Atas do ESADR 2013
Transcrição
Atas do ESADR 2013
de Conhecimento P11 Sistemas e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e Rural Atas Proceedings ISBN 978-989-8550-19-4 P11 · Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e Rural Coordenadores Timothy Koehnen (UTAD / CETRAD) [email protected] Alberto Baptista (UTAD / CETRAD) [email protected] A agricultura, o meio rural e os seus actores vivem num contexto de forte mudança, de ajustamento ao mercado, às necessidades dos consumidores e aos condicionalismos ambientais. Neste contexto de exigência, os agricultores necessitam de acesso ao conhecimento, informação, formação e educação, que facilitem e suportem as suas actividades. A questão essencial é saber, como, onde e quem pode apoiar os agricultores a obterem informação fiável e pertinente, conhecimento, formação e apoio técnico, para evoluírem e darem resposta, com sucesso, às expectativas externas e oportunidades de desenvolvimento. Conceitos como Agricultural Knowledge and Innovation Systems (AKIS), Farm Advisory Systems (FAS), usados em inúmeros documentos da UE, traduzem a importância dada ao tema. O objetivo do painel temático é compreender os atuais modelos e canais de produção de conhecimento e inovação, procurando saber quem são os atores, como funcionam, quem os suporta, e compreender impactos na agricultura e no meio rural. 3624 | ESADR 2013 DIAGNÓSTICO DE CURSOS DE CAPACITAÇÃO OFERTADOS POR UM ÓRGÃO DE EXTENSÃO RURAL BRASILEIRO: UMA ABORDAGEM DIALÓGICA LUÍS FERNANDO SOARES ZUIN Prof. Doutor do Departamento de Engenharia de Biossistemas da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, USP. [email protected] POLIANA BRUNO ZUIN Profa. Doutora da Faculdade de Tecnologia, Educação e Ciências. [email protected] RESUMO Ao longo das últimas décadas a extensão rural brasileira foi demarcada pelo desenvolvimento de práticas de ensino hierarquizadas e cunhadas no modelo tradicional de educação. O objetivo desta pesquisa foi diagnosticar e analisar os processos de capacitações rurais ofertados por uma organização de extensão rural governamental, que fomenta cursos para agricultores brasileiros. Para a realização da pesquisa foram entrevistados onze extensionistas rurais (pertencentes a mesma organização) e nove agricultores de uma mesma região atendidos por esse grupo de extensionistas. O método empregado para a coleta dos dados foi o estudo de caso (Yin, 2001). Esta pesquisa foi realizada com o suporte financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, processo no. 2011/12912-9. As questões para as entrevistas foram abertas, onde procurou-se verificar como eram as relações entre os extensionistas e agricultores; como era encaminhado o processo de ensino e aprendizado; e como se dava a comunicação entre esses sujeitos para a implementação de uma nova tecnologia. Os dados coletados a campo apontam que vários são os formatos de cursos de capacitação ofertados pelo órgão, sendo esses realizados em seus escritórios municipais e regionais, associações de agricultores e/ou nas propriedades rurais, com a duração de duas a oito horas. Os cursos são ministrados por pesquisadores convidados ou pelos próprios extensionistas. Tais resultados apontam que as relações entre os extensionistas e os agricultores poderiam ser mais próximas e dialógicas, necessitando de um maior conhecimento dos extensionistas sobre o mundo dos agricultores. Alguns extensionistas relataram que gostariam de receber formação em práticas de ensino para serem usadas em seus cursos. Tais resultados vão ao encontro das enunciações dos próprios extensionistas, evidenciando o quanto é necessário repensar as práticas educativas na extensão rural brasileira. Para isso é essencial que a metodologia de ensino seja adequada a cada contexto produtivo, por isso é relevante conhecer o mundo e o olhar dos agricultores. PALAVRAS-CHAVE: extensão rural; cursos de capacitação; dialogia. Atas Proceedings | 3625 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural INTRODUÇÃO Atualmente, nas agências brasileiras de extensão rural observa-se uma forte tendência no desenvolvimento de programas que visam a agroindustrialização da produção agropecuária nas propriedades rurais. Esses programas possuem o objetivo de aumentar a renda do produtor rural, por meio da transformação de suas matérias-primas, derivadas da sua produção. Para alguns produtos essa transformação leva em conta os saberes-fazeres historicamente constituídos pelos sujeitos, que compõem um território rural (Zuin, L.F.S. & Zuin, P.B., 2008). Entretanto, o sucesso da implementação dos programas de agroindustrialização na produção agropecuária depende de vários fatores, um deles se refere ao conjunto de conhecimentos que o produtor rural precisa dominar, para que o seu empreendimento possa sobreviver. A produção e comercialização desse tipo de produto envolve o domínio de conjuntos de conhecimentos de origens tanto técnicas quanto gerenciais (Zuin & Queiroz, 2006). Uma das formas que as agências brasileiras que prestam serviços de extensão rural, a fim de garantir o sucesso desses programas, seria por meio da oferta de cursos de formação continuada para os produtores rurais, seus familiares e funcionários. Um dos caminhos pedagógicos que pode ajudar o desenvolvimento e aplicação desses cursos de formação continuada é o emprego do referencial teórico dialógico, tanto Freiriano (Fernandes & Terra, 1994) como Bakhtiniano (Bakhtin, 2010). O objetivo desta pesquisa foi diagnosticar e analisar os processos de capacitações rurais ofertados por uma organização de extensão rural governamental brasileira, a qual fomenta cursos para agricultores brasileiros. METODOLOGIA DA PESQUISA Para a realização desta pesquisa foi empregado como método o estudo de caso (Yin, 2001), onde foram coletados dados e informações junto aos agricultores e extensionistas. No total foram entrevistados vinte sujeitos, onze extensionistas pertencentes à organização e nove agricultores. Esse grupo de agricultores tiveram contato frequente com os extensionistas por meio da oferta de cursos de capacitação. Esse grupo de extensionistas encontram-se alocados tanto na sede da organização, como 3626 | ESADR 2013 2 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 também em escritórios do órgão de algumas cidades, ao qual prestam serviços aos produtores rurais. Cada entrevista teve duração entre 90 e 120 minutos. As entrevistas com os extensionistas foram realizadas na sede da organização, e nos seus escritórios em alguns municípios. Quanto aos agricultores as entrevistas foram feitas em suas propriedades rurais. As questões que nortearam as entrevistas foram abertas, considerando as temáticas condizentes aos objetivos propostos para a pesquisa, em que se procurou verificar como era a relação entre os extensionistas e agricultores; como se davam os encaminhamentos relativos aos processos de ensino e aprendizado; e, por fim, como se realizava a comunicação entre esses sujeitos para a implementação de uma nova tecnologia, uma nova forma de gerenciar o empreendimento, bem como os desenvolvimentos de novos produtos. Para uma melhor contextualização, nas entrevistas junto aos agricultores foram observadas uma relativa diversidade de produtos e serviços oriundos de suas propriedades rurais. De produtos verificou-se que os agricultores cultivam predominantemente frutas, como: figo, caqui, pêssego, morango e uva. Quanto aos serviços foi observado a introdução do turismo rural, com a oferta de refeições típicas da região nas propriedades aos turistas, durante os finais de semana e feriados. Nas entrevistas observou-se que um grupo de agricultores começaram a beneficiar a uva em suas propriedades, fabricando e disponibilizando vinho e suco da fruta para o mercado consumidor local. RESULTADOS Os extensionistas e agricultores se constituem e são constituídos pelo outro nos seus territórios rurais, ou seja, pelos caminhos interacionais os quais são historicamente percorridos na relação entre esses sujeitos, como discorre Bakhtin (2003). Neste momento buscar-se-á descrever as interações historicamente constituídas entre os sujeitos que trabalham (extensionistas) e as pessoas (produtores rurais) que recebem os serviços da Organização de Extensão Rural Brasileira pesquisada. Também será exposto os formatos e encaminhamentos dos cursos ofertados pelos extensionistas da organização para com os agricultores de sua região. 3 Atas Proceedings | 3627 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural OS SUJEITOS ENTREVISTADOS E ALGUNS DOS SEUS CONTEXTOS SOCIOECONÔMICOS Tanto nas entrevistas com os extensionistas rurais como com os agricultores, buscou-se coletar os seus sentidos historicamente constituídos em seus territórios rurais, relativos aos contextos socioeconômicos, métodos de ensino-aprendizado e as suas interações com a organização de extensão rural pesquisada. Nos relatos dos onze extensionistas foi observado que todos esses sujeitos possuem o terceiro grau completo de nível de escolaridade, sendo em sua maioria engenheiros agrônomos, apenas um dos entrevistados apresentou graduação em zootecnia. Um dos extensionistas entrevistados buscou um maior nível de especialização, cursando e obtendo o título de mestre em uma universidade brasileira. Quanto ao tempo de trabalho na organização a maioria dos extensionistas (nove entrevistados) trabalha nela há mais de dez anos, apenas dois sujeitos são funcionários deste órgão nos últimos cinco anos. Nas entrevistas realizadas junto aos agricultores observamos que quatro deles estudaram por onze anos; três sujeitos por oito anos; e duas pessoas até quatro anos. Um dos agricultores entrevistados, com 54 anos, por exemplo, estudou somente por três anos. Na época necessitava ajudar os pais e por essa razão não podia frequentar a escola. Ele ainda relatou que havia uma professora no bairro rural que o ensinava a ler e escrever fora do horário das aulas, por causa do trabalho na propriedade rural. Por tal fato, esse sujeito considera que a inteligência é subjetiva, adquirida por habilidades comunicativas, cooperativas e práticas. Quanto ao aprendizado, todos os sujeitos são educadores e educandos, tendo o que aprender e também o que ensinar, sejam os conhecimentos baseados em um ensinamento escolar, ou mesmo aquele passado de geração para geração (Freire, 2006). Também é interessante salientar que em algumas localidades os filhos desses agricultores já possuem curso superior (em média quinze anos de estudo) ou mesmo o ensino técnico (onze anos de estudo). Como é o caso de um jovem agricultor entrevistado, de 22 anos, solteiro, que possui ensino médio e técnico em metalurgia. Esse sujeito, após a sua formação, tentou a vida na cidade, onde permaneceu durante dois anos trabalhando em uma indústria. Retornou ao campo, por volta de quatro anos a fim de “trabalhar com o pai e não para os outros”, como relatou. O “sítio de sua 3628 | ESADR 2013 4 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 família”, tal como denomina, possui 96.000 m2, sendo tocado pelo pai, mãe e ele. Em sua propriedade são cultivados figo, caqui, pêssego e uva. Nota-se em um dos relatos de um dos agricultores, com idade de 52 anos, que ele não gostaria que os filhos retornassem à propriedade rural para trabalhar diretamente na lavoura. Por outro lado esse agricultor aceitaria que o filho gerenciasse o negócio da família. Esse agricultor estudou por oito anos. Os seus dois filhos são graduados em cursos de computação e gestão de negócios. O produtor rural relatou que os seus filhos não possuem interesse em trabalhar na propriedade, embora ele acredite que no futuro eles acabarão administrando-a, até porque ele está utilizando nos seus processos produtivos, de forma significativa, conjuntos de tecnologias, citando o exemplo das colheitadeiras de frutas mecanizadas a serem adquiridas em um futuro próximo. Indo ao encontro deste relato, foi constatado durante os diálogos com o jovem agricultor de 22 anos entrevistado, que este retornou à propriedade para trabalhar junto com os seus pais, a partir da visualização de que conseguiria uma renda maior na própria propriedade, do que trabalhando para terceiros. O mesmo ocorreu com outros dois irmãos agricultores. Ambos são jovens com idade entre 24 a 30 anos e completaram onze anos de estudo. Após trabalharem no comércio de sua cidade como vendedores, passaram a se interessar pela propriedade onde foram criados e cresceram. Decidiram investir na produção de vinho fino e de suco de uva, e vem realizando cursos de capacitação frequentemente a fim de melhorar a qualidade dos seus produtos. No conjunto das entrevistas também foi observado que os agricultores, pelo fato de possuírem em média um grau de escolaridade maior, do que em grande parte das regiões brasileiras, visualizam a importância do estudo como caminho para o aumento da renda familiar. A importância e o incentivo ao ato do estudo ajuda aos pais e filhos tecerem uma relação dialógica, em que esses participam ativamente do processo de tomada de decisão na propriedade rural (Zuin, L.F.S. & Zuin, P.B., 2013). Essa postura faz com que muitos dos produtores procurem informações a respeito da oferta de novos produtos, participando de cursos ofertados pela organização de extensão rural, principalmente os relativos à gestão do seu empreendimento. Em um dos relatos dos produtores foi observado que durante os cursos de formação o contato frequente entre os agricultores resultaram parcerias, onde foi criada uma cooperativa de produtores de frutas em um dos territórios rurais estudados. 5 Atas Proceedings | 3629 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural A primeira constatação nos enunciados dos extensionistas, foi que ao longo das últimas duas décadas ocorreram alterações significativas nos objetivos e modos de conduzir os trabalhos de extensão rural, prestados pela organização nos territórios no qual atuam. Neste sentido, a organização passou a ser um agente que planeja, oferece e capacita os agricultores em projetos de desenvolvimento rural, de amplo escopo produtivo. Esse cenário proporcionou aos seus extensionistas pouco tempo para a oferta de assistência técnica direta no campo para os agricultores. Alguns extensionistas entrevistados, principalmente os mais novos na instituição, acham pertinente essa nova abordagem, pois acreditam que as atuais empresas que vendem os insumos agrícolas realizam um bom trabalho de pós-venda. Esse conjunto de extensionistas concordam em ser um dos agentes que promovem políticas públicas voltadas aos processos de desenvolvimento tecnológico nos territórios rurais. Entretanto, alguns extensionistas mais antigos de casa sentem falta da proposta anterior da organização, isto é, de estarem juntos e com os agricultores, acompanhando-os em suas propriedades rurais, prestando assessoria e consultoria técnica. Para a organização a atribuição principal do seu extensionista é ser um mediador entre as várias fontes (organizações de pesquisa governamentais e privadas) de conhecimento (técnico e gerencial) para com os agricultores, promovendo para isso encontros entre especialistas e agricultores. Desta forma, os extensionistas buscam mediar a oferta de cursos de organizações governamentais e privadas, a fim de fornecer informações técnicas e de gerenciamento para os produtores rurais. Foi observando nos relatos dos agricultores, que os técnicos da organização são frequentemente procurados e inqueridos a relatarem uma opinião sobre um novo produto ou processo, ofertados a eles pelas empresas de insumos. Neste contexto de tomada de decisão, o papel dos extensionistas da organização é o de ser uma das fontes de consulta sobre a eficácia de novas tecnologias ofertadas pelas empresas de insumos agropecuários (privadas ou governamentais). Nesta atividade o produtor rural busca no extensionista a validação das informações contidas nas propagandas dessas empresas. Foi constatado durante as entrevistas que os agricultores procuram em vários sujeitos conjuntos de informações a fim de tomarem a decisão de adquirirem ou não uma nova tecnologia, principalmente o conhecimento sobre os insumos que serão usados em suas rotinas produtivas. Os sujeitos vão em busca: 3630 | ESADR 2013 6 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 ¥ de agricultores tanto de fora como de sua região, que já utilizaram os insumos questionados; ¥ da opinião de vendedores e/ou agrônomos de grandes empresas de insumos agropecuários de quem confiam e possuem uma relação de longa data; ¥ de buscadores de informações na internet (ex. Google), bem como programas de televisão e rádio; ¥ de extensionistas da organização estudada neste artigo a fim de sanarem suas dúvidas e colherem informações; ¥ de opiniões de profissionais pertencentes a outros órgãos de extensão rural, a fim de se informar com um técnico (Engenheiro Agrônomo), cuja relação de confiança já é existente; ¥ de informações em cursos e palestras promovidos por organizações (privadas e governamentais) de pesquisa e divulgação de novas tecnologias agropecuárias; ¥ de consulta a pessoas próximas como vizinhos e familiares que possuem propriedades rurais em sua região; e ¥ de informações de vendedores de confiança nas Casas Comerciais de Vendas de Insumos de sua região. De acordo com os relatos dos agricultores, extensionistas e de alguns autores (Zuin, L.F.S & Zuin, P.B., 2013), esses sujeitos possuem essa postura inquisitiva quanto a oferta de novas tecnologias pois, ao longo de suas vidas, adquiriram novos produtos e processos, os quais historicamente determinaram prejuízos significativos ao seu empreendimento. Algumas vezes o prejuízo foi tão intenso que alguns agricultores pensaram em mudar de profissão, desejaram vender a sua propriedade e mudar para a cidade. Alguns extensionistas brasileiros de formação difusionista constantemente relatam, que de forma geral, o agricultor brasileiro de pequeno e médio porte é muito tradicional nos seus modos produtivos, aceitando muito pouco a mudança. E criticam ativamente essa postura tradicional e pouco aberta a adoção vertical de novas tecnologias. Um dos agricultores entrevistados relatou que não podem se dar ao luxo de errarem nos seus processos produtivos, pois uma decisão errônea irá comprometer 7 Atas Proceedings | 3631 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural diretamente a sobrevivência de sua família. Muito da postura tradicional dos agricultores possui origem neste fato, relatado nas entrevistas. No que se refere ao volume de oferta de novas tecnologias aos agricultores. Um dos extensionistas entrevistados relatou que atualmente aumentou muito a oferta de pacotes tecnológicos, disponibilizados pelas empresas de insumos aos agricultores de sua região. Esse extensionista acredita que parte dessas novas tecnologias não se encontram maduras o suficiente para serem empregadas nas culturas e propriedades de sua região, aumentando ainda mais a desconfiança dos agricultores para com essa oferta de novas tecnologias pelas empresas de insumos privadas e governamentais. Como podem ser observados nos relatos dos agricultores. O processo de tomada de decisão de comprar ou não um novo produto é preponderantemente dialógico. O agricultor vai nos relatos das várias fontes a fim de constituir um novo sentido para uma nova tecnologia e quanto mais dialógico for esse processo, mais seguro o agricultor irá se sentir em adquirir ou não uma nova tecnologia. OS FORMATOS E CAMINHOS PEDAGÓGICOS DOS CURSOS MINISTRADOS E FOMENTADOS PELA ORGANIZAÇÃO PESQUISADA Diversos fatores atuarão neste meio de dialogicidade nos cursos de capacitação, como aqueles que permeiam cada agricultor, como os seus: desejos, necessidades, suas dúvidas pessoais, entre outros. Dúvidas as quais muitas vezes não sentem liberdade e intimidade suficientes para expô-las e saná-las com os extensionistas. Na comunicação dialógica esses fatores se mostram menos acentuados, pois lida-se com o sujeito diretamente, frente a frente no mundo concreto, gerando novos sentidos em que os sujeitos entendam os seus propósitos nos sistemas produtivos. Quando indagamos aos agricultores e extensionistas entrevistados sobre a abordagem pedagógica empregada nos assuntos trabalhados nos cursos, verifica-se que uma ampla variedade de conteúdos, que vão desde assuntos relativos à gestão do empreendimento, tais como: técnicas produtivas, até como solicitar corretamente o crédito agrícola junto às organizações financeiras privadas e governamentais, entre outros. 