JC Relations - Jewish

Transcrição

JC Relations - Jewish
Jewish-Christian Relations
Insights and Issues in the ongoing Jewish-Christian Dialogue
Frankemölle, Hubert | 01.07.2005
Judeus e cristãos depois de João Paulo II
O papa como leitor das Sagradas Escrituras
Hubert Frankemölle
Os necrológios à morte de João Paulo II (1920-2005) são numerosos. Os aspetos diferentes da sua
ação foram múltipla e reiteradamente enfocados. No que segue, não é pretendido acrescentar mais
um necrológio. Trata-se, antes, de dar a entender as fontes espirituais da sua teologia de Israel.
Ela não nasceu aos poucos, como nos antecessores no ofício, depois da eleição de Karol Wojtyla para
papa no 16 de outubro de 1978, mas está também condicionada na base da suas experiências no
catolicismo anteguerra na juventude e, antes de tudo, no tempo nazista em Wadowice, perto de
Auschwitz e Cracóvia (Krakau). No seu livro “Atravessar o limiar da esperança”, Hamburgo 1994,
escreve em vista da declaração sobre judeus “Nostra aetate” do Concílio Vaticano Segundo de 1965:
“Atrás das palavras de declaração do concílio está a experiência de muitas pessoas, tanto
judeus como também cristãos. Atrás dessas palavras está também a minha experiência
pessoal dos primeiros anos antes de todos da minha vida na minha cidade natal”.
Lembro-me, antes de tudo, da escola primária em Wadowice, onde pelo menos um quarto
dos alunos da minha classe eram judeus. E para ser mencionada seria também a minha
amizade de então com Jerzy Kluger, um desses garotos, a qual perdura até hoje. Tenho ainda
diante os meus olhos a imagem de como os judeus cada sábado se dirigiam à sinagoga
situada atrás do nosso ginásio. Ambos os grupos religiosos, católicos e judeus, formaram
uma unidade, e isso, suponho, porque estavam cientes de adorarem o mesmo Deus. Apesar
das diferenças lingüistas, as orações na igreja e na sinagoga se baseiam nos mesmos textos.
Então, veio a Segunda Guerra Mundial com os campos de concentração e da destruição de
pessoas humanas sistematicamente planejada. Como os primeiros, os filhos e filhas do grupo
popular judaico tinham de sofrer isso, e isso só porque eram judeus. Qualquer um que vivia
na Polônia naquela época entra em contato, ainda que indireto, com esse fato.
Isso era também a minha experiência pessoal, experiência que ainda hoje carrego em mim.”
(124).
“Como arcebispo de Cracóvia, tive contatos intensivos à comunidade judaica.
Relacionamentos extraordinariamente cordiais me ligaram ao chefe dela, e esses continuam
também depois da minha mudança para Roma.” (126)
Qual bispo, qual pároco da Igreja católica pode asseverar para si coisa semelhante?
Não é aqui o lugar para tematizar a experiência do jovem Wojtyla e o conhecimento histórico de hoje
sobre as correntes antijudaicas no catolicismo polonês no tempo antes da guerra, o que importa é a
sua percepção de então e o seu comportamento então praticado a co-pessoas humanas judaicas,
sobre o qual a mídia nos dias passados escrevera detalhadamente. Mais importante ainda, considero
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a motivação teológica para esse amor a pessoas humanas: a sua fé comum com os judeus no Deus
único, como esta foi formulada nas orações litúrgicas e era fundada “em alto grau nos mesmos
testos”, quer dizer nas Escrituras sagradas dos judeus e dos cristãos.
Essa convicção básica, o papa João Paulo II, no seu pontificado, a aprofundou e desenvolveu, assim
que se possa falar duma própria teologia de Israel nele, a qual merece um acabamento intensivo.
Prólogo
Sem dúvida, a identidade própria dos cristãos pende na confissão em Jesus Cristo. Essa era a razão
porque os adeptos do movimento Jesus na Antioquia – provavelmente como designação de
estranhos – foram chamados de “cristãos” pela primeira vez (At 11,26, cf. Didahé 12,4). Igualmente
incontestado é que os primeiros adeptos – seja que falavam aramaico ou grego – se entenderam
como judeus dentro do Judaísmo múltiplo nos primeiros dois séculos depois do nascimento de Cristo;
essa convicção cobrem todos os textos neotestamentários e os autores destes.
