Pensar Contábil - Busca rápida

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ISSN 1519-0412
Ano V I • Nº 22 •
Nov - 2003/Jan - 2004
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Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Editorial
PENSAR CONTÁBIL: SEIS ANOS DE VIDA
Os membros do Conselho Editorial da Pensar Contábil vêm,
com satisfação, apresentar aos seus leitores mais uma edição da
nossa revista técnica. Esta edição de número 22, em seu sexto ano
de existência, já começa a demonstrar os resultados dos esforços
gastos por parte dos seus colaboradores (autores), equipe técnica
e conselheiros ao longo da sua vida. Quando afirmamos que os
resultados são positivos o fazemos por entender que a cada edição aumenta significativamente a quantidade de artigos de boa
qualidade e com temas diversificados remetidos pelos autores.
Esta edição é peculiar, pois além de tratar de assuntos diferenciados e interessantes, apresenta a primeira experiência de
publicação na nossa revista de artigos elaborados por membros
de uma mesma família (mãe e filha): Fortunee Rechtman Szuster, co-autora do artigo ”Afinal, o que pensa o mercado sobre o
diferimento cambial?”.Este artigo foi desenvolvido em parceria com o Professor Doutor Álvaro Vieira Lima. A co-autora é
mãe da contadora e administradora de empresas Flávia Rechtman Szuster autora do artigo “As Demonstrações do Resultado dos Clubes Brasileiros de Futebol de 2002: Uma análise
Comparativa da Desinformação”.
São importantes também os demais artigos que compõem
Índice
AFINAL, O QUE PENSA O MERCADO SOBRE O
DIFERIMENTO CAMBIAL?
ANÁLISE DO DIFERIMENTO CAMBIAL DE 1999 ............................ 4
FORTUNEE RECHTMAN SZUSTER
ÁLVARO VIEIRA LIMA
AS DEMONSTRAÇÕES DO RESULTADO DOS CLUBES
BRASILEIROS DE FUTEBOL DE 2002: UMA ANÁLISE
COMPARATIVA DA DESINFORMAÇÃO .......................................... 12
FLAVIA RECHTMAN SZUSTER
MÉTODOS DE FORMAÇÃO DE PREÇOS UTILIZADOS NAS
MAIORES INDÚSTRIAS DE SANTA CATARINA ............................. 18
ADRIANO DE SOUZA PEREIRA
ROSIMERE ALVES DE BONA PORTON
ILSE MARIA BEUREN
A MENSURAÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO MUNICIPAL:
DO SUCATEAMENTO À SUPERVALORIZAÇÃO,
OS EFEITOS DA DEPRECIAÇÃO SOBRE
O RESULTADO PATRIMONIAL ........................................................ 25
LUCIANO NERES
A IMPORTÂNCIA DO CONTROLE CONTÁBIL E
EXTRA-CONTÁBIL DOS BENS PERMANENTES ADQUIRIDOS
PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL ............................... 33
FABIANO TORRES JUNIOR
ASPECTOS JURÍDICOS DA EXTINÇÃO DA CORREÇÃO
MONETÁRIA DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS
- UM ESTUDO DE CASO - ................................................................. 44
CARLOS ALBERTO PEREIRA
CARLOS EDUARDO CLARO DE AZEVEDO
JOSÉ AUGUSTO VEIGA DA COSTA MARQUES
Uma publicação do
esta edição, pelo conteúdo e pela variedade dos temas. Temos
um artigo escrito com base em pesquisa aplicada sobre métodos de formação de preços industriais no Estado de Santa Catarina, elaborado por Adriano de Souza Pereira, Rosimere Alves
de Bona Porton e Ilse Maria Beuren que acreditamos ser ótima
fonte para futuras pesquisas acadêmicas. Os artigos que fecham
a edição tratam, respectivamente, das necessidades de aprimoramentos dos controles na área pública e os efeitos da extinção
da correção monetária, sob o enfoque jurídico. Ambos artigos
foram muito bem elaborados pelos autores Fabiano Torres Júnior (A importância do controle contábil e extra-contábil dos
bens permanentes adquiridos pela Administração Pública
Federal) e Carlos Eduardo Pereira e Carlos Eduardo Claro de
Azevedo (Aspectos Jurídicos da extinção da correção monetária das demonstrações contábeis – Um estudo de Caso).
Acreditamos que, modestamente, e de forma gradual, a Pensar Contábil vem cumprindo a sua missão, portanto, caros leitores, usufruam bem esta edição.
Antonio Miguel Fernandes
Vice-presidente de Desenvolvimento Profissional
Expediente
Pensar
Contábil
ISSN 1519-0412
CONSELHO DIRETOR
Presidente: Nelson Monteiro da Rocha
Vice-Presidente de Desenvolvimento
Profissional: Antonio Miguel Fernandes
Vice-Presidente de Administração
e Finanças: Diva Maria de Oliveira Gesualdi
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Vice-Presidente de Controle
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CONSELHO EDITORIAL
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Conselheiro Jorge Ribeiro dos Passos Rosa
Conselheiro Josir Simeone
Conselheiro Walter Conceição
Conselheiro Waldir Ladeira
Editora: Rosa Helena Martire (MT 21405)
Projeto Gráfico: W&C- Comunicação
Diagramação: Adriano Antunes dos Santos
Revisão: Claudia Stivelman
Estagiário: Gabriela Gomes
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Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Fortunee Rechtman Szuster
Álvaro Vieira Lima
Mestre em contabilidade pela UERJ e professora da FGV
Coordenador do Programa de Mestrado de Ciências Contábeis da UERJ
1 - INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é analisar a
reação do mercado frente ao posicionamento das principais empresas brasileiras que procederam ao diferimento cambial, permitido pela Medida Provisória nº
1.818, de 25 de março de 1999, posteriormente convertida na Lei 9816 de 23 de
agosto de 1999 , e pela Deliberação CVM
nº 294, de 26 de março de 1999.
Sem a menor sombra de dúvidas podese afirmar que o assunto gerou controvérsias. O diferimento cambial não foi aceito
pelo Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (IBRACON), nem está de
acordo com o Conselho Federal de
Contabilidade(CFC). Foi estabelecido que
as demonstrações contábeis das empresas que optassem por tal procedimento
deveriam apresentar ressalvas nos pareceres dos auditores e os devidos esclarecimentos nas notas explicativas.
A CSN ,porém, optou por tal procedimento e foi eleita , no ano de 2000 a “Empresa do ano” pela Revista Exame sendo
manchete do Jornal O Dia de 27 de janeiro de 2002 como “A Empresa que não sabe
o que é estar no Vermelho”.
Num momento em que a falsa transparência das demonstrações contábeis está
aliada a perdas para muitos acionistas e
a credibilidade da Contabilidade vem sendo questionada por seus usuários é de
grande importância o debate da reação
do mercado frente a procedimentos contábeis contraditórios.
2- QUAL A ORIGEM DO
PROBLEMA ?
A partir da implantação do Plano Real,
em 1994, o Governo federal desenvolveu
uma política que gerou uma elevada apreciação do real frente ao dólar como forma
de reduzir a possibilidade do aumento da
taxa de inflação. Este posicionamento incentivou diversas empresas brasileiras a
captarem recursos no exterior.
Muitas empresas iniciaram o ano de
1999 com um elevado endividamento em
dólares. Estas dívidas haviam sido estimuladas pela política governamental de
altos juros internos, com a manutenção
do real superavaliado frente ao dólar, em
decorrência do mecanismo denominado
“âncora cambial”. Outro aspecto relevante decorreu da tradicional escassez de
financiamentos nacionais de longo prazo. As aplicações efetuadas estavam em
estágio de maturação, impossibilitando o
resgate dos passivos.
No primeiro trimestre de 1999, a âncora cambial ficou insustentável, e o Real
sofreu uma grande desvalorização frente
às demais moedas estrangeiras. Em 13
de janeiro a taxa de câmbio para o dólar
era de R$ 1,2114. Este atingiu seu auge
em 03 de março quando chega a R$
2,1647.A variação no final do 1º trimestre
foi de 42,47%, com o dólar cotado a
R$1,7220.
O Governo Federal permitiu às empresas que possuíam endividamento indexado à moeda estrangeira a opção de reco-
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Contábil
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nhecer o impacto no resultado contábil em
quatro anos, de forma linear. Do ponto de
vista fiscal, o reconhecimento foi efetuado
de imediato no 1o trimestre de 1999.
Nessas condições, tal diferimento, ao
reconhecer o efeito contábil dissociado do
efeito tributário, possibilitou a melhoria do
resultado contábil das empresas, sem
conseqüências sobre seus fluxos de caixa. É possível admitir que tal medida permitiu que empresas passassem do prejuízo ao lucro.
3- AFINAL, PODEMOS
CONSIDERAR O MERCADO
EFICIENTE?
Segundo a Hipótese da Eficiência do
Mercado (HEM) o preço da ação deve traduzir, de forma completa e instantânea,
toda a informação relevante disponível a
respeito dessa ação. O mercado de ações
seria racional, refletindo nos preços, de
forma rápida e não tendenciosa, a informação disponível. O fato do diferimento
cambial não ter efeitos fiscais não causa
impacto direto no fluxo de caixa. Nessas
condições, esperar-se-ia que a opção do
diferimento não alterasse o valor da empresa.
Segundo a Hipótese de Fixação Funcional (HFF) o mercado reage a informações contábeis, sejam patrimoniais ou de
resultados, não importando se elas, de
alguma forma alteram ou não os fluxos de
caixa da empresa. Nessas condições, os
lucros contábeis seriam uma informação
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relevante, independentemente dos procedimentos utilizados na sua geração.
4 - QUAIS SERIAM AS
MOTIVAÇÕES DAS
EMPRESAS PARA
MUDANÇAS NOS
CRITÉRIOS?
As empresas que optaram por utilizar o
diferimento estavam conscientes que poderiam ser criticadas.
Segundo Kieso, Weygandt & Warfield
é difícil, principalmente para a auditoria,
determinar se um tratamento contábil alternativo é feito visando melhoria informacional de uma realidade ou para diminuição de impostos.
Como motivações para a mudança podem ser destacados:
a) os custos políticos - quanto maior a
empresa, menos propensa estará em
adotar métodos contábeis que diminuam seus lucros, já que este tipo de
empresa está mais sujeita a questionamentos pelo governo e pelos sindicatos;
b) estrutura de capital - se a empresa
pretende pagar dividendos, mais propensa estará em adotar métodos contábeis que propiciem o aumento dos
lucros, ao contrário da que pretende
reter seu capital;
c) pagamento de bônus - quando o
pagamento dos administradores é
atrelado ao lucro da empresa será
escolhido o método que o maximize;
d)
suavização dos lucros - as empresas são levadas a administrar seu lucro já que um crescimento regular de
10% ao ano seria preferível a um
crescimento de 30% em um período
seguido de uma queda de 10% no
seguinte.
Segundo o Jornal Valor Econômico de
16 de novembro de 2001 a Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN) optou pelo diferimento das perdas cambiais entre janeiro e setembro de 2001 motivada pela necessidade de pagar elevados dividendos
aos acionistas, em especial sua controladora Vicunha, para pagamento de empréstimos usados no aumento da participação
acionária da empresa. Outro motivo era a
existência de eurobônus com cláusula de
liquidação ligada à relação dívida/patrimônio .Caso esta relação se deteriorasse a
CSN teria de recomprar seus títulos.
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5 - O QUE SIGNIFICA PARA
OS CONTADORES E
AUDITORES O
DIFERIMENTO CAMBIAL?
O fato das empresas optarem ou não
pelo diferimento cambial não foi tratado
como relevante pelas revistas econômicas da época, inclusive os poucos artigos
publicados apresentavam uma visão distorcida.
A contestação com maior veemência foi
efetuada pelos profissionais da contabilidade. O IBRACON apresentou o Comunicado Técnico n°2/99 exigindo, por parte
dos auditores, que fosse efetuada uma
ressalva no parecer dos auditores em todas as empresas que optaram pelo diferimento cambial.
Tal fato pode ser justificado, em primeira instância, pela transparência e neutralidade que as Demonstrações Contábeis
devem possuir para sua avaliação pelo
mercado. O diferimento não atende a um
aspecto fundamental da contabilidade, o
Principio da Competência de Exercícios
que reconhece os efeitos econômicos no
momento de sua realização, desvinculado do reflexo financeiro. O diferimento foi
também um procedimento não conservador, representando uma ruptura com a
tendência atual das instituições contábeis
normatizadoras a nível mundial e que
constitui um aspecto desejado pelos analistas. De forma simultânea prejudica, de
forma decisiva, a consistência dos procedimentos da empresa dificultando a comparação entre os anos de 1998/1999, e
com os períodos subsequentes, além de
prejudicar a comparabilidade entre as
empresas que diferiram e as que não o
fizeram
Jorge Vieira, analista da CVM, em seu
artigo no Boletim IOB 2/2002, afirma
que...”os malefícios causados pelo diferimento das variações cambiais excedem
em muito os perceptíveis benefícios proporcionados” .
Paulo Estevão, presidente da Price
Waterhouse Coopers, na Folha de São
Paulo de 27.03.99, afirma ser difícil sustentar, sob o ponto de vista da técnica contábil, a permissão para o diferimento cambial. Lembra que o IBRACON nas Máxis
de 1979 e 1983 recomendou que as perdas cambiais das empresas, sob o ponto
de vista contábil, não fossem diferidas
para balanços futuros.
Marcelo Bessan, sócio de auditoria da
KPMG declara no Valor Econômico de
11.05.99 que a ressalva, comumente usada para apontar erros graves na elaboração das Demonstrações Contábeis, não
teria o peso que geralmente tem porque
as empresas possuem o respaldo da
CVM.
6 - O QUE DIZEM OS
EXECUTIVOS ?
Tendo como base notícias veiculadas
nos diversos jornais, tem-se diversos posicionamentos quanto a opção das empresas de proceder ao diferimento cambial..
Nelson Niero, jornalista, em sua matéria no Valor Econômico de 11.05.99 pondera que deve ser levado em consideração que o Brasil passava por uma grave
crise econômica, além de estar com a imagem arranhada no exterior.
A Bahia Sul, a Companhia Siderúrgica
Nacional e a Companhia Petroquímica do
Nordeste tiveram sua dívida aumentada
em decorrência da desvalorização do real.
Os resultados do primeiro trimestre refletiram apenas uma pequena parte do rombo que a desvalorização abriu nas contas
das empresas endividadas em dólar graças a opção pelo diferimento cambial, diluindo tal choque em quatro anos, o que
causou polêmica entre administradores,
auditores e analistas de investimentos.
Bernardo Szpigel, diretor financeiro da
Bahia Sul afirma, nesta matéria, que um
especialista iria interpretar os números
com o efeito do diferimento e sem este
procedimento. Entretanto muita gente iria
direto à última linha do resultado. Para a
sua empresa o diferimento não causou
nenhum desconforto pois a perda cambial se transformaria em ganho à medida
que fossem sendo contabilizadas as receitas com a exportação.
Segundo a Gazeta Mercantil de
11.05.99 a Companhia Siderúrgica Tubarão (CST) apresentou, no primeiro trimestre de 1999 um prejuízo líquido de
R$356,8 milhões comparado a um lucro
líquido de R$37,5 milhões em igual período de 1998. A CST, maior exportadora
mundial de placas de aço, optou por lançar todo o impacto negativo da desvalorização cambial sobre as dívidas em dólar
de uma só vez, se liberando para futuros
resultados, segundo seu diretor financeiro e de relações com o mercado Antônio
Lima Filho. Cerca de 92% de seu endivi-
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damento em 31 de março de 1999 era vinculado ao dólar, em linha com o hedge
natural da empresa, que tem mais de 90%
das suas receitas provenientes de exportações. Declarou julgar que o diferimento
seria mal entendido pelos analistas internacionais.
A Petrobrás apresentava um hedge
natural contra a variação do dólar, uma
vez que 96% de suas receitas são atreladas à moeda americana. Deste modo,
decidiu não optar pelo diferimento, reconhecendo toda a perda com o câmbio de
uma só vez no resultado do primeiro trimestre, apresentando prejuízo. Ao longo
do ano essa situação se reverteu e a empresa fechou com lucro o ano de 1999.
A Aracruz Celulose, que possuía títulos
em Frankfurt e em Nova Iorque não procedeu o diferimento por elaborar o balanço pelas regras norte-americanas que não
permitem o diferimento cambial. Apresentou um prejuízo líquido de R$166,3 milhões no 1º trimestre que, sem as perdas
cambiais seriam um lucro de R$61,6 milhões.
João Luís Tenreiro Barroso, diretor executivo do centro corporativo e de relações
com investidores declara que a empresa
que não difere fica “refém” de suas contas
e precisa fazer cada vez mais hedge, o
que implica em alto custo de proteção
cambial.
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gistro de uma grande perda financeira dificultaria a obtenção de empréstimos, além
de provocar a venda de suas ações por
investidores assustados com o impacto
contábil negativo da maxidesvalorização
cambial.
Maria Helena Santana, superintendente executiva de relações com empresas
da Bolsa de Valores de São Paulo, na Gazeta Mercantil de 16.05.01, diz que o impacto da desvalorização do real concentrada em curto período poderia obrigar
companhias a iniciar precocemente a renegociação de suas dívidas. Ao lançar
determinados tipos de papéis as empresas comprometem-se com os credores a
manter certas relações entre determinadas contas, como a proporção entre a dívida e o patrimônio líquido. Se romperem
o compromisso, podem ter de resgatar
antes os papéis.
O analista do Unibanco, Basílio Ramalho ressaltou o efeito psicológico da medida por evitar que as empresas apresentassem prejuízos muito elevados.
O diretor da Ágora Corretora, Álvaro
Bandeira, no Jornal do Comércio de
28.09.01, declara que a partir do momento em que as companhias diferem os efeitos da desvalorização cambial em seus
resultados e dividem essas perdas por
quatro anos, elas passam a contabilizar
números mais positivos. A partir daí, suas
ações podem ter uma performance melhor na Bolsa.
Segundo o Jornal a Folha de São Paulo de 27.03.99, o diferimento cambial diminuiu o impacto negativo das perdas
provocadas pela desvalorização do real.
Para efeito de tributação, esses prejuízos
já foram lançados integralmente no resultado deste ano. Por outro lado, produziu
uma melhoria artificial dos resultados. A
adoção dessa norma foi reivindicada ao
Ministério da Fazenda pela CVM.
Segundo Ricardo Pinheiro, assessor
especial da Receita Federal, nesta mesma matéria da Folha de São Paulo, houve
o cuidado de manter-se a integridade do
ponto de vista de tributação. O objetivo
seria impedir que, a partir dos balanços,
os investidores viessem a retirar o capital
injetado nas empresas por meio da venda de ações.
Vicente Ianelli Neto, advogado tributário afirma que a Medida Provisória nº 1818
é benéfica para as empresas porque o re-
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O ponto de partida deste trabalho foi a
identificação das empresas abertas brasileiras que optaram pelo diferimento cambial. Partimos da relação de companhias
abertas relacionadas no artigo de Ariovaldo dos Santos - Contabilidade das Variações Cambiais. Complementamos tal relação através de pesquisa realizada na
Infoinvest, na Economática e na CVM.
No período selecionado havia 1030
empresas de capital aberto, 474 listadas
na Bovespa. Oitenta e nove empresas efetuaram o diferimento:
Tabela 1. Nome Fantasia Das 89 Empresas Que Optaram Pelo Diferimento
1. Acesita
29. Concer
57. Medial Saúde
85. VARIG
2. Aç Portobello
30. Constr.A.Velloso
58. Micheletto
86. VASP
3. Alcoa
31. Correio Popular
59. MRS Logística
87. Vicom
4. Antarct.Paulista
32. Copene
60. Nitrocarbono
88. Vicunha NE
5. Arteb
33. Cosuel
61. Nova Era Silicon
89. Wetzel
6. Autel
34. Crown CorkEmbal.S.A
62. Pão de Açúcar
7. Bahia Sul
35. CSN
63. Petroq. União
8. Bayer Polímeros
36. DFVasconcelos
64. Portobello
9. BBM Participaç.
37. Dhb
65. Prensas Schuler
10. Belgo-Min.Part.
38. Ecisa Eng.
66. Pronor Petroq.
11. Belgo-Min.Pirac.
39. EEVP
67. Recrusul
12. Belgo-Mineira
40. Eisa Estaleiros
68. Ref. Petr. Ipiranga
13. Boviel-Kyowa
41. Eletropaulo
69. Ripasa
14. Brascan
42. Engepack
70. S.Min. Trindade
15. Braswey
43. Estado de Minas
71. Sadia
16. Cauiá
44. Fibam
72. Samarco Min.S.A
17. CBTU
45. Fund. Tupy
73. Samitri
18. Celpa
46. Gradiente Eletr.
74. Sanasa-Campinas
19. Celulose Irani
47. Granja Saito
75. Shell
20. Cemat
48. Hosp.Matern.S.Luiz
76. Sifco
21. CERJ
49. Ind. Texteis Renaux
77. Sobloco
22. CESP
50. Intral
78. Sonae
23. Cia EldoradoHot
51. Jari
79. Suzano
24. Cia MelhoramentosSP
52. Josapar
80. Staroup
25. Cimentos Liz
53. Leite Paulista
81. T.Janer
26. Clariant
54. Liasa
82. Thyssen Sur
27. Coelba
55. Light
83. Toniolo, Busnello
28. Coelce
56. Maracaí
84. Tsuzuki
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Contábil
7- E A OPINIÃO DOS
USUÁRIOS?
8 - PESQUISA
DESENVOLVIDA
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Destas, vinte e três foram selecionadas para a análise pois atendiam aos dois
critérios considerados importantes para
efetuar o trabalho:
a) relevância do diferimento, considerando-se os diferentes graus do índice de endividamento da empresa em
moeda estrangeira (Passivo US$/
Passivo).
b) liquidez em bolsa, tendo-se .definido que as empresas a serem consideradas deveriam apresentar nível
de negociação que permitisse calcular o retorno mensal. As empresas
que não apresentavam esta condição foram excluídas.
Após delimitação da amostra- alvo de
nossa pesquisa passou-se a trabalhar na
escolha das empresas que comporiam a
amostra de controle. As Revistas Exame Melhores e Maiores de junho de 2000 e
Balanço Anual da Gazeta Mercantil –
2000 foram pesquisadas para esta escolha. As empresas pares deveriam possuir
os mesmos pré-requisitos de seleção do
primeiro grupo: companhias abertas, com
liquidez em Bolsa, de mesmo setor da
respectiva empresa da amostra-alvo e
grau de endividamento em moeda estrangeira que oferecesse comparabilidade
com o primeiro grupo. A única diferença
desejada é que não tivessem diferido a
variação cambial.
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Tabela 2- Pares Casados de Empresas Considerados no Estudo:
NOME
FANTASIA
PAR
PROPOSTO
Setor:Metalurgia/Aço
Acesita
Tubarão
CSN
Usiminas
Belgo-Mineira
Gerdau-Met.
Micheletto(Parafuso)
Confab
Energia Elétrica
Eletropaulo
CEMIG
Light
Copel
CERJ
Escelsa
Cemat
CELPE
Cesp
Coelba
Celulose e Papel
Suzano
Aracruz
Ripasa
VCP
BahiaSul
Klabin
Prod. Petroquímicos
Copene
Petroflex
Pronor Petroquímica
Oxiteno
Petroq.União
Polialden
Nitrocarbono
Ref.Pet.Ipiranga
Mineração
Samitri
Autopeças
Recrusul
Pensar
Contábil
Copesul
Ciquine
Magnesita
Marcopolo
Bebidas
Antárctica Paulista
Brahma
Transp.Aéreo
VARIG
TAM
Varejo
Pão de Açúcar
Globex
Prod.Aliment.
Sadia
Perdigão
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Algumas limitações dificultaram nosso
estudo. O fato de só terem sido encontradas vinte e três empresas com os pré-requisitos limitaram o tamanho da amostra.
Por seu lado, as Demonstrações Contábeis não apresentaram uniformidade, prejudicando, por vezes, a comparabilidade.
Na maioria dos casos, nas Notas Explicativas, não é apresentado, de forma clara e
objetiva, o montante do passivo em moeda estrangeira, assim como o momento
em que a empresa amortizou o valor diferido. O motivo pelo qual foi definida a opção pelo diferimento cambial também não
é evidenciado, não caracterizando as razões da empresa.
O objetivo pretendido era analisar a
reação do mercado na época da desvalorização cambial e na época do anúncio
da adoção do diferimento. Esta reação
seria medida pela comparação entre o
retorno observado dos preços das ações
destas companhias e o retorno observado dos preços das empresas da amostra
de controle, composta, conforme visto an-
teriormente, de empresas que, na medida do possível, fossem comparáveis à
amostra-alvo, diferenciadas apenas pelo
fato de não terem optado pelo diferimento
cambial. Das Notas Explicativas do 1º
Trimestre de 1999 foi retirada a quantia
diferida. Das Demonstrações de dezembro de 1998 foram obtidas suas receitas
líquidas, assim como seu passivo e percentual deste em moeda estrangeira.
Além destes, outros dados foram obtidos de modo a complementar a análise: a
existência ou não de ADR, o faturamento
em real e dólar no ano de 1999 (quando
divulgado), a possível baixa do diferimento, o exigível a longo prazo, patrimônio líquido e informações sobre a distribuição
de dividendos .
O quadro a seguir apresenta, para ambos as amostras, a média da variável índice de endividamento, calculada com base
no valor do passivo em moeda estrangeira dividido pelo valor do passivo (passivo
em moeda estrangeira/ passivo circulante + exigível a longo prazo).
Quadro 1 – Média da Variável Índice de Endividamento
Diferidas
Amostra-alvo
Não Diferidas
Controle
Estat
T
35,88
36,59
0,895
Índice de Endividamento
Fonte: Baseado em dados da Economática
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Não se pode rejeitar a hipótese de
igualdade entre as duas amostras em relação à referida variável, cabendo ressaltar que a média de endividamento das
empresas que não diferiram é ligeiramente superior à média das que diferiram.
8.1. Tratamento dos Dados
Tomou-se a cotação de fechamento
mensal da ação mais negociada de cada
uma das 23 empresas componentes de
cada amostra, usando-se as informações
disponibilizadas pela Economática.
A seguir calculou-se o retorno mensal
destas ações, no período de março de 1998
a agosto de 1999. Foi, então, obtida a média dos retornos mensais de cada amostra.
Para cada mês observado calculou-se
a diferença entre a média dos retornos da
amostra-alvo e a média dos retornos da
amostra de controle. Finalmente, acumulou-se o valor das diferenças obtidas.
Para melhor visualização deste processo apresenta-se, a seguir, o gráfico desta
diferença acumulada.
Figura 1 – Diferença Acumulada das Médias dos Retornos das Amostras
Fonte: Baseado em dados da Economática
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8.2. Hipótese de Trabalho
Nossa hipótese de trabalho é a de que
não deveria existir diferença entre as reações das amostras, uma vez que o diferimento, na forma como foi implementado,
não altera o fluxo de caixa das empresas.
Esta hipótese baseia-se na HEM, segundo a qual o valor das empresas não deveria mudar em função da decisão de adotar o diferimento cambial.
Por outro lado, caso seja possível rejeitar a hipótese nula, esta rejeição poderia ser feita em favor da HFF, a qual sustenta que o mercado reage a intervenções
que alteram o lucro contábil das empresas, independentemente do fato do evento em questão alterar ou não o fluxo de
caixa das empresas.
