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CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Enviado por André Alcântara em 29.05.2012 RELATÓRIO DE CASO Assunto: Homicídio de Adolescentes em Ocorrência Policial no dia 30/11/2012 no bairro Demarchi de São Bernardo do Campo/SP Vítimas: D.S. (RG 41.720.728 SSP/SP) e F.M.P (RG 41.721.069 SSP/SP) Atendidos: J.V.S e C.M.C.S, e C.S.P. e V.M.S.P Referência Oficial: Inquérito Policial nº 2103/2011 da 5ª Delegacia do DHPP – 3º ECAD HISTÓRICO O Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – CEDECA da Fundação Criança de São Bernardo do Campo no desenvolvimento de suas ações visando garantir e defender os direitos da criança e do adolescente do município de São Bernardo do Campo por intermédio do monitoramento e combate às violações e da divulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente para a efetivação dos direitos fundamentais, efetivou atendimento aos familiares dos adolescentes D.S. e F.M.P. em decorrência da notícia veiculada no Diário do Grande ABC em 02/12/2011 acerca de eventual violação do direito à vida dos adolescentes em ocorrência policial. Conforme informações colhidas com os familiares, o fato ocorreu no dia 30/11/2011, por volta das 21h30min, na esquina da Av. Marina Servidei Demarchi e a Rua Armando Backx, no Bairro Demarchi, em São Bernardo do Campo, quando os citados adolescentes retornavam da escola em uma motocicleta de propriedade do pai do adolescente F.M.P e foram abordados abruptamente por policiais militares que dispararam contra os adolescentes ocasionando a morte destes. Em 20/12/2011 o pai do adolescente F.M.P, Sr. C.S.P., prestou declarações para a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, informando que “(...)o casal que presenciou os fatos afirmou que F.M.P e o amigo foram ‘derrubados’ pela viatura(...)” e que “(...) F. nunca sequer pegou numa arma e sempre foi trabalhador, fato que poderá ser confirmado por todos os vizinhos e quando perguntado sobre a ciência do filho sobre a possibilidade de apreensão do veículo (moto), respondeu que poderia existir a possibilidade de F.M.P tentar evadir-se da abordagem para evitar a apreensão da moto porque a motocicleta já foi apreendida em data anterior, mas nunca teria coragem de praticar crime qualquer(...)”, conforme termo de declaração. Em 26/01/2012 o pai do adolescente D.S., Sr. J.V.S compareceu no CEDECA e prestou declaração informando que “Segundo informação recebida, seu filho D.S estava vivo quando pediu para o amigo avisar pra mãe procurá-lo no Pronto Socorro (PS) Central, pois os ‘polícia iriam zuá-lo’”, mas na noite dos fatos seu filho foi levado à Unidade de Pronto Atendimento – UPA Jd. N. Sa. de Fátima, sendo que “uma Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE pessoa desconhecida que estava no hospital relatou que era pra família ‘meter a boca no trombone, pois os policiais mataram F.M.P e levaram o D.S para local desconhecido e possivelmente seria morto também’”; informou ainda que “com o Boletim de Ocorrência em mãos dirigiu-se para a UPA a fim de ver o corpo do filho, sendo-lhe inicialmente negado. Após insistir e afirmar veementemente que era o pai e tinham o dever de entregarem o corpo de seu filho, consegui vê-lo. Apesar do choque, viu detalhes no corpo, observando que o filho recebeu 04 tiros pelas costas”; ainda “salienta que era período de provas e o horário de término era as 21h40, próximo ao horário da ocorrência. Salienta que seu filho foi para escola, sendo possível confirmar a presença na escola”, conforme termo de declaração. Em relação aos fatos foi registrado o boletim de ocorrência nº 10521/2011 no 3º Distrito Policial de São Bernardo do Campo cuja comunicação ocorreu em 1º/12/2012, as 3h45, descrevendo que “os indivíduos (adolescentes) envolveram-se em ocorrência de resistência seguida de morte e foram feridos fatalmente, encontrando-se os corpos dos autores (adolescentes) nos hospitais UPA Demarchi e outro corpo no PSM Central”, conforme BO. A autoridade policial local, Dr. Marlon Alves Guimarães, acionou o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa DHPP da Polícia Civil do Estado de São Paulo, conforme regulamento expedido pela Secretaria de Estado de Segurança Público do Estado de São Paulo – Resolução SSP/SP nº 