A Mente_e_a_ Resposta

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A Mente_e_a_ Resposta
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A mente
é a resposta
Por Carlos Anastácio
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Acerca do autor:
Tem 52 anos de idade. É formado em engenharia mecânica, com formação em gestão
de empresas, tendo exercido vários cargos de direcção. em dedicado os últimos anos
à investigação e prática de técnicas de Transformação Pessoal Interior e Auto-Ajuda
tendo obtido formação nos E.U.A. e Espanha.
É o criador e orador em seminários e workshops.
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Agradecimentos
À Maria Luisa, minha mulher, por me ter incentivado a escrever este livro e por todo o
trabalho que teve na sua correcção e aconselhamento.
Ao meus amigos Júlia e Marciano pelas longas conversas que me permitiram uma
melhor compreensão.
Ao Quim Zé por me ter permitido expandir os meus pensamentos.
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Índice
Acerca do autor………………………………………………………………………………………2
Agradecimentos……………………………………………………………………………………...3
Introdução a uma nova mentalidade……………………………………………………………….5
Nota do autor………………………………………………………………………………………… 7
Entrevista ……………………………………………………………………………………………. 9
Considerações ………………………………………………………………………………………14
Prefácio……………………………………………………………………………………………….16
A ligação entre o corpo e a mente…………………………………………………………………21
A cura e as crenças………………………………………………………………………………….25
Como considerar a doença……………………………………………….…………………………27
Os sintomas…………………………………………………………………………………………..29
A inadequação do adulto……………………………………………………………………………33
A auto-estima…………………………………………………………………………………………38
A auto-aceitação……………………………………………………………………………………...40
O merecimento……………………………………………………………………………………….42
As crenças…………………………………………………………………………………………….44
A culpa…………………………………………………………………………………………………47
A mentalidade errada………………………………………………………………………………..49
Passado, presente e futuro………………………………………………………………………….51
A mente………………………………………………………………………………………………..55
A vida…………………………………………………………………………………………………..58
O poder do pensamento……………………………………………………………………………..60
Sonho ou realidade…………………………………………………………………………………...62
O pensamento cria a nossa realidade………………………………………………………………64
A importância do pensamento correcto…………………………………………………………….66
A realidade auto-criada……………………………………………………………………………….68
O mundo……………………………………………………………………………………………….70
Questionar a realidade do mundo……………………………………………………………………73
O dualismo do mundo…………………………………………………………………………………75
A atracção do mundo………………………………………………………………………………….78
Para além do corpo……………………………………………………………………………………80
O medo………………………………………………………………………………………………….83
Evitar o medo…………………………………………………………………………………………..85
Ser livre é libertar-se do medo……………………………………………………………………….87
As várias faces do medo……………………………………………………………………………..89
Novos sistemas de pensamento…………………………………………………………………….92
O nosso auto-conceito………………………………………………………………………………..96
A experiência corporal………………………………………………………………………………..99
O que é a salvação…………………………………………………………………………………..102
A natureza da verdadeira realidade………………………………………………………………..105
A natureza de Deus………………………………………………………………………………….107
Mudar a nossa realidade…………………………………………………………………………….109
O perdão………………………………………………………………………………………………111
Uma alternativa real………………………………………………………………………………….114
O mundo exterior……………………………………………………………………………………..116
A mudança de mentalidade………………………………………………………………………….118
A cura…………………………………………………………………………………………………..120
Epílogo………………………………………………………………………………………………….122
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Introdução a uma nova mentalidade
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Introdução a uma nova mentalidade
A medicina avançou consideravelmente neste século. No entanto, penso que deveria
ser dada mais relevância ao estudo da relação corpo-mente. A prática da homeopatia
durante vários anos deu-me a convicção de que esta interacção é fundamental para a
compreensão do desenvolvimento das doenças e do seu processo de cura.
Observei casos de pessoas que sendo vegetarianas sofriam dos mesmos sintomas
que outras que se alimentavam sem qualquer cuidado especial. Também observei
pessoas que nunca tinham fumado sofrerem de cancro nos pulmões. Compreendi
então que factores não físicos eram comuns nas pessoas com o mesmo tipo de
doenças. Esses factores eram fundamentalmente estados depressivos, traumas,
desilusão pela vida, frustração e exclusão social, muitas vezes tendo como raiz uma
infância reprimida.
Este livro pretende dar uma ajudar a compreender essa realidade, numa viagem que
passa pela interrogação mais profunda da nossa existência. Quem somos? O que é a
vida? Porque adoecemos? Porque morremos?
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Nota do autor
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Nota do autor
Em 27 de Maio de 1988, um jornal diário da capital, no seu suplemento de saúde,
publicou uma entrevista que a seguir se transcreve para que o leitor possa mais
facilmente compreender a sua responsabilidade na criação e na cura da sua própria
doença, seja ela psíquica ou física.
O conteúdo da mesma reforça a minha convicção de que a ligação corpo-mente é um
fenómeno de vital importância para a compreensão da auto-cura e da superação de
uma vida de carência
Saúdo a jornalista que escreveu o artigo pela compreensão que demonstrou por este
assunto e pela forma como o explicou aos seus leitores.
Carlos Anastácio
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Entrevista
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Entrevista de 27 de Maio de 1998:
«A nossa mente é a resposta
para vencer uma doença»
Conflito, culpa, doença. Esta relação pode não fazer sentido para quem acredita que
uma enxaqueca, uma dor de estômago e até um cancro são apenas problemas físicos.
Mas, quando percebermos que a verdadeira causa de tudo isso está na nossa mente,
é possível acreditar que está aí a resposta para a cura.
«A mente é a resposta.» Este é o princípio, a questão primordial, para se entender
todo um pensamento e uma linha de actuação que não trata doenças, mas que tenta
descobrir as suas causas. «O sintoma é apenas um sinal exterior, o efeito de uma
causa e a doença está na causa, está na mente», explica Carlos Anastácio, naturopata
e homeopata, que nos últimos anos tem vindo a aprofundar os seus conhecimentos
destas questões.
Carlos Anastácio correu mundo, frequentou diferentes cursos de medicina natural,
criou um Instituto de Saúde Integral em Lisboa (Homeos) e prepara-se para lançar
brevemente um livro sobre o poder da mente. «A mente é tudo, nada existe fora dela»,
afirma, acrescentando que é importante convencer as pessoas de que a «causa de
tudo está em nós».
Esta perspectiva de abordar a doença, radicalmente diferente do que acontece na
medicina convencional, não se limita a tratar sintomas. Vai mais longe, busca as
causas, tenta resolver um conflito. «A doença é um sintoma físico da culpabilidade de
uma pessoa, da existência de um conflito. Por detrás de uma doença, há sempre algo
escondido», explica o médico naturopata.
Tomemos como exemplo o cancro. «Pode dizer-se que um doente com cancro da
mama, provavelmente, formou esse tumor por um sentimento inconsciente de
culpabilidade», explica, adiantando que nestes casos é possível descortinar uma
relação nítida entre o desenvolvimento da doença e acontecimentos traumáticos
vividos sete e oito anos antes.
«Tudo se trata de um erro mental – prossegue --, a pessoa sente, por qualquer
razão, que errou e castiga-se a si própria.» É esta espécie de auto-punição que
alimenta esse tal conflito e que se revela através de sintomas físicos. «Quando os
nossos actos do quotidiano entram em conflito com o nosso objectivo espiritual,
sabemos de um modo inconsciente que estão lançadas as sementes da doença»,
acrescenta. Aprender a encarar a vida de uma outra forma é a estratégia a seguir, pois
cada um «é responsável pelo mundo em que vive».
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Tratar a mente
«A terapia mental é a medicina do futuro», defende Carlos Anastácio, convencido de
que essa é a única «cura» possível. Partindo do princípio de que «é o ser humano que
causa doença a ele próprio», pelos seus pensamentos e crenças, o diagnóstico não se
compadece com métodos convencionais e muito menos com um tratamento aparente.
«O tratamento dos sintomas é apenas uma questão de tempo. Alivia durante uns
meses, mas, como o conflito não se resolveu, os mesmos sintomas vão voltar e ainda
com mais intensidade», explica.
O diagnóstico de determinada disfunção, que pode ser um problema de estômago,
dores de cabeça, doenças do fígado ou cansaço crónico, faz-se ao nível físico e
mental. Também os métodos desta medicina «não agressiva» são outros. Em primeiro
lugar procede-se a uma análise da íris (a Iridologia), depois, através da
electroacupunctura, tenta-se avaliar a falência dos vários sistemas e órgãos,
identificando ao mesmo tempo as situações de excesso. Para além desta observação
física, o médico deverá tentar descobrir o que está «escondido», passando às
questões da mente.
Uma conversa é o ponto de partida para dissecar hábitos de vida (alimentação,
exercício físico), conhecer o passado e tentar descobrir situações eventualmente
traumáticas que possam estar na origem desse conflito.
Apesar da importância de uma conversa, o primeiro grande passo é proceder à
desintoxicação do indivíduo (sempre com ajuda de processos naturais), pois, apesar
de o nosso organismo ter capacidade para se auto-regular e, através dos seus próprios
mecanismos, recuperar o equilíbrio (homeostasis), a verdade é que «erros atrás de
erros» não dão tempo, nem oportunidade para que esse processo se desenrole.
As gorduras, os cafés, a forma como cada um se alimenta são factores de risco que
afectam a sua funcionalidade. Desde que se pare de «agredir» o corpo, evitando todas
as toxinas, 99% dos sintomas associados à hipertensão, cansaço crónico e
enxaquecas, por exemplo, «vão-se embora».
«O corpo físico é como uma máquina em funcionamento, as peças são susceptíveis
de sofrer acidentes que impedem o seu bom funcionamento», acrescenta o
especialista.
O sintoma é apenas um sinal exterior, muitas vezes «confundido» pela medicina
convencional com a própria doença. «Nem os bacilos mais violentos, nem as radiações
provocam doença, mas sim o ser humano, que a causa a ele próprio», insiste. E, como
todo o problema «tem uma causa», é importante descobrir o que é que está errado.
Nesta espécie de regresso ao passado, começa-se por questionar se os pais estão
vivos, se sofrem de alguma doença específica, mas principalmente tenta-se perceber
que tipo de relação existia entre pais e filhos.
Como é entre os zero e os onze anos que o nosso auto-conceito se forma, por
circunstâncias várias (dificuldade de educação, ausência do pai, um pai castigador), a
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criança pode desenvolver um falso «eu» e pela vida fora vai transmiti-lo sempre, vai ter
medos, vai ser uma pessoa insegura e, por consequência, agressiva. Tudo porque na
sua mente ficaram marcados determinados factos que o fazem questionar. «Algo em
mim está errado, mas o quê?»
A doença surge então como «um caminho» que nos leva a procurar a resposta. O
momento em que o sintoma surgiu, a forma como a pessoa verbaliza esse sintoma, o
que é que essa situação a impede ou não de fazer constituem alguns dos indicadores
que permitem ao terapeuta usando técnicas de hipnoterapia regressiva, fazer com que
o paciente tenha consciência do conflito que é responsável pelo seu mal estar seja ele
físico ou emocional.
Ensinar a pensar positivo
«A mente é a resposta» é o tema central dos seminários realizados regularmente.
Uma espécie de curso de um dia, onde se ensinam diferentes técnicas e exercícios. O
objectivo é ajudar cada indivíduo a proceder às mudanças necessárias na sua vida, de
forma a torná-la «mais perfeita» e, por consequência, mais feliz.
Esta experiência de mudança tem por base um conceito essencial: o poder do
pensamento. «O que pensamos acerca de nós próprios e do mundo torna-se
verdadeiro para nós, todos os pensamentos que temos vão criando o nosso futuro»
explica o entrevistado. Como tem um poder «incalculável», é preciso «ter cuidado»
com o que se pensa e como se faz. Este seminário ensina a «usar» esse poder através
de técnicas de visualização criativa e técnicas de dinâmica de grupo e de
conhecimento perceptual exterior. A visualização criativa ensina-nos a contactar com o
mais profundo de nós próprios, com o «sistema automático» que nos guia -- o nosso
subconsciente.
Ao permitir o acesso ao «centro de decisão inconsciente», torna possível a mudança
na vida quotidiana. «Visualizar é utilizar a imaginação para conseguir o resultado
desejado.» Por outro lado, as técnicas de dinâmica de grupo proporcionam as
ferramentas necessárias para nos conhecermos melhor a nós próprios, permitindo uma
melhor comunicação.
Nesse sentido, entende-se a importância do pensamento positivo, gerador de
experiências felizes. É o pensamento que domina as emoções, estas controlam as
energias vitais, que por sua vez interferem na nossa química corporal. Enquanto um
pensamento negativo provoca uma reacção, que vai desde uma simples alteração
emocional até causar doença, o positivo é capaz de curar uma doença orgânica
irreversível.
Por outro lado, «sempre que temos um pensamento negativo estaremos a reforçá-lo
na nossa memória psicológica e também a reviver as emoções negativas que lhe estão
associadas, reforçando a união pensamento-emoção e esquecendo frequentemente,
senão sempre, que um pensamento é apenas isso e que a capacidade de o alterar só
depende de nós mesmos», defende o naturopata.
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Aliás, um dos objectivos deste seminário é ensinar a estar alerta contra os
pensamentos negativos, numa «atitude relaxada» de mudança dos nossos padrões de
pensamento-conduta. A partir do pensamento criador, «tudo é possível, até um
milagre».
Outro dos objectivos deste seminário é o ensinamento do relacionamento mentecérebro. A aprendizagem do seu controlo permite que as nossas decisões «partam de
dentro para fora». A mente surge então como um meio, um caminho para aliviar dores,
adormecer tranquilamente e até para resolver problemas. Tem interferência no
«processo de adoecer», já reconhecido pela medicina, e nesse sentido poderá ser
«treinada» para inverter a situação, em busca do bem-estar.
«As programações negativas geram infelicidade, fracasso e doença, as positivas
proporcionam felicidade, êxito e boa saúde», explica Carlos Anastácio, acrescentando
que, sem uma mudança, a «vida seguirá igual».«Os hospitais estão cheios de pessoas
que desejam ser felizes, necessitam é de conhecer o poder que têm nelas», sustenta.
Ao longo destes seminários são ensinadas técnicas de relaxamento, estado alfa,
técnicas de acesso à mente inconsciente, detecção de conflitos e culpabilidade. Estas
técnicas podem ajudar-nos a mudar a nossa vida porque nos ajudam a compreender
os conflitos que se encontram escondidos no nosso inconsciente. "
Fim da entrevista
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Considerações
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Considerações
Após o nascimento vivenciamos experiências que parecem ser fruto do acaso e da
coincidência. À soma dessas experiências chamamos vida.
As experiências da infância estão na base do nosso comportamento como adultos. O
padrão de pensamento que formará o nosso quadro de referências determinará o
modo como nos relacionaremos com a nossa realidade diária.
No entanto, o acaso não existe e toda a experiência que vivenciamos é gerida por uma
inteligência, cuja dimensão e poder está além da nossa actual compreensão.
Este livro procurará ajudá-lo a tomar consciência dessa realidade.
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Prefácio
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Prefácio
Estamos nos anos vinte. Manuel acaba de ser pai. Tem dezoito anos. A mulher tem
quinze. O filho chamar-se-á António. Seguir-se-ão mais duas filhas e outro filho. Vivem
numa casa com cozinha separada onde uma parte do chão é de terra batida. A banha
e o toucinho, as couves e as batatas que o quintal fornece são a alimentação base da
família. A água vem do poço.
Algum tempo mais tarde o Manuel embarca como ajudante de motorista nos lugres que
iam pescar bacalhau para a Terra Nova. Era o tempo dos dórias. Quando vinha a casa,
muitas vezes ao fim de sete meses, já os filhos tinham deixado mais um pouco da sua
infância para trás. Há noite, em silêncio e à luz do petróleo, reuniam-se à mesa para
comer e cada um com o seu garfo tirava da travessa comum. Uma sopa de nabiças e
feijão, feita numa panela enegrecida pelo fumo do lume de lenha era sempre o primeiro
prato a ser servido. À mesa reinava o silêncio. Manuel comia sem dizer uma palavra e
ninguém se atrevia a iniciar conversa. Murmurava apenas as palavras necessárias
para lhe chegarem isto ou aquilo. A sua cara era como uma máscara. Nunca mudava
de expressão. Carrancudo.
António temia o pai e procurava não estar na sua frente. Só o seu olhar metia-lhe
medo. Os pedidos mais prementes fazia-os à mãe. A irmã que se seguia a ele em
idade era a sua confidente e que o encobria mais de uma vez salvando-o assim de
uma coça garantida com cinto. Foi fazendo a escola oficial. Chegou a ir descalço.
Bebeu água dos canaviais e fumou as primeiros cigarros de barbas de milho. Na
escola obrigou alguns rapazes que comiam pão branco com manteiga, a trocar com ele
o pão de trigo com toucinho. Era agressivo e andava à bulha com os outros que o
contrariavam. Quando o informavam que o pai ia chegar de mais uma viagem, sentia
um misto de alegria e de medo. Alegria porque, apesar de tudo, o pai era para si um
herói e ele sentia-se orgulhoso. Ia para o outro lado do mundo e enfrentava mares
gelados nos quais muitos se perdiam nos dorias e morriam gelados. De medo porque
voltaria a ver aquele rosto sem sorriso que nunca lhe dava um carinho ou afecto.
Até à chegada da próxima campanha Manuel dividia o seu tempo fazendo concertos
em casa ou, como todos os homens do mar, ia ao café da vila saber notícias dos
companheiros em campanha. Muitas vezes assistia à chegada das embarcações que
voltavam ao fim de seis meses de árdua temporada nos bancos da Terra Nova.
Passados um ou dois meses voltava às lides do mar e assim foi durante mais de
cinquenta anos.
António temia as temporadas que o pai passava em casa porque o seu relacionamento
era frio e distante. Muitas vezes era espancado pelo seu comportamento rebelde. O
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cinto e uma moca foram muitas vezes usados. A mãe e as irmãs procuravam que o pai
não se confrontasse com ele.
Acabou o curso da escola náutica e embarcou. Após algumas viagens pagou ao pai as
custas do curso. Era uma tradição desse tempo e os pais assim lho exigiram.
Um inebriante mundo novo até agora desconhecido para si, permitia-lhe finalmente dar
satisfação à sua ânsia de liberdade. Frequentava os bares das cidades onde o barco
aportava. Quando vinha a casa contava na vila as suas façanhas com as mulheres que
tinha conhecido.
Na cidade onde nasceu conheceu Maria. Era filha de um modesto empresário da
cidade. Entusiasmou-se pela farda do oficial da marinha e engravidou. O pai dela não
gostou da situação e ameaçou o António para que este casasse com a filha. E
casaram. Os sogros de Maria não simpatizavam muito com ela, pensavam que tinha
prejudicado a carreira do filho que, no entender deles, um oficial merecia melhor
partido. Por isso se tinham sacrificado tanto. Fosse como fosse não deixavam de lhe
demonstrar o seu antagonismo, através de um relacionamento critico e autoritário e
com constante depreciação.
