Arte sensu nº10

Transcrição

Arte sensu nº10
www.adufepe.com.br/artesensu..htm
ADUFEPE 35
tempo
passa...
OO
tempo
passa...
Elase
serenova...
renova...
Ela
Número 10 - janeiro - 2014
De
Deum
umarbusto,
arbusto,
Nasceu
uma
flor.
Nasceu
uma
flor.
NãoNão
é orquídia,
é orquídia,
Não éNão
rosa,
é rosa,
É uma É
flor
especial.
uma
flor especial.
Anima osAnima
docentes,
os docentes,
Aurora no Campus
Jarbas Souza
2
Alegra os ambientes,
Alegra os ambientes,
Na terceira Margem
Fátima Barros
3
do Mar
Com seu Com
vigor,seu vigor,
momentos da repressão
Sua fibra
sem
igual.
Lurildo Saraiva
4 Dois
em Recife
Sua
fibra
sem igual.
e a Onça
Ela seEla
chama
ADUFEPE,
se chama
ADUFEPE,
5 O Cearense
Jaime Mendonça
Passado e presente
UmaUma
musa,
musa,
Lêda Sellaro
Uma
menina,
Uma
menina,
6 Mefistófeles no HC Flávio Brayner
Um
Umsonho,
sonho,
Um dia você aprende
Jarbas Souza
7
Umideal!
ideal!
Um
Da Irmandade de Santa Cecília
Adalbert Fehlaber
8
à Ordem dos Músicos do Brasil
José Amaro Santos da Silva
10
ADUFEPE 35 anos:
construindo o futuro do
movimento docente
José Luís Simões
11
O cheiro da casa
Fátima Barros
12
13
14
Qual o papel dos sindicatos
Jarbas Souza
de classe?
Brasil - Crônicas dos
500 anos
Hulda Vale
Modernidade em
Lêda Sellaro
colapso
A Montanha
Cláudio de Castro
Importância da arte
na saúde Jarbas Souza
15
16
Maratona de Chicago: I will
Roberta Uchôa
A arte de dois artistas
Guilherme Varela
AURORA
NO CAMPUS
Jarbas Souza
Bem-te-vi “anum-ciar” aurora no
campus
Pássaros a cantar
Homens andaluzes
Cooper na pista a caminhar.
Bem-te-vi “anum-ciar”
Caga-sebite e outros mais
Lavadeiras a beira do lago
Pardais nos beirais.
Bem-te-vi “anum-ciar”
Nuvens tingidas em tons gris
Salpicos de cristais
Sobre a relva jogar.
Bem-te-vi “anum-ciar”
Mudanças na paisagem
Frescor no ar
Da estiagem no caminhar.
Bem-te-vi “anum-ciar”
O vai e vem
De quem deseja sadio ficar
Também pelo andar
Respirando o puro aroma do
campus
E em cada canto
A paisagem apreciar
Caminhando nesta vereda
Chegando a pensar
Em bosques nunca dantes
caminhados
Bem-te-vi “anum-ciar”.
2
editorial
A revista Arte Sensu mais uma vez retoma sua
publicação onde é expressa a sensibilidade artístico
cultural de seus associados. São por demais
prazerosos os textos escritos pelos colaboradores
que, espontaneamente, revelam suas outras
atividades acadêmicas, relatando as diversidades
de interesses da comunidade acadêmica.
Vale ressaltar a importância do apoio a essas
atividades, pois, elas mostram as múltiplas
manifestações de cada associado da ADUFEPE no
campo cultural e artístico.
Nesse número, contamos com a colaboração
dos colegas Jaime Mendonça, Jarbas Souza,
Lurildo Saraiva, Roberta Uchôa, Leda Sellaro,
Hulda Vale de Arruda, Fátima Barros, Jose Amaro e
Guilherme Varela.
O sucesso da Arte Sensu é resultado da
participação efetiva de seus associados e da
comunidade, e já estamos recebendo o material
para a próxima edição.
A Diretoria
Expediente:
Informativo Político-Cultural da Associação dos Docentes da UFPE
josé luís simões
presidente
juliana albuquerque
1ª vice-presidente
valéria viana
ascom - adufepe:
2ª vice-presidente
joaquim sergio
suara macedo
1º tesoureiro
guilherme varela
jornalista
2º tesoureiro
igor cabral
rosa maria cortês
assessor
de
comunicação
julianna albuquerque 1ª secretária
2º secretário
wilton pontes
designer/ilustraçao
amanda
medeiro
natália
barros
Suplentes:
estagiária
2ª vice-presidente
ADUFEPE
marcelo antônio nero
Av. dos economistas s/n Campus UFPE - Cidade Universitária - Recife / PE
2º secretário
Fones: (81) 3271.1363 - 3271.1856 - 2371.0349 - 3036.2250 - 3036.2257
gilberto cunha filho
2º tesoureiro
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Fátima Barros
Professora do Colégio de
Aplicação
“Onde o mar arrebenta em mim
/ O lamento de tantos ais...” Dormira
escutando “A Paz” em um velho
gravador, há tempo esquecido na
estante da sala. Ele era capitão de um
navio ancorado em alto-mar. E ela
deveria fazer uma viagem exaustiva
para encontrá-lo. Sairia de casa bem
cedo, ainda o dia amanhecendo, para
tomar o ônibus.
O percurso era longo e a viagem
desconfortável.
Os bancos não
reclinavam, parte da estrada era de
barro e havia muita poeira. Pareciam
estar cruzando uma região seca e
árida. Árvores de cor cinza, sem
folhas, surgiam à beira da estrada. O
destino - uma cidade litorânea, um
pequeno balneário quase deserto,
onde se viam uns poucos turistas.
Apenas uma igreja, uma praça, um
comércio de especiarias, casas simples,
uma pousada.
No terminal, indagou onde
deveria pegar uma balsa para a ilha
a meio-caminho do mar. O cais ficava
a três quadras e o sol estava ameno.
Pessoas aguardavam a travessia à
beira da maré. Pescadores tostados
de sol conversavam, traziam cestos
cheios de peixe e facões na cintura.
Moradores, que tinham ido à cidade
comprar mantimentos, comentavam
sobre a demora da embarcação. Era
um braço largo de rio, as margens
cobertas de vegetação, casebres
espalhados entre o verde da paisagem,
barcos pequenos ancorados junto
ao cais, outros balançando no meio
do rio com o movimento das águas.
Ela esperava inquieta enquanto a
balsa se aproximava lentamente do
ancoradouro.
Foi breve esse trecho da viagem.
Recorda-se de olhar as águas revoltas,
debruçada na grade ao longo da balsa.
Até onde a vista alcançava era apenas
o azul translúcido das águas e o verde
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Na Terceira Margem do Mar
rotas de tempo
em calmaria ancoradas.
em tua pele,
o discurso cálido das águas.
das encostas. A embarcação se
deslocava suave sobre o rio.
A ilha era ainda mais calma que
a cidadezinha de onde chegavam.
Não havia ruas pavimentadas, apenas
ruelas estreitas entre casas humildes,
quase todas cobertas de palha. Era
preciso atravessar a ilha para pegar um
barco e finalmente chegar ao navio.
Como levava uma sacola com roupa
e alguns livros, sentia-se cansada,
porque a areia era fofa e o sol já estava
alto. Tinha sede, mas não queria parar,
com receio de perder o barco. Após
uma longa caminhada, chegara ao
outro lado da ilha.
O barqueiro a esperava na praia.
Falaram rapidamente sobre a travessia.
Agora era o mar em sua frente.
