Vinho e saúde: o estado da arte
Transcrição
Vinho e saúde: o estado da arte
Vinho e saúde: o estado da arte Jairo Monson de Souza Filho1 RESUMO: O vinho bebido regularmente, moderadamente, junto com as refeições por quem não tenha qualquer contra-indicação ao uso de bebidas alcoólicas, agrega ao prazer de beber benefícios para a saúde. Isso é o que evidenciam centenas de milhares de pesquisas. Aqui são apresentados os principais estudos médicos que mostram a relação da ingesta regular e moderada de vinho com os benefícios para a saúde. ABSTRACT: Wine adds to the pleasure of drinking several benefits to health if it is drank regularly, moderately and during the meals, by anyone who doesn’t have any contraindications to drinking alcohol. That is what hundreds of thousands of studies put in evidence. Here are presented the main medical studies concerning the relation between moderate regular wine consumption and health benefits. PALAVRAS-CHAVE: Álcool. Coração. Hipertensão Arterial. Acidente Vascular Cerebral (AVC). Câncer. Doenças pépticas. Bactérias. Vírus. Osteoporose. Envelhecimento. Demências. Pele. Visão. Diabete. 1. INTRODUÇÃO: O vinho é sem dúvidas, entre todas as bebidas, a mais favorável à saúde. Isso se bebido junto com as refeições, regularmente, com moderação e por quem não tem contra-indicação à ingesta de bebidas alcoólicas. 1 Médico, especialista em Clínica Médica. E-mail: [email protected] O que chamou a atenção das pessoas em geral e dos cientistas em particular para as virtudes terapêuticas do vinho foi o “Paradoxo Francês”. É bem sabido que comer gorduras saturadas, fumar e ser sedentário entre outras coisas são fatores de risco para doenças do coração. Os franceses quando comparados com outros povos do mesmo nível sócio-econômico-cultural são mais sedentários, fumam mais e comem mais gorduras saturadas – os queijos, patês e manteigas são usuais na culinária francesa – e, no entanto têm a metade dos problemas cardiocirculatórios. A divulgação do “Paradoxo Francês” foi feita por Serge Renaud, inicialmente nos Estados Unidos, no programa 60 minutes da CBS, na noite de 7 de novembro de 1991 e posteriormente na revista científica The Lancet, em julho de 19921. Ele afirmou que a ingesta moderada de bebidas alcoólicas, sobretudo vinho, reduzia o risco de morbimortralidade cardiovascular em 40 a 60%. Isso causou um grande interesse sobre o assunto, principalmente da comunidade científica que não pára de estudar este fenômeno. Hoje a produção de trabalhos científicos que tem relação direta e indireta com o consumo de bebidas alcoólica, principalmente o vinho, com a saúde é crescente e chega à casa das centenas de milhares. A dose baixa de álcool e os polifenóis são os grandes responsáveis – mas não os únicos – pelos benefícios do vinho para a saúde2. Os polifenóis são o que torna o vinho uma bebida e um alimento diferente de todos os outros. São eles que, em harmonia com o álcool e outros compostos, fazem do vinho o verdadeiro “néctar dos deuses”. Os polifenóis existem apenas no reino vegetal, onde se identificam mais de 8.000 tipos. A natureza que é tão pródiga e o Criador que é tão sábio confiaram a eles a importante missão de defesa dos vegetais. A eles cabe proteger os vegetais dos ataques físicos como a radiação ultravioleta do sol e dos ataques biológicos – dos fungos, vírus e bactérias. Briosos que são, para desempenhar tão nobre encargo, armaram-se de importante ação antibiótica, potente efeito antioxidante e distribuíram-se, quase que unicamente, nas cascas, sementes e folhas dos vegetais2. Nos vinhos já se identificaram cerca de 200 polifenóis. Eles têm origem quase que exclusivamente – cerca de 95% - nas cascas e sementes das uvas. É por isso que os vinhos tintos (que são fermentados na presença delas) têm cerca de 10 vezes mais polifenóis que os vinhos brancos (que fermentam na ausência das cascas e sementes das uvas). É por isso também que os tintos, como regra, têm mais virtudes para a saúde. Os polifenóis existentes nos vinhos brancos são em menor número, porém com uma ação antioxidante mais potente2. 