vinícola nacional. Considerando-se o total produzido verifica-se que em 2014 houve
um pequeno acréscimo, 0,996%, na produção total de vinhos, suco e derivados, em
relação ao ano anterior, decorrente da redução da produção de uvas devido às
condições climáticas de baixa precipitação pluviométrica e retração de mercado.
Tabela1: Quantidade de vinho e derivados produzidos do Rio grande do Sul.
Elaboração de Vinhos e Derivados no Rio Grande do Sul - 2004 a 2014milhões de litros
Vinhos
Vinhos
ANO
Outros Derivados TOTAL
Viníferas
Comuns
2004
42,96
313,70
51,87
408,53
2005
45,45
226,08
53,50
325,04
2006
32,12
185,08
59,13
276,33
2007
43,18
275,25
70,89
389,32
2008
47,33
287,44
93,19
427,97
2009
39,90
205,42
96,50
341,82
2010
27,85
195,25
98,96
321,21
2011
52,20
258,73
151,15
461,07
2012
48,60
213,10
167,28
428,98
2013
48,40
197,90
125,15
371,45
2014
38,46
196,07
140,19
374,72
Fonte: IBRAVIN/MAPA/SEAPA/RS - Cadastro Vinícola - 2014
Quanto ao consumo per capita de vinhos no país, conforme tabela acima,
situou-se em 1,91 litros no pior ano, 2006. O crescimento tem sido lento e o produto
nacional continua perdendo mercado para os importados. Os vinhos de mesa vêm
159
apresentando tendência crescente nos últimos anos, no entanto apresentaram
redução na quantidade comercializada. No segmento de vinhos finos, para mudar este
quadro, tem havido investimentos significativos na melhoria da qualidade nos últimos
anos, com tendência a formação de várias indicações geográficas, a exemplo do Vale
dos Vinhedos.
Quanto ao modo de produção, o sistema de condução latada, este feito por
uma pérgola com moirões ou postes, onde os cabos correm no topo, por aonde
troncos e ramos vão se estendendo, formando a ramada. A impressão visual desse
sistema é um telhado verde, onde os cachos, entretanto os ramos crescem e se
fecham, e os cachos de uvas que pedem por baixo não recebem boa insolação. Além
disso, no verão, quando chove, o caramanchão forma uma estufa quente e úmida,
propiciando o aparecimento de doenças. Enquanto, o sistema espaldeira, também
chamado deGuyot, utiliza moirões ou postes de cimento ou madeira, fincados a
espaços regulares, pelos quais correm dois ou mais cabos de arame, um acima do
outro. Os ramos são conduzidos através desses cabos e frutificam sem necessidade
de outras escoras. Esse sistema lembra uma parede verde, onde os cachos dispõem
em alturas diferentes recebendo boa aeração e insolação.
Sobre o processo de produção, as principais etapas são: a colheita, o
desengaçamento, a prensagem, a fermentação, a filtragem, e o armazenamento.Ao
mesmo tempo em que, hoje a criação de novas vinícolas combina a funcionalidade de
um programa industrial com a tecnologia, o design e a arte, já que a paixão por vinhos
esta se estendendo por todo o mundo, onde os produtores de vinho estão se
esforçando para fortalecer suas posições no mercado com uma imagem corporativa
original, que ilustra o espírito da vinícola.
Do rótulo na garrafa até o edifício de produção, a programação de cada
elemento visual recebe atenção meticulosa. As novas vinícolas, suas áreas de
produção e suas salas de vendas estão se tornando espaços aconchegantes de
convivência para retratar a marca. A popularização da cultura do vinho tem
transformado vinícolas em centros para lazer e turismo, para isso alguns incluem nos
programas restaurantes e hotéis com vinho terapia.No final da década de 1990, surgiu
o desejo de mudar, então os antigos vinhedos, estes plantados pelo sistema
tradicional de "latada", que não favorecia a produção de uvas de qualidadepassaram
para o sistema de espaldeira simples ou em forma de lira, o que facilita uma boa
insolação e, consequentemente, a produção de uvas de excelente qualidade.
Este trabalho foi iniciado em 2000 e hoje cerca de 400 hectares de vinhedos já
estão enquadrados no novo padrão de plantio, tanto na Serra Gaúcha quanto nos
novos vinhedos da empresa localizados na região da Campanha, na divisa com o
160
Uruguai, em Bagé e em Santana do Livramento. Optando sempre pela qualidade, os
vinhedos têm rendimento controlado e os produtores tiveram que se adaptar às novas
regras.
HIPÓTESES
A falta de associativismo/cooperativismo na produção da viticultura e vinicultura pode
vir a interferir no modo de produção e rendimento local.E, de que formas os acordos
firmados no MERCOSUL influenciariam no espaço produtivo da área.
METODOLOGIA
O trabalho em análise refere-se a uma saída de campo realizada no Vale dos
Vinhedos, região nordeste do Estado do Rio Grande do Sul. O trabalho foi referente a
uma observação in locopara entender como se deu a inserção cooperativista entre os
produtores da região. A partir dos conhecimentos prévios,foi possível identificar uma
série de informações conceituais que serviram como um suporte teórico-metodológico
para a referida pesquisa onde as mesmas, foram descritivamente analisadas e
entãoincorporadas por meio de umquestionário não estruturado, decorrente das
exposições dos produtores de uva do local.Portanto, o trabalho de campo serviu de
base para avistar a realidade do espaço em estudo e assim, constatar as divergências
que há entre o espaço de ideias e espaço de produção. E, a partir destas bases a
elaboração deste estudo.
DESENVOLVIMENTO
A região do Vale dos Vinhedos tem uma tradição de mais de 135 anos no
cultivo da uva e na produção de vinhos. É atualmente uma das áreas mais prósperas
do Rio Grande do Sul. O Vale dos Vinhedos (Figura 1) situa-se a nordeste do estado
do Rio Grande do Sul e sua área total compreende 81,23 Km², sendo a maior parte
localizada em Bento Gonçalves e estendendo-se sobre os municípios de Garibaldi e
Monte Belo do Sul (FALCADE; MANDELLI, 1999).
161
Figura 1: Área geográfica Vale dos Vinhedos.
Fonte:Falcade; Tonietto, 2010.
As condições naturais da região são heterogêneas, com relevo que se
apresenta em patamares e as vertentes formam escarpas, o que designa a
denominação de região serrana, além disso, apresenta grande variabilidade de solos
(SARMENTO et al., 2006); (FALCADE; MANDELLI, 1999). Quanto ao uso e ocupação
vincula-se à imigração italiana, especialmente a viticultura, que é o cultivo de uvas.
Esta atividade, por sua vez, é desenvolvida em pequenas propriedades rurais, com
média de 15 ha de área total e 2,5 ha no caso dos vinhedos. A topografia acidentada,
a pouca mecanização e o predomínio da mão de obra familiar são também
características locais (PROTAS et al., 2004). O uso e cobertura do solo, as áreas
agricultadas para os vinhedos representam 2.123, 95 hectares, totalizando 26,14 % da
cobertura total do solo do Vale dos Vinhedos, sendo assim a atividade que mais
significativa em termos de área ocupante.
162
Para concluir a importância dessa concepção, que por definição e como objeto
de estudo, tem na relação entre Sociedade/Homem e Natureza, seu fazer científico,
exemplificamos o caso do objeto de análise desse artigo.A relação do Vale dos
Vinhedos de sua economia, com a cultura dos imigrantes italianos, seus fazeres e
saberes, juntamente com a paisagem da serra, tornou esse sistema único e sob o
ponto de vista do patrimônio cultural e imaterial, passível de conservação e por
consequência apropriada para atividades turísticas. Sua situação econômica e social
vigente, chama à atenção, e como principais propulsores econômicos da região estão
a viticultura e a vinicultura. Atividades que predominam na zona rural e impulsionam
também a agroindústria, de modo que além de fonte de renda para famílias que vivem
desta cultura, proporciona que o dito êxodo rural tão comum em todo Brasil, em alguns
casos transforme-se em êxodo urbano, no entanto, mais pelos fatores atrativos do
campo do que repulsivos da cidade.
Conforme foi evidenciado em trabalho de campo, a região do vale dos
vinhedos passou por um severo processo de esvaziamento populacional, sobretudo da
população mais jovem, em decorrência da desvalorização da viticultura e vinicultura
locais, bem como toda produção agrícola. Esse fato foi decorrente também da
evolução tecnológica do modo de fazer e da competição com grandes empresas do
setor. Conforme Falcade e Mandelli,
a evolução da vitivinicultura no RS e no Vale dos Vinhedos,
esta diretamente ligada a identidade do imigrante italiano, [...] a
evolução tecnológica ao longo das ultimas três décadas,
aplicada ao processo produtivo vitícola e vinícola, tem
resultado em produtos que estão conquistando mercados mais
exigentes e alcançando renome. (1999, p. 24).
Nesse contexto de mudanças e modernização, nos anos 90, houve o
fortalecimento das vinícolas familiares no Vale dos Vinhedos. Nesse sentido houve
uma importante mudança: os produtores deixaram de vender a uva para as grandes
vinícolas e passaram a produzir e comercializar seu próprio vinho.
Esse fato, aliado ao desejo da maioria dos descendentes de
imigrantes italianos de ter sua própria vinícola, foi somado ao
de que algumas vinícolas de grande porte da cidade de Bento
Goncalves e de toda a Serra gaúcha passaram por crises
setoriais, sendo que muitas faliram nos anos 90. Essa crise,
por sua vez, foi consequência da entrada de vinhos importados
com custo inferior, fato conhecido pelos produtores de uva da
Serra gaúcha como “febre da garrafa azul” e por problemas
administrativos; financeiros, como foi o caso da Cooperativa
Vitivinícola Aurora e Companhia Vinícola Rio-grandense, no
inicio e meados dos anos 90 (VALDUGA, p. 83).
163
Aliado à crise, a implantação do acordo MERCOSUL trouxe uma nova
realidade socioeconômica para a Região Sul do Brasil, na medida em que promoveu
mudanças nas relações econômicas, principalmente nas regiões de fronteiras entre os
países signatários deste Tratado. Os primeiros a sentirem o reflexo desse bloco
econômico foram às empresas vinícolas de pequeno e médio porte, ameaçadas
principalmente por produtos de baixo custo.Em decorrência disso, os pequenos
produtores vinícolas da região de Bento Gonçalves, por volta do início das décadas de
1990 e 2000, sentiram a diminuição das vendas de seus produtos tradicionais, como a
uva em natura, sucos de uvas e a graspa. Esta situação de desorganização no
sistema produtivo da viticultura, antes produtiva, ocasionou, também, a desvalorização
dos ativos patrimoniais, notadamente, as terras – as propriedades já bastante
fracionadas em função dos herdeiros. As propriedades rurais, que em maioria se
constituem pequenas, em torno de 4,0 hectares, ficaram com valor de mercado
entorno de R$5.000,00 por hectare.Tradicionalmente os produtores familiares
trabalhavam de forma individual e desorganizada ficando passíveis a sofrerem mais os
efeitos das adversidades comerciais: a concorrência com vinícolas médias e grandes
já consolidadas.
Apesar da forte integração do Mercosulo setor de uva e vinho no Brasil oferece
também uma resistência. “... encontram uma concorrência que cresce com base no
desenvolvimento das pequenas empresas vinícolas e das cantinas rurais, que
aproveitam o crescimento do mercado de vinhos comuns e o aumento de demanda
nas classes mais populares” (WRIGHT, et al, 1992). Eis então o início do surgimento
das pequenas vinícolas, cujo foco é na qualidade em detrimento da quantidade, como
forma de sobrevivência em um mercado extremamente competitivo. Esse cenário de
crise fez com que muitas vinícolas deixassem de pagar aos produtores que por sua
vez tiveram que se adaptar à nova realidade e estruturar empresas próprias, organizar
associações e produzir vinhos.
O ano de 1995 representou um marco para o setor, pois foi criada Associação
dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (APROVALE), fruto da
organização de seis vinícolas da região. Os principais objetivos eram: a qualificação
dos produtos vinícolas e derivados e o estimulo e a promoção do potencial turístico da
região.A APROVALE é responsável também pelo controle dos produtos protegidos
pela Indicação Geográfica do Vale dos Vinhedos e sua gestão; responsável pelas
condições organizacionais que operacionalizaram e permitiram a consumação da
Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, reconhecida em 2002 e concedida em
2012, pelo Instituto Nacional de Pesquisa Industrial (INPI) (EMBRAPA, 2012).
164
Agora, já em forma associativa e ou cooperativa de trabalhos, os pequenos
produtores de uvas e vinhos também passaram a adotar sistemáticas modernas,
muitos de forma sustentável, de cultura orgânica, de organização do parreiral e do
processamento da uva. Caracterizam-se por: mudanças de algumas espécies
viníferas; adoção de forma de plantio do tipo espaldar – que proporciona atividades
mecanizadas e rapidez funcional, gerando bagas de melhor qualidade; equipamentos
de última geração e técnicas melhoradas otimizando custos de produção. Assim,
agregando valor e qualidade a toda produção processada, se constitui num dos
primeiros elementos de ingresso no mercado, mesmo em pequena escala, mas
competitivo com os produtos de outras vinícolas renomadas da região e também de
importados.
Uma importante pesquisadora sobre a temática afirma que, a partir da
Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, transformações ocorreram, como o
incremento na área cultivada de Vitisvinifera, com novas formas de condução
(espaldeira e latada aberta); a qualificação dos vinhos produzidos; a instalação de
novas vinícolas com elevado padrão tecnológico e a diversificação das atividades
econômicas, como o enoturismo, incluindo a instalação de pousadas e hotéis e
gerando aumento do número de empregos; o surgimento de novas relações de
produção, como a integrada; a pavimentação das estradas e o aumento do trânsito de
automóveis e ônibus; a modernização das habitações e o embelezamento do entorno
das residências e vinícolas; a valorização das propriedades e da produção qualificada,
elevando a renda (FALCADE, 2006).
Seguindo o processo de mudanças que foi adotado em conjunto, como forma
de superar os problemas detectados, os pequenos produtores passaram a abandonar
as técnicas antigas de vitivinicultura, processos artesanais, herança dos primeiros
imigrantes. Adotaram técnicas de processos mais atualizados que proporcionam mais
eficiência no manejo e nos resultados dos produtos processados da uva. Para
promover estas mudanças os pequenos produtores, além de terem se associado como
já enfatizado, passaram a atuar como tal na busca de apoio juntos aos órgãos
governamentais locais, estadual e nacional. Esta busca resultou frutífera, pois, as
cooperativas/associações passaram a ter mais incentivos, implementação de apoio –
não só financeiro, mas de treinamento técnico, suporte de produção e novas
estratégias de comercialização.
165
CONCLUSÃO
Mesmo que ocorram algumas mudanças na variação do uso tradicional da
terra percebem-se modificações, não só na produção, como também na cultura, nas
formas de vida e na forma de se relacionar com o espaço. Porém, estas mudanças ao
mesmo tempo em que introduzem novas formas de relacionar-se com o território –
novas territorialidades, novas identidades – provocam um fortalecimento do espaço
local pela afirmação enquanto indivíduos e/ou grupo unido e pertencente àquele
território, ainda típico de seus ancestrais.
Diante de todo este conjunto de problemas relatados os pequenos produtores
se deram conta que o maior problema deles era a falta de união e organização.
Passaram a adotar como forma de enfrentamento a todas as adversidades o
cooperativismo/associativismo como ferramenta de superação. Com a implantação
das cooperativas e associações os problemas e as estratégias de mudanças e
superação dos mesmos, em geral comum a quase todos, passaram a ser
identificados, de forma sistemática, atacados para serem superados e ou contornados.
Neste sentido, foram adotadas as estratégias a seguir abordadas na tentativa de
superar os problemas identificados.
Como a produção quantitativa na pequena propriedade era inviável foi adotada
a qualidade como estratégia operacional. Ficou comprovado pela prática dos
produtores concorrentes locais e do exterior que o uso da uva produzida de boa
qualidade era de suma importância para, mediante processamento/industrialização,
produzir-se resultados de boa aceitação como os produtos do tipo: vinhos finos e
sucos finos, que são importados dos países vizinhos do MERCOSUL e vendidos no
mercado local e nacional com excelente aceitação.
Muitos viticultores, conforme relatos, em função de uma rentabilidade mais
rápida, estão transformando o uso do território. Até mesmo eliminando espécies
viníferas (VitisVinifera), para dar lugar àquelas para suco, como as americanas ou
híbridas. Outros mudam até mesmo para outro tipo de produção agrícola – que na
área em questão se limita muito em função do relevo acidentado.
Diante das diferenças, principalmente a grandes proprietários produtores,
muitos adotaram técnicas de superação dos problemas relatados, como a introdução
da prática da cultura ecológica, que é caracterizada pela produção sustentável. Prática
esta também adotada por pequenos produtores de hortaliças, que através de
cooperativa/associação que coordena ações, macros, de política organizacional,
estratégicas de marketing, logística de comercialização e entrega dos produtos,
permanecendo a independência de ação de cada associado.
166
Outra grande conquista obtida pelos produtores foi a obtenção do Registro da
Denominação de Origem do Vale de Vinhos, cujoSelo era aguardado há quase 10 anos
pelos produtores da serra gaúcha. A certificação vale para os vinhos e espumantes das
variedades merlot e chardonnay. Segundo a Associação dos Produtores de Vinhos
Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), os produtos devem valorizar em até 30%. A
expectativa é que o selo já possa ser visto nas mercadorias nas prateleiras em dois
meses. O selo, que foi concedido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), é
uma forma de proteger e valorizar a identidade dos produtos da região.
Segundo Falcade (2006), a partir da Indicação de Procedência Vale dos
Vinhedos, muitas transformações ocorreram: incremento na área cultivada de
Vitisvinifera, com novas formas de condução (espaldeira e latada aberta); a
qualificação dos vinhos produzidos; a instalação de novas vinícolas com elevado
padrão tecnológico e a diversificação das atividades econômicas, como o enoturismo,
incluindo a instalação de novas pousadas e hotéis, gerando aumento do número de
empregos; o surgimento de novas relações de produção, como a integrada;
qualificação na infraestrutura dos municípios, como a acessibilidade por estradas
pavimentadas; a modernização das habitações e o embelezamento do entorno das
residências e vinícolas; a valorização das propriedades e da produção qualificada,
elevando a renda. Um dos principais sintomas percebidos do sucesso das
modificações introduzidas nos sistemas produtivos das pequenas propriedades da
região de Bento Gonçalves foi a valorização espetacular das mesmas, que alcançaram
valores estratosféricos, variando de R$600.000,00 a R$800.000,00 por hectare,
conforme informações dos próprios pequenos produtores visitados.
Ainda com base nas informações dos pequenos produtores visitados e
entrevistados, seus novos produtos processados nas propriedades, estão a com
produção aumentada e sendo bem aceitos pelos consumidores, que destacam a
excelente qualidade dos mesmos, o que não acontecia no passado. Outra
demonstração da boa qualidade dos novos produtos é atestada pelos prêmios que os
mesmos vêm ganhando em feiras de exposição e degustação de vinhos, sucos,
graspas e espumantes.
Para alegria das famílias dos pequenos produtores muitos membros que
tinham migrado para as cidades, agora já estão voltando para a lida no campo. Muitos
deles com formação e treinamento específicos para atuarem de forma objetiva e
eficiente nos sistema produtivo das pequenas propriedades, além das escolas técnicas
que estão sendo fundadas para treinamento dos filhos dos pequenos produtores, que
de forma consciente e objetiva à formação dos futuros produtores rurais, jovens que
167
certamente com mentes abertas às mudanças, diferentemente dos seus ancestrais
que eram resistentes às quebras dos paradigmas.
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Bento Gonçalves, EMBRAPA - CNPUV, 1992.
169
CIDADES DOENTES, CIDADÃOS DOENTES: MICROTERRITORIALIDADES
DE SUJEITOS COM CÂNCER NA FEIRA ECOLÓGICA DA REDENÇÃO,
PORTO ALEGRE-RS.
Leonardo Pinto dos Santos – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Elizandra Voigt – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Jaqueline Lessa Maciel – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O artigo visa salientar as mudanças no estilo de vida da população decorrentes do atual
sistema globalizante, onde o sedentarismo e má alimentação muitas vezes influenciam no
aparecimento de algumas doenças. Enfatiza-se a microterritorialidade de pessoas com câncer
na Feira Ecológica da Redenção, as quais buscam um estilo de vida mais saudável e de
acordo com o tratamento estabelecido para a cura da doença. Os objetivos específicos
buscaram: (a) Destacar os problemas existentes nas cidades; (b) Descrever a influência do
atual modelo capitalista na alimentação e saúde das pessoas; (c) verificar a
microterritorialidade de sujeitos com câncer existente na Feira Ecológica da Redenção. A
relevância da pesquisa justifica-se pela importância dos estudos referentes à temática, visando
demonstrar as transformações no modo de vida das pessoas por meio dos hábitos alimentares.
Metodologicamente a pesquisa foi estruturada em etapas. Inicialmente realizou-se o resgate
conceitual. A segunda etapa se constituiu em levantamentos de dados em fontes secundárias.
A terceira esteve relacionada ao trabalho de campo. Nesta perspectiva, aliando os conceitos
aos dados coletados e a observação in loco, foi possível compreender a microterritoriadade
das pessoas com câncer na Feira Ecológica da Redenção.
Palavras-chave: Cidades; Microteritorialidade; Feira Ecológica da Redenção; Porto
Alegre; Globalização.
Um bicho estranho chamado cidade!
Engraçada essa “coisa” que chamamos de cidade. Lugar onde ocorre a mais
perversa segregação é também o espaço por onde florescem diversidades. A cidade é
um objeto de estudo complexo. Estudada por muitas ciências é alvo de antropólogos,
sociólogos, geógrafos, arquitetos, historiadores, das artes, da arqueologia entre
outras. Pela própria diversidade e embates ali existentes se torna objeto fecundo de
reflexões.
É na urbe que sonhos emergem e são destruídos, é na cidade que convivem a
diversidade, é nela que coabitam doutores e analfabetos, ricos e pobres, negros e
brancos, idosos e jovens, homens, mulheres, transgêneros... punks, anarquistas,
emos, roqueiros, patricinhas, hippies... é na cidade que as cores, os odores, os sonhos
e emoções se misturam. A cidade se transforma como um calidoscópio da diversidade
que constrói esse urbano em sua prática e em suas próprias imaginações.
Na diversidade de sonhos e interesses se (des)constroem lugares, se definem
caminhos, se organizam racionalidades dominantes e contrarracionalidades. A cidade
170
pode ser comparada a um organismo vivo, em constante mudança, ou seria melhor
metáfora pensá-la como uma hidra de muitas cabeças, um organismo vivo que pulsa
que se reconstrói constantemente. Uma cabeça da hidra é arrancada e logo surge
outra, diferente, incomum, não familiar ao velho habitante, surgida a partir da
reprodução do capital essa nova cabeça configura uma organização espacial urbana
que pratica a perversidade de transformar seres iguais em seres desiguais.
As cidades são realmente um “bicho estranho” onde são produzidas vivências
e onde se busca a concretude de diversos sonhos. Mas este “bicho estranho” está
ficando doente, e com ele enfermo os cidadãos do mundo também ficam. O escritor
Eduardo Galeano (2009, p. 87) bem resume o atual momento da sociedade urbana.
Meio século depois, os seres urbanos estamos todos mais ou menos
loucos, embora quase todos vivamos, por razões de espaço, fora do
manicômio. Desalojados pelos automóveis, encurralado pela
violência, condenados ao isolamento, estamos cada vez mais
amontoados e cada vez mais sozinhos e temos cada vez menos
espaços de encontro e menos tempo para nos encontramos.
Cada vez mais a população se refugia nas cidades. No Brasil 85,43% (IBGE,
2014) da população reside na área urbana, e essa grande parcela populacional se
encontra com uma infraestrutura deficitária impedindo a manutenção de uma
qualidade de vida aceitável. O processo de urbanização no Brasil, bem como, na
maioria das nações da América Latina se desenvolveu de forma descontrolada. Sem
planejamento e controle algum, caímos na (re)produção de uma cidade, mas essa
cidade é uma cidade doente produzindo sujeitos doentes.
Esse é o enfoque presente neste artigo. Ou seja, a discussão centrará na
questão da “microterritorialidade” e/ou “microterritorializações” (COSTA, 2008; 2010;
2013) com destaque para uma pequena parcela territorial do espaço urbano de Porto
Alegre, Brasil. Desse modo, centrar-se-á o foco de análise na Feira Ecológica da
Redenção, a qual ocorre todos os sábados pela manhã na capital do estado do Rio
Grande do Sul, Brasil, enfocando a presença da microterritorialização de pessoas com
câncer.
“O desenvolvimento desse bicho estranho!”
Entre a época neolítica, quando houve a grande revolução que gerou
o homo sapiens, até os inícios da cristandade, um período que se
conte em milênio (três? cinco?), a população do planeta apenas
dobra, passando de 100 ou 120 milhões a 250 milhões de habitantes.
Para que a população dobrasse outra vez, foram necessários quase
quinze séculos, entre a época romana e o reinado de Luís XIV,
quando os efetivos humanos somavam 500 milhões, para alcançar
545 milhões em 1750. A nova duplicação do estoque humano vai darse em apenas um século, pois em torno de 1850 havia entre 1,1
171
bilhão e 1,2 bilhão milhões de homens. Desde a fase em que
Bismarck e Cavour constroem a unidade da Alemanha e da Itália e o
fim da Segunda Guerra Mundial, a população mundial duplica de
novo, chegando a 2,4 bilhões de 1950. Daí para cá, a aceleração se
torna prodigiosa. Quinze anos depois, em 1965, contamos 3,5 bilhões
de criaturas sobre a face da terra. Somos, hoje, quase 5 bilhões e
admite-se que na virada do século a sociedade humana estará
formada por quase 6,5 bilhões de viventes (SANTOS, 2014, p. 43).
Como na previsão de Santos (2014), atualmente existem mais de sete bilhões
de habitantes (ONU, 2013) no mundo, sendo que grande parcela destes, volta-se a
habitar os grandes centros urbanos. O crescimento populacional deu um salto com os
avanços, principalmente no campo da saúde, transporte e alimentação.
Este avanço técnico permitiu uma mudança no perfil demográfico, o que
possibilitou como característica preponderante, um claro envelhecimento da
população. A esta nova característica da população brasileira se imprimi novas
características de relação homem X natureza advindas principalmente do processo
conhecido como globalização. Esse processo tende homogeneizar estilos de vida,
visando padronizar (e conseguindo!) principalmente os “maus hábitos” de vida, os
quais expandem os fatores de risco do mundo contemporâneo.
“É este discurso, desta forma específica de globalização, que é um importante
componente da contínua legitimização da visão de que há um modelo específico de
“desenvolvimento”, um caminho para uma forma de “modernização”” (MASSEY, 2013,
p.129).
Com a globalização agindo, muitas vezes de forma perversa, como abordado
no estudo de Santos (2000), está sendo percebida na sociedade, a diminuição das
doenças
infectocontagiosas
e
o
aumento
alarmante
das
doenças
crônico-
degenerativas. Além disso, esse processo acaba causando gastos elevados com a
saúde pública, mas ao mesmo tempo insuficientes, para o tratamento deste número
crescente de pacientes, muitas vezes impedindo, o investimento em outras áreas tais
como a educação e a segurança.
A partir dessas reflexões, enfatiza-se o problema do câncer no Brasil, o qual
está, cada vez mais, conquistando lugar nas agendas de discussão, tanto do poder
público, quanto da população em geral. Com a expectativa de vida aumentando, a
melhoria e a evolução dos métodos de diagnósticos e com o padrão de vida
“ocidental” que a globalização delineou em diversos pontos do planeta, está ocorrendo
uma elevação nos casos de diagnóstico de câncer.
Convêm destacar que o câncer é o nome dado a um conjunto de mais de cem
tipos diferentes de doenças, as quais apresentam como ponto comum o crescimento
desordenado de células anormais com potencial invasivo. Além disso, sua origem se
172
dá por condições multifatoriais. Esses fatores causais podem agir em conjunto ou em
sequências para iniciar ou promover o câncer (cancinogênese). (INCA, 2015).
O Instituto Nacional de Câncer (INCA, 2015) projeta que em 2030 o montante
de novos casos de câncer em escala global será de 21,4 milhões, sendo que desses,
haverá 13,2 milhões de óbitos.
Assim entende-se, ser extremamente importante, que sejam implementadas
ações preventivas para reduzir a carga do câncer. Ações contra o tabagismo
(relacionado ao câncer de pulmão, entre outros); promoção de uma alimentação
saudável (para a prevenção dos cânceres de estômago e intestino, entre outros);
vacinação para Papilomavírus humano (HPV) e hepatite (contra o câncer do colo do
útero e de fígado) entre outras ações, que visem ir de encontro, às práticas ofensivas
a saúde humana, estabelecidas pelo atual sistema capitalista. (INCA, 2015).
Além dos exemplos das ações supracitadas, a população pode buscar a
adoção de um estilo de vida mais saudável, com hábitos alimentares benéficos a
saúde. Esse é um importante ponto que será enfatizado neste artigo.
A busca por uma alimentação saudável elevou a circulação de pessoas na
Feira Ecológica da Redenção, dentre os indivíduos que por ali passam a uma grande
quantidade de pessoas diagnosticadas com algum tipo de câncer e que buscam ali
uma alimentação “limpa” da carga de agrotóxicos, que abastecem principalmente as
áreas de cultivo dominadas pela monocultura.
Com base nas reflexões apresentadas, pode-se afirmar que há uma
microterritorialização de homens e mulheres que partilham um diagnóstico positivo
para doenças cancerígenas.
Ao realizar observações in loco, aos sábados pela
manhã na área do Parque Farroupilha, bem como entrevistas informais aos donos das
bancas, é possível perceber que houve nos últimos anos um aumento no número de
consumidores da feira, os quais apresentam características de pessoas que estão se
recuperando da doença, como por exemplo, a falta de cabelo e/ou lenços cobrindo a
cabeça.
Ainda sobre a questão das microterritorialidades, destaca-se que o prefixo
“micro” atrelado ao território busca atrelar o sentido de “ação individual e coletiva que
leva a apropriação de certas partes do espaço produzido/usado por outros sentidos
diversos que anteriormente pensado” (COSTA, 2013, p.63).
A partir desse ponto, o trabalho apresentará a caracterização histórica da área
de estudo, ou seja, a Feira Ecológica, e posteriormente uma revisão sobre o conceito
de território e seus desdobramentos (HAESBAERT, 2002; 2005; 2014; e COSTA,
2008; 2010; 2013).
173
Características da área de estudo: A Feira Ecológica da Redenção
A Cooperativa Coolmeia, criada em 1978, possuía como princípios básicos o
ecologismo (preocupação e cuidado com a preservação ambiental, utilizando
tecnologias moderadas), naturismo (modo de vida fundamentado no retorno à
natureza, através de práticas ecológicas) e cooperativismo (valorizar o coletivo tanto
na produção quanto na organização da feira). Reunia três categorias de associados:
produtores, operacionais e consumidores, os quais trabalhavam para zelar as
atividades da cooperativa. Toda essa sapiência foi passada adiante quando, em 16 de
outubro de 1989, para comemorar o Dia Mundial da Alimentação e o Dia Mundial de
Luta Contra os Agrotóxicos, foi idealizada e organizada a Feira Orgânica dos
Agricultores e Ecologistas (FAE).
Com o fechamento do Núcleo de Ecotecnologias da Coolmeia, em 2004,
instrumento que era responsável por visitas aos produtores e assistência da produção
ecológica, surgiu a Associação dos Agricultores Ecologistas Solidários do Rio Grande
do Sul. Corporação com caráter jurídico que salienta a qualidade da produção, nos
mesmos moldes da Coolmeia, garantindo a certificação dos produtos orgânicos
através da rede Ecovida – Organismo Participativo de Avaliação de Conformidade –
que em dezembro de 2010, ante o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA) passou a ter o mesmo crível que possui uma certificadora convencional.
Nas revisões de literatura sobre o assunto, é importante destacar o
pensamento de Lutzenberger (1998, p.01) quando afirma que:
Os agricultores regenerativos modernos estão aprendendo a se
tornar cada vez mais sustentáveis, com colheitas ótimas e métodos
localmente adaptados, enquanto recuperam e mantém a
biodiversidade nos seus cultivares e na paisagem circundante.
Vamos chamá-los agricultores regenerativos, e não biológicos,
orgânicos ou alternativos. Quando se trata de vida, seja bom ou mau,
tudo é biológico, é orgânico, mesmo grandes massacres. Alternativo
apenas significa diferente, poderia ser pior. Mas regenerativo significa
regeneração do que tem sido perdido ou destruído.
A FAE, que também é conhecida como Feira Ecológica da Redenção, foi
fundada por José Lutzenberger, Sebastião Pinheiro, Jacques Saldanha, Nélson Diehl,
Glaci Campos Alves, e outros, em 1989. Desde então funciona aos sábados no
Parque Farroupilha das 07h30min às 13 horas, reunindo produtores agrícolas de Porto
Alegre e do interior do Rio Grande do Sul, organizados por cooperativas. Na feira, são
comercializados produtos hortigranjeiros e agroindustrializados livres de agrotóxicos
ou substâncias sintéticas.
174
Através do comprometimento dos consumidores, operacionais e produtores
rurais e urbanos, a Feira conquistou, por intermédio da imprensa, ampla divulgação. A
primeira realização da feira contou com um público superior a cinco mil pessoas, o que
levou ao término dos produtos em menos de quarenta minutos. Foi a partir de então,
que os envolvidos decidiram que deveriam dar continuidade.
Pelo fato de não haver produtores, produção e gerência suficientes para
atender a demanda, ficou decidido que a feira aconteceria somente uma vez por mês.
Então foi se estruturando e passou a ser quinzenal no segundo ano e, somente no
terceiro ano de existência, se tornou semanal. Hoje, os agricultores se dividem em
aproximadamente cento e cinqüenta bancas, posicionadas ao longo de duas quadras.
Por esta área, passam centenas de pessoas, em busca de uma variada gama de
alimentos, como: cereais, frutas, legumes, verduras, mel e derivados, sucos, laticínios,
massas, pães, entre outros.
Dentre as cooperativas e entidades presentes na feira atualmente cita-se:
Cooperativa Arco-íris, Cooperativa de produtos orgânicos Pão da Terra, Associação
dos Produtores Ecologistas da Linha Pereira de Lima, entre outras.
As bancas agroecológicas: algumas considerações
Destaca-se algumas bancas e produtos presentes na área em estudo, entre
eles a Banca dos Ovos que está presente na FAE desde 2011, especializada em ovos
orgânicos, é composta pelas famílias de Alessandra Coser, Airton Otton e Flávio
Figueiredo, que atuam, há cerca de, 14 anos criando galinhas sem a utilização de
hormônios e antibióticos, e o pasto onde as mesmas se alimentam é livre de produtos
químicos.
A Banca da Associação dos Colonos Ecologistas da Região de Torres
(ACERT) é um núcleo formado pelas famílias Martins, Evaldt, Mengue, Carlos e
Cassol. Foram convidados pela Coolmeia para participar da Feira dos Agricultores
Ecologistas, onde tiveram um elevado crescimento e, em 1992 fundaram a ACERT
Três Passos. Na atualidade, suas propriedades - localizadas na Vila Três Passos, em
Morrinhos do Sul - são abertas a escolas, universidades e consumidores, que podem
aprender e até trabalhar, cientes de estar em um ambiente que respeita a natureza,
livre de produtos químicos.
A Associação dos Produtores Ecológicos da Linha Pereira de Lima (APEMA)
também possui uma banca na Feira Ecológica da Redenção. A associação foi fundada
por um grupo de 11 famílias, e hoje é composta por agricultores como Vilmar Menegat,
Bermil Zampieri e Valmor Zampieri que se revezam semanalmente no atendimento da
175
banca. O grupo começou a produzir organicamente há 24 anos e quando descobriram
a existência da Feira tiveram a oportunidade de vender seus produtos diretamente ao
consumidor.
Outra banca presente na Feira é a Quinta do Livramento. José Azevedo era
quem cuidava da banca a qual tem como produtos os cogumelos orgânicos. Em 2014,
Azevedo passou sua banca para o casal Roberto e Neli Sicoli que estavam em busca
de um novo desafio e, desde então, estão procurando aprender e estudar sobre o
assunto, contando com o auxílio do antigo dono.
A Feira possui também a banca das Flores. Conhecida como “Jeito Natural”,
tem como proprietário Germano Bettio, Valdomiro Silveira dos Santos, Luis Antônio
Silveira dos Santos e Everton Garcia. A banca é especializada em flores do campo,
mas os agricultores também cultivam frutas ecologicamente, dentre as quais os
pêssegos são os que, possuem maior destaque.
O Grupo Coelho é responsável por uma banca com diversos produtos
orgânicos. O Grupo Coelho foi resultado da união dos irmãos Jonato e Jonas Moreira
Coelho, e seu pai, Agostinho de Freitas Coelho que produzem há 24 anos. Tudo
começou quando Jonato foi convidado para vender seus produtos em um prédio e
conheceu Luiz Jacques Saldanha. Posteriormente o grupo entrou para a agricultura
orgânica e começou a fazer parte da FAE.
Há 4 anos Edimar Moreira Coelho, juntamente com sua esposa Claudete
Correa Coelho, são responsáveis pela banca que comercializa caldo de cana e
também, pela produção de Semente Crioula, sobre as quais realizam palestras na
Associação Rio-Grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão
Rural (EMATER). Para o cultivo dos alimentos eles utilizam técnicas de cama de
aviários e compostagem e a irrigação é feita com água de vertentes naturais.
Cabe destacar que, ao longo dos anos a agricultura vem sofrendo
transformações devido ao avanço das tecnologias e acarretando uma série de
impactos. Por esse motivo enfatiza-se a necessidade de resgatar a relação do ser
humano com os alimentos, que são os princípios básicos da agroecologia: o resgate
da alimentação orgânica, agricultura familiar e a busca por voltar a viver em contato
com o campo e se manter dele. Ajuda a ampliar a visão de todos quanto ao sentido da
vida, promover a reflexão sobre a alimentação, o ato de levar uma vida mais saudável
e como consequência reduzir o uso de medicamentos.
No período atual, onde os alimentos estão cada vez mais, repletos de agentes
nocivos a saúde, há uma necessidade de se pensar a alimentação, através de
alimentos e hábitos alimentares mais saudáveis. Existem diversas possibilidades, uma
delas é a Alimentação Viva, também conhecida como crudivorismo ou “raw food”
176
(comida crua), é um “estilo de vida” que surgiu na década de 90 nos Estados Unidos,
que é o consumo de alimentos crus, grãos germinados e frutos frescos e secos,
influenciando na ingestão de alimentos orgânicos.
Os alimentos crus são ricos em enzimas, estas são os ‘incansáveis
trabalhadores’ que levam os nutrientes às células. Essa forma de alimentação busca a
reconexão com a natureza, fonte primordial dos alimentos. Ao reduzir o consumo de
alimentos cozidos, processados, com pesticidas e conservantes, açucares e gorduras
diminuem-se o risco de doenças crônicas, como obesidade, diabetes, problemas
cardiovasculares, entre outros.
Pesquisas científicas demonstram que a “alimentação viva” possui alto
potencial terapêutico, mesmo quando os tratamentos médicos convencionais não são
tão eficazes. Esse tipo de alimentação, como terapia principal ou complementar, pode
reverter quadros clínicos graves de doenças crônicas. Isso se dá devido ao
restabelecimento da integridade do sistema biológico, ocorre uma reestruturação e
uma desintoxicação profunda no organismo.
Do território as microterritorializações
É perceptível o número pessoas que se encontram em tratamento ou recémrecuperados de algum tipo de câncer. A falta de cabelo e/ou lenços cobrindo a cabeça
se tornam perceptíveis, mais ainda quando é numerosa a aglomeração de pessoas
com este tipo de “vestimenta”. Como o tipo de roupa é um fator identitário do grupo
social ao qual se faz parte, também o é a falta ou mesmo a pouca quantidade de
cabelos.
Um dos primeiros passos a seguir após o diagnostico da existência de algum
tipo de câncer é a mudança na alimentação. Assim, o caminho até a Feira Ecológica
da Redenção se torna ponto de encontro de usuários que necessitam encontrar
alimentos cultivados de forma sustentável.
Na feira orgânica, sábado pela manhã, é possível perceber a movimentação
dessas pessoas, andando de uma banca a outra em um lócus de interação constante.
Este é um ambiente diferente do qual estamos acostumados nos centros urbanos, ali
os odores exalados pelos produtos e a conversa entre cliente/vendedor são o tom
maior. Diferentemente das grandes redes de mercado onde o cheiro de limpeza
sobrepõe-se ao dos alimentos e a conversa com o atendente se resume a: “CPF na
nota?” e “mais alguma coisa?”, encontramos na feira além do consumo uma troca de
saberes. Alves, (1992, p. 09) faz uma bela reflexão quando destaca que:
177
Hoje, cercados de poluição, barulho, concreto e todo tipo de produtos
químicos e artificiais, olhamos, com saudade, a vida de nossos
antepassados no campo e, com certa inveja, a dos atuais moradores
de pequenas cidades, deliciando-se com as possibilidades de ainda
poderem olhar o céu e vê-lo cheio de estrelas, sentir o cheiro da terra
e de seus frutos, ouvir o som dos riachos e bichos e usar alimentos
que ainda preservam odores e sabores naturais.
Nesse ambiente de cheiros e sabores diferenciados é que se define uma
microterritorialização de sujeitos em tratamento que permanecem na busca por
alimentos e produtos que mantenham os odores e sabores naturais.
Território e territorialidades se contornam de sentidos bem distintos. Enquanto
o território se atrela fortemente em um limite mais ou menos definido, quando falamos
de territorializações não pensamos em uma espacialidade definida, podendo ela ser
formada em distintas escalas seguindo ou não uma continuidade. Assim, podem-se
encontrar dentro de um único território múltiplas territorialidades, formando o que
Haesbaert (2005, p.6786) denomina de multiterritorialidades.
Multiterritorialidade inclui assim uma mudança não apenas
quantitativa – pela maior diversidade de territórios que se colocam ao
nosso dispor (ou pelo menos das classes mais privilegiadas) – mas
também qualitativa, na medida em que temos hoje a possibilidade de
combinar de uma forma inédita a intervenção e, de certa forma, a
vivência, concomitante, de uma enorme gama de diferentes
territórios.
Nesse sentido, as territorialidades se ligam de forma intrínseca a diversidade,
pois a vivência de grupos distintos se dá de forma concomitante. Há nesse momento
um movimento de pertencimento e constante integração que organiza os grupos
identificados com características culturais, sociais ou econômicas. Assim, tem-se a
produção de uma serie de práticas que concedem fatores identitários como grupo, o
que leva a criação de espaços de poder simbólico, de apropriação, de pertença, ainda
que não claramente de dominação, controle e demarcação. Nessa linha de raciocínio
resgata-se o entendimento de
Goulart; Antunes (2014, p. 49):
As territorialidades são espaços e relações constituídos por
identidades culturais e políticas, não necessariamente configurando
territórios. Ou seja, a territorialização corresponde à projeção sobre e
a partir do espaço das representações mentais de um indivíduo ou
grupo de indivíduos. Essas representações muitas vezes
materializam-se através das formas de uso que se faz do espaço,
como o econômico, o artístico, o religioso e outros. Outras vezes, há
somente uma apropriação afetiva do espaço, normalmente motivada
por sentimentos de identificação e pertencimento. Assim se
constituem as territorialidades, as quais podem não ser delimitadas,
demarcadas e controladas como os territórios. As territorialidades
podem se sobrepor, dando lugar a multiterritorialidades que ora se
178
mesclam, ora se separam, ora se fundem para depois separar-se
novamente.
Desse modo, dentro das territorializações existe a possibilidade de distintos
atores sociais permanecerem em determinado espaço de forma concomitante, ou
mesmo em horários distintos, podendo formar um ambiente de prostituição à noite e
de dia um lugar de lazer ou de comércio, por exemplo. Assim, em um mesmo espaço
físico, manifestam-se distintas territorialidades.
Nesse sentido, pode haver territorializações formadas em um curto período de
tempo, relativamente efêmeras, que acarretam a produção de áreas de convivência
permeáveis, podendo existir uma expansão ou retração desta área em conjunto com
territorializações formadas por outros grupos sociais. Esse fato permite que haja a
sobreposição ou divisão do espaço em períodos de tempo diferenciados. O próprio
sociólogo francês Michel Maffesoli (2002), destaca o processo que vem ocorrendo nas
cidades onde distintas tribos urbanas produzem microterritorializações fluidas e
efêmeras.
“O território é, antes de tudo, uma “convivialidade”, o lugar de encontro e de
reunião, com a reunião apropriando-se de parte do espaço, mesmo que seja pequena,
uma esquina: um quadrante de uma praça, um banco da praça” (COSTA, 2008, p.143144). Por tratar-se da territorialidade de uma pequena parcela territorial em Porto
Alegre-RS, concorda-se em utilizar o termo “micro” atrelado a ideia de territorialidade,
ideário este presente em estudos como de Costa (2008; 2010; 2013).
Entende-se que a microterritorialidade pode servir como uma forma de
contraracionalidade do pensamento globalizante, que se identifica com um espírito
individualista e de segregação. Quando maior pressão para segregar e homogeneizar
processos, existem em determinados lugares da vida urbana certos refúgios onde se
mantém agregações sociais singularizadas por suas práticas culturais (construindo
muitas microterritorializações) (COSTA, 2008, p.143).
Nesse sentido, fortalecemos a ideia das microterritorializações
urbanas, estabelecidas pelas relações cotidianas dos grupos culturais
dentro da cidade, ou seja, conjuntos de lugares de reunião ou
encontro e redes de trajetos firmados pela agregação de pessoas que
compartilham
gostos,
desejos,
necessidades
relacionais,
comportamentos e estéticas comuns. Cabe novamente ressaltar o
caráter fluido em mutante dessas microterritorializações e de suas
fronteiras de convivência.
As microterritorializações acabam se constituindo por fatores identitários dos
grupos sociais, por esse motivo entende-se que na Feira Ecológica da Redenção há
um processo visível de microterritorialização de pessoas que estão e/ou passaram
179
pelo grande desafio que é enfrentar uma doença como o câncer em todos os seus
âmbitos.
Tais afirmações sobre as microterritorializações vêm ao encontro do que foi
colocado por Costa (2008, p.145) quando o autor enfatiza que:
As identificações podem ser processadas por motivos bem simples,
como uma reunião de pessoas que passeiam com seus cachorrinhos
de estimação, ou podem demonstrar complexas convivências, como
grupos de “punks”, “gays”, prostituto(a)s, travestis, “hippies”, garotos
de rua, mendigos entre outros.
Por fim, entende-se que as microterritorializações podem emergir da presença
de um pequeno agregado de pessoas que se relacionam de forma diferente, como no
caso da Feria Ecológica da Redenção. Sendo que as cidades vão se formando, como
retalhos das vivências de distintos grupos socias, que possuem na urbe o espaço de
reconhecimento de si como sujeitos e como grupos sociais que se relacionam
(re)produzindo as cidades e criando culturas que diversificam o “organismo cidade”,
que uma vez doente produz cidadãos doentes, uma vez “feliz” produz mulheres e
homens felizes.
Sistematizando alguns pontos
Ao término desse trabalho alguns pontos podem ser sistematizados como
reflexões. O primeiro ponto a ser destacado diz respeito a problemática existente nas
cidades. A população mundial está aumentando, sendo que maior parte habita os
centros urbanos. Com os avanços técnicos e a globalização, está havendo uma
mudança no estilo de vida da população, inclusive no tocante aos hábitos alimentares,
com uma diminuição das doenças infectocontagiosas e o aumento alarmante das
doenças crônico-degenerativas.
O segundo ponto diz respeito a área de estudo, a Feira Ecológica da Redenção
a qual torna-se um ambiente ímpar, se comparado ao atual modelo capitalista. Nessa
área existem bancas agroecológicas, onde os alimentos comercializados são livres de
produtos químicos. A Feira torna-se uma alternativa para as pessoas com diagnóstico
de câncer e outras doenças, bem como para as pessoas que buscam uma
alimentação mais saudável para suas famílias.
O último ponto a ser destacado diz respeito a microterritorialização existente
com a presença de sujeitos em tratamento de câncer que frequentam a Feira na busca
por alimentos e produtos livres de substâncias químicas. Agindo como uma forma de
contraracionalidade do pensamento globalizante, o qual se identifica com um espírito
individualista e de segregação.
180
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Paulo.
182
OS EFEITOS DAS EXPANSÕES DAS MONOCULTURAS DE CAFÉ,
LARANJA E CANA-DE-AÇÚCAR NO MUNICÍPIO DE TABAPUÃ, SP –
BRASIL PARA OS AGRICULTORES FAMILIARES
Guilherme Valagna Pelisson - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
O presente estudo traz uma reflexão sobre as expansões de monoculturas
desenvolvidas no município de Tabapuã, localizado no estado de São Paulo – Brasil.
E os efeitos causados na área rural, uma vez que 92% da população de acordo com o
IBGE (2010) é urbana. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é compreender a
dinâmica da agricultura familiar frente as expansões da cafeicultura, citricultura e canade-açúcar. Para tanto realizou-se levantamento bibliográfico e documental, entrevistas
e registros fotográficos. Contudo percebeu-se que a agricultura familiar sempre esteve
presente no município, que os agricultores buscam alternativas para permanecerem
no campo. A cultura da agricultura patronal é presente devido a políticas de
desenvolvimento regional que fecundaram cultivos como o do café por meio da
expansão da ferrovia, a laranja com a criação de agroindústrias voltadas para extração
do suco e formação da Área Canavieira de Catanduva, por meio de instalações de
destilarias e usinas sucroalcooleiras, expandindo a cultura da cana-de-açúcar.
Palavras-chave: agricultura familiar; monoculturas; Tabapuã
Introdução
O presente estudo traz uma reflexão sobre as expansões de monoculturas
desenvolvidas no município de Tabapuã e os efeitos causados na área rural. E tem
como objetivo compreender a dinâmica da agricultura familiar frente as expansões da
cafeicultura, citricultura e cana-de-açúcar. Para tanto realizou-se levantamento
bibliográfico e documental, entrevistas e registros fotográficos.
Esses três cultivos foram selecionados por terem gerado para o município
prestígio, riqueza, mas, de forma contraditória, forçou a agricultura familiar a
desenvolver formas de resistência a fim de oportunizar aos agricultores meios de
recursos para manter suas atividades, garantindo sua permanência no campo.
Neste estudo, entende-se como agricultores familiares aqueles indivíduos que
constituem uma base familiar para manter a propriedade rural e que se enquadram na
Lei nº 11.326, de 24 de Julho de 2006, ou seja, possuem até quatro (4) módulos
fiscais, o que em Tabapuã corresponde a 64 hectares. Passa-se então a conhecer a
localização da área de estudo, para assim, entender a dinâmica da mesma.
Localização E Caracterização Da Área De Estudo
183
Tabapuã encontra-se localizada no Estado de São Paulo, na Microrregião
Geográfica de Catanduva, que por sua vez insere-se na Mesorregião Geográfica de
São José do Rio Preto, na porção do estado geralmente designada apenas como
Noroeste Paulista, como pode ser visualizado na figura 1. O município de Tabapuã faz
divisa com os municípios de Catiguá, Uchoa, Novais, Olímpia, Catanduva, Cajobi e
Embauba.
De acordo com o IBGE (Censo Demográfico, 2010), o município de Tabapuã
possui uma área de 345,581Km² e uma população de 11.366 habitantes, dos quais
10.522 (92%) vivem no perímetro urbano e 844 (8%) habitantes na área rural. E com
uma população estimada em 2014 de 12.027 (IBGE, 2015)26. Desta forma, em 2010
tinha-se 32,88 habitantes por Km², o que indica baixa densidade demográfica. Vê-se,
portanto, que se trata de um município de pequeno porte e com população reduzida.
Figura 1 - Localização do município de Tabapuã, SP
Fonte de dados: IBGE (2010)
Organização: DA SILVA, L. F. (2014)
Em Tabapuã com a variação (dos picos de crescimento e decréscimo) do
número de habitantes do município de acordo com os censos demográficos do IBGE
ao longo das décadas de 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 1996, 2000 e 2010
pode-se observar que na década de 1940 teve o maior número de habitantes, a
população era eminentemente rural e já na década de 1991 essa realidade se inverte,
onde a maior parte da população passa a ser urbana.
26
Fonte: Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, Diretoria de Pesquisas,
Coordenação de População e Indicadores Sociais.
184
Com esses dados fica evidente o êxodo rural se consolidando a partir da
década de 1950. Os maiores valores de crescimento populacional foram nas décadas
de 1940 e 1991 e os menores em 1976 e 2000.
Uma hipótese plausível para o êxodo rural é a industrialização, mecanização
de produtos agrícolas (devido ao pacote tecnológico eminente na época, que visava
uma ampliação da produção com a finalidade de aumentar a exportação do país).
Esses que migravam do campo, tinham como destino a cidade, dirigiram-se,
provavelmente, para a cidade do município, demais municípios de São Paulo ou de
outros estados, pois a área urbana não só não absorveu o contingente migratório,
como também perdeu volume de moradores fixos.
Atualmente, constata-se baixa concentração populacional no meio rural porque
o arredamento da cana-de-açúcar ocupa pouca mão-de-obra, assim como os tipos de
cultivos agrícolas mecanizados que se desenvolveram no município.
Ao longo do período 1999-2011 o PIB (Produto Interno Bruto) municipal
cresceu em todos os setores analisados: agropecuária, indústria e serviços. No que se
refere ao meio rural, mesmo com o número reduzido de trabalhadores no setor
primário, houve aumento de produção devido à alta tecnificação empregada no
processo produtivo de cultivos relacionados ao agronegócio, como a cana-de-açúcar,
por exemplo, porém todas as áreas cresceram (exceto agropecuário nos dois últimos
anos analisados) mas a que mais teve crescimento nessa análise foi a de serviços,
uma explicação para isso é que a sociedade está indo buscar mais serviços, como
turismo e alimentação fora do domicílio.
Migliorini (1950), o estudo da evolução histórica de determinado cultivo
proporcionará o conhecimento pleno da organização agrícola.
A Agricultura Familiar E A Expansão Das Monoculturas De Café, Laranja E CanaDe-Açúcar De 1940 A 2013 No Município De Tabapuã, Sp – Brasil
A difusão da monocultura pelo interior paulista deu-se no início com o café,
principalmente, com a iniciativa do governo de trazer imigrantes europeus para
trabalhar nesta lavoura. O que ocasionou em um aumento de mão de-obra e,
consequentemente, houve a expansão da produção de café pelo estado. Monbeig
(1998) descreve sobre a faixa pioneira do estado de São Paulo, na qual a região deste
estudo ainda se encontrava em processo de início de exploração e necessitava de
mão de obra para o plantio do café, pois para expandir suas lavouras era necessário
derrubar as florestas para arar a terra e plantar.
185
E com o desenvolvimento das ferrovias (EFA) adentrando o estado (do
município de Araraquara à estação de Presidente Vargas em Rubinéia). A ferrovia
contribuiu para levar os imigrantes europeus pelo território paulista, além do seu
objetivo principal que era agilizar o escoamento da produção de café. E uma dessas
estações era a do Japurá, localizada onde se encontra o atual município de Tabapuã,
já havendo nos arredores algumas famílias presentes no futuro município que foram
pioneiras na exploração das terras pertencente a atual configuração municipal.
No café, uma das dinâmicas encontradas nas propriedades entrevistadas do
município de Tabapuã propriedades, era por meio da meação, em que o chamado
“meeiro”, recebia permissão do dono das terras para cultivá-las em troca do
fornecimento de 50 % da produção colhida. O café era então vendido em sacas, após
o período de secagem dos grãos nos “terreirões”, era ensacado e vendido para as
beneficiadoras de café, o produto final era voltado à exportação.
O gráfico 1 exemplifica, o quão foi explorado esse cultivo em Tabapuã e a atual
conjuntura que se encontra.
Gráfico 1: Área plantada de café (em hectares)
12000
10000
9764
7803
8000
6000
5338
4363
4363
4000
2000
183
25
2006
2013
0
1960
1970
1980
1985
1995/96
-2000
Área Plantada de Café (em hectares)
Lineal (Área Plantada de Café (em hectares))
Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970,
1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013.
Org.: PELISSON, G. V. (2015)
Atualmente o café deixou de ser um cultivo expressivo devido a inserção no
meio rural de outras monoculturas e da modernização da agricultura, além de
questões climáticas e de mercado.
186
Segundo Graziano da Silva (2003) a modernização da agricultura “era a
necessidade de expansão da oferta agrícola para fazer frente ao crescimento industrial
(matéria-prima) e da urbanização (alimentos) ” (p. 95). Inocêncio e Calaça (2010)
ainda salientam que “a década de 1970, no Brasil, é caracterizada por forte
concentração urbana, consequência da migração campo-cidade, que se acentuou
devido ao desenvolvimento industrial” (p. 284).
“Na década de 70, com a expansão e consolidação da indústria de suco de
laranja concentrado e congelado, para atender basicamente ao mercado externo, a
agroindústria citrícola passou a ter papel de destaque na economia brasileira” (MAIA,
1996, p. 8).
Esse cultivo foi bem aceito no local deste estudo e, sobretudo, pelos
agricultores familiares, que tinham como mão de obra para arar a terra, o plantio,
adubação, os familiares residentes na propriedade ou não, porém na colheita da fruta
necessitam de contribuição.
Os autores Amaro, Vicente e Baptistella (2001) descrevem sobre esse fato e a
contratação de mão de obra extra.
Cabe destacar que a partir da safra agrícola 1995/96, ela
passou a ser quase totalmente de responsabilidade e
administração dos próprios citricultores, os quais devem
encarregar-se de contratar as turmas de colheita e transporte
das frutas. Anteriormente, durante a vigência do “contrato de
participação” (1985/86 a 1994/95), a colheita, geralmente, era
administrada pela indústria, que empregava pessoal
especializado e, posteriormente, descontava dos produtores os
custos incidentes e previamente fixados nos contratos de
compra e venda da fruta. (p. 19)
Esses apontamentos dos autores são confirmados pelos agricultores
entrevistados do município de Tabapuã, que relataram a contratação de boias-frias
para a colheita do fruto, pois havia a necessidade de mão de obra extra. Dessa forma,
eram contratados por um período determinado, principalmente em períodos de
colheita.
O gráfico 2 demonstra a exploração do cultivo de laranja no município, que tem
seu auge principalmente nas décadas de 1980 e 1990.
187
Gráfico 2: Área Plantada de Laranja (em hectares)
12000
9984
10000
7692
8000
5896
6000
4000
2503
1535
2000
41
431
0
1960
1970
1980
Área plantada de laranja (em hectares)
1985
1995/96
2006
2013
Lineal (Área plantada de laranja (em hectares))
Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970,
1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013.
Org.: PELISSON, G. V. (2015)
Adentrando a questão da cana-de-açúcar, nas últimas décadas do século XX,
esta cultura é que ganha proeminência e transforma o cenário rural do município,
devido a instalações de Usinas Sucroalcooleiras na área canavieira de Catanduva,
tendo atualmente como municípios fornecedores e usineiros: Catanduva, Catiguá,
Paraíso, Ibirá, Itajobi, Novo Horizonte, Pindorama, Palmares Paulista, Santa Adélia,
Ariranha, Tabapuã, Uchoa, Urupês, Irapuã, Cândido Rodrigues, Borborema, Fernando
Preste, Itápolis e Vista Alegre do Alto27.
“A área de Catanduva é considerada o sexto núcleo canavieiro do estado de
São Paulo a se consolidar, após as regiões de Piracicaba, Ribeirão Preto/Sertãozinho,
Araraquara, Jaú e Vale do Paranapanema” (BRAY, 2014, p.42). E é constituída por
quatro usinas de açúcar e álcool e quatro destiladas autônomas de álcool, como pode
ser verificado na tabela 3.
E esse crescimento foi devido à expansão da cana-de-açúcar em área antes
destinadas à cultura alimentar. E Bray (2014), deixa claro o porquê:
O reequipamento industrial das usinas e a relocalização para
áreas diversas, menos disputadas e de terras mais baratas,
provocou naturalmente, a concentração de renda, uma vez que
27
Localização da Área Canavieira de Catanduva: “localiza-se no Médio Planalto Ocidental
Paulista, no setor Centro-Norte do estado, denominado de Média Araraquarense. Esse
complexo agroindustrial canavieiro, açucareiro e alcooleiro de Catanduva, é constituído por 19
municípios usineiros e fornecedores” (BRAY, 2014, p. 42).
188
os empréstimos eram feitos a juros negativos e com período de
carência ponderáveis, fazendo expandir a cana-de-açúcar por
áreas anteriormente dedicadas às culturas alimentares. (p.55)
O gráfico 3 mostra a proporção da presença do cultivo de cana no município.
Gráfico 3: Área Plantada de Cana-de-Açúcar (em hectares)
25000
21800
19900
20000
15000
10000
5890
4678
5000
557
332
1960
1970
4100
0
1980
1985
1995/96
2006
2013
Área plantada de Cana-de-Açúcar ( em hectares)
Lineal (Área plantada de Cana-de-Açúcar ( em hectares))
Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970,
1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013.
Org.: PELISSON, G. V. (2015)
Dessa forma tem-se que a cana é o cultivo que mais cresceu, no período
analisado deste trabalho e o que consequentemente ocasionado no aumento do êxodo
rural.
Sobre os agricultores familiares, de acordo com o IBGE (Censo Agropecuário
de 2006) em Tabapuã há 276 unidades de estabelecimentos agropecuários de
agricultura familiar em 4.132 hectares e 124 unidades de estabelecimentos
agropecuários não-familiares que ocupam uma área de 23.531 hectares, ou seja, há
concentração de terras, onde se tem muitos hectares em mãos de poucos. E ao
mesmo tempo têm-se muitos agricultores familiares com poucas terras. Nesse sentido,
fica perceptível a forte presença no município da agricultura patronal e uma economia
rural voltada à produção de commodities.
O território da agricultura familiar para Santos (2011) “se distingue pelo seu
processo histórico de intensa organização política de homens e mulheres em torno de
189
uma agricultura de base familiar, fundamentada na produção da policultura e, muitas
vezes na produção integrada, na própria monocultura do pacote tecnológico” (p. 322).
E Santos (2011), complementa:
A concepção de território é compreendida no caso da
agricultura familiar como uma forma de resistência e
sobrevivência, para homens e mulheres que desde a década
de 1940 tem construído sobre este espaço relações de
empoderamento do espaço a partir da política, da economia, da
cultura e também de acordo com as condições naturais (p.
322).
“A agricultura familiar afigura-se como uma peça-chave, embora não exclusiva,
do desenvolvimento integrado e sustentável, a ser definido em escala local, tornandose como unidade territorial o município ou eventualmente consórcio de município”
(SACHS, 2001, p. 79).
Para Candiotto (2011) apesar de haver a existência dessa polaridade no
cenário rural entre agronegócio e agricultura familiar. O autor não vê duas realidades
como contrapostas, para o mesmo é possível à incorporação de técnicas e métodos
de cultivo e manejo agropecuário provenientes do agronegócio, por parte de diversas
unidades produtivas familiares, como por exemplo: “a integração dos agricultores
familiares com grandes agroindústrias, para a criação de aves, suínos, leite, fumo,
entre outros produtos”.
“Dessa forma não se pode negar que o agronegócio vem influenciando as
atividades e o modo de vida familiar e, que há uma tendência de ampliação desta
influência” (CANDIOTTO, 2011, p. 277).
Frederico (2014) completa, colocando que o agronegócio, como foi escalado
pelo Estado, como já o fizera anteriormente, “a tabula salvadora da política
macroeconômica externa brasileira, exigindo fortes alterações na organização e no
uso do território das áreas de agricultura moderna” (p.2134).
E ainda Frederico (2014) explica que,
Dentre as principais alterações territoriais destacam-se: a
aceleração no ritmo de expansão da fronteira agrícola em
substituição à vegetação nativa e a pequena produção de base
familiar; a intensificação da produção e o aprofundamento da
especialização regional produtiva; o aumento da concentração
fundiária; a estruturação de uma nova divisão territorial do
trabalho das grandes empresas e das atividades do
agronegócio e o planejamento e a construção de infraestrutura
praticamente monofuncionais com o intuito de viabilizar o
escoamento da produção (p.2134).
190
Com essas adulterações no campo, o agricultor tenda se inserir e participar da
dinâmica do “desenvolvimento agrícola” com financiamentos proporcionados pelo
PRONAF, que custeiam safras, as atividades agroindustriais, seja para investimento
em maquinário, equipamento ou mesmo em infraestrutura. E por microcrédito rural que
é voltado para a produção e geração de renda das famílias agricultoras de mais baixa
renda do meio rural (BRASIL, 2015).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O contexto atual do campo brasileiro é marcado pelo quadro de exclusão social
e exige uma readequação das políticas voltadas ao desenvolvimento rural. “É
fundamental criar políticas e programas orientados para um desenvolvimento
combinado com a distribuição de renda e de riqueza” (DAVID, 2008, p. 17). E “adotar
políticas agrícolas e sociais direcionadas ao fortalecimento da agricultura familiar,
associadas à efetiva reforma agrária, capaz de promover a desconcentração da
propriedade da terra, garantindo o trabalhador rural acesso à terra e ao trabalho”
(DAVID, 2008, pp. 16-17).
A partir da análise dessas três culturas, pode-se perceber os efeitos
provocados de forma diferenciada no suceder dos tempos na agricultura familiar.
Contudo percebeu-se que a agricultura familiar sempre esteve presente no município,
que os agricultores buscam alternativas para permanecerem no campo e cultura da
agricultura patronal é presente devido a políticas de desenvolvimento regional.
Percebe-se então que as forças exercidas pelas monoculturas no município
veem se expandindo em áreas anteriormente dedicadas às culturas alimentares,
especialmente a da cana-de-açúcar. O avanço sobre as terras da agricultura familiar,
devido sua forte valorização no mercado, instalação de usinas na região e formação
da Área Canavieira de Catanduva, causa um aumento no êxodo rural e força o
agricultor a buscar alternativas para resistir no campo. A produção de cana-de-açúcar
hoje se volta, sobretudo, em atender as metas diretamente ligadas ao açúcar
(mercado interno e externo) e ao álcool combustível (mercado interno).
O agricultor se encontra pressionado pelo grande capital e acaba arrendando
suas terras para as usinas, e se deslocando para a cidade. Os que persistem, e
submetem-se ao arrendamento, utilizam seus poucos hectares, ou o que resta
próximo as suas residências, para cultivar hortaliças ou frutas (como o limão, a manga
e a tangerina, por exemplo) para o consumo próprio ou mesmo para atender o
mercado local e/ou regional.
191
Dentre os entrevistados, a maioria que resiste no campo alegando que “vive do
sítio”, “trabalho”, “a única coisa que sabe fazer”, “nasceu na área rural”, “que foi o pai
que ensinou a lida”, “porque gosta do lugar onde nasceu” e até mesmo “para não
abandonar o sítio”, esses foram alguns dos argumentos levantados pelos que
continuam morando na área rural. Sendo assim, fica evidente a paixão dos
agricultores familiares pelo local e a afirmação de sua identidade, mesmo citando
problemas do cotidiano, necessidades referentes à infraestrutura (conservação de
pontes, estradas) pelo poder público.
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V. L. S. (Ed.) Agricultura, desenvolvimento e transformações socioespaciais: reflexões
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193
OS MOVIMENTOS SOCIAIS E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UM OLHAR
PARA O ASSENTAMENTO CONQUISTA DA FRONTEIRA
Antônio Valmor de Campos – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
Este texto apresenta relatos de uma atividade de pesquisa iniciada no Assentamento
Conquista da Fronteira, em Dionísio Cerqueira/SC, na Mesorregião da Fronteira Sul – Brasil.
A pesquisa é realizada por professores e estudantes da Universidade Federal da Fronteira
Sul – Campus Chapecó. Este relato diz respeito a visita realizada no mês de dezembro de
2014. Visualiza-se no assentamento, uma organização ancorada na metodologia do MST,
que já no acampamento acompanhou dando suporte e estrutura. Com a conquista da terra
iniciou a organização para a produção de alimentos e ocupação do território, de forma
sustentável. Houve a opção pela produção coletiva, cooperada e solidária, modelo que as
famílias assentadas aderem ao projeto coletivo. A aplicação da proposta tem se mostrado
exitosa, atualmente a produção de alimentos é sem utilização de agroquímicos e não
produção de commodities. Há também a preocupação com o desenvolvimento sustentável,
com a preservação ambiental e recuperação de áreas degradadas. Verifica-se uma
integração das ações no Assentamento, com as diretrizes dos movimentos sociais da Via
Campesina, especialmente do MST, o qual mantém permanente reflexão sobre o processo
produtivo e organizacional do local. Esta posta a disposição dos assentados na produção
orgânica, agroecológica e o desenvolvimento sustentável.
Palavras-chave: Movimentos Sociais. Assentamento. Desenvolvimento Sustentável.
Camponeses.
INTRODUÇÃO
Diversas são as preocupações da humanidade atualmente, mas uma não
perpassa a qualquer pessoa, a disponibilidade de alimentos. Nada é mais importante a
um país do que garantir que seu povo tenha comida na quantidade e qualidade
necessárias para o bem estar da população.
A produção de alimentos depende hoje de inúmeros elementos, entre eles a
disponibilidade de sementes, pois sem elas não há produção. A política dos governos
em favor das patentes da vida, com garantia aos transgênicos ameaça o equilíbrio não
apenas da produção de alimentos, mas da própria qualidade do solo, que está sendo
contaminado.
Também
a
agricultura
tecnologizada,
principalmente
com
sementes
transgênicas representa uma preocupação constante a respeito dos seus impactos
ambientais, sobre as sementes nativas e sobre a manutenção dos ciclos vitais.
Ao mesmo tempo em que a tecnologia na agricultura provoca incertezas na
soberania alimentar e no equilíbrio ambiental, organizam-se movimentos que se
contrapõem ao problema. Diversos movimentos sociais, mas especialmente os da Via
194
Campesina28, os quais se organizam para o constante debate acerca da produção de
alimentos.
Um exemplo importante para contribuir com este debate é a experiência do
Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC. Esses
assentados da Reforma Agrária têm a intenção de produzir alimentos de qualidade, de
forma coletiva e solidária e estão preocupados com o equilíbrio ambiental.
Entre as discussões emerge um dos elementos fundamentais na produção
alternativa: o conhecimento. No entanto, para eles, não basta qualquer conhecimento
é preciso que o mesmo seja integrado às intenções do grupo, atendendo às demandas
de produção agroecológica e orgânica e do desenvolvimento sustentável.
O presente ensaio apresenta relatos de uma atividade de pesquisa iniciada no
Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC,
localizado na Mesorregião da Fronteira Sul – Brasil. O projeto de pesquisa é
coordenado por este autor, e realizada por professores e estudantes da Universidade
Federal da Fronteira Sul – Campus Chapecó. A atividade inicial foi com uma visita ao
local por um grupo de estudantes e professores da UFFS. Portanto o apresentado
neste trabalho refere-se especificamente a visita realizada ao Assentamento no mês
de dezembro de 2014, sendo que as atividades de pesquisa estão em andamento e
pretende analisar mais profundamente as questões do acesso à terra, a produção de
alimento de qualidade e o desenvolvimento sustentável.
Está posta também a pretensão de estabelecer o debate entre os elementos
que fazem parte da relação da produção de conhecimento, da resistência dos
movimentos sociais e da intervenção destes na produção de alimentos, na melhoria e
distribuição de sementes, sem descuidar de lançar olhares sobre os aspectos do
melhoramento genético, do patenteamento de seres vivos e da sua dominação pelo
agronegócio. Tenho convicção que por mais discussões que se façam, ainda vai ser
insuficiente para dimensionar corretamente a importância do tema, mas apresento
como uma provocação além das existentes.
2 OBJEITVOS
2.1 Objetivo Geral
Analisar as contribuições da organização da luta pela terra do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST e dos assentados, na produção de alimentos
28
Os movimentos sociais da Via Campesina no Brasil são: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra – MST; Movimento das Mulheres Camponesas – MMC; Movimento dos Atingidos por Barragens –
MAB; Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA (este último com divergências).
195
saudáveis e no desenvolvimento sustentável, no Assentamento Conquista da
Fronteira/SC.
2.2 Objetivos Específicos
-
Identificar
os elementos orientadores da organização do
Movimento
Trabalhadores sem Terra – MST, para garantia do acesso à terra;
-
Avaliar as potencialidades e limitações do movimento pela terra no Brasil, no
acesso à terra e na permanência dos assentados;
-
Analisar as condições de produção de alimentos saudáveis nos territórios
reocupados pelos acampados e assentados;
-
Identificar as “políticas” dos movimentos sociais, para a agricultura alternativa,
presentes no Assentamento Conquista da Fronteira.
3 METODOLOGIA
Inicialmente a identifição do espaço territorial, definindo os procedimentos
envolvidos, seguido da revisão bibliográfica e a busca por fontes confiáveis de
informações acerca da organização dos trabalhadores rurais sem terra, na luta pelo
acesso a terra e permanência na mesma, com a produção de alimentos orgânicos e
agroecológicos.
Deslocamento até o Assentamento Conquista da Fronteira, buscando
contextualizar as características regionais, como a falta de democracia e da violação
dos direitos humanos na região, tendo em vista que a mesma é fronteiriça e esteve
submetida ao regime de exceção (ditadura civil-militar, 1964/80), por mais tempo do
que as demais regiões do país.
Na sede do assentamento, uma equipe de assentados apresentará o histórico
de luta e dificuldades pela conquista da terra na região da fronteira, a estrutura
organizacional dos assentados, as conquistas e o aspecto da valorização educacional
no processo (Educação Infantil e Ensino Fundamental).
Posteriormente elaboração do relatório, com detalhamento das atividades
desenvolvidas, pontuando os principais elementos identificados na atividade. Também
a realização de pesquisa bibliográfica e documental de obras relacionadas e afins,
buscando elementos que permitam a afirmação da concepção presente nos
envolvidos e no processo de organização para a luta pela terra, a organização interna
do ponto de vista social e de trabalho. Os procedimentos metodológicos empregados
196
perpassam por mais de uma alternativa metodológica, tendo em vista a complexidade
do tema.
O presente texto relata uma visita realizada no dia 06 de dezembro de 2014,
com a participação de professores e estudantes da Universidade Federal da Fronteira
Sul. Esta atividade faz parte do início dos trabalhos de pesquisa iniciada, de acordo
com projeto de pesquisa em institucionalização na Universidade Federal da Fronteira
Sul – UFFS – Campus Chapecó.
4 DESENVOLVIMENTO
Em seguida serão apresentados resultados da atividade in loco, com
aprofundamento da pesquisa documental e bibliográfica, buscando situar o leitor
acerca da realidade do Assentamento Conquista da Fronteira, quanto ao acesso à
terra
e
o
sistema
produtivo
agroecológico,
observando
a
concepção
do
desenvolvimento sustentável.
4.1 O contexto histórico da Mesorregião da Fronteira Sul
O momento agrícola no Brasil é de profundas contradições entre o
desenvolvimento econômico, com objetivos estritamente econômicos e o sustentável.
De um lado, os adeptos do primeiro modelo não apresentam preocupação com as
condições ambientais, bem como dos efeitos da produção sobre a natureza, ou seja,
enfrentamos um processo de grande destruição dos recursos naturais. De outro lado,
os que pretendem produzir de forma relativamente harmônica com a natureza. Para
estes, o importante está na qualidade dos alimentos produzidos e no respeito com a
natureza. Este processo resulta na chamada produção agroecológica e no
desenvolvimento sustentável.
A presente realidade é visível na Mesorregião da Fronteira da Fronteira Sul. No
local há um avanço esmagador sobre as pequenas propriedades impondo sobre elas
um processo de expropriação dos conhecimentos tradicionais os quais são
indispensáveis a produção agrícola para o auto-sustenho. Com esta postura, os
grandes produtores provocam diversos efeitos colaterais, como o êxodo rural e a
contaminação ambiental, da água, do solo e das sementes.
Corrobora com esta visão, os registros de instituições identificadas no combate
a este procedimento dominador, alienante e excludente:
Os grandes problemas da Mesorregião, na atualidade, podem ser
resumidos nos seguintes itens: crescente perda de dinamismo da
economia regional, frente ao contexto de globalização e
197
competitividade; dificuldade de inserção da pequena propriedade
rural no mercado e as precárias condições de moradia de parcela
significativa da população, com deficiências de saneamento básico,
acesso à saúde e educação. Como consequência dos fatores
elencados, advém a baixa capacidade de absorção de mão de obra e
retenção da população, gerando êxodo rural e emigração regional.
(Projeto CRDH/UFFS, p. 5) (grifei)
Pela observação dos modelos de produção agrícola, em ascensão no mundo,
percebe-se que quase na sua totalidade não há preocupação com os efeitos da
produção, bem como, com os destinos dos alimentos produzidos e sua qualidade. O
que realmente importa é a quantidade e o lucro obtido com a comercialização. A falta
de consideração com os recursos naturais e a utilização de meios de produção
baseados nas sementes transgênicas e nos agroquímicos, tem levado ao
esgotamento do solo e da diversidade biológica, sem sinalizar para a redução da fome
no mundo, como era/é prometido.
Então, é preciso construir alternativas, capazes de configurar possibilidades de
superação do modelo hegemônico e, ao mesmo tempo garantir a alimentação da
população, com alimentos menos agressivos à saúde e produzidos com o mínimo de
agressão ao equilíbrio ambiental. Uma alternativa é o desenvolvimento de pesquisas
que tratem de elementos estruturantes dessa nova condição, da produção de
alimentos saudáveis, isso se reveste de grande importância, pois desencadeia a
construção de possibilidades.
Também é possível visualizar as inúmeras ações realizadas no sentido de
dificultar o aprofundamento da crise na agricultura mecanizada e de alta tecnologia,
propondo alternativas plenamente viáveis e exequíveis, como é o caso da experiência
do Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC.
Estas contribuições no campo prático, também têm ressonância sobre os
conceitos envolvidos. Há uma dimensão acadêmica galgando os difíceis degraus da
academia, nesse sentido, contando com os ensinamentos e a extraordinária visão de
um entusiasta da causa, que realça de forma muito simples, no entanto contundente a
relação indispensável da visão técnica, acadêmica e científica com o conhecimento
sob o domínio dos povos que desafiam a hegemonia para ver mantida a sua tradição,
como respalda a lição: “Já discuti em diversos textos e quanto há necessidade de nós
professoras e professores de disciplinas científicas fazermos a migração do
esoterismo para o exoterismo” (CHASSOT, 2001, p. 38).
Atualmente é possível visualizar estudantes e professores que exteriorizaram
suas experiências, compartilhando com a comunidade, através de feiras, dia de
campo, júris, palestras e exposição de trabalhos sobre as experiências alternativas e
198
criativas. É possível destacar alguns movimentos sociais comprometidos com estas
ações, como o MPA – Movimento de Pequenos Agricultores, MMC – o Movimento das
Mulheres Camponesas e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST.
Estes e outros movimentos apresentam uma riqueza de conhecimentos
tradicionais relacionados com discussões acerca dos organismos transgênicos, da
produção agroecológica, dos medicamentos fitoterápicos e da Educação Ambiental,
com debates sempre mais visíveis e coerentes no sentido de construir alternativas,
com vistas ao desenvolvimento sustentável. É reconhecido o quanto é forte o debate,
bem como violenta é a relação entre a agricultura camponesa e o agronegócio na
Mesorregião da Fronteira Sul.
Destaca-se as palavras de Moreira (2013, p. 50), ao tratar do campesinato na
região: “Se de um lado a terra transformou-se em um grande negócio para
latifundiários, de outro, para os camponeses, a terra é considerada uma parte
extensiva ao prolongamento da vida.” No mesmo sentido, ao tratar da definição do
camponês o autor afirma:
A realidade do camponês no Brasil foi se construindo de acordo com
algumas definições conceituais. Entendemos que ele não é um
produtor ou simples trabalhador rural que responde a estímulos,
mecanicamente pensados pela engenharia moderna urbanizada; ele
é um ser que possui muita sabedoria, repassada de geração a
geração, que percebe e se sensibiliza com seu entorno natural e
social. […] No seu cotidiano desenvolve ações, com criatividade e
espontaneidade, que lhes permitem pensar, refletir e repensar, enfim,
filosofar sobre o espaço construído e reconstruído (MOREIRA, 2013,
p. 50).
Essa definição é o relato cristalino dos assentados em Dionísio Cerqueira, que
reconstroem os seus espaços e recriam organização e forma de vida.
4.2 Os desafios no Assentamento Conquista da Fronteira
Uma breve análise é suficiente para identificar que os assentados - no
Assentamento Conquista da Fronteira - têm uma trajetória de quase três décadas de
luta pela terra e de organização e de reorganização da produção, sempre
preocupados com qualidade dos alimentos produzidos e com a preservação dos
recursos naturais da área. Conhecer, analisar e refletir sobre essas concepções têm
influenciado as comunidades regionais e também na formulação de políticas que
potencializem as experiências inovadoras.
Os conflitos agrários no Brasil têm sido tema de grande repercussão social e
política. Talvez o movimento com maior impacto ideológico. Os posicionamentos
199
contrários estão pautados ainda em visões autoritária e aristocrática. De outra banda,
os membros do movimento apontam que, para uma efetiva democracia é
indispensável a garantia da atuação dos movimentos sociais, pois, sem participação
não há democracia e a democracia somente se sustenta com participação, assim
afirma Sauer, (2010, p. 115): “[...] os movimentos sociais agrários em particular, são
indispensáveis à consolidação da democracia no Brasil. [...] a Constituição brasileira é
fonte de legitimidade e de legalidade desses movimentos.”
A era pós-ditadura – no Brasil – acena para um período de efetivação de
direitos fortemente negados e combatidos no período ditatorial, de ordem civil,
políticos, sociais, culturais e ambientais, todos devidamente contemplados e
respaldados pela Constituição brasileira. Também há preocupação com o acesso à
terra e alimentação de qualidade. Para Sauer (2010, p. 117): “A democracia se dá
somente através de uma efetiva igualdade socioeconômica e do acesso efetivo às
fontes de informação e aos bens culturais.”
Os temas do acesso à terra e da garantia de produção de alimento saudável,
representam uma preocupação emergente das instituições, como as que tratam dos
direitos humanos e da qualidade de vida. Nesse sentido, é visível o comprometimento
dos assentados. No território estudado há indícios de uma profunda ligação com a
Geografia Agrária e Humana, portanto, permitindo uma reflexão profunda da interação
dos assentados com os aspectos relacionados aos territórios que ocupam. O momento
favorável aos assentados e sua credibilidade é demonstrada nas falas dos mesmos,
como se observa:
A cada final de mês o assentamento Conquista na Fronteira, em
Dionísio Cerqueira (SC), recebe caravanas de diferentes partes do
Brasil e do mundo. “Sempre tenho visitas aqui na minha horta”,
brinca a assentada Maria Gonçalves, que coordena a produção de
hortaliças. Os visitantes são estudantes, pesquisadores, integrantes
de governos, militantes sociais e demais interessados em conhecer a
exitosa experiência do assentamento localizado no oeste de Santa
Catarina, na fronteira com a Argentina, que faz da Cooperunião uma
referência
internacional
(DOCUMENTÁRIO,
26
anos
do
Assentamento Conquista da Fronteira, 2015).
Da mesma forma, o foco na produção de alimentos e na construção de
alternativas é evidente nas manifestações dos assentados: “Começamos a discutir
primeiro a produção do que comer. Depois veio a questão da comercialização e da
industrialização da nossa produção”, conta o assentado Neudi Guindani. “Mas já
saímos
do
acampamento
decididos
a
trabalhar
coletivamente”,
reforça
(DOCUMENTÁRIO, 26 anos do Assentamento, 2015).
200
A proposta é de alto significado, tendo em vista a importante organização dos
assentados, a qual vem demonstrando a conquista, a ampliação e a garantia de
direitos humanos elementares. A proposta perseguida pelos assentados estava
pautada, inicialmente na conquista da terra e por consequência o direito de nela
estabelecer residência e prover o sustento próprio e da família. Com o assentamento
veio a possibilidade do trabalho cooperativo, privilegiando o crescimento individual e
coletivo das pessoas que ali chegam e transforma aquelas terras em seu local para
viver.
No Brasil é reconhecida a permanente luta dos movimentos sociais,
especialmente os da Via Campesina no sentido de inserir a discussão do
conhecimento
tradicional
com
os
componentes
curriculares
tradicionais
institucionalizados, sem privilegiar um ou outro. Neste sentido leciona Chassot (2001,
p. 50): “Assim, hoje, talvez uma das maiores contribuições que aqueles e aquelas que
fazem a Educação através do ensino das Ciências podem fazer é emprestar uma
contribuição para uma adequada seleção do que ensinar.”
Para os militantes dos movimentos sociais a Educação também não pode
perder de vista a superação do excesso de individualismo com a construção de um ser
mais humano, com preocupações solidárias e coletivas, tendo por horizonte mais
fraternidade e dignidade.
4.2.1 A luta pelo controle das sementes
O desafio desses agricultores e dos movimentos sociais é impedir que as
sementes sejam transformadas em mera mercadoria, através de patentes, pelas
transnacionais da biotecnologia, sendo utilizadas como mero processo produtivo, o
que já ocorre em muitas outras situações semelhantes: “A biotecnologia, como serva
do capitalismo na era pós-industrial, torna possível a colonização e controle daquilo
que é autônomo, livre e auto-regenerativo” (Shiva, 2001, p. 69).
As dimensões que merecem análise dizem respeito as atividades de resgate,
cultivo, classificação e melhoramento das sementes de milho crioulo realizadas por
agricultores camponeses, verdadeiros pesquisadores. No entanto, isso não é
suficiente, pois é preciso discutir como preservar o direito desses agricultores
manterem o controle sobre as sementes, agregando a elas melhorias, como diz Shiva
(2001, p. 70): “O reconhecimento das diversas tradições de criatividade é um
componente essencial para manter vivos diferentes sistemas de conhecimentos.” No
entanto, não basta o reconhecimento individual, pois é preciso respeitar sua história e
compromisso, nas palavras de Shiva (2001, p. 70): “A negação de direitos de
201
criatividade preexistentes é essencial para a posse da vida”. Ainda, segundo Shiva
(2001, p. 89): “A semente biotecnológica que é tratada como criação a ser protegida
pelas patentes não poderia existir sem a semente dos lavradores.”
É interessante registrar o quanto esse grupo está empenhado em garantir o
predomínio de sua cultura, de sua preocupação com o desenvolvimento sustentável.
Isso é visível no Assentamento, que preserva com mata nativa em torno de 50% da
área. Não são agroquímicos no cultivo de alimentos e não há produção de
commodities.
De outra banda, impressiona a forma predadora como as empresas da
tecnologia procuram se apropriar dos conhecimentos produzidos pela humanidade. Os
movimentos de resistência, representados pelas organizações populares, têm mantido
permanentes enfrentamentos com as multinacionais e entre os próprios agricultores
que utilizam a tecnologia das transnacionais da biotecnologia que se apropriaram sem
nenhum pudor do acúmulo de conhecimento e experiências da humanidade, afirma
com muita propriedade Shiva (2001, p. 93): “Conhecimentos e recursos são, portanto,
sistematicamente usurpados dos guardiões e doadores originais, tornando-se o
monopólio das multinacionais.”
A manutenção de direitos depende da troca de experiências e debates de
estratégias de continuidade da resistência, na tentativa de garantir a apropriação
coletiva dos conhecimentos por eles cultivados, corrobora nesse sentido Shiva (2001,
p. 93/94): “A valorização do conhecimento local, a negação dos direitos locais e,
simultaneamente, a criação dos direitos monopolistas de uso da diversidade biológica
pela alegação da novidade, estão no centro da privatização do conhecimento e da
biodiversidade.”
Esse comprometimento dos assentados está respaldado pelos movimentos
sociais, através da luta diária, mesmo desigual pela manutenção daquilo que é mais
sagrado para o camponês: as sementes em suas mãos para produzir alimentos.
Produzir sementes é a forma de garantir a produção de alimentos, não há soberania
de qualquer nação sem a garantia de produzir, armazenar e replantar suas próprias
sementes.
4.2.2 A produção de alimentos saudáveis e o desenvolvimento sustentável
É impossível imaginar uma produção neutra, desinteressada, pois quem produz
tem seu olhar voltado para o destino que vai dar a ela. Portanto, produzir alimentos
saudáveis, significa também uma opção por um modelo de desenvolvimento
sustentável, com o menor impacto ao ambiente.
202
A opção por um modelo que coloque em xeque a mecanização é vista com
desdém, tanto no cenário acadêmico quanto por uma parte dos próprios agricultores.
No entanto, fazer essa reflexão é uma forma de alargar a discussão acerca da
produção e da socialização dos conhecimentos empregados na produção, para que as
pessoas, cada vez mais possam se apoderar dele para se tornarem cidadãos e
cidadãs em plenitude. Nesse sentido, importante observar a seguinte consideração:
[...] tem se desenvolvido uma abordagem em que se consideram os
agricultores familiares tomando decisões num contexto complexo e
conflituoso, no qual as decisões e escolhas são orientadas ao mesmo
tempo pela racionalidade econômica e pelo progresso técnico e
contra estes, impulsionados pelas necessidades de reprodução social
da família, pelo desejo de liberdade, de autonomia, pelo exercício de
suas crenças e pela prática de seus valores (ALMEIDA in FERREIRA
e BRANDENBURG, 2006, p. 37).
Por sua vez, os agricultores que optam por uma prática camponesa, estão
convictos da importância de sua opção, fazendo de sua prática uma ação pela
sustentabilidade, com a consciência dos conflitos que a mesma carrega como diz
Almeida in Ferreira e Brandenburg (2006, p. 44): “As escolhas e decisões, em
particular o uso de agrotóxicos e a agricultura orgânica, revelam lógicas caracterizadas
pela coexistência de orientações diversas constituídas em processos de mudança que
articulam sujeito e conteúdo.”
As dificuldades de adesão ao projeto de produção sustentável são grandes. Os
motivos vão desde a própria desmotivação dos agricultores, por falta de incentivos e
apoio até a ação das empresas multinacionais, que intervieram no processo cultural e
impuseram seus híbridos e os venenos, como receita obrigatória aos agricultores. Esta
situação determinou/determina a perda de um grande número de variedades e faz de
outras sementes “sementes que não são sementes”. Isso tem consequências sociais e
culturais: “A biologia reducionista também é a expressão do reducionismo cultural, na
medida em que desvaloriza muitas formas de conhecimentos e sistemas éticos”
(SHIVA, 2001, p. 48).
Outro elemento a ser considerado está relacionado diretamente com a
propriedade, o seu tamanho e a prática agrícola adotada na mesma, pois dependendo
dessas condições será a característica da agricultura nela desenvolvida. Porém, há
um consenso, a sustentabilidade e a produção agroecológica e de qualidade somente
é possível na pequena propriedade. Portanto, é indispensável o desenvolvimento da
reforma agrária, para que se torne possível esta proposta em larga escala.
Tratando-se de propostas que envolvem a Reforma Agrária, também é
indispensável analisar os aspectos que envolvem a questão o tamanho da propriedade
203
rural, no sentido de garantir o desenvolvimento, mas o especialmente no
desenvolvimento sustentável:
Neste contexto, a equidade é um importante aspecto a ser
considerado, principalmente no que se refere aos recursos naturais, e,
no caso a concentração fundiária, fere este princípio. Na medida em
que há concentração de terra, se observam maiores impactos em
relação a sua exploração (DAVID e WIZNIEWSKY, 2015, p. 85).
No aspecto da qualidade da produção ela não pode ser
dependente dos
agroquímicos, pois, neste caso estaria se negando a possibilidade do equilíbrio
ambiental e do desenvolvimento sustentável. Uma perspectiva que se apresenta como
alternativa é o da agroecologia, pois ela se apresenta como uma possibilidade real,
tendo em vista que: “A agroecologia é uma ciência, e esta assume uma importante
responsabilidade no resgate dos saberes reproduzidos socialmente, como também na
assimilação dos conhecimentos científicos das mais diferentes disciplinas, conforme
afirma Wizniewsky (2004, p. 181)”.
Na perspectiva que se apresenta, a reforma agrária mostra-se indispensável,
pois o tamanho da propriedade apresenta-se como limitador do desenvolvimento
sustentável como afirmam David e Wizniewsky (2015, p. 167): “Diante deste contexto,
acreditasse que a produção familiar na agricultura representa o espaço que possui as
condições adequadas para realizar a transição para um processo de desenvolvimento
rural sustentável.” No mesmo sentido (p. 167): “Algumas experiências têm
demonstrado que a viabilização econômica e social da produção familiar deve basearse em propostas que aliam a produção agrícola com a conservação dos recursos
naturais.”
Pelas convicções preliminares, no Assentamento, visualiza-se um conjunto
social comprometido com as concepções e conquistas coletivas, acreditando na sua
organização e transmitindo essas proposições para toda a sociedade. É possível
sugerir que a experiência do Assentamento Conquista da Fronteira representa uma
alternativa de organização, de produção e de convivência social, capaz de assegurar o
acesso aos direitos humanos como a terra e à produção de alimentos saudáveis para
todos. É notória a motivação dos assentados para a produção agroecológica e
orgânica. No entanto, há também são compreendidas as dificuldades presentes no
contexto apresentado, do enfrentamento com o agronegócio e as próprias dificuldades
internas ao grupo.
204
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Está posto um conjunto de elementos preocupantes sob o ponto de vista da
sustentabilidade e da produção de alimentos de qualidade na Mesorregião da
Fronteira Sul. No entanto, no Assentamento Conquista da Fronteira está sendo
construída mais uma referência da resistência à mecanização e à artificialização da
agricultura.
Por exemplo, durante milênios, foi a produção a partir das sementes crioulas
que garantiu a base alimentar para a sobrevivência da humanidade. A trajetória
soberana dos crioulos acontece até o início do século XX, quando o capitalismo
descobriu uma nova forma de colonização e exploração: a transformação da
biodiversidade em mercadoria.
A experiência dos assentados da reforma agrária, no Assentamento Conquista
da Fronteira procura evitar uma dimensão mercantilista sobre a disponibilidade das
sementes, buscando sua garantia de forma solidária, com a troca entre as famílias,
das sementes que eles próprios produzem. Também discutem o seu direito, na
condição dos povos autóctones, ou seja, garantir as sementes em seu poder, isso é
respaldado pelos movimentos sociais.
A tentativa de garantir a produção de sementes crioulas não é pacífica, da
mesma forma é incomoda para o capital a posse por parte dos pequenos agricultores,
pesquisadores dos conhecimentos necessários ao melhoramento genético das
sementes de crioulas. Está posto um confronto desigual, os agricultores são poucos e
frágeis se comparados ao poderio das transnacionais, mas estão dispostos a utilizar
todos os meios para garantir a sua sobrevivência, biológica, cultural, social e
econômica.
Percebe-se, nesta tarefa a ação dos movimentos sociais com impulso
fundamental, pois além de fortalecer a luta coletiva promove a motivação individual
com vistas a organização da resistência e superação das dificuldades. Renova-se a
cada dia fé e a esperança de manter viva a produção de sementes, a produção de
alimentos de forma independente e autônoma, trilhando os caminhos da soberania
alimentar da nação brasileira. Esta experiência se somará a outras tantas pelo mundo,
pois o modo de cultivar a terra sustentável é resultado de um longo e tortuoso caminho
histórico experimentado e vivenciado por milhões de camponeses.
Essa é uma demonstração de que homens e mulheres que se desafiam a
proteger, com todas as suas forças o conhecimento da produção de alimentos, de
forma socializada e solidária, contínua, na ampliação da experiência de milhares de
anos de luta incessante pela disponibilidade e acesso à alimentação de qualidade, da
205
atual e das futuras gerações, identificando-se com o campesinato e o desenvolvimento
socioambiental sustentável.
A academia deve demonstrar o seu comprometimento com a causa do acesso
à terra, com a produção de alimentos agroecológicos e orgânicos e com a
sustentabilidade, firmando parcerias com os camponeses e os movimentos sociais,
alinhando e validando as pesquisas – por eles desenvolvidas – para que possam ser
reconhecidas e valorizadas.
REFERÊNCIAS
CHASSOT Attico. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. 2
ed. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2001.
DAVID, Cezar de e WIZNIEWSKY Carmen Rejane Flores (Orgs.). Agricultura &
transformações sociopolíticas: olhares geográficos e pesquisa de campo. Porto
Alegre: EvangrafJadeditora, 2015.
DOCUMENTÁRIO. Disponível em: http://www.mst.org.br/2015/01/15/cooperacaoagricola-o-simbolo-do-assentamento-conquista-na-fronteira.html;
acesso
em
11/04/2015.
FERREIRA, Angela Duarte Damasco e BRANDENBURG, Alfio (orgs.). Para pensar
outra agricultura. Curitiba: Editora da UFPR, 1998.
