fronteiras transnacionais, territórios cibernéticos e

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fronteiras transnacionais, territórios cibernéticos e
FRONTEIRAS TRANSNACIONAIS, TERRITÓRIOS
CIBERNÉTICOS E OS IMPACTOS NA CULTURA E
NA SOBERANIA NACIONAL*
Maria Helena de Amorim Wesley
Rio de Janeiro – Outubro de 2012
* Trabalho apresentado no Seminário Soberania Nacional e Relações Internacionais Promovido pela
ABD em 22/10/2011. Rio de Janeiro
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
03
FORMAÇÃO DAS FRONTEIRAS
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1.1 – Regiões Fronteiriças
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II -
FRONTEIRAS TRANSNACIONAIS
12
III -
TERRITORIOS VIRTUAIS OU CIBER-ESPAÇOS
18
3.1 - Impacto na Cultura Nacional
20
IV -
FRONTEIRAS NA REGIÃO NORTE DO BRASIL
24
V-
SOBERANIA E DEFESA DIANTE DA FRAGILIZAÇÃO DE UMA NAÇÃO:
36
I-
o desmantelamento das Forças Armadas e a debilidade da Diplomacia
VI
CONJUNTURA NACIONAL E COMPLEXIDADE ATUAL
47
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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INTRODUÇÃO
As transformações hodiernas, a ênfase ao legado territorial histórico, a emergência
das Fronteiras Cibernéticas, a atual intervenção internacional - com destaque para a Amazônia Legal - e a nova face corsária que revestem a recolonização interna e externa
constituem o pano de fundo das reflexões sobre Fronteiras, Defesa.e Soberania.
Entretanto, quando um país prima, lamentavelmente, por desprezar seu passado,
sua história, sua cultura, não significa não ter memória, mas sim ausência de educação e
instrução, responsáveis pela construção da cidadania como resultante do respeito às tradições, incutindo uma sólida consciência dos problemas políticos e sociais.
Neste espaço se busca deixar claro que não se estuda cultura ou sociedade alheias; não se analisa por sobre os ombros de alguém a sua forma de se comportar, falar e
viver, contrariando a premissa assinalada por Geertz (1978) e adotada pela maioria dos
antropólogos. Enfatiza-se que nas marcas do passado se encontram todos os moldes do
atual comportamento que leva à responsabilidade de conhecer a realidade brasileira como o fizeram Rondon, Villas Boas, Nutels e Darcy Ribeiro, compartilhando com o último
na colocação que segue, onde espelha sua decepção com aqueles profissionais:
“Eu reclamava que a Antropologia Brasileira deixasse de ser uma primatologia ou
uma barbarologia, que só olha os índios como fósseis vivos do gênero humano, que só importam como objeto de estudos. Sempre gostei, por isso, da tirada de Noel Nutels, que
chamava os antropólogos de gigolôs de índios.
De fato, ele, que procurava assisti-los, conheceu inúmeros desses estudiosos, que
lá estavam sem levantar uma palha a favor dos índios, apenas de olhos abertos, de ouvidos acesos, ouvindo, olhando, aprendendo: gigolando.” (Ribeiro, 1997).
Na busca da elucidação dos movimentos populacionais passados que resultaram,
por exemplo, no povoamento das Américas e no surgimento de sociedades dizimadas
posteriormente pelo civilizador europeu, que, munido da capacidade de agredir e desestabilizar a harmonia biótica conduziu à miséria a vida humana, perpetua-se no comporta3
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mento político agressivo, na vocação pusilânime não só dos políticos e cujo preço é a
liberdade, na luta por dinheiro e prestígio, no descuido dos problemas humanos. Esses
comportamentos também são procedentes algumas vezes das comunidades científicas
de forma imperdoável, visto que são de uma sociedade que sempre encontra recursos
suficientes para resolver os problemas que dizem respeito a interesses individuais. O d ocumentário Segredos da Tribo, de José Padilha, ilustra o submundo da comunidade científica focando em Napoleon Chagnon, autor de Yanomami: o povo feroz (1968) acusado de genocídio e Jacquez Lizot, discípulo dileto de Lévi-Strauss, financiado pelo
Collège de France que ficou durante 20 anos entre os Yanomami. Trocava sexo por armas e é incriminado de pedofilia (Wesley, 2010).
Entre os diferentes princípios que nortearam a delimitação de fronteiras ao longo
do tempo em contextos geográficos diversos, no início do sec. XIX estudos antropológicos
desvendaram a importância do princípio territorial - e não somente o parentesco - como
basilar na formação da identidade (Lowie, 1927).
As atuais instabilidades estruturais do sistema de Estados nacionais frente às velozes mudanças geram a nostalgia por uma época em que se concebia o Brasil como um
sistema fechado em seus limites históricos, sob a proteção da fronteira do Estado territ orial, fazendo com que a metáfora da porosidade das fronteiras sintetize tudo de negativo e
a emergência de situações que contrariam a coerência do sistema histórico de Estados
pareça acobertar a situação considerada caótica denominada de globalização, cujo car áter ambíguo se apresenta nas relações entre Estados e indivíduos nas mais diversas
transações.
A inexorabilidade desse processo no que tange a interdependência da economia se
mostra como um processo universal, contínuo, progressivo e homogêneo, apresentado
como uma nova realidade impulsionada pela força material da expansão capitalista, embora resulte de decisões políticas de países centrais, sobretudo o norte-americano, cujo
objetivo é alimentar as transformações tecnológicas e intensificar a competição mundial,
além de estimular reformas liberais nos países em desenvolvimento.
O mundo deste milênio, estruturado na economia informacional global, na sociedade em rede e na cultura da virtualidade real, redefine historicamente as relações de produção, poder e experiência da sociedade, configurando uma forma produtiva, competitiva,
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flexível e proprietária que se inclina ao aumento da desigualdade, da polarização entre as
classes sociais onde a exclusão não será superada.
Eis o motivo pela opção em apresentar uma breve reflexão – isolada - que se debruça na dura realidade, como peça de inclusão na Academia Brasileira de Defesa, sem
rodeios ou subterfúgios que possam amenizar a angústia gerada na impotência de alterar
um milímetro de um cenário que se delineia devastador por desprezar o fato de que s omente a preservação da História dá relevo a um passado indispensável na construção da
identidade atual para que se possa construir o futuro, pautando sempre a reflexão na evidência de que sem Soberania não há Liberdade.
Não há como negar que os membros desta Academia buscam a superação da finitude física, graças à aquisição e predominância de uma consciência crítica no entendimento que leva a colocar a clareza e a sabedoria a serviço das gerações vindouras, e que
certamente revestem brasileiros imbuídos da convicção de que a vida repr esenta bem
mais do que se tenta fazer para poder continuar a olhar nos olhos de seus descendentes.
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I - FORMAÇÃO DAS FRONTEIRAS
A denúncia dos latifúndios e a defesa ecológica que pautam os discursos ambientalistas hodiernos por certo desconhecem ou desprezam as origens da ocupação, da posse e dos direitos coloniais que nortearam as conquistas do Brasil.
Mapa1
O legado português resultante da ocupação
territorial no século XVI e consolidada no século XVIII
desenharam os contornos das futuras fronteiras, que
já constavam na Carta de Diego Nuñes - provavelmente de 1553 – e foram reconhecidas pelo Tratado
de Madri em 1750.
O fracasso da colonização espanhola exemplificados por Orellana e Pinzon em 1551 e 1555 na
Amazônia Brasileira certamente se deveu a importância repressora da muralha dos contrafortes da
cordilheira andina, um dos grandes obstáculos à penetração dos espanhóis, e que beneficiaram a ocupação portuguesa (Mapa1).
Também a descoberta da prata em Potosi, influenciou as decisões políticas imperiais que dificultaram qualquer abertura de caminho a interferir no rígido controle do contr abando e outros possíveis desvios - da Coroa - sobre os caminhos que conduziam a prata
americana para a Espanha.
O estabelecimento das fronteiras políticas internacionais teve início no século XVIII
e, nos primeiros anos do século XX, os problemas ainda pendentes foram negociados
pelo Barão do Rio Branco1.
1 . A fronteira do Brasil com a Colômbia, por exemplo, foi delimitada através dos Tratados de Bogotá, em 1907, e do Rio de Janeiro, em 1928, após o tratado que
definiu, no mesmo ano, a situação do Trapézio Colombiano, cuja posse estava até então em litígio entre o Peru e a Colômbia.
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A expansão portuguesa, favorecida pelo relevo e pela hidrografia de uma região comum das duas
maiores bacias fluviais, amazônica e platina, constituem um sistema hidrográfico em espaço continental
formado por zonas de relevo áspero, declives abruptos e profundas depressões que se apresentam como um forte obstáculo à expansão humana e são
conhecidos como faixas ou centros formadores de
fronteira e que a Constituição de 1988 e a
Lei
6.634/79, Artigo 20, assegura em 150 km para Segu-
Mapa 2
rança Nacional.
Após ter suas fronteiras juridicamente fixadas 2 em acorde com o tradicional conceito de território como o espaço físico delimitado por fronteiras onde o Estado exerce a sua
soberania3, o Brasil, desde 1909, não tem qualquer problema de fronteira, mas apresenta
crescentes problemas nas suas fronteiras (Côrtes, 2006) e, apesar de “batido”, o tema
sobre as ameaças contra a Amazônia Brasileira impõe rever o significado da criação de
reservas indígenas ao se constatar que a assinatura, na Assembleia Geral das Nações
Unidas em 13/SET/2007, da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas – por
ordem do Chanceler brasileiro – sequer foi alvo, até hoje, de discussão pelos representantes do povo brasileiro.
Entre os séculos XIII e XV o conceito de fronteira se caracterizava pela herança
dos feudos onde os indivíduos ligados por laços de vassalagem, afastaram-se dos atributos originais de parentesco e territorialidade que norteavam os estudos antropológicos.
Entretanto as relações de lealdade ultrapassavam os domínios territoriais dos reinos e
impérios, e o mosaico de fronteiras políticas resultante negava, na prática, o poder dos
reis. Isso faz ruir as bases do sistema assentado nos direitos hereditários e históricos que
2 Tratados: Tordesilhas – 1497; Madri – 1750; Santo Ildefonso – 1777. Em 1870 – Paraguai; 1895 – Argentina; 1900 - França (Guiana); 1903 – Bolívia; 1904 – Equador; 1904 + 09 – Peru; 04 - Grã-Bretanha (Guiana); 1905 – Venezuela; 1906 - Holanda (Guiana); 07 – Colômbia; 1909 - Uruguai.
3 Com todas as fronteiras já delimitadas, o trabalho de demarcação e caracterização é executado por duas comissões bilaterais demarcadoras de limites: uma com
sede em Belém é responsável pelas fronteiras setentrionais, com a Guiana Francesa, o Suriname, a Guiana, a Venezuela, a Colômbia e o Peru; outra sediada no Rio
de Janeiro executa trabalhos nas fronteiras meridionais, com a Bolívia, o Paraguai, a Argentina e o Uruguai.
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tinham prevalecido até então na delimitação de fronteiras fortalecendo a emergência do
Estado Moderno, baseado na relação entre fronteira e soberania territorial inexistente no
mundo europeu visto que o poder dos reis sobre o reino era de tipo feudal e não nacional.
A ideia de fronteira natural dos filósofos políticos franceses e ingleses levou à sua
conexão com a noção de lei natural, no sentido de que respeitar os limites naturelles dos
estados seria nada mais do que obedecer a lei da natureza.
No início do século XIX surge a doutrina de fronteira no Discurso à Nação Alemã
de J. Fichte (1807), baseada no princípio da nacionalidade que defende a unidade territorial do Estado e a lógica que preside o estabelecimento de seus limites em função de uma
língua e cultura comuns.
Os limites políticos precisos não eram demandados diante da pouca importância de
negócios realizados em escala internacional. Havia locais de inspeção, onde as mercad orias podiam ser examinadas para efeito de tarifas. A necessidade de ajustar as relações
entre os Estados ao crescimento do comércio mundial foi o principal motivo para a demarcação mais exata dos territórios, e somente no século XIX é que os Estados se tornaram suficientemente organizados e capazes de garantir a definição de suas áreas de jurisdição (Globet, 1934).
