armazém de tudo - Marcelo Silveira
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armazém de tudo - Marcelo Silveira
Apoio Incentivo ARMAZÉM DE TUDO Marcelo Silveira Moacir dos Anjos organizador Esta publicação pretende ser menos um registro abrangente da obra do artista Marcelo Silveira do que uma oportunidade de refletir criticamente sobre sua trajetória. Embora documente alguns dos mais importantes trabalhos que realizou, não estabelece certezas interpretativas sobre sua obra. Inventaria, ao contrário, questões que o animam a desdobrar sua pesquisa em direções diversas. Além das muitas imagens de objetos, esculturas e instalações feitas pelo artista, compõem a publicação um ensaio crítico de Moacir dos Anjos, uma entrevista com Marcelo Silveira – para a qual contribuíram Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos – e uma cronologia comentada sobre o seu percurso criativo, elaborada por Joana D’Arc Lima. ARMAZÉM DE TUDO Moacir dos Anjos A obra de Marcelo Silveira expressa, desde quase o seu início, a natureza imprecisa e híbrida da produção visual contemporânea, em que os meios se misturam e o espaço da produção artística se confunde com o âmbito alargado da cultura. Embora se deixe, em contato ligeiro, classificar como escultura, parte significativa dela não cabe nas convenções que demarcam o campo escultórico, esgarçando mais ainda as fronteiras, há muito já frágeis, que apartam esse campo dos terrenos da pintura, do desenho ou da instalação. Trabalhos de épocas distintas tipificam, de formas as mais diversas, esse desconforto de origem que anima a produção do artista. Ainda na primeira metade da década de 1990, Marcelo Silveira fez peças esculpidas em madeira e recobertas com caulim, interferindo na argila clara (riscando-a e apondo-lhe pequenas peças de metal) de modo a realçar suas nuances cromáticas. Embora já deixasse evidente, nesses trabalhos, o seu interesse pela criação tridimensional (e o pouco apego à representação), também neles incorporava, sem hierarquias claras, as informações sobre pintura que trazia do lugar (Recife) e do momento (década de 1980) em que primeiro se formara como artista. Também exemplares sobre a indistinção dos meios que emprega são os muitos objetos de arame retorcido e enrolado, por ele chamados de Rabiscos [1994], nos quais se aliavam uma inequívoca autonomia como objetos e a sugestão de serem, como o título indica, riscos efêmeros com que parecia querer desenhar no espaço o que não caberia em qualquer [Rabiscos . 1994 . detalhe . fio de aço oxidado . dimensões variadas . coleção do artista] superfície. Noutro trabalho de classificação ambígua [Cajacatinga, 1997], Marcelo Silveira recorta, lixa e fura diversos e pequenos pedaços de madeira, atravessando-os depois com fios de arame e prendendo-os à parede em linhas paralelas. Assim dispostos, evocam sinais caligráficos desconhecidos que poderiam, em potência, construir quaisquer vocábulos sobre o plano onde estão atados; assemelham-se também, contudo, a traços feitos em madeira que esperam somente a vontade do artista para transmutar-se em formas decididamente tridimensionais. Nesse inventário de construções incertas, inclui-se o objeto alongado que, feito um pouco mais tarde e esculpido igualmente em madeira, serve de molde para desenhos realizados diretamente sobre a parede, onde o próprio objeto é afixado, por fim, como parte do trabalho. Demarcando os contornos da peça esculpida sobre a superfície da parede, Marcelo Silveira concede que as suas formas migrem de um meio supostamente autônomo (escultura) para um outro de mesma estatura (desenho), causando indistinção, ademais, entre o que é apenas modelo e o que é trabalho concluído [Sem título, 2001]. [Cajacatinga . 1997 . madeira ‘cajacatinga’ e fio de aço tracionado . dimensões aproximadas 260 x 200 x 5 cm . coleção Cecília e Ricardo Brennand ] [Sem Título . 2001 . madeira ‘cajacatinga, mogno’ grafite, fio de couro e pregos . dimensões variáveis . coleção do artista ] [Estrutura 1 . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões aproximadas 200 x 230 x 310 cm . coleção do artista] Após experimentar, no início de sua trajetória, com técnicas e materiais diversos – período em que as especificidades dos meios usados cedem ao desejo de construção do que não existe ainda –, o artista firma-se, por alguns anos, na criação de objetos feitos em cajacatinga, madeira de árvore cujos topos, parcialmente carbonizados pela prática da queimada, são encontrados na região próxima à cidade de Gravatá, Agreste de Pernambuco, lugar onde Marcelo Silveira nasceu e passou a infância. Em sua maior parte, são peças feitas com pedaços de madeira que, após cortados e lixados, são encaixados uns nos outros por meio de cavas e pinos, constituindo os objetos que, no percurso criativo do artista, são, talvez, os mais facilmente classificáveis como escultóricos. Mesmo no interior desse campo, entretanto, tais trabalhos se voltam contra classificações dóceis, articulando duas tradições distintas de escultura: a que enfatiza o entalhe do material usado (o desbaste de cada um dos pedaços de madeira) e a que se faz pela junção entre partes. Da primeira tradição, retém o interesse pelo volume e pela massa da matéria trabalhada, e da segunda, o apreço pela aproximação mecânica entre peças diversas.1 São todos eles, também, objetos que remetem, uns mais claramente do que outros, a brinquedos e utensílios típicos da região de origem de Marcelo Silveira, não ficando evidente, quando observados em conjunto, se são filiados mais à tradição culta da arte ou se a eles basta o amparo na memória da produção anônima das ruas. Essas estruturas articuladas são, por vezes, postas de pé sobre o chão ou apenas encostadas na parede, traindo uma arquitetura precária que parece sempre próxima ao desmanche. Outras vezes, pendem do teto em balanço e eludem, mesmo a pouca distância, se são destinadas somente à visão ou igualmente ao tato, lançando dúvidas sobre as maneiras com que se pode ou se deve relacionar com os trabalhos do artista: se como observador somente ou se também como participante ativo. Seja por meio do desastre iminente da queda, ou da mobilidade que as peças aéreas, em tese, permitem, parece haver em todos esses trabalhos a admissão contida de mudar a configuração com que são apresentados, trazendo sempre, neles implícita, a idéia de movimento. [Da série Articuladas . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte] [Da série Articuladas . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte] 1 Read, Herbert. A concise history of modern sculpture. Londres, Thames and Hudson, 1970. Uma vez conquistado o terreno do impreciso, Marcelo Silveira tratou de expandi-lo. A partir de objetos feitos em madeira, construiu moldes deles e os fundiu em alumínio, tratando os pares assim criados como trabalhos únicos, feitos de componentes tão semelhantes na forma quanto diferentes em textura, cor, peso e densidade. Desses objetos que avizinham matérias capazes de imprimir sensações tão diversas (uma atrai a luz, a outra a repele; uma sugere aquecer o olhar, a outra parece que o esfria), há um que resume, com precisão, a tensão que os procedimentos construtivo e expositivo adotados ativam: formado apenas por dois elementos de madeira e outros dois elementos semelhantes de alumínio, cada um desses conjuntos é arranjado em equilíbrio precário e similar sobre parede e piso; mas enquanto parece crível que a peça em madeira se mantenha ereta por longo tempo, a outra peça, igual em sua estrutura e articulação entre partes, parece pôr em risco, dado o seu peso excessivo, quem dela se aproximar em demasia. Ao transferir os contornos e volumes de objetos de madeira para substância com características tão diversas, o artista confunde, portanto, quem espera deles alguma certeza semântica associada somente às suas formas, ampliando os sentidos da mobilidade que, apesar de sempre constrangida em sua potência plena, é constitutiva de seus trabalhos e deles transborda a todo [Sem Título . 2000 . madeira ‘cajacatinga’ e alumínio . dimensões variadas . coleção do artista ] [Sem Título . 2000 . madeira ‘cajacatinga’ e alumínio . dimensões variadas . coleção do artista] instante. Ao menos em um caso, contudo, a criação de duplos obedeceu a uma lógica distinta: uma vez feito o molde da peça esculpida em madeira, Marcelo Silveira construiu ainda um outro molde da mesma escultura, unindo-os em uma só estrutura alongada que serviu para fundir, por duas vezes, uma forma que não existia antes. Descartando a peça em madeira que deu origem ao molde, o artista expõe as duas idênticas peças em alumínio alçadas ao teto por fios trançados de couro de cabra, estabelecendo, por meios diversos aos utilizados no trabalho antes descrito, a aproximação entre matérias de características distintas. Em ambos os casos, entretanto, provoca dúvidas quanto à hierarquia de materiais e dos procedimentos empregados, enfatizando, ao contrário, o trânsito entre a origem suposta do trabalho e o seu resultado. Fica já aqui claro, ademais, o interesse que Marcelo Silveira possui pela possibilidade de replicar formas, sejam as que ele mesmo cria, sejam aquelas que, embora transformadas por uma intervenção deliberada, já existem à sua volta. A despeito da ambivalência de significados que esses trabalhos carregam (e que os aproxima, paradoxalmente, como produtos de uma mesma poética), eles podem ser considerados e analisados, individualmente, de acordo com as suas propriedades formais e alusões simbólicas. Em dois outros trabalhos, contudo, o artista – ainda que se mantendo apegado, em um deles, às relações de articulação entre partes e, no outro, à idéia de movimento – cancela essa possibilidade de análise. No primeiro [Coleção I, 1999] dispõe, sobre mesa ou balcão, cinco dezenas de pequenos objetos esculpidos em madeira e lixados. Assim como em vários outros de seus trabalhos, cada uma dessas diminutas peças lembra estruturas orgânicas ou arranjos construtivos rústicos, ecoando – por meio de corte, encaixe ou justaposição de partes – as formas de um utensílio doméstico, de um brinquedo popular ou de um adereço qualquer. Nenhuma delas, contudo, representa, de fato, coisa alguma, sendo do gradual e inevitável reconhecimento de sua inutilidade ordinária que o encanto dessa “coleção” emerge. Estabelece-se [Sem Título . 2000 . alumínio e couro trançado . dimensões variáveis . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães] [Coleção 1 . 1999 . detalhe . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variadas . coleção João Marinho] nesse trabalho, além disso, um deslocamento claro de foco: das propriedades formais de peças que se bastam, as atenções de Marcelo Silveira (e do observador) se voltam também, agora, para um conjunto delas, as quais sugerem, de modo relacional, seus (possíveis) significados. Em vez de considerar apenas cada forma específica, o olhar busca abarcar, igualmente, a relação dessas formas com outras encontráveis ao seu redor, alternando a extensão do seu campo de interesse visual sem conseguir, entretanto, uma apreensão simultaneamente localizada e ampla do conjunto. Embora ainda parcialmente ancorado no âmbito restrito da escultura, vislumbra-se, de modo inequívoco e por meio desse trabalho, o ingresso de sua obra no campo ampliado da instalação, no qual é a relação ativa, ao longo de um certo período de tempo, entre os objetos criados, o observador e o espaço que os envolve que sugere significados sempre prontos a serem redefinidos. No segundo desses trabalhos-limite [sem título, 2001], o artista abandona totalmente as articulações e os encaixes que caracterizam muitos de seus trabalhos anteriores, concentrando-se na construção de um conjunto de peças que prescindem de outras partes. Desbastando e lixando troncos antigos e gastos de árvores já mortas (além da cajacatinga, jaqueira, louro-rosa e baraúna), Marcelo Silveira constrói esferas de diversos tamanhos e acabamento irregular, misturando-as, em seguida, a outras que funde, em alumínio ou ferro, a partir de moldes feitos das esferas de madeira. Além de variarem em grandeza, [Esferas . 2001. ‘vistas das exposições na Pinacoteca da UFAL, Maceió, e na Galeria Amparo 60, Recife’ . madeiras diversas, alumínio e ferro . dimensões variadas . coleção do artista] [Esfera . 2001 . ‘vistas de intervenção no centro do Recife’ . madeira ‘jaqueira’ . dimensões 100 cm de diâmetro . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães ] 2 O trabalho Sfera di giornali [1966], do artista italiano Michelangelo Pistoletto (1933) se constituía de uma grande esfera de papiermaché feita com folhas de jornais que era rolada ao longo das ruas de Turin, numa alusão física à dinâmica dos eventos que a imprensa noticia. Enquanto o trabalho de Marcelo Silveira sugere, a despeito de sua forma, dificuldade de locomoção, a intervenção de Michelangelo Pistoletto reforça, pela matéria simbólica usada na construção da esfera, a idéia de movimento que o formato embute. 3 A passagem da temporalidade analítica (tempo lógico) para a especulativa (tempo experimentado) na escultura moderna é discutida por Krauss, Rosalind. Passages in Modern Sculpture. Londres, The MIT Press, 1977. essas esferas possuem, portanto, textura, densidade e cor distintas, criando, quando aproximadas, áreas de atração e atrito simbólicos aos olhos de quem com elas divide o espaço. Cada uma delas traz, ainda, uma marca diferente, escavada, em baixo relevo, sobre suas superfícies. São símbolos, apropriados pelo artista, que representam – pela junção gráfica de iniciais de nomes – famílias de proprietários rurais, e que são usados para marcar o gado a elas pertencente. Por meio desse entalhe em seus trabalhos, Marcelo Silveira logra esvaziar os significados estáveis possuídos por esses símbolos e os insere no âmbito de sentidos moventes da produção de arte. Aludindo, em sua própria forma, à idéia de deslocamento ágil, essas esferas concentram e multiplicam, ademais, o que antes era somente sugerido, em termos físicos, nas peças de encaixe ou, simbolicamente, na criação de duplos em alumínio. O movimento efetivo que elas permitem é, contudo, limitado: por causa de seu peso extremo e de imperfeições de corte (as quais são transmitidas às peças fundidas), as esferas maiores são obviamente difíceis de mover e restam quase inertes sobre o piso. Essa ambigüidade entre mobilidade e fixidez físicas é ainda enfatizada pela ação realizada pelo artista com a maior das esferas de madeira, medindo mais de um metro de diâmetro e pesando cerca de seiscentos quilos. Deixada, durante as madrugadas (e recolhida, com a ajuda de guincho, nas noites seguintes), sobre calçadas de diferentes bairros do Recife – todas de grande movimento durante o dia –, a esfera causou espanto ou desconcerto (registrados em fotografias) por sua inexplicável presença em lugares para onde não se supunha ser plausível mover coisa tão pesada e sem função discernível.2 Tal como acontece com os trabalhos articulados em partes, também com as esferas a idéia de movimento que as formas de um objeto sugere é truncada pelas propriedades da matéria. Consideradas individualmente ou em grupo, as esferas são, além disso, opacas a qualquer tentativa de representar o mundo, não im-porta quanto tempo com elas se despenda. De modo ainda mais incisivo do que a Coleção I já anunciava, a temporalidade que elas impõem ao observador é outra: não mais a da análise que descreve o trabalho, mas a da especulação de seus significados.3 Essa rejeição a sentidos isolados ou únicos – sejam eles formais, narrativos ou alegóricos –, permite a Marcelo Silveira se lançar em direções diversas, obedecendo apenas a sua vontade renovada de articular os seus trabalhos com o entorno simbólico e físico dos lugares onde os desenvolve. No trabalho Roupas de Casa [2003], o artista vincula, na construção de objetos, duas expressões distintas de organização social: a divisão de trabalho adotada pelos artesãos de Cachoeirinha (Agreste de Pernambuco) na confecção de montarias e a arquitetura das moradias precárias dos “trabalhadores sem-terra”, fincadas ao longo das estradas que cortam o país. Sobre esquemáticas estruturas de pequenas edificações feitas com finas hastes de aço, o artista coloca “roupas” de couro que repetem e cobrem as composições vazadas dessas “casas”, configurando uma cidade inventada e móvel, contingente mas inequivocamente concreta. Alinhadas sobre o piso, essas formas cobertas são parcialmente refletidas em espelhos de molduras ovais como os que se usavam em salas de jantar, todos também postos em fila sobre parede próxima e já trazendo, desenhadas sobre suas faces reflexivas, arquitetura delgada semelhante à que dá sustentação às casas. Uma vez mais, impõe-se nesse trabalho a idéia de que [Roupas de Casa . 2003 . ‘vista da exposição na Galeria Nara Roesler, São Paulo’ . couro, aço inoxidável, espelho e madeira ‘ipê’ . dimensões variáveis . coleção do artista ] nada fica parado e de que mesmo o que parece distante aproxima-se e se toca: a face externa das casas e os espelhos “da sala” que as refletem, o metal frio e o couro que o aquece, a idéia do artista e o trabalho dos artesãos que confeccionam as peças, as moradias frágeis dos “trabalhadores sem-terra” à margem da estrada e o conhecimento culto que o trabalho gera. Incorpora, por fim, matérias antes só pontualmente por ele usadas e volta a deixar à mostra o gosto pela construção que é fruto da linha e do traço. Se, em Roupas de Casa, aquele que antes era só observador negocia sua interação virtual com o trabalho – confundindo, no espelho, a sua imagem com as das casas –, em Bochinche [2003] a imprecisão do lugar que público e trabalho ocupam é de natureza quase tátil. Formado por doze núcleos – cada um deles composto por oito pequenos blocos de madeira presos ao teto e por igual número de fios de couro que, trespassando aqueles, descem até o chão e se entrelaçam –, o trabalho fala de conversa, de burburinho, de contatos fortuitos e imprevistos como os que acontecem em lugares de festa. Percor- [Casa Abelha . 2003 . madeira ‘moiracatiara’ . dimensões 169 x 40 x 40 cm . coleção do artista] [Casa Bernardo . 2003 . cobre . dimensões 39 x 37 x 70 cm . coleção do artista ] [Casa Coronha . 2003 . aço inoxidável, couro de cabra com pêlos . 184 x 31 x 31 cm . coleção do artista] rendo as passagens que os fios pendentes do teto formam, é possível negociar a diferença entre o percurso do olho que atravessa o espaço vazado feito de teias de couro e aquele percorrido pelo corpo inteiro, obrigado a circundar os núcleos para mover-se de um a outro canto. No meio da sala, porém, um pequeno e estranho “carro” de madeira aparenta estar pronto para deslocar-se para qualquer lado, servindo de potencial elo entre as doze unidades distintas e entre o visitante e todas elas. Já em Combinação Torreão [2004], é o encurtamento físico e simbólico da distância que separa instituições de arte que o trabalho provoca. Feito de fios de couro entrelaçados que reproduzem, quando esticados e pendurados ao teto como planos moles, a sala de exposições do Torreão (Porto Alegre), Marcelo Silveira o expõe no Gasômetro (também em Porto Alegre), no Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães – MAMAM (Recife) e no Centro Cultural São Francisco (João Pessoa), fazendo migrar, de um aos outros lugares, a arquitetura de um só espaço. Marcelo Silveira parece anunciar, nesses trabalhos, quão pequena é a distância entre as coisas julgadas distantes. E é esse desejo de aproximar o que parece apartado que orienta a criação do Armazém República [2004], instalação feita de dois segmentos distintos que partilham, além do nome, uma estratégia de construção. Num desses segmentos, cem peças esculpidas em madeira são alçadas ao teto por fios de couro, pendendo dali como se fossem carne fossilizada ou formas sem serventia à espera de um uso improvável. Assim como na Coleção I, trata-se de um ajuntamento de coisas criadas que, embora evoquem as formas de objetos úteis, não são mais que volumes desprovidos de significados assentados. Ao contrário das peças pertencentes àquele trabalho, entretanto, os objetos de madeira [Bochinche . 2003 . ‘vistas das exposições Atelier Finep, no Paço Imperial, Rio de Janeiro e Ocupações, Centro Cultural de São Francisco, João Pessoa’ . madeira ‘cajacatinga’ e couro . dimensões variáveis. coleção do artista] [Combinação Torreão . 2004 . ‘vista da exposição Ocupações, Centro Cultural de São Francisco, João Pessoa’ . couro . dimensões 400 x 400 x 400 cm . coleção do artista ] que compõem o Armazém República não foram, desde quando ficaram prontos, logo reunidos dessa forma. Sem conseguir impor-se, aos olhos do artista, como trabalhos autônomos, encontraram o seu lugar, como parte de um conjunto, apenas com o distanciamento que o passar do tempo concede. No outro segmento do Armazém República, uma estante de madeira abriga centenas de objetos de vidro (copos, potes, espelhos, garrafas, vasos, lustres, cacos) que se amontoam, dialogam uns com os outros e se espalham em prateleiras largas, formando painel vertical, transparente e frágil que se contrapõe à horizontalidade opaca e robusta dos objetos de madeira pendurados do alto. Além das diferenças de propriedades físicas, as duas seções desse grande armazém parecem se distinguir, a uma primeira mirada, pelo fato de as peças de vidro terem sido achadas já prontas, e as de madeira terem sido feitas, uma a uma, pelo artista. Efetivamente, nunca antes havia Marcelo Silveira lançado mão, com tal intensidade, do universo de formas disponíveis à sua volta, tratando quase sempre de criar outras novas. Arrumadas nessa estante, entretanto, as peças de vidro gradualmente desfazem as diferenças que [Armazém República ‘madeira’ . 2004 . madeira diversas . dimensões variáveis . coleção Nara Roesler ] possuem daquelas de madeira, posto que o arranjo novo das primeiras as torna tão desprovidas de utilidade quanto o desbaste que dá forma às segundas as faz imprestáveis para qualquer uso. Ademais, o tempo longo em que cada uma das peças de madeira foi guardada no atelier – quase como vestígios de um gesto criativo frustrado – antes de serem recuperadas como componentes do Armazém República, fez com que o artista dispusesse delas quase como se fossem obra alheia, e não mais fruto de seu trabalho.4 Ativando os canais que atam, em tensão constante, aquilo que parece diferente, essa instalação dá visibilidade, portanto, à fragilidade de distinções estanques e à incessante troca simbólica que existe entre as várias matérias e formas por onde idéias e coisas do mundo se movem. Tal como o “museu de tudo” do poeta João Cabral de Melo Neto, o armazém de Marcelo Silveira parece, pelo dinamismo que encerra, poder sempre acolher alguma coisa mais, dissolvendo limites arbitrários para se tornar “depósito do que aí está”.5 [Armazém República ‘vidros’ . 2004 . detalhe . madeira, vidros, espelhos e lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista ] 4 Silveira, Marcelo. “Armazém do Mundo”. Entrevista publicada neste livro. 5 Melo Neto, João Cabral de. “O Museu de Tudo”, in Museu de Tudo. Rio de Janeiro, Editora José Olympio, 1975. [Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004] [Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004] [Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004] [Coleção I . 1999 . ‘vista da exposição no MAMAM, Recife, 2004’ . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção João Marinho] [Roupas de Casa . 2003 . ‘vista da exposição no MAMAM, Recife, 2004’ . couro, aço inoxidável, espelho e madeira ‘ipê’ . dimensões variáveis . coleção do artista ] [Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004] [Armazém República ‘madeira’ . 2004 . detalhes . madeiras diversas . dimensões variadas . coleção Nara Roesler ] [Armazém República ‘vidros’ . 2004 . detalhes . madeiras, vidros, espelhos, lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista] [Armazém República ‘vidros’ . 