Traqueobronquite infecciosa canina - novidades e

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Traqueobronquite infecciosa canina - novidades e
Traqueobronquite infecciosa canina - novidades e controvérsias
Leonardo Brandão, MV, MSc, PhD
Gerente de Produto Animais de Companhia
Embora não seja o mais adequado, o termo "tosse dos canis" é muito conhecido para a grande maioria dos Médicos
Veterinários - e para muitos proprietários também -. Esta doença pode ser caracterizada como uma infecção respiratória
aguda e altamente contagiosa que pode ocasionar em tosse seca estridente e persistente.
Melhor definida como traqueobronquite infecciosa, esta síndrome pode acometer virtualmente todos os cães,
particularmente aqueles que coabitam em ambientes de alta densidade, como canis, abrigos de animais e lojas. Embora
seja considerada de baixa gravidade, a taxa de morbidade pode chegar a 50% entre animais susceptíveis (FORD, 2006;
EDINBORO et al., 2004). Os surtos de traqueobronquite infecciosa canina são considerados relativamente comuns,
podendo representar um desafio para o manejo dos animais infectados, especialmente quando se trata de grande
números de cães afetados simultaneamente. Os hospitais veterinários, especialmente aqueles que oferecem serviços de
hotel para animais, possuem maior nível de risco.
AS MUITAS FACES DA TRAQUEOBRONQUITE INFECCIOSA CANINA
Embora a colonização do trato respiratório inferior pelo agente B. bronchiseptica desempenhe papel fundamental na
patogênese da infecção, a traqueobronquite infecciosa canina é uma síndrome respiratória complexa que envolve a ação
de agentes virais e bacterianos de forma isolada ou concomitante (FORD, 2006; BUONAVOGLIA & MARTELLA, 2007).
Uma combinação de fatores como idade, estado imunológico do indivíduo, tipo e número de microorganismos envolvidos,
e ainda, a existência de doenças concomitantes, contribuem para agravamento dos sintomas da doença.
Do ponto de vista da sintomatologia, a traqueobronquite infecciosa canina pode se manifestar numa plêiade de sintomas,
variando de quadros isolados, brandos e autolimitantes a broncopneumonia fatal em ninhadas inteiras de cães.
A infecção respiratória causada por agentes virais é freqüentemente caracterizada por uma forma branda da doença e
pelo surgimento de sintomas agudos de tosse seca e paroxística, com melhora clínica rápida. A infecção por B.
bronchiseptica, por sua vez, costuma leva a quadros graves da doença devido a uma maior lesão do epitélio respiratório
e predisposição do paciente a infecções secundárias, podendo causar agravamento do quadro em pacientes acometidos
por vírus respiratórios relativamente benignos (ex. parainfluenza). O sítio primário de infecção por B. bronchiseptica é o
epitélio respiratório ciliado, levando à estase ciliar na fase inicial da infecção. A cilioestase em combinação com vários
agentes tóxicos liberados pelas bactérias compromete os mecanismos de defesa do epitélio respiratório predispondo o
paciente ao agravamento da doença respiratória por agentes oportunistas.
MANEJO INDIVIDUAL DO PACIENTE
A transmissão de B. bronchiseptica ocorre pela aerosolização dos agentes infecciosos presentes nas vias respiratórias dos
animais acometidos. De acordo com FORD (2006), bactérias também podem ser transmitidas diretamente por meio de
fômites (vasilhas, pelas mãos de criadores e tratadores e outras fontes). Uma vez infectado, o cão pode manifestar
sintomas de gravidade variável e o tratamento sintomático será instituído na dependência da intensidade dos mesmos. A
elevada prevalência de B. bronchiseptica em cães com traqueobronquite infecciosa justifica o tratamento empírico
baseado em doxiciclina (por via oral) na dose de 5 mg/kg a cada 12 horas (ou 10 mg/kg a cada 24 horas). O tratamento
em animais adultos deve ser mantido por 14 a 21 dias. Espera-se que terapias de curta duração (menos de 7 a 9 dias)
sejam eficientes para resolução da doença em filhotes de cães sem risco de descoloração do esmalte dentário.
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A infecção conjunta por agentes virais resulta na maior persistência e gravidade dos sintomas a despeito da utilização de
terapia antimicrobiana. Uma vez que terapias antivirais ainda não são utilizadas de modo convencional, e a vacinação de
animais já acometidos pela doença não causará alteração no curso da infecção, terapias de curta duração com doses
antiinflamatórias de corticosteróides (ex. prednisolona na dose de 0,25 a 0,5 mg/kg por via oral 1 a 2 vezes por dia)
podem ser muito úteis para controle da tosse. Tratamentos de suporte com medicamentos broncodilatadores,
antitussígenos, antiinflamatórios não-esteróides e terapia via aerosolização foram recentemente descritos (FORD, 2006).
