comunicação intercultural para brasileiros. uma cartilha de

Transcrição

comunicação intercultural para brasileiros. uma cartilha de
Comunicação
intercultural para
brasileiros.
Uma cartilha de
conversação.
Autor: Bernd Müller-Jacquier, Universität Bayreuth
Tradução: Linda Mandel
Contribuição: Isadora Teixeira Vilela (Bayreuth/Belo Horizonte)
Comunicação
intercultural para
brasileiros.
Uma cartilha de
conversação.
Autor: Bernd Müller-Jacquier, Universität Bayreuth
Tradução: Linda Mandel
Contribuição: Isadora Teixeira Vilela (Bayreuth/Belo Horizonte)
Confederação das Associações Comerciais
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Sumário
1
INTRODUÇÃO .............................................................................. 7
2
PESQUISA .................................................................................... 9
3
2.1
Impressões de experiências interculturais ........................................................................... 9
2.2
O conselho dos especialistas ............................................................................................. 12
2.3
Componentes da comunicação intercultural: dois estudos de caso .................................... 13
2.4
Pessoa – Situação – Enunciado – Cultura ............................................................................ 17
2.5
Comunicação intercultural: a matriz do processo ................................................................ 18
CONSCIÊNCIA LINGUÍSTICA DAS CULTURAS:
A TIPIFICAÇÃO DE PROBLEMAS INTERATIVOS....................... 21
3.1
Diferentes significados sociais/léxicos ................................................................................ 22
3.2
Formas específicas de realização de atos da fala / Sequências de atos da fala ................... 29
3.3
Diversas convenções em relação à estruturação do discurso ............................................. 33
3.4
Variação nas preferências temáticas .................................................................................... 35
3.5
Modalidades preferenciais específicas: estilo direto/indireto ...............................................36
3.6
Variações no uso de registros linguísticos (formas lexicais) .................................................39
3.7
Uso diverso de fatores paraverbais ...................................................................................... 40
3.8
Signos não verbais específicos ............................................................................................ 42
3.9
Etiqueta e comportamento situacional adequado ............................................................... 45
3.10
Perspectivas de valores/atitudes/crenças culturalmente específicas .................................. 47
4
COMUNICAÇÃO COMO PRODUTO COLETIVO........................ 53
5
COMPETÊNCIAS INTERCULTURAIS E BEST PRACTICES ...... 55
5.1
Complementaridade e sinergia ............................................................................................ 56
5.2
Competências relacionadas com o idioma............................................................................ 56
6
GLOSSÁRIO ................................................................................ 58
7
REFERÊNCIAS ............................................................................ 62
6
1 INTRODUÇÃO
O crescimento da economia no Brasil resulta em um aumento das
cooperações interculturais. Isso abrange áreas clássicas da economia
como compras/vendas, marketing ou joint projects e inclui, igualmente,
a cooperação para o desenvolvimento, por exemplo, nas antigas
colônias portuguesas.
Diferentemente dos contatos entre brasileiros e parceiros de outras
culturas motivados pelo turismo, a cooperação na área econômica é
caracterizada por uma outra qualidade de colaboração. Isto é, por uma
certa sustentabilidade: desenvolvem-se e perseguem-se objetivos
comuns. Assim, a categorização “pessoas da cultura ‘A’ visitam
pessoas da cultura ‘B’” é relativizada, e isso em favor de: Profissionais
do país ‘X’ e do país ‘Y’ que trabalham para atingir o objetivo ‘Z’.
Essa segunda afirmação indica que o objetivo é abordado de forma
cooperativa e que ambos os lados procuram adaptar-se mutuamente.
Nesse contexto, associar as pessoas a determinadas culturas pode
assumir uma importância secundária, pelo menos no âmbito da teoria,
que vê convergências culturais como resultados da internacionalização.
Na prática, porém, é justamente nas cooperações econômicas
internacionais que se revelam diferenças em diversos níveis, as quais
são consideradas “culturais”.
O fenômeno no qual muitos brasileiros e seus parceiros de negócios
internacionais consideram desvios daquilo que veem como
“comportamento normal” como “diferença cultural” é largamente
difundido (hajam vistas as publicações recentes de orientação para
encontros interculturais). Diferentes expectativas de normalidade são
manifestadas no plano da linguagem e são, durante as interações,
trabalhadas e revistas na comunicação. Sabemos que é impossível
ler os pensamentos do interlocutor no momento de negociação ou
discussão. E esse simples “dado” é o foco da presente cartilha. Não
existem análises empíricas disponíveis sobre a questão de como
brasileiros se comunicam com alemães e outros estrangeiros, e
trabalham conjuntamente num contexto intercultural. Diante do poder
econômico do Brasil, esse resultado é surpreendente.
7
8
2 PESQUISA
Um recurso para identificar os problemas que surgem na comunicação
intercultural consiste em entrevistar pessoas que possuem múltiplas
experiências na área da comunicação econômica intercultural.
A presente cartilha1 abrange, igualmente, esse tipo de relato de
experiência. Interpretações espontâneas do comportamento de
interlocutores de outras culturas, incluídas pelos entrevistados em
seus relatos, são complementadas, entretanto, de forma sistemática
por outras alternativas de explicação.
Uma rodada de entrevistas, realizada em diversos locais no
Brasil2, buscou identificar problemas concretos da comunicação
econômica intercultural entre brasileiros e parceiros internacionais.
Os resultados servem aqui como ilustração para esses problemas.
Inicialmente, são apresentadas algumas séries de complicações
que foram mencionadas de forma recorrente.
2.1 Impressões de experiências
interculturais
Em geral, pode-se afirmar que os profissionais entrevistados dispõem
de ampla experiência na comunicação com parceiros estrangeiros
(de países como Itália, Moçambique, Japão, China, Coreia, Paquistão,
EUA, Grã-Bretanha, França, Suíça e Alemanha). Alguns tiveram
inclusive a experiência de viver nos países mencionados. De forma
geral, muitos deles apontam que o conhecimento de línguas
estrangeiras e “conhecimentos interculturais” são importantes. Mais
precisamente: habilidades de comunicação intercultural. Afirmações
nesse sentido, consideradas relevantes, são apresentadas a seguir.
1 Agradeço à Linda Mandel, pela tradução para o português brasileiro, à Sibele Piedade Cestari
(pesquisadora, Rio de Janeiro), à Carolina de Viterbo (estudante) e à Elen Machado (intercultural
coach, Stuttgart, Alemanha) pela revisão crítica deste material. Isadora Teixeira Vilela (Bayreuth/Belo
Horizonte) contribuiu com meticulosidade para a revisão final do texto como um todo, na perspectiva
de um leitor brasileiro. À ela, um obrigado especial.
2 A pesquisa foi realizada em fevereiro de 2012 no Recife/PE, em Florianópolis/SC e em Curitiba/PR
[com apoio do BFZ (Centro de Formação Profissional de Baviera da Alemanha) da cidade de Hof, no
âmbito do Projeto de Parceria BFZ-CACB, dirigido por Martin Wahl]. Um questionário sobre experiências
profissionais interculturais, que foi utilizado como base para a entrevista pelos pesquisadores (Prof.
Müller-Jacquier; Cristiane Campos Lima), foi enviado com antecedência aos entrevistados (20 brasileiros
e 2 alemães, que se encontravam a época no país), a fim de que estes se preparassem para o perfil das
perguntas. Somos muito gratos a eles por contribuírem com suas experiências. Muitas das situações
retratadas podem ser aqui reconhecidas nos exemplos a serem dados na cartilha.
9
2.1.1 Problemas de idioma
De acordo com os relatos, o inglês era, geralmente,
o idioma utilizado no “mundo dos negócios” e, em
parte, também o português e o espanhol. Mesmo
assim: “Os problemas interacionais percorreram
todas as negociações como um fio condutor”, foi o
relato de muitos.
Pode-se dizer que, em geral, escolhe-se a língua
que representa o melhor denominador comum.
E essa, obviamente, pode ser também uma
espécie de língua mista, por exemplo o português
com uma mistura de termos técnicos do idioma
inglês3. Em uma comunidade de negócios,
raramente seus membros possuem o mesmo
nível de conhecimento do idioma adotado para a
conversação. Em consequência, pode-se afirmar
que eles precisarão se preparar para assimetrias
quanto ao domínio da língua de comunicação.
Disporiam eles de estratégias efetivas para fazeremse compreender da melhor maneira possível,
mesmo com conhecimentos reduzidos do idioma
(ver Cap. 5)?
De modo geral, para ajudar a superar as barreiras do
idioma recorre-se ao uso de expressões não verbais
(por exemplo, linguagem corporal), dicionários
bilíngues, livros com ilustrações de objetos do
cotidiano relevantes para viagens (Graf, 1995)
ou intérpretes. Mesmo assim, são necessárias
determinadas habilidades que deem conta dos
seguintes aspectos: a palavra e/ou a gesticulação
utilizada remete de fato ao significado pretendido
(ver Cap. 3.1)? O intérprete/tradutor acertou naquilo
que se queria expressar? É possível, a partir das
reações dos parceiros na comunicação, identificar
interpretações equívocas e, caso afirmativo,
descrevê-las?
2.1.2 Diferentes atitudes, valores
Muitos entrevistados referiram-se de forma geral
ao fato de que, na cooperação comercial, tornamse visíveis diferenças na concepção de valores.
Eles atribuíram essas diferenças, muitas vezes,
a atitudes culturalmente específicas e alguns
fizeram referência aos estudos de Hofstede e suas
categorias universais de valores4. Nesse contexto, é
preciso esclarecer que valores não são diretamente
observáveis. Eles precisam ser explorados a partir
de afirmações ou ações de terceiros.
Vejamos um exemplo:
Qual é nossa linguagem
em comum?
3 Além de formas mistas como o “Portunhol”.
10
4 Ver a primeira publicação do modelo de 5 dimensões relativo à
descrição comparativa de perspectivas de valores 1991 (ver Cap. 3.10).
“
Ter “iniciativa própria” é muitas
vezes uma característica pessoal
valorizada no mundo dos negócios.
No entanto, devemos nos
perguntar se “iniciativa própria”
é entendida sempre da mesma
forma. Então: o que indica que
alguém possui “iniciativa própria”?
É o fato de alguém levar adiante
processos de solução sem informar
a seus superiores sobre cada
pequena etapa? Ou o contrário:
alguém que faz muitas perguntas
ao assumir tarefas, mostra que está
motivado e que quer desenvolver
iniciativa própria? Ou que quer
evitar incertezas ou, até mesmo,
que se define como alguém que
recebe ordens? Trata-se de alguém
“fixado em detalhes” ou que
apenas quer parecer motivado?
Assim, somente a partir de manifestações linguísticas é possível deduzir uma ou mais atitudes de valor (ver
Cap. 3.10). Qual delas é mais adequada à situação, qual é possivelmente “típica” do ponto de vista cultural?
Mesmo no caso de valores aparentemente gerais – por exemplo, a religiosidade e a subordinação da ação às
ordens divinas –, nem sempre está claro como exatamente eles influenciam o processo de ação conjunta,
coconstruída, numa comunidade cultural.
11
2.2 O conselho dos especialistas
Os parceiros comerciais entrevistados foram
considerados “especialistas culturais”, justamente porque
possuíam vasta experiência na cooperação intercultural.
Quase todos os entrevistados informaram que, em
virtude do idioma comum de negócios5 ser o inglês, não
tinham encontrado problemas relacionados com a língua.
Mesmo assim pode-se argumentar que essa condição
de especialista permanece vaga: são todas as pessoas
que jogaram futebol por algum tempo especialistas
para esse esporte, isto é, são elas capazes de descrever
jogadas de forma analítica e avaliá-las depois? Será
que todos aqueles que sabem cozinhar bem também
sabem escrever bons livros de culinária? A pergunta
acerca de quais são os critérios para considerar alguém
um “especialista cultural” não pode ser tratada aqui de
forma detalhada. Ela também está relacionada com
competências que são relevantes para a descrição de
situações interculturais, isto é, com trocas de perspectiva
na representação e caracterização de avaliações
pessoais, da cultura própria ou de outras culturas. Nessa
investigação, os relatos serão considerados como
fonte importante de informações sobre o que desperta
a atenção dos interlocutores brasileiros, o que eles
consideram problemático e por quê, e quais soluções
eles recomendam. Ao mesmo tempo, as situações
relatadas serão analisadas para verificar se interpretações
alternativas plausíveis (ver Cap. 3) fornecem importantes
esclarecimentos adicionais. Essas reconstruções dos
chamados critical incidents levarão, então, a diferentes
justificativas possíveis que possam ser atribuídas às
experiências relatadas.
A presente cartilha está organizada de forma
a apresentar uma tipificação de problemas da
comunicação (ver Cap. 3.1 até 3.10). Isso é necessário,
porque não se pode aprender muito de relatos
individuais. O objetivo da cartilha é que você, leitor(a),
desenvolva estratégias para situações interculturais
que possam ser utilizadas em diversas situações
de cooperação entre profissionais de diferentes
contextos culturais. A partir de exemplos individuais
de diversas culturas (identificados pelo acréscimo
“BRA” e “ALE”, para Brasil e Alemanha, e sem pretensão
de representatividade), você deverá reconhecer
diversas facetas de um mesmo tipo de problema,
para poder identificar e analisar, de forma autônoma,
potenciais problemas de base comunicativa em
situações reais de comunicação intercultural. Os
exemplos mencionados cumprem justamente esse
objetivo: o de ilustrar, da maneira mais clara possível,
o contraste entre as expectativas de pessoas de
duas diferentes culturas. Tais expectativas seguem
diferentes convenções sobre como produzir e como
interpretar expressões linguísticas. Assim, você não
deve se apropriar dos exemplos e pessoas citadas
como “representantes” de culturas determinadas, e
sim como interlocutoras de culturas contrastantes. A
mensagem desta cartilha, portanto, não é chamar a
atenção para formas típicas de falar e agir, divergentes
e/ou curiosas, possivelmente baseadas em uma
“mentalidade cultural” específica. Os exemplos
deverão servir, ao contrário, para identificar tipos de
problemas e, com isso, treinar uma capacidade geral
de percepção diferenciada quanto às diferenças nas
convenções envolvidas na interação.
Mesmo idioma = comunicação
livre de barreiras?
5 Apenas poucos relataram situações (por exemplo, no caso de viagens
de negócios) em que um parceiro possuía conhecimentos muito reduzidos
do idioma utilizado pelo grupo e nas quais problemas de compreensão
meramente linguísticos ocorreram.
12
Isso deverá possibilitar que você identifique problemas que ocorrem na sua interação profissional com parceiros de
outros países. A sensibilidade para tipos de problemas comunicacionais recorrentes (ver Cap. 3.1 até 3.10) permite que
você reconheça essas perturbações também em outras constelações de diálogo, para, assim, poder reagir de forma
“competente”. Os termos técnicos aqui utilizados e destacados em itálico servem para descrever de forma precisa os
aspectos presentes no processo comunicativo e estão ao final da cartilha elucidados (ver Cap. 6).
2.3Componentes da comunicação intercultural:
dois estudos de caso
Livros de consultoria contêm muitos exemplos de insucessos em situações comunicativas interculturais
(por exemplo: Garcez, 1996; Novinger, 2004; Brökelmann, et al. 2006). A princípio, não há nenhuma objeção
quanto a recorrer aos critical incidents. Às vezes, porém, caberia perguntar quais são as deduções que
podem ser tiradas deles. Abaixo segue um critical incident em tom irônico, que poderia ser oriundo de uma
conversa informal entre parceiros estrangeiros.
“
O hambúrguer queimado
Um japonês, um norte-americano e um alemão entram em um
restaurante. Os três pedem hambúrguer. Na cozinha, o cozinheiro por
algum motivo se distrai e deixa a carne tempo demais no fogo, mas
mesmo assim a serve com pãezinhos, salada e cebolas.
Naturalmente, todos os três clientes percebem que a carne está queimada.
Como reagem o alemão, o norte-americano e o japonês? O alemão
provavelmente criticaria a carne. Sobre o resto da comida ele não falaria nada.
O norte-americano também criticaria a carne, mas ao mesmo tempo
provavelmente elogiaria a salada saborosa ou o pãozinho crocante. Ele,
portanto, suavizaria a crítica, utilizando os chamados softeners.
