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CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Enviado por André Alcântara em 29.05.2012
RELATÓRIO DE CASO
Assunto: Homicídio de Adolescentes em Ocorrência Policial no dia 30/11/2012 no
bairro Demarchi de São Bernardo do Campo/SP
Vítimas: D.S. (RG 41.720.728 SSP/SP) e F.M.P (RG 41.721.069 SSP/SP)
Atendidos: J.V.S e C.M.C.S, e C.S.P. e V.M.S.P
Referência Oficial: Inquérito Policial nº 2103/2011 da 5ª Delegacia do DHPP – 3º
ECAD
HISTÓRICO
O Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – CEDECA da
Fundação Criança de São Bernardo do Campo no desenvolvimento de suas ações
visando garantir e defender os direitos da criança e do adolescente do município de
São Bernardo do Campo por intermédio do monitoramento e combate às violações e
da divulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente para a efetivação dos
direitos fundamentais, efetivou atendimento aos familiares dos adolescentes D.S. e
F.M.P. em decorrência da notícia veiculada no Diário do Grande ABC em
02/12/2011 acerca de eventual violação do direito à vida dos adolescentes em
ocorrência policial.
Conforme informações colhidas com os familiares, o fato ocorreu no dia
30/11/2011, por volta das 21h30min, na esquina da Av. Marina Servidei Demarchi e
a Rua Armando Backx, no Bairro Demarchi, em São Bernardo do Campo, quando os
citados adolescentes retornavam da escola em uma motocicleta de propriedade do
pai do adolescente F.M.P e foram abordados abruptamente por policiais militares
que dispararam contra os adolescentes ocasionando a morte destes.
Em 20/12/2011 o pai do adolescente F.M.P, Sr. C.S.P., prestou declarações
para a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, informando que “(...)o casal
que presenciou os fatos afirmou que F.M.P e o amigo foram ‘derrubados’ pela
viatura(...)” e que “(...) F. nunca sequer pegou numa arma e sempre foi trabalhador,
fato que poderá ser confirmado por todos os vizinhos e quando perguntado sobre a
ciência do filho sobre a possibilidade de apreensão do veículo (moto), respondeu
que poderia existir a possibilidade de F.M.P tentar evadir-se da abordagem para
evitar a apreensão da moto porque a motocicleta já foi apreendida em data anterior,
mas nunca teria coragem de praticar crime qualquer(...)”, conforme termo de
declaração.
Em 26/01/2012 o pai do adolescente D.S., Sr. J.V.S compareceu no CEDECA e
prestou declaração informando que “Segundo informação recebida, seu filho D.S
estava vivo quando pediu para o amigo avisar pra mãe procurá-lo no Pronto Socorro
(PS) Central, pois os ‘polícia iriam zuá-lo’”, mas na noite dos fatos seu filho foi levado
à Unidade de Pronto Atendimento – UPA Jd. N. Sa. de Fátima, sendo que “uma
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pessoa desconhecida que estava no hospital relatou que era pra família ‘meter a
boca no trombone, pois os policiais mataram F.M.P e levaram o D.S para local
desconhecido e possivelmente seria morto também’”; informou ainda que “com o
Boletim de Ocorrência em mãos dirigiu-se para a UPA a fim de ver o corpo do filho,
sendo-lhe inicialmente negado. Após insistir e afirmar veementemente que era o pai
e tinham o dever de entregarem o corpo de seu filho, consegui vê-lo. Apesar do
choque, viu detalhes no corpo, observando que o filho recebeu 04 tiros pelas
costas”; ainda “salienta que era período de provas e o horário de término era as
21h40, próximo ao horário da ocorrência. Salienta que seu filho foi para escola,
sendo possível confirmar a presença na escola”, conforme termo de declaração.
Em relação aos fatos foi registrado o boletim de ocorrência nº 10521/2011 no 3º
Distrito Policial de São Bernardo do Campo cuja comunicação ocorreu em
1º/12/2012, as 3h45, descrevendo que “os indivíduos (adolescentes) envolveram-se
em ocorrência de resistência seguida de morte e foram feridos fatalmente,
encontrando-se os corpos dos autores (adolescentes) nos hospitais UPA Demarchi e
outro corpo no PSM Central”, conforme BO. A autoridade policial local, Dr. Marlon
Alves Guimarães, acionou o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa DHPP da Polícia Civil do Estado de São Paulo, conforme regulamento expedido pela
Secretaria de Estado de Segurança Público do Estado de São Paulo – Resolução
SSP/SP nº 045, de 06/04/2011 e Portaria DGP nº 20, de 14/04/12.