Correspondentemente, o cientista de religião nos EUA, Philip Sigal, os chama de “judeus cristãos”,
“pois ficaram antes de tudo, para assim dizer ‘substantivamente’, ‘judeus’, respectivamente
pertencentes ao ‘Judaísmo’, enquanto como especialidade, para assim dizer ‘adjetivalmente’,
acrescenta que chegaram a ser ‘cristãos’, respectivamente pertencentes à ‘Cristandade’.1
Essa lembrança do começo ofusca, de modo algum, a hipoteca grave que pesa, na base da reflexão
cada vez mias motivada filosoficamente, na cristologia (cf. p. ex. o artigo do grande credo de Nicéia
e Constantinopla ou as declarações dogmáticas à trindade). É também para lembrar a reivindicação
da Igreja cristã, especialmente da “católica” latino-romana para exclusividade efetiva de salvação, a
qual era o motivo para o erro no comportamento durante séculos de teólogos, concílios e papas para
com os judeus. A cristologia e a trindade assim desdobradas formavam o dissenso não-suprimível no
um-com-outro, respectivamente um-contra-outro, cristão-judaico. Antes de tudo, era a confusão de
convicção teológica e indoctrinação dessas convicções referente aos judeus (em disputações
forçadas, batismos forçados, guetoizações, expulsões, assassínios), a qual, nos parceiros judaicos de
colóquio – para eu bem ratificar – até hoje continua a produzir efeito traumático, pelo menos, porém,
deixa ficar vigilante perante as grandes palavras cristãs, quando feitos não lhes seguirem.
Em relação à história da longa “Zergegnung” [descontro] da cristandade, nós cristãos estamos,
nesse processo duma determinação nova do relacionamento de Cristandade e Judaísmo, ainda
completamente no começo, na qual se precisa tratar duma relembrança das próprias raízes bíblicas,
isso é judaicas. No contexto da descoberta nova da Escritura sagrada pelos reformadores no século
16, e da Igreja Católica no século 20, no Concílio Vaticano Segundo, a fé em Cristo estaria para ser
soletrada de novo, além da fixação na conceitualização de filosofia grega e da correspondente
teologia escolástica. Os cristãos precisam ainda descobrir a reivindicação teológica da origem. Só
assim, o Judaísmo poderá chegar a efeito como raiz e parte da fé cristã convenientemente a efeito.
Não outro que o papa João Paulo II reclamou essa relembrança em inúmeros sermões, alocuções e
declarações – em contrário ao procedimento errado de longos séculos - como o provam a sua
confissão de culpa no primeiro domingo da quaresma de 2000 em São Pedro em Roma ou como as
alocuções, que também comovem pessoas de fé não cristã, no mês de março de 2000 em Israel.
Continuamente, as motivações teológico-bíblicas são que permitem concluir a uma teologia
constante de Israel do papa. Citações das suas alocuções, portanto, estarão para articular as
exposições seguintes.