Meses mais tarde nasceu Carlos. Foi um parto difícil. Quando lhe trouxeram o filho
para que o conhecesse mandou que o levassem de volta . Aquele não podia ser o filho
dela. Ela queria uma filha. Carlos foi entregue aos cuidados dos avós paternos e
maternos durante os cinco anos que se seguiram. Maria tinha de encontrar-se com o
marido nos vários portos onde o navio fazia escala. Carlos brincava entre caixotes de
madeira cheios de palha das louças de casa de banho que o avô materno vendia e
entre as canas do milho dos campos que ficavam em frente à casa do avô paterno.
Durante um tempo ficava com uns e depois trocava ficando com os outros. Na casa
dos avós maternos levantava-se às três horas da manhã para ir com a avó para o
mercado municipal, que ali explorava um local de venda, uma vez que não havia mais
ninguém que pudesse tomar conta dele. Recorda-se de ver os carros de bois dos
agricultores que se dirigiam a essa hora para o mercado, onde iam vender os seus
produtos hortícolas. Os carros eram iluminados com uma lamparina de azeite por cima
da canga. À tarde dormia a sesta numa cesta de vime numa loja do mercado que uma
tia explorava. Quando lhe anunciavam a vinda do pai sentia-se contente e ao mesmo
tempo com medo. Um dia o pai levou-o ao café da vila e disse-lhe que lhe batia se ele,
em frente dos amigos do pai, não lhe chamasse tio em vez de pai. Nos primeiros cinco
anos os encontros com o pai foram poucos e deles apenas guarda memórias de
rejeição e de falta de afecto.
Maria fica de novo grávida e resolvem alugar uma casa na cidade. Nessa altura o
Carlos passou a viver com a mãe. Nasce o irmão que centra a total atenção dos pais
como se esse fosse o único filho. Passados uns meses Carlos sofre uma queda do alto
de um muro de vários metros de altura. Foi uma queda que quase lhe desfigurava a
face. Terá sido uma forma de chamar a atenção dos pais.
É que antes de viver com a mãe, o seu grande amigo era o avô materno que, com
grande afecto e carinho, o levava a passear ao escorrega do jardim, ao café e até a dar
passeios de carro que, nessa altura, eram mais raros. Depois que começou a viver só
com a mãe tudo isso acabou. Tentaram metê-lo num colégio de freiras mas estas
queixaram-se logo da sua rebeldia e não ficou.
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No ano seguinte mudaram para uma cidade mais perto do porto de embarque habitual
do pai. Entrou para a escola oficial e desde cedo mostrou uma capacidade de
comunicação fora do comum. Nessa escola as turmas da primeira classe estavam
juntas com as turmas da quarta classe. De modo a espicaçar os alunos da quarta
classe a professora mandava o Carlos, que era da primeira classe, ler um texto do
livro deles pois, ela esperava que a sua fluência na leitura motivasse os mais velhos.
Carlos pensou que essa habilidade que as pessoas admiravam e comunicavam aos
seus pais, lhe daria o direito de ser mais acarinhado por eles, mas tal não acontecia e
estes, em vez do afecto e atenção que ele ansiava receber, repreendiam-no e batiamlhe muitas vezes duma forma violenta e inaceitável. Ele tinha apenas seis anos. O
relacionamento com o pai apenas lhe recorda o medo, a falta de afecto e as criticas
ameaçadoras.
A mãe descarregava nele a sua frustração de mulher dum homem do mar, solitária
com dois filhos a seu cargo e com continuas queixas de doenças imaginárias.
Embarcam para África. O filho mais novo tem agora 2 anos. Carlos tem sete. A viagem
dura trinta e três dias. É uma aventura. Quando o navio balança para a ré ou proa o
Carlos entretém-se com os amigos que fez a bordo. Faziam deslizar pelo convés de
madeira , as cadeiras de descanso em lona, conforme o navio se inclinava para a proa
ou para a popa. Uma vez encontraram-no, muito satisfeito, vestido dentro da piscina do
navio, sentado numa bóia de salvamento. Os porões do navio estavam cheios de
tropas que se dirigiam para as colónias. Estávamos em 1961. Alguns desses homens
vinham apanhar ar fresco ao convés ou vomitar. O calor era muito e a ventilação nos
porões era quase nula.
O relacionamento de Carlos com os pais era sempre feito na base da rejeição. Nunca
o beijam. Nunca o abraçam. Nunca lhe dizem que fez alguma coisa bem. Nunca lhe
dizem como gostam dele. Só o criticam. Nesse Natal nada encontrou na chaminé ao
contrário do irmão. Zangado conta aos amigos do prédio que o Pai Natal não existia.
Pouco tempo depois tem um acidente, com gravidade, que o leva ao hospital. Onde é
operado de emergência. Fica várias semanas totalmente vendado na cama do hospital.
Os pais visitam-no quando podem mas, ainda assim, não havia carinho nem
demonstrações de afecto. Tinha sete anos.
Já adolescente, muitas vezes escondia os pontos do liceu, em que tinha tido más
notas, para que o pai não lhe batesse. Andava aterrorizado durante semanas com
medo de ser descoberto. Quando isso acontecia ia para a escola com marcas da fivela
do cinto e dos pontapés que o pai lhe dava. Isso fazia-o sentir-se muito envergonhado
perante os colegas.
Quando se encontrava a estudar engenharia, conheceu uma jovem que acabou por
ficar grávida. Carlos viu aí uma oportunidade de criar a sua própria família. De não ter
de enfrentar mais o seu pai. De criar o seu próprio amplexo de afecto. Casou-se e sete
anos mais tarde separou-se. Desse casamento ficou uma filha. Hoje ela tem vinte e
três anos. Voltou a casar e já passaram dezassete desde o segundo casamento do
qual tem um filho de 4 anos.
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Esta viagem apenas vai a meio. Há muito ainda a fazer emocionalmente. Esta é a
história do autor deste livro. Ela é o testemunho do seu perdão.
Ela é a prova de que os nossos pais apenas podiam dar-nos o que sabiam e portanto
não são culpados. Também é a prova de que se nós não enfrentarmos os nossos
fantasmas do passado não poderemos encarar a vida sem medo e portanto vivê-la
livremente.
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A ligação entre o corpo e a mente
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A ligação entre o corpo e a mente
Já há muito tempo que a ligação corpo-mente é considerada uma realidade. Os velhos
mestres da Índia e da China diziam que qualquer coisa que se armazenasse na mente
ver-se-ia reproduzida no corpo físico. Qualquer sentimento de amargura, intensa
paixão, inveja, grande ansiedade ou inclusive o mau humor, destruiam as células do
corpo e provocavam doenças de coração, fígado, rins, baço, estômago, etc.
Hoje em dia, já sabemos que as preocupações e o stress originam novas doenças
mortais, como a hipertensão, os problemas cardíacos, as depressões e o cancro.
Começa-se a acreditar que todas as doenças têm a sua origem na mente.
As nossas necessidades não satisfeitas, os conflitos, as carências, o stress e as
emoções reprimidas, provocam um desequilíbrio na auto-regulação do nosso corpo
físico. O corpo apenas mostra o que não somos capazes de dizer por palavras. E isso
é assim porque a nossa mente inconsciente controla o nosso sistema nervoso
autónomo. Esta ligação psicossomática mostra-nos que o corpo é um espelho da
mente. É um reflexo dos nossos pensamentos.
Ignoramos a inteligência do corpo quando o levamos ao médico, como se de uma
máquina se tratasse, para que este o repare. Este comportamento mostra a nossa
compreensão distorcida do poder da mente e da sua natureza. O corpo apenas mostra
a doença da mente. Quando dizemos que nos dói a cabeça, queremos dizer que um
conflito interno se está a manifestar na nossa cabeça.
Todos já experimentámos uma dor de estômago quando passamos por um momento
de grande ansiedade. Sabe-se que muitas pessoas submetidas a stress e a grande
tensão têm acidentes cardiovasculares. Quando estamos deprimidos o nosso corpo
fica pesado. As forças abandonam-nos. Quando estamos nervosos perdemos o apetite
ou comemos demais. Quando estamos calmos parece que nada nos acontece ou pode
ferir. É sabido que quando nos envergonhamos ficamos involuntariamente corados. É
um bom exemplo da interacção mente-corpo. O estudo deste psicossomatismo é
determinante na prevenção de qualquer doença pois todas têm a mesma origem. A
mente.
Nos Estados Unidos da América várias clinicas têm obtido altas percentagens de
sucesso na regressão do cancro, aplicando fundamentalmente terapêuticas de
transformação pessoal que envolvem, por parte do paciente, a compreensão do
processo psicossomático que levou ao desequilibro do seu sistema fisiológico.
Sendo o corpo uma criação da mente, só a mente pode adoecer, ou seja, aceitar estar
doente e só a mente pode ser curada. O corpo apenas reflecte a doença e a cura da
mente. No entanto, o facto de ficarmos doentes, mostra-nos como temos encarado a
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vida e dá-nos uma oportunidade de a repensarmos. Poderá ser um período de
reflexão e de adaptação. Quando não o compreendemos assim é muito provável que
mais tarde a doença se manifeste de novo, mas com maior gravidade.
A culpabilidade, a ira, o conflito e a preocupação podem criar mais danos ao corpo que
qualquer situação externa. Não são as situações que nos prejudicam, mas sim a nossa
interpretação delas. As emoções que elas nos geram. Não devemos pensar por um só
momento que o corpo é uma unidade autónoma e independente e que são os factores
exteriores que o debilitam. A medicina tradicional baseia a sua prática no sintoma
físico. A sociedade de consumo e por objectivos não permite ao médico convencional
ter preparação ou dispor de tempo para escutar as razões profundas da doença do
paciente.
O desespero, o fracasso e a rejeição, entre outros, são estados emocionais cada vez
mais frequentes no cidadão. Desde que nasce que enfrenta a falta de disponibilidade
dos pais, o numerus clausus, a competição, os objectivos empresariais e uma
sociedade que o valoriza pelo sucesso económico.
Neste ambiente as mensagens que o corpo recebe são de permanente alerta, com
sobrecarga das supra-renais e debilitando o sistema imunitário, conduzindo a um
processo gradual de degeneração cujo final pode até ser a morte. A ingestão de
medicamentos adia a percepção do conflito emocional, ou seja da verdadeira causa da
doença.
Quando reconhecemos que o problema está no nosso interior, damos um sinal positivo
ao organismo, dando origem a que este reaja com a convalescença ou até a cura.
Será portanto fundamental reconhecermos os nossos medos, preocupações e
inseguranças, armazenados no nosso subconsciente, pois é dele que partem as
nossas interpretações negativas e comportamentos consequentes. Deles emana a
doença. A tristeza e a insatisfação são também formas de doença.
A medicina tradicional não tem tempo para perguntar a um doente se pessoal ou
profissionalmente a vida lhe corre bem. Se gosta das condições de vida que tem.
Existe uma tendência comodista de atribuir muitas das doenças a problemas
psicossomáticos. “São nervos” diz o médico. Sabemos da quantidade de pessoas que
tomam ansiolíticos e sonoríferos. Esta prática da medicina revela a ignorância do papel
que a mente tem na realidade de cada indivíduo.
Cada pessoa tem o seu “médico interno”. Poderá alguém saber melhor que nós
próprios quais as angustias, frustrações e desilusões que experimentamos no nosso
interior? E se essa for a causa da doença alguém a poderá detectar e curar por nós?
Quando ficamos doentes, a primeira atitude a tomar é fazer um trabalho de detective e
analisar os últimos meses ou inclusive os anos da sua vida antes do aparecimento da
doença. Como era o nosso estado emocional? Houve alguma mudança importante no
nosso quotidiano? Terá havido alguma experiência psicologicamente traumatizante?
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É fundamental uma análise cuidadosa ao período da nossa infância. Muitas respostas
jazem no nosso subconsciente, estando na origem de tantas condutas erradas e
reacções auto-destrutivas.
A falta de afecto, a rejeição, a vergonha pública, a morte prematura do pai ou da mãe,
um divórcio, etc., são causa mais que frequente de profundas depressões, apatia e
stress, sendo por consequência também causa mais frequente da maior parte das
doenças dos nossos dias. Na altura em que escrevo este livro tive conhecimento de
que um paciente meu se suicidou por não poder suportar mais a pressão que as
dificuldades financeiras exerciam sobre ele.
Identificar os nossos conflitos emocionais, não esgota o trabalho que há a fazer para
um saneamento emocional. Temos de mudar as nossas convicções mais arreigadas.
São hábitos de pensamento. É necessária uma significativa mudança de mentalidade.
E é isso que este livro pretende ajudar a fazer.
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A cura e as crenças
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A cura e as crenças
Num artigo duma revista espanhola ligada a um grupo de investigação bastante
avançado encontrei alguns conceitos sobre a doença que partilho integralmente e dos
quais destaco as ideias principais.
A cura do corpo esteve sempre ligada a crenças. Assim, se recordarmos uma tribo da
antiguidade, lembraremos que a pessoa que ostentava o poder era o feiticeiro. Era ele
que se encarregava de proporcionar o remédio adequado, aquele que teria a força
necessária para enfrentar-se aos maus espíritos que provocaram a doença e quem,
por meio dos feitiços, danças, cânticos e rituais lutava tenazmente até que a doença se
fosse.
O enfermo adoptava aqui uma posição passiva, ele dependia da força do feiticeiro, do
seu conhecimento e das propriedades das plantas, da sua capacidade para invocar os
espíritos protectores da tribo. O feiticeiro era o depositário da sabedoria dos
antepassados, acumulada durante séculos, sobre as forças da natureza. O destino do
enfermo estava nas suas mãos.
Entre esta imagem e a da prática clinica dos nossos dias há muito pouca diferença.
Diariamente os hospitais registam a entrada de centenas de pessoas queixando-se de
todo o tipo de doenças e que se entregam às mãos dos feiticeiros de bata branca, a
quem de forma semelhante, consideram os mais preparados para curar a sua doença.
O doente da era moderna tem o mesmo espírito que o membro da antiga tribo:
entregará ao especialista a responsabilidade da sua cura, aceitará sem duvidar o
tratamento que lhe apliquem, seguirá todas as recomendações, inclusive aquelas que
lhe pareçam pouco acertadas e confiará plenamente o seu destino à pessoa que tem
pela frente, avalizada ela própria por anos de estudos e títulos e que, além do mais,
goza do reconhecimento da sociedade.
No entanto, sabemos que há mais de dois mil anos que Hipocrates, o pai da medicina
e inspirador do juramento profissional dos médicos actuais, observou que «alguns
pacientes recuperavam a saúde pelo simples facto de confiarem na capacidade do
médico».
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Como considerar a doença?
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Como considerar a doença?
Hoje em dia e à luz de novos conhecimentos já se começa a considerar a doença
como uma perda de harmonia. Uma perda de equilíbrio, no plano mais subtil (mente)
influenciando ou reflectindo-se no mais denso (corpo).
Certo é que, actuando sobre o plano mental corrigem-se deficiências no físico. No
entanto, para podermos actuar sobre o plano mental há que desmontar ou desactivar
previamente os desarranjos e obstruções que se produzem na mente. Ou seja a culpa
e o medo.
Mas, como é que o corpo físico sofre as irregularidades produzidas na mente?
Sabemos que o corpo físico tem uma série de glândulas que são encarregadas de
processos bioquímicos que permitem descodificar a informação que vem encapsulada
por diferentes vias, umas externas, como a alimentação, e outras internas que provêm
dos processos mentais. É obvio que a alimentação será sempre condicionada por um
estímulo resultante dum processo mental. Ou seja, que a escolha dos alimentos pode
ser desequilibrada, de acordo com a intenção oculta da mente.
Quando a mente se altera, o primeiro que se afecta a nível físico é o cérebro e mais
precisamente as glândulas fundamentais, o que se traduz em desarranjos hormonais
que, por sua vez, alteram o equilíbrio de elementos no sangue e posteriormente no
sistema nervoso.
Comprovou-se que a excessiva produção de algumas hormonas pode alterar, por
exemplo, a subsequente produção de estrogéneos, o qual faz com que se sintetize em
excesso o cálcio e se produza um estreitamento dos capilares com menor aporte de
oxigénio e nutrientes ao cérebro, o que finalmente se traduz em irritabilidade,
agressividade, cefaleias, perda de memória e também estreitamento do nervo óptico.
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Os sintomas
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Os sintomas
A medicina, como ciência que é, adoptou uma concepção do corpo como se de uma
máquina se tratasse. Assim, passou a ser normal considerar o corpo físico como uma
máquina em funcionamento. Todas as peças e componentes dessa máquina eram
susceptíveis de sofrer deterioração e acidentes que impedissem o seu bom
funcionamento. Quando alguma coisa se avariava ou falhava no mecanismo, produziase um sinal externo, um sintoma.
Por isso, a nossa medicina oficial baseia-se no tratamento dos sintomas que aparecem
no corpo físico, confundindo talvez ocasionalmente sintoma com doença. Infelizmente,
considera-se o sintoma como algo casual que aparece como consequência de um mau
funcionamento orgânico e ao qual há que eliminar, posto que, nos impede de realizar
as nossas actividades quotidianas. Não se procura a causa que produziu esse sintoma,
não se aceita, em muitos meios profissionais médicos, a possibilidade de que esse
sintoma seja uma manifestação, no plano físico, de conflitos psíquicos latentes, do
mesmo modo que um icebergue deixa ver sobre a superfície da água, uma pequena
parte, mantendo oculta, a maior parte da sua estrutura.
O conhecimento do mundo físico e da ciência médica em todas as suas especialidades
subdividiu-se tanto, em partes tão pequenas, que se perdeu de vista a visão global do
indivíduo. A concentração em análises super-especializadas, fez esquecer o ser
humano na sua totalidade. Aplicam-se assim tratamentos que geralmente provocam
efeitos secundários e produzem mutações nos agentes patogénicos os quais obrigam
a mudanças constantes dos remédios, lutando contra a doença que sempre parece
vencer.
Partindo desta óptica, o doente deveria aprender a interpretar os seus sintomas, a
dialogar com eles, a tratar de averiguar o que lhe está a querer dizer o seu corpo, o
que lhe está a reclamar e assim estar na disposição de procurar essa alteração. Uma
vez descoberta a origem do desequilibro (alimentação, tipo de vida, atitudes, processos
mentais, estados psicológicos e anímicos, etc.) seria necessário dar mais um passo e
encontrar os porquês.
“Nem os bacilos, nem as radiações provocam a doença, mas sim o ser humano que
os utiliza como meios para criar a sua doença. Tal como nem as cores nem a tela
fazem o quadro, mas sim o artista que os utiliza para criar a sua pintura”.
Poderíamos utilizar um método sugerido há alguns anos por um grupo de médicos,
método esse que foi chamado “O método de interrogação” e que é baseado em quatro
regras fáceis de aplicar:
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A primeira regra será a interpretação do sintoma desde a sua manifestação qualitativa
e subjectiva, isto é, encontrar resposta às perguntas: Que é? Como é o sintoma? Sem
nos aventurarmos por enquanto nos porquês.
