Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate”

Transcrição

Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate”
Hélder Ferreira Isayama
Marcus Aurélio Taborda de Oliveira
César Teixeira Castilho
Karine Barbosa de Oliveira
(Organizadores)
COLETÂNEA
XIII SEMINÁRIO
“O LAZER EM DEBATE”
Belo Horizonte
Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional de UFMG
2012
FICHA CATALOGRÁFICA
S471c
Seminário “O Lazer em Debate” (13.: 2012 : Belo Horizonte, MG.)
Coletânea do XIII Seminário “O lazer em debate” / Organizadores:
Hélder Ferreira Isayama, Marcus Aurélio Taborda de Oliveira, César Teixeira
Castilho, Karine Barbosa de Oliveira. – Belo Horizonte : UFMG/DEF/CELAR,
2012.
504 p.
ISBN: 978-85-61537-15-9
1. Lazer - Congressos. 2. Recreação - Congressos. 0
I. Isayama, Hélder Ferreira. II. Oliveira, Marcus Aurélio Taborda de. III.
Castilho, César Teixeira. IV. Oliveira, Karine Barbosa de. V. Título
CDU: 379.8(063)
Ficha catalográfica elaborada pela equipe de bibliotecários da Biblioteca da Escola de Educação
Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais.
Organizadores da Coletânea:
Diagramação:
Capa:
Impressão:
Hélder Ferreira Isayama
Marcus Aurélio Taborda de Oliveira
César Teixeira Castilho
Karine Barbosa de Oliveira
Júnior Sena (www.juniorsena.com.br)
Adilson Batista Moreira
Imprensa Universitária da UFMG
Observação: A revisão dos textos é de responsabilidade dos seus autores.
COLETÂNEA
XIII SEMINÁRIO
“O LAZER EM DEBATE”
Belo Horizonte, 13 a 15 de Junho de 2012.
Realização:
Universidade Federal de Minas Gerais
Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional
Departamento de Educação Física
Centro de Estudos de Lazer e Recreação – CELAR
Grupo de Estudos sobre Futebol e Torcidas - GEFuT (UFMG)
Grupo de Estudos sobre Teoria Histórico-cultural e Complexidade (UFMG)
Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Humano: Processos Cognitivos e Interacionais (UFMG)
Historiar - Pesquisa, Ensino e Extensão em História da Educação (UFMG)
Laboratório de Pesquisa sobre Formação e Atuação Profissional no Lazer – Oricolé (UFMG)
Núcleo de Estudos sobre Aprendizagem na Prática Social - NAPrática (UFMG)
OTIUM - Lazer, Brasil & América Latina (UFMG)
Centro de Extensão da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG
(CENEX)
Apoio:
Ministério do Esporte
Programa de Apoio Integrado a Eventos (ProEX/UFMG)
Programa de Pós Graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer (UFMG)
Pró-Reitoria de Pós-Graduação da UFMG
Parceiros:
Grupo de Estudo e Pesquisa em Políticas Públicas e Lazer (GEPL/FEF/Unicamp)
Grupo de Estudos Socioculturais em Educação Física (UFRGS)
Grupo de Pesquisa em Lazer (GLP/Unimep)
Grupo Interdisciplinar de Estudos do Lazer (GIEL/USP Leste)
Laboratório de Estudos do Lazer (LEL/UNESP-Rio Claro)
Laboratório de História do Esporte e do Lazer (Sport/UFRJ)
Núcleo Interdisciplinar de Estudos do Lazer (NIEL/UFPE)
Programa de Educação Tutorial – Educação Física e Lazer (PET/UFMG)
XIII SEMINÁRIO “O LAZER EM DEBATE”
REALIZAÇÃO:
Universidade Federal de Minas Gerais
Reitor: Prof. Clélio Campolina Diniz
Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional
Diretor: Prof. Emerson Silami Garcia
Departamento de Educação Física
Chefe: Luciano Sales Prado
Centro de Estudos de Lazer e Recreação (CELAR)
Coordenação Pedagógica: Profa. Christianne Luce Gomes
Coordenação Administrativa: Prof. Hélder Ferreira Isayama
APOIO:
Programa de Apoio Integrado a Eventos/PROEX/UFMG
Pró-Reitor de Extensão: Profa. Profª Efigênia Ferreira e Ferreira
Pró-Reitor de Pesquisa: Prof. Renato Lima Santos
Pró-Reitor de Graduação: Profa. Antônia Vitória Soares Aranha
Pró-Reitor de Pós-Graduação: Prof. Ricardo Santiago Gomez
Centro de Extensão da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG –
CENEX
Coordenadora: Marcella Guimarães Assis Tirado
COMISSÃO ORGANIZADORA DO XIII SEMINÁRIO
“O LAZER EM DEBATE”
Coordenação Geral
Hélder Ferreira Isayama
Marcus Aurélio Taborda de Oliveira
Comissão Científica
Profa. Dra. Christianne Luce Gomes (UFMG) - Coordenadora
Prof. Dr. Antonio Jorge Gonçalves Soares (UFRJ)
Prof. Dr. Edmur Antonio Stoppa (USP)
Profa. Dra. Gisele Maria Scwhartz (Unesp)
Prof. Dr. Helder Ferreira Isayama (UFMG)
Prof. Dr. José Alfredo de Oliveira Debortoli (UFMG)
Profa. Dra. Luciana Karine de Souza (UFMG)
Prof. Dr. Marco Paulo Stigger (UFRGS)
Prof. Dr. Marcus Aurélio Taborda de Oliveira (UFMG)
Prof. Dr. Marcus Vinicius Corrêa de Carvalho (UFF)
Profa. Dra. Miriam Bahia (UFMG)
Prof. Dr. Nelson Carvalho Marcellino (Unimep)
Prof. Dr. Rafael Fortes (Unirio)
Prof. Dr. Ricardo Ricci Uvinha (USP)
Profa. Dra. Silvia Cristina Franco Amaral (Unicamp)
Prof. Dr. Silvio Ricardo da Silva (UFMG)
Profa. Dra. Tereza Luiza França (UFPE)
Prof. Dr. Victor Andrade de Melo (UFRJ)
Prof. Dr. Walter Ernesto Marques Ude (UFMG)
Comissão Editorial
Hélder Ferreira Isayama – UFMG
Marcus Aurélio Taborda de Oliveira – UFMG
César Teixeira Castilho – UFMG
Karine Barbosa de Oliveira – UFMG
Comissão de Avaliação
Olívia Cristina F. Ribeiro – Unicamp
Priscila Campos – Unicamp
Ranucy Campos Marçal da Cruz – UFMG
Silvia Cristina Franco Amaral – Unicamp
Comissão de Espaços e Equipamentos
Clarice Noronha Ribeiro – UFMG
Fernanda Régila – UFMG
Natascha Stephanie Nunes Abade – UFMG
Comissão de Atividades Culturais
Fabiano Antônio Sena Peres – UFMG
João Paulo Silva de Carvalho – UFMG
Silvio Ricardo da Silva – UFMG
Comissão de Hospedagem, Alojamento e Transportes
Jefferson Nicássio Queiroga de Aquino – UFMG
Juliana de Alencar Viana – UFMG
Lucas Brandão Sampaio Procópio – UFMG
Rodrigo Elizalde – UFMG
Comissão de Apoio à Apresentação de Trabalhos
Gabriel Araújo Soares – UFMG
Hamilton Lopes Neto – UFMG
Henrique da Fonseca Campos – UFMG
Raphael Junio Oliveira Fonseca – UFMG
Rogério Othon Teixeira Alves – UFMG
Ana Carolina Ribeiro – UFMG
Comissão de Secretaria
Carolina Drumond Porto Carreiro Caldas – UFMG
Christian Matheus Kolanski Vieira – UFMG
Juliana Cristina Teixeira de Abreu – UFMG
Karine Barbosa de Oliveira – UFMG
Marcilia de Sousa Silva – UFMG
Marina Marques Barbosa Guedes – UFMG
Rodrigo Gomes – UFMG
Samuel Santos – UFMG
Sheylazarth Presciliana Ribeiro – UFMG
Secretaria
Cinira Veronezi – CELAR/UFMG
Sônia Maria Cândido – CENEX/EEFFTO/UFMG
Wanda Proença – CENEX/EEFFTO/UFMG
Website
Juliana de Alencar Viana – UFMG
Cerimonial e lançamento de livros
Júlia Aranha Fossi – UFMG
Nayara Cristina Albanez – UFMG
PROGRAMAÇÃO DO XIII SEMINÁRIO “O LAZER EM DEBATE”
13/06/2012 - Quarta-feira
18:00 - Credenciamento
19:00 - Abertura
19:30 - Conferência de Abertura: Poder e Hegemonia na Produção de Conhecimento em Lazer
Prof. Dr. Juan Manuel Carreño (Universidad Pedagogica Nacional – Bogotá - Colômbia)
21:00 - Confraternização de Abertura
14/06/2012 - Quinta-feira
10:00 - Mesa redonda: A Produção do Conhecimento em Lazer e os Estudos Sociohistóricos
Palestrantes: Prof. Dr. Cleber Augusto Gonçalves Dias (UFG)
Prof. Dr. Luciano Mendes Faria Filho (Faculdade de Educação - UFMG)
Debatedor: Prof. Dr. Marcus Aurélio Taborda de Oliveira (EEFFTO – UFMG)
12:00 - Almoço
14:00 - Mesas Temáticas - apresentação de trabalhos
Mesa Temática 1: Lazer e Políticas Públicas
Coordenadora: Profa. Ms. Olívia Cristina Ribeiro
1 - O Papel do Estado Brasileiro nas Políticas Públicas de Lazer entre o Período de 1988 a 2009
Lorenza Falchetto Venturim, Dirceu Santos Silva e Carlos Nazareno Ferreira Borges
2 - As Relações Intersetoriais na Construção de Políticas Públicas de Lazer
Cláudia Regina Bonalume
3 - Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC): Intervenções A Partir do Processo de Avaliação
Continuada
André Henrique Chabaribery Capi, Marie Luce Tavares e Khellen Pires Correia
4 - Análise dos Artigos Publicados na Revista Licere, com o Tema-Lazer e Políticas Públicas no
Setor Governamental
Cathia Alves, Liana A. Romera, Rosângela Benito, Sérgio Barcelos e Nelson Carvalho
Marcellino
Mesa Temática 2: Lazer, Formação e Atuação Profissional
Coordenador: Prof. Dr. Reinaldo Tadeu Boscoli Bacheco
1 - Grupos de Pesquisa em Lazer no Brasil: Um Panorama da Formação e da Atuação dos
Lideres e Vice-Líderes
Alcyane Marinho, Priscila Mari dos Santos, Mirleide Chaar Bahia e Cathia Alves
2 - Lazer, Formação e Mercado de Trabalho: Considerações Iniciais no Contexto da América
Latina
Ana Carolina Assis Ribeiro, Rodrigo Elizalde e Christianne Luce Gomes
3 - La Recreación y el Turismo: Una Propuesta de Formación de la Universidad Pedagógica
Nacional
Astrid Bibiana Rodríguez Cortés e Andrés Díaz Velasco
4 - Lazer e Atuação Profissional: Análise do Perfil dos Profissionais do SESC/MG de Bom
Despacho
Rodrigo de Oliveira Gomes
7
Mesa Temática 3: Lazer e Subjetividade
Coordenadora: Profa. Dra. Tereza Luiza França
1 - Do Conhecimento Construído no Curso de Lazer à Autoformação Humana
Sonia Cristina Ferreira Maia
2 - A Sensibilidade nas Vivências do Lazer: Uma Proposta Metodológica
Kadydja Karla Nascimento Chagas
3 - As Representações de Lazer dos Alunos de Educação Física do UNIFEMM: Egressos de
2010
Viviane Pereira Almeida e Carla Augusta N. L. e Santos
Mesa Temática 4: Lazer e Espaço
Coordenador: Profa. Dra. Juliana Pedreschi Rodrigues
1 - Reordenação do Espaço Urbano e o Direito ao Lazer
Stela Márcia Allen
2 - Gestão de Esporte e de Lazer: Análise dos Espaços e Equipamentos de Esporte Recreativo e
de Lazer em Ermelino Matarazzo, Zona Leste de São Paulo
Edmur Antonio Stoppa e Jean Flávio da Silva Santos
3 - De Volta à Infância: O Caso do Parque Cidade da Criança em São Bernardo do Campo,
Estado de São Paulo
Marcela Freitas Galvão Ortiz e André Fontan Köhler
4 - Acesso de Meninas e Meninos de Ceilândia – DF a Espaços Específicos de Lazer
Junior Vagner Pereira da Silva, Ioranny Raquel Castro de Sousa e Tânia Mara Vieira Sampaio
Mesa Temática 5: Lazer, Cultura e Patrimônio Cultural
Coordenador: Prof. Dr. Nelson Carvalho Marcellino
1 - Evolucionismo, Culturalismo e Funcionalismo: Contribuições para os Estudos do Lazer
Natalia Puke e Nelson Carvalho Marcellino
2 - Uma Reflexão sobre os Limites e Possibilidades Concernentes ao Lazer e ao Patrimônio
Cultural: Um Olhar sobre os Museus
Romilda Aparecida Lopes e Edwaldo Sérgio dos Anjos Júnior
3 -Desafios e Operacionalização de uma Vivência de Lazer Enriquecedora: O Caso das
Visitas Guiadas do Museu Ferroviário, de Juiz de Fora, Minas Gerais, sob a Ótica de uma
Trabalhadora
Romilda Aparecida Lopes
4 - Lazer e Patrimônio: Relações e Possibilidades em Além Paraíba, Minas Gerais, A Partir de
sua Rotunda
Ariane Cintia de Souza Miranda, Lucas de Oliveira Rosa e Michele Pereira Rodrigues
Mesa Temática 6: Lazer e Conteúdos Culturais
Coordenador: Profa. Dra. Luciene Ferreira da Silva
1 - Temperando com Arte e Ludicidade a Abordagem da Segurança Alimentar e Nutricional
(SAN): A Experiência ao Projeto “Cidadania no Papel: SAN em Cordel”
Anselmo Cássio Cesário, Marina Neto Rafael, Talita Lemos Paulino e Valéria Cristina
Ribeiro Vieira
2 - A Imagem Latente no Tempo Livre
Gelka Arruda de Barros
3 - Dados e Relatos de Lazer em Itajubá (MG) a Partir da Experiência de um Projeto de
Extensão Universitária
Paulo Cezar Nunes Junior
8
Mesa Temática 7: Lazer, Trabalho e Religião
Coordenador: Prof. Dr. Carlos Nazareno Ferreira Borges
1 - Entre Trabalhar e Brincar: A Rua e suas Tensões
Túlio Campos
2 - O Lazer nas Cooperativas de Trabalho
Daniel Bidia Olmedo Tejera e Carmen Maria Aguiar
3 - Lazer e Religião: Entre o Lícito e o Que Convém
Silvana dos Santos e Giuliano Gomes de Assis Pimentel
Mesa Temática 8: Lazer e Grupos Sociais
Coordenador: Prof. Dr. José Alfredo de Oliveira Debortoli
1 - A Criança e o Lazer
Leonardo Toledo Silva e José Alfredo Oliveira Debortoli
2 - Mulheres Invisíveis e Cinema: Lugar, Voz e Empoderamento
Angela Brêtas
3 - O Lazer Vivido e Apropriado por Mulheres
Tânia Mara Vieira Sampaio e Junior Vagner Pereira da Silva
Mesa Temática 9: Jovens e Lazer
Coordenador: Prof. Dr. Walter Ernesto Marques Ude
1 - A Festa do Trabalhador Adolescente da Universidade Federal de Minas Gerais: Considerações
sobre um Evento de Lazer Direcionado aos Jovens
André de Carvalho Bandeira Mendes e Ana Cláudia Pórfirio Couto
2 - Experiência Pedagógica: O Lúdico nas Aulas de Educação Física – Ensino Médio
Lucas de Andrade Carvalho e Cinthia Lopes da Silva
3 - Barreiras à Prática de Atividade Física em Adolescentes
Marcos Gonçalves Maciel e Amarildo da Silva Araújo
16:00 – Intervalo
16:30 – Sessão de Pôsteres
1 - A ação hostil das torcidas organizadas e a sua influência no futebol
Cauê V. Camilo de Almeida e Gabriela F. Fernochi
2 - A extensão universitária e as oficinas de lazer em Oriximiná: a práxis e as contradições
Paulo A . de Almeida, Guilherme S. da Silveira, Milena da Silva Abreu, Cilene Lima,
Fernanda M. Garcia, Giovane Nobre e Victor Robledo N R Nora
3 - A formação profissional em lazer à luz da teoria Gramsciana: análise de um Programa de
política pública estadual
Cathia Alves e Dagmar Ap. C. França Hunger
4 - A gestão compartilhada do PELC em Campinas: uma experiência piloto visando a garantia
do direito ao lazer e ao esporte
Débora A. M. Da Silva, Eliana de Toledo, Amanda Donadon e Regina Ferraz
5 - A influência do lúdico na socialização de conhecimentos para formação do ser: o caso mais
educação
Airton A. de Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Robson de Melo Carvalho e Kadydia
Karla N. Chagas
6 - Análise da formação profissional dos monitores da colônia de férias no campus – UFMG
Nayara Cristina Albanez
7 - Análise da produção da Revista Licere sobre políticas públicas não governamentais e estudos
conceituais
Cathia Alves, Débora Alice Machado da Silva, Karina Sarto e Nelson Carvalho Marcellino
9
8 - Análise sobre a revista licere na temática atuação profissional no lazer
Edmur Antonio Stoppa, André Chabaribery Capi, Monica Delgado e Nelson Carvalho
Marcellino
9 - Brinquedos de Mititi: brincando com a cultura em Belém-PA
Jéssyca L. Pereira e Patrícia S. C. de Araújo
10 - A noite do pijama: uma noite de socializaçãoo e vivencias lúdicas
Suelen Suerda Morais da Silva , Karolinne Stefanny de Souza , Airton Afonso de Almeida
Alves, Jéssica Suely Alves Soares, Simone Cristina L. da Silva, Lucyana Kelly de Medeiros e
Kadydja Karla N. Chagas
11 - Avanços no modo de pesquisar em lazer: contribuições da tecnologia
Tarcísio R. T. de França, Cesar A. Xavier de Lima, Athos Nascimento de Gois Calvacanti,
Ari Cesar Lopes Miron e Tereza Luiza de França
12 - Colônia de férias no programa Minas Olímpica – FHA
Leonardo Toledo Silva, Leonardo Fernando de Jesus, Alexandre Nunes Silva, Christiane
Vasconcelos Silva e Renato Gonzaga Miranda
13 - Colônia de férias temáticas – PELC Campinas: planejamento, reflexões e narrativas de um
animador
Gabriela da Costa Spolaor e Débora Alice Machado da Silva
14 - Currículo e políticas públicas de esporte e lazer: analise do projeto Minas Olímpica – Saúde
na Praça
Fabiano Antônio Sena Peres e Hélder Ferreira Isayama
15 - Espaços da folia: os equipamentos específicos de lazer dos desfiles das escolas de samba de
São Paulo e Rio de Janeiro
Denis Terezani
16 - Estresse ocupacional: uma analise da qualidade de vida no IFRN
Robson de M. Carvalho, Airton A. De Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Maria J. De
Figueiredo Gomes e Kadydia Karla N. Chagas
17 - Eventos esportivos: esporte para quem pratica ou lazer para quem assiste? Reflexões sobre
gestão de políticas públicas
Roselene Crepaldi
18 - Formação inicial e atuação do professor de Educação Física em programas sociais de Esporte
e Lazer
Beatriz Gomes da Silva Rossi e Débora Alice Machado da Silva
19 - Gestão de esporte e de lazer: analise dos espaços e equipamentos de esporte recreativos e de
lazer na subprefeitura de Pinheiros, zona Oeste de SP
Edmur A. Stoppa, Ricardo R. Uvinha, Marcelo V. De Almeida, Luiz Gonzaga G. Trigo e
Reinaldo T. B. Pacheco
20 - Hedonismo e lazer: a busca pelo prazer na vida noturna da Rua Augusta
Andressa dos Santos Ribeiro, Cecília Antunes Pereira, Cássio Land dos Anjos, Ingridy
Margot Rocha, Jéssica de Moraes Pereira, Paula Leika Hiraga Endo eVitor Nicoletti D’Auria
21 - Lazer de interesse turístico como espaço de vivencia para e pelo lazer: relato de experiência
Gislene Moreira N. Faria, Maria M. V. Prazeres e Tânia M. V. Sampaio
22 - Lazer e entretenimento nos espaços urbanos: uma analise dos estabelecimentos do município
de Eunápolis – Bahia
Salete Vieira e Vagner de Souza Leite
23 - Lazer e formação profissional: um estudo sobre licenciaturas e bacharelados em educação
física
Rodrigo de Oliveira Gomes e Helder Ferreira Isayama
24 - Megaeventos esportivos e seus impactos nos setores de lazer e turismo
Tamires Martins da Silva
10
25 - Mestrado em Lazer/tempo libre/recreación na América Latina
Christianne Luce Gomes, Ana Carolina Assis Ribeiro e Joyce K. C. Pereira
26 - Notas sobre projeto vida saudável: atividades físicas num espaço de lazer
João Miguel de Souza Neto
27 - Na festa do reinado de Nossa Senhora do Rosário: a constituição do ser um arturo
Karla Tereza Ocelli Costa
28 - NIEL-UFPE e Tabira-PE: de mãos dadas na interiozação de práticas de esporte e lazer
Ari Cesar Lopes Miron, Tarcísio R. Tenório de França e Tereza Luiza de França
29 - O Lazer e o Brincar
Leonardo Toledo Silva e José Alfredo Oliveira Debortoli
30 - O legado dos megaeventos esportivos: um estudo dos equipamentos esportivos construídos
para os Jogos Pan Americanos 2007/RJ
Jéssica Andrelozuk
31 - O processo formativo de agentes do PELC: Um olhar da experiência de Major Sales – RN
Jose Nildo Alves
32 - Polos de brincar da secretaria municipal de esportes, lazer e recreação da cidade de são paulo
- seme: “politicas de lazer para crianças e adolescentes”
Dinéia M. A. Cardoso, Fabio R. Brandão, Maria Luiza da Silva e Roselene Crepaldi
33 - Práticas da Cultura Corporal Lúdico-Multidisciplinares: cuidar do corpo idoso com esporte
e lazer para a melhoria da qualidade social de vida
Cynthia Meirelly Gomes Aragão, Islan Carlos N. da Silva e Tereza Luiza de França
34 - Processo de formação dos animadores culturais PELC-AMDI
Leonardo Toledo Silva e Claudio Gualberto
35 - Reflexões sobre a influência das atividades lúdicas e esportivas na melhoria da qualidade
de vida
Aline de Souza Lobato, Airton A. de Almeida Alves, Robson de Melo Carvalho, Leilane S.
Guedes Pereira, Sandoval V. Monteiro e Kadydia Karla N. Chagas
36 - Rope Skipping: uma experiência de lazer em comunidades atendidas pelo PELC Campinas
Roger Willian dos Santos Pinho e Débora Alice Machado da Silva
37 - Secretaria de Estado de Esportes – SEESP/MG (1996 a 2002)
Amanda Carolina Costa Silveira e Marcio Aparecido de Freitas Silva
38 - Transitando entre experiência de gestão no programa segundo tempo (PST) e no programa
esporte e lazer da cidade (PELC): o papel dos coordenadores de núcleo
Nayara Torre de Almeida e Débora Alice Machado da Silva
39 - Um estudo das politicas publicas de lazer em Brotas-SP: primeiras aproximações com o
campo.
Olivia C. F. Ribeiro e Silvia C. F. Amaral
40 - Um novo modelo para aferição de preferencia por clube de futebol
Brunna Gabriela F. dos Anjos, Camila Muralho Pereira, Larissa Palma da Silva Louro,
Maiara Lucia dos Reis, Natália Brazão Tirico e Renata Ferreira Badiali
17:30 - Painéis de debates - 80 vagas por tema
Temáticas:
Painel 1 - Modernidade, Tempo e Lazer – Prof. Dr. Valdei Araújo (UFOP)
Painel 2 - Equipamentos Públicos de Lazer - Profa. Dra. Simone Rechia (UFPR)
Painel 3 - Cultura popular urbana e Lazer – Prof. Dr. Walter Ude (UFMG)
Painel 4 -Produção do Conhecimento em Lazer: Desafios pendentes para a América Latina –
Prof. Dr. José Fernado Tabares (Universidad de Medellin/Colombia)
21:00 - Confraternização
11
15/06/2012 - Sexta-feira
10:00 - Painéis de debates
Painel 5 - Os museus como lugares de memória e os estudos do Lazer – Edgar Espejel Pérez
(Subdirector de Promoción Cultural de La Secretaría de Hacienda y Crédito Público
en Palacio Nacional, México)
Painel 6 - Lazer e Comunicação – Prof. Dr. Rafael Fortes Soares (UNIRIO)
Painel 7 - Intervenção no âmbito do Lazer – PET Lazer da EEFFTO/UFMG
Painel 8 - Lazer em Áreas Naturais e a intervenção dos animadores socioculturais – Profa. Ms.
Mirleide Chaar Bahia (UFPA)
12:00 – Almoço
14:00 – Mesas Temáticas – apresentação de trabalhos
Mesa Temática 10: Esporte, Lazer e Políticas Públicas
Coordenador: Prof. Dr. Marco Paulo Stigger
1 - Diretoria de Esportes de Minas Gerais: Políticas Realizadas, Interesses Envolvidos (19461961)
Marilita Aparecida Arantes Rodrigues e Luciana Cirino Lages Rodrigues Costa
2 - Secretaria de Estado de Esportes, Lazer e Turismo – Minas Gerais (1983-1996): Alguns
Apontamentos
Juliana de Alencar Viana e Rita Márcia de Oliveira
3 - Perspectivas de Contribuição do Setor de Esporte e Lazer para o Desenvolvimento do
Estado do Espírito Santo
Keni Tatiana Vazzoler Areias, Carlos Nazareno Ferreira Borges, Marcel Ivan dos Santos,
Ana Carolina Godoi e Noelle da Silva
4 - Perspectivas de Acesso ao Esporte e Lazer por Grupos Diferenciados como Potencialidade
de Desenvolvimento a Partir do Plano ES 2025
Marcel Ivan dos Santos, Carlos Nazareno Ferreira Borges, Ana Carolina Godoi Silveira,
Keni Tatiana Vazzoler Areias e Matheus Henrique Triunfo Costa
Mesa Temática 11: Lazer, Educação Física e Formação Profissional
Coordenador: Prof. Dr. Edmur Antonio Stoppa
1 - Conhecimento Sobre o Lazer nos Cursos de Educação Física da Cidade de Belém/PA
Gustavo Maneschy Montenegro e Wagner Wey Moreira
2 - Análise da Formação Profissional em Lazer em Currículos dos Cursos de Graduação em
Educação Física de Belo Horizonte – MG
Clarice Noronha Ribeiro e Hélder Ferreira Isayama
3 - Educação Física e a Formação Profissional para o Lazer
Tatyane Perna Silva e Cinthia Lopes da Silva
4 - “As Práticas da Educação Física no Lazer” No Curso da UNEB/Jacobina-BA: Um Relato
de Experiência
Fábio Santana Nunes, Anderson Hangel Souza Franco, Antonio Tínel de Souza, Ariane
Melo Matano, Bruno Vilas Bôas de Lima, Camilla Fernandes Soares, Dyego Rodrigues
Costa, Edileuza Matos da Silva, Erica Alane da Silva, Fernando Silva dos Santos, Igo Matos
Batista dos Santos, Igor Sampaio Pinho dos Santos, Jacqueline Silva Barbosa, Jailton Santos
Lopes, Jéssica de Souza Gama Santos, Júlia Mara Barbosa de Aquino, Leanny Ypsilon da
Silva, Lennon de Almeida Cruz, Luan Qessio dos Santos Matos, Lucas Santos de Matos,
Margarete Dias Alencar de Carvalho, Marluce Barros da Silva, Nadiane de Morais França,
Nadja Araújo da Silva, Nadja Luana Barros Cavalcanti Oliveira, Naiara Ribeiro da Silva,
Nathanna Sales Pereira Santos, Quirenia Correia Lages Vieira, Rodolfo Teixeira Rocha,
Sirlene da Silva Farias e Weverton Araújo de Oliveira
12
Mesa Temática 12: Lazer na Sociedade Contemporânea
Coordenador: Prof. Dr. Marcos Vinícius Corrêa de Carvalho
1 - Novos Tempos, Novos Lazeres
Rita de Cássia Giraldi
2-
Ser Mochileiro: Implicações para a Constituição deste Indivíduo na Sociedade
Contemporanea
Denise Falcão
3 - Ocio y Consumismo en América Latina
Rodrigo Elizalde
4 - Flash Mob Dance: Entre o Lazer Outsider e o Entretenimento Dominado
Erica Rigolin da Silva, Silvana dos Santos, Luane Maciel Freire e Giuliano Gomes de Assis
Pimentel
Mesa Temática 13: Lazer e Parques Públicos
Coordenadora: Profa. Ms. Mirleide Chaar Bahia
1 - Um Estudo Sobre Parques Urbanos e Lazer
Ana Caroline Bernal, Camila Yukie Goto, Denilton da Silva Barbosa, Jacqueline Lourençon
Ghebra, Yuli Della Volpi e Luiz Octavio de Lima Camargo
2 - Lazer em Parques Naturais Urbanos: Realidades e Desafios do Parque Estadual do Utinga
em Belém – Pará
Mirleide Chaar Bahia, Patrícia Thatyane Miranda Cabral e Silvio Lima Figueiredo
3 - O Raio de Influência de Parques Urbanos: O Caso do Parque do Ibirapuera
Jessica Miyuki Nagae, Laura Preehl Clemente, Luiz Octávio de Lima Camargo e Tamiris
Martins da Silva
4 - O Uso Público do Parque Ecológico do Tietê: Aprendizagem Ativa em Planejamento do
Lazer
Reinaldo Pacheco e Juliana Rodrigues
Mesa Temática 14: Lazer e Turismo
Coordenador: Prof. Dr. Ricardo Ricci Uvinha
1 - Breves Reflexões a Respeito do Turismo Social a Partir da História Institucional do Serviço
Social do Comércio e da Produção Acadêmica Brasileira
Bernardo Lazary Cheibub
2 - O Congado na Rota dos Diamantes
Vânia Noronha e Paula Miranda Alves Pimenta
3 - Teatro Santa Isabel: Um Cenário de Lazer, Turismo e Cultura para a Cidade do Recife/PE
Camila Bastos, Emanuelly Numeriano, Pricylla W. Lopes Xavier e Shirley Gomes
4 - Paradoxos no Uso do Tempo Livre na Cidade Turística: Um Estudo Sobre o Lazer em
Fortaleza
José Clerton de Oliveira Martins, Fabiana Neiva Veloso Brasileiro e Francisco Antonio
Francileudo
Mesa Temática 15: Lazer e Futebol
Coordenador: Prof. Dr. Silvio Ricardo da Silva
1 - Futebol e Lazer: Uma Análise Sobre o Racismo Através dos Jogos “Preto X Branco”
Bruno Otávio de Lacerda Abrahão e Antonio Jorge Gonçalves Soares
2 - Futebol e Violência: Uma Percepção sobre a Influência da Ação das Torcidas Organizadas
sobre essa Atividade de Lazer
Cauê Vinicius Camilo de Almeida, Eda Samara Porto Pádua, Gabriela Fernandes Fernochi,
Ícaro Vinícius Ramos Nogueira Souza, Lucas Felipe de Oliveira Santos, Ronney Bueno
Mesquita, Susan Louzada Ristau e Vanessa Ricarte Lucas
13
3 - De Estádios à Arenas: A Reforma do Maracanã e o Processo de Modernização (Elitização?)
dos Estádios de Futebol
Everton José Fonseca da Silva e Leda Maria da Costa
Mesa Temática 16: Lazer e Escola
Coordenadora: Profa. Dra. Ângela Bretas
1 - O Jogo na Escola: A Visão de Professores do Ciclo I do Ensino Fundamental
Lígia Estronioli de Castro e Luciene Ferreira da Silva
2 - A Escola e os Espaços Lúdicos – Em Foco o Colégio Estadual do Paraná
Simone Rechia, Aline Tshoke, Talita Stresser de Assis, Fernando Richardi da Fonseca,
Karine do Rocio Vieira dos Santos, Tânia Vieira de Lima, Daniella Tshoke Santana, Lucas
Cunha Ribeiro de Godoi, Paola Stival, Gabriela Cardoso Machado, Simone Joukoski,
Zenilda Nunes Pires e Flávia Vieira
3 - Representaciones Sociales e Imaginarios en Torno a la Escuela, la Recreación, el Tiempo
Libre y el Ocio en Tres Escuelas de la Ciudad de Bogotá
Astrid Bibiana Rodríguez Cortés, Pompilio Gutiérrez e Juan Manuel Carreño Cardozo
Mesa Temática 17: Lazer e Velhice
Coordenadora: Profa. Dra. Liana Abraão Romera
1 - Os Espaços para as Práticas de Lazer do Idoso Institucionalizado
Giselle Alves de Moura e Luciana Karine de Souza
2 - Grupos de Convivência para Idosos em Belo Horizonte: Acessibilidade, Infraestrutura,
Satisfação
Aline Oliveira Dias e Luciana Karine de Souza
3 - Projeto de Extensão com os Idosos: Possibilidades para se Compreender o Lazer como um
Direito Social
Tacimara Cristina dos Reis, Daniele Maria Silva Viana e Hilton Fabiano Boaventura Serejo
4 - Pastoral da Pessoa Idosa em Camaragibe/PE sob a Perspectiva do Lazer, Turismo e Qualidade
de Vida
Edmar Fernandes de Araújo Gomes e Pricylla Lopes Xavier
16:00 – Intervalo
16:30 – Sessão de Pôsteres
41 - A atuação profissional nos parques zoobotânicos em Belém-Pará
Mirleide Chaar Bahia e Patrícia Thatyane Miranda Cabral
42 - A construção de saberes e os oficineiros do programa Fica Vivo!: o caso dos profissionais de
educação física
Samuel Santos e Hélder Ferreira Isayama
43 - A importância do lazer no desenvolvimento individual e social de um grupo de mulheres do
Distrito Federal
Monaiza Lima Lopes, Ioranny Raquel C. de Sousa, Gislene M. N. Faria, Junior Vagner P. da
Silva e Tânia Mara V. Sampaio
44 - Análise das publicações da revista Licere destinadas a temática lazer e meio ambiente
Denis Terezani, Mirleide Chaar Bahia, Carolina Paes de Andrade, Maria Cristina Rosa,
Felipe Soligo Barbosa e Nelson Carvalho Marcellino
45 - Análise sobre a Revista Licere na temática formação profissional no Lazer
Edmur A. Stoppa, Ricardo R. Uvinha, Luciene F. da Silva, José C. de A. Moreno, Evandro
A. Correa e Nelson C. Marcellino
46 - Aproximação entre as atividades culturais de lazer e a escola de educação infantil: uma
análise de equipamento
Janaina Carrasco Castilho e Juliana Pedreschi Rodrigues
14
47 - Atividades lúdicas de expressão corporal e o processo de inclusão de crianças e adolescentes
com deficiência
Gislene Moreira N. Faria e Tânia M. V. Sampaio
48 - Contribuições das Escolas Filosóficas “Existencialismo” e “Fenomenologia” para os estudos
dos lazer
Natalia Puke e Nelson Carvalho Marcellino
49 - Corporeidade, Educação e Lazer: expressão e sensibilidade na prática de YOGA
Carlos Eduardo Campelo e Tereza Luiza de França
50 - Educação para o lazer: uma proposta de intervenção multiprofissional no ambulatório de
cuidados paliativos
Gustavo Bento Ribeiro de Araújo, Tauan Nunes Maia, Livia M. Delphim, Nathalia G. M.
de Santana, Laila Pinheiro Arruda, Edmundo de D. Alves Junior e Jonas L. Gurgel
51 - Elaboração de uma base de dados ONLINE para disseminação do lazer de idosos
Ana P. E. G. Teodoro e Gisele M. Schwartz
52 - Espaços associativos como estratégia de revisão do cotidiano dos mais idosos: convergendo
o tempo livre ao lazer
Wesley P. De Jesus Silva e Edmundo de Drummond A. Junior
53 - Escola Estadual Francisco Álvares/Campinas/SP: Práticas Corporais e a Fruição do Tempo
Livre
Silvia C. F. Amaral, Elaine Prodócimo e Gisela M. Brustolin
54 - Iniciativas autônomas de lazer: associatismo em um grupo de praticantes de escalada
Gabriel Rocha Vargas e Silvia C. F. Amaral
55 - Interfaces entre Lazer e Educação: o caso do programa escola integrada do Município de
Belo Horizonte
Marcília de Sousa Silva e Hélder Ferreira Isayama
56 - Lazer de mulheres empobrecidas de três cidades administrativas do Distrito Federal
Ioranny Raquel C. de Sousa, Monaiza Lima Lopes, Gislene M. N. Faria, Junior Vagner P. da
Silva e Tânia Mara V. Sampaio
57 - Lazer e Juventude: compreendendo os arranjos e formas de sociabilidade dos participantes
do PELC Campinas
Silene C. Faustino e Débora A. M. Da Silva
58 - Lazer e qualidade de vida em grupos de ciclista de Natal: um olhar para o âmbito espiritual
Isabele M. dos Reis V. da Silva e Maria Josely de F. Gomes
59 - Movimentos da coordenação motora no jogar peteca: da precariedade a possibilidade do
ensinar a escrever
João Joaquim Soares, Emília A. P. C. da Silva, Zuleide da Costa Lima, Francisca Rodrigues
e Marcos A. de Araújo Leite Filho
60 - O Ballet no lazer infantil
Jéssica da Silva Botossi
61 - Objeto de lazer: muro de escalada no ambiente escolar
Karolinne Stefanny de Souza, Airton Afonso de A. Alves, Simone C. Lima da Silva, Suelen
Suerda Morais da Silva , Jéssica Suely Alves Soares e Kadydja Karla N. Chagas
62 - Clube da Rhodia: sociabilidade e apropriação dos moradores da Vila Holândia – Campinas/
SP
Olivia C. F. Ribeiro e Silvia C. F. Amaral
63 - O direito à cidade, as crianças e o lazer
Débora Alice Machado da Silva e Nelson Carvalho Marcellino
64 - O estágio profissional, como elemento integrante, na formação do bacharel em lazer e
turismo
Priscila A. Nicacio de Souza
15
65 - O lazer como conteúdo da educação física escolar no ensino médio: uma leitura da lei de
diretrizes e bases dos parâmetros curriculares nacionais e dos conteúdos básicos comuns
Vagner M. da Conceição e Luciana Karine de Souza
66 - O Lazer dos “universitários”: um estudo exploratório
Cintia Buzacarini e Evandro Antonio Corrêa
67 - O novo conceito de atletismo e seu reflexo nas crianças e adolescentes: um aprendizado
para a vida
Isabele M. Dos Reis V. Da Silva e Maria Josely de F. Gomes
68 - O resgate de jogos tradicionais como estratégia de relacionamentos intergeracionais:
percepção de alunos
Marcelo F. S. Palhares, Ana P. E. G. Teodoro, Juliana de P. Figueiredo, Ana Paula Teruel e
Gisele M. Schwartz
69 - Os impactos no desenvolvimento físico, psicológico e social dos alunos que praticam arte
circense
Mônica Alves Maciel, Iara Helena Jardim de Olanda e Raphaela Barbosa
70 - O surfe para e pelo lazer na escola
Ana C. Costa Cruz, Vanessa Soly e Bruno Vinicius
71 - Projeto IFS (com) vida: capoeira, lazer e educação
Luiz Carlos V. Tavares, Tânia M. V. Sampaio, Denise Cristina Siva Rosa e Genildo Pinheiro
Santos
72 - Proposta curricular do Estado de São Paulo: Lazer e Educação Física no ensino médio
Lucas de A. Carvalho e Cinthia Lopes da Silva
73 - Sedentarismo: estilo de vida e aspectos das qualidade de vida em crianças
Robson de M. Carvalho, Airton A. De Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Maria J. De
Figueiredo Gomes e Kadydia Karla N. Chagas
74 - “Se essa fosse minha...”: Uma intervenção na VI Colônia de Férias no Campus da UFMG
Silvio Ricardo da Silva, Ranucy Campos Marçal da Cruz, Júlia Aranha Fossi e Natascha S.
Nunes Abade
75 - Trajetórias das políticas públicas de esporte e lazer em Minas Gerais: o caso da secretaria de
desenvolvimento social e esportes (2003-2006)
Fabiano Antônio Sena Peres e Hélder Ferreira Isayama
76 - Uma tarde de lazer no bairro de Mãe Luiza: o lúdico na comunidade
Karolinne Stefanny de Souza, Simone C. Lima da Silva, Suelen Suerda Morais da Silva ,
Jéssica Suely Alves Soares e Kadydja Karla N. Chagas
77 - Ludicidade e Cultura: O Brincar de Dançar na Escola como Possibilidade
Patrícia Mendes Caldeira e Luciene Ferreira da Silva
17:30 - Mesa redonda: Perspectiva de Estudos do Lazer no Campo da Saúde Coletiva
Palestrantes:
Prof. Dr. Alex Branco Fraga (UFRGS)
Prof. Dr. Marcos Bagrichevsky (UFES)
Debatedor: Profa. Dra. Christianne Luce Gomes (UFMG)
19:00 - Plenária Final / Avaliação
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APRESENTAÇÃO
Este volume oferece à comunidade cientifica a íntegra dos trabalhos apresentados durante O XIII Seminário “O lazer em debate”, com o tema Produção do Conhecimento no âmbito dos
Estudos do Lazer. O seminário, realizado entre 13 e 15 de junho de 2012 nas dependências da
Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, coroou os esforços de um grupo de
estudiosos composto por alunos de graduação, pós-graduação, professores e voluntários na busca
de uma qualificação sempre maior das possibilidades de interlocução no campo dos Estudos do
Lazer no Brasil e na América Latina. No entanto, sem a participação ativa da comunidade acadêmica ligada a este campo de estudos, a qualidade do evento não poderia ser garantida. Daí o
nosso agradecimento a todos aqueles que envidaram esforços para que o evento fosse uma arena
de debates e reflexões sobre o Lazer e as suas interfaces com a produção acadêmica, a intervenção
profissional e as políticas públicas para o setor.
Nos últimos anos o campo do Lazer ampliou de maneira significativa o conhecimento
técnico e científico produzido no Brasil, desafiando a perspectiva disciplinar tradicionalmente
adotada em nossa realidade. Entendemos que o Lazer não deve ser tratado de forma isolada, pois,
além de não se restringir a nenhuma área específica de conhecimento, qualquer abordagem estanque não é suficiente para contribuir com o avanço do conhecimento produzido sobre este universo
de práticas. Recentemente, disciplinas vêm articulando suas perspectivas de análise para tentar
compreender esse tema e essa realidade complexa que é o Lazer. Em nosso país, algumas iniciativas têm sido concretizadas com esta finalidade, como por exemplo, a realização de dois eventos
científico regulares: Encontro Nacional de Recreação e Lazer (ENAREL) e Seminário O Lazer em
Debate, ambos realizados anualmente, o primeiro apresentando média de 1000 participantes/ano
e o segundo em torno de 300 participantes/ano.
Diversos autores vêm apontando alguns motivos para a posição de destaque ocupada pelo
Lazer na atualidade, dentre os quais se observa o forte apelo da cultura de massas, com a conseqüente cultura do consumo, o crescimento da indústria do entretenimento e o aumento de
iniciativas governamentais no campo das chamadas atividades culturais, compensatórias ou não.
Com a ênfase no trabalho como referência primordial da vida em sociedade, consequentemente vem se ampliando a preocupação com o Lazer, enquanto um dos fatores básicos para o
exercício da cidadania e para a busca de uma vida com mais sentido e qualidade. Presente desde
a Declaração Universal dos Direitos Humanos, até a Constituição Federal do Brasil, sendo previsto como um direito social, afeta, ainda, o conjunto das políticas públicas de alguns Estados e
Municípios do País, o que nos faz indagar suas relações com a política, a cultura, a sociedade, a
economia etc.
O Lazer constitui, assim, um objeto a ser tratado com densidade, devendo receber atenção
prioritária não somente por parte do poder público, mas também da iniciativa privada, das diversas instituições sociais, da comunidade em geral e, certamente do meio universitário. Entendemos,
pois, que a universidade tem muito a contribuir para o incremento dos estudos que propiciem
conhecimento novo nesse âmbito, o que motivou a definição do tema geral deste XIII Seminário
O lazer em Debate.
Aos profissionais, pesquisadores e pessoas interessadas na problemática do Lazer são apresentados muitos desafios, trazendo à tona a urgência de repensar o tema não como uma forma de
dissimular/amenizar problemas sociais – afinal, no contexto brasileiro e latinoamericano, o Lazer
foi e ainda vem sendo amplamente utilizado com este objetivo – mas de encontrar alternativas
17
para a efetiva concretização desse direito, uma das condições para o exercício da cidadania, em
direta relação com o mundo do trabalho. Cabe ressaltar que o acesso ao Lazer, pela população, não
se esgota em propostas clientelistas baseadas na realização de “atividades” que visam simplesmente
à diversão e ao relaxamento atenuante das agruras do trabalho, as quais ignoram completamente
a complexidade da dinâmica social. O significado do Lazer precisa, pois, ser redimensionado enquanto um direito social e enquanto uma possibilidade de (re)significação cultural, sobre a qual
a produção do conhecimento oriundo da universidade pode ter muito a dizer. Afinal, o Lazer
também representa uma chance de produção de cultura, por meio da vivência lúdica de diferentes
práticas, os quais são coletivamente construídos, historicamente contingentes, influenciados e limitados por vários aspectos de ordem social, política, cultural e econômica. Isso significa ampliar
as chances de apreender e reconstruir o saber teórico-prático, interdisciplinar e educativo que
pode permear as vivências de Lazer, buscando a criação, e não o simples consumo, muitas vezes
acrítico, de cultura, bem como a sua crítica.
Com esta preocupação a realização do XIII Seminário “O Lazer em debate”, foi proposta
pelo Centro de Estudos de Lazer e Recreação (CELAR) e pelo Programa de Pos Graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer, ambos da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia
Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O CELAR, criado em 1990
com a preocupação de construir e socializar conhecimentos sobre o Lazer e temas afins, tendo
em vista a consolidação de uma abordagem interdisciplinar, desenvolveu em sua trajetória várias
iniciativas. A partir desse lugar institucional foi possível desenvolver e iniciar em 2007, o Mestrado
em Lazer, pioneiro na realidade brasileira. Nossa iniciativa de receber novamente o evento tem
também como motivação a recente aprovação do Programa de Pós Graduação Interdisciplinar em
Estudos do Lazer, com a abertura do seu curso de doutorado, que iniciará sua primeira turma em
agosto de 2012. Nesse contexto, docentes e discentes desse Curso de Pós-Graduação Interdisciplinar stricto sensu entenderam que a realização do evento pode contribuir com o desenvolvimento
e divulgação das pesquisas desenvolvidas no Brasil e na América Latina, constituindo-se fórum
privilegiado para a qualificação da produção científica afeita ao lazer. O seminário promovido inicialmente pela UFMG, nos últimos anos tem sido realizado em outros Estados brasileiros (Natal
– UFRN; Rio de Janeiro – UFRJ; São Paulo – USP) e nessa décima terceira edição retorna à Belo
Horizonte, coroando a criação da proposta do Programa de Pos Graduação Interdisciplinar em
Estudos do Lazer, aprovado pela CAPES na área Interdisciplinar, câmara de Ciências Humanas e
Sociais Aplicadas.
Entendendo a importância de manter a qualidade já apresentada nos doze primeiros anos
do evento, a UFMG propôs para o décimo terceiro seminário a temática da Produção do Conhecimento em Lazer, focando as contribuições de diferentes áreas do conhecimento, tais como a Educação Física, o Turismo, a Pedagogia, a Arquitetura, a Sociologia, a Administração, a História, a
Psicologia, a Antropologia, o Serviço Social, a Fisioterapia, a Terapia Ocupacional dentre tantas
outras que podem contribuir com o êxito desse evento, caracterizando o seu escopo interdisciplinar.
Para essa edição recebemos a proposta de apresentação de 61 comunicações orais e 78 pôsteres. Destes, após criteriosa avaliação pelo comitê científico que muito qualificou nossa iniciativa,
foram aprovados 180 trabalhos, os quais publicamos na íntegra para o desfrute da comunidade
acadêmica.
Além da comissão científica prestativa e competente, coordenada pela Professora Christianne Lucce Gomes, não podemos deixar de agradecer ao apoio do Ministério do Esporte, da
FAPEMIG – Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais, do Programa de Pós Graduação
Interdisciplinar em Estudos do Lazer e do Programa Integrado de Apoio a Eventos da UFMG
que viabilizou com recursos financeiros para a vinda dos convidados nacionais e estrangeiros, e a
18
publicação desses anais, além do livro com os textos das conferências e mesas redondas; à Escola
de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer, ao PET-Lazer, coordenado pelo Prof. Silvio Ricardo da Silva e, em
especial, aos alunos do PPGEL e a todos os voluntários que se empenharam para que o evento
fosse mais que um ritual acadêmico, mas um encontro aberto ao debate, para o qual contribuíram
nossos convidados nacionais e estrangeiros, com a qualidade das suas intervenções.
Uma boa leitura!
Hélder Ferreira Isayama
Marcus Aurelio Taborda de Oliveira
Organizadores,
Belo Horizonte, outono de 2012.
19
20
SUMÁRIO
O Papel do Estado Brasileiro nas Políticas Públicas de Lazer entre o Período de 1988 a 2009
Lorenza Falchetto Venturim, Dirceu Santos Silva e Carlos Nazareno Ferreira Borges............................. 29
As Relações Intersetoriais na Construção de Políticas Públicas de Lazer
Cláudia Regina Bonalume.................................................................................................................... 36
Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC): Intervenções A Partir do Processo de Avaliação
Continuada
André Henrique Chabaribery Capi, Marie Luce Tavares e Khellen Pires Correia................................... 42
Análise dos Artigos Publicados na Revista Licere, com o Tema-Lazer e Políticas Públicas no Setor
Governamental
Cathia Alves, Liana A. Romera, Rosângela Benito, Sérgio Barcelos e Nelson Carvalho Marcellino......... 48
Grupos de Pesquisa em Lazer no Brasil: Um Panorama da Formação e da Atuação dos Lideres e ViceLíderes
Alcyane Marinho, Priscila Mari dos Santos, Mirleide Chaar Bahia e Cathia Alves................................ 54
Lazer, Formação e Mercado de Trabalho: Considerações Iniciais no Contexto da América Latina
Ana Carolina Assis Ribeiro, Rodrigo Elizalde e Christianne Luce Gomes............................................... 61
La Recreación y el Turismo: Una Propuesta de Formación de la Universidad Pedagógica Nacional
Astrid Bibiana Rodríguez Cortés e Andrés Díaz Velasco........................................................................ 68
Lazer e Atuação Profissional: Análise do Perfil dos Profissionais do SESC/MG de Bom Despacho
Rodrigo de Oliveira Gomes................................................................................................................... 75
Do Conhecimento Construído no Curso de Lazer à Autoformação Humana
Sonia Cristina Ferreira Maia................................................................................................................ 82
A Sensibilidade nas Vivências do Lazer: Uma Proposta Metodológica
Kadydja Karla Nascimento Chagas...................................................................................................... 89
As Representações de Lazer dos Alunos de Educação Física do UNIFEMM: Egressos de 2010
Viviane Pereira Almeida e Carla Augusta N. L. e Santos...................................................................... 95
Reordenação do Espaço Urbano e o Direito ao Lazer
Stela Márcia Allen............................................................................................................................. 102
Gestão de Esporte e de Lazer: Análise dos Espaços e Equipamentos de Esporte Recreativo e de Lazer
em Ermelino Matarazzo, Zona Leste de São Paulo
Edmur Antonio Stoppa e Jean Flávio da Silva Santos.......................................................................... 107
De Volta à Infância: O Caso do Parque Cidade da Criança em São Bernardo do Campo, Estado de São
Paulo
Marcela Freitas Galvão Ortiz e André Fontan Köhler......................................................................... 114
Acesso de Meninas e Meninos de Ceilândia – DF a Espaços Específicos de Lazer
Junior Vagner Pereira da Silva, Ioranny Raquel Castro de Sousa e Tânia Mara Vieira Sampaio............ 120
Evolucionismo, Culturalismo e Funcionalismo: Contribuições para os Estudos do Lazer
Natalia Puke e Nelson Carvalho Marcellino....................................................................................... 126
Uma Reflexão sobre os Limites e Possibilidades Concernentes ao Lazer e ao Patrimônio Cultural: Um
Olhar sobre os Museus
Romilda Aparecida Lopes e Edwaldo Sérgio dos Anjos Júnior.............................................................. 133
Desafios e Operacionalização de uma Vivência de Lazer Enriquecedora: O Caso das Visitas Guiadas do
Museu Ferroviário, de Juiz de Fora, Minas Gerais, sob a Ótica de uma Trabalhadora
Romilda Aparecida Lopes................................................................................................................... 140
21
Lazer e Patrimônio: Relações e Possibilidades em Além Paraíba, Minas Gerais, A Partir de sua Rotunda
Ariane Cintia de Souza Miranda, Lucas de Oliveira Rosa e Michele Pereira Rodrigues........................ 147
Temperando com Arte e Ludicidade a Abordagem da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN): A
Experiência ao Projeto “Cidadania no Papel: SAN em Cordel”
Anselmo Cássio Cesário, Marina Neto Rafael, Talita Lemos Paulino e Valéria Cristina Ribeiro Vieira.. 154
A Imagem Latente No Tempo Livre
Gelka Arruda de Barros..................................................................................................................... 161
Dados e Relatos de Lazer em Itajubá (MG) a Partir da Experiência de um Projeto de Extensão
Universitária
Paulo Cezar Nunes Junior.................................................................................................................. 168
Entre Trabalhar e Brincar: A Rua e suas Tensões
Túlio Campos.................................................................................................................................... 173
O Lazer nas Cooperativas de Trabalho
Daniel Bidia Olmedo Tejera e Carmen Maria Aguiar.......................................................................... 180
Lazer e Religião: Entre o Lícito e o Que Convém
Silvana dos Santos e Giuliano Gomes de Assis Pimentel...................................................................... 186
A Criança e o Lazer
Leonardo Toledo Silva e José Alfredo Oliveira Debortoli...................................................................... 193
Mulheres Invisíveis e Cinema: Lugar, Voz e Empoderamento
Angela Brêtas.................................................................................................................................... 200
O Lazer Vivido e Apropriado por Mulheres
Tânia Mara Vieira Sampaio e Junior Vagner Pereira da Silva.............................................................. 205
A Festa do Trabalhador Adolescente da Universidade Federal de Minas Gerais: Considerações sobre
um Evento de Lazer Direcionado aos Jovens
André de Carvalho Bandeira Mendes e Ana Cláudia Pórfirio Couto................................................... 211
Experiência Pedagógica: O Lúdico nas Aulas de Educação Física – Ensino Médio
Lucas de Andrade Carvalho e Cinthia Lopes da Silva......................................................................... 218
Barreiras à Prática de Atividade Física em Adolescentes
Marcos Gonçalves Maciel e Amarildo da Silva Araújo........................................................................ 224
Diretoria de Esportes de Minas Gerais: Políticas Realizadas, Interesses Envolvidos (1946-1961)
Marilita Aparecida Arantes Rodrigues e Luciana Cirino Lages Rodrigues Costa.................................. 229
Secretaria de Estado de Esportes, Lazer e Turismo - Minas Gerais (1983-1996): Alguns Apontamentos
Juliana de Alencar Viana e Rita Márcia de Oliveira............................................................................ 237
Perspectivas de Contribuição do Setor de Esporte e Lazer para o Desenvolvimento do Estado do
Espírito Santo
Keni Tatiana Vazzoler Areias, Carlos Nazareno Ferreira Borges, Marcel Ivan dos Santos, Ana Carolina
Godoi e Noelle da Silva...................................................................................................................... 245
Perspectivas de Acesso ao Esporte e Lazer por Grupos Diferenciados como Potencialidade de
Desenvolvimento a Partir do Plano ES 2025
Marcel Ivan dos Santos, Carlos Nazareno Ferreira Borges, Ana Carolina Godoi Silveira, Keni Tatiana
Vazzoler Areias e Matheus Henrique Triunfo Costa............................................................................ 252
Conhecimento Sobre o Lazer nos Cursos de Educação Física da Cidade de Belém/PA
Gustavo Maneschy Montenegro e Wagner Wey Moreira...................................................................... 259
Análise da Formação Profissional em Lazer em Currículos dos Cursos de Graduação em Educação
Física de Belo Horizonte – MG
Clarice Noronha Ribeiro e Hélder Ferreira Isayama............................................................................ 266
22
Educação Física e a Formação Profissional para o Lazer
Tatyane Perna Silva e Cinthia Lopes da Silva...................................................................................... 272
“As Práticas da Educação Física no Lazer” No Curso da UNEB/Jacobina-BA: Um Relato de
Experiência
Fábio Santana Nunes, Anderson Hangel Souza Franco, Antonio Tínel de Souza, Ariane Melo Matano,
Bruno Vilas Bôas de Lima, Camilla Fernandes Soares, Dyego Rodrigues Costa, Edileuza Matos da Silva,
Erica Alane da Silva, Fernando Silva dos Santos, Igo Matos Batista dos Santos, Igor Sampaio Pinho dos
Santos, Jacqueline Silva Barbosa, Jailton Santos Lopes, Jéssica de Souza Gama Santos, Júlia Mara Barbosa
de Aquino, Leanny Ypsilon da Silva, Lennon de Almeida Cruz, Luan Qessio dos Santos Matos, Lucas
Santos de Matos, Margarete Dias Alencar de Carvalho, Marluce Barros da Silva, Nadiane de Morais
França, Nadja Araújo da Silva, Nadja Luana Barros Cavalcanti Oliveira, Naiara Ribeiro da Silva,
Nathanna Sales Pereira Santos, Quirenia Correia Lages Vieira, Rodolfo Teixeira Rocha, Sirlene da Silva
Farias e Weverton Araújo de Oliveira................................................................................................. 279
Novos Tempos, Novos Lazeres
Rita de Cássia Giraldi........................................................................................................................ 285
Ser Mochileiro: Implicações para a Constituição deste Indivíduo na Sociedade Contemporanea
Denise Falcão..................................................................................................................................... 292
Ocio y Consumismo en América Latina
Rodrigo Elizalde................................................................................................................................. 297
Flash Mob Dance: Entre o Lazer Outsider e o Entretenimento Dominado
Erica Rigolin da Silva, Silvana dos Santos, Luane Maciel Freire e Giuliano Gomes de Assis Pimentel... 303
Um Estudo Sobre Parques Urbanos e Lazer
Ana Caroline Bernal, Camila Yukie Goto, Denilton da Silva Barbosa, Jacqueline Lourençon .Ghebra, Yuli
Della Volpi e Luiz Octavio de Lima Camargo...................................................................................... 310
Lazer em Parques Naturais Urbanos: Realidades e Desafios do Parque Estadual do Utinga em Belém –
Pará
Mirleide Chaar Bahia, Patrícia Thatyane Miranda Cabral e Silvio Lima Figueiredo............................. 316
O Raio de Influência de Parques Urbanos: O Caso do Parque do Ibirapuera
Jessica Miyuki Nagae, Laura Preehl Clemente, Luiz Octávio de Lima Camargo e Tamiris Martins da Silva
.......................................................................................................................................................... 323
O Uso Público do Parque Ecológico do Tietê: Aprendizagem Ativa em Planejamento do Lazer
Reinaldo Pacheco e Juliana Rodrigues.................................................................................................. 330
Breves Reflexões a Respeito do Turismo Social a Partir da História Institucional do Serviço Social do
Comércio e da Produção Acadêmica Brasileira
Bernardo Lazary Cheibub.................................................................................................................. 334
O Congado na Rota dos Diamantes
Vânia Noronha e Paula Miranda Alves Pimenta................................................................................. 342
Teatro Santa Isabel: Um Cenário de Lazer, Turismo e Cultura para a Cidade do Recife/PE
Camila Bastos, Emanuelly Numeriano, Pricylla W. Lopes Xavier e Shirley Gomes............................... 348
Paradoxos no Uso do Tempo Livre na Cidade Turística: Um Estudo Sobre o Lazer em Fortaleza
José Clerton de Oliveira Martins, Fabiana Neiva Veloso Brasileiro e Francisco Antonio Francileudo..... 354
Futebol e Lazer: Uma Análise Sobre o Racismo Através dos Jogos “Preto X Branco”
Bruno Otávio de Lacerda Abrahão e Antonio Jorge Gonçalves Soares................................................. 360
Futebol e Violência: Uma Percepção sobre a Influência da Ação das Torcidas Organizadas sobre essa
Atividade de Lazer
Cauê Vinicius Camilo de Almeida, Eda Samara Porto Pádua, Gabriela Fernandes Fernochi, Ícaro Vinícius
Ramos Nogueira Souza, Lucas Felipe de Oliveira Santos, Ronney Bueno Mesquita, Susan Louzada Ristau e
Vanessa Ricarte Lucas........................................................................................................................ 365
23
De Estádios à Arenas: A Reforma do Maracanã e o Processo de Modernização (Elitização?) dos
Estádios de Futebol
Everton José Fonseca da Silva e Leda Maria da Costa......................................................................... 371
O Jogo na Escola: A Visão de Professores do Ciclo I do Ensino Fundamental
Lígia Estronioli de Castro e Luciene Ferreira da Silva.......................................................................... 377
A Escola e os Espaços Lúdicos – Em Foco o Colégio Estadual do Paraná
Simone Rechia, Aline Tshoke, Talita Stresser de Assis, Fernando Richardi da Fonseca, Karine do Rocio Vieira
dos Santos, Tânia Vieira de Lima, Daniella Tshoke Santana, Lucas Cunha Ribeiro de Godoi, Paola Stival,
Gabriela Cardoso Machado, Simone Joukoski, Zenilda Nunes Pires e Flávia Vieira.............................. 384
Representaciones Sociales e Imaginarios en Torno a la Escuela, la Recreación, el Tiempo Libre y el
Ocio en Tres Escuelas de la Ciudad de Bogotá
Astrid Bibiana Rodríguez Cortés, Pompilio Gutiérrez e Juan Manuel Carreño Cardozo........................ 390
Os Espaços para as Práticas de Lazer do Idoso Institucionalizado
Giselle Alves de Moura e Luciana Karine de Souza............................................................................. 397
Grupos de Convivência para Idosos em Belo Horizonte: Acessibilidade, Infraestrutura, Satisfação
Aline Oliveira Dias e Luciana Karine de Souza................................................................................... 402
Projeto de Extensão com os Idosos: Possibilidades para se Compreender o Lazer como um Direito
Social
Tacimara Cristina dos Reis, Daniele Maria Silva Viana e Hilton Fabiano Boaventura Serejo................ 407
Pastoral da Pessoa Idosa em Camaragibe/PE sob a Perspectiva do Lazer, Turismo e Qualidade de Vida
Edmar Fernandes de Araújo Gomes e Pricylla Lopes Xavier................................................................ 412
A ação hostil das torcidas organizadas e a sua influência no futebol
Cauê V. Camilo de Almeida e Gabriela F. Fernochi............................................................................. 419
A extensão universitária e as oficinas de lazer em Oriximiná: a práxis e as contradições
Paulo A . de Almeida, Guilherme S. da Silveira, Milena da Silva Abreu, Cilene Lima, Fernanda M. Garcia,
Giovane Nobre e Victor Robledo N R Nora........................................................................................ 420
A formação profissional em lazer à luz da teoria Gramsciana: análise de um Programa de política
pública estadual
Cathia Alves e Dagmar Ap. C. França Hunger.................................................................................. 422
A gestão compartilhada do PELC em Campinas: uma experiência piloto visando a garantia do direito
ao lazer e ao esporte
Débora A. M. Da Silva, Eliana de Toledo, Amanda Donadon e Regina Ferraz.................................... 423
A influência do lúdico na socialização de conhecimentos para formação do ser: o caso mais educação
Airton A. de Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Robson de Melo Carvalho e Kadydia Karla N. Chagas
.......................................................................................................................................................... 425
Análise da formação profissional dos monitores da colônia de férias no campus – UFMG
Nayara Cristina Albanez................................................................................................................... 426
Análise da produção da Revista Licere sobre políticas públicas não governamentais e estudos
conceituais
Cathia Alves, Débora Alice Machado da Silva, Karina Sarto e Nelson Carvalho Marcellino............... 427
Análise sobre a revista licere na temática atuação profissional no lazer
Edmur Antonio Stoppa, André Chabaribery Capi, Monica Delgado e Nelson Carvalho Marcellino..... 428
Brinquedos de Mititi: brincando com a cultura em Belém-PA
Jéssyca L. Pereira e Patrícia S. C. de Araújo........................................................................................ 429
24
A noite do pijama: uma noite de socializaçãoo e vivencias lúdicas
Suelen Suerda Morais da Silva , Karolinne Stefanny de Souza , Airton Afonso de Almeida Alves, Jéssica
Suely Alves Soares, Simone Cristina L. da Silva, Lucyana Kelly de Medeiros e Kadydja Karla N. Chagas
.......................................................................................................................................................... 430
Avanços no modo de pesquisar em lazer: contribuições da tecnologia
Tarcísio R. T. de França, Cesar A. Xavier de Lima, Athos Nascimento de Gois Calvacanti, Ari Cesar Lopes
Miron e Tereza Luiza de França......................................................................................................... 431
Colônia de férias no programa Minas Olímpica – FHA
Leonardo Toledo Silva, Leonardo Fernando de Jesus, Alexandre Nunes Silva, Christiane Vasconcelos Silva e
Renato Gonzaga Miranda.................................................................................................................. 432
Colônia de férias temáticas – PELC Campinas: planejamento, reflexões e narrativas de um animador
Gabriela da Costa Spolaor e Débora Alice Machado da Silva.............................................................. 433
Currículo e políticas públicas de esporte e lazer: analise do projeto Minas Olímpica – Saúde na Praça
Fabiano Antônio Sena Peres e Hélder Ferreira Isayama....................................................................... 434
Espaços da folia: os equipamentos específicos de lazer dos desfiles das escolas de samba de São Paulo e
Rio de Janeiro
Denis Terezani................................................................................................................................... 435
Estresse ocupacional: uma analise da qualidade de vida no IFRN
Robson de M. Carvalho, Airton A. De Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Maria J. De Figueiredo
Gomes e Kadydia Karla N. Chagas.................................................................................................... 436
Eventos esportivos: esporte para quem pratica ou lazer para quem assiste? Reflexões sobre gestão de
políticas públicas
Roselene Crepaldi............................................................................................................................... 437
Formação inicial e atuação do professor de Educação Física em programas sociais de Esporte e Lazer
Beatriz Gomes da Silva Rossi e Débora Alice Machado da Silva.......................................................... 438
Gestão de esporte e de lazer: analise dos espaços e equipamentos de esporte recreativos e de lazer na
subprefeitura de Pinheiros, zona Oeste de SP
Edmur A. Stoppa, Ricardo R. Uvinha, Marcelo V. De Almeida, Luiz Gonzaga G. Trigo e Reinaldo T. B.
Pacheco.............................................................................................................................................. 439
Hedonismo e lazer: a busca pelo prazer na vida noturna da Rua Augusta
Andressa dos Santos Ribeiro, Cecília Antunes Pereira, Cássio Land dos Anjos, Ingridy Margot Rocha,
Jéssica de Moraes Pereira, Paula Leika Hiraga Endo eVitor Nicoletti D’Auria...................................... 441
Lazer de interesse turístico como espaço de vivencia para e pelo lazer: relato de experiência
Gislene Moreira N. Faria, Maria M. V. Prazeres e Tânia M. V. Sampaio............................................. 442
Lazer e entretenimento nos espaços urbanos: uma analise dos estabelecimentos do município de
Eunápolis – Bahia
Salete Vieira e Vagner de Souza Leite.................................................................................................. 443
Lazer e formação profissional: um estudo sobre licenciaturas e bacharelados em educação física
Rodrigo de Oliveira Gomes e Helder Ferreira Isayama......................................................................... 444
Megaeventos esportivos e seus impactos nos setores de lazer e turismo
Tamires Martins da Silva.................................................................................................................... 445
Mestrado em Lazer/tempo libre/recreación na América Latina
Christianne Luce Gomes, Ana Carolina Assis Ribeiro e Joyce K. C. Pereira........................................ 446
Notas sobre projeto vida saudável: atividades físicas num espaço de lazer
João Miguel de Souza Neto................................................................................................................. 448
25
Na festa do reinado de Nossa Senhora do Rosário: a constituição do ser um arturo
Karla Tereza Ocelli Costa................................................................................................................... 449
NIEL-UFPE e Tabira-PE: de mãos dadas na interiozação de práticas de esporte e lazer
Ari Cesar Lopes Miron, Tarcísio R. Tenório de França e Tereza Luiza de França................................. 450
O Lazer e o Brincar
Leonardo Toledo Silva e José Alfredo Oliveira Debortoli...................................................................... 451
O legado dos megaeventos esportivos: um estudo dos equipamentos esportivos construídos para os
Jogos Pan Americanos 2007/RJ
Jéssica Andrelozuk............................................................................................................................. 452
O processo formativo de agentes do PELC: Um olhar da experiência de Major Sales – RN
Jose Nildo Alves................................................................................................................................. 453
Polos de brincar da secretaria municipal de esportes, lazer e recreação da cidade de são paulo - seme:
“politicas de lazer para crianças e adolescentes”
Dinéia M. A. Cardoso, Fabio R. Brandão, Maria Luiza da Silva e Roselene Crepaldi.......................... 454
Práticas da Cultura Corporal Lúdico-Multidisciplinares: cuidar do corpo idoso com esporte e lazer para
a melhoria da qualidade social de vida
Cynthia Meirelly Gomes Aragão, Islan Carlos N. da Silva e Tereza Luiza de França........................... 456
Processo de formação dos animadores culturais PELC-AMDI
Leonardo Toledo Silva e Claudio Gualberto........................................................................................ 457
Reflexões sobre a influência das atividades lúdicas e esportivas na melhoria da qualidade de vida
Aline de Souza Lobato, Airton A. de Almeida Alves, Robson de Melo Carvalho, Leilane S. Guedes Pereira,
Sandoval V. Monteiro e Kadydia Karla N. Chagas.............................................................................. 458
Rope Skipping: uma experiência de lazer em comunidades atendidas pelo PELC Campinas
Roger Willian dos Santos Pinho e Débora Alice Machado da Silva....................................................... 459
Secretaria de Estado de Esportes – SEESP/MG (1996 a 2002)
Amanda Carolina Costa Silveira e Marcio Aparecido de Freitas Silva................................................. 460
Transitando entre experiência de gestão no programa segundo tempo (PST) e no programa esporte e
lazer da cidade (PELC): o papel dos coordenadores de núcleo
Nayara Torre de Almeida e Débora Alice Machado da Silva............................................................... 461
Um estudo das politicas publicas de lazer em Brotas-SP: primeiras aproximações com o campo.
Olivia C. F. Ribeiro e Silvia C. F. Amaral............................................................................................ 462
Um novo modelo para aferição de preferencia por clube de futebol
Brunna Gabriela F. dos Anjos, Camila Muralho Pereira, Larissa Palma da Silva Louro, Maiara Lucia dos
Reis, Natália Brazão Tirico e Renata Ferreira Badiali.......................................................................... 463
A atuação profissional nos parques zoobotânicos em Belém-Pará
Mirleide Chaar Bahia e Patrícia Thatyane Miranda Cabral................................................................ 464
A construção de saberes e os oficineiros do programa Fica Vivo!: o caso dos profissionais de educação
física
Samuel Santos e Hélder Ferreira Isayama........................................................................................... 465
A importância do lazer no desenvolvimento individual e social de um grupo de mulheres do Distrito
Federal
Monaiza Lima Lopes, Ioranny Raquel C. de Sousa, Gislene M. N. Faria, Junior Vagner P. da Silva e Tânia
Mara V. Sampaio............................................................................................................................... 466
Análise das publicações da revista Licere destinadas a temática lazer e meio ambiente
Denis Terezani, Mirleide Chaar Bahia, Carolina Paes de Andrade, Maria Cristina Rosa, Felipe Soligo
Barbosa e Nelson Carvalho Marcellino............................................................................................... 468
26
Análise sobre a Revista Licere na temática formação profissional no Lazer
Edmur A. Stoppa, Ricardo R. Uvinha, Luciene F. da Silva, José C. de A. Moreno, Evandro A. Correa e
Nelson C. Marcellino......................................................................................................................... 470
Aproximação entre as atividades culturais de lazer e a escola de educação infantil: uma análise de
equipamento
Janaina Carrasco Castilho e Juliana Pedreschi Rodrigues..................................................................... 472
Atividades lúdicas de expressão corporal e o processo de inclusão de crianças e adolescentes com
deficiência
Gislene Moreira N. Faria e Tânia M. V. Sampaio............................................................................... 473
Contribuições das Escolas Filosóficas “Existencialismo” e “Fenomenologia” para os estudos dos lazer
Natalia Puke e Nelson Carvalho Marcellino....................................................................................... 474
Corporeidade, Educação e Lazer: expressão e sensibilidade na prática de YOGA
Carlos Eduardo Campelo e Tereza Luiza de França............................................................................ 475
Educação para o lazer: uma proposta de intervenção multiprofissional no ambulatório de cuidados
paliativos
Gustavo Bento Ribeiro de Araújo, Tauan Nunes Maia, Livia M. Delphim, Nathalia G. M. de Santana,
Laila Pinheiro Arruda, Edmundo de D. Alves Junior e Jonas L. Gurgel............................................... 476
Elaboração de uma base de dados ONLINE para disseminação do lazer de idosos
Ana P. E. G. Teodoro e Gisele M. Schwartz........................................................................................ 478
Espaços associativos como estratégia de revisão do cotidiano dos mais idosos: convergendo o tempo
livre ao lazer
Wesley P. De Jesus Silva e Edmundo de Drummond A. Junior.............................................................. 479
Escola Estadual Francisco Álvares/Campinas/SP: Práticas Corporais e a Fruição do Tempo Livre
Silvia C. F. Amaral, Elaine Prodócimo e Gisela M. Brustolin............................................................... 480
Iniciativas autônomas de lazer: associatismo em um grupo de praticantes de escalada
Gabriel Rocha Vargas e Silvia C. F. Amaral........................................................................................ 481
Interfaces entre Lazer e Educação: o caso do programa escola integrada do Município de Belo
Horizonte
Marcília de Sousa Silva e Hélder Ferreira Isayama.............................................................................. 482
Lazer de mulheres empobrecidas de três cidades administrativas do Distrito Federal
Ioranny Raquel C. de Sousa, Monaiza Lima Lopes, Gislene M. N. Faria, Junior Vagner P. da Silva e Tânia
Mara V. Sampaio............................................................................................................................... 483
Lazer e Juventude: compreendendo os arranjos e formas de sociabilidade dos participantes do PELC
Campinas
Silene C. Faustino e Débora A. M. Da Silva....................................................................................... 484
Lazer e qualidade de vida em grupos de ciclista de Natal: um olhar para o âmbito espiritual
Isabele M. dos Reis V. da Silva e Maria Josely de F. Gomes.................................................................. 485
Movimentos da coordenação motora no jogar peteca: da precariedade a possibilidade do ensinar a
escrever
João Joaquim Soares, Emília A. P. C. da Silva, Zuleide da Costa Lima, Francisca Rodrigues e Marcos A. de
Araújo Leite Filho.............................................................................................................................. 486
O Ballet no lazer infantil
Jéssica da Silva Botossi....................................................................................................................... 487
Objeto de lazer: muro de escalada no ambiente escolar
Karolinne Stefanny de Souza, Airton Afonso de A. Alves, Simone C. Lima da Silva, Suelen Suerda Morais
da Silva , Jéssica Suely Alves Soares e Kadydja Karla N. Chagas......................................................... 488
27
O clube da Rhodia: sociabilidade e apropriação dos moradores da Vila Holândia – Campinas/SP
Olivia C. F. Ribeiro e Silvia C. F. Amaral............................................................................................ 489
O direito à cidade, as crianças e o lazer
Débora Alice Machado da Silva e Nelson Carvalho Marcellino........................................................... 490
O estágio profissional, como elemento integrante, na formação do bacharel em lazer e turismo
Priscila A. Nicacio de Souza............................................................................................................... 491
O lazer como conteúdo da educação física escolar no ensino médio: uma leitura da lei de diretrizes e
bases dos parâmetros curriculares nacionais e dos conteúdos básicos comuns
Vagner M. da Conceição e Luciana Karine de Souza........................................................................... 492
O Lazer dos “universitários”: um estudo exploratório
Cintia Buzacarini e Evandro Antonio Corrêa..................................................................................... 493
O novo conceito de atletismo e seu reflexo nas crianças e adolescentes: um aprendizado para a vida
Isabele M. dos Reis V. da Silva e Maria Josely de F. Gomes.................................................................. 494
O resgate de jogos tradicionais como estratégia de relacionamentos intergeracionais: percepção de
alunos
Marcelo F. S. Palhares, Ana P. E. G. Teodoro, Juliana de P. Figueiredo, Ana Paula Teruel e Gisele M.
Schwartz............................................................................................................................................ 495
Os impactos no desenvolvimento físico, psicológico e social dos alunos que praticam arte circense
Mônica Alves Maciel, Iara Helena Jardim de Olanda e Raphaela Barbosa.......................................... 496
O surfe para e pelo lazer na escola
Ana C. Costa Cruz, Vanessa Soly e Bruno Vinicius............................................................................ 497
Projeto IFS (com) vida: capoeira, lazer e educação
Luiz Carlos V. Tavares, Tânia M. V. Sampaio, Denise Cristina Siva Rosa e Genildo Pinheiro Santos.... 498
Proposta curricular do Estado de São Paulo: Lazer e Educação Física no ensino médio
Lucas de A. Carvalho e Cinthia Lopes da Silva................................................................................... 499
Sedentarismo: estilo de vida e aspectos da qualidade de vida em crianças
Robson de M. Carvalho, Airton A. De Almeida Alves, Aline de Souza Lobato, Maria J. De Figueiredo
Gomes e Kadydia Karla N. Chagas.................................................................................................... 500
“Se essa fosse minha...”: Uma intervenção na VI Colônia de Férias no Campus da UFMG
Silvio Ricardo da Silva, Ranucy Campos Marçal da Cruz, Júlia Aranha Fossi e Natascha S. Nunes Abade
.......................................................................................................................................................... 501
Trajetórias das políticas públicas de esporte e lazer em Minas Gerais: o caso da secretaria de
desenvolvimento social e esportes (2003-2006)
Fabiano Antônio Sena Peres e Hélder Ferreira Isayama....................................................................... 502
Uma tarde de lazer no bairro de Mãe Luiza: o lúdico na comunidade
Karolinne Stefanny de Souza, Simone C. Lima da Silva, Suelen Suerda Morais da Silva , Jéssica Suely Alves
Soares e Kadydja Karla N. Chagas..................................................................................................... 503
Ludicidade e Cultura: O Brincar de Dançar na Escola como Possibilidade
Patrícia Mendes Caldeira e Luciene Ferreira da Silva.......................................................................... 504
28
O PAPEL DO ESTADO BRASILEIRO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE LAZER
ENTRE O PERÍODO DE 1988 A 2009
Lorenza Falchetto Venturim1
Dirceu Santos Silva2
Carlos Nazareno Ferreira Borges3
RESUMO: O objetivo do trabalho é investigar as produções acadêmicas que se propuseram avaliar e/ou comentar políticas públicas de lazer implementadas em âmbito federal com um recorte
temporal a partir da Constituição Federal Brasileira de 1988 – quando o lazer adquire status de
direito social – até o ano de 2009. A intenção foi traçar um comparativo acerca da concepção de
direito social e Estado que orientou as ações dos diferentes grupos políticos e seu reflexo nas políticas públicas de esporte e lazer. Trata-se de uma pesquisa descritiva-interpretativa, com abordagem
qualitativa. Foram seleciodos 19 trabalhos publicados em anais de eventos e em periódicos científicos do campo do lazer, para posterior análise. Nesse material, avaliamos a produção científica,
analisando as possibilidades de se pensar em gestão pública pelo viés da transformação gradual do
Estado percebidas na análise de avaliações das políticas federais.
PALAVRAS CHAVE: Políticas Públicas. Direito Social. Lazer.
INTRODUÇÃO
O presente texto baseia na análise da evolução do direito social a partir da constituição de
1988 até 2009, dentro do qual fizemos um recorte com a intenção de investigar as políticas públicas federais de esporte e lazer implementadas nesse período. Pretendeu compreender o processo
de consolidação dos direitos sociais, especificam ente do lazer e sua forma manifestada no esporte.
Assim, a reflexão central do estudo girou em torno da seguinte questão: é possível avaliar como o
lazer, enquanto direito social, vem sendo aplicado nas políticas públicas do governo federal?
Dessa forma, a pesquisa tem como objetivo investigar se o lazer e o esporte4 têm sido tratados enquanto possibilidade de garantir o atendimento do direito social como um todo. A título
de recorte trataremos especificamente das políticas de lazer implementadas pelo Governo Federal
na tentativa de traçar as possibilidades de se pensar em administração pública pelo viés da transformação gradual do Estado, levando em conta as teorias de modelos de Estado e os programas
federais implantados no período de 1988 até 2009. Em função do caminho realizado, optamos
ainda por verificar se houve mudanças ou não no modelo de Estado nos períodos dos diferentes
governos.
1
2
3
4
Graduada em Ciências Sociais – INSIÉME/Ufes – [email protected]
Doutorando em Educação Física – GEPL/Unicamp – [email protected]
Doutor em Educação Física – INSIÉME/Ufes – [email protected]
Importante dizer que o esporte não se encontra listado no Artigo 6º da Constituição como um direito social, tendo para si
um capítulo a parte que se inicia no artigo 217. Contudo, como há uma forma de manifestação esportiva recreativa, esta
atividade está contemplada como uma manifestação de lazer, conforme a classificação de Dumazedier, referendada por
Marcellino (2002).
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
29
METODOLOGIA
A presente pesquisa tem como método descritivo-interpretativo, com abordagem qualitativa. Os procedimentos metodológicos foram utilizados da seguinte forma: a) realização de um
mapeamento nos principais anais de eventos científicos e periódicos científicos que tem realizado
a temática das políticas públicas de lazer; b) como corpus da pesquisa foi selecionado 19 documentos sobre as políticas públicas federais, coletados nos anais do Encontro Nacional de Recreação e Lazer (Enarel); Seminário “O Lazer em Debate”; e Congresso Brasileiro de Ciências do
Esporte (Conbrace). Os periódicos científicos selecionados foram Revista Licere (único periódico
específico sobre o Lazer no Brasil), Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE) e Revista
Movimento. Além dos documentos, foram utilizados os documentos emitidos pelo Ministério do
Esporte para embasar a discussão.
Para chegarmos aos objetivos do presente trabalhos, utilizamos um referencial teórico que
permitiu a discussão do processo de consolidação dos direitos sociais. Em um segundo momento
foi discutido o papel do Estado nas políticas de lazer, bem como os principais programas discutidos
nos documentos, referentes ao Ministério do Esporte. Para finalizar, foram analisados e discutidos
os dados a partir das seguintes categorias: a) Estado; b) direito social; c) objetivos da política/projeto; e d) avaliação do autor. Além das categorias, nos atentamos para a fonte, conceito de lazer,
políticas pública, cidadania, participação social, parcerias, dentre outros.
ESTADO MARXISTA X ESTADO LIBERAL
Para iniciarmos a discussão é importante voltar a uma questão: é possível pensar em administração pública pelo viés da transformação gradual do Estado? Podemos perceber modificações
e reflexos do contexto global nas ações governamentais.
Mandel (1997) afirma que as funções do Estado incluem aspectos de poder, como exército, justiça, finanças, mas também outros indiretos, como ideologia, lei, filosofia, ciência, arte etc.
Essa estrutura apresentada indica quase que uma evolução da organização administrativa pública,
partindo de estágios mais simples, coletivistas, para estágios mais avançados e complexos, como
o Moderno Estado Burguês. A classe burguesa foi ganhando poder, passando a reivindicar maior
participação na vida política, utilizando do aparato estatal para a manutenção dos seus lucros, já
que esta instituição é dependente de seus rendimentos financeiros, do comércio e dos impostos.
Na visão marxista, o Estado corresponde a um conjunto de instituições permanentes,
como exército, a polícia, os altos administradores nos departamentos governamentais com intuito de atender os interesses da classe dominante, o que relembra Rousseau quando coloca que
o Estado é permanente, o governo é transitório. O poder efetivo e real desloca-se de dentro das
instituições para outras cada vez mais afastadas da influência do sufrágio universal, transferido do
legislativo para o executivo.
No que se refere ao chamado Estado mínimo e o livre mercado, baseado no princípio da liberdade, Friedman (1985) detalha a influencia da conjuntura histórica de Guerra Fria, ao apontar
os problemas e limitações do socialismo, pois na sua visão este modelo de Estado fere o princípio
fundamental da liberdade individual. Dessa forma, a liberdade imposta na sua teoria não busca a
igualdade, como na teoria marxista.
O capitalismo competitivo promove a liberdade econômica e política, separando e possibilitando o controle de uma forma de poder sobre a outra, sendo que o capitalismo é uma (e
não única) condição necessária para a liberdade política. O livre mercado possibilita a liberdade
política, embora seja possível existir uma estrutura política opressora numa sociedade capitalista,
mas, a liberdade política não surge se não houver liberdade econômica. Na verdade a defesa do Es30
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
tado mínimo por parte de Friedman é pelo receio de seu poder, sendo necessário controlá-lo, por
isso a menor intervenção do Estado seria muito importante para o desenvolvimento da sociedade
(FRIEDMAN, 1985).
Friedman (1985) acredita na liberdade, afirmando que técnica do mercado possibilita que
ambas as partes de uma troca econômica saem beneficiadas. Ao basear as trocas econômicas
exclusivamente na cooperação, como se dependesse unicamente da conveniência e não da necessidade de sobrevivência como sabemos ser no plano concreto, o autor aborda uma “realidade” de
uma pequena parcela da população, o que gera ainda mais questões: os indivíduos explorados não
têm essa liberdade, e o que fazer com os que não conseguem entrar na lógica do mercado? Como
garantir a liberdade individual deles no capitalismo competitivo, que aparentemente necessita de
uma parcela da população sendo extremamente explorada para que outras possam usufruir dos
bens produzidos?
São duas posições teóricas opostas, liberalismo e marxismo. Mas a partir do século XX, especialmente depois da quebra da bolsa de New York em 1929 e com a II Guerra Mundial surgiram
outras teorias quanto à atuação estatal, com certa contribuição das duas teorias expostas acima.
As políticas do Estado de Bem-estar social (Welfare State) pressupõem uma atuação diferente do
Estado como uma forma de “amenizar” o capitalismo, sendo fruto da busca de uma reversão das
desigualdades produzidas do próprio sistema capitalista
Esping-Andersen (1991, p. 102) afirma que a cidadania está intimamente relacionada
como a ideia de Welfare State, sendo definido como responsabilidade estatal em garantir o bem-estar básico dos cidadãos, sendo que a garantia da cidadania plena, proposta por Carvalho é de
fundamental importância para o desenvolvimento social. As políticas de Welfare State possibilitam
a “desmercadorização” das pessoas, já que o bem-estar dos indivíduos não depende mais do mercado. “A desmercadorização ocorre quando a prestação de um serviço é vista como uma questão
de direito ou quando uma pessoa pode manter-se sem depender do mercado”.
Com a crise na década de 1980 e o aumento considerável da dívida pública (devido aos
grandes investimentos e muitos programas sociais de auxílio) surge um novo modelo de Estado, o
neoliberalismo. Em tempos de avanços tecnológicos e globalização do sistema capitalista a interação dos diferentes países assume proporções planetárias e as identidades nacionais e os Estados
sofrem com a interdependência e a perda de poder.
A partir desse momento a atuação do Estado se transforma, levando em conta os interesses globais e locais das classes dominantes (nas suas diferentes escalas), em uma expansão da
hierarquia do poder político e econômico. Segundo Melo (2005) a interação entre Estado e os diversos organismos da sociedade civil ficam mais estreitos, formando parcerias em prol do “bem público”. A responsabilidade pela gestão da sociedade agora é dividida, sobretudo no que diz respeito
à promoção e execução de políticas sociais, com a intenção de promover a inclusão e combater a
desigualdade, só que com eficiência (já que a iniciativa particular sabe como). A participação aparece como um associativismo prestador de serviços sociais, da qual preza pela cooperação/parceria
e pelo voluntarismo, em detrimento do caminho do debate e do conflito.
Dessa forma, é possível perceber uma volta radicalizada aos preceitos do liberalismo clássico, novamente diminuindo a força e a intervenção do Estado na provisão social. A intenção
explicita é retomar a acumulação em detrimento ou a custo dos direitos adquiridos nesse período.
Boron apud Melo (2005) afirma que o sucesso do neoliberalismo não foi tanto pelo lado econômico e mais pelo cultural, já que se enraizou como um novo senso comum, ao mesmo tempo em que
assistiu à produção em massa da miséria.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
31
CONSOLIDAÇÃO DO DIREITO SOCIAL LAZER
A partir da Constituição Federal de 1988 o lazer e o esporte são considerados direitos sociais, tornando as ações para o setor dever do Estado. Desta forma, se antes apareciam nas ações
governamentais como elementos auxiliares para a conquista de outros direitos ou enquanto mero
aliviador de tensão social, a partir desse período adquiriu status de direito social, se tornando
elementos essenciais à constituição da cidadania plena como fins em si mesmo (não mais como
veículos ou mediadores), devendo incitar ações específicas na tentativa de garantir o acesso a esses
direitos de modo universal.
De acordo com Carvalho (2008) a cidadania plena se refere a garantia dos direitos civis
(direitos fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei), políticos (participação dos cidadãos no governo da sociedade) e sociais, possibilitando a participação de todos
na riqueza coletiva (direito à educação, ao trabalho, salário justo, à saúde e à aposentadoria, assim
como ao lazer e esporte), além dos deveres expostos aos mesmos. Nessa perspectiva, é importante
falar sobre o processo de consolidação de um direito, pois envolve aspectos políticos, econômicos
e sociais e está diretamente vinculado a um processo de lutas por melhores condições de vida. A
constituição dos direitos sociais no Brasil foi estabelecida de forma particular, diferente de outros
países.
Carvalho (2008) destaca justamente essa particularidade, afirmando que no caso brasileiro estabeleceu-se uma inversão dos processos de aquisição dos direitos e devido à repressão política
por conta dos governos ditatoriais foram desenvolvidos num primeiro momento os direitos sociais,
posteriormente os direitos políticos e por fim os direitos civis.
A ação do governo através de políticas públicas é um meio direto para a garantia e efetivação dos direitos sociais. Contudo, a simples execução de políticas públicas não é automaticamente
revertida na aquisição desses direitos e, no que se refere especialmente ao esporte e lazer, pode-se
observar que diversas políticas assumem um caráter paliativo para preencher as lacunas geradas
pela deficiência de outras áreas, seja a saúde, a segurança pública ou a educação (AREIAS, 2008).
No Brasil, os projetos ministeriais buscam ocupar o tempo livre e promover a inclusão
social de pessoas e comunidades que se encontram em vulnerabilidade social, o que tente a um
caráter assistencialista e restrito na garantida de direitos sociais constitucionalmente universais.
São inúmeras possibilidades de instrumentalização do lazer objetivando atender a interesses específicos, e em consequência disso, deve-se tomar muito cuidado para não tornar essa prática numa
simples fuga, alienação ou objeto de consumo.
Marcellino (2002) e Mascarenhas (2004) acrescentam que o lazer como “assimilador de
tensões” teria a função de desviar a atenção dos problemas sociais e pessoais, buscando a ocupação do tempo livre dos jovens, visto pelo Estado como algo “perigo” para a sociedade e que precisa
ser ocupado.
PROGRAMAS FEDERAIS DE ESPORTE E LAZER
Para pensar como o lazer vem sendo disponibilizado nas políticas públicas analisamos de
forma sintética as principais políticas federais implementadas no Brasil nas últimas décadas em
destaque nos documentos analisados: Esporte para Todos (EPT)5; Pelc e o Programa Segundo
Tempo (PST). Quanto ao EPT Cavalcanti (1984) destaque que o projeto tinha como melhorar a
utilização do tempo de lazer e desenvolvimento da aptidão física da população. As orientações a
5
O movimento EPT nasceu na Noruega e contribuiu para democratização das atividades físicas e esportivas, permitindo
que as pessoas sem grande aptidão física também praticassem. O movimento foi associado a outros programas como o
“Mexa-se”, realizado pela Rede Globo em 1975, no entanto, no Brasil sua oficialização só aconteceu no ano de 1977
(TUBINO, 1996).
32
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
nível nacional eram promover simultaneamente eventos com uma única atividade, no mesmo período ou fim de semana, a fim de que fosse algo marcante. Além de realizar promoções espaçadas
ao longo do ano, voltadas para atividades bem definidas com curta duração a fim de garantir a
grande participação.
O PST criado em 2003 e implementado em 2004, tem uma reformulação e união de políticas que foram mantidas do governo anterior, como é o caso do programa Esporte na Escola e
de algumas ações do Esporte Solidário. O PST imprimiu o caráter de inclusão social, com foco
na educação integral e tem como objetivo principal reduzir a marginalização de crianças e adolescentes, além de democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte como fator de formação da
cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente em áreas de vulnerabilidade social.
O Pelc foi reformulado pelo Ministério do Esporte no ano de 2004, tendo como diretriz
o papel contemporâneo do lazer como emancipador pessoal e possibilitando o desenvolvimento
humano, como direito social6. Esta política foi formulada com o objetivo de atingir a emancipação
da consciência e o desenvolvimento, sendo voltado para suprir a carência de políticas públicas de
lazer, principalmente daquela em situação de vulnerabilidade social. O programa orienta seus conveniados para realizarem atividades sistemáticas de oficinas de esporte, dança, ginástica, teatro,
música, capoeira entre outras dimensões da cultura local. Dessa forma, fica visível a diferença na
concepção de lazer e esporte nas três políticas, contudo são parecidas em termos funcionalistas e
utilitaristas, haja vista que toda ação governamental tem que ter uma finalidade e uma justificativa.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Verificou-se que todos os anais e artigos encontrados e analisados sobre políticas federais
foram publicados no período do governo Lula, o que se justifica com a criação de um ministério
específico para o Esporte em 2003, que tinha como objetivos unificar a política esportiva brasileira
e ampliar o acesso e as intervenções.
Todos os artigos referentes às políticas federais apresentaram alguma conceituação de Estado, das quais podemos destacar: a) Estado como máquina administrativa que deve garantir os
direitos sociais por meio de políticas públicas, aproximando-se do Wefare State, conforme discutido
em Esping-Andersen, com raízes na concepção de Estado marxista; e b) Estado como instrumento
de controle de uma classe dominante a favor do mercado e negligente com as demandas sociais,
decorrência do modelo neoliberal, sendo que esse tipo de Estado foi criticado por diversos autores,
dentre os principais podemos destacar Mascarenhas (2004) e Melo (2005).
Quanto ao conceito de direito social ao lazer, diferentemente da conceituação sobre Estado, nem todos os artigos apresentaram um conceito definido ou que indicasse um conceito mesmo
que implícito de lazer, apesar de que a grande maioria apresentou pelo menos um conceito simples
de direito social, como elemento de participação do bem coletivo da sociedade, aproximando-se
da concepção de direito social, apresentada em Carvalho (2008) .
Na categoria sobre os objetivos oficiais das políticas/projetos, foi possível pontuar mais
diretamente uma resposta para nossa busca quanto à continuidade ou não de uma concepção de
direito social e de modelo de Estado no período de 1988 a 2009. Dentre os 19 artigos analisado, 16
apresentavam como objetivos oficiais uma ideia em torno da democratização do acesso ao esporte
e lazer, promoção da inclusão social, principalmente para população em vulnerabilidade social. O
esporte e o lazer aparecem como meio, veículo para o alcance de outros direitos, como o direito a
educação, segurança e trabalho. Na atual conjuntura, tudo se justifica e se legitima ao promover a
6
Ministério do Esporte. Disponível em: <www.esporte.gov.br> Acesso em: 10 jul. 2011
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
33
cidadania, numa clara simplificação e equiparação deste conceito com dignidade humana, respeito e igualdade. Só três artigos apresentaram como objetivos oficiais de suas políticas a promoção
direta de lazer e esporte com fim em si mesmo.
Aparentemente o que mudou nas justificações anteriores – taxadas de funcionalistas, utilitaristas, promotoras da manutenção da ordem vigente e dos interesses da classe dominante –
foram os valores. Quando se percebeu que a intenção de melhorar a utilização do lazer poderia
trazer prejuízos para os indivíduos, começou-se a combatê-la. É importante perceber que é uma
questão valorativa, que envolve aspectos políticos e ideológicos. Claro que a democratização do
acesso aos direitos sociais é importante, pois é baseada na convicção de que é o melhor, ou mais
benéfico para todos, vista como promotora da igualdade e da liberdade (princípios democráticos).
No que se refere às avaliações dos autores sobre as políticas/projetos, um artigo foi desconsiderado por ausência de avaliação, pois o projeto estava em andamento. Nos demais, embora
na conceituação de Estado as críticas ao modelo neoliberal e a desresponsabilização do Estado
tenham sido muito presentes, em praticamente metade dos artigos analisados, quando observamos
as avaliações dos autores quanto aos projetos desenvolvidos, percebemos uma predominância de
pontos positivos de cada projeto desenvolvido, bem como suas limitações e dificuldades, sejam no
planejamento das ações, pretendendo objetivos que não são possíveis de serem cumpridos, pela
falta de formação de profissionais ou de recursos financeiros e físicos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto é possível perceber como a transformação gradual do Estado com suas
alterações econômicas e políticas, automaticamente refletem nos investimentos e políticas implementadas, modificando os objetivos das políticas em virtude dos interesses do governo. Enquanto
são legítimos investimentos no social, grandes somas foram destinadas, porém quando essa situação não se apresentou mais favorável ao mercado e a classe que detém o poder ideológico atuação
do Estado se transformou, alterando a destinação dos investimentos e permitindo e/ou incentivando parcerias e voluntarismo vistos como opções aos problemas administrativos e sociais.
A passagem do liberalismo para o Welfare State e dele para o neoliberalismo é perceptível
na ação dos governos, afastando o Estado (na concepção de Rousseau) do seu ideal de servir ao
povo, como um todo. A teoria marxista mostra os limites do liberalismo e dessa conduta exclusivista dos governos.
Nessa perspectiva, o que podemos considerar como avanço na atual conjuntura ideológica nas políticas públicas e na implementação do lazer como direito social – fazendo um juízo de
valor –, são os valores colocados nessas políticas atuais que, embora se justifiquem pela luta por
cidadania, ao mesmo tempo pretendem dar mais liberdade e melhores condições de vida para os
indivíduos por meio da democratização do acesso aos direitos sociais. Até 2003 não existia uma
concepção de lazer com o intuito de promover cooperação, inclusão, emancipação, apenas ações
voltadas ao esporte de rendimento rumo aos jogos olímpicos e mundiais para melhorar os números
de medalhas do Brasil.
REFERÊNCIAS
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Espírito Santo, 2008.
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Senado Federal, 1988.
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MACELLINO, N. C. Lazer e Esporte: políticas públicas. 2.ed – autores associados, Campinas-SP, 2001.
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MANDEL, E. Teoria Marxista do Estado. Lisboa, Edições Antídoto, 1977.
MASCARENHAS, F. Lazer como prática de Liberdade. Goiânia, Editora UFG, 2003.
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Campinas/SP: Autores Associados, 2005.
TUBINO, Manuel. José Gomes. O esporte no Brasil, do período colonial aos nossos dias. São
Paulo: Ibrasa, 1996.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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AS RELAÇÕES INTERSETORIAIS NA CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
DE LAZER
Cláudia Regina Bonalume7
RESUMO: Assumindo o desafio de refletir sobre as políticas públicas intersetoriais, que envolvem
o lazer, partimos da constatação de que, nesse momento histórico de rápidas transformações e
novas tecnologias, os direitos sociais vêm sendo cada vez mais demandados e proclamados - neles
incluído o direito ao lazer. O dever do provimento a esses direitos articula-se, por sua vez, a outros
aspectos, colocando-os como um setor de ação transversal que pode ser tanto enfatizado como
processo quanto produto cultural de construção, vivência e definição de valores, diversidades,
identidades, conhecimentos e competências. Também pode ser enfatizado como meio de formação dos atores para entender e participar do mundo onde vivem, conscientes da importância do
lazer, benefícios e riscos neles contidos. Trago para o Lazer em Debate algumas reflexões construídas na elaboração da dissertação de Mestrado em Políticas Públicas de Esporte e Lazer, da Universidade de Brasília, defendida em 2010, com vistas a estimular o debate acerca na importância
e necessidade de relações intersetoriais.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Intersetorialidade. Políticas Públicas.
Nesse momento histórico, os direitos sociais vêm sendo cada vez mais demandados e proclamados - neles incluído o direito ao lazer. Dar conta da garantia de acesso a esses direitos implica, também, colocá-los como ações transversais, que estão em constante diálogo entre si, no
sentido de garantir que o cidadão seja visto, reconhecido e tratado como um todo indissolúvel.
Embora a demanda por ações integradas seja tema e objeto de experiências e estudos
significativos no País, que permitem o reconhecimento de sua importância e viabilidade nas políticas sociais, ainda parece enfrentar muitas limitações no tocante a sua implantação prática,
especialmente nos casos que envolvem políticas públicas de lazer. Uma breve análise dos artigos
publicados ao longo dos últimos 15 anos8 indica pouca densidade de informações acerca do tema,
ao mesmo tempo em que é crescente a busca pela concretização de ações intersetoriais envolvendo
o lazer nas políticas públicas brasileiras.
Diariamente, a mídia e o mercado têm enfatizado que o acesso ao lazer faz grande diferença na vida das pessoas, especialmente de crianças, jovens e idosos; que são imprescindíveis para a
saúde, para a educação e para a redução nos índices de violência. Já é possível perceber o reflexo
dessa maneira de pensar na vida das pessoas e no campo das políticas sociais, como, por exemplo,
o surgimento de diversos programas e ações que trazem, no bojo de suas propostas, o desafio da
ação transversal que coloca o lazer ao lado de outros direitos sociais.
De fato, sabe-se que há um grande potencial de relação do lazer com outras áreas e que
isso vem colocando-o na pauta de programas estruturantes da educação, da saúde, do desenvolvimento agrário, da cultura, do desenvolvimento social, da segurança, do turismo, entre outros,
que procuram atuar diretamente com problemas ou questões sociais complexas, como o enfrenta7
8
36
Mestre em Educação Física pela UnB. Coordenadora de Implantação do Ministério do Esporte, Coordenadora Geral de
Implementação de Projetos de Lazer e Inclusão Social do Ministério do Esporte.
Foram consultados: a Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), o banco de teses da CAPES, e publicações que se
referem ou analisam políticas públicas intersetoriais, como as de Marcellino (2008), Pinto (2008) e Spósito (2007).
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
mento às doenças crônicas não transmissíveis, a garantia dos direitos humanos, a necessidade de
educação integral e a relação entre violência e juventude.
Para evitarmos ufanismos acerca da importantíssima relação entre as políticas públicas,
sugerimos que nossa reflexão parta de algumas questões desafiadoras: Que concepções de política pública embasam as propostas de integração? Por que e como tratar o lazer como direito
social? Como o lazer é visto e tratado na relação com as outras políticas sociais? Em que intersetorialidade acreditamos?
1. REFLETINDO SOBRE POLÍTICA PÚBLICA
Ao procurarmos definir políticas públicas cabe ressaltar, inicialmente, que esse termo deve
ser focado no plano das necessidades, e não em preferências, especialmente quando envolve amplas questões sociais. Esse foco pode sugerir o uso do termo políticas sociais, ao invés de políticas
públicas. Refletindo a respeito, opto por tratar a política pública no foco da garantia de direitos
sociais, guiados pelo princípio da igualdade, ou, como afirma Pereira (2008, p.92), tendo como
referência que a política pública engloba a política social, ou, que a “política social é uma espécie
de gênero da política pública.”
Diante da diversidade e complexidade de questões que demandam atitude e enfrentamento, por parte do Estado, a política pública constitui-se, na atualidade, a partir das demandas
da sociedade, que traduzem uma gama de necessidades dos cidadãos, especialmente aqueles que
têm mais dificuldade de acesso aos direitos sociais, por ações de qualidade, construídas de forma
participativa e integrada. A intensidade dessa integração e do envolvimento da sociedade no processo varia de acordo com o perfil do Estado, no sentido amplo, das diretrizes e dos objetivos de
cada gestão, porém ambos são indispensáveis, se o resultado almejado são ações que deem conta
da garantia universal dos direitos sociais.
2. O LAZER NO CAMPO DOS DIREITOS SOCIAIS
As necessidades humanas são históricas, subjetivas, materiais e imateriais, ou seja, são
construídas a partir da realidade de vida e do cotidiano de cada indivíduo e de cada sociedade.
Quando identificadas e reconhecidas como indispensáveis à vida e a dignidade humana tornam-se direitos sociais. Sua efetivação, por sua vez, é realizada pelas políticas públicas. Parece estarmos
falando de um processo simples, sequencial e linear, que não se configura dessa forma, no dia-a-dia.
Falar em políticas públicas com o recorte nas questões sociais sugere abordar a temática
dos direitos sociais que a elas remetem e que estão na pauta desde a Declaração Universal dos
Direitos Humanos, da ONU, em 1948, que os coloca junto aos direitos civis e políticos, no elenco
dos direitos humanos. No Brasil a concepção universalista dos direitos sociais só foi incorporada
pela Constituição de 1988, talvez esse seja um dos motivos para a grande defasagem entre o que é
previsto em lei e a bruta realidade das desigualdades e exclusões.
Partindo da premissa de que o direito social ao lazer compõem os direitos humanos9 a
serem assegurados, sem qualquer distinção, na construção de uma sociedade mais justa e mais
igualitária, pode-se dizer que este vem conquistando, passo a passo, espaço no conjunto dos direitos. São muitas as reivindicações de pessoas, com vários interesses sociais, que incluem o lazer ao
conjunto de suas demandas e ações por cidadania e por qualidade de vida. Essas reivindicações
devem-se, principalmente, ao grande número de cidadãos brasileiros que ainda está excluído do
acesso a esse direito.
9
Organização das Nações Unidas (ONU), 1948.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
37
Percebe-se a existência de uma cultura dominante que se constitui por variações demarcadas por desigualdades profundas de acesso e conhecimento ao lazer, que se acentuam em relação
a aspectos como gênero, etnia, idade, diversidade cultural e habilidade física. Percebidas essas
diferenças, que contribuem para revelar a situação de exclusão social e cultural de determinados
indivíduos, torna-se necessário o estabelecimento de políticas de cidadania que se pautem pela
perspectiva intersetorial.
Encontramo-nos, então, diante do desafio de desenvolver políticas públicas de esporte e
lazer com qualidade, integradas às demais políticas sociais e acessíveis a todos, como possibilidade
de ser contraponto à lógica social de desigualdade, exclusão e desrespeito às diversidades, que
vemos atualmente. Ao analisarmos o processo desse desenvolvimento nos programas sociais e em
parcerias, é possível perceber evolução significativa, com características, sentidos e significados
específicos, em cada período.
[...] o lazer é uma experiência cultural que não é apenas determinada mecanicamente pela base
econômica, nem tampouco é livre e idealizada. É fruto da expressão ativa de relações sociais e
das lutas que se estabelecem no cotidiano das camadas populares (MELO, 2003:55).
Os componentes do processo de desenvolvimento das políticas públicas de lazer no Brasil,
nos ajudam a compreender a dificuldade de ruptura com a visão histórica da área, presente entre
os gestores dessa e das outras políticas que fazem parte do campo integrado que começa a se desenhar. Ao analisar este aspecto Suassuna (2007) destaca a importância de se fortalecer o debate no
sentido de redimensionar o papel do lazer e percebê-lo numa perspectiva de emancipação humana, retirando-lhe a alta carga funcional. Marcellino (2001) também aponta para o caráter assistencialista, utilitarista e descomprometido, fortemente presente, inclusive no texto da Constituição.
Se o direito ao lazer está contidos, inclusive no texto constitucional, por que continua
sendo negligenciado? Poderíamos arriscar apontar algumas causas, tais como:
a. a falta de consciência desse direito;
b. a responsabilidade individual e/ou coletiva insuficiente, no cenário social para garantia do mesmo;
c. exclusão de muitos das vivências de lazer, frequentemente gerada pela própria hierarquização das necessidades básicas do ser humano;
d. falta de programas, espaços e equipamentos para que a população vivencie o lazer;
e. pouca qualificação da gestão para o desenvolvimento de ações qualificadas, participativas, integradas e transparentes;
f. falta de um sistema nacional que estabeleça pactos, adesões, articulações entre gestores, que atuam em diferentes âmbitos, com competências e papéis definidos, formação
adequada e elevação da qualidade das ações; e
g. falta de financiamento para prover a viabilização das ações de lazer, com equidade
entre as diversas necessidades e interesses.
3. O ESPORTE E O LAZER EM RELAÇÃO COM OUTRAS POLÍTICAS SOCIAIS
Mascarenhas (2007, p. 202) enfatiza a importância das várias dimensões do lazer -aliadas
à arte, música, cinema, comunicação, vida na natureza, ao bem-estar e à qualidade de vida, à
saúde, entre outras - para a apropriação coletiva, lúdica, crítica e criativa das diversas manifestações que compõem o patrimônio cultural local, incorporando novas formas de apreender, viver,
explicar e organizar a vida social e construindo proposições mais críticas ao campo de intervenção
no âmbito do lazer.
Um dos aspectos centrais de propostas intersetoriais diz respeito ao pensar o lugar como
um todo orgânico, dinâmico e integrado. Como aponta Lefebvre (1999), as cidades devem de38
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
mocratizar oportunidades, resgatar a funcionalidade e a qualidade dos logradouros públicos e
melhorar a circulação das pessoas. Uma cidade ambientalmente equilibrada tem como objetivo
o planejamento integrado e o uso do espaço urbano e rural com visão de futuro, contemplando
as atividades humanas e os elementos naturais de reprodução da vida em sociedade e não a mera
reprodução do capital.
Como já dito, enquanto um setor de ação transversal, o lazer é, ao mesmo tempo, processo
e produto de construção, (re)significação e circulação de valores, conhecimentos, sentimentos,
experiências e desejos, que implicam formação e ação qualificada de profissionais e lideranças.
Para o desenvolvimento de ações nesse sentido são importantes as idéias de parceria e solidariedade, que requerem o conhecimento do outro e das demandas que enfrentam juntos, a capacidade
de gerir ações coletivas, de aglutinar aspirações, valores e estratégias, valorizando as diferenças e
as relações constituídas, atentos aos problemas enfrentados e às alternativas encontradas. A ênfase deixa de centralizar-se no interesse de uma ou outra parte e foca as interações e as relações
de reciprocidade, ou seja, a promoção de ações intersetoriais, que é baseada na inter-relação de
necessidades de várias áreas, sujeitos e grupos, considerando suas influências mútuas. Relações
diversas, heterogêneas e complexas, variando de grupo para grupo (GRAU, 1998).
Analisando a questão das políticas públicas de lazer e sua possibilidade/capacidade de
compor redes mais amplas, um desafio fundamental é o desenvolvimento de estudos que permitam visualizar quem são os atores envolvidos, que parcerias podem ser estabelecidas, quais são as
necessidades e possibilidades envolvidas. Saúde, educação, habitação, turismo, cultura e tantas
outras áreas, com suas inúmeras necessidades, em geral estão imbricados nos trabalhos intersetoriais com o lazer.
Recentemente a intersetorialidade passou a integrar a pauta de discussões e decisões políticas no País, como, por exemplo, as três Conferências Nacionais de Esporte (2005, 2007 e 2010)
que se revelaram como momentos privilegiados de avaliação da política e construção de agenda
participativa, contribuindo para a definição das diretrizes e princípios, em forma de resoluções, a
serem implementadas pelo poder executivo e pela sociedade civil.
Para exemplificar podemos ver nas resoluções da III Conferência diversas menções à intersetorialidade, o que comprova o avanço da temática na área:
Linha Estratégica 2 – Formação e Valorização Profissional
• Ação 5 - Promover a intersetorialidade entre os Ministérios do Esporte, da Educação
e da Saúde para o desenvolvimento pleno da formação continuada e permanente em
educação física, esporte e lazer.
• Meta 1 - Criar, no prazo de dois anos, dentro do Ministério do Esporte, um setor responsável pela integração interministerial para o pleno desenvolvimento das políticas
de esporte e lazer.
Linha Estratégica 3 – Esporte, Lazer e Educação
• Ação 2 – Ampliação e qualificação das ações intersetoriais dos Programas do Governo
Federal
• Metas – PELC/PRONASCI, Mais Educação e outros como o Escola Aberta
• Ação 7 – Instituição de canais entre o Ministério do Esporte e o da Educação para
melhoria da oferta da disciplina de Educação Física no ensino básico.
Linha Estratégica 4 – Esporte, Saúde e Qualidade de Vida
• Ação 5 – ampliação das ações intersetoriais dos programas do Governo Federal
• Ação 9 – promover parceria entre os Ministérios da Saúde e do Esporte no fomento à
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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ações intersetoriais nos âmbitos da promoção da saúde, esporte e lazer, entre todas as
esferas do poder público.
A gestão integrada consiste, em síntese, na fusão das ações de setores a partir da gestão
local, pois, seguidamente, é possível perceber soluções isoladas para problemas sociais. Cresce a
necessidade da compreensão do todo, do contexto e das relações de complementaridade e interdependência entre as partes envolvidas no trato dos problemas (sociais e de gestão). A qualidade
almejada para uma política de lazer aparece bem pautada em Mascarenhas (2007, p.198), quando
diz que:
“se traduz, portanto, por um padrão de excelência e adequação às reais necessidades da maioria
da população brasileira, tendo como princípios e valores ético-políticos fundamentais a solidariedade, a justiça, a autonomia, a liberdade e, por conseguinte, a inclusão social.”
O lazer, por si mesmo, não garante conquista e/ou ampliação de cidadania, nem trará para
a “sociedade” todos os que estão excluídos dos direitos sociais, uma vez que não é suficiente para,
sozinho, resolverem os problemas sociais. Porém, se for desenvolvido com clareza de objetivos e
de forma dialógica, pode ser uma excelente ferramenta de intervenção e alteração da realidade.