O japonês, por sua vez, ao ser perguntado pela garçonete se gostou do prato,
elogiaria a salada, a cebola e o pãozinho, mas nada falaria sobre a carne.
No diálogo entre o alemão e o japonês, o alemão provavelmente pensaria
que o japonês ficou altamente satisfeito. No fim das contas, ele só elogiou
(mesmo que não tudo!). Já no diálogo entre japoneses ficaria bem claro
que havia alguma coisa errada com a carne.
De início, outras culturas talvez precisem se acostumar, de alguma
maneira, ao estilo direto dos alemães. Esse estilo direto, entretanto, é até
apreciado por alguns. Pelo menos com os alemães, na maioria dos casos,
sabe-se o que esperar! (Nertinger, 2002, p. 3)
13
Gostei da decoração
da mesa!
O atributivo “estilo direto dos alemães”, observado a
partir de critérios linguísticos pode ser interpretado
de duas maneiras:
(a) Interpretação psicológica/cultural: as
experiências de parceiros estrangeiros mostram
repetidamente que eles percebem os alemães
como “diretos”. E muitos deduzem isso do fato
de que os alemães, simplesmente, “são diretos”.
Alguns modelos de treinamento assumem isso até
como autoimagem: “nós alemães somos diretos,
pelo menos muito mais diretos que os japoneses
ou norte-americanos6”. Segundo essa variante,
há uma característica por trás disso que pode ser
considerada, também em função de sua frequência,
como “tipicamente alemã”.
(b) Interpretação linguística: a intenção de criticar
algo é expressada linguisticamente em alemão de
forma mais explícita (com contextualization cues)
do que, por exemplo, em japonês. Em todas as três
variantes da expressão de crítica no exemplo, os
falantes entendem sua crítica, vista do seu próprio
contexto cultural, como “explícita” e nem mais,
6 Assim, uma empresa de treinamento afirma o seguinte em sua
publicidade: “Na literatura internacional sobre pesquisa cultural, os alemães
são conhecidos pelo seu “estilo direto” duro como a pedra, no que eles são
campeões junto com Israel. Nós damos nomes aos bois, falamos sim ou
não quando achamos certo. Com isso, porém, cavamos um grande abismo
entre nós e os asiáticos, onde o “estilo indireto” é muito importante, e
um não ou um sim é considerado bem mais deselegante ou até mesmo
uma ofensa. Nas suas viagens tente, portanto, ser o menos direto
possível”. [http://www.interkulturelle-verhandlungen.com/typisch-deutsch/
typisch-deutsch-schmerzvolle-selbsterkenntnis-als-1-weg-zur-erfolgreicheninterkulturellen-kommunikation-und-verhandlungsfuhrung/].
A descrição de Schroll-Machl é parecida: “Germans communicate very
directly and explicitly. They formulate important statements directly
and openly and without ‘window dressing’. They can appear rude and
threatening without meaning to or even noticing it. In return, they do not
easily recognise and respond to verbal subtleties such as indirect hints,
messages ‘between the lines’ and many non-verbal signals. They can
therefore often miss the decisive content of an interaction.” (2003, p.170)
[http://www.expatica.com/de/essentials_moving_to/essentials/workingwith-the-germans-focus-on-the-task-at-hand-23880_10093.html].
14
nem menos educada e polida. O mesmo aplicase principalmente nos casos em que os sinais
relacionados com a voz (paraverbais, ver Cap. 3.7),
não verbais, que acompanham a comunicação, não
estão detectados. Bom, o que queremos dizer é
que caso seja uma convenção usual “embrulhar” a
crítica em uma forma linguística determinada, não
é possível deduzir a partir daí que esse embrulho
diferente resulte em atitudes diferentes. A intenção
de crítica é sempre a mesma.
Os duas variantes de interpretação de situações
interculturais – avaliação psicológica e análise
linguística – serão repetidamente mencionados no
decorrer desta cartilha.
O próximo exemplo (Lenz, 1990) ilustra os pontos
mais importantes do campo da comunicação
intercultural. Ele destaca o importante papel
dos critérios linguísticos. Mesmo que alguns
fenômenos linguísticos sejam, provavelmente,
de seu conhecimento, é importante que eles
sejam recorrentemente observados. Isso, porque
problemas relacionados com esses fenômenos, os
quais muitos participantes na interação percebem
apenas inconscientemente, influenciam de forma
decisiva o processo interativo.
Abaixo segue a ilustração desta situação intercultural
referida. Relembramos que as pessoas que
interagem em tais exemplos são consideradas
agentes de culturas contrastantes e sua função
consiste justamente em ilustrar determinados tipos
de problemas comunicacionais7, sem pretensão de
generalizações.
7 Por isso não é necessário que somente os brasileiros sejam base para
todos os exemplos nesta cartilha.
Eu nunca faço críticas
abertamente!
Pois bem, leia cuidadosamente o exemplo abaixo e busque elaborar suas próprias hipóteses sobre o porquê
da irritação dos finlandeses relatada.
“
Uma delegação finlandesa e uma alemã encontraram-se em Hamburgo
para uma reunião de negócios. Ela foi conduzida em idioma alemão, visto
que os finlandeses tinham um conhecimento muito bom deste idioma.
Um alemão tinha perguntado a um colega como eram os finlandeses.
“Tranquilos e simpáticos” foi a resposta, talvez um pouco econômica
em palavras, porém muito cooperativa. Como primeiro passo das
negociações, cada uma das partes apresentou sua posição, anteriormente
preparada por escrito. Depois foi iniciada a discussão.
No seu transcurso, os finlandeses ficaram, em alguns momentos, muito
inquietos. Algumas vezes, eles precisaram interromper os parceiros
alemães para que também pudessem dizer alguma coisa. Em outros
momentos, eles acompanhavam “laconicamente” as explanações dos
parceiros alemães. No fim, eles solicitaram um intervalo nas negociações.
Somente a duras penas eles conseguiram, no final, acertar perspectivas
para uma futura cooperação. E isso, embora ambos os lados tivessem
desenvolvido soluções muito concretas e terem tido tempo suficiente
para discutir tudo detalhadamente.
Os alemães foram embora da reunião muito zangados: “Por que é preciso
extrair tudo deles à força?” -- Os finlandeses estavam bastante irritados: os
alemães teriam sido extremamente agressivos, muitas vezes também maleducados. Um participante alemão ouviu o comentário de um finlandês - que
falou baixinho: “Isso foi, mais uma vez, o rolo compressor alemão”.
15
Linguistas elaboraram análises precisas do diálogo
registrado. Eis aqui o resultado:
A pausa para a troca de turno entre interlocutores
(entre o fim de um enunciado e o início de um
discurso seguinte) é mais longa no finlandês do que
no alemão. Toda vez que os interlocutores alemães
concluíam sua fala e os finlandeses não assumiam
a voz “imediatamente”, os alemães acreditavam
que os finlandeses não queriam contribuir nada e
continuavam falando, muitas vezes justamente no
momento em que os parceiros finlandeses queriam
dizer alguma coisa. Isso fez com que eles se
sentissem interrompidos regularmente e, depois de
algum tempo, reagissem irritados.
Os finlandeses davam para os alemães menos
sinais de escuta (backchanelling; por exemplo por
meio de contato visual, sons afirmativos do tipo
“uhum”), do que estes estavam habituados no
alemão. Assim gerou-se a impressão de que os
parceiros finlandeses não os estavam entendendo.
Resultado: os alemães repetiam sistematicamente
aquilo que já tinham dito, isto é, de maneira
mais insistente (incl. formas não verbais), às
vezes também em voz mais alta. Com isso,
inconscientemente, eles levavam os finlandeses
cada vez mais para a defensiva.
Aqui, uma simples amostragem seria suficiente para
constatar que, na Alemanha, esse comportamento
não seria considerado como “estilo comunicacional
típico alemão”. Dessa maneira, essa atitude
vista como “atropelamento” se apresenta como
resultado de um contexto situacional construído de
forma interativa, isto é, por uma sequência mútua
de reações em cima de reações. O mesmo aplicase ao lado finlandês. Quanto à falta de sinais não
verbais de feedback de seus patrícios, finlandeses
alheios ao grupo, de fato, externaram a suposição
de que estes – quanto mais diretos e insistentes
se mostravam os alemães –, se retraíam cada vez
mais para, possivelmente, não fornecer nenhum
incentivo ao lado alemão para continuar o estilo
de conversação percebido como agressivo e
dominador.
As mesmas funções, como o caráter explícito da
fala ou o mecanismo de alternância do locutor,
apresentam convencionalmente na sua realização
leves variações nos diferentes idiomas. Devido
à falta de sensibilidade para essas diferenças
linguísticas, muitos “especialistas culturais” tiram
conclusões errôneas quanto às características
psicológicas de seus parceiros na comunicação
(mal-educados, agressivos, etc.) e, como
consequência, pressupõem especificidades
culturais. Naturalmente, existem muitas diferenças
de origem cultural. A questão, contudo, é se
elas devem ser correlacionadas com as formas
de expressão aqui ilustradas ou com outras
manifestações linguísticas.
Já faz uma hora que
quero perguntar: quando
vamos fazer uma pausa?
16
2.4Pessoa – Situação – Enunciado – Cultura
Nem sempre é fácil separar problemas de comunicação de outros problemas. Como em toda atividade
comunicativa, os enunciados de um interlocutor estrangeiro podem ser influenciados principalmente por:
»» sua pessoa, sua educação individual, seu estado emocional momentâneo;
»» fatores externos como, por exemplo, condições e limitações temporais ou espaciais relativas à situação
da conversação, particularmente quando se trata de uma situação institucional (hotel, agência de
trabalho, centro para médias empresas, centro de assessoria, etc.);
»» seus conhecimentos de idiomas;
»» seus conhecimentos prévios sobre o assunto tratado;
»» seus conhecimentos sobre a cultura estrangeira e suas formas de comunicação;
»» suas tentativas de ajustar-se àquilo que considera benéfico para a comunicação com os parceiros de
outra cultura.
Estes fatores, de maneira geral, podem ser sistematizados na forma de um “quadrado mágico”:
Pessoa
Situação
Cultura/Valores
Convenções da Comunicação
(Fig. 1: Quadrado dos fatores)
Em situações comunicativas interculturais, o quadrado mágico pode ser considerado como a base (modelo)
de orientação do parceiro da outra cultura. Os quadrados “superpostos” na figura ilustram o seguinte: em
uma situação conjunta de diálogo, sobrepõe-se a maneira como os participantes da interação:
»» introduzem fatores pessoais relevantes para a ação;
»» se orientam conforme fatores da ação específicos à situação;
»» seguem valores culturais específicos;
»» escolhem determinadas convenções próprias ou se apropriam de convenções que lhes são estranhas
(supostamente apropriadas ao destinatário) para as formas de expressão linguísticas e não verbais.
17
Todos esses fatores, estejam eles relacionados
com pessoas, situações e/ou contexto de
adaptação, podem ser acessados, nas situações de
comunicação dadas, apenas com a ajuda de meios
comunicativos expressos e concretos (ver Cap. 3).
Lembramos que pausas na fala e momentos de
silêncio também são formas de expressão.
Ao mesmo tempo é válido que: em geral, nós
não comunicamos com um representante de
uma cultura diferente, isto é, com “o“ alemão,
“o“ angolano, “o“ norte-americano, “o“ francês,
etc., mas com uma pessoa preparada/não
preparada, nesse momento relaxada/tensa, que
conta com muitos/poucos recursos linguísticos,
culturalmente experiente/inexperiente, etc.
e que, ao mesmo tempo, pertence a uma
determinada (sub)cultura. Essa pessoa – e isso
é muito importante – segue, em termos de
interação, determinadas convenções adquiridas
no seu processo de aprendizado da língua e de
socialização. Convenções essas, que muitas
vezes se diferenciam daquelas comportamentais
e linguísticas que outros aprenderam e
consideram “normais” e/ou adequadas.
A ideia central da presente cartilha é que
você, como parte de redes internacionais,
obtenha clareza sobre quais são as convenções
possivelmente seguidas por seus parceiros de
outras culturas. Somente desta forma você estará
hábil a interpretar adequadamente as práticas
comunicativas dos outros.
2.5 Comunicação
intercultural: a matriz do
processo
Conforme o foco, o modelo de comunicação
a seguir apresenta três etapas diferentes, que
correspondem a três momentos do processo
comunicativo. Mesmo que nas publicações sobre
o tema, muitas vezes, esses níveis não sejam
adequadamente diferenciados, é importante que
eles sejam analisados separadamente.
»» O primeiro nível (A) ilustra aquilo que existe
antes da comunicação entre pessoas:
experiências acerca de que convenções da
fala levam “normalmente” a que sucessos
na comunicação, quais padrões de atuação
“funcionam bem” para a realização de que
objetivos de comunicação e que atitudes
são “normais” ou, pelo menos, podem ser
esperadas.
»» O segundo nível (B) abrange o processo em
curso da interação entre pessoas, o uso de
sinais linguísticos e não verbais e as tentativas
mútuas de sua interpretação.
»» O terceiro nível (C) representa resultados
possíveis do processo de comunicação (B):
Quando os participantes tiram com frequência
as mesmas conclusões quanto à experiência
vivenciada (no que se refere à maneira dos
parceiros se comunicarem) (ver Cap. 2.3), então
eles acreditam poder explicar essa experiência
a partir de motivos gerais coletivizantes.
Consequência: eles irão com pressupostos
correspondentemente modificados para futuras
situações de comunicação. Assim, experiências
generalizadas (atribuições coletivizantes)
se transformam em novos pressupostos,
passando a fazer parte de (A).
As análises a seguir têm como foco a área (B).
18
Comunicação intercultural – um modelo processual
(A) Requisitos para a interação
Coparticipante da cultura CBRA disposto à
comunicação; no caso de experiências anteriores
interativas e atributivas com pessoas da cultura CX
– atribuições essenciais sobre CX:
Coparticipante da cultura CX disposto à
comunicação; no caso de experiências anteriores
interativas e atributivas com pessoas da cultura
CBRA – atribuições essenciais sobre CBRA:
Convenções da fala LBRA: léxico (mental),
ações convencionalizadas da fala, estilos de
comunicação, padrões de comportamento não
verbais e paraverbais, padrões fixos de ação
preferências individuais, etc.
Convenções da fala LX: léxico (mental),
ações convencionalizadas da fala, estilos de
comunicação, padrões de comportamento não
verbais e paraverbais, padrões fixos de ação
preferências individuais, etc.
Orientações para a ação: atitudes, valores,
estereótipos, sistema jurídico-legal, ideologias,
história, pressupostos sobre atitudes e modelos
de atuação preferenciais, etc.
Orientações para a ação: atitudes,valores,
estereótipos, sistema jurídico-legal, ideologias,
história, pressupostos sobre atitudes e modelos
de atuação preferenciais, etc.
(B) Processos interativos
Ações de comunicação em situações interculturais CBRA/ LBRA – CX/ LX
(comunicação intercultural)
(1) Pessoas se comunicam na medida em que produzem e interpretam sinais; elas reagem em relação
às interpretações próprias e de terceiros. Para tanto, utilizam (tendencialmente) convenções da
própria língua, padrões de atuação e expectativas de normalidade como modelos de interpretação de
enunciados de outros.
(2) Os interlocutores podem gerar, por consequência, cognições inesperadas, contraditórias e
”desconfortáveis”.
(C) Resultados da interação
(3) Para dar conta dos resultados muitos começam, precariamente, a confundir a categoria dos
problemas: Às ações de comunicação “críticas” são atribuídas intenções diversas, absurdas ou
disposições divergentes, características pessoais culturais.
(4) Mal-entendidos recíprocos; falha na conquista dos objetivos da comunicação.
(5) Se isso acontecer repetidamente, as características alocadas serão imputadas aos parceiros como
atribuições gerais passando assim a fazer parte dos pressupostos da interação (ver acima).
(6) Falta de objetividade (estereótipos, ver acima A) na percepção de futuras situações comunicativas
interculturais (ver acima B) e desconfiança latente em relação às pessoas.
(7) Tendência a evitar contatos diretos com Coparticipantes de CX.