O segundo passo seria analisar em que momento apareceu o sintoma, recordar os
acontecimentos e noticias produzidos na altura do aparecimento do sintoma e
perguntarmos: Como nos sentíamos psicologicamente? Quais eram os nossos medos
e frustrações ?
A terceira regra força-nos a fazer a abstracção do sintoma convertendo-o num
principio, num enunciado. Isso permite-nos prestar atenção às nossas frases
idiomáticas, à forma de nos expressarmos, as palavras que utilizamos para verbalizar
os nossos sintomas. Os mais recentes estudos em neurolinguística levam-nos à
conclusão de que a linguagem pessoal é psicossomática. Por exemplo “ este desgosto
mata-me”.
E a quarta regra do processo de análise leva-nos a uma análise pessoal por meio de
duas perguntas: O que é que este sintoma me impede de fazer? O que é que este
sintoma me impõe? Deveríamos interrogarmo-nos, além disso, se obtemos algo como
contrapartida, qual é o preço que temos que pagar por ele e se não poderíamos
consegui-lo de outro modo.
Não nos podemos esquecer que quando aparece um sintoma há um “sinal de aviso”
para que introduzamos mudanças no nosso comportamento. Identificar correctamente
esta mensagem que nos dirigem as nossas células irá permitir pôr os elementos
correctivos adequados para mudar a trajectória. A paragem obrigatória que supõe a
aparição de um sintoma, impedindo-nos de realizar as nossas tarefas habituais,
segundo esta teoria, seria um meio para corrigir desequilíbrios.
No entanto, a atitude mais comum do doente é a de recusar o que está a viver e
começa , então, a sua luta particular debatendo-se até conseguir acalmar o incomodo
sintoma que tinha aparecido. Por exemplo irá ao médico e tomará medicamentos que
iludirão a mente temporariamente. É muito provável que daí a poucos meses volte a
manifestar-se a doença e possivelmente com maior gravidade. À uma maior resistência
à mudança corresponderá uma maior intensidade do sintoma.
Uma atitude corajosa ao encarar a situação, ao analisar o processo em profundidade,
de tirar as conclusões adequadas e de concretizar tudo isso em acções encaminhadas
para um maior equilíbrio do nosso ser integral, será a prova de que assimilamos e
incorporamos a lição. Já não será necessário recorrer mais a essa doença para
aprender uma vez que decidimos escolher o método da compreensão em vez do
método da dor como o nosso método de aprendizagem.
Em suma, a doença, os sintomas, seriam a forma de se mostrar algo que nos falta
aceitar, de algo que temos de mudar. O mecanismo cósmico de evolução dar-nos-ia a
oportunidade de repensarmos os nossos esquemas mentais, impedindo que se fossem
anquilosando com consequência da comodidade, da falta de preocupações ou
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desinteresse. Seriam apelos à compreensão e definitivamente a ampliação do
conhecimento e da consciência.
Há relativamente pouco tempo, no nosso país, foram notícia pública casos de várias
figuras conhecidas da rádio e televisão que após passarem por momentos de grande
angústia lutando contra doenças cancerosas que ameaçavam a sua vida declararam,
após a sua superação, que agora viam a vida com outro sentido e valor.
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A inadequação do adulto
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A inadequação do adulto
Quando uma criança nasce, a alegria irrompe no lar. Ela traz consigo uma tendência
natural para só transmitir amor. Quando sorri toda a gente sorri e quando chora já
ninguém sabe o que fazer. Todos estão prontos a ocorrer para satisfazer a mínima
necessidade que ela pareça ter. É como um milagre. Tudo lhe é provido sem que tenha
que articular uma só palavra.
Que se passou, entretanto? Porque é que quando crescemos, olhamos ao nosso redor
e vemos que esse poder desapareceu?
Aprendemos a olhar para o mundo com antagonismo e individualismo. Aprendemos o
significado de maldade, culpa, limitação e morte. O amor é aquilo com que nascemos.
O medo é o que aprendemos aqui. Renunciar ao medo é o objectivo principal desta
viagem a que chamamos vida. Viver uma vida sem conhecer o amor é condenar-se ao
sofrimento e à depressão.
Muitas crianças em todo o mundo cresceram e tornaram-se adultas fisicamente mas
não emocionalmente. São o resultado do abandono e de todo o tipo de abusos
durante a infância. A negligência no atendimento das suas necessidades de afecto,
carinho e apoio impediram o desenvolvimento de uma infância saudável. São o
resultado de um ambiente familiar desequilibrado.
Quando uma infância não é saudavelmente desenvolvida, isto é quando não são
satisfeitas as suas necessidades psicológicas essenciais existirá um desenvolvimento
físico normal mas, inevitavelmente, esse ser agora adulto sentirá no seu interior uma
criança que, psicologicamente, continuará ferida e abandonada. Emocionalmente
sentir-se-á uma criança num corpo de adulto. Será uma pessoa caracteristicamente
agressiva e extremamente insegura embora com um coração peno de amor que nunca
foi despejado por não ter com quem o trocar. Está bloqueado. Por isso não sente
alegria nem sabe brincar. Leva tudo a sério.
Quando pergunto a um desses adultos como foi a sua relação com os pais, a sua
expressão até ali dura, transforma-se numa expressão de surpresa e os seus olhos
humedecem-se. Cai a máscara. Sentem-se envergonhados. Muitas pessoas choram.
Algumas não o faziam desde crianças. Depois sentem-se melhor.
Aquilo que compõe o conhecimento que temos de cada um de nós, ou seja aquilo que
queremos significar quando dizemos “eu sou…” é o nosso conceito interno. Ele formase com os nossos primeiros sentimentos, crenças e memórias.
É o filtro através do qual passarão as novas experiências. Por isso imagine-se como é
importante uma infância saudável. Isso explica porque existem pessoas que escolhem
continuamente o mesmo tipo de relação amorosa destrutiva; é também a razão pela
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qual para alguns a vida é uma repetição de uma série de traumas; a razão porque é
que não conseguem aprender com os próprios erros. Freud chamou a esta insistência
“o impulso da repetição”. Alice Miller, chamou-a de “ lógica do absurdo”.
Por isso é fundamental compreender que se sentirmos que a nossa vida está
carregada de problemas que parecem repetir-se, isso deve-se ao nosso conceito
interno e que se a queremos mudar teremos que analisar o nosso "eu" , a nossa
criança-interior que o compõe e trabalhar nela. Ajudá-la a desfazer os medos, e
garantir-lhe que já ninguém lhe poderá fazer mal. Já é adulta e poderá defender-se.
Um exemplo do aparecimento da nossa criança-interior feliz é quando nos rimos às
gargalhadas e quando somos criativos e expontâneos. A criança-interior ferida aparece
quando fazemos más-caras, mentimos ou fazemos birras. O melhor exemplo da
criança-interior irritada é-nos dado por John Bradshaw: “ quando nos recusamos a
atravessar um semáforo vermelho mesmo sabendo que ele está avariado, que não há
mais ninguém à nossa volta e que nada pode acontecer de errado”.
As crianças que têm uma infância reprimida tornam-se adultos pensando que o mundo
lhes é hostil e que têm de defender-se dele. Para eles este é um mundo perigoso e
ameaçador. Assim foi o seu ambiente familiar
Quando nascemos, os primeiras rostos que vemos e que aprendemos a reconhecer
com alegria, são os dos nossos pais. Como é bom sentir o peito cálido da nossa mãe
quando nos dá de mamar ou nos aconchega no seu colo. Sentir a batida familiar do
coração que nos acompanhou durante tantos meses. Como é bom ouvir a sua voz
doce que nos embala para adormecer. Como é seguro sentir os braços fortes do
nosso pai que nos abraça e nos defende, que nos levanta e nos anima quando caímos.
Em quem poderíamos confiar mais? Lavam-nos, mudam-nos as fraldas, dão-nos de
comer e ensinam-nos a andar e a falar. Tínhamos alternativa?
Que pensará uma criança quando vê aqueles em quem ela mais confiava,
espancarem-na, envergonharem-na, humilharem-na, abandonarem-na, e às vezes, em
situações mais deploráveis, roubarem-lhes a própria vida.
Muitos pais são vitimas de vitimas. Não podem dar o que não receberam. Era a
informação que tinham. São adultos apenas fisicamente. Não cresceram
psicologicamente e vivem apavorados nesse papel.
Imaginem por um momento o vosso pai com três anos de idade. Vejam-no com as
lágrimas correndo pelo pequeno rosto, percorrendo os cantos da casa à procura de
alguém que o ouça porque se magoou ou porque simplesmente procura a mãe que
não encontra porque ela o deixou sozinho para ir trabalhar. Intuitivamente não
compreende como pode ser tão diferente a realidade que experimentou no interior do
ventre da sua mãe e esta realidade que lhe proporcionam agora. Ele não pediu para
nascer. Ninguém o ouve. Muitas vezes, quando quer chamar a atenção batem-lhe para
que se cale. Vai para a cama sem uma história de embalar. Não bebe o leite morno
para aconchegar. Ninguém lhe ajeita as roupas da cama. Ninguém brinca com ele em
casa. Não se dirige às pessoas em quem mais confia porque parece que cada vez que
o tenta fazer, elas ficam zangadas com ele e até lhe batem para que não as incomode.
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Aprende a reprimir para sobreviver. Parecem culpá-lo de tudo o que se passa na casa.
Da falta de dinheiro, de não poderem ir ao cinema ou à festa que desejavam ir. É um
empecilho. Os filhos dos vizinhos são sempre mais inteligentes e bem comportados do
que ele. É o que lhe dizem repetidamente. Se este fosse o seu pai como poderia
considerá-lo culpado?
Uma criança neste ambiente acaba por considerar-se alguém horrível. Cria por isso um
conceito interno que a faz envergonhar-se e preferir o isolamento. Não quer que os
outros descubram o quão horrível é. Cria um falso "eu". E é esse “eu” que lhe permitirá
sobreviver no tal mundo hostil que a rodeia. Cria uma fachada. Aprende que fazer má
cara afasta os indesejáveis. Era assim que o seu pai fazia. Quando algo não corre
como ela quer, grita ou bate. São regressões expontâneas. Foi isso que viu fazer na
infância. À mínima contrariedade desiste. Não tem confiança nela própria porque não
lhe foi possível incorporar essa característica no seu auto-conceito .
Abandona facilmente.
Provavelmente porque também alguma vez terá sido
abandonado.
Perante contrariedades ou confrontos engole a raiva e toma a única atitude que lhe
permitiram ter quando era criança : castigar os adultos com a retirada. Nada mais
podia fazer. E amua. Nunca teve a oportunidade de sentir o apoio forte e amigável do
pai. Não foi apoiada no inicio da sua caminhada. Por isso todos são seus inimigos. Na
idade adulta a esposa substitui a mãe que emocionalmente não teve. Não tem um
circulo de amigos porque tem medo de se expor. Tem medo que descubram tudo de
mau que ele é. A verdade é que se ele fosse bom os pais não lhe teriam batido, nem
lhe teriam dito aquelas coisas horríveis, pensa.
Eles disseram-lhe, vezes sem conta, que não havia nada que ele fizesse bem. Que
não estudava o suficiente. Que não era capaz e que por isso nada merecia. Ele pensa
então que, se as outras pessoas souberem como ele é realmente, irão também
abandoná-lo ou agredi-lo. Foi assim que aconteceu com os seus pais. E querem evitar
essa dor de novo. Querem evitar mais uma desilusão. É doloroso. Preferem por isso o
seu mundo privado. Assim ninguém os decepcionará. Tornam-se obsessivamente
controladores. Controlam tudo porque: “se eu controlar tudo ninguém me poderá
apanhar desprevenido e magoar-me”.
Penso ser importante frisar esta matéria porque cada vez mais existe uma tendência
na sociedade moderna a menosprezar a importância que este fenómeno tem na
explicação da depressão e no aparecimento da doença física. Vivemos numa época e
adoptamos um modo de vida que é propício a negligenciar a infância dos nossos filhos
que, se não tiverem a oportunidade de ter uma infância apoiada, experimentarão um
sem número de conflitos em todas as áreas da sua vida adulta. Geram-se assim
comportamentos compulsivos que geram alcoólicos, pesados fumadores, obsessão
sexual, sucessivos divórcios, etc….
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Hitler foi espancado continuamente na sua infância, foi humilhado e envergonhado de
forma perniciosa por um pai sádico que era um filho bastardo de um cabo judeu. Vejase como ele usou a crueldade que usaram consigo contra milhões de inocentes.
Como já foi dito, uma outra característica comum nestas pessoas é uma adição ou
compulsão. A criança-interior ferida é a causa principal de todas as adições. Se o pai
era alcoólico e o abandonou física e emocionalmente quando criança, ele não sabe
como comportar-se como pensa que um homem se deve comportar. Bebe e fuma para
demonstrar que é um homem. Mas fá-lo por imitação, sem confiança. Poderá ter outras
adições como o sexo, o jogo e os rituais religiosos.
A nossa criança-interior ferida pede que a cuidemos. Quer atenção. Que brinquemos
com ela. Que lhe demos segurança porque ela sente-se assustada. E, enquanto não
for feito um trabalho de recuperação da nossa criança-interior, levando-a a um
crescimento saudável, as nossas vidas serão muito dolorosas e carregadas de solidão
e amargura. Uma criança-interior revoltada pode ser bastante caprichosa e tornar-nos
a vida num inferno.
Os nossos pais não são culpados. Eles comportaram-se de acordo com a informação
que possuíam. Eles também eram vítimas. Não lhes ensinaram mais. Compreender
este processo é perdoar. É desvalorizar. A nossa vida muda drasticamente quando
abraçamos aqueles que tememos. Então percebemos que dentro dessa mascara que
durante tantos anos nos assustou, afinal estava apenas uma criança tão assustada
como nós. Tinham esse aspecto apenas para se protegerem. Eles não sabiam fazer
melhor pois ninguém lhes ensinou. A sua fúria era proporcional ao medo que sentiam.
Então em vez de castigá-los podemos ampará-los e libertá-los da culpa que afinal
nunca tiveram.
Uma vez recuperada e cuidada a nossa criança- interior, a energia criativa que lhe é
natural começa a surgir nas nossas vidas. Uma vez bem integrada, ela é uma fonte de
regeneração e de nova vitalidade. Carl Jung chamou à criança natural “criança
maravilhosa”, o nosso potencial nato de exploração, admiração e criatividade. Essa
criança-interior aparece naturalmente quando nos encontramos com um velho amigo,
quando nos rimos às gargalhadas, quando somos criativos e expontâneos, quando nos
extasiamos perante uma paisagem maravilhosa.
Trabalhar com a nossa criança-interior é a forma mais rápida de efectuar mudanças
nas pessoas. É um processo que permite uma transformação verdadeira e duradoura.
Devemos pois analisar-nos e dedicar-nos todos os dias uma parte do nosso tempo.
Muitas vezes pergunto à minha criança-interior onde é que lhe apetece ir e levo-a lá.
Muitas vezes apetece-lhe ir ao cinema e levo-a. Apetece-lhe ver as outras crianças a
brincar num parque e vou até lá. Outras vezes quer que eu lhe compre um gelado e eu
compro-lho. Pergunto-lhe também muitas vezes, porque está triste. E ela responde-me
que gostaria de se divertir, então eu levo-a a ver uma boa comédia no cinema.
Muitas das mudanças que gostaríamos de ver nas nossas vidas e na maneira como a
percepcionamos estão ao nosso alcance desde que atendamos à criança que todos
levamos dentro de nós.
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A auto-estima
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A auto-estima
É muito difícil, para a maioria das pessoas, absterem-se de ignorar a opinião dos
outros. Nascem e morrem sem decidirem por si mesmas. A opinião alheia também nos
diz que é errado amarmo-nos a nós próprios. Que devemos pensar mais nos outros.
No entanto, alguém é esquecido neste tipo de pensamento. Nós próprios. Aprendemos
a anular-nos. Prescindimos de ter e de fazer o que gostamos.
Crescemos orientados pelas regras dos pais, da escola, da igreja e perdemos aquela
inocência tão maravilhosa que tínhamos enquanto crianças. As crianças movem-se
sem qualquer vergonha, alheias à opinião de quem as observa. Procuram apenas o
que as faz sentirem-se felizes. Demonstram o seu desagrado em qualquer sítio ou
ocasião sem se preocuparem com o que os outros possam pensar. Só elas existem.
Amam-se verdadeiramente.
Quando adultos, somos obrigados a fazer e a comportar-nos como a sociedade espera
que o façamos. Não importa se somos felizes com isso. Aprendemos a anular-nos. A
anular a nossa auto-estima. Deixamos de nos amar.
A nossa criança-interior não tolera que a ignorem e pode infernizar-nos a vida quando
a sua vontade natural não é satisfeita. Criam-se em nós conflitos que podem ser
bastante graves ao ponto de poderem provocar a depressão e até o suicídio. Não
devemos ignorar a nossa vontade interior. Devemos sempre interrogar-nos sobre o que
intimamente desejamos. Se estivermos atentos à nossa intuição, a nossa vida
quotidiana encher-se-á de alegria e satisfação. De paz. De saúde.
Se nos amarmos a nós próprios então seremos capazes de amar os outros. Como
poderemos satisfazer alguém se não o conseguirmos fazer a nós próprios?
Recuperar a nossa auto-estima é portanto um passo imprescindível para uma
mudança positiva na nossa vida e para um estado saudável.
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A auto-aceitação
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auto-aceitação
Gosta de si? Acha que sim?
Olhe-se a um espelho e fixando os seus olhos, diga: “gosto muito de ti!”. Soa-lhe bem?
Que sente? Parece-lhe ridículo dizer isto?
Quando gostamos verdadeiramente de nós, não nos cansamos de o dizer a nós
próprios. Aceitamo-nos. Admiramos o que somos. É algo incondicional.
Analise agora o seu corpo. Gosta de tudo o que vê? Gostava de ser mais alto? Ter
olhos azuis? Ter os peitos mais pequenos? É demasiado magro?
Já pensou que vai viver com esse corpo o resto da sua vida?
O demasiado isto ou aquilo é uma invenção da sociedade e da moda. Teremos de
mudar o nosso aspecto cada vez que muda a moda? Claro que não! A solução é
aceitar-nos exactamente como somos. Se temos o aspecto que temos não se deve ao
acaso mas sim a um objectivo pré-determinado cuja compreensão não conseguimos
abranger, por enquanto. Faz parte do papel que quisemos desempenhar. A lição que
quisemos aprender.
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O merecimento
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O merecimento
O merecimento é incorporado no nosso auto-conceito durante a infância. Todas as
mensagens que recebemos que puniram o nosso pseudo mau comportamento
contribuíram decisivamente para um grau mínimo de merecimento.
