Desenvolvimento local, seguranca alimentar e multifuncionalidade

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Desenvolvimento local, seguranca alimentar e multifuncionalidade
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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO,
AGRICULTURA E SOCIEDADE
ÁREA DE CONCENTRAÇÀO : DESENVOLIMENTO E AGRICULTURA
TÓPICOS ESPECIAIS EM ECONOMIA FAMILIAR E MERCADOS
DESENVOLVIMENTO LOCAL, SEGURANÇA ALIMENTAR E
MULTIFUNCIONALIDADE DA AGRICULTURA FAMILIAR
Márcio Carneiro dos Reis
Trabalho apresentado como requisito
Ao Laboratório de Pesquisa em Análise
De Conjuntura e Segurança Alimentar –
Curso de pós-graduação em Desenvolvimento
Agricultura e Sociedade, oferecido pelo
Professor Renato S. Jamil Maluf .
SETEMBRO DE 2003.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................03
A GÊNESE DO DESENVOLVIMENTO LOCAL..............................................04
Anos Dourados: estratégias e representações do desenvolvimento.....................05
Desenvolvimento: novos contornos........................................................................09
Desenvolvimento e multifuncionalidade da agricultura familiar.......................11
A interpretação hegemônica: do emparelhamento econômico ao
político-institucional................................................................................................12
O local como espaço privilegiado do desenvolvimento.........................................15
SEGURANÇA ALIMENTAR E AGRICULTURA FAMILIAR.......................17
América Latina: segurança alimentar e estratégias de combate à pobreza.......18
Mercado de produtos agroalimentares e pobreza na América Latina................21
Análise de experiências............................................................................................21
Concentração de capital, Redes Sociais e multifuncionalidade da AF...............23
DESENVOLVIMENTO E SEGURANÇA ALIMENTAR..................................24
O problema da segurança alimentar visto sob uma perspectiva dinâmica........25
Campos de disputa e a noção de multifuncionalidade da agricultura
Familiar.....................................................................................................................28
Revisitando as estratégias de promoção da segurança alimentar........................29
CONCLUSÃO...........................................................................................................34
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................37
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DESENVOLVIMENTO LOCAL, SEGURANÇA ALIMENTAR E
MULTIFUNCIONALIDADE DA AGRICULTURA FAMILIAR
Márcio Carneiro dos Reis
INTRODUÇÃO
Os anos dourados se foram. Cada vez mais as questões relacionadas ao desenvolvimento e
sua promoção ficam em evidência e muitos motivos poderiam ser apresentados aqui para
justificar o crescimento das preocupações em torno desse tema. Como introdução ao
presente trabalho basta contudo a constatação da oferta insuficiente e do aumento das
dificuldades de acesso a alimentos - e alimentos de qualidade - que rodeia cada vez mais
um número maior de pessoas na maioria dos países. Isso torna a segurança alimentar um
tema com assento garantido nas discussões relacionadas ao desenvolvimento.
Posto isto, o objetivo das páginas que se seguem é procurar tratar a questão do
desenvolvimento local, levando em consideração a problemática concernente à segurança
alimentar. A proposta de reflexão aqui contida encontra-se centrada na percepção da
agricultura familiar como uma forma de organização social e econômica, que possui, dentre
seus atributos, o fato de ser pluriativa e multifuncional. Isto é, se organiza de forma a
acabar por exercer funções relacionadas à segurança alimentar, à eficiência econômica e
social, à preservação do meio ambiente e da paisagem e à organização territorial do espaço
(Soares, 2001).
O que representa a legitimação e o reconhecimento dessa forma de organização social da
produção para a segurança alimentar e nutricional das comunidades em particular e para os
processos locais de desenvolvimento? Que tipo de políticas e ações vêm sendo pensadas e
implementadas no sentido da promoção da segurança alimentar e que acabam por se
desdobrar em processos de desenvolvimento local? O presente trabalho pretende discutir
um conjunto de temas afins no sentido de procurar abrir caminhos para que essas questões
sejam respondidas. O caminho aqui escolhido foi o seguinte: primeiro, trataremos do
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problema relacionado com a gênese do desenvolvimento local como forma predominante
que o desenvolvimento assumiu na década de 1990 e no início da seguinte. Em seguida
serão relacionados a esse tema a problemática da segurança alimentar, vinculada à
agricultura familiar e seu caráter multifuncional. Na conclusão, tentaremos abordar os três
temas aqui trabalhados - o desenvolvimento local, a segurança alimentar e a
multifuncionalidade da agricultura familiar - do ponto de vista da formulação de políticas
públicas para a promoção do desenvolvimento local.
A GÊNESE DO DESENVOLVIMENTO LOCAL
A problemática relativa ao desenvolvimento local assumiu posição central nas discussões
relativas ao desenvolvimento apenas recentemente. 1 Ela surge enquanto tendência geral,
como alternativa às políticas nacionais de desenvolvimento, num contexto de perda relativa
da capacidade dos Estados-Nação de promover a regulação dos processos sociais e
econômicos. Assim, particularmente o desenvolvimento acrescido de seu adjetivo
econômico ocupou um lugar significativo nas ações dos governos nacionais nos trinta anos
que sucederam o fim da Segunda Grande Guerra, sobretudo com base na literatura inserida
nos limites do que se convencionou chamar de economia do desenvolvimento, com
destaque para o keynesianismo. A partir de então, a economia mundial reduziu
significativamente sua marcha e, em meio ao novo estado de coisas que se seguiu, o termo
local tomou o lugar do econômico nas discussões sobre desenvolvimento, muitas vezes
acrescido de outros adjetivos, como sustentável, por exemplo. Como isso ocorreu; o que de
fato encontra-se por detrás de tal mudança; e quais suas implicações são questões que ainda
estão por ser totalmente respondidas.
Em meio a essas questões existe uma que também é intrigante: ao longo daqueles trinta
anos, os Estados-Nação se valeram de uma estrutura relativamente pesada de planejamento
e de instrumentos de política que, pelo menos à primeira vista, contribuíram eficazmente
para a promoção do desenvolvimento ou o que por ele se entendia. No momento posterior e
1
O fato de ter assumido uma posição central nas discussões acerca do desenvolvimento não implica que ela
não era apreciada anteriormente. O trabalho de Albert Hirschman: El avance en colectividadad:
experimentos populares en la América Latina, publicado em 1984, é um excelente exemplo disto.
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na maior parte dos países, essas estruturas de planejamento foram desmanteladas e os
instrumentais de política foram postos de lado, sob o argumento de que são ineficazes ou
que provocam distúrbios muito maiores do que os problemas que procuram solucionar.
Mesmo assim, e a despeito desses argumentos, que assumiram uma forma contrária à
intervenção estatal, cabe a seguinte pergunta: porque as estratégias utilizadas para
promover o crescimento econômico e o desenvolvimento deixaram de funcionar?
Embora o adjetivo econômico tenha perdido seu lugar de destaque no âmbito das
representações acerca do desenvolvimento, pensar nesse aspecto da vida social, isto é, na
relação entre economia e desenvolvimento, implica admitir que, em grande medida, para
fazer uso de uma expressão de Hirschman, desenvolver significa também crescer e
distribuir. Crescer significa dizer que o carro se encontra em movimento; significa agregar
valor; utilizar mais eficazmente os recursos disponíveis para a produção de bens e serviços
de que as pessoas e as comunidades necessitam; significa o aprofundamento da divisão do
trabalho e a ampliação dos limites das redes mercantis, quando os seus participantes se
tornam mais especializados e, portanto, mais eficientes para se aproveitarem da maior
eficiência de seus parceiros, nos processos de troca que se dão no mercado. Significa,
assim, o aumento da renda monetária local, regional ou nacional e, ao mesmo tempo, a
renda de cada um de seus habitantes. Distribuir, por sua vez, significa criar condições para
que, de maneira equânime, esses habitantes tenham dignamente acesso ao valor adicionado;
à riqueza socialmente produzida. Significa fazer com que a maior eficiência sistêmica se
transforme em benefícios para todos que dele - do sistema local, regional, nacional ou
global participam, possibilitando que as perspectivas positivas que o crescimento traz
possam ser efetivamente as perspectivas de todos, fazendo aqui alusão ao que aquele autor
chamou de efeito túnel: quando as pessoas vêem que a fila do lado está andando, cultivam
a esperança de que a delas logo andará também.
Anos Dourados: estratégias e representações do desenvolvimento
Que estratégias eram aquelas? O planejamento das ações governamentais, particularmente
no que dizia respeito ao manejo de seus gastos, para a manutenção da demanda agregada
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em nível elevado e fazendo com que o nível de emprego se aproximasse do pleno-emprego;
e o planejamento para o atendimento de demandas sociais, que vão desde a diminuição das
incertezas que pairam sobre o ambiente privado dos negócios, até o equacionamento de
déficits nas áreas de infra-estrutura, saúde, educação, lazer e segurança. Constituía-se,
portanto, numa fórmula que associava crescimento econômico com distribuição de
riquezas, o que acabou por proporcionar uma relativa estabilidade política interna aos
países do bloco capitalista. Houve aqui uma espécie de externalização do conflito, isto é, da
instabilidade política inerente às sociedades capitalistas, consubstanciado na contraposição
capitalismo versus comunismo. Isto fez com que os gastos militares se tornassem um
importante elemento dinamizador do desenvolvimento, o que ocorreu em função dos seus
desdobramentos em termos tecnológicos e dos seus efeitos multiplicadores de renda e
novos investimentos privados e públicos (Castro, 1979).
