News Gentium - SPDI - Sociedade Portuguesa de Direito Internacional
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News Gentium Número V, Ano II Abril, Maio e Junho 2014 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional O Direito Internacional na academia portuguesa Neste número: Eleições para o Parlamento Europeu 2 Ban Ki-moon apela a uma reforçada dedicação à Convenção de Montego Bay 3 Os Custos Humanos da Guerra: mais de 50 milhões de pessoas deslocadas 5 PORTUGAL 7 O novo direito ao esquecimento na Internet 7 Síria: Justiça Internacional a chegar? 9 A abrir este News Gentium cabe-nos dar conta das mais recentes atividades da nossa Sociedade, de debate e formação em temas de Direito Internacional. Realizaram-se no passado dia 29 de maio as I Jornadas de Direito Internacional da SPDI, acolhidas pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. Esta é uma iniciativa que visa promover o debate de vários temas desta disciplina na academia portuguesa e que se pretende que tenha uma periodicidade anual. A I edição teve lugar sob o tema “As Fronteiras Luso-Espanholas” e incluiu duas intervenções e oito comunicações (apresentação de papers), divididas por dois painéis. A esta somar-se-ão mais duas organizações, já no próximo mês de setembro. Nos dias 11 e 12, a national branch portuguesa irá ser promotora da Conferência Regional 2014 da International Law Association. Esta terá lugar na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, subordinada ao tema “Towards a Universal Justice? Putting International Courts and Jurisdictions into Perspective”. Todas as informações relevantes poderão ser encontradas no site oficial: www.ilalisbonconference2014.com Já entre 15 e 19, realizar-se-á o curso intensivo International Petroleum Transactions, no Museu da Eletricidade da cidade de Lisboa. Mais informações e inscrições estão disponíveis no site da SPDI. Não podemos deixar de nos congratular com o proliferar destas iniciativas, promotoras do desenvolvimento de uma verdadeira escola de Direito Internacional em Portugal. Rita Teixeira - Vogal da Direção da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional Página 2 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional EM DESTAQUE Eleições para o Parlamento Europeu Nos passados dias 22 a 25 de maio, decorreram em todos os países da União Europeia eleições para escolher os novos deputados ao Parlamento Europeu para os próximos cinco anos. A eleição dos novos representantes europeus ficou marcada por várias polémicas, envolvendo não só os resultados finais como as consequências políticas do ato eleitoral. Com as alterações introduzidas pelo Tratado de Lisboa nos tratados constitucionais da União Europeia, no sentido de reforçar o funcionamento democrático das instituições europeias, estas foram eleições históricas, uma vez que pela primeira vez as várias famílias políticas do Parlamento Europeu apresentaram os seus candidatos a Presidente da Comissão Europeia. O discurso e o compromisso de campanha eram claros: o novo Presidente da Comissão Europeia iria sair do resultado das eleições, numa tentativa de aproximar os eleitores do governo da União. Ainda assim, e apesar de todos os esforços no sentido de democratizar a União Europeia, os valores da abstenção, cronicamente altos nas várias eleições para este Resultados provisórios (a 24 de junho) das eleições para o Parlamento Europeu. Fonte: www.results-elections2014.eu órgão, continuaram a ter um peso muito expressivo no resultado da jornada eleitoral em quatro dias, atingindo valores globais por volta dos 57%. Numa campanha marcada pelas questões económicas e financeiras na União, os resultados nacionais e globais acabaram por manifestar o sentimento dos cidadãos europeus em relação ao caminho até aqui percorrido. Em primeiro lugar, de salientar a vitória do Partido Popular Europeu que conseguiu eleger mais deputados que qualquer outra força política a concorrer nestas eleições. Contudo, a vitória mais expressiva e