“Diálogo entre a primeira e a segunda parte da Bíblia”
Diálogo cristão-judaico não é somente um colóquio entre representantes de Cristandade e Judaísmo,
mas teria, segundo o papa João Paulo Segundo, antes de tudo, de ser um colóquio intracristão. Em
17.11.1980, formulou em Mainz [Mogúncia, Alemanha]:
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“A primeira dimensão desse diálogo, a saber, o encontro entre o Povo de Deus da Antiga
Aliança nunca revogada por Deus (cf. Rm 11,29) e aquele da Nova Aliança é, ao mesmo
tempo, um diálogo dentro da nossa Igreja, como que entre a primeira e a segunda parte da
sua Bíblia. … Precisa-se dar ao esforço de entender melhor o que está, no Antigo
Testamento, de valor próprio e permanente, … porque isso, pela interpretação à luz do Novo
Testamento, a qual lhe dá o seu sentido pleno, não está sendo desvalorizado, assim que se
dá, antes, uma iluminação e interpretação recíprocas” (175s.) com uma citação das “Guias
para a execução da declaração conciliar Nostra Aetate” de 1974).2
Quem já tiver lido os escritos do Novo Testamento e procurado as muitas citações da primeira parte
da Bíblia nela, terá de conhecer como cristão que todos os teólogos cristãos primitivos entenderam a
sua fé em Cristo, não uma como fé não judaica, mas sim como “boa nova de Deus, a qual préanunciou pelos Seus profetas nas Escrituras sagradas” (assim o apóstolo Paulo em Rm 1,2; cf. 3,21;
16,26). Também a fé na interpretação da intermediação da salvação da morte de Jesus e da sua
ressuscitação é, segundo Paulo, “conforme as escrituras” (1Cor 15,4). Segundo Mateus, não só todos
os caminhos nos antecedentes são determinados por mensageiro de Deus e sonhos, Jesus, ainda,
“precisa” ir a Jerusalém (16,21), toda a história de salvação “precisa” decorrer como decorre (17,10;
24,6) – idéia que Lucas estende sistematicamente para a sua teologia (cf. p. ex. 2,49; 4,43; 9,22;
24,7.26.44). Uma guia forte de leitor são também as muitas citações de cumprimento (“para se
cumpra…”), pelo que, antes de todos, o Evangelho segundo Mateus se mostra uma com re-leitura
das Escrituras sagradas de Israel.
De fato: Quem sobre Jesus Cristo como cristão de hoje pensar segundo as guias de leitor no Novo
Testamento, entrará num “diálogo … entre a primeira e a segunda parte” da Bíblia, em que nós
cristãos temos em comum com os judeus a primeira parte da bíblia, a fé judaica, portanto, tem de
ser uma parte grande da fé cristã.
Quem queria afirmar que teólogos cristãos e cristãos em todo já teriam sondado essa raiz judaica?
“Quem encontra Jesus, encontra o Judaísmo”
Dessa frase da “Declaração sobre a relação da Igreja ao Judaísmo do 28 de abril de 1980” dos bispos
alemães (I 261) o papa João Paulo se apropriou na sua alocução em 17 de novembro em Mogúncia (I
74). Na pessoa de Jesus está sendo transmitida a inteira “herança espiritual de Israel para a Igreja”,
“herança viva, que, por nos cristãos católicos, quer ser entendida e conservada na sua profundeza e
na sua riqueza”. As Escrituras sagradas de Israel estão aqui para serem mencionadas como
conteúdo, concretamente a fé no Deus único (monoteísmo), no mundo e na pessoa humana como
criação de Deus, na condução da história por Deus. Mas à grande herança da fé de Israel para os
cristãos pertencem também a idéia da aliança, a ética, inclusive a unidade do amor a Deus e ao
próximo, o amor aos inimigos, a celebração do Sábado, a fé na ressurreição dos mortos, a idéia da
substituição expiatória no sofrimento para o povo, o juízo na morte, respectivamente no fim do
tampo, etc. Não é específica e singularmente cristão de modo nenhum tudo aquilo que cristãos
acham que seria (cf. p. ex. o fala incorrigível do amor “cristão” ao próximo). Referências dessa
natureza possam (como observei muitas vezes) ser postas em questão por vários cristãos, poderão
por isso, porém, os deixar nada menos que mais cristãos, na relembrança das raízes judaicas-cristãs.
Esse processo não é sem problema e não é fácil, como também João Paulo II o articulou claramente
em 11 de abril de 1997 numa alocução perante a Comissão Bíblica:
“De fato não é que se possa expressar completamente o mistério de Cristo, senão se
remeter ao Antigo Testamento. A identidade humana de Jesus está sendo determinada a
partir da sua ligação ao povo de Israel. … Se negar-se a Cristo a sua ligação com o Antigo
Testamento, isso significará separá-lo das suas raízes e esvaziar o seu mistério de todo o seu
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sentido.”
Segundo o papa, isso significa a encarnação, a “arraigação da encarnação na história e,
conseqüentemente, também a incorporação de Cristo na história do povo de Israel”. Um tal
religação “traz, naturalmente, aspetos difíceis e pontos sensíveis consigo, sendo, todavia,
extremamente prometedora e rica em grandes esperanças” (II 103-105). Quem queria afirmar que
os cristãos e os teólogos cristãos, na execução de fé, nas orações litúrgicas e textos de cantos já
tivessem realizado a vira-volta às raízes judaicas da fé cristã?
