editorial

Transcrição

editorial
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
INSTITUCIONAL
DIRETORIA
Presidente: Ronaldo Fredolino Wendland
Vice-Presidente: Hordi Felten
1ª Secretária: Lurdi Bender
2º Secretário: Mara Tesche Meincke
1º Tesoureiro: Valdemar Blum
2º Tesoureiro: Flávio Fleck
CONSELHO FISCAL
Laudomir Lampert
Ivo Novotny
Dalva Lenz de Souza
Nelsi Eichelberger
CONSELHO DELIBERATIVO
Ernani Krause
Ronald Kirchhof
Erni Drehmer
EDITORIAL
Com o intuito de oferecer à comunidade
acadêmica e regional os frutos colhidos pelas
pesquisas de docentes e estudantes, cada vez
mais preocupados com a qualidade da
discussão de assuntos pertinentes e atualizados
nas diversas áreas em que a Sociedade
Educacional Três de Maio – SETREM atua.
Nesta revista o leitor poderá transitar por
diversas áreas de conhecimento, constituindo-se
um instrumento de pluralidade científica para
consolidar a missão da Instituição que é:
“produzir, desenvolver e socializar o
conhecimento para a promoção da qualidade de
vida, alicerçada nos valores cristãos”.
Diretor geral – Flávio Magedanz
Vice-diretor Faculdade Três de Maio – Paulo
Renato Manetzeder Aires
Vice-diretora Centro de Ensino Médio – Zenaide
Tesche Heimerdinger
Conselho Editorial: Adalberto Lovato, Cláudia
Verdum Viegas, Cristiano Henrique Antonelli da Veiga, Fauzi
de Moraes Schubeita, Gilberto Souto Caramão, Jorge Antônio
Rambo, Liane Beatriz Tesche Roedel, Mário Luiz Santos
Evangelista, Rafael Marcelo Soder, Renata Amélia Roos,
Roque Ismael da Costa Güllich, Valmir Heckler, Vera Lúcia
Lorenset Benedetti, Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber
e Zenaide Heinsch
Nesse sentido a SETREM está fortemente
comprometida com a inovação, a mudança e
busca de soluções para a comunidade onde se
encontra inserida.
A escola é a articuladora das formas de
despertar o desejo pelo conhecimento,
alicerçando aspectos intelectuais, técnicos,
humanos e a formação do cidadão, levando-o a
agir de forma crítica, ética e criativa para o
desenvolvimento da sociedade.
Comissão Científica Interna (avaliadores):
Ms Adalberto Lovato, Ms Cláudia Verdum Viegas, Ms
Cristiano Henrique Antonelli da Veiga, Ms Evandir Bueno
Barasuol, Ms Fauzi de Moraes Schubeita, Ms Gilberto Souto
Caramão, Dr Mário Luiz Santos Evangelista, Ms Rafael
Marcelo Soder, Drdo Roque Ismael da Costa Güllich, Ms
Valmir Heckler, Ms Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber,
Ms Vera Lúcia Lorenset Benedetti e Ms Zenaide Heinsch.
Esperamos que este número possa
despertar a curiosidade, a busca por integração
entre docentes, estudantes, empresas e
Instituições, através do diálogo e a integração
entre o ensino, a pesquisa e a extensão.
Comissão Científica Externa (avaliadores)
Ms Tagli Dorval Mairesse Mallmann - FGV, Dr Carlos
Ricardo Rossetto – UNIVALI (SC), Dr Sedinei Nardelli Beber
– PUC/RS, Dra Cláudia Regina Bonfá – UFSC (SC), Dra
Soraia Napoleão Freitas – UFSM (RS), Dra Olgamir
Francisco de Carvalho – UNB (DF), Dra Cristiane Koehler –
FATEC SENAC (RS), Dr João Bosco Mangueira Sobral –
UFSC (SC), Dra Marlene Gomes Terra – UFSM (RS) e Ms
Vera Lúcia Fortunato Fortes – UPF (RS).
É com imensa satisfação que
apresentamos a Revista SETREM nº. 11,
agradecendo a todos os que contribuíram com
seus artigos e deixando o convite para todos
aqueles que quiserem utilizar esse instrumento
para divulgação de suas pesquisas e discussões.
Capa e Diagramação: Assessoria de Comunicação SETREM
Revisão: Carla Matzembacher
Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Conselho Editorial Revista SETREM
Revista SETREM: Revista de Ensino e Pesquisa/
Sociedade Educacional Três de Maio
Três de Maio: Editora SETREM.
Publicação Semestral
1
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
ADMINISTRAÇÃO
ANÁLISE DA QUALIDADE DOS SERVIÇOS PRESTADOS PELAS INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS NO MUNICÍPIO DE TRÊS DE MAIO .................................. 19
Adriano Alberto Rambo
Dinara Maldaner Hahn
Mariane Tiecher
Ms.Sandro Ergang
MODELO CONTIGENCIAL NA GESTÃO EMPREENDEDORA DAS
REDES DE COOPERAÇÃO .............................................................. 10
Jorge Antonio Rambo
Janis Elisa Ruppenthal
Mário Luiz Santos Evangelista
PANORAMA DO TRANSPORTE DE CARGAS BRASILEIRO ........... 19
Felicita Maria Peiter
Pablo Brum da Silva
Tatiana Colatto Schapanski
Cristiano Henrique Antonelli da Veiga
EDUCAÇÃO
ALGUNS
DISCURSOS
SOBRE
A
CONSTRUÇÃO
DA
CRIANÇAINFÂNCIA ........................................................................ 30
Elisabete Andrade
A PROFISSIONALIZAÇÃO DO TRABALHO DOS FUNCIONÁRIOS DE ESCOLA:
POSSIBILIDADES EM EDUCAÇÃO E GESTÃO DE PESSOAS...................... 36
Rúbia Emmel
Renata Amélia Roos
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber
SAÚDE
AUTOCUIDADO
E
RISCOS
OCUPACIONAIS:
VISÃO
DOS
PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM .............................................. 43
Daniele Beatriz Reis
Jane Lílian Ribeiro Brum
GRAVIDEZ
NA
ADOLESCÊNCIA
E
A
EVASÃO
ESCOLAR
PERCEPÇÕES E DIFICULDADES ................................................... 50
Juliane Alegranzzi
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber
Mirian Herath Rascovetzki
2
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
O COTIDIANO DO FAMILIAR CUIDADOR DO PACIENTE EM DIÁLISE
PERITONEAL DOMICILIAR1 .......................................................... 62
Luis Rafael Alfonço
Paulo Alexandre Oliveira de Lima
Vera Lucia Fortunato Fortes
O PAPEL DO CUIDADOR NOS CUIDADOS AO INDIVÍDUO PORTADOR
DA DOENÇA DE ALZHEIMER ......................................................... 69
Ademir de Freitas
Magna Denis Hoffmann
Rafael Marcelo Soder
PERCEPÇÕES DE CASAIS COM INFERTILIDADE ......................... 76
Vanessa Taís Hünemeier
Jane Lílian Ribeiro Brum
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
ESTUDO DE MELHORES PRÁTICAS DE GERENCIAMENTO DE
PROJETOS E UTILIZAÇÃO EM EMPRESAS DA REGIÃO FRONTEIRA
NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL...................... 84
Delson Liebert
Elisandra Martinha Demboski
Vera Lúcia Lorenset Benedetti
PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DE UMA FERRAMENTA DE
GERENCIAMENTO ELETRÔNICO DE DOCUMENTOS PARA UMA
INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR ........................................... 91
Daniela Schmidt
Pablo Miguel de Almeida Mucha
Denis Valdir Benatti, Antônio Ternes
3
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
ANÁLISE DA QUALIDADE DOS SERVIÇOS
PRESTADOS PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
NO MUNICIPIO DE TRÊS DE MAIO
¹ Adriano Alberto Rambo
² Dinara Maldaner Hahn
³ Mariane Tiecher
4
Ms.Sandro Ergang
5
Sociedade Educacional Três de Maio
was used for the achievement of the objectives of
the research, that not only searched to identify the
perception of quality concerning the banking services
offered by institutions, but also to know the dimensions of
the perceived quality that have greater importance to them.
SERVQUAL tool that searches to measure existing GAPs
of quality between the expectations and its perceptions in
relation to services was used. It was verified that the
institutions, although they present satisfactory
performance, had not yet surpassed any of the
expectations of the customers. From this research,
financial institutions of the city can evaluate the
preferences and expectations of its customers and
improve its services in order to supply them.
RESUMO
O presente artigo visa analisar a qualidade percebida
em serviços bancários, por meio da aplicação da escala
SERVQUAL. A pesquisa foi realizada no município de Três
de Maio, localizada no Noroeste do Estado do Rio Grande
do Sul. Foram comparadas as expectativas e percepções
dos usuários das instituições financeiras. Uma amostra
de 180 clientes foi utilizada para a consecução dos
objetivos da pesquisa, que buscou não só identificar a
percepção de qualidade acerca dos serviços bancários
oferecidos pelas instituições, mas também conhecer as
dimensões da qualidade percebida que têm maior
importância para estes. Foi utilizada a ferramenta
SERVQUAL que busca mensurar os GAPs de qualidade
existentes entre as expectativas e suas percepções em
relação aos serviços. Verificou-se que as instituições,
apesar de apresentarem desempenho satisfatório, ainda
não superaram nenhuma das expectativas dos seus
usuários. A partir desta pesquisa, as instituições financeiras
do município podem avaliar as preferências e expectativas
de seus clientes e melhorar seus serviços a fim de suprir
as mesmas.
Keywords: SERVQUAL, quality and services
INTRODUÇÃO
As expectativas dos clientes são crenças a respeito
da execução dos serviços que funcionam como padrões
ou pontos de referência com relação aos quais o
desempenho é julgado. Em razão dos clientes
compararem suas percepções do desempenho com
esses pontos de referência quando avaliam a qualidade
dos serviços, o conhecimento completo sobre a
expectativa dos clientes é fundamental para os
profissionais.
Palavras Chave: SERVQUAL, qualidade e serviços.
ABSTRACT
The present article aims to analyze the perceived
quality in banking services, through the application of
SERVQUAL scale. The research was done in Três de
Maio, located in northwest region of the state of RS.
Expectations and perceptions of the users of the financial
institutions had been compared. A sample of 180
customers
Conhecer o que o cliente espera é o primeiro e
possivelmente o mais importante passo na prestação de
um serviço de qualidade. Estar errado acerca do que os
clientes querem pode significar a perda de um negócio
com o cliente, bastando, para tanto, que a empresa
concorrente acerte o alvo com exatidão. Estar errado pode
também significar o desperdício de dinheiro, de tempo e
1- Acadêmico do Curso Bacharelado em Administração – [email protected];
2- Acadêmica do Curso Bacharelado em Administração – [email protected]
3- Acadêmica do Curso Bacharelado em Administração – [email protected]
4- Professor Orientador
5- Avenida Santa Rosa, nº 2405, Três de Maio - RS
4
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
de outros recursos como coisas que são relevantes para
o consumidor. Estar errado pode significar até mesmo a
não-sobrevivência de um mercado de violenta
concorrência.
ou saúde), que é essencialmente intangível e dedicado,
primordialmente, a quem compra. Ainda nessa linha de
raciocínio, eles definem serviços como “um ato ou
desempenho essencialmente intangível que uma parte
pode oferecer a outra e que não resulte na posse de
nenhum bem. Sua execução pode ou não estar ligada a
um produto físico”.
Dessa forma, a busca pela qualidade é uma
condição imposta tanto pelo mercado quanto pela
melhoria contínua da tecnologia, dos processos internos,
das metas e valores da organização. Neste caso, a maior
contribuição da aplicação do conceito moderno de
qualidade é a busca em preencher a lacuna que existe
entre os aspectos técnicos dos produtos e serviços e a
capacidade de compreender e atender bem aos clientes.
Os serviços aparecem como um diferencial
característico da era do cliente, pois a intenção em
oferecê-lo aliado ao produto é aumentar o valor percebido
pelo consumidor.
Os consumidores têm um período de avaliação
mais difícil que no caso de bens de consumo, em parte
pelo fato dos serviços serem intangíveis e nãopadronizados e em parte por haver uma íntima relação
entre consumo e produção. Tais características levam as
diferenças nos processos de avaliação dos consumidores
acerca de bens e serviços em todos os estágios do
processo de compra. Existem quatro categorias de
comportamento do consumidor que correspondem a
estágios do processo de compra: (1) busca de
informação, (2) avaliação de alternativas, (3) compra e
consumo e (4) avaliação pós-compra. A falta de
compreensão de como os clientes avaliam e escolhem
os serviços nestes quatro estágios fundamentais leva a
uma lacuna de mercado que terá de ser preenchida pelos
profissionais de marketing de serviços.
Quando se fala em qualidade em serviços, tem-se
um tema completo, necessitando de uma definição de
cinco dimensões: confiabilidade, atendimento, segurança,
empatia e tangibilidade. O conceito se baseia na diferença
entre a expectativa de um cliente com relação ao serviço
e sua percepção de como ele é prestado. Com isto, optouse pela aplicação de uma mensuração da qualidade dos
serviços prestados pelas instituições financeiras, com a
utilização do instrumento SERVQUAL. Para alcançar essa
mensuração foram propostos os seguintes objetivos:
identificar as expectativas dos usuários em relação aos
serviços prestados pelas instituições financeiras;
mensurar o serviço prestado atualmente pelas instituições
financeiras; analisar se os serviços prestados estão de
acordo com os serviços esperados pelas pessoas que
usufruem destes.
2.2 Expectativas em Serviços
1. METODOLOGIA
Pensando na execução dos serviços como peças
de dramaturgia, pode-se tratar cada participante como
tendo um papel na execução dos mesmos. O sucesso
de toda prestação de serviços depende em parte de quão
bem um “conjunto de papéis” ou de atores – tanto clientes
como executores de serviços – desempenham seus
papéis. Os executores de serviços devem fazê-lo de
acordo com as expectativas dos clientes; senão os
clientes podem ficar desapontados e frustrados. O papel
do cliente também deve ser bem desempenhado. Se os
clientes são informados e orientados acerca das
expectativas e das prerrogativas dos serviços, e se o
cliente coopera com o prestador de serviços, é muito
provável que a prestação de serviço seja bem sucedida.
A metodologia utilizada para a realização da
pesquisa, quanto ao método de abordagem, foi utilizado
o método dedutivo para se chegar às constatações mais
particulares. No que se refere aos procedimentos, usouse os seguintes métodos: método bibliográfico e o método
dedutivo. Já nas técnicas, foram adotadas a pesquisa
bibliográfica e documental, e a pesquisa exploratória
utilizando a ferramenta SERVQUAL, que consiste em um
questionário formado por 22 questões, respondidas sobre
dois aspectos (serviço percebido e serviço desejado), que
resultam em 44 respostas. Quanto à população e à
amostra, foi utilizada uma amostragem aleatória
estratificada. Foram pesquisados 180 usuários e clientes
das instituições financeiras do município de Três de Maio.
A margem de erro utilizada nestas pesquisas foi de 7%;
por isto, chegou-se a este número de entrevistados.
2.3 Qualidade dos Serviços
Em serviço, a avaliação da qualidade surge ao
longo do processo da prestação que geralmente ocorre
no encontro entre um cliente e um funcionário da linha de
frente. A satisfação do cliente com a qualidade do serviço
pode ser definida pela comparação da percepção dos
serviços prestados e com a expectativa do serviço
desejado.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Conceitos de Serviços
Conforme Kotler e Armstrong (1998), “serviços são
atos, processos e performances”, como também todas
as atividades econômicas cujo produto não é físico ou
construído. O serviço é consumido na hora em que é
produzido e provê valor agregado (em formas, como:
conveniência, divertimento, economia de tempo, conforto
A qualidade em serviços está diretamente ligada
à satisfação com o serviço. Um cliente satisfeito
com o serviço recebido o percebe como um
serviço de qualidade. E, além de provavelmente
5
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
voltar a contratar o serviço ou indique a outras
pessoas com as quais se relacione. A qualidade
percebida é determinada pela diferença entre a
qualidade esperada e a qualidade
experimentada, ou seja, é a diferença entre as
percepções e expectativas dos clientes
(REIS,2001 p. 62 ).
O presente estudo está baseado nas dimensões
elencadas por Hoffmann (2003), visto que as mesmas
se adaptam melhor aos serviços financeiros.
A qualidade percebida pelo consumidor é o
julgamento a respeito da excelência geral ou
superioridade do fornecedor. O que os clientes fazem é,
em resumo, comparar o serviço que recebem com o
serviço que, segundo suas expectativas, deveriam
receber. O julgamento na qualidade resultará do grau e
da direção do afastamento (ou discrepância) entre as
expectativas e o que efetivamente foi recebido do
fornecedor.
Para uma empresa prestadora de serviços ser bem
sucedida, é necessário que ela saiba atender e, talvez
exceder as expectativas dos clientes. Deve definir as
expectativas do ponto de vista do cliente – e não do ponto
de vista da própria empresa, ou seja, do ponto de vista
de um funcionário, do gerente ou do presidente.
2.5 Satisfação dos Clientes
O consumidor tem mais dificuldade de avaliar um
serviço do que um produto. A percepção da qualidade do
serviço resulta da comparação de que o consumidor faz
entre as suas expectativas a respeito do serviço e o
serviço recebido de fato.
Assim, se um cliente julga ter recebido um serviço
cuja qualidade supera as suas expectativas, ele considera
ter recebido uma prestação de qualidade superior e se
sente inclinado a utilizá-lo novamente ou recorrer à
empresa que o prestou. Desse modo, é importante que a
empresa se preocupe constantemente com a qualidade
do serviço que presta, medindo-o por meio da percepção
dos clientes.
Quando se excede a expectativa, o serviço é
percebido como de qualidade excepcional e também
como uma agradável surpresa. Quando se confirmam as
expectativas pela percepção do serviço, a qualidade é
satisfatória.
2.4 Dimensões da qualidade do serviço
2.6 Serviços Bancários
As dimensões da qualidade foram determinadas a
partir de estudos de profissionais especialistas na área
de marketing, após uma série de pesquisas em várias
categorias de serviços, capitaneadas por Parasuraman,
Zeithaml e Barry (1985). A pesquisa, segundo Hoffmann
(2003), foi realizada através de um focus group, em doze
seções diferentes, com o objetivo de identificar quais
seriam os atributos chaves relevantes na opinião dos
entrevistados para uma série de serviços dos quais
Fitzsimmons (2003), identifica como: reparo de
eletrodomésticos, serviços bancários, telefonia de longa
distância, corretoras de títulos e companhias de cartão
de crédito.
O serviço bancário apresenta características
tangíveis e intangíveis. Lovelock e Wright (2001)
consideram que o grau de envolvimento do cliente é,
muitas vezes, determinado mais pela tradição e por um
desejo de conhecer pessoalmente o fornecedor de serviço
do que pelas necessidades do processo operacional.
O mesmo afirma que “nenhuma indústria de
prestação de serviços parece mais interessada em
estabelecer relações com os seus clientes do que a de
serviços bancários”. Segundo ele, isso se deve ao
crescente uso da tecnologia em transações financeiras
que reduziu significativamente as oportunidades de
contato entre os consumidores e a empresa, alterando
as relações anteriormente conhecidas. Existem
evidências que alguns clientes de banco estão rejeitando
um relacionamento baseado em máquinas ou processos
de auto-atendimento, preferindo o contato pessoal com
que estavam habituados.
Para melhor entendimento, apresenta-se a seguir
um quadro com uma síntese das consultas a algumas
bibliografias citadas neste estudo e que serão exploradas
na seqüência, na tentativa de elucidar esta tendência e
apresentar alguns resultados já pesquisados, usados em
investigações anteriores ao presente estudo.
Hoffman (2003)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Atendimento
- Segurança
- Empatia
Fitzsimmons (2005)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Responsabilidade
- Segurança
- Empatia
Churchill (2000)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Responsabilidade
- Garantia
- Empatia
Las Casas (2002)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Responsividade
- Autoconfiança
- Empatia
2.7 SERVQUAL
Kotler (1998)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Responsabilidade
- Segurança
- Empatia
Zeithmal (2003)
- Tangíveis
- Confiabilidade
- Responsividade
- Segurança
- Empatia
SERVQUAL é um método empírico derivado que
pode ser usado por uma organização de serviços para
melhorar a qualidade dos mesmos. O método envolve o
desenvolvimento de uma compreensão das necessidades
percebidas do serviço de clientes alvo. Essas percepções
medidas da qualidade do serviço para a organização na
pergunta são comparadas, então, de encontro a uma
organização que seja “excelente”. A análise resultante da
abertura pode então ser usada como um fator causando
a melhoria de qualidade do serviço.
Figura 1: Coletânea das definições de Dimensões da Qualidade
6
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A ferramenta SERVQUAL é composta de duas
seções: uma de 22 itens, que registra as expectativas do
cliente de empresas excelentes na indústria de serviço;
outra também de 22 itens que mede as percepções do
cliente de determinada empresa daquela indústria de
serviço. Os resultados das duas seções são comparados
para se chegar às “pontuações da lacuna” em cada uma
das cinco dimensões.
Foram aplicados 180 questionários para as mais
diversas segmentações de mercado, onde 52% dos
entrevistados são do sexo masculino e 48% do sexo
feminino. A maioria dos entrevistados, totalizando 66
pessoas, está na faixa etária dos 18 aos 27 anos.
A pesquisa foi aplicada em pontos estratégicos do
município de Três de Maio, visando buscar público urbano
e rural. Porém, como foi aplicada na cidade, houve uma
maior incidência de usuários urbanos, abrangendo 64%
do total.
Cada questão é classificada por uma escala de 1
a 7 pontos, onde variam de acordo com o nível de
satisfação/concordância do consumidor. É, portanto, uma
ferramenta que utiliza uma escala de pontuações
(escores) para mensurar a diferença entre as expectativas
dos clientes e suas percepções em relação ao serviço
oferecido.
Para análise dos dados, dividiram-se as questões
por dimensões (atendimento, tangibilidade, segurança,
confiabilidade e empatia) e calculado as médias dos
serviços prestados e dos serviços desejados. Com estas
médias, obteve-se o GAP de cada questão, que significa
a diferença entre o serviço prestado e o serviço desejado.
Através da média dos GAPs, obteve-se a média das
dimensões, analisando assim de forma mais segmentada
as questões.
Do resultado obtido, são comparadas as duas
colunas (serviço desejado e serviço percebido),
calculando-se a diferença para encontrar o GAP ou
lacuna, quanto maior a lacuna, mais distantes são as
percepções do cliente em relação as suas expectativas,
e mais baixa a avaliação da qualidade do serviço. Em
oposição, quanto menor a lacuna, mais alta é essa
avaliação. GAP na teoria SERVQUAL representa a
diferença entre o que o cliente deseja e o que ele
efetivamente percebe em relação aos serviços.
Dimensões
Questionário
ATENDIMENTO
Dimensões
GAP
0,71
Média (S. D.)
GAP
Média (S. O.)
Qtão
6
A instituição trata os problemas dos seus clientes com interesse.
P
6,54
0,64
5,91
10
Os funcionários da instituição financeira oferecem informações precisas.
P
6,53
0,55
5,98
13
Os empregados da instituição financeira nunca estão ocupados demais para responder as
P
6,46
0,94
5,52
TANGIVEIS
EMPATIA
SEGURANÇA
CONFIABILIDADE
dúvidas dos clientes
5 Dimensões
0,49
0,44
0,48
0,62
5
A instituição cumpre os prazos com os quais se compromete.
C
6,58
0,62
5,97
7
A instituição realiza o serviço de forma correta na 1º vez.
C
6,51
0,73
5,78
9
A institução financeira insiste em realizar os serviços livres de erros.
C
6,42
0,37
6,04
16
Os funcionários da instituição têm conhecimento para esclarecer as dúvidas dos clientes.
C
6,59
0,36
6,23
17
O comportamento dos funcionários da instituição financeira inspira confiança nos clientes.
C
6,56
0,38
6,17
8
O(s) vigilante(s) da instituição zela pela segurança e está sempre atento.
S
6,64
0,66
5,99
14
A instituição possui transações e serviços confiáveis
S
6,53
0,32
6,21
21
A movimentação de numerários da instituição é de forma cautelosa e segura.
S
6,54
0,34
6,20
11
A instituição atende prontamente às dúvidas e consultas de seus clientes.
E
6,57
0,52
6,05
12
A instituição possui funcionários dispostos a ajudar.
E
6,60
0,53
6,07
15
Os funcionários da instit. são realmente atenciosos, simpáticos e educados com os clientes
E
6,63
0,57
6,06
18
A instituição financeira oferece atenção individual a seus clientes.
E
6,43
0,36
6,08
20
A instituição tem funcionários que dedicam atenção individual a seus clientes
E
6,57
0,53
6,04
22
Os funcionários da instituição financeira compreendem as necessidades dos clientes.
E
6,48
0,38
6,10
1
A instituição financeira possui equipamentos de última geração e com um visual moderno.
T
6,56
0,52
6,04
2
A instituição financeira tem instalações físicas visualmente atraentes.
T
6,43
0,34
6,09
3
A instituição financeira têm funcionários com boa aparência.
T
6,53
0,41
6,12
4
A instituição financeira possui recursos de auto atendimento fáceis de utilizar.
T
6,57
0,84
5,73
19
A instituição opera em horários convenientes a seus clientes.
T
6,59
1,02
5,58
6,54
0,54
6,00
0,55
Figura 2: Cálculo das dimensões da qualidade
7
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
3.1 Alfa de Cronbach
Após o levantamento da pontuação das questões
e seus respectivos GAPs, analisou-se a diferença entre
as expectativas de seus usuários e como este serviço é
oferecido. As questões que apresentam uma pontuação
menor que a média geral, possuem um GAP melhor, ou
seja, melhora a percepção dos usuários em relação aos
serviços prestados.
O coeficiente alfa de Cronbach foi desenvolvido
para calcular a confiabilidade e a correta interpretação
de um teste naquelas situações em que o pesquisador
não tem a oportunidade de fazer outra entrevista com o
indivíduo; contudo, precisa obter uma estimativa
apropriada da magnitude do erro da medida.
Os itens aos quais se encontram em amarelo no
quadro anterior estão relativamente deficitários,
necessitando de acompanhamento para obtenção de um
melhor resultado. Os itens na cor vermelha estão bem
deficitários e necessitam de uma ação imediata.
Analisando este quadro de forma geral, a maioria dos
itens pesquisados está de acordo com as expectativas
dos usuários dos serviços financeiros.
A interpretação do alfa de Cronbach, todavia, está
relacionada à interpretação que é dada para as
estimativas de confiabilidade baseadas no método splithalf. Isso porque o alfa é uma média de todos os
coeficientes split-half para um dado instrumento. Em geral,
escalas com valor do alfa menor do que 0,70 são evitadas.
Por outro lado, o valor de alfa aumenta com o número de
questões da escala; assim, escalas com vinte questões
freqüentemente apresentam valores de alfa próximo de
0,90 (Streiner, 1993). Valores de alfa altos, no entanto,
são necessários, mas não suficientes, uma vez que é
uma estimativa “otimista” da confiabilidade (Streiner,
1993).
Dimensão
Serviço Desejado
0,9022
0,9227
Serviço Oferecido
0,8833
0,9039
Segurança
Atendimento
0,8991
0,8556
0,7563
0,8602
Empatia
0,9623
0,9254
Tangibilidade
Confiabilidade
Figura 4: Alfa de Cronbach
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Figura 3: Serviço Desejado X Serviço Percebido.
A partir das análises dos dados coletados nas
entrevistas e do cruzamento das respostas obtidas,
verificou-se que a qualidade dos serviços prestados pelas
instituições financeiras no município de Três de Maio está
em parte sendo atendida.
A figura 3 apresenta o comportamento dos GAP’s
encontrados entre o serviço desejado e o serviço
oferecido. Quanto mais próximos se encontram os pontos,
menor é o GAP; conseqüentemente, maior é o
alinhamento da expectativa e da percepção. Quanto mais
afastados estão os pontos, maior é a deficiência do serviço
percebido com o desejado.
Serviço Desejado X Serviço Percebido.
Na busca das respostas aos objetivos propostos,
aplicou-se a pesquisa SERVQUAL, onde o foco foi
identificar as expectativas quanto aos serviços, mensurar
com o serviço prestado e analisar se o mesmo está de
acordo com o que se espera pelos seus usuários. Os
mesmos se encontram respondidos nos resultados da
pesquisa.
Destaca-se em especiais as questões 4, 13 e 19
(em círculo vermelho na Figura 3). A questão 4 se refere
aos serviços de auto-atendimento, que, na visão dos
entrevistados, são de difícil utilização. A questão 13 se
refere à ocupação demasiada dos funcionários das
instituições financeiras e a questão 19 se refere à pouca
flexibilidade nos horários de funcionamento das
instituições. Estas questões devem ser revistas pelas
instituições e elaborada alguma ação neste sentido.
A avaliação da qualidade para o serviço oferecido
pelas instituições trouxe evidências de que os
respondentes reconhecem os esforços na atualização
tecnológica e nos investimentos realizados pelas
instituições em busca de modernização. As variáveis mais
importantes das expectativas dos usuários, no entanto,
concentram-se naquelas que envolvem aspectos de
atendimento e tangíveis.
Esta figura revela que existem mais pontos
positivos que negativos. Têm-se três questões em que o
serviço percebido se aproxima bastante do desejado
(círculos em verde na Figura 3). Estas questões se
referem à confiabilidade dos serviços financeiros e à
excelente aparência das instituições do município.
Questões relativas à disposição dos funcionários
em auxiliar e aos horários convenientes aos mesmos
formam os quesitos de maior destaque negativo.
8
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
Comparando as escalas de expectativa e percepção,
verificou-se que as instituições, apesar de apresentar
desempenho satisfatório, ainda não superaram nenhuma
das expectativas. Dados mostram o quanto as
expectativas dos usuários são altas para o setor de
serviços.
CHURCHILL JR.,Giblbert A. Marketing: Criando valor
para os clientes. São Paulo: Saraiva, 2000.
FITZSIMMONS, James; FITZSIMMONS, Mona. A
administração de serviços: operações, estratégias e
tecnologia da informação. 4º ed. Artmed Editora S.A.,
Porto Alegre, 2005.
HOFFMANN, Douglas K., BATESON, John E.G.,
Princípios de Marketing de Serviços, conceitos,
estratégias e casos, Tradução da 2º edição, Ed. Pioneira
Thomson Learning, São Paulo, 2003.
KOTLER, P. & ARMSTRONG, G. Princípios de
marketing. Rio de Janeiro: Ed. Prentice Hall do Brasil,
1998, 7ª ed.
LAS CASAS, Alexandre Luzzi. Marketing: conceitos,
exercícios, casos. 3º ed. São Paulo: Atlas, 2002.
LOVELOCK, C.; WRIGHT, L. Serviços: Marketing e
Gestão. São Paulo: Saraiva, 2001.
PARASURAMAN, A., ZEITHAML,V., BERRY, L.
SERVQUAL: A Multiple-item Scale for mensuring
Consumer perceptions of Service Quality. Journal of
Retailing. Spring 1988; Vol 64.
STREINER, D. L. A checklist for evaluating the
usefulness of rating scales. Canadian Journal of
Psychiatry, 1993.
ZEITHAML, Valarie A., BITNER Mary Jo. Marketing de
serviços: a empresa com foco no cliente. 2º ed. São
Paulo: Bookman, 2003.
Analisando as características dos respondentes,
pessoas economicamente ativas, que valorizam a
economia do tempo, permitem compreender a razão da
formação de um grau tão elevado de expectativas. Estas
pessoas consideram que os funcionários das instituições
financeiras têm capacidade para solucionar os seus
problemas e atender as suas necessidades. Além disso,
a publicidade cria nelas o sentimento de que receberão
um atendimento mais do que especial.
As variáveis mais importantes para a escala de
percepção revelam que o usuário considera o
comportamento dos funcionários digno de sua confiança,
porque estes demonstram conhecimento técnico para
responder as suas dúvidas. No entanto, os pontos mais
críticos da percepção indicam que estes mesmos
funcionários parecem estar ocupados demais para
dedicar-lhe atenção especial.
Outro aspecto em ênfase foi o de as instituições
financeiras oferecerem um horário mais conveniente.
Sabe-se que quanto a este item não existem muitas
possibilidades de mudança, pois as mesmas respondem
a normas e ordens provenientes do Banco Central do
Brasil.
A segurança das instituições foi um dos itens que
se destacou quanto à percepção e expectativa. Ela pode
ser traduzida por a instituição possuir transações e
serviços confiáveis e pela movimentação de numerários
ser de forma cautelosa e segura.
A tangibilidade foi outra dimensão importante. A
atualização tecnológica é apontada como importante além
de ser básica; portanto, é menos perceptivo aos olhos do
público entrevistado. Já as variáveis relativas às
modernidades dos equipamentos e à beleza das
instalações físicas são consideradas muito satisfatórias.
Sabendo que os clientes demandam por uma maior
atenção individual, passa a ser fundamental que os
processos sejam revistos, de modo a identificar se está
acontecendo ou não uma sobrecarga de trabalho para
os funcionários que trabalham diretamente com os
clientes. Caso seja confirmada essa escassez de tempo,
seria interessante rever o quadro de funcionários. Por
outro lado, é imprescindível que a forma como os usuários
são abordados seja revista, na intenção de passar a
imagem de maior comprometimento com os problemas
de cada cliente.
9
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
MODELO CONTINGENCIAL NA GESTÃO
EMPREENDEDORA DAS REDES DE COOPERAÇÃO
Jorge Antonio Rambo1
Janis Elisa Ruppenthal2
Mário Luiz Santos Evangelista3
SETREM4
ABSTRACT
RESUMO
A globalização de mercados e a crescente
competitividade entre as organizações exigem o aumento
de produtividade das mesmas. As pequenas e médias
empresas apresentam algumas deficiências no aspecto
tecnológico e gerencial e precisam criar mecanismos de
fortalecimento para sua inserção no mercado. As
mudanças da sociedade, por outro lado, exigem que as
organizações disponham de pessoas com habilidades
diferenciadas, comportamento e perfil empreendedor para
gerir com competência e qualidade. Para superar as
dificuldades, as empresa, estão se organizando em forma
de redes de cooperação ou arranjos produtivos. A
pesquisa utilizou o método qualitativo, através de pesquisa
semi-estruturada com os principais líderes de uma rede,
buscou identificar as características dos gestores da Rede
AGIVEST que atua na Região Noroeste do Estado do
Rio Grande do Sul. Concluiu-se que dentre as
características presentes, o empreendedorismo e
associativismo precisam ser desenvolvidos e propõe-se
um modelo contingencial de gestão empreendedora das
redes de cooperação que considera as características
gerenciais do mercado, da organização e dos
colaboradores para, através do empreendedorismo, de
forma cooperativa e integrada gerir as áreas vitais de sua
gestão: negociação, expansão, marketing e inovação.
The globalization of markets and the increasing
competitiveness between the organizations demand the
increase of productivity of the same ones. The small and
the average companies present some deficiencies in the
technological and management aspect and need to create
mechanisms of strengthen for their insertion in the market.
The changes of the society, on the other hand, demand
that the organizations make use of people with
differentiated abilities, behavior and enterprising profile
to manage with ability and quality. To surpass the
difficulties the companies are organizing in form of
networks of cooperation or productive arrangements. The
research used the qualitative method, through semistructuralized research with the main leaders of a network,
searched to identify the characteristics of the managers
of Network AGIVEST that acts in the Northwest Region of
the State of Rio Grande do Sul. It was concluded that
among the characteristics gifts, the entrepreneurship and
association need to be developed and consider a
contingency model of enterprising management of the
networks of cooperation that considers the management
characteristics of the market, the organization and the
collaborators for, through the entrepreneurship, of
cooperative and integrated form to manage the vital areas
of its management: negotiation, expansion, marketing and
innovation.
Palavras-chave: Redes de cooperação, gestão,
contingencial, empreendedorismo.
Keywords: Networks cooperation; Management,
Contingency model, Entrepreneurship.
1
Administrador; Mestre em Engenharia de Produção pela UFSM; Professor
da Faculdade Três de Maio; Coordenador do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa da SETREM – E-mail: [email protected]
2
Engenheiro agrônomo; Doutor em Engenharia de Produção pela UFSC; Professor da UNIJUI e Faculdade Três de Maio e pesquisador da
SETREM; E-mail: [email protected]
3
Doutora em Engenharia de Produção pela UFSC. Professora do Mestrado em Engenharia de Produção
– PPGEP da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM – E-mail: [email protected]
4
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM – Avenida Santa Rosa, 2405 Três de Maio RS - E-mail: [email protected]
10
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
1. INTRODUÇÃO
O cenário mundial vive tempo de mudanças e
transformações de toda a ordem. A globalização social,
política e, principalmente, econômica leva as
organizações a refletirem sobre seu papel e rever suas
estratégias de mercado. O acelerado ritmo das mudanças
ocorridas na sociedade, o desenvolvimento tecnológico
e a globalização dos mercados têm impulsionado a
competitividade entre as organizações, exigindo
aumentos de produtividade. A quantidade de pequenas e
médias empresas no mercado demonstra o seu potencial,
contribuindo para o desenvolvimento econômico da
nação, estado e região de atuação, especialmente na
geração de empregos e renda e no equilíbrio econômico,
uma vez que elas possuem maior flexibilidade para
inovações.
que, muitas vezes, seus processos são obsoletos, não
possuem pessoas suficientemente competentes e seus
produtos não estão de acordo com os interesses e
expectativas dos clientes.
A cada dia cresce o número de pequenas e médias
empresas que, para se manterem competitivas no
mercado, organizam-se em forma de redes. Para a
sobrevivência dessas redes é necessário que seus
dirigentes apresentem ou desenvolvam um perfil
adequado, que inclua as características e habilidades
peculiares a um gestor empreendedor, integrado com
outras organizações e um modelo de gestão
empreendedora que considere as condições do ambiente
mercadológico, as características da organização, as
gerenciais e de seus colaboradores.
2. METODOLOGIA
As pequenas e médias empresas enfrentam
problemas que incluem a pequena escala de compras e
produção, o menor volume de vendas e barreiras de
mercado, resultando em uma alta taxa de mortalidade,
especialmente em seus primeiros anos de vida. As
organizações estão cada vez mais dependentes de knowhow e tecnologia, que têm um custo elevado, pois a
competição global, segundo Casarotto (2001), é muito
mais hoje uma competição entre os sistemas locais de
produção, ocorrendo de forma aberta e sem
protecionismos estatais.
O estudo foi realizado na Rede AGIVEST Associação Gaúcha da Indústria do Vestuário, integrante
do programa Redes de Cooperação da Secretaria de
Desenvolvimento e Assuntos Internacionais – SEDAI do
Estado do Rio Grande do Sul no ramo do vestuário.
Inicialmente foi realizada a revisão bibliográfica para um
maior entendimento quanto aos temas abordados e
modelos a serem propostos.
Normalmente a empresa de menor porte é mais
ágil e flexível, mas apresenta restrições em itens
fundamentais para o mercado como marketing, logística
e marca. Mesmo que ela possua um excelente mercado
local, estará sujeita a sofrer pressões da concorrência,
principalmente de grandes empresas multinacionais.
A abordagem adotada foi a qualitativa, pois envolve
questões subjetivas aplicada através de entrevista semiestruturada no período, realizada com a diretoria da Rede
AGIVEST, envolvendo o presidente, vice-presidente e
secretário, além de observação “in loco” e contatos com
associados da rede mencionada. A escolha recaiu sobre
essa rede porque está consolidada no mercado com
muitos anos de tradição e por se tratar de um setor cujo
mercado está em constante mudança.
A globalização dos mercados força as empresas a
repensarem suas práticas. Quem não se der conta da
conectividade atual perde oportunidades e corre o risco
de ficar à margem do mercado. Para superar essas
dificuldades, as empresas, por iniciativa própria ou por
influência de instituições de ensino e de programas
governamentais, vêm se organizando em forma de redes
de cooperação, arranjos produtivos ou clusters.
Após a coleta das informações, passou-se à análise
e estruturação dos resultados, dando ordenamento e
vínculo com os aspectos teóricos envolvidos. Após a
interpretação das teorias e fatos pesquisados, efetuouse um comparativo com a teoria abordada e posterior
síntese dos aspectos abordados.
Por outro lado, as mudanças da sociedade
moderna, que acontecem com uma velocidade superior
às demais épocas, exigem das pessoas comportamentos
e habilidades diferenciadas para serem eficazes no
desempenho das suas funções. O indivíduo precisa ser
preparado para as mudanças do mundo contemporâneo.
Contudo, as dificuldades e os problemas gerados pelas
constantes transformações podem impedir a construção
do desenvolvimento e deixar as empresas em dificuldade
para fazer frente às novas demandas e exigências do
mercado. É importante conhecer as habilidades e
características do empreendedor, mas torna-se relevante
estudar também as principais causas que levam muitas
empresas ao fracasso. As empresas não se dão conta
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Redes de
empreendedorismo
Cooperação
e
A necessidade de desverticalização dos ciclos de
produção rompendo com o modelo fordista criou um vasto
espaço para o ingresso das pequenas e médias empresas
no mercado. Tavares (2000), afirma que algumas
organizações estão na sociedade do conhecimento,
enquanto outras ainda estão no setor de transformação
da revolução industrial. Cada uma possui uma concepção
de gestão estratégica.
11
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A estratégia exige uma continuidade de ações,
requer investimentos que possam diferenciar a
organização no mercado. Aquele que estiver preocupado
apenas com o curto prazo dificilmente utilizará estratégias
consistentes. Na realidade, algumas organizações,
especialmente de pequeno porte, não conseguem ter
acesso ao conhecimento administrativo que, às vezes,
fica restrito ao meio acadêmico, faltando informações
qualificadas às empresas, especialmente às de pequeno
porte, para gerir seu negócio.
O que acontece com muitas pequenas empresas
é que, desconhecendo novas propostas de gestão de
negócios, preferem operar empiricamente, repetindo
aquilo que já deu certo no passado, processando uma
administração de tentativa e erro. Suas estratégias estão
baseadas nas circunstâncias do momento numa postura
plenamente reativa, não procurando elaborar um
planejamento estratégico ou utilizar-se de um
posicionamento pró-ativo. Apesar das mudanças
ocorridas no mercado globalizado, algumas empresas
operam em modelos superados, não contando com um
planejamento estratégico, sem controles confiáveis,
utilizando-se de metodologia e tecnologia obsoletas.
Dolabela (1999) cita que até 1970 as grandes
empresas eram consideradas como responsáveis pelo
desenvolvimento econômico do país. A partir da década
de 80, especialmente em função da globalização e
utilização de tecnologia, o papel das pequenas e médias
empresas passou a ocupar lugar de destaque, passando
de espectador para agente de desenvolvimento
socioeconômico do Brasil.
Diante dessa nova realidade, torna-se importante
descobrir novas ferramentas de gestão que podem
auxiliar a encontrar soluções, levando as empresas a se
darem conta da necessidade de modificar sua estrutura
administrativa e estratégias para a manutenção ou
crescimento no mercado. A pequena empresa se encontra
inserida dentro de um contexto macro e as mudanças
são inevitáveis. Aquelas que não se adaptarem à nova
realidade podem perder mercado e sucumbir.
Casarotto (2001) salienta que as pequenas
empresas podem se beneficiar com a escala de marca
regional, escala de produção, escala de tecnologia, escala
de logística e de sua vocação e região para se tornarem
competitivas. Ainda de acordo com Casarotto (2001),
existem elementos de descontinuidade a serem
considerados no futuro, pois a globalização não é tanto
correspondente à capacidade de concorrer
individualmente, mas é uma competição entre sistemas
locais.
Conforme Hamel & Prahalad (1995), a formação
de redes interempresariais baseadas na parceria, na
colaboração, na associação e complementaridade entre
as organizações, parte do princípio de que, no ambiente
atual dos negócios, nenhuma empresa, seja ela pequena,
média ou grande, é independente e auto-suficiente.
De acordo com Teixeira (2005), por causa da
interconectividade da rede, as ações locais podem ter
ressonância global, sendo que as relações entre essas
dinâmicas depende de sua estrutura.
Pesquisa realizada pelo SEBRAE em micro e
pequenas empresas que trabalham de forma associativa
no Projeto Empreender demonstra que de 4.082
empresas pesquisadas 41% tiveram aumento de
faturamento, 81% no gerenciamento, 67% em clientes e
42% de produtividade. A pesquisa foi realizada no ano de
1999 em 840 municípios brasileiros.
As redes podem apresentar-se sob os mais
variados aspectos, desde os de mínimo impacto, até os
clusters com alta competitividade, atuantes inclusive no
mercado externo.
O conceito de empreendedorismo vem sendo
difundido no Brasil a partir da década de 90, mas em
outros países, como os Estados Unidos, esse conceito é
estudado há várias décadas. No caso do Brasil, a
importância crescente das pequenas empresas e o que
elas representam, tornou o termo empreendedorismo alvo
de estudo quase obrigatório, especialmente diante da alta
taxa de mortalidade que esse segmento apresenta e a
necessidade dos órgãos representativos dedicarem
importância ao estudo.
No final da década de 90 foram criados alguns
programas específicos voltados ao empreendedorismo,
com objetivo de capacitar novos empreendedores,
elaborar planos de negócios e facilitar de alguma forma
o acesso das pequenas empresas aos programas de
crédito.
O Brasil ocupa papel de destaque entre as nações
com maiores índices de empreendedorismo, porém
muitos desses empreendimentos são concebidos e
gerenciados de forma empírica e sem a utilização de
ferramentas adequadas de gestão.
A maior diferença entre o empreendedor de hoje e
o de algumas décadas é o volume de informações
disponíveis e acessíveis em tempo real. A Internet permite
obter informações sem sair de casa. No entanto, está
mais difícil preservar a exclusividade, uma vez que o
conhecimento se reproduz com maior rapidez, encurtando
o ciclo de vida dos produtos.
Lezana (1999) afirma que a atividade
empreendedora não é arriscada, mas se torna assim
porque muitos empreendedores ignoram a essência da
vida empresarial e violam regras elementares.
12
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Para Dornelas (2001) o empreendedor é aquele
que faz as coisas acontecerem, antecipa-se aos fatos e
tem uma visão futura da organização. Ele afirma também
que “sorte é o encontro da competência com a
oportunidade”. Dornelas (2001) acentua que o
empreendedor é aquele que destrói a ordem econômica
existente pela introdução de novos produtos e serviços,
pela criação de novas formas de organização ou pela
exploração de novos produtos.
A necessidade de autonomia e liberdade faz com
que as pessoas que possuem essas características
empreendedoras sintam a necessidade de auto-afirmarse, vencendo obstáculos para alcançar seu sucesso e
conquistar seu espaço, seja através de seu próprio
empreendimento ou desempenhando um papel de
destaque nas organizações onde atua.
De acordo com Dolabela (1999), o
empreendedorismo é um fenômeno cultural, ou seja, é
fruto dos hábitos, práticas e valores das pessoas. Na
verdade, aprende-se a ser empreendedor pela
convivência com outros empreendedores.
3.2 Gestão das Redes de Cooperação
De acordo com Teixeira (2005) um plano de
construção e processo de formação de uma rede deve
conter as seguintes etapas:
a) Objetivos e metas: Uma rede eficaz depende
de objetivos bem definidos, levando-se em conta a
natureza da rede onde os objetivos estejam centrados
na soma e harmonização de interesse das empresas
envolvidas.
b) Sensibilização: A construção de uma rede
depende de duas condições:
- entendimento dos objetivos, interesses e
necessidades dos integrantes;
- motivação dos envolvidos, fruto da
conscientização da importância e vantagens advindas e
da relação do ganha-ganha percebida.
c) Visão e agenda: A visão consiste em vislumbrar
cenários atuais e futuros e estabelecer ações a serem
desenvolvidas. É importante compatibilizar interesses,
evitando eventuais desgastes ou confrontos.
d) Desenho organizacional: A configuração da
forma de organização de redes pode variar desde as mais
simples até as mais complexas e envolventes. A definição
da forma de cada uma depende do consenso das
empresas envolvidas e sua gestão. A flexibilidade de uma
rede deve ser suficiente para saber administrar possíveis
saídas de cooperados bem como a entrada de novos
membros.
e) Desenho informacional: A tecnologia da
informação deve oferecer infra-estrutura para a integração
de sistemas, processos e serviços.
No processo de formação de uma rede é importante
seguir alguns passos como: definição do objetivo comum,
realização de assembléia geral com os interessados,
elaboração de um estatuto social, regulamento interno e
código de ética, registro no cartório de pessoas jurídicas,
legalização da documentação perante os órgãos públicos,
eleição de uma diretoria e fixação da taxa de contribuição
de cada associado para custear as despesas da gestão
da entidade.
3.3 Abordagem contingencial da
Administração
De acordo com Montana (2003), a visão
contingencial enfatiza que não há nada de absoluto e o
ambiente administrativo sofre influências do meio onde
está inserido, das pessoas que compõem o ambiente e
da tecnologia.
A teoria da contingência na administração, segundo
Motta (2002), destaca que não existe “best way”, isto é,
um só caminho, mas várias maneiras para se atingir os
mesmos objetivos. Lacombe (2003) apud Woodward
afirma que não existe uma única forma de se organizar
um negócio. Os critérios para determinar a estrutura estão
baseados na extensão em que ela facilita ao alcance dos
objetivos da Organização.
Ferreira (1999) comenta que a abordagem
contingencial surgiu como resultado de uma série de
pesquisas que estudaram a relação da empresa no seu
ambiente. Seu objetivo era aplicar os conceitos das
principais escolas da administração em situações
gerenciais concretas. Ao verificar que métodos eficientes
em determinadas situações não obtinham o mesmo
resultado em outras, os precursores da Teoria
Contingencial tentaram encontrar justificativas para esses
resultados divergentes. A conclusão, após várias
pesquisas, era de que os resultados não eram os mesmos
porque as situações eram diferentes.
Robbins (2000) cita que as Organizações são
estruturadas exatamente da mesma forma. Mesmo
empresas de tamanho comparáveis não possuem
estruturas semelhantes. O que funciona numa
Organização pode não funcionar na outra. Segundo
Caravantes (1998) o grande mérito da abordagem
contingencial foi fazer com que a gerência, normalmente
concentrada nos problemas internos da Organização,
volte seus olhos para o ambiente que a cerca.
13
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Por sua vez, Daft (1999) diz que, segundo a teoria
da contingência, nenhuma das visões é entendida de
forma completamente correta. Ao contrário, certas
variáveis existem para auxiliar os administradores a
identificar e compreender as situações.
Andrade (2007) enfatiza que a estrutura
organizacional pode sofrer mudanças em decorrência dos
fatores: ambiente externo, tecnologia e tamanho. Robbins
(2000) refere que a maior força motriz da reestruturação
das empresas é o aumento da incerteza ambiental.
Lacombe (2003) apud Peter Drucker considera que a
melhor estrutura é a mais simples possível. O que torna
uma estrutura “boa” são os problemas que ela não cria.
Quanto mais simples for a estrutura, menos coisas sairão
erradas. Ainda Andrade (2007) cita que a otimização da
estrutura, compreendendo a organização formal e
informal, varia de acordo com determinados fatores
denominados circunstanciais.
4. DISCUSSÃO E APRESENTAÇÃO DOS
RESULTADOS DA PESQUISA
Realizou-se a pesquisa com a diretoria da Rede
AGIVEST, recaindo a sobre essa rede porque está
consolidada no mercado, com muitos anos de tradição e
por tratar-se de um setor cujo mercado está em constante
mudança. A seguir são apresentados os resultados das
entrevistas, abordando assuntos relevantes sobre o tema.
4.1 Características da Rede
Referente às características e particularidades da
rede foi enfatizado pelos diretores de que a rede é
composta por pequenas empresas, com média de seis
funcionários, atuando no ramo da indústria do vestuário,
englobando produtos de moda, esportivos e malharias e
localizadas em cidades próximas. A diretoria da rede é
composta pela presidente, vice-presidente, primeiro
secretário e segundo secretário, primeiro e segundo
tesoureiros. Possui, além de seu conselho de
administração, o conselho fiscal e o conselho de ética.
