armazém de tudo - Marcelo Silveira

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armazém de tudo - Marcelo Silveira
Apoio
Incentivo
ARMAZÉM DE TUDO
Marcelo Silveira
Moacir dos Anjos
organizador
Esta publicação pretende ser menos um registro
abrangente da obra do artista Marcelo Silveira do que
uma oportunidade de refletir criticamente sobre sua
trajetória. Embora documente alguns dos mais importantes trabalhos que realizou, não estabelece certezas
interpretativas sobre sua obra. Inventaria, ao contrário,
questões que o animam a desdobrar sua pesquisa em
direções diversas. Além das muitas imagens de objetos,
esculturas e instalações feitas pelo artista, compõem a
publicação um ensaio crítico de Moacir dos Anjos, uma
entrevista com Marcelo Silveira – para a qual contribuíram Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos – e uma cronologia comentada sobre o seu percurso criativo, elaborada
por Joana D’Arc Lima.
ARMAZÉM DE TUDO
Moacir dos Anjos
A obra de Marcelo Silveira expressa, desde quase o seu início, a natureza imprecisa e híbrida da
produção visual contemporânea, em que os meios se misturam e o espaço da produção artística se
confunde com o âmbito alargado da cultura. Embora se deixe, em contato ligeiro, classificar como
escultura, parte significativa dela não cabe nas convenções que demarcam o campo escultórico,
esgarçando mais ainda as fronteiras, há muito já frágeis, que apartam esse campo dos terrenos da
pintura, do desenho ou da instalação. Trabalhos de épocas distintas tipificam, de formas as mais
diversas, esse desconforto de origem que anima a produção do artista. Ainda na primeira metade da
década de 1990, Marcelo Silveira fez peças esculpidas em madeira e recobertas com caulim, interferindo na argila clara (riscando-a e apondo-lhe pequenas peças de metal) de modo a realçar suas
nuances cromáticas. Embora já deixasse evidente, nesses trabalhos, o seu interesse pela criação
tridimensional (e o pouco apego à representação), também neles incorporava, sem hierarquias
claras, as informações sobre pintura que trazia do lugar (Recife) e do momento (década de 1980) em
que primeiro se formara como artista. Também exemplares sobre a indistinção dos meios que emprega são os muitos objetos de arame retorcido e enrolado, por ele chamados de Rabiscos [1994],
nos quais se aliavam uma inequívoca autonomia como objetos e a sugestão de serem, como o título
indica, riscos efêmeros com que parecia querer desenhar no espaço o que não caberia em qualquer
[Rabiscos . 1994 . detalhe . fio de aço oxidado . dimensões variadas . coleção do artista]
superfície. Noutro trabalho de classificação ambígua [Cajacatinga, 1997], Marcelo Silveira recorta, lixa e fura diversos e pequenos pedaços de madeira, atravessando-os depois com fios de
arame e prendendo-os à parede em linhas paralelas. Assim dispostos, evocam sinais caligráficos
desconhecidos que poderiam, em potência, construir quaisquer vocábulos sobre o plano onde
estão atados; assemelham-se também, contudo, a traços feitos em madeira que esperam somente a vontade do artista para transmutar-se em formas decididamente tridimensionais. Nesse
inventário de construções incertas, inclui-se o objeto alongado que, feito um pouco mais tarde e
esculpido igualmente em madeira, serve de molde para desenhos realizados diretamente
sobre a parede, onde o próprio objeto é afixado, por fim, como parte do trabalho. Demarcando os contornos da peça esculpida sobre a superfície da parede, Marcelo Silveira concede
que as suas formas migrem de um meio supostamente autônomo (escultura) para um outro de
mesma estatura (desenho), causando indistinção, ademais, entre o que é apenas modelo e o que
é
trabalho
concluído
[Sem
título,
2001].
[Cajacatinga . 1997 . madeira ‘cajacatinga’ e fio de aço tracionado . dimensões aproximadas 260 x 200 x 5 cm . coleção Cecília e
Ricardo Brennand ] [Sem Título . 2001 . madeira ‘cajacatinga, mogno’ grafite, fio de couro e pregos . dimensões variáveis . coleção do
artista ] [Estrutura 1 . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões aproximadas 200 x 230 x 310 cm . coleção do artista]
Após experimentar, no início de sua trajetória, com técnicas e materiais diversos – período em
que as especificidades dos meios usados cedem ao desejo de construção do que não existe ainda
–, o artista firma-se, por alguns anos, na criação de objetos feitos em cajacatinga, madeira de
árvore cujos topos, parcialmente carbonizados pela prática da queimada, são encontrados na
região próxima à cidade de Gravatá, Agreste de Pernambuco, lugar onde Marcelo Silveira nasceu
e passou a infância. Em sua maior parte, são peças feitas com pedaços de madeira que, após
cortados e lixados, são encaixados uns nos outros por meio de cavas e pinos, constituindo os
objetos que, no percurso criativo do artista, são, talvez, os mais facilmente classificáveis como
escultóricos. Mesmo no interior desse campo, entretanto, tais trabalhos se voltam contra classificações dóceis, articulando duas tradições distintas de escultura: a que enfatiza o entalhe do
material usado (o desbaste de cada um dos pedaços de madeira) e a que se faz pela junção
entre partes. Da primeira tradição, retém o interesse pelo volume e pela massa da matéria trabalhada, e da segunda, o apreço pela aproximação mecânica entre peças diversas.1 São todos eles,
também, objetos que remetem, uns mais claramente do que outros, a brinquedos e utensílios
típicos da região de origem de Marcelo Silveira, não ficando evidente, quando observados em conjunto, se são filiados mais à tradição culta da arte ou se a eles basta o amparo na memória da
produção anônima das ruas. Essas estruturas articuladas são, por vezes, postas de pé sobre o chão
ou apenas encostadas na parede, traindo uma arquitetura precária que parece sempre próxima ao
desmanche. Outras vezes, pendem do teto em balanço e eludem, mesmo a pouca distância, se são
destinadas somente à visão ou igualmente ao tato, lançando dúvidas sobre as maneiras com que se
pode ou se deve relacionar com os trabalhos do artista: se como observador somente ou se também
como participante ativo. Seja por meio do desastre iminente da queda, ou da mobilidade que as
peças aéreas, em tese, permitem, parece haver em todos esses trabalhos a admissão contida de
mudar a configuração com que são apresentados, trazendo sempre, neles implícita, a idéia de
movimento.
[Da série Articuladas . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte] [Da série
Articuladas . 1999 . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte]
1
Read, Herbert. A concise history of modern sculpture. Londres, Thames and Hudson, 1970.
Uma vez conquistado o terreno do impreciso, Marcelo Silveira tratou de expandi-lo. A partir de objetos
feitos em madeira, construiu moldes deles e os fundiu em alumínio, tratando os pares assim criados
como trabalhos únicos, feitos de componentes tão semelhantes na forma quanto diferentes em textura,
cor, peso e densidade. Desses objetos que avizinham matérias capazes de imprimir sensações tão diversas (uma atrai a luz, a outra a repele; uma sugere aquecer o olhar, a outra parece que o esfria), há um
que resume, com precisão, a tensão que os procedimentos construtivo e expositivo adotados ativam:
formado apenas por dois elementos de madeira e outros dois elementos semelhantes de alumínio, cada
um desses conjuntos é arranjado em equilíbrio precário e similar sobre parede e piso; mas enquanto
parece crível que a peça em madeira se mantenha ereta por longo tempo, a outra peça, igual em sua
estrutura e articulação entre partes, parece pôr em risco, dado o seu peso excessivo, quem dela se
aproximar em demasia. Ao transferir os contornos e volumes de objetos de madeira para substância
com características tão diversas, o artista confunde, portanto, quem espera deles alguma certeza semântica associada somente às suas formas, ampliando os sentidos da mobilidade que, apesar de sempre constrangida em sua potência plena, é constitutiva de seus trabalhos e deles transborda a todo
[Sem Título . 2000 . madeira ‘cajacatinga’ e alumínio . dimensões variadas . coleção do artista ] [Sem Título . 2000 . madeira
‘cajacatinga’ e alumínio . dimensões variadas . coleção do artista]
instante. Ao menos em um caso, contudo, a criação de duplos obedeceu a uma lógica distinta: uma vez
feito o molde da peça esculpida em madeira, Marcelo Silveira construiu ainda um outro molde da mesma
escultura, unindo-os em uma só estrutura alongada que serviu para fundir, por duas vezes, uma forma
que não existia antes. Descartando a peça em madeira que deu origem ao molde, o artista expõe as duas
idênticas peças em alumínio alçadas ao teto por fios trançados de couro de cabra, estabelecendo, por
meios diversos aos utilizados no trabalho antes descrito, a aproximação entre matérias de características
distintas. Em ambos os casos, entretanto, provoca dúvidas quanto à hierarquia de materiais e dos
procedimentos empregados, enfatizando, ao contrário, o trânsito entre a origem suposta do trabalho e o
seu resultado. Fica já aqui claro, ademais, o interesse que Marcelo Silveira possui pela possibilidade de
replicar formas, sejam as que ele mesmo cria, sejam aquelas que, embora transformadas por uma
intervenção
deliberada,
já
existem
à
sua
volta.
A despeito da ambivalência de significados que esses trabalhos carregam (e que os aproxima, paradoxalmente, como produtos de uma mesma poética), eles podem ser considerados e analisados, individualmente, de acordo com as suas propriedades formais e alusões simbólicas. Em dois outros trabalhos,
contudo, o artista – ainda que se mantendo apegado, em um deles, às relações de articulação entre
partes e, no outro, à idéia de movimento – cancela essa possibilidade de análise. No primeiro [Coleção
I, 1999] dispõe, sobre mesa ou balcão, cinco dezenas de pequenos objetos esculpidos em madeira e
lixados. Assim como em vários outros de seus trabalhos, cada uma dessas diminutas peças lembra
estruturas orgânicas ou arranjos construtivos rústicos, ecoando – por meio de corte, encaixe ou justaposição de partes – as formas de um utensílio doméstico, de um brinquedo popular ou de um adereço
qualquer. Nenhuma delas, contudo, representa, de fato, coisa alguma, sendo do gradual e inevitável
reconhecimento de sua inutilidade ordinária que o encanto dessa “coleção” emerge. Estabelece-se
[Sem Título . 2000 . alumínio e couro trançado . dimensões variáveis . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães]
[Coleção 1 . 1999 . detalhe . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variadas . coleção João Marinho]
nesse trabalho, além disso, um deslocamento claro de foco: das propriedades formais de peças que se
bastam, as atenções de Marcelo Silveira (e do observador) se voltam também, agora, para um conjunto
delas, as quais sugerem, de modo relacional, seus (possíveis) significados. Em vez de considerar apenas
cada forma específica, o olhar busca abarcar, igualmente, a relação dessas formas com outras encontráveis
ao seu redor, alternando a extensão do seu campo de interesse visual sem conseguir, entretanto, uma
apreensão simultaneamente localizada e ampla do conjunto. Embora ainda parcialmente ancorado no
âmbito restrito da escultura, vislumbra-se, de modo inequívoco e por meio desse trabalho, o ingresso de
sua obra no campo ampliado da instalação, no qual é a relação ativa, ao longo de um certo período de
tempo, entre os objetos criados, o observador e o espaço que os envolve que sugere significados
sempre prontos a serem redefinidos.
No segundo desses trabalhos-limite [sem título, 2001], o artista abandona totalmente as articulações e
os encaixes que caracterizam muitos de seus trabalhos anteriores, concentrando-se na construção de
um conjunto de peças que prescindem de outras partes. Desbastando e lixando troncos antigos e gastos
de árvores já mortas (além da cajacatinga, jaqueira, louro-rosa e baraúna), Marcelo Silveira constrói
esferas de diversos tamanhos e acabamento irregular, misturando-as, em seguida, a outras que funde,
em alumínio ou ferro, a partir de moldes feitos das esferas de madeira. Além de variarem em grandeza,
[Esferas . 2001. ‘vistas das exposições na Pinacoteca da UFAL, Maceió, e na Galeria Amparo 60, Recife’ . madeiras diversas,
alumínio e ferro . dimensões variadas . coleção do artista] [Esfera . 2001 . ‘vistas de intervenção no centro do Recife’ . madeira
‘jaqueira’ . dimensões 100 cm de diâmetro . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães ]
2
O trabalho Sfera di giornali [1966], do artista italiano Michelangelo Pistoletto (1933) se constituía de uma grande esfera de papiermaché feita com folhas de jornais que era rolada ao longo das ruas de Turin, numa alusão física à dinâmica dos eventos que a imprensa
noticia. Enquanto o trabalho de Marcelo Silveira sugere, a despeito de sua forma, dificuldade de locomoção, a intervenção de Michelangelo
Pistoletto reforça, pela matéria simbólica usada na construção da esfera, a idéia de movimento que o formato embute.
3
A passagem da temporalidade analítica (tempo lógico) para a especulativa (tempo experimentado) na escultura moderna é discutida
por Krauss, Rosalind. Passages in Modern Sculpture. Londres, The MIT Press, 1977.
essas esferas possuem, portanto, textura, densidade e cor distintas, criando, quando aproximadas, áreas de atração e atrito simbólicos aos olhos de quem com elas divide o espaço. Cada uma delas
traz, ainda, uma marca diferente, escavada, em baixo relevo, sobre
suas superfícies. São símbolos, apropriados pelo artista, que representam – pela junção gráfica de iniciais de nomes – famílias de
proprietários rurais, e que são usados para marcar o gado a elas
pertencente. Por meio desse entalhe em seus trabalhos, Marcelo
Silveira logra esvaziar os significados estáveis possuídos por esses
símbolos e os insere no âmbito de sentidos moventes da produção
de arte. Aludindo, em sua própria forma, à idéia de deslocamento
ágil, essas esferas concentram e multiplicam, ademais, o que antes
era somente sugerido, em termos físicos, nas peças de encaixe ou,
simbolicamente, na criação de duplos em alumínio. O movimento
efetivo que elas permitem é, contudo, limitado: por causa de seu
peso extremo e de imperfeições de corte (as quais são transmitidas
às peças fundidas), as esferas maiores são obviamente difíceis de
mover e restam quase inertes sobre o piso. Essa ambigüidade entre mobilidade e fixidez físicas é ainda enfatizada pela ação realizada pelo artista com a maior das esferas de madeira, medindo mais
de um metro de diâmetro e pesando cerca de seiscentos quilos.
Deixada, durante as madrugadas (e recolhida, com a ajuda de guincho, nas noites seguintes), sobre calçadas de diferentes bairros do
Recife – todas de grande movimento durante o dia –, a esfera
causou espanto ou desconcerto (registrados em fotografias) por
sua inexplicável presença em lugares para onde não se supunha
ser plausível mover coisa tão pesada e sem função discernível.2 Tal
como acontece com os trabalhos articulados em partes, também
com as esferas a idéia de movimento que as formas de um objeto
sugere é truncada pelas propriedades da matéria. Consideradas
individualmente ou em grupo, as esferas são, além disso, opacas a
qualquer tentativa de representar o mundo, não im-porta quanto
tempo com elas se despenda. De modo ainda mais incisivo do que
a Coleção I já anunciava, a temporalidade que elas impõem ao
observador é outra: não mais a da análise que descreve o trabalho,
mas a da especulação de seus significados.3
Essa rejeição a sentidos isolados ou únicos – sejam eles formais,
narrativos ou alegóricos –, permite a Marcelo Silveira se lançar em direções diversas, obedecendo apenas a sua vontade renovada de articular os seus trabalhos com o entorno simbólico e físico
dos lugares onde os desenvolve. No trabalho Roupas de Casa [2003], o artista vincula, na construção de objetos, duas expressões distintas de organização social: a divisão de trabalho adotada
pelos artesãos de Cachoeirinha (Agreste de Pernambuco) na confecção de montarias e a arquitetura
das moradias precárias dos “trabalhadores sem-terra”, fincadas ao longo das estradas que cortam o país. Sobre esquemáticas estruturas de pequenas edificações feitas com finas hastes de
aço, o artista coloca “roupas” de couro que repetem e cobrem as composições vazadas dessas
“casas”, configurando uma cidade inventada e móvel, contingente mas inequivocamente concreta. Alinhadas sobre o piso, essas formas cobertas são parcialmente refletidas em espelhos de
molduras ovais como os que se usavam em salas de jantar, todos também postos em fila sobre
parede próxima e já trazendo, desenhadas sobre suas faces reflexivas, arquitetura delgada semelhante à que dá sustentação às casas. Uma vez mais, impõe-se nesse trabalho a idéia de que
[Roupas de Casa . 2003 . ‘vista da exposição na Galeria Nara Roesler, São Paulo’ . couro, aço inoxidável, espelho e madeira
‘ipê’ . dimensões variáveis . coleção do artista ]
nada fica parado e de que mesmo o que parece distante aproxima-se e se toca: a face externa das casas
e os espelhos “da sala” que as refletem, o metal frio e o couro que o aquece, a idéia do artista e o
trabalho dos artesãos que confeccionam as peças, as moradias frágeis dos “trabalhadores sem-terra”
à margem da estrada e o conhecimento culto que o trabalho gera. Incorpora, por fim, matérias antes
só pontualmente por ele usadas e volta a deixar à mostra o gosto pela construção que é fruto da linha
e do traço.
Se, em Roupas de Casa, aquele que antes era só observador negocia sua interação virtual com o
trabalho – confundindo, no espelho, a sua imagem com as das casas –, em Bochinche [2003] a imprecisão do lugar que público e trabalho ocupam é de natureza quase tátil. Formado por doze núcleos –
cada um deles composto por oito pequenos blocos de madeira presos ao teto e por igual número de fios
de couro que, trespassando aqueles, descem até o chão e se entrelaçam –, o trabalho fala de conversa,
de burburinho, de contatos fortuitos e imprevistos como os que acontecem em lugares de festa. Percor-
[Casa Abelha . 2003 . madeira ‘moiracatiara’ . dimensões 169 x 40 x 40 cm . coleção do artista] [Casa Bernardo . 2003 . cobre . dimensões
39 x 37 x 70 cm . coleção do artista ] [Casa Coronha . 2003 . aço inoxidável, couro de cabra com pêlos . 184 x 31 x 31 cm . coleção do artista]
rendo as passagens que os fios pendentes do teto formam, é possível negociar a diferença entre o
percurso do olho que atravessa o espaço vazado feito de teias de couro e aquele percorrido pelo corpo
inteiro, obrigado a circundar os núcleos para mover-se de um a outro canto. No meio da sala, porém, um
pequeno e estranho “carro” de madeira aparenta estar pronto para deslocar-se para qualquer lado,
servindo de potencial elo entre as doze unidades distintas e entre o visitante e todas elas. Já em
Combinação Torreão [2004], é o encurtamento físico e simbólico da distância que separa instituições de
arte que o trabalho provoca. Feito de fios de couro entrelaçados que reproduzem, quando esticados e
pendurados ao teto como planos moles, a sala de exposições do Torreão (Porto Alegre), Marcelo Silveira
o expõe no Gasômetro (também em Porto Alegre), no Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães –
MAMAM (Recife) e no Centro Cultural São Francisco (João Pessoa), fazendo migrar, de um aos outros
lugares, a arquitetura de um só espaço.
Marcelo Silveira parece anunciar, nesses trabalhos, quão pequena é a distância entre as coisas julgadas
distantes. E é esse desejo de aproximar o que parece apartado que orienta a criação do Armazém
República [2004], instalação feita de dois segmentos distintos que partilham, além do nome, uma
estratégia de construção. Num desses segmentos, cem peças esculpidas em madeira são alçadas ao
teto por fios de couro, pendendo dali como se fossem carne fossilizada ou formas sem serventia à espera
de um uso improvável. Assim como na Coleção I, trata-se de um ajuntamento de coisas criadas que,
embora evoquem as formas de objetos úteis, não são mais que volumes desprovidos de significados
assentados. Ao contrário das peças pertencentes àquele trabalho, entretanto, os objetos de madeira
[Bochinche . 2003 . ‘vistas das exposições Atelier Finep, no Paço Imperial, Rio de Janeiro e Ocupações, Centro Cultural de São Francisco, João Pessoa’ . madeira ‘cajacatinga’ e couro . dimensões variáveis. coleção do artista] [Combinação Torreão . 2004 . ‘vista da
exposição Ocupações, Centro Cultural de São Francisco, João Pessoa’ . couro . dimensões 400 x 400 x 400 cm . coleção do artista ]
que compõem o Armazém República não foram, desde quando ficaram prontos, logo reunidos dessa
forma. Sem conseguir impor-se, aos olhos do artista, como trabalhos autônomos, encontraram o seu
lugar, como parte de um conjunto, apenas com o distanciamento que o passar do tempo concede. No
outro segmento do Armazém República, uma estante de madeira abriga centenas de objetos de vidro
(copos, potes, espelhos, garrafas, vasos, lustres, cacos) que se amontoam, dialogam uns com os outros
e se espalham em prateleiras largas, formando painel vertical, transparente e frágil que se contrapõe à
horizontalidade opaca e robusta dos objetos de madeira pendurados do alto. Além das diferenças de
propriedades físicas, as duas seções desse grande armazém parecem se distinguir, a uma primeira
mirada, pelo fato de as peças de vidro terem sido achadas já prontas, e as de madeira terem sido feitas,
uma a uma, pelo artista. Efetivamente, nunca antes havia Marcelo Silveira lançado mão, com tal intensidade, do universo de formas disponíveis à sua volta, tratando quase sempre de criar outras novas.
Arrumadas nessa estante, entretanto, as peças de vidro gradualmente desfazem as diferenças que
[Armazém República ‘madeira’ . 2004 . madeira diversas . dimensões variáveis . coleção Nara Roesler ]
possuem daquelas de madeira, posto que o arranjo novo das primeiras as torna tão desprovidas de
utilidade quanto o desbaste que dá forma às segundas as faz imprestáveis para qualquer uso. Ademais,
o tempo longo em que cada uma das peças de madeira foi guardada no atelier – quase como vestígios
de um gesto criativo frustrado – antes de serem recuperadas como componentes do Armazém República, fez com que o artista dispusesse delas quase como se fossem obra alheia, e não mais fruto de seu
trabalho.4 Ativando os canais que atam, em tensão constante, aquilo que parece diferente, essa instalação dá visibilidade, portanto, à fragilidade de distinções estanques e à incessante troca simbólica que
existe entre as várias matérias e formas por onde idéias e coisas do mundo se movem. Tal como o
“museu de tudo” do poeta João Cabral de Melo Neto, o armazém de Marcelo Silveira parece, pelo
dinamismo que encerra, poder sempre acolher alguma coisa mais, dissolvendo limites arbitrários para se
tornar “depósito do que aí está”.5
[Armazém República ‘vidros’ . 2004 . detalhe . madeira, vidros, espelhos e lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista ]
4
Silveira, Marcelo. “Armazém do Mundo”. Entrevista publicada neste livro.
5
Melo Neto, João Cabral de. “O Museu de Tudo”, in Museu de Tudo. Rio de Janeiro, Editora José Olympio, 1975.
[Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004]
[Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004]
[Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004]
[Coleção I . 1999 . ‘vista da exposição no MAMAM, Recife, 2004’ . madeira ‘cajacatinga’ . dimensões variáveis . coleção João Marinho]
[Roupas de Casa . 2003 . ‘vista da exposição no MAMAM, Recife, 2004’ . couro, aço inoxidável, espelho e madeira ‘ipê’ .
dimensões variáveis . coleção do artista ]
[Vista parcial da exposição no MAMAM . Recife . 2004]
[Armazém República ‘madeira’ . 2004 . detalhes . madeiras diversas . dimensões variadas . coleção Nara Roesler ]
[Armazém República ‘vidros’ . 2004 . detalhes . madeiras, vidros, espelhos, lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista]
[Armazém República ‘vidros’ . 2004 . madeiras, vidros, espelhos, lâmpadas . dimensões variáveis . coleção do artista ]
ARMAZÉM DO MUNDO
Agnaldo Farias, Moacir dos Anjos e Marcelo Silveira
28 de junho de 2004 . Recife
Moacir dos Anjos . Marcelo, são quase duas décadas produzindo arte. Gostaria que você comentasse como foi o início de sua trajetória, o período em que você começou a enxergar, no
que fazia, a potencialidade de uma produção artística. Marcelo Silveira . Comecei em
meados dos anos 80. Aqueles foram anos de aprendizado, de experimentação, de
uma maneira, talvez, até inconseqüente. Mas eu acho que a consciência da produção se torna maior e mais nítida somente a partir do final dessa década e início
dos anos 90. Foi nesse período que ocorreram alguns fatos importantes, principalmente o distanciamento do que eu estava fazendo até aquele momento. Em
1991, viajei para a Europa e Norte da África, e fiquei fora durante um ano. Um ano
sem produzir quase nada, apenas esboços, desenhos, mas com a cabeça trabalhando, pensando nas coisas que via e naquilo que já havia feito. Num determinado momento, parei em Barcelona por três meses. Foi nessa época que se deu a
maturação e a tomada de consciência da minha produção.
MA . Mas como era o seu trabalho antes dessa viagem? MS . Era muita pintura e desenho.
Embora já construísse alguns objetos, inclusive já tendo feito, um pouco antes
dessa viagem, uma exposição em Belo Horizonte, na Itaú Galeria, a atitude era
ainda a de pintor. Usava madeira, usava outros materiais, mas continuava sendo
pintor. Eu tinha um pensamento claramente pictórico. A escolha da ma-deira e
dos materiais era sempre subordinada a uma preocupação com a cor.
Agnaldo Farias . Havia algum tema que predominasse nesses trabalhos? MS . Não. O que
havia, já naquela época, era uma vontade de transformar os objetos que
eu encontrava e que, por algum motivo, me chamavam a atenção.
AF . Você chegou a essa motivação através de escola, freqüentando exposições? Como é
que você se formou como artista? MS . No final dos anos 80, ainda antes da
viagem que mencionei, freqüentei muito os ateliers de outros artistas e os
Festivais de Inverno de Minas Gerais. Essa convivência me levou a pensar
um pouco mais no que era o espaço do atelier e no que é o artista. Eu
lembro que, antes de ir a esses festivais, eu ficava muito incomodado com
o ambiente em que vivia no Recife. Aqui, a pintura era muito forte, eu tinha
que pintar. As informações eram poucas, eu viajava muito pouco. Eu não
me satisfazia. As conversas eram quase apenas sobre pintura, sobre os
efeitos pictóricos obtidos com diferentes técnicas, e eu ficava muito angustiado. Aquilo me incomodava.
AF . Incomodava quem? Quem era Marcelo Silveira a essa época? MS . Eu era muito
ligado à Oficina Guaianases, que, para mim, foi um grande espaço de iniciação. Mas, apesar de sua importância na minha formação, as discussões
das quais eu participava ali não me satisfaziam totalmente. Eu queria discutir algumas outras coisas que, mesmo sem saber exatamente o que era,
não conseguia encontrar na Guaianases. Foi então que eu comecei a discutir mais com Liliane Dardot, artista mineira que, na época, morava em
Olinda. Por meio dela conheci o trabalho de Amílcar de Castro. E também
os textos de Amílcar que ela levava para a Guaianases. Fiz com Liliane um
curso de desenho, em que ela sempre mostrava coisas novas e discutia
com os alunos. Foi por causa desse contato com ela que veio o desejo de
freqüentar os Festivais de Inverno de Minas Gerais.