“Jesus era judeu e o permaneceu sempre”
É justamente das dificuldades que acabamos por indicar de que trata a Comissão Vaticana para
Relações com os Judeus no Secretariado para a União dos Cristãos. Depois de que, numa distância
de 10 anos, promulgara em 1985 “apontamentos para a apresentação reta de judeus e Judaísmo na
pregação e na catequese da Igreja Católica”, visando, então, a transposição dos conhecimentos
ganhos para o nível de comunidade. Aqui não estavam – e isso pode ser que vale até hoje –
cumpridas muitas esperanças, as quais os bispos no concílio tiveram e as quais o papa tentara
vivificar em numerosas alocuções.
Qual judeu, o qual precisou passar pelo último século, antes de tudo, pelo tempo nazista, qual
cristão –preveria que se pudesse ler numa declaração oficial do Vaticano:
“Jesus era judeu e o permaneceu sempre. … Jesus era plena e completamente uma pessoa
humana do seu tempo e do seu ambiente judaico-palestinense do 1º século, cujas angústias
e esperanças compartilhava. … Jesus compartilhava, com a maioria dos judeus palestinenses
ensinamentos farisaicos de fé: a ressurreição corporal; as formas de piedade como
benfeitoria, oração, jejum (cf. Mt 6,1-18) e o costume litúrgico de se dirigir a Deus como Pai;
a primazia do mandamento do amor a Deus e ao próximo (cf. Mc 12,28-34). O mesmo vale
também para Paulo (cf. At 23,8), este que considerou a sua pertença aos fariseus sempre
como um título de honra (cf. At. 23,6; 26,5; Fl 3,5)” (198s.).
Com razão, essa declaração aponta para que com tais apontamentos “a realidade do chegar a ser
pessoa humana” chega a ser concreta. Essa idéia, auto-inteligível para teólogos bíblicos é, para o
papa, tão importante, que volta a ela freqüentemente, pode ser por causa da suspeita de que a frase
“Jesus era judeu …”, com todas as suas conseqüências teológicas, quase mal chegou a ser
determinante para a piedade cristã. Daí, João Paulo II em 31 de outubro de 1997 numa alocução aos
participantes do colóquio vaticano sobre as raízes do antijudaísmo no ambiente cristão, censurou:
“Algumas pessoas consideram o fato de que Jesus era judeu e que o seu ambiente era o
mundo judaico um como acidente cultural simples, o qual poderia também ser substituído
por uma inculturação religiosa outra e desprendida da pessoa do senhor sem perder a sua
identidade. Mas essa gente não só desconhecem a história da salvação, mas mais
radicalmente: Atacam a própria verdade der Menschwerdung [de chegar a ser pessoa
humana]” (II 109).
Por mais importante a idéia do ser judeu de Jesus seja em geral, como teólogo bíblico a gente vai
querer mais diferenciar religioso-historicamente, já que não havia nem há o “Judaísmo” nem no
tempo de Jesus nem hoje. Formulado apontadamente: Jesus não nasceu nos círculos sacerdotais de
Jerusalém, nem se originou duma família saducéia, nem era judeu da diáspora (como Paulo, formado
na fé judaica e na cultura grega). Jesus proveio da Galiléia Superior, de Nazaré, agindo
primeiramente em Cafarnaum e arredores, no lago da Galiléia. Esse ambiente histórico da vida de
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Jesus não só cunhava as suas noções de fé, mas também era determinativo para os endereçados do
seu anúncio e para os seus parceiros teológicos, os quais, na Galiléia, em regra consistiam de
fariseus. Com toda a clareza, a declaração de 1985 enfatiza ”que os fariseus não estão sendo
mencionados nos relatos da paixão” (I 99). Com isso, está sendo tocada “o problema espinhoso da
responsabilidade pela morte de Cristo”, a qual – assim Nostra Aetate, nº 4 – ‘não se (pode) pôr sem
discriminação a cargo de todos os judeus viventes então, nem aos judeus de hoje, embora as
superioridades com os seus adeptos tenham instado na morte de Cristo’” (I 101), com o que
herodianos e saduceus em Jerusalém são entendidos concretamente.
