análise do discurso de escritos em carteiras e paredes de sala de aula

Transcrição

análise do discurso de escritos em carteiras e paredes de sala de aula
ANÁLISE DO DISCURSO DE ESCRITOS EM CARTEIRAS E PAREDES DE
SALA DE AULA
Jaber Aller Sater Gebara*
Felipe Maciel dos Santos Souza**
RESUMO: O presente estudo analisa o que pode ser encontrado no ambiente escolar como inscrições
nas carteiras, nas paredes, nas portas de salas. Entender estas marcas como uma forma de comunicação
significa considerar que os estudantes anunciam os seus desejos e pensamentos e marcam seus lugares.
Esta pesquisa foi realizada em uma instituição privada localizada no interior do Estado do Mato Grosso
do Sul, com o objetivo de analisar o discurso de escritos em carteiras e paredes de sala de aula. Para
isto, foi selecionada uma sala de aula que é usada tanto por estudantes do Ensino Médio quanto por
estudantes do Ensino Superior. Foram capturadas imagens através do uso de um smartphone, com
câmera fotográfica de 8 megapixels e resolução 3264 x 2448. A coleta ocorreu em um momento em que a
sala de aula não estava sendo ocupada. Foram capturadas 100 imagens, as quais foram obtidas tanto de
carteiras quanto de paredes. A partir deste total, os pesquisadores criaram categorias e distribuíram as
imagens em: declaração de amor/poemas (12); palavras de cunho religioso (21); matérias de disciplinas
(19); mensagens para professores (2); números de telefones (7) e teor sexual (39). A partir das imagens
foi possível determinar que as inscrições possuem caráter de demarcação de território. Além disto,
verifica-se que os estudantes estabelecem comunicações entre si através destas inscrições, e o que
conteúdo principal é de teor sexual.
ABSTRACT: This study analyzes what can be found in the school environment as inscriptions on the
student desks, the walls, the classroom doors. Understanding these brands as a form of communication
suggests that students advertises their wishes and thoughts and mark their places. This research was
conducted in a private institution located in the state of Mato Grosso do Sul, with the aim of analyzing the
speech written in portfolios and classroom walls. For this, it selected a classroom that is used by high
school students and by students of Higher Education. Images were captured through the use of a
smartphone with camera of 8 megapixels and 3264 x 2448 resolutions. The collect took place at a time
when the classroom was not being occupied. Were made 100 images, which were obtained both in student
desks as walls classroom. From this total, the researchers created categories and distributed the images:
declaration of love / poems (12); religious nature (21); school subjects (19); messages for teachers (2);
telephone numbers (7) and sexual content (39). From the pictures it was determined that the inscriptions
can delimit territory. Moreover, it appears that students establish communications with each other
through these registrations and the main content that is sexual content.
PALAVRAS-CHAVE: Ambiente escolar, grafite, pichação.
KEYWORDS: School environment, graffiti, graffiting.
INTRODUÇÃO
A instituição educacional apresenta-se, hoje, como uma das mais importantes
instituições sociais por fazer, assim como outras, a mediação entre o indivíduo e a
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
1
sociedade. De acordo com Bock, Furtado e Teixeira (1999), ao transmitir a cultura e,
com ela, modelos sociais de comportamento e valores morais, a instituição educacional
permite que a criança “humanize-se”, cultive-se, socialize-se ou, numa palavra, eduquese.
O meio físico de uma instituição educacional atua de modo não-verbal e, segundo Elali
(2008), tem impacto direto e simbólico sobre seus ocupantes, facilitando e/ou inibindo
comportamentos. Na instituição educacional, ele possibilita a decodificação e a
aprendizagem até mesmo de normas sociais, comunicando não-verbalmente aos
estudantes as intenções e os valores dos professores enquanto pessoas que exercem
controle sobre o espaço (LOUREIRO, 1999).
Assim, analisando uma sala de aula comum, é possível dizer que os móveis existentes e
seu posicionamento informam as expectativas quanto a ocupação do local, percepção
que tende a ser confirmada ao longo do tempo a partir da experiência diária, do
conhecimento mútuo professor-alunos e das normas institucionais. Cadeiras dispostas
em círculo sugerem que ocorrerá uma discussão na qual é esperada a participação de
todos; carteiras enfileiradas voltadas para o professor pressupõem aula expositiva;
mesas próximas entre si formando blocos maiores indicam a realização de trabalhos em
grupos, e assim por diante (ELALI, 2008).
