Historia da Cartografia
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Historia da Cartografia
HISTÓRIA DA CARTOGRAFIA NO DESBRAVAMENTO DAS FRONTEIRAS NA CAPITANIA DE SÃO PAULO1 Cíntia Silva Pessanha Fernando Souza Miranda Mônica dos Santos Rocha Monique Duque Lacerda Ronyelle Henrique de Oliveira 1. INTRODUÇÃO O artigo que deu origem a este trabalho foi intitulado Vestígios indígenas na cartografia do sertão da América portuguesa escrito por Glória Kok (2009). A autora é historiadora e detém profundo conhecimento sobre a cultura brasileira. Foi nesse contexto que o artigo foi desenvolvido, de base fundamentalmente histórica ele trata da decodificação do território brasileiro a partir do conhecimento indígena. Quando os colonizadores portugueses chegaram ao Brasil o território era dominado por povos indígenas. Logo os europeus perceberam que para explorar e se fixar na região era necessário conhecer e conviver com os nativos que detinham profundo conhecimento espacial e geográfico local. Os sertanistas da Capitania de São Paulo afim de desbravar o território organizaram expedições com o intuito de mapear o interior do Brasil. Foi durante essas expedições de surgiu o que a autora chama de “cartografia indígena, um acervo de informações espaciais, construído pela memória e enraizado, principalmente, nos sentidos” Kok (2009, p. 92). Os referenciais teóricos, práticos, políticos dizem respeito ao século XVIII onde de acordo com Costa (2014, p. 01), a política do Estado português era influenciada pelas principais correntes políticas e filosóficas do Iluminismo. Portanto queriam difundir junto aos ameríndios as “luzes da razão”. O objetivo dos intelectuais e estadistas era “reaver o antigo poder e a grandeza de Portugal”. Havia uma mentalidade de dominação, que estabelecia a Europa como superior a todas as civilizações. A justificativa dessa dominação seria assegurada pela ideia de civilizar os indígenas para torna-los felizes, prósperos, ou seja, úteis aos interesses europeus, (no caso português), sendo imprescindível evangelizar os pagãos (indígenas) nos seus domínios (América). Assim, o 1 Texto desenvolvido na disciplina de Cartografia Geográfica II, do curso de Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo, período 2015/2, sob responsabilidade da Professora Gisele Girardi. conceito de felicidade do colonizador estava atribuído à vida civilizada e sujeita às leis positivas que os indígenas deveriam seguir. Costa (2014, p. 02). Segundo Domingues (apud Costa 2014, p. 02), a imagem construída acerca dos ameríndios era influenciada tanto pelos “contatos diretos estabelecidos entre colonos e índios” quanto pelas “correntes intelectuais e políticas da Europa que definiam a sua política colonial”. Várias problemáticas no artigo estão em questão, pois os indígenas criaram as condições, pelo mapeamento detalhado, para que os colonizadores portugueses produzissem o acervo cartográfico que resultou no conhecimento do território em termos geográficos, topográficos etc. E com isso ter os artifícios para desapropriar as riquezas e os territórios indígenas. Havia outras questões em jogo como a divisão política do território pelas capitanias hereditárias e o povoamento do território ao interesse da coroa portuguesa. Kok (2009). 2. SENTIDOS, SENSORES DE ORIENTAÇÃO. Ao olhar a imagem refletida no espelho, não damos conta da necessidade de aprimoramento dos sentidos (sensores) visão, audição, tato, paladar, olfato, este que estão presentes, e que muitas vezes passam despercebidos, pois os esquecemos e estão ali e a todo o momento nos servido, imaginar como se desenvolver diante de uma natureza crua e aparentemente hostil, com riscos de morte a todo o momento e se esses sentidos ou sensores vier a falta, com certeza seria uma presas fácil, diante de tal situação desenvolver os sentidos (sensores de defesas) faz se necessário, para busca de segurança e alimentos, estar a todo o momento em alerta torna se essencial, visto o perigo de morte a rodear. Kok (2009). Entretanto se considerar o fato da colonização do Brasil, uma terra onde ser destro na arte da observação do que o cerca faz necessária e ao pensar neste dilema, “onde a vida facilmente encontrara com a morte”, nossos bravos colonizadores portugueses, percebem a necessidade da formação de uma rede sociável junto aos nativos, visando à sobrevivência longe da terra lusitana, tal fato fez com que esta aproximação os dessem condições de sobreviver e avançar por sobre o sertão até então fronteira a ser explorada. Kok (2009). Como conhecedores da região, os nativos foram de fundamental importância para a colonização do interior do Brasil, uma vez que já estavam aqui, tornado se mais uma ferramenta desenvolvida pelos colonizadores e jesuítas. Kok (2009). 