Para uma melhor organização do trabalho a rede
formou equipes que têm funções específicas, sendo elas:
marketing, expansão e novas tecnologias, contando com
estilistas e designers que ajudam as empresas da rede
na criação de novos modelos. A rede possui um escritório
regional na cidade de Ijuí, onde a secretária executiva
exerce suas atividades de ligação entre os membros da
rede e com seus clientes. Ela é responsável pelo
recebimento dos pedidos e despacho das mercadorias.
Outro ponto importante é de que todas as grandes
decisões são tomadas pela assembléia geral, baseadas
no estatuto, regimento interno e código de ética para
resolver os problemas mais difíceis ou questões de
controvérsia entre os associados.
4.2 Estímulo ao empreendedorismo
Na entrevista foi abordada a questão de como a
rede estimula o associado a desenvolver suas
características empreendedoras como: criatividade,
autoconfiança, inovação, iniciativa, aprendizagem e
comprometimento. Dentre as atividades desenvolvidas
pela rede está a participação dos associados nos
encontros regionais, estaduais e nacionais, cursos
específicos
para
o
desenvolvimento
do
empreendedorismo e palestras com profissionais
capacitados na área.
4.3 Qualidades pessoais dos gestores
da rede
Outro questionamento versava sobre as qualidades
pessoais que são consideradas indispensáveis para um
gestor (diretor) de uma rede. As respostas foram variadas,
citando-se entre elas: carisma, competência, democracia,
visão estratégica, responsabilidade, otimismo, confiança,
comprometimento, cooperação, negociação, flexibilidade,
empreendedorismo, dinamicidade.
4.4 Expansão da Rede
O tema da entrevista passou a maneira como
acontece a expansão da rede e a entrada de novos
associados. Segundo esclarecimentos dos diretores,
foram estabelecidos alguns critérios que levam em conta
a tradição no mercado, o tipo de processo e tecnologia
utilizado, faturamento, número de empregados e outros.
Foi formada uma equipe de trabalho encarregada de
estudar a expansão da rede. As empresas interessadas
em ingressar na rede fazem o pedido para entrar e daí,
são visitadas pelos membros dessa equipe de trabalho
que elabora o perfil, observando alguns itens técnicos
como: faturamento, número de empregados,
equipamentos, tecnologia, produtos, mercado.
Quando uma empresa entra na rede, ela recebe
um prazo de carência da mensalidade. O valor da
mensalidade fica em torno de R$ 200,00, mas, o
associado que participa da reunião mensal tem desconto
de R$ 100,00. Tem meses em que acontecem mais
reuniões e o associado recebe desconto total da
contribuição mensal como forma de incentivo à
participação de todos os associados nas reuniões.
4.5 O papel do marketing na rede
A diretoria enfatizou que o trabalho da comissão
de marketing é a elaboração das principais estratégias e
atividades dessa área na rede. Como a rede é composta
por empresas que trabalham várias linhas de produto
dentro da indústria do vestuário foram formados três
subgrupos para análises setoriais de marketing. As áreas
que compõem os setores são: moda e social, linha
esportiva e malharias porque cada uma dessas linhas
14
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
tem características próprias e por isso precisam estudar
estratégias para cada uma.
formada por equipes de trabalho para as atividades-chave
e subgrupos organizados para os diversos segmentos
da indústria do vestuário.
4.6 A negociação na Rede
A negociação é feita pela diretoria, assessorada
diretamente pela secretária executiva, responsável pelo
contato com clientes e fornecedores. As empresas
mantêm representantes (vendedores) em comum. Às
vezes acontecem negociações conjuntas com
fornecedores, procedimento não muito freqüente porque
os tipos de matéria-prima que as indústrias utilizam são
os mais diversos; mas no caso de empresas que têm
algumas linhas similares como, por exemplo, a compra
de determinado tipo de fio ou linha, quando a negociação
é feita de forma conjunta com o fornecedor, cada
associado vê suas necessidades e o pedido é feito em
escala distribuindo a mercadoria entre os associados
interessados, mas sai uma nota fiscal para cada empresa.
A diretoria dessa rede está ciente das limitações e
dificuldades que se apresentam, tais como a exigência
de resultados imediatistas de alguns associados que,
quando não conseguem ver soluções palpáveis no curto
prazo, desligam-se da rede.
É interessante perceber que o empreendedorismo
é um tema novo que, aos poucos, começa a despertar
na rede com ações tímidas e isoladas. A rede, através de
cursos, palestras e eventos oportuniza a seus associados
e funcionários o desenvolvimento pessoal e profissional,
habilitando para o desempenho de suas atividades com
maior competência, qualificando as ações administrativas
e dando maior competitividade às empresas e à rede.
4.10 Proposição de um modelo de
gestão de redes de cooperação
4.7 A Rede e a inovação
Quanto à importância das práticas de inovação
adotadas pela rede, seus diretores ressaltaram o apoio
técnico que vêm recebendo de órgãos como SEDAI e o
escritório regional do SEBRAE, especialmente para
financiamentos de máquinas ou inovações tecnológicas.
Afirma que a rede consegue acompanhar as tendências
porque o setor trabalha muito com moda e essa
atualização acontece através da participação dos
associados em eventos com a preocupação permanente
de conhecimento das principais tendências da moda para
não ficar fora do mercado.
4.8 Vantagens e dificuldades na gestão
da rede
Quando o assunto passou a ser as vantagens,
desvantagens e dificuldades da gestão das redes, as
respostas dos diretores também foram variadas,
apontando como vantagens: a compra em conjunto, a
troca de informações, as pesquisas realizadas em
conjunto e participação conjunta em feiras. As dificuldades
apontadas foram: a falta de participação dos associados,
imediatismo e desânimo. A direção está satisfeita com o
crescimento da rede em número de associados e a
obtenção de ganhos como a troca de experiências e
informações. Outra vantagem apontada é a realização
de pesquisas conjuntas sobre mercados e tendências que
são feitas em parceria com universidades da região.
4.9 Análise da entrevista
Comprovando o entusiasmo e firmeza com que os
diretores dessa rede se manifestaram, pode-se entender
a causa de sua estabilidade e sucesso. Se a entrevista
tivesse sido feita com a direção de outra rede, talvez a
constatação fosse a mesma, mas o que se percebe é
que ela possui uma estrutura organizada e participativa,
As pesquisas realizadas nas empresas que
participam do programa “Redes de Cooperação” dentro
da AGIVEST demonstram vantagens e limitações do
sistema. Diante dos conceitos de gestão abordados nesse
trabalho e com o intuito de propor soluções para a
melhoria da gestão das redes de empresas, apresentase o modelo a seguir descrito. O resumo das dimensões
organizacionais possui como base a abordagem
contingencial.
Em primeiro lugar, necessita-se levar em conta as
características pessoais dos gestores que são técnicas
individuais, motivação e experiência, que têm origem nas
necessidades, conhecimento, valores e habilidades dos
indivíduos que dirigem as organizações e dos diretores
da rede, pois cada indivíduo possui características
próprias de personalidade, fruto de experiências,
percepções e concepções. O desenvolvimento do
empreendedorismo deve acontecer reforçando, através
de cursos ou outras atividades, os aspectos técnicos de
cada atividade, mas principalmente os fatores humanos
envolvidos na gestão das organizações e das redes de
empresas. Também se pode trabalhar os itens que
apresentaram deficiências na pesquisa como a liderança,
a inovação e a flexibilidade.
Outro fator preponderante na definição da gestão
de uma rede é a característica do mercado, considerandose a oferta, a demanda, a concorrência e as
particularidades de cada região. O mercado apresenta
hoje algumas peculiaridades desconhecidas há pouco
tempo, uma vez que ultrapassa as fronteiras geográficas
para se tornar globalizado e interativo. A gestão
empreendedora da rede, através de pesquisas e trabalhos
técnicos, pode acompanhar as mudanças e tendências
do mercado e de cada segmento, recebendo orientações
no sentido de antecipar-se às mudanças, adequando sua
estrutura, seus produtos e serviços adicionais.
15
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
O terceiro ponto se refere às características das
organizações que envolvem os aspectos de suas
atividades, ou seja: produção, comercialização, gestão
de finanças, recursos humanos e outros. Por outro lado,
a cultura empresarial, as regras, procedimentos e valores
de cada organização precisam ser levados em conta na
gestão da rede. As organizações são um reflexo do
ambiente onde estão inseridas e das características dos
indivíduos que as compõem. Esses aspectos podem ser
reforçados através de um planejamento estratégico da
rede com o objetivo de estabelecer valores e
procedimentos comuns para alinhar a estratégia dos
associados à gestão da rede.
O quarto aspecto a ser enfatizado se refere às
características dos colaboradores, ou seja, a
personalidade, os valores, as necessidades, a eficácia e
o estilo de liderança adotado pelas empresas ou pelas
pessoas nas empresas que compõem a rede. O trabalho
de intra-empreendedorismo na rede AGIVEST que vise
o fortalecimento dos aspectos individuais, tornando os
colaboradores mais seguros de suas ações e despertando
a autoconfiança também é muito importante. Uma das
tarefas importantes da gestão de cada componente é
proporcionar recompensas significativas e motivadoras
para os colaboradores. A diretoria da rede não pode
intervir nesse aspecto, mas pode traçar diretrizes para
que seus associados prestem atenção porque ele poderá
tornar-se um diferencial.
Ligadas a essas características, surge a
necessidade de intensificar o empreendedorismo nas
redes, pois a pesquisa demonstrou que alguns aspectos
importantes como: liderança, flexibilidade, inovação,
independência, otimismo e originalidade apresentam
índices baixos em seus gestores na região pesquisada.
O empreendedorismo é algo que pode ser desenvolvido
e percebe-se que as redes começam a investir nele
porque alguns aspectos como: comprometimento,
orientação para resultados, formação de redes de contato,
agressividade no mercado e controle se encontram
presentes nos gestores. O estudo formal e contínuo do
empreendedorismo na rede irá fortalecer as ações
coletivas e trazer resultados para todos os associados;
outro fator a ser mencionado é o de que algumas redes,
conforme relato dos seus diretores, estão investindo em
cursos e treinamentos para melhorar a comunicação e
desenvolver a criatividade nos colaboradores.
Ainda que a cultura capitalista não tenha por hábito
fomentar o associativismo, experiências têm demonstrado
que esse é um caminho promissor, principalmente para
as pequenas empresas. O espírito do “ganha-ganha”
precisa estar presente nas redes e seus associados
devem entender que o maior ganho é aquele conquistado
para a coletividade. Nesse sentido, sugere-se um
investimento das redes de empresas na socialização da
cultura do associativismo.
Alguns aspectos operacionais merecem destaque
e se referem à formação de equipes de trabalho para se
dedicarem ao aperfeiçoamento dos mecanismos de
negociação, mola propulsora das redes e um dos fatores
que pode gerar maior competitividade coletiva. As técnicas
de negociação devem ser estudadas e, utilizando-se a
experiência adquirida e o poder de barganha, deve-se
buscar a otimização dos resultados. O desenvolvimento
do empreendedorismo pode fomentar esses aspectos
porque quem dirige uma empresa que está inserida em
rede possui comprometimento e é orientado para
resultados coletivos, participando assiduamente de
comitês e equipes. Reforçando as características
empreendedoras dos gestores pode-se melhorar a
eficácia das negociações entre os associados da rede,
com seus fornecedores e seus clientes.
O marketing é o processo de comunicação das
empresas com o seu mercado e por isso precisa ser bem
desenvolvido. É importante que seja formada uma equipe
composta por pessoas conhecedoras do assunto, que
tenham postura pró-ativa e estejam abertas a novidades.
O processo de comunicação com o cliente para colocação
dos produtos no mercado deve ser uma das prioridades
da gestão da rede e precisa ser aperfeiçoado, mediante
utilização de ferramentas adequadas e fórmulas criativas.
A entrevista com os diretores da rede demonstra que as
estratégias podem ser setoriais, com formação de
subgrupos para linhas e mercados específicos. A prática
empreendedora deve seguir tendências do setor.
A expansão também requer alguns cuidados
especiais e por isso deve contemplar equipes
interdisciplinares para realizá-la mediante uma análise
criteriosa de novos associados, considerando-se seu
perfil, habilidades e as características da empresa como
conceito no mercado e situação econômico-financeira. A
expansão deve ser fruto da vontade coletiva e servir para
consolidação da rede. A prática empreendedora de buscar
novos aliados e novas oportunidades, demonstrada pelo
perfil de agressividade e orientação para resultados
apontados na pesquisa, pode melhorar a competitividade
da rede e trazer ganhos a todos os seus integrantes.
O aspecto da inovação tecnológica não pode de
forma alguma ser esquecido, uma vez que a
obsolescência tecnológica é fatal para as organizações
dos mais diversos ramos de atividade. Buscar o
tecnicamente novo desde que seja economicamente
viável é uma alternativa para permanecer na dianteira do
mercado e cada vez mais conquistar espaços para a rede.
A entrevista com os diretores da rede demonstrou toda a
sua preocupação com as novidades e tendências e o
apoio de órgãos como o SEBRAE para sua permanente
atualização tecnológica é fundamental para alicerçar a
ação. A característica empreendedora de inovação
precisa ser despertada através de cursos e palestras,
conscientizando os empresários e gestores de sua
importância para a permanência e conquista do mercado,
além da necessidade de cada rede de manter uma equipe
preocupada com novos processos e equipamentos para
seu setor.
16
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
O desenvolvimento do empreendedorismo nas
redes de empresas pode contribuir para qualificar as
características dos gestores e dos colaboradores,
provocando uma melhoria de qualidade nos processos e
serviços e adequando as características da organização
para fazer frente às mudanças do mercado, que está em
constante transformação. Nesse sentido, as quatro tarefas
fundamentais de uma rede de empresas que são:
marketing, negociação, expansão e inovação, pela
implantação de esforços cooperativos entre as empresas
através de seus gestores podem conduzir as redes a um
patamar superior aos demais concorrentes.
A figura 01 apresenta o modelo proposto para a
gestão das redes de empresas:
Características
do Mercado
Características
Gerenciais
Necessidade
Conhecimento
Valores
Habilidades
EMPREENDEDORISMO
Demanda
Oferta
Características da
Região
Concorrência
Associativismo
Gestão
de
Redes
Inovação
Inovação
Marketing
Associativismo
Características
da Organização
EMPRENDEDORISMO
Produção
Recursos Humanos
Finanças
Comercial
Tecnologia disponível
Características
dos colaboradores
Necessidades
Personalidade
Motivação
Experiência
Perfil empreendedor
Nível educacional
FIGURA 1 – Modelo de gestão empreendedora de redes de cooperação
Fonte: Rambo & Ruppenthal (2006)
17
EMPRENDEDORISMO
Expansão
Negociação
Associativismo
EMPRENDEDORISMO
Associativismo
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho estabeleceu a importância do
empreendedorismo como um fator de desenvolvimento
na gestão das redes de empresas e evidencia as
constatações de que investir no desenvolvimento do
espírito empreendedor é fundamental para uma boa
gestão.
A entrevista com os diretores da Rede AGIVEST
demonstrou que as redes apresentam vantagens e
benefícios, mas também têm dificuldades. Dentre os
aspectos importantes levantados, ressalta-se o crescente
interesse pelo empreendedorismo e desenvolvimento
pessoal e profissional de seus integrantes, a necessidade
de fortalecer os programas através de um suporte à
cooperação, o cuidado com as atividades chaves das
redes que são: negociação, marketing, inovação e
expansão.
Todos esses aspectos ensejaram a proposição de
um modelo de gestão de redes de empresas através do
desenvolvimento do empreendedorismo, condição
essencial e decisiva para o sucesso das organizações,
uma nova visão da cooperação e do associativismo e o
desenvolvimento das atividades chaves, levando em
consideração as características do mercado, das
organizações, dos gestores e colaboradores das
empresas e instituições, cumprindo dessa forma com os
objetivos do trabalho que contemplaram o
desenvolvimento de um modelo de gestão para as redes,
alternativas e sugestões para a melhoria da gestão e
consolidação das redes de empresas.
REFERÊNCIAS
AMATO NETO, João. Redes de cooperação produtiva
e clusters regionais: oportunidades para pequenas e
médias empresas. São Paulo: Editora Atlas, 2000.
ANDRADE, Rui: AMBONI, Nério. Teoria geral da
Administração: Das origens às perspectivas
contemporâneas. São Paulo: M Books do Brasil, 2007.
CARAVANTES, Geraldo R. Teoria Geral da
Administração: Pensando e Fazendo. Porto Alegre:
Editora Fatec, 1997;
CASAROTTO FILHO, N; PIRES, L. Redes de pequenas
e médias empresas e Desenvolvimento Regional:
Estratégias para a conquista da competitividade global
com base na experiência italiana. 2 ed. São Paulo: Editora
Atlas, 2001
DAFT, Richard. Administração. Rio de Janeiro: LTC,
1999.
DOLABELA, Fernando. Oficina do Empreendedor - 6
ed. São Paulo: Ed. Cultura, 1999.
DORNELAS, José Carlos. Empreendedorismo –
transformando idéias em negócios. Rio de Janeiro:
Editora Campus, 2001.
FERREIRA, Ademir. Gestão Empresarial: De Taylor aos
nossos dias. São Paulo: Pioneira, 1997.
HAMEL G; PRAHALAD, C. K. Competindo para o futuro:
estratégias inovadoras para obter o controle de seu setor
e criar os mercados de amanhã. Rio de
Janeiro:Ed.Campus, 1995.
LACOMBE, Francisco; HEILBORN, Gilberto.
Administração: Princípios e Tendências. São Paulo:
Saraiva, 2003.
LEZANA, Álvaro G. Rojas. Empreendedorismo e ciclo
de vida das Organizações – Caderno de notas. PPGEP/
UFSC, 1999.
MONTANA, Patrick. Administração. 2 ed. São Paulo:
Saraiva, 2003.
MOTTA, Fernando; VASCONCELOS, Isabella. Teoria
geral da Administração. São Paulo: Pioneira Thomson
Learning, 2002.
RAMBO, Jorge Antonio. O Empreendedorismo como
fator de desenvolvimento na Gestão das Redes de
Empresas. PPGEP– UFSM, 2002.
RAMBO, Jorge; RUPPENTHAL, Janis. Redes de
cooperação e desenvolvimento regional. XXIV
ENEGEP: Florianópolis, 2004.
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Desenvolvimento
e Assuntos Internacionais. Programa redes de
cooperação. Porto Alegre. Disponível em
www.sedai.rs.gov.br Acesso em: agosto de 2005.
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Desenvolvimento
e Assuntos Internacionais. Termos de referência do
Programa Redes de Cooperação. Porto Alegre: SEDAI,
1999.
ROBBINS, Stephen. Administração- Mudanças e
Perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2000.
SEBRAE NACIONAL. Pesquisa sobre fatores
condicionantes e taxa de mortalidade de empresas.
Brasília: Editora SEBRAE, 1999.
TAVARES, Mauro C. Gestão estratégica. São Paulo:
Atlas, 2000.
TEIXEIRA, Francisco. Gestão de redes de cooperação
interempresariais: em busca de novos espaços para o
aprendizado e a inovação. Salvador: Casa da Qualidade,
2005.
VERSCHOORE, Jorge Renato. Redes de cooperação uma nova organização de pequenas e médias
empresas no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: FEE,
2004.
www.sebrae.com.br. Acesso em 04/02/2005.
18
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
PANORAMA DO TRANSPORTE DE CARGAS
BRASILEIRO
Felicita Maria Peiter 1
Pablo Brum da Silva 1
Tatiana Colatto Schapanski 1
Cristiano Henrique Antonelli da Veiga 2
Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM 3
RESUMO
O setor de transporte de cargas de um país merece
uma atenção especial pela sua importância estratégica
para o desenvolvimento do país. Infelizmente o Estado
brasileiro deixou de cumprir seu papel de provedor e
mantenedor da infra-estrutura básica para o transporte.
Diante deste quadro, buscou-se realizar uma pesquisa
bibliográfica, de abordagem quali-quantitativa, com o
objetivo de estudar a situação atual do setor de transporte
de cargas brasileiro, identificando os principais gargalos
que podem comprometer a capacidade produtiva da
cadeia. Constatou-se que o Brasil enfrenta, atualmente,
grandes desafios nesse setor, oriundos de diversos
problemas, como o desbalanceamento histórico da matriz
de transportes, a legislação precária, a fiscalização
inadequada, a deficiência de infra-estrutura e a falta de
segurança. Comprovaram-se as hipóteses de que o país
utiliza uma matriz de transporte muito cara e ineficiente,
que o setor de transporte de cargas brasileiro gera
instabilidade e prejuízos às empresas brasileiras e que
não há um planejamento ou controle do setor de
transporte de cargas nacional por parte do Estado
brasileiro.
Palavras-chave: administração, logística,
transporte de cargas.
ABSTRACT
The loads transportation sector of a country
deserves special attention because of its strategical
importance. Unfortunately the Brazilian government has
not fulfilled its role of provider and maintainer of the basic
infrastructure for the transportation. This way, we have
tried to do a bibliographical research, of a quali-quantitative
approach, with the objective of studying the current
situation of the Brazilian loads transportation sector,
identifying the main bottle necks that can impair the
productive capacity of the chain. It has been verified that
Brazil faces, nowadays, great challenges in this sector,
coming from a variety of problems, such as the historical
lack of balance of the transportation matrix, the poor
legislation, the inadequate inspection, the infrastructure
deficiency and the lack of safety. Hypotheses have been
proofed that the country uses a very inefficient and
expensive transportation matrix, also that the Brazilian
loads transportation generates instability and damages
to the Brazilian companies and that there is no planning
or control over the national loads transportation sector by
the Brazilian state.
Key-words: administration, logistics, loads
transportation.
1 INTRODUÇÃO
O conceito inicial de transporte centrado em
deslocar matérias-primas e produtos semi-manufaturados
ou acabados entre pontos geográficos distintos cada vez
mais perde força no atual sistema econômico, pois não
satisfaz total e isoladamente às necessidades das
empresas e dos consumidores. O valor monetário dos
produtos passou a crescer apreciavelmente, gerando
custos financeiros elevados e obrigando ao cumprimento
de prazos muito mais rígidos, e tudo isso sem perder o
foco na qualidade dos serviços e na otimização dos
recursos, pois, se de um lado se busca o aumento da
eficiência e a melhoria dos níveis de serviço ao cliente,
de outro o mercado obriga a uma redução contínua dos
custos.
Além da pressão custo x eficiência, o setor de
transporte brasileiro convive, há vários anos, com graves
problemas, principalmente no que tange à estrutura e
utilização dos diferentes modais. Isso tem afetado
1
Bacharéis em Administração - Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM.
Administrador, Especialista em Administração da Produção, Mestre em Engenharia de Produção, Professor e Coordenador do Curso de
Administração da SETREM.
3
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM – Avenida Santa Rosa, 2405 - Três de Maio, RS.
2
19
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
diretamente o desempenho geral das empresas nacionais
que sofrem com a eficiência e qualidade dos serviços
oferecidos, tendo que conviver com diversos problemas
como produtos chegando às mãos de seus consumidores
fora do prazo estabelecido, empresas com nível dos
estoques razoáveis para não ficarem reféns do setor de
transportes e parar de produzir, dificuldades para colocar
os produtos nacionais no comércio externo, entre outros.
Diante do atual quadro, é preciso salientar que qualquer
nação fica literalmente paralisada se houver um colapso
em seu sistema de transporte.
Portanto, entender o contexto atual do setor, a fim
de tomar decisões embasadas no futuro é parte do
planejamento estratégico das empresas e profissionais
de administração que buscam minimizar as ameaças e
maximizar as oportunidades do ambiente, antecipando
problemas que possam comprometer a sua
sobrevivência.
No presente artigo, é traçado um breve diagnóstico
do setor de transporte de cargas no Brasil, apresentando
dados relevantes sobre sua situação atual, bem como as
principais deficiências encontradas neste segmento que
vem sofrendo através dos anos, com graves problemas
estruturais e equívocos de gestão pública, transformandoo em um grande problema nacional.
2 METODOLOGIA DE TRABALHO
Com um objetivo exploratório para a elaboração
do presente trabalho, foram utilizados os métodos qualiquantitativo e dedutivo (pois os dados analisados foram
de caráter predominantemente subjetivos e com
premissas particulares de cada modal para análise geral
do setor), com procedimento pelos métodos histórico,
comparativo, bibliográfico e estatístico.
A técnica utilizada foi a análise de conteúdos dos
dados estatísticos disponíveis nas seguintes instituições:
Confederação Nacional dos Transportes (CNT),
Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística
(NTC), Associação Nacional dos Transportes Ferroviários
(ANTF), Ministério dos Transportes, Ministério do
Planejamento, Ministério do Desenvolvimento, Grupo
Executivo de Integração das Políticas de Transporte
(GEIPOT), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES),
Banco Mundial, Bureau of Transportation Statistics (EUA),
Association of American Railroads (EUA), International
Road Transport Union e Pamcary.
3 O QUE É LOGÍSTICA?
As origens do conceito de logística estão
alicerçadas às operações militares. Ao decidir seguir uma
estratégia militar e avançar suas tropas, os generais
precisavam ter, sob suas ordens, uma equipe que
providenciasse o deslocamento, na hora certa, de víveres,
munição, equipamentos e socorro médico para o campo
de batalha. Por se tratar de um serviço de apoio, os grupos
logísticos militares trabalhavam quase sempre em silêncio
e passavam despercebidos (NOVAES, 2001)
Somente ao final da II Guerra Mundial é que se
pode verificar o uso da logística em organizações
empresariais. Inicialmente os executivos entendiam que,
no fundo, as operações logísticas não agregavam
qualquer valor ao produto sendo, portanto, um mero centro
de custo, sem maiores implicações estratégicas e de
geração de negócios. De acordo com Novaes (2001), dirse-ia na linguagem de hoje, que “esse setor da empresa
atuava de forma reativa, e não proativa” (p.32). Esta forma
de atuar, focada no processo de fabricação industrial,
colabora para que algumas empresas considerem as
atividades logísticas algo secundário na organização
empresarial.
Ao sair da fábrica, o produto já tem um valor
intrínseco agregado, mas esse valor está ainda
incompleto para o consumidor final que deseja usufruí-lo
com toda sua plenitude; sendo assim, torna-se necessário
que a mercadoria seja colocada no lugar desejado. O
sistema logístico, mesmo o mais primitivo, agrega então
um valor de lugar ao produto que depende, obviamente,
do transporte do produto da fábrica ao depósito, deste à
loja e desta ao consumidor final, sendo por esta razão,
que as atividades logísticas foram confundidas, por muito
tempo, apenas como transporte e armazenagem. Para
Novaes (2001, p.33) “o conceito básico de transporte é
simplesmente deslocar matérias-primas e produtos
acabados entre pontos geográficos distintos”. Este
elemento, embora importante, passou a não satisfazer
isoladamente as necessidades das empresas e
consumidores.
A evolução do sistema produtivo trouxe ao sistema
o valor do tempo, pois os valores monetários dos produtos
passaram a crescer apreciavelmente, gerando custos
financeiros elevados e obrigando ao cumprimento de
prazos de entrega muito mais rígidos. Considerando a
afirmação de Novaes (2001, p. 34), que “atualmente há
uma grande preocupação das empresas com a redução
de estoques e com a busca da satisfação plena do
cliente”, pode-se dizer que isto implica a entrega do
produto nos prazos combinados e traz o fator tempo como
um dos elementos mais críticos do processo logístico.
Admitindo que o produto seja deslocado
corretamente desde a sua origem até o destino, dentro
dos prazos pré-estabelecidos, ainda assim não estariam
completas as funções logísticas. Um elemento adicional,
de grande importância, é o fator qualidade que a logística
moderna deve incorporar ao processo, respeitando a
qualidade intrínseca do produto e obtendo a excelência
no nível de serviço prestado ao cliente (FLEURY, WANKE,
FIGUEIREDO, 2000).
20
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Outra questão que está sendo introduzida
atualmente pelas empresas em suas atividades logísticas
é o valor de informação, permitindo ao cliente rastrear
seu pedido on-line, receber informações
instantaneamente a respeito do deslocamento de sua
mercadoria, migrar sua codificação para o código de
barras agregando informações importantes para o
comerciante (mesmo que estas informações não tenham
aplicação direta na própria empresa). Através destes
exemplos, pode-se verificar como está se adicionado valor
de informação aos serviços logísticos (LACERDA, 2006,
pg. 44).
Portanto, a logística empresarial evoluiu muito
desde seus primórdios, agregando valor de lugar, de
tempo, de qualidade e de informação à cadeia produtiva.
Além disso, ela procura também eliminar do processo
tudo que não tenha valor para o cliente e que acarrete
somente custos e perda de tempo para a empresa. A
moderna logística envolve também elementos humanos,
ativos, materiais tecnológicos e de informação. Também
implica a otimização de recursos pois, de acordo com
Novaes (2001), “se de um lado busca o aumento da
eficiência e a melhoria dos níveis de serviço ao cliente,
de outro, a competição do mercado obriga uma redução
contínua dos custos (p. 35). Assim, pode-se conceituar
logística como
o processo de planejar, implementar e controlar
de maneira eficiente o fluxo e armazenagem de
produtos, bem como os serviços e informações
associados, cobrindo desde o ponto de origem
até o ponto de consumo, com o objetivo de
atender aos requisitos do consumidor. (Council
of Logistics Management apud NOVAES, 2001,
p.36)
Para a SOLE – Society of Logistic Engineers, a
visão de logística está centrada em:
uma técnica e, ao mesmo tempo, uma ciência
que suporta a realização dos objetivos
empresariais, a programação dos mesmos e a
consecução; serve para o management, o
engineering e as atividades técnicas nos temas
solicitados, o projeto, o fornecimento e a
preservação dos recursos. (Shun’ichi e
Kobayashi, 2000, p.18)
Ou ainda,
um processo de elaboração, implementação e
controle de um plano que serve para maximizar,
da produção ao consumo, enfrentando custos,
a eficiência e a eficácia do fluxo e da gestão das
matérias-primas, semi-acabados, produtos
acabados e informações; tudo isso deve ser
conforme ás exigências dos clientes. (Council
of Logistics Management apud Shun’ichi,
Kobayashi, 2000, p.18)
Portanto, apesar de existirem diversos enfoques
para a definição de logística, todos eles são unânimes
em exaltar: prazos previamente acertados e cumpridos
integralmente ao longo de toda a cadeia de suprimento;
integração efetiva e sistêmica entre todos os setores da
empresa; integração efetiva e estreita (parcerias) com
fornecedores e clientes; busca da otimização global,
envolvendo a racionalização dos processos e a redução
de custos em toda a cadeia de suprimento e a satisfação
plena do cliente, mantendo um nível de serviço
preestabelecido e adequado.
4
A
ATIVIDADE
TRANSPORTE
PRIMÁRIA:
O transporte é uma das principais funções
logísticas, pois tem papel fundamental no desempenho
de diversas dimensões do serviço ao cliente. Somado a
isso, na maioria das organizações, a atividade de
transporte representa a maior parte dos custos, podendo
totalizar, segundo Fleury, Wanke e Figueiredo (2000),
cerca de 60% das despesas logísticas, chegando a
representar duas ou três vezes o lucro de uma companhia.
As principais funções do transporte na logística
estão ligadas, basicamente, às dimensões de tempo e
lugar. Conforme Fleury, Wanke e Figueiredo (2000,
p.126), “desde os primórdios o transporte de mercadorias
tem sido utilizado para disponibilizar produtos onde existe
demanda potencial, dentro do prazo adequado às
necessidades do comprador”; portanto, o transporte se
torna fundamental para que seja atingido o objetivo
logístico de produto certo, na quantidade certa, na hora
certa, no lugar certo ao menor custo possível.
Assim, o conhecimento do sistema de transportes
e mais especificamente da atividade chave transporte em
si, parece ser fator determinante na busca de melhores
performances por parte de todos os participantes da
economia, hoje globalizada.
Estudos de Fleury, Wanke e Figueiredo (2000)
relatam que muitas empresas brasileiras estão realizando
consideráveis investimentos em tecnologia da informação
(visando planejamento e controle da operação) e em
soluções intermodais (que possibilitem uma redução
significativa dos custos) por vislumbrar na logística, e mais
especificamente no setor de transporte, uma forma de
obter diferencial competitivo. Para se atingir este objetivo,
os autores afirmam ser necessário conhecer um pouco
mais sobre as funções e os princípios da operação de
transporte.
Funções: estão diretamente ligadas ao movimento
e à estocagem de produtos. Princípios: diz respeito à
economia de escala e de distância. A melhor
compreensão destes fatores auxilia os profissionais na
tomada de decisões quanto ao modal (is) que melhor se
presta à execução de determinadas tarefas que envolvem
o uso de transportes.
21
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Conforme Martins (2007), de uma forma
abrangente, o sistema de transportes apresenta a
seguinte divisão: terrestre, aeroviário e aquaviário.
O transporte terrestre é caracterizado pelo
deslocamento em terra firme, o que compreende as
variações rodoviária (sobre rodas), ferroviária (sobre
trilhos) e dutoviária (através de condutos fechados).
Quando o veículo se desloca em meio líquido, caracterizase o transporte aquaviário, que compreende também as
variações de transporte marítimo, fluvial e lacustre. Por
último, o transporte aeroviário é aquele em que o
deslocamento se dá pelo ar (como aviões, helicópteros,
balões, etc.). Desta divisão, têm-se então os cinco modais
básicos do sistema de transporte: o dutoviário, aéreo,
ferroviário, rodoviário e hidroviário.
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS
RESULTADOS
A seguir é discutida a situação atual de cada um
dos modais do setor de transporte de cargas brasileiro,
sendo que o mesmo é avaliado a partir de parâmetros
relacionados com aspectos econômicos, infra-estrutura,
segurança, energia e meio ambiente e comparado aos
dados apresentados pelos Estados Unidos, país que
possui uma extensão territorial semelhante a do Brasil, e
pode ser considerado um modelo mundial em termos de
eficiência do setor de transportes.
5.2 O Modal Ferroviário
O modal ferroviário tem característica lenta,
geralmente utilizado para transporte por longas distâncias.
Apesar de ter um custo fixo de implantação e manutenção
elevado, este modal apresenta um baixo consumo de
energia por tonelada movimentada, reflexo da capacidade
de carga do veículo – permite considerável economia de
escala na movimentação de grandes lotes. Portanto, o
tempo de percurso é compensado com a redução do
número de viagens e com o baixo custo unitário de
transporte.
A regulação sobre a exploração da infra-estrutura
ferroviária e sobre prestação do serviço público de
transporte ferroviário de cargas e passageiros é função
da ANTT (2007), e ao DNIT (2007) compete o
planejamento, o estudo e a construção de novas ferrovias,
bem como realizar melhorias nas transposições
ferroviárias nas capitais e grandes cidades brasileiras,
visando aumentar a segurança e adequar à capacidade
operacional.
Sendo a grande maioria da malha ferroviária
brasileira concessionada, segundo a ANTF (2007), no ano
de 2005 foram investidos pelas concessionárias 3,1
bilhões de reais, principalmente em obras de infraestrutura e na aquisição de vagões e locomotivas. Para
2006, a estimativa de investimento foi de 2,4 bilhões de
reais. Desde o início do programa de concessões já foram
aplicados 9,5 bilhões de reais pela iniciativa privada.
5.1 O Modal Aéreo
5.3 O Modal Aquaviário
Conforme a ANAC (2007), o sistema aeroviário
engloba as aerovias, os terminais de passageiros e cargas
e o sistema de controle de tráfego aéreo. Este modal tem
como principal característica a capacidade de vencer
grandes distâncias em um curto espaço de tempo; porém,
a baixa capacidade de transporte do veículo aeroviário
resulta no elevado custo médio por tonelada
movimentada. Portanto, o mesmo é utilizado,
predominantemente, no envio de produtos com alto valor
agregado (preponderância do fator tempo).
A regulação da aviação civil, das infra-estruturas
aeroportuária e aeronáutica, como também a regulação
técnica é responsabilidade da ANAC, órgão subordinado
ao Ministério da Defesa. Junto a ela o setor é regulado
pela INFRAERO, que administra e opera, desde 1972,
os aeroportos de interesse federal.
Em 2006 foram aplicados 521 milhões de reais de
recursos da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura
Aeroportuária, e 350 milhões de reais de aporte do
governo federal para continuar modernizando, ampliando
e melhorando terminais de logística aérea, tanto de carga
como de passageiros.
O modal Aquaviário tem como característica a
capacidade de transportar grandes volumes de carga em
um único veículo, o que representa um baixo consumo
de energia por unidade de peso movimentado. Por outro
lado, apresenta um tempo de trânsito elevado, o que faz
os produtos enviados por este modal apresentarem um
perfil de baixo valor agregado e não perecíveis, de
maneira que seus custos de estoque não são excessivos
e, portanto, seu serviço lento é compensado pelo preço
da tarifa de frete.
O sistema é regulado pela ANTAQ, que implementa
políticas formuladas pelo Ministério dos Transportes no
setor e pelo DNIT, que é responsável pela administração
e execução das obras de manutenção nas hidrovias e
pela ampliação, modernização, recuperação e dragagens
nos portos.
Em 2005, o governo federal investiu 30 milhões de
reais nas hidrovias. Especialistas como o Coppead
afirmam que a manutenção e a ampliação exigiriam o
investimento de 150 milhões de reais por ano.
22
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
5.4 O Modal Rodoviário
O modal Rodoviário apresenta alto custo de
manutenção, baixa capacidade, alta flexibilidade e
velocidade moderada. O total de rodovias no País é de
1.610.076 Km, com um índice de pavimentação é de
79,7% para as rodovias federais, de 49,6% para as
estaduais e de apenas 1,7% para as municipais.
Os dois agentes públicos que regulam o setor
rodoviário em relação à infra-estrutura são a ANTT e o
DNIT. No caso do rodoviário, compete à ANTT controlar
e acompanhar as atividades das concessionárias de
rodovia. Já ao DNIT cabe desempenhar as funções
relativas à construção, manutenção e operação de infraestrutura rodoviária. As rodovias federais permanecem
sob administração do DNIT, à exceção dos 4% da malha
que foi concedida.
Apesar da lentidão do Estado, a necessária
recuperação de 20.000 quilômetros de estradas pode ser
viabilizada com investimentos do programa de
concessões e das parcerias público-privadas (PPPs). A
NTC estima que para renovar as estradas seriam
necessários investimentos anuais de 3 bilhões de reais
nos próximos quatro anos. Como o governo não tem
recursos para liberar esse dinheiro, as soluções mais
viáveis seriam as concessões e as PPPs, que poderiam
atrair 2 bilhões de reais por ano da iniciativa privada.
5.5 O Transporte de Carga no Brasil a
partir dos Indicadores Básicos de Eficiência
5.5.1 Aspectos Econômicos
A Figura 1 mostra o quanto cada trabalhador produz
anualmente em termos de milhões de toneladas
quilômetro útil (TKUs).
25
21,2
20
17,1
15
10
8,2
Brasil
9,3
EUA
4,5
5
0,6
1,8
1
0
Aquaviário
Ferroviário
Rodoviário
Média
Fontes : Geipot 2001; Pesquisa Anual de Serviços; IBGE/1998; Bureau of Transportation Statistics e Bureau of Labor Statistics 2000
6
Figura 1: Produtividade 10 TKU / Empregado
Pode-se notar que a produtividade do setor de
transportes brasileiro é apenas 22% daquela registrada
pelo setor de transportes americano, principalmente pelo
fato de o Brasil optar pelo uso intensivo do modal menos
produtivo (rodoviário).
A Figura 2 revela uma gritante falta de oferta de
infra-estrutura de transporte no Brasil, especialmente nos
modais ferroviário e hidroviário. O conceito que ditou o
transporte rodoviário como o principal modal, num país
de dimensões continentais como o Brasil, somado ao
arcaico sistema de gestão dos demais modais e a falta
de investimentos nos mesmos traduz a deplorável
situação da atual infra-estrutura de transportes brasileiro,
significativamente menor do que aquela existente em
países com características semelhantes às nossas, ou
seja, comparadas com países em desenvolvimento e de
grandes extensões territoriais.
5.5.3 Deficiência na Infra-Estrutura de
Apoio
Conforme pode ser verificado na Figura 3, o setor
de transporte de cargas brasileiro sofre com a ausência
de uma política abrangente de coleta e análise contínua
de dados estatísticos dos seus principais indicadores de
desempenho.
Fonte: Banco Mundial, GEIPOT, CNT, Guiadelmundo, COPPEAD
Fonte: CNT (2003), apud Coppead (2003)
Figura 2: Densidade de Transportes Km / 1000 Km
2
23
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Conforme demonstra a Figura 4, o número de
mortes por quilômetros nas estradas brasileiras chega a
ser 70 vezes maior do que a dos países pertencentes ao
G-7 – segundo o Coppead (2003), 62% dos leitos de
traumatologia dos hospitais são ocupados por
acidentados no trânsito.
Fonte: Centro de Estudos em Logística - COPPEAD (2003)
Fonte: Pamcary (estatísticas de cargas seguradas, 2002); COPPE
Figura 3: Base de Dados do Setor de Transportes
O Brasil não dispõe de uma entidade que seja
responsável pela coleta de estatísticas e análises
abrangentes e contínuas sobre o transporte de cargas e
seus efeitos no desenvolvimento do país. O mais próximo
que se tem disso é a ANTT que conta, como atribuições
específicas relativas ao transporte rodoviário de cargas,
promoverem estudos relativos à frota de caminhões,
empresas e operadores autônomos, bem como organizar
e manter o Registro Nacional de Transportadoras
Rodoviárias de Cargas (RNTRC).
Fonte: Pamcary (estatísticas de cargas seguradas,
2002);(2003).
COPPEAD (2003)
Coppead
No entanto, tanto a ANTT quanto o RNTRC não
cumprem integralmente os seus objetivos propostos,
situação esta que difere do país utilizado como modelo,
onde o Bureau of Transportation Statistics americano
realiza análises sobre o transporte através de diversos
enfoques, como impactos econômicos, segurança,
mobilidade, energia e meio ambiente, e segurança
nacional.
5.5.4 Morte nas Estradas
Devido ao estado em que se encontram e a
quantidade de utilização as estradas brasileiras são
inseguras tanto para as cargas, quanto para os motoristas
e passageiros. Ao comparar as estatísticas brasileiras com
estatísticas internacionais, pode-se perceber a real
dimensão do problema.
Fonte:
G7 Transportation
(2002); ;COPPEAD
(2003)
Fonte:
G7 Transportation
Highlights
Geipot; COPPEAD
Fonte:
G7Highlights
Transportation
Highlights
Fonte: G7 Transportation Highliths (2002); Coppead
(2003).
Figura 5: Roubo de Cargas: Crescimento Anual
Com o roubo de cargas, o Brasil perde pela
roteirização não-ótima para entregas urbanas, baixa
utilização da capacidade (em razão da limitação do
seguro), os próprios gastos com seguro e gerenciamento
de risco, e a perda de produtividade nas entregas (por
causa dos procedimentos associados ao gerenciamento
de risco).
5.5.6 Consumo Energético
O grau de aproveitamento das fontes nãorenováveis de energia pode ser medido a partir do número
de BTU´s (British Termal Unit) gastos pelo setor, para
cada dólar gerado no PIB do país. Um comparativo entre
o Brasil e os Estados Unidos é apresentado na Figura 6:
(2002);
Coppead (2003)
Figura 4: Índice de Mortes nas Estradas (1996) –
Por 1.000 km de Rodovia.
24
Fonte: Coppead
(2003)(2003)
Fonte:
Coppead
Fonte: Balanço Energético Nacional
Figura
6:
BTU
Gasto
por
U$
Gerado
PIB July
Figura
6:
BTU
Gasto
por
U$ no
Gerado
no2000
PIB
Department of Energy,
Monthly
Energy
Rewiew,
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Este comparativo 29% pior do que o americano
demonstra um consumo ineficiente de energia não
renovável, causando maior emissão de poluentes, maior
custo final para os produtos, maior dependência externa
de combustíveis, pior desempenho na balança comercial,
entre outros.
5.5.7 Emissão de Poluentes
Os principais poluentes relacionados ao transporte
rodoviário de cargas são os Óxidos de Nitrogênio (NOx)
e o Monóxido de Carbono (CO). Os Óxidos de Nitrogênio
tem como principais conseqüências afetar o sistema
respiratório e causar chuvas ácidas. Já o Monóxido de
Carbono tem como principais efeitos a redução na
capacidade de transporte de oxigênio no sangue,
causando dores de cabeça, perda de reflexos e até a
morte.
O Brasil não dispõe de dados oficiais ou confiáveis
sobre a emissão de poluentes no setor de transporte de
cargas; portanto, utilizou-se aqui uma estimativa feita pelo
CEL / COPPEAD a partir de coeficientes padrão do IPCC
(Intergovernmental Panel on Climate Change), que
apresenta uma correlação padrão entre o consumo de
combustível e a emissão de poluentes, demonstrado nas
Figuras 7 e 8.
Portanto, o nível de emissão de poluentes no setor
de transporte de cargas brasileiro é alto, quando
comparado com aquele apresentado no setor de
transporte americano; e a tendência é que os valores reais
sejam ainda maiores, já que o Brasil utiliza enxofre no
diesel, tem baixo nível de manutenção dos veículos e
conta com uma das mais altas idades médias da frota de
transporte rodoviário.
6 PRINCIPAIS CAUSAS QUE AFETAM A
EFICIÊNCIA DO TRANSPORTE DE CARGAS
BRASILEIRO.
6.1 A Legislação Brasileira no
Transporte
A falta de disciplina no transporte rodoviário de
cargas brasileiro permite o funcionamento de
transportadoras que não têm condições econômicas de
exercer a atividade, a circulação de caminhões
sucateados ou com sobrepeso e a existência de jornadas
de trabalho desumanas, muito distante dos padrões
internacionais.
Fonte: Coppead (2003)
Figura 7: Emissão de NOX em 1998 (Grama /
Fonte:Coppead
Ministério
de Minas e Energia; COPPEAD;
Fonte:
(2003)
TKU)
Fonte:Coppead
Ministério
de Minas
e Energia;
(2003) (2003)
Intergovernmental
Panel
on Climate
ChangeCOPPEAD;
Fonte:
(2003)
Intergovernmental Panel on Climate Change (2003)
Fonte:
(2003);
- U.S.
DOTe (2003)
Fonte :Brasil
Brasil- CNT
- CNT
; EUAEUA
– U.S.
DOT
Espanha - Ley de Ordenación
Fonte: Coppead (2003)
Figura 9: Comparação de Regulamentação de
Transporte entre Brasil, EUA e Espanha.
Conforme demonstra a Figura 9, o Brasil não possui
uma regulamentação efetiva para nenhum dos itens
citados, não estando sujeito a nenhuma das regras
mínimas. Por isso, é imperativo ao país um regulamento
do transporte rodoviário que fiscalize todos os itens dados
como inexistentes na Figura 9.
Fonte: Coppead (2003)
Figura 8: Emissão de CO em 1998 (Grama /
6.2 Priorização do Modal Rodoviário
pelo Governo
TKU)
Com início na década de 1920, o Brasil
experimentou um período de priorização de investimentos
públicos no desenvolvimento da infra-estrutura rodoviária
até que, a partir da década de 1950, o modal rodoviário
ultrapassou o ferroviário e a navegação de cabotagem
em importância.
25
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Nas décadas de 1960 e 1970 observou-se sua
maior expansão, quando boa parte dos gastos públicos,
segundo o Banco Mundial cerca de 20%, era destinada à
construção e manutenção de rodovias. Portanto, o setor
de transporte rodoviário se desenvolveu em um contexto
de forte subsídio de sua infra-estrutura.
A partir da década de 80 ocorre uma redução
gradual dos investimentos na área, até atingir o percentual
de 0,5% do PIB em 1995. A partir da década de 1990 o
modelo de financiamento do setor de transporte rodoviário
passa a contar com ingresso de recursos complementares
da iniciativa privada, por meio da concessão e cobrança
de pedágios.
Mesmo com esse cenário tão adverso, percebese que a mudança de pensamento não ocorreu,
persistindo ainda uma forte cultura de utilização deste
modal, com uma conseqüente falta de conhecimento a
respeito das vantagens e desvantagens dos modais
alternativos ao rodoviário.
do peso máximo, a inadimplência fiscal, entre outras
práticas.
As principais causas do baixo preço do frete
rodoviário podem ser evidenciadas através da existência
de poucas barreiras de entrada para se tornar
transportador autônomo (apenas ter carteira de habilitação
e possuir um caminhão) e nas questões relacionadas à
existência de barreiras de saída. Salienta-se que, ao
deixar de ser transportador autônomo, é muito difícil para
o profissional ser recolocado no mercado de trabalho,
devido aos poucos anos de educação formal e formação
técnica das pessoas que trabalham nesse setor.
Estas barreiras geram um excesso de oferta e
práticas danosas de competição utilizando-se, muitas
vezes, de margem operacional média negativa. Por sua
vez, estas práticas operacionais danosas re-alimentam o
aumento de oferta e as práticas predatórias, criando
efeitos indesejáveis como o alto índice de acidentes e
mortes, a emissão excessiva de poluentes,
engarrafamentos e consumo excessivo de combustível.
6.3 Baixo Preço dos Fretes Rodoviários
6.4 Envelhecimento da Frota
Ao comparar o valor médio pago pelos fretes
rodoviários com os custos incorridos, pode-se perceber
que o valor é excessivamente baixo, o que causa um
problema de saúde no setor, impedindo o crescimento
de outros modais. É inegável que o transporte rodoviário
de cargas tem operado no limite, ou absorvendo custos,
porque em grande parte dispõe da figura do caminhoneiro
autônomo. A Figura 10 faz uma comparação dos custos
padrão com transporte e a remuneração deste, para
cargas fechadas em longas distâncias.
O baixo preço dos fretes rodoviários força o
envelhecimento da frota de caminhões, que gera um frete
barato ao custo da segurança nas estradas, da poluição
do meio ambiente e da diminuição da produtividade no
transporte.
Além disso, não há estímulos ou exigências por
parte das autoridades legais para a renovação dos
veículos rodoviários de carga. O que há é projetos como
o Modercarga, um programa de financiamento de veículos
novos que o governo ofereceu ao setor por meio do
BNDES. Este programa, apesar de poder aquecer as
vendas das montadoras e diminuir a idade média da frota,
não retira os caminhões velhos de circulação. O provável
é que o transportador que adquirir um veículo novo venda
o caminhão velho que continuará ativo, que aumentará a
concorrência e engrossará as estatísticas, como as
apresentadas pela Figura 11.
22
20,9
21
Fonte: Coppead (2003)
Fonte: Coppead (2003)
20
19,5
19
Figura 10: Valor do Frete Rodoviário (R$ / Ton. *
18
Km)
17,5
17,7
18
18,2
17
Como se pode perceber na Figura 10, o preço
médio pago pelos fretes rodoviários é muito baixo em
comparação com os custos incorridos. Este frete
artificialmente baixo é um problema, pois a diferença entre
custo e preço médio, identificada como gap na Figura
10, apresenta o que pode ser entendido como uma
margem operacional média negativa, que força o
transportador a reduzir a manutenção do veículo, praticar
jornadas excessivas de trabalho, o carregamento acima
16
15
2000
2001
2002
2003
2008
2013
Fonte:
ANFAVEA;
COPPEAD
(2003)
Fonte:
ANFAVEA;
Coppead
(2003)
Fonte: ANFAVEA; Coppead (2003)
Figura 11: Cenário da Evolução Média da Frota
Este quadro ajuda a empurrar o preço dos fretes
para baixo, pois o dono do caminhão velho poderá cobrar
26
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
fretes mais baratos, pois não haverá dívidas de
financiamento e redução do custo do investimento mediante
a depreciação do veículo. No médio e longo prazo essa
situação se torna insustentável, pois sem renovação a frota
perde sua capacidade de transportar adequadamente,
prejudicando a segurança nas estradas e diminuindo a
produtividade do setor como um todo.
A Figura 12 demonstra que 91% dos postos de
pesagem brasileiros estão desativados ou inoperantes. A
situação se torna ainda mais preocupante ao se perceber
que é prática comum a emissão de dois conhecimentos
de transporte, um com o peso real e o outro com o peso
da balança, para burlar os 9% de postos de pesagem
operantes.