Desta forma, foi registrado o RDO nº 257/2011 e instaurado o Inquérito Policial
nº 2103/2011 em 1º/12/2011 pela autoridade policial do DHPP – Divisão de
Homicídios, Dr. Maurício A A Luyten, visando esclarecimento acerca das
circunstâncias dos fatos comunicados pela autoridade policial do 3º DP de SBC,
relatando que “policiais militares em serviço afirmaram ter sido agredidos a tiros por
D.S. e F.M.P, durante abordagem de rotina e, na reação a tal agressão, acabaram
por ferir mortalmente ambos os autores”, conforme portaria de instauração.
As famílias dos adolescentes ao tomarem ciência da atuação da Fundação
Criança de São Bernardo do Campo neste segmento, buscou atendimento face à
indignação pela morte de seus filhos que eram estudantes e trabalhavam, não
possuindo qualquer registro pretérito que indicassem e/ou sugerissem o
envolvimento de ambos em práticas delituosas. Foram outorgados poderes ao
CEDECA da Fundação Criança pelos genitores dos referidos adolescentes, a fim de
cumprir as exigências formais para a efetivação do direito à informação e obtenção
de documentos, nos termos do artigo 5º, XXXIII e XXXIV da Constituição Federal.
Diante dos fatos relatados pelos familiares, em 17/01/2012 foram encaminhados
pedidos de providências para os órgãos dos Sistemas de Justiça, de Segurança
Pública e Direitos Humanos - Coordenadoria da Infância e da Juventude do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), Coordenadoria de Direitos Humanos do
Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), Conselho Estadual dos Diretos
da Pessoa Humana do Estado de São Paulo (CONDEPE), Comissão de Defesa dos
Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais
da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República (SDH/PR) e Conselho Nacional dos Direitos
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da Criança e do Adolescente (CONANDA) - requerendo-se a devida apuração da
ocorrência e eventual responsabilização dos autores.
Em seguida, foram requeridas cópias dos prontuários médico dos adolescentes,
os quais comprovam que o adolescente D.S. deu entrada na UPA Demarchi Batistini
no dia 30/11/11, as 21h40, não identificado (desconhecido), “apresentava 4
ferimentos na região torácica anterior + dois braço E + dois no ombro E, admitido já
em óbito”, “paciente deu entrada em óbito, trazido pela PM, Força Tática, Viat =
M40012”, conforme ficha de atendimento ambulatorial, guia de encaminhamento de
corpos e formulário de classificação de risco elaborados pelo médico Dr. Guilherme
Z. Cardillo. Em relação ao adolescente F.M.P consta na ficha de atendimento
ambulatorial e demais documentos médicos datado de 30/11/2011, as 21h48, que foi
“vítima de múltipos FAF´s, trazido pela polícia, na viatura (...) 2 em hemitórax E, 1
em hemitorax D, 2 em cotovelo, projétil alojado em subcutâneo no precárdio (...)
constatado óbito às 21h57”, conforme documentos elaborados pela médica Dra.
Eliane Hwang .
Os laudos de exame de corpo de delito – necroscópico de ambos adolescentes
nº 392 e 393/11, elaborados pelo médico legista Dr. Norberto Pieri da
Superintendência da Polícia Técnico-Científica em 1º /12/2011, confirmam que eles
foram mortos em decorrência dos ferimentos ocasionados por projeteis de armas de
fogos, demonstrando que: o adolescente D.S foi vitimado por 05 balas, sendo que
03 balas atingiram-no na direção da frente para trás e 02 na direção de trás para
frente, confirmando ainda que a vítima não utilizava substâncias psicotrópicas ou
alcoólicas; o adolescente F.M.P foi vitimado por 04 balas, sendo que 03 balas
atingiram-no na direção de trás para frente e 01 na direção de frente para trás,
confirmando ainda que a vítima não utilizava substâncias psicotrópicas ou
alcoólicas.
E ainda, o laudo do exame em projétil nº 02/140/03.175/2012 elaborado pela
perita criminal Dra. Fabiana Paiva Pires Grasso do Núcleo de Balística do Instituto
de Criminalística em 09/01/2012, demonstram que os projeteis retirados da vítima
D.S foram disparados por arma de fogo do calibre nominal .40 S&W, artefato típico
de uso policial.