2004 . madeiras, vidros, espelhos, lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista ] ARMAZÉM DO MUNDO Agnaldo Farias, Moacir dos Anjos e Marcelo Silveira 28 de junho de 2004 . Recife Moacir dos Anjos . Marcelo, são quase duas décadas produzindo arte. Gostaria que você comentasse como foi o início de sua trajetória, o período em que você começou a enxergar, no que fazia, a potencialidade de uma produção artística. Marcelo Silveira . Comecei em meados dos anos 80. Aqueles foram anos de aprendizado, de experimentação, de uma maneira, talvez, até inconseqüente. Mas eu acho que a consciência da produção se torna maior e mais nítida somente a partir do final dessa década e início dos anos 90. Foi nesse período que ocorreram alguns fatos importantes, principalmente o distanciamento do que eu estava fazendo até aquele momento. Em 1991, viajei para a Europa e Norte da África, e fiquei fora durante um ano. Um ano sem produzir quase nada, apenas esboços, desenhos, mas com a cabeça trabalhando, pensando nas coisas que via e naquilo que já havia feito. Num determinado momento, parei em Barcelona por três meses. Foi nessa época que se deu a maturação e a tomada de consciência da minha produção. MA . Mas como era o seu trabalho antes dessa viagem? MS . Era muita pintura e desenho. Embora já construísse alguns objetos, inclusive já tendo feito, um pouco antes dessa viagem, uma exposição em Belo Horizonte, na Itaú Galeria, a atitude era ainda a de pintor. Usava madeira, usava outros materiais, mas continuava sendo pintor. Eu tinha um pensamento claramente pictórico. A escolha da ma-deira e dos materiais era sempre subordinada a uma preocupação com a cor. Agnaldo Farias . Havia algum tema que predominasse nesses trabalhos? MS . Não. O que havia, já naquela época, era uma vontade de transformar os objetos que eu encontrava e que, por algum motivo, me chamavam a atenção. AF . Você chegou a essa motivação através de escola, freqüentando exposições? Como é que você se formou como artista? MS . No final dos anos 80, ainda antes da viagem que mencionei, freqüentei muito os ateliers de outros artistas e os Festivais de Inverno de Minas Gerais. Essa convivência me levou a pensar um pouco mais no que era o espaço do atelier e no que é o artista. Eu lembro que, antes de ir a esses festivais, eu ficava muito incomodado com o ambiente em que vivia no Recife. Aqui, a pintura era muito forte, eu tinha que pintar. As informações eram poucas, eu viajava muito pouco. Eu não me satisfazia. As conversas eram quase apenas sobre pintura, sobre os efeitos pictóricos obtidos com diferentes técnicas, e eu ficava muito angustiado. Aquilo me incomodava. AF . Incomodava quem? Quem era Marcelo Silveira a essa época? MS . Eu era muito ligado à Oficina Guaianases, que, para mim, foi um grande espaço de iniciação. Mas, apesar de sua importância na minha formação, as discussões das quais eu participava ali não me satisfaziam totalmente. Eu queria discutir algumas outras coisas que, mesmo sem saber exatamente o que era, não conseguia encontrar na Guaianases. Foi então que eu comecei a discutir mais com Liliane Dardot, artista mineira que, na época, morava em Olinda. Por meio dela conheci o trabalho de Amílcar de Castro. E também os textos de Amílcar que ela levava para a Guaianases. Fiz com Liliane um curso de desenho, em que ela sempre mostrava coisas novas e discutia com os alunos. Foi por causa desse contato com ela que veio o desejo de freqüentar os Festivais de Inverno de Minas Gerais. AF . O clima desses festivais era de muita efervescência. Era possível participar dos ateliers oferecidos por artistas locais, como Marcos Coelho Benjamim, Marco Túlio Resende, Fernando Lucchesi, e se aproximar do trabalho deles. Alguém lhe deu sugestões que tenham sido essenciais para o desenvolvimento de seu trabalho? MS . No primeiro Festival de Inverno de que participei, eu parecia um cego no meio de um tiroteio, perdido entre tantas coisas. Mas o de 1989, realizado em Belo Horizonte (era a quarta vez que eu freqüentava o Festival), foi muito tranqüilo e muito importante para mim. Eles investiram pesado na produção e na presença de vários críticos. Lembro de uma equipe formada pelos críticos Roberto Pontual, Olívio Tavares de Araújo e uma terceira pessoa de quem não recordo o nome. Eles faziam o acompanhamento das oficinas, avaliavam, desciam a lenha em um, falavam bem de outro. Eu sempre fui muito tranqüilo em relação a isso. Gostassem ou não gostassem do que eu fazia, eu ia lá para aproveitar o que existia de bom. Os críticos tinham a verdade deles e eu tinha a minha verdade. Era legal esse confronto. Lembro que as considerações mais pertinentes eram as feitas por Roberto Pontual. Esse festival em Belo Horizonte foi realmente marcante. Quando estive em Barcelona, algum tempo depois, percebi que as discussões que tínhamos nos festivais de Minas Gerais não ficavam atrás das discussões da escola de arte que freqüentei lá por três meses, a Massana, uma escola ligada à Prefeitura. MA . Em Minas há uma tradição de criação de objetos, e também uma prática relacionada à catação, à apropriação, no trabalho, de coisas achadas. Dentre os ateliers que você freqüentou, alguma produção lhe chamou particularmente a atenção a esse respeito? MS . O que me chamou a atenção, o primeiro grande impacto de Minas, foi o trabalho de Celso Renato. Eu ficava impressionado com a força do trabalho e em como ele não tinha visibilidade. Aliás, até hoje não há visibilidade para o trabalho dele. As pessoas simplesmente parecem desconhecer Celso Renato. MA . Essas seguidas viagens a Minas parecem ter sido muito importantes para sua formação. MS . Sem dúvida. Além dos festivais, em 1990, eu fiz uma exposição individual no Itaú Galeria de Belo Horizonte, que era coordenado por Cláudia Renault. Era um espaço cultural muito dinâmico. Muita gente ia ver a exposição. Mas o mais importante é que, nessa mesma época, estava acontecendo uma grande mostra de Arthur Bispo do Rosário, no Museu da Pampulha, organizada por Frederico Morais. Essa exposição do Bispo foi um acontecimento para mim. E é engraçado que Agnaldo [Farias], que me convidou para uma mostra coletiva em torno da obra do Bispo, não sabia, na época que me fez o convite, da importância que a experiência de ter visto aquela exposição teve para o meu trabalho. Ha- via somente uma coisa que me incomodava na mostra, que me levou até a arengar com Frederico, que foi o fato dele haver colocado na parede, na entrada da exposição, um atestado de insanidade mental do Bispo. Eu ficava incomodado toda vez que via aquele atestado. Porque eu acho que foi a obra do Bispo que me fez intuir o que significa ser um artista, mesmo que até hoje eu busque entender isso plenamente. Foi olhando o Bispo que, de alguma maneira, percebi que era aquilo que eu procurava. Percebi que aquilo, embora aparentemente tão simples, era uma grande obra. Eu lembro que me emocionei com a exposição. Aquela coisa de você ficar mudo. Uma chapu-letada. E por isso não entendia aquelas discussões todas sobre se aquilo ali era arte ou não. Acho que o fato de o curador ter colocado aquele atestado de insanidade na mostra demonstrava um pouco de insegurança da parte dele. AF . O seu depoimento é interessante porque essa mostra, que foi montada no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Belo Horizonte, provocou esse mesmo choque nas três cidades por onde passou. Lembro que, em 1991, Marcos Coelho Benjamim, Fernando Lucchesi e Paulo Lender participaram da Bienal de São Paulo com um projeto conjunto que era, nitidamente, uma homenagem a Arthur Bispo do Rosário. A impressão, pelo que você fala, é que, embora o seu trabalho tivesse uma vocação para o objeto, foi somente o trabalho do Bispo que, de alguma maneira, deu uma chancela ao que você buscava e que não encontrava eco no meio em que você se movia, naquela época, no Recife. Não apenas para a prática da catação, como o Celso Renato fazia, mas também para o tipo de produto que acho que viria a aflorar apenas alguns anos depois na sua produção, objetos mais distantes da escultura propriamente dita e mais próximos do vernáculo, do popular. Seria correto falar da passagem, ao longo dos anos, de um interesse em formas criadas para formas apropriadas no seu trabalho? MS . Eu acho que existem determinadas questões que me interessam, que são trabalhadas ao longo de um tempo de uma maneira que me satisfaz e que terminam saindo completamente do trabalho. Já outras terminam voltando de tempos em tempos. Mas é certo que o meu trabalho mais recente não se esgota na questão escultórica. Existe simultaneidade de vários interesses. Há momentos em que eu estou pensando apenas em escultura e fico tentando eliminar tudo, desbastar mes- mo. E há momentos em que entra o espaço em torno do objeto que estou fazendo, em que entra a quinquilharia que está à minha volta, em que aparece a vontade de me apropriar de tudo. AF . O que me parece é que, no início, o trabalho tinha um apuro formal mais nítido, uma preocupação maior com o acabamento. Era como se ele estivesse, de alguma maneira, ainda preso a um campo específico de criação. Houve um momento em que a sua produção artística podia acontecer dentro dos marcos da pintura, porque eram da pintura as referências que você tinha. Em um segundo momento, entra a escultura e, logo depois, a catação de objetos, a liberdade de trazer qualquer coisa para o território da arte. A sensação que tenho, acompanhando o seu trabalho ao longo da década de 1990, é que, num determinado momento, você purga a vontade de criar formas. E purga também a vontade de simplesmente se apropriar de formas ou objetos já prontos. Tanto que eu acho interessante quando você consegue, hoje, fazer trabalhos que ressoam no campo da escultura e, igualmente, no campo de onde vêm os objetos apropriados. É como se o trabalho ocupasse um espaço intermediário: metade dele está do lado de fora do museu, metade dele está dentro do museu. Há isso? MS . Creio que sim, e acho que é preciso vol tar mais uma vez a Bispo do Rosário para entender esse aspecto do meu trabalho. Talvez eu não tenha homenageado tanto o Bispo como devesse, dada a sua importância para a minha trajetória. Não que eu tenha ficado tentando trabalhar em cima do que vi naquela exposição, mas porque essa importância fica clara nos rumos que, anos depois, senti que meu trabalho estava tomando. O grande ensinamento do contato com a obra do Bispo foi esse ir e vir que é tão presente no que ele faz. Muitas vezes, o Bispo apenas se apropria do que já existe; aqui e acolá, se arrisca a construir o objeto totalmente, sem se preocupar se há ou não coerência construtiva com o que fez antes. É essa liberdade que ambiciono, não somente de procedimentos, mas também de materiais. A liberdade de eu estar interessado, hoje, em fazer um objeto por causa do peso excessivo da matéria que estou usando e de, amanhã, fazer um objeto explorando a leveza do papel. De trabalhar uma época com a madeira e em outra hora trabalhar com o ferro. Nesse momento, estou amadurecendo a idéia de trabalhar com chumbo, com ferro fundido, voltar à escultura, explorar a direção oposta da que eu estou explorando hoje, com o uso do papel, do grafite, o interesse pela linha. Não sei, acho que eu devo ter alguma coisa troncha que não permite que eu me satisfaça com o que faço. MA . Gostaria de explorar um pouco essa questão do interesse pela linha, pelo desenho, que é algo que vem ainda da década de 1980, do início de sua trajetória. Examinando a sua produção ao longo dos anos, percebo, muitas vezes, nas esculturas e objetos que você faz, um olhar de desenhista também. Esses trabalhos parecem sempre trazer presente a sugestão de que foram feitos por meio de traços articulados no espaço. Como se fossem desenhos feitos no espaço. Qual a relação entre o desenho e a escultura no seu [Livro do Armazém . 2004 . carimbos sobre papel ‘edição’ . dimensões 22,5 x 16 cm . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães] [Armazém República ‘madeira’ . 2004. detalhes, nesta página e seguinte . madeiras diversas . dimensções variadas . colelção Nara Roesler ] trabalho? MS . Apenas em pouquíssimas situações eu usei o desenho como esboço de um trabalho tridimensional. Normalmente, quando eu faço uma escultura, troco o instrumento de trabalho. Eu largo o lápis e vou para a serra tico-tico. Largo o lápis e vou construir as linhas diretamente com a serra, desbastando a madeira. Às vezes, é a forma de “desenhar” com a tico-tico que sugere uma atitude mais brusca no corte da madeira. Em outras ocasiões, é a dimensão ou o formato do pedaço de madeira que tenho à disposição que vai sugerir o “traço” que faço. Não há como fazer esboço, não dá pra ter arrependimento. A esse respeito, eu me lembro que Amílcar de Castro dizia uma coisa que me impressionou muito: que o grande ensinamento que ele recebeu de [Alberto] Guignard, com quem havia estudado, foi o de havê-lo forçado a desenhar apenas com um lápis duro, difícil de apagar. Aquilo ficou na minha cabeça a vida inteira. É engraçado não haver uma influência direta da obra de Guignard no trabalho de Amílcar e haver esse ensinamento, que é quase o fio condutor de toda obra dele: a necessidade da precisão do traço. É, talvez, por isso que não vejo desenho e escultura como coisas separadas, vem tudo junto. E isso me remete ao Livro do Armazém [2004], que reúne reproduções, feitas com carimbos que mandei confeccionar, dos contornos das 100 peças de madeira que compõem a instalação Armazém República [2004]. Nesse caso, há até uma inversão do que é mais usual: foram os objetos de madeira esculpidos que usei como “esboços” para os desenhos feitos com carimbos. AF . Nesse caso, você desenha com a tico-tico sobre a madeira, e é o resultado dessa ação que se torna a matriz do desenho que vai ser impresso no papel, e não o contrário. Isso é uma compreensão ampliada do que é desenho. MS . Acho que isso tem a ver com a arrumação que a gente faz das coisas e dos conceitos. Eu tenho mania de arrumar e de organizar as coisas como se elas fizessem parte de [Cajacatinga . 1997 . detalhe . madeira ‘cajacatinga’ e fio de aço tracionado . dimensões variadas . coleção Cecília e Ricardo Brennand] [Coleção I . 1999 . detalhe . madeira ‘cajacatinga . dimensões varidadas . coleção João Marinho] [Roupas de Casa . 2003 . detalhe . couro, aço inoxidável, espelho e madeira ‘ipê’ . dimensões variáveis . coleção do artista] um armazém. Antes, eu pegava as coisas e sempre interferia nelas. Hoje eu sou mais um arrumador. Eu arrumo tudo. Aliás, eu cheguei à conclusão de que uma pessoa organizada não é necessariamente aquela que ordena as coisas de um modo visualmente limpo; organizada, pra mim, é aquela pessoa que arruma informações a que outras pessoas podem ter acesso, que permite que outros possam enxergar o seu universo, mesmo que essa arrumação implique um acúmulo de coisas. Nesse sentido, eu acho que sou uma pessoa organizada, acho que os outros conseguem enxergar o que eu faço. AF . Então, seria a sua maneira de organizar as coisas que permite que uma outra pessoa entre no seu sistema de pensamento e de criação. Isso é um dado muito interessante, e acho que está realmente presente na sua obra. Há um trabalho seu, feito de várias pequenas peças de madeira arrumadas em linhas na parede [Cajacatinga, 1997], que tem muito a ver com caligrafia, onde as fieiras de peças arrumadas seriam quase como as linhas da pauta de um caderno e onde as peças têm uma semelhança e sugerem uma relação entre si. Já os trabalhos Coleção I [1999] e Armazém República são feitos de objetos diferentes, que foram construídos separadamente e depois aproximados. Você aproximou aquilo que estava distante no mundo, e o interesse do trabalho está menos em cada uma das coisas juntadas do que na sua organização, na maneira de mostrá-las. Os objetos que compõem esses trabalhos não têm nada ou pouco a ver uns com os outros, a não ser o fato de quase todos serem feitos de madeira. A exceção, em trabalhos recentes, talvez seja a instalação Roupas de Casa [2003], em que, embora as muitas peças que compõem o trabalho também formem uma coleção, existe um princípio isomórfico e há similitude e contigüidade entre as peças. Eu queria que você falasse um pouco sobre isso, porque você parece ter abandonado a intenção de fazer formas semelhantes para se dedicar a fazer formas cada vez mais díspares. Você tem trabalhado com um princípio de organização que aproxima as coisas que são di ferentes. MS . Vou tentar explicar como se deu esse processo. Há algum tempo, passei a perceber que coisas que havia feito no passado me incomodavam. Cheguei a destruir alguns trabalhos, tocando fogo neles. Mas, outras vezes, comecei a descobrir situações em que essas obras conviviam bem quando estavam juntas. Na verdade, já me passou pela cabeça a idéia de criar obras “inválidas”. Justamente essas obras que não me satisfazem é que seriam postas em caixas lacradas e declaradas como inválidas. Mas aí eu comecei a achar preocupante essa questão das obras inválidas. Seria uma solução muito fácil: não gostei de um trabalho, boto dentro de uma caixa e digo que é inválido. Pronto. Na verdade, eu acho que tenho que encarar de frente esses trabalhos, pegar eles, retomar eles e ver no que é que vão dar. De alguma forma, preciso interferir nesses trabalhos e dar uma nova ordem para eles. Creio que muito em breve esses trabalhos estarão sendo resgatados. E novamente aparece, nesse procedimento, essa idéia de ir e vir. E é aí que entra a estética do armazém, de sua importância para o meu trabalho. Nela, não é o verde que tem que ficar perto do vermelho ou do laranja, nem o maior que tem que ficar perto do menor, nem o transparente que tem ficar perto (ou distante) do opaco. No armazém, o espaço é preenchido por objetos sem preocupação com o que está na sua vizinhança ou com a função daquilo que está exposto, e o dono do armazém não deixa de vender os objetos por causa disso. Eles não deixam de chamar a atenção e não deixa de haver beleza naquele excesso de coisas penduradas. Comecei a ver a importância daquela disposição caótica das coisas, própria das barracas de feira, dos armazéns. Talvez esse apego venha da minha experiência com o armazém de Seu Malaquias, o meu avô, onde iam se acumulando resquícios das coisas antigas que haviam passado por lá. O cartaz antigo do sabonete Lux de Luxo, por exemplo, que ficou preso na parede por muitas décadas. Eu lembro que, nos anos 80, existia ainda o cartaz dos anos 50. O meu avô foi mudando de atividade e era muito ciumento de seu armazém; no final da vida, vendia só material de construção, mas mantinha os cartazes da época em que ele vendia carne, produtos de beleza, tecido. MA . O acúmulo do armazém era também temporal, com os símbolos de épocas distintas se amontoando ali? MS . Exato. E essa estética começou a ser importante para mim. Eu comecei a ver que aquilo não era uma coisa feia. Então, em vez de negar os trabalhos que havia feito, vi que era preciso encará-los e assumir que aquilo era, efetivamente, o que eu fazia num determinado momento. Que era preciso deixar aquilo ser visto. É diferente de trancar as obras dentro de um baú. AF . Essas peças fazem parte do Armazém República? MS . Não. Essas de que estou falando são peças mais antigas que ainda estão aguardando serem retomadas. O Armazém República é composto de peças de madeira que não deram certo em relação às minhas expectativas quando as fiz, mas que, a partir de um certo momento, começaram a chamar a minha atenção. Quando comecei a pensar em fazer esse trabalho, havia um sentimento contraditório, uma certa confusão. Porque eu estava utilizando coisas que, na minha opinião, não haviam dado certo e que, agora, queria que fossem vistas, todas juntas, como num armazém. MA . Elas não haviam dado certo sob que critérios? MS . Elas não tinham autonomia. Por isso não tinham dado certo. Só encontraram uma razão de existir quando ficaram juntas. Foi no contato prolongado com essas peças que comecei a ver que a gente não precisa ficar criando coisas novas o tempo todo. É possível entrar no atelier, abrir as caixas e os pacotes e ficar limpando, depurando, separando algumas peças e jogando fora as coisas que não prestam. Eu comecei essa história toda do Armazém República revendo as imagens de diversos trabalhos antigos. Percebi que havia algumas representações e características construtivas que se repetiam, formando famílias, e passei a agrupar as peças em função dessas semelhanças. MA . Você fala que nem sempre é preciso criar formas novas, que é possível se apropriar de coisas já prontas no atelier. Mas há um outro segmento do Armazém República que é formado por objetos de vidro, que implica um outro tipo de apropriação. Não mais a apropriação de coisas feitas por você no passado, mas sim de coisas pertencentes ao mundo da indústria. São lâmpadas, lustres, garrafas, espelhos, potes e outros objetos. Parece-me que, mesmo não sendo uma prática inédita no seu trabalho, essa é a primeira vez que essa apropriação e rearranjo de coisas industrializadas recebe tanto destaque nele. Ecoa estratégias que, aparentemente, não têm relação próxima com o seu trabalho anterior, sendo mais da ordem do readymade. Como é que você vê essa passagem no seu trabalho? MS . Foi uma coisa refletida. Não é uma atitude gratuita. Uma das razões que me fizeram construir esse armazém de vidros foi o fascínio com as características físicas do vidro, principalmente a sua fragilidade. A possibilidade de ele quebrar e, de um momento para o outro, deixar de existir. Para mim, isso já era uma razão suficientemente forte para decidir trabalhar com o vidro. A outra coisa que me interessava era retirar a função do objeto apropriado. Retirar a função de uma garrafa de suco e, ao mesmo tempo, dar a ela o mesmo tratamento que dou ao pote decorativo e ao vidro maravilhosamente bem trabalhado, agrupando todos no mesmo local. Por fim, incluí muitos vidros quebrados nesse trabalho porque também me interessa jogar com a atração que o vidro exerce, a vontade que dá de tocar nele, e o receio de fazer isso por conta do risco de se cortar com o toque. Em vez de excluir isso do trabalho, eu comecei a jogar com essa ambigüidade. Não se trata de ser agressivo, mas de encontrar beleza nisso. E acho interessante mostrar as peças de madeira do Armazém República, que foram exaustivamente trabalhadas, próximas das peças de vidro, que foram só catadas por mim e arrumadas em prateleiras. Na verdade, acho que há uma semelhança entre os dois segmentos do trabalho. Eu convivi muito com essas peças de madeira, mas não conseguia definir um fim para elas, até que elas ficaram distantes de mim. Os vidros também impunham essa distância, só que de modo imediato, porque tinham sido feitos por outras pessoas. É como se aquelas peças de madeira também tivessem sido feitas por outras pessoas. AF . De onde vem o título Armazém República? Era o nome do armazém do seu avô? MS . Não. O armazém do meu avô era M. G. Silveira. “República” é uma palavra que tem nove letras que não se repetem e que, no código que meu avô criou para fazer a contabilidade do armazém, correspondem aos numerais de 1 a 9. Uma vez eu perguntei aos meus irmãos sobre isso e eles não sabiam da existência desse código. Todos passaram pelo armazém ajudando o avô, mas só pra mim ele explicou o código. Eu ficava lá, mais conversando com ele do que ajudando no trabalho. Era o tempo todo discutindo uma coisa, discutindo outra. Foi uma grande convivência. Quando ele comentava as dificuldades do negócio de um conhecido, dizia: “Ah, aquilo não vai dar certo, ele faz do apurado lucro”. Era uma maneira simpática de se referir aos maus negócios que alguém estava fazendo. Ele não gostava de falar abertamente da decadência do outro. Era uma pessoa sempre pra cima. AF . Era uma pessoa delicada? Como ele era? MS . Um dado para entendê-lo é saber que ele não tinha carro. Preferia alugar um quando precisava para fazer isso ou aquilo. Mas investia em viagens. Viajou muito. Europa, África. Ele e os filhos. Ele com alguém da família. Só em uma das suas últimas viagens, ele começou a viajar com a mulher, porque quando um viajava o outro ficava. Era sempre assim. Tem outra coisa interessante: vovô nunca foi de dar brinquedos de presente. Quando um filho ou um neto ia viajar, ele dava um envelope na ida ou na volta com uma contribuição em dinheiro. Ele era uma pessoa muito simples. Uma pessoa que veio de uma família que, lá longe, teve dinheiro. Perderam quase tudo, e ele foi ser dono de armazém. Começou com isso. Talvez por causa dessa trajetória, ele sempre deu muita importância à educação formal dos filhos, que sempre estudaram em escolas boas. [O que abunda não atrapalha . 2003 . madeira ‘cajacatinga, ipê e jaqueira’ . dimensões variáveis . coleção privada] AF . Estamos falando de referências fortes no seu trabalho. Você tem referências pictóricas da história da arte, até por conta de sua convivência com diversos artistas pernambucanos, na década de 1980, que trabalhavam, fundamentalmente, com pintura. Eu imagino que conhecer a obra de Bispo do Rosário já foi uma grande abertura. Como você sentiu que a sua própria vivência, inclusive a familiar, podia informar o seu trabalho como artista? Quando é que isso se tornou claro para você? MS . Vou responder de uma forma meio enviesada. A origem daquela coleção das 50 peças de madeira [Coleção I] é muita engraçada, porque surgiu da vontade de fazer um prendedor de cabelo para dar de presente para uma amiga. Depois que acabei aquele trabalho foi que eu me dei conta disso. Eu terminei me envolvendo com a idéia de fazer uma peça pequena, fiz 50 delas, e nenhuma se parece com uma presilha de cabelo. Acho que foi a partir desse envolvimento concentrado que começou a aflorar, com mais força, a história do engenho, a madeira que eu encontrava abandonada na mata, os papéis do armazém. Foi aí que tudo começou a se misturar e eu comecei a ver que a minha vida talvez fosse um grande armazém. Isso foi no final da década de 1990. De lá para cá, eu comecei a pensar muito nessa questão do armazém. No início, ficava muito ligado somente à imagem do armazém, e só aos poucos fui me distanciando dela. Os “livros de escrita” que eu faço são referências aos livros do armazém, onde se anotavam os estoques, se faziam as contas, com toda a espontaneidade. Eu também vou anotando isso e aquilo nos meus “livros de escrita”. Vou anotando de qualquer modo as coisas do dia a dia, e percebo que a intensidade com que você registra uma coisa hoje é diferente da que você emprega amanhã. A tinta hoje está menos porosa do que amanhã. Hoje é grafite, amanhã é caneta. A questão é: se o que me interessa e me atrai está tão próximo de mim, pra que é que eu tenho que ir buscar referências distantes? Esse armazém do meu avô é o que eu faço no meu trabalho. É à estética do armazém que eu dou importância. Não posso negar. O Nelson Leirner também tem algo assim. Ele armazena as coisas, cria armazéns. Sinto proximidade do trabalho dele, embora ele seja muito mais urbano, enquanto minha origem é o campo. Eu fiz um trabalho em que vejo muito a ligação com Nelson Leirner. Ele se chama O que Abunda não Atrapalha [2003]. No início, eu achava tudo, nesse trabalho, excessivo, e foi uma amiga que disse: “não, o que abunda não atrapalha”. O trabalho de Nelson Leirner é isso pra mim. É um trabalho que abunda e não atrapalha. Enquanto todos estão limpando, ele vai lá e enche tudo. E é maravilhoso. Ele cria algo que eu chamaria de excesso simplificado. AF . Eu acho que muito gente trabalha com essa idéia de colecionar objetos, e todas as coleções são, evidentemente, diferentes. O momento de seu trabalho onde percebo mais proximidade com Nelson Leirner é na instalação Roupas de Casa. Nela você coloca uma casa ao lado da outra, formando uma espécie de vila ou cidade. E Nelson também organiza, de alguma forma, cidades imaginárias. Mas, talvez o que mais o aproxime do trabalho de Nelson seja mesmo a questão do excesso. Você sente alguma pressão para que seu trabalho seja mais limpo, mais “seco”? MS . Eu recebi várias ofertas para a compra de uma, duas ou três peças do Armazém República. Mas eu não vejo sentido em vendê-lo assim. O trabalho é composto de 100 peças. Quem quiser, tem que levar tudo. Não é só uma questão comercial. É que as pessoas querem tudo simples. Dizem que uma peça só basta, que duas bastam. Eu digo que não, que eu quero muitas delas juntas. Eu escuto exaustivamente isso aqui. Mas eu fico tranqüilo. Sei que mais cedo ou mais tarde eu encontro um lugar, público ou privado, para aquilo ser acomodado. Pode ser até que vá para um lugar e fique guardado, mas tudo junto. Na verdade, eu acho que algumas peças podem ficar penduradas enquanto outras ficam armazenadas dentro de caixas, sem ser expostas. Ficam ali guardadas até alguém decidir abrir e pendurar também. O importante é que o trabalho