Desenvolvimento, nesse contexto, tomou a forma de inovações e avanços tecnológicos,
associados ao crescimento da renda per capta, e acrescido do acesso a serviços básicos
fundamentais, chamados de bens públicos puros ou quase-puros, como a educação e saúde.
Além disso, a referência fundamental era o estágio alcançado por alguns países onde a
introdução de inovações e a promoção do avanço tecnológico acontecia, bem como o
acesso aos serviços básicos pela maior parte da população. Esses países eram então
designados como desenvolvidos, de modo que desenvolver significava, do ponto de vista
dos países não desenvolvidos, a busca incessante de uma condição de emparelhamento com
os primeiros.
Pressupunha-se, portanto uma uniformização de modos de ser e de funcionar para as
pessoas, para utilizar uma expressão de Amartya Sen (Sen, 2000), desconsiderando aquilo
que posteriormente Maluf (2001:75) chamou de desigualdade derivada da diversidade
(cultural, institucional, humana e natural), isto é, a desigualdade em um sentido
qualitativo. Esse pressuposto possuía a função de colocar num futuro imaginável a solução
dos problemas relacionados à pobreza, entre eles a fome e a desnutrição. Existia pobreza,
mas não havia pobreza de perspectivas.
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Pressupunha-se também que a forma de organização e funcionamento do Estado-Nação - a
democracia representativa, por um lado, havia equacionado satisfatoriamente as disputas
internas pelo poder. Organizada a partir do direito estatal-territorial (Santos, 2001), a
democracia representativa articularia cidadãos auto-interessados e maximização do
interesse coletivo, via ação do Estado e das forças de mercado. Do ponto de vista político,
isso ocorreria através do sistema de eleições e ocupação de cargos públicos orientada pelo
sistema de mérito; e, do ponto de vista econômico, através do mercado e suas escalas de
preferências. Em outras palavras, pressupunha-se uma articulação entre democracia
representativa, base para a intervenção estatal e eficiência dos mercados, o que colocava
uma tarefa para os países tidos como não desenvolvidos: a tarefa do aprimoramento
institucional, no sentido da construção de instituições democráticas inerentes ao Estado
liberal.
O desenvolvimento, então, estava também relacionado a esse processo de aprimoramento
institucional. No âmbito do Estado, ele permitiria a fluidez de interesses dos diversos
grupos sociais e a escolha democrática do conjunto deles que pautariam a ação do Estado,
no sentido da maximização do interesse coletivo. No âmbito do mercado, o aprimoramento
institucional permitiria a livre ação das forças de mercado - de oferta e procura e, portanto,
uma maior eficiência alocativa e distributiva. A democracia representativa constituía-se
portanto num elemento fundamental do desenvolvimento. O processo de aprimoramento
institucional era, dessa forma, visto como uma pré-condição para o estabelecimento de uma
dinâmica tecnológica e inovativa, base para o crescimento econômico e para o
estabelecimento de mecanismos democráticos de distribuição da riqueza social, base do
Estado do Bem-Estar Social e também da existência de perspectivas promissoras no
horizonte dos países não desenvolvidos.
A democracia representativa, por outro lado, do ponto de vista da social-democracia, me
valendo aqui de Przeworsky (1991) representava a conquista relativa à possibilidade de se
transformar o sistema a partir de dentro, se valendo das instituições políticas burguesas,
como alternativa às propostas de ruptura política, já que as condições políticas para tanto
inexistiam. Nesse contexto, o Estado era visto como um agente do processo de acumulação
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de capital em busca de legitimação política, tema desenvolvido pelas contribuições de Offe
e Habermas (Przeworsky, 1995), e o desenvolvimento como a conquista de direitos e
vantagens sociais para a classe trabalhadora, na sua luta contra a classe capitalista, no
interior da ordem burguesa. Algo que caminharia rumo ao socialismo - uma maior
distribuição da riqueza social, por meio da participação dos partidos de esquerda nas
instituições democráticas burguesas, sem que a propriedade privada dos meios de produção
fosse de fato eliminada.
Essa espécie de consenso político em torno da intervenção estatal, através do manejo dos
gastos públicos, foi alcançada, nos países chamados de subdesenvolvidos, especialmente os
da América Latina, não por meio da democracia representativa, mas sim por meio da
ideologia
desenvolvimentista.
Nesses
países,
especialmente
no
Brasil,
o
desenvolvimentismo foi o elo que fazia convergir posições políticas tanto à esquerda
quanto à direita para o apoio intervencionista que, diferentemente do que ocorria no mundo
desenvolvido, objetivavam a construção de infra-estrutura e a internalização da base da
estrutura industrial, num vigoroso processo de substituição de importações comandado pelo
Estado e fundada nas análises realizadas no contexto da CEPAL - Comissão Econômica
para a América Latina (Bielschowsky, 1988).
Muitas são as interpretações que procuram dar conta do motivo pelo qual esse consenso
político se rompeu, seja nos países onde a democracia representativa imperava e parece
ainda continuar imperando, seja nos países onde prevaleceu a força da ideologia
desenvolvimentista. Essas interpretações, contudo, não são objeto do presente trabalho.
Importa
reter
do
exposto
que
esses
processos
de
rompimento
aconteceram
concomitantemente à perda da capacidade intervencionista do Estado o que, por sua vez,
decretou a debilitação das práticas estatais-desenvolvimentistas no segundo grupo de países
e, no que diz respeito aos primeiros, comprometeu seriamente o funcionamento dos Estados
do Bem-Estar Social , quando a pobreza de perspectivas se instalou.
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Desenvolvimento: novos contornos
De qualquer forma, isso implicou o surgimento de um vácuo no que diz respeito às
questões relacionadas ao desenvolvimento, que aos poucos começou a ser preenchido com
problemáticas sociais, políticas, ambientais e culturais, além das econômicas, polarizadas
na dicotomia global - local e não mais centradas no nacional - regional. Elas fizeram aflorar
críticas aos padrões de produção e consumo do mundo capitalista (Seitz, 1990); à tendência
imanente dessa forma de organização social da produção de provocar a desigualdade social;
relacionadas à diversidade de interesses dos grupos sociais, não necessariamente alinhados
com os dos Estados-Nação (Castells, 1999); à democracia representativa e aos problemas
de eficiência alocativa que ela coloca (Przeworsky, 1995); ao keynesianismo e às práticas
de intervenção estatal; às formas de organização social e política dos países pobres
(Campos, 1998), etc., e acabaram por trazer para o âmbito do local os problemas
relacionados ao desenvolvimento. Como isso ocorreu?
O conflito político inerente às sociedades capitalistas, vale dizer, em relação à produção e à
distribuição da riqueza social, foi então reinternalizado e, ao mesmo tempo, passou a se
apresentar de forma cada vez mais descentralizada e diversificada: na verdade, mais
amplificada. Diversificada porque novos atores políticos surgiram, cuja ação política
passou a estar associada a novas identidades, que não as identidades nacionais, de grupos
específicos como os ambientalistas, os gays, os negros, as mulheres, os neonazistas, os
migrantes. 2 Descentralizada porque as questões que passaram a ser colocadas e que
passaram a dividir espaço - espaço político com as já postas pelos sindicatos, associações
profissionais e partidos políticos se concretizam no local, onde se encontram as pessoas de
fato. Isto é, em pontos difusos no espaço e que passaram a ter como referência o espaço já
territorialmente organizado, sobretudo o Estado no âmbito municipal e não necessariamente
a ele se circunscrever. Amplificou-se, portanto, o conflito com as pessoas e os grupos
reconhecendo os seus próprios direitos de ser e de funcionar de maneira igualitária,
demandando igualdade em meio à diversidade.
2
Vincent (1995) discorre sobre o ecologismo e sobre o feminismo, além do liberalismo, do socialismo e de
outras quatro construções ideológicas, todas como ideologias políticas modernas, cada uma das quais
possuindo uma leitura da história, uma percepção do presente e uma proposta de futuro.
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A problemática relativa ao desenvolvimento, então, assumiu novos contornos, relacionados
à mudança nos padrões de produção e consumo; à democracia, não mais a representativa,
mas aquela que pleiteia a igualdade na diversidade; e ao local, como espaço privilegiado
para a ação, ação política para a promoção do desenvolvimento, para além das ações
emanadas do poder político estatal-territorial.
Isso ocorreu concomitante à nova configuração da qual os Estados-Nação passaram a fazer
parte, o que lhes restringiu a capacidade de exercer autonomamente o controle sobre a
moeda nacional e, em conseqüência, de praticar políticas monetária, fiscal, social e de
promoção do desenvolvimento (Fiori, 1999). Ao longo dos anos 1980 e 1990, as ações do
Estado, em todos os níveis de governo, passaram a estar condicionadas às fontes de
recursos no âmbito de agências de fomento internacionais (Banco Mundial, Organização
das Nações Unidas, Países mais desenvolvidos - PPG7, etc.); e programas nacionais e
estaduais para os quais existam recursos, de acordo com o nível de governo que se
considera. Os recursos oriundos da tributação passaram a estar quase que completamente
comprometidos com o pagamento das dívidas públicas e com o funcionamento da máquina
administrativa e a provisão de serviços essenciais, em evidente processo de deterioração,
como segurança e manutenção de infra-estrutura já instalada, e os recursos destinados a
políticas de desenvolvimento ficaram seriamente comprometidos (Riani, 2002).