Além disso, Sommer (1973) destaca que a disposição da mobília e as condições
ambientais da classe (acústica, temperatura, insolação, ventilação, luminosidade) podem
refletir-se em fatores tão diversos quanto a sociabilidade dos usuários, seu desempenho
acadêmico e mesmo sua saúde.
Considerando que o espaço escolar é um lugar extremamente complexo, marcado por
encontros e desencontros, e que se circunscreve a partir de várias formas de
comunicação, nos aproximamos com esta pesquisa de uma forma de manifestação
estudantil bastante comum, as marcas por eles deixadas no ambiente escolar. No caso
desta pesquisa, focou-se na análise do discurso dos escritos em carteiras e em paredes
de uma sala de aula.
Em 2005, Pereira, Silva e Vilar realizaram uma pesquisa com os objetivos de analisar os
escritos de banheiro e ver quais são os sentidos produzidos por eles, quais são as
formações imaginárias aí produzidas, quais são os temas predominantes e como isso
circula na sociedade. Foram analisados textos presentes em banheiros de vários
institutos da Universidade de Campinas (UNICAMP).
Os escritos encontrados no interior dos muros universitários, especialmente os das
portas e paredes dos banheiros, representam a voz coletiva de um grupo perfeitamente
localizável e localizado (PEREIRA; SILVA; VILAR, 2005). A partir deles conhecemos
o grupo social, a idade, sua condição sociocultural e o sexo, e também podemos deduzir
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
2
os referentes que os motivaram. Neste sentido, para os autores, o apanhado de escritos
da porta de banheiro se transforma em um porta-voz de uma coletividade nem sempre
escutada e em um local de livre expressão de um grupo social muitas vezes submetido a
um silêncio forçado.
O banheiro é um lugar dedicado ao corpo, em sua mais natural condição (BARBOSA,
1984). Pereira, Silva e Vilar (2005) destacam que através da produção de grafitos, este
espaço serve à comunicação humana como um canal de expressão escrita disponível a
todos, um meio ao monopólio dos superveículos massificadores. Sem limite de censura
externa e acessível a todos, torna-se um palco discreto de confidências. E foi justamente
isso que os autores verificaram nos banheiros analisados.
Martins (2010) assinala que existem ruídos na escola, manchas de pintura, paredes
pintadas, rabiscadas, escritas, desenhadas de várias formas com materiais de diversos
tipos (canetas, pincel atômico, cola, etc). Para este autor, as paredes exibem gritos
silenciosos, ameaças, recados, mensagens que, ao longo do tempo, caracterizam
diálogos, trocas, informações, paqueras, etc.
A pesquisa realizada por Martins (2010) focaliza as marcas deixadas nas carteiras e
paredes escolares em três escolas. Para atingir seus objetivos, o autor realizou
entrevistas com os diretores escolares e com estudantes e os dados para este estudo
incluíram 694 registros fotográficos. As marcas deixadas reestabelecem as funções
destes “espaços” tomando-os como suportes para esta atividade comunicativa
(MARTINS, 2010).
A análise dos registros de Martins (2010) demonstra a complexidade da pichação
enquanto um sistema específico de comunicação, e também sugere que a pichação está
relacionada com os processos de construção de identidade dos estudantes. As pichações
nas paredes e nas carteiras podem revelar aspectos da cultura escolar e das suas
experiências o que dizem respeito as historicidade das experiências dos jovens. Nesse
sentido, Martins (2010) considera a pichação como uma forma de expressão e de
comunicação, e não como depredação escolar.
Em sua pesquisa sobre o discurso das portas de banheiros universitários, Paula (2010)
objetivou analisar as frases e diálogos das portas dos banheiros universitários de uma
Universidade do interior do Estado de São Paulo. Para isto, a pesquisadora verificou
quais são os sentidos produzidos nos discursos destas mensagens, que efeitos de sentido
eles geraram e quais são a formações imaginárias que subjazem a isso, além de detectar
quais são os discursos que predominam neste tipo de escrita marginal.
Paula (2010) recorreu às teorias de Análise do Discurso, para ter uma noção maior de
como os alunos autores pensam dentro do ambiente da instituição educacional
“Universidade”. Os resultados apontam que não há assinaturas de autoria, por isso, há
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
3
uma liberdade cedida ao autor que, ao mesmo tempo, lhe confere a liberdade de
expressão. De acordo com Paula (2010), o resultado de sua pesquisa pode propriciar
reflexões sobre as quais a própria instituição educacional possa se balizar para ter uma
noção melhor do grupo social que ela tem como clientela. Isso possibilita a
(re)formulação dos cursos universitários, visando melhorias na qualidade de ensino e/ou
de infraestrutura.