2. VINHO E CORAÇÃO: Uma quantidade muito grande de estudos epidemiológicos mostra que a ingesta moderada de bebidas alcoólicas, sobretudo de vinho, diminui as doenças cardíacas e circulatórias e as mortes por estas causas. Já se evidenciaram os seguintes mecanismos para a proteção cardiovascular oferecida pelo consumo moderado de vinho: 1. aumento do Colesterol HDL, principalmente as frações HDL2 e HDL3 – considerado o bom Colesterol, pelas ações benéficas que exerce ao sistema cardiocirculatório. Este aumento é tanto na quantidade quanto na qualidade deste tipo de Colesterol, cuja composição é rica em fosfolipídios poli-insaturados, como o ácido Omega-3 – reconhecido pelo seu efeito cardioprotetor3. 2. Diminui o Colesterol LDL e sua oxidação – situação inicial do processo de aterosclerose4. 3. Diminui a agregação plaquetária e o fibrinogênio e aumenta a atividade fibrinolítica e antitrombina – todas ações que dificultam a formação de coágulo, que é a causa principal de oclusão dos vasos sangüíneos. Fato este que causa infarto do miocárdio, derrame cerebral e gangrenas5. 4. Modifica a camada interna dos vasos sangüíneos – o endotélio, alterando a produção de óxido nítrico e diminuindo outras moléculas de adesão ao endotélio, dificultando dessa maneira a aterosclerose6. 5. Aumento da resistência e elasticidade da parede vascular2. 6. Dilata os vasos sangüíneos diminuindo a resistência ao trabalho do coração7. 3. VINHO E ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL (AVC): Os acidentes vasculares cerebrais podem ser isquêmicos (quando há uma obstrução de um ou mais vasos diminuindo o aporte sangüíneo) ou hemorrágicos (quando um ou mais vasos rompem e extravasam sangue no tecido cerebral). Os AVC isquêmicos representam 70% das ocorrências dessa patologia. As pessoas que têm o hábito regular de beber vinho moderadamente têm 40 a 60% menos riscos de desenvolver AVC isquêmico8. Já o consumo abusivo (mais de 5 copos por dia) aumenta o risco de AVC hemorrágico9. 4. VINHO E PRESSÃO ARTERIAL: A relação da ingesta moderada de bebidas alcoólicas, inclusive vinho, com a Pressão Arterial não está definitivamente esclarecida. Existem muitos estudos, alguns contraditórios. O consumo aumentada de álcool (50 g ou mais por dia, que equivalem a mais de 5 copos de vinho) aumentam a Pressão Arterial10. Estudos feitos em várias partes do mundo sugerem que a ingesta baixa de bebidas alcoólicas baixem a Pressão Arterial, tanto a Sistólica (máxima) como a Diastólica (mínima)11. Um estudo feito no Brasil pelo Dr. Moura, da UERJ, encontrou num polifenol do vinho, oriundo da casca da uva, uma ação vasodilatadora. Isso reduz a Pressão Arterial. Desse modo, o vinho bebido moderada e regularmente, junto às refeições, teria uma ação anti-hipertensiva maior que as outras bebidas alcoólicas. Neste estudo feito pelo professor Moura, com ratos, ele encontrou um efeito hipotensor nas variedades de uva Vitis labrusca (usadas para fazer vinhos comuns) maior que nas variedades Vitis vinifera (usadas para fazer vinhos finos)12. 5. VINHO E CÂNCER: Apesar dos avanços da Medicina o câncer ainda é a segunda causa de morte no mundo, depois das doenças cardiocirculatórias, representando um grande problema de saúde. As pessoas que têm o hábito regular de beber vinho moderadamente junto com as refeições têm 20% menos chance de desenvolver câncer de qualquer tipo13. E essa proteção se deve aos polifenóis que agem bloqueando tanto o início, como o crescimento e disseminação da doença14. Alguns cânceres têm relação direta com o consumo de bebidas alcoólicas. Isso significa dizer que quanto maior a ingesta de álcool maior o risco de ter a doença. Entre eles estão os cânceres de boca15, pulmão16, próstata17, mama18 e intestino19. Essa relação é verdadeira apenas para cervejas e destilado. O vinho mostrou uma proteção ao desenvolvimento destas doenças. As mulheres que têm o hábito regular de beber vinho moderadamente têm 50% menos chance de desenvolver câncer de ovário20. Um estudo feito na Universidade de Davis mostrou que ratos cancerosos que receberam uma dieta com extrato seco de vinho tiveram uma sobrevida significativamente superior ao grupo controle21. 