MANEJO DE SURTOS
Um dos maiores desafios para o controle da traqueobronquite infecciosa canina é o manejo de surtos da doença; quando
ela ganha força e a gravidade dos sintomas costuma ser muito maior. Nestes casos, recomenda-se o isolamento dos
animais doentes e dos susceptíveis como a melhor forma de controle da doença. Caso o isolamento não seja possível,
recomenda-se o tratamento diário de todos os animais com antibióticos até a remissão dos sintomas. Quando não for
possível o isolamento de animais entrantes na colônia (em casos de canis ou abrigo de animais), recomenda-se o
tratamento imediato com doxiciclina (no momento da admissão do animal) por um período de 10 dias. A administração
de vacinas intranasais para animais manifestando sintomas da doença não abrevia o curso da infecção nem reduz a
gravidade dos sintomas.
VACINAÇÃO
Embora existam várias vacinas licenciadas para auxílio na prevenção dos sintomas associados à traqueobronquite
infecciosa canina, nenhuma vacina promove proteção contra todos os patógenos potenciais desta síndrome (vide Quadro
1).
Agentes virais
Vírus da cinomose canina
Adenovírus canino tipo 2
Herpesvírus canino
Vírus da influenza canina
Vírus da parainfluenza canina
Reovírus canino tipos 1, 2 e 3
Coronavírus pantrópico canino
Coronavírus respiratório canino
Agentes bacterianos
Bordetella bronchiseptica
Streptococcus equi subsp. zooepidemicus
Mycoplasma spp.
Quadro 1 - Patógenos associados à traqueobronquite infecciosa canina
(FORD, 2006; BUONAVOGLIA & MARTELLA, 2007).
Independentemente da via de administração (intranasal ou parenteral), cães vacinados demonstram menor intensidade
dos sintomas (tosse) quando comparados com animais controles não vacinados (FORD, 2006). As vacinas intranasais
vivas atenuadas apresentam o benefício de induzir proteção com apenas uma dose após a primovacinação, apesar desta
forma de aplicação ser considerada por muitos clínicos como mais trabalhosa e pouco tolerada por alguns animais. Por
outro lado, sabe-se que as vacinas intranasais parecem sofrer interferência na revacinação anual de adultos, o que pode
interferir com o reforço vacinal desses animais (ELLIS et al., 2002).
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As vacinas inativadas parenterais necessitam de 2 doses na primovacinação de filhotes ou adultos que nunca tiveram
contato com a vacina, mas apresentam o benefício da facilidade de administração (a aplicação é freqüentemente melhor
tolerada pelos animais), e ainda, não parecem interferir com a revacinação anual dos adultos, possibilitando uma
resposta anual de revacinação mais potente (ELLIS et al., 2002).
Por último, vale a pena ressaltar que, de formar similar à vacinação contra outras afecções respiratórias em diferentes
espécies animais e seres humanos, os animais vacinados podem desenvolver os sintomas da doença, independentemente
da vacina utilizada. No entanto, a evolução dos sintomas e sua gravidade tendem a ser muito minimizadas, havendo
ainda menor eliminação dos agentes infecciosos pelos animais afetados em caso do desenvolvimento dos sintomas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BUONAVOGLIA, C.; MARTELLA, V. Canine Respiratory Viruses. Veterinary Research, v. 38, p. 355-373, 2007.
ELLIS, J.A.; KRAKOWKA, G.S.; DAYTON, A.D. Comparative efficacy of an injectable vaccine and an intranasal vaccine in
stimulating Bordetella bronchiseptica-reactive antibody responses in seropositive dogs. Journal of American
Veterinary Medical Association, v. 220, n. 1, 43-48, 2002.
FORD, R. B. Canine Infectious Traqueobronchitis. In: GREENE, C. E. Infectious diseases of the dog and cat. 3a ed.
Saunders-Elsevier, 54-61, 2006.
EDINBORO, C.H.; WARD, M.P.; GLICKMAN, L.T. A placebo-controlled trial of two intranasal vaccines to prevent
tracheobronquitis (kennel cough) in dogs entering a humane shelter. Prev. Vet. Med., v. 62, p. 89-99, 2004.
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