AF . O clima desses festivais era de muita efervescência. Era possível participar dos ateliers
oferecidos por artistas locais, como Marcos Coelho Benjamim, Marco Túlio Resende, Fernando
Lucchesi, e se aproximar do trabalho deles. Alguém lhe deu sugestões que tenham sido
essenciais para o desenvolvimento de seu trabalho? MS . No primeiro Festival
de Inverno de que participei, eu parecia um cego no meio de um tiroteio,
perdido entre tantas coisas. Mas o de 1989, realizado em Belo Horizonte
(era a quarta vez que eu freqüentava o Festival), foi muito tranqüilo e
muito importante para mim. Eles investiram pesado na produção e na presença de vários críticos. Lembro de uma equipe formada pelos críticos
Roberto Pontual, Olívio Tavares de Araújo e uma terceira pessoa de quem
não recordo o nome. Eles faziam o acompanhamento das oficinas, avaliavam, desciam a lenha em um, falavam bem de outro. Eu sempre fui muito
tranqüilo em relação a isso. Gostassem ou não gostassem do que eu fazia,
eu ia lá para aproveitar o que existia de bom. Os críticos tinham a verdade
deles e eu tinha a minha verdade. Era legal esse confronto. Lembro que as
considerações mais pertinentes eram as feitas por Roberto Pontual. Esse
festival em Belo Horizonte foi realmente marcante. Quando estive em Barcelona, algum tempo depois, percebi que as discussões que tínhamos nos
festivais de Minas Gerais não ficavam atrás das discussões da escola de
arte que freqüentei lá por três meses, a Massana, uma escola ligada à
Prefeitura.
MA . Em Minas há uma tradição de criação de objetos, e também uma prática relacionada
à catação, à apropriação, no trabalho, de coisas achadas. Dentre os ateliers que você
freqüentou, alguma produção lhe chamou particularmente a atenção a esse respeito? MS
. O que me chamou a atenção, o primeiro grande impacto de Minas, foi
o trabalho de Celso Renato. Eu ficava impressionado com a força do trabalho e em como ele não tinha visibilidade. Aliás, até hoje não há visibilidade
para o trabalho dele. As pessoas simplesmente parecem desconhecer Celso Renato.
MA . Essas seguidas viagens a Minas parecem ter sido muito importantes para sua formação. MS . Sem dúvida. Além dos festivais, em 1990, eu fiz uma exposição
individual no Itaú Galeria de Belo Horizonte, que era coordenado por
Cláudia Renault. Era um espaço cultural muito dinâmico. Muita gente ia
ver a exposição. Mas o mais importante é que, nessa mesma época, estava acontecendo uma grande mostra de Arthur Bispo do Rosário, no Museu da Pampulha, organizada por Frederico Morais. Essa exposição do
Bispo foi um acontecimento para mim. E é engraçado que Agnaldo [Farias], que me convidou para uma mostra coletiva em torno da obra do
Bispo, não sabia, na época que me fez o convite, da importância que a
experiência de ter visto aquela exposição teve para o meu trabalho. Ha-
via somente uma coisa que me incomodava na mostra, que me levou até
a arengar com Frederico, que foi o fato dele haver colocado na parede,
na entrada da exposição, um atestado de insanidade mental do Bispo.
Eu ficava incomodado toda vez que via aquele atestado. Porque eu acho
que foi a obra do Bispo que me fez intuir o que significa ser um artista,
mesmo que até hoje eu busque entender isso plenamente. Foi olhando o
Bispo que, de alguma maneira, percebi que era aquilo que eu procurava.
Percebi que aquilo, embora aparentemente tão simples, era uma grande
obra. Eu lembro que me emocionei com a exposição. Aquela coisa de
você ficar mudo. Uma chapu-letada. E por isso não entendia aquelas
discussões todas sobre se aquilo ali era arte ou não. Acho que o fato de
o curador ter colocado aquele atestado de insanidade na mostra demonstrava um pouco de insegurança da parte dele.
AF . O seu depoimento é interessante porque essa mostra, que foi montada no Rio de
Janeiro, em São Paulo e em Belo Horizonte, provocou esse mesmo choque nas três
cidades por onde passou. Lembro que, em 1991, Marcos Coelho Benjamim, Fernando
Lucchesi e Paulo Lender participaram da Bienal de São Paulo com um projeto conjunto
que era, nitidamente, uma homenagem a Arthur Bispo do Rosário. A impressão, pelo
que você fala, é que, embora o seu trabalho tivesse uma vocação para o objeto, foi
somente o trabalho do Bispo que, de alguma maneira, deu uma chancela ao que você
buscava e que não encontrava eco no meio em que você se movia, naquela época, no
Recife. Não apenas para a prática da catação, como o Celso Renato fazia, mas também
para o tipo de produto que acho que viria a aflorar apenas alguns anos depois na sua
produção, objetos mais distantes da escultura propriamente dita e mais próximos do
vernáculo, do popular. Seria correto falar da passagem, ao longo dos anos, de um
interesse em formas criadas para formas apropriadas no seu trabalho? MS . Eu acho
que
existem
determinadas
questões
que
me interessam, que são trabalhadas ao longo de um tempo de uma maneira que me satisfaz e que terminam saindo completamente do trabalho. Já outras terminam voltando de tempos em tempos. Mas é certo que
o meu trabalho mais recente não se esgota na questão escultórica. Existe
simultaneidade de vários interesses. Há momentos em que eu estou pensando apenas em escultura e fico tentando eliminar tudo, desbastar mes-
mo. E há momentos em que entra o espaço em torno do objeto que estou
fazendo, em que entra a quinquilharia que está à minha volta, em que
aparece a vontade de me apropriar de tudo.
AF . O que me parece é que, no início, o trabalho tinha um apuro formal mais nítido,
uma preocupação maior com o acabamento. Era como se ele estivesse, de alguma
maneira, ainda preso a um campo específico de criação. Houve um momento em que a
sua produção artística podia acontecer dentro dos marcos da pintura, porque eram da
pintura as referências que você tinha. Em um segundo momento, entra a escultura e,
logo depois, a catação de objetos, a liberdade de trazer qualquer coisa para o território
da arte. A sensação que tenho, acompanhando o seu trabalho ao longo da década de
1990, é que, num determinado momento, você purga a vontade de criar formas. E
purga também a vontade de simplesmente se apropriar de formas ou objetos já prontos. Tanto que eu acho interessante quando você consegue, hoje, fazer trabalhos que
ressoam no campo da escultura e, igualmente, no campo de onde vêm os objetos
apropriados. É como se o trabalho ocupasse um espaço intermediário: metade dele
está do lado de fora do museu, metade dele está dentro do museu. Há isso? MS . Creio
que
sim,
e
acho
que
é
preciso
vol tar
mais
uma
vez
a
Bispo do Rosário para entender esse aspecto do meu trabalho. Talvez eu
não tenha homenageado tanto o Bispo como devesse, dada a sua importância para a minha trajetória. Não que eu tenha ficado tentando trabalhar em cima do que vi naquela exposição, mas porque essa importância
fica clara nos rumos que, anos depois, senti que meu trabalho estava
tomando. O grande ensinamento do contato com a obra do Bispo foi esse
ir e vir que é tão presente no que ele faz. Muitas vezes, o Bispo apenas se
apropria do que já existe; aqui e acolá, se arrisca a construir o objeto
totalmente, sem se preocupar se há ou não coerência construtiva com o
que fez antes. É essa liberdade que ambiciono, não somente de procedimentos, mas também de materiais. A liberdade de eu estar interessado,
hoje, em fazer um objeto por causa do peso excessivo da matéria que
estou usando e de, amanhã, fazer um objeto explorando a leveza do papel.
De trabalhar uma época com a madeira e em outra hora trabalhar com o
ferro. Nesse momento, estou amadurecendo a idéia de trabalhar com chumbo, com ferro fundido, voltar à escultura, explorar a direção oposta da que
eu estou explorando hoje, com o uso do papel, do grafite, o interesse pela
linha. Não sei, acho que eu devo ter alguma coisa troncha que não permite
que
eu
me
satisfaça
com
o
que
faço.
MA . Gostaria de explorar um pouco essa questão do interesse pela linha, pelo desenho,
que é algo que vem ainda da década de 1980, do início de sua trajetória. Examinando a
sua produção ao longo dos anos, percebo, muitas vezes, nas esculturas e objetos que
você faz, um olhar de desenhista também. Esses trabalhos parecem sempre trazer presente a sugestão de que foram feitos por meio de traços articulados no espaço. Como se
fossem desenhos feitos no espaço. Qual a relação entre o desenho e a escultura no seu
[Livro do Armazém . 2004 . carimbos sobre papel ‘edição’ . dimensões 22,5 x 16 cm . coleção Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães] [Armazém República ‘madeira’ . 2004. detalhes, nesta página e seguinte . madeiras diversas . dimensções variadas . colelção Nara Roesler ]
trabalho?
MS
.
Apenas
em
pouquíssimas
situações
eu
usei
o
desenho como esboço de um trabalho tridimensional. Normalmente, quando eu faço uma escultura, troco o instrumento de trabalho. Eu largo o lápis
e vou para a serra tico-tico. Largo o lápis e vou construir as linhas diretamente
com a serra, desbastando a madeira. Às vezes, é a forma de “desenhar”
com a tico-tico que sugere uma atitude mais brusca no corte da madeira.
Em outras ocasiões, é a dimensão ou o formato do pedaço de madeira que
tenho à disposição que vai sugerir o “traço” que faço. Não há como fazer
esboço, não dá pra ter arrependimento. A esse respeito, eu me lembro que
Amílcar de Castro dizia uma coisa que me impressionou muito: que o grande ensinamento que ele recebeu de [Alberto] Guignard, com quem havia
estudado, foi o de havê-lo forçado a desenhar apenas com um lápis duro,
difícil de apagar. Aquilo ficou na minha cabeça a vida inteira. É engraçado
não haver uma influência direta da obra de Guignard no trabalho de Amílcar
e haver esse ensinamento, que é quase o fio condutor de toda obra dele: a
necessidade da precisão do traço. É, talvez, por isso que não vejo desenho
e escultura como coisas separadas, vem tudo junto. E isso me remete ao
Livro do Armazém [2004], que reúne reproduções, feitas com carimbos
que mandei confeccionar, dos contornos das 100 peças de madeira que
compõem a instalação Armazém República [2004]. Nesse caso, há até uma
inversão do que é mais usual: foram os objetos de madeira esculpidos que
usei como “esboços” para os desenhos feitos com carimbos.
AF . Nesse caso, você desenha com a tico-tico sobre a madeira, e é o resultado dessa
ação que se torna a matriz do desenho que vai ser impresso no papel, e não o contrário.
Isso é uma compreensão ampliada do que é desenho. MS . Acho que isso tem a ver
com a arrumação que a gente faz das coisas e dos conceitos. Eu tenho
mania de arrumar e de organizar as coisas como se elas fizessem parte de
[Cajacatinga . 1997 . detalhe . madeira ‘cajacatinga’ e fio de aço tracionado . dimensões variadas . coleção Cecília e Ricardo
Brennand] [Coleção I . 1999 . detalhe . madeira ‘cajacatinga . dimensões varidadas . coleção João Marinho] [Roupas de Casa .
2003 . detalhe . couro, aço inoxidável, espelho e madeira ‘ipê’ . dimensões variáveis . coleção do artista]
um armazém. Antes, eu pegava as coisas e sempre interferia nelas. Hoje eu sou mais um arrumador. Eu arrumo
tudo. Aliás, eu cheguei à conclusão de que uma pessoa
organizada não é necessariamente aquela que ordena as
coisas de um modo visualmente limpo; organizada, pra
mim, é aquela pessoa que arruma informações a que outras pessoas podem ter acesso, que permite que outros
possam enxergar o seu universo, mesmo que essa arrumação implique um acúmulo de coisas. Nesse sentido, eu
acho que sou uma pessoa organizada, acho que os outros
conseguem enxergar o que eu faço.
AF . Então, seria a sua maneira de organizar as coisas que permite que
uma outra pessoa entre no seu sistema de pensamento e de criação.
Isso é um dado muito interessante, e acho que está realmente presente
na sua obra. Há um trabalho seu, feito de várias pequenas peças de
madeira arrumadas em linhas na parede [Cajacatinga, 1997], que tem
muito a ver com caligrafia, onde as fieiras de peças arrumadas seriam
quase como as linhas da pauta de um caderno e onde as peças têm uma
semelhança e sugerem uma relação entre si. Já os trabalhos Coleção I
[1999] e Armazém República são feitos de objetos diferentes, que foram
construídos separadamente e depois aproximados. Você aproximou aquilo
que estava distante no mundo, e o interesse do trabalho está menos em
cada uma das coisas juntadas do que na sua organização, na maneira de
mostrá-las. Os objetos que compõem esses trabalhos não têm nada ou
pouco a ver uns com os outros, a não ser o fato de quase todos serem
feitos de madeira. A exceção, em trabalhos recentes, talvez seja a instalação Roupas de Casa [2003], em que, embora as muitas peças que compõem o trabalho também formem uma coleção, existe um princípio
isomórfico e há similitude e contigüidade entre as peças. Eu queria que
você falasse um pouco sobre isso, porque você parece ter abandonado a
intenção de fazer formas semelhantes para se dedicar a fazer formas
cada vez mais díspares. Você tem trabalhado com um princípio de organização
que
aproxima
as
coisas
que
são
di ferentes.
MS . Vou tentar explicar como se deu esse processo. Há
algum tempo, passei a perceber que coisas que havia feito
no passado me incomodavam. Cheguei a destruir alguns trabalhos, tocando
fogo neles. Mas, outras vezes, comecei a descobrir situações em que essas
obras conviviam bem quando estavam juntas. Na verdade, já me passou
pela cabeça a idéia de criar obras “inválidas”. Justamente essas obras que
não me satisfazem é que seriam postas em caixas lacradas e declaradas
como inválidas. Mas aí eu comecei a achar preocupante essa questão das
obras inválidas. Seria uma solução muito fácil: não gostei de um trabalho,
boto dentro de uma caixa e digo que é inválido. Pronto. Na verdade, eu
acho que tenho que encarar de frente esses trabalhos, pegar eles, retomar
eles e ver no que é que vão dar. De alguma forma, preciso interferir nesses
trabalhos e dar uma nova ordem para eles. Creio que muito em breve esses
trabalhos estarão sendo resgatados. E novamente aparece, nesse procedimento, essa idéia de ir e vir. E é aí que entra a estética do armazém, de sua
importância para o meu trabalho. Nela, não é o verde que tem que ficar
perto do vermelho ou do laranja, nem o maior que tem que ficar perto do
menor, nem o transparente que tem ficar perto (ou distante) do opaco. No
armazém, o espaço é preenchido por objetos sem preocupação com o que
está na sua vizinhança ou com a função daquilo que está exposto, e o dono
do armazém não deixa de vender os objetos por causa disso. Eles não
deixam de chamar a atenção e não deixa de haver beleza naquele excesso
de coisas penduradas. Comecei a ver a importância daquela disposição caótica das coisas, própria das barracas de feira, dos armazéns. Talvez esse
apego venha da minha experiência com o armazém de Seu Malaquias, o
meu avô, onde iam se acumulando resquícios das coisas antigas que haviam passado por lá. O cartaz antigo do sabonete Lux de Luxo, por exemplo,
que ficou preso na parede por muitas décadas. Eu lembro que, nos anos 80,
existia ainda o cartaz dos anos 50. O meu avô foi mudando de atividade e
era muito ciumento de seu armazém; no final da vida, vendia só material de
construção, mas mantinha os cartazes da época em que ele vendia carne,
produtos de beleza, tecido.
MA . O acúmulo do armazém era também temporal, com os símbolos de épocas distintas
se amontoando ali? MS . Exato. E essa estética começou a ser importante para
mim. Eu comecei a ver que aquilo não era uma coisa feia. Então, em vez de
negar os trabalhos que havia feito, vi que era preciso encará-los e assumir
que aquilo era, efetivamente, o que eu fazia num determinado momento.
Que era preciso deixar aquilo ser visto. É diferente de trancar as obras
dentro de um baú.
AF . Essas peças fazem parte do Armazém República? MS . Não. Essas de que estou
falando são peças mais antigas que ainda estão aguardando serem retomadas. O Armazém República é composto de peças de madeira que não
deram certo em relação às minhas expectativas quando as fiz, mas que, a
partir de um certo momento, começaram a chamar a minha atenção. Quando
comecei a pensar em fazer esse trabalho, havia um sentimento contraditório, uma certa confusão. Porque eu estava utilizando coisas que, na minha
opinião, não haviam dado certo e que, agora, queria que fossem vistas,
todas juntas, como num armazém.
MA . Elas não haviam dado certo sob que critérios? MS . Elas não tinham autonomia.
Por isso não tinham dado certo. Só encontraram uma razão de existir
quando ficaram juntas. Foi no contato prolongado com essas peças que
comecei a ver que a gente não precisa ficar criando coisas novas o tempo
todo. É possível entrar no atelier, abrir as caixas e os pacotes e ficar
limpando, depurando, separando algumas peças e jogando fora as coisas
que não prestam. Eu comecei essa história toda do Armazém República
revendo as imagens de diversos trabalhos antigos. Percebi que havia algumas representações e características construtivas que se repetiam, formando famílias, e passei a agrupar as peças em função dessas semelhanças.
MA . Você fala que nem sempre é preciso criar formas novas, que é possível se apropriar
de coisas já prontas no atelier. Mas há um outro segmento do Armazém República que é
formado por objetos de vidro, que implica um outro tipo de apropriação. Não mais a
apropriação de coisas feitas por você no passado, mas sim de coisas pertencentes ao
mundo da indústria. São lâmpadas, lustres, garrafas, espelhos, potes e outros objetos.
Parece-me que, mesmo não sendo uma prática inédita no seu trabalho, essa é a primeira
vez que essa apropriação e rearranjo de coisas industrializadas recebe tanto destaque
nele. Ecoa estratégias que, aparentemente, não têm relação próxima com o seu trabalho
anterior, sendo mais da ordem do readymade. Como é que você vê essa passagem no
seu trabalho?
MS . Foi uma coisa refletida. Não é uma atitude gratuita.
Uma das razões que me fizeram construir esse armazém de vidros foi o
fascínio com as características físicas do vidro, principalmente a sua fragilidade. A possibilidade de ele quebrar e, de um momento para o outro,
deixar de existir. Para mim, isso já era uma razão suficientemente forte
para decidir trabalhar com o vidro. A outra coisa que me interessava era
retirar a função do objeto apropriado. Retirar a função de uma garrafa de
suco e, ao mesmo tempo, dar a ela o mesmo tratamento que dou ao pote
decorativo e ao vidro maravilhosamente bem trabalhado, agrupando todos no mesmo local. Por fim, incluí muitos vidros quebrados nesse trabalho porque também me interessa jogar com a atração que o vidro exerce,
a vontade que dá de tocar nele, e o receio de fazer isso por conta do risco
de se cortar com o toque. Em vez de excluir isso do trabalho, eu comecei
a jogar com essa ambigüidade. Não se trata de ser agressivo, mas de
encontrar beleza nisso. E acho interessante mostrar as peças de madeira
do Armazém República, que foram exaustivamente trabalhadas, próximas
das peças de vidro, que foram só catadas por mim e arrumadas em prateleiras. Na verdade, acho que há uma semelhança entre os dois segmentos
do trabalho. Eu convivi muito com essas peças de madeira, mas não conseguia definir um fim para elas, até que elas ficaram distantes de mim. Os
vidros também impunham essa distância, só que de modo imediato, porque tinham sido feitos por outras pessoas. É como se aquelas peças de
madeira também tivessem sido feitas por outras pessoas.
AF . De onde vem o título Armazém República? Era o nome do armazém do seu avô?
MS . Não. O armazém do meu avô era M. G. Silveira. “República” é uma
palavra que tem nove letras que não se repetem e que, no código que meu
avô criou para fazer a contabilidade do armazém, correspondem aos numerais de 1 a 9. Uma vez eu perguntei aos meus irmãos sobre isso e eles
não sabiam da existência desse código. Todos passaram pelo armazém
ajudando o avô, mas só pra mim ele explicou o código. Eu ficava lá, mais
conversando com ele do que ajudando no trabalho. Era o tempo todo discutindo uma coisa, discutindo outra. Foi uma grande convivência. Quando
ele comentava as dificuldades do negócio de um conhecido, dizia: “Ah,
aquilo não vai dar certo, ele faz do apurado lucro”. Era uma maneira simpática de
se referir aos maus negócios que alguém estava fazendo. Ele não gostava de falar
abertamente da decadência do outro. Era uma pessoa sempre pra cima.
AF . Era uma pessoa delicada? Como ele era? MS . Um dado para entendê-lo é saber que ele
não tinha carro. Preferia alugar um quando precisava para fazer isso ou aquilo.
Mas investia em viagens. Viajou muito. Europa, África. Ele e os filhos. Ele com
alguém da família. Só em uma das suas últimas viagens, ele começou a viajar
com a mulher, porque quando um viajava o outro ficava. Era sempre assim. Tem
outra coisa interessante: vovô nunca foi de dar brinquedos de presente. Quando
um filho ou um neto ia viajar, ele dava um envelope na ida ou na volta com uma
contribuição em dinheiro. Ele era uma pessoa muito simples. Uma pessoa que
veio de uma família que, lá longe, teve dinheiro. Perderam quase tudo, e ele foi
ser dono de armazém. Começou com isso. Talvez por causa dessa trajetória, ele
sempre deu muita importância à educação formal dos filhos, que sempre estudaram em escolas boas.
[O que abunda não atrapalha . 2003 . madeira ‘cajacatinga, ipê e jaqueira’ . dimensões variáveis . coleção privada]
AF . Estamos falando de referências fortes no seu trabalho. Você tem referências pictóricas
da história da arte, até por conta de sua convivência com diversos artistas pernambucanos,
na década de 1980, que trabalhavam, fundamentalmente, com pintura. Eu imagino que
conhecer a obra de Bispo do Rosário já foi uma grande abertura. Como você sentiu que a
sua própria vivência, inclusive a familiar, podia informar o seu trabalho como artista? Quando é que isso se tornou claro para você? MS . Vou responder de
uma forma meio enviesada. A origem daquela coleção das 50 peças de
madeira [Coleção I] é muita engraçada, porque surgiu da vontade de fazer
um prendedor de cabelo para dar de presente para uma amiga. Depois que
acabei aquele trabalho foi que eu me dei conta disso. Eu terminei me envolvendo com a idéia de fazer uma peça pequena, fiz 50 delas, e nenhuma
se parece com uma presilha de cabelo. Acho que foi a partir desse
envolvimento concentrado que começou a aflorar, com mais força, a história do engenho, a madeira que eu encontrava abandonada na mata, os
papéis do armazém. Foi aí que tudo começou a se misturar e eu comecei a
ver que a minha vida talvez fosse um grande armazém. Isso foi no final da
década de 1990. De lá para cá, eu comecei a pensar muito nessa questão
do armazém. No início, ficava muito ligado somente à imagem do armazém, e só aos poucos fui me distanciando dela. Os “livros de escrita” que
eu faço são referências aos livros do armazém, onde se anotavam os estoques, se faziam as contas, com toda a espontaneidade. Eu também vou
anotando isso e aquilo nos meus “livros de escrita”. Vou anotando de qualquer modo as coisas do dia a dia, e percebo que a intensidade com que
você registra uma coisa hoje é diferente da que você emprega amanhã. A
tinta hoje está menos porosa do que amanhã. Hoje é grafite, amanhã é
caneta. A questão é: se o que me interessa e me atrai está tão próximo
de mim, pra que é que eu tenho que ir buscar referências distantes? Esse
armazém do meu avô é o que eu faço no meu trabalho. É à estética do
armazém que eu dou importância. Não posso negar. O Nelson Leirner
também tem algo assim. Ele armazena as coisas, cria armazéns. Sinto proximidade do trabalho dele, embora ele seja muito mais urbano, enquanto
minha origem é o campo. Eu fiz um trabalho em que vejo muito a ligação
com Nelson Leirner. Ele se chama O que Abunda não Atrapalha [2003]. No
início, eu achava tudo, nesse trabalho, excessivo, e foi uma amiga que
disse: “não, o que abunda não atrapalha”. O trabalho de Nelson Leirner é
isso pra mim. É um trabalho que abunda e não atrapalha. Enquanto todos
estão limpando, ele vai lá e enche tudo. E é maravilhoso. Ele cria algo que
eu chamaria de excesso simplificado.
AF . Eu acho que muito gente trabalha com essa idéia de colecionar objetos, e todas as
coleções são, evidentemente, diferentes. O momento de seu trabalho onde percebo mais
proximidade com Nelson Leirner é na instalação Roupas de Casa. Nela você coloca uma
casa ao lado da outra, formando uma espécie de vila ou cidade. E Nelson também organiza, de alguma forma, cidades imaginárias. Mas, talvez o que mais o aproxime do trabalho de Nelson seja mesmo a questão do excesso. Você sente alguma pressão para que
seu trabalho seja mais limpo, mais “seco”?
MS . Eu recebi várias
ofertas para a compra de uma, duas ou três peças do Armazém República.
Mas eu não vejo sentido em vendê-lo assim. O trabalho é composto de 100
peças. Quem quiser, tem que levar tudo. Não é só uma questão comercial.
É que as pessoas querem tudo simples. Dizem que uma peça só basta, que
duas bastam. Eu digo que não, que eu quero muitas delas juntas. Eu escuto exaustivamente isso aqui. Mas eu fico tranqüilo. Sei que mais cedo ou
mais tarde eu encontro um lugar, público ou privado, para aquilo ser acomodado. Pode ser até que vá para um lugar e fique guardado, mas tudo
junto. Na verdade, eu acho que algumas peças podem ficar penduradas
enquanto outras ficam armazenadas dentro de caixas, sem ser expostas.
Ficam ali guardadas até alguém decidir abrir e pendurar também. O importante é que o trabalho seja um só.
MA . Essa discussão sobre o Armazém República levanta uma outra questão importante.
Esse trabalho explicita, de uma vez por todas, uma mudança nos procedimentos de
criação com os quais você trabalhava antes. Não se trata mais, aqui, de uma forma única
que você cria e resolve dialogando com a tradição da escultura. Nesse trabalho, você
cede a essa operação de ajuntamento que tanto lhe fascina. E isso também provoca uma
ocupação diferente do espaço, mais relacionada com a tradição da instalação. O público,
obviamente, também passa a se relacionar de uma forma diferente com o seu trabalho.
Ele não mais circunda um objeto nem considera cada elemento que você apresenta
isoladamente, ainda que cada um desses elementos pudesse ser considerado, individual-
mente, uma escultura. Sua produção recente leva o público a considerar o que você faz
em relação ao espaço em que o trabalho está instalado e também em relação ao próprio
corpo do observador. É assim com Armazém República, com Roupas de Casa e com
Bochinche [2003], apenas para citar trabalhos recentes em que essa mudança fica patente.