(Fig. 2: Comunicação intercultural como processo: áreas processuais)
19
20
3 CONSCIÊNCIA
LINGUÍSTICA
DAS CULTURAS:
A TIPIFICAÇÃO
DE PROBLEMAS
INTERATIVOS
Pesquisadores têm identificado diversos tipos de problemas nos
processos de interação. Conforme nossa análise (resumida como
Linguistic Awareness of Cultures em Müller-Jacquier, 2000; também
apresentada em Meireles, 2005), são muito poucos os casos em que
esses problemas podem ser atribuídos a uma diferença na perspectiva de
valores especificamente culturais. Não obstante, as pessoas entrevistadas
acreditam que existe uma motivação “cultural” para esses problemas, em
geral eles podem ser definidos como resultado de diferentes convenções,
que “ordenam” a comunicação entre as pessoas.
Essas regras comunicativas possuem uma expressão linguística
específica e estão relacionadas culturalmente com os processos
de socialização. Nas páginas seguintes essas convenções são
ilustradas e organizadas em nove categorias. A décima categoria se
refere à perspectiva de valores (disposições), que é discutida em
uma seção própria.
A relação entre convenções linguísticas (ver Cap. 3.1 até 3.9) e
perspectiva de valores especificamente culturais (ver Cap. 3.10) é
tratada aqui de forma estritamente separada, embora nas entrevistas
seja, às vezes, retratada como uma relação de causa-efeito: “porque
pessoas de C2 (= culturas diferentes) possuem essa ou aquela
atitude (= perspectivas de valores)? Elas se comportam de forma
correspondente no contexto comunicativo.”
É correto afirmar que só é possível reconhecer atitudes/disposições
e crenças/valores a partir de ações comunicativas. Isso significa que
é preciso reconstruí-las, para que os coparticipantes possam refletir
sobre as mesmas.
21
A sua atitude é correta, mas eu
gosto mais da minha!
Para poder identificar as perspectivas de valores, a
ação comunicativa realizada pelos coparticipantes da
interação precisa ser clara. A análise das situações
interculturais segue duas etapas: uma análise
comunicativa muito cuidadosa deve preceder uma
determinação psicológica das atitudes e crenças!
Para que você, leitor(a), possa fazer isso, ou seja,
para que possa desenvolver uma CLA – Consciência
Linguística das Culturas (Meireles, 2005; MüllerJacquier, 2000) são apresentados, nas próximas
páginas, os exemplos típicos de mal-entendidos e
de campos propícios a mal-entendidos. A tipificação
serve como instrumento para que você, a posteriori,
possa categorizar suas próprias situações interativas
críticas, assim como aquelas relatadas por terceiros.
3.1 Diferentes significados
sociais/léxicos
Embora as palavras possam ser traduzidas,
muitas vezes elas se referem a outros conteúdos
semânticos. A “armadilha” na comunicação
intercultural consiste no fato de que muitos dos
participantes da interação se orientam pelos
significados traduzidos e não procuram por
possíveis conteúdos terminológicos diferentes.
Conteúdos estes, que resultam, principalmente,
das funções especiais que os termos cumprem
na outra cultura.
22
“
Em reuniões ou
negociações de projetos
internacionais, usam-se,
muitas vezes, palavras
que aparentam ter o
mesmo significado para
todos os participantes da
interação. Mesmo assim,
eles frequentemente as
associam com significados
(levemente) diferentes.
Portanto, essas palavras
não expressam apenas o
que os dicionários contêm
em termos de “definição”.
Pelo contrário, elas
expressam representações
sociais convencionalizadas
(significados sociais) que
são apreendidos nas
respectivas culturas, por
meio da ação prática e do
discurso.
Conforme pesquisas, há quatro níveis nos quais
as palavras podem, muitas vezes, assumir
significados variados, não equivalentes: nível
abstrato, nível concreto, nível de ação e nível
institucional. Os seguintes exemplos podem
ilustrar isso mais claramente.
Nível Concreto
»» Um relatório de atividades pode variar quanto
ao uso de representações gráficas, quanto
à forma em que o leitor é interpelado, etc.
(Bolten, 1999).
»» Um amigo pode ser associado com diferentes
funções, responsabilidades, etc.
»» A cor preta pode assumir simbolismos variados
em combinação com determinados objetos.
»» Um presente pode ser apropriado para
ocasiões e motivos diferentes; pode receber
trato diferente relativo à sua entrega e abertura;
pode ser avaliado e ponderado quanto ao valor
monetário ou valor conceitual e de origem, etc.
Nível Abstrato
Quando se trata de estabelecer confiança, a
credibilidade dada a uma pessoa é associada a
critérios muito variados (por exemplo, uma boa
capacidade de comunicação ou conhecimento
profundo do assunto de interesse ou, ainda, um
bom relacionamento com pessoas poderosas).
»» Flexibilidade expressa-se em ações ou reações
variadas e diferencia-se, conforme a cultura, de
atribuições como caos.
»» Beleza é relacionada com diferentes
características – muitas vezes, inclusive,
antagônicas (por exemplo, no caso do ideal
de “beleza feminina”, que pode ser ora
associado à imagem de mulheres altas e
esbeltas, ora ao seu oposto, ou seja, à fartura
de formas cheias e redondas).
»» A rotulação caro é avaliada de forma diversa
em relação à receita/salário, ao preço médio do
produto ou serviço na própria cultura ou mesmo à
aparência do objeto ou ao seu status de qualidade
(por exemplo, a ideia de que quanto mais cara a
comida, mais saborosa ela é).
Nível de Ação (Atividade)
»» Fazer um passeio envolve funções e
expectativas diferentes no que se refere à
duração e aos possíveis participantes, por
exemplo em comparação com a caminhada, ou
mesmo com “dar uma volta”, que pode ser um
passeio de carro.
»» Gorjetas são dadas com frequência e valores
variados e utilizando diversos rituais; na
Alemanha, o cliente arredonda o valor para cima
após receber a conta, não necessariamente
calculando os 10% sobre o valor total da
mesma, como é usual nos restaurantes
brasileiros (onde muitas vezes essa quantia já
vem discriminada na conta).
O quê! Você chama isso de
beleza? Mas ela nem usa fio
dental na praia!
23
»» Realizar uma ligação telefônica envolve
formas de proceder que podem variar quanto
às formas de: iniciar o contato, saudar
o interlocutor, identificar-se, introduzir o
assunto e assim por diante.
»» Abraçar alguém ocorre de forma diferente
(variando a intensidade, a duração, e os
movimentos do tronco, braços e cabeça)
conforme o motivo, a ocasião, e dependendo
do destinatário (gênero, idade, grau de
conhecimento, hierarquia social).
»» Da mesma maneira, a associação entre
os objetivos de duas ações varia de forma
específica: por exemplo, a combinação de
fazer amizade e falar de negócios (Assis, 1995,
p. 129) é uma prática comum e vista como
positiva em uma cultura, enquanto não é
favorecida em outra, etc.
Nível Institucional
»» O Departamento de Auditoria e Controle
de Contas pode possuir, em cada empresa,
um status diferente e as correspondentes
possibilidades de controle e/ou poder.
»» Também a alfândega possui, em cada país,
diferentes graus de poder e formas de conduta,
dispondo de imagens diferentes (por exemplo,
em relação à idoneidade).
»» Cabaré aponta, conforme o contexto, para
diferentes lugares e diferentes públicos (por
exemplo, o termo Kabarett na Alemanha referese ao teatro de sátiras políticas).
Após o panorama acima, de campos semânticos de
grupos de palavras, são ilustrados a seguir alguns
termos/conceitos específicos. Um dos muitos
termos que assumem significados culturalmente
diversos é o carro. Em todas as culturas descreve
uma máquina que serve para locomoção de A para
B. Porém, há, muitas vezes, diferenças quanto
ao uso do carro, para além de sua função prática.
24
Essas diferenças estão relacionadas com sua
representação simbólica e seu valor social.
Em algumas culturas o carro serve
reconhecidamente para paquerar: jovens do sexo
masculino tentam conquistar possíveis parceiras/
parceiros circulando de carro e, para tanto,
reconhecem determinadas marcas, modelos e
“formatos” (por exemplo, cor do vidro) como mais
adequados e “eficientes”. Em outras culturas, no
entanto, esses carros podem ser vistos como
expressão de outras atitudes/disposições e crenças/
valores ou apenas de um certo poder financeiro.
Um amigoBRA mal pode ser equiparado a um
freundALE; os alemães muitas vezes têm poucos
amigos e muitos conhecidos. No entanto,
também esse termo não equivale a amigos, pois
estes possuem funções e responsabilidades
mútuas muito específicas e são, na Alemanha,
quase “como membros de uma família”
(Harrison, 1983, p. 10). Em relação à existência de
hierarquias sociais evidentes no Brasil (ver Cap.
3.10) e à importância das relações pessoais para
que fins profissionais sejam atingidos, Silva (2006,
p. 6) cita uma das pessoas por ela entrevistadas:
“Em uma sociedade escravocrata e patriarcal
como a nossa, conexões sociais verticalmente
transgressivas são chave para se conseguir
qualquer coisa. Assim é a cordialidade brasileira,
que muitos gringos confundem com amizade”.
A autora aponta para a combinação específica
de dois conceitos abstratos, presentes na fala
citada: cordialidade e contato/sucesso profissional.
Enquanto, para o caso brasileiro, a combinação
de relações pessoais amigáveis (que seria algo
diferente de uma verdadeira amizade, caracterizado
de forma abrangente como “cordialidade brasileira”)
e negócios profissionais aparece com certa
naturalidade, pesquisas mostram que na Alemanha,
tendencialmente, as duas coisas não costumam se
misturar no “mundo dos negócios” (Fokus, 2009).
“
Também no caso do termo árvore ou do
conjunto de árvores, floresta, existem
grandes diferenças. Enquanto em uma
cultura a árvore é considerada um
símbolo de crescimento, da purificação
ecológica da atmosfera, em outros
lugares ela representa um obstáculo para
a agricultura ou indústria ou apenas um
material combustível (para aquecimento).
As associações que são feitas com o
termo floresta também podem variar
muito de acordo com o contexto: a
floresta pode ser vista como algo que
deve ser evitado, associada ao perigo,
ao selvagem, ao isolamento e à falta
de segurança ou, em outros contextos,
como sinônimo de qualidade de vida, paz
e tranquilidade. Em viagens à Alemanha,
não se assuste caso seja convidado para
um longo passeio na floresta. Os alemães
costumam ter uma relação muito positiva
com esse tipo de programa!
25
Assim, também, as convenções relativas ao tempo
são diferentes. Quando se fala de determinados:
»» momentos no tempo (jetztALE / agoraBRA; às onze
da manhãBRA / um elf uhr frühALE) ou de;
»» espaços temporais (amanhãBRA / morgenALE;
mêsBRA / monatALE), observa-se que eles podem
ser interpretados de forma diferente no Brasil e
na Alemanha.8
Vejamos uma breve comparação:
É útil saber que no Brasil e na Alemanha existem
formas diferentes de lidar com o tema da
pontualidade. Basta mencionar alguns exemplos do
dia a dia: antes do jornal de notícias (tagesschauALE)
na TV alemã é sempre mostrado um relógio, são
contados os segundos e às oito horas em ponto, ele
começa. Depois de exatos 15 minutos acaba.
Impensável para o equivalente brasileiro, o Jornal
Nacional da Rede Globo. O que se sabe é que
começa depois da “Novela das 7” e termina antes
da “Novela das 9”. Quando exatamente, ninguém
sabe, e em momento algum é mostrado um relógio
na TV brasileira. Assim, também ninguém sabe de
antemão a duração exata do noticiário brasileiro.
E não é necessário dizer que “Novela das 7” e
“Novela das 9” não significa que os programas
comecem pontualmente às 19 horas ou às 21 horas.
(Kultbrasil, 2009)
A expressão alemã “às oito” refere-se
tradicionalmente a um momento no tempo. Ele
coincide com a posição dos ponteiros do relógio:
o ponteiro grande apontando para o número 12, o
ponteiro pequeno para o número 8. No português
do Brasil “às oito horas” indica um espaço de
tempo, que pode se situar entre 8h20 e 9h (a
Novela das 7/9, por exemplo, funciona como uma
8 São interessantes os significados que a palavra amanhã pode assumir
no discurso de um brasileiro e que, de acordo com o literato João Ubaldo
Ribeiro, um alemão teria dificuldades em entender. O autor explica:
“Nunca; talvez; vou pensar; eu desapareço; procure outro; não quero;
o ano que vem; se necessário, retornarei ao assunto; em breve; vamos
mudar o assunto, etc”. (1994, p. 32)
26
referência de horário culturalmente específica,
assim como no alemão “depois do noticiário
esportivo – sportschauALE”).
Quando alguém no Brasil marca um encontro
para as 19h‚ ”às sete horas”, cabe se perguntar se
os brasileiros realmente se comprometem para
as 19h (horário no relógio / hora marcada), uma
vez que regularmente se atrasam. É assim que
normalmente é relatado nos livros de consulta sobre
o tema (ver Cap. 7.1). Em relação ao significado da
informação temporal pode-se, também, argumentar
de outra forma: a expressão “às sete horas” não se
refere a um instante no tempo, mas a um espaço
temporal. Ele começa, dependendo da ocasião, por
exemplo às 19h10 e vai até às 19h35, de maneira
que pessoas que chegam dentro desse prazo são
pontuais. Elas simplesmente se atêm à convenção.
E esta “reside” justamente no uso das palavras. Se
elas chegarem antes, por exemplo exatamente às
19h, elas serão tão pouco pontuais (a não ser que
tenham combinado explicitamente o pontual no
sentido do horário britânico) como se aparecessem
depois das 19h40 – dependendo da situação e
do grau de proximidade. E se elas violarem uma
convenção, é provável que sua conduta seja
sancionada, como em todo lugar, porém, talvez,
indiretamente (ver Cap. 5).
Para a pontualidade, portanto, existem convenções
em relação ao horário; elas não podem ser medidas
conforme o momento no tempo expressado. Isso
vale também para outras informações sobre o
tempo. Um bom exemplo é a seguinte expressão,
bem-conhecida no Brasil:
BRA: Poderia conceder-me um minuto?
Naturalmente, e isso se aplica igualmente à
Alemanha, ninguém iria alertar o interlocutor
depois de 60 segundos no sentido de que o
minuto solicitado já passou. Por isso é necessário
identificar, sempre de novo e através da
observação, de que espaço de tempo se trata
O quê?! Eu venho
intencionalmente atrasado e
chego adiantado?
convencionalmente em que comunidade de idiomas
(sobretudo em equipes internacionais são marcados
horários de encontros que não correspondem à
convenção de nenhum país dos participantes, mas
que ficaram convencionadas conforme as best
practices). Por exemplo, a unidade temporal “duas
semanas” pode ser expressa utilizando diferentes
números de dias:
BRA: A referida proibição foi prorrogada por
mais quinze dias (também: quinzena).
ALE: Dieses Verbot wurde um vierzehn Tage
(quatorze dias) verlängert.
No trato com alemães, o tempo aparece muitas
vezes na forma de um calendário de agendamentos.
Ele é uma representação simbólica de que o
tempo é visto como algo que pode ser dividido em
unidades estritamente separadas, nas quais se
persegue um objetivo da ação de cada vez. Esse
tipo de conduta monocrônica prevalece, de fato, na
Alemanha, enquanto no Brasil é dada preferência a
processos policrônicos.9 Assim, no caso brasileiro,
vários objetivos e processos são, em parte,
realizados paralelamente e, se inesperadamente
surgir algo importante, então isso rapidamente é
priorizado enquanto outras tarefas são, por sua vez,
suspensas.
Resumo: em geral, esses significados sociais
não estão no dicionário. Eles representam o
“conhecimento cotidiano do mundo”, não verbal e
9 Ver a anedota de Ribeiro sobre o alemão que ligou para ele, querendo
saber se o estupefato autor “estaria disponível na quarta-feira, 16 de
novembro, às 20:30” (1994, p. 34-35).
culturalmente específico, que precisa ser revelado
a partir da formação de hipóteses. Diferentemente
de muitas outras culturas é possível, na Alemanha,
fazer perguntas aos seus interlocutores sobre certos
significados que podem gerar desentendimentos
(como religião, salário, estado civil), sem com isso
ameaçá-los de “perder a face” (ver a apresentação
crítica do tema em Marcotulio/de Souza, s.d.).
