Livro Duque de Caxias - NIMA - PUC-Rio

Transcrição

Livro Duque de Caxias - NIMA - PUC-Rio
Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente
Prefeitura Municipal de Duque de Caxias
Secretaria de Meio Ambiente
3
NIMA
Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente
Educação Ambiental
Formação de valores ético-ambientais para
o exercício da cidadania no município de
DUQUE DE
CAXIAS
Rio de Janeiro
artigos
Apresentação
Padre Josafá Carlos de Siqueira S. J.
8
12
Introdução
12
Informações gerais sobre o município de Duque de Caxias
37
Algumas reflexões para ajudar a entender a produção desigual
do espaço urbano em Duque de Caxias
Alvaro Ferreira
34
Duque de Caxias, município da região Baixada Fluminense:
poder local, gestão do território e política pública
no Estado do Rio de Janeiro.
Augusto César Pinheiro da Silva
Rosana Cristine Machado de Oliveira
trabalhos de campo
22
Morro do Céu
11
Cidade dos Meninos
15
Parque Glicério
15
Caixa D’Água
15
Parque Municipal da Taquara
aulas
15
Reserva Biológica do Tinguá
22
27 de Setembro
15
Barragem Saracuruna
22
11 de Outubro
22
18 de Outubro
22
25 de Outubro
32
mapas
32
Introdução
32
O município de Duque de Caxias na RMRJ
32
O município de Duque de Caxias na Baixada Fluminense
do Estado do Rio de Janeiro
32
Distritos do município de Duque de Caxias
32
Geologia do município de Duque de Caxias
32
Geomorfologia do município de Duque de Caxias
32
Hidrografia do município de Duque de Caxias
32
Uso do solo e cobertura vegetal de Duque de Caxias
32
Áreas de Unidades de conservação no município de Duque de Caxias
32
Densidade de ocupação e densidade urbana de Duque de Caxias
32
Rodovias no município de Duque de Caxias
32
[zona especial]
Direito Ambiental: origens, desenvolvimento e objetivos
Fernando Cavalcanti Walcacer
Virgínia Totti Guimarães
40
Educação Ambiental: por que e para quê?
Regina Célia de Mattos
52
Os espaços “vazios” do município de Duque de Caxias:
a natureza e sua sociedade
Rita de Cássia Martins Montezuma
Rogério Ribeiro de Oliveira
59
Histórico, finalidades, objetivos e princípios da Educação Ambiental
Roosevelt Fideles de Souza
34
Jardim Gramacho e o território do lixo
Valéria Pereira Bastos
encerramento
32
Alunos do projeto de Educação Ambiental
32
Apresentações
32
Exposições de trabalhos
32
Créditos
Num mundo marcado pela fragmentação dos saberes, é admirável conhecer as experiências que estão sendo vividas e vivenciadas em escala local, onde a união de esforços entre o setor
público e o privado, o ensino superior, o ensino médio e o ensino
fundamental buscam caminhos de compreensão interdisciplinar
para a complexidade dos problemas que envolvem o Município
de Duque de Caxias. Não é de estranhar que as asas que marcam o lema do brasão da puc-Rio, Allis grave nil, não tenham
sido feitas para voar apenas no pequeno limite do território acadêmico, mas, sim, para alcançar voos mais longínquos que permitem conhecer, estudar e devolver à Baixada Fluminense, suas
riquezas e suas contradições.
O espírito que move as parcerias entre a puc -Rio, a Petrobras e a Prefeitura Municipal de Duque de Caxias, em prol da
formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania, consiste em construir conhecimentos a partir da realidade local e devolvê-los aos agentes multiplicadores da educação ambiental nas escolas. Com essa perspectiva, a equipe do
nima , coordenada pelo pesquisador Luis Felipe Guanaes Rego
e formada pelos professores dos Departamentos de Geografia,
Direito e Serviço Social da puc -Rio, empenhou-se na desafiante
missão de conhecer de perto um município onde a grandeza de
possuir um território coberto por mais de 50% de área verde,
que ocupa o sexto maior pib do Brasil e abriga uma das maiores refinarias de petróleo do país, está profundamente associada com a fragilidade de seus problemas sociais.
Antes de tematizar os conteúdos que foram explicitados durante os cursos, os professores procuraram conhecer
de perto, através dos trabalhos de campo e de numerosas pesquisas, as realidades socioambientais do município como um
todo, assim como localidades específicas que fazem parte da
história de Duque de Caxias, caso do Morro do Céu, da Cidade
dos Meninos, do Parque Glicério, da Caixa D’Água, do Parque
Municipal Taquara, da rebio Tinguá e da Barragem Saracuruna. Inspirados nesta realidade concreta, os professores ela-
Apresentação
9
10
boraram suas reflexões, retratadas nos diferentes artigos que
integram o presente livro.
Abrindo os olhos para uma problemática mais globalizada, que também está relacionada com a realidade local, o
professor Álvaro Ferreira nos fala sobre a produção desigual do
espaço urbano de Duque de Caxias, mostrando que o conceito
de urbano transcende aquilo que denominamos de cidade. O
autor termina a sua reflexão com um convite à população local
para uma participação mais ativa e constante, condição necessária para ser não apenas citadino, mas cidadão. Preocupados
em fazer uma reflexão sobre o poder local, a gestão do território
e a política pública no Estado do Rio de Janeiro, os professores
Augusto César Pinheiro da Silva e Rosana Cristine Machado de
Oliveira procuraram mostrar a complexidade das práticas políticas no espaço territorializado da Baixada Fluminense e a importância de aumentar a capacidade do ente público municipal,
para que este possa vir a se tornar uma referência regional.
Com o objetivo de elucidar os meandros legais, válidos
para as realidades nacional e local, os professores de Direito
Ambiental Fernando Cavalcante Walcacer e Virginia Totti Guimarães analisaram a evolução da legislação brasileira, o licenciamento, a participação na gestão e na fiscalização ambiental.
Questionada sobre o porquê e o para que da Educação
Ambiental, a professora Regina Célia de Mattos procura fazer
uma reflexão sobre a relação histórica entre a sociedade e a
natureza em Duque de Caxias, mostrando os sinais de avanços
e as preocupações sociais. Sem negar a importância da Educação Ambiental, a geógrafa questiona o comportamento do poder
público e empresarial que, muitas vezes, cobra mudanças de
hábitos e costumes da sociedade, mas acaba sem dar o testemunho de ações concretas em favor de condições mais dignas
de saúde, segurança e bem-estar para a sociedade.
Preocupados, também, com a relação entre a natureza e
a sociedade, os professores Rogério Ribeiro de Oliveira e Rita
de Cássia Martins Montezuma fazem uma análise cuidadosa da
história da transformação do cenário ambiental de Duque de
Caxias, formado por diversos ecossistemas. Os autores descrevem as atuais paisagens naturais, as áreas ocupadas e os espaços “vazios”, ricos e pobres em diversidade. Para eles, a heterogeneidade ambiental do espaço se modifica na relação entre
encosta e baixada, o que não tira a importância da preservação
das Unidades de Conservação existentes, como também dos
espaços que aparentemente se mostram vazios, mas que, na
verdade, estão cheios de história, ações e significados geobiofísicos e sociais. Focado na compreensão didática da temática, o
professor Roosevelt Fidelis de Souza procura abordar o histórico,
os princípios e os objetivos da Educação Ambiental, mostrando
os impactos ambientais dos ciclos econômicos e tecendo considerações finais sobre a importância de uma abordagem mais
ampla e integrada dos processos de Educação Ambiental para
as gerações presentes e futuras. O último artigo do livro, elaborado pela professora Valéria Pereira Bastos, adota um enfoque
local complexo, relacionado ao Jardim Gramacho e ao território
do lixo. Depois de apresentar dados sócioeconômicos do município de Duque de Caxias, a autora nos mostra a realidade desse
espaço territorial que abriga cerca de 40 mil habitantes, onde
50% das pessoas dependem direta ou indiretamente das atividades econômicas procedentes da catação do lixo. Fica clara a
preocupação maior da autora com os problemas relacionados
à exclusão, ao desemprego e à marginalização.
Fica, aqui, o convite para que os leitores possam assimilar a riqueza das diferentes abordagens e olhares sobre o território de Duque de Caxias. E a esperança de que os professores
do município, verdadeiros agentes multiplicadores da Educação Ambiental, possam traduzir, em linguagem acessível aos
seus alunos, as grandezas, os problemas e as soluções ecologicamente sustentáveis, socialmente justas e solidárias.
Padre Josafá Carlos de Siqueira S. J.
Vice-reitor da PUC-Rio
11
12
A preocupação com a preservação do meio ambiente e a melhoria da
qualidade de vida tornou-se algo cotidiano e a educação ambiental se
apresenta como um campo de estudo preocupado com a formação de
pessoas conscientes do planeta em que vivem. Quando trabalhamos a
educação ambiental, não falamos apenas de meio ambiente, mas abordamos as complexas relações de interdependência entre os diversos elementos da natureza, da qual fazemos parte, somos capazes de conhecer
e transformar. Nós não nos relacionamos com a natureza apenas como
indivíduos, mas, principalmente, por meio do trabalho e de outras práticas sociais. Assim, as relações de todos nós com a natureza possuem
dimensões econômicas, políticas e éticas.
Desta forma, atualmente, quando trabalhamos temas do meio
ambiente, precisamos tratar de questões sociais complexas como, por
exemplo, baixos índices de desenvolvimento, pobreza e falta saneamento
básico. Ao longo de nossa história humana, temos expressado uma
admiração pela natureza que nos rodeia e, nas últimas décadas, uma
crescente preocupação em protegê-la. Observamos que, atualmente,
uma série de questões relacionadas com as diversas formas de degradação do meio ambiente vêm motivando e despertando boa parcela
da população, em estado de alerta no que diz respeito à problemática
ambiental.
Sabemos que a educação é o meio mais eficaz que a sociedade possui para enfrentar as provas do futuro e, de fato, a educação moldará
o mundo de amanhã. A educação deve ser parte vital de todos os esforços para imaginar e criar novas relações entre as pessoas e promover
um maior respeito pelas necessidades do meio ambiente. Por isso trabalhamos a educação ambiental em seu aspecto não formal, pois ela não
deve ser relacionada apenas com a escolaridade ou o ensino formal, já
que também compreende modos de instrução não formais, incluindo o
aprendizado tradicional que se adquire no lar, no seu ambiente. Através da educação transmitimos um maior grau de consciência e sensibilidade, explorando novas visões e conceitos e inventando novas técnicas e instrumentos.
Percebemos que a Educação Ambiental, para se consolidar, precisa de ações práticas e teóricas que comprovem a viabilidade de sua
proposta em todos os níveis sociais, como um processo crítico de formação que faça com que as futuras gerações tenham capacidade de
exercer sua cidadania.
Por isso, percebemos que os valores éticos são o agente mais eficaz para a mudança e a transformação da sociedade. Valores éticos,
como a equidade, são adquiridos pela educação, no sentido mais amplo
do termo. A educação é também essencial para que as pessoas possam usar seus valores éticos a serviço de opções conscientes e éticas.
Quando trabalhamos com professores do ensino médio e fundamen-
Introdução
tal, na transmissão de novos valores ético-ambientais, imaginamos que
estamos incrementando a capacidade dessas pessoas de transformar
suas idéias sobre a sociedade em realidades funcionais, e que sem um
fundamento moral e ético dificilmente um novo modelo de sustentabilidade se tornará realidade.
O objetivo maior da educação ambiental é a do repensar o estilo
de vida do homem, a necessidade de se formar uma ampla consciência crítica das relações na natureza onde nos inserimos, dentro de uma
proposta político-social-filosófica de mudança global da sociedade e de
sua estrutura.
A metodologia de ação deste projeto delineou-se a partir da diretriz
que vem sendo traçada desde experiências anteriores em outros municípios. Nossa equipe acredita, confiando na sensação de dever cumprido
através da troca de informações e experiências, que suas variáveis estão
certamente se desdobrando em novas diretrizes, que vão orientar novas
ações na multiplicação de valores ético-ambientais para o exercício da
cidadania no Município de Duque de Caxias. Essa troca veio se estabelecendo desde o primeiro contato da nossa equipe com a Secretaria
de Meio Ambiente do município, através dos trabalhos de campo, onde
foram revelados aspectos socioambientais presentes na realidade cotidiana de Duque de Caxias.
Desta forma, a proposta do projeto Educação ambiental: Formação
de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania no município
de Duque de Caxias, promovido pelo Departamento de Geografia e pelo
nima / puc -Rio, teve como principais objetivos:
●● Fornecer uma ampla fonte de conhecimentos ambientais sobre o
município de Duque de Caxias, construída através de um diagnóstico produzido pela equipe do Departamento de Geografia e do
nima / puc -Rio, em parceria com a Secretaria de Meio Ambiente
do município.
●● Investir na formação de agentes multiplicadores da educação
ambiental, que transmitirão valores ético-ambientais, capacitando
e promovendo lideranças educacionais/comunitárias.
●● Organizar conteúdos, métodos e roteiros didáticos, pautados pelos
resultados do diagnóstico ambiental, disponibilizando os dados
através de uma home page específica para o projeto.
●● Produzir um livro que transforme o diagnóstico traçado em ferramenta didática a ser utilizada por toda rede de ensino do município perpetuando, assim, a troca inicial de informações.
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●● Produzir um vídeo que relate o desenvolvimento e as conclusões
do projeto e que também sirva como material didático e de divulgação do trabalho realizado.
●● Propiciar atividades de campo em ecossistemas locais, integrados
à Agenda 21 local e às perspectivas do desenvolvimento sustentável nos municípios.
●● Promover atividades eco-culturais (poesias, teatros, pinturas, etc)
junto aos jovens estudantes, com direito à exposição dos melhores
trabalhos, motivando o desenvolvimento de suas aptidões pessoais e integrando-os à comunidade local.
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Neste sentido, o projeto Educação Ambiental: formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania no município de Duque de
Caxias configurou-se como excelente forma de colocar em prática iniciativas que visam a sustentabilidade. Através da capacitação de lideranças
comunitárias, de professores e de alunos da rede pública, transformados
em agentes multiplicadores em comunidades locais, objetivou-se uma
ampliação do exercício consciente e responsável da cidadania, levando
a uma melhoria efetiva na qualidade de vida da população.
O projeto, que contou com a participação das secretarias municipais de Educação e Meio Ambiente, capacitou professores da rede
pública municipal e contemplará as escolas envolvidas com este livro,
que, além do conteúdo didático trabalhado nas aulas de capacitação,
apresenta um diagnóstico socioambiental do município, feito através de
trabalhos de campo que envolveram toda a equipe, além de representantes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Em ambos os trabalhos,
utilizamos o Sistema de Informações Geográficas (sig ), potencializando
a troca de informações e experiências, bem como o conteúdo didático e
teórico das aulas de capacitação elaborada pelos professores do Departamento de Geografia, em associação com o Núcleo Interdisciplinar de
Meio Ambiente (nima ) da puc -Rio. Ao longo do desenvolvimento do projeto, também foi produzido um vídeo mostrando todas as etapas do projeto, que servirá como material didático e de divulgação.
A produção deste material é importante para a perpetuação do
projeto dentro e fora das escolas, servindo como ferramentas na multiplicação dos valores ético-ambientais para o exercício da cidadania.
É importante enfatizar os resultados dos projetos também para a
sociedade como um todo, na medida em que podem ser abordados em
congressos científicos nacionais e internacionais. Inúmeras instituições
educativas de ensino médio e superior podem receber como doação as
publicações de tais resultados. Acessando os links da home page do
projeto, que complementa o material do livro, abre-se a possibilidade
de acesso a uma quantidade significativa de dados e informações sobre
o município de Duque de Caxias. O conteúdo dessas informações tornou-se uma ferramenta fundamental na capacitação dos alunos do projeto. Através do laboratório do Sistema de Informações Geográficas da
puc -Rio, o labgis , foram desenvolvidos mapas com conteúdo diverso
de dados sobre o município, igualmente disponibilizados na rede de
informações da internet através da home page do projeto, contribuindo
para a democratização de todo material levantado. Assim, buscamos oferecer um redimensionamento da simbologia cultural dos mapas, através
da sua disseminação em meio digital. Acreditamos que a capacidade de
reconhecimento da diversidade de paisagens do próprio município, através do uso e disseminação desse material pelos professores e demais
agentes locais, possa potencializar o sentido de pertencimento e orgulho
da população local, contribuindo efetivamente na construção de valores
ético-ambientais para o exercício da cidadania.
O investimento em uma maior conscientização ético-ambiental,
através da promoção de conhecimentos socioculturais e ambientais,
na formação dos agentes multiplicadores, com certeza irá proporcionar
novas territorialidades no uso do espaço geográfico do município de
Duque de Caxias. Um município com mais de 50% do território composto por área verde pode tornar-se uma referência, a partir da escala
local, na gestão ambiental com participação efetiva das instituições
públicas, privadas e da sociedade civil organizada.
O projeto também teve o importante papel de mostrar a Petrobras
como uma empresa socialmente responsável e preocupada não apenas
com projetos ambientais de caráter técnico e conservacionista, mas
também com a formação de valores ético-ambientais e com o desenvolvimento sustentável da comunidade local, na medida em que ajuda o
município a tomar consciência da importância da elaboração da Agenda
21 local, oferecendo subsídios e metodologias para sua implantação.
Além desse aspecto, o projeto ainda integra a Petrobras nos programas
de educação ambiental nas escolas públicas do interior do Estado do
Rio de Janeiro, mantendo uma preocupação com a sensibilização sobre
as questões ambientais, voltadas para uma abordagem ética.
A gestão socialmente responsável tem revelado reflexos que extrapolam os limites das empresas, com desdobramentos que afetam toda a
sociedade. No exercício da responsabilidade social, a relação da empresa
com a comunidade é otimizada, tanto nos aspectos da imagem e reputação da empresa, como nos benefícios que a empresa traz para a comunidade do ponto de vista econômico, educacional, ambiental, cultural,
entre outros.
A rede formada a partir dos conhecimentos adquiridos durante
o projeto – secretarias municipais, coordenação pedagógica escolar, e
principalmente entre lideranças, professores e alunos – certamente con-
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tribuirá na formulação e execução de novos projetos elaborados pelos
participantes. O material presente nesse livro traz a autonomia necessária para a continuidade das atividades, tanto nas escolas como nas
famílias e na comunidade, abrindo perspectivas futuras na busca de
alternativas locais sustentáveis. O acesso ilimitado às informações sobre
o município, através da página na internet, transcende as perspectivas
presentes de continuidade de troca de informações. O processo de inserção do Brasil na dinâmica da economia global, como potência regional
e como economia emergente, cria reflexos em toda dinâmica sócioespacial do seu território. Não só o município de Duque de Caxias, mas
toda a região da Baixada Fluminense, passam por transformações significativas no uso do seu espaço geográfico, em razão desta e de outras
dinâmicas internas e externas, que promovem constantemente alterações na sua paisagem. Acreditamos que o exercício pleno da cidadania, pautado nos valores de uma ética ambiental, seja a diretriz para as
ações que incorporem a sustentabilidade na dinâmica socioambiental
do município de Duque de Caxias. E que o conteúdo desse livro, assim
como seus desdobramentos, seja um ponto de referência na construção dessa realidade.
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Informações gerais
sobre o município de
Duque de Caxias
Brasil;
Estado do Rio de Janeiro;
Região Metropolitana;
22°30'S
4 distritos
40 bairros
468,3 km²
10% da região metropolitana
842.686 habitantes
1.711 hab/km²
543.646 eleitores
67,49 expectativa de vida
0,753 idh
99,6% taxa de urbanização
1,67% taxa de crescimento
8% taxa de analfabetismo
Baixada Fluminense;
22°30'S
Município de Duque de Caxias
Xerém
Imbariê
0
10
20
40 Km
22°40'S
Campos
Elíseos
Petrópolis
Miguel Pereira
Duque de
Caxias
Guapimirim
3 1,5 0
Paracambi
3 Km
Japeri
Abriga
Queimados
REDUC — Petrobras
Duque de
Caxias
Magé
Belford Roxo
Itaboraí
Instituto São Bento — PUC-Rio
Seropédica
Distritos
18
Nova
Iguaçu
Itaguaí
1º – Duque de Caxias
2º – Campos Elísios
3º – Imbariê
4º – Xerém
Jardim 25 de Agosto
Jardim Primavera
Santa Lúcia
Xerém
Parque Duque
Saracuruna
Santa Cruz da Serra
Parque Capivari
Periquitos
Vila São José
Imbariê
Mantiqueira
Vila São Luiz
Parque Fluminense
Parada Angélica
Jardim Olimpo
Gramacho
Campos Elíseos
Jardim Anhangá
Lamarão
Sarapuy
Cangulo
Santa Cruz
Amapá
Centenário
Cidade dos Meninos
Parada Morabi
Centro
Figueira
Taquara
Dr. Laureano
Chácaras Rio-Petrópolis
Parque Paulista
Olavo Bilac
Chácara Arcampo
Parque Equitativa
Bar dos Cavaleiros
Eldorado
Alto da Serra
Jardim Gramacho
São Bento
Santo Antônio da Serra
Mesquita
Nilópolis
S. João
de Meriti
Rio de Janeiro
Tanguá
São Gonçalo
Niterói
23°0'S
Oceano Atlântico
44°0'W
43°0'W
Baixada Fluminense
Região Metropolitana
www.duquedecaxias.rj.gov.br
19
trabalhos
de campo
Barragem Saracuruna p.36
rebio Tinguá p.34
Xerém
Parque Municipal da Taquara p.28
Imbariê
Nos dias 9 e 16 de agosto de 2008, a equipe do Projeto Educação Ambiental: formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania reuniu-se no campus da puc -Rio, na Gávea, para dar início aos
trabalhos de campo, que contaram com a presença de representantes
da Secretaria municipal de Meio Ambiente da prefeitura de Duque de
Caxias e contemplaram os quatro distritos que compõem o município:
Duque de Caxias, o primeiro, Campos Elísios, o segundo, Imbariê, o terceiro, e Xerém, o quarto. O primeiro encontro realizou-se no Pólo Avançado da puc -Rio, o Instituto São Bento, no segundo distrito de Campos
Elíseos, onde ocorreu uma breve reunião para a apresentação dos integrantes do projeto, assim como uma palestra sobre as principais demandas ambientais do município, feita por Wilson Leal, pedagogo da Secretaria e chefe do setor de Educação Ambiental. Foram visitados todos os
quatro distritos que compõem o município nos dois trabalhos de campo.
No mês de novembro, foi realizado um terceiro trabalho de campo com
os professores da rede municipal de ensino, os alunos do projeto. Esse
trabalho contou com a presença de professores do Departamento de
Geografia da puc -Rio e de representantes da Secretaria municipal de
Meio Ambiente. Foram visitados os parques naturais municipais da
Caixa D’Água e da Taquara.
Cidade dos Meninos p.32
Caixa D’Água p.26
Morro do Céu p.24
Campos
Elíseos
Duque de
Caxias
Parque Glicério p.22
20
alto grau de degradação e poluição dos canais que a cortam. Devido à
fiscalização da Marinha, parte da área onde será o parque não sofreu
processo de invasão e de favelização como aconteceu com outras áreas
do entorno, que além da ocupação irregular recebem ilegalmente o despejo de lixo e de entulho de obras. A favela Dois Irmãos, fronteiriça com
o parque, faz parte do complexo da favela Beira-Mar. Segundo os integrantes da secretaria, algumas ocupações irregulares serão removidas
para a construção do parque municipal.
Em seguida, paramos na Rodovia Washington Luis, em frente à
construção de um shopping center que será o maior do município. A
mesma empresa responsável pela construção do shopping tem a intenção de erguer um condomínio de luxo em frente ao empreendimento,
no trecho ao lado do parque gráfico do jornal O Globo. Trata-se de uma
área de manguezal, ou seja, área de proteção permanente, de acordo
com a legislação.
Duque de Caxias
Parque Glicério
Após o encontro com os representantes da Secretaria de Meio Ambiente
no centro do município de Duque de Caxias, seguimos para uma passarela próxima à Linha Vermelha, para visualizarmos a área da Zona
Especial de Interesse Ambiental (zeia ) n°9, denominada Parque Glicério. De acordo com os representantes da Secretaria de Meio Ambiente,
a área do Parque será cedida pela União, pois pertence ao Ministério
da Marinha. A intenção da prefeitura é implementar ali um parque com
atribuição de parque urbano para lazer e prática de esportes, de caráter
municipal regional. A área está completamente descaracterizada, com
22
23
Vista do Morro do Céu, no Bairro São Bento
Campos Elíseos
Morro do Céu
No segundo distrito, o grupo dirigiu-se para a parte mais elevada do
bairro de São Bento, chamada Morro do Céu, onde visualizou a extensão da Área de Proteção Ambiental (apa ) São Bento. No alto do Morro
do Céu foi possível observar não só os limites da apa São Bento, como a
parte que apresenta ocupação irregular, deflagrando problemas de ordem
fundiária. Também foram observadas áreas de extração irregular de saibro. Essa extração provocou a diminuição de alguns morros, alterou o
regime de ventos e o microclima da região. A área mostrada é uma planície alagada, uma característica natural de toda região do município que
se encontra no entorno da Baía de Guanabara. O afloramento do lençol
freático vindo dos maciços circundantes e a própria cota altimétrica que,
em alguns lugares, está abaixo do nível do mar, faz com que o alagamento
de áreas de planície seja um processo natural.
24
25
Vista da Caixa D’Água
Campos Elíseos
Caixa D’Água
O outro ponto visitado no segundo distrito foi a zeia 06 da Caixa
D’Água, que recebeu esse nome pelo fato de haver uma caixa d’água
abandonada no topo de um de seus morros. Segundo informações da
própria Secretaria de Meio Ambiente, já estaria em andamento o processo de homologação para transformar a zeia numa Área de Proteção
Ambiental. A Secretaria tem planos de aproveitar a própria estrutura
da caixa d’água para construir um mirante com salas para palestras e
debates. A obra abandonada é cercada por vegetação bastante descaracterizada, apresentando alto nível de degradação, com alguns resquícios de reflorestamento feito anteriormente pela própria Secretaria. Foi
possível observar que a área em torno da futura apa , na base dos morros, é ocupada por casas da classe média do município. A equipe recebeu explicações sobre o motivo da região não ser aconselhável para a
ocupação urbana: no verão, a área é frequentemente alagada devido à
dinâmica de afloramento de lençol freático vindo dos maciços circundantes. Na ocasião dessa visita a equipe tomou conhecimento da intenção
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da secretaria de acelerar o processo de homologação da apa da Caixa
D’Água, para revitalizar a área e iniciar logo os projetos que visem recuperar o ecossistema local.
Três meses mais tarde, realizamos com os alunos do projeto uma
segunda visita, no dia 29 de novembro, ao recém emancipado Parque
Natural Municipal da Caixa D’Água. A apa havia sido homologada na
semana anterior à visitação. O representante da Secretaria de Meio
Ambiente expôs os principais desafios para a área, destacando a necessidade de reflorestamento com espécies nativas e de fiscalização. Nessa
visita com a equipe e os professores, observamos que é fundamental a
presença do poder público na gestão dessas áreas. A prefeitura havia
demolido no local uma construção irregular do que seria uma rádio
pirata. Vimos que, em apenas três meses de intervalo entre a primeira
visita e essa, a ausência da intervenção de órgãos gestores da prefeitura facilitou a construção irregular. Mas, de acordo com os representantes da Secretaria de Meio Ambiente, com a homologação do Parque
Natural Municipal da Caixa D’Água haverá fiscalização constante para
evitar irregularidades futuras no local.
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Imbariê
Parque Municipal da Taquara
No terceiro distrito, Imbariê, seguimos para a zeia n°1, a Unidade de
Conservação de Proteção Integral Parque Natural Municipal da Taquara.
A área total do Parque é de aproximadamente 20,8 hectares. Localizado
no corredor ecológico que fica no meio da Serra dos Órgãos, da apa
Petrópolis e da Reserva do Tinguá, o Parque Municipal da Taquara apresenta uma variação de vegetação que abrange áreas de pasto, vegetação
secundária e Floresta Ombrófila, sendo que esta ocupa a maior parte do
parque, que chega a receber quatro mil pessoas nos dias de tempo bom,
segundo os integrantes da Secretaria de Meio Ambiente. São moradores
do município, da Baixada Fluminense e de cidades vizinhas, que visitam o local para admirar suas quedas d’água, sua rica fauna e a flora
de espécies da Mata Atlântica. Dentro da área do parque, na sua parte
baixa próxima à entrada, há cantinas que servem refeições nos finais
de semana, além de um espaço com churrasqueiras. Algumas famílias
moram dentro do parque, onde criam animais domésticos e fizeram um
lago artificial. O parque possui um rio principal, o Rio Taquara, que
corta parte do terreno.
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29
O Parque da Taquara será ampliado com a incorporação de uma área
anexa que foi cedida pela fábrica de tecidos Nova América. A área possui um reservatório de água desativado, que servia à fábrica, e que em
dias de verão chega a receber uma média de cinco mil pessoas. Ele
será reativado pela cedae para captação, tratamento, e distribuição.
Esse fato gera uma preocupação ao poder público, pois, se o reservatório for reativado, seu uso será vetado à população local, o que pode
causar conflito com os moradores que já incorporaram a represa como
área de lazer.
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Realizamos uma segunda visita ao parque, no dia 29 de novembro, com
a presença dos alunos do projeto. Visitamos os pontos mais importantes do parque e ouvimos explicações do representante da Secretaria
sobre os principais problemas enfrentados pela administração. Um dos
exemplos foi a fiação elétrica que passa dentro do parque, que eventualmente provoca a morte de uma espécie de mico. A fiação serve para
levar energia elétrica para algumas casas em torno da área do parque.
Discutimos, então, o fato de os órgãos públicos ambientais terem que
pressionar a empresa responsável para que torne subterrânea a fiação,
dando continuidade ao abastecimento de energia sem causar impacto
aos animais do parque.