3632 | ESADR 2013 8 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Como pôde ser observado, alguns cursos possuem um formato mais monológico, enquanto que outros tendem a ser dialógicos. De acordo com o relato dos extensionistas, constatou-se a presença de quatro formatos relativos aos processos de ensino-aprendizado realizados pela organização, sendo: 1. Encontros - com duração de duas a três horas, ocorre por meio de reuniões do extensionista com os agricultores de sua região nos escritórios municipais e regionais da organização; 2. Palestras - com a mesma carga horária, de duas a três horas, extensionistas, assim como outros sujeitos (pesquisadores e especialistas da própria organização ou de outra) realizam palestras sobre um tema específico de interesse dos agricultores; 3. Dias de campo – se configura por um período geralmente de oito horas, em um dia inteiro, em que a organização de extensão expõe novas tecnologias e processos em propriedades rurais modelos, as quais já a adotaram e fazem parte de suas rotinas produtivas com sucesso; e 4. Curso - com duração mais longa, de oito a dezesseis horas, se destina apenas para os extensionistas rurais da organização capacitações que visam atualizá-los no planejamento e desenvolvimento dos projetos de agroindustrialização que estão sendo implementados nos seus territórios rurais. Foi observado em alguns dos cursos e encontros fomentados pela organização, que a comunicação percorre um caminho baseado nos modelos de comunicação do difusionismo-tecnológico, cujo o conteúdo da comunicação percorre um caminho linear que vai de um sujeito (Fonte) para outro indivíduo (Receptor), cabendo a esse decodificar e interpretar o conteúdo das palavras que foram a ele encaminhadas em uma ação (Van Den Ban & Hawkins, 1996). Na proposta da comunicação dialógica, descrita por Bakhtin (2003), a produção de sentidos entre os sujeitos durante a comunicação, ocorre de forma horizontal e quase que simultânea. Para o autor no momento em que o locutor expressa uma palavra, imediatamente o interlocutor começa a realizar um ato que é denominado de memória de futuro. O interlocutor neste instante busca em suas vivências e experiências sentidos historicamente constituídos relacionados a palavra dita. Esse conjunto de sentidos fazem parte de um auditório social, sendo composto por 9 Atas Proceedings | 3633 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural infindáveis vozes, as quais o sujeito teve contato durante a suas vivências. O auditório social apresenta também um encadeamento desses sujeitos como uma infinidade de outros sujeitos e assim sucessivamente ao longo do tempo em suas interações. Muitas vezes durante o processo de produção de sentidos, denominado de significação, tanto o locutor como o interlocutor não possuem controle de como será esse processo, e em qual momento ele irá ocorrer. Na comunicação dialógica se sobressai o encontro e interação entre os sentidos, que os interlocutores disponibilizam um para o outro. Por outro lado, a comunicação difusionista se apresenta como uma imposição de conceitos do sujeito que é a fonte para o indivíduo receptor, caracterizando um contexto onde comunicação é monológica. Outro ponto que diferencia a comunicação dialógica da difusionista, empregadas nos cursos de capacitações nos territoriais rurais brasileiro, seria a intensidade que cada um dá para o contexto em que se encontram os sujeitos durante o diálogo. No arcabouço teórico difusionista o contexto socioeconômico e ambiental é pouco considerado na formulação dos cursos de capacitação, pois as informações e caminhos pedagógicos contidos nos cursos, onde são ofertados os pacotes tecnológicos, visam justamente a sua adoção desta tecnologia de forma completa pelo agricultor, sendo esse um dos principais indicadores de desempenho de seu sucesso (Zuin, L.F.S. & Zuin, P.B., 2013). A comunicação difusionista a qual visa a persuasão dos sujeitos a adotarem uma nova tecnologia (Roggers, 1983) é por si só monológica, unidirecional e hierárquica. Por outro lado, a comunicação dialógica considera intensamente o contexto em que se encontra os interlocutores, parte essencial do entendimento do processo de significação. A produção de sentidos na comunicação dialógica ocorre por meio das interações contidas dentro dos contextos, os quais os interlocutores se encontram (Bakhtin, 2003). A metodologia de comunicação deve ser adequada a cada contexto, por isso é determinante que o extensionista conheça e interaja com os agricultores. Mas como fazer isso? Por meio de um diagnóstico (Freire, 2006). Com o intuito de analisar os conteúdos sabidos do público com o qual se está trabalhando, três extensionistas entrevistados relataram, que no início de alguns cursos, é realizada uma atividade de diagnóstico com os agricultores, em que se busca saber o quanto do assunto no qual irá ser tratado no curso os sujeitos ali presentes dominam. Este método foi ofertado pela 3634 | ESADR 2013 10 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 organização aos seus extensionistas em cursos. Essa metodologia é um exercício cujo extensionista da organização pergunta para os agricultores, através de um painel, o que eles sabem do assunto que irá ser tratado. Conforme os sujeitos vão respondendo as perguntas, é escrito as palavras-chave contidas nas respostas, que depois são agrupadas e colocadas em um painel, chamado “nuvem de ideias”. Quando se esgotam as respostas, é tirada uma fotografia do painel e caso seja necessário se faz um novo questionamento aos agricultores, reiniciando o processo. As informações originárias desta atividade de diagnóstico são usadas tanto no decorrer do curso como também em sugestões para outros encontros, que possam porventura serem ofertados pelo órgão. Esse tipo de diagnóstico visa apenas conhecer conceitos e significados mais amplos de um determinado assunto. Todavia, não é realizado um diagnóstico visando conhecer os sentidos sobre o assunto que possuem cada um dos sujeitos que compõem àquele grupo. Como observa Libâneo (1987) as identificações dos sentidos e conteúdos a serem trabalhados são importantes para o planejamento e condução dos trabalhos do extensionista-educador. Entretanto, o conhecimento profundo da realidade (contexto) desses sujeitos é o que permitirá uma prática de ensino-aprendizado significativa (Freire, 2006). Pois somente pela internalização e aproximação dos sentidos das palavras proferidas pelos sujeitos nos cursos é que se dará o entendimento do conteúdo trabalhado nesses encontros (Zuin, L.F.S. & Zuin, P.B., 2013). Além disso, a condução da prática dialógica possibilita o estabelecimento de uma relação de confiança entre os sujeitos, essencial ao processo de aprendizado (Clot, 2003). Quanto ao conteúdo e formato das lâminas, os extensionistas relataram que elas geralmente apresentam pouco texto, muitas fotos e vídeos. Os agricultores relataram que não ficam a vontade com lâminas que apresentam o conteúdo do assunto em forma de gráficos. Os extensionistas observaram também que os agricultores gostam que os capacitadores exponham pequenos filmes, acham o formato interessante e visualmente melhor para o entendimento da situação proposta. O emprego de fotos também foi destacado pelos entrevistados como um bom recurso didático para os cursos, ou seja, quando a situação é pontual, o emprego deste material, se apresenta mais relevante, como afirmou um dos extensionistas “os agricultores são bem São Tomé, ver para crer! Nesses encontros busca-se mostrar uma nova tecnologia e mostrar como se aplica essa tecnologia”. 11 Atas Proceedings | 3635 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Indo ao encontro da preferência dos agricultores de ver a tecnologia sendo ofertada na prática nas rotinas produtivas, os extensionistas entrevistados acreditam que o curso no formato de dia de campo é mais impactante para os agricultores. Quando comparados com palestras expositivas. Um dos extensionistas entrevistados aponta um dos motivos dos cursos no formato de dias de campo serem bem quistos para os agricultores “eles podem ver na prática como os aparelhos ou produtos, como defensivos, funcionam e qual tecnologia poderão ter em suas propriedades”. O entrevistado cita também que esses saberes técnicos adquiridos na experiência desses indivíduos em suas rotinas produtivas se revelam em uma desconfiança do grupo, quando comparada essa experiência historicamente constituída com relação à inovação técnica, advinda da oferta de grande número de novos pacotes tecnológicos pelas empresas de insumos. Por este motivo a utilização de métodos demonstrativos e visuais, são uma escolha interessante para este tipo de abordagem de curso, diminuindo a desconfiança dos agricultores. Para um dos extensionistas entrevistados, o formato do dia de campo facilita o entendimento e a troca de informação nos diálogos informais entre todos os sujeitos que participam dele. Para alguns dos extensionistas entrevistados, o formato desde tipo de capacitação obedece frequentemente aos seguintes encaminhamentos metodológicos: ¥ frequentemente, é escolhida uma propriedade rural pertencente ao território rural da maioria dos sujeitos que compõem o público do curso; ¥ a tecnologia que vai ser trabalhada no curso, referente ao um novo processo ou produto, deve já fazer parte das rotinas produtivas da propriedade rural escolhida, pois se comprovou no local que foi interessante adquiri-la por causa de seus benefícios, como aumento de produtividade, diminuição do custos, entre outros aspetos; ¥ quando há mais uma tecnologia a ser exposta aos público são montadas estações, onde cada inovação é apresentada e demonstrada ao público; ¥ em alguns dias de campo os agricultores são convidados a manusear as tecnologias que são apresentadas nas estações; ¥ entre as estações há tempo para que os agricultores dialoguem, neste momento iniciam o processo de significação, gerando os seus sentidos sobre a nova proposta produtiva ofertada; 3636 | ESADR 2013 12 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 ¥ ao final das estações e demais demonstrações é realizado uma confraternização, por meio da oferta de um almoço ou jantar, sendo este momento importante para que os sujeitos dialoguem criticamente os seus sentidos que foram gerados durante o curso; e ¥ geralmente nesse formato de curso não ocorre uma aula teórica sobre o assunto apenas se observa a parte prática da tecnologia. Porém, esse formato de curso é realizado em menor número, quando comparados com os cursos nos moldes de palestras. Um dos motivos seria a dificuldade dos agricultores em abandonarem com frequência as rotinas produtivas nas suas propriedades durante todo um dia. Um dos extensionistas entrevistados da organização relatou uma forma inovadora de dia de campo promovido por uma empresa de insumos agropecuários. Inovadora não na metodologia empregada, mas no material didático distribuído entre os agricultores. Neste dia de campo, quando esses sujeitos chegavam no local da realização deste processo de ensino, eram recepcionados por um grupo de monitores e monitoras, em que era dado para cada agricultor um aparelho do tipo tablete, com um fone de ouvidos. No momento em que os agricultores chegavam nas estações, o tablete era ativado e imediatamente aparecia em sua tela um palestrante (geralmente um pesquisador renomado da área), relatando as vantagens de se utilizar a determinada tecnologia apresentada naquela estação. O extensionista observou que neste formato de dia de campo os agricultores quase não se falavam, indo rapidamente de uma estação a outra. Esse sujeito ainda observou ao chegar no final do circuito das estações, que o agricultor encontrava um grupo de vendedores da empresa e somente depois do contato com esse grupo, o agricultor era direcionado para o almoço de confraternização. Quando o extensionista foi questionado a respeito do que sentiu quando colocou os fones de ouvido e iniciaram as apresentações no aparelho, relatou: “eu me senti muito sozinho”. Frequentemente, para que o processo de transferência difusionista de tecnologia, nos territórios rurais, ocorra da forma mais eficiente possível para os capacitadores, pressupõe-se o emprego de modelos de ensino monológicos. Como pode ser observado no relato deste dia campo, a empresa sobrepõe o seu pensamento ao dos agricultores, abafando as demais vozes (do seu auditório social e outros agricultores) que poderiam dialogar. Este tipo de comunicação monológica impede a propagação do 13 Atas Proceedings | 3637 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural conhecimento historicamente constituído, entre os sujeitos pertencentes aos vários territórios rurais, dificultando que ocorra a troca de sentidos proposta pela abordagem dialógica. No entanto, atualmente o método de ensino monológico ainda é o mais frequentemente empregado em boa parte dos cursos de capacitação nos territórios rurais brasileiros, pelas empresas de insumos, cujo extensionista na figura de um educador, transmite aos demais uma ideia finalizada. Nessa abordagem os agricultores são tratados como se fossem recipientes vazios, pois desconsidera-se suas visões de mundo e vivências, uma vez que se impõe conhecimentos prontos a esses indivíduos sem que os mesmos possam refletir e apropriar-se do que lhes é passado (Freire, 2006). Para que se possa empregar a metodologia dialógica de ensino-aprendizagem, voltadas ao desenvolvimento conjunto de conhecimento nos territórios rurais, ambos os sujeitos durante um diálogo devem estar abertos à percepção e entendimento da realidade do outro, tanto quanto ao do mundo que os cerca. Esta metodologia de ensinoaprendizado facilita a abordagem dos diferentes pontos de vista, pois ela leva em consideração as diferenças culturais e níveis escolares, por mais distintas que suas realidades historicamente constituídas se apresentem. Por outro lado, podem ocorrer em algumas situações interpretações distorcidas do conteúdo dos cursos, quando este diálogo começa a apresentar sentidos distantes e conceitos diferentes da enunciação dos interlocutores (Bakhtin, 2003; Freire, 2006). Diante de tal fato, quanto maior for o conhecimento da realidade contextualizada do educando, isto é, de sua leitura de mundo, maior será a aproximação de sentidos e, portanto, a compreensão entre os sujeitos. Entretanto, estar aberto ao conteúdo dos cursos não significa que não haverá durante os processos de ensino-aprendizagem o embate de sentidos entre os interlocutores. O ato correspondente ao embate de sentidos é que irá determinar o sucesso ou insucesso do processo de conscientização entre os sujeitos sobre um determinado tema (Bakhtin, 2010). Sem o embate de sentidos corre-se o sério risco que os sujeitos sintam-se resignados, a aceitar de forma monológica, um determinado conceito presente em um sentido. A resignação é uma atitude temporal nos sujeitos, enquanto que a conscientização apresenta uma postura que tende a ser atemporal nos indivíduos. 3638 | ESADR 2013 14 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Como relatado, um momento importante do curso que os extensionistas entrevistados relataram são os intervalos para tomar um café (ocorrendo na metade do tempo das palestras), e também durante o almoço ou jantar de confraternização no final do curso. Eles observaram que nestes momentos acontece uma interação entre os participantes e capacitador, e entre os próprios agricultores, ocasião em que ocorre a significação de novos sentidos a respeito de suas rotinas de trabalho, bem como quais os conteúdos dos cursos poderiam ser empregadas nos seus processos produtivos. Os extensionistas entrevistados relataram que quando eles trazem palestrantes, como por exemplo pesquisadores que os agricultores não conhecem, durante a exposição dos conteúdos há uma retração dos ouvintes. Tal como pode ser observado pelo relato de um dos extensionistas entrevistados: “os agricultores ficam envergonhados em falar algo para pessoas de fora, que não conhecem, nos cursos”. Sendo assim, este momento prova a dificuldade dos agricultores em dividir suas vivências de um modo mais sociável através do diálogo, durante as palestras. Essa postura pouco a vontade dos agricultores em dialogar diretamente com o palestrante, durante a realização do curso, e demais sujeitos presentes, também foi observada nas entrevistas que foram realizadas junto aos agricultores. Conforme relato desse grupo, eles preferem tirar dúvidas com os palestrantes durante a hora do intervalo, ou durante a refeição, que geralmente é servida depois desses encontros, mais frequentemente em forma de churrascos. Uma forma de contornar este problema, de inibição dos agricultores, usada pelos extensionistas da organização, foi o emprego de um novo formato de curso que foi realizado no escritório regional do órgão. O curso durou dois dias, em um total de 16 horas, onde foram convidados vários extensionistas da organização e pesquisadores de diversos assuntos relacionados a novas tecnologias para o empreendimento rural. As palestras eram de curta duração, 20 a 30 minutos, cujo palestrante expunha sucintamente um conteúdo. Depois de terminadas a exposição do conteúdo, os agricultores interessados eram encorajados a conversar com os palestrantes em outra sala, ao lado de onde eram realizadas as palestras. Os extensionistas que promoveram esse curso observaram que os agricultores acharam muito interessante este novo formato. O produtores rurais relataram que o encontro ficou mais dinâmico e menos monótono. Os dois extensionistas observaram ainda que os agricultores não gostam de ficar muito tempo sentados e assistindo aos cursos sem que possam manifestar as suas 15 Atas Proceedings | 3639 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural opiniões. Esse formato de curso apresenta-se mais dialógico, pois permite que os agricultores entrem em contato direto, e de forma voluntária, com os palestrantes. Neste momento é importante o olhar dos extensionistas para as reações de seu público. Não somente sabendo administrar o diálogo, mas também percebendo e analisando as informações que não são ditas necessariamente em palavras. Analisar a postura e a linguagem gestual dos agricultores, assim como o próprio silêncio é importante nessa relação pedagógica, pois esses sinais fazem com que o educador, na figura do extensionista, vá mediando o processo de aprendizagem e modificando a sua prática sempre que houver necessidade (Vygotsky, 2001; Bakhtin, 2010). A respeito das palavras empregadas pelos palestrantes em seus cursos, os agricultores entrevistados relataram que é freqüente que palestrantes venham de universidades ou órgãos de pesquisa governamentais e, por essa razão, muitas palavras enunciadas, seja na linguagem oral ou escrita, não fazem sentido a eles. Para exemplificar, um dos agricultores relatou que gostaria de ver o palestrante “falar do jeito caipira”, um dialeto do território, para que eles possam entender os conteúdos ofertados a eles nesses encontros. De acordo com Bakhtin (2010), um enunciado é composto por palavras (possuidoras de sentidos), contexto (determinado pelas interações entre sujeitos no mundo concreto) e uma tomada de valor (um posicionamento responsivo perante o outro) frente a este contexto. Quando confrontamos os dizeres do agricultor com os elementos bakhtinianos que compõem os enunciados, observamos que muitos dos palestrantes, não se preocupam de como o público está gerando novos sentidos a partir da exposição dos seus conteúdos. Uma vez que de forma premeditada ou não o palestrante emprega palavras em que os sentidos não são conhecidos pelo público. Pois esses sentidos são também gerados pelo contexto ao qual estão inseridos, provocando no público um juízo de valor sobre o conteúdo das palestras. Para se ter um curso que apresente um processo de ensino-aprendizado significativo para os agricultores, o palestrante deve buscar compreender e adaptar o conteúdo do seu curso aos sentidos, contextos e juízos de valor de seu público, a fim de que se possa fazer entender. Por fim, alguns dos extensionistas entrevistados relataram dificuldades em alguns momentos em suas práticas junto aos agricultores, devido à ausência de uma formação pedagógica mais sólida, necessária para atuar junto aos produtores rurais. Tal 3640 | ESADR 2013 16 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 como salientou um dos extensionistas entrevistados, em que atua junto a organização há dezenove anos: “quando cheguei não tinha experiência para lidar com os trabalhos que envolvem a extensão rural. Eu não aprendi isso durante o meu curso de graduação”. Interessante salientar que a ampla maioria dos cursos de Graduações, Mestrados e Doutorados das universidade brasileiras, destinados à formação de profissionais das áreas técnicas, não abarcam com a ênfase necessária os conteúdos e disciplinas, que possam dar suporte às práticas de ensino e, consequentemente, ao processo de aprendizagem nos territórios rurais. CONCLUSÕES As informações coletadas a campo demonstram que o produtor rural ainda mostra-se preocupado com outras questões, além daquelas relacionadas as técnicas e rotinas produtivas do seu cultivo. A sua preocupação é relativa ao gerenciamento do seu empreendimento, como a inserção de seus produtos no mercado e o desenvolvimento de novas formas de negócios (turismo rural), visando garantir a sua sobrevivência e de sua família. Outro ponto de destaque nas enunciações dos agricultores é o fato de que quase todos neste conjunto de sujeitos, apresentaram historicamente algum insucesso com a incorporação de novas tecnologias, que nem sempre deram certo em sua propriedade rural. Visualiza-se nestes casos o uso frequente da comunicação monológica, empregada por alguns extensionistas rurais pertencentes as organizações de vendas de insumos agropecuários, o que reflete no atual comportamento dos agricultores. Muitos dos agricultores são desconfiados e sabem que o caminho de garantir um maior sucesso na aquisição de uma nova tecnologia é de se informar em várias fontes, a fim de diminuir as incertezas neste processo de tomada de decisão. A ausência de um processo dialógico mais profundo e significativo entre os extensionistas e agricultores ocorre pela falta de formação voltada a uma prática horizontal de ensino-aprendizado. Uma vez que grande parte dos extensionistas brasileiros receberam uma formação técnica pautada no difusionismo-tecnicista nos seus cursos de graduação. Quanto às metodologias dos cursos ofertados pela organização pesquisada aos agricultores, foi observado uma variedade de formatos e métodos empregados pelos 17 Atas Proceedings | 3641 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural seus extensionistas rurais. Alguns formatos como palestras expositivas apresentam um viés mais monológico e difusionista. Embora, quando essas palestras são mescladas com encontros entre palestrante e produtores rurais, esses cursos apresentam uma abordagem dialógica e horizontal, como no caso dos relatos das palestras de curta duração (20 a 30 min) realizadas no escritório regional da organização. Entretanto, o formato de curso preferido por alguns agricultores entrevistados seria aquele que ocorrem atividades práticas, como no caso os dia de campo. Nos relatos de alguns agricultores foi observado que o conteúdo e encaminhamentos metodológicos dos cursos mais significativos que haviam sido realizados na organização, estavam relacionados a alguns fatores socioeconômicos, didáticos e interacionais, os quais percebem já durante a sua participação, como: ¥ a clara diminuição dos seus custos de produção e comercialização; ¥ o tema do curso apresentou uma perspectiva de aumento significativo da produtividade por meio da apresentação de uma nova tecnologia ou trato produtivo; ¥ o extensionista possui profundo conhecimento sobre o tema tratado no curso; ¥ o extensionista emprega as palavras e demais encaminhamentos didáticos que façam sentido para eles; ¥ a ocorrência durante o curso de intenso diálogo entre todos os sujeitos presentes; ¥ a escuta atenta do extensionista relativa à produção de sentidos que ocorre no momento do curso destinado a eles agricultores; e ¥ o extensionista que ministra o curso possui uma relação de confiança historicamente constituída com os agricultores. Por fim, desenvolver processos de ensino-aprendizado dialógicos voltados para as rotinas produtivas dos territórios rurais brasileiros é uma atividade premente das organizações que prestam serviços de extensão nos territórios rurais, visando um empreendimento sustentável e socialmente justo. 3642 | ESADR 2013 18 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 AGRADECIMENTOS A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Brasil) pelo apoio financeiro a esta pesquisa, processo FAPESP no 2011/12912-9. As opiniões, hipóteses e conclusões ou recomendações expressas neste material são de responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem à visão da FAPESP. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bakhtin, M. (2003). Estética da criação verbal, Martins Fontes, São Paulo. Bakhtin, M. (2010). Marxismo e filosofia da linguagem, Editora Hucitec, São Paulo. Clot, Y. (2007). A função psicológica do trabalho, Vozes, Petrópolis. Fernandes, C.; Terra, A. (1994). 