Contudo, as questões embutidas na problemática relativa ao desenvolvimento que
caracterizou o período anterior não desapareceram. Ao contrário, tenderam a se tornar mais
agudas do que nunca, pois que a fome e a dificuldade de acesso a alimentos e a serviços
básicos aumentou para um grande número de pessoas no mundo inteiro, ao mesmo tempo
em que as formas de produção em geral e de alimentos para as populações mais pobres em
particular passou a estar relacionada com a degradação ambiental e com a prevalência de
instituições sociais e políticas arcaicas, isto é, com a ineficiência, distantes que estavam do
funcionamento livre dos mercados.
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Desenvolvimento e multifuncionalidade da agricultura familiar
É aqui que se coloca o tema da agricultura familiar, seu desdobramento em termos de
multifuncionalidade e sua relação com o problema do desenvolvimento no mundo
contemporâneo. Isto porque, do ponto de vista do argumento que se tornou hegemônico nos
últimos 20 anos e que passou a servir de base para a ação estatal, fundado mais na
eficiência dos mercados do que na organização democrática das estruturas estatais, a
organização familiar da produção é tida como ineficiente por princípio; e o tema do
desenvolvimento desapareceu da agenda dos Estados-Nação, sobretudo dos países não
desenvolvidos, quanto mais assentados em políticas que apoiam a agricultura familiar no
sentido da promoção do desenvolvimento.
De acordo com Wilkinson (2000), ao longo dos anos 90, a discussão acima, na verdade, se
colocou em meio a três debates que se complementaram. Aquele referente à Reforma Agrária
no Brasil, os trabalhos publicados relacionados à questão da pluriatividade e às atividades nãoagrícolas no meio rural e os que enfocavam o complexo agro-industrial. Desses debates
emergiram duas tendências opostas, em termos de políticas públicas. A primeira, cujo centro do
argumento é a idéia de eficiência econômica, associada, portanto aos ganhos de escala que o
desenvolvimento tecnológico e a modernização da agricultura produzem em meio à competição
dos agentes no mercado, vê grande parte dos agricultores familiares como futuros migrantes
para os centros urbanos ou para regiões de fronteira. O Estado aqui deveria intervir como
amortecedor de um drama social inevitável, pela própria diferenciação natural que a dinâmica
dos mercados produz. Sua ação, portanto, assumiria um caráter inerentemente assistencialista.
A Segunda, por outro lado, é aquela que procura demonstrar não só o caráter competitivo da
pequena produção familiar, mas também sua eficiência social, seja em termos de emprego e
ocupação no campo, seja em termos ecológicos, de equidade social e de qualidade de vida,
incluindo aí a segurança alimentar.
Como podemos observar, a idéia de multifuncionalidade é um contra-argumento, baseado
nas funções sociais, ambientais, territoriais e econômicas que essa forma de organização da
produção exerce e na sua legitimação, na medida em que gera produtos e serviços que não
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poderiam ser oferecidos pelo livre jogo dos mercados, com ou sem a interferência do
Estado.
A interpretação hegemônica: do emparelhamento econômico ao político-institucional
De um ponto de vista das correntes de pensamento que se tornaram hegemônicas a partir do
fim dos anos dourados, o que se convencionou chamar de neoliberal, o que está posto
acima deve ser colocado de forma mais incisiva, no sentido de que a importância relativa da
democracia representativa diminuiu e a do funcionamento livre dos mercados aumentou:
é que o mercado aloca recursos para todos os usos mais eficientemente do que as
instituições políticas. O processo democrático é defeituoso e o Estado é uma fonte de
ineficiência. O Estado sequer precisa fazer qualquer coisa para que as ineficiências
ocorram: basta a mera possibilidade de que possa vir a fazer qualquer coisa.
(Przeworsky, 1995:26).
Esse tipo de percepção passou então a orientar a ação dos Estados-Nação, realizando
privatizações e desregulamentando os mercados, num contexto em que a uniformização das
formas de ser e funcionar assumiram um caráter extremo, de modo que A política é vista
como basicamente a mesma em qualquer lugar (Przeworsky, 1975:27). Se ela é a mesma
em qualquer lugar, parafraseando Santos (2001), é o mesmo que dizer que ela não existe
em lugar nenhum. Decretou-se, então, o fim da política, o fim da ideologia e o fim da
história (Bobbio, 1999), e o Estado passou a assumir o caráter de regulador das ações de
agentes econômicos que agem auto-interessadamente, num contexto em que não há lugar
para o espírito público, uma vez que os agentes que agem através da ocupação de cargos
públicos, o fazem invariavelmente buscando o interesse próprio (Przeworsky, 1975:27).
Não há também lugar, no seio dessa interpretação que se tornou hegemônica, para
discussões que envolvam os problemas colocados pelo desenvolvimento, seja essa
problemática oriunda do contexto dos anos dourados, seja ela oriunda da complexidade dos
fenômenos sociais, ambientais, políticos, econômicos ou ainda culturais que afloraram nos
últimos trinta anos, desde 1968, para utilizar um marco proposto por Castells (1999). A
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resposta que é dada a esse conjunto de questões, nesse contexto mais ideológico do que
teórico, é na verdade uma aposta: que as sociedades se organizem dessa forma, isto é,
deixem seus mercados funcionarem livremente e não abafem a ação dos indivíduos no
sentido do atendimento de seus interesses próprios, que a prosperidade os alcançará.
A versão mais recente dessa proposição teórica encontra-se no que vem se convencionando
chamar de Teoria da Convergência, a qual apregoa a tendência histórica de equalização das
taxas anuais de crescimento dos países, sugerindo que no longo prazo o mesmo acontecerá
em relação às realidades sócio-econômicas de todos os países (Ferreira, s/d). No mesmo
sentido, ao responder à questão por que somos tão ricos e eles tão pobres, Jones (2000:145)
afirma ter demonstrado...
(...) o importante papel desempenhado pelas leis, pelas políticas do governo e pelas
instituições. Essa infra-estrutura forma um ambiente econômico em que as pessoas
produzem e transacionam. Se a infra-estrutura de uma economia favorece a produção
e o investimento, a economia prospera. Mas, se a infra-estrutura favorece o desvio e a
produção, as conseqüências podem ser prejudiciais. (...) A corrupção, o suborno, o
roubo e a expropriação podem reduzir drasticamente os incentivos ao investimento na
economia, com efeitos devastadores sobre a renda. A tributação, a regulamentação, os
litígios e lobbies são exemplos menos drásticos de desvios que afetam os investimentos
de todos os tipos, até nas economias avançadas. Obviamente, os países avançados são
avançados justamente porque encontraram meios de limitar a extensão do desvio em
suas economias. (grifos nossos)
O condicionante do aprimoramento institucional nos processos de desenvolvimento, já
presente quando da hegemonia das posturas políticas intervencionistas, assume aqui força
total. Em outro trabalho (Reis, 2003a), demonstrou-se como esse condicionante está
associado a uma determinada perspectiva da evolução do capitalismo e da modernidade e
como para tanto contribuíram as análises sociológicas de Durkheim e Weber; e Cowen &
Shenton (1996:28) demonstram como a obra de August Comte contribuiu também nesse
sentido, ao analisarem como, a partir da noção de progresso presente em Locke e Smith, se
desenvolveu o conceito de desenvolvimento.
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As estratégias de emparelhamento, por seu turno, que antes possuíam um caráter
econômico, isto é, subsidiavam ações concretas dos Estados-Nação no aprimoramento das
condições de infra-estrutura, indústria de base, etc., para romper obstáculos econômicos
estruturais que diferenciavam os países desenvolvidos dos não desenvolvidos, agora
possuem um caráter eminentemente político: o emparelhamento político-institucional.
Além do argumento de Jones, reproduzido acima, outro pode ser aqui arrolado para
exemplificar o que se pretende dizer com emparelhamento político-institucional. Pode-se,
por exemplo, dizer, como faz Campos (1998), que o caráter de subdesenvolvimento que é
inerente à África Subsaariana é decorrente da escolha, por parte das pessoas e grupos
sociais nativos, por instituições sociais que privilegiam a ineficiência econômica. Deveria,
então, haver um processo de aprimoramento institucional de modo a permitir que tais
pessoas e grupos sociais se organizem de maneira mais eficiente diante da alocação de
recursos. Nesse sentido, quaisquer análises de cunho histórico, como sugere, por exemplo,
Hirschman, que procure associar os processos de colonização européia com os estágios de
subdesenvolvimento inerentes aos países do Terceiro Mundo, as quais põem em evidência
questões relativas ao poder e à dominação política, cultural e econômica, não fazem
qualquer sentido nos termos da análise econômica tradicional. 3
O mesmo pode ser dito com relação à agricultura familiar: são ineficientes porque se negam
a separar os negócios do ambiente domiciliar, condição essa colocada por Weber (2002)
como fundamental nos processos de constituição do capitalismo, bem como a se
especializar, privilegiando, no caso do Brasil, instituições políticas e sociais, como o
clientelismo e o patrimonialismo, as quais, diante dos mecanismos de mercado, espelham a
ineficiência e a prevalência de formas de dominação tradicionais e não racionais-legais.
Assim, ao se negarem – os agricultores familiares – a penetrarem no jogo cujas regras são
dadas pelo mecanismo impessoal dos mercados, permanecem ineficientes e, em
conseqüência, sujeitos a serem engolidos pelo processo competitivo que acontece em torno
dos mercados.
3
Ver também, nesse mesmo sentido Franco (2003) e Sen (2000:146).