8.3. Resultados
A análise visual do gráfico das diferenças acumuladas sugere um comportamento sistematicamente inferior da amostra
das empresas que diferiram a variação
cambial. Este comportamento é acentuado no mês de janeiro de 1999, mês da
desvalorização cambial. Por outro lado,
no mês do anúncio da adoção do diferimento cambial o comportamento se inverte, indicando que a amostra-alvo tem comportamento superior à amostra de
controle.
O motivo pelo qual tais empresas apresentavam desempenho no mercado de
ações inferior ao grupo que não optou pelo
diferimento cambial não é explicitado nas
Demonstrações Contábeis, na Economática ou em notícias veiculadas em jornais
e revistas. É pouco provável a existência
de uma razão única que explique este
comportamento para as 23 empresas. Não
foi, ainda, possível fazer observações sobre as razões do diferimento .
A seguir foi aplicada a prova dos sinais
de Wilcoxon onde são considerados não
só o sentido da diferença dentro de cada
par, mas o seu valor, sendo atribuída maior ponderação a um par com maior diferença.
Os valores positivos e negativos dos
meses de março de 1998 a agosto de 1999
são considerados.O mês de março de
1999, porém não o foi por representar o
momento do evento.
Um total negativo de 109 e um total
positivo de 44 são encontrados, ensejando a probabilidade unilateral de 6,2%,
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
para a hipótese nula de igualdade de comportamento.
O quadro a seguir apresenta a diferença dos 18 retornos mensais das duas
amostras, e o valor da probabilidade associada ao valor do Teste T bilateral, para
pares casados aplicado à diferença das
médias:
Quadro 2 - Diferença dos 18 Retornos
Mensais das Duas Amostras
Mês
Mar-98
Abr-98
Mai-98
Jun-98
Jul-98
Ago-98
Set-98
Out-98
Nov-98
Dez-98
Jan-99
Fev-99
Mar-99
Abr-99
Mai-99
Jun-99
Jul-99
Ago-99
Diferença
0,0055
-0,0524
0,0019
-0,0009
-0,0462
-0,0626
0,0679
-0,0364
0,0351
-0,0931
-0,1726
0,0061
0,1284
0,0010
-0,0127
-0,0560
0,0226
-0,0428
Probabilidade
Associada à t
95,18%
25,09%
94,91%
97,55%
22,11%
7,50%
16,40%
38,72%
54,80%
10,37%
8,29%
90,01%
9,92%
98,86%
74,10%
46,09%
63,05%
46,40%
Fonte: Baseado em dados da Economática
Por esta tabela pode-se observar o valor das diferenças obtidas nos meses de
janeiro e março de 1999. O mês de janeiro, mês da desvalorização cambial,. é o
que apresenta a maior diferença negativa. O mês de março, mês da autorização
do diferimento da variação cambial, é o
que apresenta a maior diferença positiva
entre os retornos das amostras. O quadro
a seguir apresenta a média dos retornos
das duas amostras que produziram as diferenças dos meses de janeiro a março:
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
A análise deste quadro sugere que o
fator determinante no valor da diferença
entre os retornos nos referidos meses é o
comportamento da amostra de empresas
que adotaram o diferimento já que os retornos da amostra das empresas que não
diferiram é bastante próximo nos dois
meses. Observa-se que a hipótese de
igualdade de retorno nos dois meses da
amostra das empresas que diferiram a
variação cambial só pode ser aceita ao
nível de 2,36%.
Estes resultados precisam ser considerados com muita cautela. Em primeiro lugar a amostra é pequena. Em segundo
lugar, a análise está restrita a uma única
ocorrência. O ideal seria um estudo crosssection no qual o evento pudesse incluir a
reação do mercado em todas as épocas
em que ocorreram desvalorizações significativas. Assim, um viés não identificado
nas amostras poderia produzir o efeito
que estamos associando ao diferimento
da variação cambial. Infelizmente não foi
possível obter os dados necessários à realização deste estudo mais completo.
De qualquer modo, o gráfico sugere
que, em média, as empresas que diferiram atravessavam uma fase com perspectivas inferiores às das empresas de controle. Estas perspectivas se agravaram
com a desvalorização cambial de janeiro
de 1999. Ao adotarem o diferimento da
variação cambial obtiveram do mercado
uma reação positiva a esta decisão.
9 - CONCLUSÕES
Pensar
Contábil
“ I don´t read the president’s
message in an annual report.
I just look at his picture . If he’s
smiling too hard,
I know the company’s in big trouble”
Michael Thomsett
Segundo Paul Krugman em artigo veiculado pelo Jornal O Globo de 02 de fe-
Quadro 3 - Média dos retornos das duas amostras que produziram as diferenças
dos meses de janeiro a março
DIFERIDAS NÃO DIFERIDAS
DIFERENÇA
JANEIRO
-0,0135
0,1591
-0,1726
MARÇO
0,3093
0,1809
0,1284
DIFERENÇA MAR - JAN
0,3228
0,0218
PERCENTAGEM ASSOCIADA A T
2,36%
86,51%
Fonte: Baseado em dados da Economática
vereiro de 2002 sobre o Caso Enron, é
fácil uma empresa com lucro modesto, ou
até prejuízo, maquiar-se para apresentar
lucratividade . Declara que o objetivo de
se inflar os lucros é o de elevar o valor das
ações, ajudando a empresa a crescer,
obter empréstimos mais fáceis, além de
valorizar o balanço pessoal dos acionistas.
As Demonstrações Contábeis constituem o grande canal de comunicação entre
as empresas e os investidores que financiam a atividade empresarial. O conteúdo informacional da Contabilidade é um
aspecto muito importante que vem sendo
analisado e provado de forma constante
principalmente nos países onde o mercado de capitais tem uma presença marcante na economia.
A opção pelo diferimento da variação
cambial contradiz de forma direta a Estrutura Conceitual Básica da Contabilidade,
principalmente o Princípio do Confronto
das Despesas com as Receitas e com os
Períodos Contábeis, a Convenção do
Conservadorismo e a Convenção da Consistência.
Em termos das características qualitativas da informação contábil, impacta a
Comparabilidade. Em termos conceituais
a decisão pelo diferimento pode ser analisada de forma análoga ao posicionamento decorrente quando uma empresa
procede ao uso de um critério alternativo.
Este trabalho objetivou apresentar uma
contribuição para a Contabilidade brasileira bem como ao Mercado de Capitais ,
ao produzir uma evidência que retrata a
reação dos investidores, em um momento
histórico do país, frente a uma importante
decisão das empresas com reflexo nas
Demonstrações Contábeis.
Este tipo de pesquisa integrante da
Contabilidade positiva é de grande utilidade por permitir que seja estabelecida
uma política contábil que otimize os objetivos das empresas.
Estas, ao estabelecer sua política de
divulgação, no seu relacionamento com
o mercado, em diversas oportunidades
têm que fazer a opção entre procedimentos alternativos.
No caso do diferimento cambial de
1999, as empresas que optaram por diferir tinham a visão que estavam atuando
em um terreno complexo pois estavam
adotando um procedimento permitido pelo
Governo mas não aceito pela Estrutura
Conceitual Básica da Contabilidade e não
9
Pensar Contábil
respaldado pela maioria dos analistas relacionados ao mercado de capitais.
Os testes realizados de acordo com a
metodologia aplicada indicaram que o
mercado reagiu favoravelmente à decisão
de diferir os efeitos da desvalorização cambial sobre o lucro, por parte das empresas
mais afetadas pela referida desvalorização.
Esta reação estaria em desacordo com
a HEM, já que a referida decisão não teria
impacto sobre o caixa da companhia pois
o diferimento não tinha efeitos fiscais.
Estes resultados deveriam ser analisados com cuidado face ao pequeno tamanho da amostra que pôde ser obtida, aliado às características das empresas que a
compõem, em sua maioria, empresas consideradas como sendo de 2ª linha.
O entendimento do comportamento do
mercado de ações brasileiro à opção do
diferimento cambial de 1999 deve considerar diversos aspectos. De forma inicial,
deve-se analisar o cenário econômico que
o país vivenciava. O ano de 1999, segundo a Revista Exame Maiores e Melhores
de 2000, foi o segundo pior da década,
para as 500 maiores empresas privadas
do país, só perdendo para 1991 sendo a
desvalorização do real um dos fatores que
contribuíram para o péssimo desempenho
. Neste ano, apesar do crescimento das
vendas a margem de lucro das maiores
empresas privadas do país “encolheu”.
O motivo que levou as empresas a optarem pelo diferimento ou não, não é evidenciado, devendo ser submetida a suposições dos analistas. Os motivos podem ser diversos, mas difíceis de serem
definidos, uma vez que as empresas de
características equivalentes, adotaram
alternativas diferenciadas.. O fator fundamental entre as optantes deveria ser
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
o perfil da dívida constituindo um nível
substancial de Passivos em Moeda Estrangeira.
Não é evidenciado, nas empresas pesquisadas, se havia alguma proibição interna ao diferimento como a existência de
empréstimos feitos no exterior com proibições de ressalva.
O posicionamento de algumas empresas que diferiram pode ser visualizado através de declarações de seus diretores aos jornais. Os benefícios de diferir para as empresas podem ocorrer inicialmente na redução do risco da empresa ser considerada em “default” no
caso da existência de cláusulas em financiamentos, relacionadas ao valor do
Patrimônio Liquido. Um fato relevante
pode ser a pressão para que a empresa
apresente melhores resultados mesmo
que de forma artificial. Este procedimento pode acarretar o pagamento de dividendos que não deveriam ser pagos se
a empresa não diferisse. Este aspecto
ocorreu com algumas empresas e neste
caso houve um impacto do diferimento
no fluxo de caixa. Este fato configura um
efeito direto na posição financeira do acionista.
Os analistas colocaram sua preferência pelo impacto negativo de imediato da
perda cambial, afirmando que o diferimento gera uma distorção nas Demonstrações
Contábeis. Segundo opinião destes, tal
medida iria dificultar as projeções mascarando os resultados das empresas que o
fizeram.
O diferimento cambial realizado por algumas empresas propiciou, ainda, uma
assimetria informacional no Brasil em
1999.
Outro fator a ser considerado é o comportamental que é agravado pela dificul-
dade no entendimento de todos os efeitos
do diferimento.
Segundo Alves e Torres em seu artigo
“Quando a psicologia explica a reação dos
investidores” na Revista Bovespa de agosto de 1999, “acredita-se que ao longo da
história o ser humano tenha sofrido três
grandes golpes narcisos. O primeiro deles foi aplicado por Nicolau Copérnico,
quando tirou a Terra do centro do universo. O segundo foi obra de Charles Darwin, quando tirou o ser humano do centro da criação. O terceiro foi desferido por
Sigmund Freud, quando tirou a razão do
centro do pensamento humano. A irracionalidade humana, assustadora a princípio e ainda não muito bem aceita por todos, é a mais nova aliada da economia e
das finanças na busca da compreensão e
da previsão do comportamento do mercado e na formulação de um novo modelo
econômico-financeiro.
O modelo de finanças comportamentais se baseia, por um lado, na crença que
o investidor aja racionalmente, sendo capaz de considerar todas as informações
disponíveis no processo de tomada de
decisões. Por outro lado, segundo o modelo comportamental o investidor decide
influenciado por emoções e erros cognitivos, logo, de forma irracional.
Rubstein, porém, acredita que o mercado seja racional à medida que os preços são fixados como se todos os investidores o fossem.
A presente pesquisa não encerra o assunto. Muito pelo contrário. Por termos finalizado nossa dissertação no momento
em que as empresas novamente se viram
frente a opção de proceder o diferimento
cambial dada a situação que vivenciou o
Brasil no ano de 2001, esta poderá servir
de subsídio a novos trabalhos.
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Contábil
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10
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
10. BIBLIOGRAFIA
ASSAF, Alexandre Neto. Mercado Financeiro 3.ed. São Paulo: Atlas.2000
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CARDOZO, Júlio Sérgio S. Relatórios e pareceres de auditoria. São Paulo: Atlas, 1987.
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FAMA, Eugene. Efficient Capital Markets: II The Journal of Finance. Vol. XLVI, n.5, p.1575-1611, dec., 1991.
IUDÍCIBUS, Sérgio. O verdadeiro significado de uma teoria. Revista Brasileira de Contabilidade, Brasília, p.21-23.1995.
KIESO, Donald E., WEYGANDT, Jerry J., WARFIELD, Terry D. Intermediate Accounting. 10.ed. USA: John Wiley & Sons Inc,
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LIMA, Álvaro. Reação do Mercado de Ações ao Anúncio de Reavaliação de Ativos.Tese de Doutorado .COPPEAD/UFRJ.
1997
MARTINS, Eliseu. Variações cambiais: contabilidade e fisco. IOB Temática Contábil, São Paulo, ano 34, n.8, 2000.
PEROBELLI, Fernanda F. Cordeiro, NESS, Walter Lee. Reações do Mercado Acionário a Variações Inesperadas nos Lucros
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PORTELLA, Gualter Ramalho. O Conservadorismo e o Conteúdo Informativo dos Lucros. UNB Contábil. Vol 2, nº 1, p9-37,
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SANTOS Ariovaldo. Contabilização das Variações Contábeis. 3º. Simpósio Nacional IOB de Contabilidade. São Paulo p.5565,21 jun., 2000.
WATTS, Ross, ZIMMERMAN, Jerold. Positive Accounting Theory: A ten Year Perspective. USA: The Dryden Press, 1995.
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11
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
As Demonstrações do
Resultado dos Clubes
Brasileiros de Futebol de 2002:
uma Análise Comparativa
da Desinformação
1. INTRODUÇÃO
O ano de 2002 será marcado por ser a primeira vez em que
os clubes brasileiros de futebol foram obrigados a apresentar suas Demonstrações Contábeis, exigência feita pela Medida Provisória 79 que entrou em vigor em 07 de novembro
de 2002.
O presente trabalho objetiva apresentar as diversas alternativas adotadas na elaboração das Demonstrações dos Resultados dos principais clubes de futebol de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, efetuando uma análise comparativa.
Pela inexistência de normas contábeis neste setor, os clubes
apresentaram as mais diferentes formas, conteúdos, além de
diferentes modos de classificação, agregação e exibição.
Visando a uma melhor compreensão são apresentados, a
início, alguns aspectos relativos à fundamentação teórica da
Demonstração do Resultado do Exercício na legislação brasileira. A seguir é analisada a realidade apresentada pelos clubes
de futebol destacando os aspectos julgados mais relevantes. Ao
final é apresentada a Demonstração mais completa – do São
Paulo Futebol Clube – que poderá ser utilizada como modelo
visando a uma maior comparabilidade e melhor análise dos
usuários.
Pensar
Contábil
2. A DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO
EXERCÍCIO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A Contabilidade tem como função básica produzir informações úteis aos usuários internos e externos, que servirão de
subsídio à tomada de decisões.
A Demonstração do Resultado do Exercício constitui um dos
principais relatórios contábeis. Ela permite ao usuário o entendimento do processo de geração de valor, conhecimento das
receitas auferidas despesas incorridas, permitindo a avaliação
do desempenho sob o ponto de vista econômico.
De acordo com o Manual de Contabilidade das Socie-
1
Flavia Rechtman Szuster
Contadora pela UFRJ, MBA em Gestão dos Esportes pela FGV
e mestre em Administração pela COPPEAD
dades por ações, “a Demonstração do Resultado do Exercício é a apresentação, em forma resumida, das operações realizadas pela empresa, durante o exercício social,
demonstradas de forma a destacar o resultado líquido do
período”. 1
Segundo as Normas Brasileiras de Contabilidade, publicados pelo Conselho Federal de Contabilidade, “a Demonstração
do Resultado é a demonstração contábil destinada a evidenciar
a composição do resultado formado em um determinado período de operações da Entidade”.
Por sua vez, a Lei das Sociedades por Ações no artigo 187
determina a ordem de apresentação das receitas, custos e despesas para fins de publicação. O artigo estabelece que a Demonstração do Resultado do Exercício discriminará:
I“a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das
vendas, os abatimentos e os impostos;
II- a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto;
III- as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas, as despesas gerais e administrativas
e outras despesas operacionais;
IV- o lucro ou prejuízo operacional, as receitas e despesas não
operacionais e o saldo da conta de correção monetária;
V- o resultado do exercício antes do imposto de renda e a
provisão para o imposto;
VI- as participações de debêntures, empregados, administradores e partes beneficiárias, e as contribuições para instituições ou fundos de assistência ou previdência de empregados;
VII- o lucro ou prejuízo líquido do exercício e o seu montante
por ação do capital social.”
IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARTINS, Eliseu, GELBCKE, Ernesto Rubens, Manual de
Contabilidade das Sociedades por Ações, FIPECAFI, Quinta Edição, Editora Atlas.
12
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
As conceituações da lei implicam mais enfaticamente o Princípio da Competência, que pode ser desmembrado em Princípio da Realização da Receita, e Princípio do Confronto das
Despesas, como observado no parágrafo 1.
“¶ 1o- Na determinação do resultado do exercício serão computados:
a) as receitas e os rendimentos ganhos no período, independente da sua realização em moeda; e
b) os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, correspondentes a essas receitas e rendimentos.”
3. OS USUÁRIOS DAS DEMONSTRAÇÕES
CONTÁBEIS DOS CLUBES DE FUTEBOL
Com o advento da Medida Provisória 79 os clubes brasileiros
ficaram obrigados a publicar suas Demonstrações Contábeis.
Esta exigência tem como objetivo propiciar aos usuários uma
melhor avaliação da realidade destes.
O resultado contábil representa uma medida de eficiência,
proporcionando a base para análise do retorno do investimento,
que é fundamental para remuneração do capital empregado. O
lucro também representa um parâmetro de avaliação da qualidade do gestor possibilitando a comparação do sucesso do
modelo de administração utilizado.
Analisando o caso dos clubes de futebol notamos diversos
aspectos bem característicos.
O primeiro vincula-se com a própria estrutura societária dos
clubes brasileiros, já que os maiores clubes são estruturados
juridicamente como entidades sem fins lucrativos. A sua propriedade pertence, a rigor, a um grande número de associados
que compraram títulos patrimoniais mas que não possuem uma
preocupação direta com a remuneração deste valor. Por outro
lado, alguns clubes já são estruturados em forma de empresa
possuindo proprietários como é o caso do Vitória, Bahia, CFZ e
Malutrom.
No entanto, por representarem um esporte que é considerado paixão nacional, a saúde financeira dos clubes interessa a
grande parte da população brasileira. Como conseqüência, existem inúmeros usuários da Contabilidade Esportiva, como os
associados, os torcedores, os profissionais do esporte, as instituições financeiras, as indústrias de equipamentos, produtos e
serviços esportivos, os representantes dos meios de comunicação e instituições governamentais e não governamentais.
No caso dos clubes brasileiros, a Secretaria da Receita Federal também constitui um usuário específico já que os clubes
estão sujeitos ao pagamento do Imposto de Renda e Contribuição Social.
4. O PODER INFORMACIONAL DA
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO
DOS CLUBES DE FUTEBOL
Para estas entidades, a apuração do resultado abrange um
aspecto subjetivo a ser considerado: o que é mais importante,
ter excelentes resultados dentro do campo ou apresentar elevados lucros contábeis? Esta análise vincula-se ao dilema; o clube deve enfocar inicialmente a rentabilidade ou a obtenção de
vitórias e conquista de títulos.
O resultado operacional do clube, na verdade, tem relação
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
direta com o desempenho dos atletas e vice-versa, como já comprovado pelo clube inglês Manchester United, quando este abriu
capital em 1991. No início, a administração teve como meta o
resultado contábil restringindo despesas com salários e compras de grandes atletas. Neste cenário, o clube sofreu muitas
derrotas nos jogos que prejudicaram o desempenho econômico. Posteriormente, o clube alterou sua política visando a atingir
o equilíbrio entre as duas variáveis. Hoje o clube figura entre os
mais bem sucedidos do mundo.
Um fator importante decorre do fato de os associados terem
direito de voto para as eleições dos dirigentes. Neste caso os
resultados obtidos nos gramados têm um efeito relevante no
momento da decisão já que para o torcedor o que importa são
os resultados em campo.
Em decorrência destes aspectos, verifica-se que os dirigentes dos clubes brasileiros, no passado recente, em geral, priorizaram o resultado no campo e deixam as finanças para segundo plano, contraindo dívidas elevadas e oferecendo altos salários a seus jogadores, sem o devido planejamento orçamentário.
Como conseqüência, muitos clubes não conseguiram arcar com
suas despesas e acabaram tendo que responder por vários processos judiciais que, na maioria dos casos, correspondem a
valores milionários. Esse é um exemplo da incapacidade de
planejamento a Longo Prazo que influencia na continuidade
dos clubes.
A partir de janeiro de 2004 todos os sócios poderão participar
das eleições dos presidentes de seus clubes. No Flamengo,
isso acontece desde 1987, quando o então presidente Márcio
Braga foi reeleito devido aos bons resultados em campo. Fora
dele, no entanto, a situação não era satisfatória. Este dirigente
concluiu que para o torcedor ganhar títulos é mais importante
que manter a saúde financeira do clube. No longo prazo, porém, a má administração financeira do clube gerou graves reflexos dentro de campo.
Julgamos que a administração do clube deve se esforçar para
maximizar as duas variáveis de forma paralela, pois existe uma
correlação entre os dois fatores. A conquista de novos títulos e
aquisição ou formação de grandes ídolos devem representar
resultados contábeis positivos. As escolinhas são procuradas
por novos alunos que sonham em se transformar um deles. E a
conquista crescente de torcedores representa aumento de consumo dos produtos relacionados ao clube gerando o acréscimo
da Receita de Licenciamento. Para vencer os diversos torneios,
porém, faz-se necessária uma estrutura financeira e econômica
equilibrada.
A Contabilidade pode contribuir, pois com a maior transparência da entidade ocorre o aumento de credibilidade surgindo
novos investidores e financiadores inclusive com a possibilidade de abertura de capital que permite a captação de recursos a
menor custo e com maior capacidade de uma aplicação eficiente.
Pensar
Contábil
5. APLICAÇÃO DAS NORMAS
CONTÁBEIS PELOS CLUBES DE FUTEBOL
O fato de não existirem normas específicas para os clubes de
futebol, propiciou aos clubes uma total liberdade de escolha dos
critérios contábeis.
De início já se pode observar a divergência de nomenclatura
13
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
quanto à apuração do Resultado. A maior parte dos clubes usa
os termos Déficit/ Superávit. O Atlético Mineiro e o Cruzeiro, por
outro lado, usam a nomenclatura Lucro/ Prejuízo do Exercício.
Como os clubes analisados foram previamente caracterizados
como entidades sem fins lucrativos, a terminologia adequada
seria Déficit/ Superávit.
A convenção da materialidade também não foi aplicada de
forma plena. Em muitas situações os valores de menor expressão são apresentados antes de quantias maiores.
5.1. Caracterizações das Receitas
Um clube de futebol possui diversas fontes de receitas. Como
principais podemos citar a venda de ingressos, licenciamento,
publicidade, televisionamento, venda de jogadores, exploração
de estádios por meio de publicidade estática, “catering”, além
das receitas relacionadas a sua sede social.
A venda de ingressos deveria ser considerada como a principal fonte de renda por representar a forma tradicional de obtenção de recursos. No Brasil, porém, não ocorreu, pois o torcedor
brasileiro está deixando de freqüentar estádios. De acordo com
o Jornal Gazeta Mercantil, enquanto as receitas com bilheterias
representavam em 2000, em média, 40% do faturamento dos
cinco maiores times ingleses, o Corinthians refletia a média brasileira de 18%2. Segundo Mauro Holzman, diretor de marketing
do Clube Atlético Paranaense, “como a maior parte dos estádios
de futebol no Brasil é ultrapassado e não oferece segurança ou
conforto, o preço do ingresso continua, em termos monetários
corrigidos, o mesmo há mais de uma década”3. Com o advento
do Estatuto do Torcedor esse fato deve mudar, visto que os clubes estão sendo obrigados a adequar seus estádios aos parâmetros definidos pelo Estatuto, o que irá garantir maior conforto
e segurança para o torcedor. Assim, espera- se que o torcedor
volte a ter o hábito de freqüentar estádios de futebol, aumentando a receita com ingressos. Além disso, a mudança do sistema
de pontos corridos em 2003 fez com que os clubes ficassem
menos tempo sem jogar. Para se comprovar o fato basta compararmos a renda em um período de quatro meses, entre abril e
julho. Em 2002 a arrecadação com bilheteria nas principais
competições no país foi de R$13.886.130 no período. Entre abril
e julho de 2003, no entanto, a arrecadação aumentou em 138%,
para R$33.150.025. Uma das maneiras usadas pelos clubes
para aumentar esta receita é a venda de carnês. O Vitória e o
Atlético Paranaense iniciaram a venda de carnês em 1999 e
obtém números consideráveis de carnês vendidos.
A receita de televisionamento tem sido de grande relevância
para os clubes brasileiros nos últimos anos. O sistema pay-perview está sendo cada vez mais difundido. Em 2002, 230 mil
pacotes do Campeonato Brasileiro foram vendidos. Em 2003, o
número após um pouco menos de 5 meses de campeonato já é
de 200 mil pacotes. Por conta do contrato os clubes têm direito
a receber no mínimo R$40 milhões do valor obtido pela emissão
com pay-per-view. Caso a venda ultrapasse os 200 mil pacotes
os clubes participam da divisão do lucro. Paulo Carneiro, presidente do Vitória, diz que esta , no momento é a principal fonte de
renda de seu clube. Ele espera que “com a construção da arena
Pensar
Contábil
2
3
4
14
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
multiuso que deverá ficar pronta em 2004, o clube passará a ser
menos dependente e dessa forma manter seus craques no país
já que passará a explorar novas fontes de renda” .
De maior expressão aparece a negociação dos “passes” dos
atletas. Apesar da figura jurídica do passe ter sido extinta, os
clubes continuam recebendo indenizações para liberar seus atletas antes do término do contrato de trabalho e, portanto, a formação e negociação de jogadores deve continuar sendo importante. Os clubes não mais detêm os passes dos atletas e sim seus
direitos federativos.
Entre as fontes de Receitas de Marketing a mais significativa
é a publicidade através de contratos de patrocínio e de fornecimento de material esportivo. O valor a ser recebido pelo time
varia diretamente com sua visibilidade e o tamanho de sua torcida. No ano de 2001, por exemplo, o valor pago pela Pepsi Cola
ao Corinthians, time de segunda maior torcida no Brasil segundo pesquisa Lance!-Ibope4, foi entre 10 a 15 milhões de reais
enquanto a Portuguesa recebeu cerca de 1,8 milhões de sua
patrocinadora, a Schincariol.
Outra receita considerável é a receita de licenciamento, que
vem geralmente em forma de porcentagem sobre as vendas de
produtos diversos com o símbolo do clube, sendo estabelecido
um valor mínimo. Espera-se que, com o combate à pirataria,
esse tipo de receita aumente significantemente.
As receitas oriundas da exploração de estádios, por meio de
publicidade estática, bares (“catering”) e lojas também devem
ser consideradas. Estas ainda são insignificantes para a maior
parte dos clubes do Brasil já que muitos destes não possuem
sequer estádios próprios.
Alguns clubes também possuem receitas sociais. O fato de o
clube possuir uma sede social gera diversos tipos de novas
receitas independentes do futebol, tais como escolinhas, mensalidades, eventos culturais, aluguel de salões, lojas e exames
médicos. Muitos defendem a separação da administração do
futebol com o do clube social, visto que, conforme observado
nas Demonstrações dos clubes, a maior parte utiliza os recursos
vindos do pagamento dos sócios dos clubes para manutenção
do futebol.