3. ROTAS DE COMUNICAÇÃO INDÍGENAS Glória Kok (2009. p. 93-94), no seu artigo ‘Vestígios indígenas na cartografia do sertão da América Portuguesa’ destrincha sobre o que considera veredas indígenas, entendido como vias importantes de comunicação entre as tribos tupis-guaranis. No sertão interligavam aldeias e povoados. O percurso indígena mais admirável foi chamado “Peabiru” pelos índios e, depois, “caminho de São Tome” pelos jesuítas; ligava as tribos da nação Guarani da bacia do Paraguai com a tribo dos Patos do litoral de Santa Catarina, com os Carijós de Iguape e Cananéia, e com as tribos de Piratininga e do litoral próximo. De acordo com KOK (2009. p. 94) o trajeto ia desde a capitania de São Vicente, da Costa do Brasil, até as margens do rio Paraná, indo pelos rios Tibagi, Ivaí e Pequeri. Segundo Murillo (2013, p. 35), existem várias informações sobre a origem desse caminho, alguns pesquisadores acreditam ser uma rota indígena pré- colombiana, outros defendem ser de origem inca. Petrone apud Murillo (2013, p. 35) argumenta que “a longa estrada” foi o instrumento de construção do sentido continental do povoamento indígena, ligando várias tribos. Conforme Murillo (2013, p. 35) coloca no mapa abaixo, a rota Peabiru ia dos litorais de São Paulo e do Paraná até Cuzco, passando pelo atual Paraná, Mato Grosso do Sul e Paraguai. Figura 1 - Referente aos caminhos traçado para fronteira. A rota Peabiru ia de São Paulo, Paraná passando por Mato Grosso do Sul, Paraguai até cidade de Cuzco no Peru. Fonte: Murillo (2013, p. 35). Kok (2009, p. 94) argumenta que no século XVII, esse itinerário foi cursado pelos paulistas à caça do gentio guarani que vivia no sertão dos Patos, e o sertão dos Carijós, nos arredores do rio Paranapanema. Kok (2009, p. 94) comenta sobre o “marchar à paulista” como sendo um costume comum nas bandeiras que implicava andar a pé muitos quilômetros, imitando os índios, ou seja, sem o uso de calçados. Ela aborda também que a língua-geral era dominante nas bandeiras, e que os paulistas designavam nomes tupis aos novos descobertos, aos rios, as montanhas. Os próprios povoados ao falarem em tupi encarregavam-se de difundir a língua pelo sertão. Também diz que os ameríndios utilizavam a tática de marcar com sinais os troncos dos arvoredos para indicar os caminhos, tática já utilizada no continente americano e incorporada pelos sertanistas. Portanto, segundo Kok (2009, p. 94) eram utilizados vários símbolos para indicar o melhor caminho a seguir, representando os acidentes topográficos, a presença de ouro, ou, meramente, a morte de alguém falecido longe de sua aldeia. No início do século XVIII, com o declínio das bandeiras e a descoberta de ouro em Goiás e no Mato Grosso, a entrada ao sertão chega decisivamente pelos rios Tietê, Paraná, Paraguai e seus afluentes. Kok (2009, p. 94). 4. MEIOS DE LOCOMOÇÃO Em São Paulo, a locomoção dos paulistas e portugueses que lá moravam era feira por terra. A pé. Já no século XVII já começaram utilizar técnicas de produção, de caça, construção de casas e embarcações o que facilitou muito a vida e o cotidiano de cada um. E ao longo dos anos, dia após dia, esses grandes personagens moldaram a história desse ambiente. No ano de 1725, foi a público uma carta que afirmada que essas grandes pessoas da alta sociedade eram as únicas pessoas que, de fato, eram capazes que cuidar proteger e alimentar aos demais que moravam ali. O que realmente era de grande importância para o povoado, pois eles não sabiam tampouco dessas técnicas e então sempre dependeriam deles para as tarefas. Entretanto, todas as atividades que eram produzidas pelos grandes homens, não eram trabalho passado de família para família, mas sim ensinados