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Xerém
Cidade dos Meninos
A Cidade dos Meninos (Zona Especial de Interesse Ambiental, zeia 14)
é assim chamada pois ali existia, desde a década de 1940, um complexo
de internatos voltado para menores carentes. Em 1947, a área passou a
albergar o Instituto de Malariologia, que produzia para exportação pesticidas organoclorados, utilizados no controle de endemias transmitidas
por vetores de malária, febre amarela e doença de Chagas. Com a desativação da fábrica na década de 1960, aproximadamente 400 toneladas
de pesticidas foram abandonadas, o que acabou causando a contaminação dos arredores. Os resíduos desse foco principal de contaminação
foram disseminados por via aérea, águas pluviais e, principalmente, por
meio do carregamento mecânico para utilização em aterros e aplicação
como agrotóxicos, segundo relatos de moradores. Esses são os focos
secundários de contaminação e estão distribuídos aleatoriamente pela
região, sendo também objeto de estudos já realizados.
32
O problema da contaminação ambiental e o seu potencial risco à
saúde humana ganhou evidência a partir de 1989, quando a imprensa
noticiou a venda dos pesticidas em feiras livres de Duque de Caxias.
Devido à contaminação, a área não pode ser utilizada para produção de nenhum alimento, seja ele de origem animal ou vegetal. Apesar
disso, é possível observar pequenas hortas de subsistência e animais
de criação como gado, galinhas, porcos e cavalos. Existe interesse da
prefeitura de utilizar parte da área para a construção de uma usina de
reciclagem de lixo, uma vez que o Aterro Sanitário de Gramacho encontra-se em processo de encerramento de suas atividades. Vale ressaltar
que a Cidade dos Meninos continua sendo um dos maiores passivos
ambientais do município.
Em seguida, no entorno da Cidade dos Meninos, paramos no ponto
de abastecimento de água para os carros-pipa que estão a serviço do
município. Os integrantes da Secretaria Municipal ressaltaram a qualidade da água e a necessidade de regulamentar a captação, tendo em
vista o abastecimento ilegal de caminhões-pipa.
33
Xerém
rebio Tinguá
A zeia n°15 – Unidade de Conservação de Proteção Integral – Reserva
Biológica de Tinguá está situada na Serra do Mar, no Estado do Rio de
Janeiro, nos fundos da Baixada Fluminense. Abrange os municípios de
Nova Iguaçú, Caxias, Petrópolis, Miguel Pereira e Vassouras. É considerada Patrimônio da Biosfera pela Unesco desde 1992.
Junto com a equipe da Secretaria de Meio Ambiente, utilizamos
um dos acessos para a rebio , localizado no 4°distrito. Após passarmos
por um caminho já dentro da reserva, chegamos a uma área às margens do Rio Registro, um dos rios que cortam aquela parte da reserva. A
área é aberta e pudemos observar a presença de churrasquerias improvisadas, constatando que a área é utilizada para churrascos e outras
atividades pelos moradores do entorno e demais visitantes. Segundo
informações da Secretaria, nos meses de verão a reserva chega a receber cerca de três a quatro mil pessoas nos fins de semana. Infelizmente,
percebemos que, tanto no caminho de acesso como na área à margem
do Rio Registro, havia uma quantidade considerável de lixo deixada
pelos visitantes. Sobre o rio há uma tubulação de água e uma ponte de
ferro, que está em péssimo estado de conservação e não oferece segurança. A ponte dá continuidade ao caminho anterior, cortando a Mata
34
Represa de Calombé no Rio Registro
Atlântica nativa – que, infelizmente, também apresenta um pouco de
lixo (garrafas Pet, pacotes de biscoito, copos plásticos etc.) – e levando
até a Represa do Calombé, no Rio Registro, atualmente fora de operação. A represa servia para abastecimento da reduc , mas, devido a
problemas na qualidade da água, foi desativada. Os representantes da
Secretaria de Meio Ambiente ressaltaram o interesse de reativar o sistema de captação de água, junto à reduc , para abastecimento de diferentes áreas do município.
O local de represamento forma um lago e possui uma beleza cênica
que impressionou a todos da equipe. Segundo informações dos representantes da Secretaria de Meio Ambiente o lago da represa é muito requisitado para banho pelos visitantes, principalmente no verão. Concordamos que essa questão da entrada de pessoas na reserva, para banho
e outras atividades, deve ser levada em consideração na formulação do
seu Plano de Manejo, já que, de acordo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o snuc (lei 9.985/2000), a rebio Tinguá está
inserida na categoria de Unidades de Conservação de Proteção Integral.
Nessa categoria, é proibida a visitação pública, exceto aquela com objetivo educacional, de acordo com regulamento específico.
35
Xerém
Barragem Saracuruna
A Barragem Saracuruna também fica dentro da zeia nº 15, a Reserva
Biológica (rebio ) de Tinguá. A represa de Saracuruna foi construída
entre 1960 e 1962, com o objetivo de substituir a já existente barragem
de Registro no fornecimento de água bruta para a reduc . A represa
de Saracuruna conta com uma área de 43 km² e está dividida em duas
partes. A parte superior da bacia é compartilhada com a cedae , que
tem prioridade para as captações do sistema Acari. A porção inferior
da bacia fica à jusante do ponto de captação da cedae . Devido à sua
localização dentro da Reserva Biológica de Tinguá, tem seus mananciais
preservados da ocupação e exploração irregular, o que garante às suas
águas uma boa qualidade.
A barragem foi feita pela reduc e está desativada há alguns
anos. O caminho não é de fácil acesso, pois passa por algumas áreas
alagadas. Em seu entorno, a represa conta com espécies nativas e exuberante vegetação de Mata Atlântica, assim como com áreas de clareira com vegetação rasteira. Todos concordaram que a represa foi o
lugar mais impressionante visitado pela equipe no município de Duque
36
de Caxias. Apesar de possuir um enorme potencial de uso como área
de lazer, de contemplação, de conservação e de educação ambiental, a
represa é considerada pela equipe da Secretaria de Meio Ambiente como
o maior passivo ambiental do município atualmente.
Logo após, seguimos para a entrada da represa Mantiqueira, administrada pela cedae , e que, junto com a represa Boa Esperança, abastece o Sistema Acari, no município vizinho de Belford Roxo.
37
A educação ambiental deve gerar conhecimentos que sirvam à toda sociedade.
Gerando mudanças na qualidade de vida
e maior consciência na conduta pessoal,
comunitária e populacional.
Roosevelt Fideles de Souza
AULAS
A situação atual é curiosa porque não existem mais problemas de técnica na questão
ambiental, mas sim dificuldades comportamentais – vivemos uma crise ética.
Eu entendo a cidade como um ecossistema. E eu não consigo pensá-la isolada de
nenhum outro ambiente, qualquer que seja a
distância entre eles.
Luiz Felipe Guanaes Rego
Rita de Cássia Martins Montezuma
27 de setembro
11 de outubro
Eu pretendo fazer um trabalho dialógico, ou
seja, trocar experiências e tentar caracterizar
a Geografia como ciência que trabalha com
as demandas dos diferentes territórios do
espaço geográfico.
A relação do homem com a natureza é tão
intrínseca que muitas das vezes não percebemos que somos natureza tanto orgânica
como socialmente, a segunda natureza, se é
que podemos separar essas dimensões.
Augusto César Pinheiro da Silva
Regina Célia de Mattos
A visão da realidade local tem que estar
acima de todas as coisas para que você
possa pautar o técnico. Se você chegar só
com a visão acadêmica, você se quebra. É
preciso associar as duas visões.
Wilson A. Leal Boiça
38
39
O que é a cidade? Vocês já pararam para
pensar que nós usamos as palavras ‘cidade’
e ‘urbano’ como sinônimos? Será que elas
não diferem em nada?
O objetivo maior do Direito Ambiental é proteger e preservar o meio ambiente.
Alvaro Ferreira
Virgínia Totti Guimarães
18 de outubro
Os espaços “vazios” são cheios de valores e
significados para a vida do município.
Rogério Ribeiro de Oliveira
25 de outubro
Do ponto de vista da sustentabilidade, o
encerramento do Aterro de Gramacho é bom
para todo mundo. É bom para o bairro, é
bom para os catadores, é bom para o trabalho de organização que a gente faz.
Valeria Bastos
40
41
MAPAS
O espaço geográfico é o espaço construído ou transformado pelo homem,
sendo composto por elementos naturais e elementos antrópicos que
interagem entre si. Esse espaço é uno e indivisível, formado por objetos
e sistemas convergentes e/ou divergentes, concretos ou não. Para entendê-lo, apesar de seus elementos serem indissociáveis, existem métodos
que permitem que o dividamos em temas. Esses temas que compõem
o espaço geográfico podem ser representados graficamente através dos
mapas.
A interação entre os mapas que representam os elementos (temas)
que compõem um determinado espaço permite a melhor compreensão do mesmo, suas especificidades, similaridades e interações com o
entorno e o mundo.
Vivemos, hoje, a era da imagem, da tv , da internet, da telefonia
celular e das informações instantâneas. Há uma supervalorização da
linguagem gráfica, da qual a cartografia e os mapas fazem parte, sendo,
portanto, de suma importância o seu uso como facilitador para o entendimento dos mais diversos espaços e suas relações.
O mapa é uma representação do espaço geográfico em um plano
que se vale de códigos (imagens e símbolos) para indicar as feições presentes. Para usá-lo (lê-lo) é necessário a compreensão de alguns conceitos que são trabalhados na escola. Esse conjunto de conceitos é
chamado de “elementos do mapa” e seu aprendizado é denominado “alfabetização cartográfica”. Isso mesmo, na escola não aprendemos somente
a ler e a escrever, mas devemos também aprender a ler mapas!
Os elementos básicos que compõe um mapa são: o título, a simbologia (representação gráfica), o sistema de coordenadas e de projeção,
a legenda, a orientação, a fonte e a data da informação representada,
a escala e o autor.
Elementos dos mapas
Título — Define a área geográfica e o tema representado.
Escala — Demonstra a relação entre o tamanho do espaço contido no
mapa e as distâncias reais correspondentes no terreno.
2,5
Simbologia (representação gráfica) — Permite a codificação da realidade através de cores e símbolos gráficos expressos nos mapas.
Sistema de coordenadas e de projeção — Através das coordenadas é
possível localizar a área representada no mapa no Planeta Terra.
Existem vários sistemas de coordenadas que permitem a localização precisa de um ponto qualquer na superfície terrestre.
Dentre eles o mais usual é o denominado Coordenadas Geográficas (latitude e longitude).
A elaboração de uma mapa consiste em um método segundo o
qual se faz corresponder a cada ponto na superfície da Terra, em
coordenadas geográficas, um ponto no mapa, em coordenadas
planas. Para se obter essa correspondência utilizam-se os sistemas de projeções cartográficas.
Legenda — Identifica as convenções utilizadas para representar os
elementos contidos no mapa, permitindo a leitura das geometrias contidas no mapa.
Orientação — Através da rosa-dos-ventos é feita a orientação dos
mapas, indicando o Norte. Nela, a orientação Norte-Sul é considerada sobre qualquer paralelo e a orientação Leste-Oeste, sobre
qualquer meridiano.
Fonte — Indica quem gerou a informação representada ou, em alguns
casos, quem fez o mapa.
Data da informação representada — Indica quando o mapa foi feito ou
quando a informação representada foi adquirida.
Autor — Indica quem foi responsável pela elaboração do mapa.
42
0
43
22°30'S
5 km
Novas tecnologias, mapas interativos: Google Earth
A criação e a apropriação de tecnologias pelo homem, por mais complexas que sejam, está ligada à ideia de criar um meio facilitador do cotidiano das sociedades e de suas atividades. Os grandes avanços tecnológicos que a humanidade vem experimentando desde o século xx têm
proporcionado, também, a evolução acelerada de tecnologias específicas
ligadas à manipulação de dados espaciais ou dados geográficos, como
os sistemas de informação geográfica, o sensoriamento remoto e o processamento digital de imagens.
No âmbito destas geotecnologias, podemos destacar especialmente
a evolução dos sensores remotos, que saltaram de uma resolução espacial de 80 metros na década de 1970 do século passado para 0,5 metros
disponíveis comercialmente hoje. Isso significa que, através de uma imagem de satélite, identificávamos somente feições superiores a 80 metros
e que hoje é possível identificar alvos de apenas ½ metro. Realizando
um exercício meramente especulativo, levando em consideração as imagens disponíveis comercialmente e suas altíssimas resoluções, podemos
imaginar o que já existe à disposição para fins militares, de inteligência
e de espionagem em países que desenvolvem esses sensores, que fatalmente, no futuro, estarão disponíveis a todos.
No entanto, o acesso a esse tipo de informação geográfica estava
restrito a empresas, universidades, instituições públicas e militares, já
que para sua manipulação era necessário o uso de softwares caros e/ou
um alto nível de conhecimento especializado. Visando preencher essa
lacuna e democratizar de fato a informação geográfica, foi desenvolvido
um programa chamado Google Earth, que utiliza a internet, maior fonte
e repositório de informações existente na atualidade, como meio.
O Google Earth permite à navegação, através de imagens de satélite de todo o globo terestre, localizar automaticamente lugares, girar
imagens, mudar o ângulo de visão (visão tridimensional), criar marcadores espaciais e medir distâncias, entre outras funções. Sua base de
dados já possui planos de informação, como vias, sedes municipais,
sedes distritais entre outros. Ainda permite que o usuário crie suas feições e as organize também em planos de informação. Os planos de informação criados são organizados em arquivos ‘.kml’ ou ‘.kmz’, ambos formatos do Google Earth, podendo ser disponibilizados a qualquer outro
usuário.
O projeto Formação de Valores Ético-Ambientais para o Exercício da Cidadania no Município de Duque de Caxias disponibiliza, através do seu website, alguns planos de informação, já customizados, de
temas sobre o município.
44
Descrição dos mapas
Para a construção de uma política de gestão ambiental – entendida como
o controle dos organismos públicos e/ou privados e da sociedade civil
sobre o uso dos recursos socioambientais, utilizando para tanto uma
lógica determinada, que inclui instrumentos reguladores e de incentivo –
é necessário, antes, um claro entendimento dos processos de criação e de
reprodução da ordem territorial em questão e das condicionantes socioambientais da região estudada.
Nesse contexto, o desenvolvimento sustentável é um conceito-chave
porque abre o questionamento sobre a utilização/reprodução racional dos
recursos socioambientais respeitando, assim, não só as especificidades
naturais de um determinado território, mas também as variáveis sociais,
econômicas e culturais. Esse fato torna imprescindível um conhecimento
especializado de uma determinada ciência e uma visão holística espacializada das diversas forças atuantes nesse espaço, naturais e/ou antrópicas, sendo necessário entender essa “costura” para futuramente, então,
propor alternativas sustentáveis.
Com o passar dos anos, os avanços tecnológicos vão encurtando
os espaços e derrubando fronteiras. Essa situação tende a agravar-se,
fazendo urgir, emergencialmente, a construção de um modelo de gestão
ambiental para Duque de Caxias. Para a construção desse modelo se faz
necessário, previamente, o conhecimento da realidade local, possível através da caracterização das condicionantes socioambientais, cumprindo,
assim, os objetivos pretendidos pelo projeto.
A representação espacial das informações é fundamental para a
análise integrada, por proporcionar um quadro ambiental de referência
para a área de estudo, facilitando a determinação de áreas críticas do
ponto de vista de degradação socioambiental. Outra vantagem proporcionada é a possibilidade de ser observada a evolução temporal de determinados processos, principalmente aqueles relacionados à ocupação ao
uso do solo, bem como à perda de cobertura vegetal, levando à indicação
daqueles que se configuram como mais críticos.
A integração entre a informação e a educação é vital para o sucesso
de uma ação na área ambiental, pois é na sala de aula que estão sendo
cunhados novos cidadãos que, assim, serão capazes, em um futuro próximo, de exercer de forma crítica a sua cidadania. Cidadãos conhecedores
da realidade do seu município (pensar global, agindo local) são capazes
de transformá-la para melhor, contribuindo, de fato, para uma melhoria
na qualidade de vida em geral.
45
5
2,5
0
5 Km
5
Geomorfologia
2,5
0
5 Km
Geologia
22°30'S
22°40'S
22°40'S
Depressão Fluvio-Lacustre
Planície Alúvio-Colúvio
(Argilosos, Arenosos ou Indiferenciados)
Escarpas Serranas
Talus / Colúvio
Falha e/ou Fratura
Falha e/ou Fratura Encoberta
Falha e/ou Fratura Inferida
Falha Verticalizada
Zona de Brecha Preenchida
de Mat. Silici
Colinas
Fontes: CIDE 2002 ; IBGE 2000 ; PDBG 2000
Fontes: Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara – PDRH-BG (2005)
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
22°30'S
Sedimentos Fluviais / Aluviais
Maciços Costeiros Interiores
Sedimentos Paludiais
Maciços Intrusivos Alcalinos
Formação Caceribu
Planície Fluvio-Marinha
Formação Macacu
Tabuleiros
Intrusivas Ácidas Homogênea
e Deformadas
Alcalinas de Canaã
Unidade Serra dos Órgãos
46
43°20'W
Complexo Rio Negro
43°20'W
47
Uso do Solo e
Cobertura Vegetal
2,5
0
5 Km
5
2,5
0
5 Km
Hidrografia
22°30'S
22°30'S
o
Bo
a
Barragem
Saracuruna
(Petrobrás)
Es
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
Ri
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
5
Rio
Jo
ão
ça
Pin
ran
to
pe
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Cons
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iva
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M
at
22°40'S
22°40'S
Rio
Campo / Pastagem
Pila
Afloramento Rochoso
r
Rio
Vegetação Secundária
Cursos d’Água
Floresta Ombrófila
Lagos, Lagoas e
Barragens
Mangue
Iguaç
u
Canal
puí
Canal Sara
Mangue Degradado
Várzea
Fonte: CIDE 2002
Iguaçu
Área Agrícola
Solo Exposto
Rios, Lagos, Lagoas etc
Área Inundável
Área Urbana de Baixa Densidade
Rio São João d
eM
Área Urbana de Média Densidade
er
Rio Estrel
a
Fontes: FUNDREM (1975/1976)
Encosta Degradada
iti
Grandes Construções
48
43°20'W
43°20'W
49
5
2,5
0
5 Km
Zonas Especiais
5
2,5
0
5 Km
Área Urbana
22°30'S
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
Produzido por Fundação Dom Cintra 2006
REBIO Tinguá
Estrada Real
Mantiquira – Tinguá
ZIA de Xerém
ZIA da Taquara
ZIA do Rio Capivari
APA de Petrópolis
V
Interesse de Negócios
I
ZIA do Rio Saracuruna
VII
23
Estrela
24
II Figueira
III Campos Elísios
Estrada Real
Automóvel Clube
22
IV Jardim Gramacho
25
V Xerém
ZIA do Rio Roncador
VII Centro Atacadista
ZIA do Rio Pilar
21
Interesse Social
27
1 Vila Nova (Lixão)
2 Vila Ideal
3 Dique da Prainha (parte)
22°40'S
II
20
19
ZIA da Caixa D’Água
ZIA Cidade dos Meninos
4 São Sebastião (parte)
ZIA do Cangulo
5 Parque Brasil Novo
6 Vila Operária (parte)
7 Copacabana
8 Fronteira
Rodovia Federal
Estrada Real
São Bento – Pilar
9 Vila São Sebastião (parte)
III
11 São Borja (parte)
26
12 Cadeúba (parte)
VII
17
16
13 Pistóia
15 Cidade de Deus
Distritos
Área Urbana
IV
13
9
4
APP do Mangue
12
11
7
17 Marquesa de Santos
APA de São Bento
10
ZIA do Rio Sarapuí
16 Vila Fraternidade (parte)
15
14
8
18 Morro da Costela
Interesse Turístico
19 Aliado (parte)
6
20 Cachopa
21 Vai Quem Quer (parte)
3
22 Rua Ceará
23 Vila Aracy
Rodovia Estadual
18
10 Teixeira Mendes (parte)
14 Anajás
I
Fontes: CIDE 2002 ; IBGE 2000 ; PDBG 2002
Fonte: Secretaria Municipal de Urbanismo da Prefeitura de Duque de Caxias
VI Meriti
2
1 5
Interesse Rural
VI
Interesse Ambiental
ZIA do Parque Glicério
24 Vila Cabral (parte)
25 Santa Lucia (parte)
50
26 Jardim da Paz (parte)
27 Vasquinho
43°20'W
43°20'W
51
5
2,5
0
5 Km
Unidades de
Conservação
5
2,5
0
5 Km
Rodovias
22°30'S
APA Petrópolis
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
Reserva Biológica do Tinguá
BR-040
RJ-115
APA Tinguá
RJ-107
Parque da Taquara
RJ-085
BR-040
BR-116
22°40'S
APA Estrela
Proteção Integral
RJ-105
Uso sustentável
APA São Bento
BR-040
Rodovias
Federais
RJ-101
Estaduais
RJ-085
Municipais
RJ-116
Fontes: CIDE 2002 ; IBGE 2000
Fontes: CIDE 2002 ; IBGE 2000 ; PDBG 2002 ; PMDC 2006
Parque da Caixa D’Água
RJ-071
RJ-071
52
43°20'W
43°20'W
53
54
Fossa ou Sumidouro
Outra Formas
Sem instalação Sanitária
7.190 – 10.000
10.001 – 30.000
30.001 – 100.000
Outra Formas
Sem instalação Sanitária
10.001 – 30.000
30.001 – 100.000
1.000.001 – 1.801.863
250.001 – 1.000.000
100.001 – 250.000
Fossa ou Sumidouro
7.190 – 10.000
Fontes: IBGE 2000
Rede Geral
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
7.189
Região Metropolitana do Rio de Janeiro, segundo
número de domicílios e abastecimento de água
1.000.001 – 1.801.863
250.001 – 1.000.000
100.001 – 250.000
Rede Geral
7.189
Região Metropolitana do Rio de Janeiro, segundo
número de domicílios e esgotamento sanitário
Fontes: IBGE 2000
Produzido por LabGis PUC-Rio 2009
55
Alvaro Ferreira
artigos
Algumas reflexões para ajudar a
entender a produção desigual do
espaço urbano em Duque de Caxias
Partiremos de uma questão: o que é a cidade? Esta pergunta é muito
importante pois, em geral, todos sabem o que é, contudo, ao tentar responder, nos vemos enrascados. Para uma grande parte de autores, a
cidade se caracteriza pela concentração de uma certa quantidade de
população, uma certa densidade física, a presença de atividades não
diretamente ligadas à produção do campo e um modo de vida distinto
do que prevalece em áreas que se qualificam como rurais.
Essa resposta obriga-nos a formular outra pergunta: isso é suficiente para definir uma cidade? As cidades de hoje são mais complexas,
superando o marco de suas dimensões demográficas, morfológicas ou
econômicas – a elas múltiplas dimensões são incorporadas.
A diferenciação entre o urbano e o rural se torna cada vez mais
borrada. Mas aqui, já trouxemos outro elemento para o debate: o
urbano. Normalmente, cidade e urbano são entendidos como sinônimos, o que é um equívoco. O urbano transcende a cidade e ganha o planeta, já que, atualmente, alcança todos os lugares, pois incorpora valores, desejos de consumo, formas de trabalho e o tempo da metrópole.
Assim, mesmo áreas ditas rurais apresentam elementos e indícios que
nos remetem ao urbano. São modos de vestir e de falar, formas de consumo, incorporação de tecnologias, formas de trabalho e de atividades
típicas das cidades que adentram o rural. Por isso Rua (2006) acredita
tratarem-se de urbanidades no rural.
A cidade está ligada à morfologia e à organização espacial, ao
passo que o urbano realiza-se como práxis na cidade, através das atividades políticas, econômicas e culturais, reunindo assim todos os elementos da vida social (lefebvre , 2008).
As cidades são a materialização de momentos históricos que incorporam todas as contradições, todas as tensões da sociedade. Por isso,
é possível pensarmos nas diversas formas de cidade através do tempo
(e todas eram igualmente chamadas de cidades) como uma contradição
54
expressa pelas relações sociais.
O município de Duque de Caxias apresenta, também, enormes
contradições: áreas ricas e áreas sem condições mínimas de sobrevivência, bairros bem servidos pelo sistema de transporte e outros em
que o serviço é precaríssimo, distritos atendidos por escolas e hospitais
públicos e distritos carentes desses serviços, áreas com alta densidade
populacional e áreas com baixa densidade populacional, entre outras
incoerências. Este breve artigo não almeja dar conta especificamente
de todas essas contradições, mas objetiva trazer elementos para uma
reflexão acerca da produção desigual do espaço urbano de Duque de
Caxias e contribuir apontando para a necessidade da mobilização social
em busca de melhores condições de vida e do direito à cidade.
A ênfase no processo geral de urbanização dificulta a percepção
das diferenciações internas entre os lugares e, muitas vezes, o asfaltamento e a criação de ‘praças’ parece ser suficiente aos olhos dos órgãos
de governo.
Por outro lado, há simultaneamente uma impressão de características da metrópole carioca em determinados bairros caxienses, como por
exemplo a construção de condomínios fechados. O que acaba fazendo
com que não somente as práticas sociais, mas inclusive as identidades dos lugares fiquem sujeitas à valores e necessidades que se referem à capital do Estado. É necessário ter em conta as necessidades dos
moradores.
Há um grande deficit habitacional em Duque de Caxias e os programas de habitação popular têm se mostrado insuficientes. Recentemente, em meados de 2008, a Secretaria Municipal de Urbanismo divulgou que a Prefeitura começara a entregar as escrituras definitivas dos
imóveis do Conjunto Residencial Santa Alice, Nossa Senhora das Graças e Salgado Filho, em Xerém. Em princípio, seriam beneficiadas 700
famílias que ocupam casas e apartamentos funcionais da antiga Fábrica
Nacional de Motores (fnm ), construídas na década de 1950. Embora a
Secretária divulgue essa notícia como política para redução do deficit
habitacional, essas famílias já moravam no local.
Houve também, seguindo os moldes de outros municípios, a abertura de inscrições para o financiamento da casa própria, em parceria
com a Caixa Econômica Federal, para funcionários municipais com
renda superior a R$ 1.350. Os imóveis, localizados no condomínio ViaParque, em Santa Cruz da Serra (Terceiro Distrito), referem-se a 99
casas de 48 m². Medida que atende a uma população específica e em
condições específicas.
Em janeiro de 2008, a Secretaria Municipal de Urbanismo promoveu e divulgou, no site da Prefeitura a assinatura de escritura da casa
própria de 1.067 casas populares, referentes a um projeto denominado
Pedacinho do Céu. Esse projeto beneficiaria moradores de áreas consideradas de risco, como Jardim Gramacho, Sarapuí – Favela do Dique –
55
alvaro ferreira
e Parque Beira-Mar. Os conjuntos habitacionais seriam construídos em
Jardim Gramacho, Parque Paulista, Parque Beira-Mar, Jardim Anhangá
e Parque Marilândia. Eram imóveis com 42 m² e estariam todos prontos em 14 meses. Portanto, em março de 2009 deveriam estar prontos.
Como andam as obras? É preciso que se cobre mais que o discurso
apenas.
O Produto Interno Bruto (pib ) do município de Duque de Caxias
está entre os maiores das cidades brasileiras, alcançando até pouco
tempo atrás (2003) o nono lugar do ranking nacional. Apenas para que
tenhamos uma idéia do que isso significa, as dez primeiras cidades do
ranking representam 25% do pib nacional. Ainda assim, são inúmeros
os problemas que assolam o município e, para complicar ainda mais,
há grande discrepância no que se refere ao percentual de investimentos aplicados em cada distrito. Portanto, cada vez mais se acirram as
condições desiguais no município. Tem sido cada vez maior o número
de lançamentos de condomínios de luxo no Bairro 25 de Agosto, como
podemos observar no anúncio veiculado em panfletos e na Internet:
de algo, o que é bastante diferente de tê-lo como propriedade. Significa
fazer do espaço sua obra, modelá-lo, apropriar-se dele. Mas é também
o lugar dos conflitos, porque o espaço é um produto social, mas é também produtor, já que as formas construídas interferem no cotidiano da
sociedade. A produção do espaço traz consigo uma intencionalidade,
por isso é o lugar dos conflitos. É preciso questionar a forma como ele é
produzido e buscar fazê-lo de outra maneira, com outros objetivos que
não priorizem a especulação e a dominação do espaço. Em outras palavras: para mudar a vida é preciso mudar o espaço, é preciso questionar a propriedade privada do solo, é preciso valorizar o espaço público,
lutar por ele e contra o movimento dos condomínios fechados, das ruas
fechadas. Porque, como afirma Lefebvre (2008) “excluir do urbano grupos, classes, indivíduos implica também excluí-los da civilização, até
mesmo da sociedade”.
Importa romper com a força que a tecnocracia tem ao empreender seus projetos e propostas, pois o conhecimento técnico desprendido
da abertura para ouvir os citadinos de nada vale. O Estado tem sempre prescindido da participação dos interessados. É necessário fazer-se
ouvir, mostrar aos políticos e aos tecnocratas aquilo que verdadeiramente interessa à população.
Mas cuidado! O direito à cidade não se refere a uma espécie de
direito contratual, que se realiza apenas pelo Estado. Participação não
significa reunir algumas dezenas ou centenas de pessoas e apresentar-lhes um projeto de intervenções urbanas ou apresentar-lhes o que
será realizado. Isso definitivamente não é participação; é praticamente
apenas uma forma de publicidade em duplo sentido: o primeiro pretende apresentar as propostas do governo e o segundo, fazer crer que o
governo implementa a participação popular.
A verdadeira participação deve partir da população e deve ser ativa
e constante; não deve esmorecer após a conquista dos primeiros resultados, ao contrário, essa conquista deve significar que é possível transformar. Esse é o momento de reavaliar os resultados e lutar por novas
conquistas. Feito assim, estaremos deixando de ser apenas citadinos
para sermos verdadeiros cidadãos.
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cerâmica nos quartos. Biometria digital.
O projeto do prédio poderia estar vinculado à qualquer lançamento na
Zona Sul ou Zona Oeste litorânea do município do Rio de Janeiro; inclusive com um projeto que traz, em sua área de lazer, uma sala de boliche privativa e um spa .