Assim, sem uma inspeção veicular mais rigorosa e
uma política para tirar de circulação os caminhões velhos,
não se resolverá nem o problema da idade elevada da frota
e nem o problema do valor baixo dos fretes, causado
também pela oferta e circulação de caminhões velhos.
Este cenário penaliza o sistema rodoviário de carga
duplamente: primeiro com o aumento da capacidade real
da frota (o que pressiona ainda mais os fretes para baixo)
e com a rápida degradação das rodovias, aumentando os
custos com manutenção das mesmas.
6.5 Manutenção dos Veículos
6.7 O Desbalanceamento da Matriz de
Transportes
Outro efeito indesejável causado pelo baixo preço
dos fretes é o pequeno investimento em manutenção,
envolvendo peças, mão de obra, pneus, óleo, entre outros.
Enquanto estudos da CNT apontam para um custo médio
de R$ 0,23 por Km rodado para a manutenção de um
caminhão, o mesmo estudo aponta que os gastos médios
dos motoristas autônomos estão na faixa de R$ 0,16 por
Km rodado (70% daquele considerado adequado).
Devido ao seu histórico de subsídios e mentalidade
dos governantes, a disponibilidade de infra-estrutura do
modal rodoviário brasileiro é vultuosamente maior do que
a dos outros modais, conforme pode ser percebido na
Figura 13.
A questão se torna ainda mais preocupante ao se
considerar caminhões com mais de 25 anos, que
necessitam de mais manutenção e são, portanto,
propensos a gastar mais do que os R$ 0,23 e receberem
menos do que os R$ 0,16 por Km rodado, dado o baixo
poder aquisitivo do profissional dono do veículo.
6.6 Excesso de Carga
O excesso de peso nos veículos já se tornou um
fato comum, rotineiro e conhecido de todos que atuam no
mercado de transporte rodoviário, principalmente devido à
pouca fiscalização dos pesos máximos exigidos pela lei
da balança.
Fonte: Coppead (2003)
Figura 13: Densidade de Transporte (Km / 1.000
Km2)
Esse desbalanceamento na matriz de transportes
exerce um efeito de freio sobre a economia brasileira. O
escopo de participação, demonstrado na Figura 13, difere
daquela encontrada em outros países de dimensões
continentais, como o Brasil.
Fonte:
Coppead
(2003)
Fonte:
GEIPOT
2001; IBGE 1998; COPPEAD (2003)
No que tange ao escopo mundial, países com
grande extensão territorial, como a China, os EUA, o
Canadá e a Rússia usam predominantemente o modal
ferroviário em detrimento do modal rodoviário. Em
compensação, países de pouca extensão territorial, como
a Alemanha, Bélgica, Dinamarca, França e Hungria utilizam,
predominantemente, o modal rodoviário em detrimento de
outros modais. Portanto, não é errado afirmar que o Brasil
se encontra na contramão do escopo mundial.
Fonte:
DNER
Fonte:
DNER;
Coppead (2003)
Fonte: DNER; Coppead (2003)
Figura 12: Postos de Pesagem Operantes e
Desativados
O modal ferroviário, que devido à grande extensão
territorial do Brasil deveria ser o predominante, apresenta
uma baixa oferta de infra-estrutura e problemas
relacionados com a burocracia e a viabilidade econômica
27
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
de algumas ferrovias que permanecem fortemente
subutilizadas.
Com relação à navegação do interior, outra boa
alternativa ao modal rodoviário, deve-se citar que apenas
35% das vias navegáveis são efetivamente utilizadas para
o transporte. Os outros 65% só podem ser viabilizados
economicamente a partir de intervenções nos rios e
construção de infra-estrutura em terra – como terminais
intermodais hidroviários.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para cumprir o seu objetivo de integrar e desenvolver
todo o País, os modais de transporte se complementam,
permitindo o escoamento de produtos e a locomoção de
passageiros entre as regiões do Brasil e também para o
exterior. Os sistemas de transporte impulsionam também
o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) ao movimentar
as riquezas nacionais, ligar áreas produtoras a mercados
consumidores e facilitar as exportações brasileiras. Esse
círculo virtuoso se fecha com o próprio incentivo que o
desenvolvimento do PIB oferece à expansão dos sistemas
de transporte do País, estimulando investimentos públicos
e privados nos diferentes modais.
Infelizmente o que se constata é que o Governo
Federal deixou de cumprir seu papel de provedor e
mantenedor da infra-estrutura básica para o transporte e
circulação de bens e pessoas, tanto no âmbito doméstico,
quanto no internacional. Com isso, o setor de transporte
de cargas brasileiro acabou tendo que conviver com as
novas regras do mercado cada vez mais exigentes,
enquanto tenta contornar problemas graves de infraestrutura, o preço dos pedágios, o trânsito nas grandes
cidades, o baixo desenvolvimento em regiões onde não há
um retorno para a carga, e a qualificação profissional, que
resulta em uma carência de mão de obra que atinge desde
o motorista até os cargos mais altos. Outras questões
como burocracia, insegurança, impostos, múltiplas taxas
e a atenção governamental para incentivar a integração
entre os modais de transporte com uma legislação moderna
e eficaz são problemas que também atrasam o crescimento
do setor.
Contudo, mediante alerta da sociedade, o Estado
já percebe que a qualidade do setor de transporte de cargas
ameaça as metas almejadas de crescimento e já traça
um planejamento para aumentar a eficiência da nossa
logística. No entanto, o que nossos governantes parecem
ignorar, é que este aumento de eficiência não depende
simplesmente da realização de melhorias específicas para
cada um dos modais. Tão importante quanto isso é a
criação de um ambiente social e econômico que incentive
a busca pela eficiência do fluxo de mercadorias pelo país.
Por isso, recomenda-se a revisão do sistema legal
e tributário do transporte de cargas brasileiro para que seja
propiciado um ambiente econômico e legal que facilite o
fluxo de transporte e a intermodalidade. Outro ponto
interessante é a criação de uma base de dados acurada e
atualizada para o setor de transporte que torne disponível
dados para pesquisas e monitoramento das medidas
adotadas e do próprio setor (pois, atualmente, são
disponibilizados dados de forma dispersa e incompleta, o
que inviabiliza uma análise eficaz e contínua do setor).
Recomenda-se também a reestruturação do setor
federal de transportes, visando aperfeiçoar sua atuação.
Nesse sentido, urge a transformação do Ministério dos
Transportes em Ministério da Logística, criando uma nova
estrutura de planejamento setorial. No entanto, é
importante não render a pasta a interesses de partidos
políticos aliados ou ao próprio Governo.
Também é recomendação do grupo investimentos
nas áreas de qualidade e produtividade, sem descuidar da
questão ambiental. Estas são as forças que devem reger
o mercado no futuro próximo, seja em maior ou em menor
grau. Infelizmente, com o governo perdendo sua capacidade
de prover tais recursos, deve-se buscar um ambiente
estável e atrativo ao capital privado, buscando fundos para
os investimentos necessários sem sacrificar
economicamente as pessoas físicas e jurídicas.
Uma vez concluídos, esses investimentos
proporcionarão às pessoas físicas e jurídicas brasileiras
uma significativa melhoria logística e estas, por sua vez,
trarão a possibilidade de um crescimento sustentável ao
país mediante o atendimento de suas necessidades
logísticas.
REFERÊNCIAS
AAR. Association of American Railroads. Disponível em
<http://www.aar.org>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
ABTP. Associação Brasileira dos Terminais Portuários.
Disponível em <http://www.abtp.com.br>. Acesso em: 25
Jan. 2007.
ANAC. Agência Nacional de Aviação Civil. Disponível
em <http://www.anac.gov.br>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
ANTAQ. Agência Nacional de Transportes Aquaviários.
Disponível em <http://www.antaq.gov.br>. Acesso em: 25
Jan. 2007.
ANTF. Associação Nacional dos Transportadores
Ferroviários. Disponível em <http://www.antf.org.br>.
Acesso em: 25 Jan. 2007.
ANTT. Agência Nacional dos Transportes Terrestres.
Disponível em <http://www.antt.gov.br>. Acesso em: 25 Jan.
2007.
BANCO MUNDIAL. The World Bank Group. Disponível
em <http://www.worldbank.org>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
BNDES. Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social. Disponível em <http://
www.bndes.gov.br>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
CNT. Confederação Nacional dos Transportes.
Disponível em <http://www.cnt.org.br>. Acesso em: 20 Jan.
2007.
COPPEAD. Instituto Pós-graduação Pesquisa
Administração Universidade Federal do Rio de
28
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Janeiro. Disponível em <http://www.coppead.ufrj.br>.
Acesso em: 25 Jan. 2007.
FLEURY, Paulo Fernando; WANKE, Peter; FIGUEIREDO,
Kleber Fossati. Logística Empresarial: a perspectiva
brasileira. São Paulo: Atlas, 2000.
GOVERNO FEDERAL. Ministério do Planejamento.
Disponível em <http://www.planejamento.gov.br>. Acesso
em: 24 Jan. 2007.
GOVERNO FEDERAL. Ministério dos Transportes.
Disponível em <http://www.transportes.gov.br>. Acesso em:
24 Jan. 2007.
INFRAERO. Empresa Brasileira de Infra-Estrutura
Aeroportuária.
Disponível
em
<http://
www.infraero.gov.br>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
Disponível em <http://www.ipea.gov.br>. Acesso em: 25
Jan. 2007.
IRU. International Road Transport Union. Disponível em
<http://www.iru.org>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
KOBAYASHI, Shun’ichi. Renovação da Logística. São
Paulo: Atlas, 2000.
MARTINS, Petrônio Garcia. Administração de materiais
e recursos patrimoniais. São Paulo: Saraiva, 2003.
NOVAES, Antônio Galvão. Logística e Gerenciamento
da Cadeia de Distribuição. Rio de Janeiro: Campus,
2001.
U.S DEPARTMENT OF TRANSPORTATION. Bureau of
Transportation Statistics. Disponível em <http://
www.bts.gov>. Acesso em: 25 Jan. 2007.
29
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
ALGUNS DISCURSOS SOBRE A CONSTRUÇÃO DA
CRIANÇAINFÂNCIA
Elisabete Andrade1
Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM2
RESUMO
A sociedade em que vivemos vem sofrendo
constantes mudanças que afetam de forma significativa o
cotidiano das instituições (família, escola, sociedade) e
das relações estabelecidas com as crianças no contexto
sócio-educativo. Considerando tais mudanças e as diversas
possibilidades de compreensão dos processos de evolução
histórica que permeiam as concepções sobre a infância,
esse artigo vem refletir acerca dos discursos que vêm
constituindo a “criançainfância” ao longo dos tempos. São
contextualizados discursos próprios da modernidade com
produções discursivas contemporâneas estabelecendo
relações de proximidade e, ao mesmo tempo,
problematizando o momento vivido, trazendo depoimentos
que demonstram novas maneiras de compreender e viver
o mundo imaginário das “criançasinfâncias” consideradas
sujeitos de seu espaço-tempo.
Palavras Chaves: Discursos, “criançainfância”
RESUMEN
La sociedad en que vivimos viene sufriendo muchos
cambios que afectan de forma significativa el cotidiano
de las instituciones (familia, escuela, sociedad) y de las
relaciones creadas con los niños en el contexto socioeducativo. Considerando tales cambios y las muchas
posibilidades de comprensión del proceso de evolución
histórica que impregnan las concepciones sobre la infancia,
ese artículo viene reflejar acerca de los discursos que
vienen constituyendo el “niñoinfancia” al largo de los
tiempos. Son contextualizados discursos propios de la
modernidad con producciones discursivas contemporáneas
estableciendo relaciones de proximidad y al mismo tiempo
problematizando el momento vivido trayendo declaraciones
que demuestran nuevas maneras de comprender y vivir en
el mundo imaginario de los “niñosinfancia” considerados
sujetos de su espacio-tiempo.
Palabras Llaves: Declaraciones, niñoinfancia”
INTRODUÇÃO
Esta produção escrita traz problematizações que
podem vir a contribuir com as reflexões e indagações
acerca da forma como as “criançasinfâncias” vêm sendo
pensadas e constituídas pelas constantes influências das
instituições: escola, família e sociedade. Para tanto, optei
por alguns teóricos que desenvolvem importantes estudos
relacionados à temática: Narodowiski, Comenius, Bujes,
Ariès, Foucault. De forma significativa, estes referenciais
levam a compreender, como ensina Foucault (2004), “as
condições e possibilidades” geradas pelos discursos que
permeiam a representação dos sujeitos, neste caso, das
“criançasinfâncias”. É importante esclarecer ao leitor que
o uso das palavras sem separação é proposital. Com a
junção dessas palavras, quero demonstrar que nesta
produção “criançainfância” 3 são refletidas como
inseparáveis, momento da vida de sujeitos pensados a
partir das necessidades de seu espaço-tempo.
Para chegar a uma possível compreensão de como
os discursos contribuem para a constituição da
criançainfância, parto da concepção de discurso trazido
por Foucault (2004) que questiona como as coisas
funcionam, quais foram as práticas discursivas e não
discursivas que deram sentido à forma que a
“criançainfância” vem sendo constituída. Para Foucault não
existe apenas um discurso “dominador”, mas, imersos nas
relações de poder-saber os discursos ganham espaço e
são reproduzidos nas práticas cotidianas, seja nas escolas,
nas famílias ou no contexto social em que estamos
1 Pedagoga, Mestre em Educação nas Ciências pela UNIJUÍ –IJUÍ-RS, professora do 1º Ano do Ensino Fundamental- 9 anos da SETREM,
e-mail: [email protected].
2 Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e-mail: [email protected]
3 Esta maneira de representar refere-se a estética da escrita usada por Nilda Alves (1998) fazendo a junção das palavras “espaçotempo”
e também por Ferraço (2006) com as palavras “fazeressaberes” na tentativa de, ao unir palavras, buscar não só superar a dicotomia
presente mas, sobretudo, inventar outros tantos significados decorrentes da junção das mesmas.
30
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
inseridos (as). O discurso não é apenas aquilo que falam,
escrevem ou dizem, diz respeito também à forma que
conduzimos nossas próprias práticas diante daquilo que
lemos, ouvimos e vivenciamos. Seguindo os ensinamentos
de Foucault (2004) é possível afirmar que somos uma
construção, uma representação discursiva. É neste meio
que as “cirançasinfâncias” vêm sendo pensadas. É a partir
deste meio e destas concepções que pretendo trazer
algumas reflexões, relacionando com os discursos
modernos que escolarizam e pedagogizam a
“criançainfância”.
REFLETINDO ALGUNS DISCURSOS
Para Narodowski (2001 p. 21): “A infância é o ponto
de partida e o ponto de chegada da pedagogia”. Ao mesmo
tempo em que a pedagogia se vale da anterioridade da
infância, (re) produz maneiras de conduzir a educação das
crianças inaugurando discursos e possibilidades de
intervenções institucionais. A escola, o pedagogo,
juntamente com a família, constitui mecanismos sociais,
próprios da modernidade que denominam as concepções
de criança, infância e aluno.
A educação institucional (família, escola, sociedade)
contempla o cuidado, a formação intelectual, a transmissão
da cultura para que assim as crianças se tornem adultos,
como enfatiza Narodowski (2001 p. 21): “adaptados à
sociedade de maneira crítica ou sujeitos críticos e
transformadores”. Nessa perspectiva, a infância é pensada
em relação ao futuro, ou seja, ao adulto que se espera
constituir e “formar”, desconsiderando as necessidades
das crianças enquanto sujeitos capazes de pensar, opinar,
conhecer, aprender no contexto de vida atual.
O discurso da infância foi inventado a partir de
estudos teóricos e científicos da psicologia, da medicina
(pediatria), da instituição escolar, da pedagogia, da
psicopedagogia, da didática - que normatizam,
contextualizam, explicam, predizem a infância controlando
seu desenvolvimento. Narodowski questiona a diferenciação
epistemológica feita entre a criança e o aluno. Para a
infância em geral (psicologia, psicanálise, pediatria) o objeto
de estudo é a criança; já para a infância escolar (psicologia
educacional, pedagogia) o objeto é o aluno, e a escola
como instituição se especializa em produzir adultos. Tanto
a escola como instituição, quanto à ciência estabelecem
uma diferenciação entre “ser criança” e “ser aluno”. O que
pretendo destacar é que em ambas situações as crianças
acabam sendo pensadas enquanto objetos de estudos e
análises científicas; porém, parte-se do pressuposto de
que enquanto aluno/a, não deixa de ser criança. Nessa
perspectiva, a criança é entendida como sujeito das
interações realizadas nas instituições e não como objeto,
como enfatiza Narodowski (2001 p. 23): “O aluno é um
campo não alheio à infância, porém mais complexo”.
A discussão que aqui quero retratar considera que
a complexidade do aluno (a) pode ser percebida no
cotidiano da escola, quando nos discursos e práticas
pedagógicas são levadas em consideração as histórias
de vida dos sujeitos a quem o (a) pedagogo (a) educa. As
crianças que freqüentam as escolas possuem uma família
de quem recebem os primeiros cuidados e educação.
Quando ingressam na instituição escolar (cada vez mais
cedo), ao professor (a) reserva-se a responsabilidade de
dar continuidade a este processo educacional, enfatizando
a relação ensino-aprendizagem que é responsabilidade da
escola - contextualizar os saberes histórico-culturais
trazidos pelas crianças com os conteúdos que precisam
ser ensinados. Esta função do (a) pedagogo (a) é
considerada um grande desafio, envolve o
comprometimento do (a) professor (a) que busca interagir
com as crianças visando possibilidades de desenvolvimento
das suas habilidades.
Pensando justamente neste lugar de/para criança
é que a pedagogia passou a existir e a dedicar espaço de
estudo a esta etapa da vida. Para afirmar sua especificidade,
aos poucos foram sendo produzidos discursos sobre a
infância e a importância de considerá-la. De acordo com
Narodowski (2001 p. 25): “A criança é o pressuposto
universal para produção pedagógica, pressuposto de
entidade irrefutável como cimento privilegiado da educação
escolar”. Considerar esta etapa da vida como sendo
fundamental para o desenvolvimento e amadurecimento do
aprendizado infantil se tornou preocupação a partir do
século XVII, momento em que é reconhecida e nomeada a
recente “invenção da infância”. Para Ariès (1981) a infância
é produto histórico, uma construção recente, produto da
modernidade. Este momento histórico passa a ser
referência para as mudanças em relação às concepções
de criançainfância.
Em sua obra Infância e Poder (2001, p. 30),
Narodowski referencia dois grandes clássicos: o primeiro
é “Emílio ou da educação” de Jean-Jacques Rousseau. O
autor enfatiza que no pensamento rousseauniano o estudo
da infância como ação educativa aplicável pode e deve
efetuar-se de acordo com sua própria natureza. A infância
não aparece na obra como um recorte arbitrário, produto
da ação discursiva nem, muito menos, como a particular
característica que a cultura assume no que diz respeito
aos seres menores. Os produtos da infância são próprios
da infância e, portanto, naturais de seu ser. “Emilio” é para
pedagogia ponto de partida, palavra inicial, raiz “. A obra
descobre a infância nomeando-a e normatizando sua
existência; situando-a naquela posição das coisas que
merecem um nome e, portanto, ser estudadas e
respeitadas; a pedagogização da infância não é, em
absoluto, coisa de criança”.
A obra seguinte se refere à “Didática magna” de
Comenius, cuja finalidade é a de buscar ordem (uma ordem
natural e, portanto, uma ordem racional) nos afazeres
relacionados ao ensinar e ao aprender. Para Comenius a
essência da racionalidade, da especificidade humana, é a
capacidade de dotar de ordem aquilo que aparece
caoticamente (observar, denominar, classificar, graduar).
Através de operações cartesianas o mundo, ou melhor, a
atividade do homem é arrancada de seu destino celestial
31
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
para ser examinada conforme regras da razão e, sobretudo,
para ser ordenada em função destas. Demonstra também
que os discursos relacionados à conceitualização de
infância entre Rousseau e Comenius são diferentes,
enquanto que em Emilio se pretende demonstrar
justamente o tipicamente humano do ser infantil, por um
procedimento de comparação e inferência, Comenius
chega ao ponto oposto: em todas as coisas que revelam a
gradação, a infância é um momento indispensável
(NARODOWSKI, 41-45).
Os textos de Comenius e de Rousseau são
exemplos possíveis da fase de elaboração discursiva do
processo de escolarização da criança. É importante
destacar algumas especificidades discursivas sobre a
necessidade de formação das criançasinfâncias trazidas
na obra de Comenius (1997 p. 100-101):
Como dos anos da infância e da primeira
educação depende todo o resto da vida, se os
espíritos não forem, desde o principio,
suficientemente preparados para as
circunstâncias de toda a vida, não haverá mais
nada a fazer. Assim como no útero materno se
formam os membros igualmente para todos
os homens, e em cada um se formam as mãos,
os pés, a língua etc., ainda que nem todos
venham a ser artífices, corredores, copistas,
oradores, também na escola é preciso ensinar
a todos as coisas que digam respeito ao
homem, ainda que depois uma delas venha a
ser mais útil a um, e outra ao outro.
Para Comenius a infância é considerada a fase ideal
para aprendizagens, momento de definições de caráter,
personalidade, ou seja, uma sólida “formação do homem”
depende da maneira que a educação da criança é
conduzida na primeira infância. Esta educação interessa
tanto aos pais como às crianças e também para as
instituições sociais (igrejas, escolas, Estados). As
reflexões de Comenius trazem o entendimento de que
existe uma ordem maior, na sua concepção “Deus” o
criador que regulamenta, normatiza e conduz a passagem
das pessoas no lugar em que vivem; por isso a educação,
a condução deste caminhar depende das escolas e dos
mestres preparados para tal ofício. Conforme Comenius
(1997 p.87): “Assim como se devem preparar os pesqueiros
para os peixes e os pomares para as plantas, também se
devem preparar as escolas para os jovens”.
O discurso de Comenius revela certa naturalidade
ao falar da necessidade de escolarização das crianças.
No decorrer de sua obra faz inúmeras comparações entre
os homens, plantas e animais, querendo demonstrar que
existem possibilidades de intervir no processo de formação
das pessoas, assim como acontece com os outros seres
vivos - não humanos. Existe uma ordem, um lugar, um
espaço-tempo para desempenhar tal tarefa; para ele, o
ambiente mais adequado é a escola.
As escolas são as oficinas da humanidade:
elas transformam os homens em homens de
verdade, ou seja, (visando aos fins já
estabelecidos): 1) uma criatura racional; 2) uma
criatura senhora das criaturas (inclusive de si
mesma); 3) uma criatura deleite de seu criador.
Isso acontecerá se as escolas se esforçarem
por tornar os homens sábios na mente,
prudente nas ações, piedosos no coração
(COMENIUS, 1997, p.96).
Para este autor, a escola tem um fim definido e
estabelecido. É considerada uma verdade que visa a
formação do homem desde a mais tenra idade. A
preocupação pode não ser a educação e a consideração
da criançainfância, mas uma formação adequada desde a
primeira infância poderá garantir um homem útil para a
sociedade em que vive. Como ensina Foucault (2004) a
“formação de corpos dóceis” parece ser um dos principais
objetivos. Colocando o homem como centro das situações
de aprendizagem e de conhecimento e a escola como o
espaço mais adequado para este processo, Comenius
(1997) admite que existe uma formação verdadeira capaz
de transformar “homens simples” em “homens de verdade”.
Comenius buscou uma maneira ideal, dotada de ordem
para conduzir a formação deste “homem verdadeiro”, teve
fins e meios definidos e estabelecidos que, ao invés de
garantir a autonomia das pessoas, ao contrário visava o
condicionamento às regras pré-estabelecidas.
Diante das considerações sobre a educação das
criançasinfâncias gostaria de refletir algumas inquietações
suscitadas a partir da leitura de Comenius. Atualmente o
que fazemos nas escolas? Será que continuamos a
perseguir uma verdade única que serve para todos (as)?
Persistem: ordens, controles, seriações, divisões de
espaços-tempos? Estas indagações são consideradas
pertinentes para que as próprias práticas cotidianas
enquanto professores e professoras possam ser
questionadas. É importante perceber que as relações
adulto/criança, professor (a) e aluno (a) são marcados (as)
por limites, regras que fazem parte da infantilização e
escolarização que teve seu início na modernidade. O tempo
da criança nas instituições seja familiar ou escolar passa
a ser controlado e organizado conforme as necessidades
biológicas que contemplam o cuidado com o corpo. O corpo
infantil é percebido; porém, muitas vezes manipulado
conforme os ideais dos adultos que admitem saber o que
é melhor às crianças, estabelecendo uma relação de
submissão. Permeada por relações de poder-saber4, a
instituição escolar e familiar estabelece dependência das
crianças em relação aos maiores. Esta supremacia do
adulto garante e mantém as diferenças, separam o tempo
e o espaço de um em relação ao outro.
4 Para o filósofo e historiador francês Michel Foucault poder e saber estão diretamente relacionados, não há como existir poder sem estar
em relação com um campo de saber. As relações de poder-saber são exercidas e sofridas entre os sujeitos.
32
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Considero o espaço-tempo da infância como uma
fase de muitas descobertas e aprendizagens que merecem
ser incentivadas pelo professor (a), família e sociedade.
Na interação com crianças que freqüentam uma escola de
Educação Infantil, alguns depoimentos chamaram a
atenção. Na semana da Páscoa as crianças enfeitando
seus ninhos na escola, desenhando, pintando e
conversando demonstram entendimentos que instigam
reflexão. Segue o entusiasmado diálogo:
__”O coelhinho nem existe, é uma pessoa que se
veste”.
Os desejos, os sonhos, as fantasias possuem
conotações variadas dependendo da realidade vivida, das
relações e das vivências de cada criança. Em meio a tantas
possibilidades que o mundo atual oferece: televisão,
Internet, jogos eletrônicos, fica o desafio de permitir à
criança sonhar e, a partir de então, descobrir que papainoel e coelhinhos até podem existir em nossa imaginação
e fantasia; porém, em algum momento (que é diferente
para cada criança) chega a hora de perceber que na vida
real existem poucos lugares para esses personagens que
enfeitaram a vida até então.
De acordo com Bujes (2002, p. 18):
__”Existe sim, ontem lá em casa ele deixou vários
chocolates enquanto eu dormia!”.
As idealizações da infância como um espaço
utópico – o reino da inocência, da sensibilidade,
da desproteção, da felicidade, como também
de uma quase miraculosa progressão cognitiva
– deram lugar a uma visão da criança como
sujeito de seu tempo, pressionada pelas
condições do meio, marcada por diferenças de
gênero, classe, etnia, raça, idade, corpo, etc.
__”Mas não foi o coelhinho, ele nem existe nada, é
um adulto que se veste. É tudo mentira!”.
__”Profe, né que o coelhinho existe sim, a colega
está dizendo que não, mas eu sei que sim!”.
O que fazer? O que responder? O professor (a) e a
escola são referências para as crianças. O ingresso na
Escola Infantil é o momento em que a criança sai de seu
ambiente familiar e estabelece relações diferentes da
convivência em família. A escola é o lugar em que a criança
expande seus horizontes de compreensão do mundo e
das relações sociais vivenciadas no cotidiano. Trago este
diálogo para refletir até que ponto nossas crianças estão
vivendo a magia, a fantasia, o sonho da infância e como a
escola e o professor (a) podem contribuir incentivando ou
destruindo toda e qualquer possibilidade de fantasia que
são próprias da infância. Será que o encanto acabou? Onde
estão as fadas encantadas, o papai-noel, os duendes, o
coelho da Páscoa e até o bicho-papão? Pode ser que
acabaram sufocados pela era industrial, pela modernidade
ou ainda pelo avanço das redes de comunicação que
representam as necessidades da infância contemporânea
de forma diferente das vividas por nossos avós, pais ou
nós mesmos.
As constantes mudanças sociais e avanços
vivenciados em nosso dia-a-dia revelam não mais “a
criança”, ou “uma infância” idealizada e colorida. Pelo
contrário, são “crianças e infâncias” que pertencem a
culturas diversas, convivendo em um espaço-tempo de
globalização permeado por fluxos e redes de informações5.
Todo esse movimento social interfere de maneira
significativa na vida das pessoas estabelecendo relações
de poder-saber6 que conduzem os discursos, as linguagens
e as representações de sujeitos. A representação sobre a
criançainfância perpassa todos esses movimentos e nele
se constitui. Criam-se novas necessidades, atribuindo
novos sentidos e novas maneiras de compreender os
acontecimentos.
“Falar em visão de criança como sujeito de seu
tempo”, como enfatiza a autora, leva a perceber que os
discursos sobre a infância se constituem de acordo com
as condições e possibilidades que o meio oferece. O tempo
controlado, medido, cronometrado é o retrato da sociedade
em que vivemos e as rotinas das crianças não fogem a
essas regras de controle e da máxima produtividade do
tempo. A reflexão trazida com Bujes (2002) remete ao
entendimento de que a infância é constituída por discursos
carregados por significações que delimitam a maneira de
conceber a infância. Os discursos mediados pela
linguagem atravessam a educação das crianças pequenas
e conduzem a caracterizações específicas sobre a forma
como convém ser pensada, cuidada e educada. São as
próprias instituições responsáveis pela educação das
crianças que produzem, consolidam e reforçam esses
discursos cotidianamente.
Por outro lado, a inocência, a felicidade, a proteção
são aspectos que fazem parte da vida das crianças e sua
consideração remete ao reconhecimento da criança como
sujeito. Independente da cultura, do gênero, da classe, da
raça, o mundo imaginário e a fantasia são alguns dos
aspectos constituidores do jeito de ser criançainfância.
Esta relação da criança com o “mundo imaginário”
possibilita que aos poucos passe a compreender o “mundo
em que vivem”. A letra da música: “Somos quem podemos
ser” de Humberto Gessinger (2004) reflete de forma poética
a relação entre o mundo real e o imaginário que tento
retratar.
Um dia me disseram que as nuvens não eram
de algodão. Um dia me disseram que os ventos
às vezes erram a direção. E tudo ficou tão claro,
5 Manuel Castells (1942) em sua obra “A Sociedade em Rede” demonstra a dinâmica social vivenciada em nosso cotidiano. Referindose aos espaços de fluxos, o autor enfatiza a quantidade enorme de informações que temos a nosso dispor devido ao avanço das redes de
comunicações entre as pessoas e o mundo.
33
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
um intervalo na escuridão. Uma estrela de
brilho raro, um disparo pára o coração. A vida
imita o vídeo, garotos inventam um novo inglês.
Vivendo num país sedento, um minuto de
embriaguez. Nós somos quem podemos ser,
sonhos que podemos ter. Um dia me disseram
quem eram os donos da situação. Sem querer
eles me deram as chaves que abrem esta
prisão. E tudo ficou tão claro, o que era raro fico
comum. Como um dia depois do outro, como
um dia, um dia comum. Um dia me disseram
que as nuvens não eram de algodão. Um dia
me disseram que os ventos, às vezes erram a
direção. Quem ocupa o trono tem culpa. Quem
oculta o crime também. Quem duvida da vida
tem culpa. Quem evita a dúvida também tem.
Somos quem podemos ser, sonhos que
podemos ter.
O encanto e a beleza de ser criança e descobrir o
mundo a todo instante é privilégio da fase da vida
denominada infância. Parece desnecessário que o
“encanto” seja quebrado antes do tempo. Por mais que
haja pressa em vê-los crescer e perceber a realidade do
mundo em que vivem, no imaginário ficam lembranças do
tempo em que o impossível era alcançado, que o céu era
mais próximo e as nuvens com certeza eram de algodão.
Em um mundo adulto de tantas incertezas, por que não
permitir a criança sonhar que pode ser o que sua imaginação
permitir, sem que o social interfira? Porém, seria quase
impossível admitir essa façanha, levando em consideração
que as próprias fantasias das crianças são produzidas na
relação com o imaginário social que a constitui. “A vida
imita o vídeo” ou de repente poderia dizer que: “o vídeo
imita a vida”. Na ficção ou na realidade “somos quem
podemos ser” na relação com os outros, constituídos
historicamente pela cultura e assim: “quem duvida da vida
tem culpa e quem evita a dúvida também tem”. A origem
dos porquês, como, quando, onde e de que maneira
homens/mulheres/crianças foram/são constituídos desde
a mais tenra idade permanece como incerto e duvidoso.
Diante disso, é interessante permitir as várias
interpretações que possam surgir; entre elas, as
compreensões de “criançasinfâncias”.
Essas várias interpretações discursivas de
“criançasinfâncias” perpassam de maneira significativa as
instâncias e os mecanismos organizacionais que
legitimam a prática pedagógica das instituições educativas.
Entre essas instâncias de poder-saber destaca-se o
discurso do Ministério da Educação com o parecer CNE/
CP 05/2005 estabelecendo as novas Diretrizes Curriculares
para os Cursos de Licenciatura Plena em Pedagogia
homologada em de 11 de abril de 2006, conforme projeto
de resolução CNE/CP 03/2006 enfatizando:
A relevância das investigações sobre as
especificidades de como as crianças
aprendem nas diversas etapas de
desenvolvimento, especialmente as de zero a
três anos em espaços que não os da família. A
aprendizagem dessas crianças difere daquelas
entre 7 e 10 anos; elas se manifestam por meio
de linguagem próprias à faixa etária, e em
decorrência há especificidades nos modos
como aprendem. Estudos vêm demonstrando
que
o
desconhecimento
dessas
particularidades, entre outras, tem gerado
procedimentos impróprios e até de violência
às linguagens e necessidades do educando.
Daí decorre a exigência precípua do curso de
Pedagogia examinar o modo de realizar o
trabalho pedagógico, para educação da infância
a partir do entendimento de que as crianças
são produtoras e produzidas numa cultura,
rompendo com uma visão da criança como um
“vir a ser” (PARECER 05/2005.p.13).
O discurso do Ministério da Educação/ MEC sobre
a maneira como a criança pode/deve ser olhada pelas
instituições merece ser levada em consideração. Não é
mais possível admitir nas Escolas Infantis o despreparo
das pessoas que são responsáveis pela educação e
cuidado das crianças. As particularidades de sua educação
merecem atenção especial, sendo consideradas pelos (as)
professores (as) e pelas instituições educativas. Com a
aprovação do parecer CNE/CP 05/2005 todas as
instituições de Ensino Superior terão que adequar as
bases curriculares dos Cursos de Licenciatura Plena em
Pedagogia às novas exigências educacionais. A educação
inicial é (a) considerada fundamental para que os
professores (a) possam desenvolver nas escolas práticas
pedagógicas condizentes com as necessidades da criança
e do meio em que está inserida. Aliado aos conhecimentos
produzidos nos cursos de licenciaturas está a educação
continuada que possibilita ao professor (a) ampliar seus
saberes na relação e socialização de experiências com
os próprios colegas de escola e também considerando o
discurso infantil, articulando a teoria estudada com a prática
vivenciada nos ambientes sócio-educativos.
Essa articulação entre a teoria e a prática7 permite
ao professor (a) problematizar as relações estabelecidas
com as crianças no cotidiano escolar, percebendo a
necessidade de compreendê-la como sujeito do processo
educativo e não mais como um “vir a ser”. Considerar a
infância das crianças é oportunizar espaços-tempos para
que possam expressar sentimentos e desejos a sua
maneira, com a orientação e mediação do adulto, mas
não com autoritarismo e submissão às suas “verdades”.
As considerações das criançasinfâncias correspondem a
processos históricos de mudanças na maneira de conceber
esta fase da vida e a reflexão acerca dessas questões
merecem ser constantemente retomadas para que as
7 Para Foucault não existe distinção entre teoria e prática, “tudo é prática” e usa os termos práticas discursivas e não-discursivas para
desenvolver esta idéia. Entendo que a atitude de negar a ação não deixa de ser uma prática, por isso não-discursiva, porque o ato de
pensar e refletir não se concretizou para gerar alguma mudança na maneira de conduzir certa atividade ou na tentativa de resolver um
problema. Percebo as práticas discursivas como tudo aquilo que é concretamente realizado no cotidiano; por exemplo, de uma escola que
pode vir a gerar um melhor entendimento e transformação da realidade.
34
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
práticas discursivas venham a atender de forma efetiva as
necessidades educativas das crianças pequenas em
consonância com as expectativas da sociedade constituída
e constituinte nas relações entre sujeitos.
NA PERSPECTIVA DE CONTINUAR(...)
As reflexões trazidas nesta escrita visaram a
problematização em torno da temática abordada. É
importante esclarecer que o tema não se esgota; por isso,
opto por não usar o termo “conclusão” para finalizar estas
breves reflexões. As questões que envolvem a
“criançainfância” dizem respeito a um contexto amplo e
complexo que por muito tempo e ainda hoje acabam sendo
minimizadas. É importante salientar também que este
artigo é parte de reflexões amplas que constituíram dois
anos de estudo, culminando na dissertação de mestrado
que teve como título: “Educação continuada de professores
na espaço-tempo da escola infantil: relações de poderes
e saberes”.
De forma alguma posso afirmar que este tema, ou
mesmo minha preocupação, esgotou-se nesta pesquisa.
Este é o sentido do trabalho realizado. Jamais se esgota,
não é algo definido, acabado, dado como estabelecido.
Parto da perspectiva de que estar em constante processo
de construção e (re)construção de parâmetros, análises,
reflexões podem levar ao encontro de uma possível
compreensão da realidade vivida, confrontada com o ideal
suscitado por todos que acreditam na educação como uma
possibilidade de conhecer o desconhecido, para assim
produzir conhecimentos não apenas sobre, mas com os
sujeitos envolvidos na pesquisa.
REFERÊNCIAS:
ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da
Família. Rio de Janeiro: Guanabara, 1981.
ALVES, Nilda. O espaço escolar e suas marcas: o espaço
como dimensão material do currículo. Rio de Janeiro: DP
& A, 1998.
BUJES, Maria Isabel Edelweiss. Infância e maquinarias.
Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
BRASIL. Ministério da educação. Diretrizes Curriculares
Nacionais. Brasília: Ministério da educação, 2005.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo:
Paz e Terra, 2003
COMENIUS, João Amós. Didática Magna. Tradução: Ivone
Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
FERRAÇO, Carlos Eduardo. Pesquisa com o
cotidiano.In: Trabalho apresentado na 27a Reunião Anual
da ANPEd, Caxambu/MG, 2005.
FOUCAULT, Michael. Microfisíca do poder. Rio de Janeiro:
Graal, 1979.
___ Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 2004
GESSINGER. Humberto. Somos quem podemos ser.
São Paulo: Acústico MTV, 2004.
LARROSSA, Jorge. KOHAN, Walter. Educação:
experiência e sentido. In: RENCIÈRE, Jacques. O mestre
ignorante: cinco lições sobre a emancipação intelectual.
Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
NARODOWSKI, Mariano. Infância e Poder: conformação
da pedagogia moderna.Bragança Paulista: editora da
universidade São Francisco, 2001.
VEIGA-NETO. Foucault e a educação. Belo Horizonte:
Autêntica, 2004.
De acordo com Larrosa e Kohan:
É a experiência, e não a verdade, que dá sentido
à escritura. Se alguma coisa nos anima a
escrever é a possibilidade de que esse ato de
escritura, essa experiência em palavras, nos
permita liberar-nos de certas verdades, de
modo a deixarmos de ser o que somos para
ser outra coisa, diferentes do que vimos sendo
(2005, p.03).
Com esta afirmação quero ressaltar que todas as
considerações contidas nesta produção consideram o
momento vivido, refletem o entendimento atual, fazendo
parte de uma experiência de escrita, não tendo a pretensão
de estabelecer uma verdade, nem mesmo encerrar o
estudo; pelo contrário, o desejo é dar continuidade às
problematizações que constituem esta experiência.
Experiência que desejo socializar, para assim instigar,
questionar, desnaturalizar as formas de conceber a
educação e o cuidado das criançasinfâncias.
35
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A PROFISSIONALIZAÇÃO DO TRABALHO DOS
FUNCIONÁRIOS DE ESCOLA: POSSIBILIDADES EM
EDUCAÇÃO E GESTÃO DE PESSOAS
Rúbia Emmel1
Renata Amélia Roos2
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber3
RESUMO
Este estudo é resultado de uma pesquisa realizada
com funcionários de escola e vem contribuir para a
Educação e Gestão de Pessoas. Realizado em todas as
escolas da rede pública municipal de um município do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, teve como
objetivo analisar a relação dos funcionários com o trabalho
que realizam nas escolas, focando as percepções e
expectativas quanto ao ambiente de trabalho. Através de
um diagnóstico situacional, caracterizado pela abordagem
quali-quantitativa, a pesquisa revelou a necessidade
dos gestores do município oportunizarem atividades
voltadas à formação profissionalizante do grupo,
proporcionando a estes a produção de conhecimento e
trocas de experiências, visando maior valorização destes
no espaço de trabalho e integração com os demais
segmentos da escola. Entendendo que seu trabalho é
importante para a Educação, uma vez que os funcionários
podem cumprir a função de educadores informais, já que
possuem uma relação diferenciada com os alunos e
comunidade capaz de favorecer laços afetivos e o
compromisso social.
Palavras-Chave: Funcionários de escola,
Educação Informal, Valorização profissional, Gestão de
Pessoas.
ABSTRACT
This study is the result of a research carried out
with school officials, and comes to contribute to the
Education and Management of People. This research was
carried out to all schools in the public network for a city at
Northwest region of the state of Rio Grande do Sul, and
had as its main purpose to examine the relationship of the
officials with the work they act in schools, focusing on the
perceptions and expectations of the working environment.
Through a situational diagnosis, characterized by the
qualitative-quantitative approach, the survey showed the
need for managers of the municipality to offer activities
geared to the vocational training of the group, giving these
the production of knowledge and exchange of experience,
aiming to greater valorization of them at work and integration
with other segments of the school. Considering that their
work is important to education because the officials can
fulfill the function of informal educators, since they have a
different relationship with the students and community able
to foster ties of affective and social commitment.
Keywords: Officials of school, Informal Education,
Professional Recovery, Managing People.
1. INTRODUÇÃO
O desafio de educar é tarefa de todos e depende da
ação colaborativa a ser desenvolvida entre governos e
sociedade civil. Na realidade, a aprendizagem, principal
função social da escola, na perspectiva da formação
cidadã, envolve a aquisição de um conjunto de
informações, habilidades e valores, todos socialmente
relevantes que ocorrem no contexto de uma ação educativa
desenvolvida no interior da escola. Também é evidente que,
de forma complementar à importante atuação do/a
professor/a em aula, ocorrem significativos processos
educativos nos demais ambientes da escola. Esses
processos de comunicação interativa e de vivência coletiva
colocam em cena os trabalhadores em educação vistos
na maioria das vezes como “não-docentes” que estão
atuando nas instituições de ensino em todo país, aqui
denominados/as funcionários/as de escola. Este estudo
tem, portanto, como principal objetivo, colocá-los/as em
cena, instalando assim, no ambiente da rede pública
municipal, a discussão de uma política de valorização a
1
Acadêmica do 7º semestre do Curso de Pedagogia da SETREM. E-mail: [email protected]
Professora Orientadora deste estudo, Psicóloga, Mestre em Psicologia Social e Institucional, Professora dos cursos de Graduação em
Pedagogia e Psicologia na SETREM. E-mail: [email protected]
3
Professora Co-orientadora deste estudo, Mestre em Educação nas Ciências, Professora dos Cursos de Pedagogia e Normal Superior da
SETREM. E-mail: [email protected]
2
36
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
ser implementada em regime de colaboração com os
sistemas de ensino. Um gesto de reconhecimento da sua
identidade social e o reconhecimento institucional da sua
valorização profissional.
Para tanto, este estudo oferece subsídios para
pensar como anda o ambiente de trabalho dos funcionários
de escola. Através de um diagnóstico situacional, fez-se
uma análise referente a alguns temas que permeiam a
Gestão de Pessoas, em uma rede de escolas públicas
municipais, a partir de uma abordagem quali-quantitativa.
Realizado através de visitas, de conversas informais, de
questionário fechado aplicado a funcionários de escola,
além de estudos bibliográficos. Com vistas a sugerir ações
que incorporem esse profissional na rede como agente
em educação, capaz de colaborar para a qualidade da
Educação.
Este instrumento de coleta foi escolhido com o
intuito de facilitar e ampliar a comunicação, fazendo dessa
forma com que se “contribua para emergir a visão, os juízos
e as relevâncias a respeito dos fatos e das relações que
compõem o objeto do ponto de vista dos interlocutores”
(MINAYO, 2003, p.87).
3. O QUE PODEM OS FUNCIONÁRIOS
DE ESCOLA?
O funcionário de escola também educa. Deve-se
valorizar a competência construída na experiência cotidiana
dos problemas da escola e na observação dos alunos, a
capacidade de dedicação desses funcionários à escola e
às crianças. Nunes; Brito; Athayde (2001, p. 54),
questionam “Só após terem adquirido o conhecimento
escolarizado é que serão capazes de dizer alguma coisa
e de ser ouvidos ou de fazer parte do grupo de educadoras?”
Além do professor há outras funções dentro da
escola que também estão envolvidas no
processo de educar, embora não em caráter
formal. É o caso dos funcionários que,
contratados para desempenhar atividades
operacionais específicas, bem sabem que,
dentro deste tipo de instituição, seu trabalho
envolverá o contato direto com os alunos. Neste
sentido, o trabalho da funcionária encarregada
pela limpeza nunca será o mesmo da faxineira
de um escritório; o da merendeira jamais
poderá ser comparado ao da funcionária de
uma cozinha industrial; o da funcionária da
portaria da escola, então, de longe não se
assemelha ao da portaria de um prédio ou
empresa. O que dizer, então, no caso das
escolas onde alguns desses acumulam função
de tomar conta dos alunos durante o intervalo?
(CODO, 1999, p. 50).
Constitui assim, gradualmente, uma concepção de
educação cidadã, que se afasta de modelos pedagógicos
padronizados e excludentes, em favor de um ambiente de
aprendizagens colaborativas e interativas, que considerem
todos os/as integrantes da escola protagonistas do
processo educativo.
2. METODOLOGIA
Após uma conversa com o Secretário de Educação
do município em questão, na qual este explicitou a sua
preocupação com a Equipe de Funcionários, no que diz
respeito à crescente demanda de laudos de afastamento
do trabalho, aos conflitos existentes entre funcionários e
professores da escola e a não participação destes neste
contexto, passamos a pensar na possibilidade de
desenvolver uma pesquisa em gestão de pessoas em
contexto educacional com os funcionários da rede de ensino
do município.
Para tanto, produzimos um questionário
motivacional, com base no modelo proposto por Celinski
(1995), com questões referentes à Política da Instituição,
Normas Administrativas, Estilos de Chefia, Relações
Interpessoais (profissionais, comunidade escolar,
estudantes), Condições de Trabalho, Sentido de
Realização, Reconhecimento, Responsabilidades,
Autonomia, Conteúdo do Trabalho, Promoção e
Comunicação.
Codo (1999) pensa que todo trabalho envolve algum
investimento afetivo por parte do trabalhador, quer seja na
relação estabelecida com outros, quer mesmo na relação
estabelecida com o produto do trabalho. Para tanto, o autor
afirma que o ato de cuidar/educar consiste em ser realizado
com sucesso. Torna-se obrigatório o vínculo afetivo.
Para o mesmo autor (1999, p. 51) “devemos
considerar educadores todos aqueles, professores ou não,
que atuam na instituição e de alguma forma interferem na
formação do aluno”.
Esta pesquisa fez um diagnóstico situacional e um
estudo documental, caracterizado pela abordagem qualiquantitativa. Foi realizada através de questionário fechado
(105 questões fechadas), aplicado a todos os funcionários
da rede Municipal de um município da Região Noroeste do
Rio Grande do Sul, estando entre estes: 37 serventes e
merendeiras, 7 secretárias e 9 monitoras. As informações
coletadas, observadas e analisadas, constituíram um
suporte primordial para o desenvolvimento do estudo.
37
Para os alunos mais novos, elas são “a tia da
limpeza”, “a tia do banheiro”, “o tio do portão”,
“a tia do refeitório”. Estes funcionários, muitas
vezes, conhecem os alunos pelo próprio nome.
Sabem dos problemas familiares, dos
comportamentos indisciplinados, até mesmo
das dificuldades nesta ou naquela disciplina
(CODO, 1999, p. 51).
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A educação permeia os múltiplos espaços da escola
e ultrapassa seus muros. Os autores Nunes; Brito;
Athayde (2001, p. 62) pensam que “vários atores participam
do processo educativo; cabe reconhecê-los, valorizá-los,
recuperá-los para que, de alguma forma, isso seja
canalizado para a educação, já que, afinal esse é o objetivo
fundamental da escola”.
Pensamento que é corroborado por Codo (1999, p.
51): “os funcionários podem não participar da educação
em termos de currículo oficial da escola, mas, sem dúvida
nenhuma, contribuem e muito para garantir o bem-estar
dos alunos, para a criação de hábitos, atitudes e valores”.
Neste sentido, o funcionário também tem a sua participação
no currículo oculto e mesmo sem perceber está envolvido
em muitas atividades deste.
Outro momento importante em que o trabalho das
merendeiras deve ser visto como educativo e segundo os
autores Nunes; Brito; Athayde (2001, p. 55): “o momento
de distribuição da merenda é de desenvolvimento unificador,
ou seja, são dimensões coletivas e relações de cooperação
presentes no ato de educar desenvolvido pelo conjunto de
trabalhadores na escola”.
Os mesmos autores afirmam que um melhor
desempenho de suas atividades e desenvolvimento
estariam articulados ao reconhecimento do ofício de
cozinheiras, pois as atividades desempenhadas pelas
merendeiras não se resumem à preparação de pequenos
lanches escolares. Segundo os autores, “elas preparam,
com dedicação, refeições completas, procurando adequálas ao gosto dos alunos e torná-las saborosas”.
A forma como ocorreu a entrada de merendeiras e
serventes no serviço público é colocada pelos mesmos
autores como bastante irregular: “sendo muitas voluntárias
e/ou pagas com dinheiro de caixa escolar ou indicadas
por políticos” (p.52). A partir da década de 80, conforme os
mesmos autores, é que se deu início à luta por melhores
condições de trabalho e por sua efetivação nos quadros
do funcionalismo público; para tanto, foram criadas
Associações de Servidores, campanhas de valorização de
funcionários/as, sindicatos. Estes reconhecem que um dos
maiores problemas para os funcionários seria a falta de
escolaridade4 e de profissionalização, o que justifica para
estes autores o papel secundário dos mesmos no cotidiano
da escola.
O ofício de cozinhar, segundo Nunes; Brito; Athayde
(2001, p. 66), “traz à memória lembranças tantas vezes
presenciadas quando crianças nas cozinhas e fruto de
tantas brincadeiras de “comidinha” que eram, na realidade,
treinamento para um ofício”.
Suas habilidades e destrezas, consideradas
naturais às mulheres e por isso desvalorizadas
socialmente, já que não são consideradas
como qualificação profissional, legitimam a
divisão sexual do trabalho. Essas qualidades,
na verdade adquiridas no decorrer da vida, são
resultado, portanto, de anos de treinamento e
aprendizado, desde meninas até se tornarem
mulheres no trabalho doméstico (NUNES;
BRITO ATHAYDE, 2001, p. 66).
Na citação acima podemos perceber que existe
sim um memorial, ou seja, pressupostos que condizem à
vocação de merendeiras ou serventes, que existiram
pressupostos que postularam a esta profissão, uma
agregação de valores constituídos já na infância, para que
então se identificassem nesta carreira (profissão), se
tornando assim profissionais qualificados pela escola da
vida, que se julga ir além das barreiras da escola.
4.
COMPREENDENDO
RESULTADOS
OS
4.1 Os Outros: como estão as
percepções?
Um longa-metragem, dirigido por Alejandro
Amenábar, chamado “Os Outros”, pode ajudar a pensar a
sensação que foi passada durante os encontros com os
funcionários nas escolas. Neste filme, duas famílias
coabitam o mesmo espaço sem se enxergarem, mas
sentindo os efeitos da presença de ambas nas
transformações das paisagens - cortinas que se abrem,
sons de outras salas, portas que se trancam e destrancam.