Com tais avisos, os preconceitos nos cristãos até hoje divulgados, de que “os” judeus tivessem
crucificado Jesus, deveriam ter sido exterminados. Com razão se enfatiza no mesmo lugar,
remetendo a Jo 10,18, que Cristo assumiu “em liberdade” a sua morte e que, segundo Lc 23,34, “os
poucos judeus que estavam junto, de fato, não sabiam o que estavam fazendo’”.
Tais reconhecimentos estão sendo colocados em peças dramáticas de paixão, bem como nas
pregações cristãs? São – assim o papa em 31.10.1997 – “no mundo cristão … superadas
interpretações errôneas e injustas do Novo Testamento referentes ao povo judaico e a culpa
pretensa deste”, as quais eram “tempo demais em circulação” e causaram os “sentimentos da
inimizade a respeito desse povo [dos judeus]” e que “contribuíram para despontar muitas
consciências” (II 107)?
“A nossa fé no Deus Único”
O pólo na reflexão sobre o significado da cristologia no diálogo cristão-judaico é o reconhecimento
incontestável de que Jesus de Nazaré anunciou, não a si mesmo, mas sim o “domínio”, quer dizer as
realidades dinâmicas, de Deus, fazendo justamente isso experimentável a outras pessoas na sua
atividade curadora. A base judaica fundamental de fé “Deus é e Deus é um só” está sendo
inequivocamente defendida também por Jesus (cf. Mc 10,18; 12,29 como citação de Dt 6,4). A
declaração teocêntrica “Deus é um só” é também a confissão fundamental do Paulo (citada em Gl
3,20; Rm 3,30); a partir dessa, esboça a sua teologia toda: Deus é o agente na suscitação de Jesus
(cf. p. ex 1Cor 15,15), na reconciliação (2Cor 5,19), na retificação de todas as pessoas humanas (Rm
4,5), na conclusão dos tempos (1Cor 15,23-28; Rm 11,1-10.29-36).
O papa João Paulo II, portanto, o considerou no começo do seu encontro com representantes
judaicos nos EUA em 11.9,1987 como “adequado” “acentuar a nossa fé no Deus único, o qual
escolheu Abraão, Isaac e Jacó e concluiu uma aliança de amor eterno, a qual nunca foi revocada (cf.
Gn 27,13; Rm 11,29)” (II 29). De fato: A fé em Deus o Único precisa ser, por nós cristãos, não por
causa do diálogo judaico-cristão e cristão-islâmico, mas também por causa do nosso próprio
entendimento de fé, formulada assim que corresponda aos partidos bíblicos. Isso quer dizer: Os
teólogos cristãos teriam a confissão trinitária “um Deus em três pessoas” (no sentido de modos de
agir, medianizações, hipóstases) de interpretar assim da gênese dessa confissão que cristãos e nãocristãos o possam, pelo menos, re-ratificar pensativamente ou – se isso não for possível – exprimir
numa equivalência dinâmica lingüisticamente, assim que o entendido naquele tempo hoje esteja
sendo dito em outras palavras. Justamente em face da fascinação da unicidade de Deus no Judaísmo
e no Islame (com todas as correntes diversas), os cristãos teriam de novamente ensaiar a unicidade
de Deus afirmada em palavra e ação. Aqui, nós cristãos temos ainda um caminho longo diante de
nós.
No Concílio Vaticano Segundo, a Igreja Romano-Católica fez um primeiro passo. Embora Josef
Ratzinger, no comentário à constituição sobre a revelação divina de 1965, lamente com razão que a
constituição da Igreja de 1964 provoque a impressão de “como o concílio tenderia para uma automiração, na qual a Igreja circulasse completamente ao redor de si mesma, elevando-se a objeto
central do seu anúncio”, vê, na versão “ouvindo a palavra de Deus cheia de veneração e a
anunciando cheia de confiança” na constituição sobre a revelação divina, uma formulação a qual
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pertence “às cunhações felizes” do concílio.3 Entre teólogos bíblicos é trivialidade que – como o
próprio Jesus – também todos os cristãos e Igrejas têm de prestar um serviço para o evangelho do
Deus libertador e agindo historicamente.