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O local como espaço privilegiado do desenvolvimento
A despeito da crítica neoliberal, procurando reafirmar a máxima do Estado Mínimo e das
discussões que ainda continuam em aberto em torno das questões que essa corrente de
pensamento coloca, 4 paulatinamente, ao longo dos anos 1980 e 1990, a problemática
relativa ao desenvolvimento local / global foi tomando conta dos debates em torno do
desenvolvimento. Assim, em meio a uma estranha forma de integração, a disputa em torno
das representações acerca do desenvolvimento passou a se encontrar, de forma privilegiada,
para além e para aquém dos Estados-Nação. No primeiro, a disputa se instalou
principalmente nas agências supranacionais de financiamento e regulação, como o Banco
Mundial, a OMC - Organização Mundial do Comércio, o PNUD - Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento, o Grupo dos países mais desenvolvidos do mundo e
aquele que discute as questões relacionadas com o aquecimento global. E, para aquém do
Estado-Nação, a disputa se instalou também no âmbito do local, reconhecendo, mas até
certo ponto, os limites dos Estados territoriais municipais e sua capacidade (limitada) de
ação.
Diz-se que essa forma é estranha porque a dimensão do local passou a congregar aquilo que
Beck (1997), ao tratar da modernidade reflexiva, chamou de sociedade de risco, sociedade
na qual as instituições da ordem industrial já não dão mais conta dos problemas dela
originados, os quais excedem as bases das idéias sociais de segurança (Beck, 1997:18),
trazendo o risco para o âmbito do indivíduo, que deve (...) planejar, compreender, projetar
e agir - ou sofrer as conseqüências que lhe serão auto-infligidas em caso de fracasso
(Ídem, 27):
Colocando em termos mais simples, 'individualização' significa a desintegração das
certezas da sociedade industrial, assim como a compulsão para encontrar e inventar
novas certezas para si e para os outros que não a possuem. Mas também significa
novas interdependências, até mesmo globais. A individualização e a globalização são,
na verdade, dois lados do mesmo processo de modernização reflexiva. (Ídem, 26)
4
Ver Przeworsky (1995). De acordo com esse autor, as questões deixadas em aberto e que relacionam
democracia e eficiência são relativas às escalas de preferências, à competição política, à representação de
interesses e à autonomia do Estado.
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Agora, o microcosmo da conduta da vida pessoal está inter-relacionado com o
macrocosmo dos problemas globais, terrivelmente insolúveis. (Ídem, 61)
Nesse contexto, se desenvolve a subpolítica, resultado do esvaziamento político das
instituições e do renascimento não institucional do político, [quando] o sujeito individual
retorna às instituições da sociedade (Beck, 1997:28). O local se tornou então o lugar
privilegiado para tanto e seus problemas passaram a estar diretamente relacionados com a
problemática do desenvolvimento - o desenvolvimento local.
No Brasil e no mundo, experiências foram sendo catalogadas e bancos de dados montados
para dar conta da sua diversidade (Caccia-Bava & Outros, 2002). E toda uma discussão
teórica efervescente acerca dessa forma que o desenvolvimento assumiu vem sendo levada:
o que é desenvolvimento local? Quais os seus fundamentos teóricos? Que tipo de
estratégias devem nortear sua promoção? A crítica que Oliveira (2002:20) faz à forma que
vem assumindo a concepção de desenvolvimento local, vista como expressão ou do
filantropismo ou da 'nova ética empresarial', se coloca como uma espécie de divisor de
águas, deixando claro duas posturas, duas tendências teóricas no tratamento dessa questão:
O desenvolvimento local tende a substituir a cidadania, tende a ser utilizado como
sinônimo de cooperação, de negociação, de completa convergência de interesses, de
apaziguamento do conflito. O desenvolvimento local, em muitas versões, é o novo
nome do público não-estatal, essa confusão semântica proposital besseriana [em
alusão ao Ex-Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, que conduziu a Reforma do
Estado ao longo do Governo Fernando Henrique Cardoso].
Para depois asseverar:
De fato, as potencialidades e virtualidades do local são, em grande medida, políticas e
efeitos da política. Pois, de alguma maneira foi o acesso interdito aos níveis mais altos
do poder, sobretudo com derrotas sucessivas para a Presidência da República, que fez
as esquerdas voltaram-se (sic) para o local, acreditando ser possível exercer neste nível
uma outra forma de poder e uma outra forma de gestão do Estado. O local é, pois, de
alguma maneira, uma construção das esquerdas. Oliveira, 2002:21)
17
Uma questão que surge diante disto é aquela referente à explicitação de que posturas
teóricas, que leituras da realidade encontram-se por trás das ações dos agentes de ambas as
perspectivas no sentido da promoção do desenvolvimento do local. O que a teoria
econômica em particular e a teoria social em geral vem construindo, reconstruindo ou ainda
remontando para dar conta das intervenções sobre o local? É possível identificar dois tipos
de perspectivas teóricas: uma, que parte da crítica da economia do desenvolvimento e
constrói o conceito de SPL - Sistemas Produtivos Localizados; a outra consiste numa
recuperação da crítica ao funcionamento do sistema capitalista e funda o conceito de
Economia Popular e Solidária.
Não é nosso objetivo, entretanto, procurar dar conta dessas questões. Nesse âmbito, no
âmbito do local e das formas de pensá-lo, representá-lo, importa reter que os problemas
relacionados à segurança alimentar assumem importância visível, tanto no que respeita à
oferta, quanto à demanda de alimentos, seja do ponto de vista das políticas públicas e das
estratégias, relacionadas à produção, distribuição de renda e riqueza, ao abastecimento, à
fiscalização sanitária e à saúde pública, seja do ponto de vista da tensão que existe entre o
processo de acumulação de capital e a existência, permanência e reprodução de formas de
organização da produção, como a agricultura familiar e as empresas sociais, em referência
à Economia Popular e Solidária, que não necessariamente se pautam pelos princípios da
permuta, da barganha e da troca, orientados para o mercado, para fazer uso de uma
expressão de Karl Polanyi (2000). E, posta dessa forma a questão, nesse âmbito também as
questões relativas à segurança alimentar tangenciam outras, não menos relevantes, como a
relativa aos direitos humanos, à prática democrática e à reforma agrária.
SEGURANÇA ALIMENTAR E AGRICULTURA FAMILIAR
Em seguida, com o objetivo de colocar em evidência a amplitude que a relação entre
agricultura familiar e a problemática da segurança alimentar assume, passaremos em revista
os planos de promoção da segurança alimentar e do desenvolvimento rural, concebidos no
âmbito da FAO, em meados de 2002, para a Cumbre Mundial sobre la Alimentación:
cinco años después para os países andinos, centro-americanos, do Mercosul e do Caribe,
18
como também a descrição e análise que Maluf (1999) realiza acerca das experiências
apresentadas no contexto do Painel sobre Experiências Localizadas de Apoio à Produção de
Alimentos, realizado em São Paulo, em novembro de 1998. Importa-nos passar em revista,
ainda que de maneira superficial, as estratégias e as formas que estas vêm sendo pensadas,
para posteriormente relacioná-las com a problemática do desenvolvimento local.
América Latina: segurança alimentar e estratégias de combate à pobreza
Nesse sentido, o documento FAO- Países Andinos (2002) afirma que a importância do
setor agrícola encontra-se no fato da produção de alimentos e na utilização de recursos
naturais vitais, como também se constitui, esse setor, no principal empregador de força de
trabalho e de maior inter-relação com o restante da economia. Admite o fato, além disso,
que el crecimiento agrícola es la principal forma de reducir la pobreza y,
consecuentemente, la inseguridad alimentaria, no sólo en el medio rural, sino aun en el
urbano. Dessa forma, estratégias de remoção da insegurança alimentar passam
necessariamente pelo estímulo ao setor agropecuário e pela promoção do desenvolvimento
rural e, por isso mesmo, devem fazer parte da agenda dos governos da América Latina e do
Caribe como um todo.
Percebida dessa forma, a questão da segurança alimentar se torna o outro lado da moeda da
problemática relativa à pobreza, cuja relação com o setor agropecuário é umbilical e a ela,
em essência, se reduz. Isto implica a necessidade de tratar o problema da segurança
alimentar de forma integral, o que se percebe através das estratégias traçadas no âmbito da
FAO - Países Andinos. Estas estratégias, diz o documento, devem reconhecer a
heterogeneidade
produtiva,
sócio-cultural
e
econômica,
como
também
a
complementariedade dos sistemas agrícolas locais e regionais e buscar explorar suas
vantagens comparativas, numa clara alusão à necessidade de se procurar formas de inserção
mercadológica dos agricultores.
Além disso, aponta-se para a necessidade de participação de todos os atores, isto é,
governos centrais, regionais e locais; organizações de produtores, Organizações não-
19
governamentais; organismos internacionais e a cooperação internacional, como também
promover o fortalecimento institucional, isto é, o aumento da eficiência administrativa e a
construção de instrumentos adequados de intervenção e avaliação de projetos. As políticas,
nesse sentido, devem buscar, entre outros objetivos, a integração comercial regional,
nacional e internacional; o investimento em infra-estrutura e em sistemas de informação; o
fomento ao emprego na agricultura comercial e na agroindústria; priorizar subsídios à
produção e não ao consumo; o fomento ao crédito; e o manejo sustentável dos recursos
naturais.