6. VINHO E DIABETE: O vinho bebido com moderação e junto com as refeições é a bebida mais favorável para o diabético. Isso porque ele aumenta a sensibilidade das células à ação da insulina. Em decorrência disso ocorre: Melhora o aproveitamento dos açúcares pelas células, evitando o acúmulo no sangue, o que é danoso para o organismo; Diminui a Insulina circulante, o que desencadeia uma série de reações metabólicas que culminam com o ganho de peso; Diminui a necessidade de medicamentos; Diminui a Hemoglobina Glicosilada (um marcador bioquímico usado para avaliar o controle da doença); Favorece ao emagrecimento22. A principal causa de morte dos diabéticos são as doenças cardiocirculatórias. O efeito cardioprotetor do vinho é bem conhecido e representa um benefício adicional para quem sofre desse mal23. Vários estudos epidemiológicos mostram que a ingesta leve e moderada de bebidas alcoólicas, sobretudo vinho, diminui o risco de desenvolver diabete24. Os diabéticos que forem tomar bebidas alcoólicas devem atentar às orientações do Quadro 1. RECOMENDAÇÕES PARA OS DIABÉTICOS QUE FOREM TOMAR BEBIDAS ALCOÓLICAS Só beba se estiver com a doença controlada Beba junto ou logo após uma refeição Beba acompanhado Esteja preparado para hiper e principalmente hipoglicemia Diante de sintomas, faça um teste rápido da glicemia Monitore os níveis de Triglicerídeos, se beber regularmente Contabilize as calorias da bebida na sua dieta Se beber à noite, faça um lanche antes de dormir Prefira vinho tinto seco (é menos calórico) Evite dirigir automóveis e operar máquinas, se beber Quadro 1 – Recomendações para os diabéticos que forem tomar bebidas alcoólicas. 7. VINHO E OBESIDADE: O vinho, principalmente o tinto seco (que é menos calórico), em quantidade que não ultrapasse 10% do valor calórico de toda a dieta, é muito favorável para o obeso25. Muitas clínicas de emagrecimento incluem o vinho no seu cardápio. Alguns polifenóis que existem no vinho tinto destroem os adipócitos por inibição de enzimas metabolizadoras de gordura como a lípase pancreática, a lípase lipoprotéica e a glicerofosfatodesidrogenase26. Os polifenóis do vinho diminuem a resistência das células a Insulina (melhorando o aproveitamento dos carbohidratos pelo organismo) e com isso a quantidade de Insulina circulante (o que sempre está relacionado com uma série de reações metabólicas que culminam com ganho de peso)27. 8. VINHO E ENVELHECIMENTO: Quem bebe vinho às refeições, moderada e regularmente, morre mais tarde e tem melhor qualidade de vida. O envelhecimento das células, dos tecidos e do organismo como um todo é uma ação dos Radicais Livres. O organismo produz substâncias que são neutralizadoras dos Radicais Livres. Mas esta produção diminui com o aumento da idade. Isso é trágico, pois desse modo ficamos mais expostos aos processos biológicos do envelhecimento conforme envelhecemos28. Como os vinhos, mormente os tintos, são ricos em polifenóis que são potentes eliminadores de Radicais Livres, é fácil entender o efeito anti-envelhecimento dessa bebida29. As localidades no mundo onde as pessoas são mais longevas são, quase todas, regiões vitivinícolas. Pesquisadores de Harvard conseguiram com o Resveratrol (que existe em abundância nos vinhos tintos) ativar o gen Sir2, que estabiliza o DNA e com isso diminui o declínio celular. Dessa maneira eles conseguiram aumentar em 70% a vida de alguns seres unicelulares e em 33% a da mosca da fruta30. Esses são dados experimentais e em animais muito simples. Embora muito animadores esses resultados ainda não podem ser transpostos para o homem. 9. VINHO E DEMÊNCIA: As pessoas que bebem vinho regular e moderadamente criam uma barreira ao desenvolvimento de demência pelo envelhecimento. Uma pesquisa feita na região de Bordeaux, na França, mostrou que as pessoas que bebiam de 250 a 500 ml de vinho tinham 75% menos chance de desenvolver o mal de Alzheimer31. Uma série de estudos demonstrou que a ingesta regular e moderada de vinho preserva diretamente o neurônio32 além de proteger a circulação cerebral33. Com isso há uma proteção ao desenvolvimento de demências e outras doenças degenerativas do sistema nervoso34. Desse modo as pessoas envelhecem com melhor qualidade de vida porque apresentam um melhor perfil social35 e psicológico36. 