preocupante nestas eleições foi a dos partidos de extrema-direita, nomeadamente com as vitórias do UKIP no Reino Unido e da Frente Nacional em França, tendo para além disso os restantes partidos de extrema-direita e eurocéticos, conseguido aumentar, em quase todos os países e no resultado global, a sua expressão eleitoral. Este é um claro sinal do descontentamento de muitos cidadãos europeus com o rumo seguido nos últimos anos e que terá, com certeza, consequências políticas cujo alcance não deve ser menosprezado. Depois de apurados os resultados e fechadas as polémicas que envolveram a campanha e a definição de forças no Parlamento Europeu com a eleições dos mais de setecentos novos representantes europeus, nova crise se abriu imediatamente no seio da União. De facto, Página 3 e contra o que havia sido a pedra de toque destas eleições, surgiram dúvidas se o Conselho Europeu iria realmente propor Jean-Claude Juncker, indicado pelo PPE, vencedor das eleições, ao Parlamento Europeu para Presidente da Comissão Europeia. Vários líderes europeus, nomeadamente o Primeiro-Ministro britânico, manifestaram a sua discordância com o nome de Juncker para Presidente da Comissão. Esta crise aberta pelo Conselho Europeu, que poderia deitar por terra todos os esforços democratizadores que se pretendiam alcançar com estas eleições, geraram Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional imediatamente reação no seio dos eleitores que exigiam ver o seu voto respeitado e só ficou parcialmente solucionada mais de um mês depois, no passado dia 26 de junho, numa reunião do Conselho Europeu que decidiu finalmente indicar Juncker para Presidente da Comissão, não obstante a oposição dos Primeiros-ministros britânico e húngaro, que se opõem às visões federalistas do nomeado. Jean-Claude Juncker terá agora que designar a restante equipa da Comissão e apresentar-se perante o escrutínio do Parlamento Europeu antes de se tornar no novo Pre- sidente da Comissão. E, olhando para a composição do Parlamento saída das eleições, depressa se concluirá que este processo está longe de estar fechado. • Depois da vitória do PPE a 25 de Maio, Juncker consegue uma vitória importante no Conselho Europeu a 26 de Junho. Mas ainda nada está assegurado. Ban Ki-moon apela a uma reforçada dedicação à Convenção de Montego Bay A 16 de novembro de 2014 celebrar-se-á o vigésimo aniversário da entrada em vigor da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assinada em 1982 em Montego Bay, Jamaica. Neste sentido, Ban Ki-moon lançou um apelo aos estados signatários para reforçarem a sua dedicação ao acordo, considerado por muitos como a “Constituição dos Oceanos”, dada a sua vasta aplicação a nível mundial e inegável importância jurídica. Ban disse aos representantes dos estados signatários no passado dia 9 de junho em Nova York que pessoas em todo o mundo “(…) continuam a olhar para os oceanos por segurança alimentar e como uma fonte de emprego, prosperidade e bem-estar” e que estes “(…) desempenham um papel fundamental para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio”. Estas referências prendem-se com o facto de 2015 ser a data-limite para muitos dos objetivos de erradicação da pobreza. A Convenção de Montego Bay rege praticamente todos os aspetos dos espaços marítimo, nomeadamente a delimitação de fronteiras marítimas, a exploração de recursos, a proteção e preservação do ambiente marinho, pesquisa científica e formas de resolução de litígios conexos. Uma das provisões que o Secretário-Geral das Nações Unidas irá certamente destacar é a que estabelece que o seio marítimo para lá dos limites de jurisdição nacional é património comum da Humanidade, cujo uso e proteção são da responsabilidade de todos. Num relatório recentemente publicado, as Nações Unidas destacaram que a vida e a sustentabilidade de 12% da população mundial depende diretamente do sector das pescas – e, no entanto, 28% das fontes deste recurso alimentar são já sobre-exploradas. Ban Kimoon pretende