Resgatar a greve como método de luta dos
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Resgatar a greve como método de luta dos
Resgatar a greve como método de luta dos trabalhadores (tese para o Tema II, Art. 6º do regulamento) O boletim da Unafisco de 05-09-8 apresenta assim a visão da Diretoria sobre a luta dos auditores: A edição da MP (Medida Provisória) 440, contrariando pontos importantes do acordo firmado entre os Auditores-Fiscais e o Governo, deixa no ar um questionamento: os trabalhadores do setor público devem desistir da via negocial e priorizar o enfrentamento? A DEN (Diretoria Executiva Nacional) entende que não. No momento atual, em que os auditores questionam-se sobre a validade da greve, este balanço da Diretoria é útil? É válido? Esta tese discute este assunto. Uma construção histórica O general prussiano Carl Von Clausewitz escreveu um livro, publicado postumamente (Da Guerra – 1832) em que ele explica que a Guerra é a continuidade da política por outros meios. No momento atual, essa densa obra do general prussiano (mais de 900 paginas na tradução para o português) não costuma muito ser lida e muito menos citada. A grande maioria das pessoas prefere se guiar por livros como Sun Tzu - a arte da guerra, um clássico da literatura dita de auto-ajuda, onde se misturam formulas prontas e acabadas com conceitos copiados, recopiados e modificados de antigos ditados orientais e ocidentais, com ares de alta filosofia. Não conheço o suficiente de história chinesa para ver as guerras pelas quais passou Sun Tzu. Li o seu livro e, francamente, os conselhos de Maquiavel em O Príncipe me parecem bem mais sensatos, aplicados a ocasião. Entretanto, Von Calusewitz passou por uma guerra muito mais difícil: as guerras napoleônicas, após a revolução francesa. E esta dura escola lhe permitiu refletir e produzir uma formulação muito mais elaborada. Se olharmos com atenção, o que o general quer dizer é que a guerra não interrompe a política, pelo contrário é o seu prolongamento necessário, quando as negociações, disputas verbais e judiciais não chegam a bom termo, é necessário passar a outra forma de disputa, sem com isso interromper o que se fazia antes. Assim é que em toda guerra continua a existir a diplomacia e todos os seus conchavos e acordos. Aplicando este principio a nossa luta, nós poderíamos dizer: A greve é a continuidade da negociação por outros meios. O problema é que a diretoria, leitora talvez assídua dos livros de auto-ajuda a estilo de Sun Tzu não consegue chegar à altura teórica de um general prussiano do sec. XVIII e XIX. Assim, nos encontramos com as seguintes formulas no boletim de 05-09 (já citado): os trabalhadores do setor público devem desistir da via negocial e priorizar o enfrentamento? A DEN (Diretoria Executiva Nacional) entende que não Ou seja, o “enfrentamento”, eufemismo para representar a palavra greve, a palavra manifestação, é oposto à negociação. Estranha forma de encarar as coisas, já que a Diretoria propunha e fazia aprovar uma paralisação de 24h sem nenhuma preparação em assembléia realizada em 19/08 (a paralisação do 21/08)! Ou seja, passamos por uma greve de mais de dois meses que muitos classificam como a maior greve desta instituição e a Diretoria faz logo depois um jogo de cena com uma paralisação inexistente e, posteriormente, quer dizer que greve e negociação são coisas diferentes. Qualquer um que já passou por uma greve dirigida de forma séria, sabe que só chegamos a ela por que as negociações emperraram e não foi possível continuar só “falando”, teve-se que demonstrar a força da categoria. Mas nenhum dirigente sindical encaminha-se feliz para uma greve, ele sabe dos riscos e não se arrisca a fazer uma greve de um dia para outro como um “aprendiz de feiticeiro” que não sabe conduzir as forças que desencadeou. A DEN entende que a negociação não é caminho mais célere. Mais rápida é a fórmula em que o Governo impõe sua decisão e a categoria parte para o enfrentamento. Ora, a fórmula mais rápida é aquela em que o governo não nos concede nada e ficamos todos como dantes no quartel de Abrantes. Nunca o governo “impôs” sua decisão e depois fomos à greve. Aliás, depois que o governo, forçado por “negociações”, “manifestações” ou “greves” impõe a sua decisão em forma de projeto de Lei ou de MP, dificilmente essa se faz mudar, inclusive porque o governo, sempre, ou conta com maioria ampla no congresso (e não cabe aqui examinar a forma como isso se dá, deixemos a qualquer um que queira refletir sobre o assunto) ou por pressão ou negociação garante essa maioria na hora que lhe interessa. O que se conseguiu