5.2. Análise das Demonstrações Publicadas quanto as
Receitas
O São Paulo e o Flamengo são os clubes que melhor evidenciam suas receitas. O Flamengo, por exemplo, além de discriminar suas receitas de marketing, informa o valor auferido da Petrobrás, seu patrocinador, e da Nike, seu fornecedor de material
esportivo e outros. As receitas de futebol profissional e amador
apresentam-se separadas das receitas dos demais esportes
amadores, como vôlei, remo e basquete. O clube, no entanto,
não separa as Receitas operacionais das não operacionais nem
as Receitas financeiras das não financeiras.
Apenas São Paulo e Flamengo especificam o valor relativo à
vendas de jogadores. Os demais sintetizam todas as receitas
relativas ao futebol na rubrica “Receitas de futebol”. Isso torna a
informação muito pobre, já que não temos como concluir a composição deste valor.
“Prejuízos colocam futebol empresa na retranca”, Gazeta Mercantil, 14/09/2000
Site www.umbro.com
“Quanto vale a Torcida”, LANCE!, p.4-7, 07/04/2001
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Muitos são os clubes que apresentam informações confusas
nas Demonstrações do Resultado e também não explicam o contexto em notas explicativas. Este é o caso do Atlético Mineiro que
separa suas contas em “Mercado Interno” e “Mercado Externo”.
O valor oriundo do mercado externo é consideravelmente alto. O
usuário poderia deduzir que este se refere à venda de jogadores
para o exterior. Não há, porém, como ter certeza, visto que nada
consta em nota explicativa. Já o Corinthians apresenta as Receitas de futebol de modo sintético, não explicando suas receitas
em nota explicativa. O mesmo acontece com o Fluminense. O
Santos, por sua vez, apresenta o item “Contribuições e doações”
sem identificar a origem de tais valores.
O Santos foi, ainda, o clube que causou mais polêmica quanto
a evidenciação de Receitas. Este reconheceu uma elevada
Receita de Capital considerando a possibilidade do auferimento
de indenizações decorrentes do desligamento de todos os atletas. No entanto quem diz exatamente quanto vale um jogador é o
mercado e não a cláusula rescisória. Esta Receita impactou de
forma decisiva os resultados dos clientes, transformando um
Déficit em Superávit. Um problema adicional é que nesta própria Receita foi misturada a decorrente da venda de ativos Imobilizados.
Assim como os outros clubes, o Palmeiras apresentou informações pouco claras em sua Demonstração do Resultado, segmentando suas Receitas Operacionais entre “Arrecadação Social”, “Concessionária” e “Departamentos”. Entretanto foi o clube
que mais desenvolveu uma evidenciação detalhada nas Notas
Explicativas. Nesta, o clube explica que “Arrecadação Social”
refere-se às receitas das contribuições sociais mensais e as receitas de taxas sociais dos serviços utilizados pelos associados
nas dependências do clube. O termo “Concessionárias” diz respeito à exploração da marca e logomarca PALMEIRAS. Já o item
“Departamentos” está composto por itens como venda de passes, campeonatos, patrocínio, propagandas, indenizações, e
outros que por sua vez compõe o Total do departamento de futebol profissional. Ainda, estão incluídas as receitas de futebol
amador, tênis, cultura e arte, coordenadoria, patinação, arco e
flecha, xadrez, social, entre outros. Acredita-se que mesmo tendo especificado os valores em nota, o clube poderia ter efetuado
uma evidenciação de maior qualidade, pois o item “Departamentos” inclui atividades muito heterogêneas. De forma ideal, as
Receitas do Departamento de Futebol Profissional deveriam ser
individualizadas em suas Demonstrações do Resultado do Exercício, visto que os itens que compõe a rubrica “Departamentos”
são muito diferentes entre si.
O América Mineiro, por sua vez, divide suas Receitas Operacionais em “Receitas de Participações Esportivas” e “Receitas
de Convênios e outras”. Em nota explicativa, o clube explica que
esse valor diz respeito ao Acordo de Cooperação “Feyenoord”.
Esse acordo encontra-se em vigor com o Clube Holandês Feyenoord e estabelece os princípios de cooperação entre as entidades esportivas, com vigência até 31 de dezembro de 2004. Por
este instrumento, o América recebe anualmente o montante de
US$ 500.000,00 (quinhentos mil dólares), tendo o Feyenoord o
direito de escolher um atleta de até 20 anos, reservada a participação do América na revenda do mesmo para outra entidade.
O Corinthians, por sua vez, classificou o lucro na venda dos
atletas profissionais como Resultado não Operacional. No entanto, ao considerarmos a atividade efetiva do clube, este valor
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deveria ser classificado como Operacional.
Aliás, apesar de os clubes não mencionarem nada a respeito, é entendido que todos eles possuam transações com o exterior ou assinem contratos em dólares. No entanto, não existe
nenhuma informação adicional.
Reconhecemos ser difícil comparar as Demonstrações dos
Clubes, visto que cada um tem seu modo particular de apresentar suas contas. No entanto, um consenso encaminha uma
visão que, em termos básicos, as fontes de Receitas tem um
comportamento equivalente pois atuam no mesmo setor. Portanto um Modelo básico poderia ser aplicado considerando a
materialidade.
Um indicador relevante para a análise do clube e seu potencial seria a divisão do valor das Receitas Operacionais pelo
número de torcedores que é divulgado pelos órgãos de comunicação. O Corinthians, por exemplo, segundo o Data Folha,
possui 22 milhões de torcedores. Como sua Receita Bruta é de
R $18.000.000,00, o clube fatura menos de R $1,00 por torcedor, o que representa uma quantia irrisória.
5.3. Caracterização das Despesas
O conhecimento profundo das Despesas realizadas pelos
clubes é fundamental, principalmente porque o total das despesas supera o montante das Receitas obtidas na grande maioria
dos clubes brasileiros.
Julgamos que uma demonstração ideal deve incluir a classificação funcional, por atividade, abrangendo as fontes de receitas vinculadas e a natureza.
A aplicação do conceito de Operacional, no sentido de relacionar com a atividade principal do clube, deveria ser utilizada
para as Despesas incorridas pelo futebol profissional. A informação inicial deveria ser quanto custa o time entrar em campo.
Neste item estariam incluídas as despesas referentes a amortização dos passes dos atletas. O resultado com a venda/baixa
dos atletas deveria ser incluído, mas em uma linha segmentada.
As despesas referentes a outras atividades como Exploração dos Estádios, Esportes Amadores, escolinhas e atividades
sociais deveriam ser desmembradas.
A separação clássica por natureza abrangendo a Despesa
com Produtos Vendidos, Comerciais, Administrativas, Financeiras e Outras poderia ser adaptada considerando que um clube,
de forma geral, não possui um grande valor despendido com a
área comercial.
As Despesas Administrativas abrangem os gastos com a administração do clube, as atividades de apoio e gestão e controle
do patrimônio.
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Contábil
5.4. Análise das Demonstrações Publicadas referentes
às Despesas
Assim como ocorreu com as Receitas, o São Paulo foi o clube que apresentou a mais completa evidenciação da Demonstração do Resultado confrontando as Despesas com os respectivos elementos da Receita. Este vínculo é apresentado para as
Receitas de Futebol Profissional e de Base, Esportes Amadores
e decorrentes da utilização do Estádio do Morumbi. De forma
destacada são apresentadas as Receitas Financeiras, Despesas Financeiras, Tributárias e na última linha a amortização do
Passe. Sobre este posicionamento poderia haver um debate,
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pois como esta despesa vincula-se aos atletas, poderia estar
incluída nas Despesas de Futebol.
Verificou-se que a maior parte dos clubes não associaram
suas despesas às receitas. O Fluminense e o Palmeiras são
exceções. O Fluminense vinculou Despesas a Receitas de Futebol, Receitas Sociais e Desportes Amadores. No entanto, o
clube não identifica as Despesas Administrativas. Como novidade, evidencia os itens Custo de Dívidas Fiscais, Atualização
de Débitos, Depreciações e Ajuste e Provisões de Balanço.
Por sua vez, o Palmeiras segue o posicionamento de evidenciar uma Demonstração do Resultado extremamente sintética e
enxuta mas com uma grande riqueza de detalhamento nas Notas Explicativas. A estrutura da informação é realizada através
dos Departamentos. Uma curiosidade é a inclusão da conta
Resultado de Equivalência Patrimonial, que é aplicada quando
uma entidade tem investimentos em outras empresas controladas e coligadas. Não é apresentada nenhuma informação que
permita o entendimento.
Por outro lado, o Flamengo apresenta suas despesas agregadas por natureza não relacionando com as fontes de Receitas. Um procedimento equivalente é adotado pelo Atlético Mi-
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
neiro. Esse clube, curiosamente, apresenta as Despesas com
atualização de tributos e Resultado da avaliação cambial. Por
sua vez, o América Mineiro apresenta como único item das Despesas, (com exceção das Administrativas e Financeiras), a conta Custo dos Serviços Prestados sem nenhuma informação adicional.
O Cruzeiro também apresentou uma informação muito limitada com rubricas de grandes valores como Despesas com Pessoal, Administrativas e Tributárias sem nenhuma explicação
adicional em nota. É interessante notar que o clube possui uma
grande preocupação com Impostos. Deste modo, é o único clube que destaca os Impostos Incidentes sobre Receitas, Imposto
de Renda e Contribuição Social, mesmo que os valores sejam
imateriais.
Já a Portuguesa apresenta as despesas gerais de forma detalhada através da classe funcional por Departamentos. O curioso é a elevada quantidade de Departamentos apresentados.
São evidenciadas as Despesas com o Departamento Médico,
Departamento de Finanças, Comunicações e até do Departamento Feminino. Outra curiosidade é a indicação dos valores
gastos com a Presidência, Conselho Orientador, Fiscalização e
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o Conselho Deliberativo, mesmo que correspondam a valores
de baixa expressão.
5.5. Um modelo de Demonstração do Resultado do Exercício
Para fins de ilustração a Demonstração do Resultado do São
Paulo Futebol Clube é apresentada uma vez que a sua evidenciação é a mais completa.
6. CONCLUSÕES
As atividades econômicas desenvolvidas pelos clubes brasileiros de futebol movimentam bilhões de reais por ano e abrangem transações significativas com o exterior.
A obrigação da publicação das Demonstrações Contábeis
prevista na Medida Provisória 79 constitui uma grande oportunidade que a Contabilidade se depara, em ampliar o número de
usuários interessados em suas informações. A inexistência de
uma padronização contábil gerou na elaboração das Demonstrações Contábeis de 2002 diversos tratamentos, alguns com
fundamento técnico, outros não previstos nas normas contábeis.
Neste primeiro momento, entretanto, parece ter havido, na
prática, uma desinformação em virtude da adoção de critérios
heterogêneos. A classificação diferenciada e muitas vezes ina-
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dequada, bem como a omissão de dados relevantes dificulta a
análise comparativa, gerando incertezas.
Os torcedores desejam conhecer a real situação econômica do seu clube, bem como a de seus adversários. O motivo
da venda de ingressos deixar de ser a principal fonte de renda deve ser apresentada, assim como, o resultado da negociação dos jogadores, ou mesmo, em que proporção os sócios
dos clubes contribuem para a manutenção do time de futebol.
Itens como “Contribuições e doações” devem ter a devida
explicação quanto a seus valores assim como a classificação
mais rigorosa de itens que transformaram, no caso do Santos,
o Déficit em Superávit. O confronto entre Receitas e Despesas deve, na verdade, partir de rigorosa classificação de cada
elemento para não gerar um resultado distorcido desvalorizando, em última instância, o valor informacional da Contabilidade.
Por ter sido a primeira vez que importantes informações foram disponibilizadas, inúmeras falhas ocorreram, deixando clara a necessidade de um futuro aprimoramento. A Contabilidade
deve propiciar maior transparência das entidades, bem como
sua comparabilidade. A maior credibilidade das Demonstrações
Contábeis dos clubes poderá trazer novos financiadores e investidores, inclusive com possibilidade da abertura de capital e
a captação de recursos a um custo menor.
7. BIBLIOGRAFIA
BOTELHO, Ducineli Regis, SILVA, Cesar Augusto Tibúrcio, AMADOR, Renato Pereira, NIYAMA Jorge Katsumi. “Avaliação de
Empresas: Aplicação a uma equipe de futebol”, 2 Seminário USP de Contabilidade , Outubro de 2002.
CAPELA, Maurício, NIERO, Nelson. “Balanços mostram futebol no vermelho”, Jornal Valor Econômico, 14/01/03.
CORONATO, Marcos. “Bola na Trave”, Revista Exame, 20 de março de 2002.
FERREIRA, Bernardo. “Nova Fonte de receitas”, Revista Lance A+, n 150, 13 de julho de 2003.
Pensar
Contábil
IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARTINS, Eliseu, GELBCKE, Ernesto Rubens. Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações,
FIPECAFI, Quinta Edição, Editora Atlas.
IUDÍCIBUS, Sérgio de. Teoria da Contabilidade. 5ª edição. São Paulo:Atlas, 2000.
LOURES, Alexandre Rocha. “Um novo cenário para o futebol”, Gazeta Mercantil.
MARTINS, Eliseu.. “Que Sorte. A Contabilidade não é uma Ciência Exata”, Boletim IOB, Temática Contábil, 4a. semana,
Agosto de 2001.
NETO, Alexandre Assaf. Estrutura e Análise de Balanços, 5ª edição. São Paulo, Editora Atlas, 2000.
OLIVEIRA, João José. “Prejuízos colocam futebol empresa na retranca”, Gazeta Mercantil, 14/09/00.
SZUSTER, Flávia Rechtman. “Contribuição para o aprimoramento da Informação Contábil dos Clubes Desportivos Brasileiros”, 1º Seminário USP de Contabilidade, Outubro de 2001.
SZUSTER, Flávia Rechtman. “A Necessidade da Normatização Contábil para os clubes de Futebol Brasileiros”, Jornal do
CRC-RJ, maio-junho, 2003.
VARELLA, Marcio. “Norma do CFC moraliza contabilidade das Entidades Esportivas”, Revista Brasileira de Contabilidade,
n.140, Março-Abril 2003.
VIEIRA, Catherine. “Futebol, a nova Sociedade Anônima”, Jornal Valor Econômico, 25/06/02.
(Footnotes)
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
MÉTODOS
MÉTODOS DE
DE
FORMAÇÃO
FORMAÇÃO DE
DE
PREÇOS UTILIZADOS
UTILIZADOS
PREÇOS
NAS MAIORES
MAIORES
NAS
INDÚSTRIAS DE
DE
INDÚSTRIAS
SANTACATARINA
CATARINA
SANTA
1 - INTRODUÇÃO
Atualmente, as organizações estão inseridas num ambiente
globalizado, onde significativas transformações sociais, políticas e econômicas vêm ocorrendo. A globalização está proporcionando, entre outros aspectos, uma ampliação do mercado,
permitindo que as empresas atendam mercados consumidores
numa escala mundial, podendo aumentar o número de clientes,
além de criar oportunidades para alcançar um crescimento econômico e financeiro. Por outro lado, a concorrência passa a ser
muito mais acirrada, pois as empresas passam a competir com
concorrentes em nível internacional.
Para prosperar neste cenário de competição, as empresas
precisam de informações úteis, para que os gestores possam
tomar decisões acertadas. Este conjunto de informações pode
ser fornecido pela contabilidade, com destaque para a contabilidade gerencial, fornecendo informações que podem auxiliar
os gestores ao longo do processo decisório, como no controle
dos custos, na formação dos preços de venda, entre outras decisões rotineiras ou especiais.
Além disso, as empresas estão atendendo consumidores cada
vez mais exigentes, que buscam produtos de qualidade e com
baixos preços. Isto implica em buscar vantagens competitivas
através dos preços e da qualidade dos produtos oferecidos pelas empresas, sem contudo ter um concomitante crescimento
dos custos.
A vantagem competitiva refere-se à alguma característica nos
produtos ou serviços de uma empresa, que a diferencie dos
seus concorrentes. Porter (1989) afirma que a estratégia competitiva deve surgir através de uma análise das regras da concorrência, buscando lidar e modificar estas regras em favor da
empresa.
No sentido de atender as necessidades destes consumidores, que procuram produtos de qualidade e com preços baixos,
uma correta formação do preço de venda torna-se fundamental.
Para tanto, as empresas devem levar em consideração vários
fatores, como a elasticidade da demanda do produto, o número
de concorrentes, os custos de produção, a margem de lucro
desejada.
Vale destacar que a formação do preço de venda depende
dos objetivos que a empresa pretende alcançar. O cálculo do
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Adriano de Souza Pereira
Rosimere Alves de Bona Porton
Ilse Maria Beuren
Graduado em Ciências Contábeis/UFSC
Graduada em Ciências Contábeis/UFSC e mestranda em
Administração/UFSC
Doutora em Ciências Contábeis FEA/USP e professora
titular do departamento de Ciências Contábeis da Universidade Federal de Santa Catarina)
preço de venda, de acordo com Santos (1988, p.141), deve levar a um valor “que traga à empresa a maximização dos lucros;
que seja possível manter a qualidade, e atender aos anseios do
mercado àquele preço determinado, que melhor aproveite os
níveis de produção etc.”
Considerando a importância de uma política adequada de
preços e da correta formação do preço de venda, a presente
pesquisa objetivou realizar um estudo sobre os métodos de formação do preço de venda utilizados nas maiores indústrias do
Estado de Santa Catarina.
Desse modo, o trabalho foi estruturado em cinco partes. Inicia
com essa introdução, onde constam algumas considerações
preliminares. Em seguida são abordados métodos de formação
de preço contemplados na literatura sobre o tema. Depois é
evidenciada a metodologia da pesquisa, bem como os resultados da investigação e as conclusões do estudo.
2 - MÉTODOS DE FORMAÇÃO DE PREÇOS
Para a formação do preço de venda deve-se observar diversos aspectos, tanto internos, quanto externos da organização,
que influenciam nas decisões de preços. A partir disso, podem
ser elaboradas as políticas de preços a serem adotadas, visando atingir os objetivos da empresa.
Vários fatores externos à empresa influenciam na formação
do preço de venda, destacando-se a demanda esperada do
produto, as condições do mercado, o nível de concorrência, as
necessidades e o poder aquisitivo dos consumidores, a existência de produtos substitutos, as leis governamentais, o preço dos
insumos praticado pelos fornecedores.
Deve-se considerar também os aspectos internos à empresa,
com ênfase nas metas mercadológicas, situação financeira, qua-
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lidade desejada para o produto, capacidade e o nível de produção que pretende operar, estrutura de custos e despesas para
fabricar e comercializar o produto.
Para Kotler (1992), na prática, a determinação do preço é
orientada para o custo (como na fixação por margem fixa (markup) ou por metas), para a demanda (como na discriminação de
preço) e para a concorrência (como no preço-padrão e nas concorrências públicas).
Considerando os fatores externos e internos à empresa, o
cálculo do preço de venda, de acordo com Santos (1988:141),
deve levar a um valor “que traga à empresa a maximização dos
lucros; que seja possível manter a qualidade, e atender aos
anseios do mercado àquele preço determinado; que melhor
aproveite os níveis de produção”.
Para se estabelecer uma política de preço a empresa precisa
definir seus objetivos. Os objetivos podem ser os mais variados,
como a fixação de uma marca forte, a busca pela liderança do
mercado, a definição da fatia do mercado que deseja atender,
entre outros. Sendo assim, a empresa primeiramente precisa
estabelecer seus objetivos e, para que possa alcançá-los, em
seguida torna-se necessário a adoção de métodos para a formação de preços que coadunem com estes objetivos.
De acordo com Santos (1988:127-129), as empresas adotam
os seguintes métodos para a formação do preço de venda: método baseado no custo da mercadoria, método baseado nas
decisões das empresas concorrentes, método baseado nas características do mercado e método misto. Em seguida, apresenta-se com maiores detalhes os métodos citados, bem como os
possíveis desdobramentos que cada um desses métodos pode
assumir diante dos objetivos que a empresa pretende alcançar.
2.1 Método baseado no custo da mercadoria
O método baseado no custo pode tomar como base os custos
totais, adicionando-se uma margem que representaria o lucro
desejado, ou utilizar apenas os custos e despesas variáveis
como base, adicionando-se uma margem para obter um lucro e
cobrir os custos fixos.
O processo de adicionar uma margem fixa a um custo-base é
conhecido como mark-up. A fixação dos preços, observando os
custos, pode tomar como base:
a) custeio por absorção - os preços de venda são determinados pelo custo total da produção, calculados pelo custeio
por absorção, mais um acréscimo percentual para cobrir as
despesas operacionais e proporcionar uma margem de lucro;
b) custeio variável - baseia-se na soma dos custos e despesas variáveis, adicionando-se uma margem de lucro que
deve cobrir os custos e despesas fixos, e proporcionar uma
rentabilidade mínima pretendida;
c) custeio baseado em atividades (ABC - Activity Based Costing) - os custos das atividades são alocados aos produtos
através dos direcionadores de atividades, assim, a formação do preço visa cobrir estes custos das atividades consumidas pelos produtos e proporcionar uma margem de lucro
satisfatória;
d) custos de transformação - o preço de venda é calculado
como uma porcentagem sobre a mão-de-obra direta e os
custos indiretos de fabricação, que caracterizam-se como o
esforço direto da empresa para a fabricação dos produtos,
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desconsiderando, para este cálculo, os materiais e serviços adquiridos de terceiros;
e) retorno sobre o capital investido - Kotler (1992) cita este
método como sendo a fixação de preços por metas. Consiste na tentativa de determinar o preço de venda que traga
à empresa uma taxa-alvo de retorno sobre seus custos totais;
f)
custos estimados - nas empresas que fabricam bens volumosos, geralmente vendidos sob a forma de encomenda,
os preços são normalmente estabelecidos à base de negociação. Assim, pode-se fazer uma lista dos materiais a serem utilizados, estimar os custos de mão-de-obra, e aplicar
uma taxa para os custos indiretos de fabricação.
A utilização de custos para formar preços é fundamental à
medida que estabelece o preço mínimo que a empresa precisa
praticar para cobrir seus custos de produção. Além disso, serve
como base para comparar com os preços que o mercado está
disposto a pagar.
Assim, ao comparar o preço formado com base nos custos
com o preço praticado no mercado, a empresa deve procurar
ajustar suas margens de lucro ou seus custos de produção, de
maneira que consiga adequar-se aos preços que os consumidores se dispõem a pagar.
2.2 Método baseado nas decisões das empresas concorrentes
No método baseado nas decisões das empresas concorrentes verificam-se os preços praticados por estas empresas, para
que sirvam como referência na formação do preço de venda da
empresa.
De acordo com Kotler (1992:306), “a empresa que fixa os
preços orientada para a concorrência poderá procurar manter
seus preços mais baixos ou mais elevados que a concorrência,
em certo percentual”. Ressalta-se que os custos ou a demanda
podem até mudar, mas se não houver mudança nos preços dos
concorrentes, a empresa não modificará seus preços. Mas, caso
os concorrentes modifiquem seus preços, a empresa, mesmo
sem ter alterações na demanda ou nos custos, acompanhará a
mudança de preços de seus concorrentes.
De acordo com Santos (1988), o método da formação de preços baseado nas empresas concorrentes pode ser subdividido
em:
a) método do preço corrente - neste caso, todos os concorrentes utilizam o mesmo preço de venda para o produto. Supõe-se que uma empresa, isoladamente, não tem poder
para alterar os preços;
b) método de imitação de preços - caracteriza-se pela utilização dos mesmos preços praticados por uma determinada
empresa concorrente. Rocha (1999:115) salienta que “esse
procedimento, muitas vezes, reflete simplesmente o fato de
que a empresa desconhece quais são os custos de seus
produtos, e supõe que os dos concorrentes são similares
aos seus”;
c) método de preços agressivos - Santos (1988:128) explica
que “o método de preços agressivos ocorre quando um
grupo de empresas concorrentes estabelece a tendência
de uma redução drástica de preços até serem atingidos,
em certos casos, níveis economicamente injustificáveis
abaixo do custo de produção”;
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d)
método de preços promocionais - é caracterizado pela prática de oferecer mercadorias a preços promocionais, com o
intuito de atrair um maior número de clientes, e possibilitar
um aumento nas vendas de outros artigos a preços normais.
Ao utilizar o método baseado nos concorrentes, a empresa
estará fazendo uso de um importante referencial, que são os
preços praticados por seus concorrentes. O emprego deste método depende do tipo de produto que a empresa vende, se há
uma diferenciação de qualidade em relação aos produtos oferecidos pelos concorrentes e, principalmente, se os consumidores
percebem esta eventual diferenciação.
Neste sentido, se o produto é diferenciado, o cliente percebe
uma qualidade superior e está disposto a pagar um preço-prêmio
por este produto, não há motivo para seguir os preços praticados
pelos concorrentes. No entanto, se o produto é homogêneo, a
competição restringe-se ao preço praticado, é fundamental, neste
caso, o acompanhamento dos preços da concorrência.
2.3 Método baseado nas características do mercado
A aplicação do método baseado nas características do mercado exige conhecimento do mercado por parte da empresa.
Analisando o mercado, a empresa pode selecionar a fatia do
mercado que pretende atender, através de preços mais baixos,
procurando atender as classes mais pobres, ou praticar preços
mais elevados, procurando atender as necessidades de classes de maior poder aquisitivo.
Ao utilizar o método baseado nas características do mercado,
a empresa considera o valor que os consumidores estão dispostos a pagar pelo produto. Para o emprego deste método é
recomendável o acompanhamento da oferta e da procura, construindo-se uma curva de demanda do produto, para que a empresa tenha condições de verificar qual o preço de venda máximo que o mercado aceita o produto. A partir deste preço de
venda, a empresa atribui a margem de lucro desejada e obtêm o
custo máximo que pode ser incorrido na produção do produto.
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2.4 Método misto
A combinação desses métodos parece ser a forma mais adequada para a formação de preços, denominado método misto.
Segundo Santos (1988:122), “o método misto para a formação
de preços deve observar a combinação dos seguintes fatores:
custos envolvidos; decisões de concorrência; características do
mercado.”
Dependendo do mercado, do produto e dos concorrentes, a
empresa deve estabelecer seus preços. Deve observar os diversos fatores que influenciam na formação de preços: estrutura
de custos, tipo de concorrência, demanda e mercado consumidor de seus produtos. Portanto, a empresa precisa escolher
métodos de formação de preços que estejam adequados à estas características e ajudem a alcançar seus objetivos.
3 - METODOLOGIA DA PESQUISA
A presente pesquisa caracteriza-se com um estudo exploratório. Gil (1994:43) diz que são “pesquisas que têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas
a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses”. Explica que o
objetivo principal do estudo exploratório é o aprimoramento de
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idéias ou a descoberta de intuições.
A pesquisa exploratória realizada é do tipo levantamento ou
survey. Esta é definida por Pinsonneault e Kraemer (apud FREITAS et al., 2000:105) como a obtenção de dados ou informações
sobre características, ações ou opiniões de determinado grupo
de pessoas, indicado como representante de uma população
alvo, por meio de um instrumento de pesquisa, normalmente um
questionário.
Para esta pesquisa foram selecionadas as 250 maiores indústrias de Santa Catarina, de acordo com listagem adquirida
junto à Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina –
FIESC, utilizando-se como parâmetro o número de empregados. Foi enviado questionário via correio eletrônico (e-mail) para
estas empresas, no mês de março de 2002, contendo questões
abertas e fechadas relacionadas ao tema. Desse modo, das 250
empresas contatadas, obteve-se o retorno de 35 questionários
respondidos. Portanto, estas empresas constituem a amostra do
presente estudo, resultando num retorno de 14%.