Um padrão de pensamento tipo “eu não mereço…”, mantém muitas pessoas presas a
um estilo de vida onde reina a escassez. Geralmente isso indica uma falta de autoestima. Essas pessoas convencem-se a si mesmas de que não merecem viver uma
vida de abundância que o Universo lhes pode dar. O tipo de pensamento “pobre de
mim ou porquê eu?” adapta-se idealmente como pensamento adequado para se
concentrarem no que pensam que lhes falta. Estão convencidos de que não merecem
mais.
Uma atitude muito frequente e típica é o facto destas pessoas preferirem obter a
compaixão dos outros pelo seu estado. Muitas entram em detalhes sobre como a vida
lhes corre mal, como se sentem doentes, como foram enganadas ou rejeitadas.
Acontece no entanto que existem muitas outras pessoas dispostas a contar igualmente
as mesmas histórias de dor e infelicidade e se atendermos ao que antes se disse sobre
o partilhar dos pensamentos, facilmente se compreenderá que estas pessoas
dificilmente não poderão suplantar este tipo de mentalidade relacionada com a
escassez enquanto continuarem a procurar apenas a simpatia dos outros que também
se sentem nas mesmas condições.
Partilhar pensamentos de doença, desgraça, escassez e tristeza é torná-los reais na
nossa vida.
Também é verdade que muitas pessoas sentem-se muito confortáveis com
sentimentos de escassez e medo, de tal maneira que não saberiam adaptar-se às
condições opostas. Desde que tenham as necessidades mínimas satisfeitas nada mais
as preocupa. A abundância para elas significa também complicações que querem
evitar. E a regra parece ser de que quanto mais tempo o indivíduo mantiver uma
mentalidade de escassez mais razões lógicas o seu ego lhe apresentará para evitar a
mudança sua vida.
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As crenças
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As crenças
O nosso subconsciente aceita tudo o que acreditamos. A realidade à qual
verdadeiramente pertencemos não nos julga nem nos critica. Aceita-nos como somos.
Se no entanto, temos crenças que nos limitam, essas crenças virão a ser nossa
realidade. Se cremos que somos demasiado baixos, demasiado gordos, demasiado
altos, demasiado espertos (ou não o suficiente), demasiado ricos ou demasiado pobres
ou que somos incapazes de relacionar-nos com as pessoas, então essas crenças
tornar-se-ão a nossa realidade.
Mas são apenas pensamentos que, se quisermos, podemos mudar.
A nossa infância serviu para aprendermos a realidade deste mundo. Por isso muitos de
nós temos um conceito de nós próprios que não nos pertence, como se fosse criado
para esta realidade e esta realidade fosse feita para este conceito. Também não nos
pertencem muitas das regras que nos dizem como temos de viver. Se a nossa família
era composta por pessoas que eram depressivas ou coléricas, que se sentiam
assustadas ou culpadas, então é provável que tenhamos adquirido hábitos de
pensamento negativos sobre nós mesmos e sobre o mundo.
Quando crescemos, temos a tendência a recrear o ambiente emocional da nossa
infância. Também teremos a tendência a reproduzir, nas nossas relações pessoais, as
relações que tivemos com os nossos pais. Se em crianças nos criticavam muito, na
nossa vida adulta procuraremos pessoas que nos critiquem de igual modo. Se em
crianças nos elogiaram, amaram e estimularam, tentaremos reproduzir esse mesmo
comportamento.
Todos somos vítimas de vítimas e os nossos pais não podiam dar-nos o que não
aprenderam. Se eles não sabiam amar-se como podiam amar-nos a nós?
Fizeram o melhor que podiam com a informação que tinham.
É provável que quando encarnamos obedecemos a um plano global. Escolhemos
todas as condições ideais para uma aprendizagem o mais eficaz possível. Se não
fosse a minha experiência de vida eu nunca teria escrito este livro nem compreendido
esta realidade.
O passado não tem poder sobre nós. Só aquele que nós permitimos que tenha. Em
qualquer momento podemos decidir livrar-nos dele. É um pensamento. É como um
armazém onde depositámos as nossas memórias boas e as más. Porque será que
sempre procuramos recordar as memórias más?
Provavelmente para reforçar a nossa culpabilidade.
Somos sempre nós quem escolhe os nossos pensamentos. Ninguém pensa por nós.
Podemos negar-nos a pensar em certas coisas. Quantas vezes nos negamos a
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pensar algo de positivo sobre nós próprios? Também podemos negar-nos a pensar
algo negativo sobre nós próprios.
A crença mais íntima da maioria das pessoas é sempre: « eu não sirvo para…!» A
maioria das pessoas padecem, em maior ou menor grau , de sentimentos de culpa ou
de ódio a si próprias.«Eu não sirvo para isto, ou não faço o suficiente para conseguir
…, ou não mereço» são lamentos muito comuns. Mas, aos olhos de quem , ou
segundo que normas não servimos, ou não merecemos?
O ressentimento, a critica e o medo causam a maioria das situações de sofrimento que
experimentamos. Quando culpamos os outros negamos a origem dos nossos
problemas. Ou seja, os nossos pensamentos.
Não que desculpemos os outros pelo seu mau comportamento; o que digo é que o
nosso sistema de crenças atrai tal comportamento para connosco. Se as pessoas
abusam continuamente de nós ou nos maltratam, devemos estar atentos porque o
padrão mental é nosso. Esta forma de comportamento desaparecerá da nossa vida
quando mudarmos o padrão de pensamento que o atrai.
É pois, fundamental, compreender que se libertarmos o passado libertamos o futuro. O
passado já passou, e não se pode mudar. É ilógico que nos castiguemos agora porque
algo que já passou e que já não tem expressão a não ser na nossa memória.
Se optamos por crer que somos vítimas desprotegidas e que não existe esperança
para nós, o mundo é isso que nos demonstrará. As piores opiniões de nós próprios verse-ão confirmadas.
Se optamos por crer que somos responsáveis pelas nossas experiências, tanto das
boas como das supostamente más, então teremos a oportunidade de superar e deixar
para trás os efeitos do passado. Podemos mudar; podemos ser livres.
O perdão liberta-nos. Talvez não tenhamos aprendido a perdoar ou talvez não
desejemos fazê-lo; mas se tivermos um pouco de boa vontade, estaremos a iniciar a
mudança de mentalidade, e para que este processo chegue ao seu final, é
indispensável que deixemos de agarrar-nos ao passado e que libertemos o mundo da
culpa que nunca teve.
Perdoar significa desvalorizar. A pessoas que nos feriram também sofreram. Elas
reflectiram apenas o que nós pensávamos de nós próprios. Quando as pessoas
sentem os seus problemas, sejam quais forem; falta de saúde, falta de dinheiro,
relações insatisfatórias ou criatividade bloqueada, não existe outra coisa a fazer senão
trabalhar a sua auto-estima.
Está comprovado que quando realmente nos amamos, aceitamos e aprovamos
exactamente como somos, tudo na vida flui sem obstáculos.
A aprovação e a aceitação de nós próprios, no presente são a chave das mudanças
positivas que podemos conseguir em todos sentidos da nossa vida.
Amar-se a si próprio também significa não criticar-se nunca, por nada. Significa
também não julgar os outros pois eles apenas cumpriram o seu papel no filme que
fizemos para nós próprios.
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A culpa
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A culpa
A culpabilidade é responsável por toda a nossa carência e limitação. Através dela o
ego exerce o seu poder por meio do medo. Quem é culpado merece castigo e
tememos que o castigo nos atinja em qualquer momento.
Sentimo-nos culpados por alguma coisa que acreditamos que fizemos ou que
devíamos ter feito e não fizemos. É o significado do pecado. A nossa culpa é
projectada no futuro, onde acreditamos que merecemos castigo. Depois somos nós
que esquecemos que fomos nós que projectámos a nossa culpa e então agora
acreditamos que as pessoas nos atacam ou fazem sofrer injustamente.
Tentamos resolver os nossos problemas através das suas manifestações exteriores,
em vez da sua fonte (culpa) nas suas mentes.
Nós acreditamos na realidade do mundo físico porque reprimimos o facto de que o
fizemos.
Quando na universidade aprovamos um exame já não precisamos de voltar a
frequentar essa cadeira mas, se não aprovamos teremos de voltar fazer exame. O
mesmo se passa na escola da vida onde tudo é concebido por analogia com o
mecanismo da mente. As provações são lições que serão repetidas, embora em
contextos diferentes mas cujo substrato é bem similar e em que cada vez que somos
submetidos a elas é como se nos dissessem “escolhe outra vez”. Ou seja, escolhe
entre o ego e o Amor.
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A mentalidade errada
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A mentalidade errada
Não necessitamos de uma preparação especial, nem de ser formados em disciplinas
especiais para compreender os princípios de uma vida eficiente. Isso não pode ser
aprendido numa sala de aulas ou num livro. Tem de ser experimentado. Temos de
estar dispostos a consegui-la. O objectivo de cada ser humano deverá ser
compreender porque se encontra estancado numa vida de insatisfação. Deverá
analisar a parte da sua personalidade que se revela auto-destrutiva e analisar o seu
comportamento quotidiano que está a ser altamente prejudicial à sua felicidade. Depois
de analisarmos esses comportamentos devemos pensar as razões que nos levam
repetidamente a comportamentos que boicotam a nossa felicidade.
Aqui não existe outra forma que não seja a de investigarmos o sistema psicológico que
suporta esses comportamentos. Verificamos que na grande maioria dos casos a chave
da interpretação desses comportamentos está na análise da infância e dos fantasmas
que ela permitiu criar.
Normalmente, nessa análise, deparamos com motivos mais que lógicos para essa
atitude. Está recheada de medos, culpas, traumas e de uma espécie de autojustificação. É mais cómodo ter um comportamento que já conhecemos do que mudar.
Mudar, ao principio, é sempre desconfortável pois são os nossos hábitos que estão em
causa.
Quer experimentar?
Cruze os braços da maneira que costuma fazer. Tudo normal. Agora experimente
cruzar os braços ao contrário. Estranho não é? Assim nos parecerá a mudança dos
nossos hábitos.
Mudar a nossa vida é mudar os nossos hábitos de pensamento. Haverá no inicio uma
tendência a voltar aos velhos padrões de pensamento que nos fazem sentir frustrados
e infelizes. Com perseverança os novos pensamentos instalam-se e o desconforto
desaparece. Criamos hábitos de pensamento mais felizes.
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Passado, presente e futuro
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Passado, presente e futuro
Conheço poucas pessoas que vivam plenamente o presente. Para melhor ilustrar este
pensamento conto-vos a seguinte história:
Uma pessoa amiga, de fora de Lisboa, demonstrou em várias oportunidades, vontade
de visitar Sintra. Queria ver aquelas maravilhosas plantas e árvores de que tanto ouvira
falar nesse habitat tão único como é o de Sintra. Um dia fiz-lhe a vontade e fomos até
lá. Enquanto circulávamos pelas tortuosas ruas da montanha e pelos maravilhosos
recantos de Sintra, a minha amiga não parava de manifestar as suas preocupações,
em voz alta, com a mãe, já idosa, que tinha ficado em casa, se ela estaria bem, se
saberia onde encontrar as bolachas e o dinheiro para o padeiro, como é que se daria
sem ela, etc…
Estávamos quase no final da visita e ela continuava a manifestar-me em voz alta as
suas preocupações, como estava preocupada com os afazeres do dia seguinte e com
os pagamentos que não poderia esquecer-se de fazer daí a uns dias, etc…
Já abandonávamos a vila quando ela me perguntou:
- Então quando é que chegamos a essa famosa Sintra?
Esta pessoa, como a maioria, preocupou-se em viver o passado e a preocupar-se com
o futuro em lugar de viver o presente. A maioria das pessoas não sabe viver o
presente. E o mais grave é que construir o futuro com os pensamentos do passado é
hipoteca-lo. Mas se o futuro for projectado com os pensamentos do presente ele será
muito satisfatório.
Pense em alguém com quem vive há muitos anos e cujo relacionamento passou a ser
previsível, rotineiro e sem interesse. Se pensar hoje nessa pessoa sem as recordações
do seu passado, como se a visse hoje pela primeira vez, seria capaz de a tratar sem
lhe dar aquelas atenções especiais que caracterizam um conhecimento recente?
Inclusive resistiria a dar-lhe flores e presentes dizendo que a amava?
Quando vivemos ou trabalhamos com alguém durante muito tempo, existe uma
tendência a facilitar a degeneração do relacionamento através da nossa atitude,
influenciada pelo facto de sabermos coisas especiais acerca dessa pessoa. Essa
atitude inclui, muitas vezes, a falta de respeito e a tolerância. Se, pelo contrário,
olharmos para alguém como se fosse a primeira vez, o nosso interesse e curiosidade
por essa pessoa é renovado e torna-se até excitante. É como se a tivéssemos
conhecido hoje. Não existe passado. Então reparamos como ela é agradável, como é
bonita e interessante. Seria assim que veríamos todas as pessoas com quem nos
relacionamos mais intimamente, se as julgássemos sem passado.
O relacionamento das pessoas pode torna-se impossível quando se acusam
mutuamente de actos negativos do passado sendo o seu relacionamento de hoje feito
não pelo que a outra pessoa é hoje mas por todos os momentos vividos em conjunto
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nessa altura. É assim normal que muitas vezes se faça do nosso parceiro de
relacionamento mais intimo, o alvo de todas as nossas culpas e frustrações. Já não
são necessárias flores porque não o precisamos de conquistar e uma vez que já nos
conhecemos há tanto tempo já não precisamos de lhe dizer que o admiramos, como é
interessante, como gostamos de estar com ele. Mas, curiosamente, devido a esse
conhecimento de longa data, também nos damos a liberdade de ter alguns direitos,
como por exemplo: descarregar nele as nossas frustrações e culpabilidade e de nunca
nos cansarmos de dizer à outra pessoa, que se ela fosse diferente tudo seria melhor.
Algumas vezes até fazemos dela o saco físico onde despejamos a nossa ira.
Similarmente, julgamos todas as situações através dos olhos do passado, do velho
quadro de referências que, ainda nos faz ficar com uma impressão no estômago
quando ouvimos o trovejar duma tempestade e os relâmpagos que cortam o céu.
O arrependimento e as recordações são um modo de não vivermos o presente.
A espera de um futuro brilhante pode resultar em experiências decepcionantes. Por
exemplo, um estudante que pensa que quando acabar o seu curso será a pessoa mais
feliz do mundo e que finalmente começará a viver a sério, poderá ter uma grande
desilusão pois, apenas inicia uma outra etapa difícil da sua vida. Terá de procurar
emprego e de manter-se sem o auxilio dos pais. E quando encontra o emprego tão
desejado, a sua alegria depressa se torna ansiedade quando compreende as
dificuldades que o esperam para fazer uma carreira profissional.
Se não vivermos o momento presente, devido a atitudes auto-punitivas, já não o
voltaremos a encontrar. Nada se repete. Já é do passado. É assim que a maioria das
pessoas vive a sua vida.
Vejo pessoas que, nos restaurantes, vão metendo à boca, com um ar absorto,
alimentos incompatíveis com um bom estado de saúde. Ao mesmo tempo recordam,
uma e outra vez, o conflito que tiveram meia hora atrás com o chefe ou o trabalho que
terão de entregar no dia seguinte. Não desfrutam sequer no presente o que estão a
comer. Comem as suas preocupações de ontem e de amanhã.
Haverá ainda os casos de pessoas que estão tão ocupadas em acumular riqueza
material ou a fazer carreira, que quando se dão conta, verificam que os seus filhos são
dependentes de drogas. Eles não tiveram os seus pais no presente. Os pais estavam
tão preocupados com o futuro, lembrando-se constantemente das dificuldades do
passado, que se esqueceram de olhar para os seus filhos no presente. Assim o futuro
torna-se semelhante ao passado. Frustração e sofrimento.
O único momento que existe é o agora. Quando acabo de escrever estas palavras elas
já serão um acto do passado. Por isso será ridículo alguém punir-se hoje por algo que
podia ter feito e não fez ou por algo que fez e errou há muitos anos atrás. O que existe
está aqui e agora. O futuro está apenas no pensamento assim como o passado. Se eu
não viver o presente, ou seja o agora, quando é que eu terei oportunidade de o voltar a
fazer?
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Nunca, porque esse momento já passou. Passamos muito tempo a pensar no futuro
esquecendo o presente. E se o amanhã que tanto nos preocupamos em planear nem
sequer vier a existir? Pessoalmente acho que devemos dizer hoje aquilo que
pensávamos dizer amanhã. Porque pode não haver esse amanhã. Pre-ocupamo-nos
(ocupamo-nos antes de tempo) com um futuro que ainda não existe. O presente não se
repete nunca. É a impermanência.
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A mente
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A mente
Quantas maçãs caberão num saco de compras? É uma experiência fácil de entender.
E se em vez de maçãs fossem pensamentos?
Não é possível imaginar tal situação pois são realidades diferentes. Quantos
pensamentos teremos por dia? E quantos já tivemos ao longo do tempo que já
vivemos? Não têm conta. Sendo assim tantos, ao ponto de podermos dizer que são em
número infinito, poderemos perguntarmo-nos onde se produzem e onde se guardam.
No corpo não se produzem. O corpo não pensa. Se o corpo não pensa então quem
pensa?
Se a lei mais fundamental do universo é a causa-efeito, então teremos de encontrar
uma causa para o pensamento. A causa do pensamento é a mente. E se uma mente
tem como efeito infinitos pensamentos então, é legitimo concluir que ela própria terá de
ter uma dimensão infinita e portanto impossível de estar contida, como já foi dito, numa
forma limitada como é o corpo.
A mente é não física e inatingível, não pode ser dissecada em laboratório, fotografada
ou avaliada por um método impirico . O cérebro, por outro lado, é um órgão físico,
tangível e pode ser dissecado e estudado num laboratório. É o “computador” que
parece governar o corpo, organizando as informações dos sentidos que entram nele
em aparentes padrões de significado e dirigindo todos os sistemas e funções do corpo,
para adaptá-lo ao universo físico. Na verdade, é a mente que é a programadora e
dirige o cérebro para funcionar de acordo com essa programação, tal como um
computador faz o que o operador lhe manda fazer.
A mente é o centro de comando do qual todas as directivas emanam, pois instruem o
cérebro para estabelecer um realidade experimental do mundo do tempo e do espaço.
Por si mesmo o cérebro não pode fazer nada porque é apenas o órgão receptor da
mente. Claramente então é apenas a mente que faz a interpretação, não o cérebro. É a
mente que interpreta as mensagens dos olhos e lhes dá significado. Sozinha ela
decide se o que vê é real ou ilusório, desejável ou indesejável, agradável ou doloroso.
E no entanto, se é a nossa mente que parece criar a realidade aparente, uma vez que
estamos no mundo das aparências, porque razão o corpo é o herói desta realidade,
onde tudo foi pensado e criado para ele? Casas e roupas para o abrigar, veículos para
o transportar, comida para o alimentar e até médicos para o curar. E se a mente
comanda o corpo como é possível que ela o deixe adoecer e até morrer? Por
equívoco? E isso significará a morte do nosso ser? Como pode uma mente não física e
não tangível morrer? Sabe de alguém que tenha dado um tiro no pensamento de
alguém?