MS
.
Quando
o
trabalho
é
pensado
isoladamente,
ele possui uma ordem interna, ele conduz o olhar, tem uma regularidade, é
mais contido. Mas eu comecei a ver que as coisas tinham que ser mais
confusas, misturadas, menos óbvias. E para isso, o observador teria que
estar dentro dos trabalhos, fazer parte deles. É interessante que esses
trabalhos vão, eventualmente, ocupar espaços domésticos e podem, portanto, subverter um pouco a ordem da ambientação tradicional e mesmo
da escultura, em que cada coisa tem um lugar definido e onde não existe
desarrumação proposital. O problema surge quando se sabe que muitas
pessoas delegam a arquitetos e decoradores a decisão sobre a maneira
como elas vão se relacionar com os objetos que possuem em casa, abrindo
mão do poder de escolher, de selecionar. Isso me incomoda. Eu gostaria
que a pessoa que vai conviver com o trabalho escolhesse a maneira de se
relacionar com ele. Em vez do agrupamento que eu proponho, o arquiteto
escolhe um, dois, pendura no teto e termina deixando tudo arrumadinho,
mas, de algum modo, desorganizado. E minha intenção, principalmente
com esses trabalhos de agrupamento de peças, é justamente fazer as
pessoas conviverem com a desarrumação, que é uma forma de organizar.
Mesmo que não seja minha atribuição dizer como as pessoas que adquirem meus trabalhos devam colocá-los em sua casa, tenho que reconhecer que, dependendo do caso, isso me causa incômodo.
MA . Essa sua preocupação, ou incômodo, parece que é provocada por uma mudança na
forma como você pensa a relação do trabalho com o espaço. Como você mesmo mencionou, várias de suas peças parecem perder a autonomia que a escultura possui e passam
a fazer sentido somente em grupos e em relação ao espaço onde vão ser instaladas. MS
. Quando eu saio da escultura e busco ocupar o espaço com um excesso
de coisas, não há dúvidas de que é uma posição mais egoísta. Vou ocupar
mais. Vou preencher mais. Vou exigir mais. A escultura é mais simples. Eu
quero que o trabalho incomode mesmo. Quando ele for para uma casa e
quando ele estiver na rua.
AF . Parece-me que a lógica da instalação, esse tipo de ocupação desenfreada do espaço,
é uma maneira de fazer transbordar, de sair do meio onde se espera que a arte esteja, e
ocupar ou invadir a casa do outro, o espaço alheio. Mas esse espaço alheio que ele está
invadindo é um espaço da sociedade contemporânea, para o qual o trabalho traz uma
informação própria do mundo do armazém. O armazém, que é um concentrado de formas visíveis, invade as casas brancas e elegantes. O que é um dado muito curioso. Como
acomodar
isso?
A
pessoa
vai
ter
que
viver
debaixo
do
trabalho.
MS . Quando eu estou fazendo isso, não tenho a intenção de criticar a
arquitetura ou os arquitetos. Eu estou pensando o espaço. Não estou pensando somente o espaço do museu. Eu estou pensando em como a obra se
posta diante de quem tem acesso a ela. Quando eu levei uma enorme
esfera de madeira para a rua, quis confundir as pessoas que estavam passando na calçada. Eu quero fazer um trabalho com vários daqueles carrinhos que vendem CDs pirata e ficam tocando no meio da rua. Estou pensando em botar o nome do trabalho de Plágio. Na verdade, a idéia é que
fossem vários artistas. Cada um produziria um CD plagiando alguma coisa
e sairia pelas ruas tocando o disco em seu carrinho. O meu CD iria plagiar
o som dos galos, das galinhas, dos cachorros. A idéia é criar uma situação
de incômodo mesmo, introduzir um elemento estranho naquele ambiente.
Já pensou na confusão que ia ser o galo cantando ou os cachorros latindo?
Por outro lado, eu tenho muita preocupação com o modo como meu trabalho vai ver visto pelo outro. Se eu vivo disso, e quero viver disso, não tenho
que me distanciar das pessoas. Tenho que pensar nisso. Tenho que pensar
no colecionador, na galeria, no museu. Tenho que pensar nisso tudo.
MA . Mas o fato é que essa preocupação com a recepção do seu trabalho não tolhe seu
processo criativo. Há sempre ruídos que tiram a paz dessa relação com o público.
MS . Há sempre muitos ruídos. Essa preocupação com o espaço começou, na
verdade, já em meados dos anos 90. A exposição que eu fiz na Fundação
Joaquim Nabuco [1994] parecia o samba do crioulo doido, porque tinha
muita coisa. Mas foi uma exposição importante para mim. As pessoas começaram a ver meu trabalho de forma diferente. O uso da galeria da Fundação
começou a mudar também a partir daquela mostra. Antes não podia furar
nem fazer um bocado de coisa. Eu comecei a botar barro nas paredes da
sala. Foi uma confusão. Hoje eu seria mais simples. Não teria feito aquilo.
Mas havia uma vontade de fazer. Talvez fosse uma vontade de incomodar a
instituição. Não sei. Mas tudo aquilo foi importante para eu tomar consciência do que queria.
MA . Há alguns anos, você fez algumas esculturas em alumínio fundido, cujos moldes
eram esculturas feitas em madeira. Você mantinha as formas criadas, mas as transpunha
para uma outra matéria que possui, obviamente, qualidades distintas da madeira: uma é
quente, a outra é fria; uma absorve a luz, a outra a reflete. São esculturas, além disso,
que, na maior parte das vezes, são apresentadas em pares: o exemplar em madeira e o
outro em alumínio. Eu queria que você falasse um pouco sobre a motivação desses
trabalhos e como você os situa na sua obra.
MS . Na época, escolhi o
alumínio porque queria trabalhar com alguma matéria que pudesse conviver com a madeira, mas que também causasse uma sensação oposta à
causada pela madeira, que é uma matéria que atrai o toque. E o alumínio
não convida ao toque, manda você para longe. Muitas coisas surgiram
dessa motivação. Várias vezes fiz o molde a partir de uma peça de madeira
e fundi uma réplica em alumínio. Uma vez, fiquei interessado em fundir
uma forma em alumínio que não possuísse uma contraparte idêntica em
madeira. Então, peguei uma peça de madeira que havia esculpido e mandei fazer dois moldes idênticos. Quando uni os dois moldes, vi que havia
criado uma peça que não existia em madeira, e só aí a fundi em alumínio.
Mas, talvez, o principal elemento desses trabalhos seja mesmo a idéia de
rebatimento, de duplicidade de formas. Anos depois, comecei a ver que aí
já estava presente o meu interesse por espelhos e a razão de eles entrarem
no meu trabalho. Isso é mais evidente nos espelhos que
fazem parte da instalação Roupas de Casa, que rebatem as imagens das
casas, criando duplos delas. Há ainda outro elemento próximo a essa idéia,
de que eu gosto muito, que é o carimbo, outro replicador de imagens.
AF . Desde garoto você conviveu com os mais diversos materiais. Você deve ter sido um
garoto que mexia sempre com as coisas. Mas, a uma certa altura de nossas vidas, há
um momento em que a gente passa a ter uma relação consciente com as coisas, com a
fenomenologia das coisas, com a maneira como elas se comportam em dadas situa-
ções. Uma coisa é essa relação quando se é criança, outra, quando se é adulto. Quando
é que você passou a mexer, conscientemente, com a madeira e com o couro? O que é
a madeira para você? E o que é o cour o? MS . Eu sempre tive uma
proximidade grande com a madeira. Meu pai me presenteava com coisas
que ele olhava e achava estranhas. Na verdade, eu sou um especialista
em coisas inúteis. Na minha casa, nada do que era sério se falava comigo, mas tudo o que era inútil, sim. Eu somente era convidado para participar do que era banalidade. No início, isso me incomodava; hoje eu acho
simpático. Papai sempre me deu as coisas que ele achava estranhas. Se
estava no Piauí e arranjava alguma coisa estranha por lá, trazia para
mim. Encontrava um pedaço esquisito de ferro, trazia para mim. Os presentes dele eram mais em madeira. Ele tinha afinidade com a madeira.
Eu acho que, querendo ou não, ele foi um incentivador do meu trabalho.
Lembro que, numa determinada época, o engenho da família foi destruído.
E as rodas d’água eram todas feitas em cajacatinga, porque era a madeira mais resistente à água. Como eu tinha a mania de preservar as coisas,
papai quis calar a minha boca diante daquele desmonte e disse: “Olhe
aqui, desarmei as rodas e guardei pra você”. Eu trabalhei com essa
cajacatinga por muito tempo. Fiz vários trabalhos para a exposição da
Fundação Joaquim Nabuco, em 1994, e depois de um tempo, acabou
esse material. Aí, ele me informou que eu ainda podia encontrar essa
madeira jogada no campo, carbonizada. E fui atrás. Eram grandes tocos.
Comecei a mexer com essa madeira queimada e descobri que, cavando
três ou quatro centímetros em direção ao centro da madeira, ela estava
preservada.
AF . Essa madeira é sobra de queimada? MS . A região [da cidade de Gravatá, Agreste
de Pernambuco] concentrava muito dessa madeira, talvez pelo seu
excessivo uso na construção de represas. As represas eram feitas com essa
madeira. As rodas d’água eram constantemente refeitas com essa madeira. Depois de um tempo, ela acabou na região e ficaram os tocos
das árvores no meio dos canaviais. Com a queimada dos canaviais, ano
após ano, criou-se uma camada carbonizada sobre os tocos. Apesar disso,
seu interior ainda estava preservado. Além de resistente à água, des-cobri
que a cajacatinga era muito resistente ao fogo. E eram tocos enormes.
Tinha toco que eu cortava em grandes pedaços para levar pro atelier e
enchia um caminhão de madeira. Então, eu comecei a me interessar cada
vez mais pela madeira. De certa forma, eu estava voltando ao engenho
onde eu tinha morado até os cinco anos. Simbolicamente, parecia que
aquela madeira estava esperando alguém para continuar a história dela.
Por muitos anos, eu trabalhei motivado por essa vontade de dar continuidade à vida dessa madeira. Eu tenho, com a madeira, especialmente com
a cajacatinga, essa relação de familiaridade.
AF . É muito grande a cajacatinga? MS . Tem uma, caída na mata desde a época de
infância, que eu fui ver há pouco tempo. Dois cavaleiros sentados em seus
cavalos, um de um cada lado do tronco, não conseguiam ver o outro. São
imensas. Eram a atração do engenho. E na época que eu comecei a trabalhar com a cajacatinga, despertei uma memória olfativa fantástica da minha infância. Quando a plaina passava na cajacatinga, eu me lembrava do
homem que fazia uns rolinhos de madeira com que eu brincava no engenho. Foi muito interessante porque, quando eu co-mecei a lixar, percebi,
pelo cheiro, que eu realmente conhecia aquela madeira, e fui tendo idéias
pro meu trabalho. Por meio dessa madeira, de algum modo, eu recuperava
o engenho.
MA . É interessante que o cheiro da cajacatinga remeta às suas memórias de infância,
porque eu sempre vi, nas formas de vários de seus trabalhos em madeira, referências a
brinquedos populares. Esses brinquedos que a gente faz e brinca quando é criança. Esses
ajuntamentos que não servem pra nada, a não ser como demonstração da curiosidade
infantil. Não sei se seria correto dizer que, associada ao cheiro da cajacatinga, estaria não
só uma memória olfativa, mas também uma memória lúdica. MS . É provável.
Eu não tinha brinquedos. Eu vivenciava brincadeiras. Lembro que eu e
meus irmãos fazíamos bois de barro durante um dia inteiro, montávamos
aquele rebanho enorme e, no final do dia, “matávamos” todos os bois,
talvez como um acerto de contas de brigas de irmãos. No dia seguinte,
começava a história novamente. Lembro também que, quando chovia muito, a gente fazia “represas” com barro, para conter as corredeiras formadas
pelos declives do terreno. Quando alguém brigava com os outros, estoura-
va a sua represa, a água liberada estourava a dos outros e você tinha que
correr pra não apanhar. Também fazíamos embarcações com troncos de
bananeira para brincar no rio e, no final, destruíamos tudo, já virava outra
coisa. Tinha uma relação forte com as brincadeiras. Não tinha esse culto ao
brinquedo que existe hoje em dia, era tudo muito dinâmico. Talvez isso
tenha influenciado meu trabalho, principalmente o gosto de fazer as coisas, embora eu também goste de incorporar, no meu trabalho, o que os
outros fazem. Eu gosto do olho do outro. Do fazer do outro. Eu não tenho
que fazer tudo sozinho, também me agrada ter, no meu trabalho, o que o
outro faz.
AF . Mas você encomenda ao outro aquilo que você quer ou você simplesmente se apropria do trabalho já feito do outro? MS . Geralmente eu encomendo, mas o
resultado, às vezes, toma rumos que não estavam planejados. Eu esboço
alguma coisa e vou trabalhando conjuntamente. Em algum momento, o
trabalho que era feito com madeira chegou a ser quase todo feito por
assistentes. Eu apenas orientava, acompanhava. Hoje diminuiu muito a
produção de peças em madeira porque eu mesmo voltei a fazer quase tudo
pessoalmente. Embora goste do olhar do outro, com a madeira estou gostando de trabalhar eu mesmo novamente.
MA . Há uma questão técnica que gostaria de explorar. Você aproveita as formas que o
bloco de madeira possui naturalmente para criar uma peça ou você ignora as formas
naturais e descarta o que for preciso para criar o que você quer? MS . O que eu
percebo é que quando eu respeito demais a madeira, ela me domina. Eu
acho que o resultado é melhor quando a ação sobre ela é meio bruta. Logo
quando eu comecei a trabalhar com essas grandes toras de madeira, elas
me impressionavam pela sua dimensão, pelo peso, por tudo. Depois eu vi
que eu não podia pensar nisso. No momento em que estou criando as
formas, o melhor é não ter respeito por nada. Mas o processo, em geral,
tem muito de intuição, não há um planejamento de onde ou de como eu
vou cortar a madeira. O que há, em algumas peças, é um cuidado extremo
por causa da fragilidade da peça que estou criando. Em peças mais recentes, o desejo é trabalhar com madeira como não se trabalha como madeira, no limite da resistência dela. São peças extremamente frágeis que, se
quebrarem, não dá pra recuperar. São peças finas e pontudas, formas que
você encontra em vidro ou por-celana, mas que eu quero trabalhar na
madeira. Talvez seja uma vontade de confundir os materiais.
AF . Com isso você dá a peça uma aparência de algo que não parece madeira. MS . Ou que
pelo menos a forma de intervenção, a forma de ação sobre a madeira seja
diferente da que normalmente se aplica a ela. Nessas peças, em particular,
eu mesmo preciso fazer todo o processo de corte da madeira, porque não
consigo verbalizar para os meus assistentes o que o meu olho está querendo.
AF . As madeiras que você usa são muito diferentes umas das outras? MS . São muito
diferentes. É engraçado que, embora trabalhe com madeira, eu não sou
um bom conhecedor da madeira. Não sou especialista em madeira. Mas a
origem da madeira me interessa. Eu preservo o meio ambiente sem levantar a bandeira do movimento ecológico. Porque as pessoas usam desenfreadamente a madeira e abandonam tudo no meio da rua. Eu não
compro madeira. A madeira que eu uso é achada. É lixo urbano ou rural.
MA . É curiosa essa idéia de se apropriar de coisas inúteis para fazer outras que também
não têm nenhuma função utilitária. Talvez seja na Coleção I, aquele conjunto de 50
pequenas peças, que essa idéia de inutilidade fique mais evidente. Mas há também uma
outra questão que, no meu entender, é muito presente no seu trabalho, que é a idéia de
movimento. Algumas esculturas chegam a ter rodinhas, outras são feitas de peças articuladas que se movem se alguém toca nelas. Nas de alumínio, poderíamos dizer que há um
movimento de transferência das formas e das características das peças de madeira usadas como modelo para as peças de metal. Mas creio que é nas esferas de madeira que
você fez que essas duas características do seu trabalho se combinam e se condensam da
forma, talvez, a mais radical. A esfera é uma forma indecifrável; isoladamente, não tem
função alguma. Ao mesmo tempo, pode ser entendida como uma metáfora da idéia de
movimento. As esferas são o ápice da “inutilidade” de seu trabalho. O que me confunde
um pouco é que, logo após fazer as esferas, você faz o trabalho Roupas de Casa, que eu
acho que promove uma ruptura ou pelo menos cria um hiato no seu trabalho. Eu queria
que
v ocê
falasse
um
pouco
sobre
essa
passagem.
MS . Esse trabalho [Roupas de Casa] é feito de metal e couro. A idéia dele
vem de alguns anos antes, quando fiz um trabalho que era com-posto de
duas barras de alumínio fundido, penduradas do teto por cordas de couro
trançado, o mesmo produto que é usado por vaqueiros. Roupas de Casa foi
confeccionado em Cachoeirinha, cidade do Agreste de Pernambuco onde
fui levado por meu pai e onde me impressionei com a divisão de trabalho
que existe na produção de arreios, montarias, etc. É impressionante aquilo. Daria para um sociólogo fazer um estudo. Quem corta o couro é uma
pessoa, quem o trança é outra, quem faz uma determinada peça de metal
já é uma terceira, e assim por diante. E é engraçado porque eu lembro
que, quando criança, eu não pegava no couro, principalmente quando era
couro de cabra. Eu tinha aversão ao couro de cabra. À cabra e ao couro.
AF . Por que você não gosta de cabra? MS . Não sei, mas depois de um tempo, comecei
a testar o couro de cabra e a provar a carne da cabra para quebrar essa
aversão. Aí, eu comecei a perceber que o couro tinha a maleabilidade que
eu queria para trabalhar e que tinha também um cheiro específico que, se
inicialmente eu não gostava, terminei por me acostumar. Além disso, essa
aproximação com a cabra era, inconscientemente, uma ou-tra maneira de
eu estar me ligando à família, aos hábitos alimentares da família, do lugar
de
onde
venho.
Mas
da
carne
continuo
não
gostando.
MA . E qual foi a motivação desse trabalho, o Roupas de Casa? MS . Por um lado, ele
surge por causa dessa relação de proximidade com o couro, que eu tinha
desenvolvido um pouco antes. Por outro lado, por causa da observação que
eu passei a fazer das acomodações dos trabalhadores sem-terra ao longo das
estradas. Eu não via essas acomodações dos sem-terra como casas; para
mim, eram apenas estruturas cobertas. E o que eu estava querendo fazer com
o couro era exatamente isso: estruturas cobertas que não fossem exatamente
casas. Essas foram as razões para eu começar o trabalho, para construir aqueles objetos todos. Mas havia também a questão da linha. Es-se é outro ponto
pelo qual eu sempre me bati e me bato até hoje: como trabalhar, conjuntamente, as linhas orgânicas e as linhas mais precisas. O confronto da imprecisão com a precisão. O quente e o frio. Quando eu vi o metal sendo trabalhado
pelos artesãos de Cachoeirinha, percebi que as mar-cas do processo ficavam
nas peças que eles faziam. Não era aquela coisa absolutamente precisa em
que você não vê o encaixe de uma parte com a outra. Você vê os encaixes.
Você vê as sobras da solda, mesmo após a peça ser polida. Mas a relação com
os artesãos não se resolveu de imediato. Para eles, as articulações das estruturas de aço podiam ser resolvidas dobrando as hastes e fazendo muito menos pontos de solda. Mas assim a peça ficaria mais arredondada, com mais
curvas. Mas eu queria que as articulações das hastes de aço ficassem nítidas,
aparentes. Por fim, veio o couro como a cobertura dessas estruturas metálicas
que
eu
mandei
fazer.
MA . Eu acho que esse é o trabalho escultórico, talvez, mais bem definido que você já fez,
em termos representacionais. As formas das casinhas são identificáveis, mesmo quando
se afastam da idéia que usualmente se tem de uma habitação. MS . O que é
uma ambigüidade que me agrada muito. Uma coisa que me motiva são
esses encontros. São casas que não são exatamente casas. Quando eu
pensei em introduzir aqueles espelhos ovais na instalação, eu pensei ne-les
como elementos tradicionalmente ligados à casa. Elemento ligados à idéia
de casa que refletissem objetos que não eram exatamente casas.
AF . Essa instalação me faz pensar no modo como os diferentes elementos que compõem, por vezes, um único trabalho, se relacionam entre eles. Algo semehante a uma
[De Luxe . 2002-2004 . detalhe . madeira ‘imbuia’ . dimensões variáveis . coleção Celma Albuquerque Galeria de Arte]
sintaxe dos seus trabalhos. Assim como a Coleção I e o Armazém República, Roupas
de Casa é feito de elementos que, mesmo se dessemelhantes do ponto de vista formal, são articulados do ponto de vista organizacional. Elementos diferentes que se
justificam, no conjunto do trabalho, pela amarração que você promove entre eles.
Todos esses trabalhos são formados por elementos distintos que são aproxi-mados,
formando uma coisa única ou, alternativamente, são unidades que, embora fragmentadas, ainda mantêm uma dose de articulação entre suas partes. Em Rou-pas de Casa,
essa característica se apresenta de uma maneira, talvez, ainda mais complexa do que
naqueles outros trabalhos, mesmo que as suas formas sejam mais familiares. Esse trabalho promove a junção do couro – matéria profundamente orgânica que serve de revestimento das casinhas, quase como se fosse sua pele – com as estruturas metálicas que lhes
dão sustentação. E são essas mesmas estruturas que aparecem como imagens desenhadas nos espelhos, como traços. São também essas estruturas, por fim – dessa vez cobertas com couro –, que estão refletidas nos espelhos. Espelhos que não são meramente
superfícies reflexivas, porque estão emoldurados como espelhos que se encontram em
ambientes domésticos, como os das nossas casas. Cada elemento que compõe esse trabalho é, portanto, apresentado de diferentes maneiras, promovendo uma série de transposi-
ções curiosas. E, no seu conjunto, o trabalho é feito justamente dessa articulação entre
elementos tridimensionais e bidimensionais. Mas gostaria de continuar a explorar um pouco mais o seu processo de criação. Foi uma única pessoa que executou as casinhas? MS .
Foi
tudo
feito
por
uma
pessoa que trabalhava o aço e por outra que trabalhava o couro. Foi muito
bom trabalhar com eles, e é interessante pensar como foi essa relação, a
forma como eu interferi no processo de trabalho deles, porque o que eles
fazem normalmente em Cachoeirinha são objetos completamente diferentes dessas peças que produziram pra mim. A primeira estrutura feita pela
pessoa que eu contratei tinha não só a aparência de uma casa, mas tinha
telhado, porta, tudo. Ele me mostrou o resultado e disse, bastante satisfeito: “Marcelo, eu acrescentei mais umas coisas na estrutura que você
encomendou. Deu muito trabalho, mais ficou melhor”. Quando eu olhei os
caibrozinhos de cima do telhado, as divisões todas da casa, vi que tinha
que interferir mais no processo. Tive que dizer: “Eu sei que o trabalho foi
muito grande para fazer assim, mas eu quero tirar esses elementos que
você colocou”. A cada vez que eu fazia o desenho da estrutura que eu
queria, tinha que dizer para ele fazer com o mínimo de linhas necessárias
para viabilizá-la. Eu não queria nada que fosse excessivo. Se pudesse
resolver com quatro linhas, não queria que resolvesse com seis. Foi aí que
ele compreendeu o que eu estava querendo e embarcou na história.
AF . Você mostrou o resultado para os moradores da cidade? MS . Fiz uma exposição
relâmpago. Demorou apenas uma hora e meia, na praça principal da cidade. Eram 41 casinhas. Mas não havia os espelhos lá. Foi curioso ver a
reação interessada de outros trabalhadores que também faziam objetos
de aço e couro, e do povo da cidade, ao resultado do trabalho que havia
sido desenvolvido ali. Na verdade, fazer esse trabalho em Cachoeirinha
tem também esse aspecto, a vontade de sair do atelier e descambar para
uma outra cidade, mudar o ambiente do trabalho e da exibição da obra.
Existe essa vontade de trocar informações e abrir o trabalho para os outros, misturar tudo, ver o que surge desse contato. Essa experiência faz
parte de um projeto maior, o Correcaminhos. Eu havia tido uma experiência anterior de trabalhar em um contexto fora do meu atelier, em
Garanhuns. Cachoeirinha foi o segundo momento desse projeto.
AF . E essa troca de informações afetou de alguma maneira o seu trabalho? MS . Acho
que a experiência de Cachoeirinha consolidou a idéia de incorporar ao
meu trabalho o que, antes, eu considerava apenas como parte do seu
processo. Com Roupas de Casa, passei também a entender melhor a ligação do uso de espelhos com a fundição de metais. A importância da questão de copiar, de reproduzir as coisas a partir de uma matriz, seja uma
imagem ou um processo de trabalho. Contraditoriamente, com ele também voltou, com mais ênfase, a vontade de trabalhar mais com as mãos,
algo que era muito forte quando eu brincava na infância. Quando eu era
pequeno, as pessoas ficavam zombando de mim porque eu não conseguia
parar as mãos por mais que uns segundos. Eu tinha uma tia que trabalhava com tecido e, quando eu chegava na casa dela, ficava cortando as
sobras dos tecidos que ela usava. Ela chegava a ficar impa-ciente de tanto
que eu ficava cortando as sobrinhas de tecido. Com o passar do tempo, eu
passei a me controlar mais, mas o gosto de traba-lhar com a mão ainda é
muito forte.
AF . Madre Tereza de Calcutá dizia que a mais bela distração é o trabalho. É uma maneira
de você se esquecer do entorno, de ficar debruçado sobre uma só atividade. É uma
maneira de ter prazer na manipulação das coisas, seja fazendo um corte, uma dobra, um
encaixe. É bonito você falar pra pessoa que solda as estruturas das casinhas que você
quer uma coisa mais despojada. Mas que você também quer que ele não dobre o aço.
Que ele tenha o trabalho de cortar e depois soldar o metal. É despojado, mas, ao mesmo
tempo, não é o método mais simples.
MA . E interessante também que isso seja algo tão crucial para você e que não fique
visível. A estrutura de metal fica totalmente escondida sob o couro. MS . Eu tenho um
bocado de coisas escondidas. Eu gosto das coisas escondidas. E também dos
vazios. Eu tenho um outro trabalho [De Luxe, 2002-2004] que são pequenas
caixas feitas de uma madeira que tem um aroma muito forte. Eu pensei
muito se devia deixar essas caixas vazias ou preenchê-las com alguma coisa.
Primeiro, achei que, se a idéia do trabalho era guardar o cheiro nas caixas,
elas não deveriam ter nada mais do que o cheiro. Por outro lado, se eu
deixasse elas vazias, as pessoas iriam terminar guardando pequenos objetos
nas caixas. Para solucionar a questão, coloquei, dentro das caixas, blocos
feitos com a mesma madeira de que elas tinham sido feitas, ocupando todo
o seu espaço interno. Cheguei à conclusão de que, nesse caso, como em
muitos outros, eu tinha que preencher o vazio.