tratar deste e de muitos outros problemas numa cimeira a realizar em Setembro, onde quer também prosseguir com os esforços para a criação de um tratado sobre alterações climáticas, a ser assinado em 2015 e a entrar em vigor em 2020. • Países signatários da Convenção (a verde escuro os que já a ratificaram; a verde claro os que apenas a assinaram ainda.) Fonte: Wikipedia Página 4 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional CONFLITOS Crise na Ucrânia: do início ao fim de um cessar-fogo No Leste Europeu, a crise aberta no final do ano passado na Ucrânia continua e parece não ter uma solução ainda à vista. Os últimos dias foram marcados por um cessarfogo declarado unilateralmente pelo recém-eleito Petro Poroshenko, Presidente da Ucrânia, que começou às 22 horas (hora local) do dia 20 de junho, sexta-feira, e que terminou uma semana depois. Durante o cessar-fogo, no dia 27 de junho, foi ainda assinado um acordo histórico de cooperação entre a União Europeia e a Ucrânia, visto por muitos ucranianos como o culminar de meses de manifestações e da deposição do ex-presidente Viktor Yanukovych. Depois da anexação da Crimeia pela Federação Russa em março, os conflitos continuam no leste da Ucrânia, nas regiões de Donetzk e Luhansk, entre as forças leais a Kiev e milícias pró-russas. Apesar de atualmente reconhecer a participação de forças russas durante as operações de anexação da Crimeia – tendo inclusivamente distinguido alguns desses militares com a atribuição de medalhas – o Presidente russo Vladimir Putin continua a negar o envolvimento de quaisquer forças russas nesses conflitos. Para além disso, as forças russas reunidas na fronteira com a Ucrânia foram retiradas – apesar dos Estados Unidos contenderem que poderá ainda existir atividade militar na zo- na – e Putin pediu ainda ao Parlamento Russo que revogasse os poderes militares que lhe haviam sido concedidos, parecendo assim por fim à ameaça de invasão do leste ucraniano. Não obstante, a União Europeia e os Estados Unidos continuam a impor várias sanções económicas a altas figuras do regime de Putin e a empresários russos a operar na Ucrânia. O discurso de Putin mudou também em relação ao governo de Kiev: depois de o denunciar como ilegal e ilegítimo, dispõe-se agora a dialogar com o novo Presidente Poroshenko no sentido de alcançar um acordo de paz. Foi no meio destes conflitos, sanções e manobras políticas e diplomáticas que surgiu o cessar-fogo declarado pelo Presidente Poroshenko. No entanto, esta medida foi acolhida com cautela em Moscovo. O Presidente Putin, frisando que este cessar-fogo não deveria ser utilizado como um ultimato contra os separatistas russos, afirmou que, para que este tipo de medidas faça sentido, o Governo de Kiev deverá tomar medidas concretas de negociação de paz com os separatistas russos, não obstante o seu apoio ao cessar-fogo. Apesar de inicialmente terem afastado esta hipótese, os separatistas russos concordaram posteriormente em fazer cumprir o cessar-fogo de uma semana, não obstante as acusações mútuas de incumprimento. O ces- Rebeldes pró-russos rasgam bandeira ucraniana, no fim eminente do cessarfogo. sar-fogo durou até à noite entre os dias 27 e 28 de junho, tendo o Presidente Poroshenko prolongado o mesmo até dia 30. No entanto, uma série de ataques levados a cabo por milícias pró-russas durante aquela noite poderão ter ditado o seu fim. Na origem dos ataques pode estar a assinatura do acordo de cooperação entre a União Europeia e a Ucrânia. O acordo, inicialmente recusado por Yanukovysh e que esteve na origem das manifestações de Novembro, foi agora firmado pelo novo Presidente ucraniano e abre o país à maior zona de comércio livre da Europa. Espera-se com este acordo que a economia ucraniana possa receber um impulso importante, numa altura em que este Estado deve vários biliões a credores internacionais. Este acordo é, ainda, mais uma peça fundamental no jogo de forças internacional que se disputa sobre a Ucrânia. • Página 5 