Grice: “querer dizer”
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Grice: “querer dizer”
Grice: “querer dizer” Referências: Grice, Paul, “Meaning”, in Studies in the Way of Words, Cambridge (Mas.), Harvard University Press, 1989, pp 213-223. Schiffer, Stephen, Meaning, Oxford, Oxford University Press, 1972. Searle, John, Speech Acts, Cambridge, Cambridge University Press, 1969. Strawson, Peter, “Intention and convention in speech acts”, in LogicoLinguistic Papers, London, Methuen, 1971. Projecto de Grice: explicar a significação em termos de intenções. Reducionismo de Grice: reduzir o “significado das frases” ao “significado do falante”, e reduzir o “significado do falante” a noções psicológicas. Jogo com os diferentes sentidos do substantivo inglês meaning (“significado”) e o verbo to mean (“significar”, mas também “querer dizer”). Primeira distinção: “Significado natural” vs. “Significado não-natural” “Significado natural”: Those spots mean measles (“Aquelas marcas são um sinal/sintoma de sarampo”). Entre outras características, expressa uma correlação factual entre eventos (“O facto de que a pessoa tem aquelas marcas indica que tem sarampo”). Assim, não se pode dizer “O facto de que a pessoa tem aquelas marcas indica que tem sarampo, mas a pessoa não tem sarampo”. 1 “Significado não-natural”: Envolve a intenção do comunicador. O exemplo por excelência é a comunicação verbal (“Ao dizer a frase ‘O professor é muito competente’, Maria elogiou o professor”). Não há uma correlação factual entre eventos. Assim, pode dizer-se “Maria disse que o professor é muito competente, mas na realidade o professor é inepto”. Importante: não é necessário que o “significado não-natural” seja convencional. Certos gestos, por exemplo, podem “significar nãonaturalmente” sem serem por isso convencionais. Segunda distinção: “Significado do falante” vs. “Significado da frase” Diferença entre: (1) F (o falante) quis dizer com x que p. (2) x significa p. Muitas vezes, o significado do falante e o significado da frase não coincidem: o falante quer dizer mais do que aquilo que diz (ou algo totalmente diferente). Esta intuição está na base da teoria da conversação de Grice. 2 Primeira formulação da análise do significado como “querer-dizer”: Para querer dizer (significar) algo com a elocução x, o falante F deve ter a intenção de que: (1) A elocução de x por F produza uma certa resposta r numa audiência A; (2) A audiência A reconheça a intenção (1); (3) O reconhecimento, por A, da intenção (1), constitua ao menos parte da razão de A para produzir a resposta r. Vários contra-exemplos foram apresentados a esta análise: falar sozinho, responder a uma pergunta numa prova oral, lembrar alguém de algo que esta pessoa já sabia mas que no momento não lhe ocorre, etc. Além disso, é possível imaginar casos em que é possível satisfazer as condições (1)-(3) sem que se verifique uma situação de comunicação. Assim, por exemplo, Strawson propõe uma reformulação do esquema anterior para evitar determinados problemas: 3 Para querer dizer (significar) algo com a elocução x, o falante F deve ter a intenção de que: (1) A elocução de x por F produza uma certa resposta r numa audiência A; (2) A audiência A reconheça a intenção (1); (3) O reconhecimento, por A, da intenção (1), constitua ao menos parte da razão de A para produzir a resposta r. (4) A audiência A reconheça a intenção (2). Mas Strawson reconhece que outros contra-exemplos podem ser imaginados, tornando necessário um número indefinido de “intenções reflexivas” para que a comunicação seja bem sucedida (o que é psicologicamente implausível). Devido a esses e outros problemas, foram propostas várias revisões da análise original de Grice. O esquema abaixo sintetiza algumas destas reformulações: Para querer dizer (significar) algo (p) com a elocução x, o falante F deve ter a intenção de que: (1) A elocução de x por F active, numa audiência A, a crença de que F acredita que p; (2) A audiência A reconheça a intenção (1); (3) O reconhecimento, por A, da intenção (1), constitua ao menos parte da razão de A para activar a crença de que F acredita que p. 4 (4) (1)-(4) são objecto de “conhecimento mútuo” por F e A. A noção de “conhecimento mútuo” foi proposta por Schiffer (em Meaning) para evitar um regresso infinito de atribuições de intenção; mas pode por sua vez constituir outro regresso, e Grice manifestou algum cepticismo quanto a esta solução. A explicação do “significado do falante” em termos de intenções encontra assim problemas. O mesmo se verifica em relação ao projecto de explicar o “significado das frases” em termos do “significado dos falantes”. Grice não conseguiu oferecer uma formulação satisfatória desta redução. O problema mais grave diz respeito à capacidade de produção e compreensão de frases nunca antes utilizadas. Além disso, há uma componente “estrutural” na significação das frases que não se deixa reduzir a termos estritamente psicológicos. Torna-se difícil, assim defender a ideia de que “o que as frases significam” é uma função do que “as pessoas querem dizer com elas”. Conclusão: As abordagens puramente “convencionalistas” perdem de vista os aspectos não convencionais dos processos comunicativos e não dão conta do papel desempenhado pelas intenções dos comunicadores e as inferências contextuais realizadas pelos destinatários; já as abordagens puramente “intencionalistas” não 5 são capazes de explicar a produtividade e a sistematicidade da linguagem e os usos convencionais de muitas elocuções. As hipóteses de Austin e Grice deram origem a diversas tentativas de integração entre os papéis das intenções e das convenções na comunicação (p.ex., respectivamente Searle e Schiffer). No entanto, há questões em aberto, especialmente em relação ao estatuto problemático das convenções. 6