Dessa forma, quando na comunicação intercultural
as pessoas usam palavras ou as interpretam, elas
precisam se perguntar sistematicamente, como
usuários e receptores, se estão entendendo a
mesma coisa. Principalmente palavras que são
parecidas quanto à sua forma (as chamadas
“palavras internacionais”) sugerem fortemente que
também o seu significado é parecido ou até mesmo
igual10. Além disso, também varia a conotação dos
significados entre os polos “positivo-negativo”:
»» FamíliaBRA não equivale necessariamente ao
número de seus membros ao que os alemães
consideram como familieALE. Mas também a
proteção que ela usufrui por parte do estado no
Brasil e na Alemanha apresenta características
diferentes (auxílio-criança, auxílio-educação,
subsídios, isenções fiscais, etc.), além de que
apartamentos/casas são construídos de forma
diferente em relação à acomodação de crianças
e adultos.
»» O termo demonstrationALE parece corresponder
ao termo demonstraçãoBRA. Apesar da
10 Nos casos em que termos foneticamente semelhantes assumem
significados diversos em idiomas diferentes, eles são chamados “falsos
amigos” (falsche freundeALE), em referência à confusão que podem
provocar.
27
similaridade, as duas palavras têm significados
muito diferentes nos respectivos idiomas: a
tradução adequada do termo alemão para o
português seria manifestaçãoBRA (no sentido de
manifestação política, comício, etc.).
»» Dizer de uma pessoa que ela é expansivaBRA
significa que ela é comunicativa e aberta para o
relacionamento com outras pessoas; a tradução
literal expansivALE tem conotação negativa em
alemão: alguém que avança em território alheio.
»» E a qualificação esquisitoBRA é associada
no Brasil com algo “estranho”, enquanto no
espanhol (exquisitoESP) o seu significado é
mais o de “diferente, especial”. Em alemão
(exquisitALE) se usa mais no ambiente culinário:
“delicioso”, “excelente”.
»» FlexibilidadeBRA é muitas vezes enfatizada como
uma qualidade e uma habilidade por parte dos
brasileiros. Do ponto de vista alemão, esse
termo significa a capacidade de adaptação
de uma situação dada para outra no caso de
surgirem fatores inesperados. Portanto, para os
alemães, é mais uma “consequência lógica” da
falta de planejamento.
»» O adjetivo políticoBRA (muito usado na expressão
“Fulano era muito político”BRA) nem sempre
pode ser traduzido no alemão pelo semelhante
politischALE visto que, na maioria dos casos,
o termo é usado no Brasil como sinônimo de
“educado”, “bem-relacionado”, “diplomático” e
não como “politizado”, “ativo no mundo político”,
como o adjetivo alemão sugere.
Como já foi dito, também ações são culturalmente
específicas. Isso já começa com caminhar, isto
é, quando se trata de definir que trajetos são
percorridos a pé em que situações, e em que
circunstâncias se recorre a meios auxiliares (carro,
bicicleta, ônibus, etc.). Assim, sair para caminhar
pode ser, muitas vezes, considerado no Brasil
como desperdício inútil de energia, enquanto
na Alemanha, pelo contrário, é associado ao
relaxamento.
Assim, também, a atividade de consumir bebida
alcoólica desempenha um papel diferente, de
acordo com as interpretações dos entrevistados.
Muitos parceiros de negócios alemães bebem
menos álcool em jantares de negócios do que
seus parceiros de negócios internacionais. Isso é,
em parte, hábito, até certo ponto motivado pela
fiscalização do consumo de álcool no trânsito. E
beber juntos é uma atividade que é menos utilizada
para gerar uma aproximação entre um grupo de
pessoas que não se conhece bem.
Complexas e variadas são as ações que têm
a ver com a perspectiva de valor para evitar
o desperdício de energia, como abrir mão de
viagens de carro desnecessárias ou do consumo
supérfluo de energia elétrica (por exemplo:
Os alemães nunca foram
expansivos, não é mesmo?
28
desligar o computador, reduzir a temperatura do
ar-condicionado). Muitos brasileiros percebem a
conduta econômica e parcimoniosa de alemães,
principalmente quando expressada no próprio país
como conselho ou pedido, como inadequadamente
mesquinha (e em contradição com a evidente
riqueza do país).
Recomendação: visto que todas as unidades
semânticas estão embasadas de forma diferente
em redes culturalmente específicas, é necessário
verificar sistematicamente o seu significado em
cada contexto. Isso é mais válido ainda quando a
comunicação ocorre em uma terceira língua comum
(por exemplo o inglês). Neste caso existe o risco
de que todos os parceiros na interação associem
seus significados culturalmente específicos com as
formas de expressão em inglês. O uso de palavras
iguais promove a ilusão de estar se dizendo a
mesma coisa e os interlocutores ignoram que se
trata de contructos sociais específicos que lhes
podem ser desconhecidos e estranhos.
“
3.2 Formas específicas de
realização de atos da fala /
Sequências de atos da fala
Em todas as comunidades linguísticas existem
intenções idênticas da fala. Elas, no entanto, são
expressadas linguisticamente de forma diferente
dependendo da comunidade. Isto se aplica
aos signos verbais, não verbais e paraverbais
direcionados a outros. Assim, pode acontecer
que os receptores não consigam interpretar
corretamente as intenções subjacentes, uma
vez que estas não foram expressas da maneira
anteriormente conhecida. Como já foi referido,
desentendimentos também podem ocorrer no
caso inverso: diante de expressões estruturalmente
iguais se acredita ser possível identificar a
intenção de forma correta, no entanto, expressões
verbalmente iguais na outra comunidade linguística
podem representar, por convenção, atos diferentes.
Consideramos como ato de fala toda ação que é realizada
através do dizer. Quando se fala com outros, se atua.
Assim, pode-se, por exemplo saudar outras pessoas,
prometer alguma coisa para elas, supor alguma coisa,
agradecer, ameaçar alguém ou confirmar alguma coisa para
alguém, etc. Esses atos de fala exprimem as intenções
que se deseja realizar na interação; eles existem em todos
os idiomas. Porém, eles são frequentemente expressos
linguisticamente de forma diferente.
29
Vejamos alguns exemplos:
Os seguintes atos de fala ilustram que eles podem
ser realizados linguisticamente de forma diferente e
de que maneira isso pode ocorrer.
Agradecer:
»» – Receba os meus/nossos sinceros
agradecimentos!
»» – Obrigado!
»» – Valeu!
»» Sem palavras, apenas com uma leve inclinação
do tronco.
Prometer algo:
»» – A encomenda chegará às suas mãos até, no
máximo, o fim da próxima semana.
»» – O senhor receberá a encomenda até o fim da
próxima semana. Isso é tão certo como a luz do
amanhecer!
»» – Sim, eu posso resolver isso para o(a)
senhor(a).
– Eu vou, pessoalmente, garantir que o senhor
receba a encomenda até o fim da próxima
semana.
convenções que foram estabelecidas em uma
comunidade linguística e cultural. Assim, a
expressão “sim” (“já”) equivale na Alemanha
frequentemente a uma confirmação, concordância
ou consentimento, enquanto a mesma expressão
da boca de um parceiro de negócios asiático
pode apenas significar a disposição para continuar
ouvindo (sinal de que está escutando; assim como
na Alemanha se costuma dizer ao telefone “uhum”,
“ahã” (ver o exemplo dos finlandeses no Cap. 2.3).
Ou: em várias regiões da Alemanha os parceiros
comerciais agradecem com a seguinte observação
explícita: “Ah, mas não era preciso!”. Embora os
locutores acrescentem um olhar ou um tom de
aparente “irritação”, a intenção não é a de um ato de
censura, mas de um ato de agradecimento.
Ressaltar algo como positivo; louvar; fazer elogios:
“Que bonito o seu relógio!”. Esse ato é positivo, isto
é, ele contribui para “manter a face” do parceiro. A
intenção pode ser a de constatação, louvor ou elogio.
Um entrevistado complementa nesse contexto
que conforme a experiência dele (em uma excolônia portuguesa na África), o ato era repetido
pouco tempo depois: “que bonito o seu relógio!”.
Repetições são usadas, em geral, para ressaltar o
que foi dito. E cabe a pergunta: para que expressar
um elogio duas vezes?
Alertar alguém:
»» – Cuidado ao passar a mão em objetos da
empresa... o tiro pode sair pela culatra!
»» – Quem levar objetos de propriedade da
empresa será demitido sem aviso prévio!
»» – Vai, vai pegando mesmo o que não é seu, vai!
Você vai ver no que isso vai dar!
Como se pode ver nos exemplos, atos de fala
enquanto intenções de ação podem ser expressos
de muitas maneiras. Daí resulta um segundo
problema: o tipo de verbalização não depende
apenas da situação. Ele também depende das
30
Aqui é possível, também, uma outra interpretação: a
repetição confere ao objeto uma importância muito
especial, sugerindo indiretamente em algumas
línguas que o próprio locutor está muito interessado
no objeto. Então, ele faria um pedido: “será que
você poderia me dar o relógio de presente?”.
Conforme a convenção, o interlocutor deveria reagir,
oferecendo o objeto como presente. Conhecendo
essa reação, é preciso “recusar” ritualmente a
oferta, ao que se segue um jogo de “por favor,
aceite!”—“não, muito obrigado!”. O resultado é, em
princípio, aberto; em geral, no entanto, o dono pode
permanecer com seu objeto (aqui: relógio). Alguns
Como é que eu vou saber hoje
o que vou fazer em março?!
alemães desconhecem esses rituais e aceitam o
“presente” involuntariamente reivindicado, muitas
vezes só por gentileza. Naturalmente, isso frustra
os parceiros do diálogo e, assim, a colaboração
continua com um problema de comunicação não
esclarecido.11
Repetidamente surgem problemas no caso de
acordos e acertos de prazos. Em alemão esse é um
ato que ocorre em um momento no tempo (pré)
determinado: Veja os exemplos:
BRA: “Em duas semanas, então, lhe entrego,
no mínimo, três pallets de X”.
Alemães esperam e, caso o produto não chegue,
entram em contrato logo ao final do prazo
combinado. No caso dessas reclamações eles
podem expressar sua expectativa/ surpresa/
decepção explicitamente e de forma bastante
“direta” (ver Cap. 3.5), por exemplo:
ALE: “Mas nós tínhamos combinado/Você
prometeu entregar, no mínimo, três pallets até
ontem/antes-de-ontem! Não entendo…”
No Brasil (e também em outros países da região
do Mediterrâneo) esses acordos ou promessas são
implementados, muitas vezes, em duas etapas: a
primeira é a manifestação da intenção, por exemplo
como mostrado acima.
11 Com frequência, os participantes não percebem um problema de
comunicação como tal, mas fazem uma leitura psicológica das ações
do outro, por exemplo atribuindo qualidades como “avidez pessoal” ou
“conduta ilógica”. Se ocorrer repetidamente, a conduta é, muitas vezes,
generalizada como característica cultural.
A segunda etapa consiste em que o destinatário
estabeleça contato com uma certa antecedência,
reforçando de alguma forma que continua
interessado na realização da intenção. Em alguns
casos pode tornar relevante a realização, indicando
que depende dela. Assis (1995, p. 130) aponta para
uma situação em que uma brasileira é convidada
“para o dia 26 de março” e ao aceitar, ela diz:
“Okay, wonderful. Thank you. But just remind me
of it. I don’t consult my agenda and I forget things,
though I’m in touch with you almost every day and
so I won’t forget”.
Se essa segunda etapa de lembrar alguém (muitos
alemães a consideram desnecessária e confiam no
que foi acertado) não acontece, isso significa em
retrospecto que, para o receptor (cliente que espera
um produto ou um serviço), o assunto não é mais
tão importante. Os brasileiros, então, possivelmente
se permitem mais tempo, priorizam outras tarefas
cronologicamente e, de qualquer forma, ficam
totalmente surpresos quando os alemães reclamam
com duras palavras (ver Cap. 4.5).
Um caso extremo de combinar algo propício para
desentendimentos ocorre quando uma pessoa
faz promessas das quais não está plenamente
convencida. Isso acontece quando a simples ideia
de realizar X conjuntamente é atraente e quando
é divertido imaginar um procedimento. Esse
desenvolvimento de ideias pode ser chamado
no Brasil de viajar (gíria, no sentido de viajar no
pensamento) e é, na verdade, uma modalidade
de discurso (ver Cap. 4.5). Um acordo ou uma
promessa feitos em um momento de “viagem”,
31
onde todas as ideias são apenas divagações,
não devem realmente ser entendidos como
compromissos assumidos.
No caso das perguntas é necessário, igualmente,
ter cuidado. Abaixo são discutidas “falsas”
perguntas (porque pela convenção espera-se um
determinado leque de respostas) e perguntas
decisórias (que exigem uma definição na resposta).
Esses exemplos podem interessar especialmente
alemães que atuam comercialmente no Brasil.
Perguntas capciosas
Com quase 100% de certeza você será perguntado
qual é a sua impressão sobre o país anfitrião.
Cuidado: aqui não está sendo questionado o analista
crítico que identificou em 3 dias problemas e falhas
evidentes. Expresse-se de forma positiva. Os
brasileiros podem se permitir reclamar do próprio
país – você como “gringo” recém-chegado deveria,
de qualquer forma, manter uma posição reservada.
O claro e nítido JeinALE (sim/não)
A sua solicitação por uma informação concreta
não será sempre correspondida. Dificilmente
sua pergunta objetiva receberá como resposta
um claro “sim” ou “não”. Será preciso aprender
a conviver com a necessidade de se satisfazer
por determinados períodos com um nítido
JeinALE (mistura de “sim” e “não” em alemão)
para depois retomar o assunto e criar sua
própria avaliação da situação com base nos
fatos observados. Uma prova especial para
sua paciência em relação a solicitações e
requerimentos. (Maier, 2012)
É, portanto, função dos parceiros no diálogo buscar
qualificar e definir ações e afirmações feitas pelos
outros. Se o enunciado “Ah, venha conosco para
nossa casa de veraneio, seria um grande prazer”
for um convite, pode-se marcar uma data. Se for
um comentário educado referente a uma simpática
conversa recém-concluída, uma demonstração de
simpatia, então qualquer tentativa de realização
desse “convite” causaria irritação. Isso, por sua vez,
pode induzir a ver falsas contradições na atuação
dos brasileiros (Primeiro eles dão uma de anfitriões
generosos e depois eles retiram o convite!). Uma tal
reclamação, entretanto, prescinde de fundamento:
pois o primeiro ato, o convite, nem aconteceu
como ato, mesmo que o enunciado sugira isso na
tradução.
Resumo: de modo geral, as atitudes e as ações
podem se diferenciar das intenções de fala em
maior ou menor grau. Em algumas comunidades
linguísticas a intenção é expressada muito
explicitamente, da mesma forma em que a
expectativa também é manifestada (observação:
cultura de baixo contexto). Em outras culturas,
porém, muitos contextos não são verbalizados,
mas, mesmo assim, sistematicamente incluídos no
processo comunicativo (observação: cultura de alto
contexto; ver Cap. 3.5 e Cap. 3.10). Nestes casos
é preciso, constantemente, ficar muito atento para
aquilo que não é dito.
Com a gente é assim: ou você
diz SIM ou diz NÃO!
32
A melhor maneira de identificar as funções de atos de fala é abstrair conscientemente aquilo que foi de
fato falado (verbalização) e perguntar-se quais intenções são manifestadas por meio de determinadas
expressões. E se ainda restarem dúvidas e certa insegurança, pode-se tranquilamente sondar se a
comunicação foi efetivamente bem-sucedida fazendo novas perguntas – muitas vezes mais claras, como,
por exemplo, no caso de um brasileiro na Alemanha que pergunta diretamente “por que vocês o tempo todo
mandam um ao outro saudar a Deus?”12
3.3 Diversas convenções em relação à estruturação do discurso
Conversações em contextos similares transcorrem de forma diferente em diversas comunidades
linguísticas. No âmbito macro constatam-se sequências diferentes, por exemplo na conversa trivial ou
conversa fiada (small talk). Isso mostra que os locutores organizam sua fala e seguem determinadas etapas
passo a passo. No âmbito micro trata-se de técnicas diferentes na troca de turno dos locutores.