40 Horas de Esperança: o método Paulo Freire (política e pedagogia na experiência de Angicos), Editora Ática, São Paulo. Freire, P. (2006). Extensão ou comunicação?, Paz e Terra, Petrópolis. Libâneo, J. C. (1987). Democratização da escola pública: a pedagogia crítico social dos conteúdos, Edições Loyola, São Paulo. Rogers, E. M. (1983). Diffusion of innovations, Free Press, New York. Van Den Ban, A. W.; Hawkins, H. S. (1996). Extensión agraria, Editora Acribia S.A., Zaragoza. Yin, R. K. (2001). Estudo de caso - planejamento e métodos, Bookman, Porto Alegre. Zuin, L. F. S.; Queiroz T. R. (2006). “Gestão e Inovação nos Agronegócios”, In Zuin, L. F. S.; Queiroz, T. R. (Orgs.). Agronegócios: Gestão e Inovação. Saraiva, São Paulo, 1-19. Zuin, L. F. S.; Zuin, P. B. (2008). Produção de alimentos tradicionais: extensão rural, Idéias & Letras, Aparecida. Zuin, L. F. S; Zuin, P. B. (2013). “Comunicação dialógica na gestão ambiental: novos caminhos metodológicos para a extensão rural”, In Palhares, J. C. P.; Gebler, L. (Orgs.). Gestão Ambiental na Agropecuária. Embrapa Informação Tecnológica, Brasília, v. 2, 1-33. (no prelo) 19 Atas Proceedings | 3643 3644 | ESADR 2013 ESTUDO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM EM BOAS PRÁTICAS DE FABRICAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS PERTENCENTES A DOIS FRIGORÍFICOS BRASILEIROS LUÍS FERNANDO SOARES ZUIN Prof. Dr. da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos - Universidade de São Paulo - Brasil, [email protected] HELOÍSA VALARINE BATTAGIN Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos - Universidade de São Paulo Brasil, [email protected] POLIANA BRUNO ZUIN Profa. Dra. Faculdade de Faculdade de Tecnologia Ciências e Educação - Brasil, [email protected] RESUMO Nas últimas décadas, os consumidores brasileiros tem se tornado cada vez mais exigentes no que se refere a segurança físico-química e microbiológica dos alimentos, assim. Essa pressão dos consumidores fez com que as empresas aprimorassem os seus produtos e processos. Nos frigoríficos, uma forma de aprimorar seria o desenvolvimento de novos processos, os quais são voltados para um maior controle relativo as contaminações que os alimentos podem sofrer durante as rotinas produtivas. Por isso, a importância dos treinamentos para os funcionários vem sendo uma forma eficaz de controlar a qualidade dos seus produtos. Nas etapas de desossa e fases de processamento de carcaças, estes treinamentos estão relacionados à conscientização dos funcionários a respeito das atividades que compõem os manuais de Boas Práticas de Fabricação (BPF). O objetivo da pesquisa aqui relatada foi descrever e analisar os processos de ensinoaprendizagem em BPF de funcionários pertencentes a dois Frigoríficos Brasileiros. Para tanto, o método de coleta de dados foi o estudo de caso (Yin, 2001). Foram entrevistadas duas capacitadoras e cinco funcionários pertencentes aos frigoríficos onde se procurou diagnosticar por meios de seus relatos os métodos de ensino-aprendizado empregados nos cursos de BPF. Os resultados observados nos relatos indicaram que o grau de compreensão dos funcionários sobre a temática abordada foi diretamente dependente da metodologia de ensino usada nos treinamentos. Os métodos de ensino que envolvem a interação horizontal entre as pessoas foram indicados como os mais eficientes. Notou-se que em grupo à conscientização dos sujeitos quanto às normas de BPF foi mais rápida que individualmente. O uso de comparações entre o ambiente de trabalho e as casas dos funcionários, feito pelas capacitadoras, bem como entre os consumidores e suas famílias, gerou uma conscientização que resultou em melhorias nas posturas dos empregados. Este projeto de pesquisa recebeu para o seu desenvolvimento uma bolsa de iniciação científica da Reitoria da Universidade de São Paulo. PALAVRAS-CHAVE: treinamento, frigorífico, Boas Práticas de Fabricação, dialogia. Atas Proceedings 1 | 3645 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural INTRODUÇÃO Com o desenvolvimento de novas tecnologias e crescimento da preocupação com o meio ambiente nas últimas décadas, o consumidor vem tornando cada vez mais informado e exigente quanto àquilo que espera da indústria alimentícia. No caso dos produtos agropecuários, de acordo com Ludtke et al. (2010), as preocupações se definem sobre aspectos que englobam desde o bem-estar do animal que será abatido e até a definição dos processos empregados na industrialização e comercialização, visando segurança do alimento. As empresas, para manterem-se competitivas, necessitam se adequar àquilo que é esperado pelo consumidor. Nesse sentido, os frigoríficos vêm buscando inovação embasada no aperfeiçoamento de seus planos de autocontrole, referentes às boas práticas de manejo e fabricação empregadas nos processos de produção. A busca por melhorias contínuas exige alterações nas rotinas de produção, e essas mudanças agem principalmente sobre os funcionários, tirando-os de sua zona de conforto alicerçada na prática e exigindo-lhes um novo comportamento. A fim de reeducá-los, as empresas oferecem cursos de capacitação, para se adaptarem a um novo ambiente de produção, mas também para entenderem os motivos da mudança. Nesses cursos de formação continuada é comum que a equipe de garantia da qualidade enfrente uma certa dificuldade: a resistência à mudança de como fazer as atividades nas rotinas produtivas as quais são ofertadas aos funcionários. Outro gargalo é a falta de embasamento teórico por parte dos funcionários. Neli (2006) explica este último problema pela exigência mínima de escolaridade dos funcionários pelos frigoríficos, o que ocorre em função do trabalho no chão-de-fábrica ser repetitivo, manual, pouco complexo e significativamente desgastante. Cêa et al. (2009) afirmam que este cenário complexo e fisicamente desgastante é observado em grande parte dos frigoríficos brasileiros. Com base nessa problemática, as equipes que planejam e ministram os cursos procuram desenvolver métodos de ensino-aprendizado eficientes, principalmente alicerçados em diálogos e imagens. Dessa forma, cabe ao capacitador-educador orientar os funcionários a se relacionar e participar de diálogos com outros sujeitos em buscar o conhecimento. A comunicação, porém, não deve terminar com o entendimento, que é apenas um primeiro passo, e deve ser seguido pela atuação, ou seja, o diálogo como 3646 | ESADR 2013 2 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 método de ensino deve ser precursor de transformação (Braga et al., 2010). No caso dos frigoríficos, essa transformação remete à melhora da qualidade dos processos, produtos e serviços prestados pelos funcionários. A pesquisa aqui apresentada tem como objetivo descrever e analisar os processos de ensino-aprendizagem em Boas Práticas de Fabricação (BPF) de funcionários pertencentes a dois frigoríficos do estado de São Paulo, tomando como referências os estudos de Paulo Freire, Bakhtin e Vygotsky. O artigo está estruturado da seguinte forma: em primeiro lugar, apresentam-se as empresas estudadas; na sequência, seus métodos de ensino; em seguida há uma discussão de como os cursos impactaram nas rotinas dos funcionários; e, finalmente, conclui-se sobre as implicações teóricas e práticas dos métodos usados, a fim de nortear o desenvolvimento de novos métodos de ensino. AS EMPRESAS ESTUDADAS Dois frigoríficos do estado de São Paulo, no Brasil, se submeteram ao estudo de caso (Yin, 2001) para essa pesquisa ar, onde o diagnóstico dos seus métodos de ensinoaprendizado ocorreu in loco. As entrevistas das capacitadoras, pertencentes as duas organizações, observamos que foram aplicados cursos de capacitação para os funcionários durante os seis meses anteriores a entrevista. Em ambas as empresas, as capacitações foram ministradas por estagiárias, pertencentes às equipes de garantia da qualidade das duas organizações. As duas estagiárias eram acadêmicas do curso de Engenharia de Alimentos de uma faculdade do estado de São Paulo. O primeiro frigorífico estudado, o A, atua na desossa de bovinos e cordeiros, também produz alimentos embutidos e carne reestruturada e, em média, processa dez toneladas de matéria-prima por dia. É habilitado pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF) a comercializar produtos em todo o Brasil. O frigorífico B possui como única atividade a desossa de bovinos, e processa entre quinze e vinte toneladas de carne por dia. Além de ser habilitado pelo SIF, também comercializa os seus produtos em outros países. Visando relacionar o grau de compreensão dos operários com os métodos usados em cada treinamento, os instrumentos metodológicos da pesquisa foram entrevistas com os empregados e observações diretas nos frigoríficos. A pesquisa é caracterizada como 3 Atas Proceedings | 3647 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural qualitativa, descritiva e exploratória, e o método de coleta de dados e informações foi o estudo de caso, com viés sócio-histórico (Amorin, 2004). Ao todo foram entrevistados cinco funcionários pertencentes aos dois frigoríficos. Todos eram dos setores de produção, alfabetizados e pertencentes às classes econômicas C e D. Cada um desses sujeitos foi entrevistado individualmente e os relatos foram coletados após o término do período de seis meses de estágio das monitoras da garantia da qualidade nas empresas. Os funcionários responderam a um conjunto de questões abertas, relativas às estruturas dos cursos, seus impactos nas rotinas de trabalho durante e após o expediente e a didática empregada pelas estagiárias enquanto educadoras. MÉTODOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM USADOS NOS FRIGORÍFICOS ESTUDADOS Em ambos os frigoríficos, as capacitações admissionais, ministradas aos funcionários que ingressavam nas empresas, eram realizadas de forma individual e os ingressantes as recebiam no primeiro dia de trabalho, antes do início de suas atividades nas linhas de produção. Com duração aproximada de uma hora, em termos dos caminhos didáticos, o conteúdo do curso era disponibilizado de duas formas para os funcionários. A primeira, por meio de uma apresentação digital, sendo disponibilizada nos computadores das empresas, contendo um conjunto de slides que eram lidos pela estagiária responsável. O segundo caminho, era através de uma versão impressa, com textos mais aprofundados sobre os tópicos abordados, disponibilizados para que os funcionários o levassem para suas casas após o curso. O segundo tipo de encontro para capacitação, a “reciclagem”, era realizado nos refeitórios das empresas e consistia numa apresentação de slides projetada nas paredes da sala, onde se buscava que o público dialogasse sobre o assunto tratado (incluindo a capacitadora). No Frigorífico A, os 60 funcionários eram divididos em duas turmas de 30 pessoas, compartilhando um espaço do refeitório. Na empresa B, todos os 55 sujeitos eram capacitados juntos. Nestes cursos, com duração aproximada de três horas, além dos temas abordados nos encontros admissionais, incluíam-se também outros assuntos mais complexos relacionados as rotinas produtivas. 3648 | ESADR 2013 4 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 O conteúdo dos slides nos treinamentos de reciclagem era apresentado por meio de muitas figuras, alguns vídeos e quase nenhum texto, apenas o suficiente para fazer referências às imagens. Não usaram gráficos e tabelas em nenhum treinamento para evitar que os ouvintes com menor grau de escolaridade tivessem dificuldades em acompanhar o curso. Distribuíram-se ainda versões impressas do treinamento, que os funcionários puderam levar para casa a fim de consultar quando quisessem. Os diálogos durante os cursos sempre foram levados em consideração pelas capacitadoras. Elas tentaram ao máximo mantê-los com os alunos durante os encontros, com os objetivos principais de tirarem as dúvidas dos funcionários e haver compartilhamento de experiências entre os colegas. Descritas as duas formas de treinamento empregadas, em seguida serão relatados os impactos gerados por esses encontros, resultados estes, obtidos pelas entrevistas com os funcionários. IMPACTOS DOS CURSOS NAS ROTINAS DOS FUNCIONÁRIOS O primeiro assunto abordado com todos os entrevistados foi a importância das capacitações nas BPF. Inicialmente, houve um senso comum de que se todos os funcionários tivessem uma boa instrução anterior aos cursos, saberiam as corretas atividades enquanto manipuladores das carcaças nos frigoríficos, onde as capacitações seriam mais bem aproveitadas. O problema é que nem todos os funcionários possuíam esse conhecimento prévio e alguns dos entrevistados destacaram em seus relatos que alguns colegas, de menor nível de escolaridade, não davam a devida importância nem mesmo aos tópicos iniciais abordados nos treinamentos, que são os menos profundos, como lavagem de mãos com frequência e corretamente, bem como o uso de equipamentos de proteção individual. Neste momento é então que surge a primeira discussão: como tratar de um mesmo assunto dialogando com pessoas que possuem diferentes graus de instrução, vivências e experiências? Para Vygotsky (1988a) e Bakhtin (2003), a consciência depende da linguagem para formar e manifestar. É por isso que o capacitador busca exercer o papel de mediador, incentivando o diálogo para despertar interesse em todos os participantes. Para isso, pode-se levar em consideração que o diálogo é uma forma de 5 Atas Proceedings | 3649 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural compartilhamento de universos histórico-culturais (Vygotsky, 1988b). Isso foi observado claramente nas falas dos trabalhadores ao enunciarem diferentes opiniões sobre os temas abordados conforme suas experiências de vida. No contexto dos frigoríficos, enquanto para alguns os assuntos tratados nos cursos era novidade, outros descreveram que pôr em prática os conceitos teóricos abordados, dependia apenas do bom senso do funcionário. Bakhtin (1992) explica que somente compreendemos e reagimos às palavras que nos despertam ressonâncias que se apresentam à vida, ou seja, dos objetos humanizados reconhecidos pelos sujeitos no mundo concreto. Morin (2010) fortalece essa argumentação bakhtiniana, afirmando que um saber só se torna significativo ao sujeito se esse é capaz de situá-lo em um contexto. Percebendo isso, o capacitador nos frigoríficos, na função de mediador, pode conduzir o diálogo, incentivando o aluno a relacionar fatos de sua vida cotidiana aos assuntos trabalhados no curso, como foi feito nas duas empresas. Esta consciência que relaciona as atitudes tomadas no ambiente de trabalho e aquelas tomadas em casa, bem como o que é aprendido no trabalho pode ser estendido ao ambiente externo do frigorífico, foi percebida em todas as entrevistas. Uma das respostas pertencente a primeira entrevistada do Frigorífico B foi que, para ela, BPF é uma ferramenta tão importante, que pode e deve ser empregada em qualquer estabelecimento onde há manipulação de alimentos. Disse “Quando eu trabalhava numa padaria, até a mocinha que fatiava presunto e queijo sabia da importância das BPF”, e acrescentou que depois de ter mais contato com a temática, seu domínio do assunto cresceu significativamente e suas opiniões amadureceram sobre o assunto. Para Bakhtin (1992), quando os sujeitos expressam suas ideias sobre um dado tema, elas se reformulam e restabelecem no interior do seu auditório social, gerando novos sentidos sobre o tema tratado nas enunciações. Da mesma maneira, outros avanços foram notados nos processos de ensinoaprendizado estudados. Um dos entrevistados relatou que ele e alguns colegas não possuíam nenhum conhecimento prévio sobre o tópico e não se importavam, mas convivendo e dialogando com outros sujeitos dentro do frigorífico, mudaram seu pensamento e os de outros funcionários, “para os caras da manutenção o que importava era as máquinas funcionarem, agora eles consertam e deixam tudo limpinho para a gente poder usar”. 3650 | ESADR 2013 6 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Porém, não é com a frequência desejada que os sujeitos mudam o seu ponto de vista e passam a adotar novas regras e rotinas de trabalho. É comum haver uma resistência à mudança. Uma funcionária do Frigorífico A explica que o trabalho é estressante: “O ambiente é frio e barulhento, você tem que trabalhar em pé e o trabalho é desgastante”. Entende-se, assim, que mudanças exigidas do trabalhador depois que ele aprende e utiliza uma certa rotina em seu trabalho são mais difíceis de serem alteradas depois. Essa resistência as mudanças nas rotinas produtivas também foi observada por Miller & Cangemi (1993) e Liu (1998), de forma prejudicial, na implantação da Gerência da Qualidade Total. Hernandez & Caldas (2001) mencionam: “Os modelos prevalecentes de resistência à mudança tendem a considerar que os indivíduos resistem de forma homogênea. Essa hipótese desconsidera o fato de que, na maior parte das vezes, os indivíduos percebem os objetos e os acontecimentos de forma pessoal e distinta e, assim, seria de se esperar que as suas reações individuais seguissem o mesmo padrão.” (Hernandez & Caldas, 2001, p. 36). Isso explica por que alguns funcionários são menos resistentes à mudança que outros: cada indivíduo tem percepções diferentes das mudanças que surgem em suas rotinas enquanto trabalhadores, dependentes de sua personalidade e fatores sociológicos. Em outras palavras, há dois conjuntos de variáveis (individuais e situacionais) que geram a percepção (Hernandez & Caldas, 2001). Autores da administração com abordagem positivista-tecnicista como Kotter e Schlesinger (1979) apresentam seis estratégias genéricas para se superar essa resistência à mudança: a) educação e comunicação; b) participação e envolvimento; c) facilitação e suporte; d) negociação e acordo; e) manipulação e cooperação; f) coerção explícita e/ou implícita. Para os autores, alcançar a superação da resistência de maneira pacífica dos funcionários faz-se o uso capacitação por meio da comunicação, e o incentivo ao envolvimento foram as estratégias propostas pelas equipes da garantia da qualidade. Essa postura produtiva foi observada nas duas empresas estudadas. Um diagnóstico inicial indicou, no entanto, a falta de um conjunto de conhecimentos técnicos e científicos dos funcionários que facilitariam os processos de ensino-aprendizado, pois alguns deles não frequentaram escolas de ensino fundamental e médio que 7 Atas Proceedings | 3651 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural proporcionariam esse conhecimento. Essa dificuldade na capacitação, que é largamente notada, é um dos principais motivos deste estudo. Uma vez que parte dos funcionários possui um grau de escolaridade baixa, o melhor caminho para fomentar novos sentidos entre os sujeitos seria o uso de recursos midiáticos que não envolvem leitura e escrita, como vídeos, imagens e o diálogos entre todos os presentes nos cursos. Todos os funcionários entrevistados concordaram que as melhores formas de apresentação do conteúdo abordado nos treinamentos foram as já citadas, os sujeitos mostraram-se interessados em receber outros treinamentos (com outros temas) usando os mesmos métodos. De fato, Winkel (2012, p. 81) acredita que “a tecnologia só será plenamente aproveitada em todas as suas potencialidades se estiver inserida na realidade de cada organização ou comunidade, afinada com sua história, suas necessidades e expectativas”. Para conectar as experiências vividas pelos funcionários durante o trabalho com o contexto da capacitação (e as implicações em mudança que ele traz), nos dois frigoríficos usaram-se fotos tiradas nas próprias linhas de produção para apresentação do conteúdo trabalhado. Para Motta & Fontanari (2002, p. 35), “a fotografia é um corte específico no tempo e no espaço”, enxergando a imagem como um signo (sentido) que representa o sujeito. A fim de potencializar o entendimento dos funcionários sobre as atividades corretas e incorretas no ambiente de trabalho, as fotos tiradas revelaram imagens de atitudes inadequadas observadas nas rotinas produtivas. Os capacitadores tomaram o cuidado para não expor a identidade do indivíduo que cometia o erro. Sobre essa técnica de ensino, todos os sujeitos entrevistados indicaram que é muito interessante o modo como se ensina a postura correta, apresentando fotos de erros cometidos por seus pares: “Mostrar fotos com nossos erros é muito legal. Quando a gente vê de novo na produção, já sabe que está errado e arruma!”. Uma entrevistada afirmou que se lembra das expressões daqueles que nunca haviam participado de treinamentos coletivos: “A pessoa que erra faz careta e fica com vergonha quando vê que tem um hábito errado”. Apesar do funcionário responsável pelo erro nunca aparecer nas imagens, isso pode ser intimidador no momento do treinamento, quando está próximo dos colegas. Outros dois funcionários da empresa B indicaram que slides carregados de textos não prenderiam a atenção dos ouvintes e que os analfabetos não conseguiriam 3652 | ESADR 2013 8 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 acompanhar os encaminhamentos do curso. Nas palavras de um deles: “Se tivesse coisa escrita no slide, eu ia ter sono. Sem contar que tem gente que não sabe ler”. O outro relatou: “Vendo as fotos eu continuo lembrando muito tempo depois”, o que comprova a eficiência da técnica usada. Uma terceira funcionária complementa a argumentação afirmando que “O melhor do treinamento é que tem muita figura, isso não deixa cansativo, e as figuras de coisas erradas ficam na cabeça”. O funcionário entrevistado por último foi questionado quanto à sua opinião sobre a presença de tabelas e gráficos, e a resposta foi: “Não tinha tabela, não, ainda bem! Mas o que é um gráfico?”. Considerando que esta era uma das pessoas que possuía oito anos de estudo, não saber o que é um gráfico não era esperado, e indica a inadequação do emprego de gráficos e tabelas em métodos de ensino para funcionários de baixa escolaridade. Assim, dentre os possíveis recursos envolvendo imagens, a fotografia se apresenta como um melhor instrumento, que gera entendimento mais aprofundado. Isto se explica pelo texto de Andrelo & Oliveira (2012), onde relatam que em alguns casos a fotografia pode ser considerada um extensão da própria vida do sujeito que a observa. Todos os entrevistados concordaram que o diálogo foi outra ferramenta muito adequada e bem empregada, pois direcionamentos e sentidos distintos levam a diferentes entendimentos e pontos de vista, gerando diálogos e assuntos que não seriam abordados nas capacitações individuais. Para um funcionário do Frigorífico B, cada indivíduo é capaz de aprender com o erro do colega, então o treinamento coletivo é mais eficiente que o individual. Além disso, outra funcionária afirma que “Vendo todo mundo perguntar fica mais fácil falar também, a gente perde a vergonha”. Assim, se permite que todos os funcionários possam ter a mesma oportunidade de se expressar e desenvolver seu raciocínio sobre o tema estudado. Andrelo & Oliveira (2012) em seus estudos relatam que essas atividades incentivam os sujeitos a serem mais participativos e críticos: “A mídia-educação, ou Media Literacy, como é chamada na visão inglesa, é conceituada como as atividades capazes de desenvolver nos cidadãos habilidades específicas para acessar, analisar, produzir informação, ter capacidade de argumentar e saber como influenciar leitores ativos das mídias, a fim de torná-los cidadãos mais participativos, críticos e conscientes” (Andrelo & Oliveira, 2012, p. 102). 