10. VINHO E O SISTEMA DIGESTÓRIO: A digestão de uma refeição acompanhada de vinho é melhor por vários motivos. Um ácido orgânico presente nessa bebida, o cinâmico, estimula a vesícula biliar, que descarrega uma quantidade maior de biles no início do intestino delgado, melhorando e aumentando a digestão das gorduras. Há ainda as oxidases e pectases, enzimas que aceleram e facilitam o processo de digestão. O sorbitol, um álcool derivado de açúcar, que existe no vinho, estimula as secreções biliar e pancreática, importantes na digestão37. O aumento da sensibilidade dos tecidos à Insulina favorece a digestão dos carbohidratos22. Alguns polifenóis do vinho diminuem os movimentos peristálticos do intestino delgado e do intestino grosso. Isso diminui o trânsito intestinal e aumenta o tempo de permanência dos alimentos no tubo digestivo. Com isso as enzimas têm mais tempo para processarem os alimentos, melhorando a digestão, o que é muito saudável2. As pessoas que bebem vinho moderadamente regularmente junto às refeições têm uma proteção ao desenvolvimento de úlceras pépticas. Esta condição clínica é muitas vezes causada por uma bactéria que se chama Helicobacter pylori e está associada a uma quantidade aumentada de Histamina. A Histamina se origina da Histidina por ação da Histidina Descarboxilase. Ela se difunde e exerce os seus efeitos no organismo pela ação de outra enzima: a Hialuronidase. Os polifenóis do vinho agem inibindo tanto a Histidina Descarboxilase como a Hialuronidase38 e inativa o Helicobacter pylori39. 11. VINHO E AS INFECÇÕES: Desde a antiguidade se reconhece no vinho um efeito anti-infeccioso. Acreditavase inicialmente que este efeito se devia ao seu pH muito ácido (2,7 a 3,2) e ao álcool. Estas seriam condições muito hostis às bactérias, que aí não conseguiriam sobreviver. Isso funciona para alguns microrganismos2. Mas na verdade, a principal ação anti-infecciosa do vinho se deve aos antocianos, que têm uma atividade bactericida direta, quando na presença do álcool. Esse polifenol encontra-se na casca da uva e é o responsável pela sua cor e pela do vinho. O espectro de ação dele é grande e pode ser visto do Quadro 237. A natureza, sabiamente, colocou este antibiótico natural na casca das uvas, como um mecanismo de proteção. Certamente este é um dos fatores que a torna tão resistente e permitiu que ela atravessasse os tempos, desde a pré-história. BACTÉRIAS QUE SOFREM AÇÃO BACTERICIDA DO VINHO Gram + Gram Stafilococus Shighellas Streptococus Salmonellas Pneumococus Colibacilos Proteus sp Quadro 2 – Espectro antibiótico do vinho O vinho e o suco de uva, mesmo a diluições muito altas, como 1:1000, inativam uma série grande de vírus, entre eles o herpes vírus simples tipo I (causador do herpes labial), Poliovirus I (causador da poliomielite), o Echovirus, Coxsachie B5. Os grandes responsáveis por isto são as procianidinas, polifenol abundante no vinho e no suco de uva. Elas se ligam aos vírus, impedindo-os de entrarem nas células, onde causariam a infecção37. Um estudo feito durante os anos de 1998 e 1999 na Universidade de Compostela, Espanha, com 4272 professores de cinco Universidades daquele país, evidenciou que quem tomava mais de 14 taças de vinho por semana tinha 40% menos resfriado do que os abstêmios e os que bebiam cerveja ou destilados. Eles observaram também que este efeito era mais significativo para os que tomavam vinho tinto40. 12. VINHO E A SAÚDE DA MULHER: As mulheres que bebem vinho com moderação e regularmente têm atenuadas as manifestações do climatério e da menopausa. Estas manifestações ocorrem quando os ovários entram em falência e diminuem a produção de estrógeno – o hormônio feminino. Esse efeito se deve ao Resveratrol, que existe em abundância principalmente nos vinhos tintos, e tem uma semelhança estrutural (Ver Figura 1) e funcional com o hormônio feminino, sendo por isso reconhecido como um fitoestrógeno41. Um estudo feito com 1.482 mulheres australianas mostrou que a ingesta regular de destilados e cerveja não aumenta a incidência de câncer de ovário, mas a ingesta regular e moderada de vinho diminui em 50% a chance delas desenvolverem esse tipo de doença20. Figura 1 – Estradiol, Diethylstilbestrol e Resveratrol. A osteoporose é uma situação clínica onde há perda