Transferindo essa modificação de acento também à versão introdutória da constituição eclesial
“Cristo é a luz dos povos” – a qual, todavia, regozija duma larga base neotestamentária (Mt 4,16;
17,2; Lc 2,32 e, antes de tudo, Jo 1,9; 3,19; 8,12; 9,2; 12,46) – então nós cristãos teríamos de
integrar, analogamente, todos os pronunciamentos cristocentricos nas confissões teocêntricos das
Escrituras sagradas de Israel, segundo as quais Deus mesmo é a luz do mundo (Sl 27,1; 36,10;
97,11; 104,2; Mq 7,8). Muito bem a bispa Maria Jepsen de Hamburgo, para a abertura da “Semana
da Fraternidade” em março de 1999 em Potsdam, formulou: “Em desconhecimento estranho dos
fatos, continuamos partindo – astronomicamente falado – de que a Bíblia seja um sistema em que o
Antigo Testamento circula ao redor do Novo Testamento, recusando-nos a reconhecer que o Novo
Testamento é um satélite do Antigo. Não somente historicamente, mas, antes de tudo, também a
respeito do conteúdo. Para nós, Jesus Cristo é o centro da Escritura. Essa frase nos está tão
encarniçada que qualquer um desataria uma tempestade de indignação – intra-eclesialmente –
quando opusesse: Deus está o centro da Escritura.”
Será que nós cristãos estejamos dispostos, contra o estreitamento cristocêntrico da nossa fé pelos
séculos, a aceitarmos a perspectiva teocêntrica fundamental, não só dos textos
antigotestamentários, mas também de todos os textos neotestamentários? Com toda a variedade
dos esboços cristológicos, então das cristologias no Novo Testamento, todos os teólogos - seja que
pensam em categorias lingüísticas aramaicas ou gregas sobre o agir de Deus “em” e “por” Jesus
Cristo – concordam em que a unicidade de Deus não está sendo posta em questão. Somente sob
essa suposição é que possa ser concebida uma cristologia sem antijudaísmo. Somente assim estará
possível também um colóquio com judeus sobre Jesus e sobre o agir de Deus, agir o que for atribuído
a Jesus como agir de Deus.
Nós cristãos somos dispostos para pôr a lembrança no começo como reivindicação ao futuro da fé
cristã sem antijudaísmo?
“Assentimento … à pessoa e à doutrina de Jesus de Nazaré”
Já é assombroso como o papa João Paulo II, antes de toda a ênfase da delimitação de Judaísmo e
Cristandade, primeiro – partindo da fé na aliança com Israel nunca revogada por Deus (Rm 11,29) e
da identidade do Deus único dos judeus e dos cristãos – enfatiza coisas em comum. Seja lembrada a
alocução na ocasião da primeira visita dum papa na sinagoga principal de Roma em 13 de abril de
1986:
“A religião judaica é para nós, não algo ‘por fora’, mas pertence de certo modo ao ‘interior’
da nossa religião. A ela, portanto, temos relações como com nenhuma outra religião. Sois os
nossos irmãos preferidos e, assim se poderia dizer de algum modo, os nossos irmãos mais
idosos” (I 109).
Irmãos têm um pai comum. Essa imagem de família não confunde as diferenças: “Cada uma das
nossas religiões, em plena consciência das muitas ligas que uma liga a outra …, quer ser
reconhecida e respeitada na sua própria identidade” (ib.). Preconceitos têm de ser superados,
qualquer “cobra duvidosa” é para ser recusada, a própria identidade judaica e cristã é para ser
preservada. À cristã, naturalmente, pertence a fé na ação de Deus em Jesus Cristo.
A ninguém escapa que a diferença fundamental inicial consiste no consentimento dos
católicos à pessoa e à doutrina de Jesus de Nazaré, este que é filho do vosso povo. … Mas
esse consentimento pertence ao âmbito da fé, isso quer dizer do consentimento livre da
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razão e do coração, que são guiados pelo espírito. Consentimento esse nunca deve chegar a
ser, em um ou outro sentido, objeto de pressão externa. Essa é a razão por que estamos
dispostos a aprofundar o diálogo entre nós em lealdade e amizade, bem como no respeito
das convicções internas do um e do outro, tomando os elementos da revelação, o quais
temos em comum como ‘grande herança espiritual’ (cf. Nostra Aetate, nº 4) como
fundamento essencial.” (ib. 110).