No exame do local dos fatos, Laudo nº 01/030/70822/2011, elaborado pela perita
criminal Dra. Renata Gaeta Preti Moraes em 1º /12/11 constatou-se que a
motocicleta encontra-se tombada sobre a guia do passeio, próximo a esquina da Al
das Oliveiras com a R. Armando Back, havia ainda 06 estojos deflagrados, calibre
.40, distribuídos aleatoriamente sobre a via, próximos à motocicleta, sangue
próximos a motocicleta e 02 capacetes próximos a motocicleta. A motocicleta
modelo Titan, vermelha, placas DLW3235, SBC, estava com os sistemas de
segurança (elétrico, direção e freios) funcionando.
No laudo residuográfico nº 02/110/70.830/2011, elaborado pela perita criminal
Dra. Débora Rose de Oliveira, constatou-se que não foram detectados resíduos de
chumbos nas mãos dos policiais relacionados na Boletim de Ocorrência, PM H.S. e
PM A.F.C, bem como os adolescentes D.S. e F.M.P (identificado como
desconhecido).
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Salienta-se que também foi obtido junto à unidade escolar EE “Dr. Francisco
Emygdio Pereira Neto” cópia da atividade escolar realizadas no dia 30/11/2011 pelo
adolescente D.S, recebendo inclusive nota satisfatória, a fim de colaborar com os
relatos dos familiares que os adolescentes foram surpreendidos pelos policiais logo
após saíram da escola no trajeto de retorno ao lar.
Diante das comunicações realizadas aos órgãos oficiais, a Coordenadoria de
Direitos Humanos do Ministério Público respondeu o ofício da Fundação Criança
informando que foram encaminhados para conhecimento e providências para a
Promotoria de Justiça Criminal de SBC, Promotoria de Justiça da Infância e
Juventude – Área Menores Infratores de SBC, Promotoria de Justiça do CAO-Crim e
Promotoria de Justiça Militar, conforme ofícios datados de 27/12/11. Outrossim, em
06/03/2012 foi emitido ofício pela referida Coordenadoria de Direitos Humanos do
MPSP informando que a autuação da Reclamação nº 3272/2012-CDCP/CP inclusa
no Feito nº 63.537/12, encaminhada à 4ª Auditoria da Justiça Militar, conforme
comunicação do Juiz de Direito Corregedor Permanente datada de 09/02/2012.
Assim, diante de toda a documentação acima mencionada, foi realizado
diligência pelo CEDECA ao Fórum Criminal de São Bernardo do Campo em
15/03/2012, mas nada foi encontrado em pesquisas realizadas no Distribuidor do
Forum. E ainda, na mesma data foram realizadas pesquisas junto ao Ministério
Público atuante na municipalidade sendo constatado que nenhuma informação
oficial chegou à Promotoria de Justiça atuante na Vara do Tribunal do Júri de São
Bernardo do Campo, estabelecendo contato direto com a promotora de justiça Dra.
Thelma, que informou seu desconhecimento sobre o caso, apesar dos esforços da
nobre promotora em obter informação junto à polícia judiciária, orientando a equipe a
procurar o inquérito policial na Vara da Infância e Juventude de São Bernardo do
Campo e no DHPP, a fim de entender o porquê da não remessa do inquérito policial
à comarca de São Bernardo do Campo.
Também foi constatado que a Dra. Vera Lúcia Acayaba de Toledo, promotora de
Justiça da Vara da Infância e Juventude de SBC, encaminhou o expediente
contendo apenas o ofício da Coordenadoria de Direitos Humanos do MP e da
Fundação Criança de SBC para a Promotoria Criminal de SBC, pois não se tratava
de matéria de sua competência. Portanto, foi verificado que os expedientes – sem a
documentação policial – estão na Promotoria Criminal e aguardava pela análise do
promotor substituto para providências, vez que o titular estava em férias.