Não mais a calma do rio - ondas e
ondas não muito altas, mas que lhe
despertavam medo e angústia. Temia
que o barco virasse e lembrava-se de
que não sabia nadar. Olhou em volta
e não viu qualquer salva-vidas entre ela
e o barqueiro. Ele usava uma camisa
puída, e seus ombros se moviam ao
ritmo compassado dos remos. Como
o céu estava claro, procurou esquecer
as águas inquietas sob o barco e olhar
as nuvens que passavam alheias a
qualquer perigo. Pareceu-lhe esse
percurso mais longo que o anterior,
cruzando o rio. O olhar vago do
barqueiro lhe fazia crer que aquela
travessia era sempre assim. Nada
conversaram durante toda a viagem.
Aos poucos, o mar antes revolto,
se acalmou, as ondas desapareceram,
o barco deixou de balançar tanto.
Já não precisava agarrar-se em suas
bordas. Recostou-se sobre as mãos.
Jogou a cabeça para trás. Uma brisa
leve soprava espalhando seus cabelos
cacheados sobre o rosto. Afastou
uma mecha dos olhos e viu o contorno
branco do navio no horizonte. Ainda
restava um bom caminho sobre
as águas, mas agora a viagem era
agradável e livre de sobressaltos. Era
um navio de bandeira portuguesa.
Um alívio percorria seus músculos,
deixando-a levemente sonolenta.
Aportaram e ele estava debruçado
no convés, usava uma camisa-pólo
branca. Havia uma escada lateral que
parecia segura. O barqueiro aproximou
o barco e ela subiu devagar. Do alto
da escada, ele a olhava tranqüilo,
como se soubesse que viria, apesar
das dificuldades da viagem. Disse-lhe
apenas: “-Que bom que você veio!”
Ela sorriu. Caminharam pelo navio
e ele lhe mostrou a cabina. Ela entrou.
Jogou a bolsa na cama. Estava exausta,
mas alegre. Demorou-se no banho
morno, enxugou-se sem pressa. Pôs
um vestido lilás, abriu a porta e o viu
ao longe. Ele a esperava em um banco,
no fim do convés. Caminhou devagar,
sorvendo a felicidade de estar ali.
Sentou-se a seu lado e não disseram
qualquer palavra. O céu era azul e
sereno. Não havia uma nuvem sequer.
Ela recostou a cabeça em seu ombro.
O mar estava tranqüilo, com vários
tons de verde. Um cheiro de maresia e
sal envolvia a paisagem. Ela o abraçou
suave. As horas passavam lentas. A
luz do sol se arrastava em direção ao
continente. Juntos olhavam a natureza
em volta. A tarde permanecia imóvel
como um quadro. O navio não se
movia, ancorado no tempo. Ficaram
quietos, em paz, na terceira margem
do mar.
3
Lurildo R. Saraiva
Professoror do Departamento de
Medicina Clínica da UFPE
4
Dois momentos da
repressão em Recife
No início de 1969, sob os
desmandos do AI-5, Dom Helder
Câmara foi avisado que um total de
trinta pessoas, incluídos lideranças
estudantis e religiosos – o próprio
Dom – seriam vítimas do Comando
de Caça aos Comunistas (CCC). A
famosa lista, que eu nunca vi, estava em mãos do
Arcebispo, segundo consta, sendo encabeçada
por Cândido Pinto de Melo, seguindo-se os
colegas Marcos Burle de Aguiar e Humberto
Câmara Neto, da Medicina, e do Padre Henrique
Pereira Neto, entre outros.
De fato, em abril, teve início a escalada de terror
do CCC – do qual eram admiradores conhecidos
estudantes da velha direita pernambucana, hoje
políticos atuantes – e Cândido, presidente do DCE
da Federal, sofreu tocaia na ponte da Torre: ao
correr, foi baleado gravemente na coluna dorsal,
com secção de medula irreversível e conseqüente
hemiplegia. Com certeza, o Major Antônio Ferreira
foi o autor do tiro, outro crime imputado a ele,
que, mesmo assim, se encontra livre até hoje.
Irmão de médica, Clarisse Melo, Cândido
foi internado no hospital Pedro II, cercado
constantemente por dois agentes da Secretaria
de Segurança Pública, que era uma das centrais
da repressão, numa atitude humilhante,
desrespeitosa a um ambiente hospitalar e violenta.
Os estudantes de Medicina mais antigos
fomos escalados para dar plantões com o
Cândido, e eu fui um deles, cursando então, o
quinto ano médico. Lembro-me com nitidez do
seu semblante, da sua enorme angústia em não
sentir os membros inferiores, a perguntar porquês
que me eram difíceis responder. E, para a nossa
maior ansiedade, tratava-se de um moço de
corpo atlético, no pleno vigor da sua mocidade,
cheio da esperança típica da juventude: tudo
aquilo era uma enorme ignomínia! Os agentes do
DOPS a todo o momento se imiscuíam, anotavam
nomes, querendo saber até os pormenores
da medicação, era a “ditabranda”, de alguns
jornalistas de direita tendenciosos, de hoje. O
Cândido, sob os cuidados da Clínica Neurológica,
foi posteriormente transferido para São Paulo, e
muitos anos depois, era o responsável na equipe
do Professor Zerbini pela feitura de aparelhos
e válvulas artificiais para o coração humano.
Homem de enorme valentia e imensa capacidade
em enfrentar tão grande adversidade.
Em outro momento, agora em 1970, já
no internato de Medicina, fui admitido como
estudante plantonista concursado no hospital do
Pronto Socorro do Recife, hoje Restauração, que
outrora funcionava no prédio da atual FUSAM.
Em janeiro, fui conhecer o Serviço onde iria
trabalhar – a minha prática médica de urgência
era muito pouca, naturalmente andava tenso.
Nesse mesmo dia, de tarde, plantão do Euler
Mesquita, com quem trabalhava no antigo
Instituto de Cardiologia da UFPE, eu aluno, ele
staff, ao chegar à sala dos médicos, fui avisado
por ele próprio que uma “minha companheira”
levara uma grande surra da polícia e se encontrava
internada na urgência. Fui vê-la, mesmo sem
roupa apropriada, e ao chegar ao leito, logo
fui interrogado por dois alcaguetes do DOPS,
que constantemente a vigiavam. Acerquei-me
com muito cuidado, não a reconheci de modo
algum. Disse aos agentes que iria examiná-la por
orientação da Chefia do plantão, e encostei-lhe
o rosto, em verdade aproximei-me o mais que
pude, medindo-lhe a pressão arterial, e lhe
disse: “diga, confie em mim,
sou estudante”: ela falava
com enorme dificuldade,
além do corpo recoberto de equimoses, tinha
lesões bucais, como se lhe faltassem dentes, e
a língua estava ferida - só lhe foi possível dizer:
“Peixe”. Com certa surpresa dos agentes, eu falei
baixinho, “peixe, está certo”: se ouviram, os dois
pensaram, talvez, que deveria ser a comida que
desejava ou podia comer...
Eu entendi: Peixe, na realidade, era estudante
de Arquitetura, naquele momento, presidente do
Diretório Acadêmico. Saí do PS, seguido por um
dos agentes da ditadura, que com dificuldade,
consegui despistar, dirigindo-me ao meu
apartamento na rua Dom Bosco, nas cercanias.
Após alguns minutos, retornei, e fui à Faculdade
de Arquitetura, naquele tempo situada na Avenida
Conde da Boa Vista, em frente de atual hospital
psiquiátrico. Consegui vê-lo, relatei a ocorrência,
ele, ‘porra, é fulana que caiu, tenho que avisar
aos outros companheiros”, e saiu às pressas. Não
sei de quem se tratava, qual o seu destino, a que
organização de esquerda pertencia, sequer o seu
nome.