No mesmo sentido caminha o documento: Seguridad alimentaria en centroamérica: del
manejo de crisis en el corto plazo, al manejo de riesgos y reducción de la vulnerabilidad en
el largo plazo: nota estratégica. Entretanto, no diagnóstico que realiza da situação dos
países centro-americanos, seus formuladores estabeleceram uma distinção interessante
entre crescimento e crescimento que diminui a pobreza, afirmando que o simples
crescimento econômico implica deterioração dos recursos naturais, comprometendo assim o
futuro da produção de alimentos, de sua disponibilidade e o abastecimento regular.
Associado a essa forma de crescimento predatório, não-sustentável, estaria as condições
que começaram a prevalecer nos mercados externos, por imposição dos países da OCDE,
que levam à queda nos preços dos produtos exportáveis dos países sul-americanos como
um todo e, em conseqüência, a piora nas condições de insegurança alimentar. Esse ponto
será desenvolvido a seguir. Para o momento, importa notar que a pluriatividade inerente à
agricultura familiar aparece aqui como mecanismo de defesa dessa forma de organização
social da produção em relação às vicissitudes da economia de mercado e, portanto, da
segurança alimentar.
O documento acima mencionado coloca a insegurança alimentar como resultado da
instabilidade na disponibilidade de alimentos; na baixa capacidade econômica da população
de acessar alimentos; na recorrência do fenômeno da pobreza e na incapacidade de acessar
alimentos oferecidos no mercado. Aponta ainda a marginalidade social; a ausência de
serviços básicos e de saúde; as deficiências na educação e nas condições de vida da
população rural; além do agravamento das secas e das oscilações dos preços dos produtos
20
exportáveis, como o café, por exemplo, como elementos que se encontram também na
origem da insegurança alimentar.
A estratégia concebida para atacar os problemas relacionados com a segurança alimentar,
no âmbito dos países centro-americanos, envolve a ação conjunta dos governos e dos
parceiros do programa em três níveis: o nível macro, que diz respeito à ação governamental
no sentido do reforço institucional e da integração regional; o nível intermediário, no
âmbito das comunidades e organizações rurais, busca o melhoramento das capacidades
locais; e o nível micro, da família rural, que envolve transferência de conhecimento e
diversificação dos sistemas de produção no sentido da diminuição da vulnerabilidade,
aumento e diversificação da produção e o manejo sustentável dos recursos naturais.
O programa como um todo compreende, entre outros, a cooperação técnica, voltada para a
utilização eficiente da água e construção de cadeias agroalimentares articuladas ao
mercado; para a produção de alimentos para o autoconsumo e para o mercado, visando o
aumento da renda e das oportunidades de ocupação; para a organização dos produtores e
promoção do associativismo; e para a sistematização de práticas de sustentabilidade,
visando a redução de custos, a utilização de técnicas simplificadas e a adaptação da
introdução de inovações ao ambiente cultural das comunidades locais. Além disso, tem-se a
implementação de sistemas de educação, informações, comunicação e publicidade, que
venha a valorizar o rural e a importância da segurança alimentar e a implementação de
mecanismos horizontais de transferência de tecnologias (produtor - produtor, por exemplo).
Mercado de produtos agroalimentares e pobreza na América Latina
O documento La seguridad alimentaria y el acceso a los mercados internacionales de
productos agricolas y agroindustriales, produzido no âmbito do Mercosul, desenvolve a
questão relativa à participação dos produtos dos países da região nos mercados
internacionais. Afirma, nesse sentido, que as restrições comerciais dos países da OCDE, às
quais acima se fez referência, limitam o acesso aos mercados internacionais e dificultam a
competitividade internacional dos países do Mercosul, mas não apenas. Além disso, os
21
subsídios oferecidos ao setor agropecuário desses países provoca o respectivo autoabastecimento, reduzindo assim as importações que esses países poderiam realizar em
relação aos países menos desenvolvidos. Como se isso não bastasse, produz excedentes
exportáveis, aumentando a oferta e provocando a queda nos preços internacionais. Esse
procedimento, além de ofuscar a maior eficiência dos países que não fazem uso da prática
de subsídios, provoca o aumento do uso de insumos, o que provoca maiores danos
ambientais, bem como outros impactos indiretos sobre os governos dos países latinoamericanos, especificamente os do Mercosul. Esses impactos indiretos estão concentrados
na necessidade de uma maior quantidade de recursos que esses governos necessitam utilizar
para dar conta das questões relativas à segurança alimentar, ao desenvolvimento
sustentável, à promoção do crescimento econômico, de uma maior equidade social e
sustentabilidade ambiental.
Análise de experiências
Em Maluf (1999), por seu turno, encontramos a análise e descrição de um conjunto de
experiências discutidas no âmbito do Painel sobre Experiências Localizadas de Apoio à
Produção de Alimentos, realizado em São Paulo, em novembro de 1998, como já se disse.
O documento, que descreve e analisa um conjunto de experiências, foi concebido no
sentido de associar os objetivos da segurança alimentar com os processos de
desenvolvimento local, isto é, com as estratégias no sentido da sua promoção, num
contexto onde predomina a desigualdade social. Nesse contexto, assume destaque, então,
as iniciativas que buscam promover oportunidades de trabalho e renda e as políticas gerais
de combate à pobreza e promoção da equidade, tendo como foco tanto o lado da demanda
de alimentos, quanto da oferta. Acesso, de um lado e disponibilidade de alimentos de
outro, fazem com que o tema da segurança alimentar encontre lugar privilegiado nas
discussões sobre as potencialidades da agricultura familiar.
Isto é, pode-se dizer que o público-alvo da segurança alimentar é a população atingida por
índices de pobreza relativamente elevados. Pode-se dizer também que o problema da
qualidade é resolvido pelo mercado, sob a vigilância do setor público e da sociedade civil
22
(vigilância sanitária, por exemplo). Mas os problemas de acesso e disponibilidade, não. Ele
se encontra no âmbito da oferta, isto é, de seus determinantes e no da distribuição da renda
e da riqueza nas sociedades.
Fome e deficiências de caráter estrutural, como a distribuição de renda e acesso à terra,
ficam então em evidência, assentada no fato de que, ainda de acordo com Maluf (1999), no
Brasil, em todas as regiões, os índices de pobreza superam 20% e, a despeito do processo
recente de urbanização da pobreza, os índices mais elevados encontram-se na zona rural,
sendo que no Nordeste ela atinge 60% da população. Isto ocorre em função da precariedade
de reprodução da agricultura de base familiar e da insuficiência da renda auferida por essas
famílias. Nesse contexto, as iniciativas de diminuição da insegurança alimentar estão
voltadas para o estímulo à produção agroalimentar, o que implica a melhora das condições
de reprodução dessas famílias e o aumento da oferta agrícola no âmbito local e regional,
estimulando o aquecimento dos circuitos locais de produção e consumo.
A análise das experiências tratadas no documento foi então realizada a partir de oito pontos
considerados relevantes nesse contexto: o acesso à terra; acesso ao crédito; abertura de
mercados e promoção da comercialização; assistência técnica; desenvolvimento
agropecuário e desenvolvimento rural; agregação de valor, agroindústria, e integração de
cadeias produtivas; questões de gênero; e estímulos à agricultura ecológica. A descrição e
análise das experiências chama a atenção para algumas questões relacionadas aos
problemas do associativismo; a necessidade de se diversificar a produção agropecuária dos
estabelecimentos de pequeno porte; aqueles relacionados à educação e capacitação de
produtores e técnicos agrícolas; os problemas relacionados à disponibilização de crédito e
as interferências do setor público nesse sentido, como também no sentido da abertura de
mercados para os produtos oriundos da pequena produção familiar e à sustentabilidade dos
programas analisados.
23
Concentração de capital, Redes Sociais e multifuncionalidade da AF
É digno de menção à parte, entretanto, os problemas relacionados à concentração de capital.
Ainda com base em Maluf (1999), embora esse problema específico tenha sido percebido
no âmbito da análise da aplicação do Pronaf-Agroindústria no Município de Chapecó, em
Santa Catarina, o destaque que aqui se dá para tal questão é devido ao fato de que ela se
constitui, na verdade, em um processo e é preciso analisá-lo mais de perto para avaliar
melhor as estratégias utilizadas no sentido da diminuição da pobreza rural e, portanto, da
diminuição da insegurança alimentar. Isto porque muitas dessas estratégias buscam a
inserção dos pequenos produtores nos mercados, principalmente locais e regionais, e a
lógica de funcionamento dos mercados é concentradora de capital.
O mesmo problema pode ser percebido diante da distinção que o documento dos países
centro-americanos contém em relação à diferença entre crescimento econômico e
crescimento que diminui a pobreza. A questão parece estar no fato de que a exploração
rural / primária, de base capitalista, possui uma dinâmica que impele as empresas a se
valerem de forma mais intensiva, e cada vez mais, dos recursos naturais. Como isso possui
impacto sobre os preços em geral, sobre o preço da terra em particular e sobre a
disponibilidade de recursos naturais, como acima se referiu, as organizações familiares de
produção se tornam então vulneráveis, acabando por se desconstruir e/ou se reproduzir em
áreas menos aptas e/ou mais distantes, levando consigo o componente ambiental negativo e
reproduzindo a pobreza e a insegurança alimentar no espaço. 5
Pluriatividade da agricultura familiar, por um lado e multifuncionalidade por outro ficam
assim em evidência. A primeira pelos motivos acima apresentados, isto é, como mecanismo
de defesa em relação às vicissitudes da economia de mercado e garantia da segurança
alimentar; a segunda pelo fato de que ela põe em questão os benefícios relativos à
preservação ambiental, à utilização mais racional dos recursos naturais; à organização
também mais racional do território; aos benefícios sociais, em termos de ocupação e renda
que ela implica e, em conseqüência, à promoção da segurança alimentar que proporciona.