No século XX, apesar da criação do conceito de autodeterminação dos povos, a
concepção imperialista de fronteira desenhada durante a hegemonia da Grã-Bretanha no
sistema mundial, desconsiderou a existência e os interesses das coletividades envolvidas
e a maior parte das fronteiras políticas da África e da Ásia foi desenhada pelas potências
coloniais visando à estabilização do poder (embora episódico) entre as próprias potências
coloniais e apesar de ainda prevalecer a concepção contratual de fronteira internacional4,
os inúmeros conflitos de fronteira indicam que a fronteira contratual é na verdade extremamente rara. Muitos tratados foram, na prática, artifícios para ganhar tempo e consolidar
antigas conquistas.
4 Onde o princípio geral é que sua delimitação seja o resultado de uma negociação bilateral em que as partes não utilizam outros recursos para fazer prevalecer seus
pontos de vista.
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1.1 - Regiões Fronteiriças
Os poucos estudos sobre regiões de fronteira internacional se deve ao fato de
grande parte dessas regiões estarem isoladas dos centros nacionais de seus respectivos
Estados, seja pela ausência de redes de transporte e de comunicação, ou pelo pouco peso político e econômico que representam.
O Estado Territorial fruto da relação entre território, fronteiras e limites, é tradicionalmente formado pelo Componente Institucional que abriga concepções distintas, mas
simultâneas, de controle dos limites e das fronteiras no âmbito das instituições governamentais com efeitos sobre a distribuição de poder; pelo Componente Estrutural relativo ao
uso do estatuto de legalidade/ilegalidade e ao papel dos limites políticos numa economia
mundial caracterizada pelo risco e cuja irregularidade aponta para a instabilidade (estrutural) do sistema de Estados nacionais; e pelo Componente Conjuntural onde o atual escorregar da fronteira para o interior e a multiplicação de territórios especiais promovem a ascensão da concepção econômica de fronteira em detrimento da concepção tradicional
resultando na ampliação da histórica porosidade das fronteiras - com destaque, no Brasil,
para a Região Amazônica.
Também estão formalmente isoladas dos Estados vizinhos pelo papel disjuntor dos
limites políticos. Sem instituições para instrumentá-la, a cooperação entre países vizinhos
em regiões de fronteira se efetua informalmente ou através de acordos tácitos entre as
autoridades locais dos países fronteiriços.
Esse cenário tende a mudar pela importância atual atribuída às cidades e regiões
de fronteira pelos estados nacionais no contexto da integração de países em blocos regionais, e pode transformar essas regiões, em zonas de cooperação e sinergia entre países
vizinhos facilitando a criação de novos mecanismos legais e administrativos (Ganster et
al., 1997:7). A fronteira deixa de ser concebida somente a partir das estratégias e interesses do Estado central, e passa a ser concebida também pelas comunidades de fronteira,
ou seja, no âmbito subnacional. O desejo e a possibilidade real de comunidades locais
estenderem sua influência e reforçarem sua centralidade além dos limites internacionais e
sobre a faixa de fronteira estaria subvertendo e renovando os conceitos clássicos de limite
e de fronteira (Machado, 1998).
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Além das diferenças entre países e entre segmentos da própria fronteira nacional
dificultar uma teoria para uma fronteira internacional, a inclinação à formação de blocos
econômicos regionais e a intensificação das diásporas de povos com nacionalidade compósita alteram a abordagem das fronteiras e limites internacionais e muitos países vêm
desconsiderando os efeitos da existência dos limites internacionais, relevando mais os
efeitos da remoção desses limites, a diminuição das descontinuidades que estes representaram ao longo do tempo para a vida econômica e social, e na circulação de ideias,
mercadorias e serviços (House, 1980).
Mas, mesmo a proposta de Anderson (2001) 5, que considera o uso oportunista dos
diferenciais políticos e econômicos nos limites entre estados, esse uso não pode ser atribuído unicamente à globalização atual e sim aos fundamentos e evolução do sistema c apitalista e do sistema de estados nacionais. As arbitragens oportunistas resultam de uma
contradição maior nascida no interior do sistema de acumulação capitalista inclinada a
destruir obstáculos a livre circulação de bens de capital, mercadorias etc., e, simultaneamente, gerar novos obstáculos à livre circulação, apoiando-se na forma política do sistema de estados nacionais (Machado, 1996, p.374).
A visão negativa das fronteiras baseada na ideia de ser um obstáculo que limita a
liberdade individual ou coletiva se esvazia diante do fato de que a fronteira é uma necessidade incontornável que regula e previne a existência dos perigos do caos, sublinhando
tanto diferenças legais como o principio da identidade territorial e a separação entre nacionais e não nacionais através de impedimentos jurídicos, políticos e ideológicos.
Presente em todos os países, territórios, culturas, fluxos de comunicações e finanças, a economia global provoca a "exploração contínua do planeta à procura de novas
oportunidades de geração de lucros" e, implacavelmente, seleciona “conectando segmentos valiosos e descartando locais e pessoas inúteis e não pertinentes", resultando em
uma geografia de contrastes. Dos segmentos excluídos resulta o aumento das operações
em conexão perversa, com diferentes regras na prática do capitalismo global, perceptíveis
na crescente influência da economia do crime organizado. Por outro lado, não menos perversa, ocorre "a exclusão dos que excluem pelos excluídos", prevendo que "a não adesão
5 Argumenta a favor da necessidade de retomar a teorização dos limites internacionais (borders) e das regiões de fronteira (border regions) no contexto da globalização e da visão de um “mundo sem fronteiras”.
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de pessoas e de países não representará uma saída pacífica" (CASTELLS, 1999, p.4312).
O recente processo de aproximação do Brasil aos outros países da América do Sul,
após séculos de indiferença - consequente do processo de colonização - requer certa
acuidade, quando se centra a atenção às características geográficas da zona de fronteira
do Brasil e países lindeiros, que se revelam no pinçar das diferenças e peculiaridades da
fronteira continental nas análises sobre porosidade e fechamento das fronteiras dos est ados nacionais.
Essas reflexões reforçam o papel do território e a importância de pactos territoriais,
enfatizando a soberania dos interesses do Estado, para que se torne legitimamente r epresentativo da coletividade, já inferidos em trabalho anterior (Wesley, 2010).
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II – FRONTEIRAS TRANSNACIONAIS
O forte potencial das regiões fronteiriças para desenvolver a cooperação internacional dos países depende da qualidade e da intensidade das relações entre elas. Quando os sistemas em ambos os lados do limite são análogos, provavelmente existirá menor
tensão na periferia de cada um, embora a existência de simetria e paz não sejam garantia
de maior interação (Boggs, 1940).
O grau de homogeneidade das condições econômicas e sociais em ambos os lados pode limitar a complementaridade das trocas, enquanto a diversidade pode estimular
o desenvolvimento de complementaridades e consequentemente basear uma nova divisão transfronteiriça do trabalho que resulta em maior dinamismo dos espaços fronteiriços
(House 1980).
Outra pendência no que tange às regiões fronteiriças deve ser considerada. Ainda
que elas atinjam um nível de complementaridade e cooperação efetiva, necessitarão se
impor, não como simples intermediárias, para que suas cidades não sejam meros nódulos
em rotas de passagem, mas como nódulos intermediários na rede ampla que liga os centros maiores entre si. Nas cidades e regiões de fronteira a questão crucial é a de como se
inserir nas diversas redes transnacionais que as atravessam, sem desempenharem o papel de mero ponto de passagem (Pradeau, 1994).
No Brasil as relações transfronteiriças sob o controle de ONGs nacionais e internacionais detalhadas no Quadro 1 baseiam os fluxos de bens, capitais e pessoas nas zonas
de fronteira. Os efeitos nas comunidades fronteiriças de ambos os lados estão ligados às
oportunidades que oferece um Estado mais desenvolvido, sobretudo para a realização de
tarefas pesadas descartadas pelos profissionais qualificados desse mesmo Estado, acarretando ao longo do tempo grande difusão de trabalhadores para o interior.
Esse fluxo é predominantemente de trabalhadores diaristas ou sazonais, desqualificados ou semiqualificados, atraídos pelas oportunidades de trabalho e pelos possíveis
pagamentos de assistência social no outro lado, mas pelos mesmos motivos pode incluir
também a saída dos mais qualificados do Estado menos desenvolvido. Se esse afluxo de
trabalhadores reduz as pressões demográficas e o desemprego no Estado menos desen12
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volvido, pode, também, se converter em potencial para grave exploração de trabalhadores
ilegais na região de fronteira do país mais desenvolvido.
FRONTEIRAS TRANSNACIONAIS
(Quadro 1)
ONGs, MISSÕES e AMBIENTALISTAS
NACIONAIS
INTERNACIONAIS
- Assistencialismo/filantropia como lógica - Obstaculizar desenvolvimento; atos
de seus financiadores.
violentos (questão nuclear, transgêni-
- Agentes capazes de oferecer uma alter-
cos, aquecimento);
nativa de emprego e trabalho para os
- Difere dos Estados e das Organiza-
“excluídos” (e outras organizações do
ções Internacionais;
chamado terceiro setor), sobretudo para a - ONGs possuem personalidade juríclasse média.
dica de direito interno de um Estado
- empreendimentos turísticos e privatiza-
qualquer que lhes concede personali-
ções;
dade, e delega poderes para prosse-
- Certa criminalização dos movimentos
guir em suas atividades (semelhança
sociais (colonizador brasileiro).
c/a Carta de Corso).
- Distinguem-se das empresas transnacionais (sem fins lucrativos).
Sem qualquer controle pelo Estado e, menos ainda, pela população que é o
“alvo” de suas ações.
Surgem, sobretudo, pela ausência/abandono do ESTADO
Difícil de mensurar são os fluxos de capital, pela relativa imobilidade se comparada
à alta mobilidade dos trabalhadores. Sujeita a variações conjunturais constantes pelas
diferentes políticas econômicas e cambiais, a faixa de fronteira é muito instável.
É comum que vários empresários invistam nos dois lados da fronteira para se protegerem dessa instabilidade, possuindo, muitas vezes, lojas em ambos os lados. Em outros casos são instaladas fábricas do lado menos desenvolvido em busca de trabalho b a13
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rato e de padrões ambientais menos rigorosos, mas os lucros são invariavelmente drenados através da fronteira para o país de origem.
Além dos efeitos das assimetrias econômicas, a interpenetração de culturas, com
seu bilingüismo e costumes próprios, são, em muitos países, explorados para o turismo 6,
mas podem gerar efeitos negativos para as transações transfronteiriças que podem ser
TIPOLOGIA DAS FRONTEIRAS
(Quadro 2)
terrestre – aérea – marítima e oceânica
- Regidas p/Dir. Int. Públ., Atos Internacionais, Acordos e TrataJURÍDICA
FRONTEIRAS
dos Bilaterais;
- Visíveis (ainda que por convenção);
- Ações detectáveis (às vezes antes de efetivada a Violação)
- Violações fisicamente perceptíveis.
TRANSNACIONAIS
ONGs
Missões
Ambientalistas
- Não subordinadas às normas internacionais específicas
METAFÍSICA
- Invisíveis (detecção difícil ou impossível)
- O agressor age de forma insidiosa
- O agredido não percebe a violação (ou só a discerne após o
fato consumado)
espacial – institucional - cibernética
mais bem compreendidas na Tipologia das Fronteiras expostas no Quadro 2 e no Mapa 1.
6 Levando-se em consideração que a maior parte dos turistas são habitantes de grandes cidades, o isolamento das regiões de fronteira permite paisagens mais
preservadas que podem funcionar como um atrativo importante, especialmente se ela estiver próxima a áreas fortemente povoadas (Miossec apud Pradeau, 1994).
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A concordância, em 2007, do Brasil na ONU, reconhecendo os Direitos Universais
dos Povos Indígenas visando à indicação do então Presidente para Secretário favoreceu
o estabelecimento de ONGs estrangeiras, com assentimento da FUNAI, em grande parte
da Amazônia, onde estão as maiores reservas minerais e de água potável (Wesley,
2009).
A tentativa persistente de não considerar o índio como brasileiro, parece indicar
uma violenta política de fragmentação da nacionalidade, quando se observa a questão do
negro – agora afro descendentes – aliada aos quilombolas e as quotas no sistema de ensino (Wesley, 2011). Empunhadas como bandeiras, em geral sob liderança das ONGs,
pelos excluídos, constituem cunhas à integração social e construção da cidadania que
observe as leis – como qualquer brasileiro – impedindo a transformação das aldeias em
comunidades avançadas ou cidades.