CRONOLOGIA
Joana D’Arc Lima
Marcelo Luiz Silveira de Melo nasce em 1962, em Gravatá, cidade serrana de Pernambuco,
situada a 85 km do Recife. Passa a sua infância no engenho Amora Grande, de propriedade de
seus pais. Terceiro filho de uma família de seis irmãos e considerado “o curioso” da casa,
aprende, desde menino, a reinventar “coisas” e soluções para os desafios da infância. Ganha de
seu pai presentes inusitados, pequenos achados que ficam retidos em suas lembranças e que se
tornam referências para o universo lúdico patente em muitos dos seus trabalhos. Em 1979,
transfere-se para o Recife, juntamente com um de seus irmãos.
A década de 1980, no Brasil, é marcada, nos campos social e político, pela transição para um
regime democrático, a qual ganha impulso inequívoco a partir do movimento pela realização de
eleições diretas para Presidente (“Diretas Já”). No âmbito das artes visuais, há uma visível
revitalização da pintura e a constituição de redes de relações construídas por deslocamentos
territoriais (reais e virtuais) de artistas e de intelectuais, isoladamente ou em grupos. No Recife,
essas mudanças se refletem na criação das Brigadas Portinari, Gregório Bezerra e Henfil (1982)
– coletivos artísticos comprometidos com as mudanças políticas em curso –, na realização da
Primeira Exposição Internacional de Arte em Outdoor/Artdoor (1981), no Movimento de Arte
Tátil (1982), no Movimento de Arte e Cultura do Nordeste (1983), no surgimento dos grupos
Astrobelo (1982), Formiga Sabe que Roça Come, Brigada Compressora, Brigada Ecológica,
Carasparanambuco (1986), Atelier Coletivo de Olinda (1989), entre outros. Nessa época, os
Salões de Arte no Museu do Estado de Pernambuco – MEPE e as mostras realizadas no Museu de
Arte Contemporânea de Pernambuco – MAC, em Olinda (com destaque para o Salão dos Novos),
dão visibilidade a uma nova geração de artistas. A Galeria Metropolitana Aloisio Magalhães
(atual Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães – MAMAM), a Galeria Artespaço e espaços
informais
de
exposição
contribuem
para
aquecer
o
circuito
local.
Os anos de 1982 a 1985 marcam o início da formação de Marcelo Silveira. Freqüentar a
Oficina Guaianases, em Olinda, permite o estabelecimento de contatos com colegas e,
conseqüentemente, participar ativamente dos debates próprios do meio em que começa
a se inserir. São importantes, nesse período formativo, o convívio e a interlocução com a
artista mineira Liliane Dardot, à época residindo em Olinda e advogando a criação artística como expressão livre das regras “acadêmicas”. Por meio desse contato, Marcelo
Silveira se aproxima do trabalho e dos escritos de Amílcar de Castro. O convívio com o
jovem artista plástico Rinaldo também marca essa fase inicial de sua vida profissional e
social na cidade do Recife.
Em 1985, ingressa no curso de Educação Artística na Universidade Federal de Pernambuco
– UFPE, sendo marcante o contato com o professor e artista José de Barros, que fazia do
espaço formal da universidade um ponto de encontro entre jovens que queriam se expressar por meio do “fazer” artístico. As conversas se estendem ao seu atelier particular,
transformado em laboratório de experimentações, questionamentos e troca de idéias sobre os materiais, os processos e os resultados obtidos por seus alunos. Simultaneamente,
Marcelo Silveira constrói um atelier de trabalho em Gravatá (Arte & Cia), espaço de criação
também aberto às variadas manifestações culturais locais e a vivências artísticas com
crianças da região. Embora sem financiamento, essas atividades se estendem por um
período de cinco anos, tendo sido cruciais para a sua formação como artista e como
professor. Essa experiência é documentada no vídeo Brincadeira é Coisa Séria (1990),
realizado pela ONG Auçuba Comunicação e Educação, e depois transformada em exposição de mesmo nome, no Espaço Cultural da Biblioteca Central da UFPE, durante a Reunião
Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em 1993.
Ainda em 1985, viaja a São Paulo por ocasião da XVIII Bienal de São Paulo, ano em que
a curadora Sheila Leirner reúne, em um longo corredor do Pavilhão da Bienal, uma seleção
da pintura nacional e internacional contemporânea, por ela denominada de “A Grande
Tela”. Nessa viagem, impressionam-lhe muito os trabalhos dos artistas Emmanuel Nassar
e Nuno Ramos. A participação em quatro Festivais de Inverno da Universidade Federal de
Minas Gerais (1985, 1987, 1988 e 1989) é marcante em sua formação. O contato com
outros artistas, com críticos de arte e professores vindos de várias partes do país amplia
o seu repertório sobre a história da arte e o seu conhecimento do campo das artes
plásticas que então se redesenhava no país, além de diminuir a sensação de isolamento
de outras regiões brasileiras. As vivências nas oficinas e nos ateliers dos Festivais de
Inverno possibilitam a investigação artística com novos materiais e, a partir daí, uma
mudança de procedimentos construtivos, sinais de uma inquietude com os limites do
espaço bidimensional e do início de experiências com esculturas e objetos.
Participa do XIV Salão dos Novos (1985), no MAC, e, em 1986, realiza, em Gravatá, no Arte
& Cia, exposição com trabalhos em técnicas diversas. Em 1987, está presente no Salão de
Arte Contemporânea de Pernambuco, no Centro de Convenções de Pernambuco, e integra
o grupo Carasparanambuco, formado por mais sete artistas: Alexandre Nóbrega, Eduardo
Melo, Félix Farfam, João Chagas, José Patrício, Mauricio Silva e Rinaldo. Todos em início de
carreira, buscando inserção no campo das artes plásticas, e criando espaços e eventos
artísticos na cidade, afirmam-se como integrantes de um movimento em diálogo com as
questões da cultura contemporânea a partir de seu local de origem. Freqüenta, entre 1988
e 1994, o Quarta Zona de Arte, atelier coletivo comprometido com a produção contemporânea, fundado, entre outros, pelos artistas Fernando Augusto, Flávio Emanuel, José Paulo,
Márcio Almeida e Maurício Castro, pelo ilustrador e cartunista Humberto Araújo e pelo
comunicador visual Aurélio Velho.
Em 1988, Marcelo Silveira inicia experimentações com madeira. Pequenos pedaços da
matéria passam a integrar superfícies que compõem as suas obras bidimensionais e, já
nesse momento, os primeiros objetos tridimensionais. Participa, nesse ano, do 7º Salão
de Arte do Pará, em Belém, da 7ª Mostra de Gravura, em Curitiba, e da 7ª Mostra do
Desenho Brasileiro, também em Curitiba. Em 1989, participa do Salão de Arte Contemporânea de Pernambuco, no MEPE, inscrito na modalidade Pintura Mural Coletiva. Em 1990,
realiza uma exposição individual, no Itaú Galeria, em Belo Horizonte. Nessa mostra, Marcelo Silveira apresenta o seu Engenho de Objetos, reunião de vinte e cinco trabalhos
realizados entre 1989 e 1990. Utiliza, como matéria-prima desses objetos, resíduos encontrados no engenho de seu pai, em Gravatá, fragmentos de madeira achados em can-
tos diversos e reunidos por ele e, por fim, pedaços de madeira que passa a ganhar
daqueles que sabem de seu interesse pelo material. O procedimento, nessa fase, se
pauta por uma “atitude escultórica” de negar, nos objetos criados, o sentido funcional de
origem daquela matéria, transformando-a para reintegrá-la em um ambiente que possibilite o aflorar de múltiplos e inusitados significados. Ainda em 1990, vê a exposição de
Arthur Bispo do Rosário, no Museu da Pampulha, em Belo Horizonte, a qual vai marcar
profundamente a sua maneira de ver a arte e o trabalho do artista.
Em 1990, forma-se em educação artística pela UFPE e, no biênio 1991-1992, viaja pela
Europa e o norte da África, onde assume uma atitude nômade, percorrendo territórios
diversos e recolhendo fragmentos e imagens de culturas “novas” e “arcaicas”. Em 1991,
realiza uma mostra individual em Braga, Portugal, na BeloBelo Galeria. Fixa moradia por
três meses em Barcelona, onde freqüenta a Escola Massana de Artes. Essa experiência
permite desenvolver um trabalho a partir de sobras e “restos” de madeira e ferro, incorporando-os ao próprio espaço de seu atelier na escola. De volta ao Brasil, faz a exposição
“Torres, Construções e História de um Templo” (1993), na Itaú Galeria, em Vitória, onde
mostra vinte peças em madeira e ferro com jogos de encaixe criados a partir de uma
coleção de pedaços achados de madeira e nas quais usa unicamente lixas e cola. Explora,
nesses trabalhos, o sentido vertical das construções e se reporta a um tempo em que o
homem construía as próprias habitações e os objetos que faziam parte do espaço ocupado.
Com a instalação Paisagem Estranha (1994), montada na Galeria Vicente do Rego
Monteiro, (Fundação Joaquim Nabuco), no Recife, o artista surpreende o público intervindo diretamente no espaço expositivo. Exibe pequenos objetos formados com
arame que se assemelham a desenhos e esculturas feitas em madeiras diversas (amarelo, cajacatinga, cedro, mogno e outras) que deixam revelar seus sulcos e fibras,
complementando-as com a inserção de pedaços de ferro oxidado e com desenhos
entalhados. A composição dos objetos, segundo Marcelo Silveira, estava associada à
estrutura das casas populares e à disposição de ex-votos em capelas. No mesmo ano,
é selecionado para o 14º Salão Nacional de Artes Plásticas, no Rio de Janeiro, onde
exibe uma seleção de 70 objetos em metal, feitos originalmente para a instalação
Paisagem Estranha, os quais, segundo o artista, fazem parte de um novo momento
de sua carreira, em que o ferro deixa de ser somente um elemento da composição do
objeto e passar a ser, ele mesmo, a única matéria de que é feito. Ainda em 1994,
expõe numa mostra coletiva realizada na cidade do Porto, em Portugal, denominada
“Memória da Amazônia: Etnicidade e Territorialidade”, juntamente com o artista
recifense Flávio Emanuel. Participa do 51º Salão de Arte Contemporânea do Paraná,
em Curitiba.
Em 1995 e 1996, Marcelo Silveira dá seguimento às suas atividades no território da arteeducação, ministrando oficinas de criação tridimensional em diversas instituições culturais e universitárias brasileiras. Esse período é marcado pela pesquisa formal com a
cajacatinga – madeira nobre em extinção encontrada em topos parcialmente carbonizados, abandonados no engenho da família. É selecionado para o II Salão UNAMA de Pequenos Formatos, em Belém (1996), promovido pela Universidade da Amazônia. Juntamente com outros artistas de Pernambuco e da Paraíba (Alexandre Nóbrega, Alice Vinagre, Betânia Luna, Dantas Suassuna, Eudes Mota, Luis Santos e Rodolfo Mesquita), é
escolhido para integrar, com seus trabalhos, o III Salão de Artes Plásticas do Museu de
Arte Moderna da Bahia, em Salvador. Participa, ainda em 1996, do evento Art Brésil, no
Museu Nicolas Sursock, em Beirute, Líbano, da mostra “Artes Plásticas Contemporânea
Brasileira” (com curadoria da arquiteta Janete Costa e a presença dos artistas Aprígio,
José Paulo, Marianne Peretti e do designer André Lasmar) e de exposição coletiva na
Neuhoff Gallery, em Nova York, Estados Unidos.
Na segunda metade da década de 1990, o efervescente cenário cultural local (capitaneado pela produção musical ligada ao movimento Mangue Beat) influencia a produção
artística do país e é contaminado por diversas linguagens internacionais contemporâneas. Na música, no cinema e nas artes visuais, surgem novos grupos de artistas e ateliers
coletivos – Molusco Lama (1994), Carga e Descarga, Camelo (1996), Sub-Graf e Telefone
Colorido (1997), entre outros, renovando o meio cultural-artístico do Recife. São criados
o Instituto de Arte Contemporânea – IAC (1996), a Galeria de Arte Capibaribe (1998),
ambos ligados à UFPE, e o Instituto de Cultura da Fundação Joaquim Nabuco (1998), que
dinamiza as atividades expositivas já desenvolvidas pela instituição e organiza cursos e
debates sobre arte moderna e contemporânea. É aberto o Escritório de Arte Amparo 60,
posteriormente transformado na Galeria Amparo 60. Com a mostra “Ver & Verso
Pernambuco”, é inaugurado, em 1997, o MAMAM, reunindo obras de mais de 60 artistas,
incluindo esculturas de Marcelo Silveira.
Em 1998, Marcelo Silveira apresenta, na 16ª edição do Salão Nacional de Artes Plásticas,
realizado no Rio de Janeiro, o trabalho Cajacatinga, resultado das pesquisas formais com
a madeira. Os elementos que compõem Cajacatinga assemelham-se a vocábulos de uma
escrita desconhecida ou inventada, feitos de pedaços de madeira cortada e lixada em
formas diversas. Ainda nesse ano, integra a coletiva “Ceará e Pernambuco - Dragões e
Leões”, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza. Também realiza a
mostra “Dos Presentes do meu Pai”, na Galeria de Arte Marina Potrich, em Goiânia, e na
Galeria Ária, no Recife. Nessa exposição, os objetos em madeira adquirem formas orgânicas, são maleáveis e encaixados, deixando expostos, para os olhos do espectador, os
pinos, os furos e as estruturas de encaixe que lhes dão forma. Embora lixados, não
apresentam um acabamento excessivo, revelando os veios, a cor e a textura natural das
madeiras usadas. No final de 1998, Marcelo Silveira é premiado no V Salão de Artes
Plásticas da Bahia, realizado no Museu de Arte Moderna, em Salvador.
O final da década de 1990 e o início da seguinte são marcados, no Recife, por debates
institucionais sobre a dicotomia internacionalismo versus regionalismo, onde fica patente
a capacidade singular que a produção local tem de fundir, e não opor, estes termos. Se o
MAMAM, com exposições de Jean Michel Basquiat e Joseph Beuys, entre outras, provoca
conexões entre os circuitos local e internacional, a Fundação Joaquim Nabuco, por meio
de uma programação de cursos, palestras e da participação em projetos de mapeamento
da produção artística regional (Projeto Nordestes) e nacional (Programa Itaú Cultural
Rumos Visuais), atrai para a cidade vários críticos, historiadores, artistas e curadores,
promovendo circulação e troca de informações e dando visibilidade à produção cultural
da cidade. Parcerias institucionais permitem intercâmbios interestaduais como a mostra
“Arte Contemporânea [2000-1]” (1999), realizada no MAMAM e no Museu de Arte Moderna da Bahia, a qual inclui trabalhos de Marcelo Silveira. Nesse ano, o artista é premiado
no 3º Salão de Escultura do Paraná, em Curitiba, participa da exposição que integra o
Projeto Nordestes, no Sesc Pompéia, em São Paulo, e também da coletiva “O Luar do
Sertão”, na Galeria Nara Roesler, também em São Paulo, depois apresentada no Escritório
de Arte Amparo 60, no Recife.
Em 2000, Marcelo Silveira realiza sua primeira individual em São Paulo, novamente na
Galeria Nara Roesler. Essa exposição revela procedimentos distintos com o uso da madeira
e a introdução de novos materiais em seus trabalhos, tais como o alumínio e o couro.
Apresenta ainda, nessa ocasião, uma coleção de 50 pequenos objetos de madeira que
formam um único trabalho (Coleção I, 1999), anunciando a contigüidade, em sua obra,
dos campos da escultura e da instalação. Desativado desde 1993, a retomada do Salão
Pernambucano de Artes Plásticas, em 2000 – organizado sob o tema Arte Atual Brasileira
e realizado no Espaço Cultural Malakoff, no Recife –, mobiliza o meio artístico local, além
de retomar questões como a formação de públicos para a arte contemporânea. Marcelo
Silveira tem seus trabalhos selecionados e premiados nesse Salão.
Participa, ainda em 2000, de várias exposições coletivas, destacando-se “Esculturas Brasileiras”, realizada na Pinacoteca do Estado de São Paulo, a “1ª Bienal Internacional de
Artes Plásticas de Buenos Aires”, “Investigações: Rumos Visuais 2”, no Itaú Cultural, em
São Paulo, e “Desconcertos da Forma”, nas Galerias Itaú Cultural de Belo Horizonte,
Brasília e Penápolis. Integra a coletiva “O Lápis e o Papel (sobre a liberdade, o despojamento
e o sentido)”, na Galeria Nara Roesler, em São Paulo, que aproxima o seu trabalho
escultórico da produção gráfica de outros artistas contemporâneos, tais como Adriana
Rocha, Alexandre Nóbrega, Artur Lescher, Maria Teresa Louro, Nina Moraes e Tomie Ohtake.
Nesse mesmo ano, é criado um espaço coletivo de arte que movimenta a cena artística e
cultural do Recife, o Ateliê Submarino.
Inicia pesquisa e vivência com artesãos do interior de Pernambuco, com o projeto
Correcaminhos, que consiste no deslocamento temporário do seu atelier para cidades do
interior pernambucano e na ampliação do círculo de “intercessores” da obra. Essas experiências começam na cidade de Garanhuns, em Pernambuco. Realiza, em 2001, a exposição “Entre a Surpresa e o que se Espera”, na Galeria Amparo 60, no Recife. Em um dos
ambientes da mostra, apresenta uma série de peças que aproximam seu trabalho
escultórico do campo da expressão gráfica, além de adotar, mais uma vez, o couro como
elemento construtivo, incorporado não somente por sua maciez e flexibilidade, mas também por possuir cheiro forte e distinto. Em outra sala da galeria, exibe trinta esferas de
diâmetros variados feitas de madeira desbastada (cajacatinga, baraúna e jaqueira). Entalha, em baixo relevo, nessas esferas, símbolos usados nos ferros de marcar o gado,
apropriando-se de uma escritura feita com as iniciais de várias gerações de famílias proprietárias de rebanhos e que representam, portanto, ciclos de vida humana. A maior
dessas esferas é colocada em pontos de grande circulação de pessoas nas ruas do Recife,
mudando de localização a cada dia. As reações do público à presença da esfera são
documentadas em fotografias e expostas na galeria.
Outras exposições são realizadas em 2001. Faz mostra individual no Museu de Arte Contemporânea do Paraná, em Curitiba, onde exibe esculturas trabalhadas em madeira, alumínio e couro. Integra a mostra “Nordeste Brasileiro: Matriz Popular e Consciência Construtiva”, no Museu do Estado do Pará, em Belém. Expõe, como artista convidado, na
mostra coletiva “Casa Coisa”, realizada pelo Ateliê Submarino, no Recife, onde cria ambiente que problematiza o tema do trabalho doméstico: Quarto de Empregada. Dando seguimento ao processo de incorporação de novos procedimentos e materiais ao seu trabalho, Marcelo Silveira apresenta, na coletiva “Em Sete Tempos” (2002), na Galeria Amparo
60, no Recife, uma primeira versão do Armazém República, uma coleção de objetos de
vidro já existentes, que o artista recolhe e arruma numa estante, construindo combinações e agrupamentos que sugerem relações inusitadas entre o grande e o pequeno, o
opaco e o transparente, o leve e o pesado. Ainda em 2002, participa do Projeto Faxinal das
Artes, em Faxinal do Céu, Paraná. No 47º Salão Pernambucano de Artes Plásticas (2002),
na então desativada Fábrica Tacaruna, no Recife, realiza o trabalho Combinação Tacaruna,
malha trançada de tiras de couro de cabra que cria e demarca um volume vazio e cujo
tamanho varia de acordo com o espaço onde ela é colocada.
Por meio do seu projeto Correcaminhos, realizado em 2000, Marcelo Silveira conhece, em
Cachoeirinha – cidade distante 170 km do Recife –, artesãos que trabalham o aço e o
couro para confeccionar determinadas partes de selas e arreios de montaria, compondo
uma rígida divisão de trabalho. Roupas de Casa, título da instalação que integra exposição individual que faz na Galeria Nara Roesler, em 2003, resulta dessa vivência do artista,
consistindo de “esculturas-casas” concebidas por ele e executadas por artesãos de
Cachoeirinha (estruturas feitas em aço e “cobertas” feitas em couro). Nesse trabalho, o
artista também reinventa, poeticamente, as inúmeras estruturas de lona dispostas em
linha reta que formam os acampamentos dos trabalhadores sem-terra e que são
encontráveis ao longo da estrada que liga o Recife a Cachoeirinha.
Participa, ainda em 2003, da mostra coletiva “Ver de Novo, Ver o Novo”, composta por
trabalhos pertencentes ao acervo do MAMAM, e de várias outras exposições, incluindo
“Vanguarda para Todos”, no Galpão, Uberaba, Minas Gerais, “Caminhantes”, no Instituto
Ricardo Brennand, no Recife, e “Mostra Retrospectiva: Salão da Bahia 1994-2002”, na
Fundação Joaquim Nabuco, também na capital pernambucana. Em exposição coletiva na
Galeria de Arte Dumaresq, no Recife, apresenta, pela primeira vez, Garrafada (2003), um
trabalho múltiplo, composto de 28 garrafas de vidro idênticas, metade contendo pequenos pedaços de fios de couro e o restante contendo pó de serra de diversas madeiras e,
portanto, de variadas cores. Participa, nesse mesmo ano, do evento multidisciplinar “Ordenação e Vertigem”, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, organizado em
torno da obra do artista Arthur Bispo do Rosário, e onde expõe o trabalho Coleção I
(1999).
Em 2004, faz exposição individual na Pinacoteca Universitária, em Maceió. Nessa mostra,
apresenta, além de uma seleção de trabalhos de tamanho reduzido e de um conjunto de
esferas de madeira feitas em 2001, a instalação Armazém República, formada por cem
peças de madeira, realizadas entre 2001 e 2004, alçadas por tiras de couro e presas ao
teto. Exibe também, nessa mostra, dois de seus “livros de escrita”, onde os aspectos
gráficos de seu trabalho escultórico ganham expressão bidimensional. Faz mostra individual no MAMAM, onde apresenta uma seleção de trabalhos feitos entre 1998 e 2004, permitindo a visualização das inflexões de sua trajetória nesse período. Entre os trabalhos mais
recentes, exibe a instalação Roupas de Casa e uma versão ampliada do Armazém República, composto, além das peças de madeira presas ao teto, por centenas de objetos de vidro
arranjados numa estante. Realiza, no Torreão, em Porto Alegre, um trabalho de apropriação do espaço – Combinação Torreão –, criando uma estrutura de couro trançado que
replica a sala expositiva e que é, posteriormente, adaptada ao espaço do Gasômetro, também em Porto Alegre, ao do MAMAM, no Recife, e ao do Centro Cultural São Francisco, em
João Pessoa. Realiza, ainda nesse ano, exposição na Galeria Celma Albuquerque, em Belo
Horizonte, participa da mostra “Paralela 2004”, em São Paulo, e faz individual no Centro
Cultural São Francisco, em João Pessoa. Em 2005, faz exposição individual no Centro Universitário Mariantônia, em São Paulo, participa de mostra coletiva no Carreau du Temple,
em Paris, França, integrando a programação oficial do “Ano do Brasil na França”, e da
quinta edição da Bienal do Mercosul, em Porto Alegre.
Obras em acervos
Coleção Gilberto Chateaubriand . Museu de Arte Moderna . Rio de Janeiro
Fundação Joaquim Nabuco . Recife
Fundação Roberto Marinho . Rio de Janeiro
Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco . Olinda
Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães . Recife
Museu de Arte Moderna da Bahia . Salvador
Museu do Estado de Pernambuco . Recife
Pinacoteca do Estado de São Paulo . São Paulo
Bibliografia
1998 XVI Salão Nacional de Artes Plásticas (coletiva). Texto de Agnaldo Farias. Rio de
Janeiro: Funarte.
Dos Presentes de Meu Pai. Texto de Marcus Lontra. Recife/Goiânia: Ária Espaço de Dança e Arte/Galeria de Arte Marina Potrich.
1999 Nordestes (coletiva). Texto de Moacir dos Anjos. São Paulo: SESC Pompéia.
O Luar do Sertão (coletiva). Texto de Marcus Lontra. Recife/São Paulo: Galeria Amparo 60/Galeria Nara Roesler.
2000 Norte Nordeste Brasileiro: Matriz Popular e Consciência Construtiva (coletiva). Textos de Aline Monteiro e Fabrício de Paula. Belém: Museu do Estado do Pará.
2000 Desconcertos da forma (coletiva). Texto de Moacir dos Anjos. São Paulo: Itaú Cultural.
2001 Marcelo Silveira. Texto de Agnaldo Farias. São Paulo: Galeria Nara Roesler.
2002 O Lápis e o Papel (coletiva). Texto de Kátia Kanton. São Paulo: Galeria Nara Roesler.
2001 Entre a surpresa e o que se espera. Texto de Moacir do Anjos. Recife: Galeria
Amparo 60.
2002 Em Sete Tempos (coletiva). Texto de Maria do Carmo Nino. Recife: Galeria Amparo 60.
2003 Roupas de Casa. Texto de Ligia Canongia. São Paulo: Galeria Nara Roesler.
2003 Ordenação e Vertigem (coletiva). Texto de Agnaldo Farias. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil.
Cette publication prétend moins être un catalogue
couvrant l’œuvre de Marcelo Silveira qu’une opportunité
de réfléchir de manière critique sur sa trajectoire. Bien
qu’il comporte certains des travaux les plus importants
qu’il a réal isés, elle n’établit pas de certitudes
interprétatives sur son œuvre. Elle ferait plutôt
l’inventaire de questions qui incitent l’artiste à continuer
à multiplier ce qu’il fait dans plusieurs directions. En plus
de nombreuses images d’objets, sculptur es et
installations faites par l’artiste, la publication comporte
un essai critique de Moacir dos Anjos, une interview avec
Marcelo Silveira – à laquelle contribuent Agnaldo Farias
et Moacir dos Anjos – et une chronologie commentée de
son parcours créatif, élaborée par Joana D’Arc Lima.
BAZAR DE TOUT
Moacir dos Anjos
L’œuvre de Marcelo Silveira exprime, presque
depuis ses débuts, la nature imprécise et hybride de la production visuelle contemporaine,
où les moyens se mélangent et l’espace de la
production artistique se confond avec le domaine élargi de la culture. Bien qu’elle se
laisse, de manière un peu légère, classer
comme sculpture, une bonne part de celle-ci
ne s’encadre pas dans les conventions qui
démarquent le champ sculptural, déchirant
encore plus les frontières, depuis longtemps
déjà fragiles, qui séparent ce domaine de celui
de la peinture, du dessin où de l’installation.
Des travaux d’époques distinctes caractérisent,
de manières les plus diverses, cet inconfort
d’origine qui anime la production de l’artiste.
Déjà dans la première moitié des années 1990,
Marcelo Silveira a fait des pièces sculptées en
bois et recouvertes d’argile clair, en interférant
sur celui-ci (en le rayant et en lui incrustant de
petites pièces de métal) de manière à relever
ses nuances chromatiques. Bien qu’il rende
évident, dans ces travaux,
[Combinação Tacaruna . 2002 . couro . 500 x 500 x 500 cm . coleção particular ]
son intérêt pour la création tridimensionnelle (et le peu
d’affection pour la représentation), il y incorporait également, sans hiérarchies claires, les informations sur la peinture qu’il amenait du lieu (Recife) et du moment (les années 1980) où il s’était d’abord formé en tant qu’artiste.