PROJETO do Centro de Referência em Direitos Humanos – Universidade Federal da
Fronteira Sul/UFFS, parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da presidência da
República.
SAUER, Sérgio. Terra e modernidade: a reinvenção do campo brasileiro. São Paulo:
Expressão Popular, 2010.
SHIVA, Vandana. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução:
Laura Cardellini de Oliveira. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
MOREIRA, Antônio Carlos. Conquista da Fronteira: desenvolvimento territorial com
sustentabilidades. Frederico Westphalen: Ed. da URI, 2013.
DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE: Crise agroambiental e desenvolvimento
rural sustentável de saberes e percepção ambiental. Curitiba, PR; Ed. da UFPR, n. 14,
2006.
206
IDENTIDADE MISSIONEIRA: ELEMENTOS DIFUSORES
Luiz Felipe Sausen de Freitas – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Iolanda Lopes de Oliveira – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Vera Maria FavilaMiorin – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O presente trabalho visa analisar o papel de alguns elementos que agem localmente
como difusores da identidade missioneira no noroeste do Rio Grande do Sul. O apego
natural ao lugar e o sentimento de pertencimento que se verificam na região, são
também impulsionados por alguns elementos, que induzem a população local a sentir
parte de um lugar que possui uma história riquíssima e que constantemente é
evidenciada. A história age como o elemento central, porém a mesma é ressaltada por
elementos secundários, tais como a música, o turismo e os símbolos que estão
impregnados na paisagem, os quais ao agirem em conjunto, levam a população a
sentir um apego muito grande com relação ao lugar.
Palavras-Chave: Identidade Missioneira, Elementos Difusores, Apego ao Lugar.
Introdução
Muito tem se falado em Identidade Missioneira no Rio Grande do Sul. Pommer
(2008) é de certo modo quem introduz o debate, trazendo a tona informações sobre a
formação de determinada identidade, surgida forçosamente nas áreas onde no
passado se instalaram e prosperam as Reduções Jesuítico-Guaranis. A autora explica
que a região missioneira, situada no noroeste do Rio Grande do Sul, teve nas décadas
de 70 e 80 uma ressignificação de seu passado colonial, criando novo sentido ao
imaginário social missioneiro. O movimento que se iniciou no município de São Luiz
Gonzaga, visava explorar a riqueza histórica do local e ter um subterfúgio para
períodos de crise agrícola, como o que se verificava localmente quando do estopim do
movimento. O chamado “missioneirismo” nas palavras da autora acabou ganhando
força nos municípios vizinhos, os quais também possuíam total relação com a história
missioneira. Com a valorização da história local, alguns elementos passaram a difundir
a mesma desde então, gerando elos de pertencimento das populações que
atualmente habitam o lugar, que no passado serviu de palco para Guaranis e Jesuítas
nas reduções.
A História vem a ser o elemento chave, visto que é ela que é explorada por
todos os demais, é ela que é invariavelmente enaltecida, sendo constantemente
incentivada a se fazer lembrar. Logo, elementos como o turismo, a música e os
símbolos impregnados na paisagem, possuem sempre certo direcionamento para a
história missioneira, valorizando cada dia mais a mesma, induzindo a população local
207
a se sentir pertencente aquele passado histórico, independente de seus antepassados
terem feito parte ou não dos acontecimentos de outrora. A valorização de tal passado
é ainda mais destacável na medida em que se buscam elementos do passado para
justificar as ações do presente. A música local, por exemplo, a partir do período de
ressignificação do passado local, sempre tentou se diferenciar, criando uma corrente
musical classificada por seus artistas como “missioneira”.
Elementos Difusores de uma Identidade
Artistas locais imbuídos em “cantar as Missões” acabaram estudando a história
local, trazendo informações a população em suas canções, sendo uma espécie de
mensagem para os locais, que muitas vezes a partir da música se sentem
identificados com as letras e melodias, as quais entram no imaginário da população
missioneira. A musicalidade local traz reminiscências do período histórico, visto que a
música foi praticada com excelência nas reduções, muito através do Padre Antônio
Sepp, considerado o grande maestro das Missões segundoFurlong (1933). Barbosa
(2012) explica que quatro artistas locais são os grandes expoentes do reconhecimento
local através da música. De acordo com o autor, Jayme Caetano Braun, Noel
Guarany, CenairMaicá e Pedro Ortaça lançaram em 1988 um LP intitulado de
“Troncos Missioneiros”, o qual serviu de base para projetar a música da região
missioneira, diferenciando a mesma das demais correntes regionais da música
gaúcha. Tais artistas a partir do lançamento do LP “Troncos Missioneiros” passaram a
ser conhecidos como “os quatro troncos missioneiros”.
Conforme Pommer (2008) a partir da década de 1960 os artistas locais
intensificaram em suas canções a abordagem do passado local, já visando distinguir o
que era por eles produzido, como música missioneira, a qual se caracterizava
principalmente pelo forte tom de denuncia e protesto. A partir da década seguinte, com
a tentativa de dar importância maior a história local, os artistas que já praticavam esse
tipo de música, acabaram se tornando, de certo modo, os porta-vozes do movimento,
com canções cada vez mais endereçadas as Missões. Nas letras dos artistas locais,
principalmente dos conhecidos “troncos missioneiros”, não é difícil perceber tal
direcionamento. Personagens históricos são enaltecidos, a terra é extremamente
valorizada, as ruínas dos antigos povoados são sempre lembradas, assim como os
mais variados símbolos do passado regional.
Ao tentarem propor uma música missioneira, os artistas locais não somente
cantavam a história local, mas também buscavam algo particular na mesma, tentando
trazer do passado, algumas heranças que pudessem a tornar única. Nedel (2004)
208
relata a experiência do “tronco missioneiro” Noel Guarany que após se profissionalizar
acabou alterando seu repertório na busca de uma música legitimamente missioneira. A
autora relata a experiência de Noel Guarany por países vizinhos, onde o mesmo fez
uma grande busca, trazendo resquícios de antigas canções guaranis. A partir da
incursão do artista por países com Argentina e Paraguai, o mesmo passou a
diferenciar a música que fazia, como missioneira, com letras que sempre se
notabilizavam pelo forte tom de denúncia.
Barbosa (2012) revela que os chamados “troncos missioneiros”, os quais
sempre ressaltaram uma possível descendência Guarani, inicialmente seguiram
artistas já reconhecidos localmente como Tio Bilia e Reduzino Malaquias e deram
seguimento ao que consideravam música missioneira com a introdução de seus filhos
na carreira artística. Além destes, outros artistas locais, inspirados pelos pioneiros,
também deram continuidade para a música missioneira e seguem até hoje cantando a
história e a terra local, é o caso de Jorge Guedes e Família, com uma música com
uma essência guarani bastante peculiar. Barbosa (2012) ressalta que o principal
legado dos “troncos missioneiros” está em seu pioneirismo, visto que a música
exerceu um papel diferenciado na construção de uma identidade missioneira.
Atualmente, decorridos mais de três décadas da ressignificação do passado
colonial, percebe-se a música como um dos elementos que mais agem junto ao
imaginário local, tendo a mesma o papel de informar cada vez mais a população sobre
a gloriosa história local. As canções entram no imaginário dos indivíduos, os quais
cada vez mais, se sentem pertencentes aquele contexto, gerando sentimentos de
apego e de orgulho com relação ao lugar. Se no passado célebres artistas tiveram a
missão de cantar as missões, no presente a música local continua sendo valorizada.
Dos “quatro troncos”, Pedro Ortaça é o único vivo e juntamente com seus filhos segue
sendo o principal, porta voz da música missioneira. Na busca de dar continuidade a
musicalidade local, alguns eventos locais merecem atenção, como é o caso do “Canto
Missioneiro”, que vem ocorrendo nos últimos anos no município de Santo Ângelo. A
figura 1 exposta a seguir, traz o banner de propaganda do “Canto Missioneiro 2015”,
onde se percebe a valorização da cultura missioneira, tida como identidade local.
209
Figura 1: Banner Alusivo ao Canto Missioneiro 2015.
Fonte: www.cantomissioneiro.blogspot.com.br
A importância da música local, forte elemento da identidade missioneira, não
fica restrita ao “Canto Missioneiro” realizado em Santo Ângelo. O município de São
Luiz Gonzaga se orgulha de ser berço de alguns dos artistas mais reconhecidos
localmente, dentre eles Pedro Ortaça, Jayme Caetano Braun e Noel Guarany. Devido
ao fato, o município carrega com orgulho a alcunha de “Capital Estadual da Música
Missioneira”, como enfatizado na figura 2 a seguir.
210
Figura 2: Folder de São Luiz Gonzaga.
Fonte: Site da Prefeitura Municipal de São Luiz Gonzaga.
Outro elemento que age localmente na construção de uma identidade
missioneira é o turismo, o qual se evidenciou com força na região a partir do
tombamento do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, como Patrimônio Histórico
e Cultural da Humanidade pena UNESCO desde 1983. Com o crescimento do turismo,
verificado principalmente após o tombamento, a identidade local passou a ser cada
vez mais alavancada, visto que a região passou a ter maior reconhecimento externo,
sendo intensamente propagandeada. Para os locais, o turismo agiu fortemente
também, visto que os mesmos passaram a ter contato direto com símbolos
representativos que faziam alusão ao período histórico, o que acabava se inserindo no
imaginário coletivo, despertando ligações pessoais dos indivíduos para com o lugar e
sua história.
As transformações geradas pelo turismo em determinada área podem ser
bastante complexas. O contexto de exploração patrimonial é explorado por Menezes
(2014) que afirma que trabalhar com a memória é de certo modo entende-la
juntamente com seu processo de construção, visto que a mesma vem a ser um
processo dinâmico que sempre continua em andamento, sendo uma representação
social que leva a constante inserção identitária. De acordo com o autor, a
interpretação patrimonial se dá pela explanação histórica juntamente com as relações
do passado vivido e do momento atual. No caso missioneiro, o contexto vivido pode
211
ser abordado por quem fez parte de períodos marcantes como o do tombamento e de
quem vivenciou as transformações ocorridas desde o período até hoje.
Segundo Figueiredo (2013) o patrimônio histórico cultural é responsável por
materializar um sentimento que é evocado pela cultura e pela memória, auxiliando a
formação de identidades coletivas, que acabam sendo reforçadas por laços de origens
comuns, sendo esse um fator decisivo para a sobrevivência de uma comunidade.
Ainda nesse sentido o autor complementa que o patrimônio cultural se remete a
herança coletiva que deve ser repassada a futuras gerações, para que faça relação do
passado com o presente a partir de elementos históricos. Stello (2013) ressalta a
importância do patrimônio, o qual para o autor é resultado da dialética do ser humano
com seu meio, não sendo composto apenas por objetos do passado que obtiveram
reconhecimento, mas também por tudo aquilo que faz referência à memória coletiva
de um povo, que de certo modo acaba conferindo identidade para seus membros.
Com isso, percebe-se que o patrimônio é uma espécie de herança comum em que
elementos culturais e naturais, tanto materiais quanto imateriais acabam sendo
herdados de antepassados ou até mesmo criados no presente, fazendo com que os
sujeitos locais se relacionem com os mesmos e transfiram tal relação para gerações
futuras.
Além do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, a região missioneira
gaúcha preserva ainda outros três sítios; São Nicolau, São João Baptista e São
Lourenço Mártir, todos considerados patrimônios nacionais. As ruínas dos antigos
povoados são atrações turísticas, atraindo visitantes e divulgando a região. Pelo
estado de conservação e pela grandiosidade, nenhum sítio arqueológico se compara
ao de São Miguel, que age simbolicamente fazendo sempre uma alusão direta ao
período histórico.O simbolismo entorno da imagem da igreja de São Miguel Arcanjo é
considerável. A figura é constantemente ressaltada em propagandas turísticas e
calendários, sendo uma imagem que imediatamente vem a mente quando se fala em
Missões. Além de valorizar intensamente a história regional, o Sítio Arqueológico de
São Miguel Arcanjo serve de referência para os nativos, visto que o mesmo da vida a
acontecimentos do passado, trazendo a historiadores, guias turísticos e visitantes,
uma gama de detalhes sobre o passado Jesuítico e Guarani no local.
Devido ao fato de a imagem do frontispício da igreja da antiga redução ser
intensamente explorada, a mesma tem um papel de propagandear toda uma região,
divulgando a mesma externamente. Para o turista ou para as pessoas de fora, aquelas
que não vivem o dia-dia local, as Missões acabam sendo representadas por essa
imagem, da qual os missioneiros acabam fazendo uso, no sentido de informar e de
localizar as pessoas sobre seu lugar. O que se percebe na relação da população
212
missioneira para com a imagem da igreja da antiga redução e de outros símbolos
locais é de certo modo evidenciado por Lefebvre (2006) que alega que os corpos dos
indivíduos, que agem como usuários, estão de certa maneira, presos a engrenagens
espaciais, sendo análogos em termos filosóficos a imagens, símbolos e signos.
Atrelado a história local, ressaltada pela música com mais força desde a
década de 1960 e pelo turismo a partir do tombamento do Sítio Arqueológico de São
Miguel Arcanjo, surgiram símbolos e signos que fazem alusão ao período histórico e
estão impregnados localmente na paisagem, passando uma mensagem aos locais e
ressaltando que naquele lugar ocorreu uma história muito rica num passado distante.
O símbolo que é mais constantemente perceptível nas Missões é o da Cruz de
Caravaca, popularmente conhecida com Cruz de Lorena ou Cruz Missioneira. Tal cruz,
que se diferencia por possuir “quatro braços”, foi usada localmente no passado para
marcar a presença jesuítica na região. Atualmente a Cruz Missioneira é enfaticamente
usada na região, porém a mesma tem seu uso diferenciado no presente, servindo
como marco de uma história diferenciada que ali ocorreu no passado e para
diferenciar os municípios locais como “missioneiros”. A famosa cruz está presente no
dia-dia dos municípios da região, fazendo parte dos cenários urbanos, estando a
mesma evidenciada nas logomarcas comerciais e principalmente nos trevos de acesso
aos municípios locais, onde é comum a presença do elemento simbólico. Na figura 3,
apresentada a seguir, percebe-se o símbolo local missioneiro no trevo de acesso ao
município de Entre-Ijuís-RS.
213
Figura 3: Cruz Missioneira, trevo de acesso ao município de Entre-Ijuís-RS.
Foto: Autor
Saquet e Briskievicz (2009)fazem relação da identidade para com o território, o
qual é para os autores, envolvido em diferentes graus de intensidade por uma
dimensão simbólica e cultural que vem a se constituir de uma identidade atribuída por
grupos sociais do espaço de vida dos indivíduos, possuindo assim uma dimensão
concreta, que acaba se inserindo numa lógica de controle espacial como alternativa de
dominação dos sujeitos.A identidade missioneira é nesse sentido ressaltada por Brum
(2006) que informa que na região, muitas representações do passado têm sido
acionadas no presente, visando diferenciar a área de regiões circundantes, induzindo
os sujeitos locais a viveram as mesmas histórias através de elementos simbólicos
presentes na paisagem. Claval (2007) fala de tomada de posse de determinado
território, que segundo o autor se dá com a introdução de marcas que exprimem e
orientam a uma identidade comum, sendo normal a fixação de cruzes, monumentos e
arquiteturas tipificadas, que de certo modo proclamam a identidade que se quer.
A introdução de símbolos e marcas em determinada porção do espaço acaba
por se inserir numa lógica de mercado, visto que a visualização de um dominante na
paisagem, marcado pela repetição, faz com que os indivíduos comprem a partir da
imagem produzida, como enfatiza Lefebvre (2006). Para o autor a produção do espaço
através de marcas se orienta pelo caráter visual, o qual é evidenciado, tornando os
sujeitos envolvidos por essa dinâmica que se apresenta na paisagem. Outro autor que
214
da importância para marcas na paisagem, sobretudo para as representações sociais é
Claval (2007), que ressalta que os sistemas de representações induzem ao pensar,
fazendo com que a prática de batizar lugares possa reproduzir um objeto discursivo,
pois a introdução de marcas simbólicas as torna uma categoria social.
De acordo com Jodelet (2001) as representações sociais trazem consigo uma
relação de “simbolização”, interpretando o lugar e trazendo significados para o mesmo.
Para a autora tal prática de representação se insere na “construção” do sujeito, o qual
como já referido anteriormente por Lefebvre (2006) está preso a engrenagens do
espaço. Para o autor, o espaço urbano é destacável nesse sentido, sendo o mesmo, o
ponto de encontro, reunindo no mesmo lugar, seus indivíduos, suas ações e seus
símbolos. Sobre o contexto urbano, Corrêa (2007) afirma que é pelas formas
simbólicas que a cidade evidencia determinada cultura, a qual é ressaltada de acordo
com objetivos dominantes, identificando assim o papel de transformação espacial. O
autor ainda ressalta que quando se (re) significa a paisagem urbana, a mesma passa
a possuir valor simbólico, se tornando um tipo especial de mercadoria, manifestando a
representaçãoda realidade social e viabilizando a circulação de mercadorias, se
inserindo num contexto eminentemente político.
García Canclini (2000) revela a importância dos símbolos, que para o autor
servem para resgatar o passado, fazendo com que a identidade tenha sua
continuidade através de monumentos, que fazem relembrar histórias longínquas.
Saquet e Briskievicz (2009) enfatizam que os símbolos que compõe determinada
identidade não são construções sem intenção, pois os mesmos sempre mantém certa
relação com a realidade concreta. Os autores ainda afirmam que a memória coletiva
de um grupo social precisa de referências territoriais, para quepossa reafirmar suas
identidades.
Considerações Finais
Percebe-se diante do exposto no presente trabalho, que a identidade
missioneira ganha força devido a forte presença de alguns elementos difusores, que
agem localmente, induzindo a população local a se sentir pertencente ao lugar e a
todo contexto histórico que ali ocorreu no passado. A música se destacou por tentar se
diferencial como “missioneira”, tentando trazer resquícios guaranis, buscando
autenticidade que a legitimasse. Atualmente a mesma é propagada por artistas locais
e passa uma mensagem a população, induzindo a mesma a ter orgulho de sua história
e de seu chão, se notabilizando também pelo forte tom denunciativo, uma
característica marcante nas canções guaranis. O turismo incentiva a população local a
215
fazer uso do patrimônio histórico e serve como meio de tornar a região conhecida
externamente. O simbolismo da imagem do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo
e da Cruz Missioneira estão presentes no dia-dia dos locais, agindo automaticamente
no cotidiano dos sujeitos, induzindo a relações de apego e pertencimento para com o
lugar e sua riquíssima história, a qual é constantemente ressaltada.
Referências
BARBOSA, I.D. Os Troncos Missioneiros e a Construção da Identidade
Missioneira a partir da Música. Revista Para Onde!?vol.6, n°2, p.171177. Instituto de
Geociências. Programa de Pós Graduação em Geografia. Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Porto Alegre. Jul/dez 2012. ISSN 19820003.
BRUM, C. K.“Essa terra tem dono”. Representações do passado missioneiro no Rio
Grande do Sul. Santa Maria, Ed. UFSM, 2006. 280p.
CLAVAL, P.A Geografia Cultural. Florianópolis. 3ª edição. Editora da UFSC, 2007.
453p.
CORRÊA, R. L. A Geografia Cultural e o Urbano. In: Introdução a Geografia
Cultural. Orgs: Corrêa, R.L. Rosendahl, Z. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2007.
p.244.
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Patrimônio Cultural. In: Heidrich, A.L. Costa, B.P. Pires, C.L.Z. Maneiras de Ler
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FURLONG, G. Los Jesuítas y la cultura rioplatense. Montevideo: Urta y Curbelo,
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GARCÍA CANCLINI, N. Culturas Hibridas: Estratégias para Entrar e Sair da
Modernidade. 3ªed. Editora da Universidade de São Paulo. São Paulo. 2000.
JODELET, D. Representações Sociais: um domínio em expansão. In: D. Jodelet
(Ed.) Les ReprésentationsSociales. Paris: 1989, p-31-61. Tradução: Tarso Bonilha
Mazzotti. UFRJ. Faculdade de Educação. 1993.
LEFEBVRE, H. A produção do Espaço. Trad. Doralice Barros de Oliveira, Sérgio
Martins. Primeira Versão. 2006.
MENEZES, J. N. C. A Patrimonialização da Vida: Vivências, Memória Social e
Interpretação do Patrimônio Cultural. In: Valor patrimonial e turismo: limiar entre
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São Paulo. Outras Expressões. 2012. 264p.
NEDEL, L. B. Regionalismo, historiografia e memória: Sepé Tiaraju em dois
tempos. Anos 90. Porto Alegre. V.11. n°19/20. p-347-389. 2004.
POMMER, R. M. G. Missioneirismo: A Produção de uma Identidade Regional.
Tese de Doutorado. Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo. 2008.
216
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO LUIZ GONZAGA. Capital Estadual da Música
Missioneira.
Disponível
em:
www.saoluizgonzaga.rs.gov.br/VisualizaConteudo.aspx?ID=794. Acesso em: 28
fev.2014.
SAQUET, M. A. BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e Identidade: Um patrimônio no
desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, n°31, vol.1, 2009.
p.3-16.
STELLO, V. F. Além das Reduções: A Paisagem Cultural da Região Missioneira.
Tese de Doutorado. UFRGS. Porto Alegre. 2013.
217
LAS TRANSFORMACIONES TERRITORIALES URBANAS EN EL BARRIO
JACINTO VERA.
Gladys Graciela Schiavone Cánepa - C.F.E- IINN.
[email protected]
Resumen.
La gestión del territorio urbano incide en la ciudad, al cambiar espacios ineficientes o
insostenibles económicamente por estructuras que buscan competitividad económica
y uso colectivo, mejorando la oferta, rehabilitando tejidos urbanos y dinamizando el
intercambio, por encima de la conservación de estructuras pasadas que eran parte del
paisaje barrial cotidiano.
Montevideo no es ajena a este agiornamiento de los barrios, una muestra de este
proceso dinamizador es Jacinto Vera. Lo hemos seleccionado por su rico pasado y por
su presente en transformación. Recordemos que este barrio residencial de
arquitectura baja, exceptuando algunos galpones donde en el pasado funcionaron
industrias. Al sacar la planta de C.U.C.T.S.A. la empresa privada prima la organización
de ese lugar antes deprimido social y económicamente, por la instalación de un
Shopping que producirá una dinámica de avance y eficiencia al aprovechar los flujos y
nudos de transportes y comunicaciones que hay allí. Y hoy es un nudo central de
servicios, transporte y comercio, a partir de la instalación del Nuevocentro Shopping.
Palabras clave: barrio, cambios, permanencias, Nuevocentroshopping, Jacinto Vera.
1-Introducción.
La Sociedad humana se ha apropiado de la naturaleza mediante la técnica y el
trabajo,al mismo tiempo va unificando y padronizando los espacios, creando territorios
urbanos con ciudades y barrios; que acumulan formas heredadas del pasado en
comunión con las creadas en el presente,las cuales van condicionando nuestra vida
cotidiana con sus diversas funcionalidades y servicios.
2-Objetivos.
Para el siguiente trabajo nuestro objetivo general es el de analizar las diferentes
transformaciones que se han realizado en este barrio,debido a la instalación del
Nuevocentro Shopping.
Como objetivos específicos:
a)- realizar una investigación bibliográfica y en territorio,de los cambios ocurridos en el
barrio;
b)- observar los cambios y permanencias del barrio;
c)- reflexionar sobre las transformaciones territoriales ocasionadas en Jacinto Vera,
que dan lugar a su gentrificación.
218
3-Metodología de trabajo.
Este trabajo es parte de una tesina, que se está elaborando en el marco del Diploma
de Geografía, por lo tanto lo que se está presentando aquí es la primera instancia de
investigación bibliográfica de: libros, periódicos, revistas y portales web, para
informarnos sobre la situación del barrio a partir de la construcción de este
megaemprendimiento. La misma está al final del trabajo, para luego comenzar a
realizar el análisis de las transformaciones encontradas establecer conclusiones.
Al presentar el trabajo consideramos partir de un marco conceptual que se inicia en el
ítem a desarrollar a continuación, para luego focalizarnos en nuestra temática.
4-Desarrollo.
4.1-¿A qué se llama territorio urbano?
Los territorios urbanos se definen por la alta concentración de población por unidad de
superficie edificada, con alta concentración de servicios y donde la población trabaja
principalmente en el sector secundario y terciario.
En ellos se asienta la ciudad, en nuestro caso Montevideo,la metrópolis, cosmopolita y
turística, que centraliza servicios, bienes,tecnología e infraestructura.
Y como territorio está limitada, para poder controlar y ejercer su soberanía mediante
normas, conformando un mallado que se intersecta en áreas (otras ciudades, barrios)
y líneas ( de transporte,comunicación).
Para Elissalde29 es de la geografía de los territorios, establece que es un espacio
organizado, ordenado, producto de las interrelaciones entre los actores y una relación
compleja, que combina el medio físico natural y el espacio “humanizado, que
comprende a las personas que se apropian de el “30(Raffestin, 1986).
Comes31 considera que:
“el concepto de territorio es consecuencia de la delimitacion espacial de un proceso de
apropiacion de una parte de la superficie terrestre por un grupo social. Esta definicion
tiene sus referentes en caracteres deducidos de la Antropologia, Sociologia,
Psicologia, etc. Pero tambien podemos encontrar la vinculacion del termino al dominio
juridico, y este actua en la expresion ordenacion del territorio. Porque un territorio no
es solo un trozo de espacio apropiado por un grupo social, sino que corresponde a una
29
revistas.ucr.ac.cr/index.php/reflexiones/article/viewFile/1505/1514 (junio 2014)
30
Vargas Ulate, Gilbert .”Espacio y territorio en el análisis geográfico”.Reflexiones, vol.
91, núm. 1, 2012, pp. 313-326 .Universidad de Costa Rica San José, Costa Rica
31
www.educ.ar/ sitios/educar/recursos/ver?id=102733 (junio 2014)
219
extension espacial ordenada por este grupo con una unidad de funcionamiento donde
vendran los actores (estado, colectividad territorial, empresa, grupo o individuo) con
sus percepciones y sus estrategias. El territorio es el espacio de una sociedad; es
pues un espacio de vida”.32
En relación a estas conceptualizaciones nuestro concepto de territorio, para el
abordaje de este trabajo, debe considerar la apropiación del espacio por los vecinos,
que son los que habitan en él, dicho proceso se ha ido realizado desde su fundación y
hasta el presente, donde muchos espacios verdes y zonas de accesibilidad han sido
desarrolladas por el accionar de comisiones barriales y propuestas votadas en los
consejos vecinales.
Pero también el presente y el proyecto a futuro es transformado y planificado por
quienes no son habitantes del barrio y que invierten en mega estructuras y torres
habitacionales.
Al respecto Massey33 afirma que dentro del territorio existen actores que pueden
ejercer territorialidad sin el hecho necesario de vivir y ser parte activa de la
construcción del territorio, donde sus intereses priman y lo transforman para
acondicionarlo a una modernidad que le genere ganancias con sus modificaciones.
La gestión del territorio urbano incide en la ciudad, al cambiar espacios ineficientes o
insostenibles económicamente , por estructuras que buscan competitividad económica
y uso colectivo, mejorando la oferta, rehabilitando tejidos urbanos y dinamizando el
intercambio, por encima de la conservación de estructuras pasadas que eran parte del
paisaje barrial cotidiano.
Al sacar la planta de C.U.C.T.S.A. la empresa privada prima la organización de ese
lugar antes deprimido social y económicamente, por la instalación de un Shopping que
producirá una dinámica de avance y eficiencia al aprovechar los flujos y nudos de
transportes y comunicaciones que hay allí.
Desde las potencialidades que tiene este barrio se diseña y planifica un nuevo
ambiente urbanístico, donde la renta y el privilegio económico y social será la ruta de
avance a seguir.
En este barrio el Nuevocentro Shopping impone su presencia cambiándole su perfil,
para proyectarlo desde su ubicación hacia un papel de nudo y enclave comercial,
laboral, de transportes y comunicación multiescalar.
32
Adaptado de Cristòfol Trepat y Pilar Comes. “El tiempo y el espacio en la didáctica de
las ciencias sociales”. Ed.Graó. Barcelona, 1998.
33
www.ub.edu/geocrit/b3w-1023.htm (junio 2014)
220
Esta nueva urbanización, no solo realizará la transformación física del territorio donde
está emplazado el barrio, sino que condicionará mirando a futuro la sociedad y la
cultura barrial de las nuevas generaciones.
4.2-¿Qué es un barrio?
Ya consideramos que el territorio urbano está compuesto por una malla entrelazada de
áreas y líneas, las primeras son los barrios.
Si buscamos su significado etimológico barrio proviene " del árabe hispánico barri,
‘exterior’, y este del árabe ّّ‫[ ب ّري‬barrī ], ‘salvaje 34“’.
Pero el concepto de barrio va más allá de ser una fracción geográfica de la ciudad, es
una unidad provista de servicios comerciales,sanitarios, culturales,deportivos.
Y si bien su origen puede deberse a una decisión administrativa,un barrio son sus
habitantes, sus plazas,sus monumentos, sus calles principales, su historia , su cultura
y personalidades, que le dan una identidad única y diferente a los demás.
4.3-El barrio Jacinto Vera.
Para este trabajo proponemos una mirada primero a sus orígenes fundacionales, para
luego ir al pasado y lo que aún conserva de él, posteriormente trataremos el presente
con sus cambios y gentrificaciones que se proyectan al futuro.
De esta forma iremos aportando una mirada procesual e integrada de las
transformaciones que se han ido gestando en este barrio, con sus cambios y
permanencias.
4.4-Ubicación y características generales.
Jacinto Vera se distingue y caracteriza por ser residencial y de arquitectura baja,
exceptuando algunos galpones donde en el pasado funcionaron industrias.
Está ubicado entre la Avenida Br. Artigas, la Avenida Garibaldi y la Avenida General
Flores.
Se encuentra bajo la dependencia de la comisaría 13º de Montevideo, e integra el
Comunal Zonal Nº3, junto con barrios aledaños como Reducto, La Comercial o Villa
Muñoz.
34
http://lema.rae.es/drae/srv/search?key=barrio ( junio, 2014)
221
Dio nombres ilustres al fútbol, entre los que se destacan los campeones del mundial
de 1950 Míguez y Schubert Gambetta.
El poeta Líber Falco que de niño vivió en la zona en un ranchito de una tía. En sus
libros “Equis Andacalles” y “Cometas sobre los muros” ,describe las callecitas de tierra
y adoquines del antiguo Jacinto Vera así:
Yo naci en Jacinto Vera / que barrio Jacinto Vera ranchitos de lata por fuera y por
dentro de madera.
De noche blanca corria blanca corria la luna y yo corria tras ella.De repente se
perdia,de repente aparecia
entre los ranchos de lata y por adentro madera Ah luna, mi luna blanca luna de Jacinto
Vera !.35
4.5-Sus orígenes e historia.
Según Aníbal Barrios Pintos36 dentro de esa zona se realizó en setiembre de 1811 la
primera asamblea patriótica, en la entonces "Panadería de Vidal", actuales calles
Lorenzo Fernández, Pedernal, Yaguarí y Joaquín Requena.
El 11 de septiembre de 1811 también se realizó aquí la primera Asamblea de los
Orientales, convocada por José Artigas, a la que asistieron más de un centenar de
hombres. Fue en esa oportunidad que los diputados de Buenos Aires expusieron las
causas por las que firmaron el armisticio y obligaron al retiro del ejército sitiador del
Montevideo español y amurallado, ante la amenaza de una inminente invasión
portuguesa a la Banda Oriental
En 1895 Francisco Piria, el pionero del urbanismo montevideano, creó el barrio, al
lotear y rematar lo que hasta entonces era un paraje de chacras (la ex quinta Platero),
con zanjones y hondonadas, le puso por nombre el de monseñor Jacinto Vera, primer
obispo de la ciudad (1813-1881)debido a que el Sr. Piria tenía gran amistad con el
primer vicario de Montevideo.
En su origen lo poblaron gallegos e italianos,humildes obreros que habían sido la
mano de obra en las enormes construcciones de Don Emilio Reus en el barrio Sur y
Villa Muñoz, que al terminar esos proyectos se quedaron viviendo en Jacinto Vera, en
unos lotes que Piria les había rematado a precios muy bajos en su local de la Ciudad
Vieja. Los obreros construyeron unas pequeñas viviendas que le dieron su identidad al
barrio; humildes ranchitos de rústica madera de la carpintería de Martínez y con techos
35
36
municipioc.montevideo.gub.uy/node/18 (junio 2014)
http://municipioc.montevideo.gub.uy/node/18 (junio 2014)
222
de hojalata sacada de los envases metálicos del querosén y todo era unido con un
pegamento a base de yuyos y harina mojada, que se decía era de origen celta.
Hacia 1912 en el transporte se crea una sociedad anónima que fusiona a todas la
líneas de cooperativas privadas, se la denomina C.U.T.C.S.A. Y por razones casi
folklóricas, el origen étnico de la mayoría de los accionistas cooperativistas, choferes y
guardas, fue eminentemente gallega. Hay un testimonio de aquella época que lo ilustra
“ ...cuando se embarca Manolo en La Coruña, le preguntan a dónde va y contesta: a
Cutcsa37”.
Desde 1941 a 1973 se crea el permiso para la construcción de viviendas por
particulares con plano gratuito y exención de tasas. La Ley 13.728 del 17 de diciembre
de 1967 ,permite la creación de viviendas con fondos sociales, como en el caso de
Cutcsa en las calles Suárez y Micenas.
Por la calle Lafinur se ubicaba el boliche “Uruguayo”, donde los parroquianos
degustaban el aromático café y la quemante caña en copitas de grueso vidrio.
En otro emblemático boliche “El Sol”, se cuenta la leyenda, que una mañana se
trenzaron en un bravo contrapunto los payadores López y Clodomiro Pérez.
Jacinto Vera tenía fama de ser semillero de cracks e ídolos del fútbol uruguayo, que
jugaban en el potrero frente a la iglesia de San Antonino.
El Carnaval latió en sus calles, un corso salía por la actual Lorenzo Fernández, se
dirigía a Garibaldi hasta llegar a Cuñapirú. Por la calle Lafinur se levantaba un tablado
alegórico que ganó muchas veces el premio de la Comisión de Fiestas del Municipio.
Su murga locataria La Milonga Nacional, en sus poéticas retiradas varias veces
mencionó al querido barrio, con sus “ranchos de lata por fuera y por dentro de
madera”.
Los domingos de matiné eran en los cines “Ateneo” y “Edinson” de la calle Garibaldi. Y
de deporte en los clubes El Zapicán y El Victoria.
4.6- El barrio en el presente: permanencias y cambios.
Actualmente el barrio conserva parte de su pasado que lo identifica y que es parte de
su patrimonio cultural, como la Iglesia San Antonino, algunas calles conservan su
empedrado; todavía las casas con jardines y de un solo piso son mayoría, los trazados
dentro del barrio en parte son irregulares y hasta caóticos, quedando muy pocos
terrenos baldíos y las reducidas plazoletas aparecen en los lugares más inesperados.
37
”Una información urgente sobre la historia de Montevideo”. El País. Octubre 1976.
223
Pero se han incorporado : dos escuelas publicas, un liceo público de segundo ciclo,
una estación de servicio,la sede de la Administración de los Servicios de Salud del
Estado A.S.S.E. (en la ex casa de gobierno,antes llamado Edificio Libertad), el hospital
Filtro dependiente de A.S.S.E., una dependencia del Ministerio de Transporte y la
antigüa carpintería Martínez, hoy abandonada. También destaca una plaza que
recuerda el antigüo sitio de la panadería de Vidal.
Estos cambios acompasaban el ritmo de un barrio tranquilo, de población obrera y no
afectaban mucho la rutina ni la identidad cultural de sus habitantes.
4.7-Las transformaciones del barrio debido a su gentrificación.
Cuando hablamos de gentrificación estamos aludiendo a la transformación de un
sector de la ciudad que debido a la influencia de la economía, la globalización,las
fuentes de empleo, las tecnologías y la información,traerá como consecuencia un
cambio drástico en las relaciones sociales, no sólo desde los planos económicos y
culturales, sino también desde la organización de la ciudad.
En las últimas décadas hemos presenciado un proceso de transformación urbana, por
la instalación en diferentes barrios de megasuperficies e infrastructuras modernas para
vivienda, oficinas,etc; producto todas de la búsqueda de “ inserción y participación en
el circuito mundial de acumulación del capital, que ha cambiado la estructura y la
morfología
de
las
urbes38”.
De
Mattos
(2006)señala
que
las
metrópolis
latinoamericanas se encuentran inmersas en una etapa de reorganización, debido a
una nueva fase de modernización capitalista, donde la reestructuración productiva
altera la geografía económica a escala global, impactando no sólo la estructura
urbana, sino también la social.
Donzelot39 ha mencionado que la reestructuración enfocada en la tercerización de la
economía, genera nuevas formas de urbanización, con distintas velocidades según las
condiciones de vida de los grupos sociales que asumen estos procesos.
Las zonas gentrificadas generalmente están localizadas en los barrios centrales de las
ciudades, siendo el producto de planes de renovación urbana, en el marco de ejes
asociativos entre agentes urbanos públicos y privados.
La gentrificación se ha convertido en un componente fundamental de las estrategias
de regeneración urbana.
38
De Mattos et al, 2004
39
ses.ens-lyon.fr › Dossiers › Les grands dossiers, En la traducción de : la cuestón
urbana. (junio 2014)
224
Esta intervención pretende poner de manifiesto los estrechos vínculos existentes en
entre los programas de revitalización urbana, que se han estado llevando a cabo en
nuestra ciudad.
Y que forma parte integral de las iniciativas para la regeneración o rehabilitación de
determinadas zonas de la ciudad, que buscan ser desarrolladas en diversas formas y
dinámicas en este barrio en particular.
En Jacinto Vera comienza cuando se edifica el hoy ex Edificio Libertad, que fue sede
de la Presidencia de la República, mejorando el predio que estaba baldío y
acondicionando a su alrededor una plaza con esculturas e iluminación. Esto trae como
consecuencia que la Escuela Pública que está allí se pinte y refaccione, al igual que el
monumento que está en la rotonda de acceso.
La Avenida Boulevard Artigas se ensancha en doble mano hasta el entronque con Luis
A. De Herrrera y J.P. Varela. Ocasionando que las casas tengan mayor valor
inmobiliario y se vendan los predios baldíos que existían, desocupando a aquellos que
estaban de ilegales.
Desde el 2012 este barrio alejado del bullicio comercial, tiene después de cinco años
de trabajo el Nuevocentro Shopping, donde estaba antes la planta José Añón de
Cutcsa.
Las nuevas transformaciones de Jacinto Vera son el producto de nuevas actividades y
de la demanda de espacios diferentes, lo que trae como consecuencia un aumento del
costo del suelo urbano comandado por el mercado inmobiliario.
La ubicación de un nuevo centro comercial ha reconvertido a un barrio tranquilo en un
área comercial, que se dinamiza con funciones administrativas y financieras,
aprovechando el nodo de comunicaciones y transportes que convergen en él.
La renovación de este territorio se enfocó en reemplazar al gran taller de
C.U.T.C.S.A.,por un gran emprendimiento que moderniza la urbanidad.
Pero este proceso de gentrificacion no se detiene, está en obras la continuación de la
Avenida Boulevard en su ensanche, la finalización de las torres de viviendas que
comparten el predio del Nuevocentro Shopping y aún está en remodelación el edificio
de DISSE, donde estaba antes el Edificio Libertad.
Ante este fenómeno de transformación, Sandroni40 ha sostenido que
“la relacion entre renovacion urbana y gentrificacion –entendida como consecuencia
negativa- es premeditada ya que la renovacion vendria a constituir se como un
estimulo para cambiar el uso de barrios degradados y aumentar la inversion privada en
ellos”.
40
www.kellogg.northwestern.edu/.../ sandroni alvaro.a.(junio 2014)
225
La ubicación del Nuevocentro Shopping ha cambiado la dinámica del barrio para
siempre, es estratégico, es un nudo donde se conectan las principales Avenidas:
Boulevard Artigas, Luis Alberto de Herrera, José Pedro Varela, Propios, Gral Flores y
San Martín.
Está en medio de la ruta turística de quienes ingresan al país por Colonia y está más
cerca que otros Shopping.
Compite con otros establecimientos comerciales pequeños, medianos como La Pasiva
y grandes como: Devoto, Tienda Inglesa, Macro Mercado, Tres Cruces terminal y
shopping.
Su área de influencia trascendió los límites de Jacinto Vera y va más allá de sus
barrios vecinos.
5-A modo de conclusión.
A lo largo del tiempo desde su fundación, hasta el presente, el barrio Jacinto Vera ha
tenido variadas transformaciones en su infraestructura, que le han modelado sus
rasgos identitarios.
Los procesos de cambio han acompasado la modernización y las necesidades e
intereses de los ciudadanos.
La inversión económica ha dado lugar a obras de trabajo, de esparcimiento y de
servicios.
Las comisiones vecinales y clubes del barrio, en conjunto con la Intendencia Municipal,
a lo largo del tiempo ha promovido la implementación de programas de recuperación
de áreas centrales y centros históricos, además de inversión en el mantenimiento y
promoción del patrimonio histórico y cultural, todo ello con el objetivo de hacer
atractivo el espacio urbano para la inversión de capital privado. Lo cual trae como
consecuencia revalorizar el valor inmobiliario, densificando la zona al construir las
torres habitacionales en el predio del Shopping y desplazando aquella población que
no le atrae el nuevo perfil
que va tomando el barrio y su apariencia.
También se ha observado tanto el cierre progresivo de aquellos negocios pequeños
(almacenes, kioscos) ante la competencia de una oferta mejor, pero también están
aquellos negocios que no les ha afectado o han visto mejorar sus ventas, porque es
mayor el público que acierta a transitar por el barrio y que busca restaurantes y bares
alejados del centro comercial.
226
El Shopping instala en el cotidiano nuevas formas de vida y costumbres, que van más
allá de la escala local del barrio Jacinto Vera, es un espacio de compras, de reunión ,
de esparcimiento, de trabajo, de comunicaciones ,servicios y transportes.
La gentrificación del barrio Jacinto Vera, deriva de la implementación de una política
social y económica de revitalización funcional de una zona deprimida como era la
planta de C.U.T.C.S.A, en una ubicación central, que se direccionada a la ejecución de
una mega estructura moderna y al desarrollo de proyectos inmobiliarios, sin considerar
la explotación, promoción e implementación de rutas que traen y llevan ciudadanos de
todas partes de Montevideo, mediante los sistemas de transporte de C.U.C.TS.A y de
las demás compañías.
Y como se esquematiza más abajo, se promueve y desarrolla la plusvalía de su
ubicación, al configurarse como punto articulador y cohesionador del sistema urbano y
asume este rol protagónico, promocionándose por separado y en conjunto con las
otras megasuperficies, para el arribo de grupos de ingresos medios, principalmente
jóvenes y familias que gustan de estas superficies comerciales y que aún no han sido
captados por su lejanía o precios de los otros Shopping montevideanos.
6-Bibliografía empleada.
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“America Latina. Cinco tendencias constitutivas”. En: GERAIGES, A.
El País. Octubre 1976. “Una informacion urgente sobre la historia de Montevideo”.
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228
EJE 2- BIODIVERSIDAD Y ÁREA PROTEGIDA
229
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL
230
UNIDADE DE CONSERVAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE MANUTENÇÃO DA
SOCIOBIODIVERSIDADE NOS CAMPOS SULINOS DO BIOMA PAMPA
Marilse Beatriz Losekann - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Fernanda Maria Follmann - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
Os campos sulinos do Bioma Pampa se caracterizam por possuir uma vasta
biodiversidade, sendo que parcela ainda não foi estudada. Além dessa há a
diversidade cultural e social específica dos locais, que se estruturam, principalmente
através da pecuária extensiva, atividade que conformou as características atuais do
pampa gaúcho. No entanto, a expansão do agronegócio sobre o Bioma, através da
soja e da silvicultura, vem causando inúmeros impactos sobre a sociobiodiversidade
local. Neste sentido, busca-se aqui realizar uma discussão acerca do processo de
avanço do agronegócio e sobre o papel das Unidades de Conservação,
especificamente da APA do Ibirapuitã, RS, enquanto espaços de resistência a esse
processo. Para isso, utilizou-se a pesquisa documental e bibliográfica. Assim, percebese que devido a pecuária sobre campo nativo representar mais de 87% das atividades
na APA do Ibirapuitã, esta representa importante espaço de resistência ao
agronegócio, visto que se configura na maior área protegida no Pampa gaúcho.
Palavras-chave: Agronegócio. Bioma Pampa.
Resistência, Unidade de Conservação.
Área de Proteção Ambiental.
Resumen
Los pastizalesdelsurdel bioma Pampa se caracterizan por tener una amplia
biodiversidad, siendo que parte no se haestudiado. Además de estohayladiversidad
cultural y social de los lugares específicos que se estructuran principalmente a través
de una extensa actividadganadera que ha garantido las características actuales de la
pampa gaucha. Sin embargo, laexpansióndelagronegocioenel Bioma por laproducción
de soja y silvicultura, ha provocado numerosos impactos enelsocio-biodiversidad local.
En este sentido, se busca abrir un debate sobre elproceso de avance de
losagronegocios y el papel de las áreas protegidas, específicamente de la APA
Ibirapuitã, RS, como espacios de resistencia a este proceso. Para ello, hemos utilizado
el documental y lainvestigación bibliográfica. Por lo tanto, laganaderíaen pastos
nativos representa más del 87% de lasactividades de la APA Ibirapuitã, o que hace de
esta un importante espacio de resistencia al agronegocios, ya que enella se
estableceel área protegida más grande de Pampa gaucho.
Palabrasclaves: Agronegocio. Bioma Pampa. Paisaje Protegido. Resistencia. Áreas
Protegidas.
231
Introdução
Por mais de duzentos anos a atividade pecuária se desenvolve nos campos do
RS, conformando as características do Bioma Pampa através da coexistência entre
homem e natureza. Por muito tempo, houve uma relação harmoniosa entre estes, uma
vez que os sujeitos do campo tinham uma exploração que não produzia grandes
impactos, como é o caso principalmente da pecuária extensiva em campo nativo.
Atualmente, o Bioma Pampa, em especial no Estado do Rio Grande do Sul,
vem sofrendo alterações com o avanço do agronegócio, através das atividades
silvícolas e a sojicultora, e pela extranjeirização da terra. Este modelo de
desenvolvimento para o Pampa significa uma mudança radical de sua matriz produtiva
e alterações dos ecossistemas que compõem o Bioma.
Ao encontro destas alterações das características dos ambientes locais,
tornaram-se destaque, a partir do século XX, discussões internacionais e nacionais
sobre as ações do homem em relação ao meio ambiente. Em contexto brasileiro,
surgem assim, os Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (BRASIL, 1988).
No cenário brasileiro, asUnidades de Conservação (UCs) ganham destaque a
partir da década de 1960 e, segundo o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação – SNUC(2000) a UC “é um espaço territorial e seus recursos ambientais,
incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente
instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob
regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de
proteção”.
Estes espaços constituem-se numa das principais formas de intervenção
governamental, visando reduzir as perdas da biodiversidade face à degradação
ambiental.Ao encontro dos objetivos das Unidades de Conservação, traz-se a
contribuição destas na conservação do Bioma Pampa, especificamente o caso da
Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã.
Neste artigo, tem-se por objetivo discutir os impactos do agronegócio sobre o
Bioma Pampa do Rio Grande do Sul e analisar a eficácia da APA do Ibirapuitã
enquanto espaço de resistência a esse modelo hegemônico de desenvolvimento41. Ao
propor esta discussão, utilizou-se a pesquisa documental e bibliográfica, pois segundo
Marconi e Lakatos (2010,p.48) "o levantamento de dados, primeiro passo de qualquer
pesquisa científica, é feito de duas maneira: pesquisa documental (ou de fontes
primárias) e pesquisa bibliográfica (ou de fontes secundárias)". Assim, utilizou-se
41
Ver mais em: SACHS, Ignacy. Dicionário do Desenvolvimento. Ed. Vozes. 2001.
232
informações contidas em relatórios da Empresa de Assistência Técnica e Extensão
Rural do Rio Grande do Sul (Emater), legislações ambientais brasileiras como o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, 2000), Decreto de criação da
APA do Ibirapuitã e referências bibliográficas em relação as discussões nacionais e
internacionais sobre proteção ambiental no século XX e especificamente a expansão e
pressão que o agronegócio exerce sobre o Bioma Pampa Gaúcho.
Bioma Pampa: o agronegócio e seus efeitos territoriais
O Pampa abrange regiões pastoris de planícies nos três países da América do
Sul – cerca de dois terços do Estado brasileiro Rio Grande do Sul (17,6 milhões de
hectares da metade sul), as províncias argentinas de Buenos Aires, La Pampa, Santa
Fé, Entrerríos e Corrientes e a República Oriental do Uruguai, como pode ser visto na
figura 1.
Figura 01 - Abrangência do Bioma Pampa
Fonte:Picolli e Schnadelbach, 2007.
Entre os anos de 1970 e 2005, segundo Picolli e Schnadelbach (2007), estimase que 4,7 milhões de hectares de pastagens nativas do Bioma Pampa foram
convertidos em outros usos agrícolas, como lavouras e plantações de árvores
exóticas. Da sua vegetação campestre e dos seus banhados característicos, restam
apenas 39%.
No Estado do Rio Grande do Sul, a Campanha ou Planalto da Campanha
(IBGE, 1986), á a região de maior extensão de campos, dedomínio morfo-estrutural
233
das bacias e coberturas sedimentares. A altitude varia entre 70 e 150 m. O relevo varia
de plano a suavemente ondulado (coxilhas). Ocorrem solos de origem do arenito
Botucatu, principalmente a oeste do município de Quaraí e a sul e sudeste do
município de Alegrete, onde se constata o fenômeno da arenização. Os solos são, em
geral, de baixa fertilidade natural, estando muito suscetíveis à erosão.
Este Bioma é formado por um mosaico de áreas campestres, matas de galeria,
areais, banhados (alagadiços), capões de mata nativa, cerros-testemunhos, serras,
áreas de recarga e ou de descarga de aquíferos subterrâneos, matas aluviais, rios e
sangas, afloramentos rochosos, entre outras particularidades resultantes da
combinação geológica, climática e vegetal presente neste Bioma. Deste mosaico
resulta a ocorrência de uma diversidade de espécies microbianas, vegetais e animais
associadas ao Pampa, bem como de uma diversidade de tipos humanos.
É inevitável considerar a importância das questões históricas (disputas por
território entre Espanha e Portugal, ciclos econômicos, Revolução Farroupilha, etc) e
da colonização por imigrantes de diferentes etnias (açoriana, espanhola, ucraniana,
polonesa, alemã, italiana e outras), como fatores que também definiram a
diferenciação dos tipos humanos presentes no Pampa. É por esta razão que ao
tratarmos da conservação da diversidade pampeana devemos tomar o cuidado de
incluir, além da diversidade ambiental, a diversidade sociocultural presente neste
Bioma.
A pecuária extensiva tem sido a forma tradicional de aproveitamento
econômico destes campos, indicando uma maior sustentabilidade ambiental da
atividade em comparação a outras ligadas à agricultura convencional. A necessidade
de considerar o papel do homem na conservação da sociobiodiversidade do Bioma
Pampa, no caso na Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã, se justifica pelo
fato de que foi a coexistência entre o homem e natureza que garantiu a conformação e
manutenção das características deste Bioma (Bencke, 2009), e por isso se
institucionalizou uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável.
Contudo, a expansão do agronegócio sobre o Bioma Pampa, vêm causando
impactos negativos aos ecossistemas e desestruturando as comunidades locais. Estas
corporações atuam em diversas escalas, que vão desde a produção até a
comercialização, seguindo a lógica capitalista, característica do agronegócio. Nesse
sentido, Achkar, Domínguez e Pesce(2008, p. 07) mencionam o agronegócio como
Los agronegocios constituyen un complejo espacio económico en el
que convergen inversiones de capital transnacional en el conjunto de
las actividades y sectores vinculados a la producción, distribución y
comercialización de productos agrarios a escala global.
234
No Estado do Rio Grande do Sul, este processo de inserção do capital
internacional está se intensificando com a implantação de empresas estrangeiras em
busca de terras para a plantação das variedades de pinus, eucaliptos e acácia negra.
Estas empresas buscam áreas prioritariamente na região da Campanha Gaúcha, no
Bioma Pampa, principalmente pelo baixo custo de compra da terra.
O governo do Estado do Rio Grande do Sul criou no ano de 2004, o Programa
de Financiamento Florestal Gaúcho - “Proflora”, com o apoio do Banco Nacional do
Desenvolvimento Social – BNDES. A criação deste programa teve como objetivo
conceder financiamento para o plantio de monocultura de acácia negra, pinus e
eucaliptos no Estado o que resultou em um acréscimo aproximado de 57% sobre a
área total.
A expansão recente da silvicultura em território gaúcho veio antecedida da
compra de grandes áreas na parte centro-sul do Estado, a baixo custo, por parte de
três grandes empresas produtoras de celulose (Aracruz Celulose, StoraEnso e
Votorantim Celulose e Papel – figura 2) que iniciaram a implantação de extensos
plantios de árvores exóticas sem o prévio estudo de impactos socioambientais na
região, incitando a preocupação da sociedade local.
Figura 2. – Território de abrangência das empresas de celulose e Tendência atual da soja no
RS.
Fonte: FEE (2007) e Emater/RS (2012).
O avanço do cultivo de soja na campanha gaúcha também representa o avanço do
agronegócio e da monocultura sobre os campos sulinos do pampa. De acordo com a
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do RS (Emater, 2012), conforme figura
2 acima, ocorreu um aumento de 180% da área plantada de soja na região Sul e de 120%
na Campanha na última década. Além da diminuição da área de campos naturais utilizada
pela pecuária, o avanço da soja também traz consequências para outras culturas,
principalmente para o milho, as culturas do arroz e feijão.
235
Com
este aumento considerável
da
plantação
de soja no Estado,
concomitantemente tem-se uma diminuição da biodiversidade local, neste caso
diminuição da diversidade biológica e cultural do Pampa. Este processo é ocasionado
pela exportação de entropia realizada pelos chamados países desenvolvidos, ou seja,
estes exploram territórios alheios sob o discurso de produção alimentar, mas ao
produzir matéria prima e alimentos, deixam o passivo ambiental no país
subdesenvolvido.
La utilización de espacios ambientales en los denominados territorios
del “sur” a lós efectos de producir alimentos para abastecer a la
población de los países del “norte” pone en evidencia que el sobreconsumo y el subconsumo son dos caras de la misma moneda.
Desde ese lugar es que se discute la viabilidad de la seguridad y
soberanía alimentaria de lós pueblos acorde a sus necesidades de
alimentos culturalmente determinadas y a las potencialidades
productivas de los territorios (ACHKAR, DOMÍNGUEZ, PESCE, 2008,
p.9).
A forma como o capitalismo explora e degrada a natureza e a sociedade são
fatores que fazem refletir sobre o quão negativo esta maneira de viver está se
tornando. No aspecto ambiental, tem-se uma contradição quanto ao agronegócio
implantado mundialmente e a proteção de características locais da natureza e cultura
local das populações. Nessa perspectiva, seria necessária uma possível mudança,
que estaria fundamentada em uma nova maneira de viver.
Neste contexto, conforme aborda Mendonça (2011), é possível vislumbrar
sinais que delineiam uma reorganização do território, esta que estaria baseada na
gestão de áreas de preservação ambiental e nos consórcios intermunicipais de bacias
hidrográficas, pois, explicitam exemplos de reorganização territorial e administrativa da
sociedade em face da apropriação da natureza e dos recursos naturais. Entretanto,
são sinais incipientes considerando a cadeia complexa que a exploração da natureza
se encontra.
Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã: Unidade de Conservação como forma
de resistência à expansão do agronegócio no Pampa do RS
A Constituição Federal do Brasil, instituída no ano de 1988, define os espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos (BRASIL, 1988).
Esta definição indica que o poder público deve criar áreas protegidas e Unidades de
Conservação garantindo que estas contribuam para a existência de um meio
ecologicamente equilibrado (NURIT, 2006).Assim,no ano 2000 cria-se o Sistema
236
Nacional de Unidades de Conservação o qual estabelece as Unidades de
Conservação, contemplando áreas de Proteção Integral e de Uso Sustentável.
A Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã integra as Unidades de
Conservação de Uso Sustentável. Estas, caracterizam-se como, em geral, áreas
extensas, com um certo grau de ocupação humana. São dotadas de atributos
abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade
de vida das populações humanas e, têm como objetivos proteger a diversidade
biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade dos
recursos naturais (BRASIL, 2000).
Esta APA, que se encontra inserida no Bioma Pampa, localizada no Rio Grande
do Sul nos municípios de Alegrete, Quaraí, Rosário do Sul e Santana do Livramento,
tem por objetivo:
Garantir a conservação de expressivos remanescentes de mata
aluvial e dos recursos hídricos ali existentes; melhorar a qualidade de
vida das populações residentes através da orientação e disciplina das
atividades econômicas locais; fomentar o turismo ecológico, a
educação ambiental e a pesquisa científica; preservar a cultura e a
tradição do gaúcho da fronteira; além de proteger espécies
ameaçadas de extinção a nível regional (BRASIL, 1992).
Salienta-se que esta região possui potenciais histórico-culturais, com atributos
particulares, com possibilidade de se integrarem a atividades de turismo rural, em
áreas de fazendas com prédios centenários que poderiam ser alvo dessas ações,
juntamente com a grande riqueza da paisagem natural
Devido à acelerada inserção do capital internacional através de atividades
externas ao ambiente local, as quais provocam a descaracterização dos campos
sulinos pertencentes ao Bioma Pampa, as Unidades de Conservação se constituem
em importante instrumento para tentar garantir a conservação dos bens naturais e
culturais do pampa gaúcho brasileiro.
A forte relação verificada entre o desenvolvimento de culturas locais do Pampa,
como a produção de gado, faz com que o pisoteio do gado mantenha os campos na
região, logo a conexão entre os aspectos culturais e naturais estão estreitamente
integrados. A partir disso, observa-se que a Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã
condiz com a devida conservação ambiental que se necessita no Bioma Pampa, pois
integra uma bacia hidrográfica e é uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável.
237
A APA42 do Ibirapuitã foi criada em 20 de maio de 1992, e seu território abrange
a porção superior da Bacia Hidrográfica do Rio Ibirapuitã abrangendo uma área de
316.882,75 ha (figura 3). De acordo com os gestores da APA, ela é formada, dentre
outras, por propriedades rurais privadas, escolas municipais rurais, Piquetes de
Tradição
Gaúcha,
pequenos
estabelecimentos
comerciais
(“bolichos”),
uma
propriedade de pesquisa agropecuária (Fundação Maronna) e uma propriedade rural
de treinamentos da Brigada Militar (Estância Lolita).
Figura 3: Localização da APA do Ibirapuitã.
Esta heterogeneidade43 que compõem o território APA do Ibirapuitã epropicia
diferentes usos da terra e diferentes concepções de natureza, provêm de um contexto
42
APA do Ibirapuitã é Área de Proteção Ambiental, a qual é considerada uma Unidade de
Conservação (UC) de Uso Sustentável de acordo com a classificação do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (SNUC) do Ministério do Meio ambiente do Brasil.
43
A formação espaço-temporal do território agrário do Rio Grande do Sul nos permite
compreender a presença de agricultores familiares camponeses, com suas diversidades
inerentes a cada lugar, ao mesmo tempo em que o latifúndio persiste. Os sistemas de
distribuição de terras, como a das sesmarias e das datas juntamente com a Lei de Terra,
geraram uma enorme desigualdade e exclusão ao acesso a esta, originando um grande rol de
posseiros, agregados dos latifúndios, ex-peões que se instalaram em pequenos sítios baldios,
além de ex-escravos e indígenas que ocuparam áreas de difícil acesso, seja por estas serem
238
histórico e cultural de disputas territoriais, possuindo assim, atores sociais distintos em
uma mesma área que se propõem a ser de uso sustentável dos recursos naturais e
culturais. Neste contexto, a APA vai ao encontro do que menciona Diegues (2000, p.1),
que “a diversidade biológica não é simplesmente um conceito pertencente ao mundo
natural. É também uma construção cultural e social”.
Estudo desenvolvido pela Fundação Zoobotânica do RS (TORGAN, 2013)
demonstra que a APA do Ibirapuitã apresenta como principal atividade econômica a
pecuária extensiva sobre campo natural (mais de 87% do território) e pecuária
extensiva sobre pastagem cultivada (menos de 1%), além do cultivo de arroz irrigado
(menos de 3,5%). Portanto, verifica-se que no território da Unidade de Conservação
denominada APA do Ibirapuitã, ainda predomina a pecuária extensiva sobre o campo
natural, configurando a manutenção das características culturais e ambientais locais.
Em relação a biodiversidade local, estudos de Pillar, Andrade e Dadalt (2015,
p.117) ressaltam que a conservação dos campos nativospropicia inúmeros serviços
ecossistêmicos:
São exemplos a regulação hídrica e o fornecimentode água limpa, a
produção de forragem para a atividade pecuária,a manutenção de
polinizadores e de predadores de pragas deculturas agrícolas, o
potencial para a recreação ao ar livre, a estocagemde carbono no
solo que ajuda a mitigar as mudanças climáticasglobais, dentre tantos
outros.
Somando-se a esses fatores, Vélez-Martin, Chomenko, Madeira e Pillar (2015,
p. 169) apontam que “os estabelecimentos rurais dedicados à pecuária sustentável
têm maiores possibilidades de explorar atividades econômicas complementares”.
Dentre as atividades, são destacadas o turismo rural, o turismo ecológico e a
observação de aves, a apicultura, a produção de plantas medicinais e de plantas
ornamentais, a produção comercial de sementes nativas e o desenvolvimento de
cosméticos, fitoterápicos e fármacos são possibilidades que precisam ser incentivadas
e melhor exploradas nos Campos Sulinos.
Assim, a partir deste estudo, observa-se que a Área de Proteção Ambiental do
Ibirapuitã atua como forma de resistência a expansão do agronegócio nos campos
sulinos do Bioma Pampa, uma vez que é a maior Unidade de Conservação do Pampa
do Rio Grande do Sul. A APA, por possuir como principal atividade econômica a
pecuária extensiva sobre campo natural, configura um exemplo de que a criação de
Unidades de Conservação e Áreas Protegidas proporcionam limites a expansão do
as que “sobraram”, ou seja, por optar pelo isolamento. A APA do Ibirapuitã expressa essa
heterogeneidade sendo constituída por territórios da agricultura familiar e patronal.
239
agronegócio, principalmente às atividades silvícolas e da soja, logo, observa-se a
importância da criação de UCs como estratégia de manutenção das características
locais.
Considerações
No modelo econômico que pauta a sociedade atualmente, com bases na
exploração dos recursos oferecidos pela natureza, torna-se necessário a criação de
alternativas
para
que
se
minimizem
os
impactos
que
este
processo
de
desenvolvimento capitalista do modo de produção causa. Entretanto, o ideal seria uma
mudança de paradigma, no qual o afeto, o pertencimento e a ética estivessem
presentes. Mas, no momento atual, em que esta mudança de paradigma ainda não
avança, a opção é iniciar as discussões e alterações de alguns espaços que são
necessários para a manutenção da biodiversidade de espécies e culturas.
As Unidades de Conservação podem ser utilizadas, desde que respeitem o
disposto nas legislações, sendo que no caso do Pampa, a inserção de atividades
características do gaúcho é fator importante para que se tenha uma coexistência entre
a cultura e a biodiversidade. Assim, no Rio Grande do Sul nas áreas pertencentes ao
Bioma Pampa, no qual existem disputas sobre o uso da terra deste o momento de sua
colonização, a proteção de áreas se torna fundamental.
Esta preocupação em proteger determinados espaços, deriva da grande
inserção de atividades externas ao ambiente local, como a monocultura da soja, pinus,
eucaliptos e acácia negra. Este novo cenário é de um rural sem agricultores, de
substituição da produção de alimentos por produtos do agronegócio onde agentes
externos comandam o lugar homogeneizando a paisagem, desestruturando as
comunidades locais, causando perda da memória coletiva e individual, aumento dos
impactos ambientais e perda da biodiversidade.
Neste contexto, no caso particular da terra gaúcha, não se trata apenas de
valorizar os exíguos ecossistemas naturais primários remanescentes, existe algo mais
relacionado com as raízes do povoamento – áreas culturais fortemente imbricadas – e
com a dinâmica dos agroecossistemas (AB’ SABER 2003, p. 112). Dessa maneira, a
Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã, como Unidade de Conservação de uso
sustentável permite essa coexistência entre homem e natureza, contribuindo para
conservação tanto dos bens naturais como culturais.
Nessa perspectiva, a APA do Ibirapuitã, UC de uso sustentável, configura-se
como um território de resistência a expansão do agronegócio no que se refere às
atividades silvícolas e da soja.
Assim, as Unidades de Conservação enquanto
240
territórios representam importante papel da relação homem/meio, contribuem na
manutenção de serviços ecossistêmicos e na conservação da sociobiodiversidade.
Contudo, faz-se necessária a implementação de políticas públicas de
valorização das Unidades de Conservação e, no caso específico da APA do Ibirapuitã,
o estímulo a pecuária sustentável e a cadeia produtiva oriunda dos campos nativos.
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242
AS ÁREAS PROTEGIDAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA BRASIL –
URUGUAI: OPORTUNIDADES PARA A CONSERVAÇÃO INTEGRADA
Franciele da Silva – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Eliane Maria Foleto – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo: este trabalho possui como objetivo analisar as Áreas Protegidas e demais
locais destinados à conservação localizados próximos à região de fronteira entre Brasil
e Uruguai, pontuando estratégias que possam integrar essas “ilhas protegidas”,
pensando na manutenção dos remanescentes do bioma Pampa para a região de
fronteira. No total foram identificadas sete Unidades de Conservação no lado brasileiro
e cinco Áreas Protegidas uruguaias, além das Áreas Prioritárias para Conservação do
bioma Pampa no Rio Grande do Sul (totalizando 105 áreas) e a Reserva da Biosfera
Bañados del Este e Reserva da Biosfera Quebradas del Norte, ambas pertencentes ao
território uruguaio. Através da análise foi possível concluir que existe a possibilidade
de se pensar uma proposta de Reserva da Biosfera que integre Brasil e Uruguai, tendo
em vista a espacialização das áreas destinadas à conservação na região de fronteira,
considerando, principalmente, a região dos departamentos de Artigas e Rivera, além
de municípios como Quaraí, Santana do Livramento e Barra do Quaraí, visto que são
áreas estratégicas para a conservação do bioma, e, ao mesmo tempo, com a menor
representatividade de Áreas Protegidas.
Palavras-chave: bioma Pampa; Reserva da Biosfera; Áreas Prioritárias.
INTRODUÇÃO
Historicamente, para Bentancor (1995), os povos tiveram forte apreço na
demarcação de suas fronteiras, sem outras preocupações com o lado externo destas,
a não ser do ponto de vista das possíveis ameaças de perda de território. Nesse
aspecto, a questão de soberania das nações foi o motivo para a falta e, até mesmo, o
desinteresse por trocas de informações de caráter fronteiriço, prevalecendo apenas a
preocupação específica de cunho geopolítico.
Todavia, no decorrer da consolidação política das linhas de fronteiras e a
preocupação e o aprofundamento das discussões voltadas ao meio ambiente e a
sociedade,
começa-se
intergovernamental.
a
Surgindo,
questionar
assim,
os
problemas
inquietações
ambientais
pertinentes
aos
a
nível
aspectos
ambientais, culturais e sociais, na perspectiva de promover um despertar de
integração possível nas regiões de fronteira.
Essa integração torna-se necessária, principalmente, sob o viés ambiental,
uma vez que existem ecossistemas similares, com problemas ambientais parecidos e
que, no entanto estão separadas por limites políticos. Neste contexto, há que se
243
analisar, com mais atenção, as unidades territoriais transfroteiriças, especialmente as
áreas que compartilham características de identidade cultural, econômicas e/ou
ambientais.
Sob
a
perspectiva
exposta,
pode-se
citar
como
unidade
territorial
transfronteiriça e semelhante o bioma Pampa, principalmente na porção que abriga
parte do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil e a República do Uruguai. Nessa
região, além de um ecossistema integrado, existe uma cultura e economia que se
assemelham. No entanto, por mais parecidos que possam ser esses dois territórios,
não existe uma política ambiental integrada e efetiva de conservação que possa
abarcar essa região do bioma.
O bioma Pampa é composto por ecossistemas naturais com alta diversidade de
espécies vegetais e animais. É formado por um mosaico de áreas campestres, matas
de galeria, areais, banhados (alagadiços), capões de mata nativa, morros
testemunhos, serras, áreas de recarga e/ou descarga de aquíferos subterrâneos, rios,
afloramentos rochosos, entre outras particularidades resultantes da combinação
geológica, climática e vegetal presente neste bioma. Deste mosaico resulta a
ocorrência de uma diversidade de espécies microbianas, vegetais e animais
associadas ao Pampa (PILLAR et. al, 2009).
No entanto, a sua conservação tem sido ameaçada pela conversão dos
campos em culturas anuais e pela degradação associada à invasão de espécies
exóticas e uso inadequado do solo. Entre os anos de 1970 e 2005, segundo Picolli e
Schnadelbach (2007), estima-se que 4,7 milhões de hectares de pastagens nativas do
bioma Pampa foram convertidos em outros usos agrícolas, como lavouras e
plantações de árvores exóticas. Da sua vegetação campestre e dos seus banhados
característicos, restam apenas 39%.
Achkar et al. (2006) expõe a situação do Uruguai frente ao cenário de avanço
das práticas de silvicultura, transformando brutalmente os sistemas agrícolas do pais
através de marcos legais:
El fomento de los monocultivos forestales se produjo a través de la
promulgación de la ley de promoción forestal el 28 de diciembre de 1987,
cuya finalidad principal fue convertir al Uruguay en un “país forestal”. A partir
de la fecha en que se reglamentó la ley hubo un notorio incremento de la
forestación bajo la modalidad de plantaciones en régimen de monocultivos
con espécies de rápido crecimiento y de alto requerimiento en el mercado
nacional e internacional.En los últimos dieciséis años la forestación ha sido la
actividad del sector primario de la economía com mayor impulso en el país,
abarcando 19.402 explotaciones y una superfície de 660.667 hectáreas y
convirtiendo a Uruguay en país forestal emergente en el escenario económico
global (Achkar et al. 2006, p. 222)
244
No Rio Grande do Sul, o avanço da silvicultura se apresenta da mesma forma
que no país vizinho. Em 2004, o governo do Estado do Rio Grande do Sul criou o
Programa de Financiamento Florestal Gaúcho “Proflora”, com o apoio do Banco
Nacional do Desenvolvimento Social – BNDES. A criação deste programa teve como
objetivo conceder financiamento para o plantio de monocultura de acácia negra, pinus
e eucaliptos no Estado (IBGE, 2010).
Em decorrência deste cenário, passa a ocorrer uma significativa mudança da
matriz produtiva do Pampa, passando da atividade pecuária nos campos a uma
intensa exploração silvícola, além do aumento das áreas de lavouras de soja e arroz,
descaracterizando o ambiente que há séculos se complementa com a figura do
homem pampeano. De tal modo, questões que envolvem o meio ambiente, as ações
do homem e a sustentabilidade tornaram-se algumas das maiores preocupações
atuais e, nessa perspectiva, surgem os questionamentos deste trabalho, como uma
possível proposta de Reserva da Biosfera do Pampa, com o propósito de tornar
sustentável a relação entre ser humano e natureza em áreas de relevância natural e
que ainda possuem suas características tradicionais, conservando o meio natural e
uma cultura tão importante, tentando quebrar, em síntese, o conceito de “ilhas
protegidas”, e promovendo, assim, a integração das Áreas Protegidas situadas na
região de fronteira entre Uruguai e Brasil.
OBJETIVOS
Analisar as Áreas Protegidas e demais locais destinados à conservação
localizados próximos à região de fronteira entre Brasil e Uruguai, pontuando
estratégias que possam integrar essas “ilhas protegidas”, pensando na manutenção
dos remanescentes do bioma Pampa.
METODOLOGIA
Para a execução deste trabalho, primeiramente, foi feito um levantamento das
áreas destinadas à conservação, e, que estejam localizadas na região de fronteira
entre Brasil e Uruguai. Posteriormente, foram elaborados os mapas, através dos
bancos de dados já dispostos pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), Secretaria do
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Sul, Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística e UdelaR, que demonstram a localização e forma de cada área
a ser protegida, bem como a descrição de suas características e as tipologias que as
compreendem.
DESENVOLVIMENTO
245
O Conceito de Áreas Protegidas adotado no Brasil, conforme se interpreta no
Plano Nacional de Áreas Protegidas (Decreto n° 5.758/2006), consiste em:
Áreas naturais e seminaturais definidas geograficamente, regulamentadas,
administradas e/ou manejadas com objetivos de conservação e uso
sustentável da biodiversidade. Enfoca prioritariamente o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação, as terras indígenas e os territórios quilombolas.
Sendo que as demais Áreas Protegidas, como as Áreas de Preservação
Permanente e as Reservas Legais são tratadas no planejamento da
paisagem, no âmbito da abordagem ecossistêmica, com uma função
estratégica de conectividade entre fragmentos naturais e as próprias Áreas
Protegidas (DELELIS; REHDER; CARDOSO, 2010, p. 25).
Portanto, as Áreas Protegidas brasileiras são regulamentadas pelo Código
Florestal (Lei nº 4.771/1965), pelo Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/1973), pelo Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Lei nº 9.985/2000) e Decreto nº
4.887/2003, que trata das terras ocupadas por remanescentes quilombolas. Neste
trabalho, o foco será dado para as Unidades de Conservação (UC), no lado brasileiro,
sendo estas definidas, segundo o SNUC:
Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas
jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído
pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob
regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas
de proteção (BRASIL, 2000).
Com a criação do SNUC, ficou definida a criação de 12 categorias de Unidades
de Conservação (UC), reunidas em dois grupos: Unidades de Proteção Integral e
Unidades de Uso Sustentável:
- Unidades de Proteção Integral: nesta categoria estão as UCs que possuem maior
restrição quanto ao uso dos recursos naturais, sendo o uso permitido apenas de forma
indireta. É o caso da Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional,
Monumento Natural e Refúgio da Vida Silvestre.
- Unidades de Uso Sustentável: objetivam integrar a conservação da natureza com o
uso sustentável dos recursos naturais. Nesta categoria se enquadram a Área de
Proteção Ambiental, Área de Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional,
Reserva Extrativista, Reserva da Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e a
Reserva Particular do Patrimônio Natural.
No Uruguai, as Áreas Protegidas equivalem, em síntese, as Unidades de
Conservação brasileiras, e estão sistematizadas no Sistema Nacional de Áreas
Protegidas (SNAP), através da Lei n° 17.234, promulgada em março de 2000, a qual
estabelece como:
Conjunto de áreas naturales del territorio nacional, continentales, insulares o
marinas, representativas de lós ecosistemas del país, que por sus valores
ambientales, históricos, culturales o paisajísticos singulares, merezcan ser
246
preservados como patrimonio de la nación, aun cuando éstas hubieran sido
transformadas parcialmente por acciones antrópicas (Ley 17.234, Uruguay).
As categorias de Áreas Protegidas que englobam o SNAP, estabelecidas na
Lei 17.234 são: Parque Nacional, Monumento Natural, Paisaje Protegido, Sitios de
Protección, Áreas de manejo de hábitats y/o especies, Área Protegida con recursos
manejados.
Deste modo, SNUC e SNAP dialogam no que tange seus objetivos de
conservação, todavia as tipologias que cada sistema adota são diferenciadas,
principalmente pela quantidade de categorias dispostas no SNUC. Independente das
peculiaridades de cada sistema, destaca-se a importância de políticas ambientais
como estas, principalmente para o contexto de degradação vivenciado pelo bioma
Pampa. As Áreas Protegidas localizadas próximas à região de fronteira entre Brasil e
Uruguai podem ser observadas na figura 01.
(1) Parque Estadual do Espinilho
Criado em 1975 e localizado no município de Barra do Quaraí, extremo
sudoeste do Rio Grande do Sul, na divisa com Uruguai e Argentina, o Parque que
contempla a categoria de proteção integral, possui uma área de 1.617,14 hectares,
abrigando uma vegetação que não ocorre em outra área do país, sendo caracterizada
pelo IBGE (1992) como savana estépica. Deste modo, o Parque é importante para a
conservação da formação vegetal única, além das várias espécies da fauna que estão
associadas a esse tipo de formação, e dependem dessa Unidade de Conservação
para a manutenção de suas populações (MASSIA, 2003).
(2) Reserva Biológica Estadual do Ibirapuitã
Localizada às margens do rio Ibirapuitã, no município de Alegrete, a Reserva
Biológica possui uso restrito, sendo, também, uma categoria de proteção integral. Na
área de aproximadamente 350 hectares, predominam os campos com espécies de
gramíneas e a presença esparsa de espinilhos, além de uma mata ciliar densa e
preservada (SIMAS et al. 2002). São ainda encontrados afloramentos de rocha onde
se destacam espécies de cactáceas.
(3) APA Federal do Ibirapuitã
A Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã integra as Unidades de
Conservação de Uso Sustentável, sendo permitido seu uso desde que de forma
sustentável. A APA possui uma extensão de 316.790,42 hectares e está localizada
nos municípios de Alegrete, Quaraí, Rosário do Sul e Santana do Livramento. A região
247
possui potenciais histórico-culturais, com atributos particulares, como prédios
centenários, além da grande riqueza da paisagem natural (SILVA, 2009). O desenho
dos limites da APA do Ibirapuitã foi pensado de forma a abrigar a porção superior da
Bacia Hidrográfica do Rio Ibirapuitã. Ela está localizada na fronteira internacional
Brasil-Uruguai, na região conhecida como Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, e
seu limite sul coincide com o limite internacional, não havendo acidentes geográficos
(rios, vales, etc.) e nem muros ou barreiras físicas separando-a do território uruguaio.
Figura 01 - Mapa das Áreas Protegidas no bioma Pampa, na Fronteira entre Brasil e Uruguai.
Elaboração: Franciele da Silva, 2015.
248
(4) RPPNs do município de Dom Pedrito e RPPN de Santa Vitória do Palmar
No município de Dom Pedrito estão localizadas três Reservas Particulares do
Patrimônio Natural (RPPN), e, apesar de estarem inseridas na tipologia de Unidade de
Conservação de uso sustentável, seu uso é restrito, objetivando, somente, a proteção
do meio. As três áreas possuem atributos de paisagens tipicamente do Pampa,
contemplando cursos d’água e áreas de mata ciliar, banhados e campos. São elas:
RPPN Reserva dos Mananciais, com uma área de 11 hectares; RPPN Fazenda
Caneleira, possuindo uma área de 45 hectares e; RPPN Fazenda Branquilho, com 13
hectares (SEUC, 2013).
Já a RPPN localizada no município de Santa Vitória do Palmar, denominada
Estância Santa Rita, possui uma área de 340 hectares, estando inserida em um
contexto de banhado, com a presença de cursos d´água e lagoas.
(5) Reserva Biológica Estadual Mato Grande
Já contemplando as áreas úmidas que integram o bioma Pampa, na porção sul
do Rio Grande do Sul, pode-se destacar a Reserva Biológica Mato Grosso. Integrando
a categoria de Proteção Integral, a Reserva foi criada com o objetivo de proteger áreas
úmidas presentes na região denominada Banhado do Mato Grande, abrigando
banhados, campos arenosos e matas de restinga. É de extrema importância para a
conservação, principalmente da avifauna associada aos ambientes alagados, sendo
local de espécies endêmicas do bioma Pampa, espécies ameaçadas de extinção e
aves migratórias do Hemisfério Norte e Hemisfério Sul (SEUC, 2013).
(6) ARIE Federal Pontal dos Latinos e Pontal do Santiago
Localizada no município de Santa Vitória do Palmar, a Área de Relevante
Interesse Ecológico (ARIE) é uma Unidade de Conservação de uso sustentável, com
uma área de 2.992,26 hectares. Foi criada em 5 de junho de 1984, objetivando
preservar uma região do bioma Pampa que contempla áreas de banhados e campos
em bom estado de conservação (ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, 2011).
(7) Estação Ecológica Federal do Taim
Unidade de Conservação de proteção integral, localizada ao sul do Rio Grande
do Sul, contemplando os municípios de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar, a
Estação Ecológica do Taim foi criada em 1979, com uma área de 34.038 hectares. A
Estação está situada numa faixa de terra entre o oceano Atlântico e a Lagoa Mirim,
originada pelo avanço e recuo do mar. Os banhados do Taim apresentam
ecossistemas diversificados e estão representados por praias lagunares e marinhas,
249
lagoas, campos, cordões de dunas, além dos próprios banhados. Sua finalidade é a
preservação de um grande viveiro natural de animais e plantas, sendo um importante
berçário de aves migratórias (ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, 2011).
(8) Rincón de Franquía
Rincón de Franquía pertence à tipologia de Área de Manejo de Hábitat e/ou
Espécies. Encontra-se ao norte da cidade de Bella Unión, departamento de Artigas, na
zona de confluência do rio Uruguai e rio Quaraí. Está ambientalmente inserida em um
contexto de alta naturalidade, incluindo o Parque Estadual do Espinilho e as áreas
úmidas de várzea, contendo matas ciliares que constituem uma das principais
riquezas de flora e fauna do local. Além disso, contempla bosques de espinilhos e
algumas lagoas valiosas para pesca, com diversidade de avifauna aquática (RÍOS E
ALDABE, 2012).
(9) Valle del Lunarejo
Compreende a categoria de Paisagem Protegida, em um território de 29.286
hectares, localizado no extremo noroeste do departamento de Rivera, próximo à divisa
entre Artigas e Salto e a zona conhecida como Rincón de Artigas, no limite contestado
com o Brasil. O Valle está cercado por vários cursos d’água, como o Arroio Lunarejo e
cerros com altitude superiores a 350 metros. Em 2009 foi incorporada ao SNAP
(UNESCO, 2013).
Além de seus atributos ambientais somam-se importantes valores históricos e
culturais, intimamente ligados às características do território, como construções de
pedra em bom estado de conservação do período das revoluções do Uruguai e Rio
Grande do Sul (UNESCO, 2013).
(10) Laureles-Cañas
Localizada no extremo norte do departamento de Tacuarembó e no noroeste
de Rivera, com 62.500 hectares, é uma das áreas mais extensas que se propõe para
ingressar no SNAP. Forma parte de uma região maior, as Quebradas del Norte, que
também inclui o Valle del Lunarejo. Distingue-se por uma paisagem única no país, que
inclui numerosas cascatas, cânions, paredões e uma exuberante vegetação,
possuindo, assim, grande potencial para o desenvolvimento do turismo de natureza.
O ingresso dessa área no SNAP permitirá proteger e promover uma superfície
de pradaria natural, a qual constitui a base do sistema produtivo da pecuária que
modela a paisagem e pertence à cultura regional que integra o patrimônio. Na área já
foram registradas quase 60 espécies de animais e plantas prioritárias para a
250
conservação em nível nacional, incluindo algumas que se consideram em extinção
(MINISTERIO DE GANADERÍA, AGRICULTURA Y PESA DEL URUGUAY).
(11) Paso Centurión
Paso Centurión encontra-se em processo de elaboração de sua proposta de
candidatura. Está localizada no departamento de Cerro Largo e se caracteriza por
apresentar espécies pouco comuns da fauna uruguaia. Seu processo de execução
está orientado a fomentar o ecoturismo e a valorização e recuperação de sítios de
interesse para biodiversidade.
(12) Parque Nacional San Miguel
O Parque Nacional de Reserva de fauna y flora San Miguel foi criado em 1937,
e integra o SNAP desde 2010. Está situado na região nordeste do departamento de
Rocha, próximo à fronteira entre Brasil e Uruguai, compreendendo uma área de 1.542
hectares. O Parque está situado principalmente sobre a serra de San Miguel, e, devido
a sua proximidade com a Estação Ecológica do Taim, suas características são muito
semelhantes, com a presença de banhados, cordões de areias e lagoas. Dentre seus
objetivos de conservação, além da manutenção da flora e fauna local, destaca-se a
preservação do patrimônio genético do gado crioulo selvagem, único local do Uruguai
que contempla sua presença, sendo, inclusive, protegido pela UNESCO. 300 cabeças
de gado crioulo se reproduzem livremente no Parque, preservando as mesmas
características que os primeiros que ali habitaram o local, no século XVII (LEZAMA E
ROSSADO, 2012).
Além das Áreas Protegidas propriamente ditas, amparadas pelos conceitos
descritos, existem também, na faixa de fronteira, a Reservas da Biosfera Bañados del
Este e Reserva da Biosfera Quebradas del Norte, no Uruguai, e as Áreas Prioritárias
para Conservação do bioma Pampa, no Rio Grande do Sul.
As Áreas Prioritárias para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de
Benefícios da Biodiversidade Brasileira, atualizadas em 2007, resultaram na
identificação de 105 áreas do bioma Pampa, destas, 41 (um total de 34.292 km2)
foram consideradas de importância biológica extremamente alta para a conservação
segundo o Programa RS Biodiversidade (2018).
Estes números contrastam com apenas 3,3% do bioma que encontra-se
protegido através de Unidades de Conservação (2,4% de uso sustentável e 0,9% de
proteção integral), com grande lacuna de representação das principais fisionomias de
vegetação nativa e de espécies ameaçadas de extinção da fauna e da flora. A criação
de Unidades de Conservação, a recuperação de áreas degradadas e a criação de
251
mosaicos e corredores ecológicos foram identificadas como as ações prioritárias para
a conservação, juntamente com a fiscalização e educação ambiental do bioma Pampa.
Figura 02 – Áreas Prioritárias e Reservas da Biosfera na região de fronteira Brasil-Uruguai.
Elaboração: Franciele da Silva
(1) Áreas Prioritárias para conservação no Rio Grande do Sul
(2) Reserva da Biosfera Quebradas del Norte
As
Reservas
da
Biosfera
são
zonas
de
ecossistemas
terrestres,
costeiros/marinhos, ou uma combinação de ambos, reconhecidas em âmbito
internacional, através do Programa Homem e Biosfera (MAB) da Organização das
Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura (UNESCO), desde 1976.
Conceitualmente, as Reservas da Biosfera constituem sítios destinados a demonstrar
enfoques da conservação e do desenvolvimento sustentável em escala regional
(JAEGER, 2005). Lino (2010) complementa que as Reservas referem-se a iniciativas
252
de gestão territorial tendo em vista “harmonizar a convivência entre o homem e seu
espaço vital”. O objetivo dessas reservas é proteger a diversidade biológica em
biorregiões
estratégicas
do
planeta,
conciliando
a
conservação
com
o
desenvolvimento, e promover o conhecimento científico sobre essas áreas.
Sob esse argumento, em 2014, a UNESCO reconheceu a área da Reserva da
Biosfera Quebradas del Norte, possuindo características únicas do ponto de vista
paisagístico, contemplando um mosaico de ecossistemas que fornecem habitat para
inúmeras espécies de flora e fauna. Na área da Reserva foram identificados 12
ambientes diferentes, dentre os quais se destacam ecossistemas típicos do Pampa,
com uma vasta diversidade de campos e matas galeria.(UNESCO, 2013). Sua zona
núcleo é representada pela Área Protegida Valle del Lunarejo, contemplando ainda
uma porção da Área Protegida Lauredes-Cañas, que aguarda ingresso no SNAP.
(3) Reserva da Biosfera Bañados del Este
Reconhecida pela UNESCO em 1976, a área da Reserva da Biosfera inclui em
seu território Monumento Histórico y Parque Nacional Fortaleza de Santa Teresa,
Parque Nacional y Reserva de Fauna y Flora de El Potrerillo de Santa Teresa,
Monumento Histórico y Parque Fuerte San Miguel, Refugio de Fauna Laguna Castillos,
Reserva Forestal de Cabo Polonio y Aguas Dulces, Monumento Natural de Dunas y
Costa Atlántica, Parque Nacional Lacustre de las Lagunas de Rocha y Garzón.
Possuindo uma extensão de 1.250.000 hectares, esta região compreende um
notável complexo de ecossistemas de alta diversidade biológica, abrigando refúgios de
aves migratórias e destacando áreas de banhados, cordões de dunas, complexos
lagunares e áreas litorâneas. Ainda dentro da Reserva pode-se encontrar uma vasta
área de palmares de butiá, em torno de 70.000 hectares, sendo a maior área do
planeta em extensão e quantidade de exemplares (PEZZANI, 2007).
Com base nas áreas destinadas a conservação que integram o bioma Pampa,
na região de fronteira entre Brasil e Uruguai, observa-se oportunidades para a
conservação integrada do bioma, principalmente na região de Artigas, Rivera, Santana
do Livramento, Quaraí e Barra do Quaraí, tendo em vista a pouca representatividade
destas áreas quanto as Áreas Protegidas e considerando a extrema importância e
prioridade que essas áreas apresentam para biodiversidade.
Deste modo, para manter a soberania de cada país, uma estratégia de
conservação integrada poderia ser a implantação de uma Reserva da Biosfera para o
bioma Pampa, que contemplasse tanto o território brasileiro, quanto o uruguaio. Assim,
conciliando áreas destinadas somente a preservação do ecossistema (equivalente às
zonas núcleo de uma Reserva, contemplando Áreas Protegidas de uso restrito) com
253
aquelas que oportunizem o desenvolvimento sustentável, privilegiando a cultura do
gaúcho e suas formas de desenvolvimento. Cria-se, dessa forma, uma proposta que
tenha por objetivo o desenvolvimento de um mosaico de Áreas Protegidas,
promovendo, assim, uma efetivação da conservação de remanescentes do bioma
Pampa brasileiro-uruguaio, não prevalecendo “ilhas de conservação”, bem como a
associação com áreas de desenvolvimento sustentável, onde não ocorra a inserção de
agronegócios e suas implicações no território.
CONCLUSÕES
Através da elaboração deste trabalho pretende-se despertar uma maior
percepção da necessidade de uma base cooperativa entre Brasil e Uruguai, tendo em
vista o contexto de degradação vivenciado nesses dois territórios. Deste modo,
através de diálogos e construções conjuntas de estratégias e metodologias focadas
nos remanescentes do bioma Pampa, pode-se chegar a resultados que permitam às
futuras gerações conhecerem e usufruírem das áreas de Pampa, imbricadas de
história e cultura de um povo tão importante para a constituição da figura do gaucho.
BIBLIOGRAFIA
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Modalidades de Colonialismo en el Cono Sur de América Latina.
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UNESCO. Reserva de la Biosfera Bioma Pampa Quebradas del Norte. Formulario
de propuesta de Reserva de Biosfera, 2013.
URUGUAY. Lei n° 17234, de 09 de março de 2000. Declara la criacion y gestion de
um Sistema Nacional de Areas Naturales Protegidas. Disponível em:
http://www.parlamento.gub.uy/leyes/AccesoTextoLey.asp?Ley=17234&Anchor. Acesso
em 02 de jul. 2015.
255
ÁREAS PROTEGIDAS BINACIONALES, ¿UNA NECESIDAD POSIBLE O
UNA REALIDAD INFRANQUEABLE?”
Prof. Maria del Rosario Bottino Bernardi
[email protected]
Resumen:
Las actividades antrópicas han llevado a la degradación o destrucción total de
ecosistemas. La preservación y protección de los ambientes naturales y sociales son
razones que llevan a proteger determinadas áreas de planeta, a lo que se ha previsto
la creación de una red de Áreas Naturales Protegidas (ANPs). Los ambientes
naturales no poseen límites, más allá de los que su propia dinámica lo establece; solo
los demarcados por la sociedad, como el límite entre dos Estados, como los que
establecen diferencias en la gestión de ambientes compartidos por esas entidades
políticas, con consecuencias para todos ellos, es necesaria e importante, la creación
de Áreas Protegidas Binacionales, y Áreas de Conservación Transfronterizas. En la
región fronteriza de Uruguay y Brasil, existen superficies susceptibles de formar parte
de áreas protegidas transfronterizas, las que se podrían crear tras consensuar entre
ambos Estados sobre la gestión de tales espacios, ya que las normativas, e incluso el
reconocimiento de qué debe ser un área a preservar, es diferente en estos dos países.
La realidad de frontera abierta entre Brasil y Uruguay, en parte del Departamento de
Rivera con el Municipio de Santana do Livramento, donde las actividades humanas, en
especial las económicas agropecuarias, son similares; plantea la necesidad de
conocer la viabilidad de creación de áreas binacionales transfronterizas entre ambos.
Para ello es necesario observar normativas y programas de gestión que establecen
estos países para áreas de protección, y buscar una posible armonización entre ellas,
con los grados de flexibilidad de las políticas sobre áreas protegidas. Solo se logrará
con una buena disposición y compromiso en diversos ámbitos: político, económico y
social, no solo apostando a la protección de la naturaleza, sino que junto a ello lograr
un desarrollo sustentable con la participación de los habitantes que en ella residen.
Palabras claves: Preservación – Protección transfronteriza – Normativas - Flexibilidad
INTRODUCCIÓN
Existen en el planeta multiplicidad de ambientes, formados por elementos bióticos,
abióticos y sociales, con diferentes complejidades, así como el conocimiento y la
información que se dispone de ellos también es diversa y variada. Esta multiplicidad
tiene, a su vez, diversas dimensiones espaciales y temporales. El sistema natural al
que pertenecen los ambientes, cambia en forma natural, obedeciendo leyes y ciclos
propios de la naturaleza. Cuando a ello se le agrega el factor antrópico, estos cambios
se aceleran o retardan y se agregan nuevos, con múltiples consecuencias que llevan
mayoritariamente a un proceso de deterioro del sistema. Las actividades antrópicas
han llevado a la degradación o destrucción total de ecosistemas, con alteraciones en
ciclos bioquímicos, cambios en el uso del suelo, contaminación de cursos fluviales; no
dejando de lado el consumo de los recursos naturales, que llegan a casi un 40% de la
producción primaria neta del globo. (Achkar et al 2010).
256
En las sociedades modernas son muchas las razones que llevan a proteger
determinadas áreas de planeta, en primer lugar siempre se cuentan las ecológicas y
las estéticas, pero a ellas se agregan las económicas, éticas, históricas, espirituales.
Para contrarrestar la acción antrópica, se ha previsto la creación de una red de Áreas
Naturales Protegidas (ANPs). Las causas que motivan la conservación y protección
pueden ser de diversa índole: protección de elementos naturales, de determinados
paisajes, de estilos de vida tradicionales. La preservación de la diversidad de la vida
nunca fue tan evidente como en la actualidad, cuando la presión social y económica
en especial, lleva al ambiente a un deterioro creciente. Esta presión se encuentra
asociada a políticas de desarrollo que siguen un modelo lineal de crecimiento
económico, el que ha fomentado el uso y la apropiación de recursos naturales en
forma insustentable.
Se considera Área Protegida a una determinada superficie susceptible de
conservación y protección. La Unión Internacional de Conservación Natural (UICN)
define a las áreas protegidas como: «Un espacio geográfico claramente definido,
reconocido, dedicado y gestionado, mediante medios legales u otros tipos de medios
eficaces para conseguir la conservación a largo plazo de la naturaleza y de sus
servicios ecosistémicos y sus valores culturales asociados» (Dudley, 2008).
Actualmente, alrededor de un 12% de la superficie del planeta tiene algún tipo de
protección, con diferentes grados de distribución. Mientras los gobiernos elaboran
proyectos para la conservación, existen a nivel global, regional y local Organizaciones
No Gubernamentales (ONGs) de carácter ecologista y que buscan implicar cada vez
más a la sociedad en la lucha conservacionista. Hoy hay más de cien mil ANPs, se las
asocia comúnmente a grandes superficies y que han sido poco modificadas por la
sociedad; pero esta visión está cambiando en los últimos veinte años, pasándose a
tener en cuenta comunidades humanas, con un carácter de preservación cultural y su
relación con la bioconservación. En 2003, en Durban, se amplía la concepción de la
áreas integrando estrategias de desarrollo sustentable y disminución de la pobreza
(Achkar et al, 2010). Junto a ello, se propone integrar las zonas aledañas a las áreas
protegidas, con enfoques novedosos de bajo impacto en el uso del suelo, como
turismo, ciudades, minería, energía y profundizar en la vinculación de estos territorios
con las áreas protegidas.
Según el Programa de las Naciones Unidas para el Medio Ambiente (PNUMA) en el
mundo existen diferentes categorías de áreas protegidas a distintas escalas: nacional,
subnacional y local. Además, en los últimos años, se crean áreas protegidas
binacionales. También se han desarrollado categorías reconocidas internacionalmente
(Reservas de Biosfera, Sitios de Patrimonio Mundial, Sitios Ramsar).
257
La UICN busca cumplir los siguientes objetivos:

Facilitar la planificación de áreas protegidas y de sistemas de áreas protegidas.

Mejorar la gestión de la información sobre áreas protegidas.

Ayudar a regular las actividades en áreas protegidas.
La UICN reconoce 5 grupos de áreas protegidas:

áreas de protección de flora y fauna,

parques nacionales

áreas de protección de recursos naturales,

reservas de la biósfera y

áreas de recreación urbana.
La UICN define seis categorías de manejo de las áreas protegidas:
CATEGORÍA
I
Protección estricta:
I.a
Reserva natural estricta.
I.b
OBJETIVO PRINCIPAL DE MANEJO
Investigación científica
Área natural silvestre.
Conservación de ecosistemas.
II
Parque nacional.
Protección de vida silvestre.
Recreación.
III
IV
Monumento natural.
Área de gestión de
hábitats/especies.
Conservación de rasgos naturales
específicos.
Manejo de ecosistemas y especies.
V
Paisaje terrestre/marino protegido.
Protección de paisajes y recreación.
VI
Área protegida con uso sostenible
Uso sostenible.
de los recursos naturales.
Existen variaciones en nombres locales de las categorías de manejo, como ser parque
natural se corresponde con parque nacional. No todos los países adoptan todas las
categorías; la de manejo más desarrollada en el mundo es el parque nacional.
Los ambientes naturales no poseen límites, más allá de los que su propia dinámica lo
establece; los demarcados por la sociedad, como el límite entre dos Estados,
establecen diferencias en la gestión de ambientes compartidos por esas entidades
políticas, con consecuencias para estos; la naturaleza no reconoce límites humanos.
Ante esto, es necesaria e importante, la creación de Áreas Protegidas Binacionales, y
Áreas de Conservación Transfronterizas. La diferencia entre ambas estriba en la
258
gestión de las mismas, en las primeras se reconoce una gestión compartida por los
Estados en que estas se encuentran; debiendo llegar a acuerdos, consensos,
responsabilidades compartidas, flexibilizando normativas.
La IUCN define un Área de Conservación Transfronteriza como: "Un área de tierra y/o
mar que traspasa uno o más límites entre países, unidades subnacionales como
provincias y regiones, áreas autónomas y/o áreas más allá de los límites de soberanía
nacional o jurisdicción, áreas manejadas cooperativamente legalmente o de otra
manera efectiva". Para ello es necesario conocer las normativas de ambos países
sobre el tema, para determinar su viabilidad. Las propuestas pueden ser varias y
diversas.
Las áreas de conservación transfronterizas son lindantes, pero pueden ser
gestionadas según las normativas que establece cada país. Como ejemplos la
Fraternidad compartida por Guatemala, Honduras y El Salvador; en Perú hay varios
ejemplos con sus países limítrofes, a excepción de Chile; y Paraguay puede formar el
área de conservación del Lago de la Represa de Itaipú, con Brasil.
Junto a áreas de protección compartidas, se establece el concepto de “Corredor de
conservación”, propuesto por la UICN, como corredores que tienden a unir áreas
protegidas, con la finalidad de ordenamiento territorial, de articular y de integrar áreas
protegidas, fortaleciendo los objetivos que se persiguen con las ANPs. Ejemplo:
Corredor Vilcabamba-Amboró (Perú-Bolivia).
Dentro de ejemplos de integración fronteriza se encuentran aquellas que son resultado
de una cooperación pacífica entre los Estados que integran, con algún grado de
coordinación o gestiones combinadas y de una cooperación pacífica. Se lo denominan
Parques para la Paz; el primer ejemplo lo constituye el Parque Internacional para la
Paz Waterton-Glacier, entre EUA y Canadá, en 1932.
OBJETIVOS:
General:

Conocer los grados de flexibilidad de las políticas sobre áreas protegidas en
Uruguay y en Brasil y las posibilidades de establecer criterios binacionales de
protección de ambientes transfronterizos significativos.
Específicos:

Indagar sobre la existencia de áreas protegidas transfronterizas a nivel mundial
y sus criterios de gestión.

Determinar la viabilidad de creación de áreas protegidas binacionales entre
Uruguay y Brasil en la región de frontera.

Identificar categorías de áreas protegidas binacionales para el sistema “Frente
de retroceso de la cuesta basáltica” (Quebradas del Norte en Uruguay).
259
MARCO METODOLÓGICO:
El problema de investigación que se plantea, se enmarca en la identificación e
interpretación de las normativas vigentes. Por lo tanto se propone una aproximación
metodológica deductiva y una investigación cualitativa.
Se tendrá en cuenta materiales bibliográficos (libros, artículos, páginas web), sobre la
temática de áreas protegidas, y en especial aquellas que hagan mención a las áreas
transfronterizas.
Búsqueda y análisis de normativas sobre áreas protegidas en Brasil y en Uruguay.
Comparación entre estas normativas.
Recolección y análisis de información sobre encuentros binacionales entre la
Universidad de la República (UdelaR), a través del Centro Universitario de Rivera
(CUR), y la Universidad Federal de Santa María, relacionados al tema a investigar.
Entrevistas abiertas a actores locales que se relacionan con el tema.
Sistematización de la información.
DESARROLLO:
LA POSIBILIDAD DE UNA PROTECCIÓN COMPARTIDA:
La posibilidad de crear áreas protegidas entre Uruguay y sus países limítrofes, pasa
por una coordinación en la gestión, en que se deberá ceder y aceptar pautas para la
construcción de normativas específicas para el mejor manejo de cada área en
particular.
Se podrán crear áreas protegidas en partes de la extensión de frontera formada por
Uruguay y Brasil, consensuando y aunando criterios. Pero asumiendo que la evolución
que han seguido ambos países en la creación de áreas protegidas y en la
caracterización de las mismas, ha sido distinta. Se deben comparar categorías y
gestiones para aunar criterios de protección.
Se pueden citar múltiples ejemplos de modificación del ambiente, que no son
exclusivas de uno de los países, sino que su continuidad se da a través de la frontera,
siendo la conformación de áreas protegidas binacionales, la posible solución. Tales
ejemplos pueden ser: la intensificación de monocultivos o desarrollo de actividades de
megaminería.
En nuestro país, la creación de la primera área protegida, data de 1916, Ley N° 1492,
se crea el Parque Nacional, posteriormente denominado Franklin D. Roosvelt, con
fines recreativos. Se avanzó muy lentamente en el tema áreas protegidas. Hace pocos
años se creó el Sistema Nacional de Áreas Protegidas (SNAP), en el año 2000.
260
En Brasil, con una gran superficie y diversidad de ecosistemas, las “unidades de
conservación”, denominación dada a las áreas protegidas, han tenido un desarrollo
territorial importante, siendo una herramienta de gestión ambiental y de política
internacional. Las unidades de conservación son protegidas por ley, son bienes
comunes, públicos, que tienen una determinada función y utilidad en el mantenimiento
del equilibrio ambiental y en el bienestar de la sociedad. Pueden localizarse en áreas
públicas o privadas, federales, estaduales o municipales. Según las actividades
antrópicas en ellas, en Brasil se dividen en dos grandes grupos:

Unidades de protección integral.

Unidades de uso sustentable.
En las primeras se busca la preservación de la naturaleza, mientras que en las otras
se busca compatibilizar conservación con uso sustentable de parte de los recursos
que allí existen.
La Reserva Forestal del Territorio del Acre puede ser considerada como la primera
área protegida de Brasil, creada en 1911, aunque no perduró. Sí se toma como la
primera unidad de conservación al parque Nacional de Itatiaia, creado por Decreto
Federal N° 1.713 en 1937, entre los Estados de Río de Janeiro y Minas Gerais, con un
área de 120Km2, dentro del devastado sistema de la Mata Atlántica. En el año 2000 el
Sistema Nacional de Unidades de Conservación (SNUC). Brasil cuenta con el 25% de
su territorio bajo distintos niveles de protección siendo unidades federales, estaduales
y tierras indígenas.
La gestión uruguaya: En el Artículo 1° de la Ley 17.234, se indica que el SNAP tiene
por finalidad “armonizar los criterios de planificación y manejo de las áreas a proteger,
bajo categorías determinadas, con una regulación única que fije las pautas de
ordenamiento”.
En el Artículo 3° de la Ley 17.234, mediante la cual se crea en Uruguay el Sistema
Nacional de Áreas Protegidas, S.N.A.P., en el año 2000, se establecen las categorías
de definición y manejo de las áreas. Cada área protegida, posee un Plan de Manejo, el
que indica cuáles son las actividades, productivas, recreativas, etc., que se puedan
realizar allí; elaboradas en consenso entre técnicos y pobladores de ese espacio. El
Plan de Manejo rige la preservación de las poblaciones locales, de las especies de
flora y/o fauna, del agua, de los suelos, de formaciones geológicas y geomorfológicas
relevantes, regula las actividades recreativas del área, la explotación racional y
sustentable de los recursos. (En Brasil, cada AP deber tener un Plan de Manejo,
aunque no todas lo poseen).
Las áreas protegidas en Uruguay son gestionadas por el Ministerio de Vivienda y
Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente, a través de la Di.Na.M.A. (Dirección
261
Nacional de Medio Ambiente), junto a ellos participan algunas organizaciones públicas
y privadas, y sectores sociales involucrados. El control directo dentro del lugar es
llevado a cabo por el guardaparques. La primera zona que ingresó al SNAP fue la
Quebrada de los Cuervos, en el departamento de Treinta y Tres, en el año 2008, en la
categoría “Paisaje protegido”. Las últimas a incorporarse fueron el área Rincón de
Franquía, en Abril de 2013, en la categoría de “Área de manejo de hábitat y/o
especies”, localizada en la desembocadura del río Cuareim en el río Uruguay, en el
departamento de Artigas; y las Grutas del Palacio, en el departamento de Flores, en
Mayo de 2013, en la categoría de Monumento Natural.
El siguiente cuadro muestra categorías y manejo de áreas protegidas para Uruguay,
según la Ley 17.234, aprobada en el año 2000.
CATEGORÍAS DE DEFINICIÓN Y MANEJO DE LAS ÁREAS QUE
INTEGRAN EL S.N.A.P.
Áreas donde existen uno o varios ecosistemas que no
se encuentran significativamente alterados por la
PARQUE
explotación y ocupación humana; flora y fauna, sitios
NACIONAL
geomorfológicos y hábitats que presentan un especial
interés científico, educacional y recreativo, o
comprenden paisajes naturales de gran belleza.
EJEMPLOS
P. Nacional
Esteros de
Farrapos;
Cabo
Polonio.
Áreas que contienen uno o varios elementos naturales
específicos de gran importancia nacional, como una
MONUMENTO
formación geológica, sitios naturales únicos, especies,
Grutas del
NATURAL
hábitats, que podrían estar amenazados. La
Palacio.
intervención humana será escasa y estará bajo estricto
control.
Área territorial continental o marina, en cual las
interacciones del ser humano y la naturaleza, a lo
PAISAJE
largo de los años, han resultado en una zona de
PROTEGIDO
características definidas, de singular belleza, o con
valor de testimonio natural, y que podrá contener
valores culturales o ecológicos.
Valle del
Lunarejo,
Quebrada
de los
Cuervos.
262
Áreas relativamente pequeñas que contienen un valor
crítico, porque poseen especies o grupos
SITIOS DE
PROTECCIÓN
poblacionales relevantes de flora y fauna, y en ellas se
cumplen etapas claves del ciclo biológico de las
especies, tienen gran importancia para el ecosistema
que integran, contienen manifestaciones geológicas,
geomorfológicas o arqueológicas relevantes.
ÁREAS DE
Áreas terrestres o marinas, sujetas a intervención
Cerro
MANEJO DE
activa con fines de manejo, para garantizar el
Verde.
HÁBITAT Y/O
mantenimiento del hábitat y/o satisfacer las
Rincón de
ESPECIES
necesidades de determinadas especies.
Franquía.
Son espacios que contienen predominantemente
ÁREAS
sistemas naturales no modificados, que es objeto de
PROTEGIDAS
actividades de manejo para garantizar la protección y
CON
el mantenimiento de la diversidad biológica a largo
RECURSOS
plazo, y proporcionar un flujo sostenible de productos
MANEJADOS
naturales y servicios para satisfacer las necesidades
de la comunidad.
En el país no hay aún una completa representatividad de la diversidad natural
del territorio en las áreas protegidas, como las praderas naturales, los ecosistemas
oceánicos y de estuarios. Junto a esto, se debe mencionar que falta un mayor
compromiso de la sociedad en la protección y conservación de la naturaleza. Hace
parte de las políticas públicas la articulación entre conservación y uso productivo, pero
también debería hacer parte de políticas privadas.
La gestión brasileña: En Brasil, el Sistema Nacional de Unidades de
Conservación (SNUC), es el conjunto de Unidades de Conservación (UC) federales,
estaduales y municipales, creado por la Ley N° 9.985 /2000.
La Ley que da origen al SNUC busca contemplar la conservación de la
biodiversidad genética, de especies y de ecosistemas, así como garantizar el uso
sustentable de los recursos naturales, fomentar la participación de la sociedad y lograr
la distribución equitativa de los beneficios obtenidos de la creación, implementación y
gestión de Unidades de Conservación.
Está constituido por doce categorías diferenciadas en su forma de protección y
de usos permitidos, divididos en dos grupos: grupo de unidad de conservación de
protección integral, con cinco categorías, y el grupo de unidad de conservación de uso
sostenible, con siete categorías.
263
El siguiente cuadro muestra categorías y manejo de las UC:
GRUPO DE
CATEGORÍA
MANEJO
DE MANEJO
Estación
Ecológica
Reserva
Biológica
OBJETIVOS
N° DE
ÁREAS
Preservar la naturaleza y
realizar investigaciones
EJEMPLO
Estación
95
Ecológica do
científicas.
Taím
Preservar la biota y los
Reserva
demás elementos naturales
57
existentes en el área.
biológica das
Araucárias
Preservar ecosistemas
naturales de relevancia
ecológica y belleza
UNIDADES
Parque
escénica, investigaciones
Nacional
científicas, actividades de
DE
educación e interpretación
PROTECCIÓN
ambiental, recreación y
INTEGRAL
turismo ecológico.
Monumento
Natural
Parque
338
Iguazú
Preservar sitios naturales
raros, singulares o de gran
Nacional do
38
belleza escénica.
Gruta do
Lago Azul
Proteger ambientes
Refugio de Vida
Silvestre
naturales para asegurar
Refugio de
condiciones para la
Vida
existencia y reproducción
30
Silvestre
de especies o comunidades
Campos de
de flora y fauna residente o
Palmas
migratoria.
Proteger la diversidad
Área de
Protección
Ambiental
biológica, disciplinar el
proceso de ocupación y
asegurar la sostenibilidad
APA de la
271
del uso de los recursos
Bahía de
Todos los
Santos
naturales.
UNIDADES
Área de
Mantener ecosistemas
Relevante
naturales de importancia
47
ARIE do
Guará
264
DE USO
Interés
regional o local, y regular el
SOSTENIBLE
Ecológico
uso permitido de estas
áreas. Por lo general son
de pequeña extensión, y
con poca o ninguna
ocupación humana.
Bosque
Nacional
Áreas con uso sostenible
de los recursos forestales e
103
investigación científica.
Floresta do
Araguaia
Protección de los medios
de vida y la cultura de
poblaciones extractivistas
Reserva
tradicionales, de agricultura
Extractivista
de subsistencia,
Reserva
87
asegurando el uso
extractivista
Chapada
Limpa
sostenible de los recursos
naturales
Área natural con
poblaciones nativas,
terrestres o acuáticas,
Reserva de
Fauna
residentes o migratorias,
adecuadas para estudios
0
----
técnico-científicos sobre
manejo económico
sostenible de los recursos
faunísticos.
Área natural con
poblaciones tradicionales,
que basan su existencia en
Reserva de
Desarrollo
Sostenible
Reserva de
sistemas sostenibles de
explotación de los recursos
naturales, y que
desempeñan un rol
fundamental en la
Desarrollo
33
Sostenible
del Río
Madeira
protección de la naturaleza
y en el mantenimiento de la
265
diversidad biológica.
Área privada con el objetivo
de conservar la diversidad
biológica, donde se puede
Reserva
Reserva
realizar investigación
Particular del
Particular de
científica, visitas turísticas,
Patrimonio
recreativas y educativas.
Natural
Son creadas por iniciativas
Pedra da
del propietario, y puede
Águia
681
Patrimonio
Natural
obtener apoyo del SNUC en
su gestión.
Según la tenencia de la tierra el SNUC permite una ocupación y explotación de las UC
que se pueden agrupar de la siguiente forma:
UNIDADES DE CONSERVACIÓN
TENENCIA DE LA TIERRA

Estación Ecológica

Reserva Biológica
Son de dominio público y no se permite la

Parque Nacional
presencia de poblaciones humanas, si las

Reserva de Fauna
hay deben ser reasentadas.

Bosque Nacional

Reservas Extractivistas

Reservas de Desarrollo Sostenible
De dominio público, pero pueden ser
habitadas y sus recursos pueden ser
explotados por poblaciones locales.
Pueden poseer áreas privadas en su

Monumento Natural
interior, pero los usos privados deben ser

Reserva de Vida Silvestre
compatibles con el poder público, sino
serán desapropiados por dicho poder.

Área de Protección Ambiental

Área
de
Relevante
Interés Son tierras públicas y privadas
Ecológico

Reservas
Patrimonio Natural
Particulares
de
Son áreas privadas.
266
Cerca de 1.100.000 Km² se encuentra protegida como “Tierras Indígenas”, pero las
mismas no se encuentran dentro del SNUC, sino que son gestionadas por la
Fundación Nacional del Indio (FUNAI). Están incluidas dentro de las estrategias de
conservación, y son reconocidas por el Estado como áreas protegidas.
El SNUC propone que después de ser creada una UC, se debe elaborar un plan de
manejo, en función de los objetivos generales por lo cual se creó esa unidad. El Plan
de Manejo establece las normativas, las restricciones, las acciones a desarrollar, el
manejo de los recursos dentro de cada unidad, según las características de las
mismas, y deben abarcar el área de la unidad, su zona de amortiguación (Buffer zone),
y los corredores ecológicos de los que hagan parte. Se denomina Corredores
Ecológicos a las áreas Corredor Central de la Mata Atlántica, de 12,5 millones de
hectáreas, y al Corredor Central de la Amazonia, con más de 52 millones de
hectáreas; abarcan UC de diferentes categorías de manejo, tierras indígenas y áreas
de intersticio, sometidas a diferentes formas de uso de la tierra.
El PNAP (Plan Nacional de Áreas Protegidas) ha innovado al incluir a las UC, las
tierras indígenas y las tierras de las comunidades remanentes de quilombos, como
partes de la política de conservación de la biodiversidad brasileña.
En números, Uruguay cuenta con 21 áreas protegidas, correspondientes a un 1,6%
del territorio, incluyen sierras, ríos, pastizales, humedales, montes, quebradas, costas,
islas, áreas marinas, incluyéndose los valores culturales que se encuentran asociadas.
El Catastro Nacional del SNUC, con fecha de Agosto de 2013 registra en Brasil
1781UC, correspondientes a 1,5 millones de Km², las que pueden ser admiminstradas
por municipios, estados o la Unión Federal en todas las categorías. La última UC
creada el 20 de Junio de 2012, fue el Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais,
en Paraná, el que puede ser usado para actividades como turismo, extractivismo o
agricultura.
887 UC son federales, de las que 828 son áreas terrestres y 59 marítimas. Son
gestionadas por el Instituto Chico Méndes de Conservación de la Biodiversidad
(ICMBio), creado en 2007 y vinculado al Ministerio del Medio Ambiente e integra el
Sistema Nacional del Medio Ambiente (Sisnama). El ICMBio ejecuta las acciones del
SNUC, proponiendo, gestionando, protegiendo, fiscalizando, monitoreando las UC
federales, ejerciendo el rol de policía ambiental, además de investigar, preservar y
conservar la biodiversidad.
735 UC son estaduales, de las que 683 son áreas terrestres y 52 marítimas.
159 gestión municipal, de las que 146 son áreas terrestres y 13 marítimas.
267
Según el Ministerio del Medio Ambiente, en la útlima década, Brasil ha creado
alrededor de 700.000 Km² de áreas protegidas, ubicándolo como primero en la
creación de las mismas a nivel global.
La posibilidad de establecer AP binacionales entre Uruguay y Brasil, se debe dar
no solo en la categoría de gestión, sino que pasa por la gestión misma de las áreas.
Los organismos de gestión de ambos países difieren también en cantidad y en
funciones. (Organigramas)
En Uruguay, la Ley 17.234, creadora del SNAP, establece que es el Poder Ejecutivo el
que fija la política nacional para las áreas de protección, a través del Ministerio de
Vivienda, Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente (MVOTMA) que formula, ejecuta,
supervisa y evalúa las políticas al respecto, mediante un órgano específico para ello, la
Dirección Nacional de Medio Ambiente (DINAMA.). La administración de las áreas en
específico, pueden ser realizadas por otros organismos o personas públicas o
privadas. Al MVOTMA lo orienta la Comisión Nacional Asesora de Áreas Protegidas,
integrada por delegados del Poder Ejecutivo, de las intendencias departamentales, de
la UdelaR, de ANEP, y de organizaciones representativas de productores rurales y de
ONGs ambientalistas. A su vez, cada área protegida posee una Comisión Asesora,
con delegados de los distintos actores involucrados, públicos y privados. La DINAMA,
cuenta con una Unidad Ejecutora que asegura la coordinación entre las instituciones
públicas: MVOTMA, MGAP (Ministerio de Ganadería, Agricultura y Pesca), el MTD
(Ministerio de Turismo y Deporte), el PROBIDES (Programa de Conservación de la
Biodiversidad y Desarrollo Sustentable en los Bañados del Este) y el PPD (Programa
Pequeñas Donaciones).
En Brasil la gestión de áreas protegidas posee más figuras que en Uruguay, ya que
además del gobierno central, de los estados federales, de los municipios, de
fundaciones instituidas por el Poder Ejecutivo, hay fundaciones formadas desde el
Ejecutivo, que se encargan de la protección y evolución de la calidad ambiental. En
primer lugar desde el Ejecutivo, Brasil posee un Ministerio del Ambiente, que en
Uruguay posee además otros cometidos; el Ministerio es el que formula, ejecuta,
coordina, supervisa, controla las políticas nacionales ambientales, y es la figura central
del Sistema Nacional del Medio Ambiente (SISNAMA). Parte de él lo integra un
Consejo de Gobierno, que cumple iguales cometidos que la Comisión Nacional
Asesora de Áreas Protegidas en Uruguay; el Consejo Nacional del Medio Ambiente
(CONAMA), el que asesora en las políticas para el ambiente al Consejo de Gobierno y
al SNUC y es su instancia superior, comparable a la DINAMA. La figura del SISNAMA
no posee igualdad en la gestión ambiental de Uruguay. Órganos ejecutores lo
constituyen: el Instituto Brasileño del Medio Ambiente y de los Recursos Naturales
268
Renovables (IBAMA), el Instituto Chico Mendes de Conservación de la Biodiversidad
(ICMBio). Vinculados al Ministerio del Ambiente, hay otras instituciones no vinculadas
directamente al SISNAMA, pero que por sus actividades se relacionan con él, como el
Instituto de Investigaciones del Jardín Botánico de Río de Janeiro, y la Agencia
Nacional de Aguas (ANA).
A su vez, en los estados federales, en los municipios, en el Distrito Federal, hay
órganos ejecutores de políticas ambientales, en sus respectivas áreas. Hay además
Consejos Estaduales y Municipales de Medio Ambiente, con atribuciones en lo
ambiental específicos de cada estado o municipio.
El conjunto de las unidades de preservación en Brasil, lo constituye el SNUC,
comparable al SNAP de Uruguay, con diferencias en categorías de áreas de
protección. Las unidades de conservación poseen, a su vez, Consejos consultivos, con
representantes de órganos públicos, de organizaciones civiles y de los habitantes del
área protegida. Estos Consejos cumplen la función que poseen en Uruguay la
Comisión Asesora dentro de cada área.
Organigrama de las formas adoptadas para la gestión ambiental en Uruguay y
en Brasil:
Uruguay:
MVOTMA
Órgano ejecutor
DINAMA
Integra
Unidad Ejecutora
Comisión Asesora
de Áreas Protegidas
SNAP
269
SISNAMA de Brasil:
MINISTERIO DEL AMBIENTE
CONAMA
Órganos Ejecutores
ICMBio
IBAMA
Órg. estaduales
y municipales
SNUC
Como se observa en la comparación de ambos sistemas de gestión ambiental, las
formas que adquieren las mismas se ven determinadas por las unidades planificadoras
y de ejecución de los planes, junto a ello por las organizaciones no gubernamentales,
en su libertad de acción mayor o menor y en su injerencia en las mismas.
Los objetivos que se proponen con la creación del SNAP y del SNUC comparten
algunas características, pero difieren en otras, como lo muestra el siguiente cuadro:
OBJETIVOS
SNAP
SNUC
Compartidos
•
Proteger ecosistemas, fauna y flora nativas, geología, geomorfología
relevante, paisajes naturales y culturales.

Promover investigación científica, educación ambiental y monitoreo de áreas
de protección.

Fomentar un turismo responsable en las áreas permitidas.

Contribuir a una explotación sustentable de los recursos en áreas habitadas.
270
No compartidos
•
Evitar deterioro de cuencas 
Recuperar
y
restaurar
ecosistemas
hidrográficas y asegurar la calidad degradados.
y cantidad de las aguas.

Proporcionar medios e incentivos para
actividades
de
investigación,
estudios
y
monitoreo ambiental.

Valorizar económica y socialmente la
diversidad biológica.