Se não faltam lançamentos desse tipo no bairro principal de Duque
de Caxias, o mesmo não se pode dizer do restante da cidade, que sofre
com a falta de saneamento e de equipamentos urbanos básicos. É necessário que se cobre o acesso da população aos distintos equipamentos urbanos, ao lazer, à reunião e à informação pelos diferentes atores
sociais, pois a reprodução desigual das relações sociais se acirra através da dominação, por poucos, do espaço urbano. A população que vive
no município com um pib em torno de R$ 20 bilhões, precisa ter direito
à cidade.
E o direito à cidade é mais do que um habitat, é o direito a habitar.
O habitat liga-se à morfologia urbana, mas o habitar é uma atividade.
Referimo-nos à apropriação (lefebvre , 1978). Habitar é apropriar-se
56
... a produção desigual do espaço urbano ...
57
alvaro ferreira
Bibliografia
Augusto César Pinheiro da Silva
Rosana Cristine Machado de Oliveira
lefebvre , Henri. Espaço e política. Belo Horizonte: ufmg , 2008.
lefebvre , Henri. De lo rural a lo urbano. Barcelona: Península, 1978.
rua , João. Urbanidades no Rural: o devir de novas territorialidades. In: Campo-
Território. Revista de Geografia Agrária v. 1, n. 1, 2006
http://www.duquedecaxias.rj.gov.br
Alvaro Ferreira
Duque de Caxias, município
da região Baixada Fluminense:
poder local, gestão do território
e política pública no Estado
do Rio de Janeiro.
Possui graduação em geografia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(1996), mestrado em Planejamento Urbano e Regional pelo ippur da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (1999) e doutorado em Geografia (Geografia Humana)
pela Universidade de São Paulo (2003). Atualmente realiza pós-doutoramento com
o Prof. Horacio Capel na Universitat de Barcelona. É professor do Departamento de
Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (puc -Rio) e professor adjunto da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (uerj ). Participa como líder no grupo de pesquisa denominado
Núcleo de Estudos e Pesquisa em Espaço e Metropolização (nepem ) e no Núcleo
Interdisciplinar de Estudos do Espaço da Baixada Fluminense (niesbf ); e como
pesquisador do Núcleo de Estudos de Geografia Fluminense (negef ). Tem participado de congressos no Brasil e no exterior, além de produzir artigos em períodicos
nacionais e internacionais principalmente ligados aos seguintes temas: (re)produção do espaço urbano; tecnologias de comunicação e informação e as novas espacialidades nas cidades; representações no espaço urbano; relações de trabalho e o
espaço urbano; espaço e movimentos sociais.
[email protected]
58
... a produção desigual do espaço urbano ...
Apresentação
O projeto Educação Ambiental: Formação de valores ético-ambientais
para o exercício da cidadania no município de Duque da Caxias, desenvolvido pelo Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente (nima ) da puc Rio e financiado pela empresa Petróleo do Brasil s . a . (Petrobras), vem
apoiar as pesquisas socioespaciais sobre o Rio de Janeiro, em suas
múltiplas dimensões, desenvolvidas pelos grupos acadêmicos do Departamento de Geografia da instituição há vários anos. Dos grupos existentes, o g eterj (Gestão Territorial no Estado do Rio de Janeiro) implementa, desde 2002, duas linhas de investigação: a primeira, denominada
Espaço Carioca e suas Desigualdades e a segunda, Território Fluminense
e suas Sustentabilidades através das quais monografias, dissertações
de mestrado e eventos científicos, de enfoque geográfico e ciências afins,
ligados ao tema Rio de Janeiro vêm sendo produzidos.
Entre as temáticas de destaque no grupo, a geografia política e a
gestão do território no Rio de Janeiro são foco de interesse acadêmico
crescente, devido às transformações jurídico-administrativas pelas quais
o estado brasileiro vem passando nos últimos 30 anos, notadamente
após a abertura política de 1979 (dez anos depois dos atos institucionais que abalaram gravemente a democracia brasileira) e da definição da
atual carta magna, em vigência no país desde 1988. Com a constituição
federalista em vigor, os poderes locais no Brasil passaram a ter maior
força de gestão sobre os seus territórios institucionalmente definidos.
Unidades subnacionais (estados) e municípios passaram a atuar, mais
efetivamente, nas realidades logísticas, ambientais, sociais e econômi-
59
cas dos espaços geográficos sob a sua tutela político-representativa.
Governos de estado e prefeituras, juntamente com atores sociais
não-governamentais, desde então vão travando estratégias de gestão
frente a demandas espaciais específicas, o que impõe às sociedades
locais a necessidade de um maior conhecimento e de uma participação
sobre os governos estaduais e municipais, para que estes ajam mais
ativamente na redução das desigualdades socioespaciais e ambientais
tão comuns nas áreas pobres do planeta.
Nesse sentido, as escolas de ensino básico dos municípios devem
ser, assim como outros estabelecimentos educacionais do país, lócus
de produção de conhecimento socioespacial e ambiental e, portanto, de
educação político-participativa de crianças, jovens e adultos em prol
da sustentabilidade. Discussões sobre outras possibilidades de gestão
dos recursos diversos, além das competências dos poderes instituídos,
devem ser somadas ao debate político-pedagógico, sendo que este cabe
às escolas, não só através das aulas regulares e de conteúdos específicos, mas também pela participação crescente de professores, corpos
pedagógicos e administrativos, e de discentes em geral, no fazer político dos territórios.
O texto a seguir procura abrir perspectivas de educação política
para os professores da rede municipal de Duque de Caxias, afim de que
eles sintam-se mais do que meros coadjuvantes nos processos decisórios locais. Cabe aos profissionais de ensino ser elementos ativos na
transformação socioespacial devido à responsabilidade, em parte, pela
formação das racionalidades presentes e futuras das populações municipais, ou seja, o elo vital na estruturação de mentalidades participativas, questionadoras, reflexivas e valorizadoras das potencialidades e
recursos humanos e ambientais locais.
Como exemplo de temáticas que podem ser instrumentos de educação política e ambiental para os professores e alunos de Duque de
Caxias, no âmbito da formação básica, podemos destacar a qualidade da
gestão da saúde pública dos caxienses, entendendo e divulgando o nível
da difusão da rede de saneamento básico e de oferta dos serviços infraestruturais. Esse termômetro de atualidade da ação pública municipal
na região da Baixada Fluminense poderá gerar um ambiente educativo
mais propositivo em termos políticos, interdisciplinar na conjunção de
áreas educativas de interesse comum e pró-ativo nas ações coletivas
de proteção da vida, sob todos os aspectos, espalhando-se por outros
municípios de uma região que tem na pobreza estrutural, o componente
cotidiano das suas relações socioespaciais.
A região Baixada Fluminense: um espaço territorializado por
práticas políticas complexas.
das por atores que são submetidos aos seus poderes. Diante disso, os
territórios na região são configurados por diferentes territorialidades2 em
que ações são produzidas e impostas, devendo ser cumpridas por aqueles sobre os quais o poder instituído se faz valer no território políticoadministrativo, ou seja, os municípios. Aqueles que se colocam contra
essas regras passam a exercer uma força contrária aos que comandam
o poder do Estado de direito, ficando claro nos desmembramentos territoriais na região em estudo (emancipações distritais), quando diferentes
interesses econômicos, políticos e sociais contribuem para a formação
de novos territórios político-administrativos, caracterizando choques de
interesses nas diferentes escalas de poder.
Diferentes atuações socioespaciais a região Baixada Fluminense,
produzidas por variadas ações, perspectivas e tonalidades de poder
resultaram em diversas fragmentações territoriais, revelando as representações político-administrativas locais através dos municípios. Os
agentes dos poderes locais produziram um prolongamento de suas
ações, a fim de serem criadas redes de relações intermunicipais como
forma de reconhecimento da atuação de seus poderes regionalmente
e de garantia, portanto, da permanência de práticas localistas que ‘se
solidarizam’ com projetos de maior amplitude política e de força territorial, como as ações dos governos estadual e federal.
Administrativamente, essa região é formada, oficialmente, por 14
municípios fluminenses, segundo a Divisão Política do cide -rj (2005),
a saber: Mangaratiba, Itaguaí, Seropédica, Paracambi, Japeri, Queimados, Nova Iguaçu, Belford Roxo, Mesquita, São João de Meriti, Nilópolis,
Duque de Caxias, Magé e Guapimirim, como mostra o mapa da Baixada
Fluminense (p.19). Antes desses acordos localistas, porém, diferentes
divisões territoriais são necessárias para que os nichos de poder através
da máquina pública possam ser expressos regionalmente, numa verdadeira arquitetura de poder no espaço geográfico.
A figura 2 expressa as emancipações ocorridas na região ao longo
do século xx , quando os interesses das elites locais passaram a exercer, nesse fragmento do território fluminense, uma relação de poder
com outros agentes do Estado nacional. Nesse sentido, tais emancipações expressam uma esfera da ação, uma designação da capacidade
de agir, direta ou indiretamente, sobre as coisas ou sobre as pessoas,
sobre os objetos ou sobre as vontades (guichet , 1996 apud castro ,
2005, p.99). Dessa maneira, as reivindicações produzidas pela relação
comunidades-elites podem resultar em emancipações e isto dependerá
das vantagens políticas, econômicas e sociais desses grupos através da
instituição Estado.
1
Segundo Claude raffes tin (1993), “o território se
forma a partir do espaço e
é o resultado de uma ação
conduzida por um ator (…)
em qualquer nível” (p.143).
Já para Marcelo Lopes de
souza (2001), o conceito
pode ser compreendido em
sua flexibilidade, elasticidade formal e de conteúdo,
expressos na relação que
desenvolve com as noções
de espaço e tempo.
2
Para Robert sack (1986),
territorialidades são definidas como estratégias de
controle sempre vinculadas
ao contexto social nas quais
se inserem. São estratégias de poder e de manutenção independentes do
tamanho das áreas a serem
dominadas ou do caráter
meramente quantitativo dos
agentes dominadores, ou
seja, são estratégias de controle territorial.
A região Baixada Fluminense é formada por vários territórios1, onde
agentes diversos criam um conjunto de normas e regras a serem segui-
60
poder local , gestão do território e política pública
61
augusto césar pinheiro da silva e rosana cristine machado de oliveira
As diversas emancipações territoriais vão gerar no espaço diferentes relações de poder, sendo que este último, segundo Castro (2005),
assume três formas elementares: a primeira é o poder despótico, a
segunda, o poder fundado na autoridade e a terceira, o poder que se
apoia na força da política. Essas três dimensões representam as variadas formas de ação sobre os objetos e as pessoas, além das formas de
controle sobre eles. Segundo a autora, a primeira forma traz a dimensão
do medo, da coerção pela violência e da ameaça, o que caracteriza bem
a história moderna da Baixada Fluminense, região marcada pela violência, tanto explícita quanto implícita3, nas suas relações cotidianas.
Essas formas de violência podem ser verificadas em Duque de Caxias
que teve, ao longo do século xx , um forte poder de coerção pelo medo de
Tenório Cavalcanti, deputado e migrante nordestino conhecido como o
Homem da Capa Preta. Este impôs o terror em todo o município, como
forma de pressão para que seus interesses e vontades particularistas
fossem atendidos.
Tenório Cavalcanti foi um dos muitos migrantes que vieram do
Nordeste para a Baixada. Lá, enriqueceu e tornou-se uma poderosa figura social, criando um sistema clientelista e apoiando-se na
violência como estratégia de conquista e manutenção do poder tanto
econômico quanto político. Tenório aproximou-se de famílias tradicionais (inclusive pelo casamento), mas, ao mesmo tempo, manteve
suas relações com os migrantes, inclusive intermediando a vinda de
muitos outros para a Baixada, quando se formou em Direito. Como
advogado, lutou a favor de causas de despejo e de controle pela
terra. Neste sistema, projetou-se como líder regional e conseguiu
penetrar nas esferas da política nacional, conseguindo expressivas
votações para o Legislativo.
(ciberlegenda , 2004).
A segunda forma de poder está fundada na autoridade que, segundo a
mesma autora,
é um poder exercido como uma concessão, o que o torna uma forma
legitimada pela aceitação e pelo reconhecimento daqueles que a ele
se submete. É nesse reconhecimento e concordância dos que se submetem que ele se justifica e funda a sua legitimidade.
(p.103)
Esse tipo de manifestação de poder tende a se tornar mais comum hoje,
podendo se manifestar através do carisma por parte daqueles que desejam “impor o poder” através de estratégias políticas de ações assistencialistas. Estas legitimam a atuação de alguns agentes do espaço e o seu
controle sobre os objetos e sobre as pessoas (CASTRO, 2005).
E, por fim, ainda segundo Castro, o poder político “que compreende em sentido amplo, tanto a possibilidade de coerção, típica do poder
62
poder local , gestão do território e política pública
despótico, quanto à autoridade, de fundamento legal” (p. 104). Essa terceira relação de poder representa as múltiplas escalaridades da ação do
Estado nacional de Direito territorialmente, a partir de seus fragmentos
político-administrativos, ou seja, as escalas federal, estadual e municipal, três esferas político-administrativas que utilizam o poder despótico
e da autoridade em nome de um coletivo.
Assim é caracterizada a Baixada Fluminense, uma região cada
vez mais afetada por práticas políticas que provêm de distintas forças
e poderes, sendo estes relacionados, muitas vezes, a práticas sociais
assistencialistas na forma de despotismo declarado ou subsumido pela
legalidade. Tais ações aumentam a dependência, a pobreza, a fome e
a degradação ambiental, gerando gestões malsucedidas e complexas.
Outras vezes, porém, o poder é vivenciado sob a forma de autoridades
reconhecidas (instituintes) e de acordos políticos que legitimam uma
gestão articulada através dos municípios e de outras escalas administrativas (estado e federação).
Apesar das transformações técnico-científicas ocorridas no espaço
regional da Baixada Fluminense nas últimas décadas, ainda são poucos
os avanços socioespaciais reconhecidos no que concerne às mudanças
políticas mais estruturantes na região. Isso se deve às ações fragmentadas e descontinuadas de gestões ainda arraigadas por particularismos de parte das representações instituídas, além do que se reconhece
que as esferas de poder ainda não conseguiram, com eficiência, abarcar os conhecimentos gerados pelas universidades e centros sociais de
excelência.
Para a proposição de gestões mais eficientes, em todas as esferas
da sociedade, poderiam ser implementados projetos de desenvolvimento
voltados para uma qualidade de vida que vai além da mera perspectiva
economicista. Mas como deveria ser um desenvolvimento socioespacial
mais amplo e efetivo? Este deveria unir as questões sociais, ambientais, culturais e políticas para uma verdadeira autonomia socioterritorial dos lugares. Segundo Souza (1996), o desenvolvimento socioespacial precisa estar:
3
Para Marcelo Lopes de
souza (2000), baseado em
Michel foucault (1979),
a violência implícita é
aquela inerente ao modelo
de desenvolvimento dominante e que se expressa nas
contradições da civilização ocidental, ou seja, nas
desigualdades e disparidades de formas, serviços e
no acesso das populações
aos bens sociais e materiais
que, sutilmente, acabam
sendo normatizadas; já a
violência explícita é aquela
que se expressa de forma
“nua e crua” no espaço geográfico, onde as normas ou
regras morais sociais são
desrespeitadas (sequestros, assaltos, mortandade,
agressões físicas e morais,
poluições diversas…), o que
vem se naturalizando na
modernidade.
livre de ranço etnocêntrico, precisa acentuar a idéia de cada povo,
cada grupo social, deve possuir a autonomia necessária para definir o conteúdo desse conceito de acordo com as suas próprias necessidades e de conformidade com suas características culturais.
(p.10).
Diante disso, projetos de modernização de um determinado espaço
devem levar em conta a participação popular, adaptando-se às características locais e não simplesmente na aplicação de projetos “de cima
para baixo”. Já Becker (1987) compreende que o desenvolvimento
depende de uma ação política que tenha como base:
(…) uma gestão eminentemente estratégica com um princípio de fi-
63
augusto césar pinheiro da silva e rosana cristine machado de oliveira
nalidade econômica – expressa em múltiplas finalidades específicas
– e um princípio de realidade, das relações de poder, necessária à
consecução de suas finalidades; envolve não só a formulação das
grandes manobras – o cálculo das forças presentes e a concentração
de esforços em pontos selecionados – como dos instrumentos – táticos e técnica – para sua execução. A gestão científico-tecnológica
para articular, coerentemente, múltiplas decisões e ações necessárias e assim alcançar as finalidades específicas dispondo as coisas
de modo conveniente, instrumentalizando o saber de direção política, de governo, desenvolvendo-se hoje como uma ciência (…)
(p.3).
Desta maneira a gestão deverá “integrar elementos da administração
de empresa e elementos da governabilidade” (foucault , 1979 apud
becker , 1987, p.4). Esses elementos só poderão ocorrer a partir de
modelos que procurem atender às necessidades das populações, a partir
de planejamentos que busquem sustentabilidades no/do espaço. Através das estratégias e da gestão científico-tecnológica citadas por Becker,
assim como de um desenvolvimento que valorize as demandas dos grupos sociais de Souza, poderá ocorrer uma sustentabilidade espacial
local. Esta consistiria no conjunto de ações produzidas “nos lugares” e
que tenham como objetivo o “desenvolvimento pleno de cada cidadão da
localidade”, permitindo a qualidade de vida das populações municipais.
Para que isso aconteça, a sustentabilidade local deverá privilegiar:
(…) as dimensões sociais (razoável homogeneidade social), culturais (equilíbrio entre o respeito à tradição e à inovação), ecológicas
(preservação dos recursos renováveis), ambientais (respeito e ênfase da capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais,
territoriais (diminuição da assimetria na aplicação dos investimentos públicos entre áreas urbanas e rurais), econômicas (desenvolvimento econômico intersetorial equilibrado), além de considerar as
sustentabilidades políticas nacional e internacional (desenvolvimento da capacidade do Estado de implementar o projeto nacional em
parceria com todos os empreendedores, um pacote Norte-Sul de codesenvolvimento, baseado no princípio de igualdade)
Por suas características socioespaciais no conjunto regional do
Estado do Rio de Janeiro, a Baixada Fluminense possui condições de
aplicar políticas efetivas capazes de promover a sustentabilidade do seu
espaço econômico, social, político, ambiental. Todavia, como Duque de
Caxias, alguns municípios da região apresentam ainda grandes dificuldades em oferecer saúde pública de qualidade a seus habitantes, um
dos índices de sustentabilidade local. Tal dificuldade pode ser comprovada pela má distribuição da rede de abastecimento de água pelos distritos, situação que reduz os índices de qualidade de vida no território
por ampliar, por exemplo, as doenças provenientes da baixa qualidade
do saneamento básico.
A água é um vetor de grande importância na transmissão de doenças como a amebíase. Quando não tratada, ela se transforma em um
agente proliferador de patógenos, o que gera danos à saúde e leva a situações extremas como o óbito. Nesse sentido, o saneamento básico é um
dos fatores primordiais na promoção da saúde e do bem estar social,
evitando a propagação de doenças causadoras de epidemias. Logo,
sanear o espaço físico é uma das ações que promovem um ambiente
sustentável.
Nesse sentido, as imagens a seguir mostram, em linhas gerais,
a péssima qualidade das águas do Rio Sarapuí, que cruza Duque de
Caxias, uma das principais fontes de abastecimento de água desse
município da Baixada Fluminense. As imagens também mostram como
a ocupação humana em suas margens, que poderia ser contida, controlada e infraestruturada pelo poder público municipal, acaba por ampliar
o grau de saturação da potabilidade das suas águas, além de afetar,
drasticamente, o equilíbrio ecológico da área, ambiente dominado pelos
mangues que mantém algum sopro de qualidade de vida no fundo da
Baía de Guanabara.
(Adaptado de sachs , 2002 apud rua et al. 2007, p.9).
Assim sendo, a gestão para o desenvolvimento socioespacial local deve
estar diretamente ligada ao termo sustentabilidade, pois o poder público
municipal pode criar condições econômicas, políticas e sociais para
que os munícipes possam se desenvolver plenamente. Desta maneira,
o ambiente passa a ser sustentável pelo fato de as pessoas terem condições de produzir um ambiente de vida com qualidade. Os setores
públicos e privados devem se unir para criar condições como emprego,
serviços, lazer e educação, sob a observação cautelosa e pró-ativa do
Estado. Assim, a qualidade de vida poderia ser oferecida com menores
diferenciações e distinções de classes.
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poder local , gestão do território e política pública
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augusto césar pinheiro da silva e rosana cristine machado de oliveira
1 O sistema de saneamento básico (notadamente o sistema de esgotamento sanitário doméstico, comercial e industrial) do município
não tem capacidade para preservar a qualidade das águas que circulam pelo território até o seu deságüe na Baia de Guanabara e;
2 A abundância de água acumulada em algumas regiões distritais
mostra a incapacidade do poder público de melhor distribuí-la pelo
sistema oficial de abastecimento, seja por inoperância técnica ou
incapacidade de controle político dos recursos existentes.
A próxima imagem selecionada mostra apenas um pequeno exemplo do
que pode ser encontrado em termos de recursos hídricos no Município
de Duque de Caxias, se este território da Baixada Fluminense for mais
bem explorado, estudado e entendido por moradores, professores, pesquisadores e gestores em geral.
21/11/2006 – Custodio Coimbra / Agência O Globo – RI – Exclusivo
21/11/2006 – Custodio Coimbra / Agência O Globo – RI – Exclusivo
Apesar da degradação das águas do rio em curso pelo território caxiense,
observada nas imagens selecionadas, a presença de grande quantidade
de água potável nesse município fluminense é significativa. Nos mananciais existentes, notadamente, no 4° Distrito Caxiense (Xerém), as reservas de água doce são impressionantes, o que nos leva a concluir que:
Baia de Guanabara, foz do Rio Sarapuí em Caxias com área de reflorestamento. Jardim Gramacho ao fundo.
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poder local , gestão do território e política pública
Reservas de água doce em Xerém, 4º Distrito de Duque de Caxias
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augusto césar pinheiro da silva e rosana cristine machado de oliveira
Frente à poluição da rede hidrográfica que cruza o município caxiense
e, ao mesmo tempo, à abundância dos recursos hídricos no mesmo território, as conclusões anteriores estão justificadas pelos dados do ibge
(2002), apresentados nas figuras 7 e 8 da página seguinte. A figura 8
indica o número de domicílios com abastecimento regular de água na
Região Metropolitana do Rio de Janeiro (rmrj ). Observa-se que cerca
de um terço da população caxiense só tem acesso à água não tratada
obtida através de poços ou nascentes. Tal situação é similar em quase
todos os municípios da baixada, o que indica que há uma distribuição
irregular da rede de saneamento básico por esses municípios fluminenses, notadamente através das disparidades distributivas dos distritos
municipais (há uma enorme desigualdade socioespacial entre os eles),
o que impede a água de chegar às residências “mais longínquas” por
“problemas operacionais diversos”. Quando analisamos a figura 8, percebemos o mesmo tipo de problema no que se refere à distribuição de
esgotamento sanitário. Percebe-se, na Baixada Fluminense, a existência
de muitos domicílios com banheiro fora da rede geral de esgotamento
sanitário oficial, sendo que, em Duque de Caxias, um quarto deles não
tem rede de tratamento disponibilizada. Outros municípios que sofrem
muito com o esgotamento sanitário deficiente são Guapimirim, Mesquita e Paracambi, onde, de acordo com os dados do ibge (2002), mais
de 60% da população lança dejetos in natura nos rios, lagos e na Baía
de Guanabara.
Diante do quadro infraestrutural mostrado pelas figuras 7 e 8, o abastecimento de água tratada, o recolhimento e o tratamento de esgoto
constituem-se ações de políticas públicas ineficientes em toda a Baixada
Fluminense. A melhoria de tais serviços poderia evitar os efeitos nocivos à saúde das populações nos mais diferentes territórios. Além dessa
necessária melhoria, deveriam ser valorizadas as políticas de educação
ambiental básica, uma das medidas socioeducativas mais importantes
para a geração de um conhecimento capaz de capacitar pessoas e instituições a evitar a disseminação de doenças através das águas. Para
tanto, cabe ao poder público municipal estabelecer parcerias entre as
três esferas de poder (federal, estadual e municipal), a fim de definir
uma rede de relações e investimentos capazes de oferecer serviços que
incrementem a qualidade de vida dos moradores.
As políticas territoriais em curso nos Municípios da Baixada Fluminense (com destaque para Duque de Caxias), deveriam proporcionar
um desenvolvimento humano que valorizasse o índice de qualidade de
vida municipal (iqm ), para que fossem reduzidas as diversas formas de
violência às quais a população local está submetida. Nesse sentido, o
aumento da “alfabetização espacial” passa a ser um ato crucial de Edu-
68
poder local , gestão do território e política pública
cação Ambiental, pois alimenta o crescimento de pessoas mais conscientes de seus direitos e deveres, desenvolve e qualifica a mão de obra
local, cada vez mais apta a se promover no mundo do trabalho formal
e legal. Dessa forma, a população regional aumentará sua capacidade
de consumo de produtos diversos, de lazer e, principalmente, de serviços de saúde, gerando uma cadeia mais efetiva de autoregulação das
necessidades locais. Sendo assim, as políticas de planejamento e gestão na Baixada Fluminense poderiam fomentar, em médio ou longo
prazo, o surgimento de territórios com um desenvolvimento socioespacial local sustentável através de técnicas, ações, instrumentos, equipamentos e práticas educacionais, políticas e econômicas que permitam
a essa imensa população fluminense viver com a qualidade e dignidade
que merecem.
Algumas reflexões finais sobre o ente federativo e Duque de Caxias.
O atual território do Município de Duque de Caxias, emancipado, em
1943, de Nova Iguaçu, sempre teve serviços precários, desde as crises de malária e febre amarela que assolaram as fazendas canavieiras,
matando milhares de trabalhadores ameríndios e escravos, nos auspícios dos séculos xvii e xviii .
Segundo Lacerda (2003), a única presença de uma autarquia do
setor público na localidade, até o fim dos anos de 1930, era a de uma
agência fiscal arrecadadora federal. A cobrança de impostos sobrepunha-se à prestação de serviços públicos essenciais (p.11).
Desde a adoção de políticas modernizadoras por Getúlio Vargas,
nos anos de 1940, para tornar “industrializado” o recém-criado município, em uma guerra entre as elites agraristas regionais e o industrialismo moderno do Estado Novo, Duque de Caxias convive com as contradições características do processo de modernização a que foi alçada.
Socialmente, não deixou de ser um misto de sociedade escravocrata e
grupos tecnocratas baseados em estruturas modernizadoras típicas dos
estados nacionais centralistas e autoritários, o que transformou o município num espaço de contrastes socioespaciais marcantes.
Ao mesmo tempo em que o território municipal possui uma localização estratégica por estar nos entrecruzamentos de importantes rodovias do país, principalmente no eixo Rio de Janeiro – São Paulo, Duque
de Caxias tem visto o modelo de atração de investimentos no qual a
modernização fordista se pautou nos últimos 70 anos no Brasil entrar
em colapso, o que vem reduzindo a sua capacidade de captação de
recursos industriais tradicionais. Além disso, o papel da Cidade do Rio
de Janeiro na rede urbana do país se modificou expressivamente, nos
últimos 30 anos, o que vem levando os gestores municipais a buscarem
outras formas de estímulo de potencialidades (voltadas para as sustentabilidades locais) ainda pouco reconhecidas e valorizadas como estratégias de desenvolvimento socioespacial.
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augusto césar pinheiro da silva e rosana cristine machado de oliveira
Tal transformação do modelo de modernização e da estrutura federativa do Brasil será mais bem aproveitada na escala do município se a
sua população e, consequentemente, os seus gestores souberem entender as lógicas de crescimento e desenvolvimento em gestação na atualidade. Nessa nova ordem, o município tem voz ativa na administração e precisa ser entendido como parte expressiva do pacto federativo
nacional. Assim sendo, um bom gestor municipal sabe que educação,
saúde, conservação ambiental, gestão integrada dos recursos hídricos
a partir das microbacias hidrográficas e parcerias político-administrativas entre municípios (consórcios municipais) não são setores periféricos ou secundários em uma administração que tenha como premissa
a consolidação da qualidade de vida.
Nesse sentido, Duque de Caxias se apresenta como um município que busca mudar, remunerando o seu professorado melhor do que
a média estadual e ampliando o seu quantitativo de 35 mil para 85 mil,
na rede pública (villar , 2003). Tais atos políticos são importantes e
não podem ser isolados como meras ações de governos, precisam funcionar como ações definitivas do Estado de direito local. Assim sendo,
infraestrutura básica, saúde pública, transporte coletivo, conservação
ambiental e distribuição de recursos sociais são alguns caminhos estruturantes de uma nova ordem de gestão que será reconhecida como permanente pela população municipal caxiense. Esta, por sua vez, passará
a reconhecer no poder local a força política que salvaguarda o município para ele seja delegado ao papel de uma gerência que atua e se reconhece nos lugares.
Em termos práticos, se houver um aumento da capacidade do
ente público municipal em manter as atividades e serviços próprios da
administração com recursos oriundos de sua competência tributária, o
município se tornará menos dependente das transferências de recursos
financeiros dos demais entes governamentais e boa parte da capacidade
de investimento municipal será desatrelada da arrecadação de outros
governos, das esferas Federais e Estaduais, transformando sociopoliticamente o Município de Duque de Caxias em uma referência regional
importante frente à lógica de um poder revigorado, inovador e promissor de uma nova realidade de desenvolvimento.
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Direito Ambiental: origens,
desenvolvimento e objetivos
Augusto Cesar Pinheiro da Silva — Geografia
Possui graduação, mestrado e doutorado em geografia pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (ufrj ), concluídos em 1990, 1996 e 2005, respectivamente. Em
1992, fez uma especialização em geografia pela Universität Tubingen (utu ), na
Alemanha. Atualmente é professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (uerj ), professor assistente da Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro (puc -Rio) e coordenador de dois projetos de pesquisa: Gestão territorial no
Estado do Rio de Janeiro (grupo de pesquisa g eterj ) e Metodologias para a educação geográfica (gpeg ). Possui diversos artigos publicados, entre eles um capítulo
do livro Currículos e práticas pedagógicas nos cpvcs .