Aqueles eram momentos de terror do período
Médici.
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Jaime Mendonça
Professor do Departamento
de Engenharia Cartográfica
da UFPE
O Cearense
e a Onça
O Ceará é conhecido por ser uma terra de muitas histórias. Embora eu
Passado
&
Presente
Leda Sellaro*
tenha saído do Ceará há muito tempo, ainda sou cearense. Como dizem, gato
que nasce no forno não é biscoito, é gato.
Conta-se que um cearense vivia com sua família no interior.
Num fim de tarde ele saiu, como de costume, com seu canivete
para fazer seu cigarro de palha. Fumava tranquilamente quando
percebeu que estava sendo atocaiado por uma onça pintada, que
o olhava de cima de uma árvore como se já estivesse pronta para
estraçalhá-lo.
Tentou mudar o percurso, mas percebeu que não
havia jeito. Ficou, o assustado cearense acercado pela
Na modernização conservadora
do excludente “progresso social”
emerge a consciência inquiridora
face ao expropriado e ao marginal.
Quem somos nós, enquanto sociedade?
Como se explicam as nossas relações?
Onde nos encontramos, na verdade?
Quais são nossas reais aspirações?
onça. Vendo que não podia escapar ficou
Nosso passado: a grande propriedade:
pronto esperando o ataque. Em mãos só
basilar elemento do poder,
tinha o canivete. Com ele, riscou
uma cruz na árvore ao lado,
invocando o seu
“Padim Pade Cirço”.
da construção da nossa identidade,
do nosso imaginário, nosso ser?
O relacionamento feudatário
que corta a fala dos despossuídos,
roubando-lhes o espaço identitário
e condenando ao silêncio os vencidos?
- Salve meu padinho! Se você
estiver do meu lado, a primeira furada
que eu der vai ser no coração da
pintada e eu mato ela. Se você tiver do
lado da pintada a primeira tapa que ela
me der me arranca a cabeça. Mas se
você não estiver nem de um lado nem
do outro “cê” sai do “mei” que a briga
vai ser feia.
Dos poderosos, a mundividência,
que entre outras dimensões da exclusão,
obscurece a humana consciência
e favorece a desintegração?
Do privado poder, a exorbitância
na persistência patrimonialista
que encontra, no presente, ressonância
com o ranço aristocrático e elitista?
Questionando-se os modos mais fundantes
de tudo que compõe nosso estatuto
vê-se em meio aos conflitos circundantes
que o novo paga ao velho o seu tributo.
*Lêda Rejane Accioly Sellaro é Mestre em
Educação e Doutora em História. Professora
aposentada da UFPE, atualmente é escritora
de livros infantis. www.ledasellaro.com
O poema acima abre capítulo do seu livro
Educação e Modernidade em Pernambuco –
inovações no ensino público (1920/1937),
publicado pela Editora Universitária da UFPE,
vencedor do Premio Amaro Quintas, da Academia
Pernambucana de Letras, em 2010.
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
5
Mefistófeles no HC
Flávio Brayner
Professor Titular da UFPE
Em 2008 fui acometido de um
câncer de estômago que, descoberto
precocemente, não me trouxe maiores
consequências. O bom desta experiência é que, após ter realizado uma gastrectomia total, eu “não tenho mais
estômago para certas coisas”, no próprio e no figurado!
Fui acolhido por profissionais de
medicina, homens e mulheres (Marconi Meira, Ângelo Rizzo, Ângela Duarte,
Iran Costa, Fernando Raposo) a quem
reputo sensibilidades humanas que vão
muito além do simples atendimento
ao doente, e são possuidores de uma
qualidade humanística em extinção.
Infelizmente, são figuras reservadas,
no futuro, à penumbra da “Galeriados-médicos-que-fizeram-de-suas-vidas-uma-obra-de-arte-no-cuidadocom-o-outro”! Estes profissionais,
acima nomeados, exercem funções de
alta responsabilidade pública na área
da saúde.
Reservados a uma obscura galeria
porque provavelmente não resistirão
a um avassalador processo de privatização da vida, em que a existência
não será mais um valor, mas sim um
preço. Não tenho nenhum problema
com “privatizações”, mas fico muito
inquieto quando confundimos o valor
da vida com o preço dela.
“Quanto custa sua dignidade, leitor?”
A pergunta pode parecer grosseira
(menos para nossos políticos que têm
uma relação fáustica com a própria
alma!), mas é exatamente desta forma
que teremos de enfrentar o conjunto de nossas relações morais: somos
os únicos na natureza a possuir uma
consciência moral, uma capacidade
de fazer escolhas, de projetarmos o
que queremos ser e de nos definirmos
como um fim em si mesmo (um respeito e uma dignidade), que é o que nos
atribui um valor: algo pelo qual valeria
a pena viver e até morrer!
Quando vejo o Hospital das Clínicas da UFPE -uma instituição que tem
6
não apenas a função de atender a uma
população carente mas, sobretudo, de
formar profissionais da medicina- ser
ameaçada de se submeter a um modelo de gestão imposto pelo Governo
Federal como forma de redução de
custos, eu apenas entrevejo o nefasto
futuro do humanismo em medicina.
Privatizar telefone, estradas, portos,
aeroportos é uma coisa que pode trazer benefícios para os usuários; privatizar a formação humana (educação)
ou a vida (saúde, segurança, liberdade) é completamente diferente! No
momento em que a vida (e seu valor)
for medida pelo metro do custo-benefício, do resultado estatístico, da gestão eficiente mas eticamente esvaziada
–e estamos caminhando rapidamente
para isso- é porque Fausto, finalmente,
assinou o contrato com Mefistófeles!
Meus colegas diretores de Centro da UFPE, sobretudo aqueles que
condenaram os professores grevistas
como “sindicalistas radicais e irresponsáveis”, e que não perdem uma oportunidade para defender meritocracias
e ‘ranqueamentos’ sem lavrarem uma
única linha sobre o papel social da universidade em um mundo performático (este mesmo que condenará meus
médicos àquela galeria!) estão curiosamente assustados com a Lei Federal
12.772/2012 que estabelece o novo
sistema de admissão e progressão da
carreira do magistério superior (com
vistas à redução de custos, mais uma
vez!): choramingam como maridos
traídos. Eis o preço da demissão moral:
mais cedo ou mais tarde Mefistófeles
apresenta a conta.
Não tenho mais estômago –que
médicos que sabem a diferença entre
valor e preço, me fizeram o favor
de retirar!- mas ainda me resta
um pouquinho de juízo para
saber que uma Universidade que vende sua alma
deixa de ser digna da
causa a que serve.
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Jarbas Souza
Professor aposentado do Departamento de Expressão Gráfica
da UFPE
Um Dia Você Aprende
Depois de algum tempo você aprende, a sutil diferença,
entre Aposentado e aposentáveis.
E você aprende que o trabalho dignifica o homem, e
que a aposentadoria significa segurança na terceira idade.
E começa a aprender que princípios e valores não são
contratos e presentes não são promessas.
E começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e
olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a
tristeza de uma criança.
E aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.
Depois de um tempo você aprende que o sol queima se
ficar exposto por muito tempo.
E aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam…
E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela
vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la
por isso.
Aprende que falar pode aliviar dores emocionais.
Descobre que se levam anos para se construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que
você pode fazer coisas em um instante, das quais se arrependerá pelo resto da vida.
Aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer
mesmo a longas distâncias.
E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem
você é na vida.
E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.
Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebe que seu
melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou
nada, e terem bons momentos juntos.