Com este artigo, pretende-se apresentar a análise do discurso dos escritos em carteiras e
em paredes de uma sala de aula usada por estudantes do nível médio e do nível superior,
em uma instituição privada localizada no interior do Estado de Mato Grosso do Sul.
1 PROPOSTA E INSTRUMENTO DA INVESTIGAÇÃO
Trata-se de um estudo descritivo, exploratório, de abordagem qualitativa, pois trabalha
sobre fatos colhidos da própria realidade dos pesquisadores, além de buscar descobrir as
relações existentes entre os elementos componentes da situação analisada (CERVO;
BERVIAN, 2002).
Pode-se constatar, de acordo com Godoy (1995), que a pesquisa qualitativa ocupa um
reconhecido lugar entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que
envolvem os seres humanos e suas intrincadas relações sociais, estabelecidas em
diversos ambientes.
Esta pesquisa foi realizada em uma instituição privada localizada no interior do Estado
de Mato Grosso do Sul. As imagens foram capturadas em uma sala de aula usada tanto
por estudantes do Ensino Médio quanto por estudantes do Ensino Superior.
As imagens foram capturadas por meio de um smartphone, com câmera fotográfica de 8
megapixels e resolução 3264 x 2448. Para a captura das imagens, os pesquisadores
acessaram a sala em um horário em que a mesma não estava sendo ocupada e utilizada
por estudantes.
A análise dos dados teve como referencial metodológico a análise do Discurso (AD), a
qual tem como característica ouvir: (a) no que é dito, (b) o que é dito ali ou em outro
lugar, (c) o que não é dito e (d) o que deve ser ouvido por sua ausência necessária
(ORLANDI; LAGAZZI-RODRIGUES, 2006).
2 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS OBTIDOS
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
4
Foram capturadas 100 imagens, as quais foram obtidas tanto de carteiras quanto de
paredes. As mensagens contidas nas inscrições do ambiente estudado são muito ricas
semanticamente que não cabe aqui, por questões de espaço, a captação e explicitação de
tudo o que se pode perceber. De acordo com a teoria bakhtiniana, o sentido de uma
palavra, expressão, proposição não existe em si mesmo, só pode ser constituído em
referência às condições de produção de um determinado enunciado, uma vez que muda
de acordo com a formação discursiva em que está inscrito, quem o (re)produz, bem
como quem o interpreta (PEREIRA, SILVA; VILAR, 2005).
A partir do total de imagens feitas, os pesquisadores criaram categorias e distribuíram as
imagens em: declaração de amor/poemas (12); cunho religioso (21); matérias de
disciplinas (19); mensagens para professores (2); números de telefones (7) e teor sexual
(39).
Do ponto vista estético-espacial, as inscrições são muito ricas e variadas, podendo-se
verificar invasão do espaço do outro, tanto em carteiras quanto em paredes. Não há uma
margem definida a ser seguida, exceto em carteiras.
É possível identificar rasuras – rabiscos, arranhados, borrões – em palavras ou frases
inteiras, feitas pelos leitores. Supõe-se que estas rasuras foram feitas por, no mínimo,
dois motivos: (1) porque não gostaram do que leram ou (2) porque querem escrever
também nas carteiras e paredes, mas como não há mais tanto espaço, resolveram apagar
um ou outro escrito para que pudessem escrever por cima.
Figura 1 – Declaração de amor em carteira
Fonte: Elaborada pelos autores
A instituição escolar é um ambiente no qual as relações sociais são estabelecidas ou
fortalecidas, e mensagens como a da figura 1 podem significar o desejo do sujeito-autor
de pertencer a outro e a um lugar. Foram obtidas imagens de declaração de amor feitas
ou com linguagem escrita ou com linguagem iconográfica (na forma de coração). No
caso da imagem acima, há a combinação destes tipos de linguagem.
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
5
Verificou-se que o tamanho do símbolo que representa o amor (o coração), tanto em
mensagens feitas tantos nas carteiras quanto nas paredes, pode variar pela questão
espacial. Pode-se identificar a concepção social de que um coração maior é sinal de
mais amor entre o casal.
Também foram verificadas as presenças de rasuras em mensagens deste tipo, por
exemplo, onde se lia “Ro ♥ Ma”, o Ro foi rasurado e substituído por outras iniciais, o
que pode demonstrar a temporalidade de paixões, e a busca constante do sujeito-autor
por um parceiro perfeito.