através do embate direto como única forma de ação foram perdas salariais e desvalorização do cargo. A falta de perspectiva histórica, o encarar a história como pílulas que recebemos prontas, leva a estas afirmações rasteiras e incorretas. Em termos gerais, os auditores formam uma categoria privilegiada em relação ao restante, estão naquelas categorias que formam o topo da pirâmide do serviço público, junto com Policia Federal, Diplomatas, Juízes, Procuradores, etc. O fato de uma ou outra estarem no topo depende é claro da luta da categoria, mas depende também das relações criadas pelo estado, enquanto ente que se separa da sociedade e a usa (e por sua vez é usado por ela, particularmente pela sua fração dominante, hoje a burguesia). Durante a ditadura militar, quem ganhava mais eram os militares e a luta da categoria dos auditores era por conseguir um salário referenciado no do Almirante-deEsquadra. Hoje, quando a “democratização”, com o caminho a barbárie generalizada que se faz no mundo (trafico de drogas, terrorismo, guerras civis, guerras por petróleo, etc.) o aparelho jurídico-policial se torna mais “poderoso”, a Polícia Federal e os Juízes aparecem como a única alternativa à barbárie que se espalha por cidades e campos. Assim, o salário do STF se torna o maior salário entre os Três poderes (para que eles votassem a favor da EC da Reforma da Previdência quando ela foi questionada judicialmente) e a Policia Federal o maior salário do Executivo. A Diretoria, sentindo isso mas sem saber o motivo, manobrou o tempo inteiro para que a nossa reivindicação durante a greve fosse modificada de exigir 90% do salário do Juiz do STF para exigir isonomia com a PF. Belo exemplo da “via negocial”, do “caminho mais rápido”. E quando no começo da greve o governo não chamava para negociar e foi proposto no comando de greve que fizéssemos um movimento chamando o governo para negociar a Diretoria propunha “vamos esperar que eles chamem”. Sim, verdade, chamaram quando já tinham uma estratégia pronta do que fazer. Um detalhe. Dizer que Mais rápida é a fórmula em que o Governo impõe sua decisão e a categoria parte para o enfrentamento é querer encobrir o sol com a peneira. Qualquer um que releia os boletins da época anterior a greve e inclusive durante a greve, o que mais se via era um implorar constante por “uma proposta”, “governo faça uma proposta”, “governo concretize a proposta”. Ora, Ora. Ao invés de dizer o tempo inteiro: governo aceite a nossa proposta, nós imploramos ao governo para... impor sua decisão. E uma vez imposta, quando a proposta veio conhecida, ai aceitamos o acordo. Relembremos: Nós pedíamos a paridade dos aposentados? Conseguimos parcialmente, já que eles perderam os anos que não receberam e aos que tinham direitos adquiridos perderam estes direitos. Ou seja, para aumentar alguns, diminuíram o salário do restante. Nós pedíamos a solução do fosso? Conseguimos três níveis para todos os enfossados e o governo não respeitou o que foi conseguido Nós pedíamos 90% do salário do STF e depois paridade com a PF? Nem um nem outro e, ainda por cima, diminuiu-se o valor do salário inicial em relação a outras carreiras. Pedíamos a volta de nossas atribuições? Nem uma palavra a este respeito. Para não dizer que estamos mentindo, reproduzimos aqui a pauta retirada do site da Unafisco, na primeira pagina da área restrita: PAUTA REIVINDICATÓRIA DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL APROVADA NA ASSEMBLÉIA NACIONAL DE 18/10/2007 Eixo principal da pauta reivindicatória para a Campanha Salarial de 2007: • Implantação imediata da tabela remuneratória aprovada pela categoria em Assembléia Nacional de 20/09/2007. • Manutenção e resgate das atribuições privativas e prerrogativas dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. • Restabelecimento da paridade entre ativos, aposentados e pensionistas. • Devida transposição e a elevação do inicial da carreira para solucionar o fosso salarial. • Desvinculação da remuneração dos AFRFBs a metas. Demais reivindicações para a campanha salarial de 2007: • Implementação de uma Lei Orgânica da Carreira dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (*). • Gratificação de atividade de risco extensiva a todos os ativos, aposentados e pensionistas. • Fixação de data-base para revisão anual dos vencimentos. • Criação de regras estáveis e claras para o concurso de remoção (conforme plano de carreira). • Pagamento do passivo dos 28,86%, do passivo da GDAT dos aposentados e dos demais passivos judiciais e administrativos. • Fim do contingenciamento do Fundaf e sua utilização exclusiva nas atividades da