4. DE QUE INTERSETORIALIDADE FALAMOS
A relação intersetorial em políticas públicas está muito mais presente no discurso do que
na ação propriamente dita, já que, ao assumir o desafio da intersetorialidade, é fácil imaginarmos a resposta necessária, mas muito difícil construí-la. O processo de construção de um Estado
fragmentado teve um efeito perverso, indesejado e extremamente persistente. Nele cada área é
proprietária de um conjunto de ações, de temas e procedimentos. Mais do que trazer a proposta de
ação intersetorial, é preciso desenvolver um amplo processo de transformação política, ideológica
e da prática em políticas públicas. Arriscamos sugerir algumas ações que consideramos imprescindíveis na construção desta ação intersetorial:
• conhecer e articular os potenciais parceiros, a partir da análise da comunidade como
um todo, que está inserida na sociedade;
• definir um ou mais eixos ou focos centrais de ação, considerando a realidade da comunidade a ser envolvida;
• estabelecer um plano de ação coletivo, no qual cada área proponha sua contribuição
para o alcance do eixo comum, considerando suas especificidades, como e quando isso
será encaminhado;
• constituir de um grupo de trabalho, com papéis e responsabilidades definidas e uma
coordenação, com capacidade de gerir ações coletivas, de aglutinar aspirações, valores
e estratégias, valorizando as diferenças e as relações constituídas, atenta aos problemas
enfrentados e às alternativas que se apresentam;
• definir da sistemática de trabalho deste grupo, garantindo encontros periódicos para
avaliação do que vem sendo executado e ajustes no processo, sempre que necessário;
• reforçar sempre as ideias como parceria e solidariedade, que requerem o conhecimento
do outro e das demandas que enfrentam juntos;
• ter sempre presente que o resultado depende de todos e não de determinada área;
• criar e implementar mecanismos de monitoramento e avaliação das ações, dos quais
participem os gestores, beneficiados e a comunidade.
Podemos dizer que para termos intersetorialidade precisamos de: vontade política dos envolvidos; princípios claros e comuns; instrumentos, ou seja, programas, diretrizes e ações construídas coletivamente; conhecer o território e trabalhar nele e com seus cidadãos e cidadãs.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vincular o lazer a áreas diversas tem estado muito em voga. É uma boa possibilidade de
afirmação destes como políticas públicas que, ao dialogarem com as demais áreas, possam vir a
contribuir significativamente com a construção de uma sociedade mais igualitária. Acreditamos
na impossibilidade de uma real eficiência e efetividade das políticas públicas, isoladamente. Temos
a convicção de que pensar em políticas públicas de lazer depende de uma relação estreita e planejada entre diversas áreas de atuação. A questão que sempre deve se fazer presente é: qual a relação
que pode contribuir com tal intuito e como construí-la?
Ações integradas certamente favorecem a compreensão do lazer enquanto direito social,
como dimensão da cultura, com grande potencial de relação com diversas áreas de conhecimento
e de ação, por estarem mais próximas do conceito de totalidade. Para a efetivação dessas políticas
é preciso considerar: o perfil multidisciplinar dos sujeitos envolvidos; a diversidade e pluralidade
dos interesses culturais do lazer; a crescente preocupação e valorização com a utilização do tempo
livre, para além da simples ocupação; a capacidade de mobilização e organização das pessoas; o
entendimento atual de que intersetorialidade deixa de ser uma proposta de gestão e passa a ser um
requisito essencial na formulação de políticas públicas.
REFERÊNCIAS
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_______. I Conferência Nacional do Esporte. Documento final. Brasília, DF: Ministério do
Esporte, 2005.
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Esporte, 2007.
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Esporte, 2010.
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LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. Belo Horizonte, Editora UFMG, 1999.
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MELO, Victor Andrade. Lazer e minorias sociais. São Paulo: IBRASA, 2003.
PEREIRA, Potyara A. P. Discussões conceituais sobre política social como política pública e
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SUASSUNA, D., et al. O Ministério do Esporte e a definição de políticas para o esporte e lazer.
In: SUASSUNA, D. & AZEVEDO, A. (Org). Política e lazer: interfaces e perspectivas. Brasília: Thesaurus, 2007. p. 13 a 42.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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PROGRAMA ESPORTE E LAZER DA CIDADE (PELC): INTERVENÇÕES A PARTIR
DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO CONTINUADA
André Henrique Chabaribery Capi10
Marie Luce Tavares11
Khellen Pires Correia12
RESUMO: O Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC) têm como finalidade assegurar a
configuração de uma política social de esporte e lazer centrada no parâmetro de desenvolvimento
humano, buscando atender demandas da sociedade em prol do bem estar social. Assim, torna-se
necessário estabelecer um processo avaliativo que identifique se os objetivos e princípios do programa estão sendo atingidos. Neste sentido, o presente artigo busca contribuir com esse processo
de avaliação das ações disseminadas pelo PELC nos convênios estabelecidos com instituições do
setor público, privado ou terceiro setor, apontando experiências disseminadas por algumas entidades que conseguiram pautar as suas intervenções a partir do processo de avaliação continuada.
Para tanto, como metodologia, nos apropriamos de nossa experiência como formadores, mediante
a pesquisa de campo juntamente com a revisão bibliográfica.
PALAVRAS CHAVE: Avaliação. Políticas Públicas. Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC).
INTRODUÇÃO
O Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC), do Ministério do Esporte, foi organizado
como uma possibilidade de superar o tradicional modelo de política pública de esporte recreativo e
de lazer no Brasil, baseado na reprodução mecânica de atividades, e gera o compromisso do desenvolvimento de ações educativas, com vistas à autonomia dos sujeitos nessas práticas, conscientes
de sua importância, limites e possibilidades. Trata-se, pois, de uma política comprometida com a
democratização do acesso às políticas públicas de esporte e lazer; às diferentes regiões brasileiras
e à inclusão social, e por meio dessas áreas sempre priorizando as minorias e os segmentos sociais
em desvantagem social, educativa e econômica (RODRIGUES et al., 2008).
A execução do convênio do PELC está estruturada na gestão das ações dos núcleos e na
gestão administrativa e financeira. Em todos os convênios do PELC, a instituição conveniada
passa por três momentos de formação (Módulo Introdutório13 e dois Módulos de Avaliação14),
além de desenvolver a formação em serviço, cujo objetivo é atender as necessidades dos núcleos
no decorrer das ações disseminadas junto à comunidade.
10 Mestre em Educação Física - UNIP/GPL - [email protected].
11 Mestre em Lazer - Associação de Pais e Amigos da Pessoa com Deficiência de Funcionários do Banco do Brasil e
Comunidade (APABB/MG) - [email protected].
12 Mestre em Educação - UNIP/Faculdade de Palmas - [email protected]
13 Realizado até o segundo mês de funcionamento do programa e concomitante ao processo de seleção e contratação dos
agentes. Possui uma carga horária de 32 horas e é desenvolvido por formadores específicos do PELC. É fundamental
a participação nesse processo de todos os agentes envolvidos com o convênio (gestores, entidade de controle social,
coordenadores e bolsistas) (VIEIRA et al, 2011).
14 Momentos que acontecem na metade da execução e faltando dois meses para finalizar o convênio e também devem contar
com todos os agentes ainda vinculados ao programa (VIEIRA et al, 2011).
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Os módulos de avaliação têm como objetivo: identificar como as atividades vêm sendo
desenvolvidas nos núcleos; identificar a atuação da entidade de controle social e grupo gestor;
contribuir com a definição de ações que propiciem potencializar os pontos fortes do convênio e
minimizar os fracos; aplicar instrumentos de avaliação que permitam identificar os resultados, o
processo e o impacto do programa na comunidade; contribuir com o planejamento do evento previsto para o encerramento do convênio; contribuir com a elaboração da proposta de continuação
da política pública de esporte e lazer (VIEIRA et al, 2011).
Com o objetivo de contribuir com o processo de avaliação das ações disseminadas pelo
PELC nos convênios estabelecidos com instituições do setor público, privado ou terceiro setor,
esse trabalho pretende apontar as experiências disseminadas por duas entidades que conseguiram
pautar as suas intervenções a partir do processo de avaliação continuada: uma vinculada ao setor
público desenvolvida por uma prefeitura e outra ao terceiro setor cuja gestão é de uma ONG (Organização Não Governamental).
A FORMAÇÃO CONTINUADA NO PELC: A EXPERIÊNCIA DE UMA CIDADE DO INTERIOR DE GOIÁS
Localizado no sul do estado de Goiás o município pesquisado ocupa uma área territorial
de 4.691km2. Sua população está estimada em aproximadamente 24 mil habitantes, além do distrito sede, constituído hoje por dezoito bairros e dezessete vilas, o município conta também com
mais dois distritos e cinco povoados.
A prefeitura deste município, por meio da sua secretaria de esporte e cultura, foram em
busca do Programa Esporte e Lazer da Cidade com a proposta de implementar a prática esportiva
por meio de atividades a serem realizadas no turno matutino, vespertino e noturno para toda a
população, colaborando assim para a inclusão social, bem estar físico e mental, promoção da saúde
e desenvolvimento de todos os participantes.
Desta maneira, um núcleo do PELC começou a chegar nesta cidade, sendo a primeira formação um marco no entendimento dos objetivos e diretrizes deste programa. A partir do processo
diferenciado de formação temos a oportunidade de construir coletivamente a identidade do PELC
na localidade, discutindo questões que perpassam pelo direito ao lazer, espaços, tempo, políticas
públicas, intergeracionalidade e gestão participativa e ainda, podemos acompanhar o desenvolvimento das atividades por meio dos dois módulos de avaliação, contribuindo para com o desafio da
gestão de políticas públicas de esporte e lazer.
Nesse convênio já foram realizados os três momentos de formação e observamos a importância de cada módulo para os gestores do convênio e da prefeitura, o grupo de agentes sociais,
como também para os participantes das atividades. Isso está evidente quando observamos dois
aspectos em decorrência das ações do PELC: o primeiro está atrelado a ressignificação na atuação
dos envolvidos no programa e a sua contribuição para a constituição de uma política pública de
esporte e lazer mais consistente no município, visto que, a gestão local identificou as barreiras e
as fragilidades nessa área. O segundo ponto a ser destacado está ligado ao aumento da demanda
para as atividades de esporte e lazer, principalmente por grupos de pessoas que não tinham acesso
a essas experiências.
O destaque deste convênio foi à ação estratégica utilizada pela prefeitura, pois esta aproveitou a estrutura do PELC para a formação do quadro de profissionais da Secretaria de Esporte e
Cultura. Essa estratégia teve como objetivo ampliar o atendimento do convênio para a população
através da criação de subnúcleos subsidiados pela própria prefeitura.
A heterogeneidade do grupo de pessoas participantes na formação foi um aspecto a ser
ressaltado, pois no processo essa caracterização de agentes sociais com experiência em outros projetos e com níveis diferentes de instrução (professores de educação física, educadores populares,
voluntários) não impediu o envolvimento desses personagens com equidade na formação. Esse
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fato demonstrou a identificação e o comprometimento do grupo na disseminação das ações de
planejamento, execução e avaliação do programa.
Esses fatos corroboram com as observações de Isayama (2011) que concebe os profissionais
não como meros reprodutores de técnicas e práticas, mas sim como agentes de mudança capazes
de transformar e fomentar reflexões sobre aspectos diversos de nossa vida cotidiana. Para esse
autor é nesta configuração que surge o reconhecimento por parte dos órgãos públicos, da necessidade da atuação de profissionais com qualificação que possam contribuir para o acesso dos sujeitos
a uma educação para o lazer.
Esta experiência nos confronta com a realidade da necessidade de implementação de políticas públicas de formação, na área de esporte e lazer, para os diversos municípios do interior do
Brasil. E esta possibilidade de formação foi reconhecida pelo gestor municipal e da secretaria de
esportes e cultura, visto que no módulo introdutório havia vinte e cinco participantes, que compreenderam ser esta uma oportunidade única para discutir, construir e reconstruir as vivências
esportivas e de lazer daquele município.
As formações buscaram ser desenvolvidas através de metodologias diversificadas, possibilitando aos agentes momentos de reflexão, de análise da realidade social e das possibilidades de
intervenção. E o resultado deste trabalho pôde ser observado nas respostas dos questionários de
avaliação das formações, em que os agentes destacaram que conhecer os conteúdos, entendendo
seu real significado, permite atribuir valores as práticas corporais, tendo outros focos, não só no
esporte. Para eles, o conhecimento apreendido colabora com o desenvolvimento do trabalho,
tendo uma ideia de como vai ser o projeto, sendo que os conteúdos são fáceis e aceitáveis para o
público que será trabalhado e ainda que as questões conceituais e filosóficas foram fundamentais.
Observaram ainda que, os conhecimentos da formação ressaltam a importância da inclusão social, verificando que todas as pessoas, independente de idade ou que possuam alguma deficiência
podem e devem participar das atividades de esporte e lazer.
Os agentes sociais de esporte e lazer identificaram a formação como um espaço para se
debater a proposta do PELC de acordo com a realidade social em que estão inseridos, bem como
na perspectiva da formação e qualificação profissional e das trocas de experiências e de revisão de
concepções sobre o esporte e o lazer.
Nesse convênio, a academia ao ar livre tornou-se além de cartão postal da cidade, um
espaço de encontro, trocas, convivências, oficinas de ginástica, acompanhamento nos aparelhos e
da caminhada, tendo enfermeiros e fisioterapeuta auxiliando no trabalho. O balé, antes uma modalidade elitizada, hoje está acessível a toda a comunidade, atendendo a quase cem participantes.
Todo este trabalho que vem sendo construído e consolidado na comunidade é resultado da
visão da gestão, que identificou no PELC uma oportunidade de promover qualidade de vida para
seus cidadãos, a partir de uma política pública de esporte e lazer. Desde o primeiro contato com
a instituição pudemos perceber o grande interesse na efetivação do PELC, visto que a prefeitura
compreendeu a relevância de um programa de esporte e lazer alicerçado na gestão participativa.
A FORMAÇÃO CONTINUADA NO PELC: A EXPERIÊNCIA DA GESTÃO COMPARTILHADA NO TERCEIRO SETOR
A experiência desse convênio ocorre em uma cidade no interior do estado de São Paulo
que apesar de ser um município com renda per capta elevada e de riquezas econômicas, sociais,
educacionais e culturais não escapa de um problema comum das grandes cidades, a desigualdade
social e econômica.
O projeto básico do convênio aponta que a cidade possui vários bolsões de pobreza espalhados por toda extensão territorial. Nesses bolsões a maioria das famílias que habita esses espaços
se instalou nesse território por meio da ocupação desordenada, portanto, ainda vivem sob situação
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
de vulnerabilidade e risco social. Essa realidade, atrelada às barreiras culturais que impedem o
acesso aos bens e serviços culturais disponibilizados na cidade a essa parcela da população, foram
os critérios de escolha, da instituição responsável pela gestão do convênio para definir onde seriam
inseridos os núcleos do programa no município.
O desenvolvimento deste convênio com o Ministério do Esporte está sob a responsabilidade de uma organização privada sem fins lucrativos que trabalha pelo fortalecimento das ações socioeducativas e socioculturais em unidades de proteção (creches, escolas, abrigos, etc.) voltadas ao
atendimento de crianças e adolescentes, em parceria com outra organização não governamental
da cidade, cujas ações são voltadas para a promoção e garantia do esporte e do lazer como direito
de toda criança e adolescente.
Essa configuração para a gestão do recurso captado junto ao Ministério do Esporte demonstra que o convênio opta por uma ação compartilhada. Nesse sentido o convênio demonstra que uma
instituição terá a responsabilidade pela gestão administrativa e a outra pela gestão pedagógica e a
articulação em rede das outras duas instituições não governamentais que são as sedes dos núcleos.
Essa parceria se consolidou, visto que as entidades acreditam que, nessas regiões de vulnerabilidade social e econômica, a ação deve se concretizar de maneira integrada, por meio, da
mobilização de parceiros diferenciados com serviços sociais complementares (educação, assistência, esporte), pautados numa metodologia de intervenção participativa e comunitária. Nessa perspectiva a parceria ainda se estendeu com outras duas instituições que atuam na viabilização do
projeto na região atendida.
O formato desse convênio está caracterizado pela estratégia da gestão compartilhada com
o objetivo de convergir um conjunto de políticas (assistência, esporte, lazer, segurança e educação)
que contribuam com a promoção e desenvolvimento da comunidade local.
A observação através do processo de formação do PELC por meio do módulo introdutório
e de avaliação 1 (AV1) aponta que esse convenio vem disseminando uma intervenção significativa
junto às comunidades atendidas, pois suas ações estão permeadas pelas diretrizes15 e objetivos16 do
programa. Isso fica evidente quando nos deparamos com o sistema organizacional/ operacional
proposto pela coordenação geral para a implementação dos núcleos após a formação do módulo
introdutório. Como primeiro passo desse processo, a coordenação utilizou várias estratégias para
consolidar a programação de atividades do projeto básico, mapear novas possibilidades, mas também, estimular à participação da comunidade local nas ações (representantes das instituições –
sede dos núcleos, freqüentadores do espaço, e moradores do entorno). Apontamos, a seguir, quatro
ações que caracterizam esse sistema organizacional/operacional:
• Avaliação diagnóstica por meio da observação dos agentes nos núcleos, aplicação de
formulários de interesse junto aos moradores do entorno do núcleo e no momento das
oficinas e das aulas abertas ligadas aos vários interesses do lazer;
• Elaboração de canais de comunicação: junto às escolas do entorno (convites verbais
15 Auto organização comunitária; Trabalho coletivo; Intergeracionalidade; Fomento e difusão da cultura local; Respeito a
diversidade; Intersetorialidade (VIEIRA et al, 2011).
16 Democratizar o acesso a políticas públicas de esporte e lazer; Reconhecer e tratar o esporte e o lazer como direito social;
Articular ações voltadas para públicos diferenciados nos núcleos de esporte e lazer, de forma a privilegiar a unidade
conceitual do programa; Difundir a cultura do lazer através do fomento a eventos construídos e realizados de forma
participativa com a comunidade; Formação permanente aos agentes sociais de esporte e lazer (professores, estudantes,
educadores sociais/comunitários, gestores e demais profissionais de áreas afins envolvidos no programa); Fomentar e
implementar instrumentos e mecanismos de controle social; Aplicar metodologia de avaliação institucional processual
às políticas públicas de esporte e lazer; Fomentar a ressignificação de espaços esportivos e de lazer que atendam às
características das políticas sociais de Esporte e Lazer implementadas e que respeitem a identidade esportiva e cultural
local/regional; Orientar a estruturação e condução de suas políticas públicas de esporte e lazer nos poderes públicos
municipais e estaduais (VIEIRA et al, 2011).
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nas salas de aulas e realização de atividades abertas no horário de aula), divulgação
na radio comunitária e sites das instituições parceiras, criação do informativo PELC,
reuniões abertas à comunidade (moradores e pessoas representativas – lideranças formais e não formais), participação da coordenação (núcleos e geral) em ações externas
e eventos comunitários (conferências, eventos do bairro), distribuição de cartazes e
filipetas nas casas, comércio do entorno e locais com grande concentração de público,
criação das redes sociais na internet (Facebook e blogs). Essa estratégia teve como
objetivo divulgar as atividades do PELC, sensibilizar os voluntários, promover a aproximação de parceiros e institucional;
• Planejamento participativo das atividades sistemáticas17 e assistemáticas (eventos)
por meio da organização de comissões (coordenação, material e divulgação). Essa
estratégia tem como objetivo conseguir a adesão de um grupo que se comprometa com
a ação, demonstrar que a proposta de trabalho está alicerçada pela ação participativa e
convidar a comunidade local para se engajar na organização e realização das atividades;
• Sistema de avaliação e formação em serviço. O primeiro ocorre por meio da observação participante dos agentes sociais, aplicação de instrumento junto aos freqüentadores dos núcleos e eventos, reuniões com o grupo gestor (representantes das entidades
parceiras - articuladores institucionais, controle social, coordenadores de núcleo e geral, representantes dos agentes sociais), reunião de coordenação (núcleo e geral), reuniões abertas com a comunidade e reunião com lideranças comunitárias. A formação
em serviço (formação continuada) está sendo realizada com periodicidade semanal e
tem como objetivo atender as necessidades dos agentes e coordenadores. Sua estruturação está organizada em quatro momentos. Na primeira semana é desenvolvido o
grupo de estudo temático cuja proposta é abordar temas de interesse do coletivo, com
vista à qualificação das atividades. Na segunda semana acontecem as reuniões de planejamento e avaliação de eventos. Na terceira semana planejamento do repertório de
atividades das oficinas e na quarta semana planejamento geral e de núcleo. O grupo de
agentes também é informado sobre cursos gratuitos e orientado para a sistematização
desse processo do PELC, cujo objetivo é a elaboração de trabalhos para serem apresentados em eventos acadêmicos na área de esporte e lazer.
A partir do acompanhamento realizado no módulo de avaliação I e, de todo o sistema
organizacional/operacional proposto pelo convênio para a gestão do processo de formação e avaliação das suas ações, fica evidente que esse convênio apresenta resultados significativos e alguns
desafios a serem superados para a continuidade do programa. É importante apontar que as necessidades e os desafios para os dois núcleos são diferentes.
Em relação ao núcleo localizado mais na região central da cidade os desafios estão relacionados aos aspectos: consolidação do atendimento aos jovens que não tem participado; atendimento de homens e mulheres adultos, bem como idosos; ampliação do atendimento nos eventos
assistemáticos e em atividades aos sábados; garantia do efetivo registro de instrumentos de planejamento em todos os níveis; intensificação na sistematização das ações. Os pontos fortes deste
núcleo se caracterizaram pelas adaptações institucionais para prever a continuidade do PELC após
doze meses; diálogo entre articulador e coordenador geral; atendimento sistemático de jovens;
adequações de infraestrutura (organização e manutenção); apoio à divulgação de ações do PELC;
suporte de material de impressão; integração de atividades da instituição com o programa; estratégias para alcançar as metas por meio do trabalho em equipe com acompanhamento pedagógico.
17 Atividades organizadas em forma de oficina, com freqüência mínima semanal de duas ou três vezes por semana, com
local e horário preestabelecidos, de caráter permanente e/ou rotativo e de acordo com as características e interesses da
comunidade (VIEIRA et al, 2011).
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No núcleo localizado num bairro periférico da cidade os desafios estão atrelados à ampliação do atendimento para jovens, adultos e deficientes; consolidação da ação com jovens protagonistas aos sábados; afinação do diálogo com articulador institucional e alinhamento com o
plano geral de implementação do PELC; descentralização das ações do núcleo e ampliar o apoio
da instituição na realização dos eventos e desenvolvimento das atividades sistemáticas; descentralização das ações pedagógicas do núcleo e intensificação da relação com a comunidade – estratégias continuadas; mobilização da comunidade para envolvimento nos eventos assistemáticos;
consolidação do acompanhamento pedagógico no núcleo. Os pontos a serem destacados estão
relacionados à proximidade com a comunidade; diálogo com as redes locais; facilidade de aplicação de diagnóstico; diálogo com outras instituições no bairro; divulgação em rádio e jornal local;
consolidação de oficinas em espaços públicos; estratégias diversificadas de divulgação e acompanhamento pedagógico.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A avaliação é um processo de entendimento que deve ser considerado para além da análise de um conceito. Tornar a avaliação uma constante no processo de desenvolvimento das políticas públicas de esporte e lazer é um desafio que se apresenta na atualidade. O desenvolvimento
de políticas de avaliação neste momento em que as demandas pelo esporte e o lazer estão se
consolidando é fundamental para que se promova uma gestão alicerçada no planejamento, no
monitoramento e avaliação, entendendo estes como parte de um processo da gestão de projetos.
É neste sentido, que a construção da gestão participativa vem sendo consolidada em ambas as experiências apresentadas, pois há um envolvimento significativo dos agentes, voluntariado,
beneficiados e familiares na disseminação das ações. Os resultados desses convênios também estão
atrelados ao comprometimento dos agentes sociais e gestores, e as suas intervenções diversificadas
pautadas na multidisciplinaridade, fatores que contribuem com o desenvolvimento do processo
educativo do lazer junto aos participantes.
Assim, o PELC vem consolidando a ideia de que as políticas públicas de lazer devem ter
como base a intersetorialidade, abrangendo diversas áreas sociais, proporcionando uma ampla
discussão teórica da questão, e apresentando os gestores públicos como representantes no fomento
de projetos cujo foco está no bem estar do cidadão (STOPPA, 2011).
Ressaltamos ainda que a avaliação de políticas públicas, mais especificamente, na área de
esporte e lazer necessita de ações pertinentes, para consolidar as propostas que vem sendo implementadas, neste caso, pelo Ministério do Esporte, por meio do PELC, como um programa de
governo que visa criar uma demanda para a constituição de uma política de estado para a área.
REFERÊNCIAS
ISAYAMA, H. F.; PINTO, L. M. M.; UVINHA, R. R.; STOPPA, E. A.. (organizadores.). Gestão
de Políticas de Esporte e Lazer: experiências, inovações, potencialidades e desafios. Belo Horizonte: Editora UFMG. 2011. 29p.
VIEIRA, L. H. S.; SILVEIRA, S. R. F.; FERREIRA, M. A. M.; TEIXEIRA, K. M. D.. Estudos
sobre a gestão do programa esporte e lazer da cidade – Brasília : Gráfica e Editora Ideal, 2011.
188 p.
RODRIGUES, R. P.; PINTO, L. M. M.; SILVA, D. A. M.; BONALUME, C. R.; ARAÚJO, L. R.
M. (organizadores). (2008). Brincar, jogar, viver: lazer e intersetorialidade com o PELC. Brasilia:
SNDEL. 631 p.
STOPPA, E. A. Gestão de esporte e lazer: análise dos espaços e equipamentos de esporte recreativo e de lazer em Ermelindo Matarazzo, zona leste de São Paulo. São Paulo, Plêiade, 2011.
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ANÁLISE DOS ARTIGOS PUBLICADOS NA REVISTA LICERE, COM O TEMALAZER E POLÍTICAS PÚBLICAS NO SETOR GOVERNAMENTAL
Cathia Alves18
Liana A. Romera19
Rosângela Benito20
Sérgio Barcelos21
Nelson Carvalho Marcellino22
RESUMO: Nosso objetivo é investigar as produções científicas dos exemplares da revista Licere,
em torno da temática das políticas de lazer públicas governamentais. Trata-se de abordagem feita
a partir de estudo de caso, envolvendo a combinação de pesquisas bibliográfica e exploratória,
esta última com a técnica de análise de conteúdo. Em relação ao método, como trajetória de
raciocínio, trabalhou-se a partir do materialismo histórico-dialético, na concepção gramsciana.
Verificou-se que há vinte e quatro estudos ligados ao setor, publicados na revista Licere, a partir
do ano de 2000. As palavras-chave lazer e política pública predominaram. Detectaram-se pesquisas
relacionadas à experiência de gestão, relatos de experiências, estudos sobre controle e avaliação
das políticas, formulação e implementação da política, indicadores de espaços e equipamentos.
A pesquisa apontou avanços das publicações sobre esta temática, principalmente a partir do ano
2006, levando a um aumento de 17% nas publicações desse tema, na Revista, desde o ano 2000
até 2009. Demonstrou também o crescimento da qualidade de sistematização na organização
metodológica dos estudos, ainda que com lacunas, principalmente na consideração do método
como processo discursivo, apresentando pesquisas mais bem estruturadas, para além de relatos de
experiências, que dominaram as primeiras publicações referentes à temática no Brasil.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Políticas Públicas. Governo.
INTRODUÇÃO
A partir de 1998, tivemos o surgimento de um periódico científico específico sobre lazer,
no Brasil, a LICERE, Revista do Programa Interdisciplinar de Mestrado em Lazer, da Universidade Federal de Minas Gerais. Segundo sua política editorial, o periódico tem como objetivo
preencher uma lacuna, já que no Brasil, não tínhamos uma revista especifica sobre o tema lazer e
também contribuir para disseminação do conhecimento a partir desta temática.
O periódico tem definido o seu escopo, dessa forma:
Foi lançado com dois intuitos básicos: a) preencher uma lacuna na área, uma vez que não existiam, em nosso País, publicações periódicas dedicadas exclusivamente ao assunto; b) contribuir
para o avanço das discussões ao dar visibilidade à crescente produção acadêmica (seja eminentemente teórica, fruto de discussões conceituais e pesquisas realizadas; ou resultado de reflexões
18 Mestre em Educação Física, UNIARARAS/ GPL – [email protected]
19 Doutora em Educação Física, UFES/GPL- [email protected]
20 Mestre em Educação Física, GPL - [email protected]
21 Mestre em Educação Física, IFTM / GPL - [email protected]
22 Livre Docente em Estudos do Lazer, UNIMEP/CNPq/GPL – [email protected]
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entabuladas a partir de experiências de intervenção), reflexo do aumento do número de teses de
doutorado, dissertações de mestrado, monografias de especialização e graduação, assim como da
ação de grupos de pesquisas organizados. (POLÍTICA…, 2009, s.p.).
A revista, que possui o apoio institucional do Centro de Estudos de Lazer e Recreação
– CELAR – da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG, e do
grupo de pesquisa ANIMA – Lazer, Animação Cultural e Estudos Culturais, tem como objetivos:
“a) registrar, difundir e compartilhar publicamente o conhecimento construído na área do Lazer;
b) contribuir com o avanço qualitativo dos estudos e experiências desenvolvidas” (POLÍTICA...,
2009, s.p.).
Desde 1998, a revista já publicou 22 exemplares, sendo que, a partir de 2007, as publicações passaram a ser eletrônicas. Até o ano de 2008, a revista era publicada quadrimestralmente.
No entanto, no ano de 2009, a Licere passou a ser trimestral (março, junho, setembro e dezembro).
A revista Licere vem desempenhando importante papel na produção científica nacional,
acerca dos estudos do lazer. Torna-se, assim, relevante uma análise crítica dessas publicações.
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho foi desenvolver estudos exploratórios nos exemplares da revista
Licere, sobre a temática lazer e políticas públicas governamentais.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O estudo foi realizado mediante a combinação de pesquisas bibliográfica e exploratória.
Para análise bibliográfica, fomos guiados pelas leituras temática e posteriormente interpretativa (SEVERINO, 2000), a partir das palavras chave: lazer, políticas públicas e governo. A pesquisa exploratória seguiu basicamente os mesmos passos da bibliográfica, porém sua fonte foram
às revistas Licere de 1999 a 2009, exceto o ano de 2004, uma vez que nele não constam estudos
relacionados a esta temática.
Para tal, foi feita a análise de conteúdo, (GIL, 2007), entendida como uma técnica de
investigação que se desenvolve em três fases: 1. pré-análise; 2. exploração do material e 3. tratamento dos dados, inferência e interpretação.
Em relação ao método, enquanto trajetória de raciocínio trabalhou-se a partir do materialismo histórico-dialético, na concepção de Gramsci (1979; 1981), em especial nos conceitos
de hegemonia e contra- hegemonia e de intelectuais. Assim, o lazer é entendido como espaço de
resistência, de possibilidade de formação de novos valores, questionadores da sociedade. Portanto,
sua vivência e importância nos dias atuais são enfatizadas a partir do plano cultural (superestrutura), como um dos instrumentos de mudanças, apesar das limitações estruturais (infraestrutura)
encontradas em nossa realidade.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E RESULTADOS PRINCIPAIS
Quando se fala de Políticas Públicas logo se pensa em Políticas Sociais, Demo argumenta
dizendo que “a Política Social significa o esforço planejado de reduzir as desigualdades sociais,
quando entendida como proposta do Estado. Olhada de ponto de vista dos interessados é a conquista da autopromoção” (DEMO, 1993, p. 06).
Para o autor, a Política Social numa visão sintética consistiria em três fases fundamentais,
a saber: sócio-econômicas, assistencial e política, que se configurariam nos seus três eixos. A
face sócio-econômica centra-se no binômio ‘ocupação/ renda’; o eixo assistencial refere-se a um
espaço fundamental da política social, se o concebermos como assistências devidas por direito de
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cidadania a grupos que não podem auto-sustentar-se ou não deveriam fazê-lo, como é o caso das
crianças, dos idosos, dos inválidos, dos deficientes, dos mendigos, de certos grupos de risco, de
flagelados, etc. A delimitação precisa de tais grupos é sempre problemática, mas é fato que toda
sociedade reconhece o dever de assisti-los, na quantidade e qualidade devidas (DEMO, 1993).
Por sua vez, Freitag (1989, p. 16) define Política Social como “[...] certa forma de intervenção do Estado em áreas específicas da sociedade civil que atingem (mesmo que diferentemente)
todas as classes”. Segundo essa autora, o Estado moderno passou a organizar áreas de vida social
que não estavam sujeitas ao controle estatal como o trabalho, a saúde, a educação, etc, que em
outros momentos históricos e contextos sociais pertenciam à esfera privada da vida social. Para
ela, “Essa função passou a ser atribuída ao Estado no momento em que a consolidação do modo
de produção capitalista estava ameaçada pela deterioração da força de trabalho resultante de sua
exploração desenfreada na fase do capitalismo selvagem” (FREITAG, 1989, p. 16).
Ao mesmo tempo, porém, políticas sociais se desdobram em:
[...] movimentos dialéticos com efeitos não programáveis, que muitas vezes produzem o reverso
do originalmente intencionado. Somente admitindo essa dialética intrínseca ao Estado e às suas
políticas sociais é que podem ser elucidados fatos e processos que de outra forma permaneceriam obscuros ou seriam mal compreendidos. O desenvolvimento não-linear, com avanços e
retrocessos, desvios e contradições, é comumente a trajetória percorrida por uma política social
(FREITAG, 1989 p. 30-1).
Os pontos destacados por Freitag (1989) são muito importantes para verificarmos a abrangência da política social para muito além do assistencialismo, atingindo patamares econômicos e
políticos, seu caráter social amplo, suas formas e objetivos variados, inclusive os de estabilização
do Sistema Social como todo, e seus movimentos dialéticos.
Entretanto apesar das suas colocações abrangentes a autora reconhece que:
A discussão travada no Brasil, nos últimos vinte anos, em órgãos públicos, universidades e comunidades de base, em torno de política social, dificilmente é dissociada de uma visão assistencialista e paternalista. Nestas discussões, a política social é, em geral, identificada como uma
ação do governo dirigida para as chamadas “populações carentes” ou de “baixa renda”. Essa
interpretação tem levado a equívocos teóricos e políticos que muitas vezes prejudicam justamente aquelas populações em nome das quais se pretende acionar a atenção do governo com a
finalidade de sanar desigualdades e injustiças (FREITAG, 1989, p. 15).
Nesse sentido, é importante não apenas caracterizar o significado de Política Social, como
também não confundir os termos Política Pública com Política Governamental. Se considerarmos
que a esfera pública inclui amplos setores de ação da Sociedade Civil, devemos concluir que as
políticas governamentais fazem parte das políticas públicas, mas de forma alguma as esgotam.
Como tradicionalmente, os autores estudados vinculam política social e política de Estado
e, portanto, à política de governo, para efeito deste trabalho, entenderemos política pública de
uma perspectiva mais abrangente, incluindo as políticas sociais, porém sem ficar restritas a elas.
Pereira e Grau (1988) relatam que o que é público pode ser entendido como o que é de por
todos e para todos, opondo-se tanto ao privado como ao corporativo. No entanto esses autores
também reconhecem que não “é simples distinguir o que é público do que é corporativo, mais
ainda ao considerar que ao defender interesses particulares, as organizações corporativas podem
também estar defendendo o interesse geral” (PEREIRA; GRAU, 1998, p. 9).
Para superarmos o entendimento da palavra “público”, que a maioria das pessoas concebe
como “governo”, será necessário promovermos um esclarecimento sobre o seu significado, conforme nos propõe Ribeiro:
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Na modernidade, é preciso distinguir na palavra público dois sentidos principais. Primeiro aquele em que ela se opõe a ‘privado’, e se faz sinônimo de bem comum. Isso não quer dizer ‘estatal’:
pode haver uma esfera pública que não pertença ao Estado, por exemplo, a de uma associação
ou entidade que não tenha por finalidade apenas o bem de seus donos (o chamado ‘terceiro
setor’ [...]).
Mas há também um segundo sentido de ‘público’ – o que se opõe a ‘palco’, tendo assim por
sinônimo a ‘platéia’. No sentido teatral, o público vale menos que o palco. Já no primeiro sentido,
de corte jurídico, deve valer mais que o privado – embora o capitalismo, fortalecido pela economia, lhe tenha conferido poder inédito na história (RIBEIRO, 2000, p. 101-2).
É importante, ainda, esclarecer a diferença entre Estado e governo. Estado é o conjunto de
instituições permanentes, órgãos legislativos, tribunais, exércitos e outros que não propriamente
formam o mesmo bloco político, mas que possibilita a ação do governo. Enquanto, o governo é o
conjunto de programas, projetos e ações que parte da sociedade e propõe uma orientação política
de um determinado governo, assumindo e desempenhando funções do Estado por um determinado período (HOFLING, 2001).
Quanto a analise dos artigos da revista, foram identificados vinte e quatro estudos ligados
ao setor governamental, das políticas públicas de lazer, no período de nove anos de publicação da
revista, pois os estudos passaram a ser publicados a partir do ano de 2000.
Abaixo é demonstrado o índice de publicação sobre este tema na Revista:
Ao observar o gráfico, notamos que entre 2000 e 2001 foram publicados 3 estudos; no ano
de 2002, 1 estudo, 2003 contou com dois; 2004 não teve publicação sobre essa temática; no ano
de 2005 somente 1 estudo; 2006, 2007 e 2008 quatro; e no ano de 2009 foram cinco trabalhos.
Quanto às palavras-chaves, lazer e política pública foram predominantes em todos os trabalhos
que exigiam esta separação. Nota-se um avanço nas publicações sobre esta temática com um
crescimento em 9 anos de 17%.
As palavras-chaves, lazer e política pública foram predominantes. No que se refere às áreas
de estudo, uma pesquisa é da área do Turismo e os outros trabalhos são ligados a Educação Física.
Quanto aos temas de estudo detectou-se pesquisas relacionadas à experiência de gestão, relatos
de experiências e estudos sobre controle e avaliação das políticas, formulação e implementação da
política, além de diversos estudos a respeito de indicadores de espaços e equipamentos de lazer,
na cidade. A maior parte dos estudos publicados tem instituição de origem no âmbito federal, e
no que se refere à formação profissional dos autores, há um equilíbrio entre doutores e mestres.
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Outro item analisado se deu a partir de questões sobre, Formulação, Elaboração e planejamento das políticas; Implementação; Financiamento; Espaços e equipamentos; Formação de pessoal;
Integração das políticas; Controle e Avaliação. Podemos dizer que estas questões aproximam-se do
chamado “ciclo da política pública”. Compreendido por estágios, tais como, a definição de agenda,
identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, a implementação e avaliação da política (SOUZA, 2006)
Este ciclo, segundo Souza (2006), pode ser nomeado como um plano de ação, que auxilia
na ocorrência das políticas. Dessa forma, notou-se referente ao ciclo das políticas públicas que dos
24 artigos analisados, 15 (62,5%) discutem a formulação e planejamento das políticas públicas de
esporte e lazer.
Quanto ao processo de implementação das políticas de esporte e lazer, dos 15 (62,5%)
estudos sobre formulação e planejamento, 10 (41,6%) constavam a ligação com a implementação
e destes, 9 (37,5%) retrataram a questão do monitoramento e avaliação.
Seis estudos (25%) discutiram sobre espaços e equipamentos, a distribuição destes locais
na cidade e como o público se apropria deles; 2 estudo (8,3%) fizeram um recorte histórico sobre
as políticas públicas de esporte e lazer na cidade e os outros 2 (8,3%) apresentaram a relevância da
formação de recursos humanos, enfatizando necessariamente a presença de animadores socioculturais participando ativamente numa gestão compartilhada de politicas de esporte e lazer.
Percebemos que de forma indireta, os estudos indicam preocupação da gestão com a elaboração, planejamento e implementação, e este último aspecto está diretamente relacionado à ação
comunitária, entretanto os estudos não apresentaram discussões concretas em torno da participação
da comunidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos apontar ao final desta pesquisa, sete indicadores que demonstram o “estado da
arte” dos artigos publicados na revista Licere sobre política pública de esporte e lazer governamental:
Quanto ao conceito e compreensão das políticas públicas de esporte e lazer, notou-se que
são ações que ocorrem e se manifestam, mas que falham na operacionalidade. O entendimento
avançou, mas o processo ainda é frágil;
As ações concentram-se no estágio de formulação e planejamento das políticas. Apontam,
ainda, para uma preocupação em torno das fases de monitoramento e avaliação das mesmas;
Quanto ao ciclo das políticas públicas, em alguns casos os estudos apenas afirmam a importância da atividade desenvolvida, ou ainda a importância dos locais com equipamentos específicos de lazer que foram construídos ou reformados. Contudo, os resultados observados não nos
permitem afirmar que existam controle e avaliação das política implementadas, demonstrando a
carência nesses aspectos .
A intersetorialidade do lazer predomina e avança, pois se notou um número elevado de
pesquisas (70%) que relataram as parcerias entre setores e secretarias governamentais diferenciados, mas não detalharam a conexão entre os diversos órgãos envolvidos;
O financiamento das políticas públicas de esporte e lazer é um tema raro entre as pesquisas e a participação da comunidade no processo é considerada como essencial, mas pouco retratada sistematizada. O tema da gestão é discutido em poucas instâncias;
O problema da distribuição de espaços e equipamentos nas cidades permanece, assim
como, a restrição das ações a determinadas faixas de idade;
O crescimento da qualidade de sistematização na organização metodológica dos estudos,
ainda que com lacunas, principalmente na consideração do método como processo discursivo,
apresentando pesquisas mais bem estruturadas, para além de relatos de experiências, que dominaram as primeiras publicações referentes à temática, no Brasil.
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REFERÊNCIAS
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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GRUPOS DE PESQUISA EM LAZER NO BRASIL: UM PANORAMA DA
FORMAÇÃO E DA ATUAÇÃO DOS LIDERES E VICE-LÍDERES
Alcyane Marinho23;
Priscila Mari dos Santos24;
Mirleide Chaar Bahia25;
Cathia Alves26
RESUMO: Este trabalho, de natureza descritiva exploratória, com abordagem quantitativa e
qualitativa dos dados, objetivou apresentar dados preliminares de uma pesquisa em andamento,
organizada em duas fases, sobre intercâmbios internacionais e de cooperação entre pesquisadores
e instituições do Brasil e do exterior, quanto à área do lazer, delimitando elementos referentes à
formação e à atuação profissional dos líderes e vice-líderes dos grupos nacionais. Na primeira fase
realizou-se um levantamento no site do CNPq dos grupos de pesquisa em lazer nacionais, e na segunda, aplicou-se um questionário aos líderes e vice-líderes destes grupos com perguntas acerca da
temática. A formação e a atuação dos pesquisadores investigados estão relacionadas à Educação
Física, apesar de o caráter multidisciplinar do lazer ser evidente também em outras áreas, e 25,5%
dos investigados afirmaram existir programas de internacionalização/intercâmbio nos cursos em
que atuam, o que poderá impulsionar o crescimento dessas atividades, reafirmando o compromisso das instituições de ensino com a formação e a capacitação dos profissionais do lazer.
PALAVRAS CHAVE: Grupos de pesquisa. Lazer. Formação.
INTRODUÇÃO
O lazer está sendo entendido como um fenômeno gerado historicamente, fruto de diversas
ocorrências, tais como, revolução industrial, mudança no modo de produção, processo de urbanização, afastamento dos seres humanos da natureza, evolução tecnológica, globalização, entre outros fatores, que podem ter causado a necessidade de estabelecer uma relação direta do lazer com
as demais obrigações humanas e, também, gerado características específicas para este elemento
(MARINHO et al., 2011). De acordo com Marcellino (2000), o lazer pode ser considerado uma
importante dimensão da cultura, vivenciada por meio de manifestações culturais em um tempo/
espaço disponível e favorável para a manifestação do lúdico, a partir de uma atitude descompromissada.
23 Profa. Dra. do Centro de Ciências da Saúde e do Esporte (CEFID) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC),
coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Lazer e Atividade Física (LAPLAF), Florianópolis (SC). alcyane.marinho@
hotmail.com
24 Graduanda em Bacharelado em Educação Física do Centro de Ciências da Saúde e do Esporte (CEFID da Universidade
do Estado de Santa Catarina (UDESC),integrante do Laboratório de Pesquisa em Lazer e Atividade Física (LAPLAF),
Florianópolis (SC). [email protected]
25 Profa. Ms. da Universidade Federal do Pará (UFPA), Castanhal (PA), integrante do Grupo de Pesquisa em Lazer – GPL
(UNIMEP, Piracicaba – SP) e do Grupo de Pesquisa em Turismo, Cultura e Meio Ambiente (UFPA, Belém – PA). [email protected]
26 Profa. Ms. da UNIARARAS, Araras (SP), integrante do Grupo de Pesquisa em Lazer – GPL (UNIMEP, Piracicaba – SP).
[email protected]
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Na sociedade atual, o entendimento de lazer pode ganhar uma moderna perspectiva em
suas manifestações e denotar novas e diferentes características. Basta observar a diversidade de
grupos de pesquisa cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), atrelados às diferentes áreas do conhecimento, os quais desenvolvem trabalhos de
pesquisa sobre o lazer, seja de forma direta ou indireta, tais como das áreas da Educação Física,
da Pedagogia, da Sociologia, da Antropologia, do Turismo, entre outras (SOUZA; ISAYAMA,
2006). Este fato demonstra que o lazer não pode ser entendido de forma isolada, nem ser restringido a nenhuma área específica, haja vista a sua complexidade e o seu caráter multidisciplinar.
Em um levantamento realizado no site do CNPq, no ano de 2011, Marinho et al. (2011)
verificaram que existem no Brasil 211 grupos que estudam o lazer, direta ou indiretamente, sendo que 127 possuem líderes e vice-líderes e 84 possuem apenas líderes, tendo estes formações e
áreas de atuação em uma significativa diversidade de áreas de conhecimento. Nesse sentido, as
discussões sobre o assunto crescem a cada dia, assim como ganham espaço no meio acadêmico,
tornando-se tema importante de pesquisa.
Dessa forma, seja qual for a área de inserção do fenômeno do lazer, pode-se observar,
nos últimos anos, o significativo envolvimento e a troca de conhecimentos e experiências entre
alunos, professores e pesquisadores de diferentes países. Gomes e Pinto (2009) investigaram especialistas estudiosos no assunto que destacaram a necessidade atual de ampliar os diálogos entre
estudiosos brasileiros e estrangeiros, por meio de intercâmbios que possam gerar novas oportunidades de formação profissional em diferentes âmbitos e níveis, na perspectiva do lazer.
A partir destes pressupostos, os intercâmbios sobre esta temática se justificam, uma vez
que a aproximação entre diferentes povos e as trocas de conhecimentos fortalecem ainda mais a
relevância do lazer, como objeto de estudo, entendido como um elemento da cultura que sempre
existiu. Nesse contexto, chama-se atenção para as características da formação e da atuação dos
profissionais estudiosos do lazer, uma vez que estas, certamente, influenciarão as trocas de conhecimentos e de experiências nesse meio.
OBJETIVO
Apresentar dados preliminares sobre intercâmbios internacionais e de cooperação entre
pesquisadores e instituições do Brasil e do exterior, no que se refere à área temática do lazer, delimitando elementos referentes à formação e à atuação profissional dos líderes e vice-líderes dos
grupos de pesquisa nacionais.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa descritiva exploratória, com abordagem quantitativa e qualitativa dos dados, organizada em duas fases. Para a realização da primeira foi acessado o site do CNPq e
o link do Diretório dos Grupos de Pesquisa. Na “busca”, foi acessada a Base Corrente e selecionada
a opção “grupos”. Sem a utilização de filtro, foi inserida a palavra-chave “lazer”. Este procedimento
possibilitou a visualização de uma lista com todos os grupos de pesquisa do Brasil cadastrados no
site, com o referido termo, permitindo o acesso às informações de cada grupo, bem como de seus
líderes e vice-líderes.
Para a realização da segunda fase, cujos determinados resultados estão sendo apresentados
neste trabalho, além da análise das informações coletadas nos sites dos grupos investigados sobre
possíveis intercâmbios, visando à aproximação do universo pretendido, principalmente sobre os
objetivos dos grupos e dos projetos de intercâmbio, o público atendido, as linhas de pesquisa em
que estão inseridos, as relações com as áreas de conhecimento, entre outras questões, todos os
líderes e vice-líderes dos grupos de pesquisa, foram contatados, via e-mail, e, de acordo com sua
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disponibilidade e interesse, preencheram um questionário, o qual foi previamente validado por
professores especialistas na área, contendo perguntas mistas referentes a esta fase de aprofundamento temático.
As informações coletadas foram analisadas por meio da estatística descritiva (para a abordagem quantitativa) e por meio da técnica de análise de conteúdo (para a abordagem qualitativa).
E ainda, cabe ressaltar que esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos (CEPSH) da UDESC sob número de protocolo 239/2010, contando
com a assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido por parte dos 55 pesquisadores
investigados.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Alguns estudos que desenvolvem o debate sobre a internacionalização de forma mais generalizada foram úteis neste estudo (LO BIANCO, 2009; LIMA; MARANHÃO, 2009; MOROSINI, 2006; ACEVEDO MARIN, 2004), uma vez que os intercâmbios na área do lazer, especificamente, ainda estão sendo realizados de forma “tímida” e com ausência de produção científica
específica sobre o tema “internacionalização em lazer”. Esta ausência de produção científica foi detectada ao se fazer um levantamento nas bases de dados Scielo e Lilacs, no início e no decorrer das
análises dos resultados deste estudo, não sendo encontrados artigos que contivessem as variações
dos termos “intercâmbio internacional em lazer” e “internacionalização do lazer”. No entanto, a
aproximação entre estudiosos da área tem se mostrado significativa e promissora.
No contexto do lazer fica claro que essa área do conhecimento já se manifesta internacionalizada, assim como outras temáticas inseridas em programas universitários, haja vista que o
conhecimento que primeiramente temos acesso é proveniente, geralmente, da Europa ou de países
da América do Norte (LO BIANCO, 2009). Entretanto, a internacionalização também depende
de cada instituição de ensino (BLACK, 2004), uma vez que uma das principais atividades que
contribuem para esse processo, os intercâmbios, historicamente se davam muito mais entre pessoas, do que entre as instituições propriamente ditas, sistematizadas por meio de parcerias (MELO,
1997).
Atualmente, observa-se que parte significativa dos intercâmbios é operacionalizada por
grupos de pesquisa, que devidamente cadastrados no CNPq os legitimam como um dos canais de
maior representatividade em determinada área e possibilitam o intercâmbio aberto, no qual, diversas pessoas podem ter acesso às informações do grupo e podem estabelecer um contato concreto
com todos os pesquisadores envolvidos (CNPq, 2012).
Os grupos de pesquisa, delineados como uma das mais importantes vias de acesso à operacionalização dos intercâmbios nas instituições de ensino, geralmente possuem uma identidade,
intimamente interligada à área de formação e de atuação de seus líderes e/ou vice-líderes a qual,
indubitavelmente, exercerá significativa influência em vários âmbitos, como, por exemplo, no planejamento das pesquisas, nos canais de acesso às outras instituições, nas linhas de pesquisas adotadas, nos procedimentos teórico-metodológicos trabalhados, nas produções científicas do grupo,
dentre outros.
Frente a este cenário, torna-se importante refletir sobre as características da formação e
da atuação dos profissionais estudiosos do lazer, uma vez que, de acordo com Alves e Marcellino
(2010), a formação é fundamental para uma atuação eficaz, uma ferramenta de base para a competência. Segundo os autores é a partir da formação que será possível a efetivação de transformações
das ideias limitadas que as pessoas têm do lazer (como mero campo de divertimento), no sentido
de se alcançar uma consciência crítica, tanto dos profissionais que atuam na área, quanto das
demais pessoas envolvidas neste âmbito.
De acordo com Isayama (2009), é necessário lembrar que o lazer é compreendido como um
campo multidisciplinar que possibilita a concretização de propostas interdisciplinares, por meio da
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participação de profissionais com diferentes formações. A ação profissional requer a compreensão
sobre uma série de questões gerais acerca da temática, bem como um mapeamento sobre como
cada uma das áreas poderá contribuir com os seus saberes específicos e intervir nesse campo.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
No que se refere ao perfil dos 55 investigados deste estudo, os resultados apontam que
83,6% são líderes e 16,4% são vice-líderes dos grupos de pesquisa, sendo que 50,9% são mulheres
e 49,1% são homens. Dessa forma, percebe-se um equilíbrio no percentual de mulheres e homens
pesquisadores, fato animador e instigante para as pesquisas que analisam as questões de gênero, a
emancipação e a conquista de espaço pelas mulheres, tanto no meio acadêmico, quanto em outras
instâncias.
Com relação à faixa-etária 38,2% têm entre 40 e 49 anos de idade; 29,1% entre 30 e 39
anos de idade e outros 29,1% têm mais que 50 anos; e apenas 3,6% têm entre 20 e 29 anos de
idade. Esse percentual mais elevado nas faixas etárias acima de 30 anos pode indicar que este fato
tenha relativa interligação com o tempo de formação dos pesquisadores.
Entre eles, 43,6% atuam em instituições federais; 34,5% em instituições estaduais; 20% em
instituições privadas e 1,8% em uma instituição eminentemente de pesquisa. Este resultado indica
que, possivelmente, os pesquisadores que mais têm se dedicado a grupos de pesquisa e desenvolvido estudos científicos são aqueles que pertencem a instituições públicas, podendo-se levar em
consideração o acesso às linhas de fomento de instâncias públicas de apoio à pesquisa.
Tavares et al. (2009) apontaram com relação aos grupos de pesquisa em lazer, que o tema
gestão do lazer, predomina nos estudos dos grupos da região Sul brasileira. Os autores justificam
que essa demanda pode se dar pelo fato de o Ministério do Esporte, por meio da rede CEDES,
incentivar as pesquisas em lazer, contribuindo no aumento de temas específicos no contexto dessa
área.
Quanto à formação, especialmente sobre a formação inicial, 30,9% dos investigados possuem graduação em Educação Física, 18,2% em Licenciatura em Educação Física, 9,1% em Licenciatura Plena em Educação Física e 3,6% em Bacharelado e Licenciatura em Educação Física;
1,8% são graduados nos cursos de Fisioterapia e de Educação Física, e outros 1,8% nos cursos de
Bacharelado e de Licenciatura em Ciências Sociais e de Licenciatura Plena em Educação Física.
Os resultados também apontam algumas formações iniciais atreladas especificamente
ao Turismo (10,9%), às Ciências Sociais (7,3%), à Arquitetura e Urbanismo (5,5%), à Geografia
(3,6%), à Biologia Marinha (1,8%), às Letras (1,8%), à Hotelaria e Turismo (1,8%) e à Filosofia e
Turismo (1,8%).
Nesse sentido, observa-se que a Educação Física ainda permanece como uma das principais áreas de formação inicial ligada aos estudos do lazer, que vem prestando expressivas contribuições ao incremento da produção científica, pedagógica, técnica e cultural específica sobre o
lazer no Brasil (ISAYAMA, 2009).
Marcellino, Capi e Silva (2011) apontam que a Educação Física se identificou com as
origens do lazer no Brasil, remetendo-se a um profissional que oferecesse condições da população
saber usar seu “tempo livre”, de forma adequada e, ainda, que fizesse uso de atividades corporais.
O profissional da Educação Física encontrou no lazer alternativas de atuação, influenciado pelas
disciplinas da graduação que, aos poucos, foram se difundindo na área, predominando interesses
como, jogos, brincadeiras, recreação, dentre outros.
No contexto da pós-graduação, em nível de especialização, este panorama muda e se amplia para outras áreas, para além da Educação Física: 45,5% dos pesquisadores são especialistas nas
mais diversas áreas do conhecimento; 5,5% em Ciências do Esporte; 5,5% em Estudos do Lazer;
5,5% em Educação Física Escolar; 3,6% em Educação Física Infantil e 34,5% não possuem curso
de especialização.
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Em nível de mestrado, os resultados apontam que 52,7% dos pesquisadores são mestres em
diferentes áreas do conhecimento; 16,4% em Educação Física; 7,3% em Educação; 5,5% em Educação Física/Estudos do Lazer; 5,5% em Ciências do Movimento Humano; 3,6% em Educação/
Educação Motora; 3,6% em Sociologia e 5,5% não possuem mestrado.
Em nível de doutorado, os resultados mostram que 61,8% dos pesquisadores são doutores
em diversas áreas do conhecimento; 10,9% em Educação; 9,1% em Educação Física; 5,5% em Ciências da Computação; 3,6% estão com o doutorado em andamento na área da Educação e 9,1%
não possuem doutorado.
Vale destacar que, apesar da predominância da Educação Física na formação inicial dos
pesquisadores, outras áreas do conhecimento têm aumentado o seu grau de interesse e de participação na busca e na produção de conhecimentos na área do lazer, como foi possível verificar
nos resultados supracitados. Esse fato contribui para fortalecer e reafirmar a importância do lazer
como campo multidisciplinar.
No contexto atual, a oferta de possibilidades de formação e de aprofundamento dos conhecimentos dos profissionais em lazer se distingue em cursos livres de curta duração, formação
específica de nível superior, habilitações em curso superior, e/ou pós-graduações strictu sensu, lato
sensu e MBA (Master of Business Administration) em diferentes áreas do conhecimento (MARCELLINO, CAPI, SILVA, 2011). Existe pouca oferta de cursos de pós-graduação, especificamente
na área do lazer no contexto brasileiro e Isayama (2009), ao discutir a formação e atuação dos
profissionais da Educação Física que atuam nesta área, afirma ser fundamental que estes tenham
conhecimentos específicos sobre o lazer ou relacionados à área, tais como o lúdico, a recreação,
dentre outros.
Com relação ao tempo de atuação no ensino superior, 60% dos pesquisadores possuem
entre sete e 19 anos de atuação; 27,3% entre 20 e 35 anos; 7,3% entre zero e três anos; 3,6% entre
quatro e seis anos, e 1,8% acima de 35 anos. Esses resultados parecem estar relacionados à faixa
etária dos pesquisadores analisados neste estudo que, em sua maioria (96,4%), encontram-se com
idades acima de 30 anos, fato que justifica o longo tempo de atuação profissional neste segmento.
Sobre o curso de atuação dos pesquisadores, 20% atuam em cursos de graduação em Educação Física; 12,7% de graduação em Turismo; 7,3% de Licenciatura em Educação Física; 3,6%
de graduação e pós-graduação em Educação Física; 3,6% de graduação em Educação Física e
Pedagogia; 3,6% de Bacharelado e Licenciatura em Educação Física; 3,6% de graduação em Lazer
e Turismo e 45,5% atuam em diversos cursos inseridos nas mais variadas áreas do conhecimento.
Percebe-se que a atuação profissional no lazer é muito ampla e diversificada, diante da
variedade de áreas do conhecimento que envolvem a formação inicial e continuada dos pesquisadores em lazer no Brasil. Essa formação para o lazer deve se dar por meio da construção de saberes
e competências que devem estar relacionados ao comprometimento com os valores alicerçados
em uma sociedade democrática e especialmente ao conhecimento de processos de investigação
que auxiliem no aperfeiçoamento da prática pedagógica (ISAYAMA, 2009). Ainda, aponta-se, de
acordo com Santiago et al. (2007), que a produção científica neste meio tem um caráter multidisciplinar, o que certamente relaciona-se com os diálogos existentes entre os diversos profissionais
envolvidos.
Quando questionados sobre a existência de projetos e/ou programas de internacionalização/intercâmbio em lazer inseridos na estrutura curricular dos cursos em que atuam, 74,5% dos
investigados responderam negativamente, e 25,5% apontaram que existem tais projetos em seus
cursos. Esses dados podem significar que os primeiros passos estão sendo dados, especificamente
na área do lazer, para a tendência de crescimento observada no movimento atual de internacionalização, que por sua vez, pode estar sendo impulsionada pela maior concretização de acordos entre
instituições nacionais e do exterior, além de apoios de órgãos de fomento à pesquisa científica,
como o próprio CNPq.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maioria dos participantes deste estudo possui mais de trinta anos de idade, com tempo
significativo de atuação profissional (acima de sete anos). A formação e a atuação profissional
dos pesquisadores em lazer investigados estão relacionadas à área da Educação Física, apesar de o
caráter multidisciplinar do lazer ser evidente também em outras áreas.
Acredita-se que os 25,5% dos pesquisadores que apontaram a existência de programas
de internacionalização/intercâmbio nos cursos de sua atuação serão aqueles que impulsionarão o
crescimento dessas iniciativas no âmbito do lazer, e possibilitarão avanço científico sobre o tema.
A maior concretização de acordos de cooperação internacional vem a ser um passo significativo para a área e reafirma o compromisso das instituições brasileiras com a formação e a capacitação dos profissionais de lazer do país. Tais acordos devem se solidificar no sentido de formar
pessoas com visões críticas, ideias e ações autônomas, e comprometidas com o pleno exercício da
democracia, da solidariedade e da equidade social.
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LAZER, FORMAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO: CONSIDERACOES INICIAIS
NO CONTEXTO DA AMÉRICA LATINA27
Ana Carolina Assis Ribeiro28
Rodrigo Elizalde29
Christianne Luce Gomes30
RESUMO: Considerando os cursos de mestrado no campo do lazer e da recreação desenvolvidos
no contexto latino-americano, este texto tem como objetivo discutir a relação entre formação
e mercado de trabalho, bem como o papel das universidades neste processo. Embora este texto
tenha sido fruto de uma pesquisa bibliográfica específica sobre este tema, a metodologia da pesquisa envolveu também a realização de entrevistas e de grupo focal, e atualmente encontra-se em
andamento. Análises preliminares evidenciaram que a maioria dos cursos investigados são profissionais e procuram formar profissionais qualificados para atender as demandas do mercado. Este
aspecto foi priorizado na revisão de literatura apresentada neste texto, que levantou fundamentos
para discutir as temáticas da formação, atuação e mercado de trabalho considerando o papel das
instituições formativas na preparação de professores, pesquisadores e profissionais em nível de
mestrado no contexto latino-americano.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Formação. Mercado de Trabalho.
INTRODUÇÃO: O TEMA INVESTIGADO, OS OBJETIVOS E A METODOLOGIA DA PESQUISA
As ideias sistematizadas neste texto são parte da revisão de literatura de uma pesquisa
mais abrangente que focaliza a proposta acadêmica de cinco cursos de Mestrado em Lazer/Tiempo
Libre/Recreación realizados na América Latina. A formação nesse nível passou a ser desenvolvida
em alguns países latino-americanos desde a década de 1990, abrindo novas perspectivas para se
aprofundar conhecimentos sobre o lazer, o tempo livre e a recreação nesse contexto, como evidenciam as experiências da Maestría Profesional en Recreación - Universidad de Costa Rica, Maestría
en Recreación y Tiempo Libre - Escuela Politécnica del Ejército/Equador, Maestría en Recreación y
Administración del Tiempo Libre - Universidad Regional Miguel Hidalgo/México, Maestría en Recreación - Universidad YMCA/México e do Mestrado em Lazer/UFMG/Brasil.
O presente texto trata de alguns aspectos específicos da pesquisa anteriormente mencionada e tem, como objetivo, discutir a relação entre formação e mercado de trabalho. Embora
este texto seja fruto de uma revisão de literatura, a metodologia da pesquisa demandou o desenvolvimento de uma pesquisa bibliográfica durante todo o processo de investigação, sendo ainda
27 Esta pesquisa vem sendo desenvolvida com o apoio do CNPq (Edital Universal), FAPEMIG (PPM IV) e Ministério do
Esporte (Rede CEDES).
28 Acadêmica dos cursos de Turismo da UFMG e de Design de Produto da UEMG, bolsista Pibic/CNPQ e membro do Grupo
Otium. E-mail: [email protected]
29 Professor substituto da Universidade Federal de Minas Gerais. Co-Lider Grupo de pesquisa Otium: Lazer, Brasil & América
Latina. E-mail: [email protected]
30 Professora da Universidade Federal de Minas Gerais e líder Grupo de pesquisa Otium: Lazer, Brasil & América Latina. Email: [email protected]
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complementada e enriquecida com levantamento de documentos, realização de 25 entrevistas
individuais com coordenadores, professores, estudantes e egressos. Além disso, foi também utilizada a estratégia de grupo focal com os coordenadores dos cinco cursos pesquisados, seguindo as
diretrizes metodológicas propostas por Laville e Dionne (1999). A seguir serão tecidas algumas
considerações relacionadas à temática escolhida para ser tratada neste texto.
FUNDAMENTANDO O TEMA PESQUISADO
O tema da formação é amplo e abriga uma infinidade de abordagens. Deste modo, é importante destacar que a partir de uma visão sistêmica a formação não acontece exclusivamente
nas universidades, pois, há outras esferas da vida social nas quais esse processo ocorre. Com isso,
o significativo papel das instituições formais de ensino durante a formação profissional e humana
não pode ser desconsiderado. Contudo, reconhecemos que a formação “é realizada e enriquecida
com as experiências vividas pelos sujeitos em distintos âmbitos e contextos.” (GOMES, 2011, p.36)
Nesse contexto, o papel da universidade tem se transformado décadas após décadas, buscando através dessas mudanças a ressignificação de novos valores construídos e a readequação das
demandas da sociedade de cada período:
Hoje, a Universidade é multifuncional, embora algumas de suas funções se cumpram apenas de
modo fragmentado e, às vezes, acidentado. Assim, a Universidade tem função cultural, social,
política. Tem a função de preparar profissionais, de pesquisar, de prestar serviços comunitários
(...). A preparação profissional depende da qualidade do ensino e da pesquisa. Onde estas atividades não partirem de uma autêntica atenção com as humanidades, a formação de recursos
humanos fica totalmente prejudicada. (PAVIANI e POZENATO,1980, p. 25)
A dinâmica que relaciona formação de recursos humanos em diferentes níveis e o campo
de atuação profissional tem sido cada vez mais discutida, seja em uma perspectiva voltada para
o mercado ou em uma abordagem mais focada no processo educacional. Longe de ter alcançado
conclusões ou afirmações precisas acerca do assunto, o cenário atual é diverso, composto por diferentes ideais e visões. Dessa forma,
(...) o tema educação e trabalho podem ser entendidos a partir de duas perspectivas: a de que
não há relação entre os dois termos e a de que, ao contrário, ela vem se estreitando em decorrência do reconhecimento que a educação, ao qualificar os trabalhadores, pode vir a contribuir
para o desenvolvimento econômico. (SAVIANI, 1994, p.300)
Considerando as duas perspectivas mencionadas anteriormente, o estreitamento da relação entre trabalho e educação em busca da capacitação da mão de obra tem sido mais comumente
citado na literatura, sendo possível constatar que boa parte dos autores acredita que a educação
deve exercer, cada vez mais, o papel de fomentadora do desenvolvimento econômico, sendo este
a mola propulsora dos processos formativos. Entretanto, alguns autores (tais como SILVA, 1999
e MEYER, 2000) defendem a educação como ferramenta para a construção de um ser humano
mais consciencioso de sua existência. Nesse sentido, a formação e a atuação profissional não se
restringem ao simples atendimento das demandas do mercado, procurando compreendê-las, interagir e atuar sobre elas.
A crítica com relação aos interesses e as estratégias de poder vinculadas à educação no
cenário global é amplamente enfatizada por estudiosos que empreendem reflexões sobre as imposições hegemônicas presentes neste processo. Como salienta Meyer (2000, p.1) “a educação está,
cada vez mais, profundamente institucionalizada em todo o mundo, sendo o seu valor dado como
adquirido”. Silva (1999, p.28) colabora com essa discussão ao esclarecer o seguinte:
O projeto hegemônico, neste momento, é um projeto social centrado na primazia do mercado,
nos valores puramente econômicos, nos interesses dos grandes grupos industriais e financeiros.
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Os significados privilegiados desse discurso são: competitividade, flexibilização, ajuste, globalização, privatização, desregulamentação, consumidor, mercado. Nesse projeto, a educação é vista
como simplesmente instrumental à obtenção de metas econômicas que sejam compatíveis com
esses interesses.
Quando os imperativos do mercado são considerados como o que existe de mais importante e essencial da educação, acabam sendo gerados dois grupos distintos de profissionais: de “um
lado, um grupo de indivíduos privilegiados, selecionados, adaptados ao ambiente supostamente
competitivo do cenário ideal imaginado pelos teóricos da excelência dos mecanismos de mercado;
de outro, a grande massa de indivíduos dispensáveis, relegados a trabalhos repetitivos e rotineiros
ou a fileira, cada vez maior, de desempregados” (SILVA, 1999, p 28).
Ademais, se a educação é conduzida exclusivamente pela lógica do mercado, a própria
formação torna-se uma mercadoria comercializada na forma cursos. Isso está presente no campo
do lazer, onde, embora existam propostas interessantes, muitas iniciativas priorizam os modelos
tecnocráticos tradicionais geralmente destituídos de contextualizações, críticas e reflexões mais
profundas (GOMES, 2011).
Nesse âmbito, a construção do conhecimento sobre o lazer (e diversas outras temáticas) na
sociedade atual e o debate acerca de sua importância em contextos como o de fomento ao desenvolvimento nos chamados países emergentes – ou seja, situados abaixo do padrão pretendido pelo
considerado como ideal no modelo capitalista de desenvolvimento – têm alcançado novos arranjos e adquirido novos significados à medida que distintas atribuições lhes estão sendo conferidas.
Como sublinha Demo (1994), o conhecimento representa uma estratégia de destaque dentro do
cenário global:
(...) o manejo e a produção de conhecimento constituem a mais decisiva oportunidade de desenvolvimento. Mais que a disponibilidade de recursos naturais, tamanho do país e condição
geopolítica, presença farta de mão de obra, conta o capital intelectual, ou seja, a capacidade de
ocupar espaço pela via do domínio e da produção de conhecimento. (DEMO, 1994, p. 10)
Além dos aspectos anteriormente salientados, torna-se relevante pontuar que algumas
correntes de pensamento são contrárias aos moldes economicistas da educação, demonstrando
apoio à luta contra a hegemonia cultural imposta pelo Estado. De acordo com Soares (1997,
p.146), “as reflexões de Gramsci sobre as relações entre Estado e sociedade contribuíram, portanto, para questionar a ideia de que a cultura estava direta e imediatamente subordinada à economia”. Outros autores que dialogam com essa visão também discutem as abordagens educacionais
que colocam em cheque a supremacia institucional sobre algumas esferas da sociedade, como é
o caso de Edgar Morin, que, através de sua obra sobre o pensamento complexo, busca discutir a
segmentação conhecimento, como enfatizado por Lima (2008) na citação a seguir.
Uma das mais fortes propostas da complexidade é renovar, reformar o pensamento, sobre as
questões que envolvem o campo educacional, visando reconhecer o conjunto de saber que a
todo o momento é criado e recriado. Segundo Morin (2001), estes saberes promovem uma necessidade de se aliar a razão e a emoção no processo de construção do conhecimento, “humanizando” os indivíduos, considerando as criações educativas que se desenvolvem em todos os
espaços (...). (LIMA, 2008, s.p)
Diante da multiplicidade de visões e posturas a respeito da formação e dos processos educativos, novos parâmetros e paradigmas têm sido construídos e desconstruídos, redimensionando
novos valores e princípios para a educação. Nessa perspectiva é preciso questionar e entender
qual, de fato, tem sido papel da educação nas sociedades, como esta realidade tem acontecido e
qual tem sido o seu impacto na formação acadêmica e profissional, especialmente considerando
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as propostas de mestrado em Lazer/Tiempo Libre/Recreación desenvolvidos na América Latina.
Afinal, na atualidade:
A abordagem do lazer tornou-se cada vez mais econômica e comercial, evidenciando a importância do consumo e a criação de empregos e outros benefícios para a economia urbana, regional
e nacional. A necessidade de mais e melhores profissionais, juntamente com uma expectativa
renascida durante o inicio dos anos 1980 do aumento de tempo livre e consumo do lazer, geraram novos programas na educação superior na Europa Central e Ocidental. (GOMES, REJOWSKI, 2005, p.10)
Baseado em Severino, Isayama (2002, p.01) indica um ponto frágil nos cursos de formação
da área do lazer quando relata que “a prática docente, quando não fica à mercê do espontaneísmo,
decorrente de um suposto dom natural, está entregue a um tecnicismo didático demasiadamente
mecânico.”
Outro ponto importante quando se trata das temáticas da formação, atuação profissional
e mercado de trabalho, é a clareza de que cada currículo “transmite uma compreensão de mundo,
uma visão de coletividade” (FERNANDES, MONTENEGRO, 2010, p.5). No contexto latino-americano é cada vez mais urgente a necessidade de ampliar a compreensão de mundo a fim de
formar cidadãos conscientes de seu papel na sociedade e que sejam capazes de construir currículos
não só mais adequados a realidade de cada país, como também conhecimentos contextualizados e
críticos com relação à simples reprodução de teorias próprias de outras realidades, como assinala
Gomes (2011a).
A partir dessa perspectiva, podem-se vislumbrar outras possibilidades para a formação/
mercado de trabalho em lazer na América Latina distintas das atuais, onde ainda se verifica que
boa parte das demandas sociais, políticas, culturais e econômicas são respondidas com ações assistencialistas e de cunho patriarcal. Por isso, cada proposta de formação profissional ou acadêmica
de mestrado em lazer/Tiempo Libre/Recreación desenvolvida por universidades latino-americanas
– sejam elas públicas ou privadas – precisa considerar esses e outros elementos que interferem no
processo educativo, na atuação profissional e no mercado de trabalho.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Uma vez discutida a responsabilidade da universidade no contexto da formação profissional, pode-se dizer que nas propostas estudadas as perspectivas de inserção laboral dos egressos
tem estreita ligação com o desempenho e com o envolvimento de cada mestrando no período de
formação. De fato, a formação tem vínculos reais com o mercado de trabalho, mas, como destacado anteriormente, as instituições formativas não podem se prestar a ele exclusivamente, e nem
mesmo tê-lo como principal força propulsora da proposta desenvolvida.
Ao tratar da inserção laboral e do desenvolvimento profissional dos titulados, para a maioria dos entrevistados o sucesso dos mestrandos na vida profissional parece estar diretamente ligado
ao sistema econômico. Em muitas entrevistas foram enunciadas preocupações com as demandas
do “setor privado”, com a possibilidade de criar “empresas recreativas” e de incentivar o “empreendedorismo”. Essas são algumas das evidências de que o enfoque mercadológico vem predominando
nas propostas estudadas, em especial nos cursos de mestrado profissional.
A associação entre a vida profissional e a atuação como empresário ou gestor de empresas
privadas e ONG’s para atender as demandas do mercado no campo do lazer e da recreação é tratada como um processo praticamente natural e, para muitos entrevistados, é tida como uma das
metas a serem alcançadas. Silva (1999) elabora uma crítica com relação a esse aspecto, pois, os
atuais padrões sociais estão centrados
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(...) na primazia do mercado, nos valores puramente econômicos, nos interesses dos grandes grupos industriais e financeiros. Os significados privilegiados desse discurso são: competitividade,
flexibilização, ajuste, globalização, privatização, desregulamentação, consumidor, mercado. Nesse projeto, a educação é vista como simplesmente instrumental à obtenção de metas econômicas
que sejam compatíveis com esses interesses. (SILVA, 1999, p. 28)
A ênfase nos valores econômicos e, consequentemente, o descuido com relação ao formato de educação que propicie transformações e ressignificações dos valores sociais estabelecidos
precisam ser repensados. Dentro desse contexto, é importante ressaltar que
(...) não basta conceber os profissionais como simples reprodutores de práticas recreativas padronizadas e destinadas ao consumo massivo. É necessário que cada profissional em formação
seja concebido como um agente de mudança e, neste processo, torna-se imprescindível escolher
quais saberes serão priorizados. (GOMES, 2011, p.37)
Nas análises empreendidas foi possível perceber que há uma diferença clara entre os cursos investigados no que diz respeito ao investimento acadêmico e investimento profissionalizante,
pois, a maioria dos cursos tem ênfase profissional está focada na formação de profissionais qualificados para atuar no mercado. Dessa forma, a realidade brasileira difere, em alguns aspectos,
das demais propostas formativas estudadas, pois o investimento do mestrado realizado no Brasil é
acadêmico, colocando esta proposta em uma posição contrastante. Em geral, cursos com enfoque
acadêmico são pautados pela constituição de grupos de pesquisa, desenvolvimento de investigações, preocupação com a produção de novos conhecimentos no âmbito da prática social e com a
quantidade/qualidade das publicações geradas neste contexto. Essas questões também podem estar presentes em cursos de pós-graduação com enfoque profissional, mas, o que foi constatado na
pesquisa é que, por razões diversificadas, mesmo que aconteça uma apropriação das teorias sobre o
lazer e sobre a recreação, há uma preocupação muito maior em instrumentalizar o mestrando para
que este tenha êxito no campo de atuação profissional, sendo este orientado para as demandas do
mercado de trabalho na área.
Diante desse cenário diversificado e por vezes dicotômico no que diz respeito aos cursos
pesquisados, pode-se perceber que a realidade latino-americana em nível de mestrado não é composta por uma unicidade e a proposta brasileira é a que mais contrasta com as demais (desenvolvidas na Costa Rica, no Equador e no México). Esse fato tem sido cada vez mais evidenciado através
da pesquisa em andamento. Nesse ponto percebemos o valor e a importância da análise crítica
nos âmbitos da formação, da reflexão sobre a prática pedagógica-profissional e também da pesquisa, pois, interrelacionados, podem contribuir sobremaneira com o desenvolvimento acadêmico e
profissional no campo do lazer.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao tratar da responsabilidade das universidades no campo da produção de conhecimento,
Cunha (2006), se reportando a ideias de Le Goff, enfatiza que quando as universidades admitiram
o novo papel social de formação da força de trabalho intelectual, elas deixaram de deter o monopólio da produção intelectual e do ensino superior.
Portanto, apesar da maioria dos caminhos apontarem para uma formação cada vez mais
institucionalizada e uma qualificação praticamente compelida, tratada como parte natural dentro
do processo educacional, precisamos ter consciência e clareza de que a educação não é um “simples processo de transmissão e reprodução do conhecimento, pois deve perpassar por uma ação
social e científica, na qual o seu propósito deve estar voltado para a construção de um homem
coletivo, crítico e criativo” (FERNANDES, MONTENEGRO, 2010, p.4). Ainda segundo a compreensão desses autores, torna-se essencial construir uma
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(...) uma praxis pedagógica-científica que envolva a técnica, a política, a filosófica, a pedagógica
e o conhecimento crítico da realidade ampara uma reestruturação genuína na consolidação da
concepção emancipatória na formação, na qual a ação docente possa ser fundamentada por um
sólido arcabouço teórico (FERNANDES, MONTENEGRO, 2010, p.7).
Paviani e Pozenato (1980) complementam essas ideias ao esclarecer que formar profissionais capazes de atender as necessidades atuais do mercado de trabalho não é algo fácil e a aquisição de conhecimentos consagrados pelos compêndios não é suficiente: “é preciso desenvolver uma
forma crítica de assimilação destes conhecimentos. É preciso contato com a realidade.” (p.25).
Em face da importância de aprofundar conhecimentos contextualizados e reflexivos sobre
os diversos aspectos apontados nesse trabalho, finalizamos expressando que o intuito desta pesquisa em andamento é, sobretudo, conhecer algumas facetas da formação em nível de mestrado
em Lazer/Tiempo Libre/Recreación na América Latina. Busca-se, com isso, estimular diálogos que
suscitem novas possibilidades de compreender as peculiaridades que marcam essa região e ampliar as chances de que a formação e a atuação no campo do lazer contemplem, cada vez mais,
a constituição de sujeitos críticos, criativos e conscientes de seu papel em face das problemáticas
latino-americanas na atualidade que marcam não somente o lazer, mas todas os âmbitos da nossa
vida social.
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LA RECREACIÓN Y EL TURISMO UNA PROPUESTA DE FORMACIÓN DE LA
UNIVERSIDAD PEDAGÓGICA NACIONAL
Astrid Bibiana Rodríguez Cortés31
Andrés Díaz Velasco32
RESUMEN: La ponencia que se presenta recoge los insumos conceptuales sobre los que se afirma
la propuesta de formación de la Licenciatura en Recreación y Turismo de la Universidad Pedagógica Nacional (UPN). En ésta se exponen los fundamentos epistémicos y los pensamientos teóricos
en torno a la recreación y el turismo como campos sociales de formación y proyección profesional.
PALABRAS CLAVES: recreación, turismo y pedagogía
INTRODUCCIÓN
La LICENCIATURA EN RECREACIÓN Y TURISMO es una propuesta de formación
que recoge la experiencia del programa Licenciatura en Recreación de la UPN del año 2006, ampliando su horizonte formativo al campo (social y discursivo) del turismo; respondiendo, además,
a dos procesos de auto-evaluación del programa y a las proyecciones académicas de docentes y
estudiantes. Todo ello en el marco de la renovación del registro calificado33, coyuntura importante
para fortalecer y permitir el desarrollo de los programas académicos y de las ofertas educativas. La
propuesta de formación en Recreación y Turismo da respuesta también, a la necesidad de formar
agentes educativos para afrontar las necesidades lúdicas, socioculturales y ambientales de la nación
colombiana, entendiendo que su quehacer profesional trasciende los límites del aula y contempla
la construcción de propuestas político-educativas que adoptan nuevos campos sociales, como
ejes transversales de cualquier proceso de formación.
La propuesta de Formación en Recreación y Turismo coincide con las perspectivas de
análisis sobre el mundo contemporáneo que afirman la existencia de nuevas formas de construcción de subjetividad en las que los «individuos» se asumen, se relacionan y se conciben por medio
de actos re-creativos gracias a los cuales constituyen una sociedad radicalmente distinta a la heredada del siglo XIX34. Se plantea que esta nueva sociedad presenta cambios a nivel tanto tecnológico como cultural y político; afectando ello las formas de relación e intercambio social de lo
comunitario y, por tanto, alterando la dinámica misma de la educación dentro y fuera de la escuela.
Si se sigue el planteamiento de Cornelio Águila, en su estudio crítico sobre el ocio y las sociedades
31 Licenciada en Educación Física. Mg. En Educación Universidad Pedagógica Nacional. Coordinadora Licenciatura en
Recreación. Facultad de Educación Física. Universidad Pedagógica Nacional. Miembro del grupo de investigación Lúdica,
cuerpo y sociedad. [email protected]; [email protected]
32 Licenciado en Educación Física, Universidad Pedagógica Nacional. Candidato a Magister en Filosofía Universidad del
Rosario, Bogotá.
33 El registro calificado es la aprobación que reciben por parte del Ministerio de Educación Nacional los programas de Educación Superior que cumplen con los criterios nacionales de calidad. Luego de una primera aprobación, los programas que
desean continuar funcionando deben renovar su registro siguiendo ciertas indicaciones legales.
34 La concepción original de estos procesos de subjetividad en los que los individuos se liberan a sí mismos de las «sujeciones»
propias de las sociedades modernas fue elaborada por Foucault (2005, 2009), pero ha sido continuada, de un modo a su
vez renovado, entre otros, por Sloterdijk (2003). No se trata de otra cosa que de la ética como estética.
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postmodernas, de que los cambios contemporáneos tienen sus raíces en las “grandes revoluciones:
la americana y la francesa las cuales proporcionaron la estructura política e institucional, y la
revolución industrial, que aportó la base económica para el desarrollo del industrialismo, del urbanismo y, finalmente, del capitalismo como sistema socioeconómico” (2007: 13), lo que queda por
hacer, ante las condiciones actuales de la historia, es re-crear revoluciones en las que se potencie,
como decía Deleuze, “no ya la existencia como sujeto, sino como obra de arte” (1995: 79)35.
Por ello, esta propuesta académica demanda importantes retos y acciones en el contexto
nacional e internacional: resulta indudable que la recreación y el turismo se ven permeados e
interpelados por las formas contemporáneas de relación social. Urge así estudiar con una perspectiva crítica los fenómenos que configuran estas nuevas realidades y, sobre todo, desde una mirada
pedagógica que posibilite, además, la creación de modos de ser y estar (o, en suma, de vivir) en
el mundo. Pero, en la misma línea, apremia también reconocer que el conocimiento ya no es fijo
ni estático y que, si se asume que vivimos en la sociedad del conocimiento –la cual demanda que
los individuos se eduquen a lo largo de su vida y sean flexibles y adaptables a las condiciones del
mercado–, ya no es únicamente la escuela la que educa, sino que existen diversos escenarios educativos que permiten comprender cómo el mundo se ha configurado distinto y, así mismo, cómo
es posible ejercer una ciudadanía responsable (con la vida colectiva y el medioambiente).
Se presenta, entonces, un proyecto pedagógico sobre el contexto de la recreación y el turismo, donde confluyen tres elementos: Cultura, Vida y Sociopolítica; los cuales han venido alimentando la propuesta de mundo y de realidad del Proyecto Académico Licenciatura en Recreación desde sus inicios, por lo que se reflejan en los contenidos curriculares tanto como en los
desarrollos investigativos –los cuales articulan el quehacer del docente con la construcción del
saber pedagógico, el desarrollo epistemológico interdisciplinar de la recreación y el turismo, y las
relaciones teórico-prácticas del proceso formativo de licenciados. La estructura curricular se organiza facilitando convocar y actuar creativamente a profesores y estudiantes, en su relación con las
disciplinas, los saberes y las prácticas; rompiendo así con la concepción tradicional de asignaturas
o materias aisladas que fragmentan la formación. Además, tanto los ciclos como las áreas se encuentran ligadas por medio de estrategias como la sistematización y la vinculación de los proyectos
de grado a las tres líneas de investigación de la licenciatura.
EJES CONCEPTUALES
El Programa orienta el interrogante por el sentido de la «recreación» y del «turismo» en
una dirección totalmente distinta a las pretensiones esencialistas. De ahí que considere a la recreación y al turismo como formas de interrogar y de abordar el mundo contemporáneo, y no como
disciplinas del saber o meras actividades. La recreación y el turismo, se definen, para el programa,
como lugares de observación –perspectivas–; como formas de indagación que asumen tanto los procesos de diversión, de relajación, de vacaciones, como las dinámicas educativas, éticas, políticas
y sociales. A continuación se desarrollan las nociones de recreación y turismo de acuerdo a los
presupuestos conceptuales en que descansa el programa.
• EL CONCEPTO DE «RECREACIÓN»
El campo social de la recreación, en su extensión ilimitada, aflora como conjunto de relaciones actuales y potenciales de cuerpo y de sentidos. Se comprende así por qué la recreación
está vinculada a la relajación y el entretenimiento, referida a prácticas como ver televisión, jugar
35 Se entiende por re-creación la acción de repensar los procesos estructurados y modificarlos gracias al acto creativo e inspirador.
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o visitar museos –unas prácticas de “diversión para alivio del trabajo” (DRAE), para alegrarse o
deleitarse–; e, igualmente, ligada al acto de volver a crear, de producir de nuevo una cosa –como
empleo de las energías en la alteración de materiales, por ejemplo–. De allí también su relación
con el campo artístico, el político/burocrático y el educativo, por nombrar unos pocos. En este
orden de ideas, la recreación como campo social involucra la vastedad de agentes, grupos, instituciones, bienes, discursos, saberes y prácticas que la expresan: el uso de la palabra tanto como lo
que le da su sentido.
Así las cosas, los licenciados de la Universidad Pedagógica Nacional, son agentes sociales
que interactúan o han de interactuar en este campo de forma intencionada, con una determinación, un proyecto, un modo de proceder producto del estudio cuidadoso, del pensamiento crítico y
propositivo, de la reflexión y acción sistemáticas sobre el mismo campo. Intención atravesada por
el carácter pedagógico que constituye su distinción en el campo en tanto que saber particular. Una
interacción, pues, que interroga la relación enseñanza-aprendizaje, la construcción o producción
del sujeto, los procesos de socialización y/o enculturación que la sociedad colombiana, en su realidad histórica, y la sociedad mundial, con sus problemáticas actuales, generan en el campo social
recreativo.
Con base en lo anterior, puede comprenderse mejor por qué conceptualizar la recreación no sólo es importante académicamente hablando (en cuanto que universidad que ofrece un
programa de profesionalización) sino que constituye un deber como agentes sociales gestores de
cambio. Sin duda, al conceptualizar se explica el manejo o sentido de una palabra con el fin de
evitar un equívoco y en relación con un problema o un conjunto de problemas que se pretenden
solucionar o develar en la medida en que el concepto se desarrolla y materializa.
Se debe aclarar entonces: primero, hay por lo menos cuatro nociones formuladas en relación con el carácter pedagógico de la recreación: a) existe ampliamente la noción de que la recreación implica un exclusivo, y reducido, número de actividades que pedagógicamente hablando
deben «dirigirse» con fines (valga decir) moralizantes respecto del «buen» uso del tiempo libre,
esto es, del tiempo en el que no se realiza una actividad obligatoria; b) se considera también un
tipo de educación recreativa por medio de la cual los saberes a enseñar (matemáticos, lingüísticos,
morales, etc.) se presenten de forma amena y divertida; c) la recreación como un «instrumento
didáctico» especialmente útil para instituciones sin esquemas formales de educación en las que se
estimula y favorece el juego, sobre todo, infantil; y, d) en palabras de Guillermina Mesa y Harold
Manzano:
“[…] la recreación como estrategia pedagógica es una actividad incluyente, que difiere de las
actividades artísticas o deportivas en que no busca la finalidad de un producto (espectáculo) o
la formación de un especialista. Aunque mantiene con éstas y otras actividades socioculturales
vínculos muy profundos, sus motivos sociales son muy distintos. Mientras las dos primeras se
fundan en la diferenciación e individualización de los más hábiles y competentes, la segunda se
define por la inclusión y la participación colaborativa de quienes la realizan sin que importe su
condición y habilidades previas como requisito para realizarla” (2009, 24-25).
De estas cuatro, la última perspectiva es la más cercana a lo que ha venido planteando y
poniendo en acción la Universidad Pedagógica Nacional; no obstante, con un factor diferenciador: se enfatiza sobre el «acto creativo» (y la dimensión temporal de la existencia) en función de
la promoción de transformaciones sociales (y no solamente el reconocimiento de su posibilidad).
Debe aclararse que no se trata, propiamente, de pretender direccionar la sociedad con un rumbo
particular; los cambios sociales pueden tomar direcciones inesperadas e impensadas. El propósito
es más bien tanto contribuir en el posicionamiento de los sujetos en su momento histórico y su
ubicación geográfica (conciencia histórico-geográfica en el globo), como potenciar o impulsar su
capacidad de agenciamiento en concordancia con su capacidad creativa. Evoca así la «recreación»,
70
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el replanteamiento de las estructuras y la inherencia de la creatividad en el ser humano.
De este modo, la «definición» de recreación en la UPN es tal como sigue: La recreación
es una mediación creativa con intencionalidad pedagógica que tiene como propósito aportar a la construcción del tejido sociocultural potenciando la imaginación y los lenguajes lúdicos que interpelan los
discursos hegemónicos frente al trabajo, el tiempo libre y el ocio, para agenciar otros mundos posibles
alternativos, alterativos e incluyentes.
En primer lugar debe precisarse el sentido de los términos empleados. Por mediación se
apela a una lógica que no es la de los medios y los fines: cuando domina esta última perspectiva,
el propósito de la acción se encuentra predeterminado y los medios se valoran según permitan o
impidan el logro de dichos objetivos. Esta lógica eficientista deja de lado todos aquellos aspectos
que reelaboran los fines, que redefinen los medios y que parten del conflicto, de los vacíos y de las
incertidumbres para producir movimiento.
La mediación creativa no evade la intencionalidad, pero hace suyas todas aquellas circunstancias no previstas, esto es, hace suyos los agenciamientos. Las mediaciones no “controlan” los
resultados y permiten las experimentaciones, las vacilaciones y los re-comienzos, de ahí que se
enfatice en la posibilidad de interpelar (de interrogar las preguntas y las respuestas) los discursos
y dispositivos hegemónicos, esto es, todas aquellas formas de percibir, sentir, recordar y proyectar
que reproducen el orden social con sus formas de exclusión y de explotación.
La recreación se ubica desde una perspectiva crítica y propositiva que hace posible otros
modos de ser, de imaginar y de construir-se, esto es, de ser-con-otros, modos capaces de alterar las
dinámicas que producen y se benefician de las desigualdades. Esta alteración requiere de espacios
capaces de imaginar y provocar dinámicas no jerárquicas (alternativas) de estar juntos (mundos
incluyentes). Con estos elementos se delinea el modo de interrogar y de abordar los fenómenos
recreativos, el querer decir del programa.
• EL CONCEPTO DE «TURISMO»
Sustancialmente, las miradas crítico-sociales sobre el turismo dan cuenta de una serie de
problemáticas que el enfoque comercial si bien no obvia pareciera evitar a toda costa, refiriéndolos
a condiciones históricas y procesos que considera inevitables por los que el desarrollo económico
no puede detenerse (casos como la interacción multicultural, la construcción de infraestructura
hotelera en zonas biodiversas y la promoción de visitantes en masa).
En este sentido, y entendiendo el turismo como un fenómeno que afecta a los seres humanos en sus desarrollos identitarios locales, se comprende la importancia de que existan procesos
de formación centrados en que los lugareños defiendan su territorialidad, entendida ella como sus
tradiciones, costumbres, hábitos y formas de vivir; lo que comporta, en definitiva, la creación de
un ambiente de respeto y valor por su cultura para afrontar los fuertes problemas de colonización
y aculturización. Así mismo, hacer énfasis en el cuidado ambiental (tarea que actualmente no
es exclusiva de una sola área académica), representa un caso puntual debido a las relaciones que
se establecen con la tierra, no sólo en el sentido del sistema económico imperante sino además
respecto al reconocimiento de los modos en que cada zona los afronta. Sin lugar a dudas, la afectación que hace el turismo al ambiente es ampliamente conocido, así que se requiere formar y
pensar propuestas donde el ambiente no sufra drásticamente al paso de los turistas y mostrar los
beneficios que ello puede acarrear en el futuro del desarrollo de las comunidades anfitrionas.
Ahora bien, para la construcción de una propuesta educativa en turismo, se han tenido en
cuenta los avances en la educación para el tiempo libre y la pedagogía del ocio, la ciudad educadora y la pedagogía crítica y popular. De un lado, es propósito de la licenciatura seguir ahondando
en el cuestionamiento a la segmentación del tiempo vital, dentro de la cual se han generalizado
«enfermedades» relacionadas con el aumento de las velocidades, las responsabilidades productivas
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y el alejamiento de sí mismo. Por tanto, en contra del encaminamiento a hacer de nuestros jóvenes
más productivos, eficiente, proactivos (o ultra-activos), se suscita a pensar que el sistema educativo
se encargue de educar para el ocio a los niños, jóvenes y adultos; y más allá de los análisis nefastos que se pueden hacer relacionados con el vicio y la improductividad, de lo que se trata es de
reconocer la validez del cuidado de sí (el cuidado del cuerpo), de sus espacios, su tiempo, el tiempo
para sí. Estudios como el de Igarza (2009), han mostrado que el ocio y el tiempo libre no necesariamente implican un no-hacer-nada y que, además, en medio de las ocupaciones obligatorias, existe
la posibilidad de emprender un «ocio intersticial» liberador.
De este modo, la educación del tiempo libre y el ocio, es una perspectiva que pretende
que los sujetos reconozcan la importancia “de lo lúdico, la plenitud de lo artístico, la vivencia de
lo bello y, en definitiva, la felicidad que puede sentir la persona humana ante un bienestar desinteresado” (Cuenca, 2004). Con esta pedagogía del ocio en línea turística, entonces, se busca que
las personas puedan mejorar su calidad de vida, a partir de sus propias motivaciones y deseos,
llegando a experiencias sinceras de libertad y desarrollo personal.
OBJETOS DE ANÁLISIS TRANSVERSALES EN LA CONSTRUCCIÓN TEÓRICA Y PEDAGÓGICA
Como objetos de análisis, es decir, más que “cosas” cuyo comportamiento se espera entender para lograr su predicción y control, los conceptos transversales que concentran el desarrollo
teórico del programa y orientan las relaciones entre docentes y estudiantes, son ámbitos problematizadores en los que se encamina la investigación y en torno de los cuales se despliega el
quehacer epistémico de los licenciados en recreación y turismo. Estos conceptos sirven como ejes
base del programa; de su articulación, de sus tensiones y rupturas, se deriva el campo cambiante
en el que la construcción de saberes recreo-turísticos despliega su sentido. Los cuatro objetos de
análisis son: la territorialidad, en cuanto apropiación simbólica del «espacio» por medio de «técnicas corporales» (en términos de Marcel Mauss); la temporalidad, como condición esencial de la
existencia en tanto intensidad viva; la experiencialidad, entendida la experiencia como productora
de subjetividad; y, finalmente, el ambiente, conforme producto del habitar creativo (tal como lo
concibió Heidegger).
A continuación se presentan las definiciones «operativas» que se han construido para/
desde la Licenciatura en Recreación y Turismo.
TERRITORIALIDAD. El territorio evoca las diversas formas como los seres se hacen
presentes en sus concretas formas de vivir. Por ejemplo, los lugares sagrados que tienden a definirse
por la presencia de lo divino, y los festivos que lo hacen generalmente por la presencia de la carne;
tal como pasa con los lugares íntimos y públicos, a los que les corresponden unas prácticas particulares de acuerdo con la cultura; o la geografía que ha sido signada por el miedo, así como aquellos
espacios señalados por el deseo o por el afán, todos definiéndose por aquello que se hace presente,
así como por lo que debe permanecer ausente. El territorio se construye, pues, en y a partir de
la relación o interacción entre cuerpos (aun cuando éstos no se encuentren materialmente uno
frente al otro, tal como lo ha posibilitado la introducción de las tecnologías de la comunicación).
TEMPORALIDAD. Se acoge una noción existencial del tiempo en contraste con las
determinaciones contingentes del mismo. Esto es, no se trata sólo de la cronología, o del modo
como cada sociedad organiza, sistematiza, administra, produce y controla el tiempo; sino de la
forma como esos tiempos y ritmos adquieren intensidades en relación con la vida misma de los
sujetos. La temporalidad hace referencia a ese tiempo pasando que cada uno es hasta que deja de
ser, es decir, hasta la muerte (Heidegger); pero no sólo eso, también refiere al modo como cada
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cual vivencia ese tiempo o, mejor, como cada quien lo siente (se sabe, por ejemplo, que en ocasiones como caminar hacia el cadalso, un minuto de espera se vive como toda una vida). Sin duda,
la temporalidad depende de la cultura en que tales intensidades se advierten y, por lo mismo, varía
históricamente. Ha de entenderse, entonces, cómo en el transcurrir la temporalidad se reescribe
o se refunda.
EXPERIENCILIDAD. Esta noción alude al modo como lo vivido se recrea en emociones
e ideas conforme la efectuación corporal de los acontecimientos (Deleuze, 1994). La experiencia
es un proceso totalmente empírico (es decir, no trascendente) que da cuenta del hecho de que los
cuerpos «sufren» afecciones por el constante contacto de todo aquello con lo que entran en relación, produciéndose con ello no sólo diversas formas de subjetividad sino además distintas culturas
o formas de vida colectiva (Díaz, 2007). En suma, el sujeto es experiencias; pero no en el sentido
absoluto del sujeto dado, tal como lo entendía Hegel, sino –parafraseando a Foucault (2005)– en
cuanto producto de la correlación, dentro de una cultura, entre campos del saber, tipos de normatividad y formas de relación con uno mismo.
Se afirma con esto que los saberes y prácticas de la recreación y el turismo se concretan
en experiencias alterativas capaces de provocar otros modos de vivir-se. Se abre, pues, la entrada
a un «orden ficcional» (Deleuze y Guattari) como esfera que articula las realidades del deseo, específicamente a través de los imaginarios, con el devenir previsto por las acciones educativas. Las
ficciones útiles, en el sentido nietzscheano del término, pueden develar las realidades presentes
–que son sin embargo ocultadas en el transcurrir cotidiano– en la producción de lo posible.
AMBIENTE. El ambiente –en tanto existencial y objeto de análisis de la licenciatura–
da cuenta de la interacción entre «organismos» y «medios» o, parafraseando a la UNESCO, de
un macrosistema formado por varios subsistemas. En tal sentido, el ambiente comprende un flujo
continuo de energía y materia en el que se complementan, de manera holística, los sistemas humanos (económico, social, político, cultural y tecnológico) y los sistemas naturales (fauna, flora,
hidrósfera, geósfera, atmósfera). Por lo que, como lo plantean Toro y otros, “hombre–naturaleza se
recrean y evolucionan continuamente en una sola unidad sistémica” (2009: 2). Esta mirada particular del concepto ha modificado, sin duda, la concepción sobre el papel del hombre en el «medio
natural» y ha puesto de manifiesto su grado de responsabilidad en las transformaciones del mismo.
PUNTOS DE DISCUSIÓN
1. Las dificultades de formar en Recreación en Colombia: es necesario considerar que
aunque la universidad ha realizado una apuesta por la formación en recreación aún las
representaciones sociales y los imaginarios sobre recreación han sido un punto complejo a superar para gozar de credibilidad y competitividad en el campo de la educación.
2. Poner en consideración al campo del turismo dentro de la pedagogía y la importancia
de educar en él: en Colombia el campo del turismo es manejado por empresarios por
lo que impera sobre él una visión económica; sin embargo, el impacto ambiental y las
prácticas sociales que perjudican el desarrollo cultural han generado la necesidad de
formar en este campo con una mirada social.
3. Los retos que implica para la UPN liderar una formación en este campo: la Facultad de
Educación Física de la UPN, es reconocida como el alma mater de la educación física,
la recreación y el deporte en l nación colombiana, y a ella corresponde liderar procesos de innovación y propuestas de avanzada que permitan abrir nuevos escenarios
educativos. Aún así también sobre ella reposan críticas por la división que ha forjado
entre educación física, deporte y recreación como tres campos de estudio y formación
profesional aparte.
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BIBLIOGRAFÍA
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LAZER E ATUAÇÃO PROFISSIONAL: ANÁLISE DO PERFIL DOS PROFISSIONAIS
DO SESC/MG DE BOM DESPACHO36
Rodrigo de Oliveira Gomes37
RESUMO: Os processos de formação montam as demandas de atuação profissional apresentadas
pelo mercado. Existem tendências com diferentes eixos e possibilidades profissionais nas múltiplas
perspectivas do lazer. A atuação em lazer é encarada de forma multidisciplinar buscando atender
serviços e vivências pautadas no envolvimento crítico dos indivíduos. Esta pesquisa objetivou analisar o perfil dos profissionais que atuam com lazer na Unidade do SESC/MG de Bom Despacho,
tendo em vista sua formação, locais de atuação, funções assumidas, concepções de lazer, entre outros. A metodologia é contemplada pela revisão de literatura e por pesquisa de campo utilizando
entrevistas semi-estruturadas. Foram entrevistados nove indivíduos, divididos em três grupos por
suas características de atuação. O Resultado trouxe diagnóstico de três perfis profissionais bem
distintos em mesmo local de atuação. Isto ocorreu prioritariamente devido ao processo de terceirização de serviços em lazer e recreação no SESC de Minas Gerais. Constatou-se o despreparo de
alguns profissionais entrevistados e a necessidade de melhoria nos processos de busca por formação continuada destes indivíduos, além disso, propomos reflexões sobre perspectivas que ampliem
os olhares para além da especificidade técnica/instrumental vista no mercado de trabalho.
Palavras - chave: Lazer, Atuação e Formação profissional.
INTRODUÇÃO
Minha formação e atuação como animador sócio-cultural aconteceu pelo contato na unidade do Serviço Social do Comércio de Minas Gerais (SESC/MG) da cidade de Bom Despacho
no atendimento a hóspedes, nas ações de ruas de lazer, estações saúde e campanhas sociais. Além
disto, a graduação em Educação Física estreitou os conhecimentos fecundando o espírito científico através das produções acadêmicas que possibilitaram a aproximação com o campo de estudos
do Lazer.
Desta forma, a busca por qualificar minha atuação profissional motivou a aproximação
com o Centro de Estudos em Lazer e Recreação (CELAR) da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG). Essa aproximação aguçou minha curiosidade, a vontade de aprender e a disposição em ampliar minhas reflexões que possibilitaram avanços qualitativos na compreensão sobre
o Lazer.
Foi nesse caminho que o tema formação e atuação profissional surgiu como preocupação
em minha trajetória. Formar pessoas para atuarem com Lazer é fundamental nos dias atuais,
tendo em vista um mercado que se mostra cada vez mais promissor, exigente, competitivo e que
distingue os diferentes tipos de profissionais. O mergulho nas teorias sobre a formação, atuação e
mercado de trabalho em Lazer apontou observações que dizem respeito a perfis profissionais, ao
mercado de trabalho disponível e ao universo de problemas e circunstâncias da sociedade brasileira.
36 Estudo realizado no IX Curso de Especialização em Lazer da Universidade Federal de Minas Gerais em 2009.
37 Mestrando em Lazer pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2011-2013). Especialista em Lazer pela UFMG
(2009) - [email protected]
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OBJETIVO
Identificar e analisar o perfil dos profissionais que atuam com lazer na Unidade do SESC/
MG de Bom Despacho, tendo em vista sua formação, locais de atuação, funções assumidas, concepções de lazer.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa bibliográfica juntamente com a pesquisa de campo alinharam-se na busca
pela análise e compreensão do perfil dos indivíduos que atuam com lazer no SESC/MG de Bom
Despacho. A amostra foi sugerida pelo Gerente do SESC e pela disponibilidade dos entrevistados. Tivemos, então, nove sujeitos que nos autorizaram a realização da entrevista e o uso de suas
informações.
Utilizamos letras e números para identificar os indivíduos e as empresas das quais se originaram. Empresa (A) com os sujeitos A1, A2 e A3; empresa (B) com os sujeitos B1, B2 e B3 e a
empresa (C) com os sujeitos C1, C2 e C3, sendo que duas destas empresas são terceirizadas pelo
SESC/MG e a outra é composta por funcionários do próprio SESC/MG.
Desta forma, temos três indivíduos que atuam em uma empresa prestadora de serviços nas
áreas de lazer, recreação e atendimento a hospedes, outros três envolvidos em serviços de animação teatral e gincanas e os três últimos são funcionários concursados pelo SESC/MG que gerenciam, criam e delegam os projetos de lazer, esporte, saúde e educação às empresas terceirizadas.
O roteiro de entrevista foi composto por nove questões que tratavam das ações, significados, posturas e atuações dos profissionais através de seus olhares e de suas interpretações da
realidade. Foi utilizada a entrevista semi-estruturada, na qual o informante tem a possibilidade de
discorrer sobre suas experiências, a partir do foco principal proposto pelo pesquisador; ao mesmo
tempo, que permite respostas livres e espontâneas do informante e valoriza a atuação do entrevistador.
REFERENCIAL TEÓRICO:
PANORAMA SOBRE O LAZER E SUAS RELAÇÕES COM O MERCADO
Neste processo de construção das reflexões acerca do Lazer, torna-se essencial identificar
como tal objeto se desenvolve e se estabelece na sociedade brasileira. Melo; Alves Junior (2003,
p.22) evidenciam que o Lazer no Brasil “se configura como um relativamente recente, mas fértil e
promissor campo de negócios”. Tal expansão está intimamente ligada a abertura de novos postos
de serviços em setores diversos do mercado. De acordo com Stoppa (2000, p. 176) “nos últimos
anos foram abertas oportunidades em prefeituras, clubes, hotéis, acampamentos, condomínios,
campings, entidades patronais (SESC, SESI, SENAT), empresas, entre outros locais”.
O que ocorre, porém, é que tal crescimento não esteve apoiado a uma adequação social
onde os bens e serviços de lazer estejam contemplados para toda a população, tornando-o moeda
valiosa do capital e de grupos econômicos que buscam enriquecimentos imediatos. Nesta realidade o Lazer se transforma em empreendimentos cada vez mais lucrativos, ligados a corrente que o
apresenta “como mercadoria – simples empreendimento que objetiva desviar a atenção das pessoas, consideradas apenas consumidoras de mais um serviço – ajustando e ajudando os indivíduos a
conviverem com as injustiças da sociedade” (STOPPA; ISAYAMA, 2001, p. 76).
Não se pretende construir aqui uma perspectiva negativa sobre o mercado de trabalho
em Lazer, pelo contrário, a função esperada é impulsionar a reflexão para novos olhares sobre tal
situação. Em tempos de globalização, de avanços tecnológicos importantes e de um mundo cada
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vez mais competitivo é necessário que o ser humano saiba intervir no mercado de trabalho conhecendo os vários setores que se mostram receptivos as novas ações e inovações. De acordo com
Stoppa; Isayama (2001, p. 76) existe “uma ampla gama de possibilidades de atuação profissional
no mercado de lazer – sejam ligadas ao setor público, privado ou ao terceiro setor”.
Estes setores dispõem de ferramentas particulares para desenvolver o Lazer e atribuir políticas próprias, planejamentos de ações, intencionalidade no mercado. É necessário compreender
que em cada setor econômico existem possibilidades diferentes de atuação e fomento das ações
de Lazer. Cabendo uma análise específica para cada um deles, desmontando significados, problematizando situações e procurando dar possibilidade de reflexão na busca por entendimentos mais
aprofundados.
Na interfase entre o setor público-privado O SESC vem se apresentando como uma das
possibilidades interessantes de atuação no campo, estando presente em todas as capitais dos estados brasileiros e em municípios de médio e pequeno porte. Dentro de suas instalações encontram-se profissionais envolvidos em ações de animação, planejamento e execução de eventos, além dos
trabalhos em hospedagem e turismo.
Tem-se até aqui uma delineação do que o mercado de trabalho em lazer pode oferecer
para os profissionais inseridos neste campo cabendo reflexões aos processos de formação e atuação
profissional e aos desafios encontrados na prática.
A FORMAÇÃO E ATUAÇÃO PROFISSIONAL NO CAMPO DO LAZER
Entender os processos de formação e atuação profissional no campo do Lazer pode contribuir na intervenção, analise e qualificação da área. Segundo Isayama (2004) a formação profissional em Lazer aponta um desafio importante no contexto da atual sociedade que é agregar esforços
para uma formação capaz de construir coletivamente ações teórico-práticas significativas que não
mascarem ou atenuem os problemas sociais que surgem nas relações dos indivíduos.
Para o autor existem duas perspectivas de formação profissional. “A primeira preocupa-se
em formar um profissional mais técnico e tem como orientação primordial o domínio de conteúdos específicos e metodológicos” (2004, p. 94). Stoppa; Isayama (2001) esclarecem que esta ênfase
na formação prática é uma proposta vista em alguns cursos de aperfeiçoamento, atualização ou reciclagem que estipulam técnicas recreativas, disponibilizando uma gama de atividades, geralmente
lançadas como receitas de culinária, sem qualquer ligação com a vida concreta dos indivíduos que
dela participam. Desta forma, “o Lazer acaba sendo restrito a um simples tarefismo, com o “fazer
por fazer”, tão presente em muitas vivências na atualidade” (STOPPA; ISAYAMA, 2001, p. 88).
Apesar de serem muitas as iniciativas que reforçam o aspecto mercantil no processo formativo dos indivíduos que atuam com Lazer, existem outras, envolvidas com a melhoria na transmissão e assimilação do conhecimento relacionado ao Lazer. Estas trazem alternativas sólidas para
uma qualificação da atuação profissional no mercado de trabalho. Neste caso, Isayama (2004) fala
sobre uma segunda perspectiva de formação profissional na área do Lazer que está voltada para a
apreensão do conhecimento, da cultura e da crítica adquiridas pela construção de saberes e capacidades fundamentadas na verificação de compromissos sociais e da percepção do papel social do
profissional na educação para e pelo Lazer38.
A formação deve possibilitar o domínio de conteúdos que devem ser socializados a partir do entendimento de seus significados em diferentes contextos e articulações interdisciplinares. Deve,
ainda, promover o conhecimento de processos de investigação que auxilie no aperfeiçoamento
da ação do animador cultural e no gerenciamento do próprio desenvolvimento de ações educativas, lúdicas, críticas e criativas (ISAYAMA, 2004, p. 94).
38 Para maiores esclarecimentos sobre “Educação para e pelo lazer” consultar Marcellino (2004).
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Caminhamos, desta maneira para a análise do perfil dos profissionais que atuam com
lazer no SESC/MG de Bom Despacho investigando tais colocações aqui apresentadas e buscando
entender os desafios da atuação em conformidade com a amostra disponível para o estudo.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A formação e qualificação dos sujeitos da pesquisa: No ato inicial de todas as entrevistas solicitamos que os sujeitos nos falassem sobre sua formação profissional e sobre as características profissionais necessárias para atuarem com Lazer no SESC/MG de Bom Despacho. Diagnosticamos uma pluralidade de formações. Dos nove indivíduos, quatro cursavam faculdades em
diferentes áreas (Direito, Fisioterapia, Educação Física e Engenharia Civil), dois possuíam ensino
superior completo (um em Psicologia e o outro em Pedagogia com pós-graduação em supervisão
e orientação); um indivíduo possuía ensino médio completo e os dois últimos possuíam ensino
médio incompleto.
Percebemos nesta primeira análise uma disparidade de opiniões, posturas e formas de
encarar a formação em lazer. É evidente que cada indivíduo busca se qualificar dentro de suas
possibilidades financeiras, intelectuais e motivacionais, porém, um dos fatores determinantes para
esta constatação é a ausência de articulação da administração do SESC/MG em unificar as ações
e dar ferramentas para capacitação continuada de seus funcionários (efetivos ou terceirizados).
Os sujeitos da pesquisa e suas experiências com lazer e recreação: a maioria dos entrevistados possui baixa articulação de ideias ao falar sobre lazer. As argumentações colaboram com
a crítica feita por Melo; Alves Junior (2003) na qual é constatado que a compreensão sobre a atuação profissional na área de lazer e recreação é muitas vezes restrita e equivocada e que qualquer
pessoa pode assumir as funções de monitor ou recreador.
Constatamos que grande parte da amostra entrou para área do lazer sem um conhecimento prévio ou uma formação específica. Foram motivados pela aproximação com o campo de
trabalho e pela oferta imediata de emprego desprovida de exigências técnicas, pedagógicas ou
cientificas para tal atuação. Notou-se também que muitos deles eram freqüentadores da unidade
do SESC/MG de Bom Despacho, grande parte com idades que variavam entre 16 a 18 anos sem
relatos anteriores de experiências com o Lazer.
Ao atentar para tal realidade evidenciamos a necessidade da qualificação profissional através da aquisição de uma sólida cultura geral articulando ações criativas, lúdicas e
conscientes. Esta demanda ficará presente nas diferentes formas de manifestação do lazer. Em
cada vivência oferecida haverá produção de conhecimento e processos de relação com as diferentes esferas da vida social. Evidentemente que para tal perspectiva é imprescindível colaboração e
motivação próprias do animador que mediará ações de cunho crítico.
Análise sobre os requisitos e objetivos das ações de lazer na visão dos profissionais
entrevistados: Buscamos interpretar o que os entrevistados consideravam primordial como requisito para o trabalho em lazer, pretendendo saber o que estes indivíduos acreditavam necessitar ou
possuir para a plenitude de suas ações nos trabalhos desenvolvidos.