Figura 2 – Palavras de cunho religioso
Fonte: Elaborada pelos autores
Na figura 2, pode-se ler a mensagem “Sereno é quem tem paz de estar em paz com
Deus”, a qual revela um conteúdo de cunho religioso e um discurso volitivo-religioso.
Esta escrita não é do sujeito-autor, mas de Los Hermanos, uma banda brasileira de rock
alternativo formada no Rio de Janeiro em 1997. Embora a mensagem escrita seja de
uma banda de rock alternativa, vale ressaltar que, na instituição de ensino onde a
imagem foi feita, há uma grande quantidade de alunos evangélicos, o que, talvez,
justifique estes enunciados de cunho religioso, além de revelar os pensamentos do
sujeito-autor.
Figura 3 - Matérias de disciplinas em parede e em carteira
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
6
Fonte: Elaborada pelos autores
Como dito anteriormente, as imagens foram capturadas em uma sala de aula e foram
registradas mensagens contendo matérias de disciplinas (colas). De acordo com
Marquesin e Benevides (2011), a cola em uma instituição de ensino escola corresponde
à prática de furtar ideias e respostas alheias nas situações de avaliação, e percebe-se que
esta é uma forma que o estudante (sujeito-autor), pressionado por tanta avaliação e tanta
matéria, encontra para lidar com a necessidade de obter nota e aprovação.
Figura 4 – Mensagem para professor em carteira
Fonte: Elaborada pelos autores
A figura acima contém mensagens de cunho sócio-político “Doe sangue”, além de
trechos de canções de Mamonas Assassinas e Engenheiros do Hawaii. Há uma
mensagem destinada a um professor onde se pode ler: “Professor, muda de escola”.
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
7
Nesta comunicação, o sujeito-autor pode ter captado a insatisfação ou o desejo de
mudança de seu professor, ou seja, trata-se de julgamento de valor sobre a atitude do
outro, mas o sujeito-autor pode esquecer-se da própria atitude. É um olhar para o outro,
muito mais do que para si, é um vigiar e punir foucaultiano (FOUCAULT, 2004).
É importante considerar que a mensagem direcionada para o professor, pode manifestar,
inconscientemente, a insatisfação e o desejo de mudar de instituição do sujeito-autor.
Neste caso, trata-se de projeção. De acordo com Fonsêca e Mariano (2008), quando
utilizamos o mecanismo de projeção, atribuímos aos outros sentimentos e intenções que
na verdade pertencem a nós mesmos. Podemos dizer que os aspectos da personalidade
se deslocam de dentro de nós para o meio externo ao qual estamos inseridos.
Figura 5 – Número de telefones em carteira
Fonte: Elaborada pelos autores
Na figura 5 é apresentada uma mensagem que contém o número telefônico de uma
pessoa, possivelmente, o de Ana Flávia cuja face está representada infantilmente na
parede. A mensagem contém teor sexual ao fazer referência de que “Ana Flávia adora
velhinhos”, apresentando um discurso revelador dos desejos íntimos sexuais e um
discurso de submissão da figura feminina. Também se pode verificar a presença de
rasura na mensagem. Neste caso, supõe-se que a rasura foi feita para esconder uma
mensagem de conteúdo relacionado a alguma disciplina.
Figura 6 – Mensagens de teor sexual em parede e em carteira
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
8
Fonte: Elaborada pelos autores
Os discursos contidos nas mensagens da figura 6 apresentam conteúdo de cunho sexual.
Na imagem da parede há um discurso de conteúdo heterossexual e uma característica
muito comum das mensagens desta sala de aula: a linguagem iconográfica que pode ser
acompanhada de linguagem escrita ou isolada (como a apresentada). Há um peso maior
na mensagem ao colocar um desenho de um pênis, do que escrever a palavra “pênis”.
Isso também serve para chamar atenção do leitor. Além disto, pode-se identificar a
concepção masculina de que um pênis grande é sinal de mais satisfação sexual para a
mulher.
Como na primeira imagem da figura 6, na imagem da carteira há um discurso de
conteúdo heterossexual, porém, neste caso, a mensagem pode conter um discurso
revelador do preconceito contra os homossexuais. Neste caso, o sujeito-autor identifica
a pessoa que senta na carteira a sua frente e faz um julgamento de valor negativo, pois
este enuncia, em tom de deboche, o que ele pensa/sente em relação à outra pessoa.