de massa óssea, favorecendo as fraturas. Ela ocorre com mais freqüência em pessoas acima dos 45 anos, principalmente em mulheres, sobretudo na menopausa, quando diminui muito a produção de estrógeno, que são importantes na manutenção da arquitetura óssea. Um estudo reuniu um número impressionante (7.598) de mulheres com mais de 75 anos, recrutadas em 5 centros diferentes da França, entre 1992 e 1994. Ele mostrou que as mulheres que tomam de 1 a 3 taças de vinho por dia (sobretudo o tinto) junto com as refeições ganham massa óssea (ao contrário da história natural!) e têm uma proteção ao desenvolvimento de osteoporose42. Esse efeito protetor do osso se deve a três dos componentes do vinho: • álcool, • Quercitina e • Resveratrol. O álcool, em doses baixas (até 30 g por dia), age principalmente inibindo a atividade dos osteoclastos – as células que destroem o osso. Acima dessa dose o efeito é danoso ao metabolismo ósseo e aumenta os riscos de fraturas. Isso ocorre porque em doses altas o álcool passa a ter um efeito tóxico direto e indireto sobre o osso. Essa ação é do álcool e, portanto comum a todas as bebidas alcoólicas2. A Quercitina é um polifenol da uva encontrado em quantidade apreciável nos vinhos tintos. Ela tem um efeito direto sobre o osso aumentando a ação dos osteoblastos (células formadoras de osso) e inibindo os osteoclastos (células que destroem osso). Esse é um benefício encontrado apenas nos vinhos, sobretudo os tintos2. O Resveratrol tem uma estrutura química e funcional semelhante às dos hormônios femininos, que como bem sabemos são usados para tratamento da osteoporose pela sua capacidade de evitar a perda e de regenerar o tecido ósseo2. O consumo de bebidas alcoólicas aumenta a infertilidade feminina na proporção da ingesta. Isso é rigorosamente verdadeiro para outras bebidas, que não o vinho, porque esse aumenta a fertilidade como ficou bem demonstrado pela equipe do Dr. Tolstrup43. 13. VINHO E PELE: Um dos efeitos mais espantosos do vinho é na pele. Ele é tão impressionante talvez porque ela está exposta e nela se pode observar diretamente os resultados. O colágeno e a elastina são substâncias que dão consistência e elasticidade à pele. A colagenase e a elastase são enzimas que destroem o colágeno e a elastina, respectivamente, fazendo com que a pele fique atrófica e menos elástica. Os polifenóis do vinho bloqueiam a ação da colagenase e da elastase, deixando a pele mais elástica e consistente. Além disso, eles melhoram a sua microcirculação e a hidratação. Esses efeitos ocorrem por via tópica (direto na pele) e são potencializados (aumentam em muitas vezes) se também se ingerir polifenóis – e a maneira mais agradável é, sem dúvida, bebendo vinho moderadamente44. O Resveratrol elimina alguns fungos como o Tricophyton sp, Epidermophyton floccosum e microscoporum gypseum, causadores de micoses cutâneas45. 14. VINHO E VISÃO: As duas principais causas de cegueira em pessoas idosas são a catarata e a degeneração macular. A primeira é a opacificação do cristalino – uma lente interna do olho – por ação dos radicais livres. Isso altera muito a refração dificultando a visão. E a degeneração macular é uma alteração da microcirculação da retina que leva a cegueira. Ela acomete 30% das pessoas com mais de 75 anos de idade e é a primeira causa de cegueira nos países desenvolvidos. Como os polifenóis do vinho são potentes varredores de radicais livres e melhoram muito a circulação, as pessoas que têm o hábito de beber vinho moderadamente têm 20% menos de cegueira por idade46. 15. VINHO E REUMATISMOS: Já em 1950 se dizia que os polifenóis do vinho tinham uma ação anti-reumática. Atribuía-se esta ação ao seu potente efeito antioxidante. Foi em 1997 que se constatou ação antiinflamatória dos polifenóis. Ficou demonstrado que ela ocorre tanto por via oral como por via tópica (local)47. O Resveratrol tem um efeito semelhante e superior a alguns antiinflamatórios não hormonais amplamente usados na Medicina contemporânea, como por exemplo, a fenilbutazona e a indometacina. Ele age bloqueando as ciclooxigenases, que são conhecidas pela sigla de COX. Estas enzimas estão implicadas nas reações bioquímicas que culminam com a inflamação. Ele