Recentemente índios e ONGs ameaçaram o Governo, em busca da Independência
das Nações Indígenas, reconhecidas pela ONU por causa da Portaria 303 da AdvocaciaGeral da União (AGU), que proíbe a ampliação de áreas indígenas já demarcadas e a
venda ou arrendamento de qualquer parte desses territórios, se isso significar a restrição
do pleno usufruto e a posse direta da área pelas comunidades indígenas. Proíbe o garimpo, a mineração e o aproveitamento hídrico da terra pelos índios, além de impedir a cobrança, pela comunidade indígena, de qualquer taxa ou exigência para utilização de estradas, linhas de transmissão e outros equipamentos de serviço público que estejam dentro das áreas demarcadas.
A portaria 303 foi publicada com o objetivo de ajustar a atuação dos advogados
públicos à decisão do Supremo no julgamento da questão da Raposa Serra do Sol. A imprensa tem noticiado, erradamente, que os índios não aceitam a portaria porque ela estende a todos os processos demarcatórios as 19 condicionantes aprovadas pelo Supremo, que proíbem, entre outras coisas, a ampliação de áreas indígenas já demarcadas.
A situação se agrava diante da exigência das 206 nações indígenas para o rec onhecimento de autonomia territorial, política, econômica e cultural, com fronteiras fechadas. Ou seja, pretendem que sejam consideradas como nações independentes, nos termos da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela ONU com
apoio do Brasil em 2007.
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O arrependimento do governo brasileiro motivou o não envio do tratado da ONU ao
Congresso, para ratificação e entrada em vigor. A portaria 303 é a primeira norma baixada
pelo governo após a aprovação do tratado internacional. Seu texto demonstra claramente
que o Brasil não aceitará a independência das nações indígenas almejada pela ONU
(Porto, 2012).
Mapa 3
As ações em outros países contra cidadãos, empresas e investimentos brasileiros nos últimos oito anos, registram a ocorrência de sérios danos e o surgimento de
ameaças a interesses do Brasil em fronteiras extralimites (metafísicas) visíveis no Mapa
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3.
A Fronteira Institucional (metafísica) pode, por qualquer tipo de pressão, coação
ou indução ilegítima ou ilegal – por desvio ideológico ou com origem em outro Estado –
conduzir à adoção de decisões executivas, acordos internacionais ou legislação, alt amente lesivos ao Brasil, como ocorre em Brasília, caracterizando uma vulnerabilidade
que persiste há 20 anos.
Nas Fronteiras Jurídicas são registradas, com freqüência, reivindicações entre
terceiros, ameaça armada (subversão, tráfico de drogas), atividades ilícitas (contrabando, tráfico de pessoas, pesca ilegal, descaminho), agravadas pela porosidade e vazios
demográficos onde se realiza a atividade econômica local.
Essa realidade pontilhada de conflitos diversos conduz à suposição de que a
Amazônia pode ser perdida sem guerra, sem tiro, por um movimento muito mais finório
do que se imagina.
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III – TERRITÓRIOS VIRTUAIS OU CIBERESPAÇOS
O Território Virtual ou Ciberespaço se caracteriza pelo descarte absoluto dos limites impostos por fronteiras físicas e políticas que escapam da realidade conceitual costumeira de território. Está relacionado a uma ideia nova, de rede, fundamentada pela localização da informação como elemento identificador do território no ciberespaço constituindo
uma nova modalidade de fronteira transnacional.
Quadro 3
REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA, DEFESA E SOCIEDADE
AUSÊNCIA DE PODER
FRONTEIRAS TRANSNACIONAIS
ONGs – MISSÕES - AMBIENTALISTAS
+
Internacionais/Nacionais
SOBERANIA
(Fragilidade das Fronteiras)
FORÇAS ARMADAS – DIPLOMACIA
(segurança interna e externa)
DEPENDÊNCIA
(assistencialismo, empobrecimento cultural)
INSEGURANÇA
(violência urbana e rural – ameaças terroristas)
INGERÊNCIA INTERNACIONAL
DEFESA
GOV. MUNDIAL
RECOLONIZAÇÃO OU NOVA FACE CORSÁRIA?
(Interna – Externa)
A revolução tecnológica geradora dos ciberespaços ou territórios virtuais ao estabelecer uma nova modalidade de fronteira transnacional, quando aliada ao vazio de poder
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se transforma em poderosa ferramenta, através de ONGs, missões e ambientalistas, a
serviço dos interesses internacionais, afetando negativamente a Soberania, as Forças
Armadas e a Diplomacia ao fragilizar as fronteiras físicas, jurídicas e metafísicas, atingindo de forma deletéria a segurança interna e externa do Estado. Instala, geralmente, maior
dependência através do assistencialismo e do empobrecimento cultural, causando o aparecimento da insegurança geradora da violência (urbana e rural), ameaças e práticas terroristas. Compõem desse modo, elementos favoráveis à ingerência internacional na frágil
Defesa em favor do almejado Governo Mundial, configurando um novo processo de recolonização ou uma nova face corsária (Wesley, 2011), conforme se pode observar no Quadro 3 e no Mapa 3.
As características do Ciberespaço fazem com que a internet dificulte estabelecer
um centro de comando nos moldes da versão tradicional de território físico delimitado, e
cuja inexistência acarreta certa indefinição penal diante da complexidade residente no
caráter internacional da rede, afetando o Estado em seu território, na sua economia, no
seu espaço rural e na sua sociedade, ultrapassando fronteiras e limites culturais e políticos, como se verifica na presença de ONGs internacionais e nacionais que vêm ocupando
vazios do poder.
Porém, a crescente utilização da internet e a aquisição de objetos ligados à área da
informática não significa produção de conhecimento, muito menos de conhecimento científico. Resulta, sim, em dependência tecnológica e endividamento e pode fazer parte de
uma orquestração externa que visa a impedir o acesso a tecnologias sensíveis, às quais o
governo se submete, mantendo o sistema de ensino no nível mais raso possível, através
do estímulo a conteúdos escamoteados (homossexualismo, preservação ambiental, danças, esportes, etc.) e agravados pelo sistema de quotas (Wesley, 2011a).
No território cibernético se configura uma das principais ameaças para a Segurança Nacional, uma vez que as ações militares estão cada vez mais dependentes do apar ato tecnológico e por mais armamentos que se tenha nas Forças Armadas nunca se estará
seguro contra os ataques cibernéticos ou ao ciberterrorismo, cujas ameaças vão desde a
interrupção da eletricidade, apagão na rede bancária, ou sítios e redes institucionais de
conhecimentos estratégicos por um único individuo. No Brasil cerca de 400 mil ataques a
computadores foram registrados em 2011 pelo Gabinete de Segurança Institucional da
Presidência da República (GSI) através do Centro de Estudos, Resposta e Tratamento de
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Incidentes de Segurança (CERT), que reúne notificações sobre a guerra cibernética, de
ataques eletrônicos em todo o país.
A crueza desse cenário coloca em evidência a vulnerabilidade brasileira diante do
despreparo que permeia a incapacidade produtiva existente no âmbito caótico da Educ ação, configurando uma assustadora fragilidade que nasce nos primeiros anos escolares e
alcança o ensino dito superior, apesar de as Forças Armadas terem investido recentemente cerca de R$ 6 milhões em programas antivírus e simulações de ataques.
.1 – O Impacto Cibernético na Cultura Nacional
Por sua natureza interdisciplinar a Cultura Nacional é o elemento que fornece suporte para todos os estudos científicos quando se busca elaborar um esboço do cenário
nacional.
Tradicionalmente estudada enfocando as estruturas Adaptativa, Associativa e a Ideológica, toda e qualquer alteração para sua transformação (nem sempre evolução) ocorria primeiramente sempre na estrutura adaptativa, onde se encontram todas as formas
de produção, trabalho e economia, desencadeando, logo a seguir, mudanças na estrutura
associativa, que contém as relações sociais, os sistemas de parentesco e as alianças
conjugais, e, finalmente, as transformações na estrutura ideológica, constituída pelos sistemas de crenças, pela língua, pelos sistemas políticos e pelas artes (Ribeiro, 1972).
A estrutura ideológica sempre foi a última a sofrer alterações, contendo os elementos mais resistentes às mudanças. O exemplo mais imediato na História do Brasil é o do
africano: arrancado de sua terra e expropriado de sua economia, era vendido como peça,
ignorando-se qualquer ligação afetiva pessoal-familiar. Ao longo dos séculos, somente a
estrutura ideológica permaneceu através do sincretismo religioso que marca profundamente a Cultura Nacional.
O advento da Estrutura Cibernética, gerada pelas transformações tecnológicas, afetando quase simultaneamente todas as demais estruturas, contraria a tradicional forma
de analisar as culturas. A inversão na ordem das estruturas que anteriormente assinalava
alterações, primeiramente na estrutura adaptativa, agora ocorrem na estrutura ideológica
e as consequências são imprevisíveis. Pode-se somente inferir um maior controle sobre a
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sociedade através dos meios de comunicação, o rompimento do modelo político patriarcal, o esvaziamento de modelos sociais, alterações nas relações produtivas (trabalho,
economia), radicalização de crenças, novas formas de violência (que vão desde a perda
da privacidade às práticas terroristas), estímulo à importação tecnológica (com a geração
de dependência), e inversão da ordem no modelo de análise tradicional de transformação
cultural até então adotada, enfatizando o fato de muitas vezes não ocorrer transformação, mas sim a substituição instantânea de elementos simbólicos, como a língua, com
a ressalva de que não basta ter acesso tecnológico: é necessário que este tenha conteúdo (Quadro 4) sob pena de gerar a exclusão graças ao descompasso entre a velocidade e
a assimilação com que ocorre a informação afetando sobretudo as gerações pretéritas.
Quadro 4
TRADICIONAL
CULTURA NACIONAL
Elemento interdisciplinar que fornece
suporte aos estudos científicos para o
esboço do cenário cultural.
ESTRUTURA ADAPTATIVA
Produção, Trabalho, Economia
(1ª alteração)
------------------------------------------ESTRUTURA ASSOCIATIVA
Relações Sociais, Parentesco,
Alianças
----------------------------------------
(2ª etapa consequência)
ESTRUTURA IDEOLÓGICA
Sistema de Crenças, Língua,
Política, Artes
(3ª etapa - resultado final)
ATUAL
- Maior controle e comunicação;
- Rompimento do modelo político patriarcal,
- Esvaziamento de modelos sociais;
- Alterações nas relações produtivas (trabalho, economia);
-- Radicalização de crenças;
- Novas formas de violência (privacidade,
terrorismo);
- Importação Tecnológica (gera dependência);
- Provável inversão da ordem conhecida (não
basta ter acesso tecnológico: exige-se conteúdo).
Com o surgimento dos Territórios Cibernéticos, é inevitável o surgimento de uma
nova sociedade, a Sociedade em Rede, onde a Informática é ferramenta ilimitada de trabalho, aquisição de conhecimento, informação e mobilização. Nascida no seio da revolução tecnológica e causando grande impacto nos sistemas de educação e ensino, torna
imprescindível a distinção entre informação e conhecimento.
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No espaço cibernético se configura uma nova forma de territorialização, caracterizada pela inexistência de fronteiras onde as pessoas se identificam na rede e desenvolvem relações afetivas com o espaço virtual. Nessa sociedade em rede onde a segurança
física leva, de forma ambígua, ao isolamento social, a Cultura vem se firmando fora dos
espaços materiais, moldando outros tipos de produção que independem da referência a
um lugar, conformando um novo processo de conceituação de território onde a cidadania
cibernética difere da igualdade de direitos inspirada na cidadania romana fortalecendo o
ativismo eletrônico, a exemplo dos afiliados e recrutados do Greenpeace.
NOVAS FRONTEIRAS
Quadro 5
SUBFRONTEIRA IDEOLÓGICA
SUBFRONTEIRA ASSOCIATIVA
SUFRONTEIRA ADAPTATIVA
(Idéias)
(Social)
(Econômica)
Política mais agressiva
Movimentos separatistas
Radicalização de crenças
Alterações nas Leis
Transformação linguística
Ênfase de movimentos
Violência urbana e rural
Terrorismo e insegurança
Novos modelos de família
Novos comportamentos
Investimentos estrangeiros
Endividamento
Despreparo tecnológico
Desindustrialização
Empobrecimento
SUB-FRONTEIRA CIBERNÉTICA
?
CULTURA NACIONAL – NAÇÃO SEM ALMA OU TRANSIÇÃO?
Na configuração desse cenário são estabelecidos novos parâmetros culturais formados por territórios virtuais ou ciberespaços, geradores de novas fronteiras, caracterizadas por subfronteiras relacionadas às estruturas ideológica, associativa e adaptativa
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que se entrelaçam e formam a subfronteira cibernética. A convergência dessas subfronteiras constitui a atual Cultura Nacional, para os mais pessimistas, em transição, rumo a
uma futura nação sem alma diante da globalização dos comportamentos advindos pela
internet (Wesley, 2010).