“
Na comunicação instituímos os chamados marcos,
isto é, com determinados modos de falar seguimos
as convenções próprias de cada tipo de conversação:
entrevistas de emprego, reunião, conversa trivial ou
“conversa fiada”, avaliação de desempenho, negociação,
primeiro encontro, etc. É possível analisar a estrutura
concreta desses tipos de conversações através de um
levantamento sistemático de perguntas básicas: a) Quem
abre a conversação? b) Quem faz a transição para a
despedida? c) Que fases específicas a conversação precisa
conter? d) Qual é a duração e a importância de cada fase?
e) Quem possui em que fase o direito à palavra (papéis do
locutor/ouvinte)? f) Que temas precisam ser abordados em
que fase da conversação?, etc.
12 Referência à possível surpresa de um brasileiro sobre a troca recíproca de “Salve Deus!/Grüß Gott!”, como saudação costumeira no Sul da Alemanha.
33
Abaixo alguns exemplos de convenções relevantes
para situações selecionadas:
Primeiro encontro
ConvençãoBRA: alguém aborda repetidamente temas
típicos de conversa trivial ou conversa fiada, ao
invés de ir “direto ao assunto” (convençãoALE).
Uma das partes oferece que ambos se tratem
mutuamente pelo primeiro nome, ao invés de
sugerir o tratamento na segunda pessoa: vocêBRA /
duALE depois de um tempo maior de colaboração e
de estabelecimento de uma relação de confiança.
Cotidiano do trabalho
As pessoas que fazem um telefonema esperam que
quem recebe uma ligação diga imediatamente o seu
nome (convençãoALE, ver Assis, 1995, p. 124).
ConvençãoBRA: alguém pergunta demoradamente
sobre o bem-estar do interlocutor, antes de
expressar o pedido (solicitação de alguma coisa),
ao invés de apresentar logo o motivo para o
estabelecimento do contato (convençãoALE).
Alguém dá um relato de experiência durante a
elaboração dos itens da pauta de uma reunião
(possibilidade/costumeBRA), ao invés de, conforme a
regraALE, fazer isso apenas no momento em que o
item da pauta for “relatos de experiência”.
Muitos livros de orientação para relações
interculturais trazem a recomendação para alemães
de “investirem tempo” nas relações de negócios
com o Brasil. Precisamente nos primeiros contatos,
fala-se longamente sobre temas (ver Cap. 3.4) que
não tem nada a ver com o projeto pretendido, mas
com conhecer-se melhor pessoalmente. Em relação
à estrutura do tipo de conversação, isso significa
que as convenções preveem, no início, uma fase
mais longa para as pessoas se situarem.
Em geral, não é incomum no Brasil que em uma
conversação sejam conduzidas várias conversas
paralelas, sem que alguém se sinta incomodado.
O que pode ser visto como caótico ou até mesmo
agressivo.
No que se refere a essa experiência, Han/Epp
apontam para uma singularidade no âmbito micro:
In a Brazilian office people come in and out, and
several conversations are carried on at once.
People do not take turns speaking. One might
interrupt conversation or speak simultaneously.
(Han/Epp et al., 2008, p. 8)
Outra publicação sobre o tema relata algo similar:
Silence within a conversation is uncommon,
where interrupting is a sign of enthusiasm
rather than rudeness. (IBC, 2011)
Segundo Frota/Schmidt (1986), no entanto,
existem diferentes convenções quanto à troca de
turno dos locutores: em algumas comunidades
linguísticas, se começa a responder depois
de o locutor anterior ter concluído sua fala,
especificamente após uma micropausa (cuja
duração varia nos diversos idiomas).
Paquerar mesmo o Senhor só
pode depois da reunião!
34
Em outras, pode-se começar, segundo a convenção,
uma vez que se tenha compreendido o que o outro
quer dizer. Isso leva à ocorrência de uma sobreposição
entre a contribuição anterior e o início da próxima, o
que é interpretado como sobreposição e não como
interrupção, como alguns autores afirmam:
Do expect to be interrupted. The Brazilian method of
communication usually entails a lot of overlapping
speech. (Communicaid, 2009, p. 4)
“
Convenções linguísticoculturais influenciam
o que será definido
como tema em um
determinado lugar,
no âmbito de um
determinado tipo de
Interrupções e outras formas de negociação da troca de
turno de locutores (ver exemplo dos finlandeses, Cap.
2.3), em situações interculturais, não são percebidas
conscientemente pela maior parte dos participantes
da interação.13 Nessas situações, portanto, todos os
conversação, ou talvez o
parceiros, em geral, utilizam as regras de sua língua
nativa e interpretam psicologicamente os desvios
inusitados dos outros locutores (por exemplo: como
tentativa de dominar, entusiasmo, etc. ou, por outro
lado, discrição, timidez, falta de conhecimento do
assunto ou do idioma de comunicação). Como não
existe uma fórmula mágica de “bom comportamento”,
nem uma convenção universal, você deve estar sempre
atento aos sinais de seus interlocutores para não impor,
de forma desconfortável, o seu “tipo” de convenção.
situações comunicativas
3.4 Variação nas
preferências temáticas
O Capítulo 3.2 mostra claramente que nem todos os
atos de fala conduzem necessariamente para os temas
que são aparentemente enunciados. Assim, nem
“como vai a sua família?” é um convite indireto para
contar as últimas notícias sobre a família, nem “how
are you?” é uma pergunta sobre o estado de saúde da
pessoa. Esses atos não têm como objetivo introduzir
o tema de uma conversação, mas têm outras funções.
Quando é, então, que se trata realmente de introduzir
um tema e quais são os temas, em geral, que podem
ser abordados?
assunto que poderá ser
abordado. Para muitas
existe uma espécie de
“cardápio de assuntos”,
isto é, uma série de
conteúdos que são
normalmente abordados
ou que, potencialmente,
poderiam ser
abordados. Mesmo em
situações ou tipos de
conversação similares,
a escolha dos temas e
sua estruturação varia
de cultura para cultura.
13 As regras para a troca de turno dos locutores em determinadas situações
comunicativas deveriam ser abordadas no ensino de línguas estrangeiras
(Couto, 2012).
35
Alguns exemplos:
Em que culturas é possível, por exemplo, no
primeiro encontro ou em situações de conversa
trivial ou conversa fiada (small talk) falar sobre:
»» O estado de saúde?
»» A vida profissional dos filhos?
»» Doenças (inclusive de parentes)?
»» O cargo na profissão?
»» O salário anual?
Essas informações, no entanto, parecem
demasiadamente vagas: as recomendações são
válidas para toda e qualquer situação? E sobre o
que falam homens solteiros sem interesse por
futebol? Claro que a lista pode ser aprimorada. Mas,
em última instância, fica a critério dos envolvidos
identificar que temas são aceitos em situações
mais formais e menos formais. De nenhuma
maneira deve-se tentar impor o “seu” tema a
outras pessoas, ou ignorar indicações para concluir
o assunto (por exemplo: desvio do olhar, falta de
perguntas relacionadas ou sinais de retorno, ou
então tentativas de mudar de assunto).
»» O estado civil?
»» Planos de carreira?
»» O partido em que se vota?
»» Tentativas fracassadas de solução de
problemas?
»» Religião a que se pertence?
E nos casos em que o assunto é pertinente, em
que fase da conversação e como o tema deve
ser abordado (ver Cap. 3.5)? A literatura sobre
relações interculturais elenca o seguinte para o caso
brasileiro:
»» Good conversation topics: soccer, family, and
children.
»» Bad conversation topics: Argentina, politics,
poverty, religion, and the Rain Forest.
(Brazil business etiquette & culture, s.d.)
3.5 Modalidades
preferenciais específicas: estilo
direto/indireto
Muitas publicações sobre comunicação intercultural
ressaltam, em geral, que pessoas em determinadas
culturas não dizem tudo o que pensam. E
quem pesquisar “yes means no in intercultural
communication” no Google encontrará mais de
100 respostas relevantes. Isso mostra a atitude
conforme a qual as pessoas exprimem verbalmente,
porém acabam dizendo outra no seu enunciado
(intenção da fala).
Isso vale, principalmente, para a comunicação
intercultural onde falantes não nativos “traduzem”
os enunciados em língua estrangeira e naturalmente
se guiam pelas formas de expressão verbais.
Uhmm, que prazer falar
sobre o tempo...
36
A relação entre as formas linguísticas e o que se deseja expressar com elas precisa, portanto, ser
cuidadosamente analisada.
“
Ser direto e explícito é um padrão amplamente difundido
na Alemanha (ver Cap. 3.9). Ainda assim, é difícil definir
linguisticamente o que é “ser direto”. Quando se pergunta o
que estrangeiros consideram como “direto” nas formas de
comunicação alemãs é, muitas vezes, a opinião explícita,
claramente manifestada, a expressão “sem retoques” de
desejos e sentimentos e, sobretudo, de crítica.
Principalmente atos de fala relacionados com “manter a
face”, por exemplo criticar, rejeitar, elogiar, prometer ou
agradecer são expressados muito explicitamente em uma
comunidade linguística, enquanto em outra são formulados
de forma bem mais vaga. Em alemão, falantes não nativos
muitas vezes têm a impressão de não serem levados
totalmente a sério pelos interlocutores alemães, uma vez
que estes querem explicar-lhes tudo detalhadamente (por
exemplo: instruções, tarefas no trabalho).
“Os alemães são diretos”. Essa constatação aparece como um fio condutor em todos os relatos sobre
experiências de interações com alemães. “Na Alemanha, se a pessoa não vai fazer é provável que ela diga
que não vai fazer. Aqui as coisas negativas, as respostas negativas não vão ser faladas direto.” (Carvalho/
Trevisan (2003, p. 83), como disse um brasileiro. A questão, agora, é se os alemães são diretos no
sentido psicológico ou se aparecem como tais, porque expressam suas intenções, avaliações, opiniões ou
sugestões de forma explícita.
37
Observe os exemplos:
LocutorALE: Bem, essa posição é para mim
totalmente incompreensível. Isso, na verdade,
significa um retrocesso aos anos noventa!
LocutorALE: Não acredito! Não há espaço para isso
no mercado!
LocutorALE: Simplesmente não basta apenas ficar
de olho na máquina. É preciso controlar os desvios
em intervalos regulares, a cada 7-8 minutos. E,
claro, aí também precisa registrar os desvios,
anotar, para isso temos aqui o...
O estilo indireto é utilizado em muitas comunidades
linguísticas quando se trata de reclamar, criticar
ou censurar alguém. Essas intenções da fala
ameaçam a face do destinatário e são evitadas
ou “embaladas” de outra forma: No Brasil, a
pessoa a ser criticada deveria, primeiro, ser
abertamente elogiada. Depois pode-se incluir o
pedido, acrescentando “o que seria melhor ainda”,
isto é, realizar aquilo que foi solicitado/acertado.
Ou alguém “fica surpreso”: Confesso que não
compreendo, que não sei onde..., quando produtos
encomendados não são recebidos. Na Alemanha é
possível ouvir, às vezes, reclamações muito diretas
como: “Por que vocês não enviaram X?”.
Um fenômeno do estilo indireto é o uso do
humor, por exemplo para criar um clima informal.
A transição do nível sério e objetivo para o nível
não sério, orientado para os relacionamentos
pessoais, é chamado mudança de modalidade. Os
meios linguísticos e os não verbais empregados
para esse fim (por exemplo: através de um certo
tipo de sorriso, piscar de olhos, mudança de
entonação, gestos) variam consideravelmente em
diferentes comunidades linguísticas e precisam ser
identificados de forma consciente pelos parceiros.
Assim, também, a função do “humor durante a fala”
é diferente. No Brasil é bastante comum provocar
o riso em reuniões, no sentido de “rir juntos”, de
forma a gerar, além de informalidade, um senso de
comunidade ou mesmo de confiança interpessoal.
38
Se você estiver acostumado com essa forma de
expressão de “informalidade”, esteja atento às
convenções de outros países. Provocar o riso com
demasiada frequência na Alemanha, por exemplo,
pode gerar rapidamente estranheza e desconforto.
Não só as práticas de suavizar críticas ou
expressar informalidades caracterizam o estilo
indireto. Frases como “o contato com os(as)
senhores(as) foi muito interessante, precisamos,
sem falta, aprofundá-lo”, podem ter, igualmente,
o sentido de uma recusa indireta (ver Cap. 3.2).
Como então é possível identificar se a intenção
é possivelmente séria, ao pé da letra? Um
entrevistado externou como hipótese que, por
exemplo: japoneses, principalmente quando
dizem que gostariam de continuar o contato via
e-mail ou via Skype, estão realmente interessados
em uma futura colaboração.14
O “disfarce” ou a “embalagem” de enunciados
podem ser efetuados através de elementos
contextualizadores não verbais ou paraverbais
(palavras amenizadoras (hedges) 15; mímica;
entonação) ou através de “prolongamentos”:
quanto mais prolongadamente alguém é
elogiado em determinadas comunidades
linguísticas, tanto maior é o peso dado à
restrição ou crítica que se segue.
Concluindo, pode-se afirmar que os “enunciados
indiretos” fazem parte das convenções nas
respectivas comunidades linguísticas e são
utilizados com tanta frequência que os receptores
compreendem a intenção “diretamente”. Para
falantes não nativos isso é mais difícil.
14 Se, no entanto, brasileiros fossem criticados “sem disfarces” devido a
um planejamento deficiente, isso poderia causar problemas, mesmo que a
crítica parecesse justa.
15 Elementos lexicais também chamados hedges (por exemplo: reduções
perspectívicas, advérbios, adjetivos; ver glossário) são usados para amenizar
um enunciado: de alguma forma, não acho isso totalmente correto.
3.6 Variações no uso
de registros linguísticos
(formas lexicais)
padrões de enunciados em uma língua parecem
bem mais distanciados e polidos, enquanto em
outra língua são interpretados convencionalmente
como neutros, ou coloquiais e amistosos. Vejamos
os exemplos:
Na comunicação intercultural podemos observar
diferenças entre expressões que soam distanciadas
e formais e outras, mais informais, que visam
reduzir as distâncias entre os parceiros na
comunicação.
Alemão: Foi um prazer conhecê-lo, Dr. MeierWehrmann!
(em alemão, soa gentil e adequado à situação)
Em todas as situações, os participantes dão ênfase
a determinados fatores do contexto e da relação
pessoal com os receptores. Isso ocorre por meio do
uso de registros linguísticos. Quando uma situação
é muito formal e ritualizada, utiliza-se igualmente
Francês: E esse é o Dupont, esse aqui trabalha
conosco há 10 anos. (Soa depreciativo em
um registro linguístico muito “formal” e quando ela
é mais informal, pode-se – melhor: deve-se – utilizar
locuções coloquiais. Sobretudo os fatores:
»» idade;
»» grau de proximidade;
»» gênero;
»» posição de poder;
»» cargo profissional dos parceiros (por exemplo,
no setor de serviços), desempenham um papel
na escolha das palavras.
Também nesse caso é importante observar que o
registro escolhido com as respectivas formas (por
exemplo, uma determinada forma de tratamento)
não fornece, por si só, informações inequívocas
sobre informalidade/formalidade. Isso pode tornarse um problema em situações interculturais, quando
Alemão: Bom dia, gente.
(soa em alemão muito informal, familiar)
Alemão. Melhor: Esse é o Sr. Dupont, ele
trabalha conosco há 10 anos. Em francês
é possível referir-se a outra pessoa pelo
sobrenome, mesmo quando ela está presente).
Alemão: Sra. Gerlinde, por favor venha aqui!
(soa adequado em alemão, mesmo depois de
muitos anos de trabalho em conjunto; pois
superiores podem tratar seus subordinados
pelo primeiro nome, mesmo que exista uma
assimetria no caso da opção por esse registro:
os escalões mais altos na hierarquia escolhem
ser tratados por “Sr./Sra. X”).
No Brasil e em Portugal, por exemplo, há uma
diferença na convenção em relação ao tratamento
você. No Brasil é usado (muitas vezes também na
forma reduzida “cê”) para denotar informalidade
e proximidade entre as pessoas. É necessário, no
entanto, levar em consideração aspectos regionais.
Tu? Você? Ou Sr.(a)? Por
que diferenciar o grau de
proximidade?
39
Para mim isso é formal demais!