seja um só. MA . Essa discussão sobre o Armazém República levanta uma outra questão importante. Esse trabalho explicita, de uma vez por todas, uma mudança nos procedimentos de criação com os quais você trabalhava antes. Não se trata mais, aqui, de uma forma única que você cria e resolve dialogando com a tradição da escultura. Nesse trabalho, você cede a essa operação de ajuntamento que tanto lhe fascina. E isso também provoca uma ocupação diferente do espaço, mais relacionada com a tradição da instalação. O público, obviamente, também passa a se relacionar de uma forma diferente com o seu trabalho. Ele não mais circunda um objeto nem considera cada elemento que você apresenta isoladamente, ainda que cada um desses elementos pudesse ser considerado, individual- mente, uma escultura. Sua produção recente leva o público a considerar o que você faz em relação ao espaço em que o trabalho está instalado e também em relação ao próprio corpo do observador. É assim com Armazém República, com Roupas de Casa e com Bochinche [2003], apenas para citar trabalhos recentes em que essa mudança fica patente. MS . Quando o trabalho é pensado isoladamente, ele possui uma ordem interna, ele conduz o olhar, tem uma regularidade, é mais contido. Mas eu comecei a ver que as coisas tinham que ser mais confusas, misturadas, menos óbvias. E para isso, o observador teria que estar dentro dos trabalhos, fazer parte deles. É interessante que esses trabalhos vão, eventualmente, ocupar espaços domésticos e podem, portanto, subverter um pouco a ordem da ambientação tradicional e mesmo da escultura, em que cada coisa tem um lugar definido e onde não existe desarrumação proposital. O problema surge quando se sabe que muitas pessoas delegam a arquitetos e decoradores a decisão sobre a maneira como elas vão se relacionar com os objetos que possuem em casa, abrindo mão do poder de escolher, de selecionar. Isso me incomoda. Eu gostaria que a pessoa que vai conviver com o trabalho escolhesse a maneira de se relacionar com ele. Em vez do agrupamento que eu proponho, o arquiteto escolhe um, dois, pendura no teto e termina deixando tudo arrumadinho, mas, de algum modo, desorganizado. E minha intenção, principalmente com esses trabalhos de agrupamento de peças, é justamente fazer as pessoas conviverem com a desarrumação, que é uma forma de organizar. Mesmo que não seja minha atribuição dizer como as pessoas que adquirem meus trabalhos devam colocá-los em sua casa, tenho que reconhecer que, dependendo do caso, isso me causa incômodo. MA . Essa sua preocupação, ou incômodo, parece que é provocada por uma mudança na forma como você pensa a relação do trabalho com o espaço. Como você mesmo mencionou, várias de suas peças parecem perder a autonomia que a escultura possui e passam a fazer sentido somente em grupos e em relação ao espaço onde vão ser instaladas. MS . Quando eu saio da escultura e busco ocupar o espaço com um excesso de coisas, não há dúvidas de que é uma posição mais egoísta. Vou ocupar mais. Vou preencher mais. Vou exigir mais. A escultura é mais simples. Eu quero que o trabalho incomode mesmo. Quando ele for para uma casa e quando ele estiver na rua. AF . Parece-me que a lógica da instalação, esse tipo de ocupação desenfreada do espaço, é uma maneira de fazer transbordar, de sair do meio onde se espera que a arte esteja, e ocupar ou invadir a casa do outro, o espaço alheio. Mas esse espaço alheio que ele está invadindo é um espaço da sociedade contemporânea, para o qual o trabalho traz uma informação própria do mundo do armazém. O armazém, que é um concentrado de formas visíveis, invade as casas brancas e elegantes. O que é um dado muito curioso. Como acomodar isso? A pessoa vai ter que viver debaixo do trabalho. MS . Quando eu estou fazendo isso, não tenho a intenção de criticar a arquitetura ou os arquitetos. Eu estou pensando o espaço. Não estou pensando somente o espaço do museu. Eu estou pensando em como a obra se posta diante de quem tem acesso a ela. Quando eu levei uma enorme esfera de madeira para a rua, quis confundir as pessoas que estavam passando na calçada. Eu quero fazer um trabalho com vários daqueles carrinhos que vendem CDs pirata e ficam tocando no meio da rua. Estou pensando em botar o nome do trabalho de Plágio. Na verdade, a idéia é que fossem vários artistas. Cada um produziria um CD plagiando alguma coisa e sairia pelas ruas tocando o disco em seu carrinho. O meu CD iria plagiar o som dos galos, das galinhas, dos cachorros. A idéia é criar uma situação de incômodo mesmo, introduzir um elemento estranho naquele ambiente. Já pensou na confusão que ia ser o galo cantando ou os cachorros latindo? Por outro lado, eu tenho muita preocupação com o modo como meu trabalho vai ver visto pelo outro. Se eu vivo disso, e quero viver disso, não tenho que me distanciar das pessoas. Tenho que pensar nisso. Tenho que pensar no colecionador, na galeria, no museu. Tenho que pensar nisso tudo. MA . Mas o fato é que essa preocupação com a recepção do seu trabalho não tolhe seu processo criativo. Há sempre ruídos que tiram a paz dessa relação com o público. MS . Há sempre muitos ruídos. Essa preocupação com o espaço começou, na verdade, já em meados dos anos 90. A exposição que eu fiz na Fundação Joaquim Nabuco [1994] parecia o samba do crioulo doido, porque tinha muita coisa. Mas foi uma exposição importante para mim. As pessoas começaram a ver meu trabalho de forma diferente. O uso da galeria da Fundação começou a mudar também a partir daquela mostra. Antes não podia furar nem fazer um bocado de coisa. Eu comecei a botar barro nas paredes da sala. Foi uma confusão. Hoje eu seria mais simples. Não teria feito aquilo. Mas havia uma vontade de fazer. Talvez fosse uma vontade de incomodar a instituição. Não sei. Mas tudo aquilo foi importante para eu tomar consciência do que queria. MA . Há alguns anos, você fez algumas esculturas em alumínio fundido, cujos moldes eram esculturas feitas em madeira. Você mantinha as formas criadas, mas as transpunha para uma outra matéria que possui, obviamente, qualidades distintas da madeira: uma é quente, a outra é fria; uma absorve a luz, a outra a reflete. São esculturas, além disso, que, na maior parte das vezes, são apresentadas em pares: o exemplar em madeira e o outro em alumínio. Eu queria que você falasse um pouco sobre a motivação desses trabalhos e como você os situa na sua obra. MS . Na época, escolhi o alumínio porque queria trabalhar com alguma matéria que pudesse conviver com a madeira, mas que também causasse uma sensação oposta à causada pela madeira, que é uma matéria que atrai o toque. E o alumínio não convida ao toque, manda você para longe. Muitas coisas surgiram dessa motivação. Várias vezes fiz o molde a partir de uma peça de madeira e fundi uma réplica em alumínio. Uma vez, fiquei interessado em fundir uma forma em alumínio que não possuísse uma contraparte idêntica em madeira. Então, peguei uma peça de madeira que havia esculpido e mandei fazer dois moldes idênticos. Quando uni os dois moldes, vi que havia criado uma peça que não existia em madeira, e só aí a fundi em alumínio. Mas, talvez, o principal elemento desses trabalhos seja mesmo a idéia de rebatimento, de duplicidade de formas. Anos depois, comecei a ver que aí já estava presente o meu interesse por espelhos e a razão de eles entrarem no meu trabalho. Isso é mais evidente nos espelhos que fazem parte da instalação Roupas de Casa, que rebatem as imagens das casas, criando duplos delas. Há ainda outro elemento próximo a essa idéia, de que eu gosto muito, que é o carimbo, outro replicador de imagens. AF . Desde garoto você conviveu com os mais diversos materiais. Você deve ter sido um garoto que mexia sempre com as coisas. Mas, a uma certa altura de nossas vidas, há um momento em que a gente passa a ter uma relação consciente com as coisas, com a fenomenologia das coisas, com a maneira como elas se comportam em dadas situa- ções. Uma coisa é essa relação quando se é criança, outra, quando se é adulto. Quando é que você passou a mexer, conscientemente, com a madeira e com o couro? O que é a madeira para você? E o que é o cour o? MS . Eu sempre tive uma proximidade grande com a madeira. Meu pai me presenteava com coisas que ele olhava e achava estranhas. Na verdade, eu sou um especialista em coisas inúteis. Na minha casa, nada do que era sério se falava comigo, mas tudo o que era inútil, sim. Eu somente era convidado para participar do que era banalidade. No início, isso me incomodava; hoje eu acho simpático. Papai sempre me deu as coisas que ele achava estranhas. Se estava no Piauí e arranjava alguma coisa estranha por lá, trazia para mim. Encontrava um pedaço esquisito de ferro, trazia para mim. Os presentes dele eram mais em madeira. Ele tinha afinidade com a madeira. Eu acho que, querendo ou não, ele foi um incentivador do meu trabalho. Lembro que, numa determinada época, o engenho da família foi destruído. E as rodas d’água eram todas feitas em cajacatinga, porque era a madeira mais resistente à água. Como eu tinha a mania de preservar as coisas, papai quis calar a minha boca diante daquele desmonte e disse: “Olhe aqui, desarmei as rodas e guardei pra você”. Eu trabalhei com essa cajacatinga por muito tempo. Fiz vários trabalhos para a exposição da Fundação Joaquim Nabuco, em 1994, e depois de um tempo, acabou esse material. Aí, ele me informou que eu ainda podia encontrar essa madeira jogada no campo, carbonizada. E fui atrás. Eram grandes tocos. Comecei a mexer com essa madeira queimada e descobri que, cavando três ou quatro centímetros em direção ao centro da madeira, ela estava preservada. AF . Essa madeira é sobra de queimada? MS . A região [da cidade de Gravatá, Agreste de Pernambuco] concentrava muito dessa madeira, talvez pelo seu excessivo uso na construção de represas. As represas eram feitas com essa madeira. As rodas d’água eram constantemente refeitas com essa madeira. Depois de um tempo, ela acabou na região e ficaram os tocos das árvores no meio dos canaviais. Com a queimada dos canaviais, ano após ano, criou-se uma camada carbonizada sobre os tocos. Apesar disso, seu interior ainda estava preservado. Além de resistente à água, des-cobri que a cajacatinga era muito resistente ao fogo. E eram tocos enormes. Tinha toco que eu cortava em grandes pedaços para levar pro atelier e enchia um caminhão de madeira. Então, eu comecei a me interessar cada vez mais pela madeira. De certa forma, eu estava voltando ao engenho onde eu tinha morado até os cinco anos. Simbolicamente, parecia que aquela madeira estava esperando alguém para continuar a história dela. Por muitos anos, eu trabalhei motivado por essa vontade de dar continuidade à vida dessa madeira. Eu tenho, com a madeira, especialmente com a cajacatinga, essa relação de familiaridade. AF . É muito grande a cajacatinga? MS . Tem uma, caída na mata desde a época de infância, que eu fui ver há pouco tempo. Dois cavaleiros sentados em seus cavalos, um de um cada lado do tronco, não conseguiam ver o outro. São imensas. Eram a atração do engenho. E na época que eu comecei a trabalhar com a cajacatinga, despertei uma memória olfativa fantástica da minha infância. Quando a plaina passava na cajacatinga, eu me lembrava do homem que fazia uns rolinhos de madeira com que eu brincava no engenho. Foi muito interessante porque, quando eu co-mecei a lixar, percebi, pelo cheiro, que eu realmente conhecia aquela madeira, e fui tendo idéias pro meu trabalho. Por meio dessa madeira, de algum modo, eu recuperava o engenho. MA . É interessante que o cheiro da cajacatinga remeta às suas memórias de infância, porque eu sempre vi, nas formas de vários de seus trabalhos em madeira, referências a brinquedos populares. Esses brinquedos que a gente faz e brinca quando é criança. Esses ajuntamentos que não servem pra nada, a não ser como demonstração da curiosidade infantil. Não sei se seria correto dizer que, associada ao cheiro da cajacatinga, estaria não só uma memória olfativa, mas também uma memória lúdica. MS . É provável. Eu não tinha brinquedos. Eu vivenciava brincadeiras. Lembro que eu e meus irmãos fazíamos bois de barro durante um dia inteiro, montávamos aquele rebanho enorme e, no final do dia, “matávamos” todos os bois, talvez como um acerto de contas de brigas de irmãos. No dia seguinte, começava a história novamente. Lembro também que, quando chovia muito, a gente fazia “represas” com barro, para conter as corredeiras formadas pelos declives do terreno. Quando alguém brigava com os outros, estoura- va a sua represa, a água liberada estourava a dos outros e você tinha que correr pra não apanhar. Também fazíamos embarcações com troncos de bananeira para brincar no rio e, no final, destruíamos tudo, já virava outra coisa. Tinha uma relação forte com as brincadeiras. Não tinha esse culto ao brinquedo que existe hoje em dia, era tudo muito dinâmico. Talvez isso tenha influenciado meu trabalho, principalmente o gosto de fazer as coisas, embora eu também goste de incorporar, no meu trabalho, o que os outros fazem. Eu gosto do olho do outro. Do fazer do outro. Eu não tenho que fazer tudo sozinho, também me agrada ter, no meu trabalho, o que o outro faz. AF . Mas você encomenda ao outro aquilo que você quer ou você simplesmente se apropria do trabalho já feito do outro? MS . Geralmente eu encomendo, mas o resultado, às vezes, toma rumos que não estavam planejados. Eu esboço alguma coisa e vou trabalhando conjuntamente. Em algum momento, o trabalho que era feito com madeira chegou a ser quase todo feito por assistentes. Eu apenas orientava, acompanhava. Hoje diminuiu muito a produção de peças em madeira porque eu mesmo voltei a fazer quase tudo pessoalmente. Embora goste do olhar do outro, com a madeira estou gostando de trabalhar eu mesmo novamente. MA . Há uma questão técnica que gostaria de explorar. Você aproveita as formas que o bloco de madeira possui naturalmente para criar uma peça ou você ignora as formas naturais e descarta o que for preciso para criar o que você quer? MS . O que eu percebo é que quando eu respeito demais a madeira, ela me domina. Eu acho que o resultado é melhor quando a ação sobre ela é meio bruta. Logo quando eu comecei a trabalhar com essas grandes toras de madeira, elas me impressionavam pela sua dimensão, pelo peso, por tudo. Depois eu vi que eu não podia pensar nisso. No momento em que estou criando as formas, o melhor é não ter respeito por nada. Mas o processo, em geral, tem muito de intuição, não há um planejamento de onde ou de como eu vou cortar a madeira. O que há, em algumas peças, é um cuidado extremo por causa da fragilidade da peça que estou criando. Em peças mais recentes, o desejo é trabalhar com madeira como não se trabalha como madeira, no limite da resistência dela. São peças extremamente frágeis que, se quebrarem, não dá pra recuperar. São peças finas e pontudas, formas que você encontra em vidro ou por-celana, mas que eu quero trabalhar na madeira. Talvez seja uma vontade de confundir os materiais. AF . Com isso você dá a peça uma aparência de algo que não parece madeira. MS . Ou que pelo menos a forma de intervenção, a forma de ação sobre a madeira seja diferente da que normalmente se aplica a ela. Nessas peças, em particular, eu mesmo preciso fazer todo o processo de corte da madeira, porque não consigo verbalizar para os meus assistentes o que o meu olho está querendo. AF . As madeiras que você usa são muito diferentes umas das outras? MS . São muito diferentes. É engraçado que, embora trabalhe com madeira, eu não sou um bom conhecedor da madeira. Não sou especialista em madeira. Mas a origem da madeira me interessa. Eu preservo o meio ambiente sem levantar a bandeira do movimento ecológico. Porque as pessoas usam desenfreadamente a madeira e abandonam tudo no meio da rua. Eu não compro madeira. A madeira que eu uso é achada. É lixo urbano ou rural. MA . É curiosa essa idéia de se apropriar de coisas inúteis para fazer outras que também não têm nenhuma função utilitária. Talvez seja na Coleção I, aquele conjunto de 50 pequenas peças, que essa idéia de inutilidade fique mais evidente. Mas há também uma outra questão que, no meu entender, é muito presente no seu trabalho, que é a idéia de movimento. Algumas esculturas chegam a ter rodinhas, outras são feitas de peças articuladas que se movem se alguém toca nelas. Nas de alumínio, poderíamos dizer que há um movimento de transferência das formas e das características das peças de madeira usadas como modelo para as peças de metal. Mas creio que é nas esferas de madeira que você fez que essas duas características do seu trabalho se combinam e se condensam da forma, talvez, a mais radical. A esfera é uma forma indecifrável; isoladamente, não tem função alguma. Ao mesmo tempo, pode ser entendida como uma metáfora da idéia de movimento. As esferas são o ápice da “inutilidade” de seu trabalho. O que me confunde um pouco é que, logo após fazer as esferas, você faz o trabalho Roupas de Casa, que eu acho que promove uma ruptura ou pelo menos cria um hiato no seu trabalho. Eu queria que v ocê falasse um pouco sobre essa passagem. MS . Esse trabalho [Roupas de Casa] é feito de metal e couro. A idéia dele vem de alguns anos antes, quando fiz um trabalho que era com-posto de duas barras de alumínio fundido, penduradas do teto por cordas de couro trançado, o mesmo produto que é usado por vaqueiros. Roupas de Casa foi confeccionado em Cachoeirinha, cidade do Agreste de Pernambuco onde fui levado por meu pai e onde me impressionei com a divisão de trabalho que existe na produção de arreios, montarias, etc. É impressionante aquilo. Daria para um sociólogo fazer um estudo. Quem corta o couro é uma pessoa, quem o trança é outra, quem faz uma determinada peça de metal já é uma terceira, e assim por diante. E é engraçado porque eu lembro que, quando criança, eu não pegava no couro, principalmente quando era couro de cabra. Eu tinha aversão ao couro de cabra. À cabra e ao couro. AF . Por que você não gosta de cabra? MS . Não sei, mas depois de um tempo, comecei a testar o couro de cabra e a provar a carne da cabra para quebrar essa aversão. Aí, eu comecei a perceber que o couro tinha a maleabilidade que eu queria para trabalhar e que tinha também um cheiro específico que, se inicialmente eu não gostava, terminei por me acostumar. Além disso, essa aproximação com a cabra era, inconscientemente, uma ou-tra maneira de eu estar me ligando à família, aos hábitos alimentares da família, do lugar de onde venho. Mas da carne continuo não gostando. MA . E qual foi a motivação desse trabalho, o Roupas de Casa? MS . Por um lado, ele surge por causa dessa relação de proximidade com o couro, que eu tinha desenvolvido um pouco antes. Por outro lado, por causa da observação que eu passei a fazer das acomodações dos trabalhadores sem-terra ao longo das estradas. Eu não via essas acomodações dos sem-terra como casas; para mim, eram apenas estruturas cobertas. E o que eu estava querendo fazer com o couro era exatamente isso: estruturas cobertas que não fossem exatamente casas. Essas foram as razões para eu começar o trabalho, para construir aqueles objetos todos. Mas havia também a questão da linha. Es-se é outro ponto pelo qual eu sempre me bati e me bato até hoje: como trabalhar, conjuntamente, as linhas orgânicas e as linhas mais precisas. O confronto da imprecisão com a precisão. O quente e o frio. Quando eu vi o metal sendo trabalhado pelos artesãos de Cachoeirinha, percebi que as mar-cas do processo ficavam nas peças que eles faziam. Não era aquela coisa absolutamente precisa em que você não vê o encaixe de uma parte com a outra. Você vê os encaixes. Você vê as sobras da solda, mesmo após a peça ser polida. Mas a relação com os artesãos não se resolveu de imediato. Para eles, as articulações das estruturas de aço podiam ser resolvidas dobrando as hastes e fazendo muito menos pontos de solda. Mas assim a peça ficaria mais arredondada, com mais curvas. Mas eu queria que as articulações das hastes de aço ficassem nítidas, aparentes. Por fim, veio o couro como a cobertura dessas estruturas metálicas que eu mandei fazer. MA . Eu acho que esse é o trabalho escultórico, talvez, mais bem definido que você já fez, em termos representacionais. As formas das casinhas são identificáveis, mesmo quando se afastam da idéia que usualmente se tem de uma habitação. MS . O que é uma ambigüidade que me agrada muito. Uma coisa que me motiva são esses encontros. São casas que não são exatamente casas. Quando eu pensei em introduzir aqueles espelhos ovais na instalação, eu pensei ne-les como elementos tradicionalmente ligados à casa. Elemento ligados à idéia de casa que refletissem objetos que não eram exatamente casas. AF . Essa instalação me faz pensar no modo como os diferentes elementos que compõem, por vezes, um único trabalho, se relacionam entre eles. Algo semehante a uma [De Luxe . 2002-2004 . detalhe . madeira ‘imbuia’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte] sintaxe dos seus trabalhos. Assim como a Coleção I e o Armazém República, Roupas de Casa é feito de elementos que, mesmo se dessemelhantes do ponto de vista formal, são articulados do ponto de vista organizacional. Elementos diferentes que se justificam, no conjunto do trabalho, pela amarração que você promove entre eles. Todos esses trabalhos são formados por elementos distintos que são aproxi-mados, formando uma coisa única ou, alternativamente, são unidades que, embora fragmentadas, ainda mantêm uma dose de articulação entre suas partes. Em Rou-pas de Casa, essa característica se apresenta de uma maneira, talvez, ainda mais complexa do que naqueles outros trabalhos, mesmo que as suas formas sejam mais familiares. Esse trabalho promove a junção do couro – matéria profundamente orgânica que serve de revestimento das casinhas, quase como se fosse sua pele – com as estruturas metálicas que lhes dão sustentação. E são essas mesmas estruturas que aparecem como imagens desenhadas nos espelhos, como traços. São também essas estruturas, por fim – dessa vez cobertas com couro –, que estão refletidas nos espelhos. Espelhos que não são meramente superfícies reflexivas, porque estão emoldurados como espelhos que se encontram em ambientes domésticos, como os das nossas casas. Cada elemento que compõe esse trabalho é, portanto, apresentado de diferentes maneiras, promovendo uma série de transposi- ções curiosas. E, no seu conjunto, o trabalho é feito justamente dessa articulação entre elementos tridimensionais e bidimensionais. Mas gostaria de continuar a explorar um pouco mais o seu processo de criação. Foi uma única pessoa que executou as casinhas? MS . Foi tudo feito por uma pessoa que trabalhava o aço e por outra que trabalhava o couro. Foi muito bom trabalhar com eles, e é interessante pensar como foi essa relação, a forma como eu interferi no processo de trabalho deles, porque o que eles fazem normalmente em Cachoeirinha são objetos completamente diferentes dessas peças que produziram pra mim. A primeira estrutura feita pela pessoa que eu contratei tinha não só a aparência de uma casa, mas tinha telhado, porta, tudo. Ele me mostrou o resultado e disse, bastante satisfeito: “Marcelo, eu acrescentei mais umas coisas na estrutura que você encomendou. Deu muito trabalho, mais ficou melhor”. Quando eu olhei os caibrozinhos de cima do telhado, as divisões todas da casa, vi que tinha que interferir mais no processo. Tive que dizer: “Eu sei que o trabalho foi muito grande para fazer assim, mas eu quero tirar esses elementos que você colocou”. A cada vez que eu fazia o desenho da estrutura que eu queria, tinha que dizer para ele fazer com o mínimo de linhas necessárias para viabilizá-la. Eu não queria nada que fosse excessivo. Se pudesse resolver com quatro linhas, não queria que resolvesse com seis. Foi aí que ele compreendeu o que eu estava querendo e embarcou na história. AF . Você mostrou o resultado para os moradores da cidade? MS . Fiz uma exposição relâmpago. Demorou apenas uma hora e meia, na praça principal da cidade. Eram 41 casinhas. Mas não havia os espelhos lá. Foi curioso ver a reação interessada de outros trabalhadores que também faziam objetos de aço e couro, e do povo da cidade, ao resultado do trabalho que havia sido desenvolvido ali. Na verdade, fazer esse trabalho em Cachoeirinha tem também esse aspecto, a vontade de sair do atelier e descambar para uma outra cidade, mudar o ambiente do trabalho e da exibição da obra. Existe essa vontade de trocar informações e abrir o trabalho para os outros, misturar tudo, ver o que surge desse contato. Essa experiência faz parte de um projeto maior, o Correcaminhos. Eu havia tido uma experiência anterior de trabalhar em um contexto fora do meu atelier, em Garanhuns. Cachoeirinha foi o segundo momento desse projeto. AF . E essa troca de informações afetou de alguma maneira o seu trabalho? MS . Acho que a experiência de Cachoeirinha consolidou a idéia de incorporar ao meu trabalho o que, antes, eu considerava apenas como parte do seu processo. Com Roupas de Casa, passei também a entender melhor a ligação do uso de espelhos com a fundição de metais. A importância da questão de copiar, de reproduzir as coisas a partir de uma matriz, seja uma imagem ou um processo de trabalho. Contraditoriamente, com ele também voltou, com mais ênfase, a vontade de trabalhar mais com as mãos, algo que era muito forte quando eu brincava na infância. Quando eu era pequeno, as pessoas ficavam zombando de mim porque eu não conseguia parar as mãos por mais que uns segundos. Eu tinha uma tia que trabalhava com tecido e, quando eu chegava na casa dela, ficava cortando as sobras dos tecidos que ela usava. Ela chegava a ficar impa-ciente de tanto que eu ficava cortando as sobrinhas de tecido. Com o passar do tempo, eu passei a me controlar mais, mas o gosto de traba-lhar com a mão ainda é muito forte. AF . Madre Tereza de Calcutá dizia que a mais bela distração é o trabalho. É uma maneira de você se esquecer do entorno, de ficar debruçado sobre uma só atividade. É uma maneira de ter prazer na manipulação das coisas, seja fazendo um corte, uma dobra, um encaixe. É bonito você falar pra pessoa que solda as estruturas das casinhas que você quer uma coisa mais despojada. Mas que você também quer que ele não dobre o aço. Que ele tenha o trabalho de cortar e depois soldar o metal. É despojado, mas, ao mesmo tempo, não é o método mais simples. MA . E interessante também que isso seja algo