Através desta pesquisa buscou-se alcançar os seguintes objetivos específicos: a) evidenciar os métodos de formação de
preços utilizados nas empresas pesquisadas; b) identificar os
fatores que motivaram a escolha de tais métodos; c) evidenciar
os pontos positivos e negativos apontados por estas indústrias,
com relação aos métodos de formação de preços utilizados.
4 - RESULTADOS DA PESQUISA
Neste tópico são descritos e analisados os dados coletados
junto às maiores indústrias de Santa Catarina, que compõem a
amostra deste estudo. Inicialmente são evidenciadas informações de caráter geral, referentes ao perfil das empresas pesquisadas. Em seguida, são apresentadas e analisadas as respostas das questões relacionadas com os objetivos específicos estabelecidos.
4.1 Perfil das empresas pesquisadas
Para mostrar o perfil das empresas pesquisadas, na seqüência apresentam-se informações gerais sobre as mesmas, evidenciando a região do Estado em que se situam, o ramo de
atividade, a divisão entre vendas no mercado interno e externo.
Com relação à região do Estado em que se situam, verificouse que as empresas que responderam ao questionário estão
mais concentradas nas regiões do Vale do Itajaí, Norte e Oeste,
com 9 empresas em cada uma destas regiões, somando 27
empresas, o que representa 77,14% de um total de 35 empresas respondentes. Aparecem ainda, 3 empresas da Grande Florianópolis, 2 da região Sul, 2 do Meio-Oeste, e 1 do Planalto
Serrano.
Observou-se que os ramos que mais se destacam são o têxtil
e o moveleiro/madeireiro, com 9 e 7 empresas, correspondendo
respectivamente a 25,71% e 20%; seguidos pelo setor metalúrgico, com 6 respondentes, representando 17,14%. Completam
a relação dos diversos ramos de atividade existentes no Estado,
4 empresas do setor agrícola, 4 do ramo alimentício, 2 de plásticos, 1 de papel-celulose, 1 de pré-moldados, e 1 de telecomunicações.
Sobre as vendas para o mercado externo, verificou-se que
apenas 5 empresas não exportam, representando 14,28%, sendo que as outras 30 empresas, que totalizam 85,72%, exportam.
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Dentre aquelas que exportam, a maioria destina para o exterior
de 1 a 25% de sua produção, totalizando 18 empresas, representando 60% das empresas que exportam.
4.2 Métodos de formação de preços utilizados nas empresas pesquisadas
A seguir, apresenta-se informações sobre os métodos de formação de preços utilizados nas empresas pesquisadas, destacandose quais métodos utilizam, há quanto tempo estão implementados
os atuais métodos, qual tecnologia da informação é utilizada para
a formação de preços, e se o sistema para formar preços é integrado com os demais sistemas operacionais da empresa.
4.2.1 Métodos de formação de preços utilizados
No que diz respeito aos métodos de formação de preço utili-
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
zados verificou-se que, dentre as 35 empresas que compõem a
amostra do estudo, 33 utilizam métodos de formação de preços,
o que representa 94,28% do total de respondentes, ou seja, a
maioria das empresas.
Dentre os métodos utilizados, constatou-se que o baseado nos custos e baseado no mercado são os mais
utilizados, aparecendo em 79% e 76% das empresas,
respectivamente. Adicionalmente, o método baseado nos
concorrentes é utilizado como complemento, visto que
nenhuma empresa o adota como único método, sendo
adotado por 30% das empresas respondentes. Observase na Figura 1 os métodos de formação de preços utilizados, sendo baseado nos custos, no mercado, ou nos concorrentes.
Figura 1: Métodos de formação de preços utilizados nas empresas pesquisadas
Constata-se que a maioria das empresas utiliza o método
baseado nos custos, individualmente 18%, sendo que 33% adotam juntamente com o método baseado no mercado, 6% aliado
ao método baseado nos concorrentes e 21% dos respondentes
faz uma combinação dos três métodos. Destaca-se que apenas
21% não se baseiam nos custos para formar seus preços, sendo
que 18% tomam o mercado como base, 3% baseiam-se no mercado e nos concorrentes, e nenhuma empresa baseia-se apenas nas decisões dos concorrentes.
4.2.2 Tempo de utilização do atual método de formação de
preços
Objetivando informar há quanto tempo as empresas
utilizam os atuais métodos de formação de preços, agrupou-se, de acordo com o número de anos que os métodos atuais estão em uso, nas seguintes faixas: até 3 anos,
de 4 a 6 anos, de 7 a 9 anos, de 10 a 20 anos, e mais de
20 anos. Os resultados desta pergunta constam na Figura 2.
Pensar
Contábil
Figura 2: Tempo de utilização do atual método de formação do preço de venda
Conforme as informações sistematizadas a partir dos questionários respondidos pelas empresas, nota-se que 24% das empresas pesquisadas utilizam o atual método de 4 a 6 anos, assim
como outros 24% de 10 a 20 anos. Ressalta-se, portanto, que a
maioria das empresas utiliza os atuais métodos de formação de
preços há mais de 4 anos, mostrando que os métodos estão há
muito tempo sendo aperfeiçoados por estas empresas.
Destaca-se que 45% dos respondentes utilizam a mais de 10
anos o atual método, sendo 24% de 10 a 20 anos, e 21% há
mais de 20 anos, demonstrando que os métodos implementados estão atendendo suas necessidades no que concerne às
informações para a formação dos preços de venda.
21
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
4.2.3 Tecnologia da informação utilizada na formação dos
preços de venda
Dada a importância da tecnologia da informação nas empresas, visando subsidiar os gestores com informações úteis à
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
tomada de decisão, perguntou-se qual a tecnologia da informação que as empresas utilizam para formar os preços de
venda. As respostas dadas à esta questão podem ser visualizadas na Tabela 1.
Tabela 1: Tecnologia da informação
Tecnologia da informação utilizada para
formar os preços de venda
Sistema integrado
com as demais áreas
Software desenvolvido internamente
Planilhas de cálculo
Informações da contabilidade
ERP
Microsiga
SAP
BAAN
MK
Progress DATASUL
S-400
Tecnologia de terceiros
Não respondeu
Total de respondentes
Número de empresas
Freqüência*
11
7
6
5
3
3
2
1
1
1
1
1
2
33
33%
21%
18%
15%
9%
9%
6%
3%
3%
3%
3%
3%
6%
* o total da freqüência ultrapassa 100%, pois alguns respondentes assinalaram mais de uma tecnologia da informação
Verifica-se que 11 empresas utilizam um sistema integrado
com as demais áreas para a formação dos preços, representando 33% de freqüência. Várias empresas utilizam softwares
desenvolvidos por terceiros, como ERP, SAP, Microsiga, BAAN,
MK, Progress DATASUL e S-400, perfazendo um total de 13
empresas, totalizando uma freqüência de 39%. Ainda com relação ao software empregado, 7 empresas utilizam um software desenvolvido internamente, representando uma freqüência
de 21%.
Pensar
Contábil
4.2.4 Relação entre integração do sistema para formar os
preços e o tempo de utilização do atual método de formação
do preço de venda
A partir dos dados coletados procurou-se identificar a relação
entre o tempo de utilização do atual método de formação de
preços e a integração do sistema para formar preços com os
demais sistemas operacionais da empresa. Portanto, a relação
entre tempo de utilização do atual método e a integração ou não
do sistema é demonstrado na Tabela 2.
Tabela 2: Relação entre integração do sistema para formar os preços e o tempo de utilização do atual método de
formação do preço de venda
Tempo de utilização do
atual método de formação
de preço de venda
Até 3 anos
4 a 6 anos
7 a 9 anos
10 a 20 anos
Mais de 20 anos
Nº
2
6
3
7
4
O sistema para formar os preços é integrado?
Sim
Não
%
Nº
50%
2
75%
2
50%
3
88%
1
57%
3
Observa-se que na faixa de 10 a 20 anos encontra-se o
maior percentual de empresas com sistema integrado, visto que 88% das indústrias desta faixa possuem o sistema
para formar os preços integrado com as demais áreas da
empresa. Em seguida aparece a faixa de 4 a 6 anos, onde
75% das empresas possuem sistema para formar preços
integrado
Destaca-se que o número de empresas com sistema integrado não aumenta de acordo com o tempo de utilização do
22
Total de
respondentes
%
50%
25%
50%
12%
43%
4
8
6
8
7
método de formação de preços, ou seja, não há uma relação
entre quanto maior o tempo de utilização do método, maior o
número de empresas com sistema integrado.
4.3 Fatores que motivaram a escolha dos métodos de formação de preços implementados nas empresas pesquisadas
Evidencia-se na Tabela 3 os fatores apontados por estas
empresas como motivadores da escolha dos métodos de formação de preços utilizados.
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Tabela 3: Fatores que motivaram a escolha dos métodos de formação de preços
Fatores que motivaram a escolha
Adequado às características do mercado consumidor
Concorrência acirrada
Características dos produtos
Disponibilidade de informações de custo
Disponibilizar informações úteis à gestão
Otimizar os resultados
Mais adequado para atender as necessidades da empresa
Praticidade do método
Não respondeu
Total de respondentes
Número de empresas
15
13
8
7
7
5
4
2
2
33
Freqüência*
45%
39%
24%
21%
21%
15%
12%
6%
6%
*o total da freqüência ultrapassa 100%, pois alguns respondentes apontaram mais de um fator como motivador da escolha
Foram identificados como fatores motivadores pelas empresas pesquisadas para a adoção dos métodos de formação de
preços:
a) estar adequado às características do mercado consumidor,
foi apontado por 45% dos respondentes, sendo o que apresentou maior freqüência, mostrando uma tendência das empresas em escolher seus métodos de formação de preços
de acordo com o mercado consumidor que atendem; e
b) concorrência acirrada, com 39% de freqüência, reflete uma
preocupação das empresas em escolher métodos de formação de preços que possibilitem sobreviver à competição
imposta pelos concorrentes.
Portanto, os dois fatores motivadores apontados pelos respondentes estão relacionadas a aspectos externos à empresa.
Também evidenciam a atenção dos gestores ao cenário em que
as empresas estão inseridas.
4.4 Aspectos positivos e negativos observados nos métodos de formação de preços utilizados
Visando demonstrar os aspectos positivos e negativos observados pelas empresas respondentes dos métodos de formação de preços que utilizam, evidencia-se, primeiramente,
na Tabela 4 os aspectos positivos apontados por estas empresas.
Tabela 4: Aspectos positivos observados nos métodos de formação de preços
Aspectos positivos observados nos métodos utilizados
Ser competitivo no mercado
Serve como referência para comparar com os preços no mercado
Demonstrar o resultado por linha de produto
Maximizar os lucros
Estipular metas de vendas
Flexibilidade e agilidade na formação de preços
Forma de controle
Praticidade
Precisão na apuração do resultado
Definir o mix de vendas
Não respondeu
Total de respondentes
Número de empresas
10
8
7
5
4
4
4
4
3
1
2
33
Freqüência*
30%
24%
21%
15%
12%
12%
12%
12%
9%
3%
6%
Pensar
Contábil
* soma da freqüência ultrapassa 100%, visto que algumas empresas apontaram mais de um aspecto positivo.
Constata-se que as empresas apontam vários aspectos que
consideram como positivos nos métodos de formação de preços
que utilizam. Em primeiro lugar, apresentando uma freqüência
de 30%, aparece o aspecto ser competitivo no mercado, demonstrando que estas empresas utilizam os métodos para formar preços visando serem competitivas e sobreviver no mercado.
Em seguida aparece o aspecto serve como referência para
comparar com os preços no mercado, com 24% de freqüência, deixando claro que estas empresas utilizam o preço formado internamente como base de comparação com os preços praticados no mercado. O aspecto demonstrar o resultado por linha de produto apresenta 21% de freqüência, evi-
denciando que as empresas estão buscando informações
sobre o resultado de cada linha de produto, para medir se o
produto é ou não rentável e, conseqüentemente, se sua produção é viável.
Assim como são apresentados os aspectos positivos, também são ressaltados os aspectos negativos apontados pelas
empresas pesquisadas, com relação aos métodos de formação
do preço de venda utilizados. O conhecimento dos aspectos
negativos torna-se importante à medida que apresenta, na visão dos respondentes, os pontos falhos, as deficiências e as
restrições dos métodos de formação de preços. Demonstra-se
na Tabela 5 os aspectos negativos observados pelas indústrias
respondentes.
23
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Tabela 5: Aspectos negativos ressaltados nos métodos de formação de preços utilizados
Aspectos negativos ressaltados nos métodos utilizados
Não apresenta aspectos negativos
As constantes variações de preço
Necessidade de grande número de informações para a definição do preço
Rateio dos custos e despesas fixos pode distorcer a definição do preço
Algumas situações podem levar a prejuízos
O preço calculado não é 100% correto
Análise restrita a margem de contribuição
Dificuldade em reduzir os custos
Mercado inflexível com pouca negociação de preços
Total de respondentes
Nota-se que. para 52% dos respondentes, o método para
formar preços implementado não apresenta aspectos negativos, dando a entender que tais métodos estão atendendo às
necessidades destas empresas.
Em seguida aparece o aspecto as constantes variações de
preços, citado por 9% das empresas, evidenciando a dificuldade em formar preços em mercados instáveis, reforçando a necessidade da adoção de métodos para auxiliar na formação de
preços.
O aspecto rateio dos custos e despesas fixas pode distorcer a
definição do preço é ressaltado por 9% das empresas, juntamente com os aspectos o preço calculado não é 100% correto,
com 6%, e análise restrita a margem de contribuição, com 3%,
refletem a preocupação destas indústrias em buscar maior precisão no cálculo dos preços de venda.
5 - CONCLUSÕES
Considerando a importância da formação de preços, realizou-se um estudo sobre os métodos de formação do preço de
venda utilizados nas maiores indústrias do Estado de Santa
Catarina. Sendo assim, as informações obtidas junto às empresas pesquisadas possibilitaram traçar um perfil destas indústrias, no que diz respeito a formação dos preços de venda.
Verificou-se que 94,28% das indústrias pesquisadas utilizam
métodos para formar preços de venda. Dentre os métodos utilizados, destaca-se que a maioria das indústrias pesquisadas
utilizam os métodos baseado nos custos e baseado no mercado
para formar os preços.
Com relação aos fatores que motivaram a escolha dos métodos de formação de preços, verificou-se que estar adequado‘as
características do mercado consumidor e concorrência acirrada
apresentaram maior freqüência, demonstrando que as empresas pesquisadas tendem a escolher os métodos de formação de
preços de acordo com o mercado consumidor que atendem e
estão bastante preocupadas com a competição imposta pelos
concorrentes.
No que diz respeito aos aspectos positivos observados pelas
empresas objeto do estudo, verificou-se que os mais citados
foram ser competitivo no mercado, demonstrar o resultado por
linha de produto e servir como referência para comparar com os
preços no mercado. Diante disso, conclui-se que estas empresas utilizam métodos para formar preços visando serem competitivas para sobreviver no mercado, que estão buscando infor-
Pensar
Contábil
24
Nº de empresas
17
3
3
3
2
2
1
1
1
33
Freqüência
52%
9%
9%
9%
6%
6%
3%
3%
3%
mações sobre o resultado de cada linha de produto, medindo se
o produto é ou não rentável, e que utilizam o preço formado
internamente para comparar com os preços praticados no mercado.
Dentre os aspectos negativos apontados pelas empresas
pesquisadas, observou-se que para 52% destas indústrias os
métodos utilizados para formar os preços não apresentam aspectos negativos, mas são apontadas as constantes variações
de preços, a necessidade de grande número de informações
para a definição do preço e o rateio dos custos e despesas fixos
pode distorcer a definição do preço, como principais aspectos
negativos. Assim, conclui-se que as empresas encontram dificuldades para formar preços em mercados instáveis, que a necessidade de muitas informações para formar os preços acarreta em um aumento nos custos e que existem distorções que as
empresas buscam reduzir para obter maior precisão nos cálculos dos preços.
Assim, o resultado da pesquisa contribuiu para ampliar os
conhecimentos sobre a formação de preços, particularmente nas
indústrias catarinenses, visto que existem poucos estudos empíricos sobre o tema pesquisado.
REFERÊNCIAS
BERNARDI, L. A. Política e formação de preços: uma
abordagem competitiva sistêmica e integrada. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 1998.
FREITAS, H. et al. O método de pesquisa survey. Revista de administração. São Paulo, v. 35, n. 3, p.105-106, jul./
set. 2000.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 4. ed.
São Paulo: Atlas, 1994.
KOTLER, P. Marketing: edição compacta. São Paulo:
Atlas, 1992.
ROCHA, Â. da. Marketing: teoria e prática no Brasil. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 1999.
SANTOS, J. J. dos. Formação de preços e do lucro empresarial. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1988.
PORTER, M. E. Vantagem competitiva. 11. ed. Rio de
Janeiro: Campus, 1989.
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
INTRODUÇÃO
Freqüentemente, as pessoas e as empresas estão tomando
decisões sobre os mais variados assuntos. São decisões por
vezes simples como a que horas acordar, que roupa usar, a que
horas sair. Algumas são complicadas e urgentes e podem até
definir a continuidade ou não de um empreendimento. Existe
um grande movimento presente no mundo que é a troca de
informações. Pessoas recorrem a outras pessoas em busca de
dados que subsidiem a tomada de decisões. Consultam médicos, mecânicos, dentistas, horóscopos, cartas, advogados, contadores. Querem saber o que podem consumir, o que podem
gastar, até aonde podem viajar de carro, por exemplo. Com as
empresas acontece o mesmo movimento e com grande intensidade. Toda a ação requer uma decisão que tenha sido tomada a
partir de uma informação.
Neste contexto informacional destaca-se a Ciência Contábil.
Para MARION1(2003:23), a contabilidade, “é o instrumento para
a tomada de decisões”.
Enquanto instrumento para tomada de decisões, a Contabilidade necessariamente deve produzir informações úteis. Segundo HENDRIKSEN E VAN BREDA2(1999:95) a utilidade da informação está relacionada com uma série de propriedades que a
mesma deve estar revestida. São elas a compreensibilidade, a
relevância, a confiabilidade, oportunidade, valor preditivo, verificabilidade, dentre outras. Esta preocupação com os atributos
da informação é confirmada com a Norma Brasileira de Contabilidade NBC T 1 - Das Características da Informação Contábil3.
“A Informação Contábil especial, aquela contida nas
demonstrações contábeis, notadamente as previstas em
legislação, deve propiciar revelação suficiente sobre a
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Luciano Neres
Contador, graduado pela UNIMONTES – Universidade Estadual
de Montes Claros-MG, Especialista em Controladoria, Pós Graduado também pela UNIMONTES. Consultor Contábil atuando na área
pública prestando consultoria a Prefeituras e Câmaras Municipais.
E-mail: [email protected]
Entidade, de modo a facilitar a concretização dos propósitos do usuário, revestindo-se de atributos entre os quais
são indispensáveis os seguintes: confiabilidade, tempestividade, compreensibilidade e comparabilidade”.
Todos os esforços da Ciência Contábil em produzir informações úteis para a tomada de decisão são feitos em prol de diversos usuários. Estes cada vez mais exigentes definem o conteúdo que devem constar nas informações produzidas pela contabilidade. Vários exemplos desta influência dos usuários no aspecto informacional podem ser citados. O mais comum, entretanto, é a influência da Legislação. IUDÍCIBUS4(2003:25) afirma
que “a Contabilidade sempre foi muito influenciada pelos limites
e critérios fiscais”. Segundo o mesmo autor, este fato limita a
evolução dos Princípios Fundamentais de Contabilidade. Os
aspectos legais nem sempre se baseiam em critérios contábeis
corretos. Isto pode vir a comprometer a qualidade da informação.
Neste aspecto da Legislação, pode-se citar o exemplo da
Lei 4.320/645, em que está baseada as atividades da Contabilidade Pública. Esta Lei, dentre outros objetivos, define a forma
de apresentação das demonstrações contábeis para os entes
da Administração Pública. Nota-se, entretanto, que a Lei 4.320/
Pensar
Contábil
1
MARION, José Carlos.
Contabilidade Empresarial.
10ª. Ed.
– São Paulo: Atlas, 2003. p. 23
2
HENDRIKSEN, Eldon S..VAN BREDA, Michael F.
Teoria da Contabilidade.
Tradução: Antônio Zoratto Sanvicente. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. P.95
3
CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE.
Princípios Fundamentais de Contabilidade e Normas Brasileiras de Contabilidade
. 3ª ed.
– Brasília : CFC, 2001.
4
FIPECAFI.
Manual de contabilidade das sociedades por ações: aplicável às demais sociedades.
Diretor Responsável: Sérgio de Iudícibus, Coordenador Técnico: Eliseu Martins, Supervisor de Equipe de Trabalho: Ernesto Rubens Gelbcke. 5ª Ed. São Paulo: Atlas, 2000.
5
BRASIL: Lei Federal n. 4.320/64, de 17/03/1964. Estatui normas de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal. Diário Oficial (da) República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 mar. 1964, Seção I, p. 2.745.
25
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
64 é uma lei de cunho extremamente financeiro e não alcança
aspectos econômicos que são de suma importância para a
correta avaliação destes entes. De acordo com
SLOMSKI6(2001:158), “a prática de contabilização e evidenciação dos resultados anuais, por meio dos demonstrativos da
Lei 4.320/64, foi calcada apenas no enfoque financeiro, deixando-se de lado os aspectos econômicos como a depreciação e a amortização”.
A elaboração das demonstrações contábeis, quando desprovidas de aspectos relevantes, não servem de subsídio para a
tomada de decisões, tendo seu uso apenas para atendimento
de obrigações legais.
Um destes aspectos econômicos relevantes é a Depreciação. Segundo BRAGA7(1999:77), “a depreciação aplica-se aos
bens componentes do Ativo Imobilizado Tangível sujeitos a perda de sua eficiência funcional, durante seu tempo de vida útil
provável, em decorrência de seu uso, ação da natureza ou obsolescência.
SCHRICKEL8(1999:57), define a depreciação como “desgaste, perda de valor econômico, obsolescência. Representa figuradamente uma espécie de fundo de reposição dos ativos fixos
ao final da vida útil.
KOHAMA(2003:238) afirma que “ a depreciação é prevista
somente para as entidades autárquicas, porém não são efetuadas normalmente pelo desgaste que possam ocorrer, como se
procede nas empresas particulares.
Existe um pensamento um tanto equivocado acerca da depreciação. Ela é tratada por muitos apenas como um item dedutivo do Lucro, conseqüentemente um item dedutivo da base de
cálculo tributária. Segundo KOHAMA9(2003:238) “a reavaliação
e a depreciação, por serem instrumentos utilizados com efeitos
fiscais, não são consideradas pelas entidades públicas, por estas não estarem sujeitas à tributação.
Este pensamento leva a acreditar que o patrimônio público
não se desgasta, não se modifica no decorrer do tempo. Daí
surge o questionamento: O patrimônio público é corretamente mensurado através da aplicação dos dispositivos da Lei
4.320/64? Qual o impacto da adoção de valores econômicos
como a depreciação nos demonstrativos contábeis? O processo de planejamento pregado para a Administração Pública é eficiente?
Este artigo tem por objetivo a discussão sobre os efeitos da
adoção de valores econômicos para a elaboração dos demonstrativos contábeis da Administração Pública, conseqüentemente, a mensuração do Patrimônio Público.
Pensar
Contábil
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
METODOLOGIA
A metodologia utilizada neste artigo foi a pesquisa bibliográfica. Todos os dados apresentados foram obtidos através de publicações oficiais na Internet. Os dados pertinentes à Prefeitura Municipal de São Paulo – SP, Prefeitura
Municipal de Engenheiro Caldas – MG e da Prefeitura Municipal de Acrelândia – AC, foram retirados da consolidação de contas anual da Secretaria do Tesouro Nacional –
STN, dados estes enviados pelos próprios municípios. Os
dados relativos à Prefeitura Municipal de Juiz de Fora –
MG foram retirados do site do próprio município e inclusive
já estavam da forma exigida pelo Tribunal de Contas do
Estado de Minas Gerais, gerados pelo programa de prestação de contas SIACE-PCA 10.
AS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS
Do estudo das demonstrações contábeis divulgadas obrigatoriamente pelos gestores públicos, mais especificamente das
prefeituras municipais, observa-se um fato um tanto curioso: o
patrimônio público municipal não sofre desgaste, não acaba
nunca, exceto quando um elemento é desincorporado, e aumenta anualmente.Este fato foi confirmado através da análise
de dados contábeis fornecidos pela Secretaria do Tesouro Nacional – STN11.
Confirmado também a partir de análise de dados contábeis
fornecidos pela Prefeitura Municipal de Juiz de Fora12 – MG,
através de seu site na Internet, dados estes que foram enviados
ao Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Elogios devem ser feitos a Administração Pública de Juiz de Fora-MG, pois
tal transparência e obediência aos preceitos legais não é muito
comum no atual cenário político administrativo e que sirva como
exemplo para os demais municípios.
A não observância dos efeitos da depreciação causa distúrbios graves no que diz respeito à mensuração do patrimônio público. Efeito mais grave sentido quando o mesmo é vendido.
Segundo KOHAMA13(2003:238), “ Entretanto, quando são alienados os bens móveis ou imóveis deve-se proceder a apropriação do valor dos bens, ao produto obtido pela venda, reavaliando-o ou depreciando-o, conforme o caso.”.
Como não existe um controle da depreciação sobre o patrimônio público, não há registro do valor que o patrimônio
realmente apresenta. Por exemplo, um veículo adquirido no
Ano X1 por $ 30.000,00 permanece registrado no Patrimônio Público até o Ano X5, quando é alienado por $ 15.000,00.
Por não haver depreciação, o restante do valor, $ 15.000,00,
6
SLOMSKI, Valmor.
Manual de contabilidade pública: um enfoque na contabilidade municipal
. São Paulo: Atlas, 2001
7
BRAGA, Hugo Rocha.
Demonstrações contábeis: estrutura, análise e interpretação
. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 1999.
8
SCHRICKEL, Wolfgan Kurt.
Demonstrações financeiras: abrindo a caixa preta: como interpretar balanços para a concessão de empréstimos
. São Paulo: Atlas, 1999.
9
KOHAMA, Heilio.
Contabilidade pública: teoria e prática
. 9ª Ed. São Paulo: Atlas,2003.
10
O SIACE-PCA
– Sistema Informatizado de Apoio ao Controle Externo
– Prestação de Contas Anual, é um sistema desenvolvido pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais
– TCEMG, em parceria com o Departamento de Computação da Universidade Federal de Minas Gerais. Visa possibilitar o Poder Executivo e as Entidades da Administração Indireta
Municipal, o preenchimento e envio da Prestação de Contas Anual.
11
Secretaria do Tesouro Nacional
– STN
– www.stn.fazenda.gov.br
12
Visite o site da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora
– MG no endereço www.pjf.mg.gov.br.
13
KOHAMA. Op. Cit. p. 4
26
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
permanece figurando no Ativo da entidade. É algo inadmissível e improvável de se acontecer no setor privado, mas
totalmente possível e muito comum na contabilidade pública. Este fato está intimamente ligado ao fato da legislação
aplicada à contabilidade pública ter um enfoque essencialmente financeiro.