24
Sua legitimação e institucionalização legal, portanto, significa, entre outras, o
reconhecimento social de que o homem é o meio e o fim do desenvolvimento, como pensa
Amartya Sen; que os processos de desenvolvimento não são processos econômicos strictu
sensu, mas antes processos político-instititucionais, e sócio-culturais, como asseverou
Albert Hirschman; que eles se conformam através de relações que os homens mantêm
consigo mesmo, com seus iguais e com o meio nos qual encontra-se inserido, como sugeriu
Norbert Elias.
Por outro lado, com base em Barone (1996), pode-se na verdade reafirmar que as
comunidades de agricultores familiares conformam uma rede social que, como afirma
Soares (2001), além de produzir e ofertar alimentos com maior eficiência, relativamente às
formas empresariais de organização da produção agrícola, no que respeita a alguns
produtos que lhes são tradicionais; preserva o meio ambiente e a paisagem; organiza
espacialmente os territórios; protege e serve de plataforma para a inserção social de seus
membros por meio de laços de solidariedade; cria oportunidades de ocupação e, portanto,
possibilidades de trabalho para que seus membros tenham com dignidade acesso aos
alimentam de que necessitam.
Isso nos faz retornar ao tema do desenvolvimento local, agora relacionado à questão da
segurança alimentar, porque essa rede social é vulnerável àquilo que se encontra nas
origens de nossa época, para novamente fazer referência a Polanyi (2000), que tem como
ponta-de-lança, por assim dizer, a mercantilização da terra e do trabalho e a generalização
do uso do dinheiro como meio de troca.
DESENVOLVIMENTO E SEGURANÇA ALIMENTAR
Com efeito, a releitura de autores clássicos da história econômica, social e política, como
Christopher Hill (Hill, 1991) e George Rudé (Rudé, 1991), nos faz relembrar que, embora a
menção ao tema da segurança alimentar seja relativamente recente, a questão relativa à
5
Ver Reis (1993) para um exemplo de reprodução dessa dinâmica no espaço no processo de ocupação da
fronteira amazônica: o caso de Rondônia.
25
insegurança alimentar já data de bastante tempo. Vista a partir de uma perspectiva do
desenvolvimento, pode-se dizer, é um velho tema, mas com uma nova roupagem.
O problema da segurança alimentar visto sob uma perspectiva dinâmica
Se se coloca como ponto de partida para a sua análise a afirmativa de Fernand de Braudel
(Braudel, 1987) de que, até o século XIX, a maior parte da população da terra vivia e se
reproduzia a partir da produção para o autoconsumo, no âmbito do que chama de camada
da vida material, estabelecendo e mantendo laços mercantis pouco estreitos e descontínuos
e que, ao longo do século seguinte, esses laços se tornaram contínuos e fortemente
estabelecidos, mas não para todos, podemos então dizer que os problemas relativos à
insegurança alimentar possuem dois momentos distintos.
Sabendo que esses problemas possuem duas dimensões principais, isto é, a dimensão da
disponibilidade e a dimensão do acesso, pode-se dizer que, num primeiro momento, a
disponibilidade de alimentos é determinada essencialmente por fatores naturais; e, num
segundo momento, a disponibilidade de alimentos continua sendo, em parte, determinada
por fatores naturais mas, de outra parte, por fatores que determinam a oferta de mercadorias
em geral e a de alimentos em particular nos mercados.
A questão relativa ao acesso a alimentos também deve ser vista a partir desses dois
momentos: no primeiro, me valendo aqui de Elias (1991; 2001), o acesso é determinado
pela função que as pessoas e os grupos exerciam em redes sociais de interdependência,
onde a balança nós-eu pendia mais para o nós, do que para o eu. Essas configurações, que
chamamos de feudos, aldeias, etc., tinham o caráter de uma rede social que provia seus
membros, dada a sua função, e tal provimento estava diretamente ligado, para todos os
participantes, ao sucesso na colheita e na criação. No segundo momento, quando a balança
passou a pender mais para o eu do que para o nós, decorrente de um processo de
individualização crescente que caracterizou a modernidade, o acesso a alimentos passou a
estar predominantemente ligado à posse de recursos monetários.
26
Entretanto, é muito comum nos valermos de expressões como nas sociedades capitalistas,
nas economias de mercado; nas sociedades mercantis desenvolvidas, para designarmos
uma forma específica de organização social da produção, aquela voltada para o mercado,
sem nos apercebermos do fato de que a constituição dessas sociedades e dessa forma de
organização social da produção se constitui num processo - um processo histórico. E muitas
vezes nos esquecemos de procurar saber acerca das características desse processo e, assim,
nos passa desapercebido que, ao longo dele, convivem várias formas de organização social
da produção, além daquela que se organiza em função dos mercados, as quais possuem
outras características, outras dimensões que não as estritamente econômicas.
Quando se fala de sociedades capitalistas, parece que toda a sociedade se encontra
envolvida no mesmo jogo de trocas e/ou que há no futuro alguma inexorabilidade nesse
sentido, sob a pena de que aqueles que não conseguirem se inserir, perecerão. E quando se
fala de processo histórico de constituição das sociedades capitalistas, parece que se está
falando do passado e não do presente. É preciso, por isso, compreender mais de perto a
natureza desse processo histórico, para poder entender as relações entre essa forma
específica de organização social da produção e outras que lhes são contemporâneas, como a
organização da produção fundada em bases familiares, como a agricultura familiar. (Santos
2003)
A mercantilização da terra e do trabalho, acompanhadas da generalização do uso do
dinheiro como meio de troca e reserva de valor, me valendo aqui de Elias, Braudel e
Polanyi, foi o resultado da disputa em torno das oportunidades de poder, relacionadas ao
desenvolvimento dos processos de troca, os quais foram se ampliando paulatinamente e
com intensidade crescente, ao longo da segunda metade do que chamamos Idade Média, ao
mesmo tempo em que pôs em evidência as formas de defesa das sociedades a esse
processo. De maneira progressiva, passou então a ser importante, além do controle sobre os
meios de praticar a violência e os meios de se criar representações simbólicas acerca da
realidade, o controle sobre os fluxos de dinheiro, em contraposição à conformação de redes
sociais baseadas nem tanto nos mecanismos de troca, mas nos de solidariedade e
27
redistribuição. Sabemos, portanto, que tanto essas redes sociais quanto a luta por aquelas
oportunidades de poder são constitutivas de nossa sociedade.
Essa disputa, nos termos de Braudel, ao longo do século XX principalmente, foi capaz de
ampliar as dimensões da camada do mercado, fazendo com que cada vez mais um número
maior de pessoas, para sobreviver, tivesse que participar de redes de trocas mercantis. A
participação nessas redes, contudo, implica a posse de bens, passíveis de serem trocados no
mercado por outros bens, inclusive os bens alimentares. O fato da terra ter se tornado
importante para a produção de bens vendáveis no mercado, proporcionando assim uma
forma de acesso a parte do fluxo de dinheiro, fez com que a disputa pela sua posse se
acirrasse e, em conseqüência, um sem número de camponeses fossem expulsos dos campos
comunais na Inglaterra (Hill, 1991), ou foram obrigados a migrar das terras do interior do
Paraná e de São Paulo, quando foi oportuno por parte de seus proprietários, trocar as
plantações de café, ao longo dos anos 1950 e 1960, ou ainda das terras de boa qualidade do
Estado de Rondônia em fins da década de 1970 e início da de 1980, por exemplo (Reis,
1993).
Isso significa não apenas que o processo de expansão das formas capitalistas de produção
no espaço são, em si, excludentes, mas que ele avança sobre outras formas de organização
da produção e da distribuição, no sentido de desconstruí-las, seja pelo aumento do preço da
terra, pela degradação ambiental que provoca, como já se disse, seja ainda por desconstruir
as redes sociais de proteção que caracterizam essas outras formas de organização da
produção e do consumo.
Da mesma forma, vendo o Estado como uma instituição por onde passa parte substantiva da
riqueza, em termos monetários, produzida pelas sociedades, dado o monopólio que possui
da cobrança de impostos, deve-se dizer que a disputa em torno desses recursos, dos dois
lados, da cobrança de menos impostos e da realização de mais gastos, segundo os interesses
dos grupos que sobre essa instituição exercem algum tipo de influência, se tornou também
acirrada. Ela é muito acirrada, é preciso dizer, para que se possa compreender, por
exemplo, a importância e a dimensão política e cultural, além da dimensão puramente
28
econômica, que possuem os subsídios recebidos pelo setor agropecuário de países como a
França, como também as restrições comerciais impostas pelos países da OCDE.
Existe uma tendência, em função do desenvolvimento tecnológico, da diminuição da
dependência da produção de alimentos em relação aos fatores naturais, da mesma forma
que existe outra tendência no sentido de se valorizar alimentos produzidos naturalmente,
isto é, de forma tradicional, pela agricultura organizada nos moldes familiares, sem a
utilização, ou com uma pequena utilização de insumos modernos. A agricultura e a
pecuária comercial, movida por ganhos de escala e tendencialmente concentradora de terra
e de capital, dessa forma, convive com a agricultura tradicional, organizada em bases
familiares e/ou com a agricultura orgânica e, recentemente, a expressão dos valores
inerentes a essas duas últimas alcançou notoriedade em função não só das questões de
cunho ecológico, mas também cultural, social, econômico e político, que o
desenvolvimento da sociedade industrial acabou por impor.