A conseqüência de tais convicções não pode ser senão: Cada forma de missão aos judeus é
teologicamente obsoleta, cada forma de antijudaísmo é teologicamente pecado.
A questão que se abre aqui elementarmente será: Como judeus cristãos de fala aramaica e grega
falaram do agir de Deus no mundo, na história de Israel, nos profetas e em Jesus de Nazaré? Aqui é
preciso insistir que os diversos grupos judaicos (isso é documentado, antes de tudo, pelos escritos
de Qumran do tempo de Jesus), os quais diferentemente atualizam as para eles sagradas escrituras
de Israel (as quais existiam, ainda não na forma de bíblia, como livro, mas sim em rolos diversos).
Também aqueles judeus que criam no agir novo de Deus em Jesus de Nazaré liam as escrituras
sagradas da nova perspectiva de fé, chegando assim a um entendimento novo, a uma identidade
própria – p. ex. em comparação com os grupos dos fariseus, os quais aceitavam, não os escritos
sagrados de Israel escritos em grego, mas sim os textos presentes em hebraico e aramaico como
Escrituras sagradas.
Essa decisão lingüista é elementar para o brotar da Cristandade do Judaísmo com radicalização
permanente no Judaísmo. Era decisiva para o Auseinanderdriften [descorrer] das direções de fé
farisaica e cristã no tempo depois dos 70 (destruição de Jerusalém e do Templo), já que disso foi
atingido primeiro a imagem judaica de Deus. O Judaísmo grego com a sua literatura múltipla – para
os cristãos, as traduções das Escrituras sagradas hebraicas, bem como os escritos originalmente
escritos em grego Sirácida, Sabedoria, Baruc, 1 e 2 Macabeus e outros) respondeu as perguntas pela
transcendência e imanência simultâneas de Deus assim que o Deus transcendente como espírito,
como sabedoria, como palavra age dinamicamente para dentro do mundo, em que, antes de tudo, a
fé no agir de Deus por profetas era decisiva para as concepções cristológicas no Novo Testamento.
Como os teólogos farisaicos, na base da sua ligação nas Escrituras sagradas hebraicas de Israel
recusavam essas imaginações gregamente cunhadas de inclinação, condescendência de Deus, do
Seu rebaixamento, kenosis, era dada a desunião, não só a lingüística, mas também a teológica de
conteúdo. Cientistas de religião e teólogos judaicos, como G. Lindeskog, J. Neusner, D. Flusser, M.
Wyschogrod, Z. Werblowsky, aceitam esses pressupostos judaicos para a cristologia, sem concordar
como eles - em fé.4
O que me parece decisivo é que a fé cristã seja entendida no sentido descrito pelo papa, mas não no
sentido dum pronunciamento de fato, respectivamente exclusividade de salvação (como a
declaração vaticana Dominus Jesus de 6 de agosto de 2000, pelo menos, o sugere e como se pode
concluir do comportamento das Igrejas cristãs referente aos judeus até no meio do século 20, para –
custe o que custar – a salvação eterna).
Mais uma vez, seja lembrada a palavra do papa de que a adesão dos cristãos “à pessoa e à doutrina
de Jesus de Nazaré …” pertence “à região da fé”, a qual é dom de Deus e do espírito dEste e nunca –
e seja tão sutil como for – deve ser forçada. O comportamento de Pedro e Paulo conforme o capítulo
2 da carta aos Gálatas com a sua tolerância mútua de concepções teológicas fundamentais
diferentes e praxe cristã diferente pode ser impulso e critério não somente intracristãos.
Nós cristãos estamos sendo tolerantes no colóquio intracristão? Estamos dispostos a aplicar esse
critério ao comportamento, não só católico-evangélico, mas também ao cristão-judaico?