pelos indígenas que habitavam essa região. Não foi um aprendizado por simplesmente querer ensinar, mas sim, escravizados e forçados a reproduzir o que sabem para aqueles que detinham o poder. Esses índios foram torturados e obrigados a trabalhar, pelo simples fato de que eles não tinham as mesmas culturas que os demais tinham. Além dos africanos que foram trazidos da África pelos navios negreiros afins de que quanto mais mãos de obra melhor. Eles eram comercializados como qualquer outro produto de troca ou venda uma compra ou troca de madeira, moveis etc., por exemplo. Tendo os africanos e índicos como escravos, foi com certeza para eles, os brancos (pardos como diziam) a melhor forma de construir, modificar o meio em que vivem. Em primeiro lugar, foram construídas embarcações para facilitar o transporte de mercadorias para compra vendas, de pessoas em que grande maioria era as celebridades como o governo e reis. Logo mais tarde essas construções que percorriam os rios, foram se tornando mais atrativa para grande maioria das pessoas desse tempo. Outro fator econômico que propiciou as grandes movimentações desses barcos era a busca pelo ouro, a caminhada pelo sertão em busca de riquezas que futuramente foi chamado de “monsões” que eram grandes expedições feiras atrás dos rios do Brasil e que vale lembrar que essas madeiras que flutuavam eram conduzidas pelo mesmo que construíam. Contudo, em meados do século XVIII, houve uma grande reprodução por parte dos homens brancos com escravos indígenas e africanos o que nos começou a desenvolver uma nova classe, que mais tarde pode se chamar de miscigenação. 5. EXPEDIÇÕES ATÉ IGUATEMI Com a ameaça de ocupação por parte dos espanhóis na América Portuguesa, o ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Sebastião José de Carvalho e Melo, a promoveu em 1770, a demarcação e ocupação das fronteiras. Para essa promoção, as autoridades colônias de São Paulo dilapidando os cofres públicos e particulares para povoar as fronteiras. A ocupação da Praça de Nossa Senhora dos Prazeres, na margem esquerda do rio Iguatemi, região fronteiriça que não tinha uma demarcação definida, entre o Paraguai e as terras do Mato Grosso, era um dos alvos da expansão portuguesa. Para realizar esse desbravamento até a Praça de Nossa Senhora dos Prazeres foi nomeado Teotônio José Juzarte, ajudante do Regimento de Dragões Auxiliares da Capitania de São Paulo, como principal responsável pela escolta do comboio que partiria transportando mantimentos e uma segunda leva de povoadores do porto de Araritaguaba, mesmo essa expedição está sendo organizada por dois anos, ainda às vésperas da partida, mostrava-se bastante caótica. Juzarte partiu de Araritaguaba transportando mais de setecentos homens, mulheres e crianças de todas as idades, trinta soldados de linha, gente de mareação e equipagem. Ele recebeu ordens para mapear todos os rios que descobrisse, ao todo foi desenhado no percurso 65 mapas de caminho fluvial. No percurso houve alguns acidentes, o caminho fluvial tinha cachoeiras, além de toras de madeiras que dificultava a realização da viagem, fora as superstições dos tripulantes e as doenças. Na representação do Salto de Itapura, criado por Juzarte com dois detalhamentos da dificuldade para atravessar o rio Tietê antes de sua foz no rio Paraná (Figuras 1 e 2). Figura 2 – Criado por Teotônico José Juzarte . Desenho representativo do Salto do Itapura, na parte de cima aonde as canoas deciam rio abaixo e na parte de baixo, as canoas chegando no rio Grande do Paraná com uma seta indicando o seu percurso. Fonte: SOUZA; MAKINO, 2000, p. 393 (Apud KOK 2009, P.103). Figura 3 - Criado por Teotônio José Juzarte. Representação em detalhes do Grande Salto de Itapura, aonde visualiza-se os obstáculos que era encontrado. Fonte: SOUZA; MAKINO, 2000, P. 394 (Apud KOK 2009, P.104). Alguns obstáculos, os viajantes tinha que realizar o caminho pelo mato próximo ao rio, em uns dos prospecto de Juzarte, foi detalhado o acampamento e as canoas na beira do rio, para embarque e desembarque para transposição do salto do Avanhandava (Figura 3). Figura 4 - No lado esquerdo, Juzarte assinalou o lugar onde as canoas embicaram em terra para passar pelo varadouro, com muito perigo e