Percebem-se, mas não se olham, não se vêem. O filme é
um suspense, e mesmo apelando para explicações paranormais, não se pode deixar de notar a sobreposição de
cenas com a realidade vivenciada no cotidiano de muitas
Instituições escolares, principalmente no que se refere às
relações entre as pessoas no ambiente escolar.
Ao longo da pesquisa foram visitados 13 escolas e
um Centro Cultural a fim de que todos os funcionários
tivessem a chance de responder ao questionário. O
procedimento era sempre o mesmo, entrava-se em contato
com a Instituição e se marcava um dia e horário para a
execução da pesquisa, mas em cada espaço uma dinâmica
diferente se apresentava: uma forma de recepcionar, de
disponibilizar, de estranhar o que acontecia. E foram essas
sensações que inspiraram a análise que será feita neste
espaço. Observações que tangenciavam a coleta de
informações formais, referentes ao modo como alguns
entravam e saíam das salas, aos comentários, às
dificuldades, às resistências e disponibilidades.
4
No caso da pesquisa que realizamos, pôde-se observar que de um total de 53 funcionários, 26 tinham apenas o ensino fundamental
(49%); 19 possuíam ensino médio (36%); 7 com ensino superior (13%) e 1 que não havia freqüentado a escola (2%).
38
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Uma primeira questão feita por quem nos recebia
na escola que, sem exceção, fazia parte do corpo de
professores ou direção, era quanto ao fato do trabalho estar
voltado para os funcionários e não professores, como se
isso causasse um estranhamento naquela rotina. Mas não
eram apenas os professores que pareciam confusos por
não estarem no centro da pesquisa, mas também os
funcionários manifestavam seu espanto com o fato. Uma
funcionária da limpeza diz: “Nossa! O que não inventam.
Virem aplicar questionários para nós funcionários?”.
se sente desinvestido e não se percebe como educadores;
em alguns momentos estranhando o fato de se estar
realizando um trabalho com eles e não com os professores.
Não centralizar o estudo na figura do professor e/ou
estudante, ou mesmo na família deste, fez com que
aqueles que ali trabalham ficassem incomodados, ou seja,
o fato dos funcionários estarem no foco da pesquisa, suas
satisfações e insatisfações com o trabalho, produziu efeitos
naquele cenário, mobilizando aquelas pessoas de forma
diferente e mexendo com o que estava posto. Uma vez
que se permite quebrar a tríade, estudantes-professoresfamiliares, trazendo para o foco um elemento muitas vezes
esquecido, no que se refere à Educação.
Esse nome de Pasárgada, que significa “campo dos
persas”, suscitou a imaginação do poeta Manoel Bandeira
a uma paisagem fabulosa, um país de delícias. Quando
poeta, Manoel Bandeira passou por um momento de
profundo desânimo, da mais aguda doença, saltou-lhe de
súbito do subconsciente esse grito estapafúrdio: “Vou-me
embora pra Pasárgada!”.
Outra questão marcante durante as visitações se
refere à preocupação dos professores com a capacidade
dos funcionários responderem ao questionário. Devido ao
baixo nível de escolaridade, eles argumentavam que estes
não seriam capazes de ler e compreender o que estava
sendo perguntado. Realmente, havia funcionários
analfabetos. Mas isso não os impossibilitava de responder
o material e muito menos permitia que acontecessem
situações de desrespeito. Como no caso em que uma
professora adentrou abruptamente a sala onde os
funcionários estavam respondendo às perguntas, dizendo:
“Nossa! Você está fazendo com todas as merendeiras
juntas, e elas vão saber responder?” E logo após tomando
para si o questionário das mãos de uma das serventes,
completando: “Ah, ta! Isto é só de marcar então é fácil
mesmo, nós professoras também vamos responder, né?”
Havia sim dificuldades por parte dos funcionários
em algumas questões, mas principalmente naquelas que
envolviam sentimentos e expectativas destes para com a
escola e em frases que destacavam a opinião sobre o
Reconhecimento pelo trabalho bem feito,
Responsabilidades e o Sentido de Realização.
Principalmente, quando faziam referência à percepção que
os outros tinham deles. Esse fato chama a atenção, uma
vez que novamente parece que há um distanciamento entre
os funcionários e o restante da equipe. Afinal, como
poderiam saber o que os outros pensam de deles, de seu
trabalho, se o contato é bastante engessado? Afinal, que
tipo de feedback está recebendo? Se é que recebem.
Assim, ao longo da coleta de dados, durante as
aplicações dos questionários, entrando em contato com a
realidade escolar, foi possível observar elementos que se
referiam às percepções, julgamentos, tratamentos que as
pessoas assumiam diante dos funcionários e até mesmo
entre eles. O que foi exposto neste espaço só reafirma a
importância da realização de trabalhos com os funcionários
de escola, pois foi possível notar que o grupo de funcionários
4.2 (...) Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura (...)
Manoel Bandeira nos descreve uma paisagem de
felicidade que estaria em um lugar que sequer conhece. O
que, traduzindo para a realidade pesquisada, suscitou-nos
vários questionamentos, pois o que será que os funcionários
sabem realmente desse lugar (instituições escolares) onde
trabalham? Será que o conhecem? O que sabem sobre
sua existência? Estariam os funcionários cientes dos
problemas e enfrentados na Instituição que trabalham? Ou
estariam apenas executando um serviço alheios à
complexidade que os cerca?
Conhecer os objetivos e missão da escola, por
exemplo, faz com que os profissionais integrem suas ações
e pensem coletivamente nas possibilidades de alcançálos, transformá-los e redimensioná-los. Mas se o
profissional da educação que trabalha na escola não
conhece esses sua missão e objetivos, como pode
visualizar seu trabalho? Como faz para dar-lhe sentido?
No caso da pesquisa realizada, constatamos que
68% dos funcionários concordaram que a escola tem
objetivos definidos, 19% não souberam responder, outros
8% discordaram em parte. E 62% concordaram que
conhecem os objetivos da escola, 22% concordaram em
parte e 16% não souberam responder.
A missão de uma empresa é a razão de ser pela
qual ela foi criada e desenvolvida. Significa o papel que a
empresa assume na sociedade em que está inserida.
Representa a causa que a organização defende e pela
qual se organiza e luta. Quando as pessoas absorvem a
missão organizacional, deixam de trabalhar pela empresa
(CHIAVENATO, 2005, p.45).
Quanto ao fato dos planos de trabalho serem
divulgados entre os funcionários, tivemos 62% dos
funcionários que concordaram com a frase, 22% que
concordaram em parte e outros 16% que não souberam
responder. Resta explicar o porquê de tão pouco
conhecimento por parte dos funcionários dos objetivos da
escola. Principalmente se entendermos que o funcionário
39
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
capitulou frente à injunção patronal. Deve-se
haver uma luta por novas relações sociais, ela
deveria passar por um processo de
desalienação. Por não ter sido objeto de um
trabalho específico, a alienação corre o risco –
a experiência histórica o mostra – de ser
transposta tal e qual. Podemos também nos
perguntar se o desmantelamento dos
mecanismos da alienação não é uma condição
necessária, embora insuficiente, para um
projeto de transformação social (DEJOURS,
1992, p. 137).
pode envolver-se trabalhando temas transversais em
momentos que não dizem respeito à sala de aula, mas a
espaços de recreação e refeição, por exemplo.
Afinal, a aprendizagem social merece o
desenvolvimento de todos na escola e não deveria ficar
restrita aos professores apenas. Se uma turma do ensino
fundamental está trabalhando meio ambiente, as
merendeiras podem contar o que fazem com o que sobra
das refeições, ou para aproveitar o máximo os alimentos,
falar dos benefícios dos alimentos sem agrotóxicos, etc.
Bem como os funcionários da limpeza podem contar o
que fazem com o lixo da escola e como todos poderiam
melhorar a coleta, que produtos são biodegradáveis, como
conservar e reciclar evitando desperdícios. Enfim, envolvêlos significa usar mais e melhor a rede de agentes em prol
da educação.
Outra questão diz respeito à educação especial,
fala-se muito em adaptar a escola para atender aos
estudantes com necessidades educativas especiais, mas
como os funcionários participam desse objetivo? Ainda se
acredita que a educação se restringe apenas à sala de
aula e não há uma real participação dos demais setores
na busca de soluções. Como fazer essa ampliação da
educação se a escola não amplia suas discussões em
seu próprio meio? Afinal, são eles que estão presentes
quando o estudante sente dificuldade e a partir de seus
conhecimentos podem ajudar a criar alternativas para
possíveis problemas estruturais.
Paro (2001) afirma sobre a importância de que todos
os segmentos que fazem parte das instituições escolares,
bem como as relações ensino-aprendizagem, estejam
impregnadas pelos fins da educação. Ainda descreve: “se
isto não se dá, burocratiza-se por inteiro a atividade escolar,
fenômeno que consiste na elevação dos meios à categoria
de fins e na completa perda dos objetos visados com a
educação escolar” (PARO, 2001, p. 95).
É preciso haver mais reflexão por parte dos que
trabalham com educação nas escolas, sobre a qualidade
desta e sobre a verdadeira utilidade do serviço que se presta
às famílias e à sociedade em si.
Cabe ressaltar que a necessidade de aproximação
dos funcionários com os interesses da educação muitas
vezes não são entendidos por completo por estes. Como
podemos perceber nos questionários, quanto perguntado
sobre a importância de participar em reuniões pedagógicas,
somente 48% concordaram que é importante participar,
22% concordaram em parte, 8% não souberam responder,
14% discordaram em parte e 8% discordaram inteiramente.
Se o conceito de alienação não for pertinente
em nível de análise econômica, isso não quer
dizer que ele não seja válido no nível subjetivo
e vivido. A alienação é uma verdade clínica que,
no caso do trabalho, toma a forma de um
conflito onde o desejo do trabalhador não
E, novamente, em relação à participação dos
funcionários nas reuniões pedagógicas, temos confirmado
este quadro, quando para a frase “freqüentemente sou
chamado a participar das reuniões” eles respondem: que
49% concordaram inteiramente, 46% concordaram em parte
e 5% discordaram inteiramente. Fica marcada a
setorização dos funcionários e não se oportunizam
espaços para que compartilhem.
Tanto merendeiras como serventes percebem
várias coisas que acontecem com os alunos e
não têm espaço para falar, um espaço de troca
quanto ao que é necessário ao trabalho. Um
espaço em que pudessem participar de vários
atores – professores, merendeiras, serventes,
etc. – buscando entrosamento de seus papéis
e alternativa às situações. Discutir as
dificuldades referentes a outras dimensões do
processo de educação, o que estão
descobrindo, o que está acontecendo com os
alunos, suas capacidades, suas dificuldades,
suas carências etc, isso fica guardado para
elas. A escola na maioria das vezes não
incorpora e não reconhece as experiências e
as observações dessas potenciais educadoras
(ATHAYDE; NUNES; BRITO, 2001, p. 59).
Esse é um tipo de trabalho que, apesar de
aparentemente simples, constitui-se na realidade, num
trabalho difícil, complexo, que tem toda essa riqueza e
que possibilita desenvolvimento e melhoria da escola
pública, no sentido da assistência aos alunos e do seu
cuidado. Segundo Athayde; Nunes e Brito (2001) o que
observamos é que está presente na escola, como não
poderia deixar de ser em uma sociedade capitalista, a
divisão social do conhecimento em relação com a divisão
social do trabalho.
Athayde; Nunes e Brito (2001) pensam que as
merendeiras e serventes, por desenvolverem um trabalho
manual, “são consideradas trabalhadoras não qualificadas
e subalternas, das quais não se espera ou se supõe que
sejam capazes de pensar ou de ter algum tipo de
conhecimento a respeito de seu trabalho”. (p.59)
E mais uma vez neste sentido, os funcionários
responderam na afirmação “eu conheço os problemas da
escola”, que 27% deles concordam inteiramente, 36%
concordam em parte, 24% não soube responder, 5%
40
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
discordam em parte e 8% discordam inteiramente.
Comprova-se então a necessidade de que equipe diretiva
ou de gestão de pessoas, situe o grupo de funcionários da
escola como parte do todo da escola, mantendo-os
informados sobre as dificuldades.
pensar em uma formação profissional para estes
trabalhadores. Tendo por objetivo que estes estabeleçam
uma relação com o trabalho que dê visibilidade para seus
saberes e potencialize e valorize o trabalho que
desempenham na escola, promovendo concomitantemente
o seu reconhecimento.
Conhecer as dificuldades que a escola enfrenta é o
primeiro passo para se estabelecer o sentido no trabalho,
tornando-o mais explícito e integrado, no qual as ações e
decisões são tomadas em conjunto no todo, e a Gestão
se torna menos centralizada, oportunizando aos
funcionários momentos de exercer o seu trabalho de forma
a investir na criatividade, reconhecendo-os não apenas no
fazer diário, mas nas transformações que propõe, faz parte
e ajuda a promover.
Para tanto, os funcionários...
“poderiam ser incentivados a melhorar seu
desempenho, diversificar o trabalho, conhecer
melhor seu ofício, proteger a saúde que não
adoeça, em função das condições e da
organização do trabalho. Por exemplo, uma
merendeira poderia ser orientada a respeito
de como manejar os alimentos, preparar os
pratos de forma mais criativa ou caprichada,
como costumam falar. Poderia ser incentivada
a troca de experiências com as demais
merendeiras, pois verificamos que algumas
têm muita inventividade para estimular as
crianças ao consumo de determinados
alimentos. Poderia ter, desse modo, seu saber
valorizado e sua auto-estima reforçada no
trabalho”. (NUNES; BRITO ATHAYDE, 2001, p.
53-54).
Afinal, na maioria das vezes os funcionários são
da comunidade onde a escola se situa e, se participam
dos processos de decisão, planejamento, execução na
escola, podem estar buscando estabelecer laços entre as
pessoas do local e a escola. Além de serem agentes de
informação e podem ser também mobilizadores, líderes e
articuladores de processos de mudança e quem sabe
assim a Pasárgada possa ser aqui.
4.3 Mas que trabalho é esse?
A análise de algumas questões referentes à
percepção dos funcionários quanto ao seu trabalho revelou
que a maioria não acreditava que tivesse uma formação
específica para sua função. Mesmo se mostrando bastante
motivados com seu trabalho, 44% deles responderam que
concordavam inteiramente com a afirmação de que
“qualquer pessoa poderia fazer o meu trabalho”; sendo que
24% concordavam em parte e 24% discordavam
inteiramente da afirmativa.
O que significa dizer que o funcionário está
cumprindo uma função na qual não percebe sua
especificidade, nem mesmo a si próprio como importante
para aquele fazer. E talvez por isso as respostas à afirmativa
“meu trabalho permite que me desenvolva intelectualmente”
tenham sido de um percentual de 44% para concordo
inteiramente, 32% para concordo em parte, 8% para não
sei responder e 5% para discordo em parte.
Cabe destacar que historicamente o trabalho dito
manual, foi desconsiderado pela sociedade, que entendeu
o trabalhador como sendo desqualificado e subalterno, “dos
quais não se espera ou se supõe que sejam capazes de
pensar ou de ter algum tipo de conhecimento a respeito
de seu trabalho” (Athayde; Nunes e Brito, 2001, p. 59).
Isso porque estava relacionado com o trabalho escravo e
da senzala. Enquanto o trabalho que passa a ser valorizado
seria o trabalho intelectual.
Mas para termos uma escola que privilegie a
educação em todos os seus aspectos, seria importante
Compreendemos por formação todos os processos
educativos, formais ou não, que permitem a intervenção
do sujeito no universo, agindo crítica e responsavelmente,
primando pela ética nas relações, refletindo, avaliando e
reformulando suas atitudes.
A formação profissional, de modo intrínseco e
complementar à primeira, “consiste de todas as formas
pelas quais o profissional ganha mais competência
pessoal, teórica, técnica, social” (LIBÂNEO, 1998). O
indivíduo, dotado dos conhecimentos técnicos necessários
à otimização de seu desempenho funcional, desenvolve-o
com competência, criticidade e racionalidade,
abandonando, gradativamente, as ações eminentemente
empíricas.
Ante a realidade educacional brasileira, a formação
profissional dos trabalhadores em educação (funcionários
de escola) reclama a atenção do poder público, mormente
voltado, mesmo que de forma insuficiente, aos cuidados
com o professor, requerendo a formulação de políticas
adequadas às exigências de suas atribuições, às
necessidades da escola e às demandas sociais a ela
impostas.
Historicamente, as políticas de formação de
trabalhadores em educação sempre privilegiaram os
professores, confirmando o cunho elitista da educação
oferecida, inclusive nas escolas do sistema público. No
entanto, a redescoberta do valor da escola e o
reconhecimento da educação informal como fator relevante
no contexto das transformações sociais têm estimulado a
formulação de propostas inovadoras voltadas para o sistema
de formação de educadores.
41
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante desse estudo que iniciou com a demanda
da gestão municipal que se via preocupada com o alto
número de pedidos de licenças médicas feitos pelos
funcionários de escola, e que prosseguiu com um
diagnóstico realizado com todos os funcionários do
município, com o objetivo de compreender como estes
estabeleciam e percebiam o ambiente de trabalho,
consideramos que alguns aspectos precisam ser revistos
e trabalhados pela gestão municipal, de forma a promover
a saúde desse profissional e a qualidade da Educação no
município.
Primeiramente, identificamos um funcionário
motivado e satisfeito com seu trabalho, em suas relações
com as pessoas, com as condições de trabalho, com a
chefia, etc, mas que se apresentava descontextualizado
quanto aos problemas educacionais, desconhecendo a
rede da qual faz parte, desinvestido em seu poder criativo
e educativo. Um profissional que, na sua maioria, não se
percebe como mão de obra especializada, exercendo um
trabalho limitado em suas possibilidades.
Sabendo que o reconhecimento do trabalho, de seu
investimento, de seu ofício, é o que os funcionários buscam
constantemente e, conforme Nunes; Brito; Athayde (2001),
constitui elemento fundamental para a construção de
sentido no trabalho e seu fortalecimento psicossomático.
Assim, esse estudo abre a possibilidade de um próximo,
no qual se vise às relações e implicações existentes entre
os afastamentos do trabalho e o sentido do trabalho que é
vivido.
ATHAYDE, Milton; BARROS, Maria Elizabeth; BRITO,
Jussara; NEVES, Mary Yale. Trabalhar na escola? Só
inventando o prazer. Rio de Janeiro: IPUB/CUCA, 2001.
CELINSKI, Leszek. Guia para diagnóstico em
administração de recursos humanos: roteiros e
instrumentos para qualidade. 2. ed. Petrópolis: Vozes,
1995.
CHIAVENATO, Idalberto. Gerenciando com as pessoas:
transformando o executivo em um excelente gestor de
pessoas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
CODO, Wanderley. Educação: carinho e trabalho.
Petrópolis: Vozes, 1999.
DEJOURS, Christophe. A loucura do trabalho: estudo
de psicopatologia do trabalho. 5.ed. São Paulo: Cortez,
1992.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1983.
LIBÂNEO, José Carlos. Pedagogia e pedagogos, para
quê? São Paulo: Cortez, 1998.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa social: teoria,
método e criatividade. 22. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.
MOURA, Murilo Marcondes. Manoel Bandeira. São
Paulo: Publifolha, 2001.
OLIVEIRA, Silvio Luiz. Tratado de metodologia
científica. 2ª ed. São Paulo: Pioneira, 1999.
PARO, Vitor Henrique. Escritos sobre educação. São
Paulo: Xamã, 2001.
A proposta de profissionalização dos funcionários
segue o pensamento de autores que pesquisam a temática,
como Athayde, Brito e Nunes, e que entendem que este
profissional deve cumprir seu papel na educação informal,
a partir de conhecimentos em nutrição, higienização,
psicologia, pedagogia, etc. Neste sentido, seria possível
promover a valorização deste profissional e favorecer a
Educação dos estudantes como um todo. Afinal, como
apontou a pesquisa, os funcionários conhecem a
comunidade, interessam-se pelos alunos e gostam do que
fazem.
Outro fator que merece ser considerado
é a relação professor/ funcionário de escola, de forma a
quebrar com a hierarquia e a relação de subordinação.
Afinal, os funcionários necessitam de alguém que medeie
suas reivindicações e lute pela qualificação e condições
de trabalho. A formação de um líder entre eles seria uma
alternativa a ser trabalhada e investida.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre: imagens e autoimagens. Petrópolis: Vozes, 2000.
42
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
AUTOCUIDADO E RISCOS OCUPACIONAIS: VISÃO
DOS PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM
Daniele Beatriz Reis1
Jane Lílian Ribeiro Brum2
Sociedade Educacional Três de Maio-SETREM3
RESUMO
O autocuidado do profissional de enfermagem é uma
pré-condição para que o cuidado também possa ser
estendido como benefício para as demais pessoas, pois
só quem cuida de si pode cuidar com melhor qualidade do
outro. Na tentativa de conhecer o autocuidado e suas
relações, este estudo tem por objetivo analisar as práticas
de autocuidado desempenhados pelos profissionais da
equipe de Enfermagem que exercem suas atividades
profissionais em um hospital de médio porte em uma cidade
do Noroeste do estado do Rio Grande do Sul. O método
de investigação empregado é a abordagem qualitativa, do
tipo exploratório. A pesquisa foi realizada de agosto a
novembro de 2007. Na coleta de dados, realizaram-se
entrevistas gravadas e depois de transcritas pelas autoras
do estudo, respeitando a resolução nº 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde. A amostra foi composta de sete
profissionais de Enfermagem. Para a análise dos dados
foi utilizada a técnica de análise de conteúdo segundo
Minayo et al. (2003). Conclui-se que em relação aos EPIs
e riscos ocupacionais, os participantes do estudo são
sabedores dos riscos aos quais estão expostos, mas em
muitos casos deixam de usar todos os meios de
prevenção, que seriam os EPIs, sendo que se percebe
que há a necessidade de instituir programas de capacitação
para o uso dos mesmos.
Palavras-chave: Autocuidado, Saúde, Enfermagem
ABSTRACT
The self care of the nursing professional is a precondition for the care that can also be extended as benefit
for the other people because the one who cares about
himself is able to take care of the other with better quality.
In an effort to know the self care and its relationships, this
study has as its main purpose to examine the practices of
self care played by professionals of the team of nursing
who practice their professional activities in a medium size
hospital in a city of the Northwest state of Rio Grande do
Sul. The research method employed is the qualitative
approach, of exploratory type. The survey was conducted
from August to November of 2007. In the data collecting
recorded interviews took place, which were transcribed by
the author of the study, respecting the resolution No. 196/
96 of the National Council of Health. The sample was
composed of seven professionals in nursing. For the data
analysis it was used the technique to analyze the content
according Minayo (2003. It follows that, for EPIs and
occupational risks, participants of the study are conscious
about the risks they are exposed to but, in many cases,
stop using all means of prevention, which are the EPIs,
and it is realized that there is a need to establish training
programs for the use of them.
Key words: Self-care, Health, Nursing.
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa, relacionada à área da saúde,
busca explorar a visão dos/as profissionais de enfermagem
em seus níveis de atuação profissional (técnico e
enfermeiro), a respeito das ações de autocuidado que os
mesmos realizam para a manutenção da sua saúde, o
que conseqüentemente reflete em uma melhoria da saúde
dos seres por ele cuidados.
Partindo do pressuposto de que o cuidado é a
essência da Enfermagem, vivenciado em suas práticas
diárias, e que o cuidado do profissional de enfermagem,
consigo mesmo, é uma pré-condição para que o mesmo
possa desenvolvê-lo com o outro, necessário se faz
desenvolver um estudo que procure identificar as relações
de autocuidado que os profissionais de enfermagem
desempenham no seu dia-a-dia, seja em benefício próprio,
para sua autoproteção, seja nos relacionamentos para com
as pessoas sob seus cuidados.
1
Enfermeira formada no Curso Bacharelado em Enfermagem da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, e-mail:
[email protected]
2
Mestre em Enfermagem. Docente do curso Bacharelado em Enfermagem da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM. Enfermeira
da Secretaria de Saúde de Carazinho, e-mail: [email protected]
3
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e-mail: [email protected]
43
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Conforme Costenaro; Lacerda (2001), para saber
cuidar é preciso saber cuidar de si e para poder cuidar, é
necessário se cuidar. Não o cuidado provido de vaidade
que ostenta a superficialidade das aparências, mas o
cuidado que provém da sincronia entre o ajudar e o ajudarse, como a consonância que resulta da arte combinatória
da relação entre dar e receber. O cuidado que tem sua
fonte geradora no amor que se mantém pela boa interrelação dos profissionais e se renova pela valorização e
sentido que o enfermeiro confere ao atendimento que
realiza. É o cuidado que também se alimenta na atualização
profissional.
O interesse pela realização deste trabalho de
pesquisa surgiu após algumas experiências vivenciadas
em instituições de saúde, no dia-a-dia do processo de
cuidado, na qual se pode perceber que os integrantes da
equipe de enfermagem são essencialmente cuidadores de
seus pacientes, mas muitas vezes não se reconhecem ou
não são reconhecidos como sujeitos de cuidado.
2 METODOLOGIA
O método de investigação empregado para a
realização desta pesquisa segue uma abordagem de cunho
qualitativo, sendo do tipo exploratória, segundo Gil (1991).
A pesquisa foi desenvolvida em um hospital geral, de médio
porte, sendo de natureza filantrópica. O mesmo está
situado em um município da região Noroeste do Rio Grande
do Sul, pertencente à 14ª Coordenadoria Regional de
Saúde. A coleta de dados foi realizada no período de agosto
de 2007, através de um instrumento de pesquisa. Utilizouse a entrevista semi-estruturada com questões abertas
acerca do tema, aplicadas individualmente, sendo que as
respostas foram gravadas em MP3 e posteriormente
transcritas na íntegra e analisadas pelas autoras do estudo.
Para a análise e interpretação dos dados, utilizou-se a
técnica de análise de conteúdo, segundo Minayo (2003).
A entrevista foi realizada mediante aplicação de um Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido que está
regulamentado na Resolução nº 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde (CNS). A amostra constou de sete
profissionais de enfermagem que trabalham nos três turnos
da Instituição. Da pesquisa resultaram três categorias:
nexos entre o autocuidado e os riscos ocupacionais,
provendo as necessidades psicobiológicas e provendo as
necessidades psicossociais. Neste artigo será apenas
abordada a primeira categoria que é: nexos entre o
autocuidado e os riscos ocupacionais.
3 AUTOCUIDADO E OS RISCOS
PROFISSIONAIS
Cuidar de si implica em desenvolver estilo de vida
saudável que inclua práticas de cuidar, como alimentação
adequada, realização de exercícios físicos, tempo reservado
para o lazer, evitar hábitos nocivos; enfim, conhecer as
necessidades do corpo e da mente favorece uma melhor
auto-estima em si e na vida e assim também conhecer e
adotar medidas de prevenção às doenças.
O autocuidado se constitui em parar, olhar para a
vida, permitir-se realizar um exame de consciência sobre
a própria vida, não para julgá-la, mas para perguntar-se
sobre as intenções propostas e não alcançadas, sobre
como se está administrando a própria existência, a nós
mesmos, como um bem a ser preservado (LUNARDI et
al., 2004).
O profissional de enfermagem é um ser humano e,
como tal, vulnerável a qualquer doença e,
conseqüentemente, necessita de cuidado humano, ou
seja, ser cuidado, por si mesmo, ou por familiares, ou pelos
colegas da equipe de trabalho que estão bem habilitados
e preparados para cuidar (COSTENARO; LACERDA,
2001).
Um fator envolvendo o cuidado do profissional
consigo mesmo é a presença dos riscos ocupacionais,
como por exemplo os agentes biológicos que podem causar
doenças ocasionadas pelo contato com secreções
humanas, pérfuro-cortantes, equipamentos de sucção,
roupas pessoais e de cama, soluções de continuidade e
ferimentos. Esses materiais potencialmente infecciosos
podem funcionar como agentes desencadeantes,
concorrentes ou agravantes, que trazem consigo:
bactérias, fungos, leveduras e insetos (AYRES; CORREA,
2001).
Os profissionais de enfermagem são os mais
suscetíveis aos riscos ocupacionais, pois são eles que
cuidam diretamente dos pacientes. É importante que estes
trabalhadores em saúde tenham as condições necessárias
para se proteger no seu local de trabalho, a fim de reduzir
a exposição destes profissionais aos agentes causais,
como sangue e outros materiais contaminados. Segundo
Ayres; Correa (2001), as medidas preventivas que auxiliam
na redução dos riscos de exposição ocupacional incluem
a vacinação, métodos de práticas de segurança do trabalho,
os quais reduzem a probabilidade da exposição por meio
da alteração da forma de realização das atividades e o
uso de EPIs, que ajudam a prevenir a exposição
ocupacional aos materiais infecciosos por meio de
equipamentos, como: luvas, aventais, óculos de segurança,
máscaras e roupas apropriadas.
Salienta-se ainda que, com estas medidas de
controle, não há a eliminação total dos riscos de exposição,
sendo que alguns riscos não podem ser por completo
eliminados através da adoção de EPIs ou técnicas de
engenharia de segurança; devendo tais riscos serem
controlados através de procedimentos e rotinas de
segurança, como forma de minimizar os problemas
ocasionados pelos acidentes de trabalho, pois só há
eliminação total se o material contaminado não atingir o
profissional da saúde em si.
44
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
4.1 NEXOS ENTRE O AUTOCUIDADO E
OS RISCOS OCUPACIONAIS
A equipe de enfermagem em uma instituição
hospitalar composta pelo auxiliar de enfermagem, técnico
de enfermagem e o enfermeiro, exercem um papel
fundamental na assistência prestada ao paciente, pois são
eles que permanecem 24 horas ao lado do mesmo.
alimentação corretamente, dormir bem, isso faz
parte, senão vem no outro dia cansada,
esgotada, então sempre procuro vir bem, a
gente procura ter todos estes itens para a gente
poder fazer um trabalho bom aqui dentro”
(Entrevistada n 06, ENF).
Vê-se que a profissional tem uma vasta visão do
que é autocuidado. Concordando com Orem, autocuidado
é:
a prática de atividades, iniciadas e executadas
pelos indivíduos, em seu próprio benefício, para
a manutenção da vida, da saúde e do bemestar. Autocuidado... Efetivamente executado,
contribui de maneiras especificas para a
integridade da estrutura humana, para o
funcionamento da pessoa e para seu
desenvolvimento (FOSTER; JANSSENS, 1993,
p. 91).
Sabe-se que os profissionais precisam estar cientes
com a sua saúde, tendo conhecimento sobre como se
cuidar, ou seja, sobre o autocuidado, para estar em
perfeitas condições de fornecê-lo.
Na presente pesquisa ficou evidente que os
entrevistados têm conhecimento sobre o que é o
autocuidado, confirmado nas falas:
“[...] autocuidado é eu me cuidar, eu me gostar”
(Entrevistada n 07, ENF.).
“É cuidar de si mesmo, contra tudo”
(Entrevistada n 04, TE).
Outras constatações ainda conceituam o
autocuidado de uma forma mais ampla, relacionando-o com
as necessidades básicas de um indivíduo, quando relatam:
“É o cuidado que eu tenho que ter comigo
mesma, sabe, de me proteger, de eu me cuidar”
(Entrevistada 02, TE).
“É a maneira da pessoa de como ela se cuida,
da sua saúde, do lazer, da alimentação
(Entrevistada 01, TE).
Pode-se, no entanto, constatar que há realmente
consciência sobre a importância do cuidar de si mesmo,
como valorizar a própria saúde com uma alimentação bem
balanceada e práticas de lazer.
Ressalta-se que o ato de cuidar de si mesmo
favorece tanto a integridade física, ou seja, o corpo,
protegendo das atividades cotidianas do lado prático do
trabalho da enfermagem como também auxilia de uma
maneira objetiva o funcionamento moral e intelectual do
indivíduo, proporcionando o desenvolvimento e a
manutenção da integralidade do ser humano.
Nascimento et al (2006) afirma que o cuidado é uma
forma de preocupar-se, seja com o outro, seja consigo
mesmo, e que o mesmo entra na constituição do ser
humano. O cuidar não se refere apenas à pessoa, mas às
coisas ao nosso redor como, por exemplo, cuidar de uma
idéia, um ideal, uma obra de arte ou uma comunidade.
Implica também cuidar do ambiente de trabalho e do
próximo.
Na citação abaixo há a preocupação em cuidar de
si e também do paciente por conseqüência. O autocuidado
está relacionado às doenças ocupacionais existentes,
como está evidenciado na seguinte fala:
Desta forma, Nascimento et al. (2006), ressalta que
as práticas de cuidado devem ser mais amplas e intensas
a outros aspectos de suporte à vida, mais voltadas ao diaa-dia, à promoção da saúde, à prevenção de problemas
(doenças) e à cura. O ato de cuidar de si estaria voltado a
garantir a satisfação de um conjunto de necessidades
indispensáveis à vida, um conjunto de atos que tem por
finalidade e por função manter a vida.
Corroborando com Diógenes; Pagliuca (2003, p.
288) “autocuidado é a atividade que os indivíduos praticam
em seu benefício para manter a vida, a saúde e o bemestar”. Algumas entrevistadas conceituam ainda o
autocuidado relacionando-o consigo e com o ambiente de
trabalho no qual estão inseridos, quando afirmam:
“Aqui dentro, procurar usar os EPIs, e fora com
atividade física, sempre procurar ter momentos
de lazer, descontração, que isso é importante,
porque a gente trabalha em um ambiente
estressante, um ambiente assim, que tu nunca
sabe o que vai acontecer. Então a auto-estima,
vir para o trabalho bem, ajuda muito, usar a
“Bom, autocuidado não é só eu cuidar do
paciente ou do cliente que está internado, mas
também eu me proteger, protegendo a mim e a
ele para que nós possamos juntos melhorar a
situação desse paciente, desse doente e me
protegendo também” (Entrevistada 03, ENF).
“Autocuidado, é o cuidado que eu tenho que ter
comigo, procurar me cuidar, para não
posteriormente estar com uma doença, com
algo que eu ocasionei, com uma doença
ocupacional” (Entrevistada n 06, ENF).
As doenças ocupacionais são riscos que os
profissionais da área da Enfermagem e outros profissionais
da saúde estão expostos em seu ambiente de trabalho,
quando da não adoção de medidas de segurança
adequadas, o que pode ocasionar sérias conseqüências
na saúde destes. Sendo assim, às vezes, pelo hábito “da
rotina” ou do pensamento que “nunca acontecerá comigo”,
acaba falhando, ou seja, acontecem acidentes com
materiais pérfuro-cortantes, por exemplo, podendo causar
o estresse gerado pela autoconfiança extrema.
45
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
“Não estamos livres de nos contaminar, porque
atendemos pacientes doentes, de vários tipos
de patologia, e com certeza devemos nos
proteger usando sempre que possível os EPIs,
para me proteger e também proteger o paciente
de certa forma. Bom, o que a gente mais
costuma usar são luvas, quando se punciona
veia ou se entra em contato com sangue, ou
secreções, alguma coisa assim, também se a
gente entra numa sala que precisa se vestir
um avental ou alguma outra coisa relacionada
a isso também é usado.” (Entrevistada 03,
ENF).
Nesta perspectiva, Figueiredo (2003), afirma que as
doenças profissionais se desenvolvem ao longo do tempo
e são produzidas ou desencadeadas pelo exercício do
trabalho peculiar a uma determinada atividade constante.
Estes agravos específicos à saúde do trabalhador podem
não ser percebidos, como é o caso das doenças
profissionais e das doenças relacionadas ao trabalho.
Neste sentido, os sujeitos entrevistados destacam
os riscos ocupacionais encontrados na área da
Enfermagem e o que os mesmos procuram fazer para se
proteger, para que não venham a atingir a sua saúde,
promovendo desta forma saúde com segurança.
Em relação aos pérfuro-cortantes, os mesmos foram
citados como uma das principais preocupações, como as
falas a seguir descrevem:
“Sim, os pérfuro-cortantes, esse acho que é o
maior risco a que estamos expostos [...] tenho
que ter o cuidado, todo o cuidado, a atenção, o
máximo, prestar atenção no que faço”
(Entrevistada 07, ENF).
“Eu vejo sim, os riscos ocupacionais em caso
de material pérfuro-cortantes” (Entrevistada n
05, ENF).
Verifica-se que os profissionais estão conscientes
da gravidade eminente destes riscos ocupacionais, o que
é muito importante para o incremento de ações
prevencionistas eficazes nesta área.
Para Xavier; Santos (2003), um dos itens mais
importantes nas precauções universais são as medidas
de controle de inoculações com objetos pérfuro-cortantes
contaminados com sangue, secreções e/ou fluídos
corpóreos. Tais artigos são classificados como críticos,
por apresentarem alto risco de transmissão de infecção,
pois entram em contato com fluídos estéreis ou sistema
vascular, configurando-se numa grande ameaça ao
profissional de enfermagem, caso não sejam manipulados
cuidadosamente e desprezados com segurança, já que
as luvas não protegem eficazmente de acidentes com
inoculações.
Dentre os profissionais da saúde, a equipe de
enfermagem é a que mais está suscetível à exposição a
materiais biológicos, como: fezes, urina e sangue, pela
grande quantidade de atendimentos e procedimentos
realizados, como referem as citações abaixo:
“Sim, os biológicos, que estão sempre
presentes com nós, a gente não tem como tirar,
porque tu vai estar sempre em contato, com
secreção, com sangue, essas coisas, mas tu
podes diminuir estes riscos usando os EPIs,
como por exemplo, luvas, máscara, essas
coisas assim” (Entrevistada 02, TE).
Em outra fala ainda sobre os riscos profissionais,
uma das preocupações da profissional é em relação à
infecção pelo HIV e tuberculose, como relata:
“A gente corre risco pela quantidade de
pacientes que a gente atende, assim doenças
contagiosas, soropositivos, tuberculose, tudo
isso é um risco para a gente, como picada
(pérfuro-cortantes), contaminação por sangue,
até às vezes escarro, catarro a gente entra em
contato” (Entrevistada n 04, TE).
A gama expressiva de riscos biológicos que se
concentram nos estabelecimentos de saúde reforça a
necessidade de se instituir programas contínuos de
prevenção, focando o trabalhador no cuidado com a sua
saúde.
Evidente ficou ser o vírus do HIV o risco biológico
que gera maior preocupação, o que se justifica por ser
ainda uma doença sem cura, uma vez que até o momento
a ciência tem conseguido somente prolongar a vida dos
soropositivos, sendo a cura ainda algo a ser alcançado.
Conforme Xavier; Santos (2003), no ambiente
hospitalar existe sempre o risco biológico, infeccioso e
parasitário, mas os acidentes e contaminações podem ser
evitados, desde que sejam seguidas as normas de
precaução e isolamento. As principais normas de
biosegurança em ambientes hospitalares (enfermarias) são
as precauções universais, atualmente designadas de
precauções básicas.
Quanto à utilização de capotes (aventais), segundo
Figueiredo (2003), seu uso é indicado durante os
procedimentos em que houver possibilidade de contato
com material biológico – como na realização de curativos
de grande porte – ou naqueles em que houver maior risco
de exposição ao profissional como: grandes feridas
cirúrgicas, queimaduras graves e escaras de decúbito.
Para Xavier; Santos (2003), estudos mostram que a
AIDS e infecção pelo HIV são consideradas as maiores
preocupações no que se refere ao risco infeccioso no
hospital. Os casos de contaminação comprovados
mostram que a equipe de enfermagem representa metade
46
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
dos casos, seguida pelos profissionais de laboratório. Estes
acidentes ocorrem principalmente devido à picada de
agulhas, após coleta de sangue ou perfusões do doente.
Em relação aos EPIs usados, salienta-se também
que poucos profissionais usam todos os EPIs em sua rotina
profissional:
“Uma das EPIs mais comuns que a gente usa
é a luva” (Entrevistada 03, ENF).
[...] Me protegendo, usando os EPIs que a
empresa oferece. O que mais uso é luva,
máscara, o avental quando é necessário, como
em casos de acidentes, onde o paciente está
eliminando
secreções,
apresentando
sangramentos, hemorragias, alguma coisa
assim, e os óculos quando precisa
(Entrevistada n 04, TE).
[...] Os EPIs, geralmente uso, as máscaras,
luvas, principalmente as luvas, aventais, enfim,
todas (Entrevistada n 07, ENF).
Nota-se que o equipamento de proteção individual
mais presente na atividade hospitalar é a luva; isso se
justifica porque a atuação do profissional de saúde se
resume basicamente pelo uso das mãos no trato com os
pacientes.
Figueiredo (2003) refere que a luva deve ser usada
sempre quando houver possibilidade de contato com
sangue, secreções e excreções, com mucosas ou com
áreas de pele não íntegra como ferimentos, escaras, feridas
cirúrgicas e outros.
O mesmo autor destaca ainda que o EPI, como a
máscara, deve ser usado durante a realização de
procedimentos em que haja possibilidade de respingo de
sangue e outros fluidos corpóreos nas mucosas da boca,
nariz e olhos do profissional. A fala abaixo demonstra esta
preocupação:
“[...] no caso de transmissão de uma doença
por via respiratória, pelas gotículas da saliva,
no ambiente que a gente possa se contaminar,
mas riscos maiores assim, eu vejo que não.
Pelo que eu estou na minha profissão, eu nunca
pude dizer que adquiri uma doença por motivo
de estar trabalhando dentro do hospital. Atenuo
usando os EPIs, usar luvas, usar máscara,
quando necessário, quando a gente vê que é
uma doença contagiosa, e também assim até
procurando orientar as famílias para que não
se alimentem, não tomem chimarrão, ou não
peguem uma colher do outro paciente, no
sentido assim (Entrevistada n 05, ENF).
Xavier; Santos (2003) afirmam ainda que as
precauções universais são medidas de prevenção que
devem ser utilizadas na assistência a todos os pacientes,
como por exemplo na manipulação de sangue, secreções,
excreções, contato com mucosas e pele não íntegra. Isso
independe do diagnóstico definido ou presumido de doença
infecciosa. Embora sabedora dessas afirmações, uma das
entrevistadas referiu dificuldade no uso das luvas, que é a
principal forma de proteção contra secreções e percebese que deixam de usar os EPIs, como referem abaixo:
“Às vezes, luva eu não uso, mas no geral eu
uso, se eu vejo que é um paciente que precisa
de cuidado, eu uso, mas não vou negar que às
vezes deixo de colocar luva” (Entrevistado n 05,
ENF).
“Não é em todos os casos que a gente usa,
que nem a maioria dos casos tu usa, tu tenta
se proteger, que nem nos banhos, alguma
coisa, tu usa avental, máscara, luva. Às vezes
tu vai puncionar sem luva” (Entrevistada n 02,
TE).
Portanto, observa-se que nem sempre os
profissionais de enfermagem adotam os meios de
prevenção adequados quando do contato com algumas
situações que podem gerar doenças ocupacionais.
Diversas vezes os profissionais, no momento de optar em
não utilizar os equipamentos de segurança, tomam estas
decisões por critérios subjetivos, expondo-se ao risco de
forma desnecessária.
Os EPIs são dispositivos de uso individual,
destinados a proteger a integridade física do profissional.
No caso dos materiais pérfuro-cortantes, as
recomendações específicas do Ministério da Saúde para
a realização de procedimentos que envolvem materiais
pérfuro-cortantes são: máxima atenção, jamais usar os
dedos como anteparo, agulhas não devem ser
reencapadas, entortadas, quebradas ou retiradas da
seringa com as mãos, não utilizar agulhas para fixar papéis,
todo material pérfuro-cortante (agulhas, scalp, lâminas de
bisturi, vidrarias etc.), mesmo estéril deve ser desprezado
em recipiente resistente à perfuração e com tampa
(FIGUEIREDO, 2003).
Em outras citações, os entrevistados referiram
pouca importância para o uso de alguns EPIs, como a
máscara e os óculos de proteção, sendo que estes
entendem que sua utilização nem sempre é necessária,
como se observa:
Existe esta preocupação quanto à contaminação
com doenças, pois mesmo com todos os esforços
desenvolvidos em favor da prevenção, como por exemplo,
o uso de EPIs, ainda há este sério risco.
47
“Dificilmente a gente usa os óculos de
proteção” (Entrevistada n 03, ENF).
“Máscara a gente nem sempre utiliza, é uma
coisa que falta a gente pôr em
prática”.(Entrevistada n 06, ENF).
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Entende-se que os profissionais não têm por hábito
o uso de todos os Equipamentos de Proteção Individual
(EPIs) e reconhecem a inexistência de algum suporte para
que adquiram a prática do uso dos mesmos para a sua
segurança na realização de serviços e procedimentos.
Xavier; Santos (2003) ressaltam que os óculos de
proteção estão recomendados durante os procedimentos
em que haja a possibilidade de respingo ou para aplicação
de medicamentos quimioterápicos.
Verifica-se a necessidade da implantação de um
programa de treinamento que objetive a motivação e a
conscientização dos profissionais de enfermagem acerca
da importância da adoção de forma permanente das
medidas de proteção, além de capacitar também quanto
ao uso correto dessas medidas para que surtam efeitos
eficazes de prevenção.
problemas físicos e emocionais, e no local de trabalho os
profissionais muitas vezes passam por períodos de jornadas
de trabalho excessivos e ao mesmo tempo dispõem de
poucos momentos de descanso e recuperação.
A síndrome de Burnout, segundo Wallau (2003), é
caracterizada como um quadro clínico mental extremo de
estresse ocupacional e surge em decorrência de um
estresse crônico ou após o mesmo. É resultado de um
prolongado processo de tentativas de lidar com
determinadas situações de estresse.
Outro problema citado é as doenças de coluna de
origem ocupacional:
[...] um problema tardio, um exemplo é a dor
lombar, é nesse sentido (Entrevistada 01, TE).
[...] também os problemas relacionados com
postura, o uso de carregar pacientes pesados,
quando não se faz a forma correta, da passagem
do paciente da maca para a cama, então isso
pode ocasionar esses riscos ocupacionais,
provocar uma hérnia de disco, um problema
lombar. (Entrevista n 06, ENF).
Na citação a seguir, vê-se a preocupação da
enfermeira em ser exemplo no uso correto de EPIs:
[...] É justamente isso, que nem eu te disse
agora, eu devo usar a luva, é pra mim me
proteger, pra mim me cuidar, e o autocuidado é
aquilo que, eu não posso eu dizer para os
outros o que eles é para fazer, se eu mesma
não faço, como eu vou orientar se eu mesma
não faço, então é eu também me cuidar, me
cuidar da minha saúde (Entrevistado n 05,
ENF.).
Assim, Ayres; Corrêa (2001) afirmam que os
Equipamentos de Proteção Individual (EPIs),
desempenham um importante papel na redução das lesões
provocadas pelos acidentes do trabalho e das doenças
profissionais, contribuindo para a preservação de sua
integridade física e de sua saúde.
Constata-se então que os EPIs são uma importante
forma de o profissional de Enfermagem se proteger e
promover o autocuidado em seu local de trabalho, quando
bem instruídos e capacitados para o uso dos mesmos.
Outra preocupação manifestada pelas entrevistadas,
além dos riscos de contaminação, é em relação à
Síndrome de Burnout, como relata a citação abaixo:
“Com certeza, a gente tem o risco de se
contaminar com pérfuro-cortantes, entrar em
contato com doenças de alto risco, entrar em
síndrome de Burnout” (Entrevistada 01, TE).
Os trabalhadores da área da saúde são pessoas
que podem estar mais suscetíveis a adquirir a síndrome
de Burnout, pois trabalham diretamente com pessoas
doentes e em sofrimento que vem acompanhado de
Constata-se a importância de um planejamento na
área de engenharia de segurança no trabalho que possibilite
a melhora das condições de trabalho, com a oferta de
equipamentos que diminuam o contato do trabalhador com
situações de risco. Esta engenharia terá dispêndio de
recursos financeiros, mas certamente trará benefícios
físicos aos trabalhadores da saúde.
Conforme Smeltzer; Bare (2005), entre as principais
estruturas de sustentação existentes no corpo humano, a
coluna vertebral consiste do principal órgão que se relaciona
aos movimentos da vida diária e que sofre a maioria dos
processos traumáticos decorrentes deste tipo de
funcionabilidade, além das atividades relacionadas ao
trabalho e ao esporte.
A dor lombar relacionada com o trabalho está entre
as causas mais comuns de doenças profissionais. É
responsável também pela perda de tempo de trabalho e
conseqüentemente pelas despesas relacionadas com
tratamentos (SMELTZER; BARE, 2005).
Trabalhadores em intensas atividades e atletas que
se exercitam além da tolerância corporal são os mais
atingidos, assim como trabalhos que exigem agachamento
e a torção ou levantamento de objetos pesados de forma
repetitiva (SMELTZER; BARE, 2005).
De acordo com o mesmo autor, os problemas
relacionados à coluna lombar são um dos processos
patológicos que mais está crescendo na atualidade e com
maior freqüência. Suas causas podem ser atribuídas a uma
atividade ou lesão relacionada ao trabalho devido aos
profissionais adotarem posturas incorretas.
48
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Os profissionais da área da saúde, em seu local de
trabalho, estão propensos à dor lombar, pois em alguns
casos adotam posturas incorretas e por tempo prolongado,
além de movimentos freqüentes de flexão e torção da
coluna vertebral, o que pode ser um fator desencadeante
de processos patológicos.
5 CONCLUSAO
Com a realização deste trabalho, pôde-se perceber
como se dá a relação de cuidado dos profissionais de
enfermagem consigo mesmos. O cuidado com o corpo,
com a saúde, é um fator indispensável para a continuidade
do processo de cuidado. É preciso que o profissional que
age no cuidado seja um conhecedor dos limites de seu
corpo, de suas necessidades para que possa cuidar de si
e posteriormente cuidar do outro.
MINAYO, M. C. de S. et al. Pesquisa social: teoria,
método e criatividade. 22. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.
NASCIMENTO, K. et al. Conceitos de cuidado sob a
perspectiva de mestrandas de enfermagem. Revista
Gaúcha de Enfermagem. Porto Alegre: Universidade
Federal do Rio Grande do Sul: v. 27, n. 3, p. 386-397,
setembro, 2006.
SMELTZER, S. C., BARE, B G. Tratado de Enfermagem
Médico-Cirúrgica. 10ª ed. vol 3. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2005.
XAVIER, M. M. S.; SANTOS, R. B. A equipe de enfermagem
e os acidentes com material pérfuro-cortante. Revista
Brasileira de Enfermagem. São Paulo, p. 05-15, janeiro/
fevereiro, 2003.
WALLAU, S. M. de. Estresse laboral e síndrome de
Bournout: uma dualidade em estudo. Novo Hamburgo:
Feevale, 2003.
Em relação aos riscos ocupacionais no ambiente
de trabalho e o autocuidado desenvolvido pelos
profissionais da equipe de enfermagem entrevistada,
conclui-se que eles têm conhecimento dos riscos a que
são expostos, mas nem sempre se conscientizam da
importância de adotar todos os meios de prevenção, como
os EPIs, pois em muitos casos deixam de colocá-los.
O EPI mais citado é a luva, onde se entende que
é o mais usado pelos sujeitos desta pesquisa. Os demais
equipamentos de proteção, como a máscara e os óculos,
não são muito usados. Verifica-se, então, a importância
de desenvolver uma capacitação quanto ao uso correto de
todos os EPIs.
Portanto, observa-se que nem sempre o cuidado
faz parte do viver das pessoas de modo adequado como
deveria ser. E a Enfermagem, que é uma profissão que
cuida de gente, apresenta algumas situações em que o
cuidador se “esquece” do seu próprio cuidado, em virtude
do cuidar do outro.
REFERÊNCIAS
AYRES, D. O.; CORRÊA, J. A. P. Manual de prevenção
de acidentes de trabalho: aspectos técnicos e legais.
São Paulo: Atlas, 2001.
COSTENARO, R G. S.; LACERDA, M. R. Quem cuida
de quem cuida? Quem Cuida do Cuidador? Santa
Maria: Centro Universitário Franciscano, 2001.
FIGUEIREDO, N M. A. de. Ensinando a cuidar em saúde
pública: São Caetano do Sul, SP. Difusão Enfermagem,
2003.