D’autres objets exemplaires de l’indistinction des moyens
qu’il employait sont les nombreux objets de fil de fer tordu
et enroulé, qu’il a appelé Rabiscos [1994], dans lesquels
s’allient, sans équivoque, une autonomie en tant qu’objets
et la suggestion d’être, comme le titre l’indique, des traits
éphémères qui sembleraient vouloir dessiner dans l’espace
ce qui ne tiendrait sur aucune surface. Dans un autre travail de classification ambiguë Cajacatinga [1997], Marcelo
Silveira découpe, lime et perce plusieurs petits morceaux
de bois, les traversant ensuite de fil de fer et les accrochant
au mur en lignes parallèles. Disposés ainsi, ils évoquent
des signes calligraphiques inconnus qui pourraient, potentiellement, construire n’importe quels vocables sur le plans
où ils sont mis ; cependant, ils ressemblent aussi à des
traits faits en bois qui n’attendent que la volonté de l’artiste
pour se transmuter en formes résolument tridimensionnelles. Dans cet inventaire de constructions incertaines, est
inclus l’objet allongé, fait un peu plus tard et également
sculpté dans le bois, qui sert de moule à des dessins réali-
sés directement sur le mur, où l’objet lui-même est
fixé, à la fin, comme faisant partie du travail. Démarquant les contours de la pièce sculptée sur la
surface du mur, Marcelo Silveira admet que ses
formes migrent d’un milieu supposément autonome (sculpture) vers un autre de même stature
(dessin), provoquant en plus indistinction entre ce
qui n’est qu’un moule et ce qui est le travail
achevé. Sem título [2001].
Après avoir expérimenté, au début de sa trajectoire, différentes techniques et matériaux – période
où les spécificités des moyens utilisés cèdent au
désir de construction de ce qui n’existe pas encore
–, l’artiste s’en tient, pendant quelques années, à
la création d’objets faits en cajacatinga, bois d’arbres dont les souches, partiellement calcinées par
la pratique des brûlis, sont trouvées dans les environs de la ville de Gravatá, dans la campagne du
Pernambouc, lieu où Marcelo Silveira est né et a
passé son enfance. Ce sont généralement des
pièces faites de morceaux de bois qui, après avoir
été découpées et poncées, sont encastrées les
unes dans les autres au moyen de trous et de
chevilles, constituant les objets qui, dans le parcours créatif de l’artiste, sont, peut-être, les plus
facilement classifiés comme sculpturaux. Néanmoins, même dans ce champ, de tels travaux se
heurtent aux classifications dociles, en articulant
deux traditions distinctes de la sculpture : celle qui
met l’accent sur la taille du matériau utilisé (la
découpe de chacun des morceaux de bois) et celle
qui a lieu par l’assemblage entre les parties. De la
première tradition, on retient l’intérêt pour le volume et la masse de la matière travaillée et, de la
seconde, la considération de l’approche mécanique
entre diverses pièces.1 Ce sont tous des objets qui
rappellent, les uns plus clairement que les autres,
les jouets et ustensiles typiques de la région d’origine de Marcelo Silveira, ne rendant pas évident,
quand ils sont observés dans l’ensemble,
si on peut plus les affilier à la tradition cultivée de
l’art ou si l’attache à la mémoire de la production
anonyme des rues leur suffit. Ces structures
articulées, parfois, posées debout sur le sol ou
simplement contre le mur, laissent apparaître
une architecture précaire toujours proche du
démantèlement. D’autres fois, elles pendent du
plafond en balançant et font se demander,
même à courte distance, si elles sont destinées
à la seule vision ou bien également au toucher,
lançant des doutes sur les manières dont on
peut ou on doit établir une relation avec les
travaux de l’artiste : en tant qu’observateur
seulement ou bien en tant que participant
actif. Que ce soit au moyen du désastre imminent de la chute ou de la mobilité que les
pièces aériennes permettent, il semble y avoir
dans tous ces travaux l’autorisation contenue
de changer la configuration dans laquelle elles
sont présentées, en apportant toujours, implicitement en elles, l’idée de mouvement.
Une fois le terrain de l’imprécis conquis,
Marcelo Silveira a décidé de l’étendre. A partir
d’objets faits en bois, il a construit des moules
et a fondu de l’aluminium, en traitant les paires
ainsi formées comme des travaux uniques,
faits de composants aussi semblables dans la
forme que différents dans la texture, la couleur, le poids et la densité. De ces objets qui
rapprochent des matériaux capables d’imprimer des sensations tellement différentes (l’une
attire la lumière, l’autre la repousse ; l’une
semble allumer l’œil, l’autre semble le refroidir), il y en a un qui résume, de manière précise, la tension que les processus de construction et d’exposition adoptés activent : seulement formé de deux éléments de bois et de
deux autres éléments semblables d’aluminium,
chacun de ces ensembles est disposé en équilibre précaire et similaire sur le mur et sur le
sol; mais, alors qu’il semble crédible que la
pièce de bois se maintienne érigée pour longtemps, l’autre pièce, identique dans sa structure et dans l’articulation entre ses parties,
semble mettre en danger, au vu de son poids
excessif, qui s’en approche de trop. En transférant les contours et volumes des objets de bois
vers une substance avec des caractéristiques si
différentes, l’artiste confond, par conséquence,
qui en espère une forme de certitude sémantique associée uniquement à ses formes, amplifiant les sens de la mobilité qui, bien que toujours contrainte dans sa pleine puissance, est
constitutive des ses travaux et en déborde à
tout instant. Cependant, dans au moins un
cas, la création de doubles a obéi à une logique distincte : un fois fait le moule de la pièce
sculptée en bois, Marcelo Silveira a encore
construit un autre moule de la même sculpture, les unissant ensuite en une seule structure allongée qui a servi à fondre, par deux
fois, une forme qui n’existait pas auparavant.
Ecartant la pièce de bois qui a donné origine
au moule, l’artiste expose les deux pièces
identiques en aluminium accrochées au plafond par des lanières tressées de cuir de chèvre, établissant, par des moyens autres que
ceux utilisés pour le travail décrit ci-dessus, le
rapprochement entre des matériaux de caractéristiques distinctes. Cependant, dans les
deux cas, il provoque le doute en ce qui concerne la hiérarchie des matériaux et des procédés utilisés, insistant, au contraire, sur le transit entre l’origine supposée du travail et son
résultat. De plus, l’intérêt de Marcelo Silveira
pour la possibilité de faire des répliques des
formes est déjà clair, que ce soient celles qu’il
crée lui-même ou que ce soient celles qui,
même transformées par une intervention délibérée, existent déjà dans son entourage.
En ce qui concerne l’ambivalence de
significations que ces travaux comportent (et
ce qui, paradoxalement, les rapproche comme
produits d’une même poétique), ils peuvent
être considérés et analysés, individuellement,
selon leurs propriétés formelles et allusions
symboliques. Cependant, dans deux autres
travaux, l’artiste – bien que restant attaché, dans
l’un d’entre deux, aux relations d’articulations entre
les parties et, dans l’autre, à l’idée de mouvement
– annule les possibilités d’analyse. Il dispose, dans
le premier Coleção I [1999], sur une table ou un
comptoir, cinq dizaines de petits objets en bois
sculpté et poncé. Ainsi, comme dans plusieurs
autres de ses travaux, chacune de ces pièces miniatures rappelle des structures organiques ou des
arrangements constructifs rustiques, faisant écho –
au moyen de la découpe, de l’encastrement ou de
la juxtaposition de parties – aux formes d’un ustensile domestique, d’un jouet populaire ou d’un
objet quelconque. Néanmoins, aucune d’entre elles
ne représente quelque chose, du fait que l’enchantement qui naît de cette collection vient de la reconnaissance graduelle et inévitable de son inutilité. De plus, dans ce travail, s’établit un déplacement clair de centre d’intérêt : des propriétés
formelles de pièces qui se suffisent, l’attention de
Marcelo Silveira (et de l’observateur) se tourne
également, désormais, vers un ensemble de pièces, lesquelles suggèrent, de manière relationnelle,
ses significations (possibles). Au lieu de prendre
chaque forme spécifique en compte, le regard
cherche à couvrir, également, la relation de ces
formes avec d’autres que l’on pourrait rencontrer
autour, en alternant l’extension de son champ
d’intérêt visuel sans cependant arriver à une appréhension simultanément localisée et ample de
l’ensemble. Bien qu’encore partiellement ancré
dans le domaine restreint de la sculpture, on aperçoit, sans équivoque et par le biais de ce travail,
l’entrée de son œuvre dans le champ étendu de
l’installation, dans lequel c’est la relation active,
tout au long d’une certaine période, entre les objets créés, l’observateur et l’espace qui les entoure
qui suggère des significations toujours prêtes à
être redéfinies.
Dans le second de ces travaux-limites Sem título,
[2001], l’artiste abandonne totalement les
articulations et les encastrements qui
caractérisent beaucoup de ses travaux
antérieurs, et se concentre sur la construction d’un
ensemble de pièces qui ne dépendent pas d’autres
pièces. En débitant et en ponçant de vieux troncs
d’arbres abîmés (cajacatinga, jaquier, laurier rose
et baraúna), Marcelo Silveira construit des sphères
de tailles diverses et de finition
irrégulière, en les mélangeant ensuite à d’autres
qu’il fond en aluminium ou en acier, à partir de
moules faits avec les sphères de bois. En plus des
différences de taille, ces sphères possèdent donc
des textures, densités et couleurs distinctes,
créant, quand elles sont disposées à proximité
l’une de l’autre, des aires d’attraction et de friction
symboliques aux yeux de ceux qui divisent
l’espace avec elles. Chacune d’entre elles possède
également une marque différente, creusée sur sa
superficie. Ce sont des symboles, que l’artiste s’est
approprié, qui représentent – par
l’assemblage graphique d’initiales de noms – des
familles de propriétaires ruraux, et qui sont utilisés
pour marquer le bétail qui leur appartient. Au
moyen de cette entaille dans ses travaux Marcelo
Silveira arrive à vider les signifiants stables que ces
symboles possèdent et les insère dans le domaine
des sensations mouvantes de la
production d’art. En faisant allusion, dans sa forme
même, à l’idée de déplacement agile, ces sphères
concentrent et multiplient ce qui n’était auparavant
que suggéré, en termes physiques, dans les pièces
encastrées ou, symboliquement, dans la création
de doubles en aluminium. Le mouvement effectif
qu’elles permettent est
cependant limité : à cause de leur poids extrême
et des imperfections de coupe (transmises aux
pièces fondues), les plus grandes sphères sont
évidemment difficiles à déplacer et restent quasiment inertes sur le sol. Cette ambiguïté entre
mobilité et fixité physiques est, de plus, amplifiée
par l’action réalisée par l’artiste avec la plus grande
des sphères de bois qui mesure plus d’un mètre de
diamètre et pèse environ six cents kilos. Laissée, à
l’aube (et retirée, à l’aide d’une grue, les nuits
suivantes), sur les trottoirs de différents quartiers de Recife – tous très animés pendant la
journée – la sphère a provoqué surprises et
déconcertions (gravées sur des photos) en
raison de leur inexplicable présence en des
lieux où l’on ne pensait pas être plausible de
mettre une chose aussi lourde et sans fonctions discernable.2 Avec les sphères, tout
comme cela arrive avec les travaux articulés,
l’idée de mouvement que les formes d’un objet
suggèrent est tronquée par les propriétés du
matériau. Qu’elles soient prise en compte
individuellement ou en groupe, les sphères
sont, de plus, opaques à toute tentative de
représenter le monde, peu importe le temps
qu’on passe avec elles. De manière plus incisive que la Coleção I l’annonçait, la
temporalité qu’elles imposent à l’observateur
est autre : non plus celle de l’analyse qui décrit
le travail mais celle de la spéculation de ses
signifiants. 3
Ce renvoi à des sentiments isolés ou uniques –
qu’ils soient formels, narratifs ou allégoriques –
permet à Marcelo Silveira de se lancer dans
diverses directions, n’obéissant qu’à sa volonté
rénovée d’articuler ses travaux à l’entourage
symbolique et physique des lieux où il les
développe. Dans le travail Roupas de Casa
[2003], l’artiste relie, dans la construction
d’objets, deux expressions distinctes de l’organisation sociale : le division du travail adoptée
par les artisans de Cachoeirinha (dans la campagne du
Pernambouc) pour la confection d’articles de
sellerie et l’architecture d’habitations précaires
des “travailleurs sans terre”, que l’on trouve
le long des routes qui traversent le pays. Sur
des structures schématiques de petits édifices
faits de fines barres d’acier, l’artiste met des
“habits” de cuir qui recouvrent les
compositions vides de ces «maisons», créant
une ville inventée et mobile, incertaine mais
inévitablement concrète. Alignées sur le sol,
ces formes couvertes sont partiellement
réfléchies dans des miroirs aux cadres ovales
comme ceux qui s’utilisaient dans les salles à
manger, tous également disposés en file sur un
mur proche et montrant, dessinés sur leurs
faces réfléchissantes, la mince architecture qui
soutient ces maisons. Une fois de plus, s’impose dans ce travail l’idée que rien n’est immobile et que même ce qui semble être distant se
rapproche et se touche: la face externe des
maisons et les miroirs “de la
salle” qui les réfléchissent, le métal froid et le
cuir qui le réchauffe, l’idée de l’artiste et le
travail des artisans qui confectionnent les pièces, les habitations fragiles des
“travailleurs sans terre” au bord de la route
et la connaissance culturelle que le travail
génère. Enfin, il incorpore des matériaux qu’il
n’avait auparavant utilisés que
ponctuellement et montre à nouveau son goût
pour la construction qui est le fruit de la ligne
et du trait.
Si, dans Roupas de Casa, celui qui n’était avant
qu’observateur négocie son interaction virtuelle
avec le travail, – en fondant, dans le miroir, son
image à celle des maisons – dans Bochinche
[2003] l’imprécision du lieu que le public et le
travail occupent est de nature presque tactile.
Formé de douze ensembles, – chacun composé de huit petits blocs de bois fixés au plafond et d’un nombre égal de fils de cuir qui, en
les traversant, descendent jusqu’au sol et
s’entrelacent – le travail parle de conversation,
de bruissements, de
rencontres fortuites et imprévisibles comme
celles qui ont lieu dans des lieux de fête. En
parcourant les passages que forment les fils
qui pendent du plafond, il est possible de
négocier la différence entre le parcours de l’œil
qui traverse l’espace creux fait de trames de
cuir et celui parcouru par tout le corps, obligé
de faire le tour des ensembles pour se dépla-
cer d’un coin à un autre. Cependant, au milieu de
la salle, un étrange petite «voiture» de bois semble
être prête à se déplacer n’importe où et à servir de
lien potentiel entre les douze unités distinctes, et
entre le visiteurs et elles. Dans Combinação
Torreão [2004], c’est le raccourcissement physique
et symbolique de la distance qui sépare les institutions de l’art qui est provoqué par le travail. Fait de
fils de cuir entrelacés qui, quand ils sont tendus et
pendus au plafond comme des plans mous, reproduisent la salle d’exposition du Torreão (Porto
Alegre), Marcelo Silveira l’expose au Gasômetro
(également à Porto Alegre), au Musée d’Art Moderne Aloisio Magalhães - MAMAM (Recife) et au
Centre Culturel São Francisco (João Pessoa), faisant migrer, d’un lieu à l’autre, l’architecture d’un
seul espace.
Marcelo Silveira semble annoncer, dans ces travaux, combien la distance entre des choses considérées comme éloignées est petite. C’est ce désir
de rapprocher ce qui semble séparé qui oriente la
création de l’Armazém República [2004], installation faite de deux segments distincts qui partagent,
au delà du nom, une stratégie de construction.
Dans l’un de ces segments, cent pièces sculptées
dans le bois sont attachées au plafond par des fils
de cuir, pendant là comme si c’étaient de la viande
fossilisée ou des formes sans utilité en attente d’un
usage improbable. Tout comme dans la Coleção I,
il s’agit d’un
rassemblement de choses créées qui, bien
qu’évoquant les formes d’objets utiles, ne sont rien
de plus que des volumes dépourvus de
significations définies. Cependant, contrairement
aux pièces appartenant à ce travail, les objets de
bois qui composent l’Armazém República n’ont pas
été, à partir du moment où ils ont été terminés,
immédiatement réunis de cette forme. Sans parvenir à s’imposer aux yeux de l’artiste comme des
travaux autonomes, ils ont trouvé leur place en
tant que parties d’un ensemble, seulement avec la
distanciation que le temps concède. Dans l’autre
segment de l’Armazém República, une étagère de
bois abrite des centaines d’objets de verre (verres,
pots, miroirs, bouteilles, vases, lustres, tessons) qui
s’accumulent, dialoguent les uns avec les autres et
s’éparpillent sur de larges étagères, formant un
panneau vertical, transparent et fragile qui fait
contrepoint à l’horizontalité opaque et robuste des
objets de bois pendant du plafond. En plus des
différences de propriétés physiques, les deux sections de ce grand bazar semblent se distinguer, à
première vue, du fait que les pièces de verre ont
été trouvées toute prêtes et que celles de bois ont
été fabriquées, une à une, par l’artiste. Effectivement, Marcelo Silveira n’avait jamais auparavant
disposé, avec autant d’intensité, de l’univers des
formes disponibles autour de lui, cherchant presque toujours à en créer de nouvelles. Rangées sur
cette étagère, les pièces de verre défont graduellement les différences qui les séparent de celles de
bois, vu que la nouvelle disposition des premières
les rend aussi dépourvues d’utilité que la coupe qui
donne forme aux secondes les rend inutiles. De
plus, la longue période pendant laquelle chacune
des pièces de bois a été gardée dans l’atelier –
presque comme des vestiges d’un geste créatif
frustré – avant d’être récupérées comme composantes de l’Armazém República, a fait que l’artiste
puisse disposer d’elles comme si c’étaient des
œuvres d’autrui, et pas le fuit de son travail.4 En
activant les canaux qui rattachent, en constante
tension, ce qui semble différent, cette installation
rend donc visible la fragilité de distinctions imperméables et l’incessant échange symbolique
qui existe entre les différents matériaux et les
diverses formes où les idées et les choses du
monde se déplacent. Tout comme le “musée de
tout” du poète João Cabral de Melo Neto, le bazar
de Marcelo Silveira semble toujours, par le dynamisme qu’il contient, pouvoir accueillir quelque
chose mais en dissolvant les limites arbitraires pour
devenir “dépôt de ce qui est là”.5
Read, Herbert. A concise history of modern sculpture.
London, Thames and Hudson, 1970.
1
Le travail Sfera di giornali [1966], de l’artiste italien
Michelangelo Pistoletto (1933) est constitué d’une grande
sphère de papier mâché fait avec des feuilles de journaux qui
était enroulé le long des rues de Turin, faisant une allusion
physique à la dynamique des événements dont la presse rend
compte. Alors que le travail de Marcelo Silveira suggère,
malgré sa forme, des difficultés de locomotion,
l’intervention de Michelangelo Pistoletto renforce, par le
matériau symbolique utilisé dans la construction de la sphère,
l’idée de mouvement dont le format donne l’illusion.
2
Le passage de la temporalité analytique (temps logique) à la
temporalité spéculative (temps expérimenté) dans la
sculpture moderne est discuté par Krauss, Rosalind. Passages
in Modern Sculpture. London, The MIT Press, 1977.
3
Silveira, Marcelo. “Bazar du Monde”. Interview publiée
dans ce livre.
4
Melo Neto, João Cabral de. “O Museu de Tudo”, in Museu de
Tudo. Rio de Janeiro, Edition José Olympio, 1975.
5
BAZAR DU MONDE
Agnaldo Farias, Moacir dos Anjos et Marcelo Silveira
28 juin 2004, à Recife.
Moacir dos Anjos . Marcelo, ce sont presque
deux décennies de production artistiques.
J’aimerais que vous nous expliquez comment a
été le début de cette trajectoire, le moment où
vous avez commencé à apercevoir, dans ce que
vous faisiez, la potentialité d’une production
artistique.
Marcelo Silveira . J’ai commencé au milieu des
années 80. C’étaient des années d’apprentissage, d’expérimentation, d’une manière, peutêtre, inconséquente. Mais je crois que la conscience de la production devient plus forte et
plus nette seulement à partir de la fin de cette
décennie et au début des années 90. C’est à
cette période que sont advenus quelques faits
importants, principalement la distanciation avec
ce que je faisais jusqu’alors. En 1991, je suis
allé en Europe et en Afrique du Nord, et je suis
resté hors du Brésil pendant un an. Un an sans
presque rien produire, à peine quelques ébauches, dessins, mais avec la tête travaillant,
pensant aux choses que je voyais et à ce que
j’avais déjà fait. A un certain
moment, je me suis arrêté à Barcelone pour trois mois.
C’est à cette époque qu’ont eu lieu la maturation et la prise
de conscience de ma production.
MA . Mais comment était votre travail avant ce voyage ?
MS . C’était beaucoup de peintures et de dessins. Bien que
j’aie déjà construit quelques objets, ayant y compris réalisé
une exposition à Belo Horizonte, à la Galerie Itaú, un peu
avant ce voyage, l’attitude était encore celle d’un peintre.
J’utilisais du bois, j’utilisais d’autres matériaux, mais je continuais à être un peintre. J’avais une pensée clairement picturale. Le choix du bois et des matériaux était toujours subordonné à une préoccupation de couleur.
Agnaldo Farias . Y avait-il un thème prédominant dans ces
travaux ?
MS . Non. Ce qu’il y avait, déjà à l’époque, c’était une volonté de transformer les objets que je rencontrais et qui,
pour une raison ou une autre, attiraient mon attention.
AF . Vous êtes arrivé à cette motivation au travers de
l’école ? En fréquentant des expositions ? Comment vous
êtes-vous formé comme artiste ?
MS . A la fin des années 80, avant ce voyage dont j’ai parlé,
j’ai beaucoup fréquenté les ateliers d’autres artistes et les
Festivals d’Hiver de Minas Gerais. Cette proximité m’a
amené à penser un peu plus à ce qu’était l’espace de l’ate-
lier et à ce qu’est l’artiste. Je me souviens qu’avant
d’aller à ces festivals j’étais très dérangé par l’environnement dans lequel je vivais à Recife. Ici, la
peinture était très forte, je devais peindre. Les
informations étaient rares, je voyageais très peu. Je
n’étais pas satisfait. Les conversations ne portaient
quasiment que sur la peinture, sur les effets picturaux obtenus avec différentes techniques, et j’étais
très angoissé. Ça me dérangeait.
AF . Ça dérangeait qui ? Qui était Marcelo Silveira à
cette époque ?
MS . J’étais très lié à l’Oficina Guaianases, qui, pour
moi, a été un grand espace d’initiation. Mais, malgré son importance dans ma formation, les discussions auxquelles je participais là ne me satisfaisaient pas totalement. Je voulais discuter de certaines choses que, même sans savoir exactement de
quoi il s’agissait, je n’arrivais pas à trouver à la
Guaianases. C’est alors que j’ai commencé à discuter avec Liliane Dardot, artiste du Minas Gerais qui,
à l’époque, habitait à Olinda. C’est grâce à elle que
j’ai connu le travail de Amílcar de Castro. Et aussi
les textes de Amílcar qu’elle apportait à la
Guaianases. J’ai fait avec Liliane un cours de dessin
durant lequel elle montrait en permanence de nouvelles choses et discutait avec les élèves. C’est par
ce contact avec elle que m’est venu le désir de
fréquenter les Festivals d’Hiver du Minas Gerais.
AF . L’ambiance de ces festivals était d’une grande
effervescence. Il était possible de participer aux
ateliers offerts par des artistes locaux, comme
Marcos Coelho Benjamin, Marco Tulio Resende,
Fernando Lucchesi, et de s’approcher de leurs travaux. Quelqu’un vous a-t-il donné des suggestions
qui ont été essentielles pour le développement de
votre travail ?
MS . Lors du premier Festival d’Hiver auquel j’ai
participé, j’avais l’air d’un aveugle au milieu d’un feu
croisé, perdu entre tant de choses. Mais, celui de
1989, réalisé à Belo Horizonte (c’était la
quatrième fois que je fréquentais le Festival), a été
très tranquille et s’est révélé très important pour
moi. Ils avaient investi lourdement dans la
production et dans la présence de divers critiques. Je me souviens d’une équipe formée par
les critiques Roberto Pontual, Olivio Tavares de
Araujo et d’une troisième personne dont je ne
me souviens pas le nom. Ils faisaient l’accompagnement des ateliers, évaluaient, démolissaient l’un, faisaient l’éloge de l’autre. J’ai toujours été très tranquille en ce qui concerne cela.
Qu’ils aiment ou non ce que je faisais, j’allais là
pour tirer profit de ce qu’il y avait de bon. Les
critiques avaient leur vérité et j’avais ma vérité.
C’était bien cette confrontation. Je me souviens
que les considérations les plus pertinentes
étaient faites par Roberto Pontual. Ce festival, à
Belo Horizonte, a réellement été marquant.
Quand je suis allé à Barcelone, quelques temps
après, j’ai perçu que les discussions que nous
avions pendant les festivals du Minais Gerais ne
devaient rien aux discussions de l’école d’art
que j’ai fréquenté là pendant trois mois, la
Massana, une école d’art liée à la mairie.
MA . Il y a, dans le Minas Gerais, une tradition
de création d’objets, et également une pratique
de la récupération, de l’appropriation dans le
travail de choses trouvées. Dans les ateliers que
vous avez fréquenté, est-ce qu’une production
a particulièrement attiré votre attention dans ce
sens ?
MS . Ce qui a attiré mon attention, le premier
grand impact du Minas Gerais, a été le travail
de Celso Renato. J’étais impressionné par la
force de son travail et de voir comment il n’avait
pas de visibilité. D’ailleurs, jusqu’à aujourd’hui,
son travail n’a pas de visibilité. Les gens semblent tout simplement ignorer Celso Renato.
MA . Ces voyages consécutifs dans le Minas
Gerais semblent avoir été très importants pour
votre formation ?
MS . Sans aucun doute. En plus des festivals,
en 1990, j’ai fait une exposition individuelle à la
Galerie Itaú de Belo Horizonte qui était
coordonnée par Claudia Renault. C’était un
espace culturel très dynamique. Beaucoup de
gens ont visité l’exposition. Mais, le plus
important, c’est qu’à cette même époque avait
lieu une grande exposition de Arthur Bispo do
Rosario, au musée de la Pampulha, organisée
par Frederico Morais. Cette exposition de Bispo
a été un événement pour moi. Et il est amusant
qu’Agnaldo [Farias], qui m’a invité pour une
exposition collective autour de l’œuvre de
Bispo, n’ait pas su, à l’époque à laquelle il m’a
fait cette invitation, l’importance que l’expérience d’avoir vu cette exposition avait eue pour
mon travail. Il n’y avait qu’une chose qui me
dérangeait dans l’exposition, qui m’a même
amené à me chamailler avec Frederico, c’est le
fait qu’il ait mis au mur, à l’entrée de l’exposition, un certificat de maladie mentale de Bispo.