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Então, se temos uma mente e um corpo afinal qual é o nosso verdadeiro eu ? Quem é
esse “eu” que neste momento faz esta pergunta ? Esse é o verdadeiro “eu”. O nosso
verdadeiro "eu" é a nossa capacidade de pensar e sentir as emoções. Então esse “eu”
não poderá ser o corpo, uma vez que o próprio corpo não faria esta pergunta a si
próprio. Por isso devemos intuir de que o “eu” que não é físico não pode estar sujeito
às leis da física e portanto não é mortal. Não só não é mortal como não se degrada. O
nosso verdadeiro “eu” é eterno. Então porquê esta necessidade de nos identificarmos
com um corpo limitado, sujeito a doenças, decepcionante, imperfeito e mortal? Poderá
ser para sustentar a falsa realidade do mundo do ego?
Se o Filho de Deus fosse um corpo e portanto mortal então quereria dizer que se o
efeito de Deus morre então a Causa, Deus, também teria sido morto e portanto o ego
teria feito o impossível. Matar Deus. E é isso que ele tentará provar, sem qualquer
êxito, durante todas as vidas que iremos vivenciar.
Na realidade o que se passa é que cada um de nós cria um ego ou um ser que está
sujeito a uma enorme variação por causa da sua instabilidade. Fazemos também um
ego para cada pessoa que percepcionamos e que é igualmente variável. A sua
interacção é um processo que altera ambos, porque não foram feitos pelo Inalterável
ou com Ele. É importante reconhecer que essa alteração pode ocorrer e de facto
ocorre tão prontamente quanto a interacção tem lugar na mente como quando envolve
proximidade física.
Pensar sobre um outro ego é tão eficaz para mudar uma percepção relativa quanto a
interacção física. Muitas vezes observamos alguém, numa sala, desconhecida, e que
nos causa um profundo antagonismo, mesmo sem que tenhamos trocado uma só
palavra com essa pessoa. É uma prova da interacção das nossas mentes, com
distância física e com personalidade individual. Poderia haver melhor exemplo de que
o ego é só uma ideia e não um facto? Como poderia então a nossa realidade ser
apenas essa?
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A vida
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A vida
A vida é o resultado dos nossos pensamentos. Recebemos o que pensamos.
Recebemos a materialização dos nossos pensamentos. Somos por isso responsáveis
por todas as experiências da nossa vida, pelas melhores e pelas piores. Todos os
pensamentos que tivemos criaram as imagens das nossas vidas. Cada um de nós cria
a sua própria experiência com as coisas que pensa e as palavras que diz.
As crenças são ideias e pensamentos que aceitamos como verdade. O que pensamos
acerca de nós próprios e do mundo torna-se verdadeiro para nós. Então aquilo que
decidimos crer pode expandir e melhorar o nosso mundo. Cada dia pode ser uma
experiência emocionante, cheia de esperança, mas também pode dar-nos um sabor de
tristeza, de limitação e de dor. Assim podemos saber o que pensámos. Porque o
pensamento torna-se sempre forma em algum nível da nossa consciência.
Duas pessoas que vivem no mesmo ambiente e nas mesmas circunstâncias podem
percepcionar a vida de uma maneira muito diferente. O que é nos pode levar de uma
percepção a outra diferente? São as nossas crenças. Projectamos os pensamentos
que são originados em padrões estabelecidos normalmente na nossa infância e onde a
culpa se esconde.
Quando estamos dispostos a mudar a estrutura primária das nossas crenças, então
podemos experimentar uma verdadeira mudança na nossa vida.
Sejam quais forem as crenças que tenhamos sobre nós mesmos e sobre o mundo,
recordemos que são apenas pensamentos, ideias e que as ideias podem mudar-se.
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O poder do pensamento
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O poder do pensamento
O pensamento cria. O pensamento tem um poder fora da nossa compreensão. Quer
acreditemos ou não tudo que nos rodeia foi criado por ele. Através do pensamento
criamos a nossa realidade quotidiana mas ignoramos que essa realidade venha do
nosso pensamento e portanto que pode ser mudada, alterando a nossa forma de
pensar.
Se o pensamento tem tanta importância na nossa realidade diária então temos de estar
atentos ao que pensamos.
Se demos a alguém um objecto, uma caneta, por exemplo, ficamos sem ela. Porém se
compartilharmos uma ideia, não se passa assim. A ideia continua a ser nossa apesar
de ter sido dada totalmente. Além disso, se a pessoa a quem a demos a aceita como
sua, para si própria, essa pessoa reforça-a na nossa mente e assim ela aumenta.
Então os pensamentos aumentam por serem dados. E quanto maior é o número
daqueles que neles acreditam mais fortes eles se tornam.
Tudo é uma ideia. Ao contrário do sistema de pensamento do ego, onde dar é perder,
na mentalidade correcta dar e receber são o mesmo. Damos pensamentos e
recebemos pensamentos. Não será difícil agora compreender porque razão é que
enquanto houver tanta gente a acreditar que o cancro é incurável ele será mesmo
incurável porque é o compartilhar dos pensamentos de dor, doença, tristeza, ataque e
morte que os tornam reais.
Preferimos aceitar que os nossos pensamentos não podem exercer influência real na
nossa vida, porque de facto temos medo deles. Há algum tempo atrás, no meu
consultório, quando eu disse a uma paciente minha que o pensamento toma forma
sempre em algum nível, ela respondeu-me que dificilmente acreditava nessa hipótese.
No entanto logo de seguida disse-me que diariamente era assaltada pelo medo que o
marido sofresse um acidente cardíaco, pois, o modo como se alimentava era na sua
opinião perigoso e contrário aos preceitos defendidos pelos cardiologistas. Então eu
respondi-lhe que se deveria libertar desse pensamento quanto antes, pensando em
vez disso que o seu marido se alimentaria de uma forma mais saudável e que a sua
condição física era perfeitamente normal. Quando lhe expliquei melhor que a realidade
que vemos é feita pelo que pensamos, respondeu-me horrorizada que “virasse a boca
para o lado” ficando assustada. Então eu disse-lhe que se achava que o pensamento
não influencia a nossa realidade quotidiana então porque teria medo do que eu disse?
Isso prova-nos que intuitivamente não queremos aceitar, muito convenientemente para
o ego, que o pensamento tem o poder que tem. Preferimos aceitar que são as forças
exteriores a nós que fazem a nossa vida. É muito conveniente quando queremos livrarnos da responsabilidade das nossas vidas.
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Sonho ou realidade
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Sonho ou realidade
Quando alguém dorme e tem um pesadelo, a sua realidade enquanto sonho é
indiscutível para aquele que sonha. Podemos observar o seu rosto angustiado, o suor
que aparece na testa, as sacudidelas que o seu corpo dá como se quisesse libertar-se
de algo ou alguém que naquele momento é bem real e que o ameaça.
Essas cenas do sonho com todos os personagens intervenientes , ali colocados pelo
sonhador, nesse momento são a sua realidade e não duvida minimamente dela. Mas
quem estiver a observar, fora desse sonho, sabe que ele apenas está a ter um
pesadelo e gentilmente abana-o para que desperte. As reacções emocionais são reais
mas os personagens são ilusões. A nossa pressão sanguínea altera-se, temos
erecções, rimos e choramos e temos outras manifestações de caracter físico. Fomos
nós que criámos todos esses personagens e acontecimentos dentro do sonho, e
estamos a agir apenas em pensamento, mas ainda assim temos reacções físicas.
Poderemos dizer que os personagens são ilusões mas as reacções são reais. Será
que estamos a viver um sonho colectivo? Será que sonhamos acreditando estar
acordados?
Só sabemos que estamos a sonhar quando acordamos. Quando revemos os nossos
sonhos depois de acordar, vemos como é inútil ficar aborrecidos com o que sonhámos,
tratava-se apenas de um sonho. Também poderá ser um equívoco ficarmos
aborrecidos com os incidentes diários desta realidade a que chamamos vida.
Então que razão poderá ser essa que nos leva a criar uma aparente vida de dramas e
falsas alegrias e em que o evoluir dos acontecimentos parece estar condicionado por
forças exteriores? No sonho já vimos que é o sonhador que lá põe as personagens que
necessita para encenar o drama. E aqui quem é? Porque é que onde uns vêm um
drama outros vêm uma felicidade ?
Porque é que o que tem significado para uns não tem o mesmo para outros? Aquilo
que é verdade não o deveria ser para todos? O que é verdade não pode ser falso
senão contrairia o sentido da palavra. Então que realidade é esta na qual o que é
verdadeiro pode ser falso?
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O pensamento cria a nossa realidade
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O pensamento cria a nossa realidade
O pensamento cria a realidade. Esta realidade é um sonho. Mas, como sonhadores,
esquecemo-nos de que somos nós que o estamos a produzir. Se admitisse-mos por
um momento essa hipótese, então a quem culparíamos dos problemas da nossa vida
se tivéssemos em conta que esses problemas são produzidos pela nossa mente?
Qualquer pessoa que agisse de maneira destrutiva ou com agressividade em relação a
outra ou a si própria, então seria porque os seus pensamentos teriam produzido um
sonho de agressão e destruição e o seu comportamento reflectiria exactamente isso.
Ou seja, se os nossos pensamentos são de carência será esse tipo de sonho que
iremos materializar.
Deveríamos então examinar o nosso comportamento em relação a outras pessoas não
como um conflito com elas mas como resultado do que lhes estamos a transmitir.
Poderíamos deixar de culpar os outros pelas amarguras da nossa vida, uma vez que
teríamos sido nós a influenciar tudo isso, e deveríamos sim examinar o porquê de se
terem criado tais situações, em vez do habitual “porquê a mim?”.
Poderíamos criar o que queremos ter e que precisamos e seriamos capazes de fazer
milagres, utilizando a dimensão do pensamento para criar o que desejamos para nós
próprios. As situações da vida não fazem o que somos mas não deixam de revelar o
que decidimos ser, ou seja o que pensámos.
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A importância do pensamento correcto
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A importância do pensamento correcto
O pensamento é criador. Se pensarmos negativamente experimentaremos emoções
negativas que estão associadas a uma experiência. Cada vez que temos um
pensamento negativo estaremos a reforça-lo na nossa memória psicológica e também
a reviver as emoções negativas que lhe estão ligadas reforçando assim a união
pensamento-emoção, esquecendo frequentemente, se não sempre, que um
pensamento é apenas isso e que a capacidade de pensá-lo ou de mudá-lo só depende
de nós mesmos.
Portanto, seleccionar os nossos pensamentos e o conteúdo dos mesmos, não só está
ao nosso alcance, mas também devemos fazê-lo de uma forma consciente para irmos
mudando pouco a pouco os nossos padrões de pensamento e conduta negativos, por
outros de grande positividade que façam das nossas vidas uma experiência mais feliz.
Se você soubesse duma maneira de aliviar as suas dores utilizando a sua mente,
utilizá-la-ia? E se conseguisse adormecer utilizando a sua mente, tomaria comprimidos
para dormir? Se dispusesse de uma forma de ajudar-se a si mesmo e aos seus amigos
para solucionar os seus problemas mais preocupantes, não a utilizaria?
A mente é esse meio e inclusive a medicina já começou a tomar em consideração a
participação da mente no processo de adoecer e de como pode ser treinada para
inverter o processo e fazer-nos sentir bem.
Aprendemos a adoecer numa idade muito jovem. Somos programados com
mensagens do tipo “ não andes descalço, senão constipas-te !”. O nosso cérebro
aceita essa programação como uma ordem que tem de cumprir. Assim, estas
mensagens convertem-se em realidades que se cumprem por si mesmas ao longo de
uma vida inteira.
As programações negativas geram infelicidade, fracasso e doença. As programações
positivas geram felicidade, êxito e boa saúde.
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A realidade auto-criada
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A realidade auto-criada
“Acreditamos numa realidade que nos é dada pelo nossa visão,
paladar, tacto, olfacto e audição. Será então que estamos a
vivenciar uma realidade auto-criada?"
PSI-Factor (série de ficção-TV)
Quando nos questionamos se este mundo é tudo o que existe, estamos a
distanciarmo-nos duma espécie de
écran onde projectamos a vida que
experimentamos. Através do questionamento poderemos então compreender que
afinal é como se nos tivéssemos identificado com um personagem dum filme e,
finalmente, que não somos esse personagem que está a ser atacado nessas imagens
que percepcionamos e que tão reais nos parecem. Ou seja, reconheceremos que a
nossa realidade não se esgota na nossa forma física. Que não somos exclusivamente
um corpo mas que nos foi permitido experimentar essa realidade.
Por analogia com o nosso carro, sabemos que temos um carro mas que não somos o
carro. Ele serve para transportar o nosso corpo. O nosso corpo é o nosso veículo de
comunicação neste mundo físico das formas. A sua existência deve-se à necessidade
de ter um instrumento que nos permita percepcionar esta realidade através dos cinco
sentidos. Um instrumento que transmita à nossa mente os símbolos captados por
esses sentidos receptores para serem posteriormente interpretados. Assim obtemos a
consciência da realidade física. Do mundo em que parecemos viver.
Ajudá-lo a questionar esta realidade, da qual somos tão convictos e da qual tanto nos
custa separar, é um dos principais objectivos deste livro.
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O mundo
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O mundo
“Podes pintar uns lábios cor-de-rosa a um esqueleto, vesti-lo com o que é belo,
agradá-lo e mimá-lo e fazê-lo viver?
E podes ficar contente com uma ilusão de que estejas vivendo?”
A Course in Miracles
Tudo o que percepcionamos com os nossos sentidos compõe a nossa realidade. Esta
realidade não é questionada porque aparentemente não temos razão para o fazer. No
entanto, a razão porque não o fazemos é por medo inconsciente do que pensamos ser
desconhecido para nós. O nosso ego justifica esse medo através dos acontecimentos
da vida, nomeadamente através da dor e do sofrimento. Que objectivo haverá então
para a existência desta realidade percepcionada pelo ser humano? Não há ninguém
que intuitivamente, embora por momentos muitos fugazes, não se interrogue. Quem
sou eu? Deus existe? Que existirá para além da morte?
Esta é a realidade do mundo da forma física. Tudo tem uma forma. É o mundo da
consciência e da percepção. O mundo dos sentidos físicos. Sem eles não haveria a
percepção desta realidade. Seria o nada. Mas o nada é o todo.
Porquê então esta realidade tão instável e inconstante onde tudo tem opostos e onde
por isso a tristeza se disfarça na alegria?
Existe apenas uma emoção no mundo. O medo. Todas as outras emoções são
disfarces da primeira fabricados pela nossa imaginação que é infinita. A alegria é um
desses disfarces mais apetecido. É a emoção que, conscientemente, mais
ambicionamos sentir. Quem não experimentou a alegria de atingir os seus objectivos e
logo de seguida se sentiu o ser mais solitário e insatisfeito deste mundo. E que outra
opção teve que não fosse a de começar a procurar de novo outra alegria, outra
satisfação? E porque é que esta realidade parece obrigar-nos à procura de falsas
alegrias e da sua inseparável tristeza, mais parecendo uma punição.
A resposta poderá ser obtida se, corajosamente, questionarmos o sistema de
pensamento em que nos baseamos. Neste mundo não há nada que nos satisfaça pois
aquilo que satisfaz não precisa de ser repetido. Aquilo que precisa de ser repetido é
porque não satisfez. E não existe nada neste mundo que tenha essa propriedade. Só o
Amor pode satisfazer mas não pode ser vivenciado através da posse de um objecto ou
pessoa. Ele é de todos mas está dentro de nós. Não no mundo exterior. No entanto, se
o sentirmos dentro de nós poderemos sentir os seus efeitos nas experiências que
vivenciamos.
Aprendemos cedo que nascemos para morrer. Inicia-se uma contagem decrescente.
No momento em que qualquer ser vivo nasce começou a sua caminhada para a morte.
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Todos estamos a morrer. As plantas, os animais e os homens. Então porque
chamamos a isto vida, se todos os dias morremos um pouco mais? Não deveria a
palavra vida significar aquilo que não morre?
A realidade deste mundo ensina-nos que somos seres inteligentes, e que essa
inteligência nos coloca no topo da escala dos seres vivos. Mostra-nos também que
cada um de nós tem vivências diferentes, embora com o objectivo duma vida de
sucesso individual e da acumulação de riquezas que, no final da vida, serão deixadas
aos nossos descendentes.
A realidade deste mundo parece ser a de que podemos ter a sorte de nascer no seio
de pais que nos possam proporcionar as bases educacionais e emocionais, para a
obtenção de uma vida de sucesso, que a sociedade irá medir e dará o seu testemunho,
ou então o caso oposto, o daquela pessoa que nasce numa base familiar já por si
falhada e que assim terá mais probabilidades de não conseguir o tal sucesso medido
pelo reconhecimento da sociedade.
Desde sempre que isto parece acontecer, porquê? Porque é que tem de ser assim? É
a lei da vida, dirão alguns. Mas não será porque precisamos de um testemunho
convincente da nossa existência como corpos?
E se tudo fizesse parte de um plano perfeito onde são criadas as condições ideais para
a aprendizagem de algo tão fantástico acerca de nós próprios que nos obrigaria a
repetir vezes sem conta as nossas experiências corporais até que estivéssemos tão
convictos da nossa realidade imortal como estamos agora da inevitabilidade da morte.
Não podemos beber a palavra “água”. Não poderemos saber o que é um choque
eléctrico se não o experimentarmos. As palavras são símbolos de símbolos e por isso
duplamente afastadas da realidade do objecto. A experimentação através dos nossos
sentidos é a forma de percepcionarmos a realidade do mundo físico que vemos. É a
base da existência deste mundo.
Temos necessidade dos cinco sentidos para sentirmos a realidade daquilo a que
chamamos vida. Sem os sentidos físicos quererá dizer que não haverá vida? Se por
um momento imaginarmos que não temos visão, tacto, olfacto, audição e paladar,
verificaremos que não haverá percepção desta realidade a que chamamos mundo.
Mas resta alguém que formula esse raciocínio. Esse alguém, que não tem forma física,
é o nosso verdadeiro ser .
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Questionar a realidade do mundo
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Questionar a realidade do mundo
Porquê a necessidade intuitiva que todos temos de, mais cedo ou mais tarde,
questionar esta realidade? Penso que é um acto natural provocado pelo conflito gerado
entre a parte da nossa mente consciente e a parte desta que guarda memória de quem
realmente somos.
A nossa insatisfação é experimentada em todos os acontecimentos que vivenciamos e
leva-nos, em determinado momento, a procurar respostas que, enganosamente, o
nosso ego nos faz acreditar que encontraremos no mundo exterior. O seu lema é:
“procura mas não encontres”.
Procuramos no corpo, no sucesso, na carreira, nos relacionamentos, na propriedade,
no cabeleireiro, etc… E quanto tempo dura essa satisfação?