9 Atas Proceedings | 3653 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Depois de vários anos trabalhando na mesma empresa, dois funcionários do Frigorífico B passaram por diversos treinamentos, e assentiram nas entrevistas que os mais produtivos foram aqueles que tiveram mais participantes. Isso ocorre devido à capacidade do diálogo de envolver o funcionário no desenvolvimento do raciocínio sobre o tema abordado. Há ainda, para o capacitador, a certeza de que o funcionário o está acompanhando na produção de sentidos, uma vez que participa enunciando seu ponto de vista para todos. Para Bakhtin (1992), o diálogo não é somente a um processo que alternar as vozes dos falantes, mas é preponderantemente o encontro e a incorporação de inúmeras vozes. Para o autor a enunciação seria o resultado da interação de dois sujeitos socialmente organizados, assim, admite-se que a construção do indivíduo como pessoa, ou neste caso, o trabalhador de um frigorífico, se dá a partir de sua convivência e interação com outros sujeitos, pertencentes ou não a organização que trabalham. Vygotsky (1988a) também participa da mesma discussão, tratando a linguagem como intermédio de relações sociais que levam à construção do indivíduo, sendo a oralidade vista como mediadora das relações entre o homem e o mundo: “A função primordial da fala é a comunicação, o intercâmbio social. Quando o estudo da linguagem se baseava na análise em elementos, também esta função foi dissociada da função intelectual da fala. Ambas foram tratadas como funções separadas, até mesmo paralelas, sem se considerar a interrelação de sua estrutura e desenvolvimento” (Vygotsky, 1998a, p. 6). Bakhtin (1992) acrescenta que a palavra quando está dentro ou fora dos sujeitos, nas interações, sempre será possuidora de um sentido vivencial. É possível dizer, então, que a linguagem possui função organizadora do pensamento e está em constante evolução, assim como os sujeitos que interagem e se transformam conforme suas interações com outras pessoas. Para o autor a palavra e seus sentidos é que irão mediar as interações do sujeito com o mundo concreto. Assim, a evolução da linguagem e das pessoas se dá paralelamente, com o emprego da comunicação cotidiana na construção do indivíduo. No caso dos treinamentos incluindo mais de trinta pessoas, como nos casos dos frigoríficos, nem todas participam ativamente dos diálogos, mas Bakhtin (1992, p. 17) acredita que a enunciação, “ela não existe fora de um contexto social, já que cada 3654 | ESADR 2013 10 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 locutor tem um “horizonte social”. Há sempre um interlocutor, ao menos potencial”. Afirma ainda que a compreensão nem sempre é fruto da comunicação em voz alta, podendo se tratar de um discurso interior, com a oposição da palavra do locutor por meio de uma contrapalavra, que nem sempre é exteriorizada também na forma de palavra. No ambiente dos frigoríficos, isso se revela quando, no momento dos treinamentos os alunos não se manifestam em voz alta, mas aprimoram seus atos durante o trabalho com base nos assuntos discutidos anteriormente, mostrando a compreensão do diálogo na forma de ato. Bakhtin (1993) observa que o sensível (o mundo dado) e o inteligível (a apreensão do mundo) estão necessariamente integrados. Isso significa que a ação de maneira concreta é resultado da organização dos pensamentos acerca do conteúdo dos atos. Outro fator-chave para utilizar do diálogo como ferramenta para a educação é a forma como o capacitador, em sua função de mediador, aborda o conteúdo do curso. Não somente para promover o entendimento, mas até mesmo convencer o sujeito que está sendo capacitado de que o assunto merece atenção, a abordagem deve ser baseada no respeito e horizontalidade dos diálogos, segundo os entrevistados. Em outras palavras, os alunos têm a expectativa de que não se imponham informações, mas que sejam apresentadas de forma clara, permitindo o entendimento e renovação do conhecimento. Freire (1967) considera essencial o uso do diálogo dessa maneira, coordenando e horizontal, e jamais imposto e vertical em suas relações. Quanto a esta abordagem, que envolve a interação da equipe treinada e os momentos corretos de cada pessoa falar, uma funcionária da empresa B relatou que o diálogo com a estagiária seguiu sempre horizontalmente, sem que a educadora impusesse informações ou regras. Nas palavras dela: “A moça me deixou à vontade para perguntar. Não fiquei com vergonha, porque sei que é melhor perguntar uma coisa boba pra ela do que fazer alguma coisa que estrague tudo depois”. Complementando, a funcionária concordou com as afirmações de todos os entrevistados, de que a estagiária possuía um postura horizontal e aberta ao diálogo durante todo o treinamento e também durante as rotinas dos trabalhos nas linhas de produção. Os funcionários em seus relatos observaram que entendem que o trabalho das estagiárias é monitorá-los para realizar as atividades de forma correta, e isso pode ofender alguns sujeitos, conforme a maneira como eles eram abordados ao serem 11 Atas Proceedings | 3655 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural flagrados cometendo uma atividade fora do padrão. A opinião de uma funcionária do Frigorífico. Um dos funcionários entrevistado relatou sobre a capacitadora que “Ela é atenciosa e quando vai chamar atenção do povo, ninguém se sente diminuído”. Nota-se, portanto, uma necessidade de métodos diferentes dos convencionais que se empregam atualmente no ensino de jovens de ensino fundamental e médio e incluem pouco diálogo. Cury (2010, p. 44) explica que “o saber adquirido nas escolas é muitas vezes questionado em relação à sua aplicabilidade, e somente passa a ter sentido quando compreendido no contexto geral”. Isso significa que é necessária uma troca de informações, vivências e experiências, em que não somente o capacitador ensina, mas também o aluno (funcionários dos frigoríficos), ao apresentar relatos de experiências por ele vividas e ideias por ele constituídas, também contribui fortemente com o processo de ensino aprendizado. Bubnova et al. (2011, p. 271) ilustra essa necessidade de interação, argumentando que “a onipresença da voz é equiparável à ubiquidade do outro em nossa existência”. Este intercâmbio de informações proposto fortalece as relações entre os interlocutores, e novas ideias podem ser tecidas em conjunto. Dessa forma, passa a existir um acordo entre os indivíduos, e não apenas alunos que aceitam informações e mudam seus atos apenas por ser necessário. Pessoas que têm ideais e objetivos em comum trabalham melhor juntas, e a convivência entre as estagiárias e os funcionários realmente melhorou muito após os treinamentos, segundo os entrevistados. Na visão Bakhtiniana (Bakhtin, 1992): “A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas, nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações” (Bakhtin, 1992, p. 123). Ao contornar as boas relações no ambiente de trabalho, é possível estender o contato entre os colegas de trabalho ao ambiente externo da empresa, e até mesmo o emprego dos conteúdos dos treinamentos, uma vez que os caminhos utilizados no processo de ensino aprendizado permitem que o educando visualize a aplicabilidade do conteúdo dos cursos num contexto multidimensional. Freire (1967) e Morin (2010), da mesma forma, acreditam na eficiência de um método de ensino dialógico que proporcione a compreensão e o aprimoramento das capacidades intelectuais. 3656 | ESADR 2013 12 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Ao serem questionados sobre a aplicação de conceitos adquiridos na empresa fora dela, as opiniões dos entrevistados variaram. De maneira geral, em aspectos como a higiene pessoal e manipulação de alimentos, os funcionários passaram a tomar mais cuidados mesmo fora do ambiente de trabalho, e também cobram a mesma postura de seus familiares. Uma das funcionárias do Frigorífico A afirmou que depois da capacitação dá muito mais atenção à higienização dos alimentos que manipula em sua casa. Outra entrevistada, porém, disse que nada mudou, porque já cuidava muito bem de sua higiene pessoal e da sua casa. Um terceiro, que divide a casa em que mora com colegas de trabalho do Frigorífico A, afirmou que em sua casa as pessoas passaram a tomar mais cuidado com o lixo e a higiene da cozinha. Nesta residência, quando alguém cozinha, usam-se facas diferentes para alimentos distintos, evitando contaminação cruzada, como pode acontecer nas suas rotinas produtivas no frigorífico. Além das mudanças dos funcionários nos hábitos de higiene pessoal e de suas casas, uma das entrevistadas do Frigorífico A apontou a menor incidência de insetos (baratas e moscas) em sua casa após começar a aplicar melhor manejo do lixo, conhecimento este adquirido num dos treinamentos. Dessa forma, percebe-se que o funcionário que realmente incorpora o conhecimento trabalhado nos cursos o emprega em sua vida dentro e fora da empresa. Comentando ainda sobre as relações dos funcionários com seus familiares e colegas, os entrevistados dos dois frigoríficos mencionaram que alguns operários se sentem incomodados ao descumprirem as regras e serem corrigidos por seus colegas. Todos os entrevistados assentem que, de maneira geral, preferem ser abordados pela monitora da garantia de qualidade do que por outros colegas ou chefes. Isso ocorre devido às formas de corrigir os erros cometidos. Para os entrevistados, as estagiárias são mais humildes nesta posição do que pessoas com cargos superiores. Freire (1979, p. 15) mostra a importância de lidar humildemente com a educação dos funcionários quando afirma “[...] não podemos nos colocar na posição do ser superior que ensina um grupo de ignorantes, mas sim na posição humilde daquele que comunica um saber relativo a outros que possuem outro saber relativo”. Quanto às conversas sobre os assuntos do frigorífico fora do ambiente de trabalho, uma funcionária afirmou que alguns assuntos são levados até as redes sociais, principalmente quando ocorrem fatos que fogem à rotina da linha de produção, como 13 Atas Proceedings | 3657 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural quando há visitas técnicas e supervisão do estabelecimento. Da mesma forma, no Frigorífico B, uma funcionária entrevistada afirmou que as mulheres comentam eventualmente, no vestiário, sobre boas práticas que não deveriam ser esquecidas. Um rapaz lembrou que até durante as partidas de futebol que os funcionários jogavam aos finais de semana, muitos deles deixaram de usar pulseiras e colares, pois notaram, depois do treinamento, como poderiam se ferir por causas tão pequenas. Para os entrevistados desse frigorífico, as imagens e vídeos apresentados convenceram-lhes de que o que era ali apresentado realmente tinha importância e que seguir as regras não faria bem somente à empresa, mas também aos trabalhadores. Morin (2010, p. 7) relata, porém, que “o conhecimento completo é impossível: um dos axiomas da complexidade é a impossibilidade de uma onisciência”, assim, é necessária a incessante busca pelo conhecimento e que os treinamentos sejam periódicos, como o proposto pelas empresas, de haver treinamentos periódicos semestralmente. CONCLUSÃO Os treinamentos envolvendo um maior número de pessoas foram mais eficientes que os individuais com relação à conscientização do público quanto às normas de BPF a serem seguidas e sua importância. Em grupo, o conteúdo do curso foi internalizado mais significativamente, houve mais embates e discussões sobre os temas abordados e os assuntos foram mais aprofundados. O uso de comparações entre o ambiente de trabalho e a casa dos funcionários, bem como entre os consumidores e suas famílias, gerou uma maior conscientização dos funcionários para com as BPF. A dialogicidade e a ênfase da oralidade nos cursos permitiu a participação de todos os funcionários em um mesmo nível durante o curso, mesmo os que não sabiam ler e escrever. Certamente esses sujeitos não compreenderiam o conteúdo da mesma forma se houvesse o emprego de textos. Estes sujeitos, por sua vez, consideraram menos cansativas as apresentações com imagens e vídeos, quando comparadas àquelas carregadas de textos. Outros pontos importantes dos treinamentos foram ausência de gráficos e tabelas (que os funcionários admitem não estarem aptos a interpretar), e a horizontalidade das interações e dos diálogos. Este último fator é importante também 3658 | ESADR 2013 14 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 para a diminuição do estresse dos funcionários durante o trabalho, pois as suas rotinas produtivas são significativamente desgastantes fisicamente. Em ambos os frigoríficos houve indicações de que as boas relações interpessoais são imprescindíveis para nos processos de ensino-aprendizado em BPF. Largamente observada em todas as entrevistas, foi a importância que os funcionários atribuem o respeito do educador pelo educando. Um fator determinante para que o educando crie interesse pelos assuntos abordados é que o educador saiba orientar sem haver imposições, e depois, ao cobrar de forma correta o que foi ensinado. AGRADECIMENTOS A Reitoria da Universidade de São Paulo pela bolsa de Iniciação Científica da acadêmica Heloísa Valarine Battagin. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Andrelo, R. e Oliveira, M. T. (2002) Mídia-educação: da criatividade à livre expressão na escola. Comunicação e Educação, Ano XVII, n. 1, 101-109. Amorin, M. (2004). O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas, Musa Editora, São Paulo. Bakhtin, M. (1992). Marxismo e filosofia da linguagem, 6.ed., Editora Huritec, São Paulo. Bakhtin, M. (1993). Toward a Philosophy of the Act, University of Texas Press, Austin. Bakhtin, M. (2003). Estética da criação verbal, Martins Fontes, São Paulo. Braga, F. M.; Gabassa, V.; Mello, R. R. (2010). Aprendizagem dialógica: ações e reflexões de uma prática educativa de êxito, EdUFSCar, São Carlos. Bubnova, T.; Baronas, R. L. e Tonelli, F. (2011). Voz, sentido e diálogo em Bakhtin, Bakhtiniana, 6 (1): 268-280. Cêa, G. S. S.; Murofuse, N. T.; Andrade, L. A. S. (2009). Processo de recrutamento, seleção e admissão dos trabalhadores em frigoríficos da região do oeste do Paraná. 4º Seminário Nacional Estado e Políticas Sociais. Disponível em: 15 Atas Proceedings | 3659 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural <http://cacphp.unioeste.br/projetos/gpps/midia/seminario4/trabcompleto_formacao_gest ao_trabalho_capitalismo_contemporaneo/Trabcompleto_processo_de_rec_sel_adm_trab alhadores.pdf> (acesso em: 20 Maio 2013). Cury, L. (2012). Revisitando Morin: os novos desafios para os educadores. Comunicação e Educação, Ano XVII, n. 1, 39-47. Freire, P. (1967). Educação como prática da liberdade, Paz e Terra, Rio de Janeiro. Freire, P. (1979). Educação e mudança, 12ª ed., Paz e Terra, Rio de Janeiro. Hernandez, J. M. C. e Caldas, M. P. (2001). Resistência à mudança: uma visão crítica, RAE - Revista de Administração de Empresas, v. 41, n. 2, 31-45. Kotter, J. P. e Schlesinger, L. A. (1979). Choosing strategies for change. Harvard Business Review, v. 57, n. 2, 106-113. Liu, C. K. (1998). Pitfalls of Total Quality Management in Hong Kong. Total Quality Management, v. 9, n. 7, 585-598. Ludtke, C. B.; Ciocca, J. R. P. e Dandin, T. (2010). Manual de abate humanitário de suínos. Programa Nacional de Abate Humanitário, Steps, WSPA. Miller, R. L. e Cangemi, J. P. (1993). Why Total Quality Management fails: perspective of top management. Journal of Management Development, v. 12, n. 7, 40-50. Morin, E. (2010). A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento, Bertrand Brasil, Rio de Janeiro. Motta, L. T. e Fontanari, R. (2012). Roland Barthes diante do signo fotográfico. Comunicação e Educação, Ano XVII, n. 1, 31-37. Neli, M. A. (2006). Reestruturação produtiva e saúde do trabalhador: em estudo com os trabalhadores de uma indústria avícola. Dissertação de Mestrado em Medicina, Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Vygotsky, L. (1988a). Pensamento e linguagem. Martins Fontes, São Paulo. Vygotsky, L. (1988b). A formação social da mente, 6.ed., Martins Fontes, São Paulo. Winkel, J. (2012). Tradição e mudança: os desafios da afirmação de marca na Andreato Comunicação e Cultura. Comunicação e Educação, Ano XVII, n. 1, 73-82. Yin, R. K. (2001). Estudo de Caso: planejamento e métodos, Bookman, Porto Alegre. 3660 | ESADR 2013 16 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 A FUNÇÃO DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA AGREGADA DO ESTADO DO TOCANTINS: em uma região periférica da Amazônia NILTON MARQUES DE OLIVEIRA Doutorando em Desenvolvimento Regional e Agronegócio – Unioeste, Professor do Curso de Ciências Econômicas da UFT - Palmas-TO - Rua da Faculdade, 2550 Jardim Santa Maria. Toledo-Paraná. CEP: 85903-000 - e-mail: [email protected] . UDO STRASSBURG Doutorando em Desenvolvimento Regional e Agronegócio – Unioeste, Professor do Curso de Ciências Contábeis – UNIOESTE - Cascavel – PR - Rua da Faculdade, 2550. Jardim Santa Maria. Toledo-Paraná. CEP: 85903-000. e-mail: [email protected] CAMILI DEL PAI Doutoranda em Desenvolvimento Regional e Agronegócios – UNIOESTE, Mestre em Desenvolvimento Regional – UFMT - e-mail: [email protected] ISABELA BARCHET Doutorando em Desenvolvimento Regional e Agronegócio – Unioeste, Mestre em Engenharia de Produção – UFSM - Rua da Faculdade, 2550 - Jardim Santa Maria. Toledo-Paraná. CEP: 85903-000 - e-mail: [email protected] RESUMO O objetivo deste trabalho foi estimar e analisar a função de produção agropecuária agregada dos 139 municípios do Estado de Tocantins. O referencial teórico utilizado foi a função da produção Cobb-Douglas, obtida a partir dos dados Censo Agropecuário de 2006. Para o modelo empírico o Método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO). Os resultados obtidos indicaram que as variáveis área total, capital e mão de obra foram significativas para explicar a produção no estado e, este se encontra no estágio II (estágio racional) onde o produto total cresce a taxas decrescentes até seu máximo. Pode-se concluir que o Tocantins está alocando eficientemente os recursos produtivos na produção agropecuária. PALAVRAS – CHAVE: Cobb-Douglas, retorno crescente; elasticidade de produção; agricultura. Atas Proceedings | 3661 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural The AGGREGATE AGRICULTURAL PRODUCTION FUNCTION OF THE STATE OF TOCANTINS: in a peripheral region of the Amazon AGGREGATE AGRICULTURAL PRODUCTION FUNCTION IN TOCANTINS STATE: in peripheral region the Amazon ABSTRACT The aim of this study was to estimate and analyze the function of aggregate agricultural production of the 139 municipalities in the state of Tocantins. The theoretical framework used was the function of Cobb-Douglas production, the data obtained from the 2006 Agricultural Census. To empirical model was used the Method of Ordinary Least Squares (OLS). The results indicated that the total area variables, capital and labor were significant in explaining the production in the state, and it is at stage II (stage rational) where the total output grows at decreasing rates to its maximum. It can be concluded that the Tocantins is allocating productive resources efficiently in agricultural production. KEYWORDS: Cobb-Douglas, increasing returns, elasticity production, agriculture INTRODUÇÃO Este trabalho pretende estimar e analisar a função de produção agropecuária agregada do Estado do Tocantins, com intenções de verificar e identificar os principais fatores determinantes da produção. Especificamente, analisar as elasticidades parciais dos diversos insumos de produção, bem como o valor da produção média, as produtividades marginais desses fatores e verificar os retornos à escala. A base de dados para aplicação do presente estudo foi a matriz do censo agropecuário de 2006. A questão central deste artigo é, se o Estado do Tocantins está alocando eficientemente os recursos produtivos do setor agropecuário. Este tem um papel fundamental no desenvolvimento regional, nota-se a importância do agronegócio para a economia brasileira, no que tange a sua participação na formação da renda nacional, na geração de empregos e na adaptação e desenvolvimento de novas tecnologias para o mundo rural. O setor agropecuário, segundo Bacha (2012) têm funções determinante no processo de desenvolvimento econômico, tais como: gerar divisas; produzir matérias primas e alimentos para o mercado local e exterior; transferir mão de obra e capital do setor agrícola para o não-agrícola e demandar produtos do setor industrial. 