FOSTER, C. P.; JANSSENS, N. P. In: GEORGE, J. B.
Teorias de enfermagem. Os fundamentos para a prática
profissional. Porto Alegre: Artes médicas, 1993.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São
Paulo: Atlas, 1991.
LUNARDI, V. L. et al. O cuidado de si como condição para
o cuidado dos outros na prática de saúde. Revista LatinoAmericana de Enfermagem. São Paulo, v. 12, n. 6, p.
933-939, nov. 2004.
49
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA E A EVASÃO
ESCOLAR PERCEPÇÕES E DIFICULDADES
Juliane Alegranzzi1
Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber2
Mirian Herath Rascovetzki3
Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM4
RESUMO
A gravidez na adolescência e a evasão escolar estão
se configurando um problema. A gravidez precoce cresce
14% e, com isso, acarreta a saída das jovens mães da
escola ocasionando, assim, a dificuldade de encontrarem
um emprego. A gravidez nas meninas com a idade inferior
a vinte anos contribui para uma mudança na vida da
adolescente grávida influenciando a formação de sua nova
identidade, na família e na escola já que o processo de
adolescer, ao longo da história, era considerada meramente
uma etapa de transição entre a infância e a idade adulta.
Sua caracterização era a partir dos comemorativos
biológicos que marcavam essa etapa. Esta é uma pesquisa
com abordagem qualitativa do tipo descritiva exploratória
e teve como objetivo analisar se a gravidez na adolescência
está contribuindo no aumento dos índices da evasão
escolar. Foram entrevistadas, individualmente, dez
adolescentes grávidas evadidas da escola através de uma
entrevista semi-estruturada com questões abertas e
fechadas. As jovens foram encontradas através de uma
busca ativa, mais sala de espera da Unidade de Saúde
Central do Município em estudo. Evidenciou-se com o
estudo que a gravidez na adolescência, o desinteresse e
falta de condições financeiras contribui para a evasão
escolar, sendo que para as adolescentes sentem a
dificuldade de conseguir um trabalho e estão cientes de
que essa saída da escola está prejudicando o seu
crescimento profissional. Elas engravidam não por não
conhecerem os métodos anticoncepcionais e sim por não
fazerem o uso dos mesmos.
Palavras Chave: Gravidez na Adolescência, Evasão
Escolar, Percepções.
ABSTRACT
The adolescence pregnancy and school evasion are
setting a problem, early pregnancy grows 14% and with
1
that entails the removal of the young mothers of the school
causing the difficulty of finding a job, pregnancy in girls
below twenty years old
contributes to a life change in the pregnant teenager
influencing the formation of their new identity, in the family
and at school as the process of adolescer, throughout
history, it was considered merely a stage of transition
between childhood and adulthood, its characterization was
from biological commemorative that marked this step. This
is a research with qualitative approach of descriptive
exploratory type and aimed to examine whether pregnancy
in adolescence are contributing the increase in the school
evasion rates. Ten pregnant teenagers school evaded were
interviewed individually through a semi-structured interview
with open ad closed questions and also they were found
through an active search more in waiting room of Unity
Health Center of the city in the study. The study evidenced
that pregnancy in adolescence, the disinterest and lack
of financial conditions contributes to the school evasion,
therefore these teenagers feel the difficulty of achieving a
work and they are aware that leaving the school is harming
their professional growth. They become pregnant not by
not knowing the contraceptive methods, but for not making
use of them.
Keywords: Adolescence Pregnancy, School
Evasion, Perceptions.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como tema “Gravidez na
adolescência e a evasão escolar: percepções e
dificuldades” têm a finalidade de possibilitar uma reflexão
sobre a relação entre a gravidez precoce e o abandono da
escola. Tendo como objetivo principal identificar a relação
entre a gravidez na adolescência e a evasão escolar.
Acadêmica do 8° semestre do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM.
Mestre; Membro do grupo de Pesquisa do CNPq; Educação em Saúde Coletiva(SETREM) Docente do Curso Bacharelado em Enfermagem
SETREM e do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia SETREM
3
Enfermeira e Docente do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM.
4
Avenida Avaí, Três de Maio – RS [email protected].
2
50
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Segundo Osorio (1989), a adolescência não era
muito estudada e era considerada meramente uma
passagem entre a infância e a idade adulta, e foi através
dessas modificações biopsicossociais que acontecem nela
que foi sendo encarada de uma forma mais séria e com
um olhar a mais sobre a mesma.
Para falar em gravidez na adolescência é preciso
abordar dois fatores importantes: a própria adolescência e
o contexto social em que esta gravidez acontece.
A adolescência é um período marcado por muitos
conflitos e pela busca de identidade. É tempo de
descoberta de um corpo que vai se desenvolvendo e precisa
ser entendido, pode-se dizer que é tempo de sonhar e
idealizar o futuro e em meio a essas transformações é
que as adolescentes ficam grávidas.
A gravidez na adolescência vem se configurando
como um problema cada vez mais grave no país com
conseqüências em várias esferas de suas vidas; segundo
Pommé (2003) “dificilmente se consegue entender o que
se passa com os adolescentes quando, apesar de
conhecerem todas as formas de anticoncepção, geram
um bebê na hora errada” (p. 07).
A menina mergulha num turbilhão de dúvidas: será
que meu namorado vai assumir? Será que irei dar conta
do meu filho? O que vai acontecer com meu corpo? Qual
será seu futuro, como ficam meus estudos? Se a gravidez
na adolescência causa a evasão escolar em conseqüência
à jovem ter vergonha por não ter se prevenido já que estão
disponíveis gratuitamente métodos contraceptivos em todos
os Programas de Saúde da Família.
Além de vários problemas que podem ocorrer, outro
fator agravante é a evasão escolar, que junto com a falta
de incentivo familiar e outros mecanismos de educação e
informação facilitam a marginalização da mãe adolescente
e de seu filho. Reforçando a idéia de Pommé (2003) “uma
gravidez nessa época da vida, desejada ou não, pode conter
um pacote de dificuldades” (p. 08).
Em maior ou menor grau, as jovens mães deixam
seus sonhos de lado, interrompem uma caminhada ou
adiam seus objetivos para assumir uma responsabilidade
grande demais para sua idade, o abandono da escola para
trabalhar, problema esse que acomete as adolescentes.
Um dos fatores que contribuem para a gravidez na
adolescência é o fracasso escolar, e frente à gravidez é
comum a interrupção da escolarização, talvez por medo
da rejeição social ou que a barriga denuncie o início da
atividade sexual, elas se sintam envergonhadas preferindo
assim a desistência; com isso, terá menor crescimento
pessoal e profissional, e mesmo que declarem a intenção
de retomá – los após o parto, isso dificilmente pode ocorrer.
2. ASPECTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa foi realizada no primeiro e no segundo
semestre do ano de 2007, tendo como sujeitos informantes
da pesquisa, adolescentes grávidas evadidas da escola
de um Município de pequeno porte da Região Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul.
Tratou-se de uma pesquisa com abordagem
qualitativa do tipo descritiva exploratória e teve como objetivo
analisar se a gravidez na adolescência está contribuindo
com o aumento dos índices da evasão escolar.
E, para Richardson (1999), a pesquisa qualitativa
“pode ser caracterizada como a tentativa de uma
compreensão detalhada dos significados e características
situacionais apresentadas pelos entrevistados” (p. 78).
Foram entrevistadas, individualmente, dez
adolescentes grávidas evadidas da escola através de uma
entrevista semi-estruturada com questões abertas e
fechadas. As jovens foram encontradas através de uma
busca ativa como também na sala de espera da Unidade
de Saúde Central do Município em estudo.
Após a coleta, os dados foram analisados através
da análise de conteúdo e também com uma pesquisa
bibliográfica para a comprovação científica dos mesmos,
trazendo, assim, informações, possibilidades e dificuldades
da gravidez precoce, além de investigar sobre saída das
jovens da escola, se as mesmas estão cientes desta
evasão e o que pode acarretar na sua vida; também, de
identificar o que para essas meninas é ser mãe na
adolescência, já que devem encarar essa etapa com muita
segurança, pois é um novo ser que vem por aí e precisa
ser amado mesmo que não foi planejado.
Visando atender às questões de aspectos éticos, a
coleta de dados foi realizada mediante aplicação de um
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que está
regulamentado na Resolução nº. 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde, que visa resguardar a autonomia do
indivíduo, garantindo sua livre escolha em participar ou não
da pesquisa, após ter sido esclarecido sobre todas as
questões pertinentes, pois se trata de uma obrigação do
pesquisador estar ciente dos compromissos éticos
envolvidos no processo.
3. REVISÃO BIBLIOGRAFICA
Neste capítulo, pretende-se reproduzir um referencial
teórico que embasa a coleta de dados através de uma
pesquisa bibliográfica sobre a origem da adolescência e o
recomeço da nova caminhada.
Pretende-se refletir sobre a adolescência dos
primórdios à contemporaneidade a qual embasa a origem
da adolescência através dos tempos, do adolescer do
biológico ao social, a crise adolescente e a questão do
51
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
novo comportamento, da nova identidade e o luto pelo
corpo, pois é uma etapa de transição e o adolescente vai
se construir e se formar como cidadão no mundo, sendo
essa época de crise devido à busca da nova identidade e
da transformação do corpo.
Relacionar a adolescência com o sexo, família e a
escola, pois é nesse meio que vai estar em contato e ele
sofrerá influência direta, ressaltando assim a gravidez na
adolescência e a evasão escolar com enfoque também do
ser mãe na adolescência.
Nas últimas décadas, contudo, a adolescência vem
sendo considerada o momento crucial do desenvolvimento
do indivíduo, aquele que marca não só a aquisição da
imagem corporal definitiva como também a estruturação
final da personalidade. É uma idade não só com
características biológicas próprias, mas com uma
psicologia e, até mesmo, uma sociologia peculiar. Não é
sem razão que se afirma que todas as grandes mudanças
culturais da história da humanidade ocorrem no limiar entre
adolescência e a idade adula (OSÓRIO, 1989).
O adolescente não pode ser estudado apenas
sob ótica de suas modificações corporais, pois
se é verdade que nelas se radicam as
angústias básicas da puberdade, não é menos
certo, contudo, que sem o adequado
entendimento da “crise de valores” por que
passa o jovem jamais lograremos
compreender o real significado da
transformação da “criança” em “adulto”
(OSÓRIO, p. 11).
3.1
A
ADOLESCÊNCIA
DOS
PRIMÓRDIOS À CONTEMPORANEIDADE
Para Osório (1989), a adolescência era considerada,
até algum tempo atrás, meramente uma etapa de transição
entre a infância e a idade adulta. Sua caracterização era
feita a partir dos comemorativos biológicos que marcavam
esse momento evolutivo do ser humano. O adolescente,
se do sexo masculino, era descrito como um indivíduo
desengonçado, que estava mudando de voz e deixando
entrever o buço em meio a uma constelação de espinhas
e, se do sexo feminino, uma criatura igualmente
desproporcional, o peito arqueado para esconder o
desabrochar dos seios e as faces ruborizadas ao menor
galanteio, como ordenava o pudor e a boa moral caseira.
A adolescência passou a ocupar, em nossos dias,
o centro do interesse especulativo e das preocupações
dos profissionais da área das ciências humanas (OSÓRIO,
1989), pois é uma etapa evolutiva do ser humano e nela
culmina todo o processo maturativo biopsicossocial do
individuo.
Segundo Osório (1989), o interesse universal pela
adolescência atualmente advém de duas circunstâncias
principais.
A explosão demográfica de pós-guerra, que
trouxe como imediata conseqüência o
significativo crescimento percentual da
população jovem mundial. Basta que se lembre
que nos últimos 25 anos a população do Brasil
duplicou para que se perceba quão significativo
é o contingente de jovens em nosso país.
Estima-se que hoje cerca de ¼ da população
brasileira é constituída de adolescentes (p. 13).
A ampliação da faixa etária com as
características da adolescência. Assim, se
antes a adolescência era tida meramente com
aquela etapa de transição entre a infância e a
idade adulta que coincidia com os limites
biológicos da puberdade, atualmente ela é
definida por elementos que, embora balizados
pelas características psicológicas do momento
evolutivo em questão, são marcadamente
influenciados pelas contingências sócioculturais (p. 13).
Ainda para Osório (1989), o estudo da adolescência
hoje extrapola o interesse cognitivo sobre uma etapa
evolutiva do ser humano para, através dele, procurar
entender todo um processo de aquisições e motivações
da sociedade em que se vive.
Nas últimas décadas, contudo, a adolescência vem
sendo considerada o momento crucial do desenvolvimento
do individuo, aquele que marca não só a aquisição da
imagem corporal definitiva como também a estruturação
final da personalidade. É uma idade não só com
características biológicas próprias, mas com uma
psicologia e, até mesmo, uma sociologia peculiar. Não é
sem razão que se afirma que todas as grandes mudanças
culturais de história da humanidade ocorrem no limiar entre
a adolescência e a idade adulta (OSORIO, 1989).
3.2 ADOLESCÊNCIA E PUBERDADE:
DO BIOLÓGICO AO SOCIAL
Segundo Tiba (1986), a palavra adolescere vem do
latim e significa crescer, engrossar, tornar-se maior, atingir
a maioridade. Dos seres vivos os humanos são os únicos
que vivem a adolescência como uma importante etapa do
desenvolvimento. Esta é uma das etapas em que o ser
humano sofre as maiores modificações no seu processo
vital, do nascimento à morte.
A adolescência não é apenas o período em que
ocorrem acentuadas modificações somáticas
sob a regência da constelação endócrina, mas
aquela etapa evolutiva onde se cristaliza o
processo de aquisição da individualidade, com
todos os comemorativos que assinalam o
esforço pessoal para se diferenciar da matriz
sócio – familiar de origem e criar o seu próprio
universo vivencial (OSORIO, 1989. p. 13).
Para Osório (1989) “os processos biológicos que
ocorrem nessa fase são universais, o modo como são
52
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
vivenciados pelos jovens e a forma como são encarados
pelos adultos são extramente variáveis” (p. 14).
“A puberdade e a adolescência iniciam-se no mesmo
período, porém a adolescência prolonga-se após o termino
da puberdade” (CARVALHO; MERIGHI, 2006, p. 08). A
puberdade é um evento biológico; sendo assim, acontece
no mesmo período etário para todos os sujeitos e a
adolescência, por ser um evento biopsicossocial, está
nitidamente ligada ao meio em que o sujeito está inserido.
O adolescente em fase de desenvolvimento do seu
corpo sofre grandes transformações, pois há uma
passagem diferente que vai tomando as características
de infante e se transformando no adulto. Cada etapa
evolutiva tem seus aspectos predominantes; passado,
presente e futuro adquirem valor simbólico e configurante.
3.2.1 Possibilidades e dificuldades de
relacionamentos na adolescência
Tendo em vista tudo o que acontece com o
adolescente em virtude das mudanças biopsicossociais
pelas quais estão passando, como fica o relacionamento
com as pessoas que os cercam? Segundo Outeiral (1994),
a adolescência é uma etapa vital com características
particulares que vão modificar diretamente no processo
de comunicação. A família é que mais nota essas
mudanças, aí que começam os conflitos dentro de casa e
os jovens já pedem socorro para os amigos iniciando assim
uma salada de opiniões, ou seja, um “rito de passagem”.
Esse aumento está nitidamente ligado ao aumento
da gravidez na adolescência e o atraso das jovens para
terminar o Ensino Médio e, conseqüência disso, essa falta
de estudo vai se estendendo até a fase adulta.
3.2.1.2 Adolescência e a Família
A família é importante para o processo civilizatório
dos indivíduos contribuindo assim para que essa pessoa
se torne um ser educável e que possa através dos tempos
evoluir e conseguir atingir suas metas. Tudo começa na
família. Desde criança se é educado e orientado para
seguir o melhor caminho visto pelos pais. Mas, sob o ponto
de vista do adolescente que está em transição, do mundo
infantil para o adulto, como será essa percepção? Qual a
influência possível da família sobre o comportamento
adolescente? Como os amigos influenciam nesse
comportamento?
O isolamento nas famílias vai acontecendo,
convivem mais com os amigos que com os familiares. Não
visitam tios e primos; às vezes nem avós. Para Tiba (2005),
essa convivência familiar menor que a social pode estar
fazendo falta para a formação de vínculos familiares e
valores na formação dos jovens. Valores esses como
gratidão, religiosidades, disciplina, cidadania e ética que
fazem falta no futuro. Contribuindo para clarificar essa
prerrogativa Zagury (1996):
Muitas vezes, ser pai de adolescente significa
saber retirar o time de campo na hora certa.
Evitar bater de frente quando for possível e o
assunto não for relevante é uma forma
inteligente, prudente e de grande eficácia no
dia-a-dia (p.125)
3.2.1.1 Adolescência e o Sexo
Nas gerações anteriores, falar sobre sexo não era
tão comum como é nos dias de hoje. Na concepção de
Carvalho; Merighi (2006) os jovens brasileiros estão
quebrando alguns tabus sexuais e isso tem contribuído
para incrementar as relações sexuais durante a
adolescência; um deles é o maior, ou melhor,
conhecimento.
Carvalho; Merighi (2006) ressaltam que o aumento
da atividade sexual dos jovens cresce, mas aí aparece o
lado negativo dessa grande quantidade que não está sendo
acompanhado pela mesma proporção de precauções
contraceptivas. Em outros casos os adolescentes praticam
a anticoncepção de maneira errada ou descontinuada pelo
caráter esporádico de suas relações sexuais.
Para Aberastury; Knobel (1981):
Calcula-se que dos 13 aos 20 anos 88% dos
rapazes e 91% das moças já tiveram este tipo
de atividade sexual e que praticamente aos 21
anos 100% dos rapazes já tiveram essa
experiência (p. 45).
A família como primeiro grupo social de uma criança
e posteriormente a escola provêem o sujeito de uma porção
de garantias para suas necessidades e sua dependência
(ABERASTUTY, 1990, p.78).
Mas hoje não é o que está acontecendo. Os
adolescentes do século XXI são muito apegados ao seu
social, seus amigos, seus programas, suas viagens, a
ponto de os seus pais se sentirem meros provedores (TIBA,
2005, p.37). Contribuindo para a idéia, Osorio (1989)
ressalta que o grupo é importante para o adolescente, pois
lhe permite espalhar, disseminar e resgatar partes do ego
nos diversos membros do grupo.
“O grupo de iguais é a caixa de ressonância ou
continente para as ansiedades existentes do adolescente”
(OSORIO, 1989, p. 20).
Ainda conforme Osório (1989), o adolescente, ao
identificar o “grupo de iguais”, utiliza a gíria como sendo a
representação verbal da crise de identidade adolescente,
com todo o poliformismo e transitoriedade tão característica
do próprio processo puberal. É um subproduto da cultura
53
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
adolescente, servindo de identificação própria, de
reconhecimento do grupo de iguais como portadores de
uma identidade própria e distinta da identidade dos pais,
professores e do mundo adulto em geral.
O compreendimento na relação pais e filhos são
fundamentais, mas isso algumas vezes não acontece,
porém com o tempo o relacionamento vai melhorando e
conseguindo se firmar através da confiança e de conversas.
Os adolescentes querem não mais ser tratado como
crianças. Quando os pais assim o fazem, estão
desperdiçando a ajuda e o companheirismo que os
adolescentes podem lhe oferecer (TIBA, 2005, p. 38).
Amigos e família estão interligados nessa fase. Para
o autor Tiba (2005), o adolescente preciso tanto dos
amigos quanto dos pais de diferentes maneiras, e uns não
eliminam os outros, nem são melhores, mas cada um
preenche de seu modo as necessidades juvenis. É
importante que os pais o e os amigos percebam essas
diferenças e saibam interagir partilhando os saberes
afetivos dos dois lados.
Os pais na maioria das vezes acertam, mas claro
podem errar muitas vezes, mas isso é muito difícil de
acontecer já que não nasceram sabendo tudo sobre educar
um filho. Ser pai e mãe não é fácil, mas como estão nesse
barco, assumem a missão até o fim.
Para Rodrigues (2000):
informatizado” (TIBA, 2005, p. 36). Como ocorre
precocemente a saída das crianças de casa nos dias
atuais, pode acarretar, com o passar do tempo, os pais
não terem tanto diálogo com seus filhos, muito trabalho e
finais de semana sem programação entre a família, cada
vez que vai diminuindo as conversas, ficando mais difícil
de educar um filho já que é um trabalho árduo para os
pais.
Para educar um adolescente não é trabalho fácil.
Zagury (1996) relata que os professores sofrem um trabalho
dobrado, pois se deparam com a irreverência (algumas
vezes com falta de limites e de educação), rebeldia,
questionamento constante, insegurança, com as
características próprias que marcam essa fase tornando
assim um trabalho mais árduo.
O grande desafio da escola hoje é sem dúvida
conseguir conquistar a atenção e a motivação
da criança e do jovem para o estudo.
Principalmente o jovem, que nessa fase de
grandes transformações não só corporais, mas
também de grandes e importantes descobertas
(ZAGURY, 1996, p. 54).
A escola deve estar preparada para trabalhar numa
visão onde possa enfatizar o multiculturalismo, pois recebe
inúmeros estudantes com diferenças, distinções,
desigualdades: Louro (1997). Na verdade, a escola produz
as diferenças, isso desde seus primórdios que exerceu
uma ação distintiva, tornando aqueles que entravam nela
distintos dos outros.
A educação é, portanto, fundamental para a
socialização do homem e sua humanização.
Trata-se de um processo que dura a vida toda
e não se restringe à mera continuidade da
tradição, pois supõe a possibilidade de ruptura,
pelas quais a cultura se renova e o homem faz
a história (ARANHA, 2000, p. 18).
os pais podem perder algumas batalhas, mas,
enquanto tiverem fé e consciência tranqüila de
que fizeram tudo os que estava a seu alcance
e, principalmente, caso se propuserem a
revisar sua postura educativa, provavelmente,
não perderão a guerra (p.36)
Desistir de lutar algumas vezes mesmo que por
algum momento tenham vontade de sair porta afora, de
sumir do mapa e, em segredo, por alguns segundos, até
desejarem não ter tido filhos pode acontecer, é claro em
momento difíceis e complicados de encarar, mas os pais
são a base dos filhos, pois é neles que se espelham.
3.2.1.3 Adolescência e a Escola
A escola que foi legada pela sociedade ocidental
separava crianças católicas e protestantes, separou
também ricos e pobres e imediatamente meninos de
meninas. Concebida inicialmente para acolher alguns, mas
não todos, ela foi lentamente, sendo requisitada (Louro
1997).
“Os adolescentes de hoje começaram a ir para a
escola praticamente com dois anos de idade, seus pais
trabalhando fora de casa, eles passam sua infância na
escola, com pessoas cuidando deles, num mundo
“A escola facilita o processo de diferenciação e
individuação da criança, oferecendo-lhe uma introdução
ávida social” (OSORIO, 2002, p. 96). O ser humano vai se
construindo e se formando um ser educável através da
escola e da família; tudo isso vem somado de diálogo e de
uma troca entre os seres humanos.
Tudo começa com o diálogo, pela comunicação,
por uma nova relação humana que possibilite ao próprio
povo a elaboração de uma consciência crítica do mundo
em que vive. “O estudo proporciona a qualquer ser humana
uma visão de respeito na sociedade, ocorrendo assim uma
não exclusão dos indivíduos” (FREIRE, 1988, p. 99).
A escola proporciona aos estudantes ensinamentos
esses que não cabem só à escola, mas sim à família
também favorecer essa educação, como define Osorio
(2002) a “família educa” e a “escola ensina”, ou seja, cabe
à família oferecer a pauta ética para a vida na sociedade e
a escola, instruí-los para o mundo na luta da sobrevivência”
(p.96).
54
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Conforme Tiba (2005) o adolescente adora ir à escola,
o que o atrapalha é a aula. Para os jovens, a escola é o
lugar de reunir, fazer tumultos na porta e não ficarem
sentadinhos, já que a adolescência é fase da explosão
hormonal.
Atualmente a escola serve para, além da família,
delimitar espaços entre o certo e o errado e assim
mostrando o que se pode e se deve fazer. Segundo Louro
(1997), um longo aprendizado vai afinal colocar cada qual
em seu lugar, levando em consideração que as divisões
de raça, etnia, classe, sexualidade e gênero estão
implicados nessa construção.
Por um aprendizado eficaz, continuado e sutil,
um ritmo, uma cadência, uma disposição física,
uma postura parecem penetrar nos sujeitos,
ao mesmo tempo em que esses reagem e,
envolvidos por tais dispositivos e práticas,
constituem suas identidades “escolarizadas”.
Gestos, movimentos, sentidos são produzidos
no espaço escolar e incorporados por meninos
e meninas, tornando-se parte de seus corpos.
Ali se aprende a olhar e a se olhar, se aprende
a ouvir, a falar e a calar; aprende-se a preferir
(LOURO, 1997, p.61).
Conforme Louro (1997), as pessoas estudam
meninos e meninas o que os mestres os ensinam, o modo
de sentar e andar produzem um corpo escolarizado,
distinguindo o menino da menina que passa pela escola e
o tema sexualidade era tratado exclusivamente ao campo
disciplinar à educação sexual, ressaltando também que o
assunto sobre sexo era íntimo e que deveria ser falado
apenas com alguém muito íntimo e de forma reservada.
Sendo um tema pessoal e particular a quem se
confidenciava a uma amiga.
As mudanças foram muitas já que atualmente sexo
é um tema bastante discutido, mas precisa ainda ser mais
falado na medida da prevenção da gravidez tanto nas
escolas como em Unidades de Saúde.
futuro, um vir a ser (CASTRO; ABRAMOA; SILVA,
2004, p. 127).
Adolescer e engravidar não são experiências muito
fáceis. Na adolescência os jovens passam por muitas
transformações físicas e emocionais, de dúvidas sobre
quem sou e muitas angústias sobre “quem eu quero ou
não quero ser”. O corpo se transforma rapidamente sem
que você tenha tempo para se adaptar. A busca da própria
identidade sempre passa pelo confronto de idéias com os
pais (POMMÉ, 2003).
Segundo Sukiennik “A adolescente grávida tem
sido fonte de preocupações na família, na escola e nas
áreas da saúde. A taxa de fertilidade da mulher brasileira
diminuiu de 6,2 para 3,2 filhos. A taxa de gravidez entre
adolescentes de 15 a 20 anos aumentou” (p. 439).
A incidência de gravidez na adolescência é grande
e crescente. Pra que haja um controle dessa situação,
torna-se necessário tomar algumas medidas gerais de
educação, orientação, apoio emocional e psicológico
envolvendo o adolescente, os pais, a escola, os professores
e a comunidade. “Engravidar na adolescência é dose dupla
de crise, e crise é ter vida toda revirada, às vezes de ponta
cabeça” (POMMÉ, 2003, p. 19).
Matos (2003) destaca que o alto índice da gravidez
na adolescência tem crescido no Brasil e em outros países
ressaltando também que a fecundidade precoce ocorre por
falta de informação. Muitos fatores influenciam para que
não se previnam, entre outros a timidez, ou porque na
primeira vez não sabem usar o preservativo.
Toda grávida enfrenta uma modificação rápida e
intensa em seu corpo. Isso a deixa muitas vezes
assustada, pois ela tem medo de ser modificada e não
voltar a ser a mesma pessoa. Tem medo de não ser uma
boa mãe e de não conseguir exercer os outros papéis na
vida (POMMÉ, 2003, p. 19).
Segundo Atkinson e Murray, (1989): relatam que
3.3 A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA E a anticoncepção e a gravidez se tornam problemas para a
A EVASÃO ECOLAR
atividade sexual dos adolescentes. Estima-se que cerca
O adolescente inicia a busca do parceiro de modo
tímido, porém intenso, por meio de contatos superficiais
que vão se tornando mais profundos e íntimos. Sabe-se
que as primeiras relações amorosas são importantes para
o desenvolvimento da identidade de um jovem (CARVALHO;
MERIGHI, 2006).
Considera-se gravidez na adolescência aquela
ocorrida até os 20 anos incompletos, segundo
a Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas a
perspectiva da juventude como um processo
também traz limitações, pois assume que os
jovens racionalizam seus atos, não pelas
gratificações que possam delas ter no
momento, mas sim tendo como referência um
de um milhão de nascimentos ocorrem anualmente como
conseqüência da gravidez na adolescência. Os riscos
relacionados à gravidez precoce estão relacionados à
imaturidade de seu sistema reprodutor, dietas inadequadas
e estresse emocional quando faltam sistemas de apoio.
Um dos maiores problemas na adolescência é a
gravidez, de garotinha à mãe num só pulo, mas ela pode
ser evitada com conversas em casa entre pais e filhos,
entre irmãos, para que todos tenham intimidade de falar
em gravidez como um tema aberto. Para jovens atentos e
responsáveis, essas informações são rapidamente
transformadas em conhecimentos e postos em prática para
a prevenção à gravidez.
55
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
3.3.1 Evasão Escolar
Conforme Mainieri (1998) a adolescente grávida
deverá faltar um tempo na escola num período próximo do
nascimento do seu filho tanto antes como depois, sabendose que a necessidade de cuidar de um filho, em alguns
casos, afasta a mãe da escola por um ou dois anos, ficando
difícil de estudar, na maioria das vezes, se permanecer,
acabará repetindo o ano.
Já durante a gravidez, as adolescentes abandonam
escola e o emprego. Constrangimento e pressões de
diretores, professores, colegas e pais de colegas estão
entre os fatores que determinam a evasão escolar antes
ou após o nascimento do filho.
Essa saída se impõe, pois as mães necessitam
pagar com seu trabalho o sustento da família. No fim do
dia, ir à escola diante desse contexto se torna uma tarefa
impossível de ser cumprida. Jovens oriundas de famílias
com maior poder econômico e que aceitam a gravidez
podem vislumbrar a possibilidade de completar seus
estudos e retomar seu projeto de vida.
Para Carvalho; Miraghi (2006), a gravidez na
adolescência associada a uma menor auto-estima, um
menor funcionamento intrafamiliar e uma menor qualidade
de vida das atividades de tempo livre, as adolescentes
grávidas interrompem seus estudos e/ou deixam seus
empregos. As adolescentes ao se tornarem mães perdem
a liberdade, adiam projetos de estudos, limitam suas
expectativas de ingresso no mercado de trabalho e até de
ter um relacionamento amoroso satisfatório.
Uma gravidez, quando se é ainda muito jovem, é
muito mais problemática do que muitos jovens chegam a
imaginar, pois a jovem mãe, que passa a ter o bebê para
cuidar, terá seus estudos e profissionalização dificultada,
agora vai ter de assumir mais responsabilidade e deixar
os sonhos esperados para mais tarde. Com que
expectativa estará a adolescente ao ser mãe?
3.4 O SER MÃE NA ADOLESCÊNCIA
Uma adolescente pode até sonhar em um dia, no
futuro, ficar grávida, ter um bebê. Um dia significa quando
ela estiver em condições físicas, psicológicas, sociais e
financeiras.
Para TIBA,
engravidar hoje é necessário que uma mulher
esteja biologicamente amadurecida e
preparada psicologicamente, com um
companheiro para formar uma família, e que
tenha dinheiro suficiente para prover e educar
o filho (TIBA, 2005, p. 79).
Engravidar não é brincadeira. O sustento da nova
família deve estar garantido pelo marido companheiro,
conforme ressalta Tiba (2005) que esse homem deve ser
amadurecido, psicologicamente preparado para formar uma
família e que tenha uma fonte de dinheiro estável que
garanta as despesas de uma casa com criança.
Esta seria uma possibilidade, mas não é a realidade,
planejar uma família quando estiver com a sua vida
estruturada financeiramente é fácil, mas ter que dar conta
de uma gravidez sem estrutura emocional, física e
financeira e sem estímulo familiar e com pouca idade, pode
ser o início de uma desestrutura pessoal, que como
possibilidade de dar conta dessa desestrutura pode
acarretar em evasão escolar. Mas quais são as
possibilidades e as dificuldades percebidas pela mãe
adolescente ao se sentir grávida e qual a relação desse
evento com a evasão escolar?
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 O perfil social das adolescentes
A idade das entrevistadas varia, sendo a faixa etária
predominante os quinze anos para Osorio (1989), muito
embora se questione a definição de adolescência através
da idade cronológica, pois se trata de época de inúmeras
transformações e influenciada por fatores culturais, sociais
e econômicos. Ainda hoje a definição que prevalece é
baseada na idade. Oito delas possuem uma relação
estável (casada, ou amigada). Duas são solteiras, ou seja,
não moram com o pai de seu filho.
A pergunta acerca da renda familiar foi a que as
adolescentes mais hesitaram em responder, sendo que
uma delas disse não a conhecer. Entre aquelas que
responderam, mais da metade referiu uma renda mensal
familiar inferior a três salários mínimos, o que mostra tratarse de um grupo com baixo poder aquisitivo. O fato das
adolescentes desconhecerem a renda familiar reflete o
pouco envolvimento com a realidade concreta de seu
sustento e de seu filho, mostrando mais uma vez que a
gravidez não foi conscientemente programada ou o foi de
forma idealizada.
A escolaridade das adolescentes era, em geral,
abaixo daquela esperada para a idade, nove era da rede
estadual de ensino, uma da rede municipal de ensino,
apenas duas completaram o Ensino Médio, o restante
delas evadiram, a situação escolar ficou mais clara quando
se indagou sobre a condição atual, sendo que apenas uma
das adolescentes ainda estava freqüentando a EJA. Duas
das jovens irão ter o segundo filho com menos de vinte e
um anos, sendo que para uma delas o segundo filho não é
o pai do primeiro, já que iniciaram sua primeira relação
sexual precocemente.
56
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
4.2 O importante apoio da família
Apoio é indispensável, sendo fundamental durante
a gravidez na adolescência, pois é assim que se pode
enfrentar esse evento na vida da jovem mãe que, além de
estar fora dos bancos escolares, percebe-se grávida e sem
estudo onde poderia conseguir uma força a mais para ajudar
vencer e criar esse bebê que vem ao mundo junto a sua
mamãezinha. Onde as adolescentes buscam apoio?
Indagou-se a respeito do apoio durante a gravidez dado
pelo companheiro, pais e outros familiares, escola e
serviços de saúde.
Por que pensar primeiramente na família? É que
tudo o que acontece tanto positivo como negativamente
na vida, onde que se vai buscar apoio ou contar o
acontecido ou até mesmo pedir conselho de como resolver
tal problema, como encarar essa situação, tudo isso só
tem uma resposta, a família. Atualmente se fala muito da
sua importância.
As adolescentes grávidas recorrem, primeiramente,
ao parceiro e, em seguida, à mãe, sendo que, geralmente,
a comunicação é mais bem estabelecida com a mãe.
A família é um grupo social onde todos trabalham
engajados e deve ser defendida por todos. O trabalho de
um é para o bem do outro, o agito de um pode sacudir o
outro que está ligado a ele, a alegria de um contagia o
outro, os afetos correm soltos, quando todos mantêm entre
si um nível afetivo bem próximo, a família está sintonizada.
A importância da família está presente na maior parte
das respostas adquiridas. Apoio numa hora certa de quem
precisa cai como um banho, tira muitas vezes da pior, dá
força, ocorre uma renovação da pessoa. A família está
nitidamente ligada a vida da pessoa. Tudo o que acontece,
na maioria das vezes, ela sempre está presente e
ajudando. A família que se fala está englobando tanto
pessoas que têm laços sangüíneos e como ocorrem nas
famílias contemporâneas. Segundo Osorio (2002), a família
é um grupo em que se desenvolvem três relações pessoais
– aliança, filiação e consangüinidade e, com isso, ela
oferece a capacidade das pessoas de adquirirem suas
identidades pessoais e desenvolver a transição de valores
éticos, estéticos, religiosos e culturais.
Para Rodrigues (2000):
percebe-se, também, a falta de apoio,
despreparo ou abandono por parte do parceiro,
causando a interrupção do processo normal
do desenvolvimento psico-afetivo-social: na
maioria dos casos pode ocorrer de a gestante
não tem nem vínculo com o parceiro, nem o
apoio da família.
Durante esse período de transformações o apoio
dado às adolescentes é muito importante para que essas
tolerem as mudanças a que estão sujeitas e não se sintam
vulneráveis às mudanças biopsicossociais. Para tanto, a
família deve estar bem estruturada, a fim de não facilitar a
ocorrência, comum entre as adolescentes, da gravidez
precoce.
4.3 Apoio familiar e os valores que regem
a família
Por mais que todo mundo aceite bem o fato de você
estar grávida, ser mãe antes do tempo causará grandes
transtornos. Frente ao fato consumado de estar grávida
não há caminho mais adequado do que buscar auxílio de
sua família. É nela a melhor forma que se achará para
resolver o problema.
Mais do que nunca a família ganha importância na
vida de cada indivíduo. Para Osorio (1996), “a família garante
não a reprodução e sim a sobrevivência da espécie” (p.20).
Por todas as idéias apresentadas, nota-se
nitidamente que a família foi quem primeiro soube da
gravidez, e que as adolescentes foram buscar apoio nas
suas famílias. Pode-se dizer que contaram para a mãe
em virtude do apego entre mãe e filha que na maioria das
vezes acontece e a mãe é a guia.
Em contrapartida, outras adolescentes contaram
para os maridos e/ou namorados; esses não muito mais
velhos que as jovens, isso elas definem com família, muitos
com um salário baixo.
Através das observações feitas, pôde-se perceber
que as condições onde moravam com seus pais não eram
boas. A nova família que a jovem constitui não seria
meramente para ter uma possibilidade de ser diferente de
seus pais e sair das condições em que viviam?
Os valores que regem a família estão mudando, não
são mais levados em consideração, pois a família deve
ser formada para uma função socializadora e ter o papel
de intermediação entre o jovem e a sociedade. Os valores
principais como dignidade, solidariedade, valor esses que
estão se perdendo, a questão é: Será que os pais deveriam
fazer valer esses valores? São questões que ficam...
Pensa-se que as famílias devem deixar bem claro
até que ponto poderão ou que irão colaborar na criação do
neto. Sim, porque é fácil dizer, “estou grávida e vou ter um
filho”, sem considerar que essa decisão envolve problemas
concretos de sustento da criança, das necessidades de
cuidar do bebê dia por dia, hora por hora, da necessidade
talvez de a menina-mãe abandonar os estudos, entre
outros. Fazer um bebê é muito fácil, ter o filho e criá-lo é
bem diferente.
Para Aberastury (1990) as condições familiares e
culturais poderão mitigar, favorecer, demorar ou precipitar
o desenvolvimento ou nas escolhas dos jovens, pois é
57
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
através da família que se adquirem e se constroem os
valores.
Helman (2003) define cultura
como um conjunto de princípios herdados por
indivíduos membros de uma sociedade;
princípios esses que mostram aos indivíduos
como ver
o mundo, como vivenciá-lo
emocionalmente e como comportar-se em
relação às outras pessoas, às forças
sobrenaturais ou aos deuses e ao meio
ambiente natural (p. 12).
A família passa nos ensinamentos esses valores
de geração em geração que, na maioria das vezes, são
seguidos já que a família só quer o bem mesmo que não
se aceite, mas pode entrar em um consenso. Segundo
Helman (2003), a cultura favorece aos indivíduos um meio
de transmitir suas diretrizes para a geração nova que está
por vir na família mediante símbolos, linguagem, arte e
rituais.
E são essas diretrizes que constituem e atuam
nessa sociedade influenciando assim nas atitudes e na
tomada de decisão. Helman (2003) destaca que a cultura
influencia na vida das pessoas, no seu comportamento,
nas percepções, nas emoções, na linguagem, na religião
e na estrutura familiar.
4.4 Importância da escola para a
formação do cidadão
A escola propicia momentos de socialização
contribuindo na constituição das pessoas e a cada ano
os seres humanos vão constituindo-se pouco a pouco,
degrau por degrau. Os seus conhecimentos adquiridos vão
se modelando e tornando-se cada vez mais importantes
nessa constituição, sendo que a importância da escola
pode ser percebida nas respostas advindas da pergunta se as adolescentes pretendem voltar à escola -, sendo
que sete das entrevistadas têm a intenção de voltar.
A Escola não é formada só de paredes, nela há
professores e professoras que estão contribuindo na
formação dos cidadãos nessa sociedade tão difícil,
imagine! Quem não estudar,como será sua qualificação
no mercado de trabalho?
Conforme Rodrigues (2000):
o impacto adverso da gravidez precoce emerge
de forma mais clara quando se examina a
relação entre educação, pobreza e maternidade
precoce. Apresentam alguns dados na direção
do exame dessa relação. Adolescentes cuja
renda familiar se classifica entre as mais
pobres quase não têm nenhuma chance de
completar o 2o grau após o nascimento de um
filho (p. 127)
Os adolescentes querem tudo imediatamente.
Desistem com facilidade diante de qualquer dificuldade,
deixando de lado a sua preparação para o mundo do trabalho
sendo que essa condição se faz através do individual ou
em grupos.
A menina grávida não deixa de ser encarada nas
relações interpessoais na escola como diferente. Ela
precisa ser incluída, pois já que parou de estudar e não
pretende voltar à escola, nem após a readaptação à nova
realidade, como relato das jovens. Outras pretendem voltar.
Essas que voltaram, têm vontade de estudar. Percebeuse, através dos relatos, que as mesmas não deviam ter
saído, pois disseram que muitas vezes há uma
despreocupação por parte da escola, cabendo aí também
o apoio familiar de dar a assistência à jovem nessa luta.
4.5 Evasão escolar e a gravidez na
adolescência
O que levou você a abandonar a escola? Essa era a
principal resposta que se buscava. Por meio das respostas
abaixo, a gravidez na adolescência está diretamente ligada
com a evasão escolar, sendo que quanto menos estudo,
maior a chance de maternidade precoce, já que a escola
pode ser um bom método anticoncepcional.
O expressivo número de adolescentes que
abandonaram os estudos devido à gravidez pode ter relação
com a vergonha destas meninas mais jovens em
assumirem-na, de enfrentarem os colegas e as colegas,
bem como as professoras e os professores, pois estão
muitas vezes sozinhas. A saída mais fácil acaba sendo o
abandono escolar já no início da gravidez. O que pode ser
evidenciado através de justificativas como: “parei de estudar
porque estava grávida, porque achei chato continuar” ou
mesmo “parei de estudar por causa da gravidez, na escola
falaram que foi besteira minha ter feito isso”. Esses
depoimentos fazem pensar, também, em como a escola
pode estar se comportando frente ao problema da gravidez
na adolescência: omissão quanto aos aspectos
educativos/preventivos e preconceito após o fato
consumado.
Em vista dos argumentos apresentados, a evasão
escolar aconteceu em relação à gravidez para cinco das
jovens entrevistadas. Para duas jovens foi a falta de
interesse, sendo que se registra aqui a fala da adolescente
que foi identificada como sendo A9, fala claramente que o
“nenê não tem nada a ver” revelando que as adolescentes
em alguns casos evadem por seu próprio desinteresse e
se justificam através da gravidez.
Para Osorio (1996) a escola tem o papel de facilitar,
diferenciar e individualizar as pessoas, oferecendo-lhe uma
introdução à vida social fora da convivência doméstica.
Contribuindo com a idéia, Louro (1999) diz que o ser
estudado é visto diferente, pois o estudo modela os
indivíduos e faz os mesmo agir de forma correta perante
as situações na maioria das vezes.
58
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A evasão escolar está prejudicando o crescimento
da criatividade, do empreendedorismo, da cidadania e da
ética da população jovem. Os estudos ajudam na formação
e na maturação da personalidade.
Frente também ao que foi mencionado, o
desinteresse e a gravidez precoce estão favorecendo
também a saída dos bancos escolares. Lendo Osorio
(2002) os filhos não querem estudar ou não querem ir à
escola, e também o aprender não se faz somente na
escola.
A escola favorece nesse processo de aprendizagem,
mas ela não é a principal nessa formação, a escola só dá
respaldos, o restante cabe ao adolescente.
Para Osório (2002) “a negativa a estudar ou o baixo
índice de aproveitamento escolar é de deficiência dos
alunos” (p.97). Essa evasão prejudica na busca de um
emprego e na qualificação das adolescentes.
Conforme Outerial (1994), o constrangimento e
pressões de diretores, professores, colegas e pais de
colegas estão entre os fatores que determinam a saída da
escola antes do nascimento do filho. Alguns pais
contribuem decisivamente para esse abandono ao
preferirem esconder a situação “vexatória” da gravidez de
sua filha. E isso pode ser percebido no relato da A3 que
abandonou a escola devido ao preconceito que ele sofria
na escola.
Sendo assim que a escola é um lugar onde se
encontra um multiculturalismo e ainda se encontra nos
dias atuais essa discriminação. Em vista do que foi
apresentado, a gravidez na adolescência ainda é a principal
causa de evasão escolar.
4.6 Métodos contraceptivos e a
adolescência mitos e verdades
A gravidez pode ser prevenida. Estão disponíveis
várias barreiras de a mesma não ocorrer, informações são
disponibilizadas. Desde criança se ouve falar de sexo e aí
pinta a vontade de experimentar. Cada vez mais são essas
aventuras sem limites e não prevenidas que ocorrem a
gravidez. Para Cravalho; Merighi “a iniciação sexual é muito
pessoal, cada indivíduo tem seu momento próprio, assim
é necessário sentir o momento, considerar-se pronto e
confortável para o sexo” (p.70). Momento esse em que se
deve pensar antes, não agir por um instante e estar
prevenido.
Oito das entrevistadas eram bem esclarecidas sobre
os métodos, quatro delas usavam só a camisinha, mas
em algumas vezes não se preveniram e engravidaram, uma
tomava comprimido e engravidou mesmo assim, sendo que
o comprimido deve ser tomado todos os dias e em horários
habituais. A vida sexual dos adolescentes está se iniciando
cada vez mais precoce, sendo assim uma das grandes
preocupações dos pais e da equipe de enfermagem, pois
orientações acontecem, não são muitas em famílias em
que o sexo não é muito dialogado entre os pais e filhos.
O ideal seria que todos os pais tivessem liberdade
de falar claramente sobre sexo com os filhos já que quando
um filho inicia a sua vida sexual, os pais se preocupam.
Para muitas famílias sexo não é falado livremente para
Zagury (1996), embora nem todos os pais consigam falar
sobre sexo com os filhos, já cresceu o número de pais
que se sentem à vontade de falar para esclarecê-los.
Informações essas que os jovens sabem da
prevenção da gravidez, mas muitas vezes não as utilizam.
Para Tavares (1999), “a maioria dessas meninas que
engravidam são muito bem informadas e conhecem
métodos variados de contracepção, mesmo entre as
camadas mais pobres da população” (p. 123).
Quando perguntada sobre como prevenia a gravidez,
a A7 respondeu que não usava porque o namorado dizia
que ia engordar, mas agora tinha engordado mais. Segundo
Carvalho; Merighi (2006), “os adolescentes das últimas
gerações obtêm muita informação sobre sexo, entretanto,
eles fazem pouco uso dela e ainda persistem alguns medos
e tabus” (p. 70). Esse é um dos obstáculos que se pode
dizer mito dos contraceptivos de quem os usa tem um
grande medo de ganhar alguns quilinhos e isso cabe ao
ginecologista de prescrever um contraceptivo adequado
para cada mulher, sendo necessário passar essa
informação claramente.
Para Zagury (1996), é importante que as meninas e
os rapazes saibam exatamente o que vai significar na vida
deles a concepção para que pensem com mais adequação
nos passos que dão na vida. Ressaltando, assim, a A8 só
usava camisinha, mas uns dias não usaram e por isso
engravidou, revelando que é possível também relacionar o
não uso, ou uso inadequado do preservativo, à idéia de
que sua principal utilidade seria evitar as doenças de
transmissão sexual e não a gravidez.
Por outro lado, o comportamento contraceptivo dos
adolescentes é marcado por dificuldades para usar
adequadamente os métodos anticoncepcionais,
especialmente em vista da maior imprevisibilidade das
relações sexuais nesse grupo. Também se observa que
esse comportamento, assim como a adoção de medidas
preventivas quanto às doenças de transmissão sexual, varia
de acordo com o contexto da relação e do tipo de parceria
vivenciado pelos adolescentes.
Informação cabe primeiramente aos pais orientar,
passar conhecimento. Quanto mais tradicional a postura
dos pais, maior a tendência dos filhos a esconder dos
mesmos quando decidem começar sua vida sexual Cabe
aí a conversa e as informações sobre o sexo seguro.
Entrando aí o fazer da Equipe de Enfermagem da
Unidade de Saúde na prevenção, indo a campo e identificar
59
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
as adolescentes de alto risco, desvendando as falhas,
quanto a não tomar certo os comprimidos, o usar sempre
a camisinha não só para prevenir a gravidez, mas para
não contrair as Doenças Sexualmente Transmissíveis
(DSTs) e dar orientações sobre outros métodos existentes.
Não seria uma falha da Equipe, mas é melhor diminuir os
índices, pois os filhos (as) dessas vão crescer e poderão
também ser pais ou mães precocemente. Duas das
entrevistadas já irão ter o segundo filho se nem
completarem 21 anos e não terem concluído nem o ensino
fundamental que é o início da escolarização, a base para
garantir um razoável emprego.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A gravidez na adolescência contribui para a evasão
escolar, pois as jovens se deparam grávidas e não
conseguem conciliar o seu dia-a-dia de futura mãe e o
cotidiano de estudante, algumas por desinteresse, outras
por não terem condições financeiras para prosseguir
posteriormente seus estudos. Esses fatores contribuem
também fazendo assim as jovens evadirem da escola.
Evidenciou-se, também, a freqüente relação entre
gravidez e abandono escolar, apontado para um possível
agravamento das condições sócio-econômicas dessas
adolescentes que terão limitadas suas possibilidades de
ocupação e sustento, de si e de seus filhos.
Sendo que as adolescentes evadidas estão cientes
da sua evasão, identificaram a dificuldade de enfrentar e
conseguir um emprego. O que contribui mais para a evasão
é a gravidez na adolescência e vem seguida do
desinteresse, baixa condição financeira de prosseguir e
fazer uma faculdade. Desistem antes de enfrentar essa
dificuldade e o preconceito na escola após a gravidez.
Para evitar a gravidez nos dias atuais há inúmeras
maneiras, comprimidas, camisinha, entre outras as que
se pode perceber é que as jovens têm conhecimento dos
métodos anticoncepcionais, mas não os utilizam
acarretando assim a gravidez precoce. Para carvalho;
Merighi (2006), “a gravidez em adolescente pode ser uma
espécie de verificação inconsciente de fertilidade, a
sensação de imunidade característica da idade contribui
para diminuição a adesão à concepção” (p. 55).
Sendo tudo o que foi citado sobre os métodos foi
com objetivo de mostrar um pouco da realidade do que é
estar grávida, objetivando mostrar que a prevenção é
fundamental, os métodos anticoncepcionais estão aí para
serem usados, de forma que você curta a vida com
segurança.
A gravidez precoce preocupa, pois além de ser um
fator de risco, contribui para outros eventos desfavoráveis
para a adolescente grávida, como a saída da escola,
dificuldade de encontrar um emprego com uma boa
remuneração. Sendo assim que a atenção à saúde da
criança e do adolescente e a falta de planejamento
resultam em complicações para a mãe e para a criança.
Na maioria dos casos o corpo da menina não se
desenvolveu de forma adequada e a falta de
acompanhamento pré-natal aumenta a probabilidade de
morte do bebê.
No entanto, torna-se necessário um olhar a mais
das Unidades de Saúde, escola, família e sociedade que
auxiliem a jovem e incentivem para que a mesma não evada
da escola.
Este estudo mostrou ainda que, apesar de na maior
parte das vezes, a gestação não ter sido planejada, esta
foi aceita. A visão idealizada dessas garotas acerca da
gravidez e a ausência de preocupação com problemas
concretos do dia-a-dia, incluindo seu sustento, estudo,
trabalho, realização pessoal e outros ficou clara. Por fim,
ficou evidente a forma também idealizada com que falam
de suas expectativas futuras, especialmente as mais
jovens, não apresentando alternativas concretas e não
visualizando caminhos promissores na sociedade em que
estão inseridas.
REFERÊNCIAS
ABERASTURY, A. Adolescência. Porto Alegre: Ed Artes
Médicas, 1990.