045, de 06/04/2011 e Portaria DGP nº 20, de 14/04/12. Desta forma, foi registrado o RDO nº 257/2011 e instaurado o Inquérito Policial nº 2103/2011 em 1º/12/2011 pela autoridade policial do DHPP – Divisão de Homicídios, Dr. Maurício A A Luyten, visando esclarecimento acerca das circunstâncias dos fatos comunicados pela autoridade policial do 3º DP de SBC, relatando que “policiais militares em serviço afirmaram ter sido agredidos a tiros por D.S. e F.M.P, durante abordagem de rotina e, na reação a tal agressão, acabaram por ferir mortalmente ambos os autores”, conforme portaria de instauração. As famílias dos adolescentes ao tomarem ciência da atuação da Fundação Criança de São Bernardo do Campo neste segmento, buscou atendimento face à indignação pela morte de seus filhos que eram estudantes e trabalhavam, não possuindo qualquer registro pretérito que indicassem e/ou sugerissem o envolvimento de ambos em práticas delituosas. Foram outorgados poderes ao CEDECA da Fundação Criança pelos genitores dos referidos adolescentes, a fim de cumprir as exigências formais para a efetivação do direito à informação e obtenção de documentos, nos termos do artigo 5º, XXXIII e XXXIV da Constituição Federal. Diante dos fatos relatados pelos familiares, em 17/01/2012 foram encaminhados pedidos de providências para os órgãos dos Sistemas de Justiça, de Segurança Pública e Direitos Humanos - Coordenadoria da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), Coordenadoria de Direitos Humanos do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), Conselho Estadual dos Diretos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo (CONDEPE), Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) e Conselho Nacional dos Direitos Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE da Criança e do Adolescente (CONANDA) - requerendo-se a devida apuração da ocorrência e eventual responsabilização dos autores. Em seguida, foram requeridas cópias dos prontuários médico dos adolescentes, os quais comprovam que o adolescente D.S. deu entrada na UPA Demarchi Batistini no dia 30/11/11, as 21h40, não identificado (desconhecido), “apresentava 4 ferimentos na região torácica anterior + dois braço E + dois no ombro E, admitido já em óbito”, “paciente deu entrada em óbito, trazido pela PM, Força Tática, Viat = M40012”, conforme ficha de atendimento ambulatorial, guia de encaminhamento de corpos e formulário de classificação de risco elaborados pelo médico Dr. Guilherme Z. Cardillo. Em relação ao adolescente F.M.P consta na ficha de atendimento ambulatorial e demais documentos médicos datado de 30/11/2011, as 21h48, que foi “vítima de múltipos FAF´s, trazido pela polícia, na viatura (...) 2 em hemitórax E, 1 em hemitorax D, 2 em cotovelo, projétil alojado em subcutâneo no precárdio (...) constatado óbito às 21h57”, conforme documentos elaborados pela médica Dra. Eliane Hwang . Os laudos de exame de corpo de delito – necroscópico de ambos adolescentes nº 392 e 393/11, elaborados pelo médico legista Dr. Norberto Pieri da Superintendência da Polícia Técnico-Científica em 1º /12/2011, confirmam que eles foram mortos em decorrência dos ferimentos ocasionados por projeteis de armas de fogos, demonstrando que: o adolescente D.S foi vitimado por 05 balas, sendo que 03 balas atingiram-no na direção da frente para trás e 02 na direção de trás para frente, confirmando ainda que a vítima não utilizava substâncias psicotrópicas ou alcoólicas; o adolescente F.M.P foi vitimado por 04 balas, sendo que 03 balas atingiram-no na direção de trás para frente e 01 na direção de frente para trás, confirmando ainda que a vítima não utilizava substâncias psicotrópicas ou alcoólicas. E ainda, o laudo do exame em projétil nº 02/140/03.175/2012 elaborado pela perita criminal Dra. Fabiana Paiva Pires Grasso do Núcleo de Balística do Instituto de Criminalística em 09/01/2012, demonstram que os projeteis retirados da vítima D.S foram disparados por arma de fogo do calibre nominal .40 S&W, artefato típico de uso policial. No exame do local dos fatos, Laudo nº 01/030/70822/2011, elaborado pela perita criminal Dra. Renata Gaeta Preti Moraes em 1º /12/11 constatou-se que a motocicleta encontra-se tombada sobre a guia do passeio, próximo a esquina da Al das Oliveiras com a R. Armando Back, havia ainda 06 estojos deflagrados, calibre .40, distribuídos aleatoriamente sobre a via, próximos à motocicleta, sangue próximos a motocicleta e 02 capacetes próximos a motocicleta. A motocicleta modelo Titan, vermelha, placas DLW3235, SBC, estava com os sistemas de segurança (elétrico, direção e freios) funcionando. No laudo residuográfico nº 02/110/70.830/2011, elaborado pela perita criminal Dra. Débora Rose de Oliveira, constatou-se que não foram detectados resíduos de chumbos nas mãos dos policiais relacionados na Boletim de Ocorrência, PM H.S. e PM A.F.C, bem como os adolescentes D.S. e F.M.P (identificado como desconhecido). Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Salienta-se que também foi obtido junto à unidade escolar EE “Dr. Francisco Emygdio Pereira Neto” cópia da atividade escolar realizadas no dia 30/11/2011 pelo adolescente D.S, recebendo inclusive nota satisfatória, a fim de colaborar com os relatos dos familiares que os adolescentes foram surpreendidos pelos policiais logo após saíram da escola no trajeto de retorno ao lar. Diante das comunicações realizadas aos órgãos oficiais, a Coordenadoria de Direitos Humanos do Ministério Público respondeu o ofício da Fundação Criança informando que foram encaminhados para conhecimento e providências para a Promotoria de Justiça Criminal de SBC, Promotoria de Justiça da Infância e Juventude – Área Menores Infratores de SBC, Promotoria de Justiça do CAO-Crim e Promotoria de Justiça Militar, conforme ofícios datados de 27/12/11. Outrossim, em 06/03/2012 foi emitido ofício pela referida Coordenadoria de Direitos Humanos do MPSP informando que a autuação da Reclamação nº 3272/2012-CDCP/CP inclusa no Feito nº 63.537/12, encaminhada à 4ª Auditoria da Justiça Militar, conforme comunicação do Juiz de Direito Corregedor Permanente datada de 09/02/2012. Assim, diante de toda a documentação acima mencionada, foi realizado diligência pelo CEDECA ao Fórum Criminal de São Bernardo do Campo em 15/03/2012, mas nada foi encontrado em pesquisas realizadas no Distribuidor do Forum. E ainda, na mesma data foram realizadas pesquisas junto ao Ministério Público atuante na municipalidade sendo constatado que nenhuma informação oficial chegou à Promotoria de Justiça atuante na Vara do Tribunal do Júri de São Bernardo do Campo, estabelecendo contato direto com a promotora de justiça Dra. Thelma, que informou seu desconhecimento sobre o caso, apesar dos esforços da nobre promotora em obter informação junto à polícia judiciária, orientando a equipe a procurar o inquérito policial na Vara da Infância e Juventude de São Bernardo do Campo e no DHPP, a fim de entender o porquê da não remessa do inquérito policial à comarca de São Bernardo do Campo. Também foi constatado que a Dra. Vera Lúcia Acayaba de Toledo, promotora de Justiça da Vara da Infância e Juventude de SBC, encaminhou o expediente contendo apenas o ofício da Coordenadoria de Direitos Humanos do MP e da Fundação Criança de SBC para a Promotoria Criminal de SBC, pois não se tratava de matéria de sua competência. Portanto, foi verificado que os expedientes – sem a documentação policial – estão na Promotoria Criminal e aguardava pela análise do promotor substituto para providências, vez que o titular estava em férias. Da mesma forma, no dia 17/04/2012 foi realizada diligência ao Departamento de Homicídios e Proteção da Pessoa – DHPP, na 3º ECAD, sendo atendidos inicialmente pelo agente policial Luciano e pela Delegada Dra. Cíntia, que de forma solícita informou que o inquérito policial nº 2103/2011 havia sido encaminhado para a Comarca de Santo André na data de 18/01/2012 para solicitação de prazo, não tendo retornado até aquela data, conforme protocolo de remessa. Na mesma oportunidade, por intermédio de ligação telefônica (11) 4435-6889, contato com a Sra. Lilian, não obtivemos êxito em confirmar o recebimento da remessa policial junto ao Ofício de Distribuição Judicial de Santo André, mas em 23/04/2012 foi informado que o expediente criminal foi encaminhado pelo malote em 25/01/2012 ao Ofício de Distribuição Judicial de São Bernardo do Campo. Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Enfim, na iminência da perda dos depoimentos das testemunhas presenciais do fato e diante da ausência de instauração processual, foram colhidos termo de declarações de 02 testemunhas na Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, preservando-se a sua identificação a pedido das mesmas. Há ainda reportagem veiculado no jornal televisivo da Rede Record. Cumpre-nos esclarecer que o CEDECA realiza o acompanhamento das famílias das vítimas, proporcionando o suporte psíquico, jurídico e social em relação ao evento supramencionado. Os familiares são continuamente atendimentos no referido serviço da Fundação, sendo orientados acerca dos possíveis e necessárias providências frente aos órgãos do Sistema de Justiça e Segurança Pública, inclusive correcionais, a fim de prosperar a efetiva apuração e a prestação dos serviços públicos, considerando as normas vigentes no Estado Democrático de Direito. É a breve síntese dos fatos. DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS INFRACONSTITUCIONAIS VIOLADOS Indiscutível o direito aqui preconizado, vez que se trata de crime praticado contra a vida, sendo os familiares privados do direito de descobrir a realidade dos fatos e de obter o acesso à justiça, vez que o inquérito policial, que visa elucidar os fatos ao menos na fase policial, não foi concluído no prazo legal (30 dias), tampouco foi localizado fisicamente nos diversos órgãos consultados. Nesse sentido o artigo 5º da Constituição Federal que elenca os direitos tidos como fundamentais à dignidade da pessoa humana estabelece que a vida é um direito indisponível, devendo ser ela protegida pelo Estado, uma vez que assim assegurada pela Carta Magna. Vejamos: Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...). [grifos nossos]. Do mesmo modo, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto San José da Costa Rica) prevê em seu artigo 4º o direito à vida: §1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. [grifos nossos]. No Brasil, tendo se verificado a ocorrência de morte o fato deveria ser apurado por meio de inquérito policial, o qual de acordo com o art. 10 do Código de Processo Penal deve ser concluído no prazo de 30 (trinta) dias, sendo, posteriormente, enviado ao juiz competente. Vejamos: Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela. [grifos nossos] Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Ora, até a presente data o inquérito policial não foi concluído, sequer foi localizado. Apesar da Portaria da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo determinar que os delitos de “resistência seguida de morte” devem ser apurados pelo DHPP, nota-se que o Ministério Público, enquanto fiscal da lei e titular da ação penal, sequer foi noticiado ou manifestou-se em relação à lisura e fiscalização da apuração, deixando a ação penal à deriva da sorte e às determinações dos órgãos policiais em apuração de eventual crime praticado por policiais no exercício da profissão. Ademais, apesar das críticas apontadas em relação ao Ministério Público, verifica-se também que a autoridade policial encarregada das apurações não possui a estrutura necessária para a apuração ou deixou de realizar atividade inerente à sua função, qual seja, encaminhar o Inquérito Policial - IP para a Comarca correta, conforme normas de competência criminal previstas no Código de Processo Penal. No caso em voga, o IP foi remetido à Comarca de Santo André (que ao percebê-lo remeteu para São Bernardo do Campo), não tendo sido solicitada a sua devolução para a autoridade policial desde 18/01/2012, ou seja, há mais de 3 (três) meses. Conforme determina a Constituição Federal a competência para julgamento de crimes contra a vida pertence ao Tribunal do Júri, sendo garantido que em caso de lesão de direito a prestação jurisdicional é inafastavel. Entretanto, até o presente momento, os homicídios foram apenas autuados na repartição policial, nem sequer chegando ao conhecimento do Poder Judiciário ou ao Ministério Público, que apesar das notícias veiculas na imprensa, aguardam o cumprimento da oficialidade em detrimento do direito a vida e à justiça. Na prestação dos serviços públicos deve os agentes respeitar e cumprir as determinações normativas, atuando sempre em observâncias aos ditames constitucionais e responsabilizando os agentes que deixarem de cumprir suas obrigações. A Administração Pública, por intermédio de seus agentes, no exercício de seus poderes e na prestação