Procuramos no planeta Terra , no universo e em cada átomo, mas as respostas
continuam a remeter-nos para o infinito, sem satisfazer a pergunta de sempre: Quem
somos? Porque estamos aqui? Haverá vida depois da morte? Irei para o inferno? O
mundo acabará no ano 2000? Haverá vida noutros planetas? Haverá destino?
A estas perguntas parecem corresponder respostas que dependem de forças
exteriores ou de um deus a quem agradamos ou não, de acordo com os pecados que
praticamos. Este é o mundo do medo. É o mundo do ego. Temos medo de que o
telefone toque para nos dar uma má notícia, temos medo de estar felizes porque
quando estamos felizes parece que alguma coisa desagradável está para acontecer.
Temos medo que algo venha estragar esse momento.
Porque será que temos medo de cada alegria que temos? Será porque sabemos que
ela não é duradoura? Nada neste mundo dura eternamente. Porque nada é real. Não
estou a dizer que o ar que respiramos não seja real ou que a nossa casa não seja real.
Trata-se de um nível de consciência em que percepcionamos as formas criadas pelo
pensamento colectivo. É um sonho em estado acordado.
Alguns homens sacrificaram-se um vida inteira para ter uma grande fortuna e quando
a obtiveram, receberam a noticia de que sofriam de um cancro mortal e que o tempo
de vida que lhes restava era de meses. Porquê esta realidade que mais parece um
jogo de falsos objectivos e de decepções constantes?
No entanto, tudo parece acontecer ao acaso e duma forma incontrolavel. “A vida é
assim!” , costumamos dizer. Que tipo de vida é esta tão caótica que parece fugir do
nosso controle e em que a morte de alguns é a alegria de outros e em que para
alguém ganhar alguma coisa o outro tem de perder?
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dualismo do mundo
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O dualismo do mundo
O propósito final da nossa estadia neste mundo é o de re-conhecer a nossa verdadeira
realidade. As experiências de vida repetir-se-ão até que, o que hoje é uma convicção,
se torne reconhecido como o que verdadeiramente é. Uma ilusão. A morte é uma
ilusão. Esta vida também.
A nossa consciência actual em relação à morte provoca-nos um medo profundo
aumentado pela ignorância do momento e das condições em que ela ocorrerá. O efeito
surpresa ajuda o seu objectivo que não é outro senão o de nos manter numa angústia
inconsciente e num sofrimento atroz provocado pelo desconhecimento do que se irá
passar depois. É o nosso maior medo. E é natural que tenhamos medo da escuridão.
Mas também é verdade que quando se acende a luz e tomamos consciência de que
estamos afinal num lugar que sempre conhecemos como a nossa casa, então de que
teríamos medo ?
É natural que o ego não queira que a morte seja compreendida como uma simples
despedida do corpo ao qual devemos estar agradecidos por ter sido o nosso veículo de
comunicação nesta vida e neste mundo, cujas experiências quisemos recordar. Deste
modo ele perderia a sua arma mais ameaçadora e redutora. Dia após dia, ano após
ano, esperamos assustados e com enorme ansiedade a hora da sua chegada pois o
ego diz-nos que quando terminar o tempo de vida do corpo, nós deixamos de ser. Mas
será essa a realidade? O pensamento pode morrer?
É impossível escapar do mundo das ilusões sem uma ajuda que não é desta
dimensão. Mas onde encontrar essa ajuda? Não onde sempre procuramos, ou seja no
exterior, mas sim dentro de nós. Não no corpo, mas além dele. Lá encontraremos a
voz que alegremente nos guiará no mundo das ilusões, aproveitando cuidadosamente
cada uma delas para as transformar em amorosas lições de amor e compreensão.
Esta grande viagem, composta por todas as vidas que estamos a re-viver, pode ser
mais longa ou mais curta dependendo da nossa abertura a essa ajuda que, silenciosa
e pacientemente aguarda a nossa inevitável decisão. Esta escolha só é livre no que
refere ao momento em que decidimos faze-la. É o livre arbítrio, característica inerente
a um Ser perfeito que é o Efeito duma Causa perfeita. No inicio deste livro foi dito que
só o medo nos impede de questionar esta realidade. O medo é a arma que mantém a
nossa crença neste mundo do qual temos consciência. O mundo rege-se por ele.
Respiramo-lo diariamente. O poder baseia-se nele. Disfarça-se das maneiras mais
insuspeitas.
Aquilo a que chamamos amor neste mundo também é uma das faces do medo.
Relacionamo-nos com outras pessoas que consideramos especiais, sendo esse
relacionamento o resultado duma procura inconsciente de quem nos poderá completar.
O nosso parceiro ou parceira. O nosso melhor amigo. Quando a satisfação aparente
desse relacionamento se esgota, revela-se finalmente a sua verdadeira natureza
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baseada na contrapartida. Logo de seguida somos levados intuitivamente a procurar
um novo relacionamento que nos dê nova satisfação ou nos complete outra vez. É
normal constatar-se que num relacionamento as pessoas tenham personalidades
opostas. E tudo se passa como se fossemos vasos comunicantes de emoções
inconscientes. Quando se nivelam acaba-se o relacionamento. É essa a intenção do
ego, ou seja fazer-nos crer que somos seres separados com interesses diferentes e só
às vezes conciliáveis.
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A atracção do mundo
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A atracção do mundo
Tal como dizem Gloria e Kenneth Wapnick no seu livro “ The Most Frequently
Questions About The Course in Miracles”, os chamados aspectos positivos do mundo
que vemos são igualmente tão ilusórios como os negativos. São ambos aspectos dum
universo dualista fruto da nossa percepção e que apenas reflecte a divisão dualista da
nossa mente.
A famosa frase “A beleza está no olho de quem vê” também se poderá aplicar aqui,
dado que o que um considera belo , outro poderá considerar feio e vice-versa.
Por outras palavras embora tudo que é bonito seja ilusório, permanece neutro, como
tudo o mais que existe no mundo.
Uma pistola poderá servir para uma bela colecção ou para um horrível assassínio.
Interpretado pelo ego servirá para reforçar a separação, o especialismo e a culpa. Uma
mentalidade correcta servirá para nos conduzir a uma experiência da verdade que
existe por trás de cada percepção.
Por exemplo um pôr do sol pode reforçar a crença de que eu só poderei sentir paz e
bem estar apenas e enquanto o presencio, ou pode ajudar-me a lembrar-me de que a
verdadeira beleza do Amor é a minha Identidade, e que esta beleza é interior, na
minha mente e independente de qualquer coisa fora dela.
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Para além do corpo
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Para além do corpo
O quotidiano frenético da vida do homem moderno é uma das engenhosas maneiras
construídas pelo nosso ego para que a realidade do mundo que vemos nunca possa
ser questionada.
Mas, intuitivamente, quando a dor e o sofrimento nos atinge, dirigimos os nossos olhos
para o céu e procuramos numa outra realidade o perdão de um deus vingador,
pedindo-lhe misericórdia e clemência pelos nossos pecados. Pedimos que não nos
castigue. Depois aguardamos com medo a vinda do castigo que achamos merecer. E
interrogamo-nos sobre este deus que parece estar atento aos pecados dos seus filhos
e os pune com injustiças tão grandes como deixar uma criança órfã ou permitir que
pessoas morram à fome num mundo que nunca teve tanta riqueza e tecnologia.
É evidente, que só poderíamos imaginar um deus assim baseando-nos num sistema
de pensamento onde apenas impera o medo e morte. E onde existe medo não há
Amor e onde há Amor não existe medo. Ao questionarmos a base deste pensamento
poderemos ser conduzidos a uma gradual compreensão da nossa verdadeira
realidade. Ou seja que, se escolhermos vermo-nos sem medo nem limitação a nossa
vida será de satisfação e paz. Mas, se pelo contrário nos virmos como seres limitados
a um corpo e portanto indefesos neste mundo ilusório então a nossa vida será
invadida por experiências de insatisfação e sofrimento.
A palavra “forma” é um termo que poderá servir para designar o nosso “eu” físico. Inclui
todas as propriedades psicológicas que aprendemos a associar ao ser humano que
somos. A forma inclui o nosso esqueleto, as veias, o coração e tudo mais que compõe
o nosso corpo. Tudo o que nós temos na nossa forma física também os outros animais
têm. No entanto nós somos muito mais do que um simples monte de ossos. Algo
dirige esta estrutura física.
O nosso verdadeiro eu é algo que está para além da percepção física. Tem recebido
muitos nomes como, mente, consciência superior, pensamento, enfim mas seja o que
for não é uma forma física uma vez que tudo que existe no universo físico é perecível.
As palavras “transformação pessoal” têm sido usadas com frequência para descrever o
acto de ir além da forma. A mudança de mentalidade origina a transformação pessoal.
As ideias transmitidas neste livro, se forem aceites por si, poderão ajudá-lo a fazer a
sua transformação pessoal. A mudar a sua mentalidade. O nosso corpo é limitado. A
nossa capacidade de pensar não. Através do pensamento podemos ir aos lugares
mais desejados e fazer coisas que não têm que ver com as leis físicas que regem este
mundo. O pensamento não come e não se cansa. Pensamos ininterruptamente. O
corpo morre mas o pensamento não.
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Se acreditarmos que somos apenas um corpo estaremos a condenarmo-nos a uma
vida inteira de sofrimento. As rugas, a perda do cabelo, a celulite, a vista cansada, as
doenças e tudo o que faz parte da deterioração do nosso corpo físico, provoca-nos um
sofrimento que vai aumentando na proporção da nossa ansiedade para o manter vivo e
atractivo.
A utilização do nosso corpo como meio de nos sentirmos realizados nesta vida, faz
com que nos preocupemos exaustivamente com a sua aparência. Este é o mundo da
aparência. É costume dizer-se que “os olhos também comem”. Identificamo-nos com o
invólucro que nos parece conter e não reconhecemos que é apenas uma forma
temporária que estamos a usar.
Esse é o nosso corpo, limitado pelas regras do físico, sujeito a dores e deteriorando-se
lentamente. No dia em que nascemos já estávamos a morrer. Na contagem
decrescente. Mas recordemos que para além da forma, ou seja na dimensão do
pensamento, não existe nem tempo nem espaço, e portanto essa realidade não está
sujeita aos conceitos dum mundo físico limitado e portanto da morte.
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O medo
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O medo
“Ninguém neste mundo pode escapar ao medo, mas toda a gente pode
reconsiderar as suas causas e aprender a avaliá-lo correctamente .”
Supplements to “A Course in Miracles”
O medo é uma constante da nossa vida. Senão, vejam-se alguns exemplos: medo de
perder o emprego, de não ter dinheiro suficiente, de sermos atingidos por um vírus
incurável, da sida, do cancro, de não sermos aceites ou considerados pela sociedade,
da destruição da camada de ozono e até da água e da comida porque estão poluídas.
Este é o mundo que percepcionamos na nossa consciência.
Não admira que os casos de depressão aumentem cada vez mais e que os hospitais
estejam cheios de pessoas que gostariam de ser felizes. Mas o medo não as deixa. É
esta a triste realidade deste mundo do qual tanto medo temos de nos separar e ao qual
tanto nos aferramos. O nosso ego diz-nos que se não o defendermos fica o vazio. O
nada. O medo é o seu poder. Mas quando o medo é enfrentado a realidade muda e o
vazio torna-se a plenitude e o ataque torna-se paz. Os conflitos desvanecem-se e o
inimigo torna-se um amigo. Então porque esperamos?
Produzimos o medo para termos medo e assim provarmos a nossa limitação cuja
prova final é a morte. A morte é o nosso maior medo porque não é questionada. É a
escuridão. Mas não há escuridão que prevaleça quando se acende uma luz. E o
conhecimento é a luz que elimina a escuridão da morte, nas nossas mentes. Ao reconhecermos acendemos a luz e deixamos de ter medo.
Quando alguém morre dizemos que é a vontade de Deus. Poderia Deus matar o seu
próprio Filho? Poderia Deus matar alguém que sendo feito à sua semelhança é
imortal?
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Evitar o medo
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Evitar o medo
Podemos evitar o medo?
Sim, se compreendermos a sua natureza. O medo não passa de um pensamento
fabricado por nós. Pensamos na nossa mente, inconscientemente, que queremos ter
medo e projectamos as imagens que o irão provocar. Por isso diferentes pessoas terão
medos diferentes. Cada ego conhece bem a culpabilidade de cada um, uma vez que
foi ele que a criou e continuará a repetir os mesmos medos até que a pessoa os
enfrente e reconheça que é ela que os está a fabricar.
Podemos assim compreender que uma mente com um poder de criação infinito não
tem limites na imaginação das cenas que provocam sofrimento e angustia cujo
objectivo é perpetuar o poder deste mundo exterior sobre nós. A isto chama-se o
inferno. Não há diabos com garfos e fogueiras medonhas esperando pelos pecadores,
mas há sim uma mente de poder inimaginável para a qual a nossa consciência actual
não tem compreensão e cujo potencial é dominado por um ego que, através do terror
e de cenas de morte, procura provar que a morte faz parte da nossa realidade.
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Ser livre é libertar-se do medo
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Ser livre é libertar-se do medo
O medo é a emoção que nos mantém ligados a condutas que nos aborrecem, a
atitudes que nos magoam e a um estado compulsivo que nos priva da paz e do
desfrutar do momento presente; que afinal é o único que existe. O aqui e agora. O
passado já passou e o futuro ainda não é.
Um dos objectivos favoritos do medo é impedir-nos de viver o presente. Projectamonos em direcção ao passado e ao futuro numa procura desesperada de escapar da
única coisa que é real, este momento; este mesmo instante, o agora. Olhe à sua volta
e procure o passado. Consegue vê-lo? E o futuro? Eles estão apenas no seu
imaginário. Mas o presente está aqui materializado no momento que você lê este livro,
por exemplo.
A pre-ocupação (ocupar-se antes de) com o que ainda não aconteceu é uma forma de
deixar escapar a realidade, de permitir que por essa brecha se filtre o medo, a
ansiedade e a insegurança. Quando evocamos o passado costumamos reforçar a já
por si pesada bagagem da culpa. Pelo que se fez ou pelo que se deixou de fazer.
Li algures que, numa sondagem realizada nos E.U.A. sobre as frases que melhor
expressam a tristeza e a dor, a mais escolhida foi " eu podia ter sido…".
A conclusão é a de que, de uma forma generalizada, existe uma ligação mental ao
passado, que nos imobiliza e nos prende ao que foi e já não é. O passado, assim como
o futuro, são um jogo de espelhos que projectam imagens irreais.
Libertar-se da culpa e confiar no futuro sem cobri-lo previamente com as sombras do
medo é a primeira das atitudes que nos ajudará a libertar-nos dele. A sermos um
pouco mais nós próprios.
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As várias faces do medo
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As várias faces do medo
Estudar a sensação de medo e observá-la representa um passo importante no
caminho que nos leva ao nosso auto-conhecimento. Uma boa medida de higiene
mental é observarmos sem emoção aquilo que mais tememos:
De que é que temos medo?
De perder o nosso parceiro?
De ficarmos sem trabalho?
De sermos ridicularizados?
De envelhecer? O medo da solidão? O medo da rejeição…
Uma gama infinita de inquietações que se ocultam por detrás das múltiplas faces do
medo. Que existirá por detrás de uma relação afectiva que produz a dor e à qual
permanecemos ligados?
Porque não aceitamos a mudança nas nossas vidas e não reconhecemos que as
crises são oportunidades de crescimento interior?
Toda a mudança é uma ameaça ao imobilismo que sempre necessita do medo para
subsistir. Crescer é doloroso, já o disse. Mas, como qualquer parto, está nas nossas
mãos, ou seja, está na nossa mente, fazer com que essa experiência seja menos
traumática e vivê-la como realmente é: uma renovação da vida. Porque não nos pomos
a favor dessa corrente de transformação e movimento, em vez de nos agarrarmos
desesperadamente ao que acreditamos que nos dá segurança? Está satisfeito com a
vida que leva? Se não está o que é que tem a perder?
A segurança não está no ter mas no ser. Quanto mais se pratica o desapego, mais
alegria de viver temos. Ou seja que, quantas mais dependências são eliminadas da
nossa vida, mais vontade de viver temos.
Há quem dependa do dinheiro, do poder, que lhe permite sentir-se importante e há
quem dependa da capacidade de manipular ou ser manipulado, na tentativa de ser
amado…
Outros dependem da agressividade e da violência, porque se sentem internamente
ameaçados…
Há dependências para todos os gostos. Mas, facilmente as identificaremos como uma
das várias caras do medo. O medo de ser rejeitado talvez seja o mais frequente,
porque temos na nossa memória genética, uma recordação gravada das remotas
épocas pré-históricas onde a rejeição do grupo significava o pior dos castigos. A morte.
O indivíduo sozinho não podia sobreviver pelos seus próprios meios num ambiente
hostil e agressivo, sem contar com o apoio do grupo (tribo).
O medo é um velho conhecido que acompanha a humanidade desde os tempos
imemoriais. Desde que existe ego. Comparte connosco a nossa experiência
quotidiana; é intemporal e está presente em todas as culturas do planeta; assim como
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a liberdade e o amor. Eles estão em partes iguais, não o esqueçamos. Somos nós que
provocamos o desequilíbrio transformando a luz em sombra. Quando existe liberdade
desaparece o medo. São extremos opostos. A liberdade só se alcança desmascarando
o medo.
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Novos sistemas de pensamento
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Novos sistemas de pensamento
Nada do que desejamos é substancialmente diferente do que sempre foi. A riqueza
material, o status e o poder só mudaram de forma mas o conteúdo é o de sempre,
desde os princípios do mundo. E é assim porque o sistema de pensamento não
mudou. É o mesmo. Apenas se reforçou mais, dando origem a um mundo mais caótico
e egótico onde a morte nos é trazida como banalidade pela televisão à hora da
refeição e onde a imprensa procura obter em exclusivo e ao vivo os maiores dramas
humanos como forma de aumentar as audiências. Nada melhor para reforçar a
realidade do mundo do ego.
“A Course in Miracles” publicado pela Foundation for Inner Peace ensina que existem
apenas dois sistemas básicos de pensamento, o da percepção e o do conhecimento. O
sistema de pensamento da percepção (do ego) é inerentemente ilusório porque é
baseado na interpretação, não em factos. É baseado na crença de que houve uma
separação de Deus ou Causa e de uns dos outros. Daqui resulta a crença no diabo,
pecado, culpa, medo e na carência. É um mundo de aparências, do nascimento e da
morte, do tempo e da constante mudança. Este sistema de pensamento, da percepção,
é o que o “Curso” denomina de ego, que é resumidamente um conjunto de crenças que
se centram à volta do corpo como sendo a nossa realidade e o limite do nosso ser.
O mundo do conhecimento, pelo contrário, é a verdade. Ensina também, que o mundo
real, o que reflecte a verdade, pode ser visto apenas através da visão espiritual, e não
através dos olhos do corpo. O mundo do conhecimento é de unidade, amor, sem
pecado e abundante. Vê a realidade composta apenas pelos pensamentos de Deus,
que são amorosos, constantes, intemporais e eternos. O mal, o pecado e a culpa são
considerados percepções erradas. O pecado é considerado falta de amor, ou um erro
pedindo correcção e amor, em vez de culpa e consequentemente, castigo.