Campos de disputa e a noção de multifuncionalidade da agricultura familiar
Perceba-se, no entanto, que se constituiu, dessa forma, três campos de disputa: no âmbito
do mercado, em torno da maior eficiência e eficácia que pressupõe a participação em redes
mercantis de produção e consumo; no âmbito do Estado, em torno da sua capacidade de
cobrar impostos, realizar gastos e interferir sobre a realidade de maneira programada; e no
âmbito da criação de representações simbólicas - o poder simbólico ao qual se referiu
Bourdieu (1989), em torno do alimento saudável, socialmente justo e politicamente correto.
Esses três campos de disputa envolvem organizações sociais da produção diferentes
daquelas orientadas exclusivamente para os mercados, e estas últimas. Em todos os três
campos de disputa, no contexto dos países com elevados índices de pobreza rural, as
primeiras, aquelas que não se orientam exclusivamente para os mercados, são as dominadas
e as últimas, dominantes.
A noção de multifuncionalidade, que é relativamente nova, no plano das representações
simbólicas, se coloca como um desdobramento de toda uma discussão que há décadas vem
29
se travando em torno do tema da agricultura familiar. Ela toma sentido no contexto dos
problemas ecológicos, políticos, sociais, econômicos e culturais colocados para o
desenvolvimento em geral e para o desenvolvimento rural em particular, em face do
discurso que pleiteia os mecanismos de mercado como os principais reguladores da ordem
econômica, que se colocou como hegemônico nos últimos trinta anos e, ao mesmo tempo,
em face da necessidade de se justificar subsídios à agricultura familiar dos países
desenvolvidos.
Esses, por sua vez, colocam empecilhos para o desenvolvimento da agricultura familiar dos
países com elevados índices de pobreza. Nesse contexto, esses países acabam incorporando
o discurso da liberdade de comércio contra os primeiros, em face da pobreza no campo, dos
problemas relativos à concentração de terras e da escondida eficiência não apenas
econômica da produção de base familiar, porque seus fundos para dar incentivos à
agricultura nacional são escassos e porque os recursos existentes já são apropriados por
grupos de interesse politicamente mais fortes, como grandes proprietários de terra, a
agroindústria do leite e da carne; e pela indústria produtora de máquinas, equipamentos e
insumos básicos para a agropecuária, inclusive a indústria química.
Revisitando as estratégias de promoção da segurança alimentar
Os documentos acima analisados, as propostas de estratégias e as análises de experiências
relativas à segurança alimentar neles contidas mostram com clareza as dimensões e a
profundidade dos esforços que vêm sendo realizados no sentido do combate à pobreza e à
promoção da segurança alimentar. Essa problemática vem sendo pensada a partir de
diversas entradas, que envolvem a heterogeneidade produtiva, sociocultural e econômica,
além da complementariedade dos sistemas agrícolas locais e regionais, a exploração de
vantagens comparativas no sentido da inserção mercadológica e da integração comercial
em todos os níveis; a diversidade de atores; o desenvolvimento e a difusão de tecnologias
apropriadas à agricultura familiar e ao seu caráter pluriativo; o fortalecimento institucional,
visto a partir da eficiência administrativa e dos sistemas de planejamento; a valorização do
rural e da importância da segurança alimentar, entre outros.
30
Os objetivos podem ser sintetizados no combate à pobreza, na diminuição da instabilidade
no que respeita à disponibilidade de alimentos, no aumento da capacidade econômica da
população rural de acessar alimentos e de acessar alimentos oferecidos no mercado. Nesse
sentido, promover o acesso à terra e ao crédito, abrir mercados e promover a agregação de
valor, a constituição de agroindústrias, a formação ou inserção dos agricultores familiares
em cadeias produtivas agroalimentares e a formação de cadeias comercialização; a
disseminação da assistência técnica; a valorização do trabalho feminino e da agricultura
ecológica se tornam importantes estratégias para diminuir a vulnerabilidade da população
rural pobre, aumentar e diversificar a produção da agricultura familiar e promover o manejo
sustentável dos recursos naturais nesse tipo de exploração.
Contudo, em função da análise realizada acima acerca do problema da segurança
alimentar visto sob uma perspectiva dinâmica, no que diz respeito ao âmbito da disputa
que acontece no mercado, perceber a eficiência subsidiada da agricultura dos países da
OCDE, tendo como referência a dicotomia Estado x mercado, nos parece ser um erro. Isto
porque o desenvolvimento do capitalismo, seja nos seus estados iniciais, seja no momento
presente, significou e significa a atuação do Estado em vários níveis e de diversas formas e
conceder subsídios à agricultura para a manutenção de níveis de vida relativamente
elevados no campo, nesses países, entre outros objetivos, é a forma de se manter o
desenvolvimento rural alcançado ao longo do século XX.
Significa isso dizer que, no campo de disputa que ocorre em torno dos recursos e das
formas programadas que o Estado age sobre a realidade, nesses países, os agricultores
familiares possuem relativamente um maior capital político e um maior capital simbólico
do que nos países com onde a pobreza no campo é grande. E, nesse contexto, pleitear, por
meio do discurso que privilegia a eficiência e a eficácia dos mecanismos de mercado, a
retirada dos subsídios de que se valem os primeiros, parece ser uma faca de dois gumes.
Primeiro, é preciso perguntar eficácia e eficiência em relação a que? Do ponto de vista da
segurança alimentar e da diminuição da vulnerabilidade da população rural que se encontra
31
em condições de pobreza, a eficácia e a eficiência estão relacionadas à existência de
perspectivas de ocupação e renda, do respeito a formas heterogêneas de produzir e de
existir socialmente e de ver suas perspectivas com relação ao futuro alargadas. Se valer,
contudo, daquele discurso e de práticas que tão somente buscam a inserção mercadológica
da pequena produção familiar pode implicar a necessidade da especialização diante do
mercado para se auferir renda e, então, satisfazer essas necessidades. Contudo, como
procurou-se demonstrar acima, nesse campo, ou seja, no campo do mercado, as
organizações sociais da produção não necessariamente orientadas para o mercado são
dominadas e não dominantes. Além disso, a dinâmica prevalecente nesse campo possui um
caráter excludente e avança sobre as formas tradicionais de produção no sentido de
desconstruí-las.
Posta a questão dessa forma, fica claro que as estratégias de combate à pobreza no meio
rural e de promoção da segurança alimentar devem ter dois viezes bem distintos: um
primeiro que visa o fortalecimento do caráter pluriativo das explorações familiares, bem
como das redes sociais que essas explorações conformam; e um outro que visa seu
fortalecimento na participação de redes mercantis, sendo que o primeiro deve ser priorizado
em relação ao segundo, porque é ele que vai garantir, em última instância, a diminuição da
vulnerabilidade dessa forma de organização social da produção em relação aos avanços da
economia de mercado e a eliminação da insegurança alimentar. Garantirá também a
diminuição da pobreza no meio rural, como também formas heterogêneas de existir
socialmente e a ampliação das perspectivas dessa população em relação ao futuro. Em
suma, vai garantir a formação de condições de sustentabilidade para o desenvolvimento
dessa forma específica de organização social da produção.
Esse ponto merece mais atenção. Excluindo o problema do acesso à terra, que não será
tratado aqui, senão de forma marginal, as estratégias concebidas no âmbito dos três
documentos da FAO, aqui analisados, deveriam ser pensadas, assim cremos, a partir desses
dois viezes. Isto é, a ação conjunta dos governos e dos parceiros, que se daria no âmbito
macro, meso e micro deve priorizar os espaços internos à porteira e os espaços externos à
porteira, mas internos às redes sociais existentes e que possam a vir a ser formadas em
32
função da ação de atores não-estatais; e, por fim, os espaços sociais existentes para além
dessas redes sociais, caracterizados pelas redes de trocas mercantis. Isso seria um primeiro
passo para de fato ocorrer a valorização das heterogeneidades produtivas, sócio-culturais e
econômicas. Isto deveria ser incrementado com a ações que exaltem essa heterogeneidade,
através do sistema de educação e de um sistema de informações e publicidade que
valorizem o rural, a segurança alimentar e a saúde das pessoas, dos grupos familiares e das
comunidades rurais.
Os programas de investimento em infra-estrutura e de acesso ao crédito devem, então, levar
em conta também a recuperação das residências, o acesso à água e à energia elétrica, a
recuperação de cercas, o acesso aos meios de comunicação e aos sistemas de informação, e
o saneamento básico, enquanto os programas de cooperação técnica, isto é, de produção e
difusão de tecnologias apropriadas ao caráter pluriativo dessas unidades produtivas e às
condições naturais nas quais elas se encontram devem ser distintamente tão valorizados
quanto aqueles que buscam a inserção dos pequenos agricultores em determinadas cadeias
produtivas ou em determinados mercados específicos.
O fortalecimento institucional, por seu turno, deveria levar em conta também as
possibilidades inerentes à própria comunidade, como por exemplo as associações já
existentes e fomentar a formação de outras, fortalecendo a própria idéia de comunidade e
dos laços sociais nos quais ela se funda. As ações direcionadas para as redes mercantis
devem continuar levando em conta a agregação de valor, a formação de agroindústrias e a
participação em cadeias produtivas, o fortalecimento dos sistemas agrícolas locais e
regionais, a exploração de vantagens comparativas e a integração comercial, primeiro nos
níveis local e regional e, posteriormente, nos níveis nacional e externo.