[email protected]
Rosana Cristine Machado de Oliveira
Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Humana. É autora
da monografia “Gestão e sustentabilidades da saúde pública em Duque de Caxias
(rj ): os desafios atuais do município fluminense frente aos serviços médico-hospitalares, de saneamento básico e de educação pós-Constituição Federal de 1988”,
defendido no Departamento de Geografia da puc -Rio, em dezembro de 2008.
[email protected]
72
poder local , gestão do território e política pública
1
O Direito Ambiental Internacional
O meio ambiente, cada vez mais, vem sendo objeto de preocupação da
sociedade – seja em razão de estudos conclusivos a respeito da interferência nociva do ser humano no equilíbrio ecológico, seja porque as
mudanças decorrentes desta interferência estão sendo percebidas claramente no cotidiano de cidadãos do mundo inteiro. O aquecimento
global, a perda da biodiversidade, o buraco na camada de ozônio, o
aumento da desertificação, a contaminação dos solos e das águas, a
poluição do meio ambiente marinho, dentre muitas outras, são notícias que aparecem diariamente nos jornais, refletindo a preocupação
da sociedade com o tema.
O direito ambiental, um ramo novo do direito, profundamente
comprometido com a preservação da biodiversidade e a luta contra a
poluição, busca responder a tais preocupações. Ele surgiu em meados do século passado e vem se aperfeiçoando ao longo das últimas
décadas.
Estudos realizados pelo chamado Clube de Roma – um grupo
informal de economistas, educadores e industriais de 25 países, criado
com o objetivo de contribuir para uma melhor compreensão das principais questões econômicas, políticas e sociais da época (entre 1960 e
1970) – concluíram que crescimento populacional, produção agrícola,
recursos naturais, produção industrial e poluição seriam importantes
fatores limitadores do desenvolvimento econômico. Era, portanto, fundamental aumentar o nível de consciência da população a respeito da
escassez dos recursos do planeta e assim adotar um posicionamento crítico em relação às políticas então empregadas, tanto por países desenvolvidos como pelos países em processo de desenvolvimento.1
Em 1972 foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (Conferência de Estocolmo), com participação de representantes de 114 países e 19 órgãos intergovernamentais,
além de cerca de 400 organizações não-governamentais.2 A importância da Conferência advém do fato de ela haver adotado uma abordagem
73
1
m ccormick , John. Rumo
ao paraíso. A história do
movimento ambientalista.
Tradução de Marco Antonio
Esteves da Rocha e Renato
Aguiar. Rio de Janeiro:
Relume Dumará. 1999,
p.86.
2
Embora todos os países
houvessem participado das
reuniões preparatórias, os
países do leste europeu,
exceto a Romênia, se ausentaram das reuniões.
política, social e econômica dos problemas ambientais, possibilitando,
assim, um maior envolvimento de diferentes setores da sociedade civil
organizada e garantindo uma cobertura jornalística que sensibilizou boa
parte da opinião pública planetária para as questões ambientais.3 Os
resultados concretos dessa Conferência foram a criação de uma agência
da onu especificamente dedicada ao meio ambiente (o pnuma – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, com sede na capital do
Quênia, Nairobi), um chamado à cooperação internacional para reduzir os efeitos da poluição marinha e o estabelecimento de uma rede de
monitoramento global do ambiente. A Declaração de Princípios (Declaração de Estocolmo) e o Plano de Ação adotados pela Conferência de
Estocolmo, apesar de sua grande divulgação, nunca foram efetivamente
levados em consideração pelos países desenvolvidos.
Vinte anos depois realizou-se, no Rio de Janeiro, a Conferência
das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – a Cúpula
da Terra –, que ficou conhecida como Rio-92, igualmente reconhecida
como um marco no desenvolvimento do Direito Ambiental Internacional.
Mais de uma centena de chefes de Estado e de Governo estiveram presentes, além de uma infinidade de ong s, reunidas no chamado Fórum
Global, que se desenvolveu em paralelo à Conferência oficial. Da Rio-92
resultaram importantes documentos internacionais, como a Agenda 21
e a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, além
da Convenção sobre Diversidade Biológica e da Convenção-Quadro das
Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.
Além da Conferência de Estocolmo e da Rio-92, muitos outros
tratados e convenções assinados nas últimas décadas retratam a preocupação internacional com o meio ambiente (é importante destacar
que muitos Estados, embora delas sejam signatários, relutam em aplicá-las). Dentre as principais convenções internacionais que tratam do
meio ambiente, destacam-se:
●● Convenção Ramsar sobre Áreas Úmidas de Importância Internacional, adotada em 1971, com ênfase na proteção das áreas
úmidas;
●● Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora
e da Fauna Selvagem em perigo de Extinção – cites , que entrou
em vigor, no Brasil, em 1975;
●● Convenção sobre Direitos do Mar, de 1976, que entrou em vigor em
novembro de 1994, tendo como foco a proteção do meio ambiente
marinho;
●● Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio, celebrada em 22 de março de 1985, e complementada pelo Protocolo
de Montreal sobre substâncias que destroem a camada de ozônio,
assinado em 17 de setembro de 1987;
74
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
●● Convenção da Basiléia sobre o movimento transfronteiriço de rejeitos potencialmente perigosos e seu depósito, de 1989, que entrou
em vigor, no Brasil, em 1992;
●● Protocolo de Quioto, complementar à Convenção-Quadro sobre
Mudanças Climáticas, que estabelece metas para a redução dos
gases de efeito estufa pelos países desenvolvidos e entrou em vigor
em fevereiro de 2005.
2
Evolução da Legislação Ambiental Brasileira4
Na década de 30 surgiram, no Brasil, as primeiras normas específicas relativas a bens ambientais, tais como o Código Florestal (Decreto
23.793/34), o Código de Águas (Decreto 24.643/34; ainda hoje com
muitos dispositivos em vigor), e o Decreto-Lei 25/37, que dispõe sobre
a proteção do patrimônio cultural brasileiro.
Na década de 60, foram editados o novo Código Florestal (Lei
4.771/65, muito alterado desde então) e a Lei de Proteção à Fauna (Lei
5.197/1967, também muito alterada, especialmente pela Lei de Ccrimes e Infrações Administrativas Ambientais – lei 9.605/98). Na década
de 70, diversos estados brasileiros instituíram seus sistemas de combate à poluição – o Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, editou o
Decreto-Lei 134/75, instituindo o Sistema de Licenciamento de Atividades Poluidoras.
Não se pensava ainda, contudo, na proteção do meio ambiente de
forma sistemática. Isso somente aconteceria com a edição da Lei Federal 6.938, em 1981. Essa lei, conhecida como a Lei da Polícia Nacional
de Meio Ambiente, conceituou meio ambiente (“o conjunto de condições,
leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”), e estabeleceu
outros conceitos jurídicos importantes, como o de poluição, poluidor,
degradação ambiental etc.
Além disso, a Lei 6.938/81 instituiu o Sistema Nacional do Meio
Ambiente, integrado por órgãos federais, estaduais e municipais, e criou
diversos instrumentos para a proteção do meio ambiente, tais como o
zoneamento ambiental, o licenciamento ambiental, o estudo prévio de
impacto ambiental etc.
Assim, a partir de sua edição, qualquer atividade que possa ser
causadora de algum tipo de degradação ambiental precisa obter dos
órgãos ambientais, antes de se instalar, uma licença ambiental (na
verdade, são três licenças: a licença prévia, a licença de instalação e
a licença de operação, cada uma delas concedida numa fase do processo de licenciamento). Caso a poluição que vier a ser causada pela
atividade seja considerada potencialmente significativa, o empreendedor fica também obrigado a providenciar a realização de um estudo
de impacto ambiental, que deverá ser discutido com a população inte-
75
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
3
John McCormick afirma que
a “Conferência de Estocolmo
foi o acontecimento isolado
que mais influiu na evolução do movimento ambientalista internacional”.
Explica que apresentou
quatro importantes resultados: confirmou a tendência sobre meio ambiente
humano que advém da
transformação do ambientalismo em uma questão
política mais racional e global; “forçou um compromisso entre as diferentes
percepções sobre o meio
ambiente defendidas pelos
países mais e menos desenvolvidos”; marcou o início
do novo papel das ONG’s na
questão ambiental; e, como
produto tangível, originou o
Programa de Meio Ambiente
das Nações Unidas. m ccor mick , John. Obra citada,
p. 111. Cabe destacar que
a Conferência da Biosfera,
realizada em 1968, não teve
o mesmo alcance, pois discutiu os aspectos científicos
da conservação da biosfera.
4
A legislação ambiental brasileira encontra-se disponível na rede mundial de
computadores nos seguintes sites:
• leis e decretos federais:
www.planalto.gov.br;
• resoluções do conama :
www.mma.gov.br/conama;
• leis estaduais:
www.alerj.rj.gov.br.
ressada, em audiências públicas, e avaliado pelos órgãos ambientais
competentes.
Outra importante novidade da Política Nacional do Meio Ambiente
foi estabelecer um regime rigoroso de responsabilização civil do poluidor (necessidade de indenizar ou reparar os danos por ele causados
ao meio ambiente e a terceiros atingidos por suas atividades). Em tais
casos, dispensou-se a exigência de ficar provada a culpa do poluidor –
bastando a comprovação do dano ambiental e de sua causa. Assim, se
uma empresa polui um curso d’água, ela deverá reparar o dano ambiental causado, pouco importando quais tenham sido as causas do dano. É
um tipo de responsabilidade que se fundamenta no risco da atividade,
e não na culpa do agente causador do dano.
Em 1985, foi editada outra norma legal muito importante: a Lei
7.345/85, que disciplina a ação civil pública por danos causados ao
meio ambiente, ao consumidor, e a outros bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Essa lei permitiu à sociedade civil organizada ajuizar ações contra empreendimentos poluidores,
sem que seja preciso demonstrar um interesse pessoal no resultado da
causa. Assim, por exemplo, uma associação fundada com a finalidade
de proteger o meio ambiente, com sede no município do Rio de Janeiro,
pode ingressar na Justiça contra a poluição que esteja sendo causada
no município de Duque de Caxias, ou de Resende – ainda que nenhum
de seus membros resida ou tenha propriedades naqueles municípios.
O Ministério Público também teve suas funções relativas à proteção do
meio ambiente extraordinariamente reforçadas pela lei 7.347/85, mais
tarde ampliada pelo Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90).
A proteção jurídica do meio ambiente no Brasil teve o seu momento
maior em 1988, quando foi promulgada a nova Constituição da República. Ela contém inúmeras disposições relativas à matéria, com destaque para o seu artigo 225, que estabelece:
Art.225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
III definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer
utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou
atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de
impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V controlar a produção, a comercialização e o emprego
de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente;
VI promover a educação ambiental em todos os níveis
de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei,
as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a
recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com
solução técnica exigida pelo órgão público competente,
na forma da lei.
§3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a
Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á,
na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso
dos recursos naturais.
§5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas
pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias
à proteção dos ecossistemas naturais.
§6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua
localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao
Poder Público:
I
preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas;
II preservar a diversidade e a integridade do patrimônio
genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas
à pesquisa e manipulação de material genético;
76
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
77
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
Cabe destacar ainda outras importantes leis sobre proteção do meio
ambiente:
●● Lei 6.766/1979: dispõe sobre o parcelamento do solo urbano;
●● Lei 7.661/1988: instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento
Costeiro;
●● Lei 9.055/1995: disciplina a utilização do asbesto/amianto;
●● Lei 9.433/1997: cria a Política Nacional de Recursos Hídricos;
●● Lei 9.605/1998: dispõe sobre crimes e infrações administrativas
ambientais;
●● Lei 9.795/1999: dispõe sobre a Política Nacional de Educação
Ambiental;
O Meio Ambiente na Legislação Brasileira
O tratamento jurídico do meio ambiente é estabelecido por inúmeras
normas, dentre elas leis e decretos federais, estaduais e municipais, bem
como resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente – conama ,
alcançando o meio ambiente natural, cultural, artificial e do trabalho.
A seguir, apresentam-se algumas questões importantes tratadas
pelo Direito Ambiental brasileiro.
●● Lei 4.717/1965: disciplina a ação popular;
●● Lei 8.723/1993: dispôs sobre a emissão de poluentes por veículos automotores;
3
3.1 Proteção jurídica das florestas
O Código Florestal (Lei 4.771/65) é uma norma de grande importância
para a preservação das florestas. Ele instituiu o conceito de Áreas de
Preservação Permanente (app ), compostas pelas florestas e demais
formas de vegetação natural situadas:
a) Ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível
mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:
●● de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de menos de
10 (dez) metros de largura;
●● Lei 9.985/2000: instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (snuc );
●● de 50 (cinquenta) metros para os cursos d’água que
tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
●● Lei 10.257/2001: Estatuto da Cidade;
●● de 100 (cem) metros para os cursos d’água que tenham de
50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
●● Lei 10.650/2003: dispõe sobre o acesso público aos dados e informações do sisnama ;
●● de 200 (duzentos) metros para os cursos d’água que
tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de
largura;
●● Lei 11.105/2005: dispõe sobre biossegurança;
●● Lei 11.284/2006: institui o Sistema Florestal Brasileiro e o Fundo
Nacional de Desenvolvimento Florestal;
●● Lei 11.428/2006: dispõe sobre a utilização e a proteção da vegetação nativa do bioma Mata Atlântica;
●● Lei 11.445/2007: dispõe sobre o saneamento básico.
O Direito Ambiental, ramo do direito público, dotado de autonomia e
princípios próprios, constitui um sistema coerente e lógico, “voltado à
proteção da diversidade biológica e da sadia qualidade de vida dentro
de um meio ambiente ecologicamente equilibrado”.5 Nesse sentido, Édis
Milaré o conceitua como “o complexo de princípios e normas reguladoras
das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a
sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações”.6
O Direito Ambiental possui origens relacionadas à necessidade de
disciplinar a atuação e a interferência humanas nos ecossistemas, evitando as suas drásticas consequências. Seu objetivo é claramente definido: a proteção e conservação do meio ambiente.
78
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
●● de 500 (quinhentos) metros para os cursos d’água que
tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
b) Ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou
artificiais;
c) Nas nascentes, ainda que intermitentes, e nos chamados “olhos
d’água”, qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio
mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura;
d) No topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) Nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°,
equivalente a 100% na linha de maior declive;
f) Nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de
mangues;
g) Nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em pro-
79
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
5
figueredo , Guilherme
José Purvin de. Curso de
Direito Ambiental. Curitiba:
Arte & Letra, 2008, p. 37.
6
milaré . Direito do
ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 93.
jeções horizontais;
h) Em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer
que seja a vegetação.
Em princípio, as áreas de preservação permanente não podem ser utilizadas pelos seus proprietários, mesmo que não estejam cobertas por
vegetação nativa. Elas possuem a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade,
o fluxo gênico de fauna e flora. Também protegem o solo e asseguram
o bem-estar das populações humanas.
O Código Florestal instituiu, ainda, a Reserva legal, correspondente a uma parcela da propriedade rural que deve ser averbada no
Registro Geral de Imóveis, após aprovação do órgão estadual de meio
ambiente, e na qual se admite unicamente a exploração sustentável, de
acordo com princípios e critérios técnicos e científicos.7 Em propriedades rurais situadas em área de Mata Atlântica, a Reserva legal será de
20% (vinte por cento).
Em relação à proteção jurídica das florestas, cabe ainda destacar
a Lei 11.428/2006, que estabelece o regime de utilização e proteção da
vegetação nativa do bioma Mata Atlântica.
3.2 Unidades de Conservação da Natureza
Unidade de Conservação da Natureza é o “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características
naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção” (art. 2º,
I da Lei Federal 9.9985/2000).
As Unidades de Conservação são divididas em unidades de proteção integral e unidades de uso sustentável. As primeiras não admitem o uso direto, ou seja, aquele que envolve coleta e uso dos recursos
naturais. Já as unidades de uso sustentável objetivam compatibilizar o
uso sustentável dos recursos com a conservação ambiental, admitindo,
assim, o uso direto.
São categorias de unidade de conservação de proteção integral:
i
Estação Ecológica;
ii Reserva Biológica;
iii Parque Nacional, Estadual ou Municipal;
iv Monumento Natural;
v Refúgio da Vida Silvestre.
São categorias de unidade de conservação de uso sustentável;
80
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
i
Área de Proteção Ambiental;
ii Área de Relevante Interesse Ecológico;
iii Floresta Nacional, Estadual e Municipal;
iv Reserva Extrativista;
v Reserva de Fauna;
vi Reserva de Desenvolvimento Sustentável;
vii Reserva Particular do Patrimônio Natural.
Cada categoria de unidade de conservação possui características e objetivos próprios, que envolvem especialmente:
●● A necessidade de ser constituída por terras públicas ou a possibilidade de ser instituída em terras de domínio privado;
●● A possibilidade de serem realizadas pesquisas científicas em seu
interior, bem como a necessidade desta atividade ser autorizada;
●● A admissão de visitação pública em seu interior;
●● As atividades que são admitidas nos seus limites.
Assim, de acordo com as características do local, o Poder Público deverá
verificar qual destas categorias atenderá aos objetivos de proteção do
meio ambiente, considerando-se, ainda, a necessidade de desapropriar
as terras envolvidas, assim como a eventual remoção da população residente na área.
Apenas a título de exemplo, apresentam-se as principais características da Reserva Biológica e da área de proteção ambiental:
Reserva Biológica: tem como objetivo a preservação integral da
biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais. Admite apenas
medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de
manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a
diversidade biológica e os processos ecológicos naturais. É de posse e
domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas nos seus
limites devem ser desapropriadas. A visitação pública é proibida, exceto
quando tenha objetivo educacional. A pesquisa científica depende de
autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade
e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas.
Área de Proteção Ambiental: é uma área em geral extensa, com
certo grau de ocupação humana, dotada de atributos importantes para
a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas. Possui
como objetivo proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de
ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.
Pode ser constituída em terras públicas ou privadas. Admite visitação
81
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
7
Nos casos de utilidade
pública ou de interesse
social, a legislação prevê
a possibilidade de supressão de vegetação em área de
preservação permanente.
pública e pesquisas científicas.
Importa mencionar que as unidades de conservação de proteção
integral devem dispor de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão
responsável por sua administração e constituído por representantes de
órgãos públicos, de organizações da sociedade civil, por proprietários
de terras localizadas em Refúgio de Vida Silvestre ou Monumento Natural, quando for o caso.
4
A legislação ambiental exige que empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais que sejam consideradas efetiva ou
potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes
de causar degradação ambiental, sejam submetidos ao prévio licenciamento do órgão ambiental competente.
A Resolução conama 237/97, principal norma sobre o assunto,
elenca as atividades e empreendimentos sujeitos ao prévio licenciamento
ambiental (relação constante no anexo 1), sendo que o órgão ambiental poderá exigir licenças ambientais para atividades que não constem
desta relação.
A legislação prevê três licenças ambientais:
3.3 Recursos hídricos
A principal legislação brasileira sobre recursos hídricos é a Lei Federal
9.433/97, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
A lei estabelece como fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos os seguintes princípios:
I
●● A água é um bem de domínio público;
●● A água é um recurso natural limitado, dotado de valor
econômico;
III Licença de Operação (lo ): autoriza a operação da atividade ou
empreendimento.
●● A gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso
múltiplo das águas;
No licenciamento de atividades e empreendimentos considerados passíveis de causar significativo impacto ambiental deverá ser exigido
o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (eia ) e seu respectivo Relatório
de Impacto ao Meio Ambiente (rima ), disciplinados pela Resolução nº
001/86 do conama .
O rima é um relatório simplificado, em linguagem acessível à
população, das informações técnicas constantes do EIA, que deverá permanecer disponível para consulta e acesso públicos.
No caso de realização de eia /rima , sempre que o órgão licenciador
julgar necessário, ou quando solicitado por entidade civil, pelo Ministério Público, ou por 50 (cinquenta) ou mais cidadãos, deverão ser realizadas audiências públicas, com o intuito de informar e coletar opiniões
da população acerca do empreendimento.
●● A bacia hidrográfica é a unidade de implementação da Política
Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos;
●● A gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das
comunidades.
A partir da edição dessa Lei, como forma de reconhecer a água como
um bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor,
incentivar a racionalização do seu uso e obter recursos financeiros para
a gestão dos recursos hídricos, foi estabelecida a cobrança pelo uso da
água.
Estão isentos da cobrança:
O uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de
pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;
ii As derivações, captações e lançamentos considerados
insignificantes;
iii As acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.
82
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
Licença Prévia (lp ): concedida na fase preliminar do planejamento
do empreendimento ou atividade, com o objetivo de aprovar sua
localização e concepção, bem como atestar sua viabilidade ambiental. Nessa fase, quando necessário, é apresentado o Estudo Prévio
de Impacto Ambiental (eia );
II Licença de Instalação (li ): autoriza a instalação do empreendimento ou atividade;
●● Em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos
é o consumo humano e a dessedentação de animais;
i
O Licenciamento Ambiental de Atividades Poluidoras
5
Participação na Gestão Ambiental
Como visto, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um bem
de uso comum do povo, tendo a coletividade, juntamente com o Poder
Público, o dever de protegê-lo para as presentes e futuras gerações. Além
disso, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pertence
a toda a coletividade.
Alguns instrumentos buscam possibilitar a ampla participação da
83
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
sociedade na gestão do meio ambiente, podendo ser mencionados:
●● Audiências públicas, realizadas no procedimento de licenciamento
ambiental de empreendimentos e atividades que realizem estudo
prévio de impacto ambiental;
●● Consultas públicas para a instituição de unidades de conservação, exceto estação ecológica ou reserva biológica.
6
Fiscalização ambiental
As normas ambientais estabelecem direitos, deveres, obrigações e procedimentos relacionados à garantia da sadia qualidade de vida da população e da manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Infelizmente, em muitos casos tais normas não são cumpridas, o
que ocorre, por exemplo, (i) quando uma empresa não possui licença
ambiental para a realização de atividades potencialmente causadoras
de degradação ambiental; (ii) quando não foi solicitada a autorização
de supressão de vegetação; (iii) quando a emissão de efluentes, sejam
eles líquidos ou gasosos, não está de acordo com os padrões legais.
Nesses casos, deve ocorrer a responsabilidade daquele que praticou a
conduta.
A responsabilidade ambiental ocorre em três esferas: cível, em que
se exige a reparação dos danos ambientais causados; penal, na qual
se aplica uma sanção criminal, que pode ser desde multa até mesmo a
detenção do responsável; administrativa, em que são aplicadas multas, dentre outras sanções, pelos órgãos ambientais.
Ocorre que, muitas vezes, os órgãos competentes para apurar a
responsabilidade dos causadores de danos ambientais apenas tomam
conhecimento de determinado fato por meio de denúncias da população – que constitui um parceiro importante no combate às degradações
ao meio ambiente.
Os principais órgãos responsáveis pela apuração de danos ambientais, nas suas respectivas competências, são:
i
Órgãos públicos ambientais: ibama (federal), inea (estado do Rio
de Janeiro), Secretaria de Meio Ambiente (município de Duque de
Caxias);
Bibliografia
carson , R. Silent, Spring. Houghton Mifflin Co.: New York, 1962.
comissão mundial independente sobre meio ambiente e
desenvolvimento . Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: Editora da
Fundação Getúlio Vargas, 1988.
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Instituto Piaget, 1997.
rodrigues , Marcelo Abelha. Elementos do Direito Ambiental: parte geral. 2ª ed.
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Loyola, 2002.
soares , Guido Fernando Silva. Direito Internacional do Meio Ambiente:
emergência, obrigações e responsabilidades. São Paulo: Atlas, 2001.
Fernando Cavalcanti Walcacer (Direito)
Advogado e professor de Direito Ambiental da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro (puc -Rio). Vice-diretor do Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente
e coordenador do setor de Direito Ambiental do nima . Coordenador acadêmico do
curso de pós-graduação lato sensu em Direito Ambiental da puc -Rio.
[email protected]
Virgínia Totti Guimarães (Direito)
Advogada, mestranda em Planejamento Urbano e Regional no ippur / ufrj .
Especialista em Direito Ambiental pela puc -Rio (2008) e em Advocacia Pública
pela uerj (2004).
[email protected]
ii Ministério Público, Federal ou Estadual.
Além disso, importantes aliados na manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado são as organizações não governamentais e associações civis que, inclusive, possuem competência para ajuizar ação civil
pública diante da ocorrência de dano ambiental.
84
direito A mbiental : origens , desenvolvimento e objetivos
85
fernando cavalcanti walcacer e virgínia totti guimarães
Regina Célia de Mattos
Educação Ambiental:
por que e para quê?
O processo educacional é uma construção permanente e dinâmica. A
educação formal, escolar, é complementada pela denominada informal,
que podemos, sem pecar pela simplificação, entender como sendo o conjunto de relações sociais sob as quais o indivíduo está submetido, seja
na casa, nos círculos de vizinhança, nas brincadeiras, nos encontros,
enfim, no cotidiano de sua vida. A partir desse entendimento, perguntamo-nos: por que e para que educação ambiental?
A contemporaneidade do capitalismo tem evidenciado, e de
maneira assustadora, as consequências de um processo concentrador
de riquezas e de poder por um lado, e, por outro, a pobreza, o abandono social e a expansão da violência que não se restringe aos espaços
classicamente denominados de urbanos. As profundas desigualdades,
a intensificação e a expansão dos múltiplos processos de transformação da natureza têm propiciado um crescente movimento do reconhecimento dos limites desse tipo de reprodução societal, manifestado em
inúmeras matizes, mas que tem como pano de fundo a preocupação
com os derivados “problemas ambientais”.
Torna-se cada vez mais premente a necessidade de entendermos a
problemática ambiental no âmbito de um processo de desenvolvimento
que assume as suas particularidades a partir de diretrizes norteadoras
globalizadas, o que demonstra a impossibilidade de separarmos o uso
predatório e aniquilador da natureza e as condições profundamente
desiguais em que vivem milhões de pessoas. É a partir desse entendimento que, de novo, fazemos a pergunta: por que e para que educação
ambiental?
A relação do homem com a natureza é tão intrínseca que muitas
vezes não percebemos que somos natureza tanto orgânica como socialmente, a segunda natureza, se é que podemos separar essas dimensões.
Somos água, potássio, magnésio e uma relação imensa de elementos
que são responsáveis pela nossa energia e, portanto, pela nossa capacidade de crescer, de desenvolver movimentos, de raciocinar. Em nossa
contemporaneidade, os elementos naturais são cada vez mais transformados por processos que se materializam em vigorosos sistemas técnicos (edificações, equipamentos, fontes energéticas e outros) que impõem
padrões de conduta que nos alienam, distanciando-nos dessa orgânica
86
relação, pois vemos a natureza apenas como objeto, fonte de recursos
e de lazer.
É esse processo de alienação que faz com que a preservação ou
a conservação da natureza se torne foco crescente de estratégias de
ações tanto de agentes privados como públicos, surgindo como quesito
básico para políticas e ordenamentos territoriais, liberação de financiamentos nacionais e internacionais, tornando-se uma verdadeira moeda
de troca.
A prática do alienante discurso desenvolvimentista-economicista
colocou em xeque a sua sustentabilidade. A noção de sustentabilidade
surge em 1992, através da Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (unced ), e se constitui em crescente e
necessária meta nos atuais debates sobre desenvolvimento. Objeto de
múltiplas interpretações, manifesta diferentes representações e ideias,
um campo de lutas, conforme analisa Acselrad (2001, p.29):
Mas, ao contrário dos conceitos analíticos voltados para a explicação
do real, a noção de sustentabilidade está submetida à lógica das
práticas: articula-se a efeitos sociais desejados, a funções práticas
que o discurso pretende tornar realidade objetiva. Tal consideração
nos remete a processos de legitimação/deslegitimação de práticas e
atores sociais… Abre-se, portanto, uma luta simbólica pelo reconhecimento da autoridade para falar em sustentabilidade. E para isso,
faz-se necessário constituir uma audiência apropriada, um campo
de interlocução eficiente onde se possa encontrar aprovação. Poderse-á falar, assim, em nome dos (e para os) que querem a sobrevivência do planeta, das comunidades sustentáveis, da diversidade
cultural etc. Resta que a luta em torno a tal representação exprime
a disputa entre diferentes práticas e formas sociais que se pretendem compatíveis ou portadoras de sustentabilidade.
Portanto, visões alternativas produzem uma “crença na sustentabilidade”, baseadas na busca de eficiência na utilização dos recursos disponíveis; de limites ao crescimento tecnoeconômico e do “pensamento
único”; de redução da pobreza diante de um modelo altamente concentrador de riquezas e poder e consequente equidade; de reconhecimento das diferenças como novas possibilidades; e de outra racionalidade ética, dentre outras interpretações da relação sociedade-natureza
traduzidas em “modelos alternativos de desenvolvimento”.
A relação sociedade-natureza coloca a dimensão espacial como
fundante nesse debate, na medida em que o espaço é um fato histórico, isto é, fruto da história da sociedade na medida em que a história
não se reproduz fora do espaço, e nem a sociedade se realiza, se reproduz, sem o espaço. O espaço geográfico é, por natureza, social, por ser
transformado, através das práticas sociais, em segunda natureza, em
materializações que expressam tanto o uso, o espaço da reprodução,
87
regina célia de mattos
como a troca, o espaço da produção em suas múltiplas formas. Santos
(1996, p. 186) afirma que:
O período de 1950–60 também foi de intenso crescimento anual, declinando, progressivamente nas décadas seguintes, com a redução dos
fluxos migratórios e a diminuição do número de filhos diante da necessidade da mulher também ter que trabalhar fora do âmbito doméstico.
É um período importante, pois a ideologia desenvolvimentista economicista é colocada em prática através do Plano de Metas do governo
de Juscelino Kubitschek (1956-1961) que estimulou, através de incentivos ao capital externo, um processo de industrialização. É interessante observarmos, também, a dinâmica populacional do município
frente ao Estado do Rio de Janeiro e à Baixada Fluminense: nas primeiras décadas, o crescimento é bem superior aos dois recortes espaciais, aproximando sua dinâmica às da cidade do Rio e da Baixada nos
períodos mais recentes, evidenciando uma estabilidade no crescimento
populacional.