O sermos apanhados no mundo da percepção, ou no mundo do sistema de
pensamento do ego, é um pensamento de que fomos apanhados num sonho. Para
despertar para a realidade, é necessário inverter o nosso pensamento e corrigir os
nossos erros. Precisamos de ajuda para despertar desse sonho porque os nossos
sentidos físicos aceitam apenas a informação que reforça a nossa crença na realidade
do sonho. O “Curso em Milagres” oferece-nos um caminho para o despertar
mostrando-nos que a nossa percepção usual e sentido de identidade está distorcido.
Que existe um outro caminho para corrigir essas distorções de modo a que possamos
ver-nos a nós próprios e ao mundo mais claramente. A esta mudança de percepção é
o que o Curso chama “Milagre”.
Ao contrário de outros sistemas de pensamento conhecidos, não sugere o afastamento
do mundo. Ensina que os nossos relacionamentos oferecem-nos únicas e valiosas
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oportunidades para aprender, despertar e curar. Oferece uma variedade de conceitos
pelos quais os relacionamentos baseados em medo e na carência podem ser
corrigidos. O perdão de nós próprios e dos outros (uma vez que somos os fazedores
do sonho e portanto não há que culpar ninguém) dá-nos os meios pelos quais
podemos usar os relacionamentos para libertar-nos do passado com o seu peso da
culpa e ofensas. No contexto deste sistema de pensamento, “perdoar” significa
reconhecer que o que pensamos que alguém nos fez, não ocorreu (somos nós os
fazedores dos sonhos e dos seus intervenientes e situações). O perdão, neste sistema
de pensamento, não perdoa pecados para os tornar verdadeiros, pois se há alguma
coisa a perdoar é porque fui atingido realmente. Mas como se trata de um sonho nada
há para perdoar mas sim reconhecer que apenas se tratou de uma ilusão.
O perdão compreende que não houve pecado mas sim um erro de percepção. O
perdão mostra-nos apenas as extensões do amor ou os pedidos de amor, não o
ataque ou o ódio. Mudando desta maneira a percepção, podemos remover as barreiras
para a consciência da presença do amor, a que é a nossa herança natural. O objectivo
é ensinar a escutar o nosso mestre interior em vez de procurarmos ajuda fora de nós
próprios.
Procurar ajuda fora de nós próprios é a forma ideal para não a termos. É esse o truque
do ego. Procura mas não encontres. A ajuda tem de ser procurada na causa, não no
efeito. Se um filme estiver a ser observado por nós e se a meio da projecção as
imagens aparecem subitamente desfocadas, nós não iremos tentar corrigi-las no écran
mas sim no próprio projector que é onde se originou o problema.
O nosso sistema de pensamento predominante (do ego) procura ferozmente ignorar
essa perspectiva pois ela representa uma séria ameaça aos seus alicerces.
A experiência traz a convicção. Somos convictos da doença e da morte porque as
vemos e sentimos diariamente. São convicções que não questionamos porque
pensamos serem factos. Mas somos nós quem fabrica os nossos sonhos. O nosso Ser
está para além da forma e é eterno. Está vivo num mundo não físico. Quando
dormimos e é um terço da nossa vida, deixamos o mundo da forma, deixamos tranquilo
o nosso corpo e entramos no mundo da não forma, ou seja sonhamos.
Quando adormecemos e começamos a sonhar, acreditamos que estamos num corpo
criado para o sonho. No sonho convencemo-nos que o nosso corpo do sonho é
verdadeiro. Nos sonhos o tempo não existe. Podemos avançar ou recuar de acordo
com a nossa vontade. Podemos rever uma pessoa que já morreu à vários anos, e ela
parece estar ali à nossa frente, viva e real. Podemos voltar a ser crianças. E tudo é real
no mundo do sonho. Não temos consciência de que estamos a sonhar.
No entanto, nos acontecimentos dum sonho criamos todos os personagens que nos
irão agredir ou dar prazer, ou seja que necessitamos de criar alguém com quem nos
relacionarmos e os respectivos episódios desse relacionamento. Qualquer
complemento para esses acontecimentos, como prédios, carros, barcos, etc.. é criado
por nós (sonhadores). Senão por quem seria?
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O nosso relacionamento no sonho provoca reacções que se manifestam no nosso
corpo físico. Por exemplo se alguém nesse sonho ameaça matar-nos, o nosso coração
aumenta o ritmo cardíaco e isso é real, mas a pessoa que nos ameaça é uma ilusão.
No sonho convencemo-nos de que o corpo é real. No entanto não há realidade física .
É uma mera ilusão. Temos essa certeza quando acordamos.
É importante compreender esta realidade do sonho pois as mesmas regras aplicam-se
ao nosso corpo chamado real quando nos encontramos acordados. Reagimos apenas
a imagens que nos provocam reacções emocionais.
Quando somos crianças acreditamos na existência do Pai Natal. E é assim porque
quem nos ensinou a acreditar na sua existência foram aqueles em quem mais
confiávamos, por isso acima de qualquer suspeita, os primeiros seres com quem nos
relacionámos desde que tivemos a nossa primeira consciência deste mundo, ou seja,
os nossos pais. No entanto, eles sabiam e nós sabemos que por detrás dessa inocente
mentira, sempre existiu uma verdade, ou seja, não existe um Pai Natal físico, pelo
menos tal como é fantasiado todos os natais. Com o crescimento compreendemos que
existe afinal essa tal outra verdade, que nunca deixou de o ser, mesmo quando nós
acreditávamos noutra.
Também esta realidade, de que temos consciência, presentemente, encobre uma outra
realidade tão fantástica que só poderá ser vivenciada depois duma profunda mudança
de mentalidade.
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O nosso auto-conceito
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O nosso auto-conceito
O nosso auto-conceito identifica-nos com um corpo. Esse corpo tem a capacidade de
pensar, de dar origem a outros corpos e de morrer para nunca mais voltar. Viverá uma
vida dura com muito sofrimento e alegrias pouco duradouras. Este é o nosso autoconceito tradicional.
Nesta visão da existência, os corpos matam-se entre eles para terem o poder de mandar
nos outros e de terem mais coisas. Trabalham uma vida inteira, que tem a duração desse
corpo, para, em grande parte, adquirirem aquilo que não necessitam. Vestem roupas para
se taparem pois têm vergonha de se mostrarem despidos. Consideram isso uma
imoralidade. No entanto, pensam as coisas mais horríveis uns dos outros e matam
inocentes sem disso sentirem vergonha. Divertem-se a comer e beber em excesso,
acabando às vezes por adoecer em consequência. Também se divertem vendo filmes
onde choram ou riem com as cenas de morte e violação feitas por outros corpos.
O nosso auto-conceito cria esta realidade. Ela nasce dele. Ou seja, o mundo que vemos
é criado por nós para servir este auto-conceito e depois projectamos imagens no mundo
que não nos deixem duvidar de que o que vemos é verdadeiro.
Quando morremos fisicamente este nosso “eu” deixa de existir. E é um paradoxo. Por um
lado ele ameaça-nos diariamente com o medo da morte e por outro é um suicida que
sabe que, quando o corpo deixa de servir, a consciência desse "eu" desaparece.
Cada vez que, temos novamente consciência de ter um corpo, é como se nunca o
tivéssemos tido antes. Bloqueamos a memória de anteriores experiências e voltamos a
re-criar o nosso auto-conceito baseado numa forma física, limitada e mortal.
Quantas vezes se irão repetir estas experiências no mundo da forma? Tantas quantas as
necessárias à compreensão segura e irreversível da nossa verdadeira identidade que,
nunca tendo deixado de o ser, aguarda serenamente e alheia ao caos que nos rodeia,
que a reconheçamos. É o regresso a casa, donde nunca saímos. Os corpos gastam-se e
trocam-se por outros. O nosso verdadeiro Ser é imutável e eterno. A sua realidade não é
deste nível de consciência em que nos encontramos. Não tem pressa. Não pertence à
realidade do espaço-tempo.
No entanto, urge que nos lembremos de quem somos. Basta de experiências de
sofrimento e infelicidade. Porquê esta punição? Porquê a morte?
Porque razão repetimos esta odisseia quase interminavelmente? Que levará um Ser
imortal e infinito a pensar que é mortal e limitado? Tratar-se-á de um equívoco de
dimensão tão fantástica e proporcional a essa realidade?
Será que esse equívoco terá levado o Ser a uma auto-amnésia que o faz pensar que não
foi criado por outro Ser da mesma realidade. E que portanto é auto-criado, sendo um
corpo. E será que, ao acreditar, equivocadamente, ter feito algo tão horrível a Quem o
criou, temerá a destruição, como punição, e terá criado um universo físico onde se
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refugiou e onde se distribuiu por um número quase infinito de corpos, de modo a nunca
ser descoberto e destruído? E se depois se esqueceu, por amnésia, de que foi ele que
criou essa falsa realidade? E como irá recuperar a consciência de sua verdadeira
identidade?
Normalmente, quando alguém sofre de amnésia, procuramos que re-veja cenas e lugares
da sua verdadeira identidade, na tentativa de que se vá recordando de quem realmente é.
Será então que as nossas vidas em vez de serem vividas estarão a ser re-vividas para
que nos recordemos um dia quem somos? Eu creio que é esse o caso.
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A experiência corporal
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A experiência corporal
Alguns leitores, poderão interrogar-se sobre a pertinência deste capítulo uma vez que não
concebem qualquer outra forma de experiência que não seja aquela que o corpo lhes
proporciona. No entanto garanto-lhes que é pertinente questionar o inquestionável como
única forma de permitir que surjam nas vossas consciências novas realidades nunca
antes experimentadas e que vos aproximarão do conhecimento duma realidade tão
fantástica que apenas poderá ser aflorada. A nossa verdadeira realidade.
Re-conhecer (conhecer de novo) é a razão pela qual vivenciamos as nossas experiências
corporais. Duma maneira perfeita, a Inteligência Universal utiliza um equívoco feito por
nós, a realidade corporal, para através dela e das experiências que iremos re-viver neste
mundo, lembrarmo-nos finalmente, quem somos. De qual é a nossa verdadeira realidade.
Nada poderia ser mais perfeito. Utilizar o próprio erro como meio para o desfazer.
Será um período de muitos triliões de anos de aprendizagem parte dos quais já
passaram. As mudanças e a compreensão virão à nossa consciência duma forma subtil e
irreversível para que, este equívoco cometido pelo nosso Ser, ou seja a consciência
limitada de que somos um corpo que nasce, vive um tempo e morre, não volte a ser
possível. Para que não volte a existir o mundo da ilusão. Para que a consciência de um
mundo imperfeito se transforme gradualmente num mundo feliz antes da consciência final
da nossa identidade.
Estamos convictos da nossa realidade corporal porque dela temos consciência desde os
primeiros anos da nossa vida. Curiosamente ninguém se lembra do dia em que nasceu.
Diariamente somos bombardeados com conselhos de como tratar o nosso corpo, proteger
a sua saúde, como o embelezar, as ocorrências mortais com que as televisões costumam
abrir os seus noticiários, alguém conhecido que morreu, uma criança que nasce, uma
casa mais confortável, novos modelos de roupa, enfim uma variedade infinita de
mensagens que não nos deixam esquecer a nossa identificação com o corpo físico. Se
quiséssemos levar alguém a acreditar que era um corpo, não o sendo, não haveria
maneira mais convincente de o fazer.
Vemos o que queremos acreditar e acreditamos no que vemos.
A maioria acredita que no seu “eu” físico e psicológico, que vive num universo físico que
preexistia à sua chegada, e que sobrevirá depois da sua partida. A dificuldade em
compreender que não é esse o caso está relacionado com o facto de estarmos tão
identificados com o nosso “eu” corporal, que se torna quase impossível conceber outra
existência ao nível da mente e que está fora do conceito do tempo e do espaço.
O livro “Curso em Milagres”, explica metafóricamente que, quando um pensamento de
separação pareceu ocorrer ao Filho de Deus, este pareceu ter caído num sono e ter
sonhado um sonho, cujo conteúdo é o de que a unicidade se converteu em multiplicidade,
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e de que a Mente não dualista de Cristo se fragmentou, se separou da sua Fonte e se
dividiu em segmentos dementes e em guerra com eles próprios.
Estes fragmentos projectaram fora da mente uma série de sonhos, como scripts de um
filme, que colectivamente constituem a história do universo físico. Ao nível individual, a
série de dramas que as nossas personalidades egotistas identificam como as nossas
próprias vidas pessoais seriam também projecções das nossas mentes fragmentadas e
divididas.
Por isso Shakespeare escreveu que "somos todos actores e actrizes no palco da vida",
vivendo um sonho que vivenciamos como a nossa realidade individual, separada e aparte
de quem somos realmente. Ou seja do nosso Ser. Mais ainda, as nossas mentes
projectaram muitas personalidades diferentes no sonho colectivo do Filho fragmentado,
complicando assim todo o processo. Portanto a pergunta de “como chegámos até aqui?”
deve ser compreendida nesta perspectiva do sonho colectivo e individual. Por outras
palavras, nós não estaríamos realmente aqui, mas sonhando que estamos. Daí que nada
que tenha forma, se mova, se deteriore e finalmente morre, venha de Deus. Assim, a
aparente majestade do cosmos e a glória da natureza são tudo expressões do sistema
de pensamento separado do ego. Qualquer tentativa de fazer uma excepção a este facto
é tentar negociar com a verdade, exactamente o que o ego deseja para estabelecer a sua
própria existência. Como Jesus disse: “o que é falso é falso e o que é verdade nunca
mudou”. Em conclusão, portanto, nenhum aspecto da ilusão pode ser considerado
verdadeiro, o que significa que nada deste universo material vem de Deus, ou
inclusivamente é conhecido por Ele. A Sua realidade é totalmente de fora deste mundo
de sonhos.
Como nos diz “Um Curso Em Milagres”: …a lição central é sempre essa: seja para o que
for que o corpo sirva para ti, é isso que ele virá a ser para ti. Usa-o para o pecado ou para
o ataque, que é o mesmo que o pecado e o verás como pecaminoso. Porque é
pecaminoso é fraco e, sendo fraco, sofre e morre. Usa-o para trazer o Verbo de Deus
àqueles que não o têm e o corpo vem a ser santo. Por ser santo, não pode adoecer nem
pode morrer. Quando a sua utilidade finda, ele é deixado de lado e isso é tudo. A mente
toma essa decisão como toma todas as decisões que são responsáveis pela condição do
corpo.”
A afirmação acima feita é uma clara declaração de que o corpo é neutro, que a sua única
função é a de servir de veículo de comunicação neste mundo físico, não tem qualquer
poder porque não decide nada e que a doença e a cura dele é decidida exclusivamente
pela mente.
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O que é a salvação
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O que é a salvação
Kenneth Wapnick no seu livro “ Love Does Not Condemn”, diz-nos que, de acordo com “ A
Course In Miracles” a salvação é: a correcção do equívoco da separação.
É comparada ao processo de correcção que desfaz o erro através da mudança do
pensamento, não pela penitência, nem pelo sacrifício do corpo, como normalmente é
ensinado. O instrumento da salvação (do nosso pensamento egótico) é o perdão (ver o
capítulo respectivo), ou seja, a correcção da nossa percepção errada dos outros.
Onde julgámos alguém como sendo nosso inimigo, o agente ou causador de uma
angústia, agora esse mesmo indivíduo é visto como nosso amigo. Este sistema de
pensamento ensina que perdoamos os outros pelo que eles não nos fizeram, mas pelo
que pensámos que eles nos fizeram. Significando que a razão pela qual julgávamos estar
angustiados não é pelas acções dos outros, mas sempre como percepcionámos as suas
acções. Aparentes ataques são corrigidos na nossa percepção de modo a que agora
possam ser vistos como um pedido de ajuda ou amor.
Assim o sistema de pensamento descrito em “A Couse In Miracles” pretende ensinar uma
outra maneira de ver o mundo. Esta visão não nega as acções externas
ou
comportamentos que os nossos órgãos dos sentidos nos informam, mas simplesmente reinterpreta o que vimos ou, mais propriamente, o que nós acreditámos que vimos.
Recordamos também que, o ego, começa por nos convencer da realidade desta trindade,
pecado, culpa e medo, culminando na crença de que quem pecou contra Deus procura a
punição para si mesmo, e que não deverá de confiar na sua Voz Interior e que deverá
libertar-se Dela. O ego efectivamente convenceu o Filho de Deus a negar o seu papel na
“raiva de Deus”: nomeadamente de que ele atacou Deus primeiro: e este é o seu pecado.
Projectando o seu pecado em Deus, o Filho acredita agora que Deus o está a atacar e
injustamente.
Então, o pecado e a culpa primeiro foram negados e depois projectados. O próximo passo
projectará o pensamento da separação da mente, fazendo (criando erradamente) um
mundo físico, Big-Bang, e um corpo para
o vivenciar como separado dele, e
independente da mente que o criou. O ego reconhece de que, se o Filho de Deus se
lembra que fez o mundo, também compreenderá que é ilusório e feito para esconder dele
o pecado e a culpa, para não mencionar a presença do amor na sua mente que, desfaria
o pecado através do perdão daquilo que nunca existiu. Por outras palavras o Filho
simplesmente despertaria de um sonho mau de separação do seu Criador.
Devido à eficácia da negação de que somos nós que criamos o mundo e das projecções
que fazemos nele, o mundo do tempo e do espaço, ao nível da nossa experiência
individual, torna-se para nós bastante real que ele pareça ser externo às nossas mentes.
Por isso inevitavelmente consideramos que somos vítimas de forças fora do nosso
controlo.
Como já foi explicado, a correcção desse erro que nos fez acreditar na realidade deste
mundo, em primeiro lugar tem de ocorrer na mente, porque é onde o erro ocorre. A
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mente, e não o corpo, é o elemento activo no sonho do mundo separado, e portanto não
faria qualquer sentido corrigir o erro onde ele não está; no entanto é claro que o ego
tentará, de forma contínua, convencer-nos do contrário.
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A natureza da verdadeira realidade
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A natureza da verdadeira realidade
Não é fácil compreendê-la. Diria até que é quase impossível fazê-lo atendendo à
distorção da compreensão a que a nossa forma de pensamento nos levou. Também
porque é muito difícil concebermos algo fora da dimensão espaço-tempo.
A nossa verdadeira realidade não é uma dimensão física ou experiência, dado que é
criada por Deus e como Deus, não tem forma, é imutável, eterna , amor infinito, sem
limites e unicidade perfeita. Uma unicidade não dualista. A verdadeira realidade é
sinónimo de Céu e obviamente não pode estar relacionada de nenhuma maneira com o
universo da forma física, a que o mundo chama realidade. Sendo imutável, a verdadeira
realidade é permanente e fixa, e por isso qualquer pensamento de separação ( vermo-nos
separados e com vidas individuais) é impossível e por isso nunca aconteceu. Como é um
estado não dualista, a realidade está para além da percepção, pois a percepção
pressupõe uma dicotomia assunto-objecto que é inerentemente dualista e por isso não
pode ser real. Realidade é também sinónimo de conhecimento, o estado de ser chamado
Céu.