tão crucial para você e que não fique visível. A estrutura de metal fica totalmente escondida sob o couro. MS . Eu tenho um bocado de coisas escondidas. Eu gosto das coisas escondidas. E também dos vazios. Eu tenho um outro trabalho [De Luxe, 2002-2004] que são pequenas caixas feitas de uma madeira que tem um aroma muito forte. Eu pensei muito se devia deixar essas caixas vazias ou preenchê-las com alguma coisa. Primeiro, achei que, se a idéia do trabalho era guardar o cheiro nas caixas, elas não deveriam ter nada mais do que o cheiro. Por outro lado, se eu deixasse elas vazias, as pessoas iriam terminar guardando pequenos objetos nas caixas. Para solucionar a questão, coloquei, dentro das caixas, blocos feitos com a mesma madeira de que elas tinham sido feitas, ocupando todo o seu espaço interno. Cheguei à conclusão de que, nesse caso, como em muitos outros, eu tinha que preencher o vazio. CRONOLOGIA Joana D’Arc Lima Marcelo Luiz Silveira de Melo nasce em 1962, em Gravatá, cidade serrana de Pernambuco, situada a 85 km do Recife. Passa a sua infância no engenho Amora Grande, de propriedade de seus pais. Terceiro filho de uma família de seis irmãos e considerado “o curioso” da casa, aprende, desde menino, a reinventar “coisas” e soluções para os desafios da infância. Ganha de seu pai presentes inusitados, pequenos achados que ficam retidos em suas lembranças e que se tornam referências para o universo lúdico patente em muitos dos seus trabalhos. Em 1979, transfere-se para o Recife, juntamente com um de seus irmãos. A década de 1980, no Brasil, é marcada, nos campos social e político, pela transição para um regime democrático, a qual ganha impulso inequívoco a partir do movimento pela realização de eleições diretas para Presidente (“Diretas Já”). No âmbito das artes visuais, há uma visível revitalização da pintura e a constituição de redes de relações construídas por deslocamentos territoriais (reais e virtuais) de artistas e de intelectuais, isoladamente ou em grupos. No Recife, essas mudanças se refletem na criação das Brigadas Portinari, Gregório Bezerra e Henfil (1982) – coletivos artísticos comprometidos com as mudanças políticas em curso –, na realização da Primeira Exposição Internacional de Arte em Outdoor/Artdoor (1981), no Movimento de Arte Tátil (1982), no Movimento de Arte e Cultura do Nordeste (1983), no surgimento dos grupos Astrobelo (1982), Formiga Sabe que Roça Come, Brigada Compressora, Brigada Ecológica, Carasparanambuco (1986), Atelier Coletivo de Olinda (1989), entre outros. Nessa época, os Salões de Arte no Museu do Estado de Pernambuco – MEPE e as mostras realizadas no Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco – MAC, em Olinda (com destaque para o Salão dos Novos), dão visibilidade a uma nova geração de artistas. A Galeria Metropolitana Aloisio Magalhães (atual Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães – MAMAM), a Galeria Artespaço e espaços informais de exposição contribuem para aquecer o circuito local. Os anos de 1982 a 1985 marcam o início da formação de Marcelo Silveira. Freqüentar a Oficina Guaianases, em Olinda, permite o estabelecimento de contatos com colegas e, conseqüentemente, participar ativamente dos debates próprios do meio em que começa a se inserir. São importantes, nesse período formativo, o convívio e a interlocução com a artista mineira Liliane Dardot, à época residindo em Olinda e advogando a criação artística como expressão livre das regras “acadêmicas”. Por meio desse contato, Marcelo Silveira se aproxima do trabalho e dos escritos de Amílcar de Castro. O convívio com o jovem artista plástico Rinaldo também marca essa fase inicial de sua vida profissional e social na cidade do Recife. Em 1985, ingressa no curso de Educação Artística na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, sendo marcante o contato com o professor e artista José de Barros, que fazia do espaço formal da universidade um ponto de encontro entre jovens que queriam se expressar por meio do “fazer” artístico. As conversas se estendem ao seu atelier particular, transformado em laboratório de experimentações, questionamentos e troca de idéias sobre os materiais, os processos e os resultados obtidos por seus alunos. Simultaneamente, Marcelo Silveira constrói um atelier de trabalho em Gravatá (Arte & Cia), espaço de criação também aberto às variadas manifestações culturais locais e a vivências artísticas com crianças da região. Embora sem financiamento, essas atividades se estendem por um período de cinco anos, tendo sido cruciais para a sua formação como artista e como professor. Essa experiência é documentada no vídeo Brincadeira é Coisa Séria (1990), realizado pela ONG Auçuba Comunicação e Educação, e depois transformada em exposição de mesmo nome, no Espaço Cultural da Biblioteca Central da UFPE, durante a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em 1993. Ainda em 1985, viaja a São Paulo por ocasião da XVIII Bienal de São Paulo, ano em que a curadora Sheila Leirner reúne, em um longo corredor do Pavilhão da Bienal, uma seleção da pintura nacional e internacional contemporânea, por ela denominada de “A Grande Tela”. Nessa viagem, impressionam-lhe muito os trabalhos dos artistas Emmanuel Nassar e Nuno Ramos. A participação em quatro Festivais de Inverno da Universidade Federal de Minas Gerais (1985, 1987, 1988 e 1989) é marcante em sua formação. O contato com outros artistas, com críticos de arte e professores vindos de várias partes do país amplia o seu repertório sobre a história da arte e o seu conhecimento do campo das artes plásticas que então se redesenhava no país, além de diminuir a sensação de isolamento de outras regiões brasileiras. As vivências nas oficinas e nos ateliers dos Festivais de Inverno possibilitam a investigação artística com novos materiais e, a partir daí, uma mudança de procedimentos construtivos, sinais de uma inquietude com os limites do espaço bidimensional e do início de experiências com esculturas e objetos. Participa do XIV Salão dos Novos (1985), no MAC, e, em 1986, realiza, em Gravatá, no Arte & Cia, exposição com trabalhos em técnicas diversas. Em 1987, está presente no Salão de Arte Contemporânea de Pernambuco, no Centro de Convenções de Pernambuco, e integra o grupo Carasparanambuco, formado por mais sete artistas: Alexandre Nóbrega, Eduardo Melo, Félix Farfam, João Chagas, José Patrício, Mauricio Silva e Rinaldo. Todos em início de carreira, buscando inserção no campo das artes plásticas, e criando espaços e eventos artísticos na cidade, afirmam-se como integrantes de um movimento em diálogo com as questões da cultura contemporânea a partir de seu local de origem. Freqüenta, entre 1988 e 1994, o Quarta Zona de Arte, atelier coletivo comprometido com a produção contemporânea, fundado, entre outros, pelos artistas Fernando Augusto, Flávio Emanuel, José Paulo, Márcio Almeida e Maurício Castro, pelo ilustrador e cartunista Humberto Araújo e pelo comunicador visual Aurélio Velho. Em 1988, Marcelo Silveira inicia experimentações com madeira. Pequenos pedaços da matéria passam a integrar superfícies que compõem as suas obras bidimensionais e, já nesse momento, os primeiros objetos tridimensionais. Participa, nesse ano, do 7º Salão de Arte do Pará, em Belém, da 7ª Mostra de Gravura, em Curitiba, e da 7ª Mostra do Desenho Brasileiro, também em Curitiba. Em 1989, participa do Salão de Arte Contemporânea de Pernambuco, no MEPE, inscrito na modalidade Pintura Mural Coletiva. Em 1990, realiza uma exposição individual, no Itaú Galeria, em Belo Horizonte. Nessa mostra, Marcelo Silveira apresenta o seu Engenho de Objetos, reunião de vinte e cinco trabalhos realizados entre 1989 e 1990. Utiliza, como matéria-prima desses objetos, resíduos encontrados no engenho de seu pai, em Gravatá, fragmentos de madeira achados em can- tos diversos e reunidos por ele e, por fim, pedaços de madeira que passa a ganhar daqueles que sabem de seu interesse pelo material. O procedimento, nessa fase, se pauta por uma “atitude escultórica” de negar, nos objetos criados, o sentido funcional de origem daquela matéria, transformando-a para reintegrá-la em um ambiente que possibilite o aflorar de múltiplos e inusitados significados. Ainda em 1990, vê a exposição de Arthur Bispo do Rosário, no Museu da Pampulha, em Belo Horizonte, a qual vai marcar profundamente a sua maneira de ver a arte e o trabalho do artista. Em 1990, forma-se em educação artística pela UFPE e, no biênio 1991-1992, viaja pela Europa e o norte da África, onde assume uma atitude nômade, percorrendo territórios diversos e recolhendo fragmentos e imagens de culturas “novas” e “arcaicas”. Em 1991, realiza uma mostra individual em Braga, Portugal, na BeloBelo Galeria. Fixa moradia por três meses em Barcelona, onde freqüenta a Escola Massana de Artes. Essa experiência permite desenvolver um trabalho a partir de sobras e “restos” de madeira e ferro, incorporando-os ao próprio espaço de seu atelier na escola. De volta ao Brasil, faz a exposição “Torres, Construções e História de um Templo” (1993), na Itaú Galeria, em Vitória, onde mostra vinte peças em madeira e ferro com jogos de encaixe criados a partir de uma coleção de pedaços achados de madeira e nas quais usa unicamente lixas e cola. Explora, nesses trabalhos, o sentido vertical das construções e se reporta a um tempo em que o homem construía as próprias habitações e os objetos que faziam parte do espaço ocupado. Com a instalação Paisagem Estranha (1994), montada na Galeria Vicente do Rego Monteiro, (Fundação Joaquim Nabuco), no Recife, o artista surpreende o público intervindo diretamente no espaço expositivo. Exibe pequenos objetos formados com arame que se assemelham a desenhos e esculturas feitas em madeiras diversas (amarelo, cajacatinga, cedro, mogno e outras) que deixam revelar seus sulcos e fibras, complementando-as com a inserção de pedaços de ferro oxidado e com desenhos entalhados. A composição dos objetos, segundo Marcelo Silveira, estava associada à estrutura das casas populares e à disposição de ex-votos em capelas. No mesmo ano, é selecionado para o 14º Salão Nacional de Artes Plásticas, no Rio de Janeiro, onde exibe uma seleção de 70 objetos em metal, feitos originalmente para a instalação Paisagem Estranha, os quais, segundo o artista, fazem parte de um novo momento de sua carreira, em que o ferro deixa de ser somente um elemento da composição do objeto e passar a ser, ele mesmo, a única matéria de que é feito. Ainda em 1994, expõe numa mostra coletiva realizada na cidade do Porto, em Portugal, denominada “Memória da Amazônia: Etnicidade e Territorialidade”, juntamente com o artista recifense Flávio Emanuel. Participa do 51º Salão de Arte Contemporânea do Paraná, em Curitiba. Em 1995 e 1996, Marcelo Silveira dá seguimento às suas atividades no território da arteeducação, ministrando oficinas de criação tridimensional em diversas instituições culturais e universitárias brasileiras. Esse período é marcado pela pesquisa formal com a cajacatinga – madeira nobre em extinção encontrada em topos parcialmente carbonizados, abandonados no engenho da família. É selecionado para o II Salão UNAMA de Pequenos Formatos, em Belém (1996), promovido pela Universidade da Amazônia. Juntamente com outros artistas de Pernambuco e da Paraíba (Alexandre Nóbrega, Alice Vinagre, Betânia Luna, Dantas Suassuna, Eudes Mota, Luis Santos e Rodolfo Mesquita), é escolhido para integrar, com seus trabalhos, o III Salão de Artes Plásticas do Museu de Arte Moderna da Bahia, em Salvador. Participa, ainda em 1996, do evento Art Brésil, no Museu Nicolas Sursock, em Beirute, Líbano, da mostra “Artes Plásticas Contemporânea Brasileira” (com curadoria da arquiteta Janete Costa e a presença dos artistas Aprígio, José Paulo, Marianne Peretti e do designer André Lasmar) e de exposição coletiva na Neuhoff Gallery, em Nova York, Estados Unidos. Na segunda metade da década de 1990, o efervescente cenário cultural local (capitaneado pela produção musical ligada ao movimento Mangue Beat) influencia a produção artística do país e é contaminado por diversas linguagens internacionais contemporâneas. Na música, no cinema e nas artes visuais, surgem novos grupos de artistas e ateliers coletivos – Molusco Lama (1994), Carga e Descarga, Camelo (1996), Sub-Graf e Telefone Colorido (1997), entre outros, renovando o meio cultural-artístico do Recife. São criados o Instituto de Arte Contemporânea – IAC (1996), a Galeria de Arte Capibaribe (1998), ambos ligados à UFPE, e o Instituto de Cultura da Fundação Joaquim Nabuco (1998), que dinamiza as atividades expositivas já desenvolvidas pela instituição e organiza cursos e debates sobre arte moderna e contemporânea. É aberto o Escritório de Arte Amparo 60, posteriormente transformado na Galeria Amparo 60. Com a mostra “Ver & Verso Pernambuco”, é inaugurado, em 1997, o MAMAM, reunindo obras de mais de 60 artistas, incluindo esculturas de Marcelo Silveira. Em 1998, Marcelo Silveira apresenta, na 16ª edição do Salão Nacional de Artes Plásticas, realizado no Rio de Janeiro, o trabalho Cajacatinga, resultado das pesquisas formais com a madeira. Os elementos que compõem Cajacatinga assemelham-se a vocábulos de uma escrita desconhecida ou inventada, feitos de pedaços de madeira cortada e lixada em formas diversas. Ainda nesse ano, integra a coletiva “Ceará e Pernambuco - Dragões e Leões”, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza. Também realiza a mostra “Dos Presentes do meu Pai”, na Galeria de Arte Marina Potrich, em Goiânia, e na Galeria Ária, no Recife. Nessa exposição, os objetos em madeira adquirem formas orgânicas, são maleáveis e encaixados, deixando expostos, para os olhos do espectador, os pinos, os furos e as estruturas de encaixe que lhes dão forma. Embora lixados, não apresentam um acabamento excessivo, revelando os veios, a cor e a textura natural das madeiras usadas. No final de 1998, Marcelo Silveira é premiado no V Salão de Artes Plásticas da Bahia, realizado no Museu de Arte Moderna, em Salvador. O final da década de 1990 e o início da seguinte são marcados, no Recife, por debates institucionais sobre a dicotomia internacionalismo versus regionalismo, onde fica patente a capacidade singular que a produção local tem de fundir, e não opor, estes termos. Se o MAMAM, com exposições de Jean Michel Basquiat e Joseph Beuys, entre outras, provoca conexões entre os circuitos local e internacional, a Fundação Joaquim Nabuco, por meio de uma programação de cursos, palestras e da participação em projetos de mapeamento da produção artística regional (Projeto Nordestes) e nacional (Programa Itaú Cultural Rumos Visuais), atrai para a cidade vários críticos, historiadores, artistas e curadores, promovendo circulação e troca de informações e dando visibilidade à produção cultural da cidade. Parcerias institucionais permitem intercâmbios interestaduais como a mostra “Arte Contemporânea [2000-1]” (1999), realizada no MAMAM e no Museu de Arte Moderna da Bahia, a qual inclui trabalhos de Marcelo Silveira. Nesse ano, o artista é premiado no 3º Salão de Escultura do Paraná, em Curitiba, participa da exposição que integra o Projeto Nordestes, no Sesc Pompéia, em São Paulo, e também da coletiva “O Luar do Sertão”, na Galeria Nara Roesler, também em São Paulo, depois apresentada no Escritório de Arte Amparo 60, no Recife. Em 2000, Marcelo Silveira realiza sua primeira individual em São Paulo, novamente na Galeria Nara Roesler. Essa exposição revela procedimentos distintos com o uso da madeira e a introdução de novos materiais em seus trabalhos, tais como o alumínio e o couro. Apresenta ainda, nessa ocasião, uma coleção de 50 pequenos objetos de madeira que formam um único trabalho (Coleção I, 1999), anunciando a contigüidade, em sua obra, dos campos da escultura e da instalação. Desativado desde 1993, a retomada do Salão Pernambucano de Artes Plásticas, em 2000 – organizado sob o tema Arte Atual Brasileira e realizado no Espaço Cultural Malakoff, no Recife –, mobiliza o meio artístico local, além de retomar questões como a formação de públicos para a arte contemporânea. Marcelo Silveira tem seus trabalhos selecionados e premiados nesse Salão. Participa, ainda em 2000, de várias exposições coletivas, destacando-se “Esculturas Brasileiras”, realizada na Pinacoteca do Estado de São Paulo, a “1ª Bienal Internacional de Artes Plásticas de Buenos Aires”, “Investigações: Rumos Visuais 2”, no Itaú Cultural, em São Paulo, e “Desconcertos da Forma”, nas Galerias Itaú Cultural de Belo Horizonte, Brasília e Penápolis. Integra a coletiva “O Lápis e o Papel (sobre a liberdade, o despojamento e o sentido)”, na Galeria Nara Roesler, em São Paulo, que aproxima o seu trabalho escultórico da produção gráfica de outros artistas contemporâneos, tais como Adriana Rocha, Alexandre Nóbrega, Artur Lescher, Maria Teresa Louro, Nina Moraes e Tomie Ohtake. Nesse mesmo ano, é criado um espaço coletivo de arte que movimenta a cena artística e cultural do Recife, o Ateliê Submarino. Inicia pesquisa e vivência com artesãos do interior de Pernambuco, com o projeto Correcaminhos, que consiste no deslocamento temporário do seu atelier para cidades do interior pernambucano e na ampliação do círculo de “intercessores” da obra. Essas experiências começam na cidade de Garanhuns, em Pernambuco. Realiza, em 2001, a exposição “Entre a Surpresa e o que se Espera”, na Galeria Amparo 60, no Recife. Em um dos ambientes da mostra, apresenta uma série de peças que aproximam seu trabalho escultórico do campo da expressão gráfica, além de adotar, mais uma vez, o couro como elemento construtivo, incorporado não somente por sua maciez e flexibilidade, mas também por possuir cheiro forte e distinto. Em outra sala da galeria, exibe trinta esferas de diâmetros variados feitas de madeira desbastada (cajacatinga, baraúna e jaqueira). Entalha, em baixo relevo, nessas esferas, símbolos usados nos ferros de marcar o gado, apropriando-se de uma escritura feita com as iniciais de várias gerações de famílias proprietárias de rebanhos e que representam, portanto, ciclos de vida humana. A maior dessas esferas é colocada em pontos de grande circulação de pessoas nas ruas do Recife, mudando de localização a cada dia. As reações do público à presença da esfera são documentadas em fotografias e expostas na galeria. Outras exposições são realizadas em 2001. Faz mostra individual no Museu de Arte Contemporânea do Paraná, em Curitiba, onde exibe esculturas trabalhadas em madeira, alumínio e couro. Integra a mostra “Nordeste Brasileiro: Matriz Popular e Consciência Construtiva”, no Museu do Estado do Pará, em Belém. Expõe, como artista convidado, na mostra coletiva “Casa Coisa”, realizada pelo Ateliê Submarino, no Recife, onde cria ambiente que problematiza o tema do trabalho doméstico: Quarto de Empregada. Dando seguimento ao processo de incorporação de novos procedimentos e materiais ao seu trabalho, Marcelo Silveira apresenta, na coletiva “Em Sete Tempos” (2002), na Galeria Amparo 60, no Recife, uma primeira versão do Armazém República, uma coleção de objetos de vidro já existentes, que o artista recolhe e arruma numa estante, construindo combinações e agrupamentos que sugerem relações inusitadas entre o grande e o pequeno, o opaco e o transparente, o leve e o pesado. Ainda em 2002, participa do Projeto Faxinal das Artes, em Faxinal do Céu, Paraná. No 47º Salão Pernambucano de Artes Plásticas (2002), na então desativada Fábrica Tacaruna, no Recife, realiza o trabalho Combinação Tacaruna, malha trançada de tiras de couro de cabra que cria e demarca um volume vazio e cujo tamanho varia de acordo com o espaço onde ela é colocada. Por meio do seu projeto Correcaminhos, realizado em 2000, Marcelo Silveira conhece, em Cachoeirinha – cidade distante 170 km do Recife –, artesãos que trabalham o aço e o couro para confeccionar determinadas partes de selas e arreios de montaria, compondo uma rígida divisão de trabalho. Roupas de Casa, título da instalação que integra exposição individual que faz na Galeria Nara Roesler, em 2003, resulta dessa vivência do artista, consistindo de “esculturas-casas” concebidas por ele e executadas por artesãos de Cachoeirinha (estruturas feitas em aço e “cobertas” feitas em couro). Nesse trabalho, o artista também reinventa, poeticamente, as inúmeras estruturas de lona dispostas em linha reta que formam os acampamentos dos trabalhadores sem-terra e que são encontráveis ao longo da estrada que liga o Recife a Cachoeirinha. Participa, ainda em 2003, da mostra coletiva “Ver de Novo, Ver o Novo”, composta por trabalhos pertencentes ao acervo do MAMAM, e de várias outras exposições, incluindo “Vanguarda para Todos”, no Galpão, Uberaba, Minas Gerais, “Caminhantes”, no Instituto Ricardo Brennand, no Recife, e “Mostra Retrospectiva: Salão da Bahia 1994-2002”, na Fundação Joaquim Nabuco, também na capital pernambucana. Em exposição coletiva na Galeria de Arte Dumaresq, no Recife, apresenta, pela primeira vez, Garrafada (2003), um trabalho múltiplo, composto de 28 garrafas de vidro idênticas, metade contendo pequenos pedaços de fios de couro e o restante contendo pó de serra de diversas madeiras e, portanto, de variadas cores. Participa, nesse mesmo ano, do evento multidisciplinar “Ordenação e Vertigem”, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, organizado em torno da obra do artista Arthur Bispo do Rosário, e onde expõe o trabalho Coleção I (1999). Em 2004, faz exposição individual na Pinacoteca Universitária, em Maceió. Nessa mostra, apresenta, além de uma seleção de trabalhos de tamanho reduzido e de um conjunto de esferas de madeira feitas em 2001, a instalação Armazém República, formada por cem peças de madeira, realizadas entre 2001 e 2004, alçadas por tiras de couro e presas ao teto. Exibe também, nessa mostra, dois de seus “livros de escrita”, onde os aspectos gráficos de seu trabalho escultórico ganham expressão bidimensional. Faz mostra individual no MAMAM, onde apresenta uma seleção de trabalhos feitos entre 1998 e 2004, permitindo a visualização das inflexões de sua trajetória nesse período. Entre os trabalhos mais recentes, exibe a instalação Roupas de Casa e uma versão ampliada do Armazém República, composto, além das peças de madeira presas ao teto, por centenas de objetos de vidro arranjados numa estante. Realiza, no Torreão, em Porto Alegre, um trabalho de apropriação do espaço – Combinação Torreão –, criando uma estrutura de couro trançado que replica a sala expositiva e que é, posteriormente, adaptada ao espaço do Gasômetro, também em Porto Alegre, ao do MAMAM, no Recife, e ao do Centro Cultural São Francisco, em João Pessoa. Realiza, ainda nesse ano, exposição na Galeria Celma Albuquerque, em Belo Horizonte, participa da mostra “Paralela 2004”, em São Paulo, e faz individual no Centro Cultural São Francisco, em João Pessoa. Em 2005, faz exposição individual no Centro Universitário Mariantônia, em São Paulo, participa de mostra coletiva no Carreau du Temple, em Paris, França, integrando a programação oficial do “Ano do Brasil na França”, e da quinta edição da Bienal do Mercosul, em Porto Alegre. Obras em acervos Coleção Gilberto Chateaubriand . Museu de Arte Moderna . Rio de Janeiro Fundação Joaquim Nabuco . Recife Fundação Roberto Marinho . Rio de Janeiro Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco . Olinda Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães . Recife Museu de Arte Moderna da Bahia . Salvador Museu do Estado de Pernambuco . Recife Pinacoteca do Estado de São Paulo . São Paulo Bibliografia 1998 XVI Salão Nacional de Artes Plásticas (coletiva). Texto de Agnaldo Farias. Rio de Janeiro: Funarte. Dos Presentes de Meu Pai. Texto de Marcus Lontra. Recife/Goiânia: Ária Espaço de Dança e Arte/Galeria de Arte Marina Potrich. 1999 Nordestes (coletiva). Texto de Moacir dos Anjos. São Paulo: SESC Pompéia. O Luar do Sertão (coletiva). Texto de Marcus Lontra. Recife/São Paulo: Galeria Amparo 60/Galeria Nara Roesler. 2000 Norte Nordeste Brasileiro: Matriz Popular e Consciência Construtiva (coletiva). Textos de Aline Monteiro e Fabrício de Paula. Belém: Museu do Estado do Pará. 2000 Desconcertos da forma (coletiva). Texto de Moacir dos Anjos. São Paulo: Itaú Cultural. 2001 Marcelo Silveira. Texto de Agnaldo Farias. São Paulo: Galeria Nara Roesler. 2002 O Lápis e o Papel (coletiva). Texto de Kátia Kanton. São Paulo: Galeria Nara Roesler. 2001 Entre a surpresa e o que se espera. Texto de Moacir do Anjos. Recife: Galeria Amparo 60. 2002 Em Sete Tempos (coletiva). Texto de Maria do Carmo Nino. Recife: Galeria Amparo 60. 2003 Roupas de Casa. Texto de Ligia Canongia. São Paulo: Galeria Nara Roesler. 2003 Ordenação e Vertigem (coletiva). Texto de Agnaldo Farias. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil. Cette publication prétend moins être un catalogue couvrant l’œuvre de Marcelo Silveira qu’une opportunité de réfléchir de manière critique sur sa trajectoire. Bien qu’il comporte certains des travaux les plus importants qu’il a réal isés, elle n’établit pas de certitudes interprétatives sur son œuvre. Elle ferait plutôt l’inventaire de questions qui incitent l’artiste à continuer à multiplier ce qu’il fait dans plusieurs directions. En plus de nombreuses images d’objets, sculptur es et installations faites par l’artiste, la publication comporte un essai critique de Moacir dos Anjos, une interview avec Marcelo Silveira – à laquelle contribuent Agnaldo Farias et Moacir dos Anjos – et une chronologie commentée de son parcours créatif, élaborée par Joana D’Arc Lima. BAZAR DE TOUT Moacir dos Anjos L’œuvre de Marcelo Silveira exprime, presque depuis ses débuts, la nature imprécise et hybride de la production visuelle contemporaine, où les moyens se mélangent et l’espace de la production artistique se confond avec le domaine élargi de la culture. Bien qu’elle se laisse, de manière un peu légère, classer comme sculpture, une bonne part de celle-ci ne s’encadre pas dans les conventions qui démarquent le champ sculptural, déchirant encore plus les frontières, depuis longtemps déjà fragiles, qui séparent ce domaine de celui de la peinture, du dessin où de l’installation. Des travaux d’époques distinctes caractérisent, de manières les plus diverses, cet inconfort d’origine qui anime la production de l’artiste. Déjà dans la première moitié des années 1990, Marcelo Silveira a fait des pièces sculptées en bois et recouvertes d’argile clair, en interférant sur celui-ci (en le rayant et en lui incrustant de petites pièces de métal) de manière à relever ses nuances chromatiques. Bien qu’il rende évident, dans ces travaux, [Combinação Tacaruna . 