Em 1961, foi inaugurada a Refinaria de Duque de Caxias, reduc ,
no distrito de Campos Elísios, às margens da antiga Rio-Petrópolis, hoje
br -040, que integra Brasília ao Rio de Janeiro. A instalação da refinaria
foi mais um importante fator no crescimento do município, uma vez que
demandou grande contingente de mão de obra que, em grande parte,
permaneceu no local.
Pelos dados do Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro
(cide ), o município possui um dos mais vigorosos comércios e atividades de serviços da Baixada Fluminense. Com quase 850 mil habitantes
em 2005, dividiu com a capital as principais participações na indústria
de transformação, construção civil, estabelecimentos de instituições
financeiras, comércio e outros serviços. No mesmo ano de 2005, Duque
de Caxias foi o segundo município de maior Produto Interno Bruto (pib ),
acima de R$ 1 bilhão a preços básicos. A reduc teve uma participação
de quase 60% nesse desempenho (Estudo Socioeconômico, 2007).
Como estão, portanto, organizados os diferentes usos do espaço
do município de Duque de Caxias? Observando o Mapa 01 constatamos
a forte concentração populacional nos distritos de Duque de Caxias,
Campos Elíseos e Imbariê. O mapa, de fato, representa tanto o uso
do espaço para a reprodução (a casa, a família) como para a produção
propriamente dita que se encontram densamente concentrados, ocasionando uma densidade demográfica de 1.735,65 hab/km², de acordo
com o cide .
A história das chamadas relações entre sociedade e natureza é, em
todos os lugares habitados, a da substituição de um meio natural,
dado a uma determinada sociedade, por um meio cada vez mais
artificializado, isto é, sucessivamente instrumentalizado por essa
mesma sociedade. Em cada fração da superfície da terra, o caminho que vai de uma situação a outra se dá de maneira particular;
e a parte do “natural” e do “artificial” também varia, assim como
mudam as modalidades do seu arranjo.
Como foram construídas, então, as relações entre a sociedade e natureza no município de Duque de Caxias? Como são, hoje, tais relações?
Como se organizam os espaços do uso e da troca?
Para entendermos as relações entre sociedade e natureza na contemporaneidade de Duque de Caxias, é preciso que as contextualizemos
historicamente. O crescimento populacional através de fluxos migratórios e o ordenamento territorial de municípios da Baixada Fluminense
ocorreram no período de 1930-1950 devido a quatro fatores, segundo
Abreu (2006, p.107):
as obras de saneamento realizadas na década de 30 pelo dnos
(através do Serviço de Saneamento da Baixada Fluminense); a eletrificação da Central do Brasil, a partir de 1935; a instituição da
tarifa ferroviária única em todo o Grande Rio (que beneficiou sobretudo os subúrbios afastados e os municípios da Baixada); e a
abertura da Avenida Brasil, em 1946, que aumentou sobremaneira
a acessibilidade dos municípios periféricos.
Essas ações propiciaram um retalhamento espacial através de loteamentos que é estimulado, em Duque de Caxias, com a abertura, em 1928,
da rodovia Rio-Petrópolis, além do saneamento visar, conforme Abreu
(2006), a formação de um cinturão agrícola abastecedor da Capital da
República. De acordo com os dados abaixo, constatamos a aceleração
do crescimento do município a partir dos anos de 1940–50, quando foi
registrada a taxa de 12,06% de crescimento ao ano, resultado dos intensos fluxos migratórios.
Tabela 1 Taxa média anual de crescimento entre anos selecionados (%)
Unidades
1940 – 50
1950 – 60
1960 – 70
1970 – 80
1980 – 90
1990 – 00
2000 – 05
ERJ
2,61
3,68
2,97
2,30
1,15
1,30
1,30
Baixada Fluminense
8,86
8,80
5,95
3,38
1,38
1,72
1,67
12,06
10,17
5,88
2,93
1,36
1,67
1,63
Duque de Caxias
Fonte: CIDE – Baixada em Dados, 2005
88
educação ambiental : por que e para que ?
Observemos, agora, o Mapa 02 – Macrozoneamento – Zonas Especiais.
Elaborado a partir da Lei Complementar do Plano Diretor Urbanístico
de Duque de Caxias, demarca os diferentes usos do espaço e os futuros usos, em Zonas Especiais: de Interesse Social (zeis ), de Interesse
Ambiental (zeia ), de Negócios (zen ), Turístico e Negócios Rurais. Nele,
89
regina célia de mattos
vemos com mais clareza a demarcação da área ocupada e urbana retratadas no Mapa 01. Se pudéssemos sobrepor os dois ficariam claros os
limites de expansão urbana: do sul para o centro, os espaços concebidos como Zonas de Interesse Ambiental de Cidade de Meninos e São
Bento; no sentido nordeste, a Zona de Interesse Ambiental de Petrópolis; e, ao norte, a Zona de Interesse Ambiental de Xerém e a Reserva
Biológica do Tinguá.
É bastante interessante essa correlação, na medida em que o uso
do espaço tanto para moradias como para atividades produtivas ocorreu sem levar em consideração a necessária preservação dos elementos naturais, evidenciando suas consequências na qualidade de vida da
população. A sociedade e o ambiente natural sofrem por usos do espaço,
como as indústrias, que descarregam no solo ou no ar seus resíduos,
acentuando a degradação e aumentando os riscos para a vida. Além do
desmatamento, deterioração dos recursos hídricos e ocupação em terrenos insalubres, esse ordenamento territorial não foi acompanhado por
infraestrutura e medidas de saneamento.
A Organização Mundial da Saúde (oms ) define saneamento como
o controle de todos os fatores do meio físico do homem que exercem ou
podem exercer efeitos nocivos sobre a saúde, incluídas as medidas que
visam a prevenir e controlar doenças, sejam elas transmissíveis ou não.
Água, esgotamento sanitário, coleta e destinação de resíduos sólidos
urbanos definem, concretamente, as condições de saneamento (Estudo
Socioeconômico, 2007, p.26).
De fato, são expressivos os problemas enfrentados pela população
em relação ao acesso à água potável, ao esgotamento sanitário e à coleta
diária do lixo. Dentre essas condições básicas de garantia de qualidade
de vida, a coleta de lixo é a que vem recebendo mais atenção pelo poder
público, mas, não, a sua destinação. A coleta, além de ser mais barata,
desobstrui as vias de circulação, evita a geração de outros problemas
nas vias públicas, como a convivência com ratos e baratas, deixando
a paisagem mais limpa, mais politicamente negociável. Porém, a destinação, quando realizada adequadamente, requer vultosos investimentos com retorno de médio e longo prazos, prática que vai de encontro
à lógica política do balcão de negócios, cujo tempo de retorno é agora,
o imediato.
No bairro Jardim Gramacho (parece ironia), localizado no distrito
de Duque de Caxias, encontra-se o aterro de Gramacho, o maior aterro
da América Latina, que recebe, por dia, mais de sete toneladas de lixo,
a maior parte proveniente da cidade do Rio de Janeiro, e que se encontra em estado crítico, com mais de 50% de seu uso paralisado diante da
possibilidade de desmoronamento. Caso medidas urgentes não sejam
tomadas, a saúde de grande parte da população do município estará
ameaçada. Parece-nos, portanto, que os problemas enfrentados pela
população local derivam, com mais persistência, da ausência de ações
90
educação ambiental : por que e para que ?
dos agentes públicos e privados em garantir a saúde coletiva. É claro
que a recorrente ausência desses agentes promoveu resultados desastrosos nos ambientes naturais, tornando-os vetores de doenças.
Os problemas enfrentados pelo desigual desenvolvimento sócioespacial convivem, com mais de 50% do território municipal demarcados
como unidades de conservação (Plano Diretor do Município) que não
garantem, necessariamente, uma boa qualidade de vida à população.
Em princípio, a demarcação de tais unidades objetiva garantir qualidade dos recursos naturais a serem utilizados pela população, assim
como preservar ou conservar a biodiversidade e os elementos naturais
indispensáveis à reprodução humana. Tais demarcações são necessárias? Sim, mas perguntamo-nos: quais os benefícios que a população
de Duque de Caxias tem recebido com a demarcação desses territórios?
Os ricos mananciais atendem às necessidades da vida urbana que exige
salubridade? A natureza generosa que conforta o olhar, “descansa o
espírito”, é desfrutada pela população? O município tem um abastecimento alimentar, diante de tantas terras, que propicie condições para
a população, particularmente aquela de menor renda, para atender às
suas necessidades?
A educação ambiental é necessária, sim, mas não basta nas salas
de aulas, não basta como atividade lúdica, não basta como ações pontuais. As indústrias poluem, desmatam, e “nós” que temos de aprender a ter “educação ambiental”? Que “ambiente” é esse? O natural? E
o social? As empresas ganham quando promovem práticas de “educação ambiental”: é delegar ao Outro a responsabilidade com as práticas
socioambientais e continuar poluindo. O poder público não cumpre
com as suas responsabilidades de prover segurança de saúde à população e “nós” que temos de ensinar aos nossos filhos que não se joga
lixo aqui e acolá, que não devemos agir de tal e tal maneira com a natureza, como se fôssemos os responsáveis pelos infindáveis problemas de
saúde pública, das precárias condições em que vive grande parte da
população das cidades?
É óbvio que temos que ensinar, educar, mas por que todos não
foram, historicamente, “ensinados”, “educados”? Por que as práticas
do poder público e do capital quase sempre desprezaram os problemas
derivados do uso da natureza na medida em que a percebiam infinita?
As desigualdades do desenvolvimento socioespacial fizeram com os custos da degradação dos ambientes naturais fossem divididos pela população mais pobre, sem condições de pagar pela segurança à vida, isto
é, emprego, moradia digna, água potável, esgotamento sanitário, um
entorno sem vetores de doenças. Afinal, os “frutos” do desenvolvimento
não devem ser repartidos entre todos?
Portanto, mais uma vez nos perguntamos: por que e para que educação ambiental?
91
regina célia de mattos
Bibliografia
Rita de Cássia Martins Montezuma
Rogério Ribeiro de Oliveira
abreu , Mauricio de A. Evolução urbana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: ipp ,
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os significados dos espaços vazios
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santos , Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São
Paulo: Editora Hucitec, 1996.
Uma simples palavra basta para caracterizar o ambiente do município de Duque de Caxias: heterogeneidade. Nele tudo é heterogêneo: os
ambientes que compõem a base física do município, a forma de ocupação pelos seus habitantes, a vegetação, a rede hidrográfica, o relevo…
Ao longo do eixo norte-sul do município, com quase 40 km em linha
reta, nada se repete: a área densamente povoada da sede do município
e do distrito de Campos Elísios em nada lembra os vazios demográficos
dos distritos de Imbariê e Xerém. A Mata Atlântica localizada na encosta
Norte da Serra do Mar em nada se parece com os manguezais da Baía
de Guanabara. E assim por diante…
Por outro lado, existe muito pouca correspondência entre a vegetação original no município de Duque de Caxias e a atual. Essa também
é a principal característica da cobertura vegetal remanescente de toda
a região da Baía de Guanabara, principalmente no que se refere ao seu
entorno imediato. Há que se destacar, no entanto, que a feição original
destes ecossistemas não foi alterada em um único evento da história da
sua ocupação, mas foi produto de uma sucessão mais ou menos paulatina de intervenções humanas sobre a paisagem original, com grande
ênfase para os processos desencadeados nas últimas quatro décadas.
Regina Celia De Mattos – Geografia
Possui graduação em Geografia pela Universidade Federal Fluminense (uff ), concluída em 1975; mestrado em Geografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(ufrj ), finalizado em 1995; e doutorado em Geografia pela Universidade Federal
Fluminense (uff ), concluído em 2005. É professora da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (puc -Rio) desde 1979. Atualmente, ocupa o cargo de
professora assistente do Programa de Mestrado em Geografia da PUC-Rio. Na
Universidade, participou dos seguintes projetos de pesquisa: Projeto de formação
de lideranças em educação ambiental e Educação ambiental: formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania. Entre vários artigos, livros publicados,
organizados ou edições e capítulos de livros, estão os livros: Educação Ambiental:
valores éticos na formação de agentes multiplicadores (Rio de Janeiro: Ed. Loyola,
2001); Educação Ambiental: resgate de valores ético-ambientais no município de
Rio das Ostras (Rio de Janeiro: Petrobrás: puc -Rio, 2002); e Educação Ambiental:
resgate de valores socioambientais de Mangaratiba, RJ (Rio de Janeiro: Petrobras:
puc -Rio, 2003).
[email protected]
Um pouco da história da transformação
O cenário ambiental primitivo da região de baixada de Duque de Caxias
era caracterizado por grandes formações paludosas – brejos, com algum
tipo de vegetação emersa. O Rio Meriti formava um amplo estuário, com
largura superior a 50 m, em frente ao qual existiam diversas ilhas, entre
as quais Saravatá. Em função da sua proximidade com o nível de base,
o rio descrevia meandros de maré num percurso de 8 km, até encontrar
o Rio Pavuna, seu principal afluente, recebendo também como afluente
o Rio Acari. Para o interior, a partir dos manguezais, envolvendo seus
afluentes, ocorriam vastas extensões de brejos de água doce e salobra,
92
educação ambiental : por que e para que ?
93
que se confundiam com várzeas fluviais. A área mal drenada era frequentemente inundada, favorecendo o desenvolvimento de uma rica
fauna e flora.
Do Rio Meriti até o Rio São Diogo, o litoral apresentava um trecho
onde pequenas colinas chegavam ao litoral, sendo contornadas por um
fino cordão arenoso. O Rio Sarapuí, com suas nascentes nas vertentes
das serras de Madureira e Bangu, possuía um trecho desenvolvido em
meandros de maré superior a 5 km, a partir do que contornava colinas
e terraços. Alguns quilômetros a seguir encontrava-se o Rio Iguaçu,
desenvolvendo um sistema de meandros com extensão superior a 20 km,
sendo revestido por um vasto manguezal. Nas proximidades desse rio,
em local que mais tarde seria conhecido como Campos Elísios (onde
se situa a reduc ), erguia-se, como o próprio nome indica, um campo
revestido por vegetação arbustiva/herbácea. Essa formação, algo incomum para a Baía de Guanabara, era constituída de uma superfície arrasada da formação Macacu, por terraços marinhos ou por serem áreas
de lavoura deixadas em pousio pelos Tupis-Guaranis, que possuíam
aldeias na região.
As margens da Baía de Guanabara e todo o seu recôncavo já estavam ocupadas antes do final do século xvi , poucos anos após a fundação da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Nesse aspecto, é de
se destacar que a Baía de Guanabara e os rios da Baixada iriam exercer um papel fundamental para a colonização da região. Na impossibilidade de outra forma de acesso, devido aos pântanos, manguezais e
brejos, esses rios tiveram um papel decisivo de penetração e ocupação
da região. Pelas águas dos rios Meriti, Sarapuí, Iguaçu, Pilar, Saracuruna, Inhomirim e outros é que foram subindo os desbravadores. Ao
longo de suas margens foram se alinhando engenhos e fazendas, e, por
eles, se escoava a produção para o Rio de Janeiro. Portanto, todos esses
rios representaram o principal vetor de desmatamento e colonização da
Baixada Fluminense (ver mapa na p.XX).
Com relação aos vários ecossistemas do município de Duque de
Caxias, é preciso destacar que a megadiversidade característica da Mata
Atlântica é potencializada na Serra do Mar – fachada litorânea que atravessa o estado do Rio de Janeiro no sentido sw - ne – pela variedade de
biótopos: suas altitudes variam de zero a 2.200 m, apresentando encostas voltadas para diferentes quadrantes. Na bacia drenante da Baía de
Guanabara, e, em especial, em Caxias, o principal ecossistema era a
Floresta Ombrófila Densa (conhecida pela denominação geral de Mata
Atlântica). Dentro dessa categoria maior encontravam-se nas partes baixas do município os ecossistemas1 descritos na sequencia (alguns ainda
existentes, sob diferentes estágios de degradação antrópica):
94
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
a) Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas:
Abrangia os ambientes situados entre cerca de 5 m acima do nível do
mar e a altitude de 50 m, estando assentada sobre rochas do embasamento cristalino, rochas alcalinas e sedimentos da Formação Barreiras.
Trata-se do ecossistema mais impactado e descaracterizado de todos os
demais da Baía de Guanabara. Essa tipologia florestal pode abranger
uma grande variedade de fitofisionomias, mas a característica maior é
a conspícua presença de brejos e alagados, o que, de certa forma, restringe a expressão da vegetação arbórea. Nos brejos, as espécies mais
características eram as higrófilas graminóides, como Eleocharis, Typha
e Cyperus. Tratavam-se de brejos bastante ricos do ponto de vista da
diversidade faunística, hábitat do jacaré-de-papo-amarelo (Cayman latirostris) e de muitos mamíferos. Essa forma pioneira de Floresta de Terras Baixas deveria ter ocorrido, de acordo com a restituição ambiental
feita por Elmo Amador (1997), em parte considerável do terreno hoje
ocupado pela reduc .
b) Floresta Ombrófila Densa Submontana
Este ecossistema ainda ocorre em grande extensão na bacia drenante da
Baía de Guanabara, embora em localização distante da sede do município. Ocorre na faixa de altitude entre 50 e 500 m, em áreas dissecadas da Serra do Mar, das serras litorâneas e dos maciços isolados,
sobre rochas do embasamento cristalino e rochas ígneas. A orientação
de encostas desta formação exerce grande importância na estrutura e
composição da vegetação. Geralmente as vertentes voltadas para o quadrante sul apresentam menor suscetibilidade a incêndios e, por conseguinte, biomassa e diversidade de espécies substancialmente maiores.
No caso da bacia da Baía de Guanabara, a formação de maior extensão
e com maior número de tributários – a Serra do Mar e, especialmente,
a Serra dos Órgãos – apresenta todas as suas encostas voltadas para o
quadrante sul, o que favorece as características acima relacionadas.
c) Vegetação com influência fluviomarinha (manguezais)
Na Baía de Guanabara, 40% dos manguezais foram eliminados à medida
que a costa sofreu o processo de intensa urbanização (Kjerfve; Lacerda,
1993). Desde o início da fundação e durante a expansão da cidade do
Rio de Janeiro, tais atividades se deram, na maioria das vezes, às custas da drenagem e do aterro de brejos, mangues e lagunas, que estendiam-se por todo primitivo litoral do município do Rio de Janeiro. Na
região de Caxias, os manguezais devem ter ocorrido em três tipos fisiográficos: os ribeirinhos, desenvolvidos às margens de rios, geralmente até
onde se faça sentir a presença de sal no substrato carreado pelas variações de maré; os de franja, presentes nas margens de costas protegidas,
caracterizando-se por um intenso processo de inundação provocado pela
95
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
1
A nomenclatura utilizada
para conceituar os ecossistemas do município de
Duque de Caxias é a disponível em: IBGE. Manual
técnico da vegetação brasileira. Série Manuais
Técnicos em Geociências
n. 1. Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e
Estatística. Departamento
de Recursos Naturais e
Estudos Ambientais. Rio de
Janeiro. 1992.
ação frequente das marés, e os de bacia, situados nas partes mais interiores, em áreas caracteristicamente de pequena variação microtopográfica, onde a variação das águas ocorre de forma muito mais lenta da
que a observada nos demais tipos fisiográficos. Em grande parte, essas
formações devem ter sido aterradas para edificação de plantas industriais e ocupação urbana.
Paisagem construída, paisagem natural e espaços “vazios”
Em termos de unidades de conservação da natureza, o município de
Duque de Caxias é muito bem servido e apresenta em seu interior diferentes modalidades de conservação, como as apa ’s2 de Tinguá, São
Bento, Estrela e Petrópolis, os Parques Municipais (Taquara, Caixa
D’Água e Glicério) e mais de 20 áreas que o poder municipal decretou
como Zonas Especiais de Interesse Ambiental. Somando todas essas
unidades de conservação, vemos que elas abrangem cerca de metade do
território. Essa condição deixa Caxias muito próximo a países desenvolvidos como a Áustria, que apresenta porcentagem semelhante de unidades de conservação.
Vale entender melhor a grande heterogeneidade que existe entre
essas unidades de conservação, pelo menos em termos de biodiversidade. Dentro da lógica de ocupação do espaço do município, vários condicionantes, tanto sociais como ambientais, conduziram a uma concentração da população bastante intensa na sede municipal. O mapa
Densidade de ocupação & densidade urbana (p.XX) evidencia que as
zonas de maior concentração urbana estão localizadas a sudoeste do
município, abrangendo sua sede e os distritos de Campos Elíseos e
Imbariê. No norte do município, no sopé da Serra do Mar, encontram-se
as áreas de floresta contínua mais significativas, formadas principalmente pela Reserva Biológica Tinguá. Estes dois ambientes distintos – a
encosta da Serra do Mar e a planície – são fundamentalmente diferentes
no que se refere ao patrimônio de biodiversidade. Enquanto que a primeira abriga trechos com grande diversidade biológica, principalmente
na Reserva Biológica de Tinguá, apa de Petrópolis e no Parque Municipal da Taquara, a planície apresenta um quadro diametralmente oposto
– de pouca relevância em termos de diversidade. Tratam-se, portanto,
de espaços bastante heterogêneos se comparados entre si.
Na serra localizam-se as verdadeiras joias em termos de biodiversidade, como a rebio Tinguá, apa de Petrópolis e Parque da Taquara.
Já na baixada, o cenário ecológico é de relativa pobreza. Assim, grosseiramente, poderíamos dividir, em termos de diversidade, esses espaços
“vazios” em duas modalidades: os “vazios” pobres e os “vazios” ricos.
Quais seriam, pois, os valores ambientais de cada uma destas áreas?
96
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
Os “vazios” ricos em diversidade
Tais áreas de alta biodiversidade do município de Duque de Caxias
estão localizadas ao norte, exclusivamente sob o domínio montanhoso
dos maciços costeiros e interiores e das colinas adjacentes (ver mapas:
Geomorfologia pXX; Uso do solo & cobertura vegetal pXX; Unidades de
Conservação pXX). Segundo dados de 1994 da fundação cide (2000),
correspondem a 41,1% de toda a área municipal, sendo que 26,6% são
constituídas por Florestas Ombrófilas Densas e 15,1% por Florestas
Secundárias.
Essa variabilidade de relevo, associada ao gradiente altitudinal,
favorece a heterogeneidade geoambiental que, por sua vez, viabiliza a
multiplicidade de habitats que gera a grande biodiversidade que vem
sendo registrada nessas áreas.
Se considerarmos a UC de maior representatividade em área, a
Reserva Biológica de Tinguá (rebio Tinguá), serão 24.903 ha de mata
contínua, com elevação máxima de 1.600 m de altitude. Encontra-se
relativamente bem protegida desde o século xix devido à presença de
inúmeros mananciais, os quais são responsáveis pelo abastecimento de
parte do município do Rio de Janeiro e de quase 80% da Baixada Fluminense, o que tem gerado inúmeros conflitos.
De acordo com o Projeto Paisagem e Flora da Reserva Biológica
do Tinguá: subsídios ao monitoramento da vegetação (ver Instituto de
Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro), nela são registradas três
formações de Mata Atlântica:
a) Floresta Montana, entre as cotas 500 m e 1.300 m de altitude,
abriga várias espécies raras representativas da flora da Mata Atlântica, dentre as quais Manilkara salzmannii (massaranduba), Aspidosperma ramiflorum (pequiá), Geissospermum laeve (pau-pereira),
Teminalia januarensis (mirindiba) e Pradosia kuhlmannii (cascadoce).
b) Alto Montana, entre 1.300 m e 1.500 m, apresenta alta diversidade de flora saxícola, elevada biomassa e grande diversidade de
Briófitas e Pteridófitas, além de elevada taxa de endemismos, destacando-se a presença de Podocarpus sellowii, espécie típica das
florestas de grandes altitudes do Sul e Sudeste, que foi registrada
pela primeira vez nas porções mais altas da Serra do Tinguá.
c) Campos de altitude, registrados nas áreas acima das florestas
altomontanas, sobretudo nos cumes das serras do Tinguá, dos
Caboclos e de São Pedro. Nessa formação destaca-se a riqueza de
Orchydaceae, Bromeliaceae, Gramineae e Cyperaceae. Nos campos do Pico do Tinguá, os adensamentos de Glaziophyton mirabile,
uma espécie de bambu endêmico de algumas serras do estado
do Rio de Janeiro, atualmente são considerados fósseis vivos por
alguns estudiosos de evolução em plantas.
97
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
2
De acordo com o Sistema
Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza,
a APA (Área de Proteção
Ambiental) é uma das
modalidades de Unidades
de Uso Sustentável.
Dada essa condição relativamente bem conservada da vegetação, é possível encontrar na área uma fauna muito rica, onde já foram registradas
296 espécies de aves e 52 espécies de anuros, dentre os quais o menor
anfíbio do mundo já descrito: o sapo pulga. Grandes mamíferos como a
onça-parda e outras espécies ameaçadas de extinção, típicas de Mata
Atlântica, encontram refúgio na unidade (segundo dados do site www.
ibama.gov.br).
Ainda no domínio montanhoso, merece destaque o Parque Municipal da Taquara, o qual, por ser uma unidade contígua à apa Petrópolis, resulta na preservação da totalidade da área florestal compreendida
entre estas unidades.
A apa de Petrópolis, criada em 1982, abrange parte dos municípios de Petrópolis, Magé, Duque de Caxias e Guapimirim, num total
de 59.049 hectares. Funciona como um tampão para a proteção dos
recursos naturais. Possui 50% de sua área coberta por Mata Atlântica.
Fazendo parte do domínio montanhoso que delimita a Baixada Fluminense, juntamente com as outras unidades adjacentes, forma um
conjunto de vegetação praticamente contínua, protegida sob a forma
de diversas unidades de conservação estaduais, municipais e federais.
Nela, têm sido registradas várias espécies da fauna, como a onça parda,
cachorro do mato, mão pelada, gato do mato, jaguatirica, paca, caxinguelê, sagüi, macaco prego, tapiti, queixada, caititu, tatu, ouriço e quati.
Entre as aves, aparecem inhambu, anu, bico-de-lacre, beija-flor, ticotico, tziu e trinca-ferro. A relação de répteis inclui teiú, cobra-coral, jararacuçu, cobra-cipó, cobra de capim e jararaca.
Anexado a esse conjunto tem-se o Parque Municipal da Taquara,
onde têm sido registradas várias espécies típicas da Mata Atlântica, tais
como gavião-pombo, capivara, marrecos, maracajá, muriqui, onça pintada preta, tamanduá, pica-pau de cabeça preta, saíra, tangará, guaxo
e mico-leão-dourado (observação pessoal de Nelson Barroso, gestor do
Parque Municipal da Taquara). Algumas dessas espécies contrariam
as expectativas de ocorrência, como no caso de duas famílias de micoleão-dourado – primeiro registro recente na área. Tais ocorrências surpreendem alguns pesquisadores por serem raras nos dias atuais, principalmente em áreas próximas aos adensamentos urbanos. Isso só se
explica pela conectividade ainda existente entre diversos fragmentos florestais em bom estado de conservação na região e com as quais o Parque Municipal da Taquara é contíguo.
Não obstante a falta de dados precisos do tamanho das populações
das espécies observadas, a presença de mais de um desses exemplares,
alguns dos quais compõem a lista de espécies da fauna ameaçada de
extinção no estado e no bioma, é um indicativo da qualidade geral da
área. Sua importância do ponto de vista da preservação da biodiversidade torna-se, portanto, clara.
Subjacente a essa, há que se destacar a importância dos recur-
98
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
sos ambientais e das funções ecológicas dessas unidades, tais como os
mananciais que abastecem, oficialmente ou não, parte da população
do município de Duque de Caxias, bem como a importância social que
estes recursos representam: áreas de lazer, simbolismo cultural, reserva
de água e amenização climática, entre outros, inclusive caça, pesca e
subtração de espécie da flora para fins diversos, apesar dos danos que
possam causar. A figura a seguir ilustra a importância social que estas
áreas têm para as comunidades do seu entorno.
A represa da Taquara em dia de semana ensolarado
(outubro/2008)
Informativo do Parque
Ao encontro do surf no Rio Taquara.
Figura 4: As formas de apropriação dos “vazios” do município
de Duque de Caxias representadas nas múltiplas funções ecológicas do Parque Municipal da Taquara e suas formas de uso.
Informativo da CEDAE sobre a captação e tratamento
de água do Rio Taquara
99
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
Os “vazios” pobres em diversidade
●● Fonte de alimento e produtos diversos, associados à subsistência de comunidades tradicionais que vivem em áreas vizinhas aos
manguezais.
Estas áreas estão representadas em Duque de Caxias basicamente por
três distintas unidades: os manguezais, os brejos de taboa e as colinas
da baixada. Em termos de diversidade, os manguezais apenas parcialmente poderiam ser caracterizados como sistemas pobres. Somente o
componente arbóreo dos manguezais é que é menos diverso, pois geralmente são encontradas nele apenas três espécies arbóreas. Dentre as
espécies restritas aos manguezais encontram-se Rhizophora mangle
(mangue vermelho), que ocorre preferencialmente à beira dos canais. O
bosque é formado por adensamentos de Avicennia schaueriana e Laguncularia racemosa (mangue siriuba e mangue branco, respectivamente).
No entanto, fica por aí esta indicação de pobreza biológica: os mangues
constituem um ecossistema riquíssimo em termos de fauna, de algas
e de muitos outros grupos biológicos. Nesse sentido, esse ecossistema
é responsável, junto com os recifes de coral, pela manutenção da alta
diversidade biológica encontrada nas regiões costeiras tropicais de todo
o mundo. Trata-se de um ecossistema costeiro que ocorre em regiões
tropicais e subtropicais do mundo, ocupando as áreas entre marés.
É caracterizado por vegetação lenhosa típica, adaptada às condições
limitantes de salinidade, substrato inconsolidado e pouco oxigenado
e frequente submersão pelas marés. Uma fauna típica compõe ainda
esse ecossistema, igualmente adaptada às características peculiares
do ambiente.
Podemos destacar como principais funções dos manguezais:
Contaminação por chumbo no sedimento de manguezais
da Baía de Guanabara (mg/kg de peso seco).