ABERASTURY, A. KNOBEL, M. Adolescência normal:
um olhar psicanalítico. 10 ed. Porto Alegre: Ed. Artes
Médicas, 1992.
ATKINSON, L. D.; MURRAY, M. E.. Fundamentos de
Enfermagem: uma introdução ao processo de
enfermagem. Rio de janeiro: Ed. Guanabara, 1989.
CARVALHO, G.; MERIGHI, M. A. B.. Gravidez que
problema é esse?.São Paulo: Ed. Paulus, 2006.
HELMAN, C. G. Cultura Saúde e doença. Porto Alegre:
Ed. Artmed, 2003.
LOURO, G. L.; Gênero, sexualidade e educação: uma
perspectiva pós-estruturalista. Rio de Janeiro: Ed.
Vozes, 1997.
LOURO, G. L. O Corpo Educado: pedagogias da
sexualidade. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 1999.
MAINIERI, A. Sexo: será que já sabe de tudo. São
Leopoldo: Ed Sinodal, 1998.
MATOS, K. S. L. Juventude, professores e escola:
possibilidade de encontros. Ijui: Ed. Unijuí, 2003.
OSORIO, L. C. Casais e famílias uma visão
contemporânea. Porto Alegre: Ed. Artmed, 2002.
OSORIO, L. C. Família hoje. Porto Alegre: Ed. Artes
Médicas, 1996.
OSORIO, L. C. Adolescente hoje. Porto Alegre: Ed. Artes
Médicas, 1989.
OUTEIRAL, J. O. Adolescer estudos sobre a
adolescência. Porto Alegre: Ed. Artes Médicas, 1994.
POMMÉ, E. Gravidez na adolescência: muitas
histórias para compreender e lidar com a sua história.
São Paulo: Ed. Paulinas, 2003.
RICHARDSON, R. Pesquisa Social: métodos e técnicas.
3.ed. São Paulo: Ed. Atlas, 1999.
RODRIGUES, D. O adolescente hoje. Porto Alegre: Ed.
Artes e Ofícios, 2000. TAVARES, E. E. Adolescência:
60
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
entre o passado e o futuro. Porto alegre: Ed.Artes
eOficios, 1999.
TIBA, I. Puberdade e Adolescência: desenvolvimento
biopsicossocial. São Paulo: Ed. Agora, 1986.
TIBA, I. Adolescentes: quem ama educa. São Paulo:
Ed. Integrare Editora, 2005.
ZAGURY, T. O adolescente por ele mesmo. Rio de
Janeiro: Ed. Record, 1996.
61
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
O COTIDIANO DO FAMILIAR CUIDADOR DO
PACIENTE EM DIÁLISE PERITONEAL DOMICILIAR1
Luis Rafael Alfonço2
Paulo Alexandre Oliveira de Lima3
Vera Lucia Fortunato Fortes4
Universidade de Passo Fundo5
RESUMO
O paciente em diálise peritoneal domiciliar poderá
depender de um familiar para cuidá-lo. A cronicidade da
doença, a incerteza do futuro e a falta de preparo em
assumir o cuidado contínuo podem gerar angústia ao
familiar cuidador, acarretando impactos e reações
diferentes. Nesse sentido, pretendeu-se conhecer a
experiência do familiar cuidador do paciente renal crônico
em diálise peritoneal. Trata-se de estudo de abordagem
qualitativa, exploratório-descritivo, realizado com sete
familiares de pacientes em diálise peritoneal, escolhidos
intencionalmente entre pessoas de ambos os sexos,
maiores de 21 anos, que tivessem a responsabilidade de
cuidar de um doente da família há mais de seis meses. A
coleta de dados foi realizada mediante entrevistas semiestruturadas, cujo conteúdo foi analisado, obtendo-se duas
unidades de significação: “provisão do cuidado do paciente
em diálise” e “o cuidado ao cuidador do paciente em
diálise”. Apesar de o familiar que cuida sentir-se gratificado
e contar com alguma ajuda, ficou explícita a sobrecarga
imposta ao seu cotidiano. O apoio da equipe de
enfermagem ainda está aquém das necessidades que
permeiam o cuidado continuado, o qual está mais
direcionado ao paciente. Ao cuidador, a atenção volta-se
ao aprendizado da técnica da diálise e à prevenção de
intercorrências pertinentes ao tratamento.
Palavras chave: doença renal crônica, familiar,
cuidador.
ABSTRACT
The patient undergoing home peritoneal dialysis may
depend on a family member to look after him/her. The
disease chronicity, the uncertainty about the future and
the lack of knowledge to take continuous care may create
anguish to the caregiver, resulting impacts and different
reactions. In this sense, it is intended to learn the family
caregiver’s experience when looking after a chronic renal
patient undergoing peritoneal dialysis. It is a qualitative
approach study, exploratory-descriptive carried out with
seven family members of patients doing peritoneal dialysis,
randomly chosen, both genres, over the age of 21, who
have been looking after a sick family member for over six
months. The data collection was done through semistructured interviews, whose content was analyzed through
the narratives, two units of signification were obtained: “care
giving to the patient undergoing dialysis” and the care to
the patient’s caregiver”. Although the family caregiver gets
help and feels rewarded, there is an explicit overburden
imposed to his/her everyday life. The nursing team support
is still not sufficient to the needs that permeate the
continuous care, which is directed to the patient.
Concerning the caregiver, attention is paid to the learning
of the dialysis technique and the prevention of
complications pertaining the treatment.
Key words: chronic renal disease, family member,
caregiver.
1 INTRODUÇÃO
Insuficiência renal crônica (IRC) ou doença renal em
estágio terminal é a perda progressiva e irreversível da
função renal, levando à incapacidade do corpo em manter
o equilíbrio metabólico e hidroeletrolítico, resultando em
uremia ou azotemia. (SMELTZER, BARE, 2005). Embora
os rins sejam indispensáveis para a manutenção da vida,
sua capacidade funcional é largamente superior ao mínimo
necessário, permitindo que seres humanos e animais
sobrevivam com 10% ou menos de função renal. (ZATZ,
2003).
1
Trabalho desenvolvido na disciplina de Iniciação Cientifica em Enfermagem do curso de Enfermagem da Universidade de Passo Fundo
(UPF).
2
Acadêmico do IX semestre do curso de Enfermagem – UPF. lrafamac.yahoo.com.br
3
Acadêmico do IX semestre do curso de Enfermagem – UPF. [email protected]
4
Mestre em Assistência de Enfermagem pela UFSC. Professora Assistente II da disciplina de Saúde do Adulto II do curso de Enfermagem
– UPF. [email protected].
5
Universidade de Passo Fundo – Curso de Enfermagem – Campus II - Rua Teixeira Soares, 817 – Centro – CEP 99010- 080, e-mail:
[email protected]
62
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Com a confirmação da percentagem de perda da
função renal, institui-se o tratamento conservador ou terapia
renal substitutiva na forma de diálise ou transplante.
(FERMI, 2003). A modalidade de terapia renal, em primeira
mão, é indicação médica, podendo o enfermeiro avaliar as
condições que possibilitam a implementação da diálise
peritoneal.
Diálise peritoneal é um método que utiliza o peritônio
como membrana semipermeável para a depuração de
toxinas variadas, mantendo o paciente renal crônico livre
dos sintomas da uremia; remove para o dialisado toxinas
do sangue, incluindo uréia, creatinina, potássio, fosfato e
a água. A membrana peritoneal consiste numa superfície
de troca de solutos e água entre os capilares do interstício
peritoneal e a solução de diálise. Os mecanismos de
transporte peritoneal de água e solutos são a difusão e a
ultrafiltração osmótica. A primeira consiste no transporte
de solutos induzidos pelo seu gradiente de concentração
através da membrana peritoneal, ao passo que a segunda
realiza o transporte de solvente induzido pelo gradiente
osmótico, gerado pela alta concentração de glicose da
solução dialítica. (PECOITS-FILHO, 2003).
Existem duas principais modalidades de diálise
peritoneal, ambas necessitam de um cateter abdominal
para infundir e drenar a solução. Os processos de difusão
e osmose acontecem durante o tempo de permanência do
líquido na cavidade, podendo variar dependendo da
modalidade. Faz-se necessário para essas terapias de
substituição renal um treinamento pelo enfermeiro ao
paciente e ou familiar, cujo tempo depende da capacidade
de aprendizagem e da aderência ao processo educativo.
Todo o material necessário à diálise é fornecido pelo
Sistema Único de Saúde (SUS) ou por convênio do
paciente, assim como as bolsas e equipamentos
necessários. Necessita-se dispor de alguns recursos no
domicílio, incluindo água encanada, luz elétrica, local de
armazenamento e para troca de bolsas.
A principal complicação da diálise peritoneal é a
peritonite, caracterizada por dor abdominal, febre,
prostração, náuseas, vômitos, falta de apetite, além do
líquido turvo e demora na drenagem. As causas mais
freqüentes incluem erro na técnica durante a troca de bolsa
ou instalação na máquina, lavagem inadequada das mãos
e infecção prévia do orifício do cateter. (FIGUEIREDO,
1999).
Na diálise peritoneal, manual ou automatizada, a
presença da família é parte imprescindível no sucesso da
terapia, maior ainda quando o cuidado é realizado
exclusivamente por um ou mais membros dessa. O ideal
seria que o próprio paciente realizasse seu autocuidado,
porém por causas diversas ele está impossibilitado de
assumir autonomamente seu processo terapêutico que,
nesse caso, exige habilidade manual e uma boa
compreensão. Algumas limitações o impedem de realizar
as trocas das bolsas ou manuseio da cicladora, incluindo
idade avançada, diminuição da acuidade visual,
neuropatias, sofrimento psíquico ou instabilidades clínicas
relacionada à doença. (FORTES, 2000).
A família é considerada o hábitat natural da pessoa
humana, no qual ela se mostra como realmente é, sem
máscaras sociais, com o que as qualidades e defeitos
afloram (LEME, SILVA, 1996). “Pode ser definida
biologicamente, legalmente ou como uma rede social com
laços e ideologias pessoalmente construídos”.(POTTER,
PERRY, 1999. p. 444).
A família é a principal instituição social em que o
indivíduo inicia suas relações afetivas, na qual se criam
vínculos, adquirem-se valores. Essa relação familiar se
mostra de forma interligada, como se fosse a extensão
um do outro; assim, seus membros sofrem modificações
no modo de pensar e agir com o surgimento da doença
grave ou crônica. (ARAÚJO, NASCIMENTO, 2004).
Durante o processo educativo ao paciente e ou
familiar, além do procedimento técnico com as trocas de
bolsa ou manuseio de uma máquina, o enfermeiro enfatiza
a importância da higiene corporal, lavagem das mãos,
cuidados com o cateter e uso de máscara com o intuito
de prevenir peritonites.
Cuidador é aquele sujeito que presta cuidados a
pessoas com dificuldades ou impossibilitadas de se
autocuidar. (CARLETTI, REJANI, 1996). Quando o cuidador
é um familiar, o vínculo preexistente determina reações do
total envolvimento até o compromisso meramente técnico.
De qualquer forma, anos de dedicação ao cuidado de um
familiar doente em diálise tornam essa pessoa uma
cuidadora especial.
O serviço de diálise deve possuir um programa
sistematizado de treinamento com o objetivo de capacitar
o paciente ou familiar. Para isso, utilizam-se aulas
expositivas e materiais didáticos específicos que permitam
a compreensão do mecanismo fisiológico e técnico da
diálise peritoneal. O enfermeiro necessita estar apto a
trabalhar com pacientes e familiares com dificuldade de
lidar com a doença crônica e tratamento continuado, assim
como desenvolver habilidades no executante da técnica.
A dedicação e sensibilidade do profissional terão reflexo
no grau de aprendizado do paciente e familiar, promovendo
a adesão ao processo terapêutico.
A cronicidade da doença, a incerteza do futuro e a
falta de preparo em relação à técnica podem gerar uma
grande angústia ao familiar cuidador principal. Além disso,
a incorporação desse papel traz uma sobrecarga de
responsabilidades, mescladas ao envolvimento emocional
de ter um doente em casa e à responsabilidade com o
procedimento, o que traz uma série de impactos e reações
diferentes a cada familiar cuidador. O cuidador em diálise
peritoneal se torna responsável infinitamente pelo seu
familiar doente, mesmo que algum outro membro o auxilie.
Ele se insere no processo educativo, necessita dominar
uma seqüência técnica e, o que é mais importante,
63
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
compromete-se com o andamento da terapia, dia após
dia, ininterruptamente.
Nesse sentido, o enfermeiro necessita sensibilizarse quanto ao impacto que a doença trará sobre a vida do
familiar cuidador, pois o rigor técnico que a diálise requer
e a preocupação excessiva com o paciente sobrepõem-se
às suas próprias necessidades, ficando a vida do familiar
para um segundo plano.
Liell e Lipinski (2003) reiteram que a tarefa de cuidar
pode sobrecarregar o cotidiano, sendo de responsabilidade
da equipe de saúde atentar para esse problema. O
enfermeiro de diálise deverá antever a possibilidade desse
desgaste, sugerindo que o cuidador principal tenha o apoio
de outros co-partícipes.
Com base nesse referencial, emergiram os
seguintes pressupostos: a experiência de cuidar de um
familiar em diálise peritoneal traz conseqüências fortes na
vida do cuidador; quando o papel de cuidador é
desempenhado pela esposa é mais bem aceito; se durante
o processo de treinamento ocorresse a visita domiciliar, o
cuidador se beneficiaria com maior intensidade da ação
cuidativa de enfermagem. Norteado por esses
pressupostos, este estudo teve como objetivo conhecer
como se dá a experiência do familiar cuidador do paciente
renal crônico em diálise peritoneal com vistas à melhoria
da assistência domiciliar a esse cuidador.
2 METODOLOGIA
Estudo de abordagem qualitativa, exploratóriodescritiva. Segundo Minayo, este tipo de pesquisa
responde a questões particulares e subjetivas em níveis
que não podem ser quantificados, pois se aprofunda nas
ações e relações humanas (2002).
O estudo foi desenvolvido com a clientela de um
dos médicos nefrologistas que tinha pacientes em programa
de diálise ambulatorial num dos hospitais desta cidade,
pertencente à 6a Coordenaria Regional de Saúde.
A escolha dos participantes foi de forma intencional,
ouvindo um parecer do médico assistente que tinha seus
pacientes em programa diálise peritoneal, residentes no
município ou região. Foram incluídas pessoas de ambos
sexos, maiores de 21 anos, independentemente do nível
de instrução que estavam sob a responsabilidade de cuidar
de um doente da família há mais de seis meses e que
aceitaram participar da coleta de dados. Foram excluídas
pessoas que se encontravam em sofrimento psíquico e/ou
em uso de antidepressivo, em situação de luto há menos
de três meses e os entrevistados que tiveram seu familiar
doente presente no momento da entrevista. Após contato
telefônico, os familiares optaram pelo local da coleta de
dados, domicílio ou sala de espera da unidade de diálise.
Assim, foram entrevistados sete familiares
cuidadores de pacientes em diálise peritoneal, seis sob a
forma automatizada e uma de modalidade manual. As
entrevistas foram realizadas nos domicílios ou na sala de
espera da unidade de diálise, todas de forma individual,
sem a presença outras pessoas, durante os meses de
março e abril de 2007. Participaram três esposas, três
filhas e uma neta, com idades entre 25 e 53. Além de
cuidar do familiar doente, cinco delas desenvolvem
atividades fora do lar e duas se ocupam do serviço de casa;
quanto à escolaridade, apenas uma possui curso superior.
As demais, ensino médio completo. Quanto ao número de
filhos, variou entre nenhum e no máximo quatro.
Os dados foram coletados por meio de entrevistas
semi-estruturadas individualizadas, utilizando-se de uma
seqüência de perguntas preestabelecidas pelos
entrevistadores: “Por que o Sr(a) está nessa função de
cuidar do familiar em diálise?” “Como é para o Sr(a) cuidar
do seu familiar em diálise?” “Além de cuidar do seu familiar
em diálise, o que mais preenche o dia-a-dia?” “ Como esse
cuidado é visto pela família e amigos?” “Que tipo de cuidado
o Sr(a) percebe que a enfermagem tem com a pessoa que
se responsabiliza pelo familiar doente em diálise?”
Os dados foram analisados pelas narrativas.
Segundo Silva e Trentini (2002), a narração, como técnica
de investigação de enfermagem, parte do pressuposto de
que, ao exercer o cuidado e desenvolver pesquisa de
campo, precisa-se fazer interações sociais e ouvir com
atenção o que as pessoas têm a contar. Trata-se de uma
forma desafiadora de o pesquisador conhecer as
experiências vividas pelas pessoas e elucidar seus
significados potenciais por meio de uma interação entre
ouvinte-leitor, texto-narrativa.
O projeto de pesquisa observou os preceitos da
Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, tendo
sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade de Passo Fundo, sob protocolo n° 275/2006.
Recebeu autorização para o seu desenvolvimento da
instituição hospitalar e do médico assistente. Todos os
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido.
3 A EXPERIÊNCIA DE CUIDAR DE UM
FAMILIAR EM DIÁLISE PERITONEAL
O processo de análise iniciou após a transcrição
das falas a partir da realização das entrevistas, subsidiando
a estrutura de duas unidades de significação que compõem
a experiência de cuidar de um doente em diálise em casa
(SILVA, 2001).
3.1 PROVISÃO DO CUIDADO DO
PACIENTE EM DIÁLISE
Prover o cuidado à pessoa com doença renal crônica
em diálise peritoneal exige o envolvimento de, no mínimo,
duas vezes ao dia, razão por que o cuidador necessita
abster-se de outras atividades e dedicar-se exclusivamente
à execução de técnica, com domínio de uma habilidade e
64
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
rigor asséptico. Dessa forma, geram-se ao cuidador
sentimentos de recompensa pessoal e, paralelamente, um
acúmulo de funções cotidianas.
Valorização em cuidar
Após o convívio duradouro com uma pessoa, se num
determinado momento ela adoecer e necessitar de
cuidados domiciliares, a situação gera sentimento de
gratificação e orgulho no cuidador por existirem vínculos
familiares e laços sangüíneos. As falas traduzem esses
sentimentos de préstimos:
seu cotidiano. A sobrecarga de atividades é referenciada
pela maioria dos familiares cuidadores:
“...tinha dias que eu ia chorar escondida no banheiro,
secava o rosto e voltava como se nada tivesse acontecido”
“Não sobra tempo para mim: cuido da casa, das contas,
dos filhos, de uma neta de cinco anos e também quem
marca os exames sou eu.” (E1)
“Trabalhoso, não é fácil, pois existem mais coisas
que preciso resolver” “Trabalho, cuido de quatro filhos e da
própria casa.” (E3)
“Não é fácil, é uma tarefa árdua...”(E4)
“Sinto muito carinho em cuidar, tudo o que eu posso
fazer por ele eu faço. Não me sinto cansada em ajudar...
esse trabalho é muito valorizado” (E1)
“... já cuidava do avô que teve um AVC” (E2)
“.. .me deixa orgulhosa por aprender e desenvolver
um trabalho que é feito apenas por pessoas com estudo”
(E6)
“Sempre quis fazer enfermagem... busco saber
mais sobre o assunto.” (E7)
Pavarini et al. (2001) afirmam que mesmo diante da
necessidade de reorganização da vida em virtude do
compromisso de cuidar, existem fatores positivos na
relação entre cuidador e familiar, isto é, algumas interações
são consideradas agradáveis, gerando sentimentos de
prazer, conforto, orgulho e valorização.
Cattani e Girardon-Perlini (2004) apresentam
resultados de uma pesquisa com mulheres cuidadoras de
idosos dependentes, mostrando que os benefícios
pessoais relatados estavam relacionados ao crescimento
humano, auto-realização, senso de significado e
reciprocidade.
Sentir-se valorizado para cuidar parece ser um
atributo básico do cuidador, sentimento que o impulsiona
incondicionalmente ao cuidado e possibilita o enfrentamento
da rotina contínua e, por vezes, duradoura.
Sobrecarga e privação ao cuidar
Cuidar significa “ter zelo por; tomar conta de.” (LUFT,
2001, p.208). O cuidador, no caso do paciente renal, deve
zelar primordialmente pela acurácia da técnica da diálise
domiciliar e, paralelamente, não se abstém das
peculiaridades que envolvem o processo crônico. Também,
e mais importante, o cuidador tem vida própria, seus
compromissos e necessidades.
O cuidador do paciente em diálise realiza um trabalho
difícil, pois não estava preparado para enfrentar esta
situação, acumulando, além do cuidar, outras funções em
“...pensava que nunca iria aprender...” (E5)
Para Pavarini et al. (2001), cuidar de um parente
representa, indubitavelmente, um papel difícil, que
facilmente compromete o bem-estar do cuidador. Cattani
e Girardon-Perlini (2004), citando Silva, reiteram que o
esgotamento físico e emocional advindo do cuidado ao
familiar doente está associado a múltiplos fatores, pois,
além das tarefas rotineiras, sofre pressão cotidiana
decorrente do estado de saúde do doente, pela
dependência física e emocional.
Cuidar de um familiar doente no domicílio pode
causar incômodo, exaustão física e mental, pois a
preocupação com a doença do familiar não dá trégua,
preenchendo grande parte do seu dia, o qual é dividido
com outras atribuições, como a casa, filhos e trabalho.
Cattani e Girardon-Perlini (2004) descrevem que o cotidiano
do cuidado favorece o aparecimento de sentimentos de
insatisfação por parte do cuidador, e a manifestação do
seu descontentamento, entre outros motivos, pode produzir
situações de conflito entre ele e o familiar. Sentimentos
ambíguos podem rondar o cuidador, como compaixão pela
dependência e fragilidade e, paralelamente, aborrecimento
pela obrigatoriedade de atender o familiar doente.
A tarefa de cuidar faz o cuidador extenuar-se em
suas atribuições, gerando conseqüências em sua vida
pessoal e profissional. Pesquisa realizada no município
de Passo Fundo com cuidadores de idosos enfermos
mostra que cuidar interfere no trabalho fora de casa,
incluindo seu abandono (17,1%), impossibilidade ou
redução da jornada (11,4%), denotando que a obrigação
de cuidar dificulta a inclusão no mercado de trabalho e
diminui a renda familiar (PORTELLA et al., 2006).
Na mesma pesquisa os resultados apontam que
30% das cuidadoras não têm tempo para se cuidar; 38,6%
afirmam que cuidar deixa-as sempre cansadas; 35,7%
sentem-se deprimidas; 34,3% reduziram o tempo de lazer
e 24,3% percebem piora em sua saúde. A redução do lazer
e do convívio familiar/social interfere na vida particular dos
cuidadores porque eles deixam de cuidar de si e abdicam
65
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
de atividades prazerosas (PORTELLA et al., 2006). A fala
abaixo corrobora com a situação:
“Me privou de várias coisas, parei de trabalhar, me
anulei. Ele é agressivo (dependendo do dia), mal humorado.”
(E7)
Os efeitos mais contundentes na vida do cuidador
dizem respeito à sua vida pessoal, incluindo renunciar à
liberdade, aos compromissos e leva a rever prioridades,
obrigando-o a deixar em segundo plano a relação conjugal,
os filhos, a sexualidade e o trabalho.
3.2 O CUIDADO AO CUIDADOR DO
PACIENTE EM DIÁLISE
O cuidar da família
Percebe-se que alguns cuidadores se sentem
gratificados pelo reconhecimento de seus familiares, o que
os motiva à continuidade do cuidado e ao fortalecimento
dos laços afetivos entre os entes. A gratidão expressa pelos
cuidadores é representada por admiração, atitudes e auxilio
financeiro, como segue:
“....a família apóia, eles fazem você parecer uma
heroína, tenho um filho maravilhoso que sempre levanta o
meu astral ...(E1)
“Os familiares acham normal” (E2)
“ Apóiam, ajudam financeiramente. Vêem o esforço
que faço para cuidar dele, alguns ajudam a cuidar quando
é preciso, como em internações hospitalares.” (E4)
A pessoa que cuida de seu familiar enfermo espera
ter o reconhecimento e a apreciação no meio familiar e
social por todo esforço despendido. Estudo sobre as
repercussões na vida de um cuidador familiar mostra que
mais da metade sente que a tarefa de cuidar é valorizada
e apoiada pela família. (PORTELLA et al., 2006). Autores
apontam que os benefícios referidos pelos cuidados estão
ligados ao crescimento pessoal, senso de auto-realização,
significado e reciprocidade. No aspecto social os ganhos
se relacionam à valorização perante a sociedade, à
satisfação por cumprir normas e beneficiam as relações
familiares. (CATTANI e GIRARDON-PERLINI, 2004).
Por outro lado, alguns cuidadores se vêem solitários
no desempenho do cuidado, não contam com o apoio dos
demais familiares ou outras pessoas de seu ciclo de
relações, sentem-se exauridos no compromisso
continuado, sem ter com quem dividir o serviço, as
dificuldades e angústias. A indiferença por parte das
pessoas que rodeiam o cuidador parece desapontar de
maneira mais intensa do que a negação de ajuda
propriamente no cuidado.
“Vêem com indiferença, não interferem.” (E3)
“Acham complicado todos os cuidados que se deve
ter com o doente” (E5)
“A maioria pensa que é algo muito trabalhoso e
difícil” (E6)
“A minha família não aceita porque os filhos dele
não assumem o cuidado” (E7)
Cattani e Girardon-Perlini (2004), citando os estudos
de Karsch, explicitam que em algumas situações o assumir
a responsabilidade pelo cuidado não acontece por opção,
mas por indisponibilidade de outros possíveis cuidadores.
E quanto mais o cuidador se envolve, mais os nãocuidadares se desvencilham do cuidado, parecendo que
existem forças opostas: uma empurrando centripetamente
o cuidador para dentro da situação e a outra,
centrifugamente, remetendo os demais familiares para fora
da condição. Percebe-se que, passado algum tempo, o
compromisso de cuidar, que inicialmente parecia mais
fácil, torna-se mais extenuante, pois é ininterrupto,
impossibilitando ao familiar abster-se de sua obrigação e
descomprometendo seus pares.
Embora a família sofra com a situação de
adoecimento, espera-se que tenha forças para apoiar seu
familiar doente, tornando-se um aliado positivo ao paciente.
Por outro lado, observam-se reações familiares não
cooperativas, atribuídas às relações deterioradas antes do
aparecimento da doença (FELÍCIO, 2003). Quando o
cuidador tem apenas uma convivência com o cuidado,
desprovido de um relacionamento afetivo com o familiar
doente, geram-se implicações negativas neste (PEREIRA,
2004).
O papel do cuidador do paciente em diálise
peritoneal é de vital importância, pois a manutenção da
vida está na dependência do familiar para realizar os
procedimentos; a negligência provoca sintomas
desagradáveis, piora da uremia e complicações fisiológicas
graves e progressivas.
As ações da enfermagem
Observa-se pelas falas que há um certo descuido
por parte da enfermagem para com os cuidadores. Os
profissionais convergem todos os esforços em prol do
paciente renal crônico, esquecendo-se dos atores
responsáveis pelo cuidado.
“Ensinam e orientam bastante quanto aos cuidados
que se deve ter com o paciente, dedicam bastante atenção
ao familiar.” (E2)
66
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
“Tem muito cuidado com o paciente, cuidado com
o familiar não tem, acho que um cuidado psicológico deveria
ter.” (E3)
“O atendimento é sempre feito com prontidão quando
precisamos, para mim nunca foi preciso cuidado.” E4
“Acho que a enfermagem tem grande cuidado com
o paciente.” E5
“Não tive apoio, senti falta de alguém que me
explicasse mais sobre o cuidado do meu marido... falta
apoio psicológico.” (E7)
“Intensa dedicação da enfermeira durante o
treinamento, deixando seguro para fazer a diálise em casa.”
(E5)
O familiar que assume o papel de cuidador do
paciente em diálise peritoneal domiciliar na maioria das
vezes não está preparado para exercer essa função, e isso
não só em relação aos aspectos técnicos, mas quanto à
sua capacidade de confrontar-se com essa inusitada
situação de se dedicar ao cuidado com o familiar e procurar
manter as atividades do seu cotidiano. Ao identificar
situações na qual o familiar cuidador não sabe onde buscar
ajuda é que se faz importante o papel da enfermagem,
prestando-lhe muito mais que ensinamento e apoio técnico
para desempenhar o cuidado no domicílio, mas algo que
mostre uma preocupação real com esse familiar, visando
à promoção do seu bem-estar.
Quando o processo de diálise está iniciando, há
uma relação enfermeiro/cuidador-familiar mais ostensiva
em razão das ações educativas; no entanto, após estar
apto ao cuidado do paciente, o familiar também careceria
de uma assistência ao longo do tratamento.
principalmente no começo, e ainda tenho, tiveram
enfermeiras que vieram me dar apoio, e também a
psicóloga, mesmo após a perda do meu filho eles vieram
me visitar.” (E1)
Simpionato (2005) evidencia a importância de prover
a qualidade de vida e a promoção da saúde da família
cuidadora, mencionando a “enfermagem familiar” como
processo que inicia na avaliação da família por meio de
um levantamento de dados e o contínuo diagnóstico no
porvir da situação cuidativa. Observou-se nesse estudo uma
fragilidade no suporte ou rede social com a qual as famílias
têm contato, pois não estão sendo supridas todas as
necessidades de apoio. O plano de intervenções para essa
promoção da saúde deve ser realizado com diálogo
permanente entre seus membros, procurando contribuir
para seu desenvolvimento e não somente visar ao
aprendizado sobre o aparato tecnológico e processo
terapêutico.
4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O trabalho possibilitou imergir na realidade vivenciada
pelo cuidador do paciente em diálise peritoneal, tendo como
foco a pessoa que cuida, analisando a partir de suas falas
como se dá essa experiência, considerando os aspectos
de engrandecimento pessoal, sobrecarga física e mental,
apoio ou desamparo da família e a presença da
enfermagem.
Quanto aos pressupostos, o estudo confirmou que
a experiência de um familiar em diálise peritoneal trouxe
conseqüências contundentes na vida do cuidador,
independentemente do grau de parentesco. Nenhum
familiar referiu a visita domiciliar, pois não faz parte do
protocolo da unidade.
Seria adequado manter um seguimento de ambos
os envolvidos no processo, pois, ao acompanhar o cuidador,
possibilita à enfermagem prestar uma assistência efetiva
e proporcionar um acolhimento de forma digna, visando
colaborar com o familiar em seus conhecimentos e
habilidades para lidar com a demanda de cuidados que
lhe são exigidos. A relação entre enfermagem e cuidador
carece de um envolvimento maior entre ambos que
possibilite conhecer e vislumbrar as possibilidades que
esses possam oferecer em termos de necessidade e
expectativa (CATTANI; GIRARDON- PERLINI, 2004).
No contexto do estudo inexistem programas de
acompanhamento aos familiares, visto que são
considerados meros tarefeiros. Os enfermeiros parecem
despreocupados com as repercussões que a
responsabilidade do cuidar impõe à vida do cuidador. Há
uma escassez na oferta de serviços que atendam às
necessidades das famílias que se ocupam do cuidado,
pois, ainda, a única preocupação dos profissionais de
saúde é instrumentalizar os cuidadores no desempenho
da tarefa com o paciente. As capacitações ofertadas aos
cuidadores se tornam excelentes oportunidades para o
desenvolvimento paralelo de atividades que apóiem essas
pessoas que dividem prazeres e sofrimentos.
Constatou-se numa fala a existência de um maior
vínculo entre enfermagem/cuidador, em razão da história
pregressa desse familiar que tivera outro doente submetido
a tratamentos na mesma instituição, na qual se percebeu
uma diferenciação na atenção.
Outra possibilidade é a implementação de grupos
de apoio aos familiares que cuidam de paciente crônicos
ou específicos para os cuidadores em diálise peritoneal,
fóruns de convivências e trocas de experiências como
forma de ajuda mútua.
“Eu acho que o pessoal atende super bem os
familiares; para mim, é mais porque os funcionários já me
conhecem pelo tempo que estive no hospital... Obtive ajuda
No decorrer da pesquisa, observou-se uma
dificuldade em encontrar publicações de estudos voltados
ao cuidador em diálise, existindo uma oferta de trabalhos
67
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
que atende a outra demanda de cuidadores, tais como
idosos demenciados, seqüelados, oncológicos, entre
outros. Espera-se com esses resultados contribuam para
que a equipe de enfermagem em diálise transponha o seu
olhar ao familiar.
5 REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Jorgéria da S.; NASCIMENTO, Maria A. A.
Atenção da família frente ao processo saúde doença de
um familiar com câncer de mama. Rev Bras Enferm,.
Brasília, v. 57, n. 3, p. 274-278, maio/jun. 2004.
CARLETTI, Suzana M. Da M.; REJANI, Mirian I. Atenção
domiciliária ao paciente idoso. In: PAPALEO NETTO,
Matheus P. Gerontologia: a velhice e o envelhecimento
em visão globalizada. São Paulo: Atheneu, 1996p. 415430.
CATTANI, Roceli.B.; GIRARDON-PERLINI, Nara.M.O.Cuidar do idoso doente no domicilio na voz de cuidadores
familiares. Revista eletrônica de enfermagem, v.06,
n.02, 2004 disponível em www.fen.ufg.br. Acesso em: 4
abr. 2006.
FELÍCIO, Jônia L. As famílias de pacientes com doenças
crônicas e graves: funcionamentos mais característicos.
O Mundo da Saúde, v. 27, n. 3, p.426-31, jul./set. 2003.
FERMI, Marcia R. V. Manual de diálise para
enfermagem. Rio de Janeiro: Medsi, 2003.
FIGUEIREDO, Ana E. Diálise peritoneal ambulatorial
contínua: manual de orientação. Porto Alegre: Fotoletras,
1999.
FORTES, Vera L. F. Cotidiano da pessoa em tratamento
dialítico domiciliar: modos criativos de cuidar-se. 2000.
Dissertação (Mestrado em Assistência de enfermagem) –
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2000.
LEME, Luiz E. G.; SILVA, Paulo S. C. Idoso e a família.
In:PAPALEO NETTO, Matheus P. Gerontologia: a velhice
e o envelhecimento em visão globalizada. São Paulo:
Atheneu, 1996. p. 92-97.
LIELL, Márcia V. V.; LIPINSKI, Jussara M. Da prevenção
ao tratamento da úlcera de pressão – a família como aliada.
Revista Técnico-científica de Enfermagem, Curitiba,
v. 1, n. 2, p. 115-121, mar./abr. 2003.
LUFT, Celso P. Minidicionário da língua portuguesa.
20. ed. São Paulo: Ática, 2001.
MINAYO, Maria. C. S. et al. Pesquisa social: teoria,
método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2002.
PAVARINI, Sofia C. L; et al. De necessidades à intervenção:
etapas na organização de um serviço de orientação para
cuidadores de idosos. http://www.itoiu.ufrj.br/sempe/t1p27.htm Acesso em: 4 abr. 2006. Anais do IV Senpe Seminário de metodologia para projetos de extensão,
São Carlos 29-31 Ago. 2001.
PECOITS-FILHO, Roberto. Diálise peritoneal. In: RIELLA,
Miguel C. Princípios de nefrologia e distúrbios
hidroeletrolíticos. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2003, p. 919-928.
PEREIRA, Daiane. Os limites da educação do cuidador
de idoso dependente. In: BOTH, Agostinho; MAIAS, Luis
G.; GIUSTI, Ivanice (Org.). Os mais velhos .... em novos
tempos. Passo Fundo: Editora Berthier, 2004.
PORTELLA, Marilene R. et al. Cuidar de um familiar idoso:
repercussões no curso da vida. In: PORTELLA, Marilene
R.; PASQUALOTTI, Adriano; GAGLIETTI, Mauro.
Envelhecimento humano: saberes e fazeres. Passo
Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2006.
POTTER, Patrícia A.; PERRY, Anne G. Fundamentos de
enfermagem: conceitos, processo e prática. 4. ed. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999.
SILVA, Denise G. V. da. Narrativas do viver com diabetes
mellitus: experiências pessoais e culturais. Florianópolis:
UFSC/Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, 2001.
SILVA, Denise M. G. V.; TRENTINI, Mercedes. Narrativas
como técnica de pesquisa em enfermagem. Revista
Latino-Americana de Enfermagem, v. 10, n.3, p. 423432, maio/jun. 2002.
SIMPIONATO, Erica. A enfermagem familiar na
promoção da saúde de famílias de crianças com
insuficiência renal crônica. 2005. Dissertação (Mestrado)
- Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, 2005.
Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponíveis/
22/22133/tde-17022006-175912. Acesso em: 26 maio 2007.
SMELTZER, Suzanne C.; BARE, Brenda G. Brunner &
Suddarth: tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 10.
ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
ZATZ, Roberto. Insuficiência renal crônica. In: RIELLA,
Miguel C. Princípios de nefrologia e distúrbios
hidroeletrolíticos. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2003.
68
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
O PAPEL DO CUIDADOR NOS CUIDADOS AO
INDIVÍDUO PORTADOR DA DOENÇA DE ALZHEIMER
Ademir de Freitas1
Magna Denis Hoffmann2
Rafael Marcelo Soder3
ABSTRACT
RESUMO
A evolução da sociedade permitiu através de estudos
e pesquisas o aumento da expectativa de vida das pessoas
e, para tanto, garantir um envelhecimento com qualidade
de vida, tornando-se uma preocupação que atinge todas
as áreas da saúde; portanto, o envelhecimento faz parte
do ciclo da vida e com ele pode-se dizer que o indivíduo
adquire experiências, conhecimentos e vivências. Esta
bagagem que o indivíduo traz consigo deve ser respeitada,
mesmo que muitas vezes suas concepções sobre o mundo
estejam desatualizadas à época em que se vive, mas a
evolução do mundo como um todo é rápida; mudam-se
conceitos e teorias de um dia para outro, não se pode
querer que as pessoas acompanhem, aceitem e mudem
o seu comportamento.Este artigo centra-se no tema
assistência a idosos dependentes por doença crônica e
degenerativa, em atenção ao papel do cuidador. A
recomendação para que os cuidados aos idosos
dependentes sejam desenvolvidos no domicílio está
ganhando mais força, muitas vezes de maneira incauta
por parte dos profissionais de saúde. Delegar à família a
função de cuidar necessita de clareza sobre a estrutura
familiar, o tipo de cuidado a ser executado, o tempo
necessário, as características da doença e o
acompanhamento profissional. Com o intuito de contribuir,
este estudo contempla uma pesquisa qualitativa aplicada
aos cuidadores, procurando mapear, diagnosticar, prever
e contribuir com as deficiências que surgiram com esta
pesquisa. Segundo Smeltzer; Bare (2002), a demência é
uma síndrome adquirida na qual a deterioração progressiva
nas habilidades globais é de tal gravidade que interfere
com o desempenho ocupacional e social no cotidiano da
pessoa. As deficiências levantadas reafirmam a importância
de se manter o diálogo, a socialização de informações e a
busca por maiores conhecimentos, tanto dos cuidadores
como dos profissionais envolvidos de todas as áreas.
The society evolution allowed trough some studies
and researches the increase of people’s life expectation,
therefore, to guarantee a growing-older with life quality is a
concern that reaches all the health areas. To grow older is
a part of the life cycle, and with it we can say that a person
acquires experiences and knowledge. This life experience
has to be respected, even if, sometimes their conceptions
about the world are not updated at the age they live,
because the world evolution is quick and concepts and
theories are changed day by day and it is not fair to have
the people accepting, following and changing their behavior.
This article is centered on the topic old-aged attendance
affected by chronic and degenerative diseases detaching
the function of the people that take care of these elders.
According Smeltzer ; Bare (2002), madness is an acquired
syndrome in which progressive deterioration in global
abilities is so serious that interferes with the daily duties
and social performance of the person. The recommendation
that elders cares must be developed at home has gained
force lately, sometimes in a non prudent way by the
professional in health aiming to contribute this study
contemplates a qualitative research applied to the people
that care elders, searching to map, diagnose, foresee and
contribute with the deficiencies that appeared with this
research. To delegate families the function of care, needs
clearness about the family structure. Through this study
the raised deficiencies reaffirm the importance of
maintaining dialogue, information socialization and the
search of more knowledge by people who care elders as
well as professionals involved in other areas too.
Keywords: Elder health, Home cares in health,
Growing-older.
Palavras-chave: Saúde do Idoso, Cuidados
Domiciliares de Saúde, Cuidadores.
1
Enfermeiro, Pós-Graduado em Saúde Coletiva pela Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM
Enfermeira, Pós-Graduada em Saúde Coletiva pela Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM
3
Enfermeiro Docente da Curso Bacharelado em Enfermagem, Especialista em UTI, Mestre em Enfermagem pela UFRGS, membro do
GESC (Grupo de Estudos em Saúde Coletiva). [email protected]
2
69
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
1 INTRODUÇÃO
Com a evolução da sociedade, o processo do
envelhecimento vem sendo tema de vários debates e
discussões no âmbito social evidenciando as modificações
pelas quais o ser humano passa, repercutindo
significativamente na alteração do cotidiano das pessoas
idosas, muitas vezes acarretando perda da autonomia e
independência.
A freqüência das doenças crônicas e a longevidade
atual dos brasileiros são as duas principais causas do
crescimento das taxas de idosos portadores de
incapacidades. A prevenção das doenças crônicas e
degenerativas, a assistência à saúde dos idosos
dependentes e o suporte aos cuidadores e familiares
representam novos desafios para o sistema de saúde
instalado no Brasil.
Neste país, a velhice sem independência e
autonomia ainda faz parte de uma face oculta da opinião
pública. Vem sendo mantida no âmbito familiar dos
domicílios ou nas instituições asilares, dificultando a
visibilidade e, conseqüentemente, qualquer preocupação
política de proteção social.
A doença de Alzheimer faz parte do grupo das mais
importantes doenças comuns aos idosos que estão
relacionadas, desde os estágios precoces, com um declínio
progressivo funcional e uma perda gradual da autonomia
que, em conseqüência, ocasiona nos indivíduos por ela
afetados uma dependência total de outras pessoas. Muitas
vezes essa dependência cria um certo constrangimento
do idoso em relação à família ou a seu cuidador. A própria
maneira do conviver toma um novo rumo, sentir que não
consegue mais realizar as próprias atividades dá-se para
o idoso uma sensação de incapaz, o que
conseqüentemente pode levar o mesmo a desencadear
depressão (FREITAS et al. 2002).
O mesmo autor transcreve que a história da
descoberta da doença de Alzheimer ocorreu em meados
de 1906 e 1907, por Alois Alzheimer que comunicou o
primeiro caso da doença. Supôs-se que a desordem
estivesse restrita a formas graves de demência pré-senil
de evolução rápida, com presença abundante de placas
senis e de emaranhados neurofibrilares4. Com o passar
dos tempos, o conceito da doença de Alzheimer foi se
estendendo, confirmando que as formas pré-senil e senil
de demência apresentavam o mesmo substrato
neuropatológico. Diante dessa concepção mais
abrangente, a doença de Alzheimer passou a ser
considerada uma doença neurodegenerativa progressiva,
heterogênea nos seus aspectos etiológicos, clínico e
neuropatológico (FREITAS et al. 2002).
Na visão de Freitas et al.(2002), dados demográficos
e epidemiológicos indicam o envelhecimento populacional
em todo o mundo e o conseqüente aumento do número de
pessoas afetadas por demência em geral, e pela doença
de Alzheimer. Nos EUA, a doença de Alzheimer é a quarta
causa de óbito na faixa etária compreendida entre 75 e 84
anos de idade, e a terceira maior causa isolada de
incapacidade e mortalidade.
Ainda Freitas et al. (2002), expõe que as projeções
mais conservadoras de despesa ao ano em 2030, para os
EUA, somente com o cuidado direto desses pacientes,
atingirão cifras alarmantes de cerca de 30 bilhões de
dólares.
Em face deste quadro, Smeltzer; Bare (2002)
relatam que a doença de Alzheimer não é encontrada
exclusivamente em pacientes idosos. Em 1 a 10% dos
casos, seu início acontece na meia idade. Uma história
familiar da doença de Alzheimer e a presença da síndrome
de Down são dois fatores de risco estabelecidos para esta
doença. Quando um membro da família tem pelo menos
um outro parente com doença de Alzheimer, então se diz
que existe um componente familiar.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a
doença de Alzheimer atualmente atinge cerca de um milhão
dos 15 milhões de idosos brasileiros, uma prevalência ao
redor dos 7%, podendo a patologia se tornar epidêmica e
amplamente difundida nos próximos 20 anos.
Estudos revelam que cerca de 40% dos indivíduos
com 65 anos ou mais de idade precisam de algum tipo de
ajuda para realizar pelo menos uma tarefa como fazer
compras, cuidar das finanças, preparar refeições e
higienizar a casa. Uma parcela menor (10%) requer auxílio
para realizar tarefas básicas como tomar banho, vestir-se,
ir ao banheiro, alimentar-se, sentar e levantar de cadeiras
e camas (MEDINA, 1998). Segundo a pesquisa, estes
dados remetem à preocupação por mais de 6 milhões de
pessoas e famílias, e a um e meio milhão de idosos
gravemente fragilizados no Brasil, segundo a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2001 (IBGE,
2002).
Com a evolução da medicina, o prolongamento da
vida se tornou possível, mas este prolongamento significa
também desafios na continuidade da qualidade de vida,
pois pode trazer consigo o desenvolvimento de
multipatologias com o passar do tempo, entre elas a doença
de Alzheimer.
Segundo Forlenza (2002), a doença de Alzheimer é
a principal causa de declínio cognitivo em adultos,
sobretudo idosos, representando mais da metade dos
casos de demência. A idade é o principal fator de risco,
4 É uma estrutura intracelular decorrente da acumulação dos pares de filamentos helicoidais e reagrupados em um espesso feixe de
fibrilas (MARQUES, 1997 , p. 122).
70
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
sua prevalência passa de 0,7% aos 60 – 64 anos de idade
para cerca de 40% nos grupos etários de 90 – 95 anos,
revelando a magnitude do problema no Brasil, onde já vivem
cerca de quinze milhões de indivíduos com mais de 60
anos.
Para Smeltzer; Bare (2002), o envelhecimento
intrínseco, a partir da própria pessoa se refere àquelas
alterações provocadas pelo processo normal de
envelhecimento, as quais são geneticamente programadas
e quase universais dentro da espécie. A universalidade é o
principal critério a ser utilizado na diferenciação entre o
envelhecimento normal e anormal. O envelhecimento
extrínseco resulta das influências externas à pessoa.
Enfermidades e doenças, a poluição do ar e a luz solar
constituem exemplo de fatores extrínsecos que podem
acelerar o processo do envelhecimento.
Esses processos de envelhecimentos anormais
podem ser eliminados ou reduzidos através das
intervenções efetivas de cuidados de saúde na saúde do
cuidador, criados durante o processo de assistência
prestada. Por tudo isso, a doença de Alzheimer é
reconhecida, a exemplo de outras demências, como um
importante problema de saúde pública em todo o mundo.
Ainda, segundo Smeltzer; Bare (2002), a demência
é uma síndrome adquirida na qual a deterioração
progressiva nas habilidades globais é de tal gravidade que
interfere com o desempenho ocupacional e social no
cotidiano da pessoa. As demências se caracterizam por
um declínio geral no funcionamento intelectual, o que pode
incluir as perdas de memória da capacidade de raciocínio
abstrato, do julgamento e da linguagem. Ocorrem
alterações da personalidade e a capacidade de realizar
atividades da vida diária se deteriora com o passar do tempo.
A demência é suspeitada quando a pessoa apresenta um
declínio substancial na memória e outras alterações na
cognição ou ambos.
Em geral, os sintomas são sutis no início e, com
freqüência, progridem lentamente, até que se tornam
evidentes e devastadores. Essas alterações características
da demência recaem em três categorias gerais: cognitiva,
funcional e comportamental. As causas reversíveis de
demência incluem o alcoolismo, o uso de medicamentos
(polifármacos), os distúrbios psiquiátricos e a hidrocefalia
com pressão normal.
A doença de Alzheimer é um distúrbio
neurológico, degenerativo, progressivo e
irreversível, que começa de maneira insidiosa
e se caracteriza por perdas graduais da função
cognitiva e por distúrbios no comportamento e
afeto (SMELTZER; BARE, 2002, p.152).
A experiência da doença pode vir acompanhada de
uma mudança para um novo ambiente, pois alguém terá
de ajudar este indivíduo em suas atividades do dia-a-dia.
Muitas vezes são os familiares os cuidadores ou então
pessoas que prestam serviços de cuidado. Para Liorente
(2001), situações como estas podem revelar a vivência de
sentimentos de ansiedade, raiva, negação, tristeza,
desesperança, culpa, regressão ou confusão. Para a autora,
a pessoa perde o controle de sua vida, tendo dificuldades
em resolver os seus problemas e em tomar decisões,
podendo apresentar sentimentos de medo, solidão, sentir
dor, ser dependente e de morrer.
Diante da constatação da necessidade de cuidados
especiais ao ente familiar, a família constitui papel
principal, tendo que fornecer um sistema de suporte para
o portador da doença de Alzheimer, disponibilizando
pessoas e mecanismos que sirvam de suporte para as
dificuldades do processo de aceitação de uma nova rotina
de cuidados para com este familiar.
2 PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS
O presente estudo foi desenvolvido com os
cuidadores de pessoas portadoras de doença de Alzheimer
em município no interior da região Noroeste do Rio Grande
do Sul. Os dados foram coletados por meio de uma
entrevista com oito cuidadores de idosos com doença de
Alzheimer auxiliados por um formulário estruturado com
questões abertas a fim de atingir os objetivos da pesquisa.
Para Haghete apud Santos; Luis (1999, p.34), “a entrevista
consta de um processo de interação social entre duas
pessoas, em que aquele que faz a entrevista visa à
obtenção de informações do outro (entrevistado)”.
A escolha dos oito entrevistados se deu após uma
conversa com o médico do Programa de Saúde da Família
de um município do Noroeste colonial do Rio Grande do
Sul, pois o mesmo realizou as indicações através dos
diagnósticos feitos por ele mesmo, através de sinais e
sintomas e acompanhamento que o mesmo vem realizando
há mais de cinco anos.
Nina (1983) citada por Minayo (1993, p. 122),
costuma definir a entrevista aberta como “conversa com
finalidade”, cujo roteiro serve de orientação, de baliza para
o pesquisador e não de cerceamento da fala dos
entrevistados.
Procurando preservar o anonimato dos entrevistados
e garantir o sigilo das respostas, os participantes foram
designados pelos pesquisadores como sujeitos 1, 2, 3
sucessivamente, assegurados também que os mesmos
estavam cientes que poderiam desistir de participar a
qualquer momento, conforme dispõe a Resolução Nº 196,
de 1996 do Conselho Nacional de Saúde que regulamenta
as pesquisas envolvendo seres humanos.
A amostragem foi composta por cuidadores de
pessoas portadoras da doença de Alzheimer no período de março
a maio de 2006, que aceitaram participar do estudo.
71
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Face à natureza do fenômeno estudado e do objetivo
proposto, optou-se pela metodologia qualitativa. Segundo
Polit, Beck e Hungler (2004),
os pesquisadores que se apóiam no
paradigma
naturalista
enfatizam
a
compreensão da experiência humana como é
vivida, através da coleta e da análise de
materiais subjetivos, narrativos, usando
procedimentos flexíveis que evoluem no
campo; este paradigma está associado com a
pesquisa qualitativa (p. 40).
As mesmas autoras referem ainda que “[...] os
resultados da pesquisa qualitativa são tipicamente
baseados nas experiências da vida real de pessoas [...]”
(p. 30). As pesquisas qualitativas, para Minayo (1993), “são
aquelas capazes de incorporar a questão do significado e
da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações
e às estruturas sociais” (p.10).
A investigação foi baseada na pesquisa do tipo
exploratória descritiva, referida por Polit, Beck e Hungler
(2004, p.38) “[...] a pesquisa exploratória investiga a sua
natureza complexa e os outros fatores com os quais ela
está relacionada”.