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IV - FRONTEIRAS NA REGIÃO NORTE DO BRASIL
Apesar de “batido”, o tema sobre as ameaças contra a Amazônia Brasileira sofreu
reformulação do significado da criação de reservas indígenas no Brasil, quando da assinatura da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas – por diplomatas brasileiros – na ONU, sem que a mesma tenha sido alvo de discussão pelos representantes do
povo brasileiro.
O atual quadro do Ministério das Relações Exteriores 7 dominado por internacionalistas divididos entre alinhados com o bloco sino soviético e os alinhados com o establishement anglo-americano ignora os poucos nacionalistas que consideram a assinatura
daquele documento um crime de lesa-pátria, pois faculta a legitimidade a futuras declarações de independência por parte dos povos indígenas das muitas reservas do Brasil e
que não foi aceita pelos EUA e demais países anglo-saxões com populações indígenas
em seus territórios ou sob seus domínios, não deixando dúvidas sobre o propósito da
mesma como se pode observar nos artigos destacados 8:
Artigo 3 - Os povos indígenas têm direito à livre determinação. Em virtude desse
direito, determinam livremente a sua condição política e perseguem livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural;
Artigo 4 - Os povos indígenas no exercício do seu direito a livre determinação,
têm direito à autonomia ou ao autogoverno nas questões relacionadas com seus assuntos internos e locais, assim como os meios para financiar suas funções autônomas;
Artigo 30 - Não se desenvolverão atividades militares nas terras ou territórios
dos povos indígenas, a menos que tenham solicitado;
Artigo 36 - Os povos indígenas, sobretudo os separados por fronteiras internacionais, têm direito de manter e desenvolver contactos, relações e cooperação com outros povos, através das fronteiras.
Para dirimir a contradição de vários artigos com os princípios da Constituição Brasileira, o Congresso introduziu, em 2004, um dispositivo no parágrafo 3º do Artigo 5º da
7 Responsável pela condução da política externa brasileira a cargo do Itamaraty (nome do palácio no Rio de Janeiro que abrigou o MRE até 1970).
8 Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas
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Constituição que dá aos tratados internacionais sobre direitos humanos equivalência a
emendas constitucionais, quando aprovados pelas duas casas do legislativo e por três
quintos dos votos, caracterizando uma manobra furtiva, aprovando-o em meio a um pacote de reformas do judiciário que liberou a pseudo legitimidade deste ato e refletindo com
clareza o histórico degradante do legislativo onde o voto favorável é acessível e barato
para a WWF, Greenpeace e Survival International.
As áreas fronteiriças entre a Amazônia brasileira e os demais países sul americanos se revestem de alta complexidade, desafiando generalizações estáticas e estadistas
que muitas vezes traem os preconceitos deixados pelo período colonial, ou evidenciam o
poder de um discurso ambientalista vigente, a exemplo dos discursos sobre os povos indígenas, que marcam fortemente os estudos da Região Amazônica, em geral, distanciados das estratégias e práticas dos atores locais e da mobilização transnacional que transcende tanto as instituições formais do Estado, como as restrições legais, afastados da
realidade das comunidades e habitantes locais.
Na Amazônia Brasileira as terras indígenas apresentam a mais grave, urgente e
problemática questão da Amazônia como um todo, diante das discordâncias institucionais
e até mesmo individuais. Não existe, nem na FUNAI, nem entre profissionais voltados para as diversas vertentes que o tema requer (antropólogos, economistas, geógrafos, ambientalistas, agricultores, políticos etc.) uma concordância, além de invariavelmente ignorarem a premissa de que as Forças Armadas não trabalham para governos. Trabalham para
o Estado Brasileiro e precisam que a sociedade nacional – da qual fazem parte - decida o
que fazer em relação à faixa de fronteira.
Detentora de riqueza incalculável, a região não pode mais ser vista como reserva
intocável. Sua integração em um programa de desenvolvimento em curto prazo é urgente,
diante da evidência cada vez mais clara da cobiça de nacionais e estrangeiros (Wesley,
2011).
Apesar de o Exercito Brasileiro e a Aeronáutica (Sindacta 4) defenderem os principais pontos, onde os pelotões de fronteira têm uma tarefa decisiva no processo, é impossível garantir a invulnerabilidade das fronteira, seja em trânsito, seja pela possibilidade de
confronto.
A Lei Complementar 117 deu poder de polícia ao Exército na faixa de 150 quilômetros da fronteira, mas não os meios para a atuação eficiente. Um tenente do Exército é
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formado para guerra e não para averiguar documentação de transporte de madeira. Isso
não esta no currículo das escolas militares e cabe mais aos agentes da Polícia Federal,
do IBAMA e da Receita Federal.
Para a fronteira de Roraima, por conta de divergências entre países vizinhos, foi
enviada a 1ª Brigada de Infantaria de Selva, antecipando a importância da vivificação da
fronteira no arco fronteiriço.
A reserva Raposa do Sol (Mapa 4) se localiza numa
área que já foi motivo de disputa no episódio conhecido por
Questão do Pirara. Foi resolvida por arbitragem pelo Rei da
Itália, em 1904, numa decisão inesperada em que o Brasil
perdeu parte do seu território, cerca de 19 630 Km², embora a
Inglaterra não tenha ficado com toda a área reivindicada
(33.200 Km²)
Mapa 4
.
Apesar de os argumentos brasileiros, defendidos por Joaquim Nabuco e sob instrução do Barão do Rio Branco, serem impecáveis do ponto de vista histórico e jurídico, as
pressões inglesas sobre o Rei de Itália foram decisivas. A Inglaterra alegou o mesmo motivo de hoje: a proteção aos índios (os povos em questão eram o Macuxi e o Tuxaua).
A disputa começou a partir das expedições de Robert Hermann Schomburgk, alemão a soldo da Royal Geografic Society, cujos relatórios de duas expedições (1835-36,
1837-38), despertaram o governo britânico para o potencial da zona, que resolveu tomar
sob sua proteção os povos da área. Este trabalho foi facilitado pelos esforços do pastor
Thomas Yould da Church Missionary Society, que fundou uma missão (1838) próxima do
Forte São Joaquim, mas foi prontamente expulso do território9.
A divulgação da Church Missionary Society de denúncias de escravidão deu ao
primeiro-ministro Palmerston (1840) a desculpa para expedir uma mensagem do governo
da Guiana ao governo brasileiro em Março de 1841, notificando-o da oposição britânica à
presença de brasileiros no território e pedindo que o comandante deixasse o mesmo em
quatro meses, pedido reforçado em dezembro do mesmo ano por um ultimato em que
9 O forte recebeu reforços após o episódio, passando a sua guarnição a 10 homens, e o frei José dos Santos Innocentes se instalou na área para catequizar os
silvícolas.
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Londres ameaçava bloquear os portos brasileiros e ocupar a área com militares. Ao ultimato se seguiu a ação, e em 14 de Fevereiro de 1842 chegou um destacamento militar de
40 homens ao local, obrigando a retirada e o abandono do forte no dia 27, apesar das
tentativas de negociação do comandante.
O presidente do Grão-Pará, Bernardo Sousa Franco, reagindo a esse movimento,
enviou 100 homens e pediu autorização ao governo central para atacar, mas nunca rec ebeu a resposta. O destacamento inglês ficou na área até setembro e Schomgburgk continuou a colocar marcos na fronteira.
O Brasil vivia um momento de imensas dificuldades 10 e os temores do governo de
uma guerra diante da fragilidade à unidade nacional naqueles idos, fez com que o governo propusesse a neutralização do território no princípio de 1843, aceita pela Grã-Bretanha
em 29 de agosto do mesmo ano.
A questão permaneceu suspensa até 1904, com nova investida dos ingleses a pr etexto de um suposto pedido de proteção dos índios à coroa britânica.
Convém lembrar que além do país viver uma crise econômica que restringiu os
seus orçamentos, como consequência das políticas econômicas adotadas durante a pr imeira década da república, as Forças Armadas estavam num estado lamentável11.
O Brasil conseguiu que a Grã-Bretanha aceitasse o arbitramento da disputa e foi
escolhido o rei Vitorio Emanuel III, que, novamente, diante de pressões, ignorou os argumentos de Joaquim Nabuco fundamentados pelos documentos históricos e mapas reunidos por Rio Branco.
Embora a derrota brasileira não fosse total, a Grã-Bretanha conseguiu o acesso indireto ao Rio Amazonas através dos rios Mau e Tacutu. Os atores principais da recente
criação da reserva Raposa/Serra do Sol são os mesmos da Questão do Pirara; o Brasil e
a casa de Hanôver, idealizadora e financiadora da WWF e da Survival International.
10 O Brasil vivia a desordem dos tempos da Regência (1831-1840), envolta em inúmeras revoltas civis, como a Guerra dos Farrapos (1835-1845) ao Sul e a Cabanagem ao Norte (1835-1840), e além de os ingleses, os franceses ocuparam dois pontos na margem direita do Rio Oiapoque (no Rio Amapá e na Ilha de Maracá), sob o
argumento de defender Caiena, iniciando uma questão resolvida favoravelmente ao Brasil em 1900, graças ao Barão do Rio Branco.
11 A poderosa marinha imperial, que se encontrava entre as cinco maiores do planeta em 1889, foi reduzida a sucata após a Revolta da Armada (1893-4) e a maior
parte dos oficiais foi fuzilada em virtude de ser um bastião monárquico; o orçamento do exército foi diminuído a um quarto do que era no ano final do Império (1889)
nos primeiros dez anos da república, caindo ainda mais com os cortes orçamentários resultantes do acordo do Funding Loan, de 1898 (medida econômica tomada
pelo quarto presidente republicano brasileiro, Campos Sales e seu Ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, em 1898, a fim de estabelecer conversações com os
bancos credores e tentar negociar uma saída para a questão da dívida interna causada pela politica do encilhamento).
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As incertezas hodiernas acompanhadas das ambiguidades da política interna nas
definições das TIs (Terras Indígenas) afetam a política externa quando são estabelecidas
nas fronteiras, sobretudo quando se fixa o fato de que nas regiões Sul e Nordeste as TIs
são pequenas e 30% da população indígena habita áreas urbanas, enquanto no Norte a
Amazônia detém 99% das TIs e a extensão territorial das reservas nas fronteiras a oeste
dessa região fica a mercê de elementos externos como a USAID (Agência de Desenvolvimento Internacional), ONGs, instituições privadas e estrangeiras de pesquisas e negócios em diversas áreas vindo lesionar a soberania e a segurança nacional.
A situação atual das Terras Indígenas, conforme dados fornecidos pela FUNAI, apresentam 105 milhões de hectares, reservados para cerca de 520 mil indígenas, correspondendo a 12,41% do território brasileiro. Em dados comparativos, a cidade do Rio de
Janeiro apresenta 0,014% do território brasileiro ocupado por mais de 6 milhões de pessoas enquanto a cidade de São Paulo mostra 0,018% do território brasileiro ocupado por
mais de 10 milhões de pessoas.
Segundo Bensousan (2009), a prevalência de fraudes nos encaminhamentos antropológicos em consequência das ONGs infiltradas nos quadros funcionais da FUNAI são
indícios marcantes da ingerência, subversão da ordem pública e dos conceitos morais e
éticos que regem os procedimentos antropológicos.
Mapa 5
A Amazônia Azul incorporou área de
960 mil km2 à zona de soberania nacional no
mar, hoje de 3,5 milhões de km2, apesar
dessa medida não contar com aval da ONU,
ampliou os direitos do Brasil para exploração
de petróleo e gás.
Na Amazônia Azul, semelhante ao que ocorre na Amazônia Legal, o vazio de poder
e a porosidade das fronteiras nas 200 milhas, favorecem as atividades de ONGs estrangeiras, pirataria e práticas terroristas .
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A delicadeza dessa realidade agrava a situação regional e o país e os índios não
podem ficar a reboque do laudo de um antropólogo ou opinião isolada, por mais bem intencionada que seja, e os resultados desastrosos já se fazem sentir.
Na Raposa Serra do Sol, a segregação é mais perigosa porque se acredita que a
maioria dos índios desejasse a permanência de não índios indicando um processo de integração o que não significaria apagar a cultura indígena (Wesley, 2011).
