uma estratégia brilhante

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uma estratégia brilhante
UMA ESTRATÉGIA BRILHANTE
Por Raul Marinho
Com o sucesso que o filme “UMA MENTE BRILHANTE” está fazendo, a história do matemático John
Forbes Nash Jr. se tornou popular. Mas suas idéias ainda não. Muito mais interessante que sua
esquizofrenia ou seu casamento, o trabalho de Nash foi tão revolucionário que não foi aceito como tese de
doutorado em Princeton em 1950 (ao contrário do que o filme dá a entender) para ser reconhecido com o
Nobel em 1994. Na verdade, aquele Nobel foi um reconhecimento da comunidade científica sobre um
trabalho desdenhado 44 anos antes.
Nash trabalhou sobre o que ficou conhecido como “Teoria dos Jogos”. Esta teoria foi concebida em 1944
por dois outros matemáticos: Oskar Morgenstern e John von Neumann; este último famoso por ter sido
um dos pais da bomba atômica e do computador digital. A “Teoria dos Jogos”, assim como o trabalho de
Nash, é extremamente polêmico. Morgenstern e Neumann conceberam uma série de “jogos” onde os
“jogadores” se defrontavam com situações em que tinham que realizar escolhas com base na escolha do
outro “jogador”. O “jogo” mais famoso ficou conhecido como “O Dilema do Prisioneiro”, uma função
matemática que explica a cooperação ou não-cooperação entre os “jogadores”. O que Nash fez foi
explicar o ponto de equilíbrio desta cooperação, no que ficou conhecido como “O Equilíbrio de Nash”.
Mas o que o matemático fez de realmente notável foi expandir esses conceitos puramente matemáticos
para o mundo das ciências sociais, inicialmente a economia. Da economia, a “Teoria dos Jogos” migrou
para a sociologia, a antropologia e ficou especialmente interessante quando chegou à biologia. Hoje em
dia, o que existe de mais moderno em direito, administração, psicologia, e uma série de outras disciplinas
aplicadas deriva da “Teoria dos Jogos”. E, após o Nobel de Nash, o assunto ganhou tanta importância que
hoje norteia importantes correntes acadêmicas de pensamento no mundo.
Na biologia, a “Teoria dos Jogos” encontrou grande receptividade na zoologia em geral e na etologia em
particular quando se percebeu que os animais também “jogavam”, em muitos casos de forma análoga ao
homem. Neste ponto, houve a mistura de conceitos e disciplinas diversas, o que dificultou a compreensão
do todo. Seria a matemática (“Teoria dos Jogos”) explicando o comportamento animal (etologia) que, por
sua vez, explicaria o comportamento humano (Sociologia e Antropologia) que levaria a conseqüências no
dia-a-dia humano (economia, administração, direito, psicologia, etc.).
Além da complexidade de cada assunto em particular, existe o agravante deles geralmente serem
estudados por grupos antagônicos. Os matemáticos pertencem a um grupo diferente dos biólogos e dos
cientistas sociais e, freqüentemente, não se compreendem. Fora isto, quando os conceitos evolucionistas
de Darwin se incorporam a esta salada, volta à tona a polêmica ética e religiosa com os criacionistas.
Somente para ilustrar: segundo uma pesquisa realizada em 2001 pelo instituto Gallup nos EUA, 57% dos
norte-americanos não acreditam que o homem é uma evolução dos símios. Note-se que isto decorre do
trabalho de Darwin feito no século XIX (1859, para ser preciso). Se Darwin ainda é polêmico hoje em
dia, imagine Neumann, Morgenstern e Nash!
Este assunto é extenso, complexo e fascinante. Os desdobramentos dele atingem o que de mais
interessante existe nas relações humanas. Na economia, existem exemplos fantásticos, como o tema do
Nobel de 2001 sobre informações assimétricas. Em sociologia e antropologia, estudos sobre cupins e
formigas levaram à criação da sociobiologia, com conceitos muito interessantes para explicar nosso
complexo arranjo social. Estudos sobre símios revelaram um novo conceito psicossocial, o MPI (Male
Parental Investment ou, mal traduzindo, Taxa de Investimento Paterno) que explicaria as razões básicas
emocionais que levariam uma mulher a se interessar por um homem. No direito e na justiça, inúmeros
conceitos de “Teoria dos Jogos” vêm sendo utilizados para a formatação de concorrências públicas mais
eficazes e contratos mais justos e aplicáveis, assim como está sendo mais fácil prever a ocorrência de
crimes como estupro.
Em administração de empresas, a aplicação da etologia em geral e da “Teoria dos Jogos” em particular
oferece um vasto campo de trabalho. Aplicações de conceitos de observação de chimpanzés, por exemplo,
nos ensinam muito sobre as estruturas de poder nas relações corporativas. Estudos sobre a repetição
contínua do “Dilema do Prisioneiro” por outro lado, levam a conclusões surpreendentes sobre estratégias
profissionais de longo prazo. Tudo isto leva à criação de estratégias empresariais verdadeiramente
brilhantes, onde a grande vantagem é a aderência à mecânica comportamental do ser humano.
Hoje em dia, governos e empresas têm utilizado a “Teoria dos Jogos” para suas estratégias microeconômicas. Basicamente, sempre que a sua decisão é interdependente e simultânea em relação à decisão
do outro, estes conceitos podem ser aplicados. Um bom exemplo são as estratégias mais ou menos
protecionistas que os governos adotam no comércio internacional, onde o objetivo é maximizar o
rendimento total variando o grau de cooperação entre países em função da reação do restante do mundo
relacionada à sua própria decisão.
Simplificando a “Teoria dos Jogos”, o que se pretende é responder à pergunta: “O que é mais vantajoso
para mim, tendo em mente que a minha decisão vai implicar em uma reação da(s) outra(s) parte(s):
cooperar ou desertar?” A resposta a esta pergunta leva a desdobramentos espetaculares, onde a melhor
estratégia nem sempre é o que parece ser. Exatamente aí é que está o brilho desta estratégia. Brilho nem
sempre percebido, diga-se.
• Leia aqui a biografia de John Nash Jr., escrita por ele mesmo:
www.nobel.se/economics/laureates/1994/nash-autobio.html

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