A Lei Complementar 101 de 04 de Maio de 2.000 – Lei de
Responsabilidade Fiscal 14 não acrescentou dispositivos novos relacionados ao controle e a mensuração do Patrimônio
Público. Novamente o foco é financeiro e é comprovado, por
exemplo, pelo Artigo 44: “ É vedado a aplicação da Receita de
Capital derivada da alienação de Bens e Direitos que integrarão o Patrimônio Público para o financiamento de Despesa
Corrente.”.
A preocupação visível que existe em relação ao Patrimônio
Público está restrita ao momento da desincorporação. Se não
houver a desincorporação, não ocorre decréscimo patrimonial.
Como não existe um controle eficiente, não existe mensuração
real do Patrimônio.
AS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS
EXIGIDAS PELA LEI 4.320/64
“Art. 101. Os resultados gerais do exercício serão demonstrados no Balanço Orçamentário, no Balanço Financeiro, no Balanço Patrimonial, na Demonstração das Variações Patrimoniais, segundo os Anexos números 12, 13, 14 e 15 e os quadros
demonstrativos constantes dos Anexos números 1 – 6 – 7 – 8 –
9 – 10 – 11 - 16 e 17”15.
A Lei 4.320/64 estabeleceu regras para a elaboração
dos demonstrativos contábeis. O Balanço Orçamentário,
demonstração prevista no artigo 102, demonstra as re-
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
ceitas e despesas previstas em confronto com as realizadas.
Previsto no artigo 103 o Balanço Financeiro demonstra o fluxo financeiro da entidade composto pela receita e a despesa
orçamentárias, os recebimentos e os pagamentos de natureza
extra-orçamentária, os saldos em espécie provenientes do exercício anterior, e os que se transferem para o exercício seguinte.
A Demonstração das Variações Patrimoniais, prevista no artigo 104 demonstra as alterações sofridas pelo Patrimônio, indicando o Resultado Patrimonial.
O Balanço Patrimonial representa a composição do Patrimônio em determinado momento e está previsto no artigo 105 da
Lei 4.320/64.
A elaboração dos demonstrativos contábeis desprovidos de informações sobre a depreciação, não é privilégio dos municípios
menores, não está relacionada a localização geográfica, montante
de valores recebidos ou gastos, ou algum outra característica. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, a maioria dos
demonstrativos contábeis elaborados pelas administrações públicas municipais não apresentam dados relativos a depreciação.
A seguir apresenta-se dados coletados junto a Secretaria
do Tesouro Nacional que confirmam que a depreciação não é
considerada na apuração do resultado patrimonial. Estes dados estão disponíveis para a consulta via Internet. Se reportam
ao período de 1999 / 2000 e 2001. São dados consolidados
enviados pelas prefeituras municipais. Por serem públicos e
estarem disponíveis para consulta, os nomes das respectivas
Prefeituras Municipais não foram ocultados.Os dados confirmam a não consideração dos efeitos da depreciação sobre o
patrimônio público, produzindo desta forma uma representação infiel do mesmo.
Quadro 01 . Balanço Patrimonial Consolidado da Prefeitura Municipal de Engenheiro Caldas – Estado de Minas Gerais
1999
2000
2001
Ativo
879.441,00
889.277,42
2.052.297,95
Ativo Financeiro
340.158,00
28.847,14
128.183,46
Disponível
340.158,00
28.847,14
127.591,75
Caixa
251.373,00
0,00
0,00
Bancos
88.785,00
28.847,14
127.591,75
Créditos Circulantes
0,00
0,00
591,71
Créditos a Receber
0,00
0,00
591,71
Ativo Não Financeiro
189.274,00
393.643,92
1.924.114,49
Realizável CP
16.305,00
0,00
0,00
Créditos
16.305,00
0,00
0,00
Diversos
16.305,00
0,00
0,00
Realizável LP
131.681,00
158.879,68
152.741,58
Créditos Realiz LP
131.681,00
158.879,68
152.741,58
Divida Ativa
131.681,00
158.879,68
152.741,58
Permanente
41.288,00
234.764,24
1.771.372,91
Imobilizado
41.288,00
234.764,24
1.771.372,91
Bens Moveis Imóveis
41.288,00
234.764,24
338.575,62
Títulos Valores
0,00
0,00
1.432.797,29
Depreciação
0,00
0,00
0,00
Diferido
0,00
0,00
0,00
Despesas Diferidas
0,00
0,00
0,00
Amortização Acumulada
0,00
0,00
0,00
Ativo Real
529.432,00
422.491,06
2.052.297,95
Ativo Compensado
350.009,00
466.786,36
0,00
Outras Compensações
350.009,00
466.786,36
0,00
Pensar
Contábil
Fonte: STN – Secretaria do Tesouro Nacional, adaptado pelo autor.
14
BRASIL: Lei Complementar 101, de 04/05/2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade fiscal e dá outras providências. Brasília. Diário Oficial
da União, Poder Legislativo, 05/05/2000, Seção I, p. 1.
15
LEI 4.320/64. OP. Cit. p. 2
27
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Quadro 02 . Balanço Patrimonial Consolidado da Prefeitura Municipal de São Paulo – Estado de São Paulo
Ativo
Ativo Financeiro
Disponível
Caixa
Bancos
Aplicações Financeiras
Ativo Não Financeiro
Realizável Curto Prazo
Créditos Circulantes NF
Emp. e Financiamentos
Outros Créd Circulantes
Bens e Val. Circulantes
Estoques
Realizável LP
Cred Realiz LP
Divida Ativa
Emp. e Financiamentos
Créditos a Receber
Permanente
Investimentos
Participação Societária
Out Investimentos
Imobilizado
Bens Moveis Imóveis
Depreciação
Ativo Real
Ativo Compensado
Resp Titulo/ Valores
Garantias
Convênios Contratos
Out Compensações
23.144.928.659,74
52.918.687,54
52.918.687,54
2.640,74
10.561.031,58
42.355.015,22
14.764.131.570,40
44.345.480,93
17.678.312,76
0,00
17.678.312,76
26.667.168,17
26.667.168,17
4.910.572.177,21
4.910.572.177,21
4.909.350.651,56
1.221.525,65
0,00
9.809.213.912,26
2.438.178.995,79
1.340.933.378,54
1.097.245.617,25
7.371.034.916,47
7.371.034.916,47
0,00
14.817.050.257,94
8.327.878.401,80
42.371.689,81
3.341.261.988,67
1.007.004.075,99
3.937.240.647,33
38.412.495.365,03
64.223.202,55
64.223.202,55
193,67
13.077.282,24
51.145.726,64
16.638.938.032,25
66.301.999,40
33.462.983,93
1.221.525,65
32.241.458,28
32.839.015,47
32.839.015,47
6.194.710.555,53
6.194.710.555,53
6.194.710.555,53
0,00
0,00
10.377.925.477,32
2.787.079.707,28
1.496.704.803,58
1.290.374.903,70
7.590.845.770,04
7.590.845.770,04
0,00
16.703.161.234,80
21.709.334.130,23
50.680.950,87
14.138.922.724,19
928.595.687,81
6.591.134.767,36
46.411.017.283,88
904.105.951,80
904.105.951,80
260,53
18.188.454,99
885.917.236,28
20.176.162.618,37
104.592.665,26
45.233.794,43
0,00
45.233.794,43
59.358.870,83
59.358.870,83
8.690.225.276,44
8.690.225.276,44
8.283.558.096,98
1.221.525,65
405.445.653,81
11.381.344.676,67
3.169.002.673,35
1.598.993.055,50
1.570.009.617,85
8.212.342.003,32
8.212.342.003,32
0,00
21.080.268.570,17
25.330.748.713,71
67.318.923,36
18.461.620.193,11
1.249.664.411,96
5.552.145.185,28
Fonte: STN – Secretaria do Tesouro Nacional, adaptado pelo autor.
Quadro 03 . Balanço Patrimonial Consolidado da Prefeitura Municipal de Acrelândia – Estado do Acre
1999
2000
Ativo
1.370.639,29
1.465.626,91
Ativo Financeiro
67.622,23
33.627,87
Disponível
67.622,23
33.627,87
Caixa
0,00
0,00
Bancos
67.622,23
33.627,87
Ativo Não Financeiro
1.303.017,06
1.431.999,04
Realizável LP
59.415,83
57.630,45
Créditos Realizáveis LP
59.415,83
57.630,45
Divida Ativa
59.415,83
57.630,45
Permanente
1.243.601,23
1.374.368,59
Imobilizado
1.243.601,23
1.374.368,59
Bens Moveis Imóveis
1.243.382,22
1.374.149,58
Títulos Valores
219,01
219,01
Depreciação
0,00
0,00
Ativo Real
1.370.639,29
1.465.626,91
Ativo Compensado
0,00
0,00
Resp Titulo Valores
0,00
0,00
Garantias
0,00
0,00
Convênios Contratos
0,00
0,00
Outras Compensações
0,00
0,00
Pensar
Contábil
2001
2.595.187,47
814.468,72
814.468,72
980,42
813.488,30
1.780.718,75
51.048,00
51.048,00
51.048,00
1.729.670,75
1.729.670,75
1.729.451,74
219,01
0,00
2.595.187,47
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
Fonte: STN – Secretaria do Tesouro Nacional, adaptado pelo autor.
A MENSURAÇÃO DO PATRIMÔNIO
PÚBLICO – EFEITOS NEGATIVOS DA
NÃO UTILIZAÇÃO DA DEPRECIAÇÃO
Analisando as demonstrações contábeis produzidas pela Prefeitura Municipal de Juiz de Fora –
MG, através de dados coletados no site da entidade, pode-se verificar os efeitos da não utilização
da depreciação. A contabilização do patrimônio e
das respectivas variações patrimoniais obedece a
simples equação abaixo:
28
VALOR ATUAL DO PATRIMÔNIO = SALDO
INICIAL + AQUISIÇÕES – ALIENAÇÕES.
A contabilização é feita a partir do custo histórico de aquisição do bem. Não são observada as variações ocorridas no patrimônio pela ação da depreciação ou desvalorização Nota-se
uma certa confusão entre os profissionais de contabilidade acerca da desvalorização e a depreciação. Normalmente tendem a
confundir os dois conceitos. É importante ressaltar que apesar
de guardarem estreita relação, não significam o mesmo evento.
A depreciação está relacionada com o desgaste físico do bem e
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
do conseqüente comprometimento da condição de geração de
benefícios presentes e futuros para a entidade. A desvalorização diz respeito ao mercado, ao quanto este estaria disposto a
pagar pela aquisição do bem, o quanto este bem, estaria valendo no mercado.
Reportando às demonstrações da Prefeitura Municipal
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
de Juiz de Fora – MG, é possível verificar com clareza este
fenômeno que acontece no Patrimônio Público. A seguir
será demonstrado dados relativos ao balanço patrimonial
do período de 1999 - 2002, retirados dos demonstrativos
enviados para o Tribunal de Contas do Estado de Minas
Gerais.16
Quadro 04. Balanço Patrimonial Consolidado da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – Estado de Minas Gerais
EXERCÍCIO
1999
2000
2001
2002
ATIVO
77.909.928,09
105.980.068,98
138.849.817,59
223.850.363,87
ATIVO FINANCEIRO
10.524.475,89
18.116.623,49
36.260.049,90
22.625.441,32
Disponível
10.289.415,90
17.722.690,41
35.622.323,03
21.319.046,14
Caixa
767,74
Bancos
2.269.745,36
12.052.426,29
22.626.218,39
11.890.558,16
Vinculado
8.019.670,54
5.670.264,12
12.996.104,64
9.427.720,24
Realizável
235.059,99
393.933,08
637.726,87
1.306.395,18
Ações de Curto Prazo
Devedores Diversos e Outras
235.059,99
393.933,08
637.726,87
1.306.395,18
ATIVO PERMANENTE
67.385.452,20
87.863.445,49
102.589.767,69
201.224.922,55
Bens Móveis
8.438.008,14
10.837.645,63
12.155.351,71
29.817.966,71
Bens Imóveis
10.876.187,95
12.265.748,55
14.412.477,20
20.525.908,13
949.822,28
Bens de Natureza Industrial17
Créditos
43.260.943,65
52.895.241,28
63.215.389,38
103.733.778,15
Dívida Ativa
43.260.943,65
52.895.241,28
63.215.389,38
103.733.778,15
Valores Diversos
4.810.312,46
11.864.810,03
12.806.549,40
46.197.447,28
Ações
3.363.099,14
4.479.549,92
4.485.519,59
43.580.471,77
Almoxarifado
1.447.213,32
1.976.245,95
2.002.113,26
2.616.975,51
Incorporações
5.409.014,16
6.318.916,55
Soma do Ativo Real
77.909.928,08
105.980.068,98
138.849.817,59
223.850.363,87
SALDO PATRIMONIAL
Passivo Real Descoberto
Soma
77.909.928,09
105.980.068,98
138.849.817,59
223.850.363,87
ATIVO COMPENSADO
433.739,00
433.739,00
15.045.871,04
15.092.040,97
TOTAL GERAL
78.343.667,09
106.413.807,98
153.895.688,63
238.942.404,84
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG, adaptado pelo autor.
Os valores destacados no quadro do Balanço Patrimonial
acima demonstram claramente um aumento anual dos valores lançados a título de Bens Móveis e Imóveis. O total de
Bens Móveis em 2002 corresponde ao saldo em 1999 acrescido das incorporações orçamentárias e independentes da
execução orçamentária de bens e subtraído das desincorporações orçamentárias e independentes da execução orçamentária. Para os Bens Imóveis o raciocínio é o mesmo. É
importante ressaltar que no período analisado, 1999 a 2002,
não houve nenhum decréscimo patrimonial em virtude da
Depreciação, ou seja, os bens registrados no Patrimônio
Municipal não sofreram nenhum tipo de desgaste. Do estudo das demonstrações contábeis do período entregues ao
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, principalmente as informações contidas nos demonstrativos de incorporação e desincorporação de bens, chegou-se ao seguinte quadro-resumo das variações ocorridas nos Bens
Móveis e Imóveis:
Pensar
Contábil
Quadro 05. Demonstração das Variações Patrimoniais da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – Estado de Minas Gerais –
Somente Bens Móveis e Imóveis
EXERCÍCIO
1999
2000
2001
2002
SALDO INCIAL BENS MÓVEIS
8.438.008,14
10.837.645,63
12.155.351,71
SALDO INCIAL BENS IMÓVEIS
10.876.187,95
12.265.748,55
14.412.477,20
EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA
Incorporação de Bens Móveis
1.802.722,08
1.951.505,62
8.027.731,77
Incorporação de Bens Imóveis
1.611.153,62
2.993.359,88
1.807.610,24
Desincorporação de Bens Móveis
Desincorporação de Bens Imóveis
1.400.089,56
1.382.578,69
783,66
INDEPEND. DA EXECUÇÃO
ORÇAMENTÁRIA
Incorporação de Bens Móveis
632.131,72
165.701,50
10.161.730,55
Incorporação de Bens Imóveis
1.178.496,54
535947,46
4.306.604,35
Desincorporação de Bens Móveis
35.216,31
799.501,04
526.847,32
Incorporação de Bens Imóveis
SALDO FINAL BENS MÓVEIS
8.438.008,14
10.837.645,63
12.155.351,71
29.817.966,71
SALDO FINAL BENS IMÓVEIS
10.876.187,95
12.265.748,55
14.412.477,20
20.525.908,13
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG, adaptado pelo autor.
16
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora
– MG. www.pjf.mg.gov.br
17
Nos exercícios de 1999 a 2001 não foram informados valores relativos aos Bens de Natureza Industrial. Por este motivo seu valor não foi considerado para fins deste artigo. É
importante ressaltar que a ausência destes valores não compromete os resultados pretendidos com a elaboração deste artigo.
29
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
O EFEITO SUPERVALORIZAÇÃO –
SUCATEAMENTO
Sem sombra de dúvida, a maior conseqüência da não adoção da Depreciação é a falsa mensuração do Patrimônio Público. Os valores lançados a título de Bens Móveis e Imóveis sofrem aumento anualmente, porém não representam de forma
fiel a capacidade real de geração de benefícios presentes e
futuros para a entidade.
O Efeito Supervalorização – Sucateamento ocorre quando os
bens patrimoniais tem seu valor aumentado gradativamente a
partir do resultado entre incorporações e desincorporações ao
mesmo tempo em que tem sua capacidade de geração de benefícios presentes e futuros reduzida em função dos efeitos da
depreciação. Este efeito tende a supervalorizar o Patrimônio
Público encobrindo as deficiências e inibindo ações de preservação e modernização do mesmo. A tendência é que cada vez
mais o Patrimônio Público tenha supervalorizada sua incapacidade de geração de benefícios.
A partir de dados extraídos do balanço Patrimonial da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG, calculou-se a variável “Capacidade de Geração de Benefícios” que representa o valor dos
bens móveis e imóveis deduzidos da taxa de depreciação. A
Secretaria da Receita Federal determina as taxas de depreciação a serem adotadas para fins de imposto de renda. Como a
Administração Pública não está sujeita aos efeitos do Imposto
de Renda, o valor adotado para a Depreciação pode e deve ser
o valor real do desgaste do bem em suas condições reais de
uso. Para fins de entendimento desta variável foi arbitrado um
percentual inicial de 10% para a depreciação que incidiu sobre
o saldo de Bens Móveis e Imóveis no exercício de 1999 e nos
outros exercícios foi considerado um valor que supostamente foi
verificado pelo setor responsável pelo Patrimônio Municipal.
Quadro 06. Valores Patrimoniais Versus Capacidade de
Geração de Benefícios
Capacidade de
Bens
Geração de Benefícios
19.314.196,09
17.382.776,48
23.103.394,18
18.515.191,68
26.567.828,91
17.291.682,40
50.343.874,84
35.690.123,74
Pensar
Contábil
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG, adaptado pelo autor.
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Gráfico 01. Efeito Supervalorização Sucateamento
A distorção entre a real capacidade de geração de benefícios e o valor lançado a título de bens móveis e imóveis, Efeito
Supervalorização – Sucateamento, pode ser observado ao longo de todo período representado no gráfico. É interessante
observar o intervalo de tempo “3”, onde se verifica uma tendência de supervalorização e sucateamento mais acentuado. Os
valores lançados como Bens não representam de fato a capacidade de geração de benefícios , característica esta singular
dos ativos. A análise da verdadeira capacidade dos ativos em
gerar riquezas, apresenta distorções ainda mais graves quando se adiciona o fato do valor inicial lançado em 1999 a título
de Bens Móveis e Imóveis é resultado de incorporações e
desincorporações ocorridas deste a Fundação do Município,
sem influência dos efeitos da depreciação. Atualizando-se as
informações constantes no Balanço Patrimonial para que sejam observados os efeitos da depreciação chega-se ao seguinte quadro resumo:
Quadro 07. Balanço Patrimonial Consolidado de 1999 a 2002.
EXERCÍCIO
ATIVO
ATIVO FINANCEIRO
Disponível
Caixa
Bancos
Vinculado
Realizável
Ações de Curto Prazo
Devedores Diversos e Outras
ATIVO PERMANENTE
Bens Móveis
Bens Imóveis
Bens de Natureza Industrial
( - ) Depreciação Acumulada
Créditos
Dívida Ativa
Valores Diversos
Ações
Almoxarifado
Incorporações
Soma do Ativo Real
SALDO PATRIMONIAL
Passivo Real Descoberto
Soma
ATIVO REAL
TOTAL GERAL
1999
77.909.928,09
10.524.475,89
10.289.415,90
2000
105.980.068,98
18.116.623,49
17.722.690,41
2001
138.849.817,59
36.260.049,90
35.622.323,03
2.269.745,36
8.019.670,54
235.059,99
12.052.426,29
5.670.264,12
393.933,08
22.626.218,39
12.996.104,64
637.726,87
235.059,99
65.454.032,59
8.438.008,14
10.876.187,95
393.933,08
83.275.242,99
10.837.645,63
12.265.748,55
637.726,87
93.313.621,18
12.155.351,71
14.412.477,20
(1.931.419,61)
43.260.943,65
43.260.943,65
4.810.312,46
3.363.099,14
1.447.213,32
75.978.508,48
(4.588.202,50)
52.895.241,28
52.895.241,28
11.864.810,03
4.479.549,92
1.976.245,95
5.409.014,16
101.391.866,48
(9.276.146,51)
63.215.389,38
63.215.389,38
12.806.549,40
4.485.519,59
2.002.113,26
6.318.916,55
129.573.671,08
1.497.680,61
77.476.189,09
4.154.463,50
105.576.329,98
77.476.189,09
105.576.329,98
129.573.671,08
5.769.724,53
135.343.395,61
2002
223.850.363,87
22.625.441,32
21.319.046,14
767,74
11.890.558,16
9.427.720,24
1.306.395,18
1.306.395,18
186.571.171,45
29.817.966,71
20.525.908,13
949.822,28
(14.653.751,10)
103.733.778,15
103.733.778,15
46.197.447,28
43.580.471,77
2.616.975,51
209.196.612,77
209.196.612,77
438.289,87
209.634.902,64
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG, adaptado pelo autor.
30
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Aplicando-se os valores da Depreciação sobre os componentes dos Bens Móveis e Imóveis, verifica-se que o Resultado
Patrimonial nos anos de 1999 e 2000, que até então apresentava um resultado positivo, passou a apresentar um Passivo a
Descoberto. Os valores dos exercícios seguintes sofreram uma
significativa redução.
CONCLUSÃO
A Ciência Contábil, enquanto Ciência, apresenta sérias dificuldades no que diz respeito à elaboração de conceitos e significados. Não existe, como por exemplo, na Biologia, uma definição clara dos termos, das funções, das atividades. Biologicamente falando, é possível determinar com precisão e principalmente com uniformidade e consenso o que é uma célula, a função dos tecidos, a localização e função dos órgãos. Contabilmente não se pode determinar com exatidão o conceito de Ativo, Passivo, Receitas, afinal não se trata de uma ciência exata.
O que é o Ativo é o conjunto de bens e direitos de uma entidade? É o conjunto de potencialidades e possibilidades de uma
entidade? Deve ser considerado pelo valor físico de seus elementos ou pela capacidade de geração de benefícios? Como
determinar esta capacidade de geração de benefícios? São perguntas que existem e sempre serão alvos de discussão. Neste
ponto é que se pode verificar que a Ciência Contábil ainda está
em franca evolução.
Esta dificuldade de conceituação por vezes é tratada do ponto de vista legal. A legislação existe para determinar conceitos e
definir padrões. O que se observa muitas vezes, é que a legislação não acompanha os ditames dos Princípios e Normas
Contábeis.A Ciência Contábil, quando é tratada apenas sob o
ponto de vista da Legislação, não consegue realizar sua missão
que é fornecer informações úteis para a tomada de decisão.
Algumas distorções são graves como é o caso da Contabilidade Pública que é baseada na Lei 4.320/64. Esta lei, por ter
seu foco extremamente financeiro, proporciona a elaboração
de demonstrativos que sempre estão relacionados ao curto
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
prazo. Sempre se refletem ao período a que a entidade está
em atividade. É contraditório pensar em planejamento quando
a entidade não sabe ao certo sua capacidade de geração de
resultados.
A desconsideração de efeitos econômicos criam distorções
graves na mensuração do Patrimônio Público. O Efeito Supervalorização Sucateamento mostra que existe um descompasso
entre o valor registrado do bem e a sua capacidade de geração
de benefícios para a entidade. A avaliação patrimonial leva em
conta os valores registrados nos demonstrativos contábeis exigidos pela Lei 4.320/64.
Estes demonstrativos apresentam valores patrimoniais que
não espelham a realidade da entidade. A depreciação é considerada elemento de natureza essencialmente fiscal e só utilizada para efeitos de dedução do Imposto de Renda. O desgaste
físico do bem não é considerado. Se não há desgaste do bem,
não há necessidade de investimentos. O resultado cruel desta
linha de raciocínio é o sucateamento do Patrimônio Público e a
inevitável perda de eficiência do serviço público.
A Lei Complementar 101 – Lei de Responsabilidade Fiscal,
prevê em seu Capítulo VIII – Da Gestão Patrimonial, medidas
para a preservação do Patrimônio Público. Infelizmente são
medidas apenas financeiras, pois tratam de depósitos de disponibilidades financeiras ou da destinação da receita proveniente
da alienação de bens. Demais critérios para preservação do
Patrimônio Público ficaram a cargo da Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Os efeitos da não adoção da depreciação pela contabilidade pública tem seus efeitos mais graves percebidos a longo prazo, uma vez que a capacidade do Ativo em produzir
benefícios é afetada gradualmente e os serviços a serem
prestados pela entidade aumentam constantemente. A afetação do Ativo em sua capacidade de produzir benefícios
presentes e futuros deve ser considerada na fase de planejamento para que ocorra de fato a Preservação do Patrimônio Público.
BIBLIOGRAFIA
BRAGA, Hugo Rocha. Demonstrações contábeis: estrutura, análise e interpretação. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 1999.
Pensar
Contábil
BRASIL: Lei Complementar 101, de 04/05/2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade
fiscal e dá outras providências. Brasília. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, 05/05/2000, Seção I, p. 1.
________ Lei Federal n. 4.320/64, de 17/03/1964. Estatui normas de direito financeiro para elaboração e controle dos
orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Diário Oficial (da) República Federativa do
Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23 mar. 1964, Seção I, p. 2.745.
CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Princípios Fundamentais de Contabilidade e Normas Brasileiras de Contabilidade. 3ª ed. – Brasília : CFC, 2001.
FIPECAFI. Manual de contabilidade das sociedades por ações: aplicável às demais sociedades. Diretor Responsável:
Sérgio de Iudícibus, Coordenador Técnico: Eliseu Martins, Supervisor de Equipe de Trabalho: Ernesto Rubens Gelbcke. 5ª Ed.
São Paulo: Atlas, 2000.
HENDRIKSEN, Eldon S..VAN BREDA, Michael F. Teoria da Contabilidade. Tradução: Antônio Zoratto Sanvicente. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 1999. P.95
KOHAMA, Heilio. Contabilidade pública: teoria e prática. 9ª Ed. São Paulo: Atlas,2003.
MARION, José Carlos.Contabilidade Empresarial. 10ª. Ed. – São Paulo: Atlas, 2003. p. 23
Prefeitura Municipal de Juiz de Fora – MG - www.pjf.mg.gov.br.
SCHRICKEL, Wolfgan Kurt. Demonstrações financeiras: abrindo a caixa preta: como interpretar balanços para a concessão de empréstimos. São Paulo: Atlas, 1999.
Secretaria do Tesouro Nacional – STN – www.stn.fazenda.gov.br
SLOMSKI, Valmor. Manual de contabilidade pública: um enfoque na contabilidade municipal. São Paulo: Atlas, 2001
(Footnotes)
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Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Prêmio
FREITAS BASTOS
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Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
A IMPORTÂNCIA DO
CONTROLE CONTÁBIL
E EXTRA-CONTÁBIL
DOS BENS PERMANENTES
ADQUIRIDOS PELA
ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA FEDERAL1
1 - ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
Antes da implantação do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI), a União enfrentava
diversos problemas de natureza administrativa com relação a
gestão dos seus recursos. No que se refere ao controle patrimonial, a falta de tempestividade no registro do fato contábil da
aquisição de um bem permanente comprometia, sobremaneira,
a escrituração extra-contábil desses bens nos registros paralelos, que são mantidos, até os dias de hoje, para fins de apuração de responsabilidade pela guarda e uso do material, além do
retardo em registrar as principais informações técnicas dos bens
no banco de dados da Unidade Gestora (UG). O tempo transcorrido entre a ocorrência de um fato e o levantamento dos demonstrativos orçamentário, financeiro e patrimonial era de aproximadamente 45 dias tornando-se inviável a utilização das informações contábeis para fins gerenciais. A evidenciação da
situação patrimonial, devido às dificuldades na conciliação e
unificação dos dados, não refletia a realidade. O SIAFI foi criado
com a finalidade precípua de suprir a Administração Pública
federal de informações on-line, em tempo real, de todos os registros efetuados pelas Unidades Gestoras. Os lançamentos são
registrados de forma automática e todos os relatórios e demonstrações contábeis, emitidos pelo próprio sistema, são atualizados no mesmo instante em que a transação é efetuada (on-line).