Je me sentais mal à l’aise chaque fois que je
voyais ce certificat. Parce que je crois que c’est
l’œuvre de Bispo qui m’a donné l’intuition de ce
que signifie être un artiste, même si aujourd’hui
je cherche à
comprendre ça pleinement. C’est en regardant
Bispo que, d’une certaine manière, j’ai perçu
que c’était ça que je recherchais. J’ai perçu que
cela, bien qu’apparemment si simple, était une
grande œuvre. Je me suis souviens que l’exposition m’a ému, à en rester bouche bée. Une
baffe ! C’est pour ça que je ne
comprenais pas toutes ces discussions pour
savoir si ceci était de l’art ou pas. Je pense que
le fait que le commissaire ait posé ce
certificat de maladie mentale dans l’exposition
démontrait un peu de manque d’assurance de
sa part.
AF . Votre témoignage est intéressant parce
que cette exposition, qui a été montée à Rio
de Janeiro, São Paulo et Belo Horizonte, a
provoqué ce même choc dans les trois villes où
elle est passée. Je me souviens qu’en 1991,
Marcos Coelho Benjamin, Fernando Lucchesi et
Paulo Lender ont participé à la Biennale de Sao
Paulo avec un projet commun qui était, nettement,
un hommage à Arthur Bispo do Rosario. L’impression, en vous écoutant, est que, bien que votre
travail ait une vocation pour l’objet, c’est seulement
le travail de Bispo qui, d’une certaine manière, a
ouvert une porte à ce que vous cherchiez et qui ne
rencontrait pas d’écho dans le milieu dans lequel
vous évoluiez, à cette époque, à Recife. Non seulement pour la pratique de la récupération, comme
Celso Renato le faisait, mais aussi pour le type de
produit qui, je pense, ne viendrait éclore que quelques années après sa production, des objets plus
distants de la sculpture proprement dite et plus
proches du vernaculaire, du populaire. Serait-il
correct de parler de passage, au fil des années,
d’un intérêt pour des formes créées à un intérêt
pour des formes appropriées dans votre travail ?
MS . Je pense qu’il existe certaines questions qui
m’intéressent, qui sont travaillées au fil d’un temps
d’une manière qui me satisfait et qui finissent par
sortir complètement du travail. Par ailleurs, d’autres
finissent par revenir de temps en temps. Mais il est
certain que mon travail le plus récent ne s’épuise
pas dans la question sculpturale. Il y a simultanéité
d’intérêts divers. Il y a des moments où je ne pense
qu’à la sculpture et je cherche à tout éliminer, épurer. Et il y a des moments où l’espace entre autour
de l’objet que je suis en train de faire, où entre le
bazar qui m’entoure, où m’apparaît le désir de tout
m’approprier.
AF . Il me semble qu’au début le travail avait un
perfectionnisme formel plus net, un plus grand
souci pour la finition. C’est comme s’il était, d’une
certaine manière, encore prisonnier d’un champ
spécifique de création. Il y a eu un moment où
votre production artistique aurait pu avoir lieu dans
le cadre de la peinture puisque les références que
vous aviez étaient de la peinture. Dans un second
temps, entre la sculpture et, tout de suite après, la
récupération d’objets, la liberté d’amener n’importe
quoi dans le territoire de l’art. La sensation que j’ai,
en accompagnant votre travail tout au long des
années 90, c’est qu’à un moment déterminé, vous
avez purgé la volonté de créer des formes. La purge
est également la volonté de simplement s’approprier des formes ou des objets déjà prêts. De telle
manière que je trouve intéressant quand vous
parvenez, aujourd’hui, à faire des travaux qui résonnent dans le champ de la sculpture et aussi
dans le champ d’où viennent les objets appropriés.
C’est comme si le travail occupait un espace intermédiaire : une moitié se situe en dehors du musée
et l’autre moitié à l’intérieur du musée. C’est vrai ?
MS . Je crois que oui et je pense qu’il faut revenir
encore une fois à Bispo do Rosario pour
comprendre cet aspect de mon travail. Peut-être
n’ai-je pas rendu hommage à Bispo comme je
l’aurai dû, au vu de son importance dans ma trajectoire. Non pas que j’ai tenté de travailler sur ce que
j’avais vu à cette exposition, mais parce que cette
importance est claire dans les directions que, des
années plus tard, j’ai senti que mon travail prenait.
Le grand enseignement au contact de l’œuvre de
Bispo a été ce va-et-vient qui est si présent dans ce
qu’il fait. Souvent, Bispo ne fait que s’approprier ce
qui existe déjà ; ça et là, il se risque à construire
l’objet, totalement, sans se soucier s’il y a une
cohérence constructive avec ce qu’il a fait
auparavant. C’est cette liberté que j’ambitionne,
non seulement de procédés, mais aussi de
matériaux. La liberté d’être intéressé, aujourd’hui, à
faire un objet à cause du poids excessif du
matériau que j’utilise et de, demain, faire un objet
en explorant la légèreté du papier. De travailler à
une époque avec le bois et à une autre avec le fer.
En ce moment je suis entrain de mûrir l’idée de
travailler avec du plomb, avec de la fonte, de retourner à la sculpture, d’explorer la direction
opposée de ce que j’explore aujourd’hui, en utilisant
le papier, le crayon, l’intérêt pour la ligne. Je ne sais
pas, je pense que je dois avoir quelque chose de
tordu qui ne me permet pas de me satisfaire de ce
que je fais.
MA . J’aimerais explorer un peu cette question de
l’intérêt pour la ligne, pour le dessin, qui est quel-
que chose qui vient des années 1980, du début
de votre trajectoire. En examinant votre production au fil des années, j’ai souvent remarqué, dans les sculptures et les objets que vous
faites, un regard de dessinateur également. Ces
travaux semblent toujours suggérer qu’ils ont
été faits au moyen de traits articulés dans l’espace. Comme si c’étaient des dessins faits dans
l’espace. Quel est le rapport entre le dessin et
la sculpture dans votre travail ?
MS . Je n’ai utilisé le dessin comme ébauche
d’un travail tridimensionnel que dans de rares
situations. Normalement, quand je fais une
sculpture, je change l’instrument de travail. Je
lâche le crayon et je prends la scie sauteuse. Je
lâche le crayon et je vais construire les lignes
directement à la scie, découpant le bois. Parfois, c’est la manière de “dessiner” avec la scie
qui suggère une attitude plus brusque dans la
coupe du bois. En d’autres occasions, c’est la
dimension ou la forme du morceau de bois dont
je dispose qui va suggérer le “trait” que je fais.
Il n’y a pas moyen de faire une ébauche, il n’y a
pas de place pour les regrets. A ce sujet, je me
souviens qu’Amílcar de Castro disait une chose
qui m’a beaucoup
impressionné : que le grand enseignement qu’il
avait reçu de [Alberto] Guignard, avec qui il
avait étudié, avait été de le forcer à ne
dessiner qu’avec un crayon dur, difficile à effacer. Cela m’est resté en tête toute la vie. Il est
amusant qu’il n’y ait pas d’influence directe de
l’œuvre de Guignard sur le travail d’Amílcar et
d’avoir cet enseignement, qui est
pratiquement le fil conducteur de toute son
œuvre : la nécessité de la précision du trait.
C’est peut-être pour cette raison que je ne vois
pas le dessin et la sculpture comme des choses
séparées, tout vient ensemble. Et ceci me renvoie au Livro do Armazém [2004], qui réunit
des reproductions, faites avec des tampons que
j’ai fait faire, des contours des 100 pièces de
bois qui composent l’installation Armazém
República [2004]. Dans ce cas, il y a même une
inversion par rapport à ce qui est plus habituel :
ce sont les objets de bois sculpté que j’ai utilisé
comme “ébauches” pour les dessins faits avec
les tampons.
AF . Dans ce cas, vous dessinez avec la scie sur
le bois, et c’est le résultat de cette action qui
devient la matrice du dessin qui va être imprimé sur le papier, et pas le contraire. C’est
une compréhension élargie de ce qu’est le
dessin.
MS . Je pense que cela a à voir avec l’arrangement qu’on fait des choses et de concepts. J’ai
la manie d’arranger et d’organiser les choses
comme si elles faisaient partie d’un bazar.
Avant, je prenais les choses et j’interférais
toujours sur elles. Aujourd’hui, je suis plus un
organisateur. Je range tout. D’ailleurs, je suis
arrivé à la conclusion qu’une personne organisée n’est pas nécessairement celle qui ordonne
les choses d’une manière visuellement propre ;
organisée, pour moi, c’est la personne qui
range des informations auxquelles d’autres
personnes peuvent avoir accès, qui permet que
d’autres puissent voir son univers, même si ce
rangement implique une accumulation de choses. En ce sens, je crois que je suis une personne organisée, je pense que les autres arrivent à distinguer ce que je fais.
AF . Alors, ce serait votre manière d’organiser
les choses qui permettrait qu’une autre personne entre dans votre système de pensée et
de création. C’est une donnée très
intéressante et je pense qu’elle est réellement
présente dans votre œuvre. Il y a un de vos
travaux, fait de plusieurs petites pièces de bois
rangées en lignes sur un mur [Cajacatinga,
1997], qui a beaucoup à voir avec la calligraphie, où les ensembles de pièces rangées seraient presque comme les lignes d’un cahier et
où les pièces ont une ressemblance et suggèrent une relation entre elles. Les travaux
Coleção I [1999] et Armazém República sont faits
d’objets différents, qui ont été construits séparément et ensuite mise ensemble. Vous avez rapproché ce qui était loin du monde, et l’intérêt du travail
est moins dans chacune des choses jointes que
dans leur organisation, dans la manière de les
montrer. Les objets qui composent ces travaux n’ont
rien, ou peu, à voir les uns avec les autres, si ce
n’est le fait que presque tous sont faits de bois.
L’exception, dans des travaux récents, serait peutêtre l’installation Roupas de Casa [2003], dans
laquelle, bien que beaucoup de pièces qui composent le travail forment aussi une collection, il existe
un principe isomorphe et il y a une ressemblance et
une continuité entre les pièces. J’aimerais que vous
parliez un peu de ça, parce que vous semblez avoir
abandonné l’intention de faire des formes ressemblantes pour vous dédier à faire des formes chaque
fois plus disparates. Vous avez travaillé avec un
principe d’organisation qui rapproche des choses
qui sont différentes.
MS . Je vais essayer d’expliquer comment se processus s’est opéré. Il y a quelque temps, j’en suis
venu à sentir que les choses que j’avais faites dans
le passé me dérangeaient. J’en suis venu à détruire
quelques travaux, les brûlant. Mais, d’autres fois,
j’ai commencé à découvrir des situations où ces
œuvres vivaient bien lorsqu’elles étaient ensembles.
En vérité, il m’est déjà passé par la tête l’idée de
construire des œuvres
“invalides”. Justement, ces œuvres qui ne me satisfaisaient pas et qui seraient placées dans des caisses scellées et déclarées comme invalides. Mais
alors j’ai commencé à trouver préoccupant cette
question des œuvres invalides. Ce serait une solution très facile : je n’aime pas un travail, je le mets
dans une caisse et je dis qu’il est invalide. C’est
tout. En vérité, je pense que je dois affronter ces
travaux, les prendre, les reprendre et voir ce qu’ils
vont donner. D’une certaine manière, j’ai besoin
d’interférer dans ces travaux et de leur donner un
nouvel ordre. Je pense que ces travaux seront très
bientôt récupérés. Et, à nouveau, apparaît ce pro-
cessus, cette idée d’aller et venir. Et c’est là qu’entre
l’esthétique du bazar, son importance pour mon
travail. Ce n’est pas le vert qui doit être près du
rouge ou du orange, ni le plus grand qui doit être
près du plus petit, ni le transparent qui doit être à
côté (ou loin) de l’opaque. Dans le bazar, l’espace
est rempli d’objets sans se soucier de lieu ou de
fonction de ce qui est exposé, et ce n’est pas pour
autant que le propriétaire du bazar cesse de vendre
les objets. Elles ne cessent d’attirer l’attention et il y
a de la beauté dans cet excès de choses pendues.
j’ai commencé à voir l’importance de cette disposition chaotique des choses, propre des baraques de
foire, des bazars. Peut-être que cet attachement
vient de mon expérience avec le bazar de Monsieur
Malaquias, mon grand-père, où s’accumulaient des
vestiges des vieilles choses qui étaient passés par
là. La vieille affiche de savonnette Lux de Luxo, par
exemple, qui est restée sur le mur pendant plusieurs décennies. Je me souviens que, dans les
années 80, il existait encore l’affiche des années 50.
Mon grand-père a changé d’activité et était très
jaloux de son bazar. A la fin de sa vie, il ne vendait
plus que du matériel de construction, mais il maintenait les affiches de l’époque où il vendait de la
viande, des produits de beauté, du tissu.
MA . L’accumulation du bazar était également temporelle, avec les symboles d’époques distinctes
amoncelés là ?
MS . C’est exact. Et cette esthétique a commencé à
prendre de l’importance pour moi. J’ai commencé
à voir que ce n’était pas une chose laide. Alors, au
lieu de renier les travaux que j’avais faits, j’ai vu
qu’il fallait les affronter et assumer que c’était, de
fait, ce que je faisais à un moment déterminé, qu’il
fallait laisser voir ça. C’est différent d’enfermer les
œuvres dans un coffre.
AF . Ces pièces font partie du Armazém República ?
MS . Non. Celles dont je parle sont des pièces plus
anciennes que j’attends encore de reprendre.
L’Armazém República est composé de pièces de
bois qui n’ont pas donné le résultat que j’espérais
quand je les ai faites, mais qui, à partir d’un
certain moment, ont commencé à attirer mon
attention. Quand j’ai commencé à faire ce travail, il y avait un sentiment contradictoire, une
certaine confusion. Pourquoi est-ce que j’utilisais des choses qui, à mon avis, n’avaient pas
été réussies et que, maintenant, je voulais
qu’elles soient vues, toutes ensemble, comme
dans un bazar ?
MA . Elles n’avaient été réussies selon quels
critères ?
MS . Elles n’avaient pas d’autonomie. Pour cela,
elles n’avaient pas été réussies. Elles n’ont
trouvé une raison d’exister que lorsqu’elles se
sont trouvées ensemble. C’est au contact prolongé avec ces pièces que j’ai commencé à voir
qu’on n’avait pas besoin de créer des choses
nouvelles tout le temps. Il est possible d’entrer
dans l’atelier, d’ouvrir les caisses et les paquets
et de nettoyer, épurer, de séparer quelques
pièces et de jeter celles qui ne valent rien. J’ai
commencé cette histoire de l’Armazém
República en revoyant les images de plusieurs
travaux anciens. Je me suis aperçu qu’il y avait
quelques représentations et caractéristiques
constructives qui se répétaient, formant des
familles, et j’en suis venu à regrouper les pièces
en fonction de ces ressemblances.
MA . Vous dites qu’il n’est pas toujours nécessaire de créer de nouvelles formes, qu’il est
possible de s’approprier des choses déjà prêtes
dans l’atelier. Mais il y a un autre segment de
l’Armazém República qui est formé d’objets de
verre, ce qui implique un autre type d’appropriation. Non plus l’appropriation de choses
faites par vous-même dans le passé, mais bien
de choses appartenant au monde de l’industrie : ampoules, lustres, bouteilles, miroirs, pots
et autres objets. Il me semble que, même si ce
n’est une pratique inédite dans votre travail,
c’est la première fois que ces appropriation et
réarrangement de choses industrielles y rencontrent tant d’importance. Cela fait écho à des
stratégies qui, apparemment, n’ont pas de
relation proche Avec votre travail antérieur,
étant plus de l’ordre du readymade. Comment
voyez-vous ce passage dans votre travail ?
MS . Ca a été une chose réfléchie. Ce n’est pas
une attitude gratuite. Une des raisons qui m’ont
fait construire ce bazar de verre est la fascination pour les caractéristiques physiques du
verre, principalement sa fragilité. La possibilité
qu’il casse et, que d’un moment à l’autre, il
cesse d’exister. Pour moi, cela était déjà une
raison suffisamment forte pour décider de
travailler avec le verre. L’autre chose était de
retirer la fonction de l’objet approprié. Retirer la
fonction d’une bouteille de jus de fruit et, en
même temps, lui donner le même traitement
que celui que je donne à un pot décoratif et au
verre merveilleusement bien travaillé, en les
regroupant dans un même endroit. A la fin, j’ai
inclus beaucoup de verre cassé dans ce travail
parce que ça m’intéressait aussi de jouer avec
l’attirance que le verre exerce, la volonté qu’il
donne de le toucher, et la crainte de le faire à
cause du risque de se couper. Au lieu d’exclure
cela du travail j’ai commencé à jouer avec cette
ambiguïté. Il ne s’agissait pas d’être agressif,
mais de trouver de la beauté là-dedans. Je
trouve intéressant de montrer les morceaux de
bois de l’Armazém República, qui ont été travaillés de manière exhaustive, à côté des morceaux de verre que j’ai juste récupérés et rangés sur des étagères. En vérité, je pense qu’il y
a une ressemblance entre les deux segments
du travail. J’ai beaucoup vécu avec ces pièces
de bois, mais je n’arrivais pas à leur définir une
fin, jusqu’à ce qu’elles soient distantes de moi.
Les pièces de verre imposaient aussi cette
distance, mais de manière immédiate, parce
qu’elles avaient été faites par d’autres personnes. C’est comme si ces pièces de bois avaient
aussi été faites par d’autres personnes.
AF . D’où vient le titre Armazém República ?
C’était le nom du bazar de votre grand-père ?
MS . Non. Le bazar de mon grand-père était M.G.
Silveira. “República” est un mot qui a neuf lettres
qui ne se répètent pas et qui, dans le code que
mon grand-père a créé pour faire sa comptabilité,
correspondent au chiffres de 1 à 9. Un fois, j’ai
interrogé mes frères à ce propos et il ne connaissaient pas l’existence de ce code. Ils ont tous aidé
mon grand-père dans le bazar, mais ce n’est qu’à
moi qu’il a expliqué le code. Je restais, discutant
plus que je ne l’aidais dans le travail. Discutant tout
le temps d’une chose ou d’une autre. Ça a été une
grande entente. Quand il parlait des difficultés des
affaires d’une de ses connaissances, il disait : “Ah !
Ca ne va pas
marcher, il confond recette et bénéfice.” C’était une
manière sympathique de faire référence aux mauvaises affaires que quelqu’un faisait. Il n’aimait pas
parler ouvertement de la décadence d’un autre.
C’était une personne toujours positive.
AF . C’était une personne délicate ? Comment étaitil ?
MS . Une chose pour le comprendre est qu’il n’avait
pas de voiture. Il préférait en louer une quand il en
avait besoin pour faire ceci ou cela. Mais il investissait dans les voyages. Il a beaucoup voyagé. Europe, Afrique. Ses enfants et lui.
Quelqu’un de la famille et lui. C’est seulement lors
d’un de ses derniers voyages qu’il a commencé à
voyager avec sa femme., parce que quand l’un
voyageait l’autre restait. C’était toujours comme ça.
Il y a une autre chose intéressante : papy n’a jamais donné de jouets comme cadeaux. Quand un
de ses enfants ou de ses petits-enfants allait voyager il donnait une enveloppe au départ ou au retour, une contribution financière. C’était une personne très simple. Une personne qui venait d’une
famille qui avait eu de l’argent. Ils ont
presque tout perdu et il est devenu le patron du
bazar. Ca a commencé comme ça. Peut-être qu’il a
toujours beaucoup prêté attention à l’éducation
formelle de ses enfants, qui ont toujours étudié
dans de bonnes écoles, à cause de cette
trajectoire
AF . Nous parlons de références fortes dans votre
travail. Vous avez des références picturales de l’histoire de l’art, également en raison de votre contact
avec plusieurs artistes du Pernambouc, dans les
années 80, qui travaillaient principalement avec la
peinture. J’imagine que la découverte de l’œuvre de
Bispo do Rosario a déjà été une grande ouverture.
Comment avez-vous senti que votre propre vie, y
compris familiale, pouvait informer votre travail en
tant qu’artiste ? Quand cela est-il devenu clair pour
vous ?
MA . Je vais répondre de manière moitié biaisée.
L’origine de cette collection de 50 pièces de bois
[Coleção I] est très drôle, parce qu’a surgi le désir
de faire une barrette à cheveux, pour offrir à une
amie. C’est lorsque je l’ai terminée que je me suis
rendu compte de ça. J’ai commencé par l’idée de
faire une petite pièce, j’en ai fait 50, et aucune ne
ressemble à une barrette à cheveux. Je crois que
c’est à partir de cette concentration qu’à commencé
à bourgeonner, mais avec force, cette histoire de
l’usine de canne à sucre, du bois que je rencontrais
dans la forêt, des papiers du bazar. C’est à ce moment que tout à commencé à se
mélanger et j’ai commencé à voir que ma vie était
peut-être un grand bazar. C’était à la fin des années
1990. A partir de ce moment, j’ai beaucoup pensé à
la question du bazar. Au début, je suis resté très
pris à l’image du bazar, et c’est seulement peu à
peu que j’en ai pris mes distances. Les “livres d’écriture” que je fais font référence au livre du bazar, où
l’on notait les stocks, où l’on faisait les comptes, en
toute spontanéité. Je note aussi ceci et cela dans
mes “livres d’écriture”. Je note n’importe comment
les choses au jour le jour, et je remarque que l’intensité avec laquelle vous enregistrez une chose
aujourd’hui est différente de celle que vous y mettrez demain. L’encre est moins poreuse aujourd’hui
que demain. Aujourd’hui c’est le crayon de papier,
demain c’est le stylo. La question est : si ce qui
m’intéresse et m’attire est aussi proche de moi,
pourquoi irais-je chercher des références distantes ? Ce bazar de mon grand-père est ce
que je fais dans mon travail. C’est à l’esthétique
du bazar que je donne de l’importance. Je ne
peux pas le nier. Nelson Leirner a également
quelque chose comme ça. Il entrepose les
choses, crée des bazars. Je ressens une proximité avec son travail bien qu’il soit beaucoup
plus urbain, alors que mon origine est la campagne. J’ai fait un travail dans lequel je vois très
bien le lien avec Nelson Leirner. Il s’appelle O
que Abunda não Atrapalha [2003]. Au début, je
trouvais tout, dans ce travail, excessif, et c’est
une amie qui m’a dit : “Non, o que abunda não
atrapalha.” (Ce qui abonde ne dérange pas.) Le
travail de Nelson Leirner, c’est ça pour moi.
C’est un travail qui abonde et qui ne dérange
pas. Alors que tous épurent, lui, il remplit tout.
Il est merveilleux. Il crée ce que j’appellerais un
excès simplifié.
AF . Je pense que beaucoup de gens travaillent
avec cette idée de collectionner des objets, et
toutes les collections sont, évidemment, différentes. Le moment de votre travail que je sens
le plus proche de Nelson Leirner est l’installation Roupas de Casa. Vous y mettez une maison à côté d’une autre, formant ainsi une espèce de village, ou de ville. Et Nelson, lui aussi,
organise, d’une certaine manière, des villes
imaginaires. Mais, peut-être que ce qui s’approche le plus du travail de Nelson serait la question même de l’excès. Sentez-vous une quelconque pression pour que votre travail soit plus
propre, plus «sec» ?
MS . J’ai reçu plusieurs offres pour acheter une,
deux ou trois pièces de l’Armazém República.
Mais je ne vois aucun sens à les vendre ainsi.
Le travail est composé de 100 pièces. Qui le
veut doit tout prendre. Ce n’est pas seulement
une question commerciale. C’est que les gens
veulent tout simple. Ils disent qu’une seule
pièce est suffisante, que deux pièces suffisent.
Je dis que non, que j’en veux beaucoup ensem-
ble. J’entends ça en permanence. Mais je suis
tranquille. Je sais que tôt ou tard je rencontrerai un endroit, public ou privé, pour que ce soit
installé. Il se peut même que ça aille dans un
lieu pour y être gardé, mais tout ensemble. En
fait, je pense que certaines pièces peuvent être
accrochées alors que d’autres sont rangées
dans des caisses, sans être exposées. Elles
restent là, gardées, jusqu’à ce que quelqu’un
décide d’ouvrir les caisses et d’exposer les
pièces. L’important est que le travail
soit un tout.
MA . Cette discussion sur l’Armazém República
soulève une autre question importante. Ce
travail explique, une fois pour toutes, un changement des processus de création par rapport à
ceux avec lesquels vous travailliez auparavant.
Il ne s’agit plus d’une manière unique de créer
mais d’une résolution à dialoguer avec la tradition de la sculpture.
Dans ce travail, vous cédez à cette opération de
regroupement qui vous fascine tellement. Et
cela provoque aussi une occupation différente
de l’espace, plus en rapport avec la tradition de
l’installation. Le public, évidemment, en vient à
avoir une relation différente avec votre travail. Il
ne circonscrit plus un objet ni ne prend en
considération chaque élément que vous présentez, isolément, bien que l’on puisse voir, individuellement, une sculpture. Votre production
récente amène le public à prendre en considération ce que vous faites par rapport à l’espace
dans lequel le travail est installé et aussi par
rapport au propre corps de l’observateur. Il en
est ainsi avec Armazém República, avec Roupas
de Casa et avec Bochinche [2003], pour ne
citer que quelques travaux récents dans lesquels cette mutation est notable.
MS . Quand le travail est pensé isolément, il
possède un ordre interne, il conduit le regard, il
a une régularité, il est plus contenu. Mais j’ai
commencé à voir que les choses devaient être
plus confuses, mélangées, moins évidentes. Et pour
cela, l’observateur devait être à l’intérieur des travaux, en faire partie. Il est intéressant que ces
travaux aille, éventuellement, occuper des espaces
domestiques et puissent ainsi, être un peu une
subversion de l’ordre de décoration traditionnel et
même de la sculpture, où chaque chose a un lieu
défini et où il n’existe pas de désordre intentionnel.
Le problème apparaît quand on sait que de nombreuses personnes délèguent à des architectes et
décorateurs la décision de la relation qu’ils vont
avoir avec les objets de la maison, renonçant au
pouvoir de choisir, de sélectionner. Ca me dérange.
J’aimerais que la personne qui va vivre avec l’œuvre
choisisse la relation qu’elle veut avec celle-ci. Au lieu
de l’ensemble que je propose, l’architecte choisit
une ou deux pièces, les pend au plafond et finit par
laisser tout bien ordonné, mais, d’une certaine
manière, désorganisé. Mon intention, principalement avec ces travaux de regroupement de pièces,
est justement de faire que les personnes vivent
avec ce désordre, qui est une manière d’organiser.
Même si ce n’est pas mon attribution de dire comment les gens qui admirent mes travaux doivent les
installer chez eux, je dois reconnaître que, selon les
cas, cela me met mal à l’aise.