●● Proteção da linha de costa, evitando erosão da mesma e assoreamento dos corpos d’água adjacentes;
●● Controlador de vazão e prevenção de inundações e proteção contra tempestades;
●● Absorção e imobilização de produtos químicos (por exemplo, metais
pesados), filtro de poluentes e sedimentos, além de tratamento de
esgotos em seus diferentes níveis;
●● Fonte de recreação e lazer, associado a seu alto valor cênico;
100
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
0,05
0,1
●● Manutenção da diversidade biológica da região costeira;
0,02
●● Pontos de pouso (alimentação e repouso) para diversas espécies
de aves migratórias, ao longo de suas rotas de migração;
0,07
●● Área de abrigo, reprodução, desenvolvimento e alimentação de
espécies marinhas, estuarinas, límnicas e terrestres;
0,02
0,02
●● Fonte de detritos (matéria orgânica) para as águas costeiras adjacentes, constituindo a base de cadeias tróficas de espécies de
importância econômica e/ou ecológica;
O fato de o manguezal ocupar uma área de transição entre o continente
e o mar, entre a água doce e a salgada, entre o sólido e o líquido, confere
a esse ecossistema características biológicas muito especiais. Mas uma,
em especial, distingue os manguezais de outros ecossistemas costeiros:
a sua grande resistência a impactos feitos pelo homem. Esta característica funcional faz com que os manguezais resistam a pesadas cargas
poluidoras, sejam elas orgânicas, como os esgotos domésticos, ou inorgânicas, como os metais pesados. Em função disso, o manguezal tem
sido considerado como uma verdadeira barreira geoquímica a poluentes provenientes do continente em direção ao estuário. Um ótimo exemplo disso são os manguezais de Duque de Caxias, que se localizam na
interface de dois ambientes severamente poluídos do Estado do Rio de
Janeiro: a Baía de Guanabara e os rios que drenam a Baixada Fluminense. Da primeira, os manguezais recebem esgotos domésticos, cargas tóxicas de indústrias localizadas no seu entorno, lixo flutuante e
eventuais derramamentos de óleo; os rios trazem grande carga orgânica
decorrente da virtual inexistência de tratamento dos esgotos produzidos
pela região de maior densidade demográfica do estado. O gráfico abaixo
dá uma idéia da poluição por um metal pesado (chumbo) existente no
sedimento dos manguezais da Baía de Guanabara.
0,04
Profundidade
0 a 5 cm
20 a 25 cm
São Gonçalo
D. de Caxias
Ilha do
Governador
Guapimirim
Ilha Grande
Fonte: Oliveira, 1998.
Mesmo o manguezal localizado nas proximidades do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho mantém-se em razoável vigor, apesar da
carga orgânica e inorgânica a que está submetido. O volume de chorume produzido por este aterro é imenso, assim como imensa é a carga
tóxica derivada do processo aeróbico e anaeróbico da decomposição das
101
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
3
Dados obtidos em: http://
odia.terra.com.br/rio/htm/
feema_aterro_de_ gramacho_entrara_em_colapso_a_
qualquer_momento_160874.
asp
quase 7.700 toneladas de lixo, das quais 6.500 são oriundas do município do Rio de Janeiro11.
Para entender (ou tentar entender) a grande capacidade de resiliência do manguezal a esta carga poluidora, o gráfico a seguir traz uma
comparação entre o teor de chumbo encontrado em folhas de dois tipos
de ecossistemas (Oliveira; Bressan; Silva, 1998). Os números são bastante distintos no que se refere à carga de poluição recebida: os dados
referentes à Floresta Atlântica dizem respeito a uma região próxima ao
Pico do Papagaio, localizado no Maciço da Tijuca, em altitude de 850 m.
Ou seja, relativamente distante de qualquer fonte pontual de poluição.
As eventuais entradas que essas folhas recebam são extremamente diluídas, recebidas exclusivamente por entradas atmosféricas. Já os dados
de manguezal referem-se a uma situação oposta: estão submetidos,
duas vezes por dia, por ocasião das marés, à imersão em águas ricas
em chumbo. Apesar da grande diferença em relação à entrada da contaminação por chumbo, a contaminação das folhas é significativamente
maior no ecossistema de Mata Atlântica.
0,2
6,0
21
27
Contaminação por chumbo em folhas de espécies de Mata Atlântica
e de manguezais do Estado do Rio de Janeiro (mg/kg).
0,3
Ilha do
Governador
Guapimirim
D. de Caxias
Floresta
da Tijuca
Floresta
do Camorim
Fonte: Oliveira, 1998.
Outra formação relevante que ocorre na área de baixada do município
de Duque de Caxias são as colinas localizadas na baixada. Em termos
geomorfológicos são formações antigas e correspondem à porção final
da Serra do Mar, paralelas ao seu alinhamento principal. Tratam-se de
colinas de baixa altitude situadas de forma não contínua ao longo da
102
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
baixada do município. Primitivamente, as mesmas eram revestidas pela
Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas e pela Floresta Ombrófila
Densa Submontana. Como estas colinas erguiam-se como ilhas em meio
às áreas brejosas, forneciam ambiente distinto para a fauna e certamente eram utilizadas por essas populações na busca por recursos para
a sobrevivência. Mais tarde, em período histórico, estas colinas sediaram distintos ciclos agrícolas da região, como plantio de subsistência,
canaviais e plantio de laranja. São constituídas por solos dessecados e
de baixa fertilidade natural. Como muitas dessas colinas localizam-se
nas proximidades de brejos, durante muito tempo funcionaram como
área de empréstimo para aterros. Esta situação contribuiu ainda mais
para a degradação da vegetação existente no local.
Com esses condicionamentos históricos, as colinas apresentam,
hoje em dia, uma baixa diversidade. A floresta que as reveste – quando
existente – é uma formação secundária com reduzido número de espécies arbóreas. A fauna é bastante pobre e poucas aves podem ser visualizadas. A pobreza tanto da fauna quanto da flora decorre, portanto,
de dois fatores: do uso histórico dessas colinas e da situação de insulamento destes fragmentos, verdadeiras ilhas cercadas por áreas urbanas.
Como essas áreas não recebem propágulos (como, por exemplo, sementes) de outras espécies, a sua flora é constituída por espécies típicas
de estágios sucessionais iniciais. As espécies arbóreas mais frequentes
nestas colinas da baixada são: carrapeta (Guarea guidonia), arco-depipa (Erythroxylum pulchrum), assa-peixe (Vernonia polyanthes), jacaré
(Piptadenia gonoacantha), ipê verde (Cybistax antisyphilitica) e cambará
(Gochnatia polymorpha), a mais comum de todas, que forma adensamentos monoespecíficos e tem relativa resistência ao fogo. Tratam-se
todas de espécies bastante comuns a este tipo de ambientes.
Qual seria, pois, o valor ambiental dessas colinas para o município
de Duque de Caxias? Diversas podem ser as respostas: algumas dizem
respeito ao presente, outras ao futuro. Para o tempo atual, a vegetação
preservada (ainda que parcialmente em função de invasões, incêndios
etc.) significa uma redistribuição das águas de chuva. Por apresentar
o seu solo recoberto por serapilheira, essas colinas têm um papel relevante no que diz respeito ao armazenamento da chuva. O município
apresenta, em sua porção sul, baixíssima altitude em relação ao nível
do mar – inclusive, em muitas áreas, essa chega a ser negativa, ou seja,
o local está alguns metros abaixo no nível do mar. Esse fato resulta
em grande vulnerabilidade ecológica, principalmente em um cenário
de mudanças climáticas globais. A destruição destas poucas formações
florestais, sua urbanização e consequente impermeabilização do solo,
representam um fator relevante no agravamento das enchentes e dos
alagamentos.
Com referência ao futuro do município, a preservação destas colinas empreendida pelo poder municipal significa uma possibilidade de
103
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
ganho ambiental significativo para a vida da cidade. A decretação dessas áreas como unidades de conservação significa um primeiro passo
para uma mudança da qualidade ambiental. Assim, um grande leque
de possibilidades se abre com esta opção. Projetos podem ser desenvolvidos no sentido de prover o enriquecimento de espécies, via reflorestamento. A fauna e a flora podem ter uma melhoria que resultará
em maior qualidade de vida para a população. Suas funções ecológicas
ligadas à redistribuição das águas de chuva podem ser implementadas
com o reflorestamento. A população pode passar a dispor de um espaço
adequado à contemplação, aos esportes ao ar livre, a atividades educativas etc. A criação de unidades de conservação sobre esses ambientes
representa, como o recente Parque Municipal da Caixa D’Água, uma
conquista cidadã em torno de espaços que, de outra forma, poderiam
ser perdidos para a violência urbana. Nesse sentido, a preservação no
presente dessas áreas abre uma perspectiva futura para uma verdadeira
utopia de ações. Algo como um tomar posse hoje, por parte da municipalidade, da qualidade de seu futuro.
Finalmente, outra área pobre do ponto de vista da diversidade
relativa aos “vazios”, são as áreas planas e em parte brejosas, localizadas em muitas das áreas planas do município, notadamente a sudoeste do mesmo, nas proximidades da Refinaria Duque de Caxias. Preteritamente, essas áreas foram revestidas pela Floresta Ombrófila Densa
das Terras Baixas. Do que existia dessa formação, não se dispõe atualmente nem mesmo de fragmentos, quer no município de Duque de
Caxias, quer na Baía de Guanabara. Esta formação foi destruída, em
grande parte, em meados do século passado, nas chamadas obras de
saneamento. Segundo o presidente Getulio Vargas, “o saneamento da
Baixada Fluminense é, no gênero, uma obra monumental”. De fato, em
função da abertura de canais que se destinavam à dragagem das terras, foram criadas extensas terras emersas, incluindo aquelas onde hoje
se situam a da Refinaria Duque de Caxias. As fotografias a seguir evidenciam um pouco deste esforço colossal, feito anonimamente por uma
legião de trabalhadores.
Etapas da construção dos canais de drenagem da Baixada Fluminense.
Fonte: O homem e a Guanabara, de Alberto Lamego.
104
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
105
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
O que era uma rica formação florestal virou, em sua maior parte, uma
área brejosa. Brejo, alagado ou charco são designações utilizadas para
um tipo especial de ecossistema de águas rasas e semiparadas coberto
com ervas de diversos tipos e tamanhos. O nome oficial adotado pelo
ibge para estes ecossistemas é “comunidades aluviais”. A água é o elemento chave nesse tipo de ecossistema. Para que o brejo exista, são
necessárias algumas condições físicas. A primeira é a pouca inclinação
do terreno, que retarda ou impede o escoamento das águas. A segunda
é a existência de solos impermeáveis, impedindo ou dificultando a infiltração, e a terceira é a proximidade da rocha-mãe logo abaixo de uma
fina camada de solos, ou a combinação destes fatores. Desde que essas
condições existam, haverá a possibilidade de ocorrência de brejo. Este
pode ser permanente, temporário ou ter um núcleo permanente com
uma zona no entorno onde o brejo se expande e se retrai de acordo com
a época do ano. A erva mais abundante nos brejos é a taboa (Typha
dominguensis), que cresce em tufos que podem atingir mais de dois
metros de altura. São comuns, ainda, muitas outras espécies, como a
samambaia-do-brejo (Achrosticum aureum), o aguapé (Echornia crassipes) e a salsa-do-brejo (Jussiaea sp). Os brejos de taboa têm importância para a fauna, principalmente para aves aquáticas como o jaçanã
(Jacana jacana) e roedores como a preá (Cavia aperea). A taboa é uma
espécie de grande importância para a fabricação de artesanatos, principalmente esteiras.
Muitas dessas áreas brejosas constituem Zonas Especiais de Interesse Ambiental. Assim como as demais áreas de baixa diversidade do
município, estas apresentam grande valor ambiental, principalmente
no que se refere à circulação de águas superficiais e de sub-superfície
e também como áreas de circulação atmosférica.
Integrando os “vazios”: valores e funcionamento da paisagem de
Duque de Caxias
A paisagem constitui um objeto de estudo comum a diversas ciências.
Ela é entendida como o estudo da estrutura, função e dinâmica de áreas
heterogêneas compostas por ecossistemas interativos (Forman, 1995).
Atualmente, é bastante estudada pela Geoecologia, definida como uma
ciência que lida com as interações entre a sociedade humana e o seu
espaço de vida, natural ou construído – ou seja, a paisagem (Metzger,
2001). No entanto, sendo um termo polissêmico, o conceito de paisagem apresenta inúmeros significados e representações. Historicamente,
paisagem significa cenário. Como tal, sua definição torna-se subjetiva.
É dependente dos sentidos, o que para alguns significa distinção não
apenas através da visão, como também do olfato, dos conceitos préconcebidos, valores, cultura, posição social, religião, crenças, gênero,
enfim, do arcabouço cognitivo de cada um.
Para alguns autores, essa delimitação espacial pode ser feita “até
106
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
onde a vista alcança” (Santos, 2006). Para outros, a delimitação se dá
em função da frequência de ocorrência de determinados elementos, ou
padrões fisionômicos que regem uma “área terrestre heterogênea, composta por um conjunto de ecossistemas que interagem e se repetem de
forma similar através da paisagem” (Forman, 1995).
Portanto, para entendermos a dinâmica da paisagem do município de Duque de Caxias, importa analisá-la como um todo, integrando
seus diversos espaços, sejam eles construídos, naturais ou em distintas
estratégias e formas de alterações pela milenar ação do homem. Não se
pode pensar a zona de planície do município fora do contexto da encosta
da Serra do Mar. A água, seja sob a forma de chuva ou de escoamento
superficial ou subsuperficial, integra todos esses elementos da paisagem. Da mesma forma, a proximidade com a Baía de Guanabara impõe
severas restrições à ocupação do território e de seu planejamento para o
futuro. O estudo integrado e dinâmico da paisagem do município constitui uma forma para o enfrentamento do fenômeno das mudanças climáticas globais. Ainda mais se considerando as inúmeras fragilidades
a que o município está sujeito, como a alta densidade populacional, a
reduzida altitude de sua sede em relação ao nível do mar, a proximidade com a Serra do Mar etc.
Como visto, as partes planas do município de Duque de Caxias
são constituídas por ecossistemas inteiramente descaracterizados de
sua condição original. Em sua parte não habitada (ou fracamente habitada), a baixada é constituída de pastagens, manguezais e pelas áreas
drenadas nas décadas de 1940 e 1950. Associado à ideologia de “saneamento”, que resultou na radical transformação da paisagem do município, encontra-se a criação, por essa época, de uma grande indústria
de bhc estatal. Sua falência gerou a tristemente conhecida Cidade dos
Meninos, um passivo ambiental antigo e de difícil solução.
Assim, dentro do quadro de elevada densidade demográfica que
tanto o município como a própria Baixada Fluminense apresentam,
esses espaços vazios têm grande importância para a vida do município
e são relevantes os esforços feitos para a sua proteção. Do ponto de vista
da circulação aérea, essas áreas representam um importante papel nas
condições climáticas das áreas mais habitadas. Funcionam também
como dispersores da poluição atmosférica, seja ela oriunda de veículos
automotores ou da reduc . Essas áreas planas desabitadas têm também grande importância no que se refere à circulação de águas subterrâneas do município. Em se tratando de um município com alto grau de
industrialização, a contaminação atmosférica é relevante e essas áreas
representam um grande papel não apenas na dissipação dos poluentes, como também na amenização do clima, pois tratam-se de áreas não
impermeabilizadas pela urbanização.
Em função de sua baixa altitude, essas áreas constituem um
ambiente de tamponamento das águas provenientes das elevações e
107
rita de cássia martins montezuma e rogério ribeiro de oliveira
contribuem para minorar as enchentes. Enfim, esse conjunto heterogêneo de espaços “vazios” representa um papel altamente relevante para
as condições de vida dos seus habitantes. Entretanto, sua viabilidade
fica a depender do interesse dos grupos sociais que dele fazem parte.
A função dos espaços vazios quanto à regulação e manutenção
dos recursos hídricos, qualidade do ar, fornecimento de alimento, conforto ambiental, lazer e espaço de interação social, ou seja, enquanto
recurso ambiental, só será mantida na medida em que os grupos sociais
que deles se utilizam assim desejarem, atribuindo-lhes valores sociais.
Assim sendo, a utilização desses espaços como área de preservação
integra um circuito de interesses e ações que pode ser compreendido
através do esquema abaixo.
Nesse sentido, a transformação dos espaços vazios de Duque de
Caxias em Unidades de Conservação tem seu valor intrínseco enquanto
resgate ou, em certos casos, promoção de suas funções ecológicas. Contudo, estes só manterão suas dinâmicas próprias se e somente se os
grupos sociais a eles associados compreenderem e respeitarem sua
importância. Do contrário, outros usos lhes serão dados, em função
das necessidades que tais grupos identificarem.
Cabe ressaltar que essa relação não se restringe à ação local, uma
vez que, segundo dados do Tribunal de Contas do Estado do Rio de
Janeiro, o município de Duque de Caxias necessitaria implantar 721
ha de corredores ecológicos, o que corresponde a 1,5% da área total
do município. Isso reitera a necessidade de ter que adotar a paisagem
como o recorte mínimo para a tomada de decisão, entendendo-a como
uma paisagem concreta, em que se conjugam o sistema dito natural e
o cultural, integrando cada espaço como o Ecossistema Humano Total
– seres humanos integrados em seu ambiente total (Naveh, 2000).
Desse modo, podemos concluir que os “vazios” de Duque de Caxias
são espaços prenhes de história, ações, significados. Sendo assim, é fundamental que cada um desses espaços seja considerado tanto dentro
do seu contexto geobiofísico e da paisagem em que está inserido, como
também no contexto social que sobre ele atua.
funções ecológicas
Sociedade
Preservação / Conservação
espaços
vazios
disponibilidade
necessidade
Bibliografia
do recurso
Recurso Ambiental
amador , E.S. Baía de Guanabara e ecossistemas periféricos: Homem e Natureza.
Reproarte Gráfica e Editora Ltda. 539 p., 1997.
bressan , F. A.; oliveira , R. R.; silva , E. V. Contaminação por metais pesados
Visto dessa maneira, como recursos ambientais, passa a ser um conceito vinculado à cultura e, portanto, à sociedade. Sociedade com seus
valores associados, suas formas de organização específicas e, por isso,
com dinâmicas próprias, sujeita a variações ao longo do tempo. Segundo
Sachs (2000), “é recurso aquela parcela do meio que eu considero útil.
É recurso, hoje, o que não era recurso ontem. Não é mais recurso, hoje,
o que era recurso ontem. Será recurso amanhã o que não é um recurso
hoje.”
Portanto, diante de cada espaço vazio, cabe a pergunta: Vazio
de quê? O que está ausente neste espaço? Quais atributos existem
ou inexistem para que o adjetivemos dessa forma? Atribuir um novo
uso resulta em atribuir novos significados, que só serão respeitados
na medida em que forem também entendidos e apreendidos, afinal, a
paisagem e o sujeito são co-integrados em um conjunto unitário que se
autoproduz e autorreproduz. Paisagem-marca expressa uma civilização
e paisagem-matriz participa dos esquemas de percepção, da concepção
e de ação-cultura (Rosendahl; Corrêa, 2004).
108
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
no sedimento e em compartimentos bióticos de manguezais da Baía de
Guanabara. In: IV Simpósio de Ecossistemas Brasileiros, 1998, Águas
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Rogerio Ribeiro De Oliveira — Geografia
Graduado em Comunicacao Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Histórico, finalidades, objetivos e
princípios da Educação Ambiental
Janeiro (puc -Rio), em 1976. Fez mestrado e doutorado em Geografia na Universidade
Federal do Rio de Janeiro (ufrj ) em 1987 e 1999, respectivamente. Tem pós-doutorado em História Ambiental, concluído em 2007, pela Universidade de Klagenfurt
(Áustria). Atualmente é professor assistente do Departamento de Geografia da puc Rio e integrante do corpo docente dos programas de pós-graduação em Geografia
A palavra que melhor traduz o conceito de natureza que emerge é “vida”.
De acordo com o artigo 3 da Lei 6.938 de 1981, o meio ambiente “permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.
Em nome da vida, a questão ambiental adquire dimensão global,
seduzindo defensores alistados numa pluralidade de espaços sociais e
geográficos. As lutas em defesa do meio ambiente são variações em torno
do tema vida/morte. O sentido ambiental da tensão vida/morte desloca
a questão da sobrevivência de uma luta contra as forças naturais para
uma luta em defesa do meio ambiente. O conceito de meio ambiente, ao
definir as condições que permitem a vida, nos força a pensar a natureza
como mera possibilidade.
Outro aspecto promissor da luta em defesa do meio ambiente é
o combate ao utilitarismo pragmático de um projeto de dominação da
natureza que desconhece outros valores além da produção e do consumo de bens materiais. Isso não se restringe ao terreno das ideias:
são “ações” concretas que visam reorientar as atividades econômicas
no sentido de atenuar seus impactos ambientais. A questão ambiental
abre espaço para um deslocamento valorativo, em que parte da quantidade de crescimento econômico é substituída pela qualidade de vida.
da puc -Rio, de Ciências Ambientais e Florestais da ufrrj e de Ecologia da ufrj .
Entre seus artigos publicados, destaca-se Mata Atlântica, paleoterritórios e história ambiental (Ambiente & Sociedade). Sua produção bibliográfica inclui artigos em
diversos periódicos, livros e capítulos sobre História Ambiental e ecologia da Mata
Atlântica.
[email protected]
Rita De Cassia Martins Montezuma — Geografia
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(uerj ) em 1985. Mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(ufrj ), curso concluído em 1997, e doutora em Geografia pela mesma instituição
(2005). É professora assistente da puc -Rio, com atuação em ensino e pesquisa em
cursos de graduação e pós-graduação. Escreveu artigos em dois livros: Aspectos
estruturais da paisagem da Mata Atlântica em áreas alteradas por incêndios florestais e As comunidades vegetais das restingas de Macaé.
[email protected]
Sobre as relações homem-natureza
A crise nas relações homem-natureza deve ser buscada nos modelos de
conjunto de valores, que marcaram as diferentes concepções de natureza, sendo algumas hoje profundamente questionadas. Segundo o
filósofo Gómez-Heras (1997:20), a partir do Renascimento, dois tipos
distintos de interpretação da natureza surgiram: um ligado ao ideal galileano-cartesiano de ciência, com forte acento na quantificação e formalização matemática da natureza, e outro relacionado com a dimensão
qualitativa e valorativa da natureza.
A primeira acabou por se expandir ao longo da história, impondo
suas regras nas ciências modernas. Na relação com a natureza existe
110
natureza e sociedade no município de duque de caxias ...
111
uma outra racionalidade, que não pode ser mensurada e quantificada,
pois seus fundamentos são a qualidade e os valores. É a racionalidade
qualitativo-axiológica, ela mostra que nem todo o saber sobre a natureza
tem que ser quantificado e formalizado conforme a matemática.
É preciso reconhecer que as experiências estéticas da natureza
e a vivência de valores solidários, harmônicos e inspiradores da própria natureza viva fornecem também um quadro axiológico qualitativo
de extrema importância para a nova mentalidade ecológica do mundo
moderno. Vivemos atualmente mergulhados em duas concepções filosóficas da natureza. Uma sustentada pela racionalidade axiológica, que
corresponde a esta visão mais qualitativa da natureza, e outra sustentada pela racionalidade técnico-operacional, alimentada pela cosmovisão matematizante e quantitativa da natureza.
O desafio ético que encontramos consiste em buscar um ponto
de equilíbrio entre essas duas concepções, fazendo com que a atividade
humana se integre entre ambas, evitando a perda das dimensões subjetiva, teleológica e teológica da natureza e não permitindo a polarização excessiva da mentalidade objetiva e instrumental da natureza, pois
essa acaba esvaziando a relação do homem com o mundo circundante
e com o próprio sentido radical e absoluto da história, Deus. (Siqueira,
2002:13)
Certamente, qualidade de vida é um valor bem mais complexo do
que o de progresso material. Isso porque ela é multifacetada, incorporando as dimensões estética, espiritual e material: à quantidade gerada
pela atividade “produtiva” soma-se a qualidade que o meio ambiente
não degradado é capaz de proporcionar à vida. O planeta Terra abriga
30 milhões de espécies de vida vegetal e animal, das quais apenas 2
milhões são conhecidos e estudados. Existem atualmente 5.500 espécies
animais e 4 mil espécies vegetais seriamente ameaçadas de extinção,
sendo que 450 dessas espécies animais e vegetais são do Brasil.
A ecologia (do grego oikos, casa, lugar, estado) natural desenvolveu os princípios do equilíbrio dos ecossistemas, os quais estão fundados na interdependência dos seus diferentes elementos constitutivos.
Interferir em um elemento do ecossistema pode implicar a alteração de
todo o seu equilíbrio. Mudar o curso de um rio, desmatar uma encosta
ou eliminar alguns insetos são atitudes que podem ocasionar mudanças no solo, na fauna e no microclima. (Guatari, 1991:68)
Sobre a Educação Ambiental
A Educação Ambiental contribui na afirmação de valores e ações que
influenciarão a transformação social, gerando mudanças na qualidade de vida e maior consciência na conduta pessoal, comunitária e
populacional.
A Educação Ambiental deve gerar conhecimentos que sirvam a
toda a sociedade, possibilitando reverter este quadro. As transforma-
112
histório , finalidades , objetivos e princípios ...
ções na consciência, conduta pessoal, estilos de vida, harmonia entre os
seres humanos e destes com outras formas de vida, surgirão a partir da
realização de um trabalho que deve ser seriamente realizado em todas
as classes sociais, dos variados níveis intelectuais e faixas etárias.
Com as crescentes pressões humanas sobre os ambientes naturais, a Educação Ambiental tem se tornado cada vez mais importante
como meio de buscar apoio e participação dos diversos segmentos da
sociedade para a conservação e melhoria da qualidade de vida. A Educação Ambiental propicia o aumento de conhecimentos, mudanças de
valores e o aperfeiçoamento de habilidades, que são condições básicas
para que o ser humano assuma atitudes e comportamentos que estejam em harmonia com o meio ambiente.
A preocupação oficial com a necessidade de um trabalho educativo que procurasse sensibilizar as pessoas para as questões ambientais
surgiu em 1972, na Conferência sobre Meio Ambiente Humano, realizada pela onu , em Estocolmo. A conferência gerou a Declaração sobre
o Meio Ambiente Humano e teve como objetivo chamar a atenção dos
governos para a adoção de novas políticas ambientais, entre elas um
Programa de Educação Ambiental, visando a educar o cidadão para a
compreensão e o combate à crise ambiental no mundo.
A unesco promoveu, em Belgrado, em 1975, um Encontro Internacional sobre Educação Ambiental. O encontro culminou com a formulação de princípios e orientações para um programa internacional
de Educação Ambiental (ea ), segundo o qual esta deveria ser contínua,
interdisciplinar, integrada às diferenças regionais e voltada para os interesses nacionais.
Em 1977, ocorreu a Primeira Conferência sobre Educação Ambiental, em Tbilisi, Geórgia, considerada o mais importante evento para a
evolução da Educação Ambiental no mundo. A “Conferência de Tbilisi”
como ficou conhecida, contribuiu para precisar a natureza da Educação
Ambiental, definindo objetivos, características, recomendações e estratégias pertinentes ao plano nacional e internacional. Foi recomendado
que a prática da Educação Ambiental deve considerar todos os aspectos
que compõem a questão ambiental, ou seja, aspectos políticos, sociais,
econômicos, científicos, tecnológicos, éticos, culturais e ecológicos, dentro de uma visão inter e multidisciplinar.
Na Conferência de Tbilisi, a Educação Ambiental foi definida como
uma dimensão dada ao conteúdo e à prática da educação, orientada
para a resolução de problemas concretos do meio ambiente, através de
enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável
de cada indivíduo e da coletividade, como podemos ver no conceito ratificado na conferência:
Formar uma população mundial consciente e preocupada com o ambiente e com os problemas que lhe dizem respeito, uma população
que tenha conhecimentos, as competências, o estado de espírito, as
113
roosevelt fideles de souza
motivações e o sentido de participação e engajamento que lhe permitam trabalhar individualmente para resolver problemas atuais e
impedir que se repitam.
●● Aplicar um enfoque interdisciplinar, aproveitando o conteúdo específico de cada disciplina, de modo que adquira uma perspectiva
global.
unesco , 1971:10
Durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, a Jornada Internacional de Educação Ambiental, realizada no Fórum Global durante a Rio 92, reafirma o compromisso crítico da Educação Ambiental no Tratado de Educação Ambiental para as
Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global.
O tratado diz que a Educação Ambiental não é neutra, mas ideológica. É um ato político baseado em valores para a transformação
social. O tratado considera a Educação Ambiental para a sustentabilidade equitativa como “um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida”.
Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a transformação humana e social e para a preservação ecológica.
As definições são muitas, mas o importante a ressaltar é que a
Educação Ambiental se caracteriza por apresentar uma abordagem integradora e holística (a capacidade de ver a transversalidade de detectar os inter-retro-relacionamentos de tudo com tudo) das questões
ambientais.
Somente em 1981, passados 15 anos de Tbilisi, foi concebido o
primeiro documento oficial brasileiro sobre a Educação Ambiental, Projeto de Informações sobre Educação Ambiental.
Em 1988, a Constituição Federal definiu que a Educação Ambiental deve ser oferecida em todos os níveis, mas, na realidade, pouco se fez
para incorporá-la ao currículo escolar, numa visão interdisciplinar.
Em 1996, foram lançados pelo Ministério da Educação os “Parâmetros Curriculares”, os quais propõem que a Educação Ambiental seja
discutida no currículo.
Em abril de 1999, foi sancionada a Lei Federal de Educação
Ambiental, nº 9.795, que institui a Política Nacional de Educação
Ambiental no Brasil.
Essa lei diz que a Educação Ambiental deve ser um componente
essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente,
de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal. O Art.13, que trata da Educação
Ambiental Não Formal, ou seja, as ações e práticas educativas voltadas
para a sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais, com
a participação e parceria de escolas, universidades e empresas.