2 3662 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Desta forma, o crescimento do setor agropecuário representa um transbordamento para outras atividades, constituindo uma mola propulsora para o crescimento e desenvolvimento econômico. As atividades do agronegócio apresentam um dos maiores índices de encadeamento para frente e para trás e os melhores canais para a transmissão dos efeitos dessas ligações na estrutura da economia brasileira, indicando ser este conjunto de atividades importante para receber estímulos que visam o crescimento sustentado da economia. O desempenho futuro do setor agrícola brasileiro está relacionado com a criação de novas alternativas de apoio à produção, de forma a manter a atividade competitiva com possibilidades de ampliação, via modernização das estruturas produtivas. A estimativa da função de produção agropecuária agregada para o Tocantins é também uma agregação de tecnologias, em diferentes estágios. Assim, a agregação representa a média desses diferentes estágios dos municípios que compõem o Estado e pode-se dizer que é necessário para a caracterização tecnológica do setor agropecuário (ALVES, 2002). Diversos autores vêm, estimando funções de produção do tipo Cobb-Douglas, com o propósito de compreender como os fatores de produção estão combinados em determinado sistema produtivo. Lemos et al (1984) apud Alves (2002) analisaram as elasticidades parciais de produção e os valores das produtividades marginais e médias, para os fatores terra, capital e trabalho para os estados brasileiros. Curi (1997) apud Alves (2002) fez uma análise da eficiência alocativa dos fatores de produção da agropecuária mineira, evidenciando que os mineiros usam os fatores de produção menos onerosos ao processo produtivo. Oliveira e Marques (2002) estimaram essa função para o Estado de Mato Grosso; Alves (2002) fez um estudo para o Estado do Paraná, determinando os valores dos coeficientes das elasticidades de produção, os valores dos produtos marginais da terra, trabalho, investimento e capital. Dias e Oliveira (2004) entre outros de seus objetivos, fizeram uma análise da eficiência alocativa dos fatores de produção utilizados pela agropecuária goiana, usando uma função de produção Cobb-Douglas, evidenciaram que a variável investimento e financiamento foi a que apresentou maior sensibilidade, indicando que qualquer 3 Atas Proceedings | 3663 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural incentivo em aumentar o financiamento resulta numa variação crescente da produção para o Estado de Goiás. Assim sendo, este estudo centra-se no Estado do Tocantins, criado em 05 de outubro de 1988, considerando as duas mesorregiões Ocidental e Oriental e as oito microrregiões: Araguaína, Bico do Papagaio, Gurupi, Miracema do Tocantins, Rio Formoso, Dianópolis, Jalapão e Porto Nacional. Subdivide-se em 139 municípios de acordo com a divisão adotada pelo IBGE (2011). Com uma área de 277.620,9 Km², participa com 7% em relação à área da região Norte (3.869.637) e 3,3% do território nacional, sendo Palmas a capital do estado. Limita-se ao norte com os Estados do Maranhão e do Pará; ao sul com o Estado de Goiás; a leste com os Estados do Maranhão, do Piauí e da Bahia; e a oeste com os Estados do Pará e do Mato Grosso. Em território tocantinense, as distâncias máximas são de 899,5 km na direção norte-sul, e entre os pontos extremos leste-oeste são 615,4 km. O potencial agrícola do Tocantins é elevado, pois 60% da superfície do Estado são de solos agricultáveis e mais de 25% apresentam condições de produção, se for utilizada a tecnologia já disponível. Cerca de 430 mil hectares são utilizados para atividades agrícolas, principalmente na produção de soja, frutas, cana-de-açúcar, milho, algodão e arroz irrigado. Dados do IBGE (2010) revelam que a sojicultura, principal produto agrícola, apresentou no ano de 2012, 52% na participação das principais culturas temporárias em termo de área colhida. A produção de soja do Tocantins aumentou em mais de seis vezes entre 2000 e 2009 (144 mil toneladas em 2000 para 875 mil toneladas em 2009). A área colhida cresceu 14% ao ano, em quase duas décadas, e a produtividade média ficou em 2,5 toneladas por hectare (FEITOSA, 2011). Houve, também, uma reintrodução do cultivo da cana de açúcar, nos últimos anos, levando à instalação de uma unidade da Bunge Açúcar e Álcool no município de Pedro Afonso. Além disso, a plantação de milho vem apresentando crescimento constante, desde 2001, uma vez que é plantado como cultura rotativa nas áreas de arroz e de soja. No entanto, apesar da expansão das últimas décadas, a produção agrícola tocantinense é modesta, quando comparada à nacional. Exceção do arroz, que ocupou a quinta posição no ranking nacional, em 2011, já a produção de melancia e de abacaxi ficou entre as dez maiores do país. A produção de melancia, 88.135 t, obteve a 8ª 4 3664 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 posição e a de abacaxi com 48.657 mil frutos, ocupando o 9º lugar entre os estados produtores. O milho representa 0,5% da produção nacional, a soja representa apenas 1,5% e a cana de açúcar 0,1% (IBGE, 2011). As pastagens, por sua vez, ocupam a maior parte das terras do Tocantins, com 56%. A criação do gado bovino concentra-se na parte norte, principalmente na região de Araguaína, aparecendo como a principal atividade agropecuária. Em 2010, o estado contava com 8 milhões de hectares de pastagens e com um rebanho de 6 milhões de cabeças, com elevada participação das raças gyr para corte e leite, e nelore para corte. Em 2012, o rebanho atingiu 7,6 milhões de cabeças, um crescimento médio anual de 7,8%, número bem acima da média nacional que foi de 6%; na região Norte, a taxa de crescimento médio foi de 9%. (IPEA, 2012) As condições naturais são consideradas essenciais para o sucesso da agricultura, assim como a logística do escoamento, por meio do transporte multimodal em fase de implantação, mais especificamente dos meios hidro-ferroviários. Contudo, a maior parte da produção agrícola produzida ainda é vendida in natura e transportada via Rodovia Belém-Brasília. Destarte, dada a relevância do conhecimento das peculiaridades do setor a estimação da função de produção Cobb_Douglas se faz necessária para analisar as características da produção agropecuária agregada para o Estado do Tocantins. Isso posto, este artigo está divido em 4 partes, além desta introdução. A seguir será apresentada a seção 2, que trata dos procedimentos metodológicos, enquanto a seção 3 apresenta os principais resultados e discussão. As considerações finais sumarizam o trabalho. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Modelo Teórico A teoria utilizada neste trabalho foi a Teoria da Produção, que consiste em uma análise de como os agricultores combinam os vários insumos para obter determinado volume de produção de forma economicamente eficiente. A Função de Produção pode ser definida como sendo a relação que indica a quantidade máxima que se pode obter de um produto, por unidade de tempo, a partir da utilização de uma determinada 5 Atas Proceedings | 3665 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural quantidade de fatores de produção, e mediante a escolha do processo de produção mais adequado (Varian, 2000). A função de produção é utilizada para a identificação da ineficiência dos recursos produtivos utilizados no processo, ou até identificar as unidades produtivas eficientes e as ineficientes. Descobrindo assim as melhores práticas e as melhores formas de utilização dos recursos tecnológicos disponíveis. De acordo com Varian (2000) e Alves (2002), matematicamente, a função de produção pode ser representada por: (1) Y=f( , ...... , ) Onde Y é a variável dependente que corresponde a quantidade produzida; ,..., , são as variáveis independentes, representando os fatores de produção. Fazendo-se a derivada parcial da função de produção em relação ao fator, obtém-se o Produto Marginal do fator (Pmg ), mantendo os demais fatores constantes (DEBERTIN, 1986): (2) = PMg | = constante O Produto Médio do fator (PMe ) é a relação entre as quantidades do produto e o fator em análise: (3) PMe = A elasticidade parcial de produção é igual à variação percentual do produto dividida pela variação percentual de insumo. Também é igual à relação entre o PMgx i e PMexi: (4) = = 6 3666 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 A elasticidade de produção consiste na razão entre variações relativas na produção e nos fatores. Indica a resposta em produção, provocada por variações nos fatores, isto é, mede a sensibilidade da produção em relação à mudança do nível de uso dos fatores. Em uma função tipo Cobb-Douglas, a elasticidade de produção é dada pelos coeficientes de regressão, pois a elasticidade de uma função exponencial é dada pelo seu expoente. O parâmetro de retorno à escala, também chamado de função coeficiente por Debertin (1986) é dado pela soma das elasticidades parciais de produção dos n(s) fatores da função de produção: (5) No presente trabalho foi utilizada a função Cobb-Douglas, a qual é uma ferramenta que melhor auxilia na obtenção de informações que subsidiam estudos como este. Para estudos desta natureza a literatura indica a utilização da função do tipo CobbDouglas, visto que proporciona resultados importantes do ponto de vista da agregação. Isto facilita a interpretação, pois a função poder se tornar linear na forma logarítmica e, se tornar de fácil ajustamento. A forma funcional da produção tipo Cobb-Douglas é dada pelo modelo descrito abaixo: (6) ou, expressa nos logaritmos, como é utilizada no presente trabalho: (7) onde Y = produção total; A = parâmetro de eficiência; 7 Atas Proceedings | 3667 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural n = número de variáveis independentes; ai = elasticidade-parcial de produção em relação ao i-ésimo fator; Xi = quantidade da i-ésima variável explicativa; ui = termo aleatório. A função do tipo Cobb-Douglas possui características tais que permitem a realização de uma regressão linear múltipla. A elasticidade parcial de produção identifica qual é o estágio da produção, na época de sua realização, destacando, o estágio de produção que a mesma foi realizada, se em situação economicamente racional ou irracional, ou seja, ela quantifica a variação do volume de produção, relacionando com as variações na utilização dos insumos. Se a elasticidade parcial é (p 1) a produção está sendo realizada no estágio I, onde o produto total cresce a taxas crescentes e decrescentes até o ponto em que a produtividade marginal do fator variável iguala a produtividade média deste fator em seu máximo, isto é, corresponde aos rendimentos médios crescentes dos insumos. Se 0 p 1, a produção está sendo realizado no estágio II. Nesse estagio o produto total cresce a taxas decrescentes até seu máximo, sendo a produtividade marginal do fator variável sempre decrescente até o ponto onde ela iguala-se a zero, correspondendo a rendimentos médios decrescentes. Se p 0 está sendo realizado no estágio III em que o produto total é decrescente sendo a produtividade marginal do fator variável decrescente e negativa, isto significa que há unidades adicionais do insumo variável neste estágio provocando declínio no produto total. Os estágios I e III são, portanto, considerados irracionais. Desse modo, a produção deve ocorrer entre os limites do estágio II (VARIAN, 2000). Outra vantagem da função do tipo Cobb-Douglas é a natureza dos rendimentos de escala que pode ser determinada pela soma dos coeficientes estimados pela regressão. Segundo Oliveira (1966) apud Alves (2002) as principais características da função tipo Cobb-Douglas são: a) permite produtividade marginal constante, crescente e decrescente, mas só pode avaliar uma fase de cada vez; b) estima uma elasticidade de produção constante, dada pelos coeficientes de regressão; c) a soma dos coeficientes indica os retornos à escala; d) a produtividade marginal de um recurso depende do nível dos outros recursos; 8 3668 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 e) um recurso nunca pode ser completamente substituído por outro; f) conduz a uma Taxa Marginal de Substituição (TMgS) constante quando os fatores variam em proporções fixas, isto é, a TMgS é constante na linha de escala; g) facilita a derivação de produtos marginais; h) permite maiores facilidades de computação porque poderá ser usada na forma logarítmica; i) pode-se estudar grande número de variáveis sem que o processo estatístico se torne muito complicado; e j) a TMgS é dada pela relação inversa das elasticidades de produção, isto é, multiplicando-se os coeficientes pela relação direta dos fatores considerados. Dito de outra forma a função Cobb-Douglas permite uma série de inferências, possibilitando a análise e interpretação de quais são os procedimentos e tecnologias que estão influenciando a produção no Estado do Tocantins. Modelo Empírico A função de produção agropecuária agregada para o Estado do Tocantins dos 139 municípios tendo como referência os dados do censo agropecuário de 2006 o qual é expressa no modelo empírico de equações (8 e 9): (8) VPT = A * ATβ1 * K β2 * MO β3 ou, expressa nos logaritmos, como é utilizada no presente trabalho: (9) LVPTi = βj + βj LATi + βj LKi + βj LMOi + µi onde, • LVPTi é o logaritmo natural do valor da produção total agregada do setor agropecuário (animal e vegetal), em cada um dos municípios, medido em R$ (reais); • LATi é o logaritmo natural da área total (lavouras permanente e temporária; pastagens natural e plantada; matas natural e plantada), utilizada para os municípios, medida em hectares; • LKi é o logaritmo natural do fluxo de capital (financiamento/investimento) total que compreende todas as modalidades de crédito ou financiamento, segundo a 9 Atas Proceedings | 3669 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural origem (bancos, entidades governamentais e outras fontes) e a finalidade (investimento, custeio e comercialização), medido em R$ (reais); • LMOi é o logaritmo natural do fluxo de serviços da força de trabalho total ocupada que abrange todas as pessoas, com ou sem remuneração, que na data do Censo encontravam-se executando serviços ligados às atividades do estabelecimento. Os valores foram convertidos em equivalente-homem adotando-se a seguinte ponderação: homens acima de 14 anos (1,0); mulheres acima de 14 anos (0,7). • βj é o parâmetro associado à variável explicativa j = 0, 1, 2, 3; • µi é o resíduo associado à observação do município i; e • i é município = 1, 2, 3, 4,..., 139. Usou-se, nas estimativas o método de mínimos quadrados ordinários (MQO), levando-se em consideração os seguintes pressupostos (GUJARATI, 2000): i) L VPT i = β0 +β1LATi + β2LKi + β3LMOi + µi ii) E(µi) = 0, iii) E( )= i = 1, 2, 3,.....139; i = 1, 2, 3,.....139; , i = 1, 2, 3,......139; iv) E(µi, µj) = 0, i ≠ j; v) LVPTi são fixas vi) há ausência de relação linear entre as variáveis explicativas; vii) µ ~ N(0, ) i = 1, 2, 3,......139; Espera-se que os parâmetros β1 > 0; β2 > 0; β3 > 0 sejam positivos e atendam as seguintes hipóteses a serem testadas neste trabalho: i) ii) iii) espera-se que um aumento (redução) na área total plantada tende a aumentar (reduzir) o valor da produção, e; um aumento (redução) no capital (financiamento e investimento) tende a aumentar (reduzir) o valor da produção, e; um aumento (redução) na mão de obra tende a aumentar (reduzir) o valor da produção. Esperam-se sinais positivos para todos os coeficientes das variáveis ATi Ki MOi mas com magnitude dos números entre 0 e 1, pois acima de 1 e negativos estar-se-á nos estágios irracionais, conforme descrito no modelo teórico. Atenta-se para o produto marginal do fator (PMgxi), o qual não deve ser confundido com o valor do produto marginal do fator (VPMg xi), uma vez que se 10 3670 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 trabalhou com o valor da produção, pois é praticamente impossível trabalhar uma função agregada de produção em termos de unidades físicas de produto. Para a realização da regressão e os testes econométricos, que são o teste t de student e o teste F, foi utilizado o software Econometric EViews versão 5.0. RESULTADOS E DISCUSSÃO Nesta seção serão apresentados e discutidos os resultados obtidos pela estimativa da função de produção Cobb-Douglas agregada. O modelo mostrou-se relevante para os fins analíticos pretendidos. Na primeira parte apresenta-se as estatísticas descritivas das variáveis utilizadas, a seguir a estimativa da função de produção bem como a análise econômica. Na Tabela 1 estão sumarizadas as estatísticas descritivas das variáveis utilizadas no modelo. A média do valor da produção agropecuária do Tocantins foi de R$9.860,19. O município que apresentou o maior valor de produção foi Campos Lindo com R$60.302,00, nesse encontra-se grandes produtores rurais cultivando soja com multinacionais instaladas para armazenamento do produto como Cargil e Bunge. Desde 2005, o município é campeão estadual de exportação de soja, em 2008 a produção de soja representou cerca de 26% da produção estadual. O município Rio da Conceição apresentou o menor valor de produção com R$56,00. É considerado o portal do Jalapão cercada de cachoeiras, rios e habitado pelos índios Xerente, sua economia está centrada no turismo e na agricultura de subsistência, com pouco valor agregado. A área total utilizada no Estado apresentou média de 56.647,55 hectares. Observou-se que o município Paranã apresentou a maior área utilizada com 494.154 hectares e o município de Combinado com a menor área, 166 hectares. A média do capital (investimento e financiamento) no Tocantins foi de R$4.103,71. O município de Campos Lindos, maior produtor de soja, apresentou o maior investimento e financiamento num total de R$31.162,00, em contrapartida Lagoa do Tocantins apresentou a menor média de capital, investido na propriedade, ficando na ordem de R$201,00. 11 Atas Proceedings | 3671 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural TABELA 1 – Descrição estatística das variáveis utilizadas Variável Amostra Valor da Produção Agrícola (R$) Área Total (ha) Capital (Investimento/financiamento) (R$) Mão de Obra Fonte: Resultado da Pesquisa 139 139 139 139 Média Valor Máximo 60.302,00 494.154 31.162,00 3.107 Valor Mínimo 9.860,19 56.647,55 4.103,71 1.027 59,00 166 201,00 79 A média de mão de obra dos 139 municípios do Tocantins foi de 1.027 trabalhadores (homens e mulheres acima de 14 anos). O município de Arraias apresentou o maior número de trabalhadores no campo com 3.107 e o município com menor número de empregados rurais foi Xambioá 79. Os resultados econométricos estimados da função de produção do tipo CobbDouglas indicaram que 52% da variação total ocorrida no valor da produção se explicam pelas variações dos fatores terras totais, capital (financiamento/investimento) e mão de obra. Os coeficientes das variáveis área total, capital (financiamento/investimento) e mão de obra mostraram-se estatisticamente diferentes de zero, o que demonstra a importância deles em termos de política agrícola para o Estado do Tocantins (Tabela 2). TABELA 2 - Estimativa da função de produção do setor agropecuário agregado, para o Estado do Tocantins, 2006. Variável Coeficientes Erros-Padrão t- Statistic Constante 0,1416 0,7119 0,1988 LAT 0,4114 0,0903 4,5530* LK 0,2542 0,1080 2,3523** LMO 0,3300 0,1313 2,5132** 2 R = 0,52 Estatística F = 49,36971 DW=2,11 Multicolinearidade FIV menores que 5 Fonte: Resultado da pesquisa Notas: (*) significativo a 1%, (**) significativo a 5%. Nos testes econométricos (White Heteroscedasticidade, FIV e de normalidade dos resíduos) aceitou-se Ho , significando que o modelo está sem problemas econométricos. A estatística F (49, 3697) demonstra a validade explicativa do conjunto das variáveis satisfazendo todas as pressuposições teóricas básicas do modelo de regressão linear clássico. O teste t-student estimados para cada variável independente, foram significativos a 1% e 5% rejeitando assim H o para cada variável isolada, implicando que 12 3672 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 cada variável independente exerce explicação sobre o valor da produção. Para o teste de Durbin-Watson observa-se que o dc = 2,11 encontra-se na área de aceitação (com α = 5%), indicando que não há autocorrelação serial dos resíduos. Por meio do teste de White constatou-se que o modelo não é heterocedástico. Os erros ui que aparecem na regressão populacional são homocedásticos, ou seja, as observações têm a mesma variância. Com relação ao teste de normalidade dos resíduos, elaborado através do teste de Jarque-Bera, apresentou o Valor-P de 25% de probabilidade de aceitar a H o, de que os resíduos possuem distribuição normal. Para verificar a multicolinearidade foi aplicado o teste FIV (Fator da Inflação da Variância), com o qual contatou-se que o FIV calculador foi menor que 5 em todas as etapas. A matriz de correlação entre as variáveis explicativas apresentou coeficientes de correlação relativamente baixo (r < 0,75), mostrando que não existe multicolinearidade no modelo. Na Tabela 3 estão expostas as elasticidades parciais de produção para cada fator, sua produtividade média, sua produtividade marginal e retornos à escala. TABELA 3 – Elasticidade parcial de produção, valor do produto médio e do produto marginal de cada fator de produção e retorno à escala para o setor agropecuário agregado,Tocantins 2006 Variável Área (ha) Capital (Financiamento/Investimento) Mão de Obra Retorno à escala Fonte: Resultado da pesquisa Elasticidade Parcial VPMe VPMg 0,41 0,25 0,33 0,99 0,17 2,40 9,60 - 0,07 0,60 3,80 - As elasticidades parciais de produção para cada fator são dadas diretamente aos fatores na função Cobb-Douglas, na qual seus valores são: 0,41; 0,25 e 0,33 para os fatores área, capital e mão-de-obra respectivamente. Percebe-se que todos os fatores analisados na regressão, indicam que estão na região racional de produção (estágio II de produção), em que o valor de seus produtos marginais são positivos e suas elasticidades estão entre zero e um. Tem-se ainda que o valor da variável área total apresentou maior elasticidade parcial de produção (0,41) (Tabela 3). A elasticidade total de produção é 0,99, o que traduz retornos constantes à escala (Estágio II); dessa maneira, quando todos os fatores de produção forem aumentados em 13 Atas Proceedings | 3673 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural mil unidades, o valor da produção aumentará em R$990,00. O fator terra (área em ha) apresentou elasticidade parcial de 0,41%, ou seja, para cada um 1% de aumento nesse fator, a produção tende a aumentar em 0,41%. O valor da produção é medido em R$1.000,00, isto quer dizer que o último hectare plantado contribuiu para o aumento no produto médio em R$170,00 e R$70,00 no produto marginal. A elasticidade parcial do capital (financiamento/investimento) indica que o aumento de 1% provoca acréscimo de 0,25% no valor da produção. A unidade do fator R$1.000,00 de capital (investimento e financiamento) tende a aumentar o valor do produto médio em R$2.402,00 e R$600,00 no valor do produto marginal. Em relação à mão de obra, observa-se que o acréscimo de uma unidade tende a aumentar o valor da produção em 0,33%, o valor do produto médio em R$9,60 e R$3,80 no valor do produto marginal. No caso do fator mão-de-obra, os dados dos dois últimos censos mostram queda do pessoal ocupado em atividades agropecuárias em todo o Brasil, esse fenômeno também foi constatado no Tocantins, mas ainda a mão de obra é relevante na produção agropecuária no Estado, mesmo com a modernização agrícola. Em fim a evidência indica que o retorno à escala é de natureza constante a crescente, tendo como fator principal a área total, mão de obra e capital (financiamento/investimento) que foi de caráter expressivo. Os resultados deste estudo corroboram com os resultados encontrados por Alves (2002), Dias e Oliveira (2004) quando estes analisaram a função de produção agropecuária agregada para o estado do Paraná e para o Estado de Goiás respectivamente, com dados do censo agropecuário de 1995-1996. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho teve como objetivo estimar e analisar a função de produção agropecuária agregada do Estado do Tocantins, especificamente pretendeu identificar os principais fatores determinantes da produção e em que estágio de produção o estado se encontra. Pela estimação de uma função de produção Cobb-Douglas agregada para o Estado do Tocantins, o coeficiente de determinação (R2), foi da ordem de 52%, o que constitui evidência de um coeficiente relativamente bom. 14 3674 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Analisando os 139 municípios do Estado do Tocantins, o estudo da função de produção agropecuária leva ao conhecimento das variáveis importantes que podem afetar a produção do Estado. Decisões políticas podem ser tomadas analisando-se a utilização racional dos recursos que oferecem maiores retornos. De acordo com os resultados a variável área total foi a que apresentou a maior sensibilidade. Isto indica que qualquer incentivo em aumentar área resulta numa variação crescente da produção, sua elasticidade parcial foi 0,41. A variável mão de obra apresentou a menor elasticidade parcial de 0,33, pode-se inferir que a agricultura e pecuária do Estado do Tocantins possui alto grau utilização dessa variável. Para a variável capital (financiamento/investimento) a elasticidade mostrou-se significativa indicando que políticas de financiamento tente aumentar a produção no Estado, principalmente de soja, milho e cana de açúcar. Os fatores se mostraram satisfatórios dentro do estágio racional de produção (estágio II) na premissa ceteris paribus, com retornos constantes à escala (conforme testado estatisticamente) para a função de produção. Os resultados deste trabalho refletem o momento econômico do Tocantins, com uma economia em formação, mas com grande potencial de produzir alimentos para o Brasil e o mundo. Este trabalho não esgota o assunto, sugere para futuras pesquisas uma análise nacional e que inclua outras variáveis como, mecanização, educação, transporte de carga e comercialização. Outra sugestão é analisar com mais profundidade a questão da redução de mão de obra no meio rural. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Luiz Batista (2002). Produção Agrícola Agregada do Estado do Paraná. Revista Anhanguera. v 3, n 1, jan/dez, p. 103-121. BACHA, C. J. C. (2012). Economia e Política Agrícola no Brasil. São Paulo: Atlas. CURI, W. F.(1997). Eficiência e fontes de crescimento da agricultura mineira na dinâmica de ajustamento da economia brasileira. Tese (Doutorado em Economia Rural) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. DEBERTIN, D. L. (1986). Agricultural production economics. New York: MacMillian Publishing Company. 15 Atas Proceedings | 3675 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural DIAS, Carlos Antônio Ferreira; OLIVEIRA, Nilton Marques (2004). Estudo da Função de produção Agropecuária Agregada do Estado de Goiás. In: Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, Cuiabá, 2004. Anais. Cuiabá: Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural. FEITOSA, Cid Olival (2011). Do antigo norte de Goiás ao Estado do Tocantins: elementos de uma economia em formação. 217f. Tese de Doutorado em Desenvolvimento Econômico, Unicamp, Universidade de Capinas. GUJARATI, D. N, (2000). Econometria Básica, São Paulo, MAKRON BOOKS, P 846. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) (2012). Censo Agropecuário, Estado de Tocantins, 2006. Disponível em: www.ibge,gov.br . (acesso em: 20 de dezembro de 2012). ______ (2012) Contas nacionais e regionais. Diversos números. Disponível em: www.ibge,gov.br . (acesso em: 20 de novembro de 2012). IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) (2012). Tema Regional Agropecuária. Disponível: http://www.ipeadata.gov.br/ (acesso: em 30 novembro de 2012). LEMOS, J. J. S., FERNANDES, A. J., BRANDT, S. A. (1984). Produtividade de fatores, retornos à escala e desenvolvimento agrícola. Revista de Economia Rural, vol. 22, n. 3, Jul/Set. OLIVEIRA, Nilton Marques; MARQUES, Neiva de Araújo (2002). Função de Produção Agrícola Agregada do Estado de Mato Grosso em 1995. Revista de Estudos Sociais. Ano 4, n 8, p 7-15. OLIVEIRA, E. B. de (1966). Análise econométrica de uma função de produção – milho na Região de Patos de Minas, Minas Gerais. Ano Agrícola 1964/65, MG, 1966. Dissertação de mestrado em Economia Rural, Viçosa, Universidade Federal de Viçosa. VARIAN, Hal R. (2000). Microeconomia: Princípios básicos. Rio de Janeiro: Campus, 5.ed. 16 3676 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 INOVAÇÃO E EMPREENDEDORISMO NO MEIO RURAL. IDENTIFICAÇÃO E DIVULGAÇÃO DE BOAS PRÁTICAS NOS SECTORES AGRÍCOLA E AGRO-INDUSTRIAL CÁTIA RIBEIRO, LUIS MIRA DA SILVA, CRISTINA MOTA CAPITÃO INOVISA – Associação para a Inovação e o Desenvolvimento Empresarial (Tapada da Ajuda 1349-017 Lisboa, Portugal) [email protected]; [email protected]; [email protected] Resumo A inovação e o empreendedorismo são conceitos quase sempre omnipresentes no discurso do desenvolvimento económico e social, usando-se e abusando-se dos mesmos, como se o facto de os usarmos muitas vezes pudesse melhorar as condições sociais e económicas de um sector de actividade ou de uma região desfavorecida. Contudo, pouco ou nada foi ainda feito para tentar compreender os resultados reais dos investimentos que têm sido feitos nesta área e sobre os impactos da inovação e empreendedorismo no meio rural. O objectivo deste trabalho é analisar e compreender o papel da inovação e do empreendedorismo no desenvolvimento rural, com particular enfoque nos sectores agrícola e agro-industrial, mais especificamente nas fileiras das frutas, flores e hortícolas, olival e vinha, e estabelecer boas práticas para que a inovação e o empreendedorismo possam ter um papel, no futuro, cada vez mais importante. Com vista a atingirem-se os objectivos propostos, foram realizadas visitas e entrevistas a empresas “modelo” dentro do sector, tanto nacionais como internacionais. Com base nas mesmas construiu-se um inquérito que foi realizado presencialmente a mais de 100 empresas do sector, com o intuito de fazer a sua caracterização, com enfoque na inovação. Essa informação foi tratada estatisticamente e posteriormente foi cruzada com dados financeiros de algumas dessas empresas. Chegou-se assim a vários resultados interessantes, entre os quais o facto de cerca de 90 % das empresas que apostam na inovação simultânea de produtos, processos e marketing, exportarem os seus produtos, fazendo-o para mercados muito diversificados, como para a América Latina, América do Norte e Ásia. Pelo contrário, das empresas que assumem não inovar, apenas 22 % exportam e todas para mercados semelhantes ao mercado português, na europa mediterrânica. Outros resultados da análise efectuada serão apresentados nesta comunicação. Palavras-chave: desenvolvimento rural, inovação, empreendedorismo, exportação. Atas Proceedings | 3677 1 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Introdução Este projecto, financiado pelo programa PRRN (Programa para a Rede Rural Nacional, do PRoDeR), foi realizado em parceria pelo Instituto Superior de Agronomia (ISA / Universidade de Lisboa), INOVISA – Associação para a Inovação e Desenvolvimento Empresarial e AJAP - Associação de Jovens Agricultores de Portugal. O trabalho efectuado teve por objectivo geral identificar e divulgar boas-práticas nos sectores agrícola e agro-industrial e analisar e compreender o papel da inovação e do empreendedorismo no desenvolvimento do mundo rural, com particular enfoque nos sectores agrícola e agro-industrial e mais especificamente nas fileiras das frutas, flores e hortícolas, olival e vinha. Pretendeu-se, igualmente, estabelecer boas-práticas para que a inovação e o empreendedorismo possam ter um papel, no futuro, cada vez mais importante. Em termos mais concretos, o projecto visava atingir os seguintes objectivos: analisar modelos de inovação e empreendedorismo no meio rural, a nível internacional; analisar o impacto da inovação e do empreendedorismo no desenvolvimento rural em Portugal, nos sectores agrícola e agro-industrial, particularmente nas fileiras das frutas, flores e hortícolas, olival e vinha; estabelecer e divulgar boas-práticas de inovação e empreendedorismo, tendo em vista o desenvolvimento social e económico das zonas rurais. Este projecto é um projecto de ordem prática, suportado por informação concreta e real, com objectivos muito específicos que teve uma calendarização própria decidida a priori. Assim, nunca houve a presunção de ser um projecto académico nem tão pouco de cariz científico. Deste modo alerta-se para o facto de não se ter feito qualquer revisão bibliográfica, nem se ter seguido rigorosamente uma metodologia específica, nem tão pouco se tenha procurado realizar uma análise estatística muito robusta. Não se fez nada disto porque não eram esses os objectivos do projecto, tendo cada tipo de estudos o seu próprio lugar no que se refere a outputs relevantes para o aumento do conhecimento geral. Em vez de uma revisão bibliográfica, fez-se um levantamento de informação e de projectos anteriormente realizados, ou a decorrer, nesta área e foi-se ao terreno “perceber” a realidade. Em detrimento da utilização rigorosa de uma metodologia, “criou-se” uma que permitisse atingir os objectivos da forma mais expedita possível 2 3678 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 com a informação que se conseguiu obter. A análise estatística de dados robusta foi substituída por uma análise simples mas “sincera”, em que não existiu “manipulação” de dados. Metodologia No início deste projecto foram realizadas entrevistas (essencialmente com perguntas abertas) a empresas consideradas exemplares em termos de boas-práticas de inovação e empreendedorismo no meio rural, tanto nacionais como internacionais. Com base nestas entrevistas construíram-se inquéritos (essencialmente com perguntas fechadas) que foram realizados a explorações agrícolas e a agro-indústrias, por técnicos da AJAP e da INOVISA. Com estes inquéritos recolheu-se informação qualitativa e quantitativa sobre as empresas, com especial enfoque na área da inovação (quadro I). As empresas/explorações inquiridas foram escolhidas tendo por base o facto de utilizarem um software de gestão específico (desenvolvido pela empresa Agrogestão), de modo a ser possível, numa fase posterior, recolher e analisar os seus dados financeiros. Posteriormente, os dados dos inquéritos foram analisados utilizando uma estatística muito simplificada e, numa fase subsequente, foram cruzados com os dados financeiros (indicadores financeiros). Foi possível assim cruzar a informação directamente fornecida pelas empresas / agricultores (de carácter qualitativo) com os resultados financeiros realmente obtidos (ou seja, na prática, procurando medir de forma muito objectiva o impacto da inovação e do empreendedorismo). Por fim, e porque se achou necessário, após a análise de toda a informação recolhida, escolheram-se duas empresas, de duas fileiras distintas, para se obter respostas às perguntas que foram surgindo com a análise da informação – case studies. 3 Atas Proceedings | 3679 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural QUADRO I – Informação recolhida através dos inquéritos Recursos Humanos Exportação Tempo de existência das empresas Empresas exportadoras Origem da entidade Nº de produtos exportados Capital Colaboradores dedicados à exportação Tipo de empresa (por VN) Peso da exportação no VN (%) Tipo de empresa (por nº de colaboradores) Destinos das exportações Hectares de produção própria Modo de exportar Colaboradores por faixa etária Certificação que possui Grau de formação académica dos colaboradores Entraves à exportação Inovação Inovam, em pelo menos, 1 das três áreas Finalidade da melhoria/inovação? Colaboradores dedicados à inovação Possui página Web Nº de produtos em portfólio O que permite fazer a página? Existência de produtos inovadores Marketing: que alterações introduziu nos últimos 2 anos? Quem desenvolve os produtos inovadores Inovar nas 3 áreas Os produtos distinguem-se verdadeiramente da concorrência? Produtos inovadores lançados nos últimos 2 anos. Inovar nas 3 áreas Possuir processos inovadores. Modalidades de protecção Financiamento em inovação com retornos positivos Processos inovadores desenvolvidos/aplicados nos últimos 2 anos. 4 3680 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Caracterização da amostra Foram inquiridas 114 empresas, no entanto, após uma primeira análise verificou-se que apenas 111 inquéritos estavam passíveis de fazerem parte do estudo. Do universo de amostragem, 68% das empresas são inteiramente agrícolas, 10% são agro-indústrias e 22% operam em ambos os ramos de actividade. Existem empresas que especializaram os seus serviços actuando numa única fileira, enquanto outras possuem actividades em duas ou três fileiras, sendo que pouco mais de um terço actua na fileira da pecuária e/ou do vinho (Quadro II). Em relação ao capital, este é maioritariamente português (em 98% dos inquiridos). QUADRO II – Percentagem de empresas amostradas por ramo de actividade e por fileira Ramos de actividade Agrícola 68% Agro-industrial 10% Agrícola e agro-industrial 22% Fileira de actuação Pecuária 38% Vinha 37% Cereais 27% Hortofrutícolas e floricultura 22% Olival 21% Os recursos humanos amostrados são “jovens” (maioritariamente entre os 30 e os 49 anos) e “instruídos” (a maioria das empresas possui pelo menos um colaborador com formação superior), denotando-se alguma transferência sistemática de conhecimento entre universidades e as empresas, como se comprou nas entrevistas aos case study. Verifica-se, também, que as fileiras do olival e da vinha são as que mais inovam tanto ao nível dos processos, como dos produtos e do marketing. Mais de metade das 5 Atas Proceedings | 3681 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural empresas destas fileiras inova nestes parâmetros, contra cerca de um terço (ou menos) das empresas das fileiras da pecuária e dos cereais. A fileira da hortifruticultura e flores apresenta-se como um caso intermédio, uma vez que em relação a inovações de marketing perfila pelas fileiras menos inovadoras, mas no que diz respeito aos processos, assemelha-se às fileiras do olival e da vinha (Quadro III). A percentagem de empresas que inova a nível dos produtos situa-se entre os valores dos dois grupos (40%). Curiosamente, ou não, as fileiras que mais inovam são também as que possuem maior percentagem de empresas com página web e as que possuem algum tipo de modalidade de protecção, sendo a eleita o registo de marca. Apenas uma das empresas possui registo de marca. QUADRO III- Percentagem de empresas que inovam em cada um dos parâmetros por fileira Fileira Olival Vinha Hortofrutícolas Cereais Pecuária Produtos Inovadores 69,6% 68,3% 41,7% 20% 23,8% Processos Inovadores 52,2% 65,9% 54,2% 36,7% 31,0% Alterações no Marketing 52,2% 63,4% 25% 13,3% 19% Página Web 68,2% 82, 9% 31, 8% 13, 8% 22,5 % Independentemente da fileira em que operam, a finalidade da introdução das inovações prende-se com a melhoria da qualidade (40%) e com o aumento de eficiência que conduz a uma redução de custos (cerca de 30%). Em relação à exportação, cerca de 50% das empresas amostradas exportam, sendo a fileira da vinha a que fileira que mais exporta. Os principais destinos de exportação são a Europa Central e do Norte (68%) e a Europa Mediterrânea (57%). Contudo, os destinos de exportação dos produtos agrícolas e agro-industriais são tão distintos como os países da América do Norte, da América Latina, da Ásia (oriente) e da África. 6 3682 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Apesar de muito se exportar, existindo empresas cujo volume de negócios provém sobretudo das exportações, foram apontados vários entraves às mesmas, entre os quais as dificuldades burocráticas e administrativas e a concorrência internacional. Resultados Após a caracterização da amostra total dividiu-se a mesma em empresas inovadoras e empresas conservadoras (entendendo-se aqui como conservadoras as empresas que não são inovadoras). A amostra das empresas inovadoras é composta pelas empresas que no inquérito responderam que realizam inovações com regularidade (pelo menos nos últimos dois anos) a pelo menos em um dos três níveis: produtos, processos ou marketing. A amostra das empresas conservadoras é composta por todas as empresas que admitiram não inovar em nada. Utilizando apenas a informação recolhida nos inquéritos tentou-se perceber se existem características diferenciadoras entre os dois extremos da inovação: as empresas que inovam a todos os níveis (produtos, processos e marketing) e as empresas que não inovam em nada. Obtiveram-se resultados muito interessantes no que diz respeito a este assunto (Quadro IV). Por um lado, em corroboração com o que foi descrito anteriormente, a maioria das empresas inovadoras pertencem à fileira da vinha e do olival. O extremo oposto (empresas conservadoras) é composto, sobretudo, por empresas das fileiras da pecuária e dos cereais. Caracterizando as empresas inovadoras, 33% das mesmas possuem mais de 5 colaboradores com formação superior, todas possuem página web, todas estão protegidas pelo registo de marca e 89% das mesmas exporta. No extremo oposto (empresas conservadoras), 22% não possuem qualquer colaborador com formação académica, 91% não possuem qualquer modalidade de protecção, só 4,3% possui página web e apenas 22% exporta. Contudo os resultados mais interessantes prendem-se com a ligação nítida entre inovar e exportar. Para além da diferença nas percentagens de exportações (a maioria das empresas inovadoras exporta, contra um terço das empresas conservadoras) existe uma 7 Atas Proceedings | 3683 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural grande diferença nos destinos de exportação: as empresas inovadoras exportam para os 4 continentes, sendo os principais destinos a América Latina e do Norte e a Ásia, enquanto as empresas conservadoras apenas exportam para a Europa Mediterrânea (quadro IV e V). Quadro IV – Diferenças mais relevantes entre empresas que inovam a nível dos produtos, processos e do marketing e entre empresas conservadoras Variáveis Inovadoras * Conservadoras Colaboradores com formação superior 5% não possui 22% não possui 33% possui mais de 5 Possuem página web 100% 4,3 % Possuem alguma modalidade de protecção 100% 8% Exportam 89% 21,5% Presente em todos os mercados 100 % - apenas para a Europa Mediterrânea Destinos de exportação 81% - América Latina e do Norte; 75% - Ásia; 62,5% - Filo-Escandinávia; Europa Mediterrânea *Empresas que inovam tanto ao nível em todas as áreas: produtos, processos e marketing 8 3684 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 QUADRO V – Percentagem de empresas que exportam para cada destino. Destinos Percentagem (%) Europa Central e do Norte (Alemanha, Holanda, Inglaterra, Luxemburgo, Suíça, Irlanda e Bélgica, França) 67,9 Países de Leste (Polónia, República Checa, Eslovénia, Letónia, Áustria, Croácia, Letónia, Ucrânia, Lituânia, Estónia) 19,6 Europa Mediterrânea (Espanha, Itália) 57,1 Escandinávia (Finlândia, Suécia, Noruega, Dinamarca) 39,3 PALOP (S. Tomé, Cabo Verde, Moçambique e Angola) 41,1 Países Africanos (Marrocos, Quénia, África do Sul) 7,1 América Latina (Brasil, Guatemala, Argentina, Venezuela) 53,6 América do Norte (EUA e Canadá) 53,6 Oriente (China, Tailândia, Hong-Kong, Macau, Taiwan, Indonésia, Singapura, Japão) 48,2 Outros (Austrália, Rússia e Guiné-Bissau) 7,1 Por outro lado, a informação financeira revelou resultados pouco interessantes. Comparou-se o desempenho financeiro das 5 empresas mais inovadoras com o das restantes empresas da amostra (que facultaram informação financeira dos últimos 5 anos), através de indicadores financeiros (autonomia financeira, rentabilidade líquida de capitais próprios, rentabilidade do activo e taxa de crescimento anual).Os indicadores foram escolhidos tendo por base os indicadores utilizados pelo IAPMEI para o ranking da PME líder. Observando os resultados dessa comparação, verifica-se que a inovação não traz, aparentemente, benefícios concretos e observáveis em termos financeiros, sendo excepção a média da taxa de crescimento (do volume de negócios): as empresas inovadoras apresentam, para a média dos cinco anos, crescimentos na ordem dos 23%, enquanto as restantes empresas apresentam taxas de crescimento na ordem dos 5%. 9 Atas Proceedings | 3685 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural QUADRO VI – Indicadores financeiros: resultados médios para 5 anos das empresas inovadoras e das outras Autonomia Financeira Inovadoras 0,38 Outras 0,43 Taxa de Crescimento do Volume de Negócios Inovadoras 0,23 Outras 0,05 Rentabilidade dos Capitais Próprios Inovadoras 0,00 Outras 0,06 Rentabilidade Liquida do Activo Inovadoras 0,01 Outras 0,07 Rentabilidade Liquida por Trabalhador (milhares de euros/trabalhador) Inovadoras -704 Outras -1447 Conclusões Com este estudo foi possível chegar a algumas conclusões inesperadas sobre o tema da inovação no sector. Por um lado, e apesar da amostra estar longe de representar o sector agrícola e agro-industrial nacional, surpreendem pela positiva as características das empresas inquiridas. De facto, são empresas que têm estruturas jovens (as idades dos colaboradores situam-se sobretudo entre os 30 e os 50 anos), “instruídas” (a maioria das empresas possui pelo menos um colaborador com formação superior), e verifica-se que em muitos casos começa a existir uma transferência sistemática de conhecimento entre as universidades e as empresas. Além disso, a juventude e a instrução correlacionam-se, segundo o estudo efectuado, com a capacidade das empresas em desenvolver inovação. Esta correlação, apesar de ser 10 3686 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 expectável, é fundamental para justificar e defender a aposta em medidas que apoiam os jovens que queiram desenvolver actividades no sector. A questão da formação também é muito importante. Numa altura em que a agricultura é tida como uma possível opção para quem está desempregado, é importante referir que a actividade agrícola e agroalimentar não é para todos, que é uma actividade especializada, e que a formação é muitas vezes condição necessária para o sucesso. Outra conclusão a referir é que ambos os sectores (agrícola e agro-industrial) se aperceberam de que ou apostam na diferenciação dos seus produtos e/ou serviços, ou “morrem” (são ultrapassados pela concorrência). Deste modo, verifica-se que a transformação destes sectores tem-se vindo a dar no sentido de aliar a tradição e o conhecimento empírico secular às novas tecnologias e a uma produção mais sustentável (redução de custos e/ou aumento da produtividade) e diferenciadora. Quem inova fá-lo sobretudo porque percebe que a competitividade nesta área não se pode fazer por via dos preços reduzidos. Não conseguimos baixar os custos dos factores de produção para valores que nos tornem competitivos à escala global. Quando o mercado é cada vez mais internacional, isto é, quando dentro e fora do país e da Europa competimos com produtos provenientes de todos os cantos do mundo, torna-se premente que nos consigamos diferenciar de algum modo. Não temos também capacidade de competir com a mão-de-obra barata de alguns países da Ásia, da América Latina e de África, ou com climas e solos que permitem duas colheitas ao ano, como as vindimas no nordeste brasileiro. Assim, urge encontrar uma via para a competitividade, e essa via só pode ser a da qualidade e da diferenciação dos produtos: conjugar boa matéria-prima com a tradição e o saber secular e transformá-las em algo único. Foi a esta conclusão que chegaram todas as empresas consideradas inovadoras deste estudo. Por isso, é natural que os inquiridos dizem que “ou inovam ou morrem”, porque já se aperceberam que este pequeno rectângulo a que chamamos Portugal não pode ser a linha de horizonte de comercialização e, mesmo em Portugal, já lá vai o tempo em que estávamos protegidos do que se produzia e comercializava no resto do mundo. De acordo com o referido acima, e tal como revelam os dados, o grande beneficio da inovação é justamente a abertura de novos mercados. Quem se recusa arriscar, testar e 11 Atas Proceedings | 3687 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural alterar vai-se mantendo à tona de água mas apenas e até ser ultrapassado pela concorrência com preços mais atractivos, no mercado interno e em mercados semelhantes ao nosso e com os quais concorremos directamente (por exemplo, países mediterrâneos). À primeira vista, em termos financeiros (e mais uma vez olhando para os resultados obtidos), poder-se-ia dizer que a inovação piora os resultados financeiros das empresas. Contudo, numa observação mais detalhada dos dados, e após discutir os resultados com as empresas mais inovadoras (case studies), percebe-se que esta não só abre mercados, como permite que, em épocas de crise, como as que se vivem actualmente, estas empresas continuem a ter, em média, uma melhoria continuada e sistemática dos seus indicadores financeiros, além de possuírem taxas de crescimento superiores às que apostam menos na inovação. Existe, assim, uma justificação dada pelos inquiridos dos casos de estudo para esta dissonância entre inovação e resultados financeiros: o facto das empresas inovadoras serem, sobretudo, empresas jovens ou recentemente restruturadas e, como tal, terem sido sujeitas a fortes investimentos nos últimos anos. Estes investimentos não advêm exclusivamente de capitais próprios e, por isso, estas empresas apresentam resultados menos favoráveis do que as empresas que não investiram na criação ou restruturação do negócio nos últimos anos e/ou que não investem com regularidade em I&D. Outro aspecto que se poderia ter analisado e comparado, mas que terá de ficar para uma oportunidade posterior, é a dívida que as empresas têm a fornecedores, assim como perceber quando é que cada uma delas sofreu uma restruturação. Por fim, outro dado interessante observado neste estudo é o facto de a inovação ser quase sempre de várias tipologias (produto, processo, posicionamento,..), mas prende-se muito, nomeadamente na produção, com a optimização dos processos. Há, de facto, uma clara aposta na optimização dos processos pelas empresas, que atinge normalmente um duplo objectivo: redução de custos – electricidade, consumos de água, produtos aplicados,… e redução da pegada ecológica, com claros benefícios para a imagem. Deste modo, a tecnologia é posta ao serviço de uma empresa ambientalmente sustentável e mais eficiente, permitindo que, para um dado nível de qualidade e produtividade, os custos associados ao produto sejam menores. 