MA . Mais ce souci, ou malaise, il semble qu’il est
provoqué par un changement dans la manière avec
laquelle vous pensez la relation du travail et de
l’espace. Vous l’avez vous-même mentionné, plusieurs de vos pièces semblent perdre l’autonomie
que la sculpture possède et n’ont de sens qu’en
groupe et par rapport à l’endroit où elles sont installées.
MS . Quand je sors de la sculpture et que je cherche à occuper l’espace avec un excès de choses, il
n’y a aucun doute que c’est une position plus égoïste. Je vais occuper plus. Je vais remplir plus. Je
vais exiger plus. La sculpture est plus simple. Je
veux que le travail incommode. Qu’il soit dans une
demeure ou qu’il soit dans la rue.
AF . Il me semble que la logique de l’installation, ce
type d’occupation sans frein de l’espace, est une
manière de faire déborder, de sortir du milieu où
l’on attend que l’art soit, et d’occuper ou d’envahir
la demeure de l’autre, l’espace de l’autre. Mais cet
espace qu’il envahit est un espace de la société
contemporaine, auquel il apporte une information
propre au monde du bazar. Le bazar, qui est un
concentré de formes visibles, envahit les maisons
blanches et élégantes. Ce qui est un fait curieux.
Comment accommoder cela ? La personne va-t-elle
devoir vivre en-dessous de l’œuvre ?
MS . Quand je fais ça, je n’ai pas l’intention de
critiquer l’architecture ou les architectes. Je pense
l’espace. Je ne pense pas seulement l’espace du
musée. Je pense à comment l’œuvre se pose face à
qui y a accès. Quand j’ai mis une énorme sphère de
bois dans la rue, j’ai voulu confondre les gens qui
passaient sur le trottoir. Je veux faire un travail avec
plusieurs de ces chariots qui vendent des CDs
pirates et jouent de la musique dans la rue. je
pense nommer le travail Plágio. En fait, l’idée est
que ce seraient plusieurs artistes. Chacun produirait
un CD en plagiant quelque chose et sortirait dans le
rue, jouant la musique sur son chariot. Mon CD
serait un plagiat du son des coqs, des poules, des
chiens. L’idée est de créer une situation de dérangement, d’introduire un élément étrange dans le
lieu. Vous imaginez la confusion que ce serait, le
coq chantant et les chiens aboyant ? D’autre part,
je me soucie beaucoup de comment mon travail va
être vu par l’autre. Si je vis de ça, et je veux en
vivre, je ne dois pas me distancier des gens. Je dois
y penser. Je dois penser au collectionneur, à la
galerie, au musée. Je dois penser à tout ça.
MA . Mais le fait est que ce souci envers l’accueil de
votre travail n’est pas un obstacle à votre processus
créatif. Il y a toujours des bruits qui tirent la paix de
cette relation avec le public.
MS . Il y a toujours des bruits. cette préoccupation
pour l’espace a déjà commencé, en vérité, au milieu
des années 1990. L’exposition que j’ai faite à la
Fondation Joaquim Nabuco [1994] ressemblait à la
«samba do crioulo doido» (samba du nègre fou),
parce qu’il y avait beaucoup de choses. Mais ça
a été une exposition importante pour moi. Les
gens ont commencé à voir mon travail de manière différente. L’utilisation de la galerie de la
Fondation a commencé à changer à partir de
cette exposition. Avant, on ne pouvait ni percer
ni faire un tas de choses. J’ai commencé à
mettre de l’argile sur les murs de la salle. Ca a
été tout un cirque. Aujourd’hui, ce serait plus
simple. Je n’aurais pas fait ça. Mais j’avais envie
de le faire. Peut-être un désir d’incommoder
l’institution. Je ne sais pas. Mais tout ça a été
important pour que je prenne conscience de ce
que je voulais.
MA . Il y a quelques années, vous avez fait
quelques sculptures en aluminium fondu, dont
les moules étaient des sculptures faites en bois.
Vous conserviez les formes créées, mais les
transposiez vers un autre matériau qui possédait, évidemment, des qualités différentes du
bois : l’un est chaud, l’autre est froid ; l’un
absorbe la lumière, l’autre la reflète. Ce sont
des sculptures qui, de plus, la plupart du
temps, sont présentées en paires : l’exemplaire
en bois et l’autre en aluminium. J’aimerais que
vous parliez un peu de la motivation pour ces
travaux et de comment vous les situez dans
votre œuvre.
MS . A l’époque, j’ai choisi l’aluminium parce
que je voulais travailler avec un matériau qui
puisse cohabiter avec le bois, mais qui provoque également une sensation opposée à celle
provoquée par le bois, qui est un matériau qui
invite au toucher. Et l’aluminium n’invite pas au
toucher, il vous envoie loin. Beaucoup de choses ont surgi de cette motivation. Plusieurs fois,
j’ai fait le moule à partir d’une pièce de bois et
j’en ai fondé une réplique en aluminium. Une
fois, je me suis intéressé à fondre une forme en
aluminium qui ne possède pas de contrepartie
en bois. Alors, j’ai pris une pièce de bois que
j’avais sculptée et j’ai fait faire deux moules
identiques. Quand j’ai réuni les deux moules,
j’ai vu que j’avais créé une pièce qui n’existais
pas en bois, et alors je l’ai fait fondre en aluminium. Mais, peut-être le principal élément de
ces travaux est l’idée même du renvoi, de la
duplicité de formes. Des années plus tard, j’ai
commencé à voir que, là, mon intérêt pour les
miroirs était déjà présent et leur raison d’entrer
dans mon travail. C’est plus évident pour les
miroirs qui font partie de l’installation Roupas
de Casa, qui renvoient les images de la maison,
en en créant des doubles. Il y a encore un
autre élément proche de cette idée, de ce que
j’aime beaucoup, qui est le tampon, un autre
duplicateur d’images.
AF . Depuis votre enfance vous cohabitez avec
les matériaux les plus divers. Vous avez dû être
un enfant qui tripotait tout le temps les choses.
Mais, à un certain moment de nos vies, il y a un
moment où on en vient à avoir une relation
consciente avec les choses, avec la phénoménologie des choses, avec leur manière de se
comporter dans des situations données. Une
chose est cette relation quand vous êtes enfant,
une autre quand vous êtes adulte. Quand en
êtes-vous venu à utiliser, consciemment, le bois
et le cuir ? Qu’est-ce que le bois pour vous ?
Qu’est-ce que le cuir ?
MS . J’ai toujours été très proche du bois. Mon
père me faisait cadeau de choses qu’il regardait
et trouvait étranges. En vérité, je suis un spécialiste des choses inutiles. Chez moi, on ne me
parlait de rien de sérieux, mais de tout ce qui
était inutile, si. Je n’étais invité à participer
qu’aux banalités. Au début, cela me gênait.
Aujourd’hui, je trouve ça sympathique. Papa
m’a toujours donné les choses qu’il trouvait
bizarres. S’il était dans l’état du Piaui et qu’il y
trouvait quelque chose d’étrange, il me l’apportait. Il trouvait un morceau de fer bizarre, il me
l’apportait. Ses cadeaux étaient plutôt en bois.
Il avait une affinité avec le bois. Je pense que,
le voulant ou non, il a été un incitateur de mon
travail. Je me souviens qu’à une certaine époque,
l’usine de canne à sucre de la famille a été détruite.
Et les roue à eau étaient toutes faites en
cajacatinga, parce que c’était le bois le plus résistant à l’eau. Comme j’avais la manie de préserver
les choses, Papa a voulu me faire taire devant ce
démontage et a dit : “Regarde, j’ai démonté toutes
les roues et je les ai gardées pour toi”. J’ai travaillé
avec ce cajacatinga pendant longtemps. J’ai fait
plusieurs travaux pour l’exposition de la Fondation
Joaquim Nabuco, en 1994, et après un temps, ce
matériel a terminé. Alors, il m’a dit que je pouvais
encore trouver de ce bois dans les champs, carbonisé. Et j’en ai cherché. C’étaient de grandes souches. J’ai commencé à me servir de ce bois brûlé et
j’ai découvert que,
creusant trois ou quatre centimètres en direction du
centre du bois, il était préservé.
AF . Ce bois est des restes de brûlis ?
MS . Beaucoup de ce bois était concentré dans la
région [la ville de Gravata, Pernambouc], peut-être
en raison de son usage intensif pour la construction
de barrages. Les barrages étaient faits avec ce bois.
Les roues à eau étaient refaites en permanence
avec ce bois. A un moment, ce bois a disparu de la
région et sont restés les souches au milieu des
champs de canne à sucre. Avec les brûlis de canne
à sucre, année après année, une couche carbonisée
s’est créée sur les troncs. malgré cela, leurs intérieurs étaient préservés. En plus d’être résistant à
l’eau, j’ai découvert que le cajacatinga était très
résistant au feu. Et c’étaient des souches énormes.
Il y avait des souches que je coupais en grands
morceaux pour les emporter dans mon atelier et qui
remplissaient un camion de bois. Alors, j’ai commencé à m’intéresser de plus en plus au bois. Ainsi,
je revenais à l’usine de canne à sucre où j’avais
habité pendant cinq ans. Symboliquement, il semblait que ce bois attendait quelqu’un pour continuer
son histoire. Pendant de nombreuses années, j’ai
travaillé motivé par cette volonté de donner continuité à la vie de ce bois. J’ai, avec le bois, spécialement avec le cajacatinga, cette relation de familia-
rité.
AF . C’est très grand le cajacatinga ?
MS . Il y en a un, tombé depuis mon enfance, que
je suis allé voir il y a peu de temps. Deux cavaliers
assis sur leurs chevaux, un chaque côté du tronc,
n’arrivaient pas à se voir. Ils sont immenses. C’était
l’attraction de l’usine de canne. Et à l’époque à
laquelle j’ai commencé à travailler avec le
cajacatinga, j’ai réveillé une fantastique mémoire
olfactive de mon enfance. Quand le rabot passait
sur la cajacatinga, je me souvenais de l’homme qui
faisait des petits rouleaux de bois avec lesquels je
jouais. Ca a été très intéressant parce que, quand
j’ai commencé à poncer, je me suis aperçu, par
l’odeur, que je connaissais réellement ce bois, et
ainsi j’ai eu des idées pour mon travail. Par le biais
de ce bois, d’une certaine manière, je récupérais
l’usine de canne à sucre.
MA . Il est intéressant que l’odeur du cajacatinga
renvoie à vos souvenirs d’enfance parce que j’ai
toujours vu, dans les formes de plusieurs de vos
travaux, des références à des jouets populaires. Ces
jouets que l’on fait et avec lesquels on joue quand
on est enfant. Ces montages qui ne servent à rien
sinon comme démonstration de la curiosité de
l’enfant. Je ne sais pas s’il serait correct de dire que,
associées à l’odeur du cajacatinga, il y aurait non
seulement une mémoire olfactive, mais aussi une
mémoire ludique.
MS . C’est probable. Je n’avais pas de jouets. Je
jouais à des jeux. Je me souviens que mes frères,
mes sœurs et moi faisions des bœufs en terre pendant une journée entière, nous montions ces énormes monticules et, à la fin de la journée, nous
“tuions” tous les bœufs,
peut-être comme un règlement de comptes de
bagarres entre frères et sœurs. Le jour
suivant, l’histoire recommençait. Je me
souviens aussi que, quand il pleuvait
beaucoup, nous faisions des “barrages” avec de la
terre, pour retenir les ruissellements formés par la
dénivellation du terrain. Quand quelqu’un se dispu-
tait avec les autres, on lui détruisait son barrage, l’eau ainsi libérée
emportait les barrages des autres et il fallait
courir pour ne pas prendre de coups. On
faisait aussi des embarcations avec des troncs
de bananiers pour jouer sur la rivière et, à la
fin, on détruisait tout, ça devenait déjà autre
chose. J’avais une forte relation avec les jeux. Il
n’y avait pas ce culte du jouet qui existe
aujourd’hui. Tout était très dynamique. Peutêtre cela a-t-il influencé mon travail,
principalement le goût pour faire les choses,
bien que j’aime aussi incorporer, dans mon
travail, ce que les autres font. J’aime l’œil de
l’autre. Le savoir faire de l’autre. Je n’ai pas à
faire tout tout seul, ça me plaît aussi, dans mon
travail, ce que l’autre fait.
AF . Mais vous commandez à l’autre ce que
vous voulez ou vous vous appropriez tout simplement le travail déjà fait par l’autre ?
MS . Généralement je le commande, mais le
résultat, parfois, n’est pas utilisé comme il était
planifié. J’ébauche quelque chose et je travaille
ensemble. A certains moments, il est arrivé que
le travail qui était fait en bois soit presque entièrement fait par des assistants. Je ne faisais
qu’orienter et accompagner. Aujourd’hui, j’ai
diminué la production de pièces en bois parce
que j’ai recommencé à faire presque tout personnellement. Bien que j’apprécie le regard de
l’autre, avec le bois, j’aime le travailler moimême à nouveau.
MA . Il y a une question technique que j’aimerais explorer. Vous vous servez des formes que
le bloc de bois possède naturellement pour
créer une pièce ou vous ignorez les formes
naturelles et retirez ce qui est nécessaire pour
créer ce que vous voulez ?
MS . Ce dont je m’aperçois, c’est que quand je
respecte trop le bois, il me domine. Je crois que
le résultat est meilleur quand l’action sur celui-ci
est plutôt brutale. J’ai découvert tôt comment
travailler avec ces grandes bûches de bois. Elles
m’impressionnaient par leur dimension, par leur
poids, tout. Après, j’ai vu que je ne pouvais
penser à ça. Au moment où je crée des formes
il vaut mieux n’avoir de respect pour rien. Mais
le processus, en général, vient beaucoup de
l’intuition, il n’y a pas de planification de où et
comment je vais couper le bois. Ce qu’il y a,
dans certaines pièces, c’est un extrême soin en
raison de la fragilité de la pièce que je suis en
train de créer. Dans des pièces plus récentes, le
désir est de travailler avec le bois comme si ce
n’était pas du bois, à la limite de sa résistance.
Ce sont des pièces extrêmement fragiles qui, si
elles cassent, ne pourront être récupérées. Ce
sont des pièces fines et pointues, des formes
que vous trouvez en verre ou en porcelaine
mais que je veux travailler avec le bois. Peutêtre est-ce une volonté de confondre les matériaux.
AF . Ainsi vous donnez à la pièce l’apparence de
quelque chose qui ne ressemble pas à du bois.
MS . Ou la forme d’intervention, la forme d’action sur le bois est différente de celle qui s’applique normalement à lui. Dans ces pièces, en
particulier, je dois faire moi-même tout le processus de coupe du bois, parce que je n’arrive
à exprimer verbalement à mes assistants ce
que mon œil veut.
AF . Les bois que vous utilisez sont-ils très
différents les uns des autres ?
MS . Ils sont très différents. Il est drôle que,
bien que je travaille le bois, je ne sois pas un
bon connaisseur du bois. Je ne suis pas spécialiste en bois. Mais l’origine du bois m’intéresse.
Je préserve l’environnement sans brandir l’étendard du mouvement écologique. Parce que les
gens utilisent sans limites le bois et abandonnent tout au milieu de la rue. Je n’achète pas
de bois. Le bois que j’utilise est trouvé. Ce sont
des déchets urbains ou ruraux.
MA . C’est curieux cette idée de s’approprier
des choses inutiles pour en faire d’autres qui
n’ont pas non plus de fonction utilitaire. Peut-être
est-ce dans Coleçao I, cet ensemble de 50 petites
pièces, que cette idée d’inutilité semble plus évidente. Mais il y a aussi une autre question qui, à
mon entendement, est très présente dans votre
travail : c’est l’idée de mouvement. Certaines sculptures ont même des roulettes, d’autres sont faites
de pièces articulées qui bougent si quelqu’un les
touche. Celles d’aluminium, on pourrait dire qu’il y a
un mouvement de transfert des formes et des
caractéristiques des pièces de bois utilisées comme
modèles pour les pièces de métal. Mais je crois que
c’est dans les sphères de bois que vous avez faites
que ces deux caractéristiques de votre travail se
combinent et se condensent de la manière, disons, la
plus radicale. La sphère est une forme indéchiffrable ; isolément, elle n’a aucune fonction. En même
temps, elle peut être comprise comme une métaphore de l’idée de mouvement. Les sphères sont le
comble de “l’inutilité” de votre travail. Ce qui me perd
un peu, c’est que, tout de suite après avoir fait les
sphères, vous avez fait le travail Roupas de Casa,
qui, je pense, crée une rupture ou au moins un
hiatus dans votre travail. J’aimerais que vous parliez
un peu de ce passage.
MS . Ce travail [Roupas de Casa] est fait de métal et
de cuir. L’idée m’est venue il y a quelques années,
quand j’ai fait un travail qui était composé de deux
barres d’aluminium fondu, pendues au plafond par
des cordes de cuir tressé, le même produit utilisé par
les vachers. Roupas de Casa a été confectionné à
Cachoeirinha, petite ville de la campagne du
Pernambouc où mon père m’a emmené et où j’ai été
impressionné par les division du travail qui existe
dans la production de harnais, selles, etc. C’est impressionnant. Ca serait une bonne étude pour un
sociologue. Il y a une personne qui coupe le cuir, une
autre qui le tresse, celle qui fait une certaine pièce de
métal est encore une autre, et ainsi de suite. C’est
amusant parce que je me souviens que, petit, je ne
touchais pas le cuir, principalement quand c’était du
cuir de chèvre. J’avais horreur du cuir de chèvre. Des
chèvres et du cuir.
AF . Pourquoi n’aimiez-vous pas les chèvres ?
MS . Je ne sais pas, mais, plus tard, j’ai commencé
à essayer le cuir de chèvre et à goûter la viande
de chèvre pour en finir avec cette aversion. Alors,
je me suis aperçu que le cuir avait la malléabilité
que je cherchais pour travailler et qu’il avait également une odeur spécifique que je n’aimais pas au
début mais à laquelle j’ai fini par m’habituer. De
plus, ce rapprochement avec la chèvre était, inconsciemment, une autre manière de me lier à ma
famille, aux habitudes alimentaires de la
famille, du lieu d’où je venais. Mais je continue à
ne pas aimer la viande.
MA . Et quelle a été la motivation de ce travail,
Roupas de Casa ?
MS. D’une part, il est apparu en raison de cette
relation de proximité avec le cuir que j’avais développée un peu auparavant. D’autre part, en raison
de l’observation que j’ai faite des campements des
travailleurs sans terre le long des routes. Je ne
voyais pas ces baraques comme des maisons ;
pour moi ce n’étaient que des structures couvertes. Et ce que je désirais faire avec le cuir était
exactement cela : des structures couvertes qui ne
soient pas exactement des maisons. Ce sont les
raisons qui m’ont fait commencer le travail, construire tous ces objets. Mais il y avait aussi la question de la ligne. Ca, c’est l’autre point pour lequel
je me suis toujours battu, et je me bats jusqu’à
aujourd’hui : comment travailler, ensemble, les
lignes organiques et les lignes plus précises ? La
confrontation de l’imprécision et de la précision. Le
chaud et le froid. Quand j’ai vu le métal travaillé
par les artisans de Cachoeirinha, je me suis rendu
compte que les marques du processus restaient
sur les pièces qu’ils fabriquaient. Ce n’était pas ces
choses absolument précises où vous ne voyez pas
l’endroit ou une pièce s’encastre dans l’autre. Vous
voyez les encastrements. Vous voyez les surplus
de soudure, même après avoir poli la pièce. Mais
le rapport avec les artisans n’était pas tout de
suite résolu. Pour eux, les articulations des struc-
tures d’acier pouvaient être résolues en pliant
les barres et en faisant beaucoup moins de
points de soudure. Mais, ainsi, la pièce serait
plus arrondie, avec plus de courbes. Mais je
voulais que les articulations des barres d’acier
soient nettes, apparentes. Enfin, le cuir est
venu en tant que couverture de ces structures
métalliques que j’ai fait faire.
MA . Je pense que c’est peut-être le travail
sculptural le mieux défini que vous ayez fait,
en termes de représentation. Les formes des
maisons sont identifiables, même quand elles
s’éloignent de l’idée qu’on se fait habituellement d’une habitation.
MS . C’est une ambiguïté qui me plaît beaucoup. Une chose qui me motive, ce sont ces
rencontres. Ce sont des maisons qui ne sont
pas exactement des maisons. Quand j’ai
pensé à introduire ces miroirs ovales dans
l’installation, j’y ai pensé comme des éléments
traditionnellement liés à la maison. Des éléments liés à l’idée de maison qui réfléchissent
des objets qui n’étaient pas exactement de la
maison.
AF . Cette installation me fait penser à la manière comment différents éléments qui composent, parfois, un travail unique, établissent des
relations entre eux. Quelque chose de semblable à une syntaxe de vos travaux. Tout comme
la Coleçao I et l’Armazém República, Roupas
de Casa est fait d’éléments qui, même si différents du point de vue formel, sont articulés du
point de vue organisationnel. Des éléments
différents qui se justifient, dans l’ensemble du
travail, par l’amarrage que vous promouvez
entre eux. Tous ces travaux sont formés d’éléments distincts qui sont rapprochés, formant
ainsi une chose unique ou, alternativement,
sont des unités qui, bien que fragmentées,
gardent encore une dose d’articulation entre
leurs parties. Dans Roupas de Casa, cette
caractéristique se présente d’une manière,
peut-être encore plus complexe que dans ces
autres travaux, même si ses formes sont plus
familières. Ce travail promeut la jonction du
cuir – matière profondément organique qui
sert de revêtement des maisonnettes, presque
comme si c’était leur peau – et des structures
métalliques qui leur donnent support. Et ce
sont ces mêmes structures qui
apparaissent comme des images dessinées
dans les miroirs, comme des traits. Ce sont
aussi ces structures – cette fois-ci couvertes
de cuir – qui sont réfléchies dans les miroirs.
Des miroirs qui ne sont pas simplement des
superficies réfléchissantes, parce qu’ils sont
encadrés comme des miroirs que l’on rencontre dans des lieux domestiques, comme ceux
de nos demeures. Chaque élément qui compose ce travail est donc présenté de diverses
manières, promouvant une série de transpositions curieuses. Et, dans son ensemble, le
travail est justement fait de cette articulation
entre éléments tridimensionnels et bidimensionnels. Mais j’aimerais continuer à explorer
un peu plus votre processus de création. C’est
une seule personne qui a réalisé les maisonnettes ?
MS . Tout a été fait par une personne qui
travaillait l’acier et une autre qui travaillait le
cuir. Ca a été très bien de travailler avec eux
et il est intéressant de penser à cette relation,
ma manière d’interférer dans leur travail,
parce que ce qu’ils faisaient normalement à
Cachoeirinha sont des objets complètement
différents de ces pièces qu’ils ont produit pour
moi. La première structure faite par la personne que j’ai embauchée n’avait pas seulement l’apparence d’une maison, mais avait un
toit, une porte, tout. Il m’a montré le résultat
et a dit, assez satisfait: “Marcelo, j’ai ajouté
quelques petites choses à la structure que
vous m’avez commandée. Ca m’a donné beaucoup de travail mais c’est beaucoup mieux.”
Quand j’ai vu les petites charpentes du haut
du toit, toutes les divisions de la maison, j’ai vu
qu’il fallait que j’interfère plus dans le processus. Il
a fallu que je dise: “Je sais que le travail a été très
grand pour faire de cette manière, mais je voudrais retirer ces éléments que vous avez mis.”
Chaque fois que je faisais le dessin de la structure
que je désirais, il fallait que je lui dise de la faire
avec le minimum de lignes nécessaires pour la
rendre possible. Je ne voulais rien d’excessif. Si
c’était possible de résoudre en quatre lignes, je
n’en voulais pas six. C’est alors qu’il a compris ce
que je voulais et il a embarqué dans l’histoire.
AF . Vous avez montré le résultat aux habitants de
la ville ?
MS . J’ai fait une exposition éclair. Elle n’a duré
qu’une heure et demie, sur la place principale de
la ville. Il y avait 41 maisonnettes. Mais là, il n’y
avait pas les miroirs. Ca a été intéressant de voir
la réaction intéressée des autres travailleurs qui
faisaient aussi des objets d’acier et de cuir, et du
peuple de la ville, réactions au résultat du travail
qui avait été réalisé là. En fait, faire ce travail à
Cachoeirinha revêt aussi cet aspect, la volonté de
sortir de l’atelier et de débarquer dans une autre
ville, changer d’ambiance de travail et d’exhibition
de l’œuvre. Il existe cette volonté d’échanger des
informations et d’ouvrir le travail aux autres, de
tout mélanger, de voir ce qui surgit de ce contact.
Cette expérience fait partie d’un projet plus ample,
le Correcaminhos. J’avais eu une expérience antérieure de travail dans un contexte hors de mon
atelier, à Garanhuns. Cachoeirinha a été le second
moment de ce projet.
AF . Et cet échange d’informations a affecté d’une
certaine manière votre travail ?
MS . Je pense que l’expérience de Cachoeirinha a
consolidé l’idée d’incorporer à mon travail ce que
je ne considérais auparavant que comme une
partie de son processus. Avec Roupas de Casa,
j’en suis aussi venu à mieux comprendre la lien de
l’utilisation des miroirs avec la fonte des métaux.
L’importance de la question de copier, de reproduire les choses à partir d’une matrice, que ce soit
une image ou un processus de travail. De manière
contradictoire, avec ce travail, est revenu, plus
fortement, la volonté de travailler avec les mains,
quelque chose qui était très fort quand je jouais
lorsque j’étais enfant. Quand j’étais petit, les gens
se moquaient de moi parce que je n’arrivais pas à
arrêter mes mains plus que
quelques secondes. J’avais une tante qui travaillait
le tissu et quand j’arrivais chez elle, je coupais les
restes des tissus qu’elle utilisait. Au fil du temps
j’ai appris à me contrôler plus, mais le goût du
travail manuel est encore très fort.
AF . Mère Tereza de Calcutta disait que la plus
belle distraction est le travail. C’est une manière
pour vous d’oublier ce qui vous entoure, de rester
penché sur une seule activité. C’est une manière
de prendre plaisir à manipuler les choses, que ce
soit en faisant une coupe, un pli, un emboîtement.
C’est joli que vous disiez à la personne qui soude
les structures des maisonnettes que vous voulez
une chose plus rustique. Mais aussi que vous ne
voulez pas qu’il plie l’acier. Qu’il ait le travail de
couper puis de souder le métal. C’est rustique,
mais en même temps, ce n’est pas la méthode la
plus simple.
MA . Il est intéressant aussi que ce soit si crucial
pour vous et que ça ne soit pas visible. La structure de métal est complètement cachée sous le
cuir.
MS . J’ai un tas de choses cachées. J’aime bien les
choses cachées. Et aussi des vides. J’ai un autre
travail [De Luxe, 2002-2004] formé de petites
boîtes faites d’un bois qui a un arôme très fort. Je
me suis beaucoup demandé si je devais les laisser
vides ou si je devais les remplir avec quelque
chose. Au début, j’ai pensé que si l’idée du travail
était de garder l’odeur dans les boîtes, il ne devrait
rien y avoir d’autre que l’odeur. Cependant, si je
les laissais vides, les gens finiraient par y garder
de petits objets. Pour résoudre la question, j’ai
mis, dans les boîtes, des blocs faits du même bois
qui avait servi à leur confection, occupant tout leur
espace interne. Je suis arrivé à la conclusion
que, dans ce cas, comme dans beaucoup
d’autres, je devais remplir le vide.