Em julho de 2002 o Presidente Fernando Henrique Cardoso, para honrar compromisso formal – “conservar” 10% do território nacional – com o príncipe Philip, fundador e
presidente Emérito do WWF, bem como justificar sua presença na RIO+10 em Johannesburg, criou o Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque, com 3,8 milhões de hectares (38.000 km²), equivalente ao território da Bélgica, na região fronteiriça com a Gui ana Francesa e a reserva indígena (Mapa 4) que abriga os Tiriyó, Apalaí, Wainá e Kaxuiana, esta contígua ao Suriname (Wesley, 2009).
Pelo fato de estar na
fronteira, se o índio não for
integrado à sociedade nacional, será, fatalmente, integrado
a outra sociedade, deixando
de ser brasileiro, embora habitando o território do país (Figueiredo & Folha, 1977), remetendo a uma questão de
Segurança e Soberania, como
se pode aferir nos exemplos
dos Tiryó (Mapa 6) e dos chaMapa 6
mados Yanomami.
No Tumucumaque os Tyrió foram absorvidos pelas missões protestantes do Suriname (Folha, 1987), e a desastrosa retirada de produtores da Raposa Serra do Sol, arruinou o processo de integração entre índios e arrozeiros que há muito tempo conviviam
em harmonia e em pleno processo de integração.
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A busca histórica de internacionalização da Amazônia constitui uma ameaça real à
soberania nacional e requer a urgente e imprescindível compreensão das ameaças a essa região, como um dos maiores legado de nossos antepassados, cuja obra nenhuma
geração pode rejeitar e negar o usufruto às gerações posteriores, conforme vem ocorrendo.
Nos 11 mil quilômetros de fronteiras internacionais na Amazônia, quase totalmente
ocupados por reservas indígenas, o vazio da presença do Estado vem sendo ocupado
pelo Exército, mas a missão se torna mais difícil pela ausência de povoados civis inviabilizados pela demarcação de terras indígenas.
Atualmente o Programa Calha Norte tem mais de 800 convênios, alguns ligados às
Forças Armadas, mas a maioria referente a atividades civis desenvolvidas pelas pref eituras nos Estados. Inclui alguns pelotões de fronteira, como a construção da base de uma
Brigada que será sediada na cidade de Barcelos (AM).
Os frequentes documentários sobre a devastação da Amazônia exibidos na Europa
(RTP 2) estão repletos de conselhos, através de ativistas, para que se deixe de consumir
carne brasileira, por ser a mesma a principal causa da destruição. Provavelmente esses
ativistas nunca estiveram no Brasil e muito menos estudaram essa questão da qual falam
cheios de certezas. Mas, como tantos especialistas, levantam a hipótese de estarem sendo regiamente pagos.
Não se trata aqui de desejar destruir a Amazônia, mas sim de querer que continue
sendo do Brasil. Para tal, urge reforçar a lei fundiária e levar o Estado, de fato, para a
Amazônia, hoje território de ninguém nas reservas indígenas, na floresta e nas zonas de
atuação do MST, estes últimos, os mesmos que se arvoram de defensores daquela região e lutam para que isso não aconteça.
Os conflitos na área da reserva Raposa Serra do Sol continuam a aumentar, apesar da expulsão dos "brancos" da área e ao contrário do que havia sido propagandeado
como sendo o objetivo da criação do jardim antropológico, justificado em teses que podem ser resumidas em poucas palavras: discriminação racial, eugenia, tribalismo.
Os conflitos que envolvem a Polícia Federal e o Exército de um lado, e os brasileiros silvícolas de outro, giram em torno da questão do garimpo que prolifera na área, apesar de ser ilegal, conforme o estatuto da reserva, devido à destruição da agricultura nos
cerrados da região.
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A opção agora é o garimpo, ilegal, ou a fome, que será aproveitada como arma de
propaganda, e alguns grupos já pensam em trazer o MST à região para ajudar na produção agrícola. O conhecido MST, que nada produz nas suas terras - a não ser conflito - e
depende por completo da ajuda federal para alimentar os seus bate-paus.
Tem-se a desmistificação das fraudes praticadas por antropólogos prestadores de
serviços à FUNAI, para dissimular os atos ilícitos e culpando toda a sociedade pela miséria e a desagregação cultural indígena. Essas práticas precisam ser difundidas, pois refletem a irresponsável impunidade que campeia no país, permitindo o perigoso desmonte e
banalização das instituições no continuado crime omissivo (Besausan, 2009).
Embora se reconheça que o Brasil tem o melhor combatente de selva do mundo e
tenha aperfeiçoado, do ponto de vista estratégico, o dispositivo militar inspirado na ocupação dos fortes portugueses, o mérito maior é a profunda ligação com a região, onde as
Forças Armadas se encarregam de ser o governo, de ser o Estado na Amazônia. Em muitos lugares são a única presença do Estado. Isso confere grande conhecimento da área e
uma profunda ligação com a população, apesar das deficiências, da falta de investimentos
e da falta de recursos.
A crença de que o controle da fronteira exige grande número de soldados pode s er
uma visão equivocada. Enquanto a Amazônia tem 11 mil quilômetros de fronteira, entre o
México e os Estados Unidos essa extensão é de 2.500 quilômetros, numa área de fácil
acesso e controle. Mesmo assim, o norte-americano não conseguiu controlar essa faixa
de fronteira.
O que realmente dá efetividade ao controle das fronteiras é o trabalho conjunto do
Exército, Polícia Federal, Receita Federal, IBAMA e FUNAI, além de equipamentos com
plataformas altamente móveis, respaldando os pelotões de recursos compatíveis com o
século XXI.
Além de repetir enfaticamente a necessidade do entendimento consistente em que
as Forças Armadas não trabalharem para governos e sim para o Estado Brasileiro, é n ecessário que a sociedade nacional – da qual fazem parte inseparável - decida o que fazer
em relação à faixa de fronteira, impõe-se o reconhecimento do fato de que não existe
uma nação indígena. Existem etnias que vivem em tribos.
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A instalação de bases militares norteamericanas (Mapa 7) na Colômbia: de 3 bases
aéreas, de 2 bases navais - no Atlântico e no
Pacífico - e de 2 terrestres, sendo que uma das
bases aéreas tem capacidade para receber aviões de transporte estratégico C-17 (Palanquero), equipamento utilizado somente em campanhas militares de grande intensidade, não combina com a ameaça representada pela guerrilha
ou por Chavez 12.
Mapa 7
A Venezuela sofre para adaptar o emprego das suas forças ao armamento russo e
chinês e enfrenta grande dificuldade logística com as compras de armas recentes e a m anutenção de caças Sukhoy 30, evidenciando sua dependência tecnológica.
Na realidade a Venezuela não oferece risco militar significativo para nenhum país,
incluindo a Colômbia 13. A crise econômica e a queda do preço do petróleo vêm afetando
os planos de equipamento futuros e a possibilidade de uma invasão terrestre torna-se improvável.
A disposição das bases americanas no continente aponta para região da Cabeça
do Cachorro, no Brasil, e nada têm a ver com a Venezuela e o maior risco que Chavez
representa é o político. A guerra contra o narcotráfico e a ameaça chavista não justificam
esse gigantesco dispositivo14.
Todavia, não é de bom tom considerar essas reflexões como antiamericanismos. A
admiração pela República Americana estará sempre preservada dos banqueiros eugenistas do stablishment Anglo-Americano que se aproveitam dessa potência para direcioná-la
contra os demais países, enfraquecendo a liberdade americana.
12Chavez fez muitas compras de armas, destacando-se a aquisição de 24 Sukhoy 30MK2, com a possibilidade de se chegar a 150, de radares tridimensionais
chineses, sistemas Tor-M1 de defesa aérea russos e 100 mil fuzis AK-103. Existem informações sobre o desejo de comprar armas mais sofisticadas.
13 O simples deslocamento de um porta-aviões Nimitz para a costa venezuelana bastaria para destruir toda a capacidade aérea e grande parte da infraestrutura do
país, incluindo as estradas principais, e garantiria a defesa do seu aliado colombiano em caso de ataque.
14 Isto deveria levar os americanos, na pior hipótese, a concentrar a sua infraestrutura em Cartagena e na Zona de Guajira, de onde poderiam atacar Maracaibo e
Caracas, defendendo-se com baterias Patriot e misseis anti-aéreos, além de conter qualquer invasão terrestre pelo norte junto aos aliados colombianos.
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Mapa 8
Qualquer estudo sobre as chamadas reservas indígenas brasileiras na Amazônia deve, prioritariamente, considerar
a extensão das mesmas, destacando as
localizadas nas Faixas de Fronteiras, zonas sensíveis para as Forças Armadas,
formando verdadeiros territórios contínuos
como se pode observar nos mapas 8 e 7.
A extensão da Reserva Raposa do Sol vai desde a fronteira com a
Guiana15 até a zona da Cabeça do
Cachorro, na fronteira com a Colômbia. Visto que a área intermediária
entre as reservas da Cabeça de Cachorro e a Reserva Yanomâmi se
encontra em processo de se tornar
nova reserva (a Cué-Cué Marabitanas), mais ao leste, no estado de
Roraima, o território entre a Reserva
Raposa Serra do Sol e a Reserva
Mapa 9
Yanomâmi está pontilhado de enclaves.
Por outro lado, a antiga desconfiança boliviana é dispensada ao Brasil, desde os
tempos coloniais, diante da percepção de uma futura expansão para o Oeste em busca
de uma saída para o Pacífico, absorvendo o Alto Peru (atual Bolívia, quando o Peru incluía também o Paraguai), a Argentina e a Província Cisplatina (atual Uruguai) a fim de garantir a ligação da costa brasileira com o interior da América do Sul pela Bacia do Prata.
15 País onde grandes áreas estão sob controle da WWF ou são territórios indígenas.
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A expansão do Brasil para o Oeste somente ocorreria no final do século XIX, com o
boom da borracha, quando os brasileiros compunham a maioria da população do Acre,
até então boliviano, na maior parte e também envolvido em disputas com o Peru.
O reconhecimento de que só recentemente as regiões Norte e Oeste estão sendo
ocupadas, especialmente a Amazônia, deve-se a uma mudança do processo econômico
que superou o extrativismo, quebrando o isolamento com o Sul e Sudeste do país, iniciado com a construção da Belém-Brasília. Embora estivesse presente na visualização dos
grandes problemas desde o período colonial, a ocupação do Norte ficou condicionada
pelas limitações e características temporais que transformaram o Brasil Amazônico em
região exportadora de toda a produção e importando para próprio consumo, sendo por
isso a mais penalizada das regiões, pelas variações do mercado internacional (Osiris da
Silva, 1962, p. 63).
O desinteresse do governo Central na questão do Acre demonstra claramente o
descaso do Poder Central da República pelo Norte, ante o despudor da interferência norte-americana que explode com a entrega do Acre ao Bolivian Sindicate, chefiado pelo filho
do então presidente Roosevelt, tendo como figura de proa o embaixador boliviano Felix
Aramayo. Somente depois do comunicado do então Ministro das Relações Exteriores B arão do Rio Branco (24 de Janeiro de 1903), observa-se uma mudança na atitude do Governo Federal, concretizada no Tratado de Petrópolis (Wesley, 1997).
Rio Branco conseguiu evitar a arbitragem do problema pela Inglaterra, alternativa
sugerida pelo Barão Rothschild, o maior credor do Brasil (cujo filho, August Belmont, era
acionista do Bolivian Syndicate), e a intromissão do governo de Theodor Roosevelt (seu
primo, W.E. Roosevelt, também acionista da companhia), negociando diretamente com o
governo boliviano, numa ação que exigiu extraordinária habilidade diplomática e pressão
militar. O envolvimento dos EUA e da Inglaterra na questão, poderia levar à abertura do
rio Amazonas, necessário à ligação do Acre com o Atlântico.
Com a incorporação do Acre ao país, a navegação do Amazonas permaneceu exclusiva do Brasil.
Recentemente, contando com o apoio do governo brasileiro, Evo Morales, presidente boliviano, expropriou a Petrobrás na Bolívia, invadindo as refinarias com o exército.
Questiona frequentemente a posse do Acre e começa a expulsar brasileiros dos territórios
limítrofes, instalando cocaleros no seu lugar e trazendo a produção do alcaloide para as
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fronteiras do Brasil (Defesa Net, acessado em agosto/2012). O mesmo ocorre com o Paraguai depois que o ex-presidente Lugo - frequentador assíduo do Foro de São Paulo anulou a dívida com o Brasil para dispor como desejar a energia de Itaipú, construída com
dinheiro brasileiro após a hábil negociação do Embaixador Gibson Barboza, e deu início
ao processo de expulsão de centenas de milhares de agricultores brasileiros .