O importante é que os subsídios, o crédito e os recursos oriundos de outros fundos sejam
utilizados para a organização da vida familiar e comunitária e para potencializar os recursos
disponíveis, seja no âmbito da família, seja no âmbito da comunidade, ou ainda dos grupos
que no interior dela se formam, promovendo suas respectivas auto-sustentabilidades,
através da diversificação da produção, da valorização do que lhes é próprio, da
33
solidificação dos laços internos de solidariedade e troca e dos laços externos com atores
estatais e não-estatais.
Essa forma de abordar o problema da pobreza rural e da insegurança alimentar, assim,
cremos, além de ser mais eficaz no sentido da diminuição da vulnerabilidade desses grupos
sociais em relação à dinâmica dos processos de valorização do capital e da ampliação das
perspectivas de existência e reprodução das pessoas, dos grupos familiares e das
comunidades, enfim, do desenvolvimento, por valorizar suas próprias formas de ser e de
funcionar, o caráter qualitativo da desigualdade e os processos locais em curso, implicaria
maior objetivação dos programas de intervenção e, provavelmente, os seus custos e,
portanto, uma maior eficiência.
Isso significa o funcionamento de redes sociais que garantam, para usar uma expressão de
Jacobs (2001:96), a superação de economias de escala, forma característica de
funcionamento das empresas orientadas para o mercado, pelo desenvolvimento de
economias locais. Essa autora, embora trate das questões relacionadas ao desenvolvimento
de um ponto de vista da teoria dos sistemas, parecendo cair naquilo que Domingues
chamou de funcionalismo estrutural (Domingues, 1999:34), 6 contrapõe a idéia de
economias locais ao conceito de economias de escala e isso nos leva a pensar nas redes
sociais como maneira eficiente de reduzir custos, proporcionar segurança, em termos de
ocupação, saúde, educação e segurança alimentar e agilizar o processo de difusão de
informações, de tecnologias e, em conseqüência, de introdução de inovações: de fazer,
portanto, ressurgir as perspectivas de se eliminar a pobreza que se esvaíram com o fim dos
anos dourados.
É interessante lembrar, no entanto, que uma das características que se encontram na gênese
do desenvolvimento local é o fato de que ele existe na medida em que se faz referência ao
além do local, que em última instância é o global e na medida que o local não se encontra
6
Esse autor afirma, ao buscar construir uma teoria da ação criativa dos grupos sociais, que “Em seu
funcionalismo estrutural, a lógica sistêmica torna-se absoluta, descentrando o sujeito de modo aparentado a
Durkheim e seus herdeiros, porém o faz mais radicalmente – com o que permanece, ainda que de forma
absolutamente unilateral, na polarização entre indivíduo e sociedade, que atravessa a concepção moderna da
vida social, em geral, e a teoria sociológica em particular.” (Domingues, 1999:34).
34
circunscrito ao Estado Territorial. Assim, o desenvolvimento de economias locais se dá
para além dos Estados territoriais propriamente ditos, como também para além dos locais.
Só assim pode-se entender a dimensão do indivíduo, das famílias, dos grupos e das
comunidades nos processos de desenvolvimento local, bem como a participação, nesses
processos, de entidades supra-estatais - o Banco Mundial, por exemplo e não-estatais, como
ONGs de cunho religioso, social, ambiental, político, cultural, tecnológico, etc., espalhadas
por todo o mundo.
CONCLUSÃO
Na primeira parte do presente trabalho, procurou-se demonstrar os diversos sentidos que o
desenvolvimento assumiu a partir da Segunda Grande Guerra, de acordo com grupos
políticos e de países diferenciados. Além disso, uma das características do fim dos anos
dourados foi o esvaziamento das perspectivas em relação ao futuro, ao mesmo tempo que a
problemática relativa ao desenvolvimento sofreu um processo de amplificação, cujos
extremos passaram a ser o indivíduo de um lado e o global de outro e seu conteúdo
marcado por demandas sociais, políticas, ambientais e culturais, além das econômicas.
As disputas em torno do desenvolvimento então passaram a se concentrar,
predominantemente, para além e para aquém dos Estados-Nação. Nesse contexto de
disputa, observou-se a presença de uma postura dominante, não intervencionista, e que tem
o emparelhamento político-institucional como resposta para as questões relacionadas à
dicotomia países ou regiões ricas / pobres. Uma segunda postura, intervencionista, cuja
intervenção se assenta também nos processos de emparelhamento político-institucional. E
uma terceira, que revaloriza o associativismo, a partir do princípio da solidariedade.
Posto isto, no segundo tópico, relembramos que a problemática colocada pela segurança
alimentar não é nova e tentamos tratar de averiguar as formas que ela vem sendo pensada e
tratada. Isso foi feito com base em três propostas de ação para os Países Andinos, os Países
Centro-americanos e para os participantes do Mercosul Ampliado, realizadas no contexto da
Cumbre Mundial sobre la Alimentación: cinco años después, como também em documento
35
preparado por Maluf (1999) como resultado da apresentação de um conjunto de
experiências no âmbito do Painel sobre Experiências Localizadas de Apoio à Produção de
Alimentos. Da descrição e análise desses documentos, ficou em evidência duas questões
singulares: aquela relativa à concentração de capital e aquela relativa à distinção entre
crescimento econômico e crescimento econômico que diminui a pobreza, o que nos levou a
apontar novamente para a questão do desenvolvimento local, acompanhada da problemática
relacionada à agricultura familiar e duas de suas características: o caráter de ser pluriativa e
seu caráter multifuncional. Crescimento e acumulação, por outro lado, colocaram em
evidência também a necessidade de se perceber essas questões, no seu conjunto, enquanto
um processo dinâmico.
Nesse esforço, percebemos, com base em Elias, Braudel e Polanyi, que as tentativas de
equacionar os problemas relativos à relação entre pobreza, segurança alimentar e
agricultura familiar acabam colocando essa última diante de três campos de disputa em
relação às oportunidades de poder: o campo do mercado; o campo da esfera do Estado; e o
campo das representações simbólicas. Nesse último campo, a noção de multifuncionalidade
vem cumprindo um papel até certo ponto contraditório, na medida em que é usado pelos
países desenvolvidos para justificar preços mais altos dos produtos produzidos pela
agricultura de base familiar. Se essa diferença não é paga pelo mercado, é então financiada
pelo Estado, através da concessão de subsídios à agropecuária. Esses subsídios, no entanto,
de acordo com a perspectiva dos países pobres, destrói as bases de competitividade de seus
produtos e, portanto, compromete a segurança alimentar de suas respectivas populações
rurais.
No plano das representações simbólicas, a noção de multifuncionalidade da agricultura
familiar deve ser pensada também como um importante instrumento de combate à pobreza
no campo nos países não desenvolvidos. Esses países, em face dos problemas ecológicos
que vivenciam, em face dos novos mercados que vêm se abrindo e, em conseqüência, as
novas oportunidades de ocupação, renda, valorização do rural e integração rural - urbano, o
que vem sendo convencionado chamar de novas ruralidades; e em face das novas
tecnologias e do desenvolvimento da sub-política, nos termos de Beck, possuem um
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importante campo para o embate de propostas políticas relativas ao desenvolvimento em
geral, desenvolvimento rural e local, para a redução da pobreza e promoção da segurança
alimentar. Contudo, verificou-se que essa noção é prenha das possibilidades de
reconhecimento legal e legítimo da agricultura familiar enquanto forma de organização
social da produção.
Nesse contexto, para além dos preceitos de eficiência e eficácia contidos nas análises que
contrapõem mercado e Estado, permite pensar o rural de maneira integrada, incorporando
assim a problemática que passou a caracterizar o desenvolvimento, enquanto
desenvolvimento local. Ao nos perguntarmos eficiência e eficácia em relação a que?,
observamos que a abordagem do problema da pobreza e da segurança alimentar no meio
rural deveria levar em consideração três espaços distintos, os quais deveriam passar a estar
na base da formulação de estratégias e programas de desenvolvimento agropecuário e rural:
o espaço interior às porteiras; o espaço exterior às porteiras, mas interior às comunidades e
às redes sociais que se formam no interior dessas e nas relações mantidas com agências
estatais e não-estatais; e o espaço concernente ao das redes mercantis, que é o espaço
privilegiado do processo de valorização do capital.
Ter como ponto de partida essa premissa, para a elaboração daqueles programas e para a
construção de estratégias, segundo argumentamos, aumentaria suas respectivas eficácias, já
que promoveria, no médio prazo, a diminuição da vulnerabilidade das comunidades de
agricultores empobrecidos e ampliaria suas respectivas perspectivas com relação ao futuro,
contribuindo assim eficazmente para a eliminação da insegurança alimentar e para a
promoção do desenvolvimento rural. Por outro lado, implicaria também o aumento da
eficiência, por permitir uma maior objetivação dos programas e das estratégias e,
possivelmente, a redução dos custos inerentes ao processo de intervenção.
Por fim, argumentou-se que a formação de redes sociais, fundada na diversidade de atores
que atuam sobre o meio rural com o intuito de reduzir-lhe a pobreza, contribui para
constituir economias locais, em contraposição às economias de escala, que acabam por
recriar as condições sobre as quais as perspectivas em relação ao futuro se vêem
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revitalizadas, o que significa possibilidades de se eliminar a pobreza, de promover a
segurança alimentar e o desenvolvimento local.
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