Finalmente, em 17 de dezembro de 1999, foi sancionada no Rio de
Janeiro a Lei Estadual de Educação Ambiental, 3.325, que dispõe sobre
a Educação Ambiental, institui a Política Estadual de Educação Ambiental, cria o Programa Estadual de Educação Ambiental e complementa a
Lei Federal 9.795/99 no âmbito do Estado do Rio de Janeiro.
114
histório , finalidades , objetivos e princípios ...
Princípios básicos da Educação Ambiental
●● Considerar o meio ambiente em sua totalidade, ou seja, em todos
os seus aspectos naturais e criados pelo homem (tecnológico e
social, econômico, político, histórico-cultural, moral e estético).
●● Examinar as principais questões ambientais, do ponto de vista
local, regional, nacional e internacional, de modo que os educandos se identifiquem com as condições ambientais de outras
regiões.
●● Insistir no valor e na necessidade da cooperação local, nacional e
internacional para prevenir e resolver problemas ambientais.
●● Ajudar a descobrir os sintomas e as causas reais dos problemas
ambientais.
Objetivos da Educação Ambiental
Consciência — Ajudar os grupos sociais e os indivíduos a adquirirem
consciência do meio ambiente global e sensibilizarem-se por essas
questões.
Conhecimento — Ajudar os grupos sociais e o indivíduo a adquirirem
diversidade de experiências e compreensão fundamental do meio
ambiente e dos problemas anexos.
Comportamento — Ajudar os grupos sociais e os indivíduos a comprometerem-se com uma série de valores e a sentirem interesse e
preocupação pelo meio ambiente, motivando-os de tal modo que
possam participar ativamente da melhoria e da proteção do meio
ambiente.
Habilidades — Ajudar os grupos sociais e os indivíduos a adquirirem
as habilidades necessárias para determinar e resolver os problemas ambientais.
Participação — Proporcionar aos grupos sociais e aos indivíduos a possibilidade de participar ativamente das tarefas que têm por objetivo resolver problemas ambientais.
Os impactos ambientais dos ciclos econômicos.
A expansão colonial é a primeira responsável pela degradação ambiental no Brasil. A natureza foi, ao mesmo tempo, meio e fim da exploração
115
roosevelt fideles de souza
colonial, constituindo-se como limite e potencialidade para a conquista
e a invenção do Brasil. O Brasil foi criado como espaço de exploração
ecológica e humana.
parte do governo federal. Novas exigências aos formatos das políticas
sociais e aos resultados esperados que, em última análise, atendam a
uma concepção integrada de Desenvolvimento Social, abarcando o conjunto das necessidades sociais e ambientais nos termos do Desenvolvimento Humano Sustentável.
A dinâmica desse desenvolvimento deve combinar políticas econômicas orientadas para o crescimento sustentado e políticas sociais e
educacionais eficazes com capacidade de geração de emprego e renda,
de modo a preservar as bases de integração social. A emergência da
formulação de políticas sociais ambientais para as todas as áreas e,
em especial, as áreas urbanas, percebendo o aumento do interesse das
cidades em relação ao desenvolvimento sustentável, entendendo este
como o único caminho para se enfrentar as questões ambientais em
nosso país.
De forma mais genérica, não é mais possível pensar a Educação
Ambiental em dimensões isoladas (só pesquisa ou só ensino, só processo formal ou só informal). É imprescindível acoplar essas dimensões,
entendendo a educação como um todo dinâmico e diverso.
De uma forma geral, a pobreza e o analfabetismo aparecem como
fatores de degradação ambiental. Mas nada impede que uma cidade
seja ecologicamente saudável e, ao mesmo tempo, socialmente injusta.
Portanto, o ponto central do debate, hoje, desloca-se para as questões
de justiça social, educação ambiental e cidadania.
E que este artigo venha a contribuir para promoção de novos debates em que a Educação Ambiental acentue a necessidade de criação de
um novo estilo de desenvolvimento, que inclua crescimento econômico,
equidade social e conservação dos recursos naturais, capaz de propiciar
relações mais humanas, fraternas e justas entre os seres humanos. Que
inspiradas por uma ética ambiental que ofereça princípios norteadores
de posturas e condutas das ações transformadoras e educativas desta
relação entre Deus, natureza e sociedade, alcancem níveis cada vez mais
crescentes de qualidade de vida para as futuras gerações.
Os ciclos
1 Ciclo Econômico — Exploração do Pau-Brasil (exploração de uma
única espécie e não destruía toda a cobertura vegetal para se
implantar).
2 Ciclo da Cana-de-Açúcar — Em São Paulo (São Vicente) e em
Pernambuco, sob o comando de Duarte Coelho. Destruição da
Mata Atlântica, além da queima da floresta para abastecer as
caldeiras.
3 Ciclo do Gado — Ampliou a colonização do Brasil, penetrando inicialmente pelo Rio São Francisco e depois se espalhando pelo país
todo.
4 Ciclo do Ouro — No final do Séc. xvii e no Séc. xviii , a economia
colonial brasileira esteve centrada na extração deste metal, nas
minas descobertas pelos bandeirantes paulistas nos sertões de
Minas Gerais.
5 Ciclo do Café — No final do Séc. xix , o café foi plantado inicialmente na Amazônia, mas se adaptou melhor no Sudeste. Usou-se
a mesma lógica predatória de eliminar florestas para se fazer a
lavoura e, assim que a terra dava sinais de esgotamento, mais
mata era derrubada. A contribuição que o Ciclo do Café deu ao
país foi que, a partir de sua riqueza, se processou o acúmulo de
capitais necessário para o próximo ciclo: a industrialização.
6 Ciclo da Industrialização — Aberturas de novas estradas e consumo cada vez maior dos recursos da natureza e início dos processos de poluição.
Considerações finais
Percebemos que, na maioria de nossos problemas ambientais, suas
questões fundamentais estão ligadas a fatores políticos, questões socioeconômicas e a fatores culturais, e essa problemática não tem como
ser resolvida apenas através da novas tecnologias. Ao abordar tais problemas sob o aspecto apenas ecológico, que é uma confusão que ainda
permeia muitos estudos brasileiros, verifico um profundo desconhecimento e uma visão simplista da realidade que nos cerca e que precisamos, com urgência, modificar.
É necessário que, no Brasil, as questões sociais em relação ao
meio ambiente tenham prioridade educacional, política e econômica por
116
histório , finalidades , objetivos e princípios ...
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futuro comum. rj : fgv , 1987.
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ministério do meio ambiente . Educação Ambiental, curso básico à distância,
Valéria Pereira Bastos
contido em seis livros: (1) – Questões ambientais, conceitos, história,
problemas e alternativas.(2-3) – Educação e Educação Ambiental I e II. (4) –
Gestão de recursos hídricos em bacias hidrográficas sob a ótica da educação
No mundo da globalização, o espaço geográfico ganha novos contornos, novas características, novas definições. E, também, uma nova
importância, porque a eficácia das ações está estreitamente relacionada com a sua localização. Os atores mais poderosos se reservam
os melhores pedaços do território e deixam o resto para os outros.
ambiental. (5) – Documentos e legislação da educação ambiental. (6) – Guia do
aluno e caderno de atividades. Ed. Fubras, Brasília, 2001.
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Araraquara, JM Editora, 1999.
Prof. Msc. Roosevelt Fideles de Souza
Bacharel e licenciando em História e em Geografia e Meio Ambiente pela puc Rio (1990). Mestre em Serviço Social pela puc -Rio (2003). Professor estatutário do estado do Rio de Janeiro (1998), coordenador de Projetos Ambientais do
Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente da puc -Rio (nima ) e do projeto Jornadas
Ecológicas na Vila Olímpica Clara Nunes (coordenado pelo Departamento de Serviço
Social da puc -Rio), dá aulas de Caminhadas Ecológicas no setor de Educação Física
da puc -Rio.
[email protected]
118
histório , finalidades , objetivos e princípios ...
milton santos , 2007
O bairro Jardim Gramacho: o espaço geográfico
Para compreender a história do “território do lixo”, consideramos importante apresentar inicialmente o município de Duque de Caxias, circunscrição administrativa que abriga o bairro Jardim Gramacho.
Inúmeras são as obras que descrevem o contexto geográfico do
município, mas selecionamos dois textos que consideramos apontar os
elementos fundamentais para nossa análise. Então, nos baseamos na
dissertação de mestrado de Luiz Cláudio Moreira e no documento produzido pelo ibase em 2005 denominado Diagnóstico social do bairro de
Jardim Gramacho.
Neste sentido, encontramos a informação de que o município de
Duque de Caxias foi criado através do Decreto Estadual 1.055 de 31 de
dezembro de 1943, tendo completado em dezembro de 2008 65 anos
de existência. Antes de sua emancipação, a localidade pertencia ao 8º
Distrito de Nova Iguaçu (ibase , 2005, p.5).
O município de Duque de Caxias encontra-se dividido por quatro
distritos e 40 bairros oficiais e eles estão distribuídos da seguinte forma:
no primeiro Distrito, que é o de Duque de Caxias, localizam-se os bairros Jardim 25 de Agosto, Parque Duque, Periquitos, Vila São Luiz, Gramacho, Sarapuy, Centenário, Centro, Dr. Laureano, Bar dos Cavaleiros, Olavo Bilac e Jardim Gramacho. Já no segundo, Campos Elíseos,
encontram-se os bairros Jardim Primavera, Saracuruna, Vila São José,
Parque Fluminense, Campos Elíseos, Cangulo, Cidade dos Meninos,
Figueira, Chácaras Rio-Petrópolis, Chácara Arcampo e Eldorado. No terceiro distrito, que é o de Imbariê, estão os bairros Santa Lúcia, Santa
Cruza da Serra, Imbariê, Parada Angélica, Jardim Anhangá, Santa Cruz,
Parada Morabi, Taquara, Parque Paulista, Parque Eqüitativa, Alto da
119
Serra, Santo Antônio da Serra. Por fim, no quarto distrito, Xerém, localizam-se os bairros de Xerém, Parque Capivari, Mantiqueira, Jardim
Olimpo, Lamarão e Amapá.
Por meio do estudo elaborado pelo Tribunal de Contas do Estado
do Rio de Janeiro, que Moreira cita em sua dissertação, Duque de Caxias
está localizado na Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro
que também abriga os municípios do Rio de Janeiro, de Belford Roxo,
Guapimirim, Itaboraí, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Niterói, Nova
Iguaçu, Paracambi, Queimados, São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica e Tanguá (Moreira, 2007, p. 24).
Em relação à extensão geográfica, o município de Duque de Caxias
totaliza a área de 468, 3 Km², o que representa 10% de área ocupada
da Região Metropolitana.
Quanto ao sistema viário e ferroviário de Duque de Caxias, informamos que está integrado à cidade do Rio de Janeiro, dada a proximidade. Ainda em termos de sistema viário, no mês de março de 2008,
começaram as obras do Arco Rodoviário que intenciona ligar o Porto de
Sepetiba, em Itaguaí, até Itaboraí, passando por Seropédica. Para tanto
será construído um trecho entre Queimados, Nova Iguaçu e Duque de
Caxias.
Registra-se no ibge que, em 2007, a contagem populacional do
município de Duque de Caxias alcançou o quantitativo de 842.686
munícipes em uma área territorial de 465 Km².
O Índice de Desenvolvimento Humano (idh ) do município em
2000, segundo o ipea ,, é de 0,753, ocupando assim a 52ª posição no
Estado do Rio de Janeiro. Isso porque a base para cálculo desse índice
prende-se ao valor de quanto mais próximo de um for o idh , maior o
nível de desenvolvimento humano apurado.
Quanto à taxa média geométrica de crescimento, no espaço de
tempo compreendido entre os anos de 1991 e 2000, foi de cerca de 1,7%
ao ano, contra cerca de 1,2% na região e de 1,3% no estado. Em relação
ao processo de urbanização, registra-se o percentual correspondente a
99,6% da população, enquanto que na Região Metropolitana a referida
taxa é de 99,5%.
No tocante aos domicílios, o município de Duque de Caxias tem
um total de 256.422 habitações, com uma taxa de ocupação de 86%.
No entanto, registra-se que 11% delas são de uso ocasional.
Em relação à raça e religião dos munícipes, registra-se que, por
meio da declaração das pessoas, há um predomínio de afro-descendentes, o que representa 57,7% da população, contra 41% daqueles que
se declaram brancos. Na religião, há uma incidência de católicos, chegando ao percentual de 46%, o que é superior à soma das outras religiões declaradas.
Quanto à estrutura de serviços, o município de Duque de Caxias
possui sete agências dos correios e telégrafos, 30 agências bancárias e
120
jardim gramacho e o território do lixo
23 estabelecimentos da rede hoteleira.
No tocante à questão de acesso ao mundo cultural, o Município
conta com cinco cinemas, três teatros, um museu e duas bibliotecas.
Segundo o Ministério das Cidades, o município de Duque de
Caxias apresenta o seguinte panorama, no que se refere aos indicadores urbanos:
●● Quanto ao abastecimento de água, o município tem 69% dos domicílios com acesso à rede de distribuição, 27,9% com acesso a água
através de poço ou nascente e 2,7% têm outra forma de acesso. O
total distribuído alcança 90.000m³ por dia, dos quais 74% passam
por tratamento convencional e o restante por simples cloração.
●● No tocante à rede coletora de esgoto sanitário, somente 57,1%
dos domicílios têm este serviço, pois 20,9% têm fossa séptica,
4.3% utilizam fossa rudimentar, 13,2% estão ligados a uma vala
e 3,5% são lançados diretamente em um corpo receptor (rio, lagoa
e mar).
●● Em relação à coleta regular de lixo, registra-se que 88,9% dos
domicílios usufruem do serviço, pois 3,6% têm o lixo jogado em
terrenos baldios ou em logradouros públicos e 6.8% colocam fogo.
Isso porque a produção de resíduos diários no município chega à
soma de 730 toneladas/dia.
No que tange às atividades econômicas do município, Duque de Caxias,
representa o sexto maior Produto Interno Bruto (pib ) do país e o segundo
em arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadoria (icms ). Isso
porque concentra suas atividades nas indústrias e no comércio, além de
abrigar uma das maiores refinarias de petróleo do Brasil, a Refinaria de
Duque de Caxias (reduc ), além do pólo gás-químico, inaugurado em
abril de 2005, que pretende gerar, em um período de cinco anos, de 30 a
50 mil postos diretos e indiretos de trabalho na Baixada Fluminense.
Já em relação ao bairro de Jardim Gramacho, integrante do 1º
Distrito de Duque de Caxias, enfocamos que se encontra dividido por
localidades que não podem ser conceituadas como sub-bairros, em
razão de não serem oficializadas pela prefeitura, mas estão divididas
segundo documento Diagnóstico Social do ibase da seguinte forma:
cohab (conjunto habitacional – 1ª área loteada de Jardim Gramacho),
Morro do Cruzeiro, Triângulo e Morro da Placa, locais que já possuem
infraestrutura urbana adequada à necessidade local. Por outro lado, o
bairro tem ocupações recentes caracterizadas por bolsões de miséria,
sem infraestrutura. Nesse contexto, localizam-se a Chatuba, a Favela
do Esqueleto, o Beco do Saci, a Cidade de Deus, a Avenida Rui Barbosa,
o Parque Planetário e a comunidade da Paz ou Maruim, como é conhecida, onde as casas são construídas em cima do manguezal.
Quanto à questão populacional, Jardim Gramacho tem aproxima-
121
valéria pereira bastos
damente 40.000 habitantes, sendo que cerca de 50% dependem direta
ou indiretamente da atividade econômica advinda da catação de lixo
(ibase , 2005, p. 10).
Em relação à presença de equipamentos sociais voltados para a
educação formal no âmbito do Governo do Estado, o bairro tem a Escola
Estadual Lara Vilela, de ensino fundamental o ciep 218 – Ministro Hermes de Lima, de ensino médio e fundamental, além de possuir uma
turma de aceleração de jovens, projeto educacional que procura atender
àqueles que não completaram o ensino em idade compatível. Também
funciona um núcleo do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(peti ). Finalizando, há o Colégio Estadual Álvaro Negro Monte, de 5ª a
8ª série e ensino médio.
Quanto às escolas municipais, informamos que no bairro registra-se a instalação da Escola Municipal Jardim Gramacho e da Escola
Municipal Mauro de Castro, que também tem em seu anexo uma creche. No contexto comunitário, contabiliza-se a Creche Comunitária e a
Escola Comunitária Jardim Gramacho, que é apoiada pela Igreja Católica e pelo Portal do Crescimento. E as escolas particulares estão presentes com o maior quantitativo, chegando ao número estimado de 15
unidades. As de maior destaque são: Colégio Deco, Colégio abc da Alegria, Casinha Feliz e Colégio da Penha.
Já no tocante aos equipamentos de saúde no bairro de Jardim
Gramacho, existem sete postos do Programa de Saúde da Família, o
Posto Municipal de Saúde Edina Siqueira Sales e um posto de saúde
apoiado por políticos do local. Mas, no entanto, há registros de que 15%
do contingente de crianças residentes estão em risco nutricional, sendo
12% com desnutrição grave (ibase , 2005, p. 22).
Quanto à presença e/ou ausência de serviços públicos, bem como
a qualidade desses, encontramos registrado no Diagnóstico Social do
Bairro de Jardim Gramacho a seguinte questão:
Com relação aos Serviços públicos, em Jardim Gramacho destacam-se os serviços de saúde. As entrevistas realizadas ressaltam
o esforço do Secretário de Saúde Oscar Berro na implementação e
ampliação do psf visando atender a toda a população do bairro. A
atuação do Posto de Saúde (da prefeitura) também é reconhecida,
embora também vivencie momentos de escassez, funciona com a
boa vontade e compromisso de seus profissionais.
No que diz respeito às escolas, os entrevistados reclamam do estado
de conservação de algumas, da qualidade do ensino e do número
de vagas oferecidas que está aquém da demanda local. No entanto,
é importante ressaltar que não tivemos acesso, neste pré-diagnóstico, ao número de crianças em idade escolar residentes em Jardim
Gramacho. Segundo as entrevistas realizadas, os vereadores eleitos
com o apoio dos moradores locais possuem significativa força políti-
122
jardim gramacho e o território do lixo
ca na identificação e implementação de ações de desenvolvimento
e melhoria do bairro.
ibase , 2005, p. 17
No tocante ao processo organizacional em defesa do bairro e dos moradores em Jardim Gramacho, somente foi identificada a existência de
uma associação de moradores legitimada, que é a do Parque Planetário,
pois tem representantes eleitos e é inscrita na Federação das Associações de Moradores de Caxias (mub ). No entanto, segundo o Diagnóstico
Social de Jardim Gramacho, a associação não realiza ações em conjunto
com a federação e apenas recorre a ela no período da eleição da diretoria da associação atual, tendo em vista a necessidade de legitimação do
processo (ibase , 2005, p. 24).
Registramos que, embora não existam outras associações de moradores no bairro de Jardim Gramacho, após a realização do Diagnóstico
Social elaborado pelo ibase , foi legitimada, em abril de 2006, a instalação de um Fórum Comunitário, composto por 26 instituições locais
que têm quatro grupos de trabalho focados em educação, saúde, convivência comunitária e trabalho e renda – onde o serviço social do aterro
se faz representar. Esse Fórum é apoiado pelo ibase em parcerias com
Furnas Centrais Elétricas através do Comitê de Entidades no Combate
à Fome e pela Vida (coep ), e escolheu o bairro com a finalidade de
promover o desenvolvimento local sustentável. Após vários encontros
visando traçar as metas em busca do desenvolvimento, foi inaugurada
uma sede própria que está aberta aos moradores para encontros e para
diversas reuniões, precisamente no dia 20 de dezembro de 2007. Atualmente, ocorre, na última segunda-feira de cada mês, uma reunião com
as instituições que constituem o Fórum para refletir acerca dos avanços e retrocessos das ações comunitárias.
O Fórum Comunitário do Jardim Gramacho vem se desenvolvendo
e, com o apoio do ibase , apresentou na vi Expo Brasil Desenvolvimento
Local, realizada em Salvador, em 2007, as seguintes questões ligadas
à perspectiva de trabalho e renda para os catadores que, em sua maioria, são moradores do bairro:
O Fórum reivindica hoje a consolidação de um sistema de coleta
seletiva com núcleos descentralizados no município de Duque de
Caxias. Cada distrito terá um grupo de catadores realizando a coleta, responsável por levar o material reciclável para o Pólo de beneficiamento e Comercialização de Recicláveis, já em operação. “É
um sub-bairro com uma infinidade de bares e pensões. Esses bares
vendem fundamentalmente para catadores. O fechamento do aterro
afetará muitos moradores, que se deram conta do problema e da
oportunidade de lutarem juntos” diz a assistente social do Ibase,
Rita Brandão.
Expo Brasil Desenvolvimento local, 2007, p. 1
123
valéria pereira bastos
Através desse pequeno desenho do bairro Jardim Gramacho, podemos
enfatizar que ele expressa o que vem sendo apresentando no cenário
de milhares de bairros brasileiros, ou seja, é mais um local periférico
que revela uma grande desigualdade social atrelada a outros tipos de
desigualdade, como a ambiental, por abrigar um dos maiores aterros
de lixo da América Latina, o que coloca em debate os riscos ambientais
aos quais a população residente e trabalhadora está exposta.
Esse processo apresenta também uma contradição, visto que neste
mundo de consumo, global, líquido-moderno etc, a produção de lixo é
crescente. Caso não exista espaço para sua destinação final e, também, a mão-de-obra de catação para minimizar os impactos, provavelmente seremos engolidos por uma avalanche de resíduos orgânicos e
inorgânicos (lixo) que produz uma imensa poluição ambiental, quiçá
planetária.
Nossa afirmativa encontra sustentação quando a comparamos
com algumas considerações expressas no Diagnóstico Social do ibase ,
quando efetuam comentários a respeito do bairro e da população dele
residente:
Na medida em que a população moradora está não só, exposta aos
riscos ambientais por viver nas proximidades de um aterro controlado, mais conhecido como “lixão” – exposta à contração de doenças,
à poeira, sujeira, entre outros – mas também encontra sua fonte de
sobrevivência na atividade de catação, se evidencia a crise social
de desemprego e de injustiças (social e ambiental). Estas pessoas são trabalhadoras e em sua maioria, anônimas e destituídas
de qualquer direito – muitas não são registradas e não têm nem a
certidão de nascimento, vivem em situação de total abandono, em
condições precárias de infra-estrutura. Poderia se dizer que são os
“não cidadãos (ãs)”. Paradoxalmente esta população vem dando
uma grande contribuição para o circuito da reciclagem de materiais
(coleta seletiva), para limpeza pública e ainda para a proteção de
recursos naturais.
ibase , 2005, p. 30 [Grifo nosso]
Por fim, sinalizamos que o bairro de Jardim Gramacho é permeado por
todo o trajeto da rota do lixo e que, por mais que se tente desvinculá-lo
da atividade de catação, torna-se quase impossível, pois praticamente
todo o bairro tem sua vida ativa economicamente em função da catação.
Nossa reflexão ganha sustentação a partir da seguinte análise:
Em 1978, quando a comunidade do distrito de Jardim Gramacho
(Duque de Caxias – RJ) testemunhou a inauguração do que viria a
ser o maior aterro sanitário da América Latina, houve preocupação
e revolta. Quase 30 anos depois, o que preocupa agora é o rebatimento que a desativação do aterro, programada para este ano,
terá sobre a vida de uma comunidade que aprendeu a conviver
124
jardim gramacho e o território do lixo
e viver das mais de dez toneladas de lixo despejadas a cada dia
em Duque de Caxias. Contando com a desativação, representantes
de 26 instituições locais, entre associações de catadores, igrejas,
Ongs e grupos comunitários resolveram se unir e fundar o Fórum
Comunitário de Jardim Gramacho…
Expo Brasil Desenvolvimento local, 2007, p. 1
Jardim Gramacho: o lugar da catação
Nossa atenção, neste momento, será dedicada ao lugar que foi, é e será,
ainda por algum tempo, produzido pela atividade de catação de lixo que
se processa no interior do Aterro Metropolitano de Gramacho e no seu
entorno.
Portanto, estamos conceituando de “território do lixo” todo o
espaço do Aterro Metropolitano de Gramacho e toda a rota que o lixo
percorre no bairro até chegar ao destino final, por entendermos que a
efervescência gira em torno da atividade mercantil gerada pelo negócio
do lixo, uma vez que consideramos o que Milton Santos afirma acerca
do território, do dinheiro e de sua fragmentação:
O território como um todo é objeto da ação de várias empresas, cada
qual, conforme já vimos, preocupadas com suas próprias metas e
arrastando, a partir dessas metas, o comportamento do resto das
empresas e instituições. Que resta então da nação diante dessa
nova realidade? Como a nação se exerce diante da verdadeira fragmentação do território, função das formas contemporâneas de ação
das empresas hegemônicas?
Milton Santos, 2007, p.86
Complementando sua reflexão a respeito do território e dessas implicações, Milton Santos enfoca que é dentro de um mesmo país que são
criadas diferentes formas e ritmos de evolução, governadas pelas metas
e pelos destinos específicos de cada empresa hegemônica, que arrastam com sua presença outros atores, mediante a aceitação ou mesmo
a elaboração de discursos “nacionais-regionais” alienígenas ou alienados (Milton Santos, 2007, p. 87).
Esse sentido dado por Santos ao mundo mercantil de negócios é
o mesmo sentido que damos ao território do lixo, por ser um local que
recebe 8 mil toneladas/dia de lixo, cujo trajeto é realizado pelos veículos
de grande porte (carretas e caminhões compactadores) que transportam
o lixo das vias principais do bairro/município para o Aterro.
A primeira passagem se dá pela Usina de Transferência no bairro
do Caju, zona portuária do Rio de Janeiro, onde os caminhões compactadores que circulam pelas residências despejam o lixo em um recipiente
com maior capacidade em volume cúbico. Por intermédio desses equipamentos mecânicos, realizam a transferência para carretas com capacidade de 27 toneladas de lixo, perfazendo, assim, um percurso de 27
125
valéria pereira bastos
km até chegar ao aterro, totalizando, a cada dia, 44 viagens oriundas
somente do Caju. Além da supracitada Usina de Transferência, existem
mais dois trajetos: Jacarepaguá, que dista do aterro 37 km, sendo realizadas 12 viagens com as carretas por dia, e Irajá, com 17 km de distância do aterro e seis viagens diárias.
Quanto aos outros trajetos, que envolvem os municípios de Duque
de Caxias, Nilópolis, Queimados, Mesquita e Belford Roxo, a rota é bem
menor, assim como o volume de resíduos. Nesse caso, os próprios caminhões que realizam a coleta domiciliar levam para o vazamento os materiais recolhidos nas residências, empresas etc.
Na via principal de acesso ao aterro, chegam a transitar dia e
noite cerca de 600 veículos de grande porte e, quanto mais se diminuir o fluxo, menor investimento será necessário para a manutenção
e o recapeamento do asfalto, que é de responsabilidade da empresa
operadora.
Esses trajetos e o volume de lixo transportado se revelam como
uma grande mina de ouro, pois conforme já mencionamos anteriormente, o valor do produto potencialmente reciclável cresceu no período industrial (Velloso 2004), e vem crescendo no mundo contemporâneo. Dessa forma, há um forte interesse das empresas em comercializar
o material com o catador, que normalmente fica com a menor parte,
enquanto aqueles que já detêm o domínio do capital, produzem riquezas, fragmentações, discurso alienante e, com certeza, também o domínio do material.
A título de registro, informamos que a Companhia Municipal de
Limpeza Urbana do Rio de Janeiro – comlurb realizou, em junho de
2006, um estudo que proporcionou apurar, em um período de 30 dias,
qual foi a quantidade retirada dos materiais separados pelos catadores. Foi descoberto que, diariamente, o contingente de catadores separa
cerca de 200 toneladas de material potencialmente reciclável, isto é,
material que ele já separou da matéria orgânica e dos outros inservíveis, tais como papel higiênico e absorventes, entre outros sem valor no
mercado, vendendo-os para ferros velhos instalados na via de acesso
ao aterro.
Somado a esse fator, faz-se necessário elucidar que, para o território efetivamente ganhar vida, circulam diariamente cerca de 1.200
catadores que desenvolvem atividade de catação dentro do aterro, mais
os caminhões dos 42 depósitos que têm autorização para transitar no
local com a finalidade de proceder à compra e à retirada do material
separado pelo catador.
Mas o que vai demarcar o espaço como território, é a forma perversa existente quanto ao estabelecimento da relação de trabalho entre
os catadores e os donos de depósito. Pesquisa realizada por Lúcia Pinto
(2004), no território de Jardim Gramacho, deixou evidente que, dos trabalhadores fixos ligados a eles, a grande maioria entrevistada confirmou
126
jardim gramacho e o território do lixo
não ter carteira assinada.
Lucia Pinto justifica essa desresponsabilização dos empresários
com os catadores enfocando que o poder de barganha dos depósitos,
independentemente do seu porte, é expresso pelo estabelecimento do
preço do produto coletado, pela oferta de trabalho e pela possibilidade
de empregar pessoas sem documentação, egressos ou fugidos do sistema penitenciário, e pela forma de pagamento imediata (Pinto, 2004,
p. 12).
O cenário descrito por Pinto nos permite, mais uma vez, ratificar
que o território de Jardim Gramacho carrega todo o estigma do rejeito e/
ou refugo humano, tendo em vista que até mesmo os depósitos não têm
uma organização quanto aos equipamentos e em relação ao espaço físico
também, visto que misturam materiais recicláveis com rejeito do lixo.
Assim, os depósitos classificados como precários têm toda a atividade realizada a céu aberto, em péssimas condições de higiene e trabalho e, segundo diagnóstico realizado por Lucia Pinto (2004), “funcionam em alguns casos próximos ao mangue e em associação com locais
de distribuição de drogas”, e ainda poluem o ambiente com a queima
de fios de cobre e pneus.
Outro ponto de grande efervescência no cenário do território de
Jardim Gramacho é a perversa forma de catação efetuada pelos catadores de lixo que, por meio do garimpo de saco em saco, separam o
material para ser comercializado. Embora seja responsável pela sobrevivência desses trabalhadores, a forma visualmente é estigmatizante e
depreciativa.