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional Os Custos Humanos da Guerra: mais de 50 milhões de pessoas deslocadas Pela primeira vez depois da II Guerra Mundial, o número de refugiados, de pessoas que solicitaram asilo ou que estão deslocadas a nível interno ultrapassou a marca dos 50 milhões em 2013, anunciou a agência de refugiados da ONU. No ano que passou, um número estimado de 51,2 milhões de pessoas em todo o mundo foram vítimas O número de refugiados sírios contribui para atingir a barreira dos 50 milhões. Na imagem: dados de 2002. de deslocação forçada (devido a perseguições, conflitos, violência generalizada ou violações de direitos humanos), superando em seis milhões o valor do ano anterior. São números avançados pelo relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR):, apresentado no Dia Mundial do Refugiado (20 de junho), que recebeu, assim, o subtítulo “Custos Humanos da Guerra”. Este aumento foi impulsionado, principalmente, pelas guerras na África Central, do Sul do Sudão e Síria, que, no final do ano passado foram a causa para 2,5 milhões de pessoas fugirem de casa e causaram 6,5 milhões de deslocados internos. António Guterres, Alto Comissário do ACNUR disse que “há uma sensação geral de impunidade, os conflitos surgem, e, com eles as violações dramáticas dos direitos humanos. A comunidade internacional perdeu muita capacidade na prevenção das situações de conflito e na resolução em tempo útil”. Para o Comissário, “A paz está hoje perigosamente em défice” e a ajuda humanitária apenas pode ajudar como paliativo. Resoluções políticas são vitais, e o ACNUR lançou um apelo à Comunidade Internacional para que afaste as suas diferenças e trabalhe para encontrar soluções. Na Europa, a pressão internacional aumenta para que se trave o aumento descontrolado do número de imigrantes que arriscam a vida em perigosas viagens pelo Mediterrâneo. Neste verão, centenas de milhares de pessoas preparam-se para encetar uma perigosa travessia em embarcações desadequadas, vindas do norte de África, para tentarem desembarcar com sucesso nas costas da Grécia ou de Itália, e a ACNUR afirmou pela primeira vez que é necessário fazer um acompanhamento deste imigrantes e refugiados que vêm fora da Europa. Discute-se a criação de centros de controlo de imigrantes fora do continente, no norte de África ou no Médio Oriente, com oposição de organizações como a Human Rights Watch, que receiam que os refugiados fiquem à mercê de Estados em que os direitos humanos e a justiça são uma miragem. • Cimeira pelo Fim da Violência Sexual em Conflitos As Nações Unidas lançaram, na Cimeira Internacional pelo Fim da Violência Sexual em Conflitos de junho, um conjunto de linhas orientadores sobre a compensação das vítimas e das comunidades afetadas por este tipo de violência. A “Guidance Note on Reparations for Conflict-Related Sexual Violence” apresentada na Cimeira de Londres por Phumzile Mlambo-Ngcuka (Diretora-Executiva da ONU para as Mulheres) resulta de um trabalho conjunto da Secretaria-Geral da ONU e do Alto Comissariado para os Direitos Humanos e pede soluções de longo prazo e de profundida, que vão para além da realização de um só pagamento, e podem ter implicações na propriedade de terras ou nos direitos sucessórios. A Cimeira foi copresidida pela Enviada Especial Angelina Jolie e pelo Ministro dos Negócios Estran- Phumzile Mlambo-Ngcuka apresentou o documento contendo linhas orientadoras para a reparação destes crimes. Página 6 geiros Britânico William Hague. “Estamos aqui por todos os sobreviventes esquecidos, escondidos, que foram levados a sentir-se envergonhados ou abandonados”, disse a atriz na sua intervenção. “É um mito que violações sejam uma parte inevitável dos conflitos”, acrescentou. Nela participaram mais de 900 peritos, organizações nãogovernamentais, sobreviventes, líderes religiosos e organizações internacionais de todo o mundo. O documento fala ainda de acesso a crédito, cirurgia para as ví- Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional timas de violações e da aquisição de competências que permitam a sua subsistência e estabelece princípios que se aplicam a todas as partes envolvidas, não apenas aos Estados. O seu objetivo é ajudar as vítimas de violência sexual a reconstruir as suas vidas. No início do mês, a Procuradora -Geral do TPI, Fatou Bensouda, declarando-se alarmada pelo aumento de provas deste tipo de violência durante os conflitos, já se havia comprometido a intensificar as investigações do tribunal no que se referem ao julgamento de crimes sexuais e raciais, incluindo outras ofensas para além de agressões físicas. • Angelina Jolie ouve histórias de refugiados que escaparam da Síria (18 de junho 2013) Conflito iraquiano ameaça a unidade do país O primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, é apontado, quer por adversários internos quer por países estrangeiros, como o responsável pelo agravamento da situação no Iraque, devido a políticas sectárias que levaram tribos sunitas a alinharem com os jihadistas do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS), que, nas últimas semanas, ocuparam vastas áreas do Iraque. A urgência de uma solução deve -se principalmente à situação no terreno – dia 29 de junho, as notícias eram de uma ofensiva do Exército e da aviação contra Tikrit, 160 kms a norte de Bagdad, ocupada por jihadistas. Contudo, os ataques, que envolvem milhares de soldados, tanques e apoio aéreo, têm sido repelidos pelos jihadistas. Testemunhas citadas pela BBC indicam que há pesadas baixas de ambos os lados. Com o apoio de sunitas, o ISIS conquistou nas últimas três sema- nas vastas áreas do Norte e Ocidente do Iraque, incluindo Mossul. Paralelamente, os curdos iraquianos tomaram Kirkuk. A necessidade de uma solução governativa (que permita escolher o novo primeiro-ministro) decorre também da aproximação do dia 1 de julho, data para que está marcada a primeira sessão legislativa do Parlamento após as eleições. A coincidir com os últimos esforços governamentais com vista à recuperação do controlo de Tikrit, o Iraque recebeu um conjunto de jatos de combate russos Sukhoi, Su25, que vão ajudar as suas forças militares a responderem à ofensiva jihadista das últimas semanas. Os aviões começarão a ser usados dentro de “três ou quatro dias”. No mesmo dia, os combatentes do ISIS anunciaram, numa gravação difundida na Internet, que restabeleciam o califado e que o seu chefe, Abou Bakr Al-Baghdadi, é "o líder de todos os crentes". Os combates das últimas semanas no Iraque provocaram já, segundo as Nações Unidas, mais de um milhar de mortos e levaram à fuga de centenas de milhares de pessoas. • Mais informações em: http:// www.publico.pt/mundo/noticia/ iraque-comecou-a-receber-avioesrussos-para-combater-jihadistas1660972 Iraque recebe aviões russos para combater jihadistas. Página 7 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional PORTUGAL Portuguesa nomeada para cargo europeu No passado dia 5 de junho, foi confirmada a nomeação de Maria João Valente Rosa para o Comité Consultivo Europeu de Estatística. Esta nomeação foi feita pela Comissão Europeia, com a indicação de uma lista de oito membros, num total de vinte e quatro, sendo que Maria João Valente Rosa é a única portuguesa da lista de nomeações. Especialista em demografia, é atualmente a diretora do Pordata, tendo anteriormente dirigido a área de estatística do Ministério da Educação e no Observatório da Ciência. Professora na Universidade Nova de Lisboa, é ainda autora de vários textos académicos sobre o envelhecimento da sociedade portuguesa e a evolução demográfica ao longo dos últimos cinco anos. Aos 52 anos, é assim nomeada para o órgão da União Europeia cuja missão é contribuir para o desenvolvimento de políticas de informação estatística e para a racionalização da produção de dados estatísticos ao nível europeu. • Secretário-Geral da Amnistia Internacional visitou Portugal Nos passados dias 4 e 5 de maio, Salil Shetty, Secretário-Geral da Amnistia