2002 . couro . 500 x 500 x 500 cm . coleção particular ] son intérêt pour la création tridimensionnelle (et le peu d’affection pour la représentation), il y incorporait également, sans hiérarchies claires, les informations sur la peinture qu’il amenait du lieu (Recife) et du moment (les années 1980) où il s’était d’abord formé en tant qu’artiste. D’autres objets exemplaires de l’indistinction des moyens qu’il employait sont les nombreux objets de fil de fer tordu et enroulé, qu’il a appelé Rabiscos [1994], dans lesquels s’allient, sans équivoque, une autonomie en tant qu’objets et la suggestion d’être, comme le titre l’indique, des traits éphémères qui sembleraient vouloir dessiner dans l’espace ce qui ne tiendrait sur aucune surface. Dans un autre travail de classification ambiguë Cajacatinga [1997], Marcelo Silveira découpe, lime et perce plusieurs petits morceaux de bois, les traversant ensuite de fil de fer et les accrochant au mur en lignes parallèles. Disposés ainsi, ils évoquent des signes calligraphiques inconnus qui pourraient, potentiellement, construire n’importe quels vocables sur le plans où ils sont mis ; cependant, ils ressemblent aussi à des traits faits en bois qui n’attendent que la volonté de l’artiste pour se transmuter en formes résolument tridimensionnelles. Dans cet inventaire de constructions incertaines, est inclus l’objet allongé, fait un peu plus tard et également sculpté dans le bois, qui sert de moule à des dessins réali- sés directement sur le mur, où l’objet lui-même est fixé, à la fin, comme faisant partie du travail. Démarquant les contours de la pièce sculptée sur la surface du mur, Marcelo Silveira admet que ses formes migrent d’un milieu supposément autonome (sculpture) vers un autre de même stature (dessin), provoquant en plus indistinction entre ce qui n’est qu’un moule et ce qui est le travail achevé. Sem título [2001]. Après avoir expérimenté, au début de sa trajectoire, différentes techniques et matériaux – période où les spécificités des moyens utilisés cèdent au désir de construction de ce qui n’existe pas encore –, l’artiste s’en tient, pendant quelques années, à la création d’objets faits en cajacatinga, bois d’arbres dont les souches, partiellement calcinées par la pratique des brûlis, sont trouvées dans les environs de la ville de Gravatá, dans la campagne du Pernambouc, lieu où Marcelo Silveira est né et a passé son enfance. Ce sont généralement des pièces faites de morceaux de bois qui, après avoir été découpées et poncées, sont encastrées les unes dans les autres au moyen de trous et de chevilles, constituant les objets qui, dans le parcours créatif de l’artiste, sont, peut-être, les plus facilement classifiés comme sculpturaux. Néanmoins, même dans ce champ, de tels travaux se heurtent aux classifications dociles, en articulant deux traditions distinctes de la sculpture : celle qui met l’accent sur la taille du matériau utilisé (la découpe de chacun des morceaux de bois) et celle qui a lieu par l’assemblage entre les parties. De la première tradition, on retient l’intérêt pour le volume et la masse de la matière travaillée et, de la seconde, la considération de l’approche mécanique entre diverses pièces.1 Ce sont tous des objets qui rappellent, les uns plus clairement que les autres, les jouets et ustensiles typiques de la région d’origine de Marcelo Silveira, ne rendant pas évident, quand ils sont observés dans l’ensemble, si on peut plus les affilier à la tradition cultivée de l’art ou si l’attache à la mémoire de la production anonyme des rues leur suffit. Ces structures articulées, parfois, posées debout sur le sol ou simplement contre le mur, laissent apparaître une architecture précaire toujours proche du démantèlement. D’autres fois, elles pendent du plafond en balançant et font se demander, même à courte distance, si elles sont destinées à la seule vision ou bien également au toucher, lançant des doutes sur les manières dont on peut ou on doit établir une relation avec les travaux de l’artiste : en tant qu’observateur seulement ou bien en tant que participant actif. Que ce soit au moyen du désastre imminent de la chute ou de la mobilité que les pièces aériennes permettent, il semble y avoir dans tous ces travaux l’autorisation contenue de changer la configuration dans laquelle elles sont présentées, en apportant toujours, implicitement en elles, l’idée de mouvement. Une fois le terrain de l’imprécis conquis, Marcelo Silveira a décidé de l’étendre. A partir d’objets faits en bois, il a construit des moules et a fondu de l’aluminium, en traitant les paires ainsi formées comme des travaux uniques, faits de composants aussi semblables dans la forme que différents dans la texture, la couleur, le poids et la densité. De ces objets qui rapprochent des matériaux capables d’imprimer des sensations tellement différentes (l’une attire la lumière, l’autre la repousse ; l’une semble allumer l’œil, l’autre semble le refroidir), il y en a un qui résume, de manière précise, la tension que les processus de construction et d’exposition adoptés activent : seulement formé de deux éléments de bois et de deux autres éléments semblables d’aluminium, chacun de ces ensembles est disposé en équilibre précaire et similaire sur le mur et sur le sol; mais, alors qu’il semble crédible que la pièce de bois se maintienne érigée pour longtemps, l’autre pièce, identique dans sa structure et dans l’articulation entre ses parties, semble mettre en danger, au vu de son poids excessif, qui s’en approche de trop. En transférant les contours et volumes des objets de bois vers une substance avec des caractéristiques si différentes, l’artiste confond, par conséquence, qui en espère une forme de certitude sémantique associée uniquement à ses formes, amplifiant les sens de la mobilité qui, bien que toujours contrainte dans sa pleine puissance, est constitutive des ses travaux et en déborde à tout instant. Cependant, dans au moins un cas, la création de doubles a obéi à une logique distincte : un fois fait le moule de la pièce sculptée en bois, Marcelo Silveira a encore construit un autre moule de la même sculpture, les unissant ensuite en une seule structure allongée qui a servi à fondre, par deux fois, une forme qui n’existait pas auparavant. Ecartant la pièce de bois qui a donné origine au moule, l’artiste expose les deux pièces identiques en aluminium accrochées au plafond par des lanières tressées de cuir de chèvre, établissant, par des moyens autres que ceux utilisés pour le travail décrit ci-dessus, le rapprochement entre des matériaux de caractéristiques distinctes. Cependant, dans les deux cas, il provoque le doute en ce qui concerne la hiérarchie des matériaux et des procédés utilisés, insistant, au contraire, sur le transit entre l’origine supposée du travail et son résultat. De plus, l’intérêt de Marcelo Silveira pour la possibilité de faire des répliques des formes est déjà clair, que ce soient celles qu’il crée lui-même ou que ce soient celles qui, même transformées par une intervention délibérée, existent déjà dans son entourage. En ce qui concerne l’ambivalence de significations que ces travaux comportent (et ce qui, paradoxalement, les rapproche comme produits d’une même poétique), ils peuvent être considérés et analysés, individuellement, selon leurs propriétés formelles et allusions symboliques. Cependant, dans deux autres travaux, l’artiste – bien que restant attaché, dans l’un d’entre deux, aux relations d’articulations entre les parties et, dans l’autre, à l’idée de mouvement – annule les possibilités d’analyse. Il dispose, dans le premier Coleção I [1999], sur une table ou un comptoir, cinq dizaines de petits objets en bois sculpté et poncé. Ainsi, comme dans plusieurs autres de ses travaux, chacune de ces pièces miniatures rappelle des structures organiques ou des arrangements constructifs rustiques, faisant écho – au moyen de la découpe, de l’encastrement ou de la juxtaposition de parties – aux formes d’un ustensile domestique, d’un jouet populaire ou d’un objet quelconque. Néanmoins, aucune d’entre elles ne représente quelque chose, du fait que l’enchantement qui naît de cette collection vient de la reconnaissance graduelle et inévitable de son inutilité. De plus, dans ce travail, s’établit un déplacement clair de centre d’intérêt : des propriétés formelles de pièces qui se suffisent, l’attention de Marcelo Silveira (et de l’observateur) se tourne également, désormais, vers un ensemble de pièces, lesquelles suggèrent, de manière relationnelle, ses significations (possibles). Au lieu de prendre chaque forme spécifique en compte, le regard cherche à couvrir, également, la relation de ces formes avec d’autres que l’on pourrait rencontrer autour, en alternant l’extension de son champ d’intérêt visuel sans cependant arriver à une appréhension simultanément localisée et ample de l’ensemble. Bien qu’encore partiellement ancré dans le domaine restreint de la sculpture, on aperçoit, sans équivoque et par le biais de ce travail, l’entrée de son œuvre dans le champ étendu de l’installation, dans lequel c’est la relation active, tout au long d’une certaine période, entre les objets créés, l’observateur et l’espace qui les entoure qui suggère des significations toujours prêtes à être redéfinies. Dans le second de ces travaux-limites Sem título, [2001], l’artiste abandonne totalement les articulations et les encastrements qui caractérisent beaucoup de ses travaux antérieurs, et se concentre sur la construction d’un ensemble de pièces qui ne dépendent pas d’autres pièces. En débitant et en ponçant de vieux troncs d’arbres abîmés (cajacatinga, jaquier, laurier rose et baraúna), Marcelo Silveira construit des sphères de tailles diverses et de finition irrégulière, en les mélangeant ensuite à d’autres qu’il fond en aluminium ou en acier, à partir de moules faits avec les sphères de bois. En plus des différences de taille, ces sphères possèdent donc des textures, densités et couleurs distinctes, créant, quand elles sont disposées à proximité l’une de l’autre, des aires d’attraction et de friction symboliques aux yeux de ceux qui divisent l’espace avec elles. Chacune d’entre elles possède également une marque différente, creusée sur sa superficie. Ce sont des symboles, que l’artiste s’est approprié, qui représentent – par l’assemblage graphique d’initiales de noms – des familles de propriétaires ruraux, et qui sont utilisés pour marquer le bétail qui leur appartient. Au moyen de cette entaille dans ses travaux Marcelo Silveira arrive à vider les signifiants stables que ces symboles possèdent et les insère dans le domaine des sensations mouvantes de la production d’art. En faisant allusion, dans sa forme même, à l’idée de déplacement agile, ces sphères concentrent et multiplient ce qui n’était auparavant que suggéré, en termes physiques, dans les pièces encastrées ou, symboliquement, dans la création de doubles en aluminium. Le mouvement effectif qu’elles permettent est cependant limité : à cause de leur poids extrême et des imperfections de coupe (transmises aux pièces fondues), les plus grandes sphères sont évidemment difficiles à déplacer et restent quasiment inertes sur le sol. Cette ambiguïté entre mobilité et fixité physiques est, de plus, amplifiée par l’action réalisée par l’artiste avec la plus grande des sphères de bois qui mesure plus d’un mètre de diamètre et pèse environ six cents kilos. Laissée, à l’aube (et retirée, à l’aide d’une grue, les nuits suivantes), sur les trottoirs de différents quartiers de Recife – tous très animés pendant la journée – la sphère a provoqué surprises et déconcertions (gravées sur des photos) en raison de leur inexplicable présence en des lieux où l’on ne pensait pas être plausible de mettre une chose aussi lourde et sans fonctions discernable.2 Avec les sphères, tout comme cela arrive avec les travaux articulés, l’idée de mouvement que les formes d’un objet suggèrent est tronquée par les propriétés du matériau. Qu’elles soient prise en compte individuellement ou en groupe, les sphères sont, de plus, opaques à toute tentative de représenter le monde, peu importe le temps qu’on passe avec elles. De manière plus incisive que la Coleção I l’annonçait, la temporalité qu’elles imposent à l’observateur est autre : non plus celle de l’analyse qui décrit le travail mais celle de la spéculation de ses signifiants. 3 Ce renvoi à des sentiments isolés ou uniques – qu’ils soient formels, narratifs ou allégoriques – permet à Marcelo Silveira de se lancer dans diverses directions, n’obéissant qu’à sa volonté rénovée d’articuler ses travaux à l’entourage symbolique et physique des lieux où il les développe. Dans le travail Roupas de Casa [2003], l’artiste relie, dans la construction d’objets, deux expressions distinctes de l’organisation sociale : le division du travail adoptée par les artisans de Cachoeirinha (dans la campagne du Pernambouc) pour la confection d’articles de sellerie et l’architecture d’habitations précaires des “travailleurs sans terre”, que l’on trouve le long des routes qui traversent le pays. Sur des structures schématiques de petits édifices faits de fines barres d’acier, l’artiste met des “habits” de cuir qui recouvrent les compositions vides de ces «maisons», créant une ville inventée et mobile, incertaine mais inévitablement concrète. Alignées sur le sol, ces formes couvertes sont partiellement réfléchies dans des miroirs aux cadres ovales comme ceux qui s’utilisaient dans les salles à manger, tous également disposés en file sur un mur proche et montrant, dessinés sur leurs faces réfléchissantes, la mince architecture qui soutient ces maisons. Une fois de plus, s’impose dans ce travail l’idée que rien n’est immobile et que même ce qui semble être distant se rapproche et se touche: la face externe des maisons et les miroirs “de la salle” qui les réfléchissent, le métal froid et le cuir qui le réchauffe, l’idée de l’artiste et le travail des artisans qui confectionnent les pièces, les habitations fragiles des “travailleurs sans terre” au bord de la route et la connaissance culturelle que le travail génère. Enfin, il incorpore des matériaux qu’il n’avait auparavant utilisés que ponctuellement et montre à nouveau son goût pour la construction qui est le fruit de la ligne et du trait. Si, dans Roupas de Casa, celui qui n’était avant qu’observateur négocie son interaction virtuelle avec le travail, – en fondant, dans le miroir, son image à celle des maisons – dans Bochinche [2003] l’imprécision du lieu que le public et le travail occupent est de nature presque tactile. Formé de douze ensembles, – chacun composé de huit petits blocs de bois fixés au plafond et d’un nombre égal de fils de cuir qui, en les traversant, descendent jusqu’au sol et s’entrelacent – le travail parle de conversation, de bruissements, de rencontres fortuites et imprévisibles comme celles qui ont lieu dans des lieux de fête. En parcourant les passages que forment les fils qui pendent du plafond, il est possible de négocier la différence entre le parcours de l’œil qui traverse l’espace creux fait de trames de cuir et celui parcouru par tout le corps, obligé de faire le tour des ensembles pour se dépla- cer d’un coin à un autre. Cependant, au milieu de la salle, un étrange petite «voiture» de bois semble être prête à se déplacer n’importe où et à servir de lien potentiel entre les douze unités distinctes, et entre le visiteurs et elles. Dans Combinação Torreão [2004], c’est le raccourcissement physique et symbolique de la distance qui sépare les institutions de l’art qui est provoqué par le travail. Fait de fils de cuir entrelacés qui, quand ils sont tendus et pendus au plafond comme des plans mous, reproduisent la salle d’exposition du Torreão (Porto Alegre), Marcelo Silveira l’expose au Gasômetro (également à Porto Alegre), au Musée d’Art Moderne Aloisio Magalhães - MAMAM (Recife) et au Centre Culturel São Francisco (João Pessoa), faisant migrer, d’un lieu à l’autre, l’architecture d’un seul espace. Marcelo Silveira semble annoncer, dans ces travaux, combien la distance entre des choses considérées comme éloignées est petite. C’est ce désir de rapprocher ce qui semble séparé qui oriente la création de l’Armazém República [2004], installation faite de deux segments distincts qui partagent, au delà du nom, une stratégie de construction. Dans l’un de ces segments, cent pièces sculptées dans le bois sont attachées au plafond par des fils de cuir, pendant là comme si c’étaient de la viande fossilisée ou des formes sans utilité en attente d’un usage improbable. Tout comme dans la Coleção I, il s’agit d’un rassemblement de choses créées qui, bien qu’évoquant les formes d’objets utiles, ne sont rien de plus que des volumes dépourvus de significations définies. Cependant, contrairement aux pièces appartenant à ce travail, les objets de bois qui composent l’Armazém República n’ont pas été, à partir du moment où ils ont été terminés, immédiatement réunis de cette forme. Sans parvenir à s’imposer aux yeux de l’artiste comme des travaux autonomes, ils ont trouvé leur place en tant que parties d’un ensemble, seulement avec la distanciation que le temps concède. Dans l’autre segment de l’Armazém República, une étagère de bois abrite des centaines d’objets de verre (verres, pots, miroirs, bouteilles, vases, lustres, tessons) qui s’accumulent, dialoguent les uns avec les autres et s’éparpillent sur de larges étagères, formant un panneau vertical, transparent et fragile qui fait contrepoint à l’horizontalité opaque et robuste des objets de bois pendant du plafond. En plus des différences de propriétés physiques, les deux sections de ce grand bazar semblent se distinguer, à première vue, du fait que les pièces de verre ont été trouvées toute prêtes et que celles de bois ont été fabriquées, une à une, par l’artiste. Effectivement, Marcelo Silveira n’avait jamais auparavant disposé, avec autant d’intensité, de l’univers des formes disponibles autour de lui, cherchant presque toujours à en créer de nouvelles. Rangées sur cette étagère, les pièces de verre défont graduellement les différences qui les séparent de celles de bois, vu que la nouvelle disposition des premières les rend aussi dépourvues d’utilité que la coupe qui donne forme aux secondes les rend inutiles. De plus, la longue période pendant laquelle chacune des pièces de bois a été gardée dans l’atelier – presque comme des vestiges d’un geste créatif frustré – avant d’être récupérées comme composantes de l’Armazém República, a fait que l’artiste puisse disposer d’elles comme si c’étaient des œuvres d’autrui, et pas le fuit de son travail.4 En activant les canaux qui rattachent, en constante tension, ce qui semble différent, cette installation rend donc visible la fragilité de distinctions imperméables et l’incessant échange symbolique qui existe entre les différents matériaux et les diverses formes où les idées et les choses du monde se déplacent. Tout comme le “musée de tout” du poète João Cabral de Melo Neto, le bazar de Marcelo Silveira semble toujours, par le dynamisme qu’il contient, pouvoir accueillir quelque chose mais en dissolvant les limites arbitraires pour devenir “dépôt de ce qui est là”.5 Read, Herbert. A concise history of modern sculpture. London, Thames and Hudson, 1970. 1 Le travail Sfera di giornali [1966], de l’artiste italien Michelangelo Pistoletto (1933) est constitué d’une grande sphère de papier mâché fait avec des feuilles de journaux qui était enroulé le long des rues de Turin, faisant une allusion physique à la dynamique des événements dont la presse rend compte. Alors que le travail de Marcelo Silveira suggère, malgré sa forme, des difficultés de locomotion, l’intervention de Michelangelo Pistoletto renforce, par le matériau symbolique utilisé dans la construction de la sphère, l’idée de mouvement dont le format donne l’illusion. 2 Le passage de la temporalité analytique (temps logique) à la temporalité spéculative (temps expérimenté) dans la sculpture moderne est discuté par Krauss, Rosalind. Passages in Modern Sculpture. London, The MIT Press, 1977. 3 Silveira, Marcelo. “Bazar du Monde”. Interview publiée dans ce livre. 4 Melo Neto, João Cabral de. “O Museu de Tudo”, in Museu de Tudo. Rio de Janeiro, Edition José Olympio, 1975. 5 BAZAR DU MONDE Agnaldo Farias, Moacir dos Anjos et Marcelo Silveira 28 juin 2004, à Recife. Moacir dos Anjos . Marcelo, ce sont presque deux décennies de production artistiques. J’aimerais que vous nous expliquez comment a été le début de cette trajectoire, le moment où vous avez commencé à apercevoir, dans ce que vous faisiez, la potentialité d’une production artistique. Marcelo Silveira . J’ai commencé au milieu des années 80. C’étaient des années d’apprentissage, d’expérimentation, d’une manière, peutêtre, inconséquente. Mais je crois que la conscience de la production devient plus forte et plus nette seulement à partir de la fin de cette décennie et au début des années 90. C’est à cette période que sont advenus quelques faits importants, principalement la distanciation avec ce que je faisais jusqu’alors. En 1991, je suis allé en Europe et en Afrique du Nord, et je suis resté hors du Brésil pendant un an. Un an sans presque rien produire, à peine quelques ébauches, dessins, mais avec la tête travaillant, pensant aux choses que je voyais et à ce que j’avais déjà fait. A un certain moment, je me suis arrêté à Barcelone pour trois mois. C’est à cette époque qu’ont eu lieu la maturation et la prise de conscience de ma production. MA . Mais comment était votre travail avant ce voyage ? MS . C’était beaucoup de peintures et de dessins. Bien que j’aie déjà construit quelques objets, ayant y compris réalisé une exposition à Belo Horizonte, à la Galerie Itaú, un peu avant ce voyage, l’attitude était encore celle d’un peintre. J’utilisais du bois, j’utilisais d’autres matériaux, mais je continuais à être un peintre. J’avais une pensée clairement picturale. Le choix du bois et des matériaux était toujours subordonné à une préoccupation de couleur. Agnaldo Farias . Y avait-il un thème prédominant dans ces travaux ? MS . Non. Ce qu’il y avait, déjà à l’époque, c’était une volonté de transformer les objets que je rencontrais et qui, pour une raison ou une autre, attiraient mon attention. AF . Vous êtes arrivé à cette motivation au travers de l’école ? En fréquentant des expositions ? Comment vous êtes-vous formé comme artiste ? MS . A la fin des années 80, avant ce voyage dont j’ai parlé, j’ai beaucoup fréquenté les ateliers d’autres artistes et les Festivals d’Hiver de Minas Gerais. Cette proximité m’a amené à penser un peu plus à ce qu’était l’espace de l’ate- lier et à ce qu’est l’artiste. Je me souviens qu’avant d’aller à ces festivals j’étais très dérangé par l’environnement dans lequel je vivais à Recife. Ici, la peinture était très forte, je devais peindre. Les informations étaient rares, je voyageais très peu. Je n’étais pas satisfait. Les conversations ne portaient quasiment que sur la peinture, sur les effets picturaux obtenus avec différentes techniques, et j’étais très angoissé. Ça me dérangeait. AF . Ça dérangeait qui ? Qui était Marcelo Silveira à cette époque ? MS . J’étais très lié à l’Oficina Guaianases, qui, pour moi, a été un grand espace d’initiation. Mais, malgré son importance dans ma formation, les discussions auxquelles je participais là ne me satisfaisaient pas totalement. Je voulais discuter de certaines choses que, même sans savoir exactement de quoi il s’agissait, je n’arrivais pas à trouver à la Guaianases. C’est alors que j’ai commencé à discuter avec Liliane Dardot, artiste du Minas Gerais qui, à l’époque, habitait à Olinda. C’est grâce à elle que j’ai connu le travail de Amílcar de Castro. Et aussi les textes de Amílcar qu’elle apportait à la Guaianases. J’ai fait avec Liliane un cours de dessin durant lequel elle montrait en permanence de nouvelles choses et discutait avec les élèves. C’est par ce contact avec elle que m’est venu le désir de fréquenter les Festivals d’Hiver du Minas Gerais. AF . L’ambiance de ces festivals était d’une grande effervescence. Il était possible de participer aux ateliers offerts par des artistes locaux, comme Marcos Coelho Benjamin, Marco Tulio Resende, Fernando Lucchesi, et de s’approcher de leurs travaux. Quelqu’un vous a-t-il donné des suggestions qui ont été essentielles pour le développement de votre travail ? MS . Lors du premier Festival d’Hiver auquel j’ai participé, j’avais l’air d’un aveugle au milieu d’un feu croisé, perdu entre tant de choses. Mais, celui de 1989, réalisé à Belo Horizonte (c’était la quatrième fois que je fréquentais le Festival), a été très tranquille et s’est révélé très important pour moi. Ils avaient investi lourdement dans la production et dans la présence de divers critiques. Je me souviens d’une équipe formée par les critiques Roberto Pontual, Olivio Tavares de Araujo et d’une troisième personne dont je ne me souviens pas le nom. Ils faisaient l’accompagnement des ateliers, évaluaient, démolissaient l’un, faisaient l’éloge de l’autre. J’ai toujours été très tranquille en ce qui concerne cela. Qu’ils aiment ou non ce que je faisais, j’allais là pour tirer profit de ce qu’il y avait de bon. Les critiques avaient leur vérité et j’avais ma vérité. C’était bien cette confrontation. Je me souviens que les considérations les plus pertinentes étaient faites par Roberto Pontual. Ce festival, à Belo Horizonte, a réellement été marquant. Quand je suis allé à Barcelone, quelques temps après, j’ai perçu que les discussions que nous avions pendant les festivals du Minais Gerais ne devaient rien aux discussions de l’école d’art que j’ai fréquenté là pendant trois mois, la Massana, une école d’art liée à la mairie. MA . Il y a, dans le Minas Gerais, une tradition de création d’objets, et également une pratique de la récupération, de l’appropriation dans le travail de choses trouvées. Dans les ateliers que vous avez fréquenté, est-ce qu’une production a particulièrement attiré votre attention dans ce sens ? MS . Ce qui a attiré mon attention, le premier grand impact du Minas Gerais, a été le travail de Celso Renato. J’étais impressionné par la force de son travail et de voir comment il n’avait pas de visibilité. D’ailleurs, jusqu’à aujourd’hui, son travail n’a pas de visibilité. Les gens semblent