Para a tabulação dos dados, optou-se pela análise
de conteúdo que, para Minayo (1993, p.198), poderia ser
um termo genérico a ser usado para caracterizar o
tratamento dos dados; no entanto, “[...] trata-se de um
conceito historicamente construído, com implicações
teórico-metodológicas e em oposição a outros conceitos”.
3 O CUIDADO DISPENSADO PELOS
CUIDADORES: UMA TROCA DE CARINHO
CONSTANTE
Na perspectiva de estudar as relações de cuidados
entre os cuidadores, buscou-se contato com os possíveis
participantes do estudo, que foram interrogados quanto
ao interesse de participar da pesquisa. Aqueles que
aceitaram, fizeram parte da população do estudo. Foi
atribuído um nome fictício a cada participante com o
objetivo de garantir o anonimato. Desta forma, elaborouse um questionário com perguntas abertas aos cuidadores
dos indivíduos portadores da doença de Alzheimer. Este
questionário foi aplicado de forma oral em seus locais de
trabalho.
Quando questionados em relação ao seu
conhecimento frente à patologia, os entrevistados
responderam que não têm conhecimento científico sobre
a doença. Em relação aos sintomas, os entrevistados
responderam que sabem que a doença leva o portador ao
esquecimento e que percebem sinais evidentes
característicos da demência, tais como a diminuição da
capacidade de memória quanto a fatos e acontecimentos
recentes, não lembrava da última refeição realizada, de
seus objetos pessoais, localização de seu leito e
sanitários.
Sujeito 2
Sujeito 4
Sujeito 6
“[...] percebo que eles são bastante
esquecidos...não se lembram do que
falamos há 5 minutos [...]”
“[...] temos que encaminhá-los aos seus
leitos quase todas as noites [...]”
“[...] temos que administrar a vida deles [...]”
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Figura 1: Conhecimento sobre a doença
Em caso de incapacidade, a dependência é a
necessidade de o indivíduo recorrer à ajuda humana e/ou
técnica para realizar as atividades da vida diária. A
dependência também é um processo dinâmico que pode
ser modificado ou prevenido se houver ambiente e
assistência adequados. Muitos estudos usam a
dependência (ter a ajuda de alguém para realizar uma
atividade) como um indicador de incapacidade. Verbrugge;
Jette (1994, p. 38) propõem um modelo do processo de
tornar-se incapaz, em que categorizam os fatores de risco
para incapacidade em: (1) predisponentes (fatores de risco
existentes antes do processo de incapacidade ser
instalado); (2) intra-individuais (estilo de vida, atributos
psicossociais, mudanças de comportamento, maneiras de
lidar com as dificuldades e com as modificações de
atividades que podem afetar o processo de incapacidade);
e (3) extra-individuais (suporte social, intervenções de
serviços de saúde e de reabilitação, uso de medicamentos,
suportes externos e o ambiente físico e social).
O envelhecimento faz parte do ciclo da vida e com
ele pode-se dizer que o indivíduo adquire experiências,
conhecimentos e vivências. A bagagem que o indivíduo traz
consigo deve ser respeitada, mesmo que muitas vezes
suas concepções sobre o mundo estejam
descontextualizadas à época em que se vive. A evolução
do mundo como um todo é rápida. Mudam-se conceitos e
teorias de um dia para outro, não se pode querer que as
pessoas acompanhem, aceitem e mudem o seu
comportamento.
Os pesquisados, quando perguntados, identificavam
em algum ou alguns dos idosos os sintomas desta doença.
Todos foram unânimes em responder que sim, evidenciado
pelas falas:
sujeito 1
“[...] eles são esquecidos [...]”
sujeito 5
“[...] não recordam o que
fizeram minutos atrás [...]”
“[...] a gente percebe que eles
não buscam nenhum tipo de
informação [...]”
sujeito 3
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Figura 2: Identificação dos Sintomas
O esquecimento se manifesta em muitas ações
diárias desses indivíduos. Podem perder sua capacidade
de reconhecer faces, lugares e objetos familiares e ficar
perdidos no ambiente familiar, repetindo a mesma história
várias vezes porque esquecem de tê-las contado.
A expressão clínica da doença de Alzheimer se
caracteriza pela progressiva decadência das funções
72
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
cognitivas e por uma grave redução da autonomia pessoal
e da adequação do comportamento. Atualmente, esta
doença de Alzheimer ainda não tem cura, mas é possível
minimizar os seus sintomas desagradáveis, permitindo que
o portador mantenha uma boa qualidade de vida.
Segundo Freitas et al. (2002), os recentes avanços
no entendimento da complexa fisiopatologia da doença, a
maior conscientização e envolvimento da sociedade, as
possibilidades de diagnósticos cada vez mais precoces e
precisos, os processos científicos na descoberta de novos
tratamentos de eficácia comprovada e a proliferação de
grupos de apoio são alguns dos motivos que permitiram o
surgimento de boas perspectivas, que se contrapõem às
tradicionalmente sombrias, relacionadas com a doença de
Alzheimer.
O cuidador tem papel fundamental na qualidade de
vida do indivíduo portador da doença de Alzheimer. É ele
quem pode facilitar ou dificultar o dia-a-dia deste. A partir
do momento em que o cuidador busca ou recebe
orientações específicas sobre o entendimento da
manifestação e evolução da doença, este consegue criar
alternativas em sua atividade, de modo a manter o indivíduo
com sentimentos de bem-estar, fazendo com que este não
sofra por causa da doença. Dependendo da habilidade e o
comprometimento do cuidador para com o portador desta
patologia, o portador da doença de Alzheimer pode levar
uma vida normal, com limitações sim, de memória e de
algumas atividades que a exijam, mas nunca sem ter o
prazer de viver.
Indagados em relação ao diagnóstico clínico,
responderam que não tinham conhecimento, apenas
suspeitas, e outros disseram que sim, ou seja, existia o
diagnóstico médico. Questionados de como promovem o
cuidado a estes indivíduos portadores da doença de
Alzheimer, os pesquisados declararam ter amor pelo que
fazem, falaram de carinho e dedicação, além de muita
paciência.
sujeito 1 “[...] tenho amor no que
faço [...]”
sujeito 2 “[...] me dedico porque
sinto carinho por eles [...]”
sujeito 3 “[...]
é
preciso
ter
paciência para lidar com
eles [...]”
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Para os autores citados, os cuidadores participam
menos de atividades sociais, têm mais problemas no
trabalho e apresentam maior freqüência de conflitos
familiares, freqüentemente tendo como foco a forma como
eles cuidam do parente comum. Apesar dessas
constatações, algumas pessoas são capazes de enfrentar
mais adequadamente as situações estressantes
decorrentes do cuidado prestado. Assim, para propor
intervenções, é necessário identificar a variabilidade das
respostas aos estressores para se promover programas
que possam ajudar a limitar o impacto que o cuidar pode
trazer ou ajudar a identificar e aumentar fatores que possam
mediar e reduzir o impacto.
Quando perguntados se receberam orientações
sobre a doença e o melhor modo de prestar cuidados,
todos disseram que não receberam treinamento algum e
que aprenderam “cuidando” no dia-a-dia. No entanto, a
Política Nacional de Atenção à Saúde dos Idosos
recomenda que essas pessoas devem também receber
cuidados especiais, considerando que “a tarefa de cuidar
de um adulto dependente é desgastante e implica riscos
de tornar doente e igualmente dependente o cuidador”.
Portanto, sugere-se que estes profissionais cuja capacidade
funcional pode estar, de certa forma, comprometida e
requer orientação, informação e assessoria de
especialistas.
Cerqueira e Oliveira (2002) sugerem que a
experiência pessoal e a visão que os profissionais de saúde
têm sobre o cuidado com idosos devem ser examinadas,
pois podem interferir no julgamento profissional, uma vez
que muitos valores interferem nas decisões de como, onde
e até quando cuidar do idoso. Assim, como recomenda
este autor, o profissional que pretende trabalhar com
cuidadores deverá ter entre suas habilidades e
conhecimentos a familiaridade com os transtornos comuns
do envelhecimento e com suas possibilidades de
tratamento, informações sobre diagnóstico e avaliações
dos transtornos do envelhecimento, conhecimento sobre
as disponibilidades dos serviços de saúde para o idoso
doente, habilidades clínicas que permitam tanto prover
orientação relativa ao comportamento do idoso como
aquelas que permitam levar o cuidador a identificar
sentimentos e comportamentos relativos ao idoso,
compreendê-los e/ou modificá-los, de modo a resultar em
melhora de sua qualidade de vida, e de sua relação com o
idoso, com outros familiares e com pessoas do seu
convívio.
Figura 3: Procedimentos referentes ao cuidado
Esse tipo de questionamento pretende permitir a
expressão de sentimentos, estimular o compartilhar de
experiências, o relato de dificuldades, bem como oferecer
acolhimento para os sentimentos e para as dificuldades
relatadas, além de orientações e sugestões para lidar com
elas. Cerqueira; Oliveira (2002), relatam que cuidadores
apresentam taxas mais altas de depressão e outros
sintomas psiquiátricos e podem ter mais problemas de
saúde que pessoas com a mesma idade que não são
cuidadores.
Quando questionados se desenvolvem alguma ou
algumas atividades específicas com o indivíduo portador
da doença de Alzheimer, se desenvolvem, quais são,
responderam:
73
sujeito 1
sujeito 2
sujeito 3
sujeito 4
“[...] levo passear [...]”
“[...] sento e tomo chimarrão [...]”
“[...] escuto o que ela fala [...]”
“[...] não faço nada [...]”
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Figura 4: Atividades realizadas com os portadores
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Diante de tais afirmativas, percebe-se que os
cuidadores não têm a preocupação e nem mesmo
criatividade para desenvolver atividades que distraiam ou
mesmo estimulem o raciocínio dos idosos. O
envelhecimento populacional nos países em
desenvolvimento, entre eles o Brasil, tem colocado o
desafio de enfrentar essa nova realidade com soluções
criativas e viáveis, especialmente nos países do terceiro
mundo. Esse envelhecimento tem exigido respostas no
que diz respeito especialmente às políticas de saúde e
políticas sociais dirigidas à população idosa, com o intuito
de preservar sua saúde e qualidade de vida, bem como de
atendê-la em suas doenças.
Pensa-se, então, no indivíduo portador da doença
de Alzheimer que praticamente vive em época passada
devido a sua doença neurodegenerativa progressiva. Não
é simples para ele aceitar o que se passa ao seu redor,
muitas vezes sem nenhuma explicação dos
acontecimentos e fatos. Neste momento é que se destaca
o papel do cuidador em propiciar uma qualidade de vida a
este portador, tendo a paciência de lhe explicar os
acontecimentos, mesmo que por diversas vezes, sem
deixar o indivíduo ansioso ou triste com a manifestação
dos sintomas de sua doença. O cuidador deve ser também
um pesquisador curioso na busca de alternativas que
favoreçam o bem estar de seu cliente.
Questionados e desafiados quanto ao interesse e
tempo disponível para conhecer um pouco mais sobre a
doença de Alzheimer, foram unânimes e de pronto
responderam:
Sujeito 1 “[...] sim, gostaria muito [...]”
Sujeito 2 “[...] interesse eu tenho e tempo a gente arruma [...]”
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na perspectiva de buscar um modelo de cuidado ao
portador da doença de Alzheimer através da observação
das famílias dos mesmos, deve-se constantemente avaliar
e discutir as práticas para que as atividades sejam
desempenhadas com técnica, dedicação, respeito e
responsabilidade perante as pessoas cuidadas. Emerge a
preocupação de criar um modelo de cuidado que seja
comprometido com o trabalho dos cuidadores para garantir
a melhoria da qualidade ao atendimento prestado aos
mesmos.
Ao analisar as percepções dos cuidadores de
pessoas portadoras de demência de Alzheimer em um
município do Noroeste colonial do Rio Grande do Sul,
procurou-se detectar as deficiências e dificuldades
encontradas pelos familiares em cuidar dos mesmos, com
o intuito de contribuir para uma nova discussão em relação
aos serviços prestados por seus familiares.
Na execução das atividades realizadas por seus
cuidadores no dia-a-dia deve-se avaliar suas ações,
reestruturar seus conhecimentos e incentivar a capacitação
dos mesmos para que, com a maior bagagem de
conhecimentos, seja possível o oferecimento de melhores
condições de saúde aos mesmos.
Através da pesquisa pode-se verificar que a
estimulação necessária ao paciente é praticamente
insignificante pela falta de conhecimento e orientação dos
cuidadores, o que proporciona o desabrochar de ações
que venham a sanar as deficiências encontradas.
Sujeito 3 “[...]é claro que tenho interesse, imagina [...]”
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Figura 5: Interesse em conhecer a doença
Provocados a falar sobre seus sentimentos em
relação ao cuidado que deve ser dispensado aos idosos
doentes ou não, demonstraram o que a bibliografia aponta,
ou seja, os cuidadores realmente necessitam
monitoramento permanente e acompanhamento de
profissionais especialistas para, assim, evitar que
desenvolvam doenças, bem como qualificar o atendimento
aos idosos, expressado da seguinte forma:
Sujeito
Sujeito
Sujeito
Sujeito
Obs:
1
2
3
4
“[...] Não é fácil cuidar de uma pessoa assim doente [...]”
“[...] Precisa tempo e paciência [...]”
“[...] Tem que ser bom para essa pessoa [...]”
“[...] Eles não têm culpa de ser assim [...]”
“[...] Outras 4 pessoas não opinaram [...]”
Fonte: Freitas; Hofmann; Soder, 2006.
Figura 6: Sentimentos diários do cuidador
Assim, pode-se antever que a função de prevenir
perdas e agravos à saúde deverá abranger, igualmente, a
figura do cuidador e, para tanto, devem ser desenvolvidos
programas destinados a prevenir a sobrecarga e o impacto
emocional negativo que podem afetar a saúde e qualidade
de vida de cuidadores de idosos e de outras pessoas
dependentes.
Diante da problemática, sugere-se elaborar um
programa de apoio aos cuidadores, o qual tem como
objetivos preservar a qualidade de vida dos mesmos e
proporcionar melhores condições de atendimento familiar
aos pacientes. O programa consta de 02 reuniões
semanais, com duas horas de duração, coordenadas por
uma equipe multiprofissional composta de enfermeiro,
psicólogo, médico e assistente social.
Uma atenção especial aos dados coletados
oportuniza um novo enfoque e um novo modelo de
proporcionar o cuidado que pode ser baseado em técnicas
psicodramáticas focalizando o papel do cuidador e suas
decorrências sociais e emocionais. Ao profissional de
saúde pode ser possível a socialização de informações
teóricas vinculadas por meio de discussões em grupo e
recursos audiovisuais, possibilitando a solução de
problemas do fazer diário. E, ainda, serem abordados
alguns temas, tais como: significado e motivações do
cuidado prestado, sinais de alerta de desgaste físico e
mental do cuidador, possibilidades de se cuidar e solicitar
ajuda, formas de melhorar a comunicação diante da
deficiência visual, auditiva e cognitiva, formas de favorecer
a independência e autonomia e de lidar com os problemas
74
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
relativos à higiene, mobilidade, agressão, irritação,
alucinações e idéias delirantes do idoso; enfim, sempre
mantendo o objetivo principal em foco que é proporcionar
uma melhor qualidade de vida ao paciente e também ao
seu cuidador.
5 REFERÊNCIAS
BRASIL-Ministério Da Saúde. Política nacional de
atenção à saúde dos idosos. Documento disponível no
site do Ministério da Saúde, (2000) Brasil: http://
www.saúde.gov.br.
CERQUEIRA, Ana Teresa de Abreu Ramos; OLIVEIRA,
Nair Isabel Lapenta de. Programa de apoio a
cuidadores: uma ação terapêutica e preventiva na
atenção à saúde dos idosos. Psicol. USP., São Paulo,
v. 13, n. 1, 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br>
IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística), 2002. Dados sobre População do Brasil,
PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios)
2001. 27 Julho 2002 <http://www.ibge. gov.br>.
FORLENZA, O.V.; Doença de Alzheimer. In BRASIL,
Ministério da saúde; Manual de condutas médicas.
Brasília: Ministério da Saúde, 2002.
FREITAS, E. V.; et.al; Tratado de geriatria e
gerontologia. Rio de Janeiro: Guanabara koogan, 2002.
GIACOMIN, Karla C., UCHOA, Elizabeth, FIRMO, Josélia
O. A. et al. Projeto Bambuí: um estudo de base
populacional da prevalência e dos fatores associados
à necessidade de cuidador entre idosos. Cad. Saúde
Pública. [online]. 2005, vol. 21, no. 1 [citado 2006-08-25],
pp. 80-91. Disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102LIORENTE P.; RUIPÉREZ I.; Geriatria. Rio de Janeiro:
McGraw-Hill, 2000.
MARQUES, P. R. de B Demência do tipo Alzheimer,
diagnóstico tratamento e aspectos sociais Recife:
Sulina, 1997.
MEDINA, C.; SHIRASSU, M. & GOLDFEDER, M., 1998.
Das incapacidades e do acidente cerebrovascular. In:
Envelhecimento com Dependência: Revelando
Cuidadores (U. Karsch, org.), pp. 199-214, São Paulo:
EDUC.
MINAYO, Maria Cecília de Souza, O Desafio do
Conhecimento – Pesquisa Qualitativa em Saúde . 2ª ed.
Rio de Janeiro: Hucitec – Abrasco, 1993.
POLIT, Denise I.; BECK, Cheryl tatano; HUNGLER,
Bernardete P. Fundamentos de Pesquisa em
Enfermagem, Porto Alegre: Art Med, 2004.
SANTOS, Sandra Sueli Celano; LUIS, Margarita Antonia
Villar, A relação da Enfermeira com o Paciente
Cirúrgico. Goiânia: AB, 1999.
SMELTZER, S. C.; BARE, B. G.; Tratado de
Enfermagem Médico-Cirúrgica. 9ªed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2002. v. 1.
75
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
PERCEPÇÕES DE CASAIS COM INFERTILIDADE
Vanessa Taís Hünemeier 1
Jane Lílian Ribeiro Brum2
Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM3
RESUMO
Segundo Farinati; Rigoni; Müller (2006, p. 21):
Este artigo tem por objetivo conhecer as percepções
de casais com infertilidade e o impacto que este causa
em suas vidas. Pode-se evidenciar que no momento em
que um casal descobre a infertilidade, simultaneamente
ocorre uma situação de frustração que desencadeia
diversos sentimentos, como de perda, de solidão, de
incapacidade e de insegurança. Diante deste problema de
saúde e do preconceito gerado sob o casal acometido,
torna-se difícil a convivência, gerando conflitos nos âmbitos
físicos, psicológicos e sociais e ao mesmo tempo
favorecendo a união do casal.
[...] é estimado que entre 60 e 80 milhões de
pessoas em todo o mundo enfrentam
dificuldades para levar seu projeto de
paternidade e maternidade em suas vidas e
calcula-se
que
esse
índice
atinja
aproximadamente 20% dos casais em idade
reprodutiva. No ano de 2000, cerca de 5,0 a 6,3
milhões de mulheres nos Estados Unidos
apresentaram problemas com infertilidade,
estima-se para 2025 um aumento desse índice
para 5,4 a 7,76 milhões. No Brasil os dados
referentes aos casais com infertilidade não são
diferentes dos outros países. O índice dos
casais com infertilidade é de 1 a cada 10.
Palavras-chaves: Infertilidade. Sentimento.
Enfermagem.
ABSTRACT
This article has as its main purpose to know the
perceptions of couples with infertility and the impact that
this causes in their lives. It can be evidenced that at the
moment in which a couple find out the infertility, a frustration
situation simultaneously occurs that unchains a lot of
feelings as loss, loneliness, incapacity and insecurity.
Before this health problem and the prejudice generated
under the assaulted couple, the house holding becomes
difficult generating conflicts in the physical, psychological
and social scopes and at the same time favoring the union
of the couple.
Key words: Infertility – Feeling - Nursing
1 INTRODUÇÃO
Desde criança, as pessoas têm em suas mentes
um cronograma já programado sobre sua vida. Pensam
em arrumar um príncipe ou uma princesa, casar, formar
uma nova família, ter filhos, vê-los crescer e assim
sucessivamente. Alguns casais não conseguem vivenciar
esta realidade.
Considera-se infertilidade após um ano de relações
sexuais desprotegidas entre o casal, ou seja, um ano sem
uso de métodos anticoncepcionais, sem gravidez natural.
Quanto à infertilidade, esta pode ser de dois tipos: a primária
e a secundária. A infertilidade primária se refere àquelas
pessoas que nunca conceberam, enquanto a infertilidade
secundária se refere àquelas pessoas que já conceberam
alguma vez, mas que atualmente não consegue engravidar
(PIVA, 2002).
A infertilidade gera variadas respostas emocionais
tanto em homens como em mulheres. São comuns vários
sentimentos, como de perda, de inferioridade, de culpa. O
estresse também tem influência sobre a infertilidade
variando conforme sua condição socioeconômica, assim
como outros fatores, a idade, a história pessoal, até o
estágio de investigação ou tratamento e a duração da
infertilidade.
Diante desta realidade, evidenciou-se a necessidade
de buscar informações que possam ajudar a entender as
percepções dos casais que sofrem com a infertilidade,
1
Acadêmica do 8° semestre do curso Bacharelado em Enfermagem – SETREM, e-mail: [email protected]
Mestre em Enfermagem Obstétrica, Docente do Curso Bacharelado em Enfermagem SETREM, e-mail: [email protected]
3
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e-mail: [email protected]
2
76
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
assim como as dificuldades enfrentadas pelos mesmos
no tratamento.
Desse modo, buscaram-se informações acerca das
percepções vividas pelos casais que sofrem com
infertilidade bem como o impacto sofrido pelos mesmos
durante suas vidas.
sintoma. A mulher procura por seu ginecologista e se
espanta por não estar grávida depois de haver interrompido
a contracepção já há algum tempo. Outras, sem uso de
métodos que impeçam a gravidez, descobrem que não
tiveram o resultado esperado.
Após, então, inúmeras tentativas de gravidez
natural, o casal inicia o processo de investigação:
2 METODOLOGIA
“Mas será que você não tem o probleminha,
vamos fazer um exame, e isso vai passando, aí
quando vê já passou três anos e daí quatro
anos, [...] então quando a gente viu já estava
beirando os trinta anos” (SUJEITO 6 FEMININO).
Este estudo foi desenvolvido no segundo semestre
do ano de 2007 em um município de pequeno porte da
região Noroeste do estado do Rio Grande do Sul,
constituindo-se em uma pesquisa do tipo exploratório –
descritiva com abordagem qualitativa que, segundo Minayo
(2007), é um tipo de pesquisa que se preocupa com as
ciências sociais, em um nível de realidade que não pode
ser quantificado e aprofunda-se no mundo dos significados
das ações e relações humanas.
“Eu tentei engravidar desde 2005, em abril [...]
mas depois de seis meses sem sucesso a
gente procurou de novo o médico para investigar
porque não conseguíamos engravidar. [...]
agora então faz dois anos e alguns meses”
(SUJEITO 1 FEMININO).
O levantamento dos sujeitos da amostra foi realizado
através da pesquisa na lista de casais adotantes com
infertilidade no Fórum do Município pesquisado, pelo Juiz
de Direito da Comarca, o qual indicou um casal, e após
foi usada a técnica da bola de neve ( Snow Ball ), onde o
casal entrevistado indicava outro casal com infertilidade e
assim sucessivamente.
A coleta das informações foi através de uma
entrevista com roteiro semi - estruturado que foi aplicado
aos casais. Estas foram gravadas, transcritas e analisadas
pela autora do trabalho. A amostra foi definida utilizandose o princípio da saturação dos dados no qual se obteve
oito sujeitos num total de quatro casais.
Utilizou-se um termo de consentimento livre
esclarecido, seguindo os preceitos éticos da Resolução
Nº 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional
de Saúde, para assegurar os direitos de liberdade de
escolha de participação e garantia do anonimato (BRASIL,
2007).
3 PERCEPÇÕES DE CASAIS COM
INFERTILIDADE
“Tudo começo quando nós casamos faz dezoito
anos atrás hoje né, e nós queríamos logo ter
um filho, daí não , um mês não, no outro
também não engravidava e não menstruava,
daí fazia exame e dava negativo e aí era aquela
frustração.[...] Aí fui consultar e o médico pediu
uma ecografia transvaginal, aí ele descobriu
que meu caso era de ovários policísticos”
(SUJEITO 7 FEMININO).
Não ocorrendo a gravidez natural com o passar
dos meses e anos, o casal percebe que algo está errado,
e é nesta fase que aceitar a condição de ser infértil perpassa
por um processo delicado. Portanto, descobrir que a pessoa
é infértil é um momento doloroso para ambos parceiros,
bem como a expectativa do casal e a pressão social por
um filho que vêm desgastar ainda mais os indivíduos
inférteis e é onde o sentimento de angústia se torna
manifesto, mas, com o passar do tempo, começam a
entender a dimensão do problema e iniciam a investigação
das causas da infertilidade (ORIÁ; XIMENES, 2006).
3.2 Investigação
3.1 Tentativa de engravidar
Em casais que vivem juntos e têm relações normais,
regulares e sem proteção, espera-se que ocorra uma
gravidez após um ano de relações sexuais desprotegidas.
A duração desse período difere, dependendo da carga
individual, social e cultural. Cada casal tem sua própria
hora, em que a esposa ou o marido ou ambos começam a
perceber que a gravidez desejada não chega e alguma
coisa deve estar errada.
O processo de investigação se inicia com a procura
do médico gineco- obstetra local ou com médico
especialista em infertilidade, sendo que alguns casais após
fazerem exames “por conta própria” vão direto a uma clínica
de reprodução humana. Como referem as falas abaixo:
Nesse instante, a infertilidade se torna objeto de
preocupações constantes, objeto de medo, um verdadeiro
77
“Me indicaram um médico que é especialista
em infertilidade que é de Santa Rosa então a
gente foi lá para consultar com esse médico,
pediu novamente o espermograma e mais
alguns exames para nós” (SUJEITO 2
MASCULINO).
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
“Nós fomos direto para uma clínica nós não
ficamos indo de um médico para outro, porque
isso acontece muito, os casais sentem-se
perdidos em relação à infertilidade e eu como
médico me sinto bem a vontade de prestar
assistência quando eu atendo um casal com
essa dificuldade. Eu já digo não percam tempo
vão direto ao ponto (clínica)” (SUJEITO 3
MASCULINO).
Das entrevistadas, uma apresentava como causa
da infertilidade a endometriose pélvica, duas apresentavam
ovários policisticos que levam à falta de ovulação e a outra
não foi encontrada qualquer alteração. Para investigar as
causas de infertilidade feminina, a mulher passa por vários
exames que são desgastantes, dolorosos e que expõem
a genitália levando a situações constrangedoras como
revelam as falas abaixo:
“Como minha mulher tinha ovários policísticos,
fez o tratamento e depois de alguns meses
ainda não conseguimos engravidar, fomos
consultar com outro médico que me pediu um
espermograma, e aí deu que eu tinha baixa
contagem de esperma” (SUJEITO 8
MASCULINO).
“[...] os exames, é uma coisa que desgasta
bastante, enfim fiz duas histerossalpingografia,
é bem dolorido também bem chato de fazer”
(SUJEITO 6 FEMININO).
“Eu fiz a histerosalpingografia, foi uma dor
horrível, é ficar com as pernas abertas com o
técnico olhando, injetando (contraste), olhando.
E tu naquela posição” (SUJEITO 1 FEMININO).
Passando pelo procedimento de infertilidade e
intervindo como médico, o sujeito três ajudou a si próprio
a lidar com a sua situação e estabelecer um limite para a
investigação, ou seja, aceitando sua condição de infértil e
fazendo o enfrentamento da circunstância em busca de
alternativas para minimizar o desgaste do processo.
O homem também passa por situações
constrangedoras, uma delas é a coleta de material para o
espermograma.
Um dos sujeitos entrevistados referiu ter levado uma
pancada no saco escrotal e após este acontecimento fez
um espermograma “por conta própria”, onde foi constatada
uma alteração de viscosidade.
“O grande problema é tu fazer o
espermograma, depois de certa idade, tu
chega no local e pra ti fazer uma masturbação
é complicado. A maioria dos laboratórios não
tem uma estrutura, não te dão um filme, nem
uma revista. De manhã cedo no frio, é
complicado, tu tem que ir sozinho, tu fica
constrangido.não é uma coisa que tu faz
normalmente e parece que todo mundo esta
vendo” (SUJEITO 2 MASCULINO).
“[...] depois de um tempo a gente tentou
engravidar e não deu certo, daí foi feito exame
de novo, veio mais alterado, já pela idade”
(SUJEITO 2 MASCULINO).
As alterações do espermograma podem variar com
o passar dos anos, conforme a idade do indivíduo e dos
fatores intrínsecos e extrínsecos que influenciam na
quantidade e qualidade dos espermatozóides, como refere
a fala abaixo:
Já nas clínicas de fertilidade há uma melhor
estrutura que evita o constrangimento na hora da coleta
de sêmen.
“Lá tem uma sala com vídeo, máquina de café,
revistas sobre tudo, um sofá super confortável,
a moça te entrega o potinho e quando tu
termina, tu aperta a campainha e logo alguém
vem buscar o potinho. Assim, não achei
constrangedor” (SUJEITO 3 MASCULINO).
“[...] fizemos todos os exames. Quatro exames
estavam alterados e daí cada vez foi piorando
devido ao fato de que cada ano que passava
diminuía mais a minha motilidade dos
espermatozóides” (SUJEITO 2 MASCULINO).
Além dos problemas masculinos com as
alterações do espermograma que ocorrem em 40% dos
casais com infertilidade, as mulheres são responsáveis
em 40% dos casos. Já em torno de dez a 20% dos casais
não são diagnosticadas as causas da infertilidade
(TARASCONI, 2007).
3.3 O martírio do tratamento
Após um determinado tempo sem engravidar é
realizada a investigação da causa da infertilidade, em
seguida os casais interessados dão início à fase do
tratamento da infertilidade que implica em extensos
exames diagnósticos e tratamentos médicos de longa
duração que podem precipitar sintomas psicológicos,
sendo de maior freqüência a ansiedade e a depressão,
78
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
além da raiva, frustração, isolamento familiar/social e
dificuldades sexuais. Esses sintomas afetam entre 25 a
60% das pessoas inférteis (RIBEIRO, 2004). A ansiedade
costuma aparecer pela natureza estressante dos
tratamentos e pelo medo de não conceber. Estando a
depressão mais relacionada ao resultado negativo do
tratamento, na fala seguinte consegue-se observar
claramente a ansiedade em relação à duração do
tratamento:
“É que a medicina pede pra você queimar
etapas, você não parte logo pro radical no
primeiro ano que você não tem filhos, você vai
fazer inseminação artificial, não você vai fazer o
tratamento será que não podemos melhorar
tua fertilidade, mas será que você não tem um
probleminha no útero, vamos fazer um exame,
e isso vai passando, e aí quando vê já passou
três anos e daí quatro anos, e daí vamos fazer
um tratamento, daí passou mais dois, e daí
quando a gente viu já estava beirando os trinta
anos” (SUJEITO 6 FEMININO).
“Na região não havia na época um serviço de
fertilidade especializada, fomos a Porto Alegre,
fomos clientes da primeira clinica de fertilização
do estado, a Fertilita, lá passamos por
entrevistas e entrevistas, ginecologistas,
urologistas, e ficou detectado que ambos são
inférteis, então, ela não tem condições de
engravidar e eu não tenho espermatozóides o
suficientes para fertilização. Aí nós optamos por
fazer um bebê de proveta, então houve toda uma
preparação, indução, biopsia de ovário, coleta
de sêmen, separação de espermatozóides
viáveis, e, ah foram implantados quatro
embriões na mulher” (SUJEITO 3 MASCULINO).
Diferentes alternativas de tratamento têm sido
usadas pela medicina reprodutiva para oferecer nova
esperança aos casais inférteis, uns dos principais
tratamentos o qual todas as entrevistadas realizaram foi a
indução de ovulação.
Durante esta fase as mulheres relataram
desconforto físico e mental devido às aplicações diárias
de medicação intramuscular e subcutânea, bem como
pelas ultrassonografias transvaginais que medem o
diâmetro do folículo ovariano.
diminuem devido à hipofunção ovariana e viabilidade
espermática.
“[...] Ele deixou bem claro que a fertilização tem
50% de chances e a inseminação tem 20% na
minha idade, aí quando a mulher tem uma idade
avançada vai diminuindo conforme a idade”
(SUJEITO 1 FEMININO).
“Como as chances de engravidar na primeira
tentativa era maior que 40% e hoje já existem
dados que aumentou a possibilidade quanto
mais vezes você tenta, mais vezes você tem
chance de conseguir engravidar” (SUJEITO 4
FEMININO)
A chance de uma Fertilização In Vitro resultar em
gravidez é em média de 20 a 35% por tentativa, dependendo
principalmente da idade da paciente (quanto menor a idade
da mulher que realiza uma FIV, melhores são os
resultados). Em pacientes abaixo de 30 anos, as chances
de sucesso são de quase 50%, enquanto que em pacientes
acima de 40 anos as chances são bastante reduzidas
(CHEDID, 2000).
Para Chedid (2000), os índices de sucesso da
inseminação artificial são de aproximadamente dez a 18%
por ciclo. Deve-se lembrar que a chance de um casal sem
nenhum problema para engravidar em um mês fértil é de
cerca de 20 a 22%. Quando o casal realizar de três a
cinco tentativas, as chances de gravidez podem chegar a
50%. Após esse número de tentativas, as chances de
gravidez através da inseminação caem drasticamente, não
sendo recomendado insistir neste tipo de tratamento. A
partir de então, o casal e o médico devem reavaliar o caso
para saber qual o melhor procedimento.
Outra preocupação que o casal acaba tendo é em
relação aos gastos que irá ter para fazer o tratamento, em
virtude de o tratamento ser caro e restrito a uma clientela,
restando para muitos casais a opção de esperar anos em
longas filas nos hospitais de ensino que oferecem o
tratamento gratuitamente.
“Usei Clomid de novo, todos os meses eu ia
aqui na cidade e fazia ultrassonografia
transvaginal, media o folículo no período,
sempre tomando Clomid para induzir a
ovulação, onde o médico detectava que o
folículo estava no tamanho ideal, e daí fazia a
injeção para amadurecer o folículo e liberar o
óvulo. Fizemos isso uns três, quatro meses e
aí de novo, tudo de novo” (SUJEITO 1
FEMININO).
Os entrevistados estavam cientes dos percentuais
de gravidez da contracepção assistida e inclusive eram
sabedores que com o passar dos anos esses percentuais
“Eu tenho 28 anos e dava para esperar para
fazer a fertilização até os trinta a trinta e cinco,
então não precisaria correr, a gente pensou
vamos nos inscrever pelo SUS, o tempo de
espera pelo SUS é de três meses a um ano e
tu só paga a medicação ainda é um pouco
menos da uns três mil e pouco, não paga tudo”
(SUJEITO 1 FEMININO).
Os tratamentos para infertilidade demandam um
gasto financeiro às vezes muito superior à renda familiar
expondo o casal a sacrifícios e inclusive a idéias
impensadas como se desfazer de bens como a casa e o
carro para suprir o desejo da maternidade/paternidade.
79
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
“A gente falou que não agüentava mais, que a
pressão tava grande, e as coisas assim, tinha
hora certa para transar e isso estava
prejudicando nosso casamento” (SUJEITO 1
FEMININO).
“[...] a gente penso em vender o carro, estava
pensando em vender a casa, daí desistimos
de vender o carro, desistimos de vender a casa,
daí eu fui falar como o médico, e a gente se
inscreveu então pelo SUS” (SUJEITO 1
FEMININO).
“[...] são três dias que são férteis aqueles ali é
que você vai ter o fator psicológico, fator ânimo,
fator de vontade e tudo, não vai transar pra ter
filhos, você transa porque gosta, ou coisa
assim né, então são doze, vamos multiplicar
por três, são vinte e quatro, trinta e seis
chances de engravidar por ano que você tem,
né, às vezes isso pesa contra, e os anos vão
passando e cada vez vai ficando mais difícil e
assim foi acontecendo” (SUJEITO 5
MASCULINO).
“Acabamos deixando de fazer o tratamento
porque a nossa situação financeira não
ajudava, os remédios eram caros, [...] então
pensamos em dar um tempo nisso, e esse
tempo esta durando quinze anos” (SUJEITO 1
FEMININO).
3.4 Conseqüências da infertilidade
O casal que vive o drama da infertilidade sofre
pressões de todos os lados. Ainda recém-casados a família
e os amigos já começam a cobrar os filhos. Parece que,
uma vez juntos, o casal não tem mais razão de ser como
tal. A vontade de ter filhos muitas vezes reflete mais a
cobrança da sociedade do que o desejo do casal.
“Na minha família eu sou o único filho homem e
isso faz com os familiares cobrem, ei, e aí e os filhos vem
quando, ta na hora se não vai morrer o nosso sobrenome”
(SUJEITO 8 MASCULINO).
Quando um filho é desejado e apesar das tentativas
de concepção para que este desejo se realize, ocorre um
hiperinvestimento no projeto de um descendente. Todos
os outros projetos e investimentos da vida ficam em
segundo plano (RIBEIRO, 2004). Em alguns casos ocorre
a sensação de que suas vidas estão paralisadas à espera
da gravidez e do filho tão sonhado.
“[...] tu te joga de cabeça e tu não enxerga o
lado ruim, da medicação tu ficava toda inchada,
mas é que tu tem aquele objetivo focado eu
acho até que os casais têm que passar por
isso, eu admiro quem decide adotar uma
criança sem ter tentado todos os métodos para
a infertilidade, eu acho que tem que ir até o
último ponto para esgotar isso, daí não deu,
bem aí você vai repensar se você quer família
ou não [...]” (SUJEITO 4 FEMININO).
Segundo Ribeiro (2004), os casais que optam por
métodos de concepção assistida podem experienciar uma
verdadeira revolução em suas vidas. A mais imediata é o
fato de que uma equipe médica começa a fazer parte da
intimidade do casal e também a determinar quando deverão
ou não ocorrer as relações sexuais. Nos métodos de
reprodução assistida, como a inseminação artificial e a
fertilização in vitro, a concepção deixa de ser conseqüência
de uma relação sexual.
O processo de investigação e tratamento da
infertilidade pode ser um caminho muito árduo e muitas
vezes interfere no relacionamento conjugal. Enquanto o
sexo era antes um contato íntimo espontâneo e sem
compromisso, na vigência da investigação e do tratamento
da infertilidade ele passa a ser regulado por dias e horários
convenientes para a concepção, abrindo margem para o
surgimento dos mais diversos problemas e dificuldades
conjugais.
3.5 O sonho de ter filhos que não se
concretiza
A realização pela maternidade e paternidade
geralmente é um dos mais importantes projetos de vida
para o indivíduo e para o casal, é um dos alicerces a partir
do qual o casal constrói seu relacionamento. Justamente
por sua importância, a infertilidade pode ser um forte abalo
na estrutura psíquica, reabrindo, de diferentes formas,
antigas feridas e afetando intensamente a auto-estima
(RIBEIRO, 2004). A experiência da infertilidade parece
promover danos consideráveis nos referenciais de
masculinidade e feminilidade.
“[...] logo que a gente engravidou, duas
semanas depois já houve o abortamento
espontâneo, daí a gente optou por não
continuar, né achamos que não foi uma
experiência muito prazerosa, não pela questão
financeira, mas pelo custo emocional que
envolvia, [...] a infertilidade fazia parte do nosso
casamento. Que a nossa família seria realizada
através de adoção” (SUJEITO 4 FEMININO).
Segundo Ribeiro (2004), a capacidade de conceber
e gerar um filho são extremamente importantes para as
questões da feminilidade e da masculinidade, assim como
para o próprio sentido da vida, gerar filhos e ser pais é
uma das razões em torno das quais o casal se constitui.
A situação de infertilidade não é somente uma crise
80
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
individual, mas uma crise do par, a situação os impele a
reavaliar o sentido de seu relacionamento.
Nas falas a seguir os entrevistados demonstram a
preocupação permanente com a questão da infertilidade e
os sentimentos de insegurança:
Observou-se que a infertilidade não é apenas
frustrante, mas sim devastadora para aqueles que desejam
ter um filho e não conseguem tê-lo. A auto-estima e a
autoconfiança do casal sofrem um forte impacto, o
relacionamento fica sobrecarregado de acusações, culpas,
frustrações e desapontamentos (PIVA, 2002).
“Tudo isso é o sentimento, não cai fora ali, fica
ali, fertiliza, daí tu sai dali imaginando “conversa
com ele” o óvulo tá indo o espermatozóide
também. Então o psicológico da gente fica bem
alterado, é isso que eu queria dizer, aí as
pessoas antes de começar esse tratamento
elas dizem “aí relaxa vocês têm que esquecer
que querem ter filhos”, gente ninguém esquece,
“ai quando tu esquecer tu vai ficar”, eu não sei,
eu não me acho uma pessoa assim que
pensa, pensa, pensa, que não é assim, mas tu
não esquece é um desejo muito inconsciente,
está num todo” (SUJEITO 6 FEMININO).
“[...] como é difícil engravidar tendo
endometriose, aí sim veio aquele sentimento
de não poder ter filhos de querer muito ser mãe
e de repente não poder, de ter que escolher
uma adoção e até tentar uma fertilização, mas
sempre com medo de não dar certo e esse
sentimento persistiu por muito tempo ele vem
e volta só termina o dia que a mulher consegue
engravidar” (SUJEITO 1 FEMININO).
A infertilidade conjugal traz consigo, em maior ou
menor grau, sentimentos negativos que na maioria das
vezes dificultam o tratamento. Nesse sentido, é preciso
que antes de tudo o homem e a mulher queiram
profundamente ter um filho para que possam aceitar os
problemas decorrentes da infertilidade e, assim, criar forças
para percorrerem juntos um caminho que talvez seja
bastante difícil e longo (CHEDID, 2000).
“[...] os casais sentem-se perdidos em relação
à infertilidade” (SUJEITO 3 MASCULINO).
Conforme Ribeiro (2004, p.42): “homens e mulheres
podem experienciar a infertilidade como uma situação de
injustiça cometida contra eles”.Tal situação gera intensos
sentimentos de raiva, desespero, desesperança, cansaço
e é também nesse momento que ocorre o isolamento social
decorrente de sentimentos de fracasso e vergonha por
não ser possível realizar o que muitos casais fazem sem
grande esforço, como relata a fala abaixo:
3.6 As dores da infertilidade
“[...] fiquei frustrada, tu se sente pequeninha,
se sente báh, porque isso aconteceu comigo?
A gente se revolta no momento né, porque
comigo, porque né. É a gente até acha injusto,
na época a gente achava injusto, a gente dizia
a gente tem condições e quer tanto conseguir
engravidar” (SUJEITO 4 FEMININO).
Desde muito cedo em seu desenvolvimento, muitas
pessoas constroem um projeto de vida, e um deles é o
desejo de ter filhos, mas, ao se deparar com uma
impossibilidade nesse processo, ocorre a produção de uma
ampla gama de sentimentos, tais como medo, ansiedade,
tristeza, frustração, desvalia, vergonha, desencadeando por
vezes quadros de estresse importantes. É por esse motivo
que muitas vezes a situação de infertilidade é capaz de
provocar efeitos devastadores tanto na esfera individual
como conjugal e desestabilizar as relações do sujeito com
seu entorno social, podendo ocasionar um decréscimo na
qualidade de vida (RIBEIRO, 2004).
Conforme Ribeiro (2004), o estresse da situação de
infertilidade promove um impacto na saúde mental e física,
conviver com a infertilidade é semelhante a lidar com as
mais devastadoras doenças médicas, a cada tentativa
malograda de alcançar uma gravidez, os pacientes podem
ficar, gradativamente mais deprimidos e com sentimentos
de tristeza como descrevem as falas abaixo:
“Volta e meia vem aquela coisa na cabeça, tu já
imaginou como vai ser quando nós ficar velho
e não tem ninguém pra nos cuidar[...]”
(SUJEITO 7 FEMININO).
“Tu tenta sempre manter o controle emocional,
tu tenta sempre manter uma aparência de que
está tudo bem, que está tudo controlado, mas
por dentro já começa a frustração ali, é uma
frustração” (SUJEITO 5 MASCULINO)
A infertilidade desencadeia vários sentimentos, nem
sempre verbalizados, mas que afetam a vivência do casal.
Para Ribeiro (2004, p.35) “A infertilidade tende a ser um
sofrimento silencioso, os casais que passam por essa
situação podem experienciá-la como algo que inferioriza
diante dos outros [...]”.
“[...] eu tentava me passar de forte, pois a
estrutura psicológica dela já estava bastante
nervosa e triste quanto a isso” (SUJEITO 2
MASCULINO).
Ainda para Ribeiro (2004) a impossibilidade de
realização da maternidade e da paternidade é um evento
que tem múltiplas facetas, e estas facetas envolvem a
sexualidade espontânea, a experiência da gravidez, o filho
tão desejado e a continuidade genética.
81
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
3.7 Uma saída
Após incansáveis tratamentos para a infertilidade,
onde o sonho de ter filhos biológicos não se concretiza,
os casais suscitam o desejo de adotar uma criança para
satisfazer o desejo de ser mãe e pai. Ser pai e mãe é uma
opção de amor e afeto que independe do biológico, sendo
uma forma de realização da paternidade e maternidade.
Muito se fala sobre adoção, mas pouco se sabe a
respeito de um universo complexo, onde a emoção e a
razão estão diretamente ligadas e podem juntas mudar o
destino de quem adota e de quem é adotado.
“[...] por mais que a gente quer ter filhos, eu
acho que se não der, vamos adotar, mas é
uma questão de tempo porque não é de uma
hora pra outra que tu vai pensar que vai adotar”
(SUJEITO 2 MASCULINO).
“Eu me sinto tão pai, tão homem tendo uma
filha adotiva como se eu tivesse engravidado a
minha mulher” (SUJEITO 3 MASCULINO).
“AGORA, ainda não tomamos uma decisão de
se vamos ter filhos, se vamos adotar uma
criança ou se ainda esta em tempo de fazermos
algum tratamento”.(SUJEITO 8 MASCULINO).
A adoção estabelece a relação filial. É uma forte
relação afetiva que se cria entre responsáveis e criança,
ou adolescente. Pode-se relacioná-la a uma gestação que
acontece na vida das pessoas a partir de diferentes
motivações e oportunidades (TÜRCK, 2000).
Uma possibilidade é esperar pela gravidez natural,
como ocorreu com uma das entrevistadas durante a
pesquisa.
Outra possibilidade é o casal ficar sem filhos, afinal
não se pode reforçar a idéia de que o único objetivo de vida
de um casal é ter filhos. Um relacionamento deve ser
baseado em amor e cumplicidade independente de filhos
ou não.
4 CONCLUSÃO
Ao finalizar este trabalho, num contexto mais
amplo, este estudo oportunizou compreender melhor a
realidade encontrada em muitos aspectos relacionados às
percepções e dificuldades provocados pela infertilidade que
devem ser discutidos para que a cultura da infertilidade
seja efetivamente alterada em nossa sociedade.
Partindo de uma história que retrata a infertilidade
como uma enfermidade aceitável até a evolução deste
fenômeno, percorreu-se por períodos da história que
reeditam a infertilidade e suas múltiplas causas, formas e
sentimentos distintos, mas partindo de uma mesma matriz:
a insegurança dos casais e as alternativas que possam
garantir a necessidade de ter um filho.
O estudo com os casais inférteis proporcionou um
melhor conhecimento sobre o tema pesquisado, pois se
percebeu que eles tinham o conhecimento da situação e
sabiam da importância dessa jornada.
Pode-se evidenciar que no momento em que um
casal descobre a infertilidade, simultaneamente ocorre uma
situação de frustração que desencadeia diversos
sentimentos, como de perda, solidão, incapacidade,
depressão e insegurança. Diante deste problema de saúde
e do preconceito gerado sob o casal acometido, torna-se
difícil a convivência, gerando conflitos nos âmbitos físicos,
psicológicos e sociais e ao mesmo tempo favorecendo a
união do casal. Dessa maneira, para que esta trajetória
ocorra de forma natural, é importante que todas estas
condições sejam compreendidas e trabalhadas pela
equipe de saúde.
Referente ao sentimento dos casais, concluiu-se
que os mesmos se sentiam inseguros e ao mesmo tempo
felizes ao realizarem tratamentos para engravidar por um
curto período pois logo ocorria o aborto ou simplesmente
não ocorria a concepção, mas continuavam tentando a
gravidez. Eles estavam cheios de esperança de ter filhos
e cientes da importância do tratamento, pois se sentiam
angustiados e tristes em não poder conceber naturalmente.
Com base neste contexto, acredita-se que a
pesquisa alcançou os objetivos propostos permitindo
identificar as percepções dos casais frente à infertilidade.
Entretanto, também ficou enfatizado nas declarações dos
casais, o fato de que a infertilidade proporcionou um contato
mais próximo entre marido e mulher, favorecendo a vida
conjugal.
Após a análise das entrevistas, concluiu-se a
necessidade da criação de grupos de apoio com
assessoria de equipe multiprofissional, especialmente de
uma psicóloga para auxiliar na abordagem emocional do
problema da infertilidade, pois nos relatos, os casais
descrevem a falta de apoio especialmente no momento de
grande transtorno que ocorre por ocasião dos tratamentos.
Também neste contexto, o enfermeiro pode proporcionar
a orientação através de um novo olhar sobre a infertilidade,
trazendo à tona questões até então pouco discutidas. Para
que isso se consolide e venha surtir os efeitos desejados,
é necessário um trabalho em equipe, porque na saúde
nenhuma pessoa trabalha sozinha.
82
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
5 REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da saúde. Resolução N°196/96.
Brasília: Ministério da Saúde/ Conselho Nacional de Saúde,
Brasília, 1996. Disponível em http://www.bioetica.ufrgs.br/
res19696.htm. Acesso em 20 de maio 2007.
CHEDID, S. Infertilidade. 2.ed. São Paulo: Contexto,
2000.
FARINATI; D. M.; RIGONI, M. S.; MÜLLER, M. C.
Infertilidade: um novo campo da Psicologia da saúde.
Revista estudo da psicologia. v. 23, n.
4, Campinas, dez. 2006.
MINAYO, M. C. S. Pesquisa social: teoria, método e
criatividade. 25. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
ORIÁ, M. O. B.; XIMENES, L. B. Casal infértil em busca
do filho desejado: estudo de caso clínico. Online Brazilian
Journal of Nursing, v. 5, n. 2, 2006. Disponível em http:/
/www.uff.br/objnursing/index.php/nursing/rt/printerFriendly/
254/49. Acesso em 05 de outubro de 2007.
PIVA, M. Em nome do filho: aspectos psicológicos da
infertilidade na vida conjugal. Passo Fundo: UPF, 94 p.,
2002.
RIBEIRO, M. Infertilidade e reprodução assistida. São
Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.
TARASCONI, A. C. Gênesis, clínica de reprodução humana:
saiba mais sobre infertilidade. Jornal Zero Hora: Porto
Alegre, ano 44, n. 15.371, p. 09, 28 de setembro de 2007.
TÜRCK, M. G. M. G. Perícia social no contexto da
infância e da juventude: manual de procedimentos
técnicos. Campinas. Editora Livro Pleno, 2000.
83
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
ESTUDO DE MELHORES PRÁTICAS DE
GERENCIAMENTO DE PROJETOS E UTILIZAÇÃO EM
EMPRESAS DA REGIÃO FRONTEIRA NOROESTE DO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Delson Liebert1
Elisandra Martinha Demboski1
Vera Lúcia Lorenset Benedetti2
Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM3
ABSTRACT
RESUMO
No período de dezembro de 2006 a julho de 2007,
desenvolveu-se um trabalho no Curso de Sistemas de
Informação da SETREM, o qual tem o intuito de verificar a
real situação das empresas da Região Fronteira Noroeste
do Rio Grande do Sul, em relação ao gerenciamento de
projetos e utilização de algum conjunto de melhores
práticas, avaliando a necessidade e interesse de adoção
pelas empresas. Baseado nesta situação aplicou-se
questionários através de entrevistas com responsáveis da
área de TI de cada empresa, enfatizando o conhecimento
do PMI e IPMA e interesse em obter informações sobre os
mesmos. Paralelo às entrevistas, foram buscadas
informações bibliográficas sobre o PMI e a IPMA,
comparando-os e analisando suas semelhanças e
diferenças, onde se constatou que o PMI é mais voltado
para processos, técnicas e conduta ética. Já a IPMA é
caracterizada por adaptar-se à cultura de cada país e nas
atitudes pessoais. Com base neste conhecimento,
elaboraram-se e ministraram-se palestras às empresas
interessadas. Ao finalizar as palestras em cada empresa,
distribui-se um questionário aos participantes das
palestras, se os mesmos teriam ou não interesse em
participar de cursos de extensão / treinamentos focados
ao assunto. Analisando os dados deste questionário
aplicado durante as palestras, conclui-se que a maioria
dos participantes da palestra, tem interesse de participar
de um curso de extensão / treinamento e voltado à IPMA.