Da mesma forma, no dia 17/04/2012 foi realizada diligência ao Departamento de
Homicídios e Proteção da Pessoa – DHPP, na 3º ECAD, sendo atendidos
inicialmente pelo agente policial Luciano e pela Delegada Dra. Cíntia, que de forma
solícita informou que o inquérito policial nº 2103/2011 havia sido encaminhado para
a Comarca de Santo André na data de 18/01/2012 para solicitação de prazo, não
tendo retornado até aquela data, conforme protocolo de remessa. Na mesma
oportunidade, por intermédio de ligação telefônica (11) 4435-6889, contato com a
Sra. Lilian, não obtivemos êxito em confirmar o recebimento da remessa policial
junto ao Ofício de Distribuição Judicial de Santo André, mas em 23/04/2012 foi
informado que o expediente criminal foi encaminhado pelo malote em 25/01/2012 ao
Ofício de Distribuição Judicial de São Bernardo do Campo.
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Enfim, na iminência da perda dos depoimentos das testemunhas presenciais do
fato e diante da ausência de instauração processual, foram colhidos termo de
declarações de 02 testemunhas na Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo,
preservando-se a sua identificação a pedido das mesmas. Há ainda reportagem
veiculado no jornal televisivo da Rede Record.
Cumpre-nos esclarecer que o CEDECA realiza o acompanhamento das famílias
das vítimas, proporcionando o suporte psíquico, jurídico e social em relação ao
evento supramencionado. Os familiares são continuamente atendimentos no referido
serviço da Fundação, sendo orientados acerca dos possíveis e necessárias
providências frente aos órgãos do Sistema de Justiça e Segurança Pública, inclusive
correcionais, a fim de prosperar a efetiva apuração e a prestação dos serviços
públicos, considerando as normas vigentes no Estado Democrático de Direito.
É a breve síntese dos fatos.
DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS INFRACONSTITUCIONAIS VIOLADOS
Indiscutível o direito aqui preconizado, vez que se trata de crime praticado contra
a vida, sendo os familiares privados do direito de descobrir a realidade dos fatos e
de obter o acesso à justiça, vez que o inquérito policial, que visa elucidar os fatos ao
menos na fase policial, não foi concluído no prazo legal (30 dias), tampouco foi
localizado fisicamente nos diversos órgãos consultados.
Nesse sentido o artigo 5º da Constituição Federal que elenca os direitos tidos
como fundamentais à dignidade da pessoa humana estabelece que a vida é um
direito indisponível, devendo ser ela protegida pelo Estado, uma vez que assim
assegurada pela Carta Magna. Vejamos:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade (...). [grifos nossos].
Do mesmo modo, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto San
José da Costa Rica) prevê em seu artigo 4º o direito à vida:
§1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse
direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da
concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.
[grifos nossos].
No Brasil, tendo se verificado a ocorrência de morte o fato deveria ser apurado
por meio de inquérito policial, o qual de acordo com o art. 10 do Código de Processo
Penal deve ser concluído no prazo de 30 (trinta) dias, sendo, posteriormente,
enviado ao juiz competente. Vejamos:
Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o
indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso
preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em
que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias,
quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela. [grifos nossos]
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Ora, até a presente data o inquérito policial não foi concluído, sequer foi
localizado. Apesar da Portaria da Secretaria de Segurança Pública do Estado de
São Paulo determinar que os delitos de “resistência seguida de morte” devem ser
apurados pelo DHPP, nota-se que o Ministério Público, enquanto fiscal da lei e titular
da ação penal, sequer foi noticiado ou manifestou-se em relação à lisura e
fiscalização da apuração, deixando a ação penal à deriva da sorte e às
determinações dos órgãos policiais em apuração de eventual crime praticado por
policiais no exercício da profissão.
Ademais, apesar das críticas apontadas em relação ao Ministério Público,
verifica-se também que a autoridade policial encarregada das apurações não possui
a estrutura necessária para a apuração ou deixou de realizar atividade inerente à
sua função, qual seja, encaminhar o Inquérito Policial - IP para a Comarca correta,
conforme normas de competência criminal previstas no Código de Processo Penal.
No caso em voga, o IP foi remetido à Comarca de Santo André (que ao percebê-lo
remeteu para São Bernardo do Campo), não tendo sido solicitada a sua devolução
para a autoridade policial desde 18/01/2012, ou seja, há mais de 3 (três) meses.
Conforme determina a Constituição Federal a competência para julgamento de
crimes contra a vida pertence ao Tribunal do Júri, sendo garantido que em caso de
lesão de direito a prestação jurisdicional é inafastavel. Entretanto, até o presente
momento, os homicídios foram apenas autuados na repartição policial, nem sequer
chegando ao conhecimento do Poder Judiciário ou ao Ministério Público, que apesar
das notícias veiculas na imprensa, aguardam o cumprimento da oficialidade em
detrimento do direito a vida e à justiça.