Descobre que as pessoas com quem você mais se importa
na vida são tomadas de você muito depressa, por isso
sempre devemos deixar as pessoas que amamos com
palavras amorosas, pode ser a última vez que as vejamos.
Aprende que as circunstâncias e os ambientes tem influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós
mesmos.
Começa a aprender que não se deve comparar com os outros, mas com o melhor que você mesmo pode ser.
Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa
que quer ser, e que o tempo é curto.
Aprende que não importa aonde já chegou, mas onde está
indo, mas se você não sabe para onde está indo, qualquer lugar serve.
Aprende que, ou você controla seus atos ou eles o controlarão, e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter
personalidade, pois não importa quão delicada e frágil
seja uma situação, sempre existem dois lados.
Aprende que os aposentados são pessoas que fizeram o
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Está poesia adaptação de uma poesia de um grande escritor
William Shakespeare
que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências
de suas determinações para colocar as universidades publicas no pódio da vida e que são delas
que saem as melhores e maiores pesquisas de relevância social.
Aprende que paciência requer muita prática.
Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que
o chute quando você cai é uma das poucas que o ajudam a levantar-se.
Aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de
experiência que se teve e o que você aprendeu com elas
do que com quantos aniversários você celebrou.
Aprende que há mais dos seus pais em você do que você
supunha.
Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens, poucas coisas são tão humilhantes
e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.
Aprende que quando está com raiva tem o direito de estar
com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel.
Descobre que só porque alguém não o ama do jeito que
você quer que ame, não significa que esse alguém não o
ama, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar isso.
Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por
alguém, algumas vezes você tem que aprender a perdoar-se a si mesmo.
Aprende que com a mesma severidade com que julga, você
será em algum momento condenado.
Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração
foi partido, o mundo não pára para que você o conserte.
Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para
trás.
Portanto,plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de
esperar que alguém lhe traga flores.
E você aprende que realmente pode suportar… que realmente é forte, e que pode ir muito mais longe depois de
pensar que não se pode mais.
E que realmente a vida tem valor e que você embora aposentado tenha valor diante da vida e da sociedade!
Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem
que poderíamos conquistar se não fosse o medo
de tentar.
Agente descobre que como aposentados, fazemos
parte da historia das IFES, ainda que muitos não
entendam ou reconheçam essa verdade.
Aprende que desta dimensão não levamos absolutamente nada, mas, lutar por princípios procurando ser justo e ético, nos credencia para uma
vida melhor com harmonia e paz, sobretudo com
consciência e a certeza de que assim o fazendo,
estaremos contribuindo para a construção de um
mundo melhor sem ódio, sem medo ou segregações, onde todos têm os mesmos direitos exercidos nos princípios do amor cristão e das liberdades democráticas com mais justiça social.
7
José Amaro Santos da Silva
Professor aposentado do Dep.
de Música da UFPE e exPresidente do CRM-PE da Ordem
dos Músicos do Brasil - OMB.
A história das corporações sóciomusicais origina-se na associação de
classe que, regularmente estatuída, se
fundou, sob a égide protetora de Santa
Cecília, foi em Paris, no ano de 1576.
Após esta, outras se organizaram no
mundo católico. A Irmandade de
Santa Cecília, de Lisboa, data, segundo
todas as probabilidades, no século XVI,
embora o seu primeiro Estatuto só em
1603, no século XVII, portanto, tivesse
sido oficialmente regularizado.
Em 1784, fundava-se no Rio
de Janeiro, à semelhança de Lisboa
a Irmandade de Santa Cecília que
congregava músicos profissionais e
tinha como fundador o músico e não
ainda padre, José Maurício Nunes
Garcia (1767-1830)
Em 1787, segundo o musicólogo
Pe. Jaime Cavalcanti Diniz (19241989), estudioso da vida e da obra
de Louis Álvares Pinto (1719-1789),
primeiro grande nome da música
erudita no Brasil, para a honra e glória
do povo recifense onde nasceu essa
proeminente figura de músico, fundou
a Irmandade de Santa Cecília, que foi
incorporada em 1788 e funcionou na
Igreja de São Pedro dos Clérigos.
Da Irmandade de Santa Cecília à
Segundo o musicólogo Luiz Heitor
Correia de Azevedo, in 150 Anos de
Música no Brasil, “em Olinda e na
Bahia os músicos se haviam reunido em
corporações, constituindo Irmandades
de Santa Cecília, com o privilégio de só
os seus membros poderem exercer o
ofício, sob pena de prisão aplicada aos
contraventores”.
A Irmandade de Santa Cecília era
um organismo reconhecido pelo poder
real, que o auxiliava na fiscalização
profissional dos que exercia atividades
assalariadas de músico, tanto em
Portugal como no Brasil. O músico para
ser reconhecido como profissional era
submetido a rigorosos exames, perante
bancas examinadoras, com membros
nomeados por Sua Alteza Real e que,
após lograr entrar para a Irmandade,
o novo músico recebia a autorização
para “tanger” instrumentos musicais,
assim como, para “descer compassos”,
para usar uma linguagem da época,
onde tanger era tocar ou executar um
instrumento musical, e no caso, descer
compasso era a função de quem dirigia
agrupamentos musicais, os chamados,
então, corifeus, que são os regentes de
coros e de orquestras, na atualidade.
Mesmo existindo no Rio de
janeiro desde 1784, a Irmandade de
Santa Cecília parecia não satisfazer os
interesses da classe musical, pois, após
a saída de Dom João VI do Brasil, este
que destinara uma pensão ao Padre
José Maurício Nunes Garcia, para a
manutenção da sua escola de música e
do seu sustento, foi a mesma cortada
pelo Imperador Pedro I, mesmo tendo
sido aluno do Padre-Mestre. Isto sói
acontecer desde então, quando o
Brasil passava ou passa por problemas
econômicos, quem primeiro tem seus
recursos cortados são a Educação e a
Cultura. Tendo o padre mestre passado
por grandes difilcudades. Surge, então,
o nome mais expressivo que cuidou da
vida social do músico, no Rio de janeiro
e que vai refletir em todo o território
brasileiro,
o compositor Francisco
Manuel da Silva (1795-1865).
Francisco Manuel da Silva que
foi interessado na proteção e bemestar dos obreiros da música, era
compositor, pedagogo, fundador do
Conservatório Imperial de Música,
tendo passado à posteridade com a
Marcha Triunfal ,composta em 1831
para ressaltar a abdicação do trono
de Dom Pedro em favor do filho Pedro
II, que vem a ser, com o advento da
República, o Hino Nacional Brasileiro,
adotado como símbolo da pátria por
decreto de 02 de janeiro de 1890, do
Marechal Deodoro da Fonseca.
Foi o músico mais notável do
seu tempo, tendo sido um dos mais
Pintura: Santa Cecília - Jacques Blanchard (1600 - 1638)
8
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Ordem dos Músicos do Brasil.
brilhantes alunos da escolinha de
música do Pe. Mestre, José Maurício
Nunes Garcia, revelando-se, Francisco
Manuel, incansável, nos propósitos
de divulgação da boa música, da
verdadeira música dos cultos na igreja,
da educação musical e do amparo
ao músico. Construiu um ambiente
musical de valor, escudado no seu
prestígio junto ao Imperador Pedro II.
Francisco Manuel foi compositor
da Imperial Câmara a partir de 1841;
mestre da Capela imperial a partir de
1842, Cavaleiro da Ordem da Rosa,
em 1846 e Oficial da mesma Ordem
em 1857. A partir de suas honrarias
e reconhecimentos públicos de seus
valores, além de sua respeitabilidade,
passou a promover o engrandecimento
da vida musical brasileira.