Para os sujeitos A1, A2, A3 e C1 as qualidades ligada à extroversão, carisma e domínio
de atividades com diferentes públicos ficavam em destaque no tocante às suas visões. Os sujeitos
apontaram características estereotipadas e requisitos muitas vezes ligados ao fazer técnico-prático.
Marcellino (1998) destaca que muitos profissionais assumem uma personalidade personalizada
querendo para isto “entreter” seu público se transformando na própria atividade. Sob outra ótica, alguns sujeitos mostraram que trabalhar com lazer no SESC/MG de Bom Despacho é estar
disponível e responsável a todo o momento. Relatam que suas vidas giram em torno desta dis-
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ponibilidade é que o trabalho passa a ter caráter decisório para toda e qualquer intenção de sua
vida. Relacionamos este fato ao alerta que Stoppa; Isayama (2001) já fizeram sobre o lazer dos
profissionais do lazer e o que isto acarreta para suas vidas profissionais quando deixam o trabalho
invadir sua privacidade.
Outros aspectos destacados como requisitos foram: segurança, liderança, noções do que
desenvolver, atenção, receptividade, paciência e compreensão. Pontos de vista diferentes sobre um
mesmo campo de atuação articulados com a realidade vivenciada de cada individuo. De acordo
com Silvestre Neto (1980, p.14) os requisitos para um Animador Cultural são: “formação cultural
ampla e profunda; ligação afetiva com a prática cultural; adesão ao que faz; ação sociocultural voluntária; caráter optativo; intenção em exercer influência; desconfiança da rotina e do consumismo; inquietação ante a situação cultural; crença na ação”. Para todos estes pontos, levantados por
Silvestre Neto (1980), é importante relativizar o baixo envolvimento dos profissionais do SESC/
MG em ações que os motivem adquirir tais requisitos. Exemplo disso é a inexistência de possibilidades para formação continuada apontada nas entrevistas.
Sobre os públicos que se envolvem com as práticas de lazer no SESC/MG de Bom Despacho, perguntamos qual era o público alvo de atendimentos naquela instituição. Grande parte
das respostas mostrou que não existe um público específico. Os atendimentos são direcionados a
várias faixas etárias e existe uma preocupação em disponibilizar ações generalistas (maior número
de pessoas possível por atividade).
Conceituação e avaliação das ações em lazer e recreação: Um detalhe importante ao
analisar perfis profissionais é entender como os profissionais entrevistados qualificam sua atuação.
Como eles avaliam o trabalho que propõe e desenvolvem. Cremos que avaliar deve ser um processo de continuo diagnóstico das situações, desafios e inquietações dos profissionais do lazer, a fim
de contribuírem com sua formação e com a quebra de paradigmas em suas atuações.
Neste entendimento percebemos através dos discursos dos entrevistados que os processos
relativos à avaliação das ações de lazer não ocorrem de forma sistematizada, ou seja, não apresentaram procedimentos ou formas quantitativas/qualitativas para reflexões posteriores e melhora das
ações. Visualizamos apenas autorreflexões, que, de forma pontual são significativas, mas em uma
perspectiva institucional não contemplam avanços nas discussões que podem favorecer e amadurecer atendimentos, ações e atuações profissionais.
Conceituar lazer e recreação não é tarefa fácil, demanda uma vasta interpretação de símbolos e significados dessa expressão cultural. Segundo Gomes (2008) lazer e recreação devem ser
entendidos em seus vários sentidos nos termos que lhes são empregados. A construção intelectual
deve oportunizar diálogo entre as muitas manifestações que dele surgem e interagem na sociedade
de hoje.
Para todos os entrevistados o lazer somente ocorre em locais próprios a ele e é “uma” parte
da vida dos seres humanos deslocada das outras, estanque. Percebemos que os caracteres tempo
e espaço se fazem presentes em tais posicionamentos e restringem o conceito destes indivíduos
a uma visão parcial do lazer e de suas relações com o cotidiano dos seres humanos. Além disso,
constatamos que o lazer, é ainda, compreendido como instrumento de felicidade e prazer apenas.
As ações giram em torno de agradar, animar, recrear, envolver, brincar, desenvolver o corpo. Estes
pontos mostram que os indivíduos analisados trabalham sob a ótica da reprodução de atividades.
Logicamente os aspectos de bem-estar, prazer, procura de felicidade estão presentes e atrelados ao lazer. Nossa contribuição é evidenciar que o lazer não se restringe apenas a isto. Indo
além, compreendemos esta esfera da vida como um direito social, necessário a todos os seres
humanos e que emancipa, trás conhecimento provocando reflexão e qualidade de vida. O lazer
é uma das importantes esferas da cultura assim como o trabalho, a educação, a família, a escola,
entre outros; não existindo maiores ou menores importâncias a qualquer um deles.
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Desta forma concordamos com Gomes (2011) sobre a ideia de que a formação profissional
é um eixo privilegiado de ação que integra relações dialéticas em quatro elementos importantes:
Tempo, espaço-lugar, manifestações culturais e atitudes lúdicas. De acordo com a autora o lazer é
uma dimensão da cultura constituída por meio da vivência lúdica de manifestações culturais em
um tempo/espaço social.
Evidentemente que discussões sobre conceitos não se esgotam nunca. A lógica fruída é
alicerçar debates críticos que (re) signifiquem as premissas no contexto cultural em que vivemos.
O lazer é campo de tensão e produção cultural, ao ser mediado por relações de despertar de consciência pode garantir acesso ao pensar reflexivo a partir das trocas conscientes e dialógicas de
conhecimento e vivência dos sujeitos envolvidos em suas práticas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constatamos que os indivíduos que atuam com lazer no SESC/MG de Bom Despacho se
posicionam de diferentes maneiras dentro do contexto da atuação profissional. É evidente que
suas relações são diferenciadas pelos perfis das empresas que os contrataram. Assim, temos num
mesmo espaço de atuação três perfis bem marcados que se projetam dentro das perspectivas que
lhes são propostas e da apropriação de poderes que cabem assumir. É interessante observar que
o processo de terceirização de serviços influenciou tal desenho de perfil profissional. Esta lógica
de mercado provocou uma inadequação de perfil na instituição pesquisada, fazendo com que
tendências e incoerências gerassem certos desencontros conceituais, atitudinais e procedimentais
durante as entrevistas.
Não nos cabe, nesta pesquisa, ir contra uma medida institucional do SESC/MG, mas, é
coerente nossa orientação em evidenciar que é necessária a adoção de critérios na seleção das
empresas durante o processo licitatório adequando o perfil da empresa a ser contratada ao perfil
do SESC/MG. Assim numa mesma visão de atendimento e execução de serviços poderemos ter
um mesmo discurso e uma mesma apresentação institucional.
É necessário ainda que no SESC/MG de Bom Despacho existam propostas de formação
e aprimoramento das formas de atendimento dentro do que a Instituição cobra de seus funcionários. Um trabalho que tome em consideração a expressão cultural dos indivíduos que ali atuam
alinhando o discurso. Assim, as ações conseguirão alcançar melhores atendimentos e proporcionarão maior qualidade na atuação dos profissionais ali presentes.
Deixamos aqui a sugestão para que outros estudos sejam efetuados. Cumprimos determinadas etapas na elaboração destes perfis, mas sabemos que inúmeras outras estão abertas para
análise. Temos a certeza que ações conscientes e transformadoras trarão ganhos expressivos para
as reflexões sobre mercado de trabalho em lazer e conseqüentemente sobre as atuações profissionais neste setor.
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DO CONHECIMENTO CONSTRUÍDO NO CURSO DE LAZER À
AUTOFORMAÇÃO HUMANA
Sonia Cristina Ferreira Maia39
RESUMO: O Presente estudo teve como objetivo analisar as vivências do lazer mais significativas, reveladas pelo grupo investigado, durante curso; e descrever as vivências ludopoiéticas na
formação acadêmica que foram significativas para sua autoformação humana. O estudo articulou
a abordagem etnográfica para a construção das pontes ludopoiéticas entre a formação acadêmica
proposta pelo curso de Lazer e Qualidade de Vida do IFRN e a autoformação humana vivenciada
como lazer pelos participantes do estudo. A pesquisa realizada conseguiu evidenciar dados importantes da formação ludopoiética desses profissionais do lazer para a sua autoformação humana.
Propriedades do sistema ludopoiético vivenciadas na formação são buscadas com autonomia no
lazer. Assim, o aprendizado vivenciado durante o curso de graduação em Lazer e Qualidade de
Vida é valorizado pela emoção da alegria e do amor à vida, tornando-se algo desejado pelos sujeitos que escolheram o lazer como profissão.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Autoformação. Ludopoiese.
1. INTRODUÇÃO
A autoformação humana no lazer é pautada numa perspectiva de construção de si, devendo privilegiar as condições do fluir nas vivências de lazer de forma reflexiva, no sentido de uma
aprendizagem para a vida. Ao pensar nas vivências humanas, criativas e criadoras no lazer, Dumazedier (1975) contribui com uma análise importante sobre as atividades de lazer, como passeio,
jogos esportivos, pesca, novas formas de cultura do corpo que não estão dialogando com a escola,
por esta ainda estar distante do debate da perspectiva vivencial dos conteúdos culturais trabalhados no lazer, visualizados numa estrutura de rede de vivências que deveria estar no contexto da
formação humana de modo institucionalizado.
Essa formação visualiza o aprender a ser em nossa sociedade, que implica em elaborar
pensamentos autônomos, emitir juízos de valor, tomar decisões por si mesmo em diferentes circunstâncias, é preciso dar mais importância a ambiente de autoformação humana, a partir de
valores construídos nas vivências corporalizadas do lazer. Essas vivências devem ser desenvolvidas
em espaços favoráveis para que a capacidade reflexiva contribua com postura humanescente do
indivíduo diante da vida.
Para tanto, o grupo investigado foi constituído por cinco alunos egressos do curso de Tecnologia em Lazer e Qualidade de Vida do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Rio Grande do Norte (IFRN). Na ocasião, as disciplinas “Lazer, Corpo e Sociedade”, “Trabalho
de Conclusão de Curso (TCC I e II)”, “Elemento Lúdico da Cultura” e “Princípios Básicos da
Qualidade de Vida” subsidiaram a abordagem etnográfica para a pesquisa.
O grupo pesquisado deveria atender a alguns critérios sendo assim especificados: ter colado grau, ter estágio de prática profissional concluído e estar atuando ou ter atuado recentemente
como profissional do lazer, tendo em vista que o mercado de trabalho desse profissional é muito
39 Professora Doutora – IFRN-campus João Câmara – [email protected]
82
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sazonal. Atendendo a tais critérios, cinco alunos tornaram-se participantes do estudo. Alunos
estes que na convivência acadêmica foram atuantes efetivos em seus projetos, cumprindo às exigências acadêmicas solicitadas pelos professores do curso com brilhantismo, tanto no que diz
respeito às propostas institucionais de ensino, pesquisa e extensão, quanto a intervenções sociais
construídas pela própria turma.
A expressividade lúdica sempre foi marcante na convivência desses alunos, tanto nos corredores da Instituição como em sala de aula, evidenciando uma produção constante de si mesmo
no brincar e alegrar-se com o outro, com a vida.
Os projetos desenvolvidos por eles, em grupos, desencadearam uma relação intima de
convivência, tornando-os cada vez mais próximos e cúmplices em seus estudos e vivências de
lazer. Nesse sentido, para desenvolver o estudo foram traçados os seguintes objetivos: Analisar as
vivências do lazer mais significativas, reveladas pelo grupo investigado, durante o curso; Descrever
as vivências ludopoiéticas na formação acadêmica que foram significativas para sua autoformação
humana.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O estudo se apoia no método etnográfico com uma atenção especial à observação participante, exigindo uma análise complexa das informações e situações observadas. Como destaca
Pole e Morrison (2003), as pesquisas etnográficas têm sido ferramentas importantes numa abordagem de investigação social, ao coletar dados que tornem transparente a realidade subjetiva da experiência vivida e pela facilidade que o pesquisador-participante tem ao olhar de perto o processo
que está vivendo. No nosso caso especial, por meio do processo formativo envolvendo o ensino, a
pesquisa e a extensão no curso de Tecnologia em Lazer e Qualidade de Vida.
Tal prática social passa pelo projeto acadêmico e pedagógico de cada profissional, uma vez
que há uma interrelação íntima e dinâmica na troca de experiências entre os saberes da formação
e aqueles implicados na autoformação que ocorreu no âmbito do lazer.
A intervenção nesse processo de investigação é estruturada por meio de diálogos construídos pelos participantes na busca de uma nova realidade vivida como lazer e, na medida do possível, da reconstrução de categorias teórico-metodológicas que pavimentam os estudos e a prática
profissional de intervenção no mundo do trabalho.
Os memoriais das vivências de lazer constaram de relatos referentes às vivências de lazer
que marcaram ou contribuíram para sua autoformação enquanto ser, sujeito de sua própria história e que através delas, aconteceu o fluxo que lhes permitiu um novo olhar sobre suas vidas cotidianas. Alguns pontos foram relembrados dessas vivências, como: As vivências de lazer durante o
curso; A relação com o que estava estudando e o conjunto das disciplinas; Pontos marcantes das
aulas de campo e que contribuíram para sua autoformação humana.
2.1. A ABORDAGEM ETNOGRÁFICA E O PROCESSO FORMATIVO
Entender o lazer em sua especificidade e sua estreita relação com as demais áreas de atuação do homem, considerando o processo histórico e social, bem como, compreender a complexidade e o dinamismo da estrutura social é a matriz curricular do curso de Tecnologia em Lazer
e Qualidade de Vida que aborda disciplinas que permitem estabelecer o diálogo entre sociedade,
cultura e lazer de forma integrada e conectada entre si, para que possa acontecer uma interconexão entre o ensino, pesquisa e extensão proporcionando ambientes poiéticos para desabrochar as
vivências ludopoiéticas.
A matriz curricular que é flexível em abordar seus conteúdos se estrutura da seguinte
forma: Teoria do lazer; Introdução ao estudo da filosofia; Princípios administrativos; Cultura e so-
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ciedade; Mídia e conhecimento; Produção de texto; Filosofia do lazer; Interesses culturais do lazer;
Gestão de negócios; Elemento lúdico da cultura; Evolução histórica do trabalho; Lazer, corpo e
sociedade; Lazer e meio ambiente; Cultura digital; Lazer e práticas corporais; Lazer e festa; Mídia
e indústria cultural; Literatura e estudos culturais; Desenvolvimento interpessoal; Primeiros socorros; Lazer e mercado de trabalho; Lazer e urbanismo; Pedagogia do jogo; Jogos pré-desportivos;
Estudos da arte; Metodologia da pesquisa social; Recreação aquática; Ação comunitária; Lazer
e inclusão social; Espaços artísticos culturais; Lazer e esporte de aventura; Gestão de lazer em
espaços alternativos; Projetos I, II, III, IV e V; TCC I e II; Organização de eventos; Legislação e
políticas culturais; e Prática profissional.
Para atender ao critério de dialogicidade dessa matriz, trabalhamos com o projeto integrador, como uma forma interdisciplinar de abordar o problema, realizando seminários em sala de
aula, aulas de campo interdisciplinares e fóruns temáticos para apresentar e discutir o vivido no
processo de ensino-aprendizagem.
Os seminários realizados em sala de aula permitem aos alunos formas criativas de abordarem diferentes temáticas, utilizando recursos de multimídias disponíveis na Instituição como
computadores e seus utensílios, DVD, filmadora, máquina fotográfica digital, além da própria
manifestação corporal como apresentações teatrais.
Nas aulas de campo, todos vivem de forma intensa as experiências de aprendizagem, por
permitir o contato com a natureza, outras culturas e o conhecimento das riquezas e potencialidades do Estado do Rio Grande do Norte e da Região. É um momento também de conhecimento
interior para se perceber enquanto profissional, as possibilidades de atuação no mundo do trabalho do lazer, como fenômeno social em expansão.
A aula de campo tem sempre uma temática a ser abordada e as disciplinas que dialogam
em determinado momento são indicadas para realizar a aula, que deve se constituir de um projeto
com roteiro, objetivos, conteúdos, justificativa e metodologia a ser adotada. Ao final de cada aula
de campo os alunos devem cumprir tarefas preestabelecidas pelos professores envolvidos.
Os roteiros são definidos geralmente com o foco para descoberta das potencialidades de
lazer em diversos ambientes do Estado, no conhecimento das políticas públicas de lazer, na vivência dos esportes de aventura e na compreensão da relação do homem com a natureza com base
numa discussão sobre a corporeidade.
Os fóruns temáticos realizados se pautam em apresentação pública de pesquisas com intervenção em diversos segmentos do lazer durante o semestre cursado. O Fórum é um momento
de troca de conhecimentos entre todos os participantes. Atualmente, o Fórum se tornou relevante
em seu contexto institucional, fazendo pensar que ele pode ser realizado uma vez por ano.
A pesquisa no Curso de Lazer é um fato marcante para poder incentivar o projeto integrador. A partir do segundo semestre do curso, os alunos já podem participar dos projetos de
pesquisas desenvolvidos pelos professores. Projetos estes, financiados pelo IFRN, CNPq (Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Ministério dos Esportes e outras entidades de fomento à pesquisa.
A prática profissional que se dá por meio de um projeto de extensão, é obrigatória para
todos que pretendem concluir o curso de Lazer e Qualidade de Vida, com uma carga horária de
400 horas. Essa prática profissional poderá ser também um projeto de pesquisa se for utilizada a
própria monografia de conclusão de curso. De acordo com a atual estrutura organizacional do
curso, tanto a prática profissional como a monografia tem um professor orientador.
Diante de tal complexidade, articular a matriz curricular com o ensino, a pesquisa e a
extensão, torna-se um grande desafio para formar profissionais que compreendam o lazer como
essencial para a autoformação humana permanente.
Para isso, como forma de discutir a formação ludopoiética e sua relação com o processo da
autopoiese do lazer de forma concreta e objetiva, foram utilizados instrumentos como anotações
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no diário de campo, artigos, projetos, fotografias, filmagens das aulas de campo e intervenções
sociais.
3. FUNDAMENTANDO A FORMAÇÃO E A AUTOFORMAÇÃO
A formação e a autoformação no lazer devem estar voltadas para o ser humano, para sua
humanescência, fazendo irradiar luminosidade a partir de si mesmo, com o outro, com a natureza,
com a sociedade e com o planeta (Perspectiva que vem sendo trabalhada pela base de Pesquisa
Corporeidade e Educação-BACOR/UFRN). Portanto, deve-se compreender a autoformação humana no lazer a partir da necessidade de tomada de consciência de si no mundo e, assim, poder
irradiar alegria de viver que é capaz de transformar a si mesmo, aos outros e a tudo à sua volta.
Dumazedier (2002), Delors (2006) e Pineau (1977) argumentam que a autoformação é
aprofundada a partir da formação. Portanto, seria preciso transformar a educação numa educação
para a vida que fosse capaz de oferecer múltiplas oportunidades de aprender, e que essa aprendizagem ultrapassasse os muros das instituições educativas e fosse se confraternizar com a cultura.
A preocupação de Dumazedier (1975, p. 64) a respeito da autoformação pelo lazer se dá
pelo seguinte questionamento:
Será que as novas formas de controle social não vão despossuir o indivíduo do poder que a sociedade lhe outorga na escolha do seu lazer? Será que este poder não lhe vai ser retomado, roubado
de novo pela instituição social, talvez como uma escola camuflada?.
Essa indagação de Dumazedier esclarece dois aspectos fundamentais: indivíduos podem
ser passivos e consumidores de uma cultura pedagógica muito forte e tradicional; ou voltar-se pela
impassividade social e a delinqüência que leva a destruição da própria dignidade.
Acrescenta ainda o autor que a função de desenvolvimento do lazer não se contrapõe
totalmente a do divertimento, porque o desenvolvimento consta de uma tendência profunda de
autogestão do próprio tempo, encaminhando-se para um ambiente de criatividade e afetividade.
As atividades autogeradoras podem chegar à autoformação em sua constituição.
Conforme destaca Pineau (2006), Dumazedier foi um dos pioneiros na discussão da autoformação no lazer ao tratar da revolução cultural associada à autoformação. Revolução essa
pensada e vivida na perspectiva de uma sociedade educativa emergente.
Nesse sentido, pensar o lazer numa perspectiva de desenvolvimento humano, valorizando
as escolhas pessoais, exige atentar para o fato da privação da liberdade do ser humano por meio
do controle social, que poderá impedir a autoformação, uma vez que impede também a autogestão
do espaço-tempo e, conseqüentemente, a criatividade e a sensibilidade desfrutadas nas vivências
de lazer, estimulando a passividade do ser humano nas relações sociais.
O fluir da sensibilidade e da afetividade são emoções que podem ser vividas nas experiências de lazer e contribuem com uma autoformação humana pelas via da ludicidade de forma
democrática, ética e participativa de toda comunidade.
Para Ranghetti (2004), o espaço da formação, que também é um encontro, chamado de
campo de jogo, é um espaço de trocas, superação, de movimento, de crescimento. É um campo em
que se dialoga consigo mesmo e com os outros, facilitando descobertas significativas para a vida
humana. Complementa ainda o autor que “no campo do jogo há o espaço de vivência, de pesquisa, de desenvolvimento pessoal e profissional, no qual as dimensões espirituais, físicas, emocionais,
afetivas, intelectuais, cognitivas são desenvolvidas com a mesma intensidade”.
No sentido da autoformação humana no lazer, Cavalcanti (2007, p.4) trata da autoformação humana do animador sócio-cultural, observando que esse animador deve permitir que “sua
presença irradiante no mundo viaje nas emoções e sentimentos, tornando-se memória viva no
arquivo existencial daqueles que compartilham de sua alegria”.
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Para tanto, sugere sete categorias de aprendizagem vivencial em valores humanos específicos para a autoformação do animador sócio-cultural, a partir de uma estrutura da galáxia da autoformação apresentada pelo Groupe de Recherche sur L´Autoformation em France (GRAF), como
também defendida pela Base de Pesquisa Corporeidade e Educação (BACOR) da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN): Simplicidade, Confiança, Alegria, Coragem, Persistência, Serenidade, e Autotranscendência. Nessa forma de pensar, a autoformação humana no lazer,
torna-se necessário compreender o processo de autoprodução e da autogestão do próprio lazer.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Para o Participante 1, as vivências de lazer mais marcantes durante o período em que realizava a sua formação acadêmica em lazer foram as viagens com a turma, especialmente aquela
que envolveu o rapel e a visita a um castelo. O aprendizado mais significativo para a vida foi a
superação do medo, tanto no rapel como na caminhada pelo labirinto do castelo, quando uns
assustavam outros, fazendo jogos de mímica usando a luz e as sombras.
O Participante 2 também ressalta como vivências de lazer mais marcantes durante o curso
foram as viagens, aulas de campo e congressos com a turma. Destaca as atividades intelectuais
como lazer, pois gosta muito de estudar e sente muito prazer quando está envolvido com os estudos. O turismo urbano foi algo muito marcante, estando associado a um evento cientifico. O
aprendizado significativo que deve ser evidenciado foi conhecer novos lugares e novas pessoas.
Os destaques do Participante 3 se distribuem pelos interesses físicos e esportivos; práticos;
sociais; artísticos; intelectuais e turísticos. Durante o curso, as suas vivências mais marcantes
foram: ficar deitada na rede; ir à praia; cozinhar para a família; visitar o zoológico; lazer gastronômico; ficar em casa; exposição de arte; shows, coral; ler na rede; viagens com a turma. O aprendizado da teoria do lazer possibilitou ampliar suas próprias vivências do lazer com a turma e em
outras situações culturais. A descoberta da culinária como possibilidade de lazer possibilitou a sua
inclusão no repertorio pessoal de vivências lúdicas. O envolvimento com as atividades artísticas
foi um aprendizado importante para a sua vida, para a sua autoformação humana que passou a
compartilhar com outras pessoas da família e amigos.
O Participante 4 aponta as aulas de campo com a turma como o momento mais marcante
de lazer durante o período de sua formação no IFRN. A visita a uma localidade serrana no interior
do estado como atividade acadêmica sobre as relações entre lazer e meio ambiente foi considerada
uma experiência culminante entre outras igualmente importantes para a sua autoformação humana. A mudança do olhar para vida e a valorização do conviver harmonioso foram lições significativas para contribuir com a desconstrução de representações limitantes sobre a vivência do lazer.
O mundo do trabalho e o mundo do lazer apresentavam-se fortemente diferenciados para
o Participante 5. Embora o seu trabalho fizesse parte do mundo do lazer de outras pessoas, geralmente turistas que usufruíam do equipamento hoteleiro, tal experiência dicotomizada contribuiu
para que ele pudesse compreender melhor o lazer e valorizá-lo para si mesmo. Assim, destacou
como vivências de lazer importantes na sua vida, durante o curso: ir à praia, descansar e relaxar;
contato com animais; conhecer pessoas diferentes; cinema, museus; leitura; TV; compreender a
natureza. Tais vivências envolvem conteúdos culturais do lazer relativos ao corpo, às manualidades, à sociabilidade, às artes, às atividades intelectuais e à espiritualidade. Para a sua autoformação humana, o reconhecimento das fronteiras entre o lazer e o trabalho parece ter sido o grande
aprendizado para a vida.
Para Galvani (2002), a autoformação requer uma abordagem transdisciplinar para considerar a pluralidade de níveis de realidade do autos e formação de si. A autoformação é também
um processo antropológico que requer uma abordagem transcultural. Então, para a autoformação
fluir enquanto desenvolvimento humano será preciso inverter o eixo da ação educativa e mergu86
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lhar no interior da educação. A tomada de consciência e a tomada de poder sobre sua formação
parecem ser a base da autoformação. Para Galvani (2002), a transdisciplinaridade se dá sob dois
fatores: perturbações dos equilíbrios ecológicos e pela crise antropológica. Esses desequilíbrios são
herdados pelo materialismo, egocentrismo, divisão do conhecimento em disciplinas, redução do
sujeito a um indivíduo racional entre outros aspectos. Por isso, a autoformação é uma abordagem
interior da educação.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Captam-se nessas vivências de lazer os momentos de experiências máximas de fluxo. Nelas, as pessoas corporalizam e descrevem com emoção os melhores momentos de sua vida. Csikszentmihalyi (1999, p. 36) argumenta que “o fluxo costuma ocorrer quando uma pessoa encara
um conjunto claro de metas que exigem respostas apropriadas”. Então, torna-se significativo o
valor da oralidade pelo próprio autor do sentimento vivido.
A valorização dessas experiências de lazer se dá pelo fato de deixar fluir as emoções de
forma espontânea, entendendo que a emoção é o elemento mais subjetivo da consciência, já que
a própria pessoa é quem pode falar do seu verdadeiro sentimento (CSIKSZENTMIHALYI, 1999).
Por outro lado, essa emoção é objetiva porque a sensação é experimentada fisicamente, e isso é
bastante real. Complementa Maturana (1997) que não se pode negar a emoção em favor da razão
porque não se apaga a alegria ou sofrimento que é gerado em nós mesmos e nos outros.
Decifrar as vivências ludopoiéticas que marcaram a vida desses participantes do estudo,
constitui-se um procedimento de pesquisa muito valioso para poder captar a diversidade das emoções reveladas durante as suas respectivas trajetórias de vida.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
A SENSIBILIDADE NAS VIVÊNCIAS DO LAZER: UMA PROPOSTA
METODOLÓGICA
Kadydja Karla Nascimento Chagas40
Resumo: Este estudo teve como objetivo provocar uma reflexão a respeito da necessidade de
aprofundar conhecimentos sobre o lazer, fundamentando-se nos aspectos sócio-psicológicos do
ser humano, na perspectiva de atuação dos alunos do curso de turismo da UFRN em atividades
do lazer. Para tanto procuramos associar a teoria e a prática no universo de vivências, para que os
alunos não só refletissem teoricamente a respeito do processo, mas que tivessem a possibilidade de
sentir e poder dialogar a respeito do vivido. Para que essa realidade se tornasse possível, convidamos os alunos do curso de turismo da UFRN para na disciplina lazer, animação e desenvolvimento humano vivenciassem o lazer através do sentir, permitindo que a imaginação invadisse nossos
pensamentos. Como metodologia possibilitamos vivências do lazer fundamentadas em Mariotti e
Maslow, dois autores da psicologia que focam seu trabalho na evolução e desenvolvimento do ser
humano através da afetividade. Consideramos que os alunos se sensibilizaram a ponto de criarem
atividades que também lhe proporcionassem satisfação e alegria. Sentindo o outro, o ambiente e
recordando vivencias, além do diálogo dos sentimentos em sala de aula e a forma de ser e agir com
o ser humano.
Palavras Chave: Lazer. Sentimento. Vivências.
Quando nos permitimos devanear em pensamentos que nos transportam para um estado
de afetividade, causando-nos bem-estar, começamos a entender e principalmente a sentir o que
seja esse sentimento. Seja de prazer, de alegria, de amor, de carinho ou satisfação. Na maioria das
vezes nos emocionamos, mas não nos permitimos viver o sentimento de tal emoção. A maneira
como o ser humano se sente na participação de uma atividade é bastante influenciada pelas condições que proporcionamos.
Pensar em lazer na perspectiva do desenvolvimento do ser humano, significa ter abertura
para discutir pensamentos inquestionáveis; significa mudar a forma de ver a própria realidade,
considerando uma outra forma de ver o mundo e a própria vida (CSZENTMIHALYI, 1999).
Nesse sentido, viver significa olhar para si mesmo, reeducar-se para compreender novos cenários,
deixar de ser passivo, correr riscos, realizar sonhos, traçar metas, mudar rotas, fugir da passividade,
transformar, agir, aprender a suportar obstáculos e, principalmente, agregar valores.
Para Csikszentmihalyi viver significa experimentar:
Quando mudamos o modo que vivenciamos a qualidade de vida, passamos a aprimorar as qualidades das vivências proporcionando atividades que causam satisfação, ou seja, que fluem oferecendo sensações de descoberta, um sentimento criativo, que transporta o indivíduo para outra
realidade (1999, p.72).
De acordo com Maslow (1968, p. 12), se faz necessário o desenvolvimento de uma psicologia humanista e transpessoal que seja escrita com um sentimento de compaixão e amor. Buscando
respostas para tal preocupação encontramos Maria Cândida Moraes que, apoiada em Maturana e
40 Mestre em Educação Instituição: IFRN. E-mail: [email protected]
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Varela propõe para a educação uma “escola viva”. É viva porque parte de uma nova concepção de
vida fundamentada no amor. Para autora,
Viver é poder celebrar a vida em toda sua beleza. É aprender a dançar com a vida com flexibilidade, alegria, encantamento e leveza. É vivenciar o movimento dialético entre o interior e o
exterior que envolve todos os seres [...]. Viver é, necessariamente, conviver consigo mesmo, com
os outros, com a natureza, e com o sagrado que existe dentro de cada um de nós (MORAES,
2003, p. 50).
A escola da vida significa aprender a se relacionar, compartilhar experiências, crescer
juntos. Moraes (2003, p. 55) coloca que “devemos ter o amor como base, como sabedoria, como
farol que tudo ilumina e vivifica e que nos dá a energia necessária para continuarmos vivendo,
convivendo a cada instante e aprendendo”.
Csikszentmihalyi (1992, p.72), nos chama a atenção para o cuidado com a busca da felicidade diante do seguinte fato:
As pessoas continuam achando que a mudança das condições externas de suas vidas lhe oferecerá uma solução: se conseguirem ganhar mais dinheiro, ter uma forma física melhor ou um
companheiro mais compreensivo realmente chegarão lá. Mesmo reconhecendo que o sucesso
material pode não trazer a felicidade, fazemos um enorme esforço para atingir metas externas,
esperando que elas melhorem nossas vidas.
O autor continua seu diálogo sobre a busca da felicidade, relatando que “o essencial é
como nos sentimos a respeito de nós mesmo e do que nos acontece. Para que a vida seja melhor
precisamos aprimorar a qualidade da vivência” (p.73). Para que este processo se concretize e possamos exercitar uma educação para a vida se faz necessário aceitarmos ao convite de Antônio
Damásio (2000) a sentir a verdadeira essência da vida que é o amor, não só com emoção, mas com
sentimento...muito sentimento....
Sobre os sentimentos apresenta Lacroix (2006, p.38) o Homo Sentiens, no qual a experiência das coisas e dos seres só é interessante quando irrigada pela emoção, não a emoção efêmera
, mas a emoção sentida. Para o autor “ser significa sentir” a sensibilidade se torna o fio condutor
para essa emoção sentida , vivida e experienciada.
O autor revela que, uma coisa é você ser tomado pela emoção, outra coisa é você ter consciência dessa emoção. É sentir e poder dizer o que sente em várias linguagens: seja no olhar, no
sorriso, na respiração e no abraço. Esse sentimento é expresso da forma mais pura possível.
No processo metodológico da disciplina fomos criando possibilidades de colocar em pratica toda essa teoria do sentimento, falando do amor, da emoção e da sensibilidade. Para isso
contamos com o apoio de alguns autores de suma importância como Dumazedier (1980) que nos
apresenta os interesses do lazer (manuais, físicos, sociais, artísticos e intelectuais) e suas principais
funções (descanso, divertimento e desenvolvimento. Em parceria com dois autores da psicologia:
Mariotti (2000) representando a prática e Maslow( 1975) a teoria, na perspectiva do experienciar, onde aprofundamos o nosso conhecimento do sentir. Assim, foi possível eleger as categorias
abaixo como pilares para o desenvolvimento da disciplina, com o objetivo de despertar a emoção
e sensibilidade nos alunos.
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Nesse sentido, apresentamos o significado e a relevância do envolvimento da teoria com
a prática de forma intrínseca para poder criar vivências no lazer que fossem qualitativas. Abordamos as seguintes categorias: Das Sensibilidades no observar - saber olhar para o aluno, o que ele
necessita, seu comportamento; Da Auto-preservação - relacionando-se a questão da insegurança
do aluno ao iniciar uma atividade ou dificuldade de fazer algum movimento, quando temos que
saber esperar para poder agir, esperar o tempo do aluno, respeitando sua individualidade; Dos
Relacionamentos - saber aproximar-se do aluno através do diálogo, para podermos entendê-lo
melhor; Da auto-estima - motivando-o para o que ele tem de melhor, para que ame a si e ao seu
próximo no desabrochar desse sentimento. Da Auto-realização - as atividades que fluem proporcionam sensações maravilhosas. Sentindo-se bem, esse Ser abraçará a vida... Por fim, ressaltamos:
Quem ama estende a mão, e quem estende a mão se prepara para o abraço (MARIOTTI, 2000,
p. 314). Quando o individuo abraça a vida assume a responsabilidade social de ampliar a sua ação
profissional na perspectiva humanescente do Ser, que flui necessariamente pelo desabrochar da
verdadeira essência do lazer.
Depois de estudarmos os autores e ver possibilidades de aplicação de cada um desses
saberes, dividimos a sala em vários grupos, no qual eles poderiam escolher a temática desde que
sua teoria e prática contemplassem os autores: Dumazedier ( com sua sensibilidade nas funções e
categorias do lazer), Maslow (com sua sensibilidade na reflexão do ser) e Mariotti ( com sua sensibilidade no vivenciar). Após todos os grupos definirem o que iriam desenvolver, antes de qualquer
ação, montava-se o ateliê onde todos os alunos passaram por experiências de sensibilização, como
o toque, o abraço, o observar o outro, as possibilidades de se movimentar. Procuramos observar
cada detalhe para que após a vivência pudéssemos dialogar a respeito do vivido. Em seguida todos
iriam decidir que vivência do lazer poderia estar realizando, então esse alunos escolhiam a vivência, o local e, tinham que visitá-lo para fazer as observações e ver a possibilidade de realização da
vivência do lazer ao grupo que estava se propondo e por ultimo, os alunos montavam um projeto
de execução dessa atividade. Apresentavam teoricamente, fundamentando todo o processo da
prática, dialogávamos em sala de aula para que o mesmo fosse aprimorado. Logo em seguida a
atividade era vivenciada com os alunos da própria turma, para depois ser vivenciada com o grupo
alvo.
Como resultado podemos observar a construção e desenvolvimento das oficinas educativas que, particularmente tinham um diferencial: A alegria dos alunos. Que se empenharam e já
não se preocupavam que nota poderiam receber com o trabalho, e sim se a oficina teria uma boa
aceitação, se iria proporcionar descanso, divertimento e desenvolvimento. Foram desenvolvidos
os seguintes temas:
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O tema deste grupo foi a água, no qual iríamos explicar quais os tipos e cores de água
que existiam através da brincadeira, então foram desenvolvidas três oficinas e trabalhado tais conhecimentos no momento de lazer das crianças acompanhadas dos pais. Como interesse do lazer
podemos destacar os interesse manuais, físicos e sociais.
O tema deste grupo foi a terra onde foi desenvolvido o cuidado com a terra, o que ela nos
oferece e como aproveitar cada detalhe proporcionado pela natureza, seus frutos, os animais, as
folhas, aprendendo através da brincadeira. Podemos destacar como interesses do lazer os manuais
e intelectuais.
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Este grupo enfatizou a cultura popular, apresentando a importância de tudo que está inserido em nosso contexto, através de exposição e apresentações culturais. . Podemos destacar como
interesses do lazer os físicos, intelectuais e artísticos.
Após as vivências voltamos a dialogar a respeito de todo processo que se deu da seguinte
forma:
- Conhecimento sobre lazer;
- Dialogo sobre sensibilidade e a importância de seu desenvolvimento interior;
- Vivencias do lazer para toda turma;
- Dialogo sobre o a teoria e a prática;
- Construção das vivências do lazer em grupo com orientação;
- Apresentação teórica e pratica das vivências criadas para toda turma;
- Dialogando sobre a construção de cada grupo;
- Desenvolvendo as atividades com o público alvo e;
- Avaliação da experiência do lazer.
Nesta avaliação contamos com os depoimentos dos alunos para poder perceber o diferencial de uma atividade com seu foco na sensibilidade, de maneira que todos vivenciaram e participaram de todo processo. Como Csikszentmihalyi(1992) revela as experiências de fluxo nos faz
melhorar a qualidade das vivências e atingir momentos de êxtase e de felicidade.
Percebemos que a maioria dos alunos ficaram surpresos tanto com a metodologia da disciplina quanto como eles mesmo se sentiram no desenvolver do processo. Alguns alunos que
não se achavam capaz, ou que tinham um pouco de timidez e, até mesmo os que não pensavam
que tinham habilidades para o desenvolvimento de algumas vivências ou no trato com o outro.
Puderam reavaliar, refletir, se sentir desafiado e se inserir no contexto de forma natural. Outra
avaliação feita pelos 50 alunos é que no inicio eles estavam preocupados em serem aprovados e
com o desenvolver das aulas as notas era o que menos interessava.
Também ficou evidente a união, onde todos se ajudavam, eram solidários e o espírito de
grupo e equipe evoluiu de uma maneira espetacular. No inicio foi difícil, pois cada um que cuidasse da sua parte, depois percebemos que o processo acontecia através do dialogo.
Nesse sentido acredito na possibilidade de se enfatizar qualquer conhecimento de forma sensível e prazerosa o que proporcionará um maior empenho de cada um e principalmente
um enorme prazer no desenvolver do processo criativo das atividades do lazer. Para Dumazedier
(1980) o lazer deve ser entendido como o conhecimento que está enraizado na sensibilidade e na
cultura vivida.
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REFERÊNCIAS
CSIKSZENTMIHALYI, M. A psicologia da felicidade. São Paulo: Saraiva, 1992.
______. A descoberta do fluxo: a psicologia do envolvimento com a vida cotidiana. Rio de
Janeiro: Rocco, 1999.
DUMAZEDIER, J. Lazer e cultura popular. São Paulo: Perspectiva, 1973.
______. Valores e Conteúdos Culturais do Lazer. São Paulo: SESC, 1980.
LACROIX, Michel. O culto da emoção. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2006.
MARIOTTI, As Paixões do Ego: Complexidade, Política e Solidariedade. São Paulo, Editora
Palas Athena, 2000.
MASLOW, Abraham. Motivation and Personality. New York: Harper & Row, 1975.
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AS REPRESENTAÇÕES DE LAZER DOS ALUNOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO
UNIFEMM: EGRESSOS DE 201041
Viviane Pereira Almeida42
Carla Augusta N. L. e Santos43
RESUMO: Este estudo teve o objetivo de compreender o que os discentes do curso de Educação
Física do Centro Universitário de Sete Lagoas (UNIFEMM) pensam sobre lazer. Além disso, procurou entender qual a representação de lazer dos mesmos verificando se essa mudou ao longo do
curso. Os egressos de 2010 constituíram a amostra que partiu de uma análise de discurso para examinar o entendimento de lazer dos voluntários. De maneira geral, os entrevistados se esforçaram
em apresentar um conceito de lazer mais ampliado e distanciando-se do senso comum, mesmo
diante de uma carga horária de trinta e cinco horas/aula. Pude notar, também, que os mesmos
tiveram contato com as literaturas específicas sobre o lazer no decorrer da formação acadêmica.
Porém, ressalto que este estudo não se esgota nesta produção, até porque não acredito em um conceito único de lazer e sim em várias concepções que nos ajudam a pensar e compreender o campo.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Formação Profissional. Representação.
INTRODUÇÃO
Paralelamente gostaria de dizer que o motivo que contribuiu para a escolha do curso em
Educação Física e, sobretudo o tema que apresento neste artigo, foi devido as minhas experiências
na infância, na adolescência e na escola através das praticas corporais e culturais. A busca pelo
tema iniciou-se logo no primeiro ano de curso, com a disciplina jogos, brinquedos e brincadeiras. Mesmo não sendo a disciplina que estudaria o lazer de forma específica, através dos autores
Dumazedier e Marcellino, comecei a compreender que o entendimento de lazer supera o senso
comum e que a temática encontra-se repleta de contradições e ambigüidades.
Sendo assim, senti a necessidade de uma reflexão mais sistematizada do que é lazer e aos
valores que a ele são atribuídos, pois na sociedade existe a competitividade, a preparação para o
mercado de trabalho, os avanços tecnológicos, a falta de tempo para desfrutar a vida como deveria
ser. Nessa perspectiva, há uma valorização da produção e do consumo, na qual o lazer se torna um
produto, uma valiosa mercadoria.
A pesquisa em questão buscou compreender o que os discentes do curso de Educação
Física do UNIFEMM pensam sobre lazer. Além disso, procurei entender qual a representação de
lazer dos mesmos e verificando se essa mudou ao longo do curso.
41 O presente artigo é fruto do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado pela discente Viviane Pereira e orientado pela
professora Carla Augusta. O mesmo foi defendido e apresentado em 2011 no curso de Educação Física do UNIFEMM –
Sete Lagoas.
42 Graduada em Educação Física Licenciatura pela UNIFEMM (Centro Universitário de Sete Lagoas/ UNIFEMM). Email:
[email protected]
43 Mestre em Lazer pela UFMG, docente do Centro Universitário de Sete Lagoas – UNIFEMM e membro do grupo de pesquisa em formação e atuação profissional em lazer – ORICOLÉ. Email: [email protected]
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A metodologia se constituiu em uma discussão conceitual sobre o tema, através de pesquisa bibliográfica, informações em jornais, revistas e internet. Por ser uma pesquisa de natureza
qualitativa, me propus a investigar os vinte e sete egressos do curso de Educação Física do ano de
2010. A investigação foi feita com estes discentes por entender que a pesquisa ficaria mais interessante com quem tivesse percorrido os quatro anos de curso.
Para a coleta de dados, entrei em contato com os alunos através de e-mail. Lembro que dos
vinte e sete egressos, oito se prontificaram a contribuir com a pesquisa. Mediante apresentação
da proposta de investigação, os mesmos assinaram um termo de consentimento onde lhes foram
informados sobre a manutenção dos nomes em sigilo. O roteiro de entrevista, contendo quatro
perguntas, foi elaborado com base nos referenciais estudados. Os voluntários tiveram o prazo de
uma semana para retornarem às questões que foram analisadas e discutidas a luz dos autores pesquisados. Para diferenciar os participantes que responderam as perguntas chamei-os de A1, A2,
A3, A4, A5, A6, A7 e A8.
CONTEXTUALIZANDO O LAZER
Buscar o entendimento de lazer sempre me instigou, pois em conversas informais e no
contato com a literatura, percebi que havia diferenças quanto ao seu significado. Diferenças que
parte da lógica de considerarem o lazer como o inverso das obrigações de diferentes naturezas
como (religiosa, política, social, familiar e profissional), ou a associação de atividades recreativas,
eventos produzidos para as massas, com caráter de promoção ao ar livre como, por exemplo, os
shows, ou ainda, atribuir valores ao lazer, o associando ao descanso para recuperação da força de
trabalho, ao entreter-se, ao distrair-se, enfim, ao divertimento.
Partindo dessas análises começo a pontuar as discussões acerca do lazer na modernidade,
pois considero o lazer um fenômeno moderno fruto da Revolução Industrial, além de se caracterizar como algo complexo e ambíguo.
Diante desse paradigma, ao fazer o levantamento do estado da arte para este estudo, compreendi que não existe um conceito único para o lazer, mas diversas concepções recorrentes nesse
campo. Sendo assim foi necessário aprofundar nos estudos de alguns autores para concretizar a
pesquisa que realizei.
Identifiquei autores como Dumazedier44, Camargo45, Marcelino46 e Gomes47 que se debruçaram na tentativa de definir o conceito de lazer e percebi que tais concepções se diferenciam
em alguns aspectos, como: tempo, espaço e atitude. Diferenças estas muito bem exploradas por
Gomes (2004) que traçou um paralelo entre as concepções existentes no âmbito dos estudos sobre
o lazer.
Contudo, ressalto que a compreensão de lazer que norteou nosso estudo está pautada em
Gomes (2004) que conceitua o lazer na dimensão da cultura, na escolha individual, como uma
opção que traz diversão, prazer e satisfação, realizado no tempo/ espaço/ atitude na qual não se
separa as esferas, abrindo espaço para o crescimento pessoal, social e cultural das pessoas por ele
vivenciado, criando oportunidades para que se questionem normas vigentes da sociedade e que
se produza cultura.
Essa concepção caracteriza o lazer a ser pensado como um campo das práticas humanas
que tem símbolos, sentidos e significados que dialogam com as demais esferas da vida (educação,
política, economia, trabalho e outros) nos mais diferentes contextos e práticas sociais.
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DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. São Paulo: 1973.
CAMARGO, Luiz Octávio L. O que é lazer. São Paulo: Brasiliense, 1986.
MARCELLINO, Nelson Carvalho. Lazer e Educação. 15°.ed. Campinas, SP: Papirus, 2010. p.19-48.
GOMES, Christianne Luce. Lazer: concepções. In: GOMES, Christianne Luce (org.). Dicionário Crítico do Lazer. Belo
Horizonte: Autêntica, 2004.p.119-125.
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FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM LAZER
Considerando que o lazer é um campo abrangente e multifacetado. Compreendo que falar
de formação profissional neste estudo foi necessário para entender como ela vem sendo processada
em nossa sociedade.
No entanto, gostaria de frisar que a formação profissional na área de lazer não é só de responsabilidade da Educação Física, pois lazer é um campo multidisciplinar na qual são integradas
diferentes áreas de conhecimento, como por exemplo: Administração, Artes, Fisioterapia, Pedagogia, Psicologia, Sociologia, Turismo, entre outros. Considero, pois, que educação física e lazer
possuem laços históricos que estabeleceram uma forte relação do profissional de educação física
com a área de atuação do lazer como bem aborda Melo e Alves Júnior (2003, p. 14).
Todavia, Isayama (2002) nos alerta que no Brasil a maioria dos profissionais que atuam no
âmbito do lazer são da Educação Física, por estarem associados com atividades físicas e esportivas,
na qual possibilita a apropriação de um amplo mercado de trabalho na área.
Independentemente da área de formação é necessário destacar que ao realizar- se a prestação de serviços na esfera do lazer, os profissionais desse campo não recaiam na lógica de que o divertimento é a idéia de desviar atenção de algo ou alguma coisa, reforçando assim o entendimento
que o senso comum tem a respeito de quem atua nessa área como coloca Stoppa e Isayama (2001).
Tendo em vista tal discussão, Stoppa e Isayama (2001, p. 94-95) apresentam:
Trabalhar com a animação não significa atuar de forma estereotipada ou como um “apresentador de auditório”, que procura estimular o consumo alienado do divertimento, mas sim intervir
com a idéia da construção coletiva da satisfação, do prazer e da alegria, e isso implica lidar com
limites e possibilidades das mais diversas ordens. A animação sócio cultural, assim, busca se
alicerçar na vontade social e no compromisso político- pedagógico de promover mudanças nos
planos cultural e social. Portanto, uma ação preocupada com essas questões pode contribuir
com o efetivo exercício da cidadania e com a melhoria da qualidade de vida, buscando a transformação social, para tornar a nossa realidade mais justa e humanizada. Representa, portanto,
uma ação educativa preocupada com a emancipação dos sujeitos.
Portanto, atuar na perspectiva de animação sociocultural abre um leque para autonomia
dos sujeitos, e no caso da Educação Física que atua na esfera do lazer, essa deve assumir um papel
de responsabilidades pedagógicas e políticas, minimizando as barreiras que as pessoas podem encontrar para o lazer e ampliar as possibilidades de apropriação do mesmo.
REPRESENTAÇÃO
Fez-se necessário contextualizar o conceito de representação, uma vez que o eixo norteador do trabalho foi o de saber qual a representação que os egressos de Educação Física 2010
possuem sobre o lazer.
Dessa maneira mobilizei alguns autores48 que abordam sobre essa temática e que me auxiliaram na reflexão e análise desse estudo. Pesavento49 (2005, p.39), por exemplo, nos diz que
As representações construídas sobre o mundo não só se colocam no lugar deste mundo, como
fazem com que os homens percebam a realidade e pautem a sua existência. São matrizes geradoras de condutas e práticas sociais, dotadas de força integradora e coesiva, bem como explicativa
48 CHARTIER, R. O mundo como representação. Estudos Avançados, São Paulo, v. 5, n º 11, p. 173-91, 1991; PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e História Cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
49 Mesmo sabendo que a autora utiliza esse conceito para os estudos históricos, considerei prudente a sua utilização para este
estudo por apresentar uma linguagem mais acessível.
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do real. Indivíduos e grupos dão sentido ao mundo por meio das representações que constroem
sobre a realidade.
A ideia de Pesavento (2005) nos orienta que as representações estão ligadas as formas
integradoras da vida social, o que envolve os processos de percepção, identificação, entendimento,
reconhecimento, classificação, legitimação, exclusão e atuação sobre o real, construídas através
dos diferentes grupos que compõem uma sociedade, onde estes tendem a justificar e a legitimar o
próprio mundo social.
Dessa maneira, compreendo que as representações sociais são as construções de saberes
integrados com os sujeitos na forma de costumes, crenças, valores e habitus. Além do mais, entendo que a representação é a apropriação que os sujeitos fazem na forma de ver e ler o mundo.
DISCUSSÕES
O contato com a temática do lazer
Analisando as respostas da questão: “Quando e como foi seu contato com a temática lazer?”
percebi que seis entrevistados (A1, A2, A3, A4, A5, A7) afirmaram que tiveram o contato com a
temática do lazer depois de entrarem no curso de Educação Física/Unifemm na disciplina Jogos,
brinquedos e brincadeiras que é ministrada no primeiro ano do curso.
Já o participante A6 colocou que o contato com a temática do lazer se deu no último ano
do curso de Educação Física, onde ele ampliou seus conhecimentos acerca da área e contribuiu
para que a sua visão sobre o lazer modificasse.
Todavia, ao analisar as respostas destes voluntários, percebi que os mesmos não abordam
como se deu o contato com o campo do lazer para além do mundo acadêmico, porém, salientam
que começaram a pensar o lazer de outra forma.
Nesse sentido, acredito que a representação que estes participantes tinham antes de entrar
no curso superior era somente considerar o lazer na dimensão de jogos, brinquedos e brincadeiras,
atividades físicas ou esportivas, ou até mesmo no viés de descansar para recuperar as energias para
o trabalho. A partir das respostas dos entrevistados, entendo que as representações que os sujeitos
possuem de lazer estão relacionadas à idéia de construção de saberes integrados com os sujeitos
na forma de costumes, crenças, valores, habitus, ou seja, é a apropriação que os sujeitos fazem na
forma de ver e ler o mundo.
O entendimento de lazer
Diante das respostas, sobre a questão: “O que você entende sobre lazer?” notei que o entendimento de lazer para eles tem que partir de uma livre escolha, de caráter desinteressado, ou seja,
seria o momento desprovido das obrigações seja para repousar, divertir, entreter-se e recrear- se.
Partindo desses dizeres percebo que a representação que fazem do lazer são parecidas
com o pensamento de Dumazedier (1973) e Camargo (1986), que colocam o lazer em oposição às
obrigações da vida cotidiana e o período do trabalho, onde o lazer parte da livre escolha. Contudo, colocar o lazer como algo separado das obrigações sociais, familiares e profissionais, ou seja,
separá-lo das esferas da sociedade é um equívoco, pois nunca a escolha é completamente livre.
Já o participante A6, atribui ao lazer o momento em que os indivíduos extravasam suas
energias para poder relaxar ou esgotar-se completamente. No entanto, pontuar o lazer dessa forma, significa compreendê-lo numa dimensão funcionalista, onde o lazer compensa a insatisfação
e alienação do trabalho e de outras esferas da nossa vida. Além do mais, acredito que essa visão
do lazer seja, ainda, a que mais predomina no senso comum.
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Outro fator que chama atenção é o entendimento do tempo para o lazer. Para os participantes A3 e A6, ele se dá nos momentos livres ou vagos, porém, como afirma Marcellino (2006),
considerar o termo livre adicionado a tempo configura um mal entendido, pois tempo nenhum é
livre de coações ou normas de conduta social, talvez o mais correto em se dizer seja tempo disponível.
Nessa perspectiva, pelas representações que fazem do lazer, ficam evidentes que estas se
associam ao seu tempo com o inverso das obrigações e, segundo Gomes (2004), o tempo disponível se traduz em liberação de determinadas obrigações. Essa autora ainda salienta que o chamado
tempo livre não se opõe ao tempo de trabalho. Deve-se ter a clareza de que, na realidade, um é a
extensão do outro.
Relação existente entre Educação Física e Lazer
“Para você, qual a relação existente entre Educação Física e Lazer?” essa foi uma das questões
encaminhada aos entrevistados que ao analisar as respostas, encontrei dizeres de que a Educação
Física está relacionada ao lazer por causa das atividades que são produzidas.
Algumas demonstraram que a relação com a Educação Física é por atuarem com as diversas práticas corporais que envolvam as atividades físicas e esportivas e atividades recreativas sendo
abordadas no espaço escolar ou em diferentes espaços, como por exemplo, Parques temáticos,
Clubes, Hotéis, etc.
De acordo com os estudos de Isayama (2002), no Brasil a maioria dos profissionais que
atuam na área do lazer é da Educação Física, por estarem associados com as atividades físicas e
esportivas, além do mais surge no cenário da Educação Física vários grupos de estudos e pesquisas
relacionadas ao lazer.
Já os discentes A4, A6 E A8 também pontuam a Educação Física ter relação com o lazer
por esta associada ao conjunto de práticas corporais físicas e esportivas. O que chama atenção nas
respostas é o posicionamento que os participantes colocam enquanto profissionais de Educação
Física e possíveis profissionais do lazer. Os entrevistados têm uma visão de que ao trabalhar com o
lazer, este não pode ser somente na perspectiva tecnicista e tradicional como jogos, brinquedos e
brincadeiras que recaia na lógica somente do divertimento para desviar atenção de algo ou alguma
coisa.
Contudo, a atuação profissional como mencionada no referencial teórico tem que ocorrer
numa perspectiva abrangente que busque subsídios que fundamentem sua ação profissional, para o
empreendimento de ações politicamente engajadas e comprometidas com a mudança da realidade
injusta, encontrada na nossa sociedade.
Os conhecimentos acadêmicos e o lazer
Através do questionamento: “Os conhecimentos acadêmicos fizeram com que você compreendesse o lazer de outra forma? Por quê?”, pude verificar se a representação que os discentes tinham
do lazer mudou durante o curso.
Todas as respostas nos revelam que os conhecimentos acadêmicos foram importantes para
compreender o lazer de outra maneira. Em tais respostas pude identificar que a representação que
eles tinham do lazer partiam do senso comum, onde o lazer era considerado como algo somente
de distração, diversão, ou mesmo confundido com recreação.
Ainda que essa visão tenha mudado nos quatro anos de permanência no curso de Educação Física, percebo que elas ainda pontuam o lazer somente no tempo liberado do trabalho, seja
para relaxar ou extravasar as energias a fim de recuperar a insatisfação e alienação do trabalho e
de outras esferas da nossa vida.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos dados analisados podemos refletir que apesar dos entrevistados tentarem ampliar suas concepções de lazer para além do senso comum, ainda encontra-se, por exemplo, a confusão entre recreação e lazer, muitas das vezes, considerados como sinônimos ou colocam o lazer
como campo de oposição das obrigações sejam elas profissionais, familiares, políticas ou sociais.
Além disso, ainda encontra-se o entendimento de lazer associado ao descanso para recuperação
da força de trabalho, ao entretenimento, distração e divertimento.
As representações desses entrevistados são parecidas com as concepções Dumazedier
(1973) e Camargo (1986) onde citam que o lazer é um conjunto de ocupações na qual acontecem
no tempo liberado do trabalho ou das obrigações, além de partir da livre escolha, com caráter
gratuito e de prazer. Percebi que os entrevistados não têm clareza de que o termo livre se difere de
tempo disponível, conforme abordei através dos estudos de Marcellino (2006).
Outro fato abordado pelos entrevistados é a atuação do campo do lazer nas aulas de Educação Física, alguns demonstram que não sabem como o lazer acontece dentro da escola. Embora
outros colocassem que o lazer não pode ser tratado nas aulas de Educação Física como um momento só de brincadeiras e diversão, mas sim pedagogicamente.
De maneira geral, percebi que todos os entrevistados se esforçaram em apresentar um
conceito de lazer mais ampliado na tentativa de romper com o discurso do senso comum, porém,
muitas vezes não conseguiram. Também pude perceber que os mesmos tiveram contato com as
literaturas específicas sobre a temática no decorrer da formação acadêmica. No entanto, considero
que a carga horária de 35 horas destinada aos estudos do lazer no currículo do curso seja o fator
principal para que algumas contradições ou reforço do senso comum ainda perdurem.
Este estudo não se esgota nesta produção, até porque não existe um conceito único para
lazer e sim várias concepções que nos ajudam a pensar o campo de lazer. Sendo assim, a pesquisa
fica a disposição para quem quiser aprofundar nos conhecimentos relacionados na área. Sendo
assim, a ideia era descobrir as representações que os alunos tinham sobre o lazer para talvez possibilitar a sociedade novos entendimentos a cerca do campo, abrindo espaço para novas discussões
no meio acadêmico, construindo e reconstruído uma interlocução de diferentes saberes, na qual a
formação para atuar no âmbito do lazer não pode ser somente tecnicista ou mera transmissão de
conhecimentos.
REFERÊNCIAS
CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. Educação para o Lazer. 4°.ed. São Paulo: Moderna, 2001..
DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. São Paulo: 1973.
GOMES, Christianne Luce. Lazer e descanso. IX Seminário “O Lazer em Debate”, USP, São
Paulo. n. 14, 2008. Disponível em:< http://www.eeffto.ufmg.br/celar/?main=biblioteca>. Acesso
em: 03 outubro. 2010.
GOMES, Christianne Luce. Lazer: concepções. In: GOMES, Christianne Luce (org.). Dicionário
Crítico do Lazer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.p.119-125.
ISAYAMA, Hélder Ferreira. Recreação e Lazer como integrantes de currículos de cursos de graduação em Educação Física. 2002. Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação Física
Departamento de Estudos do Lazer, Campinas, 2002. Disponível em: <http://www.eeffto.ufmg.
br/celar/?main=biblioteca >. Acesso em: 03 outubro. 2010.
MARCELLINO, Nelson Carvalho. Estudos do lazer: uma introdução. 4°.ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2006.
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________. Lazer e Educação. 15°.ed. Campinas, SP: Papirus, 2010. p. 19-48.
MELO, Victor Andrade; ALVES, JÚNIOR, Edmundo Drumond. Introdução ao Lazer. Barueri,
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In: PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e História Cultural. 2°. ed. Belo Horizonte: Autêntica,
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REORDENAÇÃO DO ESPAÇO URBANO E O DIREITO AO LAZER
Stela Márcia Allen50
RESUMO: presente trabalho teve como objetivo identificar a intervenção e consequente reordenação do espaço urbano do emissário submarino do José Menino, promovida pela administração
pública da cidade de Santos/SP, proporcionando e promovendo espaço e atividades para o lazer
de munícipes e turistas, bem como identificar qual seu uso atual. O estudo foi realizado através
de pesquisa bibliográfica utilizando como técnica o levantamento das obras correlatas ao tema, as
análises textual, interpretativa e critica. Os resultados da pesquisa apontaram que a reordenação
do espaço da plataforma do emissário submarino causou uma revitalização e ressignificação do
local para os munícipes e turistas e, consequente direito ao lazer.
PALAVRAS CHAVE: Espaços de Lazer. Equipamentos de Lazer. Politicas Públicas de Lazer.
INTRODUÇÃO
O acelerado processo de urbanização vem ocasionando problemas à qualidade de vida das
pessoas em relação as suas vivências de esporte e lazer.
Os aspectos essenciais para possível vivência do lazer devem estar interligados e são compreendidos pelo tempo disponível na vida das pessoas, a atitude e o espaço onde esse lazer poderá
acontecer (MARCELLINO, 2004).
Em relação ao aspecto espaço, uma pesquisa de informações básicas municipais realizada
pelo IBGE (2006) aponta que a grande maioria das cidades brasileiras conta com um número
insuficiente de espaços e equipamentos específicos de esporte e lazer. Esses poucos, geralmente
estão mal distribuídos pelo espaço urbano das cidades e nem sempre são otimizados, pois a falta de
divulgação dos locais e suas programações nem sempre permitem o acesso pela população.
Infelizmente, nem todos tem a possibilidade de acesso aos equipamentos de lazer, seja por
falta de condições econômicas, por falta de política pública de lazer, por barreiras como gênero e
faixa etária ou por deficiência de uma política de animação sociocultural que viabilize a democratização cultural.
Melo e Peres (2006) afirmam que para garantir a qualidade de acesso aos equipamentos
são importantes três aspectos: se há equipamentos propriamente ditos; se os valores cobrados e os
gastos são acessíveis e, se há intervenção pedagógica sobre tal manifestação cultural ou equipamento de esporte e lazer para que as pessoas sejam estimuladas a frequentá-los.
Nesse sentido, é preciso que se cobre do poder público a implementação de políticas públicas de lazer que sejam capazes de transformar e ressignificar a cidade em um espaço urbano
de qualidade. Políticas essas que privilegiem a construção de espaços e equipamentos de esporte
e lazer, bem como sua manutenção, programação de atividades, divulgação, “dessacralização”,
incentivo à utilização, a conservação e revitalização dos equipamentos já existentes (MARCELLINO, 2006).
50 Mestre em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba. Membro do Grupo de Pesquisa em Lazer – G.P.L/
Unimep/CNPq. E-mail: [email protected]
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OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Desta forma, os objetivos deste estudo foram identificar a intervenção e consequente reordenação do espaço urbano do emissário submarino do José Menino, promovida pela administração pública da cidade de Santos/SP, proporcionando e promovendo espaço e atividades para o
lazer de munícipes e turistas, bem como identificar qual seu uso atual.
O estudo foi realizado através de pesquisa bibliográfica utilizando como técnica o levantamento das obras correlatas ao tema, as análises textual, interpretativa e critica (SEVERINO,
2007).
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A estrutura de referência geral para esta pesquisa foi baseada na consideração do lazer
como a cultura, entendida em sentido amplo, vivenciada no “tempo disponível” das obrigações
profissionais, escolares, familiares e sociais, de caráter desinteressado, combinando os aspectos
tempo e atitude (MARCELLINO, 2002a).
A noção de cultura deve ser entendida em sentido amplo, ou seja, “... num conjunto de
modos de fazer, ser, interagir e representar que, produzidos socialmente, envolvem simbolização e,
por sua vez, definem o modo pelo qual a vida social se desenvolve” (MACEDO, 198, p.35).
De acordo com Marcellino (2002a), o lazer também é compreendido como um
• fenômeno gerado historicamente e do qual emergem valores questionadores da sociedade como um todo, e sobre o qual são exercidas influências da estrutura social
vigente;
• um tempo privilegiado para a vivência de valores que contribuam para mudanças de
ordem moral e cultural;
• portador de um duplo aspecto educativo - veículo e objeto de educação.
De acordo com Dumazedier (1980), a vivência do lazer pode ser classificada de acordo
com os interesses dominantes na atividade. Assim, classifica-os como: conteúdos físico-esportivos,
manuais, artísticos, intelectuais e sociais, acrescentados pelos turísticos por Camargo (1992).
Faz-se importante ressaltar que a distinção destes conteúdos culturais só pode ser estabelecida em termos de predominância, uma vez que eles se encontram interligados, ou seja, numa
vivência de interesse físico-esportiva, também é possível ter uma convivência social paralelamente, porém esta surge como consequência da primeira escolha.
Quanto à dimensão dos gêneros, os principais apontados por Dumazedier (1980) são o
prático, o conhecimento e a fruição ou consumo propiciado pela assistência a um espetáculo
(MARCELLINO, 2002b).
Fatores como a dificuldade de acesso aos espaços, a falta de divulgação e de políticas, o
crescimento da violência urbana, a classe social, o nível de instrução, a faixa etária, o gênero e
a falta de espaços vazios urbanizados limitam a vivência do esporte e do lazer no espaço urbano,
contribuindo para a formação de dois processos: o de “enclausuramento” levando as pessoas cada
vez mais a usufruir seu tempo no ambiente doméstico ou o de mercantilização do lazer. (MARCELLINO, 2007).
É nítida a diferenciação do acesso aos espaços de esporte e lazer pelas classes de maior
poder aquisitivo, daquelas menos favorecidas.
As classes privilegiadas têm a oportunidade de desfrutar o esporte e o lazer em espaços privados ou privatizados, nos condomínios fechados, clubes, academias de esporte e shopping Center,
enquanto que as classes menos privilegiadas se limitam ao uso dos poucos espaços públicos, que
em sua maioria, apresentam equipamentos de péssima qualidade, uma vez que são negligenciados
pelo poder público. (MARCELLINO, 2007)
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Nas últimas décadas, a iniciativa privada vem atuando fortemente na oferta de equipamentos e atividades de lazer, especialmente as físico esportivas, a serem consumidas pelos que dispõem de tempo e dinheiro. Essas atividades, na maior parte das vezes, são ditadas pela demanda
do mercado.
Sob esta perspectiva, o lazer passa então a ser compreendido e vivenciado pela grande
maioria como um produto, mercadoria ou mero entretenimento, que promove distração, aliena e
recupera a força de trabalho, fazendo com que os indivíduos percam seu entendimento enquanto
um direito social.
Sob esta perspectiva, de acordo com Marcellino (2002b), o espaço - as oportunidade que
ele possa oferecer - é mais importante que os equipamentos.
Assim, compreendendo que o lazer é um direito social como os demais, garantido pela
Constituição Federal (BRASIL, 1988), cabe ao poder público a ampliação das oportunidades de
lazer às diferentes classes sociais, reduzindo as desigualdades de acesso e permitindo uma melhor
qualidade de vida, por meio de políticas públicas democráticas e participativas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
De acordo com a pesquisa bibliográfica, o Emissário Submarino do José Menino foi inaugurado em 21 de julho de 1978 para melhorar as condições sanitárias e a balneabilidade das praias
de Santos/SP. (MILENIO, 2011)
Sua função é recolher as águas dos canais de drenagem e conduzir o esgoto de Santos até
o alto-mar. Sua plataforma tem 400 metros de comprimento por 10 metros de largura.
Nas décadas de 1980 a 1990, a plataforma do emissário abrigou eventos como o Inverno
Quente (quermesse junina municipal), apresentações circenses, parques de diversões, e era frequentado por pescadores e surfistas.
No entanto, o local não apresentava infraestrutura adequada ao lazer, faltando pavimentação, iluminação, segurança, equipamentos de lazer, sanitários públicos e falta de manutenção,
sendo usualmente frequentado por usuários de drogas e marginais, tornando-o inadequado enquanto espaço de lazer.
Diante disso, várias sugestões para a utilização do local foram levantadas pelas autoridades
locais e pela população, entre elas, um estacionamento de ônibus de hóspedes de hotéis da orla, a
instalação do Playcenter, do Beto Carreiro World, circos e até o Museu Pelé.
Porém, as tentativas esbarraram em contestações de munícipes e do Ministério Público
para o uso da área, que tem restrições ambientais.
Uma pesquisa de opinião realizada em 2006, executada pela Prefeitura a pedido da Justiça ouviu 870 pessoas, todos moradores de Santos, que passaram pelo local durante a Festa de
Inverno. No local, painéis mostravam o projeto de urbanização da plataforma desenvolvido pela
Prefeitura.
Dos entrevistados, 85,3% afirmaram ser favoráveis à urbanização da área e, 89,1% responderam ser favoráveis à proposta de transformar o espaço em um parque público.
Diante o fato, a solução mais adequada foi o Parque Municipal Roberto Mário Santini,
que foi inaugurado em 26 de janeiro de 2010, hoje usufruído por santistas e turistas em múltiplas
atividades esportivas, culturais e de lazer, em uma área de 43 mil m².
O local tem extensas áreas verdes ajardinadas, pista de cooper, ciclovia, playground, pista
de skate projetada para competições internacionais, equipamentos de ginástica ao ar livre, sanitários, bicicletário, espaço para abrigar competições de surfe com torre de jurados e arquibancada
para cerca de 600 pessoas, junto ao quebra-mar, câmeras de monitoramento instaladas e o Museu
do Surfe.
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Além do espaço, têm sido oferecidas pela administração pública em parceria com empresas da região, atividades gratuitas direcionadas com ampla divulgação pela mídia impressa e televisiva, tais como o projeto música no quebra-mar, que oferece música ao vivo todos os domingos
à tarde, feira do livro, apresentações artísticas de dança e teatro, atividade física e aulas de dança.
Desta forma, os resultados da pesquisa bibliográfica apontaram que a reordenação do espaço da plataforma do emissário submarino do José Menino, causou uma revitalização e ressignificação do local para os munícipes e turistas e, consequente direito ao lazer.
Os usuários podem participar de atividades que atendem aos diferentes interesses do lazer
como os turísticos, físico esportivos, artísticos, manuais, intelectuais e sociais, seja através da prática, do conhecimento e/ou da assistência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com Rolnik (2000), um dos caminhos para superação do lazer mercadoria e
da sua retomada enquanto possibilidade de encontro e convívio no espaço urbano pode ocorrer
através da implementação de uma política de investimento na retomada da qualidade do espaço
da cidade.
Marcellino (2006), neste sentido, aponta para a implantação de políticas setoriais de lazer
conectadas as demais áreas socioculturais, indicando a manutenção e animação de equipamentos
de esporte e lazer como instrumentos nesta ressignificação do espaço urbano.
Desta forma, foi possível observar que no caso especifico da plataforma do emissário submarino, não apenas a oferta de um espaço mais adequado ao lazer permitiu o acesso e o direito a
essa vivência pelos usuários, mas também uma política mais ampla de manutenção do local e dos
equipamentos, com a devida divulgação e incentivo à utilização e da animação que viabilizou a
democratização cultural, procurando minimizar as barreiras de acesso aos interessados.
REFERÊNCIAS
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5 de outubro de 1988. Brasília/ DF, 1988.
CAMARGO, L.O.L. O que é lazer. S.Paulo, Brasiliense, 1992.
DUMAZEDIER, Joffre. Valores e conteúdos culturais do lazer. S.Paulo, SESC, 1980.
IBGE. Pesquisa de Informações Básicas Municipais. Perfil dos municípios brasileiros - Suplemento de Esporte 2003. Rio de Janeiro: IBGE, 2006. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/
municesportes/index.htm >. Acesso em: 12/01/2011.
MACEDO, C.C. Algumas observações sobre a cultura do povo. In: VALLE, E. e QUEIROZ,
J.(Org.) A cultura do povo. 2ª ed., São Paulo, EDUC. 1982.
MARCELLINO, N.C. Lazer como fator e indicador de desenvolvimento regional. In: MULLER,
A. e COSTA, L. (Orgs.) Lazer e desenvolvimento regional. Santa Cruz do Sul, EDUNISC, 2002a.
______. Lazer e humanização. 6ª ed. Campinas Papirus, 2002b.
______. Lazer e educação. 11ª edição. Campinas: Papirus, 2004.
______. Estudos do lazer: uma introdução. 4ª ed. Campinas: Autores Associados, 2006.
______, et al. Espaços e equipamentos de lazer em região metropolitana. Curitiba: Opus, 2007.
MELO, Victor Andrade de e PERES, Fabio de Faria. Espaço, Lazer e Política: Desigualdades na
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distribuição de Equipamentos Culturais na Cidade do Rio de Janeiro. Revista Digital, Buenos
Aires: Ano 10, N° 93, Fevereiro de 2006. Disponível em http://www.efdeportes.com
MILENIO, Novo. Pesquisa aponta que santistas querem urbanização. 19 de Setembro de 2006.
Disponivel em: http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0282h.htm. Acesso em 12/03/2012.
ROLNIK, R. O lazer humaniza o espaço urbano. In: SESC SP (Org.). Lazer numa sociedade
globalizada. São Paulo: SESC/WLRA, 2000, p.179-184.
SEVERINO, Antonio Joaquim. Metodologia do Trabalho Cientifico. São Paulo: Cortez, 23ª ed.,
2007.
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GESTÃO DE ESPORTE E DE LAZER: ANÁLISE DOS ESPAÇOS E EQUIPAMENTOS
DE ESPORTE RECREATIVO E DE LAZER EM ERMELINO MATARAZZO, ZONA
LESTE DE SÃO PAULO51
Edmur Antonio Stoppa52
Jean Flávio da Silva Santos53
RESUMO: O presente trabalho teve como objetivos entender como se processa o planejamento e
a administração dos diferentes espaços e equipamentos esportivos e de lazer de uma região extremamente carente da cidade de São Paulo, a partir da apropriação por parte da comunidade, além
de apontar possíveis alternativas para melhor adequar o desenvolvimento da política de esporte
e lazer na região de Ermelino Matarazzo. A pesquisa foi realizada por meio da combinação da
pesquisa bibliográfica, documental e empírica. O método utilizado foi o estudo comparativo entre
os diferentes espaços e equipamentos de esporte e lazer da Sub-Prefeitura de Ermelino Matarazzo.
O principal instrumento de coleta de dados foi a observação participante, complementadas pelas
entrevistas centradas, com os profissionais e as entrevistas estruturadas, com os freqüentadores
dos espaços e equipamentos de lazer. Como resultado pode ser apontado que os espaços analisados
não dispõem de estruturas adequadas para a comunidade exercer o seu direito ao lazer, além de
grande parte deles não ter nenhum tipo de conservação e limpeza.
PALAVRAS CHAVE: Gestão do Esporte e Lazer. Políticas Públicas. Participação Cultural.
INTRODUÇÃO
Miséria, violência, falta de oportunidades profissionais, preconceitos relacionados aos mais
diversos tipos de situações, falta de cidadania. Se o olhar em relação à periferia das grandes cidades do país for feito pelo seu exterior, descontextualizado de sua realidade, uma das conclusões a
que poderíamos chegar é que os problemas locais seriam insolúveis, quase impossíveis de serem
resolvidos e que as pessoas moradoras desses espaços, sem alternativa, acabariam por levar a vida
remediando sua situação, apenas sobrevivendo frente às questões acima colocadas.
No entanto, um olhar mais atento, sintonizado com cotidiano e por dentro da dinâmica
dessas localidades, vai perceber que, apesar da ocorrência desses problemas e da seriedade com
que tais situações devam ser enfrentadas pelo poder público, a periferia também pode ser marcada
pelo encontro, pela troca de experiências, pela luta em busca de melhores condições de vida, com
base no interesse coletivo. Sem abandonar a alegria de viver!
Entendido nos dias atuais como fruto da sociedade urbana, o lazer é entendido como uma
das áreas de manifestação humana em estreita relação com outras esferas de atuação, como o
trabalho, a educação, etc., podendo exercer valores questionadores na sociedade como um todo,
assim como, sofrendo influências da estrutura social vigente. Pode ser, portanto, um tempo pri51 O presente estudo é resultado da pesquisa realizada por meio do convênio entre a Universidade de São Paulo e o Ministério do Esporte – Rede CEDES e contou com a participação, além dos nomes acima citados, de Ana Cristina Fernandes
Clemente, Anderson Patrick de Almeida, Augusto de Paula Felipe, Débora Hellen Afonso Carvalho, Fernanda Nakayama
Gonçalves, Giuliano Fanhani Pieve, Letícia de Jesus, Talita Carolina Samuel Custódio como colaboradores.
52.Doutor em Educação Física – USP/ ORICOLÉ/GPL/GIEL – REDE CEDES- ME – [email protected]
53 Graduando em Lazer e Turismo – USP/Bols. FUSP-ME - [email protected]
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vilegiado para vivência de valores que contribuam para mudanças de ordem moral e cultural,
devendo ser entendido como objeto de ação do poder público e privado, através do desenvolvimento de políticas específicas na área do lazer contribuindo, com isso, para o desenvolvimento da
cidadania das pessoas.
OBJETIVOS
O presente estudo teve como objetivos: 1) entender como se processa o planejamento e a
administração dos diferentes espaços e equipamento de lazer; 2) entender como se dá a apropriação dos diferentes espaços e equipamentos de lazer por parte da comunidade, procurando caracterizar as diferentes particularidades dessa apropriação para as crianças, adolescentes, adultos e
idosos; 3) verificar como se dá e quais são as características da política de animação desenvolvida
pelos profissionais de esporte e lazer nos espaços e equipamentos, bem como qual é o papel da
comunidade no desenvolvimento das ações; 4) apontar possíveis alternativas para melhor adequar
o desenvolvimento da política de esporte e lazer na região de Ermelino Matarazzo.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa foi realizada por meio da combinação da pesquisa bibliográfica, documental e
empírica (SEVERINO, 2000) com a inserção dos pesquisadores nos espaços e equipamentos de
lazer administrados pela Secretaria de Esportes, Lazer e Recreação (SEME), da Sub-Prefeitura de
Ermelino Matarazzo.
Quanto ao método, enquanto trajetória de raciocínio, trabalhou-se na perspectiva do materialismo histórico-dialético, na concepção de Gramsci (1979;1981), em especial nos conceitos
de hegemonia e contra-hegenomia. Já entendido como modo de observação, que constituem os
meios de abordar o “real” (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991) o método utilizado
foi o estudo comparativo.
Em relação às técnicas utilizou-se para a pesquisa bibliográfica, após o levantamento inicial das obras as análises textual, temática, interpretativa e problematização (SEVERINO, 2000),
para definição das “categorias” utilizadas na pesquisa empírica.
A pesquisa documental (TRIVIÑOS, 1998) foi desenvolvida por meio de levantamento
dos documentos referentes a política de esporte e lazer da Sub-Prefeitura de Ermelino Matarazzo,
com posterior análise e interpretação desses documentos, em relação aos objetivos do projeto.
Para a pesquisa empírica, o instrumento de coleta de dados principal foi a observação participante
(BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991) o que levou à observação direta e convívio
com as pessoas observadas, com a utilização de diário de campo. Foram utilizadas como recurso
complementar as entrevistas centradas (THIOLLENT, 1987) junto aos profissionais e as entrevistas estruturadas (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991) junto aos freqüentadores dos
espaços e equipamentos de lazer para aprofundar a investigação.
A definição de amostra deu-se de forma não-probabilística, intencional para os locais documentos e profissionais (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991) e por saturação para
os freqüentadores ligados aos espaços (MAGNANI, 2003), levando em conta critérios de representatividade e acessibilidade.
Foram pesquisados quarenta e cinco equipamentos, sob administração direta ou indireta
da Secretária de Esporte, Lazer e Recreação (SEME) de São Paulo, na Sub Prefeitura de Ermelino
Matarazzo que tem sob sua administração os distritos de Ermelino Matarazzo e Ponte Rasa, compreendendo praças com equipamento esportivo e de lazer, campos de rodízio, clubes da comunidade (CDC) e as chamadas ruas de lazer.
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FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O lazer é entendido no presente trabalho como a cultura vivenciada no tempo disponível
das obrigações humanas, combinando os aspectos tempo e atitude (MARCELLINO, 2000), bem
como a cultura é entendida em sentido amplo, como “[...] conjunto global de modos de fazer, ser,
interagir e representar que, produzidos socialmente, envolvem simbolização e, por sua vez, definem o modo pelo qual a vida social se desenvolve” (MACEDO, 1984, p. 35).
Assim, o lazer é possuidor de um duplo aspecto educativo – a educação pelo e para o lazer,
em sua relação com a Educação, como forma de desenvolver ações nas áreas que busquem considerar não apenas suas possibilidades de descanso e divertimento, mas também de desenvolvimento pessoal e social, não de uma perspectiva funcionalista (MARCELLINO, 2000) mas como possibilidade de reivindicação social, ou resgate da cidadania, tudo por meio da participação cultural.
Sobre a implantação de uma Política de Lazer, alguns autores como Requixa (1980), Dumazedier (1980), Camargo (1985), Carvalho (1978), Marcellino (2001, 2008), entre outros, têm
contribuições importantes sobre a discussão de tal problemática, que devem ser entendidas e
apropriadas a partir de uma leitura crítica.
Apontando a necessidade de um repensar sobre o entendimento do lazer relacionado à sua
abrangência, sobre o entendimento da totalidade das relações sociais, em que o trabalho ocupa
posição central articulado às dimensões da não-obrigação e sobre a relevância da problemática do
lazer na cidade, apesar da falta de sua ressonância social, Marcellino (2008), no que diz respeito
ao desenvolvimento das políticas de lazer, propõe que a discussão e a implementação desses mecanismos, por parte do público ou de outras instituições ligadas à sociedade civil, passe pelo
[...] entendimento amplo do lazer, em termos de conteúdo, pela consideração do seu duplo aspecto educativo, suas possibilidades enquanto instrumento de mobilização e participação
cultural, as barreiras socioculturais verificadas, e por outro lado, pelos limites da Administração
Municipal e a necessidade de fixação de prioridades a partir da análise de situação (p. 24).
Para tanto, uma estrutura de animação capacitada e atuante é papel central para que o
lazer possa ser vivenciado como instrumento de mudança e gerador de novos valores em nossa
sociedade.
Assim, a animação sociocultural (CARVALHO, 1978) deve ser entendida numa perspectiva de alargamento da consciência dos indivíduos, procurando a partir da competência técnica e
do compromisso político de mudança, a capacitação das comunidades para a sua autonomia em
relação ao lazer.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
No que diz respeito à forma como se processa o planejamento e a administração dos diferentes espaços e equipamento de lazer de Ermelino Matarazzo pode-se apontar a presença de três
tipos diferentes de gestão dos espaços. A primeira, mais comumente encontrada em alguns CDCs,
campos de rodízio e ruas de lazer, é a realizada pelas entidades e representantes das comunidades locais, de forma autônoma, sem a intervenção ou colaboração mais efetiva da administração
municipal. A segunda é a realizada por meio da parceria das Organizações Sociais (OSs) com a
administração municipal, caso de quatro CDCs, onde a administração foi repassada a essas entidades, a partir de novo modelo de gestão da SEME, que por contrato deve acompanhar e fiscalizar
as ações realizadas nos equipamentos. Já a terceira forma é caracterizada pela gestão da SEME, ou
deveria ter essa característica, uma vez que a administração dos espaços é esporádica, ausente em
sua quase totalidade, afastada das comunidades locais, como o caso das praças com equipamentos
de esporte e lazer. Em todas estas formas de gestão aspectos positivos e, principalmente, negativos
podem ser visualizados.
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Em relação à primeira forma de gestão encontrada pode-se apontar que a distância da
SEME nas ações realizadas pelas entidades locais ou pelos responsáveis dos equipamentos de
esporte e lazer, embora garanta a autonomia para as comunidades, traz uma série de problemas,
com consequências desastrosas para as ações cotidianas, uma vez que há grande precariedade em
relação aos recursos físicos, materiais e humanos, advindos da falta de recursos econômicos para
respaldar a compra de materiais, bem como a manutenção do espaço e dos recursos humanos.
Tais dificuldades encontradas têm relação direta com as ações específicas desenvolvidas
para as comunidades locais. De forma geral, o conteúdo físico esportivo predomina nos equipamentos, porém em termos de opções pouco pode ser observado, uma vez que o futebol, na quase
totalidade dos espaços visitados, é a única possibilidade de lazer.
Os dados coletados em grande parte das entrevistas com os profissionais ou responsáveis
dos CDCs e campos de rodízio apontam informações de que o processo de planejamento das atividades baseia-se em ações de escolinhas de futebol que mantêm atividades de treinamento esportivo, com dias e horários específicos, bem como vagas limitadas para a participação das pessoas,
situação bem diferente da perspectiva da animação sociocultural desenvolvida no tempo de lazer
das pessoas, com determinadas características de atitude, como prazer e liberdade de escolha,
planejada por um grupo de profissionais com formação específica em áreas relacionadas à temática do lazer, que tem como objetivo a formação cidadã dos participantes, com o desenvolvimento
pessoal e social, por meio da autonomia.
Nas ruas de lazer, sem contar o fato de que quatro delas estavam desativadas, o que mais
presenciamos foi o simples fechamento do espaço aos finais de semana, com quase inexistência de
atividades, uma vez que o desenvolvimento destas depende, em grande parte, da espontaneidade
das pessoas.
Poucos são os locais que diferem das questões apontadas. Os que escaparam desta perspectiva restrita de lazer é fruto do exclusivo empenho pessoal dos responsáveis locais, como por exemplo a rua de lazer Acapuzal, local que tem como responsável uma senhora que é líder comunitária,
extremamente envolvida com as questões do bairro e sempre presente em busca de alternativas
que possam agregar esforços ao desenvolvimento das ações.
Assim, apontamos em relação a essas questões, a necessidade da política de lazer destes
equipamentos serem planejadas a partir do entendimento amplo do lazer, o que requer a diversificação das vivências, ação articulada com outras políticas na área, como a necessidade de formação e capacitação dos profissionais ou voluntários que atuam nos equipamentos analisados.
Tais dados remetem para as discussões realizadas por diferentes estudiosos ligados ao lazer que
apontam a importância das pessoas terem contato com diferentes experiências, de modo a formarem um repertório de vivências que garanta um desenvolvimento pessoal e social, por meio da
participação crítica e criativa.
No entanto, a efetiva mudança da situação depende da presença direta da SEME nesse
processo, garantindo que a gestão dos equipamentos seja objeto central de preocupação, com a
administração pública se colocando como um dos atores centrais nesse processo, administração
que deve ser realizada junto com as comunidades do entorno dos espaços.
Outros problemas foram observados, como a inexpressiva participação feminina, a violência ocasionada pela precariedade das políticas sociais, a presença constante de usuários de drogas
nos equipamento, quer seja durante o dia ou à noite, a utilização de pelo menos um dos equipamentos para prostituição, as péssimas condições encontradas nos espaços como o lixo distribuído
no entorno dos principais equipamentos, campos e quadras mal planejadas, banheiros e vestiários
em péssima condição, falta de água potável e de bebedouros, entre outras questões.
Sobre essas questões, é importante de ser destacada a inexpressiva participação comunitária no planejamento, execução e avaliação das ações nos equipamentos, de modo a participar
mais efetivamente da realidade local. Embora autônoma na gestão dos equipamentos, entidades e
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responsáveis nem sempre levam em consideração a participação mais ampla da comunidade para
definir a tomada de decisão. E isso pode ser explicado por posições extremamente autoritárias, de
caráter político, com a presença de grupos que detém o poder e se perpetuam em cargos diretivos,
ou pela dificuldade de participação das pessoas, devido à falta de tempo, a pouca valorização dos
espaços enquanto possibilidade de efetiva participação social ou, ainda, pela falta de conhecimento específico dos gestores e da comunidade que garanta a implantação de ações com essa
característica.
No entanto, é necessário destacar que a comunidade reconhece a importância dos equipamentos de lazer da região de Ermelino Matarazzo, uma vez que estes são uma das poucas possibilidades locais para a vivência do lazer, enquanto momento de sociabilidade e, por isso, em vários
dos espaços a mesma anseia pelo estabelecimento de processos participativos mais amplos, além
de apontarem na entrevistas que o pouco realizado é muito aos olhos da comunidade, revelando
preocupação com possíveis críticas que poderiam levar à descontinuidade do trabalho nos equipamentos. Situações que justificam, mais uma vez, a necessidade da SEME rever sua participação
junto à gestão dos equipamentos de esporte lazer da região.
Ao contrário da situação colocada observa-se que os responsáveis por vários equipamentos
não visualizam a SEME ou, mesmo as OSs como parceiras, mas como instituições externas que
intervém na autonomia das comunidades, restringindo suas possibilidades de ações.
Exemplos interessantes das questões colocadas acima podem ser encontrados nos próprios
equipamentos da SEME que foram objeto de parceria com as Organizações Sociais, espaços que
estão com visíveis reformulações nas atividades, recursos humanos e em suas estruturas físicas,
a partir da regulamentação do programa Clube Escola, através do decreto-lei n° 48.392 (SÃO
PAULO, 2007), instituiu a administração (ainda que gradativamente) dos CDCs às iniciativas do
terceiro setor, a partir das políticas de parcerias do governo com Organizações de Sociedade Civil
de Interesse Público (OSCIPS).
Com métodos similares de ação os CDCs administrados dentro dessa pareceria, são divididos em núcleos de atuação e em cada um desses núcleos pode-se destacar, apesar de alguns
limites, elementos relacionados aos pilares de uma ideal política de formação e desenvolvimento
de quadros, de mobilização e participação cultural e de espaços e equipamentos. Além disso,
em termos de programação, os locais têm atividades em praticamente todos os horários, com
diferentes modalidades esportivas para todas as idades e gêneros. Observamos também que a
participação comunitária nesses equipamentos é mais efetiva, por meio de reuniões do Conselho
de Usuários local.
Seria este então o caminho a ser desenvolvido pela SEME com todos os equipamentos
de esporte e lazer da Subprefeitura de Ermelino Matarazzo, ou mesmo da cidade de São Paulo?
Entende-se que esta questão deve ser tratada com muito cuidado, após extensivo processo de discussão e avaliação, tanto com as OSs envolvidas, quanto com as comunidades atendidas, quer seja
para ampliar as parcerias, ou para renovar os contratos já estabelecidos.
A busca por parceiros que colaborem no desenvolvimento das políticas de esporte e lazer
deve ser um dos mecanismos de ação, com importantes reflexos no cotidiano das comunidades,
mas não pode ser a única possibilidade, muitas vezes visualizada a partir de vários problemas estruturais da administração pública. A administração municipal não pode abrir mão de seu papel
enquanto poder público responsável em planejar, executar e avaliar as diferentes políticas sociais,
como a de esporte e lazer. A gestão dos equipamentos, quer seja de forma direta ou indireta, não
pode prescindir da presença efetiva da SEME. Assim, nas parcerias com as OSs a SEME deve
discutir amplamente com a organização social que tipo de política de esporte e lazer deve ser
desenvolvido na cidade, a partir de suas diretrizes para a área. Mais do que isso deve avaliar periodicamente e, em loco, como as ações realmente são realizadas, de forma a exigir, se for o caso,
a mudança de rumo na execução das ações.
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Outro equipamento analisado vive em situação hibrida entre a administração da OSs e a
administração por meio da comunidade local. Tal fato coloca em questão no mesmo equipamento
a presença de dois públicos distintos, com deveres e direitos diferentes, revelando vários privilégios
para uma parte da comunidade, em detrimento de outra parcela, como a qualidade e do tipo de
serviço oferecido no local, uma vez que os profissionais que atuam nas duas realidades têm formação e experiência na área distinta.
Por fim, situação semelhante aos dos equipamentos geridos pela comunidade ou pelos responsáveis pode ser encontrada na gestão das praças com equipamentos esportivos e de lazer, espaços que deveriam ser de responsabilidade direta da SEME, mas que estão, em quase sua totalidade,
completamente abandonados, tanto em relação à infraestrutura, sem conservação e manutenção
dos materiais e espaços disponibilizados, como brinquedos, minicampos e quadras, quanto no
desenvolvimento de políticas de animação sociocultural, processo fundamental, conforme visto,
para dar “ânimo”, dar vida aos equipamentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para minimizar a ocorrência desta última questão, problema crônico observado em praticamente todos os locais visitados devido a vários fatores como a falta de recursos humanos
devidamente capacitados, sugerimos que a administração municipal desenvolva em suas ações
programas e projetos não apenas de difusão cultural, importantes enquanto possibilidade de levar
diferentes opções na área do lazer, mas também de criação e participação cultural, para que as
pessoas possam participar efetivamente das decisões, promovendo a inclusão social, o desenvolvimento humano e a cidadania.
Uma alternativa de ação dentro desta perspectiva pode ser experimentada a partir da
metodologia da ação comunitária, que busca identificar os interesses da comunidade e envolvê-la na tomada de decisão em todo o processo de planejamento, execução e avaliação, formando
multiplicadores da metodologia capazes de desenvolver de forma autônoma suas ações na área,
necessitando, se for o caso, da supervisão técnica de tempos em tempos.
Assim, conforme famosa música brasileira, “[...] se muito vale o já feito, mais o vale o que
virá e o que foi feito é preciso conhecer para melhor prosseguir [...]”54.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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DE VOLTA À INFÂNCIA: O CASO DO PARQUE CIDADE DA CRIANÇA EM SÃO
BERNARDO DO CAMPO, ESTADO DE SÃO PAULO
Marcela Freitas Galvão Ortiz55
André Fontan Köhler56
RESUMO: O artigo analisa e avalia a trajetória histórica do parque temático Parque Cidade da
Criança, em São Bernardo do Campo, mostrando a importância histórica, cultural e turística do
equipamento de lazer em questão. Percebe-se os problemas de gestão pública relacionados ao parque, tanto na forma da administração em si do equipamento quanto da celebração de parcerias
público-privadas; destaca-se negativamente a falta de continuidade das políticas públicas que tem
como objeto o Parque Cidade da Criança. Atualmente, o parque está inserido em um plano mais
amplo de desenvolvimento turístico municipal. Contudo, a indefinição quanto a novos modelos
de gestão pública colocam em risco o atual processo de recuperação do parque, que, mais uma vez,
pode entrar em decadência, o que ocorreu em situações anteriores.
PALAVRAS CHAVE: Parques temáticos. Políticas Públicas. Patrimônio Cultural.
1. INTRODUÇÃO
Segundo dados fornecidos pelo Sistema Integrado de Parques e Atrações Turísticas (SINDEPAT), que congrega onze dos principais parques temáticos brasileiros – Hopi Hari, Beto Carrero World, Beach Park etc. –, em 2009, o setor faturou R$ 802.000.000,00, tendo crescido 23% em
relação ao ano anterior, ao receber 12.000.000 de visitantes. Em 2010, o total de visitantes chegou
a 15.000.000, o que representou um faturamento de R$ 1.000.000.000,00; os parques temáticos
foram responsáveis pela geração de 90.000 empregos diretos e indiretos no país. Entre 2008 e
2010, inclusive, foram investidos cerca de R$ 100.000.000,00 nos onze equipamentos associados
ao SINDEPAT, com previsão de mais R$ 500.000.000,00 até 201557.
O objeto de estudo do artigo é o parque temático Cidade da Criança, localizado em São
Bernardo do Campo, Região Metropolitana de São Paulo. Fundado em 1968, foi um empreendimento pioneiro e ousado à época, tendo sido o primeiro parque temático do país. Ele ocupa uma
área de quase cinco hectares, sendo de propriedade da Prefeitura Municipal de São Bernardo do
Campo (PMSBC). Nos anos 1970, foi o principal responsável pelo desenvolvimento do turismo
na cidade, que atraiu para seu entorno meios de hospedagem e negócios ligados à alimentação e
entretenimento.
As justificativas do estudo ligam-se à importância cultural do objeto de estudo, ao pioneirismo da criação de um parque temático na área, a seu potencial turístico e de lazer, atualmente
pouco explorado, e ao fato de a PMSBC ser proprietária da área, já tendo várias vezes investido
recursos públicos lá, nos últimos anos, mas sem ter tido resultados duradouros.
55 Bacharel em Lazer e Turismo pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP).
E-mail de contato: [email protected].
56 Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/
USP). Professor Doutor do Curso de Bacharelado em Lazer e Turismo da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da
Universidade de São Paulo (EACH/USP). E-mail de contato: [email protected].
57 Os dados foram enviados aos(às) autores(as) pelo SINDEPAT, através de mensagem eletrônica.
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O objetivo central do estudo de caso é reconstruir historicamente o funcionamento do
Parque Cidade da Criança, dos anos 1960 à atualidade, avaliando-o conjuntamente com sua
gestão pública. Como objetivos secundários, propõe-se entender as razões do sucesso do parque,
principalmente nos anos 1970, avaliar as causas da decadência e do encerramento das atividades,
nos anos 1980 e 1990, e como se deu a reabertura, nos anos 2000.
2. METODOLOGIA DE PESQUISA
Optou-se pelo estudo de caso como metodologia de pesquisa, iniciado a partir de embasamento teórico, necessário para limitar conceitos e definições e para definir os critérios de avaliação dos dados e informações coletados.
A pesquisa enquadra-se como um caso único e de fundamento lógico longitudinal, pois
pretende estudar o mesmo caso, em pontos diferentes ao longo do tempo. Também pode ser considerado como um estudo de caso incorporado, já que a pesquisa aborda um único equipamento,
mas, dentro dele, são estudadas mais de uma unidade de análise; incluem-se resultados sobre a
administração, a estrutura física, os funcionários e os frequentadores do parque temático (YIN,
2005).
Procurou-se adequar a coleta de dados aos três princípios estabelecidos por Yin (2005).
Foram utilizadas várias fontes de evidências, para que os tipos de investigação convergissem;
havendo informações contraditórias, os tópicos poderiam ser aprofundados, o que não ocorreu.
O encadeamento das evidências foi mantido, para que o(a) leitor(a) pudesse seguir sua origem,
chegando às considerações finais. Por fim, os dados coletados foram organizados e documentados
separadamente do relatório do estudo de caso.
Dentre as seis fontes de evidências para um estudo de caso, discutidas por Yin (2005),
apenas a observação e a observação participante não foram utilizadas; a pesquisa contemplou a
documentação, os registros em arquivos, entrevistas e artefatos físicos, ou seja, o próprio parque
temático.
Para esse artigo, a estratégia analítica geral foi desenvolver uma estrutura descritiva que
organiza cronologicamente o estudo de caso acerca do Parque Cidade da Criança. Dentre as técnicas apontadas por Yin (2005), foi utilizada a explanação; ou seja, os fenômenos foram explicados
com o objetivo de identificar seus elos, que podem refletir interpretações importantes para a reconstrução histórica da trajetória do supracitado parque temático.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A palavra “lazer” vem do termo em latim licere, que significa algo lícito, permitido. Para
Huizinga (2005), o lazer está relacionado ao jogo, presente não só em todo ser humano, mas
também nos animais. O jogo é a atividade que não está ligada a nenhum tipo de necessidade ou
utilidade no campo material, mas que segue regras, possui um ambiente com entusiasmo, sagrado
ou festivo, e é coerente com a cultura na qual se insere.
Com o advento da pós-modernidade e o surgimento da indústria cultural e de entretenimento, o lazer passou a ser visto como sinônimo de produto ou mercadoria, e a internalizar
promessas compensatórias; ou seja, como algo que foge das frustrações do cotidiano e da rotina,
compensando os momentos de estresse (WERNECK, 2000).
Contudo, para Szmrecsanyi (2004), a ideia de lugares para a concentração de pessoas, tendo a mercadoria como objeto de lazer, existe desde pelo menos 1851. Em Londres, em um edifício
inovador, que retratava o domínio tecnológico e colonial do Império Britânico, foi realizada a I
Exposição da Produção Internacional, que tratava sobre a inovação e a capacidade tecnológica.
Segundo a autora, com a Modernidade, o lazer passou a ser comandado pela mercadoria, e o ele-
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mento imaginário passou a ganhar força. Essa valorização do falso e do emocional, aliada ao entretenimento tecnológico, possibilitou o início dos parques de diversão. Conney Island, em Nova
Iorque, surgiu no final do Século XIX, utilizando-se dessa combinação como uma mercadoria para
as massas, descoberta como “vendável e valiosa” (SZMRECSANYI, 2004, p. 27).
Ortiz (2006) defende que não existe uma identidade nacional autêntica e verdadeira; ela é
sempre um discurso de segunda ordem, cujo objeto de seleção e interpretação é a cultura popular,
múltipla e particularizada. Fonseca (2005, p. 21) faz uma excelente síntese do processo de formação de um patrimônio histórico e artístico nacional pelos Estados:
A constituição de patrimônios históricos e artísticos nacionais é uma prática característica dos
Estados modernos que, através de determinados agentes, recrutados entre os intelectuais, e com
base em instrumentos jurídicos específicos, delimitam um conjunto de bens no espaço público.
Pelo valor que lhes é atribuído, enquanto manifestações culturais e enquanto símbolos da nação,
esses bens passam a ser merecedores de proteção, visando à sua transmissão para as gerações
futuras. Nesse sentido, as políticas de preservação se propõem a atuar, basicamente, no nível
simbólico, tendo como objetivo reforçar uma identidade coletiva, a educação e a formação de
cidadãos.
4. PRINCIPAIS RESULTADOS DA PESQUISA
Esse item apresenta o estudo de caso em si, reconstruindo historicamente a trajetória do
Parque Cidade da Criança, de acordo com a análise de documentos, fotos, arquivos, recortes de
jornais e entrevistas. Estas foram feitas com Jefferson José da Conceição (Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo da PMSBC), Aparecida Dani (gerente do parque), Vanderlei Beltran e Edson Souza (ex-funcionários do parque) e Carolina Maia de Araújo, responsável
pela exposição Cidade da TV, dentro do parque. Infelizmente, não foi possível entrevistar personagens importantes para o Parque Cidade da Criança em gestões públicas anteriores, inclusive
antigos permissionários.
A área onde se encontra hoje o Parque Cidade da Criança foi desapropriada em 1959, pela
PMSBC, para a criação do Bosque Municipal, e contemplava alguns estúdios da Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Em meados dos anos 1960, a extinta TV Excelsior iniciou as gravações
da novela Redenção no local, construindo, para isso, uma cidade cenográfica. Com o término das
filmagens, os cenários deixados no local foram aproveitados para a criação de uma minicidade,
com estações de trem, prefeitura, casas etc. – formalmente, deu-se a inauguração do parque, em
1968.
Contudo, a cidade que reproduzia em miniatura o mundo dos adultos foi oficialmente
inaugurada apenas em 1970; o sucesso do parque foi tanto que, logo após a inauguração, as instalações foram ampliadas. Ele foi dividido nas seguintes áreas: a) área central, onde ficava a cidade
cenográfica em si; b) miniregião amazônica, com o Teatro Amazonas, a Ferrovia Madeira-Mamoré etc.; e c) região espacial, caracterizada pelo Luar I, um foguete que simulava uma viagem à lua.
Em 1975, a firma de economia mista Turismo de São Bernardo do Campo S/A (PROTUR) investiu em novas atrações, como o submarino e a Casa Maluca, tornando o parque uma
importante atração turística; em meados dos anos 1970, o parque chegou a receber 45.000 visitas
por fim-de-semana. Segundo Jefferson José da Conceição, em entrevista realizada em 09/12/2011,
em São Bernardo do Campo, o sucesso do parque pode ser explicado também pelo elevado crescimento econômico da RMSP nos anos 1970, com o adensamento da classe média e o aumento do
consumo, inclusive relacionado ao lazer, turismo e entretenimento.
Quase todos os brinquedos e pontos de venda não eram administrados pela PMSBC; eram
de permissionários privados. Essas permissões davam-se através de licitações, funcionando como
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um instrumento de transferência de prestação de serviços públicos. Elas não dependiam de leis
para serem aprovadas, mas apenas de um contrato, e eram consideradas precárias, pois podiam ser
desfeitas a qualquer momento pelo poder público, sem pagamento de indenização.
Isso significa que o poder público transferiu a administração sobre pontos de venda e
equipamentos para firmas particulares. Os contratos previam que as firmas pagariam um aluguel
simbólico e uma porcentagem do lucro para a PMSBC. A prefeitura municipal comprometia-se a
manter a infraestrutura e os serviços públicos do parque, como limpeza, segurança e fiscalização.
Com o tempo, a manutenção das áreas comuns do parque, bem como os serviços públicos, foram
sendo “deixados de lado” por parte da PMSBC. A fiscalização sobre os permissionários também
não recebia atenção; começaram a acontecer acidentes nos brinquedos, reclamações acerca do
atendimento e cobrança de preços abusivos.
No início dos anos 1980, o parque já tinha entrado em decadência; ele tinha parado de
ser muito frequentado pelos residentes locais, não contava mais com espetáculos da Turma da
Mônica, e muitos brinquedos achavam-se deteriorados – em 1985, houve apenas 490.000 visitas,
metade do verificado para 1975. No final dos anos 1980, ele tinha suas atividades praticamente
paralisadas.
Em 1989, o parque sofreu sua primeira tentativa de “revitalização,” que contou com o
apoio do Projeto Suvinil Cor, Arquitetura e Memória para serviços de pintura geral58. Muitos
brinquedos foram reformados pelos permissionários, foi criada a Carteirinha do Munícipe, que
provia descontos aos residentes locais, além de ações pontuais para a nova inauguração. Contudo,
o parque não conseguiu atrair turistas e visitantes, como tinha acontecido nos anos 1970.
Os anos 1990 trouxeram consigo uma mudança nos hábitos de lazer; o avanço tecnológico
fez com que parte do público infantil passasse a se interessar mais por videogames, computadores
e brinquedos eletrônicos. Andar de avião, por exemplo, já era mais acessível, fazendo com que o
brinquedo que simula um voo perdesse a magia da novidade. Em seu conjunto, os brinquedos não
acompanharam essa evolução, tornando-se, dessa forma, antiquados, além de deteriorados.
Em 1990, parte do Parque Cidade da Criança foi tombada pelo Conselho Municipal do
Patrimônio Histórico e Cultural de São Bernardo do Campo (COMPAHC-SBC), através da Lei
n. 3496, de 01/06/1990.
Em 2000, criou-se o Fórum Regional em Defesa da Cidade da Criança, formado, entre
outros, por moradores(as) e professores(as) da região, permissionários e funcionários(as) do parque. Ele tinha como objetivo discutir seus problemas, para tentar desenvolver soluções para evitar
seu fechamento, então cogitado pela PMSBC. Representantes do fórum chegaram a participar
de reuniões na Câmara dos Deputados, em Brasília, DF, tendo apresentado várias alternativas à
prefeitura municipal; contudo, segundo Vanderlei Beltran, em entrevista realizada em 07/12/2011,
em São Bernardo do Campo, a PMSBC tinha como objetivo encerrar as atividades do parque,
arrumando mais problemas a cada proposta apresentada pelo fórum.
Em 2004, foi estimado um público frequentador de apenas 127.000 pessoas; segundo a
PMSBC, o parque era responsável por um prejuízo de R$ 3.000.000,00 anuais à prefeitura municipal. Em 02/10?2012, às vésperas do Dia das Crianças, o parque foi fechado à visitação pública;
muitos brinquedos “sumiram.” Vanderlei Beltran fala com pesar sobre o fechamento do parque e
a perda de sua história, a partir do “sumiço” de muitos brinquedos: “Levamos mais de trinta anos
para construir uma história, uma marca, e, daí, tudo foi destruído em um dia” (Entrevista em São
Bernardo do Campo, 07/12/2011).
58 Esse projeto é de responsabilidade da Glasurit do Brasil, do Grupo BASF, e tem como objeto de intervenção conjuntos
arquitetônicos e paisagísticos, equipamentos culturais e grandes equipamentos urbanos, a exemplo do Pátio de São Pedro
(Recife, PE) e do Estádio do Pacaembu (São Paulo, SP).
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Em 19/12/2008, o parque foi reaberto, com o nome de Parque Educativo Cidade da Criança, após gastos de R$ 21.000.000,00 (alegados), além de previsão de R$ 250.000,00 mensais com
folha de pagamento. Contudo, ele foi fechado no outro dia, 20/12/2008, pois, segundo a lei federal
em vigor, o prefeito municipal não poderia contratar novos servidores públicos a menos de um
mês da posso do novo governante municipal. Além disso, esses gastos foram questionados pelo
Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, pois partiu da Secretaria de Educação da PMSBC,
configurando-se como recurso para a educação do município, algo não aceito pelo supracitado
tribunal.
O parque foi novamente reaberto no final de 2009, quando, depois de (mais) um investimento (R$ 1.300.000,00) em infraestrutura, apenas dois brinquedos estavam funcionando, e
não havia pontos de venda de alimentação. Jefferson José da Conceição relata a precariedade do
parque nessa reabertura:
A gente ficou muito surpreso com a (sic) primeira abertura, nós não tínhamos equipamentos.
Nós abrimos e avisamos que era para caminhadas, tínhamos dois brinquedos e mais nada. Estimamos um público entre 30.000 e 40.000 pessoas; não tinha nem alimentação, e eu confesso
que torci para chover. Passei o dia inteiro lá com a equipe e chegava mais e mais gente perguntando: “- Cadê a xícara?”, “- Cadê o tobogã?”, “- Cadê o submarino?” (Entrevista em São
Bernardo do Campo, 09/12/2011)
O parque fechou para (mais) uma reforma, e voltou a abrir as portas em 17/01/2010. As
reformas e a implantação dos brinquedos estão sendo feitas gradualmente. Para reabrir o parque,
optou-se novamente pelas permissões de uso; contudo, os contratos são mais detalhados, estipulando todas as responsabilidades, direitos e diretrizes que devem ser seguidos pelos permissionários, além de estipular um preço menor para os munícipes. Ainda há problemas, como a (falta de)
iluminação noturna e equipamentos fechados (Planetário, Teatro Amazonas etc.). A inauguração
gradual dos brinquedos é vista como uma estratégia; a cada inauguração, há um novo motivo para
convidar a população a visitar o parque.
Jefferson José da Conceição ressalta que a PMSBC fez questão de que a área central do
parque possuísse muitos brinquedos gratuitos, com o objetivo de atender a população mais carente, além de manter preços mais baixos para os residentes locais, implantando novamente a
Carteira do Munícipe. Além disso, o planejamento está sendo aprimorado; será desenvolvido um
calendário anual que tenha pelo menos cinco eventos âncoras.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Um dos principais motivos que explicam o sucesso, desde a última reabertura, é o fato de
o Parque Cidade da Criança estar inserido em um plano de desenvolvimento turístico maior, que
conta com outras atrações, a exemplo do Parque do Estoril, Estância Alto da Serra, Pinacoteca
Municipal e Rota do Frango com Polenta. Além disso, preveem-se a restauração e abertura de
novos hotéis, bem como a criação do Museu do Trabalho e do Trabalhador.
A organização desse plano é, em boa parte, de responsabilidade do Grupo de Turismo (GETUR), coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo da PMSBC, que envolve a cadeia turística da cidade: agências de viagem, hotéis, locadoras de automóveis,
bares e restaurantes, entre outros. A ideia do grupo é fazer com que o(a) turista executivo(a) e de
eventos estenda sua estadia para o fim de semana, e também que, a partir de agora, esses(as) turistas tragam junto sua família, aproveitando as atrações turísticas e “descobrindo” a cidade. O parque tem um papel fundamental nesse plano, podendo ser considerado o principal atrativo local.
De acordo com a análise de inúmeros comentários em reportagens na imprensa e comentários em redes sociais, percebe-se que muitos visitantes do parque estão contentes com seu estado
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atual; as crianças parecem adorar o local, mas a maioria dos adultos, que já tinha frequentado o
parque nos anos 1970 e 1980, ficou decepcionada ou frustrada, não porque a estrutura e brinquedos atuais sejam ruins, mas principalmente em virtude da descaracterização do local – o parque
encontrado não confere com o esperado.
Por mais que se tente recuperar os brinquedos que mais marcaram a história do local,
é completamente inviável, se não impossível, construí-los da mesma forma novamente. Novos
prédios e brinquedos fizeram com que os antigos tenham mudado de lugar, um “detalhe” que não
passa despercebido; por exemplo, o avião perdeu sua torre de comando. Também não há planos
para o Lago dos Cisnes e a Casa dos Espelhos, e é difícil acreditar que a Casa Maluca será tão
incrível quanto a primeira, pelo menos na memória dos mais velhos. Pode-se dizer que a reconstrução da Casa Maluca é um desafio, pois a proposta do brinquedo é ser inovador e desafiar o comum, mas sem perder a identidade da original. Uma cópia seria batida, uma nova seria criticada.
Infelizmente, não há um jeito de reverter todos os problemas que ocorreram com o parque,
desde sua inauguração formal, em 1970. A maior insegurança, a partir de agora, é lembrar que,
em poucos anos, a PMSBC pode passar por uma profunda reestruturação, com mudanças de prioridade na agenda pública, e, mais uma vez, o parque enfrentar a falta de manutenção e serviços
públicos ou novos conflitos com os permissionários. Em algum momento, os(as) idealizadores(as)
da última reabertura deixarão seus cargos, sendo substituídos por outras pessoas, que podem decidir parar de investir, ou, então, mudar o formato e objetivos do parque.
Um parque temático desse porte e importância exige atenção e investimento constante
por parte do poder público, e, se durante uma gestão, os cuidados na manutenção e serviços públicos forem deixados de lado, ele entrará rapidamente em decadência, como atestam os anos 1980,
1990 e 2000. O ideal seria procurar um novo modelo de gestão pública e parceria público-privado
para a área, de modo a fazer com que o futuro do Parque Cidade da Criança não dependa mais
da boa vontade do gestor público de plantão. Defende-se o estudo da utilização do instrumento
da concessão pública para o parque como um todo, através do qual uma única firma privada teria
o controle sobre todo o local, por um tempo determinado, sob a fiscalização e controle públicos.
Assim, a firma privada teria a segurança para investir no local, ao passo que o poder público teria
como controlar as ações da iniciativa privada, para garantir a preservação do local e seu acesso
diferenciado para os munícipes e população mais carente. Infelizmente, desde o final dos anos
1960, a PMSBC não tentou implantar nenhum outro modelo de gestão pública para a área, que
combina controle direto do espaço público do parque com permissões de uso para brinquedos e
pontos de venda.