bloqueia tanto a COX1 como a COX248. O ácido úrico é um cristal que tem uma predileção por pequenas articulações onde se deposita e causa inflamação – a gota. É corrente que quem sofre deste reumatismo não deve ingerir bebida alcoólica. Mas um estudo feito na Escola Médica de Harvard, Boston, Massachusetts, USA avaliou especificamente a ingesta de diferentes bebidas alcoólicas e os níveis de ácido úrico. Eles estudaram 14.809 pacientes, sendo 6.932 homens e 7.877 mulheres, todos com mais de 20 anos de idade, entre os anos de 1988 e 1994. A conclusão que chegaram é que a ingestão de cerveja e destilados aumenta fortemente os níveis de ácido úrico no sangue e o vinho não49. 16. VINHO E PULMÃO: Os pacientes portadores de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) se beberem vinho moderadamente terão atenuadas as suas manifestações clínicas. Isso porque o Resveratrol, abundante nos vinhos, diminui as ocitocinas inflamatórias dos macrófagos alveolares50. Pesquisadores da Universidade de Búfalo, Nova Iorque, observaram que as pessoas que têm o hábito regular de beber vinho branco moderadamente têm uma melhor função pulmonar. E função pulmonar tem relação direta com quantidade e qualidade de vida51. Fumantes que tomam vinho regular e moderadamente têm atenuado os malefícios do cigarro52. Entre as bebidas alcoólicas a que mais manifestações alérgicas como urticária e asma é o vinho. Os componentes sulforosos são os principais responsáveis por isso53. 17. CONCLUSÃO: Da mesma forma que se sabe que o consumo abusivo de álcool e danoso ao organismo há muitas evidências dos benefícios do consumo moderado, mormente do vinho. Apesar disso ainda existe muita resistência de autoridades sanitárias e alguns médicos para dizerem que bebida alcoólica, sobretudo vinho, ingerida regular e moderadamente com as refeições é benéfica para a saúde. Isso, a meu ver, se deve a três fatores: aos níveis de evidências, à dependência e à tolerância induzidas pelo álcool. Tolerância é o fato de serem necessárias doses progressivamente maiores de uma substância para ela fazer o mesmo efeito. Isso pode levar à dependência, o que é um problema de saúde e social. Hoje vivemos a época em que o exercício da Medicina é baseado em evidências. Estamos também num processo de mudança de conceito. Até a bem pouco tempo atrás se dizia que tomar bebidas alcoólicas era tão prejudicial quanto fumar. Quase a totalidade dos estudos na área de “vinho e saúde” é dos últimos 20 anos. Na verdade, centenas de milhares de pesquisas ainda não são suficientes para se mudar um conceito na rigorosa ciência médica. Isso também porque a maior parte das pesquisas a esse respeito tem baixo nível de evidência. Mas é necessário entender que todos estudos que hoje têm níveis altos de evidência, no início eram de nível baixo. Hoje já começam a aparecer os estudos com alto nível de evidência e a resistência das autoridades e dos médicos será progressivamente menor para recomendar a ingesta moderada e preferentemente junto com as refeições. O mais importante é saber que as virtudes terapêuticas do vinho só ocorrem se ele for bebido regularmente, com moderação junto com as refeições e se não houver nenhuma contra-indicação a ingesta de bebidas alcoólicas. 1. Renaud S., De Lorgeril M.: Wine, alcohol, platelets and the French Paradox for coronary heart disease. Lancet 1992; 339: 1523-1526. 2. SOUZA FILHO, J.M. Vinho e saúde. In Albuquerque, M.A. et al. Viticultura e enologia: atualizando conceitos. Andradas, MG: Epamig, 2002. cap 1. pág 1-15. 3 Diehl AK, Fuller JH, Mattock MB, Salter AM, El-Gohari R, Keen H. The relationship of high density lipoprotein subfractions to alcohol consumption, other lifestyle factors, and coronary heart disease. Atherosclerosis 1988; 69: 145-153 4 Lasunción MA, Ortega H, Carrero P, Martínez-Botas J, Álvarez JJ, Gómez-Coronado D. Flavonoides del vino y oxidación de las lipoproteínas plasmáticas. En: Medina FX, editor. La alimentación mediterránea. Historia, cultura, nutrición. Barcelona: Icaria-Antrazyt, 1996; 295-308 5 Renaud SC, Beswick AD, Fehily AM, Sharp DS, Elwood PC. Alcohol and platelet aggregation: the Caerphilly prospective heart disease study. Am J Clin Nutr 1992; 55: 1.012-1.017. 