Entretanto, o SIAFI não discrimina os bens permanentes que
estão classificados dentro das contas contábeis, instituídas de
acordo com o Plano de Contas Único da União. A Administração
Pública federal não trabalha com um sistema integrado de contabilidade, não utilizando, assim, os dados da contabilidade
para fins de controle, subsídio e auxílio à alta administração.
Somente são acumulados os saldos, nas respectivas contas
contábeis, de acordo com as classificações feitas pela UG. Para
controle dos bens permanentes, há a necessidade de se manter um controle paralelo ao contábil. Cada Órgão ou Ministério,
através do seu Órgão de Controle Interno, emana orientações
de como proceder para executar o controle extra-contábil dos
1
Fabiano Torres Junior
Contador, Mestre em Ciências Contábeis pela UERJ, Professor
Universitário (UNIVERCIDADE e UNIPLI) Orientador: Prof. L. D. Lino
Martins da Silva , Controlador do Município do Rio de Janeiro, Professor do Programa de Mestrado em Ciências Contábeis da UERJ
bens permanentes , além de determinar a periodicidade da conciliação entre a existência física e o que está registrado na
contabilidade (SIAFI).
2 - DESPESAS PÚBLICAS
Todos os gastos executados pelo Estado, com fins de manter
os serviços oferecidos em pleno funcionamento, bem como outras melhorias à população, chama-se de Despesas. Pires (2002,
p. 139) define Despesas Públicas como “o conjunto de dispêndios do Estado ou de outra pessoa de direito público para o
funcionamento dos serviços públicos”. Silva (2000, p. 113) caracteriza as Despesas Públicas como aquelas que “constituem
todos os desembolsos efetuados pelo Estado no atendimento
dos serviços e encargos assumidos no interesse geral da comunidade, nos termos da Constituição, das leis, ou em decorrência
de contratos ou outros instrumentos”. Angélico (1991, p. 68)
define Despesa Pública como “todo o pagamento efetuado a
qualquer título pelos agentes pagadores”. As despesas públicas representam a retribuição que o Estado realiza, no cumprimento de suas funções, dos recursos por ele auferidos, através
da própria sociedade a ser beneficiada. A Administração Pública, ao aplicar seus recursos, não visa angariar receitas, mas
sim prestar e/ou manter os melhores serviços à população, como
por exemplo, a saúde, a educação, o transporte entre outros.
Essa é a finalidade das despesas na Administração Pública.
Inicialmente, pode-se classificar as Despesas Públicas em
orçamentárias e extra-orçamentárias. As Despesas Orçamentárias são aquelas que dependem de autorização legislativa.
Pensar
Contábil
Dissertação apresentada no Programa de Mestrado da UERJ em abril de 2003.
33
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Essas despesas não podem ser realizadas sem prévia autorização, ou seja, esses gastos têm que estar publicados na Lei Orçamentária Anual (LOA). As Despesas Extra-orçamentárias são
aquelas que são pagas independente de autorização legislativa; não constam na LOA. Geralmente se caracterizam com a
baixa do Passivo Financeiro. São devoluções de quantias que
antes foram arrecadadas como receitas extra-orçamentárias,
como por exemplo, as cauções, os depósitos de terceiros etc.
Além desta classificação existem diversos elementos de despesas numerados de 01 a 99. Pires (2002) explica que essa
classificação foi alterada , no âmbito da esfera federal, a partir
do exercício de 1990 por imposição da LDO de 1989. A nova
classificação orçamentária das despesas tem um desdobramento
diferenciado daquele implantado pela Lei 4.320/64 e é composto por: categorias (despesas correntes e de capital), grupo de
despesas (pessoal e encargos sociais, juros e encargos da dívida interna, juros e encargos da dívida externa, outras despesas
correntes, investimentos, inversões financeiras, amortização da
dívida interna, amortização da dívida externa, e outras despesas de capital), modalidade de aplicação (aplicações diretas e
transferências) e elementos de despesas (tabela composta de
quase 99 elementos). Pela nova classificação, as despesas devem ser analisadas, no que diz respeito a sua natureza, quanto
a categoria econômica, o grupo a que pertence, a modalidade
de aplicação, ou seja, se ela vai ser realizada diretamente ou
por meio de transferência a outro organismo ou entidade, dentro
ou fora do orçamento, e o elemento de despesa, caracterizado
pelo objeto final do gasto.
2.1 - DESPESAS CORRENTES
As Despesas Correntes são os gastos de natureza operacional, realizados pela Administração Pública, para manutenção e
funcionamento dos seus órgãos. Piscitelli, Timbó e Rosa (1999)
explicam que as despesas correntes também são chamadas de
efetivas, ou de despesas propriamente ditas, pois essas despesas correspondem aos fatos modificativos diminutivos ocorridos
na contabilidade das empresas privadas. Ocorre esse fato pois
há uma diminuição do Ativo sem diminuição do Passivo ou mesmo um aumento de Ativo (no qual seria classificado um fato
permutativo). As despesas efetivas se caracterizam por afetarem ao patrimônio no momento de sua liquidação, diminuindo o
valor em termos quantitativos, sem contudo gerar incorporação
de bens e direitos ou resgate de obrigações. Pires (2002) explica que basicamente se classificam como despesas efetivas as
Despesas Correntes (com exceção das despesas de aquisição
de materiais) e as transferências de capital. As Despesas Correntes podem ser classificadas em Despesas de Custeio e Transferências Correntes.
Pensar
Contábil
2.2 - DESPESAS DE CAPITAL
Despesas de Capital são os gastos realizados pela Administração Pública, cujo propósito é o de criar novos bens de capital
ou mesmo adquirir bens de capital já em uso, como é o caso de
investimentos e inversões financeiras, respectivamente, que
constituirão incorporações ao patrimônio público de forma efetiva ou através de mutação patrimonial. Andrade (1981, p. 80)
define Despesas de Capital como:
34
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
dotações para investimentos ou inversões financeiras que outras pessoas de direito público ou privado
devam realizar, independentemente de contraprestação direta em bens ou serviços, constituindo essas
transferências auxílios ou contribuições segundo derivem diretamente da Lei de Orçamento ou de Lei Especial anterior, bem como as dotações para a amortização da dívida pública.
As Despesas de Capital são também conhecidas como nãoefetivas ou por mutação patrimonial. Essas despesas representam troca de recursos financeiros por elementos patrimoniais,
tais como: aquisição de bens, concessão de empréstimos, amortização da dívida etc. Essas despesas são representadas por
mutações patrimoniais que nada acrescentam ao patrimônio, só
ocorrendo uma troca de recursos financeiros por bens, direitos
ou obrigações, ou seja, uma diminuição no Sistema Financeiro
(saídas de recursos) e um aumento no Sistema Patrimonial (entrada no patrimônio).
3 - PATRIMÔNIO NA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O patrimônio público é formado por bens de toda natureza e
espécie que tenham interesse para a Administração Pública e
para a comunidade administrada. Kohama (2001, p. 213) entende como Patrimônio Público “o conjunto de bens, direitos e
obrigações, avaliados em moeda corrente, das entidades que
compõem a administração pública”. Viana (1972, p. 101) define
bens como “ os elementos materiais, exteriores ao homem, que
servem para debelar suas necessidades”. Os bens públicos,
num sentido amplo, podem ser entendidos como todas as coisas, corpóreas (tangíveis) ou incorpóreas (intangíveis), imóveis,
móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam, a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas, fundacionais e empresas governamentais. Habckost (1991, p. 25)
define bens públicos como “o conjunto de coisas sobre as quais
o Estado exerce o direito de soberania em favor da coletividade
ou o direito de propriedade privada”.
Os bens públicos podem ser:
- de uso comum do povo, como por exemplo os mares,
rios, estradas, ruas, praças etc, enfim todos os locais abertos à utilização pública. Atualmente estes bens não são
suscetíveis a contabilização no patrimônio público, nem
inventariados, não gerando acréscimos patrimoniais. São
bens inalienáveis por sua natureza. Somente são contabilizados os gastos para manutenção ou construção desses bens;
- de uso especial, como edifícios e terrenos aplicados
na execução dos serviços públicos, bem como os bens
integrados que são indispensáveis para a execução desses serviços;
- os dominicais ou dominiais, isto é, os que constituem
o patrimônio da União, dos Estados, ou dos Municípios,
como objeto de direito pessoal, ou real de cada uma dessas entidades, como por exemplo o disponível (caixa e
bancos), bens móveis, bens imóveis e de natureza industrial.
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Este trabalho terá seu enfoque voltado para os bens de uso
especial e dominicais, classificados como bens móveis, de caráter permanente, decorrente da efetivação de despesas de
capital, os quais têm a característica de serem contabilizados,
inventariados, avaliados e estão incluídos no patrimônio público.
3.1 - ADMINISTRAÇÃO PATRIMONIAL
O arrolamento e a escrituração de todos os bens, sejam eles
móveis ou imóveis, de um órgão público constituem atribuição
específica da administração patrimonial. Na estrutura administrativa de qualquer órgão público deve constar uma unidade de
material que inclua, além dos setores de Aquisição, Licitação e
Almoxarifado, um setor específico de Patrimônio, que será responsável por todos os registros e controles físicos dos bens
móveis. Especificamente, este setor se responsabilizará pelo
controle da guarda, manutenção, distribuição e contabilização
dos bens. Fica responsável, ainda, pela salvaguarda e gestão
primeira de todo o patrimônio da entidade, inclusive pela reposição e troca dos equipamentos de produção e outros bens que,
se não forem bem cuidados, colocam em risco o ser humano,
aquele que os operam. Outras atribuições e responsabilidades
virão complementar o serviço de administração patrimonial, objetivando viabilizar o controle do acervo. Algumas situações,
como por exemplo, manter os dados sobre os responsáveis
pelo uso e guarda dos bens distribuídos sempre atualizados,
coordenar e controlar eventuais movimentações desses bens
são de difícil cumprimento e constituem preocupação constante da Seção de Patrimônio. Esta seção tem participação efetiva
em todas as áreas da UG, onde exista um bem patrimonial distribuído.
A administração patrimonial tem por finalidade planejar, organizar, controlar, zelar, conservar e promover a melhor utilização dos bens de uma instituição pública ou privada, bem como
assegurar sua alta administração em assuntos relativos a sua
área de atuação. O chefe deste setor deverá manter sempre
atualizado a escrituração dos bens, cumprindo todas as normas
internas e a legislação vigente no que se refere ao controle
contábil e extra-contábil dos bens permanentes, bem como
estar sempre em condições de fornecer informações que sejam
úteis à tomada de decisão.
São propósitos da gestão de material de uma UG: a) processar a gestão dos bens patrimoniais em estoque e imobilizados
nas Unidades Gestoras, por intermédio de um sistema próprio
para controle extra-contábil do bens permanentes, de forma compatível com o SIAFI, para que os fatos administrativos correspondentes sejam registrados e contabilizados do mesmo modo
em ambos os sistemas e em todos os demais que participem do
controle desses bens; b) documentar, registrar e demonstrar os
resultados dos atos e fatos administrativos relativos às transações efetuadas com os bens patrimoniais; c) definir e controlar
as responsabilidades pela gestão, uso, guarda e conservação
dos bens móveis; d) manter atualizados os valores contábeis
desses bens em relação às variações da moeda em que são
expressos e ao seu estado de conservação; e) fiscalizar e efetuar a tomada de contas dos responsáveis por esses atos e fatos
administrativos quanto aos aspectos contábil, formal e legal; f)
produzir os demonstrativos contábeis requeridos pelo Controle
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Interno e Externo; g) diligenciar e zelar pela fiel observância das
normas, para não haver substituições ou passagens de cargos
ou funções sem que se proceda a rigorosa conferência patrimonial e a verificação da situação do material; h) manter em arquivo, durante os prazos legais (geralmente cinco anos), à disposição dos órgãos de controle, a documentação afeta aos atos e
fatos da administração de material; i) propor, quando ciente de
qualquer irregularidade, a instauração do competente apuratório de responsabilidades dos gestores, auxiliares ou outros responsáveis pela guarda, conservação e aplicação do material; j)
inventariar, pelo menos uma vez ao ano, todo o acervo patrimonial e elaborar o respectivo relatório com as alterações encontradas; l) orientar e supervisionar o recebimento e o exame de
material, solicitando sempre que necessário a presença de técnicos ou peritos para proceder o exame qualitativo de material
especializado recebido pela UG; m) solicitar nomeação de comissão para recebimento do material, conforme determinação
do Agente Diretor; n) entre outras atribuições.
3.2 - CONTROLE PATRIMONIAL
O Controle Patrimonial consiste nas ações que assegurem,
por meio de registros e relatórios, a coleta de dados relativos à
identificação, existência, quantidade, localização, condições de
uso e histórico dos bens patrimoniais, desde a sua primeira inclusão no patrimônio (ou relacionamento), até a sua baixa final,
seja qual for o motivo. É a atividade de caráter administrativo
que tem por propósito o controle da movimentação de material
de qualquer natureza nas Unidades Gestoras, desde o seu
recebimento até a sua destinação final. A atividade de controle
patrimonial, exercida pela Seção de Patrimônio, permite que
esta funcione como um centro de informações dos bens físicos.
O controle atualiza os dados de registro e mantém sempre em
dia o cadastro geral dos bens. Pelo controle analisa-se o passado e o presente, bem como se estabelece bases de ação
para o futuro. Através do controle planejam-se as inspeções
periódicas, a fixação de chapas de tombamento dos bens móveis, como também, fiscaliza-se toda a movimentação dos bens
ao longo de sua vida útil. Os registros individuais são importantes para prover a administração com informações relevantes
para efeito de política de capitalização e substituição de bens e,
até mesmo, a contratação de seguros. A eficácia do controle dos
bens móveis depende, fundamentalmente, da implantação e
manutenção sistemática de registros administrativos e contábeis.
Pensar
Contábil
3.3 - CLASSIFICAÇÃO DOS BENS
Os bens móveis são aqueles que por sua natureza são suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia.
Consistem nos itens de material de grande valor intrínseco e
que não desaparecem com o uso, preservando as características originais, mantendo-se fisicamente individualizados, permitindo a sua incorporação ao patrimônio de uma UG.
Os bens móveis podem ser classificados em material permanente ou material de consumo. Material é uma designação genérica de equipamentos, componentes, sobressalentes, acessórios, veículos em geral, matérias-primas e outros itens empregados, ou passíveis de emprego nas atividades dos órgãos e
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Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
entidades públicas, independente de qualquer fator. O § 2º, do
art. 15, da Lei 4.320/64, classifica como material permanente o
bem cuja sua vida útil seja superior a dois anos. São classificados no Ativo Permanente, conforme rege o § 2º do art. 105 da
mesma Lei. Na prática, às vezes, fica muito difícil distinguir o
material permanente do material de consumo; ou melhor, fica
muito difícil saber com quais recursos serão adquiridos certos
itens: com Despesas Correntes ou Despesas de Capital. Existem várias legislações que regulam o assunto, e será tratado, da
forma mais minuciosa possível, essa distinção, tendo em vista
as distorções e as dúvidas constantes no dia-a-dia de uma UG.
A Norma de Execução nº 04, de 31 de outubro de 1997, da
STN, define como material permanente “aquele que, em razão
de seu uso corrente, não perde a sua identidade física, e/ou tem
sua durabilidade superior a dois anos”. A mesma norma define
material de consumo como “aquele que, em razão de seu uso
corrente e da definição na Lei 4.320/64, perde normalmente sua
identidade física e /ou tem sua utilização limitada a dois anos”. É
todo item, peça, artigo ou gênero alimentício. Destinam-se a
aplicação, transformação, utilização ou emprego imediato e,
quando utilizados, perdem suas características individuais e isoladas. Adicionalmente aos conceitos apresentados, serão levados em consideração, ainda, os seguintes parâmetros excludentes: a) durabilidade, quando o material em uso normal perde
ou tem reduzidas as suas condições de funcionamento, no prazo máximo de dois anos; b) fragilidade, cuja estrutura esteja
sujeita a modificação, por ser quebradiço ou deformável, caracterizando-se pela irrecuperabilidade e/ou perda de sua identidade; c) perecibilidade, quando sujeito a modificações (químicas ou físicas) ou que se deteriora ou perde sua característica
normal de uso; d) incorporabilidade, quando destinado a incorporação a outro bem, não podendo ser retirado sem prejuízo
das características do principal; e e) transformabilidade, quando adquirido para fins de transformação.
Para fins de registro e classificação, a Lei 4320/64 definiu
bens permanentes de acordo com a vida útil. Para fins de registro no patrimônio, a citada Lei não trata da materialidade. Deixou essa decisão por conta do Administrador Público. O item nº
3 da IN nº 142, de 05 de agosto de 1983, do Departamento
Administrativo do Serviço Público – DASP, cita que o controle
deverá ser suprimido quando o custo de se controlar o bem for
superior ao risco da perda do material. Esse dispositivo está
regulado no art. 14 do Dec. Lei nº 200/67.
Pensar
Contábil
3.4 - TOMBAMENTO
Entende-se como carga, segundo a IN nº 205 da Secretaria
de Administração Pública da Presidência da República - SEDAP, de 08 de abril de 1988, a efetiva responsabilidade pela
guarda e uso de material pelo seu consignatário. A descarga,
segundo a mesma IN, é a transferência dessa responsabilidade. A entrada de material configura a carga, enquanto que a
saída configura a descarga.
Os bens permanentes só poderão ser distribuídos após registrados todos os seus dados em um sistema próprio para fins
de controle físico e contábil. O bem será considerado em carga,
com seu registro, após o cumprimento das formalidades de recebimento e aceitação. A maioria dos órgãos públicos trabalha,
hoje, com o sistema de tombamento dos bens, apondo uma
36
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
plaqueta de metal ou uma etiqueta com o número patrimonial.
Nenhum bem permanente poderá ser distribuído sem o conhecimento da Seção de Patrimônio, bem como sem o seu número
patrimonial. Este número é seqüencial e será aposto mediante
gravação, fixação de plaquetas, carimbos, etiqueta apropriada
ou marcação a tinta. Nos manuais específicos deverão conter
instruções quanto o emplaquetamento dos bens, padronizando
locais predeterminados para aposição dos números, separando-os por grupos. Há órgãos, como por exemplo a Comissão
de Valores Mobiliários e o Banco Central do Brasil, que utilizam
plaquetas de alumínio com leitura feita através de código de
barras. Este sistema proporciona inúmeras vantagens, uma vez
que a tecnologia empregada agrega importantes recursos ao
sistema. O controle dos bens passa a ser total e a agilidade
operacional constitui fator fundamental na administração de
itens de patrimônio que tenham características muito dinâmicas.
A utilização de leitoras acopladas a coletores de códigos de
barras conferem às movimentações e aos levantamentos efetuados a agilidade, dinamicidade, controle e segurança operacionais. O excelente desempenho dessa ferramenta resulta na otimização e racionalização do trabalho, permitindo às organizações reestruturarem as áreas responsáveis pelo patrimônio, proporcionando, inclusive, a realocação de pessoal para aproveitamento em atividades fins.
3.5 - CADASTRO PATRIMONIAL
O cadastro patrimonial tem por finalidade básica registrar todos os dados sobre os elementos passíveis de identificação, de
maneira a dotar o órgão de informações imprescindíveis a quaisquer expansões, novas aquisições, alienações e reformas. O
controle efetivo dos bens patrimoniais será realizado através de
registro analítico dos bens em uso, mediante utilização de um
banco de dados informatizado, que evidencie a localização física do bem por órgão ou setor e um controle por ordem numérica
crescente de registro patrimonial.
Além dos dados contábeis, deve figurar, também, uma série
de dados técnicos e econômicos capazes de fornecer elementos a um planejamento e a uma futura tomada de decisão. O
banco de dados deverá conter, no mínimo, as seguintes informações: a) nomenclatura correta do material, de acordo com o
manual de operação do equipamento; b) relação dos componentes, caso o material seja um conjunto; c) especificação técnica do material (potência, marca, modelo, número de série e outros dados que sejam relevantes para melhor identificação do
bem); d) tipo de aquisição ( compra no comércio, doação, transferência entre Unidades Gestoras, fornecido por Órgão Provedor etc); e) data de aquisição; f) data que foi colocado em
operação; g) vida útil estimada; h) origem (nome da empresa
que foi adquirido o bem, Órgão Provedor etc. ); i) número da NE,
Guia de Fornecimento, Guia de Remessa etc; j) conta contábil;
l) número da Ordem de Entrega ou documento similar (emitido
pelo almoxarifado para a entrega dos bens); m) valor unitário; n)
valor total; o) campo para o número patrimonial (preenchido
automaticamente pelo sistema); p) situação do bem ( estado de
conservação de acordo com a IN nº 205-SEDAP, de 08 de abril
de 1988 que classifica os bens em bom, ocioso, recuperável,
antieconômico ou irrecuperável); q) observações, onde serão
inseridos outros dados que sejam de interesse da administra-
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ção; r) localização do bem (o nome da seção a quem foi distribuído o material); s) número de catalogação (se for o caso); t)
entre outras informações que forem julgadas pertinentes ao processo.
O sistema adotado deverá manter, ainda, o cadastro de todas
as seções, vinculando o nome dos respectivos chefes de seção.
A cada troca de chefia, por prazo superior a trinta dias, esse
cadastro será atualizado. Essa medida visa manter um controle
efetivo dos responsáveis pela guarda e uso dos bens distribuídos. Qualquer mudança estrutural na UG deverá ser comunicada para atualização do sistema, quanto a localização física dos
bens patrimoniais.
A carga ficará sob a responsabilidade do Chefe da Seção ou
Serviço, de acordo o art. 87 do Dec. Lei 200/67: “Os bens móveis, materiais e equipamentos em uso ficarão sob a responsabilidade dos chefes de serviço, procedendo-se periodicamente
as verificações pelos competentes órgãos de controle.”
Por ocasião do cadastro do bem , com o respectivo tombamento, será dado o valor final de aquisição, a fim de que os
registros financeiros, através dos elementos e valores extraídos
dos documentos fiscais, coincidam exatamente com os valores
registrados na Seção de Patrimônio. O inciso II, do art. 106, da
Lei 4.320/64 explica que os bens móveis e imóveis serão avaliados, para fins de registro contábil, pelo valor de aquisição, custo de produção ou de construção. Como custo histórico entende-se o valor final de aquisição, onde estarão incluídos todos os
gastos para colocar o ativo em pleno funcionamento como fretes, taxas alfandegárias, outras taxas e impostos, custos de manuseio e estocagem, prévios a incorporação, custos de instalação na base física de operação e todos os demais gastos necessários para colocar o bem em plenas condições de utilização.
Pode-se verificar que este dispositivo está de acordo com o princípio contábil do Registro pelo Valor Original.
3.6 - INCLUSÃO NO PATRIMÔNIO
As inclusões de bens permanentes no patrimônio de uma UA
decorrem, basicamente, de: aquisição direta no comércio, recebimento de material fornecido por órgão provedor (OP), transferência de material de outra UA, cessão, permuta, produção própria, doação e superveniência ativa causada por fato fortuito ou
natural.
Todo o material que der entrada nas Unidades Gestoras
virá acompanhado de documento comprobatório, confeccionado em pelo menos duas vias (uma para recibo), como NF,
Fatura, Termo de Cessão, Termo de Doação, Guia de Remessa, Guia de Transferência, Guia de Produção, Ato Declaratório etc. Será recebido e conferido no Almoxarifado de cada
UG. O recebimento não ocorrerá neste local quando não se
puder proceder o exame por falta de espaço físico, ou não
deva ali o material ser recebido, caso em que a entrega se
fará em locais previamente designados, com o conhecimento
prévio do almoxarife.
Se o trâmite legal de entrada dos bens móveis na UA não for
seguido, a contabilidade, cujo papel é registrar o fato contábil
com oportunidade e tempestividade, deixará de cumprir a sua
função, representando uma posição de estoque, ou mesmo a
existência física de bens, que não exprime a realidade, contemplando a administração com informações incongruentes.
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3.7 - DA DISTRIBUIÇÃO E REPONSABILIDADE
Segundo consta do art. 83 da Lei 4.320/64 , “a Contabilidade
evidenciará perante a Fazenda Pública a situação de todos quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas,
administrem ou guardem bens a ele pertencentes ou confiados”. Com este dispositivo, é imposto à contabilidade, como instrumento gerador de informações para o controle e avaliação da
gestão patrimonial, as regras que deverão se evidenciar através
dos registros e relatórios em que se louvarão as decisões administrativas. Machado Júnior e Reis (2000, p. 180 e 181) esclarecem, com muita oportunidade, a responsabilidade do profissional contábil:
o Contador, profissional responsável pela contabilidade, responde pelo conteúdo informativo das demonstrações contábeis, enquanto o agente público,
político ou administrativo, que apõe sua assinatura
naquelas demonstrações é responsável pelos atos
praticados que deram conseqüência aos fatos representados pela contabilidade nas demonstrações.
O art. 94 da Lei 4.320/64 determina que “haverá registro analítico de todos os bens de caráter permanente, com indicação
dos elementos necessários para a perfeita caracterização de
cada um deles e dos agentes responsáveis pela sua guarda e
administração.”
O Agente Diretor é a autoridade responsável pela gestão de
material em uma UA. É ele quem autoriza a distribuição dos
bens às seções contempladas. No momento da distribuição dos
bens, a Seção de Patrimônio atualiza os Termos de Responsabilidade, que serão assinados pelos detentores diretos ou agentes consignatários . É atribuição do detentor direto da carga de
todos os órgãos públicos a responsabilidade pelos bens patrimoniais, bem como comunicar ao órgão competente pelo controle (Seção de Patrimônio), quando houver qualquer tipo de
movimentação ou irregularidade com o material sob sua guarda.
O Termo de Responsabilidade tem a finalidade de atribuir a
responsabilidade pelos materiais permanentes nele relacionados, com seus respectivos números de registro e valores de
aquisição, aos detentores de carga.
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Contábil
3.8 - DA DESCARGA
A descarga é a transferência de responsabilidade sobre um
bem, de um consignatário para outro, ou a baixa de forma
definitiva, desse bem, do patrimônio público. A descarga do
material é ordenada pelo Agente Diretor, em face dos documentos que deram origem ao processo, ou seja, dos termos das
comissões, pareceres, relatórios de sindicância, solução de
inquérito , processo administrativo específico, solicitação de
transferência interna de bens entre seções, ordem de fornecimento, remanejamentos, entre outros. É efetuada com o registro de saída do material no sistema de controle físico, procedendo a atualização do Termo de Responsabilidade, concluindo
com a movimentação contábil no SIAFI, se for o caso.
A baixa patrimonial ocorrerá, observadas as condições e formalidades legais, em decorrência das seguintes situações: ces-
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são; doação; permuta; alienação; inservibilidade para o fim a
que se destina, não sendo suscetível de recuperação e reparação ( ou recuperação antieconômica ); acidente; perda ou extravio; furto ou roubo; obsolescência; insubsistência ativa; desuso e inclusão indevida em carga.