Na prestação dos serviços públicos deve os agentes respeitar e cumprir as
determinações normativas, atuando sempre em observâncias aos ditames
constitucionais e responsabilizando os agentes que deixarem de cumprir suas
obrigações. A Administração Pública, por intermédio de seus agentes, no exercício
de seus poderes e na prestação dos serviços públicos deve atentar-se aos princípios
administrativos previstos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, sendo eles,
a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência.
No caso em voga, a eficiência demonstra-se deficiente tanto pela ausência de
mecanismos de controle e monitoramente da atividade policial, quando pela
ausência de empenho dos agentes na administração do serviço de apuração de
crime contra a vida – recordamos que a vida e a dignidade são bens mais valiosos
para todos os cidadãos. Tal constatação, também viola a garantia fundamental dos
familiares dos mortos em obter, no âmbito judicial e administrativo, a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (art.
5º, LXXVIII, CF).
Neste sentido, deparamo-nos com a ausência direta do Ministério Público,
sobretudo do Ministério Público do Tribunal do Júri na Comarca de São Bernardo do
Campo na apuração de crime contra a vida (homicídio), especialmente em relação à
fiscalização do serviço policial visando evitar a morosidade nas apurações da
autoridade policial e nas tramitações processuais do serviço judicial.
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É sabido que o Ministério Público, agindo como fiscal da lei deve acompanhar o
feito, promovendo todas as diligências necessárias no tocante ao descobrimento da
verdade. São expressas e objetivas as funções conferidas ao Ministério Público pela
Constituição Federal:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
(...)
VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei
complementar mencionada no artigo anterior;
VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito
policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações
processuais;
Colaborando a sistemática constitucional acerca das atribuições do Ministério
Público, o Código de Processo Penal em seu artigo 257 prevê que:
Ao Ministério Público cabe:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma
estabelecida neste Código; e
II - fiscalizar a execução da lei.
Apesar das dificuldades na busca dos esclarecimentos dos fatos e da justiça, os
familiares dos adolescentes vitimados na ocorrência policial acreditam nas
instituições do Estado Democrático de Direito e aguardam que as aparentes
“inércias” sejam superadas. Por isto, recorrem às diversas instâncias e poderes do
Estado para ver seu apelo atendido.
Por fim, registra-se que a ausência de fiscalização dos serviços públicos
ocasiona grave violação à cidadania e à dignidade da pessoa humana, facilitando a
prática da seletividade de casos por parte dos agentes públicos, fazendo com que
um adolescente acusado pela prática de ato infracional seja brevemente apreendido
e “punido” enquanto que agentes de segurança do Estado envolvidos em crime
contra a vida sequer seja devidamente apurado, sendo este o principal desafio
apresentado.
DOS ENCAMINHAMENTOS
Diante de todo o exposto, e com base na legislação supracitada, necessário se
faz a comunicação aos órgãos de gestão e correcionais superiores conclamando-se
pela celeridade. E ainda, diante da violação de direito previsto na Convenção
Interamericana de Direitos Humanos somado à demora na apuração dos fatos pelos
serviços públicos de segurança e justiça é possível apresentar queixa na Comissão
Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado Brasileiro, nos termos do artigo
44 da referida Convenção, para que as garantias dos diversos diplomas e
instrumentos legais supracitados sejam plenamente efetivadas para os familiares
dos adolescentes D.S. e F.M.P.
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Em tempo, reitera-se que desde o conhecimento da violação aqui narrada, a
Fundação Criança acionou os diversos órgãos judiciais de garantia de direitos para
que fossem ouvidas duas testemunhas presenciais dos fatos, mas diante da inércia
dos órgãos que integram o Sistema de Justiça e o Sistema de Segurança Pública na
realização das oitivas, estas foram realizadas pela Ouvidoria da Polícia do Estado de
São Paulo, a fim de garantir o registro probatório, essencial à elucidação da
verdade.
São Bernardo do Campo, 07 de maio de 2012.
ARIEL DE CASTRO ALVES
Diretor Presidente
ANDRÉ FEITOSA ALCÂNTARA
Coordenador do CEDECA
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