tout simplement ignorer Celso Renato. MA . Ces voyages consécutifs dans le Minas Gerais semblent avoir été très importants pour votre formation ? MS . Sans aucun doute. En plus des festivals, en 1990, j’ai fait une exposition individuelle à la Galerie Itaú de Belo Horizonte qui était coordonnée par Claudia Renault. C’était un espace culturel très dynamique. Beaucoup de gens ont visité l’exposition. Mais, le plus important, c’est qu’à cette même époque avait lieu une grande exposition de Arthur Bispo do Rosario, au musée de la Pampulha, organisée par Frederico Morais. Cette exposition de Bispo a été un événement pour moi. Et il est amusant qu’Agnaldo [Farias], qui m’a invité pour une exposition collective autour de l’œuvre de Bispo, n’ait pas su, à l’époque à laquelle il m’a fait cette invitation, l’importance que l’expérience d’avoir vu cette exposition avait eue pour mon travail. Il n’y avait qu’une chose qui me dérangeait dans l’exposition, qui m’a même amené à me chamailler avec Frederico, c’est le fait qu’il ait mis au mur, à l’entrée de l’exposition, un certificat de maladie mentale de Bispo. Je me sentais mal à l’aise chaque fois que je voyais ce certificat. Parce que je crois que c’est l’œuvre de Bispo qui m’a donné l’intuition de ce que signifie être un artiste, même si aujourd’hui je cherche à comprendre ça pleinement. C’est en regardant Bispo que, d’une certaine manière, j’ai perçu que c’était ça que je recherchais. J’ai perçu que cela, bien qu’apparemment si simple, était une grande œuvre. Je me suis souviens que l’exposition m’a ému, à en rester bouche bée. Une baffe ! C’est pour ça que je ne comprenais pas toutes ces discussions pour savoir si ceci était de l’art ou pas. Je pense que le fait que le commissaire ait posé ce certificat de maladie mentale dans l’exposition démontrait un peu de manque d’assurance de sa part. AF . Votre témoignage est intéressant parce que cette exposition, qui a été montée à Rio de Janeiro, São Paulo et Belo Horizonte, a provoqué ce même choc dans les trois villes où elle est passée. Je me souviens qu’en 1991, Marcos Coelho Benjamin, Fernando Lucchesi et Paulo Lender ont participé à la Biennale de Sao Paulo avec un projet commun qui était, nettement, un hommage à Arthur Bispo do Rosario. L’impression, en vous écoutant, est que, bien que votre travail ait une vocation pour l’objet, c’est seulement le travail de Bispo qui, d’une certaine manière, a ouvert une porte à ce que vous cherchiez et qui ne rencontrait pas d’écho dans le milieu dans lequel vous évoluiez, à cette époque, à Recife. Non seulement pour la pratique de la récupération, comme Celso Renato le faisait, mais aussi pour le type de produit qui, je pense, ne viendrait éclore que quelques années après sa production, des objets plus distants de la sculpture proprement dite et plus proches du vernaculaire, du populaire. Serait-il correct de parler de passage, au fil des années, d’un intérêt pour des formes créées à un intérêt pour des formes appropriées dans votre travail ? MS . Je pense qu’il existe certaines questions qui m’intéressent, qui sont travaillées au fil d’un temps d’une manière qui me satisfait et qui finissent par sortir complètement du travail. Par ailleurs, d’autres finissent par revenir de temps en temps. Mais il est certain que mon travail le plus récent ne s’épuise pas dans la question sculpturale. Il y a simultanéité d’intérêts divers. Il y a des moments où je ne pense qu’à la sculpture et je cherche à tout éliminer, épurer. Et il y a des moments où l’espace entre autour de l’objet que je suis en train de faire, où entre le bazar qui m’entoure, où m’apparaît le désir de tout m’approprier. AF . Il me semble qu’au début le travail avait un perfectionnisme formel plus net, un plus grand souci pour la finition. C’est comme s’il était, d’une certaine manière, encore prisonnier d’un champ spécifique de création. Il y a eu un moment où votre production artistique aurait pu avoir lieu dans le cadre de la peinture puisque les références que vous aviez étaient de la peinture. Dans un second temps, entre la sculpture et, tout de suite après, la récupération d’objets, la liberté d’amener n’importe quoi dans le territoire de l’art. La sensation que j’ai, en accompagnant votre travail tout au long des années 90, c’est qu’à un moment déterminé, vous avez purgé la volonté de créer des formes. La purge est également la volonté de simplement s’approprier des formes ou des objets déjà prêts. De telle manière que je trouve intéressant quand vous parvenez, aujourd’hui, à faire des travaux qui résonnent dans le champ de la sculpture et aussi dans le champ d’où viennent les objets appropriés. C’est comme si le travail occupait un espace intermédiaire : une moitié se situe en dehors du musée et l’autre moitié à l’intérieur du musée. C’est vrai ? MS . Je crois que oui et je pense qu’il faut revenir encore une fois à Bispo do Rosario pour comprendre cet aspect de mon travail. Peut-être n’ai-je pas rendu hommage à Bispo comme je l’aurai dû, au vu de son importance dans ma trajectoire. Non pas que j’ai tenté de travailler sur ce que j’avais vu à cette exposition, mais parce que cette importance est claire dans les directions que, des années plus tard, j’ai senti que mon travail prenait. Le grand enseignement au contact de l’œuvre de Bispo a été ce va-et-vient qui est si présent dans ce qu’il fait. Souvent, Bispo ne fait que s’approprier ce qui existe déjà ; ça et là, il se risque à construire l’objet, totalement, sans se soucier s’il y a une cohérence constructive avec ce qu’il a fait auparavant. C’est cette liberté que j’ambitionne, non seulement de procédés, mais aussi de matériaux. La liberté d’être intéressé, aujourd’hui, à faire un objet à cause du poids excessif du matériau que j’utilise et de, demain, faire un objet en explorant la légèreté du papier. De travailler à une époque avec le bois et à une autre avec le fer. En ce moment je suis entrain de mûrir l’idée de travailler avec du plomb, avec de la fonte, de retourner à la sculpture, d’explorer la direction opposée de ce que j’explore aujourd’hui, en utilisant le papier, le crayon, l’intérêt pour la ligne. Je ne sais pas, je pense que je dois avoir quelque chose de tordu qui ne me permet pas de me satisfaire de ce que je fais. MA . J’aimerais explorer un peu cette question de l’intérêt pour la ligne, pour le dessin, qui est quel- que chose qui vient des années 1980, du début de votre trajectoire. En examinant votre production au fil des années, j’ai souvent remarqué, dans les sculptures et les objets que vous faites, un regard de dessinateur également. Ces travaux semblent toujours suggérer qu’ils ont été faits au moyen de traits articulés dans l’espace. Comme si c’étaient des dessins faits dans l’espace. Quel est le rapport entre le dessin et la sculpture dans votre travail ? MS . Je n’ai utilisé le dessin comme ébauche d’un travail tridimensionnel que dans de rares situations. Normalement, quand je fais une sculpture, je change l’instrument de travail. Je lâche le crayon et je prends la scie sauteuse. Je lâche le crayon et je vais construire les lignes directement à la scie, découpant le bois. Parfois, c’est la manière de “dessiner” avec la scie qui suggère une attitude plus brusque dans la coupe du bois. En d’autres occasions, c’est la dimension ou la forme du morceau de bois dont je dispose qui va suggérer le “trait” que je fais. Il n’y a pas moyen de faire une ébauche, il n’y a pas de place pour les regrets. A ce sujet, je me souviens qu’Amílcar de Castro disait une chose qui m’a beaucoup impressionné : que le grand enseignement qu’il avait reçu de [Alberto] Guignard, avec qui il avait étudié, avait été de le forcer à ne dessiner qu’avec un crayon dur, difficile à effacer. Cela m’est resté en tête toute la vie. Il est amusant qu’il n’y ait pas d’influence directe de l’œuvre de Guignard sur le travail d’Amílcar et d’avoir cet enseignement, qui est pratiquement le fil conducteur de toute son œuvre : la nécessité de la précision du trait. C’est peut-être pour cette raison que je ne vois pas le dessin et la sculpture comme des choses séparées, tout vient ensemble. Et ceci me renvoie au Livro do Armazém [2004], qui réunit des reproductions, faites avec des tampons que j’ai fait faire, des contours des 100 pièces de bois qui composent l’installation Armazém República [2004]. Dans ce cas, il y a même une inversion par rapport à ce qui est plus habituel : ce sont les objets de bois sculpté que j’ai utilisé comme “ébauches” pour les dessins faits avec les tampons. AF . Dans ce cas, vous dessinez avec la scie sur le bois, et c’est le résultat de cette action qui devient la matrice du dessin qui va être imprimé sur le papier, et pas le contraire. C’est une compréhension élargie de ce qu’est le dessin. MS . Je pense que cela a à voir avec l’arrangement qu’on fait des choses et de concepts. J’ai la manie d’arranger et d’organiser les choses comme si elles faisaient partie d’un bazar. Avant, je prenais les choses et j’interférais toujours sur elles. Aujourd’hui, je suis plus un organisateur. Je range tout. D’ailleurs, je suis arrivé à la conclusion qu’une personne organisée n’est pas nécessairement celle qui ordonne les choses d’une manière visuellement propre ; organisée, pour moi, c’est la personne qui range des informations auxquelles d’autres personnes peuvent avoir accès, qui permet que d’autres puissent voir son univers, même si ce rangement implique une accumulation de choses. En ce sens, je crois que je suis une personne organisée, je pense que les autres arrivent à distinguer ce que je fais. AF . Alors, ce serait votre manière d’organiser les choses qui permettrait qu’une autre personne entre dans votre système de pensée et de création. C’est une donnée très intéressante et je pense qu’elle est réellement présente dans votre œuvre. Il y a un de vos travaux, fait de plusieurs petites pièces de bois rangées en lignes sur un mur [Cajacatinga, 1997], qui a beaucoup à voir avec la calligraphie, où les ensembles de pièces rangées seraient presque comme les lignes d’un cahier et où les pièces ont une ressemblance et suggèrent une relation entre elles. Les travaux Coleção I [1999] et Armazém República sont faits d’objets différents, qui ont été construits séparément et ensuite mise ensemble. Vous avez rapproché ce qui était loin du monde, et l’intérêt du travail est moins dans chacune des choses jointes que dans leur organisation, dans la manière de les montrer. Les objets qui composent ces travaux n’ont rien, ou peu, à voir les uns avec les autres, si ce n’est le fait que presque tous sont faits de bois. L’exception, dans des travaux récents, serait peutêtre l’installation Roupas de Casa [2003], dans laquelle, bien que beaucoup de pièces qui composent le travail forment aussi une collection, il existe un principe isomorphe et il y a une ressemblance et une continuité entre les pièces. J’aimerais que vous parliez un peu de ça, parce que vous semblez avoir abandonné l’intention de faire des formes ressemblantes pour vous dédier à faire des formes chaque fois plus disparates. Vous avez travaillé avec un principe d’organisation qui rapproche des choses qui sont différentes. MS . Je vais essayer d’expliquer comment se processus s’est opéré. Il y a quelque temps, j’en suis venu à sentir que les choses que j’avais faites dans le passé me dérangeaient. J’en suis venu à détruire quelques travaux, les brûlant. Mais, d’autres fois, j’ai commencé à découvrir des situations où ces œuvres vivaient bien lorsqu’elles étaient ensembles. En vérité, il m’est déjà passé par la tête l’idée de construire des œuvres “invalides”. Justement, ces œuvres qui ne me satisfaisaient pas et qui seraient placées dans des caisses scellées et déclarées comme invalides. Mais alors j’ai commencé à trouver préoccupant cette question des œuvres invalides. Ce serait une solution très facile : je n’aime pas un travail, je le mets dans une caisse et je dis qu’il est invalide. C’est tout. En vérité, je pense que je dois affronter ces travaux, les prendre, les reprendre et voir ce qu’ils vont donner. D’une certaine manière, j’ai besoin d’interférer dans ces travaux et de leur donner un nouvel ordre. Je pense que ces travaux seront très bientôt récupérés. Et, à nouveau, apparaît ce pro- cessus, cette idée d’aller et venir. Et c’est là qu’entre l’esthétique du bazar, son importance pour mon travail. Ce n’est pas le vert qui doit être près du rouge ou du orange, ni le plus grand qui doit être près du plus petit, ni le transparent qui doit être à côté (ou loin) de l’opaque. Dans le bazar, l’espace est rempli d’objets sans se soucier de lieu ou de fonction de ce qui est exposé, et ce n’est pas pour autant que le propriétaire du bazar cesse de vendre les objets. Elles ne cessent d’attirer l’attention et il y a de la beauté dans cet excès de choses pendues. j’ai commencé à voir l’importance de cette disposition chaotique des choses, propre des baraques de foire, des bazars. Peut-être que cet attachement vient de mon expérience avec le bazar de Monsieur Malaquias, mon grand-père, où s’accumulaient des vestiges des vieilles choses qui étaient passés par là. La vieille affiche de savonnette Lux de Luxo, par exemple, qui est restée sur le mur pendant plusieurs décennies. Je me souviens que, dans les années 80, il existait encore l’affiche des années 50. Mon grand-père a changé d’activité et était très jaloux de son bazar. A la fin de sa vie, il ne vendait plus que du matériel de construction, mais il maintenait les affiches de l’époque où il vendait de la viande, des produits de beauté, du tissu. MA . L’accumulation du bazar était également temporelle, avec les symboles d’époques distinctes amoncelés là ? MS . C’est exact. Et cette esthétique a commencé à prendre de l’importance pour moi. J’ai commencé à voir que ce n’était pas une chose laide. Alors, au lieu de renier les travaux que j’avais faits, j’ai vu qu’il fallait les affronter et assumer que c’était, de fait, ce que je faisais à un moment déterminé, qu’il fallait laisser voir ça. C’est différent d’enfermer les œuvres dans un coffre. AF . Ces pièces font partie du Armazém República ? MS . Non. Celles dont je parle sont des pièces plus anciennes que j’attends encore de reprendre. L’Armazém República est composé de pièces de bois qui n’ont pas donné le résultat que j’espérais quand je les ai faites, mais qui, à partir d’un certain moment, ont commencé à attirer mon attention. Quand j’ai commencé à faire ce travail, il y avait un sentiment contradictoire, une certaine confusion. Pourquoi est-ce que j’utilisais des choses qui, à mon avis, n’avaient pas été réussies et que, maintenant, je voulais qu’elles soient vues, toutes ensemble, comme dans un bazar ? MA . Elles n’avaient été réussies selon quels critères ? MS . Elles n’avaient pas d’autonomie. Pour cela, elles n’avaient pas été réussies. Elles n’ont trouvé une raison d’exister que lorsqu’elles se sont trouvées ensemble. C’est au contact prolongé avec ces pièces que j’ai commencé à voir qu’on n’avait pas besoin de créer des choses nouvelles tout le temps. Il est possible d’entrer dans l’atelier, d’ouvrir les caisses et les paquets et de nettoyer, épurer, de séparer quelques pièces et de jeter celles qui ne valent rien. J’ai commencé cette histoire de l’Armazém República en revoyant les images de plusieurs travaux anciens. Je me suis aperçu qu’il y avait quelques représentations et caractéristiques constructives qui se répétaient, formant des familles, et j’en suis venu à regrouper les pièces en fonction de ces ressemblances. MA . Vous dites qu’il n’est pas toujours nécessaire de créer de nouvelles formes, qu’il est possible de s’approprier des choses déjà prêtes dans l’atelier. Mais il y a un autre segment de l’Armazém República qui est formé d’objets de verre, ce qui implique un autre type d’appropriation. Non plus l’appropriation de choses faites par vous-même dans le passé, mais bien de choses appartenant au monde de l’industrie : ampoules, lustres, bouteilles, miroirs, pots et autres objets. Il me semble que, même si ce n’est une pratique inédite dans votre travail, c’est la première fois que ces appropriation et réarrangement de choses industrielles y rencontrent tant d’importance. Cela fait écho à des stratégies qui, apparemment, n’ont pas de relation proche Avec votre travail antérieur, étant plus de l’ordre du readymade. Comment voyez-vous ce passage dans votre travail ? MS . Ca a été une chose réfléchie. Ce n’est pas une attitude gratuite. Une des raisons qui m’ont fait construire ce bazar de verre est la fascination pour les caractéristiques physiques du verre, principalement sa fragilité. La possibilité qu’il casse et, que d’un moment à l’autre, il cesse d’exister. Pour moi, cela était déjà une raison suffisamment forte pour décider de travailler avec le verre. L’autre chose était de retirer la fonction de l’objet approprié. Retirer la fonction d’une bouteille de jus de fruit et, en même temps, lui donner le même traitement que celui que je donne à un pot décoratif et au verre merveilleusement bien travaillé, en les regroupant dans un même endroit. A la fin, j’ai inclus beaucoup de verre cassé dans ce travail parce que ça m’intéressait aussi de jouer avec l’attirance que le verre exerce, la volonté qu’il donne de le toucher, et la crainte de le faire à cause du risque de se couper. Au lieu d’exclure cela du travail j’ai commencé à jouer avec cette ambiguïté. Il ne s’agissait pas d’être agressif, mais de trouver de la beauté là-dedans. Je trouve intéressant de montrer les morceaux de bois de l’Armazém República, qui ont été travaillés de manière exhaustive, à côté des morceaux de verre que j’ai juste récupérés et rangés sur des étagères. En vérité, je pense qu’il y a une ressemblance entre les deux segments du travail. J’ai beaucoup vécu avec ces pièces de bois, mais je n’arrivais pas à leur définir une fin, jusqu’à ce qu’elles soient distantes de moi. Les pièces de verre imposaient aussi cette distance, mais de manière immédiate, parce qu’elles avaient été faites par d’autres personnes. C’est comme si ces pièces de bois avaient aussi été faites par d’autres personnes. AF . D’où vient le titre Armazém República ? C’était le nom du bazar de votre grand-père ? MS . Non. Le bazar de mon grand-père était M.G. Silveira. “República” est un mot qui a neuf lettres qui ne se répètent pas et qui, dans le code que mon grand-père a créé pour faire sa comptabilité, correspondent au chiffres de 1 à 9. Un fois, j’ai interrogé mes frères à ce propos et il ne connaissaient pas l’existence de ce code. Ils ont tous aidé mon grand-père dans le bazar, mais ce n’est qu’à moi qu’il a expliqué le code. Je restais, discutant plus que je ne l’aidais dans le travail. Discutant tout le temps d’une chose ou d’une autre. Ça a été une grande entente. Quand il parlait des difficultés des affaires d’une de ses connaissances, il disait : “Ah ! Ca ne va pas marcher, il confond recette et bénéfice.” C’était une manière sympathique de faire référence aux mauvaises affaires que quelqu’un faisait. Il n’aimait pas parler ouvertement de la décadence d’un autre. C’était une personne toujours positive. AF . C’était une personne délicate ? Comment étaitil ? MS . Une chose pour le comprendre est qu’il n’avait pas de voiture. Il préférait en louer une quand il en avait besoin pour faire ceci ou cela. Mais il investissait dans les voyages. Il a beaucoup voyagé. Europe, Afrique. Ses enfants et lui. Quelqu’un de la famille et lui. C’est seulement lors d’un de ses derniers voyages qu’il a commencé à voyager avec sa femme., parce que quand l’un voyageait l’autre restait. C’était toujours comme ça. Il y a une autre chose intéressante : papy n’a jamais donné de jouets comme cadeaux. Quand un de ses enfants ou de ses petits-enfants allait voyager il donnait une enveloppe au départ ou au retour, une contribution financière. C’était une personne très simple. Une personne qui venait d’une famille qui avait eu de l’argent. Ils ont presque tout perdu et il est devenu le patron du bazar. Ca a commencé comme ça. Peut-être qu’il a toujours beaucoup prêté attention à l’éducation formelle de ses enfants, qui ont toujours étudié dans de bonnes écoles, à cause de cette trajectoire AF . Nous parlons de références fortes dans votre travail. Vous avez des références picturales de l’histoire de l’art, également en raison de votre contact avec plusieurs artistes du Pernambouc, dans les années 80, qui travaillaient principalement avec la peinture. J’imagine que la découverte de l’œuvre de Bispo do Rosario a déjà été une grande ouverture. Comment avez-vous senti que votre propre vie, y compris familiale, pouvait informer votre travail en tant qu’artiste ? Quand cela est-il devenu clair pour vous ? MA . Je vais répondre de manière moitié biaisée. L’origine de cette collection de 50 pièces de bois [Coleção I] est très drôle, parce qu’a surgi le désir de faire une barrette à cheveux, pour offrir à une amie. C’est lorsque je l’ai terminée que je me suis rendu compte de ça. J’ai commencé par l’idée de faire une petite pièce, j’en ai fait 50, et aucune ne ressemble à une barrette à cheveux. Je crois que c’est à partir de cette concentration qu’à commencé à bourgeonner, mais avec force, cette histoire de l’usine de canne à sucre, du bois que je rencontrais dans la forêt, des papiers du bazar. C’est à ce moment que tout à commencé à se mélanger et j’ai commencé à voir que ma vie était peut-être un grand bazar. C’était à la fin des années 1990. A partir de ce moment, j’ai beaucoup pensé à la question du bazar. Au début, je suis resté très pris à l’image du bazar, et c’est seulement peu à peu que j’en ai pris mes distances. Les “livres d’écriture” que je fais font référence au livre du bazar, où l’on notait les stocks, où l’on faisait les comptes, en toute spontanéité. Je note aussi ceci et cela dans mes “livres d’écriture”. Je note n’importe comment les choses au jour le jour, et je remarque que l’intensité avec laquelle vous enregistrez une chose aujourd’hui est différente de celle que vous y mettrez demain. L’encre est moins poreuse aujourd’hui que demain. Aujourd’hui c’est le crayon de papier, demain c’est le stylo. La question est : si ce qui m’intéresse et m’attire est aussi proche de moi, pourquoi irais-je chercher des références distantes ? Ce bazar de mon grand-père est ce que je fais dans mon travail. C’est à l’esthétique du bazar que je donne de l’importance. Je ne peux pas le nier. Nelson Leirner a également quelque chose comme ça. Il entrepose les choses, crée des bazars. Je ressens une proximité avec son travail bien qu’il soit beaucoup plus urbain, alors que mon origine est la campagne. J’ai fait un travail dans lequel je vois très bien le lien avec Nelson Leirner. Il s’appelle O que Abunda não Atrapalha [2003]. Au début, je trouvais tout, dans ce travail, excessif, et c’est une amie qui m’a dit : “Non, o que abunda não atrapalha.” (Ce qui abonde ne dérange pas.) Le travail de Nelson Leirner, c’est ça pour moi. C’est un travail qui abonde et qui ne dérange pas. Alors que tous épurent, lui, il remplit tout. Il est merveilleux. Il crée ce que j’appellerais un excès simplifié. AF . Je pense que beaucoup de gens travaillent avec cette idée de collectionner des objets, et toutes les collections sont, évidemment, différentes. Le moment de votre travail que je sens le plus proche de Nelson Leirner est l’installation Roupas de Casa. Vous y mettez une maison à côté d’une autre, formant ainsi une espèce de village, ou de ville. Et Nelson, lui aussi, organise, d’une certaine manière, des villes imaginaires. Mais, peut-être que ce qui s’approche le plus du travail de Nelson serait la question même de l’excès. Sentez-vous une quelconque pression pour que votre travail soit plus propre, plus «sec» ? MS . J’ai reçu plusieurs offres pour acheter une, deux ou trois pièces de l’Armazém República. Mais je ne vois aucun sens à les vendre ainsi. Le travail est composé de 100 pièces. Qui le veut doit tout prendre. Ce n’est pas seulement une question commerciale. C’est que les gens veulent tout simple. Ils disent qu’une seule pièce est suffisante, que deux pièces suffisent. Je dis que non, que j’en veux beaucoup ensem- ble. J’entends ça en permanence. Mais je suis tranquille. Je sais que tôt ou tard je rencontrerai un endroit, public ou privé, pour que ce soit installé. Il se peut même que ça aille dans un lieu pour y être gardé, mais tout ensemble. En fait, je pense que certaines pièces peuvent être accrochées alors que d’autres sont rangées dans des caisses, sans être exposées. Elles restent là, gardées, jusqu’à ce que quelqu’un décide d’ouvrir les caisses et d’exposer les pièces. L’important est que le travail soit un tout. MA . Cette discussion sur l’Armazém República soulève une autre question importante. Ce travail explique, une fois pour toutes, un changement des processus de création par rapport à ceux avec lesquels vous travailliez auparavant. Il ne s’agit plus d’une manière unique de créer mais d’une résolution à dialoguer avec la tradition de la sculpture. Dans ce travail, vous cédez à cette opération de regroupement qui vous fascine tellement. Et cela provoque aussi une occupation différente de l’espace, plus en rapport avec la tradition de l’installation. Le public, évidemment, en vient à avoir une relation différente avec votre travail. Il ne circonscrit plus un objet ni ne prend en considération chaque élément que vous présentez, isolément, bien que l’on puisse voir, individuellement, une sculpture. Votre production récente amène le public à prendre en considération ce que vous faites par rapport à l’espace dans lequel le travail est installé et aussi par rapport au propre corps de l’observateur. Il en est ainsi avec Armazém República, avec Roupas de Casa et avec Bochinche [2003], pour ne citer que quelques travaux récents dans lesquels cette mutation est notable. MS . Quand le travail est pensé isolément, il possède un ordre interne, il conduit le regard, il a une régularité, il est plus contenu. Mais j’ai commencé à voir que les choses devaient être plus confuses, mélangées, moins évidentes. Et pour cela, l’observateur devait être à l’intérieur des travaux, en faire partie. Il est intéressant que ces travaux aille, éventuellement, occuper des espaces domestiques et puissent ainsi, être un peu une subversion de l’ordre de décoration traditionnel et même de la sculpture, où chaque chose a un lieu défini et où