A descarga de um bem patrimonial, de conformidade com a
legislação em vigor, efetivar-se-á quando for consumido e comprovado o ato que lhe deu origem. Um bem baixado no sistema
de controle físico ficará registrado no banco de dados, evidenciando, principalmente quando foi adquirido, quando foi descontinuado o seu uso, e o seu tempo de efetiva utilização. O número do tombamento baixado nunca será reaproveitado para o
registro de uma nova entrada.
3.9 - DOS PREJUÍZOS E INDENIZAÇÕES
Todos os servidores públicos poderão ser chamados à
responsabilidade pela perda ou extravio do material que lhe
for confiados, para guarda ou uso, bem como pelo dano que,
dolosa ou culposamente, causarem a qualquer material, esteja ou não sob sua responsabilidade. O servidor responderá civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular
de suas atribuições. A responsabilidade civil decorre de ato
omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em
prejuízos ao erário ou a terceiros. A responsabilidade civiladministrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou da função. Meirelles (2001)
explica que essencial para a existência da responsabilidade civil é que o ato culposo do servidor cause dano patrimonial à administração. Sem a ocorrência de dano patrimonial,
não há fundamento para a responsabilização civil, que visa,
unicamente, a reparação, material ou pecuniária , à administração.
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3.10 - INVENTÁRIOS
A técnica do inventário é tão antiga quanto ao surgimento da
própria civilização. Na época essa técnica era utilizada como
uma forma rudimentar de contabilidade. A contabilidade empírica, praticada pelo homem primitivo, já tinha como objetivo o
Patrimônio, representado pelos rebanhos e outros bens em seus
aspectos quantitativos. Os primeiros registros se processaram,
de forma bem rudimentar, porém, logo foram encontradas formas mais eficientes de processar registros, utilizando-se gravações e outros métodos alternativos. O inventário exercia um importante papel, pois a contagem era o método adotado para o
controle dos bens, que eram classificados segundo a natureza:
rebanhos, metais, escravos etc.
Como uma excelente ferramenta de controle até os dias atuais, o art. 96 da Lei 4.320/64 explica que o levantamento geral
dos bens móveis e imóveis terá por base o inventário analítico
de cada UA e os elementos da escrituração sintética na contabilidade. O inventário, segundo Silva (2000), é uma relação de
todos os elementos ativos e passivos, componentes do patrimônio, com a indicação dos valores desses elementos. Mello (1962)
nos explica que o Inventário é o arrolamento dos direitos e dos
compromissos de uma administração feito periodicamente com
fim de conhecer-se a exatidão dos valores acusados nas respectivas contas do Razão, e que formam o Ativo e o Passivo, ou
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apenas, com o objetivo de apurar-se devidamente a responsabilidade de agentes consignatários, sob cuja guarda se encontram determinados bens da administração. Os inventários descrevem minuciosamente e do modo mais analítico possível os
elementos patrimoniais. Machado Júnior e Reis (2001) citam
que o levantamento do inventário é de responsabilidade da
Seção de Patrimônio e será realizado por uma comissão de
funcionários graduados da entidade. A finalidade desse instrumento é, além de levantar o estado de cada bem utilizado, o de
controle dos bens que estão sob a guarda dos responsáveis,
conferindo com os registros sintéticos da contabilidade. A técnica de inventário permite conhecer a composição qualitativa do
patrimônio em determinado instante, bem como fornecer informações para que se estabeleça a sua expressão quantitativa.
Os inventários na Administração Pública serão levantados não
apenas por uma questão de rotina, ou mesmo de disposição
legal, mas também como medida de controle, tendo em vista
que os bens neles arrolados não pertencem a uma pessoa física, mas ao Estado e precisam estar resguardados de qualquer
dúvida ou suspeita. A fim de manter atualizados os registros
dos bens patrimoniais, bem como a responsabilidade dos setores onde localizam tais bens, o inventário será feito pelo menos
uma vez ao ano
A importância do inventário físico de bens reside no fato de
que não adianta controlar os bens permanentes distribuídos, ou
mesmo em almoxarifado, observando critérios condizentes de
avaliação e registro, se não existe a certeza das reais quantidades existentes na UA, num determinado momento. A apuração
quantitativa depende de controles analíticos adequados e mantidos em dia, agregados a um bom sistema de controle interno.
Os Órgãos de Controle Interno de cada Órgão/Ministério verificarão, periodicamente, os procedimentos adotados por cada
UG, conforme determina o art. 87 do Dec. Lei 200/67. Os resultados apresentados no inventário terão forte influência no resultado da UG, caso hajam divergências com os registros contábeis no SIAFI.
4 - SISTEMAS INTEGRADOS
Inicialmente, parece necessário esclarecer alguns aspectos
relacionados com a Teoria Sistêmica. A fórmula da equação
sistêmica é: INPUT à PROCESS à OUTPUT. Quando se fala em
sistemas no meio universitário, empresarial ou mesmo político,
tem-se a impressão de que nasceram com os computadores.
Para Magalhães e Lunkes (2000) isso parece um equívoco,
pois, segundo os mesmos autores, o computador é algo novo e
sua primeira versão, o Eniac, surgiu como conseqüência da
Segunda Guerra Mundial. Não se deve negar, entretanto, que
com a evolução tecnológica os processos sistêmicos passaram
por verdadeiras modificações, mas não somente em decorrência dos processamentos automatizados. As mudanças organizacionais, decorrentes dos diversos processos de desenvolvimento social, político, econômico, institucional e educacional, é
que propiciaram o aperfeiçoamento, a evolução e a criação de
novos sistemas, e estes estão relacionados com as mais diversas atividades do conhecimento humano, inclusive com a própria Ciência Contábil. Todo sistema, seja físico, econômico, social, tem finalidades específicas, para as quais todas as suas
partes devem contribuir. Sem essas finalidades comuns, a inter-
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ligação das partes componentes do sistema não teria justificativa. Entende-se por sistema um conjunto de partes e funções
dinâmicas, interdependentes, com objetivos bem específicos.
Para Teles e Vartanian (1998), sistema é “um conjunto de elementos interdependentes interagindo para o alcance de um
objetivo comum”. Cada sistema existente em uma organização
faz parte de um sistema maior (macrossistema) e contém vários
sistemas menores (microssistemas). Um sistema processa dados (entradas), transformando-os em relatórios (saídas). Esses
relatórios são destinados a pessoas com interesses bem específicos (usuários). O termo sistema traduz um pensamento de
algo geral, integrado por partes independentes e inter-relacionadas. É necessário considerá-lo como algo mais do que partes
reunidas estaticamente, e sim como, partes que formam e transmitem a dinâmica de um processo.
A Contabilidade, como um todo, é um sistema, tendo na sua
composição vários subsistemas, que tem por função informar e
explicar as variações que ocorrem com o patrimônio, que é seu
objeto. O Sistema Contábil apóia-se em estruturas que, como
tais, são a cultura (teoria, leis, princípios, normas etc.) e a tecnologia (técnicas contábeis). Sua finalidade está calcada em proporcionar informações contábeis úteis subsidiando o processo
decisório em todos os seus níveis. Pode-se concluir que um
Sistema de Informações Contábeis deve resultar das normas,
procedimentos e práticas dirigidos à coleta, classificação, registro, acumulação, resumo, medição e interpretação dos fatos administrativos que afetam a composição e o montante do patrimônio. A visão sistêmica conduz à verificação do desempenho da
totalidade do sistema, mesmo que o foco de análise seja apenas de um elemento do conjunto. Isso é devido a sua interação
com o todo organizado e à interdependência das partes para
alcançar a eficácia, em face do objetivo a ser atingido. A Administração Pública federal, como já comentado, utiliza-se do SIAFI para o registro dos atos e fatos administrativos. É um sistema
integrado de administração financeira, onde registros automáticos são efetuados, integrando os quatro sistemas de contas:
orçamentário, financeiro, patrimonial e compensado. Mas o
SIAFI só evidencia os itens monetários, resultado das operações executadas on line, através da estrutura dos eventos. Os
itens não-monetários (quantidade física) são demonstrados através de sistemas paralelos de controle, inexistindo, na grande
maioria dos casos, uma integração entre os mesmos.
Verifica-se, ainda, na prática, setores afins dentro da área
patrimonial que não se comunicam, trabalhando de forma isolada, executando, às vezes, a mesma tarefa repetidas vezes. Tanto o SIAFI (na esfera federal), quanto outros sistemas similares
utilizados pelos Estados e Municípios, onde existe uma informatização acentuada no controle da despesa pública, não possui
instrumentos suficientemente técnicos para uma avaliação de
eficácia no que tange ao controle patrimonial. Não havendo a
interligação entre os sistemas, haverá setores executando tarefas repetidas, e o órgão estará, dessa forma, aproveitando mal a
mão-de-obra disponível. Para minimizar os problemas advindos da não integração desses dados, seria necessário a implantação de um Sistema Integrado de Contabilidade, aproveitando a base de dados do Sistema Contábil tradicional (SIAFI).
Criaria-se, dessa forma, um Sistema Integrado de Informações
Contábeis, integrando as principais áreas envolvidas no controle patrimonial (Compras, Almoxarifado, Contabilidade, Seção
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de Patrimônio e Tesouraria).
Um Sistema Contábil Integrado pode ser entendido como um
sistema operativo que centraliza os registros dos fatos contábeis, cujos dados se encontram nos diversos arquivos dos sistemas integrados, compreendendo: cadastros, carteiras e movimentos. A principal função dos sistemas integrados é aglutinar
os dados que poderão produzir informações contábeis, processando-as de maneira a produzir as demonstrações de natureza
obrigatória e para fins gerenciais, com base em lançamentos
automáticos ou não. Peleias (2001) enumera alguns fatores que
justificam a implementação de sistemas integrados, explorando-se ao máximo o que a Tecnologia da Informação tem a oferecer: a) aumento da eficiência das diversas áreas por meio da
utilização de uma ferramenta que atenda a maioria das necessidades operacionais da empresa; b) possibilidade de redesenho, racionalização e redução do tempo de execução das
atividades por meio dos ciclos de transações da empresa; c)
descentralização de determinadas atividades, eliminando redundâncias, retrabalhos, promovendo sinergias e aumentando
a fluidez do inter-relacionamento entre os ciclos de transações.
A implantação desse tipo de sistema trará grandes vantagens
aos contabilistas que atuam na área de patrimônio, entre as
quais pode-se destacar: a) ampla utilização do conceito de razão auxiliar, com a segurança de que os valores registrados nos
vários módulos componentes do sistema estão perfeitamente
correspondidos com o registro contábil sintético; b) redução do
prazo entre a data do fato e o registro extra-contábil; c) maior
disponibilidade de tempo para a elaboração de instruções escritas (políticas, normas, procedimentos etc), principalmente
daquelas que afetam diretamente o sistema de controle patrimonial; d) a liberação de um grande volume de atividades
operacionais, possibilita ao contabilista dedicar mais tempo para
identificar e analisar os modelos decisórios dos gestores da organização e então, fornecer, a estes, as informações de que
necessitam. Esta atuação permite que este profissional esteja
cada vez mais próximo dos locais e dos momentos de ocorrência das decisões. Os Sistemas Integrados de Gestão foram desenvolvidos para resolver um dos mais sérios problemas enfrentados pela organização em um ambiente dinâmico: a fragmentação de dados.
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4.1 - SISTEMA INTEGRADO DE GESTÃO PATRIMONIAL
Os bens do Ativo Imobilizado constituem a estrutura básica
de toda a atividade empresarial. Tung (1972) afirma que o mobilizado varia de empresa para empresa. Explica, ainda, que em
alguns ramos de atividades representam uma parcela elevada
do total do seu ativo. As empresas de utilidade pública geralmente possuem elevado montante de investimento em bens
pertencentes ao Imobilizado. O sucesso no controle do mobilizado é vital para o desenvolvimento a curto e a longo prazo da
organização. Por isso, as entidades que possuem grandes volumes aplicados em ativos fixos deverão implantar sistemas de
controle e informação de modo que gerem, com o menor custo
possível, as informações desejadas, aumentando sua rentabilidade nessa atividade.
Ainda que muitas ou a totalidade das Organizações Públicas
não disputem mercados e vendas, e não tenham concorrência,
devem buscar melhoria de desempenho e competitividade em
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Pensar Contábil
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suas diversas atividades. Para a obtenção de vantagem competitiva das organizações, a eficiente melhoria na utilização dos
recursos relacionados com o patrimônio se torna indispensável.
Por outro lado, e de forma inexplicável, ocorreu ao longo dos
anos, um notável desleixo na condução estratégica, gerencial e
operacional desses recursos patrimoniais pelos organismos
competentes. Filho (1999) explica que o gerenciamento do patrimônio deve ser diferente e revestido de práticas complementares dos controles patrimoniais até então desenvolvidos, pelo
menos em quatro sentidos. Primeiro, deve ser focado como uma
entidade única e integrada, em vez de distribuir autoridades e
confiar responsabilidade de forma fragmentada para diversas
áreas funcionais, tais como Compras, Manutenção, Jurídica,
Controle Patrimonial e outras. A segunda característica que deve
ser focada no gerenciamento patrimonial é derivada diretamente da primeira: tomada de decisão estratégica. O patrimônio é
objeto compartilhado por funções numa organização, requerendo portanto um significado estratégico particular devido ao que
pode causar, para o mal ou para o bem, sobre os custos totais e
na produtividade. Em terceiro lugar, a gestão patrimonial deve
fornecer uma perspectiva diferente sobre os demais recursos da
organização: deve ser um dos primeiros e não o último a ser
gerido. Finalmente, como quarto sentido, necessariamente a
gestão patrimonial exige uma abordagem sistêmica: deve ocorrer integração, não apenas interface entre áreas afins.
Para que as Entidades Públicas possam custear as suas atividades, conforme determina a Lei 4.320/64 e a LRF, através da
implantação de Sistemas de Apuração de Custos, é mister que
se tenha um módulo integrado de administração patrimonial, de
modo que sejam agregadas as informações no que se refere ao
controle do patrimônio público. É necessário que se integre um
Sistema de Administração Patrimonial, interligando as diversas
áreas da organização, aproveitando a base de dados já existente. Speroni (1997) explica que um Sistema de Administração
Patrimonial fundamenta-se na visão e organização como um
conjunto de recursos humanos, materiais e tecnológicos, interagindo de forma coordenada no desempenho de atividades voltadas para os propósitos da organização. O mesmo autor explica que o Sistema de Patrimônio compõe um dos elementos do
Sistema Integrado de Informações, logo, um subsistema capaz
de interagir com os demais, compartilhando seu banco de dados e destinado ao controle da integridade patrimonial dos bens
e dos efeitos de seu uso, em termos de eficiência, eficácia e
economicidade. Como uma grande ferramenta de gestão, deve
ser capaz de disseminar as informações, de natureza quantitativa e qualitativa, para auxiliar aos gestores no planejamento e
controle, e aos usuários dos bens, na operacionalização. A idéia
de se ter um sistema nesse nível é melhorar o desempenho das
Unidades Gestoras, com vista à qualidade e à produtividade.
O MEC, desde 1994, vem coordenando um trabalho integrado por inúmeras universidades, com o objetivo de implantar um
Sistema de Informações Gerenciais para as Instituições Federais de Ensino Superior. Nesse contexto, surgiu a necessidade
de desenvolver , dentre outros, um sistema de patrimônio que
permitisse, além de melhorar as condições de controle patrimonial das instituições, determinar o componente de custo com
depreciações, a ser incorporado ao custo das atividades dessas
Instituições, como um custo patrimonial. Com base nessas idéias é que será moldado, nesse tópico, um Sistema de Adminis-
Pensar
Contábil
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tração de Patrimônio, contendo módulos integrados com as
diversas áreas de uma organização.
O Sistema de Administração de Patrimônio não pode limitarse a uma visão simplista de controle, que muitas vezes, tem
norteado a implantação de sistemas de administração patrimonial, cujo escopo se restringe somente ao atendimento das determinações legais, que se circunscreve a um simples cadastro
dos componentes patrimoniais, caracterizados por seus elementos identificadores e dos agentes responsáveis pela sua guarda
e localização.
Speroni (1997) explica que, por reconhecer que o sistema
formal de Contabilidade Pública e seus sistemas auxiliares convencionais (sistema analítico de contabilidade patrimonial) se
mostram insuficientes para atender a todas as demandas de
informações necessárias à gestão patrimonial, o sistema que
aqui será proposto assume o caráter de um sistema complementar ao sistema de contabilidade formal.
Pode-se ressaltar, ainda, que na estrutura da organização,
dentro dos diversos níveis, há a necessidade de informações
sobre a atividade patrimonial, porém diferenciadas quanto ao
grau de detalhamento. Tal fato induz à geração de informações
com base em bancos de dados que possam ser compartilhados
por diversos usuários, devidamente autorizados e habilitados.
O subsistema de Administração Patrimonial, para melhor desempenhar o seu papel, deverá estar integrado com os seguintes subsistemas:
a) Planejamento, onde o provimento de bens permanentes
decorre da execução orçamentária e constitue Despesa de Capital0; b) Compras e Almoxarifado, onde são acionados os subsistemas após a autorização de compra pelo Ordenador de Despesas. A compra do bem, como já comentado, no que tange a
esses subsistemas, desencadeia-se com o processo licitatório,
empenho e termina na liquidação da despesa. Empenhando-se
a despesa, vários dados são inseridos no subsistema de compras, como: os dados do fornecedor, a descrição completa de
cada item a ser adquirido, a quantidade, o valor unitário, entre
outros. No ato do recebimento, o subsistema Almoxarifado, com
base na NE emitida, faz a conferência dos itens de acordo com
a NF de fornecimento, detectando, se for o caso, disparidades
entre os dados, depurando, assim, possíveis inconsistências.
Nesse momento ( o da liquidação da despesa), o subsistema de
Patrimônio também é acionado, face ao registro contábil de entrada dos bens na conta de Almoxarifado Depósito
(1.4.2.1.2.92.01); c) Financeiro, que, após a liquidação da despesa, é acionado face à obrigatoriedade da Administração Pública em arcar com seu compromisso de pagamento da dívida
com o fornecedor de bens; d) Pessoal, que, quando da distribuição dos bens, é acionado requerendo o tombamento, distribuição da carga ao detentor direto e consubstanciando com a assinatura do Termo de Responsabilidade; e) Manutenção, onde se
aproveitará os dados de registro do bem, como: o estado geral,
a data em que foi posto em operação, o prazo de garantias, as
condições de uso etc, de tal modo que as manutenções periódicas sejam executadas, aproveitando-se melhor a capacidade
de geração de serviço dos bens, subsidiando-se os gestores
com informações relevantes para decisões pertinentes; f) Custos, onde serão apurados os custos dos serviços prestados ou
dos bens fabricados. Nesse contexto, é importante haver a integração face às informações que auxiliam no cálculo da depreci-
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ação dos bens. Os registros referentes à data de aquisição, à
data de efetiva operação, ao valor de aquisição e ao tempo de
durabilidade estimada são importantes para alimentar o subsistema de apuração de custos, onde este calculará, de forma automática, a depreciação de cada item que esteja distribuído aos
diversos Departamentos ou Centros de Custos.
4.2 - ESTRUTURA DO MODELO
Nesse tópico será proposto, com base nos estudos de
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Speroni (1997), com as devidas adaptações, um modelo
de Sistema Integrado de Gestão Patrimonial, que informatizado e integrado aos demais subsistemas, se constituirá
num subsistema do Sistema de Informações Contábeis. A
figura abaixo, adaptada de Speroni (1997, p. 49), demonstra a integração do Sistema de Gestão Patrimonial ao
Sistema de Informações Contábeis do Órgão, apresentando, ainda, outros subsistemas com os quais se interage,
compartilhando, dessa forma, o banco de dados integrado:
Gestão
Patrimonial
Financeiro
Custos
Compras
Sistema Integrado
de Informações Contábeis
Almoxarifado
Planejamento
e Orçamento
Manutenção
Pessoal
Figura 1 Sistema Integrado de Informações Contábeis
Todos os subsistemas, trabalhando harmonicamente,
proporcionarão ao administrador público informações consistentes, além de racionalizar o uso da mão-de-obra, eliminando tarefas duplicadas e reduzindo, nesse caso, a pro-
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babilidade de inserção de dados incorretos. A próxima figura, adaptada de Speroni (1997, p. 49), abaixo representada, demonstra a estrutura do Subsistema de Gestão Patrimonial:
Módulo Controle
de
de Bens
Módulo Controle
Usuários
Subsistema de
Gestão Patrimonial
Módulo de Controle
de
Condições de Uso
Módulo de Correção
e Depreciação
Figura 2 Estrutura do Subsistema de Gestão Patrimonial
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O módulo Cadastro dos Bens destina-se a manter o registro
analítico dos bens que compõem o acervo patrimonial do órgão,
contendo todos os elementos necessários à identificação individualizada de cada componente. Pela integração com os Subsistemas de Compras (no ato do empenho) e Almoxarifado (no
ato do recebimento), a carga no módulo se faz de forma automática, evitando redundância de operações e aumentando a consistência nos controles. No caso de bens transferidos de outras
Unidades Gestoras, cedidos, doados etc, a inclusão dos dados
se fará no subsistema de Almoxarifado, onde se tomará por base
o documento de origem do bem.
O módulo Controle de Usuários destina-se a manter o controle dos agentes responsáveis pelo bem patrimonial alocado a uma determinada seção, bem como ao controle das pessoas autorizadas a utilizá-lo, ou ao responsável pelo mesmo.
Deverá conter informações sobre a unidade de lotação patrimonial (seção), centro de custo do usuário, responsável pelo
lotação (chefe), transferências de responsabilidades, localização física do bem, tais como prédio, sala e outros dados
que possam melhor identificar essa localização. A integração
com o Subsistema de Pessoal permite a captação automática
dos dados sobre as pessoas e os locais, com base em banco
de dados compartilhados. Assim, também permite prontas
buscas, a qualquer tempo, da carga patrimonial sob a responsabilidade de cada servidor, para fins de tomada de contas, transferência de responsabilidade por término de gestão,
entre outras.
O módulo Controle de Condições de Uso destina-se a manter o banco de dados qualitativo do bem sobre suas condições de uso ao longo do tempo, suas características de operação, recomendações de operação e manutenção, manuais
operacionais, contratos de manutenção, operações de manutenção planejadas e executadas, controle de uso, legislação
pertinente ao uso do bem (quando for o caso), e a responsabilidade sobre a guarda por parte do agente patrimonial e
usuários. Integra-se, principalmente, com o Subsistema de
Manutenção, mas existe um relacionamento, também, com os
Subsistemas de Planejamento, Compras e Almoxarifado, entre outros.
O Módulo de Correção de Valores e Depreciação destina-se
a manter atualizado os dados sobre o valor do bem, incorporação de novos valores, atualização e depreciação. Registra dados, entre outros, sobre o valor atualizado do bem, valor residual, custos com reformas e adaptações, atualização de valores, correção monetária, critérios de reavaliação e vida útil do
bem, assim como registra a data de todos os eventos. Integrase, principalmente, com os subsistemas Financeiro e de Custos.
Pensar
Contábil
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
5 - COMENTÁRIOS FINAIS
Esta pesquisa teve o propósito de mostrar a importância do
controle patrimonial dos bens permanentes, adquiridos pelas
Unidades Gestoras pertencentes a Administração Pública Federal Direta. O SIAFI, como se verificou no decorrer do trabalho,
não demonstra a composição física dos saldos de cada conta
contábil pertencente ao imobilizado de cada Unidade Gestora.
Só demonstra os itens monetários.
Um dos problemas detectado no decorrer da pesquisa é a
não adoção da técnica de reavaliação de bens e o não reconhecimento do desgaste dos mesmos, através da apropriação
das cotas de depreciação. A concepção de controle utilizada
hoje pela maioria dos Órgãos Públicos é simplista o suficiente a
não contemplar, a alta administração, com informações que sejam úteis, tempestivas e confiáveis, para suportar o processo
decisório, nos diversos níveis dentro da organização. A não utilização da concepção de Sistemas Integrados, na sua essência,
faz com que os dados sejam fragmentados em diversos setores,
não se aproveitando a base de dados do sistema tradicional de
contabilidade. Em conseqüência, abre-se uma lacuna entre a
entrada do bem na UG e o seu registro extra-contábil no patrimônio público.
A correta evidenciação do patrimônio, seguindo os Princípios
Fundamentais de Contabilidade e a legislação vigente, no que
tange ao correto controle do patrimônio, fará com que tornem
confiantes e seguras as informações registradas. A informação
contábil é de interesse de todos, dentro e fora da organização,
e deve ser formatada de acordo com a necessidade de cada
usuário, que tem interesse específico em determinada área,
servindo como instrumento de controle e planejamento.
Os Órgãos Públicos federais devem envidar esforços de tal
forma que usufruam do que a Tecnologia da Informação tem a
oferecer, utilizando-se da concepção de Sistemas Integrados,
que aproveitem a base de dados do SIAFI. Esse sistema de
controle não deve enfocar somente a imputação de responsabilidade, ou mesmo a localização física dos bens. O método de
tombamento dos bens, aliado a um sistema informatizado que
proporcione o controle através de leitora ótica, seria o perfeito
para que as Unidades Gestoras exercessem o efetivo controle
de seus bens, reduzindo o tempo de registro e economizando
os gastos com pessoal envolvido na área patrimonial, além de
proporcionar informações úteis e tempestivas sobre os bens em
uso na organização. Um bom sistema de informação não pode
repousar apenas em valores monetários. Desta forma, o administrador público estaria, efetivamente, racionalizando os recursos, gerindo o patrimônio sob sua responsabilidade, de forma
eficiente e eficaz.
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Contábil
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Pensar Contábil
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Aspectos jurídicos da extinção
da correção monetária das
demonstrações contábeis
- Um estudo de caso INTRODUÇÃO
Em 1990 o então Presidente da República Fernando Collor
de Mello decretou o confisco dos saldos das cadernetas de poupança e de outros tipos de investimentos, numa das medidas
mais arbitrárias de que se tem notícia na história recente desse
país, apropriando-se das quantias que os cidadãos, a custo de
anos de trabalho, levaram para acumular. Isso porque os investimentos em poupança normalmente são feitos por cidadãos de
baixa renda, com pequeno risco e, sobretudo, com garantia do
governo. Esse mesmo governo que deveria garantir esses depósitos foi quem veio reter essas quantias, deixando uma massa
de trabalhadores sem suas economias.
A situação se repetiu no governo anterior, com promulgação
da Lei 9249/95, que extingue a correção monetária. Isto tem
provocado a exposição do capital das empresas à desvalorização da moeda, já que ainda temos inflação, mesmo que pequena. A conseqüência disso é a apropriação do fisco sobre o capital dessas empresas, seu necessário físico. A razão disto reside
no fato de o governo, com o propósito de extinguir a inflação,
estar tributando mais do que simplesmente o lucro; vem tributando o patrimônio das empresas, tendo em vista que a inflação,
apesar de estar em patamares bem baixos, não foi eliminada.
Ela tem valor significativo ao longo de anos subseqüentes, já
que vários ítens do patrimônio deixaram de ser corrigidos, como
era feito anteriormente.
Pretende-se mostrar, primeiramente através dos dispositivos
legais pertinentes, que esta medida produz efeitos discutíveis.
Em um segundo momento pretende-se mostrar como as empresas estão sendo penalizadas com essa carga adicional de tributos sobre o patrimônio dessas empresas, através de um estudo
de caso prático, comparado às simulações já feitas anteriormente.