Proteger
los
recursos
naturales
necesarios para la sobrevivencia de poblaciones
tradicionales, respetando y valorizando sus
conocimientos y su cultura y promoviéndolas
social y económicamente.
En la frontera Uruguay-Brasil, se encuentran tres unidades de conservación
brasileñas, dos de ellas son federales y una estadual, al Área Protegida del Río
Ibirapuitá, la Estación Ecológica del Taím y el Parque Estadual do Espinilho,
respectivamente; mientras la primera es la única que llega al límite entre los dos
países, las dos últimas se encuentran en la región fronteriza.
El Área de Protección Ambiental del río Ibiratpuitá, al suroeste del Estado de Río
Grande del Sur, fue creada el 20 de Mayo de 1992 mediante el Decreto Federal
N°529. Abarca un área de 318.767 has en los municipios de Alegrete (15,22%), Quaraí
(12,22%), Rosario do Sul (15,75%) y Santana do Livramento (56,81%). Los objetivos
de su creación son preservar la biodiversidad y los recursos hídricos y edáficos en los
ecosistemas originales remanentes de vegetación herbácea y arbustiva; junto a ellos
también se busca mejorar la calidad de vida de las poblaciones humanas allí
existentes, desarrollar programas de educación ambiental y de investigación científica,
fomentar el turismo y preservar las tradiciones.
Las áreas de protección que Uruguay posee en su región fronteriza con Brasil, son el
Parque Nacional de San Miguel, el Paisaje Protegido del valle del arroyo Lunarejo y el
Área de Protección del Rincón de Franquía .
En Uruguay, el valle del arroyo del Lunarejo fue creada como área protegida el 8 de
Octubre de 2009, situado al Oeste del departamento de Rivera, abarcando un área de
28.952 has de propiedad privada y del Instituto Nacional de Colonización, en la
categoría Paisaje Protegido. Con su creación se pretende que la interacción entre las
poblaciones humanas allí establecidas y la naturaleza del lugar resulte en beneficio
271
para ambos, con protección hacia los ecosistemas, la fauna y la flora, y el uso
sostenible de los recursos, transformando y mejorando la calidad de vida de sus
habitantes. El valle posee un alto valor paisajístico resultante de la interacción hombrenaturaleza, pero sumamente frágil, lo que lleva a promover su protección a través de
una labor conjunta con los habitantes del lugar, a través de proyectos de desarrollo
social, económico y cultural, en consonancia con la sostenibilidad.
Su situación fronteriza, sus características naturales y las actividades humanas
realizadas, tienen continuidad en el territorio brasileño. Son factores que llevan a
proponer la creación de un área binacional, integrada por el APA del Ibirapuitá en
Brasil y un área de mayor extensión del lado uruguayo, propuesta como Quebradas
del Norte. Del 10 al 13 de Junio de 2014, se desarrolló en Suecia, la vigesimosexta
Sesión del MAB (programa del Hombre y la Biosfera de la UNESCO), en la que se
aprobó la creación como reserva de la biosfera bioma pampa y Quebradas del Norte;
la última con abarcando una superficie desde el valle de los arroyos Laureles y Las
Cañas, en el departamento de Tacuarembó, hasta el Parque gran Bretaña, en el
departamento de Rivera, limítrofe con Brasil, con una dirección suroeste-noreste,
siguiendo la región de quebradas formadas por los cursos fluviales de estas cuencas
en el frente de retroceso de la cuesta basáltica y con un total de 110.843 hás.
El área binacional que se propone abarca una superficie de 420.000 hás.
aproximadamente, en el que se encuentran cascadas, paredones, cañones, y los
denominados “balcones” desde donde se obtienen amplias vistas de los valles, así
como una extensa y exuberante vegetación tropical y subtropical de quebradas
alternando con praderas, con numerosas especies de la flora y la fauna autóctonas a
conservar. En ella se desarrollan tradicionalmente actividades ganaderas extensivas,
las que mantienen a una población arraigada a un patrimonio cultural que se debe
amparar. A esto se agregan actividades económicas no tradicionales en la región,
como la forestación y el turismo natural, lo que reafirma una necesidad urgente de
planificación y de lograr un desarrollo sustentable. Las cuencas de los arroyos
Laureles, Las Cañas y Lunarejo son subcuencas del río Tacuarembó; nacen en el
sector oriental de la cuchilla de Haedo, siguiendo una dirección noroeste-sureste. Por
su parte, la cuenca del río Ibirapuitá, con numerosos afluentes, discurre en una
dirección sur-noroeste y pertenece a la cuenca del río Ibicuí.
La posibilidad de llevar adelante la creación de un área de protección ambiental
binacional, en el que la categoría de la misma sea igual a ambos lados del límite entre
ambos territorios, implica que la gestión se dé en forma semejante y que las
poblaciones que allí se asientan, compartan la voluntad de integrar el área y de
trabajar en forma sustentable. Las legislaciones de protección que los países adoptan
272
para gestionar sus espacios dependen de distintos factores, como ser: ¿cuál es la
categoría de manejo? ¿Qué objetivos se persiguen? ¿Qué tipo de protección se
establecerá? ¿Qué medios son necesarios para aplicarla?
En el establecimiento del APA del río Ibirapuitá, situada en la frontera con Uruguay, la
decisión de su establecimiento fue tomada por Brasil, sin consultar al Estado
uruguayo, en 1992. De igual forma las áreas que posee Uruguay en sus regiones
fronterizas con Brasil.
También se debe tener en cuenta que aún está muy arraigada la visión de las
fronteras como una región de seguridad, a la que se aplican normativas específicas.
La implementación de un área binacional entre Uruguay y Brasil debe articular ambos
sistemas de protección, a fin de salvar las diferencias en cuanto a la visión y misión de
la frontera y de un área de protección.
En el ámbito del MERCOSUR los países que lo integran, han buscado en los últimos
años generar políticas comunes dirigidas a la protección ambiental y al desarrollo
sostenible en la región. En Junio de 2001, los representantes del poder Ejecutivo de
los Estados que lo integran, aprobaron la Decisión N° 2/01 Acuerdo Marco sobre el
Medio Ambiente, en el que se propone la cooperación dentro del Bloque, intercambio
de información, de equipos técnicos y experiencias en áreas protegidas, así como la
implementación de acciones que profundicen en el tratamiento de problemas
ambientales, en la conservación de la biodiversidad, el uso sostenible de recursos y la
participación justa y equitativa de los beneficios que se deriven de los recursos
genéticos. Entre los objetivos propuestos se destaca la necesidad de desarrollar
mecanismos comunes de planificación de áreas con ecosistemas compartidos,
desarrollando planes conjuntos de protección, recuperación e incremento de biomas y
ecosistemas; aunque no se ha nombrado específicamente áreas binacionales, los
acuerdos establecidos, son base para la creación de las mismas.
En 2013 se realizaron encuentros44 entre actores públicos y privados de los municipios
que comprende el APA del Ibirapuitá y del PP del valle del Lunarejo, la que tuvo por
finalidad intensificar estudios y analizar el desarrollo socio-económico y una
explotación sustentable de los recursos naturales dentro de ambas áreas de
protección, como la explotación del acuífero Guaraní y la implementación de un
parque eólico, en parte ya en funcionamiento, desde la Villa Thomaz Albornoz, en
límite contestado entre ambos países, hasta el APA del Ibirapuitá. Si bien la reunión
significó un avance en cuanto a buscar una mayor integración ambiental, no se buscó
la creación de un área binacional.
44
El día 28 de Febrero de 2013, en el Núcleo de Estudios Fronterizos del Centro de Integración
del MERCOSUR/UFPel, en santana do Livramento.
273
La integración del área propuesta del Parque Natural de las Quebradas del Norte en
Uruguay y el APA del río Ibirapuitá en Brasil, se deben articular en lo posible dentro de
su categoría, creando un área de protección ambiental o un parque natural binacional.
Brasil
y Uruguay no poseen la figura Parque Natural dentro de las categorías
reconocidas por el SNUC y el SNAP, respectivamente; para ello deberán
compatibilizar sus objetivos de conservación, profundizando en los mismos, integrando
también a los habitantes de esas áreas. Ya la figura de Área de Protección Ambiental
es común a ambos sistemas, con objetivos similares. Se requiere como “conditio sine
qua non” encontrar la forma jurídica legal más adecuada, con un plan de manejo45
ambiental desarrollado por ambos.
El APA del Ibirapuitá no posee un plan de manejo aprobado, no siguiendo la normativa
del SNUC, aunque tuvo inicio su elaboración en 2011. Ya el área que comprende la
propuesta del Parque Natural Quebradas del Norte, en su porción dentro del
departamento de Rivera, fue aprobada en 2004 por la Junta Departamental, el plan de
manejo de la misma. Estas diferencias son obstáculos a superar para la conformación
del área transfronteriza propuesta.
Otra posible figura que podría adoptar el área binacional propuesta es la creación de
un Corredor de Protección Binacional, en el que se creara una categoría en que
ninguno de los dos sistemas de protección posee. Para ello se necesitan crear
normativas específicas y coordinadas entre los países.
El MAB ha solicitado al aprobar la reserva de la biosfera para Uruguay mapas más
detallados de la zonificación del área, la creación de un plan de gestión por un año, y,
en especial, considerar mayor coordinación con la Reserva de la Biosfera de la Mata
Atlántica de Brasil, existiendo potencial para crear una reserva de la biosfera
transfronteriza.
CONCLUSIONES
Cualquiera sea la categoría que se adopte para la conformación de un área binacional
protegida, se debe aunar criterios, esfuerzos, educación ambiental, preparación de
técnicos y en especial la colaboración de los pobladores del lugar, actores unidos
indefectiblemente al área a proteger, ya que sus acciones pueden ser benéficas o no
para
el
lugar.
Preservar
biomas,
recursos,
actividades
humanas
están
45
Un Plan de Manejo de un área es el documento técnico, que señala y regula el uso que se
debe hacer de la misma y el manejo de sus recursos naturales, Toma como base los objetivos
de creación del área, dividiéndola en zonas.
274
indisolublemente entrelazados, son los tres lados de un triángulo, que van a estar
presentes y posibilitar la vida, es una prioridad que no se puede postergar.
La formación
y consolidación de un área de protección ambiental binacional, se
logrará con una buena disposición y compromiso en diversos ámbitos: político,
económico y social, en el que no solo se apueste a la protección de la naturaleza, sino
que junto a ello lograr un desarrollo sustentable con la participación de los habitantes
que en ella residen.
Uruguay y Brasil disponen de espacios de protección en sus regiones de frontera, que
se podrían convertir en áreas binacionales. Para ello se deben aunar criterios y
normativas, delimitar una superficie a proteger que amplíe las que ya existen en sus
fronteras, logrando una contigüidad y adoptar una figura dentro de las categorías que
poseen, compartida por ambos sistemas de protección, o crear una nueva para
ambos. Deben haber acciones de desarrollo conjunto, así como también crear las
condiciones, las infraestructuras, preparar personal para guardaparques y de guías de
las áreas naturales.
La reciente creación de la reserva Quebradas del Norte, en Uruguay, tomando la ya
existente en el Valle del Lunarejo y creando nuevas con las cuencas de los arroyos
Laureles y Las Cañas, en el frente de retroceso de la cuesta basáltica, se puede
ampliar a una binacional, formando junto con el APA del río Ibirapuitá, en Brasil, una
superficie contigua, en la que las poblaciones humanas allí existentes sean partícipes
en su construcción y conservación.
¿Es posible ampliar la propuesta del Área de Protección Binacional anexando el
Rincón de Artigas, límite contestado entre Uruguay y Brasil? ¿Se debe resolver
primero la cuestión del límite contestado? ¿Podría crearse el Área de Protección
Binacional sin dejar de ser límite contestado? ¿Bajo qué normativas? Por ser un límite
contestado ¿Podría impedir la creación de un Área de Protección? ¿Hay antecedentes
en otras partes? La soberanía de Uruguay y Brasil ¿se vería afectada? ¿Cómo lo
perciben las personas que allí habitan?
Tenemos la obligación de salvaguardar los recursos que nos ofrece la naturaleza, la
que no conoce los límites entre los Estados. No importa el lado del límite en que
estemos, es la forma como usemos los recursos, la que nos afectará directa o
indirectamente. Es un derecho como seres humanos el disfrutar de la naturaleza,
somos parte de ella; debemos siempre tener presente que estamos de paso, y que la
herencia que dejamos será el presente y el futuro del planeta.
275
ANEXOS
1.
Fuente: http://www.mma.gob.cl/biodiversidad/1313/w3-propertyvalue-15607.html
276
2.
Mapa de áreas protegidas en las distintas etapas de desarrollo.
Fuente: Plan Ceibal
277
3.
ÁREAS PROTEGIDAS DE BRASIL
Fuente: IBGE. 2013
278
4.
Fuente: www.biodiversidade.rs.gov.br
279
5.
Áreas de protección en la región fronteriza Uruguay.Brasil, cercanas al límite.
6.
Fuente: Proyecto Quebradas del Norte. Diciembre 2012
Propuesta del Parque Nacional Quebradas del Norte
280
7.
8.
Cuenca del arroyo y área del Paisaje Protegido del valle del Lunarejo.
281
9.
Área de Protección Ambiental del río Ibirapuitá y parte de su cuenca.
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www.pnuma.org
283
COPROVÍNCIAS DO PAMPA URUGUAIO-SUL-RIO-GRANDENSE: UMA
PROPOSTA DE REGIONALIZAÇÃO
Jaciele Carine Sell - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
André Weissheimer de Borba - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Adriano Severo Figueiró - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo: Este trabalho apresenta uma proposta de regionalização do Pampa
Uruguaio-Sul-rio-grandense tendo como base as características geológicogeomorfológicas que compõem sua paisagem. As escalas de abordagem utilizadas
foram as de biorregião, ecorregião e ecoprovíncias. Através de uma compilação de
dados e interpretações de diversas pesquisas já realizadas, bem como de
observações de campo e de imagens de satélite, nota-se que a realidade paisagística
da região não condiz com a visão homogênea de pampa construída no imaginário
social da população. Como resultado, obteve-se uma compartimentação em cinco
ecoprovíncias que poderão auxiliar na busca de estratégias de conservação e manejo
mais adequadas à diversidade paisagística desta ecoregião: pampa dos matacões,
pampa serrano, pampa ondulado, pampa do espinilho e pampa das mesetas..
Palavras-chaves: Biorregião; Ecorregião; Ecoprovíncias; Pampa Uruguaio-Sul-riograndense.
Por uma outra concepção de identidade: a biorregião
Com menos de 1% de sua área protegida e mais de 80% de sua paisagem já
transformada por cultivos agrícolas, o Pampa demanda preocupações com questões
de conservação, de redução de impactos ambientais e de sustentabilidade da geo-biosociodiversidade. Conforme Figueiró (2012) “não são apenas as espécies que estão
desaparecendo, junto com elas desaparecem também as formas de patrimônio que
possuem estreita ligação com as comunidades bióticas ao longo da história: a
geodiversidade e a diversidade cultural”. Os habitats que sustentam as espécies
biológicas precisam ser considerados nas estratégias de conservação; novos
processos e métodos de conservação – que envolvam a complexidade das paisagens,
as comunidades, seus saberes, suas histórias e sua cultura – precisam ser pensados.
Uma das abordagens que melhor contemplam esta perspectiva é a do
biorregionalismo. De acordo com Martino (2004), o conceito oferece um novo olhar
sobre o território, pois permite incorporar aspectos sociais e econômicos ao contexto
ecológico, resultando em propostas de desenvolvimento econômico preocupadas com
a conservação do ambiente e com a melhoria da qualidade de vida das populações
locais.
284
O “regionalismo autônomo”, proposto por Gudynas (2002), se aproxima muito
da ideia de biorregionalismo, pois está baseado em questões de conservação e de
qualidade ambiental, de relações humanas e culturais em regiões geográficas
determinadas por atributos tanto ecológicos quanto culturais, econômicos e políticos
(GUDYNAS, 2002). Assim, um espaço geográfico relativamente homogêneo do ponto
de vista ecológico como é o pampa, somado à identidade cultural presente nos
gaúchos da Argentina, do Uruguai e do Rio Grande do Sul e a forma como esta
população ocupa e transforma seu espaço, nos leva à compreensão e individualização
de uma “Biorregião do Pampa”. Essa biorregião compartilha grandes características
fisionômicas e estas condicionam uma forma de uso e consequente uma cultura com
enorme grau de identidade em todo seu território, e é essa cultura projetada no espaço
que demarca as fronteiras da biorregião.
Dentro desta biorregião, Martino (2004) aponta a existência de seis grandes
unidades de paisagem que expressam, especialmente, os diferentes graus de
umidade e, consequentemente, a resultante ecológica destas diferenças dentro do
Pampa, definindo, portanto, as ecoregiões, aqui denominadas de: Pampa UruguaioSul-rio-grandense, Pampa Mesopotâmico, Pampa Inundável, Pampa Úmido, Pampa
Espinhento e Pampa Semi-árido. Dentre estas ecoregiões, o presente trabalho se
propõe a discutir e apresentar as heterogeneidades internas ligadas às variações
estruturais e à geodiversidade da primeira ecoregião referida, o Pampa Uruguaio-Sulrio-grandense. Tais diversidades representam a chave interpretativa para a definição
de ecoprovíncias no seu interior (Figura 01). Esta delimitação hierárquica é importante
porque auxilia na compreensão dos limites de resiliência e do potencial de atratividade
turística de cada ecoprovíncia. Cabe ainda reforçar que, apesar das diferenças
internas da ecorregião, os usos e a cultura são muito próximos ao de toda a
biorregião, tornando o recorte ecorregional ou mesmo o ecoprovincial possuidor de um
apelo muito mais ecológico-estrutural do que propriamente cultural, não no sentido de
exclusão, mas sim de complementaridade.
Por uma nova escala de conservação: a ecorregião
Na medida em que se avança na compreensão da necessidade de
conservação da natureza, avançam também os questionamentos sobre as melhores
estratégias a serem utilizadas. Novas formas de compreender o meio natural e outras
escalas de abordagem passam a ser pensadas. Uma das iniciativas que surgem para
subsidiar uma nova discussão sobre estratégias de conservação do patrimônio natural,
por exemplo, é a proposta de ecorregião. Na intenção de aprimorar o mapeamento da
285
biodiversidade, Olson et. al. (2001) propõem o uso desta terminologia e a definem
como uma grande unidade de terra ou água que contém uma mescla geograficamente
distinta de espécies, comunidades naturais e condições ambientais.
De acordo com os autores (op. cit.), os mapas existentes de biodiversidade
global têm sido ferramentas ineficazes para pensar a conservação, pois dividem a
Terra em unidades que desconsideram as associações de espécies e a história
geológica (como a forte influência das glaciações ou das pontes de terra do
Pleistoceno) sobre a distribuição de plantas e animais. Neste sentido, a proposição de
ecorregiões constitui uma nova maneira de espacializar a diversidade da vida na
Terra, colocando-se como alternativa ao conceito de Bioma, o qual, segundo
FIGUEIRÓ (2012), caracteriza-se pela absoluta ausência de qualquer referência às
formas de ocupação humana existentes dentro de cada um dos conjuntos naturais
delimitados, quando na verdade muitos têm o componente humano como definidor da
diversidade. De acordo com o autor (op. cit.),
Não podemos simplesmente aceitar que alguns milhares de anos
de desenvolvimento da sociedade humana em interação direta
com as comunidades vegetais e animais do planeta não tenham
resultado em estruturas e processos co-evolutivos entre umas e
outras. São as nossas geo-grafias humanas (marcas humanas
sobre a terra) entremeadas às estruturas naturais, tanto quanto as
geo-grafias da natureza têm condicionado nossas formas de
produzir, de viver e de sonhar (FIGUEIRÓ, 2012, p.66).
Este é o caso, de uma forma geral, da região do Pampa Uruguaio-Sul-riograndense que é representada no mapa dos biomas brasileiros e das ecorregiões
globais, como uma unidade homogênea. Em abordagens globais, continentais ou
mesmo nacionais, como as de Olson et al. (2001) ou de IBGE (2004), essa
homogeneidade do pampa uruguaio-sul-rio-grandense é compreensível, uma vez que,
na escala de maior abrangência, a área é dominantemente caracterizada por
vegetação rasteira e arbustiva em relevo suave ondulado com clima subtropical. No
entanto, em escala de maior detalhe, a suposta homogeneidade dessa extensa região
não se sustenta frente à realidade observada no campo, onde o que existe na prática
é uma
substancial diversidade paisagística
que expressa heterogeneidades
geológicas, geomorfológicas, de solo e de vegetação.
286
Figura 01: Ecoprovíncias do Pampa Uruguaio-Sul-rio-grandense. Proposta de regionalização
com base na geodiversidade e na sua influência sobre os aspectos ecológicos e paisagísticos.
Fonte: Elaborado pelos autores
Diante da necessidade de considerar as demais formas de diversidade e
também as diferentes formas de interação entre a sociedade e natureza, é de extrema
importância realizar um maior detalhamento desta ecorregião. Neste sentido, uma
nova proposta de divisão em ecoprovíncias46 será apresentada neste trabalho,
considerando as particularidades reais existentes, mas que se tornam invisíveis na
escala global.
Regionalização do Pampa uruguaio sul-rio-grandense: ecoprovíncias
Para obtenção dessa regionalização, inicialmente foram analisadas imagens de
satélite de diferentes sensores e composições, mapas geológicos do Rio Grande do
46
Compreende-se a ecoprovíncia como uma regionalização da ecorregião, caracterizada por
um padrão distinto de organização macro e mesoestrutural da paisagem, envolvendo relevo,
geologia, geomorfologia, solo e respostas bióticas.
287
Sul (CPRM, 2009) e do Uruguai (DINAMIGE, 1985), além de inúmeras publicações
com sínteses regionais de geologia (BOSSI e NAVARRO, 1991; CHEMALE Jr. et al.,
2000; HARTMANN et al., 2000), meio ambiente (ACHKAR et al., 2013; GUDYNAS e
EVIA, 2000; RIO GRANDE DO SUL, 2010; MMA, 2000 e 2007; PILLAR, 2009) e
fisionomia vegetal (HASENACK et al., 2010). Por fim, foram percorridos mais de 6 mil
quilômetros de rodovias e estradas vicinais no Rio Grande do Sul e no Uruguai,
tomando-se fotografias e informações relevantes sobre a geologia e o relevo do
pampa uruguaio-sul-rio-grandense.
Na construção dessa regionalização é preciso ponderar que Hasenack et al.
(2010) e Boldrini et al. (2011), com base em características fisionômicas e de
composição florística, já subdividem a área de abrangência do “Bioma Pampa”
(coincidindo com o Pampa Uruguaio-Sul-Rio-Grandense aqui analisado) em uma série
de sistemas ecológicos ou tipos de vegetação campestre, demonstrando apenas uma
das facetas da heterogeneidade da região analisada. No entanto, além da descrição e
regionalização tomando por base as formações vegetais, é preciso também aportar
uma série de subsídios da geodiversidade e da evolução geológica que, ao se
somarem
às
heterogeneidades
fisionômicas,
florísticas,
culturais,
sociais
e
econômicas irão auxiliar no sentido de uma nova regionalização ambiental e
paisagística para essa região. Pretende-se, com isso, que futuras iniciativas e
estratégias de conservação da natureza levem em consideração, também, as
heterogeneidades geológico-geomorfológicas e as características que elas emprestam
ao Pampa Uruguaio-Sul-Rio-Grandense.
A geodiversidade, interpretada como a diversidade geológica, geomorfológica,
edáfica e de recursos hídricos de uma determinada região ou território, possui
significativa influência sobre a distribuição de formações vegetais e ecossistemas, bem
como sobre a estruturação e manutenção de habitats para uma série de espécies de
fauna e flora, inclusive no condicionamento dos endemismos. Adicionalmente, a
geodiversidade influencia e, em certos casos, condiciona, os padrões de ocupação
humana, inclusive impondo sérios limites a essa, como nas áreas de alta declividade,
suscetíveis a movimentos de massa, e nas áreas marginais a cursos d’água,
suscetíveis a inundações. Ainda no que se refere à sociedade, a geodiversidade pode
inspirar os costumes, as lendas e as tradições, além de fornecer o material para as
construções históricas e determinar as vocações econômicas das comunidades, suas
culturas agrícolas, rebanhos e bens minerais. Diante disso, se optou em utilizar a
geodiversidade como critério balizador para a proposição desta regionalização na
escala das ecoprovíncias.
288
a) O Pampa dos Matacões
A primeira ecoprovíncia identificada com base nas características de
geodiversidade é a de cerros e planaltos graníticos com floresta estacional, paisagem
aqui denominada de Pampa dos Matacões, que se estende como uma faixa de cerca
de 300 quilômetros de extensão, com orientação NE-SO, desde os municípios de
Herval e Arroio Grande, no extremo sul gaúcho, até Encruzilhada do Sul e Porto
Alegre,
em
sua
terminação
norte/nordeste
(Figura
01).
Corresponde,
aproximadamente, à área mapeada como floresta estacional por Hasenack et al.
(2010), estendendo-se um pouco mais ao sul. Essa região possui como substrato
rochoso uma série de corpos ígneos plutônicos, de diferentes dimensões, compostos
por granitos e granodioritos diversos, reunidos sob a designação de Batólito Pelotas
(PHILLIP et al., 2000). Essas unidades ígneas foram formadas entre 630 e 550
milhões de anos, e registram as raízes de uma antiga cadeia de montanhas que se
estendia do sul do Uruguai até o norte do litoral catarinense, produzida pela colisão
entre os crátons La Plata e Kalahari.
A exposição desses corpos intrusivos à superfície, no entanto, produziu-se
somente a partir do Cretáceo, durante os processos de soerguimento relacionados à
quebra de Gondwana e à abertura do Oceano Atlântico sul. A relativa homogeneidade
do substrato (apenas rochas graníticas), somada ao caráter relativamente recente do
substancial soerguimento e da consequente exposição dessas rochas, faz com que
toda essa região seja uma área mais alta e plana, chegando aos 500 metros de
altitude. Esse fato tem levado diversos pesquisadores a propor designações
geomorfológicas como “planalto (uruguaio) sul-rio-grandense” (JUSTUS et al., 1986;
SUERTEGARAY et al., 2004). Mesmo dentro desta área soerguida, algumas
elevações se destacam ainda mais, por possuírem composições muito ácidas e
resistentes ao intemperismo diferencial, como os granitos da crista de Porto Alegre e
as elevações da serra do Herval.
As rochas graníticas dessa região afloram na forma de grandes concentrações
de matacões arredondados (Figura 2B), entremeados de floresta, como no Parque
Estadual do Podocarpus, em Encruzilhada do Sul, ou onde há presença do gado em
meio a pastagens nativas de baixa capacidade de suporte. A fisionomia originalmente
florestal pode até mesmo ser atestada pela toponímia nativa, uma vez que os
indígenas se referiam a essa região como caa-guaçú (“mato grande”), expressão que
foi adaptada para compor o nome de um dos maiores e mais populosos municípios da
região, Canguçu.
289
Ainda sobre a abrangência da vegetação florestal, é possível supor que
durante o último período interglacial (há aproximadamente 5 mil anos), quando o nível
do mar estava cerca de 5 metros mais alto que o atual (TOMAZELLI e VILLWOCK,
2000) e o litoral atlântico do Rio Grande do Sul se posicionava mais próximo à região
focalizada, essa floresta ocupasse uma área maior e estivesse conectada à floresta
atlântica da encosta do planalto meridional brasileiro, mais a norte.
b) O Pampa do Espinilho
A ecoprovíncia formada por planícies fluviais da bacia do rio Uruguai com
parque de espinilho, ou “pampa do espinilho” (Figura 01), coincide com as áreas cuja
vegetação original se constitui, além do estrato herbáceo campestre, de um estrato de
arvoretas esparsas (espinilho, algarrobo, inhanduvá, entre outras – Figura 2B),
bastante representativo no Uruguai, mas preservado no Rio Grande do Sul apenas no
Parque Estadual do Espinilho, em Barra do Quaraí e no Cerro do Jarau, em Quaraí.
Coincide com a área mapeada como campo com espinilho por Hasenack et al. (2010),
possuindo duas manchas principais, uma desde São Borja até a cidade de Salto, e
outra entre Paysandú e a porção noroeste do Departamento de Colonia,
principalmente acompanhando o trecho final do rio Negro. Corresponde, em território
argentino, à ecorregião do Pampa Espinhento, que bordeja a ecorregião do Pampa
Úmido. (BURKART et. al., 1999).
A principal característica geológica que permite a individualização dessas áreas
é o substrato sedimentar, formado por depósitos continentais, aluviais e coluviais,
acumulados desde o Paleógeno até o Quaternário (ou seja, nos últimos 35 milhões de
anos) sobre as rochas vulcânicas da Formação Serra Geral, acompanhando as
variações do nível do mar e seus reflexos sobre a mesopotâmia argentina e o estuário
do Prata, incluindo grandes transgressões marinhas. As unidades estratigráficas às
quais se vinculam tais depósitos recebem, no Uruguai, designações como Formación
Salto e Formación Fray Bentos (DINAMIGE, 1985), enquanto no Rio Grande do Sul há
referências a designações como Formação Touro Passo e aloformação Guterres (DAROSA, 2009). Grande parte dessa ecorregião é caracterizada por solos orgânicos de
alta fertilidade química (os chernossolos e argissolos), alguns ricos em carbonatos e
sais, desenvolvidos exatamente sobre os depósitos quaternários aluviais do rio
Uruguai e dos trechos finais de seus afluentes Butuí, Ibicuí, Quaraí/Cuareím, Arapey e
Negro.
290
Figura 02 – A – O pampa do espinilho – fisionomia de savana-parque, no Parque Estadual do
Espinilho, no município de Barra do Quaraí, RS; B – matacões arredondados de granito em
área campestre com pastejo de gado bovino, no município de Herval, RS.; C – Campos úmidos
típicos da ecoprovíncia do Pampa Ondulado.
Fonte: Trabalho de campo realizado em outubro de 2014.
c) O Pampa Ondulado
A ecoprovíncia de maior extensão dentro da área de estudo é aquela das
planícies e colinas onduladas com campos diversos, ou “pampa ondulado” (Figura
2C), que compreende a Depressão Central (ou Periférica) do Rio Grande do Sul, a
maior parte da fronteira oeste gaúcha e a Cuesta do Haedo, bem como os terrenos
cristalinos do cráton Rio de La Plata, no Uruguai. Em linhas gerais, compreende as
áreas mapeadas por Hasenack et al. (2010) como campo com flechilhas, campo de
solos rasos e campo misto de andropogôneas e compostas. Optou-se, aqui, por não
subdividir essa grande área que, ainda que possua importantes heterogeneidades
geológicas, guarda as características mais prontamente associadas ao Pampa pelo
público em geral, pois se considera que as características de geomorfologia e
fisionomia dependem muito menos do substrato geológico (geodiversidade) e muito
mais de fatores ligados ao clima, à evolução das vertentes, à sucessão ecológica em
si e à forma de ocupação humana.
d) O Pampa das Mesetas
A ecoprovíncia de cerros tabulares e areais com campos, ou “pampa das
mesetas”, estende-se como uma grande faixa de orientação norte-sul, com cerca de
291
300 quilômetros de comprimento e até 50 quilômetros de largura (Figura 1), desde a
cidade de Tacuarembó, no Uruguai, até Unistalda, próxima a Santiago, no Rio Grande
do Sul. Essa região guarda pouca correlação com as subdivisões propostas por
Hasenack et al. (2010), a não ser por sua porção mais ao norte, onde aqueles autores
mapearam o campo com areais. O substrato rochoso dessa região é formado pelas
diferentes camadas de rochas sedimentares avermelhadas do Permiano e do
Mesozóico, da chamada Bacia do Paraná, referidas na literatura pelas designações
estratigráficas Rosário do Sul, Pirambóia, Sanga do Cabral, Santa Maria, Guará e
Botucatu, estando por vezes recobertas por finas camadas de basaltos. As rochas
sedimentares citadas apresentam-se, de um modo geral, em camadas tabulares e
horizontais, com características variáveis de porosidade, permeabilidade e capacidade
de transmitir água. Além disso, algumas dessas rochas sedimentares são pouco
litificadas e muito friáveis, tornando-se suscetíveis ao intemperismo físico e químico.
Em termos de geomorfologia, o caráter tabular e horizontal das camadas levou
à formação de cerros dominantemente em forma de mesa (ou cerros chatos, em
castelhano), com desnível de até 200 metros e topos planos. As áreas da serra do
Caverá, em Rosário do Sul, do Cerro Palomas, em Santana do Livramento (Figura
3A), e dos Tres Cerros de Cuñapirú, a NE da cidade de Tacuarembó, são
emblemáticas desse caráter de “meseta”. Quando vistas em planta, tais elevações
podem se apresentar com formatos desde circular até retilíneo, muito alongado ou
recortado por fraturas, dependendo do controle tectônico. Ainda que a maior parte da
região seja caracterizada por vegetação rasteira, as faces sul e sudoeste desses
cerros tabulares, bem como os vales encaixados em fraturas, são ocupados por
formações arbustivas e, em certos locais, até mesmo florestais, ilustrando a
importância daquelas formas de relevo sobre a fisionomia.
Uma característica importante desta ecoprovíncia é o predomínio de neossolos,
quartzosos e muito rasos, pobres em nutrientes, em grande parte expostos à ação do
intemperismo físico (chuva e vento), formando as manchas de areia livre conhecidas
como areais (Figura 3B). Durante o último máximo glacial, há cerca de 18 mil anos,
supõe-se que tais areais tenham sido muito mais extensos (SUERTEGARAY e SILVA,
2009), constituindo hoje, juntamente com a presença marcante de cactáceas, um
registro importante dos climas mais frios e secos do passado. Além dos areais, a
região se destaca pela atuação de processos erosivos importantes, como ravinas e
voçorocas, em função tanto do uso inadequado da terra quanto dos contrastes
naturais de permeabilidade entre as diferentes camadas do solo e do subsolo. É
particularmente interessante que a região seja cortada e sirva como área fonte da
292
carga sedimentar do rio Ibicuí, palavra cujo significado em guarani remete ao “rio das
areias finas”.
e) O Pampa Serrano
A ecoprovíncia de serras e cerros cristalinos com mosaicos de campo-floresta
e formações arbustivas, ou “pampa serrano”, ocorre em duas áreas distintas: (1) uma
na porção ocidental do Escudo Sul-rio-grandense, englobando os municípios de
Caçapava do Sul, Lavras do Sul e Santana da Boa Vista, na região do Alto Camaquã;
e (2) a segunda entre os departamentos de Rocha, Maldonado e Lavalleja, no
leste/sudeste do Uruguai. Correspondem, aproximadamente, às áreas mapeadas por
Hasenack et al. (2010) como Campo arbustivo. A mais importante característica física,
compartilhada por ambas as áreas, é a elevada geodiversidade: rochas metamórficas,
como xistos, quartzitos, filitos, anfibolitos e mármores, com muitas estruturas
deformacionais, encontram-se intrudidas por corpos graníticos isolados (plútons como
os de Caçapava, Lavras, Jaguari, Capané, Carapé e Aiguá) e recobertas por
sucessões sedimentares antigas (como as Guaritas de Caçapava do Sul) e rochas
vulcânicas de diversas composições e idades (BORBA et al., 2013; PRECIOZZI et al.,
1993).
Essa significativa geodiversidade, com rochas de resistência variável ao
intemperismo químico e os soerguimentos ocorridos ao longo do Fanerozóico, levaram
à formação de um relevo irregular, com cerros e serras de forte declividade (Figura
3C). Além disso, os solos desenvolvidos sobre essas rochas são muito diversificados,
desde ausentes ou muito delgados, sobre granitos, quartzitos ou arenitos, até solos
profundos e bem estruturados sobre as rochas vulcânicas ou metamórficas mais ricas
em minerais ferromagnesianos. Por isso, nas Sierras de Rocha, nas Sierras de Minas
ou nas serras que compõem a parte mais alta da bacia hidrográfica do rio Camaquã, é
comum de se observarem, a poucos quilômetros de distância, cerros com grandes
matacões graníticos arredondados, vales fluviais de solo fértil, cristas de quartzito ou
xisto, cerros vulcânicos com disjunções colunares, ou ainda formas de relevo
ruiniformes (Figura 3D) produzidas sobre arenitos e conglomerados muito litificados.
Essa geodiversidade também implica em uma diversidade florística e fisionômica
maior, com gramíneas, leguminosas, arbustos, florestas de encosta e de galeria, além
da ocorrência notável de cactáceas e bromeliáceas.
293
Figura 3 – Destaques do pampa das mesetas: (A) o Cerro Palomas, em Santana do
Livramento, RS; (B) areais no município de Alegrete, RS, com vegetação muito esparsa; (C)
Feições destacadas do pampa serrano, as elevações da Sierra de Minas, no Departamento de
Lavalleja, Uruguai, desenvolvidas sobre rochas metamórficas de composições diversas; (D) a
Casa de Pedra, em Bagé, RS, composta por feições ruiniformes desenvolvidas sobre
conglomerados muito litificados;
Fonte: Trabalho de campo realizado em julho de 2014 (A, B, D) e janeiro de 2015 (C).
Considerações Finais
Com este trabalho, além de alertar sobre a necessidade de novas estratégias
de conservação da paisagem do pampa, objetivou-se demonstrar outras propostas de
regionalização e articulação do ambiente gaucho.
No anseio de diminuir o distanciamento entre sociedade e natureza, foi
proposto um zoneamento territorial a partir da perspectiva da biorregião – que parte
das características ecológicas mas que incorpora também as demais dimensões da
sociedade humana; um aprofundamento na compreensão da complexidade desta
biorregião, leva à delimitação de diferentes ecoregiões e, dentro destas, diferentes
ecoprovíncias.
Tais esforços, além de tentar desconstruir o imaginário de um pampa
monótono e homogêneo, presente em diferentes discursos e concepções, buscam dar
conta da complexidade deste território com elevada diversidade natural (bio e
294
geodiversidade) que, articulado com a cultura da população local, resulta em
paisagens singulares e ainda pouco estudadas e conservadas.
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296
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO GÊNERO FRAILEA BRITTON & ROSE
NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SANTA MARIA, RS.
Anabela Silveira de Oliveira Deble - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Luis Eduardo de Souza Robaina - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Romário Trentin - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
De importância ornamental, as fraileas são muito procuradas por horticultores e
colecionadores de cactos, o que leva as populações do gênero a sua redução e
posteriormente a quase extinção de algumas espécies. Este trabalho tem por
finalidade fazer um levantamento, bem como investigar a distribuição geográfica do
referido gênero na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria. Para o levantamento das
populações de Frailea foram identificadas imagens de afloramentos rochosos através
de geoprocessamento de imagens, Google Earth e da posição no local de estudo
através de GPS. As áreas identificadas foram visitadas para confirmação de
ocorrência das populações. A determinação das espécies foi baseada em descrições
originais, análise dos tipos, bem como em fotografias digitais disponíveis na rede
internacional de computadores (Internet) de holótipos de Herbários internacionais GDC (Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de Genève), P (Muséum National
d'Histoire Naturelle), K (Royal Botanic Gardens), NY (New York Botanic Garden), US
(Smithsonian Institution), além de fotótipos do F (Field Museum), acessados através
do Instituto Botánica Darwinion (SI – Buenos Aires) e consulta a estudos anteriores,
herbários, cactários e especialistas da família. Durante o levantamento foram
encontradas seis espécies do gênero entre as quais Frailea castanea, F. gracilima, F.
lepida, F. mammifera, F.pygmea e Frailea sp1. Na Bacia Hidrográfica do rio Santa
Maria as espécies do gênero Frailea foram encontradas em afloramentos areníticos e
devido ao seu hábitat muitos espécimes estão vulneráveis a extinção em função de
empreendimentos como barragens, pecuária, silvicultura e mineração entre outras
ações antrópicas que se beneficiam de paisagens rupestres.
Palavras chave: afloramentos rochosos, hábitat, região da Campanha, Cactaceae.
ABSTRACT
The genus Frailea is much sought after by gardeners and collectors of cacti, which
leads your reduction and subsequently the near extinction of some species. This study
aims to survey and investigate the geographic distribution of that genus in River Basin
Santa Maria. To survey the populations of Frailea were identified outcrops using
images, Google Earth and GPS position at the study site. The identified areas were
visited for the populations occurring confirmation. The determination of the species was
based on original descriptions, analysis of the types, as well as digital photos in the
international computer network (Internet) of holotypes international Herbaria G-DC
(Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de Genève), P ( Muséum National
d'Histoire Naturelle), Royal Botanic Gardens (K), New York Botanic Garden (NY),
Smithsonian Institution (US), and phototypes of the Field Museum (F), accessed
through the Botany Darwinion Institute (SI - Buenos Aires ) and refers to previous
studies, herbarium, cactarios and specialists. During the survey found six species of
the genus including Frailea castanea, F. gracilima, F. lepida, F. mammifera, F.pygmea
297
and Frailea sp1. In Basin River Santa Maria the Fraileas were found in sandstone
outcrops and due to their habitat many species are vulnerable to extinction due to new
developments like dams, livestock, forestry and mining and other human activities that
benefit from rocky landscapes.
Key words: sandstone outcrops , habitat , Campanha region , Cactaceae.
1. INTRODUÇÃO
As fraileas são de extrema raridade e muito difíceis de serem encontradas, pois
seu hábitat é extremamente hostil vivendo entre rochas, por vezes, em afloramentos
rochosos nas nascentes associadas a morrotes e canhadas47. Estas plantas também
são extremamente variáveis em relação à cor, tamanho, disposição e quantidade de
espinhos.
Neotropical, o gênero Frailea foi descrito por Britton & Rose em 1922 para
abrigar espécies diminutas de cactos que anteriormente haviam sido descritos para o
gênero Echinocactus. Atualmente, o gênero é reconhecido para flora brasileira com
cerca de 12 espécies (OLIVEIRA-DEBLE, 2011), encontradas em locais com
afloramentos rochosos úmidos, em áreas abertas (campos) no sul do Brasil, Paraguai,
Uruguai, sudeste da Bolívia e nordeste da Argentina. O centro de diversidade do
gênero no Brasil é o Rio Grande do Sul onde há muitas espécies endêmicas, raras ou
ameaçadas de extinção devido à destruição do seu habitat natural (MACHADO, 2007).
Embora frequentes no espaço regional, são muito escassos levantamentos,
estudos taxonômicos, ecológicos e fitogeográficos sobre a família Cactaceae no Rio
Grande do Sul, mais especialmente o gênero Frailea, a maioria dos trabalhos estão
relacionados a gêneros e espécies epífitas e terrestres para o norte e centro do
território sul riograndense, os trabalhos florísticos de Brack et al. (1985), Waechter
(1986), Dislich & Mantovani (1998), Taylor & Zappi (1991); Bruxel, J. & Jasper, A.
(2005), Machado (2007), Pontes et al. (2014) apresentam espécies epífitas e terrestres
de Cactaceae, mas apenas os dois últimos se referem às espécies rupestres
encontradas em afloramentos rochosos e paredões.
As Cactáceas podem ser encontradas associadas a formações florestais
(espécies epífitas), campos nativos e rupestres e afloramentos rochosos (espécies
terrestres ou rupestres), mas é principalmente na vegetação rupestre associada aos
campos de vegetação de savana que se encontram muitas cactáceas endêmicas do
Rio Grande do Sul (BOLDRINI, 2009). Das oitenta espécies estimadas para o Estado
setenta e três constam na Lista de Espécies da Flora Ameaçadas de Extinção do Rio
Grande do Sul (2002).
47
Planície estreita entre montanhas.
298
Oliveira-Deble (2011) reconheceu 42 espécies e 8 gêneros para o Bioma
Pampa, com principal centro de ocorrência e diversidade nos afloramentos rochosos
da serra do sudeste e campos rupestres da campanha, tendo sido citados pela
primeira vez para o Brasil duas espécies: Gymnocalycium schroederianum e Monvillea
sp.
Observadas em campo Cereus hildmanianus (tuna), Opuntia monacantha
(opúntia) e Notocactus ottonis (tuna) são espécies terrestres comuns na paisagem do
Bioma Pampa, enquanto que os gêneros mais raros ou endêmicos (Echinopsis,
Frailea, Gymnocalycium, Notocactus e Wigginsia) possuem populações reduzidas,
normalmente em afloramentos rochosos, notadamente na Serra do Sudeste,
Depressão Central e Campanha.
Jacinto & Oliveira Deble (2012) através de levantamento de Cactáceas para o
Cerro do Graxaim em Dom Pedrito, reconheceram 10 espécies pertencentes a 7
gêneros, distribuídos em 4 tribos, sendo 3 da subfamília Cactoideae (Cereae,
Notocacteae, Trichocereeae) e 1 da subfamília Opuntioideae, registrando para o local
Frailea mammifera citada na literatura (MACHADO,2007) como endêmica na região,
tendo sido encontrados apenas dois indivíduos, comprovando a raridade da espécie
no local estudado.
A Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria localiza-se, entre as coordenadas
29°47' e 31°36' de latitude Sul e 54°00' e 55º32' de longitude Oeste, seus principais
formadores são o rio Santa Maria-Chico, o arroio Taquarembó, arroio Santo Antônio, o
rio Cacequi, o arroio Ponche Verde, o rio Ibicuí da Armada e o arroio Saicã.
Entre as atividades econômicas da Bacia estão a orizicultura moderna
juntamente com à pecuária extensiva tradicional e a extração de areia. Parte da Bacia
hidrográfica do Rio Santa Maria encontra-se infestada por capim annoni (Eragrostis
plana Ness.), principalmente em campos antropizados devido às lavouras de arroz,
soja, milho, trigo e introdução de espécies exóticas para silvicultura. Do ponto de vista
ambiental, são extremamente escassos os inventários sobre a flora e a fauna na
região e principalmente sobre a família das Cactáceas que frequentemente habitam os
afloramentos rochosos existentes nas nascentes do rio Santa Maria, bem como em
áreas esparsas aos arredores.
A
região
tem
relevo
levemente
ondulado,
representado
por
colinas
(regionalmente conhecidas por coxilhas), que se caracterizam como formas de relevo
com amplitudes ao redor de 40m e declividade das encostas entre 5 e 10%. As
espécies estudadas ocorrem em elevações isoladas, associadas ao relevo de colinas,
com amplitudes variando de 40 a 140m e declividades das encostas de 30% ou mais,
constituindo formas classificadas como Morrotes quando a amplitude é inferior a 100m
299
e Morros quando superior. Há um predomínio na paisagem de vegetação herbácea,
todavia a flora original está afetada pela agricultura, presente em quase toda a
extensão campestre. Os campos naturais, em geral, estão restritos a pequenas faixas
de transição entre o banhado e as coxilhas. A floresta de galeria pode atingir
dimensões consideráveis, de um lado a outro do rio Santa Maria e Ibicuí da Armada,
assumindo, por vezes, caráter aluvial.
2. METODOLOGIA
Para o levantamento das populações de Frailea na Bacia Hidrográfica do Rio
Santa Maria, foram identificadas imagens de afloramentos rochosos através de
geoprocessamento de imagens, Google Earth e de posicionamento através de
equipamento GPS. As áreas identificadas foram visitadas para confirmação de
informação e escolha dos locais para os levantamentos. A determinação das espécies
foi baseada em descrições originais, análise dos tipos, bem como em fotografias
digitais disponíveis na rede internacional de computadores (Internet) de holótipos de
Herbários internacionais G-DC (Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de
Genève), P (Muséum National d'Histoire Naturelle), Royal Botanic Gardens (K), New
York Botanic Garden (NY), Smithsonian Institution (US), além de fotótipos do Field
Museum (F), acessados através do Instituto Botánica Darwinion (SI – Buenos Aires) e
consulta a estudos anteriores (Briton & Rose, 1942, Scheinvar, 1985; Barthlott e
Taylor, 1993; Hunt 1999; Kiesling, 2005), herbários, cactários e especialistas da
família.
A consulta ao material bibliográfico foi feita nas seguintes instituições: Instituto
de Botánica Darwinion (SI), Instituto de Biociências (UFRGS), Instituto Anchietano
(UNISINOS), Museu Nacional (UFRJ), Jardim Botânico do Rio de Janeiro (R), Herbário
Barbosa Rodrigues (HBR) e Biblioteca da Universidade Federal do Paraná (UFPR),
além de intercâmbio com bibliotecas internacionais.
Para levantamento das espécies foram realizadas excursões de coleta em
diferentes áreas da Bacia na época de floração e frutificação entre os anos de
2013/2015, as espécies foram fotografadas com câmara Sony 21 mega pixel e
georreferenciadas com aparelho GPS/Etrex garmin. O mapa foi confeccionado através
da espacialização dos pontos de coletas de campo utilizando o software SIG ArcGIS
10.1, utilizando como bases cartográficas as malhas digitais do IBGE (2010).
300
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria, foram encontradas seis espécies
ocorrendo em fendas dos afloramentos areníticos na região, com exceção de Frailea
mammifera. Este grupo de plantas também é citado por Machado (2007) para solos
areníticos no território sul riograndense. A seguir estão disponíveis a descrição,
distribuição geográfica, hábitat e status de conservação das fraileas encontradas na
área de estudo.
3.1 Descrição do gênero Frailea Briton & Rose
Plantas geralmente diminutas, por vezes de hábito solitário, globosas a
cilíndricas. Costelas pouco desenvolvidas e espinhos muito pequenos retos ou curvos,
aureoladas. Flores cleistógamas ou casmógamas, bastante efêmeras, amarelas ou
amarelo-creme, brácteas florais com densa lanosidade e muitas cerdas. Frutos secos,
com muitas sementes com até 1,5 cm de comprimento.
3.1.1 Frailea castanea Backeberg (fig. 1 a, b)
Planta de hábito herbáceo semi-enterrado com corpo globoso, tuberculado de 4
cm de altura e 3-4 cm de diâmetro; apresenta costelas proeminentes e auréolas de
espinhos marrom escuros ou pretos muito curtos. Flores amarelo creme, de 4 cm de
comprimento, as nervuras são bastante variáveis entre as populações, bem como a
forma das flores e geralmente são de cor castanho-avermelhada ou verde
dependendo da intensidade da luz que recebem (MACHADO, 2007). A espécie cresce
em áreas de solo raso em fendas de afloramentos rochosos de arenito e pode ser
encontrada convivendo em simpatría com Frailea phaeodisca. Distribuição Geográfica:
No sul do Brasil e norte do Uruguai. Na Bacia Hidrográfica do rio Santa Maria, ocorre
na região da Serra do Caverá, entre Rosário do Sul e Santana do Livramento,
preferencialmente associada a córregos com afloramentos de arenito, sua ocorrência
também é registrada para a região sudoeste do estado, em Quaraí na região do Passo
da Guarda, associada a afloramentos nas nascentes dos rios e no Palmar do Coatepe,
bem como afloramentos areníticos na região de Alegrete. Status de Conservação:
Criticamente ameaçada (CR)
3.1.2 Frailea gracilima (Lemaire) Britton & Rose (fig. 1 c, d)
Planta de hábito herbáceo, de corpo cilíndrico verde-acinzentado, com costelas
tuberculadas de até 10 cm de altura e 2,5 de diâmetro, com um ou dois espinhos
centrais de cor escura e espinhos radiais brancos. As flores são amarelo-creme, com
301
tépalas agudas de 3 cm de comprimento. Os frutos esverdeados são de 6 mm de
diâmetro. A espécie é bem variável, originando populações com diferenças. Cresce
em solos de arenito, sob arbustos e gramíneas no meio, ou em solo associado a
Polytrichum commune (musgo) e outras plantas herbáceas formando comunidades
vegetais nos afloramentos rochosos. Há inúmeras variações nas populações de F.
gracilima, muitas plantas têm espinhos centrais em linha reta, enquanto outros podem
ter espinhos curvados. As diferenças entre as subespécies descritas para F. gracilima,
não apresentam caracteres definitivos para separação das mesmas, a espécies
apresentam variações ao longo da área de ocorrência, podendo esta variação estar
associada a fatores físicos, como intensidade da luz, solo e clima entre outros
(MACHADO, 2007). Distribuição Geográfica: Paraguai, Uruguai e no Brasil. Ocorre no
estado do Rio Grande do Sul, em afloramentos rochosos na no Escudo sul
riograndense (Bagé, Caçapava do Sul, Canguçu, Encruzilhada do Sul, Piratini,
Pinheiro Machado e Santana da Boa Vista). Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria
é bastante comum desde Bagé até Santana do Livramento em afloramentos
areníticos, juntamente com outras espécies herbáceas. Status de Conservação: Em
Perigo (EN).
3.1.3 Frailea lepida Buining & Brederoo (fig. 1 e, f)
Planta de hábito herbáceo de corpo cilíndrico verde-acinzentado, com costelas
tuberculadas de até 5 cm de altura e 1-1,5 de diâmetro, espinhos radiais brancos.
Flores infundibiliformes, infundibuliformes 1,9 cm de comprimento e 2,2 de diâmetro,
amarelas. Frutos esverdeados de 6 mm de diâmetro com sementes de 2,2 -2,4 mm de
comprimento, 1,5-1,7 mm de largura. Na bacia do rio Santa Maria foi encontrada no
município de Dom Pedrito no extremo SE da bacia sobre afloramentos rochosos. As
duas populações encontradas estavam sobre Polytrichum commune (musgo) a pleno
sol. Distribuição Geográfica: Brasil. A espécie atualmente figura como sinonímia de F.
gracilima, porém neste trabalho decidiu-se por manter como espécie pelas diferenças
marcantes relacionadas ao hábito, tamanho e diferenças nos espinhos. Status de
Conservação: Criticamente ameaçada (CR)
302
a
b
c
d
e
f
Figura 1: a) População de Frailea castanea em solo arenítico evidenciando o hábito
semi-enterrado em meio a musgos e outras plantas herbáceas; b) Frailea castanea,
destacando o hábito solitário em rochas areníticas; c) Flor amarelo-creme de Frailea
gracilima; d) Frailea gracilima subs. albifusca junto a Polytrichum commune. e) Frailea
lepida frutificada em afloramento arenítico; f) População de Frailea lepida em
Polytrichum commune (musgos) a pleno sol, próximo a BR 293.
3.1.4 Frailea mammifera Buining & Brederoo (fig. 2 a, b)
Planta de hábito herbáceo, geralmente solitária de tamanho diminuto,
apresentando forma globosa, brevemente colunar, verde escura até púrpura de até 3
cm de altura e 1-2,5 cm de diâmetro. Possui flores infundibuliformes, maiores do que a
própria planta, de cor amarelo de 2,5 cm de comprimento; tépalas acuminadas, longas
e delgadas, com estigma com 5-7 lobos. De fruto seco de até 8 mm de diâmetro.
Espécie restrita as nascentes do Rio Santa Maria, crescendo em solo raso com outras
303
espécies herbáceas nas fendas dos afloramentos rochosos areníticos próximos ao
arroio Taquarembó. Distribuição Geográfica: Brasil, no Rio Grande do Sul, ao norte de
Dom Pedrito. Na Argentina cresce uma entidade infraespecífica distinta (ssp.
angelesiae R. Kiesling & Metzing). Status de Conservação: Criticamente ameaçada
(CR).
a
c
e
b
d
f
Figura 2: a) População de Frailea mammifera frutificada, juntamente com outras
espécies herbáceas; b) Frailea mammifera em afloramento arenítico demonstrando
hábito solitário; c) População de Frailea pygmea, juntamente com herbáceas; d)
Afloramento granítico, área de ocorrência de Frailea pygmea; e) Frailea sp1, com
hábito solitário em afloramento arenítico; f) População de Frailea sp1 em afloramento
arenítico.
3.1.5 Frailea pygmea (Spegazzini) Britton & Rose (fig. 2 c, d)
Plantas herbáceas, por vezes solitárias, de tamanho variável, globosas a
cilíndricas de até 7 cm de altura e 3 cm de diâmetro, sempre verdes. De flores
304
amarelas, de 2-2,5 de comprimento e tépalas acuminadas. Frutos geralmente com 1,5
cm de largura. A espécie é frequente em fendas de afloramentos rochosos areníticos,
ou esporadicamente em solos rasos vivendo em simpatria com outras espécies
herbáceas, além de algumas populações de Wigginsia sellowii. Distribuição
Geográfica: sul do Brasil, argentina e Uruguai. Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa
Maria, foram encontradas algumas variações nas populações, havendo espécies de
espinhos brancos e também de espinhos amarelos. Ocorre na porção S e SE da Bacia
nos municípios de Dom Pedrito (Torquato Severo), Lavras do Sul e sul de São Gabriel
até Santana do Livramento em afloramentos rochosos. Status de Conservação: Em
perigo (EN).
3.1.6 Frailea sp1. (fig. 2 e, f)
Planta herbácea, diminuta, globosa de até 1-2 cm de altura e 1,5 cm de
diâmetro, geralmente verde com espinhos avermelhados. Encontrada em cerros de
arenito entre fendas de rochas, juntamente com herbáceas de pequeno porte. Não
foram encontradas flores e frutos. Distribuição: Brasil no Rio Grande do Sul. Ocorre no
limite W da bacia hidrográfica do Rio Santa Maria em fendas de serros areníticos na
Serra do Caverá. Status de Conservação: Dados insuficientes (DI)
Distribuição geográfica do gênero Frailea Britton & Rose e sua relação com os
aspectos geomorfológicos na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria
Geomorfologicamente
a
BHRSM
encontra-se
inserida
nas
unidades
geomorfológicas da Depressão Periférica do Rio Grande do Sul, do Planalto da Serra
Geral e, ainda, uma pequena parte, a sudeste, do Escudo Sul-riograndense
(ROBAINA et al. 2010).
As áreas planas são caracterizadas por declividades inferiores a 2% e estão
dominantemente associadas a planície de inundação do rio Santa Maria, na unidade
geomorfológica da Depressão Periférica.
As colinas são as formas predominantes na área de estudo e caracterizam-se
por amplitudes entre 20 e 60m e por declividades variando de 2% inferiores a 15%.
Ocorrem associadas as rochas sedimentares da Depressão periférica, rochas
cristalinas do Escudo, a sudeste, e no extremo sul da bacia, com rochas vulcânicas do
Planalto.
Os morros e morrotes são formas caracterizadas por declividades das encostas
superiores a 15%, sendo diferenciados por amplitudes superiores a 100m nas formas
de morros e inferiores nos morrotes. Ocorrem de forma isolada, marcando o recuo da
305
escarpa do Planalto e formando um alinhamento estrutural denominado “Serra do
Caverá” que marca os divisores da bacia do rio Santa Maria a oeste.
O substrato litológico que forma a BHRSM está representado, principalmente,
por rochas do Maciço cristalino e por sequências de rochas sedimentares e vulcânicas
da Bacia do Paraná, além de rochas e sedimentos recentes.
As rochas do Maciço cristalino, em uma pequena porção, a SE da bacia e são
representadas por granitos, gnaisses e, com menor representação, xistos e vulcânicas
ácidas.
As primeiras unidades sedimentares da Bacia do Paraná, aflorantes na
BHRSM, estão depositadas sobre e na borda do Escudo Sul Rio-grandense.
Em direção a oeste passa para lamitos marinhos, com intercalações
carbonáticas, formando uma faixa N-S de exposição, na região SE da bacia.
Estes afloramentos dão lugar, a uma sequência litológica, representado por
arenitos e lamitos, distribuída ao longo de faixas laterais caracterizados por Lavina
(1988) como continentais.
O avanço de depósitos continentais é marcado por uma espessa sucessão
flúvio-eólica que corresponde à Formação Sanga do Cabral (Lavina,1988), que está
muito bem representada e, apesar de ocorrer intercalações, podem ser separadas em
duas porções: uma primeira, localizada mais a leste, com predominância de arenitos
eólicos; e uma segunda de arenitos com características fluviais que predominam para
oeste e norte da bacia, e que se caracterizam pela presença comum de micas.
As rochas vulcânicas ocorrem aflorando na porção mais a sul e oeste da
BHRSM com variações de estrutura, textura e químicas.
Os depósitos recentes estão representados por depósitos fluviais de canal e
planície de inundação.
Considerando a distribuição geográfica das espécies em estudo (Figura 3 –
Mapa da distribuição geográfica das espécies), nota-se que as mesmas foram
encontradas a sudeste e oeste da Bacia, notadamente Frailea mammifera ocorre em
rochas vulcânicas, demonstrando certo endemismo, enquanto que Frailea gracilima e
Frailea pygmea tem ocorrência em rochas vulcânicas e sedimentares. Frailea lepida,
F. castanea e F. sp1, tem ocorrência restrita a afloramentos areníticos na BHRSM.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Foram reconhecidas seis espécies do gênero Frailea Britton & Rose na Bacia
Hidrográfica do rio Santa Maria. Entre as espécies mais comuns estão F. gracilima e
F. pygmea, que possuem distribuição geográfica ampla habitando afloramentos
306
areníticos desde a Serra do Sudeste até a região da Campanha e Sudoeste do Rio
Grande do Sul. Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria as espécies de distribuição
restrita são F. lepida e F. mammifera que possuem populações localizadas nos
somente nos afloramentos rochosos dentro da região de estudo, o que comprova a
necessidade de conservação das áreas de ocorrência dessas duas espécies. F.
castanea tem distribuição geográfica mais a sudoeste do estado, tendo sido
encontrada somente no limite da Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria e Frailea sp1.
foi registrada apenas uma população habitando afloramentos areníticos próximo ao
limite da área de estudo.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Rodrigo Pontes e Leonardo Paz Deble pela
colaboração na identificação das espécies e pela companhia nas excursões de campo.
307
Figura 3: Mapa da distribuição geográfica do gênero Frailea na Bacia Hidrográfica do
Rio Santa Maria.
308
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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biodiversidade. Brasília, MMA, 2009.
309
310
TRABAJOS POSTERS
311
PLANEJAMENTO E ADEQUAÇÃO DE TRILHAS NO CORREDOR
ECOLÓGICO DA QUARTA COLÔNIA, RS
Suzane B. Marcuzzo – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Elisangela Lopes – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Marilim Mazui – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
RESUMO
Os corredores ecológicos são concebidos como forma de conectar áreas protegidas,
possibilitando a conectividade da paisagem e facilitando o fluxo genéticos entre as
populações por meio de alternativas para o desenvolvimento de práticas de pouco
impacto nas áreas de interstícios. Este trabalho tem por objetivo planejar e delimitar
um sistema de trilhas na região do Corredor Ecológico da Quarta Colônia, RS,
utilizando estruturas facilitadoras para o uso público em atividades de recreação e
interpretação da natureza. O trabalho consistiu no reconhecimento das condições
atuais dos percursos existentes no local e definição de ações necessárias para
adequação ou recuperação do trajeto para a trilha. Para tal, foram realizadas vistorias
de campo, obtenção de coordenadas geográficas com GPS, pesquisa bibliográfica,
consulta e manuseio de base de dados georreferenciada. Como resultados verificouse a necessidade de implantar os seguintes segmentos de segurança e conforto:
sinalização e orientação, elementos facilitadores, valas de drenagem e travessias e
passadiços elevados.Concluiu-se que itens de segurança e conforto associados a uma
padronização de equipamentos e placas informativas cumprem a função de suporte
para envolver e melhorar a relação da população com os recursos naturais da região
por meio da realização de atividades em trilhas ecológicas.
PALAVRAS-CHAVE: uso público, conservação de áreas naturais, beleza cênica.
INTRODUÇÃO
A
perda
da
biodiversidade
causada
pelas
atividades
humanas
nos
ecossistemastorna urgente a aplicação de estratégias e formas de manejo
sustentáveis das áreas naturais. Neste sentido, o Estado do Rio Grande do Sul é uma
região de transição entre biomas e zonas biogeográficas apresentando paisagens e
ecossistemas diversificados para uma área relativamente pequena, abrigando animais
e vegetais com diferentes centros de origem, além de um número considerável de
espécies vegetais e animais endêmicos. Contudo, estas distintas características
ambientais estão sofrendo graves impactos ambientais resultantes do manejo
inadequado e de fatores geológicos e climáticos relacionados aos movimentos
naturais de massa do rebordo do planalto da Serra Geral. Desta forma, é de extrema
importância formular estratégias e ações de conservação desta natureza no sentido de
garantir a riqueza das espécies e de seus ecossistemas para com isto reduzir as
312
ameaças existentes sobre a biodiversidade gaúcha. A incorporação da proteção e
conservação da biodiversidade junto aos principais setores produtivos do meio rural,
por meio de ações extensionistas e fomentos de métodos sustentáveis no uso e
manejo da biodiversidade nativa, são práticas usadas para o desenvolvimento das
comunidades.
No ano de 2012 foi implementado pela EMATER no Rio Grande do Sul, o
projeto RS-Biodiversidade, o qual visa promover a conservação e recuperação da
biodiversidade, mediante o gerenciamento integrado dos ecossistemas e a criação de
oportunidades para o uso sustentável dos recursos naturais, com vista ao
desenvolvimento regional. Foram selecionadas quatro áreas de importante relevância
biológica no Estado (Figura 1), nas quais serão estabelecidos corredores de
conservação, bem como identificação e recomendações de proteção a algumas áreas,
e a promoção de ações práticas que visem à recuperação e conservação da
biodiversidade.
Figura 1. Áreas de atuação do Projeto RS-Biodiversidade.
Fonte: Projeto RS Biodiversidade 2012.
Uma das estratégias de conservação que o projeto RS-Biodiversidade vem
implementandona região da Quarta Colônia é a promoção de ações de educação
ambiental, onde se inclui o tema: corredores ecológicos e suas interações positivas
com a conservação da biodiversidade e salvaguarda do patrimônio cultural.
Dentre as ações desenvolvidas, atividades de educação e lazer, em ambientes
com relevante potencial paisagístico e grande biodiversidade, estão se tornando
313
importantes ferramentas para conservação e preservação desses espaços (JESUS;
RIBEIRO, 2006). Neste sentido, as trilhas interpretativas são consideradas estratégias
de conscientização ambiental visando à conservação das características naturais.
As trilhas são caminhos que podem ser percorridos ao ar livre. Para a criação
dessas trilhas temos que levar em conta a segurança e o conforto necessários para
que os visitantes percorram estas, juntamente com as características físicas e bióticas
para que as trilhas sejam traçadas sem prejudicar o meio ambiente. O planejamento
de uma trilha depende da identificação de um ambiente capaz de despertar o interesse
em relação ao ambiente natural, observando componentes debeleza cênica,tais como
árvores frondosas, formações rochosas, seres de sucessão ecológica, fauna,
nidificações e corpos d’água, ou seja, aspectos biofísicos bem como os
aspectos sociais.
A implantação das trilhas pode contribuir para um melhor relacionamento da
população local com os recursos naturais de sua região, tomando conhecimento de
sua importância por meio de programas de educação ambiental (CARREIRO et al,
2009). Por outro lado,ao ser considerado como parte integrante do ambiente natural,o
indivíduo pode,com maior facilidade, refletir sobre suas responsabilidades no
quesitopreservação,eentão buscarmudanças deatitudes em seu cotidiano.
Contudo, para que ocorram essas modificações no indivíduo, é necessário que
o local apresentealguns atributos para que os visitantes vivenciem diversos tipos de
experiências que os sensibilizem no sentido de sua integração com a natureza. Assim,
a presença de uma infraestrutura que proporcione segurança e conforto que permitam
a observação e contemplação da paisagem é de grande valia nesse processo de
sensibilização.
Além da adequação das trilhas, um bom planejamento é fundamental para o
sucesso das atividades de educação ambiental em locais com essa vocação.
Neste contexto, a propriedade Raddatz, localizada no município de Agudo,
apresenta
sua
área
inserida
no
Corredor
Ecológico
da
Quarta
Colônia,
sendoreconhecida pela comunidade do entorno e região como um dos principais
atrativos turístico de áreas naturais com a presença de uma cachoeira com queda
d'água com 32 metros em meio à mata nativa. Assim, em virtude do interesse de seus
proprietários em tornar o local uma ferramenta para conservação do ambiente natural
e oferecer aos visitantes um programa de uso público adequado, o presente projeto
propõe o planejamento e a delimitação de trilhas interpretativas, as quais possibilitem
os visitantes conhecer o ecossistemao qual a queda d’água está inserida, tornando a
visita um instrumento pedagógico, o qual propicia o contato mais próximo entre o
homem e a natureza.
314
OBJETIVO
Este trabalho tem por objetivo planejar e delimitar um sistema de trilhas utilizando
estruturas facilitadoras para o uso público em atividades de recreação e interpretação
da natureza.
METODOLOGIA
Caracterização da área do estudo
A região central do Rio Grande do Sul está localizada entre a Encosta da Serra
Geral e a Depressão Central, inserida em parte da Área Núcleo da Mata Atlântica no
estado, interconectando remanescentes florestais da região da Floresta Ombrófila
Mista, Floresta Estacional Decidual e florestas de origem Atlântica. Esta composição
contempla uma das regiões Prioritárias Para Conservação, Uso e Repartição de
Benefícios da Biodiversidade Brasileira, do Ministério do Meio Ambiente (MMA 2007).
A Quarta Colônia Italiana (figura 2) localizada no centro do Estado do Rio
Grande do Sul, faz parte da junção de três regiões geomorfológicas: Depressão
Periférica (denominada como Depressão Central), Serra Geral e Borda Meridional do
Planalto das Araucárias com altitudes que variam entre 50 e 450 m, apresentando
relevo muito variável correspondente à interface entre a Serra e a Depressão.
Figura 2: Área da Quarta Colônia
Fonte: Projeto RS-Biodiversidade 2012.
315
Em virtude de suas características geomorfologicas e contendo uma grande
biodiversidade, a região da Quarta Colônia de imigração italianacompõe uma das
áreas prioritárias no projeto RS Biodiversidade do estado do Rio Grande do Sul,
realizado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA) em parceria com a
EMATER.
Este trabalho é produto do programa “Estratégias de conservação na região do
Corredor Ecológico da Quarta Colônia” cuja solicitação à UFSM foi realizada por
intermédio da EMATER/RS da cidade de Agudo, buscando consolidar ações de
conservação na região do corredor por meio da implantação de um sistema de trilhas
ecológicas, tendo como área demonstrativa neste contexto à propriedade Raddatz,
inserida no Corredor Ecológico (Figura 3).
Esta propriedade servirá de modelo para um desenvolvimento territorial
sustentável, contribuindo para a consolidação da conservação da biodiversidade bem
como o uso fruto da mesma, sem causar grandes impactos e tendo um manejo
adequado.
Figura 3: Corredor Ecológico da Quarta Colônia.
Fonte: Projeto RS Biodiversidade 2012.
A propriedade Raddatzestá localizada na Linha Nova, interior do Município de
Agudo, RS, distante aproximadamente 10 Km da área urbana, na direção
leste,
316
coordenadas aproximadas de latitude 29º37’37 S e longitude 53º14’41 O, lote
10 (ColôniaSanto Ângelo).Apropriedadeé de 35 hectares, onde a agricultura é
baseada na plantação de fumo e dispõe de um representativo remanescente de
Floresta Estacional Decidual conservado.Junto à área de floresta,uma cachoeira com
queda d'água de 32 metros é um dos pontos atrativos para visita, bem como uma
benfeitoria que funciona como centro de visitantes e base de apoio para área de
camping.
O clima segundo a classificação de Köppen é Subtropical, pertencente à
variedade específica “Cfa”, assim definida por apresentar temperatura média do mês
mais frio entre -3º e 18ºC (de junho a agosto) e, do mês mais quente, superior a 22ºC
(em janeiro) (NIMER, 1990).
Os solos da região são predominantemente pouco desenvolvidos, rasos,
apresentando o horizonte pouco espesso, sendo que estão diretamente assentados
sobre a rocha e contêm material de rocha em decomposição (PEDRON; DALMOLIN,
2011). De acordo com o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, o solo da região
é classificado como NeossoloLitólico (EMBRAPA, 2006).
MATERIAL E MÉTODOS
A idealização de atividades e estudos que objetivem alcançar uma situação
adequada no percurso datrilha que leva a cascata deve ser entendida por meio de
frentes de ação relacionadas à intervenção física e oferta de infra-estrutura,
equipamentos de apoio e sinalização.
O trabalhoconsistiu no reconhecimento das condições atuais dos percursos
existentes no local e definição de ações necessárias para adequação ou recuperação
do trajeto para a trilha. Para tal, foram realizadas vistorias de campo, obtenção de
coordenadas geográficas com GPS, pesquisa bibliográfica, consulta e manuseio de
base de dados georreferenciada, pesquisa e análise de materiais construtivos
confeccionados com madeira da retirada de espécies exóticas invasoras e rochas e
seixos em abundância no local. Posteriormente, realizou-se a investigação das
condições de solo e topografia do terreno para definir o traçado da trilha.
Os percursos e seus elementos constituintes foram organizados em fichas,
caracterizados por segmentos e pontos de controle. Os segmentos foram
estabelecidos em função da identificação de características relativamente uniformes
de paisagem, desenho e estrutura do leito da trilha. Os pontos de controle constituem
os locais onde se encontra infra-estrutura instalada e os pontos de atrativos
317
identificados em campo. Cada segmento ou ponto de controle foi observado por meio
de indicadores de segurança, conforto, manutenção e uso.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na etapa de realização do desenho de implantação das trilhas, foi definido o
piso, isto é, a superfície da trilha sobre a qual os visitantes transitam a qual deverá
apresentar a largura de 1,2-1,5 metros, se mantendo natural, salvo trechos de alta
declividade os quais necessitem da construção de degraus, sendo estes estruturados
de madeira e rochas. Bem como a linha central da trilha deverá apresentar 2,0-3,0
metros de altura, onde esta área deve ser livre de vegetação. A declividade de
drenagem deverá ser desenvolvida de modo quepossibilitea drenagem natural,
variando de 5 a 10%.
Adicionalmente a essas recomendações, verificou-se a necessidade de
considerar os seguintes parâmetros a serem implantados no sistema da trilha:
a) Sinalização e orientação: É necessária a indicação da trilha, as distâncias
até os vários destinos, bem como as regras e regulamentos pertinentes ao local;
b) Facilitadores:equipamentos de apoio para garantir segurança e conforto dos
visitantes, caracterizados pela estrutura de escadas marinheiro, cabo guia e guarda
corpo em escada de pedra;
c) Limpeza do local da trilha: pequenas árvores, galhos e outros deverão ser
retirados para o corredor da trilha, para que aja um melhor fluxo de visitantes no local,
diminuindo assim o impacto possível na vegetação;
d) Chanframento de encosta: trata-se do corte de encosta para aumentar a
largura do piso da trilha;
e) Valas de drenagem: técnica efetiva para o manejo da água, no sentido de
mantê-la fora da trilha, evitando a erosão;
f) Travessias de água: utilizados em áreasonde a trilha corta olhos d'água,
nascentes ou pequenos rios;
g) Escadas e passarelas: é indicado para sua construção materiais como
pedras e madeira, os quais estejam presentes na área em abundância;
h) Passadiços e pisos elevados: são leitos de trilhas elevados pormadeira
serrada, toras, pedra, argila ou outro material de preenchimento. São eficientes em
áreas baixas ou úmidas.
Via de regra, relacionado ao item de sinalização e orientação, definiu-se a
fixação de placas de orientação em trechos de bifurcação, indicando a trilha correta a
318
seguir, bem como placas informativas contendo o nome das espécies da flora de
relevância pela raridade, porte, beleza e interações com a fauna daquele ecossistema.
O material utilizado para confecção das placas será da madeira das espécies
arbóreas
exóticas
presentes
no
local
como
Psidiumguajava
(goiabeira)
e
Hoveniadulcis(uva-do-japão), uma vez que estas espécies devem ser retiradas do
sistema devido as consequências negativas acarretadas pelas mesmas em função da
modificação da composição florística original em virtude de sua monodominância. Da
mesma forma, sobre o ítem de faciltitadores, será utilizada a madeira destas espécies
para fabricação de barrotes para construção de escadarias em trechos íngremes ou
mesmos apoio para os degraus.
Em alguns trechos, onde a trilha acompanha um córrego, será realizada a
instalação
de
cabos
guia,
proporcionando
ao
visitante
o
conforto
de
uso.Adicionalmente,a avaliação das condições de manutenção foi determinada em
função das situações relacionadas a necessidade de poda de vegetação, limpeza e
retirada de galhos e troncos caídos no leito da trilha, os pontos averiguados perfazem
25 situações. De forma geral, em todo o trajeto observou-se a necessidade de
trabalhos de manutenção e limpeza. Essa situação merece destaque, pois muitos dos
problemas relacionados às condições de uso e necessidade de intervenções
estruturais podem ser atribuídos à falta de um programa de manutenção continuado.
Com relação ao item de chanframento, em torno de cinco pontos é necessária
a realização desta atividade, devido à necessidade de aumentar a largura do leito da
trilha, trazendo maior segurança para o público.
Por sua vez, entende-se que a realização de obras corretivas, principalmente
relacionadas ao sistema de drenagem, é uma necessidade constante em trilhas, seja
para interferir nas soluções propostas, pois o fluxo da água pode não estar
percorrendo da forma prevista pelo projeto,
ou mesmo,
para prevenir
o
comprometimento dos canais e valetas que pode encontrar-se com acúmulo de
sedimentos e folhas e não atender a vazão de água prevista. A falta de atenção para
essas questões gera um efeito em cadeia, definindo ambientes impactados e
problemas mais difíceis de serem solucionadas, exigindo com o tempo a reformulação
ou necessidade de elaborar novos projetos.
Assim, para minimizar esses problemas foram determinadas ações corretivas
classificadas pela natureza da intervenção. A instalação de valas de drenagem foi
determinada em segmentos de trilha localizados em terrenos com declividades
suaves, cujo caminho da água acontece sob o leito da trilha e o percurso encontra-se
com pontos de alagamento nas partes planas. As valas devem ser implantadas ao
longo do segmento buscando reduzir a velocidade e desviar a água antes dela
319
alcançar as áreas que atualmente encontram-se inundadas. A instalação de diques de
contenção foi determinada emsegmentos de trilha localizados em terrenos com
declividades médias, cujo caminho da água acontece sob o leito da trilha e o percurso
encontra-se com pontos de e erosão e alagamento nas partes planas. Os diques
devem ser implantados ao longo do segmento, buscando reduzir a velocidade, conter
os processos erosivos e desviar a água.
Por fim, verificou-se a necessidade de implantar passadiços elevados e em
dois trechos do percurso. O critério para selecionar os locais para a instalação dessas
estruturas consistiu na identificação de áreas, cuja capacidade de suporte do ambiente
é inferior a demanda de visitação pública permitida. Ou seja, são percursos que não
conseguem manter condições ambientais adequadas em função dos impactos
ocasionados pela intensidade de visitação atualmente realizada. Nestas condições, a
trilha suspensa minimiza os impactos ambientais ocasionados pelo pisoteio dos
visitantes, tais como: erosão, assoreamento, ampliação da área da trilha e diminuição
do efeito de borda. Entretanto, deve ser ressaltado que a instalação da trilha suspensa
modifica o ambiente de intervenção, interferindo, principalmente, na insolação. Esta
situação pode, entre outros aspectos, propiciar condições favoráveis para a ocorrência
deespécies invasoras ou dificultar a revegetação da área que ficará sombreada pela
trilha suspensa. Desta forma, é necessário realizar um projeto específico que avalie a
performance da revegetação sob as trilhas suspensas.
Contudo, além das possíveis interferências relacionadas com a instalação das
estruturas suspensas, também devem ser observadas as raízes expostas. A trilha
suspensa irá contribuir para minimiza os processos erosivos e, consequentemente,
evitar o agravamento e o surgimento de novos pontos de raízes expostas. Entretanto,
deve-se considerar que as raízes expostas existentes estão neste momento
fragilizando a estrutura da vegetação e, por consequência a estrutura dos terrenos
íngremes que faceiam o percurso da trilha e áreas de mirantes. Desta forma, é
necessário realizar um projeto específico que avalie a necessidade de preencher com
solo ou serapilheira os locais com ocorrência de raízes.
CONCLUSÃO
Concluiu-se após a realização do presente trabalhos que itens de segurança e
conforto associados a uma padronização de equipamentos e placas informativas
cumprem a função de suporte para envolver e melhorar a relação da população com
os recursos naturais da região por meio da realização de atividades em trilhas
ecológicas.
320
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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da Trilha das Árvores Gigantes às práticas pedagógicas de professores que visitam o
Parque Estadual de Porto Ferreira. III Seminário de Iniciação Científica do Instituto
Florestal,
2009.
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321
PESCA ARTESANAL NO RIO VACACAÍ, RS. AS INFLUÊNCIAS DA
ORIZICULTURA IRRIGADA E OS POTENCIAIS TERRITÓRIOS DE
CONFLITOS.
Tiago Rossi de Moraes - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Eduardo Schiavone Cardoso - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
A presente pesquisa tem como temática central a pesca artesanal praticada no rio
Vacacaí, RS. Buscou-se identificando sua relação com as demais atividades
econômicas que também se utilizam das águas do rio, em especial a orizicultura
irrigada, a partir da visão dos pescadores artesanais e com o aporte de pesquisas
bibliográficas e documentais. A partir do uso de dados oficiais de produção de arroz e
área plantada, pluviometria e cotas altimétricas do rio Vacacaí, entre os anos de 2004
a 2013, estabeleceu-se a relação entre o consumo hidrointensivo da orizicultura
irrigada e a diminuição do nível do rio. Através de três expedições onde foram
percorridos os mais de 200 navegáveis do rio Vacacaí onde o nível da água permite a
navegação, foram mapeadas 64 bombas de irrigação das lavouras de arroz e mais 24
estruturas desativadas. Para se identificar os pesqueiros do Vacacaí foi utilizada a
cartografia participativa, onde os pescadores artesanais entrevistados reconheceram
seus pesqueiros com o auxílio de mosaicos de imagens de satélite. Assim, dezessete
pesqueiros foram mapeados pelos pescadores do Vacacaí, sendo que em dez há a
presença de bombas de irrigação. Estes locais foram considerados potenciais
territórios de conflito entre as duas atividades analisadas.
Palavras-Chave: Pesca Artesanal. Território Pesqueiro. Orizicultura Irrigada.
Conflitos.
Introdução
A água é um bem vital a sobrevivência do planeta, insubstituível no
funcionamento, regulação e equilíbrio de todos os seres vivos, assim como tem sido
fundamental no desenvolvimento das sociedades ao longo do tempo. Pela abundância
de água em nosso planeta, raramente nos damos conta que a escassez desse recurso
pode levar a um comprometimento ecológico e econômico, gerando conflitos em
variadas escalas, inclusive mortes. Atualmente as diferentes formas de apropriação da
água, algumas mais impactantes que outras, implicam a fundamentação de leis que
devem acompanhar os instrumentos de gestão dos recursos hídricos, para que se
garanta a qualidade da água existente e para que se tenha a satisfação desses
diferentes usos, bem como a resolução dos conflitos que venham existir nos períodos
de escassez.
322
O acelerado desenvolvimento tecnológico e industrial nas últimas décadas
têm gerado grandes impactos ambientais que a partir da década de 1970 vêm sendo
amplamente discutidos pelas nações do mundo, levando a sucessivos tratados de
restrição de emissão de poluentes, na maioria das vezes não cumpridos ou nem
sequer assinados por alguns países. Na atual configuração da sociedade moderna, as
formas de relações exercidas com os recursos naturais se diferem em muito das
existentes nas sociedades ditas tradicionais, onde as muitas formas de degradação da
natureza, presente nas atividades das sociedades urbanas industriais, não foram
absorvidas e a relação das pessoas com a natureza é diferente.
O homem moderno tem diversificado as suas formas de dominação da
natureza em prol da geração de bens de consumo, produção de alimentos,
possibilidades de locomoção, entre outros. As profundas mudanças ocorridas na
agricultura nas últimas décadas, frutos da tecnologia que se desenvolve em ritmo cada
vez mais acelerado, é um exemplo do esforço do ser humano em domesticar a
natureza, impondo-a o seu ritmo de consumo, ao invés de adaptar-se ao ritmo
biológico das plantas e animais. A agricultura é responsável atualmente pelo uso de 70
% da água doce disponível no planeta (Rebouças, 2001), todo esse uso se deve em
grande parte a necessidade excessiva de irrigação de determinadas culturas,
geralmente cultivadas no modelo de monoculturas de grande escala. Tal modelo de
agricultura também é marcado pelo grande uso de fertilizantes e biocidas organosintéticos (agrotóxicos) que geram diversos problemas ambientais e de saúde da
população.
Por outro lado, comunidades tradicionais residentes em áreas rurais e
altamente dependentes dos recursos naturais são encontradas em diversas regiões do
mundo. Essas comunidades, no Brasil, diferenciadas em indígenas e não-indígenas,
buscam na defesa de seus territórios a garantia de sua reprodução social.
Os pescadores artesanais, reconhecidos como um dos 14 povos tradicionais
existentes no Brasil, fazem parte de um modelo de produção extrativista que se utiliza
de um conhecimento empírico sobre o comportamento do meio ambiente, pois nele
estão inseridos em seu dia a dia de trabalho, reproduzindo e criando gêneros de vida
distintos das sociedades modernas urbano/industriais. Entre as modalidades de cultivo
(Aquicultura) e pesca extrativa, esta última responde por 45% da produção de pescado
brasileiro, sendo que 99% dos trabalhadores empregados nessa modalidade e
cadastrados no Registro Geral de Pesca – RGP são pescadores artesanais (MPA,
2014), somando mais de 1 milhão de pessoas que proveem seu sustento da pesca
artesanal no Brasil.
323
No caso dos pescadores artesanais, a defesa dos territórios pesqueiros no
Brasil é bandeira de luta há décadas, que culminou no ano de 2012 com a criação da
Campanha pela Regularização do Território das Comunidades Tradicionais Pesqueira
pelo Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais - MPP, um projeto de lei de
iniciativa popular que visa o reconhecimento, proteção e garantia do direito ao território
dessas comunidades. Aliados a isso, se constituem alguns mecanismos legais de
defesa destes territórios, por parte das comunidades e do Estado.
A orizicultura irrigada, bastante desenvolvida no Rio Grande do Sul, estado
que contribui com cerca de 54% da produção nacional (MAPA, 2014), e também
praticada em larga escala em toda a Bacia Vacacaí Vacacaí-Mirim, está caracterizada
pela alta tecnologia empregada em equipamentos e estruturas de produção, pelo
grande consumo de água na irrigação e pelo uso de uma variedade de insumos e
pesticidas que, ao serem usados, são incorporados às águas que retornam aos corpos
d’água podendo contaminar toda a biota aquática. Atualmente, para se instalar uma
bomba de irrigação em algum rio do Rio Grande do Sul é necessária obter uma licença
ambiental específica para esse fim, o órgão que fica a cargo da emissão da licença é a
Fundação de Proteção Ambiental – FEPAM.
Neste contexto, estamos diante de duas atividades econômicas que se
utilizam dos mesmos recursos naturais, e muitas vezes dos mesmos territórios, para
se desenvolver. De um lado a pesca artesanal, atividade que emprega profissionais
reconhecidos no Brasil como populações tradicionais, possuidores legítimos de
direitos sobre seus territórios tradicionais, reproduzindo gêneros de vida onde as
relações com a natureza diferem em muito das sociedades urbano/industriais, um
imenso contingente de trabalhadores, responsáveis por grande parte da produção do
pescado brasileiro. Por outro lado, a orizicultura irrigada, atividade que nasce de forma
artesanal, onde o homem utilizava-se apenas dos desníveis do terreno e pela
gravidade guiava a água para seus cultivos. Ao longo do tempo, e mais recentemente
com a globalização e aumento demográfico mundial, a necessidade de elevar a
produção de alimentos abriu espaço para a tecnologia e a ciência a desenvolverem
em prol desse aumento de produção. Os efeitos desse desenvolvimento tecnológico
científico foram, entre outros, a troca da mão de obra do homem pela da máquina
desde o plantio, colheita e processamento dos produtos agrícolas e a criação e uso de
inúmeros fertilizantes sintéticos e pesticidas que causam degradação aos recursos