il n’existe pas de désordre intentionnel. Le problème apparaît quand on sait que de nombreuses personnes délèguent à des architectes et décorateurs la décision de la relation qu’ils vont avoir avec les objets de la maison, renonçant au pouvoir de choisir, de sélectionner. Ca me dérange. J’aimerais que la personne qui va vivre avec l’œuvre choisisse la relation qu’elle veut avec celle-ci. Au lieu de l’ensemble que je propose, l’architecte choisit une ou deux pièces, les pend au plafond et finit par laisser tout bien ordonné, mais, d’une certaine manière, désorganisé. Mon intention, principalement avec ces travaux de regroupement de pièces, est justement de faire que les personnes vivent avec ce désordre, qui est une manière d’organiser. Même si ce n’est pas mon attribution de dire comment les gens qui admirent mes travaux doivent les installer chez eux, je dois reconnaître que, selon les cas, cela me met mal à l’aise. MA . Mais ce souci, ou malaise, il semble qu’il est provoqué par un changement dans la manière avec laquelle vous pensez la relation du travail et de l’espace. Vous l’avez vous-même mentionné, plusieurs de vos pièces semblent perdre l’autonomie que la sculpture possède et n’ont de sens qu’en groupe et par rapport à l’endroit où elles sont installées. MS . Quand je sors de la sculpture et que je cherche à occuper l’espace avec un excès de choses, il n’y a aucun doute que c’est une position plus égoïste. Je vais occuper plus. Je vais remplir plus. Je vais exiger plus. La sculpture est plus simple. Je veux que le travail incommode. Qu’il soit dans une demeure ou qu’il soit dans la rue. AF . Il me semble que la logique de l’installation, ce type d’occupation sans frein de l’espace, est une manière de faire déborder, de sortir du milieu où l’on attend que l’art soit, et d’occuper ou d’envahir la demeure de l’autre, l’espace de l’autre. Mais cet espace qu’il envahit est un espace de la société contemporaine, auquel il apporte une information propre au monde du bazar. Le bazar, qui est un concentré de formes visibles, envahit les maisons blanches et élégantes. Ce qui est un fait curieux. Comment accommoder cela ? La personne va-t-elle devoir vivre en-dessous de l’œuvre ? MS . Quand je fais ça, je n’ai pas l’intention de critiquer l’architecture ou les architectes. Je pense l’espace. Je ne pense pas seulement l’espace du musée. Je pense à comment l’œuvre se pose face à qui y a accès. Quand j’ai mis une énorme sphère de bois dans la rue, j’ai voulu confondre les gens qui passaient sur le trottoir. Je veux faire un travail avec plusieurs de ces chariots qui vendent des CDs pirates et jouent de la musique dans la rue. je pense nommer le travail Plágio. En fait, l’idée est que ce seraient plusieurs artistes. Chacun produirait un CD en plagiant quelque chose et sortirait dans le rue, jouant la musique sur son chariot. Mon CD serait un plagiat du son des coqs, des poules, des chiens. L’idée est de créer une situation de dérangement, d’introduire un élément étrange dans le lieu. Vous imaginez la confusion que ce serait, le coq chantant et les chiens aboyant ? D’autre part, je me soucie beaucoup de comment mon travail va être vu par l’autre. Si je vis de ça, et je veux en vivre, je ne dois pas me distancier des gens. Je dois y penser. Je dois penser au collectionneur, à la galerie, au musée. Je dois penser à tout ça. MA . Mais le fait est que ce souci envers l’accueil de votre travail n’est pas un obstacle à votre processus créatif. Il y a toujours des bruits qui tirent la paix de cette relation avec le public. MS . Il y a toujours des bruits. cette préoccupation pour l’espace a déjà commencé, en vérité, au milieu des années 1990. L’exposition que j’ai faite à la Fondation Joaquim Nabuco [1994] ressemblait à la «samba do crioulo doido» (samba du nègre fou), parce qu’il y avait beaucoup de choses. Mais ça a été une exposition importante pour moi. Les gens ont commencé à voir mon travail de manière différente. L’utilisation de la galerie de la Fondation a commencé à changer à partir de cette exposition. Avant, on ne pouvait ni percer ni faire un tas de choses. J’ai commencé à mettre de l’argile sur les murs de la salle. Ca a été tout un cirque. Aujourd’hui, ce serait plus simple. Je n’aurais pas fait ça. Mais j’avais envie de le faire. Peut-être un désir d’incommoder l’institution. Je ne sais pas. Mais tout ça a été important pour que je prenne conscience de ce que je voulais. MA . Il y a quelques années, vous avez fait quelques sculptures en aluminium fondu, dont les moules étaient des sculptures faites en bois. Vous conserviez les formes créées, mais les transposiez vers un autre matériau qui possédait, évidemment, des qualités différentes du bois : l’un est chaud, l’autre est froid ; l’un absorbe la lumière, l’autre la reflète. Ce sont des sculptures qui, de plus, la plupart du temps, sont présentées en paires : l’exemplaire en bois et l’autre en aluminium. J’aimerais que vous parliez un peu de la motivation pour ces travaux et de comment vous les situez dans votre œuvre. MS . A l’époque, j’ai choisi l’aluminium parce que je voulais travailler avec un matériau qui puisse cohabiter avec le bois, mais qui provoque également une sensation opposée à celle provoquée par le bois, qui est un matériau qui invite au toucher. Et l’aluminium n’invite pas au toucher, il vous envoie loin. Beaucoup de choses ont surgi de cette motivation. Plusieurs fois, j’ai fait le moule à partir d’une pièce de bois et j’en ai fondé une réplique en aluminium. Une fois, je me suis intéressé à fondre une forme en aluminium qui ne possède pas de contrepartie en bois. Alors, j’ai pris une pièce de bois que j’avais sculptée et j’ai fait faire deux moules identiques. Quand j’ai réuni les deux moules, j’ai vu que j’avais créé une pièce qui n’existais pas en bois, et alors je l’ai fait fondre en aluminium. Mais, peut-être le principal élément de ces travaux est l’idée même du renvoi, de la duplicité de formes. Des années plus tard, j’ai commencé à voir que, là, mon intérêt pour les miroirs était déjà présent et leur raison d’entrer dans mon travail. C’est plus évident pour les miroirs qui font partie de l’installation Roupas de Casa, qui renvoient les images de la maison, en en créant des doubles. Il y a encore un autre élément proche de cette idée, de ce que j’aime beaucoup, qui est le tampon, un autre duplicateur d’images. AF . Depuis votre enfance vous cohabitez avec les matériaux les plus divers. Vous avez dû être un enfant qui tripotait tout le temps les choses. Mais, à un certain moment de nos vies, il y a un moment où on en vient à avoir une relation consciente avec les choses, avec la phénoménologie des choses, avec leur manière de se comporter dans des situations données. Une chose est cette relation quand vous êtes enfant, une autre quand vous êtes adulte. Quand en êtes-vous venu à utiliser, consciemment, le bois et le cuir ? Qu’est-ce que le bois pour vous ? Qu’est-ce que le cuir ? MS . J’ai toujours été très proche du bois. Mon père me faisait cadeau de choses qu’il regardait et trouvait étranges. En vérité, je suis un spécialiste des choses inutiles. Chez moi, on ne me parlait de rien de sérieux, mais de tout ce qui était inutile, si. Je n’étais invité à participer qu’aux banalités. Au début, cela me gênait. Aujourd’hui, je trouve ça sympathique. Papa m’a toujours donné les choses qu’il trouvait bizarres. S’il était dans l’état du Piaui et qu’il y trouvait quelque chose d’étrange, il me l’apportait. Il trouvait un morceau de fer bizarre, il me l’apportait. Ses cadeaux étaient plutôt en bois. Il avait une affinité avec le bois. Je pense que, le voulant ou non, il a été un incitateur de mon travail. Je me souviens qu’à une certaine époque, l’usine de canne à sucre de la famille a été détruite. Et les roue à eau étaient toutes faites en cajacatinga, parce que c’était le bois le plus résistant à l’eau. Comme j’avais la manie de préserver les choses, Papa a voulu me faire taire devant ce démontage et a dit : “Regarde, j’ai démonté toutes les roues et je les ai gardées pour toi”. J’ai travaillé avec ce cajacatinga pendant longtemps. J’ai fait plusieurs travaux pour l’exposition de la Fondation Joaquim Nabuco, en 1994, et après un temps, ce matériel a terminé. Alors, il m’a dit que je pouvais encore trouver de ce bois dans les champs, carbonisé. Et j’en ai cherché. C’étaient de grandes souches. J’ai commencé à me servir de ce bois brûlé et j’ai découvert que, creusant trois ou quatre centimètres en direction du centre du bois, il était préservé. AF . Ce bois est des restes de brûlis ? MS . Beaucoup de ce bois était concentré dans la région [la ville de Gravata, Pernambouc], peut-être en raison de son usage intensif pour la construction de barrages. Les barrages étaient faits avec ce bois. Les roues à eau étaient refaites en permanence avec ce bois. A un moment, ce bois a disparu de la région et sont restés les souches au milieu des champs de canne à sucre. Avec les brûlis de canne à sucre, année après année, une couche carbonisée s’est créée sur les troncs. malgré cela, leurs intérieurs étaient préservés. En plus d’être résistant à l’eau, j’ai découvert que le cajacatinga était très résistant au feu. Et c’étaient des souches énormes. Il y avait des souches que je coupais en grands morceaux pour les emporter dans mon atelier et qui remplissaient un camion de bois. Alors, j’ai commencé à m’intéresser de plus en plus au bois. Ainsi, je revenais à l’usine de canne à sucre où j’avais habité pendant cinq ans. Symboliquement, il semblait que ce bois attendait quelqu’un pour continuer son histoire. Pendant de nombreuses années, j’ai travaillé motivé par cette volonté de donner continuité à la vie de ce bois. J’ai, avec le bois, spécialement avec le cajacatinga, cette relation de familia- rité. AF . C’est très grand le cajacatinga ? MS . Il y en a un, tombé depuis mon enfance, que je suis allé voir il y a peu de temps. Deux cavaliers assis sur leurs chevaux, un chaque côté du tronc, n’arrivaient pas à se voir. Ils sont immenses. C’était l’attraction de l’usine de canne. Et à l’époque à laquelle j’ai commencé à travailler avec le cajacatinga, j’ai réveillé une fantastique mémoire olfactive de mon enfance. Quand le rabot passait sur la cajacatinga, je me souvenais de l’homme qui faisait des petits rouleaux de bois avec lesquels je jouais. Ca a été très intéressant parce que, quand j’ai commencé à poncer, je me suis aperçu, par l’odeur, que je connaissais réellement ce bois, et ainsi j’ai eu des idées pour mon travail. Par le biais de ce bois, d’une certaine manière, je récupérais l’usine de canne à sucre. MA . Il est intéressant que l’odeur du cajacatinga renvoie à vos souvenirs d’enfance parce que j’ai toujours vu, dans les formes de plusieurs de vos travaux, des références à des jouets populaires. Ces jouets que l’on fait et avec lesquels on joue quand on est enfant. Ces montages qui ne servent à rien sinon comme démonstration de la curiosité de l’enfant. Je ne sais pas s’il serait correct de dire que, associées à l’odeur du cajacatinga, il y aurait non seulement une mémoire olfactive, mais aussi une mémoire ludique. MS . C’est probable. Je n’avais pas de jouets. Je jouais à des jeux. Je me souviens que mes frères, mes sœurs et moi faisions des bœufs en terre pendant une journée entière, nous montions ces énormes monticules et, à la fin de la journée, nous “tuions” tous les bœufs, peut-être comme un règlement de comptes de bagarres entre frères et sœurs. Le jour suivant, l’histoire recommençait. Je me souviens aussi que, quand il pleuvait beaucoup, nous faisions des “barrages” avec de la terre, pour retenir les ruissellements formés par la dénivellation du terrain. Quand quelqu’un se dispu- tait avec les autres, on lui détruisait son barrage, l’eau ainsi libérée emportait les barrages des autres et il fallait courir pour ne pas prendre de coups. On faisait aussi des embarcations avec des troncs de bananiers pour jouer sur la rivière et, à la fin, on détruisait tout, ça devenait déjà autre chose. J’avais une forte relation avec les jeux. Il n’y avait pas ce culte du jouet qui existe aujourd’hui. Tout était très dynamique. Peutêtre cela a-t-il influencé mon travail, principalement le goût pour faire les choses, bien que j’aime aussi incorporer, dans mon travail, ce que les autres font. J’aime l’œil de l’autre. Le savoir faire de l’autre. Je n’ai pas à faire tout tout seul, ça me plaît aussi, dans mon travail, ce que l’autre fait. AF . Mais vous commandez à l’autre ce que vous voulez ou vous vous appropriez tout simplement le travail déjà fait par l’autre ? MS . Généralement je le commande, mais le résultat, parfois, n’est pas utilisé comme il était planifié. J’ébauche quelque chose et je travaille ensemble. A certains moments, il est arrivé que le travail qui était fait en bois soit presque entièrement fait par des assistants. Je ne faisais qu’orienter et accompagner. Aujourd’hui, j’ai diminué la production de pièces en bois parce que j’ai recommencé à faire presque tout personnellement. Bien que j’apprécie le regard de l’autre, avec le bois, j’aime le travailler moimême à nouveau. MA . Il y a une question technique que j’aimerais explorer. Vous vous servez des formes que le bloc de bois possède naturellement pour créer une pièce ou vous ignorez les formes naturelles et retirez ce qui est nécessaire pour créer ce que vous voulez ? MS . Ce dont je m’aperçois, c’est que quand je respecte trop le bois, il me domine. Je crois que le résultat est meilleur quand l’action sur celui-ci est plutôt brutale. J’ai découvert tôt comment travailler avec ces grandes bûches de bois. Elles m’impressionnaient par leur dimension, par leur poids, tout. Après, j’ai vu que je ne pouvais penser à ça. Au moment où je crée des formes il vaut mieux n’avoir de respect pour rien. Mais le processus, en général, vient beaucoup de l’intuition, il n’y a pas de planification de où et comment je vais couper le bois. Ce qu’il y a, dans certaines pièces, c’est un extrême soin en raison de la fragilité de la pièce que je suis en train de créer. Dans des pièces plus récentes, le désir est de travailler avec le bois comme si ce n’était pas du bois, à la limite de sa résistance. Ce sont des pièces extrêmement fragiles qui, si elles cassent, ne pourront être récupérées. Ce sont des pièces fines et pointues, des formes que vous trouvez en verre ou en porcelaine mais que je veux travailler avec le bois. Peutêtre est-ce une volonté de confondre les matériaux. AF . Ainsi vous donnez à la pièce l’apparence de quelque chose qui ne ressemble pas à du bois. MS . Ou la forme d’intervention, la forme d’action sur le bois est différente de celle qui s’applique normalement à lui. Dans ces pièces, en particulier, je dois faire moi-même tout le processus de coupe du bois, parce que je n’arrive à exprimer verbalement à mes assistants ce que mon œil veut. AF . Les bois que vous utilisez sont-ils très différents les uns des autres ? MS . Ils sont très différents. Il est drôle que, bien que je travaille le bois, je ne sois pas un bon connaisseur du bois. Je ne suis pas spécialiste en bois. Mais l’origine du bois m’intéresse. Je préserve l’environnement sans brandir l’étendard du mouvement écologique. Parce que les gens utilisent sans limites le bois et abandonnent tout au milieu de la rue. Je n’achète pas de bois. Le bois que j’utilise est trouvé. Ce sont des déchets urbains ou ruraux. MA . C’est curieux cette idée de s’approprier des choses inutiles pour en faire d’autres qui n’ont pas non plus de fonction utilitaire. Peut-être est-ce dans Coleçao I, cet ensemble de 50 petites pièces, que cette idée d’inutilité semble plus évidente. Mais il y a aussi une autre question qui, à mon entendement, est très présente dans votre travail : c’est l’idée de mouvement. Certaines sculptures ont même des roulettes, d’autres sont faites de pièces articulées qui bougent si quelqu’un les touche. Celles d’aluminium, on pourrait dire qu’il y a un mouvement de transfert des formes et des caractéristiques des pièces de bois utilisées comme modèles pour les pièces de métal. Mais je crois que c’est dans les sphères de bois que vous avez faites que ces deux caractéristiques de votre travail se combinent et se condensent de la manière, disons, la plus radicale. La sphère est une forme indéchiffrable ; isolément, elle n’a aucune fonction. En même temps, elle peut être comprise comme une métaphore de l’idée de mouvement. Les sphères sont le comble de “l’inutilité” de votre travail. Ce qui me perd un peu, c’est que, tout de suite après avoir fait les sphères, vous avez fait le travail Roupas de Casa, qui, je pense, crée une rupture ou au moins un hiatus dans votre travail. J’aimerais que vous parliez un peu de ce passage. MS . Ce travail [Roupas de Casa] est fait de métal et de cuir. L’idée m’est venue il y a quelques années, quand j’ai fait un travail qui était composé de deux barres d’aluminium fondu, pendues au plafond par des cordes de cuir tressé, le même produit utilisé par les vachers. Roupas de Casa a été confectionné à Cachoeirinha, petite ville de la campagne du Pernambouc où mon père m’a emmené et où j’ai été impressionné par les division du travail qui existe dans la production de harnais, selles, etc. C’est impressionnant. Ca serait une bonne étude pour un sociologue. Il y a une personne qui coupe le cuir, une autre qui le tresse, celle qui fait une certaine pièce de métal est encore une autre, et ainsi de suite. C’est amusant parce que je me souviens que, petit, je ne touchais pas le cuir, principalement quand c’était du cuir de chèvre. J’avais horreur du cuir de chèvre. Des chèvres et du cuir. AF . Pourquoi n’aimiez-vous pas les chèvres ? MS . Je ne sais pas, mais, plus tard, j’ai commencé à essayer le cuir de chèvre et à goûter la viande de chèvre pour en finir avec cette aversion. Alors, je me suis aperçu que le cuir avait la malléabilité que je cherchais pour travailler et qu’il avait également une odeur spécifique que je n’aimais pas au début mais à laquelle j’ai fini par m’habituer. De plus, ce rapprochement avec la chèvre était, inconsciemment, une autre manière de me lier à ma famille, aux habitudes alimentaires de la famille, du lieu d’où je venais. Mais je continue à ne pas aimer la viande. MA . Et quelle a été la motivation de ce travail, Roupas de Casa ? MS. D’une part, il est apparu en raison de cette relation de proximité avec le cuir que j’avais développée un peu auparavant. D’autre part, en raison de l’observation que j’ai faite des campements des travailleurs sans terre le long des routes. Je ne voyais pas ces baraques comme des maisons ; pour moi ce n’étaient que des structures couvertes. Et ce que je désirais faire avec le cuir était exactement cela : des structures couvertes qui ne soient pas exactement des maisons. Ce sont les raisons qui m’ont fait commencer le travail, construire tous ces objets. Mais il y avait aussi la question de la ligne. Ca, c’est l’autre point pour lequel je me suis toujours battu, et je me bats jusqu’à aujourd’hui : comment travailler, ensemble, les lignes organiques et les lignes plus précises ? La confrontation de l’imprécision et de la précision. Le chaud et le froid. Quand j’ai vu le métal travaillé par les artisans de Cachoeirinha, je me suis rendu compte que les marques du processus restaient sur les pièces qu’ils fabriquaient. Ce n’était pas ces choses absolument précises où vous ne voyez pas l’endroit ou une pièce s’encastre dans l’autre. Vous voyez les encastrements. Vous voyez les surplus de soudure, même après avoir poli la pièce. Mais le rapport avec les artisans n’était pas tout de suite résolu. Pour eux, les articulations des struc- tures d’acier pouvaient être résolues en pliant les barres et en faisant beaucoup moins de points de soudure. Mais, ainsi, la pièce serait plus arrondie, avec plus de courbes. Mais je voulais que les articulations des barres d’acier soient nettes, apparentes. Enfin, le cuir est venu en tant que couverture de ces structures métalliques que j’ai fait faire. MA . Je pense que c’est peut-être le travail sculptural le mieux défini que vous ayez fait, en termes de représentation. Les formes des maisons sont identifiables, même quand elles s’éloignent de l’idée qu’on se fait habituellement d’une habitation. MS . C’est une ambiguïté qui me plaît beaucoup. Une chose qui me motive, ce sont ces rencontres. Ce sont des maisons qui ne sont pas exactement des maisons. Quand j’ai pensé à introduire ces miroirs ovales dans l’installation, j’y ai pensé comme des éléments traditionnellement liés à la maison. Des éléments liés à l’idée de maison qui réfléchissent des objets qui n’étaient pas exactement de la maison. AF . Cette installation me fait penser à la manière comment différents éléments qui composent, parfois, un travail unique, établissent des relations entre eux. Quelque chose de semblable à une syntaxe de vos travaux. Tout comme la Coleçao I et l’Armazém República, Roupas de Casa est fait d’éléments qui, même si différents du point de vue formel, sont articulés du point de vue organisationnel. Des éléments différents qui se justifient, dans l’ensemble du travail, par l’amarrage que vous promouvez entre eux. Tous ces travaux sont formés d’éléments distincts qui sont rapprochés, formant ainsi une chose unique ou, alternativement, sont des unités qui, bien que fragmentées, gardent encore une dose d’articulation entre leurs parties. Dans Roupas de Casa, cette caractéristique se présente d’une manière, peut-être encore plus complexe que dans ces autres travaux, même si ses formes sont plus familières. Ce travail promeut la jonction du cuir – matière profondément organique qui sert de revêtement des maisonnettes, presque comme si c’était leur peau – et des structures métalliques qui leur donnent support. Et ce sont ces mêmes structures qui apparaissent comme des images dessinées dans les miroirs, comme des traits. Ce sont aussi ces structures – cette fois-ci couvertes de cuir – qui sont réfléchies dans les miroirs. Des miroirs qui ne sont pas simplement des superficies réfléchissantes, parce qu’ils sont encadrés comme des miroirs que l’on rencontre dans des lieux domestiques, comme ceux de nos demeures. Chaque élément qui compose ce travail est donc présenté de diverses manières, promouvant une série de transpositions curieuses. Et, dans son ensemble, le travail est justement fait de cette articulation entre éléments tridimensionnels et bidimensionnels. Mais j’aimerais continuer à explorer un peu plus votre processus de création. C’est une seule personne qui a réalisé les maisonnettes ? MS . Tout a été fait par une personne qui travaillait l’acier et une autre qui travaillait le cuir. Ca a été très bien de travailler avec eux et il est intéressant de penser à cette relation, ma manière d’interférer dans leur travail, parce que ce qu’ils faisaient normalement à Cachoeirinha sont des objets complètement différents de ces pièces qu’ils ont produit pour moi. La première structure faite par la personne que j’ai embauchée n’avait pas seulement l’apparence d’une maison, mais avait un toit, une porte, tout. Il m’a montré le résultat et a dit, assez satisfait: “Marcelo, j’ai ajouté quelques petites choses à la structure que vous m’avez commandée. Ca m’a donné beaucoup de travail mais c’est beaucoup mieux.” Quand j’ai vu les petites charpentes du haut du toit, toutes les divisions de la maison, j’ai vu qu’il fallait que j’interfère plus dans le processus. Il a fallu que je dise: “Je sais que le travail a été très grand pour faire de cette manière, mais je voudrais retirer ces éléments que vous avez mis.” Chaque fois que je faisais le dessin de la structure que je désirais, il fallait que je lui dise de la faire avec le minimum de lignes nécessaires pour la rendre possible. Je ne voulais rien d’excessif. Si c’était possible de résoudre en quatre lignes, je n’en voulais pas six. C’est alors qu’il a compris ce que je voulais et il a embarqué dans l’histoire. AF . Vous avez montré le résultat aux habitants de la ville ? MS . J’ai fait une exposition éclair. Elle n’a duré qu’une heure et demie, sur la place principale de la ville. Il y avait 41 maisonnettes. Mais là, il n’y avait pas les miroirs. Ca a été intéressant de voir la réaction intéressée des autres travailleurs qui faisaient aussi des objets d’acier et de cuir, et du peuple de la ville, réactions au résultat du travail qui avait été réalisé là. En fait, faire ce travail à Cachoeirinha revêt aussi cet aspect, la volonté de sortir de l’atelier et de débarquer dans une autre ville, changer d’ambiance de travail et d’exhibition de l’œuvre. Il existe cette volonté d’échanger des informations et d’ouvrir le travail aux autres, de tout mélanger, de voir ce qui surgit de ce contact. Cette expérience fait partie d’un projet plus ample, le Correcaminhos. J’avais eu une expérience antérieure de travail dans un contexte hors de mon atelier, à Garanhuns. Cachoeirinha a été le second moment de ce projet. AF . Et cet échange d’informations a affecté d’une certaine manière votre travail ? MS . Je pense que l’expérience de Cachoeirinha a consolidé l’idée d’incorporer à mon travail ce que je ne considérais auparavant que comme une partie de son processus. Avec Roupas de Casa, j’en suis aussi venu à mieux comprendre la lien de l’utilisation des miroirs avec la fonte des métaux. L’importance de la question de copier, de reproduire les choses à partir d’une matrice, que ce soit une image ou un processus de travail. De manière contradictoire, avec ce travail, est revenu, plus fortement, la volonté de travailler avec les mains, quelque chose qui était très fort quand je jouais lorsque j’étais enfant. Quand j’étais petit, les gens se moquaient de moi parce que je n’arrivais pas à arrêter mes mains plus que quelques secondes. J’avais une tante qui travaillait le tissu et quand j’arrivais chez elle, je coupais les restes des tissus qu’elle utilisait. Au fil du temps j’ai appris à me contrôler plus, mais le goût du travail manuel est encore très fort. AF . Mère Tereza de Calcutta disait que la plus belle distraction est le travail. C’est une manière pour vous d’oublier ce qui vous entoure, de rester penché sur une seule activité. C’est une manière de prendre plaisir à manipuler les choses, que ce soit en faisant une coupe, un pli, un emboîtement. C’est joli que vous disiez à la personne qui soude les structures des maisonnettes que vous voulez une chose plus