Em 07 de abril de 1831 compôs
uma Marcha Triunfal, para piano, que,
segundo os historiadores, seria para
comemorar a abdicação de Dom Pedro
I em benefício de seu filho Pedro II.
Em 1833 fundara a Sociedade
Beneficente Musical com o objetivo em
“promover a cultura da arte e exercer a
beneficência recíproca entre os artistas
associados, e por morte destes, às suas
famílias”. Esta instituição a que esteve
ligado até o fim de sua vida, chegou
a ter grande desenvolvimento, tendo
sido a instituição que deu suporte
ao repassamento de recursos que o
Imperador Pedro II destinou à criação
do Conservatório Imperial de Música.
A Sociedade foi dissolvida em 1890,
com patrimônio avaliado em 90 contos
de réis, tendo distribuído centenas de
contos em befícios de seus associados.
No século XX já não se tinha notícias da Irmandade de Santa Cecília,
mas a necessidade da organização da
atividade profissional dos músicos perdurava, o que levou o maestro e compositor paraibano José de Lima Siqueira, após experiências em fundação de
sociedades de beneficiência a músicos,
a exemplo da União dos Músicos do
Brasil, elabora um projeto de lei que
foi encampado pelo então presidente
Juscelino Kubtschek de Oliveira, em
1960, cujo projeto foi encaminhado
ao Congresso Nacional, tornando-se a
Lei Nº 3.857, de 20 de dezembro de
1960, que criou a Ordem dos Músicos do Brasil-OMB existindo em
todo território nacional, gerenciando e
auxiliando o governo no que se refere
às atividades profissonais do músico,
através de seus CRM- Conselhos Regionais.
Na atualidade, alguns dos chamados sociocidas, aproveitando-se da
ignorância histórica da maioria dos
jovens músicos, e não respeitando o
labor constante de alguns abnegados
que sempre cuidaram da vida social
do músico, vem incentivando as novas
gerações a abandonarem e a fecharem
a Ordem dos Músicos do Brasil, com
alegações estapafúrdias de que fazer
música não precisa de legislação para
controlar atividades musicais. Ocorre
que, o fazer musical é livre a qualquer
cidadão brasileiro, mas, para exercer a
atividade musical como profissional,
remunerado financeiramente, há de
ter seu registro no órgão competente,
no caso, a Ordem dos Músicos, que é
o forum competente para salvaguardar os direitos profissionais do músico.
Texto escrito especialmente para a
Revista ARTE SENSU, da Associação dos
Docentes da UFPE.
Hulda Vale de
Araújo
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
9
José Luís Simões
Presidente da ADUFEPE
Fundada em 1979, neste ano a Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pernambuco está completando 35 anos de existência.
Sua história é marcada por lutas
que moldaram os caminhos do Movimento Docente e a política: a origem
da entidade durante a ditadura militar, a defesa veemente da carreira e da
universidade pública, as grandes greves e a atuação na redemocratização
do país.
A ADUFEPE sempre foi protagonista na história da UFPE e do movimento docente, e essa história forte e
marcante será celebrada ao longo de
2014.
Atualmente, nosso trabalho tem
sido na direção de fortalecer e ampliar
as conquistas e ações históricas do
nosso sindicato. Ao completar seus 35
10
ADUFEPE 35 anos:
construindo o futuro do
Movimento Docente
anos, a ADUFEPE encontra-se em seu
momento de maior força e representatividade. Atualmente, são mais de
2.200 associados. Somente no ano de
2013, quase 100 novos docentes se filiaram à ADUFEPE.
Avançamos em diferentes direções. Hoje, a ADUFEPE atua com ações
acadêmicas, oferecendo espaços de
debates, discussões e de cuidados aos
seus associados, a exemplo das atividades nas comemorações do aniversário
do sindicato, na 65ª Reunião da SBPC
e na Semana do Professor.
Participamos ativamente das principais questões políticas da categoria.
Em nível nacional, em todas as atividades do ANDES e, localmente, junto ao
Conselho Universitário, na Comissão
Estatuinte e nos fóruns de discussão
em defesa da Universidade Pública, na
campanha por melhores condições de
trabalho na UFPE e pela resistência à
implantação da EBSERH.
Permanecemos atentos ao cumprimento dos acordos salariais e demais
questões da carreira, resultados da
maior, mais longa e mais forte greve já
realizada por nossa categoria (2012).
Atuamos para garantir e ampliar
os direitos dos docentes com as ações
jurídicas constantes e com intervenções diretas junto a Administração
Central da UFPE.
Somos uma ADUFEPE de lutas,
sem abrir mão das conquistas e levando em conta a preocupação com o
bem estar dos professores.
Somos a ADUFEPE que honra seus
35 anos de história, ciente de sua responsabilidade no Movimento Sindical,
na Universidade e na vida de cada docente.
Somos a ADUFEPE forte, democrática, plural, atuante, histórica e contemporânea. Somos a ADUFEPE dos
35 anos e do futuro.
Que venham as próximas lutas e
vitórias, estaremos preparados, porque, juntos, somos a ADUFEPE.
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Fátima Barros
Professora do Colégio de Aplicação
O cheiro da casa
“Houses and rooms are full of perfumes, the shelves are crowded with
perfumes, I breathe the fragrance myself and know it and like it...”
Walt Whitman in “Song of Myself”
Nos últimos dias, vinha sonhado
com ele quase todas as noites. Quase sempre eram sonhos sem diálogo,
como o de ontem em que ela apenas o
via de longe, jogando bola, de calção
azul. Sentada na cama, com frio, Clara
se lembra de tê-lo encontrado tantas
vezes assim em casa: sem camisa, descalço, de calção, com um sorriso vasto e um brilho de rebeldia nos olhos.
Outras vezes, nesses sonhos mais recentes, os dois são namorados, ora se
abraçam na praia, ora se beijam com
paixão, ora se encontram na esquina
da escola. Acordada, depara-se com a
nitidez do seu rosto, o timbre da sua
voz em seus ouvidos,
o calor de suas mãos... Teria falado algo enquanto dormia? Levantouse mais cedo do que de costume para
não correr mais riscos... Pôs o roupão,
os chinelos. Saiu do quarto com cuidado, sem ruídos. Mais um dia frio.
Depois de tanto se perguntar e
esconder a razão desses sonhos (Afinal, já fazia quase dez anos...), hoje,
sem qualquer motivo plausível, diante
do espelho, Clara pôde perceber talvez
uma ligação entre os sonhos e algo
externo, inconsciente, desapercebido
– um cheiro. Agora que o notou, ele
a sufoca e entorpece, é um cheiro de
longe, do passado. É o cheiro que havia na casa de Dona Alda, um cheiro
úmido, de roupa guardada, de abafado, de calor, de maresia. Um cheiro
que ela sempre sentia cada vez que ia
lá, mas de que nunca lhe havia falado.
Era um cheiro que se espalhava
por todos os cômodos, pelos quartos
onde à tarde faziam sexo. Um cheiro
que estava nas poltronas da sala, onde
ele se deitava, punha a cabeça no seu
colo e Clara acariciava seus cabelos...
Quase não consegue respirar... Passavam horas assim... ela tentando desmanchar as mechas de seu cabelo que
teimavam em voltar para o mesmo
lugar tão logo as soltasse... Uma
carícia única, mágica... Ainda
podia sentir o movimento leve
dos fios entre meus dedos,
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
o cheiro de seu corpo... E esse cheiro
que se entranhava pela casa... Outras
vezes ele se deitava, com a cabeça em
uma almofada no seu colo, no chão
da sala...