Quando pensamos em Deus, Ele surge-nos como uma ideia. Se somos feitos à sua
imagem então a nossa verdadeira realidade não é uma forma que dura um determinado
tempo e que parece vagabundear num mundo sem salvação e onde o medo rege as suas
experiências.
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A natureza de Deus
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A natureza de Deus
A nossa identificação com o sistema de pensamento do ego, leva-nos a ter uma ideia de
Deus que não pode deixar de ser à nossa imagem ou seja, com uma forma
antropomórfica, um velho de barbas que satisfaz os seus caprichos destinando ao
sofrimento e à morte aqueles que ousam ofendê-lo. É essa a razão principal porque,
inconscientemente, não queremos questionar a realidade deste mundo. O medo da
vingança de Deus.
O ego induziu na nossa mente a ideia de que Deus procura vingança contra o Filho que
se atreveu a separar Dele. Por isso o Filho procurou esconder-se do seu Pai no mundo
físico, em corpos, na esperança de não ser encontrado pois, se for, será destruído
impiedosamente pela tentativa de usurpação da Causa, o lugar de Deus (este foi o
pensamento de separação). Por isso teremos de vivenciar um número de vidas
necessário ao total desfazer mental desse terrível equívoco que se criou na mente do
Filho de Deus, de que Deus é o seu inimigo e que só o mundo físico o poderá salvar. Por
isso renascemos uma e outra vez até que o que nos ensinámos a nós próprios seja
completamente corrigido e aceitemos plenamente a nossa condição natural. A de Filhos
de Deus.
Primeiro que tudo é necessário reconhecer que Deus é um Ser não dualista, no Qual não
existem opostos. É o criador da vida, um Ser de Amor puro e a Fonte e Primeira Causa de
uma realidade e de totalidades não físicas, Aquele que tudo contém, fora do qual nada
existe e o Qual é tudo. A natureza da nossa Fonte não pode ser descrita ou realmente
compreendida. A natureza de Deus não pode ser escrita porque é uma realidade não
dualista e porque as palavras faladas e escritas que expressam o pensamento duma
mente dividida são dualistas. Por isso qualquer tentativa de descrever o não dualismo
falhará e inevitavelmente será redutora ao expressar a realidade da unicidade que está
para além da expressão. Simplesmente é.
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Mudar a nossa realidade
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Mudar a nossa realidade
Qualquer caminho por maior que seja a distância, inicia-se com o primeiro passo. Quando
se tomam as decisões e se acompanham com um pensamento claro e persistente, a
realidade muda. Pensar, falar, sentir e actuar de forma a aproximarmo-nos da meta, sem
fissuras nem contradições, é o único segredo. Essa é a fé capaz de mover montanhas.
Esse é o poder que reside dentro de cada um e que habitualmente nos foge, porque nos
dá muito trabalho em manter essa forma de pensar.
O macaco da nossa mente salta de uma coisa para a outra e o seu passatempo favorito é
disfarçar-se no tempo. No antes e no depois. Também o ruído interno que nos
acompanha diariamente, é outro dos aliados do medo. É outra das suas camuflagens,
outra das manhas do ego para que nos esqueçamos de quem somos.
Não espere por amanhã para dizer " este é o primeiro dia do resto da minha vida". Não
espere, porque cada instante é único e pode ser o começo doutra forma de se aventurar
nessa viagem interior que é a vida. Decida que a liberdade é sua. Agora mesmo tome
consciência de que este é o primeiro momento de todo o tempo que lhe resta para viver.
Aqui começa, se você quiser, a sua nova vida. É seu o privilégio de vivê-la na plenitude.
Tem todo o direito a ser feliz. Convença-se disso. Pare por um momento e recorde quem
é.
As nossas experiências podem registar-se como o negativo de uma fotografia: cinzentas,
pretas, brancos sujos ou então a cores, com muita luz e cor. A escolha, como sempre, é
sua. Uma das chaves principais é a atenção. A observação pessoal. A tomada de
consciência.
Aumentar o nível de consciência, expandi-la, é aumentar as perspectivas de visão da
realidade. Existe todo um universo que se estende mais além dos limites da nossa
percepção.
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O perdão
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O perdão
O perdão é a chave para a mudança de mentalidade. Através duma correcção da mente,
desfazem-se os princípios de negação e projecção, invertendo a direcção que a mente
tomou quando seguiu o conselho do ego e portanto escolheu ver cenas de drama e
sofrimento da nossa vida. Essas cenas, como já foi dito, são a materialização de
pensamentos equivocados dirigidos pelo nosso ego que como sabemos apenas visa obter
sofrimento e dor.
O Perdão como instrumento da libertação do sistema de pensamento do ego, pode ser
sintetizado como um processo de três etapas:
-
A primeira etapa consiste em compreender que a causa do nosso mundo pessoal de
sofrimento e dor, de vitimas e vitimização, não está no que parece ser externo, mas
nas nossas próprias mentes. Dado que o mundo exterior não é mais do que um
espelho do que está na mente, é um sonho não diferente da dinâmica do sonho
quando estamos a dormir e onde nada “real” se passa, onde tudo o que ocorre nas
nossas vidas foi literalmente sonhado por nós. Não existe realmente ninguém fora de
nós, excepto aquelas figuras que introduzimos no nosso sonho. E uma vez
reconhecida esta condição, podemos avançar para a segunda etapa.
- Agora podemos escolher de novo qual será o sistema de pensamento cujo conselho
iremos seguir. Em cada dificuldade, angústia, e dor, a Voz Interior parece dizer-nos “
escolhe outra vez”. Recapitulando os passos do perdão, as primeiras questões da
validade do ego de vitima e vitimização: que estamos sujeitos a forças externas e para
além do nosso controlo. Trazer o problema do pecado e da culpa à nossa mente que é
onde ele verdadeiramente pertence, não em alguém ou em alguma coisa.
A segunda etapa fica agora completa permitindo que possamos reconsiderar a primeira
decisão de acreditar no ego. A base do problema foi acreditar que éramos pecadores e
culpados. Agora essa crença pode ser analisada de novo, desta vez com a Voz Interior, e
o nosso investimento nela é retirado. Uma vez que esta escolha é feita e a nossa decisão
alterada, a culpa desaparece, uma vez que ali estava suportada apenas pela nossa
crença nela. O que resta então é o Amor de Deus que sempre ali esteve. A terceira etapa,
portanto, não é uma etapa realmente. É o resultado natural e inevitável da aceitação (as
primeiras duas etapas) da correcção feita pela Voz Interior. Por isso o "Course in
Miracles" diz-nos que as primeiras duas etapas são da nossa responsabilidade e a
terceira não. Como um farol, a Voz Interior dirige o seu raio para as águas da mente
escurecidas pela culpa, como uma bóia de segurança e direcção para todos os que estão
perdidos no mar do ego.
Tal como num script dum filme, escolhemos os cenários, ou seja o lugar onde vamos
nascer, os nossos pais, o nosso país, a raça e todas as outras condições com que onde
iremos vivenciar esta experiência a que chamamos vida e onde também escolhemos o
papel de actor principal deste filme. Tudo parece obedecer a um plano perfeito para o
qual ainda não temos compreensão. As condições ideais para uma aprendizagem. A
114
aprendizagem do significado do perdão. Perdoar é não valorizar. É não dar realidade
aquilo que, por mais real que nos pareça, nunca aconteceu. É um sonho do qual ainda
não despertámos. Então, se é um sonho, quem poderemos então culpar dos nossos
problemas?
Imagine, por exemplo, que inadvertidamente entra numa sala para si desconhecida, e que
depara com um homem que, com uma serra na mão, está a serrar uma mulher numa
aparente tentativa de homicídio brutal. Imagine agora que a sua reacção perante tal cena
foi a de atirar-se violentamente ao presumível homicida tentando assim evitar o seu acto
demoníaco. Imagine também que, depois de agarrar o pescoço do seu opositor e de o
começar a apertar furiosamente, se dá conta das gargalhadas de um grupo de pessoas
que assistiam a um número de ilusionismo nessa mesma sala onde você terá entrado
sem se dar conta. Então agora o tal homem que empunhava a serra ainda lhe parece
culpado de tentativa de homicídio? Não nos esqueçamos que este é um mundo de
aparências. De ilusões.
Neste mundo de ilusões também culpamos os outros por aquilo que nos parece
acontecer.
Através do perdão, ou seja do reconhecimento da ilusão, chegaremos ao conhecimento
do Amor. Só eliminando a culpa em nós e libertando os outros dela poderemos atingir um
estado mental que nos fará conhecer uma realidade diferente ainda neste mundo. A
realidade de um mundo mais feliz.
O perdão é a chave para percepcionar essa nova realidade.
A nossa proximidade ao écran onde é projectado o nosso filme, não nos permite abranger
essa outra realidade onde poderíamos reconhecer facilmente as ilusões. Não
conseguimos ter consciência da globalidade. A nossa identificação com o actor principal é
tão grande que não nos permite questionar a realidade do mundo que percepcionamos
com os nossos sentidos. Não questionamos esta realidade porque estamos demasiado
ocupados em defendermo-nos dela. Corremos para os empregos, tratamos dos filhos,
tratamos dos pais doentes, fazemos contas ao dinheiro que às vezes não chega e
fazemos férias desgastantes. Haverá melhor maneira de evitarmos a reflexão e o
questionamento desta realidade?
A nossa atenção é desviada intencionalmente pelo nosso inconsciente para tarefas de
sobrevivência com o objectivo de que o nosso auto-conceito não seja posto em causa.
Inconscientemente tememos a nossa espiritualidade. Pensamos ser auto-criados.
Preferimos acreditar que somos meros esqueletos andantes num mundo desolador de
sofrimento e morte. Um mundo sem esperança. Um mundo limitado ao que os nossos
sentidos percepcionam.
Procuramos a imortalidade desde os tempos mais remotos. Somos capazes de matar por
ela. As experiências laboratoriais secretas em seres humanos atingem já limites que
desafiam a ética. E no entanto, a nossa amnésia colectiva faz-nos esquecer que já somos
aquilo que tanto procuramos, mas do qual ainda não temos consciência. Que já somos e
sempre fomos imortais ao sermos criados pela própria Imortalidade.
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Uma alternativa real
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Uma alternativa real
Todos nós pensamos encontrar no mundo exterior as soluções para os problemas que a
vida nos proporciona. Por exemplo, quando alguém tem dificuldades económicas procura
apoios junto dos bancos, dos familiares ou vende algo que possui.
No entanto, se essa necessidade não foi pontual, e se se trata da repetição duma situação
que já antes se tinha verificado, é possível que após o período de conforto proporcionado
pelo auxilio que se recebeu, o mesmo fenómeno venha a repetir-se. Pode não ser no
mesmo contexto mas, uma atenta observação mostrará que o conteúdo da situação é a
mesmo. Voltará a ser uma dificuldade financeira.
Podemos mudar de terra, de projecto e até de método mas o problema repetir-se-á
indefinidamente até que compreendamos que as soluções procuradas no exterior são
apenas uma forma de nunca mais resolver o problema, ou seja que servem apenas para
perpetuá-lo. E cada vez que nos surge o mesmo tipo de problema é como se alguém no
nosso interior nos dissesse: “escolhe de novo”.
O exemplo acima descrito serve como referência a qualquer situação a qual, embora
tenhamos feito tudo para a resolver, teima em surgir periodicamente na nossa vida.
Se persistirmos numa escolha feita no mundo exterior para resolver um problema aí
percepcionado, seremos certamente confrontados de novo com a rejeição, abandono,
carência e sofrimento. Só uma mudança na nossa forma de pensar poderá mudar o que
iremos percepcionar com os nossos sentidos. A solução do nosso problema crónico. Não
há excepções a esta regra.
A pergunta que deveremos fazer quando confrontados com qualquer aflição crónica, é:
“porque é que eu estou a fazer a isto a mim mesmo?” De seguida devemos procurar dentro
de nós a culpabilidade que, insuspeitamente, nos está a fazer da vida um inferno.
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O mundo exterior
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O mundo exterior
O mundo exterior é neutro. Tem o significado que queremos que ele tenha para nós.
Somos nós que o valorizamos. Um índio da Amazónia despreza o dinheiro, porque não
lhe vê utilidade a não ser para acender uma fogueira. O mesmo não se passa com o
comum dos cidadãos que faz da acumulação do dinheiro, o primeiro objectivo da sua
vida.
A interpretação do mundo que o sistema de pensamento do ego quer que utilizemos é
baseado na trindade: pecado, culpa e castigo. E é isso que projectamos no nosso sonho
colectivo. Acreditamos que o pecado é real e que ao sermos culpados merecemos
castigo. Depois projectamos os nossos castigos. Eles podem ser desde a doença física,
nossa ou de próximos, poderá ser a carência financeira, poderá ser o fracasso
profissional, a solidão, o assassinato, a violação, etc…
Como poderemos despertar (salvação) deste sonho tão dramático e redutor do Filho de
Deus? Não o podemos fazer sem ajuda. Todas as soluções que procuremos para
melhorar a nossa visão deste sonho, serão viciadas, dado que as soluções serão sempre
concebidas dentro do mesmo quadro de referências do ego.
É por isso que podemos assistir à proliferação de novas correntes de pensamento
habilmente disfarçadas pelo ego com falsas bases de santidade e que visam a
reprogramação da mente. No entanto, como é típico do ego, elas servem apenas para
reforçar a convicção na realidade deste mundo. Assim, essas reprogramações visam a
rápida obtenção de mais bens materiais ao invés de procurarem a razão porque que é
que eles não abundam na vida ilusória de cada um.
O investimento no sistema de pensamento do ego, no materialismo, diminui o
investimento na nossa visão espiritual, mas, também o contrário é verdadeiro. As religiões
ou sistemas de pensamento que advogam a punição do corpo ou a sua purificação
defendem ambas a sua existência e atribuem-lhe o poder da responsabilidade da
salvação. Não faz sentido considerar um instrumento de aprendizagem como sendo a
própria lição.
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A mudança de mentalidade
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A mudança de mentalidade
Para uma verdadeira mudança na nossa vida é obrigatória uma mudança de mentalidade.
Para tal é imprescindível não esquecer e compreender o segredo da salvação: “o de que
estamos a fazer isto a nós próprios. Não importa a forma de sofrimento ou dor, continua a
ser verdadeiro.
Seja quem for que tome o papel de inimigo continua a ser verdadeiro. Seja qual for aquilo
que parece ser a causa de qualquer dor e sofrimento que sintamos, continua a ser
verdadeiro. De certeza que não reagiríamos a estas figuras num sonho que soubéssemos
que estávamos a sonhar. Deixemo-las serem tão odiosas e viciosas quanto queiram, não
podem ter nenhum efeito sobre nós a não ser que nós não nos lembremos que se trata
apenas dum sonho”. E quando nos sentimos zangados, depressivos ou culpados ajuda
muito entender que é meramente uma ESCOLHA. O que temos de fazer, simplesmente, é
fazer OUTRA.
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A cura
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A cura
Nunca será demais repetir a questão essencial: uma vez que só a mente pode estar
doente, só a mente pode ser curada. Apenas a mente pode ter necessidade de cura. Esta
não parece ser a realidade da nossa experiência, dado que as manifestações deste
mundo parecem ser inquestionavelmente reais. Todo aquele que quer mudar deve
primeiro questionar a sua realidade. Ele poderá começar a abrir a sua mente sem uma
ajuda formal, mas mesmo nesse caso é porque uma mudança nas suas relações
interpessoais lhe permitiu fazê-lo.
Seja como for, a pessoa deverá ser conduzida a questionar a realidade das ilusões. No
fundo trata-se de remover os obstáculos para a verdade. Assemelha-se a um viagem num
dia de nevoeiro cerrado no qual começamos a apercebermo-nos de silhuetas conforme
ele se torna menos denso ou nos aproximamos do nosso objectivo. Ninguém no mundo
escapa ao medo mas qualquer um pode reconsiderar as suas causas e aprender a
valorizá-las correctamente.
Quem precisar de ajuda, independentemente da sua preocupação, é porque está a
atacar-se inconscientemente a si mesmo, através da culpa e consequentemente perdeu a
sua tranquilidade.
Estas tendências são muitas vezes consideradas auto-destrutivas e muitas vezes a
pessoa considera-as dessa forma. O que ele não compreende e precisa aprender é que
este “eu” , que pode atacar e ser atacado, é o seu auto-conceito. Ela alimenta-o e
defende-o e, muitas vezes até, está disposto a sacrificar a sua vida por ele (suicidio)).
Porque ele considera-o como sendo ele mesmo. É impossível manter este auto-conceito
tal como ele é sem sofrimento. Para a crença demente isso é possível. Mas, para a
mente correcta isso é claramente impossível, então procura-se a magia (o que não é da
verdade).
Por exemplo: cortamos o cabelo, mudamos o visual, mudamos de país, mudamos de
parceiro, etc. Em ilusões o impossível é facilmente conseguido mas só a custa de novas
ilusões. Ou seja não houve nenhuma mudança interior. Então a pessoa parece apresentar
uma nova energia, uma nova alegria, um dinamismo diferente. No entanto, mais cedo ou
mais tarde, noutro cenário, os mesmos problemas voltarão a repetir-se.
Sem um entendimento correcto da nossa realidade como seres perfeitos e da razão da
passagem por estas consciências corpóreas torna-se difícil a evolução em direcção a
casa.
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Epílogo
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Epílogo
Uma mudança de mentalidade acarreta inevitavelmente algum sofrimento e desconforto.
É uma ilusão própria do ego pensarmos que a nossa vida muda pelo simples facto de
mudarmos de cidade ou de parceiro e deixando intacto o nosso auto-conceito. É
necessário que ele mude. E por isso, quando começa uma verdadeira mudança no nosso
interior, geram-se conflitos e uma aparente solidão ao sentirmos que aquilo que tanto
valorizámos e que aparentemente nos dava satisfação, deixou de o fazer. Surge uma
espécie de raiva por já não apreciarmos o que antes tanto apreciávamos. Parece que
perdemos as nossas referências no mundo. O nosso auto-conceito leva-nos a fazer a
pergunta: Então, para quê viver?
Simultaneamente, uma paz brotando do mais profundo do nosso ser vem, gradualmente,
substituir essa ansiedade, permitindo-nos olhar para os valores que o mundo nos oferece
com mais distanciamento e desapego. Finalmente podemos entender qual o verdadeiro
propósito do mundo. Um lugar onde viemos para aprender que o nosso irmão é o nosso
salvador independentemente da forma que ele tenha. Que será escutando o seu pedido
de ajuda e respondendo-lhe que nós nos ajudaremos a nós próprios. Compreenderemos
finalmente que aquele que atacávamos afinal éramos nós próprios. Porque todos somos
um.
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Fim