naturais e afetam as populações de diversas maneiras.
Quando alguma atividade potencialmente impactante do ponto de vista
ambiental e social é desenvolvida em algum território onde outras atividades menos
impactantes também ocorrem, e de certa forma veem-se prejudicadas por essa outra,
324
pode-se dizer que esse território abriga uma situação de potencial conflito entre seus
usuários. É o que acontece com a pesca artesanal e orizicultura irrigada quando
desenvolvidas concomitantemente em um mesmo território.
No Rio Grande do Sul, a orizicultura irrigada é apontada como uma das
principais problemas da pesca artesanal desenvolvida em águas interiores. Esse
modelo de atividade pesqueira vem passando por diversos problemas, em alguns
casos, não garantindo mais as necessidades dos trabalhadores, que necessitam
realizar outras funções como sirvam de auxílio na renda família. Cardoso (2009)
enfatiza a situação precária dos pescadores de municípios como Cachoeira do Sul e
Rio Pardo, reflexo dos diversos problemas enfrentados pelos pescadores de pequena
escala, que vão desde a escassez do pescado até a falta de apoio governamental
perante a classe.
Assim, estudos que venham realizar uma análise dessas duas atividades
dentro de uma área de estudos, identificando os territórios potencialmente conflituosos
no que se refere ao uso da água, mostram-se de grande importância no planejamento
e gestão dos recursos hídricos e consequentemente na preservação ambiental e
também da existência da atividade da pesca e dos pescadores artesanais. Nesse
sentido, a presente pesquisa indaga quais são as relações de influências da
orizicultura irrigada sobre a pesca artesanal no rio Vacacaí, RS, como os pescadores
artesanais percebem essas influências e também se pode se falar na existência de
potenciais territórios de conflito entre pescadores e arrozeiros.
Objetivo Geral
Compreender como se desenvolve a pesca artesanal no rio Vacacaí, RS,
identificando as influencias exercidas pela orizicultura irrigada e os potencias territórios
de conflitos existentes entre ambas atividades.
Objetivos Específicos
(a)
Caracterizar a pesca desenvolvida na área de estudo, bem como as
condições de vida e de trabalho dos pescadores artesanais;
(b)
Conhecer a atual situação de conservação do leito e das margens do rio
Vacacaí, ao longo de seu percurso navegável;
(c)
Verificar a distribuição espacial dos recursos pesqueiros e dos
pescadores ao longo do rio Vacacaí
325
(d)
Identificar e mapear as potenciais áreas de conflito existentes entre
arrozeiros e pescadores;
Metodologia
Considerando a análise da dinâmica presente nas relações homem – meio
como princípio da ciência geográfica e que essas relações podem gerar conflitos entre
os diferentes grupos sociais que se utilizam dos mesmos espaços e bens naturais,
esta pesquisa apresenta dois objetos de estudos distintos: os pescadores artesanais,
como se organizam e desenvolvem a atividade pesqueira, sua problemática, relações
com a natureza; e a produção de arroz irrigado, localização e quantidade de bombas
de sucção, conservação das margens, dados de produção e área plantada, modo de
produção.
Para se analisar as condições de vida e de trabalho dos pescadores
artesanais, bem como seus saberes e percepções sobre a pesca no rio Vacacaí,
optou-se pela documentação direta e indireta. A documentação indireta se fez pelas
pesquisas bibliográficas e pelas informações obtidas em conversas com alguns
pescadores antes da elaboração e aplicação das entrevistas. Na documentação direta
a técnica utilizada foi a entrevista com aplicação de questionários aos representantes
de pescadores de Santa Maria, Colônia Borges (Restinga Seca), Restinga Seca
(cidade), Passo do Rocha (Vila Nova do Sul) e São Gabriel. Além disso, na
documentação direta com os pescadores foi utilizada a cartografia participativa, onde
os mesmos puderam cartografar seus territórios de pesca, moradia, etc.
Para que se pudesse conhecer a localização dos pesqueiros do rio Vacacaí,
optou-se pela prática da cartografia participativa. A partir da utilização de imagens de
satélite como ferramentas, enquanto eram entrevistados, os pescadores artesanais
foram convidados a identificar e mapear, de forma colaborativa, seus espaços de
vivência.
Para cobrir toda a área de interesse numa escala onde se fosse possível
reconhecer objetos e feições naturais, foram construídos três mosaicos de imagens
quickbird do Google Earh no tamanho A0 (841mm × 1189mm). Na montagem dos
mosaicos foi utilizado o software CorelDraw X6, onde cada imagem final agregou em
média 36 imagens,
A escala final das três imagens mosaicos ficaram
aproximadamente em 1:50.000, com pequenas variações de uma para outra, nessa
escala e com a boa qualidade das imagens, ficou fácil para os pescadores se
localizarem e assim apontarem seus pesqueiros.
326
O uso de imagens de satélite possui como aspecto positivo a facilidade de se
trabalhar com pessoas que não estão habituadas a interpretar mapas topográficos ou
não possuem alfabetização. Isso se confirmou ao se entrevistar o pescador mais
antigo entre os entrevistados, com 82 anos e residente na comunidade do Passo de
Barca, o mesmo não possui alfabetização e rapidamente, assim como todos os
demais, soube se localizar na imagem, identificando sua residência e seus locais de
pesca. Na maioria dos casos esses pescadores nunca tinham analisado uma imagem
de satélite, com bastante curiosidade os mesmos analisaram atentamente as imagens,
conversando entre si na identificação das feições do terreno e de seus locais de
vivência.
Com a finalidade de conhecer in loco a área de estudos, reconhecendo as
atuais condições das margens e do leito do rio, mapear a localização exata das
bombas de sucção das lavouras de arroz e encontrar pescadores para um pré-contato,
foram realizadas três expedições pelo rio Vacacaí. A partir de uma análise minuciosa
de imagens de satélite e do auxílio de algumas pessoas que já haviam navegado pelo
rio Vacacaí, estabeleceu-se o local mais à montante possível para que se pudesse
navegar, devido ao baixo nível do rio. Esse local localiza-se à cerca de 30 quilômetros
da área urbana de São Gabriel e a extensão do leito do Vacacaí deste ponto até sua
foz é superior a 200 quilômetros.
Ao se planejar a logística pela qual se daria a execução das expedições
definiu-se três recortes, do ponto inicial até o Balneário do Verde, deste ponto até o
Balneário das Tunas e por fim, do Balneário de Tunas até a foz. Estabelecido esses
recortes, a execução se deu primeiramente dos dois recortes à jusante e por último se
navegou o trajeto mais à montante do Vacacaí.
Para as duas primeiras foi utilizado uma embarcação do modelo “chata” de
fabricação artesanal com capacidade para quatro passageiros, na primeira expedição
o trajeto foi cumprido com propulsão a remo, já na segunda expedição a embarcação
foi equipada com motor de popa marca Suzuki de 4 Hp .
Na terceira expedição a embarcação utilizada foi um modelo “Marujo 430” da
marca Levefort, também com capacidade para quatro passageiros, essa embarcação
foi equipada com motor de popa da marca Branco Marine com potência de 15 Hp.. As
três expedições contaram com um carro de apoio, outras ferramentas utilizadas foram
uma câmera fotográfica semiprofissional para registro de imagens e um GPS da marca
Garmin modelo 76 para marcação do trajeto e dos pontos relevantes.
327
Desenvolvimento
De um lado os pesqueiros do rio Vacacaí, locais definidos a partir da
percepção dos pescadores artesanais sobre seus territórios de vivência e mapeados
com o auxílio da cartografia participativa. Locais conhecidos por todos e de livre
acesso a qualquer pescador que neles chegar. Portanto, são locais de uso coletivo
entre os pescadores, onde a relação de respeito com o próximo predomina na
mitigação de conflitos entre os mesmos. De outro, a territorialidade expressa pela
orizicultura irrigada ao longo do leito do rio através da instalação das bombas de
sucção, locais que na maioria das vezes são caracterizados pela degradação das
margens do rio. Ambas as atividades possuem pontos específicos onde realizam suas
funções.
No caso dos pesqueiros, segundo as informações obtidas com os
pescadores, os mesmos não possuem uma área de influência específica,
tecnicamente o raio de influência de cada pesqueiro será o comprimento e a
quantidade de redes de emalhe e/ou espinhéis utilizados. No entanto, como os efeitos
negativos, principalmente na degradação das margens proporcionado pela instalação
das bombas de sucção pra lavoura de arroz, muitas vezes podem alcançar muitos
metros, até quilômetros de extensão, e o assoreamento causado pela erosão dessas
margens interfere na dinâmica do rio como um todo, optou-se por identificar as
bombas mais próximas de cada pesqueiro. Em outras palavras, buscaram-se
identificar os pesqueiros que possuem mais bombas de sucção próximas de si. A partir
da proximidade e da densidade de bombas de sucção em relação aos pesqueiros,
identificou-se alguns locais com maior potencialidade de se tornarem geradores de
conflitos (Figura 1).
Dos quatorze pesqueiros mapeados no rio Vacacaí e que se encontram no
trecho navegado durante a pesquisa, nove deles possuem bombas de sucção
localizadas até 1000 metros de sua localização. Destes, destacam-se três que
possuem bombas de sucção localizadas a menos de 100 metros de distância, o
pesqueiro “Largão”, que possui uma bomba nesta proximidade e os pesqueiros “Foz
do Rio São Sepé” e “Prateleira”, que possuem duas bombas localizadas a menos de
100 metros cada. O pesqueiro “Prateleira”, além de disputar sua localização com duas
bombas muito próximas, também possui outras quatro bombas localizadas na faixa
dos 500 aos 1000 metros, uma delas à montante e três à jusante.
328
Figura 1: Pesqueiros e bombas no rio Vacacaí.
Org.: Moraes, 2015.
O pesqueiro “Passo do Camisão”, que foi apontado por todos os pescadores
entrevistados como um importante pesqueiro do Vacacaí, é marcado pela presença de
três bombas de sucção na faixa de análise, uma delas localizada entre 100 e 500
metros de distância e duas delas na faixa dos 500 aos 1000 metros. O pesqueiro “G”,
que localiza-se à montante do pesqueiro “Passo do Camisão, possui quatro bombas
localizadas entre 500 e 100 metros de distância, duas a montante e duas a jusante.
Neste último também há a presença de mais três bombas distantes pouco mais de
1000 metros a montante. As imagens anexas ao mapa final mostram o nível de
degradação das margens do rio Vacacaí nos locais onde estão instaladas as bombas
localizadas próximas a este pesqueiro, mesmo que estejam todas localizadas a mais
de 500 metros de distância, o impacto para o rio e para a pesca potencializa-se pelo
elevado número de bombas próximas entre si.
“Foz do Arroio Arenal” e o pesqueiro “O” também possuem duas bombas localizadas
entre 100 e 500 metros de distância cada, neste último encontram-se uma a jusante e
329
outra a montante, e no “Foz do Arenal” ambas encontram-se a montante. Os
pesqueiros “Paredão” e o pesqueiro “M” possuem uma bomba localizada entre a faixa
dos 500 aos 1000 metros de distância cada.
Conclusões
A possibilidade de estar observando em loco o objeto de estudo proporcionou
um alcance amplo sobre a realidade da pesca artesanal no rio Vacacaí, o contato com
os pescadores possibilitou obter uma imensa quantidade de informações que não
seriam encontradas em nenhum outro lugar, senão ouvidas da boca dos próprios
pescadores artesanais, além é claro da possibilidade de se visualizar as condições
ambientais das margens do rio Vacacaí ao longo do seu curso navegável.
Como fruto das entrevistas, podemos realizar uma caracterização dos
principais elementos relacionados ao desenvolvimento da pesca artesanal no Vacacaí,
desde a captura e processamento do pescado até a venda, além de se ter noções
sobre as condições de vida e de trabalho destes pescadores. Essas informações são
importantes para que se evidencie a existência do pescador artesanal dos rios e lagos
do Rio Grande do Sul, ratificando a importância da sua contribuição para a
conservação desses ecossistemas e o quanto é necessária uma maior atenção, por
parte dos gestores públicos, a esse modelo de atividade econômica.
Observou-se que os pescadores artesanais possuem amplo conhecimento
histórico sobre o Vacacaí, compreendendo a situação atual de conservação desse
curso d’água e a contribuição de cada atividade econômica nele desenvolvida para a
sua deterioração, inclusive a própria pesca, quando praticada de forma desordenada e
em períodos de defesa, o que constitui crime ambiental. Ficou clara a grande
preocupação dos pescadores do Vacacaí com a contaminação das águas por
agroquímicos utilizados tanto na orizicultura quanto nas lavouras cultivadas com soja,
pois esta é a cultura agrícola que domina as áreas de lavouras permanentes nos
municípios por onde o rio Vacacaí percorre. Quanto ao consumo excessivo de água na
irrigação das lavouras de arroz, esta também está entre as principais preocupações
dos pescadores. No entanto, por possuírem amplo conhecimento sobre os fenômenos
naturais, esses pescadores conseguem situar o fator determinante dos níveis
pluviométricos nos períodos de déficit hídrico, bem como compreendem a importância
da orizicultura para a economia dos municípios em que vivem. Talvez por isso o
problema de consumo excessivo de água na irrigação das lavouras de arroz seja visto
como menos prejudicial que a pesca predatória praticada por pescadores amadores.
Mesmo assim, durante as entrevistas muitos pescadores levantaram a necessidade de
330
se estabelecer limites na quantidade de água retirada do rio para a irrigação em
períodos onde se passe por estiagem severa.
Essa possibilidade de se estabelecer limites no consumo de água pela
orizicultura em períodos de estiagem, levantada pelos pescadores artesanais do
Vacacaí, pode e deve ser amplamente discutida pelos gestores dos recursos hídricos.
Além disso, devem ser levadas em consideração nas tomadas de decisões as
informações aqui obtidas, qual sejam a localização dos pesqueiros do Vacacaí e sua
proximidade com as bombas de irrigação das lavouras de arroz. Pois estas são o
símbolo da ligação dessa atividade econômica com o rio Vacacaí e com a pesca
artesanal e demais atividades desenvolvidas neste ambiente e, através dessa análise,
fica evidente que essa proximidade entre pesqueiros e bombas de irrigação
constituem potenciais territórios de conflitos.
A fundo o que se buscou aqui foi trazer a visão dos pescadores artesanais
sobre os principais problemas enfrentados em sua faina pesqueira. Portanto, devem
ser desenvolvidos muitos estudos que embasem as tomadas de decisões, pesquisas
que aprofundem a análise das dinâmicas naturais, da complexidade dos usos dados
para o rio Vacacaí e que também deem enfoque à percepção dos pescadores
artesanais sobre esse curso de água tão importante para a região e para o estado.
Criado um grande mosaico de informações e fontes de conhecimento sobre o
rio Vacacaí, poder-se-á se ter uma gestão apropriada desse ecossistema. Com isso
deve-se buscar a solução de conflitos existentes entre os usuários do rio ou mitigação
de possíveis conflitos que possam vir ocorrer. Essa talvez seja a principal contribuição
da presente pesquisa, sob a perspectiva da categoria do território, mostrar os
potenciais territórios de conflitos existentes entre dois do total de usuários do rio
Vacacaí, qual sejam, os pescadores artesanais e os orizicultores.
Bibliografia
BRASIL; Ministério da Agricultura. Disponível em <www.agricultura.gov.br>.
BRASIL; Ministério da Pesca e Aquicultura. Disponível em: <www.mpa.gov.br>.
CARDOSO, E. S. et al.; Pesca e Atividades Complementares em Águas Interiores
do Rio Grande do Sul. In: XII Encontro de Geógrafos da América Latina. EGAL.
Montevideo, 2009.
Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler. Disponível em
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Biodiversidade, Cultura e Soberania Alimentar do Povo Brasileiro. Disponível em:
331
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REBOUÇAS, A. C.; Água e Desenvolvimento Rural. In. Revista Estudos Avançados,
vol. 15, n. 43, p. 327-344, 2001.
332
A FLORA RELICTUAL COM ESPÉCIES ENDÊMICAS NO CERRO DO
ITAQUATIÁ E CERRO DO RIBEIRÃO NO OESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO
PEDRO DO SUL/RS
Rodrigo Corrêa Pontes - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Leonardo Moreira Aguiar - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Prof.Ms. Leopoldo Witeck Neto - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Prof. Dr. Mauro Werlang Kumpfer - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O presente trabalho busca apresentar a relevância da florística relictual da encontrada
no município de São Pedro do Sul, que se estabeleceu em razão da geomorfologia
propícia para a formação deste tipo de vegetação.
Palavras-chave: endemismo, fitogeografia, Geomorfologia, relictos.
INTRODUÇÃO
A interferência antrópica tem afetado diretamente os diversos tipos de
ambientes em razão da apropriação e uso desenfreado dos ecossistemas naturais.
Em razão do aumento da população durante os últimos cinqüenta anos, a produção
agrícola buscou expandir suas áreas para desta forma atender a nova demanda do
mercado internacional.
Desta forma, a expansão agrícola, a criação de gado
extensiva, o florestamento com espécies exóticas (silvicultura) e a modernização do
homem no campo adentraram em espaços que anteriormente não eram visados para
atividades agrícolas. Assim, muitos ambientes têm sido agredidos diretamente, sendo
alguns considerados muito frágeis por estarem representados em pequenas áreas e
abrigarem espécies endêmicas e ameaçadas de extinção.
De acordo com Troppmair (2012) a paisagem modificada pelo homem coloca
em risco a sobrevivência de espécies da fauna e flora que a constituem. Sem o
conhecimento e a compreensão dos complexos mecanismos de sobrevivência das
espécies não há como cobrar da sociedade uma atitude justa perante a causa. Em
razão da situação presente, tornam-se necessários estudos fitogeográficos, buscando
divulgar a riqueza florística presente em nossos ecossistemas.
333
A paisagem do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão, no distrito de
Xiniquá, no município São Pedro do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, favorece a
formação de um ambiente propícios para o surgimento de endemismos, verdadeiros
relictos vegetacionais. Representantes da família Bromeliaceae e Cactaceae são
verdadeiros testemunhos de paleoclimas anteriores ao atual, e ao longo dos milhares
de anos ficaram isolados em locais que reproduzem as condições necessárias para
sua permanência e reprodução. Estas áreas são o que conhece-se como refúgios
ecológicos, que por razões geomorfológicas e pedológicas o homem ainda não
conseguiu impactá-los ao avançar sobre eles. Estes locais geralmente são escarpas
íngremes, afloramentos rochosos e solos muito pobres em nutrientes, onde não é
rentável e por esta razão há pouco interesse para a agricultura.
OBJETIVOS
Perante a atual problemática ambiental, este trabalho possui como objetivo
geral a identificação dos endemismos do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão, a
oeste de São Pedro do Sul, buscando enfatizar a importância destes frágeis
ecossistemas com fins conservacionistas e preservacionistas
Como objetivos específicos, o trabalho busca: a) identificar e representar
cartograficamente a área de estudo; b) descrever a situação em que se encontra a
área de estudo perante a ação antrópica e c) inventariar o contingente de espécies
endêmicas na área de estudo, confirmando a importância fitogeográfica da área.
METODOLOGIA
O trabalho iniciou-se com a adoção da proposta metodológica da proposição
da análise sistêmica da paisagem e o método hipotético-dedutivo para uma maior
aproximação da realidade com a pesquisa.
Após a seleção da área de estudo,
buscou-se um levantamento bibliográfico sobre a temática proposta a investigação dos
objetivos, para desta maneira definir os subsídios para o desenvolvimento do tema,
orientação teórico-metodológica e organização dos procedimentos ao longo do
trabalho. A revisão bibliográfica realizou-se a partir de leituras sobre fitogeografia,
onde foram consultados artigos, dissertações e livros os quais permitiram definir o
marco conceitual deste trabalho. Os procedimentos metodológicos foram organizados
em quatro fases: a) localização geográfica, delimitação da área de estudo e sua
caracterização; b) coleta de dados à campo e investigação (levantamento); c)
334
organização e interpretação dos dados coletados e d) elaboração dos resultados e
conclusões.
A área de estudo encontra-se a oeste do município de São Pedro do Sul, Com
a definição da área de estudo, iniciou-se a delimitação da área e de localização
geográfica, baseando-se na carta topográfica da Diretoria do Serviço Geográfico do
Exército Brasileiro, correspondente à Carta Topográfica de Mata, Folha SH.21-X-D-VI1, MI-2964/1, Rio Grande do Sul, na escala 1:50.000, localizada entre as coordenadas
geográficas 29º 30’ e 29º 45’ de Latitude Sul e 54º 15’ e 53º 30’ de Longitude Oeste.
Figura 1: Modelo digital da elevação da área de estudo a oeste de São Pedro do Sul.
Fonte: Autores.
Os dados foram coletados com um aparelho receptor de GPS (Sistema de
Posicionamento Global), modelo eTrexLegendHCx. Foram definidos os limites da
área, formando um polígono. Utilizou-se o Datum WGS-84 e o programa Google Earth
335
6.1. As coordenadas geográficas coletadas em campo pelo receptor GPS foram
inseridas no programa GPS Trackmaker Professional (GTM PRO, versão 4.8) sobre a
base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul, esta com escala de
1:50.000, na carta topográfica referida acima, constituindo um mapa de localização.
Para a base cartográfica foram utilizados arquivos digitais para uso em SIG,
Base Cartográfica digital do Rio Grande do Sul, escala 1:250.000. Foi utilizada uma
imagem SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), com resolução de 90 metros. A
adição da base cartográfica com dados coletados a campo permitiu a criação do mapa
base da área em estudo. A partir desse mapa base foi desenvolvido o mapa
hipsométrico da área. Em seguida, após a interpretação de imagens de satélite
fornecidas pelo programa Google Earth e do mapa geológico produzido pela
Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (2010), caracterizou-se as litologias
presentes. Durante trabalho de campo buscou-se a confirmação ou correção, dos
contatos
das
formações
geológicas
presentes.
Posteriormente
todas
essas
informações foram selecionadas e reunidas através da confecção de mapas
demonstrando as características ambientais da área de estudo. Os mapas foram
confeccionados através do programa ArcGis 10, onde foram digitalizadas as curvas de
nível, apresentando as cotas altimétricas da área de estudo.
A respeito da análise da vegetação, adotou-se do método de Caminhamento,
proposto por Filgueiras et al. (1994), que consiste em três etapas: a) reconhecimento
dos tipos de vegetação na área a ser amostrada, b) elaboração da lista das espécies
encontradas e c) análise dos resultados. A identificação das espécies vegetais foi
realizada in situ e posteriormente no Herbário Florestal do Departamento de Ciências
Florestais da Universidade Federal de Santa Maria.
DESENVOLVIMENTO
Para a caracterização da flora relictual no Cerro do Itaquatiá e no, Cerro do
Ribeirão primeramente devemos entender a sua forma geomorfológica. De acordo
com a proposta de Ross (1996) a geomorfologia nessa área corresponde a
macroforma estrutural denominada Bacia Sedimentar do Paraná, onde são
reconhecidas duas grandes unidades esculturais como Depressão periférica sul-riograndense e os Planaltos e Chapadas da Bacia do Paraná. De acordo com Sartori
(2009) na Depressão periférica sul-rio-grandense, ocorrem as Formações Sanga do
Cabral, Santa Maria e Caturrita e a unidade Planaltos e Chapadas da Bacia do Paraná
abrange as Formações Botucatu e Serra Geral. O Cerro do Itaquatiá e o Cerro do
Ribeirão são morrotes testemunho de topo plano com a altitude aproximada,
336
respectivamente, de 204 e 256 metros. Ambos possuem nas escarpas íngremes no
seu entorno. Conforme os dados coletados em campo e referencial teórico da CPRM
(2014), a litologia de ambos morrotes consiste em três tipos distintos. Na sua base
pode-se encontrar a Formação Caturrita, que consiste em arenitos finos, médios e
grossos a conglomerados, róseos a alaranjados, com laminação cruzada de médio à
grande porte, podendo conter vertebrados fósseis (terápodes), fragmentos vegetais
(troncos silicificados) e perfurações de invertebrados (icnofósseis). Os sedimentos
foram oriundos de ambiente continental, associado a canais fluviais e corpos lacustres
depositados durante o Triássico Superior.
Figura 2. Perfil do Cerro do Itaquatiá, com escarpa de arenito.
Fonte: Autores
Na porção intermediaria encontra-se a Formação Botucatu, apresentando
arenitos finos a grossos, de coloração avermelhada, grãos bem arredondados e com
alta esfericidade, com estratificações cruzadas de grande porte. A formação
corresponde à ambiente continental desértico.
Foi depositado durante a segunda
metade do Jurássico. Nas escarpas do cerro pode-se visualizar as estratificações
cruzadas de grande porte. Talvez por esta feição que o morrote leva a denominação
“Itaquatiá”, significando no tupi-guarani “pedra-pintada”. No topo, apenas no Cerro do
337
Itaquatiá apresenta-se uma fina camada da rocha da Formação Serra Geral, composta
por derrames basálticos, granulares finos a médios, maciços de cor cinza escuro.
Inseridos neste tipo de forma geomorfológica estão os redutos ecológicos de
flora, verdadeiros testemunhos de eventos paleoclimáticos. As espécies ali se
estabeleceram em razão de condições edáficas e ambientais. Conforme Hauck (2009)
reduto é uma área atual que abriga vegetação que se expandiu no passado (durante o
Pleistoceno) e com o aumento da temperatura e umidade não foi capaz de competir
por espaço permanecendo em lugares onde resiste na paisagem como um
ecossistema. Já refúgio reporta-se à flora confinada em setores mais úmidos,
permitindo seu mantenimento durante os tempos áridos do Pleistoceno.
O estudo da vegetação relitcutal do Cerro do Itaquatiá e Cerro do Ribeirão
exigem, primeiramente, observações sobre o meio físico e a dinâmica da vegetação.
No Rio Grande do Sul é curiosa a predominância de áreas campestres em um clima
favorável para o desenvolvimento de florestas. A mescla de vegetação herbácea,
arbustiva e arbórea e seus arranjos já despertaram o interesse de pioneiros do estudo
fitogeográfico do Rio Grande do Sul, como pode-se observar no trabalho de Rambo
(1956) e de Lindmann (1906). Marchiori (2004, p.16.) afirma que os campos nativos
foram interpretados por Lindman como relíctos de climas pretéritos mais secos do que
o clima atual, concordando com os eventos climáticos do Pleistoceno.
Nos estudos fitogeográficos de Marchiori (2002) e Rambo (1956) é notório que
a vegetação do estado do Rio Grande do Sul situa-se em um período transitório
induzido pelos padrões climáticos firmados entre os períodos do Pleistoceno e do
Holoceno. Marchiori (2004) propõe que para deduzir a distribuição da vegetação do
Estado, no caso da transição campo - floresta, deve-se dar ênfase na biologia das
espécies representativas dessas áreas, assim como suas relações com o relevo.
Na mescla de fisionomias vegetacionais distintas podem ocorrer pequenas
áreas com vegetação aberta, como campos e campos rupestres, verdadeiras ilhas
ricas em endemismo, apresentando geralmente espécies xerofíticas e heliófilas.
Conforme Romariz (2012) uma espécie heliófila é um ser vivo que necessita de alta
intensidade de luz para efetuar a fotossíntese e garantir seu ciclo vital.
No Cerro do Itaquatiá foram encontradas sete espécies ao todo. Foram
encontradas ao todo sete espécies endêmicas: Parodia ottonis, Parodia linkii,
Echinopsis
oxygona
(Cactaceae),
Dyckia
ibicuiensis,
Tillandsia
lorentziana
(Bromeliaceae), Sinningia macrostachya (Gesneriaceae) e Eugenia hamiltonii
(Myrtaceae). No Cerro do Ribeirão foram encontradas ao todo dez espécies
endêmicas: Parodia ottonis, Parodia glaucina, Parodia linkii, Echinopsis oxygona
(Cactaceae), Dyckia racinae, Dyckia selloa, Tillandsia lorentziana, Sinningia
338
macrostachya (Gesneriaceae) e Schlechtendalia luzulifolia (Asteraceae) e Trithrinax
brasiliensis (Arecaceae).
Figura. 3. Encosta com escarpa abrutpa no Cerro do Ribeirão.
Fonte: Autores.
As espécies encontram-se em afloramentos rochosos no topo e nas escarpas
com orientação nordeste e norte, onde é maior o índice lumínico e de temperatura. Em
razão das espécies se encontrarem nas partes elevadas, há pouca interferência
antrópica.
Analisando a flora dessas ilhas vegetacionais pode-se perceber as diversas
formas anatômicas devido à adaptação. Holz (2003) relata que as mudanças no tipo
de ambiente no passado influenciavam na distribuição e na morfologia da vegetação.
Em razão de pressões ambientais no passado as espécies adquiriram estruturas que
permitem sua sobrevivência em um substrato seco, com uma raiz para se sustentar e
tirar nutrientes, além de habitar os mais distintos nichos ecológicos.
Waechter (2002) cita gêneros chaquenhos presentes na flora do Rio Grande do
Sul, como Dyckia (Bromeliaceae), Echinopsis, e Parodia (Cactaceae), entre outras.
Estes elementos migraram da Província Chaquenha (Argentina e Paraguai) durante
tempos áridos no passado geológico, quando foi propício para seu avanço,
339
colonizando amplamente ambientes xerófitos como afloramentos rochosos, solos
arenosos e até escarpas abruptas.
Sobre a espécie Trithrinax brasiliensis, Marchiori (2004) faz importantes
considerações:
Cabe salientar que a presença da espécie nestes locais assume um grande interesse
fitogeográfico, pois certamente antecede a invasão holocênica da floresta pluvial na
região, a semelhança da criúva (Leucothoe eucalyptoides) e da Schaefferia
argentinensis), constituindo verdadeiras relíquias do período xerotérmico pleistocênico
junto as florestas Estacional, Atlântica e mista. (MARCHIORI, 2004, p. 76).
Este tipo de vegetação está intimamente associado a uma formação campestre
(mais aberta) do que a formação florestal (mais fechada) por necessidades fisiológicas
de sobrevivência. Nestas composições relictuais, predominam elementos xerófitos,
adaptados a escassez de água e nutrientes, à insolação e à temperatura.
Representantes das famílias Bromeliaceae e Cactaceae são alguns exemplos.
Estudos sobre a dinâmica climática do Pleistoceno explicam a presença dessas
xerófitas nos tempos atuais.
De acordo com Marchiori (2004) a vegetação no Estado é formada por campos
e florestas, em constante competição por espaço e influenciada por fatores
ambientais. As áreas campestres, sendo a maioria, são verdadeiros relictos do clima
do Pleistoceno, onde atualmente sofre o avanço das florestas em razão do clima do
Holoceno correspondente a temperaturas mais quentes e umidade. Conforme Romariz
(2012) uma área relíquia ou relictual é uma extensão geográfica onde ocorrem
espécies cuja presença não pode ser explicada pelas condições climáticas e
ecológicas atuais, sugerindo que sua ocorrência nessa área ocorreu em condições
diferentes, em tempos pretéritos. As espécies que ali ocorrem são chamadas de
relíquias.
Conforme Melo et al. (2009) é Schlechtendalia luzulifolia, uma espécie
endêmica, com ocorrência restrita. Foi encontrada uma grande população no topo do
Cerro do Ribeirão. Sobral (2003) cita a presença de Eugenia hamiltonii para os
campos rupestres da Depressão Central no Rio Grande do Sul. Marchiori (2004)
também cita os órgãos subterrâneos espessos, caules modificados como xilopódios de
muitas espécies de mirtáceas, armazenadores de nutrientes, contribuem com a
sobrevivência de espécimes em ambientes com pouca disponibilidade de macro e
micronutrientes essenciais à sobrevivência. O autor também enfatiza que estas
características indicam xeromorfismo, o que discorda da vegetação do entorno, com
caráter arbóreo.
340
Rambo (1956) enfatiza em seus estudos fitogeográficos sobre a vegetação do
Rio Grande do Sul a presença de plantas xerófitas, como nos morros graníticos em
torno de Porto Alegre e em alguns tabuleiros areníticos da Depressão periférica sulrio-grandense e do sudoeste do Estado. O autor mencionado relata a vegetação dos
encontrada
“Ao pé dos paredões, as sociedades silváticas se abrigam a sobra dos rochedos, que
lhes fornecem solo humoso e água em abundância. Sobre os próprios rochedos
verticais alinham-se os litófilos, cactos redondos em forma de ouriço (Echinocactus),
tunas colunares (Cereus) e gravatás (Dyckia) e um mundo de líquenes crustosos e
foliáceos” (RAMBO, 1956, p. 129).
Esses
protagonistas
constituintes
do
ecossistema
atual
apresentam
características morfológicas adaptadas em tempos passados e atualmente mostramse inadequadas às condições climáticas atuais; são como testemunhos das restrições
a que foram submetidos no passado. Dessa forma essas áreas são nichos ecológicos,
oumelhor, dizendo, relictos vegetacionais. Como exemplo de endemismo do Rio
Grande do Sul, Aziz Ab’Saber resalta as cactáceas nos campos:
Onde quer que apareçam, constituem mini-refúgios de uma flora outrora mais
extensa e biodiversa. Eles todos restaram amarrados em minúsculos espaços
ecológicos, constituídos por lajedos emergentes de arenitos ou chão pedregosos, que
funcionam como litobiomas, sítios de aridez rochosa e resistentes bancos genéticos
para a sobrevivência de gerações de cactáceas. (Ab’Saber ,1995, p. 26)
É indispensável comentar sobre a fragilidade destes ecossistemas, que
algumas ocasiões não permitem o emprego de métodos tradicionais de monoculturas
e silvicultura por motivos edáficos (solos rasos) e declividade. A exploração destas
áreas é limitada devido à grande rochosidade e a pouca oferta de nutrientes no solo.
Mesmo assim, populações estão sendo devastadas. Deble (2012, p. 67) cita a
introdução da silvicultura, pecuária e ecoturismo. Deve-se ressaltar a presença de
fanerófitas
invasoras
nestes
ambientes,
que
introduzidas
pelo
homem,
descontroladamente colonizam solos pobres, terrenos rochosos e áreas degradadas,
colocando em risco a sobrevivência de espécies nativas endêmicas. Marchiori (2004)
cita diversas espécies fanerófitas invasoras como Pinus elliotii, Pinus taeda, Ulex
europeus, entre outras. Estas espécies invasoras são fortes competidoras por
ambiente e que de certa forma ganham a competição perante espécies. A imposição
deste tipo de elemento acaba comprometendo as necessidades nutricionais e
principalmente lumínicas das espécies nativas.
341
CONCLUSÃO
A flora endêmica dos morrotes do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão
está associada com a geomorfologia dos morrotes, que apresentam ambientes
adequados para abrigar espécies relictuais, endêmicas e ameaçadas de extinção com
necessidades particulares de sobrevivência como calor, luminosidade e drenagem.
O contingente florístico é formado por espécies xerófitas e endêmicas, sendo
algumas ameaçadas de extinção. Foi abundante a presença de elementos
chaquenhos, como as espécies pertencentes aos gêneros Echinopsis e Parodia
(Cactaceae), Trithrinax brasiliensis (Arecaceae) e Dyckia ibicuiensis, Dyckia racinae,
Dyckia selloa (Bromeliaceae), demonstrando que o conjunto geomorfológico do oeste
de São Pedro do Sul de alguma forma serviu como abrigo e rota destas espécies, que
provavelmente, migraram durante condições climáticas mais propícias para sua
expansão. O estudo também observou que a ação antrópica não avançou totalmente a
estes espaços em razão de condições impróprias para agricultura, em razão da
declividade, de solos rasos ou paupérrimos em nutrientes e a presença de
pedregosidade dos mesmos. A presença de Parodia linkii, Parodia ottonis, Echinopsis
oxygona, Tillandsia lorentziana e Sinningia macrostachya é justificada pelos seus
eficientes mecanismos de propagação, característica apresentada por espécies
dominantes. Schlechtendalia luzulifolia (Asteraceae), Dyckia ibicuiensis, Dyckia selloa,
Dyckia racinae (Bromeliaceae) e Trithrinax brasiliensis (Arecaceae) são espécies mais
raras, com poucos indivíduos e em uma área de ocorrência. Com a exceção de Dyckia
ibicuiensis, todas as outras espécies foram encontradas apenas no Cerro do Ribeirão.
O trabalho enriqueceu para o conhecimento da flora de São Pedro do Sul e
espera-se também que este possa contribuir de alguma maneira como referência a ser
considerada em trabalhos posteriores, relacionados à fitogeografia e estudos
referentes à vegetação no município São Pedro do Sul.
REFERÊNCIAS
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formação de areais na Campanha Gaúcha. Ciência & Ambiente, 11, p. 7-31
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343
EJE 3- GEOGRAFIA FÍSICA Y SISTEMAS DE INFORMACIÓN GEOGRÁFICA
344
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL
345
COMPARAÇÃO ENTRE DADOS GEOGRÁFICOS: AS OTTOBACIAS DA
AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA) E AS CARTAS TOPOGRÁFICAS
DO EXÉRCITO
Maurício Rizzatti - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Roberto Cassol - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Natália Lampert Batista - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Nadinne da Silva Fernandes - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo a comparação dados geográficos, referentes a
Bacias Hidrográficas, oriundos das Ottobacias,daAgência Nacional de Águas (ANA),e
da delimitação dos divisores de água em Cartas Topográficas do Exército. Além disso,
com base nos bancos de dados mencionados,verificaram-se as diferenças nas
delimitações de bacias e analisou-se a confiabilidade e a acurácia cartográfica em
relação à realidade. Por meio dos mapas da Bacia Hidrográfica do Rio VacacaíMirimconstatou-se queasOttobacias da ANA possuem a presença de nascentes, de
afluentes, de outras bacias hidrográficas, além disso,em determinadas coordenadas o
rio principal não está contido na bacia hidrográfica em estudo o que revela uma menor
confiabilidade nos dados, mesmo sendo dados oficiais. Em contrapartida, o mapa
elaborado através das cartas topográficas do exército possui uma área mais coerente
com a realidade, abrangendo somente os rios de sua bacia. Contudo, para a correta
delimitação das bacias é necessário que o mapeador/usuário conheça a teoria
cartográfica e realize corretamente a delimitação do divisor de águas.Baseado nisso,
concluiu-se que o mapa elaborado tendo como base cartográfica as cartas
topográficas apresentaram maior acurácia e confiabilidade que mapa em que se
utilizaram os dados das Ottobacias, da ANA.
Palavras-chaves: Comparação de mapas, bacias hidrográficas, ottobacias, cartas
topográficas, QGIS.
1. INTRODUÇÃO
A representação cartográfica da superfície terrestre é muito relevante para a
organização e planejamento do espaço, pois possibilita a geração de informações que
servem como auxílio na tomada de decisões na gestão territorial. O mapa, que é um
modelo conceitual de representação da realidade, permite o planejamento e a tomada
de decisão de forma mais coerente e adequada.
346
O estudo das bacias hidrográficas, por meio da Cartografia, também é
importante porque permitem o entendimento de fatores naturais (como a topografia e a
natureza de drenagem) e artificiais (como a influência que a atividade antrópica)
causam em um determinado local.
As bacias hidrográficas são áreas separadas topograficamente, ou seja, pelos
pontos de maior altitude do terreno que recebe o nome de divisor de água. É
constituída por um conjunto de rios que drenam suas águas das áreas das maiores
altitudes para as menores. Santos (2004) propõe a bacia hidrográfica como unidade
de planejamento por ser um sistema bem delimitado, composto por um conjunto de
terras topograficamente drenadas por um curso de água e seus afluentes, cujas
interações são integradas, sendo mais facilmente interpretadas.
Lanna (1995) adota a unidade territorial “bacia hidrográfica” como uma das
opções
para
o
planejamento
ambiental,
mostrando
algumas
vantagens
e
desvantagens. Sobre as vantagens mostra que a rede de drenagem de uma bacia
pode ser capaz de indicar relações de causa-efeito. Como desvantagens, relata que
nem sempre os limites municipais e estaduais respeitam os divisores da bacia.
Para Christofoletti (1980), o estudo hidrológico e das características físicas de
uma bacia hidrográfica tem aplicação nas seguintes áreas: escolha de fontes para
abastecimento de água, projeto e construções de obras hidráulicas, projetos de
drenagem, irrigação, regularização de corpos d’água e controle de inundações,
controle da poluição, controle de erosão; navegação; aproveitamento hidroelétrico,
operação de sistemas hidráulicos complexos, recreação e preservação do meio
ambiente e preservação e desenvolvimento da vida aquática.
Neste contexto, a bacia hidrográfica se torna uma unidade de estudo ambiental
essencial ao entendimento da configuração do espaço geográfico. Esse estudo pode
ser realizado por meio de levantamentos cartográficos ou com base em dados
disponibilizados por órgãos oficiais.
Entre os órgãos que possuem bancos de dados geográficos sobre as bacias
hidrográficas, destaca-se aAgência Nacional de Águas (2013), que mapeia o Brasil
continental em até seis diferentes níveis de codificação ou graus de classificação,
segundo o método desenvolvido por Otto Pfastatter.Esse sistema de codificação
associa um identificador único para cada bacia, que são organizadas em uma
estrutura hierárquica. Cada um desses níveis associa-se a um diferente grau de
detalhamento, consequentemente, agrega variadas quantidades de Ottobacias ou
unidades de gestão, conforme se pode observar na tabela 1.
347
Tabela 1: Nível de codificação e número de Ottobacias da ANA
Nível de codificação
Número de Ottobacias
1
6
2
39
3
351
4
2.541
5
14.921
6
60.001
Fonte: OLIVEIRA-GALVÃO, 2012.
De acordo com Rubert (2000), trata-se de um método natural, baseado na
topografia da área drenada e na topologia (conectividade e direção da rede de
drenagem). Ainda, a metodologia é aplicada inicialmente para o continente e consiste
em agrupar a rede de drenagem em três classes: aquelas que drenam diretamente
para o mar (podendo ser uma bacia ou uma região hidrográfica), aquelas que drenam
para bacias fechadas e aquelas que são tributárias dos dois primeiros casos
(RUBERT, 2000).
Os códigos (Nunivotto) são aplicados às quatro maiores bacias hidrográficas
identificadas que drenam diretamente para o mar, sendo-lhes atribuídos os algarismos
pares 2, 4, 6, e 8, seguindo uma ordem no sentido horário em torno do continente. À
maior bacia fechada é atribuída o código 0 (zero). As demais áreas do continente são
as regiões hidrográficas restantes, as quais são atribuídos os algarismos ímpares 1, 3,
5, 7, e 9, e são denominadas interbacias (RUBERT, 2000). Tais dados podem
subsidiar os mapeamentos e os planejamentos das bacias hidrográfica, porém,
observam-se determinados ruídos na delimitação de bacias disponibilizada pela ANA.
Uma alternativa para melhorar a acurácia dos geográficos utilizados é a delimitação
manual das bacias hidrográficas com base em Cartas Topográficas, com as quais é
possível observar localidades, vias de circulação, limites, áreas urbanas, bem como a
altitude e a rede de drenagem.
Para a delimitação manual, Finkler (2014) aponta as etapas indicadas por
Sperling (2007). Nestas etapas, primeiramente, define-se o ponto inicial (exutório) a
partir do qual será feita a delimitação da bacia. Após, reforça-se a marcação do curso
d’água principal e dos tributários. Em próximo momento, começa-se a delimitação da
bacia hidrográfica partindo do exutório e conectando os pontos mais elevados com
base nas curvas de nível. O limite da bacia circunda o curso d’água e as nascentes de
seus tributários. Para facilitar a definição dos limites é importante diferenciar os
348
talvegues48 dos divisores de águas49. A delimitação da bacia deve retornar ao ponto
inicial definido como exutório, além disso, a rede fluvial de drenagem pode ser
classificada segundo uma hierarquia como, por exemplo, a estabelecida por Horton
(FINKLER, 2014).
2. OBJETIVOS
Com base na contextualização inicial e em mapeamentos realizados com as diferentes
bases de dados geográficos, propôs-se os seguintes objetivos:
1)
Comparar dados geográficos, referentes a Bacias Hidrográficas, oriundos das
Ottobacias, da Agência Nacional de Águas (ANA), e da delimitação manual dos
divisores de água em Cartas Topográficas do Exército.
2)
Identificar as diferenças entre as bacias hidrográficas nos mapas elaborados.
3)
Analisar a confiabilidade e a acurácia cartográfica dos mapeamentos em
relação à realidade e a teórica cartográfica.
3. METODOLOGIA
Para a concretização dos objetivos desta proposta em primeiro momento foi
realizada a leitura de textos referentes a bacias hidrográficas e sobre Ottobacias, da
ANA, para aprofundar a fundamentação teórica sobre o tema.Após elaborou-se o
mapa da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim delimitado através do método de Otto
Pfastatter. Para isso, foi utilizada a malha digitalOttobacias nível seis, código é
776912.
Para a hipsometria da área em estudo, utilizou-se o Modelo Digital de Terreno
(MDT)da Missão do ônibus espacial de topografia por radar Shuttle Radar
TopographyMission (SRTM), disponibilizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA), com escala de 1:250.000 e 90 metros de resolução
espacial. A unidade de altitude é em metros, sendo o formato do arquivo GEOTIFF (16
bits) e o datum é o WGS-84 (sistema de coordenadas geográficas). A rede de
48
Os talvegues são depressões (vales), representados graficamente onde as curvas de nível
apresentam a curvatura contrária ao sentido da inclinação do terreno, indicando que nestes
locais ocorre concentração de escoamento (FINKLER, 2014).
49
Os divisores de água são representados pelo inverso de um talvegue, no qual as curvas de
nível apresentam curvatura voltada para o sentido da inclinação do terreno, sobre a qual as
águas escoam no sentido ortogonal às curvas em direção aos talvegues(FINKLER, 2014).
349
drenagem utilizada é disponibilizada por Hasenack; Weber (Org.), Base cartográfica
vetorial contínua do Rio Grande do Sul, escala 1:50.000.
O software utilizado para elaboração dos mapas é o QGISPisa(2.10.1). As
camadas serão reprojetadas para o datum SIRGAS 2000/UTM 22 S. O SRTM foi
cortado utilizando a camada máscara da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim (código
776912), extraído da ottobacias nível seis, da ANA. Da mesma maneira, a rede de
drenagem foi cortada utilizando a mesma camada máscara. Por fim, usa-se a
ferramenta novo compositor de impressão para a finalização.
Para realizar a comparação foi elaborado o mapa com base as Cartas
Topográficas, na escala de 1:50.000, elaboradas pelo Exército Brasileiro. Serão
utilizadas as seguintes cartas para a vetorização dos dados: Agudo (SH-22-V-C-V-2),
Arroio do Só (SH-22-V-C-IV-4), Camobi (SH-22-V-C-IV-2), Faxinal do Soturno (SH-22V-C-V-1), Jacuí (SH-22-V-C-V-4), Restinga Seca (SH-22-V-C-V-3), Sanga da
Laranjeira (SH-22-V-C-IV-3) e Santa Maria (SH-22-V-C-IV-1). Todas as cartas
topográficas citadas possuem de uma extremidade a outra 15’ de longitude por 15’ de
latitude.
Para elaborar o mapa da mesma bacia por meio da delimitação manual, todas
as Cartas foram georreferenciadas utilizando tipo de transformação linear e o método
de reamostragem vizinho mais próximo. Foi georreferenciado no sistema de referência
SAD-69/UTM 22 S. Após serem todas georreferenciadas, foi feita a criação de um
mosaico, afim de unir todas em um arquivo só, sendo reprojetado para SIRGAS
2000/UTM 22 S. A partir disso, efetuou-se a digitalização bacia hidrográfica do
Vacacaí-Mirim, a rede de drenagem, bem como as curvas de nível e pontos cotados
da mesma.
Com as curvas de níveis e pontos cotados digitalizadas deu-se a criação de um
MDT por Interpolação triangular (TIN) para representar a hipsometria do terreno.
Usou-se o novo compositor de impressão para a finalização do mapa. Ambos os
mapas, o elaborado a partir da ottobacias e pelas cartas topográficas, têm oito classes
para a classificação da hipsometria, com o intervalo de classes de 60 metros.
Na elaboração do mapa de localização da bacia hidrográfica, foi utilizada a
malha digital do IBGE 2013, a camada com o limite municipal (43MUE250GC_SIR) e o
limite da bacia é o elaborado através da digitalização das cartas topográficas. As
camadas foram reprojetadas para SIRGAS 2000/UTM 22 S. Para finalizar o mapa,
usa-se o compositor de impressão.
Por fim, calculou-se a área e o perímetro das duas bacias e sobrepôs-se os
layersde ambas a fim de comparar e identificar as diferenças entre ambas, analisandose a confiabilidade e a acurácia cartográfica em relação a realidade.
350
3.1. A área de estudo
A bacia hidrográfica do rio Vacacaí-Mirim localiza-se na região central do
estado do Rio Grande do Sul. O rio principal nasce no município de Itaara e tem seu
exutório no rio Jacuí, em Restinga Seca -RS. Está situada entre as coordenadas
geográficas 53° 46’ 30” a 53° 49’ 29” de longitude Oeste e 29° 36’ 55” a 29° 39’ 50” de
latitude Sul. Conforme Gastaldinie Oppa (2011), a bacia hidrográfica possui 1.120 km²,
abrangendo os municípios de Santa Maria, Restinga Seca, Itaara, São João do
Polêsine, Silveira Martins e Júlio de Castilhos(conforme a figura 1).
Figura 1. Mapa de localização da Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim
4. DESENVOLVIMENTO
Com o estudo em questão foi possível comparar os dados geográficos e
apontar as diferenças entre ambos. O mapa elaborado através do shapefiledas
Ottobacias da ANA (figura 2a), apresentou 250.833 metros de perímetro e uma área
de 1.096 km². O mapa elaborado através da digitalização da base cartográfica
baseada nas cartas topográficas (figura 2b) apresentou 205.753 metros de perímetro e
1.116 km² de área.
351
Figura 2. Mapa hipsométrico da Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim:
a) ottobacias e b) cartas topográficas.
352
Posteriormente a elaboração dos mapas, realizou-se uma superposição das
camadas para se apontar as diferenças entre limites de cada bacia hidrográfica (figura
3).
Figura 3. Superposição dos layers
Comparando os dois layers, percebe-se que os limites da bacia hidrográfica do
Vacacaí-Mirim são diferentes. Observando o mapa elaborado através da Ottobacias,
nota-se que o mesmo ele agrupa rios que estão presentes em outra bacia hidrográfica,
como as áreas próximas as coordenadas: 257.610mE e 6.696.120mN, na qual os
afluentes são do rio Vacacaí e não do Vacacaí-Mirim. Também, ao entorno das
coordenadas 272.235mE e 6.708.335mN, além de 283.340mE e 6.695.330mN, essa
última próxima a foz da bacia, ambas são afluentes do rio Jacuí, mas as nascentes,
conforme a Ottobacia, utilizada para elaboração do mapa fazem parte da bacia
hidrográfica do Vacacaí-Mirim. Observa-se também, por volta da coordenada:
230.000mE e 6.714.780mN, na porção mais a oeste da bacia, a presença de um corpo
de água. Trata-se da Barragem do Departamento Nacional de Obras e Saneamento
(DNOS), também conhecida como Barragem do Vacacaí Mirim. No mapa elaborado
353
com base na Ottobacia, a barragem em sua maior parte é cortada e o rio principal
(Vacacaí-Mirim) desaparece da bacia, voltando a aparecer na coordenada de
232.170mE e 6.712.000mN, ou seja, o rio principal, em um determinado momento
deixa de fazer parte da bacia hidrográfica que nomeia.
Observando o mapa baseado nas cartas topográficas, observa-se que o divisor
de água é bastante sinuoso/detalhado, que buscou os pontos cotados para
delimitação do mesmo, isto é, ele passa exatamente onde é a área mais elevada do
terreno. Também não agrupa nascentes de outras bacias, como no caso do delimitado
pela Ottobacias.
Comparando a área obtida através dos shapefiles, apresentou uma diferença
de 20 km². A área abrangente pela Ottobacia é de 1.096 km² e a vetorizada a partir
das cartas topográficas é de 1.116 km². Com a pesquisa em referenciais teóricos, foi
encontrado que a bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim possui uma área de 1.120 km²,
logo, delimitação baseada em cartas topográficas apresenta maior coerência com a
realidade. Pela digitalização feita manualmente, também pela aproximação da área da
bacia por parte do limite elaborado através das cartas topográficas, e pelo fato de não
apresentar ruídos, como a presença de nascentes de outras bacias, conclui-se que o
mapa elaborado com base cartográfica do exército possui uma melhor confiabilidade e
a acurácia cartográfica em relação a realidade.
5. CONCLUSÃO
Por meio dos mapas da Bacia Hidrográfica do Rio Vacacaí-Mirim constatou-se
que as Ottobacias da ANA possuem a presença de nascentes, de afluentes, de outras
bacias hidrográficas, além disso, em determinadas coordenadas o rio principal não
está contido na bacia hidrográfica em estudo o que revela uma menor confiabilidade
nos dados, mesmo sendo dados oficiais. Em contrapartida, o mapa elaborado através
das cartas topográficas do exército possui uma área mais coerente com a realidade,
abrangendo somente os rios de sua bacia. Contudo, para a correta delimitação das
bacias é necessário que o mapeador/usuário conheça a teoria cartográfica e realize
corretamente a delimitação do divisor de águas. Com base nessas observações,
concluiu-se que o mapa elaborado tendo como base cartográfica as cartas
topográficas apresentaram maior acurácia e confiabilidade do que mapa em que se
utilizaram os dados das Ottobacias, da ANA.
354
6. AGRADECIMENTOS
A Universidade Federal de Santa Maria pela infraestrutura disponibilizada para
a elaboração do trabalho e pela bolsa PROLICEN do primeiro autor e à Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo auxílio da bolsa de
mestrado a terceira autora.
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São Paulo, 2004. 183p.
355
ANÁLISE DE ERROS ASSOCIADOS A MODELOS DIGITAIS DE ELEVAÇÃO
DECORRENTES DO PROCESSO DE VETORIZAÇÃO DA REDE DE
DRENAGEM ORIUNDA DE CARTAS TOPOGRÁFICAS
Daniel Junges Menezes - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Romario Trentin - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Luís Eduardo de Souza Robaina - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
Uma das fontes mais utilizadas para delimitação de bacias hidrográficas e análise do
relevo por meio de SIG, no Brasil, tem sido as cartas planialtimétricas. Considerando
que grande parcela destas cartas topográficas foram disponibilizadas de forma
impressa, para o uso em ambiente SIG, se faz necessário a digitalização,
georreferenciamento e, então, vetorização de suas informações. Associadas a todas
estas etapas, podem ocorrer erros que prejudicam a acurácia e precisão das
informações. O presente trabalho tem como objetivo comparar Modelos Digitais de
Elevação gerados com a interpolação de redes de drenagem vetorizadas de maneiras
distintas e a sua aplicabilidade na obtenção de atributos físicos de uma bacia
hidrográfica. A partir dos MDEs gerados foram obtidos parâmetros morfométricos da
bacia hidrográfica e comparados visualmente e de forma quantitativa as respostas
oriundas perante cada MDE. O Trabalho mostrou que a vetorização da rede de
drenagem, no sentido foz para nascentes, compromete a obtenção de um MDE
modelo hidrológicamente consistente. Foi possível verificar que a resposta a
parâmetros morfométricos se deu diferenciada quando comparados os MDEs gerados,
destacando-se as grandes variações nas análises de hiposometria e declividade,
informações básicas para a caracterização do relevo e estudos de processos
associados a dinâmica de bacias hidrográficas.
Palavras-chave: Carta topográfica; Rede de drenagem; Bacias hidrográficas;
Morfometria
Introdução
Com os avanços tecnológicos e desenvolvimento significativo nas áreas de
sensoriamento remoto e geoprocessamento, não somente a produção de mapas, mas
também a análise geográfica foi otimizada e acrescida de significativos ganhos de
qualidade. Tendo sua utilização cada vez mais ampla, e sendo cada vez mais
difundidas também entre as demais ciências, as chamadas geotecnologias, trouxeram
avanços quanto a obtenção de informações e a integração de vários elementos
espaciais, como também contribuem muito com a aplicabilidade destas análises.
356
Considerada uma unidade fundamental no planejamento e apreensão da
dinâmica ambiental, seja a sua caracterização ou o estudo integrado de suas
características, a análise de bacias hidrográficas, tornou-se uma tarefa mais ágil por
meio das novas tecnologias de obtenção e disponibilização de Modelos Digitais de
Elevação – MDEs, juntamente com avanço dos Sistemas de Informação Geográfica –
SIGs.
O Modelo Digital de Elevação (MDE) é uma representação digital de uma seção
da superfície, por meio de uma matriz de células com coordenadas planimétricas (x,y)
e um valor da célula, correspondente à elevação (LUIZ et al, 2007). Com o
desenvolvimento de modelos digitais de elevação (MDEs) e de técnicas mais precisas
de extração de drenagem numérica e delimitação de bacias hidrográficas, tornou-se
propício o uso dos sistemas de informações geográficas para obtenção automática
das características físicas das bacias hidrográficas (MARQUES, 2006).
Da mesma forma, o surgimento dos Sistemas de Informações Geográficas
(SIGs), caracterizaram uma evolução no desenvolvimento dos modelos hidrológicos
estimulando a construção de diversos sistemas integrados, conectando os modelos
hidrológicos às bases de dados espaciais (CHAVES, 2002).
Teodoro et al (2007), colocam que a caracterização morfométrica de uma bacia
hidrográfica é um dos primeiros e mais comuns procedimentos executados em
análises hidrológicas ou ambientais, e tem como objetivo elucidar as várias questões
relacionadas com o entendimento da dinâmica ambiental local e regional.
De maneira geral, uma das fontes mais utilizadas para delimitação de bacias
hidrográficas e análise do relevo por meio de SIG, no Brasil, tem sido as cartas
planialtimétricas nas escalas de 1:50000 a 1:250000, oriundas dos levantamentos
topográficos realizados, principalmente no final da segunda metade do século
passado, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Exército
Brasileiro (DSG).
Estes produtos cartográficos apresentam informações referentes à altimetria,
rede de drenagem, sistema viário, manchas urbanas, uso do solo e, ainda, toponímias.
Considerando que grande parcela destas cartas topográficas foram disponibilizadas de
forma impressa, para o uso em ambiente SIG, se faz necessário a digitalização,
georreferenciamento, e então vetorização de suas informações. Associadas a todas
estas etapas, podem ocorrer erros que prejudicam a acurácia e precisão das
informações, além dos quais a escala do documento cartográfico permite.
Estes erros podem ter caráter espacial, tais como deslocamentos, relacionados à
inclusão equivocada de valores de atributos ou, ainda, associados à geometria dos
elementos representados, sendo comuns na etapa de vetorização das informações
357
das cartas topográficas. A imprecisão se dá por limitações da própria tarefa de
vetorização e incluem equívocos do operador e também metodológicos, que muitas
vezes respondem na aplicação destas informações e, consequentemente, nos
resultados oriundos de sua análise.
Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo comparar Modelos
Digitais de Elevação gerados com a interpolação de redes de drenagem vetorizadas
de maneiras distintas e a sua aplicabilidade na obtenção de atributos físicos de uma
bacia hidrográfica.
A área de estudo corresponde à bacia hidrográfica do arroio Guassupi,
localizada no município de São Pedro do Sul, porção central do Rio Grande do Sul
(Figura 1). A partir dos MDEs gerados foram obtidos parâmetros morfométricos da
bacia hidrográfica e comparados visualmente e de forma quantitativa as respostas
oriundas perante cada MDE.
Figura 1 - Localização da bacia hidrográfica do Arroio Guassupi.
Org.: Os autores, 2015
358
Materiais e métodos
A primeira etapa deste trabalho constituiu-se no levantamento bibliográfico,
procurando-se estabelecer um referencial teórico sobre a temática abordada,
delimitado por conceitos norteadores e buscando trabalhos anteriores que remetem à
discussão em escopo. Através desta, aprofundaram-se os conceitos e abordagens da
temática investigativa. Com esse propósito, e subsidiada por diversos autores, é que
se estabeleceu a estrutura teórica e metodológica a respeito da análise de bacias
hidrográficas a partir de MDEs e identificação de erros associados a estes modelos.
Para obtenção de um primeiro MDE oriundo de cartas topográficas, foi
utilizado a Base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul na escala
1:50.000 (HASENACK; WEBER, 2010).
Esta base vetorial contém elementos da
altimetria (pontos cotados e curvas de nível), hidrografia, sistema viário, manchas
urbanizadas e limite do Estado, resultantes da vetorização de 462 cartas da Diretoria
de Serviço Geográfico do Exército (DSG) e do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), sendo 460 na escala 1:50.000 e duas na escala 1:100.000. Os
dados espaciais digitais encontram-se georreferenciados em SIRGAS 2000 (Sistema
de Referência Geocêntrico para as Américas, realização 2000), de acordo com os
parâmetros oficiais do Sistema Geodésico Brasileiro e encontram-se no sistema de
projeção UTM (Universal Transversa de Mercator), fusos 21 e 22. Os dados vetoriais
estão armazenados no formato shape (ESRI©) (HASENACK; WEBER, 2010).
Para cobertura do arroio Guassupi foram utilizadas as cartas topográficas de
São Pedro do Sul e Quevedos com índice de nomenclatura SH.21-X-D-VI-2 e SH.21X-D-III-4, respectivamente. A área de cobertura destas cartas foi utilizada como limite
da área interpolada.
As informações oriundas das cartas topográficas foram processadas, gerando
assim um MDE, através da ferramenta topo to raster do Arc Toolbox disponível no
software ArcGis (ArcMap) 10.1 (ESRI, 2012). Este é baseado no programa ANUDEM
desenvolvido por Michael Hutchinson (1988, 1989, 1996, 2000, 2011). Através desta
ferramenta, é possível gerar um Modelo Digital de Elevação Hidrologicamente
Consistente (MDEHC).
Foram interpolados, a partir do software, pontos cotados e curvas de nível
para determinação de altimetria, drenagens no formato linha, como áreas de fluxo
preferencial, drenagens no formato polígono para área rebaixadas.
Sendo assim, o MDE se deu a partir da geração de uma grade retangular
corresponde a uma matriz (raster) com espaçamento fixo, onde cada ponto da grade
apresenta um valor estimado a partir da interpolação das amostras.
359
Na etapa seguinte foram realizados procedimentos empregados para a
delimitação da bacia hidrográfica a partir do MDE, seguindo proposta de Jensen e
Domingue (1988) e ainda as aplicações de Paz e Collischonn (2008), Buarque (2008),
Medeiros (2009), Rocha et al (2015), entre outros estudos de caso. São utilizadas
funções do módulo Spatial Analyst - Hydrology do software ArcGIS versão 10.1 (ESRI,
2012).
A bacia hidrográfica em formato vetorial foi utilizada para o recorte de seu
respectivo MDE. Portanto, a delimitação automática da área captação obtida MDE
passou a corresponder à geometria das informações obtidas.
A próxima etapa esteve associada à análise do MDE obtido, sendo
analisados a amplitude altimétrica, perímetro e área da bacia hidrográfica, além da
distribuição de classes hipsométricas e obtenção de classes de declividade. O mapa
hipsométrico teve suas classes definidas através das linhas de quebra do relevo,
compostas de altitudes contínuas considerando a equidistância de 60 metros. Foram
estabelecidas as classes: < 120m; 120 – 180m; 180 – 240m; 240 – 300m; 300 – 360m;
360 – 420m;
O mapa de declividade foi elaborado, a partir da ferramenta slope, dividindose o terreno em seis classes: < 2%; 2% - 5%; 5% - 15%; adaptadas do IPT (Instituto
de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo). Ainda as classes sugeridas por De Biase
(1992): 15% - 30%; 30 – 47%; áreas com declives superiores a 47%.
Para uma melhor análise do comportamento do relevo, foi traçado um perfil
topográfico com cerca 8,5 quilômetros de extensão, com um exagero vertical de cinco
vezes, com o intuito de mostrar o comportamento altimétrico da superfície e algumas
variações quanto ao desenho das vertentes e vales na bacia hidrográfica. Este perfil
se deu a partir de uma linha que estendeu-se no sentido NE – SO, interseccionando o
curso médio da bacia hidrográfica, passando por interflúvios a calha do arroio
Guassupi.
Concluídas as etapas descritas, o conhecimento prévio da área de estudo
permitiu avaliar que a resposta quanto aos parâmetros obtidos, não se deu de forma
satisfatória e condizente com as características da bacia hidrográfica. Foi então,
identificado inconsistência hidrológica no Modelo Digital de Elevação em função do
processo de vetorização da rede de drenagem utilizada, cuja se deu, em alguns
segmentos da rede de drenagem, no sentido foz para montante.
Portanto, se fez necessário uma correção topológica da drenagem vetorial
disponível na base utilizada. Adaptando a proposta de Luiz e Faria (2013), foi
identificado primeiramente os chamados end points, para verificação da foz de cada
drenagem, e então identificação da inconsistência topológica. Posteriormente foi
360
utilizado a ferramenta flip, que consiste na alteração do sentido de digitalização da
rede de drenagem, e então, novamente obtidos os endpoints para verificação das
correção topológica automática e também para identificação das drenagens que
necessitam de nova vetorização.
Digitalizada uma nova rede de drenagem vetorial, foram repetidos os
procedimentos para obtenção do de um novo MDE e também para obtenção de
informações a partir deste. Estabelecidos os MDEs em resolução equivalente, este
foram comparados sob o aspecto visual e quantitativo, quanto a resposta aos
parâmetros obtidos e analisados.
Em todo o banco de dados foi utilizado Sistema de Coordenadas UTM – 21S,
Datum vertical Sirgas 2000 (Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas).
Resultados
Quanto a delimitação automática da área de captação, diante a metodologia
proposta, os dois modelos obtiveram respostas satisfatórias quanto ao desenho da
bacia hidrográfica, considerando os interflúvios e drenagens que compõem o sistema
até a sua foz. O MDE gerado com a inclusão das drenagens vetorizadas originalmente
identificou uma área de captação de 77,28 km², enquanto o MDE gerado com as
drenagens corrigidas obteve uma área de 77,86 km², indicando um aumento de 0,54%
na área após o segundo processamento. Quanto ao perímetro total da bacia
hidrográfica gerado, os MDEs apresentaram, respectivamente, os valores de 45,54 km
e 43,74 km, indicando uma diminuição de 3,95% em relação ao primeiro
processamento,
caracterizando
uma
suavização
no
delineamento
da
bacia
hidrográfica.
Quanto a análise dos MDEs na obtenção de características físicas como
altimetria e declividades, uma primeira análise se dá pelas altitudes máxima e mínima
encontradas na bacia hidrográfica, e consequente amplitude total, dada por cada
MDE. Os parâmetros obtidos a partir de cada MDE e a sua variação percentual podem
observados na Tabela 1.
361
Tabela 1 - Parâmetros da bacia hidrográfica do arroio Guassupi obtidos partir de
MDEs gerados com a rede de drenagem vetorizada originalmente e corrigida.
MDE - drenagem
original
MDE - drenagem
corrigida
Variação
percentual
Área da bacia hidrográfica
78,28 km²
77,86 km²
0,54%
Perímetro da bacia hidrográfica
45,54 km
43,74 km
-3,95%
Altitude máxima
443 m
432 m
-2,48%
Altitude mínima
92 m
92 m
0,00%
Amplitude total
351 m
340 m
-3,13%
Org.: Os autores, 2015
As variações entre os dois MDEs gerados se deu em função da altitude máxima
e consequentemente, na amplitude total. O MDE gerado com a inclusão das
drenagens de vetorizadas originalmente identificou 443 metros como maior altitude,
enquanto o MDE gerado com as drenagens corrigidas obteve 432 metros na mesma
análise, indicando uma diminuição de 2,48%. A altitude mínima obtida junto à foz foi
equivalente (92 metros), caracterizando uma variação na amplitude altimétrica de
3,13%. Esta variação está associada à inclusão de valores diretos de ponto cotados
no primeiro MDE gerado, que em função da direção de fluxo estabelecida de forma
errônea, estabeleceu divisores de água mais angulares e menos suavizados, em
relação ao segundo MDE, que foi gerado a partir da drenagem e, consequente,
direção de fluxo, corrigidos.
A partir da Figura 2 é possível observar a delimitação da bacia hidrográfica a
partir dos dois Modelos Digitais de Elevação gerados, juntamente com a resposta de
ambos diante a análise da hipsometria e também da declividade para bacia
hidrográfica do arroio Guassupi.
362
Figura 2 - Distribuição espacial das classes hipsométricas (A e B) e de declividade (C e D), da
bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial
original e corrigida.
Org.: Os autores, 2015.
A análise visual da distribuição espacial das classes de hipsométricas, obtida a
partir do MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente (Figura 2A) e
obtida a partir do MDE gerado com as drenagens corrigidas (Figura 2B), permite
verificar que no Modelo Digital de Elevação gerado com a presença de drenagens
vetorizadas originalmente e, portanto, em grande maioria, no sentido foz para
montante, apresenta um demasiado entalhamento dos vales em função da inversão da
direção de fluxo preferencial. Portanto, o processo de digitalização da rede de
drenagem estabelecido na base vetorial utilizada, quando submetido ao processo de
interpolação, ocasionou o rebaixamento dos vales e mostrou-se equivocado na
obtenção da hipsometria, o que não se deu após a correção topológica da rede de
drenagem e obtenção de um novo MDE.
363
Este fato respondeu, consequentemente, na distribuição e representatividade
de cada classe hipsométrica na bacia hidrográfica, sendo que no MDE gerado com as
drenagens vetorizadas originalmente, obteve-se uma superestima das classes
compreendidas entre as altimetrias inferiores a 120 metros e até 240 metros, em
função do entalhamento do rebaixamento dos vales, sendo as altimetrias
compreendidas entre os 240 metros até os 420 metros subestimadas, em relação ao
MDE gerado com as drenagens corrigidas. Quanto a representatividade da altimetria
superior a 420 metros, o segundo MDE apresentou uma menor área em relação ao
primeiro, tendo em vista a menor homogeneização dos interflúvios descrita
anteriormente.
A área compreendida em cada classe e sua representatividade perante a área
de bacia hidrográfica do arroio Guassupi pode ser observada a partir da Tabela 2:
Tabela 2 - Distribuição das classes hipsométricas da bacia hidrográfica do arroio
Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida.
Classes
MDE - drenagem original
MDE - drenagem corrigida
< 120 m
4,21 km²
5,38%
3,00 km²
3,87%
120 - 180 m
18,31 km²
23,39%
17,51 km²
22,49%
180 - 240 m
18,18 km²
23,22%
17,51 km²
22,49%
240 - 300 m
17,47 km²
22,32%
18,54 km²
23,82%
300 - 360 m
13,41 km²
17,13%
14,51 km²
18,64%
360 - 420 m
6,41 km²
8,19%
6,60 km²
8,48%
> 420 m
0,28 km²
0,36%
0,16 km²
0,22%
100,00%
77,86 km²
100,00%
TOTAL
78,28 km²
Org.: Os autores, 2015.
Quanto a resposta perante a obtenção das declividades da bacia hidrográfica,
a análise visual da distribuição espacial das classes de declividade, obtida a partir do
MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente (Figura 2C) e obtida a partir
do MDE gerado com as drenagens corrigidas (Figura 2D), permite verificar que no
Modelo Digital de Elevação gerado com a presença de drenagens vetorizadas
originalmente e, portanto, em grande maioria, no sentido foz para montante, apresenta
um demasiado declive junto aos vales em função do rebaixamento dos vales originado
na inversão da direção de fluxo preferencial.
Portanto, da mesma forma que na obtenção das classes de hipsometria, o
processo de digitalização da rede de drenagem estabelecido na base vetorial utilizada,
quando submetido ao processo de interpolação, mostrou-se equivocado na obtenção
da declividade e ocasionou o demasiado encaixe da rede de drenagem, o que não se
deu após a correção topológica da rede de drenagem e obtenção de um novo MDE.
364
Esta condição evidencia-se quando analisados a distribuição percentual das classes
de declividade em cada um dos MDEs gerados, conforme mostra a Tabela 3.
Tabela 3 - Distribuição das classes de declividade da bacia hidrográfica do arroio
Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida.
Classes
MDE - drenagem original
<2%
5,81 km²
2%-5%
5,82 km²
5 % - 12%
14,82 km²
12 % - 30 %
25,86 km²
30 % - 47 %
11,96 km²
> 47 %
14,00 km²
TOTAL
78,28 km²
Org.: Os autores, 2015.
MDE - drenagem corrigida
7,42%
7,44%
18,93%
33,03%
15,28%
17,88%
100,00%
4,26 km²
9,35 km²
19,86 km²
27,86 km²
11,86 km²
4,66 km²
77,86 km²
5,47%
12,02%
25,51%
35,78%
15,24%
5,98%
100,00%
É possível observar que no primeiro MDE gerado há uma grande
representatividade na classe de menor declividade (<2%) e também nas classes de
maior declividade (entre 30% e 47% e maior que 47%), em relação ao segundo MDE.
Isto
se dá
justamente
pelo
processo
de rebaixamento
das nascentes e
consequentemente dos vales, o que superestima as áreas planas de fundo de vale e,
da mesma forma, evidencia os gradientes das vertentes, gerando um aumento das
declividades nas áreas próximas às drenagens.
Todavia, com a correção topológica há uma suavização dos vales e,
consequentemente, das declividades médias da bacia hidrográfica, sendo que no
segundo MDE obtido há uma diminuição na representatividade das classes descritas
acima e uma maior representatividade nas classes compreendidas entre 2% e 30% de
declividade, em relação ao MDE gerado inicialmente.
Outra análise comparativa, entre o MDE gerado com as drenagens vetorizadas
originalmente e o MDE gerado com as drenagens corrigidas, se deu pelo traçado de
uma seção transversal do terreno, no sentido NE – SO, junto ao curso médio da bacia
hidrográfica do arroio Guassupi. Os respectivos perfis topográficos obtidos a partir do
MDEs gerados com a drenagem vetorizada no sentido foz para nascente e,
posteriormente, com a drenagem corrigida, caracterizam no primeiro, o entalhamento
das vertentes e o um demasiado encaixe dos vales, inconsistentes com a topografia
da área de estudo, o que não acontece no segundo perfil traçado, conforme pode ser
observado na Figura 3.
365
Figura 3 - Perfis topográfico NE – SO da bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de
MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida.
Org.: Os autores, 2015.
Conclusões
A partir do objetivo proposto e metodologia estabelecida para comparação dos
dois MDEs gerados, evidenciou-se que o processo de vetorização da rede de
drenagem oriunda de cartas topográficas pode vir a induzir erros associados a
Modelos Digitais de Elevação, comprometendo assim, os resultados obtidos e
informações geradas.
O Trabalho mostrou que a vetorização da rede de drenagem, como realizada em
grande parte dos segmentos da base vetorial utilizada, no sentido foz para nascentes,
compromete a obtenção de um MDE modelo hidrológicamente consistente a partir dos
interpolador topo to raster. Da mesma forma, a resposta a parâmetros morfométricos
se deu de forma diferenciada quando comparados os MDEs gerados, destacando-se
as grandes variações nas análises de hiposometria e declividade, informações básicas
para a caracterização do relevo e estudos de processos associados a dinâmica de
bacias hidrográficas.
No entanto, o processo de correção topológica, realizado a partir da metodologia
proposta, mostrou-se eficiente para a base cartográfica utilizada, caracterizando-se um
processo rápido e eficiente para adequação da drenagem vetorial para fins de
obtenção de Modelos Digitais de Elevação para estudos de relevo em bacias
hidrográficas.
Ressalta-se ainda que o presente trabalho não caracteriza uma crítica ou
invalida a base vetorial utilizada no estudo, tendo em vista que esta caracteriza-se
com uma excelente base cartográfica para estudos das mais variadas tipologias do
âmbito geográfico. Portanto, os resultados obtidos buscam contribuir com as
366
discussões referentes à obtenção de bases vetoriais e a utilização de bases já
disponíveis, somando-se aos avanços das geotecnologias cada vez mais presentes na
análise geográfica.
Referências
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368
Potencialidad de las imágenes satelitales de alta resolución en la
detección de especies leñosas invasoras
Beatriz Sosa - Facultad de Ciencias UdelaR
[email protected]
Carlos Chiale - Facultad de Ciencias UdelaR
[email protected]
Gabriela Fernández - Facultad de Ciencias UdelaR
[email protected]
Marcel Achkar - Facultad de Ciencias UdelaR
[email protected]
Resumen
Conocer el patrón de distribución de una especie invasora resulta esencial para definir
estrategias de control eficientes. Las técnicas de teledetección constituyen una
herramienta de apoyo apropiada para identificar y cartografiar patrones de distribución
de las especies vegetales. Actualmente las imágenes satelitales de alta resolución
espacial brindan nuevas oportunidades para el mapeo de la vegetación por lo que
resulta pertinente evaluar la potencialidad de su aplicación. En el Parque Nacional
Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay la leñosa invasora Gleditsia
triacanthosconstituye una de las principales amenazas para la conservación de la
biodiversidad. Identificar su patrón de distribución se constituye en un insumo
relevante para definir estrategias de control. En este trabajo se evaluó el potencial de
detección de G.triacanthos mediante el procesamiento de tres imágenes satelitales de
alta resolución: pancromática 0,5m; multiespectral 2m y fusionada 0,5m. Se utilizó el
método de clasificación por objetos basado en ejemplos. La imagen fusionada
presenta el mayor potencial para la detección de G.triacanthoscon una fiabilidad del
60%. La clasificación obtenida sobreestima la presencia de G.triacanthos en el
bosque, pero resulta muy fiable en la identificación de áreas no invadidas brindando
información relevante para el diseño de estrategias de gestión proactiva.
Palabras clave: imagen satelital de alta resolución, imagen pancromática, imagen
multiespectral, imagen fusionada, especie invasora.
Introducción
Las invasiones biológicas constituyen uno de los principales factores en la pérdida de
diversidad biológica y en la alteración de la capacidad de los ecosistemas para proveer
servicios ambientales (Vitousek et al. 1997).Conocer el patrón de distribución de una
especie invasora resulta esencial para definir estrategias de control eficientes,
visualizar la posible dinámica del proceso de invasión (Bradley &Mustard 2006; Byers
et al. 2001; Rew et al.2005) y prever el potencial desarrollo del proceso invasivo.
Además permite identificar potenciales mecanismos de dispersión así como definir la
369
susceptibilidad de distintos tipos de hábitat al proceso de invasión (Andersen et al.
2004; Cohen &Goward 2004; Parker et al. 1999).
Las técnicas de teledetección constituyen una herramienta de apoyo apropiada para
identificar y cartografiar los patrones de distribución de las especies vegetales. Desde
el lanzamiento del satélite IKONOS-2 en Setiembre de 1999 surgieron nuevas
oportunidades para el mapeo de la vegetación (Carleer& Wolff 2004) como la
identificación de comunidades vegetales e incluso especies (Turner et al 2003).La
identificación de tipos de vegetación mediante el procesamiento de imágenes
pancromáticas ha permitido identificar una especie leñosa del conjunto de la
comunidad boscosa (Tsai&Chou 2006). En otros estudios las posibilidades de
discriminación de la imagen pancromática ha resultado menor; en los bosques de
montaña de los alpes japoneses la clasificación con imágenes pancromáticas permitió
distinguir dos tipos de comunidades vegetales mientras que el uso de las imágenes
multiespectrales permitió discriminar seis (Kosaka et al 2005). Esta variedad de
resultados apoyan lo planteado por Chuvieco (1995) quien señala que la clasificación
digital no pretende la definición absoluta de cada cubierta sino más bien que la misma
es válida para una determinada imagen en un territorio y momento dados. Por lo tanto
no resulta razonable estandarizar las técnicas de procesamiento en relación a sus
resultados pero si evaluar la potencialidad de su aplicación en el uso de los recursos
naturales y la gestión del territorio.
Las características espectrales de la vegetación se deben al tipo de pigmentos de sus
hojas, a la estructura de la planta y a su estado de salud (Gilmore et al. 2008). Por tal
motivo, si la especie invasora presenta una fenología distinta a la de la comunidad de
especies nativas existe una ventana temporal que optimiza la identificación de la
especie invasora mediante teledetección (Wilfong, 2009). Gleditsia triacanthos es una
especie leñosa perteneciente a la familia de las fabáceas, originaria de Norte América.
En la actualidad se la considera como especie invasora en Argentina y Uruguay
(Chaneton et al. 2004; Nebel &Porcile 2006). En el Parque Nacional Esteros de
Farrapos e Islas del Río Uruguay (PNEF) G.triacanthosse ha constituido en la especie
dominante en varias áreas del bosque nativo(DINAMA 2014). Esta especie se
diferencia del conjunto de la comunidad de leñosas nativas por su estructura fustal y
su comportamiento caducifolio. En tal sentido se plantea como hipótesis orientadora
que las diferencias estructurales y fenomenológicas de G.triacanthos en relación a la
comunidad de especies nativas permitirán su identificación mediante técnicas de
teledetección. En este marco este trabajo se desarrolló con el objetivo de evaluar el
370
potencial de la imagen pancromática, multiespectral y fusionada en la identificación de
G.triacanthos.
Metodología
Sistema de estudio
El PNEF pertenece al Sistema Nacional de Áreas Protegidas de Uruguay; ubicado
sobre la costa del Río Uruguay 32°37’36.308”S- 58°09’40.920”O. abarca 5.760 ha de
bosque fluvial, praderas con régimen de inundación semipermanente, áreas
paludosas, lagunas y arenales fluviales. El área de estudio comprende 135 ha de
bosque fluvial. Constituye un ambiente de características hidromórficas y topografía
plana. El área es atravesada por un pequeño curso de agua que define dos zonas: al
norte del curso área sin invasión y al sur del mismo área invadida (Fig. 1).
Gleditsia triacanthoses un árbol caducifolio de copa amplia (10-12 metros) y poco
densa, porte ovoide que se vaabriendo con la edad y termina aparasolado. Presenta
hojas alternas pinati o bipinaticompuestas; su fruto es una legumbre lineal-comprimida
(Sabattini et al. 2009). Es una especie caducifolia; florece en la
primavera del
hemisferio sur; la fructificación se inicia a comienzos del verano (Diciembre) y se
prolonga hasta entrado el otoño (Mayo) (Rossi et al 2008).
Imágenes satelitales
Se utilizó una imagen pancromática de 0,5m de resolución espacial y una
multiespectral (Rojo, Verde, Azul, Infrarrojo cercano) de 2 m de resolución espacial.
Fueron captadas por el satélite Geoeye lanzado en setiembre de 2008 y equipado con
la más avanzada tecnología para los satélites comerciales (SEMAR, 2015).
La
nubosidad de las imágenes fue menor al 15% y su calidad mayor al 50%. Las
imágenes corresponden a Mayo del 2013 fecha en la cual las diferencias espectrales
entre G.triacanthos y el bosque nativo se acentúan debido a su comportamiento
caducifolio.
371
Procesamiento de imágenes
Los métodos tradicionales de clasificación de imágenes se basan en la respuesta
espectral de cada pixel.El método de clasificación basado en objetos utiliza tanto datos
espectrales como espaciales (tamaño, forma, textura y asociación con los objetos
vecinos); su utilización ha resultado satisfactoria cuando la clasificación se realiza
sobre tipos de vegetación que presentan una respuesta espectral similar (Gibbes et al
2010). Si bien las diferencias fenomenológicas debieran maximizar la diferencia
espectral entre la comunidad de nativas y G.triacanthoseste método presenta mayor
potencialidad para discriminar entre clases similiares y por tanto será utilizado en el
presente trabajo. La clasificación se realizó en el programa ENVI 5.0 utilizando los
algoritmos Edge en el proceso de segmentación y Full Lambda Schedule en el de
unión.
372
La imagen multiespectral fue preprocesada mediante una clasificación de máxima
verosimilitud extrayéndose las áreas de sombra e hidromorfismo permanente. La
imagen pancromática no fue preprocesadamediante la mencionada clasificación ya
que se entendió que la clasificación por objeto que integra la información espectral y
espacial resulta más apropiado para el tratamiento de una imagen pancromática.
La imagen fusionada se generó mediante el proceso PCSpectralSharpeningcon
aplicación de máscara en la banda 2. Se obtuvo así una imagen multiespectral de
0,5m de resolución. Sobre esta imagen se aplicó otro proceso de fusión (proceso
Gram Schmidt Pan Sharpening); este procedimiento optimizó la visualización de la
imagen fusionada.
En las imágenesmultiespectral y fusionada se realizó una primera clasificación por
objeto basada en ejemplos seleccionando 4 categoríasque fueron identificadas en la
pantalla de previsualización: (1) Bosque, área boscosa al norte de la cañada; (2)
G.triacanthos: área boscosa con alta densidad de individuos de G.triacanthos
identificada durante trabajo de campo; (3) Sauce: área boscosa con alta densidad de
Sauces (Salixhumboldiana) identificada durante
trabajo de campo; (4) Pastizal.En
laimagen pancromática (sin preprocesamiento) se incluyó la categoría Hidromorfismo
permanenteque se corresponde con áreas paludosas.
Las clasificaciones obtenidas presentaron 4 clases: sin clasificar, bosque, sauce,
G.triacanthos, pastizal.
Laimagen pancromática presentó baja capacidad de
discriminación; por tal motivo se resolvió culminar con su proceso de clasificación. Las
imágenes multiespectral y fusionada fueron reclasificadas utilizando la opción de
inclusión de archivo de campo verdadero. Para ello se creó un nuevo vector con las
siguientes categorías: (1) G.triacanthos; corresponde a la clasepredominante
identificada en el área de alta densidad de G.triacanthos. (2)No G.triacanthos;
polígonos identificados en la clase G.triacanthospero que no se corresponden con esa
especie ya que se encuentran en el área sin invasión. (3) Pastizal; polígonos que
efectivamente se ubican en áreas de pastizal (4) Árboles; polígonos incluidos en la
clase pastizal pero que son árboles. Se generó así una nueva clasificación en la que
se identificaron las categorías: sin clasificar, bosque, sauce, G.triacanthos y pastizal.
Para validar los resultados de la clasificación se utilizaron datos de terreno que consta
de un total de 86 puntos de los cuales 49 corresponden a áreas de Bosque y 37 a
áreas de G.triacanthos. Se construyó una matriz de confusión con la que se calculó la
fiabilidad de la clasificación como el cociente entre el número de áreas bien
373
clasificadas y el número total de áreas muestreadas. Se calculó la fiabilidad de
comisión y omisión para las clases de Bosque y G.triacanthos. La fiabilidad de
comisión se calculócomo el cociente entre el número de aciertos para una clase dada
y el total de predicciones realizadas para esa clase. La fiabilidad de omisión fue
calculada como el cociente entre el número de puntos acertados de una clase dada y
el total de puntos muestreados para esa clase.
Fig. 2 Metodología de clasificación utilizada para las imágenes pancromática,
multiespectral y fusionada
Resultados y Discusión
La visualización de la imagen pancromática permite la identificación de grandes tipos
de vegetación así como su categorización en relación a la densidad. Esta visualización
es posible con la imagen multiespectral pero la imagen pancromática brinda mayor
nivel de detalle (Fig. 1). No obstante, el proceso de clasificación por objetos sobre la
imagen pancromática no brindó buenos resultados ya que no presentó capacidad para
discriminar la ausencia de G.triacanthos en el área sin invasión y presentó poca
capacidad para detectar a G.triacanthosen el área invadida. (Fig. 2). Estos resultados
mejoran con la clasificación sobre la imagen multiespectral que presenta mayor
potencialidad para la detección de G.triacanthos en el área invadida y pequeños
polígonos clasificados como G.triacanthos en el área sin invasión. Cabe señalar que
374
muchos de estos polígonos no corresponden a áreas boscosas sino a áreas de
pastizal. Además la imagen multiespectral presentó mejor capacidad en la detección
del área de sauces visualizándosela como una zona homogénea. En la clasificación
sobre la imagen pancromática esta zona está comprendida fundamentalmente por la
clase que también comprende a G.triacanthos(áreas rojas Fig.2.a)
Sauces
Área no
invadid
a
Área no
invadid
a
a
b
Figura 3. Clasificación por objetos. (a) Imagen pancromática (b) Imagen multiespectral.
Los círculos blancos muestran las áreas clasificadas como G.triacanthos en áreas
invadidas.
La clasificación sobre la imagen fusionada presenta mayor capacidad para detectar al
conjunto de la masa boscosa. De hecho, ésta se ajusta casi completamente a la masa
boscosa e incluso identifica individuos leñosos aislados (Figura 4). Sobre la imagen