12 3688 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Também se observa que as empresas mais inovadoras reduzem geralmente o risco de inovarem porque não são, por regra, líderes da criação de algo, são seguidores. Além disso, a maioria das mudanças que fazem na produção, comunicação, e posicionamento de produto, fazem-no em parcerias, oficiais ou não, com fabricantes de equipamentos, com outras empresas do sector, ou com universidades. A tendência geral é ver como os outros fazem, dentro do país e além-fronteiras, testar, e discutir… e só depois avançar. Assiste-se também muitas vezes, em resultado da aposta na inovação por parte da empresas, a uma união de vários agentes destes sectores e a uma desconstrução da ideia de rivalidade entre concorrência. O futuro da inovação no sector agrícola e agro-industrial passa, portanto, em grande parte, pela capacidade de união dos vários intervenientes, por transferir conhecimento entre universidades e empresas, e por colocar a tecnologia e a inovação ao serviço da tradição e qualidade das matérias-primas que temos e das características únicas do clima e do solo em Portugal, com vista à obtenção de produtos de qualidade e diferenciados, mas sempre de modo eficiente, ambientalmente sustentáveis e ao mais baixo custo possível, tornando-nos competitivos dentro e fora das nossas fronteiras. É para aí que caminhamos rumo ao futuro. O caminho é longo e difícil, mas como foi verificado neste projecto, muitas das empresas já estão preparadas para o percorrer, existindo neste momento uma oportunidade única, em termos de apoios, para apostar na inovação. 13 Atas Proceedings | 3689 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Bibliografia Mira da Silva, L., et al. (2009). Inovação e Criação de Novos Negócios. Associação de Jovens Agricultores de Portugal: 104 pp. Tidd, J.; Bessant, J.; Pavit, K. (2005). Managing innovation. John Wiley & Sons Publishing: 632pp. Carvalho, M. (2011). The future FP8. (documento on-line em: http://www.gracacarvalho.eu/xms/files/ACTIVIDADE_PARLAMENTAR/ITRE/Contri butions_FP8/Contributions_MGC_to_FP8site.pdf Comissão Europeia. (2010). COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO - EUROPA 2020: Estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo (documento on-line em: http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2010:2020:FIN:EN:PDF Comissão Europeia. (2011). COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES. Horizonte 2020 - Programa-Quadro de Investigação e Inovação (documento on-line em: http://ec.europa.eu/research/horizon2020/pdf/proposals/com%282011%29_808_final.pd f Comissão Europeia. (2011). Proposta de REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO que estabelece o Horizonte 2020 – Programa-Quadro de Investigação e Inovação (2014-2020) (documento on-line em: http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2011:0809:FIN:pt:PDF Comissão Europeia. (2011). Proposta de REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER). (documento on-line em: http://ec.europa.eu/agriculture/cap-post-2013/legal-proposals/com627/627_pt.pdf Comissão Europeia. (2011). COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO relativa à parceria europeia de inovação «Produtividade e Sustentabilidade no Setor Agrícola». (documento on-line em: http://ec.europa.eu/agriculture/eip/pdf/com2012-79_pt.pdf Oost, I.V. (2013). The European Innovation Partnership “Agricultural Productivity and Sustainability“ Moving Innovation in Agriculture Ahead! (document on-line em: http://ec.europa.eu/research/bioeconomy/pdf/inge-van_oost.pdf. 14 3690 | ESADR 2013 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 UN.(1987).Report of the World Commission on Environment and Development: Our Common Future. (Documento on-line: http://www.un-documents.net/our-commonfuture.pdf, Acesso em: 4.Junho.2012). 15 Atas Proceedings | 3691 3692 | ESADR 2013 AVALIAÇÃO DE IMPACTO SOBRE CONHECIMENTO E A CAPACITAÇÃO: UMA PROPOSTA DE MODELO DANIELA VIEIRA MARQUES M.Sc. em Geografia, Analista [email protected] MIRIAN OLIVEIRA DE SOUZA M.Sc. em Estatística e Métodos Quantitativos, Pesquisadora [email protected] GRACIELA LUZIA VEDOVOTO M.Sc. em Desenvolvimento Sustentável, Analista [email protected] Secretaria de Gestão Estratégica - SGE Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Edifício Sede, Parque Estação Biológica, Av. W3 Norte final, 70770-901, Brasília, DF RESUMO A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa possui uma longa experiência acumulada nos estudos de avaliação de impactos econômicos, sociais e ambientais, utilizando metodologias específicas, que possibilitam uma análise multidimensional dos impactos gerados por suas tecnologias. A avaliação de impactos é antes de tudo um instrumento que permite, a partir dos resultados obtidos, definir os rumos da pesquisa de modo a corrigir efeitos negativos e a maximizar os benefícios transferidos à sociedade e, mais particularmente nesse caso, já que se trata de conhecimento, à comunidade científica. Com o intuito de ampliar essas análises, a Empresa tem direcionado esforços para aprimorar a metodologia de avaliação dos impactos em outras dimensões não tradicionais. Nesse contexto, este artigo tem por objetivo apresentar uma proposta de aprimoramento da metodologia de avaliação expost de impactos sobre conhecimento e a capacitação. O uso de uma metodologia capaz de avaliar os impactos sobre o conhecimento, capacitação e político-institucional, gerados pelos centros de pesquisa da Embrapa, proporciona resultados que permitam aos pesquisadores avaliar em que medida a pesquisa está tomando a direção desejada, se está cumprindo seu papel na promoção do bem-estar social ou de desenvolver insumos para novas pesquisas e, em muitos casos, podem servir também de base para a formulação e orientação de políticas públicas para o setor agropecuário. Ressalta-se também que, em termos institucionais, um dos maiores ganhos para a Embrapa com a avaliação de impactos é torná-la, sobretudo para as unidades de pesquisa que tratam de temas básicos, um processo internalizado e sistematizado. Assim, inovações metodológicas devem ser uma prática das instituições, principalmente as de cunho multidimensional, para que o maior número de benefícios possíveis sejam captados e demonstrados à sociedade. PALAVRAS-CHAVE: Avaliação de impacto, Conhecimento, Capacitação Atas Proceedings | 3693 1 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural 1. INTRODUÇÃO Avaliar é um processo fundamental para o contínuo desenvolvimento das instituições, pois age como um instrumento de gestão e planejamento que permite conhecer o alcance e o retorno dos produtos gerados, desenvolvidos e adotados. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, enquanto instituição pública de pesquisa voltada para o desenvolvimento de inovações para atender ao meio rural, tem buscado avaliar os impactos gerados por seus produtos há mais de uma década. O intuito dessa prática tem sido demonstrar à sociedade seus resultados, justificando os investimentos recebidos. Além disso, avaliar de possibilitar perceber a realidade, planejar o futuro, além de dar subsídios para a prestação de contas dos investimentos feitos na pesquisa, bem como oferecer um aprendizado sobre todo o contexto de geração, transferência e adoção da tecnologia avaliada. Outro efeito a ser medido é a construção da qualidade da tecnologia, pois as avaliações podem apresentar, de forma permanente e integrada, subsídios para a melhoria das pesquisas e da transferência dessa tecnologia. Como a Embrapa tem direcionado seus esforços para aprimorar a metodologia de avaliação dos impactos gerados por suas tecnologias, outras dimensões nãotradicionais como conhecimento, capacitação e político-institucional, também são alvos de estudos, buscando avaliar seus resultados sob um caráter multidimensional e alinhado com seus objetivos enquanto instituição de pesquisa. Dessa forma, com o intuito de contribuir com o constante aprimoramento metodológico realizado, este artigo tem por objetivo apresentar uma proposta de aprimoramento da metodologia de avaliação ex-post de impactos sobre o conhecimento e a capacitação. Nesse contexto, o artigo compõe-se da seguinte forma: a Seção 2 traz a experiência da Embrapa em avaliação de impactos, a proposta metodológica para avaliação de impactos sobre o conhecimento e a capacitação é apresentada na Seção 3 e, a Seção 4, encerra o estudo com as conclusões. 2. A EXPERIÊNCIA DA EMBRAPA EM AVALIAÇÃO DE IMPACTOS A Embrapa é uma instituição formada por uma rede de centros de pesquisa classificados segundo suas missões e o objeto de pesquisa, como: Unidades de pesquisa 3694 | ESADR 2013 2 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 de produto (15 centros) e Unidades de pesquisa ecorregionais (13 centros), como pode ser visto na Figura 1. Fonte: EMBRAPA, 2013a. Figura 1: Distribuição das unidades (centros de pesquisa) da Embrapa pelo território nacional A Embrapa ainda possui outro tipo de centro de pesquisa, chamados de Unidades de pesquisa de temas básicos (9 centros), que geram tecnologias de difícil mensuração quando utilizadas somente as metodologias existentes, conforme figura já citada. A avaliação de impactos realizada na Embrapa já é um processo antigo iniciado com estudos pontuais, nas décadas de 1980/90, principalmente relacionados aos impactos econômicos, como pode ser visto em Avila et al. (2008). A partir de 2001, a avaliação de impactos de tecnologias geradas e adotadas foi institucionalizada, usando nesse processo uma metodologia de referência desenvolvida e adaptada à realidade da Empresa. Os resultados gerados pelas avaliações de impactos das tecnologias são divulgados anualmente no Balanço Social da Empresa (EMBRAPA, 2013b). Assim, ao longo desse período de mais de 10 anos de experiência foram avaliados, anualmente, os impactos de uma amostra de tecnologias geradas, sob o ponto de vista econômico, 3 Atas Proceedings | 3695 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural social, ambiental e também sobre conhecimento, capacitação e político-institucional, conforme será apresentado a seguir. 2.1. A avaliação multidimensional de impactos: breve apresentação A existência de feedback, conhecido por meio da avaliação de impactos, entre a pesquisa e o sistema produtivo é um traço central do processo de inovação (KLINE & ROSENBERG, 1987). A criação e a utilização de métodos de avaliação de impactos de programas tecnológicos fazem parte desse instrumental, pois se revela como ferramenta para a orientação de atividades de pesquisa e participação no processo de inovação (PAULINO et al., 2003). A longa experiência acumulada em diversos estudos de avaliação de impactos econômicos, sociais e ambientais realizados na Embrapa nas últimas décadas foi fundamental para que metodologias fossem aperfeiçoadas e o exercício de avaliar os impactos de suas tecnologias pudesse ser internalizado, sistematizado e realizado anualmente, tornando-se um processo constante na Empresa. Cabe ressaltar que metodologias para avaliação de impactos de qualquer ordem têm sido muito utilizadas em estudos pontuais nos quais, na maioria das vezes se avalia um único impacto, primordialmente, econômico ou ambiental, no atendimento de demandas específicas e muitas vezes sazonais. Nesse contexto, a inovação introduzida pela Embrapa em tal processo, foi à análise multidimensional e periódica de tais impactos. Por isto a experiência da Embrapa tem servido de modelo para outras instituições de pesquisa no Brasil e no exterior. O processo de avaliação de impactos revelou elevados níveis de benefícios econômicos para os produtores adotantes das tecnologias, um significativo número de empregos gerados para a sociedade, melhorias importantes sob os aspectos relacionados a meio ambiente, saúde, nutrição, renda e qualidade de empregos. Os impactos econômicos, sociais e ambientais – principalmente de produtos – já são demonstrados a partir do uso de metodologias adequadas, desenvolvidas por pesquisadores da própria Embrapa. As metodologias, encontradas em Avila et al. (2008), usadas nas avaliações das inovações tecnológicas foram aprimoradas/desenvolvidas por tipo de impacto gerado. Para avaliação do impacto 3696 | ESADR 2013 4 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 econômico é usado o método do Excedente Econômico, aprimorado para atender as peculiaridades das tecnologias desenvolvidas. Para avaliação dos impactos sociais e ambientais foi desenvolvido o Sistema de Avaliação de Impacto Ambiental da Inovação Tecnológica Agropecuária – Ambitec Social e Ambitec Agro, dividido em Agricultura, Produção Animal e Agroindústria. A partir da experiência em avaliação de impactos dos últimos anos, pôde-se observar que as metodologias para a avaliação de impactos das tecnologias na Embrapa têm se demonstrado bastante eficientes para tecnologias desenvolvidas pelos seus centros de pesquisa que desenvolvem, por exemplo, variedades de cultivares, raças melhoradas geneticamente, vacinas para animais, máquinas e equipamentos, sistemas de produção e insumos, temas avaliados com facilidade por tais metodologias. Dessa forma surgiu a necessidade de se desenvolver mais uma metodologia que auxiliasse no processo de avaliação de tecnologias, surgindo assim à avaliação de impactos sobre o conhecimento, capacitação e político-institucional. 2.2. A atual metodologia de avaliação de impactos sobre conhecimento, capacitação e político-institucional da Embrapa O Grupo de Estudos e Organização da Pesquisa e Inovação – Geopi, da Universidade de Campinas – Unicamp, tem desenvolvido trabalhos na temática de avaliação de impactos, inclusive desenvolvendo metodologias para esse fim. Uma das metodologias desenvolvidas a partir da experiência do Geopi/Unicamp foi a metodologia Esac. Esse método, segundo Furtado (2003), integra a avaliação das dimensões econômica, social, ambiental e de capacitação (Esac). O método Esac de Avaliação de Impactos da Pesquisa consiste na mensuração ex-post da intensidade das transformações que um determinado programa de pesquisa e suas consequentes inovações desencadeiam em certos atores sociais. Segundo os criadores da metodologia Esac, a concepção do método de avaliação de impactos procurou inspiração na tentativa de ir além das medidas convencionais – a relação input/output, a análise bibliométrica e a avaliação de retornos econômicos, por exemplo. Tal método contribuiu muito para a atual avaliação dos impactos sobre o 5 Atas Proceedings | 3697 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural conhecimento da pesquisa da Embrapa. Avila et al. (2008) apresentam maiores informações sobre o método Esac e sua influência na metodologia utilizada na Empresa. Para avaliar os impactos sobre o conhecimento, capacitação e políticoinstituicionais, utilizou-se uma variação da dimensão “capacitação” do método Esac, uma vez que a metodologia: a) é comprovadamente eficiente para avaliar impactos dessa natureza; b) é adequada à realidade da Embrapa; e c) envolveu vários técnicos da Embrapa na realização do projeto. A metodologia de avaliação adotada na Embrapa, apresentada na Figura 2, mostra a estrutura das dimensões avaliadas nos quesitos conhecimento, capacitação e político-institucional (políticas públicas ou gestão institucional). Fonte: AVILA et al., 2008. Figura 2: Estrutura de impactos das dimensões conhecimento, capacitação e políticoinstitucional. Para manter certa coerência com o método Ambitec usado na avaliação de impacto nas dimensões ambiental e social, foi utilizada, neste método, a mesma escala que varia de -3 a + 3 estruturada da seguinte forma, conforme descrito na Tabela1: Tabela 1: Descrição da escala utilizada na avaliação das dimensões conhecimento, capacitação e político-institucional Coeficiente Efeito Descrição de alteração muito negativo -3 redução superior a 75 % negativo -1 redução entre 25 % e 75 % sem alterações que representem reduções ou sem mudança 0 aumentos inferiores a 25 % positivo 1 aumento entre 25 % e 75 % muito positivo 3 aumento superior a 75 % Fonte: AVILA et al., 2008. 3698 | ESADR 2013 6 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 A escala descrita (-3, -1, 0, +1, +3) é utilizada para averiguar o coeficiente de alteração atribuído por pesquisadores, professores ou analistas, consultados acerca da tecnologia e possuam vínculo direto ou indireto com a mesma. Para compor a média final de cada indicador, referente aos impactos abordados, a tecnologia deve ser avaliada, no mínimo, por três pessoas. A diferença principal entre esse método e o sistema Ambitec, é o fato de naquele não ser gerado um índice final para os diferentes tipos de impactos, mas apenas médias por indicador de cada impacto avaliado. 3. AVALIAÇÃO DE IMPACTO SOBRE O CONHECIMENTO E A CAPACITAÇÃO A criação e a utilização de métodos de avaliação de impactos de programas tecnológicos é um instrumental para as instituições de forma geral, pois constitui uma ferramenta para a orientação de atividades de pesquisa e participação no processo de inovação (PAULINO et al., 2003). A construção de uma metodologia para avaliação de impactos sobre o conhecimento e demais deve ser uma ferramenta e não um fim em si mesmo. Por isso, o método deve ser discutido no contexto do gerenciamento e da avaliação de políticas, e sua construção deve se apoiar em claras definições dos objetivos que justificam sua utilização. A questão não é simplesmente utilizar uma lista de indicadores, por exemplo, mas criá-los de modo a responderem a determinadas necessidades analíticas do processo de tomada de decisão sobre programas científicos ou tecnológicos. No caso da Embrapa, a avaliação dos outros impactos ajuda a demonstrar os impactos gerados pelos centros que trabalham com temas básicos da pesquisa. A diferença básica entre a metodologia apresentada no item anterior e o método proposto para avaliação dos outros impactos é que na nova metodologia será gerado um índice baseado em indicadores pré-definidos ponderados pelos coeficientes de alteração, e também esses impactos poderão ser quantificados. Nessa proposta optou-se por trabalhar apenas com dois tipos de impactos, conhecimento e capacitação. Assim, essa proposta metodológica leva em consideração a qualificação e a quantificação dos Impactos sobre o Conhecimento e a Capacitação, metodologia que passa a ser 7 Atas Proceedings | 3699 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural denominada como Sistema de Avaliação de Impactos sobre o Conhecimento e a Capacitação da Inovação Tecnológica Agropecuária – AICC. A proposta metodológica apresentada nesse estudo está baseada na metodologia desenvolvida e aplicada nas avaliações de tecnologias já mencionada anteriormente, o Ambitec. Dois são os procedimentos de avaliação proposto neste estudo, o primeiro, usado para captar as mudanças subjetivas provocadas pela adoção da tecnologia, apoiada no segundo procedimento destinado a quantificar os avanços sobre o conhecimento e a capacitação ocorridos após essa adoção. O AICC consiste em solicitar aos responsáveis pelo desenvolvimento e transferência da tecnologia que indiquem o percentual e a quantidade de alteração para cada atributo decomposto dos indicadores avaliados. A fonte dos dados usados na avaliação são pesquisadores, analistas, estagiários, consultores, professores e pessoas de outras instituições que estejam diretamente relacionadas ao desenvolvimento da tecnologia ou que conheçam seus efeitos referentes aos impactos desta natureza. Para gerar o índice de impacto sobre o conhecimento e a capacitação, busca-se expressar as mudanças promovidas pela tecnologia por meio de uma escala que varia de 1 a 5 (Tabela 2), associada a um percentual de mudança, observado pela adoção da tecnologia avaliada, que varia de 0 a 100%, conforme pode ser visto a seguir: Tabela 2: Descrição da escala utilizada na avaliação das dimensões conhecimento, capacitação e político-institucional Descrição Escala até 20% de impacto 1 entre 20% e 40% de impacto 2 entre 40% e 60% de impacto 3 entre 60% e 80% de impacto 4 acima de 80% de impacto 5 Fonte: Organizado pelas autoras Após a quantificação descrita, os indicadores são considerados em seu conjunto, por tipo de impacto, para composição dos índices finais de impacto sobre conhecimento e capacitação da inovação tecnológica agropecuária. Primeiro, pondera-se os coeficientes de impacto para cada indicador, obtidos pela expressão: ∑ 3700 | ESADR 2013 (1) 8 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 em que: CIi = coeficiente de impacto do indicador i; Aji = coeficiente de alteração do variável j do indicador i; Pji = fator de ponderação para importância do componente j na composição do indicador i; m = número de componentes do indicador i. No processo de avaliação, quando algum atributo e/ou indicador for considerado como sem efeito, deve-se considera-lo como Não se Aplica e o seu peso redistribuído para as demais variáveis do indicador, conforme pode ser visto no exemplo apresentado na Tabela 3: Tabela 3: Exemplo de Tabela de coeficientes de alteração da variável Variável 1 Variável 2 Variável 3 Indicador Fatores de ponderação Se sem efeito: marcar com X Escala Coeficiente de impacto = (coeficientes de alteração x fatores de ponderação) 0,5 0,3 0,2 0 0 0 Averiguação fatores de ponderação 1 0,0 Fonte: Organizado pelas autoras O índice final de impacto da inovação tecnológica agropecuária é obtido pela expressão: ∑ (2) em que: II = índice de impacto (conhecimento ou capacitação) da tecnologia; CIi = coeficiente de impacto do indicador i; Pi = fator de ponderação para importância do indicador i na composição do índice de impacto da tecnologia; m = número de indicadores. Assim, a mensuração dos impactos ao tornar-se um procedimento padronizado auxilia no entendimento da dimensão das mudanças que uma tecnologia causa ao ser adotada. A seguir serão descritos os atributos e os indicadores de cada um dos impactos abrangidos por essa metodologia. 