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ACESSO DE MENINAS E MENINOS DE CEILÂNDIA – DF A ESPAÇOS
ESPECÍFICOS DE LAZER
Junior Vagner Pereira da Silva59
Ioranny Raquel Castro de Sousa60
Tânia Mara Vieira Sampaio61
RESUMO: Os atuais estudos do lazer começam a trazer a problemática do acesso diferenciado
entre homens e mulheres a estes espaços. Uma realidade que vem se alterando lentamente como
mostra o estudo realizado junto à população adolescente de uma das regiões administrativas do
Distrito Federal. O objetivo da pesquisa foi avaliar o lazer vivido pelos adolescentes e as relações
de gênero dele decorrentes. Especificamente, avaliou-se o acesso de adolescentes do sexo feminino
e masculino aos espaços específicos de lazer. A metodologia utilizada foi do tipo descritivo/exploratório e contou com a participação de 165 adolescentes de Ceilândia – DF, sendo 111 do sexo
feminino e 64 do sexo masculino, selecionados de forma não-probabilística (por conveniência). A
técnica de investigação adotada foi a aplicação de questionário, com questões fechadas, politômicas, estruturada em escala likert de cinco níveis. No que tange às relações de gênero, conclui-se
que o acesso aos espaços específicos de lazer está relacionado à tipificação e estereótipos construídos historicamente e arraigados na sociedade em conformidade com aquilo que é concebido
culturalmente como próprio de homens e próprio mulheres, pois as adolescentes mostraram maior
uso dos espaços relacionados aos interesses culturais artísticos e os adolescentes aos espaços específicos fomentadores dos interesses culturais físicos/esportivos.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Gênero. Adolescentes.
INTRODUÇÃO
Historicamente construídas, interpretações equivocadas e marcadas por discursos preconceituosos foram sendo cristalizadas na sociedade a respeito do papel da mulher, atribuindo a elas,
sob a alegação de possuírem características dóceis – belas, frágeis, estéticas –, a função de mãe,
esposa e dona de casa, sendo essa concepção estendida a diversos contextos, como a família, o
trabalho, os esportes, o lazer dentre outros (SAMPAIO, 2008a).
Levando em considerando os estereótipos relacionados ao gênero, estudos têm sido desenvolvidos a respeito de sua ocorrência em atividades relacionados ao interesse físico/esportivo do lazer – jogos olímpicos (DEVIDE, 2005), esportes culturalmente masculinos (KNIJNIK;
HORTON; CRUZ, 2010, ZUZZI; SAMPAIO 2010), participação em lutas (FERRETTI, 2011;
CARDOSO et al., 2012), limite geográfico permitido ao jogo (SILVA; NUNES, 2008), tipo de
brincadeiras infantis (SILVA, 2012; SAMPAIO, 2008b), dentre outros, observando que, embora
avanços venham ocorrendo, as mulheres, em relação aos homens, ainda têm usufruído de menores
oportunidades de ocupação do tempo disponível com atividades físicas/esportivas de lazer.
59 Doutorando em Educação Física pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Docente no Curso de Educação Física da
Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC; Bolsista PROSUP/CAPES (2010-2011) – [email protected]
60 Licenciada em Educação Física e acadêmica do Bacharelado em Educação Física da Universidade Católica de Brasília –
UCB. Bolsista IC/CNPq. [email protected]
61 Doutora em Ciências da Religião. Docente dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado e Doutorado) em Educação Física da Universidade Católica de Brasília – UCB. [email protected]
120
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Em relação aos estereótipos de gênero ocorridos nos esportes, Cardoso et al. (2012) expõem que a construção social de que homens são fortes e mulheres frágeis, favorecem a ocorrência
de preconceitos nos esportes, atuando negativamente sobre a adesão das modalidades que têm
muito contato físico e exigem maior aplicação de força, como o boxe, por ser concebido como
masculino, pois aquelas que acabam decidindo pela adesão deste tipo de atividade com frequência
são rotuladas de homossexuais.
Uma participação menor em atividades de lazer de interesse físico por parte de mulheres
tem sido observada em diversos estudos brasileiros desenvolvidos com adultos (BRASIL, 2004;
ZANCHETTA et al., 2010), adolescentes (LIPPO et al., 2010; GARCIA; FISBERG, 2011) e
crianças (SILVA; SILVA, 2008).
Embora dados de investigações indiquem que as mulheres têm menos acesso ao lazer de
interesse físico/esportivo e a literatura especializada assegure que o gênero se constitui uma barreira ao lazer, fazendo com que mulheres tenham menores oportunidades, seja na infância ou na
idade adulta (MARCELLINO, 2002), ainda são incipientes os estudos que avaliam a participação
em atividades de lazer relacionadas a outros interesses culturais – artísticos, intelectuais, manuais,
sociais e turísticos –, pouco se conhecendo a respeito deste fenômeno em termos quantitativos.
Diante ao exposto, a presente investigação teve como objetivo da pesquisa foi avaliar o lazer vivido pelos adolescentes e as relações de gênero dele decorrentes. Especificamente, avaliou-se
o acesso de adolescentes do sexo feminino e masculino aos espaços específicos de lazer.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A investigação foi caracterizada como descritiva e exploratória, na perspectiva de que
estudos descritivos possibilitam a obtenção de informações de características de uma determinada
população (GIL, 2010) e avaliam programas, principalmente aqueles relacionados à análise de
opiniões, atitudes e crenças de uma população (MARCONI; LAKATOS, 2002). Por sua vez, os
estudos exploratórios possibilitam a descoberta de práticas que necessitam ser modificadas, assim
como permite a formulação de alternativas que possam substituí-las. Ainda, as pesquisas exploratórias visam desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, possibilitando uma visão geral
sobre um fato ainda pouco explorado (GIL, 2010).
A população do estudo foi composta por adolescentes, residentes em Ceilândia – Distrito
Federal. A amostra foi composta por 175 adolescentes, sendo 111 do sexo feminino e 64 do sexo
masculino, com idade média de 12,8±1,2 anos, matriculados do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental em uma escola Pública de Ceilândia – DF.
A técnica de investigação adotada foi a aplicação de questionário, sendo as informações
fornecidas de próprio punho pelos participantes da investigação. Como instrumento adotou-se um
questionário, criado especificamente para os objetivos do estudo, composto por questões fechadas,
politômicas, desenvolvidos em escala likert de cinco níveis – 1 (nunca), 2 (pouco), 3 (às vezes), 4
(com frequência), 5 (sempre).
No tratamento dos dados foi aplicada a análise estatística de frequência relativa, utilizando a planilha do Excel para os cálculos.
O estudo obedeceu as recomendações da Resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS/196/96, sendo a autorização para realização concedida pela direção da escola e pelos responsáveis pela(o)s adolescentes e pela(o)s própria(o)s adolescentes os quais assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE. A pesquisa teve sua aprovação pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Católica de Brasília – UCB sob o número de protocolo UCB-017/2011.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados indicam que independente do sexo, a maioria dos adolescentes nunca visitaram alguns dos espaços de lazer avaliados – concha acústica, memorial de cultura, museu e está-
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
121
dio/campo de futebol. Ainda, espaços como teatro, biblioteca, museu e ginásio/quadra de esportes
são pouco frequentados pelos adolescentes.
Dentre os espaços que apresentaram maior regularidade de acesso figuraram o cinema, as
praças e os parques/praças esportivas, oscilando a frequência entre “às vezes” e “com frequência”.
Por conseguinte, o ginásio ou quadra de esportes mostraram ser os espaços que os adolescentes apresentaram o maior percentual de uso na escala de frequência “sempre”.
Embora o espaço de lazer que tenha apresentado maior acesso na escala de frequência
“sempre” seja de interesse físico, condição que pode estar relacionada à influência que os meios
de comunicação exercem sobre a formação de opiniões, o que por vezes faz com que o lazer seja
entendido de forma reduzida, como se fosse composto apenas por atividades de interesse físico/
esportivo (MELO; ALVES JÚNIOR, 2003), os dados observados indicam uma maior diversificação em relação aos espaços e interesses culturais por eles experimentados, haja vista que o cinema
(interesse artístico) e praças (interesse social) demonstraram ser procurados “às vezes” e “com
frequência”.
Contudo, em relação aos interesses artísticos, verifica-se a inexistência de acesso a espaços
como concha acústica, memorial de cultura, assim como a pouca frequência ao teatro e museu.
O acesso da população as oportunidades de lazer de interesse artístico é historicamente
restrita a uma pequena parcela da sociedade (SILVA; SAMPAIO, 2011), podendo esta condição
estar relacionada ao “ar” de santuário, de acesso a poucos, com que são revestidos e o local em
que estes espaços se localizam – com frequência nos centros das cidades, inibindo assim a sua
utilização (MARCELLINO, 2008).
Esta condição deve ser vista com preocupação, pois a arte se configura em uma importante possibilidade de releitura para diversos problemas da atualidade e para a abertura de horizontes
com vistas à criatividade e transformação do meio em que se vive. A arte apresenta-se como
um terreno fértil de possibilidade de construção de sentidos, de compreensão da realidade, de
expressão de anseios, desejos, protestos, emancipação e novas ideias: maneiras de se interpretar a
realidade de compreender o mundo (SOUSA; MELO, 2009, p.12).
Tabela 1. Análise de frequência do acesso de meninas e meninos de Ceilândia – DF aos
equipamentos específicos de lazer
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Ao analisar os resultados por sexo, verifica-se que o percentual de adolescentes que afirmaram nunca ter ido a espaços de lazer relacionados ao interesse cultural artístico – concha
acústica, memorial de cultura e museu – é maior entre o sexo masculino e a maioria que nunca
frequentou estádio/campo de futebol (interesse físico/esportivo) está entre o sexo feminino.
Dentre os que sinalizaram “sempre” frequentar biblioteca, cinema e praça, respectivamente espaços de predominância do interesse intelectual, artístico e social, os percentuais foram
maiores entre o sexo feminino, resultado inverso sendo obtido em relação ao parque/praça esportiva, estádio/campo de futebol e ginásio/quadra de esportes, espaços de predominância do interesse
físico/esportivo.
Nota-se que, a exemplo do que ocorre em outros contextos e atividades cotidianas, como
a família e o trabalho (TURNER, 2000), a estereotipia de gênero também vem ocorrendo nas
oportunidades de lazer, fazendo com que o uso e frequência de um espaço ou outro, estejam relacionados ao ser mulher ou homem (SAMPAIO, 2008a), levando as mulheres a apresentar maior
frequência a espaços de interesses artísticos e os homens aos equipamentos de interesses físicos/
esportivos.
Isso pode estar relacionado à construção histórica e reprodução simbólica sobre o gênero,
que entende a mulher como ser frágil (GOELLNER, 2005; SAMPAIO, 2008b), delegando à elas
funções tidas como estéticas, belas e de pouco esforço físico, seja nas tarefas de casa – esposa e mãe
(TURNER, 2000), na incorporação de funções de cuidados já na infância (GAYA; POLETTO;
TORRES, 2002), nas oportunidades e tipificação de jogos infantis (HAYWWOD; GETCHELL,
2004; GOMES; MARQUES; NUNES, 2005; RANGEL, DARIDO, 2005; ZUZZI: SAMPAIO,
2010), na inserção da mulher no esportes e tipo de modalidades permitidas (GOELLNER, 2005),
na introdução da educação física no âmbito escolar (ADELMAN, 2003), na ocupação do espaço
de jogo no recreio escolar (ALTMANN, 1999).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora os resultados indiquem que a(o)s adolescentes avaliados frequentam espaços de
lazer relacionados aos interesses físicos/esportivos, artísticos, sociais e intelectuais, há discrepância
na frequência de acesso aos equipamentos relacionados aos interesses físicos/esportivos em comparação com os demais, sendo de forma mais expressiva a ocupação por meninos desse espaço.
No que tange às relações de gênero, conclui-se que o acesso aos espaços específicos de
lazer está relacionado à tipificação e estereótipos construídos historicamente e arraigados na sociedade em conformidade com aquilo que é concebido culturalmente como próprio de homens
e próprio mulheres, pois as adolescentes mostraram maior uso dos espaços relacionados aos interesses culturais artísticos e os adolescentes aos espaços específicos fomentadores dos interesses
culturais físicos/esportivos.
Com base nos resultados obtidos, se faz necessário que projetos pautados na filosofia do
duplo processo educativo do lazer, que o considera como veículo e objeto de educação, sejam
desenvolvidos desde a infância e adolescência, iniciando os jovens nos seis interesses culturais do
lazer e estimulando a atuação em níveis médios e superiores, o que pode favorecer o rompimento
com estigmas e preconceitos, que construídos historicamente, são incorporados nas ações cotidianas da sociedade e interpretados como se fossem de ordem natural, inerente ao biológico, como
por vezes ocorrem marcando as relações de gênero como espaços assimétricos.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
125
EVOLUCIONISMO, CULTURALISMO E FUNCIONALISMO: CONTRIBUIÇÕES
PARA OS ESTUDOS DO LAZER
Natalia Puke; Nelson Carvalho Marcellino62
RESUMO: O “lazer” no sentido amplo do termo é uma temática contemporânea que se apresenta de maneira complexa e como um vasto campo de investigações para se compreender a cultura,
o comportamento humano, as relações socioeconômicas e de poder. Assim, para que se tenha
uma compreensão mais vasta dessa “teia” de relações, das questões metodológicas das pesquisas
relativas ao lazer e seu significado para o ser humano contemporâneo, fazem-se necessárias as
contribuições teóricas de áreas do saber que nos possibilitem avaliar alguns dos pontos nodais em
suas manifestações, que por ora são silenciados pelas políticas de difusão cultural e pelos discursos
mercadológicos. Partindo dessa problemática esse trabalho analisa o que o processo discursivo
das escolas antropológicas - evolucionista, culturalista e funcionalista -, tem a contribuir para os
estudos do lazer.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Antropologia. Sociedade.
INTRODUÇÃO
O lazer, embora seja relativamente um novo objeto de estudo para o mundo acadêmico,
tem sido nas últimas décadas, alvo de pesquisa de diversas áreas do saber, não só das ligadas às Ciências da Saúde, como também, das vinculadas às Ciências Humanas. Esse interesse pela temática
tem se ampliado e tomado forma, na medida em que se constatou que o lazer não é simplesmente
um subitem do esporte, tal como se conceitua na Constituição Brasileira63, mas, um complexo de
manifestações, vivências e ainda, um direito social, cujas “atividades e atitudes” estabelecem múltiplas relações com os aspectos culturais, econômicos, midiáticos, políticos, morais, educacionais
e subjetivos.
Fundindo-se e algumas vezes se confundindo com outros termos, tais como ócio, recreação, lúdico e entretenimento, o lazer, enquanto objeto de análise e interpretação, apresenta diversas conceituações. Embora haja divergências se o lazer existe desde a antiguidade ou se é um
fenômeno da Sociedade Industrial (GOMES, 2004), se é um “conjunto de ocupações” (DUMAZEDIER, 1973), se é “tempo livre” ou “tempo disponível” (MARCELLINO, 2010), há certa concordância entre os pesquisadores, quando fazem referência que o lazer é uma dimensão da cultura,
cujas manifestações consideram, privilegiam e se constituem mediante os aspectos tempo, espaço,
atividade e atitude.
Neste trabalho, assumiremos como o referencial conceitual as pesquisas do sociólogo Nelson Carvalho Marcellino pela ótica do materialismo-histórico, uma vez que, compreendemos o
62 Nelson Carvalho Marcellino é Livre docente em Educação Física (Estudos do Lazer). Docente do curso de mestrado em
Educação Física da UNIMEP, líder do GPL – Grupo de Pesquisa em Lazer e Pesquisador do CNPq - [email protected].
Natália Puke é graduanda em Filosofia na Universidade Metodista de Piracicaba, bolsista de Iniciação Científica pelo
programa CNPq/PIBIC e membro do GPL - Grupo de Pesquisas em Lazer – [email protected]
63 O termo lazer aparece em algumas passagens da Constituição Brasileira que está em vigor desde 1988. No art. 6 e 7
do Capítulo II que trata dos Direitos Sociais e na Seção III que diz respeito ao Desporto. https://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm
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lazer como um elemento cultural gerado histórica e dialeticamente do conflito entre homem e
trabalho. Nesse sentido, as problemáticas que cerceiam o lazer têm os precedentes no contexto
sociocultural da segunda metade do século XIX, período no qual as transformações nos modos
de produção e a predominância da mentalidade liberal modificaram as relações entre homem e
trabalho, entre homem e tempo. Em síntese, compreendemos o lazer como,
Cultura vivenciada (praticada, fruída ou conhecida), no tempo disponível das obrigações profissionais, escolares, familiares, sociais, combinando os aspectos tempo/espaço e atitude [...]; o
tempo a ser privilegiado para a vivência de valores que contribuam com mudanças de ordem
moral e cultural [...]; portador de um duplo aspecto educativo, veículo e objeto de educação,
considerando, assim, não apenas as suas possibilidades de descanso e divertimento, mas também
de desenvolvimento pessoal e social (MARCELLINO, 2007, pp. 46 - 47).
Contudo, enquanto “tempo disponível” a ser vivenciado pelo sujeito a partir de vários
conteúdos culturais, o lazer se apresenta de forma contraditória, diversa e adversa, visto que, ora se
constitui no entrelaçado da cultura massa, como um aparato instrumentalizado em beneficio das
lógicas do consumo e da “docilização dos corpos”, ora como um veículo educacional das políticas
públicas, do usufruto dos prazeres e escolhas.
Acerca dessa breve elucidação conceitual, compreendemos que para abarcar a complexidade da estrutura sociocultural relacionada às manifestações e representações do lazer, seus estudos não podem ficar na dependência de uma disciplina exclusiva, como por exemplo, a Educação
Física, área historicamente ligada à temática. Fazem-se necessárias, portanto, as contribuições
teóricas de outras áreas do saber, tais como, Ciências Sociais e Filosofia que procuram investigar
nos imbricados das relações humanas e sociais os “porquês” e os desdobramentos de certas “práticas” e “necessidades” construídas pelo humano.
Desse modo, compreendendo que o escopo da antropologia é o estudo do homem inteiro, nas suas múltiplas dimensões em sociedade e diversidades culturais (LAPLANTINE, 2007),
esse trabalho tem o objetivo de investigar o que processo discursivo de três das principais escolas
antropológicas (evolucionista, culturalista e funcionalista), tem a contribuir para os estudos do
lazer, principalmente, no que se refere à análise dos discursos midiáticos e políticos que tendem
a construir um ideário de lazer padronizado vinculado às lógicas de consumo e à funcionalidade
ideológica do sistema de produção vigente. Cabe ressaltar, portanto, que as formas discursivas
não apenas nos auxiliam a compreender um conjunto de conceitos e ideias inerentes a uma determinada corrente do pensamento, mas também, analisar a intencionalidade e aquilo que está
implícito nos discursos reproduzidos na esfera sociocultural que passam a construir “verdades” e a
sustentar as relações de poder que até mesmo o lazer está sujeito.
Para efeito disso, este trabalho foi efetuado por pesquisa bibliográfica, no Sistema de Bibliotecas da UNIMEP e ferramentas disponíveis na Internet. As obras foram selecionadas por
ordem cronológica e investigadas por análise textual, temática, interpretativa e crítica, (SEVERINO, 1980) sempre abordando o método enquanto abordagem e processo discursivo (BRUYNE et
alli, 1977).
2. AS ESCOLAS ANTROPOLÓGICAS
A antropologia enquanto saber autônomo emerge na Europa, na segunda metade do século XIX, período no qual o homem não é mais visto só como sujeito, mas também como objeto do
saber. Transformações no campo do conhecimento, como a emancipação do pensamento filosófico em relação ao metafísico, e, sobretudo, a predominância das concepções das ciências empíricas
sobre o entendimento bio-psico-social, confluem para rupturas de paradigmas, que além de provocarem um giro epistêmico na conceituação sobre o que é o “homem”, transformam também, as
relações culturais em todas as instâncias no “mundo” ocidental.
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É nesse cenário de transformações que os estudos antropológicos, propõem, mediante
uma visão naturalista, “um novo modo de acesso ao homem, que passa a ser considerado em sua
existência concreta, envolvida nas determinações de seu organismo, de suas relações de produção,
de sua linguagem, de suas instituições, de seus comportamentos” (LAPLANTINE, 2007, p. 55).
Os primeiros antropólogos constituíram a escola evolucionista que obteve como procedimento metodológico a comparação entre as diferentes culturas. Os principais representantes dessa
perspectiva são Henri Morgan (1818 – 1881), James George Frazer (1854 – 1941) e Edward Burnett
Tylor (1832 - 1917).
Embebidos pelo “espírito” progressista do século XIX, principalmente pela ótica cientificista do positivismo e ainda, pelos estudos das ciências biológicas - predominante em termos de
matriz nos saberes da época -, esses antropólogos, compreenderam o processo histórico cultural
hierarquizado em estágios. Esses estágios demarcariam os status de cada sociedade no processo
evolutivo, que por sua vez, desenvolveria como uma “escada” a partir de uma única origem e para
uma finalidade uníssona – o progresso civilizatório.
Os evolucionistas acreditavam no monogenismo das raças, portanto, a humanidade teria
apenas uma trajetória, o que indica em suma, não haver espaço para as diversidades e especificidades culturais. Todas as culturas deveriam obrigatoriamente desenvolver-se pela seguinte ordem
evolutiva: selvageria (período inicial – inferior), barbárie (período intermediário) e civilização
(período final – superior), o que significa consequentemente, “reduzir as diferenças culturais a
estágios históricos de um mesmo caminho evolutivo” (CASTRO, 2009, p. 27)
O norte-americano Lewis Henri Morgan discorreu na obra “Sociedade Primitiva” de 1877
(MORGAN, 1973) que todas as tribos que nunca alcançaram a arte da cerâmica são consideradas
selvagens, e as que nunca alcançaram o alfabeto fonético e o uso da escrita, são classificadas como
bárbaras. Segundo o autor, “os antepassados das tribos gregas, romanas e germânicas passaram pelos estágios que indicamos, e, na metade do último, a luz da história caiu sobre eles” (MORGAN,
1973, p. 29). A partir dessa classificação Morgan (1973) constrói uma concepção antropológica
que pretende legitimar a superioridade das sociedades europeias em relação as demais e afirmar a
ideia de uma cultura enquanto apogeu e referencial.
Em diálogo com essas concepções o escocês James George Frazer (1854 – 1941) no artigo
“O Escopo da Antropologia Social” publicado originalmente em 1909 (CASTRO, 2009), enfatizou que o objetivo da antropologia era “descobrir as leis gerais às quais se possa presumir que
os fatos particulares se conformam” (FRAZER, 2009, p. 103 – 104) independente das variações
climáticas e diferenças biológicas presentes em cada cultura. Os povos considerados “primitivos”
dariam as pistas iniciais para se compreender o processo de desenvolvimento das demais nações
autodenominadas superiores e mais civilizadas. Para tanto, o autor chegou a escrever que o “selvagem é um documento humano, um registro dos esforços do homem para se elevar acima do nível
da besta” (FRAZER, 2009, p. 121).
Por conta desse discurso eurocêntrico Laplantine (2007) ressalta que o objetivo desses antropólogos não era compreender as especificidades e costumes das diversas culturas consideradas
primitivas, mas sim, encontrar os exemplos etnográficos que pudessem “ilustrar o processo grandioso que conduz as sociedades primitivas a se tornarem sociedades civilizadas” (LAPLANTINE,
2007, p. 70). Desse modo, segundo Laplantine (2007, p. 69), “o evolucionismo aparece logo como
justificação teórica de uma prática: o colonialismo”.
Para pesquisadores contemporâneos como Laplantine (2007) e Castro (2009) a antropologia evolucionista é uma “antropologia de gabinete”, pois é um estudo apriorístico baseado em
relatos sem evidência científica e construído através da coleta de informações feita por missionários, comerciantes, viajantes ou observadores superficiais, e não mediante um levantamento
etnográfico empírico junto a cultura e linguagem das sociedades investigadas.
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Nos desdobramentos dos estudos antropológicos desenvolve-se uma abordagem mais complexa - o funcionalismo -, fundamentado metodologicamente na possibilidade de estabelecer uma
relação da análise social ao funcionamento dos sistemas biológicos.
O polonês Bronislaw Malinowski (1884 – 1942) e o inglês Alfred Reginald Radcliffe-Brown (1881 – 1955) representantes dessa leitura, contrariamente dos evolucionistas apresentam uma
perspectiva relativista de cultura e defendem que a antropologia deve ser uma análise decorrente
do contato real com os nativos.
No livro “Uma Teoria Científica da Cultura”, Malinowski (1970) infere que todas as culturas têm como principal denominador comum um conjunto de tipos institucionais (família, a
religião, educação, economia e política), que correspondem a organização e funcionalidade de
uma sociedade. As instituições não só possuem um corpo material, mas também um estatuto legal
e simbólico que se relaciona com as necessidades primárias (biológicas) e derivadas (culturais).
O conceito de cultura para Malinowski (1970, pp. 69 - 70), “deve ser compreendido como
um meio para um fim, isto é, instrumentalmente e funcionalmente”. Nesse sentido, a cultura é
compreendida em relação ao conceito de função, pois se apresenta tal como um aparato instrumental que possibilita o homem a lidar com a hostilidade do ambiente natural e a viver em um
ambiente melhor “através da criação de artefatos, organização em grupos cooperativos e também
do desenvolvimento do conhecimento: do sentido de valor e ética” (MALINOWSKI, 1970, p.
43). Assim, a função sempre atende um imperativo biológico ou cultural, visto que “em todas as
atividades verificamos que o uso de um objeto como parte de um comportamento técnico, legal
ou ritualmente determinado leva os seres humanos a satisfação de alguma necessidade” (MALINOWSKI 1970, p. 144).
Radcliffe-Brown (1881 – 1955) apresenta uma concepção distinta do conceito de função e
discorre que ele é apenas uma hipótese, uma vez que considera que toda a matéria impressa pelos
antropólogos é circunstancial. Além disso, na obra “Estrutura e Função na Sociedade Primitiva”
o autor salienta que a escola funcional nunca existiu e fora um mito inventado irresponsavelmente
por Malinowski. Apesar dessas divergências, suas observações sobre o conceito de função e estrutura nos trazem significativas contribuições para a análise do discurso funcionalista.
O conceito de cultura em Radcliffe-Brown é entendido como “o processo e meio pelo qual
uma pessoa adquire conhecimento, especialidade, ideias, crenças, gostos e sentimentos, mediante
contato com outras pessoas, ou pelo trato com outras coisas, tais como livros ou obras de arte”
(RADCLIFFE-BROWN, 1973, p. 14). Dessa maneira, a cultura seria um sistema social organizado podendo se caracterizar em três conceitos logicamente inter-relacionados: processo, estrutura
e função.
Resumidamente o processo é a própria cultura, a sua estabilidade, reprodução e continuidade. A estrutura se refere a “uma rede de relações socialmente existentes” (RADCLIFFE-BROWN, 1973, p. 20), e que se mantem não por conjunções acidentais entre os indivíduos, mas
por determinações do próprio processo social, isto é, normas, regras e padrões. Por fim, a função
social seria um modo padronizado de agir ou pensar relacionado com a estrutura social.
Na contramão dessas abordagens situa-se a antropologia culturalista que veio a valorizar
todas as formas e especificidades culturais independentemente das condições de sobrevivência ou
linguagem. Nessa linha encontramos o judeu naturalizado norte-americano, Franz Uri Boas (1858
– 1942), considerado o fundador da etnociências e precursor do culturalismo por ser o primeiro a
tratar a palavra cultura no plural. Sua leitura provocou uma descentralização radical sobre o conceito de cultura, sobretudo, uma ruptura com a ideia de centro do mundo, tal como preconizavam
os antropólogos evolucionistas.
Boas (2010) mediante o método particularismo histórico acentua a importância do acesso
à língua da cultura na qual se trabalha, visto que o costume só tem significado se for relacionado
com um contexto particular. Nesse sentido, cada sociedade garante para si a estrutura de uma
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totalidade autônoma e mesmo que seja provável que as culturas se desenvolvam pelas mesmas causas, “as ideias não existem de forma idênticas em toda parte” (BOAS, 2010, p. 27), pois “os mesmos
fenômenos podem se desenvolver por uma multiplicidade de caminhos” (BOAS, 2010, p. 30). É a
partir desse referencial que o autor desconstrói o método comparativo do evolucionismo e ressalta
que o que há de natural na espécie humana é a sua aptidão à variação cultural.
O estadunidense Clifford James Geertz (1926 – 2006) influenciado por Boas apresenta
uma abordagem semiótica da cultura e defende que a antropologia é uma análise etnográfica densa e interpretativa. Tal como Max Weber, o autor acredita que “o homem é um animal amarrado a
teias de significados que ele mesmo teceu” (GEERTZ, 1989, p. 15). Desse modo, para o autor o trabalho do antropólogo é similar ao de um decifrador de códigos, ou ainda, semelhante a um crítico
literário, que determina a base social e importância da obra sem estabelecer critérios valorativos.
Seguindo essa lógica Geertz (1989) define que há quatro características da descrição etnográfica:
1. Ela é interpretativa; 2. O que ela interpreta é o fluxo do discurso social; 3. A Interpretação
envolvida consiste em tentar salvar o “dito” e fixa-lo em formas pesquisáveis; 4. A descrição é
microscópica. De um modo geral, a abordagem antropológica de Geertz pretende captar no entrelaçado dos jogos simbólicos do comportamento, ou seja, no fluxo da ação social, os significantes
e os significados que determinam as formas culturais, para que a partir delas possibilitemos “um
alargamento do universo do discurso humano” (GEERTZ, 1989, p. 24) que venha “fornecer um
vocabulário no qual possa ser expresso o que o ato simbólico tem a dizer sobre ele mesmo – isto é,
sobre o papel da cultura na vida humana” (GEERTZ, 1989, p. 38).
3.RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
O discurso evolucionista caracterizado por uma concepção hegemônica e homogênea de
cultura alimenta os ideais elitistas, bem como, as práticas de segregação social que também podem
ser diagnosticas através do lazer. Assim, no que tange essa problemática, podemos ressaltar que
nas áreas de interesses intelectuais e artísticos como as bibliotecas, museus, galerias de artes e
teatros, frequentemente a participação é dificultada para as pessoas com menos condições financeiras, uma vez que o acesso é inibido pelo “ar de santuário de que se revestem as construções e
sua sistemática de utilização, talvez porque, e até principalmente, por não serem mantidos pelo
poder público” (MARCELLINO, 2007, p. 55).
Observamos ainda, que algumas instituições de fomento e desenvolvimento do lazer reproduzem o que podemos nomear de “lazer de gabinete”, ao passo que pretensiosamente inserem
pacotes de atividades e constroem áreas de recreação sem consultar as especificidades das determinadas comunidades que virão a usufruir desses recursos. Isso nos leva a questionar quem determina o que é lazer, para quem o lazer é destinado e o que significará essas atividades para uma
dada comunidade. Na medida em que se padroniza o que é lazer aprioristicamente, reduz as possibilidades de experiências e o reconhecimento dos diversos conteúdos culturais de manifestações
nos diferentes grupos sociais. Sobre essas questões Cavalleiro & Salgado (1996, p. 109) discorrem,
No campo da difusão cultural, uma das ações que comumente encontramos são os “pacotes”
de lazer, onde em alguns casos, a cultura do lazer é reduzida, ou ao supérfluo (se justificando
exclusivamente pelo divertimento) ou aos padrões do mercado, ou melhor, da indústria cultural.
A abordagem funcionalista nos ajuda a compreender a funcionalidade do lazer a partir de
três representações: O lazer enquanto mercadoria; o lazer compensatório e moralizante e o lazer
reinventivo. A primeira se enquadra nos discursos mercadológicos que fazem do lazer um aparato
instrumentalizado em benefício da lógica estrutural do capitalismo, cuja função é dar vazão ao
consumo, já que é no “tempo disponível” que o sujeito está susceptível ao engodo midiático e fetichista dos produtos comerciais. Portanto, a partir desse aspecto o lazer como função social seria
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um modo padronizado de agir ou pensar relacionado com a estrutura social do capitalismo. Na
segunda representação, podemos compreender o lazer funcionalmente como “válvula de escape”
que transforma a rotina do trabalho mais suportável e, consequentemente, dociliza os indivíduos
silenciando as tensões que permeiam os âmbitos subjetivos e sociais. Como bem aponta Marcellino (2010) a visão funcionalista do lazer se opõe em primeira instância ao ócio, no sentido
de “parar para pensar”, o que evita a tensão existencial que “seria necessária para a percepção da
problemática individual e social” (Marcellino, 2010, p. 36). Na terceira possibilidade de representação funcional, podemos repensar a função do lazer resignificada pelo próprio sujeito da ação. Na
medida em que a função atende uma necessidade, podemos fazer do “tempo disponível” um espaço criativo para o seu desenvolvimento sociocultural e ético. Sendo o lazer o “tempo disponível”,
é neste “tempo” em que há a possibilidade de o sujeito construir sentido e formas que o permita
compreender a si mesmo e aquilo que o circunda.
Acerca da perspectiva particularista e interpretativa presente no discurso culturalista, percebemos a necessidade de compreender as especificidades culturais das diversas localidades e/ou
comunidades que usufruem das políticas públicas concernentes ao lazer. Nesse sentido, os projetos
de lazer só podem ter êxito social, se os profissionais que atuam na área fizerem uma análise densa
das comunidades, penetrando empiricamente na vivência e no campo de significações. Em primeiro lugar devemos nos questionar: O que irá definir um projeto de lazer em uma comunidade
“x”? A partir de qual referencial e experiências os profissionais irão inserir um pacote de atividades
e construir um espaço de recreação? Essas conclusões têm sentido e significarão algo para a região
que virá a usufruir desses espaços e ações? Seria como trabalhar na investida interpretativa, mas
democrática valorizando as singularidades e as múltiplas lógicas de sobrevivência e experiência.
Concluindo, seria acima de tudo, construir um lazer a partir do próprio autor da manifestação
cultural, visto que a espécie de material produzido por um trabalho de campo junto ao um grupo
pessoas, só pode adquirir atualidade sensível na medida em que possibilita o “pensar não apenas
realista e concretamente sobre eles, mas, o que é mais importante, criativa e imaginativamente
com eles” (GEERTZ, 1989, pp. 33 - 34).
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MALINOWSKI, Bronislaw. Uma Teoria Científica da Cultura. Rio de Janeiro, Zahar, 1970.
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SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo, Cortez, 1993.
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UMA REFLEXÃO SOBRE OS LIMITES E POSSIBILIDADES CONCERNENTES AO
LAZER E AO PATRIMÔNIO CULTURAL: UM OLHAR SOBRE OS MUSEUS
Romilda Aparecida Lopes64
Edwaldo Sérgio dos Anjos Júnior65
RESUMO: Este trabalho, de caráter teórico-reflexivo, visa discutir as relações entre o patrimônio e o lazer na contemporaneidade, tomando como escopo o museu, um equipamento cultural
relevante para a vivência do lazer. A presente investigação se justifica por compreendermos que,
embora o lazer se faça valer cada vez mais de bens culturais, em alguns casos reconhecidos como
“patrimônios culturais”, é possível, ainda, explorar melhor as relações entre ambos os termos, suas
limitações e possibilidades. O procedimento metodológico adotado por excelência foi a revisão
bibliográfica, pautada principalmente em livros e artigos que abordem os eixos temáticos abordados nesta pesquisa, como lazer, patrimônio e museus. Por fim, vislumbra-se um campo de atuação
do museu como espaço multifacetado de lazer. Contudo, isso não se dará sem o devido preparo
dos animadores socioculturais, bem como uma reflexão acerca do próprio conceito de patrimônio
cultural.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Patrimônio Cultural. Museus.
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho, de caráter teórico-reflexivo, visa discutir as relações entre o patrimônio e
o lazer na contemporaneidade, tomando como escopo o museu, um dos equipamentos culturais
relevantes para a vivência atual do lazer, mormente em sua faceta artística-cultural. Importa delinear que, para alcançar o objetivo proposto, lançou-se mão, neste paper, de uma breve revisão
bibliográfica acerca dos seguintes eixos temáticos: lazer, patrimônio e museus.
A presente investigação se justifica por compreendermos que, embora o lazer se faça valer
cada vez mais de bens culturais, é possível, ainda, explorar melhor as relações entre ambos os termos, suas limitações e possibilidades. Ademais, acreditamos que este trabalho pode, dentre outros
fins, contribuir para a reflexão acerca do papel, limitações e desafios das instituições museológicas, mormente aquelas ligadas ao turismo, além de possibilitar a otimização de áreas típicas de
um espaço museal, como a exposição permanente, a captação de público e os eventos/exposições
temporárias.
Quanto à metodologia utilizada nesta investigação, algumas observações se fazem necessárias. O procedimento metodológico adotado por excelência foi a revisão bibliográfica, pautada
principalmente em livros e artigos que abordem os eixos temáticos abordados nesta pesquisa, a
saber: para discutir a relação entre lazer e turismo, haja vista que o patrimônio é comumentemente ligado à atividade turística, sendo esta prática entendida aqui como um dos seis conteúdos do
lazer; no que tange à temática do lazer, utilizamos, dentre outros, Dumazedier (1979), que aborda
as relações entre o lazer e as outras esferas da vida, como a religião, a família e o trabalho. Ainda
64 Bacharel em Turismo pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Funcionária do Museu Ferroviário de Juiz de Fora. E-mail:
[email protected].
65 Mestre em Cultura & Turismo pela Universidade Estadual de Santa Cruz, Bahia (UESC). Professor Assistente do Departamento de Turismo da Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: edwaldo.anjos@ufjf,edu.br.
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sobre essa temática, utilizamos as contribuições de Marcellino (2007) e Gomes (2004). Se o primeiro entende o lazer como algo vivenciado no tempo disponível, relacionando-o ao planejamento
e às políticas de lazer, Gomes (2004) apresenta que o lazer é compreendido como dimensão da
cultura construída socialmente; para a discussão de patrimônio histórico-cultural e museus optamos por utilizar autores, como Castriota (2009), que discute a relação entre cultura e patrimônio
histórico-cultural, além de ressaltar a importância do entendimento mais ampliado desses termos;
já para a discussão acerca de museus, utilizamos Costa (2006), que realiza um estudo acerca dos
princípios da museologia, e Leite (2005), que debate as relações de democratização de espaços
como os museus.
Este documento está organizado em três partes. A introdução apresenta aspectos gerais
sobre trabalho, destacando sua natureza, objetivo, justificativa e metodologia empregada, além
de apresentar a estruturação do texto. Em seguida será feita uma breve contextualização teórica
acerca dos temas lazer; patrimônio histórico-cultural e museus. Após estas etapas, apontar-se-á as
principais considerações passíveis de serem extraídas da discussão aqui proposta.
2. DIÁLOGO TEÓRICO ENTRE LAZER E PATRIMÔNIO: LIMITES E POSSIBILIDADES
TOMANDO COMO ESCOPO OS MUSEUS
Nesta seção, em um primeiro momento, a investigação tangencia para uma análise acerca
do lazer, buscando salientar a importância de se entender esse fenômenos social de forma mais
abrangente e profunda. Em seguida, passar-se-á ao debate acerca da importância da vivência autônoma do tempo disponível para a preservação do patrimônio, bem como as limitações de sua
prática, como, por exemplo, a desigualdade quanto à distribuição dos equipamentos de lazer.
Nessa conjuntura, entende-se que o aprofundamento dos estudos relacionando lazer e
patrimônio cultural é de fundamental importância para uma melhor vivência do lazer nesses
equipamentos culturais, especialmente, aqueles de natureza pública, que, no fim do século XIX,
começam a estruturarem-se como locais de maior visibilidade e crescente interesse. Um exemplo
dessa tendência são os museus, que, desde o século passado, vêm ganhando maior notoriedade,
sendo empregados, em muitos casos, como um local propício para o aprendizado, podendo ser empreendidos como um espaço de obtenção de conhecimentos outros, um anseio esse dos partícipes
de vivências de tempo disponível. Ainda podem ser compreendidos como esferas importantes para
a participação social sendo convertidos em locais de interpretação e de novas leituras de mundo.
2.1. NOTAS SOBRE O LAZER: REFLEXÕES, POSSIBILIDADES E PROBLEMAS.
O lazer pode contribuir no processo de valorização e preservação do patrimônio cumprindo importante papel, também, na revitalização dos espaços e equipamentos, colaborando de
maneira significativa para uma vivência mais rica da cidade.
O sociólogo francês Joffre Dumazedier (1979, p.91) aponta essa prática como um tempo
livre das obrigações institucionais elementares (trabalho, família, sócio espiritual e sócio- política),
e que tem como premissas fundamentais (1979, p.94): i) o caráter liberatório, no qual o indivíduo
tem o livre arbítrio de escolher a que se dedicar, já que está usufruindo seu tempo disponível das
obrigações; ii) o caráter desinteressado, uma vez que o lazer não está fundamentalmente ligado
a nenhum fim lucrativo, ideológico ou proselítistico; iii)o caráter hedonístico, o objetivo do indivíduo é atingir um estado de satisfação; iv) caráter pessoal, em que o sujeito busca atender suas
próprias necessidades.
Dumazedier afirma ainda (1979, p.92) que, além do divertimento e do descanso, que são
componentes evidenciados por Marcellino (1996, p.24), o lazer propicia, também, o desenvolvimento pessoal e social, através de atividades correlacionadas aos cinco conteúdos culturais por ele
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categorizados em sua pesquisa, como os interesses físicos, os práticos, os artísticos, aqueles ligados
ao intelecto e os de ordem social. Porém, Marcellino (1996, p.17), em seus estudos posteriores,
adiciona, ainda, um sexto interesse, o turístico, como já dito anteriormente.
Contudo, Marcellino (1987) analisa que, apesar da polêmica sobre o conceito, a tendência
atual entre alguns estudiosos do lazer é analisá-lo, pelo menos, sob dois aspectos - tempo e atitude.
Caracterizado, portanto, como uma atividade de escolha individual, praticada no tempo disponível e que proporcione um descanso físico ou mental, o divertimento, o desenvolvimento pessoal
e social. Analisando dessa forma, o conteúdo das atividades de lazer é amplo, englobando vários
interesses. Segundo o autor, o lazer pode ser entendido:
[...] como a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou
fruída), no “tempo disponível”. É fundamental como traço definidor o caráter “desinteressado”
dessa vivência. Não se busca, pelo menos basicamente, outra recompensa além da satisfação
provocada pela situação. A “disponibilidade de tempo” significa possibilidade de opção pela
atividade prática ou contemplativa (MARCELLINO, 2005, p.28).
Como visto no excerto acima, o lazer possui como uma das especificidades concretas,
na atualidade, a reivindicação social, ou seja, é uma vivência que, por intermédio da cidadania
e da participação cultural, é capaz de evocar, no sujeito, atitudes críticas e criativas. Essas ações
seriam capazes de promover uma renovação democrática e humanista da cultura e da sociedade,
buscando não só a instauração de uma nova ordem social, mas de uma nova concepção cultural.
Ele pode vir a ser uma importante ferramenta educacional, estimuladora de competências, e um
instrumento ativo de mobilização e participação cultural, sendo capaz de transpor barreiras socioculturais e de proporcionar uma melhoria na qualidade de vida (MARCELLINO, 1996, p.4).
Ao se debater o lazer e suas relações com o espaço urbano, um tema inerente ao debate
diz respeito à má distribuição de equipamentos culturais de lazer pela cidade, um dos desafios a
serem assumidos sob este aspecto pelas políticas de lazer e cultura. Essa perspectiva ganha uma
conotação ainda mais relevante considerando que, no Brasil, identifica-se grande desigualdade na
distribuição desse tipo de equipamentos.
É possível perceber que, de maneira geral, a estrutura das cidades não está voltada para as
necessidades de lazer de seus habitantes. Marcellino (2008) e Gonçalves (2006) apresentam que
as grandes cidades não possuem espaços de lazer suficientes, o que gera um distanciamento dos
cidadãos de suas cidades, sem que estes criem relações de afeto e pertencimento com seu local de
moradia, incidindo com maior frequência nas regiões periféricas dos municípios.
A democratização do acesso a outras realidades histórico-culturais da cidade faz com que
o cidadão se desloque de seu espaço para a realização de atividades culturais, apreciando e valorizando esse patrimônio, e, desencadeando, dessa forma, um processo de sensibilização da população. Essa medida pode possibilitar um maior aprendizado sobre a própria história da cidade,
bem como despertar o seu interesse, fazendo com que o cidadão proteja o seu patrimônio e queira
compartilhar com os visitantes essa aura, esse olhar não rotineiro (MOESCH, apud MARCELLINO, 2007, p. 23).
Assim, o entendimento correto acerca do lazer é de suma importância para o planejamento das ações e para a democratização dos espaços de lazer. Para isso, é necessária, dentre outros
fatores, a formação dos gestores, animadores que dominem a área e suas interfaces, sendo formado
por profissionais de competência específica que dominem pelo menos um dos seis conteúdos que
o lazer abarca. Segundo Isayama (2000, p.96), são necessários profissionais que sejam criativos, reflexivos, pesquisadores, articuladores, interdisciplinares, mas que, sobretudo, possuam um conhecimento teórico acerca do lazer e que saibam aliá-lo à realidade local, diferentemente da realidade
encontrada junto ao poder público no Brasil66.
66 Dumazedier (1975) propõe uma estrutura de animação, em forma de uma pirâmide, com três divisões, a saber i) o
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2.2. REVISITANDO A NOÇÃO DE PATRIMÔNIO E SUAS INTERFACES COM O LAZER
Para compreender melhor os museus, se torna necessário entender o significado do patrimônio histórico-cultural. Tal conceito, segundo Castriota (2009, p.61), pressupõe uma relação
reflexiva com o passado e a tradição. O autor sustenta o posicionamento de Choay, que defende a
emergência do patrimônio com a emersão da modernidade, apresentando a noção e a trajetória do
pensamento e das políticas de patrimônio desenvolvidas desde o século XVIII, através da distinção entre “monumento” e “monumento histórico”, que, de acordo com a autora, é uma “invenção”
moderna e europeia, recuperando uma intuição de Alois Riegl, que, no início do século XX, já
fazia esta distinção. Enfim,
A criação e a conservação de tais monumentos “intencionais”, dos quais se encontram traços
até nas épocas mais antigas da cultura humana, não cessaram até os nossos dias; não obstante,
quando falamos do culto e da proteção moderna dos monumentos, não pensamos nos monumentos ‘intencionais’, mas nos ‘monumentos históricos e artísticos’, como reza a denominação
oficial até hoje (CASTRIOTA, 2009, p.61).
Por outro lado, Marcellino (2007) considera que a falsa noção de memória cultural era
difundida até pouco tempo apresentando um sentido muito restrito e permeada pela ideologia dominante. Segundo o autor, essa noção estava ligada ao conceito clássico de patrimônio histórico e
artístico, tal como definido no decreto de criação do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional. Assim, o Decreto-Lei n.25, de 30/11/1937, no seu artigo 1°, definia como patrimônio
artístico nacional:
[...] o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse
público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico ou artístico (MARCELLINO, 2007, p.17).
Faz-se necessário considerar que, atualmente, se torna possível perceber um avanço significativo no conceito de patrimônio, visto que a ideia de monumentalidade e de singularidade são
superadas. Além disso, se reconhece a cultura como processo vivo e as possibilidades patrimoniais
para além da arte e da arquitetura, que, segundo Marcellino (2007), proporcionaram o surgimento
do conceito de Patrimônio Ambiental Urbano, constituído por espaços que transcendem a obra
isolada e que caracterizam as cidades, pelo seu valor histórico, social, cultural, formal, técnico ou
afetivo, dando, assim, possibilidades para a ação no campo do lazer:
[...] a noção mais recente reconhece antes o valor representativo dos aspectos históricos, sociais,
culturais, formais, técnicos, afetivos dos elementos como critérios para sua inclusão no programa
de preservação e revitalização do patrimônio ambiental urbano (SEPLAN, apud MACELLINO,
2007, p.20).
Essa noção mais abrangente dos bens/manifestações relevantes, dignas de atenção e resguardo possibilita, como é defendido por Marcellino (2004, p.170), que o lazer possa contribuir, de
forma prazerosa, no processo de valorização e preservação desse mesmo patrimônio, desde que este
seja entendido não apenas como mero item da indústria cultural. Pelo seu duplo processo educatitopo da pirâmide estariam os animadores profissionais, que devem possuir uma sólida cultura geral, além de ter noções
administrativas, coordenando e supervisionando os projetos; ii) no meio da pirâmide estariam os animadores de
competência específica, que dominam as técnicas das atividades de lazer dos mais diversos conteúdos, sendo responsáveis
pela execução e avaliação das ações, podendo auxiliar no planejamento das mesmas também; iii) na base, estariam
os animadores voluntários, que vão fazer uma promoção sociocultural do meio pelo meio (DUMAZEDIER apud
DELGADO,2003, p.30).
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vo (MARCELLINO, 2004), como objeto e veículo de educação (educação pelo lazer), o lazer pode
contribuir na Educação Patrimonial, que, segundo definição do Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional – IPHAN, seria um processo que objetiva envolver a comunidade na questão
do patrimônio, pelo qual ela também é responsável, levando-a a apropriar-se e a usufruir os bens
e valores que o constituem, realizando, dessa forma, uma “alfabetização cultural”, capacitando-a a
ler e compreender o mundo ao qual ela está inserida e os processos culturais humanos (HORTA;
GRUNBERG; MONTEIRO, 1999).
2.3. O MUSEU COMO ESPAÇO PRIVILEGIADO DE LAZER
Contextualizando a discussão proposta nesta seção, que debate as relações entre patrimônio e lazer, é relevante considerar que os museus67 podem proporcionar um contraste importante
com as viagens, pois neles as pessoas “viajam” pequenas distâncias para vivenciar a cultura, a
geografia e o tempo de uma determinada época, enquanto os turistas contemporâneos frequentemente viajam grandes distâncias, em curtos espaços de tempo, para experimentar a “alteridade”
de uma maneira mais intensa e dramática. Mas ambas as possibilidades são maneiras organizadas
de explorar realidades diferentes, bem como conhecer práticas de um “outro”.
Essa forma distinta de lazer nos traz experiências prazerosas, diferentes das que nos deparamos no cotidiano. Além de vivenciá-lo, possibilita a difusão de um olhar de interesse sobre
as vivências de uma determinada época, gerando a curiosidade no espectador sobre o ambiente.
Nessa linha de raciocínio, embora agora pensando os espaços museológicos, os museus
também podem ser entendidos como referências para a compreensão da trajetória humana, embora, ao apresentar suas coleções, possivelmente dão a perceber as bases ideológicas ali postas. Nesse
ínterim, Costa (1994, p. 44) assinala que:
O que possibilita um objeto deixar sua função utilitária, ser resguardado do perecimento e da
deterioração, passar a constituir parte de uma coleção particular e, finalmente, se transformar
em patrimônio público e memória coletiva é sua função simbólica, sua capacidade de portar
significados e constituir identidade.
Contudo, um elemento básico para o êxito do museu como espaço de lazer se deve antes
ao espaço físico, mas a forma pela qual o seu acervo está disposto e é apresentado. Nesse ínterim,
surgem as técnicas de interpretação do patrimônio, dente as quais a visita guiada, cujo objetivo é
entreter e inspirar novas atitudes junto ao visitante, pois, para Murta e Albano (2005, p.14), mais
que informar, interpretar é revelar significados, é provocar emoções, é estimular a curiosidade. Enfim, a visita guiada pode ser, assim como outros meios de interpretar o patrimônio, uma amostra
da necessidade dos museus se repensarem. Enfim,
O público chega ao museu com diferentes níveis de possibilidades de compreender os temas
apresentados, ou seja, com suas redes cotidianas de conhecimentos parcialmente tecidas e abertas à incorporação de outros novos fios. Os fatores sociais e as expectativas pessoais dos diferentes visitantes contribuem para a significação que eles darão às narrativas museais. Por esse
motivo, a pedagogia deve contemplar todos estes aspectos, a fim de que se estabeleça um vínculo
entre museu e visitante.
67 Aqui entendidos como espaços híbridos, com sentidos e funções diferentes, isto é, passível de apropriações multifacetadas
do espaço. Ex: Espaço do museu é reapropriado mediante práticas, projetos e ações de maneira diferente simbolicamente
pelas crianças, passando a ser talvez uma espécie de parque. Fisicamente, o espaço é o mesmo, mas o sentido atribuído a
ele se modifica, o que não quer dizer que ele perde a sua função original, mas agrega outras, antes complementares do que
excludentes.
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Para tal, é necessário que o museu esteja aberto à negociação com o público. As exposições não
devem ser um simples conjunto de ilustrações e a relação com o público deve se fazer por meio
de uma construção na qual os termos ilustrar, demonstrar e completar não devem ser lidos de
forma mecânica, e sim interpretados a partir de concepções voltadas à compreensão, negociação e parceria, em uma interação do sujeito com o objeto do conhecimento (VALENTE apud
FONSECA 2009, p.5).
Certamente, o contato com os objetos que compõem a coleção facilita o acesso das pessoas
aos museus, entendendo-os como lugares de cultura. Dessa forma, percebe-se que os museus e suas
exposições podem ser lugares de encontro de gerações, de memórias, de identidades, enfim, de
cultura68, lugares de se reconhecer e conhecer o outro, lugares de encantamento, de poesia e de
conhecimento, portanto, lugares onde identidades culturais podem ser reconhecidas e identificadas, em que a produção da diferença se evidencia sem que o “outro” seja o diferente. Esses lugares
não guardam apenas um conjunto de elementos de valor cultural, mas sim são resultado da relação
do homem com o seu espaço-tempo (REDDIG e LEITE, 2007, p.36). Leite (2006, p.75) ressalta
ainda que os museus não apenas exercem o papel da guarda, mas têm vocação para investigar,
documentar e comunicar-se. Além disso, entende-se que os museus também são “espaços de produção de conhecimento e oportunidades de lazer” e que “seus acervos e exposições favorecem a
construção social da memória e a percepção crítica da sociedade” (LEITE, 2006, p. 75).
Por último, lembrar-se-á de Santana (2009), que reforça que as pessoas e/ou grupos sociais
selecionam momentos e elementos determinados e deixam outros de lado, conferindo a estes
conteúdos mais ou menos esquemáticos ou complexos, não sendo necessária a conectividade dos
episódios no tempo passado. Para ele, o local ou o fato patrimonial podem variar de significado
conforme múltiplos interesses e condições, relativos à dinâmica sociocultural de cada lugar, realçando a importância de entender o patrimônio cultural de uma forma mais abrangente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É correto afirmar que a democratização dos equipamentos culturais, como os museus,
pelo lazer contribui, cada vez mais, para a valorização e a preservação do patrimônio, apoiando a
revitalização dos espaços e equipamentos. Além disso, é uma ferramenta que contribui para uma
vivência mais rica da cidade e das culturas capaz de educar, estimular competências, se tornando
instrumento para a mobilização social e a participação cultural, gerando novas atitudes nas pessoas, cada vez mais críticas, reflexivas, criativas e abertas à alteridade.
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68 O patrimônio, enquanto expressão cultural, é que vai construir os costumes, a política, os interesses econômicos e as características do lugar, como explica Leff no seguinte excerto: “A cultura, entendida como as formas de organização simbólica
do gênero humano remete a um conjunto de valores, formações ideológicas e sistemas de significação, que orientam o
desenvolvimento técnico e as práticas produtivas, e que definem os diversos estilos de vida das populações humanas no
processo de assimilação e transformação da natureza” (LEFF, 2000, p.123).
138
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DESAFIOS E OPERACIONALIZAÇÃO DE UMA VIVÊNCIA DE LAZER
ENRIQUECEDORA: O CASO DAS VISITAS GUIADAS DO MUSEU FERROVIÁRIO,
DE JUIZ DE FORA, MINAS GERAIS, SOB A ÓTICA DE UMA TRABALHADORA
Romilda Aparecida Lopes69
RESUMO: Com este estudo, propus descrever a minha vivência enquanto monitora junto ao
Museu Ferroviário-Estação Arte, instituição localizada em Juiz de Fora, Minas Gerais. Trata-se de
um documento descritivo de minha experiência, evidenciando alguns métodos e técnicas utilizadas durante a monitoria, além de conter uma breve reflexão acerca dos desafios de um animador
sociocultural, papel que julgo ter desempenhado. Espera-se, com este estudo, contribuir para a reflexão sobre o papel do animador sociocultural em um equipamento cultural ligado à preservação
do patrimônio e vinculado ao tema do lazer. Por último, constata-se que os trabalhadores de um
museu, quando imbuídos dos pressupostos que embasam a animação cultural, podem fomentar
uma visita mais enriquecedora para o visitante, ou, no mínimo, uma experiência de lazer mais
educativa.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Animador Sociocultural. Museu Ferroviário-Estação Arte.
1. INTRODUÇÃO
O presente relato de experiência apresenta a descrição de algumas atividades e ações
desenvolvidas durante o estágio profissionalizante no Museu Ferroviário/Estação Arte – MF/EA,
instituição localizada em Juiz de Fora, Minas Gerais. Através deste documento, almejamos não
só descrever a minha vivência enquanto monitora de um museu, mas também apresentar as vivências e os desafios ligados à gestão de um equipamento de lazer, bem como expor as ações
socioculturais realizadas pelo MF/EA70, em parceria com a Fundação Cultural Alfredo Ferreira
Lage - Funalfa71, visto que a utilização do Patrimônio Cultural pelo lazer durante é cada vez mais
crescente na contemporaneidade. Posto isto, acredito que este documento pode vir a contribuir
para a reflexão acerca do papel, limitações e desafios de um animador sociocultural, função que
exerci enquanto monitora.
Importa destacar que, para melhor contextualização do tema abordado neste documento,
optou-se por conceber o lazer como:
[...] como a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou
fruída), no “tempo disponível”. É fundamental como traço definidor o caráter “desinteressado”
69 Bacharel em Turismo pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Funcionária do Museu Ferroviário de Juiz de Fora. E-mail:
[email protected]
70 Desde 2011, realizo atividades de monitoria, planejamento, produção e participação em projetos e eventos culturais realizados pelo museu e a FUNALFA, participação no Correio da Estação, informativo on line do MF-EA, além de realizar,
mensalmente, junto à outra estagiária, a pesquisa do perfil de público que frequenta o museu.
71 Instituída através da lei 5.471, em 14 de setembro de 1978, passou a ser a primeira fundação municipal responsável por
cultura a ser criada no Estado de Minas Gerais. Hoje, além de responder pela política cultural do município, a Funalfa
administra espaços de grande importância: a Biblioteca Municipal Murilo Mendes, o Centro Cultural Bernardo Mascarenhas, o Museu Ferroviário e o Anfiteatro João Carriço. (FUNALFA, 2005).
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dessa vivência. Não se busca, pelo menos basicamente, outra recompensa além da satisfação
provocada pela situação. A “disponibilidade de tempo” significa possibilidade de opção pela
atividade prática ou contemplativa (MARCELLINO, 2007, p.28).
Como visto no excerto acima, o lazer possui como uma das especificidades concretas, na
atualidade, a reivindicação social, ou seja, é uma vivência que, por intermédio da cidadania e da
participação cultural, é capaz de evocar, no sujeito, atitudes críticas e criativas. Assim, ele pode vir
a ser uma importante ferramenta educacional, estimuladora de competências, e um instrumento
de mobilização e participação cultural, sendo capaz de transpor barreiras socioculturais e de proporcionar uma melhoria na qualidade de vida, como apontado por Marcellino (1996, p.4). Nesse
sentido, há adesão entre os postulados supracitados e as tarefas desencadeadas por mim enquanto
monitora/animadora, tal como veremos adiante.
Posto isso, o entendimento correto acerca do lazer é de suma importância para o planejamento das ações e para a democratização dos espaços de lazer. Para isso, é necessário que os
gestores, nesse caso animadores de conhecimento geral, dominem a área de atuação do espaço e
conte com uma equipe formada por profissionais de competência específica que dominem pelo
menos um dos seis conteúdos que o lazer abarca. Enfim, segundo Isayama (2000, p.96), são necessários profissionais, nestes setores, que sejam criativos, reflexivos, pesquisadores, articuladores,
interdisciplinares, mas que, sobretudo, possuam um conhecimento teórico acerco do que é o lazer
e que saibam aliá-lo à realidade local, diferentemente da realidade encontrada junto ao poder
público no Brasil.
Marcellino (2007, p.27) assevera que, há muito que ser feito na área de formação de profissionais na área de lazer para que a situação atual seja modificada e que a animação sociocultural
pode ser empreendida como forma de planejamento para intervenções pedagógicas durante as
práticas de lazer, fazendo com que este se torne fator de promoção da saúde e qualidade de vida.
Além disso, essa reflexão não só se tornou uma espécie de guia e alerta de minhas práticas, mas
nos leva a refletir que o profissional precisa alicerçar o seu trabalho na vontade social e no compromisso político-pedagógico de promover mudanças nos planos cultural e social.
2. CONHECENDO O MUSEU FERROVIÁRIO/ESTAÇÃO ARTE – MF/EA
O Museu Ferroviário/Estação Arte de Juiz de Fora – M.F/E.A – JF foi criado em 1985,
inicialmente apenas como Núcleo Histórico Ferroviário, cujo principal objetivo era a preservação
do patrimônio ferroviário e que, após a extinção da Rede Ferroviária Federal da Sociedade Anônima – RFFSA, ficou abandonado. O núcleo foi criado na antiga Estação da Estrada de Ferro
Leopoldina, que inicialmente serviu como um depósito, em que as peças, recolhidas em antigas
estações desativadas, eram armazenadas.
Em 2003, três anos após o convênio firmado entre a RFFSA junto à Prefeitura Municipal
de Juiz de Fora e à FUNALFA, que se deu o tombamento do prédio e das peças, pela municipalidade e pelo Instituo Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – IEPHA,
favorecendo para que o espaço recebesse o título de Museu Ferroviário72.
72 O Museu Ferroviário/ Estação Arte conta com um espaço museulógico composto por aproximadamente 400 peças, possuindo locomotivas, placas de tráfego, mobiliário, relógios, louças, miniaturas, instrumentos de trabalho e de comunicação, sendo distribuído em cinco salas temáticas, acompanhado de painéis didáticos que enriquecem a compreensão da
sua importância histórica. Além de revistas, livros e cerca de 800 fitas em VHS que tratam a temática da ferrovia. Além
deste espaço, existe um anexo, a Estação Arte, composta por um anfiteatro de aproximadamente 75 lugares e uma sala
multimeios, abriga a demanda de grupos que necessitam de um lugar para expressões artísticas, lazer e entretenimento
cultural. O MF/EA, inicialmente criado com o objetivo de resgatar a história e os costumes dos tempos da Maria Fumaça,
e pautado em práticas museológicas tradicionais, como de diversos museus, se tornou referência para o resgate da memória
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3. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS: UM REFLEXÃO SOBRE A MONITORIA
Esta seção tem o objetivo de fazer uma reflexão acerca das funções que desenvolvi enquanto monitora durante o estágio. O monitor, entendido como um animador sociocultural específico,
é o mediador entre o público e o museu, se tornando o anfitrião e o porta-voz do museu. Durante
o período de monitoria no Museu Ferroviário/Estação Arte foram desenvolvidas atividades de
agendamento de visitas orientadas e preparação e organização de visitas guiadas de acordo com
o perfil de cada grupo (faixa etária, interesse pelo assunto, grupo escolar etc...), documentação,
atendimento ao público e pesquisa constante.
Aliás, é preciso abrir um parêntese aqui, pois, antes do relato avançar, é preciso considerar
a natureza da animação cultural. Nesse sentido, Marcellino (1986, p.61) entende animação cultural como: “[...] a atividade desenvolvida por profissionais ou amadores que dominem pelo menos
um setor cultural e que tenham como característica adicional uma consciência social que os impele a querer difundir esse seu bem cultural”. Ele ainda acrescenta que os profissionais, denominados
de animadores socioculturais, devem atuar com base na participação cultural, contribuindo para
“os níveis culturais conformistas sejam superados e que a prática de atividades de lazer se transforme em participação efetiva” (MARCELLINO, 1986, p.62).
Nesse sentido, há afinidade com a compreensão que detemos acerca do monitor, afinal de
contas,
O monitor é um trabalhador (voluntário ou profissional) que desempenha uma função fundamentalmente dinamizadora nos grupos onde intervêm, que utiliza seus conhecimentos, aplica
seus métodos e estratégias que ajudam ao desenvolvimento do grupo e individual de seus componentes (VENTOSA, 1998, p. 260).
É possível perceber o monitor e/ou animador sociocultural precisam proporcionar ao visitante a interpretação do lugar, das peças e contextualizar a época em que foram utilizados aqueles objetos e por que tais artefatos são importantes para a construção da memória cultural e da
história. O animador sociocultural, como aponta Marcellino (2007, p.27), deve dominar, assim,
o conteúdo cultural para que ele possa dividir esse conhecimento com outras pessoas, devendo,
para isso, possuir uma cultura sólida geral, exercer quotidianamente o compromisso político com
a mudança da situação em que nos encontramos. O animador sociocultural, no papel de monitor
em instituição cultural precisa discorrer sobre diversos temas e será ele que incentiva a participação e o contato maior do visitante com o espaço, fazendo com que esse se sinta parte da história
do acervo, realçando a necessidade da preservação e induzindo a reflexão.
O estágio proporcionou que eu entendesse que cada tipo de público interpreta as informações recebidas de formas diferentes. Assim, tive que adaptar o discurso acerca das peças
para estimular a fluência dessas reflexões, estimulando a curiosidade dos visitantes, através das
vivências dos espectadores, tornando a visita guiada algo mais enriquecedor para a pessoa. Ao
invés de apenas repetir dados, aprendi a utilizar recursos que induziam os visitantes a participar
mais ativamente. Por muitas vezes, utilizei a prática filosófico-pedagógica socrática, a Maiêutica73,
ferroviária, inserindo práticas que ampliaram as abordagens do espaço, incentivando a inclusão de novas e diversificadas
formas de apropriação patrimonial. Um exemplo disso foi o programa Trem Vivo, lançado no ano de 2005, idealizado para
promover a integração do Museu no circuito cultural da cidade e região, abrindo parcerias com instituições responsáveis
pelo patrimônio nacional, segmentos turísticos, culturais e educacionais. Além disso, o espaço é responsável por diversas
frentes de atuação da instituição, seja como museu, em que são desenvolvidas ações educativas, de formação e pesquisa,
ou como espaço cultural – Estação Arte. (FUNALFA, 2009).
73 Sócrates dizia que a filosofia não era possível enquanto o indivíduo não se voltasse para si próprio e reconhecesse suas
limitações. Conhece-te a ti mesmo era seu lema. Para ele a melhor maneira de abordar um tema era o diálogo: por meio
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enriquecendo as discussões acerca das informações do acervo, evitando respostas prontas, mas
suscitando o debate e a troca de experiências do visitante e/ou grupo. Durante a monitoria foram desenvolvidas diversas funções, como o agendamento de visitas orientadas e participação em
eventos. Contudo, destacar-se-á, neste trabalho, a visita guiada.
3.1. VISITA GUIADA
A visita guiada é um dos principais serviços oferecidos pelo Museu Ferroviário, sendo a
mais importante função que realizei durante esses seis meses de atuação como estagiária. Durante
a minha trajetória como monitora, entendida aqui como animadora sociocultural, pude apreender que as visitas guiadas devem abarcar a dessacralização do espaço museal, que, como já foi
apresentado, era visto como um lugar sacro e inacessível para determinadas classes da sociedade.
Portanto, o monitor, enquanto animador sociocultural, deve prezar para que haja a participação
cultural, buscando a participação efetiva de sujeitos historicamente situados, com uma visão crítica e criativa da sociedade e do lazer. Para Carvalho, a ação do animador sociocultural deve ser
realizada através das noções de:
i) facilitação: em que centrará a sua atenção especialmente sobre a rede de comunicações elaboradas pelo grupo, procurando “abrir” sempre novos e mais profundos “canais” de comunicação;
ii) clarificação: procurando esclarecer o grupo e cada um dos seus elementos sobre o significado
do comportamento individual e coletivo; iii) catalisação: suscitando um movimento de constante procura do grupo no sentido de este poder elaborar, por si próprio, as formas concretas
de ação para que está, no momento, motivado; iv) promoção: como resultado de toda a
ação definida anteriormente, poder-se-á elaborar uma autêntica via participativa de todos os
elementos do grupo, única forma, parece-nos, de construir uma autêntica via emancipadora
(CARVALHO apud DELGADO, 2003, p.34).
A ideia de atuação apontada pelo autor nos mostra a relação entre animação sociocultural
com a educação, apontando a preocupação centrada no ser humano e nos seus anseios, buscando
o alargamento da consciência deles e a sua participação realmente efetiva. Com isso, vemos que o
monitor, durante a vista guiada, deve realçar o interesse dos visitantes, ajudando-os a interpretar
o espaço, acrescentando valor ou realçando a experiência de um lugar. A interpretação estimula
a apreciação ambiental e promove o entretenimento para os usuários e visitantes. (MURTA e
ALBANO, 2005, p.14).
Assim, para a realização desta função, foram necessários estudos aprofundados sobre o
assunto “ferrovia”, história geral do Brasil e, acima de tudo, aprender a forma de utilização de cada
peça que compõe o acervo do museu. Os conhecimentos adquiridos junto com o treinamento de
um roteiro fizeram com que eu pudesse aprender a vivência dos ferroviários e dos passageiros de
outras épocas, e essas ações me ajudaram a ganhar o respeito do visitante durante os seis meses
de estágio. Como é ressaltado por Murta e Albano (2005, p.25), a interpretação de um espaço
“[...] requer geralmente treinamento e pesquisa pessoal, já que os registros da memória perpetuam
imprecisões” e, para que o guia seja respeitado, ele deve equilibrar cuidadosamente os comentários
e as demonstrações com as necessidades do lugar e com a tolerância dos visitantes. Na medida
em que se sabe que os animadores socioculturais são de extrema relevância para que um espaço/
equipamento de lazer não se torne subutilizado, os animadores socioculturais necessitam ter uma
relação de proximidade entre a prática e a teoria.
As visitas realizadas no MF são dinâmicas e não possuem um roteiro específico, pois
este é adaptado de acordo com as características do grupo e/ou pessoa visitante. Porém, sempre
do método indutivo que denominou “maiêutica”. Um exemplo clássico da aplicação da “maiêutica” é o diálogo platônico
intitulado Mênom (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1999, s/p).
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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apresentamos, a título de sugestão apenas, um roteiro-base do espaço, que é composto por: apresentação de documentários sobre a ferrovia e patrimônio cultural, teatro de sombra com temática
ferroviária e palestras exibidas no anfiteatro antecedendo a visita ao acervo do Museu Ferroviário.
Ao iniciar as visitas, optamos por começar pela sala “A História da Ferrovia”, que contextualiza
a importância da locomotiva a vapor, resumindo a história e a evolução da ferrovia no séc. XIX;
os painéis ali existentes também apresentam como se deram a implantação da ferrovia no Brasil
e os principais fatos históricos ligados à ferrovia. No centro desta sala fica exposta a miniatura da
locomotiva a vapor n°322, idealizada e montada por um mestre de oficinas da cidade de Cachoeira Paulista (SP), o Sr. Reinaldo Justo Guimarães, que levou aproximadamente dezoito anos para
terminá-la (1922-1940).
A segunda sala se intitula “Agência da Estação”, e representa uma antiga agência do século
XIX, onde fica exposto o mobiliário utilizado na época, composto pela estante de bilhetes, pela
cabine de vendas e pelo o telefone.
Em seguida, passa-se para a sala “Sinalização e Via permanente”, que agrupa telefones do
século XIX, dentre eles um exemplar portátil, substituído mais tarde pelo telefone sem fio. Sinos
ornamentados em bronze, faróis e lamparinas compõem a exposição. Aqui, os visitantes são convidados a cruzar novamente o hall de entrada do museu e seguir em direção à sala do “Escritório
da Estação”, que mostra o cotidiano do chefe da estação revelado em documentos, mata-borrões
dispostos nas mesas, armários de época e pela rica coleção composta por vinte e quatro relógios
de parede, que foram resgatados de antigas estações.
Seguindo mais adiante, no passeio pelo Museu Ferroviário, chega-se à “Sala de Material
Rodante e Aspectos Tecnológicos”. No local, é possível saber sobre a sinalização, a manutenção
dos equipamentos da ferrovia e observar de perto os componentes internos das locomotivas. A
viagem termina na plataforma, onde ficam expostas duas locomotivas a vapor originais.74
As visitas guiadas devem entreter e inspirar novas atitudes junto ao visitante, pois, para
Murta e Albano (2005, p.14), mais que informar, interpretar é revelar significados, é provocar
emoções, é estimular a curiosidade. Ela não pode se limitar apenas às informações teóricas do
museu, como é apresentado no excerto abaixo:
O público chega ao museu com diferentes níveis de possibilidades de compreender os temas
apresentados, ou seja, com suas redes cotidianas de conhecimentos parcialmente tecidas e abertas à incorporação de outros novos fios. Os fatores sociais e as expectativas pessoais dos diferentes visitantes contribuem para a significação que eles darão às narrativas museais. Por esse
motivo, a pedagogia deve contemplar todos estes aspectos, a fim de que se estabeleça um vínculo
entre museu e visitante.
Para tal, é necessário que o museu esteja aberto à negociação com o público. As exposições não
devem ser um simples conjunto de ilustrações e a relação com o público deve se fazer por meio
de uma construção na qual os termos ilustrar, demonstrar e completar não devem ser lidos de
forma mecânica, e sim interpretados a partir de concepções voltadas à compreensão, negociação e parceria, em uma interação do sujeito com o objeto do conhecimento (VALENTE apud
FONSECA 2009, p.5).
Feitas as considerações quanto à necessidade de evocar mecanismos capazes de melhor
favorecer a compreensão dos visitantes, descreverei as principais abordagens que utilizei para receber grupos de diferentes faixas etárias e, para isso, optei por classificar os grupos em i) crianças
de 0 a 10 anos; ii) adolescentes de 11 a 15 anos; iii) jovens de 15 a 24 anos; iv) adultos de 25 a 60
74 As locomotivas expostas na plataforma do Museu Ferroviário foram fabricadas em 1913. A locomotiva n.º1 foi fabricada
na Alemanha e a n.º 7, batizada de Duquesa, na França. Ambas circularam pela Estrada de Ferro Central do Brasil e, desde
1985, elas foram recolhidas pelo Núcleo Histórico Ferroviário de Juiz de Fora.
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anos e v) idosos de 61 a 90 anos, tornando assim mais fácil a descrição das ações desenvolvidas
em cada um.
As visitas realizadas para crianças possuíam um caráter mais lúdico, possibilitando o intercâmbio entre as vivências do grupo e as peças que compõem o acervo do museu. Desse modo,
diversas vezes utilizei a estratégia de comparação entre os artefatos expostos e palavras ou coisas
cotidianas na vivência deles, como brincadeiras, desenhos animados e filmes. Antes de iniciar
as visitas pelas salas do museu, sempre passávamos um desenho animado relacionado à ferrovia,
geralmente o “Thomas e seus amigos75”, algo que facilitava a apresentação do acervo. As visitas
direcionadas a este perfil geralmente são mais curtas e mais dinâmicas, visto que, usualmente, esta
faixa etária possui uma dificuldade maior em se concentrar, se distraindo com qualquer coisa que
os chame a atenção. Também era utilizado um vocabulário específico, mais voltado para a faixa
etária dos visitantes, facilitando, assim, a compreensão dos fatos relatados.
Acredito que, dentre todos os grupos que recebi, os adolescentes eram os mais difíceis de
lidar, pois apresentavam um desinteresse mais visível, exigindo um grau de atenção e de paciência
maior. Antes de iniciar qualquer atividade com visitantes com esse tipo de perfil, sempre tentávamos “acalmá-los” (termo utilizado pelos funcionários do MF). Geralmente, o grupo era convidado
para o anfiteatro para conversar. Durante o diálogo eram propostos alguns combinados, como
estratégia para que eles não entendessem como “regras”, eu sempre fazia as seguintes perguntas: a)
Alguém aqui faz algum tipo de coleção?; b) Vocês sabiam que o museu tem uma coleção que eu
adoro?; c) Vocês gostam das coleções de vocês?; d) Vocês cuidam das coleções? E a partir dessas
indagações eu elaborava o seguinte combinado: “Gente, então já que vocês cuidam das coleções
de vocês vamos fazer o seguinte quando entrarmos no museu: Lá dentro não vamos colocar as
mãos nas peças, pois o suor das nossas mãos danifica as peças, vamos esperar o monitor apresentar
as salas e podemos perguntar muito”.
Já para os grupos compostos por jovens, eram utilizadas estratégias parecidas com relação
aos combinados, e o que diferenciava a prática da exposição eram as abordagens quanto à linguagem e à temática. Geralmente, durante a conversa dentro do anfiteatro, era apresentada a relação
entre revolução industrial e ferrovia, tendo em vista que a maior parte dos jovens que visitam o
museu já se encontra nos períodos finais do ensino médio e pretendem fazer vestibular. As visitas
geralmente com esse perfil são mais longas e mais teóricas e, dentre os principais pontos abordados durante o roteiro, pode-se citar: industrialização, ferrovia e acontecimentos políticos da época
áurea da ferrovia.
Para os adultos e terceira idade, a estratégia é relacionar coisas corriqueiras do dia-a-dia
com o tema da ferrovia. Grupos como esses geralmente falam mais do que ouvem, sendo mais independentes e gostam de passar informações e não penas retê-las, quase sempre preferindo realizar
o percurso do museu sozinhos. Na maioria das vezes nos dão informações sobre o acervo ou então
contam suas histórias na época da ferrovia.
Dentre as visitas guiadas que realizei posso destacar que a mais desafiadora para mim foi o
trabalho realizado com pessoas com deficiência mental A visita teve de ser elaborada cuidadosamente com um roteiro específico para recebê-los, afinal, a dificuldade de concentração era grande
e de retenção de informações entre os componentes do grupo era muito pequena, exigindo que
a visita fosse a mais dinâmica possível, possibilitando um contato maior entre os visitantes e as
peças do acervo. Dentre os participantes da visita havia um deficiente visual que se deslumbrou ao
75 Série animada de televisão, baseada em The Railway Series, série de livros criada pelo reverendo Wilbert V. Aldry. Atualmente, é exibida no Brasil pelo canal pago Discovery Kids. O desenho animado narra as histórias de uma ferrovia situada
na fictícia ilha de Sodor, onde convivem vários meios de transportes falantes, como locomotivas, vagões, ônibus e um
helicóptero.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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tocar as peças e as legendas em braile76, já que este sinalizou a dificuldade em encontrar espaços
que democratizem o acesso de deficientes físicos à cultura.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estágio me proporcionou um rico aprendizado quanto ao contato intrapessoal, de maneira que foi possível transcender aos manuais e obras que tratam a questão do patrimônio, pois se
pôde vislumbrar que, a despeito do espaço do Museu ser o mesmo para todos os visitantes, as reações, sentidos e significados da visita são diferentes para cada pessoa. E, além disso, foi importante
para que eu pudesse perceber que há a necessidade de um estudante de turismo em instituições
assim, pois, ao que me parece, ele, de fato, possui uma função específica, cuja competência passa
por uma preocupação radical para com os visitantes, buscando todas as formas de favorecer a sua
visita. Um exemplo disso seria a preocupação com a acessibilidade, com a linguagem empregada,
com a articulação entre a equipe, isto é, uma formação muitifacetada, capaz de favorecer a arranjo
entre vários componentes de uma visita, bem como a conexão entre diversos atores. Portanto, não
uma formação específica, mas justamente em uma formação abrangente residiria a riqueza de meu
aprendizado.
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VENTOSA, Victor J. (coord). Manual Del Monitor de Tiempo Libre. Madri: Editorial CCS,
1998.
76 Sistema de leitura a partir do tato inventado para cegos pelo francês Louis Braile, no ano de 1827, em Paris.
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LAZER E PATRIMÔNIO: RELAÇÕES E POSSIBILIDADES EM ALÉM PARAÍBA,
MINAS GERAIS, A PARTIR DE SUA ROTUNDA
Ariane Cintia de Souza Miranda77
Lucas de Oliveira Rosa78
Michele Pereira Rodrigues79
RESUMO: O presente artigo propõe-se a refletir acerca de alguns vínculos entre patrimônio e
lazer. Para isso, tomaremos como ponto de partida a rotunda existente em Além Paraíba, Minas
Gerais e, para dar sustentação teórica ao estudo, utilizar-se-á de uma breve revisão bibliográfica.
Esta edificação, datada do século XIX, é um exemplo de como é possível associar patrimônio e
lazer, explorando não só sua constituição/disposição física, mas as memórias ali vividas, bem como
sua relação com o entorno. Em linhas gerais, considera-se o uso da rotunda aproximaria a comunidade alemparaibana de seu respectivo patrimônio, possibilitando a vivência de seu tempo livre
em um ambiente histórico/cultural enriquecedor. Além disso, este paper se justifica pela tentativa
de reflexão acerca das interfaces entre dois assuntos que, embora passíveis de vínculos, ainda não
são alvo de robustas investigações.
PALAVRAS CHAVE: Patrimônio. Lazer. Rotunda.
1. INTRODUÇÃO
A partir da descoberta da máquina a vapor, na primeira Revolução Industrial, ocorrida
na Inglaterra no final do século XVIII e inicio do século XIX, começa a surgir no Brasil um novo
sistema de transporte de cargas e passageiros, que rapidamente se tornou um dos setores mais promissores da época, o modal ferroviário. O pontapé inicial se deu com a inauguração realizada por
D.Pedro II em 30 de Abril de 1854, da primeira estrada de ferro - a Estrada de Ferro Mauá - que
ligava a cidade fluminense de Magé até Raiz da Serra, próximo à cidade imperial, Petrópolis. A
primeira locomotiva a ser usada no Brasil foi batizada de “A Baroneza”, em homenagem à esposa
do Barão de Mauá, Dona Maria Joaquina.
A ascensão da ferrovia no país se deu a partir da necessidade “...de acompanhar o crescimento da atividade cafeeira,...”(Lohmann, 2002, p. 339) sendo que, “no Brasil, seu objetivo primordial era escoar a produção agrícola do interior para os portos. Assim, essas ferrovias iniciavam-se nas fazendas do interior e terminavam na região portuária dos principais centros.” (Lohmann,
2002 p. 339). Com isso, podemos perceber o motivo de grande parte da malha ferroviária do país
estar situada na região Sudeste, devido ao grande número de plantações de café, antigamente localizadas nesta região. Com o surgimento de um novo sistema de transporte, o modal rodoviário,
o sistema ferroviário brasileiro começa a entrar em declínio, com grande parte de suas linhas sendo privatizadas, devido, principalmente, à falta de investimentos. Surge, então, a preocupação com
o que fazer com as linhas que deixaram de ser usadas, pois assim como afirma Lohman, (2002,
77 Graduanda do curso de História da Universidade Federal de Juiz de Fora - [email protected]
78 Graduando do curso, Bacharelado Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora – [email protected]
79 Graduanda no curso Bacharelado Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora – [email protected]
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p. 340) “a opção pela privatização do sistema foi o caminho encontrado na segunda metade da
década de 1990”.
Nesse ínterim, com vistas à melhor corroborar as considerações supracitadas, faz-se necessário trazer à tona as considerações de Tomelin80, 2009, p. 495
É bem verdade que todo o potencial ferroviário do nosso país ainda tem muito a se desenvolver,
principalmente no que tange às iniciativas de melhoria no aproveitamento das preciosas malhas
ferroviárias que temos espalhadas, transformando-as em atrações turísticas histórico-culturais,
além, é claro, de meios de transporte de preço acessível e não poluentes. (2009)
Diante disso, o objetivo principal deste trabalho é discutir teoricamente algumas relações,
possibilidades e usos entre lazer e patrimônio, tomando como escopo de análise um tipo de edificação específico/singular no âmbito ferroviário: a rotunda de Além Paraíba, Minas Gerais. Já os
objetivos específicos são: i) breve revisão bibliográfica de lazer e patrimônio; dissertar brevemente
sobre a história ferroviária brasileira e, por conseguinte, de Além Paraíba, Minas Gerais.
O procedimento metodológico adotado, por excelência, foi a revisão de literatura, evidenciando as temáticas de lazer, ferrovia, patrimônio e Além Paraíba. Para discutir patrimônio,
nosso marco teórico é composto por Castriota (2010) e Ferreira (2006); já ao debater lazer, nos
valemos de Dumazedier (1999) e Gomes (2004). Além disso, é importante considerar que nos
valemos de dados secundários, obtidos, sobretudo, da internet.
A justificativa para a realização deste paper é o diálogo que pode se ter entre patrimônio
e lazer, já que estes são assuntos de suma importância no âmbito acadêmico. Por último, importa
destacar a estrutura deste trabalho, que, será composto por três seções, a saber: introdução, momento em que há de se destacar os objetivos, a justificativa e os procedimentos metodológicos
utilizados nesta investigação; o segundo momento diz respeito ao debate teórico acerca de lazer,
patrimônio e suas interfaces; por último, as considerações finais decorrentes desta investigação.
Este artigo está estruturado em quatro partes, a primeira dedicada à introdução, outra
dedicada às definições de conceitos, a terceira dedicada à abordagem do patrimônio e ao lazer e
a quarta às considerações finais.
2. RETOMANDO CONCEITOS
2.1 RETOMANDO A COMPREENSÃO DO LAZER
O termo lazer pode ser encontrado já a partir do século 13, sempre com uma denotação
que remete à antítese do trabalho, à preguiça. É neste contexto que, a partir da ascensão da Igreja
Católica e da ideia de livre arbítrio, o tempo de lazer passou a ser condenado e o trabalho ganhou
status de algo que elevava o ser humano. Neste período, a Igreja exercia controle social e moral
sobre a vida das pessoas.
Ao discorrer sobre lazer, devemos considerar que este se dá no tempo livre das pessoas,
tempo esse que, segundo Dumazedier, deve ser desvinculado de qualquer compromisso ligado ao
trabalho profissional, às obrigações familiares, às questões sócio-políticas e espirituais.
Acreditamos ser a um só tempo mais válido e mais operatório destinar o vocábulo lazer ao
único conteúdo do tempo orientado para a realização da pessoa com fim último. Este tempo é
outorgado ao indivíduo pela sociedade quando este desempenhou, segundo as normas sociais do
momento, de suas obrigações profissionais, familiares, sócio-espirituais e sócio-políticas. É um
tempo que a redução da duração do trabalho e das obrigações familiares, a regressão das obriga80 NETTO, Alexandre Panosso; ANSARAH, Marília. Segmentação do. Mercado Turístico: Estudos, Produtos e Perspectivas. São Paulo: Manole, 2009.
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ções sócio-espirituais e a liberação das obrigações sócio-políticas tornam disponível; o indivíduo
se libera a seu gosto da fadiga, descansando, do tédio, divertindo-se, da especialização funcional
desenvolvendo de maneira interessada as capacidades de seu corpo ou seu espírito. 81
Já segundo Gomes, embora não seja possível se desvencilhar totalmente das obrigações
expostas, não havendo plenamente um tempo verdadeiramente livre, sua concepção do que venha
a ser lazer é bem próxima a anterior:
uma dimensão da cultura constituída pela vivência lúdica de manifestações culturais no tempo/
espaço conquistado pelo sujeito ou grupo social, estabelecendo relações dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações - especialmente com o trabalho produtivo.(Gomes, 2004,
p.125)82
Para Dumazedier (1999), como o tempo do trabalho profissional se define primeiro, porém
não de modo exclusivo, é possível distinguir quatro períodos nos quais o lazer pode ser vivenciado.
São eles: o fim do dia, da semana, do ano (período de férias) e o fim da vida (aposentadoria).
2.2. RETOMANDO CONCEITOS DE PATRIMÔNIO
A partir do século XVIII, o patrimônio passou a ser uma preocupação dos governos, vinculado-o a uma ideia de identidade nacional, baseadas nas experiências que as pessoas possuíam
do passado. O historiador francês Le Goff, descreve que a afirmação do patrimônio ocorreu no
período de entreguerras, no qual se verificou um uso crescente do termo patrimônio pelas instituições e associações internacionais. Mas a maior expansão do patrimônio se deu entre os anos 60 e
80 do século XX. Nesse período a conceituação do patrimônio passou de um patrimônio histórico
a um patrimônio social; de um patrimônio herdado a um patrimônio reivindicado; de um patrimônio visível, material, a um invisível, imaterial. 83
Castriota (2010) também defende que é a partir da década de 60, que a conceituação do
que é patrimônio cultural passou por uma ampliação, abrangendo não só os valores históricos e
artísticos tradicionais, mas também os valores culturais e urbanos. Além da mudança quantitativa, percebe-se também que a conceituação de preservação expandiu-se da ideia de somente
preservação, para conservação e reabilitação. 84
Antes dos anos de 1960, acreditava-se que a cultura de uma população era composta
apenas por obras de arte e manifestações culturais ditas eruditas. Porém, foi se percebendo que
cultura era um conceito mais amplo, abrangendo músicas, modos de se fazer, festas, literatura e
uma infinidade de criações populares. Esse alargamento do conceito de cultura inevitavelmente
impactou em um dilatamento da noção de patrimônio, que passou a englobar também, como há
de ser ver mais adiante, bens imateriais e manifestações das minorias.
Ao se falar de patrimônio é necessário levar em consideração os conceitos de tempo, de
identidade e de memória. Somente através dessas definições que se entende e se define algo com
patrimônio cultural. É necessário lembrar ainda, que patrimônio é sempre o produto de uma escolha feita por um determinado grupo. Porém, patrimônio não é somente um referencial do passado,
mas um apelo ao presente e ao futuro.
81 DUMAZEDIER, Jofre. Sociologia empírica do lazer; tradução Silvia Mazza e J.Guinsberg – São Paulo: Perspectiva: SESC,
1999
82 GOMES, Christianne Luce (Org.). Dicionário crítico do lazer . Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2004
83 MAZZUCCHI, Maria Letícia. Patrimônio: discutindo alguns conceitos. Diálogos. Maringá: DHI/PPH/UEM, v. 10, n. 3,
2006. p. 81.
84 CASTRIOTA, Leonardo. PAC Cidades Históricas – oportunidade para a conservação integrada?. Locus: Revista de
História – Dossiê: Patrimônio Histórico e Cultural. Juiz de Fora: UFJF, vol. 15, n. 02, 2010, p. 94.
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Fundamental ressaltar-se que nessa construção cultural que é o patrimônio, o jogo de escolhas
e o espaço do conflito são elementos inerentes ao mesmo [...] o patrimônio é muito mais reivindicado do que herdado e muito menos comunitário que conflitivo. Quando falamos de escolhas
nos referimos ao caráter sempre eletivo daquilo que vai representar um grupo, uma sociedade,
ou a própria humanidade no seu sentido mais amplo. Ao falar de conflitos nos remetemos à
memória, à sua própria natureza ambivalente, que carrega a lembrança e o esquecimento como
faces de um mesmo processo. 85
Candau (2001 p. 151), reflete sobre a ausência da consciência patrimonial. Segundo ele
esse fenômeno acontece de acordo com os sentimentos que a memória se associa.
A ausência de consciência patrimonial é muitas vezes, a expressão normal do trabalho da memória que regularmente libera os sujeitos dos traços mais penosos de seu passado. Assim, é
preciso compreender, por exemplo, a destruição voluntária de velhos instrumentos agrícolas
pelos camponeses, como uma expulsão de sua memória dos objetos que lhes recordam um ofício
penoso, feito de sofrimento, de tempo e esforços que apenas lhes permitiam ganhar a vida. 86
É somente através da compreensão do que se é patrimônio e entendendo a sua importância como expressão cultural e arquitetônica, é que se compreende a importância de se preservar e
respeitar os elementos que representam à identidade de um povo.
3. PATRIMÔNIO E LAZER EM ALÉM PARAÍBA, MINAS GERAIS: DEBATENDO AS POSSIBILIDADES A PARTIR DA ROTUNDA.
Saindo de uma perspectiva diacrônica, para um olhar contemporâneo e mais específico,
é possível tomar a cidade de Além Paraíba, Minas Gerais, em especial seu patrimônio ferroviário,
como uma das tantas cidades cujo legado ferroviário carece de ser revisto. Com destaque para a
rotunda ainda existente na cidade, uma das construções mais antigas da região, datada do final
do século XIX (por volta de 1880), essa edificação não só é um ícone de uma época, símbolo de
práticas sociais, mas também se torna uma oportunidade para uma vivência enriquecedora do
lazer na cidade e na região. Trata-se de um prédio circular, construído em 360° em uma área de
5.000 m², utilizado para direcionar os vagões de trem, além de trabalhos de reparo e manutenção
nas locomotivas e vagões, que muito auxiliaram na atividade produtiva da época, como a escoação do café.
Foto 1: Interior da rotunda em 1988
Fonte: Eduardo Coelho.
85 FERREIRA, Maria Letícia Mazzucchi. Patrimônio: discutindo alguns conceitos. Diálogos. Maringá: DHI/PPH/UEM, v.
10, n. 3, 2006. p. 80.
86 CANDAU, Joel. Memoria e Identidad. Buenos Aires: Ediciones del Sol, 2001. p. 158.
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Foto 2: Interior da rotunda em 1988
Fonte: Eduardo Coelho
A rotunda necessita de reformas em sua estrutura que se desgastou bastante, devido à
falta de manutenção e ao tempo. Contudo, há um grande impasse entre os principais interessados
em reformá-la: a Igreja alega ser a proprietária do terreno onde está situada à referida rotunda; a
Prefeitura de Além Paraíba, que, após ter tombado a construção como patrimônio histórico de
acordo com a Lei Municipal: Nº 1.829 de 14 de abril de 1998, na administração do Prefeito Miguel
Belmiro de Souza, tem planos de reformá-la para que se torne um local de visitação na cidade e a
ABPF (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária) que tem como um dos principais objetivos, lutar pela preservação de bens históricos ligados à ferrovia. Contudo, o diálogo é escasso e as
ações conjuntas mais raras ainda.
Os desentendimentos se arrastam já há alguns anos e giram em torno de questões financeiras do tipo: quem disponibilizará os recursos financeiros para a reforma da rotunda? Para que
fim a rotunda será reformada? Quem administrará a renda obtida a partir destas reformas? Qual
seria o papel da ABPF após a reforma, entre outras circunstâncias. Apesar do impasse entre os
diversos setores, podemos notar, entre todos os envolvidos, o desejo de que o patrimônio seja preservado. 87
A rotunda de São João Del Rey, provavelmente edificada entre 1891 e 1895, faz parte do
complexo ferroviário da cidade tombado pelo IPHAN, assim como a linha de ferro Tiradentes X
São João Del Rey. Atualmente esta rotunda resguarda antigas locomotivas, pois devido à demolição do patrimônio entre 1973 –1974, ela teve de ser reconstruída em 1984, passando a abrigar o
museu “Centro de Preservação da Memória Ferroviária de Minas Gerais”. Atualmente a rotunda
– museu encontra-se em níveis preocupantes devido à sua má conservação, fato este que não ocorre com a estação ferroviária da cidade, que recebe um grande fluxo de turistas durante todo o ano.
É importante que se ressalte, que estas imponentes construções ferroviárias estão
presentes em toda a Zona da Mata, foram e são muito importantes ate os dias de hoje quando o
assunto diz respeito a ferrovias, pois nestas edificações, eram empregados um conjunto de ofícios,
tais como, mecânicos, torneiros, maquinistas, dentre outros, que dali tiravam seu sustento e de
toda família.
Assim, ao se pensar na correlação entre ambos (lazer e patrimônio), percebemos que patrimônio está associado a muitos bens materiais e imateriais, eleitos pela memória e pela identidade.
Percebe-se ainda que muitos desses bens são ou se tornaram formas de lazer de determinadas
sociedades. Vários estudiosos apontam a importância do patrimônio como forma de lazer e entretenimento.
87 Caso semelhante acontece em Ribeirão Vermelho, Minas Gerais, cuja rotunda ainda existente na cidade construída em
1888, componente do complexo ferroviário, atualmente se encontra em ruínas.
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Brandão defende que a preservação do patrimônio deve ser associada ao estabelecimento
de circuitos de lazer e entretenimento. Seus questionamentos giram em torno das polêmicas ligadas às transformações dos espaços públicos das cidades, considerados fundamentais como lugares
de referências físicas e simbólicas para a memória e história urbanas. 88
Já os pesquisadores Nelson Carvalho; Tânia Sampaio; Felipe Soligo e Stéphanie Mariano, defendem a importância de se analisar como se dá o processo de preservação, conservação e
revitalização desse patrimônio urbano e as Políticas Públicas de Lazer do município. Nota-se, que
muitas vezes o patrimônio urbano se torna uma atração turística e deve assim ser entendido do
ponto de vista dos conteúdos culturais do lazer. Porém, deve verificar até que ponto a população
tem acesso a esses bens, já que em alguns casos eles são revestidos de uma sacralidade que acaba
inibindo seu efetivo uso democrático por parte da população. Nesse sentido, como já foi falado
acima, é fundamental entender as Políticas Públicas de Lazer, que incluem a questão das estruturas e dos espaços, além da necessidade de preservação e a revitalização do patrimônio urbano. 89
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O potencial de uso da rotunda de Além Paraíba é bastante vasto, visto que em pesquisa
realizada na cidade em Agosto de 2011 durante a Exposição Agropecuária, pelo projeto de extensão, “Diagnóstico e Aproveitamento do Potencial Turístico, relativo ao patrimônio ferroviário de
Além Paraíba” pôde-se obter um levantamento preliminar, onde 80% dos entrevistados possuem
forte vontade de visitar o complexo ferroviário da cidade, com destaque para a rotunda. Assim,
torna-se necessário, que as Políticas Públicas do município levem em conta a importância deste
patrimônio e voltem suas ações à sua preservação. Para tanto, coube a esta discussão teórico-reflexiva debater os conceitos e relações entre patrimônio e lazer, usando o exemplo prático das
rotundas do estado de Minas Gerais, em especial a da cidade de Além Paraíba, o que nós dá o
exemplo de como o patrimônio pode ser aproveitado em função do lazer e do turismo.
REFERÊNCIAS
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CANDAU, Joel. Memoria e Identidad. Buenos Aires: Ediciones del Sol, 2001.
CASTRIOTA, Leonardo. PAC Cidades Históricas – oportunidade para a conservação integrada?. Locus: Revista de História – Dossiê: Patrimônio Histórico e Cultural. Juiz de Fora: UFJF,
vol. 15, n. 02, 2010.
DNIT.A invenção da locomotiva. http://www1.dnit.gov.br/ferrovias/historico.asp. Acesso em
12/02/2012
DUMAZEDIER, Jofre. Sociologia empírica do lazer; tradução Silvia Mazza e J.Guinsberg – São
Paulo: Perspectiva: SESC, 1999.
FERREIRA, Maria Letícia Mazzucchi. Patrimônio: discutindo alguns conceitos. Diálogos. Maringá: DHI/PPH/UEM, v. 10, n. 3, 2006.
GOMES, Christianne Luce (Org.). Dicionário crítico do lazer . Belo Horizonte: AutênticaEditora, 2004
88 BRANDÃO, Joseane Paiva Macedo. Cultura, Patrimônio e Lazer na construção social do espaço público no Rio de
Janeira: A “Revitalização” da Lapa. Disponível em: http://www.xiconlab.eventos.dype.com.br/resources/anais/3/130826
53431308265343ARQUIVO_TextocompletoXIConlab-JoseanePaivaMacedoBrandao.pdf. Acesso em 10/03/2012.
89 MARCELINO, Tânia Mara Vieira; BARBOSA, Felipe Soligo; MARIANO, Stéphanie Helena. Lazer, Cultura e Patrimônio Ambiental Urbano – Políticas Públicas. Curitiba: Opus Print, 2007. p. 09.
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MARCELINO, Tânia Mara Vieira; BARBOSA, Felipe Soligo; MARIANO, Stéphanie Helena.
Lazer, Cultura e Patrimônio Ambiental Urbano – Políticas Públicas. Curitiba: Opus Print,
2007.
NETTO, Alexandre Panosso; ANSARAH, Marília. Segmentação do. Mercado Turístico: Estudos, Produtos e Perspectivas. São Paulo: Manole, 2009.
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Prefeitura Municipal de Além Paraíba. http://alemparaiba.net/index.php?option=com_content&
view=article&id=143&Itemid=113. Acesso em 01/03/2012
Primeira revolução industrial. http://www.brasilescola.com/geografia/primeira-revolucao-industrial.htm. Acesso em 02/03/2012
Rotunda de Porto Novo do Cunha. http://www.estacoesferroviarias.com.br/rotundas/portonovodocunha.htm. Acesso 01/03/2012
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TEMPERANDO COM ARTE E LUDICIDADE A ABORDAGEM DA SEGURANÇA
ALIMENTAR E NUTRICIONAL (SAN): A EXPERIÊNCIA DO PROJETO
“CIDADANIA NO PAPEL: SAN EM CORDEL”
Anselmo Cássio Cesário90;
Marina Neto Rafael 91;
Talita Lemos Paulino2;
Valéria Cristina Ribeiro Vieira92
RESUMO: O Guisado (Grupo Universitário Interdisciplinar e Itinerante pela promoção da Segurança Alimentar e Nutricional em parceria com Adolescentes) é uma iniciativa de Extensão
Universitária que, com base em conceitos como a Educação Popular e o Protagonismo Juvenil, prima pela relação horizontal entre os participantes, estabelecendo-se diálogo de saberes e parcerias
na execução de atividades educativas e culturais diversas, com vistas a contribuir na formação de
“Agentes Jovens de Segurança Alimentar e Nutricional-SAN”. As estratégias utilizadas incentivam a participação ativa e criativa dos envolvidos, centrando-se em atividades interativas e de caráter lúdico e/ou artístico-cultural, as quais são desenvolvidas em parceria com o “Grupo Mundo:
Teatro Itinerante, Prazer em conhecê-lo”, composto por também jovens atores, atrizes e diretor
teatral. Dentre as diversas experiências já vivenciadas, destaca-se o projeto “Cidadania no Papel:
Segurança Alimentar e Nutricional em Cordel”, no âmbito do qual foram realizadas Oficinas de
Literatura de Cordel com estudantes da Educação Básica e da de Jovens e Adultos (EJA), bem
como apresentações de um espetáculo teatral, montado a partir dos cordéis criados e/ou trabalhados nas oficinas. Os objetivos foram alcançados, com visível despertar do Protagonismo Juvenil e
sensibilização pela temática da SAN nos processos de criação literária e teatral.
PALAVRAS CHAVE: Cultura Popular. Protagonismo Juvenil. Segurança Alimentar e Nutricional.
INTRODUÇÃO
A conquista, em 2006, de uma Lei Federal criando o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) representou a culminância de um amplo movimento pela garantia
do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), colocando em evidência a necessidade
da abordagem dessa temática sob a ótica da construção da cidadania, tendo sempre em vista o
enfoque interdisciplinar/intersetorial a que remete o conceito mais atual de SAN, qual seja “é a
realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base
90 Licenciado em História. Ator e Diretor Teatral do “Grupo Mundo: Teatro Itinerante Prazer em Conhecê-lo”.
91 Graduanda do Curso de Nutrição da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG). Bolsista do Programa de Educação
Tutorial (PET/MEC/SeSu).
92 Mestre em Ciência da Nutrição. Professora da Faculdade de Nutrição e Tutora do grupo PET Nutrição da UNIFAL-MG.
E-mail de contato: [email protected]
Fonte de financiamento: Programa de Apoio à Extensão Universitária em interface com a Cultura (PROEXT/Cultura)
dos Ministérios da Cultura e da Educação.
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práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social,
econômica e ambientalmente sustentáveis” (BRASIL, 2006).
Institucionalizado enquanto uma ação de Extensão da Universidade Federal de Alfenas
(UNIFAL-MG) e fundamentando-se em conceitos como a Educação Popular (VASCONCELOS,
2004) e o Protagonismo Juvenil (COSTA, 1999), o Guisado (Grupo Universitário Interdisciplinar
e Itinerante pela promoção da Segurança Alimentar e Nutricional em parceria com Adolescentes)
vem, desde 2008, trabalhando em prol da formação de “Agentes Jovens de SAN” - em diferentes
contextos - e contribuindo, simultaneamente, para a formação acadêmica e cidadã de jovens universitários. O grupo tem buscado adotar estratégias metodológicas que incentivam a participação
ativa e criativa dos envolvidos, os quais, por sua vez, são capazes de atuar como multiplicadores em
seus diversos espaços de socialização. Nesse sentido, além do caráter interativo, as atividades propostas - desenvolvidas em parceria com o “Grupo Mundo: Teatro Itinerante, Prazer em conhecê-lo” (composto por também jovens atores, atrizes e diretor teatral) – têm se pautado, sobretudo,
pela valorização do aspecto lúdico e/ou artístico-cultural.
Dentre as diversas experiências já vivenciadas, destaca-se o projeto “Cidadania no Papel:
Segurança Alimentar e Nutricional em Cordel”, o qual foi desenvolvido no âmbito do Programa
de Apoio à Extensão Universitária em interface com a Cultura (PROEXT/Cultura) dos Ministérios da Cultura e da Educação.
OBJETIVOS
A proposta do presente trabalho é relatar a experiência do projeto “Cidadania no Papel:
Segurança Alimentar e Nutricional em Cordel” - executado pelo Guisado, em parceria com o
“Grupo Mundo: Teatro Itinerante, Prazer em conhecê-lo” – cujo principal objetivo foi contribuir
para a formação de universitários e de outros “Agentes Jovens de SAN”, bem como divulgar e
incentivar a valorização da Cultura Popular, em especial o Teatro de Rua e a Literatura de Cordel.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A metodologia inicialmente proposta para execução do projeto constituía-se por: (1) realização de Oficinas de Literatura de Cordel com adolescentes e jovens da Educação Básica e da de
Jovens e Adultos (EJA) do município de Alfenas e outros da região, nas quais eles seriam estimulados a criar textos em Cordel, abordando a temática da SAN e (2) montagem de um espetáculo
teatral a partir de cordéis sobre SAN de autores conhecidos e agregando-se também as criações
dos adolescentes a ser apresentado em escolas parceiras e em outros locais e/ou circunstâncias que
se fizessem oportunos.
Diante da constatação da necessidade de se estabelecer um “canal de comunicação” com
possíveis escolas e/ou professores parceiros, promoveu-se o “Curso para professores parceiros na
formação de Agentes Jovens de SAN: Literatura de Cordel e Teatro como proposta metodológica”,
oferecido a todos os interessados das redes pública e privada de Alfenas e região. Os participantes
desse curso, bem como os diretores das respectivas escolas, foram contatados posteriormente para
a concretização da parceria. Propôs-se que realizassem com seus alunos - preferencialmente, na
semana anterior à apresentação teatral na escola – uma “oficina pré-espetáculo”, cujo intuito era
despertar a motivação em relação ao tema e, sobretudo, oportunizar a criação de cordéis a serem
eventualmente incluídos no espetáculo. Sugeriu-se que fossem utilizadas estratégias para estimular, de maneira prazerosa, a discussão e a criação artística, tendo sido disponibilizados alguns materiais, a saber: DVD com vídeos didáticos produzidos pelo Programa “Fome Zero”, do Governo
Federal (pequenas chamadas sobre a temática da SAN, trabalhando com rimas e musicalidade),
CD com a música “O que é Literatura de Cordel?” (um “cordel sobre o cordel”, em ritmo de forró e
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com a participação de um coro infantil), além de um folder com “perguntas-geradoras”, em forma
de versos, contemplando vários aspectos abarcados pelo conceito de SAN.
Para o processo de criação teatral, o ponto de partida foi a realização de uma vasta pesquisa no universo da Literatura de Cordel. Por meio da leitura do trabalho de Galvão (2006),
descobriu-se que a leitura ou audição dos folhetos de cordel, herança lusitana ao povo do nordeste
brasileiro, estava, na maior parte dos casos, relacionada, inicialmente, ao lazer. Nesse sentido,
buscou-se montar um espetáculo que - além de informar e despertar um senso crítico em relação
ao tema da SAN - também pudesse divertir, emocionar e proporcionar uma intensa interação com
os expectadores. Para a criação das cenas, o desafio foi transformar o que antes era apenas escrito, lido e ouvido, em personagens vivos que migrariam do imaginário nordestino, por exemplo,
para a realidade do público mineiro, mesmo que durante a efêmera apresentação do espetáculo.
Intitulado “Pãofogehomemmigracadêlei?” (nome e grafia propositalmente inusitados para instigar
curiosidade e reflexão), ele contou com cenário, figurinos, músicas, vinhetas, adereços e textos
complementares de introdução e finalização de forma a estabelecer uma comunhão entre a didática e a arte. Sem jamais subestimar a capacidade intelectual do público, buscou-se penetrar
em seu universo físico/geográfico, proporcionando-lhe um teatro inteligente, simples e lúdico. Em
vista disso, houve intensa utilização de objetos e símbolos que pudessem remeter ao cotidiano das
pessoas. Para inserir as criações dos adolescentes no espetáculo, a estratégia adotada foi encerrá-lo
com uma ciranda em que eles eram incluídos e chamados ao centro para recitar os versos.
No caso das apresentações nas escolas, foram realizadas ainda as denominadas “oficinas
pós-espetáculo”. Apesar da proposta de roteiro elaborada, ficou evidente, desde o início, que não
seria possível trabalhar com uma “receita pronta”, em função das diversas realidades encontradas
- incluindo tempo, espaço físico e recursos audiovisuais disponíveis - e do próprio interesse dos
participantes. Foi justamente esse interesse que norteou as discussões, conduzidas sob a forma de
diálogo e valorizando o compartilhamento de ideias/experiências variadas sobre a temática da
SAN. Para favorecer a interação, buscou-se sempre dispor os participantes em círculo, bem como
intercalar as explanações da equipe com a leitura/criação de cordéis, além de descontraídos momentos de canto e dança da música “O que é Literatura de Cordel”. Todas as experiências vivenciadas foram sistematizadas considerando os registros feitos pela equipe no decorrer do processo,
bem como os obtidos da ficha de avaliação entregue aos participantes.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para fundamentar uma reflexão acerca da pertinência de se situar a atuação do Guisado
no escopo do presente Seminário, serão apresentados alguns pressupostos teóricos a partir dos
quais se evidenciam interfaces entre tal atuação e os conceitos de Educação Popular, Protagonismo Juvenil e Animação Sociocultural, bem como os de Ludicidade e Lazer.
1) Educação Popular, Protagonismo Juvenil e Animação Sociocultural
Segundo Vasconcelos (2004), um dos elementos fundamentais do método da Educação
Popular é a valorização dos saberes do educando, que permite que ele se sinta “em casa” e mantenha a sua iniciativa. Assim, não se reproduz a passividade e a verticalidade usuais dos processos
pedagógicos tradicionais. Para ele, todas as técnicas que facilitam a aprendizagem são metodologias de Educação Popular se, numa discussão aberta, buscam problematizar o que está incomodando e ajudam os educandos a apurar o que precisam, se posicionar e lutar por seus interesses.
Também para Brandão (1982), a Educação Popular busca ampliar os espaços de interação
cultural e fomentar, pedagogicamente, formas coletivas de aprendizado e investigação, de modo
a estimular a capacidade de análise crítica da realidade e o aperfeiçoamento de estratégias de
enfrentamento dos problemas.
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Tais pressupostos estão em sintonia com a premissa do Protagonismo Juvenil (COSTA,
1999), segundo a qual é preciso acreditar no adolescente, sem a presença do paternalismo que
esconde, por vezes, a descrença em sua capacidade. Para que ele desempenhe um papel de pessoa
participante, consciente e transformadora, é necessária uma estratégia metodológica que, apoiada
na auto-estima e na positividade, valorizem e estimulem seu potencial criativo.
A Animação Sociocultural, por sua vez, pode ser considerada, histórica e ideologicamente, herdeira dos movimentos de Educação Popular dos dois últimos séculos, visando ao acesso de
todos à cultura, bem como à formação de cidadãos responsáveis e críticos, com vistas às transformações da sociedade (WANDERLEY, 2007). Lopes (2007) também cita a estreita ligação - fundada numa relação de filiação - entre a Animação Sociocultural e a Educação Popular.
Segundo Wanderley (2007), a Animação Sociocultural inspira-se na cultura do lazer - especialmente na segunda metade do século XX - e bebe em correntes psico-sociológicas que valorizam o grupo e a ação comunitária como espaços de expressão e de criatividade. Na literatura, é
adjetivada de social, cultural ou sociocultural, com particularidades mais ou menos marcantes Em
seu campo semântico estão presentes temas como educação popular e participação social - mais
diretamente relacionados com educação de jovens e adultos; ação comunitária e desenvolvimento
de comunidades; ócio, recreação e animação lúdica, principalmente relacionados ao lazer.
Almeida (2008), por outro lado, reporta a confusão na ótica que se possui atualmente
sobre a Animação Sociocultural. Para ele, é veiculada uma visão de que “ser animador é cuspir
fogo, fazer palhaçadas ou de vez em quando uma peça de teatro”, e essa desfigura sua verdadeira
essência: a transformação social, a democratização no acesso à cultura, a promoção de valores
de auto-organização, a formação de agentes conscientes e empenhados na prática de desenvolvimento de grupos e comunidades. Segundo o autor, o próprio vocábulo reproduz uma confusão:
animar seria entendido enquanto fazer palhaçadas e não dar alma às atividades, no sentido da
intervenção social. Além do esvaziamento percebido em torno da própria prática de “cuspir fogo,
fazer malabarismo ou teatro”, representando um fim em si mesmo e não uma ponte para a discussão de assuntos.
Na perspectiva da transformação social, Wanderley (2007) observa que, nas últimas décadas, a sociedade brasileira passou por processos que permitiram o crescimento de espaços ocupados
por diferentes segmentos sociais, com o objetivo de fazer política e constituir novos sujeitos. No
campo especificamente cultural, ela destaca, surgiram inúmeras atividades de resgate da memória,
valorização das identidades culturais, cultura popular, diálogo inter-religioso em cursos ecumênicos, atividades de educação popular, teatro participativo, música engajada etc. Para a autora, a
Animação Sociocultural nesses espaços seria uma mediação interessante. Ela ainda enfatiza seu
caráter multidisciplinar e lembra que está necessariamente vinculada à noção de participação.
2) Ludicidade e Lazer
Segundo Marinho e Pimentel (2010), por se tratar de algo que interage o particular ao
universal, agindo subterraneamente em diversas instâncias, o universo lúdico é parte indissociável
da condição humana e tem participação criadora no cotidiano. Ao levantarem algumas reflexões
sobre categorias referentes às teorias do lazer, esses autores questionam se seria o lúdico o “princípio de tudo”, propondo considerá-lo o “ânima do prazer improdutivo, isto é, aquilo que move ou
alimenta o jogar, o brincar, o festar e outras atividades pontuadas pelo fim em si mesmo”.
Também para Bruhns (1993), o lúdico possui um conceito mais abrangente que o de lazer,
pois suas possibilidades de ocorrência são maiores. O lúdico não ocorre exclusivamente no lazer,
podendo ser detectado em diferentes facetas da realidade, como na linguagem, na alimentação,
na moda, na ciência e na política.