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V - SOBERANIA E DEFESA DIANTE DA FRAGILIZAÇÃO DE UMA NAÇÃO: o desmantelamento das Forças Armadas e debilidade da Diplomacia
O divórcio ocorrido a partir dos anos 90 entre Diplomacia e Forças Armadas acentua-se no início do século XXI, trincando a união histórica entre as Forças Armadas e a
Diplomacia, em face da diplomacia presidencial, que funciona como cunha geradora do
afastamento do corpo diplomático das Forças Armadas, colocando à deriva a Soberania e
a Segurança e enfraquecendo o PN (poder nacional), graças aos desacertos diplomáticos
gerados na diplomacia presidencial, marcada por descaso nas questões orçamentárias e
pelo ranço histórico que se estabeleceu pós-período militar.
Em nome da economia, dentre centenas de ações negativas promovidas contra as
Forças Armadas, chegou-se ao ponto de interromper a continuidade na formação anual
dos nossos contingentes de reservistas, podendo com tal irresponsável ato produzirem
sérias consequências para a integridade territorial do país se houver necessidade de uma
mobilização em caso de guerra.
Os inúmeros cortes de verbas e o prejuízo na preparação das turmas de aspirantes
a oficial das academias militares de Agulhas Negras, Pirassununga e da Escola Naval
quebram a continuidade na formação de toda a cadeia de c omando, que vai dos tenentes
aos oficiais generais.
Dentro da lei, o limite acima citado, a ser entendido como Estado de Necessidade,
deve obrigatoriamente ter que existir, e se o foi – atingido - os chefes militares deixaram
de cumprir com suas missões constitucionais. Em um trecho da carta enviada aos generais do Exército em 12 de outubro 2002, pela diretoria da ASMIR-PR (Associação do Militares da Reserva do Paraná), Coronel - Oficial de Estado Maior, Roberto Monteiro de Oliveira, pode-se ler:
“(...) E, se esta nossa avaliação for correta, já estamos perigosamente
próximos da situação extraordinária que São Tomás de Aquino e também o nosso Direito Positivo define como Estado de Necessidade, em que todos os fatores
adversos atingem um nível de gravidade e complexidade tão agudo que se potencializam entre si, o que tende a engendrar um cenário tão excepcional que dá
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origem ao chamado Estado de Necessidade, no qual as avaliações, os juízos, os
conceitos, as decisões, e até os atos devem estar referenciados a parâmetros de
hierarquia superior, filosófica, quase de ordem metafísica, acima, portanto, das
normas, regras, valores e até dos princípios normais do Direito Positivo Salus
Patriae Suprema Lex.
E esse Estado de Necessidade pode — in extremis — tornar lícita (para
alguns até mesmo um dever) a desobediência civil contra o tirano injusto que
quer destruir a Pátria (...)”.16
Os sucessivos governos, neoliberais ou assemelhados, colocaram em risco a segurança do Estado e o patrimônio nacional ao desmobilizar e desarmar criminosamente as
Forças Armadas, sem que ocorra uma insurreição, de ofício, por parte de seus comandantes, dentro do que prevê a Constituição da República, a Lei de Segurança Nacional e
o Código Penal Militar.
Conforme Fregapani (2012), os alertas feitos publicamente por generais do Exército de que só há munição para uma hora de combate, torna-se mais alarmente diante da
constatação de que a única fábrica de munição não ser nacional, estar sediada em um
paraíso fiscal e o próprio Exército bloqueiar, de forma inexplicável, a fabricação de munições nacionais, desconsiderando os avisos às pressões do FMI e demais esquemas da
oligarquia financeira transnacional, quando tem seus interesses contrariados e passam a
urdir a substituição de gestores.
Em 1982, ficou estabelecido nos termos do Consenso de Washington, além da criação do Ministério da Defesa, o da submissão do Brasil ao Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis.
O tanque de combate EE-T1 Osório, desenvolvido pela extinta Engesa S/A, parte
do emergente complexo industrial militar brasileiro, é um dos melhores exemplos para
denunciar essa política que submete as FFAA ao contínuo desarmamento e a dependência da boa vontade de governos estrangeiros para o fornecimento, através das Comissões
16 Ao lançar mão deste Direito o ex-ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Werner Brauer, quando FHC, para humilhar as FFAA, nomeou para o recém criado Ministério
da Defesa um elemento civil, desqualificado e supostamente ligado a atividades ilícitas no Estado do Espírito Santo. Werner Brauer, corajosamente, denunciou o ato,
mas, desgraçadamente, foi abandonado por seus pares e por isso exonerado.
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Mistas de Compras no exterior, de suprimentos e de material bélico caro, inadequado e
ineficiente17.
Segundo declarações de um engenheiro de armamentos, ex-executivo da Engesa:
“Nesse momento as luzes de emergência se acenderam no governo americano. A
primeira consequência foi a surpreendente declaração de que a concorrência chegava ao
fim com dois produtos possíveis de serem comprados, de acordo com o anúncio feito em
Riad pelo ministro da Defesa, príncipe Sultan Azsiz Abdulazis. Essa foi a forma encontrada
para ceder às pressões de Washington e manter o M1-A1 no páreo. Na época, começou a
circular no Senado e na Câmara um documento conclamando senadores e deputados a se
envolverem no processo para impedir o fechamento da ENGESA, as demissões de trabalhadores e a perda de mercados cativos caso a encomenda do Osório não fosse concretizada com a Arábia Saudita, país nem sempre amigo.” (entrevista para o jornal O Estado de
São Paulo de 10/11/2002).
Em 1991, com o fim da ENGESA, articulado pelo governo dos EUA com a colaboração do governo brasileiro, o Exército ficou sem um fornecedor nacional de um tanque
de combate do mesmo nível do Abrams norte-americano, do Challenger inglês ou do
AMX-40 francês e de outros carros de combate nacionais, como o Urutu e o Casc avel18.
A assinatura do protocolo de compra do Osório entre o governo brasileiro e o da
Arábia Saudita foi marcada duas vezes pelo então presidente Fernando Collor de Mello
com o rei Fahd. O primeiro encontro, em agosto de 1990, não foi possível porque o prí ncipe Sultan quebrou a perna. Em outubro de 1990, Collor anunciou uma nova data e os
nomes da comitiva oficial liderada pelo general Leônidas Gonçalves. A cerimônia seria
realizada em Roma.
Novo cancelamento foi anunciado, por causa da mobilização para a guerra contra o
Iraque. Em novembro daquele ano, a Arábia fez o anúncio de que fecharia o contrato com
a General Dynamics americana.
17 O Brasil, que já esteve próximo de produzir um dos mais modernos tanques de guerra do mundo, hoje voltou a ser um país importador de blindados usados, mal
repotencializados e de segunda linha, como o Obus autopropulsado 105-M-108, porque em 1989 os EUA impediram que a ENGESA vendesse 702 tanques pesados
— os EE-T1 Osório — para o Exército saudita. O contrato de US$ 7,2 bilhões ficou com o grupo americano General Dynamics, fabricante do tanque M-1A1 Abrams,
segundo colocado nas provas de desempenho promovidas pela Arábia Saudita.
18 O EE-T1 Osório pesava 41 toneladas vazio, peso limite para o seu transporte em carretas rodoviárias, usava blindagem de placas duplas, e levava como arma
principal um canhão de 120 milímetros, capaz de disparar munição supersônica. Além disso, incorporava vasta carga eletrônica. O tanque brasileiro era o único dos
concorrentes projetado especificamente para atender às exigências da licitação. Ao final de uma semana de ensaios, o Osório havia vencido todas as provas.
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Soube-se posteriormente, que a formalização para a compra dos tanques americ anos havia sido concluída antes dos contatos de Collor com o rei saudita.
A ENGESA havia apostado todas as suas fichas no desenvolvimento do Osório,
cuja venda para a Arábia era tida como certa; contraiu uma dívida de US$ 53 milhões que
contribuiu para sua falência, e poderia ser refinanciada, tranquilamente, com o apoio do
governo federal. Entretanto, Fernando Collor não encomendou nenhuma unidade do Os ório para o Exército Brasileiro e a ENGESA desapareceu fechando cinco fábricas e extinguindo cerca de 6 mil empregos, com graves consequências econômicas, sociais e militares.
Após este lamentável episódio, o Brasil comprou para o Exército 87 tanques Leopard lAl da Bélgica e 91 M-60 A3 TTS dos EUA e, recentemente, os dois últimos exemplares do EE-T1, que faziam parte da massa falida da ENGESA, foram incorporados ao Exército Nacional, com autorização judicial, o que conduz a hipótese de que talvez algum
governante já tenha assinado secretamente a nossa rendição, em termos mais vis do que
os do Tratado de Versalhes e o Brasil e suas Forças Armadas não foram avisados.
A recente revisão do conceito de Estratégia Nacional de Defesa (END) parece ter
seu objetivo esvaziado. Um processo desta natureza depende muito do envolvimento da
sociedade civil e da participação dos setores mais dinâmicos e qualificados do país tendo
em vista que o Conceito Estratégico só se torna Nacional a partir do momento em que o
País o assume como seu.
Não é o que se vive. O plano em curso, no Brasil, há muito promove a demolição
das Forças Armadas 19 e apesar dos modelos econômicos da geopolítica possuir um movimento relativamente previsível, nada garante que a ordem internacional se manter á igual nos próximos anos, especialmente se houver uma turbulência suficientemente forte
para desfazer as atuais alianças e abrir espaço para realinhamentos. Se isto acontecer, o
Brasil ficará na posição de uma nação cheia de riquezas e um enorme potencial econômico e militar, uma vez que faz questão de mostrar ao mundo o quanto pode desperdiçar
em eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, e anuncia que abdicou da força
19 A substituição por “forças populares”, comum nas ditaduras socialistas encerra elementos funestos.
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como recurso para a resolução de qualquer questão, provando isso através da pauperização e desmoralização das suas Forças Armadas.
É uma maneira eficaz de promover a cobiça internacional e atrair o desastre. Além
de sucateadas e mal armadas, as forças militares brasileiras só dispõem de munições
para uma hora de resistência, segundo declarou o General Maynard Santa Rosa ao jornal
O Globo. No caso de uma situação de guerra, teríamos que contar com um grande esforço diplomático, a fim de ganhar tempo e mobilizar a Nação às pressas para a defesa do
território e o desencanto de alguns faz com que sugiram, talvez, valer mais a pena contar
com o PCC e o Comando Vermelho, se houver uma invasão. É certo que uma ocupação
militar do Brasil por uma força invasora é quase impossível, e que teríamos condições de
expulsá-la depois de imensos sacrifícios da população civil, mas com a destruição de
nossos centros industriais mais importantes, o que mostra o Brasil como um dos países
mais vulneráveis do mundo (Santayana, 2012).
Atualmente a IMBEL, empresa estatal brasileira ligada ao exército, vem sinalizando
o desenvolvimento de um novo fuzil de assalto a partir do MD-9720, cujo nome é A-2, nos
calibres 5,56mm e 7,62mm, este último mais adequado a experiência de combate brasileira, que não permite a adoção do calibre 5,56mm em todos os teatros de operação que o
território brasileiro comporta 21, como se pode verificar na Amazônia Brasileira, atualmente
o teatro de operações mais importante. Os desvios das munições menos pesadas causados pela densidade da vegetação, elegem o calibre 7,62mm nas unidades como a infantaria de selva.
Mas apesar da penúria por que passam as Forças Armadas desde os anos 90 do
século XX, a pesquisa e o desenvolvimento de armamentos continuam a ser conduzidos
com extremo zelo pelos militares.
Recorrendo a Santayana (2012), pode-se afirmar que a desnacionalização do que
resta de indústria bélica, diante da entrada maciça de empresas estrangeiras, sobretudo
as de Israel, através da aquisição de firmas nacionais ou associações com empreendedo-
20 Parece que o desenvolvimento do mesmo é uma resposta à proposta da Taurus de produzir localmente o fuzil israelita Tavor, no calibre 5,56mm, que só peca por
ser do tipo bullpup. No combate aproximado, tal configuração torna a operação de carregamento problemática por exigir extrema atenção para que o carregador não
se fixe na roupa. A lentidão resultante dessa característica significa muito num combate a curta distância.
21 O 5,56mm cada vez mais usado pelas forças da NATO/OTAN permite que mais munição seja carregada e é menos mortal, causando maiores problemas para os
hospitais de campanha do inimigo, mas exigindo que mais soldados sejam postos fora de combate em operações de resgate.