From December 2006 to July 2007, a work of the
Information of Systems Course of SETREM was developed
with the purpose of verifying the real situation of the
companies of the Border of Northwest Region of the state
Rio Grande do Sul, in relation to the management of projects
and better use of some set of practical, evaluating the
necessity and interest of adoption them for the companies.
Based on this situation, questionnaires were applied through
responsible interviews with of the TI area of each company,
emphasizing the knowledge of the PMI and IPMA and
interest in getting information on the same ones. Parallel
to the interviews, bibliographical information on the PMI
and the IPMA had been searched comparing them and
analyzing their similarities and differences, where if was
evidenced that the PMI is more is turned back toward
processes, techniques and ethical behavior. The IPMA is
characterized by adapting itself to the culture of each
country and in the personal attitudes. Based on this
knowledge, lectures to the interested companies were
elaborated and given. When finishing the lectures in each
company, a questionnaire to the participants of the lectures
is distributed, if they would have or not interest in
participating of courses of extension/training focused to
the subject. Analyzing the data of this questionnaire applied
during the lectures, it is concluded that the majority of the
participants of the lecture, has to participate of an extension
course/training related to the interest of the IPMA.
Palavras-chave: gerenciamento de projetos,
empresas de TI, IPMA, PMI, cursos de extensão/
treinamento.
Key Words: Projects management, companies of
IT, IPMA, PMI, extension course/training.
1
Acadêmico(a) do Nono Semestre do Curso Bacharelado em Sistemas de Informação – SETREM.
Professor(a) Orientador(a) do Estágio do Curso Bacharelado em Sistemas de Informação – SETREM.
3
Av. Santa Rosa, 2405 - Três de Maio-RS
2
84
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
1. INTRODUÇÃO
Com a alta competitividade do mercado atual as
empresas vêm buscando novas alternativas e mudanças
em sua gestão. Os projetos fazem parte da realidade de
empresas de todos os setores da economia tornando o
gerenciamento de projetos eficaz. A área de TI vem
utilizando metodologias de Gerenciameto de Projetos para
ter bons resultados. As melhores práticas reúnem e
padronizam as técnicas que foram utilizadas em projetos
com sucesso.
Na Região Fronteira Noroeste do estado do Rio
Grande do Sul existem várias empresas que utilizam a
informática como meio ou fim. Com base nisso, o presente
artigo irá mostrar um estudo de dois conjuntos de melhores
práticas de gerenciamento de projetos e uma análise da
atual situação da área de TI nas empresas da região
abordada, com relação ao gerenciamento de projetos,
sugerindo e auxiliando no entendimento do PMI (Project
Management Institute) e da IPMA (International Project
Management Association).
2. METODOLOGIA
Considerando que os métodos estabelecem uma
ordenação para a investigação dos fatos, adotou-se os
procedimentos metodológicos conforme as propostas do
estudo e adequadas aos objetivos.
A abordagem das informações necessárias para a
execução do trabalho foi a abordagem qualitativa tomada
como eixo central.
Realizou-se a pesquisa bibliográfica sobre o PMI
através do site da organização Project Management
Institute (PMI), do livro PMBOK, versão 2004 e de outras
bibliografias para obtenção de conhecimentos sobre os
conceitos e técnicas divulgadas pelo PMI através do livro
PMBOK. Foi estudada cada área de gerenciamento de
projetos com base na pesquisa bibliográfica.
A pesquisa bibliográfica sobre a IPMA foi realizada
através do Referencial Brasileiro de Competências em
Gerenciamento de Projetos (RBC) - guia oficial divulgado
pela Associação Brasileira em Gerenciamento de Projetos
ABGP e pela International Project Management
Association (IPMA).
Levantou-se as principais empresas de Tecnologia
da Informação da Região Fronteira Noroeste, que se tem
conhecimento por divulgação, e também das principais
empresas de outros ramos que tenham uma área de
Tecnologia da Informação bem estruturada. Vindo a visitar
as mesmas realizando entrevistas com o responsável da
área de TI sobre como é feito o gerenciamento de projetos.
gerenciamento de projetos. Também foi elaborada e
ministrada palestra sobre PMI e IPMA em cada uma das
empresas pesquisadas que aceitaram participar.
Ao final foi verificado o interesse de todas as
empresas em participar de cursos de extensão que
abordaram mais detalhadamente o assunto. Este estudo
poderá ser utilizado por instituições de que tenham
interesse em promover tais cursos.
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 GERENCIAMENTO DE PROJETOS
Para Keeling (2002) o gerenciamento de projetos é
o planejamento, programação e controle de tarefas
integradas para atingir seus objetivos com êxito. A gestão
de projetos vem se tornando cada vez mais importante
para o mundo empresarial tanto para o futuro quanto no
presente.
Segundo o site oficial do PMI do Rio Grande do Sul
(2007), o gerenciamento de projetos é o uso do
conhecimento, das habilidades, ferramentas e técnicas
com a finalidade de suprir as necessidades e expectativas
do empreendedor com relação a um projeto.
A realização de projetos tem sido realizada há muito
tempo, porém têm evoluído consideravelmente nos últimos
anos.
Os princípios da gerência de projetos surgiram na
segunda metade do século XIX com o significativo aumento
na complexidade dos novos negócios em escala mundial.
Transformações dessa época exigiram que a gestão das
organizações fosse cada vez mais eficiente. Nesse
contexto é que se firma e difunde a gestão dos projetos,
tornando as empresas cada vez mais competitivas.
Kelling (2002) afirma que a gestão de projetos
alcançou nos últimos anos novos patamares de
sofisticação e popularidade. Os projetos das civilizações
antigas se relacionavam ao poder, religião ou construção
de grandes monumentos. Preocupações como custo e
tempo não eram importantes para os realizadores de
projetos antigamente, diferentes dos projetos de hoje, onde
esses pontos são de essencial importância no
gerenciamento de projetos. Um exemplo da falta de
consideração dada ao prazo foi a construção das antigas
catedrais, caracterizadas pela grandeza, beleza e
durabilidade de sua estrutura. Essas obras se estendiam
por centenas de anos, onde trabalhavam nela sucessivas
gerações e devia haver qualidade na mão-de-obra.
Pode-se citar como exemplo de grandes projetos,
a construção das pirâmides do Egito, da muralha da China,
do canal do Panamá, entre outros.
A pesquisa foi tabulada e partir de sua análise foi
verificada a situação das empresas em relação ao
85
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A Figura 2 mostra uma visão geral dos processos
de gerenciamento de projetos de acordo com as áreas de
conhecimento.
Fonte: Dinsmore, 2006
Figura 1: Mapeamento dos grupos de processos de gerenciamento de projetos e
o ciclo PDCA.
Fonte: Sotille, 2007.
Figura 2: Visão geral dos processos de gerenciamento de projetos de acordo com as áreas de conhecimento.
O gerenciamento de projetos pode ser classificado
em 9 grandes áreas de conhecimento. Segundo o PMBOK
(2004) as áreas são gerenciamento da integração,
gerenciamento de escopo, gerenciamento do tempo,
gerenciamento de custo, gerenciamento da qualidade,
gerenciamento de recursos humanos, gerenciamento da
comunicação, gerenciamento de riscos, gerenciamento
das aquisições.
O gerenciamento da integração engloba processos
necessários para garantir que os elementos do projeto
estão apropriadamente coordenados. Segundo Dinsmore
(2006), esta área de gerenciamento envolve decidir entre
objetivos e alternativas que competem entre si de modo a
atender ou exceder as necessidades e expectativas dos
stakeholders (interessados no projeto).
O gerenciamento de escopo inclui todos os
processos necessários para garantir que o projeto contenha
86
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
todo o trabalho necessário, e somente o trabalho
necessário, para completar o projeto com sucesso.
Dinsmore (2006) mostra que o escopo tem como finalidade
fornecer uma base de referência (baseline), melhorar a
precisão das estimativas de custo, duração e recursos e
facilitar as designações de responsabilidades.
O correto gerenciamento do tempo é de vital
importância no andamento de um projeto. O tempo se
caracteriza pela sua inexorabilidade e significa que tempo
gasto é tempo perdido e não se pode mais recuperar. Sob
este aspecto, o gerenciamento do tempo é uma das
principais áreas do gerenciamento de projetos, segundo
Dinsmore (2006).
Os processos de gerenciamento do tempo
asseguram que o projeto será implantado no prazo previsto,
utilizando-se de padrões e critérios que irão ajudar na
previsão e no acompanhamento do prazo de implantação
de cada atividade prevista.
O gerenciamento de custos do projeto trata
principalmente do custo dos recursos necessários para
terminar as atividades do cronograma. Tem a função de
fazer com que o projeto termine dentro do orçamento
previsto, através dos seus processos principais,
considerando o efeito das decisões sobre os custos do
projeto, de acordo com o PMBOK (2004).
O gerenciamento da qualidade possui a função de
garantir a satisfação dos objetivos para os quais o projeto
foi realizado. Segundo o PMBOK (2004) consiste de
planejamento, garantia e controle da qualidade. Se o projeto
estiver dividido em fases, esses processos acontecem ao
menos uma vez cada um e interagem entre si e com outros
processos.
O gerenciamento dos recursos humanos reúne
processos que organizam e gerenciam os membros ou
equipe do projeto. A equipe é formada por pessoas com
funções e responsabilidades dentro do projeto, participando
do planejamento e das tomadas de decisões, segundo o
PMBOK (2004).
O gerenciamento da comunicação assegura a
geração, coleta, armazenamento, distribuição apropriada
e o controle básico das informações do projeto.
O gerenciamento dos riscos do projeto trata de
processos que definem e analisam os riscos com o objetivo
de ampliar os eventos positivos e minimizar as
conseqüências dos eventos negativos.
O gerenciamento de aquisições do projeto
contempla processos que compram ou adquirem produtos,
serviços ou resultados, inclui também processos de
gerenciamento de contratos.
3.2.2 IPMA
A sigla IPMA significa International Project
Management Association e quer dizer Associação
Internacional de Gerenciamento de Projetos.
Segundo Santos e Carvalho (2006), a instituição
IPMA é uma associação sem fins lucrativos, cujo objetivo
é promover internacionalmente o gerenciamento de
projetos, atendendo necessidades dos profissionais dessa
área.
Prado (2004) afirma que a associação IPMA está
registrada na Suíça e é responsável por manter um sistema
universal para validação dos programas nacionais e para
coordenação e harmonização das certificações em
gerenciamento de projetos neste sistema. Atua fortemente
nos países europeus e possui Associações Nacionais em
35 países ligados à IPMA, Estas associações nacionais
atendem às necessidades dos profissionais de
gerenciamento de projetos em seus respectivos países e
idiomas, são responsáveis pelo desenvolvimento e
administração de seus próprios programas de certificação
e pela implantação de seus respectivos órgãos de
certificação.
Santos e Carvalho (2006) citam que a IPMA foi criada
em 1965 e inicialmente era um fórum de troca de
experiência entre gerentes de projetos internacionais com
o nome de INTERNET, sendo que sua primeira conferência
internacional ocorreu em 1967, em Viena. A partir de então,
a IPMA tem se desenvolvido constantemente, da mesma
forma que o gerenciamento de projetos.
Todo o conhecimento em gerenciamento de projetos
é reunido no ICB (IPMA Competence Baseline) - guia
internacional que apresenta a estrutura geral da Certificação
da IPMA - onde define os Domínios, as Competências e
os Sistemas de Classificação (taxonomias) do
gerenciamento de projetos para a avaliação de
conhecimento, experiência, atitudes pessoais e
impressões gerais, segundo Santos e Carvalho (2006).
Existe um guia brasileiro que representa a
compreensão e as práticas nacionais do Gerenciamento
de Projetos e contém uma bibliografia simplificada sobre
gerenciamento de projetos. De acordo com Santos e
Carvalho (2006), esse guia denomina-se RBC (Referencial
Brasileiro de Competências em Gerenciamento de
Projetos).
A certificação da IPMA é dividida em quatro níveis:
A, B, C, e D, de acordo com as atividades,
responsabilidades e exigências típicas da prática.
No nível A o profissional certifica-se Diretor de
Projetos Certificado (Certified Projects Director) e é capaz
de coordenar todos os projetos de uma pesquisa, unidade
de negócio ou programa.
87
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
No nível B o profissional certifica-se Gerente de
Projetos Sênior Certificado (Certified Sênior Project
Manager) e é capaz de gerenciar projetos complexos de
maneira autônoma.
No nível C o profissional certifica-se Gerente de
Projetos Certificado (Certified Project Management) e é
capaz de gerenciar projetos não complexos e apoiar o
gerente de um projeto complexo, em todos os elementos
e aspectos do gerenciamento de projetos.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
4.1 COMPARAÇÃO ENTRE PMI E IPMA
Tendo em vista que existem algumas diferenciações
entre o PMI e a IPMA, montou-se um quadro comparativo
entre ambos, mostrando as diferenças e semelhanças,
conforme o Quadro 1.
Características
No nível D o profissional é um Associado em
Gerenciamento de Projetos Certificado (Certified Project
Management Associate) e possui conhecimento dos
elementos e aspectos do gerenciamento de projetos e pode
aplicá-los em determinados campos do projeto, atuando
como um especialista.
Gerenciamento por áreas de conhecimento
Os elementos do IPMA conceituam Projetos e
Gerenciamento de Projetos. Implementação do
Gerenciamento de Projetos. Gerenciamento por Projetos.
Abordagem Sistêmica e Integração. Contexto do Projeto.
Fases do Ciclo de Vida do Projeto. Desenvolvimento e
Avaliação do Projeto. Objetivos e Estratégias do Projeto.
Critérios de Sucesso e Insucesso do Projeto. Iniciação do
projeto. Encerramento do Projeto. Estruturas do Projeto.
Conteúdo e Escopo. Programação do Tempo. Recursos.
Custos e financiamento do Projeto. Configuração e
Modificações. Riscos do Projeto. Medidas do desempenho.
Controle do Projeto. Informação, documentação e reporting.
Organização do Projeto. Trabalho em equipe. Liderança.
Comunicação. Conflitos e Crises. Aquisições e Contratos.
Qualidade do Projeto. Informática em Projetos. Normas e
Regulamentações. Negociação e Reuniões. Marketing e
Gerenciamento de Produtos. Segurança, saúde e meio
ambiente. Aspectos legais. Gestão da cadeia de
suprimentos. Trabalho colaborativo a distância e Gestão
do Conhecimento em projetos. (DEMBOSKI, 2007)
IPMA
X
Gerenciamento por elementos base
Dentre as associações filiadas à IPMA está a ABGP
do Brasil (Associação Brasileira em Gerenciamento de
Projetos). Santos e Carvalho (2006) afirmam que a ABGP
foi criada no final de 2001 com a finalidade de permitir o
acesso do Brasil a uma rede internacional de certificação
em gerenciamento de projetos, da qual participam vários
países dos quais o Brasil é o único país da América do
Sul integrante desta rede. Sua sede da ABGP está
localizada em Curitiba.
Conforme Santos e Carvalho (2006), no Referencial
Brasileiro em Gerenciamento de Projetos (RBC) são
apresentados 37 Elementos Base para a certificação
ABGP/IPMA, dos quais 28 são elementos de base,
comuns a todas as associações nacionais IPMA, 6 são
elementos adicionais do ICB e 3 são elementos adicionais
específicos para a certificação brasileira. Tais elementos
tratam de conceitos relacionados às melhores práticas de
gestão de projetos e cada um destes aborda um assunto
específico.
PMI
X
Certificação
X
X
X
Níveis de certificação
X
Aplicabilidade em grandes empresas
X
X
Aplicabilidade em pequenas e médias empresas
X
X
Maior divulgação no Brasil
X
Maior divulgação na América
X
Maior divulgação na Europa
X
Utilização (maior número de certificações e membros)
X
Ilustrações explicativas
X
Maior sintetização do assunto
X
Maior detalhamento nos conceitos
X
Mais detalhamento das áreas de conhecimento
X
X
Fonte: Demboski, Liebert, Benedetti, 2007.
Quadro 1: Comparação entre PMI e IPMA.
4.2 PESQUISA SOBRE A UTILIZAÇÃO
DE MELHORES PRÁTICAS DE GESTÃO DE
PROJETOS
4.2.1 Visita às empresas da região
Fronteira Noroeste do Rio Grande do Sul
Tentando cumprir com os objetivos traçados em
projeto do presente trabalho, listou-se algumas empresas
da Região Fronteira Noroeste do Rio Grande do Sul que
possuem a informática como meio ou fim, presumindo que
as mesmas realizam projetos nessa área. O intuito da
pesquisa é de conhecer a forma de gerenciamento de
projetos utilizada, verificar se as empresas utilizam algum
conjunto de melhores práticas de gerenciamento de
projetos e se são utilizados o PMI e a IPMA os quais são
abordados no presente trabalho. Ao final, propõem-se a
realização de uma palestra para a empresa de forma
gratuita.
Após a listagem das empresas, elaboraram-se as
questões que fazem parte da entrevista, contemplando os
objetivos do trabalho.
Como se tratava de uma entrevista, contatou-se
anteriormente a pessoa responsável pela área de TI de
cada uma das empresas listadas, agendando a entrevista
por meio eletrônico e telefone.
88
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Após esse processo inicial, finalmente foi-se a
campo para entrevistar e verificar como as empresas se
organizam em relação à realização de projetos e quanto
ao gerenciamento dos mesmos.
A recepção e o atendimento dos responsáveis pela
área de TI nas empresas visitadas foram de muita atenção
e interesse em ajudar a responder a entrevista da melhor
forma possível.
Porém, algumas empresas não abriram espaço
devido à pessoa responsável pela área não ter
disponibilidade em sua agenda; desta forma, foi buscada
outra forma de realizar a entrevista. Encaminhou-se a
mesma através de e-mail e, posteriormente, entrou-se em
contato via telefone, diminuindo assim o tempo da
entrevista, levando-se em conta que o entrevistado já estava
interado ao assunto.
Depois de efetuado um estudo do PMI e IPMA,
através de seus respectivos guias, foi montada a palestra
com o intuito de mostrar para as pessoas inicialmente o
propósito do trabalho, explanando o PMI e a IPMA, após
conceituando o que é projeto, qual a importância da
realização de projetos para as empresas e também os
principais pontos que devem ser alcançados para que o
projeto após seu término seja considerado de sucesso.
Na palestra foram abordados diversos assuntos
relacionados a projetos, gerenciamento de projetos, desde
a origem que foi por volta da segunda metade do século
XIX que exigiram que a gestão das organizações fosse
cada vez mais eficiente e devido à complexidade dos
negócios e à competitividade em mercado mundial, faz
com que as empresas e organizações busquem
alternativas que auxiliem na gestão, e esta pressão de
mercado fará com que se adote uma prática padronizada
de gerenciamento de projetos.
Após toda essa introdução sobre o gerenciamento
de projetos e sua importância, abordou-se então o conceito
de prática de gerenciamento de projetos, evidenciando que
através do bom uso dessas práticas evita-se o insucesso
do projeto.
Abordou-se, então, o PMI e IPMA, sobre os quais
se deteve toda a explanação, citando as suas origens, a
forma de estruturação das mesmas.
Depois da explanação, mostrou-se um
comparativo das características de ambas. E, para finalizar
a explanação, disponibilizaram-se os sites oficiais do PMI
internacional, do PMI do Brasil e da seção do PMI no Rio
Grande do Sul, também o site oficial do IPMA e da ABGP,
para que os participantes pudessem buscar mais
informações.
Dada por encerrada a explanação, abriu-se um
espaço para perguntas onde os participantes poderiam
sanar diversas dúvidas, dentre as quais questionamentos
sobre certificação, adoção d e práticas, guias de divulgação,
dentre outros. As respostas destas perguntas foram dadas
buscando sempre relacionar o assunto com a empresa e
o ramo de atuação de cada uma delas. Pôde-se notar que
em algumas empresas os questionamentos foram mais
voltados a IPMA, pois havia participantes que possuíam
mais conhecimento do PMI.
As palestras ministradas foram consideradas
positivas. Houve um ótimo recebimento por parte das
empresas bem como disponibilização de equipamentos
necessários para a execução das mesmas. Os
participantes demonstraram interesse no assunto por ser
algo novo e também pela apresentação de exemplos
relacionados com as atividades diárias da empresa.
As questões referentes ao feedback foram uma
alternativa de melhorar a explanação do assunto à medida
em as palestras foram sendo ministradas. A questão
relativa ao interesse de participar de um curso de extensão
/ treinamento para obter mais informações sobre o assunto
foi tabulada e é representada na Figura 3.
Fonte: Demboski, Liebert, Benedetti, 2007.
Figura 3: Interessados em participar de um curso
de extensão/ treinamento.
Os resultados apresentados são dados coletados
com os participantes presentes na explanação. Pôde-se
notar que existe grande interesse por parte das pessoas
que assistiram às palestras em aprender mais sobre este
assunto através de um curso de extensão / treinamento.
Também foi questionado qual dos dois conjuntos
de melhores práticas os participantes possuem um maior
interesse em realizar um curso de extensão / treinamento,
representada na Figura 4.
Interes s ados em partic ipar de c urs o de
extens ão / treinamento em qual das
melhores prátic as em g erenc iamento de
projetos ?
P MI
45%
IP MA
55%
Fonte: Demboski, Liebert, Benedetti, 2007.
Figura 4: Metodologia que despertou mais interesse
em participação de curso de extensão / treinamento.
89
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
Nota-se que a maioria dos participantes mostrou
mais interesse em participar do curso de extensão /
treinamento em IPMA, pois houve uma melhor aceitação
nas empresas que foi ministrada as palestras, apesar da
diferença entre ambas ser pequena como mostra a Figura
4.
5. CONCLUSÃO
Pode-se concluir até então que o gerenciamento de
projetos é de suma importância na gestão das empresas
para serem competitivas. As práticas de gerenciamento
de projetos são importantes para o desenvolvimento eficaz
de projetos através do uso de boas práticas.
PRADO, Darci. Gerenciamento de Programas e
Projetos nas Organizações. Nova Lima: INDG-Tecs Ltda,
2004.
SANTOS, J. A.; CARVALHO, H.G. Referencial Brasileiro
de Competências em Gerenciamento de Projetos.
Curitiba: ABGP, 2006.
Seção PMI-RS. Disponível http://www.pmirs.org.br.
Acessado em 24 de abril de 2007.
SOTILLE, Mauro Afonso. Processos de gerenciamento
de projetos. Disponível em http://www.pmtech.com.br/
artigos/Processos_PMBOK_3a.pdf. Acessado em 24 de
abril de 2007.
Quanto ao contexto das empresas da Região
Fronteira Noroeste do Rio Grande do Sul, em relação à
organização de projetos, constatou-se que os projetos de
TI são pequenos, pois as empresas entrevistadas são de
pequeno porte e algumas não são voltadas para o ramo de
atividade de TI. Os controles para gerenciar projetos são
elaborados pela própria organização.
Em relação à utilização de práticas de
gerenciamento de projetos PMI e IPMA, despertaram
interesse no uso das mesmas para maioria dos
participantes presentes na palestra, porém é necessário
dar mais ênfase ao assunto através de cursos de extensão
/ treinamentos para que o profissional possa usar
adequadamente estas práticas de gestão.
Levando em consideração o interesse das
empresas da Região Fronteira Noroeste do Rio Grande do
Sul, sugere-se a disponibilização de cursos de extensão /
treinamento em IPMA, conforme mostrou este estudo, pois
há um público alvo interessado no assunto em questão.
6. REFERÊNCIAS
CAVALIERI, Adriane; DINSMORE, Paul Campbell. Como
se tornar um profissional em Gerenciamento de
Projetos. Rio de Janeiro, Editora Quality Mark: 2006.
DEMBOSKI, Elisandra Martinha; LIEBERT, Delson;
BENEDETTI, Vera Lúcia Lorensett. Estudo de
metodologias de gerenciamento de projetos e
utilização em empresas da Região Fronteira Noroeste
do estado do Rio Grande do Sul. Trabalho de Estágio
de curso Bacharelado em Sistemas de Informação da
SETREM defendido e aprovado em agosto de 2007.
FERREIRA, Paulo Affonso. Nova certificação PgMP.
Disponível
em
http://www.pmi.org.br/joomla/
index.php?option=com_content&task=view&id=18&Itemid=2.
Acessado em 5 de Agosto de 2007.
KEELING, Ralph. Gestão de Projetos: uma abordagem
global. São Paulo, Saraiva: 2002.
KERZNER, Harnold. Gestão de Projetos: as melhores
práticas. Porto Alegre, Bookman, 2002.
PMBOK, Project Management Body of Knowledge,
2004.
90
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DE UMA
FERRAMENTA DE GERENCIAMENTO ELETRÔNICO
DE DOCUMENTOS PARA UMA INSTITUIÇÃO DE
ENSINO SUPERIOR
Daniela Schmidt1, Pablo Miguel de Almeida Mucha1
Denis Valdir Benatti, Antônio Ternes2
Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM
[email protected], [email protected]
[email protected], [email protected]
RESUMO
Atualmente, a informação é considerada o ativo mais
valioso de uma organização, seja ela pública ou privada, a
mesma pode ser o diferencial no ambiente competitivo que
se depara, porém o gerenciamento destes dados pode
representar um problema para a organização, visto que o
acúmulo de documentos em papel acaba dificultando a
localização e conservação dos mesmos. Com base neste
contexto, busca-se analisar soluções de Gerenciamento
Eletrônico de Documentos (GED), avaliando seus pontos
principais, para posteriormente optar pela solução mais
adequada para a Sociedade Educacional Três de Maio –
SETREM. Após análise mencionada, definiu-se como
ferramenta base o Nou-Rau, sendo assim, o trabalho em
questão apresenta os principais conceitos no que se refere
à ferramenta, como também, a importância da utilização
de Sistemas de Gerenciamento de Documentos nas
instituições de ensino. Este trabalho foi desenvolvido no
segundo semestre do ano 2007 pelos acadêmicos do Curso
Superior de Tecnologia em Redes de Computadores, no
ambiente computacional da Sociedade Educacional Três
de Maio – SETREM.
Palavras-Chave: Nou-Rau, gerenciamento,
SETREM.
the location and conservation of the same ones. With base
in this context, it is looked for to analyze solutions of
Electronic Administration of Documents (GED, evaluating
their main points, for later to choose for the most appropriate
solution for the Sociedade Educacional Três de Maio SETREM. After the mentioned analysis, it was defined as
tool base Nou-Rau, being like this works as a trainee
supervised in subject, it presents the main concepts in
what refers to the tool, as well as the importance of the
use of Systems of Administration of Documents in the
institutions. This work of the second semester of 2007 for
the academics of the Curso Superior de Tecnologia em
Redes de Computadores, in the computational atmosphere
of the Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM.
Word-key: Nou-Rau, administration, SETREM.
1 INTRODUÇÃO
Cada vez mais cresce a importância da informação
dentro das organizações, tornando-se, assim, necessária
para o desenvolvimento do negócio. O ambiente se torna
mais complexo e menos previsível, conseqüentemente,
mais dependente dos dados e da infra-estrutura tecnológica
existente.
ABSTRACT
The information is considered the most valuable
asset of an organization, being it public or private, the
same can be the differential in the competitive atmosphere
that it comes across, however the administration of these
data can represent a problem for the organization, because
the accumulation of documents in paper ends up hindering
Normalmente as empresas geram inúmeras
documentações em forma de papel, o que pode causar
atrasos e dificuldades na localização de um determinado
material. Documentos armazenados desta forma têm menor
flexibilidade, sendo assim, exigem maiores espaços para
armazenamento e, com isso, geram maiores custos de
manutenção.
1 Acadêmicos do sexto semestre Curso Superior Tecnologia em Redes de Computadores da Sociedade Educacional Três de Maio –
SETREM – Estágio Supervisionado, Três de Maio – RS, e-mail: [email protected]
2 Professores Orientadores do Trabalho.
91
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
A informação é um patrimônio, algo de valor que
deve ser armazenado e organizado de forma eficiente. As
novas tecnologias possibilitam a melhoria da qualidade e
a disponibilidade desses dados. Oferecendo suporte para
a evolução dos processos internos e dos serviços
prestados.
Nesse contexto surge a necessidade da utilização
de ferramentas e processos que possam facilitar a tarefa
do gerenciamento de documentos. O GED (Gerenciamento
Eletrônico de Documentos) é a tecnologia capaz de prover
um meio de armazenar, localizar e recuperar informações
existentes em documentos e dados eletrônicos.
Esta pesquisa pretende demonstrar os métodos
necessários para a implantação de uma ferramenta de
Gerenciamento Eletrônico de Documentos em uma
Instituição de Ensino Superior da nossa região,
demonstrando os benefícios e as vantagens da utilização
desse tipo de solução para gerenciar as produções
acadêmicas da mesma.
Além disso, este estudo aborda os princípios do
Gerenciamento Eletrônico de Documentos, os conceitos
e as principais características. O trabalho pretende avaliar
ferramentas que possam realizar a tarefa proposta neste
estágio, levando em conta o cenário escolhido para o
desenvolvimento do mesmo.
Por fim, pretende-se optar pela solução que melhor
se adapte à realidade da Instituição, realizando então a
implantação da ferramenta, como também toda a
configuração necessária.
2 METODOLOGIA
Etapa 6: Implantar a solução de GED na instituição
escolhida.
Etapa 7: Estruturar os resultados obtidos com o
devido projeto.
Etapa 8: Considerações finais e apresentação de
resultados.
3 GERENCIAMENTO ELETRÔNICO DE
DOCUMENTOS (GED)
O GED é um subconjunto de processamento
eletrônico de informações que teve início com o uso de
computadores. Este processamento foi disseminado nos
anos 60, sendo utilizado principalmente para
processamento de informações numéricas. Na década de
70, o processamento se expandiu de forma a agrupar texto
ao processamento acima mencionado. Os elementos
gráficos foram adicionados na década de 80 e, nos anos
90, imagens, voz e vídeo passaram a ser eletronicamente
processados.
O Gerenciamento Eletrônico de Documentos
(GED) é uma técnica, um sistema, uma
metodologia para o tratamento e o
processamento automatizado de documentos
em papel e/ou suas cópias em microfilme.
(Avedon, 2002. Pág 03).
A tecnologia de GED automatiza o processamento
de informações em forma de documento. Após as
informações de um documento serem convertidas em
formato eletrônico, o documento pode ser armazenado,
recuperado, transmitido, processado, exibido ou impresso
rapidamente. (AVEDON, 2002).
A pesquisa realizada foi do tipo bibliográfica e
experimental, onde a abordagem qualitativa foi utilizada
como eixo central.
Para a realização do projeto,
seguiram-se as seguintes etapas:
O Gerenciamento Eletrônico de Documentos
(GED) é uma configuração de equipamentos,
software e, normalmente, de recursos de
telecomunicações baseada em computadores
e automatizada que armazena e gerencia
imagens de documentos – e seus índices
codificados – que podem ser lidas por
máquinas e processadas por computadores
para recuperação sob solicitação. (Avedon,
2002. Pág 11).
Etapa 1: Definição do local para a aplicação do
projeto.
Etapa 2: Entender a necessidade da instituição
escolhida.
Etapa 3: Elaborar o projeto para a implantação da
solução.
Etapa 4: Elaborar o projeto científico, com base
nas normas da ABNT e conforme a metodologia SETREM.
Etapa 5: Elaborar o Embasamento Teórico
mencionando as principais tecnologias utilizadas no
decorrer do processo.
Os sistemas de GED preservam as características
visuais e espaciais e a aparência do documento original
em papel, sendo uma das grandes vantagens do GED a
capacidade de capturar, recuperar e transmitir documentos
contendo informações como manuscritas, diagramas,
fotografias, desenhos de engenharia e impressões digitais,
por exemplo.
Na maioria dos sistemas de GED, scanners são
utilizados para converter documentos em papel ou imagens
de microfilme em imagens eletrônicas digitalizadas. Após
a digitalização, as imagens eletrônicas são gravadas em
92
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
discos ópticos em locais controlados por software, sendo
possível também a inserção de documentos gerados a partir
de sistemas informatizados. (AVEDON, 2002).
3.1 Vantagens e Benefícios dos
Sistemas de GED
Uma trilha de auditoria relativa ao acesso a um arquivo ou
documento em particular também pode ser mantida.
Backups da Mídia ou índice podem ser armazenados em
local remoto para proteção contra acidentes. (AVEDON,
2002).
4 INFORMAÇÃO
O que torna o GED atraente para usuários e gerentes
é a soma dos benefícios do mesmo, não somente
características isoladas. Desta forma, serão citados
algumas vantagens e benefícios do sistema quando
comparado a sistemas de documentação em papel,
microfilme ou mídias magnéticas. (AVEDON, 2002).
l Densidade de Pacotes: o conteúdo (imagens de
bitmap) de dez arquivos com quatro gavetas cada (200 mil
páginas) pode ser armazenado em um disco de 12
polegadas em vez de 1200 microfichas, 40 rolos de
microfilme de 16 mm (com redução 24:1), 40 rolos de fita
magnética ou 2 mil disquetes. (AVEDON, 2002).
l Recuperação Veloz: qualquer documento pode
ser localizado em segundos. De um arquivo com milhões
de páginas, a recuperação não deve exceder 30 segundos.
O papel em um arquivo local pode exigir 5 minutos; de um
local remoto, a recuperação pode levar horas. A
recuperação de informações em microfilme leva mais tempo
que em discos ópticos, porém menos que a de papel.
(AVEDON, 2002).
l Workflow: muitas funções e atividades de
negócios têm seu ritmo e sequenciamento estabelecidos
pelo fluxo da papelada e não pelo trabalho em si realizado
com os documentos. Por exemplo, as tarefas de
processamento começam quando o papel chega à mesa
de determinado colaborador e não quando alguém conclui
uma etapa de processamento. Utilizando sistemas de
gerenciamento, pessoas podem ser avisadas
automaticamente quando há um novo processamento a
ser executado. Pode-se definir prioridade a determinados
documentos. Ainda, podem ser definidas rotas de auditoria
estabelecendo relatórios de gerenciamento gerados através
do fluxo de trabalho. (AVEDON, 2002).
l Indexação e Referência Cruzada: os sistemas
de Gerenciamento Eletrônico de Documentos utilizam um
computador como controlador ou “gerenciador eletrônico
de sistemas” e podem definir referências cruzadas para
os documentos. Os usuários podem pesquisar
documentos por nome, número de conta ou qualquer
combinação de descritores. (AVEDON, 2002).
l Documentos sempre Disponíveis: muitos
usuários podem consultar o mesmo arquivo ou documento
simultaneamente; documentos e pastas não podem ser
arquivados no lugar errado. (AVEDON, 2002).
Informação é o conjunto de dados utilizados na
transferência de uma mensagem entre indivíduos ou
máquinas em processos comunicativos ou transacionais.
A informação pode estar presente ou ser manipulada por
diversos processos denominados ativos, os quais são alvos
de proteção da segurança da Informação. (SÊMOLA,
2003).
O termo ativo possui esta denominação,
oriunda da área, por ser considerado um
elemento de valor para um indivíduo ou
organização, e que, por esse motivo, necessita
de proteção adequada. (Sêmola (2003), aput
ISO/IEC – 17799, Pág. 45).
A Informação é considerada o ativo mais valorizado
de uma organização, visto que a todo o momento surgem
mudanças no mercado que influenciam e provocam
alterações no contexto das Empresas ou Instituições. Com
freqüência surgem experiências, conceitos, métodos e
modelos oriundos da movimentação de questionadores
estudiosos, pesquisadores e executivos que não se
conformam com a passividade da vida e buscam a inovação
e a quebra de paradigmas. (SÊMOLA, 2003).
O significado de informação é o ato de transmitir a
terceiros o conhecimento que é caracterizado pela
disseminação verbal ou escrita de obras cientificas,
literárias e artísticas que contenham conteúdo valoroso e
diferenciado pela sua originalidade em relação a qualquer
obra de mesmo gênero. (STAREC ETT ALL, 2006).
5 SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO
A informação é considerada um ativo como
qualquer outro, sendo essencial para os negócios de uma
organização e, por conseqüência, necessita de proteção
adequada. (ABNT, 2005).
A segurança da informação é a área do
conhecimento que estuda meios para a proteção de ativos
da informação, impedindo acessos não autorizados; além
disso, impede que ocorra alterações indevidas ou a
indisponibilidade das informações. (SÊMOLA, 2003).
l Segurança: um sistema de senhas de usuário
pode restringir o acesso a várias categorias de material.
93
Segurança da informação é a proteção da
informação de vários tipos de ameaças para
garantir a continuidade do negócio, minimizar
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
o risco ao negócio, maximizar o retorno sobre
os investimentos e as oportunidades de
negócios. (ABNT, 2005. Pág IX).
A informação pode estar em diversas formas, pode
encontrar-se em forma impressa, armazenada
eletronicamente, apresentada em filmes ou gravações.
Mas, independentemente da forma de armazenamento, é
importante que a informação esteja sempre protegida de
forma adequada. (ABNT, 2005).
A Segurança da Informação pode ser defina como
um processo flexível, onde o mesmo é atualizado
constantemente. Ou seja, os processos e procedimentos
devem ser adequados, pois os riscos, ameaças e
vulnerabilidades estão sempre sofrendo alterações, visto
que, na medida em que as soluções de segurança são
aperfeiçoadas, novas ameaças surgem e adaptam-se a
estas. (HORTON, 2004).
Para Oliveira (2001), a segurança da informação não
é somente uma questão técnica, mas sim uma questão
gerencial e humana. Além da implementação de métodos
e ferramentas de proteção, é necessária a conscientização
de todos os níveis funcionais da organização.
5.1 Contingências
Para garantir a continuidade dos processos de uma
organização, é importante minimizar os impactos de um
possível desastre. (SÊMOLA, 2003).
Um plano de contingência é um produto para
avaliações de riscos, o qual contém uma série de ações
preventivas e de recuperação. (CASTRO FILHO, 2003).
O plano de continuidade do negócio descreve
o enfoque para continuidade, por exemplo, o
enfoque para assegurar a disponibilidade e
segurança do sistema de informação ou da
informação. Convém que cada plano também
especifique o plano de escalonamento e as
condições para sua ativação, assim como as
responsabilidades individuais para execução
de cada uma das atividades do plano. Quando
novos requisitos são identificados, é importante
que os procedimentos de emergência
relacionados sejam ajustados de forma
apropriada, por exemplo, o plano de abandono
ou o procedimento de recuperação. Convém
que os procedimentos do programa de gestão
de mudanças da organização sejam incluídos
para assegurar
que os assuntos de
continuidade de negócio estejam sempre
direcionados adequadamente. (ABNT, 2005, p.
105).
vezes, uma organização deverá possuir vários planos de
contingência de forma integrada e focados em diferentes
perímetros da empresa, sejam físicos, tecnológicos ou
humanos. (SÊMOLA, 2003).
6 ESCOLHA DA SOLUÇÃO
Para a escolha da ferramenta a ser implantada no
decorrer do estágio, realizaram-se testes utilizando três
ferramentas selecionadas aleatoriamente. Estes softwares
se baseiam em plataforma livre, ambos disponíveis para
download. Trata-se das ferramentas: DocMGR, Tede e NouRau. Estes aplicativos tiveram suas funcionalidades
testadas como também seu desempenho analisado.
7 NOU-RAU
Optou-se pela utilização da ferramenta Nou-Rau, pois
a mesma possui características imprescindíveis para o
gerenciamento eficiente em um ambiente educacional
devido ao controle de acessos e à necessidade de
aprovação dos documentos antes da sua definitiva
publicação.
O Nou-Rau é resultado de um projeto de pesquisa
desenvolvido pelo Instituto Vale do Futuro, juntamente com
o Centro de Computação da Unicamp de São Paulo. Seu
uso é livre e gratuito, sendo distribuído sob a licença GPL
(GNU General Public License).
O sistema Nou-Rau tem como principal
funcionalidade o recebimento de documentos digitais de
diversos formatos, os quais são convertidos para texto
puro e posteriormente são indexados utilizando um
mecanismo denominado ht://Dig, este é responsável em
realizar as consultas à base de dados.
A ferramenta possui ainda um sistema de aprovação
para os materiais incluídos no mesmo. Os documentos
são inseridos por colaboradores e são submetidos à
aprovação e revisão de responsáveis do sistema.
7.1 Instalação
O processo de instalação e configuração da
ferramenta ocorreu no laboratório de redes da SETREM,
onde a mesma foi realizada utilizando um equipamento
com a seguinte configuração de hardware:
- Microcomputador Athlon 1500 Mhz
- 1 Gb de Memória Ram
- Disco rígido de 40 Gb
O plano de continuidade possui um alto nível de
complexidade, assumindo diversas formas e funções
dependendo do tipo de objeto a ser contingenciado. Por
Para o processo de instalação, foi utilizado como
base de informação o “Manual de Instalação – Nou-Rau”,
94
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
o qual está disponível no site do desenvolvedor do sistema.
( h t t p : / / w w w. r a u - t u . u n i c a m p . b r / n o u - r a u / d o c s /
instalacao_nourau.pdf).
l Sistema operacional GNU/Linux ou outro da família
UNIX.
l Linguagem PHP.
7.2 Ferramentas
Conversores
Auxiliares
e
l Linguagem Perl.
Para a implantação da ferramenta é necessário que
ocorra a instalação de alguns conversores (Quadro 1). Cada
um destes tem a função de realizar a tarefa de conversão
do formato original do documento para um formato de texto
ou similar, onde posteriormente serão utilizados para as
indexações de buscas.
Conversor
Descrição
ANTIWORD
O Antiword é software livre utilizado para leitura de
documentos no formato doc, para as plataformas Linux,
Unix e Risc OS.
Atualmente a ferramenta é compatível com as versões do
Microsoft Word 6, 7, 97, 2000, 2002 e 2003. Possuindo a
capacidade de conversão deste tipo de formato para um
formato de texto puro ou para o formato postScript.
PDFTOTEXT
Realiza a conversão de um arquivo em formato PDF para
o formato de texto puro.
PPTHTML
Realiza a conversão de apresentações em formato PPT para o
formato de arquivo HTML.
PSTOTEXT
Realiza a conversão de arquivos em formato PS para o
formato texto.
XLHTML
Esse software faz a conversão de planilhas do Excel do
formato XLS para o formato HTML.
XPDF
Ferramenta em software livre, utilizada
visualização de arquivos em formato PDF.
FONTE: Mucha, Schmidt, Benatti, Ternes; 2007.
QUADRO 1: LISTA DE CONVERSORES DO NOU-RAU.
para
l Servidor de páginas Apache.
7.5 PERSONAGENS DO SISTEMA
A ferramenta Nou-Rau utiliza o conceito de
personagens no sistema em que cada um possui
determinados perfis e privilégios de acesso como também
responsabilidades distintas. Estes personagens se
encontram definidos da seguinte maneira:
l Visitante: é considerado qualquer indivíduo que
acessa o sistema com o objetivo de realizar alguma
consulta na base de informações. Não necessita estar
cadastrado no sistema, ficando limitado às seguintes
atividades: consulta de tópicos, buscas e download dos
documentos publicados.
a
7.3 Ht://DIG
O ht://Dig, é uma poderosa ferramenta para
indexação e busca em domínio de Internet e Intranet. Este
mecanismo é considerado uma das partes mais
importantes do sistema Nou-Rau.
O ht://Dig foi desenvolvido pela San Diego State
University. Esse sistema possui uma base própria,
otimizada para efetuar buscas internas, alimentando uma
base de dados com conteúdo dos documentos e com as
informações associadas a eles.
Quando realizada uma consulta, a ferramenta retorna
uma página de resultados onde os documentos são
apresentados conforme a sua relevância quanto às palavras
chaves fornecidas. O índice criado pelo ht://Dig é composto
pelas informações cadastrais do documento e pelo
conteúdo completo do mesmo.
7.4
PRÉ-REQUISITOS
FERRAMENTA
l Banco de dados PostgreSQL.
DA
Conforme informações coletadas do site oficial dos
desenvolvedores, o Nou-Rau possui alguns requisitos
fundamentais em nível de software para seu adequado
funcionamento. Seriam eles:
l Colaborador: corresponde a um usuário
cadastrado no sistema, o qual tem a permissão de adicionar
novos documentos. Porém, para a publicação do
documento, é necessário optar por um tópico e uma
categoria associada ao mesmo para que, depois disso, o
documento seja adicionado à ferramenta e submetido à
avaliação do responsável pelo tópico.
l Responsável: é o usuário que deve administrar
um tópico do sistema. Tem a função de interagir com os
colaboradores na aceitação ou rejeição de um determinado
documento. É notificado por e-mail sobre os novos
documentos incluídos no sistema. Cada tópico do sistema
possui apenas um responsável, mas um responsável pode
administrar vários tópicos.
l Administrador: é considerada a pessoa que
administra a ferramenta. É responsável pela manutenção
do sistema, definindo e criando novos tópicos e categorias.
Além disso, é responsável pelos cadastros de todos os
usuários.
É importante ressaltar que qualquer pessoa que
acesse o sistema sem estar autenticado no mesmo é
considerado um visitante, e esse, tem acesso a toda base
de informação disponível para a realização de consultas.
Além disso, um usuário cadastrado no Nou-Rau
pode assumir dois personagens distintos no sistema. Por
exemplo: um responsável de um tópico pode ser um
colaborador em outro tópico.
95
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
7.6 ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA
O sistema Nou-Rau possui uma estrutura interna
para a organização e o armazenamento dos conteúdos
incluídos no sistema, da seguinte maneira:
l Tópicos: o Nou-Rau utiliza o conceito de tópicos
para a organização dos documentos em áreas especificas
do sistema. Ou seja, é possível criar tópicos específicos
para cada um dos assuntos que serão adicionados no
sistema. Por exemplo, é possível criar tópicos chamados
“informática” e outro “saúde”, onde cada um terá os
documentos relacionados ao tema do tópico. Cada tópico
possui um responsável pelo gerenciamento, o qual tem a
função de aprovar ou rejeitar os documentos adicionados
pelos colaboradores. O Nou-Rau possui uma organização
hierárquica, ou seja, é possível criar um ou mais subtópicos
dentro de um determinado tópico.
l Categorias: cada tópico do sistema possui uma
categoria correspondente. Quando um determinado tópico
é criado pelo administrador, é necessário definir que
categoria de documentos que serão armazenados. As
categorias definem quais formatos de arquivos serão aceitos
em cada um dos tópicos como também o limite máximo
do tamanho do arquivo a ser incluído no sistema.
l Documentos: o Nou-Rau caracteriza como
documento os arquivos incluídos no sistema, juntamente
com uma série de informações complementares. As
informações relacionadas aos documentos são as
seguintes: título, autor(es), e-mail, palavras-chave,
descrição e informações adicionais.
Após a solicitação feita, a ferramenta notificará o
administrador sobre a necessidade do mesmo efetuar a
autorização ou a rejeição do novo colaborador.
O Nou-Rau notificará o novo usuário através do envio
de um e-mail, informando a decisão do administrador, se o
usuário foi ou não aceito. Caso for aceito, o novo usuário
receberá um link, onde o mesmo efetuará o registro de
suas informações pessoais e receberá sua senha de
acesso.
FONTE: Mucha, Schmidt, Benatti, Ternes; 2007.
FIGURA 1: TELA DE REGISTRO DO NOU-RAU.
8 FLUXO DOCUMENTAL
O trabalho mostra as funcionalidades que
possibilitam mapear os trajetos e controlar o status do
fluxo documental (workflow) das informações.
A utilização do fluxo documental possibilita a criação
de fluxogramas, os quais representam os caminhos dos
documentos no processo de publicação das informações.
Com isso, busca-se garantir que todo o processo seja
respeitado por todos os personagens do sistema.
7.7 ACESSO AO SISTEMA
Uma das características do Nou-Rau é a de ser uma
ferramenta de arquivamento de documento de forma
colaborativa, ou seja, a ferramenta recebe os documentos
de vários usuários através da Internet.
Para isso, é necessário que estes usuários estejam
cadastrados no sistema e possuam a autorização para a
inclusão de novas informações no mesmo.
Conforme o que foi mostrado anteriormente, os
usuários cadastrados no sistema são denominados
colaboradores. Estes têm a permissão de submeter
arquivos para a análise dos responsáveis para que
posteriormente as informações venham a ser
disponibilizadas no site Web do sistema.
8.1 Fluxo para a publicação de um novo documento
no sistema
Como dito anteriormente, para que um usuário
realize a publicação de um determinado material no
sistema, é necessário que o mesmo esteja cadastrado
como colaborador da ferramenta e que o documento seja
analisado e aprovado por um responsável do Nou-Rau.
Na seqüência, é demonstrado o passo a passo.
Os processos necessários para que o ocorra a inclusão e
a aprovação de um documento no sistema, para que após,
o mesmo fique disponível para consulta de outros usuários.
1. O colaborador acessa o sistema
2. O colaborador deve estar cadastrado no sistema.
O processo para a inclusão de novos colaboradores
é relativamente simples, onde basta o usuário interessado
em ser cadastrado, acessar a página principal do sistema,
e solicitar seu registro através do link “registrar” (Figura 1).
3. Se não estiver cadastrado:
a. o usuário deve solicitar seu registro ao
administrador do sistema;
96
REVISTA SETREM - Ano VI nº11 Jul/Dez 2007 ISSN 1678-1252
b. o administrador, analisa a solicitação e define se
o usuário é incluído ou não no sistema;
c. o novo usuário é cadastrado como um
colaborador.
4. Se estiver cadastrado:
a. o colaborador escolhe o tópico onde pretende
publicar o documento;
1.O responsável deve justificar o motivo
pela rejeição do documento e solicitar a correção do
mesmo.
2. O sistema envia um e-mail para o
colaborador, avisando da rejeição do documento e
solicitando a correção.
Na Figura 2, é possível visualizar todo o processo
de inclusão e aprovação de um material, através de um
fluxograma.
b. anexa o documento;
c. adiciona informações complementares sobre o
documento (autor, e-mail, palavras-chave...)
5. O sistema envia um e-mail para o responsável do
tópico, informando que existe um documento a ser
aprovado ou rejeitado.
6. O responsável pelo tópico acessa o sistema.
7. O responsável deve analisar o documento.
8. O responsável deve aprovar ou rejeitar o
documento.
9. Se o documento for aprovado
a. O sistema envia um e-mail para o colaborador
avisando da publicação.
b. O documento é publicado e fica disponível para
consulta na Web.
10. Se o documento foi rejeitado
FONTE: Mucha, Schmidt, Benatti, Ternes; 2007.
a. O responsável do tópico pode corrigi-lo e alterá-
FIGURA 2: FLUXO DOS DOCUMENTOS.
lo
9 DEFINIÇÃO DOS TÓPICOS
i. Se for corrigido
1. O documento é aprovado.
2. O sistema envia um e-mail para o
colaborador avisando da publicação.
3. O documento é publicado e fica
disponível para consulta na Web.
ii. Se não for corrigido
Na implantação da ferramenta foi definida uma
estrutura de tópicos e subtópicos, os quais serão utilizados
para a organização de todos os documentos armazenados
no sistema Nou-Rau da SETREM.
Foram criados dois tópicos principais. Um tópico
para os documentos do curso de Sistemas de Informação
e outro para o curso de Tecnologia em Redes de
Computadores.
Para a melhor organização dos documentos foram
criados diversos subtópicos, os quais foram distribuídos
da seguinte forma:
97

Documentos relacionados