Havia esse mesmo cheiro nos travesseiros, nas camas, nas colchas, nos
lençóis, nas toalhas... Como pôde encontrá-lo tão distante, tantos anos depois em outra casa! Como esse cheiro
foi capaz de lhe trazer recordações tão
nítidas, trancadas na memória, escondidas de si mesma? Gestos, palavras
com suas raízes espalhadas por todo
o seu corpo, sua pele, seu cérebro,
seu coração, seu sexo? Quanto tempo guardou lembranças tão fortes e
tão vivas, capazes de acordar com um
cheiro e trazer aquela infinita felicidade, cujo gosto jamais poderia esquecer?
Lembra-se de ter lido, anos atrás,
em Proust sobre lembranças esquecidas no sabor da madeleine. Por causa
de um cheiro, sente o passado fluir no
presente como um rio...
Um cheiro que penetra no corpo e
devora as vísceras lentamente como
um poderoso veneno de que não
se pode fugir, porque não se
pode deixar de respirar... Um
cheiro de vida, de suor...
Clara abre a janela, olha
a rua, precisa de ar...
Um cheiro capaz de
a levar a um tempo em que a vida
era outra, eles
eram jovens,
e o amor
parecia possível.
Quantas cenas, sonhos, desejos
podem ficar guardados anos a fio em
um cheiro que se espalha pela casa!
Um cheiro carregado de memória, capaz de fazê-la sentir, ao mesmo tempo, o desatino da felicidade extrema e
a dor intensa, escondida no álbum de
retratos ...
Ah! Um cheiro para fazê-la de
novo sentir-se viva, com falta de ar,
com o peito apertado...
Um cheiro que torna o corpo febril, causa uma leve tontura, deixa a
boca morna ... Um cheiro que se espalhava em outra casa, mas que se entranha pelos poros, exato, idêntico, após
tantos anos trancado em silêncio, nos
armários do tempo...
11
Jarbas Souza
Professor aposentado do
Departamento de Expressão
Gráfica da UFPE
As lutas sociais, desde a divisão
da sociedade em duas classes, vêm
mudando as relações entre patrões
e empregados, viabilizando maior
participação nos lucros das empresas
com vistas a assegurar uma melhor
qualidade de vida digna aos trabalhadores, agentes da produção.
O papel do Sindicato Classista é sem dúvida o de defender
intransigentemente a classe que
representa, sem abdicar do bom
senso e da diplomacia nas negociações.
Para Karl Marx, “se os sindicatos
são indispensáveis para a guerra de
guerrilhas cotidianas entre o capital
e trabalho, são também importantes
como meio organizado para a abolição do sistema de trabalho assalariado”.
Ao longo da historia, o trabalhador vem conquistando através de
suas organizações classistas, avanços
que permitiram aos empregados pequenas participações nos lucros das
empresas.
Embora a classe docente não
seja uma classe de trabalhadores cuja
principal força de produção é braçal, - máquinas humanas cumprindo
apenas ordens – há de se compreender, que o trabalho intelectual exige
um esforço muito maior, sem menosprezo das demais classes produtoras.
A considerar que vivemos em
uma democracia na forma constitucional, - governo do povo pelo povo
e para o povo - na prática o que percebemos e sentimos na pele, é um
sistema capitalista selvagem a exemplo do feudalismo antes da divisão
social.
Assim, não obstante as lideranças sindicalistas, muitas vezes inflamadas em discursos, defenderem as
classes produtoras dos bens de consumo temos que entender serem elas
de falhas e tentações, se deixando
encantar muitas vezes pelo “canto
das sereias”.
Entendemos que com a queda
do feudalismo, os homens poderiam
alcançar o paraíso terrestre que Karl
12
Qual o papel do
Sindicato
de classe?
Marx
almejou.
No entanto, a falta
de conscientização do homem
enquanto homem frustrou em muito
Marx.
Todavia, a classe professoral,
dentre as demais, principal e única
formadora de opinião e esclarecedoras das verdades e dos direitos de cidadania, ainda não se deu conta que
cabe a ela a tarefa de levar a sociedade ao paraíso marxista, procurando
colocar esse ideal sem confrontos,
agressões ou violência com práticas
medievais.
Tenho defendido sempre que é
preciso usar nossa principal e única
arma forjada nas academias universitárias – a informação e o conhecimento – para fazer valer o principal
direito dos homens livres: o direito
a cidadania com qualidade de vida
honrosa e ética.
Não se pode remover um obstáculo de gerações sem formar uma
consciência transparente do que
deve ser em um sistema democrático, onde a pluralidade faz parte do
equilíbrio harmonioso de sustentação da democracia.
A história da humanidade tem
registrado inúmeros fatos que nos
faz reavaliar conceitos, atitudes e
ações que não deram certo. Aquelas
que tiveram sucesso estavam calcadas no ordenamento lógico do respeito humano, sem tentativa de escravidão ou exploração.
Assim, pois, a conquista do “paraíso terrestre”, se concretizará na
medida em que nos libertemos de
nossas forças primitivas, ainda não
domadas pela informação e pelo conhecimento, nos deixando a mercê
dos sofistas da politicagem barata e
usurpadora dos bens comuns.
Portanto o papel dos sindicatos classistas é, através do diálogo,
usando como arma a informação e
o conhecimento, trazer a luz dos
responsáveis por uma cidadania para
que o trabalho digno torne o homem
enquanto homem cônscio de seus
deveres e direitos democráticos, para
sua plenitude.
É importante levar ao conhe-cimento do povo que em uma democracia, o Estado está a serviço do
povo e não o povo a serviço do
Estado. Gestores devem ser pessoas
ilibadas, outorgadas pela sociedade,
com conhecimento e informação suficiente e adequada para fazer valer
os desejos do povo. Se não chegarmos ao paraíso apregoado pelas religiões ao menos um Shangrilá onde o
ser humano possa viver dignamente
em paz consigo e com seu semelhante, respeitando suas diferenças.
Assim a sociedade irá escolher
os gestores à luz de uma consciência
de razão lógica do dever ser, com a
certeza de que eles cumprirão seus
mandatos, voltados para quem os
outorgou sem se locupletarem do
poder.
Nunca é tarde para iniciarmos
esse processo de conscientização
através da informação e do conhecimento.
Por um sindicato verdadei-ramente docente na busca da qualidade de vida ideal para todos!...
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Hulda Vale de Araújo
Professora Adjunta
Centro de Ciências da Saúde
Departamento de Enfermagem
da UFPE
BRASIL
CRÔNICAS DOS 500 ANOS
Brasil – 500 anos de Descobrimento.
A Inconfidência Mineira de Itamar Franco.
De como o Fundo Monetário Internacional vai Escalpelar o
Topete Republicano.
Não sabemos ao certo, mas a história do Brasil,
apresenta-se ainda ao que parece, conforme os autos
da versão Inglesa ou seja, os escarnecedores e assassinos
foram os Portugueses e, quanto as riquezas dos cofres
aristocráticos Ingleses, ... não se têm nada a declarar.
No entanto, as idéias liberais do iluminismo Europeu,
(século XVII e XVIII), contrastavam com o poder absolutista
monárquico, assim diz a nossa história.
Enquanto Portugal exigia mais e mais impostos, a
sociedade mineira resolveu reagir.
Um grupo de poetas, militares e padres, produziu um
texto com propósitos e objetivos, que se seguidos
à época, em nossos dias, não teria sido necessário Itamar desencadear uma segunda
... “inconfidência mineira”.
Falava-se em desenvolver indústrias
no país e estimular a agricultura, entre
outras medidas.