Para Bramante (1998, p. 11), o lazer se traduziria por uma “dimensão privilegiada da
expressão humana dentro de um tempo conquistado, materializada através de uma experiência
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pessoal criativa, de prazer e que não se repete no tempo/espaço, cujo eixo principal é a ludicidade”. Já Gomes (2004, p. 124) o conceitua como “uma dimensão da cultura constituída por meio
da vivência lúdica de manifestações culturais em um espaço/tempo conquistado pelo sujeito ou
grupo social, estabelecendo relações dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações,
especialmente com o trabalho produtivo”. Essa mesma autora pondera que se “por um lado, o lazer
pode contribuir para o desmascaramento das contradições sociais, por outro, pode representar
uma possibilidade de questionamento e resistência à ordem social injusta que predomina em nosso
meio”.
No que tange à formação do indivíduo, Marcelino (1996, p. 38) considera fundamental
“assegurar à criança o tempo e os espaços para que esse caráter lúdico do lazer seja vivenciado com
intensidade capaz de formar a base sólida para a criatividade e a participação cultural e, sobretudo,
para o exercício do prazer de viver”. Nesse sentido, é interessante observar que os antigos dividiam
a vida em duas zonas: otium (ócio) e nec-otium, sendo que o otium não correspondia à negação do
fazer, mas à ocupação voltada para a realização do humano no homem, aí se situando, por exemplo, a arte (ORTEGA Y GASSET, 1963).
Assim, torna-se razoável postular que - para além de serem “produtivas” ou “um fim em
si mesmo” - as atividades lúdicas vinculadas ao lazer, aí incluídas as diversas expressões artísticas,
podem sim se propor questionadoras e - por que não? - transformadoras.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Durante a execução do projeto, incluindo as apresentações do espetáculo e a realização das
oficinas, sete escolas foram visitadas, contemplando quatro municípios da região, além da capital
Belo Horizonte, em que a oportunidade de atuação surgiu já no decorrer do desenvolvimento das
atividades. Além das apresentações nas escolas, o espetáculo foi apresentado em outras sete ocasiões, no âmbito de eventos diversos ocorridos ao longo do segundo semestre de 2009. Algumas
dessas experiências apresentaram peculiaridades interessantes, as quais serão descritas a seguir:
- Escola Estadual Padre José Grimminck: considerada a experiência-piloto, os cordéis
elaborados pelos alunos dessa escola (localizada em um bairro da periferia de Alfenas) foram enviados previamente à equipe do projeto, sendo que três deles foram selecionados, recitados ao final
do espetáculo e seus autores convidados para participar da ciranda final. Bastante aplaudidos pelo
público presente e com a auto-estima visivelmente elevada, perante o reconhecimento e valorização de seu potencial criativo, esses adolescentes assumiram o almejado papel de protagonistas
(primeiro passo na formação de “Agentes Jovens de SAN”), para o que certamente contribuiu a
vivência artística/lúdica propiciada pela participação no projeto.
- Escola Estadual Judith Vianna: essa escola surpreendeu a equipe do projeto com iniciativas ímpares, tais como (1) preparação de uma apresentação de dança pelos adolescentes,
incluindo uma deficiente auditiva, a partir da música “O que é Literatura de Cordel?”, a qual foi
traduzida para a Linguagem Brasileira de Sinais (LIBRAS), sob coordenação de uma intérprete
da própria escola. Esse foi um momento marcante para a equipe do projeto, sobretudo para o elenco do espetáculo que, de maneira inédita, deslocou-se do palco para a plateia; (2) realização de
oficinas pré-espetáculo, sob coordenação das professoras de Português e Artes, as quais geraram
mais de 50 criativos cordéis, cuidadosamente preparados sob a forma de “folhetos” ilustrados com
autênticas obras-de-arte nas capas; (3) oferecimento de lanche, durante a oficina pós-espetáculo,
cujo cardápio acabou se tornando mais um tema a ser problematizado nas discussões sobre SAN
e que, inclusive, inspirou a criação de mais cordéis (Ex: “Se só beber refrigerante, você pode ficar
ignorante”; “Coca todo dia na mesa, vai te deixar obesa”), num exemplo da improvisação típica
dessa manifestação da cultura popular.
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Escola Estadual Brasil: localizada no município vizinho de Varginha, possibilitou a primeira experiência com uma turma de EJA, destacando-se a presença de um genuíno poeta popular nordestino. Por meio da diretora da escola, que havia participado do curso, a equipe teve
acesso, previamente, a uma apostila contendo mais de 60 cordéis criados por este poeta que, cheio
de ânimo aos 64 anos, foi homenageado ao final da apresentação do espetáculo.
Escola Estadual José do Patrocínio: escola da periferia de Belo Horizonte, em que se deu
a segunda experiência com EJA. A oficina pós-espetáculo foi realizada com a “turma da alfabetização”, cuja professora já vinha trabalhando o tema da alimentação saudável e - tendo recebido os
materiais do projeto – incorporou a Literatura de Cordel e incentivou a criação coletiva de dois
poemas pela turma, os quais foram recitados por integrantes do elenco ao final da apresentação
do teatro. Uma aluna da “turma de alfabetização”, de 74 anos, ao se esforçar no preenchimento
da ficha de avaliação, expressou este eloquente sentimento: “Queria escrever tanta coisa para vocês,
que pena que ainda não consigo”.
Destaca-se, também, por fim, a apresentação realizada na Solenidade com o Ministro do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, ocorrida no município de Machado.
Foi, sem dúvida, muito significativo e gratificante para todos os envolvidos na execução do projeto poder compartilhá-lo com o representante máximo do órgão do governo federal responsável
pela Política Nacional de SAN e receber seu incentivo, quando declarou à plateia que o projeto o
havia feito “retornar à infância, no Norte de Minas, já que os primeiros textos que leu foram os cordéis
clássicos” e que “nesses tempos de indigência cultural, estamos precisando mesmo de iniciativas como
esta, senão a TV vai ‘empastelando’ todo mundo”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisadas em conjunto, as experiências relatadas configuram uma bela “teia” de vivências, aprendizados, intercâmbios, parcerias, superações, enfim, da mais pura “arte de viver e aprender”. O processo de produção, bem como as diversas apresentações do espetáculo teatral, foi peça
fundamental na composição dessa “teia”. A cada diferente “palco” - ao montar o cenário, ajustar
luzes e microfone, atores e atrizes com seus figurinos coloridos, nos seus postos na cochia e o
público ali, diante do ainda não conhecido - a arte milenar do teatro cumpria o seu mais digno
papel: juntar harmoniosamente, em um mesmo ambiente, pessoas de tão diferentes realidades
culturais, econômicas, políticas e sociais, dando-lhes a oportunidade de rir, chorar e refletir sobre
assuntos comuns à rotina de milhões de brasileiros. Por sua vez, o objetivo de promover a discussão
sobre o tema da SAN, resgatando e valorizando uma expressão da Cultura Popular - por meio das
Oficinas de Literatura de Cordel – também foi seguramente alcançado, confirmando-se, ainda,
como uma válida estratégia para estimular a criatividade e o protagonismo juvenis, considerados
os ingredientes essenciais do Guisado.
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contribuições da psicologia e da animação sociocultural. Cadernos Temáticos do Conselho
Regional de Psicologia da 6ª Região. n. 5. São Paulo: CRP 06, 2007.
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A IMAGEM LATENTE NO TEMPO LIVRE
Gelka Arruda de Barros93
RESUMO: O estudo apresenta a prática da fotografia em câmera de orifício como possibilidade
de produção cultural do indivíduo, potencializando sua autonomia subjetiva frente aos modelos
visuais vigentes. Nesse ambiente, pretendo demonstrar como essa experiência estética em particular, contribui para alterar nosso olhar sobre a realidade, nos ajudando a construir novos sentidos
para nossas relações de ser e estar no mundo. Para tanto, ilustro os momentos mais pontuais do
processo de desenvolvimento dos mecanismos óticos que possibilitaram o advento da fotografia
como a conhecemos nos moldes atuais e suas implicações nos nossos modos de ver. Além disso,
através do relato da experiência realizada por um coletivo de artistas visuais que divulgam e incentivam essa prática, pretendo demonstrar como esse processo alternativo de produção de imagem
institui uma vivência lúdica capaz de despertar no indivíduo sua sensibilidade criativa. Por fim, no
intuito de enriquecer a reflexão sobre o tema, no decorrer do texto será abordado, principalmente,
o conceito de aparelho do filósofo Vilém Flusser caracterizado por se constituir em um sistema de
“produção e reprodução” automático que aliena o homem no mundo contemporâneo.
PALAVRAS CHAVES: Fotografia. Tempo Livre. Experiência Estética.
INTRODUÇÃO
Largamente utilizada, a fotografia atualmente vive um momento de expansão proporcionado pela digitalização da imagem e pela democratização dos dispositivos fotográficos, permitindo
novas possibilidades expressivas dentro da sociedade contemporânea. Nesse tempo, mais do que
nunca, a fotografia se configura uma possibilidade de construção de sentidos94, de nossas relações
com o mundo e com o outro; se apresentando no tempo livre através do ato fotográfico em si ou
como seu registro, em instantâneos de comemorações familiares, viagens, festas, em redes sociais,
etc. Hoje, os aparelhos celulares dispõem de câmeras fotográficas com boas resoluções de imagem,
ocasionando uma grande mobilidade, onde tudo, a qualquer momento e em qualquer lugar, pode
ser fotografado.
Em uma sociedade cada vez mais imagética, esse estudo propõe criar um espaço de reflexão que possibilite a discussão da subjetividade em um mundo pautado por imagens. Veiculadas
pelos meios de comunicação via cultura de massa, essas imagens condicionam nosso olhar, estabelecendo modelos de comportamento através de ideais de beleza, de saúde, de entretenimento,
do ambiente público ao privado. Nesse contexto, o que seria válido para a construção de sentidos
para o sujeito e o mundo? A tensão tênue entre o real e o simbólico tornam superficiais a maioria
93 Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais; bacharel em Artes Plásticas pela Escola Guignard – Universidade Estadual de Minas Gerais. Mestranda em
Estudos do Lazer pela Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas
Gerais. Fonte de financiamento do CNPq sob n. 470687/2011-8, e da FAPEMIG sob n. 00635/11; gelkabarros@yahoo.
com.br.
94 O estudo apresenta alguns dos resultados do projeto A educação dos sentidos na história: o tempo livre como possibilidade de
formação (entre os anos finais do séc. XIX e os anos iniciais do séc. XXI), em andamento, desenvolvido na UFMG, o qual conta
com os financiamento citados anteriormente.
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de nossas vivências. Assim, ainda é possível pensar numa autonomia subjetiva? Acreditar nessa
possibilidade pode parecer romantismo para muitos, mas não ter esperança diante desse quadro
significa aceitar que não somos capazes de realizar o que nos torna humanos - a imaginação, ou
melhor, o ato de criar.
VESTÍGIOS DA CAIXA PRETA
Nada mais significativo para o nosso contexto que o título Filosofia da Caixa Preta – Ensaios para uma futura filosofia da fotografia que nomeia uma das obras mais conhecidas de Vilém Flusser. É a partir desse aparato, a caixa preta, que o autor elabora seu pensamento sobre a
transformação da imagem tradicional em imagem técnica95, perpassando todas as instâncias da
fotografia e os agentes envolvidos no processo. Flusser denomina aparelho - “brinquedo que simula
um tipo de pensamento” (FLUSSER: 2011, p.17) o que caracteriza uma caixa preta por se tratar
de um sistema complexo “jamais penetrado totalmente” (FLUSSER: 2011, p.44), onde se ignora o
que se passa em seu interior. Porque brinquedo? Porque o aparelho é resultado de uma automação
e se configura como um jogo, funcionando através de movimentos repetitivos, programados por
outrem, assim, não trabalhamos com ele mas jogamos, concretizando as virtualidades contidas em
seu interior oculto, procurando esgotar-lhe o programa (FLUSSER: 2011).
A câmara obscura ou caixa preta, originalmente, é um quarto fechado a entrada da luz,
com uma pequena abertura em uma das paredes, por onde a luz pode entrar de modo a formar
uma imagem na parede oposta; tendas também foram utilizadas, de acordo com o mesmo princípio, com o objetivo de elaborar esboços de paisagens ou retratos, no século XVI. Mas os vestígios
da câmara obscura remontam a antiguidade. A primeira referência ao fenômeno de formação da
imagem é atribuída a Aristóteles no século IV a.C., que relata a imagem de um eclipse parcial do
sol, observado sob uma árvore frondosa. A luz do sol passando pelas pequenas aberturas entre as
folhas produzia o desenho do sol eclipsado no solo. Em 1038, os estudos de ótica do sábio árabe
Al Hazen em Constantinopla, descrevem o uso do aparato para observações de eclipses solares
sem prejuízo da visão, relato utilizado como referência por inúmeros acadêmicos europeus, séculos
mais tarde, como o inglês Roger Bacon (1214-1294). A primeira descrição detalhada da câmara
obscura foi elaborada por Leonardo da Vinci em 1499 e a primeira ilustração foi publicada no livro
“de ratio astronomico et geometrico líber”, de Reiner Gemma Frisius, físico e matemático holandês,
em 1544.
Figura1: Gemma Frisius, Primeira ilustração
de uma câmara
95 Na evolução imagética, há momentos históricos bem distintos onde as imagens tradicionais denominadas pré-históricas,
imaginam o mundo e as imagens técnicas chamadas de pós-históricas, imaginam textos que concebem imagens que imaginam o mundo e são produzidas por aparelhos; onde a fotografia inaugura o advento da imagem técnica (FLUSSER: 2011).
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O primeiro avanço tecnológico do aparato acontece em 1550, quando o cientista milanês
Girolamo Cardano acrescenta uma lente convergente bi-convexa à frente do furo de entrada da
luz, possibilitando o emprego de uma abertura maior e consequentemente formando uma imagem
mais clara dentro da câmara. Em 1553, o cientista napolitano Giovanni Battista Della Porta em
seu tratado “Magiae Naturalis” promove a difusão do conhecimento e recomenda seu uso como
auxiliar na prática do desenho. O aperfeiçoamento da nitidez da imagem projetada foi introduzido
por Daniello Bárbaro em 1568. O veneziano incorporou um diafragma com várias aberturas na
lente convergente da câmara; até então, a possibilidade de tornar nítidos dois objetos a distâncias
diferentes da lente somente era possível diminuindo o diâmetro da abertura de passagem da luz.
Essa transformação da câmara obscura em um instrumento ótico reflete o interesse renascentista
na sistematização da perspectiva artificialis96 (FRIZOT, 1998). A câmara obscura foi largamente
utilizada na pintura ocidental a partir do período renascentista.
Quando o astrônomo e matemático fiorentino Egnatio Danti, em 1573, em “La perspecttiva di Euclide”, sugere a utilização de um espelho côncavo para reinverter a imagem, o aparato está
prestes a completar seu desenvolvimento, somente concluído em 1676, pelo matemático Johann
Strumm que desenvolve um modelo portátil que iria inspirar, por volta de 1793, Joseph Nicéphore
Niépce na elaboração da primeira câmera fotográfica quando introduziu em seu interior uma placa
sensível à luz e realizou em 1827 a primeira imagem fotográfica que se tem noticia. A popularização do dispositivo começa em 1888, quando George Eastman produz sua primeira câmera portátil,
a Kodak n.1, possibilitando um maior alcance da prática fotográfica. O processo fotográfico até
então complexo e alquímico, se torna industrial. O slogam da Kodak “Você aperta o botão e nós
fazemos o resto” correu o mundo.
Pelo processo histórico descrito, percebemos que o aperfeiçoamento da câmara obscura a
transformou em uma caixa preta, no momento em que o homem se desloca e não está mais face ao
aparato pois é engolido por ele e passa a ignorar os processos que ocorrem dentro da caixa, pois
esses se tornam mecânicos e automáticos, ou seja, programados, alienando-o frente ao aparelho
que um dia foi instrumento97. A intenção não foi apresentar o processo na íntegra mas ilustrar de
uma maneira simples os momentos mais pontuais sobre a origem da fotografia, que segundo Flusser, inaugura o advento da imagem técnica, que por sua vez, são produzidas por aparelhos. Nesse
entremeio, chamo atenção para dois momentos que considero particulares, a introdução da lente
objetiva, que a meu ver corresponde a instauração de um determinado conceito de mundo através
da perspectiva artificialis e a produção da Kodak n1, que aumenta o acesso a prática fotográfica ao
mesmo tempo que institui um novo aparelho, o da fábrica de aparelhos fotográficos que por sua
vez está programado por outros aparelhos, tais como o do parque industrial sob a programação do
econômico-social programado pelo político-cultural e assim por diante, em uma hierarquia aberta
para cima (FLUSSER: 2011, p.46).
O advento da fotografia alterou de forma sensível a subjetividade humana ao possibilitar o
registro mecânico de uma imagem semelhante a que vemos com nossos próprios olhos, porém não
podemos esquecer que todo o aparato construído advém de um discurso científico-tecnológico,
uma perspectiva artificial constituída por uma determinada ideologia. Nesse contexto, um dos
caminhos para o branqueamento da caixa preta é a imagem latente.
96 De acordo com Machado (1984, p. 32), a perspectiva artificial foi sistematizada por Leo Batista Alberti em 1443 e consiste
em um sistema de projeções geométricas destinadas a representar relações tridimensionais no plano bidimensional.
97 Segundo Flusser (2011, p.39), instrumentos são prolongações de órgãos do corpo: dentes, dedos, braços, mãos prolongados. Assim como a câmara obscura, uma extensão do olho, que visava arrancar objetos da natureza para aproximá-los do
homem, informando-o.
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A IMAGEM LATENTE – A FOTOGRAFIA PINHOLE E O NIL
A fotografia pinhole - termo em inglês que significa “buraco de agulha” - é também conhecida como fotografia estenopeica pela ausência de elementos óticos. Uma técnica alternativa
que utiliza os princípios de formação da imagem da câmara obscura, porém sem lentes objetivas.
Portanto, diante dos avanços tecnológicos, de todas as facilidades e dos imediatismos proporcionados pelos aparelhos, qual seria a razão de fazer fotografia pinhole? Pretendo apontar ao longo
do texto, alguns motivos que penso levar milhares de pessoas no mundo todo a praticar pinhole.
O NIL - Núcleo de Imagem Latente - é um coletivo de artistas visuais, formado por
fotógrafos e professores da área que se dedicam a prática da fotografia com câmara de orifício
no âmbito artístico e educacional, realizando oficinas e exposições relacionadas aos processos
alternativos de fotografia, visando a divulgação e o incentivo dessa prática, além de exercitar o
compartilhamento e a transmissão desse saber. O grupo foi formado em 2004 por Tibério França98
em parceria com Cleber Falieri99 e é responsável pelo evento de celebração do Pinhole Day - Dia
Mundial da Fotografia Pinhole - em Belo Horizonte, desde aquela data. O Pinhole Day100 é um
evento internacional criado para promover e celebrar o fazer pinhole. Acontece em um único
dia, no último domingo do mês de abril, onde todos são convocados para produzir uma imagem
utilizando a técnica pinhole. A idéia, na contra-mão tecnológica do mundo digitalizado, celebra
uma prática simples e lúdica de produção de imagem. No sitio do evento são compartilhadas as
fotografias produzidas ao redor do mundo durante o ultimo domingo do mês de abril, apresentando os diversos olhares que representam toda a singularidade desse processo fotográfico ancestral.
A escolha do NIL, entre tantos outras iniciativas semelhantes, tem uma razão de ser que
considero particular, as oficinas são iniciadas com a montagem de uma grande câmara obscura
(225 de comprimento por 200 de altura por 150 cm de profundidade/largura) e todos adentram
em seu interior, onde é transmitido o princípio de formação da imagem e sua importância na
história, facilitando o entendimento do processo fotográfico atual através da gênese da fotografia.
Figura 2: Gelka Barros, Montagem da câmara obscura durante o X Pinhole Day. Belo
Horizonte, 2011.
98 Especialista em Arte Contemporânea pela UEMG, atua no meio fotográfico desde 1986, tendo passado pelo fotojornalismo e pela publicidade. Dirigiu a Primeira Fotogaleria de Belo Horizonte, entre 2003 e 2006. Atualmente é professor de
Fotografia na Escola Guignard - UEMG e membro fundador do Fórum Mineiro de Fotografia Autoral, criado em Belo
Horizonte no início de 2010.
99 Um dos artistas brasileiros mais atuantes neste tipo de fotografia, reconhecido internacionalmente.
100 Disponível em: http://www.pinholeday.org/.
164
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A vivência desse processo aponta um primeiro passo rumo a ativação da autonomia subjetiva no momento em que se passa a conhecer a codificação interna da caixa preta, a apreensão
do sistema pode levar a uma compreensão de que estamos inseridos em um jogo simbólico regido
por interesses hegemônicos.
Em um segundo momento, são construídas as câmaras pinhole com as quais cada um irá
fotografar. As câmaras são fáceis de construir devido a utilização de materiais simples e pelo fato
do orifício substituir o uso da lente objetiva. A câmara pinhole é uma câmara obscura que pode
ser construída de diversas maneiras, os materiais mais utilizados são caixas de sapatos, latinhas
de leite em pó, caixas de fósforos, etc (existem casos de câmaras pinhole feitas em caminhões e
galpões industriais). O mais importante é a vedação da caixa. O interior da caixa deve ser totalmente pintado de preto-fosco ou forrado com papel preto. A melhor maneira de se conseguir um
furo exato é fazer um buraco maior na caixa e sobre ele colocar um retalho de metal de lata de
refrigerante com o furo da agulha, pois é esse orifício que funcionará como diafragma – abertura
por onde entra a luz. O motivo se deve ao fato do furo feito na fina lâmina de alumínio ser mais
perfeito que aquele feito no papelão grosso. O tamanho do furo deve ser o menor possível para a
definição focal e a nitidez da imagem. Sobre ele deve ser colocado um tampão que somente será
retirado no momento de tomada da imagem. Diversos efeitos podem ser obtidos de acordo com
o formato da caixa e a quantidade de furos, desde distorções a sobreposição de imagens, além
de outros, dependendo da imaginação de cada um. Essa é uma diferença fundamental entre a
pinhole e a fotografia convencional: sua característica construtiva permite a subversão da imagem
padrão estabelecida devido a ausência de lentes objetivas e à particularidade da construção artesanal do aparato, incluindo o diafragma e a interferência do fotógrafo. A construção do aparato
significa um segundo passo rumo a ativação da autonomia subjetiva no momento em que se passa
a programar o software da caixa preta, onde as virtualidades do aparelho são determinadas pelo
construtor, submetidas a sua intenção, presente principalmente no furo de agulha que realiza, esse
ato configura a particularidade do instrumento na produção da imagem.
A partir desse momento, o laboratório fotográfico é montado e as demais etapas do processo são esclarecidas. O material fotossensível requer cuidados especiais de manuseio, portanto
o carregamento e o descarregamento da câmara deve ser realizado em local seguro, ou seja, no
interior do laboratório (um outro tipo de câmara obscura), para evitar a velatura do mesmo. Pode-se usar qualquer tipo de filme ou papel fotográfico, mas para um controle maior do processo de
modo a iniciar os participantes na técnica, utiliza-se na produção do negativo, o papel fotográfico
P&B com baixa sensibilidade. Esse é outro fator interessante, as imagens em preto e branco ganham um determinado distanciamento da realidade, são recortes que permitem a percepção do
que realmente é uma fotografia, ou seja, uma representação advinda de um determinado modelo
de pensamento científico que estabelece conceitos sobre o mundo, e nesse sentido são mais “verdadeiras”, como diria Flusser (2011), por apresentarem através da ausência da cor, a sua origem na
ciência. As fotografias são reveladas através de um processo químico onde são utilizados o revelador, o interruptor e o fixador, que estabiliza a imagem no suporte. No ato de revelar as imagens
percebe-se a surpresa e o encantamento que as fotografias exercem sobre todos pois cada imagem
é única. A singularidade do que está representado confirma a transgressão das imagens dominantes e suscita no indivíduo o reconhecimento do que acabou de produzir e introduzir no mundo.
As imagens produzidas por uma câmara pinhole não simulam fielmente a realidade, são
precárias, distorcidas, acidentais, pois o fazer pinhole se caracteriza por um processo de experimentação que exige a tomada de decisões e o aprendizado via tentativa, erro e acerto. Além de
necessitar de uma exposição e de um apoio diferenciados dos da câmera convencional no momento da tomada da imagem, para evitar seu desfoque, é preciso alternar para mais ou menos o tempo
de exposição para se chegar ao resultado pretendido, sem o uso de instrumentos, tudo baseado no
próprio processo de aprendizado.
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Figura 3: Gelka Barros, Exemplo de fotografias pinhole. Mostra do processo de experimentação e aprendizado. Parque Lagoa do Nado.
Belo Horizonte, 2010.
É um processo individualizado, uma vivência temporal e visual próprias que cada um
exercita de acordo com o seu objetivo. Neste sentido, esta técnica possibilita o resgate de um saber
sensível que retira o sujeito da condição de mero espectador que aponta e clica seu aparelho automaticamente e o restitui como ator político pelas múltiplas possibilidades de produção de sentidos.
O que envolve diretamente as construções imaginárias e simbólicas do sujeito em sua relação de
ser e estar no mundo, são essas possibilidades ilimitadas que configuram a imagem latente.
A imagem latente, termo próprio utilizado no meio fotográfico, é característica da fotografia analógica, onde o filme é utilizado. Segundo Tibério França, “é aquela que se forma no filme
no momento de tomada da fotografia, quando a luz atinge a superfície fotossensível iniciando um
processo foto-químico, antes ainda do processo de revelação que torna a imagem visível”. Ampliando esse conceito para além de seu próprio termo, considero a imagem latente a configuração
da potencialidade de criação do indivíduo inscrita em sua subjetividade, porém ainda não revelada, precisando somente de um despertar.
REFLEXÕES FINAIS
A automaticidade dos aparelhos característica dos tempos atuais é embasada estritamente
em conceitos racionais que subjugam a sensibilidade, ou seja, a imaginação. Dessa forma, como o
próprio Flusser (2011: p.64) nos aponta “A função de toda crítica fotográfica seria, precisamente,
revelar o desvio das intenções humanas em prol dos aparelhos” pelo fato de que no momento em
que o instrumento passa a recorrer a teorias científicas de modo a libertar o homem do trabalho,
ele não mais articula a relação do homem com o mundo, ele o elimina do processo do experienciar
o mundo, tornando-se aparelho, isto é, automatizando a subjetividade.
A vivência do processo de formação da imagem, a possibilidade de construção do instrumento fotográfico, o fazer experimental, a experiência alquímica e o revelar da imagem latente
são etapas de um processo autônomo que permite o indivíduo se reposicionar no mundo contemporâneo. Acredito ser esse conjunto de elementos que motivam as pessoas a fazer pinhole porque
nesta experiência estética reside a potencialidade do ato de criação que permeia ao processo de
formação do indivíduo conjugando razão e sensibilidade na ampliação do campo dos sentidos.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
A fotografia pinhole permite a percepção e a construção de novos sentidos não se limitando simplesmente em informar sobre o mundo, mas se dispõe a modificá-lo, fundindo formas de
expressão e novas linguagens pois resgata o olhar subjetivo do indivíduo que pode então, passar a
jogar com o aparelho, compreendendo, alterando e consequentemente enriquecendo o jogo. Nesse
momento, onde as imagens se tornam transparentes, o indivíduo como produtor de cultura abre
caminho para a construção de suas relações com o mundo diante de qualquer aparelho.
Figura 4: Cleber Falieri, Museu de Artes e ofícios - Praça da Estação. Belo Horizonte,
2011.
REFERÊNCIAS
FALIERI, Cleber. Manual prático de fotografia pinhole. Disponível em: <http://www.eba.ufmg.br/
cfalieri/pinhole.html>. Acesso em: 17 Nov. 2011.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta: Ensaios para uma futura filosofia da fotografia. São Paulo:
Annablume, 2011.
FRIZOT, Michel. A new history of photography. Köln: Könemann, 1998.
KEMP, Gregg. Wordwide Pinhole Photography. Disponível em: <http://www.pinholeday.org/>.
Acesso em: 17 Nov. 2011.
MACHADO, Arlindo. A ilusão especular: introdução à fotografia. São Paulo: Brasiliense, 1984.
ROSENBLUM, Naomi. A world history of photography. Nova Iorque: Abbeville, 1997.
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DADOS E RELATOS DE LAZER EM ITAJUBÁ (MG) A PARTIR DA EXPERIÊNCIA
DE UM PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
Paulo Cezar Nunes Junior101
RESUMO: Este texto visa relatar os resultados da execução do projeto de extensão universitária
“Lazer e espaço urbano em Itajubá: diagnóstico e proposta de novos usos”. Serão apresentados aqui
dados de levantamento e diagnóstico referentes à primeira fase do projeto: localização de equipamentos por bairros acesso a pessoas com necessidades especiais, tipo de instituição, manutenção
e disposição do espaço. Os principais resultados mostraram que a cidade apresenta distribuição
desigual de espaços de lazer, mostraram ainda que igrejas e escolas são centros de atividades de
lazer importantes nos bairros.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Espaço Urbano. Extensão Universitária.
INTRODUÇÃO E OBJETIVOS
Há cerca de um ano atrás, na ocasião do XII Seminário O lazer em Debate, foi apresentado o projeto “Lazer e espaço urbano em Itajubá: diagnóstico e proposta de novos usos” (NUNES
JUNIOR, 2011). Tal projeto, executado entre janeiro e dezembro de 2011 a partir de recursos do
Ministério da Educação teve como objetivo geral realizar um levantamento dos espaços de lazer
existentes na cidade de Itajubá (MG), perceber os principais usos feitos por parte da população em
cada um deles e propor ações de promoção de lazer e atividades culturais na cidade.
Por meio de fichas diagnósticas, foram mapeadas áreas físicas e redes de lazer na cidade.
A partir destes dados, a idéia seria fomentar atividades e interlocuções entre estes espaços/redes a
fim de se ampliar o acesso aos bens e atrações culturais na cidade, proporcionando novas formas
de usos, atividades, eventos e festivais de temas ligados ao lazer, cultura e arte em diferentes áreas
do município.
Passados estes doze meses de trabalho, apresentaremos neste artigo os principais dados e
relatos de experiência advindos das experiências com o projeto, principalmente no que diz respeito
à Etapa 1- Levantamento e Diagnóstico.
Esperamos que as informações e as reflexões a seguir possam de alguma forma subsidiar
ações, projetos de extensão e pesquisas dos profissionais ligados ao campo do lazer e áreas afins.
101 Mestre em Educação Física – Universidade Estadual de Campinas. Professor Assistente II – Universidade Federal de
Itajubá. Email para contato: [email protected]. Este artigo é fruto das ações do projeto “Lazer e espaço urbano:
diagnóstico e proposta de novos usos”, financiado pelo edital PROEXT, Edital N. 5 de 2010 - Ministério da Educação.
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METODOLOGIA
Em um primeiro momento, este projeto cobriria apenas bens que são habitualmente considerados como equipamentos culturais: cinemas, museus, centros culturais, praças, etc. Porém,
com o passar do tempo decidimos incluir outros tipos de equipamentos, a princípio sem relação direta com nossas práticas de lazer populares. Isso porque o contato de perto com o campo
(MAGNANI, 2002), com as ruas, com as pessoas, com os detalhes materiais e imateriais que se
apresentaram nos forçaram a uma classificação mais aberta do que seriam estes equipamentos.
Isso não implicaria necessariamente em uma refutação dos diversos tipos de classificação
e categorias criadas no campo do lazer. Entendemos que esforços neste sentido, como aqueles
preconizados pelo pesquisador Renato Requixa no início da década de 80 (REQUIXA, 1980), são
importantes e relevantes para o campo do lazer.
Assim, no andamento do projeto nos utilizamos tanto dos aspectos qualitativos, tal como
o processo de apropriação ser humano-entorno físico (POL, 2006), os elementos imateriais (SANTOS, 1996) presentes na produção destes espaços (fluxos de pessoas, formas de acesso, horários
de funcionamento, calendário de atividades, etc.); quanto os aspectos quantitativos: número de
equipamentos, distribuição por bairros, recursos infraestruturais, acesso a pessoas com necessidades especiais, etc.).
Neste artigo daremos especial atenção aos dados quantitativos/numéricos através da apresentação dos gráficos e tabelas no tópico a seguir.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Conforme dito, os dados apresentados dizem respeito a Etapa 1- Levantamento e Diagnóstico do projeto “Lazer e espaço urbano em Itajubá: diagnóstico e proposta de novos usos”, quando
foi feito um levantamento de todos os espaços de lazer e cultura da cidade de Itajubá.
Cada um dos espaços elencados para esta pesquisa teve um caderno de registros qualitativos feito pelos bolsistas integrantes do projeto: freqüência, público usuário, atividades desenvolvidas, calendário de eventos, etc.
Dentro desta etapa, foram estipulados dois roteiros: um primeiro, com o objetivo de mapear as áreas físicas propriamente ditas, com oito pontos principais de classificação: tipo de equipamento, denominação, localização por bairros, dimensões, descrições gerais de ordem física, entorno, acesso e coleta de imagens (fotografias).
O segundo, responsável por fazer o registro das redes de lazer do município: pessoas, grupos, cargos, etc. Trata-se de uma planilha onde consta o registro de dados básicos de possíveis
líderes, gestores e artistas locais tais como nome, email, e telefone; além de outras informações
relativas a sua participação em iniciativas e grupos de lazer na cidade.
Em contato com a prefeitura, conseguimos um mapa do município onde constam os bairros, avenidas e ruas da cidade. A partir daí fizemos a divisão dos alunos bolsistas por área, e cada
dupla ficou responsável pelo mapeamento geral de oito bairros da cidade.
Mapeamos ao todo 96 espaços de lazer, e 64 contatos de pessoas que, de uma forma ou de
outra, inserem-se nos circuitos de atividades esportivas, artísticas, culturais de Itajubá. Os dados
destas redes foram importantes para a criação de redes de trabalho que posteriormente acionamos
para participar de um festival de arte e cultura, ocorrido em outubro de 2011.
A seguir, apresentamos os gráficos e tabelas mais relevantes oriundos deste trabalho:
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O Gráfico 1 apresenta a distribuição dos espaços de lazer da cidade por bairros. Os 96 espaços estão divididos entre os 26 bairros da cidade mapeados de maneira não equilibrada: o Bairro
Centro apresenta a maior concentração de espaços, com 17 no total, seguido pelo Bairro Varginha
com 10 equipamentos e bem próximo a região mais central da cidade.
Diferentemente do que ocorre normalmente, os bairros que vem a seguir nesta escala
intercalam-se entre áreas mais vulneráveis e regiões nobres da cidade. Tal situação explica-se pelo
fato do mapeamento considerar também igrejas e escolas, conforme indica a legenda do Gráfico
2. A primeira vista, pode parecer que a cidade dispõe de inúmeros espaços de lazer: 96 equipa-
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
mentos para uma população de 60 mil habitantes é um número bastante razoável se comparado
com outros estudos realizados sobre a temática da distribuição espacial de áreas de lazer. Porém,
como pode ser visto no Gráfico 2, excetuando-se os chamados equipamentos não específicos, este
número cai para 35% da disponibilidade existente hoje.
O Gráfico 2 indica ainda a distribuição por tipologia, segundo a função específica de
cada espaço. Nele, podemos perceber um alto número de praças e áreas verdes (25,5% do total)
incluindo-se aí pracetas, vias de passagem ajardinadas e outras áreas menores que muitas vezes
não podem ser tomadas ao pé da letra como espaço de lazer devido a quantidade restrita de usos
que proporcionam.
A segunda maior parcela diz respeito às escolas e outras instituições de ensino, provando
que trata-se de um local privilegiado para as práticas de lazer principalmente nas áreas mais vulneráveis da cidade (conforma consta na distribuição observada no Gráfico 1). Como muitas das
vezes os bairros periféricos carecem de espaços para o lazer, a comunidade em geral se organiza
em torno de escolas e instituições de ensino uma vez que são capazes de aglutinar famílias e redes
de todo o bairro.
Chama a atenção também a alta porcentagem de espaços de caráter privado (clubes, academias de ginástica, escolas de dança, luta e alguns auditórios). Além da disponibilidade estar
aquém daquela necessária por parte da população, muitas das vezes o acesso fica ainda mais restrito por conta de custos e privilégios advindos da iniciativa privada.
O Gráfico 3 diz respeito a qualidade de manutenção de cada espaço, e a alta média das
classificações boa/ótima (75,5%) dizem respeito a grande quantidade de áreas privadas ou sob
administração de órgão e colegiado público (a exemplo das igrejas e escolas). A manutenção razoável/ruim não chega a 5% do total de áreas mapeadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os números descritos acima representam quantitativamente o mapeamento feito no decorrer do projeto. Porém, há inúmeras entrelinhas, inúmeras considerações qualitativas entre cada
um deles, uma vez que a resultante das forças que participam da formação do espaço urbano e
da constituição do lazer na realidade observada deve ser construída na direção do espaço para
o tempo livre (NUNES JUNIOR, 2009, 2010), e não apenas em conceitos e classificações soltas
destes equipamentos.
Por isso mesmo, é preciso colocar o olhar próximo à realidade, no esforço de compreender
qual a relação estabelecida entre o sujeito e o espaço do qual ele participa, principalmente por
trata-se de um projeto de extensão universitária.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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Depois dos primeiros meses de aplicação do projeto, nas etapas seguintes foram feitas propostas diretas de atividades e programação em alguns dos espaços de lazer, arte, cultura da cidade
de Itajubá, de acordo com as demandas surgidas e com as redes formadas. Nas etapas posteriores,
os gráficos, números e informações foram importantes para nortear nossas ações práticas. Porém,
mais importante ainda foram as pessoas, as redes, as vontades, a força transformadora que nasceu
de cada um que conheceu e se reconheceu nas atividades desenvolvidas.
Os meses seguintes serviram para organizarmos um grande Festival de Lazer, Arte e Cultura na cidade de Itajubá, e contou com inúmeras parcerias, dezenas de voluntários e grupos do
município ligados ao tema da cultura, arte e lazer.
Entre tantas cenas e aprendizados vivenciados ao longo deste ano, conseguimos conferir a
Universidade o papel educacional que lhe cabe, por meio da extensão com a comunidade. Através
do grande tema do lazer e na cidade de Itajubá, tomamos como categoria de análise o espaço,
investigando seus usos e suas formas de apropriação por parte do público e da cultura local. Nesta
relação dialógica entre Universidade e Sociedade pudemos pesquisar e vivenciar na prática a construção e a implementação de ferramentas para auxiliar na ação e nas estratégias que possibilitem
atividades de lazer, cultura e arte transformadoras.102
REFERÊNCIAS
MAGNANI, J. G. C. De perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana. Revista Brasileira
de Ciências Sociais, São Paulo, v. 17, n. 49, p. 11-29, 2002.
NUNES JUNIOR, P. C. Espaço para o tempo livre. Considerações sobre lazer e apropriação
do espaço urbano no Parque do Ibirapuera. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de
Campinas. Campinas, 2009. 89f.
NUNES JUNIOR, P. C.; AMARAL, S. C. F. Entre a marquise e a pista central. Espaço para o
tempo livre no Parque do Ibirapuera. Movimento, v. 16, n.2, 2010. p. 249-265.
NUNES JUNIOR, P. C. Extensão universitária em campo: lazer e espaço urbano em Itajubá MG.
In: Seminário O Lazer em Debate. Escola de Artes e Ciências Humanas – Universidade Estadual
de São Paulo, 2011.
POL, E. La apropiación del espacio. In ÍÑÍGUEZ, L.; POL, E. (Coord.). Apropiación, cognición
y representación ambiental: monografías psicosocioambientales. Barcelona: PUB, 1996. p. 45-62.
REQUIXA, R. Sugestões de diretrizes para uma política nacional de lazer. São Paulo: SESC, 1980.
SANTOS, M. A natureza do espaço. São Paulo: Hucitec, 1996.
102 Agradeço aos alunos bolsistas que participaram de toda a execução do projeto: Cinthya Oestreich Silva, Leandro Torres
Menezes, Déborah Vieira Pinto Aguiar, Fernanda C. Pedrezzini de Paula, Jean Carlo Nemanis Cascardo, Jonas Henrique dos Santos e Mauro Arantes. Agradeço ainda a ajuda indispensável de todos os colaboradores, especialmente Janir
Coutinho Batista e Andressa Coutinho Batista.
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ENTRE TRABALHAR E BRINCAR: A RUA E SUAS TENSÕES
Túlio Campos103
RESUMO: Este texto traz reflexões acerca das relações estabelecidas entre o trabalho e o brincar no cotidiano das crianças e dos jovens que praticam o malabares nos sinais de trânsito de
uma grande metrópole. Tendo a etnografia como metodologia de aproximação dessa realidade, foi
possível constatar que não há uma separação nítida entre o trabalho e o brincar, apesar de constituírem universos distintos. Na conjuntura das práticas sociais desses sujeitos, o tempo do brincar
e o tempo do trabalho integraram a mesma dinâmica social, estabelecendo relações dialéticas no
contexto da cidade.
PALAVRAS CHAVE: Infância. Trabalho. Brincar.
INTRODUÇÃO
Este ensaio busca discursar de que forma o trabalho e a brincadeira estabeleceram suas
relações no cotidiano das crianças e dos jovens que praticam o malabares nos sinais de trânsito em
Belo Horizonte. Seus apontamentos são parte integrante da dissertação intitulada Pequenos Trabalhadores nos Sinais e suas Experiências no Cotidiano da Rua: entre o “espetáculo” do malabares e as
brincadeiras, os riscos e as tensões do trabalho explorado104. O estudo propôs como objetivo compreender como as crianças e jovens do malabares nos sinais de trânsito vivenciam suas experiências
no cotidiano do trabalho explorado de uma grande metrópole.
O processo de construção da pesquisa adotou como referenciais teórico-metodológicos
os estudos de diferentes áreas do conhecimento, tais como: Antropologia, Sociologia, Psicologia,
Educação, História, Filosofia, dentre outras. Em especial, destacaram-se, no estudo, a Antropologia Urbana e a Sociologia da Infância. A metodologia105 adotada no estudo, a etnografia, possibilitou a compreensão dos aspectos históricos, sociais e culturais presentes no contexto de vida das
crianças e jovens nos sinais, além de revelar aspectos que circunscrevem a exploração do trabalho
infanto-juvenil nas ruas da metrópole pesquisada, acreditando que “os estudos das crianças a partir de si mesmas permite descortinar uma outra realidade social” (SARMENTO; PINTO, 1997,
p. 25). Concomitantemente, destacou-se a importância do constante diálogo entre a bibliografia
consultada e as questões que emergiram das observações de campo. Nesse aspecto, cabe apontar
que “em etnografia, o dever da teoria é fornecer um vocabulário no qual possa ser expresso o que
o ato simbólico tem a dizer sobre ele mesmo – isto é, sobre o papel da cultura na vida humana”
(GEERTZ, 1989, p. 380).
103Mestre em Lazer pela UFMG. Professor de Educação Física da Rede Municipal de Belo Horizonte – MG e Docente do
Centro Universitário de Sete Lagoas – UNIFEMM/MG. Contato: [email protected]
104 Dissertação defendida em junho de 2010 no Programa Interdisciplinar de Mestrado em Lazer da Universidade Federal de
Minas Gerais de minha autoria, sob a orientação do Professor Dr. Walter Ernesto Ude Marques (Orientador) e Professor
Dr. José Alfredo Oliveira Debortoli (Co-Orientador). Cabe ressaltar que os procedimentos metodológicos propostos pela
pesquisa foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais.
105Maiores detalhes a respeito do caminho metodológico adotado no estudo ver: CAMPOS, T.; MARQUES, W. E. U.;
DEBORTOLI, J. A. A Cidade e Seus Sinais: A Construção de uma Pesquisa com as Crianças do Malabares. Revista Licere, v.
14, n. 2, junho de 2011. Disponível em: <http://www.anima.eefd.ufrj.br/licere/pdf/licereV14N02_a5.pdf>. Acesso em 13
de março de 2012.
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APONTAMENTOS INICIAIS
Tendo como referência trabalhos anteriores106 foi possível constatar a existência de um
volume considerável de estudos produzidos referentes à realidade do trabalho de crianças no cotidiano rural e urbano. Alguns autores, como Silva (2002) e Marques (2000), destacam em seus
estudos que, na maioria das pesquisas que tratam do tema da exploração do trabalho infantil,
a ênfase apresenta-se circunscrita aos aspectos jurídicos, econômicos e demográficos, em detrimento aos estudos de cunhos sociais, históricos e culturais. Como assinala Silva (2002, p. 29),
raramente os estudos, principalmente sobre o mundo do trabalho, reconhecem o significado social
de suas contribuições para a construção dos elementos “macro e microssociais da vida cotidiana”.
No mundo contemporâneo, a exploração do trabalho infanto-juvenil107 constitui uma temática destacada por diferentes órgãos internacionais. No entanto, diante dos expressivos avanços
tecnológicos, das importantes conquistas no campo jurídico e dos movimentos sociais de combate
à presença da criança e do adolescente no mundo do trabalho, esse tipo de atividade ainda se faz
presente em diversos setores produtivos, que vão desde a agricultura até a grande indústria, passando, também, pelos diferentes contextos sociais, como nos grandes centros urbanos. No Brasil,
estima-se que os números ultrapassam os 5,1 milhões de crianças e adolescentes em situação de
trabalho precoce, perigoso e insalubre (SILVA, 2007).
Contudo, em decorrência das ações lideradas pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) as estatísticas revelam quedas
dos números de crianças inseridas no trabalho explorado108. Contraditoriamente, nesse contexto,
outros estudos109 têm evidenciado renovadas formas de inserção de crianças e jovens neste tipo
de atividade, quase nunca apontadas nas pesquisas realizadas pelos governos, de modo que se
constata um crescimento no número de pequenos trabalhadores e de seus familiares em busca de
estratégias para o complemento da renda familiar, como tentativa de manter a sobrevivência do
grupo. Nessa perspectiva, Silva (2007) destaca o chamado “trabalho clandestino e invisível”, quais
sejam: trabalhadores em casas de farinha e em lixões; lavadores de carros; sacoleiras; malabares e
vendedores de balas em semáforos das grandes e médias cidades; trabalhadores domésticos, sobretudo, feminino; dentre outras atividades ilícitas.
No caso da realidade pesquisada – uma metrópole – constatou-se a tensão entre ser criança e sua relação com o mundo do trabalho explorado. Pesquisas relacionadas à temática – Infância
e Trabalho – destacam que a presença da criança no cotidiano do trabalho explorado compromete
o tempo de sua infância, “sonegam o tempo para o lúdico, afeta a escolarização e, consecutivamente, detona situações de constrangimentos que repercutem na construção da identidade da
criança” (SILVA, 2001, p. 10). Frente a isso, tais apontamentos levaram-me a problematizar como
as crianças, – entendidas como uma categoria social –, realizam suas experiências no contexto da
cidade, principalmente nos aspectos que se referem à exploração do trabalho infantil.
106 Sobre a temática do trabalho infantil, destacam-se: Marin (2005); Oliveira (1994); Marques (2000); Martins (1993); Silva
(2007). Apontam-se também estudos realizados pela OIT e UNICEF, dentre outros.
107 Para fins de esclarecimento e em consonância com as observações apontadas por Silva (2007), no estudo optou-se por adotar o termo “exploração do trabalho infantil”, já que existe, ainda, no senso comum, tanto na academia, nas instituições
e órgãos oficiais, bem como, na mídia e na população em geral, concernente à temática, uma idéia de que todo trabalho
infantil é explorado, sem uma análise mais crítica das atividades realizadas no contexto do trabalho realizado por crianças.
108 Segundo a pesquisa nacional por amostra de domicílio (2007), do contingente de 44,7 milhões de crianças e adolescentes
de 5 a 17 anos de idade, 4,8 milhões estavam trabalhando. De acordo com os dados encontrados, a estimativa apontou
redução em relação a 2006, quando existiam, no País, 5,1 milhões de trabalhadores nesta faixa etária. Maiores detalhes
estão disponíveis em: <http://www.ibge.gov.br/home>. Acesso em: 05 mar. 2009.
109Nessa perspectiva, destacamos: Martins (1993), Marques (2000), Silva (2007), Graciani (2005), Marin (2005), dentre
outros.
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No que tange às tensões entre o trabalho infanto-juvenil explorado e o brincar, na área
rural e no âmbito urbano, o brincar constitui um assunto que mobiliza diversos questionamentos,
tais como, por exemplo: Qual a relação entre o ser criança e o brincar diante do trabalho explorado?
De que maneira o brincar se anuncia quando se faz presente no contexto da exploração do trabalho de
crianças e jovens? Qual o sentido do brincar para esses sujeitos? Estas mesmas indagações permearam
o estudo.
Autores como Martins (1993) e Silva (2001, 2003), dentre outros, afirmam que as crianças no universo do trabalho explorado podem ser caracterizadas como “sem infância”. Segundo
Martins (1993), a concepção de criança sem infância diz respeito ao que está acontecendo com as
crianças do Brasil e do outros países do chamado Terceiro Mundo. Nesse aspecto, o mesmo autor
afirma que “a criança absorvida, já como mão-de-obra excedente, pelo mercado de trabalho, tem
seu destino inteiramente submetido ao processo de reprodução do capital e da sociedade” (p. 16).
Nas considerações de Silva (2003, p. 54), a presença da criança no trabalho explorado compromete a infância, envolvendo “constrangimentos que desencadeiam o dilema e o impasse de ser
duplamente alienado, ou seja, ser criança e ser adulto ao mesmo tempo, ser criança e trabalhar
precocemente”.
Estes pesquisadores ainda enfatizam que, no sistema de produção capitalista – exaltação
à produtividade e ao consumo –, o brincar e o lazer/lúdico tornam-se cada vez mais negados, já
que passam a ser encarados enquanto um tempo improdutivo e irresponsável. Não obstante, essas
argumentações são utilizadas para justificar a ocupação das crianças pobres pelo trabalho – o que
chamamos de valor moral do trabalho (RIZZINI, 2002) e, ainda, subsidiar explicações para o preenchimento dos tempos e dos espaços das crianças de outras classes sociais com atividades ditas
mais “responsáveis”, mais “pedagógicas” e mais “profissionalizantes” para um mercado de trabalho
cada vez mais exigente e competitivo, como nos afirma Marques (2000, p. 173).
Todavia, outros estudos também enfatizam que as crianças criam situações para viver seu
ser criança, reivindicando seus direitos por meio da subversão de ordens e hierarquias que não
levam em consideração suas condições de vida e sua singularidade (MARQUES, 2000; SILVA,
2007). Nessa perspectiva, inspirado em Marques (2000, p. 172), indaga-se: Qual a temporalidade
dos pequenos trabalhadores nos sinais para vivenciarem o seu brincar e o seu ser criança?
No cotidiano das crianças e dos jovens nos sinais, mesmo quando entremeado com o trabalho, o brincar se expressa como uma capacidade de encontrar brechas perante a realidade que
lhe é imposta, trazendo a esperança de gerar alguma transformação (DEBORTOLI, 1999; MARQUES, 2000; SILVA, 2007). Nesse contexto, presenciei várias circunstâncias que evidenciaram
tensões entre o trabalho e o brincar, como pretendo discorrer nos próximos escritos.
A CRIANÇA QUE TRABALHA É A MESMA QUE BRINCA?
Ao acompanhar as crianças e os jovens nos sinais fez-se possível perceber claramente
que não há uma separação nítida entre o trabalho e o brincar, apesar de constituírem universos
distintos. No cotidiano desses sujeitos, o tempo do brincar e o tempo do trabalho integraram a
mesma dinâmica social, estabelecendo relações dialógicas no contexto da cidade. A partir desses
apontamentos, o contato com a bibliografia permitiu assinalar que “brincar em serviço” já era
detectado no início do século nas indústrias e, também, nos demais espaços onde se fazia presente
a exploração do trabalho de crianças e jovens (PRIORE, 2002; RIZZINI, 2002).
No contexto da rua pude observar a presença do brincar em diversas ocasiões. As brincadeiras compartilhadas entre as crianças e os jovens nos sinais aconteciam entremeadas com a
realização do malabares, mais freqüentes no momento em que aguardavam o fechamento do semáforo. Os dados coletados assinalaram para uma grande diversidade de brincadeiras, tais como
brincadeiras de escolha e adivinhação, danças, músicas, jogos e brincadeiras tradicionais, manifesColetânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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tações esportivas, dentre outras. Nesse aspecto, a maioria das atividades observadas manifestou-se
no coletivo, como nos afirmam Gomes e Gouvêa (2008), é nas brincadeiras coletivas que esses
sujeitos vivenciam “conflitos, atos de solidariedade, amizade e rompimento, numa dramaticidade
que teatraliza o que se observa no mundo adulto”. De maneira complementar, Gouvêa (2002, p.
25) afirma que: “esse caráter coletivo da produção infantil irá também expressar-se numa sociabilidade própria, os grupos de pares. A criança necessita do grupo para situar-se no mundo, estabelecendo uma relação diferenciada com os adultos”.
No campo pesquisado foram observadas as seguintes brincadeiras: lutas/porradinha – “golpes de proteção110” –; futebol de prego ou moedas; brincar de cabana; futebol com coco vazio e bola
de tênis; futebol com porradinha; “chutinho” ou embaixadinha; jogo da moeda; adedanha; dois
ou um; ímpar-par; brincadeiras com o bastão; acrobacias (dar estrela, mortal para trás e plantar
bananeira) realizadas no asfalto – no espaço disputado entre automóveis, ônibus e motocicletas –;
desenhar no caderno de campo; tapão ou bafão; qual é a cor111; músicas. Em muitas ocasiões, objetos como o bastão, as varetas, as garrafas tipo pet, as caixas de papelão, as bolas de tênis, o coco
vazio, as pedras e folhas do canteiro central se configuravam como brinquedos para as crianças,
como, por exemplo, as varetas “transformaram-se” em “espadas”, as pedras em bolas de futebol,
dentre outras formas de brincar. Perante esses apontamentos, podemos destacar que, “o brinquedo
adquiri aqui uma outra função importante: a de despertar imagens que dão sentido ao mundo que cerca
a criança, à vida que está envolvida, e às acções que tem que praticar” (AMADO, 2008, p. 92).
Ao averiguar a presença do brincar no contexto dos sujeitos pesquisados, as tensões entre
ser criança e ter que trabalhar circunscreveram-se em relações paradoxais no dia-a-dia das crianças
e dos jovens nos sinais, traduzindo-se em práticas de resistências, de formas de liberdade e de reivindicações por melhores condições de vida. No que se refere ao contexto da rua, Graciani (2005,
p. 149) afirma que a partir do brincar a criança “afirma-se, constrói-se, revê-se no mundo, cria
saber e conhecimento sobre seu universo, como ato de criação”. Nesse sentido, Silva (2007, p.71)
pondera que:
O que realmente está em jogo, no meu entendimento, é o fato de elas brincarem numa realidade
destruída pela racionalidade capitalista e, mesmo assim, se imporem como seres sociais, resistindo ludicamente, anunciando, enfim, um outro projeto de sociedade.
Durante a permanência das crianças e dos jovens nos sinais, os momentos das obrigações
– auferirem determinada renda ao final do dia ou desempenhar determinações do grupo – foram
preenchidos com momentos do brincar. Não raro, essas formas de resistência tornaram-se alvo de
vigilância e fiscalização por parte de alguns colegas do malabares, para se tentar evitar que o trabalho ficasse prejudicado. Esse tipo de ação também foi constatada por Marques (2000). O autor
nos indica que, durante o trabalho nas ruas, os pequenos trabalhadores estavam sob constante
vigília das mães e dos irmãos adolescentes. Nessa perspectiva, afirma:
Nesse contexto a relação entre o trabalho e o brincar é permeada por uma constante tensão
ante a necessidade de auferir dinheiro e a necessidade de um tempo de liberdade para viver a
liberdade, ou seja, para se ter tempo livre (MARQUES, 2000, p. 177).
De acordo com Certeau (1994, p. 40), esses sujeitos “[...] pelo prazer de inventar produtos
gratuitos destinados somente a significar por sua obra um saber-fazer pessoal (...) realiza ‘golpes’ no
terreno da ordem estabelecida”. Dessa forma, fica notório que viver o brincar para esses sujeitos diz
110 Nome dado pelos sujeitos.
111 Brincadeira de adivinhação na qual as crianças pegavam o maço de cigarros vazio e alguém teria que descobrir a cor do
papel interno.
176
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
respeito à temporalidade do ser e da sua história como sujeito que participa e atua na sociedade,
portanto, “precisa da atividade, da ação para compreensão do universo social e natural” (GOUVÊA, 2002, p. 21). Nesse sentido, a fotografia presente na figura abaixo ilustra a tensão entre o
brincar e o trabalho, entendendo que “a criança vai além da realidade significada pelo mundo
adulto, ao atribuir ao que a cerca um sentido próprio, transgredindo o real” (Ibidem).
Figura 1: O jogo do adedanha na organização do trabalho. O brincar e o trabalho se confundem. Arquivo pessoal. Maio de 2009.
Dessa forma, ao observamos a figura acima e sua relação com o contexto das crianças
e dos jovens nos sinais, podemos, a partir de Silva (2003), afirmar que é nessas situações que as
crianças reivindicam o direito do brincar, ajudando-nos a repensar o significado social, cultural e
político-pedagógico do brincar, do tempo do lazer/lúdico, na constituição da infância. Além disso,
questionam a “menorização” (CASTRO, 2001) da criança, ou seja, o pensamento que as consideram seres que vivem no mundo irreal e isolado, que despreza e desvaloriza seus conhecimentos e
experiências.
Para Brougère (2001) a criança ao brincar está envolvida em um processo de aprendizagem
ativa no sentido de que ela não se submete às regras e artefatos do mundo adulto, mas aprende a
transformá-las ou negá-las. Diante disso, as práticas sociais desses sujeitos permitem questionar
aquilo que até o momento têm sido os grandes mitos da infância e das concepções tradicionais,
como nos salienta Maria Manuela Ferreira (2008, p. 146):
das crianças como seres em défice, simples objetos passivos e meros receptáculos de uma ação
de socialização; ii) da socialização como um processo vertical e unívoco, conduzido exclusivamente por adultos que o lideram, de acordo com objetivos claramente definidos e em benefício
da reprodução social; iii) do brincar como ação natural e espontânea das crianças, credo único e
emblema das atividades da infância; iv) do grupo de pares como forma de organização heterônima e genuína, de cuja suposta homogeneidade estão isentas relações sociais desiguais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o olhar voltado para as perspectivas apontadas pelos autores e, principalmente, pelas
observações realizadas no estudo, o brincar assumiu o papel de sociabilidade, expressão e afirmação da cultura das crianças e dos jovens nos sinais. Segundo Sarmento (2004), as culturas infantis
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177
radicam e desenvolvem-se em modos específicos de comunicação intrageracional e intergeracional. Sendo assim, possuem relações dimensionais, constituem-se nas interações entre os pares e
com os adultos, organizando-se, nessas relações, formas e conteúdos representacionais distintos;
no contexto da cultura societal em que se inserem – diferente da dos adultos –, ao mesmo tempo
em que veiculam formas especificamente infantis de inteligibilidade, representação e simbolização
do mundo.
Por fim, ao acompanhar esses sujeitos foi possível perceber claramente que há uma tensão
nítida entre o brincar e o trabalho, que se expressa por relações dialógicas no contexto dessa atividade. Ficou claro que viver o brincar para as crianças e os jovens dos sinais diz respeito à temporalidade do ser e da sua história como sujeito que participa e atua na sociedade, reivindicando
seu direito ao brincar.
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179
O LAZER NAS COOPERATIVAS DE TRABALHO
Daniel Bidia Olmedo Tejera112
Carmen Maria Aguiar113
RESUMO: Através deste trabalho, analisaremos de que forma ocorre ás atividades de lazer dos
trabalhadores e trabalhadoras de algumas Cooperativas de Piracicaba. O objetivo é identificar se
os estes trabalhadores têm o lazer como parte do seu cotidiano e qual a importância que esse tipo
de vivência tem na rotina deles. Na sociedade urbana, somos condicionados a separar o trabalho
do lazer, é como se essas duas manifestações não pudessem ocorrer no mesmo espaço e tempo. A
metodologia utilizada foi uma combinação de pesquisa bibliográfica e de campo. As Cooperativas
aqui referidas, eram em sua grande maioria constituídas por grupos mistos de homens e mulheres,
compartilhavam uma realidade da baixa renda e baixa escolaridade. Os grupos tiveram muitos
problemas no que diz respeito a constantes quebra de estrutura e falta de organização. O resultado
deste trabalho nos coloca a pensar até a onde a relação das vivências dessas pessoas na escola, bem
como sua condição social exerceu influencia na sua opção de como utilizar o tempo fora do trabalho. Partindo deste princípio, vemos a necessidade de uma ação educativa que venha estimular
a vivência mais legítima do tempo.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Ócio. Cooperativas de Trabalho.
INTRODUÇÃO
Através deste trabalho, analisaremos de que forma ocorre ás atividades de lazer dos trabalhadores e trabalhadoras de algumas Cooperativas de Piracicaba. Versaremos aqui sobre a compreensão do tipo de lazer experimentado por essas pessoas e de que modo eles veem esse tipo
de atividade. Este estudo acaba tornando-se interessante na medida em que foi realizado com
pessoas que lutam para aumentar seu orçamento familiar e construir um espaço de trabalho com
dignidade, partilha e construção nas diferenças, igualmente buscam uma renda fixa e ascender
socialmente. Dai surge a questão: como que essas pessoas – ainda em busca de condições dignas
de vida através do trabalho – utilizam e percebem o seu tempo de lazer, já que este proporciona
momentos não propícios ao lucro, considerando o contexto social em que vivemos, cuja atividades
que não geram lucro ou capacitação para gerá-lo é considerada “perda de tempo”.
Segundo Pereira (2002, p.7), sociedade cooperativa trata-se de um grupo de pessoas “[...]
com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para
prestar serviços aos seus associados”. Podemos ter um melhor entendimento ao complementar com
o esclarecimento de Ferreira (1999, p, 549) ao referir-se ao termo como sendo uma “sociedade ou
empresa constituída por membros de determinado grupo econômico ou social, e que objetiva desempenhar, em benefício comum, determinada atividade econômica”. Não possui fins lucrativos,
ou seja, os lucros obtidos não devem beneficiar a pessoa jurídica da cooperativa, mas apenas os
seus associados através das sobras líquidas do exercício (PAMPLONA, 1999 apud. PEREIRA,
2002).
112 Mestrando pelo DEF/IB Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Rio Claro/SP – Bolsista CNPq / Integrante do GPL e-mail: [email protected]
113 Professora Doutora do DEF/IB Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Rio Claro/SP e-mail: [email protected]
180
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Em grande parte das vezes a remuneração como resultado de trabalhos cooperativos demora consideravelmente para ser significativa. Desse modo, não sobra tempo para quase mais
nenhuma tarefa, e menos ainda para uma atividade cujo retorno financeiro não seja o foco, como
é o caso do lazer.
Quatro cooperativas participaram da nossa pesquisa, foram elas: Cooperativa de Costureiras e bordadeiras do Centro, Cooperativa dos Recicladores Solidários, Cooperativa de Costureiras
do Jardim Oriente e Cooperativa dos Guardadores de Carros (Flanelinhas), as duas primeiras já
regularizadas e registradas, e as duas últimas ainda em processo de formação.
OBJETIVO
Identificar se os trabalhadores das cooperativas de Piracicaba têm o lazer como parte do
seu cotidiano e qual a importância que esse tipo de vivência tem na rotina deles.
REVISÃO DE LITERATURA
Culturalmente, na sociedade urbana, somos condicionados a separar o trabalho do lazer,
é como se essas duas manifestações não pudessem ocupar o mesmo espaço (ZANIN, AGUIAR
E MORELLI, 2006). Mesmo que de maneira rara, ainda é possível encontrar comunidades cujo
estilo de vida se alterne no decorrer de sua rotina entre a ludicidade e o trabalho, sem delimitações
de tempo e espaço para que isso ocorra. É o caso do “povo da Barra”– comunidade que vive semi-isolada na Barra da Aroeira, região norte do Brasil – assim denominado pelas povoações vizinhas
(AGUIAR, 1994)
Segundo Mirleide Chaar Bahia, registros revelam que:
[...] no século XVIII, não havia uma divisão que separasse, na vida das pessoas, instâncias tão
próximas e inter-relacionadas como lazer – trabalho – meio ambiente. O trabalho, vivenciado
em família, nas colheitas dos campos, possuía uma intima relação com o lazer, pois não havia
separação entre os momentos vividos – já que as colheitas eram permeadas por festas, danças,
cantos e alegria. O tempo se estabelecia com as estações do ano, com o nascer do sol, com o
pôr-do-sol. A vida girava em torno de sinais demonstrados pela natureza e se estabelecia numa
interdependência entres estes. (BAHIA, 2005, p.20)
O trabalho no continente passa a ser industrial, explorando em demasia os operários, de
forma a desrespeitá-los como seres humanos, fato este que propiciou vários manifestos em forma
de obra literária, porém somente no início do século XX, nos Estados Unidos e na Europa, foram
desenvolvidos estudos do lazer de forma sistemática. Essa sistematização dos estudos do lazer, a
partir da década de 50, passou a ser aderida nas sociedades urbano-industriais de forma geral,
tanto nas capitalistas quanto socialistas. Já no Brasil, os estudos da temática só evoluíram 50 anos
após a evolução já ocorrida na Europa, o principal motivo, foi que na Europa o interesse por esse
tipo de estudo se deu devido à industrialização, já no nosso país, o mesmo estava relacionado ao
processo de urbanização. As universidades brasileiras deram início às pesquisas a partir dos anos
70, que foram se desenvolvendo de forma relevante até a década de 90. Período em que surgem
muitas teses sobre o tema, principalmente interligadas com a produção cultural e a educação.
Todos esses anos de estudo permitiram ao lazer ter características bem peculiares, como
qualquer outro objeto de estudo.
Nelson Marcellino (2002) caracteriza o lazer como uma esfera social importante na vida
moderna para mudanças de ordem moral e cultural. Ele ainda complementa que ao contrário do
comportamento de grande parte das pessoas, este não deve ser tido como um assimilador de tensões ou uma atividade compensatória de uma rotina estafante.
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181
Para que um momento de lazer possa ser caracterizado como tal em sua plenitude, é necessário que este contenha os aspectos “tempo” e “atitude” de maneira integrada. O primeiro aspecto
refere-se ao tempo livre do trabalho de qualquer outro tipo de obrigação, portanto, um tempo
disponível para o lazer, o segundo aspecto é referente à atitude e liberdade de escolha da atividade
que se deseja realizar, simplesmente em busca do prazer em realizá-la. Embora o principal objetivo
das atividades de lazer seja o divertimento e o descanso, é importante que esta prática colabore
também para o desenvolvimento pessoal e social (MARCELLINO, 2002).
Os interesses buscados no lazer são classificados em seis áreas principais, denominadas
“conteúdos culturais do lazer” são estes os interesses artísticos, intelectuais, físico-esportivos, manuais e sociais, estabelecidos pelo sociólogo francês Joffre Dumazedier e mais o conteúdo turístico
inserido posteriormente pelo autor Luiz Otávio Camargo, totalizando os seis conteúdos (MARCELLINO, 2002).
Independente de qual conteúdo cultural do lazer predomina em determinada atividade,
todas podem ser efetivadas de dois pontos de vista diferentes, ativo ou passivo. Estes dois pontos
de vistas estão diretamente relacionados com a postura do praticante em relação a prática de lazer,
independente de qual seja essa prática (MARCELLINO, 2002).
Através dos conceitos históricos e teóricos, pudemos perceber que o lazer não é apenas
momento de divertimento, mas sim algo muito mais complexo, contextualizado historicamente
sendo também um campo de estudo importante.
METODOLOGIA
A metodologia utilizada foi uma combinação de pesquisa bibliográfica e de campo. Priorizamos no primeiro momento, a execução de um levantamento bibliográfico utilizando temas chave (lazer e cooperativismo), devido ao fato de conter obras significativas sobre a temática. Após a
identificação da bibliografia, foram realizadas as análises: textual, interpretativa e crítica, acerca
da temática em foco. (LÜDKE & ANDRÉ, 1986). Posteriormente, para que fosse possível a identificação do perfil dos participantes, principalmente no que diz respeito á “atividade preferida nas
horas vagas”, foi realizada uma pesquisa de campo por meio de questionário com questões abertas
e fechadas (LÜDKE & ANDRÉ, 1986). As atividades tidas pelas participantes como preferidas
foram classificadas dentro dos conteúdos culturais, para posterior análise. Tal analise foi expressa
em forma de tabela, podendo ser vista mais a frente, além de focar também em como os cooperados veem o tempo livre deles para o lazer.
RESULTADO E DISCUSSÃO
As Cooperativas aqui referidas, eram em sua grande maioria constituídas por grupos mistos de homens e mulheres, com exceção da Cooperativa de Costureiras. No entanto, tinham em
comum a realidade da baixa renda e baixa escolaridade. Os grupos tiveram muitos problemas no
que diz respeito a constante quebra de estrutura e falta de organização. Durante o processo de
formação e manutenção das Cooperativas, houve oscilações nos sentimentos dos cooperados em
relação ao processo, vivendo em constante sensação de: esperança, desmotivação, conflitos, saída
excessiva de cooperados, etc.
Com a aplicação do Questionário, especificamente falando, da aplicação da pergunta
“Quais as atividades que gosta de praticar nas horas vagas?” pudemos identificar quais eram os
conteúdos culturais do lazer preferidos pelos participantes das Cooperativas quando eles estavam
de folga. Quando falamos em conteúdos culturais, é importante lembrar que não é possível classificar a prática das pessoas, com apenas um conteúdo. Embora haja uma determinada característica predominante, uma atividade é composta por vários aspectos, sem contar também que a
182
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característica predominante em uma mesma atividade para uma pessoa, pode não ser a mesma
para outra, dependendo do que essa pessoa busca quando executa uma determinada prática:
Pelo exposto, conclui-se que a distinção entre os vários interesses só pode ser estabelecida em
termos de predominância e representando escolhas subjetivas, aliás evidenciando uma das características das atividades de lazer, ou seja, a escolha, individual. E nem poderia ser de outra
forma, pois os interesses compõem um todo interligado e não formado por partes estanques.
Assim, se podemos estabelecer relações na semelhança das práticas de um deles como base para
outro, podemos também caracterizar, através de aspectos dominantes, cada um dos interesses
no lazer. (MARCELLINO, 1983, p.41)
Na tabela abaixo mostramos as atividades preferidas nas horas vagas de todos os
cooperados envolvidos, com o indicativo do sexo, escolaridade e em que conteúdo cultural a atividade predileta se encaixa:
Sujeito
Sexo
Escolaridade
Atividade
Preferida
Conteúdo
Cultural
01
M
AB
Nenhuma
-----
02
M
E. Fund (i)
jogar futebol
Físico-esportivo
03
M
E. Fund (i)
Assistir TV
Artístico
04
F
E. Fund (c)
Ginástica
Físico-esportivo
05
M
E.Méd (c)
exercício físico
Físico-esportivo
06
M
E. Fund (i)
assistir TV
Artístico
07
M
E. Fund (i)
Cozinhar
Manual
08
M
E.Méd (c)
jogar futebol
Físico-esportivo
09
M
E. Fund (i)
jogar futebol
Físico-esportivo
10
F
E. Fund (i)
Costura
Manual
11
M
E. Fund (i)
Fliperama
Intelectual
12
M
AB
ir na igreja
Social
13
M
E. Fund (i)
Passear
Turístico
14
M
E. Fund (i)
ir ao pagoda
Artístico
15
M
E. Fund (i)
Passear
Social
16
M
E. Fund (i)
Assistir TV
Artístico
17
M
E. Fund (c)
Caminhada
Físico-esportivo
18
M
E.Méd (c)
jogar futebol
Físico-esportivo
19
M
E. Fund (i)
Assistir TV
Artístico
20
M
E. Fund (i)
Caminhada
Físico-esportivo
21
M
E.Méd (c)
Ir ao pagode
Artístico
22
M
E. Fund (i)
Assistir TV
Artístico
23
M
E. Fund (c)
Ler
Intelectual
24
M
E.Méd (c)
Ler
Intelectual
25
M
E. Fund (c)
Ir na igreja
Social
26
M
E. Fund (c)
Assistir TV
Artístico
27
M
E. Sup (c)
ouvir música
Artístico
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183
28
F
E. Fund (c)
sair com os filhos
Social
29
F
E. Méd (c)
Ler
Intelectual
30
F
E. Fund (c)
Ir em festas
Social
31
F
E. Fund (i)
Ler
Intelectual
32
F
E. Fund (c)
Ler
Intelectual
33
F
E. Fund (c)
Assistir TV
Artístico
34
F
AB
sair com filhos
Social
35
F
E. Fund (i)
Crochê
Manual
36
F
E. Fund (c)
descansar em casa
-----
37
F
E. Fund (i)
Ir na igreja
Social
38
F
E. Fund (i)
Nenhuma
-----
39
F
E. Fund (c)
Dançar
Artístico
40
M
E. Fund (c)
jogar futebol
Físico-esportivo
41
F
E. Fund (i)
não sabe
-----
42
F
E. Fund (i)
sair com filhos
Social
43
F
E. Fund (i)
Ir na igreja
Social
44
F
E. Méd (c)
Ler
Intelectual
45
F
E. Fund (i)
Assisti TV
Artístico
AB – Analfabeto
E. Fund (i) – Ensino Fundamental Incompleto
E. Fund (c) – Ensino Fundamental Completo
E. Méd (c) – Ensino Médio Completo
E. Sup (c) – Ensino Superior Completo
Assistir TV é a atividade preferida de 8 dos participantes, destes 8, apenas 2 completaram
o ensino fundamental. Segundo Marcellino (2002), verifica-se uma grande alienação no lazer
televisivo, que devido a necessidade para o estimulo rápido de consumo, transmite programas
elementares e fragmentários.
A leitura é a atividade preferida de 6 participantes, deste total, verifica-se que 3 concluíram o ensino médio, 2 concluíram o ensino fundamental e apenas um não terminou o ensino
fundamental. No nosso país, há uma falta de hábito em praticar a leitura, além de um número
elevado de analfabetos e analfabetos funcionais, considerando também o fato de que na escola, a
literatura não é entendida e assimilada como cultura, e sim apenas como instrumental para adquirir conhecimentos exigidos na situação de ensino formal. (MARCELLINO, 2002).
Outro fenômeno relevante que podemos analisar através da tabela, é o fato de que no
questionário, verificamos 3 pessoas que não sabiam ou não tinham nenhuma atividade preferida
para se realizar no tempo disponível
CONCLUSÃO
É fundamental que o lazer seja concebido como um direito inalienável de todo o ser humano, independente de sexo, gênero, etnia, classe social, status social, idade, crença etc. O lazer
como parte fundamental da constituição humana não deve se opor ao trabalho, mas conviver com
este como uma das esferas importantes a serem vividas. A compreensão do lazer como um objeto
de consumo ou compensação da realidade estafante, nos impede de pensar sobre a ludicidade, –
184
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
que é diretamente ligada ao lazer – como uma vivência humana fundamental, que não deve ser
experimentada apenas após o cumprimento das obrigações ou depois da satisfação das necessidades básicas humanas (SAMPAIO, 2004).
O resultado mostrado na tabela, nos coloca a pensar até a onde a relação das vivências
dessas pessoas na escola, bem como sua condição social exerce influencia na sua opção de como
utilizar o tempo fora do trabalho.
Partindo deste princípio, vemos a necessidade de uma ação educativa que venha estimular
a vivência mais legítima do tempo ócio (MARCELLINO, 1987 p58). Embora possa parecer não
ter a ver no primeiro momento, lazer e educação caminham juntos, na medida em que boa parte
de como utilizamos o nosso tempo livre pode ter relação com a maneira como fomos educados.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
185
LAZER E RELIGIÃO: ENTRE O LÍCITO E O QUE CONVÉM
Silvana dos Santos114
Giuliano Gomes de Assis Pimentel115
RESUMO: O presente estudo procurou abordar os conflitos e influências dos diferentes tipos de
lazer. Buscamos ainda, destacar as possíveis vertentes que poderiam relacionar-se com as características religiosas, influenciando direta ou indiretamente e ainda sofrendo a mesma influência.
Constatamos que a religião ainda é muito influenciada pelas visões de sociedade vigentes, re-significando seus valores e práticas de acordo com as necessidades de cada momento. Nossa
proposta foi efetivada por meio de uma pesquisa indireta, pautada na utilização de informações,
conhecimentos e dados que já foram coletados por outras pessoas. No que tange aos lazeres, existem imposições atribuídas às religiões, mas sem força obrigatória a ponto da maioria ser capaz de
estabelecer mediações entre a doutrina que professa e seus interesses culturais no lazer.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Religião. Cultura.
INTRODUÇÃO
O lazer é uma dimensão privilegiada para opções, ainda que limitado por diferentes formas
de constrangimento. Por isso, onde há promessa de liberdade, também, há tentativas de controle.
Nos Estudos do Lazer, é recorrente observar tais barreiras, especialmente aquelas ordenadas por
condições econômicas. Porém, pouco se sabe sobre o impacto atual das doutrinas religiosas sobre
o que cada fiel toma como lícito no seu tempo livre.
Dentro desta temática, também interessa discutir a crescente referência das atividades de
lazer aplicadas nas esferas religiosas. Isso se justifica no sentido de buscar entendimento sobre motivações para as religiões cristãs, seculares ou pentecostais se valerem cada vez mais de atividades
ligadas ao repertório do lazer.
Na cultura Ocidental, a religião esteve associada à ascese do sujeito frente às tentações
contidas no ócio. Por outro lado, muitas manifestações eram cooptadas. Nisto havia um processo
de vigilância sobre práticas como artes plásticas, literatura, arte religiosa espontânea, o teatro e
certas festividades toleradas pelo catolicismo. Logo, a relação entre lazer e religião é tanto de estímulo quanto de coerção, conforme a capacidade de certa prática ajustar-se ou não – como um mediador– à mensagem cristã (PIMENTEL, 2003). Assim, historicamente, há desde a flexibilidade
barroca às festas na relação sagrado-profano pelo catolicismo (TAVARES, 2008), até a pregação
calvinista contrária às diversões (CAMARGO, 1998).
Rolim (1989, p. 44) elucida que os dois mundos, dos homens e dos deuses, são distintos,
mas não estão separados. Almeida (2004) vem fortalecer esta idéia ao dizer que, hodiernamente, a
religião tem disputado espaço com muitas novidades. Rádio, a televisão, e atualmente a internet,
são meios que estão ocupando cada vez mais o tempo e a atenção do fiel. A partir dessa nova realidade percebe-se que os líderes religiosos acabaram verificando que não é mais possível limitarem-se às práticas tradicionais, concentradas em pregações.
114 Mestranda da Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
115 Doutor e Docente da Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
186
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Desta feita, é pressuposto do estudo que o livre-arbítrio no tempo livre é objeto de direcionamentos religiosos, a fim de conciliar as práticas lúdicas com as doutrinas da fé. Destarte, o
objetivo deste trabalho foi identificar e analisar as opções de lazer e, mais particularmente, as práticas corporais consideradas adequadas ou impróprias aos fiéis de diferentes religiões, em algumas
igrejas da cidade de Maringá-PR.
ASPECTOS METODOLÓGICOS
Trabalhou-se com instrumento estruturado, em coleta survey, em oito denominações religiosas na cidade de Maringá-Paraná: Espaço Ecumênico da Religião de Deus de Maringá; Igreja
do Evangelho Quadrangular; Igreja Presbiteriana do Brasil; Templo Budista; Igreja Betesda; Igreja
Evangélica Avivamento Bíblico dos Fins; Igreja Ucraniana e Igreja Metodista. Antes do estudo, os
líderes religiosos consentiram com a pesquisa e em receber a equipe de coleta nos templos, para o
instrumento ser respondido após o culto. Ao todo foram respondidos 180 instrumentos, sob processo de seleção intencional da amostra pelos pesquisadores de campo. Os resultados não possuem
representatividade estatística, caracterizando a pesquisa como descritiva de forma exploratória.
Os resultados nos quadros foram inseridos em percentual por igreja.
O instrumento interrogou sobre as práticas de lazer incentivadas pela igreja e, seu par dialético, aquelas impróprias ao fiel. Em relação ao lazer que não convêm ser praticado por motivos
de fé, foram dadas as seguintes opções: parque de diversão, bailes/ danceterias, festas da cidade,
ruas de recreio, bate-papo na internet, vídeo-game, teatro (comédia), yoga/ tai-chi-chuan, livros de
Paulo Coelho, novelas, carnaval, capoeira, brincar na rua, baralho ou bingo, determinados filmes,
determinadas músicas, determinados esportes.
Neste texto, embora todos os resultados sejam apresentados, o enfoque foi sobre contra
quais atividades de lazer as pessoas mais se incompatibilizam por motivos religiosos, havendo um
debate mais profundo sobre a condição da capoeira nesse quesito, dada sua histórica relação com
a religiosidade.
SINCRETISMO E DIVERSIDADE NAS RESPOSTAS
Em termos gerais as práticas que tiveram maior resistência perante as doutrinas apresentadas foram: bailes/ danceterias, carnaval, baralho ou bingo, yoga/ tai-chi, livros de Paulo Coelho,
determinados filmes, determinadas músicas, e em alguns casos a capoeira.
O quadro 01, embora apresente as igrejas envolvidas no estudo, não fornece os resultados
de duas religiões (Templo Budista e Igreja Ucraniana), pois em ambas o resultado foi zero. Especula-se que as características da amostra ou a doutrina da religião sejam fatores intervenientes nesse
dado.
Igreja/
Práticas
Espaço
Ecumênico
(%)
Quadrangular
(%)
Metodista
(%)
Betesda
(%)
Avivamento
(%)
Presbiteriana
(%)
Baile/danceteria
56,66
50
63,33
36,66
53,33
46,66
Yoga/tai-chi
10
43,33
20
46,66
43,33
50
Livros de Paulo
Coelho
3,33
40
60
43,33
40
43,33
Carnaval
60
56,66
50
60
53,33
50
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
187
Capoeira
16,66
16,66
20
33,33
43,33
0
Baralho/bingo
43,33
50
20
6,66
23,33
50
86,66
53,33
53,33
60
53,33
46,66
56,66
23,33
46,66
46,66
23,33
46,66
Determinados
filmes
Determinadas
músicas
Quadro 1: Atividades com maior resistência entre os fiéis.
Além das atividades relacionadas no quadro 01, outras foram consideradas impróprias,
porém com menor resistência. Os fiéis apontaram em ordem decrescente: novelas, festas junina,
determinados esportes, conversa na internet, e videogame.
Ao observar os dados em relação a bailes/danceterias, percebemos a existência de conflitos
entre a doutrina religiosa e a ação de seus fiéis, inclusive, no que tange ao entendimento de corpo.
Em geral, nas religiões ocidentais, o corpo apresenta-se composto pela dualidade material (corpo
externo) e imaterial (alma). O corpo tem por função “guardar” algo maior – a alma. Dentro das
concepções contraditórias de alguns princípios históricos do cristianismo (negação do corpo, do
prazer e do divertimento) apropria-se o conceito de corpo ao que é certo ou errado moldado pela
igreja com o intuito de disciplinar esses corpos, objeto de interação com o sagrado (MAUSS e
HUBERT, 2005).
Porém, em muitos casos, o corpo é considerado um “locus” do pecado; daí a necessidade
de ser orientado, vigiado e punido, em um processo preventivo e corretivo em relação ao pecado.
Pelegrini (2004) atribui a esse pensamento a concepção dualística do homem, com a existência
do corpo corrupto e pecaminoso, o que de certa forma “atrapalha” o desenvolvimento da alma.
Como veremos mais adiante (quadro 2), em certas doutrinas, processos de sedução no/para o corpo pelo lúdico também são empregados.
Ainda nesta contextualização, determinadas músicas se relacionam ao uso inapropriado
do corpo, pois alguns gêneros estimulam a sensualidade ou a rebeldia, tais como: funk, axé, rock.
Tais gêneros, ao provocarem a erotização, já foram considerados comportamentos desviantes e,
atualmente são criticadas também pela massificação dos gestos, banalização dos corpos e subsunção à Indústria cultural, como observou Tortela (2011) em casas de dança de Maringá.
Yoga/tai-chi também foram representadas como atividades suspeitas aos olhos do cristão,
já que se enquadram na categoria dos elementos formadores, não somente no que diz respeito à
inclusão do “pensar oriental”, mas, na função de incorporação não religiosa e fragmentária de práticas envolvidas com a natureza e a crença da reencarnação, fato comum no hinduísmo e budismo
(APOLLONI, 2004).
Neste sentido, Apolloni (2004) elucida que a prática do yoga torna-se preocupante por
parecer um risco de desvio religioso, pois tal prática não seria apenas psico-física-religiosa, mas
uma espécie de novo instrumento controlável de transcendência a ponto de “mudar” a própria
visão de mundo de seus praticantes.
Ainda, no que tange às práticas corporais ligadas ao pensamento oriental, para Pimenta
(2008) seria uma relação historicamente indissociável:
estas manifestações corporais orientais perfilham um conjunto de valores peculiares que residem em um universo religioso característico do extremo oriente feudal, ou seja, a necessidade de
encontrar um caminho para o estabelecimento de uma ruptura de pensamento entre os valores
materiais para os valores espirituais torna-se o fim da filosofia budista a base para a sustentabilidade de sua característica religiosa.(p. 4).
Não apenas lazeres que envolvem lutas e ginásticas podem ser postos sob suspeita em sua
associação ao misticismo oriental. A literatura de Paulo Coelho ao ser tomada como imprópria por
188
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
parte dos pesquisados, nos remete à história de obras e autores excomungados, prática recorrente
ainda no presente. A história nos apresenta a censura direcionada a livros, como ocorrido no V
Concílio de Latrão em 1515, quando a igreja católica implantou a primeira lista oficial de livros
proibidos, o INDEX. No entanto, em 1962 o Papa João XXIII veio a abolir esta lista de livros
proibidos, o que de certa forma nos remete ao entendimento de que não há condições suficiente
de controle às opções de literatura dos fiéis, que são instigados por essa quantidade de referências ofertada pelo mercado literário, neste sentido a igreja vem oferecer seus escritos como uma
opção aos leitores, na tentativa de fortalecer seus dogmas, já que uma das formas de controlar a
produção e circulação do discurso esta no fato de limitar o número daqueles que tem acesso a ele
(PORTELLA, 2006).
Mais forte que a disputa entre livros cristãos e literatura secular, os filmes representam um
risco, tanto pela desigualdade (qualitativa e quantitativa) quanto pelo acesso. Foram qualitativamente destacados como perniciosos os roteiros que trazem o sobrenatural espírita ou o sexo.
Chama atenção em todas essas práticas a falta de consenso entre respondentes das religiões estudadas quanto ao que é impróprio, mas pode ser fruto da pouca vigilância exercida o
lazer dos fieis. Isso não significa, todavia, a ausência de reatividade ou que qualquer lazer esteja
santificado.
A capoeira é um exemplo desse embate. Se de um lado existe a agressividade da luta, por
outro a capoeira traz a dança e a música, acompanhadas por instrumentos de percussão e símbolos do ecletismo religioso afrobrasileiro. É interessante que a capoeira inquieta alguns que a veem
como um desdobramento do candomblé, enquanto em outros casos, ela chega a ser apropriada
como instrumento de evangelização.
A capoeira embora tenha uma história significativa de conquistas e avanços ainda encontra uma barreira no tocante ao posicionamento contrário de algumas religiões. A religiosidade
apresenta um papel um tanto significativo na vida social e política da sociedade e, assim como
outras instituições (mídia, cultura, saber científico, família) exerce uma relação de poder com a
sociedade, podendo refletir em sua manifestação corporal. A religião está presente, confrontando
valores, comportamentos e criando estilos de vida. Em relação à religião dos negros em especial,
Genovese (1988) afirma que, à medida que a religião promovia nos negros certa autonomia psicológica e cultural, conseqüentemente estimulava a resistência.
Na história do Brasil as religiões afro-brasileiras, especialmente na Primeira República,
foram perseguidas e reprimidas pela polícia. Isto se devia ao fato de que o uso de tambores, as
danças, os transes, os sacrifícios de animais, a ênfase em melhorar a vida dos adeptos através de
meios sobrenaturais, eram todos, elementos que caracterizavam a religiosidade africana, mas não
coincidiam com a visão dominante, branca e católica do que deveria ser uma religião. De acordo
com Santos (2010, p. 4) “tudo que signifique e/ ou faça referência à cultura negra, é visto como
pecado, seguindo a idéia de candomblé que sempre foi demonizado pela doutrina cristã”.
Não obstante a capoeira não seja uma religião, ela possui sentidos/significados que também lhe atribuem caráter eminentemente sagrado. O corpo e a música são atributos que lhe conferem uma especificidade e a aproxima dos rituais religiosos de matriz africana em que a música e
a dança exercem importante papel na ligação do humano com o sagrado.
Santos (2010) enfatiza que a capoeira não surgiu do ócio do povo negro, mas de sua ousadia ao rejeitar a escravidão. Enquanto o progresso da capoeira está pautado na trajetória dolorosa e
discriminatória, mesmo sendo aceito por alguns seguimentos sociais. O mesmo autor ainda defende que a capoeira enquanto manifestação do movimento é completa, pois trabalha o psicológico,
o físico e o social do ser humano, deixando, ainda, a opção por desenvolver o seu lado espiritual,
muitas vezes camuflado por meio da dança.
Ferracini e Maia (2007) afirmam que, para os africanos, a dança está revestida de significados religiosos, políticos e culturais que, em suas viagens forçadas a terras desconhecidas, manti-
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
189
veram-se vivos, embora transmudados. O bailar dos corpos passou a traduzir uma forma de defesa
da vida em comum e uma resposta às condições específicas do escravismo colonial no Brasil.
Diante dessas colocações indagamos: é possível imaginarmos que os lazeres lícitos não
possuem nenhuma influência dos lazeres ilícitos? Será que as diferentes religiões permitem aos
seus fiéis fazer uso do livre arbítrio? Até que ponto a capoeira é vista e entendida como luta pelos
fiéis e pregadores das religiões? São questões que o instrumento não permite inferências, mas merecedoras de desdobramentos em futuros estudos.
Não obstante, na sabedoria popular em relação ao ócio, se tome que “cabeça vazia é oficina do diabo” e as religiões cristãs darem uma roupagem coercitiva e coletiva ao ascetismo antigo,
o lazer também é objeto de ações afirmativas dentro das igrejas contemporâneas. Pensar lazer na e
para religião nos remete ao entendimento de oferecer uma gama de vivências corporais para seus
fiéis, tais como dança, teatro, festivais, festas, atividades esportivas e lutas.
O quadro 02 apresenta uma participação considerável em relação à festas com danças, neste sentido compreendemos que esse índice é possível independente de religião, visto que a origem
da dança surgiu com vários significados e formas, mas geralmente vinculada à religião (AMARAL, 2009). As pessoas dançavam em nascimentos, puberdade, casamentos, lutas, fertilidade,
colheita e até em magia, tudo com sentido de rituais. Para Faro (1986, p. 14) “as danças folclóricas
nasceram das danças religiosas que pouco a pouco foram sendo liberadas pelos sacerdotes para
que as celebrações passassem a ser realizadas em praças públicas, e não mais dentro dos templos”.
Igreja/
Práticas
Espaço
Ecumênico
(%)
Igreja
Quadrangular
(%)
Igreja
Metodista
(%)
Igreja
Avivamento
(%)
Igreja
Presbiteriana
(%)
Igreja
Budista
(%)
Festa com dança
56,66
20
36,66
26.66
10
6.66
Festa com comida
86,66
53,33
73,33
50
93,33
6,66
70
46,66
53,33
36,66
80
6,66
56,66
53,33
66,66
30
63,33
6,66
Acampamento
0
63,33
83,33
60
93,33
0
Esporte
6,6
40
80
66,66
90
60
Bingo
76,66
0
0
3,33
0
0
Filme
3,3
26,66
73,33
10
60
0
Passeio turístico
33,33
10
16,66
3,33
56,66
46,66
Festa com
brincadeira
Festivais de
música
Quadro 2: Opções de lazer ofertadas pelas igrejas.
Já no que diz respeito às comemorações com comida, acampamentos e festas com música,
este fato se dá em virtude dos festejos serem elementos essenciais na religião. Nas palavras de
Durkhein (1989, p. 456) “a própria idéia de cerimônia religiosa de alguma importância desperta
naturalmente a idéia de festa”. Inversamente, toda festa, quando por suas origens, é puramente
leiga, apresenta determinadas características de cerimônia religiosa, pois tem como efeito aproximar os indivíduos.
Neste aspecto, Gabriel e Vieira (2001) situam a importância da humanidade não se privar
de práticas seculares apenas pelo fato de não serem sagradas. Por exemplo, uma música para ser
sagrada não necessita limitar-se a assuntos espirituais ou louvar a Deus, pois o fiel deve usar de seu
livre-arbítrio para tomar decisões críticas frente ao que fazer no tempo livre.
190
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
De fato, pelos resultados, há de se reduzir o tom da crítica à força coercitiva das religiões
aqui pesquisadas, visto que, de um modo geral a reserva a certos lazeres foi mais sentida como
oriunda de grupos/indivíduos nas comunidades do que propriamente uma vigilância das igrejas
sobre o lazer.
CONCLUSÕES
Ao abordarmos nosso estudo, realizando um paralelo entre o lazer e a religião, ficou evidente a construção de entendimentos sobre lazeres apropriados e impróprios, visto que as igrejas
pregam “ideologias”, de modo que seus seguidores possam refletir sobre o certo e errado. Neste
tocante, conclui-se que existem imposições atribuídas às religiões, mas sem força coercitiva a ponto da maioria ser capaz de estabelecer mediações entre a doutrina que professa e seus interesses
culturais no lazer.
A capoeira, por sua vez, é um processo complexo constituído pela fusão de fatores, dentre
eles a fonte mística, a qual nos permite visualizar no presente estudo características de resistência
relacionadas à capoeira em algumas religiões. Deste modo pode-se afirmar que a capoeira ainda
é caracterizada em relação aos cultos afros. Sendo significativa em algumas igrejas a associação
entre a doutrina e a rejeição à capoeira. Levanta-se a hipótese de que as formas de interdição à
capoeira hoje são sutis, incluindo sua resignificação com o propósito de educação (religiosa) pelo
lazer. Esse aspecto foi evidenciado em outras formas de lazer (festas, esportes, artes), indicando
uma tendência dessas instituições cristãs em disciplinar não apenas pela interdição, mas, cada vez
mais, pela sedução.
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192
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
A CRIANÇA E O LAZER116
Leonardo Toledo Silva117
José Alfredo Oliveira Debortoli118
RESUMO: Esse trabalho constitui em uma investigação sobre os fenômenos: criança, lazer e o
contexto onde esses atores sociais se encontram, o Aglomerado da Serra. Para investigar as relações socioculturais das crianças com os diversos membros da sua comunidade em seu Pedaço, foi
preciso discutir os termos: criança e Lazer relacionado-os com os acontecimentos investigados.
Somente foi possível investigar o contexto e os atores sociais a partir da perspectiva de análise etnográfica, acompanhada de desenhos, fotografias e diversas conversas com as crianças, os jovens e
os adultos, observando suas ações, “trocas”, relações, informações e tensões. Teve como objetivos:
descrever o processo de participação das crianças no cotidiano da vida social; identificar relações
entre pares que possibilitem problematizar processos de constituição de identidades; e, por último,
explorar tempos e espaços sociais no Aglomerado, identificando formas cotidianas de participação
das crianças. O estudo possibilitou compreender as crianças e entendê-las como sujeitos produtores de cultura, como cidadãos.
PALAVRAS CHAVE: Criança. Lazer. Cultura.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho procurou investigar as crianças nas suas práticas sociais e teve como
objetivos: descrever os processos de participação das crianças no cotidiano da vida social; identificar relações entre pares (crianças e crianças; crianças e adultos; crianças e jovens) que possibilitem problematizar processos de vivencia do lazer.
Para conhecer as crianças nas suas práticas sociais destacamos a compreensão do que é
cultura, que muitas vezes está associada aos modos de vida, hábitos e costumes de um povo, grupo
ou determinada região. Contudo, Clarice Cohn (2005) afirma:
A cultura não está nos artefatos nem nas frases, mas na simbologia e nas relações sociais que
os conformam e lhes dão sentindo. Assim, um texto, uma crença ou o valor da vida em família
pode mudar, sem que isso signifique que a cultura mudou ou se rompeu. A cultura continuará
existindo enquanto consistir esse sistema simbólico. Nesse sentido, está sempre em formação e
mudança. (COHN, 2005, p. 20).
Se tomarmos como referência a noção de cultura apresentada pelo pesquisador Clifford
Geertz (1989), sobressai o entendimento que o homem é um animal amarrado a teias de significado que ele mesmo teceu, e a cultura sendo essa teia e a sua análise, entender a cultura é entender
o significado atribuído as diferentes práticas cotidianas. Para ele a cultura é pública porque o
significado o é.
116 Este trabalho é parte da minha dissertação de Mestrado em Lazer da UFMG
117 Especialista em Lazer (UFMG, 2008). Professor do curso de Educação Física – FHA. [email protected]
118 Doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professor dos Cursos de Graduação em
Educação Física e Mestrado em Lazer na Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
193
Como sistema entrelaçado de signos interpretáveis (o que eu chamaria símbolos, ignorando as
utilizações provinciais), a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou processos; ela é um
contexto, algo dentro do qual eles podem ser descritos de forma inteligível – isto é, descritos com
densidade. (GEERTZ, 1989, p. 24).
Ao buscar compreender as práticas culturais, entendemos a importância de darmos voz às
experiências e aos atores envolvidos em cada comunidade, ao modo de deixar fluir, experimentar
e realizar suas manifestações culturais existentes, sem querer impor nosso estilo de vida. Dessa
forma Noronha (2011) afirma:
Reconhecer a multiplicidade de manifestações culturais existentes no planeta é, mais uma vez,
superar o etnocentrismo, ou seja, o entendimento presente em todas as culturas segundo a qual
o seu modo de viver e de ver o mundo é melhor do que o do outro. A antropologia há muito
trouxe contribuições para reconhecimento de que não existe uma cultura melhor do que a outra, e sim culturas, no plural. Desse modo, não se pode julgar uma cultura, mas compreendê-la;
é esta a tarefa das pesquisas etnográficas. Conhecer outras culturas é reconhecer e respeitar as
diferenças, contribuir para a construção de um mundo que consiga estabelecer o diálogo entre
os povos de modo mais tolerante e em busca da paz sem que os grupos percam sua identidade
pessoal e coletiva. (NORONHA, 2011, p. 84).
Dessa perspectiva, desdobra-se um entendimento de lazer como vivência e possibilidade
concreta de exercer a cultura e a experiência de cidadania como um direito conquistado e que
deve ser apropriado sem distinção de classe econômica, religião, gênero, raça e outros. Ressalto
que os valores atribuídos ao lazer nos dias de hoje possuem uma relação dialética com a cultura,
relações essas estabelecidas com o trabalho, a família, a religião, a educação, a política, entre outras, e que são construídas histórica e socialmente.
Diferente de quaisquer concepções utilitaristas e compensatórias, neste trabalho o lazer
compreende a vivência de inúmeras práticas culturais, como o jogo, a brincadeira, a festa, o passeio, a viagem, o esporte e também as formas de arte (pintura, escultura, literatura, dança, teatro,
música, cinema), dentre várias outras possibilidades. Inclui, ainda o ócio, uma vez que esta e
outras manifestações culturais podem constituir, em nosso meio social, notáveis experiências de
lazer. (Gomes, 2004).
O lazer como uma dimensão da cultura constituída por meio da vivência lúdica de manifestações culturais em um tempo/espaço conquistado pelo sujeito ou grupo social, estabelecendo relações dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações, especialmente com o trabalho
produtivo. (GOMES, 2004, p. 125).
Christianne Gomes (2011) assinala que o lazer é uma necessidade humana e uma dimensão da cultura119. É constituído de acordo com as peculiaridades do contexto histórico e sociocultural no qual é desenvolvido – por isso, precisa ser tratado como um fenômeno social, político,
cultural e historicamente situado, constituindo-se na articulação de três elementos fundamentais:
a ludicidade, as manifestações culturais e o tempo/espaço social.
Como mola propulsora do lazer, a ludicidade pressupõe a valorização estética e a apropriação expressiva do processo vivido, e não apenas do produto alcançado. A ludicidade é construída
119 Segundo Gomes e Faria (2005), compreender o lazer como dimensão da cultura significa entendê-lo como inserido numa
dinâmica cultural complexa. Em outras palavras, para compreender o lazer é fundamental, pois, situá-lo no contexto
da dinâmica sociocultural, com suas contradições, mazelas, (re)produções, limites e possibilidade, etc. Desse modo, é
necessário considerar que as tramas culturais que perpassam o lazer são cada vez mais importantes à compreensão da
realidade sociocultural, bem como à superação de limites colocados por ela. (p. 53).
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culturalmente e cercada por vários fatores, tais como normas políticas e sociais, princípios morais,
regras educacionais e condições concretas de existência. Reflete, assim, as tradições, os valores, os
costumes e as contradições presentes em cada sociedade. Já como narrativa, pode manifestar-se de
diversas formas (gestual, verbal, impressa, visual, artística, etc.) e ocorre em todos os momentos.
Desse modo, a ludicidade estimula os sentidos, exercita o simbólico e exalta as emoções, mesclando alegria e angústia, relaxamento e tensão, prazer e conflito, regozijo e frustração, liberdade e
concessão, entrega, renúncia e deleite (GOMES, 2011).
As manifestações culturais vivenciadas ludicamente são, assim, práticas que integram a
cultura de cada povo e que podem assumir múltiplos significados: ao serem concretizadas em um
determinado tempo/espaço social, ao dialogarem com um determinado contexto e, também, ao
assumirem um papel peculiar para os sujeitos, os grupos sociais, as instituições e a sociedade que
as vivenciam histórica, social e culturalmente. O lazer compreende, ainda, práticas culturais mais
voltadas para as possibilidades introspectivas – tais como a meditação, a contemplação e o relaxamento –, pois elas podem constituir notáveis experiências de lazer devido ao seu interessante
potencial reflexivo (GOMES, 2011).
O tempo/espaço é uma expressão das relações sociais e da natureza e constitui-se por
aspectos objetivos, subjetivos, simbólicos, concretos e materiais, evidenciando conflitos, contradições e relações de poder – os quais, inevitavelmente, influenciam não apenas o lazer, mas também a formação de profissionais para atuarem nesse âmbito. Santos (1980 apud GOMES, 2011)
assinala que não é possível definir os acontecimentos históricos e espaciais “fora de suas próprias
determinações ou sem levar em conta a totalidade da qual eles emanam e que eles reproduzem”
(p. 206). O autor concluiu que o espaço social não pode ser explicado sem o tempo social, e vice-versa, pois essas dimensões são inseparáveis (GOMES, 2011).
Dessa forma, iremos conhecer as vivências, os sonhos e desejos das crianças da Serra em
relação ao lazer, ao pesquisar e compreender as práticas sociais desses PEQUENOS.
A CRIANÇA
Refletir sobre a noção de criança conduz a pensar a maneira como o meio a concebe e sedimenta o seu modo de ser; portanto, discutir a infância é discutir a sociedade na qual ela se insere
(MOUKACHAR, 2004, p. 54). Ou seja, é entender a relação da sociedade com as crianças, seus
processos de interações e práticas sociais. Nessa perspectiva, há uma ênfase em como as crianças
enquanto agentes criam, interpretam, adquirem e recriam a cultura juntamente com os adultos e
outras crianças (PIRES, 2007, p. 33). As noções de infância são representações constituídas social,
histórica e culturalmente, e o constituir-se criança se estabelece a partir de relações contextualizadas em práticas sociais singulares (COELHO, 2011, p. 15).
Cada época irá proferir o discurso que, ao revelar seus ideais e expectativas em relação às
crianças, traz consequências sobre o sujeito. Assim, a produção e o consumo de conceitos sobre
a infância pelo conjunto da sociedade interferem diretamente no comportamento de crianças,
adolescentes e adultos, e modelam formas de ser e agir de acordo com as expectativas das crianças
nos discursos que passam a circular entre as pessoas. Tais expectativas, por sua vez, correspondem
aos interesses culturais, políticos e econômicos do contexto social (PEREIRA; SOUZA, 1998).
Compartilho com Coelho (2011, p. 7) o entendimento das crianças como sujeitos sociais
plenos. Ou seja, compreendo a criança como sujeito ativo na produção de culturas e a brincadeira
como linguagem e forma tipicamente infantil de se relacionar com o mundo e as pessoas (CARVALHO, 2007, p. 80). Portanto trato as crianças como atores sociais completos, e quando estão
brincando ou imitando os adultos, estão envolvidas em culturas infantis. Como assinala Carvalho
(2007, p 83),
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As crianças compreendem o mundo na experiência da brincadeira e o fazem na interação com
as outras crianças e com os adultos. Nessa interação a criança compreende o mundo, experimenta suas emoções e elabora suas experiências. Esse exercício da imaginação e interpretação
do mundo pode ser visto como uma forma própria de a criança atribuir diferentes significados
às coisas. No desenrolar da brincadeira, a criança mistura vivencias que são imaginárias com
decisões e circunstâncias que são concretas.
Compreender as crianças como sujeitos é reconhecê-las como produtoras de cultura. Enfatizar a brincadeira como prática cultural; como “patrimônio cultural humano” e, principalmente,
discutir o papel da criança como agente de criação e transmissão de cultura é um desafio proposto
neste trabalho (CARVALHO, 2007).
Mais que um estágio da vida, ser criança é ter uma forma particular de se relacionar com
o universo social e humano. Infância não é um período natural. Ser criança é uma forma particular de absorver e transformar o universo de cultura em que se está inserido, a partir dos dados
concretos que se têm em mãos nesse momento da vida (DEBORTOLI, 1995).
Trabalhar numa concepção de infância como construção social é entendê-la não como uma característica natural e nem universal dos grupos humanos, mas como um componente estrutural
e cultural específico presente em muitas sociedades. Significa, também, desconstruir uma idéia
universal de infância como se a mesma fosse igual em todos os tempos e espaços. (SILVA, 2011,
p. 23).
Compreender a ideia da infância como construção social é entender que essa construção
está sujeita às transformações históricas e contextos geográficos, culturais e políticos. Portanto,
ainda que se tenha contemporaneamente um entendimento de infância, existem múltiplas condições de se viver esse ciclo da vida, que varia em função das realidades socioculturais (CARVALHO, 2007). Todavia, devo ressaltar que, ainda hoje, se pode observar certa insistência em
tratar as questões relativas à infância de forma generalizante e comportamentalista, como se o
desenvolvimento e a formação humana pudessem ser tomados rigidamente e fechados em características biológicas e psicológicas predeterminadas – infância desencarnada, passiva e manipulável
(DEBORTOLI, 1995).
Fazendo referência a Debortoli (2008), penso que os papéis sociais atribuídos à infância
mudam conforme o contexto e as diferenças culturais, suas relações de classe econômica, gênero,
religião, raça, faixa etária. Tratamos aqui da participação ativa da criança e sua capacidade de atuar no processo histórico e de transformação cultural. Suas produções ganham visibilidade naquilo
que passa a ser definido como “culturas infantis120”. (SILVA, 2011, p. 24). Nesse sentido,
A infância não é uma idéia abstrata, tampouco natural, menos ainda neutra. Sua visibilidade
está condicionada e condiciona as relações que os diferentes sujeitos inscrevem e conformam.
Esse entendimento reforça uma concepção de que o estatuto e os papéis sociais que são atribu120 Nas culturas infantis podemos perceber tanto a forma como as crianças adquirem e aprendem os códigos que plasmam e
configuram o real como a forma criativa em que fazem uso destes mesmos códigos. As formas culturais produzidas e realizadas pelas crianças constituem não apenas os jogos infantis, mas também os modos específicos de significação e de uso
da linguagem, se desenvolvendo especialmente nas relações entre os pares, distintamente diferentes dos processos vividos
pelos adultos. As produções das crianças não surgem do nada, muito pelo contrário, estão profundamente enraizadas na
sociedade nos “modos de administração simbólica da infância”. As culturas da infância constituem-se no mútuo reflexo
das produções culturais dos adultos para as crianças e das produções geradas pelas crianças nas suas interações entre pares.
Se essas culturas não se reduzem aos produtos da indústria para a infância, seus valores e processos ou aos elementos integrantes das culturas escolares, também não é verdade dizer que cultura da infância seja algo a ser analisado exclusivamente
pelas ações, significações e artefatos produzidos pelas crianças. (SILVA, 2011, p.25).
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ídos à infância mudam com as formas sociais das quais as crianças são sujeito e objeto de variação e de mudança em função de dimensões sociais, como classe, contextos culturais e relações
de gênero, entre outras. (DEBORTOLI, 2008, p. 71).
ETNOGRAFIA COMO PERSPECTIVA DE ANÁLISE
Para investigar as práticas sociais das crianças no contexto do Aglomerado da Serra, optei
por buscar apoio nas teorias antropológicas e na etnografia, como metodologia de coleta de dados.
Segundo Cohn (2005):
Fazer antropologia é tentar entender um fenômeno em seu contexto social e cultural. É tentar entendê-lo em seus termos. Desde cedo, os antropólogos têm insistido na necessidade de
abordar as culturas e as sociedades como sistemas, o que significa dizer que qualquer evento,
fenômeno ou categoria simbólica e social a ser estudado deve ser compreendido por seu valor no
interior do sistema, no contexto simbólico e social em que é gerado. Por isso, não podemos falar
de criança de um povo indígena sem entender como esse povo pensa o que é ser criança e sem
entender o lugar que elas ocupam naquela sociedade. (COHN, 2005, p. 9).
Para Geertz (1989, p. 15), praticar a etnografia é estabelecer relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário, e assim por
diante. Mas não são essas coisas – as técnicas e os processos determinados – que definem o empreendimento. O que o define é o tipo de esforço intelectual que ele representa: um risco elaborado
para uma descrição densa. Mais à frente, esse mesmo autor (1989) coloca que o ponto a enfocar
agora é somente que a etnografia é uma descrição densa.
O que o etnógrafo enfrenta, de fato – a não ser quando (como deve fazer naturalmente) está
seguindo as rotinas mais automatizadas de coletar dados – é uma multiplicidade de estruturas
conceptuais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro
apreender e depois apresentar. E isso é verdade em todos os níveis de atividade do seu trabalho
de campo, mesmo o mais rotineiro: entrevistar informantes, observar rituais, deduzir os termos
de parentescos, traçar as linhas de propriedade, fazer o censo doméstico... escrever seu diário.
(GEERTZ, 1989, p. 20).
O trabalho consistiu em observações sistemáticas das crianças da Serra em espaços diversos que elas utilizam para suas práticas. Após as primeiras incursões em campo, ficou visível
que teria que utilizar diversas fontes (métodos complementares) para compreender melhor as diferentes situações da pesquisa. Sendo assim, conversas (com adultos, jovens e crianças), fotos e
desenhos foram utilizadas para perceber a realidade das práticas sociais.
O LAZER E CRIANÇA DO AGLOMERADO DA SERRA
O lazer foi definido neste trabalho como um direito e compreende a vivência de inúmeras práticas culturais – o jogo, a brincadeira, a festa, o passeio, a viagem, o esporte e também as
formas de arte (pintura, escultura, literatura, dança, teatro, música, cinema), dentre várias outras
possibilidades, incluindo, ainda, o ócio. Compreendemos o lazer como constituído de acordo com
as peculiaridades do contexto histórico e sociocultural no qual é desenvolvido – por isso, precisa
ser tratado como um fenômeno social, político, cultural e historicamente situado, e em constante
diálogo com o trabalho, a família, a religião e demais esferas da vida. Lembrando que os momentos
de lazer observados não são apenas aqueles instituídos (final de semana, férias e feriados) e não
existem as dicotomias: tempo de estudo, tempo da igreja, tempo de projeto social entre outros
versus tempo de lazer.
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Entendemos as crianças como sujeitos ativos (agentes de criação e transmissão) na produção de culturas, ou seja, sujeitos sociais plenos (cidadãos). Mais que um estágio da vida, ser criança
é ter uma forma particular de se relacionar com o universo social e humano. E esse envolvimento
acontecia em todos os espaços investigados, ora dentro dos seus grupos de pares, ora com grupos
geracionais completamente diferentes do seu, o que possibilita a incursão dessas crianças nos mais
diversos espaços em que elas circulam.
Compreender a ideia da criança como construção social é entender que essa construção
está sujeita às transformações históricas e contextos geográficos, culturais e políticos. Por vários
momentos observei as crianças tendo uma atitude que não necessariamente estaria vinculado ao
mundo infantil – como no caso de ir ao culto, deixar de soltar papagaio para assistir à missa, sem
contar as diversas possibilidades de ocupação do tempo (escola em tempo integral, projetos, ensaios...) com o discurso de não poderem “ficar na rua”, muito difundido na mídia, principalmente
na televisão.
As crianças observadas tinham diversas obrigações além da escola, o que, em certa medida, poderia atrapalhar seus momentos de lazer. Mas fica evidente que, a todo o instante, elas burlam esses momentos e se aproximam do que intitulamos de ‘lazer’ neste trabalho. Ou seja: quando
elas são obrigadas a ir ao Culto, mas levam alguns brinquedos dentro da Bíblia; quando brincam
de pegador no salão pastoral ou apostam corridas nas aulas de capoeira; quando fazem a opção de
olhar o irmão mais novo na Rua do Meio, “matam” aula para soltar papagaio, vão comprar alguma
coisa na mercearia, mas vão de bicicleta.
Ser criança nesse pedaço é viver entre diversas culturas geracionais, uma vez que elas se
apropriam do local como extensão da sua casa: entram e saem de uma casa para outra, vão ao
CCVF, investigam cada espaço (sabem aonde podem ir e identificam quem é do morro), sabem da
importância de irem ao Culto (de sexta e domingo), de fazerem o mutirão da Dengue, das festas
surpresas, do ritual da “ovada”, de ajudar ao próximo com o pouco que têm, seja dividindo um
brinquedo (bicicleta ou skate) ou ajudando nos diversos mutirões.
As crianças observadas tinham diversas obrigações (ir à escola, participar de projetos e
cultos, olhar os irmãos mais novos, cuidar da casa, fazer compras na mercearia, ensaiar para o
Culto) – o que, em certa medida, poderia atrapalhar seus momentos de lazer. Contudo, fica evidente que, a todo instante, elas burlam estes momentos e se aproximam do que intitulamos de
lazer neste trabalho.
Mesmo com essa sobrecarga de atividades das crianças, sejam as obrigações do lar ou de
projetos, existe um discurso forte dos adultos sobre a falta de locais para elas passarem os momentos de lazer, aprendendo algo e não ficarem na rua. Trata-se de um discurso “salvacionista” dos
projetos de lazer e não uma valorização do lazer como direito.