Internacional, esteve em Portugal, naquela que foi a sua primeira visita ao país que terá inspirado o britânico Peter Benenson, Salil Shetty é Secretário-Geral da Amnistia Internacional desde 2009. alarmado com as violações de direito humanos cometidas durante o regime do Estado Novo, a fundar esta organização. Esta é, aliás, a primeira visita de um Secretário-Geral desta organização a Portugal em quase vinte anos. Entre outros eventos, Salil Shetty participou numa conferência, no dia 5 de maio, na Faculdade de Direito de Lisboa, organizada pelo Instituto de Direito Económico, Financeiro e Fiscal daquela faculdade e pelo Instituto Europeu, subordinada ao tema “Direito Humanos na Europa: que desafios para o futuro?”. Em ano de eleições europeias, os temas em destaque na conferência prenderam-se com os direitos económicos e sociais, as situações de refugiados e minorias, liberdades e democracia. Esta conferência contou ainda com a presença de Mário Soares, ex -Presidente da República que fora considerado como prisioneiro de consciência pela organização e “prisioneiro do ano” em 1968, e ainda de Catarina Albuquerque, Relatora da ONU para o Direito à Água e Saneamento, e o eurodeputado Carlos Coelho, tendo cabido a intervenção final da conferência ao Secretário-Geral Shetty. • TRIBUNAIS INTERNACIONAIS O novo direito ao esquecimento na Internet Desde o mês de Maio que qualquer cidadão europeu pode reivindicar o seu direito ao esquecimento na Internet. Tal é possível em consequência de uma decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia no caso Google c. Mario Costeja González, onde reconheceu o direito a um cidadão de nacionalidade espanhola que requeria ao motor de busca que eliminasse a ligação existente entre o seu nome e um anúncio de jornal que publicitava um leilão de imóveis para o paga- Página 8 mento de dívidas à Segurança Social, onde o cidadão constava como um dos devedores. Mais do que proteger o bom nome deste cidadão, estava em causa definir se os motores de busca são ou não responsáveis pelos dados colocados por terceiros na Internet, e se lhes é possível proceder a um tratamento dos mesmos. Tendo decidido pela afirmativa, esta decisão do TJUE foi considerada por muitos como uma decisão histórica em matéria de proteção de dados na União Europeia. Este direito agora reconhecido vem, assim, permitir que qualquer cidadão requeira que as ligações de resultados sobre si, desde que consideradas inadequadas, irrelevantes ou excessivas, sejam eliminadas pe- Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional los motores de busca. Para tal, terá apenas que formalizar o pedido diante destes. A Google, já colocou à disposição dos seus utilizadores um formulário de “pedido de remoção de pesquisa ao abrigo da Lei Europeia de Proteção de Dados”, de modo a facilitar o processamento das queixas. Consta que já terá recebido mais de 41 mil pedidos e, desde o final de Junho, alguns dos links começaram a ser removidos. Algumas das críticas feitas contra este novo mecanismo são, em primeiro lugar, a sua difícil eficácia, pois num mundo em que a informação é difundida rapidamente e os motores de busca não têm controlo sobre o que acontece depois de partilhada, a proteção nunca será absoluta; em segundo lugar, a verdadeira polémica, é que cabe aos próprios operadores de busca avaliar o mérito dos pedidos, isto é, decidir quando está ou não em causa o interesse público. Perigoso para uns, uma lacuna finalmente preenchida para outros, o que é certo é que já está a ser discutida uma alteração à legislação europeia em matéria de proteção de dados. • A Google já recebeu 41 mil pedidos de remoção de resultados de pesquisa, e já começou a processá-los. Novas decisões do TPI O TPI continua a desenvolver o seu trabalho, marcado nas últimas semanas por desenvolvimentos em processos que envolvem crimes de guerra e crimes contra a humanidade ocorridos na Costa do Marfim e na República Democrática do Congo. No passado dia 23 de maio, Germain Katanga foi