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res, esvaziam o comando pelo Estado22 na produção de armamentos, contrariando a participação direta na indústria brasileira de defesa, e o grau de conteúdo nacional nas encomendas que estão sendo contratadas junto a empresas estrangeiras, a exemplo da f abricação de blindados pela IVECO. Em caso de conflito, ou mera ameaça de confronto,
entre o Brasil e qualquer país da OTAN (Europa e Estados Unidos), a produção desses
tanques seria descontinuada, e não teríamos como substituir o material perdido em combate, tal como ocorreu com a Argentina, na guerra das Malvinas 23.
O cerco dos países geopoliticamente identificados como ocidentais à indústria bélica brasileira - das empresas que desenvolveram tecnologia militar - nos últimos anos fica
evidente no controle adquirido por grupos internacionais recentemente. Apossaram-se,
assim, do conhecimento desenvolvido por técnicos e engenheiros brasileiros, e agora podem decidir, conforme a orientação estratégica dos governos de seus países de origem, o
limite dessas empresas no desenvolvimento de novas tecnologias bélicas.
Atualmente, seja na área de blindados, na aviônica, na optoeletrônica (como é o
caso de periscópios) ou de aviões robóticos não tripulados, os israelenses – e, por meio
deles, também seus aliados norte-americanos - monitoram tranquilamente cada passo do
Brasil nessas áreas e o lucro do baixo investimento feito por multinacionais estrangeiras
está assegurado por encomendas já contratadas, pela Marinha, pelo Exército e pela Força Aérea. Em muitos casos, nossas forças armadas já desenvolviam sistemas em parc eria com as empresas que estão sendo desnacionalizadas, quando ainda estavam sob
controle local.
Vale, porém, ressaltar que após o período dos governos militares o escasseamento
orçamentário e o engavetamento dos projetos sob a alegação da falta de ameaças e inimigos, enfraqueceram os argumentos militares para o sistema de Defesa. Mas isso serviu
para impulsionar o desenvolvimento da tecnologia e da indústria no meio militar, apesar
da atual ameaça proveniente da crise econômica europeia e norte-americana que sufocadas pelos cortes nos gastos, atiram-se vorazmente sobre os mercados com preços altos
para cobrir os investimentos feitos. Tropeçam, no Brasil, nas prioridades estabelecidas na
Estratégia Nacional de Defesa/Lei 12.598/2012 (fomento da indústria nacional de defesa e
22 A cada ano, devido à Amazônia e ao Pré-sal, entre outras razões, cresce a importância de a Nação aumentar (como acontece na Europa com complexos industriais militares como a EADS, a Navantia e a Finmecannica) a participação direta do Estado na indústria brasileira de defesa, e o grau de conteúdo nacional nas encomendas que estão sendo contratadas junto a empresas estrangeiras.
23 A fabricação de 2000 blindados ligeiros Guarani no município de Sete lagoas – MG pela IVECO prevê que apenas 60% das peças sejam fabricadas no Brasil.
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a geração de emprego e renda no País) e na emergência de uma nova política que tem
como representantes principais a ORBISAT, fabricante de radares, comprada pela Embraer no ano passado 24, e a THALES com o objetivo de expandir os negócios da área de
aviões militares para as forças terrestres e navais (http://www.defesabr.com/blog, 2011).
A Embraer Defesa e Segurança escolhida pelo Exército Brasileiro para executar o
projeto piloto do SISFRON (Sistema de Monitoramento de Fronteiras, Mapas 10 e 11),
contempla contempla, uma área de aproximadamente 600 quilômetros de fronteira terrestre, na fronteira do Estado do Mato Grosso do Sul com o Paraguai e a Bolívia. Prevê, ainda, o monitoramento de uma área de quase 17 mil quilômetros quadrados de fronteira
seca, envolvendo dez países sul-americanos e onze Estados brasileiros e poderá envolver uma área de até 900 quilômetros, devido aos sensores, que contemplarão toda a área
de responsabilidade do Comando Militar do Oeste.
Mapa 10
Mapa 11
A recém-criada SAVIS, (Secure Advanced VISA Issuing System) 25 conforme informação da EMBRAER atuará na gestão integrada de projetos de monitoramento e controle
de fronteiras, estruturas estratégicas e recursos naturais. A fabricante brasileira de aviões
informou que a SAVIS foi criada com o objetivo de fazer frente às necessidades nacionais
no setor de defesa e segurança e consequentemente estimular o desenvolvimento tecno-
24 Desenvolvem radares para o Exército que enxergam sob as copas de árvores da Amazônia e forneceram ao Exército 11 radares antiaéreos e 6 comandos de
operação de artilharia antiaérea, um dos 7 projetos estratégicos da força.
25 Foram desenvolvidas pesquisas para determinar como atingir um elevado grau de segurança para a emissão de Visto necessário no controle fronteiriço a fim de
minimizar as vagas de migração ilegais e o crime organizado.
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lógico nacional, inclusive para posterior exportação, fortalecendo assim a indústria naci onal e a balança comercial brasileira.
O projeto SISFRON também atraiu o interesse das grandes empreiteiras brasileiras, que se associaram a grupos de defesa estrangeiros para participar da concorrência,
mas a vitória da Embraer nessa primeira etapa do projeto demonstra que o governo priorizou o nível de conteúdo nacional oferecido pelas empresas que disputaram a licitação,
confirmando as declarações do presidente da Embraer Defesa e Segurança, Luiz Carlos
Aguiar, ao assegurar que um dos principais diferenciais da proposta apresentada pela
empresa era o nível de conteúdo nacional com índice de 60% exigido pelo Exército Brasileiro.
Talvez esses novos fatos possam atenuar a aprovação desastrosa ocorrida no Governo de Fernando Henrique Cardoso, da emenda constitucional que transformou para
todos os efeitos, em brasileira qualquer empresa instalada no Brasil - mesmo que controlada por capitais públicos ou privados estrangeiros – por mais que se esforce o atual governo não consegue impedir o processo de desnacionalização e em alguns casos a fabricação de armamentos é feita – sem subterfúgios ou hipocrisia – por empresas diretamente controladas por governos estrangeiros.
Esse é o caso da DNCS, Direction des Constructions Navales, – que tem 75% de
suas ações nas mãos do governo francês 26. Para Santayana (2012), a estratégia dos Estados Unidos e da Europa Ocidental, com relação ao Brasil, está cada vez mais clara,
conforme se pode observar nos itens elencados pelo Autor como segue:
- Impedir o desenvolvimento de tecnologia nacional própria, com a compra de qualquer empresa que procurar desenvolvê-la;
- Associar-se à empresa que não se puder comprar, oferecendo cooperação no
desenvolvimento da tecnologia, com o intuito aparente de ajudar o país a queimar etapas,
mas, na verdade, para impedir que qualquer avanço se faça à sua revelia, sem a sua vigilância ou participação.
- Impedir que o dinheiro gasto com o reaparelhamento das Forças Armadas chegue
às mãos de empresas sob controle nacional, e que esse dinheiro não seja investido para
26 Associou-se à Odebrecht, para construir, em Itaguaí, no Rio de Janeiro, quatro submarinos da classe Scorpéne, e mais o casco do futuro submarino nuclear
brasileiro – encomendados por 7 bilhões de dólares, através de contrato- negociado pelo então Ministro da Defesa Nelson Jobim
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avanços de caráter tecnológico que coloquem em risco a hegemonia de suas empresas
no mercado brasileiro e no exterior.
- Cooptar, com associações ou contratos de representação e de “lobby”, pessoal
da reserva das forças armadas, principalmente ex-adidos militares brasileiros no exterior,
para vender, como uma coisa ideologicamente natural, a associação do Brasil com empresas ocidentais para a produção de armamento, de forma a impedir que a Nação recorra a outras opções.
- Impedir a reunião, coordenada, de pequenas empresas brasileiras de grande potencial tecnológico, em grandes consórcios industriais militares de inspiração ou controle
público, como os que existem no Ocidente, como a Lockheed Martin, ou a própria EADS.
- Diminuir, via participação na maioria dos contratos, a realização de parcerias entre empresas brasileiras de defesa de qualquer porte e empresas não ocidentais, como as
existentes nos países BRICS, e, se não puder impedir a cooperação entre uma empresa
brasileira de defesa e uma congênere do BRICS, estar presente acionariamente ou como
participante do projeto, do lado brasileiro, para “controlar” essa aproximação.
- Estabelecer, coordenadamente, via supervisão dos métodos de produção e administração e baixos índices de conteúdo nacional, um alto grau de dependência da indústria nacional de defesa com relação aos seus “parceiros” e controladores ocidentais,
tornando-se capaz de paralisar as linhas de montagem de seus armamentos em nosso
país, em caso de conflito, ou de potencial conflito, entre o Brasil e esses países.
A legislação perversa, do ponto de vista da defesa do capital nacional, obrigada a
concorrer com empresas que contam com acintoso apoio – direto e indireto – dos governos de seus países de origem, e as agências reguladoras nacionais, incluindo o CADE,
não fazem nenhuma distinção entre empresas de capital nacional ou estrangeiro, até
mesmo quando grandes grupos autenticamente nacionais tentam se expandir via aquisições, no mercado internacional.
Parecendo ser insuficiente, o Brasil ainda enfrenta internamente o absurdo dos
formadores de opinião na defesa do entreguismo e da capitulação da Nação, em um
mundo em que os países que mais intervêm na economia são justamente os que mais
crescem e onde os mais poderosos são os mais nacionalistas, como é o caso da China,
dos Estados Unidos, da Alemanha e do Japão.
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A recente criação da AMAZUL (Amazônia Azul Tecnologias e Defesa) - aprovada
por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados no dia 30 de maio do ano em curso - para cuidar da produção do propulsor nuclear que irá equipar o futuro submarino nuclear brasileiro, pode ser mais um impulso para a independência do Brasil na área de defesa, constituindo-se em uma estatal, que não poderá ser vendida a nenhum grupo estrangeiro. Isso poderá representar – se houver decisão política nesse sentido por parte do
governo – um divisor de águas na política brasileira de defesa, afirma Santayana (2012).
Poderá ser – e o Brasil precisa disso - a primeira de grandes empresas cem por cento
nacionais, destinadas à produção de armamento, transformando-se no embrião de um
grande estaleiro estatal, acoplado a uma importante escola de engenharia naval, para a
Marinha, além de constituir exemplo para a criação de uma empresa desse porte também
para a força terrestre.
Entretanto, a diplomacia brasileira, conforme determina a Constituição, deve ser
conduzida pelo presidente da República, mas isso não significa que essa liderança seja
exercida de forma arbitrária como se observa nas duas últimas décadas 27. Além da partidarização sistemática da política externa, que transformou a diplomacia em exercício ideológico, cujo perfil, danoso ao País, apegado a um antiamericanismo pueril, recentemente agregou movimentos voluntariosos a fim de imprimir a marca pess oal28.
Em fevereiro de 2007 a revista VEJA publicou a entrevista concedida por Roberto
Abdenur, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e ex-secretário geral do Itamaraty
(durante a primeira passagem de Amorim pela chefia do MRE), rotulando a política externa brasileira de Amorim-Lula de ideológica, antiamericanista e denuncia a “intolerância à
pluralidade de opinião” no seio do Itamaraty, desencadeando e promovendo tensões políticas que se arrastam até hoje.
27 Casos dignos de figurar em manuais de relações internacionais, mas pelo seu aspecto negativo. O Brasil apequenou-se ante a ocupação, por tropas bolivianas, de
duas refinarias da Petrobrás naquele país, em maio de 2006. A resposta ao óbvio vilipêndio do patrimônio brasileiro, do então mandatário foi de que o ato boliviano
era "soberano" e que a Bolívia precisava de "carinho".
28 Acumulam-se demonstrações e gestos de voluntaristas. A fim de mostrar sua força como estadista, na conferência do clima Rio+20, a Presidente impacientou-se
com seus diplomatas e preferiu festejar um documento final articulado, às pressas, para não ter peso decisório nenhum, de modo que pudesse ser aceito por todos e
dar a impressão de uma grande competência diplomática. Posteriormente, quando da destituição do então presidente Fernando Lugo, no Paraguai, também em junho,
aceitou sem titubear a tese de que houve um golpe e que, portanto, o Paraguai tinha de ser duramente punido. Patrocinou pessoalmente a lamentável manobra de
inclusão da Venezuela no MERCOSUL, aproveitando a oportunidade do “golpe” a que foi submetido o Paraguai, que resistia ao ingresso do país de Hugo Chávez no
já desacreditado bloco sul-americano.