REFERÊNCIAS
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f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação da Universidade Federal de
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1995.
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SILVA, Rogério Correia da. Circulando com os meninos: infância, participação e aprendizagem
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MULHERES INVISÍVEIS E CINEMA: LUGAR, VOZ E EMPODERAMENTO
Angela Brêtas121
RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de apresentar e analisar alguns aspectos do projeto de
extensão intitulado “Cinema para trabalhadoras da EEFD: a produção de sentidos e de prazer”,
desenvolvido pelo grupo ESQUINA - Cidade, Lazer e Animação Cultural, na Escola de Educação
Física e Desportos da UFRJ. Utilizando o cinema como detonador da experiência, são expostas as
incertezas e os desafios enfrentados ao se assumir o compromisso de romper com o manto da invisibilidade que cobre mulheres trabalhadoras em empresas de serviços gerais. Também é exposta
a inquietação surgida no interior do ESQUINA em relação ao conceito de lazer.
PALAVRAS CHAVES: Mulheres. Cinema. Lazer.
A universidade costuma ser um espaço de afirmação da racionalidade e do fortalecimento
dos sujeitos. No que tange ao ensino e à pesquisa, dimensões mais valorizadas, professores consolidam sua posição de detentores e de produtores de conhecimentos. No que diz respeito aos
discentes, há aqueles que ratificam seu lugar na sociedade e há os que se tornam mais fortes na
medida em que têm a chance de ascender socialmente. O desenvolvimento das atividades de extensão completa a função da universidade pública formando o tripé que a sustenta e que justifica
sua existência.
Entretanto, a comunidade acadêmica não envolve apenas estudantes e docentes, há outra
categoria de trabalhadores formada pelos técnicos-administrativos que atuam para fazer funcionar
as dimensões burocráticas destas instituições. De todo modo, professores, alunos e funcionários
ocupam lugares definidos e socialmente relevantes, para os quais os olhares se voltam quando
falamos sobre organizações de ensino superior.
Em uma visão panorâmica, podemos ter dado conta do modo pelo qual Academia se articula em seu dia a dia, mas, para funcionar de maneira adequada, ela ainda necessita de um exército de trabalhadores que normalmente não são vistos como integrantes de sua comunidade. Cabe
esclarecer que o verbo ver foi empregado na assertiva anterior em sentido simbólico e literal, já
que estas pessoas executam suas funções sem que sejam percebidas, a não ser que as negligenciem.
Refiro-me àqueles que podemos considerar como “invisíveis” e que são, muitas vezes, funcionários
de empresas terceirizadas. Dentre eles, ressalto um conjunto de indivíduos que atua para deixar o
ambiente limpo e em condições de uso, e que é rotineiramente chamado de “o pessoal da limpeza”.
O desaparecimento simbólico de indivíduos pobres com profissões que não exigem qualificação escolar ou técnica foi estudado por Costa (2004). Este autor trabalha com as categorias
de humilhação social, invisibilidade pública e reificação para observar que a existência de sujeitos
que são invisíveis em meio a grupos de outros sujeitos expressa desigualdade política e exclusão de
toda uma classe social para a qual estão destinados os trabalhos desvalorizados socialmente. Afirma, ainda, que estes fenômenos estão internamente vinculados e são manifestações da sociedade
capitalista que degradam o labor humano e retiram do trabalhador sua fala e sua capacidade de
agir politicamente.
121 Doutora em Educação. Professora Adjunta da Escola de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Rio de
Janeiro – EEFD/UFRJ.
Este artigo é parte do projeto “Cinema para trabalhadoras da EEFD: a produção de sentidos e de prazer”, desenvolvido
pelo Grupo ESQUINA – Cidade, Lazer e Animação Cultural, financiado pela FAPERJ, e com o apoio em forma de bolsas
PIBEX da Pró-Reitoria de Extensão da UFRJ. Contato: [email protected]
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Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), especificamente na Escola de Educação Física e Desportos (EEFD), “o pessoal da limpeza” é um grupo formado por homens e mulheres, com idades variando entre 22 e 58 anos. São funcionários de uma empresa especializada
no fornecimento de profissionais de serviços gerais e de apoio122, e trabalham em dois turnos que
são manhã/tarde e tarde/noite, pois a EEFD funciona das 7h às 22h. Atuam fundamentalmente
na limpeza e na conservação de salas de aula, departamentos, ginásios e áreas comuns pelas quais
circulam, diariamente, mais de mil pessoas. O fato de vestirem uniformes que não apresentam
diferenças entre modelos femininos e masculinos reforça a condição de trabalhadores não-especializados e a sua invisibilidade. (Costa, op. cit)
Como se pode observar, a condição de ser invisível se pauta em relações hierarquizadas,
nas quais aqueles que ocupam posições de superioridade buscam continuamente reiterar seu lugar,
enquanto os que estão em posições subalternas já têm internalizado e, muitas vezes, incorporado
seu lugar na sociedade. Entretanto, existem possibilidades de se alterar este quadro.
Refletindo acerca das brechas que este tipo de interação apresenta, há, ao menos, duas
chances de mudança deste estado de invisibilidade. Uma é motivada por questões afetivas e, a
outra, impulsionada por questões políticas. Se pensarmos na possibilidade do surgimento de laços
afetivos (mesmo que frágeis) propiciados pela interação cotidiana em ambientes relativamente
fechados, estes seres invisíveis podem passar a existir aos olhos dos outros, isto é, são vistos para
além de seu uniforme e de sua função. No caso da EEFD/UFRJ, este tipo de situação poder ocorrer, em parte, na medida em que “o pessoal da limpeza” entra todos os dias nos espaços123 por onde
circulam quase que exclusivamente funcionários e professores. No que tange aos olhos discentes,
as chances de permanecerem invisíveis são maiores e parece ser mais difícil encontrar saídas, posto que os contatos são fugazes o que pode obstaculizar o surgimento de interações.
Engajamentos políticos fundamentados nas noções de igualdade e de justiça social também podem abrir fissuras em relações consideradas como monolíticas. Pessoas que compartilham
destas visões de mundo talvez sejam mais atentas às condições de vida e de trabalho de outrem
e, por isso, podem apresentar comportamentos que rompem com distanciamentos causados por
relações hierárquicas e de dominação, pautando seu cotidiano por interações mais igualitárias,
respeitosas e humanizadoras.
É acreditando na existência destas chances de mudanças que se inserem as ações do grupo
ESQUINA – Cidade, Lazer e Animação Cultural, sediado na EEFD/UFRJ, composto por estudantes dos cursos de Educação Física e Letras, e coordenado pela Prof.ª Dr.ª Angela Brêtas.
Atento às condições materiais, históricas e culturalmente situadas do “pessoal da limpeza”
da EEFD, mas preocupado especificamente com as mulheres integrantes deste grupo, o ESQUINA elaborou uma intervenção que conjugou três dimensões. A primeira estava referida ao lazer
entendido como campo preferencial de trabalho do Grupo; a segunda dizia respeito à uma opção
política de atuar com mulheres trabalhadoras das classes populares; e a terceira, referiu-se ao
modo de atingi-las e de mobilizá-las e, para isso, escolhemos o cinema.
Obviamente que estas escolhas, ao mesmo tempo em que apontam ricas possibilidades de
trabalho, de produção de conhecimentos e de alterações, tanto subjetivas quanto objetivas no que
tange às relações que se estabelecem entre os envolvidos, também estão permeadas por inúmeras
tensões e questionamentos que serão expostos e analisados a partir de uma breve apresentação do
projeto em pauta.
122 A função do profissional de serviço geral é executar trabalhos de limpeza e conservação em geral, bem como serviços de
entrega, recebimento, confecção e atendimento, utilizando os materiais e instrumentos adequados, e rotinas previamente
definidas. Ver em: http://www.bfservice.com.br/mao-obra-especializada/servicos-gerais-prevencao-empresa.php
Acessado em 02/03/2012.
123A Escola de Educação Física e Desportos da UFRJ está organizada em seis Departamentos quais sejam, Arte Corporal,
Biociências, Corridas, Jogos, Ginástica e Lutas. Possui, ainda, salas aonde funcionam os diversos setores da administração.
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Este projeto de extensão surgiu a partir de uma ação anterior do ESQUINA que aconteceu na comunidade da Maré, vizinha ao campus da UFRJ e considerada por esta como área
preferencial de intervenção. Esta localidade apresenta o quarto pior índice de Desenvolvimento
Humano124 da cidade do Rio de Janeiro, ocupando a 157ª posição entre 160 bairros. É composta
por dezesseis comunidades e, foi alçada à condição de bairro em 1994. Neste local vivem cerca de
130 mil pessoas, dentre imigrantes nordestinos, imigrantes angolanos e pessoas de outros estados
que vêm tentar a sorte na cidade do Rio de Janeiro.
O projeto que deu origem a este que ora apresentamos foi destinado à jovens alunos de
um CIEP125 localizado na comunidade do Parque União. Nesta oportunidade percebemos que na
área havia inúmeras ações voltadas para crianças, adolescentes e jovens, mas poucas atividades
direcionadas à mulher adulta e trabalhadora (do lar ou de empresas de qualquer tipo). Decididos
a intervir nesta situação, criamos o projeto “Cinema para donas de casa da Maré: a produção de
sentidos e de prazer” que recebeu apoio da FAPERJ através do edital Extpesq 2010. Entretanto,
devido a variados fatores, terminamos por atuar na própria EEFD, com um público-alvo de perfil
semelhante, isto é, mulheres, com idades variando entre 25 e 50 anos, moradoras de comunidades
de baixa renda, muitas ocupando posição central na sobrevivência e na manutenção da família,
posto que têm filhos, mas não têm maridos ou companheiros estáveis. Esta versão final foi intitulada “Cinema para trabalhadoras da EEFD/UFRJ: a produção de sentidos e de prazer”.
Este projeto teve o objetivo geral de exibir filmes – longas e curtas-metragens - que abordavam questões referidas ao universo feminino. Os objetivos específicos foram três: a) garantir um
espaço de fruição do cinema; b) criar oportunidades de ampliação do universo cultural; c) abrir
um lócus de reflexão sobre si mesmas em confronto com outras realidades. As sessões126 aconteciam, inicialmente, a cada quinze dias, mas com o desenrolar da atividade, passaram a ocorrer
semanalmente.
Cabe retomar os apontamentos acerca das tensões, das incertezas e dos desafios que cercam atividades de risco, tais como projetos de extensão universitária. Em nosso entendimento,
esta dimensão configura uma atividade de alto risco, pois a imprevisibilidade é aspecto marcante.
Saímos dos espaços seguros da universidade e mergulhamos em um mundo no qual nem sempre
o que foi planejado, estabelecido e organizado acontece segundo nossa vontade. Claro que as atividades de ensino e de pesquisa também possuem dimensões do inesperado, mas a sensação de
segurança gerada pelos muros acadêmicos traz algum conforto para os profissionais envolvidos.
O mesmo não acontece com as ações extensionistas, pois são voltadas para aqueles que não integram a comunidade acadêmica e, portanto, não compartilham seus códigos. Este movimento
de imiscuir-se e deixar-se banhar por outra realidade sem perder seu foco e seu lugar, demanda
do(s) representante(s) da universidade engajamento político, disposição, paciência, generosidade
e competência teórica. Este último aspecto está ligado à capacidade de lidar com os fenômenos a
partir do modo como se manifestam; penetrar neles, observar e compreender suas conexões com
os outros aspectos da realidade para, a seguir, poder voltar à eles e percebê-los de outra maneira.
Enfim, o grande desafio é confrontar a produção teórica com o que a realidade concreta apresenta. É nesse embate que as teorias são, ou podem ser abaladas na medida em que, quando lidamos
com seres humanos, não há certezas, mas sim, caminhos, descaminhos e potencialidades.
As tensões que permeiam este projeto estão relacionadas ao que acreditávamos que nos
amparava no que diz respeito ao conceito de lazer. Atuamos na perspectiva do lazer enquanto
fenômeno resultante da emergência da chamada sociedade industrial (Melo e Alves Jr., 2006;
124 Para maiores informações ver em: http://www.gfdesign.com.br/canaldofundao/curso.php. Acesso em 04/03/2012
125 CIEP 326 - Cesar Pernetta
126 Alguns dos filmes exibidos foram: Pão e tulipas, Transamérica, A cor púrpura, Vida Maria (curta-metragem), O segredo de
Vera Drake, Beijos Roubados, Monstro – desejo assassino, O piano.
202
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Marcellino, 1996). Nesta perspectiva, o tempo do lazer está referido a um tempo de não-trabalho,
liberado de todas as obrigações, quer sejam familiares, domésticas, fisiológicas, religiosas etc. É um
tempo marcado pela possibilidade de escolhas, pela liberdade, pela busca pelo prazer e aberto à
vivências culturais que podem levar os sujeitos a estabelecer outras relações com a sociedade na
qual estão inseridos. Na singeleza do trato está implícita a ideia de que o conceito de lazer, nesta
perspectiva, é bastante conhecido no campo acadêmico e, portanto, não são necessários detalhamentos.
Acontece que nesta intervenção, as “meninas da limpeza”, como costumávamos chamá-las, eram liberadas por sua coordenadora, com a aquiescência do Administrador da EEFD em
meio de seu horário de trabalho, isto é, era permitido que, na parte da tarde, sua jornada diária
fosse interrompida para que pudessem assistir às exibições. Cabe esclarecer que a participação no
projeto era livre havendo, inclusive, aquelas que afirmavam não gostar de cinema. Entretanto, as
que se comprometessem tinham que estar ali conosco, pois caso não frequentassem as sessões,
as próprias colegas de equipe poderiam avisar aos seus superiores. Normalmente as exibições
também eram interrompidas pouco antes do encerramento de sua jornada, pois elas tinham que
chegar ao relógio de ponto (situado em outra unidade) no tempo estabelecido para encerrar sua
lida. Logo, o filme era assistido em dois momentos no intervalo de uma semana.
Importa ressaltar, ainda, que os filmes eram escolhidos pelo ESQUINA. Com relação a
este aspecto, a ideia inicial era que a decisão sobre o que assistiríamos seria negociada entre nós,
do Grupo, e as “meninas”, mas sua reação foi inesperada e pode ser representada na seguinte fala
de uma delas:
_ “Ah, professora! A gente quer aprender e a gente sabe que vocês vão escolher filmes legais pra
gente ver. Então, a gente prefere não escolher nada e ver o que vocês trouxerem”127.
Neste ponto há três aspectos que geravam debates sem fim nas reuniões do grupo. Os dois
primeiros têm relação com o lazer, e o terceiro com as teorias da recepção, que não serão tratadas
neste texto. Naqueles, as inquietações, como já foi indicado, estavam pautadas em nosso ancoramento a um conceito de lazer que, cunhado a partir de uma dada realidade não mais respondia ao
que observávamos. A pergunta que dava origem ao debate era: “Este é um projeto de lazer?”. Se
nos detivéssemos na busca pelo prazer, sim, este poderia ser considerado um projeto de lazer, já que
as mulheres davam mostras claras de que adoravam assistir aos filmes. Por outro lado, as exibições
só poderiam acontecer se seus chefes permitissem que houvesse a interrupção de sua lida diária.
Neste caso, havia o aproveitamento de uma oportunidade que lhes era prazerosa, mas que era
resultado de uma concessão. Estávamos criando uma espécie de “intervalo feliz”, um tipo de parêntese aberto para que pudessem fruir a linguagem do cinema, pois, de acordo com o conceito de
lazer no qual nos apoiamos, elas não estavam em seu tempo/espaço de lazer. Ao contrário, estavam
em pleno horário de trabalho e não poderiam ir embora se fosse sua vontade. A concessão não
era para parar de trabalhar e sair. Era para parar de trabalhar e assistir ao filme escolhido por nós.
O fato de escolhermos os filmes que seriam exibidos também nos inquietava, posto que
configurava uma imposição que, somadas às outras, analisávamos como mais uma distorção do
conceito. Afinal, fruíam a linguagem do cinema em um tempo/espaço concedido e assistiam o que
era escolhido por outrem. Enfim, este é um projeto de lazer? Se não é, o que é? O que fazer, então,
com nossas crenças, engajamento político e concepções teóricas?
Diante dessa experiência e a partir da observação das mudanças nas relações dos sujeitos
com seu trabalho, no que diz respeito à submissão às novas máquinas, menores, portáteis, bonitas, atraentes, práticas, rápidas e potentes que configuram todo o arsenal tecnológico que alguns
elegem como imprescindíveis para a vida profissional e pessoal, acreditamos que chegou a hora
127 Depoimento de S., 45 anos, dois filhos e um neto, moradora do Parque União, na Maré.
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de rediscutir o conceito de lazer que nos dá suporte. De posse deste instrumental que facilita a
vida, conecta os indivíduos a outros mundos e pessoas e gera infinitas possibilidades de ampliação
do universo lúdico, cultural, pessoal e profissional, se não houver atenção e cuidado, o labor não
cessa. Estas maquinetas prendem os sujeitos à sua lida de tal modo que qualquer lugar pode se
transformar em local de trabalho. São coleiras ou crachás dos quais os indivíduos não se livram.
Não se pode desconsiderar as determinações históricas que deram origem ao termo lazer,
mas também, não podemos nos aferrar a ele, ao ponto de tratá-lo como um dogma, deixando de
examinar convenientemente suas “zonas de sombra”. Carregado de significações não pode ser
esvaziado e, nem tampouco, reduzido a um fenômeno da linguagem. Por outro lado, não se pode
forçar seu enquadramento a qualquer situação, pois caso isso aconteça, estaremos fechando os
olhos para o que nos mostra a realidade, tentando moldá-la ao que a Academia julga ser o correto
e mais adequado. De todo modo, intervenções deste tipo são fundamentais para arejar o campo
de estudos, pois nos retiram de um estado confortável no qual o conhecimento nos acolhe sem
muitas arestas.
Importa, ainda, justificar o título deste trabalho que se refere à uma condição de ser mulher e invisível, no contexto já apresentado e discutido. De acordo com Costa (2004), a invisibilidade e a humilhação sociais, retiram do trabalhador sua voz e sua capacidade de agir politicamente, de certo modo, anulando sua existência e seus desejos. Nas conversas que entabulávamos após
as sessões, era possível observar que aquelas mulheres apresentavam plena consciência acerca de
sua condição, do lugar que ocupavam na sociedade, das lutas que empreendiam diariamente e da
relação que todas estas dimensões tinham com o cenário político. Suas vozes poderiam não ser
ouvidas em todos os lugares ou em fóruns mais valorizados, mas como não são inocentes, intuíam
que há brechas por onde se pode subverter a ordem dominante.
Além disso, o contato com a linguagem do cinema lhes permitia penetrar em outros mundos e em outras culturas, fornecendo-lhes instrumentos para por em xeque também a sua própria
realidade. Sentiam-se poderosas e era emocionante ouvir declarações do tipo:
_ “Ih, professora, lá na minha comunidade, quando eu falo dos filmes que assisto aqui, tiro a
maior onda. Digo que eles nem imaginam como tem coisa nesse mundo. Aí, eles vêm me perguntar, pra poder baixar da internet, pra ver também.” 128
Enfim, mesmo sabendo das lacunas que ficaram por preencher, é necessário encerrar este
artigo. Sua elaboração foi movida pela possibilidade de compartilhar experiências e incertezas.
Como em toda esquina movimentada, nunca se sabe o que pode acontecer. Correr riscos faz parte.
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Paulo:Globo, 2004.
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Históricos. v. 5, n.10, p. 134-146, 1992. Disponível em
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________. Estudos do lazer: uma introdução. São Paulo: Autores Associados, 1996
MELO, Victor Andrade de, ALVES JUNIOR, Edmundo de Drummond. Introdução ao lazer.
São Paulo: Manole, 2003
128 Depoimento de G., 24 anos, uma filha, moradora da comunidade Timbau, na Maré.
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O LAZER VIVIDO E APROPRIADO POR MULHERES
Tânia Mara Vieira Sampaio129
Junior Vagner Pereira da Silva130
RESUMO: As oportunidades de lazer, em decorrência de construções socioculturais ocorrem
diferentemente entre homens e mulheres, as diferenças biológicas são utilizadas para justificar
as desigualdades. Compreendendo o lazer como fonte de emancipação, o objetivo da pesquisa
foi analisar a percepção de mulheres participantes de um projeto de educação para e pelo lazer.
Avaliaram-se quais atividades relacionadas aos interesses culturais fazem parte do rol de suas
vivências e quais motivos favorecem a realização de um tipo de atividade de lazer e não outros.
A metodologia utilizada foi descritiva/exploratória realizando diagnóstico para posteriormente,
desenvolver as intervenções. Participaram do estudo 10 mulheres de três cidades de Brasília-DF,
selecionadas de forma não probabilística, por conveniência. Utilizou-se um questionário construído especificamente para o estudo. Os resultados desta etapa do projeto maior evidenciaram que as
atividades de lazer mais procuradas são as relacionadas ao interesse físico-esportivo, destacando-se a caminhada, a ginástica, a prática de esportes e o brincar com crianças da família. Seguidas
por experiências de interesse turístico, como viajar e passear; atividades artísticas, ir ao cinema;
intelectuais, leitura. Quando questionadas a preferência pelo interesse físico-esportivo, a maioria
apresenta a justificativa da saúde e melhora estética, quanto aos demais interesses são bem reduzidos devido à condição econômica.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Gênero. Interesses Culturais. Emancipação.
INTRODUÇÃO
Embora reconhecido como um componente da cultura e um direito legal de todo cidadão,
por vezes, a importância do lazer tem sido defendida fundamentando-se em visões funcionalistas,
atribuindo a este o papel de recuperador, compensador e hedonístico (DUMAZEDIER, 1979).
Concebido desta forma, entende-se que o lazer pouco pode contribuir com a contestação das
desigualdades existentes na sociedade, mas sim favorecer a manutenção do status quo, permeado
por ações preconceituosas e hierarquização de poder, como as percebidas nas relações de gênero,
etnia, classes sociais, dentre outras.
No que tange as questões de gênero, independente do interesse cultural – físico/esportivo,
artístico, intelectual, social, manual ou turístico –, o uso do tempo disponível com oportunidades
de lazer, em decorrência de construções socioculturais, ocorre de forma diferente entre homens e
mulheres, pois desde a infância existe uma imposição de um imaginário cultural indicando o que
é próprio do masculino e o próprio do feminino, sendo ações agressivas e competitivas atribuídas
aos meninos e as delicadas e estéticas às meninas (SAMPAIO, 2008). Outro fator que contribui
para que as mulheres tenham menores oportunidades de lazer é que, ao passo que a mulher foi
129 Doutora em Ciências da Religião. Docente do Curso de Graduação e Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado e Doutorado) na Universidade Católica de Brasília – UCB. Coordenadora do Projeto de Pesquisa financiado pelo
Ministério do Esporte – Rede CEDES. [email protected]
130 Doutorando em Educação Física pela Universidade Católica de Brasília – UCB; Docente no Curso de Educação Física da
Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC; Bolsista PROSUP/CAPES (2010-2011) – [email protected]
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inserida no mercado de trabalho, as mesmas não abandonaram as tarefas domésticas e seguem no
cuidado dos filhos (BRUHNS, 1995), quando não são responsabilizadas atualmente pela obesidade dos membros da família que fazem refeições fora de casa. Esta condição também é ressaltada
por Marcellino (2002):
[...] para as mulheres que “trabalham fora” a situação também não é nada animadora. Além de
sofrerem os mesmos efeitos negativos do trabalho moderno a que os homens estão expostos,
há toda uma carga de pressões socioculturais no ambiente profissional, com agravantes que se
manifestam após o expediente. A divisão do trabalho doméstico, numa sociedade tipicamente
patriarcal, é verificada como exceção. Além das jornadas de trabalho profissional, as mulheres
cumprem novos expedientes, assumindo, via de regra, a totalidade das tarefas do lar.
Nota-se, que diferenças biológicas, justificam as desigualdades entre homens e mulheres
nas vivências em diversas esferas da vida social, inclusive no lazer. Sobre esta questão, Siebert
(1995, p. 19) expõe que “as práticas sociais são, portanto, introjetadas pelos indivíduos que aprendem a dar as respostas esperadas aos estímulos que recebem do mundo e da sociedade”.
Nesse sentido, o entendimento do lazer como possibilidade de superação do status quo, ou
seja, que o vê como fonte de emancipação humana, sendo afirmado não por suas características
de compensação, recuperação e hedonismo, mas sim por sua capacidade formativa e transformadora, sendo objeto e veículo de educação, pode resultar em contestação de valores historicamente
construídos, concepção esta da qual partilhamos.
Diante do exposto, objetivamos analisar a percepção de mulheres empobrecidas, participantes de um projeto de educação para e pelo lazer, denominado “Lazer e Gênero: Processo
Educativo de Mulheres Negras-Empobrecidas e Políticas Públicas”. Especificamente, avaliamos quais
atividades relacionadas aos interesses culturais fazem parte do rol de vivências de lazer; investigamos quais motivos favorecem a realização de um tipo de atividade de lazer e não outros.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os resultados apresentados neste trabalho fazem parte de uma das etapas do desenvolvimento do projeto maior, intitulado de “Lazer e Gênero: Processo Educativo de Mulheres Negras-Empobrecidas e Políticas Públicas”, desenvolvido pelos Cursos de Graduação e Pós-Graduação Stricto
Sensu em Educação Física da Universidade Católica de Brasília – UCB com o apoio da Rede
Cedes do Ministério do Esporte. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa, sob o protocolo UCB-051/2010.
Partindo do pressuposto de que todo projeto de transformação social tem como ponto
fundamental a construção coletiva, a pesquisa em tela, se caracteriza como descritiva/exploratória
(MARCONI; LAKATOS, 2002), haja vista que tratou de diagnosticar aspectos relacionados ao
lazer para somente posteriormente, em segunda etapa, desenvolver as intervenções.
Participaram do estudo, 10 mulheres residentes em três cidades de Brasília-DF – Areal,
Riacho Fundo II e Recanto das Emas –, todas localizadas no entorno da Universidade Católica de
Brasília – UCB, selecionadas de forma não probabilística, por conveniência, a partir de Programas
de Extensão (Comunidades Educativas) já desenvolvidos anteriormente pela Universidade, que
sinalizou a existência de carência de espaços para o lazer nessas regiões e a urgência de desenvolvimento de processos educativos crítico e criativos que resgatassem a cidadania e a afirmação da
igualdade de direitos.
A técnica de investigação utilizada foi aplicação de questionário, sendo o instrumento
construído especificamente para os objetivos do estudo, com as seguintes perguntas: Qual a atividade de lazer que você mais gosta? Por que você gosta desta atividade? O que mais lhe motiva
a praticar esta atividade? Existe algum empecilho para que você realize mais vezes esta atividade?
Se sim, quais são eles?
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RESULTADOS E DISCUSSÕES
No que tange ao perfil demográfico da amostra investigada, o grupo apresentou idade média de 37,17 anos, sendo a maioria negras e pardas (63%), participantes de comunidades religiosas
(93%). Dentre elas, 43% são casadas, 34% separadas ou viúvas. Variando o número de moradores
por casa de 3 a 8 pessoas, 71,4% possuem casas próprias e as demais pagam aluguel. Em relação
ao grau de instrução e vínculos trabalhistas, apenas um pequeno grupo possui o ensino superior,
sendo que 66% trabalham como autônomas, predominando entre as funções a atuação como
diaristas, acompanhantes de idosos e comércio.
As atividades de lazer que as participantes assinalaram mais realizarem foram as relacionadas ao interesse físico-esportivo, destacando entre as atividades a caminhada, a ginástica, a
prática de esportes e o brincar com crianças da família (60%), seguida por experiências de interesse turístico: viajar e passear (20%), atividades artísticas: ir ao cinema e intelectuais: ler, ambas
somando 10% do total da amostra.
Quando questionadas a respeito dos motivos pelos quais preferem as oportunidades de
lazer de interesse físico-esportivo, os resultados mostram que a maioria delas adere este tipo de
lazer devido a sua interface com a saúde e melhora estética, conforme pode ser evidenciado nos
depoimentos abaixo:
“Por que acho bom, e por questão de saúde, e por que não quero ficar obesa” (P1).
“Melhorar o corpo e perder peso” (P2)
“Porque além de fazer bem para o corpo melhora outras áreas do corpo” (P3).
“Brincar com meus sobrinhos” (P4).
“Ajuda na animação” (P5).
“Além de movimentar o corpo todinho, a gente usa a mente também” (P6).
“Ajuda o desenvolvimento físico, mental e motor” (P7);
“Ficar com o corpo melhor” (P8).
“A felicidade de estar com os meus sobrinhos” (P9).
“Quando era pequena jogava bola e meu sonho era ser jogadora” (P10).
Isso pode indicar que há uma boa compreensão das participantes do estudo a respeito dos
benefícios à saúde a partir do envolvimento nos momentos de lazer com atividades de interesse
físico/esportivo, o que condiz com os achados da literatura que demonstram que a prática de atividades físicas pode proporcionar prevenção de ocorrência da osteoporose (SIQUEIRA et al., 2009);
prevenção de depressão (VASCONCELOS-RAPOSO et al., 2009), proteção a hipertensão arterial sistêmica de adultos (WAGMACKER; PITANGA, 2007), melhora de capacidade funcional,
aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, saúde mental e aspectos
emocionais em adultos velhos e idosos (ADAIR et al., 2006).
Estudos desenvolvidos em outras localidades brasileiras com adolescentes (INTERDONATO et al., 2008), adultos (BALBINOTTI; CAPOZZOLI, 2008; FERMINO; PEZZINI; REIS,
2010; LEICHTWEIS; BAGGIO; ERDMANN, 2011) e idosos (FREITAS et al., 2007; BALBINOTTI; CAPOZZOLI, 2008; GOMES; ZAZÁ, 2009; EIRAS et al., 2010) também evidenciaram que o envolvimento com as atividades físicas/esportivas estavam relacionadas a melhora da
saúde.
A adesão de atividades físico/esportivas nos momentos de lazer, devido aos benefícios deles
advindos, pode estar relacionada à veiculação destas informações na mídia televisiva, pois estudos
demonstram que as principais fontes de informação sobre a prática de atividade física é a televisão
(27,5%) (22,2%) (ROCHA; RODRIGUES; MOREIRA, 2007; MENDES et al., 2010).
Em que pese os benefícios da adesão de um estilo de vida fisicamente ativos nos momentos de lazer, a maior difusão deste interesse cultural pela mídia faz com que por vezes o lazer seja
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compreendido pela população de forma reduzida, ou seja, que o lazer se restringe tão somente aos
esportes/exercícios físicos (MELO; ALVES JÚNIOR, 2003). Ainda, Santos (2000) nos chama
atenção a respeito da forma com que as informações transmitidas pelas mídias são destinadas à
população, afirmando que:
[...] Através da tirania da mídia, a informação passa a ser ministrada como propaganda. E em
vez das promessas de um conhecimento mais verdadeiro dos lugares, com sua variedade de
combinações e escolhas, com a produção mercantil enviesada de imagens do mundo e imagens
de pessoas, estamos sob ameaça permanente da manipulação. A imagem estereotipada ameaça
substituir o gosto pela fantasia e pela descoberta (SANTOS, 2000, p. 33).
Em relação da participação em atividades turísticas, justificaram como sendo a oportunidade de conhecer situações novas e por questão de saúde.
“Se sente bem, conhece coisas diferentes (P 9)”.
“Eita, relaxa, faz bem para a saúde” (P10).
E o que as motivam mais nessa atividade “são as possibilidades de conhecer novas pessoas, lugares diferentes, estar com os parentes, fazendo que fiquem ‘de bem com a vida’” (P 2).
Embora o conteúdo cultural turístico do lazer se manifeste pela busca do contato com novas paisagens, pela mudança de ritmo e estilo de vida, alterando a rotina cotidiana (SILVA; SAMPAIO; 2011), não apenas em viagens intermunicipais, mas também na própria cidade em que o
sujeito reside (MELO, 2004), verifica-se que nos depoimentos das participantes além da busca de
vivenciar paisagens diferentes, os aspectos relacionados ao interesse social também se mostraram
bastante evidentes. Esta condição, conforme ressalta Dumazedier (1979), ocorre pelo fato de que
as oportunidades de lazer não se dão de forma isolada pautada somente em um interesse cultural,
estando a distinção presente apenas em termos de predominância.
Com relação às atividades artísticas, entre as justificativas estava a de que “é uma forma
de sair do mundo real, dos problemas do dia a dia e de sair do estresse um pouco”. E na intelectual
“a vontade de conhecer coisas novas e diferentes, no caso da leitura”. Nas atividades manuais por
que “gosto de inventar, fabricar”, manifestando uma expressiva motivação para “... sair da rotina,
ocupar a mente”.
Embora a busca pela invenção esteja presente nos motivos que levam a participação em
oportunidades de lazer, nota-se que nos motivos atribuídos à vivência do lazer de interesse artístico, intelectual e manual, também se encontra fundamentado duas características da concepção
funcionalista do lazer – fuga das pressões cotidianas e alívio do estresse – compensação e recuperação.
Quando questionadas sobre a existência de empecilhos para praticar mais vezes as atividades de lazer, seis das dez mulheres avaliadas destacaram entre eles as questões financeiras,
obrigações familiares (cuidar da casa e de filhos) e uma por compromisso profissional e escolar.
Nota-se que no emaranhado de fatores que atuam como barreiras à efetivação do
direito ao lazer apareceram de forma bastante evidente aspectos relacionadas às características da
amostra participante do estudo, a condição financeira e o sexo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse sentido, esta pesquisa também contribuiu para a construção de saberes e de perspectivas de políticas públicas para dialogar com o Sistema Nacional de Esporte e Lazer, Rede
Cedes do Ministério do Esporte. Esta compreensão tem guarida nas deliberações da I Conferência
Nacional de Esportes e reiterada posteriormente na II Conferência, as quais apontam incisivamente para os seguintes princípios norteadores;
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1. O projeto histórico de sociedade comprometido com a reversão do quadro de injustiça,
exclusão e vulnerabilidade social ao qual se submete grande parcela da nossa sociedade;
2. O reconhecimento do esporte e do lazer como direitos sociais;
3. A inclusão social compreendida como a garantia do acesso aos direitos sociais de
esporte e lazer a todos os segmentos, sem nenhuma forma de discriminação, seja de
classe, etnia, religião gênero, nível socioeconômico, faixa etária e condição de necessidade especial de qualquer espécie;
4. A gestão democrática e participativa, com ênfase na transparência no gerenciamento
dos recursos (BRASIL, 2004).
Compactuamos ainda do pensamento de que para que qualquer mudança ocorra se faz
necessário uma ação coletiva, movida em conjunto com a comunidade, envolvendo todo um
processo coletivo de educação, pois conforme nos ensina Gebara (2000, p. 112) “é preciso mudar
a ordem simbólica e, consequentemente, mudar as relações na prática, no cotidiano da cultura”.
Pautado no entendimento de que o lazer se manifesta como uma possibilidade de contraposição à lógica de compensação, alienação e/ou exploração do sistema capitalista, o projeto
consistiu na realização de encontros quinzenais, durante o ano de 2011, através da iniciação das
mulheres participantes aos seis interesses culturais do lazer – físico/esportivo, intelectual, artístico,
social, manual e turístico –, assim como na estimulação das vivências dessas oportunidades em
níveis médios/crítico e superiores/críticos-criativos.
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na Idade Adulta. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 15, n. 1, p. 27-30, 2009.
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p. 69-74, 2007.
210
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
A FESTA DO TRABALHADOR ADOLESCENTE DA UNIVERSIDADE FEDERAL
DE MINAS GERAIS: CONSIDERAÇÕES SOBRE UM EVENTO DE LAZER
DIRECIONADO AOS JOVENS
André C.B. Mendes131
Ana Claudia Porfírio Couto132
RESUMO: Este artigo descreve e propõe considerações sobre o evento Festa do Trabalhador
Adolescente que anualmente é promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais. Foi elaborada a revisão teórica dos autores que lidam com o tema, fazemos ainda considerações sobre suas
obras e demarcamos o nosso objeto de análise e interpretação. Durante o trabalho foi considerada
a questão das festas como espaços lúdicos e de auto-determinação, das juventudes como vivências
singulares e contextualizadas, e das contradições que permeiam as ações dirigidas aos jovens,
mormente em uma configuração institucional. O artigo está inserido no campo multidisciplinar
de estudos do lazer e procura oferecer subsídios para a construção, o entendimento e consecução
de atividades dirigidas aos jovens trabalhadores.
PALAVRAS CHAVE: Festa. Jovens. Cultura.
INTRODUÇÂO
Neste artigo pretendemos situar, descrever e interpretar a Festa do Trabalhador Adolescente, evento anual que é organizado pela PRORH – Pró-reitoria de Recursos Humanos da
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais133 e tem a intenção manifesta de promover o
lazer, integração e o desenvolvimento dos jovens que trabalham na instituição.
Não encontramos até o momento uma teoria estruturada para as festas, com essas vistas, nos estudos consultados, como manifestações culturais de cunho lúdico. Pela dificuldade
de delimitarmos este segundo conceito nos ateremos à descrição do evento como se apresenta e
pretendemos inserir algumas concepções com caráter empírico. A tarefa proposta se dará em dois
momentos, o primeiro de descrição teórica, e o segundo de caracterização do evento. Adiante
faremos algumas considerações relativas a contradição da festa possuir o termo adolescente e nos
os tratarmos neste artigo por jovens, duas categorias que se tocam, possuem pontos em comum,
mas não são de forma alguma similares.
FESTAS: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
Para localizar o que entendemos por festa, nos remetemos a três autores: Roger Callois
(1990), Joan Huizinga (1980) e Clifford Geertz (2008) O foco dos dois primeiros autores não é
131 Departamento de Recursos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais – PRORH/ DRH/CGP. Psicólogo e Mestrando em Lazer na Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG. Membro do GESPE –
EEFFTO. E-mail: [email protected] .
132 Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional – Universidade Federal de Minas Gerais. Docente
133A universidade está localizada em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais – Brasil. Esta possui o segundo maior corpo
técnico entre as universidades federais, possuindo 275 vagas para preenchimento através de convênio com a Cruz Vermelha Brasileira - CVB. Estas vagas são preenchidas por jovens entre 16 e 18 anos, previamente selecionados pela CVB,
que cumprem uma jornada de 40 horas semanais e possuem o regime de trabalho ordenado pela CLT – Consolidação das
Leis Trabalhistas – com direito a todas as proteções e obrigações jurídicas.
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propriamente a festa, mas o jogo, entretanto esta se insere em suas considerações, sendo entendida
um jogo social, marcado pelo caráter lúdico.
A festa para Roger Callois (1990) é um momento de encontro, subversão de regras e
confraternização. A festa, como o jogo, é livre, pois se é compulsória perde seu caráter. Adiante
voltaremos a este ponto (nas nossas considerações finais). Ela também é limitada, em um espaço
e tempo acordados de antemão. Também é incerta, pois não podemos definir previamente o que
ocorrerá. O autor a descreve como improdutiva, pois não tem a função de gerar bens ou conhecimentos em si, caso eles ocorram esta é uma conseqüência que não pode ser estritamente planejada. A festa também é regulamentada, sujeita a convenções que surgem durante as mesmas e que
se suspendem a orientação normal criam outra própria e elástica, de cunho mais interpretativo e
jurisprudencial que normativo. A última característica atribuída é ser fictícia, com a convivência
de realidades da vida normal e irrealidades no mesmo espaço.
Para Johan Huizinga (1980), em que pese a dificuldade de compreensão de seu trabalho
Homo Ludens de 1939134, festa é seria e relaxada, contraditória, sendo uma manifestação lúdica,
marcada por regras tácitas, negociadas e que se não podem ser quebradas, são construídas e encerradas de forma abrupta, restando a vivência e o desfrute. Huizinga propõe que o jogo – e no nosso
caso as festas – deve ser avaliado e compreendido em sua totalidade, não possibilitando análises
puramente racionais e causais. O autor relata que o objeto de estudo é o jogo como uma forma
específica de atividade, forma significante e com função social. O jogo tem como características
ser uma atividade voluntária, praticada nas horas de ócio. É livre, sendo ele próprio a liberdade.
Não é a vida real, mas uma evasão desta para uma esfera temporária com orientação própria e
ainda distinta do faz de conta. O jogo está fora dos mecanismos de satisfação imediata e até os interrompe. Também é marcado pelo isolamento e pela limitação, possuindo uma ordem específica
e absoluta, onde ele cria e é a ordem, possuindo, como a dança, ritmo e harmonia.
O autor ainda situa que o jogo é marcado pela tensão (como em jogos de azar e competições esportivas) e que possui o encanto de ter um segredo e permitir tornar-se outro. O jogo é
uma atividade livre, conscientemente tomada como não séria e exterior a vida habitual. Também
é desligada do todo e qualquer interesse material. O rito do jogo leva a participação no sagrado e
apresenta uma separação espacial em relação à vida cotidiana, sendo-lhe reservado material ou
imaterialmente um espaço fechado e isolado do cotidiano. Essa caracteriza um ritual, uma forma
de culto. Mas esse lugar tem ao mesmo tempo um ambiente instável em que o jogo pode ser interrompido, quer pela quebra das suas regras intrínsecas, quer pelas demandas cotidianas. Como
os rituais os jogos implicam uma noção do que existe e não existe e que estão representando um
papel e o mesmo tempo são o papel. Não há uma ilusão total, constituindo uma crença negociada. Chegamos assim a uma das conclusões propostas em Homo ludens, a festa e o jogo, possuem
intrinsecamente as mesmas características.
Em Geertz (2008) a festa é uma manifestação cultural, onde a cultura é considerada a teia
de significados que as pessoas utilizam para descrever o mundo, incluindo neste a si mesmos. A
festa possui a função de atribuir sentido aos eventos tanto compreensíveis quanto incompreensíveis, além da transmissão viva das crenças e tradições, com a participação num ethos135 de um
134 Nesta obra seminal o autor é passível de várias críticas, como bem marcado por Umberto Eco (1989), onde se questiona a
ausência de referencias e o caráter pessoal das considerações. Porém o mesmo trata do caráter lúdico do ser humano, o qual
é da esfera imaginária, inefável e vivenciada de forma singular. Boas referencias também são encontradas no Dicionário
Crítico de Lazer, organizado pela professora da UFMG Christiane Luce Gomes.
135 Clifford (1989) define ethos como os elementos valorativos de determinada cultura. Este termo denota o tom, o caráter
e a qualidade de vida, seu estilo moral e estético, a atitude em relação a ele mesmo e ao seu mundo que a vida reflete. O
ethos difere da visão de mundo, que por sua vez se refere a idéias abrangentes de ordem e possui um cunho cognitivo (op.
citada, p 93).
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povo. A cultura para o autor é compreendida como um padrão de significados que é transmitido
historicamente, assim como um sistema ordenado de símbolos e significados nos termos dos quais
as pessoas definem seu mundo, fazem julgamentos e expressam sentimentos. Assim temos as festas
como manifestações que fazem parte de toda uma rede que ordena o mundo tanto na compreensão e aceitação, quanto na perspectiva teleológica, atribuindo significado a existência.
A festa, em todas as abordagens é marcada por prazer e tensão, possuindo também o sentido de catarse e carregando a contradição de ser desejada e temida, séria e relaxada, de brincadeira
e compromisso. Nelas apresenta-se a face que surpreende, que concorda e contesta. A festa traz
em si a característica da contradição, descrita por Chaui (2008) como a capacidade de possuir
em si elementos opostos que possuem uma negação interna. Somente na contradição é possível
o estudo das relações entre as partes, pois os elementos contraditórios só existem em relação. A
possibilidade do isolamento de partes caracteriza a contradição externa, que por sua vez é a oposição, onde um fenômeno nega o outro e pode ser estudado de forma isolada. Portanto, aparte o
uso excessivo do termo, consideramos a festa contraditória em si, pois ela é e não é diversão, é
séria e não séria, estruturada e não estruturada ao mesmo tempo. Quanto a última observação
podemos considerá-la não estruturada porque a mesma pode ser planejada, porém não é possível
um controle total sobre o que ocorrerá durante o seu decorrer, como acidentes, brigas, início de
relações de amizade ou até defeitos na estrutura física do evento.
Consideramos da mesma maneira a perspectiva atual Melo (in ISAYAMA; SILVA, 2011)
de considerar a instância diversão como pertinente ao campo de estudos do lazer. Antes da descrição proposta convém reforçar que baseamos nosso trabalho nas idéias de Medeiros (1975) que
também situa o lazer em um tempo delimitado, após as obrigações cotidianas e situado como espaço da liberdade e da possibilidade de divertimento. Esta última autora faz uma viva descrição das
festas no Brasil, incluindo as religiosas, que tem origem época colonial e marcam o calendário até
a atualidade. Ultrapassando a descrição Medeiros analisa as festas em relação com a urbanização,
a evolução econômica e as mudanças de configurações familiares e dos modos de produção. Podemos então afirmar que as sociedades mudam, assim como suas festividades e manifestações, que
caracterizam uma história humana contínua, onde os valores são contextuais e interdependentes.
Assim tronamos clara nossa idéia de lazer como um campo da cultura, porém baseada na
liberdade, capacidade de auto-determinação, características lúdicas e em relação com o tempo
disponível, ou tempo livre, a despeito do significado ambíguo deste último termo. Utilizamos a
categoria tempo disponível, porque nenhum tempo é livre de algumas (ou muitas) coações e determinantes, além da carga ideológica, que remete a conceitos marxistas, que incluem a teorização
materialista-dialética sobre ideologias e sociedade. Desta forma a festa, junto aos significados sociais, hedonísticos e rituais, a festa é uma característica humana e além do campo do lazer remete
a compreensões sociológicas, econômicas e históricas interdependentes.
Contemporaneamente Chris Rojek (in FORTINI; GOMES; ELIZALDE, 2011), sociólogo
inglês pesquisador do lazer, o descreve como um tempo em que as restrições que governam nosso
comportamento em outras áreas da vida (como o trabalho e a família) são diminuídas, permitindo
autonomia e flexibilidade, mas permitindo ainda a emersão de aspectos obscuros e sombrios com
características de transgressão destrutiva, como episódios de violência e abusos de drogas, além
das agressões sexuais. Não temos como negar que eventos festivos requerem segurança, algum
grau de vigilância e um corpo de apoio capaz de prestar primeiros-socorros. Nos eventos que fazem parte do escopo das festas, junto à diversão temos o risco que pode ser gerado por um contato
físico inconveniente, um olhar desditoso ou um desejo não correspondido, aos quais determinada
pessoa, ou determinados grupos não conseguem lidar, assim a festa e o lazer também podem envolver frustrações que requerem mecanismos para conviver com a insatisfação dos desejos que o
envolvem a aceitação das diferenças e a alteridade.
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Antes de finalizarmos este trecho devemos situar que o termo lúdico não possui tradução
em outros idiomas. Embasamos nosso estudo, ao analisar esta forma de vivência, nas pesquisas de
Gomes (2004) que o situa como instância de desfrute, prazer e auto-satisfação, que por sua vez
traz o risco de uma conduta de evasão da realidade. Desta forma o lúdico pode possuir conotações
positivas, de alegria, emancipação e reflexão. Também remetendo a pontos negativos, como alienação, fuga da realidade, conformismo e passividade (p. 146)
O EVENTO
Este artigo foi elaborado após a análise da observação não estruturada da festa. Os autores participaram das mesmas como um evento institucional, porém com o olhar crítico de quem
pesquisa a juventude e suas manifestações, nesta incluída o lazer. A “Festa do Trabalhador Adolescente” deve-se ao nome do programa que a PRORH, denominado PORTA – Programa de
Orientação ao Trabalhador Adolescente – que orienta e gerencia a trajetória deste público na
Universidade136.
A festa é o ápice de uma preparação que dura meses e envolve a criação de uma comissão
organizadora, processos de licitação, planejamento de atividades, organização de tempos e espaços. Nela prepara-se uma equipe de salvamento, de primeiros socorros e o contato com corpo
docente e técnico administrativo da instituição. Envolve a liberação para participação da chefia e
a autorização dos responsáveis.
Os jovens também se preparam, organizando as suas roupas – de múltiplas cores – shorts,
acessórios e maquiagens. Neste dia eles tiram o uniforme vermelho que os caracteriza frente ao
corpo institucional e aparecem como gostariam em seu cotidiano fora do trabalho. O uniforme,
além da cor, possui estampado o nome da CVB, uma cruz e listras brancas paralelas. Cada jovem
recebe duas camisetas ao entrar em exercício, com o compromisso de preservá-las e trabalhar com
as mesmas em bom estado de asseio.
O primeiro passo da festa consiste no envio de ofícios as chefias imediatas e diretores dos
órgãos administrativos e das unidades acadêmicas. Também é enviada a autorização dos pais para
assinatura e entrega prévia. A partir deste passo é feita a lista de presença, onde os jovens que não
enviaram os documentos são questionados sobre a vontade de participar e, se não autorizados e
desejosos de comparecer, as chefias e responsáveis são procurados para avaliar o que impediria a
ida do mesmo.
Temos desta maneira um caráter coercitivo, pois a festa imbrica-se da obrigação de participação, visto que o não comparecimento implica na rotina de trabalho normal.
Durante a mesma ocorre a recepção, com a assinatura do nome na lista de presença, tal
qual uma folha de ponto. Os que não comparecerem são posteriormente interpolados sobre os
motivos. A festa, como já citado, ocorre anualmente em um dia de trabalho, preferencialmente
na semana próxima ao dia das crianças, tanto por seu valor no imaginário social, quanto por seu
significado pessoal, este último atribuído pessoalmente. Outra motivação é o recesso escolar que
é ligado ao calendário letivo.
Na entrada, junto a lista de presença, é distribuído o material, composto por camiseta
e acessórios como bonés, e fichas de alimentação. A camiseta é feita após a prévia consulta de
alguns modelos e cores elaborados pela assessoria de comunicação da Universidade a comissão
organizadora e a um grupo de jovens que faz parte desta comissão, cabendo a avaliação de que
mais se propuser. São levados em conta os custos do tecido, as possibilidades de estampa e a adequação a organização. No momento não podemos estabelecer um contínuo entre as estampagens,
136 Maiores informações podem ser obtidas no endereço eletrônico: <HTTP://www.ufmg.br/prorh> último acesso em 10 de
novembro de 2011
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constituindo-se em geral do nome da festa, com ano e figura na frente e o nome da UFMG e
PRORH na parte de trás.
Durante a festa são distribuídos lanches, no horário da manhã e tarde, composto por
pães, cachorros-quente, e o que mais for possível definir de antemão e com relação ao aporte de
recursos. Também encontra-se a disposição frutas para o consumo durante o evento, estas de livre
acesso, sem necessidade de entrega de fichas de controle
A festa ocorre no CEU – Centro Esportivo Universitário, clube da UFMG, com porte
considerável, duas piscinas adultas e uma infantil, vestiários, quadras, campos e gramados, através
de acordo de cessão no dia. Este fator também interfere na data, que em regra é na segunda-feira,
pois este é o dia em que o clube fecha para manutenção e folga escalonada do seu corpo de funcionários e servidores.
A festa é marcada por atividades esportivas, artísticas e culturais elaborados pelo PET –
Programa de Educação Tutorial – da EEFFTO – Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia
Ocupacional da Universidade. Também contamos com a participação de outras unidades, como
o Teatro Universitário e eventos como show de talentos, com premiações e escolha das melhores
apresentações entre atividades que normalmente se referem a duas manifestações: dança e música.
Ambas estão imbricadas na cultura juvenil (DAYRELL, 2005) e constituem formas de manifestações corporais, emocionais e ideativas, permitindo a existência social e a expressão de idéias, que
se não são estruturadas de forma refinada constituem a comunicação viva de sentimentos e visões
de mundo (GEERTZ, 2008).
Durante a festa são observadas descontração, alegria e ao mesmo tempo certa tensão
por ser avaliado pelos pares e pelo corpo técnico da instituição em sua vida fora do trabalho.
Alguns atos de desafio podem ocorrer, assim como as pequenas transgressões. Estas são vistas
em tentativas de furar filas de almoço ou lanche, na resistência a participar de certas atividades
que impliquem em sair de equipamentos como as piscinas ou quadras e na resistência a algumas
ordenações das atividades, como os horários de jogos que são limitados pela disponibilidade de
quadras e instrumentos como bolas e acessórios.
Também ocorrem fatos inusitados como chuvas inesperadas, falhas em equipamento de
som e quebra de estruturas do clube. Durante a última festa, ocorrida em 10 de outubro de 2011,
por volta do meio-dia ocorreu uma queda de caixa de abelhas de uma árvore. A queda ocorreu
de uma altura de aproximadamente dez metros, implicando em uma certa balbúrdia e por sorte
nenhuma pessoa estava muito próxima ao local da queda. O fato foi resolvido, trazendo aos jovens, estagiários e corpo técnico a lição que sempre ocorrem fatos inesperados e incontroláveis,
que levam a necessidade de lidar com os mesmos de forma a minimizar danos e tentar manter o
evento. Percebemos então que o show tem que continuar, mesmo que com adaptações e ajustes.
AS JUVENTUDES
Como expomos anteriormente, trabalhamos na vertente sócio-cultural de considerarmos
preferível o termo jovens ao adolescentes. Nossa opção deve-se a falta de delimitação exata de qual
seria a duração da adolescência, qual seria seu inicio e fim. Em nosso entendimento lidamos com
a abordagem da vida de forma contínua, como um fluxo em que as separações são artificialmente
criadas de modo sócio-histórico.
Nesta compreensão a criação de faixas etárias e de conceitos como criança, adolescente
e adulto, se aferram a questões jurídicas e em perspectivas com maior foco no desenvolvimento
como fases da vida, características das ciências clinicas como medicina e psicologia. Podemos
exemplificar através dos seguintes modelos: um jovem de dezesseis anos, que sustente a família,
possua filhos, vida sexual ativa seria uma adolescente? Uma mãe na mesma idade, emancipada,
casada e trabalhadora seria adolescente? E o que dizermos dos boys de trinta a quarenta anos, deColetânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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pendentes dos pais, sem filhos, que participam de todas as festas juvenis e não necessitam se preocupar com horários, seriam eles adolescentes? Portanto torna-se clara a fragilidade de conceitos
que delimitem de forma tão estática as formas de viver cada idade em cada sociedade.
Concordamos e assumimos a abordagem de Juarez Dayrell (2005) que a juventude é ao
mesmo tempo representação social e condição, com caráter universal mas representações sociais
e vivencias diferentes. Dayrel aponta que a sociedade torna-se cada vez mais heterogênea, tornando-se uma difícil tarefa a construção de normas e conceitos universalizantes e válidos para
qualquer extrato social ou até mesmo dentro deles.
Entre as vastas contribuições de Dayrell para o estudo da juventude podemos citar uma
das que abrange o nosso estudo e se relaciona às anteriores. Ele aponta – e crítica – a divisão
ternária das idades, nas quais a na infância se brinca, na juventude137 se forma (ocorrendo uma
preparação) e na vida adulta chega a hora do trabalho, da produção. Temos assim uma visão
causal e linear, com características deterministas, onde o objetivo final é tornar-se adulto. Esta
divisão artificial constitui uma herança do modelo que orientava a criação nas classes superiores,
posteriormente incorporada em todas as outras classes (CHAUI, 2008) como o ideal e normativo,
o que também influenciou as ciências já citadas, a saber: medicina e psicologia, saberes normativos
com poder social de definir o que é normal e o que pertence ao espectro desviante.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do que foi exposto não temos uma festa em si, no sentido estrito, nem um evento
propriamente dito, com esta manifestação constituindo-se um misto de ambos, onde o caráter
compulsório de participação pode ser convertido em exercício da liberdade, livre expressão e que
possui a característica contraditória da cultura juvenil, onde o sério pode ser relaxado e divertido,
da mesma forma que a diversão pode ser extremamente séria, formal e delimitada.
A participação nas festas institucionais permite várias análises. Seguindo a tendência de
Dejours (1992) podemos encará-la como uma forma de controle do trabalhador fora do ambiente
laboral, assim como um mecanismo para a criação de laços entre os funcionários que permita
mecanismos de regulação interna desta população, onde os valores da instituição são incorporados como valores pessoais e naturais, influenciando na rotina, nas relações fora do trabalho e na
compreensão do mundo. Tem-se ainda a finalidade de promover o equilíbrio psíquico, através da
liberação controlada e de uma catarse delimitada. O funcionário também desfruta da sensação de
ter um retorno da empresa pelo trabalho prestado, ganhando um quinhão sobre o resultado que
este não vê.
Como Dejours, Friedmann (1983) percebe as festas como formas de controle da insatisfação no trabalho. Em ambos temos com ponto crucial a característica da Organização Cientifica
do Trabalho (OCT) ser incorporada em vários aspectos da vida, com a divisão do trabalho em
instâncias de planejamento, execução e controle. Esta fragmentação leva também a desagregação
dos sujeitos, com a incorporação de uma vigilância interna mais efetiva que a externa. Acreditamos que existem formas de minimizar esta dicotomia, pois os autores situam que existem formas
de escapar deste controle, tanto negativas como a doença e a evasão, quanto positivas, entendidas
como a busca de formas de participação na construção dos eventos e das rotinas.
Portanto acreditamos que a festa não deve ser feita para os jovens, mas com os mesmos,
através da construção de mecanismos institucionais negociados que incrementem o protagonismo
e a livre expressão, ainda que delimitada nos tempos e espaços. Partiremos então de um evento
pontual e imposto para uma organização participante, democrática e se não perfeita pelo menos
que gere autonomia, assim como a responsabilidade que advém da primeira.
137 Como construção histórica este autor também descreve que a juventude era uma prerrogativa das classes superiores, onde
comportamentos desviantes eram tolerados por serem considerados provisórios.
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A festa é organizada todo ano, com início há nove anos, deste modo tornou-se uma tradição, que faz parte das rotinas, crenças e ritos institucionais. Tentamos não nos arriscar a crítica
sem proposições, ou ao enaltecimento, do mesmo modo acrítico. Acreditamos que não possuímos
um conhecimento completo sobre seus efeitos na rotina dos jovens, na relação com a instituição,
em sua identidade e nas relações entre os pares. Estamos abertos a críticas, interpolações e acréscimos, deixando este trabalho aberto a novas investigações e desenvolvimentos.
REFERÊNCIAS
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CHAUI, Marilena de Souza. O que é ideologia. 2° ed. São Paulo: Brasiliense, 2008.
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FRIEDMANN, Georges. O trabalho em migalhas: especialização e lazeres. São Paulo: Ed. Perspectiva (Debates), 1983.
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GOMES, Christianne Luce (Org.). Dicionário crítico do lazer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
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ISAYAMA, Hélder F.; SILVA, Silvio R. (orgs.). Estudos do lazer: um panorama. Rio de Janeiro:
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MEDEIROS, Ethel Bauzer. O lazer no planejamento urbano. 2º Ed. Rio de Janeiro: Fundação
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ROJEK, Chris. O lado obscuro do lazer: formas anormais. In: FORTINI, J. L. M.; GOMES, C.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA: O LÚDICO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA –
ENSINO MÉDIO
Lucas de Andrade Carvalho138
Cinthia Lopes da Silva139
RESUMO: Este trabalho tem como objetivo descrever uma experiência pedagógica a partir da
dança. É parte da tradição das aulas de educação física a esportivização e a ênfase no desenvolvimento da aptidão física dos alunos. É também parte da realidade escolar aulas sem um direcionamento pedagógico. Desde final da década de 1970 foi introduzido na área de Educação Física
o conceito de cultura corporal, como uma forma de contraponto à perspectiva da aptidão física,
de acordo com tal conceito as manifestações corporais são expressões históricas e culturais. Esse
conceito vai ao encontro dos estudos do lazer, em especial, da perspectiva da pedagogia da animação, que enfatiza o lúdico como dimensão humana. A experiência relatada expressa a tentativa
de aproximação com tal referencial, de modo a viabilizar que as aulas de educação física atinjam
todos os alunos e que o lúdico seja elemento predominante nessas aulas. A experiência pedagógica
foi realizada durante sete semanas em uma escola pública da cidade de Piracicaba, SP, com turmas
do Ensino Médio. No decorrer da experiência os alunos tiveram acesso à dança e música, de modo
a superar preconceitos, vivenciar e ressignificar esse elemento da cultura corporal de movimento.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Lúdico. Educação Física Escolar.
O LÚDICO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA – ENSINO MÉDIO
Com relação à Educação Física Escolar, as situações de aprendizado estão longe de cumprir com os objetivos especificados para a disciplina com relação ao movimentar-se, pois o preconceito, a discriminação e agora a auto-discriminação estão presentes nessas aulas, fato observado
por Oliveira (2006), onde alunos por escolha própria se abstêm das práticas corporais, ficando
sentados nas arquibancadas, tornado as aulas no ensino médio momentos onde ocorrem muitas
atividades, porém pouco ligadas ao movimento humano (Oliveira, 2006).
Nos anos de 1990, Daolio (1998) afirmou que a Educação Física na escola ainda possuía
resquícios da esportivização ocorrida entre 1969 e 1979, abordagem esta que discriminava os
“mais habilidosos” dos outros, discriminação que mesmo de outra forma ou intensidade, ainda
está presente no discurso e ou na prática de alguns professores.
O comportamento dos alunos e professores diante das aulas práticas de Educação Física
no Ensino médio com relação à movimentação corporal ou não, Snyders (1988) classificaria como
“aula triste”, pois acaba por gerar uma aula de Educação Física onde o movimento nunca é o protagonista, incompatível com a dança, a luta, os jogos e as ginásticas. Assim como é incompatível
com o elemento lúdico criador do ânimo que a “pedagogia da animação” busca. Em oposição a
esta situação de aula “triste” podemos perguntar: Onde está a valorização da alegria no aprender?
138 Mestrando em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Membro do Grupo de Estudo e
Pesquisa em Lazer, Práticas Corporais e Cultura (GELC).
139 Professora Doutora, atuante na Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Coordenadora do GELC.
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Snyders (1988) defende que esta alegria em construir conhecimento deve partir de uma iniciativa
da própria prática pedagógica, aparentemente poderíamos dizer que este é o mesmo princípio que
move a “pedagogia da animação”, de Marcellino (2010).
No entanto, para Marcellino (2010), a animação não se dá apenas pela mudança na prática pedagógica em si, mas na mudança do olhar desta para a abordagem dos conteúdos que não
desprezam a cultura historicamente construída. Além disto, é importante para a “pedagogia da
animação” tratar a cultura historicamente construída também historicamente situada, sempre
trazendo a motivação lúdica das crianças para a prática pedagógica em seu todo, alcançando
assim uma Educação Física que atinja a todos os alunos por meio do elemento lúdico. Segundo
Marcellino (2010), o lúdico não está apenas nas atividades que são escolhidas livremente, no tempo disponível objetivando o lazer, pelo contrário, o lúdico deve fazer parte de todas as áreas da
cultura e não se configurar como elemento compensatório.
Para Marcellino (2010, p.39), lazer é “... a cultura, compreendida em seu sentido mais amplo,
vivenciada no tempo disponível. É fundamental como traço definidor, o caráter desinteressado dessa
vivência”. Há uma importância com relação à postura diante do lazer, que deve ser descompromissada, que o tempo deve ser necessariamente “livre”, isso parece ser unanimidade entre os autores
do tema. No entanto, Elias e Dunning (1992) dão maior relevância ao aspecto do não trabalho
por este ser oposto ao lazer, afirmando que lazer é “uma ocupação escolhida livremente e não remunerada – escolhida, antes de tudo, porque é agradável para si mesmo” (ELIAS e DUNNING,
1992 p.107).
Marcelino (2011) buscou desmistificar a ambiguidade entre lazer e trabalho, além de descaracterizar o mesmo como simplesmente funcional, num sentido que o lazer seria uma necessidade para que o sujeito pudesse se recuperar para o trabalho. Contudo, o autor afirma ter encontrado
o elemento lúdico como conciliador entre estes dois elementos culturais, aceitos anteriormente
como opostos, o trabalho e o lazer, “não creio nessa oposição. Não consigo colocar lazer e trabalho
em campos opostos” (MARCELLINO, 2011 p. 120). Compreendemos então que o autor procura
deixar claro que em qualquer área da cultura, inclusive no trabalho docente e discente, é possível
encontrar o elemento lúdico, aproximando assim todos os momentos de obrigações sociais dos
momentos de tempo disponível e livre escolha (MARCELLINO, 2011).
Assim, o tema do lazer na Educação Física Escolar parece intimamente ligado à intenção
de se discutir a relevância da Educação Física como coadjuvante na construção da cultura corporal de movimento dos alunos do ensino médio. Aparentemente, o tempo do qual estes alunos
dispõem para o lazer está sendo gasto com atividades não produtivas para seu desenvolvimento
cultural, além disto, aparentemente tem sido a mídia a referência para quais são seus gostos, como
eles devem ler determinados fatos e, consequentemente, quais serão suas ações. Sendo que a intervenção intencional do professor, no sentido de alertá-los para que reflitam atentamente ao que
lhes é exposto, poderá torná-los de alguma maneira conscientes e, portanto, autores de sua própria
ressignificação dos elementos da cultura corporal de movimento.
O lazer como conteúdo da Educação Física deveria ser abordado tanto como meio quanto
como objeto de produção de conhecimento, tal abordagem, Marcellino (2011) denomina de “pedagogia da animação”, e considera a escola espaço privilegiado na implantação desta teoria, e que
a Educação Física teria papel importantíssimo na manutenção da mesma. A “pedagogia da animação” é a compilação de sua afirmação que existe possibilidade de lúdico em todas as áreas da
sociedade e não só no mundo das crianças. Assim como afirmado por Huizinga (2007), autor que
entende o jogo como uma representação lúdica e como sendo a essência da cultura e, portanto, o
início da formação da sociedade. Esta visita às afirmações de Huizinga, que nos originais datam do
início do século XX, segundo Eco (1989), faz-se necessário para compreendermos melhor o lazer a
partir da “pedagogia da animação” que se baseia no lúdico.
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O que se espera dos alunos é que eles possam fazer mediante uma educação não só voltada
à formação para o trabalho, mas também embasada numa educação para lazer, por meio do lúdico
com a “pedagogia da animação”. O lazer aqui é compreendido não em um sentido funcionalista,
mas como sendo parte da cultura, como Marcellino (2011) afirma, ter encontrado no elemento
lúdico da cultura a relação possível entre as obrigações e o lazer e que este é gerado dialeticamente
na sociedade, e sendo este uma construção, é pela sociedade influenciado e também a influência.
Sendo assim, a criação de ânimo, a provocação de estímulos e a cobrança da esperança, pode
trazer aos discriminados pelo professor, pela turma ou por si mesmo, o ânimo, o estímulo e a
esperança de poder se expressar com seu corpo sem se preocupar com modelos pré-estabelecidos.
Marcellino (2010) na obra “pedagogia da animação” propôs uma educação para e pelo
lazer e elegeu a Educação Física, não a única, mas a disciplina privilegiada para iniciar a aplicação
desta nova pedagogia. Reafirmamos que o lúdico é o elemento essencial ao processo educacional
escolar, justamente por torná-lo mais interessante e produtivo uma vez que pode aflorar a criatividade dos envolvidos, como afirma Marcellino (2011). Estas afirmações podem causar grande incômodo aos profissionais que ainda compreendem a Educação Física a partir do modelo esportivista
de aula e, por conseguinte, biologicista no modo como discrimina os menos “aptos”. Por outro
lado, a afirmação de Marcellino (2011) pode trazer “esperança” para profissionais de Educação
Física Escolar que estiverem interessados em trabalhar com o pensamento de uma Educação Física
voltada para todos os alunos.
Colocamos então em prática uma experiência de Ensino médio da escola Santa Fé, no município de Piracicaba-SP, que objetivava especificamente a busca do ânimo tanto para os alunos
quanto para o professor no 4º bimestre do ano letivo de 2011.
Tal experiência foi pensada pelo fato do Festival de Dança fazer parte das situações de
aprendizado prevista na Proposta Curricular do Estado de São Paulo (PCESP) para o Ensino Médio e por entendermos que a Educação Física deve, a partir dos jogos, das ginásticas, das danças e
das lutas, analisar de maneira sistematizada a construção da sociedade com relação ao movimento
de maneira crítica e o máximo possível desprovida de preconceitos, para que o aluno seja capaz
de reconstruir os conteúdos aprendidos de forma consciente (DAOLIO, 1998). Na intenção que
o aluno forme sua própria cultura corporal de movimento, entendendo ainda que estes conteúdos
estejam ligados às diferentes formas de expressão da cultura que se relaciona com os aspectos
corporais (SEE, 2010).
A experiência foi dividida em sete semanas com duas aulas para cada ação pedagógica em
cada turma, conforme descrito abaixo. Foram envolvidas nesta atividade cinco turmas de ensino
médio, sendo três do 1º ano e duas do 2º ano da Escola Estadual Santa fé, em Piracicaba-SP.
A EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA
Ação pedagógica 1
Na primeira semana o objetivo foi descobrir o gosto musical dos alunos, a escolha de
gêneros musicais e das músicas que para eles são representativos de cada gênero. Fizemos um quadro com os gêneros e com as músicas escolhidas, ficou combinado que na semana seguinte eles
trariam as músicas escolhidas para a atividade. Nesta atividade percebemos que o gosto musical
dos alunos era variado e que em geral não tinham tolerância por mais de um gênero musical, em
alguns casos por nenhum mais além do seu preferido, o que foi motivação de algumas discussões
na segunda ação pedagógica.
Ação pedagógica 2
Na segunda semana discutimos e dançamos as músicas escolhidas anteriormente, tendo
principalmente o objetivo de romper com os preconceitos dos alunos em relação aos gêneros di-
220
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
ferentes de sua preferência, e também fizemos uma análise crítica de seu próprio gosto musical.
Alguns alunos se deram conta que muitas vezes ouviam a música apenas pelo seu ritmo e outros
apenas pela letra, como é o caso de algumas músicas que mudam de gênero e outras que tem a
letra gospel (evangélica) e o ritmo típico do Heavy metal (rock´n roll pesado). Nesta atividade, foi
possível observar a dificuldade que os alunos têm em simplesmente se expressar corporalmente
sem se preocupar com a dança “correta” que lhe é imposta pela mídia, quando aquela música tem
uma coreografia já divulgada pelo próprio interprete.
Ação pedagógica 3
Na terceira semana continuamos incentivando os alunos a dançarem as músicas por eles
escolhidas, levantando a questão sobre o fator cultural presente nas expressões corporais, argumentando no sentido de que não há uma única maneira de dançar determinada música. Essa discussão também nos possibilitou realizar uma mediação com relação ao que é difundido pela mídia,
que enfatiza muitas vezes o fato de existirem técnicas “corretas” de se expressar que caracterizam
certos ritmos de música. Questões como: e se fosse uma pessoa com deficiência a dançar ou um
cadeirante? Eles estariam dançando “errado” por suas limitações, então eles não podem dançar?
As colocações foram no sentido de incentivar os alunos a dançarem ou movimentarem-se ao som
das músicas escolhidas por eles.
Ação pedagógica 4
Na quarta semana o objetivo foi proporcionar aos alunos uma experimentação musical a
partir do século XVIII, com músicas eruditas (música clássica ou de concerto) até os anos oitenta
do século XX. O objetivo principal foi trazer para os alunos músicas que eles tiveram pouco ou
nenhum contato. A atividade que mais surtiu efeito em termos de reconstrução de conceitos foi
com a música clássica, pois os alunos acabaram por perceber que esta já faz parte da vida deles
mesmo sem se darem conta, pois ela está presente em filmes, desenhos, comerciais de televisão
e etc., desta forma, procuramos desmitificar que música clássica é “antiga, ultrapassada, coisa de
velho” e que, portanto, não deve ser ouvida. Com estas músicas realizamos a primeira atividade
corporal dirigida para a montagem de coreografia. Com isso, buscou-se a desinibição e a quebra
dos preconceitos acerca das músicas diferentes daquelas habitualmente ouvidas pelos alunos.
Propomos que se dividissem em grupos de quatro pessoas, onde o primeiro realizaria um
movimento, e segundo imitaria o do primeiro e faria mais um, o terceiro imitaria o do primeiro o
do segundo e faria mais um, o quarto imita os três movimentos e faria mais um, e retornando ao
primeiro que imitaria os quatro movimentos e mais um até que se chegar ao quarto integrante,
estando assim montada uma coreografia de oito movimentos. A ação pedagógica seguinte consistiu nos alunos realizarem uma apresentação da coreografia para a sala, com acompanhamento de
diferentes gêneros e ritmos musicais, o objetivo é que eles adaptassem a coreografia a cada música
trocada.
A participação nesta atividade demonstrou que o objetivo de não discriminação e de
combate ao preconceito, principalmente com relação aos movimentos, foi de fato atingido, pois
até este momento a maioria dos alunos (de todas as salas) se envolveu na prática solicitada pelo
professor. A intervenção do professor foi no sentido de incentivar os alunos na construção da
coreografia, de modo a priorizar a criatividade. A idéia principal era de que não existe certo ou
errado, e sim a construção realizada por eles, os alunos. A utilização de músicas diferentes as que
eles estão acostumados a ouvir foi crucial para que os movimentos fossem criados com certo distanciamento do que eles estão acostumados a ver pelos meios de informação.
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Ação pedagógica 5
Na quinta semana a classe escolheu uma música e uma coreografia a ser apresentada no
festival de dança realizado na penúltima semana de aula. Os alunos puderam escolher uma música dentre as propostas pelo professor na semana anterior. A coreografia a ser montada ficaria a
critérios dos alunos, poderiam contar uma história, misturar estilos ou ter como tema a própria
época da música escolhida. Também foi pensado em figurinos que ajudassem na expressão da
coreografia.
Ação pedagógica 6
A sexta semana foi de ensaios e preparação para o Festival de Dança e Show de Talentos.
Ação pedagógica 7
Na sétima semana foi realizado o Festival de Dança intercalado com um Show de Talentos
da seguinte forma: uma apresentação das atividades realizadas em sala e uma apresentação do
show de talentos onde os alunos puderam trazer práticas corporais próprias deles, como cantar,
tocar instrumentos, contar piadas, discotecagem etc. Todas as cinco salas (turmas) apresentaram
a coreografia elaborada em sala, algumas com metade da sala em cena, aproximadamente 15 alunos, uma delas com apenas três, o show de talentos também contou com a participação de todas
as turmas. A iniciativa do show de talentos foi fundamental para não comprometer o objetivo
de combater o preconceito existente entre os gêneros musicais, pois somente assim conseguimos
fechar o círculo que passou pelo século XVIII e chegou à contemporaneidade.
Durante o festival foi feita uma avaliação final da experiência com os alunos, e tivemos
oportunidade de discutir sobre o significado do processo pedagógico vivenciado por eles. É interessante que uma semana antes da apresentação no festival, durante uma avaliação escrita que
abordou tal experiência, dentre outros conteúdos, uma aluna que inicialmente relutou em dar
valor ao que por eles era criado em termos de movimento, escreveu o seguinte “... antes eu achava
que havia uma só maneira de se dançar, mas com as aulas do professor hoje penso que podemos
criar danças e movimentos diferentes e nos divertirmos do mesmo jeito”. No geral, a avaliação dos
alunos foi a melhor possível, todos participaram do festival de dança e do show de talentos, no
palco ou na platéia.
As ações pedagógicas implementadas nesta experiência tiveram o objetivo inicial de por
meio do elemento lúdico devolver ou resgatar o ânimo que aparentemente havia sido perdido nas
turmas envolvidas, situação que, segundo Oliveira (2006), é comum no Ensino Médio, onde os
alunos não participam das aulas por diversos motivos. Conjuntamente com o incentivo à ludicidade procuramos proporcionar aos alunos uma maneira de produção de conhecimentos e um
contato com conhecimentos historicamente construídos que normalmente não são abordados nas
aulas de Educação Física.
Tivemos a preocupação de tratar a Educação Física como expressão da cultura corporal de
movimento na concepção de uma Educação Física que atinja todos os alunos e o elemento lúdico
como elemento de ligação entre o trabalho do professor, o trabalho escolar (dos alunos) e o lazer
compreendido como elemento da cultura.
Avaliamos que esta experiência com os alunos do Ensino Médio atingiu seu propósito
de provocar o ânimo durante as aulas. Curiosamente, até a ação pedagógica de elaborar uma
coreografia com a técnica descrita anteriormente, todos os alunos participaram ativamente do
que foi proposto pelo professor. Porém, a partir dos ensaios, a participação dos alunos na dança
foi diminuindo para aproximadamente metade dos envolvidos. Observando os alunos que não se
apresentaram no palco durante o Festival de Dança e o Show de Talentos, mas participaram como
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expectadores, foi possível perceber que o ânimo também para eles foi motivador de estarem ali,
uma vez que sendo a penúltima semana de aula, em geral, já estavam dispensados das aulas regulares. Com relação à cultura corporal de movimento, foi nítida a representação de todas as formas
de expressão contidas no repertório de movimentos dos alunos envolvidos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência pedagógica relatada é um exemplo de ação a ser desenvolvida nas aulas
de Educação Física escolar, uma alternativa ao modelo tradicional de aula em que o esporte é o
elemento de ensino predominante. O intuito das ações realizadas foi de viabilizar aos alunos o
acesso ao conhecimento acerca das manifestações corporais como a dança, elemento da cultura
corporal de movimento que é muitas vezes compreendido como uma prática de meninas ou como
algo a ser vivenciado por aqueles que têm maior facilidade com ritmo. A experiência mostrou que
é possível a participação de todos os alunos, tanto daqueles que possuem alguma facilidade com a
dança como daqueles que se mostram com maior dificuldade.
A experiência pedagógica relatada teve o principal objetivo de criar o ânimo nos alunos
e nas aulas de Educação Física, como preconiza a pedagogia da animação, uma vez que a participação dos alunos se mostrou bem maior que em aulas tradicionais. Seus objetivos adjacentes de
instrumentalizar os alunos em montar uma coreografia e de repensar o preconceito a diferentes
gêneros musicais também foram atingidos.
Espera-se que esse trabalho possa ser uma contribuição aos profissionais de Educação Física que atuam no âmbito escolar. Não é nossa intenção ter as ações pedagógicas aqui apresentadas
como uma “receita” de aulas para outras escolas e turmas, compreendemos que no trabalho do
professor de Educação Física é fundamental que se considere as particularidades e necessidades
do contexto em que tal profissional está inserido, mas almejamos que as idéias aqui apresentadas
possam despertar interesse e ânimo aos tais profissionais, de modo a reverem ações e valores.
REFERÊNCIAS
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ECO, U. Sobre os espelhos e outros ensaios. 2ª Ed. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1989.
ELIAS, N.; DUNNING, E. A busca da excitação, Lisboa, Difel, 1992.
HUIZINGA, J. Homo ludens. São Paulo: Ed. da USP, 1971.
MARCELLINO, N.C. Lazer e Educação. Campinas, SP. Papirus, 2010. – (Coleção Fazer – Lazer). 15ª edição.
_________. Pedagogia da Animação. Campinas, SP. PAPIRUS, 2011. - (Coleção Fazer – Lazer).
OLIVEIRA, R. C. Educação física, escola e cultura: o enredo das diferenças. Campinas, SP –
UNICAMP, 2006 – (Dissertação de mestrado).
SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Currículo do Estado de
São Paulo: Linguagens, códigos e suas tecnologias / coordenação geral, Maria Inês Fini; coordenação de área, Alice Vieira. São Paulo – SEE, 2010.
SNYDERS, G. A alegria da escola. São Paulo: Manole, 1988.
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BARREIRAS À PRÁTICA DE ATIVIDADE FÍSICA EM ADOLESCENTES
Marcos Gonçalves Maciel140
Amarildo da Silva Araujo141
RESUMO: Este estudo de caráter transversal descritivo teve como objetivo identificar as barreiras para a prática de atividade física de lazer por adolescentes com idade entre 14 e 19 anos em
uma escola pública estadual de Belo Horizonte/MG. Participaram da amostra 50 alunos, 60%
do sexo feminino e 40% do sexo masculino com média de faixa etária de 17,2 anos; a seleção foi
intencional não probabilística. Foi adotado o questionário elaborado e validado por Santos et al.
(2009), para avaliar as barreiras para a prática de atividades físicas em adolescentes. Os dados
apresentados demonstram que em geral os alunos identificaram barreiras para a prática de atividades físicas, a saber: “preferir fazer outras coisas”, “não ter tempo” e “falta de companhia” (54%,
54% e 58% respectivamente); a opção “condições climáticas” teve um percentual de 50%. Conclui-se a presença de uma nítida opção pessoal dos adolescentes ao não escolherem praticar uma
atividade física, portanto, a inatividade física nessa amostra não está vinculada a fatores externos,
como socioeconômicos, disponibilidade de equipamentos e espaços de lazer próximo à suas casas,
disponibilidade de tempo, dentre outros, mas, a barreiras pessoais.
PALAVRAS CHAVE: Atividade Física de Lazer. Barreiras. Facilitadores.
INTRODUÇÃO
A partir da década de 1970 em âmbito mundial, se torna mais evidente uma redução no
nível de atividade física (AF) no tempo de lazer nos diversos grupos sociais e faixas etárias, sobretudo na infância e adolescência. Com isso aumenta-se o risco da incidência de doenças crônicas
não transmissíveis (DCNT) (SALLES-COSTA, et al. 2003).
De acordo com Ceschini, Figueira Jr. (2008), o estilo de vida, a promoção e a recuperação
do nível de saúde da população são fatores muito importantes para todas as faixas etárias, pois
com o passar dos anos, as DCNT como diabetes, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, obesidade e alguns tipos de câncer que podem resultar em custos elevados para o sistema de saúde.
Para Copetti, Neutzling, Silva (2010) a prática da AF regular na adolescência pode contribuir para a formação do hábito dessa prática na fase adulta, atuando na prevenção das DCNT,
bem como na adoção de um estilo de vida mais saudável.
A adesão à prática de AF é um fenômeno complexo e multifatorial requerendo a análise
de fatores inerentes a cada pessoa, bem como a fatores relacionados aos aspectos socioambientais
(DUMITH, 2010). Santos et al. (2010) destacam a existência de algumas barreiras (que são empecilhos), à prática da AF, podendo ser classificadas em internos e externos. Os fatores internos são
as características individuais (experiências com essas atividades, personalidade, etc). Os fatores
externos estão relacionados às influências de familiares e amizades, falta de tempo, inacessibilidade a espaços e equipamentos de lazer, financeiros.
140 Mestre em lazer. Docente do Centro Desportivo da Universidade Federal de Ouro Preto-MG/ Escola de Educação Física
da Fundação Helena Antipoff/Ibirité-MG
141 Especialista em Lazer, Prof.de Educação Física da Rede Estadual de Minas Gerais e Municipal de Santa Luzia.
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De acordo com Silva et al. (2009), alguns desses fatores externos como os espaços físicos
(praças, parques, clubes e praias), e os atributos sociais que existem nesses locais exercem uma
influência concomitante a prática de AF, podendo estimular (tornando-se facilitadores) e/ou inibindo (barreiras) a essas atividades.
Considerando os aspectos acima descritos, pode-se fazer o seguinte questionamento: Quais
fatores são identificados pelos adolescentes para a prática de AF na atualidade? Sendo assim, este
trabalho tem como objetivo identificar quais são as barreiras apontadas em adolescentes alunos do
ensino médio em praticar uma AF no tempo de lazer.
METODOLOGIA
Este estudo é caracterizado como transversal do tipo qualitativo descritivo. Foi adotado o
questionário elaborado e validado por Santos et al. (2009)142, para avaliar as barreiras para a prática de atividades físicas em adolescentes. A seleção da amostra foi intencional não probabilística,
composta por alunos regularmente matriculados em uma escola pública estadual na região do
Barreiro, cidade de Belo Horizonte/MG.
Os voluntários após assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido responderam
o questionário. A coleta dos dados foi realizada por um único aplicador, que reuniu os participantes em uma sala segundo um agendamento prévio com a direção da escola.
A digitação dos dados foi realizada no programa Excel® 2007, seguida de conferência para
o lançamento correto dos dados. A análise foi realizada no programa SPSS 18, adotando procedimentos descritivos dos dados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A amostra foi composta por 50 alunos com média de 17,2 anos, sendo 60% do sexo feminino e 40% do sexo masculino. A Tabela 1 apresenta os valores atribuídos pelos adolescentes às
barreiras percebidas para a prática de atividades físicas, por meio do questionário143.
Questões
Barreiras
Facilitadores
Não encontra AF que gosta perto de casa
36%
64%
Não conhece lugares perto de casa
24%
76%
Amigos moram longe
36%
64%
142 O instrumento é do tipo estruturado contendo 12 questões de múltipla escolha onde o respondente só pôde escolher uma
alternativa em cada questão atendendo aos objetivos da pesquisa. A seguir são apresentadas as questões do instrumento:
Questão 1- Não encontro lugares perto de casa com a atividade física que gosto; Questão 2- É difícil fazer atividade física
porque não conheço lugares perto de casa onde eu possa ir; Questão 3- É difícil fazer atividade física porque os amigos que
me acompanham moram longe; Questão 4- É difícil fazer atividade física porque não tenho como ir (ou voltar) onde posso
praticar; Questão 5- O clima (frio, chuva, calor) dificulta minha prática de atividade física; Questão 6- Eu deixo de fazer
atividade física porque prefiro fazer outras coisas (ler, ficar sem fazer nada); Questão 7- Tenho preguiça de fazer atividade
física; Questão 8- Acho difícil fazer atividade física porque não me sinto motivado; Questão 9- Tenho muitas tarefas para
fazer por isso é difícil fazer atividade física; Questão 10- Falta tempo para fazer atividade física; Questão 11- É difícil fazer
atividade física sem alguma companhia; Questão 12- É difícil fazer atividade física porque em casa ninguém faz.
143 A pergunta feita aos adolescentes foi: “Gostaríamos de saber se as condições ou situações abaixo dificultam a sua prática
de atividades físicas! Responda o quanto essa situação é verdadeira para você!”. As respostas foram agrupadas em duas
classificações conforme proposto pelo instrumento; as opções “discordo muito” e “discordo”, foram nomeadas como sendo
pontos positivos/facilitadores; as alternativas “concordo” e concordo muito”, como sendo pontos negativos/barreiras.
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Meio de locomoção para o local da prática
28%
72%
Aspectos climáticos
50%
50%
Outras prioridades
42%
58%
Preguiça
30%
70%
Desmotivação
32%
68%
Outras tarefas
54%
46%
Sem tempo
54%
46%
Falta de companhia
58%
42%
Falta de apoio da família
24%
76%
Tabela 1: Identificação das barreiras percebidas pelos adolescentes.
Os dados apresentados demonstram que em geral os alunos identificaram barreiras para
a prática de atividades físicas, sendo as principais: “preferir fazer outras coisas”, “não ter tempo” e
“falta de companhia” (54%, 54% e 58% respectivamente); a opção “condições climáticas” teve um
percentual de 50%. Percebe-se então uma nítida opção pessoal dos adolescentes ao não escolherem praticar uma atividade física, portanto, a inatividade física nessa amostra não está vinculada
a fatores externos, como socioeconômicos, disponibilidade de equipamentos e espaços de lazer
próximo à suas casas, disponibilidade de tempo, dentre outros.
Essa realidade encontrada na amostra estudada confirma a proposta apresentada pelo
Centro de Investigação em Actividade Física, Saúde e Lazer (CIAFEL, 2006), ao reforçar a hipótese de que apesar de o ambiente influenciar diretamente nos níveis da prática de atividade física,
existe alguns fatores individuais positivos e algumas barreiras psicossociais que podem determinar
as decisões das pessoas para qual estilo de vida vai adotar, ou seja, se será um estilo saudável ou
não. Neste estudo prevalecem os fatores individuais como barreiras.
Santos et al (2010) ao adotarem esse mesmo instrumento em adolescentes curitibanos, relataram que entre as 12 barreiras investigadas, apenas “não ter alguém para levar” não diferiu entre os gêneros; para todas as outras, a percepção de barreiras foi maior entre as meninas (p<0,05);
“Não ter a companhia dos amigos” e “ter preguiça” foram as barreiras mais reportadas pelos meninos (30,4%) e meninas (51,8%), respectivamente; no entanto a barreira mais fortemente associada
com maior prevalência de níveis insuficientes de atividade física foi “preferir fazer outras coisas”
para meninos e meninas. Em nosso estudo não compara a percepção de barreiras entre os sexos.
Copetti, Neutzling, Silva (2010) verificaram a prevalência de barreiras à prática de
atividades físicas no período de lazer em adolescentes residentes na área urbana da cidade de Pelotas/ RS, bem como sua associação com sedentarismo no lazer incluindo 398 adolescentes de 10
a 19 anos foi conduzido em Pelotas, RS. Segundo os autores, as barreiras mais prevalentes foram
os dias de chuva (65,9%), seguida de preguiça/cansaço (37,5%) e falta de local adequado (33,8%).
Todas as meninas e 57% dos meninos que relataram seis ou mais barreiras à prática de atividades
físicas eram sedentários.
Maciel (2009) ao investigar a intenção de mudança do comportamento em adolescentes
do ensino médio de diferentes níveis socioeconômicos (NSE) para a prática de atividades físicas
de lazer, em escolas (particular e públicas) na região metropolitana de Belo Horizonte, analisou a
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percepção dos alunos da prática das atividades físicas como momento de lazer ou não de lazer. Em
geral, os resultados mostram que a maioria dos alunos (85%) associa positivamente essa relação,
ou seja, para a amostragem estudada, a prática de atividades físicas é associada à livre escolha, sem
imposições ou como obrigação, bem como lhes proporciona prazer, atendendo os pressupostos instituídos por Dumazedier (1979): caráter desinteressado, liberatório, hedonístico e de livre escolha.
Todavia, segundo Maciel (2009), se a maioria dos participantes dessa pesquisa entende as
atividades físicas como momento de lazer e benéficas à saúde, há um paradoxo, pois, nessa mesma
população estudada, 57% dos alunos foram classificados como fisicamente inativa no lazer. Segundo esse mesmo autor, esse fato demonstra a complexidade que envolve a compreensão dos fatores
associados ao fenômeno da adesão a essas práticas.
De acordo com Gazzinelli, Reis (2006), não é possível pensar em saúde sem simultaneamente pensar em educação e as relações existentes entre ambas questões. Fato que dá importância
as vivências de lazer e do movimento corporal em uma perspectiva mais crítica.
Nas palavras de PINTO (2008, p.46), “o lazer apresenta-se como um espaço de (re)construção das relações sociais e de conhecimentos, oportunidade de (re)significação das dimensões
objetivas e subjetivas que os constituem. Desse modo, uma das intervenções do lazer seria a pedagógica, ou seja, estimular o indivíduo a um processo de aprendizagem, visando à mudança de
comportamento como, por exemplo, uma educação que motive a adoção da prática de atividade
física saudável; no entanto, essa abordagem estaria aliada à uma vivência de lazer em uma visão
crítica dessa prática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A adesão à prática e manutenção de atividades físicas é complexa e multifatorial, necessitando a compreensão desse fenômeno de forma sistêmica. Barreiras são fatores que impedem uma
pessoa a realizar alguma atividade podendo estar relacionadas às questões pessoais e ambientais.
Compreender a percepção das barreiras pelo indivíduo é fundamental, pois, isso, permitirá identificar o comportamento assumido pelo mesmo, possibilitando ao poder público elaborar
estratégias que incentivem a romper essas barreiras.
A prática da atividade física regular na adolescência pode contribuir para a formação do
hábito dessa prática na fase adulta, atuando na prevenção das DCNT, bem como na adoção de
um estilo de vida mais saudável.
De acordo com os dados obtidos nesse estudo percebe-se a necessidade de uma intervenção direcionada aos aspectos individuais dos alunos participantes, pois, foram as maiores barreiras
percebidas pelos mesmos.
REFERÊNCIAS
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FIGUEIRA JR, A. Atividade física e fatores inter-relacionados. Revista Brasileira de
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UFMG, 2006.
MACIEL, M. G. Análise comparativa da intenção de mudança do comportamento em
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228
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
DIRETORIA DE ESPORTES DE MINAS GERAIS: POLÍTICAS REALIZADAS,
INTERESSES ENVOLVIDOS (1946-1961)141
Marilita Aparecida Arantes Rodrigues 142
Luciana Cirino Lages Rodrigues Costa143
RESUMO: Este estudo é parte de uma pesquisa cujo objetivo foi analisar a trajetória das políticas
públicas de esportes em Minas Gerais no período de 1938 a 2006. Tem como foco as políticas esportivas geridas pela Diretoria de Esportes de Minas Gerais, órgão responsável por elas, no Estado,
no período de 1946 a 1987. Foram utilizados como fonte a legislação; as Mensagens do governador
dirigidas à Assembleia Legislativa – um balanço da administração realizado anualmente; poucos
documentos preservados no Centro de Memória e Informação do Esporte (CEMIE); estudos históricos sobre o esporte mineiro e a história oral, realizada com pessoas que vivenciaram diferentes
momentos da trajetória histórica da DEMG. Apresentou-se um recorte no período de 1947 a 1961,
tempo em que a política esportiva esteve aliada a uma política de Difusão Cultural e no qual
aconteceram as primeiras aproximações com a recreação. Nesse período, procurou-se identificar
interesses representados, atores envolvidos e grupos atendidos, arranjos institucionais e ações realizadas. Percebeu-se o uso da política desenvolvida pelo órgão por meio de barganhas, em troca
de apoios políticos e o prolongamento do ambiente ideológico composto no Estado Novo durante
o período analisado.
PALAVRAS-CHAVE: Políticas Públicas. Esporte. Recreação.
A trajetória histórica das Políticas Públicas de Esporte no Estado de Minas, no período de
1938 a 2006, é objeto de uma pesquisa realizada pelo Centro de Memória e Informação do Esporte
(CEMIE), da Secretaria de Estado de Esportes e da Juventude (SEEJ), em parceria com o Grupo
de Estudos POLIS/CELAR, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional
da UFMG. Na reconstrução dessa história, o papel da Diretoria de Esportes de Minas Gerais
(DEMG), como órgão gestor dessa política, no período de 1946 a 1987, foi destacado, o que nos
motivou aprofundar estudos sobre ela.
Infelizmente, para recuperarmos sua memória, poucas foram as fontes disponíveis, uma
vez que a documentação proveniente da DEMG desapareceu do acervo, que, hoje, se encontra
preservado pela Secretaria de Estado de Esportes e da Juventude (SEEJ), principal fonte de informações sobre as políticas públicas de esporte e lazer em Minas Gerais. Há indícios de que ela possa
ter sido descartada em administrações anteriores, uma vez que a função Esporte já esteve ligada a
diferentes órgãos da administração pública.
Para a construção da sua história, usamos como fontes: a legislação; as Mensagens do governador dirigidas à Assembleia Legislativa – um balanço da administração realizado anualmente;
poucos documentos preservados no Centro de Memória e Informação do Esporte (CEMIE); estudos históricos sobre o esporte mineiro e a história oral, realizada com pessoas que vivenciaram
diferentes momentos da trajetória histórica da DEMG.
141 Pesquisa financiada pela FAPEMIG e pelo Ministério do Esporte
142 Doutora em História pela FAFICH/UFMG. Centro de Memória e Informação do Esporte da SEEJ/MG. marilita@uol.
com.br
143 Mestre em Lazer pela EEFFTO/UFMG. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte; UNIFEMM. [email protected]
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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Com a ajuda de René Rémond144, entendemos que o político não constitui um setor separado, pois ele é uma modalidade da prática social. Como a vocação do historiador é interrogar-se
sobre os sentidos dos fatos, a leitura das políticas instituídas pela DEMG foi realizada com base
em interesses representados de grupos atendidos nessas representações e fatores que possivelmente
influenciaram nas decisões das ações implementadas, que se constituíram em projetos idealizados
para conformar a vida social.
Criada em 17 de junho de 1946, pelo Decreto-Lei n. 1.765,145 no governo do Interventor
Federal no Estado de Minas, João Tavares Corrêa Beraldo, a DEMG foi responsável pela estruturação e gestão da política esportiva mineira até 1987.
Em sua trajetória, ela passou por mudanças administrativas que a vincularam a setores diferenciados da administração estatal. Para atender aos interesses do Estado em relação ao esporte,
desde sua criação até 1963, a DEMG esteve ligada diretamente ao Governador146, situação que
foi alterada somente após a criação da Secretaria de Estado do Trabalho e Cultura Popular, que
assumiu, dentre outras funções, o estímulo ao esporte.147 Essa vinculação ocorreu até 1967, quando a DEMG passou a integrar, novamente, a estrutura do Gabinete Civil do Governador.148 Em
1976, foi reorganizada como órgão autônomo da Administração Direta e vinculou-se ao Sistema
Operacional de Trabalho, Ação Social e Desportos149. Com a criação do Sistema Operacional de
Esportes, Lazer e Turismo, em 19/11/1983150, a DEMG passa a integrar esse sistema, mas com uma
ressalva de que seria decretada sua extinção, o que aconteceu em 29/12/1987151, quando teve suas
competências transferidas para a Secretaria de Esportes, Lazer e Turismo.
Essas diferentes vinculações, no organograma da política administrativa do Governo mineiro, nos instigaram a identificar os interesses que permeavam as políticas de esporte da época.
Que relações políticas envolviam o setor esportivo? Que ações foram realizadas e que interesses
estavam aliados a elas? Havia peculiaridades em cada uma das administrações?
As fontes nos revelam que, além de mudanças de subordinação, a política de esporte,
durante a trajetória histórica da DEMG, esteve aliada a diferentes políticas setoriais, tais como:
Difusão Cultural e Turismo; Educacional; Bem-Estar Social; Recursos Humanos; Trabalho, Ação
Social, Menor e Desporto; e Esporte, Lazer e Turismo.152 Evidenciam, também, que a própria
política de esportes, historicamente, esteve aliada às políticas de Educação Física e de lazer, como
estratégia para promover a educação corporal, orientada pelas necessidades do desenvolvimento
capitalista.
Leila Pinto, em estudo que contextualiza historicamente as políticas públicas de lazer,
destaca que, na década de 1940, “vivemos uma série de eventos importantes para a legalização e
a legitimidade do direito a um tempo que historicamente foi sendo ressignificado como tempo de
lazer”. Nesse período histórico, como forma de ocupação do tempo do não trabalho, difundiu-se a
política assistencialista de recreação orientada. Essa política de atividades recreativas foi disseminada como modelo a ser desenvolvido em todos os setores do País.153
144
145
146
147
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149
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151
152
153
230
RÉMOND, 2003.
MINAS GERAIS, 1946.
MINAS GERAIS, 1946.
MINAS GERAIS, 1963.
MINAS GERAIS, 1967.
MINAS GERAIS, 1976.
MINAS GERAIS, 1983.
MINAS GERAIS, 1987.
Em especial as Mensagens anuais do governador à Assembleia Legislativa.
PINTO, 2008, p. 80.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Especificamente para esse texto tratamos dos primeiros momentos vividos na construção
histórica da DEMG, identificando a política de esportes pensada para ser gerida em Minas Gerais por esse órgão, no período de 1946 a 1961, aliada a uma Política de Difusão Cultural. Nesse
exercício, despertou-nos, também, o interesse em conhecer quando e como a recreação passou a
integrar a política desenvolvida pela Diretoria de Esportes, influenciada pelo contexto da época.
O recorte temporal foi definido considerando a criação da DEMG e o encerramento de
um governo em que a recreação já se fazia presente na política de forma mais sistematizada.
OS PRIMÓRDIOS DAS POLÍTICAS DE ESPORTE REALIZADAS PELA DEMG
Para entendermos como foram estruturadas as políticas de esporte na DEMG, tomamos
como referência as lembranças de seu ex-presidente Afonso Celso Raso:
Vou dizer a vocês que, a política pública de esportes em Minas Gerais, durante muitos anos, foi
pura balela, conversa fiada! Não havia política coisa nenhuma. Era o governador do Estado que
escolhia, entre seus amigos, os dirigentes da Diretoria de Esporte e lá fazia um diálogo, talvez,
do presidente da Diretoria com o Governador. E assim, saiam as subvenções: qual cidade iria ganhar uma piscina, qual ganharia uma quadra, posteriormente qual cidade ganharia um ginásio,
dependendo da força política do prefeito, do deputado.154
Essa livre escolha dos dirigentes pelo governador era assegurada no artigo 2º do Decreto-Lei n. 1.765/1946, uma vez que a DEMG deveria ser comporta de três membros, nomeados pelo
chefe do Governo do Estado, além do presidente do Minas Tênis Clube (MTC), seu membro nato.
Previa, ainda, que a DEMG teria um presidente, escolhido pelos demais membros.
O MTC, clube referência para a política de esportes mineira, também teve seu presidente
escolhido pelo governador até a década de 1980. Vários desses presidentes acumularam a presidência do clube e da DEMG simultaneamente. A exemplo disso, no período de criação da DEMG, era
presidente do MTC João Lima Pádua, genro do ex-governador Benedito Valadares e amigo pessoal
do então interventor em Minas, João Tavares Correia Beraldo.155
A administração das duas instituições foi explicada por Paulo Macedo Gontijo, presidente
do clube e da DEMG na década de 1940.
Enquanto presidente do Minas, tinha que dirigir a Diretoria de Esportes, mas era uma atuação
inteiramente separada, diferente. O Minas era um clube tratado pela Diretoria como outro clube
qualquer. Ele não influenciava lá dentro, a não ser através da presidência.156
Essa relação simbiótica entre o clube e a Diretoria sempre favoreceu o MTC. Mesmo procurando dar um tratamento equânime aos clubes, Paulo Gontijo deixa claro, em suas lembranças,
a diferença de tratamento que lhes era dispensada:
A minha ligação com a Diretoria me colocou a par da [...] da dependência do clube com a Diretoria, de modo que [como diretor] tinha interesse em me livrar dos clubes que não precisassem
mais de subvenção [...]. A Diretoria de Esportes distribuía para todos os clubes uma subvenção,
para o Paysandú, para o América, o Atlético, para o MTC. A do MTC era grande naquela época; eram 40 contos, e os outros, eram 5, 6. Na minha administração, nós abrimos mão [dessa
subvenção].157
154
155
156
157
RASO, 2008.
RODRIGUES, 1996.
GONTIJO, 1994, grifo nosso.
GONTIJO, 1994 apud RODRIGUES, 1996, p. 214.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
231
A esse respeito, Newton Wanderley, que foi assistente jurídico da DEMG e, posteriormente, superintendente do MTC, esclarece:
Havia, na época, uma simbiose entre o Minas Tênis Clube, governo e Diretoria de Esportes[...].
Ela funcionava numa salinha perto da entrada do Minas [...]. Então, o negócio mais ou menos se
confundia. O objetivo da DEMG era incrementar o esporte em todo o Estado.158
Newton Wanderley explica a criação da política esportiva na época: “O fundamento da
Diretoria de Esportes teve o Minas Tênis Clube como paradigma: construir praças de esporte no
interior, com o nome da cidade e ‘Tênis Clube’. Porque o Minas Tênis Clube era a fotografia”.159
Há indícios de que essa política tenha sido gestada no interior do Minas Tênis Clube, uma
vez que, para concebê-la, Benedito Valadares contou com o apoio do major Dorneles, na época
chefe de Polícia e presidente do MTC, bem como de José Mendes Junior, vice-presidente do Clube
e de pessoas ligadas ao MTC.160
Criada para orientar e fiscalizar a política de praças de esportes, a DEMG contou com o
auxílio da Polícia Militar de Minas Gerais no processo de difusão e desenvolvimento do esporte
e da Educação Física por todo o Estado. Em quase sua totalidade, as chefias das praças de esportes ficavam a cargo de elementos da Corporação, que ainda exerciam a função de instrutores de
Educação Física nos ginásios do Estado e em grande número de colégios particulares, religiosos
ou não, da capital e do interior, bem como em clubes, onde atuavam como técnicos de natação,
de remo, de esportes coletivos, atletismo e instrutores de ginástica. Esse papel da Corporação era
avaliado pelo governador do Estado como uma “obra patriótica do preparo físico da mocidade
mineira’.161
Essa aproximação da Polícia Militar com DEMG era uma forma de o governo assegurar que fossem inculcados, nos jovens, valores ligados à ordem, disciplina, obediência e civismo,
inerentes à organização social que se pretendia legitimar162. Resolveria, também, o problema da
carência de pessoal habilitado para a atuação nas praças de esportes, uma vez que não havia em
Minas Gerais, naquela época, outros cursos de formação em Educação Física, além do Centro de
Educação Física do Departamento de Instrução da Polícia Militar, que foi um núcleo de formação
de instrutores e monitores, dessa especialidade.
A partir da década de 1950, a DEMG esteve ligada à política de Difusão Cultural e Turismo, que, segundo a avaliação do governador Juscelino Kubitschek, era uma política que visava
ao “aprimoramento intelectual e moral das populações, procurando-se, através dela, elevar o nível
de civilização do Estado”.163 A ela era dada a competência de implementar a difusão do esporte,
mediante a construção de praças de esportes, realizar cursos especializados para a formação de
técnicos e apoiar as agremiações esportivas por meio de subvenções e auxílios.
O “caráter da eugenia e aprimoramento físico e moral” atribuído ao esporte, herança de
períodos anteriores, até mesmo do Estado Novo, pela influência positivista e o interesse na realização “de algo útil pela crescente projeção do Estado nas competições nacionais” estava presente
em todas as Mensagens de JK. Essa busca da representatividade, a partir de então, valorizava cada
vez mais o rendimento nas práticas esportivas.164
158 WANDERLEY, 1995 apud RODRIGUES, 1996, p.101.
159 WANDERLEY, 1995 apud Rodrigues, 1996, p.101.
160 UMA PÁGINA de nostalgia, s/d; RODRIGUES, 1996.
161 MINAS GERAIS. 1947, p. 44.
162 MANHÃES (1986) utiliza as categorias discursivas “disciplina”, “nacionalismo”, “moral e civismo” para analisar as
políticas de esporte no período em ele foi tutelado pelo Estado, tendo como objeto de análise a legislação.
163 MINAS GERAIS, 1951, p. 226.
164 MINAS GERAIS, 1951, p. 237.
232
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Dentre as principais realizações da DEMG, considerada uma das mais expressivas do seu
governo “para amparar e incentivar a prática esportiva” destaca-se a criação da Escola de Educação Física do Estado165. Segundo JK, dessa escola deveriam “sair os técnicos que, enviados a
todos os recantos de nossa terra, ir[iam] contribuir para disseminar entre a nossa juventude a
prática dos hábitos eugênicos”166 visando “proveitosos resultados para a e educação integral d[ess]
a juventude”167.
Até o governo JK, a relação MTC/DEMG ainda era muito forte. Bolivar Drumond, amigo
de JK e presidente do Clube e da DEMG, esclarece:
Os deputados faziam pressão sobre o governo para que ele separasse a Diretoria de Esportes e
eles pudessem se valer daquilo para fazer política no interior, lá nas zonas eleitorais de cada um
deles, coisa que comigo eles não conseguiriam, porque eu só fazia o que fosse justo e não o que
fosse favorável a A ou a B [...]. Não tinha esse negócio de ser partidário do dr. Bias ou ser partidário da UDN; para mim era a mesma coisa.168
JK, em 1955, quando estava deixando o governo mineiro para se candidatar a presidência
da República, fez algumas mudanças na DEMG, desvinculando sua administração da presidência
do MTC.169 Tal separação, segundo Bolivar Drumond, veio ao encontro das propostas clientelistas
daquele momento histórico, favorecendo as demandas dos políticos da época:
Quando o Juscelino dividiu a Diretoria de Esportes; eu não posso afirmar isso assim, acusando
o Juscelino, porque ele era político, a Diretoria de Esportes era um centro que favorecia a
política no Estado. Fazia as praças de esportes do interior. Então era um elemento bom para
isso, agradar um prefeito, agradar um bloco político, etc. Talvez por isso, e pressão de deputados,
Juscelino separou a Diretoria de Esportes do MTC.170
Dessa forma, as políticas esportivas serviam como mercadoria, que era barganhada com a
sociedade em troca de apoio político.
Mas as políticas de esporte, a partir do final da década de 1950, não ficaram mais restritas
à promoção do esporte via entidades esportivas, seja construindo, seja financiando equipamentos,
qualificando técnicos ou fornecendo material esportivo. Dirigida por um profissional de Educação
Física, a partir de 1956 – Sylvio José Raso –, amigo e conterrâneo do governador Bias Fortes (19561961), primeiro presidente que não dirigia, também, o MTC, a DEMG passou a contar com uma
equipe conceituada de profissionais da área, o que contribuiu para a ampliação de suas ações. A
realização de Jornadas Internacionais, que possibilitaram a vinda a Minas Gerais de expoentes
da Educação Física da Alemanha, Argentina, Áustria, Chile, França, Japão, Suécia e Uruguai,
circulou conhecimentos que possibilitaram a reestruturação da política esportiva, voltada para
a “educação através do esporte”, por meio de atividades “ginásticas, desportivas e recreativas”.171
A RECREAÇÃO NA POLÍTICA DA DEMG
As fontes revelam que já nos anos iniciais da DEMG ocorreram eventos que contribuíram
para o desenvolvimento de uma política de atividades recreativas.
165
166
167
168
169
170
171
MINAS GERAIS, 1952, p. 312.
MINAS GERAIS, 1951, p. 237.
MINAS GERAIS, 1952, p. 313.
DRUMOND, 1994 apud RODRIGUES, 1996, p. 237.
DIRETORIA DE ESPORTES DE MINAS GERAIS, 1956. p.15-21.
DRUMOND, 1994 apud RODRIGUES, 1996, p. 237, grifo nosso.
MINAS GERAIS, 1960, p.504.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
233
No governo Milton Campos (1947/1951), realizaram-se estudos sobre a possibilidade de
se iniciar a construção de piscinas populares, localizadas de preferência nos centros industriais,
com a finalidade de beneficiar o grande número de operários que ali exerciam suas atividades.
Identificamos que essa intenção de construção de piscinas populares, preferencialmente nos centros industriais, pode ser compreendida, por um lado, pelo viés de uma política orientada sob
uma perspectiva de isolamento dos operários em relação à própria cidade, pois preestabelecia
seus locais de construção; e, por outro, por evidenciar o lugar central que a indústria ocupava ao
pensarem o planejamento desses espaços, uma vez que servia de referência espacial para orientar
a localização prevista para as piscinas.
Essa preocupação da política estatal em relação à vida dos operários já estava presente
na política, em âmbito federal, desde a década de 1940. Segundo Meily Linhales172, o objetivo do
Serviço de Recreação Operária, criado em 1943 e vinculado ao Ministério do Trabalho, era disciplinar e adequar socialmente a classe trabalhadora utilizando atividades desenvolvidas, também,
pelo setor esportivo.
Assim, é possível identificar resquícios dessa política federal na orientação de ações direcionadas aos trabalhadores e nas intenções da política mineira realizada pela DEMG. Percebe-se
que a relação entre o tempo de trabalho e do não trabalho dos operários, se observada do ponto
de vista da construção de espaços esportivos, seguiu a tônica geral do País, nesse período, que era
orientada pelo caráter eugênico-educativo. E, no caso de Minas Gerais, os corpos dos trabalhadores eram vistos como forma de impulsionar o desenvolvimento da nação, engrandecendo o Estado.
A tônica era educar os corpos para fortalecê-los, para se constituir um País forte!
Com a publicação do regulamento da DEMG, no governo Clóvis Salgado (1955-1956), em
janeiro de 1956, foi possível o entendimento da sua constituição e dos seus diferentes papéis.173
Destacamos, neste documento, a estrutura do organograma, uma vez que se encontra nele o que
podemos considerar o primeiro registro da palavra recreação. É destacada nessa estrutura, além
das Divisões de Desportos, de Obras e de Serviços auxiliares, a Divisão de Educação Física,
formada por uma Seção de Ensino e uma de Recreação, com as seguintes funções: orientar, estimular e controlar a Educação Física nas escolas, nos núcleos de classes trabalhadoras e órgãos
de assistência social; controlar, mediante convênio com o Governo, Federal a Educa­ção Física
nos estabelecimentos de ensino particulares e oficiais, vincula­dos ao Ministério da Educação
e Cultura; promover e orientar a formação de pessoal especializado em Educação Física e
Desportos, podendo recorrer à Escola de Educação Física de Minas Gerais; e, ainda, promover, orientar e estimular competições, torneios e campeonatos colegiais, classistas, do interior, dentre outros e cursos de aperfeiçoamento e atualização de Educação Física e Desportos.
Identificamos que, nessa estruturação, a Divisão de Educação Física era a responsável pela
orientação, pelo estímulo e controle da Educação Física em diversas instituições. Esse foi o lugar
embrionário do que posteriormente concebemos como lazer na política pública em Minas Gerais
e que naquele momento começava a se estruturar como política estadual de recreação.
É nessa estreita ligação da política de esportes com a Educação Física e a recreação que
surgiram as Ruas de Recreio. Fernando Furtado, pertencente ao grupo de professores de Educação
Física da DEMG, recorda:
172 LINHALES, 1996.
173 DIRETORIA DE ESPORTES DE MINAS GERAIS,1956. p.15-21.Como um dos poucos documentos remanescentes da
DEMG, este documento apresenta toda a legislação até então editada, recheado de modelos, regulamentos e instruções
diversas, o que reflete o contexto nacional vivido da década de 1940 à 1980, quando o esporte esteve sobre a tutela do
estado.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Sylvio foi o criador das ruas de Recreio. Belo Horizonte pode se orgulhar de ter sido a cidade
pioneira, no Brasil, de atividades recreativas na rua. Artigos de jornais do Rio de Janeiro e São
Paulo da época atestam nosso pioneirismo. Artigos esses que guardo comigo até hoje.174
Desde 1957, a Divisão de Educação Física do Ministério da Educação e Cultura havia
proposto ao então ministro Prof. Clovis Salgado a realização da Campanha das Ruas de Recreio,
que mobilizou a promoção de atividades esportivo-recreativas em ruas e praças das cidades. Sua
criação levou em conta não somente a carência de parques apropriados à mocidade e a escassez
de possibilidades de recreação e espaços adequados na maioria dos educandários, uma vez que as
atividades de recreação não deveriam estar limitadas somente ao espaço escolar, mas, principalmente, ocupar as crianças ociosas que “viviam em más companhias”, fator considerado de “desvio
da mocidade para o vício e a delinquência, formando, assim, elementos nocivos à Pátria”.175 Essa
orientação federal pode ter sido incrementada inicialmente em Minas.
Segundo Leila Pinto, como forma de ocupar o tempo de não trabalho, nesse período
“difundiu-se a política assistencialista de recreação orientada, promotora do acesso a atividades
mediante benesse, ou seja, supondo sempre um doador e um receptor”. Esse modelo marcou, e
ainda marca, muitas das práticas realizadas por instituições na atualidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A releitura histórica das políticas de esportes desenvolvidas pela DEMG em Minas Gerais
nos mostra uma trama de interesses a ela aliados.
Destacamos, nos seus primórdios, a relação direta da DEMG com o governador do Estado.