6 Laug WE. Ethyl alcohol enhances plasminogen activator secretion by endothelial cells. JAMA 1983; 250: 272-274 7 Venkov CD, Myers PR, Tanner MA, Su M, Vaughan DE. Ethanol increases endothelial nitric oxide production through modulation of nitric oxide synthase expression. Thromb Haemost 1999 Apr;81(4):638-42. 8 Jamrozik, K. et al. The role of lifestyle in the etiology of stroke. A population-based-case-control study in Perth, Western Australia. Stoke., 1994. 25:51-59. 9 Klatsky AL, Friedman GD, Siegelaub AB. Alcohol and mortality: a ten-year Kaiser-Permanente experience. Ann Intern Med 1981; 95: 139-45. 10 Klatsky AL, Freidman GD, Siegelaub AB, et al. Alcohol consumption and blood pressure. N Engl J Med. 1977; 296:1194-1200. 11 Marmot MG, Elliott P, Shipley MJ, et al. Alcohol and blood pressure: The INTERSALT study. BMJ. 1994;308:1263-1267. 12 MOURA, R.S. Vinho e Hipertensão. In Souza FILHO, J.M. Vinho e saúde: vinho como alimento natural. Bento Gonçalves: UCS, 2005. p34. 13 Camargo CA Jr, Stampfer MJ, Glynn RJ, Gaziano JM, Manson JE, Goldhaber SZ, Hennekens CH. Prospective study of moderate alcohol consumption and risk of peripheral arterial disease in US male physicians. Circulation 1997;95:577-80. 14 Jang M, Cai L, Udeani GO, Slowing KV, Thomas CF, Beecher CW, et al. Cancer chemopreventive activity of resveratrol, a natural product derived from grapes. Science. 1997; 275:218-20. 15 Gronbaek M, Deis A, Sorenson TIA, Becker U, Schnohr P, Jensen G. Mortality associated with moderate intakes of wine, beer or spirits. BMJ 1995;310:1165-69 16 Prescott E et al. Alcohol intake and the risk of lung cancer : influence of type of alcoholic beverage. Am J Epidemiol 1999;149(5):463-70. 17 Schoonen WM, Salinas CA, Kiemeney LA, Stanford JL. Alcohol consumption and risk of prostate cancer in middle-aged men. Int J Cancer 2005 Jan 1;113(1):133-40. 18 Zhang Y, Kreger BE, Dorgan JF, Splansky GL, Cupples LA, Ellison RC. Alcohol consumption and risk of breast cancer: the Framingham Study revisited. Am J Epidemiol 1999 Jan 15;149(2):93-101. 19 Wolter F, Stein J. Resveratrol enhances the differentiation induced by butyrate in caco-2 colon cancer cells. J Nutr 2002 Jul;132(7):2082-6. 20 Webb PM, Purdie DM, Bain CJ, Green AC. Alcohol, wine, and risk of epithelial ovarian cancer. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 2004 Apr;13(4):592-9. 21 Clifford A. J. “Delayed tumor onset in transgenic mice fed an amino acid-based diet supplemented with red wine solids”, Am. J. Clin. Nutr., 1996, 64, 748-756. 22 Gin H., “Short-term effect of red wine on insulin requirement and glucose tolerance in diabetic patients”, Diabetes Care, 1992, 15, 4, 546-548. 23 Tanasescu M, Hu FB, Willett WC, Stampfer MJ, Rimm EB. Alcohol consumption and risk of coronary heart disease among men with type 2diabetes mellitus. J Am Coll Cardiol 2001 Dec;38(7):1836-42. 24 Nakanishi, Noriyuki; Suzuki, Kenji; Tatara, Kozo. Alcohol consumption and risk for development of impaired fasting glucose or type 2 diabetes in middle-aged Japanese men. Diabetes Care. 2003 Jan; 26(1): 4854. 25 Vadstrup, E.S. et al. Waist circumference in relation to history of amount and type of alcohol: results from the Copenhagen City Heart Study. International Journal of Obesity (2003) 27, 238246. 26 Yoshikawa M, Shimoda H, Nishida N, Takada M, Matsuda H. Salacia reticulata and Its Polyphenolic Constituents with Lipase Inhibitory and Lipolytic Activities Have Mild Antiobesity Effects in Rats. J Nutr 2002 Jul;132(7):1819-24. 27 Bhathena SJ, Velasquez MT. Beneficial role of dietary phytoestrogens in obesity and diabetes. Am J Clin Nutr 2002 Dec;76(6):1191-201. 28 Bonnefoy M, Drai J, Kostka T. Antioxidants to slow aging, facts and perspectives. Presse Med 2002 Jul 27;31(25):1174-84. 29 Klatsky AL, Armstrong MA. Alcoholic beverage choice and risk of coronary artery disease mortality: do red wine drinkers fare best? Am J Cardiol. 1993; 71:467-9. 30 Konrad, T.H. et. al.: Small molecule activators of sirtuins extend Saccharomyces cerevisiae lifespan. Nature 2003; 425: 191-196. 31 Orgogozo JM, Dartigues JF, Lafont S, Letenneur L, Commenges D, Salamon R, Renaud S, Breteler MB. Wine consumption and dementia in the elderly: a prospective community study in the Bordeaux area. Rev Neurol (Paris). 