3.1. Impacto sobre o Conhecimento Segundo Furtado (2003) um projeto ou programa de P&D costuma gerar, em primeiro lugar, resultados científicos e tecnológicos, os quais são produtos intermediários do processo de inovação, antes que esses conhecimentos venham a ser aplicados em atividades socioprodutivas. 9 Atas Proceedings | 3701 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural A dimensão conhecimento, neste estudo, é composta de sete indicadores que abordam questões relacionadas ao tipo de conhecimento gerado e às formas de transferência desse conhecimento, demonstrados no organograma na Figura 2. Os indicadores adotados na análise desse impacto abrangem: a geração de novos conhecimentos; inovação de técnicas; intercâmbio de conhecimentos; diversidade de conhecimento; patentes protegidas; artigos publicados em periódicos indexados e teses desenvolvidas. Cada um desses indicadores é formado por variáveis/atributos que permitem construir um índice por indicador que ponderados geram o índice final de Impacto sobre o Conhecimento, como será detalhado nos itens a seguir. Geração de novos conhecimentos Geração de novos conhecimentos Influência dos novos conhecimentos Abrangência dos novos conhecimentos Técnicas inovadas Inovação de técnicas e metodologias Grau de inovação das técnicas Metodologias inovadas Grau de inovação das metodologias Intercâmbios com outras Instituições C ONHECIMENTO Intercâmbio de conhecimentos Intercâmbios com outras Embrapas Diversidade de conhecimentos Áreas afetadas pelo conhecimento Diversidade de conhecimento Patentes protegidas no Brasil Propriedade intelectual Patentes protegidas no exterior Cultivares protegidas no Brasil Cultivares protegidas no exterior Artigo em periódico indexado Artigo em anais de congresso Produção técnico científica Resumo em anais de congresso Livro/Série Cocumento/Texto para Discussão Capítulo de livro técnico-científico Tese/ Dissertação defendida Fonte: Organizado pelas autoras Figura 2: Estrutura de impactos da dimensão conhecimento. 3702 | ESADR 2013 10 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 3.1.1- Geração de novos conhecimentos O indicador geração de novos conhecimentos é composto por três variáveis, quais sejam: geração, influência e abrangência dos novos conhecimentos. Na geração de conhecimentos, com peso 0,5 busca-se apontar, por meio da escala já definida, a produção de novos conhecimentos acerca da temática da tecnologia gerada. A influência desses conhecimentos sobre as demais áreas do conhecimento e de pesquisa pode ser medida no terceiro atributo desse indicador (peso 0,3). O terceiro atributo trata da abrangência (peso 0,5) que esses novos conhecimentos gerados atingiram antes (fase de pesquisa) e depois da adoção da tecnologia. 3.1.2- Inovação de técnicas e metodologias As variáveis que compõem esse indicador com seus respectivos pesos: técnicas inovadas, com peso 0,3; grau de inovação das técnicas, com peso 0,2; metodologias inovadas, com peso 0,3; e grau de inovação das metodologias, com peso 0,2. A inovação de técnicas consiste em demonstrar a quantidade de técnicas criadas a partir da tecnologia, referentes apenas ao ano de análise da mesma. Além de quantificar tais técnicas, também é possível qualificar essa inovação no atributo grau de inovação das técnicas. A quantidade de metodologias criadas é um importante instrumento que ajuda a complementar os dados da inovação trazida pela tecnologia avaliada. Metodologias já existentes, também podem ser afetadas pela tecnologia, por isso, essa evolução da metodologia também pode ser mensurada no atributo grau de inovação das metodologias. 3.1.3– Intercâmbio de conhecimentos Os novos conhecimentos criados acerca de uma nova tecnologia não podem e nem devem se restringir aos pesquisadores envolvidos com a geração da tecnologia. Esses conhecimentos precisam alcançar outras instituições, pesquisadores e adotantes de 11 Atas Proceedings | 3703 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural forma geral. Os atributos que compõem esse indicador são: intercâmbio com outras instituições, com peso 0,6 e intercâmbio com outras unidades da Embrapa, com peso 0,4. Dessa forma, medir o intercâmbio de conhecimentos é um fator importante no diagnóstico da transferência e disseminação desses conhecimentos, tanto para outras unidades da Embrapa, criando e fortalecendo redes dentro da Empresa, quanto para outros tipos de instituições, seja ou não de pesquisa. 3.1.4– Diversidade de conhecimentos A diversidade de conhecimentos e as áreas afetadas por ele são os atributos que ajudam a entender como o conhecimento tem sido afetado pela criação e adoção de uma nova tecnologia. Os atributos têm pesos 0,6 (áreas afetadas pelo conhecimento) e 0,4 (diversidade de conhecimento gerados). 3.1.5– Propriedade intelectual O indicador propriedade intelectual compreende o direito de inventores ou responsáveis auferir, ao menos por um determinado período de tempo, recompensa pela própria criação. É composto por três atributos: patentes, cultivares e marcas/símbolos/imagens/nomes com seus respectivos pesos, 0,3, 0,3 e 0,2. As patentes, cultivares e marcas/símbolos/imagens/ abrangem apenas aquelas legalmente protegidas nos órgãos competentes nomes protegidas no Brasil e no exterior. 3.1.6– Produção técnico científica A quantificação da produção técnico-científica relacionada à tecnologia avaliada é composta dos seguintes atributos: artigos em periódico indexado, segundo a classificação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, (CAPES, 2010), com peso 0,35; artigos publicados em anais de congresso com peso 0,15; resumos publicados em anais de congresso, peso 0,05; livro técnico- 3704 | ESADR 2013 12 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 científico/Série Documento, peso 0,2; capítulo de livro, 0,1 e por fim, tese/dissertação defendidas com peso 0,15. Devem ser contadas como teses e dissertações defendidas apenas aquelas cujas defesas tenham acontecido ao longo do ano avaliado. 3.1.7 – Índice de Impacto sobre o Conhecimento Para a construção do índice final do impacto sobre o conhecimento é aplicado um fator de ponderação para cada um dos indicadores descritos. A Tabela 1 mostra a distribuição dos pesos para cada um dos indicadores que compõem o impacto sobre o conhecimento. Efetuada a ponderação e soma dos indicadores, chega-se ao índice final que mostrará o impacto da nova tecnologia gerada sobre o conhecimento. Tabela 1: Índice de Impacto sobre o Conhecimento (P) Coeficiente de impacto (CI) P x CI Geração de novos conhecimentos 0,2 0,00 0,00 Inovação de técnicas e metodologias 0,15 0,00 0,00 Intercâmbio de conhecimentos 0,15 0,00 0,00 Diversidade de conhecimento 0,05 0,00 0,00 Propriedade intelectual 0,2 0,00 0,00 Produção técnico-científica 0,25 0,00 0,00 Indicador Índice Final de Impacto sobre o Conhecimento Peso 1,00 0,00 3.1.8. Quantificando o impacto sobre o Conhecimento Os impactos sobre o conhecimento foram apresentados até o momento de forma qualitativa, conforme detalhado nos itens 3.1.1 a 3.1.7. A partir de agora, buscar-se-á mostrá-los também de forma quantitativa, na qual são levantados os impactos produzidos pela tecnologia em cada um dos indicadores e seus atributos. Os indicadores passíveis de quantificação dentre aqueles analisados na perspectiva qualitativa da avaliação de impactos sobre o conhecimento. Os indicadores são: inovação de técnicas e metodologias, intercâmbio de conhecimentos, propriedade 13 Atas Proceedings | 3705 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural intelectual e produção técnico-científica. A quantificação desses indicadores busca apontar a contribuição da tecnologia avaliada no âmbito da unidade e da própria Embrapa com vistas a demonstrar à sociedade a contribuição da tecnologia na geração de impactos sobre o conhecimento. 3.2. Impacto sobre a Capacitação A dimensão capacitação é composta de seis indicadores que abordam as questões voltadas à capacidade da unidade geradora da tecnologia em se relacionar com outras instituições formando redes e/ou parcerias, compartilhando infraestrutura e informações, bem como, capacitando pessoas para um maior desenvolvimento e disseminação da tecnologia gerada e avaliada. Os indicadores adotados na análise desse impacto, capacidade de se relacionar com o ambiente externo; capacidade de formar redes e de estabelecer parcerias; capacidade de compartilhar equipamentos e instalações; capacidade de trocar informações e dados codificados; capacitação da equipe técnica e capacitação de pessoas externas são mostradas na Figura 3. O índice geral do Impacto sobre a Capacitação é formado pelos indicadores citados, que por sua vez, são constituídos por variáveis/atributos, como será detalhado nos itens a seguir. 3.2.1 – Relacionamento com o ambiente externo A geração de uma nova tecnologia provoca alterações na capacidade da unidade em se relacionar com o ambiente externo. Tais interações são medidas pelo atendimento ao público realizado pessoalmente na unidade (peso 0,4), pelo serviço de atendimento ao cliente feito via internet (peso 0,3) e por carta e telefone (0,3). 3706 | ESADR 2013 14 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 Relacionamento com o ambiente externo Atendimento ao público na unidade Serviço de Atendimento ao Cliente (internet) Serviço de Atendimento ao Cliente (carta/telefone) Parcerias internacionais Formação de redes e estabelecimento de parcerias Parcerias nacionais Redes nacional/internacional Redes nacionais C APACITAÇÃO Compartilhamento de equipamentos e instalações Equipamentos compartilhados Instalações compartilhadas Troca de informações e dados codificados Dados codificados trocados Informações trocadas Captação de recursos nacionais públicos Capacidade de captar recursos Captação de recursos nacionais privados Captação de recursos internacionais públicos Captação de recursos internacionais privados Curso - Treinamento Transferência de Tecnologia Dia de campo Palestra - Seminário Workshops Outros eventos Folder/Folheto/Cartilha Produzido Difusão de imagem Vídeo/DVD produzido Vitrine Tecnológica/Unidade Demonstrativa/Observação Prosa Rural Matéria Jornalística Fonte: Organizado pelas autoras Figura 3: Estrutura de impactos da dimensão capacitação. 3.2.2 – Formação de redes e estabelecimento de parcerias A formação de redes e o estabelecimento de parcerias é uma capacidade que surge no desenvolvimento da tecnologia e segue enquanto a tecnologia está sendo adotada. O impacto desse indicador é contado pelo número de redes e parcerias 15 Atas Proceedings | 3707 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural formadas. As redes nacionais/internacionais têm peso 0,35, já as redes nacionais e as parcerias internacionais têm ambas peso 0,25 e, as parcerias nacionais, peso 0,15. As redes podem ser constituídas pelo conjunto de diversos tipos de entidades fora do âmbito da Embrapa e também por outras unidades da empresa. Podem ser formadas por entidades nacionais, e também por uma rede mista, envolvendo entidades nacionais e internacionais. As parcerias se dividem em nacionais e internacionais e é uma relação de colaboração entre pessoas e/ou instituições com vista à realização de um objetivo comum. Tanto a formação de redes quanto o estabelecimento de parcerias podem ser estabelecidas na construção do projeto, desenvolvimento da tecnologia e também no processo de transferência da mesma. 3.2.3 – Compartilhamento de equipamentos e instalações O compartilhamento tanto de equipamentos quanto de instalações é um indicador que mostra a capacidade da unidade da Embrapa em maximizar o uso de estruturas e a partir dela estabelecer contato com outras instituições no sentido de criar/desenvolver uma tecnologia. Esse indicador é medido pelos equipamentos (peso 0,6) e instalações (peso 0,4) compartilhados. 3.2.4 – Troca de informações e dados codificados A troca de informações e dados codificados demonstra a capacidade da unidade em se relacionar com vistas a ampliar, discutir e divulgar os resultados relativos à tecnologia desenvolvida e avaliada. Os atributos dados e informações codificados trocados compõem esse indicador, com pesos 0,6 e 0,4, respectivamente. A quantidade de informações trocadas é um atributo medido qualitativamente de acordo com o desenvolvimento do projeto e da adoção da nova tecnologia. No atributo dados codificados são contados o número desse tipo de dado que é trocado entre as instituições envolvidas com a tecnologia avaliada. 3708 | ESADR 2013 16 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 3.3.5 – Capacidade de captar recursos A demanda por diferentes fontes financiadoras para a geração/transferência da tecnologia avaliada é um indicador na medida em que mostra a versatilidade da unidade em buscar novas fontes de financiamento. Os atributos que formam esse indicador são: captação de recursos nacionais públicos advindos de fontes federais, estaduais e municipais (peso 0,2) e fundos privados (peso 0,3); captação de recursos internacionais públicos (0,25) e privados (0,25). 3.2.6 – Transferência de tecnologia A partir do desenvolvimento da nova tecnologia, surge a necessidade de se promover a transferência e a capacitação dos interessados em adotar/disseminar tal tecnologia. Para tanto podem ser desenvolvidos diversos tipos de ações que atendam a necessidade do momento, tais como: cursos/treinamentos (peso 0,3), palestras/seminários (peso 0,2), workshops (peso 0,2), outros eventos (peso 0,2) e dias de campo (peso 0,1). 3.3.7 – Difusão de Imagem O lançamento de uma tecnologia no mercado implica numa promoção da imagem da Embrapa provocando um impacto positivo na divulgação do nome da empresa nos meios de comunicação em geral. Os atributos que compõem esse indicador são: matéria jornalística nacional e internacional, ambas com peso 0,3 e, folder/folheto/cartilha e vídeo/DVD produzido, cada um com peso 0,2. 3.2.7 – Índice de impacto sobre a capacitação Na construção do índice final de impacto sobre a capacitação é aplicado um fator de ponderação para cada um dos indicadores descritos. Como pode ser visto com a Tabela 2, a cada indicador é atribuído um peso. Após a ponderação dos dados e soma dos indicadores analisados tem-se o índice de impacto sobre a capacitação gerado pela nova tecnologia. 17 Atas Proceedings | 3709 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Tabela 2: Índice de impacto sobre a capacitação Indicador Peso Relacionamento com o ambiente externo Formação de redes e estabelecimento de parcerias Compartilhamento de equipamentos e instalações Troca de informações e dados codificados Capacidade de captar recursos Transferência de Tecnologia Difusão de imagem (P) 0,15 0,20 0,20 0,15 0,10 0,10 0,10 Índice Final de Impacto sobre a Capacitação 1,00 Coeficiente de impacto (CI) 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 P x CI 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 3.2.8 – Quantificação do impacto sobre a Capacitação Os impactos sobre a capacitação foram apresentados até o momento de forma qualitativa, conforme detalhado nos itens 3.2.1 a 3.2.7. Além disso, tal impacto também pode ser quantificado. Os indicadores passíveis de quantificação dentre aqueles analisados na perspectiva qualitativa da avaliação de impactos sobre a capacitação são: relacionamento com o ambiente externo, formação de redes e estabelecimento de parcerias, compartilhamento de equipamentos e instalações, captação de recursos, transferência de tecnologia, e difusão de imagem. A quantificação desses indicadores busca apontar a contribuição da tecnologia avaliada no âmbito da unidade e da própria Embrapa com vistas a demonstrar a sociedade a contribuição da tecnologia na geração de impactos sobre a capacitação. 4. CONCLUSÃO Os processos de avaliação ajudam a legitimar a tecnologia e por consequência a própria ciência, comprovando de forma mais efetiva que há correlação positiva entre produção científica e bem-estar econômico e social. O uso de uma metodologia capaz de avaliar os impactos sobre o conhecimento, capacitação, gerados pelos centros de pesquisa da Embrapa, proporciona resultados que 3710 | ESADR 2013 18 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 permitem aos pesquisadores avaliar em que medida a pesquisa está tomando a direção desejada, se está cumprindo seu papel na promoção do bem-estar social ou de desenvolver insumos para novas pesquisas e, em muitos casos, podem servir também de base para a formulação e orientação de políticas públicas para o setor agropecuário. O desenvolvimento da metodologia AICC teve como intuito, especialmente, avançar nos processos de avaliação de impactos das unidades de pesquisa de temas básicos da Embrapa, uma vez que a experiência dos últimos anos em avaliação da pesquisa na empresa revelou a dificuldade das metodologias tradicionais em captar os benefícios gerados pela pesquisa de centros dessa natureza. É importante destacar que a partir da análise dos relatórios de impactos disponibilizados por todos os tipos de Centros de Pesquisa da Embrapa foi observado que a metodologia tem sido eficiente para avaliar os impactos sobre conhecimento, capacitação e político-institucionais da pesquisa gerada também pelas unidades de pesquisa de produtos e pelas unidades agroflorestais ou agropecuárias nas ecorregiões brasileiras. No entanto, os resultados levantados não estão sendo divulgados à sociedade por meio do Balanço Social da Embrapa, como são feitos com os outros impactos. Por isso, a metodologia proposta nesse estudo buscou dar mais um passo nessa perspectiva de dar visibilidade ao maior número de impactos quantos sejam possíveis. Nesse contexto a metodologia do AICC se coloca como uma ferramenta muito importante. Ressalta-se também que, em termos institucionais, um dos maiores ganhos para a Embrapa com a avaliação de impactos sobre o conhecimento e a capacitação é tornar a avaliação de impactos dessa natureza, sobretudo para as unidades de pesquisa de temas básicos, um processo internalizado e sistematizado. A avaliação de impactos é antes de tudo um instrumento que permite, a partir dos resultados obtidos, definir os rumos da pesquisa de modo a corrigir efeitos negativos e a maximizar os benefícios transferidos à sociedade e, mais particularmente nesse caso, já que se trata de conhecimento e capacitação, à comunidade científica. Portanto, as inovações nas metodologias de avaliação de impactos devem se tornar uma prática das instituições voltadas para a pesquisa, principalmente as avaliações de cunho multidimensional, para que o maior número de benefícios sejam captados e demonstrados à sociedade. 19 Atas Proceedings | 3711 VII Congresso da APDEA, V Congresso da SPER, I Encontro Lusófono em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Avila, A. F. D.; Rodrigues, G. S.; Vedovoto, G. L. (ed.). (2008). Avaliação dos impactos de tecnologias geradas pela Embrapa: metodologia de referência. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica. 189 p. Capes. (2010). Qualis Periódicos. Disponível em <http://www.capes.gov.br/avaliacao/ qualis> Acesso em 9 jun. Embrapa. (2013a). Mapa das unidades da Embrapa no Brasil. Disponível em: <http://www.embrapa.br/a_embrapa/enderecos/mapa1_uni_br_simpl_v2.jpg/image_vie w_fullscreen>. Acesso em: 15 jul. Embrapa. (2013b). Balanço Social da Pesquisa Agropecuária Brasileira. Brasília, DF: Embrapa, Secretaria de Comunicação, Secretaria de Gestão Estratégica. Furtado, A. T. (2003) Políticas públicas para a inovação tecnológica na agricultura do estado de São Paulo: métodos para avaliação de impactos de pesquisa, dimensão capacitação. Campinas, SP: UNICAMP – GEOPI. p. 45-60. Kline, S. e Rosenberg, N. (1987). An overview of innovation. In: Landau, R.; Rosenberg, N. (ed.). The positive sum strategy. Washington, DC: National Academy of Press. p. 275-306. Paulino, S. R.; Rodrigues, G. S.; Salles-Filho, S. L. M.; Bin, A. (2003) Impactos ambientais na agricultura: um método de avaliação de programas tecnológicos. In: Seminario Latino-Iberoamericano de Gestión Tecnológica - Altec, 10. 2003, Cidade do México. Anais... Cidade do México: Altec. p.1-16. 3712 | ESADR 2013 20 Sistemas de Conhecimento e Inovação para o Desenvolvimento Agrícola e RuralP11 USO DE ANÁLISE MULTIVARIADA NA CONSTRUÇÃO DOS ÍNDICES DE IMPACTOS SOCIAIS E AMBIENTAIS DAS TECNOLOGIAS DA EMBRAPA MIRIAN OLIVEIRA DE SOUZA M.Sc. em Estatística e Métodos Quantitativos, Pesquisadora [email protected] DANIELA VIEIRA MARQUES M.Sc. em Geografia, Analista [email protected] GERALDO DA SILVA E SOUZA Ph.D. em Estatística, Pesquisador [email protected] GRACIELA LUZIA VEDOVOTO M.Sc. em Desenvolvimento Sustentável, Analista [email protected] Secretaria de Gestão Estratégica - SGE Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Edifício Sede, Parque Estação Biológica, Av. W3 Norte final, 70770-901, Brasília, DF RESUMO A metodologia usada atualmente na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa para avaliar os impactos sociais e ambientais das tecnologias geradas pelos seus centros de pesquisa é denominada Sistema de Avaliação de Impacto de Inovações – Ambitec. Esta metodologia é composta por indicadores ponderados que são dependentes de critérios subjetivos, não permitindo avaliar a influência de cada indicador sobre os demais e nem sobre o índice final gerado. Desse modo, a proposta deste artigo é definir novos pesos na construção dos índices de impacto social e ambiental das tecnologias da Embrapa por meio do uso de métodos estatísticos de análise multivariada, buscando oferecer uma alternativa de análise ao método usado atualmente na Empresa. A abordagem metodológica aqui utilizada padroniza todas as variáveis, com o intuito de eliminar a influência de localização e escala. Essa padronização é feita subtraindo-se de cad