condenado a 12 anos de prisão por quatro crimes de guerra e um crime contra a Humanidade, nomeadamente assassínio, ataque a população civil, destruição de propriedade e pilhagem. Os crimes foram cometidos num ataque em fevereiro de 2013 à aldeia de Bogoro por um grupo denominado Force de Résistance Patriotique en Ituri, do qual Katanga era comandante. O Juiz Bruno Cotte explicou em audiência pública que o tribunal teve que considerar a legítima necessidade de justiça e verdade expres- sada pelas vítimas, bem como assegurar que a sentença teria um efeito detrator para potenciais perpetradores de crimes semelhantes. Por sua vez, Martin Kobler, chefe da MONUSCO (‘United Nations Organization Stabilization Mission in the Democratic Republico f the Congo’), afirmou que esta decisão “envia outro aviso a grupos armados, incluindo o FRPI, para que cessem imediatamente os ataques contra a população civil e deponham armas”. *** Num processo diferente, o TPI decidiu levar a julgamento o antigo presidente da Costa do Marfim, Laurent Gbagbo, após ter considerado como suficiente as provas apresentadas pelos procuradores. O antigo chefe de estado é acusado de lançar o seu país numa guerra civil por não querer ceder o poder, após ter perdido as eleições em 2010. Irá enfrentar acusações de crimes contra a humanidade, já que se estima que mais de 3000 pessoas tenham morrido nos conflitos. Os procuradores defendem que Gbagbo planeou com outros coconspiradores, incluindo a sua esposa Simone e Charles Ble Goude, um escalar da violência, da qual retirou lucros. Por seu lado, os seus advogados afirmam que este é um processo político movido pelo atual Presidente Ouattara. Estas duas decisões do Tribunal Penal Internacional foram tomadas nas últimas semanas e atestam o vigor com que esta instituição atua hoje na cena judicial internacional. Durante muito tempo acusado de lentidão, estes resultados são uma vitória para os procuradores, para os juízes e para as vítimas dos crimes cometidos. • Página 9 Newsletter da Sociedade Portuguesa de Direito Internacional Síria: Justiça Internacional a chegar? No passado dia 20 de Junho, foi apresentado perante o Tribunal Penal Internacional um documento contendo provas da existência de vários crimes de guerra perpetrados por ambos os lados do conflito na Síria. O documento de cerca de mil e quatrocentas páginas contem relatos de pelo menos vinte alegações de crimes de guerras, com citações precisas das violações do Estatuto de Roma e recomendações sobre que tipo de penas devem seguir-se a estas acusações. Estas alegações refletem ainda a força crescente das organizações islâmicas extremistas na Síria. Ao contrário de anteriores relatórios onde predominavam descrições das atrocidades cometidas pelas forças leais ao regime de Al-Assad, neste documento as alegações encontram-se divididas no que toca aos autores dos crimes alegados, cobrindo em igual medida tanto as forças do regime como os grupos rebeldes que combatem contra AlAssad. Afirmam os seus autores que não se trata apenas de tentar julgar as altas figuras do regime no poder, mas procurar administrar a justiça internacional em ambos os lados do conflito. Os relatos detalhados contidos neste documento juntam-se assim à até agora grande quantidade de informação e de dados recolhidos acerca da situação no terreno naquela que o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, já apelidou de uma “guerra extraordinariamente brutal”. No seio da comunidade internacional, existe uma vontade bastante generalizada de submeter as questões relativas à Síria ao Tribunal Penal Internacional. Neste âmbito, o Governo francês tem tomado um papel de claro destaque, procurando fazer pressão junto dos seus parceiros internacionais no sentido de reunir consensos alargados em torno desta questão e denunciando as situações no terreno, nomeadamente no que diz respeito à utilização de armamento químico, mesmo depois de todos os esforços de neutralizar o arsenal químico existente na Síria. No