“Fraternidade genuína com o Povo da Aliança”
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No limiar ao novo milênio, João Paulo II exorta o mundo católico de enfrentar os erros e pecados do
passado. Ele mesmo falou em 12 de março de 2000, no primeiro domingo da quaresma, em São
Pedro em Roma, um abrangente “mea culpa” por falhas e pecados. Na confissão de culpa em
relação a Israel como “povo da aliança e dos louvores” pediu: “Somos profundamente tristes sobre o
comportamento de todos que, no decorrer da história deixaram sofrer os teus filhos e filhas. Pedimos
perdão e nos queremos intervir a favor de fraternidade genuína com o povo da aliança.” (II 154).
Esse texto é idêntico com o texto que pôs em 26 de março de 2000 no muro ocidental em Jerusalém
(II 161).
Quem achar que essa referência teria pouco a ver ao tema de “Referências Bíblico-Teológicas à
Relação de Judeus e Cristãos”, seja lembrado do entendimento de fé judaico, segundo o qual fé
sempre significa santificação do cotidiano, uma fé atestada pelo agir. Enfim: A cristo-praxe cristã
tem de corresponder à cristologia cristã – conforme o comportamento de Jesus e a fé em Deus
judaica. É que reza no midrash Shemôt Rabba à revelação divina em Ex 3,14: “O Santo, louvado seja
Ele, disse a Moisés: Queres saber o meu nome? Correspondente ao meu agir estou sendo nomeado.”
Como está a cristo-praxe dos cristãos? O que significa “pedimos perdão” em consideração ao
comportamento dos cristãos e das Igrejas cristãs referente aos judeus no passado? Como tem de ser
o aspecto de “fraternidade genuína” entre cristãos e judeus hoje?
Epílogo
Como é fundamental o cruzamento de cristologia e cristopraxe para o presente e o futuro, mostro
uma olhada no passado. Quem cresceu como jovem no tempo depois do Concílio Vaticano Segundo
(1962-65) e ler as declarações das Igrejas cristãs dos decênios passados, mal poderá adivinhar quais
são as mudanças realmente fundamentais que se consumaram no relacionamento, p. ex. do
Vaticano ao Judaísmo, no século passado. Que se pode falar, com o papa João Paulo II, duma
“mudança decisiva” (I 108), mostra repentinamente uma alocução de Pio IX - que,
incompreensivelmente, foi beatificado em 3/9/2000 pelo papa João Paulo II (em parelha diplomática
dupla com João XXIII) – em agosto de 1871 aos membros duma organização de mulheres romanocatólica. Disse sobre os judeus: Na antiguidade, antes do nascimento de Jesus, teriam sido “crianças
na casa de Deus”, “por causa da sua teimosia e da sua falte de fé se tornaram cachorros”. Essas
palavras foram faladas somente poucos meses depois de que tropas italianas liberaram os judeus do
gueto, o que foi lamentado pelo papa como segue: “Infelizmente, temos hoje em Roma demais
desses cachorros, e os ouvimos latirem em todas as ruas, vendo que, por toda a parte, molestam as
pessoas.”5
Um dito de sabedoria judaica antiga, que está sendo atribuído a Baal Shem Tob (cerca de
1700-1760) – está também sobre o lugar memorial Yad WaShêm em Jerusalém – diz: “O querer
esquecer prolonga o exílio, e o mistério da salvação se chama de lembrança.”6
O papa João Paulo II tem – se quisermos aproveitar a metáfora – acabou com o exílio da Igreja
Romano-Católica no que se refere ao esquecimento da culpa de cristãos contra os judeus, como o
documenta o alto significado simbólico da confissão de culpa no domo de Pedro e no Muro Ocidental
em Jerusalém no mês de março de 2000. Como nenhum outro teólogo católico no último século,
intensivou, em palavra e fato, a nova determinação da relação da Igreja Católica ao povo judaico. A
sua focalização bíblico-teológica fortemente cunhada (também nos assunto de imagem de pessoa
humana, paz, justiça social, liberdade, crítica no capitalismo e comunismo, unidade dos cristãos,
ecumena entre Judaísmo – Cristandade – Islame) são o legado do seu pontificado à Igreja de Deus
em Jesus Cristo.7
Notas: Veja no fim do texto alemão.
8/9
Texto alemão
Tradução: Pedro von Werden SJ - Rua Padre Remeter, 108 - Bairro Baú - 78008-150 Cuiabá-MT
-BRASIL [email protected]
9/9
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