Esse órgão favorecia a política mineira, uma vez que suas benesses para a sociedade podiam ser
barganhadas com ela em troca de apoio político. Com era dirigida por amigos do governador, essas
barganhas poderiam ser facilmente articuladas.
Como órgão gestor e controlador de verbas públicas aplicadas na difusão do esporte em
Minas Gerais, a DEMG teve na construção de praças de esportes sua principal ação política, que
desempenhou, por muitos anos, papel importante tanto na formação de jovens atletas em diversas modalidades esportivas não somente na capital, mas em todo Estado de Minas Gerais, como
também na possibilidade de vivências de diferentes práticas esportivas ligadas à Educação Física
e à recreação.
De modo geral, na gestão das políticas públicas de esporte realizadas pela DEMG, foram
criados espaços esportivos em todo o Estado, qualificados professores para atuar na área, ofertados
programas de promoção de práticas esportivo-recreativas e dados auxílios e subvenções a diferentes instituições esportivas.
O ambiente ideológico composto no Estado Novo continuou a orientar a política da década de 1950.
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à Marilita Aparecida Arantes Rodrigues.
GONTIJO, P. M. Belo Horizonte, 11 ago. 1994. (Arquivo Pessoal). Depoimento concedido à
Marilita Aparecida Arantes Rodrigues.
174 FURTADO, F. C., 2011.
175 Processo n. 135 161/57 apud Ruas de Recreio, 2012, p.1.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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MANHÃES, Eduardo Dias. Política de esportes no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1986.
MINAS GERAIS. Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa em sua sessão ordinária de 1947,
pelo governador Milton Soares Campos. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1947.
206 p.
MINAS GERAIS. Decreto n. 27740, de 29 de dezembro de 1987. Extingue a diretoria de esportes
de Minas Gerais. Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 27, col. 2, 30 dez. 1987.
MINAS GERAIS. Decreto-Lei n. 1.765, de 17 de junho de 1946. Muda a denominação da Diretoria Geral das Praças de Esportes Minas Gerais, altera sua constituição e contém outras disposições. Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 2 col. 1, 18 jun. 1946.
MINAS GERAIS. Lei n. 2.877 de 4 de outubro de 1963. Dispõe sobre a reestruturação administrativa do estado e dá outras providências. Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 2, col. 2, 5, out. 1963.
MINAS GERAIS. Lei n. 4.429, de 9 de fevereiro 1967. Dispõe sobre a estrutura da Secretaria do
Estado do Trabalho e Ação Social e da outras providências. Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 7,
col. 3, 10 fev. 1967.
MINAS GERAIS. Lei n. 6.827, de 22 de julho de 1976. Dispõe sobre a reorganização da diretoria
de esportes de Minas Gerais e dá outras providências. Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 5, col. 2,
23, jul. 1976.
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Academia de Polícia Militar. Caixa Adolfo Guilherme.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
SECRETARIA DE ESTADO DE ESPORTES, LAZER E TURISMO – MINAS GERAIS
(1983-1996): ALGUNS APONTAMENTOS176
Juliana de Alencar Viana177
Rita Márcia de Oliveira178
RESUMO: O presente trabalho compõe a pesquisa “Trajetória Histórica das Políticas Públicas
de Esporte em Minas Gerais (1938 a 2006)”, realizada pelo Centro de Memória e Informação do
Esporte (CEMIE) da Secretaria de Estado de Esportes e da Juventude (SEEJ) e pelo grupo POLIS/CELAR, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG. Este
texto, em específico, objetiva compreender a apropriação e condução das políticas públicas de
esporte e lazer pela Secretaria de Estado de Esportes, Lazer e Turismo, de 1983 a 1996, na qual foi
atravessada pelo marco político de redemocratização do país. Como procedimento metodológico,
realizamos entrevistas com dirigentes e funcionários relacionados ao período investigado, além
do acesso à legislação – leis, decretos, resoluções – e do acervo do CEMIE. Foi percebido que o
Estado transfere suas responsabilidades de uma política executora para uma política gestora; o uso
do esporte como instrumento político-eleitoral e preventivo (violência); a abertura às diferentes
fontes de financiamento com caraterística de mercado; e, por fim, a frágil legitimação dos direitos
ao esporte e lazer como setores de políticas sociais para todos. Fica claro que a apropriação e condução das políticas se faz de maneira interessada, contudo, não fica isenta de inúmeras tensões e
contradições.
PALAVRAS CHAVE: Política Pública. Esporte. Lazer.
1. INTRODUÇÃO:
A fim de compreender as maneiras pelas quais o Estado, em especial, a Secretaria de
Estado de Esportes, Lazer e Turismo – SELT – de Minas Gerais (1983 a 1996), se apropriou e conduziu diferentes políticas de esporte e lazer, realizamos diversos procedimentos metodológicos em
busca do que a história nos permitiu contar. Realizamos entrevistas com dirigentes e membros de
equipes de trabalho relacionados ao período investigado, como recurso da História Oral, além do
acesso à legislação – leis, decretos, resoluções – através de diferentes meios (digital e impresso) e do
acervo do CEMIE, que preserva e guarda documentos (relatórios, convênios, programas, recortes
de jornais e revistas179, material didático e de divulgação, prestação de contas) que compõem o
176 Este trabalho compõe a pesquisa intitulada “Trajetória Histórica das Políticas Públicas de Esporte em Minas Gerais (1938
– 2006)”, realizada pelo Centro de Memória e Informação do Esporte (CEMIE) da Secretaria de Estado de Esportes e
da Juventude (SEEJ) e pelo grupo POLIS/CELAR, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da
UFMG e contou com financiamento da FAPEMIG e do Ministério do Esporte.
177 Professora de Educação Física da Prefeitura Municipal de Congonhas e da Prefeitura Municipal de Contagem (MG); Mestre pelo Programa de Mestrado (interdisciplinar) em Lazer pela Universidade Federal de Minas Gerais; pesquisadora do
Oricolé - Laboratório de Pesquisa sobre Formação e Atuação Profissional em Lazer e do POLIS/CELAR, ambos da UFMG.
E-mail: [email protected]
178 Mestre em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro (FJP/MG), especialista em lazer
(UFMG). Analista de Políticas Públicas da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), membro do Polis/CELAR.
179 Por meio do trabalho de “clipping” desenvolvido pela Assessoria de Imprensa e Relações Públicas (SETAS) e pela As-
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seu acervo de inúmeras secretarias que fizeram e fazem a história da política pública de esporte e
lazer no Estado.
No que se refere ao estudo das políticas no setor que foram desenvolvidas no período de
existência da SELT procurou-se privilegiar a análise de quais interesses estavam representados,
quais os grupos atendidos nessas representações e quais os fatores possivelmente influenciaram o
processo decisório na formulação e implementação das ações. Nesse sentido reportamos ao pensamento de Subirats e Gomá (1998) quando afirmam que a análise de políticas públicas pretende
contribuir para o estudo da formação, comparação e conflito entre preferências desde uma perspectiva comparada, dinâmica, que considera as dimensões espaço e tempo. Isso nos faz a entender
que processo de formulação e implementação de políticas públicas envolve uma relação de poder
onde as preferências de um grupo afeta ou influencia as atitudes ou ações de outro ou outros.
Outra fator a ser considerado na análise de políticas, e que de acordo com Melo (1999),
influenciou muito a produção científica na área no período de democratização do país, período
que coincide com a criação da SELT, relaciona-se com questões do desenho institucional. Veronez
(2005), apoiando-se nas idéias de Murrel e Surel (2002), considera que as instituições possuem
um papel essencial que definem os quadros onde se desenvolvem comportamentos individuais,
a ação coletiva ou as políticas públicas. As instituições acabam por afetar o comportamento dos
governantes e demais atores envolvidos, a intermediação de interesses (análise de arranjos institucionais e processo decisório). Para Meny e Thoenig (1992) em um momento dado, uma autoridade
pública adota práticas de determinado gênero, atua ou não atua frente a determinadas demandas
provenientes dos vários grupos existentes na sociedade.
2. O CONTEXTO POLÍTICO NACIONAL NO PERÍODO (1983 – 1996)
No transcorrer do período investigado, ocorreram algumas mudanças no cenário político
que foram fundamentais ao país, criando implicações para a formulação e execução das políticas
de esporte e lazer no Estado. Estamos falando de um período de deslocamento da transição democrática no Brasil (década de 80) para o de consolidação da democracia no país – anos 90.
Durante o período da transição democrática, que marca o fim da ditadura militar, a sociedade civil já se encontrava mais mobilizada exigindo uma maior participação nos processos
políticos. Para Franco (2006), pela participação, os atores sociais e políticos expressaram e lutaram
por reconhecimento e acesso aos direitos sociais, políticos e econômicos para os setores populares.
O fortalecimento de outras forças no cenário político impõe a criação de novos espaços, regras e
estruturas que facilitem a representação dos interesses e valorização desses novos atores.
Com certeza um dos acontecimentos mais importantes deste período foi a promulgação
da Constituição Federal em 1988. O novo ordenamento jurídico conferido ao sistema de proteção
social brasileiro a partir da Constituição de 1988, consagra novos direitos sociais e novos princípios de organização da política, o que possibilitou avanços em direção a um modelo mais universalista e igualitário, fortalecendo o caráter redistributivo das políticas sociais.
A inscrição do lazer, como direito social, no texto constitucional representou, sem
dúvida um grande avanço. Em uma análise realizada por Pinto (2008) sobre a consagração do
lazer como direito social, mesmo apontando limites, ela reconhece que este fato proporcionou novas experiências nas políticas públicas do setor. Para esta autora, o lazer deixa de ser considerado
um beneficio social concedido apenas aos trabalhadores, passando a ser tratado no conjunto de
medidas políticas necessárias à melhoria da qualidade de vida de todos.
sessoria de Comunicação (SELT), pudemos encontrar importantes registros divulgados na imprensa que apresentavam as
ações em torno de diversos projetos e programas sociais no Estado e no país.
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Esse fato passou a desafiar governantes e a sociedade no sentido da elaboração e implementação de políticas que pudessem reconhecer e proteger tal direito. Esse desafio trouxe no seu bojo
outro maior ainda, ou seja, a necessidade de repensarmos as políticas de lazer desenvolvidas
como políticas de atividades, sem reflexos sociais mais amplos e continuidade nas ofertas para a
população (PINTO, 2008, p.86).
Considerando o contexto macro econômico e social no pais na década que se seguiu à
promulgação da Constituição Federal de 1988, observou-se piora em alguns indicadores, como
na distribuição de renda, nas taxas de desemprego, no índice de trabalhadores formalizados que
contribuem para a previdência social, e aumento do percentual da população vivendo com baixos
salários. Tudo isso indicava que uma grande parcela da população encontrava-se excluída dos
circuitos do mercado, carecendo da proteção do Estado.
Dessa forma, em meio a esse cenário, com altos e persistentes níveis de desigualdade social, contexto de escassez de recursos e crescente demandas sociais, pressionavam para que o
Estado ampliasse sua responsabilidade social na provisão de bens e serviços sociais. Porém, não foi
isso que assistimos. A década de 1990 foi marcada pela adoção de medidas pautadas nas políticas
neoliberais. Essas medidas afetavam tanto o campo econômico quanto o social. Assim, o projeto
de desenvolvimento alçado ao modelo estatizante-intervencionista que vigorava até então cede
lugar ao discurso modernizador-privatizante do Estado Mínimo (MASCARENHAS, 2007).
Na esfera econômica, dentre várias medidas adotadas, ganhou evidência a onda de privatização de empresas e bancos estatais e a adoção de reformas na Administração Pública que
atendiam a princípios que visavam uma intervenção cada vez menor do Estado na implementação
e desenvolvimento das políticas públicas em todos os setores. Um novo modo de implementar e
desenvolver políticas sociais é adotado no país. São defendidas ações em que a aparelhagem estatal
deixe de executar políticas sociais diretamente (MELO, 2005). Nessa época, tornou-se comum no
desenvolvimento de políticas sociais a transferência na execução de diversos serviços do Estado
para organizações existentes na sociedade civil, especialmente as organizações não governamentais – ONGs.
As iniciativas no setor de esporte e lazer implementadas e desenvolvidas na década de
1990 não passaram imunes aos ditames dessas novas formas de desenvolver políticas sociais. Com
enormes clamores por parte dos governantes e também da mídia a sociedade civil era cada vez
mais convocada a participar. Dessa forma a quase totalidade das ações no setor foram desenvolvidas em sistema de colaboração entre Estado e sociedade civil e também entre Estado e iniciativa
privada180. Mascarenhas (2007) alerta para o fato de que grande parte dos programas de esporte e
lazer vinculados à ONG’s eram subvencionados pelo Estado ou então recebiam apoio de organismos internacionais. Muitos desses trabalhos eram desenvolvidos por ONGs cujos dirigentes eram
atletas e ex-atletas de renome nacional.
Nesse cenário, onde as práticas adotadas pelas políticas públicas não conseguiram consolidar o esporte e lazer como direitos sociais, possíveis de serem usufruídos por toda a população
brasileira, tornava-se necessário pensar em propostas governamentais que caminhassem nessa
direção.
180 Melo (2005) aponta o Programa Comunidade Solidária, vinculado à Presidência da República e coordenado pela, então,
primeira dama Ruth Cardoso, como um bom exemplo da intensificação da relação entre as ONG’s e o Estado. Importante
ressaltar que várias ações de esporte e lazer difundidas no país eram vinculadas à esse programa, denominado como Esporte
Solidário.
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3. ESTRUTURA ADMINISTRATIVA E AÇÕES DESENVOLVIDAS
A Secretaria de Estado de Esportes, Lazer e Turismo – SELT – tem seu início e fim marcados pelas leis n. 8502, de 19 de dezembro de 1983 e n. 12351, de 18 de novembro de 1996, respectivamente. Ao longo destes treze anos, o governo foi atravessado por cinco gestões no Estado,
sendo elas: Tancredo Neves181 (março de 1983 a agosto de 1984); Hélio Garcia182 (agosto de 1984
a março de 1987); Newton Cardoso183 (março de 1987 a março de 1991); segundo mandato de
Hélio Garcia184 (março de 1991 a janeiro de 1995) e, por fim, no governo de Eduardo Azeredo185
(janeiro de 1995 a janeiro de 1999) que a SELT tem sua denominação alterada, ainda em novembro de 1996.
A sua criação, pelo governo de Tancredo Neves, sucede a Secretaria de Estado do Trabalho, Ação Social e Desportos com a promulgação da referida lei. Conforme o texto da sua lei de
criação este órgão encontrava-se estruturado em Sistemas. De acordo com seu art.17, o Sistema
Operacional de Esportes, Lazer e Turismo responde pelo desenvolvimento das atividades esportivas, de lazer e turísticas no Estado. O sistema é composto da seguinte forma:
I - Pelo Órgão Central – que é a Secretaria de Estado de Esportes, Lazer e Turismo;
II - Pelos Órgãos colegiados: a) Conselho Regional de Desporto – CRD; b) Conselho Estadual de Lazer – CEL e c) Conselho Estadual de Turismo – CET;
III - Pelas Entidades vinculadas: a) Empresa Mineira de Turismo – TURMINAS; b) Águas
Minerais de Minas Gerais S.A – Hidrominas; b) Companhia Mineira de Promoções –
PROMINAS e d) Administração de Estádio de Minas Gerais – ADEMG.186
Os Conselhos Estaduais de Lazer e Turismo foram criados na referida lei. O Conselho
Regional de Desporto já existia e foi mantido pela mesma lei187.
Uma das justificativas para a criação da SELT, é que a forma como os setores de turismo,
esporte e lazer estavam situados nos sistemas operacionais anteriores, ou seja, vinculados às pastas
da indústria, comércio e turismo e a do trabalho, ação social e desporto, não favorecia a coordenação de ações que permitissem ativar o setor em suas áreas afins e operacionais de forma integrada
e eficiente (MINAS GERAIS, 1984)
A concepção de esporte e lazer contida no documento citado acima, associa o primeiro
ao caráter nacional e internacional das competições atléticas. Ressalta também a importância
da criação e fomento de condições que favoreçam o seu exercício e desenvolvimento. Já o lazer e
a recreação são colocados como prioridades e devem ser consolidados para o bem estar do povo
mineiro, especialmente, aos pertencentes das camadas de baixa renda.
A estrutura inicial da SELT, ainda, mantinha a Diretoria de Esportes – DEMG. As ações
da Diretoria, no ano de 1983, conforme prestação de contas enviadas à Assembléia Legislativa,
contida na Mensagem de 1984, centraram-se na participação do Estado nos Jogos Escolares e Universitários Brasileiros e também nos Jogos da Primavera. Neste mesmo documento é mencionado
181 Secretário Leopoldo Bessone (1984 a 1986), cujas Superintendências ficaram a cargo de Luiz Afonso (esporte), Gervásio
Horta (lazer) e Raimundo Nonato (turismo).
182 Secretários Leopoldo Bessone (1984 a 1986); Evandro de Pádua Abreu (1986); Amaury Laje (1986 a 1987).
183 Secretários Tancredo Antônio Naves (1987 a 1989); José Ádamo Belato (1989 a 1990); Maurício Pádua Souza (1990 a
1991).
184 Secretários João Pinto Ribeiro (1991 a 1994); José Afonso Bicalho Beltrão (1994) e, novamete, João Pinto Ribeiro (1994).
185 Secretários Ademir Lucas (1995 a 1996); Paulo Eduardo Ferraz (1996) e, novamente, João Pinto Ribeiro (1996 a 1998),
período este em que a SELT muda a sua denominação.
186 Para melhor detalhamento das funções e atribuições da SELT e demais Órgãos a ela vinculados ver Lei nr. 8502/83 – MG..
187 Em função da intencionalidade da pesquisa, nos debruçamos nas questões relativas ao esporte e ao lazer, deixando a indicação de estudos e pesquisas para os demais assuntos.
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o Projeto “Escolinhas Esportivas”. Pelo percebido, tratava-se do desenvolvimento da prática de
vôlei, basquete e futebol de salão para crianças de 08 à 14 anos.
No mais, no período de existência da SELT, a DEMG manteve as responsabilidades que
lhe cabia em órgãos anteriores à criação da SELT. Estas encontravam-se basicamente centradas
na subvenção às Federações esportivas com o objetivo de apoiar e contribuir com o surgimento
de novos atletas e também subvencionar os municípios também para construir e ampliar as instalações esportivas existentes. A divisão médica deste órgão foi mantida com o objetivo de prestar
assistência aos atletas e acompanhamento de equipes de diversas modalidades. Outra ação que
a DEMG deu continuidade foi o Programa Esporte para Todos – EPT, que, constituía-se, basicamente, na realização de ruas de lazer nos municípios do Estado.
Uma informante do estudo aponta outra ação, de responsabilidade da DEMG, como de
extrema relevância. Tratava-se do projeto “Adote um Atleta”. Ao mesmo tempo em que elogia este
projeto, Rosângela Bessone (2010), também aponta suas fragilidades. Ela salienta que a princípio
foi um projeto muito bacana, mas sua extinção se deu em função de seu mau uso. Conforme ela
nos diz, a Campanha “Adote um Atleta” foi criada justamente para dar recursos para aqueles atletas de ponta que estavam surgindo no judô, no vôlei, na natação. De início, as empresas tomavam
conhecimento do projeto, da lei, e esse valor investido era deduzido do imposto de renda. Entretanto, as próprias empresas começaram a adotar os próprios filhos. Então, quando isso se tornou
frequente, o diretor na época, interrompeu a sua realização. Mas, segundo ela, seria interessante
retomá-lo, feitas estas correções.
É interessante notar que no ano de 1984, ou seja, um ano após sua criação, houve uma mudança na concepção da finalidade da SELT. De uma visão de esporte ligada aos ideais olímpicos
desloca-se para desenvolvimento de medidas que incentivem a prática do esporte, da recreação e
do lazer entre as diversas camadas da população.
Cabe destacar que as ações executadas pelo Conselho Regional de Desportos de Minas
Gerais – CRD188, nas mensagens enviadas à Assembléia encontravam-se relatadas à parte. Suas
principais atribuições correspondiam à emissão de alvarás desportivos à entidades e associações
do setor no estado, bem como a fiscalização destas organizações. Segundo o conteúdo da mensagem de 1984, sua atuação visava garantir o cumprimento das determinações do Conselho Nacional do Desporto – CND.
Compondo também o Sistema Operacional de Esporte, Lazer e Turismo existia uma entidade cuja finalidade é a administração dos Estádios Magalhães Pinto – Mineirão – e Jornalista
Felipe Drumond-Mineirinho – Mineirinho – pela ADEMG. Durante vários anos consecutivos
nas mensagens enviadas à Assembléia Legislativa do Estado – ALMG – pelo respectivo governador do período, é mencionado que todas as despesas da ADEMG são custeadas, em grande
parte, com recursos advindos de receita própria. Em alguns casos sem nenhuma participação do
tesouro do estado. Também pode ser verificado nas mensagens, por vários anos, que as atividades
desenvolvidas comumente por esta entidade estavam concentradas basicamente na manutenção,
conservação e obras nos estádios esportivos mencionados.
Na mensagem do ano de 1985, mais uma vez é ressaltado que uma parte dos recursos arrecadados com a venda de bilhetes da Loteria Mineira189 seriam destinados ao Fundo de Assistência
à Educação Física e Esporte Especializado –FAEFEE. No decreto n. 23500/1984 este percentual
está estipulado em dezoito por cento. Neste ano, iniciava a gestão do então Governador Hélio
Garcia.
188 De acordo com o decreto 23507/1984 a finalidade do CRD era cooperar com o Conselho Nacional de Desportos para a
realização de seus fins em todos os estados e funcionar como órgão consultivo. Neste decreto também estão descritas as
competências, composição, normas, designação, mandato e outros itens deste órgão.
189 A divisão dos recursos arrecadados com a loteria mineira encontram-se especificadas no decreto 23500/1984-MG.
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Analisando a mensagem do ano de 1984, pode ser notado, que a ênfase maior das ações
foram no setor de Turismo. Já na área de Esporte e Lazer, parece relevante o fato da menção do
ato de posse do Conselho Estadual de Lazer. Contudo, neste documento não está especificado
nenhuma atribuição deste órgão. Também nota-se um incentivo à ampliação de novos espaços
destinados ao lazer, na capital. Neste sentido, foi inaugurada a Praça do Mineirão e a doação de
um terreno para a construção de um Centro Esportivo no Bairro Vera Cruz, uma área de extrema
vulnerabilidade social da capital do estado.
Nesta mesma linha de ação há uma autorização governamental para a construção e reforma das já existentes de praças de esportes no interior do Estado, que ficaram sob a direção da
Diretoria de Esportes de Minas Gerais. Também existe uma tentativa de obtenção de recursos
junto a um fundo administrado pela Caixa Econômica Federal – CEF – para incentivo dessa linha
de ação e para implementação de novas propostas..
Na mensagem do ano seguinte, em 1986, antes da apresentação da execução das ações
da SELT, existe uma alteração na concepção e finalidades das ações de esporte, bem como na de
lazer. No primeiro, é demonstrada uma preocupação quanto à descontinuidade da política e também na relação com o esporte como fator para aquisição de conhecimentos, promoção da saúde
e integração social da criança, do jovem, do adulto, do idoso e do deficiente. No setor esportivo,
nesta mensagem é mencionada, pela primeira vez, a realização dos Jogos do Interior de Minas –
JIMI – cuja realização foi autorizada pelo decreto 24202/1984. Neste documento consta que uma
dos objetivos deste evento seria a promoção da interiorização das práticas esportivas. Previa-se
também a sua realização anual. Desta forma, em 1985, inicia-se a primeira versão dos Jogos.
Vários dos entrevistados reconhecem o valor do JIMI - política que animou as Praças de
Esporte no Estado - e salientam, inclusive, que foi a partir dele que muitas das Secretarias de Esporte nos municípios foram criadas, para que pudessem receber os recursos para a organização dos
eventos. Além disso, supõe-se que esta foi a primeira política que animou, de fato, todo o investimento realizado nas Praças de Esporte no Estado, consideradas como equipamentos de esporte
e lazer, alavancadas como carro-chefe da política introdutória da SELT. Dessa forma, Cláudio
Boschi (2010) comenta que o JIMI - Jogos do Interior de Minas - nome dado por Gervásio Horta190 - foi criado para a integração das Praças de Esporte, após um longo período de estagnação das
praças, chegou-se a número de quatrocentas e cinquenta Praças de Esporte.
Rosângela Bessone (2010) ainda completa que o JIMI foi um evento muito exitoso, porque
é executado até hoje. Destaca também que no primeiro JIMI participaram somente sessenta e seis
municípios e transfere a responsabilidade de tal fato à ausência de Secretarias de Esporte nos municípios, indicando que foi a partir do JIMI que tais órgãos foram criados nos municípios.
Segundo ela, o JIMI conseguiu alcançar o seu objetivo que era o de criar um intercâmbio
entre os municípios do Estado, dada a territorialidade de Minas Gerais, o que permitiu, inclusive,
a troca de conhecimento técnico entre os municípios participantes, fomentando ainda mais a formação técnica esportiva. Contudo, revela o impacto e a expectativa da criação de uma Secretaria
do porte da SELT, em detrimento da Diretoria de Esportes, pois, mesmo sendo um órgão pequeno,
se comparado à SELT, conseguiu realizar tantos eventos e, com a criação da Secretaria, pouco se
fez além de ampliar o JIMI.
Para a realização do JIMI, de acordo com Luiz Afonso Almeida (2010, p. 13), o Estado era
dividido em seis regiões, constituindo seis modalidades em disputa (vôlei, basquete, natação, atletismo, futsal, handebol), entre equipes masculinas e o femininas. Dizia ele que até alguns prefeitos
participavam jogando em quadra, o que dava estímulo para a “meninada”.
190 Inclusive, como Superintendente de Lazer, foi aquele mais ampliou e diversificou as práticas, entre elas: o teatro, cinema,
música, de acordo com vários dos entrevistados.
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dado o exposto acima, evidenciamos uma passagem de uma política executora - marcada
pela extinta ação da Diretoria de Esportes de Minas Gerais - para uma política gestora - como
sinaliza ainda a Lei n. 8502/1983 que cria a SELT.
A criação da SELT representou um grande avanço em relação ao lazer. Primeiramente
foi a primeira vez no Estado, ainda que atrelado à palavra esporte, que o lazer apareceu como
conteúdo de uma pasta governamental. Disso resultou a a inclusão de órgãos específicos em sua
estrutura responsáveis por desenvolver ações específicas da área.
Tornaram-se evidente, até o período aqui analisado, que as ações desenvolvidas estavam
centralizadas em pressupostos do esporte de alto rendimento. Isso, de alguma forma, contradizia
textos das legislações do estado para o setor que apontavam o lazer como fator de integração social. Porém, foram poucas ações realizadas pela SELT que contemplavam o lazer. Basicamente, no
período analisado, estas ficaram centradas no desenvolvimento de Ruas de Lazer que compunham
as orientações do Programa EPT.
Os dados também sugerem e somam aos estudos (LINHALES, 1996; VERONEZ, 2005),
que afirmam que legitimação dos direitos ao esporte e lazer, apesar da CF/1988, ainda não foram
assegurados como setores de políticas sociais para todos, ficando ainda restrito à seletividade de
determinados grupos sociais e, com frequência, à serviço de outros direitos sociais, como saúde e
educação, dificultando seu entendimento como produção sócio-histórica e cultural.
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2008.
VERONEZ, Luiz Fernando Camargo. Quando o Estado joga a favor do privado: as políticas de
esporte após a Constituição de 1988. 2005. 376f. Tese (Doutorado em Educação Física)- Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2005.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
PERSPECTIVAS DE CONTRIBUIÇÃO DO SETOR DE ESPORTE E LAZER PARA O
DESENVOLVIMENTO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
Keni Tatiana Vazzoler Areias191
Carlos Nazareno Ferreira Borges192
Marcel Ivan dos Santos193
Ana Carolina Godoi194
Noelle da Silva195
RESUMO: O estudo teve como objetivo identificar e discutir de que forma as perspectivas de
Esporte e Lazer, alocadas no plano de desenvolvimento Espírito Santo 2025 (ES 2025), se relacionam com a perspectiva de direito social garantido constitucionalmente. Tratou-se de um estudo
qualitativo, pelo qual se realizou análise documental do Plano de Desenvolvimento ES 2025 e do
Planejamento Estratégico da Secretaria Estadual de Esporte (SESPORT). Os resultados apontam
para expressões funcionalistas do esporte e o lazer vinculados à ideia de desenvolvimento, entre
as quais: o esporte como estratégia contra os números da violência, a ocupação do tempo unido
ao combate ao sedentarismo e a estratégia do esporte para a melhoria da imagem do Estado e
aumento da autoestima do capixaba.
PALAVRAS CHAVE: Desenvolvimento. Esporte. Lazer.
INTRODUÇÃO
Estudos recentes no campo das políticas sociais, entre os quais podemos destacar Junqueira et al (1997) e Marcellino (2002), enfatizam a importância do planejamento político como vetor
do desenvolvimento local e regional, que tem como principais benefícios: a criação de um desenvolvimento sustentável, melhoria da qualidade de vida, criação de espaços e equipamentos para
o desenvolvimento de Políticas Públicas, inclusão social e minimização das desigualdades sociais.
Também no âmbito dos estudos do Centro de Estudos em Sociologia das Práticas Corporais e Estudos Olímpicos (Cespceo/CEFD/Ufes), temos nos debruçado sobre as Políticas Públicas estaduais e municipais de Esporte e Lazer, e compreendido que as mesmas têm encontrado
muitas dificuldades de operacionalização, principalmente quando pensamos na perspectiva de
atendimento aos direitos sociais dos cidadãos (AREIAS ET AL. 2009; BORGES ET AL., 2009a;
BORGES ET AL., 2009b).
As discussões das políticas públicas de interface entre esporte e lazer no Estado do Espírito
Santo aparecem, no documento final do Plano de Desenvolvimento Espírito Santo 2025 (ES 2025)
191 Mestre em Educação Física pelo Programa de Pós-graduação em Educação Física (PPGEF), da Universidade Federal do
Espírito Santo (UFES). Professora temporária do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) – Ufes. E-mail: [email protected]
192 Doutor em Educação Física, pela Universidade Gama Filho - RJ. Professor adjunto da UFES. E-mail: naza_para@yahoo.
com.br
193 Mestrando em Educação Física pela PPGEF – UFES. E-mail: [email protected]
194 Mestranda em Educação Física pela PPGEF – UFES. E-mail: [email protected]
195 Graduada em Ciências Sociais – UFES. E-mail:
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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como sendo de grande relevância para o desenvolvimento político regional, visto que, busca-se um
debate acerca da intersetorialidade do esporte e lazer com outros setores que pretendem atender a
direitos sociais e/ou interesses de caráter econômico local, entre os quais o da educação, da saúde,
da cultura, do turismo, segurança (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006).
Junqueira (1997) acena há algum tempo para a necessidade de se trabalhar a perspectiva
de ações intersetoriais como estratégia de gestão descentralizada e que possibilite maior eficácia e
efetividade nas políticas, pressuposto esse corroborado por Belloni et al (2003).
No entanto, uma dificuldade quando discutimos direitos sociais, políticas públicas e desenvolvimento, é entender as concepções que subjazem essas categorias. Heidemann (2009) discute a evolução da idéia de “progresso” para “desenvolvimento”. Da mesma forma, faz também
uma investigação do trânsito da concepção de administração pública para a gestão de políticas
públicas. É em virtude desse debate que uma pergunta introdutória surge: de que desenvolvimento
se está falando no planejamento estratégico do Espírito Santo? Será que o planejamento é feito de
possibilidades exequíveis que conduzam ao desenvolvimento esperado pelos cidadãos?
Uma questão precede, ainda, a análise dos planejamentos estratégicos quanto ao direcionamento que este pode fornecer ao setor de Esporte e Lazer, qual seja: como o Esporte e Lazer,
enquanto categorias que expressam fenômenos sociais e direitos constitucionais são pensados e
perspectivados dentro de um contexto de planejamento estratégico do Estado? Esses questionamentos se apresentam em função do imaginário histórico atrelado a essas categorias, principalmente o lazer, como dimensões não produtivas ou no máximo funcionalistas em relação ao trabalho (MARCELINO, 2002; MELO; ALVES JR, 2003).
Marcelino (2001) já se referia ao fato de como as Políticas Públicas de Esporte e Lazer vêm
sendo justificadas por seu potencial de “prevenir” a criminalidade, através da ocupação do tempo
“ocioso” de indivíduos, sobretudo jovens, em situação de vulnerabilidade. São concepções desse
tipo que fizeram o Ministério da Justiça conveniar com o Ministério do Esporte em ações intersetoriais do Programa Nacional de Segurança com Cidadania (PRONASCI)196 com o Programa
Esporte e Lazer da Cidade (PELC). O Objetivo desta parceria é contribuir para a redução dos
números da criminalidade juvenil (15 a 24 anos) em territórios de altos índices de homicídios197.
É possível observar como as Políticas Públicas de Esporte e Lazer tem servido ao atendimento de necessidades vinculadas à saúde pública, à cultura, e à assistência social. Tudo isso
pode ser bom, desde que as iniciativas sejam de caráter intersetorial, e não na forma de políticas
implementadas exclusivamente pelo setor de Esporte/Lazer e, ainda, sem qualquer ênfase no lazer
com fim em si mesmo (enquanto direito constitucional), nem a participação ampliada dos setores
beneficiados, o que poderia potencializar mais as ações em favor dos cidadãos.
Nesse sentido, foi desenvolvido o estudo com o objetivo de identificar e discutir as perspectivas de contribuição do Esporte e Lazer que foram alocadas no Plano de Desenvolvimento
Espírito Santo 2025 (ES 2025), e de como as políticas pensadas para o setor se relacionam com as
perspectivas de direito social instituídas constitucionalmente.
Nesse propósito, buscamos identificar a concepção de desenvolvimento que subjaz os programas de Esporte e Lazer no Plano ES 2025, e identificar os projetos contidos neste mesmo plano
que apresentem perspectivas de ações intersetoriais balizadas na concepção de direito social.
Imbuídos da responsabilidade de responder aos objetivos e amparados nos pressupostos
metodológicos apontados por Gil (2002), a investigação que propusemos foi do tipo pesquisa descritiva de abordagem qualitativa, e constou de duas etapas: revisão de literatura de suporte e
análise documental.
196 Convênio ainda em vigor, uma vez que existem núcleos em funcionamento, mas com previsão de finalização a partir de
2012.
197 Disponível em: <http://www.esporte.gov.br >. Acesso em: 16 maio 2011.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Após a revisão de literatura que nos serviu de suporte, realizamos o estudo detalhado do
documento final do Plano de Desenvolvimento Espírito santo 2025, o qual se constitui em uma
obra de 11 (onze) Volumes, disponível nos formatos impresso e digitalizado.
O estudo foi realizado seguindo as orientações da metodologia de análise documental, que
segundo Gil (2002), consiste no tratamento analítico e descritivo de documentos conservados
em arquivos públicos e instituições privadas em nível regional e estadual e que ainda não receberam tratamento com o rigor científico. O documento foi tomado a partir das categorias centrais
escolhidas para o estudo: o Esporte, o Lazer; o Desenvolvimento; as Políticas Públicas; o Direito
Social.
Mediante a escolha dessas categorias, inicialmente as utilizamos como palavras-chave, e
procuramos as ocorrências dessas palavras no texto (digitalizado). Para não escapar nenhuma informação que estivesse registrada de forma indireta no texto, optamos também por fazer a leitura
completa do documento.
Os trechos selecionados do documento foram analisados pela técnica de análise de conteúdo e organizados de acordo com os conteúdos mais significativos para o estudo. Posteriormente,
foram agrupados nas categorias escolhidas para a investigação, e para as quais foram estabelecidas
relações entre si (BARDIN, 2009).
DESENVOLVIMENTO, POLÍTICAS PÚBLICAS E INTERSETORIALIDADE
Como ponto de partida, tomamos basicamente o Lazer na forma como ele foi conceituado
por Marcelinno (2002), Melo; Alves Jr (2003) e Mascarenhas (2004); todos esses autores utilizando das categorias tempo (disponível), atitude (livre) para considerar o Lazer como um elemento
da cultura em sentido amplo e que pode proporcionar ao indivíduo crescimento pessoal e social.
O Esporte é tomado como as práticas normatizadas, universalizadas e institucionalizadas
(TUBINO, 2010), e que, por uma série de motivos passou a ser redimensionado e manifestado tal
qual aparece no texto constitucional brasileiro de 1988 em três dimensões: o esporte de rendimento (que mantém todas as características mencionadas antes), o esporte educacional (propagado
como veículo de educação associado ao sistema de ensino) e o esporte participação ou de lazer
(perspectivado conforme as características mencionadas do conceito de lazer).
As ações de âmbito mais social provenientes do Estado são parte das políticas públicas do
mesmo e definidas como políticas sociais – elementos que minimizam as desigualdades existentes
na sociedade. A expressão políticas sociais “refere-se às políticas consideradas do ponto de vista
setorial, ou de uma questão pública em particular da sociedade. Entre elas se incluem as de educação, saúde, transportes, entre tantas mais” (HEIDEMANN, 2009, p.30).
A análise do processo de desenvolvimento de um país, passa pela análise de sua relação
com o processo de formação e de implementação de políticas públicas. Entretanto, essa relação
nem sempre é utilizada pelos governos, que poderiam fazer uso das políticas públicas como instrumentos para promover o desenvolvimento e o bem-estar social. Durante décadas se mediu o desenvolvimento dos países pelo grau de industrialização que este possuía. Sendo assim, os principais
indicadores eram de natureza econômica.
Desenvolver um país significava, e ainda significa, basicamente, implantar uma economia
de mercado que inclua, se não a totalidade, pelo menos a maior parte de seus cidadãos. Diferentemente do mito do progresso, o conceito de desenvolvimento permite a operacionalização por meio
de políticas públicas decididas pelo conjunto dos atores sociais (HEIDEMANN, 2009).
No processo de redemocratização no Brasil surgiram questões que reivindicavam um modelo de gestão mais eficiente, com propostas de descentralização e maior participação social, que
desse modo permitiriam uma atuação do Estado mais democrática aos cidadãos, alterando a relação entre Estado e Sociedade (JUNQUEIRA 1997, 2004, 2005; CKAGNAZAROFF; MOTTA,
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2003). Nessa articulação entre os serviços públicos e os cidadãos, Junqueira (1997) aponta dois
conceitos importantes, e que se interligam, na administração das políticas sociais: descentralização e intersetorialidade.
Esses dois conceitos na administração pública passam a ser eficazes, com efetividade social. A necessidade de se abordar demandas sociais de forma abrangente leva em conta os diferentes fatores que influenciam os problemas sociais, analisando-os de forma integrada no espaço
social onde se manifestam, e também considera os diversos atores sociais envolvidos como sujeitos
do processo. Sobre o conceito de descentralização, Junqueira (2005, p. 02) diz que
Descentralizar significa transferir decisão, trazer para junto dos usuários o poder de decidir.
Mas poder de decidir sobre o quê? Por isso que quando se fala em descentralização é importante
ter claro transferir o quê, para quem e como. A descentralização como um processo de transferência de poder determina a redistribuição das decisões. Nesse sentido, este é um conceito
dialético, porque ele existe em oposição à centralização. Não se descentraliza se não há poder
centralizado.
Neste caso, há uma mudança na articulação entre Estado e Sociedade. Ou seja, há uma
alteração na atuação do Estado, e no seu papel na gestão das políticas sociais. O Estado deixa
de ser o único responsável pelas soluções dos problemas sociais, mesmo que tenha como sua
competência garantir os direitos sociais a todos os cidadãos. Exemplo disso é o crescimento das
organizações não-governamentais (ONGs), que amparados no discurso de ineficiência do Estado,
assumem algumas dessas atribuições198.
Com esse processo alterado na relação entre Estado e sociedade, a intersetorialidade surge
como uma possibilidade de lidar de maneira integrada com os problemas sociais que afetam as
pessoas num determinado território dando maior suporte a administração no que tange a questão
social.
Para Junqueira (1997, p.43), “A descentralização e a intersetorialidade inovam a gestão da
cidade, transferem o poder aos que utilizam os serviços prestados e integram a gestão das políticas
públicas”. De modo geral, a intersetorialidade constitui a relação entre as diferentes esferas da
administração pública, e, para que uma política intersetorial seja efetiva, deve contar com planejamento, execução, apoio político e monitoramento. Dito de outra forma, a ação deve focar no
desenvolvimento local, na participação e na descentralização das ações do Estado.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E LAZER E O PLANO DE DESENVOLVIMENTO ES 2025
Mascarenhas (2004) apresenta a proposta de formulação de políticas públicas na área de
lazer centradas no princípio da inclusão dos indivíduos, e que estes entendam o lazer não de forma
utilitária, mas como prática de liberdade e direito social dos cidadãos.
A concepção de lazer centrada no desenvolvimento pessoal e social é vista como geradora de novos valores e normas capazes de intervir na ordem vigente, o que vai contra a lógica
capitalista e neoliberal. Podemos então considerar que o lazer, dessa forma, apresenta-se como um
instrumento viável capaz de atuar no campo cultural e ideológico, e ainda, intervindo no processo
educativo.
A restrição do lazer às práticas esportivas, e o uso do esporte como perspectiva de mobili198 O Plano de Desenvolvimento ES 2025 conta com a participação da ONG Movimento Espírito Santo em Ação, constituída, basicamente pelo movimento empresarial do Estado. Uma discussão rica e importante acerca das ONGs como
estratégia de responsabilização da sociedade civil e desresponsabilização do Estado pode ser encontrada em Neves et al.
(2010). Nesse sentido, cabe a indagação se uma instituição composta pelo movimento empresarial poderá estar atenta
exclusivamente aos interesses da população e do poder público.
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dade social, são alguns dos motivos que fazem com que o Lazer seja compreendido como assistencialismo e compensação por parte do Poder Público, quando este deveria ser compreendido como
direito social.
O estudo de Borges et al. (2009), identificou que nas ações observadas nos programas
conveniados entre o governo do Estado do ES e os municípios, assim como nas ações observadas
em programas de iniciativa gestão municipais,
foi possível encontrar práticas corporais funcionando sob a forma de ‘escolinhas’ de Esporte para
crianças e adolescentes; práticas corporais de desempenho humano ou de caráter eminentemente “recreativo” para jovens (por volta de 18 a 20 anos, desempregados); e práticas corporais de
desempenho humano ou perspectivadas na saúde, para os idosos (BORGES et al., 2009, p. 13).
No Plano de Desenvolvimento ES 2025, o Governo do Estado elaborou eixos, metas,
programas e projetos a serem executados em diversas áreas. O objetivo é que até 2025 o ES alcance padrões de desenvolvimento próximos aos dos países com as melhores condições de vida
na atualidade. O Plano se anuncia como construído participativamente, numa parceria Governo-Sociedade, apontando para um novo ciclo de desenvolvimento do Estado.
Os quatro grandes pilares de sustentação desse Plano são: a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades para ampla inclusão social; o desenvolvimento do capital humano capixaba segundo padrões internacionais de excelência; a diversificação econômica, agregação de
valor à produção e adensamento das cadeias produtivas; e o desenvolvimento do capital social e
a devoção absoluta à ética republicana por parte das instituições públicas. Nesse sentido, a meta
é até 2025 erradicar a pobreza e diminuir a desigualdade em 26%. (GOVERNO DO ESPÍRITO
SANTO, 2006)
A estratégia de desenvolvimento será operacionalizada por intermédio de noventa e três
(93) projetos estruturantes e quatro (4) alianças estratégicas reunidos em onze (11) grupos. (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006). Desses 93 projetos estruturantes, o Esporte aparece em
três. O primeiro deles é o projeto 19, de Prevenção Social da Criminalidade, que tem por objetivo
desmotivar a entrada de jovens em atividades ilícitas, implantando em áreas de risco atividades
de esporte, música, dança, teatro e cursos profissionalizantes. Percebemos aí que o Esporte é visto
de forma funcional, como uma maneira de afastar o jovem da criminalidade, como já destacou
Mascarenhas (2004).
No projeto 37, de Desenvolvimento da Região Metropolitana, o lazer e o esporte aparecem
como condições para garantir a qualidade de vida da população, com disponibilização de equipamentos urbanos de lazer e esporte. Já no projeto 92, que se enquadra na temática do fortalecimento da identidade capixaba e imagem do Estado, trata de desenvolvimento do esporte, e tem por
objetivo tornar o Estado uma referência nacional em modalidades esportivas selecionadas.
É possível perceber nesse contexto uma espécie de senso e de pertencimento regional, colocando o esporte como um meio de promover uma imagem do Estado nacionalmente. A cultura
e o lazer também são citados neste ponto, e são encarados como componente fundamental para a
construção da autoestima e identidade capixaba. O esporte também é encarado no Plano, como
atividade socioeducativa, com o objetivo de manter os alunos nas escolas, afastando-os da rua
(GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006).
CONCLUSÕES
Diante dos resultados aqui apresentados, ainda que de forma sucinta, pois o espaço é contido, procuramos dar um panorama geral de como as perspectivas de políticas públicas de esporte
e lazer estão alocadas no Plano de Desenvolvimento ES 2025, e ainda se há alguma ação intersetorial no que diz respeito aos direitos sociais.
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O que o Plano propõe é o aprimoramento do setor de esporte e lazer em questões que
envolvem a qualidade de vida do cidadão, mas que por ora, aparece como função utilitarista, a
fim de reduzir o envolvimento dos jovens com as drogas e a criminalidade. Em outro momento,
aparece como proposta a promoção da identidade capixaba no cenário nacional. E ainda no âmbito educacional, manter a permanência do aluno na escola, no horário inverso da aula, para que
este não fique nas ruas.
Não foi possível observar em nenhum momento, que os projetos contidos no plano voltados para o tema aqui em questão, tenham dado um verdadeiro enfoque a emancipação do indivíduo. Também não observamos a idéia de que o esporte e o lazer são essenciais para a vida dos
indivíduos.
A elaboração do Plano não foi realizada em conjunto com as secretarias de governo, com
as principais entidades e organizações da sociedade civil, representativas da população. O Plano
foi desenvolvido pelo Governo do Estado, através da Secretaria de Economia e Planejamento em
parceria com a ONG Espírito Santo em Ação199 e a Petrobrás, com o apoio de uma empresa de
consultoria para a metodologia do Plano. Essa associação demonstra um nível muito incipiente
de atividade intersetorial e denota que o plano tem um cunho predominantemente economicista.
É importante ressaltar que o estudo aqui apresentado realizou a primeira abordagem das categorias do esporte e do lazer relacionadas com o Plano de Desenvolvimento ES 2025.
Faz-se necessário um estudo mais detalhado do plano, bem como o acompanhamento de como
as ações e os projetos que estão alocados no documento vêm se desenvolvendo, para melhorar a
qualidade da análise e da proposta aqui apresentada.
REFERÊNCIAS
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199 Ver nota 8.
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JUNQUEIRA, L. A. P. et al. “Descentralização e intersetorialidade na Gestão Pública Municipal
no Brasil: a experiência de Fortaleza.”In: EL TRÁNSITO de la cultura burocrática al modelo de
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MASCARENHAS, F. Lazer como prática da liberdade: uma proposta educativa para a juventude.
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TUBINO, M. J. G. Estudos Sobre o Esporte: ênfase no esporte-educação. Maringá: Eduem, 2010.
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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PERSPECTIVAS DE ACESSO AO ESPORTE E LAZER POR GRUPOS
DIFERENCIADOS COMO POTENCIALIDADE DE DESENVOLVIMENTO A PARTIR
DO PLANO ES 2025
Marcel Ivan dos Santos200
Carlos Nazareno Ferreira Borges201
Ana Carolina Godoi Silveira¹
Keni Tatiana Vazzoler Areias202
Matheus Henrique Triunfo Costa203
RESUMO: Este estudo problematiza a participação de grupos diferenciados na expectativa de
desenvolvimento do Estado do Espírito Santo, o enfoque se direciona a direitos, por parte desses
grupos, sobretudo ao esporte e lazer pelos idosos e pessoas com deficiência física. Trata-se de um
estudo qualitativo, a partir de revisão de literatura, e análise documental do plano de Desenvolvimento ES 2025. A perspectiva é de que os resultados possam contribuir para reflexões importantes a respeito das concepções de desenvolvimento, esporte e lazer que subjazem a elaboração
do Plano.
PALAVRAS CHAVE: Desenvolvimento. Esporte e lazer. Idosos. Deficientes Físicos.
INTRODUÇÃO
O Plano de Desenvolvimento Espírito Santo 2025 se inicia de modo bastante otimista:
“Até 2025 o Espírito Santo alcançará padrões de desenvolvimento próximos aos dos países com
as melhores condições de vida na atualidade. E isto não é um sonho. É um projeto viável” (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006, p.6). Trata-se de um projeto coordenado pelo Governo
do Estado do Espírito Santo, em parceria com o Espírito Santo em Ação204 e com a Petrobras.
Lançado em 2006, o Plano, também chamado de ES 2025, parte de um diagnóstico da situação do
Estado e prevê uma série de ações a serem implementadas pela máquina pública em parceria com
empresas privadas e Sociedade Civil para que o Estado atinja um patamar de desenvolvimento
semelhante ao dos países considerados desenvolvidos.
Dividido em onze volumes e totalizando mais de mil páginas, o documento é um extenso
projeto que consolida uma proposta de desenvolvimento a longo prazo para o Estado. Para que a
proposta se efetive, o Plano prevê que sejam concretizados um total de 93 projetos estruturantes,
agrupados em 11 grupos de projetos.
Admitimos que o planejamento político é um dos principais vetores de desenvolvimento
local e regional. Essa premissa pode ser concebida a partir da discussão realizada por Heidemann
(2009) acerca da transição do ideal de progresso para o de desenvolvimento no discurso político-filosófico moderno. Nessa transição teria acontecido o deslocamento da noção de administração
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Mestrando em Educação Física pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). E-mail: [email protected]
Doutor em Educação Física pela Universidade Gama Filho - RJ. Professor adjunto da UFES.
Mestre em Educação Física pela UFES. Professora temporária da UFES.
Graduando em Ciências Sociais da UFES.
ONG que reúne empresários capixabas
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
pública para a ideia de gestão de políticas públicas. Contudo, é preciso que se pergunte “que desenvolvimento queremos?”.
Apropriando-se de uma compreensão do Lazer como “força de reorganização da sociedade” (MASCARENHAS, 2004, p.13) e do Esporte em sua dimensão educativa (TUBINO, 2010),
o presente trabalho pretende analisar a maneira como as duas práticas – Esporte e Lazer – são
conceituadas e abordadas nas carteiras de projeto sugeridas pelo Plano ES 2025, já que as mesmas
têm encontrado dificuldades de operacionalização, principalmente na perspectiva de atendimento
aos direitos sociais dos cidadãos (AREIAS et al, 2009; BORGES et al, 2009a, BORGES et al,
2009b).
Buscando ampliar a questão levantada por Heidemann, perguntamos: “desenvolvimento
para quem?” Propomos esta pergunta pensando nos conceitos de cidadania e direito social, os
quais abordaremos adiante, e que necessariamente prevêem ações do Estado acessíveis a todos os
seus cidadãos. Para problematizar a questão, centramos o foco em dois grupos sociais específicos
que, deveriam também contar nas perspectivas de atendimento do Plano ES 2025, os idosos e as
pessoas com deficiência física e sensoriais.
Diante do crescimento da “[...] população com 65 anos ou mais, que era de 4,8% em 1991,
passando a 5,9% em 2000 e chegando a 7,4% em 2010” (BRASIL, 2011, p.53), há o indicativo de
uma tendência para o envelhecimento da população brasileira. A realidade não é muito distinta
no Espírito Santo, pois, segundo o censo (2011), o estado possui aproximadamente 249 mil pessoas na condição de idosos, totalizando um percentual de aproximadamente 7,10% da população.
Além disso, de acordo com os dados do IBGE (BRASIL, 2000), a cada 100 brasileiros, no mínimo
14 possuem algum tipo de limitação física ou sensorial.
Diante de tais números, buscamos entender como os grupos diferenciados de indivíduos,
são considerados no contexto de um processo de planejamento estratégico do Estado. Questão
interessante, visto que, como indicam Beauvoir (1990), Cabral (2009) e Goldman (2009), subsiste
no imaginário ocidental uma concepção extremamente negativa e estigmatizante desses indivíduos.
Sendo assim, o objetivo do estudo é identificar e analisar a noção de desenvolvimento que
subjaz a elaboração do Plano ES 2025, atentando para a maneira como grupos diferenciados de
indivíduos – idosos e deficientes físicos – se fazem presentes nas carteiras de projetos apresentadas,
além de avaliar a maneira como as práticas de Esporte e Lazer são conceituadas e mobilizadas nos
projetos apresentados pelo Plano ES 2025.
METODOLOGIA
A presente investigação é classificada como descritivo-analítica. Considerada uma pesquisa de cunho qualitativo, realizamos levantamento bibliográfico e análise documental, com tratamento dos dados seguindo um modelo de análise de conteúdo. Na etapa de pesquisa documental,
houve um estudo detalhado do Plano ES 2025, disponível nos formatos impresso e digitalizado.
O documento foi analisado a partir das categorias centrais escolhidas para o estudo: Esporte, Lazer; Desenvolvimento; Políticas Públicas; idoso; e pessoas com deficiência física. Mediante a escolha dessas categorias, inicialmente as utilizamos como palavras-chave, e procuramos as
ocorrências dessas palavras no texto (digitalizado). Uma vez encontrados trechos do documento
com alguma das palavras, os mesmos foram separados para análise. No entanto, para não escapar
nenhuma informação que estivesse registrada de forma indireta no texto, optamos também por
fazer a leitura completa do documento. Os trechos selecionados do documento foram tomados
como dados e foram analisados pela técnica de análise de conteúdo, conforme sugerido por Bardin
(2009).
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PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Há pressupostos levantados nesse estudo que precisam ser explicitados antes de explanarmos os dados coletados dos documentos que constituem o Plano ES 2025. Esse Plano, enquanto
detentor das características de uma agenda de desenvolvimento estratégico constitui-se como
instrumento de orientação das políticas públicas do Estado. Para os objetivos desse estudo, estamos considerando as políticas públicas como ações do Estado em atendimento às demandas apresentadas pela sociedade civil (BELLONI et al. 2003; HEIDEMANN, 2009). Muitas vezes essas
demandas dizem respeito às necessidades específicas de determinados grupos sociais, e por isso,
atendidas sob a forma de políticas sociais (HEIDEMANN, 2009).
As políticas públicas não são efetivadas pelo Estado simplesmente por um dever de atendimento às demandas da sociedade, mas porque os indivíduos que constituem a sociedade são
detentores de direitos garantidos por lei, direitos de cidadania. Para Marshall (1967), a cidadania
consiste na posse de três tipos de direitos: civis, políticos e sociais. Ao estudar os direitos na Inglaterra, o autor afirmou que os direitos civis surgiram primeiro, seguidos dos direitos políticos, e
finalmente os direitos sociais, tudo isso ao longo dos séculos XVIII, XIX e XX, respectivamente.
Lembramos que na Inglaterra os direitos foram conquistados.
No caso do Brasil, Carvalho (2002) diz que os direitos sociais foram concedidos e não
conquistados, além de que, houve uma inversão na evolução da consecução dos direitos, surgindo
primeiro os direitos sociais, depois os políticos, e os civis. Para o autor, esses últimos direitos ainda
não foram consolidados, em razão do histórico de dominação instalado no Brasil desde a época de
colônia, e que se mantém como herança na atualidade.
Marshall (1967) e Carvalho (2022) concordam que os direitos civis e políticos são essencialmente individuais, enquanto os direitos sociais se constituem como direitos coletivos, porque
são resultados da herança social acumulada por conquistas também advindas dos demais direitos.
Ambos os direitos são condições de cidadania, mas estão relacionados com deveres, uma vez que
são acessados em uma sociedade de iguais. Por isso, tanto o acesso e desfrute de direitos, quanto
o exercício de deveres, pressupõe um processo de educação.
Nessas perspectivas conceituais apontadas nos tópicos anteriores, ganham forças questões
que surgem a partir das intencionalidades do Plano ES 2025. Em uma sociedade pautada no capital, como pensar em desenvolvimento que envolva os cidadãos idosos ou pessoas com deficiência
física e sensorial, muitas vezes considerados pessoas inativas? Como pensar em políticas públicas
que considerem os direitos sociais dos cidadãos independentemente de suas diferenças? E quanto
às políticas públicas de esporte e lazer, como viabilizá-las em diferentes possibilidades para a diversidade dos cidadãos?
Como se vê, são questões amplas para as quais trazemos algumas respostas nas nossas
análises, que não são contempladas em plenitude devido às restrições de espaço deste artigo. Com
o escopo de dar visibilidade aos nossos estudos e reflexões, apresentamos os resultados mais significativos na sequência do trabalho.
DISCUSSÃO E RESULTADOS
A leitura do Plano de Desenvolvimento Espírito Santo 2025 revela que ele foi elaborado
com o intuito de oferecer ao Governo do Espírito Santo uma série de propostas de ações que,
possibilitariam que o Estado alcance no ano de 2025 um elevado patamar de desenvolvimento.
O Plano apresenta onze estratégias de desenvolvimento, sendo quatro principais e sete
complementares (ver Tabela 1). Cada estratégia corresponderia a um determinado grupo de projetos, totalizando 93 propostas de projetos a serem implementados pelo Poder Público, em âmbito
municipal e estadual.
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Grupo
DESCRIÇÃO
1
Desenvolvimento do capital humano referenciado a padrões internacionais de excelência
2
Erradicação da pobreza e redução das desigualdades para ampla inclusão social
3
Diversificação econômica, agregação de valor à produção e adensamento das cadeias produtivas
4
Desenvolvimento do capital social e da qualidade e robustez das instituições capixabas
5
Redução drástica e definitiva da violência e da criminalidade no Estado
6
Recuperação e conservação de recursos naturais;
7
Promoção de um desenvolvimento mais equilibrado entre a região metropolitana, o litoral e o
interior
8
Alcance de níveis crescentes de eficiência, integração e acessibilidade do sistema logístico,
reforçando seu papel de fator de competitividade da economia capixaba
9
Estabelecimento de alianças estratégicas regionais para desenvolver oportunidades de
desenvolvimento integrado de interesse do Estado
10
Desenvolvimento de uma rede equilibrada de cidades que favoreça o dinamismo econômico e a
qualidade e sustentabilidade do espaço urbano
11
Fortalecimento da identidade capixaba e imagem do Estado
Tabela 1: Relação dos grupos de projetos propostos no Plano ES2025.
Fonte: GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006.
É interessante notar que, mesmo consistindo em um projeto que pretende formular diretrizes que orientem ações futuras da máquina pública, o que impactará diretamente a vida dos
mais de três milhões de capixabas (BRASIL, 2011) e despenderá de cifras na casa dos bilhões,
não consta no Plano qualquer menção, quanto a seu processo de elaboração, de um envolvimento
maior da Sociedade Civil além das pouco mais de cem entrevistas realizadas para a elaboração
do referido plano. O que parece é existir um enfoque eminentemente gerencial para as Políticas
Públicas. Isto se mostra em descompasso com as atuais tendências da reforma do Estado Brasileiro
diagnosticadas por Paula (2005) que tem se orientado pelo que ela chamou de “vertente societal”
da administração. Segundo a autora, [...] a vertente societal [...] enfatiza a participação social e
procura estruturar um projeto político que repense o modelo de desenvolvimento brasileiro, a estrutura do aparelho de Estado e o paradigma de gestão (PAULA, 2005, p.174).
Pensamos que se o objetivo do Plano é sugerir projetos que viabilizem a inserção do Estado
em um novo ciclo de desenvolvimento, deveria ter-se criado oportunidades de discussões amplas
com a Sociedade Civil acerca de “que desenvolvimento queremos”, como bem sugere Heidemann
(2009).
Chamamos atenção para isso a fim de problematizar a concepção de desenvolvimento que
norteia em grande parte a elaboração do Plano, pois, embora discursivamente se manifeste preferência por uma concepção de desenvolvimento sustentável, na prática, a alocação de recursos por
grupo de projetos, evidencia a característica marcadamente econômica do desenvolvimento que
se pretende alcançar, deixando em segundo plano avanços na área social.
Quanto às nossas preocupações com o Lazer no Plano, lembramos de Marcellino (1996, p.
9 e 10) quando este afirma que o tempo de lazer seria “[...] um tempo privilegiado para a vivência
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
255
de valores que contribuam para mudanças de ordem moral e cultural. Mudanças necessárias para
a implantação de uma nova ordem social”. Assim, a tematização do lazer se mostra relevante
quando se pensa em desenvolvimento como expansão das liberdades, pois o lazer constituiria
“tempo e lugar de construção da cidadania e exercício da liberdade” (MASCARENHAS, 2004,
p.14).
Além disso, por ser “a forma dominante de apropriação do tempo livre na contemporaneidade” (MARCELLINO, 2006, p.95), o lazer consta no Artigo 6° da Constituição Federal de 1988
(BRASIL, 1988) como direito social, sendo responsabilidade do Estado.
Não obstante, conforme evidencia Mires (2008), o direito ao lazer se faz presente também
no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Estatuto do Idoso e na Política Nacional para a Integração das Pessoas Portadoras de Deficiência.
No mesmo sentido das discussões do lazer, Tubino (2010) chama a atenção para a relevância que o esporte tem adquirido ao longo da história moderna. Segundo ele, o fenômeno esportivo
poderia ser divido em três fases distintas: esporte antigo, esporte moderno e esporte contemporâneo. O esporte em sua fase contemporânea é considerado fenômeno complexo e multifacetado.
Dentre as várias manifestações que adquire o fenômeno esportivo, podemos indicar a emergência
do Esporte-Educação e do Esporte-Lazer. O Esporte-Educação se referiria majoritariamente ao
esporte praticado em escolas, centrado no potencial educativo, e nos princípios de inclusão, participação e cooperação (TUBINO, 2010). Já o Esporte-Lazer, ou Esporte-Participação, compreenderia as manifestações esportivas espontâneas, sendo marcado pelo aspecto lúdico e desinteressado.
Em vista do que foi exposto acima, entendemos que tanto o lazer quanto o esporte, compreendido em suas múltiplas manifestações, constituem-se em práticas importantes para o desenvolvimento humano, devendo ser objetos de interesse do Estado. Contudo, ao analisarmos a carteira de projetos apresentadas pelo Plano ES 20025 (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006)
constatamos que dos 93 projetos sugeridos, apenas três compreendem ações que possuem alguma
interface com o esporte, sendo que o lazer é apenas mencionado em duas propostas.
Diante desta insuficiência, cabe aqui os mesmos questionamentos levantados em estudos
anteriores (AREIAS et al. 2009, AREIAS et al. 2009a), nos quais se pergunta o porquê das políticas para o esporte e lazer ficarem quase sempre em segundo plano. Em nosso caso particular,
pensamos que esta insuficiência se justificaria pela concepção de desenvolvimento que orienta a
formulação do plano, conforme exposto anteriormente.
O que depreendemos da análise dos projetos em que o esporte e o lazer estão presentes é
uma concepção extremamente funcionalista destas práticas, concebidas como instrumentos para
a conservação da ordem e controle da violência, o que nos remete às reflexões de Marcellino
(2001) acerca do caráter utilitário das políticas para esses setores. Isso fica evidente, por exemplo,
no Projeto 19 – Prevenção Social da Criminalidade, cujo objetivo é “desmotivar a entrada de
jovens em atividades ilícitas por meio da disponibilização de atividades sócio-educativas e profissionalizantes voltadas para sua inclusão social” (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006, p.
95). Neste projeto o esporte se apresenta como uma das atividades a serem ofertadas por núcleos
de referência a serem implantados em “áreas de risco”.
Assim, diante do caráter secundário e utilitário do esporte neste projeto, fica evidente que
ele responde muito mais a uma tentativa de atender a uma demanda por “segurança” do que de
contemplar o direito social ao esporte e lazer de jovens em situação de risco social.
Também nos chamou atenção o fato de o único projeto que trata diretamente do desenvolvimento do esporte se pautar em uma concepção de esporte de desempenho205. O Projeto 92
205 Que “objetiva resultados, vitórias, recordes, títulos esportivos, projeções na mídia e prêmios financeiros” (TUBINO, 2010,
p. 43).
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– Desenvolvimento do Esporte – tem como objetivo “tornar o estado referência nacional em modalidades esportivas selecionadas” (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006, p. 235) através
da criação de três centros de excelência esportiva. Em vista disso, é importante lembrarmos que o
art. 217 da Constituição Federal de 1988, trata que é dever do Estado fomentar as práticas desportivas. Contudo, o inciso II prevê “a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do
desporto educacional” (BRASIL, 1988).
Diante da concepção acentuadamente econômica de desenvolvimento que é proposta
pelo Plano ES 2025, interessa-nos ainda saber “para quem” ele está sendo planejado. Nossa questão se faz relevante diante do crescimento da parcela da população considerada idosa nos últimos
20 anos (IBGE, 2011), uma população que, em virtude de sua condição de vulnerabilidade, vive
em uma situação de duplo desamparo. Segundo se pôde constatar, há déficit de atendimento aos
idosos
[...] no aspecto quantitativo, na medida em que o aumento desse segmento não foi acompanhado
pelo aumento dos serviços. Já no qualitativo, o acesso à informação e aos avanços tecnológicos
tende a ser concedido às faixas mais jovens que se inserem na força de trabalho (GOLDMAN,
2009 p. 38).
Mesmo que haja reconhecimento explícito de que uma das condicionantes nacionais e
internacionais para o desenvolvimento futuro do Estado seja o envelhecimento da população, não
encontramos menção alguma a qualquer tipo de projeto perspectivado no lazer que contemple as
demandas específicas dos idosos.
Em situação pior encontram-se as pessoas com deficiência física, pois sequer são levados
em consideração nos levantamentos realizados pelo Plano ES 2025. Em nossa análise, não encontramos nenhuma menção a este grupo de pessoas que, como já mencionamos, perfazem 14% dos
brasileiros. Seguindo as reflexões de Beauvoir (1990) e de Cabral (2009), acreditamos que esta
ausência é sintomática de uma concepção predominantemente economicista da sociedade, já que
estes setores da população situam-se predominantemente às margens da cadeia produtiva.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em nossa análise, percebemos que, apesar de extenso e meticulosamente elaborado, o
Plano ES 2025 possui carências e limitações que necessitam ser problematizadas. A começar pelo
processo de elaboração, constatamos que o processo de pesquisa e montagem do Plano contou
com participação limitada da Sociedade Civil, o que talvez responda pela concepção economicista
de desenvolvimento que se faz presente. Acreditamos que o enfoque no desenvolvimento econômico não seja suficiente para que o Estado atinja um patamar de desenvolvimento satisfatório,
sendo necessário que se consolidem políticas em outros campos, a fim de garantir, como propõe
Sen (1999), o incremento nas liberdades substantivas da população capixaba.
Em relação às práticas de lazer e esporte, percebemos uma insuficiência de projetos que
as operacionalizem. Ainda assim, nos projetos em que estão presentes prevalece uma apropriação
eminentemente funcionalista das práticas, o que contrasta com abordagens consolidadas no meio
acadêmico. Especificamente em relação ao esporte, percebemos a prevalência do Esporte de Desempenho.
Por fim, o Plano não faz qualquer menção a projetos que atendam as necessidades dos
idosos e pessoas com deficiências físicas, apesar de admitir a relevância de considerar o problema
do envelhecimento da população para os rumos futuros do Estado. Ainda assim, “[...] cabe ressaltar que a composição da carteira de projetos estruturantes será dinâmica e irá sendo modificada
ao longo do tempo em função da execução, dos resultados alcançados e da evolução de fatores
externos” (GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO, 2006, p. 82).
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257
Essa última citação nos faz ter esperanças de que, através de um amplo processo de discussão envolvendo diversos atores da Sociedade Civil e pelo qual possam ser debatidas as virtudes e
limitações do Plano ES 2025, possamos chegar a um projeto interessante, capaz de guiar as ações
da máquina pública no sentido da conquista de um desenvolvimento sustentável e abrangente.
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258
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
CONHECIMENTO SOBRE O LAZER NOS CURSOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA
CIDADE DE BELÉM/PA
Gustavo Maneschy Montenegro206
Wagner Wey Moreira207
RESUMO: Esse artigo apresenta os principais resultados da pesquisa que teve como objetivo
analisar os conhecimentos sobre o lazer desenvolvidos nos cursos de Educação Física da cidade de
Belém/PA. Metodologia: adotou-se, como lócus de investigação, os cursos de Educação Física da
Universidade do Estado do Pará – UEPA e da Universidade Federal do Pará - UFPA. As fontes
de análise elegidas foram ementas e planos de ensino das disciplinas que abordam o tema do lazer
nas respectivas instituições. Resultados: identificou-se que a UEPA procura discutir temas relacionados às políticas públicas de lazer; direito ao lazer; lazer e qualidade de vida; lazer e sociedade. Na
UFPA, evidenciou-se que a disciplina segue orientação didático-metodológica, tendo em seu eixo
central a intenção de socializar conhecimentos “técnicos” para a aplicação jogos e brincadeiras.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Educação Física. Formação profissional.
INTRODUÇÃO
Essa pesquisa apresenta os principais resultados da Dissertação de Mestrado “Conhecimento sobre o lazer na formação de professores de Educação Física: um olhar sobre os cursos
superiores das Universidades Públicas em Belém/PA”, a qual foi apresentada junto ao Mestrado
em Educação da Universidade Federal do Pará. Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi analisar
os conhecimentos sobre o lazer desenvolvidos nos cursos de formação de professores de Educação
Física da cidade de Belém/PA.
No campo da produção teórica, o tema do lazer tem sido bastante discutido na Educação
Física brasileira, principalmente pela crescente inserção de disciplinas específicas nos cursos de
formação na área (ISAYAMA, 2002), pelo aumento de cursos de Pós-Graduação lato e stricto senso e também pela ampliação de espaço destinado a discussão do lazer em encontros acadêmicas
da Educação Física, como, por exemplo, no Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte, o qual
destina um dos seus GT’S para a análise e reflexões da temática do lazer (ISAYAMA, 2010).
Por outro lado, Marcellino (2010) afirma que essa associação entre a Educação Física e o
lazer não é algo recente. O autor destaca que, tradicionalmente, a primeira presta serviços na área
de recreação e lazer desde as décadas iniciais do século XX, apesar de somente na década de 1960
a recreação tenha sido incluída formalmente na formação do profissional.
Para o autor, “a grande vinculação entre educação física e recreação/lazer é vista no Brasil,
no caminho histórico da ação profissional desde os anos de 1930” (MARCELLINO, 2010, p. 61).
Isso mostra o longo percurso de associação entre essas áreas em nosso país.
Essa questão pode ser facilmente percebida no estudo desenvolvido por Isayama e Souza
(2006), uma vez que os autores identificaram, ao consultar os grupos de pesquisa cadastrados
na plataforma lattes do site do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
206 Mestre em Educação – UFPA – CAPES - [email protected].
207 Doutor em Educação – UFTM - CNPQ – [email protected]
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259
(CNPq), a existência de 81 grupos que discutem lazer, dos quais 36 estão ligados à Cursos de
Educação Física.
Um dos motivos que influenciam, segundo os autores, o aumento de pesquisas sobre esse
tema, é o fato deste se configurar como um campo de atuação que tem crescido nos últimos anos,
gerando não só oportunidades de intervenção profissional, mas também possibilidades de investigação e produção de conhecimento na área da Educação Física.
Com base no pensamento de Isayma (2010), compreende-se que apesar do crescimento
de produções científicas no campo de conhecimento Educação Física/Lazer, poucos estudos tem
se dedicado a refletir sobre a questão da formação dos profissionais, o que faz urgir a necessidade
de investir em pesquisas que visam discutir e revelar como o lazer é abordado no interior desses
currículos.
Autores como Schawarz (2007), Isayama (2002), Marcellino (2003, 2010) e Valente (1993,
1997), ao investigarem a temática, identificaram que a forma como o lazer é abordado, nos currículos de Educação Física, segue uma perspectiva apenas instrumental, ou seja, a formação se
assenta em uma discussão superficial, centrada na vivência corporal descontextualizada, tendo
assim, o intuito de “treinar” os profissionais a reproduzir atividades lúdicas.
Compartilha-se com o pensamento de Werneck (2000, p. 144), pois a formação deve estar
alicerçada na busca de:
sujeitos comprometidos com o processo de construção do saber, sujeitos que questionem a realidade, que perguntem pelo sentido de seu exercício profissional, que assumam uma atitude
reflexiva face aos processos sociais e às contradições do nosso meio, fazendo do lazer não um
mero (e alienante) produto a ser consumido, mas uma possibilidade lúdica, crítica, criativa e
significativa a ser vivenciada com autonomia e muita responsabilidade.
Destarte, discutir o conhecimento sobre o lazer a ser inserido na formação em Educação
Física é importante, pois o profissional é responsável por dinamizar um espaço lúdico, criativo,
democrático, com ampla possibilidade de vivências no lazer, as quais podem contribuir para uma
compreensão da realidade social.
A partir dessas análises, percebeu-se a necessidade de investir em estudos que tragam a
tona questões relacionadas à formação nos Cursos de Educação Física de Belém/PA voltadas ao lazer, pois, apesar do crescente número de pesquisas sobre esses cursos, as produções não realizaram
reflexões mais profundas sobre como o lazer é abordado no interior desses currículos.
Em meio aos questionamentos levantados se detém o problema da pesquisa: Quais conhecimentos sobre o lazer são desenvolvidos nos cursos de formação de professores de Educação Física
nas Instituições de Ensino Superior (IES) Públicas de Belém/PA?
Nessa linha de raciocínio, necessário se faz destacar que, em termos da relevância acadêmica e social do conhecimento produzido na perspectiva dos “Estudos do Lazer”, em especial para
o Estado do Pará, esta pesquisa pretende cobrir possíveis lacunas existentes na produção do conhecimento acerca das questões político-pedagógicas em relação à temática, uma vez que, apesar
de grande parte dos currículos de Educação Física nos mostrar discussões sobre o lazer, há poucos
estudos na Região Norte e no Estado que se dedicam a essas discussões.
METODOLOGIA
Essa pesquisa se caracteriza como uma investigação do tipo Documental, a qual, de acordo
com Gil (1991, p. 51), “vale-se de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou
que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa”.
Para a realização deste estudo, essa pesquisa adotou como lócus de investigação os cursos
de Educação Física da Universidade do Estado do Pará – UEPA e na Universidade Federal do
260
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Pará – UFPA. Essas instituições foram selecionadas em virtude dos seguintes fatores: da vivência
na graduação enquanto discente e também por se tratar das instituições de ensino públicas da
cidade, sendo referências na formação e no incentivo de debates acadêmicos relacionados ao lazer.
Para sua realização, primeiramente, entrou-se em contato com as coordenações dos cursos
a fim de obter autorização para a execução da investigação. Mediante a autorização, requereu-se
junto às instituições os Projetos Políticos Pedagógicos dos cursos com o objetivo de identificar a
presença de disciplinas que abordassem o tema do lazer na formação dos alunos.
Como critério de inclusão das disciplinas na pesquisa, foi determinado que fossem selecionadas somente as que apresentassem, em seu título, a palavra “lazer”. Com isso, identificou-se,
tanto na UEPA, como na UFPA, apenas uma disciplina que aborda especificamente a temática
do lazer, que são denominadas, respectivamente, de “Estudos do Lazer” e de “Recreação e Lazer
na Sociedade”.
Após essa identificação, a próxima ação foi à solicitação das ementas e dos planos de ensino dessas disciplinas. Ao todo, os cursos disponibilizaram as ementas requeridas e quatro planos
de ensino, sendo dois da UEPA, referentes ao ano de 2010 e dois da UFPA, um do ano de 2010 e
o outro de 2011.
Para analisar o material coletado utilizou-se a técnica da Análise Documental, a qual é
definida por André e Lüdke (1986, p. 38) como um procedimento que “busca identificar informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse”.
Por se tratar de uma pesquisa documental, considera-se que esses procedimentos metodológicos possam ter possibilitado análises e interpretações abrangentes dos documentos obtidos, as
quais serão explicitadas a seguir.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Na UEPA, no que concerne a disciplina Estudos do Lazer, foi possível observar, por meio
da proposta de formação presente em sua ementa, que a mesma exibe a intenção de abordar o lazer a partir dos seguintes aspectos: enfoque sóciohistoricos e tendências na produção do conhecimento
no campo do lazer; o lazer como campo transdisciplinar de formação humana, intervenção profissional
e direito social.
Tomando como referência os conhecimentos sobre o lazer presentes nos planos de ensino
da disciplina, é possível perceber o destaque para os seguintes temas a serem discutidos na formação dos alunos: políticas públicas do lazer, os direitos legais ao lazer, práticas políticas de lazer para
o desenvolvimento humano e qualidade de vida, lazer e sociedade, formação e desenvolvimento para a
atuação – o Público e os Projetos Sociais.
Isso posto, considerando as temáticas expressas nos documentos analisados, identificou-se
que a principal intenção da proposta de formação na disciplina gira em torno de uma reflexão do
lazer enquanto um direito social e como política pública.
Com relação à questão, é possível identificar, na atualidade, a presença do lazer em diversas leis que o garantem como direito social, como política pública e o tratam como dever do Estado
em proporcionar espaços e vivências nesse âmbito de nossas vidas.
De acordo com os estudos de Marcellino (2008), constata-se a inserção do lazer na própria
Constituição brasileira de 1988, por meio do Título II, Capítulo II e artigo 6ª, em que aparecem
como direitos sociais “a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados,
na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988).
Montenegro (2011) ressalta que o lazer é abordado também na Política Nacional para a
integração das Pessoas com Deficiência - Decreto lei Nº 3.298, no qual é ratificado que “será dispensado tratamento prioritário e adequado às pessoas portadoras de deficiência para viabilizar e
promover o seu acesso à cultura, ao lazer, ao turismo e ao desporto” (BRASIL, 1989).
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O autor destaca que o mesmo acontece, por exemplo, na Legislação do Sistema Único de
Saúde – SUS, lei nº 8.080, no Título I, art. 3°, na qual o lazer é abordado como um dos fatores
determinantes da saúde de toda a população; na lei nº 10.216, que dispõe sobre a proteção e os
direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, o lazer aparece no art. 4°, § 2º: “O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa
portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos,
ocupacionais, de lazer” (BRASIL, 2001).
A partir desse breve levantamento, pode-se perceber que o lazer, enquanto direito social
e política pública, não está presente apenas na Constituição Nacional, sendo citado também em
várias leis que o abordam como um dever do Estado brasileiro em ofertar espaços e oportunidades
para que a população possa usufruir da vivência do lazer.
Em meio ao debate, avaliou-se que a inserção dessas discussões na proposta da disciplina
da UEPA se justificava pelo fato do lazer aparecer enquanto direito social em várias leis brasileiras,
o que, além de proporcionar uma visão mais ampla do mesmo, pode explicitar ao discente que o
lazer é um bem social, o qual deve ser acessível a toda as pessoas em suas diferentes faixas etárias.
Apesar de incluir essas reflexões na formação, constatou-se que a disciplina oferece pouco espaço
para a discussão de conhecimentos de cunho metodológico e para a construção crítica e reflexiva
de um repertório de atividades lúdicas que possam embasar a atuação desse profissional. Nesse
sentido, considera-se que podem ser incluídos mais espaços formativos que tenham o intuito de
auxiliar na construção de um saber técnico por parte do professor, fato que pode ser alcançado
por meio de organização de programações de lazer ou, como ensina o educador Antônio Nóvoa
(1992), do contato com profissionais mais experientes que já atuam nessa área.
Na UFPA, ao observar os conhecimentos presentes na ementa da disciplina Recreação e
Lazer na Sociedade, pode-se identificar que a sua proposta de formação apresenta a intenção de
abordar conteúdos de ordem didático-metodológicos, ao enfatizar aspectos como Programação de
atividades de esporte e lazer em conjunto com as organizações comunitárias e a Aplicação didático-metodológica no contexto da Educação Física escolar e não escolar.
Com relação à organização dessa disciplina, a partir dos planos de ensino obtido por meio
de solicitação na coordenação do curso de Educação Física, foi identificado que a sua organização
não enfoca apenas aspectos didático-metodológicos, embora esses ainda apareçam com bastante
destaque.
Nas unidades de conteúdos destes documentos, podem ser observados destaques para conhecimentos de cunho metodológico: modelos e paradigmas de planejamento, programação, execução e avaliação de ações de lazer e recreação; planejamento e aplicação das atividades recreativas e de
lazer em instituições de ensino.
Essa perspectiva também está presente nos próprios objetivos presentes nos planos de
ensino, nos quais é possível constatar a intenção de discutir conhecimentos como: sistematizar
possibilidades metodológicas de intervenção no âmbito do lazer e recreação; executar possibilidades de
intervenção no âmbito do lazer e vivenciar alternativas metodológicas para o trato do lazer em espaços
formais e não-formais.
Entretanto, percebe-se que a proposta de formação desenvolvida pela disciplina na UFPA
não se limita à abordagem desses temas, embora esse seja o seu foco central de discussão.
Isso é afirmado em virtude de se ter encontrado, nos próprios planos de ensino, a presença
dos seguintes conhecimentos: lazer e trabalho na sociedade; processo histórico do surgimento do lazer
e da recreação; concepções de lazer e recreação; conteúdos culturais do lazer e atividades recreativas.
Mediante as evidencias destacadas, pode-se verificar que a disciplina segue uma proposta
em que se enfatizam aspectos didático-metodológicos relacionados ao lazer, porém, não se trata
de uma perspectiva instrumental, mas sim, constitui-se em uma formação a qual busca agregar
fundamentação teórica que auxilie a atuação do professor nos espaços de lazer.
262
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Isayma (2010) afirma que a formação do profissional em lazer não deve negar a construção
de um conhecimento técnico, entretanto, o autor enfatiza a necessidade de se estabelecer um processo formativo não de mera reprodução de jogos e brincadeiras, fundamentados em verdadeiros
“manuais” de recreação. Nesse sentido, o pesquisador argumenta que os cursos de Educação Física
devem criar espaços para a construção de um repertório de atividades vivenciadas e refletidas
socialmente a partir da ação/reflexão/ação de professores e alunos envolvidos no processo de formação (ISAYMA, 2002).
Corrobora-se as reflexões de Isayma (2010, p. 13), haja vista que a formação “deve possibilitar o domínio de conteúdos que tem de ser socializados, por meio do entendimento de seus
significados em diferentes contextos e articulações interdisciplinares”. Sendo assim, compartilha-se com o pensamento do autor quando afirma que a formação pode promover o conhecimento
de processos de investigação que auxiliem no aperfeiçoamento da ação dos profissionais no desenvolvimento de ações educativas lúdicas, críticas e criativas.
Portanto, a partir desse olhar sobre a abordagem da temática do lazer no curso de Educação Física da UFPA, pode-se constatar que o mesma segue essa orientação didático-metodológica,
pois a instituição ressalta aspectos como a aplicação e execução de atividades e programações de lazer.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No caminhar dessa pesquisa, partiu-se da crítica a ênfase “didático-metodológica” que
historicamente assumiu a discussão do lazer como conhecimento trabalhado na formação em
Educação Física. Nessa direção, deparou-se com diversos autores, que em suas produções acadêmicas, revelaram constantes fragilidades nos processos formativos de profissionais para atuação
nos espaços de lazer.
Em síntese, identificou-se duas perspectivas diferentes de pensar a formação na área do
lazer nos cursos de Educação Física de Belém/PA. Na UEPA, a discussão do lazer tem o seu núcleo
voltado para reflexões de temas como: Políticas públicas; Formação humana e intervenção profissional; Enfoque sociohistórico do lazer; lazer e sociedade; Políticas públicas e direitos legais ao lazer. Assim,
demonstra-se que a proposta formativa não ocorre na lógica do “fazer pelo fazer”.
Apesar de incluir essas reflexões na formação, foi possível constatar que a disciplina oferece pouco espaço para a discussão de saberes de cunho metodológico e para a construção de um
repertório de atividades lúdicas, que possam embasar a atuação desse profissional.
Nesse sentido, pensa-se haver a necessidade de incluir mais espaços formativos, os quais
possam auxiliar na construção do conhecimento técnico e de um repertório de atividades refletidas culturalmente e socialmente, a partir das experiências de vida dos alunos e professores.
No que se refere ao Curso de Educação Física da UFPA, identificou-se conhecimentos
sobre o lazer que seguem orientação de cunho didático-metodológico, em que se destacam temas
como: a Programação e execução de atividades voltada para o lazer; Modelos e paradigmas de planejamento, programação, execução e avaliação de ações de lazer e recreação; Construção e aplicação de
intervenção pedagógica; Aplicação didático-metodológica no contexto da educação física escolar e não
escolar. Apesar de privilegiar esse foco, compreendeu-se que a disciplina não trabalha o lazer de
forma pragmática, apenas instrumental, por meio de uma reprodução acrítica de “técnicas” recreativas e na ausência de construção teórica.
Portanto, com as reflexões realizadas no transcorrer desta pesquisa, espera-se ter suscitado
novas interpretações e novas possibilidades de compreensão desse objeto, sobretudo, no que concerne a formação profissional ligada à área do lazer.
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265
ANÁLISE DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM LAZER EM CURRÍCULOS DOS
CURSOS DE GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA DE BELO HORIZONTE - MG
Clarice Noronha Ribeiro208
Hélder Ferreira Isayama209
RESUMO: No Brasil há uma presença de profissionais da Educação Física atuando com o lazer,
questão decorrente da associação histórica do lazer com as atividades físicas e esportivas. Existe
um mercado de trabalho que se amplia a cada dia e portanto, possibilita um crescimento nas possibilidades de atuação nessa área, mobilizando novas oportunidades e desafios. Essas discussões
colaboraram para que esses conhecimentos integrassem, de forma sistematizada, os currículos dos
cursos de Educação Física. Dessa forma, o objetivo desta pesquisa foi diagnosticar e analisar os
conteúdos desenvolvidos nas disciplinas relacionadas ao lazer nos currículos de cursos de graduação em Educação Física de Instituições de Ensino Superior de Belo Horizonte. Os encaminhamentos metodológicos foram baseados na combinação das pesquisas bibliográfica e documental.
A revisão de literatura foi realizada a partir dos termos chave: currículo, lazer e Educação Física
e na pesquisa documental forão analisados programas de disciplinas que tinham como eixo temático o lazer. Para a análise dos dados foi utilizada a técnica de análise de conteúdo. Os dados
indicaram a pequena inserção dos conteúdos sobre lazer nos currículos dos cursos analisados,
visualizado através do número de disciplinas ministrado, do número de créditos de disciplinas e
do conteúdo explicitado nos programas analisados.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Educação Física. Currículo.
INTRODUÇÃO
O lazer tem despertado grande interesse em diferentes segmentos de nossa sociedade atual. No entanto, esse termo vem sendo utilizado de diversas formas, carregado de preferências e
juízos de valores o que, na maioria das vezes, dificulta a sua compreensão (MARCELLINO, 1983).
Além disso, o lazer é frequentemente associado a descanso, ao entretenimento alienado ou à possibilidade de consumo de conteúdos culturais de forma passiva. Essa forma de entender o lazer,
muitas vezes, é resultante das barreiras presentes em nossa vivência, tornando-a inacessível nos
mais diferentes aspectos.
Uma perspectiva a ser destacada sobre a vivência do lazer em nosso contexto é a sua associação ao consumo exacerbado e alienado de bens materiais e de serviços “recreativos”. Com isso,
a sociedade, caracterizada pela valorização da produção e do consumo alienado, entende o lazer
como mais uma de suas valiosas mercadorias, um produto rentável da sociedade de consumo, que
objetiva, principalmente, a fuga dos problemas surgidos em nosso cotidiano, bem como a distração
e o entretenimento alienados (WERNECK, 1998).
Nesta ótica, o lazer vai ao encontro da ideologia dominante, desconsiderando os conflitos
e as contradições presentes em nosso meio. Essa forma de apropriação do lazer geralmente tem
208 Graduação em Licenciatura Plena/UFMG. Graduanda em Bacharelado/UFMG. Bolsista de Iniciação Científica da FAPEMIG.
209 Doutor em Educação Física/Estudos do Lazer pela Unicamp. Docente do Curso de Pós Graduação Stricto Sensu em Lazer
da UFMG. Líder do Oricolé – Laboratório de Pesquisa sobre Formação e Atuação Profissional em Lazer da UFMG. Membro do Grupo de Pesquisa em Lazer (GPL/Unimep). Email: [email protected]
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seus significados incorporados aos valores que imperam em nosso contexto, direcionando para a
manutenção de uma estrutura social injusta e desigual, buscando a permanência do status quo.
O lazer, neste trabalho, é considerado como um espaço privilegiado para vivências lúdicas
de conteúdos culturais em patamares críticos e criativos, o que o caracteriza como esfera abrangente, fundamental na melhoria da qualidade de vida dos sujeitos. Além disso, tem profundas
relações com o trabalho, com a educação, com a família, dentre outras dimensões da vida do homem, sendo um direito social garantido em nossa Constituição Federal. Consideramos também a
importância de superar a ideia de lazer como momento de não trabalho ou como uma mercadoria
a ser consumida.
Cabe lembrar, portanto, que o lazer não pode ser desvinculado de toda a problemática social e que, sozinho, não é capaz de transformar a nossa vida e de torná-la qualitativamente melhor.
Assim, pensar o lazer numa perspectiva abrangente não significa desconsiderar a possibilidade de
que ele também possa se constituir em estratégia de manipulação e controle social – e é este o
sentido que muitas vezes é a ele atribuído. Por isso, é necessário repensar essas visões, por meio
da sistematização de conhecimentos e da realização de pesquisas que tratem o lazer de maneira
ampla e contextualizada.
Apesar de uma discussão sistematizada sobre o lazer ter sido introduzida em nosso país
aproximadamente na década de 70, nos meios acadêmicos isso se deu somente no decorrer das
décadas seguintes, quando este objeto, bem como suas implicações no contexto social, cultural,
político e econômico passou a ser difundido em currículos de cursos de formação profissional
(Educação Física, Turismo, Pedagogia, Administração etc.) de muitas universidades brasileiras.
Entre essas áreas, a Educação Física vem prestando contribuições ao incremento da produção científica, pedagógica e cultural específica sobre o lazer no Brasil, especialmente no ensino
superior. Surge nesse contexto, diversas iniciativas nos níveis de graduação e pós-graduação em
Educação Física, que inserem as questões referentes ao lazer como disciplinas específicas e aprofundamento de estudos nos currículos de formação profissional.
Essas discussões colaboraram para que esses conhecimentos passassem a integrar, de forma sistematizada, os currículos de formação profissional em Educação Física na década de 60. Foi
com a aprovação da Resolução nº. 69, de 6/11/1969, que a recreação passou a fazer parte do rol de
disciplinas que integram o currículo mínimo desses cursos de graduação.
Inicialmente, utilizava-se apenas o termo recreação; mas com o avançar dos estudos, principalmente no decorrer dos anos 90, adotou-se associação entre os termos recreação e lazer, em
alguns momentos entendidos como sinônimos, sendo possível encontrar disciplinas com nomenclaturas diversas.
A recreação tem marcada na sua historicidade o caráter técnico, operacional, com o emprego adequado do tempo livre, sendo atividades com “conteúdo a ser desenvolvido no tempo e
espaço de lazer, à necessidade de reposição, manutenção e preparação da força de trabalho, ou
melhor, como fenômeno submetido à lógica da política e da economia do trabalho” (GOMES,
2004). Há também presente em seu significado a conotação de atividade, do fazer, e este pode
ser o principal elo da Educação Física com a recreação, sua relação com a prática. Essa é uma das
possibilidades de algumas instituições ainda adotarem na formatação de seus currículos tal nomenclatura, já que “recreação”, nos remete a “prática” e essas são palavras que “vendem”.
Os estudos sobre as temáticas do lazer ganharam destaque em relação à recreação devido
às suas características e funções associadas à cultura, à vida cotidiana, ao trabalho. No entanto,
poucos estudos tem se dedicado a análise dessas relações no contexto dos cursos de graduação em
Educação Física, podemos citar os estudos de Valente (1993); Isayama (2002) e Schwarz (2007).
Com a aprovação da Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002 (Institui Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores de Educação Básica em Cursos de Licen-
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ciatura plena) e da Resolução CNE/CES n. 07, de 18 de março de 2004 (Institui as Diretrizes
Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física, em nível superior de graduação plena) é necessário analisar como os currículos de Educação Física se adequaram a essas
Diretrizes e de que maneira vêm abordando os conhecimentos referentes ao lazer.
Nesse contexto, cabe perguntar: como se têm desenvolvido os conhecimentos sobre a recreação e o lazer nos currículos de formação profissional em Educação Física em Belo Horizonte?
Qual a especificidade sobre a recreação e o lazer nos cursos de formação profissional em Educação
Física? Qual a importância atribuída à recreação e ao lazer pelos currículos desses cursos?
O objetivo proposto é diagnosticar e analisar os conteúdos desenvolvidos nas disciplinas
relacionadas ao lazer, a partir dos currículos propostos pelos cursos de graduação em Educação
Física de Instituições de Ensino Superior (IES) públicas e privadas da cidade de Belo Horizonte.
Como objetivos específicos destacamos a análise do lazer nos programas a partir dos seguintes critérios: ementas, objetivos, conteúdos, metodologias empregadas, bibliografia utilizada,
relação com o mercado de trabalho e com a produção acadêmica, dentre outros aspectos. Além
disso, buscamos contribuir com a fundamentação teórico-prática sobre a formação profissional em
Lazer e suas relações com o campo da Educação Física e produzir conhecimento sobre a Formação
Profissional em Lazer e em Educação Física.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os encaminhamentos metodológicos utilizados nesta pesquisa foram baseados na combinação das pesquisas bibliográfica e documental. Utilizamos a revisão de literatura, com a finalidade de familiarizar-se, em profundidade, com o assunto e fornecer um maior domínio dos termos
centrais da pesquisa. O levantamento bibliográfico foi realizado através do site Scielo (biblioteca
virtual de assuntos científicos), do Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal de Minas Gerais e do Google acadêmico. Os artigos, livros, dissertações e teses relacionadas neste levantamento bibliográfico foram encontrados a partir das palavras chave: currículo, Lazer e Educação Física.
Para a pesquisa documental a técnica empregada foi a análise documental (BRUYNE;
HERMAN; SCHOUTHEETE, 1977). Inicialmente fizemos um levantamento das instituições
que oferecem o curso de graduação em Belo Horizonte. Para tanto, foi selecionado a partir no site
do Ministério da Educação (MEC), uma lista com os nomes de todas as instituições de Ensino Superior da cidade de Belo Horizonte que ofertavam os cursos de Educação Física. O portal e-Mec,
vinculado ao MEC, é um sistema eletrônico em que as Instituições são cadastradas. Dessa forma,
acompanha e realiza os processos de avaliação nas instituições de ensino superior, regulando,
credenciando e reconhecendo a educação superior no Brasil. A partir deste cadastro alguns dados
das instituições são fornecidos, tais como autorização de abertura e funcionamento, instituição
mantenedora, endereço físico e eletrônico, responsável legal, dentre outras informações disponíveis para consulta.
Neste novo levantamento foram encontrados um total de nove Cursos de Graduação em
Educação Física cadastrados na cidade de Belo Horizonte. De posse desta informação a primeira
forma de se obter alguns dados necessários para a pesquisa foi através dos sites das próprias instituições que o e-MEC disponibiliza para consulta. Através do site pudemos relacionar as Instituições
de Ensino Superior que são foco desta pesquisa, sendo elas Universidades ou Faculdades, públicas
e privadas, que possuem curso de graduação em Educação Física, nas modalidades Licenciatura e/
ou Bacharelado da cidade de Belo Horizonte.
Os dados solicitados para a realização desta pesquisa foram programas contendo ementas,
objetivos, conteúdos, nomes das disciplinas, fluxograma ou matriz curricular das disciplinas relacionadas à temática do lazer e recreação, ministradas nos cursos de Educação Física nas instituições de Belo Horizonte.
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Os sites foram analisados, buscando identificar na grade curricular as disciplinas que tem
como eixo central de estudo a temática do lazer. Em alguns casos os programas das disciplinas puderam ser retirados diretamente dos sites das instituições. Nos casos em que os programas curriculares não são divulgados na internet, os programas e demais dados necessários foram requisitados
posteriormente através de uma carta que foi enviada por e-mail ao coordenador do curso solicitando o programa das disciplinas selecionadas inicialmente, contendo ementa, objetivos, conteúdos,
bibliografia e período de oferta.
Cada uma das instituições pesquisadas possui um formato específico para apresentar os
programas das disciplinas, fazendo com que em alguns casos o número de informações para análise fossem menor, enquanto outros disponibilizaram mais elementos possibilitando uma análise
mais completa. Com isso foram levantados o que havia em comum entre todas as informações dos
programas para que a análise fosse realizada, sendo elas: modalidade(s) oferecida(s), duração do
curso, matriz curricular, carga horária por disciplina relacionada ao lazer, ementas e bibliografias
(básica e/ou complementar).
A amostra da pesquisa documental foi, portanto, do tipo não probabilística (BRUYNE;
HERMAN; SCHOUTHEETE, 1977), mediante o critério de acessibilidade. Desta forma foi possível realizar a análise de conteúdos de seis instituições que disponibilizaram os dados, seja através
da carta ou através do site.
Das nove instituições cadastradas no site do e-MEC, em somente dois sites foram possíveis
o acesso as informações necessárias; uma delas não tinha qualquer informação de contato virtual
para solicitação de dados; outras seis instituições foram contatadas através de uma carta de apresentação, sendo que três enviaram respostas. Desta foram foram analisadas cinco instituições com
informações disponíveis.
A partir do recebimento desses dados foi utilizado a técnica de análise de conteúdo proposta por Triviños (1987). O conceito do método de análise de conteúdo diz respeito a um conjunto de procedimentos técnicos que objetiva conhecer os significados das informações contidas
nas mensagens, que neste caso tende a ser mensagens escritas. Este método consiste em três etapas
básicas: Pré-análise, descriminação analítica e interpretação referencial.
Na primeira fase dessa técnica foram organizados os materiais coletados, tais como nomes,
endereços e programas curriculares das Instituições de Ensino Superior cadastradas através do site
do e-MEC.
Na segunda etapa, de descrição analítica, foi realizada uma síntese dos pontos de vista
quanto às coincidências e as divergências de idéias entre os dados analisados. Esta etapa foi fundamental para que eu categorizasse os materiais que auxiliaram na análise, tais como: ementa,
programas, dados da instituição com grade curricular e apenas dados da instituição.
Na última etapa, de interpretação referencial, foi estudado o conteúdo latente das mensagens, refletindo com maior intensidade sobre este conteúdo, para descobrir ideologias, tendências
e influências no desenvolvimento dos programas e ementas analisadas.
DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS
O acesso às informações necessárias para a realização da pesquisa foi um dificultado por
algumas instituições, limitando a análise de dados e, conseqüentemente as reflexões e questionamentos. Com isso, ao serem analisadas, determinadas instituições foram ponderadas de forma
quantitativa, como o número de disciplinas dedicadas à temática do lazer e suas cargas horárias
apenas.
Dos dados que foram analisados pode-se perceber de forma geral que a relação do lazer
com as políticas públicas possui uma ênfase especial nos cursos, já que é uma das perspectivas
mais citadas nas ementas e bibliografias de referência. Outra observação interessante é que, em
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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algumas bibliografias percebe uma relação do lazer com a ideia de atividades e nesse caso com o
desenvolvimento de um rol de atividades. Esse fato pode ser relacionado a ideia de atendimento
direto as demandas impostas pelo mercado que exigem dos graduandos de Educação Física, já nos
primeiros períodod, o conhecimento de um número elevado de atividades para a aplicabilidade
em suas atividades de estágio.
Na maioria das instituições pesquisadas, o número de disciplina se restringe a 1 ou 2, com
carga horária reduzida, indicando uma possivel incompatibilidade no que se apresenta nos dados
encontrados, principalmente no site de algumas instituições, que demonstram a importância de se
formar profissionais que poderão atuar com as vivências de lazer no mercado de trabalho.
Os conteúdos trabalhados demonstram uma diversidade de possibilidades de temas que
podem ser trabalhados e associados a questão do lazer, conforme destaca Isayama (2002) ao propor possibilidades de eixos norteadores que podem ser trabalhados nos currículos dos cursos de
Educação Física.
Este estudo demonstra que é necessário contextualizar as disciplinas com o dia a dia do
aluno, com a região em que está inserido, com o perfil do público que ele irá trabalhar, acarretando assim o aumento do interesse e melhoria da atuação profissional. Também é importante pensar
em um currículo que não se estruture não só pela demanda do mercado, mas pelas necessidades
daquela determinada sociedade, pela valorização da cultura, por uma educação igualitária, democrática e sem hierarquias, partindo do propósito de que o lazer é um direito.
Algumas concepções de currículo levantam reflexões importantes no que diz respeito ao
trato com os conteúdos das disciplinas de lazer e recreação. Partindo do pressuposto de que o
currículo não é neutro nem alheio aos acontecimentos cotidianos, ele possui em sua constituição
uma parte seletiva de conhecimentos escolhidas por alguém e por algum motivo. O currículo é um
espaço de relações, de perpetuação de valores e ideias, que reproduz ideologias. Ele se representa
o um saber sistematizado e socialmente produzido que é incorporado pelas Instituições de Ensino
Superior. Com esta perspectiva, Schwarz (2007, p.89) coloca-o como o “produto que organiza e
desorganiza o povo”, influenciando decisões e construções ao longo da formação e, consequentemente, da atuação profissional.
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271
EDUCAÇÃO FÍSICA E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA O LAZER210
Tatyane Perna Silva211
Cinthia Lopes da Silva212
RESUMO: Este trabalho teve como objetivo investigar o que os estudantes de um curso de educação física entendem por lazer, e quais suas relações com a educação física e atuação do profissional. Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo eminentemente qualitativo. Foram realizadas
uma revisão bibliográfica e uma pesquisa de campo. A pesquisa de campo foi realizada junto a
estudantes do curso de Educação Física da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). A
investigação junto ao grupo de estudantes de Educação Física foi feita por meio de entrevistas
semi-estruturadas. Foram coletados dados de 14 estudantes de Educação Física, divididos em dois
grupos, sendo sete do primeiro ano e sete do último ano. De modo geral observamos que a área
do lazer ainda é vista de modo restrito pelos estudantes de educação física. Assim, percebemos
uma necessidade nos cursos de formação profissional em Educação Física em se ter uma produção
teórica que parta do conhecimento dos estudantes e que faça uma mediação de significados de
modo a ampliar a compreensão que tais sujeitos possuem da realidade de vida.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Formação Profissional. Educação Física.
INTRODUÇÃO
O lazer é visto pelo senso comum como sinônimo de descanso e divertimento, no entanto,
para além dessas duas possibilidades, o lazer pode ser um espaço fundamental para o desenvolvimento pessoal e social. Desta forma, se torna essencial que os profissionais de lazer estejam
preparados para uma atuação efetiva junto à população, a fim de oportunizar variadas vivências
de lazer, bem como incentivar a prática de um lazer crítico e criativo.
Ao considerar tal quadro de atuação, este trabalho tem como objetivo investigar o que os
estudantes de um curso de educação física entendem por lazer, e quais suas relações com a educação física e atuação do profissional. Para alcançar nosso objetivo, o texto foi dividido em tópicos,
primeiramente foi realizada a revisão bibliográfica, contemplando os temas a serem estudados,
seguido da metodologia. Em um terceiro momento temos a análise das entrevistas realizadas com
os estudantes de Educação Física, e, por fim, algumas considerações acerca do trabalho.
LAZER E EDUCAÇÃO FÍSICA
No Brasil, as primeiras iniciativas de sistematização do conhecimento sobre lazer não
surge das necessidades comunitárias ou associativas, mas de uma instituição (Serviço Social do
210 Este artigo faz parte de um trabalho em desenvolvimento financiado pelo Ministério do Esporte, intitulado Lazer e Educação Física: textos didáticos para a formação de profissionais do lazer
211 Mestranda em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba. Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa em
Lazer, Práticas Corporais e Cultura (GELC). Email: [email protected]
212 Docente dos cursos de Graduação em Educação Física e Mestrado em Educação Física da Universidade Metodista de
Piracicaba (UNIMEP) - Brasil. Coordenadora do Grupo de Estudo e Pesquisa em Lazer, Práticas Corporais e Cultura
(GELC), grupo certificado pela Plataforma CNPq e locado na UNIMEP. Email: [email protected]
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Comércio/SESC) que tinha como finalidade contribuir com o bem-estar e a paz social (MARCELLINO et al, 2007). Sem desmerecer o fato do SESC propor-se a sistematizar o conhecimento
relacionado ao lazer, é fundamental compreender que essa influência é de caráter assistencialista e
funcionalista e, segundo Marcellino et al (2007), tem contribuído para uma compreensão restrita
à ideia de atividade e às possibilidades práticas proporcionadas por ela. O problema que se coloca
é que o lazer passa a ser compreendido como mera ocupação, incentivando os sujeitos ao consumo passivo dos bens culturais, ficando para segundo plano o papel pedagógico da animação, de
intervenção na cultura.
Marcellino (2007) defende que o lazer deve ser considerado em sua especificidade concreta, e não apenas em sua especificidade abstrata, onde a última atenderia às concepções funcionalistas, não levando em conta o lazer em um contexto amplo. Desta forma, entendemos o lazer na
concepção de Marcellino (1990), que o define
(...) como a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou fruída) no “tempo disponível”. O importante, como traço definidor, é o caráter “desinteressado”
desta vivência. Não se busca, pelo menos fundamentalmente, outra recompensa além da satisfação provocada pela situação (p. 31).
Devemos reconhecer as possibilidades que o lazer oferece para um desenvolvimento social e pessoal, oportunizando contatos, e não somente levar em conta o divertimento e descanso
proporcionado nesses momentos. Assim, defendendo uma participação mais efetiva nesse campo,
devem-se oferecer informações específicas para que ocorra o exercício crítico e criativo do lazer
(MARCELLINO, 2011).
É preciso estimular a população a participar de vivências de lazer, para isso é necessário
um mínimo de orientação que permita a opção por qual seja a atividade. Assim, é válido fazer
a distinção das áreas abrangidas pelo conteúdo do lazer (MARCELLINO, 2007). Com base em
Dumazedier (1980) e Camargo (1986), Marcellino (2007) aponta seis áreas fundamentais do lazer: os interesses artísticos, os intelectuais, os físicos, os manuais, os sociais e os turísticos. Seria
ideal que os sujeitos praticassem atividades que abrangessem os vários grupos de interesse, porém
o que se verifica é a restrição a um campo de interesse, muitas vezes pela falta de conhecimento
e oportunidade de vivência.
O lazer como direito tem uma trajetória de mudanças significativas. É na Constituição de
1988 que o lazer passa a ser entendido como um direito social, e a se relacionar a outras políticas
sociais.
Porém, Marcellino (2008) ressalta que até mesmo na Constituição de 1988 ocorre uma
vinculação do termo ‘lazer’ a um único conteúdo, o esporte; o que enfatiza a restrição do lazer em
relação aos seus conteúdos, dificultando a construção de políticas públicas e sua efetiva realização.
Assim, quando a questão do lazer é abordada, relacionada à formulação de políticas de
atuação, deve-se considerar a abrangência do lazer. É verificada uma associação com experiências
individuais vivenciadas, que muitas vezes reduz o conceito a visões parciais e restritas das atividades (MARCELLINO, 2008).
É nesse sentido que devemos entender a relação entre educação física e lazer, onde o
profissional deve atuar como mediador na questão de conhecimento e escolha das atividades,
orientando como se utilizam determinados espaços e equipamentos de lazer.
FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM LAZER
Sendo o lazer considerado direito do cidadão pela Constituição de 1988, necessitamos de
políticas públicas efetivas para a disseminação de atividades de lazer que enfoquem os vários conteúdos culturais. Sendo assim, Marcellino (2007) afirma que um dos aspectos fundamentais em
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políticas públicas nesta área diz respeito à formação e desenvolvimento de pessoal.
O processo de formação de profissionais é fundamental para uma mudança de fato na
visão do senso comum acerca do ‘lazer’. Os envolvidos no processo de estudo e formação nessa
área sofrem alguns preconceitos, inclusive no meio acadêmico quando o lazer é enfocado. No setor
público isso é observado quando a questão do lazer envolve liberação de recursos (MARCELLINO, 2007).
Assim, é necessário que a atuação do profissional de lazer não esteja alienada dos problemas que permeiam esta área em específico, pelo contrário, deve considerar em sua prática os
fatores limitantes da participação em momentos de lazer que sejam significativos, e procurar amenizar estas limitações. Com isto, o profissional contribui para a disseminação de uma ideia de lazer
não-excludente, demonstrando que são possíveis ações que vençam as barreiras sociais e culturais
que restringem a vivência de um lazer crítico e criativo a uma elite (MARCELLINO, 2003).
Isayama (2010) afirma nesse sentido, que a reflexão sobre a formação de profissionais do
lazer deve ser feita a partir da visão de que este é um campo multidisciplinar, onde concretizam-se propostas interdisciplinares, por meio da participação de indivíduos com diferentes formações.
Ressalta suas considerações dizendo que o maior desafio na questão da formação profissional está
centrada no fato dos profissionais serem “(...) capazes de construir coletivamente ações teórico-práticas sobre o lazer que sejam significativas, a fim de não mascarar ou atenuar os problemas
sociais dos sujeitos envolvidos (p.12).
Estamos vivendo um momento em que o lazer, em sua visão funcionalista/assistencialista,
privilegia as propostas que envolvem as atividades físicas e esportivas em detrimento de outras
práticas culturais que podem ser vividas no âmbito do lazer (ISAYAMA, 2010).
Em vista deste quadro em que nos encontramos, a discussão de uma formação profissional
no âmbito do lazer merece destaque e incentivos por parte de todos os envolvidos neste processo,
desde o profissional que já atua, devendo procurar sempre uma formação continuada, passando
pelos futuros profissionais, chegando aos formadores desses profissionais, que devem estar aptos a
auxiliar na formação adequada.
METODOLOGIA
Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo eminentemente qualitativo. Foram realizadas uma revisão bibliográfica e uma pesquisa de campo.
A pesquisa de campo foi realizada junto a estudantes do curso de Educação Física da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). A escolha por esse curso é pelo fato dessa instituição estar localizada em uma região privilegiada para a atuação de profissionais no âmbito do lazer.
A investigação junto ao grupo de estudantes de Educação Física foi feita por meio de
entrevistas semi-estruturadas, procedimento considerado por Triviños (1987) como um dos principais meios na pesquisa qualitativa em Ciências Humanas.
Foram coletados dados de 14 estudantes de Educação Física, divididos em dois grupos,
sendo sete do primeiro ano e sete do último ano. O tamanho da amostra foi determinado pela saturação dos dados. Optamos por entrevistar dois grupos de alunos com características diferentes,
sendo que o grupo dos alunos de primeiro ano ainda não teve nenhum contato com as disciplinas
sobre lazer, dessa forma, seus conhecimentos sobre essa área são provindos de experiências pessoais, do senso comum. Já os alunos do último ano cursaram as disciplinas oferecidas sobre lazer,
assim, tiveram acesso a um conhecimento institucionalizado de lazer, podendo responder a entrevista baseando-se em suas experiências e neste conhecimento adquirido.
As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para uma melhor análise dos
dados pesquisados. Para nos referirmos as falas dos entrevistados, utilizaremos letras para diferenciá-los; sendo os entrevistados “A”, “B”, “C”, “D”, “E”, “F” e “G” do primeiro ano do curso de
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educação física, e os entrevistados “H”, “I”, “J”, “L”, “M”, “N” e “O” do último ano.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Notamos que as respostas dadas à questão 1 são muito semelhantes entre todos os estudantes, tanto do primeiro quanto do quarto ano. Nesta questão, todos os entrevistados respondem
que sim, que já realizaram alguma prática corporal nos momentos de lazer, as mais citadas são
esportes, danças e lutas. Outras práticas citadas foram jogos de tabuleiro, jogo de baralho, caminhada, natação, brincadeiras de rua.
Na questão 2, esperava-se que os estudantes do último ano de educação física elaborassem
uma resposta mais estruturada que os estudantes do primeiro ano, pelo fato de já terem cursado
disciplinas referentes ao lazer, porém o que se observa são respostas muito semelhantes:
“Lazer, brincar, é um momento que a gente tem. Acho que é um momento único que a gente
tem pra se divertir” (Entrevistado E).
“O lazer é um momento de prazer, de diversão, onde posso esquecer os problemas do dia-a-dia,
praticar alguma atividade que eu goste” (Entrevistada M).
Podemos observar que, em geral, não há muita diferença entre as respostas dadas pelos
alunos ingressantes no curso e pelos que estão terminando. Vemos que suas respostas são, ainda,
muito relacionadas ao conhecimento vindo do senso comum, que, como explica Geertz (2001),
é a primeira base de conhecimento que os sujeitos possuem, pois quando indagados sobre o lazer
suas respostas estão relacionadas com suas próprias experiências em lazer, bem como associadas
ao descanso, divertimento e descontração.
Durante as entrevistas, nota-se uma grande dificuldade em responder as questões 2 e 3,
que se caracterizam como perguntas centrais para sabermos o entendimento que os graduandos
possuem sobre lazer.
Nove entrevistados relacionam o lazer a um momento de descanso, livre de obrigações.
Dois alunos relacionam lazer necessariamente com movimento corporal, ambos do primeiro ano
do curso.
Apenas uma entrevistada, do último ano, mencionou a palavra ‘cultura’ em sua resposta,
porém sem se aprofundar muito na questão, mesmo assim demonstra um indício de um conceito
mais ampliado de lazer.
“Se você me perguntasse antes iria te dizer que o lazer era praticar esportes, mas agora tenho
um entendimento um pouco maior, entendo o lazer agora como uma fonte, tanto de criação de
cultura e recreação, quanto de vivência” (Entrevistada I).
Outra entrevistada que podemos dizer que também se mostra como uma tentativa mais
aproximada do conceito de lazer que utilizamos em nossos estudos foi a entrevistada “O”, do último ano do curso.
“Lazer pra mim é uma coisa que eu faço fora das minhas obrigações em horário livre” (Entrevistada O).
Observamos que a estudante aponta uma questão importante ao se considerar o lazer, o
“tempo livre”, ou seja, o tempo disponível, um dos elementos a ser considerado quando falamos
sobre este assunto, considerando o conceito de Marcellino (1990) e os três aspectos propostos pelo
autor para que se considere o lazer, são eles o tempo, a atitude e o espaço.
Na questão 3, que diz respeito a relação entre lazer e educação física, dois entrevistados
não souberam responder, sendo um do primeiro e um do último ano:
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“Acho que tá relacionado, porque, sei lá porque, ah não sei” (Entrevistado F).
“É uma coisa bem interessante, estão sempre ligados” (Entrevistada O).
Nas respostas fornecidas pelos demais participantes, percebemos que apresentam dificuldades ao fazerem a explicação sobre esta relação; também é possível observar respostas muito
superficiais sobre o assunto.
“Muito importante, os esportes são culturais e cultura é lazer” (Entrevistado N).