Analisamos a questão acima à luz da fala de Dirce Koga a respeito da classe excluída, que, segundo a autora, deverá ter a resistência
dobrada em função da necessidade cotidiana da luta pela sobrevivência
física aliada à sobrevivência moral, “pelo fato de serem naturalmente
suspeitas no meio de uma sociedade altamente segregadora” (Koga,
2001, p. 45).
Inúmeras são as questões a serem levantadas pelo território de
Jardim Gramacho. Listamos algumas por considerarmos fundamentais
para entendermos a real situação dos catadores de lixo que são, a todo
o momento, furtados da sua condição de cidadão trabalhador, primeiro
pelo fato de a categoria não ser reconhecida oficialmente, e depois por
diversas perversidades advindas do mundo global e líquido apontados
por Bauman:
A “população excedente” é mais uma variedade de refugo humano. Ao contrário dos homini sacri, das “vidas indignas de serem
vividas”!, das vítimas dos projetos de construção da ordem, seus
membros não são “alvos legítimos” excluídos da proteção da lei
por ordem do soberano. São, em vez disso “baixas colaterais”, não
intencionais e não planejadas, do progresso econômico. No curso
do progresso econômico (a principal linha de montagem/desmon-
127
valéria pereira bastos
tagem da modernização), as formas existentes de “ganhar a vida”
são sucessivamente desmanteladas e partidas em componentes
destinados a serem remontados (“reciclados”) em novas formas.
Nesse processo, alguns componentes são danificados a tal ponto
que não podem ser consertados, enquanto, dos que sobrevivem à
fase de desmonte, somente uma quantidade reduzida é necessária para compor os novos mecanismos de trabalho, em geral mais
dinâmicos e menos robustos.
Bauman, 2004, p. 53
Pensando a partir dessa reflexão, podemos considerar o catador de lixo
como população excedente do processo, pois já sinalizamos anteriormente que ele é o menos beneficiado. Assim percebemos que, no jogo de
poderes, os que sobrevivem acabam por se tornar algozes do seu próprio companheiro, pois o nível de mobilidade apresentado por eles é de
se transformar em comprador, ou seja, passar a deter poder do capital.
Com isso, desconhecem sua origem, ou, quando isso não acontece de
imediato, passam a fazer desvio da rota do material que deveria ir para o
aterro, deixando chegar somente aquilo que não tem valor comercial.
No entanto, dentro da lógica capitalista, a venda realizada pelos
catadores no aterro ocorre de forma a desvalorizar o produto que os
depósitos estabelecidos no entorno compram e transportam em seus
caminhões, furtando daqueles que dão a partida no processo a possibilidade de negociar diretamente com as indústrias e se inserirem como
apontam Cortizo e Oliveira (2004).
como integrantes da “articulação do binômio capital-trabalho, na
apropriação coletiva dos meios de produção e dos resultados da
produção, na prática da autogestão, na apreensão de todo o processo produtivo pelos todos os trabalhadores, na valorização de cada
pessoa, na construção do coletivo, no compromisso com os outros
trabalhadores, com as questões sociais e com a sustentabilidade
ambiental”
Cortizo e Oliveira, 2004, p. 87
Em face desse cenário de desigualdade posto no cotidiano da atividade
de catação, na qual estão presentes os processos exclusão/inclusão,
precarização do trabalho, ausência do exercício de cidadania, desemprego estrutural, desqualificação social e informalidade, entre outras
questões, acreditamos ser de fundamental importância dialogar com
alguns autores para entender melhor essa trama.
Por outro lado, faz-se necessário compreender também como se dá
o processo de desvio existente no trajeto até o aterro metropolitano, uma
vez que a rota do lixo é demarcada por um território construído a partir
de desigualdades de acesso e de vantagens, pois por cada gota de chorume (líquido oriundo do efeito químico produzido pelo lixo orgânico), ou
cada saco de coleta domiciliar deixado no caminho, é possível usufruir
128
jardim gramacho e o território do lixo
de um benefício, transformando, assim, em moeda corrente todo e qualquer resquício advindo dessa atividade. Furta-se, mais uma vez, da mão
do catador o material mais valorizado, pois muito embora o montante
do que é recebido (8 mil toneladas/dia) seja significativo, o que é considerado nobre fica pelo caminho, na mão daqueles que detêm o domínio
e/ou poder de negociação, que, como já vimos, não é o catador.
Para melhor entender este processo, procuramos buscar sustentação teórica em Koga (2001), que realizou um estudo a respeito de território que nos permitiu compreender melhor as tramas existentes nesses espaços, que não se constituem apenas como área geográfica e/ou
de concentração de um povo, mas podem ser consideradas como
(…) um dos elementos potenciais para uma nova perspectiva redistributiva possível para orientar as políticas públicas. A redistribuição
viabilizada pelo acesso às condições de vida instaladas no território
onde se vive soma-se aos demais processos redistributivos salariais, fiscais ou tributários, fundiários e das garantias sociais, como
a própria reforma fundiária, a reforma fiscal. Parto do pressuposto
de que as políticas públicas ao se restringirem ao estabelecimento
prévio de públicos-alvos ou demandas genéricas apresentam fortes
limitações, no que se refere a conseguirem abarcar as desigualdades concretas existentes nos diversos territórios que compõem uma
cidade, e assim permitir maior efetividade, democratização e conquista de cidadania.
Koga, 2003, p.33
Na busca de aprofundarmos o entendimento a respeito do que estamos
problematizando, e, ainda, objetivando apreender como alguns dos atores envolvidos percebem a rota do lixo dentro do território de Jardim
Gramacho, entre os meses de maio e junho realizamos cinco entrevistas com alguns catadores e com dois donos de depósitos, com a finalidade de melhor compreendermos essa trama de relações existentes e o
olhar tanto de uns quanto de outros a respeito da cadeia produtiva de
reciclagem e o papel deles nesse processo perverso.
Estruturamos as entrevistas com o objetivo de saber o que os catadores tinham em mente a respeito do seu papel na cadeia industrial
de reciclagem, além de identificar como eles se sentiam na atividade de
catação e como percebiam a sua função em relação ao meio ambiente.
Por fim, procuramos saber o que conheciam a respeito do trajeto dos
caminhões e suas histórias dentro do território, o que denominamos de
“a rota do lixo de Jardim Gramacho”.
Em relação aos donos de depósitos, utilizamos as mesmas perguntas feitas para os catadores, tendo somente modificado a questão relativa ao trabalho que eles realizavam no aterro junto aos catadores.
No que diz respeito às respostas, os cinco catadores reconheceram
que são importantes na cadeia industrial de reciclagem, mas são sabe-
129
valéria pereira bastos
dores que o trabalho que desenvolvem é desvalorizado, principalmente
pelos donos de depósitos, mas intencionam trabalhar para romper este
domínio. Como exemplo, apresentamos duas falas das catadoras:
Acho que o catador é um agente ambiental, mas não é valorizado,
não é mesmo, mas por causa das indústrias, porque se agente tiver
a possibilidade de estar nas grandes negociações, eliminaria o atravessador, mas isto é muito difícil.
Entrevista realizada na coopergramacho em 03/06/2005, cooperada
Audinéa da Silva
Acho que o catador é importante, mas seu papel não é tão reconhecido porque se conseguíssemos vender para indústria seria melhor,
mas aí o que se tinha que fazer é juntar o material em um núcleo e
com isto agregar mais valor e com isto melhorar o trabalho.
Entrevista realizada com a catadora Maria Sandra da Silva em
03/06/2005
Quanto à importância do seu papel como agentes ambientais, todos se
identificaram com a classificação formal junto ao Ministério do Trabalho, mas não souberam detalhar como poderiam tornar isso de conhecimento público e ter esse papel reconhecido de fato pela sociedade.
Podemos ilustrar essa posição com a fala de um dos entrevistados:
Eu me considero sim, agente ambiental, porque estou reciclando e
evitando menos resíduos lá em cima no vazamento.
Entrevista com a catadora Tânia em 26/05/2005
Eu me considero catador de material reciclável e um agente ambiental, assim porque agente contribui com o meio ambiente, porque
aquele material que seria despejado no lixão ou Aterro Sanitário que
prejudica o Meio Ambiente agente ta fazendo outro projeto que é de
reciclagem e com isto você aumenta a vida útil dos Aterros e evita
que novas matérias-prima seja retirada da natureza para fazer o
mesmo produto.
Entrevista com o catador Sebastião em 06/06/2005
Em relação à rota no território do lixo, de acordo com cada um dos
entrevistados que ofereceu riqueza de detalhes em suas respostas, ficou
evidente a ocorrência de diversas formas de desvios existentes e as articulações estabelecidas, ora pelos motoristas das carretas e/ou caminhões, ora pelos garis, entre outros poderes mencionados, que realizam
a comercialização do material potencialmente reciclável que deveria ser
conduzido diretamente para o aterro, mas é negociado antes de chegar
no seu destino final. Deixaram claro também que é bastante confusa
essa rota e, por vezes, perigosa a interferência para evitar o desvio do
material, conforme ilustra a seguinte fala:
Bom penso que diversas coisas acontece de lá até aqui, cara, é uma
130
jardim gramacho e o território do lixo
rota muito confusa, pois dependendo do material recolhido já sai
negociado de lá mesmo, porque hoje em dia o motorista já conhece
o valor do reciclado do lixo, então se ele sabe que aquele material
que esta carregando tem algum valor automaticamente ele já destina para algum lugar, aqueles que não tem bom conhecimento, mas
alguém conhece que o material tem valor ele já extravia para o meio
do caminho para outro lugar, uma série de processos que se ocorre,
outros por uma questão de não conhecimento ou questão ética não
destina, mas grande parte fica no meio do caminho.
Entrevista do catador Sebastião em 06/06/05
A catadora Maria Sandra enfoca que:
Aí ele sofre perda nos caminhos é muito desviamento de carro, cada
um quer ganhar seu tostãozinho, embora não ache correto prefiro
não falar muito sobre o assunto.
Entrevista catadora Maria Sandra em 03/06/2005
Já os donos de depósitos, quando entrevistados, reconheceram a importância dos catadores na cadeia industrial de reciclagem, mas procuraram justificar a importância e a necessidade da existência da categoria
de sucateiros, em razão do material oriundo do aterro ser impuro, e com
isso existir uma rejeição total das indústrias quanto à compra direta.
Sua atividade consiste em beneficiar este produto através da limpeza
e misturá-lo com outros materiais, oriundos de compra procedente da
atividade de catação nas ruas. Assim vendem para outros atravessadores que ainda melhoram mais o material, até chegar à indústria. Outro
ponto abordado por eles é a existência dos encargos e tributos que por
vezes os impede de negociar diretamente, “que dirá o catador”.
Bom, o catador é a primeira fase da reciclagem do papel, primeira
fase é o catador naturalmente que tira o que é aproveitável do lixo,
tá, a segunda fase é o dono do depósito evidentemente, né, que nós
fazemos? Damos uma mexida no material de forma que separe o
que ele catou e não presta que vai voltar para o lixão e beneficiamos
o que presta, enfardamos e mandamos para o atravessador, isto
porque o papel do lixão é diferente do papel da rampa por uma série
de motivos é diferente, porque o material da rua tem um valor e do
lixão tem outro e este material não pode ser mandado diretamente para a indústria porque ela não aceita em razão das impurezas
oriundas do lixão, mas para o atravessador que também compra
papel da rua torna-se vantagem, pois ele mistura 50% de cada e
além de pagar mais baixo pelo nosso material diminui seu custo e
ele então manda para indústria e o material é aceito.
Entrevista realizada no Aterro Metropolitano de Gramacho em 09/06/2005
Sr. Sebastião Luiz – Depósitos 07 e 35
Quanto à rota do lixo, assim como os catadores, todos sabem das tran-
131
valéria pereira bastos
sações comerciais executadas antes de chegar ao vazamento oficial –
Aterro Metropolitano de Gramacho –, mas aceitam e chegam a afirmar
que, embora não tenham certeza por não terem sido ameaçados ainda,
mexer com essa engrenagem pode criar desconforto e perigo de vida.
Um deles relata:
denominado de desqualificação social. Esse fator tem relação direta
com o processo de precarização do trabalho e, também, de ausência de
qualificação, que por vezes leva o trabalhador ao desemprego e, consequentemente, ao processo de exclusão social, aqui reconhecida como
a nova exclusão, que tem características à luz do mundo globalizado,
onde o avanço tecnológico e a automação dos serviços se fazem presente
e empurram cada vez mais os indivíduos para a informalidade.
O autor, ao apontar o estado de desqualificação social, identifica
ainda diferentes tipos de indivíduos. No caso dos catadores, acreditamos
que estejam inseridos na qualificação de marginalizados organizados,
visto que participam de um contexto cultural tolerável em um espaço
controlado pela experiência das trocas das atividades cotidianas e, às
vezes, graças aos recursos do imaginário (Paugam, 2003, p. 177).
Inserimos o catador de lixo nesse contexto, onde foi possível identificá-lo como aquele que, por se sentir excluído do acesso a melhores
condições de trabalho, até mesmo de usufruir de bens e serviços como
qualquer cidadão, desenvolveu uma cultura voltada para a submissão,
naturalizando esta condição de modo a considerar que a exploração de
sua mão-de-obra em todos os sentidos é muito normal. Conforme àlguns
depoimentos colhidos nas entrevistas que realizamos, para eles é muito
difícil chegar próximo às grandes indústrias. Com isso, a negociação
fica sempre não mão dos sucateiros, ou seja, daqueles que dominam o
“mundo dos recicláveis” através do poder do dinheiro.
Já ouvi falar que são pessoas com um tipo de influência, digamos
em termos de coagir as outras pessoas a fazer isto, os próprios carreteiros da comlurb e s /a paulista , talvez não seja para benefício próprio, mas uma forma de coação senão fizer isto pode acontecer alguma coisa não só com o emprego, mas dependendo da forma
de quem estiver coagindo a sua própria integridade física.
Entrevista realizada no Aterro Metropolitano de Gramacho em 03/06/2005
Sr. Gilmar – Depósito 26
Diante dos depoimentos, torna-se evidente que a questão levantada a
respeito da comercialização e do consequente desvio do lixo antes de
o mesmo chegar ao aterro existe. Isso confirma que o catador é lesado
de diversas maneiras, desde a forma como se dá concretamente o trajeto do lixo até o seu despejo no destino final, e ainda na formação da
cadeia industrial de reciclagem – o material que é mais valorizado no
processo de comercialização não chega ao seu destino final inteiro, o
que em muito reduz o ganho daqueles que estão à espera do material
bruto para separação e venda.
Nesse cenário, podemos afirmar que o território de Jardim Gramacho é permeado por questões. Os diversos atores deparam-se diariamente com desafios em razão do negócio lucrativo do lixo, que envolve
cada vez mais um elenco de situações que giram em torno do lucro a ser
obtido, não importando de que forma ele possa ter sido adquirido.
Por outro lado, apesar de reconhecerem a existência do desvio e,
portanto, o furto do seu potencial produto, os catadores de lixo não se
organizam para o desmonte da rota, preferindo assumir uma atitude
de acomodação e, consequentemente, resignação diante da realidade.
Pode-se, diante disso, levantar uma questão: qual seria o poder efetivo
que teriam os catadores para alterar esse estado de coisas?
Além disso, os depoimentos permitiram abrir um leque de informações sobre fatos que obstaculizam e impedem o catador de participar da cadeia produtiva como agente de parte do negócio e, com isso,
usufruir dos lucros. Possibilitou, ainda, olhar para além da forma perversa utilizada no capitalismo para lidar com essa mercadoria específica e permitiu vislumbrar a necessidade de aprofundar a discussão e
a reflexão sobre a questão da formação e da organização da categoria
de catadores.
Aproximamos o olhar, neste momento em que o catador passa
por esse processo injusto de não participação na cadeia produtiva, do
estudo desenvolvido por Paugam (2003), a respeito do processo por ele
132
jardim gramacho e o território do lixo
Bibliografia
bauman , Zygmunt. Identidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
cortizo . Maria Del Carmen; OLIVEIRA, Adriana Lucinda. A economia solidária
como espaço de politização. in: Serviço Social e Sociedade, São Paulo, Cortez,
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133
valéria pereira bastos
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(Programa de Pós-Graduação em Saude do Trabalhador). Fundação Oswaldo
Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública. Rio de Janeiro, 2004.
Valéria Pereira Bastos
É doutora em Seviço Social. Suas áreas de pesquisa são meio ambiente, estudos culturais e desenvolvimento sustentável. Atualmente é professora da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (puc -Rio). Sua experiência é com ênfase
em trabalho social voltado para o meio ambiente com catadores de materiais recicláveis, atuando principalmente nos seguintes temas: identidade, trabalho, exclusão social, políticas sociais e contemporaneidade.
[email protected]
134
jardim gramacho e o território do lixo
135
encerramento
136
Pátio interno do Instituto São Bento
No dia 6 de dezembro de 2008, o nima realizou a cerimônia de encerramento do projeto Educação Ambiental: formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania no município de Duque de Caxias.
O encontro aconteceu no Pólo Avançado da puc -Rio, o Instituto São
Bento, em Duque de Caxias, e contou com a participação de representantes de todas as esferas do projeto. O objetivo do evento foi proporcionar um espaço de troca, onde todos os participantes pudessem conhecer os trabalhos realizados ao longo do semestre.
Durante a abertura da cerimônia, os representantes da puc -Rio,
da Diocese de Duque de Caxias, da Prefeitura de Duque de Caxias, da
Petrobras e do nima destacaram a importância da realização de um projeto como esse que, além de respaldar professores da rede municipal
no desenvolvimento da educação ambiental a partir de uma abordagem
local, ainda promove uma integração entre universidade, escola e sociedade. Como foi ressaltado por um participante, a mudança de postura
que o atual quadro ambiental e social exige passa inexoravelmente pela
educação ambiental, essa maneira holística de transmitir conhecimento
ao mesmo tempo em que se afirmam valores.
Após a entrega de certificados aos professores municipais de
Duque de Caxias, ocorreram as apresentações dos projetos desenvolvidos por eles em suas respectivas escolas. Através dessas exposições ficou claro que a educação ambiental já era abordada na maioria
das instituições, através de temas como reciclagem, aproveitamento
integral dos alimentos, uso consciente da água e reaproveitamento de
materiais. O que nos mostrou, mais uma vez, a importância dessa iniciativa que busca a integração e a complementação dos trabalhos realizados nas escolas com o conteúdo acadêmico e científico trazido pela
universidade.
O número de trabalhos apresentados na tentativa de ilustrar de
forma didática os resultados obtidos, assim como o nítido empenho
dos professores em realizá-los, mostraram o tamanho da necessidade
de se trabalhar com esse tema e a vontade que crianças e adultos têm
de sentirem que estão fazendo a sua parte na conservação do planeta.
Projetos como Os agentes pedagógicos ambientais, desenvolvido pela
Escola Municipal Guadalajara, serviram como exemplo de que é possível envolver alunos, pais e professores em atividades lúdicas que utilizam a sensibilidade para transmitir conhecimento.
O término da primeira etapa do projeto Educação Ambiental: formação de valores ético-ambientais para o exercício da cidadania garantiu
grande satisfação a seus executores, uma vez que mostrou o interesse
crescente da sociedade pela educação ambiental, assim como o valor da
união de instituições públicas e privadas na articulação de resultados
efetivos em prol do desenvolvimento social e ambiental.
Por fim, é necessário salientar que o presente projeto se configura
como uma importante mediação na divulgação e concretização da Lei
n.9795, de 27 de abril de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, tanto nos aspectos formais como informais.
137
Eu diria que nesse dia nós temos dois
sentimentos. Primeiro, uma alegria e
a esperança… A alegria de poder traduzir aquilo que nós temos no brasão
da nossa universidade, um brasão que
tem duas asas… o quanto é importante
saber que essas asas conseguiram voar
lá da Zona Sul até Caxias.
Efetivamente, a gente só vai conseguir transformar o quadro caótico e crítico que o planeta vive através de uma
mudança de postura. Isso passa inexoravelmente por uma coisa chamada
Educação Ambiental.
Padre Josafá Carlos de Siqueira
Vice-Reitor da puc -Rio
Outro dia li uma frase que eu achei interessante… “Nós não herdamos o planeta dos nossos pais, nós o tomamos
emprestado dos nossos filhos”.
Ronaldo Chaves Torres
Representante da Petrobras
Arcebispo Dom José Francisco
Rezende Dias
Arquidiocese de Duque de Caxias
e São Jõao de Meriti
O grande sentido de estarmos aqui é
fazer uma grande parceria entre todos.
Não viemos aqui pensando em ensinar
nada a ninguém, viemos com a intenção
de trocar coisas.
Vocês poderão nos ajudar a extender
esse sonho, para que a realidade da
Baixada, do recôncavo da Guanabara,
cada vez mais possa ter sua própria
formação.
Professor Luiz Felipe Guanaes Rego
Diretor do NIMA
Doutor Celso Pinto Caris
Professor do Departamento de Teologia
da puc-Rio e do Instituto São Bento
138
139
Professores da rede municipal
de Duque de Caxias que
participaram do projeto
Adriana Ambrozio Venâncio da Silva (Biologia)
Deusilene Soares Ferreira (Ensino Básico)
Pré-Iguaçu
e . m . Professora Amélia Câmara dos Santos
Adriana de Araújo Maia (Biologia)
Dilza Lima Santos (Geografia)
e . m . General Mourão Filho
ciep 340 – Profª Lais Martins
Adriana Olivia Briata da Conceição (Ciências)
Doti Gay Pinto (Ciências)
Escola Estadual Álvaro Negromonte
e . m . Expedicionário Aquino de Araújo
Ana Lúcia Teixeira (Geografia)
Elisabete Santos Peixoto da Silva (Geografia)
e . e . Hervalina Diniz Freire
e . e . Frei Henrique de Coimbra
Andrea Nunes da Silva (Orientação Educacional)
Fabiana Pereira Policarpo (Disciplina Integrada)
e . m . Carmem Corrêa dos Reis Brás
e . m . Professora Amélia Câmara dos Santos
Angélica F. de Santana Guedes (Pedagogia)
Giuseppina Adelia Briata Leiros (Pedagogia)
e . e . Álvaro Negromonte
e . e . Álvaro Negromonte
Aureo Ferreira Muri (Ciências)
Helenita Maria Beserra da Silva (História)
ciep 338 (Municipalizado Célia Rabelo)
e . e . Guadalajara
Bruna C. S. Lima (Ciências Biológicas)
Ivana Maria Dias (Ciências/Biologia)
Unigranrio
e . e . Álvaro Negromonte
Carlos José Alves (Ciências)
José Antonio Casais Casais (Ciências)
e . m . Roberto Weguelin de Abreu
e . m . Carmem Correa
Cátia Cristina Rodrigues da Silva
Katya de Oliveira Vieira (Ciências)
Claudia Regina Siqueira do Carmo (Ciências)
Escola Vilela Fernandes
Claudia Souto Vieira da Silva
e . m . Evlina Pinto de Barros
Lenise de Oliveira Paiva (Sociologia)
Centro de Referência de Assistência Social
(Ciências Físicas e Biológicas)
Leodegário Baptista Cordeiro (Ciências)
ciep 113 – c . f . Nogueira Mineiro
e . m . Expedicionário Aquino de Araújo
Cidvaldo Victor Cavalcanti (Educação Artística)
Lídia de Sá Reis (Educação Ambiental)
e . m . Anton Dworsak
Coordenadoria Regional Metropolitana V
Cristiane Santos da Silva (Ciências e Biologia)
Lizangela Reis Santana (Educação Infantil)
Colégio Estadual Fernando Figueiredo
Casa da Criança Esperança do Futuro
Cristina Maria da Silva (Geografia)
Luciana Ambrozio Venâncio da Silva
e . m . Presidente Costa e Silva
(Geografia e História)
Denise de Oliveira Silva
141
Colégio Flama
Centro Educacional Nogueira Mineiro
continua na página seguinte
Apresentações
continuação da página anterior
Marcelen Chagas do Amaral (Pedagogia)
Sidney Nascimento Nunes (Biologia)
Colégio Flama
Agência Nacional do Petróleo
Margarida M. da Silva Ribeiro (Educação Básica)
Silvania Rodrigues Maciel (Biologia)
Casa da Criança Esperança do Futuro
ciep 434 – Maria Jose Machado
Maria Bernadete Fonseca Amarante
Silvia Regina Bastos Souza (Geografia)
Maria Mônica Sarandy (História)
e . e . Alemy Tavares da Silva
Marineth Muiz Lyra Cordeiro de Almeida
Marisa Sanche (Ciências)
Escola Equipe Infantil – sme
Maristela dos Santos de Oliveira
Marta de Souza Golçalves (Língua Portuguesa)
ciep 199 – Charles Chaplin
ciep 218 – M. Hermes Lima
Visões de Meio Ambiente dos alunos do 6º ano
Lixo: restos nos interessam
José Antonio Casais Casais
Silvania Rodrigues Maciel
Escola, meio ambiente e profissão
Projeto água: qual futuro que queremos?
Ivana Maria Dias
Giuseppina Adriana Briata Leiros
crrmv
Vera Lúcia Pífano da Cruz
Simone Côrtes Rodine (Geografia)
Conhecendo as riquezas do Bairro São Bento
e . m . Vitela Fernandes
Simone Côrtes Rodine
Claudia Regina Siqueira do Carmo
Vera Lucia Pifano da Cruz
Suely dos Santos Cozendey (Química)
e . e . Frei Henrique de Coimbra
Taciane Peixoto da Silva
Vera Lucia Pifano da Cruz (Ciências e Biologia)
e . m . Expedicionário Aquino de Araújo
e . m . Nisla Vilela Fernandes
Educação ambiental a partir de
tendas educaticas
Maria Bernardete Amarante Fonseca
Projeto sobre mina de água
Luciana Ambrozio Venâncio da Silva
Nelson Barroso da Conceição
Esperança do Futuro
Margarida Maria da Silva Ribeiro
Lizangela Reis Santana
Reciclagem
Suely dos Santos Cozendey
Trabalho confeccionado por alguns alunos
com a técnica de mosaico
Suely dos Santos Cozendey
Mina de água
Claudia Souto Vieira da Silva
Luciana Ambrozio Venâncio da Silva
Rosane Rangel da Costa
Nelson Barroso da Conceição (Biologia)
Projeto plantando vidas
Secretaria de Meio Ambiente
Paulo Pedro da Silva (História)
Entrevistas sobre a qualidade da água
alunos sobre a importância da preservação
e . m . Professor João Faustino
da natureza.
Regina Célia da Silva
Direito à vida
Ricardo Bustamante da Silva (Geografia)
Escola Aquino de Araújo
Rômulo Lima Ayres (Geografia e História)
Leodegário Baptista Cordeiro
Lídia de Sá Reis
Maria Mônica Sarandy
Políticas públicas em educação ambiental
Leane Rodrigues Martins
Acampamento e apresentação de raps
ciep 404
Rosânea Luxidi Duarte da Costa (Ciências)
e . m . Dr. Ely Combat
elaborados pelos alunos do 7º ano
Elisabete Santos Peixoto da Silva
Sideli Vieira Maia (História e Geografia)
Coordenadoria Regional Metro V
142
143
Apresentação de cartazes com desenho dos
Cidvaldo Victor Cavalcanti
Andrea Nunes da Silva
Exposição
de trabalhos
144
145
2009
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Prof. Pe. Jesus Hortal Sánchez, S.J. — reitor
Prof. Pe. Josafá Carlos de Siqueira, S.J. — vice-reitor
CCS – Centro de Ciências Sociais
Prof. Luiz Roberto Azevedo Cunha — decano
Prof. Nizar Messari — coordenador setorial de pós-graduação e pesquisa
Profª. Daniela Trejos Vargas — coordenadora setorial de graduação
NIMA – Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente
Luiz Felipe Guanaes Rego — diretor
Fernando Cavalcanti Walcacer — vice-diretor
Camila Tati Pereira da Silva Barata
Ilana Parga Nina de Oliveira
Daise dos Santos Mendonça
Guilherme Moreira
Marcelo Luiz Guedes Fonseca
Ana Clara Matos Carneiro Barbosa Pinto
Rosana Cristine Machado de Oliveira
Julia Pereira
Professores
Alvaro Henrique de Souza Ferreira
Augusto César Pinheiro da Silva
Josafá Carlos de Siqueira
Regina Célia de Mattos
Rita de Cássia Martins Montezuma
Rogério Ribeiro de Oliveira
Virgínia Totti Guimarães
Valéria Pereira Bastos
Da esquerda para a direita: Roosevelt, Rogério, Júlia, Sabrina, Rosana (abaixo), Marcelo,
Ana Clara (abaixo), Ilana, Luiz Felipe, Camila (sentada), Rita, José Miguel, Regina, Cláudia.
Produçâo do vídeo
Julio Uchoa
Adriana Guanaes
Sabrina Gortz Carauta de Souza
Web
Paulo Dreyer Marques
Adriana Lessa Garcia
Prefeitura de Duque de Caxias
Petrobras
2008
Ricardo Santos Azevedo
Washington Reis de Oliveira — prefeito
Ronaldo Chaves Torres
José Miguel da Silva — secretário de meio ambiente
2009
José Camilo Zito dos Santos Filho — prefeito
Samuel Maia dos Santos — secretário de meio ambiente
146
Coordenação editorial
Revisão
Luiz Felipe Guanaes Rego
Luciana Werner
Elizabeth Grandmasson
Felipe Kaizer
Projeto gráfico & Diagramação
Felipe Kaizer
Textos
Escritório Modelo de Arquitetura e Design:
Introdução (p.??)
Níkolas Pereira (assistente)
Roosevelt Fideles de Souza
Bruno Senise (assistente)
Marcelo Luiz Guedes Fonseca
Rodrigo Martins (assistente)
Trabalhos de campo (p.?? – p.??)
Produção Gráfica
Camila Tati Pereira da Silva Barata
Portas Design:
Marcelo Luiz Guedes Fonseca
Karla de Souza
Roberta Portas
Mapas (p.?? – p.??)
Guilherme Moreira
Imagens
Marcelo Luiz Guedes Fonseca
Todas as imagens foram produzidas
pelo NIMA, exceto:
Encerramento (p.?? – p.??)
Agência O Globo (p.??)
Ilana Parga Nina de Oliveira
147
Créditos

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