entanto, Rússia e China mantêm a sua posição de bloqueio quanto a qualquer tentativa de remeter estas questões para o TPI. De facto, dias depois da apresentação deste documento àquele Tribunal, Rússia e China exerceram o seu direito de veto sobre um projeto de resolução da ONU nesse sentido. Esta resolução, aprovado pelos restantes treze membros do Conselho de Segurança, foi apelidada pelo embaixador Um conflito sem resolução à vista e bloqueado na comunidade internacional. russo na ONU, Vitaly Churkin, como uma “manobra publicitária” sem capacidade efetiva de contribuir para a resolução do conflito que já se arrasta há três anos naquele país. Esta posição mereceu a censura generalizada dos restantes membros do Conselho de Segurança, tendo o Ministro do Negócios Estrangeiros britânico, William Hague, manifestado a sua reprovação pelo facto destes países terem vetado uma resolução não-política, tendo igualmente ignorado uma oportunidade da comunidade internacional se unir pela justiça na Síria. Esta é já a quarta vez que a Rússia usa o seu direito de veto para bloquear qualquer ação do Conselho de Segurança em relação à Síria. A importância de procurar uma solução rápida e eficaz para o conflito na Síria assume atualmente uma importância ainda maior, atendendo à situação no Iraque e ao crescimento do grupo extremista do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, com ligações à AlQaeda, que tem vindo a conduzir uma campanha de grande magnitude no Iraque e com ligações importantes à Síria.• Rússia e China bloqueiam resoluções do Conselho de Segurança da ONU, impedido a submissão do caso ao TPI. Universidade Nova vence Europa Moot Court O ano letivo de 2014-2015 foi novamente um ano de marcos alcançados para as faculdades de direito portuguesas. Um destes marcos é o reforço da participação em moot courts, competições de julgamentos simulados que reúnem equipas de universidades de todo o mundo e permitem aos estudantes uma realística experiência da prática forense, como já havíamos dado notana última edição. A Telders International Law Moot Court Competition é organizado todos os anos pela Universidade de Leiden e decorre nas premissas do Palácio da Paz, na Haia. O litígio deste ano versou sobre temas vários como jurisdição internacional, uso de força, proteção diplomática e imunidades. A Universidade Nova fez-se representar por uma meritória equipa que deixou atestado o seu conhecimento nas semifinais da competição. As faculdades de direito começam a aperceber-se da importância fundamental que a participação num evento desta natureza tem no desenvolvimento das capacidades e do currículo dos seus alunos. A confirmar esta afirmação está o facto de ter havido uma ronda nacional para apurar qual a universidade a enviar uma equipa portuguesa à prestigiada Jessup International Law Moot Court Competition. Após os julgamentos disputados entre a Universidade de Lisboa e a Universidade Nova, foi a uma equipa desta última que coube a responsabilidade de ir a Washington D.C. no passado mês de Abril. Mas a mais compensatória participação foi a da primeira edição do Europa Moot Court FICHA TÉCNICA Redação, edição e design gráfico por Rita Teixeira, Maria Inês Basto, João Francisco Diogo, João Barreiros, e Ricardo Bastos (Sócios Júnior da SPDI). Competition. A equipa da Universidade Nova foi composta pelos alunos finalistas Josefina Carreira, João Barreiros, Rita Teixeira e Ricardo Bastos e teve a honra de ver os seus esforços coroados com o primeiro lugar na competição. A equipa defrontou concorrentes das universidades de Paris, Atenas, Salónica e Košice em julgamentos simulados em Kavala, Grécia. A Grande Final foi presidida pelo Advogado-Geral Melchior Wathelet do Tribunal de Justiça da União Europeia. Todas estas participações e esta vitória demonstram a qualidade que as faculdades de direito se dedicam a alcançar e, naturalmente, o espírito empreendedor e sério com que os nossos estudantes se lançam na sua vida académica e profissional. •