CHRONOLOGIE
Joana D’Arc Lima
Marcelo Luiz Silveira de Melo est né en 1962,
à Gravatá, ville des hauteurs du
Pernambouc, située à 85 kilomètres de
Recife. Il a passé son enfance à l’usine de
canne à sucre Amora Grande, propriété de
ses parents. Troisième d’une famille de six
enfants et considéré comme “le curieux” de
la maison, il a appris, depuis petit, à
réinventer “des choses” et des solutions pour
les défis de l’enfance. Il recevait de ses parents des cadeaux inhabituels, de petites
trouvailles qui sont restés gravées dans ses
souvenirs et qui sont devenues des références pour l’univers ludique
présent dans beaucoup de ses travaux. En
1979, il déménage à Recife, avec un de ses
frères.
Les années 1980, au Brésil, sont marquées,
dans le domaine social et politique, par la
transition vers un régime démocratique, qui
franchit un pas décisif à partir du mouvement pour la réalisation d’élections directes
pour le Président de la République (“Diretas
Já”). Dans le domaine des arts
visuels, il y a une revitalisation visible de la peinture et la
constitution de réseaux de relations construits par des
déplacements territoriaux (réels et virtuels) d’artistes et
d’intellectuels, isolément ou en groupes. A Recife, ces
changements se reflètent dans la création des Brigades
Portinari, Gregorio Bezerra et Henfil (1982) – collectifs
artistiques impliqués dans les changements politiques en
cours –, dans la réalisation de la Première Exposition
Internationale d’Art en Outdoor/Artdoor (1981), dans le
Mouvement d’Art Tátil (1982), dans le Mouvement d’Art
et de Culture du Nordeste (1983), dans l’apparition des
groupes Astrobelo (1982), Formiga Sabe que Roça
Come, Brigade Compressora, Brigade Ecologique,
Carasparanambuco (1986), Atelier Collectif d’Olinda
(1989), entre autres. A cette époque, les salons d’Art du
Musée de l’Etat du Pernambouc – MEPE et les expositions réalisées au Musée d’Art Contemporain du Pernambouc – MAC, à Olinda (tout particulièrement le Salon des
Nouveaux), font découvrir une nouvelle génération d’artistes. La Galerie Métropolitaine Aloisio Magalhães (actuel
Musée d’Art Moderne Aloisio Magalhães – MAMAM), la
Galerie Artespaço et des
espaces informels d’exposition contribuent à dynamiser
le circuit local.
La période de 1982 à 1985 marque le début de
la formation de Marcelo Silveira. la fréquentation
de l’Atelier Guaianases, à Olinda, lui permet
d’établir des contacts avec des collègues et,
ainsi, de participer activement aux débats propres au milieu dans lequel il commence à s’insérer. Pendant cette période de formation, la fréquentation de l’artiste du Minas Gerais, Liliane
Dardot, et leurs conversations sont importantes.
Celle-ci habite à l’époque à Olinda ou elle plaide
pour une expression artistique libre des règles
“académiques”. Grâce à ce contact, Marcelo
Silveira approche le travail et les écrits d’Amílcar
de Castro. La proximité avec le jeune artiste
plastique Rinaldo marque également cette phase
initiale de sa vie professionnelle et sociale dans
la ville de Recife.
En 1985, il entre au cours d’Education Artistique
de l’Université Fédérale du Pernambouc – UFPE,
où le contact avec le professeur et artiste José
de Barros le marque profondément, celui-ci faisant de l’espace formel de l’université un point
de rencontre entre jeunes qui veulent s’exprimer
au moyen du “faire” artistique. Les conversations
se continuent dans son atelier particulier, transformé en laboratoire d’expérimentations, questionnements et échanges d’idées sur les matériaux, les procédés et les résultats obtenus par
ses élèves. Simultanément, Marcelo Silveira construit un atelier de travail à Gravatá (Arte & Cia),
espace de création également ouvert à diverses
manifestations culturelles locales et à des rencontres artistiques avec des enfants de la région.
Bien que sans financement, ces activités se prolongent sur une période de cinq ans, étant cruciales pour sa formation en tant qu’artiste et
professeur. Cette expérience est enregistrée dans
le documentaire Bricadeira é Coisa Séria (1990),
réalisé par l’ONG Auçuba Comunicação e
Educação, et ensuite
transformée en exposition du même nom, à
l’Espace Culturel de la Bibliothèque Centrale
de l’UFPE, pendant la Réunion Annuelle de la
Société Brésilienne pour le Progrès de la
Science, en 1993.
Toujours en 1985, il va à São Paulo à
l’occasion de la XVIIIe Biennale de São Paulo,
année ou la conservatrice Sheila Leirner
réunit, dans un long couloir du Pavillon de la
Biennale, une sélection de la peinture nationale et internationale contemporaine, qu’ellemême a dénommée de “A Grande Tela” (La
Grande Toile»). Lors de ce
voyage, il est très impressionné par les travaux des artistes Emmanuel Nassar et Nuno
Ramos. La participation à quatre
Festivals d’Hiver de l’Université Fédérale du
Minas Gerais (1985, 1987, 1988 et 1989) est
marquante pour sa formation. Le
contact avec d’autres artistes, avec des critiques d’art et des professeurs venant de
toutes parts du pays élargit son répertoire
sur l’histoire de l’art et sa connaissance du
domaine des arts plastiques qui se
redessinait dans le pays, en plus de réduire
la sensation d’isolement. La fréquentation
des ateliers et des stages des Festivals d’Hiver rendent possible la recherche
artistique avec de nouveaux matériaux et, à
partir de là, un changement de procédés
constructifs, signaux d’une inquiétude
envers les limites de l’espace bidimensionnel
et du début d’expériences avec des
sculptures et des objets.
Il participe au XIVe Salon des Nouveaux
(1985), au MAC, et, en 1986, il réalise, à
Gravatá, à l’Art et Cia, une exposition avec
des travaux réalisé selon diverses techniques. En 1987, il est présent au Salon d’Art
Contemporain du Pernambouc, au Centre de
Conventions du Pernambouc, et intègre le
groupe Carasparanambuco, formé de sept
autres autres artistes : Alexandre Nóbrega,
Eduardo Melo, Félix Farfam, João Chagas,
José Patrício, Maurício Silva et Rinaldo. Tous
en début de carrière, cherchant à s’insérer
dans le domaine des arts plastiques, créant
des espaces et des événements dans la ville,
s’affirmant comme partie intégrante d’un
mouvement en dialogue avec les questions
de la culture contemporaine à partir de son
lieu d’origine. Il fréquente, de 1988 à 1994 le
Quarta Zona de Arte, atelier collectif engagé
dans la production contemporaine, fondé,
entre autres, par les artistes Fernando
Augusto, Flávio Emanuel, José Paulo, Márcio
Almeida e Maurício Castro, par l’illustrateur
et dessinateur de B.D. Humberto Araújo et
par le communicateur visuel Aurélio Velho.
En 1988, Marcelo Silveira commence des
expérimentations avec du bois. De petits
morceaux de cette matière viennent intégrer
des surfaces qui composent ses œuvres
bidimensionnelles et, déjà à cette époque,
les premiers objets tridimensionnels. Il participe cette année-là au 7e Salon d’Art du Pará,
à Belém, à la 7e Exposition de Gravure, à
Curitiba, et à la 7e Exposition de Dessin Brésilien, également à Curitiba. En 1989, il participe au Salon d’Art Contemporain du Pernambouc, au MEPE, inscrit dans la modalité
Peinture Murale Collective. En 1990, il réalise
une exposition individuelle, à la Galerie Itaú,
à Belo
Horizonte. Lors de cette exposition, Marcelo
Silveira présente son Engenho de Objetos,
réunion de vingt-cinq travaux réalisés entre
1989 et 1990. Il utilise, comme matière première de ces objets, des résidus
rencontrés dans l’usine de canne à sucre de
son père, à Gravatá, des fragments de bois
trouvés dans divers lieux et qu’il a réunis et,
enfin, des morceaux de bois que ceux qui
connaissent son intérêt pour ce matériau lui
donnent. Le procédé, pendant cette phase,
se caractérise par une “attitude sculpturale”
de nier, dans les objets créés, le sens fonctionnel
d’origine de la matière, la transformant pour la
réintégrer dans une ambiance qui rend possible
l’affleurement des sens multiples et inusités.
Toujours en 1990, il voit l’exposition de Arthur
Bispo do Rosario, au Musée de la Pampulha, à
Belo Horizonte, laquelle va marquer
profondément sa manière de voir l’art et le travail de l’artiste.
En 1990, il est diplômé en éducation artistique
par l’UFPE et, en 1991-1992, il voyage en Europe
et en Afrique du Nord, où il épouse une attitude
nomade, parcourant divers territoires et recueillant fragments et images de cultures “nouvelles” et “archaïques”. En 1991, il réalise une
exposition individuelle à Braga, au Portugal, à la
Galerie BeloBelo. Il s’installe pour trois mois à
Barcelone où il fréquente l’école Massana de
Artes. Cette expérience lui permet de développer
un travail à partir de rebuts et de restes de bois
et de fer, en les incorporant à l’espace de son
atelier dans l’école. De retour au Brésil, il fait
l’exposition “Torres, Construções e História de
um Templo” (1993), à la Galerie Itaú, à Vitoria,
où il montre vingt pièces en bois et en fer avec
des jeux d’encastrement, créées à partir d’une
collection de morceaux de bois trouvés et pour la
réalisation lesquelles il n’a utilisé que des limes
et de la colle. Il explore, dans ces travaux, le
sens vertical des constructions et se fait référence à un temps où les hommes construisaient
leurs propres habitations ainsi que les objets qui
faisaient partie de l’espace occupé.
Avec l’installation Paisagem Estranha (1994),
montée dans la Galerie Vicente do Rego
Monteiro, (Fondation Joaquim Nabuco), à Recife,
l’artiste surprend le public en intervenant directement dans l’espace d’exposition. Il montre de
petits objets formés en fil de fer qui ressemblent
à des dessins et des sculptures faites de divers
bois (amarelo, cajacatinga, cèdre, acajou entre
autres) qui laissent voir leurs fissures et veines,
complétés par l’insertion de morceaux de fer
oxydé et de dessins découpés. La composition
des objets, selon Marcelo Silveira, était inspirée
de la structure des maisons populaires et de la
disposition des ex-voto dans les chapelles. La
même année, il est sélectionné pour le 14e Salon
National d’Arts Plastiques, à Rio de Janeiro, où il
montre une sélection de 70 objets en métal, faits
à l’origine pour l’installation Paisagem Estranha,
et qui, selon l’artiste, font partie d’un nouveau
moment de sa carrière où le fer n’est plus seulement un élément de la composition de l’objet et
devient, en soi, la seule matière. Toujours en
1994, il participe à une exposition collective dans
la ville de Porto, au Portugal, nommée “Memória
da Amazônia : Etnicidade e Territorialidade”, avec
un autre artiste de
Recife, Flávio Emmanuel. Il participe au 51e Salon d’Art Contemporain du Paraná, à Curitiba.
En 1995 et 1996, Marcelo Silveira poursuit ses
activités dans le domaine de l’art-éducation,
animant des ateliers de création tridimensionnelle dans diverses institutions culturelles et
universitaires brésiliennes. Cette période est
marquée par la recherche formelle avec le
cajacatinga – bois noble en voie de disparition
rencontré sous forme de souches partiellement
carbonisées, abandonnés dans l’usine de canne à
sucre de la famille. Il est sélectionné pour le IIe
Salon UNAMA de Petits Formats, à Belém (1996),
organisé par
l’Université de l’Amazonie. Avec d’autres artistes
du Pernambouc et de la Paraíba (Alexandre
Nóbrega, Alice Vinagre, Betânia Luna, Dantas
Suassuna, Eudes Mota, Luis Santos et Rodolfo
Mesquita), il est choisi pour participer, avec ses
travaux, au III e Salon d’Arts Plastiques du Musée
d’Art Moderne de la Bahia, à Salvador. Il participe, toujours en 1996, à l’événement Art
Brésil, au Musée Nicolas Sursock, à Beyrouth, au
Liban, à l’exposition “Arts Plastiques Contemporains Brésiliens” (avec comme commissaire l’architecte Janete Costa et la présence des artistes
Aprígio, José Paulo, Marianne Peretti et du
designer André Lasmar) et à l’exposition
collective de la Neuhoff Gallery, à New York,
aux Etats-Unis.
Lors de la seconde moitié des années 1990,
l’effervescente scène culturelle locale (commandée par la production musicale liée au
mouvement Mangue Beat) influence la production artistique du pays et est contaminée
par plusieurs langages internationaux contemporains. Dans la musique, dans le cinéma
et dans les arts visuels, surgissent de nouveaux groupes d’artistes et d’ateliers collectifs – Molusco Lama (1994), Carga e
Descarga, Camelo (1996), Sub-Graf et
Telefone Colorido (1997), entre autres, renouvelant le milieu culturel-artistique de
Recife. L’Institut d’Art Contemporain – IAC
(1996), la Galerie d’Art Capibaribe (1998),
toutes deux liées à l’UFPE (Université Fédérale du Pernambouc), sont créés ainsi que
l’Institut de Culture de la Fondation Joaquim
Nabuco, dynamisant les activités d’exposition
déjà développées par l’institution et organisant cours et débats sur l’art moderne et
contemporain. Le Bureau Arte Amparo est
ouvert, puis transformé en Galerie Amparo
60. Avec l’exposition “Ver & Verso
Pernambuco”, en 1997, le MAMAM est
inauguré, réunissant des œuvres de plus de
60 artistes, y compris des sculptures de
Marcelo Silveira.
En 1998, Marcelo Silveira présente, à la 16e
édition du Salon National d’Arts Plastiques,
réalisé à Rio de Janeiro, le travail
Cajacatinga, résultat des recherches formelles faites sur ce bois. Les éléments qui composent Cajacatinga peuvent être comparés à
des vocables d’une écriture inconnue ou
inventée, faits de morceaux de bois coupés
ou poncés sous des formes diverses. Toujours cette année-là, il intègre le collectif
“Ceará e Pernambuco –
Dragões e Leões”, au Centre Dragão do
Mar d’Art et de Culture, à Fortaleza. Il
réalise également l’exposition “Dos Presentes
do meu Pai”, à la Galerie d’Art Marina Potrich,
à Goiânia, et à la Galerie Ária, à Recife. Dans
cette exposition, les objets en bois acquièrent des formes
organiques, sont malléables et emboîtés,
laissant exposés, aux yeux du spectateur, les
axes, les trous et les structures
d’emboîtement qui leur donnent forme. Bien
que poncés, ils ne présentent pas une
finition excessive, révélant ainsi les veines, la
couleur et la texture naturelle des bois utilisés. Fin 1998, Marcelo Silveira est primé au
Ve Salon d’Arts Plastiques de la Bahia, réalisé
au Musée d’Art Moderne, à Salvador.
La fin des années 1990 et le début de la
décade suivante sont marqués, à Recife, par
des débats institutionnels sur la dichotomie
internationalisme versus nationalisme, où
apparaît clairement la capacité singulière que
la production locale a de fondre, et non pas
d’opposer, ces deux termes. Si le MAMAM,
avec les expositions de Jean Michel Basquiat
et Joseph Beuys, entre autres, favorise des
connections entre les circuits locaux et internationaux, la Fondation Joaquim Nabuco, au
moyen d’une programmation de cours, de
conférences et de la participation à des projets de recensement de la production artistique régionale (Projet Nordestes) et nationale
(Programme Itaú Cultural Rumos Visuais),
attire dans la ville plusieurs critiques, historiens, artistes et commissaires,
promouvant la circulation et l’échange
d’informations tout en rendant visible la
production culturelle de la ville. Des partenariats institutionnels permettent des échanges
entre les états comme l’exposition “Arte
Contemporeana [2000-1]” (1999), réalisée
au MAMAM et au Musée d’Art Moderne de la
Bahia, et qui inclue des travaux de Marcelo
Silveira. Cette année-là, l’artiste reçoit un prix au
3e Salon de Sculpture du Paraná, à Curitiba,
participe à l’exposition qui intègre le Projet
Nordestes, au Sesc Pompéia, à São Paulo, et
aussi à la collective “O Luar do Sertão”, à la
Galerie Roesler, également à São Paulo, puis
présentée au Escritório de Arte Amparo 60, à
Recife.
En 2000, Marcelo Silveira réalise sa première
exposition individuelle à São Paulo, de nouveau à
la Galerie Roesler. Cette exposition révèle des
procédés distincts comme l’utilisation du bois et
l’introduction de nouveaux matériaux dans ses
travaux, tels que l’aluminium et le cuir. Il présente aussi, à cette occasion, une collection de
50 petits objets de bois qui forment un unique
travail (Coleçao I, 1999), annonçant les deux
facettes, dans son œuvre, la sculpture et l’installation. Désactivé depuis 1993, la reprise du Salon
Pernamboucain d’Arts Plastiques, en 2000 –
organisé sous le thème Art Actuel Brésilien et
réalisé à l’Espace Culturel Malakoff, à Recife –
mobilise le milieu artistique local en plus de remettre à l’ordre du jour quelques questions
comme la formation de publics pour l’art contemporain. Les travaux de Marcelo Silveira sont sélectionnés et primés lors de ce Salon.
Il participe, toujours en 2000, à plusieurs expositions collectives, en particulier
“Sculptures Brésiliennes”, réalisée à la
Pinacothèque de l’Etat de Sao Paulo, la “1re Biennale Internationale d’Arts Plastiques de Buenos
Aires”, “Investigações : Rumos Visuais 2”, à la
Itaú Cultural, à São Paulo, et “Desconcertos da
Forma”, à la Galerie Itaú
Cultural de Belo Horizonte, Brasília et Penápolis.
Il intègre la collective “Le Crayon et le Papier
(sur la liberté, la simplicité et le sens)”, à la
Galerie Roesler, à São Paulo, qui rapproche son
travail sculptural de la production graphique
d’autres artistes contemporains, comme Adriana
Rocha, Alexandre Nóbrega, Arthur Lescher, Maria
Teresa Louro, Nina Moraes et Tomie Ohtake.
Cette même année, un espace collectif qui agite
la scène artistique et culturelle de Recife est
créé, l’Atelier Submarino.
Il commence une recherche et une convivialité
avec des artisans de l’intérieur du Pernambouc,
avec le projet Correcaminhos, qui consiste au
déplacement temporaire de son atelier vers des
villes de l’intérieur du Pernambouc et à l’élargissement du circuit des “médiateurs” de l’œuvre.
Ces expériences commencent dans la ville de
Garanhuns. Il réalise en 2001 l’exposition “Entre
a Surpresa e o que se Espera”, à la Galerie
Amparo 60, à Recife. Une des salles de l’exposition montre une série de pièces qui rapprochent
son travail sculptural du domaine de l’expression
graphique, en plus d’adopter, une fois de plus, le
cuir comme élément constructif, l’incorporant
non seulement pour sa douceur et souplesse,
mais aussi parce qu’il possède une odeur forte et
distincte. Dans d’autres salles de la galerie, il
exhibe trente sphères de différents diamètres
faites de bois découpé (cajacatinga, barauna et
jaca). Il taille, en bas relief, sur ces sphères, des
symboles utilisés par les fers à marquer le bétail,
s’appropriant une écriture faite des initiales de
plusieurs générations de familles de propriétaires
de troupeaux et qui représentent donc des cycles
de vie humaine. La plus grande de ces sphères
est installée à des points de grande circulation
de personnes, dans les rues de Recife, changeant chaque jour de localisation. Les réactions
du public à la présence de la sphère sont photographiées et
exposées dans la galerie.
D’autres expositions sont réalisées en 2001. Il
fait une exposition individuelle au Musée d’Art
Contemporain du Paraná, à Curitiba, où il montre
des sculptures travaillées en bois, aluminium et
cuir. Il participe à l’exposition “Nordeste Brésilien : Matrice Populaire et Conscience Constructive”, au Musée de l’Etat du Pará, à Belém. Il
expose, comme artiste invité, à l’exposition
collective “Casa Coisa”, réalisée par l’Atelier
Submarino, à Recife, où il crée un travail qui
prend pour problématique le thème du travail
domestique: Quarto de Empregada. Poursuivant son processus d’incorporation de nouveaux procédés et matériaux dans son travail, Marcelo Silveira présente, à la collective
“Em Sete Tempos” (2002), à la Galerie
Amparo 60, à Recife, une première version
d’Armazém República, une collection d’objets
de verre déjà existants, que l’artiste récupère
et organise sur une étagère, construisant des
combinaisons et des regroupements qui
suggèrent des relations inusitées entre le
grand et le petit, l’opaque et le transparent,
le léger et le lourd. Toujours en 2002, il participe au Projet Faxinal das Artes, à Faxinal
do Céu, dans le Paraná. Au 47e Salon
Pernamboucain d’Arts Plastiques (2002),
dans l’usine Tacaruna, à l’époque désactivée,
à Recife, il réalise le travail Combinação
Tacaruna, pièce tressée de lanières de cuir
de chèvre qui crée et démarque un volume
vide et dont la taille varie selon l’espace où
elle est mise.
Grâce à son projet Correcaminhos, réalisé en
2000, Marcelo Silveira fait la connaissance, à
Cachoeirinha – ville située à 170 km de Recife - , des artisans qui travaillent l’acier et le
cuir pour confectionner certaines pièces de
sellerie et des article d’équitation, organisés
selon une rigide division du travail. Roupas
de Casa, titre de l’installation qui comporte
l’exposition individuelle qu’il a fait à la Galerie Roesler, en 2003, résulte de ce vécu de
l’artiste, et consiste en
“sculptures-maisons” qu’il a conçues et qui
ont été exécutées par des artisans de
Cachoeirinha (structures faites en acier et
“revêtement” fait en cuir). Dans ce travail,
l’artiste réinvente aussi, poétiquement, les
innombrables structures de bâches
disposées en lignes droites qui forment les
campements des travailleurs sans-terre et
que l’on rencontre le long de la route qui
relie Recife à Cachoeirinha.
Il participe, toujours en 2003, à l’exposition
collective “Ver de Novo, Ver o Novo”,
composée de travaux appartenants à la
collection du MAMAM, et à plusieurs autres
expositions, y compris “Vanguarda para
Todos”, au Galpão, Uberaba, Minas Gerais,
“Caminhantes”, à l’Institut Ricardo
Brennand, à Recife, et “Mostra
Retrospectiva : Salão da Bahia 19942002”, à la Fondation Joaquim Nabuco,
également dans la capitale pernamboucaine.
Il présente, lors d’une exposition collective à
la Galerie d’Art Dumaresq, à Recife, et pour
la première fois, Garrafada (2003), un travail
multiple, composé de 28 bouteilles de verre
identiques, la moitié contenant de petits
morceaux de lanières de cuir et le reste
contenant de la sciure de venant plusieurs
variétés de bois et donc, de plusieurs
couleurs. Il participe, cette même année, à
l’événement pluridisciplinaire “Ordenação e
Vertigem”, au Centre Culturel Banco do
Brasil, à Sao Paulo, organisé autour de
l’œuvre de l’artiste Arthur Bispo do Rosario,
où il expose le travail Coleçao I (1999).
En 2004, il fait une exposition individuelle à
la Pinacothèque Universitaire, à Maceió. Il
montre dans cette exposition, en plus d’une
sélection de travaux de taille réduite et d’un
ensemble de sphères de bois faites en 2001,
l’installation Armazém República, formée de
cent pièces de bois, réalisées entre 2001 et
2004, liées par des lanières de cuir et
accrochées au plafond. il montre aussi, dans
cette exposition, deux de ses “livres
d’écriture”, où les aspects graphiques de son
travail sculptural gagnent une expression
bidimensionnelle. Il fait une exposition
individuelle au MAMAM, où il présente une sélection de travaux effectués entre 1998 et 2004,
permettant la visualisation des inflexions de sa
trajectoire lors de cette période. Parmi les travaux les plus récents, il montre
l’installation Roupas de Casa et une version
élargie de Armazém República, composé, en
plus des pièces de bois accrochées au plafond,
de centaines d’objets de verre disposés sur une
étagère. Il réalise, au Torreão, à Porto Alegre,
un travail d’appropriation de l’espace –
Combinaçao Torreão - , créant une structure de
cuir tressé, réplique de la salle d’exposition, et
qui est, postérieurement, adaptée à l’espace du
Gasometro, également à Porto Alegre, à celui du
MAMAM, à Recife et à celui du Centre Culturel
Sao Francisco, à Joao Pessoa. Il
réalise, toujours cette année, une exposition à la
Galerie Celma Albuquerque, à Belo
Horizonte, participe à l’exposition “Paralela
2004”, à São Paulo, et une exposition
individuelle au Centre Culturel Sao Francisco, à
João Pessoa. En 2005, il fait une exposition
individuelle au Centre Universitaire Maria
Antonia, à Sao Paulo, et participe à l’exposition
collective au Carreau du Temple, à Paris, France,
événement faisant partie de la
programmation officielle de “L’année du Brésil
en France”, et de la cinquième édition de la
Biennale du Mercosul, à Porto Alegre.
Organização editorial e ensaio crítico
Moacir dos Anjos
Entrevista
Marcelo Silveira
Agnaldo Farias
Moacir dos Anjos
Cronologia
Joana D´Arc Lima
Fotografias
Flávio Lamenha
Jailton Moreira [Combinação Torreão]
Manoel Veiga [Roupas de Casa . Casa Abelha . Casa Bernardo . Casa Coronha]
Wilton Montenegro [Bochinche]
Tratamento de imagem
Robson Lemos
Revisão de texto
Anatailde Crespo
Tradução para o Francês
François Tardieux
Projeto gráfico
Martinho Patrício
Valquíria Farias
Produção gráfica
Robson Lemos
Impressão
Gráfica Santa Marta
Agradecimentos
Adriana Franco, Agnaldo Farias, Carlos Augusto Lira, Cecília e Ricardo Brennand, Celma
Albuquerque, Flávio Lamenha, Francisco Baccaro, Genivaldo dos Santos,
Gil Vicente, Joana D’Arc Lima, João Marinho, Lúcia Santos, Manoel Veiga,
Martinho Patrício, Nara Roesler, Nona Maia, Paula e Flávio Silveira, Rivaldo do Espírito
Santo, Robson Lemos, Valquíria Farias.
FUNDARPE, Secretaria de Cultura do Recife e equipe do MAMAM.
Moacir dos Anjos é pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco e diretor geral do Museu
de Arte Moderna Aloisio Magalhães . MAMAM
Agnaldo Farias é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade
de São Paulo e curador independente
Joana D´Arc Lima é historiadora de arte e arte-educadora
Marcelo Silveira é representado por
Galeria Nara Roesler [São Paulo]
Celma Albuquerque Galeria de Arte [Belo Horizonte]
Galeria Mariana Moura [Recife]

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