rustique. Mais aussi que vous ne voulez pas qu’il plie l’acier. Qu’il ait le travail de couper puis de souder le métal. C’est rustique, mais en même temps, ce n’est pas la méthode la plus simple. MA . Il est intéressant aussi que ce soit si crucial pour vous et que ça ne soit pas visible. La structure de métal est complètement cachée sous le cuir. MS . J’ai un tas de choses cachées. J’aime bien les choses cachées. Et aussi des vides. J’ai un autre travail [De Luxe, 2002-2004] formé de petites boîtes faites d’un bois qui a un arôme très fort. Je me suis beaucoup demandé si je devais les laisser vides ou si je devais les remplir avec quelque chose. Au début, j’ai pensé que si l’idée du travail était de garder l’odeur dans les boîtes, il ne devrait rien y avoir d’autre que l’odeur. Cependant, si je les laissais vides, les gens finiraient par y garder de petits objets. Pour résoudre la question, j’ai mis, dans les boîtes, des blocs faits du même bois qui avait servi à leur confection, occupant tout leur espace interne. Je suis arrivé à la conclusion que, dans ce cas, comme dans beaucoup d’autres, je devais remplir le vide. CHRONOLOGIE Joana D’Arc Lima Marcelo Luiz Silveira de Melo est né en 1962, à Gravatá, ville des hauteurs du Pernambouc, située à 85 kilomètres de Recife. Il a passé son enfance à l’usine de canne à sucre Amora Grande, propriété de ses parents. Troisième d’une famille de six enfants et considéré comme “le curieux” de la maison, il a appris, depuis petit, à réinventer “des choses” et des solutions pour les défis de l’enfance. Il recevait de ses parents des cadeaux inhabituels, de petites trouvailles qui sont restés gravées dans ses souvenirs et qui sont devenues des références pour l’univers ludique présent dans beaucoup de ses travaux. En 1979, il déménage à Recife, avec un de ses frères. Les années 1980, au Brésil, sont marquées, dans le domaine social et politique, par la transition vers un régime démocratique, qui franchit un pas décisif à partir du mouvement pour la réalisation d’élections directes pour le Président de la République (“Diretas Já”). Dans le domaine des arts visuels, il y a une revitalisation visible de la peinture et la constitution de réseaux de relations construits par des déplacements territoriaux (réels et virtuels) d’artistes et d’intellectuels, isolément ou en groupes. A Recife, ces changements se reflètent dans la création des Brigades Portinari, Gregorio Bezerra et Henfil (1982) – collectifs artistiques impliqués dans les changements politiques en cours –, dans la réalisation de la Première Exposition Internationale d’Art en Outdoor/Artdoor (1981), dans le Mouvement d’Art Tátil (1982), dans le Mouvement d’Art et de Culture du Nordeste (1983), dans l’apparition des groupes Astrobelo (1982), Formiga Sabe que Roça Come, Brigade Compressora, Brigade Ecologique, Carasparanambuco (1986), Atelier Collectif d’Olinda (1989), entre autres. A cette époque, les salons d’Art du Musée de l’Etat du Pernambouc – MEPE et les expositions réalisées au Musée d’Art Contemporain du Pernambouc – MAC, à Olinda (tout particulièrement le Salon des Nouveaux), font découvrir une nouvelle génération d’artistes. La Galerie Métropolitaine Aloisio Magalhães (actuel Musée d’Art Moderne Aloisio Magalhães – MAMAM), la Galerie Artespaço et des espaces informels d’exposition contribuent à dynamiser le circuit local. La période de 1982 à 1985 marque le début de la formation de Marcelo Silveira. la fréquentation de l’Atelier Guaianases, à Olinda, lui permet d’établir des contacts avec des collègues et, ainsi, de participer activement aux débats propres au milieu dans lequel il commence à s’insérer. Pendant cette période de formation, la fréquentation de l’artiste du Minas Gerais, Liliane Dardot, et leurs conversations sont importantes. Celle-ci habite à l’époque à Olinda ou elle plaide pour une expression artistique libre des règles “académiques”. Grâce à ce contact, Marcelo Silveira approche le travail et les écrits d’Amílcar de Castro. La proximité avec le jeune artiste plastique Rinaldo marque également cette phase initiale de sa vie professionnelle et sociale dans la ville de Recife. En 1985, il entre au cours d’Education Artistique de l’Université Fédérale du Pernambouc – UFPE, où le contact avec le professeur et artiste José de Barros le marque profondément, celui-ci faisant de l’espace formel de l’université un point de rencontre entre jeunes qui veulent s’exprimer au moyen du “faire” artistique. Les conversations se continuent dans son atelier particulier, transformé en laboratoire d’expérimentations, questionnements et échanges d’idées sur les matériaux, les procédés et les résultats obtenus par ses élèves. Simultanément, Marcelo Silveira construit un atelier de travail à Gravatá (Arte & Cia), espace de création également ouvert à diverses manifestations culturelles locales et à des rencontres artistiques avec des enfants de la région. Bien que sans financement, ces activités se prolongent sur une période de cinq ans, étant cruciales pour sa formation en tant qu’artiste et professeur. Cette expérience est enregistrée dans le documentaire Bricadeira é Coisa Séria (1990), réalisé par l’ONG Auçuba Comunicação e Educação, et ensuite transformée en exposition du même nom, à l’Espace Culturel de la Bibliothèque Centrale de l’UFPE, pendant la Réunion Annuelle de la Société Brésilienne pour le Progrès de la Science, en 1993. Toujours en 1985, il va à São Paulo à l’occasion de la XVIIIe Biennale de São Paulo, année ou la conservatrice Sheila Leirner réunit, dans un long couloir du Pavillon de la Biennale, une sélection de la peinture nationale et internationale contemporaine, qu’ellemême a dénommée de “A Grande Tela” (La Grande Toile»). Lors de ce voyage, il est très impressionné par les travaux des artistes Emmanuel Nassar et Nuno Ramos. La participation à quatre Festivals d’Hiver de l’Université Fédérale du Minas Gerais (1985, 1987, 1988 et 1989) est marquante pour sa formation. Le contact avec d’autres artistes, avec des critiques d’art et des professeurs venant de toutes parts du pays élargit son répertoire sur l’histoire de l’art et sa connaissance du domaine des arts plastiques qui se redessinait dans le pays, en plus de réduire la sensation d’isolement. La fréquentation des ateliers et des stages des Festivals d’Hiver rendent possible la recherche artistique avec de nouveaux matériaux et, à partir de là, un changement de procédés constructifs, signaux d’une inquiétude envers les limites de l’espace bidimensionnel et du début d’expériences avec des sculptures et des objets. Il participe au XIVe Salon des Nouveaux (1985), au MAC, et, en 1986, il réalise, à Gravatá, à l’Art et Cia, une exposition avec des travaux réalisé selon diverses techniques. En 1987, il est présent au Salon d’Art Contemporain du Pernambouc, au Centre de Conventions du Pernambouc, et intègre le groupe Carasparanambuco, formé de sept autres autres artistes : Alexandre Nóbrega, Eduardo Melo, Félix Farfam, João Chagas, José Patrício, Maurício Silva et Rinaldo. Tous en début de carrière, cherchant à s’insérer dans le domaine des arts plastiques, créant des espaces et des événements dans la ville, s’affirmant comme partie intégrante d’un mouvement en dialogue avec les questions de la culture contemporaine à partir de son lieu d’origine. Il fréquente, de 1988 à 1994 le Quarta Zona de Arte, atelier collectif engagé dans la production contemporaine, fondé, entre autres, par les artistes Fernando Augusto, Flávio Emanuel, José Paulo, Márcio Almeida e Maurício Castro, par l’illustrateur et dessinateur de B.D. Humberto Araújo et par le communicateur visuel Aurélio Velho. En 1988, Marcelo Silveira commence des expérimentations avec du bois. De petits morceaux de cette matière viennent intégrer des surfaces qui composent ses œuvres bidimensionnelles et, déjà à cette époque, les premiers objets tridimensionnels. Il participe cette année-là au 7e Salon d’Art du Pará, à Belém, à la 7e Exposition de Gravure, à Curitiba, et à la 7e Exposition de Dessin Brésilien, également à Curitiba. En 1989, il participe au Salon d’Art Contemporain du Pernambouc, au MEPE, inscrit dans la modalité Peinture Murale Collective. En 1990, il réalise une exposition individuelle, à la Galerie Itaú, à Belo Horizonte. Lors de cette exposition, Marcelo Silveira présente son Engenho de Objetos, réunion de vingt-cinq travaux réalisés entre 1989 et 1990. Il utilise, comme matière première de ces objets, des résidus rencontrés dans l’usine de canne à sucre de son père, à Gravatá, des fragments de bois trouvés dans divers lieux et qu’il a réunis et, enfin, des morceaux de bois que ceux qui connaissent son intérêt pour ce matériau lui donnent. Le procédé, pendant cette phase, se caractérise par une “attitude sculpturale” de nier, dans les objets créés, le sens fonctionnel d’origine de la matière, la transformant pour la réintégrer dans une ambiance qui rend possible l’affleurement des sens multiples et inusités. Toujours en 1990, il voit l’exposition de Arthur Bispo do Rosario, au Musée de la Pampulha, à Belo Horizonte, laquelle va marquer profondément sa manière de voir l’art et le travail de l’artiste. En 1990, il est diplômé en éducation artistique par l’UFPE et, en 1991-1992, il voyage en Europe et en Afrique du Nord, où il épouse une attitude nomade, parcourant divers territoires et recueillant fragments et images de cultures “nouvelles” et “archaïques”. En 1991, il réalise une exposition individuelle à Braga, au Portugal, à la Galerie BeloBelo. Il s’installe pour trois mois à Barcelone où il fréquente l’école Massana de Artes. Cette expérience lui permet de développer un travail à partir de rebuts et de restes de bois et de fer, en les incorporant à l’espace de son atelier dans l’école. De retour au Brésil, il fait l’exposition “Torres, Construções e História de um Templo” (1993), à la Galerie Itaú, à Vitoria, où il montre vingt pièces en bois et en fer avec des jeux d’encastrement, créées à partir d’une collection de morceaux de bois trouvés et pour la réalisation lesquelles il n’a utilisé que des limes et de la colle. Il explore, dans ces travaux, le sens vertical des constructions et se fait référence à un temps où les hommes construisaient leurs propres habitations ainsi que les objets qui faisaient partie de l’espace occupé. Avec l’installation Paisagem Estranha (1994), montée dans la Galerie Vicente do Rego Monteiro, (Fondation Joaquim Nabuco), à Recife, l’artiste surprend le public en intervenant directement dans l’espace d’exposition. Il montre de petits objets formés en fil de fer qui ressemblent à des dessins et des sculptures faites de divers bois (amarelo, cajacatinga, cèdre, acajou entre autres) qui laissent voir leurs fissures et veines, complétés par l’insertion de morceaux de fer oxydé et de dessins découpés. La composition des objets, selon Marcelo Silveira, était inspirée de la structure des maisons populaires et de la disposition des ex-voto dans les chapelles. La même année, il est sélectionné pour le 14e Salon National d’Arts Plastiques, à Rio de Janeiro, où il montre une sélection de 70 objets en métal, faits à l’origine pour l’installation Paisagem Estranha, et qui, selon l’artiste, font partie d’un nouveau moment de sa carrière où le fer n’est plus seulement un élément de la composition de l’objet et devient, en soi, la seule matière. Toujours en 1994, il participe à une exposition collective dans la ville de Porto, au Portugal, nommée “Memória da Amazônia : Etnicidade e Territorialidade”, avec un autre artiste de Recife, Flávio Emmanuel. Il participe au 51e Salon d’Art Contemporain du Paraná, à Curitiba. En 1995 et 1996, Marcelo Silveira poursuit ses activités dans le domaine de l’art-éducation, animant des ateliers de création tridimensionnelle dans diverses institutions culturelles et universitaires brésiliennes. Cette période est marquée par la recherche formelle avec le cajacatinga – bois noble en voie de disparition rencontré sous forme de souches partiellement carbonisées, abandonnés dans l’usine de canne à sucre de la famille. Il est sélectionné pour le IIe Salon UNAMA de Petits Formats, à Belém (1996), organisé par l’Université de l’Amazonie. Avec d’autres artistes du Pernambouc et de la Paraíba (Alexandre Nóbrega, Alice Vinagre, Betânia Luna, Dantas Suassuna, Eudes Mota, Luis Santos et Rodolfo Mesquita), il est choisi pour participer, avec ses travaux, au III e Salon d’Arts Plastiques du Musée d’Art Moderne de la Bahia, à Salvador. Il participe, toujours en 1996, à l’événement Art Brésil, au Musée Nicolas Sursock, à Beyrouth, au Liban, à l’exposition “Arts Plastiques Contemporains Brésiliens” (avec comme commissaire l’architecte Janete Costa et la présence des artistes Aprígio, José Paulo, Marianne Peretti et du designer André Lasmar) et à l’exposition collective de la Neuhoff Gallery, à New York, aux Etats-Unis. Lors de la seconde moitié des années 1990, l’effervescente scène culturelle locale (commandée par la production musicale liée au mouvement Mangue Beat) influence la production artistique du pays et est contaminée par plusieurs langages internationaux contemporains. Dans la musique, dans le cinéma et dans les arts visuels, surgissent de nouveaux groupes d’artistes et d’ateliers collectifs – Molusco Lama (1994), Carga e Descarga, Camelo (1996), Sub-Graf et Telefone Colorido (1997), entre autres, renouvelant le milieu culturel-artistique de Recife. L’Institut d’Art Contemporain – IAC (1996), la Galerie d’Art Capibaribe (1998), toutes deux liées à l’UFPE (Université Fédérale du Pernambouc), sont créés ainsi que l’Institut de Culture de la Fondation Joaquim Nabuco, dynamisant les activités d’exposition déjà développées par l’institution et organisant cours et débats sur l’art moderne et contemporain. Le Bureau Arte Amparo est ouvert, puis transformé en Galerie Amparo 60. Avec l’exposition “Ver & Verso Pernambuco”, en 1997, le MAMAM est inauguré, réunissant des œuvres de plus de 60 artistes, y compris des sculptures de Marcelo Silveira. En 1998, Marcelo Silveira présente, à la 16e édition du Salon National d’Arts Plastiques, réalisé à Rio de Janeiro, le travail Cajacatinga, résultat des recherches formelles faites sur ce bois. Les éléments qui composent Cajacatinga peuvent être comparés à des vocables d’une écriture inconnue ou inventée, faits de morceaux de bois coupés ou poncés sous des formes diverses. Toujours cette année-là, il intègre le collectif “Ceará e Pernambuco – Dragões e Leões”, au Centre Dragão do Mar d’Art et de Culture, à Fortaleza. Il réalise également l’exposition “Dos Presentes do meu Pai”, à la Galerie d’Art Marina Potrich, à Goiânia, et à la Galerie Ária, à Recife. Dans cette exposition, les objets en bois acquièrent des formes organiques, sont malléables et emboîtés, laissant exposés, aux yeux du spectateur, les axes, les trous et les structures d’emboîtement qui leur donnent forme. Bien que poncés, ils ne présentent pas une finition excessive, révélant ainsi les veines, la couleur et la texture naturelle des bois utilisés. Fin 1998, Marcelo Silveira est primé au Ve Salon d’Arts Plastiques de la Bahia, réalisé au Musée d’Art Moderne, à Salvador. La fin des années 1990 et le début de la décade suivante sont marqués, à Recife, par des débats institutionnels sur la dichotomie internationalisme versus nationalisme, où apparaît clairement la capacité singulière que la production locale a de fondre, et non pas d’opposer, ces deux termes. Si le MAMAM, avec les expositions de Jean Michel Basquiat et Joseph Beuys, entre autres, favorise des connections entre les circuits locaux et internationaux, la Fondation Joaquim Nabuco, au moyen d’une programmation de cours, de conférences et de la participation à des projets de recensement de la production artistique régionale (Projet Nordestes) et nationale (Programme Itaú Cultural Rumos Visuais), attire dans la ville plusieurs critiques, historiens, artistes et commissaires, promouvant la circulation et l’échange d’informations tout en rendant visible la production culturelle de la ville. Des partenariats institutionnels permettent des échanges entre les états comme l’exposition “Arte Contemporeana [2000-1]” (1999), réalisée au MAMAM et au Musée d’Art Moderne de la Bahia, et qui inclue des travaux de Marcelo Silveira. Cette année-là, l’artiste reçoit un prix au 3e Salon de Sculpture du Paraná, à Curitiba, participe à l’exposition qui intègre le Projet Nordestes, au Sesc Pompéia, à São Paulo, et aussi à la collective “O Luar do Sertão”, à la Galerie Roesler, également à São Paulo, puis présentée au Escritório de Arte Amparo 60, à Recife. En 2000, Marcelo Silveira réalise sa première exposition individuelle à São Paulo, de nouveau à la Galerie Roesler. Cette exposition révèle des procédés distincts comme l’utilisation du bois et l’introduction de nouveaux matériaux dans ses travaux, tels que l’aluminium et le cuir. Il présente aussi, à cette occasion, une collection de 50 petits objets de bois qui forment un unique travail (Coleçao I, 1999), annonçant les deux facettes, dans son œuvre, la sculpture et l’installation. Désactivé depuis 1993, la reprise du Salon Pernamboucain d’Arts Plastiques, en 2000 – organisé sous le thème Art Actuel Brésilien et réalisé à l’Espace Culturel Malakoff, à Recife – mobilise le milieu artistique local en plus de remettre à l’ordre du jour quelques questions comme la formation de publics pour l’art contemporain. Les travaux de Marcelo Silveira sont sélectionnés et primés lors de ce Salon. Il participe, toujours en 2000, à plusieurs expositions collectives, en particulier “Sculptures Brésiliennes”, réalisée à la Pinacothèque de l’Etat de Sao Paulo, la “1re Biennale Internationale d’Arts Plastiques de Buenos Aires”, “Investigações : Rumos Visuais 2”, à la Itaú Cultural, à São Paulo, et “Desconcertos da Forma”, à la Galerie Itaú Cultural de Belo Horizonte, Brasília et Penápolis. Il intègre la collective “Le Crayon et le Papier (sur la liberté, la simplicité et le sens)”, à la Galerie Roesler, à São Paulo, qui rapproche son travail sculptural de la production graphique d’autres artistes contemporains, comme Adriana Rocha, Alexandre Nóbrega, Arthur Lescher, Maria Teresa Louro, Nina Moraes et Tomie Ohtake. Cette même année, un espace collectif qui agite la scène artistique et culturelle de Recife est créé, l’Atelier Submarino. Il commence une recherche et une convivialité avec des artisans de l’intérieur du Pernambouc, avec le projet Correcaminhos, qui consiste au déplacement temporaire de son atelier vers des villes de l’intérieur du Pernambouc et à l’élargissement du circuit des “médiateurs” de l’œuvre. Ces expériences commencent dans la ville de Garanhuns. Il réalise en 2001 l’exposition “Entre a Surpresa e o que se Espera”, à la Galerie Amparo 60, à Recife. Une des salles de l’exposition montre une série de pièces qui rapprochent son travail sculptural du domaine de l’expression graphique, en plus d’adopter, une fois de plus, le cuir comme élément constructif, l’incorporant non seulement pour sa douceur et souplesse, mais aussi parce qu’il possède une odeur forte et distincte. Dans d’autres salles de la galerie, il exhibe trente sphères de différents diamètres faites de bois découpé (cajacatinga, barauna et jaca). Il taille, en bas relief, sur ces sphères, des symboles utilisés par les fers à marquer le bétail, s’appropriant une écriture faite des initiales de plusieurs générations de familles de propriétaires de troupeaux et qui représentent donc des cycles de vie humaine. La plus grande de ces sphères est installée à des points de grande circulation de personnes, dans les rues de Recife, changeant chaque jour de localisation. Les réactions du public à la présence de la sphère sont photographiées et exposées dans la galerie. D’autres expositions sont réalisées en 2001. Il fait une exposition individuelle au Musée d’Art Contemporain du Paraná, à Curitiba, où il montre des sculptures travaillées en bois, aluminium et cuir. Il participe à l’exposition “Nordeste Brésilien : Matrice Populaire et Conscience Constructive”, au Musée de l’Etat du Pará, à Belém. Il expose, comme artiste invité, à l’exposition collective “Casa Coisa”, réalisée par l’Atelier Submarino, à Recife, où il crée un travail qui prend pour problématique le thème du travail domestique: Quarto de Empregada. Poursuivant son processus d’incorporation de nouveaux procédés et matériaux dans son travail, Marcelo Silveira présente, à la collective “Em Sete Tempos” (2002), à la Galerie Amparo 60, à Recife, une première version d’Armazém República, une collection d’objets de verre déjà existants, que l’artiste récupère et organise sur une étagère, construisant des combinaisons et des regroupements qui suggèrent des relations inusitées entre le grand et le petit, l’opaque et le transparent, le léger et le lourd. Toujours en 2002, il participe au Projet Faxinal das Artes, à Faxinal do Céu, dans le Paraná. Au 47e Salon Pernamboucain d’Arts Plastiques (2002), dans l’usine Tacaruna, à l’époque désactivée, à Recife, il réalise le travail Combinação Tacaruna, pièce tressée de lanières de cuir de chèvre qui crée et démarque un volume vide et dont la taille varie selon l’espace où elle est mise. Grâce à son projet Correcaminhos, réalisé en 2000, Marcelo Silveira fait la connaissance, à Cachoeirinha – ville située à 170 km de Recife - , des artisans qui travaillent l’acier et le cuir pour confectionner certaines pièces de sellerie et des article d’équitation, organisés selon une rigide division du travail. Roupas de Casa, titre de l’installation qui comporte l’exposition individuelle qu’il a fait à la Galerie Roesler, en 2003, résulte de ce vécu de l’artiste, et consiste en “sculptures-maisons” qu’il a conçues et qui ont été exécutées par des artisans de Cachoeirinha (structures faites en acier et “revêtement” fait en cuir). Dans ce travail, l’artiste réinvente aussi, poétiquement, les innombrables structures de bâches disposées en lignes droites qui forment les campements des travailleurs sans-terre et que l’on rencontre le long de la route qui relie Recife à Cachoeirinha. Il participe, toujours en 2003, à l’exposition collective “Ver de Novo, Ver o Novo”, composée de travaux appartenants à la collection du MAMAM, et à plusieurs autres expositions, y compris “Vanguarda para Todos”, au Galpão, Uberaba, Minas Gerais, “Caminhantes”, à l’Institut Ricardo Brennand, à Recife, et “Mostra Retrospectiva : Salão da Bahia 19942002”, à la Fondation Joaquim Nabuco, également dans la capitale pernamboucaine. Il présente, lors d’une exposition collective à la Galerie d’Art Dumaresq, à Recife, et pour la première fois, Garrafada (2003), un travail multiple, composé de 28 bouteilles de verre identiques, la moitié contenant de petits morceaux de lanières de cuir et le reste contenant de la sciure de venant plusieurs variétés de bois et donc, de plusieurs couleurs. Il participe, cette même année, à l’événement pluridisciplinaire “Ordenação e Vertigem”, au Centre Culturel Banco do Brasil, à Sao Paulo, organisé autour de l’œuvre de l’artiste Arthur Bispo do Rosario, où il expose le travail Coleçao I (1999). En 2004, il fait une exposition individuelle à la Pinacothèque Universitaire, à Maceió. Il montre dans cette exposition, en plus d’une sélection de travaux de taille réduite et d’un ensemble de sphères de bois faites en 2001, l’installation Armazém República, formée de cent pièces de bois, réalisées entre 2001 et 2004, liées par des lanières de cuir et accrochées au plafond. il montre aussi, dans cette exposition, deux de ses “livres d’écriture”, où les aspects graphiques de son travail sculptural gagnent une expression bidimensionnelle. Il fait une exposition individuelle au MAMAM, où il présente une sélection de travaux effectués entre 1998 et 2004, permettant la visualisation des inflexions de sa trajectoire lors de cette période. Parmi les travaux les plus récents, il montre l’installation Roupas de Casa et une version élargie de Armazém República, composé, en plus des pièces de bois accrochées au plafond, de centaines d’objets de verre disposés sur une étagère. Il réalise, au Torreão, à Porto Alegre, un travail d’appropriation de l’espace – Combinaçao Torreão - , créant une structure de cuir tressé, réplique de la salle d’exposition, et qui est, postérieurement, adaptée à l’espace du Gasometro, également à Porto Alegre, à celui du MAMAM, à Recife et à celui du Centre Culturel Sao Francisco, à Joao Pessoa. Il réalise, toujours cette année, une exposition à la Galerie Celma Albuquerque, à Belo Horizonte, participe à l’exposition “Paralela 2004”, à São Paulo, et une exposition individuelle au Centre Culturel Sao Francisco, à João Pessoa. En 2005, il fait une exposition individuelle au Centre Universitaire Maria Antonia, à Sao Paulo, et participe à l’exposition collective au Carreau du Temple, à Paris, France, événement faisant partie de la programmation officielle de “L’année du Brésil en France”, et de la cinquième édition de la Biennale du Mercosul, à Porto Alegre. Organização editorial e ensaio crítico Moacir dos Anjos Entrevista Marcelo Silveira Agnaldo Farias Moacir dos Anjos Cronologia Joana D´Arc Lima Fotografias Flávio Lamenha Jailton Moreira [Combinação Torreão] Manoel Veiga [Roupas de Casa . Casa Abelha . Casa Bernardo . Casa Coronha] Wilton Montenegro [Bochinche] Tratamento de imagem Robson Lemos Revisão de texto Anatailde Crespo Tradução para o Francês François Tardieux Projeto gráfico Martinho Patrício Valquíria Farias Produção gráfica Robson Lemos Impressão Gráfica Santa Marta Agradecimentos Adriana Franco, Agnaldo Farias, Carlos Augusto Lira, Cecília e Ricardo Brennand, Celma Albuquerque, Flávio Lamenha, Francisco Baccaro, Genivaldo dos Santos, Gil Vicente, Joana D’Arc Lima, João Marinho, Lúcia Santos, Manoel Veiga, Martinho Patrício, Nara Roesler, Nona Maia, Paula e Flávio Silveira, Rivaldo do Espírito Santo, Robson Lemos, Valquíria Farias. FUNDARPE, Secretaria de Cultura do Recife e equipe do MAMAM. Moacir dos Anjos é pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco e diretor geral do Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães . MAMAM Agnaldo Farias é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e curador independente Joana D´Arc Lima é historiadora de arte e arte-educadora Marcelo Silveira é representado por Galeria Nara Roesler [São Paulo] Celma Albuquerque Galeria de Arte [Belo Horizonte] Galeria Mariana Moura [Recife]