No Sul do Brasil, porém, o tratamento “tu” ainda é
muito comum em contatos informais, assim como
também em Portugal. Em Portugal é preciso utilizar
o “tu”, “você”só no Brasil. (Kultbrasil, 2009)
Aqui você pode ver, igualmente, que uma forma
lexical (palavra), em si, ainda não diz nada sobre
o seu emprego. Apenas com base em uma
determinada forma não é possível tirar conclusões
sobre atribuições psicológicas do sujeito (por
exemplo: “polido”, “informal”, “distanciado”,
“indireto”, etc.). O importante é identificar
exatamente as formas lexicais que indicam
quais são as relações vigentes no momento da
comunicação e observar sua utilização.
De modo geral, concorda-se que uma vez na
qualidade de falante não nativo de um determinado
idioma, portanto como não pertencente à
comunidade no qual se encontra (podendo
desconhecer muitas de suas particularidades), devese evitar determinadas formas lexicais – sobretudo
aquelas oriundas de expressões muito informais
ou até mesmo vulgares –, ainda que elas sejam
permanentemente utilizadas pelos interlocutores.
40
tonalidade de voz se assentam sobre convenções
pré-estabelecidas e são interpretadas como
resultado de emoções, isto é, como sintomas.
Todavia, em todos os idiomas existem convenções
específicas sobre como interpretar uma tonalidade
de voz adotada. Em geral, pode-se dizer que os
parâmetros da voz e suas possíveis funções são
processados inconscientemente pela maioria das
pessoas (e, por isso, essa questão não é abordada
explicitamente no ensino de línguas estrangeiras).
Fatores paraverbais são qualidades da fala
relacionadas com a voz. Por um lado, são
interpretados como expressão de uma determinada
atitude do locutor (por exemplo, como expressão de
tristeza situacional). Por outro lado, estão inseridos
em convenções, no que se refere a determinadas
situações comunicativas, ou para expressar
intenções específicas da fala. Eles abrangem os
seguintes elementos:
»» volume;
»» entonação e modulação do tom (= melodia da
fala), acentuação da frase;
»» entonação de palavras (acentuação da palavra),
expressões idiomáticas;
3.7 Uso diverso de fatores
paraverbais
»» ritmo da fala;
Em todas as comunidades linguísticas, a expressão
de voz é baseada nos mesmos pressupostos
biológicos. Na comunicação, o espectro
compreendido entre os tons baixos e os tons altos
é utilizado de forma variada. Essas variações na
»» qualidade geral da voz.
»» velocidade da fala;
»» pausas na fala;
As regras quanto ao uso e significado dos fatores
paraverbais são extremamente variadas nas
diversas línguas.
Esses elementos paraverbais são, portanto,
sintomas de estados momentâneos ou de
disposições de pessoas e sinalizam, entre
outros, relevância/irrelevância, simpatia/antipatia,
insegurança/determinação, tristeza/alegria, etc.
Exemplos:
Em português, os homens tendem a falar
regularmente em uma combinação de tom de
voz muito agudo e muito grave. Isso ocorre
especialmente quando querem expressar algo
inesperado. Segundo as convenções alemãs, no
entanto, falar em um tom muito agudo pode levar
que o locutor seja considerado “histérico” pelo seu
interlocutor. Não que o falante do português não
corra “riscos” por usar tons agudos em sua fala,
como, por exemplo, o de ser considerado menos
masculino (de fato, isso acontece com frequência
no Brasil). Mas é inegável que existe uma diferença
quanto à avaliação do que seria normal: o jeito de
um brasileiro falar pode ser visto como histérico por
um alemão, mesmo sendo ele no Brasil considerado
normal (e isso quer dizer nem um pouco mais agudo
do que é tido como padrão de voz masculina).
Publicações de consulta sobre o tema também
relatam que apresentações (por exemplo,
exposições de projetos) transcorrem de forma
diferente no Brasil e na Alemanha. Alguns alemães
apresentam assuntos importantes com “voz
sonora”, organizadamente listados e sem ênfase
especial (ver Cap. 7.1). Nos ouvintes brasileiros, isso
gera a impressão de serem secundários. Alemães,
por outro lado, se surpreendem com o fato de
que, por exemplo em suas apresentações, alguns
locutores latino-americanos falam muitas coisas
com uma entonação cheia de modulações, quase
patética, acompanhada de “gestos exacerbados”
(ver Cap. 3.8). Uma tal combinação de recursos
paraverbais e não verbais pode gerar, em ouvintes
alemães, sentimentos de desconfiança em relação
à pessoa e ao assunto.
Quando as pessoas, no transcurso da fala, baixam
a voz e introduzem uma pausa (interna), muitos
locutores e locutoras alemães concluem que
a pessoa terminou sua fala e começam, eles
próprios, a falar. Dessa forma, interrompem aqueles
locutores acostumados, no seu respectivo contexto
linguístico, a estruturar seus enunciados por meio
de uma redução do tom de voz (por exemplo:
finlandeses ou japoneses, ver Cap. 2.3) e não,
como por exemplo no alemão, mantendo um tom
uniforme ou aumentando-o levemente.
Além disso, o volume é um fenômeno paraverbal
interessante. Do ponto de vista alemão temse a impressão de que os brasileiros falam, em
geral, mais alto que os alemães. Isso pode ser
verdade. Quando brasileiros estão na Alemanha,
porém, é necessário considerar que pessoas
em um contexto linguístico diferente tendem a
falar mais alto e mais despreocupadamente do
que o fariam no seu próprio contexto cultural.
Por isso, lembramos mais uma vez, que fatores
situacionais devem ser observados antes que
conclusões coletivizantes sejam retiradas.
Homem com voz fina
não é homem!
41
3.8 Signos não verbais
específicos
Diferenças no uso de signos não verbais chamam
especial atenção na comunicação intercultural. Muitas
das pessoas entrevistadas referiram-se à mímica e à
gestualidade como “linguagem substitutiva” à falta de
conhecimento da língua estrangeira.
Embora existam muitas publicações sobre a atuação
não verbal, apenas o campo da biologia humana (EiblEibesfeld, 1967) e a psicologia (Matsumoto/Yoo et al.,
2007) contam com áreas de pesquisa desenvolvidas.
Seus métodos não têm como foco a documentação
e análise de signos na interação, mas sim abrangem
signos isolados e posturas e/ou movimentos corporais.
Em situações interculturais, nunca se pode ter certeza
absoluta daquilo que é interpretado como signo,
em termos das expressões não verbais próprias e
o significado que outros lhe atribuem. Os exemplos
abaixo ilustram certos mal-entendidos:
»» Alguém pede “duas cervejas”
na China usando o polegar e
o indicador (como se indica
gestualmente o número dois na
Alemanha) e recebe oito.
»» Durante uma conversa, uma pessoa aponta
permanentemente para as pessoas presentes
com o indicador direito. Isso representa, muitas
vezes, apenas um gesto de acompanhamento
da fala, porém é interpretado por outros como
depreciativo.
»» Um brasileiro acena com a mão para um alemão,
chamando-o. A posição e o movimento da mão,
no entanto, são muito similares a um gesto que
o alemão interpreta
como “Até logo!”. Ele
acena alegremente e
vai embora.
42
“
Na comunicação
direta, os locutores
acompanham aquilo
que expressam
verbalmente com
signos não verbais,
como mímica,
gestualidade,
orientação do corpo
ou proxêmica. Assim,
também, o contato
visual (frequência,
local e intensidade do
olhar) ou a vestimenta
no sentido mais
amplo (incluindo joias,
perfume, peruca, etc.)
podem ser usados e
interpretados como
signos.
»» Um membro da gerência usa uma pulseira de
ouro no pulso. Isso é considerado por alguns
parceiros alemães como sinal de práticas de
negócios duvidosas.
Os alemães são frios: eles
cumprimentam apenas com a
mão. E depois, nada de beijo!
A literatura sobre o tema contém inúmeros
mal-entendidos desse tipo. Vejamos aqui novos
exemplos organizados e exemplificados em 8
categorias:
1) Mímica: com a ajuda da mímica facial são
expressadas emoções tais como surpresa,
preocupação, raiva, nojo, alegria, etc. Além disso,
em algumas comunidades linguísticas elas sinalizam
avaliações daquilo que acaba de ser ouvido (por
exemplo, franzir a testa como sinal de feedback).
Difícil se torna uma negociação para um brasileiro,
quando não é possível extrair muito da mímica
de um interlocutor, porque pela convenção ela é
pouco expressiva. Em negociações com japoneses
isso acontece com frequência: a ausência de
expressão facial confunde tanto alguns parceiros
que eles procuram certificar-se, utilizando
elementos da metacomunicação, por exemplo “O
Sr./a Sra. me entende?”.
3) Postura corporal: existem diferentes
convenções para o tipo de direcionamento em
relação ao parceiro. Em algumas comunidades
linguísticas, questões importantes na conversação
são expressadas com um direcionamento total para
o parceiro, parando para isso se estiver caminhando.
Atos como direcionar-se/voltar-se para alguém,
ficar com o corpo ereto, inclinar-se para frente são
relevantes, também, do ponto de vista interativo:
eles servem como sinais convencionais para a
organização da troca de turno dos locutores (Ribeiro,
2009, p. 9), pois indicam que um parceiro deseja
assumir o papel do locutor.
4) Contato corporal: tocar em outras pessoas
expressa a relação social existente (Hall, 1963, p.
1020) touch code. As convenções estabelecidas
para essa “evocação” de uma relação existente
através de um gesto de atenção, no entanto, variam
de cultura para cultura.
2) Gestualidade: em geral, os brasileiros são
visivelmente mais “ativos” do que os alemães,
no que diz respeito ao uso dos braços e das
mãos durante conversas. Eles simplesmente
usam com maior frequência a gestualidade e os
gestos individuais são, por si só, mais amplos e
ocupam mais espaço. O espaço gestual localizase, em comparação com o alemão, em uma área
mais alta e um pouco mais distante do corpo,
deslocado para frente. Esse último aspecto faz
com que a proxêmica entre as pessoas se reduza
(do ponto de vista alemão). 16
16 Ver citação da fonte em www.payer.de/kommkulturen/kultur042.htm
(Fig. 3: Espaço gestual)
43
Eu até faço uma reverência... e
ele estica uma mão espalmada
batendo na minha testa!
Traina (2005) relata sobre o “Estudo de Jourard”
– que abrange diferentes culturas de forma
comparativa – e sua análise da frequência com
que pessoas de um mesmo tipo de instituição se
tocam.17 Também as zonas de toque (braços, mãos,
tronco, cabeça ou costas) variam conforme a cultura
e são objeto de observação.
6) Distância corporal: quando pessoas interagem,
elas mantêm uma determinada distância entre si
que depende da situação e da relação entre os
envolvidos. Essas zonas são consideradas nos
Estados Unidos como:
»» íntimas (aprox. 0,5 metro);
»» pessoais (0,5 a 1,2 metro);
No Brasil, o contato corporal ocorre também entre
estranhos, quando precisam passar muito perto
um do outro. Também ao se cumprimentarem, as
pessoas se tocam, os homens batendo levemente
na parte superior das costas do outro. Isso pode
ser considerado por alemães como uma invasão
desnecessária da privacidade espacial, em geral não
adequada à situação e/ou à relação. Isso significa
que atos idênticos de toque sinalizam relações
sociais diferentes conforme o contexto cultural.
5) Contato visual: em muitas comunidades
linguísticas, há convenções diferentes para
a duração e o ritmo do contato visual; essas
convenções não são conscientes e geram
desentendimentos e confusões, porque
movimentos inesperados dos olhos (por exemplo,
olhar demoradamente nos olhos) é imediatamente
interpretado do ponto de vista psicológico (como
aproximação ou insistência).
17 Jourard/Rubin (1968) observaram pessoas que tomavam café juntas.
Em Londres, elas não se tocaram nenhuma vez, na Flórida 2 vezes, em
Paris 110 vezes e em San Juan (Pto. Rico) 180 vezes.
44
»» sociais (1,2 a 3,6 metros);
»» públicas (a partir de 3,6 metros).
Elas são objeto de análise da proxêmica, disciplina
que faz parte das ciências da comunicação, e
variam de cultura para cultura (Hall, 1966). As
respectivas distâncias “normais” são inconscientes.
Divergências são rapidamente psicologizadas, isto
é, parceiros que reduzem a proxêmica são vistos
como “impertinentes” e, no caso de uma distância
maior, como “frios, distanciados”.
7) Odores: diferenças na preparação da comida, por
si só, fazem com que pessoas de culturas diversas
“cheirem” de forma um pouco diferente. Lidar com
possíveis odores corporais também está sujeito
a regras culturalmente específicas. Assim, por
exemplo, executivos(as) brasileiros(as) relatam
que seus parceiros são mais parcimoniosos no
uso do perfume. Eles também observam que
alemães, depois de uma reunião ou de uma
programação com visitas, não aproveitam o
intervalo antes do jantar, comum para trocar de
roupa (e tomar um banho “de verdade” e não um
“banho francês”; ver Cap. 3.9).
8) Vestimenta: tudo aquilo com que as pessoas
mudam intencionalmente seu corpo e que faz
parte de sua apresentação como “persona” possui
característica de sinal. Isto é:
»» acrescentar alguma coisa ao corpo (roupa
de baixo/de cima; enfeites/joias; piercing;
tatuagens; cosméticos; perfume; implantes; ou
então óculos; mochila, bolsa);
»» remover alguma coisa de seu corpo (por
exemplo: corte de cabelo; raspar os pelos da
barba, axila ou pernas).
Existem, também, regimes culturalmente
específicos em termos de “vestimenta apropriada
para a situação”. Isso envolve um outro tipo
de atenção: a combinação de vestimenta e
comportamento é muitas vezes interpretada
erroneamente, tanto em situações formais,
quanto informais. Se a vestimenta e outros
fatores (por exemplo, não verbais: posição
sentada/em pé; proxêmica; gestualidade)
divergem das expectativas de normalidade,
isso pode levar a interpretações erradas
com maiores consequências. Assim, uma
determinada informalidade (expressada por meio
de vestimenta, comportamento não verbal e
paraverbal, assim como escolha de registro) pode
ser considerada como desconhecimento ou até
mesmo como violação proposital de regras da
etiqueta e, com isso, como falta de educação e/
ou atrevimento.
Assim, alguns homens brasileiros na Europa
transmitem uma impressão dúbia: por
um lado, aparecem muito “bem-tratados”
(unhas, cabelos/pele cuidados; terno) e quase
“excessivamente produzidos” (overdressed)
para uma reunião de negócios. Por outro lado
são percebidos como “falando alto” (ver Cap.
3.7) e, em virtude da redução da proxêmica
e de uma gestualidade expansiva, como
inapropriadamente “impertinentes”.
Na interação monocultural observa-se, muitas
vezes, um mimetismo de gestos. Eles simbolizam,
por um lado, a disposição para a cooperação e a
adaptação. Por outro lado, sinalizam entendimento.
Na comunicação intercultural, no entanto, pode
predominar a disposição para expressar uma
vontade geral de cooperação através de imitações
do comportamento não verbal. Os correspondentes
atos imitativos, porém, podem ser interpretados
pelo parceiro também como sinal de entendimento,
mesmo que ele não tenha sido totalmente atingido.
3.9 Etiqueta e
comportamento situacional
adequado
Todas as situações que contam com a participação
de várias pessoas estão assentadas em um
sistema de regras situacionais, que regulam o
seu comportamento. As convenções relativas à
etiqueta são aprendidas na fase da socialização e
estão sujeitas, portanto, a características relativas a
cultura, classe social e gênero.
Muitos projetos de parcerias internacionais
começam com um encontro entre os tomadores
de decisões e os colaboradores em um ambiente
formal. Este requer determinados tipos de
comportamento. E a própria situação está
estruturada em sequências que possuem caráter
protocolar. Por isso é necessário refletir sobre os
tipos de comportamento situacional adequados
e, no caso de parceiros de outras culturas,
sobre a existência de expectativas em satisfazer
determinadas convenções.
45
“
Em diversas culturas valem regras diferentes para o
que fazer e o que não fazer em determinadas situações
profissionais, e quanto às expectativas em relação a
como estas devem transcorrer. A respectiva etiqueta
social às vezes varia pouco, mas, com frequência, muitas
convenções divergem consideravelmente dos padrões de
conduta considerados normais.
O problema com os rituais diferentes é que, em geral, eles
determinam papéis específicos para todos os participantes,
isto é, todos estão envolvidos, mesmo que não tenham um
conhecimento exato das convenções.