Este entrevistado demonstra uma visão diferenciada ao associar o esporte como produção
cultural, uma vez que o termo cultural é comumente associado às artes. Porém, sua resposta é
reduzida, novamente, a um conteúdo do lazer, o físico-esportivo, e mais especificamente aos esportes.
Alguns estudantes relacionam o lazer e a educação física considerando os movimentos
corporais.
“... eu acho q a educação física tem a relação com o lazer por você se liberar, se dedicar a alguma
atividade relacionada ao seu corpo” (Entrevistada G).
“Grande parte do tempo que é voltado para o lazer, a educação física pode propor algumas atividades para trazer bem-estar para as criança” (Entrevistada H).
Podemos observar que alguns estudantes possuem um entendimento das manifestações
corporais serem um dos conteúdos do lazer, porém não fazem referência a nenhum outro conteúdo, mostrando novamente uma visão assistencialista/funcionalista do lazer.
A quarta questão diz respeito à atuação profissional, as respostas foram bastante variadas,
e apenas um entrevistado diz diretamente que gostaria de atuar na área do lazer:
“O lazer é uma das áreas que eu gostaria de estar trabalhando né, não sei se atuando direta ou
indiretamente, mas de alguma forma estar trabalhando com o lazer. E eu gosto muito da área
de performance, no treinamento, da avaliação, da área esportiva mesmo, são duas áreas que eu
vejo no meu futuro...” (Entrevistada I).
A última questão foi um momento livre para que os estudantes pudessem dizer mais alguma coisa que quisessem ou complementar alguma das respostas dadas, nesse momento nem
todos quiseram dizer algo a mais. Dos entrevistados do primeiro ano do curso apenas um fez mais
comentários.
“Olha, o que existe de lazer hoje acho que é suficiente e isso aí vai ta tudo mudando, o lazer faz
parte da criatividade, não é só você pegar uma coisa marcada e falar eu vou fazer só isso, entendeu? Eu acho que você tem que usar muito a criatividade e saber trabalhar com o que você tem,
porque o que acontece você pode dar lazer em uma comunidade e você não ter os recursos que
tem dentro de um hotel cinco estrelas, dentro de um clube, como em uma comunidade carente,
mas eles também precisam de lazer...” (Entrevistado D).
Podemos ver que o entrevistado D tem uma visão de que o lazer deve ser acessível a todos,
mesmo que o profissional não tenha muitos recursos materiais, ou mesmo a questão do espaço. É
imprescindível que os profissionais do lazer tenham essa visão de lazer que considere os diferentes
grupos sociais, tentando diminuir as barreiras sociais que impedem a vivência do lazer.
Dentre os alunos do último ano, três não quiseram acrescentar nada ao final da entrevistas, dois criticaram a falta de aulas práticas nas disciplinas que abordam o tema lazer. Estas
respostas caracterizam um problema já estudado por alguns autores, que diz respeito à questão da
dicotomia teoria e prática, entre eles encontramos Isayama (2010), que enfatiza a questão entre teoria e prática, onde ocorre uma ênfase à prática e uma menor importância é atribuída às reflexões
filosóficas, políticas, cultural e sociológico, que são fundamentais no processo de atuação profis276
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sional. Isto ocorre numa formação centrada em formar um profissional mais técnico, que domine
conteúdos específicos e metodologias. Frisa ainda que “um sólido referencial teórico possibilita a
compreensão da prática por meio de novos olhares, permitindo a consolidação da práxis” (p. 12),
apontando uma formação centrada no conhecimento, na cultura e na crítica.
Analisando as entrevistas, percebemos que os alunos apontam para a necessidade de aulas
que façam a junção da teoria e da prática, bem como que apontem a relação entre o lazer e as
demais esferas da vida, como trabalho, família, escola, cultura, gênero, faixa etária, entre outros.
É neste sentido que pensamos em uma formação que possa se mostrar interessante para
os alunos, e ao mesmo tempo em que contemple a abrangência do lazer, trazendo à tona sua interdisciplinaridade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De modo geral observamos que a área do lazer ainda é vista de modo restrito pelos estudantes de educação física. Assim, percebemos uma necessidade nos cursos de formação profissional em Educação Física em se ter uma produção teórica que parta do conhecimento dos estudantes e que faça uma mediação de significados de modo a ampliar a compreensão que tais sujeitos
possuem da realidade de vida.
Após análise das entrevistas percebe-se a importância de o profissional formador considerar o conhecimento trazido pelo aluno à universidade, o senso comum, e a partir deste conhecimento que é familiar para o estudante, introduzir um conhecimento sistematizado.
Observamos que a maior dificuldade que os alunos apresentaram se deu na questão em
que deveriam explicar a relação entre o lazer e a educação física, neste momento da entrevista
muitos se mostraram confusos ao formularem as respostas, seja pela dificuldade de expor suas
idéias/conhecimentos, ou pela falta de conhecimento sobre o assunto.
Observamos, também, que apresentaram respostas muito sucintas quando indagados sobre o que é lazer, sendo que nesta questão esperavam-se respostas mais elaboradas pelos alunos
do último ano do curso, fazendo assim, uma diferenciação das respostas dos alunos ingressantes,
estas últimas vindas do senso comum, pelo fato de esses alunos ainda não possuírem um acesso ao
conhecimento sistematizado sobre o lazer.
Além disso, encontramos poucas respostas que exemplificavam o lazer fora do conteúdo
físico-esportivo, a maioria se conteve em relacionar o lazer com atividades esportivas, recreativas,
tudo o que envolvesse movimento corporal, esquecendo-se dos outros conteúdos do lazer, igualmente importantes para a vivência de um lazer repleto de oportunidades e práticas diferenciadas.
Defendemos, assim, que o profissional de educação física tenha acesso ao conhecimento
sistematizado sobre lazer, e que tenha consciência de que o lazer é uma área interdisciplinar, ou
seja, necessitamos de uma atuação efetiva neste campo de profissionais de várias áreas.
Com isso, esperamos ter contribuído para o debate sobre a formação de profissionais de
educação física para atuarem no lazer.
REFERÊNCIAS
GEERTZ, C. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. 4ed. Tradução de Vera
Mello Joscelyne – Petrópolis: Vozes, 2001.
ISAYAMA, H. F. Formação profissional no âmbito do lazer: desafios e perspectivas. In: ________.
(org). Lazer em estudo: currículo e formação profissional. Campinas: Papirus, 2010.
MARCELLINO, N. C. Lazer e Educação – 2ed – Campinas: Papirus, 1990.
________. Lazer e humanização. 7ed. Campinas: Papirus, 2003
Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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________. Lazer e Cultura: algumas aproximações. In: ______. (org). Lazer e Cultura. Campinas: Editora Alínea, 2007.
_______. Subsídios para uma política de lazer: o papel da administração municipal. In: ______.
(org). Políticas Públicas de Lazer. Campinas, SP. Editora Alínea, 2008.
_______. Pedagogia da animação. 10ed. Campinas. Papirus, 2011
MARCELLINO et al. Políticas públicas de lazer formação e desenvolvimento de pessoal: os casos
de Campinas e Piracicaba-SP. Curitiba: Opus, 2007.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução a pesquisa qualitativa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa
em educação. São Paulo: Atlas, 1987.
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“AS PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO LAZER” NO CURSO DA UNEB/
JACOBINA-BA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Fábio Santana Nunes213, Anderson Hangel Souza Franco, Antonio Tínel de Souza, Ariane Melo
Matano, Bruno Vilas Bôas de Lima, Camilla Fernandes Soares, Dyego Rodrigues Costa, Edileuza Matos da
Silva, Erica Alane da Silva, Fernando Silva dos Santos, Igo Matos Batista dos Santos, Igor Sampaio Pinho dos
Santos, Jacqueline Silva Barbosa, Jailton Santos Lopes, Jéssica de Souza Gama Santos, Júlia Mara Barbosa de
Aquino, Leanny Ypsilon da Silva, Lennon de Almeida Cruz, Luan Qessio dos Santos Matos, Lucas Santos de
Matos, Margarete Dias Alencar de Carvalho, Marluce Barros da Silva, Nadiane de Morais França, Nadja
Araújo da Silva, Nadja Luana Barros Cavalcanti Oliveira, Naiara Ribeiro da Silva, Nathanna Sales Pereira
Santos, Quirenia Correia Lages Vieira, Rodolfo Teixeira Rocha, Sirlene da Silva Farias, Weverton Araújo de
Oliveira214
RESUMO: O objetivo deste artigo é socializar uma experiência inovadora que construímos no
componente curricular “As Práticas da Educação Física no Lazer”, durante o semestre 2011.1, no
Curso de Educação Física - Departamento de Ciências Humanas – Campus IV/Jacobina, da Universidade do Estado da Bahia. Optou-se por uma Pesquisa Participante tendo 30 (trinta) acadêmicos do Curso de Educação Física matriculados na disciplina em questão como sujeitos da pesquisa.
Na coleta de dados, para registrar as intervenções nas aulas, utilizou-se Observação Participante
através do Diário de Bordo; e Análise Documental do plano de curso da disciplina e folders dos
seminários temáticos realizados pelos discentes. Relatamos os diversos momentos vividos desde
as primeiras aulas, conteúdos abordados, procedimentos metodológicos adotados, avaliações realizadas e finalizamos com as experimentações ocorridas durante o IV Seminário Avançado sobre
Lazer.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Educação Física. Inovação Pedagógica.
INTRODUÇÃO
Pensar o ensino universitário, em especial, a formação de professores é algo instigante
e nos remete ao desafio: como planejar em 60 horas de um componente curricular que produza
significado, na aprendizagem dos estudantes, de modo que impacte de forma importante na formação como cidadão e profissional do campo Educação Física?
Na aprendizagem significativa, o aprendiz não é um receptor passivo. Longe disso. Ele deve fazer
uso dos significados que já internalizou, de maneira substantiva e não arbitrária, para poder captar os significados dos materiais educativos. Nesse processo, ao mesmo tempo que está progressivamente diferenciando sua estrutura cognitiva, está também fazendo a reconciliação integradora de modo a identificar semelhanças e diferenças e reorganizar seu conhecimento. Quer dizer,
o aprendiz constrói seu conhecimento, produz seu conhecimento (MOREIRA, 2010, p. 05).
As palavras de Moreira se traduziram em nosso cotidiano, pois foi o que buscamos fazer
durante todo tempo pedagógico juntos aos estudantes matriculados no Componente Curricular
“As Práticas da Educação Física no Lazer”.
213 Mestre em Educação – UFBA, Professor Assistente da UNEB – Campus IV/Jacobina. E-mail: [email protected]
214 Todos os coautores são acadêmicos do Curso de Educação Física da UNEB – Campus IV/Jacobina.
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O objetivo deste artigo é socializar uma experiência inovadora que estamos construindo,
no Curso de Educação Física, no Departamento de Ciências Humanas - Campus IV/Jacobina, da
Universidade do Estado da Bahia. Esta experiência acontece em pleno Sertão Baiano, na Região
da Chapada Diamantina.
Optou-se por uma Pesquisa Participante tendo 30 (trinta) acadêmicos do Curso de Educação Física matriculados na disciplina em questão como sujeitos da pesquisa. Na coleta de dados,
para registrar as intervenções nas aulas, utilizou-se Observação Participante através do Diário de
Bordo; e Análise Documental do plano de curso da disciplina e folders dos seminários temáticos
realizados pelos discentes.
CONHECENDO O LAZER: RELATANDO O PERCURSO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
No primeiro dia, realizamos uma introdução à temática, apresentamos o plano de curso,
aproximamos os alunos de alguns termos debatidos na disciplina: tempo livre, tempo disponível, atitude de lazer, entre outros. Todos estes, elementos que ajudam a formular um conceito
mais abrangentes sobre o lazer. Aproximamos os acadêmicos dos estudiosos do lazer, Dumazedir,
Nelson Carvalho Marcellino, Victor Andrade de Melo, Christianne Luce Gomes, entre outros
autores.
Na aula seguinte debatemos o conceito de lazer a partir dos livros de Marcellino (1983);
e Alves Júnior e Melo (2003). Provocamos o debate passando o filme: “Antes de Partir” (The
Duchet List – 2007, EUA). Trazemos a sinopse do filme para ilustrar um pouco a intenção pedagógica:
Você só vive uma vez, portanto, por que não viver com estilo? Essa é a conclusão a que chegam
dois pacientes portadores de câncer internados em um mesmo quarto, um irritável bilionário
(Jack Nicholson) e um simplório mecânico (Morgan Freeman), quando recebem as más notícias. Cada um deles monta uma lista de coisas a serem feitas até o momento derradeiro, e juntos
saem mundo afora para viver a maior aventura de suas vidas. Salto de pára-quedas? Perfeito.
Pilotar um Mustang Shelby em alta velocidade? Feito. Admirar a grande pirâmide de Khufu?
Feito. Descobrir a alegria em suas vidas antes que seja tarde demais? Feito! Sob a competente
direção de Rob Reiner, estes dois astros oferecem interpretações de corpo e alma nesta inspirada
saudação à vida, que prova que o melhor momento para se viver ainda é o agora. (http://interfilmes.com/filme_16877_Antes.de.Partir-(The.Bucket.List).html)
Depois da aproximação aos debates sobre o conceito do lazer, discutimos o percurso histórico do lazer na civilização. Nosso ponto de partida foi o Período Antigo, neste, a Civilização
Grega e a Civilização Romana. Posteriormente, o Período Medieval, depois a Modernidade e
avançamos pelo momento atual, tentando compreender o fenômeno na Contemporaneidade.
Neste caminhar sobre o processo histórico do lazer, fizemos uso dos estudos de Christianne Luce Gomes (2008) tendo como objetivo nos apropriarmos dos sentidos e significados do lazer
nos diferentes tempos históricos. Assim como o esporte, para Silvana Goellner (2004), o lazer,
também, possui uma história e compreendê-la, nos ajuda a entender o tempo presente, que apesar
de distante na cronologia, traz consigo conceitos e preconceitos, formulações teóricas, construções estéticas, políticas e ideológicas do tempo atual.
Compreender os sentidos e significados do lazer no passado nos ajuda a entender o que é
feito dele no tempo presente. Visto, ainda por muitos, como algo proibido aos sujeitos, quase um
pecado. Daí o termo do latim, licere, o que era permitido, também usado, infelizmente, ainda, nas
políticas governamentais de muitas administrações, como alienador social, a mesma política do
pão e circo da Era Romana. Entre outros tantos usos e significados do lazer construídos historica-
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
mente e que são reeditados ou transformados critica ou acriticamente pela civilização.
Em seguida, para trabalhar com o assunto: “conteúdos culturais do lazer”, dividimos a
turma em 6 (seis) grandes grupos, cada um deles, representando um dos conteúdos culturais do
lazer: artístico, intelectual, físico, turístico, social, manual.
Cada equipe deveria apresentar um dos interesses culturais do lazer de forma criativa, vivenciando uma ação de lazer. Esta atividade foi muito interessante, pois fixou, junto aos acadêmicos, que existe lazer para além das práticas corporais, e que o profissional do lazer deve incentivar
a diversificação de práticas relativas aos diferentes interesses culturais do lazer.
Sobre o conteúdo “políticas públicas de lazer”, foi realizada aula expositiva introdutória
sobre o assunto, debatendo conceitos básicos como: o que seriam políticas/políticas públicas, compreendendo o lugar delas dentro do arcabouço legal brasileiro; dentro do cotidiano das gestões
públicas e o impacto na vida de cada cidadão. Levantamos um grande questionamento: “Lazer,
direito social ou mercadoria?”.
Para a aula seguinte, foi indicada a leitura do artigo de Marcellino (2001) com título igual
ao tema estudado “Políticas de Lazer: Mercadores ou educadores? Os cínicos bobos da corte”. E
para aprofundar o debate sobre o texto, propomos o estudo do texto em 6 (seis) grupos, cada grupo
representaria uma função social – Gestores Governamentais; Especialistas do Lazer na área da
Educação Física; Mulheres; Idosos; Jovens; e Pessoas com Deficiência.
Cada grupo elegeria um relator que iria participar do debate ampliado com a turma toda.
As cadeiras da sala em forma de semicírculo com os relatores posicionados na mesa dos professores
– aproximando-se do formato de uma mesa-redonda, cada relator tinha um tempo de 5 (cinco)
minutos de fala. Após as falas de todos, foi aberto a discussão entre a plenária e os próprios debatedores. Percebemos, na atividade, que a maioria das políticas na área de lazer são focalizadas
apenas em um dos seguimentos representados no debate.
Como processo avaliativo do componente curricular, utilizamos 3 (três) instrumentos avaliativos: a) uma avaliação escrita após este primeiro momento da disciplina; b) um artigo construído processualmente durante toda disciplina; c) e por fim e ao cabo, o planejamento e execução
de um seminário temático sobre lazer.
OS SEMINÁRIOS AVANÇADOS SOBRE LAZER
O componente curricular “As Práticas da Educação Física no Lazer” desenvolvido na Universidade do Estado Bahia, Curso de Educação Física, Campus IV/Jacobina, promoveu entre os
meses de agosto e setembro de 2011, o IV Seminário Avançado sobre Lazer.
Todo o planejamento foi participativo. Tínhamos 34 estudantes matriculados, porém frequentando 30. A turma sugeriu algumas temáticas, dividimos a partir das mesmas, 6 (seis) grupos,
e partimos para definição dos dias e da dinâmica do seminário.
Ficou definido, que era parte integrante do evento, e constituía atribuição dos acadêmicos
responsáveis pelo seminário: confecção de folder; estudo, planejamento e exposição teórica e vivências sobre o tema; oferecimento de lanche; e finalização com reflexões sobre as aprendizagens.
O professor ministrante da disciplina ficou com a divulgação geral dos seminários, elaborando cartaz, colocando os mesmos nos murais da própria UNEB e na internet - redes sociais;
e-mails dos acadêmicos e professores do curso; e na página da UNEB.
Cada grupo deveria organizar, com antecedência, um folder da temática do seu seminário,
para ser distribuído com a turma e divulgado na universidade em alguns lugares estratégicos –
mural do curso de Educação Física, sala dos professores e Colegiado de Educação Física.
Comentaremos a seguir como transcorreu cada seminário, apresentando alguns fatos marcantes, falas dos sujeitos envolvidos e a dinâmica vivida em cada dia.
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SEMINÁRIO 1 - “PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, MAS SEM LAZER: REALIDADE E POSSIBILIDADE”
No dia 09 de agosto, abordou-se a temática: “Pessoas com Deficiência, mas sem lazer:
realidade e possibilidade.” Optou-se por realizar o trabalho tendo como público alvo, estudantes
da APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais. O objetivo foi promover reflexões e
vivências acerca do lazer para pessoas com deficiências. Iniciou-se a explanação teórica na própria
UNEB com posterior deslocamento para a APAE. Foram realizadas diversas atividade: Dinâmica
de Apresentação (Lá vai à bola), Petboliche, Gingue a Ginga(Capoeira), Vôlei Sentado, Basquete,
Dance com o Mestre, Relaxamento. Ao final fizemos um grande círculo, professor e estudantes
de Educação Física; e alunos e professores da APAE. Percebeu-se na fala e fisionomias de diversos
alunos a satisfação – falas como: “Amei” e “Adorei” sugiram de alguns, e por parte dos acadêmicos, percebeu-se a importância de estarmos ali, de experienciar o lazer com aqueles sujeitos.
Pode-se inferir através deste relato, que de forma significativa à aprendizagem dos acadêmicos foi
marcada. É essencial termos em nossa sociedade pessoas com deficiência, no entanto com lazer.
SEMINÁRIO 2 - “LAZER E TERCEIRA IDADE: ENTRE O TEMPO LIVRE DO TRABALHO E
AS OBRIGAÇÕES DOMÉSTICAS, ONDE ESTÁ O LAZER,‘O GATO COMEU?’ ”
No dia 16 de agosto, abordou-se a temática: “lazer e terceira idade, entre o tempo livre do
trabalho e as obrigações domésticas, onde está o lazer, ‘o gato comeu?’ ”. Decidiu-se por convidar
a UATI – Universidade Aberta a Terceira Idade. Foram entregues convites, também, no Centro
de Convivência do Idoso e no Centro de Referencia em Assistência Social - CRAS, possuidores
de grupos de idosos. O objetivo do seminário foi proporcionar aos idosos uma manhã de atividades de lazer, com intuito de estimular a interação social e compartilhar experiências de lazer
estimulando vínculos afetivos. O evento ocorreu no Auditório da UNEB, iniciou-se a explanação
teórica, seguida de uma peça teatral retratando o cotidiano da vida de idosos em diferentes formas
de envelhecimento - com mais ou menos qualidade de vida, lazer, mobilidade, entre outros aspectos. Foram realizadas diversas oficinas: Dinâmica de apresentação (jogo do barbante); Dança com
músicas dos anos setenta, boleros, marchinhas de carnavais, forrós; Massagem Relaxante; Jogos
de Salão; Jogos recreativos. Finalizamos com algumas palavras dita por uma das convidadas no
encerramento das atividades: “E quem não quiser envelhecer?... Que morra!”
SEMINÁRIO 3 – “POLÍTICAS PÚBLICAS DE LAZER EM JACOBINA: DEBATES, EXPERIÊNCIAS VIVIDAS E NÃO VIVIDAS”
No dia 23 de agosto, abordou-se a temática: “Políticas Públicas de Lazer em Jacobina:
debates, experiências vividas e não vividas”. O objetivo foi proporcionar, aos alunos da escola convidada, uma vivência prática de lazer, com intuito de estimular a interação social e compartilhar
experiências de lazer promovendo vínculos afetivos e cooperativos. E mostrar a realidade, possibilidades e experiências do lazer na cidade de Jacobina. Iniciou-se a Rua de Lazer com vários jogos:
Jogo da velha com bolinha; Acerte o alvo; Circuito com obstáculos; Pega-pega; Mamãe da rua; e
Cabo de guerra. E no final da manhã, foi realizada uma palestra sobre Políticas Públicas de Lazer,
com a participação do Prof. Ms. Urbano Félix Pugliese do curso de Direito UNEB/Campus IV.
SEMINÁRIO 4 - “JOGOS TRADICIONAIS E LAZER URBANO: DESAFIOS E PERSPECTIVAS”
No dia 06 de setembro, abordou-se a temática: “Jogos Tradicionais e Lazer Urbano: desa-
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fios e perspectivas. O objetivo foi promover conhecimento sobre jogos tradicionais promovendo
debates e questionamentos acerca do conteúdo sobre lazer, objetivando demonstrar a importância
desses jogos para todos. Iniciou-se no Estádio Municipal de Futebol local da realização das vivências do Festival de Jogos Tradicionais: pipa, gude, pião, pega-pega, travinha/golzinho, participaram
estudantes do 4 ano do ensino fundamental de uma escola próxima a UNEB, por fim nos deslocamos à UNEB para explanação teórica. Foi um momento de muita nostalgia quando a equipe
apresentou um vídeo mostrando diversos brinquedos e brincadeiras da infância.
SEMINÁRIO 5 - “LAZER E ESPORTES RADICAIS: CAMINHOS A PERCORRER PELA EDUCAÇÃO FÍSICA DENTRO E FORA DA ESCOLA”
No dia 20 de setembro, abordou-se a temática: “Lazer e esportes radicais: caminhos a
percorrer pela educação física dentro e fora da escola.” O objetivo foi proporcionar uma manhã
agradável, com várias vivências de esportes radicais e de aventura, com suas possibilidades de
inserção nas aulas de educação física escolar. Iniciou-se a explanação teórica na própria UNEB
com posterior deslocamento para o CTAC – Centro de Treinamento dos Aranhas da Chapada,
um sítio nas imediações da cidade de Jacobina à10 Km de distância da UNEB. O local oferece
paredão para decida de rapel, tirolesa, espaço para escalada, arborismo (ainda em construção),
pista progressiva com obstáculos verticais e horizontais. Colocamos em prática, a pista progressiva,
dividindo a turma em 4 grupos de 5 pessoas, um dos grupos era o dos coordenadores do seminário, um grupo, por vez, realizava o trajeto e era tomado o tempo de realização da tarefa. Vencia a
equipe que obtinha a menor duração da atividade.
SEMINÁRIO 6 - “PLANEJAMENTO E AÇÕES DO PROFISSIONAL DE LAZER EM ACAMPAMENTOS DE FÉRIAS”
Nos dias 26 e 27 de setembro, abordou-se a temática: “Planejamento e ações do Profissional de Lazer em Acampamentos de Férias”. Acampamento é uma atividade ao ar livre em
convívio com a natureza, cujo principal objetivo é o desenvolvimento integral do ser humano e a
educação ambiental visando à preservação do meio ambiente. A saída da UNEB ocorreu, no final
da tarde do dia 26, com destino ao Acampamento Sol Nascente, localizado na Fazenda Mucambo, 20 minutos da cidade de Jacobina. Na chegada, fizemos reconhecimento do local, dividimos
grupos para realização de tarefas, organizamos a fogueira e o café da noite, armamos as barracas
de camping, cantamos e tocamos violão ao redor da fogueira e no dia seguinte realizamos voleibol
e bilhar. Além de, no final, ter ocorrido uma explicação teórica sobre o tema do seminário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Voltando ao questionamento colocado, na introdução do nosso artigo: como planejar em
60 horas de um componente curricular que produza significado, na aprendizagem dos estudantes,
de modo que impacte de forma importante sua formação como cidadão e profissional do campo da
Educação Física. A resposta já está na própria pergunta, com planejamento! Ações pedagógicas
realizadas de forma intencional.
Pelo exposto nas páginas anteriores, acreditamos que a socialização desta experiência de
ensino-aprendizagem é um primeiro passo na produção de conhecimentos vindos das vivências,
na busca constante de aprendizagens significativas aos acadêmicos, os nosso novos estudiosos do
lazer.
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REFERÊNCIAS
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NOVOS TEMPOS, NOVOS LAZERES
Rita de Cássia Giraldi215
RESUMO: O presente artigo refere-se a uma nova abordagem temporal para os lazeres, ou seja, o
tempo pontuado. Numa sociedade pós-moderna, continuar a analisar a prática dos lazeres tendo
como parâmetro o tempo linear e dentro deste o tempo livre, leva-nos a incidir em erros devido à
exclusão de diversas práticas de lazer surgidas nos últimos tempos em decorrência aos avanços da
tecnologia informacional. Deste modo, torna-se necessário repensar a abordagem a que estamos
acostumados nos últimos tempos, ou seja, uma vida regida pelo tempo linear e dentro deste o
tempo livre dedicado aos lazeres, para adotar o tempo pontuado como elemento básico de análise
do lazer numa sociedade informacional e globalizada.
PALAVRAS CHAVE: Tempo Livre. Tempo Pontuado. Lazeres na Pós-Modernidade.
INTRODUÇÃO
Dentro da dinâmica atual dos ritmos cotidianos de vida urbana, uma questão se faz presente: Como analisar o lazer nos dias atuais frente às novas organizações temporais do cotidiano?
Para tanto, o presente artigo busca, através de uma reflexão teórica, abordar uma nova
concepção do tempo que se apresenta na sociedade pós-moderna, ou seja, o tempo pontuado e,
como este reflete na prática dos lazeres de forma diferenciada das anteriormente praticadas.
Assim, tomando como parâmetro as discussões de Debord (2003) sobre a “sociedade do
espetáculo” e Baudrillard (2007) sobre a “sociedade do consumo e o simulacro”, a abordagem desta ótica temporal encontra significado para compreensão do lazer na atualidade e numa sociedade
informacional e globalizada.
OS NOVOS TEMPOS
O lazer é já de muito tempo, considerado como um fenômeno que surge a partir da Revolução Industrial onde uma jornada de trabalho imposta pelo sistema produtivo fazia emergir a
necessidade de um tempo disponível desta, mas que não deveria ser só dedicado as necessidade
fisiológicas e sim para as atividades com um ‘fim-em-si-mesmo’. Este fenômeno foi conquistado
através de diversas manifestações sociais e desde então tem crescido gradativamente.
No entanto, o lazer tal qual entendemos hoje é fruto da sociedade urbana e industrial que
possui suas raízes juntamente com o avanço técnico da industrialização e conquistas trabalhistas,
sendo teoricamente entendido como as atividades praticadas fora do tempo de subsistência (sejam
as fisiológicas ou as de trabalho) e às quais podemos nos dedicar a atividades elegidas pelo livre
arbítrio e que atendam a interesses pessoais.
Para compreendermos a atual eleição de tempo pontuado para os lazeres, substituindo
em algumas ocasiões o tempo livre, precisamos primeiramente entender o tempo e seus diversos
significados.
215 Arquiteta, Livre Docente da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil.
Professora Doutora do curso de Lazer e Turismo. Pesquisadora na área de espaços e equipamentos de lazer.
Email contato: [email protected]
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O tempo é um fenômeno de extrema importância em nossa vida, chamando nossa atenção, principalmente por ser enigmático. Isto porque nossa vida é temporal, na medida em que ela
se faz de tempo e nele flui. O passado perdura no presente virtualmente e, este pertence à antecipação do futuro. Considerando que viver consiste em dispor de uma limitada reserva de tempo e,
ainda, que sua marcha diminui essa reserva, somos obrigados a reconhecer que a vida, enquanto
processo ‘é ir vivendo e gastar esse tempo’ (BACAL, 2003, p. 16).
A vida decorre em uma sequência de tempo mensurável, considerado sob a perspectiva
objetiva e contado mediante a marcação dos relógios. Existem diversas concepções do tempo que
dependem diretamente da abordagem adotada para sua análise e assim o tempo foi adjetivado:
biológico, fisiológico, psicológico, histórico, matemático, filosófico, etc.
No entanto, a quantificação e medição do tempo, no decorrer de nosso cotidiano assume
uma posição de valor enquanto o tempo em si, ou seja, ele pode significar um bem, sendo seu uso
um objeto de transação e comprovação de prestígio e status. Porém, a percepção do tempo e sua
medição são apenas mais um produto da história humana, pois o tempo não é um processo real,
uma sucessão efetiva que se limita a registrar. Ele nasce da relação que o homem estabelece com
as coisas e nessas mesmas coisas, o futuro e o passado estão em uma espécie de pré-existência e de
sobrevivência eterna. Sob essa ótica, todos os fenômenos sociais ocorrem em algum momento no
tempo e podemos dizer que vida social é vivida no tempo.
Desse modo, a própria experiência do tempo e a ideia de tempo derivam da natureza mutante da realidade e dos fenômenos, tendo em vista que os últimos são adjetivados de acordo com
o quadro temporal que aplicamos e que são irreversíveis. Tal fato é compreendido através da ideia
metafórica de um fluxo de tempo em que sua irreversibilidade implica a distinção entre passado,
presente e futuro, porém não de forma clara uma vez que os processos sociais são contínuos.
A noção de tempo só adquire significado quando os ‘homens’, num determinado estágios
de evolução, conseguiram aprender como tratar os acontecimentos e refletir sobre os mesmos
com a ajuda de instrumentos. A percepção e a consciência do tempo são experiências humanas
universais, porém existem diferentes categorias de tempo (cíclico, sócio-psicológico, físico, linear,
entre outros).
Na filosofia, o tempo é considerado uma medida de movimento (ELIAS, 1998, p. 59 –
segs), algumas partes deste tempo são passadas, outras são futuras, porém nenhuma existe e, no
entanto o tempo é divisível ou, sendo considerado um dado a priori, “o tempo é um conceito empírico derivado de experiência alguma, porque a simultaneidade ou a sucessão não seriam percebidas se a
representação ‘a priori’ do tempo não lhes servisse de fundamento. (KANT, s/d, p. 50).
Seja como medida externa ou sentimento interno a nós, para a esfera dos lazeres, pode-se dizer que o tempo é a forma do sentido interno, isto é, da intuição de nós mesmos e de nosso
estado interior. Ele não pode ser determinação alguma dos fenômenos externos por não pertencer
nem a uma figura, nem a uma posição, pois ele determina a relação das representações em nossos
estados internos. Tal afirmação se pauta no fato de que as opções por determinadas práticas exercidas no tempo livre devem seu uso aos nossos graus de liberdade.
Assim, o tempo tem um valor objetivo somente em relação aos fenômenos, porque eles são
coisas que consideramos como objetos de nossos sentidos. O tempo é qualquer coisa real e é, com
efeito, a forma real da intuição interna, mas ele não é objeto real, pois sua percepção está sempre
atrelada a elementos externos a ele.
Mas ao mesmo tempo em que o tempo possui correlação direta com os fenômenos, ele
também é percebido como “duração contínua” (BERGSON, 2006), uma sucessão pura e simples,
mas não uma adição, isto é, uma sucessão que resulte em uma soma. O denominado tempo subjetivo expressa essa concepção, uma vez que é sentido por cada indivíduo e depende das sensações e
sentimentos e está dissociado do tempo linear (do relógio), sendo chamado também, por Bergson,
“duração subjetiva”. É o tempo percebido pela consciência, e sua duração é antes mensurada pela
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vivência de determinados eventos. Sua importância para os lazeres recai na percepção de duração
de uma atividade elegida por nosso livre arbítrio.
No entanto, o homem é um ser social e o tempo vivido cada dia, por todos nós e por cada
um de nós, no âmago dos grupos e das sociedades às quais pertencemos, é denominado tempo
social. Sociologicamente, o tempo também foi alvo de estudos, principalmente para sua compreensão frente aos fenômenos e sua influência nos comportamentos e na cultura e, sendo os lazeres
um comportamento socialmente aceito, o tempo social adquire seu significado.
Porém, vivemos no tempo e somos submetidos às suas regras, apesar de ele ser igualitariamente distribuído e desigualmente gasto, devido, principalmente, a fatores socioeconômicos e a
fatores psicológicos ou idiossincrasias 216.
Podemos afirmar que os limites do tempo diário são universais e passíveis de mensuração
ao longo de uma única dimensão; o tempo é a medida natural da vida e por isso delimita a vida
cotidiana de uma sociedade, possibilitando que avaliemos a distância entre seus valores vigentes e
a realidade vivencial, como também, que identifiquemos os beneficiários e as vítimas dessa valoração. Seria como se Cronos (GUIMARÃES, 1995, p. 116) ainda estivesse presente nos dias de hoje.
Mas, no século XXI, o tempo é comparável a bens preciosos, como em épocas passadas o
foram outros elementos, mas não o tempo.
Constantemente medido e valorado, o tempo enquanto matéria prima vital fomenta o
crescimento de economias baseadas em terabytes e gigabytes por segundo.
Às categorias temporais antes mencionadas podemos acrescentar mais uma: o tempo pontilhista (MAFESSOLI, 2003) ou também denominado tempo pontuado (NICOLE AUBERT apud
BAUMAN, 2008, p. 50). Sendo categorias temporais existentes na sociedade pós-moderna, sua
importância está diretamente relacionada a um ritmo de vida marcado pela agilidade dos sistemas
informacionais e pela sociedade de consumo. Ambos, o tempo pontilhista e o tempo pontuado, são
utilizados quase como sinônimos, pois significam a ruptura e descontinuidade da percepção temporal pelo homem através do conteúdo específico destes pontos de tempo e, hoje, se atentarmos
para nosso cotidiano, perceberemos que há um aumento sucessivo de eventos comprimidos em um
determinado intervalo de tempo.
O tempo pontilhista e o tempo pontuado são percebidos pelo Homem através da multiplicidade de instantes “eternos” vividos através de eventos, incidentes, acidentes, aventuras etc. e cada
um de nós o configura de modo particular, atribuindo-lhe significados diversos. Deste modo, os
pontos são considerados fragmentos de tempo, nos quais marcamos nossas memórias pelos fatos
nele ocorridos. É o que Bauman (op. cit., p. 50) denomina de “vida agorista”. Tal imediatismo no
viver encontra consonância em uma tecnologia cada vez mais ágil e que impregna todas as esferas
do nosso viver.
A percepção de que o tempo gasto em uma atividade possa produzir um maior retorno de
satisfação, se usado em outras atividades é o que torna passível sua valoração.
Em um mundo altamente tecnologicizado, a cada dia percebemos novos tipos de marcadores de tempo com precisões cada vez mais infinitesimais. Mas, como afirma ATTALI “cada vez
que aparece um novo instrumento de leitura do tempo, segue-se uma ruptura da ordem da sociedade”.217
OS NOVOS LAZERES
Inegavelmente o trabalho consome a maior parcela de tempo de nossas vidas. Ele se coloca
em uma posição de destaque porque é através dele que é possível desenvolver atividades para ad216 São entendidas como a disposição do temperamento do indivíduo, que o faz reagir de maneira muito particular e pessoal
à ação dos agentes externos, manifestos nas maneiras de ver, sentir, reagir de cada um de nós.
217 ATTALI, Jacques. Entrevista a Gilles Lapouge in O personagem da semana. O Estado de São Paulo, 10/04/1983,ano III, nº
148, p.8.
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quirir meios de sobrevivência, somam-se a isso os resquícios da ética protestante em que ‘trabalhar
é digno, é moral’. É sob a égide desses valores que gerações anteriores foram criadas; no entanto,
percebemos que se está delineando uma inversão nessa situação devido a alguns fatores tais como:
o trabalho já não satisfaz as necessidades interiores dos indivíduos; há uma transformação nas tarefas laborais, onde o indivíduo é hoje um anônimo e executa parte do processo total; a tecnologia
ajudou na modificação das tarefas laborais exercidas, mas as despersonificou e a introdução da
tecnologia informacional na esfera laboral agravou o ritmo das tarefas que hoje em dia se dão em
frações cada vez menores de tempo.
A presença da máquina na vida humana alterou o campo econômico uma vez que coletivizou a produção, o psicológico através da realização de um trabalho impessoal e o social, transferindo as relações familiares para as relações do local de trabalho. Também alterou as condições de
vida, uma vez que a relação espaço, consumo e alimentação foram dissociados. Dentro do sistema
capitalista, a maquinária não é considerada serva da humanidade, mas sim, instrumento daqueles
a quem a acumulação de capital proporciona a propriedade das máquinas. Esse fato destitui o
trabalhador do controle de seu próprio trabalho porque este passa a ignorar a história pessoal do
homem. Atualmente, há uma inversão entre a carga física do trabalho para uma carga mental no
trabalho, afetando as variáveis referentes ao comportamento, caráter, motivação etc.
Nesse contexto, vemos surgir, o ‘Homem-de-após-trabalho’, fruto de diversas reivindicações que resultaram na redução e limites da jornada de trabalho, no descanso remunerado, na
segurança e no vínculo empregatício, frutos da 1ª e 2ª Revolução Industrial. No caso da 3ª Revolução Industrial – a revolução informacional, o homem depara-se com o dilema de não ter mais
tempo para si e para seus lazeres e, portanto, necessita viver as pequenas parcelas de tempo pontuado em sua plenitude, porém isto não invalida a ideia do tempo livre.
Após sessenta anos de profícuos estudos na área dos lazeres218, a atividade é uma realidade
social e, cada vez mais profissionais preparados atuam no sentido de compreendê-lo para colaborar
que o homem pós-moderno possa melhor usufruir seus lazeres dentro de um padrão considerado
optimum. Mas a discussão acerca do fenômeno nunca conseguiu atingir um consenso conceitual,
principalmente quanto ao significado do termo e nem tão pouco ao que ele encerra. Sem dúvida,
existem elementos permanentes na atividade de lazer e intrínsecos a ela, pautados principalmente
pelos diferentes contextos sociais em que se inserem e configurando-se indispensáveis à realidade
efetiva do fenômeno. Porém, apesar dos esforços para uma clarificação conceitual, o termo lazer
continua impregnado por elementos subjetivos o que dificulta a apreensão científica do fenômeno.
Em sua essência, a palavra lazer traz a ideia de afrouxamento de diferentes formas de restrições ou de dependências, liberação de imposições externas, de repressão ou censura, mas esses
aspectos possuem um cunho subjetivo e para uma real compreensão torna-se necessário encontrar
elementos objetivos, por isso a importância da dimensão temporal.
Dentre as teorias do lazer, podemos destacar dois estudos, os realizados por Dumazedier
(1976) e Baudrillard (2007). A menção a essas duas teorias não pretende relegar a planos inferiores
as demais, mas sua adoção justifica-se pelo fato de que Dumazedier, se empenhou, através de estudos empíricos, em estabelecer a compreensão do fenômeno, chegando a uma conceituação onde
o contexto predominante era a industrialização que estava presente como o eixo fundamental da
vida humana. Quase vinte anos após os estudos de Dumazedier, Baudrillard procurou compreender o fenômeno em uma sociedade de consumo, ressaltando que o tempo livre também seria
passível de ser considerado um valor de troca e não mais de uso como a teoria anterior afirmava.
218 Dentre os precursores dos estudos na área podemos mencionar PARKER (1978) e DUMAZEDIER (1976, 1979, 1980,
1994), cujos estudos, assim como os realizados pelos sociólogos do trabalho FRIEDMAN e NAVILLE (1973) procuravam
conhecer como se realizavam as atividades de tempo livre e seus reflexos na dicotomia trabalho/lazer. A trajetória dos
estudiosos em lazer pode ser encontrada no estudo detalhado realizado por GOMES (2004)
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
Para Dumazedier (1976, p. 34), dentro de uma visão funcionalista, o lazer é parte da vida
social e individual, em que a caracterização e as modalidades de expressão são principalmente definidas e determinadas por variáveis culturais e psicológicas. Entretanto, existem variáveis estruturais que condicionam certas formas de expressão de lazer, mas que não são consideradas como
determinantes ou explicativas. Nesse caso, assume-se uma ruptura entre o ‘tempo imposto’ pelas
obrigações produtivas e sociais e o ‘tempo livre’ para a satisfação íntima dos interesses pessoais.
Por outro lado, Jean Baudrillard (2007, p. 160 - segs), que faz uma crítica ao uso do tempo
livre para os lazeres, condenando seu uso para tal finalidade, iguala o tempo a uma mercadoria que
pode ser vendida ou comprada. Tal posição reflete o uso das quantidades de tempo e as diversas
práticas de atividades realizadas por indivíduos de diferentes estratos ocupacionais e por diversos
grupos, revelando as diferenças conjunturais existentes na sociedade. Sob esse ponto de vista,
o tempo livre que pode ser alocado para atividades discricionais está ‘amarrado’ ao tempo de
trabalho que determina o volume e até seu conteúdo, ou seja, existem variáveis estruturais que
condicionam as formas de ser dos lazeres enquanto característica e modalidade de expressão de
uma determinada sociedade, tais características demonstram forte influencia dos elementos estruturais advindos da organização econômica e produtiva dentro do contexto de uma sociedade
global (LANFANT, 1972).
Sob a ótica de Baudrillard não haveria ruptura entre tempo ‘compulsório’ e tempo ‘livre’,
pois fazendo parte de um mesmo bem e de uma mesma organização econômica e produtiva, seus
conteúdos são determinados distintamente. É nesse contexto que o tempo pontilhado ou pontilhista
encontra seu significado, levando o homem a praticar o que podemos denominar de lazer ‘hedonístico’ em que, através de fragmentos de tempo pulverizados ao longo de suas 24 horas, ele busca
atividades que lhe proporcione prazer, principalmente em um cenário consumista. Tal proposição
resgata, em parte, a teoria de Thorstein Veblen (1965) para quem o consumo improdutivo do
tempo, ou seja, um tempo sem valor econômico em relação ao trabalho produtivo é a base fundamental da acumulação do capital e a manifestação do ‘ócio conspícuo’219 pelo consumo de bens
supérfluos.
Assim, na sociedade pós-moderna220, o lazer assume uma conotação de prestígio social
e de superioridade dos que o praticam, significando que o lazer seria valorizado e motivado pelo
status gerado pela exibição de consumir um tempo improdutivo. Na sociedade informacional e
do trabalho, cujo progresso está fundamentado também na acumulação de bens, a apropriação
do tempo pontuado associado ao tempo de consumo significa uma necessidade de integração dos
praticantes na classe dominante.
E O FUTURO?
Após 1990, com o processo de globalização e de mundialização, as teorias desenvolvidas
até então para compreensão do fenômeno dos lazeres já não bastam. Isso porque devido à velocidade da informação, o consumo, as relações efêmeras, as reformulações do tempo e do espaço e,
principalmente, a mundialização da cultura e minimização do indivíduo, trazem consigo novas
formas dos usos do tempo para os lazeres.
Além do consumo, outro aspecto que modificou em muito as práticas dos lazeres foi a utilização da comunicação informacional para o entretenimento221, modalidade que penetrou a vida
219 O ócio conspícuo é entendido como sendo o uso do tempo para demonstrar que quem o pratica pertence a uma classe
privilegiada na qual, além de praticar atividades que significam gastos diretos e valores econômicos, o indivíduo também
gasta seu tempo, sem que haja retorno em bens econômicos, mas sim em status e prestígio entre os pares.
220 Apesar da grande discussão acerca do significado da pós-modernidade, adotamos como parâmetro para tal a sociedade
marcada por mudanças advindas da globalização e do desenvolvimento da tecnologia virtual.
221 Devemos diferenciar entretenimento de lazer uma vez que para o primeiro três variáveis são elementares para sua prática,
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humana, nas esferas tanto do público como do privado. Essa prática é denominada lazer virtual.
Elemento característico de uma sociedade pós-moderna, a virtualidade se faz presente
transformando nossos modos de viver, de nos relacionarmos e até mesmo de percebermos o mundo.
Ao falarmos de lazer virtual, encontramos maior consonância nos ditames de Baudrillard
(1991) onde os simulacros imperam. Para ele, a caracterização e modalidade de expressão de lazer
numa determinada sociedade e desse modo, “o tempo dos lazeres, como tempo de consumo em geral,
torna-se o tempo social forte e marcado, produtivo de valor, dimensão não de sobrevivência econômica,
mas de salvação social” (BAUDRILLARD, 1973, p. 77). Assim, é no mundo do simulacro que o
real e o virtual se fundem, principalmente nos lazeres.
Falar de virtualidade nos remete à tecnologia e a um mundo de fronteiras móveis. Isso
porque, tal tecnologia conecta a todos em um fluxo contínuo de informações e relacionamentos
pessoais de modo mutante. Os avanços que estão na raiz dessa transformação são de um tipo que
raramente se vê, mas afeta diretamente o modo como a sociedade se organiza e a transformação
é ainda mais penetrante, pois opera em todos os níveis da vida em sociedade, ou seja: em casa, no
trabalho, nos relacionamentos, na educação e nos divertimentos.
A simultaneidade tornou-se presente em nossa vida e a rede informacional impôs novos
ritmos a esta.
Marcado pelo “tempo pontilhado”, o lazer até então entendido como atividade de livre
arbítrio, perde sua essência em um cotidiano repleto de apelos e cedendo espaço para o lazer de
consumo entendido como um reflexo da sociedade consumista e imediatista onde o “ócio conspícuo” reaparece neste “tempo pontilhado” e ao lazer virtual como fruto da sociedade tecnicista e
individualista. Assim o lazer passa a ser mediado pela tecnologia dos sistemas informacionais e
possibilita o que J.Baudrillard (1991) denomina de “simulacro” numa “sociedade do espetáculo”
(Debord, 2003).
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
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SER MOCHILEIRO: IMPLICAÇÕES PARA A CONSTITUIÇÃO DESTE INDIVÍDUO
NA SOCIEDADE CONTEMPORANEA
Denise Falcão222
RESUMO: Este trabalho se propõe a apresentar uma reflexão teórica constituinte de uma pesquisa em desenvolvimento no mestrado em Lazer da UFMG. Esta pesquisa faz um mergulho no
universo do turismo de mochila e busca compreender os sentidos e significados construídos pelos
mochileiros nas e pelas suas práticas de lazer, diante de uma sociedade contemporânea, capitalista, que tenta impingir modos hegemônicos de vivenciar viagens turísticas. Nesta apresentação,
adentro o campo de estudos da antropologia das sociedades complexas trazendo a tona elementos
que apontam a intrínseca relação indivíduo-sociedade gerada na tensão de uma experiência que
tanto escapa ao imperialismo da obrigação coletiva como ao relativismo da liberdade individual
na constituição do ser mochileiro.
PALAVRAS CHAVE: Mochileiros. Antropologia. Lazer.
Esta pesquisa procura estabelecer parâmetros para a compreensão das possíveis formas de
constituição da noção de indivíduo aplicadas aos praticantes do turismo de mochila – os mochileiros ou backpackers.
Uma primeira apresentação desse grupo se faz necessária. São denominados mochileiros
as pessoas que viajam de forma independente, flexível e econômica, por períodos longos, que
enfatizam o encontro com outras pessoas (do local ou estrangeira) e que buscam conhecer vários
destinos (Pearce e Locker-Murphy, 1995). Ser mochileiro requer compartilhar de alguns valores
que identificam este grupo. Segundo Giaretta (2003), os mochileiros são dotados de um espírito
aventureiro e buscam sempre novos desafios, procuram conhecer de fato o lugar que escolhem,
bem como a cultura local. Eles respeitam o meio ambiente, consomem coisas do lugar, aceitam
a hospedagem rústica sem mudar os hábitos do morador e são abertos a novos relacionamentos.
Esses aspectos descritivos circunscrevem os mochileiros num perfil recorrente entre os estudiosos.
Porém, o sentimento de pertencimento a este grupo situa-se no nível pessoal e subjetivo, impossibilitando assim que outra pessoa categorize e/ou identifique o mochileiro como tal. Somente o
próprio indivíduo pode auto denominar-se mochileiro. Assim, passo a utilizar essas características
como eixo norteador para a discussão da intrínseca relação existente entre o individual e o social
neste trabalho.
O homem é mutável e mutante. Não é mais possível aceitar a visão de homem na perspectiva iluminista pressupondo um mundo estático, um mundo ordenado, onde as leis que regem
a natureza são invariantes, portanto deixando o mundo previsível. Acreditar que a natureza do
homem é constante significa concebê-lo independente de tempo, lugar e circunstância. Tratar os
costumes dos lugares que pertence como meros adereços da constituição de homem, certamente
acarretam uma ilusão, um erro. A perspectiva de homem, hoje, que vive numa sociedade contemporânea capitalista é bem mais complexa e corroborando com Geertz, “a humanidade é tão
variada em sua existência como em sua expressão” (1978, p.49).
Para compreender o sujeito é preciso não perder de vista sua relação com a sociedade. O
homem atinge o “ser humano” não no nascimento, mas através das relações sociais. Nasce homem
222 Mestranda do Programa Interdisciplinar em Lazer da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), bolsista da CAPES
– contato: [email protected]
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em se tratando da espécie, mas se humaniza ao apropriar-se das características ontológicas externas ao seu corpo biológico, porém inseridas na cultura e dotadas de um processo histórico. Nas
palavras de Geertz:
Tornar-se humano é tornar-se individual, e nós nos tornamos individuais sob a direção dos
padrões culturais, sistemas de significados criados historicamente em termos dos quais damos
forma, ordem, objetivo e direção às nossas vidas. Os padrões culturais envolvidos não são gerais,
mas específicos (1978, p.64).
Para colocar em foco esta relativização indivíduo-sociedade, utilizo como arcabouço teórico o pensamento de Mauss. Este autor nos coloca frente às ideias de que as relações sociais não
se formam apenas a partir da liberdade individual, mas também mediante uma força coercitiva
coletiva que se impõe às vontades individuais. Nos estudos sobre a dádiva, Mauss preconiza que
as relações sociais se edificam a partir de uma experiência que tanto escapa ao imperialismo da
obrigação coletiva (as normas e valores interiorizados e as repressões psicológicas) como ao relativismo da liberdade individual (a capacidade de cada indivíduo escolher arbitrariamente o que lhe
é mais útil e interessante, seguindo sua própria preferência independentemente dos demais), então
estamos admitindo que obrigação e liberdade são elementos de um paradoxo. Ou seja, não se trata
de colocar um dilema – ou isso ou aquilo: obrigação ou liberdade, interesse ou desinteresse –, mas
de admitir que tais opostos não são contraditórios, sendo apenas expressões polares da realidade
social complexa. Mas em que medida o indivíduo é influenciado a pertencer a um determinado
grupo e não a outro? O que leva os mochileiros a se constituírem como tal?
Nos contornos da “modernidade tardia” (Guiddens, 1997) tem-se uma nova ordem social
diretamente ligada “ao seu dinamismo, ao grau de erosão dos hábitos e costumes tradicionais e
ao seu impacte global” (1997, p.1). Isto nos leva a uma transmutação da vida individual, pois é
crescente a interligação entre os dois pólos introduzidos pela modernidade: extensividade e intensividade, relativizando as influências globalizadoras com as tendências pessoais. Guiddens pontua
como podemos observar:
...a emergência de novos mecanismos de auto-identidade que são moldados (ainda que também
as moldem) pelas instituições da modernidade. O self não é uma entidade passiva, determinada
por influências externa; ao forjarem as suas auto-identidade, e independentemente do caráter
reduzido dos seus contextos de ação específicos, os indivíduos contribuem para, e promovem
diretamente, influências sociais com consequências e implicações globais.
Nesse contexto, o self, o indivíduo, deve ser construído reflexivamente, o que torna uma
árdua tarefa já que ela deve ser cumprida mediante uma inumerável diversidade de opções e possibilidades.
Neste sentido, temos a invariante figura do homem necessitado, movido pela escassez.
Um ser imperfeito com desejos que sempre ultrapassam seus poderes. Sahlins (2004, p.563) nos
aponta “que a vida se resume à busca da satisfação” idéia esta ainda muito presente nos dias de
hoje, só que seu fundamento está no entendimento da necessidade “do alívio de nosso sofrimento”
(2004:563). Uma sociedade que afirma o tropo como a busca da felicidade já afirma que nascemos
e somos infelizes. A origem desta infelicidade segundo Paul Ricoeur (1967) pode ser lida com a
queda do paraíso. Este mito da gênesis do ser humano e sua consequente expulsão do paraíso por
violar uma “advertência Divina” já nos colocam diante um ser em contato com seu próprio desejo.
Ao não suportar a restrição do conhecimento apenas do bem e desejar conhecer também o mal, se
igualando assim ao conhecimento divino (do bem e do mal), este homem passa a ter em si o pecado original, perde o paraíso onde vivia sem tensões e passa a ter necessidades. “Punível tornou-se
a vida humana e hostil o mundo”(Sahlins 2004:565). Então, temos um homem que passa a ter a
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necessidade como princípio e a escassez pontua o eterno sofrimento da não satisfação da necessidade, ou seja, a falta. Ficamos diante então, do que Sahlins chamou de “enfrentar o capitalismo
como economia cultural” (2004, p.563).
Mas o que tudo isso tem a ver com a formação do ser mochileiro?
A experiência de viagem sempre esteve presente no imaginário e na trajetória de todas as
sociedades. O ser humano sempre se deslocou em tempo/espaço motivado pela curiosidade, pela
necessidade de sobrevivência, por sonhos de conquistas, pela profissão (tropeiros, vendedores,
bandeirantes, artistas...), pelo desejo de superação psicológica, em busca do belo, do prazer, da
aventura, do encontro com o Outro. Atualmente nas sociedades contemporâneas acrescenta-se
outro elemento constituinte dos desejos/motivações – a indústria turística. O turismo hoje é uma
grande e forte característica da experiência moderna (URRY, 2001). Pautada pela lógica capitalista de consumo, o turismo é implementado por métodos, técnicas e procedimentos do marketing
de destino que se fundamentam nos estudos sobre a imagem do lugar e o comportamento ambiental da demanda, recebendo inclusive contribuições da psicossociologia que investiga a percepção
e o imaginário expressados no comportamento individual e coletivo dos consumidores-turistas.
Assim o sujeito desejante, por natureza, fica inserido nesse contexto da necessidade/consumo, pois
não viajar seria como não possuir um carro ou uma bela casa (sonhos de consumo). Mas também
representa algo que confere status elevado e supostamente se faz necessário à saúde, pois também
já é valorizado e vendido como “remédio anti stress”. A construção de todo este imaginário em
torno das viagens promovido pela indústria turística está na promessa da vivencia de prazeres
diferentes daquelas que nos deparamos na vida cotidiana, ou seja, a “satisfação da necessidade”.
Para os mochileiros viajar é abrir novos horizontes, conhecer novas culturas, lugares e paisagens. A viagem traz para a vivência dos turistas expectativas sempre surpreendentes, realização
de sonhos, que serão vividos de formas diferenciadas daquelas que habitualmente experienciamos. “Tal expectativa é construída e mantida por uma variedade de práticas não-turísticas, tais
como o cinema, a televisão, a literatura, as revistas, os discos e os vídeos/ DVDs, que constroem
e reforçam o olhar” (Urry 2001, p.18). Esta construção imaginária pode cair nas armadilhas de
consumismo cultural, pois a experiência da viagem é “vendida” como se o espaço turístico fosse o
paraíso e o tempo/espaço deslocado à possibilidade para fruição do mais puro “lazer”.
Outra manifestação produzida pelos indivíduos/sociedade e captada para o fenômeno turístico é o gosto pela aventura. A aventura para Le Breton (1996) é um dom de sonhar, é um
agente liberador de emoções que prenuncia uma existência sem tempos mortos, uma vida plena
de momentos excepcionais. Segundo o autor o desejo de viver uma aventura marca o inacabado
na condição humana, de desejar o que ainda não existe, de realizar em pensamento o sonho de
ser um outro diferente de si. As dificuldades de um ambiente desconhecido fazem com que esses
sujeitos desfrutem e deem vida a seus herois interiores encaminhando novos sentidos à aventura
que constroem em cada viagem. A aventura, ainda segundo o autor citado, é uma paixão capaz
de transformar os obstáculos encontrados em plataformas para ascensão dos aventureiros nos seus
espaços e projetos, pois esses espaços e projetos quando comuns, não são suficientes para comportar a imaginação e ação desses aventureiros. Le Breton vê a aventura como paixão pelo risco.
O conhecimento dos riscos incita ao gosto pela transgressão, numa afirmação de capacidade de
superação. A determinação objetiva dos riscos e dos perigos se mistura a subjetividade das representações e dos imaginários sociais.
Temos então, uma teia inesgotável de elementos que se relacionam para constituir a forma
que os mochileiros viajam e vivenciam suas viagens. Pois eles, como descrito nas pesquisas analisadas, não viajam em pacotes turísticos, são mais autônomos nos processos decisórios que envolvem seus deslocamentos, são dotados de um espírito aventureiro, buscam sempre novos desafios,
aprendem por meio da exposição, do desprendimento e do intenso relacionamento com outras
pessoas. Os itinerários são escolhidos de forma personalizada propiciando novas experiências -
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regiões menos turísticas, culturas mais “excêntricas”, lugares com possibilidades de atividades ao
ar livre- porém sem deixar de conhecer e experimentar os aspectos e lugares considerados tradicionais em uma cultura.
Outra instigante questão é perceber que mesmo inseridos no capitalismo de economia
cultural há também uma tensão gerada pela disposição de fazer de forma diferenciada, quase como
bandeira de uma contracultura ou simplesmente a instituição de uma outra cultura. Seria esta
uma forma de contestar o sistema vigente? Seriam eles transgressores da imposição econômica
capitalista?
Compreender o mochileiro por esta ótica implica ter um olhar crítico buscando o estranhamento naquilo que hoje nos parece muito familiar: redução das práticas de viagem como
mercadoria (transformando-a num produto a ser adquirido, consumido e utilizado).
Em oposição a este viés mercantil, a viagem precisa ter sentido para aqueles que a desfrutam. Como constituinte do ser mochileiro faz-se necessário reconhecer que sua prática está
vinculada à construção de significados que dão sentido à existência. Sendo que esses sentidos são
produzidos e reproduzidos pela interação dialógica dos sujeitos em suas relações com o mundo.
Perceber que estas relações se dão na medida em que o sujeito interage com o mundo constituindo saberes, valores, motivações e desejos, numa perspectiva dinâmica, não corrobora com
visões lineares acerca deste fenômeno e evidencia o paradoxo que a fruição desta prática possui.
A interdependência com os processos histórico-culturais de cada sujeito evidencia que o tempo/
espaço social de experiência dos mochileiros não tem um sentido e significado únicos, muda com
a idade, com as condições de educação, com as oportunidades para as experiências de viagem,
com as condições afetivas, enfim, muda segundo as diferentes condições da cultura e sociedade
que o indivíduo pertence.
Podemos caminhar para algumas considerações finais corroborando com o pensamento
de Mauss quando nos coloca que a ideia de que as pessoas individualmente “fazem coisas”, mas
o fazem não dentro de uma liberdade total; ao contrário, elas o fazem nos limites das estruturas
sociais e das transformações históricas concretas. O grande desafio é compreender como se dá a
relação das partes com o todo e como aquelas se integram neste, não como objetos estranhos, mas
como elementos constitutivos de uma realidade maior – a sociedade – que, por seu lado, segue um
curso histórico que escapa às partes. Segundo Elias:
O que nos falta (...) são os modelos conceituais e uma visão global mediante os quais possamos
tornar compreensível, no pensamento, aquilo que vivenciamos diariamente na realidade, mediante os quais possamos compreender de que modo um grande número de indivíduos compõe
entre si algo maior e diferente de uma coleção de indivíduos isolados: como é que eles formam
uma sociedade e como sucede a essa sociedade poder modificar-se de maneiras específicas. Ter
uma história que segue um curso não pretendido ou planejado por qualquer dos indivíduos que
a compõem (1994, p.16).
Para superar o dilema das partes e avançar no entendimento dinâmico do todo, as sociedades consideradas como totalidades são sempre mais ou menos incompletas: de onde quer que
sejam vistas, continuam em aberto na esfera temporal em direção ao passado e ao futuro. “(...)
Trata-se, na verdade, de um fluxo contínuo, uma mudança mais rápida ou mais lenta das formas
vivas;” (ELIAS, 1994 p.20).
Certamente que, através desta exposição, não tive a pretensão de responder à tão instigante indagação sobre a constituição do ser mochileiro, de forma objetiva e direta, como se fosse possível apenas uma resposta para esta complexa formulação. Mas acredito ter levantado argumentos
e apontamentos relevantes, me apoiando em autores como Gueertz, Mauss, Sahlins, Guiddens e
Elias entre outros para delinear um possível caminho entre tantos, mas fundamentando em abordagens que apresentem a ação e a estrutura, não como opostos, mas como elementos constituintes
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de um movimento incessante e ambivalente de trocas - às vezes organizativas, às vezes degenerativas -, de objetos materiais e simbólicos – não estáticos – em circulação na vida social, resultando,
a cada momento, na criação de novos lugares (estruturas) e de novas identificações (ações).
REFERÊNCIAS
Geertz, C. A. Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978.
Giaretta, M. J. Turismo da Juventude. São Paulo: Manole, 2003, v.01.
Giddens, A. Modernidade e Identidade Pessoal. Oieras: Celta Editora, 1997.
Le Breton, D. Passions du Risque. Paris: Métailié. 1996.
Sahlins, M. D. Cultura na Prática. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2004.
Taylor, C. As Fontes do Self: A construção da identidade moderna. Edições Loyola, 1997.
Urry, John. O olhar do turista: lazer e viagens nas sociedades contemporâneas. São Paulo: Studio
Nobel: SESC, 2001.
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OCIO Y CONSUMISMO EN AMÉRICA LATINA
Rodrigo Elizalde223
RESUMEN: El artículo plantéa algunas de las contradicciónes y problemáticas que el ocio presenta en la actualidad, al ser homologado a un tiempo/espacio de consumo y visto solo como
mercancía. Todo esto genera sociedades cada vez más alienadas e insustentables y el surgimiento
de sujetos sociales con poca conciencia de las necesarias y urgentes mudanza socioculturales que
requieren nuestro tiempo.
PALABRAS CLAVE: Ocio. Consumismo. Imaginario Social Latinoamericano.
INTRODUCCIÓN
Se entiende que el ocio (desde aquí comprendido como sinónimo de lazer en portugués)
es una práctica social compleja e históricamente determinada, que a la vez expresará el mundo
subjetivo de cada sujeto. Así entendido, el ocio no es un fenómeno aislado y se manifiesta en diferentes contextos según los sentidos y significados producidos/reproducidos culturalmente por las
personas en sus relaciones con el mundo. Como indica Gomes (2004, 2008), el ocio participa de
la compleja trama histórico-social que caracteriza la vida en sociedad, y es uno de los hilos tejidos
en la red humana de significados, símbolos y significaciones.
Desde esta perspectiva concordamos con las ideas de Marcellino (2007) al entender a la
“cultura” sin reducirla a un único contenido, evitando así generar una visión parcial, como generalmente ocurre cuando se utiliza esta palabra, que casi siempre se hace restringiéndola a los
contenidos artísticos o a la cultura docta. En este contexto cultura debe ser referida a los diversos
contenidos socioculturales más amplios. El autor también resalta que el ocio debe ser entendido
como uno de los elementos de la vida humana históricamente situada. Otras opciones implicarían ubicar apenas de forma parcial y abstracta todo lo relativo al ocio. Según su visión, es imposible, por ejemplo, abordar al ocio aislado del trabajo, de la educación, de la familia, etc.
Siendo así, el objetivo de este artículo es generar un debate sobre el papel que ocupa el ocio
en las sociedades latinoamericanas actuales, ya que en muchos casos este está cargado de prejuicios y connotaciones negativas. A su vez se busca indagar en las contradicciónes y problemáticas
que presenta el ocio al ir en aumento un estilo de vivenciarlo exclusivamente homologado a un
tiempo/espacio de consumismo.
FUNDAMENTACIÓN TEÓRICA
Al entender al ocio como una necesidad humana y una dimensión de la cultura además
de otorgar la posibilidad de cuestionar el orden social vigente, esta perspectiva entrega la posibilidad de la vivencia lúdica de manifestaciones culturales en el tiempo/espacio social. Así, el ocio
se constituye en la articulación de tres elementos fundamentales: la ludicidad, las manifestaciones
culturales y el tiempo/espacio social. Juntos, estos elementos configuran las condiciones materiales
y simbólicas, subjetivas y objetivas que pueden – o no – hacer del ocio un potente aliado en el pro223 Professor substituto Universidade Federal de Minas Gerais. Co-Lider Grupo de pesquisa Otium: Lazer, Brasil & América
Latina. E-mail: [email protected]
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ceso de transformación de nuestras sociedades, volviéndolas más humanas e inclusivas (Gomes,
2010).
En este sentido, para Gomes (2010), las manifestaciones culturales que constituyen el ocio
son prácticas sociales vivenciadas como disfrute de la cultura al poseer significados singulares para
cada sujeto y para cada grupo humano. Constituyendo así prácticas sociales y culturales que integran la vida de cada persona y la cultura de cada pueblo, pudiendo asumir múltiples significados:
al ser concretizadas en un determinado tiempo/espacio social, al dialogar con un determinado
contexto y, también, al asumir un papel peculiar para los sujetos, grupos sociales, instituciones y
sociedad que las vivencian histórica, social y culturalmente.
No se debe olvidar que el ocio también comprende otras prácticas culturales enfocadas en
posibilidades de introspección. Por cierto, existe un prejuicio con este tipo de experiencia porque
ellas desafían la lógica productivista que impera en nuestra realidad social al ser, lamentablemente, considerada como improductiva y como una pérdida de tiempo. De lo cual definitivamente se
discrepa ya que no todo deberá ser medido únicamente por la vara de la productividad. A partir
de lo anterior surgen las preguntas: ¿Productivo para quién? Incluso si estás experiencias fuesen
improductivas ¿Qué justifica la urgente necesidad de tener que ser productivos? ¿A qué intereses
y a que valores responde esa preocupación por la productividad?
Estas consideraciones resaltan la necesidad de promover, como indica Marcellino (2007)
una educación crítica/creativa por y para el ocio, esto es un aprendizaje transformacional, una
vez que este representa una posibilidad de reflexionar sobre la realidad en que se vive y así poder
aportar a las urgentes transformaciones que requieren las sociedades humanas. Entendido así el
ocio será uno de los muchos elementos que posibilitarán la constitución de sociedades realmente
solidarias y sustentables (ELIZALDE, 2011).
Desde esta perspectiva, el resignificar al ocio, como una forma de superar las visiones
negativas y prejuciosas, podrá ser uno de los múltiples elementos que ayuden a ir generando alternativas desde otra lógica, posibilitando el reconocimiento, valoración y respeto de la diversidad
cultural latinoamericana, elemento fundamental si anhelamos sociedades donde sea posible el
acceso a una vida buena para todos los seres humanos, de hoy y de mañana.
En este sentido, el desafío de revalorar y resignificar el ocio no se tratará de una nueva
forma de adoctrinamiento o hegemonía gnoseológica y epistemológica. Siendo así, con lo expuesto
se busca la producción de conocimientos nuevos que ayuden a conectar conceptos fragmentados y
aislados, como una forma de contextualizarlos y acercarlos a las necesidades de la Latinoamérica
actual.
OCIO E IMAGINARIO SOCIAL LATINOAMERICANO ACTUAL
Hablar de sociedad latinoamericana es una suma de realidades amplias, diversas y heterogéneas, llenas de contrastes, ambivalencias y contradicciones que necesariamente deberán
ser entendidas en plural. Por lo cual se debe hablar de “sociedades latinoamericanas” al postular
que no existe una única sociedad latinoamericana, sino múltiples y diversas realidades sociales y
culturales que coexisten. Ya sea desde las propias realidades territoriales y locales específicas, entiéndase por países, regiones, comunas, barrios, etc., como dentro de ellas mismas, sabemos de la
existencia de variadas culturas conviviendo paralelamente dentro de un mismo territorio.
Culturas singulares y plurales que presentarán características específicas dependiendo de
variables tales como factores de identidad, historias, mitos, fantasías y sueños, así como los contextos políticos, económicos, sociales, en los cuales se esté inmerso, entre otros elementos. A su
vez estas realidades culturales estarán determinadas en gran medida por factores etarios, raciales,
étnicos, de género, educacionales y tantas otras características propias de los miembros específicos
de esos grupos humanos. Desde esta perspectiva se plantea que en América Latina está presente
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la multiculturalidad e interculturalidad, y estas se entienden como fenómenos actuales, más allá
de la tendencia global a la asimilación y homogenización cultural.
Así, hablar de la existencia de una realidad única frente a cualquier fenómeno o elemento de una cultura, como algo absoluto en una sociedad, será siempre una generalización, la cual
estará lejana de expresar estas múltiples dimensiones y diversas realidades humanas simultáneas
que coexisten, se entrelazan, influyen, interafectan e interrelacionan en una dinámica de conservación y trasformación constante.
Esta explicación se elabora para evitar una visión estática y rígida, que no considere las
diferencias y, a su vez, similitudes existentes en las realidades multiculturales e interculturales
latinoamericanas.
Basados en lo anterior, se plantea que en las sociedades latinoamericanas el ocio no presenta una forma única de ser vivenciado y entendido, lo que no quita que al mismo tiempo paradojal y paralelamente, presente tendencias similares en cómo es vivido, aprendido y comprendido
desde un imaginario socialmente construido.
Siguiendo las reflexiones ya iniciadas, en Latinoamérica habitualmente el ocio es subvalorado y entendido en el lenguaje popular como sinónimo de “vago”. A su vez se entiende al ocio
como la inacción, holgazanería y como el vicio de no trabajar y de perder el tiempo. Así encontramos el tradicional refrán popular que dice: “el ocio es la madre de todos los vicios”, que expresa la
visión negativa y prejuiciosa que existe frente al ocio, lo que se traduce en su subvaloración.
Algo similar ocurre con la recreación, en el sentido de ser vista, generalmente, solo como
actividades, esto es “recreacionismo” y “activismo”, sin necesariamente presentar mayor trascendencia o un sentido más profundo, por lo cual no es vinculada con lo “serio” del mundo del trabajo.
En este sentido es útil destacar que desde nuestro punto de vista el ocio es más amplio que la recreación, pudiendo incluso incluirla en cuanto posibilidad de vivenciar actividades generalmente
ligadas a la diversión (ELIZALDE y GOMES, 2010).
Conocida es la idea de que los juegos son solo para los niños y las cosas verdaderamente
importantes del mundo son para los adultos. De aquí, quizá, el que todo el sistema educativo esté
centrado en educar a los niños, futuros adultos del mañana, para el mundo del trabajo, y no para
un desarrollo integral que considere la necesidad de ocio. Desconsiderando así el potencial que
tanto el ocio, como la recreación poseen en cuanto herramienta educativa y pedagógica como
elementos que colaboren con la evolución y transformación social.
A lo anterior se agrega que al quedar el ocio en manos del mercado, como ocurre en muchos casos en la actualidad, este será comprendido casi exclusivamente como un nicho económico
generador de lucro e interpretado así como un bien o servicio para los clientes-consumidores. De
esta forma, el ocio, será entendido únicamente como otro objeto de consumo, perdiendo así su
potencial capacidad de ser un aporte en la generación de otras perspectivas creativas y críticas,
que permitan cambiar la mirada y hacer frente a las problemáticas sociales actuales de forma
innovadora y renovada. Por esta vía, la relación que las personas establecerán con su propio ocio
será pasiva, generando un consumo alienado, marcado por una fuerte tendencia escapista y sobreconsumidora (ELIZALDE, 2008).
Añadido a todo esto, los medios de comunicación masivos muchas veces entregan la visión del ocio como un ideal a ser alcanzado, en el cual la imagen del millonario, eterno adolescente,
que descansa sin tener que trabajar ni un día, será casi un sueño no necesariamente reconocido,
pero si anhelado de forma silenciosa por la gran mayoría. De esta forma vemos como el ocio ocupa
un lugar central en este nuevo ideal en el imaginario social, en el cual la aversión y rechazo al
trabajo serán un elemento nuevo, central y paradojal, que muestra las profundas contradicciones
existentes en las sociedades actuales.
Podemos ver así la coexistencia de fuerzas antagónicas y ambivalentes, las que por un lado
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según el modelo social de crecimiento continuo de la economía, desde una moral productivista
capitalista, rechazará al ocio por considerarlo contrario a los ideales de la sociedad moderna,
donde la idea de progreso, en cuanto crecimiento de la producción y el consumo, será el objetivo
primero de la vida en sociedad. Pero a su vez, contradictoriamente y de forma paralela, se buscará
exacerbar el consumo de bienes y servicios de ocio, por ser un emergente nicho de mercado, focalizándose en un idealhedonista y narcisista, en el cual la despreocupación (en cuanto carencia
de responsabilidades), el descuido y el descanso continuo, con dinero, serán el sueño a alcanzar,
pero solo concretado por unos pocos privilegiados. Así la ecuación puede ser “trabajar poco y ganar mucho dinero”, para disfrutar de los placeres de la vida, entre los cuales el ocio será una de las
metas supremas.
De esta forma, cambia sólo en apariencia la lógica capitalista ya que entramos a resaltar
un aspecto medular del modelo, en este caso el consumismo. Con esto la alienación humana ya no
entra sólo por la vía del trabajo, sino también, por el consumo, a través del ocio, que se transforma
en una nueva forma de adicción al buscar, como ideal, poseer la mayor cantidad de bienes y servicios – entiéndase hiperconsumo – algo que definitivamente no será posible, al vivir en un mundo
finito y limitado en sus recursos ambientales y ecológicos (ELIZALDE, 2008, 2011).
Es importante postular que al ser nuestras sociedades contradictorias, llenas de tensiones
y al estar en constante e impredecible cambio, está emergiendo un nuevo sujeto social y un nuevo
imaginario social que expresa como ideología base el sobreconsumo, lo desechable, lo fragmentado e individual, efímero, fugaz e inmediato, pero a su vez material y concreto. Todas estas novedosas características harán vivir de forma distinta el ocio a este emergente sujeto social en las
agitadas sociedades actuales.
A pesar de lo anterior se observa que en América latina aún existentes en muchas comunidades locales y realidades sociales en las cuales la solidaridad, la empatía y la valoración y
preocupación por los otros, en cuanto legítimos otros, sigue siendo un elemento relevante, central
y significativo en sus formas de convivencia habitual. Se sabe así de expresiones culturales y manifestaciones de vivencias de ocio en las cuales la gratuidad, lo espontáneo, auténtico y propio,
toman protagonismo en un acto que puede interpretarse como de resistencia a un modelo que en
gran medida olvida, obliga y oprime al ser humano.
En contraste, se observa que de forma equivocada la producción y el consumo han pasado
a ser elementos que se entienden como la base de todo proceso social que busque alcanzar el desarrollo, bajo la ideología del progreso capitalista occidental. Algo que sin duda afecta e influye a
la esfera del ocio. Habitualmente se escucha decir que sin crecimiento económico no hay riqueza,
y que sin este crecimiento no hay como superar la pobreza material en que viven muchos latinoamericanos. A pesar de saber lo insustentable de este sistema económico y saber que el crecimiento
de la economía no lleva a la superación de la pobreza y a su vez de de reconocer todas las otras
críticas que se pueden formular a este paradigma de crecimiento, en muchos casos de forma cada
vez más habitual, se sigue difundiendo el estilo de vida consumista, lo que de veladamente es entendido como un elemento inherente e imprescindible para el funcionamiento y éxito del modelo
vigente.
Entendido así, el consumismo será una la tendencia inmoderada a adquirir, gastar o consumir bienes, no siempre necesarios. De esta forma, en América Latina, los hábitos cotidianos y
estilos de vida consumistas actuales están contribuyendo a ritmos acelerados con la degradación
de la naturaleza. De esta forma, se observa como las sociedades actuales favorecen e incluso incentiva el consumismo y el despilfarro. A pesar de los posibles cambios en las mentalidades que
han comenzado, aún somos, como dice Galeano (2006), la generación del “úselo y tírelo”, algo que
expresa lo inadecuado del modelo de sociedad actual.
Hoy en día la forma de producción y consumo de bienes (y servicios) conduce a que éstos
se conviertan en fines en sí mismos. De este modo el “tener” se vuelve lo más importante y el “ser”
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queda relegado a una segunda categoría, como destacara Erich Fromm (1964). Tras esto se esconde la idea de que al tener acceso a estos bienes y servicios ofertados por el mercado se alcanzará
una calidad de vida superior, lo que sin duda es una falacia.
Algo similar ocurre con el ocio. Al ser vivenciado desde una actitud consumista ya no
importará mucho el porqué o para qué de este, centrándose en el cuanto, el exeso, en la acumulación. Lo medular será la cantidad más que la calidad o el sentido profundo de eso a lo que se tiene
acceso, de eso que se consume. Esta pseudo satisfacción de la necesidad de ocio que se centra en
el tener limita al ser humano y lo aleja de su libertad individual de elección y de una satisfacción sinérgica. Queda allí abonado el terreno para la instauración de sociedades alienadas, que se
embarcan en una carrera productivista y consumista sin sentido. La meta es crecer, pasando este
crecimiento a ser un fin en sí mismo. La vida se pone al servicio de los artefactos, en vez de estar
los artefactos al servicio de la vida. Con esto se olvida que una calidad de vida más elevada se
refiere al desarrollo de las personas y no al crecimiento de los objetos, como equivocadamente se
acostumbra entender.
De este modo, la búsqueda de una calidad de vida y de un ocio que genere real satisfacción
y desarrollo personal y social, es remplazada por la obsesión de incrementar los bienes y el nivel de
consumo, como si más siempre fuese equivalente a mejor, como si tener mucho correspondiera a
lo óptimo. Así esta “supuesta” libertad en el acto de consumir se transforma en el ideal social a alcanzar, y por esta vía el ocio pasa a ser otra forma de alienación y de despersonalización al quedar
los seres humanos atrapados en las manos del mercado.
Como indica Bauman (2008, p.71):
La “sociedad de consumidores”, en otras palabras, representa el tipo de sociedad que promueve,
incentiva o refuerza, la elección de un estilo de vida y una estrategia existencial consumista,
y rechaza todas las opciones culturales alternativas. Una sociedad en que adaptarse a los principios de la cultura del consumo y seguirlos estrictamente es, para todos los fines y propósitos
prácticos, la única elección aprobada de manera incondicional. Una elección viable y, por lo
tanto, posible – y una condición de afiliación (de pertenencia).
Así, podemos homologar consumo alienado a ocio alienado y con esto el resultado será
sociedades alienadas, enajenadas y despersonalizadas que encuentran su sentido y su entrada al
bienestar individual a través del acto de tener acceso a eso que se ofrece en el mercado. A su vez
se equipara la libertad individual con la falaz sensación de libertad que produce la elección entre
estos productos o servicios ofertados en el mercado. Todo lo cual definitivamente, desde nuestro
punto de vista, será una ilusión y la principal estrategia para mantener el actual sistema insustentable en pié.
CONSIDERACIONES FINALES
Frente a todo lo anterior se plantea la necesidad de establecer un urgente vínculo entre
la educación en sus variadas formas (formal, no formal e informal), el aprendizaje transformacional y un ocio contrahegemónico. Al posibilitar una visión crítica de la realidad social y una
perspectiva nueva frente al estilo de vida actual, se estará abriendo un potencial de aprendizaje
comprometido con la transformación del modelo social vigente. Esto es vivenciando al ocio con
una actitud contrahegemónica frente al modelo social y cultural actual, el cual se presenta excluyente, discriminador e injusto para amplios sectores de la población y con alarmantes señales
de insustentabilidad global.
Por esto resaltamos lo importante de profundizar las ideas de Marcellino (1987) al postular
la necesidad de una educación crítica/creativa por y para el ocio, que posibilite la construcción
de otro mundo posible. De esta forma consideramos necesario despertar las utopías, siendo estas
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entedidas (FREIRE, 1980) como la dialectización de los actos de denunciar y anunciar. Denunciar sociedades que en muchos aspectos se muestran cada día más inhumanas y anunciar nuestra
indignación y nuestra determinación de luchar por nuestro sueño de un mundo rehumanizado.
Así, postulamos que el ocio al ser resignificado, como algo importante en la vida humana, podrá
se una de las nuevas posibilidades para entender y enfrentar los emergentes conflictos sociales y
ecológicos de la actualidad desde una visión crítica, creativa, constructiva y transformacional.
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Coletânea do XIII Seminário “O Lazer em Debate” | Belo Horizonte | 2012
FLASH MOB DANCE: ENTRE O LAZER OUTSIDER E O ENTRETENIMENTO
DOMINADO224
Erica Rigolin da Silva225
Silvana dos Santos226
Luane Maciel Freire227
Giuliano Gomes de Assis Pimentel228
RESUMO: Flash Mob Dance (FMD) pode ser entendido como apresentações surpresa em lugares não-usuais à dança. A disseminação desses manifestos ético-estéticos com o auxílio de novas
mídias incita o questionamento teórico sobre o FMD como experiência gregária e artística de lazer. Assim, o objetivo do trabalho foi analisar significados presentes em FMD. O estudo documental sobre 15 fontes disponíveis na web interpretou as imagens, agrupando as coreografias conforme
sua lógica interna e contexto sociocultural, na perspectiva da Hermenêutica. O estudo evidenciou
que a prática de FMD embora relacionada a possibilidades criativas no lazer, está crescentemente
subsumida à lógica do entretenimento e da sociedade do espetáculo.
PALAVRAS CHAVE: Dança. Cultura. Lazer.
INTRODUÇÃO
O cenário contemporâneo impõe desafios ao campo acadêmico no lazer, uma vez que certas práticas culturais surgem de forma viral, experimentando tanto algum impulso notável quanto
certo esgotamento de seu conteúdo. Essa ambigüidade acarreta inquietações diversas, da política
à cultura. É neste cenário que indagamos sobre manifestações inesperadas em locais públicos. O
Parkour e o Flash Mob Dance (FMD) são exemplos de formas lúdicas inusitadas (a primeira acrobática e a outra dançante) que trazem a promessa de um colorido diferente à vivência do lazer.
Salvatti (2010) descreve o Flash Mob como manifesto de demonstrações impressionantes
da conversão de comunidades virtuais em comunidades físicas por meio de reunião pública entre
desconhecidos, que se organizam via internet ou celular, realizando um ato sem sentido que logo
se dispersa. Pautado neste argumento, levantamos as seguintes reflexões, até que ponto seria um
ato sem sentido? Esta falta de intencionalidade estaria na visão dos telespectadores ou seriam os
mobers protagonistas de uma ação meramente hedonista?
Para Molon et. al. (2010) a principal intencionalidade desta ação é atrair e entreter o público, seja aquele que foi contatado, sejam as pessoas que não foram previamente conectadas e são
surpreendidas pela transformação do espaço urbano, incitando a vontade de fazer parte do movimento. Contraditóriamente ao pensamento de Salvatti, Molon et al, nos levam a ter outro entendimento desta ação. Pois deixa de ser um ato sem sentido como citado pelo primeiro, construindo
assim, outros sentidos e significados, onde não se busca apenas uma nova forma de dançar, mas,
projeções de atitudes muitas vezes consideradas desviantes.
224 Apoio: CNPq.
225 Graduanda da Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
226 Mestranda da Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
227 Mestranda da Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
228Orientador. Universidade Estadual de Maringá. Coordenador do GEL – Grupo de Estudos do Lazer. ggapimentel@uol.
com
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Essa forma de manifestação, embora momentânea, faz romper a ordem espacial moderna
da cidade, pois os “mobbers” não possuem uma hierarquia de lugares, reunem-se em qualquer
local, provocando resistência ao espaço moderno, talvez uma nova percepção espacial. Estes fenômenos vêm em contrariedade aos padrões normativos sociais, pois permitiriam que as comunidades imaterial (internet) e material (espaços públicos) se potencializem e apropriem do espaço
através da multidão. Neste sentido Bauman (2001) afirma que a internet é a mídia “suporte” ao
Flash Mob, por isso nos faz perder a real dimensão do espaço concreto das cidades.
A maneira em que se concebe aqui, o tempo e o espaço, é contemplada por Harvey (2003)
na contemporaneidade, enquanto os processos de transformações das relações sociais, consequentemente vem sendo expressas nas diversas práticas sociais. A dinâmica da história pode ser observada por meio das concepções de tempo e espaço, refletidas nas atividades cotidianas individuais
e coletivas de uma determinada sociedade.
Deste modo, pode-se analisar os Flash Mobs, enquanto manifestação do âmbito da cultura e lazer, podendo-se considerar como um fenômeno estético, onde seus registros apresentam-se
em vídeos disseminado pela web, como qualquer sistema de representação.
Neste sentido, é necessário realizar um paralelo existente na arte moderna, entre os movimentos artísticos dadaísmo e futurismo. Harvey (2003) encontra no primeiro a representação da
velocidade como forma de moldar o espaço e no segundo, a busca por uma arte efêmera por meio
da negação dos espaços permanentes, similar aos Flash Mobs no que concerne o trato do espaço
e tempo.
Existem três momentos para os participantes (mobbers): a) expectativa da realização (disseminação da ação via web onde são previamente informados sobre tal ação por meio das redes
sociais, combinando as coreografias, local e data das apresentações), b) o momento de realização
(em locais inusitados, públicos ou privados), c) após a realização (onde os participantes agem como
se nada houvesse acontecido, voltando a fazer o que estavam realizando antes). Para quem assiste,
existem apenas dois momentos: a) durante a apresentação (os telespectadores não são avisados de
tal ação previamente sendo surpreendidos) e b) após o término da ação.
Deste modo, é preciso que nos atentemos às possíveis diferenças entre quem assiste e
quem participa do Flash Mob Dance, de modo a perceber como o sujeito significa esse momento
potencialmente lúdico. Nesta contextualização abrimos a seguinte reflexão: sendo a dança uma
manifestação da cultura e o elemento principal do FMD, como essas manifestações reverberam
no campo do lazer? Com o intuito de discutir esse apontamento, nos propomos realizar a análise
de quinze vídeos disseminados no site YouTube.
METODOLOGIA
Este é um estudo documental sobre as fontes disponíveis na web. A obtenção foi feita nas
produções públicas e disponíveis no YouTube, seguindo o critério de maior quantidade de informação disponível sobre o contexto do vídeo. As fontes foram tabuladas conforme as categorias de
análise do estudo. Para tanto, foi realizada uma fase piloto em material nacional e estrangeiro para
identificar tipificações e esquemas interpretativos já existentes.
Fizeram parte da análise, os seguintes vídeos:
I: Sound of Music | Central Station Antwerp (Belgium)
II: Dubai Airports Flash Mob
III: KLM Portugal – Flash Mob Aeroporto de Lisboa – Vídeo Oficial
IV: Official Seattle Glee Flash Mob Vídeo – Seattle, Westlake
V: ##OKI FLaSH MOB## . LMFAO Party Rock Anthe
VI: Maior Flash Mob Black Eyed Peas - I Gotta Feeling
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VII: Biggest Flash Mob Ever
VIII: Aeroporto do Galeão - Rio de Janeiro - Brasil
IX: TAP e Aeroporto Internacional de São Paulo – uma homenagem cosmopolita
X: [OFFICIAL] Jackson Dance Tribute – STOCKHOLM
XI: Flashmob Nürnberg Hauptbahnhof 07.05.2011
XII: Flash Mob Nieuwmarkt Amsterdam 03-01-2010
XIII: ゲリラダンス 「名古屋でBeat It! 2011/ Dança da Guerrilha “ Beat It em Naygoya! 2011”
XIV: 中国(颤栗),MJ,你看到了吧。所有mj迷都要感动哭 / China
XV: University of Minnesota Flash Mob – College of Science and Engineering 75th Anniversary
10/19/2010.
Após a tabulação, os dados foram sujeitados à análise teórica, visando seu significado
interno em articulação à dimensão macro. Logo, o trabalho foi de matriz Hermenêutica (GRONDIN, 1999) e buscou interpretar e compreender a lógica interna dessas atividades. Não importa,
na Hermenêutica, estabelecer conceitos universais, mas, sobretudo, pontuar a diferença no modo
como cada coreografia produz sentidos. Para tanto, foram selecionados consensos e dissonâncias
entre 15 práticas de diferentes FMD analisados. No primeiro nível de análise a ênfase foi sobre
o tempo-espaço. No segundo nível de análise, foram confrontados os estilos musicais e, posteriormente, como terceiro nível de análise, a comparação entre o conjunto das modalidades e as
normas sociais.
ANÁLISE E DISCUSSÃO
O espaço e tempo são categorias básicas da existência humana. Tendemos a experenciá-los como certo conforme a atribuição dada pelo senso comum, embora esporadicamente discutamos o seu sentido. (HARVEY, 2003). Neste tocante, observamos os espaços escolhidos para
as intervenções dos “Mobbers”, partindo do ponto em que aparentemente são similares, embora
ocorra em diversos lugares do mundo. A princípio visualizamos a contingência da divisão material
por meio de duas especificações: espaços fechados e espaços abertos.
No que diz respeito à primeira, observamos que dentre os quinze vídeos analisados, cinco
encontram-se em locais próprios para a espera de sistemas de transportes como aeroportos e estações de trem. As pessoas estão situadas como passageiros circulando livremente pelo espaço. Além
disso, há dois vídeos que estão dispostos nesta categoria. Contudo diferenciam-se dos demais; um
deles ocorre em um salão de festa levantando indícios de que seja uma colação de grau, a ação
acontece entre os corredores envoltos por cadeiras e o segundo video é realizado no corredor de
um centro comercial, entre as lojas, sendo este um espaço horizontal e estreito, para a livre circulação de pedestres.
Em relação à segunda categoria constatamos a existência de lugares como praças e pátios
públicos geralmente situados na frente das saídas de Metrôs ou em locais quase vazios e extensos.
As ruas também foram escolhidas pelos “Mobbers” por meio de duas situações; em uma delas
acontecia um show e em outra o trânsito foi impedido. Em relação à iluminação dos espaços,
constatamos em um único vídeo a ação no período noturno, considerando assim, artificial.
Conforme Harvey (2003) as concepções acerca do espaço e tempo são estabelecidas por
meio das práticas e processos materiais. Deste modo podemos relacioná-las com os procedimentos
político-econômicos e culturais.
A princípio, atentemos para as escolhas dos espaços de transições como os de espera em
estações de trem, aeroportos e saídas dos metrôs, ao mirar para tais locais, observamos um grande
fluxo de pessoas, possivelmente exista alguma intenção por parte dos “Mobbers” na escolha desses
espaços, de início supomos que seja pelo grande número de pessoas circulando.
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Por meio desse raciocínio visualizamos os espaços e tempo vivenciado pelos “Mobbers”
e espectadores. Podemos levantar algumas hipóteses; uma delas é de que a economia influencia
consideravelmente na escolha dos espaços para a efetivação da ação, que muitas vezes é voltada
para a propaganda e consequentemente ao consumo. Outra está relacionada com a percepção do
tempo fugaz na contemporaneidade, consequência do desenvolvimento frenético das tecnologias.
Bauman (2001) destaca que as distâncias podem ser percorridas à velocidade dos sinais
eletrônicos e todas as referências ao tempo parecem instantâneas. Assim sendo, tempo e espaço
formam teias de sentidos/significados envolvidos na concepção humana por meio de sensações
materiais do contexto histórico social. Já que, o modo distinto de produção ou formação social
incorpora um agregado particular de práticas e conceitos do tempo e espaço (HARVEY, 2003).
Por outro lado, pensar o conjunto de modalidades destes vídeos, nos leva a subdivisão
de genêro musical, público, finalidades a qual está sendo atribuído o FMD no tempo livre. Vale
ressaltar, nestas condições, que o lazer é ainda visto como oposição às obrigações, e, por isso,
sentido por um desejável caráter liberatório, fruto de uma livre escolha e tendo como resultado
final algo prazeroso (DUMAZEDIER, 1980). Entretanto, essa oposição entre lazer e obrigações
não se confirma empiricamente, quando, no próprio FMD, as barreiras entre trabalho e lazer se
fundem ludicamente em apresentações misto de entretenimento planejado para o marketing e
voluntariado gregário.
No que se refere aos genêros musicais podemos atribuir à música um forte elemento do
lazer, assim como pontua Pimentel (2003, p. 202): “a música é uma das vivências mais produzidas
e consumidas no tempo do lazer”. A música exerce diferentes funções, ultrapassa as barreiras do
tempo-espaço, firmando-se como uma das mais importantes formas de comunicação (FERREIRA, 2010).
No caso do repertório dos FMD, a ênfase parece ser a internacionalização, tendo em vista
a predominância de músicas cantadas em inglês. Por outro lado, por ocasião da triagem dos vídeos, foram identificadas outras vertentes musicais, tais como: sertanejo, samba, zouk, axé, gospel,
dentre outros gêneros.
Sendo a música, forte e presente no cotidiano das pessoas, pode-se considerá-la enquanto
objeto de fácil assimilação (PIMENTEL, 2003), apontando para a necessidade dos “mobbers” em
se comunicar por meio da música. Por vezes, conforme informações apontadas na postagem do
vídeo, determinada música ou cantor é o motivador inicial da organização do FMD na rede.
Dentre os quinze vídeos analisados torna-se perceptível a “interação” involuntária dos
telespectadores em quatro vídeos, talvez por ser “a música considerada a coletivadora-mor entre as
artes” (LOUREIRO, 2003, p. 59).
Apesar do apelo da música e coreografia, na maioria dos vídeos verificam-se os potenciais
expectadores centrados em seus compromissos, esbarrando uns nos outros ao tentar desviar do
‘obstáculo’. O mesmo não se verificar quando os FDM foram realizados em praças e shopping’s,
considerados equipamentos voltados à diversão e repouso, onde os constrangimentos do tempo de
trabalho produtivo não são sentidos tão diretamente.
Aqui é interessante observar o FMD assumir duas possibilidades opostas nesses locais:
surgir com a roupagem de recreação voltada para o entretenimento das massas, com exposição
pela web das performances; ou insurgência dentro dos próprios locais de domesticação do tempo
livre, a favor do direito ao lazer nos diferentes espaços de sociabilidade.
Marcellino (1996, p. 55) pontua que o lazer “é fundido de uma forma integral e linear no
dia-a-dia das pessoas”, partindo dos dizeres de Marcellino, este estudo vem de encontro com outra
perspectiva de lazer, (re) direcionado ao consumismo, tal ação é comum na rotina de todo ser
humano. Marx (1982, p. 9) sinaliza que “a produção não se limita a fornecer um objeto material
a necessidade, fornece ainda uma necessidade ao objeto”, os “mobbers” de determinados vídeos
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nos permitem a visualização de um “espetáculo” produzido por pessoas alienadas aos flash mobs,
levando uma mensagem à seres alienantes ao consumo, fato evidente nos FMD com fins publicitários. Neste sentido, a música aqui direciona-se à algo sugestivo, intencional. Para Arbex (2001)
existe a realidade e a representação dela, neste caso, a música utilizada para esse tipo de FMD
fez-se enquanto representação estimulando o telespectador ao consumo.
Pautado nestes argumentos, podemos subdividir as finalidades dos FMD em questão da seguinte forma: homenagem, propaganda e hedonista. Dos quinze vídeos analisados, quatro vídeos
são destinados à homenagem (geralmente a músicos), três à propaganda e seis com característica
hedonista. Por outro lado, nestes mesmos vídeos notável características similares entre um e
outro, tais como dois vídeos destinados à propaganda e ao mesmo tempo homenageando, assim
como um vídeo de propaganda com características hedonistas.
No que tange a manifestação FMD, pode-se dizer que existe a presença de comportamento desviante, pois em raras excessões mantém-se a lógica normativa. Essa lógica promove a
dominação e apropriação de mercadoria de modo a utilizar o corpo enquanto elemento de “venda”
para McLuhan (1964), o flash mob dance pode ser entendido como um meio de comunicação levando em consideração que todo meio é uma extensão do nosso corpo, pois todo meio realmente
“trabalha” sobre os indivíduos, ou seja, faz uma espécie de “massagem” nos órgãos sensoriais do
corpo humano, gerando mudanças psíquicas, sociais e cognitivas que, por sua vez, constituem os
efeitos que criam as mensagens e os ambientes comunicativos.
Para Gore (2010) estaríamos diante de um novo gênero, que se alimenta da mescla entre
formas teatrais e elementos não-tradicionais da dança. Porém, segundo o autor, o mais impressionante é a capacidade para usar os meios de comunicação para reconfigurar o espaço urbano,
mesmo que essas formas potenciais de novas sociabilidades não expressem objetivos políticos.
Decerto a realização dos FMD permite aos “mobbers” sair das normas padronizadas, já
que os espaços utilizados na grande maioria são abertos, o que dificulta a “moldagem” em determinados grupos. Por outro lado, pergunta-se: o que levaria um grupo social a romper com os
paradigmas sociais vigentes? Os protestos realizados pelos “mobbers” possuem apenas o interesse
de “luta”, ou seria uma ação apenas com o intuito de “dizer” existimos? Esses apontamentos, nos
abre reflexões para estudos futuros.
Neste interim, ao pensar o FMD enquanto manifestação de protesto, podemos classificá-lo como um comportamento desviante, Formiga e Gouveia (2003) definem o comportamento
desviante enquanto conduta de não conscientização das normas que devem ser respeitadas, e as
caracteriza como um fato que incomoda, porém sem causar danos físicos à outras pessoas, comum
nas ações joviais, e também há busca em romper com algumas leis sociais.
Vale ressaltar que além do comportamento desviante evidente em nosso estudo, ainda
existe os desvios de conduta delitiva, quando se vêem riscos, morais e físicos, à sociedade. No
entanto, esse paralelo só foi realizado pelo fato dessas duas condutas possuirem algo em comum –
ambas interferem nos direitos e deveres dos indivíduos.
Por outro lado, a prática ou comportamento desviante pode ser entendida enquanto um
desafio na ruptura dos padrões tradicionais impostos socialmente, os FMD se enquadram neste
contexto, pois tal ação provoca essa “quebra” normativa, causando inquietação em alguns e ao
mesmo tempo articulando a atenção de outros. Formiga (2006) evidência que determinadas condutas, justificam-se como parte integrante do desenvolvimento do jovem, que na maioria das vezes
são desordenadas, extravagantes e excessivas, de modo a expor a si mesmo e aos outros os riscos
pessoais e sociais.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar as questões culturais associadas ao lazer, em especial os FMD, alerta para uma
prática gregária, lúdica e dinâmica que, por sua vez, está está crescentemente subsumida à lógica
do entretenimento e da sociedade do espetáculo. Para neste estudo ficou evidente que a escolha
de lugares centra-se na idéia de atração do maior público possível, onde há grande circulação de
pessoas, como aeroportos, estações de trens, praças e pátios públicos.
O público, embora não tenha uma comunicação prévia do que irá acontecer, é provocado
a interagir com tal ação, pois a música selecionada pelos “mobbers” insta e, ao mesmo tempo,
surpreendem os telespectadores.
Ao final, o estudo encontrou possibilidades diversas de apropriação do FMD, embora a
finalidade mais encontrada fora a hedonista, que possui caráter libertário comumente associado
às visões vigentes de lazer. Nesse sentido, considerando o campo aberto às disputas, este estudo
sugere trabalhos sobre o FMD como expressão contemporânea de educação para e pelo lazer.
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309
UM ESTUDO SOBRE PARQUES URBANOS E LAZER
Ana Carolina Bernal229
Camila Yukie Goto230
Denilton da Silva Barbosa231
Jacqueline Lourençon Ghebra232
Yuli Della Volpi233
Luiz Octavio de Lima Camargo234
RESUMO: O presente trabalho traz um levantamento bibliográfico sobre a temática de parques
urbanos, cujos resultados foram analisados dentro de quatro categorias: estudos teóricos e genéricos; estudos de parques urbanos no Brasil; estudos de parques urbanos em São Paulo; e estudos
do Parque do Ibirapuera, sendo este o nosso maior enfoque. O trabalho foi realizado sobre o banco
de teses e dissertações da CAPES, através do método de exploração bibliográfica, onde foi possível
encontrar vinte pesquisas a respeito do tema abordado. Pôde-se perceber a partir do material que
há uma predominância de pesquisas feitas por universidades públicas e também o fato de ainda
existir poucos estudos a respeito do uso dos parques urbanos como equipamentos de lazer.
PALAVRAS CHAVE: Lazer. Parques Urbanos. Parque do Ibirapuera. Áreas Verdes.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho está embasado na questão dos parques urbanos que surgem, segundo
Macarrão (2009), no século XVIII com a abertura dos jardins da corte para o público. Segundo
o autor, com o crescimento urbano no século XIX, os parques começam a ter maior significado
para a transformação urbanística na cidade, visto como uma questão de higiene e paisagismo.
Nesse momento, os parques obtêm duas funções: a primeira em atender uma demanda de lazer e
recreação e a segunda, criar espaços vazios de forma a compensar o cinzento que se instalava nas
cidades.
O lazer, o parque urbano é um produto da cidade moderna. Nasceu, a partir do século
XIX, da necessidade de dotar as cidades de espaços adequados para atender a uma nova demanda
social: o lazer e o tempo livre deveriam contrapor-se ao trabalho e ao tempo produtivo gerado
pelas imanências do ambiente urbano. Isso quer dizer que esses locais que teriam por função conduzir os sujeitos à sensação de descanso e de entretenimento, seja pela recriação do contato com a
natureza, sejam pela oferta de atividades dotadas de elementos lúdicos, que despertassem o sujeito
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para uma noção de tempo e de conduta alheios àquela proporcionada pelo sistema produtivo das
fábricas (NUNES JÚNIOR, 2009).
Assim, podem-se entender parques urbanos como:
Parque público como um equipamento urbano ambiental, constituído por um espaço de uso
público com foco na recreação da população e capaz de incorporar outras intenções, como a
de conservação, preservação, educação ambiental e mesmo atividade cultural (Macarrão, 2009
p.21)
Portanto, verifica-se a importância dos parques urbanos na cidade de São Paulo para o
lazer por proporcionar uma ampla oportunidade para o visitante em relação à paisagem.
Objetivo
Desta forma, o objetivo deste trabalho implica numa exploração bibliográfica sobre o
tema, visando enriquecer a bibliografia já existente, além de contribuir para o planejamento e
para a gestão de políticas públicas dos parques urbanos, em especial do Parque do Ibirapuera, na
cidade de São Paulo.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa que utilizou de uma metodologia de exploração bibliográfica. Foi
realizado um levantamento no banco de dissertações e teses da CAPES e o mesmo permitiu que
fossem encontradas vinte pesquisas relacionadas a parques urbanos. Estas, então, foram subdivididas em quatro categorias, a saber: estudos teóricos e genéricos sobre os parques urbanos; estudos
de parques urbanos no Brasil; estudos de parques urbanos em São Paulo e estudos relacionados
diretamente ao Parque do Ibirapuera.
RESULTADOS
1. Estudos teóricos e genéricos sobre os parques urbanos
O estudo de caso de Santini (1987) procura analisar a importância do espaço urbano no
contexto do lazer, pois de acordo com a autora, com a transformação do meio ambiente fez com
que o homem contemporâneo vivesse em outro espaço social, onde foram concebidas novas maneiras de viver: as cidades. Com a industrialização, ocorreu o crescimento desenfreado juntamente
com o crescimento populacional, no qual gerou a explosão espacial ocasionando o adiamento de
espaços propícios para as práticas do lazer e como consequência a impossibilidade da melhoria da
qualidade de vida da população. .
No estudo de Kliass (1989), a autora visa resgatar elementos da história de parques urbanos da cidade de São Paulo, sua evolução e urbanização para melhor compreende-lo. Nesta pesquisa, a autora verifica a inserção dos parques urbanos na estrutura da cidade selecionando oito
parques, onde observa o processo de apropriação do espaço urbano, o planejamento e por fim seu
desenvolvimento. No final, é apresentada uma proposta de projeto para um futuro parque urbano
na cidade de São Paulo.
2. Estudos de parques urbanos no Brasil
Luciene da Silva (2003), através de uma séria de entrevistas com o Administrador da
Cidade do Gama, o Legislador, os Executores e com os moradores ao entorno do parque, buscou
compreender o papel da percepção dos atores urbanos que comprometem a implementação de um
uso urbano de proteção especial – parque urbano e concluiu que a dificuldade para implementação do Parque Urbano e Vivencial do Gama se dá pela crença dos atores institucionais de que tal
implementação provocaria a desaprovação de eleitores e a comunidade não vê os possíveis benefícios que esta implementação traria.
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Em sua pesquisa, Cláudia de Oliveira (2004) procurou comprovar a necessidade de integração do plano de manejo do Parque Nacional da Tijuca com as políticas urbanas de entorno e
a participação efetiva da sociedade civil para demonstrar a necessidade de integração dos mesmos
com a base legal para fundamentar as ações a favor da qualidade de vida na cidade e destacar a
importância de questões ambientais.
Adjalme Ferreira (2005) também analisou os efeitos positivos gerados pelos parques urbanos e também a qualificação e definição das funções do Passeio Público da Cidade do Rio de
Janeiro e a qualidade de vida que o mesmo possibilita.
Mariana de Albuquerque (2006) estudou os espaços livres públicos inseridos na paisagem
urbana, em especial dos parques urbanos, a fim de compreender a configuração espacial destes
e observar a relação entre forma-conteúdo, função, estrutura e processo para identificar as memórias, rugosidades e metamorfoses e por fim obter a percepção de que os arranjos territoriais
urbanos refletem as formas de gestão sócio-espacial.
Ademir de Oliveira (2007) realizou uma análise e uma avaliação de práticas de usos dos
espaços do Parque do Flamengo, identificando as relações com que os diversos grupos sociais delimitam os seus “territórios” a partir da ideia de que os espaços públicos, principalmente os parques
urbanos, são os locais para que cada indivíduo, dentro das suas necessidades, possa entrar em
contato com a natureza e fugir do estresse e das condições do dia-a-dia.
Ricardo Teixeira (2007) propôs uma investigação sobre parques urbanos, buscando fazer
uma análise de apropriação pelos usuários dos mesmos localizados na Bacia da Pampulha, em Belo
Horizonte e a partir de questionários, mapas mentais, levantamento fotográfico e um roteiro de
observação, buscou traçar o perfil dos usuários para que isso o auxiliasse a compreender as formas
de apropriação do espaço.
Por fim, Felipe de Souza (2008) buscou a compreensão dos processos de transformação
do espaço público na sociedade contemporânea nos parques urbanos de Porto Alegre – RG para
estudar a gestão do espaço público e a relação entre sociedade civil e Estado, assim como analisar
o processo de transformação do valor de uso desse espaço em valor de troca.
3. Estudos de parques urbanos em São Paulo
A pesquisa de Corrêa (2002) revela que a cidade de São Paulo está em crescente processo
de urbanização e seus habitantes, à medida que a cidade cresce vertiginosamente nas últimas décadas, parecem acompanhar o ritmo desconcertante desse desenvolvimento. Para dar o título do
estudo, a autora pesquisou os parques Piqueri, do Carmo e Raul Seixas, todos situados na zona leste da cidade, procurando desvelar o processo histórico que deu origem a estes espaços a partir da
compreensão dos interesses de criação dos parques, da transformação desses espaços no contexto
da urbanização, da forma como as políticas públicas os conservam, do significado dos três parques
para a comunidade, da forma de atuação do poder público municipal para a criação de políticas
públicas de lazer que atendam os espaços, e da presença ou não de mecanismos de preservação e
manutenção desses locais.
Martins (2002) procurou compreender como o Parque Trianon, em São Paulo, é visto pela
mídia impressa e pelos seus usuários. Ele dividiu sua pesquisa em duas partes: a primeira analisando notícias do jornal “O Estado de São Paulo” relacionadas ao Parque, entre os anos de 1892
e 1999, e a segunda, por meio de entrevistas realizadas com os próprios frequentadores do mesmo
parque.
Os estudos acerca da relação homem-natureza na cidade de São Paulo realizados por
Schreiber (1997) giram em torno das representações de natureza na metrópole paulistana em
um Domingo no Parque Estadual Alberto Lofgren. Com uma perspectiva antropológica, a autora
estuda os valores, os padrões sociais e as formas de comportamento dos usuários do parque em
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relação à natureza representada no local, por se situar no Horto Florestal, e qual o significado da
ideia do direito ao patrimônio natural como qualidade de vida, incluindo as práticas de lazer, e do
direito a cidadania.
Já em 2004, Maria Laruccia procurou fazer uma análise das mudanças que ocorreram em
determinado bairro após a implantação de um parque urbano, procurando entender qual o significado dos parques em São Paulo. A autora buscou compreender o contexto urbano do parque e
foram feitos estudos que visaram o uso, manutenção e administração locais.
Ana Burjato (2005) buscou, em seu estudo, discorrer sobre a acessibilidade dos espaços de
lazer de São Paulo às pessoas com deficiência. De acordo com a autora, a construção de parques
públicos urbanos acessíveis, assim como a adaptação dos parques existentes corresponde à melhora na qualidade de vida dos envolvidos e à ampliação do convívio social
O trabalho de Luiz Macarrão (2009), por fim, analisa as ações relacionadas à implantação
de parques públicos entre 1989 (por conta da promulgação da Constituição de 1988, que trazia um
capítulo de política urbana, além de fazer a consagração do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito social) e 2008, em São Paulo, tendo como objetivo compreender a tendência
das ações e sua relação com a política urbano-ambiental.
4. Estudos do Parque do Ibirapuera
Na sua tese de doutorado, Barone (2007) aborda a temática sobre o Ibirapuera: Parque
Metropolitano (1926 – 1954) discorre sobre um enfoque sobre o eixo comemorativo do IV centenário do de São Paulo e a construção do parque do Ibirapuera. Processo esse que envolveu oposições como: jornalistas, urbanistas e intelectuais que foram silenciados.
Roberto Silveira (2003) formulou sua tese de mestrado tentando entender a interação
entre o cidadão, a cidade e o lazer no município de São Paulo. Teve como objetivo descobrir as
possibilidades de apropriação dos espaços públicos de lazer. Para sua reflexão, elegeu o Parque do
Ibirapuera para estudo de caso devido sua importância na cidade.
Os estudos realizados por Paulo Nunes Junior (2009) apresentam uma discussão sobre o
lazer e apropriação dos espaços, em especial o parque do Ibirapuera. Nesse trabalho o autor se
propõe a discutir o conceito de lazer e tempo livre, espaço liso e apropriação, aceleração da sociedade e encurtamento do espaço, Oasis e subversão. No seu trabalho propõe a expressão de “espaço
para o tempo livre” verificando que nem todo espaço para tempo livre e espaço para lazer, tendo
em vista que nesse espaço para tempo livre existe mais de uma possibilidade para autocondiocionamento.
Já o foco da pesquisa de Rosa Miglionico (2007) está na evolução até a consolidação do
Parque do Ibirapuera, considerando sua paisagem, arquitetura, seus aspectos culturais e de lazer.
O objetivo é traçar um paralelo detalhando igualdades e distinções de atividades e preservação
entre os parques do Ibirapuera e Villa Borghese.
A pesquisa de Janice Eder (2004) está debruçada sobre o conjunto cultural do Parque do
Ibirapuera com foco voltado ao papel sócio-cultural e histórico que o mesmo exerce. Objetivou
mostrar que os espaços têm uma função interdisciplinar, e a partir dos conjuntos o lugar se torna
ideal para o redimensionamento do individuo com o auxilio da arte.
DISCUSSÃO
Dentre os vinte trabalhos analisados, a grande maioria foi realizada por universidades
públicas, sendo cinco delas federais e doze estaduais. Quanto às de cunho privado, encontramos
três trabalhos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho foram feitas discussões em torno dos parques urbanos, analisando
sua definição, utilização, função, gestão, distribuição. Para tanto, foi dado maior enfoque ao Parque do Ibirapuera.
Mostrou-se como o tema é recente da mesma forma que a conscientização da população
sobre as áreas verdes também é recente. Dito de outra forma, é de se supor que a crescente conscientização da necessidade de parques como espaços de lazer também leve a crescentes iniciativas
e estudos acadêmicos.
Finalizando: este estudo abre inúmeras possibilidades de aprofundamento, tais como as
direções que os estudos bem assumindo, novas hipóteses de trabalho, teste de novos instrumentos
de análise, etc.
REFERÊNCIAS
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em arquitetura e urbanismo) – Universidade de São Paulo, 2005.
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Cidade do Rio de Janeiro. Dissertação (mestrado em ciência ambiental) – Universidade Federal
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Dissertação (mestrado em geografia) – Universidade de São Paulo, 2004.
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MARTINS, R. W. A. A imagem do Parque Trianon via mídia impressa e na percepção urbana
dos usuários. Dissertação (mestrado em comunicação) – Universidade Paulista, 2002.
MIGLIONICO, R. I. Parque do Ibirapuera: um ícone da paisagem paulistana. Tese (doutorado
em arquitetura e urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São
Paulo, 2007.
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OLIVEIRA, A. L. de. Parque do Flamengo – Avaliação de um parque urbano sob ponto de vista do uso do espaço. Dissertação (mestrado em arquitetura e urbanismo) Universidade Federal
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SANTINI, R. de C. G. O aproveitamento dos espaços livres urbanos para os lazeres. Dissertação
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Dissertação (mestrado em ciência florestal) – Universidade de Federal de Viçosa, 2007.
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LAZER EM PARQUES NATURAIS URBANOS: REALIDADES E DESAFIOS DO
PARQUE ESTADUAL DO UTINGA EM BELÉM – PARÁ
Mirleide Chaar Bahia235
Patrícia Thatyane Miranda Cabral236
Silvio Lima Figueiredo237
RESUMO: Esta pesquisa teve como objetivo apresentar as realidades e desafios vivenciados no
Parque Estadual do Utinga (PEUT), busca