trabalho, e, abaixo, o lugar onde as canoas foram recolocadas no rio para seguir viagem. Teotônio José Juzarte. Prospecto do grande salto de Avanhandava, 1769. Fonte: SOUZA; MAKINO, 2000, p.385 (Apud KOK 2009, P.105). Quando os povoadores finalmente aportaram à Praça de Nossa Senhora dos Prazeres do Iguatemi, após uma viagem não encontrara um ambiente desagradável, depois do sacrifício da viagem, a praça do Iguatemi foi atacada por uma tropa composta de espanhóis e índios guaicurus, após o Tratado de Santo Ildefonso, e os povoadores regressaram ao porto de Araritaguaba. Em compensação esse percurso serviu para realizar desenho de prospectos fluvial até a fronteira, com auxilio dos escravos indígenas e negros, aonde os índios continham conhecimento da rota, orientava os portugueses qual caminho seguir. A cartografia após o Tratado de Santo Ildefonso (1777), segundo BUENO (2009), o mapa (Figura 4), representa em detalhes a rede de caminhos, capelas, freguesias, vilas e cidades que articulava a Capitania de São Paulo às adjacentes, representa seus contornos dilatados e fronteiras com as capitanias vizinhas, completando o minucioso levantamento litorâneo, com latitudes e longitudes. Figura 5 - Mapa Cartográfico da Capitania de São Paulo do autor: Antônio Rodrigues Mezinhos, datado de 1791 e 1792. Fonte: BUENO, 2009, p. 150. 6. CONCLUSÃO O artigo que nos foi proposto para analise aborta questões históricas e cartográficas durante a colonização da América portuguesa nos séculos XVI, XVII e XVIII. Como sabemos não só na capitania de São Paulo, mas em todo território brasileiro os índios foram escravizados e explorados na busca de riquezas. Mas o profundo conhecimento que os ameríndios detinham foi fundamental no que tange à disponibilidade recursos hídricos, melhores locais para pesca, conhecimento da mata e de ervas, e os caminhos mais seguros para as expedições lideras pelos portugueses no sertão da capitania. A relação entre os portugueses e indígenas revelou uma nova ordenação do território. Segundo Gruzinski (apud KOK, 2009, pág. 107), “a situação colonial impôs uma nova orientação do espaço que, devido à conjugação dos símbolos indígenas com os símbolos coloniais, favoreceu arranjos cartográficos inéditos”. Do aprendizado que adquirimos ao trabalhar com essa temática diz respeito ao vimos durante todo o semestre na disciplina, que a cartografia só chegou onde está hoje, com todo aparato tecnológico, uso de softwares, imagens de satélite e os mais variados mapeamento existentes, graças ou conhecimento e ciência já praticada em tempos remotos pelas civilizações antigas de todo o planeta. Por mais ‘fácil’ que esteja na atualidade trabalhar com a cartografia e com os mapas, jamais podemos deixar de explorar e conhecer a forma como a cartografia foi criada pelos índios aqui no Brasil, pelos Incas, Astecas e Maias também aqui na América e por todos as outras civilizações e povos que marcaram e decodificaram o território ao longo da história. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BUENO, Beatriz P. S. Do borrão às aguadas: os engenheiros militares e a representação da Capitania de São Paulo. An. mus. paul., São Paulo , v. 17, n. 2, p. 111-153, Dec. 2009 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010147142009000200008&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 24/09/2015. COSTA, João Paulo P. Anais do XVI Encontro Regional de História da Anpuh- Rio: Saberes e práticas cientificas. Disponível em: <http://www.encontro2014.rj.anpuh.org/resources/anais/28/1400503147_ARQUIVO_Iluminismoepoli ticaindigenistanadocumentacaodogovernodeBernardoManueldeVasconcelosnoCeara.pdf>. Acesso em: 19/10/2015 KOK, Glória. Vestígios indígenas na cartografia do sertão da América Portuguesa. Anais do Museu Paulista (Impresso), v. 17, p. 91-109, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/anaismp/v17n2/07.pdf>. Acesso em: 24/09/2015 MURILLO, Edelsvitha P. Estudo toponímico do Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira, Petar: historicidade e etnicidade nos aspectos conceituais dos nomes de lugar. 2013.Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo- Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde26052014-093131/en.php>. Acesso em: 26/10/2015.