multiespectral un conjunto importante de individuos leñosos quedan fuera de la
clasificación (Figura 4). No obstante la clasificación sobre la imagen fusionada
presenta aún problemas para discriminar entre áreas de pastizales y áreas boscosas
(Figura 4).
375
Figura 4. Clasificación por objetos. (a) Imagen multiespectral (b) Imagen fusionada.
La
imagen
fusionada
presenta
mayor
potencial
para
la
identificación
de
G.triacanthossiendo su capacidad de acierto total del 80% en comparación con la
imagen multiespectral cuya capacidad de acierto fue del 74% (Tabla 1). Además
presenta mayor potencialidad para detectar a G.triacanthos su fiabilidad de comisión
fue del 62% mientras que la imagen multiespectral alcanzó solo el 51% (Tabla 1).
Tabla 1. Validación de la clasificación
Fiabilidad de la clasificación
Imagen
Fusionada
Imagen
Multiespectral
Acierto Total
0,80
0,74
Fiabilidad de comisión Bosque
0,94
0,92
Fiabilidad de comisión G.triacanthos
0,62
0,51
Fiabilidad de omisión Bosque
0,77
0,71
Fiabilidad de omisiónG.triacanthos
0,88
0,83
Por otra parte la fiabilidad de comisión para el Bosque fue muy alta en ambas
clasificaciones (93% para la imagen fusionada y 91% para la imagen multiespectral)
indicando que estas clasificaciones son buenas para detectar áreas en las que la
especie invasora no se encuentra presente. Se plantea que la estrategia más eficiente
para el control de una especie invasora es la de limitar su establecimiento ya que se
evitan sus impactos y se previene la conformación de nuevos focos de invasión. Por lo
tanto la información que proveen estas clasificaciones resulta un insumo útil para la
implementación de estrategias de gestión proactivas.
376
En ambas clasificaciones las clases definidas como G.triacanthos sobreestiman la
distribución real de la especie. En este punto se identifican tres problemas: (1) esta
clase incluye además de áreas boscosas áreas de pastizales que no fue posible
discriminar mediante la metodología utilizada. Estas áreas son fácilmente identificables
mediante el análisis visual de la imagen, especialmente en la imagen fusionada, por lo
que su exclusión resulta más o menos sencilla. (2) un conjunto diverso de factores que
podrían
generar
variabilidad
en
la
firma
espectral
de
los
individuos
de
G.triacanthoscomo su altura, densidad del dosel, posición, vigor, y tipo de ambiente en
el que se ubica y (3) la presencia de otras especies leñosas con una firma espectral
semejante a la de la invasora debido a que presentan una morfología y/o
fenomenología similar. Este punto es especialmente relevante si se considera que el
patrón espectral entre las áreas actualmente discriminadas como Bosque y G.
triacanthospresenta variaciones muy pequeñas; para una longitudde onda de 0,50
micrométros el valor registrado fue de 150DN para G.triacanthosy de 180 para las
áreas de Bosque (Fig.5). Esta diferencia se acentúa para longitudes de onda mayores
a 0,80 que presentaron valores de 350 y 600 para las áreas de G.triacanthos y Bosque
respectivamente (Fig.5).En tal sentido resulta pertinente continuar evaluando
procesamientos que permitan identificar y maximizar las diferencias espectrales que
sólo consideren a la clase definida como G.triacanthos. La imagen fusionada parece
presentar la mayor potencialidad para continuar con los análisis mejorando su
capacidad de detección.
Figura 5. Patrón espectral sobre imagen fusionada. (a) Patrón sobre área de bosque
(b) Patrón sobre G.triacanthos
Conclusiones
Los tres tipos de imágenes analizadas brindan información relevante pero diferencial
sobre el patrón de distribución de los principales tipos de vegetación en el área de
estudio. El método de clasificación por objetos basado en ejemplos no presentó
377
capacidad de discriminación sobre la imagen pancromática. La capacidad de
discriminación mejora cuando la clasificación se realiza sobre la imagen multiespectral
pero la fiabilidad en la detección de G.triacanthos es muy baja. Los resultados de la
clasificación mejoran utilizando la imagen fusionada pero aún la fiabilidad de detección
de G.triacanthos resulta baja. La presencia de G.triacanthos en esta clase resulta
sobreestimada. Identificary maximizar las diferencias espectrales de los objetos dentro
de esta clase constituyen el principal desafío para mejorar la capacidad de detección
de la especie invasora.
El método utilizado presenta un alto porcentaje de fiabilidad sobre las áreas de bosque
por lo que la clasificación utilizada resulta apropiada para identificar áreas en las que
el proceso invasivo no se ha consolidado aún. Esta información resulta relevante en el
marco de la gestión proactiva.
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379
ANÁLISE E MAPEAMENTO DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NO
MUNICÍPIO DE SORRISO, MATO GROSSO
Tiéle Lopes Cabral - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Luis Eduardo de Souza Robaina - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Ivaniza de Lourdes Lazzarotto Cabral - Universidade Federal de Mato Grosso
[email protected]
Resumo – A ação do homem sobre a “natureza” se manifesta de inúmeras formas
conforme os meios adotados para a busca constante de elementos que possibilitam a
sua existência. A produção do espaço agrário em Mato Grosso se fundamenta na
apropriação das diferentes unidades de paisagem, resultando em inúmeras
intervenções, principalmente a eliminação da cobertura vegetal original. Sendo assim,
a intenção do trabalho foi a de estabelecer o mapeamento do uso e ocupação do
município de Sorriso-MT, a fim de avaliar as restrições da paisagem frente à
ocupação. O mapeamento de uso e ocupação da terra permitiu analisar informações a
partir da interação de atributos físicos com o apoio do Sistema de Informação
Geográfica - SIG e recursos do geoprocessamento, se detendo ainda ao levantamento
bibliográfico e dados obtidos dos produtos do Sensoriamento Remoto e trabalho de
campo. A importância do trabalho tem relação com a própria dinâmica do avanço da
agricultura na região Centro-Oeste do Brasil que traz consigo inúmeras intervenções
nos ambientes do Cerrado e da Pré-amazônia vinculadas às práticas agrícolas. Os
resultados principais obtidos indicam que os setores de maiores intervenções estão
concentrados nas áreas de lavouras representando 75,8% da extensão do município.
Palavras-chaves: Degradação ambiental; Geoprocessamento; Sensoriamento
Remoto; Cerrado e Pré-amazônia.
INTRODUÇÃO
O crescente aumento da utilização dos recursos naturais exige, cada vez mais,
a elaboração de estudos voltados à harmonização das interações entre a sociedade e
o ambiente em que se vive. Desta forma, o planejamento não deve apenas limitar-se
aos aspectos socioeconômicos, mas é de fundamental importância, levar em
consideração a análise das características dos elementos componentes do meio físico
(VEDOVELLO, 2004).
O uso e ocupação da terra é um fator bastante importante, já que, o município
de Sorriso e o norte de Mato Grosso vêm sofrendo nas últimas décadas do século XX,
com o avanço da fronteira agrícola, o que provoca progressivas alterações nos
diferentes ambientes que constituem os sistemas dessa região.
380
Já na etapa inicial de implantação do agronegócio, os elementos
sistêmicos da cobertura vegetal, junto com o biológico, hídrico e antrópico, são
substituídos e/ou alterados pela monocultura. Paralelamente a este fluxo
interventor, numa escala mais específica da questão, estão os fatos
relacionados à dinâmica de superfície, responsáveis pela geração do recurso
apropriado pela referida atividade, ou seja, intervenção na dinâmica dos
sistemas morfopedológicos.
A região da Chapada e Planalto dos Parecis vem sendo submetida desde o
início da década de 1960, a um acelerado processo de ocupação, fruto da expansão
das fronteiras agrícolas para a Amazônia Ocidental, onde o tema degradação
ambiental reveste-se de importância, à medida que, a realização de estudos nessas
áreas, relaciona-se às situações de maior preocupação ecológicas no Estado.
Cabral (2011) considera que o setor Sul do município de Sorriso-MT apresenta
uma área com restrição ambiental atrelada a prática dos agricultores de construir
canais para remover o excesso de água que se acumula durante o período das
chuvas. Este procedimento é comum nas amplas superfícies planas com atividade
agrícola, não só no estado de Mato Grosso, mas em toda a superfície do Planalto
Central Brasileiro.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho é desenvolver o mapeamento do uso e
ocupação do município de Sorriso-MT, a fim de avaliar as restrições da paisagem
frente à ocupação.
O município de Sorriso (Figura 1) corresponde uma área de aproximadamente
9.330km² e faz parte da região Norte do estado de Mato Grosso, possui uma
população de 72.521 habitantes (IBGE, 2014). Situa-se entre as coordenadas 11º 43`
38”; 13º 40` 10” de latitude Sul e 56º 06` 27”; 55º 06` 36” de longitude Oeste.
381
Figura 1 – Área de estudo: município de Sorriso-MT.
Fonte: Cartas Topográficas DSG 1:100.000; SEPLAN/MT, 2009.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O levantamento dos dados refere-se ao primeiro nível de análise, pesquisas
bibliográficas e informações sobre o material cartográfico disponível para a área de
estudo. Os dados foram obtidos através de trabalhos de campo, laboratório e
pesquisas secundárias.
A delimitação da área de estudo, bem como informações sobre hidrografia,
malhas viárias, curvas de nível, pontos cotados, manchas urbanas e drenagem
artificial foram obtidas através dos arquivos do banco de dados da Secretaria de
Planejamento do estado de Mato Grosso – SEPLAN/MT e do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE, contendo as malhas cartográficas dos municípios da
federação. Além disso, foram obtidas informações das cartas topográficas DSG
1:100.000.
Para o levantamento de informações socioeconômicas e históricas de
ocupação foram buscados dados de órgão oficiais como a Secretaria de Estado do
Meio Ambiente - SEMA/MT, Instituto Nacional de Reforma Agrária – INCRA, SEPLANMT e IBGE. Estes dados foram importantes para entender a relação dos usos
382
antrópicos, principalmente o agrícola e sua influência na transformação da
paisagem.
Para a elaboração do mapa de uso e ocupação da terra utilizou-se como base
de recobrimento da área, a imagem orbital do sensor “Thematic Mapper" do
LANDSAT-8, bandas 432 de composição colorida, com 30 metros de resolução
espacial, Órbita-Ponto 227/68, 227/69 e 226/69, de maio de 2013. Essas imagens
foram adquiridas no site da U.S. Geological Survey (USGS Gobal Visualization –
http://glovis.usgs.gov).
A aquisição das imagens com esse período ocorreu em função do clima da
área, onde nos meses de novembro a março ocorre o cultivo de grãos caracterizandose por ser uma época bastante chuvosa, tal fato restringiu a obtenção de imagens com
melhor visualização espacial, o que levou a utilização de imagens do mês de maio,
porém com trabalhos de campo e analises geomorfológicas e pedológicas junto ao
conhecimento prévio da área de estudo, onde se tem informações sobre a fase dos
cultivos da região, pode-se efetuar um mapeamento de uso e ocupação sem mais
problemas.
Nesse período do mês maio a grande maioria das espécies cultivadas já foram
colhidas ou estão na fase madura, isso resulta em melhor diferenciação das áreas
utilizadas com cultivos, devido à refletância do solo exposto e dos cultivos maduros que neste caso se resume ao cultivo do milho safrinha, serem bem diferentes da
vegetação arbórea.
Como todas as imagens disponibilizadas já possuem correção geométrica
(ortorretificadas) e, também, já georreferenciadas passou-se diretamente para a
mosaicagem. Para tal etapa, utilizaram-se as ferramentas “mosaicking” e “masking” do
software ENVI 5.0, as quais serviram respectivamente para unir e recortar as imagens
a fim de selecionar apenas a área de interesse. Todas as imagens estão com sistema
de coordenadas projetadas (Universal Transversa de Mercator - UTM), Datum
Horizontal SAD 69 e Fuso 21S. O limite utilizado da malha da SEPLAN foi atualizado
de acordo com os limites naturais existentes, como estradas e principalmente a rede
hidrográfica.
Os resultados obtidos referentes aos usos da terra implicaram em etapas de
classificação automática e ajustes manuais.
As classes de uso da terra foram definidas através de trabalho de campo na
área e por fotointerpretação da imagem orbital, sendo identificados cinco principais
tipos de uso, ou seja, floresta, água, pecuária, lavoura e área urbana.
Posteriormente a importação e processamento da imagem no ENVI, foi
realizado o treinamento (reconhecimento da assinatura espectral das classes) das
383
amostras para cada classe identificada, o que consiste em coletar amostras na área
da imagem representante de uma das classes, traçadas diretamente sobre região
segmentada da imagem.
Para determinação da classe lavoura foram adquiridas 48 amostras de
aquisição e 41 amostras teste, para determinação da classe floresta foram adquiridas
24 amostras de aquisição e 21 amostras de teste, para a classe pecuária foram
adquiridas 12 amostras de aquisição e 10 de amostras teste e para a classe água
foram adquiridas 15 amostras de aquisição e 12 de amostras teste.
Foi criado um banco de dados com as categorias de uso da terra, criando as
classes dos temas observados. Em seguida, com o auxilio do software ArcGis 9.3,
realizou-se o mapeamento, associando cada tema a sua respectiva classe na imagem
classificada.
A partir do mapa matricial das classes, foi transformada a matriz em vetor. Com
esse mapa pode-se refazer a edição vetorial das classes, através de uma revisão das
regiões classificadas. Nessa revisão aplicou-se o conhecimento prévio da região
podendo ser ajustadas áreas que houve classificação errônea, por exemplo, as áreas
de solo exposto pertencentes às lavouras após a colheita; e os campos sujos
anexados as pastagens.
No que se refere à ocupação do município de Sorriso, obteve-se duas classes
envolvendo as áreas urbanas e os drenos artificiais. As áreas urbanas foram
mapeadas manualmente de acordo com a imagem de satélite Landsat-8, mencionada
anteriormente, devido à confusão na classificação automatizada com a classe de solo
exposto. Depois de mapeadas, as áreas urbanas foram subtraídas desta classe de
uso e tomadas como forma de ocupação.
A rede de drenagem artificial foi mapeada a partir de fotointerpretação,
utilizando as imagens de satélite SPOT-5 (junho de 2007), órbitas MI-1814, MI-1869,
MI-1870, MI-1923, MI-1924, MI-1925, MI-1974, MI-1975, MI-1976 e MI-2023, com
resolução espacial de 5m, o que foi bastante importante para a identificação do alvo.
As imagens de satélite foram obtidas através da SEPLAN/MT.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os diferentes usos da terra desenvolvidos no município de Sorriso estão
associados com a estrutura fundiária, com a cultura dos colonizadores e com o relevo
das propriedades rurais presentes na área.
384
As informações referentes as ações de ocupação advindas de um processo
histórico-evolutivo que ao longo dos anos desencadeou os diferentes usos da terra no
município de Sorriso, vem resultando nas últimas transformações da paisagem local.
No estado de Mato Grosso a difusão da soja se origina nos anos de 1970,
quando programas implantados pelo governo brasileiro visavam o aumento da
produção e da
produtividade no setor agropecuário com o objetivo de abastecer os centros
urbanos e de inserir a produção nacional no contexto mundial através da exportação.
Entre os programas, o POLOCENTRO - Programa de Desenvolvimento do Cerrado,
PRODOESTE - Programa de Desenvolvimento do Centro Oeste e POLONOROESTE Programa de Desenvolvimento Rural Integrado do Noroeste do Brasil, proporcionaram
o desenvolvimento agropecuário nos cerrados da região Centro-Oeste e a criação de
corredores de exportação com infraestrutura (SCHWENK, 2013).
Decorrentes desse fato foram implantadas então, entre 1971 e 1974, as
rodovias federais Transamazônica, Perimetral Norte que foi inserida parcialmente, e,
sobretudo, a Cuiabá-Santarém e incorporadas novas regiões agrícolas através do
Programa Nacional de Desestatização.
Sorriso é um dos municípios resultantes desse processo, onde sua colonização
inicia-se com imigrantes do Estado do Paraná, Santa Catarina e do Rio Grande do Sul,
mais precisamente gaúchos da região de Passo Fundo. Esses imigrantes foram
trazidos pela Colonizadora Feliz, composta pelo colonizador Claudino Francio, o qual
havia adquirido vasta área no Médio Norte mato-grossense. As primeiras famílias a se
fixarem na atual cidade de Sorriso, foram as famílias Silva e Santos (FERREIRA,
2008).
Em 1980, a pequena agrovila mato-grossense foi elevada à categoria de
Distrito, pertencente ao Município de Nobres. Mais tarde, em 1982, foi instalada a
subprefeitura no Distrito de Sorriso, tendo como subprefeito o Sr. Genuíno
Spenassatto. Foi emancipado do município de Nobres pela Assembleia Legislativa do
Estado de Mato Grosso em 13 de maio de 1986. Logo após a emancipação veio
ocorrer a explosão demográfica em Sorriso e, concomitantemente, a pavimentação
asfáltica da BR-163 cooperou com esse fato, pois proporcionou uma redução nos
custos com escoamento dos grãos, possibilitando, assim, a expansão do potencial
agrícola da região, devido o aumento da competitividade dos produtos agrícolas do
setor Norte do Estado, perante o mercado nacional e internacional (FERREIRA, 2008).
A sede municipal de Sorriso, em 1979, era apenas uma vila, possuindo apenas
algumas casas ao longo da BR-163. Atualmente é um importante centro urbano
regional e está em ritmo acelerado de crescimento urbano, inclusive apresentando
385
vários indícios em relação ao fenômeno de verticalização urbana, com a construção de
prédios residenciais. Assim, em pouco mais de duas décadas, Sorriso deixou de ser
um simples vilarejo, para se tornar o município que, atualmente, ocupa o posto de
maior produtor de soja por município do Brasil.
A cidade de Sorriso conta com boa prestação de serviços, vários escritórios de
multinacionais ligadas ao ramo do agronegócio, empresas essas de beneficiamento de
produtos agrícolas, e também de insumos e maquinários, Shopping Center, hospital
regional, clínicas especializadas de saúde, bons supermercados e outros comércios
de alto padrão.
O município cresceu consideravelmente nos últimos 20 anos, desde 1985 a
população vem crescendo e atinge atualmente, cerca de 66.521 mil habitantes IBGE
(2013).
Entre 2000 e 2010, a população teve uma taxa média de crescimento anual de
6,45%. Na década anterior, de 1991 a 2000, a mesma taxa foi de 9,96%, ou seja, nas
últimas duas décadas a taxa de urbanização cresceu 20,32% (IBGE, 2014).
Análise do uso e ocupação da terra e cobertura vegetal no município de Sorriso
A intensificação do uso da terra, especialmente em termos de atividades
agrícolas, em geral provoca a eliminação da cobertura vegetal natural e promove o
desencadeamento de processos de erosão acelerada dos solos se não forem
utilizadas técnicas adequadas de uso. A caracterização e espacialização do potencial
e predisposição aos impactos hídricos, pode ser conduzida utilizando tecnologias de
Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas – SIG, que
possibilitam à aquisição, manipulação, integração e espacialização dos dados
tratados.
O uso da terra no município de Sorriso está predominantemente atrelado às
atividades agrícolas, sendo esta classe identificada por lavouras, seguidas ainda das
classes de florestas e água. A vegetação arbórea no município em questão concentrase nas áreas de maiores declividades, próximas às redes de drenagens. Nesta
análise, o uso da terra está composto de acordo com a figura 2.
O quadro 1 apresenta a variação quantitativa dos tipos de uso, em quilometro
quadrado e em percentual, com destaque para a predominância da existência de
lavouras na área de estudo.
386
Quadro 1: Quantificação do uso e ocupação no município de Sorriso.
Org: CABRAL, T. L., 2014.
Figura 2: Uso e ocupação da terra do município de Sorriso - MT.
Org: CABRAL, 2014.
Na classificação das imagens, as lavouras estão associadas com as áreas de
solo exposto por estarem em fase de pós-colheita. Desse modo, constatou-se que a
situação do uso da terra apresentava-se com o predomínio de lavouras medindo uma
área de 7.081,056 km², correspondendo a 75,8 % da área total do município.
Portanto, essa classe de uso é predominante no município de Sorriso e
apresenta-se em áreas bastante planas com declives em torno de <2% em altitudes
que variam de 340 a 440 m.
387
Em função das características climáticas presentes em Sorriso, todo o
processo de uso e ocupação se torna totalmente adaptado e estruturado para que,
principalmente, a atividade agrícola obtenha altos índices de sucesso ao longo do ano.
Os índices pluviométricos médios anuais estão distribuídos durante sete meses
do ano, ou seja, ocorrem cinco meses de seca, durante os meses de maio, junho,
julho, agosto e setembro. Dessa maneira, o ano está dividido em duas estações
características, uma relacionada às chuvas - verão-outono, com grandes precipitações
e outra ligada à seca - inverno-primavera, com baixos índices pluviométricos (TARIFA,
2011).
A estação das chuvas ocorre geralmente no mês de novembro até o mês de
abril. Segundo Peretto (2012, apud Bittencourt Rosa et al., 2002) os meses de
dezembro a março, correspondentes ao verão se caracterizam por um aumento
acentuado nas chuvas regionais e 80% delas caem durante este espaço de tempo.
Esta configuração climática permite a atividade agrícola por todo ano, com
apoio da irrigação nos períodos de baixa precipitação, já no período chuvoso surge a
necessidade de escoamento do excesso de água nas áreas de plantio, promovendo a
frequente presença de drenos observados em campo, tanto paralelos quanto
interrompidos, tal forma de manejo exerce um papel fundamental para o sucesso da
produção, pois retira todo o excesso de água acumulados nas imensas áreas planas,
uma vez que as mesmas não estão adaptadas aos meios onde ocorre acúmulo de
água, fazendo com que a planta não se desenvolva da melhor forma.
Cabe destacar, que de acordo com o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária – INCRA (2012), o município de Sorriso possui três Projetos de
Reforma Agrária reconhecidos pela esfera federal (Figura 2), sendo eles:
a) Assentamento São Vicente, criado em 28 de fevereiro de 2000, com uma
área de 169,3 km², tem capacidade para comportar 630 famílias, mas possui
atualmente 384 famílias assentadas. Está localizado ao extremo sul do município de
Sorriso, no distrito de Boa Esperança e faz divisa com o município de Santa Rita do
Trivelado.
b) Assentamento Santa Rosa I, com 71 famílias foi criado em 31 de dezembro
de 1997, possui uma área de 246,5 km². Localiza-se ao sul do município de Sorriso,
no distrito de Boa Esperança, faz divisa com o município de Santa Rita do Trivelado e
com o Assentamento São Vicente.
c) Assentamento Jonas Pinheiro, criado em 17 de dezembro de 2001, possui
213 famílias assentadas e uma área de 73,6 km², está localizado a 18 km da cidade
de Sorriso, seguindo a norte a BR-163, possui parte de seu território no município de
Vera.
388
Observa-se, a partir da interpretação das imagens Landsat, que tais projetos de
assentamentos estão localizados em áreas menos favoráveis as atividades agrícolas
se comparado ao restante do município. O Assentamento Jonas Pinheiro encontra-se
na classe dos Plintossolos, isto é, solo pouco favorável aos cultivos de soja e milho. Já
os assentamentos Santa Rosa I e São Vicente localizam-se ao extremo sul do
município, em áreas mais dissecadas, com a densidade de rios maior. Em campo
observou-se nessas áreas pequenas manchas de cultivos de soja e milho e áreas de
pastagem - pecuária.
A atividade de pecuária normalmente tem-se em áreas próximas as florestas,
drenagens e está atrelada aos campos sujos, representa 439,370 km², correspondente
a 4,7% da área de estudo.
Os corpos d’água existentes na área de estudo referem-se a açudes, utilizados
para atividade agrícola e bebedouros, represas para a criação de peixes e rios. Essa
classe abrange uma área total de 63,499 km², o que representa - 0,7% da área de
estudo.
As áreas identificadas como florestas, algumas vezes estão ligadas a atividade
da silvicultura, que se localiza próximo aos rios que perfazem a área. O plantio de
eucalipto na região norte do estado de Mato Grosso se tornou bastante frequente e
está vinculado a recuperação de áreas de preservação permanente – APPs. Desse
modo, os proprietários optaram por espécies que futuramente forneçam retorno
financeiro, como eucalipto, teca, mamão e seringueira.
A classe de florestas nativas estão associadas às áreas com declividades de 515% e >15% e representam remanescentes do Cerrado e da Pré Amazônia matogrossense, uma vez que a vegetação nativa do município se restringe a cinco tipos Savana Florestada ou Cerradão, Savana Arborizada ou Cerrado, Savana Parque ou
Campo Cerrado, Floresta associada ao Planalto dos Parecis, Floresta associada ao
Planalto dos Parecis/Savana, Formações Justafluviais.
Poucas são as áreas de remanescentes a maioria foi substituída por atividades
econômicas importantes introduzidas nessas formações vegetais, principalmente
baseadas na utilização do Cerrado, como as culturas de arroz, milho e soja, muitas
vezes praticada em associação com a criação de gado bovino.
De acordo com Schwenk (2005) grande parte da área foi tomada pela
expansão da soja levando ao desaparecimento da vegetação nativa com a derrubada
das matas, provocando gradativa diminuição da fertilidade dos solos. Disso, também
resultam a erosão, a compactação e a perda de matéria orgânica.
389
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a modernização da agricultura, aconteceram mudanças nas técnicas de
produção, como uso de insumos externos químicos, mecanização e tecnificação
agrícola, tendo como consequência o aumento da degradação do ambiente, uma vez
que, nem sempre as ocupações são precedidas de estudos que considerem as
restrições dos recursos naturais, especialmente com relação à fragilidade das
litologias, dos solos, do relevo e das drenagens, quando submetidos a determinados
usos. Por esse motivo, um conhecimento sistemático e ordenado ligado a dinâmica
ambiental se faz necessário, pois fornecem alternativas que tenham como premissa
recuperar ou preservar a paisagem em suas dimensões natural e antrópica.
Diante dessa conjuntura, o município de Sorriso apresenta-se em um contexto
econômico junto ao estado do Mato Grosso à frente da atividade econômica local,
regional e nacional na perspectiva do agronegócio, onde as intervenções nos
ambientes naturais, em especial, o do Cerrado e o da Pré Amazônia, são
diversificados nos diferentes elos que perfaziam a “paisagem” antecedente.
A análise das imagens dos satélites Landsat e Spot foram importantes para o
estudo, possibilitando dados com qualidades espaciais e espectrais recentes. O uso
praticado na área é caracterizado predominantemente por áreas com agricultura
moderna e áreas de pecuária extensiva. A agricultura tem intensificado o uso de áreas
do Cerrado brasileiro e mato-grossense, ocupando grandes áreas, suprimindo a
vegetação primária, interferindo desta forma na biodiversidade local e regional, no
caso de Sorriso, a agricultura ocupa uma área acima de 7.000 km² contrapondo a
classe de floresta que representa apenas 18% da área total do município.
Nos usos pecuário e floresta, apresentam-se respectivamente com pastagens
em zonas com solos plínticos e nas áreas próximas aos rios encontram-se zonas de
regeneração e o consequente surgimento de floresta secundária. Apesar de
apresentarem áreas úmidas próximas as nascentes em praticamente todas as classes
do município, seu uso tem se intensificado com a aplicação de maquinários agrícolas
que constroem drenos artificiais escoando o excesso d’água, facilitando o uso dessas
áreas. Existe ainda, baseado em observações de campo uma aparente manutenção
de alguns remanescentes florestais, bem como a recomposição de algumas áreas
próximas aos rios de maior ordem.
Portanto, na área de estudo verificou-se que as atividades agrícolas atualmente
representam uma matriz antrópica com poucos fragmentos de vegetação natural e que
representam os últimos remanescentes da biodiversidade local, onde sua extensão
condiciona a existência de problemas e potencialidades cujos limites estão
390
relacionados a variáveis naturais. Nesse sentido, as limitações atribuídas para a
ocupação do espaço físico tendem a apresentar diferenças dignas de destaque em
qualquer política que vise à elaboração de diretrizes capazes de atenuar a degradação
ambiental.
REFERÊNCIAS
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município de Sorriso-MT: Uma intervenção ambiental da prática agrícola.
Trabalho de Conclusão de
Curso – Departamento de Geografia. Universidade Federal de Mato Grosso UFMT. Cuiabá - MT, 2011.
CABRAL, T. L. Zoneamento e mapeamento geoambiental do município de
Sorriso-MT. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em
Geografia PPGGeo, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria - RS, 2014.
FERREIRA, J. C. V. Cidades de Mato Grosso. Pe. José de Moura Silva e João
Carlos Vicente Ferreira. J. C.V. Ferreira: Cuiabá - MT, 2008.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Diretoria de Pesquisas,
Coordenação de População e Indicadores Sociais. Estimativas da população
residente com data de referência 1º de julho de 2014. Diário Oficial da União.
Agosto
de
2014.
Disponível
em:
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=510792&search=mato
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Agrária Conforme Fases de Implementação. 2012. Disponível em:
http://www.incra.gov.
br/index.php/reforma-agraria-2/questao-agraria/numeros-dareforma-agraria/file/31-relacao-de-projetos-de-reforma-agraria. Acesso em: mar. 2013.
PERETTO, A. Bacia hidrográfica do Ribeirão Grande: sua dinâmica natural e a
relação com a produção do espaço geográfico. Dissertação de Mestrado.
Universidade Federal de mato Grosso – UFMT. Cuiabá - MT, 2012.
SCHWENK, L. M. Conflitos Sócio-Econômicos-Ambientais relativos ao avanço ao
cultivo da soja, em áreas de influência dos eixos de integração e
desenvolvimento no estado De Mato Grosso. Tese de Doutorado – UFRJ. Rio De
Janeiro - RJ, 2005.
SCHWENK, L. M. Transformações decorrentes do processo de expansão da soja
em mato grosso: algumas reflexões no contexto ambiental, econômico e social.
Revista Mato-Grossense de Geografia, nº 16. Cuiabá - MT, 2013.
SEPLAN. Secretaria de estado de Planejamento - Mato Grosso. Projeto sócioeconômico ecológico: Projeto de desenvolvimento agroambiental do estado do
Mato Grosso – PRODEAGRO. Cuiabá-MT, 1997.
TARIFA, J. R. Mato Groso: Clima: Análise e representação cartográfica. (Série
recursos naturais e estudos ambientais). Entrelinhas: Cuiabá - MT, 2011.
391
VEDOVELLO, R. Aplicações da Cartografia Geoambiental. In: 5º Simpósio
Brasileiro de Cartografia Geotécnica e Geoambiental. Anais: São Carlos - SP, 2004.
392
TRABAJOS POSTERS
393
ANÁLISE DE UM TRECHO DE 1,9 KM DO ARROIO DO VEADO EM
SILVEIRA MARTINS, RS
Guilherme Cardoso da Silva - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected];
Indiara Bruna Costa Moura Moraes - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo - A ocupação antrópica em APP é muito recorrente na América do Sul. As
Áreas de Preservação Permanente são áreas protegidas, cobertas ou não por
vegetação nativa, localizadas nas faixas marginais de qualquer curso d’água natural,
também conhecida como mata ciliar ou mata galeria, entre outros locais. No presente
artigo, a análise tem como foco a APP de margem de rio, desta forma o objetivo do
trabalho é analisar a situação da Área de Preservação Permanente de um trecho de
1,9 km do Arroio do Veado na localidade de Val Feltrina em Silveira Martins, RS.
Utilizou-se as referências de temáticas relacionadas à APP, além de leis e o Código
Florestal, para dar embasamento às análises posteriores. O SIG foi uma importante
ferramenta do geoprocessamento empregada no tratamento dos dados para geração
de outras informações e mapeamentos que colaborassem com a pesquisa. Utilizou-se,
fundamentalmente, o software QGIS para elaboração de um buffer e a classificação
das temáticas de acordo com a cobertura do solo. Percebeu-se a existência de
habitações e estradas dentro da APP de 30 metros. Conclui-se que a dinâmica natural
pode ser alterada, resultando em maior compactação do solo, escoamento superficial,
supressão de vegetação, diminuição da infiltração, entre outros fatores.
Palavras-Chave – Área de Preservação Permanente; Ocupação antrópica; Código
Florestal
Abstract – Human estabilishment in preservation areas is a recurrent fact in South
America. Permanent Preservation Areas (PPAs) are protected areas, that could or
could not be covered by native vegetation located in the marginal belts of any water
course also known as riparian forest or gallery forest among other places. In this study,
the analysis focus on river bank PPAs also known as riparian forests. The aim this
study is to analyse the situation of a 1,9km long stretch in the PPA of “Veado” stream,
located in Val Feltrina, Silveira Martins, Rio Grande do Sul. PPAs - related thematics,
as well as legislation-manly the Forest Code - were used as references for further
analysis. GIS was an important geoprocessing tool used for handling data, thus
generation new informations and maps that could help in this research. QGIS software
was used to create a buffer as well as to soil cover. It was observed roads and houses,
inside the 30m-wide PPA. It could be concluded that the natural dynamics might be
changed as a result of the misuse, rendering higher soil compaction runoff, vegetation
suppression, lower water infiltration, among other factors.
Keywords – Permanent Preservation Areas; Human Estabilishment; Forest Code.
394
1.
INTRODUÇÃO
Com o desenvolvimento do município e a intensificação do uso das encostas
relacionadas à viticultura, tem-se a presença dos primeiros impactos ambientais mais
significativos. Neste contexto é interessante analisar a cobertura do solo e a
interferência das atividades da população local com relação aos cursos d’água.
Por muitas vezes as populações se estabelecem em locais inapropriados,
como nos casos de áreas de preservação, sejam elas em topo de morro, declividade
acentuada, proximidade com corpos d’água, entre outros.
É interessante destacar que o Código Florestal brasileiro sofreu modificações
por algumas vezes, o que causa um pouco de confusão tanto para habitantes locais
quanto para autoridades.
Áreas de Preservação Permanente (APP) são áreas protegidas, cobertas ou
não por vegetação nativa, localizadas nas faixas marginais de qualquer curso d’água
natural, também conhecida como mata ciliar ou mata galeria, entre outros locais
(Código Florestal, 2012).
No caso do presente estudo, vale destacar as particularidades do estado do
Rio Grande do Sul, presente na região do Cone Sul, que apresenta características que
não devem ser deixadas de lado. Desta forma, além de analisar a área de estudo
dentro das leis que regem a relação entre homem e natureza, deve-se avaliar o
contexto da região.
As funções das Áreas de Preservação Permanente são as mais diversas, tais
como: Preservação dos recursos hídricos, estabilidade geológica, biodiversidade,
beleza da paisagem, conter a erosão do solo, diminuir os riscos de enchentes e
deslizamentos de terra e rocha nas encostas, facilitar o desenvolvimento da fauna e
flora e, especialmente, assegurar e preservar o bem-estar das populações humanas
(Código Florestal, 2012).
A dinâmica ambiental não se dá de forma fragmentada, desta forma busca-se
analisar o solo, litologia, hidrografia, vegetação, entre outros, além da ação antrópica,
visando à dinâmica da população local.
Assim, o objetivo deste trabalho é analisar a situação da Área de Preservação
Permanente de um trecho de 1,9 km do Arroio do Veado na localidade de Val Feltrina
em Silveira Martins, RS.
395
2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
O município de Silveira Martins está localizado na região central do Rio Grande
do Sul, Brasil, sendo sempre fortemente atrelado à região da Quarta Colônia, um local
com características italianas, devido à migração, a qual é marcada pela agricultura,
como exemplo o cultivo do vinho. A cultura de plantar em encostas e áreas altas foi
trazida da Itália, onde os imigrantes plantavam uva nas extensas montanhas de
Vêneto.
Silveira Martins foi emancipada de Santa Maria no dia 11 de dezembro de
1987, tendo como base da economia o cultivo do feijão, soja, milho e batatinha, além
da atividade turística, que atrai muitos visitantes que visam à gastronomia e os
atrativos religiosos, naturais e históricos (Sampaio, Ouriques & Robaina, 2014).
A economia de Silveira Martins é baseada principalmente no setor primário,
com destaque para a agricultura. A estrutura fundiária esta centrada nas pequenas
propriedades com até 50 ha, minifúndio diversificado, com integração entre agricultura
e pecuária (Sampaio et al., 2014).
O município tem uma população total de 2.449 pessoas, em uma área de
118,273 km² (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2010). Neste
contexto, a localidade de Val Feltrina possui algumas famílias que vivem em uma área
de 172,62 há, ou, aproximadamente, 1,73 km² (Sampaio et al., 2014).
Pode-se compreender melhor a localização do município da localidade referida
com a Figura 1.
396
Figura 1 – Mapa de localização do município de Silveira Martins e da localidade de Val
Feltrina.
Como pode ser percebida, a localidade de Val Feltrina fica na porção oeste do
município de Silveira Martins.
Silveira Martins localiza-se no Rebordo do Planalto, na transição entre o
Planalto e a Depressão Central. A sua topografia caracteriza-se por ser formada por
escarpas abruptas e a drenagem fluindo no sentido da Depressão Central e padrão
dendrítico (CASAGRANDE, 2004). A altitude do município é de cerca de 430 metros,
quanto à geologia se observam rochas vulcânicas ácidas da Formação Serra Geral, e
com a diminuição da altitude tem-se a presença, em menor proporção, de arenitos da
Formação Botucatu. Nas áreas planas o município apresenta também arenitos médios
finos róseos, com estratificação cruzada, acanalada e planar, intercalados com siltitos
vermelhos, de ambiente fluvial e troncos vegetais fósseis silicificados, da formação
Caturrita (Bisso, 2008; Sampaio et al., 2014; IBGE, 2010).
Conforme uma análise realizada no software de SIG, com arquivos no formato
shapefile disponibilizados pelo IBGE, constatou-se que Silveira Martins possui cinco
diferentes tipos de formações litológicas, sendo elas: Botucatu (Arenito fino e Quartzo
arenito), Caturrita (arenito e pelito), Caxias (Riodacito e Quartzo Latito), e Gramado
(Rochas Basálticas e Latitos). Já o Arroio do Veado, no trecho analisado, perpassa por
três delas, Botucatu, Gramado, e, uma pequena porção, Caturrita.
397
A hidrografia é bastante limitada, não possuindo rios de grande porte, somente
arroios, sangas e fontes d'água, fato justificado pela presença de topografia dobrada,
movimentada e de altitude. São evidenciadas duas sub-bacias hidrográficas, a do Rio
Soturno e do Rio Vacacaí, ambas pertencentes ao sistema Jacuí-Guaíba, que
completa a hidrografia de inúmeros arroios, sangas e banhados (Sampaio, Ouriques &
Robaina, 2014).
3. METODOLOGIA
Para o desenvolvimento deste trabalho foi realizada um pesquisa a artigos e
trabalhos teóricos gerais relacionados ao tema em questão, a busca por dados, mais
diversos, em sites conceituados como os dos órgãos IBGE – Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatísitca, CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais,
SEMA – Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentáveis, entre outros, além
da utilização de alguns software como o Google Earth Pro, e o QGIS 2.8.2, este último
que é um SIG (Sistema de Informação Geográfica) livre para a elaboração de mapas,
quantificação de áreas, esclarecimento de dúvidas, entre outras funções.
Foi realizado o download de arquivos no formato shapefile nos sites referidos,
para posterior utilização no software QGIS 2.8.2.
Inicialmente utilizou-se o Google Earth Pro para o download de imagens em
alta resolução da área em questão. Após este procedimento, fez-se a elaboração de
um mosaico no software Photoshop CS5. Com a imagem pronta, fez-se o
georreferenciamento da imagem no QGIS, sendo então gerada uma imagem no
formato TIF.
Com a imagem georreferenciada, vetorizou-se o trecho do arroio que se
encontra na localidade de Val Feltrina, para posteriores procedimentos. O primeiro
deles foi a geração de um “buffer” de 30 metros, de acordo com a legislação brasileira,
na intenção de representar a Área de Preservação Permanente – APP correta para
este arroio.
Outro procedimento executado de suma importância para a pesquisa foi a
classificação de temáticas dentro dos limites do buffer referido na pesquisa. Assim,
com uma análise visual, foram classificadas as temáticas APP (que é seria
representada pelo buffer); vegetação arbórea; campo, que seria basicamente
vegetação rasteira, como gramíneas; habitação; estrada e água. Esta última temática
foi criada para porções mais largas do arroio, visando não haver problemas com a
quantificação das áreas posteriormente, sendo que o restante do rio foi representado
398
apenas com uma linha (tipo de camada linha), pois devido à escala não seria
representativo na quantificação de áreas.
Após a vetorização de todas as temáticas, utilizou-se a tabela de atributos de
cada camada shapefile criada e gerou-se uma coluna intitulada “Área”. Visando a
quantificação em m².
Também se elaborou um mapa com a litologia da área para localizar o Arroio
do Veado conforme questões geológicas, além de compreender a sua ligação dentro
de um sistema hídrico mais amplo. Isso foi permitido com a utilização de arquivos
shapefile disponibilizados pelos órgãos já referidos no trabalho.
4. RESULTADOS
Observou-se uma variação significativa de altitude no trecho analisado do
Arroio do Veado, com uma diferença de cerca de 60 metros, de acordo com o software
Google Earth Pro.
Elaborou-se uma carta-imagem com imagens Google Earth Pro, e por meio do
software de SIG vetorizou-se um trecho do corpo d’água presente na região de Val
Feltrina. O trecho selecionado é de 1,9 km, e conforme os arquivos hidrológicos do
IBGE, o corpo d’água faz parte do Arroio do Veado, que é um tributário do Rio
Vacacaí-Mirim, como pode ser percebido da Figura 1.
Com a utilização da ferramenta “buffer” gerou-se a Área de Preservação
Permanente de 30 metros, de acordo com o Código Florestal Brasileiro, levando em
consideração áreas que não se enquadram nas áreas consolidadas, tratadas no
Código anterior ao de 2012. Neste sentido a APP nas faixas marginais de qualquer
curso d’água natural, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular
devem obedecer 30 metros de largura em cada margem do corpo d’água, para cursos
hídricos de até 10 metros, como é o caso do trecho do Arroio do Veado.
A partir disso, fez-se uma classificação temática de todas as classes presentes
na área de APP. As classes foram: Vegetação arbórea, campo, estrada, habitação e
água, como pode ser observado na Figura 2.
399
Figura 2 – Classificação das temáticas no interior da Área de Preservação
Permanente.
As áreas foram quantificadas, obtendo-se 110.925 m² de APP, 882,8 m² de
água, 594,82 m² de residências, 1.739,25 m² de estradas, 36.928,60 m² de campo e
70.791,56 m² de vegetação.
Para melhor compreensão dos dados, tem-se a Tabela 1.
Tabela 1 - Quantificação das áreas
Temática
Área
Val Feltrina
1.726.200 m²
Área de Preservação
110.925 m²
Permanente
Vegetação
70.791,56 m²
Campo
36.928,60 m²
Residência
594,82 m²
Estradas
1.739,2 m²
Água
882,80 m²
400
De acordo com os dados gerados pelo SIG, percebe-se que do total da área da
localidade de Val Feltrina, a APP do presente trabalho ocupa 6,42%.
Mudando a escala de avaliação, e levando em consideração apenas a APP,
percebe-se que a maior parte da área, 64%, é constituída por uma vegetação de porte
mais elevado, o que a priori é positivo ao meio ambiente e vai ao encontro do Código
Florestal. Ainda neste sentido, 33% da área é constituída por campo, comum no Rio
Grande do Sul, sendo uma vegetação de pequeno porte, como exemplo as gramíneas.
Desta forma, a grande maioria da área de APP é positivamente constituída por
vegetação, de forma geral, totalizando 97%.
No
local
também
se
presenciam
alguns
exemplares
da
espécie
Platanusoccidentalis (Plátano), sendo que a vegetação predominante no local se
caracteriza por pertencer à tipologia de Floresta Estacional Decidual, caracterizada por
apresentar-se em estágios iniciais, médios e avançados de sucessão. Por apresentar
vegetações em diferentes estágios, destaca-se uma vegetação de mata mais fechada,
de porte adulto e espécies clímax, correspondendo ao estágio sucessional avançado,
e um segundo tipo de vegetação, esta mais limitada por um plantio de plátanos, em
estágio primário de sucessão, ou seja, algumas espécies arbóreas presentes,
substituindo o estágio anterior da vegetação local. São encontradas mais de 20
espécies arbóreas e arbustivas na localidade (Sampaio, Ouriques & Robaina, 2014).
As outras temáticas são constituídas por estradas, 1,57%, água (extensões
maiores do arroio) 0,79%, e residência, 0,53%. Todas as percentagens podem ser
observadas na Figura 3.
Figura 3 – Percentagens das temáticas quantificadas no interior da Área de
Preservação Permanente.
401
Apesar de ocupar uma área pouco representativa, as temáticas Habitação e
Estrada merecem atenção. Mesmo que as habitações tenham sido expressadas no
gráfico da Figura 3 por 0%, especificamente o total é 0,53%, sendo que o valor no
terreno é de aproximadamente 595 m², o que não pode ser desprezado. Ainda neste
sentido, as Estradas, representadas por 2% no gráfico, totalizam aproximadamente
1740 m².
Com a carta-imagem elaborada na pesquisa, nota-se que algumas famílias de
Val Feltrina se estabeleceram nas proximidades do arroio, e por conta disso algumas
residências se fazem presentes dentro da Área de Preservação Permanente.
De acordo com o Código Florestal brasileiro, não é permitido o estabelecimento
de estradas, mesmo que seja “de terra”, pois isso representaria a retirada da
vegetação local. E da mesma forma seria proibido o estabelecimento de residências,
pois também representaria a retirada da vegetação e o estabelecimento de habitações
que mudariam, em diferentes escalas, a dinâmica natural do ambiente.
É válido destacar as áreas consolidadas, que são áreas rurais que possuem
ocupação antrópica consolidada até 22/07/2008 com edificações, benfeitorias e
atividades agrosilvipastoris, admitida neste último caso a adoção do regime de pousio.
Assim, se garante a manutenção das atividades desenvolvidas nessas áreas rurais
consolidadas, respeitados os termos de compromisso ou de ajustamento de conduta
eventualmente assinados, até que os Programas de Regularização Ambiental (PRAs)
sejam promulgados pela União, estados ou DF e observadas as condições
especificadas no projeto (Código Florestal, 2012).
No caso das áreas consolidadas há diferenças de acordo com o tamanho em
módulos fiscais da propriedade rural. Neste sentido, para os imóveis rurais com área
de até um módulo fiscal (de acordo com cada região) ao longo de cursos d’água
naturais, será obrigatória a recomposição de faixas menores que 30 metros. Nesta
situação, as margens em 5 metros, contados a partir da borda da calha do leito
regular, independentemente da largura do curso d´água.
Já nas APPs são definidos os limites mínimos sem possibilidade de redução ou
ampliação pelos estados e DF, e obriga que seja recomposta a vegetação em APP
que tenha sido suprimida sem autorização, ressalvados os casos que estejam sendo
tratados no âmbito dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs), os quais
poderão regularizar as atividades rurais consolidadas em APP com fundamento nos
levantamentos e estudos socioambientais definidos na lei. Na hipótese de
regularização das atividades, os PRAs deverão prever medidas compensatórias pelos
proprietários ou possuidores (Código Florestal, 2012).
402
5. CONCLUSÕES
Conclui-se que as Áreas de Preservação Permanente merecem um cuidado
especial devido à complexidade das relações dentro das dinâmicas da natureza.
Cabe destacar que a área merece análises mais aprofundadas, visto que o
Código Florestal brasileiro faz especificações de acordo com o tamanho das
propriedades rurais e seus módulos, podendo haver alterações no tamanho da APP.
No presente trabalho, utilizando-se da norma geral, 30 metros para cursos
d’água menores de 10 metros de largura, percebeu-se a presença de habitações
irregulares, que podem alterar a dinâmica local, seja pelo escoamento superficial,
diminuição da infiltração das águas da chuva, diminuição da fauna e flora,
compactação dos solos, qualidade do ciclo hidrológico, entre outros fatores.
É válido destacar que caso a APP permitida seja menor que 30 metros, isso
não isenta a situação de interferência ao ambiente, apenas não apresenta questões
conflitantes com as leis do país em alguns locais.
Ainda que em pequena proporção, a existência de entradas abertas dentro da
APP pode também alterar a dinâmica natural, seja pelo trânsito de pedestres ou
automóveis, que varia de acordo com a intensidade do fluxo. Na região o tráfego é
pouco intenso, mas de qualquer forma há de se considerar a compactação do solo e a
supressão da vegetação.
Percebeu-se a relação de diferentes vegetações como algo bastante particular,
visto que na região Cone Sul é comum a presença de vegetações rasteiras, como
gramíneas, que muitas vezes são permitidas como APP, não sendo necessário
especificamente vegetações de portes maiores, desde que nativas, considerando-se
positiva a heterogeneidade da vegetação local, desde que não haja uma interferência
significativa na introdução de vegetação exótica.
Notou-se que a preocupação se dá não só com o que já foi estabelecido, mas
também com o que ainda pode acontecer no local. Com o crescimento populacional e
expansão de manchas habitacionais, apesar do êxodo rural forte no Brasil, não se
pode menosprezar uma eventual intensificação das ocupações na localidade de Val
Feltrina e, principalmente, dentro dos limites das Áreas de Preservação Permanente.
Embora a construção feita em Área de Preservação Permanente seja proibida
pela legislação ambiental atual, a denominada área consolidada deve ser mantida. Em
área rural, além de se considerar o marco temporal, é necessário que a intervenção
tenha se dado por meio de edificações ou benfeitorias ou atividades agrossilvipastroris
para continuidades de atividades ligadas ao turismo rural ou ao ecoturismo.
403
Logo, a lei não pode retroagir para atingir uma situação já concretizada.
Precisamente por este motivo a lei supõe e preserva as ocupações antrópicas,
porquanto uma legislação posterior não pode julgar as intervenções ocorridas antes
das definições legais.
REFERÊNCIAS
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Graduação). Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, UFSM.
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Disponível
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03/07/2015.
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Ocorrências de Movimentos de Massa e Deslizamentos Verificados na Localizada de
Val Feltrina, Zona Rural do Município de Silveira Martins/RS. Santa Maria: Engeambih.
404
SÍNTESE DA EVOLUÇÃO DOS AREAIS DA BACIA DO ARROIO PUITÃ,
OESTE DO RS, NO PERÍODO DE 1984 À 2014
Angélica Cargnin de Souza - Universidade Federal de Santa Maria
angé[email protected]
Carlos Alberto da Fonseca Pires - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O Sudoeste do Estado do Rio Grande do Sul apresenta áreas de intensa degradação
do solo, com extensas porções de terra recobertas por areias submetidos aos
condicionantes climáticos locais, sendo denominadas de areais. Nesse contexto, o
objetivo desse trabalho foi realizar uma síntese da evolução dos areais da Bacia
Hidrográfica do Arroio Puitã no período 1984 a 2014, através de mapeamento
multitemporal. Assim se seguiram algumas etapas: primeiramente se deu a coleta de
dados; após o trabalho de campo; a seguir se deu a etapa de geoprocessamento com
a confecção dos mapas de uso e cobertura da terra dos anos de 1984, 1994, 2004 e
2014 de toda a Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã, a validação das classificações e as
análises geográficas. A partir do mapeamento dos areais da bacia verificou-se uma
expansão de área nos períodos correspondentes de 1984-1994 e 1994-2004, porém a
redução de área num terceiro período, de 2004-2014. Analisando-se todo o período
tem-se a expansão dos areais em 1,87 km² de área. O comportamento dos areais no
período está diretamente relacionado com os condicionantes climáticos e de relevo do
local, tendo como principais agentes naturais responsáveis pela manutenção desse
processo a água e o vento.
Palavras-chave: Arenização. Arroio Puitã. Mapeamento Multitemporal. Uso e
Cobertura da Terra. Sensoriamento Remoto.
INTRODUÇÃO
O Sudoeste Estado do Rio Grande do Sul é caracterizado por apresentar áreas
de intensa degradação do solo. Essas áreas foram classificadas como áreas de
atenção especial tomando como base o mapa elaborado pelo Ministério do Meio
Ambiente e Recursos Hídricos e da Amazônia Legal (1992), que localiza as áreas com
risco de desertificação.
O processo de desertificação é caracterizado pela degradação da terra em
áreas áridas, semiáridas e secas, onde há dificuldade de fixação da cobertura vegetal,
resultante de inúmeros fatores que incluem as atividades antrópicas. Nas áreas de
degradação do solo no Sudoeste do RS a dinâmica dos processos aí envolvidos é
derivada de um clima úmido onde há abundância de água. Esse processo de
degradação é conceituado por Suertegaray (1987) como arenização.
Na região Oeste do RS encontra-se a Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã
(Figura 1) marcada pela presença de inúmeros areais que recobrem extensas porções
405
da superfície no interior da mesma, constituindo assim numa das principais áreas da
região em ocorrência de areais.
Figura 1 – Mapa de localização da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã
Segundo Robaina et al (2010) nessa região há ocorrência de “processos
geomorfológicos controlados pela drenagem do Rio Ibicuí e seus afluentes, atuando
sobre substrato de rochas sedimentares de diferentes tipos, onde há a predominância
de arenitos” (p. 15). Conforme o mesmo autor essa área de ocorrência dos areais é
constituída por formas de relevo do tipo colinas associadas à morrotes isolados de
arenitos. Há a presença de arenitos pouco coesos e solos arenosos que facilitam a
ação hídrica e eólica facilitando a formação de feições como areais, ravinas e
voçorocas.
Quanto aos areais existentes na Bacia do Arroio Puitã, segundo Trentin (2007)
os campos de areia “desenvolvem-se a partir de cabeceira de drenagens desmatadas
e, principalmente, em vertentes convexadas junto à base das colinas, em geral,
associados, na meia encosta, a arenitos pouco coesos” (p. 117).
A degradação desses ambientes corresponde á um problema uma vez que a
fertilidade do solo é reduzida e a erosão também aumenta, sendo assim necessário
que haja o conhecimento da localização, gênese, evolução e comportamento desse
processo em cada local específico, bem como o conhecimento dos principais agentes
da dinâmica superficial envolvidos no processo nesses locais.
406
O levantamento e análise do uso e cobertura da terra de determinada área é
um instrumento imprescindível para estudos ambientais, uma vez que possibilita o seu
melhor gerenciamento e planejamento, de modo que possibilita se conhecer a
utilização dada por parte do homem à terra ou a situação da vegetação que reveste o
solo, além de permitir o desenvolvimento de técnicas e projetos que visem um melhor
planejamento e gestão do ambiente em questão.
Segundo o IBGE (2006) “ao retratar as formas e a dinâmica de ocupação da
terra, esses estudos também representam instrumento valioso para a construção de
indicadores ambientais e para a avaliação da capacidade de suporte ambiental, diante
dos diferentes manejos empregados na produção, contribuindo assim para a
identificação de alternativas promotoras da sustentabilidade do desenvolvimento”
(p.20).
Nesse contexto o mapeamento e levantamento do uso e cobertura da terra de
uma determinada área, segundo Cavalheiro e Rassier (1998), vêm demonstrar a
distribuição espacial das atividades nela realizadas. Para Silva et al. (2013) “o
mapeamento do uso do solo mediante técnicas de análises espaciais são o meio mais
rápido e fácil para análise dos fenômenos naturais nas mais variadas escalas” (p. 02).
Fontes básicas para o mapeamento da cobertura da terra são os dados de imagens
orbitais, podendo ser utilizados dados de diversos sensores dependendo de fatores
como o objetivo, a escala e o custo do mapeamento.
Segundo Keller (1969), “somente o registro dos fatos em mapas poderá
mostrar as áreas e a distribuição real das diferentes formas de uso do espaço rural” (p.
151). Porém, para que se possa entender as mudanças nas relações entre uso e
cobertura da terra, é necessário que seja feita a classificação da cobertura da terra, a
caracterização de sua função e o entendimento dos agentes envolvidos
OBJETIVOS
O objetivo principal desse trabalho é realizar uma síntese da evolução
(expansão, estagnação ou redução) dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã
num período de 30 anos (1984 a 2014).
Como objetivos específicos foi proposto elaborar um mapeamento do uso e
ocupação do solo da bacia do Arroio Puitã a partir de imagens de satélite dos últimos
30 anos e analisar as principais mudanças no uso e ocupação do solo no entorno das
áreas dos areais.
407
METODOLOGIA
Os dados coletados para a realização da pesquisa podem ser subdivididos em
dois grupos, os bibliográficos e os cartográficos. Os dados bibliográficos foram
utilizados
principalmente
para
fundamentar
teoricamente
a
pesquisa
e
compreenderam principalmente trabalhos científicos e órgãos de pesquisa. Já os
dados cartográficos foram utilizados principalmente na etapa de geoprocessamento na
compilação de outros dados e geração de informações.
Dentre os dados cartográficos estão: a base vetorial do RS, elaborada por
Hasenack e Weber (2010), da UFRGS, em formato shapefile, com elementos de
altimetria, hidrografia, sistema viário, manchas urbanizadas e limites do Estado: a
malha municipal digital do RS (IBGE, 2010) em shapefile na escala 1:250.000, sistema
de coordenadas geográficas Lat/Long e datum SIRGAS2000; três imagens do sensor
TM do satélite Landsat 5 em formato digital, órbita-ponto 224-080, de 2 de Julho de
1984, 12 de Junho de 1994 e 09 de Julho de 2004, respectivamente; uma imagem do
sensor OLI e TIRS do satélite Landsat 8, de 06 de Agosto de 2014, com órbita-ponto
224-080; e outras bases vetoriais já existentes.
Na etapa correspondente ao geoprocessamento foram utilizados os softwares
Environment for Visualizing Images - ENVI 4.8 no processamento digital das imagens
e o software ArcGIS 10 na realização de análises geográficas e geração dos layouts
finais de apresentação.
Quanto à classificação das imagens primeiramente se deu o reconhecimento
de padrões espectrais dos alvos e a posterior determinação das classes de uso e
cobertura da terra, que nesse caso para o mapeamento de toda a área de estudo
foram sete: água; agricultura; areais; campos; florestas; silvicultura; e, solo exposto.
Após foram coletadas amostras de treinamento nas imagens a fim de classifica-las por
meio de classificação supervisionada, verificando-se após o grau de separabilidade
das mesmas. Por fim foi aplicado o método classificador pixel a pixel Maxima
Verossimilhança – MAXVER buscando a classificação das imagens.
Para validar as classificações, ou seja, para que elas condigam com a verdade
do terreno foram geradas matrizes de confusão para as classificações cruzando os
dados oriundos da classificação com os dados de campo. A verdade do terreno
corresponde ao que há de real no terreno sendo que para realizar o confronto desses
dados necessitou-se da ida a campo.
A matriz de confusão gera produtos como a Acurácia Global da classificação e
o Coeficiente Kappa. Na Acurácia Global são considerados no calculo apenas os
pixels corretamente classificados, ou seja, apenas os localizados na diagonal principal
408
da matriz. Já o Coeficiente Kappa considera em seu cálculo todos os pixels da matriz,
ou seja, os corretamente e os não corretamente classificados dando assim maior
confiabilidade ao resultado. O Coeficiente Kappa gera valores que vão até um (1),
onde para a avaliação considera-se o que foi proposto por Landis e Koch (1977)
quanto à qualidade da classificação, sendo: < 0,00 – Péssima; de 0,00 à 0,20 – Ruim;
de 0,20 à 0,40 – Razoável; de 0,40 à 0,60 – Boa; 0,60 à 0,80 – Muito Boa; e, de 0,80 à
1,00 – Excelente.
Posterior à validação das classificações houve a transformação dos resultados
das mesmas do formato raster para vetor e a quantificação de áreas de cada classe.
Posteriormente houve a transformação para o formato shapefile e feitas as análises
geográficas cruzamento de informações das classificações de 1984 – 1994, 1994 –
2004, 2004 – 2014 e 1984 – 2014.
RESULTADOS
Como resultado do mapeamento multitemporal da Bacia Hidrgráfica do
Arroio Puitã obteve-se quatro mapas de uso e cobertura da terra bacia referentes
às quatro datas estudadas, ou seja, dos anos de 1984, 1994, 2004 e 2014,
considerando as seguintes classes temáticas: Água, Agricultura, Areais, Campos,
Florestas, Silvicultura e Solo Exposto.
Durante todo o período analisado houve a predominância da classe Campos
em mais da metade da área da bacia, onde essa predominância se deve às
características naturais da área inserida no Bioma Pampa com vegetação
característica de gramíneas. Apesar de serem predominantes na bacia as áreas de
campos diminuíram no período analisado, ou seja, 1984 à 2014, passando de 278,2
km² para 253,12, uma redução de 24,9 km² de área. Em análise geral do uso e
cobertura da terra de 1984 e 2014 percebe-se que essas áreas de campos cederam
espaço principalmente para a agricultura e silvicultura.
As áreas de agricultura na época de captura das imagens são
representadas em sua maioria por cultivos de invernos como trigo, sorgo ou aveia,
ou pastagens cultivadas em intermediário e avançado de desenvolvimento. As
porções de área ocupadas pela classe Agricultura aumentaram 48.02 km² no
período, passando de 6.91 km² em 1984 para 50,58 km² em 2014, aumento devido
principalmente à expansão da lavoura de soja, vindo de encontro com a redução
das áreas de campo já citadas.
409
A classe Solo Exposto corresponde principalmente à solos descobertos, ou
seja, com ausência de vegetação que estão sendo preparados para a implementação
de cultivos agrícolas. Também compreende a solos em que há presença de
vegetação, porém rala, podendo corresponder a áreas onde os cultivos agrícolas
estão em estágio inicial de desenvolvimento. As áreas de Solo Exposto
apresentaram redução em 2,59 km², passando de 39,32 km² em 1984 para 36,73
km² em 2014. Essa redução condiz em grande parte com a data das imagens, ou
seja, devido ao fato de a imagem de 1984 ter sido captada no mês de Julho e a
imagem de 2014 ter sido captada no mês de Agosto conferindo assim um mês de
diferença entre as datas, considerando que em Agosto parte dos cultivos de verão
já foram implementados.
As áreas da classe Florestas compreendem vegetação natural de grande porte,
em geral árvores de médio à grande porte e arbustos de grande porte. Estas
correspondem em parte matas galeria dispostas ao longo de cursos d’água, mas em
maior proporção estão localizadas em áreas declivosas como encostas. As Florestas
compreendiam um total de 55,6 km² de área em 1984 e apenas 22,0 km² em 2014
representando uma diminuição de 33,06 Km² de área. Essa diminuição na área
florestal se deve a dois fatores principais, o aumento das áreas agrícolas e o
desmatamento.
A classe Silvicultura é representada por plantações de pinus e
principalmente de eucalipto. Essa classe em 1984 recobria 5,6 km² de área da
bacia e em 2014 recobria 15,79 km² de área, cerca de 4% do total da área da
bacia, representando um aumento de 10,19 km² de área. Esse aumento se dá
principalmente no período de 2004 a 2014 onde o investimento de empresas
multinacionais de celulose é o principal responsável.
A classe Água é representada por cursos d’água e por açudes e represas.
Essa classe apresenta pequenas porções de área se comparadas ao total da bacia
devendo-se principalmente ao não elevado número de corpos d’água existentes no
interior da bacia.Verifica-se ao longo do período um aumento gradual dessas áreas
onde em 1984 tinha-se apenas 0,33 km² e já em 2014 0,80 km², representando
assim um aumento de 0,47 km² de área. Esse aumento se deve principalmente ao
aumento no número de açudes e represas durante o período na área de estudo.
Quanto aos areais da bacia os processos relacionados ao clima que são
mais atuantes nessas áreas são o vento e a água (Figura 2 – A, B, C). A água por
meio da erosão e lixiviação com importante papel na ativação de processos da
dinâmica superficial como o ravinamento e o voçorocamento através do
410
escoamento superficial concentrado. Já o vento constante que sopra na região
atua como agente erosivo e também no transporte de desagregados de solo e
rocha, gerando depósitos arenosos e mantendo os depósitos já existentes em
constante mobilidade.
Em sua maioria esses areais estão localizados em declividades baixas de
até 5% e nas mais baixas elevações dentro da bacia que variam dos 87 m a 215 m
de altitude. Estão associados em sua maioria a cabeceiras de drenagem, à meia
encosta de vertentes geralmente côncavas e a morrotes de arenito comuns na
área (Figura 2 – D, E, F).
De maneira geral a ocorrência de areais em dado local limita a realização
de atividades econômicas, porém o que se observa a campo é a tentativa
constante da implantação da silvicultura sobre áreas arenosas e também à
bovinocultura, devido ao fato dessas áreas encontrarem-se geralmente no interior
de campos destinados à atividade comum na região (Figura 2 – G, H, I).
Figura 2: Diferentes cenários nos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã: A) ação
da água; B) deflação; C) processos de ravinamento e voçorocamento; D) areal em
meia encosta; E) blocos de arenitos sob ação do intemperismo; F) morrote de arenito;
G) silvicultura sobre áreas arenosas; H) cerca enterrada pela areia e reconstruída
sobre areais; I) presença de bovinos soltos em areais.
411
Os areais da bacia do Arroio Puitã possuem semelhanças quanto ao seu
comportamento (expansão e retração) devido ao fato de serem regido pelo mesmo
tipo de clima e, portanto, por um regime de chuvas e ventos semelhantes. Esse fato
condiciona processos da dinâmica superficial parecidos neste ou naquele areal dentro
da bacia. E em sua maioria dentro da bacia os areais tem origem dos arenitos fluviais,
com processos eólicos associados, da Formação Guará que possuem coloração bege
à esbranquiçada e granulometria grossa a media pouco selecionada.
Partindo para uma análise quantitativa, verifica-se que durante os 30 anos em
estudo as áreas recobertas pelos areais nos revelam em um primeiro e segundo
momento uma expansão e num terceiro momento a retração (Figura 3). Em 1984 os
areais da BHAP computavam 7,29 Km² de área correspondendo a 1,9 % da área total
de estudo, em 1994 as áreas somavam 9,06 km², 2,3 % da área total e em 2004 a
área correspondia quase que ao dobro do primeiro ano analisado correspondendo a
13,4 km² de área, ou seja, 3,4 % do total da área de estudo. Porém em 2014 a área
era menor em relação ao ano anterior considerado, somando 9,16 km² de área, 2, 3%
do total. Considerando todo o período de estudo identificou-se uma expansão de
1,87 km² nas áreas recobertas por areais dentro da bacia.
Figura 3: Mapa da evolução dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã por ano
de mapeamento
412
A dinâmica desses areais se dá principalmente no seu entorno onde as
expansões se dão geralmente sobre áreas de campo e solo exposto. Verificou-se
também que a redução das áreas dos areais de 2004 à 2014 se deu em função da
expansão de áreas de campo, solo exposto e principalmente de silvicultura implantada
geralmente sobre áreas em processo de arenização.
O dinamismo no comportamento dos areais está relacionado também com a
influência dos fenômenos ENOS que atingem o estado influenciando seja através de
estiagem ou do aumento significativo nos níveis pluviométricos.
Ressalta-se por fim quanto à validação das classificações geradas para 1984,
1994, 2004 e 2014 ressalta-se que as mesmas apresentaram índice Kappa
correspondentes a 0,976, 0,9604, 0,9384 e 0,9762, respectivamente, validando as
classificações e aferindo-lhes grau de eficiência segundo o proposto por Landis e Koch
(1977) como excelente.
CONCLUSÕES
A partir do mapeamento multitemporal dos areais da Bacia Hidrográfica do
Arroio Puitã pode-se perceber mudanças consideráveis nos mesmos durante as fases
estabelecidas para o estudo. Tem-se assim um pequeno aumento de área no período
de 1984 a 1994, um aumento consideravelmente maior no período de 1994 a 2004 e
uma redução considerável, quase que de mesma proporção a este último aumento, no
período que vai de 2004 a 2014.
Porém ao analisar o período como um todo considerando apenas as datas
inicial e final do estudo, ou seja, o período entre 1984 e 2014, tem-se que os areais
sofrem pequeno aumento de área considerando o período de 30 anos, mascarando o
comportamento do mesmo ao longo do período estudado.
Assim o mapeamento de uma mesma área considerando apenas duas datas
buscando a análise num longo período de tempo, como no caso da presente pesquisa
num período de 30 anos, pode mascarar o resultado obtido a respeito de
determinados alvos em estudo, uma vez que o comportamento desses alvos ao longo
do período analisado pode ter sido absolutamente diferente dos dados encontrados
nos períodos inicial e final do estudo.
Dessa forma pode-se inferir que o mapeamento multitemporal de alvos da
superfície terrestre com a utilização de mais de duas datas de mapeamento, reduzindo
o intervalo de obtenção de dados, possibilita maior eficiência e confiabilidade ao
monitoramento do comportamento desses alvos.
413
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Oeste do RS. Dissertação (Mestrado em Geografia e Geociências, Universidade
Federal de Santa Maria, 2007). 142.
414
OS DADOS SRTM E SUA APLICABILIDADE NA REPRESENTAÇÃO DO
CENÁRIO GEOGRÁFICO CAPINÓPOLIS/MG/BRASIL
Eduardo Marques Silveira - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Meri Lourdes Bezzi - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Roberto Barboza Castanho - Universidade Federal de Uberlândia
[email protected]
Resumo
O desenvolvimento de novas metodologias é de extrema importância para se
espacializar diversas temáticas, onde, a partir de mapeamentos, por exemplo, obtemse a tradução da realidade, bem como, uma proximidade da mesma, demonstrando a
organização espacial de qualquer parte do território. Através destes, e de outros
acontecimentos, foram criadas novas tecnologias, podendo citar a computacional,
através da qual foi possível gerar uma série de novas técnicas para se efetuar a
espacialização das mais diversas regiões. Partindo deste pressuposto, a pesquisa
teve como objetivo central efetuar uma análise sobre as utilidades dos dados The
Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), bem como, seu uso e aplicabilidade na
Geografia. Especificamente, buscou-se: a) elaborar exemplos de utilização de dados
SRTM no município em estudo; b) verificar a aplicabilidade destes dados em
Capinópolis. Por fim, entende-se que ocorreu uma crescente utilização dos dados
SRTM, nos últimos anos. Destaca-se que ao se utilizar deste tipo de mecanismo, fazse necessário uma avaliação detalhada no tipo de procedimento realizado na sua
organização, pois se o mesmo não for analisado e utilizado corretamente, a
metodologia empregadatende a ser ineficaz não correspondendo aos para os
resultados esperados pelo pesquisador.
Palavras chaves: SRTM; Aplicabilidade, Geoprocessamento
Introdução
Com o desenvolvimento tecnológico mundial, as novas tecnologias estão cada
vez mais, presentes não somente na vida cotidiana, mas na área urbana e rural, ou
seja, no globo como um todo. Assim, tecnologias como o Geoprocessamento, o SIG
(Sistema de Informação Geográfica) e a Cartografia Digital, na atualidade, são valiosos
instrumentos para se compreender e analisar a utilização do espaço.
Através disto, destaca-se a importância da junção destas tecnologias entre si, ou
seja, se um pesquisador efetuar a utilização do Geoprocessamento e do SIG, para a
elaboração de um mapeamento, o mesmo tende a ficar cada vez mais preciso,
propiciando, um trabalho com maior riqueza nos detalhes, o que facilita a compreensão
e observaçãodas informações.
O trabalho expõem quais são as aplicabilidades das imagens The Shuttle Radar
Topography Mission (SRTM) no cenário geográfico como um todo. Desta forma a
415
pesquisa apresenta como objetivo central efetuar uma análise sobre as utilidades dos
dados The Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), bem como, seu uso e
aplicabilidade na Geografia. Especificamente, buscou-se: a) elaborar exemplos de
utilização de dados SRTM no município em estudo; b) verificar a aplicabilidade destes
dados em Capinópolis.
A utilização de técnicas para a compreensão do cenárioGeográfico
Na atualidade a análise e compreensão do uso solo tem se tornado de suma
importância para a potencialização da produção agropecuária e compreensão das
dinâmicas que ocorrem no espaço como um todo. Desta forma, cada vez mais, novas
tecnologias são agregadas para espacialização destas áreas, proporcionando melhor
aproveitamento do espaço rural ou urbano.
Neste sentido, pode-se afirmar que as transformações dos dados reais para os
virtuais devemobedecer certas condições, pois os mesmos propõem demonstrar
exatamente o que é observado no espaço. Fitz (2008, p. 70) discorre sobre esta
questão dizendo
A introdução de dados em um SIG deve seguir determinadas
condições específicas. Os dados espaciais possuem características
próprias, cuja percepção por parte do usuário definirá formas
diferenciadas de interpretações. A passagem dos dados do mundo
real para um mundo virtual deverá ocorrer a partir da utilização de
modelos, os quais deverão seguir padrões conceituais vinculados à
maneira como o indivíduo concebe o espaço observado. Tal
estrutura, portanto, não pode ser desvinculada do paradigma
epistemológico envolvido na questão. Nesse sentido, a aclamada
“neutralidade cientifica” acaba por perder seu principal aporte
filosófico
Assim, entende-se que é de fundamental importância a compreensão do termo
sensoriamento remoto, uma vez que este passou a ser utilizado com o
desenvolvimento de outras tecnologias, como por exemplo o Geoprocessamento.
Este processo foi muito utilizado até o início da Primeira Guerra Mundial, porém
apenas a partir da Segunda Guerra Mundial, que houve um enorme desenvolvimento
tecnológico, no que tange ao sensoriamento remoto. Entretanto a partir do lançamento
de objetos não tripulados é que houve um aumento na utilização do sensoriamento
remoto. Rosa (2009, p.13), elaborou a seguinte evolução histórica referente a esta
ferramenta.
416
Em 4 de outubro de 1957, pela primeira vez na história de nossa
civilização, um objeto não tripulado foi lançado ao espaço exterior e
pôs-se a gravitar em torno da terra. Na década de 60 deu-se início
aos experimentos espaciais tripulados, como por exemplo, a série de
espaçonaves Gemini e Apolo, a National Aeronautics and Space
Administration (Nasa), o que motivou o desenvolvimento de uma série
de sensores com o objetivo de obter informações sobre a superfície
terrestre. Em 1972 os EUA deram um salto e colocaram em órbita o
primeiro satélite de sensoriamento remoto com finalidade civil,
destinado à obtenção de dados de forma rápida, confiável e repetitiva
dos alvos terrestres.
Neste sentido o desenvolvimento desta tecnologia e significativa e agregada a
outros sistemas implantados, permite na atualidade se obter diversas informações
através dos sensores dos satélites. O imageamento, na atualidade, funciona através
de sensores acoplados aos satélites, os quais emitem uma espécie de laser,
efetuando escaneamento da superfície terrestre. Deve-se levar em consideração
também a ideia de que, para o sensoriamento efetuar a aquisição de dados é
necessário utilizar energia para se efetuar a transferência de informação do objeto
para o sensor.
Para Novo (1993, p. 2), a definição de sensoriamento remoto é,
[...] a utilização conjunta de modernos sensores, equipamentos para
processamento de dados, equipamentos de transmissão de dados,
aeronaves, espaçonaves etc., com o objetivo de estudar o ambiente
terrestre através do registro e da análise das interações entre a
radiação eletromagnética e as substâncias componentes do planeta
Terra em suas mais diversas manifestações.
Assim, pode-se afirmar que a evolução das tecnologias fiz com que o
desenvolvimento de novas técnicas trouxesse uma maior evolução para a elaboração
de mapas e de outros produtos cartográficos.
Através destes pressupostos deve-se levar em consideração a eficácia de
outros mecanismos e/ou ferramentas, tais como, o geoprocessamento, cartografia
digital e Sistema de informação Geográfica (SIG) que contribuíram para a
espacialização das dinâmicas que ocorrem no uso da terra. Levando em consideração
que para alguns autores, como Rosa; Brito (1996), Fitz (2008), Rosa (2009) dentre
outros, o SIG é um conjunto de instrumentos que tem por finalidade a análise do
espaço geográfico e, por si só, acaba englobando as outras ferramentas citadas aqui,
com isto, faz-se necessário a compreensão deste sistema operacional.
Assim, para se compreender como funcionam estas ferramentas, deve-se
analisar sua história. Para Rosa; Brito (1996, p. 8) é importante enfatizar que,
417
O Sistema de Informação Geográfica (SIG) é um caso especifico do
Sistema de Informação. Seu desenvolvimento começou em meados
da década de 60. O primeiro sistema a reunir as características de
um SIG foi implementado no Canadá, em 1964, sendo chamado de
“Canadian Geographic Information System). Em seguida foram
desenvolvidos outros sistemas. Dentre eles podemos destacar os
sistema de New York Landuse na Natural Resources Information
Systems (1967) e Minnesota Land Management Information System
(1969). Nas décadas posteriores ocorreram consideráveis avanços
em equipamentos e software, permitindo o desenvolvimento de
sistemas mais potentes e novas aplicações, popularizando
principalmente os CAD s (Computer Aided Design), cujos objetivos
são diferentes dos SIG s. No começo da década de 80, a evolução da
tecnologia foi afetada pelos avanços em hardware e software, com o
uso mais efetivo na manipulação das informações geográficas, bem
como a ligação entre a base de dados gráfica e alfanumérica
Neste sentido, o Sistema de Informação Geográfica deve possuir diversas
funções, as mesmas, muitas vezes, são entendidas como os próprios módulos do
sistema a elas relacionados. Fitz, (2008, p. 80), destaca que um SIG deve conter:
Aquisição de dados; Gerenciamento do banco de dados; Análise geográfica de dados
e Representação de dados.
Entende-se, por aquisição de dados coleta de informações virtuais, ou até
mesmo os reais, ou seja, documentos que podem ser “palpáveis”, como exemplo
pode-se destacar fotografias aéreas, imagens de satélite, cartas topográficas, mapas,
relatórios estatísticos e outras fontes de informação. Estas informações podem ser
processadas de diversas formas, por meio de teclado, scanner CD-ROM, dentre
outros. (ROSA 2009)
Para utilizar qualquer tipo de ferramenta seja ela, SIG ou geoprocessamento,
ou até mesmo para a elaboração de um MDT, é fundamental a compreensão de
alguns parâmetros cartográficos.
SegundoJoly (2004, p. 7) “[...] cartografia é a arte de conceber, de levantar, de
redigir e de divulgar os mapas”, isto para
Também para Rosa (2004, p. 4) a cartografia
[...] é considerada como a ciência e a arte de expressar (representar),
por meio de mapas e cartas, o conhecimento da superfície terrestre.
É ciência porque, para alcançar exatidão, depende basicamente da
astronomia, geodesia e matemática. É arte porque é subordinada as
leis da estética, simplicidade, clareza e harmonia.
O conceito de mapa, por si só, acaba sendo incompleto para a compreensão
da ideia de cartografia, ou seja, é de fundamental importância entender o que é um
mapa. Assim para, Joly (2004, p. 7)
418
Um mapa é uma representação plana, simplificada e convencional,
do todo ou de parte da superfície terrestre, numa relação de similitude
conveniente denominada de escala. Um mapa é a representação,
sobre uma superfície plana, folha de papel ou monitor de vídeo, da
superfície terrestre, que é uma superfície curva. A passagem de uma
para outra suscita várias dificuldades. Uma delas é a definição exata
da forma e das dimensões da terra. Este é o objeto da geodésia, que
se encontra assim na origem de toda cartografia. Uma outra
dificuldade consiste em transferir para o plano a superfície assim
mensurada. Este é o problema das projeções
Desta maneira, entende-se que a análise e elaboração de um mapa torna-se
cada vez mais complexa se não forem levados em consideração alguns elementos
cartográficos, como por exemplo, a escala, as projeções, as coordenadas e a
localização. Rosa; Brito (1996, p. 25) destacam que uma escala é
[...] a relação entro o tamanho dos elementos representados em um
mapa e o tamanho correspondente sobre a superfície da Terra
(E=d/D. É indicada da seguinte forma: 1:25.000 ou 1/25.000 (está
escala indica que uma unidade no mapa eqüivale a 25.000 unidades
sobre o terreno) A escala é uma informação que deve constar em
qualquer mapa ou carta e, pode ser representada, geralmente pela
escala numérica e/ou escala gráfica.
Com isto, compreende-se a importância da evolução computacional, pois
através desta foi possível um melhor desempenho no que tange a espacialização do
cenário geográfico como um todo.
Os dados SRTM
Para se compreender este tipo de instrumento e necessário se analisar seus
fundamentos, pois sem esta compreensão não é possível a verificação e o
entendimento de suas importâncias. Assim, osdados são vitais espacialização
geográfica.
Diante deste pressuposto, para Valeriano; Rosseti (2010, p. 19) o
desenvolvimento dos dados SRTM, foi de suma importância para o mapeamento de
algumas áreas, pois
Os Modelos Digitais de Elevação (MDE) são representações de
dados topográficos passíveis de tratamento em Sistemas de
Informações Geográficas (SIG). O processamento destes dados em
SIG permite a caracterização do estado e de processos do sistema
terrestre em abordagem espacializada. Uma vez estruturados em
colunas e linhas, em analogia às imagens de satélite, os valores de
419
altitude podem ser integrados a outras informações diretamente ou
após serem operados para a determinação de variáveis topográficas
derivadas da altimetria. Nesse contexto, a tomada de dados em
cobertura global pela SRTM (Shuttle Radar Topography Mission)
representa uma oferta até então inédita de MDE, por áreas
relativamente desprovidas de mapeamentos topográficos.
A partir disto, entende-se que a utilização de uma boa base é de fundamental
importância para execução e exposição de um produto cartográfico. O site Jet
Propulsion Laboratory (JPL) da National Aeronautics and Space Administration
(NASA) destaca que,
On February 11, 2000, the Shuttle Radar Topography Mission
(SRTM) payload onboard Space Shuttle Endeavour launched into
space. With its radars sweeping most of the Earth's surfaces, SRTM
acquired enough data during its ten days of operation to obtain the
most complete near-global high-resolution database of the Earth's
topography. To acquire topographic (elevation) data, the SRTM
payload was outfitted with two radar antennas. One antenna was
located in the shuttle's payload bay, the other on the end of a 60meter (200-foot) mast that extended from the payload pay once the
Shuttle was in space. The Shuttle Radar Topography Mission is an
international project spearheaded by the National GeospatialIntelligence Agency (NGA) and the National Aeronautics and Space
Administration (NASA).
Outros aspectos podem ser compreendidos, se levarmos em conta o
funcionamento deste mecanismo. De acordo com Valeriano (2004, p. 20)
A missão usou o mesmo instrumento utilizado em 1994 no programa
Spaceborne Imaging Radar-C/X-Band Synthetic Aperture Radar (SIRC/X-SAR), a bordo do ônibus espacial Endeavour. Porém o arranjo foi
projetado para coletar medidas tridimensioanis da superfície terrestre
através de interferometria. Para tanto, a nave foi munida de um
mastro de 60m, em cuja extremidade foram instaladas antenas para
bandas C e X, além de melhorados os dispositivos de controle e
navegação
Para o site Brasil em Relevo EmbrapaMonitoramento por Satélite, as
imagens de satélite têm como objetivo
[...] produzir e disponibilizar informações sobre o relevo do território
nacional, a partir dos dados gerados pelo projeto SRTM (em inglês,
Shuttle Radar Topography Mission). A partir do processamento
digital dessas imagens, a EMBRAPA-Monitoramento por Satélite
recortou os mosaicos estaduais, compatibilizando-os também com os
produtos LANDSAT da série Brasil visto do espaço. Além de
organizar todas as informações obtidas numa base digital de fácil
420
consulta, CD ou internet, compatível com a maioria dos softwares de
navegação utilizados pelo público em geral, também foram
disponibilizados os dados numéricos originais para download,
direcionados aos usuários especializados em geoinformação.
Finalmente, essa nova integração e disponibilização de produtos do
sensoriamento remoto com propósito múltiplo continuará à contribuir
para a ampliação do mercado de observação da Terra no Brasil,
apresentando diversas aplicações para o desenvolvimento
sustentável da agricultura e do país.
Por meio desta ferramenta, efetuou-se a cobertura de 80% do total da área
terrestre, sendo que está varredura foi efetuada nas áreas de 60º N e 56º S, e o
satélite perpassou de 14 vezes nestas regiões, como pode ser observado na figura
031
Figura 01: Cobertura das imagens SRTM pelo globo
Fonte: NASA,2000
Destaca-se, que algumas ciências são importantes e exercem um papel
fundamental para elaboração destes e outros produtos cartográficos. A ciência da
Cartografia é um exemplo que deve ser levado em consideração no que tange à
elaboração destes tipos de materiais.
Alguns exemplos de utilização dos dados SRTM
A utilização destas ferramentas, na atualidade, é de suma importância para a
elaboração de qualquer tipo de produto cartográfico, ou seja, mecanismos, como o
Sistema de Informação Geográfica, o Geoprocessamento, a Cartografia Digital, as
imagens por satélite, imagens SRTM dentre outras. Elas são indispensáveis para a
421
compreensão e elaboração de produtos cartográficos como o Modelo Digital de Terreno
(MDT) e entendimento do espaço.
Assim, nesta pesquisa será exposto alguns tipos de produtos cartográficos que
podem ser alcançados através da junção dos dados SRTM e do Sistema de
Informação Geográfica, visando sempre que o SIG também deve englobar os
softwares como outro meio de utilização para a confecção de produtos Cartográficos,
como por exemplo, o Modelo Digital de Terreno (MDE). Segundo, Luiz; Santos;
Brenner (2007, p. 582), MDE e/ou DEM”[...]é uma representação digital de uma seção
da superfície, dada por uma matriz de pixels com coordenadas planimétricas (x,y) e
um valor de intensidade do pixel correspondente à elevação”.
Salienta-se
que
a
utilização do mesmo se restringe à modelagem de relevo. Um exemplo de MDE, pode
ser observado na figura 02, a qual demonstrando a aplicabilidade deste tipo de
ferramenta
Figura 02: Modelo Digital de Elevação (MDE)
Este tipo de produto é gerado através de das curvas de nivel que também são
adiquiridas por intermédio das imagens SRTM.Deve-se destacar que este processo
somente é possivel através da utilização de alguns softwares específicos.
Outros exemplos podem ser citadas no que se refere a utilização das imagens
SRTM, um deles seria o Modelo Digital de Terreno (MDT).Assim, este produto
cartográfico para Viviane; Manzato (2005, p. 27) “[...]é uma representação matemática
computacional da distribuição de um fenômeno espacial que ocorre dentro de uma
região da superfície terrestre”.
422
Convém salientar que existem diversas maneiras para elaboração de um MDT,
dentre essas, pode-se destacar a triangulação de dados, a interpolação dos dados
coletados. A qual foi utilizada neste trabalho é a Geração automática do MDT. Assim,
segundo Barbosa (1999, p. 25),
Com a fotogrametria digital, as técnicas fotogramétricas para a
geração do Modelo Digital do Terreno têm sido automatizadas. A
geração automática do MDT, a partir de um par de fotos digitais
(imagens) com superposição adequada, compreende os seguintes
passos: - determinação de pontos correspondentes (matching); interpolação e densificação da superfície; - conferência e edição do