1997; 153(3):185-92. 32 Sun AY, Simonyi A, Sun GY. The "French Paradox" and beyond: neuroprotective effects of polyphenols. Free Radic Biol Med. 2002 Feb 15;32(4):314-8. 33 Letenneur L. Risk of dementia and alcohol and wine consumption: a review of recent results. Biol Res. 2004;37(2):189-93. 34 Mukamal KJ, Kuller LH, Fitzpatrick AL, Longstreth WT Jr, Mittleman MA, Siscovick DS. Prospective study of alcohol consumption and risk of dementia in older adults. JAMA. 2003; 289(11):1405-13. 35 Mortensen EL, Jensen HH, Sanders SA, Reinisch JM. Better psychological functioning and higher social status may largely explain the apparent health benefits of wine: a study of wine and beer drinking in young Danish adults. Arch Intern Med. 2001; 13-27;161(15):1844-8. 36 McGregor D, Murray RP, Barnes GE. Personality differences between users of wine, beer and spirits in a community sample: the Winnipeg Health and Drinking Survey. J Stud Alcohol. 2003; 64(5):634-40. 37 Masquelier J., La vigne, plante medicínale –Naissance d’une thérapeutique, Paris, Bull. de I’OIV, 1992, 65, 733-734, 175-196. 38 Weisse M. E., “Wine as a digestive aid: comparative antimicrobial effects of bismuth salicylate and red and white wine”, Brit. Med. J., 1995, 311, 1657-1660. 39 Tutel'ian VA, Vasil'ev AV, Kochetkov AM, Pogozheva AV, Lysikova SL, Akol'zina SE, Vorob'eva LSh. Clinical use of flavonoid enriched biologically active food supplements in patients with chronic atrophic gastritis in combination with chroniccholecystitis or bile ducts dyskinesia. Vopr Pitan. 2003;72(1):30-3. 40 Takkouche, Bahi, et col. American Journal of Epidemiology. Vol. 155, No. 9 : 853-858. 2002. 41 Calabrese G. Nonalcoholic compounds of wine: the phytoestrogen resveratrol and moderate red wine consumption during menopause. Drugs Exp Clin Res. 1999;25(2-3):111-4 42 Ganry O, Baudoin C, Fardellone P. Effect of alcohol intake on bone mineral density in elderly women: The EPIDOS Study. Epidemiologie de l'Osteoporose. Am J Epidemiol. 2000 Apr 15;151(8):773-80. 43 Tolstrup JS, Kjaer SK, Holst C, Sharif H, Munk C, Osler M, Schmidt L, Andersen AM, GrOnbAEk M. Alcohol use as predictor for infertility in a representative population of Danish women. Acta Obstet Gynecol Scand. 2003 Aug;82(8):744-749. 44 Masquelier J., La vigne, plante medicínale –Naissance d’une thérapeutique, Paris, Bull. de I’OIV, 1992, 65, 733-734, 175-196. 45 Chan MM. Antimicrobial effect of resveratrol on dermatophytes and bacterial pathogens of the skin. Biochem Pharmacol. 2002 Jan 15;63(2):99-104. 46 Obisesan TO, Hirsch R, Kosoko O, Carlson L, Parrott M. Moderate wine consumption is associated with decreased odds of developing age-related macular degeneration in NHANES-1. J Am Geriatr Soc 1998 Jan;46(1):1-7. 47 Blazso G, Gabor M, Rohdewald P. Antiinflammatory activities of procyanidin-containing extracts from Pinus pinaster Ait. after oral and cutaneous application. Pharmazie. 1997 May;52(5):380-2. 48 de Groot H, Rauen U. Tissue injury by reactive oxygen species and the protective effects of flavonoids. Fundam Clin Pharmacol 1998;12(3):249-55. 49 Choi HK, Curhan G. Beer, liquor, and wine consumption and serum uric acid level: the Third National Health and Nutrition Examination Survey. Arthritis Rheum. 2004 Dec 15;51(6):1023-9. 50 Culpitt SV, Rogers DF, Fenwick PS, Shah P, De Matos C, Russell RE, Barnes PJ, Donnelly LE. Inhibition by red wine extract, resveratrol, of cytokine release by alveolar macrophages in COPD. Thorax. 2003 Nov;58(11):942-6. 51 Schunemann HJ, Grant BJ, Freudenheim JL, Muti P, McCann SE, Kudalkar D, Ram M, Nochajski T, Russell M, Trevisan M. Evidence for a positive association between pulmonary function and wine intake in a population-based study. Sleep Breath. 2002 Dec;6(4):161-73. 52 Hakim IA, Harris RB, Brown S, Chow HH, Wiseman S, Agarwal S, Talbot W. Effect of Increased Tea Consumption on Oxidative DNA Damage among Smokers: A Randomized Controlled Study. J Nutr. 2003 Oct;133(10):3303S-9S. 53 Vally, H; Thompson, P J. Role of sulfite additives in wine induced asthma: single dose and cumulative dose studies. Thorax 2001;56:763-769.