Traidores e ideais à parte, o alferes
Joaquim da Silva Xavier, coincidentemente
... (será?). Apresentava-se, conta a nossa história, como o menos provido de proventos reais e
sem apoio dos políticos, sendo assim, foi “exemplarmente”
tratado.
A aristocracia européia :: Portuguesa e Inglesa, como se sentiram?
Após todos esses anos e ainda com os anglo
– saxões “em nosso calcanhares” (leia-se FMI),
os mineiros dão provas de suas inconfidências.
Quando governador Itamar Franco, atua de
forma a contrariar e manda dizer a D. Maria I,
leia-se hoje, Presidente Fernando Henrique Cardoso, agora não mais através das cartas levadas pelas
caravelas mas através de canais televisivos (C.N.T)
no dia 11/01/1999, logo por ocasião do café da manhã dos brasileiros (assim foi transmitido), que: “Minas só
pagaria ao Governo Federal após quitar suas dívidas junto
aos servidores públicos e alimentar seus encarcerados”.
Como o Fundo Internacional não tem
mais os alferes desprovidos de
reais e de padrinhos poarte sensu nº 10 - janeiro 2014
líticos, nem indígenas e escravos para exterminar, ... deve,
ao que parece, contentar-se em mandar o português / brasileiro, não mais D. Maria I, mas outro “Dom Fernando”,
cortar o expressivo topete da cabeleira do governador Itamar Franco, distribuindo pelas esplanadas dos Ministérios,
um pouco dos seus cabelos, e VIVA a REPÚBLICA!!! Sem os
inconfidentes, com certeza.
13
Modernidade
em colapso
Jarbas Souza
Professor aposentado do
Departamento de Expressão
Gráfica da UFPE
Lêda Sellaro
Visionárias mentes não previram,
nem a literatura antecipou
toda a ciência e tecnologia
que o século passado acumulou!
Mas permanece um imenso
descompasso
entre o progresso e o avanço
social...
e com sucessos convive o fracasso
de um mundo extremamente
desigual!
Há multidões de marginalizados
sob um discurso de base
humanista...
seja na luta livre do mercado
ou no planejamento socialista.
E num mundo “menor”, globalizado,
tragédias que parecem fictícias...
males que se supunham superados,
são manchetes de hoje, são
notícias!
Lêda Rejane Accioly Sellaro é Mestre
em Educação e Doutora em
História. Professora aposentada
da UFPE, atualmente é
escritora de livros infantis.
www.ledasellaro.com
A Montanha
Cláudio de Castro
“Na próxima vez que subí-la
Subirei sozinho.
Comigo levarei apenas
Meu rebenque e minhas
lembranças.
Lá no alto, no lugar mais adequado
Instalarei meu piano imaginário.
Emocionado e em grande estilo
Tocarei a cavalgada das Valquírias.
O universo inteiro aplaudirá.
Depois
Coloco minhas asas imaginárias
E do ponto mais elevado
Lanço-me no espaço vazio
Iniciando meu vôo solitário
E tranquilo
Em direção ao infinito.”
Cláudio de Castro é professor do Depto.
de Engenharia de Minas
14
Todo passado da história da
humanidade e em particular das ciências
médicas foi documentado pelos artistas
através de desenhos. Desenhos esses
que procuravam mostrar não só a
beleza de cada forma anatômica, como
os aspectos epidemiológicos no decorrer
da história. Hoje mais do que nunca o
desenho presta sua colaboração à saúde
pública ora comunicando e interagindo
nas transformações e na prevenção, ora
como interface nas áreas da saúde.
Na linguagem gráfica, dois pontos
são indispensáveis para a realização de
um trabalho: harmonia e contraste que
têm estreita relação entre si. O organismo humano parece buscar
freqüentemente a harmonia e
o sossego, mas o contraste é a
contraforça; desequilibra, ativa,
estimula, atrai a atenção; o contraste de valor é tão importante
como a presença da luz para o
processo da visão.
O gênio Leonardo da Vinci além de elaborar um minucioso tratado de anatomia humana
para o qual dissecou trinta corpos (1452-1519), foi um anatomista muito adiantado para a época,
mas os seus extraordinários desenhos e
notas referentes aos seus estudos só foram encontrados dois séculos depois.
Também o anatomista André
Vesálio considerado pai da anatomia
humana, em sua obra De humani
corporis fabrica, publicada em 1543,
utilizou-se do Desenho para apresentar
o primeiro tratado sistemático de
anatomia humana.
Não se pode negar a importância da
Importância da
arte na saúde
Arte, do Desenho,
para as ciências da
saúde, pois sem o
uso das representações gráficas certamente teria havido
um compasso de
espera no desenvolvimento
das
questões vitais do
homem enquanto
homem.
O artista em sua época sempre se
deixou inspirar pela beleza da anatomia,
em especial feminina Foi assim desde
os primórdios da civilização até nossos
dias, que a Arte contribuiu e vem
contribuindo com as ciências da
saúde, documentando e representando diferentes formas de conhecimento, quer como arte, ciência ou crítica humorística, como
se vê no desenho3, onde mostra
como os populares poderiam ficar
após a vacina contra varíola.
Registros de grandes
obras trabalhadas por artistas,
comprovam não só a importância
da arte no contexto sócio/cultura e político, mas, especificamente no
campo das ciências da saúde. Foi assim
na antiguidade, na idade média e contemporaneamente, mais do que nunca o
Desenho vem prestando relevantes contribuições no campo da saúde pública.
Na Gruta de Gargas, nos Altos
Pireneus, na Espanha; encontramse impressa na parede: uma mão
no interior da mesma com os dedos
amputados de forma tão precisa que
não poderiam ter sido cortados num
acidente, daí acreditar-se se tratar de
prováveis cirurgias pioneiras da história
das ciências da saúde.
Estudar o Desenho a Arte em suas
diferentes formas de manifestação,
é compreender sua importância,
interagindo no contexto das demais
áreas do conhecimento e do saber.
1 Desenho de Leonardo da Vinci - (1452)
2 Ilustração de Humani corporis fabrica (1519)
3 A sociedade inglesa em 1802 publicou este desenho, que explorava os receios que os populares
tinham da vacinação. Vêem-se alguns dos que foram inoculados a transformarem-se em vacas,
enquanto da cabeça e do corpo de outros irrompem bovinos.
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Roberta Uchôa
Assistente Social e
Professora da UFPE
([email protected])
Para os mais de 26 mil participantes, a 117ª edição da mais
antiga e tradicional maratona internacional não vai ser lembrada pela
perfeita organização ou vibração
dos espectadores, nem pelas belas
paisagens da estrada que liga
Hopkinton, na zona rural do estado de
New England, à Boston. Os vencedores,
o etíope Lelisa Desisa e a queniana
Rita Jeptoo, bem como o êxtase dos
corredores amadores ao concluir os
42K da prova, também não vão ser
lembrados. A primeira maratona internacional a incluir oficialmente mulheres
e cadeirantes entre os participantes e
a pagar prêmios do mesmo valor ao
vencedor e vencedora da elite, fez mais
uma vez história, mas, infelizmente,
desta vez para ser lembrada como
a primeira a ser alvo de um ataque
terrorista.
Exatamente, às 14h50, da 2ª
feira, 15 de abril de 2013, na Boylston
Street, há poucos metros da linha
de chegada, quando a maioria dos
corredores amadores está concluindo
a prova, em torno de quatro horas de
corrida, a primeira bomba explodiu.