MDT (controle de qualidade)
Diferentemente do MDE, que demonstra a elevação de uma localidade
qualquer através das curvas de nível o Modelo Digital de Terreno, busca representar a
hipsometria do espaço através dos pixels presentes na imagem dos dados SRTM, ou
seja, quanto menos pixel mais plana é área em estudo. A figura 03 demonstra de
forma final o MDT que foi extraído das imagens SRTM.
Figura 06: Modelo Digital de Terreno (MDT)
Assim pode-se salientar que há diversas outras finalidades para as imagens
SRTM. Cita-se como exemplo, efetuar a confecção da rede hidrográfica de uma área
qualquer, levando em consideração os cursos d’água que aparecem na imagem. Temse também a possibilidade de elaborar mapas geomorfológicos de uma localidade
423
qualquer e diversas outras formas de utilização desta ferramenta. Deve-se destacar
que, para que haja sucesso neste tipo de elaboração de produtos cartográficos,
geralmente tende-se a necessidade da utilização de outras tecnológicas, ou seja, o
pesquisar não deve se atentar em utilizar apenas os dados SRTM, mas também é
executável a utilização de, por exemplo, imagens LANDSAT.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
E de fundamental importancia destacar que deve ser levado em consideração a
grande necessidade do desenvolvimente tecnológico, principalmente no que se refere
ao avanço computacional na década de 90, para que assim, houvesse a possibilidade e
utilização destas e de outras tecnologias visando a espacialização do cenário
geográfico.
Os dados SRTM, foram uma inovação no que se refere ao mapeamanto de
pequenas escalas, ou seja, por ter sua extenção de 90x90 metros o mesmo tende a ser
utlizado apenas em pequenas áreas em que a escala não seja muito grande, pois se o
mesmo não for realizado desta maneira e possivel que ocorra alguns erros
principalmente no que se refere o mapeamento destas regiões.
Para que ocorra uma melhor utilização dos dados SRTM é fundamental que os
mesmos sejam utilizados, com outras tecnologias, como por exemplo, imagens de
satélite, GPS dentre outras, pois somente assim haverá uma maior precisão nos dados
e no mapeamento realizado pelo pesquisador, ou seja, deve-se efetuar uma junção de
tecnologias.
Por fim, entende-se a importância deste tipo de material, mas o pesquisador que
se utilizará deste aparato deve compreender pelo menos, o mínimo dos conceitos da
ciência cartografica e isto, não deve ser levado em consideração apenas para os dados
SRTM, mas para todo e qualquer tipo de mapeamento realizado. Desta maeira sem o
entendimento destas ideias é possivel que todo o trabalho efetuado passa a ser errônia,
pois a certas formalidades que devem ser cumpridas no que se refere ao mapemanto
de forma geral.
A utilização dos dados SRTM permitiram a representação do espaço geográfico
do município de Capinópolis. Alguns exemplos podem ser citadaos, no que se refere a
aplicabilidade desta instrumento, tais como: mapas hipsometricos, modelo digital de
terreno, hidrografica relevo dentre outros.
Através das metodologias empregadas foi possivel verificar que o municipio de
Capinópolis, possui uma variação no seu relevo e isto se da por conta da proximidade
424
de um curso d’água o que ocasiona em uma área onde o declive e mais acentuado é o
restante do municipio possui um relevo ligeiramente plano.
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utilizando câmaras digitais de pequeno formato. 1999. 96f. Dissertação (Mestrado em
Ciências e aquisição, Análise e Representação de Informações Espaciais) –
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áreas sob atuação da indústria petrolífera através da integração de dados
batimétricos e altimétricos da zona costeira norte do RN. Acedido em 05 de Junho
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partir de imagens Referente Stereo do Satélite IKONOS. In: Simpósio Brasileiro de
Sensoriamento Remoto, XIII, 2007, Florianópolis. Anais... Florianópolis, XIII Simpósio
Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2007. Acedido em 25 de Junho de 2015 em:
http://marte.sid.inpe.br/col /dpi.inpe.br/sbsr@80/2006/11.15.15.41.56/doc/581-587.
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informação geográfica. Uberlândia.
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Valeriano, M. de M; Rossetti. S. de F. (2015). Topodata: seleção de coeficiente
geoestatísticos para o refinamento unificado de dados SRTM. São José dos Campos,
2010. (Apostila). Acedido em 15 de Junho de 2015 em: http://mtcm19.sid.inpe.br/col/sid.inpe.br/mtc- m19%4080/2010/ 05.10.18.35 /doc/publicacao.pdf
425
ANÁLISE DE DISTINTAS BASES CARTOGRÁFICAS NO MAPEAMENTO DE
ÁREAS DEALTA DECLIVIDADE
Analysis of different cartographic databases for the mapping of high slope areas
Bruno Zucuni Prina - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Romario Trentin - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo:
O objetivo geral desse trabalho é o de mapear as áreas de alta declividade por meio
da utilização de distintas bases cartográficas e de diferentes resoluções espaciais.
Assim, há como suporte teórico a Lei nº 12.651 de 25 de maio de 2012 (BRASIL,
2012), na qual, em seu Artigo 4º V destaca que as áreas com declividade superior a
45° são consideradas de preservação. Como bases cartográficas utilizadas, destacamse: arquivosmatriciais do SRTM e do ASTER (oriundas do USGS), além de dados
vetoriais de curvas de nível e pontos cotados das cartas topográficas na escala
1:50.000 (HASENACK; WEBER, 2010). Com isso, a partir dos mapas de altimetria,
foram confeccionados mapas clinográficos. Para analisar os dados, segmentou-se a
declividade em 3 classes ("<30º", "30 a 45°" e "> 45º”), e, posteriormente, os dados
foram analisados, por meio de uma planilha eletrônica. Quanto aos resultados,
destaca-se que as informações clinográficas sofreram as principais diferenças ao
analisar a mudança da resolução espacial das imagens registradas. Assim, destaca-se
que a geração da cartografia da declividade é altamente dependente da resolução
espacial acerca das informações altimétricas, bem como de sua fonte de origem.
Palavras-chave: Área de Preservação Permanente. Geoprocessamento. SIG.
Introdução
O mapeamento de áreas de alta declividade é de grande importância, pois,
entre suas aplicações destaca-sea delimitação das Áreas de Preservação Permanente
(APP), as quais são caracterizadasnas áreas com declividade acima de 45º. A
proteção dessas áreas é de grande importância, a fim de resguardaras áreas que são
ambientalmente frágeis. Assim, o presente trabalho tem como proposta realizar uma
discussão a respeito do mapeamento clinográfico com distintas fontes topográficas e
com diferentes resoluções espaciais.
O objetivo geral desse trabalho é o de mapear as áreas de alta declividade por
meio de distintas bases cartográficas e de diferentes resoluções espaciais. Assim,
tem-se como área de estudo o território municipal de Itaara, e, tem-se como foco,
inclusive, a discussão das formas de realizar o mapeamento de áreas de APP
(declividade acima de 45° ou 100%).
426
A fim de englobar o entendimento desse trabalho, faz-se necessário
contextualizar o entendimento conceitual da legislação vigente acerca do intervalo
clinográfico o qual caracteriza áreas de APP.
No que tange a legislação vigente, destaca-se a Lei nº 12.651 de 25 de maio
de 2012 (BRASIL, 2012) na qual, entre vários objetivos, há o respaldo quanto a
questão de estabelecer normas gerais sobre a proteção da vegetação, entre elas,
referenciando as áreas de alta declividade como áreas de APP.
Entre as áreas que são caracterizadas como áreas de APPs, a Lei exposta
anteriormente, destaca, no Artigo 4º V que "as encostas ou partes destas com
declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior
declive" são consideradas de preservação (BRASIL, 2012).
Deve-se destacar que o mapeamento a ser destacado nesse trabalho ocorreu
no município de Itaara pelo fato do mesmo possuir uma grande amplitude altimétrica,
com áreas de alta declividade. Em relação ao município de Itaara, pode-se citar que o
mesmo está localizado na porção central do estado do Rio Grande do Sul, e possui
uma população de 5.010 (em 2010), espaçada em um território de 172,989 km², com
uma densidade populacional de 28,96 habitantes/km² (IBGE, 2015).
Metodologia
A fim de evidenciar todas as rotinas metodológicas dessa pesquisa faz-se
necessário, inicialmente salientar todos os aplicativos e bases cartográficas utilizadas.
Dentre os aplicativos, pode-se destacar o ArcGIS®, versão 10.1, importante para toda
a implementação da análise dos dados em ambiente SIG, além de uma planilha
eletrônica (Excel®), para analisar os dados.
Referente às bases cartográficas, destaca-se a utilização de arquivos
matriciais: SRTM e ASTER; além de dados vetoriais de curvas de nível e pontos
cotados oriundos das cartas topográficas na escala 1:50.000 (HASENACK; WEBER,
2010).
Os arquivos matriciais, tanto do ASTER como do SRTM, foram obtidos por
meio do sítio do Serviço Geológico Americano (United StatesGeologicalSurvey'sUSGS). O arquivo do ASTER refere-se ao GDEM versão 2, com resolução espacial de
30 m. O SRTM utilizado referencia o modelo global de 1 arco-segundo, com resolução
espacial de 30 m.
Todos os dados cartográficos, ao serem importados para o aplicativo em
ambiente SIG, foram tratados. Com isso, atribuiu-se as informações para o sistema de
referência SIRGAS 2000, coordenadas UTM, fuso 22 J Sul.
427
Toda a modelagem foi realizada em uma área maior do que a do limite do
território municipal de Itaara, a fim de excluir o problema referente ao "efeito de borda",
na qual pode ser gerado ao realizar a modelagem da superfície.Deve-se enfatizar que
o“efeito de borda” é um grande problema a trabalhos que envolvam interpolações de
dados. Mais informações podem ser consultadas em Frisomet al. (2006) e emLucas et
al. (2012), os quais destacam alguns dos problemas referente ao tema.
A modelagem do SRTM e do ASTER é a própria imagem, ou seja, não é
necessário implementar um algoritmo e remodelar a superfície. Porém, para gerar o
modelo da carta topográfica, a mesma necessitou da aplicação de um interpolador.
Assim, por meio do algoritmo Topo toRaster, do ArcGIS®, gerou-se a modelagem,
utilizando as curvas de nível e os pontos cotados da carta topográfica na escala
1/50.000. Deve-se destacar que a hidrografia não foi utilizada na geração da
modelagem, uma vez que a mesma não estava previamente orientada no sentido do
fluxo da drenagem, ou seja, não foram vetorizadas no sentido montante a jusante (no
sentido de escoamento do trecho hídrico).
A fim de comparar os dados referente a declividade, todos os modelos gerados
possuíam uma resolução espacial padrão, no caso das imagens ASTER E SRTM era
de 30m, e, assim, para fins de comparação, adotou-se o mesmo valor para a carta
topográfica. Assim, para comparar os dados, os modelos SRTM, ASTER e da Carta
Topográfica foram reamostrados para os valores de 90 m (generalização cartográfica em três vezes) e para 10 m (hiperdetalhamento dos dados - em três vezes).
Assim, resumidamente, houve a construção de três modelos oriundos de cada
uma das bases cartográficas, com as resoluções espaciais de 10, 30 e 90 m. Alertase, que, os dados (curvas de nível e pontos cotados) da carta topográfica sofreram
uma interpolação pelo algoritmo Topo to Raster.
Com todos os modelos prontos, gerou-se o mapeamento da declividade da
área de estudo. Nessa etapa fez-se o uso do algoritmo Slope (do ArcGIS®). Assim,
houve a geração do mapeamento da declividade por meio de 3 distintas bases
cartográficas, além dos dados reamostrados, alguns generalizados (com pixels de
maior dimensão), e dados hiperestimados (com pixels menores do que o tamanho
padrão).
Sabe-se que as áreas de APP são aquelas superiores a 45º ou 100% de
declividade, porém, os dados foram subdivididos em classes a fim de aumentar as
análises. Com isso, dividiram-se os valores em declividades menores de 15º, entre 30
a 45° e superiores a45º, por meio da ferramenta "Reclassify" do ArcGIS®, sendo
possível, nesse momento, a quantificação das feições.
428
Por fim, todos os dados foram analisados, por meio de uma planilha eletrônica,
e, posteriormente os mesmos foram discutidos, a fim de entender toda a questão
envolvida junto a geração de áreas de APP com declividade superior a 45º.
Resultados
Com a implementação de todos os procedimentos metodológicos, foram
geradas todos os produtos cartográficos referentea declividade, oriundas da carta
topográfica, do SRTM e do ASTER.Inicialmente serão apresentadostodos os
resultados do mapeamento com as imagens do ASTER e do SRTM, além da
interpolação com os dados altimétricos das cartas topográficas.Assim sendo, os
resultados referentesa quantificação das classes de declividade do ASTER, do SRTM
e da carta topográfica estão dispostos a seguir, por meio da Figura 1.
Declividade:
< 30º
30 - 45º
> 45º (APP)
Total
Declividade:
< 30º
30 - 45º
> 45º (APP)
Total
ASTER
Resolução espacial
10m
30m
90m
90,2% 95,6% 98,8%
7,7%
4,2%
1,2%
2,1%
0,2%
0,0%
100%
100%
100%
SRTM
Resolução espacial
10m
30m
90m
91,1% 96,0% 98,8%
7,3%
3,9%
1,2%
1,6%
0,1%
0,0%
100%
100%
100%
429
Declividade:
< 30º
30 - 45º
> 45º (APP)
Total
CARTA
Resolução espacial
10m
30m
90m
98,0% 99,2% 100,0%
2,0%
0,9%
0,0%
0,0%
0,0%
0,0%
100%
100%
100%
Figura 2 - Resultados obtidos.
Deve-se destacar que na modelagem da clinografia, para cada uma das bases
cartográficas,foram geradas três imagens, uma original, com resolução espacial de 30
m; outra com pixel de 90 m, ou seja, com generalização dos dados altimétricos (em
três vezes); e outra com informações altimétricas hiperestimadas (em três vezes), com
resolução de 10m.
Ao comparar os resultados acerca da clinografia pode-se constatar que as
áreas delimitadas como APPs no município de Itaara contempla uma mínima porção,
com uma área de no máximo 2,1% (para o ASTER com resolução de 10 m). Tal
resultado demonstra que no município, apesar de possuir uma alta discrepância
altimétrica, apresenta poucas áreas de APPs devido, pelo menos é o que foi
constatado com as bases altimétricas analisadas.
Ainda, pode-se enumerar a alta similaridade obtida entre os modelos ASTER e
SRTM, ambos com resolução espacial de 30 m. Já ao comparar os dados com a carta
topográfica, pode-se constatar que a mesma apresenta um percentual significativo de
diferenças, constatando uma mínima porcentagem na classe clinográfica intermediária
que foi adotada.
Deve-se destacar que as principais diferenças ocorrem ao analisar a mudança
da resolução espacial das imagens registradas. Essa análise, visualmente pouco
modifica no mapa de altimetria, porém ao gerar o mapeamento da declividade há uma
mudança significativa. Em síntese, quanto maior for o tamanho do pixel do modelo
altimétrico, maior será o poder de generalização, logo, haverá menores porções de
áreas com alta declividade. E, se houver um maior adensamento de informações
(diminuir a resolução espacial), maior será a porcentagem de áreas íngremes, uma
vez que a declividade é calculada por meio da relação matemática entre distância
horizontal e vertical. Ou seja, generalizando os dados altimétricos, e mesmo que se
mantenha as diferenças altimétricas, a distância horizontal é alterada, e, dessa forma,
explica-se a minimização de áreas com maior declividade, e, assim ocorre no fato
430
contrário, quando há a minimização do tamanho do pixel, aumentando as áreas de alta
declividade. Em resumo, analisa-se que para mapear a declividade de uma
determinada área, ha uma grande preocupação à resolução espacial a ser adotada,
pois essa é altamente correlata ao resultado final.
Deve-se ter atenção no que tange as áreas com inclinação superior a 45º, as
quais, conforme legislação vigente, caracterizam-se como áreas de APP, e, precisam
ser preservadas. Assim, deslumbra-se, que, dependendo dos dados utilizados, com a
escala de mapeamento dos mesmos, o dimensionamento de áreas de APP pode
sofrer maximizações ou minimizações, ou até mesmo inexistir, idôneo a modelagem
da carta topográfica, seja ela com qualquer uma das resoluções espaciais.
Com o intuito de analisar, de forma visual os resultados acerca da declividade,
tem-se, por meio da Figura 2, a visualização do comportamento da mesma para todas
as bases cartográficas, em relação a uma área específica de Itaara.
Figura 3 - Análise visual comparativa da declividade em uma área específica.
Por fim, deve-se apresentar as informações dos dados altimétricos de cada
uma das bases cartográficas, pois, esses originaram a cartografia da declividade.
Assim, tem-se na Figura 3 a apresentação dos mesmos.
No que tange a imagem ASTER, a mesma registrou 57 m como menor valor
altimétrico e 536 m como maior, gerando uma amplitude de 479 m. Já a imagem
SRTM registrou 63 m como menor valor altimétrico e 531 m como o maior, gerando
uma amplitude de 468 m. Por fim, a interpolação dos dados da carta topográfica
431
resultou no valor de 58,9 m como o menor e 514,9 m como maior valor altimétrico,
gerando uma amplitude de 456 m.
Na Figura 3 está identificado os três produtos cartográficos acerca da
altimetria, os quais foram bases à geração da declividade. Analisando tais mapas no
geral, com toda a delimitação da área de estudo a mesma apresenta-se insuficiente a
fim de verificar a diferenciação dos dados, porém, ao apresentá-los em uma área
sintetizada, verificam-se as distinções geradas ao verificar os dados com valores de
pixels distintos. Essas diferenças são as apontadas por alterar os resultados da
declividade.
Figura 4 - Informações altimétricas das bases cartográficasem uma área específica.
Conclusões
A partir de todas as análises segmentadas anteriormente, conclui-se que a
geração da cartografia da declividade é altamente dependente da resolução espacial
acerca das informações altimétricas bases. Ou seja, ao realizar o mapeamento da
declividade de uma determinada área, dependendo da base cartográfica utilizada, o
resultado pode sofrer grandes variações.
Há uma preocupação nessa temática, pelo fato da definição de áreas de APP
em áreas de alta declividade, metodologias que precisam ser implementadas em
propriedades rurais que realizarem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), uma vez que
432
áreas íngremes, por legislação, devem ser preservadas e não utilizadas para usos
(pecuária, agricultura, moradia, etc.).
Explicita-se que o referido trabalho não se sustenta na análise dos dados,
muito menos na conversão dos mesmos, mas sim na discussão acerca da
problemática tangente a declividade, a qual é altamente dependente da resolução
espacial do pixel referente a altimetria do terreno. Assim, com a análise dos dados, em
forma geral, possibilitou identificar que dependendo da base cartográfica utilizada, o
resultado da declividade pode sofrer variações, principalmente se as mesmas
possuírem resoluções espaciais diferentes. Assim, deve-se destacar que a delimitação
de áreas de APPs são claramente subjetivas, sem haver um dimensionamento padrão.
Com esse foco, verifica-se que a delimitação de áreas de APPs são altamente
dependentes da base cartográfica de entrada, e, se a mesma fosse obtida a campo,
com coleta de dados in loco (com receptores de sinal GNSS), os dados poderiam ser
mais precisos, e, provavelmente, as áreas íngremes estariam com maiores porções,
uma vez que haveria o detalhamento dos dados altimétricos. Porém, coletas a campo
para delimitar APPs em áreas declivosas são de difícil acesso, principalmente ao fato
das condições desfavoráveis de coleta de dados, pela declividade do terreno e pelo
adensamento de vegetação.
Por fim, destaca-se que, seria muito importante não apenas mapear áreas de
APP em áreas de alta declividade, mas também ser obrigatório a transparência das
metodologias que os profissionais utilizam, as bases cartográficas e, principalmente a
resolução espacial dessas.
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434
RELAÇÃO ENTRE VARIÁVEIS LIMNOLOGICAS, DADOS
METEOROLÓGICOS E USO DA TERRA: ABORDAGEM MÚLTIPLOS
SENSORES
Fábio Marcelo Breunig - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Waterloo Pereira Filho - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Flávio Wachholz - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O estudo apresenta uma abordagem integrada, baseada em múltiplas fontes de dados
para avaliar a relação entre parâmetros limnológicos da represa de Passo Real, dados
meteorológicos e variações interanuais de uso da terra. Para tal, foram conduzidas 12
campanhas de campo em 2009 e 2010, para aferir o total de sólidos em suspensão,
transparência, clorofila e temperatura. Os dados meteorológicos de re-análise foram
utilizados (NCEP_Reanalysis 2). Para o período de 2000 a 2015 foi calculado o verdor
das principais bacias de captação, a partir dos seguintes produtos MODerateresolution Imaging Spectroradiometer (MODIS): MOD13Q1; MYD13Q1 e MCD43A4.
Após o pré-processamento, todos os dados foram analisados em uma abordagem
temporal para identificar as principais variáveis que promovem modificações nos
parâmetros limnológicos da represa. Os resultados mostraram que as variações estão
associadas a um efeito combinado de altas precipitações e maior vulnerabilidade de
produção de sólidos do ecossistema terrestre durante o período de entressafras.
Contudo, mesmo em períodos de alto verdor das bacias, na ocorrência de maiores
índices de precipitação, há uma modificação relevante nas variáveis limnológicas
como total de sólidos em suspensão, transparência e clorofila na água.
Palavras Chave: Sensoriamento remoto; resposta espectral; total de sólidos
suspensos; transparência da água; clorofila.
Introdução
O estudo de ambientes aquáticos a partir de sensores orbitais tem sido
considerado como uma alternativa às atividades de campo e laboratório, muitas vezes
exaustivas, financeiramente onerosas e espacialmente limitadas (Bergamino et al.,
2009; Chavula et al., 2009; Dalu et al., 2015; Dekker et al., 2002; Lobo et al., 2014; Min
et al., 2012; Palmer et al., 2015; Park and Latrubesse, 2014; Duan et al., 2014; Rolim
et al., 2015). Nesse sentido, diversas abordagens têm sido propostas para estimar os
constituintes opticamente ativos presentes na água com base em modelos empíricos e
físicos e para de compreender a resposta espectral da água com distintos níveis de
eutrofização (Gitelson et al., 2007; Gitelson et al., 2008; Dall'Olmo et al., 2005; Le et
al., 2009; Le at al., 2011; Lobo et al., 2014; Hestir et al., 2015). O uso de produtos
435
orbitais passa a viabilizar o monitoramento de grandes áreas, como por exemplo, as
águas interiores no sul do Brasil. Página 2 de 12
No Brasil, as represas são amplamente utilizadas para a geração de energia,
regulação do fluxo de água e abastecimento água (Tundisi et al., 2007; Tundisi e
Tundisi, 2008). Contudo, essas represas atualmente estão sendo indicadas como
grandes fontes de metano e outros gases do efeito estufa (Tranvik et al., 2009;
Fearnside and Pueyo, 2012; Raymond et al., 2013; Fearnside, 2015a; Fearnside,
2015b), de forma a contribuir para os problemas ambientais associados a mudanças
climáticas. Assim, entender como as variáveis meteorológicas e de uso e cobertura da
terra afetam a qualidade da água é fundamental para definir estratégias de mitigação
de impactos, ajustes de conduta do ecossistema terrestre envolto e tratamento de
água (Wang et al., 2004; Hestir et al., 2015). Recentes abordagens de estudo da
represa de Passo Real, na bacia hidrográfica do Alto Jacuí têm indicado uma relação
entre as variáveis de uso do solo e dados meteorológicos com a qualidade da água da
represa (Pereira Filho et al., 2005; Santos e Pereira Filho, 2013; Kramer et al., 2009;
Kramer e Pereira Filho, 2011; Wachhoz, 2011; Silveira et al., 2013; Pereira Filho et al.,
2013; Kaiser et al., 2015; Santos et al., 2015; Sarmento e Pereira Filho, 2015).
Entretanto, uma abordagem integrada de todas as variáveis ainda não foi
desenvolvida. Nessa perspectiva, sensores de amplo campo de visada com alta
repetitividade levam a uma maior probabilidade de se obter cenas sem cobertura de
nuvens. O sensor MODerate-resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS) gera
imagens quase diárias do sul do Brasil, considerando os diversos produtos e
especificações disponíveis (Lucht, 1998; Friedl et al., 2000; Schaaf et al., 2002; Barnes
et al., 2003; Xiong et al., 2009; Ju et al., 2010).
Objetivos
O objetivo é apresentar uma abordagem integrada das relações entre dados
meteorológicos, uso do solo e modelagem hidrodinâmica com os dados limnológicos
da represa de Passo Real, no sul do Brasil.
Metodología
Área de estudo
O trabalho foi desenvolvido no reservatório de Passo Real (233,39 km²),
localizado na bacia hidrográfica do alto Jacuí, no estado do Rio Grande do Sul, Brasil
(Figura 1). A área apresenta um clima subtropical tipo Cfa (de acordo com a
classificação de Köppen-Gaiger), com quatro estações bem definidas ao longo do ano.
436
A precipitação média anual é de 1.737,63 mm (±80,94 mm) e a temperatura média é
de 20,03 °C (± 5,14 °C) (CEEE-GT, 2011; COAJU, 2009). A vazão média anual do
reservatório é de 209,37 m³/s (± 243,45 m³/s) com base em 75 anos de medidas
(1939-2014).
Nas bacias de captação predominam solos derivados de basalto, em especial o
Latossolo. Quanto ao uso e cobertura da terra, a característica geral da região é de
dois ciclos agrícolas anuais, com cultura de verão (soja e milho) e de inverno (trigo).
Entre as áreas agrícolas existem vários fragmentos florestais, em especial nas áreas
de mata galeria e campos de pastagem (Kramer et al., 2009; Kramer e Pereira Filho,
2011; Wachhoz, 2011; Silveira et al., 2013).
Figura 1. Localização da represa de Passo Real no estado do Rio Grande do Sul,
Brasil. As principais áreas de amostragem são indicadas dentro dos limites do
reservatório. O limite do reservatório foi elaborado a partir de uma cena Landsat-5
Thematic Mapper (TM).
Dados de campo
Para caracterizar as variáveis limnológicas do reservatório, forma conduzidas
12 campanhas de campo de março de 2009 a julho de 2010. Foram medidas variáveis
em campo e feitas determinações a partir de coletas, em laboratório. Entre as
variáveis levantadas citam-se: Total de Sólidos em Suspensão (TSS); Clorofila a;
437
Temperatura da água; transparência e profundidade em 25 estações amostrais
(localização dos compartimentos representativos dos pontos é indicada na Figura 1).
Detalhes sobre os procedimentos metodológicos adotados para a determinação de
cada variável são descritos em (Wachhoz, 2011).
Imagens de satélite e dados meteorológicos
Para o estudo foram utilizados dados do sensor MODIS, plataformas Terra e
Aqua. Os seguintes produtos da coleção cinco foram utilizados: MOD13Q1
(MODIS/Terra Vegetation Indices 16-Day L3 Global 250-m SIN Grid V005); MYD13Q1
(MODIS/Aqua Vegetation Indices 16-Day L3 Global 250-m SIN Grid V005) (Solano et
al., 2010) e MCD43A4 (Nadir BRDF-Adjusted Reflectance 16-Day L3 Global 500m)
(Friedl et al., 2000; Shaaf et al., 2002; Lucht et al., 2000; Lucht, 1998; Lucht and Lewis,
2000) foram utilizados.
Os dados foram adquiridos através do Bulk Download Application (BDA)
(USGS, 2015) na projeção sinusoidal e convertidos para um sistema planar através do
algoritmo MODIS MRT (Dwyer and Schmidt, 2006) em associação com a linguagem
IDL (Excelis Vis, 2014). O período de aquisição das cenas foi de 2000 a 2015, de
acordo com a disponibilidade.
Os dados meteorológicos referentes a temperatura e precipitação foram
obtidos a partir do NCEP_Reanalysis 2, disponibilizados pela NOAA/OAR/ESRL PSD,
Boulder,
Colorado, USA, através da página http://www.esrl.noaa.gov/psd/ (Kalnay et al., 1996;
ESRL/PSD - NOAA, 2015; Kanamitsu et al., 2002).
Análise dos dados
Para a análise dos dados foram elaborados perfis temporais de das variáveis
limnológicas e comparados com os resultados das variáveis meteorológicas (baseado
na análise gráfica e estatística dos dados).
Com base nos dados MODIS foi calculado o índice de vegetação Normalized
Difference Vegetation Index (NDVI) (Rouse et al., 1973) para a bacia hidrográfica que
representa a área de captação do reservatório de Passo Real, para o período de 2000
a 2015 (produto composição 16 dias). Os dados permitiram identificar os períodos de
maior verdor da bacia de captação e relacionar esses resultados com os parâmetros
limnológicos.
438
Para compreender algumas flutuações que ocorrem dentro do reservatório de
Passo Real, foi utilizado o modelo hidrodinâmico IPH-ECO (Cardoso et al., 2011;
Fragoso Jr. et al., 2011; Fragoso Jr. et al., 2010; Pereira, F.F. 2010; Fragoso Jr. et al.,
2009; Ferreira et al., 2008; Fragoso Jr. et al., 2008; Fragoso Jr. et al., 2007a; Fragoso
Jr. et al., 2007b; Fragoso Jr., 2005) com foco na variável velocidade da água. Com
base nesse modelo, foram simuladas algumas condições de contorno extraídas dos
dados de campo, informações meteorológicas e imagens de satélite.
Resultados
Análise das variáveis limnológicas
Para facilitar a interpretação dos resultados, os gráficos das variáveis
limnológicas de apenas dois setores distintos são apresentados (setor montante e
setor jusante na Figura 1). Em geral se verifica uma transição das variáveis
limnológicas da parte montante para a parte jusante do reservatório (Figura 2). A
concentração de TSS reflete bem essa transição, conforme média de todas as
campanhas de campo para os três principais setores do reservatório (Figura 2a). A
temperatura da água acompanha as variações sazonais da temperatura do ar na
região sul do Brasil, em concordância com resultados apresentados por Rolim et al.
(2015) (Figura 2b).
A transparência da água nitidamente mostra a existência de dois períodos
distintos nos setores ilustrados (Figura 2c). Em ambos os setores foi encontrada uma
maior transparência e variância no período de verão e outono e uma diminuição no
inverno e primavera. No setor montante se verifica uma menor transparência e
variância, considerando que esse setor recebe a maior parte da captação do
reservatório (Wachholz, 2011).
A concentração de clorofila apresenta uma maior variabilidade a partir da
transição do inverno para a primavera, resultando ainda na maior concentração deste
componente opticamente ativo. Em geral, as maiores concentrações de clorofila são
encontradas no segundo semestre do ano.
439
Figura 2. Variabilidade dos parâmetros limnológicos no reservatório de Passo Real. (a)
média do TSS para os três principais setores do reservatório; (b) variação anual da
temperatura de sub-superfície da água; (c) variabilidade anual da transparência da
água e; (d) variação anual da concentração de clorofila na água, considerando dois
setores do reservatório. Os dados se referem a fevereiro de 2009 a julho de 2010. As
manchas transparentes referem-se ao desvio padrão.
Em alguns pontos amostrais, foi verificada uma maior concentração de TSS
quando comparado com as amostras adjacentes (Wachholz 2011). Em uma análise
através da modelagem hidrodinâmica como IPH-ECO, verificou-se que nesses pontos
ocorre um aumento da velocidade da água, associado a um estrangulamento do corpo
do reservatório. Tudo indica que esse aumento da velocidade da água provoca a resuspensão dos sedimentos e altera as características dos parâmetros limnológicos
analisados.
Dinâmica meteorológica e do NDVI (verdor)
Com base dos dados reprocessados e centrados no centro da represa, verificase uma maior ocorrência de chuvas a partir de agosto dos anos analisados (Figura
3a), bem como uma variação sazonal da temperatura (Figura 3b). A precipitação
acumulada mostra que ocorre um aumento das chuvas de agosto a dezembro,
coincidindo com o aumento da concentração de TSS e clorofila. A temperatura da
água (Figura 2b) acompanha as variações da temperatura do ar (Figura 3b).
440
Ao analisar os 15 anos de verdor das três principais bacias de captação da
represa de Passo Real, é possível constatar a presença de duas culturas anuais, com
um mínimo nos meses de março/abril e setembro/outubro (períodos de entressafra)
(Figura 4). Em geral, todas as bacias apresentam o mesmo padrão de verdor ao longo
dos anos, com pequenas variações associadas a magnitude do NDVI.
Figura 4. Variação interanual do NDVI para as três principais bacias de captação da
represa de Passo Real.
Quando confrontamos os dados de verdor com os de parâmetros da água
como clorofila e TSS (inversamente correlacionada com a transparência), verifica-se
que a exposição do solo não necessariamente implica em aumento nos parâmetros da
água, mas, quando o fenômeno ocorre associado a chuvas intensas, há indícios de
um forte carreamento de material do ecossistema terrestre para o aquático,
promovendo alterações nos parâmetros limnológicos em estudo.
Conclusões
Os resultados mostram que tanto as variáveis meteorológicas quanto as formas
de uso e cobertura da terra interferem nos parâmetros limnológicos do reservatório.
Em geral, condições favoráveis a perda de sólidos do ecossistema terrestre ou o
verdor da bacia não implicam necessariamente em relações diretas com a qualidade
441
da água. Contundo na presença de condicionantes meteorológicos favoráveis,
ocorrem mudanças nas características da água do reservatório. Um melhor
entendimento poderá ser obtido através de avanços no uso de modelos
hidrodinâmicos.
Agradecimentos
Os autores agradecem a NASA Land Processes Distributed Active Archive
Center (LPDAAC) e a NOAA/OAR/ESRL PSD. A Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM) pelo apoio para a realização do estágio de Pós-doutoramento. Ao Conselho
Nacional
de
Desenvolvimento
Científico
e
Tecnológico
(CNPq)
(processos
168869/2014-4, 305914/2014-6, 502287/2014-4, e 484712/2007-1).
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447
CARACTERIZAÇÃO E MAPEAMENTO DAS UNIDADES DE RELEVO DO
MUNICÍPIO DE MATA/RS
Daniélli Flores Dias - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Romario Trentin - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo geral identificar e caracterizar as principais
unidades de relevo presentes no município de Mata.Para atender a isso, o trabalho
tem como objetivos específicos: Caracterizar a hipsometria e as declividades do
município, definir as principais unidades de relevo presentes no município de Mata e
por fim, definir e espacializar cada unidade de relevo, a fim de entender a dinâmica
ambiental do município de Mata. A metodologia baseou-se primeiramente em um
breve levantamento bibliográfico, posterior a isso, realizou um cruzamento entre a
hipsometria e a declividade do município, gerando-se assim, o mapa das unidades de
relevo do município de Mata. As unidades de relevo encontradas no município foram
as seguintes: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas, Morros e
Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. Por fim, destaca-se
que os resultados mostraram que a metodologia e a escala de análise foram
satisfatórias, cumprindo os objetivos e as expectativas esperadas. A análise permitiu a
compartimentação da área de estudo em seis unidades. Essas unidades foram
definidas e mapeadas de acordo com a estrutura espacial dos parâmetros utilizados.
Palavras-chave: Espaço Geográfico, Unidades de Relevo, Mata.
INTRODUÇÃO
Enquanto denominada como a ciência da terra, a Geografia tem como princípio
fundamental, o estudo do Espaço Geográfico. Embora esteja associado a definições
complexas e abrangentes, o Espaço Geográfico pode ser entendido de uma forma
mais ampla, como a relação entre a sociedade e a natureza.
Schirmer (2012) destaca que o Espaço Geográfico é resultado da ação do homem, e
dessa forma, constitui-se de aspectos ambientais, econômicos e sociais. Diante das
alterações ambientais vivenciadas até o presente momento, nota-se que cada vez
mais, não se pode pensar o espaço de forma fragmentada. Compreender que as
mudanças ambientais além de terem sua origem natural e que, além disso, também
são influenciadas pela ação antrópica é um fato muito importante para a análise do
relevo que compõem a paisagem.
A dinâmica do ambiente, está relacionada as modificações causadas pela ação
antrópica. Desta forma, trabalhos que retratam a relação sociedade/natureza se
revestem de grande importância, pois se hoje considerarmos todos os meios de
atuação antrópica, pode-se dizer que não mais existe natureza que ainda não tenha
sofrido algum tipo de influência ou alteração antrópica. As ações que o homem exerce
448
sobre a natureza, apresentam um padrão de localização próprio de cada sociedade.
Essas marcas geradas pela apropriação e transformação do meio natural, são
responsáveis pela organização do Espaço Geográfico. Para Sccoti (2015), as
diferentes formas de avaliar o ambiente modificado permitem o surgimento de estudos,
onde muitos deles, estão relacionadas a interação sociedade/natureza, que visam
buscar alternativas para um uso racional (menos agressivo) e ordenado do meio
ambiente.
Diante disso, nos últimos anos o estudo das formas de relevo tem adquirido novas
dimensões.Cabral (2014) destaca que o relevo como objeto de estudo da
geomorfologia, é o resultado da atuação das forças antagônicas sintetizadas pelas
atividades tectônicas e estruturais e pelos mecanismos morfoclimáticos ao longo do
tempo geológico, podendo ocorrer de forma simultânea ou sucessiva.
O relevo refere-se às saliências e reentrâncias da superfície terrestre, que podem ser
descritas e caracterizadas em diferentes escalas. O relevo de uma região é
caracterizado por diferentes atributos, como as altitudes, as declividades, o
comprimento e a amplitude das encostas, sendo que é a partir das cartas topográficas
que podem-se obter e gerar essas informações.
Dando continuidade aos trabalhos de caracterização do relevo, apresenta-seum
estudo sobre as unidades de relevo de Mata, município localizado entre as
coordenadas geográficas de 29º27’01” e 29º38’08” (latitude sul) e 54º20’01” e
54º34’20” (longitude oeste), limitando-se com os seguintes municípios: Jaguari ao
norte e a oeste, Jari ao norte, São Pedro do Sul ao leste e a sul, São Vicente do Sul ao
oeste e a sul e Toropi ao leste. De acordo com dados do IBGE (2010) o município
possui uma área territorial de 311,8 km² e uma população total de 5.111 habitantes. A
Figura 1 traça a localização do município de Mata.
449
Figura 1: Mapa de Localização do município de Mata.
Assim, o presente trabalho tem como objetivo geral identificar as principais unidades
de relevo presentes no município de Mata. Para atender a isso, têm-se os objetivos
específicos: (1) Caracterizar a hipsometria e as declividades do município, (2) Definir
as principais unidades de relevo presentes no município de Mata, (3) Caracterizar
cada unidade de relevo, a fim de entender a dinâmica ambiental do município de Mata.
METODOLOGIA
Inicialmente realizou-se o levantamento bibliográfico, procurando estabelecer um
breve referencial teórico do trabalho, através de bibliografias específicas que retratem
a temática em questão.
Posterior a isso, iniciou-se o processo de mapeamento dos atributos a serem
analisados. Diante disso, as informações referentes a hipsometria, declividade e mais
tarde as unidades de relevo, foram obtidas a partir da Base Vetorial Contínua do
Estado do Rio Grande do Sul desenvolvida pelo Centro de Ecologia da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (Hasenack & Weber, 2010), além do Modelo Digital de
Elevação (MDE) construído através de imagens SRTM (Shuttle Radar Topography
Mission).
450
Com relação aos trabalhos de campo, estes foram realizados através de perfis,
seguindo estradas e caminhos que cortam a área de estudo, utilizando o receptor GPS
(Global Position System) modelo Garmim 62SX. Nos trabalhos de campo são
observadas e descritas as formas de relevo, a litologia da área, os tipos de solos e o
uso e ocupação da área de estudo.
Para a elaboração dos mapas temáticos (hipsometria, declividade e unidades de
relevo), utilizou-se os softwares ArcGIS10.2.2 desenvolvido pela ESRI e o CorelDRAW
X6 desenvolvido pela Corel Inc. na etapa de finalização do layout dos mapas.
O mapa hipsométrico teve suas classes definidas através das linhas de quebra do
relevo, compostas de altitudes contínuas e pela amplitude altimétrica (260 metros).
Dessa forma, estabeleceram-se as seguintes classes hipsométricas: 80 – 120 metros;
120 – 170 metros; 170 – 220 metros; 220 – 280 metros; 280 – 340 metros; acima de
340 metros.
O mapa de declividade foi elaborado dividindo-se o terreno em cinco classes: áreas
com declives inferiores a 2%, correspondendo as áreas onde predominam os
processos de acumulação; de 2 – 5% de declividade denominada como áreas de
acumulação; de 5 – 15% sendo que a partir desta começam a predominar os
processos erosivos, além de ser considerado o limite para o processo de mecanização
agrícola, conforme o IPT e as classes sugeridas por De Biasi (1992); de 15 – 45%,
onde dentro dessa classes, a declividade de 30% definida pela legislação federal (Lei
nº 6.766 – Lei de Lehman) vai definir o limite máximo para a urbanização sem
restrições, a partir do qual toda e qualquer forma de parcelamento far-se-á através de
exigências específicas; áreas com declives maiores que 45%, sendo que de acordo
com o Código Florestal, as áreas com declives de 47% são definidas como o limite
máximo de corte raso, a partir do qual a exploração só será permitida se sustentada
por cobertura de florestas (Lei nº 4.771 de 15/09/1965). Áreas com declives superiores
a 47%, o artigo do Código Florestal define que não é permitida a derrubada de
florestas, só sendo tolerada a extração de toras, quando em regime de utilização
racional e que vise rendimentos permanentes.
Por fim, o mapa de unidades de relevo foi elaborado a partir da base cartográfica
desenvolvida pela UFRGS juntamente com imagens de satélite de alta resolução,
onde estabeleceu-se um Modelo Digital de Elevação (MDE) da área de estudo, além
dos trabalhos de campo no município de modo a validar as informações obtidas no
decorrer do trabalho. Dessa forma, foram estipuladas as seguintes classes de
unidades de relevo: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas,
Morros e Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. A variável
visual cor seguiu um padrão ordenativo em tons de preto a cinza, onde os tons claros
451
representavam as classes com altitudes mais baixas próximas ao Rio Toropi,
enquanto que os tons mais escuros representam as áreas com maiores altitudes.
RESULTADOS
O produto final do trabalho, ou seja, o mapeamento das unidades de relevo, consistiu
no cruzamento entre o mapa de hipsometria e o mapa de declividade do município,
obtendo-se assim, as unidades de relevo do município de Mata.
Hipsometria
De acordo com Guerra (1978), a hipsometria pode ser definida como a “representação
altimétrica do relevo de uma região no mapa, pelo uso de cores convencionais”. É
através da hipsometria que é determinada a altitude de um lugar em relação ao nível
do mar.
O conhecimento da hipsometria de uma região nos permite reconhecer os fenômenos
que podem ocorrer, destacando-se principalmente a relação da altitude com a
ocorrência dos tipos climáticos, além do tipo de vegetação predominante em cada
porção.
O município de Mata apresenta como menor altitude o nível de 80 metros, junto à
planície do rio Toropi, onde nesta área, também encontra-se a área urbana do
município. Já a maior altitude, aproximadamente 350 metros, situa-se na porção nortenordeste do município, resultando em uma amplitude altimétrica de 270 metros.
Essa diferença altimétrica pode ser explicada pelo fato de que o município de Mata,
encontra-se na transição de uma área de Depressão (áreas mais rebaixadas) para
uma área de Planalto (áreas mais elevadas).
As porções de menores altitudes do município, ou seja, entre 80 e 120 metros,
limitam-se com o rio Toropi e correspondem a 21,6% da área total do município. Essa
área sofre influência deposicional de sedimentos transportados pela rede de
drenagem, formando uma planície de inundação.
No intervalo predominante, encontra-se as altitudes correspondentes a 120 e a 170
metros localizam-se nas porções centrais e noroeste do município. Essa classe
hipsométrica corresponde a 29,3% da área total do município.
As altitudes entre o intervalo de 170 a 220 metros correspondem a faixa noroestenordeste do município, dando início a um relevo mais íngreme. Essa classe
hipsométrica corresponde a 15% da área total do município.
O intervalo de 220 a 280 metros também corresponde a faixa noroeste-nordeste do
município, caracterizando um relevo íngreme correspondente a encosta do Planalto
452
Meridional Brasileiro. Essa classe hipsométrica corresponde a 12,9% da área total do
município.
A classe hipsométrica que corresponde aos intervalos de 280 a 340 metros localiza-se
nas porções mais ao norte e nordeste do município, caracterizando um relevo bastante
íngreme situado no Rebordo do Planalto Meridional Brasileiro. Essa classe
corresponde a 12,7% da área total do município.
Por fim, as maiores altitudes correspondem a uma área de 8,5% do município, tendo
suas altitudes superiores a 340 metros, localizando-se na região conhecida como
Topo do Planalto.
Declividade
A declividade indica o grau de inclinação de uma encosta expressa em grau ou
porcentagem. Sendo assim, quanto maior for o ângulo formado pela diferença de
altitude entre o ponto mais baixo e o ponto mais alto, maior a inclinação e maior a
declividade do terreno compreendido entre esses dois pontos.
O estudo da declividade de um determinado local é e extrema importância, pois além
de ser um atributo importante para caracterizar o relevo, permite antever processos
que possam ali ocorrer, sendo relevante para as atividades agropecuárias e obras de
engenharia.
O mapa de declividade do município de Mata foi elaborado dividindo-se o terreno em
cinco classes, tendo em vista os processos naturais predominantes, além do uso e
ocupação recomendados considerando-se o grau de inclinação de cada parcela do
terreno.
Áreas com declives inferiores a 2%: correspondem as áreas planas onde predominam
os processos de acumulação. Representam 14,3% da área total do município.
Áreas com declives entre 2-5%: correspondem as áreas de acumulação. Representam
18,7% da área total do município.
Áreas com declives entre 5-15%: correspondem as áreas onde começam a atuar os
processos erosivos, além de ser considerada o limite para a mecanização agrícola. É
nessa classe que se encontra inserida a área urbana de Mata. Representam 44% da
área total do município.
Áreas com declives entre 15-45%: conforme a Legislação Federal (Lei nº 6.766),
também chamada de Lei de Lehmann, as áreas com 30% de declividade servirão
como o limite máximo para o processo de urbanização sem restrições, a partir do qual
toda e qualquer forma de parcelamento far-se-á através de exigências específicas.
Correspondem a 22,5% da área total do município.
Áreas com declives superiores a 45%: o Código Florestal prevê que em áreas acima
de 25º de inclinação (47%) não é permitido a derrubada de florestas, só sendo
453
permitida a extração de toras de madeiras que visem rendimentos permanentes.
Correspondem a apenas 0,5% da área total do município.
Unidades de Relevo
A interação entre as informações obtidas a partir das características das vertentes,
como declividade, hipsometria, amplitude altimétrica, análise da presença de rede de
drenagem e o traçado de alguns perfis topográficos, permitiram a delimitação de
unidades de relevo no município de Mata.
O município de Mata apresenta uma boa diversidade de formas de relevo, pois é
possível encontrar desde áreas planas junto as drenagens até áreas escarpadas do
Rebordo de Planalto. Diante disso, foram encontradas e classificadas cinco unidades
de relevo: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas, Morros e
Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. A Figura 2 mostra o
mapa das unidades de relevo mapeadas no município de Mata.
Figura 2: Mapa das Unidades de Relevo do município de Mata.
Colinas Levemente Onduladas de Altitude: caracteriza-se por apresentar um relevo
suavemente ondulado, ou seja, com declividades entre 2 e 5%. Localizam-se na
porção que compreende ao Planalto Meridional Brasileiro, ou seja, nas porções mais
454
altas do município. Apresenta amplitudes altimétrica de aproximadamente 60 metros.
Essa unidade representa 12,4% da área total do município.
Colinas Onduladas: caracteriza-se por apresentar um relevo suavemente ondulado
com declividades em torno de 15%, caracterizando uma área onde os processos
erosivos passam a atuar de forma significativa, além de marcarem o limite para a
mecanização agrícola. Corresponde a 38,7% da área total do município.
Morros e Morrotes Isolados: responsável por 7,5% da área total do município, essa
unidade constitui-se por áreas íngremes situadas em porções isoladas do município,
destacando-se entre as formas de colinas. Caracterizam-se por apresentar uma
topografia escarpada e indicam os processos que provocam o recuo do planalto que é
controlado pela resistência dos materiais e as linhas de fraturas.
Os morrotes são formas de relevo com declividades de encostas superior a 15% e
amplitude altimétrica inferior a 100 metros. Indicam os processos da atuação dos
processos erosivos sobre as áreas elevadas topograficamente e apresentam uma
maior resistência com relação aos processos degradacionais.
Cabe destacar, que em alguns casos os morrotes podem apresentar algumas
diferenças relacionadas aos tipos de litologias, pois os morrotes com topos planos em
geral são compostos por rochas areníticas, enquanto que os com topos arredondados
podem indicar a presença de rochas vulcânicas.
Por sua vez, os morros diferenciam-se dos morrotes em pouco fatores, um deles é
com relação a amplitude altimétrica, onde para os morros, esta deve ser superior a
100 metros. Assim como os morrotes, os morros também se destacam na paisagem
por apresentarem porções resistentes aos agentes intempéricos e erosivos.
Áreas Escarpadas do Rebordo: corresponde as áreas mais íngremes do município,
típicas da região do Rebordo do Planalto. Caracterizam-se por apresentarem as
encostas bem preservadas com a presença da vegetação nativa. Essa unidade
corresponde a 19,5% da área total do município.
Áreas Planas: caracteriza-se por apresentar um relevo plano que ocorre junto as
principais drenagens, como o rio Toropi, estando sujeitos a processos deposicionais,
sendo consideradas como áreas de acumulação ou várzeas. Nessa unidade as
declividades não ultrapassam os 2% É nessa unidade que localiza-se a área urbana
do município. Essa unidade corresponde a 21,9% da área total do município.
Com relação a quantificação das classes (Tabela 1), observa-se que as unidades que
predominam no município são as Colinas Onduladas e as Áreas Planas, sendo que
juntas, representam quase 60% da área total do município. Por sua vez, os Morros e
Morrotes Isolados são os que detém a menor área dentro do município de Mata.
455
Unidades
Área em km²
Porcentagem (%)
Colinas Levemente Onduladas de Altitude
38,98
12,4
Colinas Onduladas
120,84
38,7
Morros e Morrotes Isolados
5,84
7,5
Áreas Escarpadas do Rebordo
68,57
19,5
Áreas Planas
77,89
21,9
Tabela 1: Quantificação das Unidades de Relevo do município de Mata.
CONCLUSÃO
O relevo do município de Mata foi descrito com base em dois parâmetros que foram a
hipsometria e a declividade. A integração desses dados possibilitou um breve
reconhecimento sobre as formas de relevo e a sua relação com os processos atuantes
na superfície.
O estudo descreve as diferentes formas de relevo que compõem a paisagem e aponta
suas principais características quanto a fisionomia e até mesmo possíveis processos
que possam ser desencadeados, sejam eles naturais ou através da ação antrópica.
Dessa forma, além de enriquecer a geomorfologia, também permite evoluir nos
estudos ligados a dinâmica sociedade/natureza, sendo que com essas informações é
possível ocorrer a tomada de decisão consciente, quando se aborda como temática o
planejamento e oreordenamento territorial.
Com isso, destaca-se que os resultados mostraram que a metodologia e a escala de
análise foram satisfatórias, cumprindo os objetivos e as expectativas esperadas. A
análise permitiu a compartimentação da área de estudo em seis unidades. Essas
unidades foram definidas e mapeadas de acordo com a estrutura espacial dos
parâmetros utilizados.
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Sorriso-MT. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa Maria, Santa
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Francisca, Nova Palma e Pinhal Grande-RS. Dissertação de Mestrado. Universidade
Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil.
457
EJE 4- EXPERIENCIAS DE EDUCACIÓN
458
TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL
459
ANÁLISE DE DISCURSO E GEOGRAFIA: POSSIBILIDADES
METODOLÓGICAS
Edipo Djavan dos Reis Göergen - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Taiane Flores do Nascimento - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Benhur Pinós da Costa - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected])
RESUMO
A Geografia desde sua gênese convive com conflitos teóricos e metodológicos que
abarcam grande parte da sua estruturação enquanto ciência. Dessa forma, cada olhar
do pesquisador que conta sua evolução é diferente em determinadas fases de seu
processo de afirmação, e resultado da heterogeneidade de visões, gera um mútuo e
constante debate. Em níveis gerais, a ciência geográfica intensificou seus estudos de
acordo com os acontecimentos de períodos de nossa história e contextualiza
diferentes opiniões no que se refere ao processo histórico, cultural, político, econômico
e social. Neste sentido, o objetivo central desse artigo, é compreender a eficiência de
novas metodologias às abordagens contemporâneas da Geografia, destacando
principalmente a análise de discurso dentro das abordagens de gênero e sexualidade
na ciência geográfica. Considera-se que o gênero e a sexualidade são questões
presentes nas relações sociais, sendo estas representadas no espaço por diferentes
visões da própria sociedade, justificando a relevância deste artigo, que pode contribuir
como aporte teórico a novas discussões relacionadas a esta temática.
Palavras-chave: Geografia; Gênero; Sexualidade; Análise de Discurso.
RESUMEN
La Geografía desde su génesis viven con conflictos teóricos y metodológicos que
abarca gran parte de su estructura como una ciencia. Por lo tanto, la perspectiva de
cada investigador que cuenta su evolución es diferente en ciertas fases de su proceso
de reclamación, y el resultado de la heterogeneidad de opiniones, genera un debate
mutuo y constante. Generalmente los niveles, la ciencia geográfica intensificaron sus
estudios de acuerdo a los acontecimientos de los períodos de nuestra historia y
contextualiza las diferentes opiniones con respecto al proceso histórico, cultural,
política, económica y social. En este sentido, el objetivo principal de este artículo es
comprender la eficacia de los nuevos enfoques de los enfoques contemporáneos de la
geografía, destacando especialmente el análisis del discurso en el género y la
sexualidad enfoques en la ciencia geográfica. Se considera que el género y la
sexualidad son temas en las relaciones sociales, que están representados en el
espacio por diferentes visiones de la sociedad misma, que justifican la relevância de
este artículo, que puede contribuir como soporte teórico a los nuevos debates
relacionados com este tema.
Palabras claves: Geografía; Género; Sexualidad; Análisis Del Discurso.
INTRODUÇÃO
A Geografia desde sua gênese convive com conflitos teóricos, epistemológicos
e metodológicos que abarcam grande parte da sua estruturação enquanto ciência.
Dessa forma, cada olhar do pesquisador que conta sua evolução é diferente em
460
determinadas fases de seu processo de afirmação, e resultado da heterogeneidade de
visões, gera um mútuo e constante debate.
Em níveis gerais, a ciência, inclusive a geográfica, intensificou seus estudos de
acordo com os acontecimentos de períodos de nossa história e contextualiza
diferentes opiniões no que se refere ao processo histórico, cultural, político, econômico
e social. Gomes, analisando o processo de transformação epistemológica da
Geografia afirma,
A principal vocação da epistemologia é pois, desde o início, constituir
um campo de discussão, de questões sobre métodos e limites de
validade, sua inclinação não é normalizar nem restringir as iniciativas.
Podemos, de forma muito geral, dizer assim que a epistemologia
é um campo crítico de discussões sobre as formas de
pensamento científico. Isto quer dizer que essas discussões
epistemológicas dizem respeito antes de mais nada aos métodos, aos
objetivos e as finalidades de um conhecimento científico. Discutir
criticamente as formas de construir um pensamento científico não
quer absolutamente dizer se transformar em um tribunal para julgar
da sua conformidade ou não em relação a um modelo único e ideal,
ao contrário (GOMES, 2009, p. 14-15).
Na geografia, assim como nos demais campos do conhecimento científico, tais
concepções ainda não são muito bem aceitas, tendo muitos de seus pesquisadores
arraigados às concepções tradicionais de ser compreender o espaço. Contrariando a
isso, Gomes reafirma,
A epistemologia pretende ser justamente um domínio aberto ao
reconhecimento da pluralidade de recursos e orientações nas
diferentes disciplinas científicas. Ser um domínio de discussões
significa exatamente não estar orientado de forma exclusiva e
não agir como se detivéssemos algum tipo de certeza que
legitimasse a priori esse ou aquele caminho, em detrimento de
outros possíveis. O objetivo de uma discussão epistemológica
não é, portanto, estabelecer, ao final, uma orientação que deve
ser seguida por todos ou quase todos. Trata-se, sobretudo, de
demonstrar que a maneira de fazer ciência é também um produto
histórico e contextual, mais importante ainda, trata-se de
demonstrar que a cada momento as respostas são múltiplas e
que essa pluralidade crítica é a razão mesmo da existência da
ciência (grifo nosso) (GOMES, 2009, p. 14-15).
Para tanto, Gomes conclui dizendo que não se pretende encontrar uma forma
“ideal e absoluta pela qual a geografia deve ser pensada ou tampouco apontar a boa
direção para trabalharmos geograficamente”, mas sim que, na Geografia, assim como
na ciência em si, que não se deve evitar discussões, principalmente porque “dúvidas
não nos enfraquecem, ao contrário, elas são o testemunho e os elementos pelos quais
461
a geografia pode ser reconhecida como uma ciência, viva e dinâmica, aberta e plural
(GOMES, 2009, p. 14-15).
A geografia contemporânea, por exemplo, é muito mais que uma simples
descrição. Ela abarca temáticas interessantes no contexto espaço-tempo de sua
trajetória, sempre colocando a sociedade em evidência e como agente transformador
do espaço. Neste sentido, considera-se que a sociedade, em geral, foi construída a
partir de discursos, regras, normas e de tradições culturais. Se ela é construída de
discursos, normas e saberes culturais, pode-se inserir a subjetividade e a
intersubjetividade do sujeito aos estudos geográficos, uma vez que suas ações estão
intrínsecas nas representações espaciais. Para tanto, o gênero e a sexualidade são
questões presentes nas relações sociais, sendo estas representadas no espaço por
diferentes visões da própria sociedade. Visões que são padronizadas e que priorizam,
conforme nos assegura Butler, a heteronormatividade50 invisibilizando outros gêneros
e manifestações sexuais que constituem o ser humano. Mas há uma grande questão
que permeia certa temática: esse fenômeno é atual ou só estava ocultado no espaço?
Para Silva,
As ausências e os silêncios de determinados grupos sociais são
resultantes de embates desenvolvidos na comunidade científica, que
criam hierarquias e dependências, ratificando o poder de grupos
hegemônicos e, consequentemente, de suas próprias teorias
científicas (2009, p. 25).
Complementando,
A ciência geográfica hegemônica é marcada por privilégios de sexo e
de raça, características que dificultam a expressão das
espacialidades dos grupos das mulheres, dos não-brancos e dos que
não se encaixam na ordem heterossexual dominante (...) Durante
muito tempo, as existências espaciais desses grupos ou de suas
ações concretas não foram consideradas “adequadas” como objetos
de estudos do campo da geografia. (...) A razão de suas ausências no
discurso geográfico deve ser entendida pela legitimação naturalizada
dos discursos hegemônicos da geografia branca, masculina e
heterossexual, que nega essas existências e também impede o
questionamento da diversidade de saberes que compõem as
sociedades e suas mais variadas espacialidade (SILVA, 2009,p. 25) .
Para tanto, as temáticas relacionadas ao gênero e sexualidade tem sido com
certa relutância, objeto de interesse da geografia em diferentes esferas e em todos os
cantos do globo. No Brasil ela ainda é incipiente e conta com poucos trabalhos
50
Heteronormatividade é um termo utilizado para descrever situações nas quais orientações
sexuais diferentes da heterossexual são marginalizadas, ignoradas e até mesmo perseguidas
por práticas sociais, crenças ou políticas. Ver em: BUTLER, Judith. Problemas de Gênero:
Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
462
relacionados a esta temática. Ainda é um campo dentro da ciência geográfica a ser
explorado, e que oferece uma gama de interpretações com relação ao espaço. Ainda
que haja inúmeras possibilidades de se verificar e analisar a diversidade no que se
refere ao gênero e suas espacialidades, a geografia pouco se utiliza desta temática
para compreender o espaço sob a perspectiva de relações sociais, justificando a
importância de discussões acerca desse campo na ciência geográfica.
Para tanto, o objetivo da apresentação desse trabalho, é muito mais que uma
simples revisão teórica, mas também compreender a eficiência de novas metodologias
às abordagens contemporâneas da Geografia.
METODOLOGIA
Metodologicamente, a pesquisa é baseada no mapeamento de conceitos que
subsidiou a pesquisa. Neste sentido, ela teve como primeiro passo, a ampla procura
pelo referencial teórico-metodológico que sustenta a temática em questão.
Considera-se a Análise do Discurso (AD) como uma possibilidade de captar o
sentido não explícito no discurso. Neste sentido, a interpretação da linguagem
propriamente dita vem como uma forma de aproximação sujeito-pesquisador, pois é
nesse espaço da linguagem que se podem explicar diferentes fenômenos e conceitos,
sendo a palavra uma condição de ponte difundida entre um ou mais locutores e um ou
mais interlocutores.
Pode-se considerar que a palavra é o modo mais autêntico e também legítimo
das relações sociais, configurando-se como um fenômeno ideológico por excelência.
Neste sentido, destaca-se Orlandi (2013, p. 15) quando diz que,
A Análise de Discurso, como seu próprio nome indica, não trata da
língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe
interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso,
etimologicamente, tem em si, a ideia de curso, de percurso, de correr
por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento,
prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem
falando.
A autora ao mencionar em suas palavras o “homem”, ela se refere ao homem
em geral, o homem como espécie humana, desconsiderando o gênero, ou seja, ela
sugere que a AD conceba a linguagem como mediação necessária entre o homem e a
realidade natural e social (ORLANDI, 2013).
Para se trabalhar com esta técnica de análise é importante considerar a
linguagem exteriorizada do sujeito, uma vez que ela pode refletir as ideologias levando
em conta o sentido, enquanto simbologias constituídas do próprio indivíduo e sua
463
história. Para tanto, destaca-se as observações de Orlandi (2012, p. 83) sobre a
questão da materialização do corpo, ou ainda, sobre o processo de significação do
mesmo.
Considerando a materialidade do sujeito, o corpo significa. Em outras
palavras, a significação do corpo não pode ser pensada sem a
materialidade do sujeito. E vice-versa, ou seja, não podemos pensar
a materialidade do sujeito sem pensar em relação com o corpo. Por
isso nos interrogamos: como juntar corpo, sujeito, sentido, pensado a
questão da materialidade discursiva?
Quando a autora fala em materialidade do corpo, ela faz uma relação entre
sujeito/corpo/linguagem/sociedade, visando compreender o discurso, pensando na sua
historicidade, dando significado em um ou outro espaço de existência, considerando o
espaço de vivência. Neste sentido, Orandi (2013, p. 21) destaca:
Para a Análise de Discurso, não se trata apenas de transmissão de
informação, nem há essa linearidade na disposição dos elementos da
comunicação, como se a mensagem resultasse de um processo
assim serializado: alguém fala, refere-se alguma coisa, baseando-se
em um código, e o receptor capta a mensagem, decodificando-a.
É importante destacar que a AD tem o objetivo de questionar os sentidos
estabelecidos em diferentes formas de produção, que podem ser verbais e não
verbais, contanto que a materialidade da fala e expressões produzam sentidos para a
interpretação.
A geografia como ciência apresenta possibilidades de atrelar teoria e prática na
construção ou renovação de conceitos, paradigmas e metodologias, onde se definem
diante de novos fatos geográficos que se apresentam na atualidade, bem como abre
caminhos para novas perspectivas de interpretações. Ao enfatizar o espaço geográfico
em suas análises, a geografia estabelece uma conexão de modo interdisciplinar,
assumindo a integração das diferentes espacialidades que se formam a partir das
relações sociais.
DESENVOLVIMENTO
GÊNERO E SEXUALIDADE NA ANÁLISE GEOGRÁFICA
As temáticas relacionadas ao gênero e sexualidade tem sido objeto de
interesse da geografia em diferentes esferas e em todos os cantos do globo. No Brasil
ela ainda é incipiente e conta com poucos trabalhos relacionados a esta temática.
Ainda é um campo dentro da ciência geográfica a ser explorado, e que oferece uma
464
gama de interpretações com relação ao espaço. Ainda que haja inúmeras
possibilidades de se verificar e analisar a diversidade no que se refere ao gênero e
suas espacialidades, a geografia pouco se utiliza desta temática para compreender o
espaço sob a perspectiva de relações sociais, justificando a importância de discussões
acerca desse campo na ciência geográfica.
As Geografias Feministas e Queer surgem pela necessidade de inovações e
diferentes problematizações que são postas no cotidiano, direcionando fatos
geográficos mais significativos na atualidade (ou marginalizados até os dias de hoje) e
que exigem novas perspectivas de interpretação. Ela vem para trabalhar com a
invisibilidade da mulher e de grupos sociais que não se incluem na sociedade
heteronormativa. De acordo com Silva, esse novo ramo de estudos da ciência
geográfica é fruto dos movimentos sociais, principalmente o feminista,
Dentre os vários movimentos sociais emergentes nos anos 60, o
movimento feminista, notadamente aquele reconhecido como a
“segunda onda”, foi fundamental para a inspiração da ação de
geógrafas que iniciaram um movimento interno à geografia nos anos
70, sob a perspectiva de três objetivos principais: [1] construir a
igualdade entre homens e mulheres no âmbito da disciplina; [2]
centrar as investigações geográficas sobre as mulheres; e [3] desafiar
as filosofias, conceitos e metodologias que sustentavam a hegemonia
da geografia masculina (SILVA, 2009, p. 27).
Dessa forma,
Assim como as mulheres brancas reivindicavam, na década de 70,
espaços teóricos e políticos de hegemonia masculina, as mulheres
negras oriundas de países em desenvolvimentos reivindicavam,
agora, o reconhecimento de suas experiências específicas nem
contexto de globalização que deveria contemplar a multiplicidade
étnica, racial e sexual (SILVA, 2009, p. 39).
Considerar a pluralidade da sociedade requer uma atenção especial, pois se sabe que
alguns padrões sociais ainda são conservadores. De uma forma semelhante Gomes
afirma,
De forma global, podemos dizer que a partir dos anos 50 uma grande
parte dos geógrafos passa a reconhecer a insuficiência e fraqueza
das bases teóricas que pretendiam sustentar o projeto científico da
geografia naquele momento. Essa insuficiência provinha em grande
parte da resistente ideia de que a ciência geográfica se identificava
inteiramente com o conhecimento empírico dos lugares e não
precisava necessariamente ultrapassar esse estágio, ou seja, não
precisava criar teorias ou explicações abstratas gerais. Ela seria,
portanto, uma ciência diferente das demais pois, não só privilegiava o
conhecimento concreto como se limitava a ele (GOMES, 2009, p. 17).
Neste sentido, basta falar em gênero (a priori, feminino e masculino) que se
iniciam as discussões e principais problemas referentes as padronizações sociais.
465
Para tanto, a pesquisa sobre as Geografias Feministas e Queer, juntamente com a
temática religiosa, são estudos emergentes no âmbito da ciência geográfica, uma vez
que os fenômenos estão surgindo em proporções notáveis e estão intimamente
ligados a atual configuração do espaço. De acordo com Silva,
A adoção do conceito de gênero pelas geógrafas feministas permitiu
avanços teóricos e metodológicos, além da ampliação do campo de
estudos, já que o espaço passou a ser um importante elemento para
a compreensão das relações de gênero instituídas socialmente,
contudo, hierarquizada, com primazia dos homens em relação às
mulheres (SILVA, 2009, p. 35).
Da mesma forma, tratando da teoria queer,
A teoria queer, portanto, além de sua importância capital em
reconhecer a formação de comunidades e culturas sexuais, é um
espaço teórico no qual se pode evidênciar a exclusão e a
marginalização de determinados grupos sociais nas atividades
econômicas e políticas, frutos da homofobia. Segundo eles, mais do
que leitura queer do espaço, é necessário empreender uma leitura
queer da própria geografia, que tem banalizado esse campo de
produção científica (SILVA, 2009, p. 44).
A potencialidade da teoria queer, vem da abordagem a qual leva à
compreensão de culturas sexuais e a evidenciar a exclusão e a marginalização de
determinados grupos sociais, resultado de práticas homofóbicas nas atividades
econômicas e políticas. Neste sentido, a subversão pode desestruturar os espaços, ou
seja, as práticas e também estudos subversivos podem ser fundamental para ressaltar
esses grupos marginalizados. Conclui-se que gênero é uma construção cultural e
social e, como tal, sua representação e disseminação pelos meios comunicacionais é
responsável pela construção de ideais sociais, valores, estereótipos e preconceitos.
UMA NOVA POSSIBILIDADE METODOLÓGICA NA ANÁLISE GEOGRÁFICA
O processo de construção de novas formas de metodologias que podem ser
aplicadas na geografia não é um caminho fácil. São inúmeras possibilidades que
resultam em diferentes resultados ao final de cada pesquisa. Neste sentido, destacamse dois exemplos de pesquisas geográficas que estão sendo realizadas na área de
gênero e sexualidade, utilizando a AD. Salienta-se que as duas tem perspectivas
diferentes, mas a metodologia escolhida para alcançar os objetivos das mesmas tem
pilares basilares que entrelaçam a AD juntamente com outras perspectivas
metodológicas.
466
Relacionando gênero, sexualidade e religião, a primeira pesquisa a ser
exemplificada neste artigo tem cunho fenomenológico e Análise de Discurso como
método e procedimento metodológico, respectivamente. Desta forma, o presente
trabalho a ser exemplificado, tem como questão central compreender como as
travestilidades/transsexualidades compõem as práticas religiosas nos centros de
cultos afro-brasileiros. Os caminhos constituídos de reflexão buscam compreender o
conjunto de relações estabelecidas entre o que é ser travesti/transexual a partir da
vivência cotidiana nos terreiros, e identificar as maneiras pelas quais essas vivências
são mediadas pela representação de gênero dentro da religião afro.
Como o trabalho tem como sujeitos as travestis nos terreiros de cultos afrobrasileiros e de origem africana, considera-se importante a análise de discurso das
mesmas, uma vez que no campo da fenomenologia como método de abordagem, são
os sujeitos que determinam o objeto, pois ela parte do pressuposto de que os sujeitos
constituem a realidade, que é singular do próprio sujeito.
De uma forma semelhante, relacionando gênero e sexualidades, o foco da
segunda pesquisa desenvolvida busca compreender a construção de identidades
homoeróticas na territorialidade tradicionalista, a espacialidade que agrega o
Movimento Tradicionalista Gaúcho.
Para tanto, compreende-se os centros de tradições gaúchas e demais eventos
como os territórios a serem estudados, e o Movimento Tradicionalista Gaúcho uma
territorialidade.
Nota-se, ao “adentrar” tal espacialidade, a existência de uma identidade
tradicionalista dotada de uma performance (BUTLER, 2008) característica. Esta última
não só é percebida pelo limite espacial, que remete a um tempo passado, e às
vestimentas folclóricas que os indivíduos, que do MTG são adeptos, são obrigados a
portar, mas, aos atos e discursos fortemente conservadores, machistas, elitistas e
heteronormativos ali disseminados.
Levando em conta que cada território não é comporto homogeneamente, e sim,
também por disputas internas de poder, permitindo notar assim porções espaciais
centrais e marginais (SILVA, 2013). Porções marginais, às vezes, paradoxais às
concepções identitárias e performáticas esperadas.
Percebendo a grande quantidade de homossexuais, ou então, indivíduos que
se auto-denominam não-heterossexuais, habitando a territorialidade do MTG, e que
sua sexualidade não se encaixa no propagado pela referida entidade, vem-se
questionar a esses indivíduos, de que maneira tais indivíduos convivem nesses
espaços tendo suas identidades (HALL, 2005) em constante conflito. (ORNAT, 2009,
p. 203-204).
467
Para se alcançar os objetivos propostos por ambas as pesquisas, buscou-se
uma forma (possível metodologia) de interpretar os objetos de estudo a partir de uma
perspectiva qualitativa. Escolheu-se a técnica de análise, Análise de Discurso (AD),
sob a perspectiva de responder os questionamentos que resultaram neste trabalho. O
processo de AD tem o objetivo de interrogar os sentidos estabelecidos em diversas
formas de produção, que podem ser verbais e não verbais, desde que sua
materialidade produza sentidos para interpretação. Ela será importante na pesquisa
pois demonstrará a partir das falas, das travestis e transexuais, e dos homossexuais
tradicionalistas, uma forma diferenciada de se analisar o espaço dentro da ciência
geográfica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ideia em se trabalhar com novos métodos de abordagem, dá maior
visibilidade à ciência a se propor em realizar pesquisas que podem ir muito além do
conhecimento do pesquisador. A Geografia, assim como os demais campos do
conhecimento científico, rompendo as barreiras epistemológicas, avançando a
espaços não visitados, assimilando novas concepções de ciência, possibilitadas por
interdisciplinares alternativas metodológicas. Ao estabelecer essas relações sociais
com o espaço, a ciência geográfica adquire a cada evento espaço-temporal, uma
forma diferente de se inserir nos fenômenos mais atuais. Nesta perspectiva da
construção social do pensamento científico, as teorias e paradigmas que vão surgindo
estão atrelados a um determinado contexto histórico e os embasamentos de
interpretação vão sendo construídos pelos pesquisadores.
Considerando todas as possibilidades de interpretação dentro da ciência
geográfica nesta temática, não se pode dizer que ela é uma ciência fechada, mesmo
que atualmente suas características ainda estejam entrelaçadas com o tradicionalismo
científico que a sustenta. A interdisciplinaridade dá a geografia uma maior força em se
manter como a ciência que relaciona tudo com todos e todos com tudo. As adaptações
que a temática de gênero e sexualidade que sofreu e ainda sofre, são consequências
de uma sociedade modernizada de diferentes espacialidades, que valoriza a estrutura
social heteronormativa, imposta pela cultura e também pelas questões religiosas.
Para tanto, ao se destacar a AD como uma possível forma de metodologia para
se analisar as temáticas envolvendo as tendências geográficas, abre-se novas
possibilidades de interpretação dentro da Geografia, sempre considerando as relações
sociais e espaciais.
468
Diante de todas as informações de pesquisadores desta linha, aliando-a com a
ciência geográfica (sendo geógrafos ou não) tem-se uma ciência ampla, complexa e
livre para abrir ainda mais caminhos, transformando, reformulando e até mesmo
criando novos paradigmas e novas teorias. Afinal, se descobrir a resposta para todo
dinamismo de um determinado tema, considera-se a ciência como encerrada. Diante
desta perspectiva de ciência ampla, com possibilidades ilimitadas, é viável este estudo
de gênero e sexualidade, pois a geografia é uma ciência espacial, e tudo que acontece
no espaço (relações socioespaciais), pode se tornar objeto de estudo da ciência
geográfica.
REFERÊNCIAS
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de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
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de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
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doutrinário. In, MENDONÇA, Francisco de Assis, LOWEN-SAHR, Cicilian Luiza,
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Desenvolvimento de Antonina (ADEMADAN), 2009, p. 13-30.
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sexualidade. In: SILVA, Joseli Maria (org.). Geografias Subversivas: discursos
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espaços. Ponta Grossa: Toda palavra, 2013, p. 243-272.
469
EDUCAÇÃO E PERCEPÇÃO AMBIENTAL: O QUE DIZEM OS MAPAS
MENTAIS DOS ALUNOS DE 1º ANO DO ENSINO MÉDIO DO MUNICÍPIO DE
QUEVEDOS/RS
Natália Lampert Batista - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Roberto Cassol - Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Elsbeth Léia Spode Becker - Centro Universitário Franciscano
[email protected]
Resumo
Os mapas mentais são uma forma de linguagem que refletem o espaço vivido e
possibilitam que o mapeador expresse sentimentos topofílicos e topofóbicos,
representados em nuances cujos signos e símbolos são construções sociais. Assim,
tem-se como objetivo no presente trabalhocontribuir para estudos geográficos
enfatizando a percepção ambiental local dos alunos de 1º ano, do Ensino Médio, da
Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I, por meio da elaboração de mapas
mentais.Essa investigação encontra-se embasada teoricamente no método
fenomenológico, proposto por Husserl, e a análise das representações mentais está
apoiada na “Metodologia Kozel”. Constatou-se que práticas vinculadas ao
entendimento ambiental local se fazem necessárias para a construção de um
entendimento do espaço que possibilite a leitura e a compreensão dos fatos de modo
articulado, inter-relacional e sistêmico, permitindo um pensar mais reflexivo e
despertando o sentimento de pertencimento e a identidade dos educandos, bem como
contribuindo para a valorização e cuidado do lugar.
Palavras-chave:Ensino de Geografia; Educação Ambiental; Pertencimento.
1.INTRODUÇÃO
“Enriquecemo-nos pela utilização pródiga dos nossos recursos
naturais e podemos, com razão, orgulhar-nos do nosso progresso.
Chegou, porém, o momento de refletirmos seriamente sobre o que
acontecerá quando as nossas florestas tiverem desaparecido, quando
o carvão, o ferro e o petróleo se esgotarem, quando o solo estiver
mais empobrecido ainda, levado para os rios, poluindo as suas
águas, desnudando os campos e dificultando a navegação”
(Théodore Roosevelt, Conferência sobre a Conservação dos
Recursos Naturais, 1908).
O fragmento de texto é parte integrante de uma conferência sobre conservação
dos recursos naturais, em 1908, na qual o então presidente dos Estados Unidos,
Theodore Roosevelt, alertava sobre o desequilíbrio ambiental do mundo moderno.
Também, é o primeiro parágrafo da introdução do livro “Antes que a natureza morra”,
de Jean Dorst, publicado em 1973.
470
A principal mensagem é a de que os recursos naturais disponíveis no Planeta
Terra estão sendo amplamente explorados pela sociedade, sem levar em
consideração a sua exaustão nem os impactos produzidos ao ambiente. Nesse
sentido, no século XXI, a mensagem continua muito adequada aos atuais parâmetros
de (in)sustentabilidade no Planeta. Emerge, então, a necessidade de um novo
paradigma51 e de um novo conhecimento, embasado nos saberes ambientais,
desacomodando os atuais paradigmas do conhecimento disciplinar e desafiando para
o conhecimento integrado e complexo.
Essa discussão, apesar de constituir-se como um tema transversal e
interdisciplinar, é uma questão chave no discurso da Geografia, pois a inter-relação
sociedade natureza é fortemente marcada em seu discurso e em seu objeto de
estudo. A temática ambiental, neste contexto, mostra-se um exercício indispensável às
descobertas de novas passagens e de novos encontros, fortalecendo o desejável e o
imprescindível trânsito dos sujeitos do conhecimento.
Segundo Leff (2001, p. 17), o conceito de ambiente apresenta-se justamente
nessa interseção (sociedade e natureza), pois “o ambiente não é a ecologia, mas a
complexidade do mundo; é um saber sobre as formas de apropriação do mundo e da
natureza através das relações de poder que se inscreveram nas formas dominantes
de conhecimento”.
O autor ainda menciona que o ambiente não é um processo perdido na
diferenciação/especificação das ciências, nem um espaço integrável pelas trocas
interdisciplinares, mas é antes de tudo a “casa comum” ou Ethos52 de todas as formas
de vida e de sociedade. “O ambiente e a falta insuperável do conhecimento, esse
vazio onde se aninha o desejo de saber gerando uma tendência interminável para a
completude das ciências, o equilíbrio ecológico e a justiça social” (LEFF, 2001, p.17).
No âmbito escolar, as questões ambientais podem embasar a abordagem
geográfica e contribuir para a compreensão de muitos conceitos relevantes para esta
disciplina. Os mapas e as representações cartográficas, como os mapas mentais,
assim como o enfoque ambiental, são nativos ao ensino de Geografia, tornando-se
seus grandes aliados, pois materializam a representação de diversos fenômenos no
espaço geográfico.
51
Para Thomas Kuhn, no livro “A estrutura das Revoluções Científicas”, um paradigma é um
modelo ideológico. Um “novo paradigma implica uma definição nova e mais rígida do campo de
estudo” (KUHN, 2001, p. 39), sendo que a transição entre um paradigma e outro é marcada por
uma revolução científica (série de acontecimentos que resultam em mudanças/saltos
qualitativos na ciência).
52
“Ethos, em seu sentido original do grego, significa a toca do animal ou casa do humano, ou
seja, a Terra” (BOFF, 2002, p. 27).
471
Com essa mesma conotação, Simielli (1999) aponta que a abordagem da
Cartografia Escolar pode percorrer dois caminhos principais: o primeiro conduz a um
aluno como leitor crítico da representação cartográfica, por meio da leitura de mapas,
cartas e plantas, e o segundo a um aluno mapeador consciente, com a elaboração de
mapas mentais, maquetes e croquis.
No eixo que conduz a ideia de aluno mapeador consciente, o mapa mental53,
pode ser uma alternativa eficiente para a compreensão do lugar e das características
ambientais do município, conduzindo o aluno a uma leitura consciente e subjetiva da
realidade (ambiental). Segundo Richter (2011, p. 17), ele “é analisado como um
recurso que permite a construção de uma expressão gráfica mais livre, tendo a
perspectiva de que o estudante possa transpor para essa representação espacial”
elementos importantes de sua realidade e assim compor um entendimento mais
profundo e complexo de seu espaço vivido, pois pode utilizar a escrita, a imagem ou o
próprio mapa convencional/tradicional.
Ao construir os mapas mentais, os alunos necessitam “dar-se conta” dos
elementos do espaço vivido. Isso, não é uma tarefa fácil. Exige conhecimento do lugar,
do ambiente local. Segundo Bello (2006), esse processo é a percepção ou o resultado
do “dar-nos conta”, isto é, da tomada de consciência dos fenômenos circundantes.
Kozel (2006, p.115) aponta que “os mapas mentais como construções sígnicas
requerem uma interpretação/decodificação (...), lembrando que essas construções
sígnicas estão inseridas em contextos sociais, espaciais e históricos coletivos
referenciando particularidades e singularidades”.
Neste sentido, com o uso dos mapas mentais, para a representação da realidade
ambiental, cada signo (as “palavras” do mapa) poderá servir de referência para um
elemento que conduz ao entendimento da percepção ambiental dos estudantes. Os
mapas mentais possibilitam a inclusão de elementos subjetivos que, geralmente, não
estão presentes nos mapas tradicionais e remetem aos sentimentos topofílicos e
topofóbicos54, fazendo com que o mapeador expresse sua afetividade e, muitas vezes,
seu inconsciente. “Essa característica torna mais rica essa representação de próprio
53
Pode-se definir como mapa mental um signo que transmite uma mensagem, por meio de uma
forma verbal e/ou gráfica. Em um mapa mental o mapeadorregistra os elementos do espaço
que são mais significativos, “com as quais mais se identifica, ou elementos dos quais mais faz
uso no seu dia-a-dia ou, ainda aqueles elementos que mais lhe chama a atenção por serem
exóticos, ou por seu valor histórico, ou porque tem uma relação de afetividade” (ROCHA, 2007,
p. 161).
54
As palavrastopofilia e seu oposto topofobia são neologismos que se referem aos laços
afetivos positivos e negativos, respectivamente, dos seres humanos com o ambiente (TUAN,
2013).
472
punho, por incluir contextos que podem ampliar a compreensão do espaço”
(RICHTER, 2011, p.125).
De acordo com Nogueira (2009),os mapas mentaisdizem respeito aos mapas
elaborados pela mente humana.
Eles são imagens guardadas na mente que levam em conta
informações sobre o ambiente que cerca os seres humanos, ou então
podem ser novas imagens de lugares nunca vistos, as quais a mente
cria a partir de algum estímulo externo. (...) Os mapas mentais
influenciam, frequentemente, em vários aspectos da tomada de
decisão (NOGUEIRA, 2009, p. 46).
Assim, a abordagem contextualizada dos mapas mentais com os mapas
tradicionais (ou convencionais), aqueles que possibilitam a uma leitura crítica da
realidade, auxilia na compreensão das possibilidades de resgatar a ação coletiva pela
justiça social no momento histórico em que, segundo Bauman (2001), a pósmodernidade torna-se cada vez mais individualizada e privatizada, onde o espaço
público torna-se esvaziado das funções de tradução das questões individuais em
coletivas e os próprios indivíduos ficam cada vez mais sujeitos a darem uma solução
biográfica para problemas que remetem à amplitude maior do tecido social.
2. OBJETIVO
A partir do exposto na contextualização inicial, o presente estudo possui como
objetivo contribuir para estudos geográficos enfatizando a percepção ambiental local
dos alunos de 1º ano, do Ensino Médio,da Escola Estadual de Educação Básica Dom
Pedro I, por meio da elaboração de mapas mentais.
3. METODOLOGIA
Essa
investigação
encontra-se
embasada
teoricamente
no
método
fenomenológico, proposto pelo filósofo alemão Edmund Husserl, pelo qual é realizada
a descrição e análise da consciência, isto é, o estudo dos fenômenos e dos objetos
que se mostram “a nós”, e compreender o sentido, tanto de ordem física quanto de
caráter cultural (CHAUÍ, 2006).
Os sujeitos da pesquisa foram os alunos matriculados em 2015 nos 1º anos, do
Ensino Médio, da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I55, localizada em
55
Cabe destacar que está é a única Escola que possui Ensino Médio no município de
Quevedos, RS.
473
Quevedos/RS (figura 1), ou seja, 24 alunos. Todos os alunos construíram mapas
mentais do município durante uma manhã do Seminário Integrado da Escola.
Ressalta-se que eles foram orientados a desenhar elementos que constituem o
ambiente local. Após, foram selecionados aleatoriamente 6 mapas mentais (por meio
de sorteio), resultando em 20% do total os quais constituíram a amostra de descrição
e de análise, conforme os resultados e as considerações a seguir.
Figura 1: Mapa de localização da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I,
Quevedos, RS, Brasil.
Org.: Batista, N. L, 2015.
A análise dos mapas mentais foi apoiada na metodologia proposta por Kozel
(2007). Segundo a autora, “visando decodificar os textos referendados nos mapas
mentais e em sua construção sígnica elaboramos uma metodologia como aporte para
as análises desenvolvidas a partir dessas representações” (KOZEL, 2007, p. 133).
Segundo a “Metodologia Kozel” (2007), os mapas foram decodificados e analisados
pelos seguintes quesitos:
a)
Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem:
observaram-se em um primeiro momento as formas que aparecem como: ícones,
letras, mapas e linhas.
474
b)
Interpretação quanto a distribuições dos elementos na imagem: analisaram-se
como as formas estão dispostas no mapa, isto é, se estão isoladas, dispersas,
horizontais, em perspectiva.
c)
Interpretação quanto às especificidades dos itens: neste item a leitura
aprofundou-se, subdividindo-se em:

Representação dos elementos naturais da paisagem

Representação dos elementos da paisagem construída

Representação dos elementos móveis

Representação dos elementos humanos
d)
Apresentação de outros aspectos ou particulares: apresentou-se de outros
elementos que permitem a decodificação da informação.
Incluiu-se na metodologia baseada em Kozel (2007), as percepçõessobre as questões
ambientais inspiradas nas noções de ética e do saber cuidar (BOFF, 2002) e as
noções de identidade e de pertencimento(TUAN, 2013).
4. DESENVOLVIMENTO
O desenho de mapas é evidência incontestável do poder de
conceituar as relações espaciais. É possível determinar o caminho
por meio do cálculo de posição sem usar observações astronômicas
e mediante a considerável experiência sem procurar desenhar as
relações globais da localidade (TUAN, 2013, p.100).
Os mapas mentais são uma forma de linguagem que reflete o espaço vivido e
possibilitam que o mapeador expresse sentimentos topofílicos e topofóbicos,
representados em nuance cujos signos e símbolos são construções sociais. Assim,
para Bertin (2014), o estudo da percepção, por meio de representações, como os
mapas mentais, faz-se necessário nas investigações geográficas, sobretudo para
entender as relações e interações entre o homem e o ambiente, influenciando as
decisões e a representação espacial e social.
Em sala de aula, podem ser utilizados nos momentos iniciais do trabalho sobre
um determinado tema ou conteúdo, quando o objetivo é trazer os conhecimentos e as
representações prévias dos alunos. De forma similar, é um procedimento importante
nos momentos finais de uma unidade de estudo, já que oportuniza a retomada e a
verificação dos conhecimentos construídos.
Neste sentido, Richter (2011) aponta que as representações oriundas das
imagens mentais não existem dissociadas do processo de leitura que se faz do
mundo. Logo, os mapas mentais são considerados uma representação do mundo real
475
observado por meio do olhar particular de um ser humano, com uma história, uma
cultura, um aporte cognitivo e emocional, pela visão de mundo e por intencionalidades
que permite identificar como esse ser compreende o lugar em que está inserido e
como ele se relaciona com o mesmo.
Desse modo, conforme Bertin (2014, p. 66)
Perante um estímulo externo ou interno o sujeito seleciona na
memória a imagem mental correspondente ao seu entendimento, o
que resulta em um nível de compreensão que constitui num tipo de
filtro de representação subjetiva, intersubjetiva e social.
Dentre os elementos que influenciam na percepção e consequentemente na
construção dos mapas mentais está à idade, o tempo, mas principalmente, as
sensações, ou seja, os sentimentostopofílicos e topofóbicos onde estão imbricados
valores, atitudes e vivências. A idade dos alunos participantes da pesquisa (figura 2A)
revela a fase da adolescência e varia entre 14 e 17anos. Com relação aotempo de
residência dos participantes da pesquisa evidenciou-se que 80% residema mais de 10
anos no município, conforme apresentado na figura 2B.
Figura 2: A) Idade dos alunosdo 1º ano do Ensino Médio; B)Tempo de residência dos
alunos no município de Quevedos/RS.
Fonte: Dados da pesquisa. Jun/2015.
Org.: Batista, N. L, 2015.
Os mapas mentais construídos pelos alunos são imagens que representam
uma articulação entre os elementos constitutivos do espaço vivido, demonstrando
como eles entendem o ambiente local. A linguagem dos mapas é a semantização que
os alunos fazem de seu município enquanto espaço de vivência, de sensações e de
percepções (figura 3).
476
Figura 3: Mapas mentais dos alunos de 1º anos do Ensino Médio (com alto
contraste).
Fonte: Atividade realizada com os alunos. Jun/2015.
Org.: Batista, N. L, 2015.
477
4.1. Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem
Como proposto por Kozel (2007), a primeira análise dos mapas mentais
consiste em reconhecer as formas impressas nas representações. É uma primeira
observação, mas importante para auxiliar a compreensão nas análises posteriores.
Assim, a linguagem presente nas imagens construídas pelos alunos do 1º ano (figura
3) evidencia uma pluralidade quanto à forma de representação. As figuras 3A, 3B, 3C,
3D e 3E são marcadas pela presença predominante de ícones que demostram os
elementos da realidade. Já o mapa mental da Figura 3F é marcado pela presença de
mapas (convencionais). Nas figuras 3B56, 3C57, 3D58 e 3F59, destacam-se também a
presença de letras, isto é, de textos explicativos para facilitar a compreensão do leitor.
4.2. Interpretação quanto a distribuições dos elementos na imagem
Em uma segunda fase de observação ainda há uma leitura incipiente, onde
se destacam as distribuições dos elementos. No caso dos mapas mentais construídos
pelos alunos de 1º ano, observa-se que a figura 3A apresenta uma distribuição
assimétrica, isto é, apenas um lado da folha foi utilizado. As figuras 3B e 3E
apresentam uma representação horizontal, o que remete a um entendimento do
espaço em um nível de abstração bidimensional, ou seja, não há visualização vertical
dos elementos constitutivos do lugar. A figura 3C apresenta o mapa em perspectiva,
estabelecendo assim um referencial central na folha e as noções iniciais de distância
em relação às bordas da mesma. Já as figuras 3D e 3F compreendem representações
isoladas, isto é, que não demostram relação direta com os demais elementos do
ambiente e, por isso, precisam ser lidas enquanto elementos com significados mais
amplos e com relações mais abstratas.
4.3. Interpretação quanto às especificidades dos itens
Nesta etapa a leitura começa a aprofundar-se, destacando as representações
dos elementos naturais e dos da paisagem construída, dos elementos móveis e dos
humanos. No caso dos mapas mentais analisados, percebe-se que o imaginário nos
mapas mentais (figura 3A, 3B, 3C, 3D e 3E) remonta claramente os elementos da
56
[Texto explicativo do aluno] Sede Campeira do CTG Mangueira de Pedra
[Texto explicativo do aluno] Dom Pedro I
58
[Texto explicativo do aluno] Wi-Fi Praça
59
[Texto explicativo do aluno] Internet
57
478
paisagem natural acrescida da paisagem construída,bem como a presença da
representação dos elementos humanos e móveis.
O primeiro mapa mental (3A) traz a noção de estações do ano, características do
clima Subtropical, pois o estudante representou uma árvore sem as folhas, remetendo
a vegetação decidual e a estação do inverno. Os elementos móveis e humanos ficam
claramente evidenciados na figura 3B. A vida no campo, o contato com os animais,
destacando aspectos da lida60 campeira gaúcha, atrelada ao cavalo e a pecuária, são
os elementos dispostos nesta figura formando a imagem do aluno mapeador. A figura
3C e 3E remete aos elementos humanos e naturais constituintes de parte da área
urbana do município, ressaltando a escola, a Igreja Católica, a residência e a praça
(espaço de convivência dos jovens no local). A figura 3D aponta apenas os elementos
construídos. Já a figura 3F, não faz referência àsrepresentações dos elementos
naturais e dos da paisagem construída nem aos elementos humanos, mas vincula-se
aos elementos móveis, ou seja, ao vínculo lugar-mundo.
4.4. Apresentação de outros aspectos ou particulares
Nesta etapa faz-se a leitura subjetiva, das entrelinhas dos mapas mentais.
Assim, a linguagem presente nos mapas mentais dos alunos de 1º ano (figura 3)
evidencia uma pluralidade de concepções espaciais que relacionam percepções
vinculadas
ao
lugar
e
ao
ambiente, mas também
reproduzem
elementos
característicos do mundo globalizado. Essa representação plural imbrica com a própria
concepção da Geografia que apresenta o espaço geográfico como o espaço da vida,
onde natureza e sociedade se relacionam e se influenciam.
As figuras 3A, 3B E 3C remontam a realidade do lugar de vivência e da relação
mapeador-ambiente. Já a figura 3D vincula a ideia de ambiente à religiosidade e a
crença na figura divina.Como constatado em uma pesquisa anterior, o que acaba
construindo uma cultura de defender a necessidade de preservar/conservar sem saber
o porquê remetendo os problemas ambientais a ordem das crenças e dos mitos, isto é,
vistos como castigo divino (BATISTA, 2013). Com relação ao quinto e ao sexto mapa
mental (figura 3E e 3F), fica evidente a relação ambiente-mundo globalizado, e a
representação dos elementos móveis, o que permite apontar que os referenciais de
problemas ambientais não estão atrelados ao lugar, mas sim aos espaços ausentes,
aqueles trabalhados no livro didático, as notícias na mídia e as informações
disponíveis no mundo virtual.
60
Termo regional para se referir a trabalho.
479
Embora a grande maioria dos alunos (80%) resida no município a mais de 10
anos, demonstram que não há uma leitura ambiental local atrelada às características
peculiares ao município e ao espaço de vivência, bem como o descompasso entre os
recursos cartográficos existentes que tratam das questões ambientais com a realidade
local. Essa interface é observada na pesquisa de Richter (2011), quando o autor
aponta que a Cartografia vem ganhando espaço na sala de aula de tal modo que os
mapas chegam a se tornar símbolos do Ensino de Geografia, porém seu uso, muitas
vezes, é inadequado ou desvinculado com o cotidiano do aluno, exigindo abstração e
não contribuindo para a apreensão do espaço local e sua compreensão, nem para a
visualização gráfica dos elementos que compõe o ambiente.
5. CONCLUSÕES
Com base no exposto, observa-se que nos mapas mentais dos alunos de 1º
ano do Ensino Médioapresentam múltiplas concepções espaciais que relacionam
percepções vinculadas ao lugar e ao ambiente, mas também reproduzem elementos
característicos do mundo globalizado, dos espaços ausentes trabalhados no livro
didático e na mídia.
Em relação às referências ambientais dos alunos vinculadas aos espaços
vividos, demonstram dificuldades para definir o que é e como se apresenta o quadro
ambiental do município de Quevedos/RS, enquanto totalidade. Há uma leitura
ambiental mais pontual do espaço de vivência. Nesse sentido, pode-se inferir que a
abordagem generalizada dos temas ambientais produz certa cegueira61 para a
percepção ambiental local e, consequentemente, surge à dificuldade de relacionar
conceitos sobre questões ambientais com o espaço vivido.
Quando os problemas ambientais não são mencionados em uma perspectiva do
local, o educando não constrói uma cultura ambiental ou um desejo de preservação
com o espaço vivido. Defende a preservação da Mata Atlântica, na Serra do Mar, e da
Amazônia, na Região Norte, mas não defende a mata galeria que protege as águas
que abastece seu município e sua casa. Isso acaba construindo uma cultura de
defender a necessidade de preservar/conservar sem saber o porquê ou ainda a
atribuição de problemas ambientais a ordem das crenças e dos mitos.
Portanto, a partir das constatações apresentadas, aponta-se que a construção
de mapas mentais, como um procedimento pedagógico, caracteriza-se pela realização
61
A sociedade enxerga a realidade, mas não consegue fazer uma análise e uma reflexão mais
profunda sobre as situações. A cegueira, então, não está relacionada em não enxergar, mas
em 'ser cego' de consciência, de intuição, de pensamento crítico sobre o ambiente, sobre a
realidade.
480
de representações pessoais. Esse procedimento é bastante adequado ao ensino pela
sua
possibilidade
de
desencadear
processos
mentais
importantes
para
o
desenvolvimento dos alunos, por oportunizar condições de expressão do mundo
vivido. Além disso, as práticas vinculadas ao entendimento ambiental localse tornam
urgentes para a construção de umentendimento do espaço que possibiliteuma leitura e
uma compreensão das verdades temporárias sobre o “mundo” de modo articulado,
inter-relacional e sistêmico, permitindo um pensar mais reflexivo e despertando o
sentimento de pertencimento e a identidade dos educandos, bem como contribuindo
para a valorização e cuidado com o lugar.
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Graduação). Centro Universitário Franciscano, Curso de Geografia, Santa Maria, RS:
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482
EDUCAÇÃO DO CAMPO: EMANCIPAÇÃO SOCIAL DE SUJEITOS
Eduardo Pastorio – Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
Resumo
O processo de constituição da Educação do Campo ocorreu a partir de reivindicações
de movimentos sociais camponeses, constituídas por características de exclusão
social e educacional, e de processos pedagógicos de ensino-aprendizagem ser
relegado ao plano secundário pelas esferas governamentais. Nesse sentido, esse
artigo tem como objetivo compreender a existência e atuação dos sujeitos inseridos
nas escolas do campo, indivíduos esses carregados social e culturalmente a partir de
suas práticas cotidianas sucessivas, que criam espaços e reproduzem suas bases
humanas. Como resultado, busca-se garantir visibilidade enquanto sujeito, permitindo
a emancipação social e a insurgência de sua cultura enquanto luta contrahegemônica. De forma a contribuir com esse debate, buscaremos as discussões
levantadas por teóricos que trabalham sobre o viés cultural/educacional, perspectivas
que torne os sujeitos como protagonista de sua história e criadores de sua própria
existência. Assim, a Educação do Campo torna-se como lugar possível do
desenvolvimento da interculturalidade, de espaço que emerge os ausentes,
possibilitando a realização de trocas sociais e culturais, em favorecimento de sua
formação.
Palavras-Chaves: Educação do Campo; Emancipação social; Interculturalidade;
Sujeito; Sociologias da Ausências/Emergências.
INTRODUÇÃO
Dentro da perspectiva da historicidade da Educação do Campo, percebe-se a
presença de sujeitos fundamentais na sua gênese, representados pelos movimentos
sociais. Estes, a partir de suas lutas, reivindicaram por educação aos seus membros,
pois consideravam que através do sistema educacional, poderiam perpetuar suas
ideologias e lutar contra a questão agrária brasileira. Assim, apesar da consistência de
uma luta recente, sua contribuição conseguiu reorganizar algumas questões
pedagógicos ao meio rural.
Nessa discussão, percebe-se que a Educação do Campo ocorreu a partir de
reivindicações de movimentos sociais camponeses, e que por serem constituídas pela
exclusão social e educacional, e o processo de ensino-aprendizagem nas escolas do
campo ser relegado ao plano secundário pelas esferas governamentais, possibilitou a
criação de debates que dessem visibilidade para os sujeitos pertencentes a esse
espaço.
Além disso, permitiu repensar as bases do campo brasileiro em seus aspectos
gerais, desde questões educacionais, como também cultural, produtivo e social, ou
seja, todos os elementos essenciais para os sujeitos na constituição enquanto seres
humanos. Porém, dentro dessa análise surge a questão de discutir a emancipação do
483
sujeito, enquanto indivíduo constituído por bases culturais e produtor de espaço, que
reafirma em seu território de ação, sua percepção de mundo e suas necessidades. Por
constituir grupos/movimentos sociais, que reivindicam por lutas que se encontram
distantes dos planos políticos, chamados de “movimentos minoritários”, surge a
necessidade de alterar as bases de exclusão social e política, transformando para uma
esfera cultural, a possibilitar a construção de práticas sociais mais igualitárias e
interculturais.
Nesse sentido, esse artigo tem como objetivo compreender a existência e
atuação dos sujeitos inseridos nas escolas do campo, indivíduos esses carregados
social e culturalmente a partir de suas práticas cotidianas, que criam espaços e
reproduzem suas bases humanas. De forma específica, possibilitar a visibilidade aos
sujeitos das comunidades escolares que desenvolvem educação do campo,
permitindo a emancipação social e a insurgência de sua cultura enquanto luta contrahegemônica.
De forma a contribuir buscou-se discussões levantadas por teóricos que
possam contribuir para essa questão. Inicialmente, realizaremos um levantamento da
construção histórica entre os movimentos sociais, que através de ações traçaram
planos de reivindicações por um sistema educacional de qualidade para seus
membros. Além disso, análise das políticas públicas, que regularizam perante a
legislação brasileira, essa educação diferenciada, que atende sujeitos do campo.
A discussão encaminha-se para um pensamento que proporcione debater
espaços para os excluídos/minorias, e da questão cultural dos indivíduos. Destes,
iniciamos com Alain Toiraine, em seus livros “Um novo paradigma: para compreender
o mundo de hoje” e “Iguais e Diferentes: podemos viver juntos?”; percebe-se também
a contribuição de Néstor García Canclini em seu trabalho “Diferentes, desiguais e
desconectados” e de Boaventura de Sousa Santos em “Renovar a teoria crítica e
reinventar a emancipação social”.
A
EDUCAÇÃO
DO
CAMPO:
QUESTÃO
POLÍTICO-PEDAGÓGICA
EM
CONSTRUÇÃO
Sua construção foi marcado por lutas diante de um sistema econômico vigente,
que priorizava a acumulação do capital em deterioração do social. Os Movimentos
Sociais, por outro lado, defendem que o campo perpassa o significado de
concentração espacial, correspondendo a um cenário de lutas/embates políticos,
sendo um espaço culturalmente construído, detentor de tradições, místicas e
costumes singulares (MORIGI, 2003, p.13-38).
484
Porém, com a precarização da educação no meio rural, o Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST), desenvolveu um sistema de ensino próprio, que
além dos aspectos pedagógicos das redes de ensino tradicionais, desenvolviam um
processo de aprendizagem carregado de significações, na busca da autonomia do
sujeito, construção da cidadania e da criticidade entre seus membros. (CALDART,
2012, p.331-337).
As “Escolas Itinerantes” como foram intituladas, tinham como finalidade atender
os sujeitos dos movimentos sociais (acampamentos e assentamentos), garantindo o
acesso a educação, para seus militantes em idade escolar, legalmente aprovadas pelo
Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul apenas em 19 de novembro de
1996.
A respeito das políticas publicas criadas para subsidiar o funcionamento da
Educação do Campo, percebe-se que sua criação remete a um tempo restrito, porém
com avanços substanciais para sua consolidação. Inicialmente, salientamos o período
de remodelamento estrutural da educação brasileira (a população rural) que ocorreu
no período de redemocratização brasileira, que culminou com a promulgação da
Constituição de 1988.
No ano de 1996, tem aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Lei n° 9394/96), que em seu Artigo 28, estabelece as seguintes
normas,
Na oferta da educação básica para a população rural, os sistemas de
ensino de ensino proverão as adaptações necessárias à sua
adequação, às peculiaridades da vida rural e de cada região,
especialmente: I- conteúdos curriculares e metodologia apropriada às
reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; IIorganização escolar própria, incluindo a adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; IIIadequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 1996).
Dentre
outras
conquistas,
o
movimento
conseguiu
promover
a
institucionalização, através do Conselho Nacional de Educação, das Diretrizes
Operacionais para Educação Básica nas Escolas do Campo no ano de 2002. Essa
criação surge surgem como marco da história da educação brasileira, que possibilita
orientar as práticas pedagógicas das Escolas do Campo, considerando que,
A Educação do Campo, tratada como educação rural na legislação
brasileira, tem um significado que incorpora os espaços da floresta,
da pecuária, das minas e da agricultura, mas os ultrapassa ao acolher
em si os espaços pesqueiro, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. O
campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não-urbano, é um
campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres
485
humanos com a própria produção das condições da existência social
e com as realizações de sociedade humana. (BRASIL, 2002).
No ano de 2007, é enviado ao Ministério de Educação e a Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) o Parecer CNE/CEB
N°23, que estabelece a “Consulta referente às orientações para o atendimento da
Educação do Campo”, que corresponde ao texto base para aprovação das
consideradas diretrizes complementares para a educação do Campo.
Após a aprovação desse Parecer N°23, no dia 12 de setembro de 2007, pelo
Ministério de Educação, Câmara de Educação Básica e Conselho de Educação
Básica, fica estabelecido as “diretrizes complementares, normas e princípios para o
desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do
Campo”, pela Resolução N°2, de 28 de abril de 2008, que define aspectos gerais e
complemento a Escolas localizadas no meio rural, que em seu Art. 7º, diz que a
A Educação do Campo deverá oferecer sempre o
indispensável apoio pedagógico aos alunos, incluindo
condições infra-estruturais adequadas, bem como materiais e
livros didáticos, equipamentos, laboratórios, biblioteca e áreas
de lazer e desporto, em conformidade com a realidade local e
as diversidades dos povos do campo, com atendimento ao art.
5º das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas
escolas do campo. (BRASIL, 2008).
Dentre as conquistas, observamos também a sua constituição enquanto
modalidade de ensino no Brasil, após a aprovação da Resolução N°4, no dia 13 de
julho de 2010, pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação,
que define “Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica”, que
quando visualizada a Seção IV, do Capítulo 2, que segmenta as Modalidades da
Educação Básica, podemos perceber aspectos sobre essa modalidade de ensino,
definida assim,
Art. 35. Na modalidade de Educação Básica do Campo, a educação
para a população rural está prevista com adequações necessárias às
peculiaridades da vida no campo e de cada região, definindo-se
orientações para três aspectos essenciais à organização da ação
pedagógica:
I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos estudantes da zona rural;
II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III – adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 2010) .
486
Apenas como consideração, devemos mencionar a respeito das contribuições
da Educação Popular para a definição teórica e prática da Educação do Campo.
Apesar de considerar essa educação como uma ensino não-formal, sua análise
educacional dinamiza essa questão, criando possibilidade de avanços pedagógicos.
Assim, devemos apropriar-se do conceito base da Educação Popular,
delimitado segundo Paludo (2012), que
A origem da concepção de educação popular, dessa forma, decorre
do modo de produção da vida em sociedade no capitalismo, na
América Latina e no Brasil, e emerge a partir das classes populares
ou dos trabalhadores mais empobrecidos na defesa de seus direitos,
dependendo da organização na qual se congregam, os trabalhadores
chegam inclusive a defender e a lutar pela construção de uma nova
ordem social. (PALUDO, 2012).
Dessa forma, a Educação Popular desenvolve-se no contexto da fuga do
capital, em que sua construção, partiu na contradição do próprio sistema capitalista.
Suas origens encontram-se interligadas a luta de classe e encontrou na educação,
dentro do contexto pedagógico, a possibilidade de avanço de sua expansão. Segundo
Paludo (2012), “a educação popular vai se firmando como teoria e prática educativas
alternativas às pedagogias e às práticas tradicionais e liberais (...)”.
Por fim, percebe-se que o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
compreende que existe uma ligação necessária entre a conquista da terra e da
educação. Também entende que a existência da terra não garante a fuga dos
trabalhadores da exploração, e que somente pelo viés educacional a escola também
não é capaz de libertar os sujeitos da expropriação e do latifúndio. Por isso, enfatizase que a Reforma Agrária é a junção dessas duas conquistas, ter acesso a terra, à
escola, ao conhecimento e à escolarização.
Entre essas lutas se retomam as solicitações pelo direito à educação pública e
em 1980, surgiram as primeiras discussões sobre educação do campo, através dos
movimentos sociais, que lutavam por uma política educacional que atendesse as
necessidades dos assentados da reforma agrária. A partir dessas articulações do MST
a nível nacional, que possibilitou o início da elaboração de uma proposta de escola
primeiramente para os assentamentos. Atualmente essa questão se expandiu e o
meio rural inicia-se um caminho de acesso as teorias definidas, alterando as bases
educacionais do meio rural.
Assim, a Educação do Campo como resultado de disputas territoriais e acesso
a educação de qualidade a todos os povos do campo, possibilitou rediscutir as
questões pedagógicas desenvolvidas no meio rural e encontrar soluções para as
lacunas existentes, criando políticas públicas, bem como reorganizando as estruturas
487
educacionais nas escolas que atendem indivíduos do campo brasileiro, alterando as
bases tradicionais.
SOCIOLOGIA
DAS
AUSÊNCIAS/EMERGÊNCIAS
E
INTERCULTURALISMO:
EMANCIPAÇÃO SOCIAL DOS SUJEITOS A PARTIR DAS ESCOLAS DO
CAMPO/EDUCAÇÃO DO CAMPO
Os povos do campo no território nacional, sempre corresponderem a grupos
independentes em suas ações que conduziam suas práticas cotidianas a partir de
seus hábitos e costumes, ou seja, construíam suas próprias bases culturais e
difundiam no espaço a partir de suas relações com o seu grupo social, ou na
aproximação de outros. Porém, a partir de inúmeras determinações e políticas
públicas, o campo sofreu profundas transformações, e tornou-se secundário na
agenda política nacional, sendo apenas objeto de ações de nível econômico, que
privilegiava o mercado externo brasileiro, em detrimento das culturas dos povos que
se localizavam no meio rural. (MORIGI, 2003, p.13-38).
Para alterar essas questões, surgem os movimentos sociais camponeses, que
preocupados com o direcionamento das questões agrárias, partem para uma luta, que
segundo Santos (2007), refere-se a uma luta contra-hegemônica. Nesse sentido, o
mesmo autor utiliza-se da expressão “Sociologia das Ausências”, salientando que
esse termo expressa de forma clara a existência de coisas que não existe apenas
como resultado de um processo onde reduzimos a realidade apenas para aquilo que
existe, sendo que o restante torna-se algo inexistente, sendo na verdade, apenas
ausentes.
Esse processo do que não existe, torna-se elemento invisível para a realidade
hegemônica do mundo, podendo ser figurada pela exemplificação dos movimentos
sociais, os mesmo que se propuseram em elaboração a Educação do Campo. Dentro
das Sociologias das Ausências, Santos (2007) elabora cinco modos de produção das
ausências, constituído como monoculturas, que produz a exclusão de conhecimentos
alternativos, descredibilizando todos os povos/grupos sociais organizados por esses
conhecimentos.
Destas existentes, os cincos modos de produção contribuem para justificar a
ausências dos movimentos sociais, bem como a educação do campo como secundário
no contexto educacional. A primeira é a “monocultura do saber e do rigor”,
considerando que apenas o conhecimento construído cientificamente fosse válido,
descartando e ignorando aquele construído socialmente que não possui aprovação
científica.
Isso,
corresponde
aos
conhecimentos
populares
e
aqueles
dos
488
camponeses, considerados como não relevante ou rigoroso pela cientificidade e tão
grato para a Educação do Campo, na qual em seu trabalho (diretrizes) busca resgatálos e aproveitá-los em suas práticas pedagógicas, como forma de contextualização do
saber e da cultura presente na comunidade escolar.
O segundo deles é a “monocultura do tempo linear”, como se a história tivesse
um sentido único e que os países desenvolvidos e sua organização estivesse sobre
tudo, em relação às formas de sociabilidade e as maneiras de estarem no mundo dos
países subdesenvolvidos. A Educação do Campo que busca seu espaço na esfera
política nacional e visibilidade, torna-se esse setor educacional semelhante a um país
subdesenvolvido considerado como simples e primitivo, que almeja alcançar as bases
e destaque do desenvolvido, representado pelo fazer educação urbana, considerado
como completo.
A terceira monocultura refere-se a “naturalização das diferenças”, considerando
que na sociedade existem diferenças entre os sujeitos, que provocam hierarquias
sociais. Porém, essas diferenciações correspondem ao resultado de um processo de
inferiorização de alguns grupos (composto por segmentações étnicas, sexuais e
raciais), pois quem não representa a hegemonia, tornam-se desiguais e inferiores. A
questão maior constitui que esse processo caracteriza-se como uma racionalidade
preguiçosa, tornando como uma alternativa de desqualificar o outro, naturalizando as
diferenças.
Isso pode ser percebido em relação aos povos do campo, que inferiorizados
perante as características do urbano brasileiro, suas diferenças sempre foram
consideradas habituais como algo secundário e normal. Porém, suas diferenças
devem ser consideradas como forma de igualdade enquanto sujeitos do mesmo
espaço social e político. Essas considerações revelam também o trabalho inferiorizado
realizado nas Escolas do Campo, pois sempre considerados como excluídos do
processo formal da sociedade, suas preocupações tornam-se distante da agenda
política nacional.
O quarto modo de produção corresponde a “monocultura da escala dominante”,
ou seja, que sempre haverá uma escala dominante sobre os elementos e coisas da
sociedade. Nesse segmento, as ausências são produzidas de forma que o particular e
o local (espaço invisível e desprezível) não possuem visibilidade em um contexto
global, sendo esse último considerado como hegemônico. Essa questão pode ser
observado em relação as prioridades governamentais realizadas para o campo, na
qual prevalece a questão do agronegócio e da produtividade, secularizando outros
aspectos presentes nesse espaço. Dentre esses se percebe a questão educacional e
489
da valorização cultural, que surgem como uma discussão de escala local e que
apresenta dificuldade em encontrar seu espaço de valorização no contexto maior.
O quinto e último modo de produção representa-se pela “monocultura da
produtivismo capitalista” na qual considera o trabalho humano e acumulação de capital
como único processo relevante na natureza. Assim, a lógica produtiva atual torna
representativa a partir do aumento vertiginoso da produtividade, com uso considerável
de insumos químicos e equipamentos agrícolas. Porém, a outra lógica de produção,
considera tanto o sujeito que produz com também a terra e a natureza, constituída
pelo seu tempo-espaço de produção, que não necessita de resultados em
produtividade, mas na forma na qual natureza possibilita. Esse modo de produção,
que corresponde aquele realizado pelos povos do campo, que possuem interligações
humanas e culturais com a natureza existente, e não apenas a partir de uma lógica de
produção.
Todas
as
cincos
formas
de
ausências
criam
modos
de
produção
(monoculturas) que segundo Santos (2007) geram a subtração do presente, excluindo
e descredibilizando muitas experiências sociais pertinentes e existentes no espaço,
valorizando apenas aquelas de credibilidade científicas e universais. Assim, a
Sociologia das Ausências, nas palavras de Santos (2007), surge como forma de tornar
objetos ausentes em objetos presentes, dando visibilidade para aqueles invisíveis.
Para isso é necessário substituir essa sociologia das “monoculturas” por “ecologias”,
de forma a inverter essa situação de desperdício e criar possibilidades de valorização
das “experiências ausentes se tornem presentes”.
Assim, a cada modo de produção apresentado buscou sua substituição por
ecologias apresentados por Santos (2007). A primeira representa a “ecologia dos
saberes”, que corresponde a realização de uma diálogo entre o saber científico, com o
saber popular e camponês, contrária as hierarquias abstratas do conhecimento. Essa
definição contribui para aproximar as teorias e legislações criadas a partir de um
conhecimento científico, com aqueles presentes no espaço social e construído
historicamente pelos sujeitos que compõe esse lugar, que necessitam serem ouvidos
e possam contribuir nas construções textuais.
A segunda corresponde a “ecologia das temporalidades” salientando que
apesar da existência de um tempo linear, há também outros tempos que devem ser
considerados como relevantes na construção social. Assim, cada forma de
sociabilidade deve ter sua própria temporalidade de ação, eliminando qualquer sentido
de residualidade, ou seja, os povos do campo devem manter sua própria dinâmica,
perpetuando sua continuidade.
490
A terceira enfoca a “ecologia do reconhecimento”, na qual propõe excluir as
hierarquias existentes e propor uma aproxima dos desiguais, mantendo as diferenças
a partir de um contexto ecológico, e não de exclusão. Possibilita aos sujeitos inseridos
nessa modalidade de ensino, exercer seus direitos perante a sociedade e constituir
agentes construtores de seu próprio espaço, responsáveis pela construção de sua
cultura.
A quarta é a “ecologia da transescala”, que possibilita uma articulação mútua
na definição de objetivos e iniciativas entre as escalas locais, nacionais e globais.
Trabalhos que possibilitem condições suficientes de movimentos locais poderem
tornar-se nacionais, como também de movimento nacionais conseguirem se articular e
contribuir para exemplos locais. Essa questão torna-se pertinente a Educação do
Campo, na qual os movimentos sociais camponeses locais buscam encontrar seu
espaço político-social no contexto nacional, principalmente para contribuir nas
definições das diretrizes educacionais para as escolas do campo, que muitas vezes
são textos distantes da realidade apresentadas.
Na última questão, a “ecologia das produtividades” promove a “recuperação e
valorização dos sistemas alternativos de produção” que contribui para dar visibilidade
e espaço para as minorias que historicamente foram secundários nesse processo. Isso
também possibilita os movimentos sociais camponeses lutar/reivindicar pelo acesso a
terra, contrariando as bases da modernização da agricultura. Nesse contexto,
podemos também utilizá-lo para recuperar evalorizar as culturas que se encontram
espacializada no campo brasileiro e que necessitam serem contextualizada nas
instituições escolares do campo.
Como resultado dessa “Sociologia das Ausências” Santos (2007) propõe ainda
a “Sociologia das Emergências”, que surge no intuito de possibilitar para as ausências
existente no presente, sinais de um futuro dinâmico, com possibilidades emergentes e
que ainda não adquiriram relevância pois ainda constituem “embriões”, ainda em
processo de construção. Isso possibilita a ampliação simbólica de forma a transformar
experiências disponíveis em experiências possíveis, aumentando a produção de
realidades.
No contexto das escolas do campo, quando da formação de uma determinada
instituição, percebe-se a confluência de sujeitos diversos, carregados de significações
e historicidade em sua formação enquanto indivíduo. Em um primeiro momento,
interpreta-se essa união de diversidade como reflexo apenas da aceitação das
diferenças em um mesmo lugar. Nesse sentido, Canclini (2009) menciona o termo
multicultural, para explicar esse fenômeno de aceitação das inúmeras culturas, como
sendo “justaposição de etnias ou grupos em uma cidade ou nação”, admitindo “a
491
diversidade de culturas, sublinhando sua diferença e propondo políticas relativistas”,
que devido a permanência de grupos isolados nesse aspecto, pode segregar e
provocar o comunitarismo, que segundo Touraine (2007) defini-se “em oposição a
cidadania”, o comunitarismo fere as “liberdades individuais”.
Touraine (1997) ainda contribui para explicar o comunitarismo como “um
movimento cultural, ou uma forma política, que criam, de maneira voluntarista, uma
comunidade eliminando aqueles que pertencem a uma outra cultura ou a uma outra
sociedade, ou então não aceitam o poder da elite dirigente”. Porém, percebe-se a
necessidade de ruptura da unidade comunitária de forma a possibilitar condições
modernas e grupos sociais. Porém, a escola do campo dentro da concepção da
Educação do Campo, busca além de uma mera aceitação da diversidade existente
entre seus sujeitos, mas uma aproximação com absorção de aspectos cultural
presentes nos grupos. Para Canclini (2009), a interculturalidade representa essa
questão e essa diversidade em adaptação, pois “remete à confrontação e ao
entrelaçamento, àquilo que sucede quando os grupos entram em relações e trocas”.
Para que haja trocas e conexões, os sujeitos pertencentes a esse espaço
devem socializar-se entre si, promovendo uma comunicação intercultural, essa
compreendida segundo Canclini (2009) “como relações interpessoais entre membros
de uma mesma sociedade ou de culturas diferentes, e, depois, abrangendo também
as comunicações entre sociedades distintas”. Ou seja, obrigatoriamente, a
comunicação deve ocorrer entre indivíduos, pois apenas no diálogo entre dois sujeitos
podem gerar transformações na forma de agir e de pensar, e refletir em seus hábitos e
costumes.
Dessa forma, a questão cultural encontra-se como objeto central de análise,
que pode ser observado entre os membros da comunidade escolar das Escolas do
Campo. Os sujeitos detentores de direitos sociais e políticos, também apresentam
direitos culturais, representados por uma coletividade. No caso das minorias presentes
nos estados, percebe-se que lutam por atributos de independência, defendendo seus
direitos
culturais,
particularmente
hábitos
e
costumes
(TOURAINE,
2007).
Direitos culturais, segundo a definição de Touraine (2007), que conduz as
democracias em debater e refletirem sobre sua própria existência e possam
transformar/reconhecer os seus direitos, possibilitando essa conquista a ser expandida
para os demais sujeitos sociais.
Essa questão encontra-se diretamente ligada aos direitos políticos e, dessa
forma, a cidadania. Porém, os direitos culturais não visam apenas a proteção da
diversidade social, mas que cada indivíduo, ou sua coletividade, possa construir e
transformar sua própria vida. Sujeitos, que segundo Touraine (1997) não pode ser
492
considerado/confundido apenas como indivíduo e que não encontra-se apenas como
elemento dinâmico de transformação de seu estado de consciência ou de
determinações sociais. Para a educação do campo, há uma interação, trocas, ganhos
e perdas de características na constituição desse sujeito inacabado, que garante sua
formação a partir de suas dúvidas/certezas, compostos por sua base social em
consonância com outros aspectos, promovendo a interculturalidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Educação do Campo constitui-se como projeto camponês de educação, que
surgiu a partir de lutas contra a hegemonia do capital sobre o campo, com intuito de
valorizar o conhecimento historicamente construído pelos sujeitos do campo. Também
delimitaos como um significado de resistência política e cultural do campesinato frente
ao avanço 

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