dos serviços públicos deve atentar-se aos princípios administrativos previstos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, sendo eles, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. No caso em voga, a eficiência demonstra-se deficiente tanto pela ausência de mecanismos de controle e monitoramente da atividade policial, quando pela ausência de empenho dos agentes na administração do serviço de apuração de crime contra a vida – recordamos que a vida e a dignidade são bens mais valiosos para todos os cidadãos. Tal constatação, também viola a garantia fundamental dos familiares dos mortos em obter, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (art. 5º, LXXVIII, CF). Neste sentido, deparamo-nos com a ausência direta do Ministério Público, sobretudo do Ministério Público do Tribunal do Júri na Comarca de São Bernardo do Campo na apuração de crime contra a vida (homicídio), especialmente em relação à fiscalização do serviço policial visando evitar a morosidade nas apurações da autoridade policial e nas tramitações processuais do serviço judicial. Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE É sabido que o Ministério Público, agindo como fiscal da lei deve acompanhar o feito, promovendo todas as diligências necessárias no tocante ao descobrimento da verdade. São expressas e objetivas as funções conferidas ao Ministério Público pela Constituição Federal: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; (...) VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; Colaborando a sistemática constitucional acerca das atribuições do Ministério Público, o Código de Processo Penal em seu artigo 257 prevê que: Ao Ministério Público cabe: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma estabelecida neste Código; e II - fiscalizar a execução da lei. Apesar das dificuldades na busca dos esclarecimentos dos fatos e da justiça, os familiares dos adolescentes vitimados na ocorrência policial acreditam nas instituições do Estado Democrático de Direito e aguardam que as aparentes “inércias” sejam superadas. Por isto, recorrem às diversas instâncias e poderes do Estado para ver seu apelo atendido. Por fim, registra-se que a ausência de fiscalização dos serviços públicos ocasiona grave violação à cidadania e à dignidade da pessoa humana, facilitando a prática da seletividade de casos por parte dos agentes públicos, fazendo com que um adolescente acusado pela prática de ato infracional seja brevemente apreendido e “punido” enquanto que agentes de segurança do Estado envolvidos em crime contra a vida sequer seja devidamente apurado, sendo este o principal desafio apresentado. DOS ENCAMINHAMENTOS Diante de todo o exposto, e com base na legislação supracitada, necessário se faz a comunicação aos órgãos de gestão e correcionais superiores conclamando-se pela celeridade. E ainda, diante da violação de direito previsto na Convenção Interamericana de Direitos Humanos somado à demora na apuração dos fatos pelos serviços públicos de segurança e justiça é possível apresentar queixa na Comissão Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado Brasileiro, nos termos do artigo 44 da referida Convenção, para que as garantias dos diversos diplomas e instrumentos legais supracitados sejam plenamente efetivadas para os familiares dos adolescentes D.S. e F.M.P. Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected] CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Em tempo, reitera-se que desde o conhecimento da violação aqui narrada, a Fundação Criança acionou os diversos órgãos judiciais de garantia de direitos para que fossem ouvidas duas testemunhas presenciais dos fatos, mas diante da inércia dos órgãos que integram o Sistema de Justiça e o Sistema de Segurança Pública na realização das oitivas, estas foram realizadas pela Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, a fim de garantir o registro probatório, essencial à elucidação da verdade. São Bernardo do Campo, 07 de maio de 2012. ARIEL DE CASTRO ALVES Diretor Presidente ANDRÉ FEITOSA ALCÂNTARA Coordenador do CEDECA Cidade dos Direitos da Criança e do Adolescente Eurídice Ferreira de Melo “Dona Lindu” Rua Francisco Visentainer 804 – Administração Telefone: (55 11) 4344-2100 / 4344-2128 Site: www.fundacaocrianca.org.br E-mail: jurí[email protected]