Doze segundos depois, na mesma rua,
explodiu a segunda bomba. As imagens
das explosões foram capturadas de
diversos ângulos por cinegrafistas
profissionais e amadores, foram transmitidas ao vivo e permanecem na
mídia e na nossa memória. Martin
Richard, Krystle Campbell e Lingzi Lu
foram vítimas fatais desse ato terrorista
e mais de 200 pessoas saíram feridas,
muitas com amputações dos membros
inferiores. A todos, meus sentimentos.
Apesar dessa tragédia, que me faz
chorar quando escrevo estas linhas,
a Maratona de Boston também será
lembrada por alguns momentos especiais, como no traslado para Hopkinton,
quando conheci Kim Sammons, uma
jovem norte-americana, professora de
uma escola pública em Portland,
costa oeste dos Estados Unidos. Na
concentração, no frio de cerca de 10º C,
arte sensu nº 10 - janeiro 2014
Maratona de Boston:
“we will finish this race”
nossa conversa diminuiu a ansiedade
nas mais de três horas de espera para o
início da prova. Ainda na concentração,
foi respeitado pelos milhares de
corredores um minuto de silêncio em
homenagem às vítimas do massacre de
Newtown, Connecticut, em dezembro
do ano passado. Foi comovente. E no
meio daquela multidão, Carlos Rutter,
um brasileiro residente em Londres,
que me conheceu na Meia Maratona
da Cidade do Rio de Janeiro, em julho
de 2010, me reconheceu e também
me fez companhia. Que memória!
Da largada, passando pelas
cidades de Ashland, Framinghan,
Natick, Wellesley e Newton até Boston,
impressionava a estrada completamente tomada pelos corredores.
O colorido deles contrastava com a
paisagem ainda cinza do final de mais
um inverno. “The long and widing
road” até Boston, com inúmeras
subidas e descidas, estava repleta de
espectadores e os mais efusivos eram
as estudantes que estavam em frente
ao Wellesley College com cartazes
suplicando para serem beijadas pelos
corredores.
Já em Boston, por volta do
36ºK, as sirenes dos bombeiros, ambulâncias e polícia começaram a soar
freneticamente. Os carros seguiam na
direção à chegada, na pista oposta
a dos corredores. Um pouco assustada, ainda sem saber o que havia
acontecido, continuei correndo até
por volta do 38ºK, quando uma
ambulância passou do meu lado
em alta velocidade. Imediatamente,
perguntei a um policial o que havia
acontecido. Fui então informada sobre
as explosões na Boylston Street e fui
orientada a continuar minha corrida.
Segui o curso da prova, mas sem
mais conseguir correr, tomada pela
tristeza. Beth Brennan (uma amiga
norte-americana, que me aguardava
na chegada da prova), Kim e Carlos
não saiam da minha cabeça. Nessa
hora, a notícia já devia estar correndo
o mundo e receei que minha mãe em
Recife já tivesse tomado conhecimento
da tragédia e sofresse por não saber
que eu estava bem. No 40ºK, às
15h30, na Beacon Street, a prova foi
interrompida e os corredores começaram a se aglomerar no meio da rua.
Os voluntários e policiais ainda não
sabiam o que fazer, mas pediam a
todos para manter a calma. Logo em
seguida, todos foram levados a uma
sinagoga, Temple Ohabei Shalom,
onde trabalhavam Becca e Leslie
Wilkinson, mãe e filha. Elas disponibilizaram telefones, internet, banheiros, agasalhos, bebidas quentes e
alimentos. A elas, minha gratidão.
No início da noite, a organização
da maratona começou a disponibilizar
transporte para os corredores e
somente por volta das 20h00, exaurida,
consegui chegar ao hotel, onde estava
hospedada. Mesmo assim, a minha
odisseia ainda não havia acabado.
Somente depois de dar notícias aos
familiares e amigos no Brasil e de saber
que os amigos estavam bem, pude
descansar.
Por fim, no dia em que se celebrava “Patriots’ Day”, a Maratona de
Boston foi interrompida por um ato
de covardia de supostos soldados de
uma causa desconhecida. Certamente,
conseguiram chamar atenção, mas
não a sua causa, e não atingiram o
objetivo de intimidar os corredores,
pois como afirmou o presidente Barak
Obama, na cerimônia ecumênica em
homenagem às vítimas, “we will finish
this race”. Nós vamos terminar essa
prova e, certamente, eu
vou continuar correndo
pelo mundo.
15
Jane Higino e Jarbas Souza
A Continuação da obra de
dois Artistas
O Professor Jarbas Souza é um artista de extraordinário
talento. Detentor de uma formação acadêmica em artes
plásticas, Jarbas teve oportunidade de conviver e estudar
com artistas de renome internacional como Manuel Bandeira,
Murilo La Greca, Vicente do Rego Monteiro, Lula Cardoso Aires,
Abelardo Barreto, Edson Rodrigues, e outros grandes nomes
cujas contribuições artísticas foram de inestimável valor para a
cultura pernambucana e brasileira. Foi também com o Professor
Laert Baldini que Jarbas aprendeu e se especializou nas
técnicas de gravuras, xilogravuras e Litografia ou calcogravuras.
A união de uma formação acadêmica impecável com
o talento natural do artista garantiu a Jarbas Souza uma
trajetória artística sólida e eclética. Suas obras produzidas ao
longo da sua trajetória artística ganharam reconhecimento e o
respeito da comunidade nacional e internacional. Jarbas Souza
domina com maestria as técnicas de expressão artística da
escultura à pintura, mas é na gravura que este artista mais
se destaca, com obras em exposição permanente em museus
da Europa. Suas obras se destacam não apenas pela harmonia
e equilíbrio da composição e das cores, mas principalmente
pelos sentimentos e emoções desse artista, exuberantemente
retratadas em suas obras.
Essa exposição apresenta algumas de suas obras, com
destaque para as técnicas de pastel.
As obras selecionadas para esta exposição expressam os
sentimentos desse artista em relação a cenas do cotidiano e
de detalhes de obras arquitetônicas que fazem parte do povo e
da cultura. O conjunto dessas obras demonstra a versatilidade
desse artista e narra a sua capacidade de expressar os seus
sentimentos de forma majestosa através das suas obras.
A Professora Jane Higino com formação acadêmica nas
áreas de Farmácia e Química é uma artista ainda novata, e de
muito talento. Com grande interesse pelas artes Jane é uma
autodidata em sua formação artística. Começou a pintar por
impulso para expressar os seus sentimentos e as suas relações
de afetividade com os objetos.
Essa artista vem se aperfeiçoando e evoluindo suas
técnicas de pintura a óleo sobre tela através da observação
acurada das pinturas de grandes artistas e da busca por
orientações disponíveis no mundo digital sobre técnicas de
pintura a óleo sobre tela. Este interesse pela pintura não
apenas impulsionaram o seu desenvolvimento técnico, mas
permitiram aflorar todo o seu potencial artístico. Jane Higino
nos últimos anos tem dedicado parte do seu tempo livre à
pintura, explorando de forma primitiva e distinta sua capacidade
artística de expressar sentimentos, através de suas obras.
Suas obras de pintura a óleo sobre tela expressam o
sentimento dessa artista, explorando objetos do cotidiano, com
um carinho especial pelas flores com as quais se identifica e
com as paisagens naturais. Em suas telas as emoções e os
sentimentos dessa artista são exuberantemente retratados.
Desta forma, sentimo-nos honrados em apresentar ao
público as obras de dois artistas “expressão da emoção” que
assim dão uma expressiva contribuição para o fortalecimento
da Arte e da Cultura
Pernambucana.
Guilherme Varela, Jarbas Souza e Jane Higino
Prof. Guilherme Varela - Curador
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arte sensu nº 10 - janeiro 2014

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