A abundância de publicações sobre a etiqueta de
negócios internacionais oferece muitas dicas úteis.
Vejamos os exemplos:
Mulheres como colegas de trabalho: enquanto
na Alemanha os homens abrem a porta para as
mulheres e as deixam passar primeiro, isso não é
comum em outras culturas ou é considerado como
“comportamento machista”.
Comer/Beber: na Alemanha, come-se comida
quente com garfo e faca (fora coxas de frango),
enquanto para comer certos pratos em
determinados países usam-se os dedos e as mãos.
Vestimenta: no Brasil, por exemplo, existem
diferenças quanto à etiqueta da vestimenta entre o
Norte e o Sul: Que roupa é adequada para recepções,
reuniões, jantares, etc.? E (quantas vezes por dia)
deveria ser mudada a roupa? Para algumas situações
em que na Alemanha seria apropriado um terno
escuro, em outros países são igualmente bem-vindos
ternos claros, conjuntos ou pulôver/colete.
Papel do locutor: na Alemanha faz parte das boas
maneiras manter uma conversação em andamento
e não deixar que ela pare, contribuindo ativamente
para tanto. Em alguns países, porém, é praxe não
ser o(a) primeiro(a) a iniciar uma conversa ou uma
fase da conversação.
O desvio de regras de etiqueta vigentes é, muitas
vezes, considerado “típico” para um país e costuma
ser visto como traço da “mentalidade” de seus
habitantes. Neste caso, é importante salientar que
em situações interculturais não existe, a priori,
clareza absoluta quanto às convenções que deverão
ser seguidas.
Rituais diversos se estabelecem no âmbito dos
encontros econômicos Brasil-Alemanha devido
ao costume brasileiro de utilizar um mestre de
cerimônias em eventos com 30-50 participantes,
para conduzir o evento. Alguns alemães consideram
a presença de um mestre de cerimônias
uma formalidade desnecessária18. Isso vale
18 Alguns alemães ficam irritados se a pessoa não estiver muito bempreparada, e trocar as etapas da cerimônia ou os nomes de personalidades
importantes.
46
Isso é jeito de apontar para
outras pessoas?
principalmente para aqueles casos em que, como
parte do ritual, é cantado o hino nacional, com todos
os participantes voltados para a bandeira nacional.
No Brasil, muitos dos entrevistados apontam para a
incerteza quanto à escolha da vestimenta apropriada
para uma determinada ocasião. Eles registram com
surpresa que alguns dos parceiros aparecem à noite
no mesmo traje que usaram durante as reuniões. E
parceiros alemães fazem referência à exuberância
3.10Perspectivas de
valores/atitudes/crenças
culturalmente específicas
Na literatura sobre comunicação intercultural as
orientações para ação culturalmente específicas
são, predominantemente, vistas como disparadoras
e como fundamento teórico para explicar as
convenções vigentes no processo de comunicação
no estilo de algumas executivas/mulheres de
(ver Cap. 2.3). É justamente pelo fato de que essas
negócios brasileiras.
“orientações” existem (às vezes descritas de
Diferenças culturais e regionais também foram
percebidas por alguns entrevistados em situações
em que devidas “superstições”entraram em jogo.
forma coletiva como parte de uma “mentalidade”
culturalmente específica), que os membros de uma
cultura aceitam e agem de acordo com valores e
práticas convencionalizados.
É possível perceber sinais de tabus relacionados
com certas crenças em ações específicas, como,
por exemplo, o fato de alguém, ao atravessar a
soleira de uma porta, “arranhar” o piso com o pé
(como se fazia antigamente na Áustria) ou evitar
o aperto de mãos em cima da mesma (como de
costume na Rússia).
Determinados valores regulam a vida pública e
institucional, proporcionando uma certa segurança e
senso de comunidade aos membros dessa cultura.
Assim, seus atos são identificados, interpretados e,
muitas vezes, avaliados com base nessa perspectiva
de valores comuns. As situações de comunicação
Muitas vezes também ocorrem problemas na
intercultural tornam-se problemáticas quando os
comunicação intercultural realizada através de
participantes estão habituados a valores culturais
e-mail, quanto à forma de expressão “adequada”.
diferentes. Soma-se a isso o fato de que essas
A correspondente “netiqueta” do espaço virtual
(quais são as fórmulas ideais de como se referir a
cada destinatário, de cortesia, de saudação, etc.)
abrange convenções muito variadas. Naturalmente,
atitudes culturalmente específicas são, também,
expressadas de forma diferente. Isso significa que
não se pode ter certeza quanto a concluir, a partir de
também neste tipo de comunicação virtual o
determinados atos de parceiros de outras culturas,
uso (ou o não uso) das regras podem gerar
que se trata de uma atitude que na outra cultura é,
desentendimentos e confusões.
justamente, representativa desse ato.
47
Claro que, de início, é importante conhecer perspectivas de ação culturalmente específicas, incluindo as
respectivas opções de expressão e realização.
Fonseca/Castor (2005) resumem as perspectivas de
valores atribuídas a brasileiros da seguinte forma:
»» abertura em relação a estranhos (por exemplo,
por meio da redução espontânea de distância
em primeiros encontros, B. M.-J.);
»» orientação para o curto prazo (ver, entre outros,
as Dimensões de Hofstede);
»» aversão contra trabalhar de forma sistemática
(por exemplo, devido à preferência pelo trabalho
policrônico, B.M.-J.);
»» protecionismo (por exemplo, por meio de
decisões na área de recursos humanos não
fundamentadas em critérios objetivos, B.M.-J.);
»» evitando insegurança (ver, entre outros, as
Dimensões de Hofstede);
»» individualismo (ver, entre outros, as
Dimensões de Hofstede);
»» orientação para relacionamentos (relationship
valorization) (por exemplo, por meio de longas
fases de conversa informal (small talk) ou
longas conversas em intervalos, B.M.-J.);
»» formalismo (por exemplo, por meio do
endosso de decisões junto aos superiores
hierárquicos, B.M.-J.);
No risk, no fun!
48
»» “jeitinho” (por exemplo, por meio de soluções
criativas para problemas, respondendo a
situações e fora dos padrões rotineiros,
B.M.-J.);
»» personalismo (por exemplo, levando
sistematicamente em consideração as
especificidades individuais de outras pessoas e
sua relação com a respectiva situação, B.M.-J.).
Algumas perspectivas de valores manifestadas
pelos entrevistados serão apresentadas aqui em
mais detalhes:
Extroversão
Brasileiros apresentam-se, com frequência,
abertos para o diálogo, aproximam-se de pessoas
desconhecidas, são acolhedores (ver Cap. 3.2),
mostram-se prestativos e interessados em muitos
assuntos e estabelecem redes de contato entre eles,
seus conhecidos e amigos. Do ponto de vista alemão,
falam mais alto (ver Cap. 3.7) e acompanham suas
falas com gestos e mímicas expressivos.
Autonomia
Em uma sociedade dá-se, em geral, muito
valor quando as pessoas atuam de forma
independente, mostram iniciativa e se esforçam
para trabalhar de forma autônoma. Em outras
culturas valoriza-se mais a concentração da
responsabilidade em uma entidade central,
delegando-se a execução das tarefas.
Preservação da “honra” (face)
Em algumas culturas considera-se como princípio
superior que norteia a ação preservar a “honra” (a
face dos colaboradores) e, além disso, apoiá-los
e apresentá-los positivamente. Nessas culturas,
todas as ações potencialmente indesejáveis (por
exemplo, crítica em relação à pessoa/objeto)
não são mencionadas explicitamente, apenas
sugeridas, e possivelmente “embaladas” em
muitas fórmulas de cortesia.
Estilo direto
Na Alemanha, por exemplo, é comum as
pessoas expressarem sua opinião ou sua posição
argumentativa para demonstrar sinceridade e
confiabilidade. O foco, nesse contexto, é voltado
para o conteúdo do que é dito e (por isso) parte-se
da premissa que a relação com o interlocutor não
será colocada em risco.
Na colaboração com parceiros alemães, alguns
brasileiros identificam determinadas perspectivas de
valores. Eles mencionam, como muito positivo, o “gosto
pela ordem” e a “pontualidade”.Alguns estabelecem
uma conexão causal entre ambos os valores: “Porque
gostam da ordem, os alemães são pontuais”.
Na literatura científica, as perspectivas de valores
mais conhecidas são as 5 dimensões culturais de
Hofstede (1991). A posição da Alemanha (República
Federal Alemã antes da reunificação) e do Brasil
(até 1985) encontra-se entre os polos dos seguintes
pares de opostos:
1) High–low Power Distance (PDI; português:
Distância em relação ao poder)
Indicates dependence of professional
relationships in a country. In Germany, there is a
tendency of limited dependence of subordinates
and bosses, a preference of consultation (PDI: 35;
rank 43 out of 53). Brazil is more heterogeneous
but on average, it shows a clear tendency to
large power distance (PDI: 69; rank 14 out of 53):
subordinates depend on their bosses and accept
that power is distributed unequally.
(Hofstede, 1991, p. 27-28)
2) Individualism–Collectivism (IDV;
português: Individualismo–Coletivismo)
Individualism indicates that persons live and act
independently: everybody should look after him/
herself and their nuclear family. In collectivists’
societies, people grow into strong, cohesive
ingroups which protect them on the one side and
ask for a strong loyalty on the other. Germany is
ranked more individualistic (IDV: 67; rank 15 out
of 53), whereas Brazil shows a middle position
(IDV: 38; rank 27 out of 53): they show more
dependence of employees to the company and
consequently less importance of personal time,
freedom and challenge to achieve professional
goals. (Hofstede, 1991, p. 50-53)
3) Masculinity–Femininity (MAS; português:
Masculinidade–Feminilidade)
Masculine societies show distinct social
gender roles (typical professions for men
and for women) whereas feminine cultures
show systematic overlaps. For masculine
Uma ministra da defesa?
Ha ha ha!
49
Eu evito qualquer risco!
cultures (Germany’s MAS: 66; rank 9 out of
53), earnings, recognitions, challenges, and
advancements are important. In feminine
societies, god working relationships,
cooperation, integration of work and family
duties and employment security are favored.
Brazil holds a middle position: MAS 49; rank 27
out of 53. (Hofstede, 1991, p. 81-84)
4) High–low Uncertainty Avoidance (UAI;
português: Evitar incertezas)
Indicates the degree how people are able or willing
to tolerate ambiguity. It seems that people in Brazil
practice a middle or low degree of avoidance of
uncertainty (UAI: 76; rank 21 out of 53). Germans
show some efforts in trying to avoid it (USI: 65; rank
29 out of 53. (Hofstede 1991, 111-114)
5) Confucian Dynamism (LTO; português:
Dinâmica Confucionista)
Indicates a short term or a long term orientation
in life. Long term oriented societies attach much
importance to the future. People foreground
values like saving material goods (e.g. in terms
of money or energy) persistence concerning
social goals, or capacity for interpersonal
and environmental adaptation. In short term
oriented societies, people relate to the past and
to the present, respect and practice cultural
traditions on the macro level, and they preserve
other’s faces and fulfill social/interpersonal
obligations on the micro level.
Como todas as perspectivas de valor, elas
representam uma média, podendo assim ocorrer
variações regionais. Isso vale particularmente para
50
países como Brasil e Alemanha, que passaram por
grandes processos de mudanças sociais nos últimos
20 anos.
Para o desenvolvimento de uma competência
intercultural baseada em valores é importante
relacionar as polarizações verificadas na pesquisa
científica com a prática. O consultor comunicacional
Schulz von Thum (2005) afirma que as pessoas
veem aquelas perspectivas de valor que elas
próprias praticam de forma muito positiva. Os
“polos opostos” são, muitas vezes, radicalmente
rejeitados. Isso pode ser visualizado no chamado
“quadrado de valores” (ver o exemplo abaixo).
A seguir, ilustramos um par de opostos de
perspectivas de valor:
»» orientação da conduta conforme requerido pela
situação para atingir os objetivos da ação (por
exemplo, atravessar a rua quando o semáforo
está vermelho para pedestres, porque não vem
nenhum carro, ou usar o canto da toalha de
mesa de papel para assoar o nariz, quando não
se tem um lenço);
»» tentativa de atingir os objetivos da ação
respeitando as regras em vigor (isto é, entrar
na fila mesmo com falta de tempo ou estar
disposto a aceitar um certo tempo de espera
para depois entrar em um apartamento privado
com pantufas emprestadas, mesmo que os
donos da casa digam que não faz mal ficar com
os sapatos da rua).
Pessoas que praticam uma ou outra perspectiva de valor avaliam, sempre de forma positiva, a sua
própria (ver Virtudes). No caso da outra perspectiva de valor, elas veem principalmente os aspectos
negativos (ver Fraquezas).
Perspectiva Situacional (PS)
Virtudes (PS):
- reage com flexibilidade a eventos
inesperados;
- está preparado para eventos
inesperados.
Perspectiva baseada em Regras (PR)
Virtudes (PR):
- atua de forma previsível, calculável;
- atua conforme padrões conhecidos,
convenções.
Fraquezas (PS):
Fraquezas (PR):
- precisa pensar sempre de novo como
seguir adiante;
- não respeita exigências;
- identifica tardiamente desvios da norma;
- não reconhece soluções que ficam fora
dos padrões habituais.
- comete pequenos atos ilegais.
(Fig. 4: Quadrado de valores)
Pessoas interculturalmente competentes tentam contrapor uma combinação de ambas as virtudes:
Perspectiva Situacional (PS) e Perspectiva baseada em Regras. Isto é, elas visam obter uma sinergia das
perspectivas de valores culturalmente diferentes. Isso vale a pena principalmente em equipes interculturais.
Todavia, aplica-se também a esse modelo: ao apontar para perspectivas de valor não se diz claramente como
exatamente elas se revelam na ação e nem com base em que critérios elas podem ser definidas em termos
de sua relação com a ação. Assim, quando seguem a perspectiva de valor evitar a incerteza (ver acima UAI
– 4ª dimensão cultural de Hofstede), pessoas em uma cultura podem, por exemplo, contratar seguros para
muitas circunstâncias, enquanto em outros países o resultado da mesma atitude poderia ser bem mais o de
economizar dinheiro, procurar a proteção de pessoas poderosas (também no sentido religioso), consultar
videntes ou tentar sistematicamente desenvolver confiança. E ao contrário: é preciso que o comportamento
demonstrado possa ser relacionado em processos comunicativos, se possível, com uma determinada
perspectiva de valor.
51
52
4 COMUNICAÇÃO COMO PRODUTO
COLETIVO
No Capítulo 3, os respectivos problemas
mencionados nas entrevistas foram descritos
e ordenados, atribuindo-se a eles os termos
técnicos correspondentes. Isso possibilita agora
uma discussão diferenciada dos problemas como
dificuldades na, de fato, comunicação. Problemas
típicos podem ser encontrados em outras
publicações, de maneira que você, leitor(a), possa
dar prosseguimento a suas leituras por iniciativa
própria e conforme interesse.
Na prática, contudo, as pessoas envolvidas na
cooperação intercultural não enfrentam fenômenos
isolados. Nas situações comunicativas concretas
existe uma combinação entre os seguintes pontos:
outras convenções com convenções levemente
diferentes, com adaptações àquilo que se aceita
como tolerável ou esperado em relação ao outro.
Surge, então, uma situação complexa que
representa um grande desafio para a mentalidade
analítica. Devido, justamente, às adaptações
recíprocas que acontecem no contexto do
encontro intercultural, os fenômenos do processo
comunicativo não podem ser previstos com
exatidão. Por isso é necessário apropriar-se das
categorias acima mencionadas como ferramentas
e aplicá-las às experiências comunicativas próprias.
Um alerta, porém: aquilo que se observa em outras
pessoas não é necessariamente “típico”, pois elas
podem se adaptar e/ou não reagir “corretamente” a
formas de comunicação desconhecidas.