SRF. • Reajuste dos valores do ressarcimento à saúde, das diárias e da indenização de transporte. • Revogação da Portaria SRF 1.582, de 23 de novembro de 2000 (trata da dispensa de ponto para participação em eventos promovidos pelo sindicato), que vem dificultando a participação dos AFRFBs em seminários, Conaf, CDS, plenárias e demais eventos promovidos pelo Sindicato. • Construir uma política salarial permanente que garanta a reposição anual das perdas inflacionárias. • Criação de adicional de fronteira ou adicional para localidade de difícil acesso, de modo a fixar servidores nos pontos de fronteira e em outros em que a rotatividade de pessoal é muito grande. • Defesa das atribuições relativas aos AFRFBs oriundos da SRP. • Defesa da seguridade social pública. • Defesa de uma política tributária justa. • Contra o PLP 01/2007. • Pela discussão da negociação coletiva. • Remuneração por subsídio. (*) com base no projeto do Plano de Carreira aprovado em 11/02/2004 acrescido de demais pontos a serem deliberados pela categoria. Sim, todos podem ver aonde chegamos com o “modelo negocial”, em particular com o fato de o governo ter mantido o SIDEC, que foi rejeitado em seu conteúdo por mais de 95% dos auditores em Assembleia Nacional Conjunta. E agora, o que fazer? A Diretoria tem a saída: Ao invés de darmos um passo para trás, acreditamos que o desafio agora é avançar no modelo, fazendo com que o Governo não apenas negocie, mas cumpra os compromissos selados em acordo. A alternativa nesse momento é eleger um árbitro que faça prevalecer o fruto da negociação: o Poder Legislativo, uma vez que é lá que a MP será analisada. Isso não quer dizer que a luta saia definitivamente da esfera do Executivo. Apenas terá como principal “campo de batalha” o Congresso Nacional. O congresso que tudo aprova o que o Executivo quer, é transformado em arbitro. A proposta aprovada no ultimo CDS de agosto, de Denuncia do acordo se ele não fosse cumprido é simplesmente esquecida. O engraçado é que quando lemos as emendas, algumas delas têm relação com o acordo, outras nasceram não se sabe de qual escaninho secreto (ai, como as coisas que dizemos voltam, eles que perguntaram tanto de onde vieram os ganhos que outras categorias tiveram) onde se transforma nossa carreira em “Carrera jurídica”. Onde isso foi discutido? Qual o fórum que deliberou? Isso não entrou nem na famosa LOF que desceu garganta abaixo dos auditores em assembléia plebiscitária, sim ou não a LOF, sem que a Assembléia pudesse se pronunciar sobre cada um dos artigos. Ai, todos os engenheiros, os contadores, os economistas, os médicos e todos os que fizeram concurso viraram “juristas”. Sinto muito, não sou daqueles que quer um titulo por passe de mágica. Se alguém quer ser de Carrera jurídica, que estude e passe em concurso próprio e não se utilize de sua posição qualquer com negociador para passar isso por baixo dos panos e por cima da Constituição, já que não se pode transformar alguém com outra formação em “jurista”! Alias, diga-se de passagem, existe um caminho a mais: porque não aproveitamos exatamente a posição adotada em nossa pauta de reivindicações (Defesa de uma política tributária justa) e nos posicionamos contra a Reforma Tributária do governo e, baseada nesta posição de força, justificar frente ao congresso e a sociedade os motivos para termos melhores salários e nossas atribuições de volta? Que tal mostrarmos porque somos necessários ao invés de autoelogiarmos nossa direção, nosso presidente e nossa tática? Que tal usar a política ao invés de livros de auto-ajuda? Conclusão Cabe a este congresso fazer um balanço de nosso movimento e da greve. Cabe ao congresso decidir que negociação e greve não se contrapõem, mas a greve é parte da negociação em momentos específicos de impasse. Cabe a este congresso recuperar que a melhor forma de defender nossas reivindicações é mostrar a sociedade que somos úteis, somos necessários, que temos posição que defende a maioria contra os grandes tubarões, contra os burocratas do governo e, com greve ou sem greve, defendemos os interesses da maioria desta sociedade. Em outras palavras, trata-se de superar o “modelo negocial” pelo velho modelo de defender a categoria a partir de sua importância e do se lugar na sociedade, onde se combinam propaganda, pressão, negociação, manifestações e greves e não se contrapõem uma à outra nem se contrapõem uma parte da categoria a outra. Vamos debater o fundo do problema e construir a nossa unidade. Unidos e com uma política justa poderemos vencer. Luiz Roberto Bicalho Domingos [email protected] Tel: (21) 8676 4602 DS – Rio de Janeiro – DEINF/RJO