Pensar
Contábil
O Imposto de renda e Proventos de
Qualquer natureza e as normas legais
Classicamente, o Direito se divide em público e privado, em
virtude de critérios, muitas vezes contestados por alguns autores, que consideram essa divisão inútil. Ramo mais recente do
Direito, o Direito público, está intimamente relacionado com a
atividade estatal e vem se desenvolvendo e se tornando complexo na medida da organização e agigantamento do Estado.
Principalmente no século XX, com o advento das Grandes Guer-
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Carlos Alberto Pereira
Carlos Eduardo Claro de Azevedo
José Augusto Veiga da Costa Marques
Mestrado em Ciências Contábeis, área de concentração Gestão
Empresarial, da FACC/UFRJ
Mestrado em Ciências Contábeis, área de concentração Gestão Empresarial, da FACC/UFRJ
Mestrado em Ciências Contábeis, área de concentração Gestão
Empresarial, da FACC/UFRJ
Mestrado em Ciências Contábeis, área de concentração
Gestão Empresarial, da FACC/UFRJ
Mestrado em Ciências Contábeis, área de concentração Gestão
Empresarial, da FACC/UFRJ
ras Mundiais, esse agigantamento estatal tornou-se mais evidente. Outra razão é a consciência da necessidade de que o
Estado participe ativamente na busca da igualdade e justiça
social. Sob esse aspecto, o Direito tributário surge como base
para atuação do Estado no sentido de regular as suas relações
com os cidadãos, ou seja, com o conceito mais difundido de
direito tributário, que é estudar as relações jurídicas entre o Estado e o contribuinte, relativas à instituição, fiscalização e arrecadação de tributos.
Com classificação elencada no ramo das receitas derivadas,
que são aquelas que o Estado consegue angariar realizando
atividades que lhe são típicas e utilizando a soberania que lhe
foi outorgada pela coletividade, os tributos têm sua definição
discriminada pelo Código Tributário Nacional, em seu artigo 30:
Tributo é toda a prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada.
As regras referentes à tributação são definidas pela Lei, Lei
nesse sentido, significando ato que emana do poder executivo,
onde tem-se a representação popular. Como norma básica, temse no topo da hierarquia, a Constituição Federal de 1988, que
estabelece regras acerca da tributação, inclusive determinando
competências para a instituição das diversas modalidades de
tributos no nosso Sistema Tributário Nacional. Entre essas competências, há a da União de instituir o Imposto de Renda de
Pessoas Físicas e Jurídicas(artigo 145, inciso I e artigo 150,
inciso III). Entretanto, no mesmo texto constitucional, pode-se
observar algumas limitações a esse direito(artigo 150), entre
elas destacaremos as limitações que se prestam ao objeto de
nosso estudo:
Art. 145, parágrafo 1...Sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica do contribuinte...
Pensar Contábil
Nov - 2003/Jan - 2004
Art. 146. Cabe à Lei Complementar:
I- Dispor sobre conflitos de competência....
II- Regular as limitações constitucionais ao poder de tributar
III- Estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes...
Art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, Estados, ao Distrito Federal e
Municípios:
I - ...
II – Instituir tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independente da denominação jurídica dos rendimentos,
títulos ou direitos;
III - ...
IV - Utilizar tributo com efeito de confisco;
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
III - Renda e proventos de qualquer natureza;
...parágrafo segundo. O imposto previsto no inciso III:
I - Será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da Lei;
O Código Tributário Nacional, com a finalidade de complementar o texto constitucional, desenha a estrutura dos conceitos
que são estatuídos na Constituição Federal. Ao contrário do que
se pode pensar, esse Código não institui tributo algum, apenas
estabelece regras que deverão ser observadas pela lei que deva
instituir o tributo. Com relação ao Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer natureza, estas regras estão definidas no
art. 43 do CTN.
Esse diploma legal estabelece as regras acerca do que vem
a ser não somente o fato gerador do imposto, como também sua
base de cálculo, sujeito passivo, etc. Dentre essas definições
está a do fato gerador do imposto de renda, que é a aquisição de
disponibilidade econômica ou jurídica de:
1. Renda, que vem a ser o produto do capital, do trabalho ou
de ambos;
2. proventos de qualquer natureza, que são os acréscimos
patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
A partir desses dados, há que se fazer algumas reflexões a
respeito do assunto. Num primeiro momento discutiremos a
questão do que vem a ser renda. Segundo Ives Gandra Martins,
renda e proventos de qualquer natureza abrange os fatos que
devem ser considerados como acréscimo patrimonial. Desta forma, o legislador não pode considerar acréscimo patrimonial
aquilo que evidentemente não o seja. Outro jurista de renome,
Hugo de Brito Machado, comenta que não há renda nem provento que não seja acréscimo patrimonial, complementando que
não se admite tributação sobre aquilo que na verdade em momento algum ingressou no patrimônio, implicando incremento
de valor deste. Num segundo momento vamos comentar as infringências aos dispositivos constitucionais em virtude da extinção dos métodos de correção monetária.
O primeiro dispositivo constitucional infringido é, a nosso ver,
o princípio da capacidade contributiva, determinado no art. 145
da CF/1988, que diz:
Sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
Tendo em vista que as diversas modalidades de conformação do patrimônio podem ensejar maior ou menor exposição do
capital à inflação, independente da capacidade de contribuição
das empresas, há empresas que estão sendo mais penalizadas
do que outras em virtude dessa exposição à inflação, independentemente de sua capacidade contributiva.
Outra situação a ser analisada é a do art. 146 e seus parágrafos. Esse artigo estabelece que a competência para definir as
espécies de tributos, bases de cálculo e contribuintes é determinada por lei complementar, nesse caso o Código Tributário Nacional, que define claramente o significado de renda em seu
artigo 43, como já mostramos anteriormente.
O próximo seria o artigo 150. Neste caso podemos perceber
duas situações que vão de encontro aos preceitos constitucionais. A primeira delas é o inciso II desse artigo, já que há uma
situação de desigualdade de tratamento por parte do fisco sobre
os contribuintes. A segunda trata-se do inciso IV, já que, uma vez
que o imposto de renda é um tributo que deve incidir apenas
sobre o conceito de renda e, nesse caso está incidindo também
sobre o capital, o necessário físico das empresas, entende-se
que há um confisco por parte da autoridade fiscal sobre o patrimônio dessas empresas.
Por último será comentado o artigo 153. Entende-se que esse
critério da generalidade exposto no inciso I desse artigo fica
prejudicado com o fim da correção monetária, pelos motivos
que já expusemos anteriormente.
Da Correção Monetária.
Até 1995 coexistiam duas formas de se reconhecer os efeitos
da inflação no patrimônio das empresas. A primeira delas era a
decorrente da Lei 6.404/76, aqui chamado método simplificado,
que consistia basicamente em se corrigir os itens do ativo permanente e do patrimônio líquido.
A segunda, denominada correção monetária integral, estatuída pela Instrução CVM N.º 64/87, complementada pela Instrução CVM N.º 191/92, que consistia no reconhecimento de forma
global dos efeitos da variação do poder aquisitivo médio da
moeda. Esse método advogava a utilização de um índice geral
de preços que medisse a variação do poder aquisitivo da moeda em relação aos produtos e serviços disponíveis no nosso
sistema econômico. O índice geral de preços é um índice que
indica a variação do preço total de um grupo de bens e serviços,
em vigor em determinada data, em relação ao preço total de um
grupo idêntico em outro período selecionado.
Nem todos os componentes das demonstrações são afetados da mesma forma. No processo de conversão das quantias históricas para a moeda da data do fechamento, deve-se
distinguir os ítens monetários dos não-monetários. Tanto no
ativo quanto no passivo os ítens monetários são aqueles cujos valores podem ser expressos em quantias monetárias, ou
seja, em valores fixos a pagar ou a receber em dinheiro. Já os
ítens não-monetários do ativo ou do passivo representam
bens, direitos ou obrigações cuja realização não se expressa
em moeda e sim com a entrega de bens ou prestação de
serviços.
As receitas, normalmente expressas em datas correntes, são
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Contábil
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Pensar Contábil
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corrigidas em relação a sua data de obtenção. As receitas antecipadas devem ter sua data de recebimento consideradas.
Quanto às despesas, diversos ítens merecem considerações
especiais. A despesa que constitui o somatório dos ítens que
compõem o custo dos produtos vendidos, é um elemento composto que não pode ser corrigido pela atualização de seu valor
histórico por algum coeficiente. Temos que efetuar a correção
específica de cada um de seus componentes, considerando a
data de sua formação.
Despesas como depreciação, amortização e exaustão, pelo
fato de se referirem a eventos passados, devem ser corrigidas
em relação às datas de aquisição dos ativos a que se vinculam.
Outros tópicos merecem destaque, entretanto não serão abordados aqui.
Em síntese, o método de correção monetária integral apresenta três principais vantagens em relação ao método correspondente à legislação societária, a saber:
1. Avaliação de todos os ítens, inclusive referentes a
outros períodos, em uma moeda de mesmo poder aquisitivo, possibilitando comparações muito mais realistas;
2. Mensuração dos efeitos inflacionários sobre os ítens
patrimoniais diretamente expostos, ou seja, os monetários, propiciando informações extremamente importantes;
3. Avaliação mais precisa dos ítens não monetários, gerando avaliação mais realista do patrimônio e do resultado.
Como já dito anteriormente, a correção monetária existente
até 1995, consistia basicamente na atualização de elementos do
ativo permanente e do patrimônio líquido. Este dispositivo tinha
por finalidade principal eliminar ou reduzir os efeitos da perda de
valor aquisitivo dos bens patrimoniais em virtude da inflação, já
que os elementos do patrimônio são registrados atendendo a um
princípio contábil denominado “Princípio do Custo como base do
Valor”, ou seja, os elementos do patrimônio são registrados pelo
seu valor de custo ou aquisição. Deste modo, como a inflação
atingia patamares elevados, era possível reduzir-se a perda de
valor aquisitivo desses bens patrimoniais por ocasião da apresentação dos demonstrativos contábeis. Esse dispositivo permitia uma visão mais próxima da realidade do patrimônio.
Ocorre que, com a política governamental de eliminação da
inflação, deixou de ter sentido o emprego de qualquer tipo de
correção monetária. Dessa forma, através da Lei 9249/95 e da
implementação do Plano Real, o governo tenta colocar uma
“pedra” na questão da inflação. O problema é que a inflação
jamais deixou de existir, não obstante o fato de que a política
econômica do governo tenha dado resultados significativos, já
que reduziu a inflação a níveis muito baixos, se comparados
aos existentes até à época.
A conseqüência disso é que a eliminação da correção monetária nas demonstrações financeiras tem causando sérios problemas para as empresas, imperceptíveis num primeiro momento, mas que no decorrer de alguns períodos torna-se visível. Isso
já tinha sido previsto por renomados estudiosos da contabilidade que, em simulações já na época da extinção da correção
monetária, eram feitas.
A situação é particularmente simples. Os bens do ativo são
resultado dos investimentos feitos por sócios ou por terceiros.
Desse modo, quando alguém faz um investimento em uma em-
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presa, sócio ou terceiro, espera que esse investimento produza
retorno. Esses investimentos são convertidos, via de regra, em
bens patrimoniais que permanecem no ativo. Como esses bens
são registrados pelo seu custo de aquisição, segundo o princípio do “Custo como Base de Valor”, como já se expôs anteriormente, eles ficam expostos aos efeitos da inflação, inflação esta
que ainda existe, mesmo que pequena.
Como o resultado de um período, valor que servirá de suporte para a determinação da base de cálculo do Imposto de Renda, é o resultado do confronto entre receitas e despesas desse
período, pode-se observar reduções no ativo em virtude da inflação que antes era computado para apuração do lucro e hoje
não mais o são. Isso provoca um falso lucro, ou seja uma base
de cálculo aumentada para o Imposto de Renda, o que provocará uma carga tributária maior para o contribuinte, já que não se
considera mais nessa apuração uma despesa que antes era
considerada.
Pode-se analisar isso de duas formas. A primeira considerando que ocorre uma variação da alíquota do tributo em função de um lucro que não corresponde ao verdadeiro. Nesse
caso o fisco estaria tributando os contribuintes com alíquotas
diferentes, ferindo diversos princípios constitucionais já expostos anteriormente, já que o aumento da alíquota do tributo não
pode propriamente ser considerado um confisco, desde que
estabelecida em lei. A segunda maneira é a de que o fisco está
se utilizando de uma base de cálculo que não corresponde ao
verdadeiro lucro da empresa. O que queremos dizer é que,
uma vez tributando o Imposto de Renda sobre um lucro irreal e
essa tributação deve ocorrer, segundo os preceitos constitucionais, sobre o lucro, a renda propriamente dita. O que está
ocorrendo na prática é uma tributação sobre “mais” do que o
lucro. Como a configuração do patrimônio líquido compõe-se
basicamente de capital + reservas e lucros o fisco está, na
verdade, tributando o capital das empresas, que não configura, sob nenhuma hipótese, base de cálculo desse imposto.
Observe-se que os impostos sobre o patrimônio estão elencados não só na Constituição Federal, mas também no Código
Tributário Nacional.
Um exemplo.
Suponhamos que uma empresa iniciasse suas atividades com
a seguinte configuração patrimonial:
Caixa
20.000
Capital social
20.000
Levando-se em conta que esses são os únicos elementos
patrimoniais e que esse valor depositado no caixa pelos sócios tenha sido aplicado no mercado, com rendimentos de
20% no período e uma inflação de 15%, teríamos o seguinte
demonstrativo do resultado no período(supondo a alíquota
do I.R. de 25%), segundo a legislação vigente:
Receita
Lucro antes do I.R.
Pagamento de I.R.
Lucro Líquido
4.000
4.000
(1.000)
3.000
Façamos agora o mesmo caso considerando o efeito da infla-
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ção do período. A demonstração do resultado seria a seguinte:
Receita
Correção monetária
Lucro antes do I.R.
Pagamento de I.R.
Lucro Líquido
4.000
(3.000)
1.000
(250)
750
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Sem correção monetária:
Receita de vendas
Lucro antes do I.R.
Pagamento de I.R.
Lucro líquido
8.000
8.000
(2.000)
6.000
Com correção monetária:
Pode-se observar que houve uma redução do lucro no valor
de $3.000 correspondentes justamente à correção monetária
do período, pois na verdade esses $3.000 não são lucro e sim
reposição do poder aquisitivo da moeda. No primeiro caso houve um pagamento de I.R. de $ 1.000 e no segundo caso o pagamento foi de $250. O que estamos querendo demonstrar é que
essa diferença de $750 foi uma tributação que na verdade não
incidiu sobre o lucro da empresa e sim sobre seu patrimônio.
Para evidenciarmos isso conjugaremos os dois demonstrativos
anteriormente feitos:
Receita
Correção monetária
Lucro antes do I.R.
Provisão real de I.R.
Lucro Líquido
4.000
(3.000)
1.000
(1.000)
0
Ou discriminando-se as partes tributadas(lucro e patrimônio):
Imposto de Renda pago
Correção
Capital monetária do
20.000 capital 3.000
0
750
Lucro
1.000
250
Como o novo capital corresponde a $23.000($20.000 mais
os $3.000 correspondentes à atualização monetária). Se analisarmos que desses 23.000, foi pago 750 de I.R., chegaríamos a
conclusão que o fisco está se apropriando de 3,17% no período
do capital social da empresa, conforme demonstramos:
Capital social = 23.000
Imposto de renda pago sobre o capital = 750
Porcentagem do patrimônio da empresa entregue ao fisco = 750/23.000 = 0.0317(3.17%).
Agora apresentaremos um caso em que a correção monetária possui saldo credor, ou seja, um caso em que os ítens do
ativo permanente têm maior correção do que o patrimônio líquido. Suponhamos a seguinte situação hipotética do patrimônio
de uma empresa:
Caixa
Passivo
2.000
10.000
Imobilizado
Capital
28.000
20.000
Supondo não ter havido aplicação dos valores do caixa e que
tenha havido receitas de $8.000 no período referentes à serviços prestados e nenhuma outra receita ou despesa(como no
exemplo anterior, a inflação no período foi de 15% e o I.R de
25%). Neste caso, o demonstrativo de resultado seria o abaixo:
Correção do ativo permanente: 28.000X15% = 4.200
Correção do patrimônio líquido:20.000X15% = 3.000
Saldo da correção monetária(credor) = ............1.200
Receita de vendas
Saldo da correção monetária
Lucro antes do I.R.
Pagamento de I.R.
Lucro líquido
8.000
1.200
9.200
(2.300)
6.900
Neste caso temos uma diferença a maior de I.R. pago no caso
de correção monetária credora, tendo em vista que houve um
ganho em virtude de uma maior correção do ativo permanente
do que o patrimônio líquido(1.300). O excesso de I.R. pago corresponde justamente a essa diferença em virtude da correção.
Numa primeira análise poderia parecer que se estaria pagando menos I.R. em virtude da não correção monetária. Se
apenas considerarmos um exercício esse raciocínio estaria correto. Ocorre que, com o passar dos exercícios, os bens do ativo
permanente sofrem depreciação, depreciação esta que, em virtude dessa não correção do permanente estaria subavaliada,
reduzindo despesas do exercício e aumentando o lucro. Isto
proporcionaria um falso lucro ao longo dos anos, ocorrendo uma
tributação sobre o patrimônio.
Essa situação poderia ser antecipada se esse bem do ativo
permanente fosse vendido. Nesse caso, esse bem teria sido
baixado do ativo com seu valor escoimado da correção monetária, ou seja, uma despesa que deixou de ser computada para
redução da base de cálculo do I.R. Em ambos os casos, mesmo
que o valor presente do I.R. fique menor em algumas situações,
isso não quer dizer que não esteja havendo incidência desse
imposto sobre o patrimônio líquido das empresas.
Pensar
Contábil
Da manutenção do patrimônio
Situações recentes ocorridas na economia mundial nos dão
conta no sentido de que temos que fazer algumas reflexões
sobre os modelos adotados pelos diversos países causadores
do “terremoto” ocorrido no mercado de capitais, especialmente
o norte-americano e com reflexos no Brasil. Tema ainda pouco
difundido no Brasil, a manutenção física ou financeira do capital
vem tomando força.
David Solomoms, entre outros, já por volta de 1980 preconizava conceitualmente a manutenção física e financeira do capital, teoria essa corroborada por diversos outros autores, como
de Robert Sterling (1982), Carsberg (1982), de Revsine (1982),
de Butterworth (1982).
Um dos pontos essenciais dessa teoria é a discussão de como
se tem tentado manter o capital longe de variações, oscilações,
ou perdas. E a fórmula que tem imperado até aqui é aquela que
visa a manutenção financeira do capital (fundamentada nos princípios do mercado de capitais). Manter o capital longe de flutuações tem provocado mudanças conceituais profundas na contabilidade, a partir dos anos 80.
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O ponto crucial dessas mudanças é a tentativa de substituição do custo histórico pelo custo corrente. Outro ponto “nervoso”
é a revisão das estruturas de informação contábil (demonstrações contábeis).
No Brasil, um importante passo dado no sentido de se
manter o capital ileso às flutuações do mercado foi a instituição
da correção monetária, através da Lei 6.404/76 e da correção
monetária integral, através da Instrução CVM 64, já que o Brasil
é um país que sofre com as oscilações cambiais, dependente
que é do capital internacional, especialmente das taxas flutuantes de juros decorrentes da dívida externa.
Internacionalmente a preocupação da substituição do custo
em bases históricas recrudesceu por volta dos anos setenta em
virtude da extinção do acordo de Bretton Woods, com o abandono dos padrões de conversibilidade da moeda em ouro.
Basearam os pesquisadores norte-americanos seus conceitos contábeis de riqueza e de resultado da riqueza em idéias
econômicas preconizadas por Von Hayek (1941), Hicks (1939),
Pigou (1941) e outros economistas da metade do século XX. Na
década de 80, muitos pesquisadores se basearam na máxima
de Hicks de que:
A renda de um homem é o valor máximo que ele pode consumir durante uma semana e ainda permanecer com a situação
financeira no final da semana tão boa quanto no início.
Esse é um conceito que deveria ser observado pelos legisladores ao instituir o nosso imposto sobre a “renda”. Não questionamos o tributo em si, mas a base de cálculo que vem sendo
utilizada, desconsiderando os efeitos pernósticos da inflação.
Embora esse conceito de Hicks seja difícil de se demonstrar na
prática, já que essa manutenção depende de vários fatores exógenos, tais como mercado, políticas de governo, entende-se
que a manutenção do capital livre de efeitos da inflação é uma
medida que vai de encontro a esse objetivo.
Uma outra discussão acerca do capital é sobre sua função.
Seria a manutenção das operações da empresa, ou geração de
serviços potenciais, ou ambas? Ainda se observa em entidades
fechadas o procedimento dos gerentes no sentido de manter
suas atividades voltadas para a operacionalização do processo
fabril, como era feito desde a revolução industrial. Hoje os gerentes das corporações estão voltados para a consecução de
resultados financeiros, “não-operacionais” (serviços potenciais).
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Contábil
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Antônio Lopes de Sá teoriza a manutenção do capital, tratando de um “meio patrimonial” (capital) e de uma “necessidade”
(manutenção).
Os pesquisadores norte-americanos defendem a tese da
manutenção da quantidade física das unidades, ou seja, a
tese em que somente a variável quantidade determina a
prosperidade da empresa. Entretanto, segundo Antônio
Lopes de Sá o que determina a prosperidade da empresa
seria a eficácia das funções sistemáticas, estas autônomas
e interativas. Desta forma, como bem ressalta o mestre, é
necessário que o meio capital seja bastante funcional para
atender às necessidades de manutenção da empresa, necessidades estas que se alteram segundo diversas variáveis, tais como espaço, tempo, qualidade, quantidade, causa e efeito.
Por essa razão, considerar apenas a variável quantidade,
nesse caso, significa conduzir a empresa à ineficácia, ao engessamento operacional, ou seja, a resultados insatisfatórios que a
própria variável quantidade, isoladamente, pretendia evitar.
Diante desses conceitos e a partir da preocupação de diversos países na manutenção do capital das empresas, entendese que a medida do governo no sentido de eliminar a correção
monetária dos balanços vai na “contramão” das tendências internacionais, um passo atrás após um grande avanço, quando
da implantação dessa correção monetária.
Um caso prático
A seguir será apresentado um balanço correspondente aos
exercício de 1999 e 2000 da Copesul – Petroquímica do Sul
publicado em jornais. Em virtude de falta de dados, vamo-nos
restringir apenas aos componentes do balanço ativo permanente e patrimônio líquido e estimar a correção monetária com base
na Lei 6.404/76 e verificar a diferença paga a maior de I.R. em
virtude da não correção monetária.
Por uma questão de simplificação vamo-nos ater apenas na
variação do ativo permanente entre esses dois exercícios, supondo que essa variação tenha sido em virtude de baixa ou
venda. Nesse caso teremos uma despesa de correção monetária não incluída no demonstrativo do resultado do exercício de
2000, alterando o lucro para mais.
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COPESUL - COMPANHIA PETROQUÍMICA DO SUL E EMPRESA CONTROLADA
BALANÇOS PATRIMONIAIS
31 de dezembro de 2000 e 1999
(Valores expressos em milhares de reais)
ATIVO
Controladora
Consolidado
2000
1999
2000
1999
708
112
790
261
280.956
248.361
336.649
295.799
214.852
192.342
199.313
175.972
59.023
17.945
75.438
41.863
(18.572)
(14.447)
(5.680)
(1.118)
4.134
2.616
4.685
3.462
-
16.727
-
16.727
31.746
1.384
31.746
1.384
121.403
79.176
121.403
79.176
8.105
6.117
8.105
6.637
702.355
550.333
772.449
620.163
Circulante
Disponibilidades
Títulos e valores mobiliários
Contas a receber de clientes Partes relacionadas
Clientes – outros
Saques de exportação – faturados
Outras contas a receber
Adiantamentos a fornecedores
Impostos e taxas a recuperar
Estoques
Despesas pagas antecipadamente
Total do ativo circulante
Realizável a longo prazo
Partes relacionadas
-
101.717
128.974
10.120
6.638
10.120
9.472
1.625
9.472
14.270
14.144
14.270
407
8.605
407
5.265
6.676
5.265
37.688
39.534
139.405
168.508
20.950
46.415
16.253
12.322
1.642.104
1.731.319
1.642.104
1.731.319
34.421
41.214
34.421
41.214
1.697.475
1.818.948
1.692.778
1.784.855
2.437.518
2.408.815
2.604.632
2.573.526
Impostos e taxas a recuperar
6.638
Depósitos judiciais
1.625
Despesas pagas antecipadamente
Pensar
Contábil
-
14.144
Mútuos com terceiros
8.605
Sinistros a receber e outros
6.676
Permanente
Investimentos
Imobilizado
Diferido
Total do ativo
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Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Considerações:
Total do ativo permanente em 1999: ................................. $ 1.818.948.000
Total do ativo permanente em 2000: ................................. $ 1.697.475.000
Diferença: ........................................................................... $
121.473.000
Atualização monetária da diferença: 121.473.000X0.185 = 22.472.505
Imposto de renda pago a maior em virtude de não contabilização dessa diferença: 22.472.505X0.35 = 7.865.376.
Podemos deduzir a partir dessa simples verificação que a
empresa deixou de contabilizar uma despesa de $ 22.472.505
em virtude da não atualização do ativo permanente baixado,
aumentando o lucro nesse valor e, conseqüentemente tributando o I.R. sobre o patrimônio dessa empresa. Outras verificações
poderiam ter sido feitas, entretanto pela falta de dados mais
consistentes deixamos de elencar aqui, como a subavaliação
da depreciação em virtude da não atualização do permanente,
etc.
Conclusão:
A instituição da correção monetária foi um passo importante no sentido de a contabilidade se aperfeiçoar para fornecer
informações relevantes aos seus usuários. Entretanto, com
sua extinção, ocorreu não somente um retrocesso, mas os
relatórios contábeis deixaram de fornecer informações que
são de interesse principalmente dos acionistas, na medida
que está sendo informado um lucro que não condiz com a
realidade.
A análise do lucro passível de tributação deve ser encarada
com rigor, na medida que esse lucro é uma medida que pode, a
qualquer momento ser alterado em virtude de uma simples assembléia de acionistas, reduzindo-se a parcela que, porventura, comprometa o capital da empresa. Entretanto isso não ocorre com os valores recolhidos ao fisco com base no capital da
empresa que, uma vez recolhido, jamais retornará, causando
uma sangria no necessário físico das empresas.
Bibliografia:
Constituição da República Federativa do Brasil/1988
Código Tributário Nacional
Pensar
Contábil
Extinção da Correção Monetária – Sérios Problemas com o lucro e com a Tributação Sobre o Lucro, IOB – Boletim 33/96
FIPECAFI – Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras – Aprendendo Contabilidade em Moeda
Constante, São Paulo, Atlas, 1995
Hendriksen, Eldon S., Van Breda, Michael – Teoria da Contabilidade, São Paulo, Atlas, 1999
IUDÍCIBUS, Sérgio; MARTINS Eliseu e GELBCKE, Ernesto Rubens – Manual das Sociedades por Ações, Quarta edição,
São Paulo, Atlas, 1995
____. Tendências Evolutivas nas Doutrinas Contábeis – o Neopatrimonialismo. http://www.lopesdesa. com/.
Szuster, Natan – Cálculo e análise contábil do lucro passível de distribuição, Revista Brasileira de Contabilidade - 1986
____. Neopatrimonialismo como pensamento Moderno em Contabilidade. http://www.lopesdesa.com/.
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