“Comunicação como produto coletivo” significa,
igualmente, que cada um contribui com sua parte
para a reação dos outros. Particularmente no âmbito
dos atos potencialmente “ameaçadores da face”,
pode ocorrer que a “ação”que se observa nos
outros, na verdade, seja uma “reação”: parceiros
desconhecidos recebem de nós enunciados
que não esperavam, que não sabem interpretar
rotineiramente, ou que eles simplesmente
interpretam errado. Assim, essas reações não são
a expressão de seu comportamento comunicativo
“normal” e não podem ser consideradas como
“(culturalmente) típicas”.19
Ir ao encontro do outro significa, também, se
empenhar claramente em assumir as convenções
do outro. Isso pode ser visto, às vezes, mas nem
sempre, como “renúncia às práticas da própria
cultura” e, com isso, como submissão. Por
outro lado, adaptações podem ser consideradas
também como esforços construtivos para
atingir um patamar comum no que se refere à
interpretação de convenções.
Assim, parceiros relatam nas entrevistas que
algumas empresas brasileiras, na cooperação com
parceiros alemães, partem do pressuposto de um
maior comprometimento – em relação a acordos,
contratos e estabelecimento de objetivos – do que
seria o caso se a cooperação fosse brasileira. Ou,
então: empresas alemãs aceitam um planejamento
menos rígido nas fases preparatórias de um projeto
e confiam que o lado brasileiro com seu sistema
da flexibilidade (lema: é grande a variedade de
soluções) ou dos “jeitinhos” cumpra, em algum
momento, os acordos desejados.
19 Quando, por exemplo, se reclama – enquanto parceiro alemão na
comunicação – que os “brasileiros nunca respondem e-mails urgentes”,
é necessário pensar se a falta de resposta não poderia ser uma reação a
uma mensagem excessivamente direta do parceiro alemão, uma “ameaça
à face”. Ou será que esperavam um “lembrete”? Talvez eles usem a falta
de resposta como estratégia para evitar conflitos.
53
54
5 COMPETÊNCIAS
INTERCULTURAIS E
BEST PRACTICES
Na introdução desta cartilha afirmamos: no âmbito da cooperação
econômica entre grupos de contextos culturais diferentes são
perseguidos objetivos definidos em comum e, assim, a categorização:
“pessoas da cultura A visitam pessoas da cultura B” é relativizada
e isso em favor de: “profissionais do país X e do país Y trabalham
para atingir o objetivo Z”. Pois bem. Acontece que parceiros desse
tipo de cooperação relatam, muitas vezes, experiências que
representam exatamente o contrário. Eles vão para as situações de
encontro intercultural com a ideia de encontrar colegas de profissão,
gerentes, dirigentes de delegações, administradores(as), etc., e falam
depois de forma generalizada “dos alemães”, “dos chineses”, “dos
moçambicanos”, ou “dos norte-americanos”.
Isso tem a ver com o fato de que constatam nos seus parceiros
internacionais sempre as mesmas “divergências” de suas expectativas
de normalidade, por exemplo: que “sejam pontuais” (no sentido de
que sua chegada ocorra relativamente perto do horário marcado). Com
base nos muitos exemplos acima, isso também pode ser formulado
de outra maneira: algumas pessoas interpretam a fala e a ação de
seus parceiros regularmente de forma errada. Daí que, partindo de sua
experiência, chegam sempre às mesmas conclusões erradas sobre
os parceiros na comunicação. Esse padrão será ilustrado a seguir com
base em um exemplo.
Ou, então, essas generalizações das nacionalidades derivam de
leituras preparatórias. Tanto em obras científicas (por exemplo, as
dimensões culturais de Hofstede; ver Cap. 3.10) ou em livros de
orientação para situações interculturais, fala-se sem diferenciação
“dos brasileiros”. Em alguns casos, seu comportamento é até
fundamentado do ponto de vista da psicologia antropológica,
referindo-se “aos árabes/portugueses”:
As culturas árabes se destacam pela forte hospitalidade. Quer-se
mostrar aos estrangeiros o que a terra-mãe tem de melhor. Em
virtude da miscigenação dos portugueses com os árabes, esse
comportamento tem-se estendido, também, ao povo português.
É de se supor que os brasileiros herdaram a hospitalidade dos
portugueses. (Brökelmann et al., 2005, p. 58)
55
Claro que poderia se concluir daí que a
hospitalidade brasileira deveria ser equivalente à
encontrada em Guiné-Bissau, Cabo Verde, Macau,
Moçambique ou Angola. Mesmo que isso fosse
o caso, a questão principal não foi respondida:
através de que atos e padrões comunicativos
expressa-se a “hospitalidade”?
Os diferentes níveis de comunicação e a
validade fundamental de diferentes convenções
em uma situação comum requerem, além do
conhecimento da língua e da cultura, uma série de
competências que permitem o acompanhamento
das situações em seu transcurso e sua reflexão.
Essa forma de monitoramento se relaciona com
as coconstruções linguísticas e não verbais
que caracterizam uma conversação. Ambas – a
possibilidade da reflexão e as potenciais reações
– foram esboçadas nos Capítulos 3 e 4.
5.1 Complementaridade
e sinergia
Do ponto de vista de alemães e brasileiros, é
possível identificar muitas outras diferenças
no trabalho do dia a dia. Em geral, equipes
interculturais têm o objetivo de equilibrar essas
diferenças ou de tomar medidas para que um dos
lados se adapte.
Existe uma outra alternativa no sentido de
analisar as diferenças para verificar se elas se
complementam na cooperação. O objetivo,
então, seria a complementação. De pleno acordo
com o “quadrado de valores” (ver Cap. 3.10),
pode-se verificar se abordagens diferentes,
porém igualmente valiosas, podem conduzir a
melhores resultados ou, pelo menos, a resultados
considerados construtivos por ambos os lados.
56
5.2 Competências
relacionadas com o idioma
Muitos indicadores na presente cartilha apontam
para o fato de que a análise do processo de
comunicação em curso (ver tb. Fig. 1) tem um
papel fundamental. Somente com base nos
enunciados linguísticos dos parceiros, no contexto
comunicativo, é possível tentar identificar as suas
expectativas de normalidade. Trata-se daquelas
convenções que o outro considera como mais
efetivas no sentido de atingir seus objetivos. Como
recomendação, vale abster-se de realizar atribuições
psicológicas sobre pessoas ou até mesmo de emitir
qualificativos culturais, em favor de uma análise dos
signos expressados. Para esse fim dispõe-se, com
as categorias LAC, já referidas (ver Cap. 3), de um
instrumento detalhado de análise. Ele possibilita
questionar estrategicamente determinadas
unidades de significado e ação, duvidosos em
relação à sua função na conversação.
A hipótese da presente cartilha é que somente
a aplicação de competências de análise
conversacional coloca as pessoas em uma
posição em que possam dar conta de situações
interculturais de forma construtiva e, portanto,
consciente. Ao mesmo tempo, elas devem
aprender a reconhecer e descrever problemas
comunicacionais como problemas de comunicação
de fato (e não apenas de atitude, caráter pessoal,
socialização, etc.). Isso é importante para a
transmissão de experiências culturais ou, melhor
ainda, experiências comunicacionais.
Na introdução desta cartilha, fizemos referência
ao fato de que não existem trabalhos empíricos
disponíveis sobre a comunicação de brasileiros em
contextos interculturais. Esperamos que os tipos de
problemas comunicacionais aqui apresentados deem
impulso para esse trabalho sobre linguagem e, com
isso, aumentem a sensibilidade para quais dinâmicas a
comunicação intercultural pode desenvolver.
57
6GLOSSÁRIO
Os conceitos abaixo elencados aparecem diversas
vezes no texto e possuem o significado a seguir:
Ato da fala
(Ver Cap. 3.2).
Atribuição de causalidade
Processo pelo qual o indivíduo busca explicações
acerca do porquê das ocorrências, das causas do
fenômeno, formando uma relação unitária entre
sua origem e suas consequências. Os estudos que
deram origem ao que hoje se denomina atribuição
de causalidade tiveram suas bases, principalmente,
nos textos heurísticos de Heider de 1944 e 1958
(Dela Coleta, J.A. & Dela Coleta, M.F., 2006), que
definiu, a princípio, dois fatores básicos aos quais
as pessoas dirigiriam a atribuição de causalidade
dos fenômenos que observassem: as forças do
ambiente (atribuição externa ao sujeito envolvido
na ação, causas impessoais, situacionais) e as
características das pessoas (atribuição interna
ao sujeito envolvido na ação, causas pessoais,
disposicionais).
Backchannelling
No papel de receptor, dar sinais de retorno – que
podem ser não verbais (gestualidade, mímica,
contato visual, postura corporal), vocais (uhum;
oh, ah, etc.) ou verbais (sim; interessante; OK, não
diga...) – sem pretender assumir o papel do locutor.
Best practices
Convenções que surgem com o decorrer da
interação – através de implementação, repetição
e aceitação – e que não existem de tal forma em
nenhuma das culturas/de idiomas de origem dos
envolvidos.
Comunicação
Interação entre dois ou mais pessoas, na qual
o planejamento da ação é simultâneo ou quase
simultâneo à execução, onde os interlocutores
58
estão nos mesmos espaços físico
e temporal e têm acesso imediato
à reação do outro – o que
possibilita que as palavras sejam
redirecionadas com auxílio de
“reparos” ou de esclarecimentos
metacomunicativos.
eles sinalizam uma área de
conhecimento (conhecimento
de fundo) ou uma situação
interpretativa real (também: in/
formalidade; seriedade/falta de;
objetivos da ação), que permitem
conclusões adicionais em relação
ao que foi dito.
subentender o que não é exposto
de forma explícita; já nas culturas
de “baixo contexto” os fatores
contextuais importantes são
incluídos na verbalização.
Distância Corporal
(Ver Cap. 3.8).
Comunicação Intercultural
Grupo de pessoas em interação,
que admitem possivelmente
por outras convenções de
comunicação, que não a própria.
Unidade de comunicação
descrita como problemática
pelos participantes, uma vez que
expectativas de normalidade
não são frequentemente
correspondidas. Construção
de convenções baseada no
comportamento comunicacional
de outros e das reações
causadas pela própria atividade
comunicativa.
Comunidade de Negócios
Grupo de pessoas que interagem
para fins profissionais e que,
no processo comunicativo,
admitem e se adaptam a outras
convenções linguísticas.
Contato Corporal
(Ver Cap. 3.8).
Contato Visual
(Ver Cap. 3.8).
Contextualization Cue
Recursos linguísticos (não verbais,
paraverbais, lexicais) que remetem
para contextos que podem/devem
ser utilizados para prosseguir na
interpretação de enunciados;
Convenções Linguísticas
Enunciado
Regras que, em uma comunidade
linguística, regem o uso de
expressões verbais, paraverbais
e não verbais em determinadas
situações.
Unidade de comunicação que
abrange formas de expressão não
verbais e paraverbais.
Conversa Fiada (Small Talk)
Conversa informal, banal
sem relação com o trabalho,
frequentemente sobre pessoas
ausentes ou temas do dia a dia.
Espaço Gestual
Espaço em que gestos são
produzidos.
Estruturação do Discurso
(Ver Cap. 3.3).
Etiqueta
Critical Incident
Unidade de comunicação que é
identificada como problemática
pelos envolvidos, uma vez que,
repetidamente, as expectativas
de normalidade não são
correspondidas.
Cultura Contrastante
Espaço com formas
comunicacionais específicas, que
servem para ilustrar convenções
comunicacionais inesperadas
e – de forma generalizada –
certos tipos de problemas
comunicacionais.
Cultura de Alto/Baixo
Contexto
As culturas de “alto contexto” são
aquelas comunidades linguísticas
em que os ouvintes devem
(Ver Cap. 3.9).
Expectativas de Normalidade
Comportamento comunicacional
não refletido (ver Modelo
Processual, Cap. 2.5).
Experiência na Comunicação
Construção de convenções
a partir do comportamento
comunicacional de outros ou
das reações dos mesmos em
relação às próprias atividades
comunicativas (ver Modelo
Processual, Cap. 2.5).
Expressão In/Direto
(Ver Cap. 3.5).
Face de um Interlocutor
Imagem social/pública que uma
pessoa deseja para si, delineada
59
em termos de atributos sociais
(por meio de procedimentos que
os outros supõem que ela siga).
Todos os atos que somos levados
a produzir na interação são, de
alguma forma, “ameaçadores”
a uma e/ou à outra face dos
interlocutores presentes,
chamados de face threatening
acts. Se os participantes
envolvidos no processo interativo
têm um desejo e necessidade de
face, cada um procura conservar
intactos, e mesmo melhorar, seu
território e sua face (positiva).
Gestualidade
(Ver Cap. 3.8).
Habilidades de Comunicação
Intercultural
Habilidades para aplicar
fatores da Consciência
Linguística das Culturas (ver
Cap. 3) às situações atuais de
comunicação intercultural e,
caso problemas surjam, para
atuar como moderador entre os
interlocutores.
Intenção
Intuito da fala, a finalidade da
ação comunicativa; ela deve ser
descoberta/explorada através
daquilo que o locutor exprime de
forma verbal, paraverbal e não
verbal.
Mentalidade Analítica
Estratégia que considera
fenômenos comunicativos
como expressão de uma ordem
pretendida, e procura pela sua
função na conversação em curso
de forma “aberta”, isto é, sobre
a base de hipóteses, que são
confirmadas ou modificadas
no transcurso das experiências
comunicacionais.
Mimetismo
Imitação de gestos (em
parte também: mímica,
postura corporal) do parceiro
conversacional no processo de
interação.
Postura Corporal
(Ver Cap. 3.8).
Pressuposto
Pressuposição sobre o
comportamento de pessoas de
outros contextos culturais, que é
baseada na própria experiência e
em relatos de terceiros.
Proxêmica
Distância corporal em relação ao
parceiro na comunicação, vista
como normal na situação dada.
Mímica
(Ver Cap. 3.8).
Recipient Design
Nível do discurso – como
representação de desejos, ironia,
pertinência e metacomunicação.
Formação/modelamento daquilo
que se deseja exprimir que leva
em consideração o ouvinte e as
suas competências linguísticas e
culturais.
Monocrômico
Registro
Caracterização da divisão
do tempo em unidades
subsequentes, no âmbito das
quais se realiza uma determinada
atividade (oposto: policrônico).
(Ver Cap. 3.6).
Modalidade
Odor
(Ver Cap. 3.8).
Paraverbal
Manifestação Linguística
(Ver Cap. 3.7).
Expressão verbal, não verbal
e paraverbal.
Policrônico
Tendência a realizar várias
atividades em uma unidade
de tempo. É, com frequência,
60
associado à capacidade de,
espontaneamente, dar preferência
a questões mais importantes
(oposto: monocrônico).
Significado Social/Léxico
(Ver Cap. 3.1).
Sinal de Escuta (Hearer
Signal)
Manifestação breve (verbal ou não
verbal) que indica que o ouvinte
está presente e atento àquilo que
é dito (mas não deseja assumir o
papel de locutor).
Sinal de Retorno
Sinais não verbais (por
exemplo, consentir com a
cabeça, com o movimentos das
sobrancelhas) e expressões
verbais (por exemplo, expressões
“uhum”/“é”, coavaliações), que
indicam a participação ativa do
receptor na conversação, sem
que ele pretenda, contudo,
assumir o papel de locutor; ver
anteriormente backchannelling).
Signo Não Verbal
(Ver Cap. 3.8).
Trocas de Perspectiva
Tentativa de se colocar no lugar
do outro e combinar a sua própria
percepção com à do outro.
Troca de Turno/Alternância
do Locutor
Pausa entre as falas do Locutor 1
e do Locutor 2; ou sobreposição
das falas dos mesmos; ou Locutor
2 assume a fala antes que o
Locutor 1 tenha de fato terminado
sua contribuição.
Situação Intercultural
Conversação com participantes
de diferentes culturas, que
perseguem um objetivo
comum e que perpassam as
etapas ilustradas no “Modelo
Processual” (ver Cap. 2.5).
Valor
(Ver Cap. 3.10).
Valores
Ver Disposições.
Vestimenta
Softeners (Hedges)
(Ver Cap. 3.8).
Expressões que suavizam
a informação expressada e
marcam (algumas vezes de forma
aparente) distância em relação ao
conteúdo daquilo que foi dito.
Tema
(Ver Cap. 3.4).
Tipo de Conversação
Unidade de interação delimitável;
maiores podem ser por exemplo:
“palestra”, “negociação”,
“assessoria”, “brainstorming”,
enquanto menores seriam:
“abertura de uma reunião”,
“resumo de resultados”,
“estabelecer acordos” ou
“procurar informações”.
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