Porém sua própria sexualidade é posta em questão quando faz uma afirmação deste tipo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com este artigo, foi realizada a análise do discurso dos escritos em carteiras e em
paredes de uma sala de aula usada por estudantes do nível médio e do nível superior, em
uma instituição privada localizada no interior do Estado de Mato Grosso do Sul. A
análise dos dados teve como referencial metodológico a análise do Discurso.
Foram capturadas 100 imagens, as quais foram obtidas tanto de carteiras quanto de
paredes. A partir deste total, foram criadas seis categorias e as imagens foram
distribuídas em declaração de amor/poemas (12); cunho religioso (21); matérias de
disciplinas (19); mensagens para professores (2); números de telefones (7) e teor sexual
(39).
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
9
A análise dos conteúdos que são veiculados através dos inscritos nas carteiras e paredes
nos sugere que elas estão relacionadas com questões relativas ao processo de construção
de identidade vivenciado pelos estudantes. Assim são frequentes os temas relativos: a) à
sexualidade (ou ao sexo) expresso ora por frases ora por desenhos; b) ao namoro e à
paquera, caracterizados pelas frases fulano ama fulano ou pela disputa de paqueras.
Verificamos que há uma liberdade muito grande de expressão e que não há assunto
inválido ou proibido que não possa ser escrito nestes em carteiras escolares e nas
paredes da sala de aula. Foucault (1987) defende de que pelo fato de não haver
assinaturas de autoria, então, a liberdade é conferia ao autor, ao mesmo tempo, que lhe
confere o direito de se expressar como bem entender.
A realização desta pesquisa permitiu evidenciar que há um discurso ideológico maior
que subjaz e que perpassa por trás dos escritos nas carteiras e paredes da sala de aula: o
discurso de uma eterna condenação ou enaltecimento do fazer alheio, sem notar o
próprio fazer, é um eterno vigiar e punir foucaultiano (FOUCAULT, 2004).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, A, G. Grafitos de banheiro. São Paulo, Brasiliense, 1984.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. Psicologias: Uma introdução ao
estudo da psicologia. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia científica. 5 ed. São Paulo: Prentice
Hall, 2002.
ELALI, G. A. O ambiente da escola – o ambiente na escola: uma discussão sobre a
relação escola–natureza em educação infantil. Estudos de Psicologia, v.8, n.2, p.309319, 2003.
FONSÊCA, A. L. B.; MARIANO, M. S. S. Desvendando o mecanismo da projeção.
Psicologia &m foco, v. 1, n. 1, p.1-8, 2008.
FOUCAULT, M. As palavras e as coisas. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir. 24 ed. São Paulo: Vozes, 2004.
GODOY, A. S. Pesquisa qualitativa: Tipos fundamentais Revista de Administração de
Empresas, v. 35, n.3, p, 20-29, 1995.
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
10
GUERRA, V. M. L. A análise do discurso de linha francesa e a pesquisa nas ciências
humanas. An. Sciencult, v.1, n.1, p. 5-18, 2009.
LOUREIRO, C. Classe, controle, encontro: o espaço escolar. São Paulo, 1999. Tese
(Doutorado em Educação) - Universidade de São Paulo, 1999.
MARQUESIN, D. F.; BENEVIDES, C. R. Avaliação da aprendizagem no ensino
superior: Reflexões sobre a cola. Revista da educação, v. 14, n. 18, p. 9-18, 2011.
MARTINS, J. B. Pichação na escola e a construção da identidade juvenil. In:
ENCONTRO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA REGIÃO SUL - ANPED SUL, 8,
Londrina, 2010. Anais... Londrina: UEL, 2010, p. 1-25.
ORLANDI, E. P.; LAGAZZI-RODRIGUES, S. (org.). Introdução às Ciências da
Linguagem: Discurso e textualidade. Campinas: Pontes, 2006.
PAULA, J. J. Discursos das portas de banheiros universitários. In: SEMINÁRIO DE
PESQUISAS EM LINGUÍSTICA APLICADA, 6, 2010, Taubaté. Anais... Taubaté:
UNITAU, 2010, p. 331-352.
PEREIRA, P. H. C.; SILVA, T. E.; VILAR, F. S. Análise dos discursos dos escritos
de banheiro na universidade. Campinas: UNICAMP, 2005. Disponível em:
<http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/a00009.htm>. Acesso em:
05/10/2015.
SOMMER, R. Espaço Pessoal. São Paulo: EDUSP, 1973.
* Bacharel em Psicologia pelo Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN),
Dourados – MS.
** Psicólogo; professor do Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN),
Dourados - MS. Mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo – SP.
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 5, Edição número 23, Março/Setembro 2016 - p
11