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Posteriormente, Mário Gibson Barboza escreveu uma coleção de artigos criticando
a condução do MRE feita por Amorim, acusando abertamente estar havendo:
“[...] politização dos diplomatas, para que possam obter promoção ou os melhores
postos no exterior. Por ‘politização’ entenda-se entusiástica adesão política ao petismo e
ao atual governo; absurda e desnecessária criação de novos 400 cargos de diplomatas,
quando éramos pouco mais de 900; leitura obrigatória de textos históricos e/ou diplomáticos e subsequente e vexatória ‘tomada de lição’, visando à formação de uma ideologia unificada” (BARBOZA, 2008, 173).
O desagrado no meio diplomático se evidencia nas duras críticas ao ministro Celso
Amorim, feitas em carta aberta publicada no Jornal do Brasil em 16 de dezembro de 2007,
pelo embaixador aposentado Marcio de Oliveira Dias, ao acusar o rompimento das tradições históricas do Itamaraty, diante do viés partidário que se implantou no comando da
Casa em nome de questões ideológicas:
“Como um grande número de colegas, acompanho com desaprovação, mas, em silêncio, a maneira como você e Samuel [Pinheiro Guimarães] vêm conduzindo o Itamaraty.
Hierarquizados como somos, ainda acreditamos no velho bordão de que quem fala pela
Casa é o seu Chefe. Assim, ao nos darmos conta, logo no início do Governo Lula, de quem
iria dirigir a Casa nos próximos anos, muitos preferimos aposentar-nos a seguir na ativa
sob uma direção de que fatalmente discordaríamos. A propósito, nunca em momento algum do Itamaraty, houve tantos Embaixadores aposentados voluntária e precocemente
(...). Com o Governo do PT e conhecendo a sua ‘flexibilidade’, mais o viés ideológico do
Samuel, vários, como eu, previmos o que estaria por acontecer e, com o espírito de disciplina da carreira, preferimos dela nos afastar, por estimarmos que viéssemos a discordar
frontalmente da maneira pela qual a Casa seria conduzida” (DIAS, 2007, p. A11).
Além de ressaltar que nunca, em momento algum do Itamaraty, houve tantos embaixadores aposentados voluntária e precocemente, contrariados com os rumos da atual
gestão, antes da data compulsória, critica duramente o comportamento indiferente de
Celso Amorim após a morte do embaixador Mário Gibson Barboza, no fim de novembro.
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VI – CONJUNTURA NACIONAL E COMPLEXIDADE ATUAL
As colocações até aqui feitas são somente uma tentativa de reflexão baseada em
fatos atuais à luz do conhecimento histórico, na busca de compreender o comportamento
errático da política externa brasileira.
Na política externa norte-americana, especialistas aparentam involuntariamente
prejudicar o próprio interesse nacional, apunhalam os aliados pelas costas, mas não se
pode acreditar nesse comportamento involuntário, quando se analisa com acuidade os
grupos que dominam os EUA e a política desses grupos, cujo poder se estende por várias
organizações, partidos e ideologias aparentemente divergentes. Nada mais é do que um
método dialético que pode ser aprendido com alguns estudos sobre as técnicas desenvolvidas pela inteligência soviética (Cheka) 29, por sua vez desenvolvidas a partir do know
how britânico. Esses especialistas não podem ser vistos como tendo esse comportamento
involuntário, quando se analisam com acuidade os grupos que conduzem efetivamente
aquele país e cujo poder se estende por várias organizações, partidos e ideologias ap arentemente divergentes como se pode observar no exemplo venezuelano a seguir.
A chegada de Chávez ao poder se fez com a ajuda dos norte-americanos e com
recursos da Ford e da Rockefeller Foundation, fornecidos aos esquerdistas da América
Latina. O mesmo Chávez que depois a CIA ajudou a derrubar num golpe fracassado, que
mais pareceu uma farsa (tão rápida foi a ajuda do grupo convocado pelo então presidente
Jimmy Carter), que ficou ao lado dos EUA de Obama na questão de Honduras (apoiando
um ex-liberal que se tornou chavista e se recusou a respeitar a constituição, sendo por
isso destituído e expulso), e que agora se arma até os dentes e exporta sua revolução
para o continente.
Esses fatos levam a suspeitar que os grupos dominantes dos EUA estejam criando
um inimigo poderoso na América Latina, visando uma futura intervenção no continente,
semelhante ao ocorrido com a União Soviética e com a Alemanha Nazista (Sutton, 1976),
29 Cheka a primeira polícia secreta da União Soviética fundada por Felix Edmundovich Dzerzhinsky (1877-1926), do partido Social Democrata na Polônia, em 1900.
Passou a maior parte da sua vida preso por suas atividades revolucionárias. Em março de 1917, livre, após uma prisão de cinco anos, seu primeiro ato foi filiar-se ao
Partido Bolchevique. Dada a sua honestidade e seu caráter incorruptível, aliados à sua devoção à causa do partido lhe renderam o apelido de "Felix de Ferro”. É
atribuída a ele a seguinte frase: "Um membro da Cheka deve ter a cabeça fria, o coração quente e as mãos limpas." Era considerado por Lenin como um herói.
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tendo como coadjuvante o movimento comunista da região, liderado pelo Foro de São
Paulo e cujo mentor governa a Venezuela.
Empreender uma verdadeira guerra patriótica contra os gringos, a fim de unir o
continente e estabelecer uma ditadura comunista nacionalista no Brasil e na América Latina, com vista à formação da URSAL, faz parte de um jogo que podem ter resultados f unestos, almejados pelos norte-americanos para poderem lançar-se sobre a Amazônia,
que sob o domínio estrangeiro, respaldaria a união do Brasil e do continente lembrando
os acordos entre bolcheviques e a Alemanha do Kaiser Guilherme I.
As implicações estratégicas para os países do continente americano ocasionadas
pelo terremoto do Haiti desnudaram a impotência militar do Brasil e dos seus aliados Venezuela e Bolívia.
Mapa 12
O terremoto abafou a tentativa de
intimidação do então governo interino de
Honduras no episódio Zelaya, desviando
a atenção ao término da vergonhosa hospedagem dispensada na embaixada brasileira, enquanto os Estados Unidos instalavam 20.000 homens no Haiti, configurando um fator de dissuasão para Cuba e
Venezuela.
Se na época áurea dos cartéis colombianos, a infiltração do dinheiro da
droga no sistema político e policial americanos foram alarmantes, agora, com os
cartéis mexicanos ao lado e as maras associadas, dentro das fronteiras americanas, piorou30.
30 Contam com o apoio de organizações como o La Raza, grupo que defende a separação do sul dos EUA (e cujo presidente faz parte do governo Obama). Há
milhões de imigrantes mexicanos e latino-americanos que podem servir como ingênuos úteis desses bandos.
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Sempre a pretexto da guerra contra as drogas, os Estados Unidos aumentaram a
sua presença militar, construindo novas bases na Colômbia (Mapa 12) e já circulam informações da crescente presença da Black Water no Brasil em plataformas petrolíf eras e
reservas indígenas 31.
O personalismo imposto à política externa evidencia decisões tomadas não exatamente segundo o interesse nacional, mas de acordo com projetos de afirmação e manutenção de poder. Esse atalho ocorrido na aproximação irresponsável com autocratas c omo Chávez, comprometeu a independência do Brasil na definição de seus interesses e xternos. Em nome da exigência de buscar a "formação de uma comunidade latinoamericana de nações", conforme determinação constitucional se colocou o país a serviço
do delirante projeto bolivariano, exemplo do Socialismo do Século XXI adotado pelo grupo
de diplomatas brasileiros que assessora o governo32, e, atualmente, além de enfrentar as
idiossincrasias pessoais que contrariam os princípios basilares da diplomacia nas mesas
de negociação, compromete a diplomacia nacional, que sempre se pautou pelo comedimento, enfraquecendo a influência do Brasil no concerto internacional.
A complexidade atual remete ao fato de que qualquer estudo sobre as chamadas
reservas indígenas brasileiras na Amazônia deve prioritariamente considerar a extensão
das mesmas destacando as localizadas nas Faixas de Fronteiras, zonas sensíveis para
as Forças Armadas, formando verdadeiros territórios contínuos, valendo o alerta de Fregapani:
“A multiplicação das reservas indígenas, exatamente sobre as maiores jazidas minerais, usa o pretexto de conservar uma cultura neolítica (que nem existe mais), mas visa
mesmo à criação de ‘uma grande nação’ indígena. Agora mesmo assistimos, sobre as brasas ainda fumegantes da Raposa-Serra do Sol, o anúncio da criação da reserva Anaro,
que unirá a Raposa/São Marcos à Ianomâmi. Posteriormente a Marabitanas unirá a Ianomâmi à Balaio/Cabeça do Cachorro, englobando toda a fronteira Norte da Amazônia Ocidental e suas riquíssimas serras prenhes das mais preciosas jazidas”. (Fregapani, 2012)
31 O Gal. Durval Antunes de Andrade Nery (Escola Superior de Guerra) denunciou a presença da Black Water em reservas na Amazônia e em plataformas de petróleo na costa do país.
32 Coordenados por Chávez e Marco Aurélio Garcia.
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A cobiça sobre a Amazônia se expressa atualmente não somente por invasões e
conflitos e a perda vem se encaminhando da forma mais perniciosa e letal: através da
política externa adotada há mais de 10 anos.
As ameaças atuais geradas pelo vazio demográfico ou pela ausência do Estado f avorecem o tráfico de armas e ações terroristas em todo o território nacional, graças ao
vazio de poder que sempre se apresenta quando se coloca pessoas vazias no comando
de um governo, cuja incompetência ignora que para alcançar o tão almejado Desenvolvimento Sustentável, não pode se pautar numa economia política de meio ambiente onde a
problemática ecológica desconsidera a realidade de que a preservação dos recursos e
investimentos realizados, entre si e as instituições, requerem o uso regulamentado e monitorado, conhecido e aceito, por civis e militares independentes de ideologias presas ao
ranço do passado.
Entre as ameaças atuais talvez o sistema hidrográfico brasileiro na Amazônia oculte uma das mais complexas (Mapa 13). A revolução tecnológica estabelecendo novas
fronteiras e inovações bélicas não são capazes de apagar a realidade de ter a nascente
do rio Amazonas em um país lindeiro.
Mapa 13
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Em outro escrito (Wesley, 2011), foi assinalado que na visão do Estado a rala densidade demográfica nas regiões limítrofes com os demais países latino-americanos configura um território afeito à guerrilha, carente de controle e integração através de forte ação
geopolítica. Ressurgem preocupações estratégicas, sobretudo para a Amazônia, impondo-se uma geopolítica intensa, capaz de exercer vigilância e controle, considerando-se o
passado de guerrilhas e contrabandos e a atual ação das FARCs e de narcotraficantes
que tangenciam atividades terroristas. As ópticas e interesses externos que veem a região
de uma maneira totalmente diferente somam-se à óptica endógena da sociedade local,
possibilitando ações concretas para o surgimento de um novo espaço regional e ou de
uma nova Amazônia que desconsidera o ecossistema regional e os recortes naturais, como se constata na antiga ocupação ao longo dos rios.
Acrescente-se, ainda, o fato de que uma das nascentes do Rio Amazonas se loc alizar no córrego Carhuasanta (ou ainda Quebrada Carhuasanta), localizado na região peruana de Apurímac, alimentado pelo derretimento de neve do monte Nevado Mismi e é
um dos nomes dados ao Rio Amazonas em sua saída do Peru antes de chegar ao Brasil.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Quebrada_Carhuasanta). Tal fato obriga a ficar atento à tradicional colocação de quem comanda a foz, comanda o curso, assertiva esta que pode ser
contestada, considerando-se a possibilidade de o Peru instalar hidroelétricas em seu território a fim de prover as suas necessidades energéticas 33.
A insegurança urbana e rural provenientes das fissuras na organização do Estado
surge da perda de autoridade ocorrida na entrega gradual de suas leis a grandes empresas, caracterizando a criação do vácuo no poder onde se instalou o poder paralelo responsável pelos picos de insegurança, aumento da desigualdade, eclosão da violência e
empobrecimento regional que conformam a contra-face da modernização 34.
Apresentando uma política externa, no mínimo estranha, o Brasil deixou de aproveitar a porta aberta pela crise internacional para se apropriar de mão de obra especializada e de tecnologia que estão disponíveis lá fora, sem abrir mão de controlar, sozinho,
uma área que é estratégica para o país.
Novas faces corsárias se impõem, mas os objetivos são antigos.
33 Basta observar os exemplos na implantação de grandes projetos (entre os índios Waimirí /Balbina; as populações heliêuticas e camponesas – INGÁ, e mais
recentemente o caso Belo Monte).
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